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Sequência 4 Os Maias de Eça de Queirós

11º Ano

Leia, atentamente, o texto a seguir transcrito.

Por uma manhã de abril, nas vésperas de Páscoa, Vilaça chegava de novo a Sta. Olávia.
Não o esperavam tão cedo; e como era o primeiro dia bonito dessa primavera chuvosa os
senhores andavam para a quinta.[…] As três portas envidraçadas estavam abertas para o
terraço, que se estendia ao sol, com a sua balaustrada de mármore coberta de trepadeiras: e
5 Vilaça, adiantando-se para os degraus que desciam ao jardim, mal pôde reconhecer Afonso da
Maia naquele velho de barba de neve, mas tão robusto e corado, que vinha subindo a rua de
romãzeiras com o seu neto pela mão.
Carlos, ao avistar no terraço um desconhecido, de chapéu alto, abafado num cache-nez
de pelúcia, correu a mirá-lo, curioso - e achou-se arrebatado nos braços do bom Vilaça, que
10 largara o guarda-sol, o beijava pelo cabelo, pela face, balbuciando: - Oh meu menino, meu
querido menino! Que lindo que está! que crescido que está...
- Então, sem avisar, Vilaça? exclamava Afonso da Maia, chegando de braços abertos.
-Nós só o esperávamos para a semana, criatura! Os dois velhos abraçaram-se; depois um
momento os seus olhos encontraram-se, vivos e húmidos, e tornaram a apertar-se comovidos.
15 Carlos ao lado, muito sério, todo esbelto, com as mãos enterradas nos bolsos das suas largas
bragas de flanela branca, o casquete da mesma flanela posta de lado sobre os belos anéis do
cabelo negro - continuava a mirar o Vilaça, que com o beiço trémulo, tendo tirado a luva,
limpava os olhos por baixo dos óculos.
- E ninguém a esperá-lo, nem um criado lá em baixo no rio! dizia Afonso. Enfim, cá o temos, é o
20 essencial... E como você está rijo, Vilaça! - E V. Ex.ª meu senhor! balbuciou o administrador,
engolindo um soluço. Nem uma ruga! Branco sim, mas uma cara de moço... Eu nem o
conhecia!... Quando me lembro, a ultima vez que o vi... E cá isto! cá esta linda flor!... Ia abraçar
Carlos outra vez entusiasmado, mas o rapaz fugiu-lhe com uma bela risada, saltou do terraço,
foi pendurar-se de um trapézio armado entre as árvores, e ficou lá, balançando-se em cadência,
25 forte e airoso, gritando: «Tu és o Vilaça!»
O Vilaça, de guarda-sol debaixo do braço, contemplava-o embevecido.
- Estás uma linda criança! Faz gosto! E parece-se com o pai. Os mesmos olhos, olhos dos Maias,
o cabelo encaracolado... Mas há- de ser muito mais homem! […]
Apenas no corredor, o mordomo, ansioso por conversar com o senhor administrador,
30 perguntou-lhe, desembaraçando-o do guarda-sol e do xaile-manta:
- Com franqueza, como nos acha por cá, pela quinta, Sr. Vilaça?
- Estou contente. Pode-se vir por gosto a Santa Olávia.
E, pousando familiarmente a mão no ombro do escudeiro, piscando o olho húmido:

- Tudo isto é o menino. Fez reviver o patrão! O Teixeira riu respeitosamente. O menino
realmente era a alegria da casa... […]
35 - Então, o nosso Carlinhos não gosta de esperar, hein? Já se sabe, é ele quem governa... Mimos
e mais mimos, naturalmente... Mas o Teixeira muito grave, muito sério, desiludiu o Sr.

