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Sumário

MÓDULO I: CONCEITOS, PRINCIPIOS E O CENÁRIO NACIONAL DA REDUÇÃO


DE DANOS...........................................................................................................1
AULA 1: POLÍTICAS PÚBLICAS DE REDUÇÃO DE DANOS.................................................................2
Conceitos a respeito de Redução de Danos (RD).....................................................................................3
A Redução de Danos aplicada ao contexto do uso de drogas e das infecções sexualmente
transmissíveis (IST).......................................................................................................................................3
Princípios Básicos da Estratégia de Redução de Danos...........................................................................4
Breve histórico da Redução de Danos no contexto internacional e nacional....................................6
Evolução das políticas públicas de Redução de Danos no Brasil.........................................................9
A IV Conferência Nacional De Saúde Mental e a Redução De Danos.................................................12

AULA 2: LEGISLAÇÃO E POLÍTICAS PÚBLICAS SOBRE ÁLCOOL E OUTRAS DROGAS...................15


As convenções internacionais a respeito das drogas............................................................................16
A legislação nacional a respeito das drogas............................................................................................18
LEI 11.343/2006..........................................................................................................................................18
Outros Decretos e Leis sobre drogas no Brasil......................................................................................20
A Política Nacional de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas...............................................................22
A Lei n.º 10.216...........................................................................................................................................23
Outras leis e decretos.................................................................................................................................24
Resumo.......................................................................................................................................................25

AULA 3: ESTRATÉGIAS DE REDUÇÃO DE DANOS NA ATENÇÃO BÁSICA E NOS CENTROS DE


ATENÇÃO PSICOSSOCIAL (CAPS)....................................................................................................27
As Redes de Atenção do SUS (RAS)..........................................................................................................28
Rede de Atenção Psicossocial (RAPS)......................................................................................................29
O cuidado na Atenção Básica....................................................................................................................33
Matriciamento............................................................................................................................................35
Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS)............................................................................................36
Consultórios na Rua e outras iniciativas bem-sucedidas......................................................................39
Resumo.......................................................................................................................................................43

AULA 4: A RELAÇÃO SUJEITO/DROGA/CONTEXTO........................................................................45


Sujeito..........................................................................................................................................................46
As Drogas....................................................................................................................................................49
Voltando aos Contextos..............................................................................................................................49
Os tipos de clínica........................................................................................................................................51

GLOSSÁRIO.......................................................................................................................................58
REFERÊNCIAS....................................................................................................................................59

MÓDULO II........................................................................................................63

AULA 1 : HIV/AIDS E OUTRAS INFECÇÕES SEXUALMENTE TRANSMISSÍVEIS...............................64


O que são Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST)?......................................................................65
SÍFILIS E SÍFILIS CONGÊNITA......................................................................................................................65
Sinais e sintomas........................................................................................................................................66
SÍFILIS CONGÊNITA.....................................................................................................................................68
GONORREIA................................................................................................................................................70
HEPATITES...................................................................................................................................................72
HEPATITE B E HEPATITE C.........................................................................................................................72
HIV e AIDS...................................................................................................................................................74
Resumo.......................................................................................................................................................78

AULA 2 : Dependência química e abordagem neuroquímica da dependência........................79


Fatores que envolvem a dependência neuroquímica.............................................................................80
Funcionamento biológico da dependência............................................................................................82
Diagnóstico da dependência......................................................................................................................85
Cage.............................................................................................................................................................87
Resumo.......................................................................................................................................................88

AULA 3 : Alcoolismo.........................................................................................................................89
Alcoólatra ou alcoolista?.............................................................................................................................90
Mecanismo de ação do álcool no corpo..................................................................................................91
Problemas físicos........................................................................................................................................93
Problemas sociais.......................................................................................................................................97
Tratamento farmacológico........................................................................................................................98
Resumo.....................................................................................................................................................100

AULA 4 : Principais drogas de abuso e seus efeitos...................................................................101


Benzodiazepínicos...................................................................................................................................102
Solventes ou inalantes.............................................................................................................................103
Drogas Opiáceas......................................................................................................................................105
Cocaína......................................................................................................................................................107
Anfetaminas.............................................................................................................................................108
Crack..........................................................................................................................................................110
Maconha...................................................................................................................................................112
LSD - Dietilamida do Ácido Lisérgico......................................................................................................114
Resumo.....................................................................................................................................................116

AULA 5 : Ações de Prevenção........................................................................................................117


Redução de Danos para Drogas Injetáveis............................................................................................118
Redução de Danos para Drogas Ingeridas............................................................................................118
Redução de Danos para o Álcool............................................................................................................119
Redução de Danos para Drogas Inaladas e/ou Aspiradas..................................................................121
Redução de Danos para Drogas Fumadas............................................................................................121
Prevenção combinada.............................................................................................................................122
Resumo.....................................................................................................................................................129

GLOSSÁRIO.....................................................................................................................................130
REFERÊNCIAS..................................................................................................................................130

MÓDULO III....................................................................................................135
AULA 1 : PREVENÇÃO E PROMOÇÃO DA SAÚDE DOS USUÁRIOS DE DROGAS..........................136
Prevenção do uso e abuso de Substâncias Psicoativas (SPA)...........................................................137
Fatores de Risco e de Proteção...............................................................................................................139
Promoção de Saúde na perspectiva da Prevenção aos problemas relacionados
ao uso de drogas.......................................................................................................................................142
Níveis de prevenção..................................................................................................................................144
Intervenções em fatores de risco e proteção ao uso de drogas na perspectiva da Prevenção....145
Modelos de prevenção baseados em evidências.................................................................................147
Análise crítica sobre os modelos de prevenção....................................................................................149
Prevenção na lógica de Rede..................................................................................................................151
Prevenção Combinada: um novo paradigma na prevenção do HIV/AIDS........................................153
Resumo.....................................................................................................................................................160

AULA 02 : REDUÇÃO DE DANOS ASSOCIADOS AO USO DE DROGAS.........................................161


Estratégias de Redução de Danos..........................................................................................................162
Resumo.....................................................................................................................................................167

AULA 03 : INTERSETORIALIDADE E INTEGRALIDADE DA ASSISTÊNCIA......................................169


Cuidado integral às pessoas que usam drogas....................................................................................170
A construção do cuidado em rede.........................................................................................................172
Intersetorialidade....................................................................................................................................173
Exemplos de práticas intersetoriais na saúde......................................................................................175
Resumo.....................................................................................................................................................176

AULA 04: ENTREVISTA MOTIVACIONAL, ABORDAGEM, ACOLHIMENTO, ATENDIMENTO E


REINSERÇÃO SOCIAL......................................................................................................................177
Entrevista Motivacional (Em)..................................................................................................................178
Estágios motivacionais.............................................................................................................................178
Acolhimento.............................................................................................................................................183
Abordagem, atendimento e a reinserção social...................................................................................186
Família e seu contexto social...................................................................................................................187
A Comunidade e suas relações...............................................................................................................188
A rede social e suas conexões.................................................................................................................188
Reinserção Social......................................................................................................................................190
Resumo.....................................................................................................................................................190

AULA 05: VÍNCULO AO TRATAMENTO..........................................................................................191


Vínculo e afetos........................................................................................................................................192
O processo de vínculo e suas implicações.............................................................................................193
Auxiliando o assistido a lidar com crises...............................................................................................196
Resumo.....................................................................................................................................................197

AULA 06: ASSISTÊNCIA AO USUÁRIO DE DROGAS PORTADOR DO HIV/AIDS/HV.....................199


Vulnerabilidade........................................................................................................................................200
Situações de risco relacionadas às ISTs, AIDS/HIV e hepatites virais.................................................203
Orientações para a realização da testagem das ISTs, AIDS/HIV e hepatites virais..........................204
Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDT), na perspectiva do Cuidado.........................209
Atenção e cuidado no caso de HIV........................................................................................................212
Resumo.....................................................................................................................................................216

GLOSSÁRIO.....................................................................................................................................217
REFERÊNCIAS..................................................................................................................................218

CRÉDITOS........................................................................................................219
MÓDULO I: CONCEITOS,
PRINCIPIOS E O CENÁRIO
NACIONAL DA REDUÇÃO DE DANOS
Olá Cursista!

Seja bem-vindo ao primeiro módulo deste curso. Nele você iniciará


seus estudos e reflexões sobre a Redução de Danos, seus conceitos,
princípios e sua importância na atenção e cuidado em saúde, relacio-
nados às IST/AIDS e hepatites virais e ao uso de drogas. A Redução de
Danos será apresentada como uma Estratégia e uma Ética que po-
dem fundamentar as ações dos trabalhadores deste campo. Em segui-
da, discutiremos a Política de Atenção ao Álcool e Outras Drogas e os
instrumentos legais e normativos desta área. Depois, destacaremos a
estratégia da Redução de Danos no contexto da atenção primária e da
atenção psicossocial no Brasil, percorrendo a história da constituição
destas políticas e trazendo elementos para o debate atual deste campo.
Por fim, teremos a discussão a respeito da tríade dos conceitos de Su-
jeito/ Drogas e Contexto, que marca uma visão ampliada e singular da
relação das pessoas com o uso de drogas e seus contextos.

Bons estudos!

Curso
CAPACITAÇÃO EM
REDUÇÃO DE DANOS
MINISTÉRIO DA SAÚDE
1
AULA 1: POLÍTICAS PÚBLICAS DE REDUÇÃO DE DANOS

Você sabe o que é Redução de Danos (RD)?

Consideramos a Redução de Danos como uma estratégia transver-


sal que se integra com várias políticas públicas e é imprescindível para
o cuidado em saúde e para a inclusão social, com especial atenção às
populações mais vulneráveis, às questões de gênero e à sexualidade. A
RD convida você a ter um novo olhar para os sujeitos e a saúde e é uma
atitude exercitada diariamente. Esse entendimento diferenciado consi-
dera a RD como promotora de cidadania, de acesso às ações preventi-
vas, ao autocuidado e à adoção de práticas mais seguras em relação às
infecções sexualmente transmissíveis (IST).
A Redução de Danos se aplica a diversas áreas da saúde, como des-
tacaremos neste curso, desde as infecções sexualmente transmissíveis
e sua prevenção, ao campo do cuidado na atenção psicossocial e aos
problemas relacionados ao álcool e outras Drogas, assuntos que serão
abordados com mais detalhes no Módulos 2 e 3.
Nesta Aula teremos o desafio de compreender a Redução de Danos,
seus conceitos e práticas e de como esta estratégia foi se incorporando
às diretrizes brasileiras para os serviços e para as ações no campo das
IST/AIDS. Apresentaremos, também, o processo de constituição da Re-
dução de Danos como parte das políticas públicas do Sistema Único de
Saúde (SUS). Vamos lá?

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CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
1. Conceitos a respeito de Redução de Danos (RD)

Redução de Danos (RD) é uma estratégia de saúde pública que visa


diminuir as vulnerabilidades de risco social, individual e comunitário,
relacionados ao uso de drogas. A abordagem da RD reconhece o usuá-
rio em suas singularidades e, mais do que isso, constrói com ele estra-
tégias, tendo como foco a defesa de sua vida (BRASIL, 2004).
De acordo com a REDUC - Rede Brasileira de Redução de Danos -
para além de um conjunto de técnicas e estratégias de cuidado em saú-
de, a Redução de Danos (RD) é uma perspectiva profundamente ética,
sendo, portanto:

(...) uma postura, uma atitude, um modo de se portar em relação ao usuário e


aos inúmeros problemas relacionados à maneira como a nossa sociedade vem
abordando a questão das drogas. (MACRAE; GORGULHO, 2003)
Desta forma, esses conceitos de Redução de Danos apontam para a
necessidade de ampliar a visão sobre este campo e sobre os fenômenos
envolvidos, o que implica considerar todos os contextos relacionados,
as dimensões sociais, políticas, econômicas, a organização dos serviços
e as relações que se estabelecem entre profissionais e usuários. Assim,
a RD visa à promoção de bem estar das pessoas e tem uma perspectiva
mais abrangente e complexa da saúde, dos riscos e danos e também
uma compreensão sobre os sujeitos, como agentes históricos, sociais
e subjetivos.

2. A Redução de Danos aplicada ao contexto do uso de


drogas e das infecções sexualmente transmissíveis (IST)

A RD também é um conjunto de estratégias e ferramentas de abor-


dagem e de cuidado com pessoas com infecções sexualmente trans-
missíveis e/ou com uso de álcool e outras drogas, bem como, de pre-
venção de situações de risco e utilização de técnicas de substituição de
drogas ou de uso adequado de insumos. Nessa perspectiva, a RD:

•• É uma estratégia que trata o consumo de drogas como questão de saúde


pública;
•• É uma abordagem dialógica, que valoriza a voz dos sujeitos para além do
sintoma, considerando-os como produtores de conhecimento a respeito
de seu próprio cuidado;

MINISTÉRIO DA SAÚDE
3
•• Não julga, não pune e não exclui o paciente;
•• Enxerga o usuário como pessoa que precisa de cuidados de saúde e não
como criminoso ou degenerado;
•• Opõe-se à “Exigência de Abstinência” para todos os usuários;
•• É comprovadamente eficiente no tratamento para dependência do álcool,
da nicotina e de heroína;
•• É a mais eficiente estratégia de cuidado para os pacientes com comorbi-
dades graves
•• Diminui as barreiras para adesão ao cuidado;
•• Amplia o universo dos pacientes atendidos;
•• É compatível com as psicoterapias e busca a responsabilização pessoal e
a autonomia.

2.1 Princípios Básicos da Estratégia de Redução de Danos

A Redução de Danos está fundamentada em quatro pilares:

Pragmatismo Tolerância Diversidade Vínculo

Fonte: autor

•• Pragmatismo: A abordagem de RD procurará, identificando o padrão de


uso de drogas de cada usuário, definir, com a participação dele, aquilo que
é possível fazer, o que é viável dentro de seu contexto, de forma muito
objetiva, sem colocar metas impossíveis de serem atingidas ou que não
sejam decididas com o usuário.
•• Tolerância: A abordagem RD não julga e não condena o comportamento
dos usuários. A tolerância com os modos de ser e de viver de cada pessoa
é base para a empatia com o usuário, baseia-se no respeito à diversidade
de cada sujeito e à realidade em que vive.
•• Diversidade: A RD não oferta apenas uma estratégia de cuidado, um

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CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
único serviço, uma única saída. A RD fundamenta-se na necessidade de
uma diversidade de ofertas de atenção ao usuário, pois compreende que
as pessoas são diversas e necessitam de estratégias diversificadas, que
mais se aproximem de suas necessidades naquele momento, ou seja, com
ações que sejam efetivas para o conjunto de usuários e ao mesmo tempo
contemplem a particularidade de diferentes formas de consumo e de vul-
nerabilidades e a forma como o álcool e/ou outras drogas se inserem na
história de vida de cada sujeito.
•• Vinculo: A aposta da RD está no estabelecimento de vínculo com o usuário
em uma relação de respeito e confiança, onde ele pode falar de si mesmo,
ser escutado, não julgado, mas acolhido em sua queixa, problemas e ne-
cessidades.

Assim a Redução de Danos se distancia da lógica da Abstinência


como única saída para o usuário e a internação como única forma de
tratamento, mas a RD não exclui a abstinência como meta no tra-
tamento, se assim for o desejo do usuário no processo terapêutico. A
Redução de Danos não é contra a abstinência! Veja algumas diferen-
ças de abordagem nas duas perspectivas, no quadro comparativo em
destaque.

