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Mestranda em História pelo Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal da Grande
Dourados (PPGH/UFGD). Bolsista Capes.
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(HALBWACHS, 2003, p. 31). Le Goff (2013) também aponta alguns elementos importantes
para o estudo da memória e insere o caráter de identidade como fundamental para conceituá-
la como algo a ser conquistado, construído:
está inserido. Assim, para o autor, a partir memória há uma significação do passado, o qual é
retratado através da narrativa do tempo histórico vivido (RICŒUR, 2007, p. 174).
Isto posto, podemos dizer que a história de Dourados foi e tem sido escrita, em grande
parte, por meio de memórias, testemunhos e vestígios escritos, sobretudo por autores
memorialistas. Dentre vários outros, destacamos os memorialistas e suas publicações, os quais
serão utilizados neste artigo: Ercília de Oliveira Pompeu (Monografia do município de
Dourados, publicado em 2014), Regina Heloíza Targa Moreira (Memória Fotográfica de
Dourados, publicado em 1990) e João Augusto Capilé Jr. (“Sinjão”), Julio Capilé, Maria de
Lourdes da Cruz e Souza (História, fatos e coisas douradenses, publicado em 1995).
e os outros elementos que foram compondo este espaço (MOREIRA, 1990, p. 21). Tais
elementos são entendidos como características formadoras de identidade cultural e da história
do município, de maneira que os moradores foram construindo, além de um sentimento de
pertencimento pelo lugar, e também por estabelecer um vínculo entre as memórias trazidas
dos locais de onde vieram. Esse vínculo, segundo Le Goff (2013) que se torna afetivo,
possibilita que essa população passe a se enxergar como “sujeitos da história”, que possuem
assim como direitos, também deveres para com a sua localidade.
Alguns “sujeitos” da história de Dourados são “destacados” nos discursos
memorialistas em suas atividades profissionais ou ações políticas, os chamados “pioneiros”.
Moreira (1990, p. 21) aponta algumas características dessas famílias que mais tarde darão
início ao processo de construção da primeira igreja católica na localidade.
cruzeiro ficava onde foi a residência episcopal sobre a invocação da Imaculada Conceição,
onde em 1912 foi rezado o primeiro terço. O segundo onde é hoje o loteamento São Pedro,
invocando Santa Rita e o terceiro na atual Cabeceira Alegre sobre a proteção de Santa
Catarina (POMPEU, 2014, p. 19).
No cruzeiro que dedicado à Imaculada Conceição, considerado um símbolo da fé da
pequena população que se formava, os fiéis costumavam juntar-se para fazer suas preces e
rezar os rosários e terços, geralmente em intenção à alma de algum conhecido ou familiar
(CAPILÉ JUNIOR; CAPILÉ; SOUZA, 1995, p. 107).
O cenário religioso vislumbrado na região era, de certo modo, precário. Pela falta de
assistência católica, leigos realizavam os batizados em casa, algumas famílias se encontravam
para “puxar as rezas” nas fazendas, com muitos elementos de crendices populares. “O povo
tinha sede de religião” (CAPILÉ JUNIOR, CAPILÉ, SOUZA, 1995, p. 187).
Na primeira década de existência do patrimônio não havia capelas, nem padres nem
juiz de paz. Os casamentos, batizados, missas e outras práticas que necessitavam da figura do
padre eram realizados quando os mesmos estavam de passagem pela região, as chamadas
“visitas de desobriga”. Moreira (1990) discorre sobre a figura do “padre” utilizando a obra de
Hélio Serejo “Homens de aço - a luta nos ervais do Mato Grosso” para discorrer sobre o que
ocorria nesta região:
Ou seja, de acordo com a autora, mesmo sem haver ainda um templo, uma capela onde
se encontrariam os fiéis para exercer suas práticas religiosas, a figura do padre se inseriu e
permaneceu na mística religiosa do povo, constituindo como tais a aspectos de identidade
cultural na medida em que os indivíduos necessitavam exercer os costumes e tradições
católicas trazidos consigo das regiões de onde vieram.
A partir desta necessidade e nesse contexto, os habitantes do povoado começaram a se
organizar para construir uma capela em 1923 (CAPILÉ JUNIOR; CAPILÉ; SOUZA, 1995, p.
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107), fato que culminou com uma comissão, composta em sua maioria por mulheres, pró-
construção da “capela da Conceição” (MOREIRA, 1990, p. 25). A primeira capela de
Dourados foi construída no espaço de tempo entre junho e dezembro de 1925, com doação do
terreno por um morador, espaço este onde atualmente fica a Catedral Imaculada Conceição.
No dia 08 de dezembro1 de 1925, a capela2 foi aberta ao público e recebeu a imagem de Nossa
Senhora Imaculada (POMPEU, 2014; MOREIRA, 1990). Porém, a inauguração oficial deu-se
somente em 1926, quando por ocasião esteve na região o padre missionário João Giardelli. A
Paróquia foi criada em outubro de 1935, ano em que Dourados se torna município e, em junho
de 1957 é criada a Diocese de Dourados, tendo sempre, como templo religioso principal a
Igreja Nossa Senhora Imaculada Conceição, antes capela.
Diante de tais apontamentos históricos, podemos entender que algumas marcas
simbólicas que são identificadas através das memórias dos lugares, personagens, datas e
acontecimentos são relevantes na tentativa de significar alguns aspectos identitários que
fazem parte do processo de criação do município e desenvolvimento do povoado a partir da
igreja Nossa Senhora Imaculada Conceição.
Nesse sentido, entendemos que a história da igreja em questão, se confunde muitas
vezes com a própria história do município e dos seus moradores, constituindo-se, dessa forma,
como uma herança de significados, ligados diretamente à memória e à questão do
pertencimento. Desse modo, essas memórias são importantes nos processo de formação
identitária do município, uma vez que nos faz entender-se também como sujeito pertencente
deste processo histórico.
Assim, a memória e a identidade cultural da Igreja Nossa Senhora Imaculada
Conceição fazem parte de um conjunto de fatores que podem contribuir para a organização do
processo e do sentido histórico da cidade. Atuando, sobretudo, na intenção de manter a
unidade do grupo social em torno dos referenciais de identidade em comum.
Referências Bibliográficas
1 Data de comemoração da Imaculada Conceição de Maria, mãe de Jesus, segundo as práticas católicas.
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Nesta época, a capela ficou subordinada à Diocese de Corumbá.
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CAPILÉ JUNIOR, João Augusto.; CAPILÉ, Júlio.; SOUZA, Maria de Lourdes da Cruz.
História, fatos e coisas douradenses. Dourados/MS: s/ed., 1995.
POLLAK, Michael. Memória e identidade social. Estudos históricos. Rio de Janeiro, vol. 5,
n. 10, 1992, p. 200-212.