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administrador. Mimos e mais mimos, dizia Sua Senhoria? Coitadinho dele, que tinha sido
educado com uma vara de ferro! Se ele fosse a contar ao Sr. Vilaça! Não tinha a criança cinco
35 anos já dormia num quarto só, sem lamparina; e todas as manhãs, zás, para dentro duma tina
de água fria, às vezes a gear lá fora... E outras barbaridades. Se não se soubesse a grande paixão
do avô pela criança, havia de se dizer que a queria morta. Deus lhe perdoe, ele, Teixeira, chegara
a pensa-lo... Mas não, parece que era sistema inglês! Deixava-o correr, cair, trepar às árvores,
molhar-se, apanhar soalheiras, como um filho de caseiro. E depois o rigor com as comidas! Só a
40 certas horas e de certas coisas... E às vezes a criancinha, com os olhos abertos, a aguar! Muita,
muita dureza. […]
Os três homens [Afonso da Maia, Vilaça e o abade Custódio] sentaram-se à mesa do café.
Defronte do terraço, o Brown, de boné escocês posto ao lado e grande cachimbo na boca,
puxava ao alto a barra do trapézio para Carlos se balouçar. Então o Vilaça pediu para se voltar.
45 Não gostava de ver ginásticas […].
- E parece-me imprudente, sobre o jantar…
- Qual, é só balouçar-se, olhe aquilo!
Mas Vilaça não se moveu, com a face sobre a chávena. […]

50 (Cap.III)

Grupo I

Responda, por palavras suas e de forma completa, às questões que se seguem.

1.Tendo em conta a o que já conhece da obra, explique por que motivo Vilaça «mal pôde
55 reconhecer Afonso da Maia» (ll.5-6) quando o avistou em Santa Olávia e por que razão se operou
esta mudança em Afonso? Justifique a sua resposta através de uma citação do texto.

2. Por que motivo Vilaça, quando afirma que Carlos é parecido com o pai, sente necessidade de
acrescentar «Mas há - de ser muito mais homem! (ll.24-25)?

3.Com base neste excerto, elabore o retrato físico e psicológico de Carlos. Justifique cada um
60 dos traços apresentados através de uma citação do texto.

4. Explique que aspetos da educação de Carlos são reprovados por Teixeira.

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GRUPO II

Leia, atentamente, o seguinte texto.

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Camões viveu a fase terminal da expansão portuguesa e, depois, a da decadência e do
desmoronamento político do seu país. (...) Mas, ao mesmo tempo, Camões viveu um período
intelectual singular da história sociocultural, económica e política de Portugal, da Europa e do
Mundo. (...)
5 Com as navegações, os homens acabavam de adquirir novas dimensões, muitas vezes
contraditórias, para o pensamento, e novos horizontes, muitas vezes alucinantes, para a sua
errância, o que tornava possível a mistura de vontade e audácia, especulação e riqueza, viagem
e perigo, livre-arbítrio e fatalismo. Tudo isso os levava a viver dramaticamente uma época em
que os mais esclarecidos viam a aventura portuguesa como uma forma de expansão europeia
10 sob o denominador comum que lhes era possível conceber: a propagação da fé cristã. (...)
A ideologia dominante, consciente do alcance universal das descobertas portuguesas e
comparando-as às narrativas fabulosas dos feitos heróicos da antiguidade clássica, concluía pela
superioridade das expedições modernas e aspirava a vê-las cantadas sob o modelo clássico da
epopeia, dimensão que faltava ainda à glória que tais feitos mereciam e que poderia fazê-la valer
15 em toda a parte. A viagem de Bartolomeu Dias (passagem do Cabo da Boa Esperança, em 1488),
quatro anos antes de Colombo e muito mais do que a jornada deste, abriu novas perspetivas
para a revolução da noção de espaço planetário, podendo, por isso, ser justamente considerada
o limiar de uma nova era. Dez anos depois, a viagem de Vasco da Gama (1497/98) tinha sido a
que mais radicalmente contribuíra para a transformação da civilização europeia e da História do
20 Mundo. E houvera ainda, ao longo de décadas, muitas outras viagens portuguesas da maior
importância. Mas faltava ainda a dimensão da glorificação pela criação artística, relativamente
aos feitos de que provinha tão grande transformação (...) e que haviam gerado tão grande massa
de informações acumuladas sobre os descobrimentos portugueses, informações essas que
todos, príncipes, homens políticos e de ciência, eclesiásticos e intelectuais, aventureiros,
25 viajantes, marinheiros, piratas, diplomatas e espiões, buscavam avidamente na Europa.