Na RD a prioridade “é colocada na maxi-


mização da quantidade de contato que
usuários de drogas problemáticos têm com os serviços comunitários sociais, de assistência
e outros.” (NADELMAN, MCNEELY & DRUCKER, 1997.)
O tema Sujeito, Contextos e Drogas será objeto de maior aprofundamento na Aula 4 e mais
adiante neste curso, no Módulo 3, veremos, as formas de promover a prevenção e o cuidado
em saúde relacionado ao uso problemático de álcool e outras drogas.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
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Quadro 1.1.2 Quadro comparativo redução de danos

Na Redução de Danos Na Lógica da Abstinência

• O foco está na oferta de escuta, acolhimento e • A abstinência é o único objetivo aceitável e a


cuidado, levando em conta os contextos tanto Redução de Danos pode ser incluída, mas apenas
econômicos e sociais, quanto culturais e subjetivos, como caminho para chegar a Abstinência
focando no Sujeito e nas suas relações
• A internação tem papel central no cuidado
• A lógica é da promoção da saúde, mais do que da
abstinência, porque não objetiva diretamente à • É reducionista, com ótica predominantemente
extinção do comportamento de uso, mas sim, agir médica, psiquiátrica e/ou moral;
nos determinantes que provocam o uso problemáti-
co e os riscos associados às formas de uso e aos • O foco está na cultura de Combate às Drogas;
agravos de saúde relacionados.
• A eliminação da droga está em 1º lugar
• A Redução de Danos leva em conta os contextos
vividos as relações que o Sujeito estabelece com as • Contextos sociocultural e subjetivos são
drogas, o que origina, provoca e/ou mantém o uso negligenciados;
abusivo e os comportamentos de risco associados
ao uso, como por exemplo, beber e dirigir, ou ações • Tende-se a fazer a associação com comportamen-
que acentuam os danos, como manter relações tos antissociais e criminalidade;
sexuais desprotegidas ou compartilhar instrumen-
tos de uso ou outras situações de risco. • O usuário não é protagonista de seu cuidado.

• O objetivo é instrumentalizar o sujeito para assu-


mir sua condição de saúde, reduzir riscos e danos, e
promover seu cuidado.

Fonte: Autor

3. Breve histórico da Redução de Danos no contexto


internacional e nacional

Você sabe como surgiram as primeiras práticas de cuidado na pers-


pectiva da redução de danos em relação às drogas? Há um consenso de
que estas práticas apareceram no final da primeira guerra mundial, na
Inglaterra, em um contexto assolado pelas “neuroses de guerra” e pelo
uso de morfina para tratar as dores dos combatentes, que se tornou
uma dependência, com severos efeitos de abstinência.
O Relatório Rolleston foi o primeiro documento público a indicar
a substituição da morfina por outros opióides mais seguros e menos
danosos para tratar os dependentes, como forma de amenizar o mal
causado pela síndrome de abstinência. Até hoje, estas estratégias são
conhecidas pela oferta de Metadona aos dependentes de morfina.

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CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
O Relatório Rolleston (UNITED KINGDOM, 1926), como ficou conhecido, recomen-
dava a administração de morfina e heroína, sob supervisão médica, como estraté-
gia para diminuir o sofrimento decorrente da brusca retirada destas drogas, que
em casos mais extremos pode levar até mesmo à morte. (PETUCO 2016 p.112)

Além disto, o Relatório Rolleston também preconizava a dispensação


pública de derivados do ópio, incluindo heroína, para pessoas que não
conseguissem abandonar o uso e que não se adaptassem às terapias
de substituição. Ainda mais polêmica que a substituição, este tipo de
estratégia existe ainda hoje, em uns poucos países do mundo.
Nos anos 80 a epidemia de HIV/AIDS trouxe profundas transforma-
ções culturais e exigiu novas formas de tratar os problemas relaciona-
dos às drogas e à sexualidade. Mais uma vez, em um contexto de crise,
e frente à disseminação dos vírus (AIDS e Hepatites virais) através do
compartilhamento de seringas, foi necessário agir de forma pragmática.
Nessa época, em Amsterdã, capital da Holanda uma iniciativa pio-
neira foi proposta por uma associação de usuários, a qual consistia na
distribuição de seringas esterilizadas aos usuários de drogas injetáveis
e, com isso, reduziu a contaminação (VAN DEN HOEK, J.A.R.; VAN HAAS-
TRECHT, H.J.A. & COUTINHO, R.A , 2008). Essa iniciativa marcou a identi-
dade das práticas chamadas de Redução de Danos, que se espalharam
pela Europa.

A partir de 1985, os dependentes passaram a dispor de uma grande variedade de


serviços, incluindo: troca de seringas e educação em sua comunidade; prescrição
de drogas como heroína e cocaína; serviços de aconselhamento, emprego e mo-
radia; tratamento para a dependência, incluindo internação para desintoxicação”
(FONSECA 2012 p.13).

A Redução de Danos nasceu como


uma abordagem ampla que inclui di-
versas ações e estratégias. Ela nunca
foi restrita às trocas de seringas.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
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No Brasil, a experiência mais conhecida, a
da cidade de Santos, no final dos anos 80,
experimentou projetos de troca de seringas
para reduzir os danos entre usuários de dro-
gas injetáveis, já que essa cidade tinha a maior taxa de contaminação por HIV/AIDS da épo-
ca. Os anos eram do processo de abertura política, mas ainda em um contexto com grande
viés repressivo, principalmente no campo das drogas, e esta experiência, junto com outras,
como a de Itajaí e de Balneário Camboriú em SC, embora bem sucedidas, sofreram grande
resistência para se consolidarem como política pública. De acordo com PETUCO (2016):

O Medo e o Preconceito matam mais que qualquer vírus. A intransigência articulada de


setores conservadores bloqueou as trocas de seringas não apenas na cidade litorânea do
estado de São Paulo, mas atrasou a implementação de estratégias voltadas à prevenção da
AIDS junto às pessoas que usavam drogas injetáveis em todo o país. Seria preciso esperar
mais seis anos até que os soteropolitanos conseguissem realizar abertamente aquilo que
os santistas foram obrigados a concretizar por meio de uma clandestinidade análoga à do
próprio uso de substâncias qualificadas como ilícitas.

A experiência da Bahia nasceu do ambiente acadêmico e isso pode


ter facilitado sua implementação. Em 1994, o Centro de Estudos e Tera-
pia de Abuso de Drogas (CETAD), um serviço de extensão permanente
do Departamento de Anatomia Patológica e Medicina Legal da Faculda-
de de Medicina da Universidade Federal da Bahia, recebe recursos da
então Coordenação Nacional de DST/Aids, via Banco Mundial. Assim, O
CETAD conseguiu tornar realidade, em 1995, o primeiro Programa de
Troca de Seringas do Brasil, realizando ações de RD dirigidas às pes-
soas que usavam drogas injetáveis.
A Política Nacional de DST/AIDS passa, nos anos 90, a incentivar di-
versos Programas de Agentes Redutores de Danos que faziam a troca
e distribuição não só de seringas esterilizadas, mas de outros insumos
para a prevenção da AIDS e outras doenças infectocontagiosas, visando
promover a saúde e o vínculo com usuários de drogas e ofertar cuidado
às suas necessidades.

Desta forma a abordagem de Redução de Danos foi se incorporando


às políticas públicas com o protagonismo da área de DST/AIDS a par-
tir dos anos 90. Em 1997, surge a ABORDA - Associação Brasileira de
Redutores de Danos, que visa a implementação e o fortalecimento da
Redução de Danos como política pública, e a defesa da dignidade do
redutor de danos e, em 1998, surge a REDUC - Rede Brasileira de Re-
dução de Danos, que visa discutir, planejar, elaborar, articular e apoiar
ações científicas e sociais, assim como fortalecer as políticas públicas
que favorecem assuntos relacionados à redução de danos.

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CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
A Política Nacional de Saúde Mental Álcool e outras Drogas do Minis-
tério da Saúde, nos anos 2000, passa a agregar serviços voltados espe-
cificamente ao cuidado dos usuários com uso problemático de álcool
e outras drogas, por meio dos Centros de Atenção Psicossocial para
o Álcool e outras Drogas, os CAPS AD (assunto que será tratado na
Aula 3), abordando as drogas como uma questão de saúde pública. A
Redução de Danos passa a ser vista, neste contexto, como diretriz para
o cuidado em álcool e outras drogas. Atualmente, alguns municípios in-
tegram em suas políticas públicas as estratégias e práticas de Redução
de Danos e pesquisas são realizadas no sentido de fundamentar essas
ações e produzir evidências de sua efetividade.

O Programa de Orientação e Atendimento


a Dependentes da Universidade Federal de
São Paulo (PROAD/UNIFESP), por meio de
uma pesquisa e experiência realizada en-
tre usuários de crack, foi um dos pioneiros
na Redução de Danos no Brasil. Para co-
nhecer mais a respeito dessa experiência,
clique aqui.

4. Evolução das políticas públicas de Redução de


Danos no Brasil

Atualmente, a Redução de Danos é uma diretriz da Política Nacional


de IST/AIDS e está presente na Política Nacional sobre Drogas da SE-
NAD/ Ministério da Justiça e na Política sobre Álcool e outras drogas do
Ministério da Saúde. Mas como chegamos até aqui?

Hoje, as DSTs são chamadas de ISTs. Segun-


do a atual diretora do Departamento de
IST, HIV/AIDS e hepatites virais, Adele Ben-
zakem, a denominação ‘D’, de ‘DST’, vem de
doença, que implica em sintomas e sinais
visíveis no organismo do indivíduo. Já o ‘I’ em ‘IST’ indica infecções, que podem ter períodos
assintomáticas (sífilis, herpes genital, condiloma acuminado, por exemplo) ou se mantém
assintomáticas durante toda a vida do indivíduo (casos da infecção pelo HPV e vírus do Her-
pes) e são somente detectadas por meio de exames laboratoriais

MINISTÉRIO DA SAÚDE
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Foi em 2002 que o Ministério da Saúde passou a considerar a Re-
dução de Danos como uma de suas estratégias de prevenção ao uso e
abuso de drogas, incorporando-a através de serviços específicos, como
os Centros de Atenção Psicossocial - Álcool e Drogas (CAPS AD), mas
foi em 2003 que o governo brasileiro, através do Ministério da Saúde,
assumiu o desafio de prevenir, tratar e reabilitar os usuários de álcool e
outras drogas como um problema de saúde pública, apoiando, através
do SUS, mais de 150 Programas de Redução de Danos, que estavam em
funcionamento nos municípios. A partir daí vários instrumentos norma-
tivos e legais passaram a incluir a RD nas políticas públicas e principal-
mente no SUS.
Com a Política de Atenção Integral a Usuários de Álcool e outras Dro-
gas do Ministério da Saúde, em 2003, o foco passou a ser a constituição
de ações de promoção, prevenção e cuidado que transversalizassem,
isto é, estivessem presentes nas várias políticas e redes de atenção e
se capilarizassem, ou seja, que se distribuíssem nos diversos pontos de
atenção do SUS, como os Centros de Atenção Psicossocial – CAPS, e nos
serviços de Atenção Básica, como a Estratégia de Saúde da Família (que
veremos com mais detalhes na Aula 3).
Em 2005 a Coordenação de Saúde Mental Álcool e outras drogas do
MS institui a Portaria GM 1.059/2005 ,que destina incentivo financeiro
para o fomento de ações de Redução de Danos em Centros de Aten-
ção Psicossocial para o Álcool e outras Drogas – CAPS AD - e dá outras
providências e a Portaria 1.028/2005 que normatiza, no Art.4º, o esta-
belecimento de conteúdos necessários para as ações de informação,
educação e aconselhamento em RD, entre eles:

I- informações sobre os possíveis riscos e danos relacionados ao con-


sumo de produtos, substâncias ou drogas que causem dependência;
II- desestímulo ao compartilhamento de instrumentos utilizados
para consumo de produtos, substâncias ou drogas que causem depen-
dência;
III- orientação sobre prevenção e conduta em caso de intoxicação
aguda (“overdose”);
IV- prevenção das infecções pelo HIV, hepatites, endocardites e ou-
tras patologias de padrão de transmissão similar;
V - orientação para prática do sexo seguro;
VI- divulgação dos serviços públicos e de interesse público, nas áreas
de assistência social e de saúde; e

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CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
VII- divulgação dos princípios e garantias fundamentais assegurados
na Constituição Federal e nas declarações universais de direitos.
Em 2009, com o aumento dos problemas relacionados ao uso de cra-
ck no país, se institui o Plano Emergencial de Ampliação do Acesso ao
Tratamento e Prevenção em Álcool e Outras Drogas (PEAD 2009-2010).
As Escolas de Redutores de Danos surgiram, então, no âmbito do PEAD
em novembro de 2009 e nos termos da Portaria GM 1.059/2005. Tra-
tava-se de um projeto de fomento e qualificação das ações de redução
de danos municipais e intermunicipais, voltado para a capacitação te-
órica e prática de segmentos profissionais e populacionais da comuni-
dade, na forma de treinamento em serviço, para atuação em ambiente
de consumo de álcool e outras drogas, e de convívio com a população
usuária, especialmente em contextos de vulnerabilidade.
No decorrer do ano de 2010, o cenário de gravidade do consumo de
álcool e outras drogas - em especial o crack, associada à expansão de
importantes dispositivos do SUS, como os Consultórios de Rua, CAPS
AD, CAPS AD 24hs (você verá mais sobre eles na Aula 3) - bem como a
demanda para intensificar as Ações de Redução de Danos, levaram o
Ministério da Saúde à urgente ampliação das Escolas de Redutores de
Danos do SUS.
O Plano Integrado de Enfrentamento ao Crack pelo Decreto n. 7179,
de 20 de maio de 2010 possibilitou a ampliação das Escolas de Redução
de Danos com recursos financeiros em dezembro de 2011, por meio da
II Chamada para Seleção de Projetos de Escolas de Redutores de Danos
do SUS e de estratégias de indução direta para Ações de Redução de
Danos previstas nos termos da Portaria GM 1.059/2005.
Assim as estratégias e a lógica de RD foram sendo incluídas nas po-
líticas públicas de saúde do SUS no Brasil e, até hoje, influenciam os
modelos de atenção, as concepções e práticas dos profissionais neste
campo (como veremos no módulo 3).
A Redução de Danos está presente nas diretrizes das políticas públi-
cas, desde a prevenção ao HIV/Aids e hepatites virais até a promoção
de saúde entre as pessoas que usam drogas, bem como na diminuição
da violência associada a este campo buscando a articulação de ações
entre as redes e serviços e o protagonismo dos usuários. Mesmo as-
sim, as Estratégias de Redução de Danos têm enfrentado problemas
e resistências em sua implementação no âmbito do SUS e em outras
instâncias de governo, encontrando forte tensionamento com setores
sociais e institucionais, os quais são posicionados contra a RD e a favor
de uma política focada na abstinência e nas internações.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
11
Importante destacar que as ações
de Redução de Danos se originaram
da organização e protagonismo dos
usuários, principalmente das pessoas
com HIV e AIDS, que provocaram o po-
der público a incluir em suas políticas
as diretrizes e ações de RD, como me-
didas de saúde prevenção e cuidado!