Vasco Graça Moura, «Camões e os Descobrimentos», in Oceanos, n.º 10, Abril, 1992 (adaptado)

Selecione, em cada um dos itens de 1 a 7, a única opção que permite obter uma afirmação
adequada ao sentido do texto.

Escreva, na folha de respostas, o número do item e a letra que identifica a opção correta.

1. Em relação às proezas exaltadas na antiguidade clássica, os contemporâneos de Camões


consideraram a expansão portuguesa de importância …

(A) similar.
(B) irrelevante.
(C) superior.
(D) inconcebível.

2. A aventura portuguesa entendida como uma forma de divulgação do cristianismo traduz o


pensamento da classe mais…

(A) inculta.
(B) instruída.
(C) poderosa.
(D) belicosa.

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3. A passagem do Cabo da Boa Esperança, no século XV…

(A) marcou o término da aventura portuguesa.


(B) constituiu um hiato na evolução do conhecimento.
(C) marcou o começo de uma nova época.
(D) constituiu um embargo ao avanço científico.

4.As expressões textuais «expansão portuguesa» (l.1), «aventura portuguesa» (l.9),


«descobertas portuguesas» (l.11), e «descobrimentos portugueses» (l.25)...

(A) frásica.
(B) lexical.
(C) interfrásica.
(D) temporal.

5.Os termos livre- arbítrio e fatalismo mantém entre si uma relação semântica de …(l.8)

(A) equivalência.
(B) hierarquia.
(C) oposição.
(D) inclusão.

6. Em «para a sua errância» (linhas 6 e 7) «sua» remete para…

(A) «as navegações» (linha 5).


(B) «os homens» (linha 5).
(C) «o pensamento» (linha 6).
(D) «novos horizontes» (linha 6).

7. A forma verbal «haviam gerado» (linha 22) encontra-se no…

(A) pretérito mais-que-perfeito composto do indicativo.


(B) pretérito mais-que-perfeito do conjuntivo.
(C) pretérito perfeito composto do indicativo.
(D) pretérito perfeito do conjuntivo.

2. Faça corresponder a cada segmento textual da coluna A um único segmento textual da


coluna B, de modo a obter uma afirmação adequada ao sentido do texto.
Escreva, na folha de respostas, as letras e os números correspondentes. Utilize cada letra e
cada número apenas uma vez.

Coluna A Coluna B

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(a) Com o conector «Mas» (linha 2), (1) o enunciador constrói uma relação de
simultaneidade com a escrita da epopeia.
(2) o enunciador fundamenta a ideia exposta
(b) Ao usar parênteses (linha 15), no segundo parágrafo do texto.
(3) o enunciador introduz uma perspetiva de
(c) Ao mencionar a viagem de Bartolomeu outro autor, relativamente aos factos
Dias, a de Vasco da Gama e outras viagens apresentados.
portuguesas, nas linhas 15 a 20, (4) o enunciador clarifica a referência de
uma
expressão nominal.
(d) Com o advérbio «avidamente» (linha 25), (5) o enunciador desvaloriza a importância
dos factos apresentados.
(6) o enunciador introduz uma relação de
contraste.
(7) o enunciador introduz um modificador
do
predicado.
(8) o enunciador retoma um referente
expresso.

Grupo III

Na obra Os Maias, de Eça de Queirós, o comportamento e as ideologias de Afonso da


Maia desencadearam a fúria do pai. De tal forma que este decidiu castigar o filho, expulsando-
o de casa.”
As gerações mais antigas têm, por vezes, dificuldade em compreender os ideais a que as
gerações mais novas aderem.
Num texto bem estruturado, com um mínimo de 250 e um máximo de 300 palavras,
apresente uma reflexão sobre a afirmação. Para fundamentar o seu ponto de vista, recorra, no
mínimo, a dois argumentos, ilustrando cada um deles com, pelo menos um exemplo
significativo.
Bom trabalho!

Cotações
GRUPO I ……………100 Pontos
1. ……………….. 25 pts
2. ……………….. 25pts
3. ……………… 25 pts

Página 5 de 6
4. …………… … 25 pts

GRUPO II ………… 50 Pontos


1. ((7x5) ………….. 35 pts
2. …………………...20 pts
GRUPO III ………… 50 Pontos

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