4.1 A IV Conferência Nacional De Saúde Mental


e a Redução De Danos

Em 2010 foi realizada a IV Conferência Nacional de Saúde Mental e


a primeira realizada de forma intersetorial. Esta Conferência revelou
maior participação dos temas relacionados a problemática de álcool e
outras drogas nas discussões da política de saúde e saúde mental no
país e deliberou vários pontos sobre a Redução de Danos (MORAES, M;
CASTRO, R. & PETUCO, D.R.S.). São eles:
•• Garantir, através de normatizações, a sustentabilidade técnica e financeira
das ações de redução de danos no território, fortalecendo a gestão intrase-
torial (saúde mental e DST/AIDS/Hepatites virais) e intersetorial.
•• Criar estratégias de incentivo e financiamento para que as redes de saúde
e social que trabalham diretamente com os usuários (CAPs I, II, III, ad e i,
Residências Terapêuticas, Atenção Básica – NASF, CRAS, PSF, ACS, Emer-
gências), sejam capacitadas em RD.
•• Propor regulamentação do cargo de Redutor de Danos no quadro de re-
cursos humanos da rede pública de saúde mental;
•• Construir Políticas de Atenção Integral às Crianças e Adolescentes usuá-
rio(a)s de drogas, com ênfase na redução de danos, em articulação com
as escolas.
•• Criar fóruns municipais e estaduais para a discussão acerca da Política de
Redução de Danos.
•• Implantar ações de redução de danos em todos os serviços e políticas pú-
blicas.
•• Ampliar o debate e a divulgação da lógica, da política e das ações de RD em
todos os âmbitos, visando quebrar mitos, esclarecer dúvidas e fortalecer
o seu papel fundamental na atenção aos problemas ligados ao uso de
drogas dentro dos princípios antimanicomiais.
•• Estabelecer que os CAPS AD trabalhem com a lógica da redução de danos,

12
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
em cumprimento ao Decreto n 5.912/06.
•• Incentivar a promoção da saúde, a prevenção primária e o diagnóstico pre-
coce pelas unidades Básicas de Saúde, através da ESF, para abordagens de
redução de danos.
•• Compor a equipe dos CAPS com, no mínimo, um profissional redutor de
danos como referência para a equipe de Saúde da Família.
•• Que a estratégia de Redução de danos deixe de ser programa regulamen-
tado por portaria e passe a ser Lei Federal, passando a ser efetivamente
uma política pública da saúde (Saúde Mental e Saúde Geral) nos diversos
serviços como: CAPS, UBS/ESF, SAE, entre outros.
•• Que a Redução de danos deixe de ser regulamentada por portaria e passe
a ser Lei Federal, sendo, efetivamente, uma política pública da saúde nos
diversos serviços: CAPS, UBS/ESF, SAE, entre outros.
•• Implantar o programa de redução de danos nos municípios garantindo o
financiamento, custeio e sustentabilidade, em parceria com o terceiro se-
tor, adequando à realidade de cada município.
•• Estender a formação em redução de danos aos profissionais que atuam
em abordagem com criança e adolescentes em situação de rua, integrado
com o Consultório de Rua e outros serviços in loco.

Estas são diretrizes que podem servir para que os municípios e esta-
dos programem seus projetos de Redução de Danos.

Instituições que apoiam as atividades de


Redução de Danos:

Organização Mundial da Saúde

Ministério da Saúde

Secretaria Nacional de Políticas sobre


Drogas

MINISTÉRIO DA SAÚDE
13
AULA 2: LEGISLAÇÃO E POLÍTICAS PÚBLICAS SOBRE
ÁLCOOL E OUTRAS DROGAS

Na Aula 1 tratamos de compreender a Redução de Danos, seus con-


ceitos e práticas e de como esta estratégia foi se incorporando às dire-
trizes brasileiras para os serviços, para as ações no campo das IST/AIDS
e foi, enfim, se instituindo como parte das políticas públicas do SUS.
Nesta aula, trataremos de conhecer as principais convenções interna-
cionais, as legislações nacionais e as normativas sobre o tema da saúde
mental, álcool e outras drogas e relacioná-las às políticas públicas deste
campo. É importante ficar por dentro das leis para saber como melhor
proceder dentro do contexto da Redução de Danos. Vamos lá?

MINISTÉRIO DA SAÚDE
15
1. As convenções internacionais a respeito das drogas

A Organização das Nações Unidas (ONU) junto com a Organização


dos Estados Americanos (OEA), que é uma organização internacional
que reúne os países das Américas do Norte, Central e do Sul, orientam
a política dos países em relação à questão das drogas.

A ONU possui três convenções sobre o tema, que representam ainda


hoje os principais documentos internacionais de referência para as leis
dos Estados-membros, inclusive no Brasil:

•• a Convenção Única sobre Entorpecentes, de 1961;


•• a Convenção sobre Substâncias Psicotrópicas, de 1971; e
•• a Convenção contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e Substâncias Psico-
trópicas, de 1988.

Uma Convenção Internacional é um docu-


mento, elaborado em conjunto e aprova-
do pelos governos dos países-membros de
uma organização internacional, a respeito
de um tema considerado importante. Esse
documento cria regras, deveres e obriga-
ções para os países envolvidos.

As Convenções de 1961 e 1971 definiram que substâncias devem fi-


car sob o controle da comunidade internacional, estabeleceram regras
para garantir a disponibilidade de tais substâncias para uso médico e
científico e evitar o desvio para o comércio ilícito. A Convenção de 1988
estabeleceu diretrizes para o controle e punição do tráfico ilícito de en-
torpecentes e definiu estratégias de colaboração entre os países.
O importante nessas convenções é que elas reconhecem que a questão
das drogas é um problema social e de saúde pública, e que a melhor a
forma de combater tal problema é instituir programas e ações integradas
e coordenadas, mesmo que a principal estratégia dessas três convenções
seja inibição da produção, circulação, comércio e uso de substâncias
consideradas problemáticas. Estas proibições e controles envolvem
questões muito delicadas no que diz respeito a algumas substâncias. A
heroína, por exemplo, é uma droga com efeitos muito danosos, mas é
também a origem de medicamentos amplamente utilizados para aliviar
dores intensas em tratamentos médicos, como a morfina.

16
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
Atualmente, alguns países e ONGs questionam os resultados atin-
gidos por uma abordagem proibicionista, fundada basicamente na re-
pressão. Outras convenções da ONU, especialmente relacionadas a Di-
reitos Humanos e a Direitos à Saúde, serviram como fonte para novas
propostas de abordagem sobre o assunto.
O Brasil, através da Lei n.º 11.343/2006, mantêm o caráter criminal
da punição, mas sem a previsão de pena de prisão para o usuário – é
a despenalização do uso de drogas. Outros países, por sua vez, como
Portugal, transformaram o uso de drogas em uma infração administra-
tiva, sem a intervenção da justiça criminal – é a descriminalização do
uso de drogas. Outros países, ainda, como o Uruguai está experimen-
tando a legalização com regulação do cultivo da compra e da venda de
algumas drogas.

A nova lei uruguaia, que entrou em vigor


em 2014, prevê que tanto a produção e a
comercialização da maconha quanto o seu
uso sejam legalizados. Segundo a nova lei,
são permitidos: (a) o cultivo pessoal da planta, com limite de seis plantas por pessoa; (b) o
cultivo por associações de 15 a 45 pessoas, com limites proporcionais de plantas; e (c) com-
pra em farmácias, no limite de 40 gramas mensais por pessoa. Para plantar ou adquirir, a
pessoa deve ser maior de idade, residente no país e registrada junto ao órgão do governo
responsável pela regulação do comércio.

Cada uma dessas políticas adotadas tem diversos argumentos favo-


ráveis e contrários à sua adoção. É importante saber que existem vários
arranjos possíveis, e que o resultado das experiências internacionais
ao longo dos anos tem servido para que o Brasil avalie e construa sua
política sobre drogas. Vejamos a seguir, com mais detalhes, como se dá
essa política em contexto nacional.

PARA REFLETIR Reflita sobre as diferenças entre despenali-


zação, descriminalização e legalização! Qual
a sua opinião a respeito?

MINISTÉRIO DA SAÚDE
17
2. A legislação nacional a respeito das drogas

A Política Nacional sobre Drogas do Brasil é de 2005 e parte da pre-


missa de que se deve buscar a integração das políticas públicas relacio-
nadas a esta área e descentralizar as ações, para que sejam realizadas
em conjunto com estados e municípios, e com a colaboração da socie-
dade e da comunidade científica. A Política Nacional sobre Drogas esta-
belece os fundamentos, os objetivos, as diretrizes e as estratégias para
as ações no campo das drogas fundamentada em cinco eixos:

TRATAMENTO, REDUÇÃO DE ESTUDOS,


PREVENÇÃO RECUPERAÇÃO E DANOS SOCIAIS REDUÇÃO DA PESQUISAS E
INSERÇÃO SOCIAL E À SAÚDE OFERTA AVALIAÇÕES

Fonte: Autor

Vejamos a seguir que leis foram criadas a partir dessa política.

2.1 LEI 11.343/2006

Conhecida com a Lei de Drogas, esta Lei instituiu o Sistema Nacional


de Políticas Públicas sobre Drogas (SISNAD). O SISNAD foi construído
para colocar em prática as diretrizes da Política Nacional sobre Dro-
gas, por meio da centralização das orientações na Secretaria Nacional
de Políticas sobre Drogas (SENAD) e no Conselho Nacional de Políticas
sobre Drogas (CONAD). Assim, a concepção e a execução das políticas
públicas sobre drogas são de responsabilidade compartilhada entre o
governo federal, estados e municípios, e são supervisionadas por um
conselho federal e pelos conselhos estaduais e municipais, nos quais
estão representados o governo e a sociedade civil.

O SISNAD tem a finalidade de articular, integrar, organizar e coorde-


nar as atividades relacionadas com:
•• a prevenção do uso indevido, a atenção e a reinserção social de usuários e
dependentes de drogas;
•• a repressão da produção não autorizada e do tráfico ilícito de drogas.

18
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
A principal alteração desta Lei foi em seu aspecto repressivo com
a despenalização do porte para uso de drogas, o que significa que a
conduta permaneceu criminalizada, mas sem pena de prisão aos usu-
ários. Tal inovação seguiu a tendência internacional de reconhecer a
diferença entre usuários/dependentes químicos e aqueles envolvidos
no tráfico de drogas, e oferecer sanções jurídicas diferenciadas.

O Artigo 28 dessa lei estabelece que: 

Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para


consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação
legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:

I - advertência sobre os efeitos das drogas;


II - prestação de serviços à comunidade;
III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.

A Lei 11343/2006 ainda estabelece as mesmas penalidades para


quem semeia, cultiva ou colhe, para seu consumo pessoal, plantas des-
tinadas à preparação de pequena quantidade de substância ou produ-
to capaz de causar dependência física ou psíquica.

A LEI 11343/2006, apesar de demonstrar um avanço em relação ao


usuário de drogas , possui importantes pontos a serem discutidos. Veja
no quadro abaixo alguns desses aspectos.

A questão mais polêmica dessa despenalização fica por conta de determi-


nar o que evidencia o consumo pessoal. A Lei diz: para determinar se a droga
destinava-se a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da
substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação,
às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes
do agente.
Além disso, a Lei de Drogas não define quais são as substâncias de uso e co-
mércio controlados e aquelas proibidas. Quem estabelece essa classificação,
com autorização legal, é a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), ór-
gão do Ministério da Saúde responsável por editar e alterar a lista de produtos
restritos e de uso proibido no Brasil.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
19
A ANVISA realiza análise técnica e pode incluir novas substâncias na lista
de uso proibido no Brasil ou ao contrário liberar o uso de uma substância até
então considerada proibida.
Por fim, é fundamental que Leis vigentes sejam sempre avaliadas, para que
seja possível analisar seus resultados e, se for o caso, propor alterações. A Lei
de Drogas de 2006, por exemplo, provocou, de forma paradoxal, um grande
aumento no número de presos por crimes relacionados ao tráfico de drogas,
contribuindo para a crise do sistema penitenciário.
Comparando os dados do INFOPEN, de 2006 a 2012 o número de presos
por tráfico passou de 47.472 para 138.198, o que representa um aumento de
191% em 6 anos. A proporção dos presos por tráfico de drogas em relação ao
total de presos no País dobrou. Assim, o tráfico de drogas ultrapassou o crime
de roubo qualificado como o tipo penal mais comum nas prisões, e a popu-
lação carcerária feminina cresceu significativamente. Em 2006, 5.800 mulhe-
res foram presas por tráfico; no entanto, esse número passou, em 2012, para
14.900. Em 2016 havia 45.989 mulheres presas no Brasil, sendo que 62% das
prisões de mulheres está relacionada ao tráfico de drogas. Já em relação aos
homens presos, essa taxa é de 26%. 

2.2 Outros Decretos e Leis sobre drogas no Brasil.

Em 2006 o Decreto 5.912/2006 regulamentou a Lei 11343/2006, esta-


belecendo a finalidade do SISNAD e as competências do CONAD.
Em 2007, foi editado o Decreto n.º 6.117, que instituiu a Política Na-
cional sobre o Álcool, a qual orienta, dentre outras ações: a realização
de pesquisas e diagnósticos sobre o consumo de álcool no país; es-
tabelece mecanismos de tratamento e reinserção social de usuários e
dependentes de álcool; orienta a realização de campanhas de sensi-
bilização e mobilização da opinião pública sobre as consequências do
uso e abuso de bebidas alcoólicas; e articula ações de prevenção com
estados e municípios.
Em 2008 a Lei n.º 11.705 conhecida como Lei Seca, impôs regras se-
veras para o condutor que dirigir sob a influência de álcool ou de outras
substâncias e proibiu a venda de bebidas alcoólicas em estradas.

20
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
A questão do álcool é uma preocupação
central para às Políticas Públicas sobre
Drogas. Um exemplo disso é que, desde
1990, o Estatuto da Criança e do Adolescen-
te (ECA) proíbe a venda de bebidas alcoólicas a crianças e adolescentes. Além disso, esforços
têm sido realizados para restringir a propaganda de bebidas alcoólicas no país. Atualmente,
somente a propaganda de alguns tipos de bebidas (aquelas com maior teor alcoólico) não é
permitida nos horários de maior audiência de jovens.

Decreto 7.179 de 2010, e o Decreto 7.637 instituíram o Plano de


Enfrentamento ao Crack. O Plano definiu, no âmbito federal, o Pro-
grama Crack, É Possível Vencer, lançado em 07 de dezembro de 2011,
que se estruturou com base na Política Nacional sobre Drogas em três
eixos: prevenção, cuidado e autoridade. Veja o quadro a seguir para
saber mais detalhes.

O Programa Crack é Possível Vencer teve, como principal objetivo, o forta-


lecimento e a articulação da rede intersetorial de atenção às pessoas com pro-
blemas decorrentes do uso de drogas. Nesse sentido, muitos recursos foram
investidos para aumentar a quantidade de serviços oferecidos à população,
com estabelecimento de metas em articulação com as políticas públicas dos
estados e municípios. Além disso, vários cursos de capacitação presenciais e
à distância foram disponibilizados pela SENAD e pelo Ministério da Saúde. De
acordo com a Política Nacional sobre Drogas, a responsabilidade por este pro-
grama foi compartilhada entre a coordenação federal e os comitês-gestores
nos estados e municípios para monitorar as ações.
Assim o Programa Crack é possível vencer:
•• estabeleceu diretrizes na perspectiva de compreender e atuar diante um
problema complexo e desafiador;
•• estabeleceu ações integradas nas áreas de saúde, segurança, assistência
social, educação e direitos humanos;
•• estabeleceu atuação conjunta dos governos federal, estaduais e munici-
pais (articulação interfederativa), com: disponibilização/ expansão de equi-
pamentos e serviços, e integração da rede de serviços para atendimento a
usuários e famílias
•• promoveu a prevenção como central na política; e
•• considerou o problema das drogas como uma questão social que enseja
ações complexas e articuladas.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
21
Em alinhamento com o que foi proposto no caso do crack, as polí-
ticas sobre drogas começaram, nos últimos anos, a desenvolver abor-
dagens mais complexas, retirando o foco somente da repressão, pois,
como vimos, essa abordagem não produz, de forma isolada, a redução
do consumo, e tem enfrentado problemas relacionados ao aumento da
violência e da população carcerária no país.
As tendências passam então a considerar o uso, abuso e a depen-
dência de drogas como um fenômeno que exige a compreensão dos di-
versos setores das políticas públicas, bem como, os aspectos familiares,
subjetivos e sociais envolvidos. De acordo com Maximiano, Vitore e De
Paiva, Luiz Guilherme (2014):

Diversos instrumentos de direitos humanos reforçam a ideia de que devem ser


garantidos ao usuário/dependente de drogas todos os direitos e garantias previs-
tos na Constituição, especialmente ao se tratar de uma população vulnerável. O
Estado, ao tratar o problema das drogas, não pode adotar medidas que violem
tais direitos. (BRASIL, 2014)

Portanto, a prioridade absoluta das políticas públicas de saúde e so-


bre drogas deveria ser as pessoas - usuários e ou dependentes, enten-
didos como sujeito de direitos, a quem se deve escutar e tratar com dig-
nidade, respeitando suas condições e singularidades e ofertando, cada
vez mais, uma diversidade de serviços nas redes de atenção e cuidado.
Vejamos, a seguir, como a atual política pública de saúde relacionada às
drogas se alinha a essa visão.

3. A Política Nacional de Saúde Mental,


Álcool e outras Drogas

A política de saúde mental brasileira foi construída a partir de inten-


sos debates e de mobilização de atores sociais em torno da discussão
sobre os manicômios no Brasil, sobre as formas de tratar as pessoas
com transtornos mentais e com uso problemático de álcool e outras
drogas.
Essa política é também resultado da mobilização de usuários, fami-
liares e trabalhadores da saúde desde a década de 1980, com o obje-
tivo de mudar a realidade da atenção em saúde mental e da forma de
ver e conceber a loucura, o hospício e o tratamento. Este movimento

22
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
denominado de Luta Antimanicomial alimentou-se das experiências
exitosas de países europeus na substituição de um modelo baseado
na internação em hospitais psiquiátricos, por um modelo de atenção
psicossocial em serviços inseridos na comunidade.

A Itália é uma referência no mundo para as


Reformas Psiquiátricas. A Psiquiatria De-
mocrática da Itália, através da Lei 180 de
13 de Maio de 1978, marcou o movimento
de desinstitucionalização da saúde mental criando os Centros de Saúde Mental e diversos
equipamentos residenciais e de geração de trabalho e renda, fechando progressivamente
os hospitais Psiquiátricos. A desinstitucionalização é uma concepção e uma estratégia que
visa questionar os dispositivos que mantém a exclusão das pessoas com transtorno mental
e promover transformações tanto nos conceitos quanto nas práticas de cuidado. O objetivo
é a integralidade da saúde, na perspectiva da garantia de direitos, com a promoção de auto-
nomia e o exercício de cidadania, buscando sua progressiva inclusão social.

Este movimento fomentou, no Brasil, a aprovação de leis estaduais


de Reforma Psiquiátrica e, ao longo da década de 1990, um intenso
debate se formou em torno do Projeto de Lei Nacional. Assim, norma-
tivas estaduais e federais passaram a estimular e regular a nascente
mudança de modelo de atenção no Brasil com a criação de uma rede
de serviços de base comunitária.

3.1 A Lei n.º 10.216

Em 2001, após mais de dez anos de tramitação no Congresso Nacio-


nal, foi sancionada a Lei da Reforma Psiquiátrica brasileira, Lei 10.216,
que “dispõe sobre os direitos das pessoas portadoras de transtornos
mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental”. Os prin-
cípios do movimento social iniciado na década de 1980 começam, en-
tão, a se tornar uma Política Pública.
Essa lei assegura, às pessoas com transtorno mental e com uso de
substâncias psicoativas, direitos de cidadania, direito a um tratamento
que respeite as singularidades dos usuários e que, por isso, seja reali-
zado, de preferência, em serviços comunitários, de base territorial, sem
excluí-los do convívio na sociedade. A lei 10216 também destaca os se-
guintes direitos dos usuários do SUS:

MINISTÉRIO DA SAÚDE
23
I - ter acesso ao melhor tratamento do sistema de saúde, de acordo com
suas necessidades;
II - ser tratado com humanidade e respeito e no interesse exclusivo de be-
neficiar sua saúde, visando alcançar sua recuperação pela inserção na famí-
lia, no trabalho e na comunidade;
III - ser protegido contra qualquer forma de abuso e exploração;
IV - ter garantia de sigilo nas informações prestadas;
V - ter direito à presença médica, em qualquer tempo, para esclarecer a
necessidade, ou não, de sua hospitalização involuntária;
VI - ter livre acesso aos meios de comunicação disponíveis;
VII - receber o maior número de informações a respeito de sua doença e de
seu tratamento;
VIII - ser tratado em ambiente terapêutico pelos meios menos invasivos
possíveis;
IX - ser tratado, preferencialmente, em serviços comunitários de saúde mental.

3.2 Outras leis e decretos

A partir dos anos 2000, mais especificamente a partir da Portaria


336/2002, novos recursos foram instituídos, pela primeira vez, para o
financiamento dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), o que favo-
receu a ampliação dos serviços que viriam depois, possibilitando a cons-
tituição de uma Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), que regulamenta
a atenção às pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com ne-
cessidades decorrentes do uso de crack álcool e outras drogas no SUS.
Com o Decreto Presidencial n.º 7.508, de 28 de junho de 2011, a
Atenção Psicossocial passa a se constituir como uma Rede de Atenção
indispensável à constituição de Regiões de Saúde do Sistema Único de
Saúde (SUS). Um novo cenário passa então a ser construído em rela-
ção à atenção em saúde mental no país, descentralizando o cuidado,
promovendo a garantia de direitos, reduzindo o estigma relacionado
às pessoas que antes tinham apenas os Hospitais Psiquiátricos como
único recurso de tratamento.

Na Aula 3 você verá o que são os CAPS e


como eles são fundamentais no cuidado
das pessoas com uso de álcool e outras
drogas. Na mesma aula falaremos tam-
bém a respeito da RAPS, instituída pela
portaria GM 3088/2011, e suas atribuições.

24
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
Resumo

Vimos nesta Aula sobre a Legislação e as Políticas Públicas que tra-


tam sobre o tema das drogas, seu histórico, relações e atribuições, e
como elas foram possibilitando a criação de políticas públicas de saúde
para as pessoas com transtornos mentais e uso problemático de álcool
e outras drogas. Na próxima aula veremos as estratégias de Redução
de Danos no contexto dos serviços de Atenção Básica e dos Centros de
Atenção Psicossocial- os CAPS e as possibilidades de trabalhar em rede
com os diversos pontos de atenção, incluindo os serviços especializa-
dos do campo das IST/Aids e hepatites virais.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
25
AULA 3: ESTRATÉGIAS DE REDUÇÃO DE DANOS NA ATENÇÃO
BÁSICA E NOS CENTROS DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL (CAPS)

Nas aulas anteriores tratamos da Redução de Danos, das Legisla-


ções e das Políticas sobre Drogas e a respeito da Saúde Mental, Álcool
e outras Drogas. Nesta Aula, trataremos de conhecer as estratégias de
Redução de Danos no contexto dos serviços de Atenção Básica e dos
Centros de Atenção Psicossocial - os CAPS, buscando entender melhor
como funcionam esses espaços dentro das Redes de Atenção em Saúde.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
27
1. As Redes de Atenção do SUS (RAS)

O SUS está organizado em Redes de Atenção (RAS), que servem


para ordenar e articular os Pontos de Atenção das diversas redes, ten-
do em vista superar sua fragmentação e promover a atenção integral
em saúde. A Portaria GM 4279 de 2010 foi responsável por estabelecer
as diretrizes para a organização da Rede de Atenção à Saúde no SUS.

Rede de Atenção à Saúde - RAS


Imagem 1.1.1

Todos o s pontos d e atenção à saúde são


RAS
igualmente importantes e se relacionam hori-
zoltalmente ( atenção primária, secundária e
terciária);

Atenção integral com intervenções promocio-


nais, preventivas, curativas, cuidadoras, reabi-
litadoras e paliativas;

Sob coordenação d a atenção p rimária à


saúde;

Focam-se n ciclo completo de atenção a uma


condição de saúde.

Fonte: adaptado de Mendes, 2011

•• O que são Redes de Atenção à Saúde?


•• “As Redes de Atenção à Saúde (RAS) são arranjos organizativos de ações e
serviços de saúde de diferentes densidades tecnológicas que, integradas
por meio de sistemas de apoio técnico, logístico e de gestão, buscam ga-
rantir a integralidade do cuidado”. (BRASIL 2010).
•• O que são Pontos de Atenção?
•• Os pontos de atenção são os serviços, as unidades de atendimento, os cen-
tros de cuidados e sistemas de apoio diagnóstico e terapêutico.

28
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
Rede de Atenção à Saúde - RAS
Atenção Contínua
e Integral

APS

Compartilhamento Relações Horizontais


de Objetivos e entre os Pontos
Compromissos com a APS

Fonte: adaptado de Mendes, 2011

Uma destas Redes que se integrou a tal reorganização assistencial


do SUS foi a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS). É nessa rede que es-
tão os pontos de atenção do âmbito da saúde mental no SUS.
2. Rede de Atenção Psicossocial (RAPS)

A Rede de Atenção Psicossocial para pessoas com sofrimento ou


transtorno mental, incluindo necessidades decorrentes do uso de cra-
ck, álcool e outras drogas foi instituída pela Portaria GM 3088 de 2011
no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). A sua finalidade foi criar,
ampliar e articular os pontos de atenção à saúde para promover o
acesso das pessoas com transtornos mentais - e com necessidades de-
correntes do uso de crack, álcool e outras drogas, e suas famílias ao
atendimento, e garantir a articulação e integração nas redes de saú-
de no território, qualificando o cuidado por meio do acolhimento, do
acompanhamento contínuo e da atenção às urgências.
A RAPS incorpora a lógica de Redução de Danos tanto em seus objeti-
vos quanto em suas diretrizes, pois opera com a promoção da saúde e a
autonomia dos sujeitos, como podemos ver nos itens elencados a seguir:

MINISTÉRIO DA SAÚDE
29
Objetivos específicos da RAPS:
•• Promover cuidados em saúde especialmente para grupos mais vulneráveis
(criança, adolescente, jovens, pessoas em situação de rua e populações
indígenas);
•• Prevenir o consumo e a dependência de crack, álcool e outras drogas;
•• Reduzir danos provocados pelo consumo de crack, álcool e outras dro-
gas;
•• Promover a reabilitação e a reinserção das pessoas com transtorno mental
e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas
na sociedade, por meio do acesso ao trabalho, renda e moradia solidária;
•• Promover mecanismos de formação permanente aos profissionais de saú-
de;
•• Desenvolver ações intersetoriais de prevenção e redução de danos
em parceria com organizações governamentais e da sociedade civil;
•• Produzir e ofertar informações sobre direitos dos usuários e familiares,
medidas de prevenção e cuidado e os serviços disponíveis na rede;
•• Regular e organizar as demandas e os fluxos assistenciais da Rede de Aten-
ção Psicossocial; e
•• Monitorar e avaliar a qualidade dos serviços por meio de indicadores de
efetividade e resolutividade da atenção.

Diretrizes da RAPS:
•• Respeito aos direitos humanos, garantindo a autonomia e a liberdade das
pessoas;
•• Promoção da equidade, reconhecendo os determinantes sociais da saúde;
•• Combate a estigmas e preconceitos;
•• Garantia do acesso e da qualidade dos serviços, ofertando cuidado inte-
gral e assistência multiprofissional, sob a lógica interdisciplinar;
•• Atenção humanizada e centrada nas necessidades das pessoas;
•• Diversificação das estratégias de cuidado;
•• Desenvolvimento de atividades no território, que favoreçam a inclusão
social com vistas à promoção de autonomia e ao exercício da cidadania;
•• Desenvolvimento de estratégias de Redução de Danos;
•• Participação dos usuários e de seus familiares no controle social;
•• Organização dos serviços em rede de atenção à saúde, com
estabelecimento de ações intersetoriais para garantir a integralidade do
cuidado;
•• Promoção de estratégias de educação permanente;

30
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
•• Desenvolvimento da lógica do cuidado para pessoas com transtornos men-
tais e com necessidades decorrentes do uso de álcool, crack e outras drogas,
tendo como eixo central a construção do projeto terapêutico singular.

Podemos ressaltar que todos estes objetivos da RAPS coincidem e se articu-


lam com os objetivos da Redução de Danos, como ética e como estratégia de
prevenção e cuidado em saúde.
Mas como foi estruturada a RAPS em sua origem? Quais eram seus
componentes e pontos de atenção e como está hoje?
Vejamos, no quadro abaixo, a forma original da estruturação da RAPS pela
Portaria GM 3088/2011 e a crítica em relação a não inclusão dos dispositivos
da política de IST/AIDS na RAPS. Em seguida, destacaremos os novos Pontos
de Atenção da RAPS, a partir da Portaria Nº 3588 de 21 de dezembro de 2017.

Quadro 1.3.3 Pontos de atenção RAPS


RAPS

Unidade Básica de Saúde;


Núcleo de Apoio a Saúde da Família;
Atenção Básica em Saúde Consultório na Rua;
Centros de Convivência e Cultura

Atenção Psicossocial Centros de A tenção Psicossocial, nas suas d iferentes


Estratégica modalidades;

SAMU 192;
Atenção de Urgência Sala de Estabilização;
e Emergência UPA 24 horas e portas hospitalares de atenção à urgên-
cia/pronto socorro

Atenção Residencial Unidade de Acolhimento;


de Caráter Transitório Serviço de Atenção em Regime Residencial

Leitos de Saúde Mental na clinica médica ou pediatria


Atenção Hospitalar em Hospital Geral;
Enfermaria especializada em Hospital Geral

Estratégias de Serviços Residenciais Terapêuticos;


Desinstitucionalização Programa de Volta para Casa

Estratégias de Iniciativas de Geração de Trabalho e Renda;


Reabilitação Psicossocial Fortalecimento do Protagonismo dos usuários e familiares

Fonte: Guia AD BRASIL 2014.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
31
Como este curso tem o objetivo de abordar as IST, o HIV/AIDS e as
hepatites virais, vale chamar a atenção para o fato de não se ter inclu-
ído na RAPS os serviços especializados nestes agravos: os Serviços de
Atendimento Especializado (SAE) para pessoas vivendo com HIV/AIDS
SAE e os Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA) - que são servi-
ços de saúde que realizam ações de testagem e prevenção das IST, Aids
e hepatites virais - destinados, prioritariamente, a segmentos popula-
cionais considerados em situação de maior vulnerabilidade e à popula-
ção em geral (CTA).
A epidemiologia dos agravos entre pessoas que usam drogas é ele-
vadíssima. Sendo assim, não há como pensar nas “necessidades decor-
rentes do uso de crack, álcool e outras drogas” sem incluir, na rede, os
SAE e CTA, não apenas como serviços de referência para os usuários,
mas também com função matriciadora (veja seção seguinte) para com
o restante da rede.

A Portaria GM 3588 de 21 de dezembro de 2017

A Portaria GM 3588/22-12-2017 instituiu alterações na Rede de Aten-


ção Psicossocial, em especial, criando a Equipe Multiprofissional de
Atenção Especializada em Saúde Mental ou Unidades Ambulato-
riais de Saúde Mental, reestabelecendo o Hospital Psiquiátrico Es-
pecializado como ponto de atenção e criando os CAPS IV (que veremos
com mais detalhes nas próximas seções), que visam atender pessoas
com quadros graves e intenso sofrimento decorrentes do uso de crack,
álcool e outras drogas.
De acordo com essa portaria, a implantação dos CAPS IV deve ser
planejada junto a cenas de uso em municípios com mais de 500.000 ha-
bitantes e capitais de Estado, de forma a maximizar a assistência a essa
parcela da população. Tem como objetivos atender pessoas de todas as
faixas etárias; proporcionar serviços de atenção contínua, com funcio-
namento vinte e quatro horas, incluindo feriados e finais de semana; e
ofertar assistência a urgências e emergências, contando com leitos de
observação.
Dentre os vários pontos de atenção da RAPS, vamos nos dedicar, nes-
ta aula, a tratar das Estratégias de Redução de Danos que, neste contexto
inclui a Atenção Básica em Saúde e os Centros de Atenção Psicossocial.

32
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
3. O cuidado na Atenção Básica

Como pontos principais na Atenção Básica temos:

•• As Unidades Básicas de Saúde com as Equipes de Saúde da Família (ESF) e


Agentes Comunitários de Saúde (ACS)
•• Os Núcleos de Apoio a Saúde da Família (NASFs)
•• Os Consultórios na Rua

Veja, no quadro a seguir, como são constituídos cada um desses pontos:

•• Unidades Básicas de Saúde: Unidade Básica de Saúde: serviço de saúde


constituído por equipe multiprofissional responsável por um conjunto de
ações de saúde, de âmbito individual e coletivo, que abrange a promoção e
a proteção da saúde, a prevenção de agravos, o diagnóstico, o tratamento,
a reabilitação, a redução de danos e a manutenção da saúde com o obje-
tivo de desenvolver a atenção integral que impacte na situação de saúde
e autonomia das pessoas e nos determinantes e condicionantes de saúde
das coletividades.
•• Os Núcleos de Apoio a Saúde da Família (NASFs): O Núcleo de Apoio à
Saúde da Família, é vinculado à Unidade Básica de Saúde, é constituído por
profissionais de saúde de diferentes áreas de conhecimento, que atuam
de maneira integrada, sendo responsável por apoiar as Equipes de Saúde
da Família, as Equipes de Atenção Básica para populações específicas e
equipes da academia da saúde, atuando diretamente no apoio matricial e,
quando necessário, no cuidado compartilhado junto às equipes da(s) uni-
dade(s) na(s) qual(is) o Núcleo de Apoio à Saúde da Família está vinculado,
incluindo o suporte ao manejo de situações relacionadas ao sofrimento ou
transtorno mental e aos problemas relacionados ao uso de crack, álcool e
outras drogas. Veja mais informação aqui.
•• Os Consultórios na Rua : São Equipes Multiprofissionais que lidam com
os problemas e necessidades de saúde da população em situação de rua.
Suas atividades incluem a busca ativa e o cuidado dos usuários de álcool
crack e outras drogas. Veja a Portaria.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
33
Estes pontos de atenção são grandes potenciais para operar com a
lógica de Redução de Danos como forma de acolhimento e para contri-
buir para a prevenção das IST, HIV/AIDS e HV, realizando ações de saú-
de sob esta perspectiva, pois estão no território e são as equipes mais
próximas dos usuários.
A Redução de Danos não é uma estratégia isolada e deve ser incor-
porada nas ações cotidianas do acolhimento, da escuta, do aconselha-
mento, das ações de prevenção e de cuidado, vendo o usuário como
protagonista. Os serviços e ações devem fortalecer novas atitudes de
vida, no qual o vínculo é o elemento principal pois a RD na Atenção Bá-
sica e nos CAPS buscam a autonomia dos sujeitos.
A Atenção Básica tem um grande potencial para a prevenção e o
cuidado das pessoas que fazem uso problemático de Álcool e outras
Drogas e que também possuem agravos associados, pois as Equipes de
Saúde da Família e Agentes Comunitários de Saúde conhecem o territó-
rio, os grupos familiares e os fatores de risco e proteção que existem na
comunidade e podem ser manejados em uma estratégia de cuidado. O
trabalho implica uma via de mão dupla, ou seja, o usuário tanto pode
procurar o serviço, quanto o serviço pode realizar busca ativa no terri-
tório, promovendo o vínculo:

Muitas vezes, o usuário, ao ser apresentado à estratégia de RD fica surpreso, pois


costuma associar o cuidado à institucionalização e à abstinência. Mas uma vez
que este usuário compreende a dimensão desta estratégia, ele passa a se sentir
acolhido da forma como ele se apresenta. (BRASIL 2014)

Para trabalhar com as estratégias de Redução de Danos é preciso


algumas atitudes: A primeira atitude passa pela abertura dos profissio-
nais em se aproximar das pessoas com uso problemáticos de álcool e
outras drogas - o acolhimento, e estar disponível para o vínculo. A se-
gunda é a atitude empática por parte dos trabalhadores que precisam
colocar “de lado” os preconceitos e valores próprios sobre as drogas e
as pessoas que as usam para poder olhar com os olhos de quem está
em sua frente. A terceira atitude é da escuta atenta para poder propor
estratégias de cuidado a partir da realidade e das necessidades da pes-
soa de forma singular e articulada em rede.
As redes se constituem na relação e na pactuação cotidiana entre
os trabalhadores dos diferentes pontos de atenção e os sujeitos em
processo de cuidado, o que permite a organização dos processos de

34
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
trabalho e dos fluxos de acesso e atenção. Vejamos como isso se dá por
meio do matriciamento.

3.1 Matriciamento

A integração dos serviços proporciona que estratégias de cuidado


em Redução de Danos sejam estabelecidas entre a Atenção Básica e os
Centros de Atenção Psicossocial. Nesse processo, um dispositivo funda-
mental é o matriciamento (ver quadro abaixo), pois este possibilita o
entrelaçamento das equipes e dos serviços e a ativação dos pontos de
atenção das redes.

O que é Matriciamento?

•• Matr(i): de onde se vem, de onde se gera


•• Instrumento para melhorar a integração das Equipes
•• Potencializa saberes nucleares e amplia o campo de ação conjunta
•• Possibilita discussão entre profissionais corresponsáveis pela atenção
•• Resgata a complexidade dos casos sem reduzir as relações de causa/efeito
•• Desmistifica saberes

Atualmente, há uma profunda discussão envolvendo os departa-


mentos de Atenção Básica e de IST, HIV/Aids e hepatites virais, no sen-
tido de estabelecer lógicas de matriciamento entre SAE/CTA e serviços
de Atenção Básica.
É necessária a sensibilização dos vários atores e a interlocução contínua
para diminuir as barreiras de acesso, assim como evitar a descontinuidade
do cuidado e a sobreposição de ações. O matriciamento provoca tanto
a saúde mental como a atenção básica em direção à integralidade, é um
dispositivo fundamental para promover e efetivar o cuidado integral ofe-
recido aos sujeitos nos territórios.
Além disso, o matriciamento opera com a lógica de romper com os
tradicionais encaminhamentos, para ofertar uma atenção compartilhada
ampliada e integral. No campo da atenção às pessoas que fazem uso

MINISTÉRIO DA SAÚDE
35
problemático de álcool e outras drogas e são portadoras de HIV/AIDS e/
ou possuem outros agravos, torna-se mais importante ainda as discussões
de casos (ver Módulo 3), e os atendimentos compartilhados, promovendo
a continuidade do cuidado, de forma responsabilizada, pelas equipes da
atenção básica, dos serviços especializados do campo das IST, do HIV/
Aids e das hepatites virais, os SAE e CTAs e da saúde mental pois, de outra
forma, “perde-se” muitos usuários nas entranhas dos encaminhamentos e
das lacunas das redes, na fragmentação dos serviços.
4. Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS)

O cuidado com usuários e familiares deve partir do pressuposto da


complexidade do sujeito, do contexto e do padrão de uso (conforme
veremos na Aula 4), pois tal complexidade torna impossível apostar em
uma saída única, padronizada para todos os casos, e em um serviço iso-
lado. A ética da Redução de Danos valoriza as demandas dos usuários,
nas suas singularidades, pois é essencial construir estratégias terapêu-
ticas articuladas e com baixas exigências dos profissionais e serviços
em relação aos usuários. Fortalecer o vínculo e a contratualidade com
as equipes, tanto da Atenção Básica como nos CAPS, é para promover
a prevenção e o cuidado das pessoas com uso problemático de álcool
e outras drogas na comunidade, com maior vulnerabilidade e com pro-
blemas decorrentes das IST/Aids.
Os CAPS têm a função de Cuidado e Apoio Estratégico aos casos mais
graves e em situações de maior vulnerabilidade e risco psicossocial, que
demandem atenção diária e ou intensiva, com equipes multiprofissio-
nais, sendo organizados em cinco modalidades.

•• CAPS I
•• CAPS II
•• CAPS III
•• CAPS AD e CAPS AD III
•• CAPS AD IV
•• CAPS infanto-juvenil (CAPSi)

36
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
As modalidades de CAPS I, II e III referem-se ao tamanho (crescente)
da população referenciada e das equipes que os compõem. No caso
dos CAPS tipo III, há a oferta de vagas de acolhimento noturno para as
situações de crise e/ou maior vulnerabilidade, eles funcionam 24h e
todos os dias da semana e podem ser do tipo CAPS III para transtornos
mentais em geral ou específicos para problemas relacionados ao Álcool
e outras drogas (CAPS AD III).
O CAPS AD IV tem como atividade principal a Atenção Psicossocial e
atendem pessoas com quadros graves e intenso sofrimento decorren-
tes do uso de crack, álcool e outras drogas (dependência de substâncias
psicoativas).
Os CAPS específicos concentram seu atendimento para determina-
dos grupos, como crianças e adolescentes (CAPS i) e usuários de drogas
(CAPS AD). O CAPS Infanto–juvenil funciona em municípios com popula-
ção acima de 150.000 habitantes, das 8 às 18h, de 2ª a 6ª feira, e pode
ter um terceiro período, funcionando até às 21h
Nos locais em que não há CAPS especializados para esses públicos,
todos devem atender o conjunto das situações clínicas que se apresen-
tam, em qualquer idade.

Os CAPS podem oferecer:


•• Atendimento individual (psicológico, médico, social, orientações, entre ou-
tros)
•• Atendimento em grupo – oficinas terapêuticas, expressivas, de geração de
renda, grupos terapêuticos, atividades esportivas, etc.
•• Atendimento às famílias
•• Atividades comunitárias e de inserção social
•• Assembleias como exercício da participação e do protagonismo dos usu-
ários
•• Visitas domiciliares junto com as Equipes de Saúde da Família e ACS
•• Outras atividades de reabilitação psicossocial
•• Leitos para desintoxicação ambulatorial (no caso dos CAPS AD)
•• Acolhimento integral noturno e todos os dias da semana (nos CAPS III e AD
III e CAPS IV)
A articulação entre a as Equipes de Saúde da Família com os Servi-
ços de Atendimento Especializado (SAE) para pessoas vivendo com HIV/
AIDS e os Centros de Testagem e Aconselhamento (CTA) com as equipes
dos CAPS é fundamental para um cuidado em rede, bem como ativar

MINISTÉRIO DA SAÚDE
37
Embora os CAPS-AD, CAPS AD III e CAPS AD
IV sejam os Centros de Atenção Psicosso-
cial específicos para usuários de álcool e
outras drogas e tenham a missão de cui-
dar e promover possibilidades de vida com estes usuários, não devem ser os únicos CAPS a
se responsabilizar pelo cuidado dos usuários: os CAPS I também são responsáveis, pois estes
encontram-se em maior número e nos menores municípios do país.

as portas hospitalares e de urgência e emergência quando necessário.


A articulação de outros pontos de atenção das redes intersetoriais,
em especial os CRAS e CREAS, que são unidades de atendimento da
rede de assistência social do Sistema Único da Assistência Social (SUAS),
também podem promover a atenção integral, reduzir barreiras de aces-
so e promover a saúde e a ampliação da inserção social dos sujeitos.
O cuidado às pessoas em situações de risco e vulnerabilidades, seja
por uso de álcool e outras drogas, por transtornos mentais e/ou com
comorbidades frequentes, como é o caso dos agravos pelas infecções
sexualmente transmissíveis, desafiam as políticas públicas a disponi-
bilizarem dispositivos de cuidado e atenção nos territórios, tais como:

•• O acolhimento qualificado
•• Os atendimentos singularizados
•• Os grupos de apoio e terapêuticos
•• As ações de redução de danos
•• Os atendimentos domiciliares
•• O acolhimento às famílias
•• As articulações intersetoriais

De acordo com o MS (2015):

Acolher é valorizar como o usuário se apresenta, disponibilizar-se para a agenda


dele, suas vivências e seu sofrimento. Assim gera uma atitude de reconhecimento
do outro como legítimo interlocutor. É uma atitude transversal ao processo de
trabalho no serviço, mais que receber ou realizar a triagem, neste sentido, o aco-
lhimento não é apenas um procedimento e não pode ser agendado para depois,
segundo a disponibilidade do serviço.
Os trabalhadores dos serviços, que quotidianamente exercem a
função de Redutor de Danos, precisam se atualizar e se aprofundar
frequentemente , por exemplo, nos tipos de prevenção em HIV/AIDS e
Hepatites Virais, as formas de transmissão, de tratamento, a notificação

38
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
dos casos e sobretudo exercer uma postura acolhedora, dialógica e de
escuta. Precisam estar abertos e receptivos a todos os sujeitos, sem
discriminação. Disponibilizar-se no momento em que o sujeito procura
o atendimento pode fazer toda a diferença para o vínculo e o cuidado.
Nesse sentido,

é necessário ressaltar que o ato de acolher não está restrito ao processo do primei-
ro contato. Essa tecnologia está presente nos processos do cotidiano dos encon-
tros e é um compartilhamento de cuidado e saberes, dúvidas, anseios e intenções.
(BRASIL, 2010)

Além disso, é preciso reinventar as ofertas de atenção e as redes


constantemente, para que a diversidade de necessidades dos sujei-
tos seja contemplada. Neste sentido, experiências criadas em outros
âmbitos podem inspirar as políticas públicas, como no caso dos Con-
sultórios de Rua, que nasceram de uma experiência da Universidade
Federal da Bahia e se tornou um ponto de atenção da rede de Atenção
Básica e da RAPS como Consultórios na Rua, sobre o qual veremos na
próxima seção.

4. Consultórios na Rua e outras iniciativas bem-sucedidas

O Consultório de Rua (CR) teve origem a


partir da experiência denominada Banco
de Rua, desenvolvida na Praça da Piedade
em Salvador, idealizada e conduzida pelo
Prof. Antonio Nery Filho (1989-1991). Em 1999, diante da constatação da vulnerabilidade
das crianças e adolescentes em situação de rua e de sua exposição aos mais diversos riscos,
organizou-se a equipe multidisciplinar buscando “observar e compreender” a vida das crian-
ças e adolescentes em situação de rua através dos olhares técnicos de seus profissionais
para então promover as transformações possíveis originadas dos e nos encontros. A equipe
passou a trabalhar em regiões da cidade onde a concentração desta população e os riscos
sociais, físicos e psicológicos eram maiores. 
Se quiser conhecer mais a respeito dessa experiência, acesse os seguintes endereços
eletrônicos: Link 1, Link 2, Link 3

MINISTÉRIO DA SAÚDE
39
A estratégia Consultório na Rua foi instituída pela Política Nacional
de Atenção Básica, em 2011 para ampliar o acesso da população em
situação de rua aos serviços de saúde, ofertando, de maneira mais pró-
xima, atenção integral à saúde para esse grupo populacional, o qual se
encontra em condições de vulnerabilidades e com os vínculos familia-
res interrompidos ou fragilizados. Em municípios ou áreas em que não
haja Equipe de Consultório na Rua, a atenção deve ser prestada pelas
Equipes de Saúde da Família e ACS. 

As Equipes de Consultório na Rua podem ser compostas pelos se-


guintes profissionais de saúde:
•• Enfermeiro
•• Psicólogo
•• Assistente social
•• Terapeuta ocupacional
•• Médico
•• Agente social
•• Técnico ou auxiliar de enfermagem e
•• Técnico em saúde bucal.

Outros projetos

Veja outros dois exemplos de Projetos bem sucedidos no Brasil:

Nos sites abaixo, você pode aprender mais


sobre como a prática de atendimento
nas ruas tem ajudado muitas pessoas em
diferentes regiões do país.
Link1, Link2, Link3, Link4

O Programa ATITUDE - Atenção Integral aos Usuários de Drogas e


seus Familiares, é um Programa do Governo do Estado de Pernambuco
coordenado pela Secretaria de Desenvolvimento Social, Criança e
Juventude (SDSCJ), por meio da Secretaria Executiva de políticas Sobre
Drogas (Sepod). O ATITUDE proporciona proteção às vítimas de violência
e atendimento espontâneo aos usuários de crack, álcool e outras
drogas, com atenção também direcionada aos familiares, oferecendo
cuidados de higiene, alimentação, descanso, atendimento psicossocial,

40
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
além de outros, e com encaminhamentos direcionados para a rede SUS
E SUAS e demais políticas setoriais
O Programa CORRA PRO ABRAÇO, é uma iniciativa do Governo do
Estado da Bahia, através da Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e
Desenvolvimento Social (SJDHDS), que tem como objetivo promover ci-
dadania e garantir direitos de pessoas que fazem uso abusivo de drogas
em contextos de vulnerabilidade, ou afetadas por problemas relaciona-
dos  a criminalização das drogas, baseado nas estratégias de Redução
de Danos físicos e sociais, aproximando seus beneficiários das políticas
públicas existentes uma vez que  o estigma e as desigualdades inter-
ferem em suas capacidades de busca, acesso e acolhimento pelos ser-
viços públicos. Nosso papel é promover uma maior aproximação das
pessoas que fazem uso de drogas à serviços públicos, prioritariamente
nas áreas de saúde, assistência social, educação e justiça

Fonte: autor

MINISTÉRIO DA SAÚDE
41
As práticas de Redução de Danos têm como
princípio fundamental a saúde, acima de
qualquer juízo moral sobre os comporta-
mentos e crenças dos usuários e estão a serviço da defesa da vida, dos direitos humanos e
da inclusão social. Essas são as finalidades do cuidado aos usuários, seja na Atenção Básica,
seja nos CAPS e na comunidade. O objetivo das políticas públicas que articulam esse cuidado
é a construção e garantia da cidadania. A interrupção do uso de álcool e de outras drogas
quase sempre é também um dos objetivos, mas outros avanços são valorizados, como evitar
colocar-se em risco, melhorar o relacionamento familiar e recuperar a atividade profissional.

Assim, o sucesso de tratamento não é avaliado apenas pelo critério de parar ou não de usar
drogas. Muitas outras dimensões da vida como o relacionamento familiar e no trabalho, a
inclusão na escola, as condições clínicas e psíquicas, as relações com a lei e outros fatores
são usadas para a avaliação do resultado das ações. Vejamos alguns dados em relação a isso:

•• Segundo a OMS os programas de intervenção mais eficazes para dependentes de dro-


gas são os que adotam o modelo ambulatorial, onde o paciente aprende a se manter
abstinente ou reduzindo riscos e danos, convivendo em sociedade, com a ajuda de equi-
pes multidisciplinares.
•• Para a grande maioria das pessoas, é possível fazer desintoxicação ambulatorial, com
medicamentos que tratam a crise de abstinência, quando necessário. A desintoxicação
e o tratamento não precisa ser feito somente com internação.
•• A participação do usuário nas escolhas das metas e etapas do tratamento valoriza e
aumenta a sua motivação e engajamento
•• Um estudo, feito pelo psiquiatra e coordenador do Programa de Orientação e Atendi-
mento a Dependentes (PROAD) Dartiu Xavier da Silveira, da Universidade Federal de
São Paulo (UNIFESP), mostra que apenas 2% dos pacientes internados contra a vontade
têm sucesso no tratamento e 98% deles reincidem. “A porcentagem de fracassos é alta
demais para que a medida seja adotada como política pública no enfrentamento do
crack”
•• O tratamento por internação compulsória de qualquer droga – álcool, cocaína etc. – si-
tua-se na ordem de 2%, ou seja, 98% dos usuários internados compulsoriamente, inclu-
sive os de “crack”, não conseguem manter a abstinência
•• O tratamento ambulatorial garante a maior taxa de abstinência, de 35% a 40% dos
usuários tratados. Isso também vale para os usuários de “crack”. Os 60% a 65% que
não conseguirão se manter abstinentes, podem se beneficiar de ações de Redução de
Danos, ou seja, redução dos riscos associados às drogas. Veja mais no seguinte ende-
reço: Veja mais aqui.
•• As pessoas marginalizadas e em situação de extrema vulnerabilidade social, que mui-
tas vezes são vistas como responsáveis pela violência urbana (dentre as quais situam-
-se os usuários de crack), são muito mais vitimadas por atos violentos do que a popu-
lação geral.

42
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
Resumo

A questão das drogas, dos agravos e das doenças associadas ao seu


uso problemático exigem a integração dos pontos de atenção da saúde
com as políticas públicas em suas diversas redes e com as ações comu-
nitárias. Esperamos que você tenha conseguido identificar as potencia-
lidades destes dois componentes da RAPS - a Atenção Básica e os CAPS-
como estratégicos no cuidado à saúde, incorporando a perspectiva da
Redução de Danos em suas ações.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
43
AULA 4: A RELAÇÃO SUJEITO/DROGA/CONTEXTO

Nas Aulas anteriores tratamos das Políticas de Redução de Danos,


das Legislações das Políticas sobre Drogas e sobre Saúde Mental Álcool
e outras Drogas e sobre a Estratégia de Redução de Danos na Atenção
Básica e nos CAPS. Agora trataremos de refletir sobre a concepção de
Sujeito e a relação com os Contextos e as Drogas.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
45
1. Sujeito

Para que possamos atuar diretamente com os usuários de álcool e


outras drogas e suas necessidades, temos que pensar Por que os Huma-
nos usam Drogas? Essa é uma pergunta que se faz Antonio Nery Filho
médico e fundador do Centro de Estudos e Terapia do Abuso de Drogas
– CETAD/UFBA da UFBA, autor de diversas experiências inovadoras de
cuidado às pessoas que usam drogas em vários contextos. Essa per-
gunta parte da constatação de que os Humanos usam Drogas porque
são humanos e diversos. A história da humanidade mostra que as ex-
periências de alteração da consciência sempre estiveram presentes nas
mais diversas culturas e civilizações. Importa aqui ressaltar a importân-
cia de pensar a relação entre as pessoas, seu contexto e as drogas e não
apenas as Drogas em si. Desta forma o que importa são as pessoas,
suas fragilidades e potencialidades, enfim os Sujeitos!

Se quiser ler a obra do Dr. Antônio Nery Fi-


lho, “Por que os Humanos usam Drogas?“
Clique aqui.

Que Concepção de Sujeito?

As concepções de Sujeito são muitas e complexas. Consideramos


que não há como falar de pessoas sem falar de relações. São as rela-
ções que constituem os sujeitos e são os Sujeitos que entram em
relação com o mundo, ou seja, as pessoas se formam através de ex-
periências, vivências próprias, a partir de seu nascimento até à morte.
Sempre estaremos nos constituindo enquanto Sujeitos, em mudança
constante e em movimento para o futuro, e aí se encontra o sentido de
nossa existência. Existir é viver em um fluxo temporal de vivências no
tempo, no mundo, com os outros e consigo mesmo.

Um aspecto importante do sujeito é a sua relação com o seu próprio corpo, que
tem uma dimensão biológica dada, mas que, ao mesmo tempo, se organiza so-
cialmente sobre a base das emoções experimentadas pelo sujeito em seus diferen-
tes sistemas de relações. (BRASIL 2014 p. 49).

46
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
A visão aqui colocada compreende o Sujeito como um ser históri-
co-social-cultural situado na complexidade das relações intersubjetivas
que o constituem como condição existencial.
Sujeito e subjetividade não se separam. A subjetividade é o processo
de subjetivação e objetivação permanente dos Sujeitos. Não nascemos
prontos e a Subjetividade, assim como a personalidade, não nasce já
dada. O Sujeito se constrói a partir de suas ações e sua Subjetividade
é este constante movimento de fazer-se no mundo. Subjetividade” e
“processos de subjetivação” no sentido atribuído por Foucault (1987), e
Guattari (1986), indicam processos de produção histórica, o que nos leva
a pensar cada sujeito singular como sujeito contextualizado, coletivo.
Temos uma condição humana e não uma natureza humana, e é
através das experiências vividas, seus significados e sentidos que nossa
subjetividade se concretiza. Assim a subjetividade não é natural, é
construída, a invenção de formas de vida nada mais é que a produção
de subjetividade.
A subjetividade não está dada, não seria interior ao indivíduo e nem
uma entidade no cérebro, mas é produzida pelos mais diversos âmbi-
tos de nossa vida presentes no contexto de nossa existência. Para Guat-
tari, a subjetividade é essencialmente fabricada e modelada no registro
do social (Guattari, 1986). A subjetividade inclui não apenas o con-
teúdo cognitivo de nossas funções psíquicas, mas também nossas
experiências afetivas, perceptivas e imaginárias.
A subjetividade, então, é compreendida como um processo no qual
existem múltiplos componentes, resultantes da relação que cada ser
humano estabelece, permanentemente, a partir de uma heterogenei-
dade de elementos do contexto social. Os valores, as ideias e signifi-
cados são construídos e subjetivados na expressão singular de cada
Sujeito de forma singular.

Então os Sujeitos não nascem prontos, já com um caráter pró-


prio ou com tendências de personalidade?

Não! os Sujeitos nascem e a partir daí vão se tornando uma pessoa,


uma personalidade, que estará, por sua vez, sempre em transformação.
O sujeito, a partir das relações que vivencia no mundo, produz significa-
ções, que lhe farão sentir, pensar e perceber o mundo, as coisas, os valo-
res e ideias de determinadas formas. Assim, todo processo de constru-
ção do sujeito é realizado na relação com a sociedade, com a família,
com os grupos e redes sociais, nos quais nasceu, cresceu e convive.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
47
Inserido nesse cenário de múltiplas singularidades que se entrecru-
zam, o sujeito, ao realizar sua história, também realiza a dos outros, na
mesma medida em que é realizado por essa mesma história, sendo,
por isso, produto e produtor da sociedade e participante ativo de sua
própria vida e de seu tempo histórico.

A atenção em saúde se preocupa com os sujeitos em seu contexto


de vida, para além dos sintomas, para além da droga:

•• Quem são estas pessoas?


•• Qual sua história?
•• Qual a trajetória de sua vida e como a droga passou a fazer parte dela?
•• Qual o significado da droga em sua vida?
•• Qual a situação em que se encontram?
•• Como se sentem nesta situação?
•• Como se sentem com seu modo de vida?
•• Qual seu sofrimento?
•• Qual seu projeto de vida? Como resgatá-lo?

Poderíamos perguntar por que há pessoas


que conseguem usar alguma droga espo-
radicamente e outros se tornam depen-
dentes?

•• O que vai diferenciar um usuário ocasional de um dependente são outros fatores que
não têm nada a ver com a droga.
•• Os adolescentes de classe média também abusam de drogas, mas, as variáveis determi-
nantes para a dependência estão associadas mais aos conflitos familiares e relacionais
do que à situação de vulnerabilidade social.
•• A dependência de drogas não é um ‘privilégio’ da classe desfavorecida.
•• Na situação extrema de crianças em situação de rua, o risco é altíssimo. A droga muitas
vezes aparece como um recurso para suportar a vida.
•• Se pessoas com problemas psíquicos associados, como depressão e ansiedade, por
exemplo, começam a usar o álcool e a cocaína para resolver seus problemas, ou para
enfrentar situações de muito stress, elas poderão mais facilmente se tornar dependen-
tes.
•• O sofrimento psíquico pode provocar e/ou agravar a dependência de drogas.
•• Assim, os Sujeitos têm suas próprias razões e sentidos para agirem, sentirem e se en-
volverem com drogas. O importante é compreender estes sentidos e buscar apoiar
cada pessoa em sua busca, em seu projeto de vida, em sua autonomia.

48
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
2. As Drogas

De acordo com Fiore (2013), substância psicoativa é o termo cientí-


fico contemporâneo mais consensual para definir os compostos, extra-
tos, plantas, pílulas, bebidas, pós, gases, enfim, qualquer excipiente que
contenha moléculas às quais são atribuídas a propriedade de alterar o
funcionamento neural, o sistema nervoso, a percepção ou a consciên-
cia humana.
De acordo com essa perspectiva, é possível afirmar que, ao longo da
história humana, esse enorme conjunto de substâncias recebeu diver-
sos nomes e foi consumido de diferentes maneiras, até que, no século
passado, algumas delas foram alçadas a um estatuto de questão social
de problema de Estado. Foram então classificadas, proscritas, persegui-
das, elogiadas, divinizadas e inventadas. O termo pelo qual essas subs-
tâncias passaram a ser, e até hoje são, globalmente nomeadas – ainda
que com pouca precisão, mas extrema eficácia – foi drogas.
As drogas, descritas a partir de seus agenciamentos químicos, mate-
riais e sociais peculiares viraram uma entidade, um objeto que foi per-
sonificado com diversos sentidos, como o símbolo de todo o mal e todo
perigo, por exemplo, que precisa ser combatida com uma verdadeira
guerra - a guerra às drogas - a qual, espalhada pelo mundo, já produziu
mais violência e mortes do que as próprias substâncias.
Desta forma as drogas não podem ser objetivadas e postas fora da
história. Assim como o HIV, ambos os elementos são sobrecarregados
de preconceitos, de medos, de pânico moral e social ambos mobilizam
forças políticas, disparam reações sociais.

3. Voltando aos Contextos

O contexto, o território, o país, as cidades, os bairros não são


apenas áreas geográficas em que habitamos, são lugares de produção
de subjetividade, de cultura, onde aprendemos nossos valores ações,
e sentimentos.
Os contextos incluem os fatores culturais, socioeconômicos e polí-
ticos, bem como, as leis e normas dos municípios, dos estados e do
país, por exemplo. O paradigma do proibicionismo marca a atuação
do Estado no campo das drogas e tem diversas repercussões. No cam-
po da saúde, traz grandes dificuldades, desde a pesquisa e as ações de

MINISTÉRIO DA SAÚDE
49
prevenção até para que as pessoas que usam drogas se aproximem
dos serviços e tenham acesso aos profissionais e às ações de redução
de danos e cuidados. As pessoas que usam drogas vivem sob o estigma
de serem usuários de drogas supostamente criminosos ou perigosos.

Proibicionismo é uma forma simplificada de classificar o paradigma que rege a


atuação dos Estados em relação a determinado conjunto de substâncias. Seus
desdobramentos, entretanto, vão muito além das convenções e legislações nacio-
nais. O proibicionismo modulou o entendimento contemporâneo de substâncias
psicoativas quando estabeleceu os limites arbitrários para usos de drogas legais/
positivas e ilegais/negativas. Entre outras consequências, a própria produção cien-
tífica terminou entrincheirada, na maior parte das vezes, do lado “certo” da bata-
lha, ou seja, na luta contra as drogas. O proibicionismo não esgota o fenômeno
contemporâneo das drogas, mas o marca decisivamente. (Fiore 2012).

O enquadre do uso de drogas em um contex-


to proibicionista é produtor de sofrimento e
amplia as vulnerabilidades para o HIV, como
já comprovado por alguns estudos (DEBECK,
K. et al. HIV and the criminalization of drug use among people who inject drugs: a systematic
review. The Lancet HIV, v. 4, n. 8, p. e357-e374, Ago. 2017. / MAHER, L.; DIXON, T. C. Collateral
damage and the criminalization of drug use. The Lancet HIV, v. 4, n. 8, p. e326-e327, Ago. 2017.)

Neste contexto, marcado pelo proibicionismo, os consumidores de


drogas são conduzidos a um contato estreito com o crime. Envoltas
por uma aura marginal que tanto seduz como estigmatiza, as dro-
gas tornam-se um marcador de coragem e virilidade. Demonizadas
por campanhas que carregam mais pânico do que informações, duas
drogam tão diferentes como maconha e cocaína, por exemplo, mistu-
ram-se não só no imaginário, mas nos locais e/ ou nas pessoas que as
vendem. Diferentemente do que ocorre com as drogas legais, sobre
as quais os serviços de saúde podem fornecer informações a respeito
de usos mais seguros e, assim, estimular o autocuidado, o consumidor
de drogas ilícitas é confrontado com uma única decisão: interromper o
consumo ou manter-se escravo da droga.
Para Fiore (2012) a Redução de Danos, de alguma forma consegue
se distanciar das premissas proibicionistas e alcançar bons resultados,
com os quais ganhou credibilidade. Guiadas pelo pressuposto de que
cabe aos profissionais de saúde a minimização dos danos e não a

50
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
erradicação das drogas, as políticas de redução de danos foram deci-
sivas para recolocar os termos do debate, principalmente no cuidado
com o consumidor.

4. Os tipos de clínica

Campos (1997) afirma que se colocarmos a doença entre parênte-


ses, nesse caso, a droga, para permitir a reentrada em cena do sujeito,
e assim olhar para a pessoa concreta, seu sofrimento e sua saúde, sem
descartá-lo de seu contexto, essa atuação será de uma Clínica do Su-
jeito, centrada nas pessoas reais em sua existência concreta, conside-
rando também as doenças, as drogas, como parte destas existências.
Aqui surge uma mudança na concepção de clínica, há uma amplia-
ção do objeto do saber, inclui-se o sujeito e seu contexto como objeto
de estudo e de práticas da clínica. A atuação nesta clínica ampliada
enfrenta os ‘nós críticos’ que a clínica tradicional não tem conseguido
analisar e resolver.
A relações são constitutivas do próprio ser, pois o humano é, desde
sua origem, social, marcado por várias dimensões: o sujeito reflexivo,
da narrativa, produto da relação intersubjetiva, mediada pela lingua-
gem; mas também o ser que o embasa, um ser experiencial, pré-refle-
xivo, corporal. Essa mudança, absolutamente fundamental e inovadora
para a atenção e o cuidado em saúde, toma as doenças, os agravos, o
uso de álcool e outras drogas, não apenas como alterações no corpo,
mas como alterações que implicam em um sujeito e seus modos de
relação no mundo, na sociedade.
Na Clínica tradicional, centrada e fundamentada nas doenças e não
nos Sujeitos, há uma fragmentação decorrente da especialização pro-
gressiva, e um grau de alienação, desinteresse, dificuldades de escutas
e fixação em procedimentos técnicos dos agentes de saúde em relação
às pessoas concretas, que dificulta uma abordagem mais complexa e
contextualizada.
Como vimos nas ações de Redução de Danos, para a atuação nesta área
são necessárias estratégias de intervenção que promovam a autonomia
dos sujeitos, pois envolve a ideia de liberdade, autorreflexividade,
autorresponsabilidade, materialidade de um corpo, particularidades e
potencialidades dos Sujeitos. Com esta concepção de Sujeito, é possível
trabalhar com as dificuldades que as pessoas enfrentam em relação às
drogas e ao sofrimento psíquico, na sua relação com o mundo.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
51
Desta forma, precisamos
compreender a relação que
cada usuário estabelece com o
uso de drogas, a função que as
drogas tomaram em sua vida,
a historicidade desta relação e SUJEITO
os sentidos e significados que
adquiriram no decorrer de sua CONTEXTO
história.  Cada sujeito faz parte
de uma família, tem relações DROGAS
com diferentes pessoas no con-
texto em que vive e possui um
organismo com características
únicas, portanto cada sujeito é
singular.

A Clínica ampliada

A Clínica ampliada deve assentar-se sobre um deslocamento da ên-


fase na doença para centrá-la sobre o sujeito concreto e suas relações
com o contexto em que vive. A Atenção Psicossocial e a Redução de
Danos compreendem que a história de vida é marcada pelas relações
sociais, familiares, bem como, pelas experiências culturais, os valores, o
dia a dia, constituindo o sujeito, que afeta o mundo e por ele é afetado.
Essas abordagens enfatizam a interação e a interdependência dos fe-
nômenos e buscam conhecer os processos subjetivos de cada usuário,
em sua vivência cotidiana.
A Redução de Danos e a Atenção Psicossocial pressupõem articula-
ções no território em que o usuário está vivendo e a ativação das redes
públicas e sociais que podem potencializar seu cuidado, visando dimi-
nuir os fatores de risco e aumentar a proteção à saúde. Nessa perspec-
tiva da clínica ampliada, as relações do sujeito com seu contexto pas-
sam a ocupar um lugar privilegiado, convocando o Sujeito a se engajar
em processos e a se responsabilizar pela própria saúde e a transforma-
ção do seu futuro.
Assim, tentamos compreender a complexidade do ser humano em
seus processos de vida, sofrimento, desenvolvimento, que envolvem as
questões subjetivas, materiais e relacionais para que possamos pensar
e criar com os usuários possibilidades de cuidado. Um instrumento
fundamental para isso é o Projeto Terapêutico Singular, adotado pela

52
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
política pública de saúde que reúne essas perspectivas e concepções
para uma abordagem clínica com o Sujeito.

O Projeto Terapêutico Singular (PTS)

O Projeto Terapêutico Singular (PTS) pode ser compreendido como


uma tecnologia para realizar o cuidado em saúde. Um Projeto, pois tra-
ta de ser uma construção compartilhada com o Sujeito visando reto-
mar a processualidade da sua vida, a perspectiva de futuro e a potên-
cia de lançar-se, enfrentando os obstáculos, em busca de sentido para
suas ações. O Projeto Terapêutico implica em refletir sobre si mesmo
no mundo, suas escolhas passadas e futuras. É terapêutico, uma vez
que experimenta no cuidado de si a construção de sentidos para sua
saúde. É singular, pois é próprio de cada um, não pode ser copiado
de um modelo, nem imposto pelo profissional, precisa estar de acordo
com as suas necessidades, demandas e possibilidades.
O PTS se faz na relação, no diálogo com as exigências, as necessida-
des, os afetos e os conflitos que emergem no processo terapêutico – é
um esforço para superar as formas de pensar e de agir, do modelo
tradicional, prescritivo e autoritário, que dificulta as possibilidades de
contrato nas relações com os sujeitos e suas singularidades.
O Projeto Terapêutico Singular visa possibilitar a retomada pela re-
flexão de um posicionamento do Sujeito sobre sua vida, localizando-se
em sua história, no tempo, presente e futuro e nos diversos contextos
nos quais viveu. Este processo de reflexão e ação também colocará em
questão seu padrão de uso de drogas, e como as doenças e agravos de
saúde entraram em sua vida e como passou a significá-las.
É um “novo olhar” sobre os modos de fazer a clínica, o cuidado. O
PTS possibilita o acompanhamento do Sujeito em seu itinerário pelas
redes de atenção intra e intersetoriais, qualificando as intervenções e
os recursos.
A pessoa, família, grupo ou comunidade devem ser o centro das ob-
servações, planejamentos, ações e avaliações, promovendo, desta for-
ma, a corresponsabilização de todos os envolvidos. Para isso, é preciso
a permanente escuta qualificada, estabelecendo vínculos e acompa-
nhamento dos Sujeitos envolvidos.
Portanto, o PTS busca a educação permanente, a relação com os
profissionais, com a pessoa em sofrimento, com o território e as redes
de sociabilidade, que envolvem a corresponsabilização, transcendendo
ao estudo de caso clínico tradicional, não focando em diagnósticos, mas
sim no Sujeito e seus Contextos, no âmbito da clínica ampliada.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
53
Outros conceitos de Projeto Terapêutico Singular

“O Projeto Terapêutico Singular é um movimento de coprodução e de cogestão do


processo terapêutico de um Sujeito Singular, individual ou coletivo, em situação de
vulnerabilidade”. (OLIVEIRA, 2007, p. 91)

Para Onocko & Gama (2008) o Projeto Terapêutico Singular é um dispositivo que
tem como objetivo traçar uma estratégia de intervenção para o usuário, levando-
-se em conta os recursos da equipe, do território, da família e do próprio sujeito.

A concepção de Zerbetto & Pereira (2005) considera que: O Projeto Terapêutico


tem o objetivo de ajudar o indivíduo a restabelecer relações afetivas e sociais, re-
conquistar direitos e poder, “buscar a autonomia afetiva-material-social e o incre-
mento da incorporação desses na vida de relação social e política”. (p.113)

Três movimentos para a formulação de um PTS

A formulação de um PTS possibilita planejar, produzir e avaliar o cui-


dado na continuidade da vida do usuário, para além dos momentos
de crise ou somente de remissão de sintomas ou ideais de cura. Além
disso, aponta para a emancipação, interação social das pessoas e pro-
dução de vida. Ele pode ser organizado segundo três movimentos:

1. Coprodução da problematização
2. Coprodução de projeto
3. Cogestão / avaliação do processo

1. COPRODUÇÃO DA PROBLEMATIZAÇÃO

Parte do reconhecimento da capacidade / poder das pessoas de


interferirem na sua relação com a vida e com as doenças. Busca um

54
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
saber-fazer enquanto oferta, não enquanto olhar armado, mas da
construção de diálogo e pactuações para a detecção e enfrentamento
dos problemas. Busca:
•• Fazer junto e não pelo outro;
•• Buscar resoluções com e não para o outro;
•• Ofertar contatos, encontros, momentos de conversa, seja nos espaços dos
serviços, na rua ou no domicílio das pessoas.

O significado desses encontros não se dá apenas pela necessidade


da equipe de coletar informações, mas, além disso, será o de oportu-
nizar o vínculo e a formação de algo em comum para a construção do
cuidado.

2. COPRODUÇÃO DO PROJETO E DEFINIÇÃO DE METAS

São momentos de compreensão do problema com a pactuação de


objetivos e metas com o Sujeito e ou Família/Grupos. O Projeto precisa
ser factível, segundo as possibilidades e recursos do próprio Sujeito, do
Contexto em que está, dos recursos disponíveis no serviço e no contexto
das redes de cuidado, com base nos princípios éticos e políticos do SUS.
Os recursos do usuário dizem respeito a sua condição afetiva, cognitiva
e relacional e são proporcionais ao seu território existencial, à sua relação
com os serviços e redes intersetoriais. Estes recursos que são próprios do
sujeito, muitas vezes são deixados de lado na clínica tradicional, que des-
taca apenas seu diagnóstico e não as suas capacidades e singularidades.
Logo, são recursos que potencializam e complexificam o PTS.
Este é o momento de composição de estratégias conjuntas de inter-
venção, com maior chance de sucesso e menor possibilidade de dano,
ou seja, sob a ética da Redução de Danos.

3. COGESTÃO - AVALIAÇÃO DO PROCESSO E DIVISÃO DE RESPON-


SABILIDADES E TAREFAS

É o momento da pactuação conjunta do PTS e suas metas, buscando a


formação de uma rede solidária de sustentação do projeto terapêutico.
A escolha de um profissional de referência pode ser uma estratégia, desde
que ele não se torne “o” único responsável pelo caso, mas sim aquele que
articula, acompanha e promove a avaliação dos objetivos e metas.
O PTS é um movimento, um processo, não é estático. Desta forma é

MINISTÉRIO DA SAÚDE
55
preciso avaliação constante e redefinição de objetivos e metas, de acor-
do com o movimento da vida, as ações que foram possíveis ou não, os
sentidos que mudaram. Os profissionais precisam estar abertos a este
movimento e não apenas “cobrar” o que foi estabelecido, mas escutar
e compreender as mudanças necessárias. O importante é manter o vín-
culo terapêutico e acompanhar o Sujeito em suas tentativas, fracassos
e sucessos.
A clínica da atenção psicossocial do Sujeito desafia as Equipes a cada
dia, a cada intervenção. É uma clínica que se faz no cotidiano, junto com
os usuários, construindo coletivamente as intervenções e os projetos
terapêuticos. Lancetti (2006) defende a ideia de uma “clínica peripaté-
tica” onde as conversações e pensamentos ocorrem no movimento da
vida, durante um passeio, caminhando, em outros espaços não forma-
lizados. Nisso reside a potência das ações de cuidado nos territórios, na
comunidade, que se realizam, na experiência de um cuidado em movi-
mento, que pode modificar qualitativamente as relações entre os usu-
ários e os profissionais, entre os usuários e entre eles e a comunidade.
Nesse sentido, a clínica não pode ser vista separada do processo de
trabalho dos profissionais, da forma como o trabalho está organiza-
do e da subjetividade de seus agentes. As práticas terapêuticas serão
mais efetivas na medida em que os profissionais trabalharem juntos e
compartilharem seus saberes e intervenções. Quanto mais acirrarem
as divisões entre categorias e níveis profissionais e o fechamento em
núcleos, mais empobrecidas serão suas práticas.
Convêm ressaltar que esta estratégia de cuidado já é utilizada em di-
ferentes contextos e pontos de atenção das redes e pode ser ampliada
na Atenção Básica, com as Equipes de Saúde da Família (ESF), com os
Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF) e nos CAPS, e que vai pra
muito além da utilização de dispositivos da política pública de saúde,
envolvendo arte, cultura, lazer e esporte. Além disso, é fundamental
a participação dos serviços especializados na questão das IST, do HIV/
AIDS e das hepatites virais entre pessoas que usam álcool e outras dro-
gas na construção de seus PTS.
O PTS na atenção em saúde e com sujeitos que usam drogas e que
vivem com AIDS e/ou hepatites virais pode ser um dispositivo potente,
uma vez que estes sujeitos apresentam diversas vulnerabilidades
em comum, que precisam de um olhar ampliado. O PTS possibilita
a ampliação da gestão do cuidado, num exercício corresponsável e
compartilhado. Um processo produtivo na injunção de trabalhadores

56
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
de diferentes formações e núcleos e usuários, com o compromisso em
subverter lógicas pré-estabelecidas, permitindo a dimensão inventiva e
criativa dos caminhos e produções para a redução de danos e o cuidado.

PARA REFLETIR Seguem algumas questões para você pen-


sar ao se deparar com os sujeitos que pre-
cisam de seu cuidado na Saúde:

Quem são as pessoas envolvidas no caso?


De onde vêm?
Onde moram?
Como moram?
Como se organizam?
O que elas acham do lugar em que moram
e da vida que têm?
Como lidamos com esses modos de viver?
Qual é e como vemos a situação envolvida
no caso?
Essa situação é problema para quem?
Essa situação é problema de quem?
O que nos mobiliza neste usuário?
A que riscos acreditamos que essa pessoa
está exposta?
Como vamos traçar uma estratégia tera-
pêutica conjunta?

Resumo

Nesta Aula levamos você à reflexão das concepções que fundamen-


tam as práticas de cuidado em saúde. O que é o Sujeito? Quem são os
Sujeitos de quem cuido? Como compreendê-los? E como operar uma
clínica levando em conta essas concepções? O PTS é um instrumento
para isso? Estas são questões centrais na perspectiva das políticas de
saúde do SUS, no cuidado das populações mais vulneráveis e na ética
da Redução de Danos.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
57
GLOSSÁRIO

ABORDA - Associação Brasileira de Redutores de Danos


ACS - Agentes Comunitários de Saúde
ANVISA - Agência Nacional de Vigilância Sanitária
CAPS AD - Centro de Atenção Psicossocial para pessoas com problemas
relacionados ao álcool e outras Drogas
CAPS I -  Centro de Atenção Psicossocial do tipo I (tem como referência
uma população de 20 a 70.000 habitantes)
CAPS II - Centro de Atenção Psicossocial do tipo II  (que tenha como re-
ferência uma população de 70.000 a 200.000 habitantes)
CAPS III - Centro de Atenção Psicossocial do tipo III (tem como referên-
cia uma população acima de 200.000 habitantes)
CAPSi - Centro de Atenção Psicossocial voltado aos problemas de saúde
mental da Infância e Juventude (tem como referência uma população
acima de 150.000 habitantes)
CETAD - Centro de Estudos e Terapia de Abuso de Drogas
CONAD - Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas
CRAS - Centro de Referência da Assistência Social
ECA - Es­tatuto da Criança e do Adolescente
ESF - Equipe de Saúde da Família
INFOPEN - Sistema de Informações Estatísticas do Sistema Penitenciá-
rio Brasileiro
IST/AIDS - Infecções Sexualmente Transmissíveis / Síndrome da Imuno-
deficiência Adquirida
MS - Ministério da Saúde
NASF- Núcleo de Apoio à Saúde da Família
OEA - Organização dos Estados Americanos
ONU- Organização das Nações Uni­das
PEAD - Plano Emergencial de Ampliação do Acesso ao Tratamento e
Prevenção em Álcool e Outras Drogas
PROAD - Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes da
Universidade Federal de São Paulo
PSF - Programa de Saúde da Família
PTS - Projeto Terapêutico Singular
RAPS - Rede de Atenção Psicossocial
RD - Redução de Danos
REDUC - Rede Brasileira de Redução de Danos. 
SAE- Serviço de Atendimento Especializado (IST/AIDS)
SENAD - Secretaria Na­cional de Políticas sobre Drogas
SISNAD - Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas
SUS - Sistema Único de Saúde
UBS - Unidade Básica de Saúde
 
REFERÊNCIAS

 AULA 1:

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departa-


mento de Ações Programáticas Estratégicas. Guia estratégico para o
cuidado de pessoas com necessidades relacionadas ao consumo de
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Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas.
– Brasília : Ministério da Saúde, 2015. 100 p. : il.

DA FONSECA Cicero José Barbosa.  Psicologia & Saberes, 2012, 1(1), pp.


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MACRAE, Edward e GORGULHO, Mônica. Redução de Danos e Trata-


mento de Substituição Posicionamento da Reduc.  http://www.neip.
info/downloads/t_edw8.pdf acessado em junho 2018.

MORAES, M; CASTRO, R. & PETUCO, D.R.S. “Álcool e outras drogas” na


IV Conferência Nacional de Saúde Mental – Intersetorial: reminiscências
de uma observação muito participante.

PETUCO, Denis Roberto da Silva. Pomo da Discórdia? A construção de


um campo de lutas em torno das políticas públicas e das técnicas
de cuidado em saúde dirigidas a pessoas que usam álcool e outras
drogas no Brasil. Tese (doutorado) UFJF Instituto de Ciências Humanas
Programa de Pós Graduação em Ciências Sociais 2016.

REDUC.  http://pbpd.org.br/membro/rede-brasileira-de-reducao-de-da-
nos-e-direitos-humanos-reduc/Acessado em junho de 2018..
VAN DEN HOEK, J.A.R.; VAN HAASTRECHT, H.J.A. & COUTINHO, R.A. Risk
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1357. / BLOK, G. Pampering “needle freaks” or caring for chronic ad-
dicts? Early debates on harm reduction in Amsterdam, 1972-1982. The
Social History of Alcohol and Drugs, v. 22, n. 2, 2008. p. 243-261.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
59
 AULA 2

BRASIL. Conselho Nacional Antidrogas. Resolução n.º3/GSIPR/CH/CO-


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In: ______. Legislação e Políticas Públicas sobre Drogas. Bra­sília (DF):
SENAD, 2008. Disponível em: http://www.obid.senad.gov.br/portais/
OBID/biblioteca/documentos/Legislacao/327912.pdf. Aces­ so em: 6
mar. 2014.

______. Lei n.º 11.343, de 23 de agosto de 2006. Institui o Sistema Na­


cional de Políticas Públicas sobre Drogas – Sisnad; prescreve medidas
para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usu-
ários e dependentes de drogas; estabelece normas para repressão à
produ­ção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas; define crimes
e dá ou­tras providências.  Diário Oficial da União, Brasília (DF), p. 2,
24 ago. 2006. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_
ato2004-2006/2006/lei/l11343.htm. Acesso em: 3 mar. 2014.

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mj.gov.br/services/DocumentManagement/FileDownload.EZTSvc.as­
p? DocumentID={DAD9EFE5-FA77-4479-8F56-2BD7A4F0DEB7} &Servi-
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CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
______.  Convenção sobre Substâncias Psicotrópicas. Viena (AUT):
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AULA 3:

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vel em:  http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2010/
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______. Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas Prevenção dos pro-


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Políticas sobre Drogas. – 6. ed. – Brasília, DF : SENAD-MJ/NUTE-UFSC,
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– Brasília : Ministério da Saúde, 2015. 100 p. : il.

______. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Núcleo Téc-


nico da Política Nacional de Humanização. Acolhimento nas práticas de
produção de saúde. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2010.
 

AULA 4:

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Técnico da Política Nacional de Humanização. Clínica ampliada, equi-
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cional de Humanização. O HumanizaSUS na Atenção Básica. Brasília:
Ministério da Saúde, 2010.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
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_______. Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas. Prevenção dos
problemas relacionados ao uso de drogas: capacitação para conselhei-
ros e lideranças comunitárias / Ministério da Justiça, Secretaria Nacional
de Políticas sobre Drogas. – 6. ed. – Brasília, DF : SENAD-MJ/NUTE-UFSC,
2014.

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terapêutico singular como estratégia de organização do cuidado nos
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tivos de atenção em saúde mental. Rev.Latino-am Enfermagem 13(1),
112-7.

62
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
MÓDULO II
Olá! Agora que você já aprendeu um pouco mais sobre a política de
Redução de Danos – incluindo os seus principais conceitos, diretrizes e
fundamentos e seus aspectos éticos, bem como a Política de Atenção
ao Álcool e Outras Drogas, a estratégia de RD no contexto da atenção
primária em saúde no Brasil e, principalmente, como o abuso de subs-
tâncias está relacionado aos sujeitos de forma individual - é hora de
conhecer um pouco mais sobre como lidar com a apresentação dos
agravos nos indivíduos.

Neste módulo, nós falaremos sobre as doenças sexualmente trans-


missíveis cujo grupo vulnerável inclui o sujeito usuário de drogas. Com
relação à dependência neuroquímica, aprenderemos como ela se
manifesta no sujeito e como deve ser abordada. Dentro desse tema,
também abordaremos o alcoolismo e suas complicações clínicas e psi-
quiátricas, bem como os tipos comuns de drogas ilícitas de acordo
com sua classificação e tipo de tratamento. Por fim, discutiremos algu-
mas ações de prevenção relacionadas aos temas indicados.
Este módulo, composto de 5 aulas, é mais conceitual, mas fornece
elementos fundamentais para o profissional de saúde que lida com o
sujeito usuário de drogas.

Vamos lá? Bons estudos!

Curso
CAPACITAÇÃO EM
REDUÇÃO DE DANOS
AULA 1 : HIV/AIDS E OUTRAS INFECÇÕES SEXUALMENTE
TRANSMISSÍVEIS

Olá! Em nossa primeira aula, vamos definir conceitos importantes


dentro das ações de redução de danos, abordando as Infecções Sexu-
almente Transmissíveis (IST), tais como HIV/AIDS, Hepatites Virais, Sífilis
e Gonorreia. Esses são alguns dos principais agravos a serem evitados
em ações de redução de danos desenvolvida por qualquer profissional
de saúde, em especial aquele vinculado à atenção básica, pois tais in-
fecções são as de mais difícil tratamento e causam danos mais perma-
nentes às pessoas que as desenvolvem.
Mais tarde, para finalizarmos o módulo, voltaremos a esse assunto e
trataremos da prevenção a estes agravos, considerando o uso do pre-
servativo como principal estratégia que, somada à vacinação e à pre-
venção combinada, deve compor a “caixa de ferramentas” do profissio-
nal de saúde com vistas à redução de danos. Vamos começar?

64
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
O que são Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST)?

As IST são causadas por vírus, bactérias ou outros microrganismos.


São transmitidas, principalmente, por meio do contato sexual (oral, va-
ginal, anal) com uma pessoa que esteja infectada sem o uso de camisi-
nha masculina ou feminina. A transmissão de uma IST pode ocorrer,
ainda, da mãe para a criança durante a gestação, o parto ou a ama-
mentação.
As IST podem se manifestar por meio de feridas, corrimentos ou
verrugas anogenitais, que aparecem, principalmente, no órgão genital,
mas podem surgir também em outra parte do corpo (ex.: palma das
mãos, olhos, língua). Algumas infecções, tais como as causadas pelo
HIV e pelos vírus que transmitem a hepatite B e C, apresentam sinais
e sintomas específicos. Vejamos, a seguir, como se manifesta cada IST,
seu tratamento e ações específicas.

1. SÍFILIS E SÍFILIS CONGÊNITA

É uma Infecção Sexualmente Transmissível curável e exclusiva do ser


humano, causada pela bactéria Treponema pallidum. Pode apresentar
várias manifestações clínicas e diferentes estágios (sífilis primária,
secundária, latente e terciária). Nos estágios primário e secundário da
infecção, a possibilidade de transmissão é maior.

Transmissão

Pode ser transmitida por meio de relação sexual sem camisinha com
uma pessoa infectada, ou para a criança durante a gestação ou parto.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
65
Sinais e sintomas

Quadro 2.1.1 - Manifestações clinicas de acordo com a evolução e


estágios da sífilis adquirida.

Evolução Manifestações clínicas

Primária
- 10 a 90 dias após o contato, em média
três semanas
- A lesão desaparece se cicatriz em duas
a seis semanas com ou sem tratamento

Secundária - lesões cutaneomucosas sintomáticas¹


- Seis semanas a seis meses após o contato - Sintomas gerais, micropoliadenopatia
- As lesões desaparecem sem cicatrizes em - Pode haver envolvimento ocular
quatro a 12 semanas (ex: uveíte), hepático e neurológico
- Pode haver novos surtos (ex: alterações nos pares cranianos,
meninginismo)

Latente recente² - Assintomática, com testes imuno-


lógicos reagentes

Latente tardia³ - Assintomática, com testes imuno-


lógicos reagentes

Terciária³ - Quadro cutâneo destrutivo e formação de


- Dois a 40 anos após o contato gomas sifílicas que podem ocorrer em
qualquer órgão
- Acometimento cardiovascular, neurológico
e ósseo

Fonte: DDAH/SVS/MS.
Sífilis primária

Ferida, geralmente única, no local de entrada da bactéria (pênis, vulva,


vagina, colo uterino, ânus, boca, ou outros locais da pele), que aparece
entre 10 a 90 dias após o contágio. Essa lesão é rica em bactérias.
Normalmente não dói, não coça, não arde e não tem pus, podendo
estar acompanhada de ínguas (caroços) na virilha.

66
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
Sífilis secundária

•• Os sinais e sintomas aparecem entre seis semanas e seis meses do apare-


cimento e cicatrização da ferida inicial.
•• Pode ocorrer manchas no corpo, que geralmente não coçam, incluindo
palmas das mãos e plantas dos pés. Essas lesões são ricas em bactérias.
•• Pode ocorrer febre, mal-estar, dor de cabeça e ínguas pelo corpo.

Sífilis terciária

•• Pode surgir de dois a 40 anos depois do início da infecção.


•• Costuma apresentar sinais e sintomas variados, principalmente lesões
cutâneas, ósseas, cardiovasculares e neurológicas, podendo levar à morte.

Sífilis latente – fase assintomática

•• Não aparecem sinais ou sintomas, mas com exame positivo.


•• É dividida em sífilis latente recente (menos de dois anos de infecção) e sífi-
lis latente tardia (mais de dois anos de infecção).
•• A duração é variável, podendo ser interrompida pelo surgimento de sinais
e sintomas da forma secundária ou terciária.

Diagnóstico

O teste rápido (TR) de sífilis está disponível nos serviços de saúde do


SUS, sendo prático e de fácil execução, com leitura do resultado em,
no máximo, 30 minutos, sem a necessidade de estrutura laboratorial, a
qual é ideal para ações de campo e visitas destinadas à redução de da-
nos. O TR de sífilis é distribuído pelo Departamento das IST, do HIV/Aids
e das Hepatites Virais/Secretaria de Vigilância em Saúde/Ministério da
Saúde (DIAHV/SVS/MS), como parte da estratégia para ampliar a cober-
tura diagnóstica, e a distribuição do teste às estruturas regionais, muni-
cípios e equipes deve seguir a logística de outros materiais destinados
ao controle de IST e AIDS. Para populações chave, como é o caso do usu-
ário de álcool e drogas (veja a respeito nas aulas 3 e 4, respectivamente),
principal público alvo das ações de redução de danos, o DIAHV/SVS/MS
recomenda a utilização apenas de testes rápidos e tratamento imediato.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
67
Para saber como ter acesso aos kits
e ao treinamento para aplicação dos
testes consulte a secretaria de saúde
da sua instância do SUS.

Tratamento

O tratamento de escolha é a Penicilina benzatina, que poderá ser


aplicada na unidade básica de saúde ou equipes especiais de saúde,
como consultório na rua. Este medicamento deve ser adquirido pela
secretaria municipal de saúde e distribuído às equipes. Para gestantes,
a penicilina também é distribuída pelo DIAHV/SVS/MS aos municípios.
Sífilis primária, sífilis secundária e latente recente (até um ano de
duração) devem ser tratadas com Penicilina G benzatina, 2,4 milhões
UI, IM, dose única (1,2 milhão UI em cada glúteo). A Sífilis latente tardia
(mais de um ano de duração) ou latente com duração ignorada e sífilis
terciária deve ser tratada também com Penicilina G benzatina, 2,4 mi-
lhões UI, IM, (1,2 milhão UI em cada glúteo), aplicada semanalmente,
por três semanas, conferindo uma dose total de 7,2 milhões UI.
Esse tratamento também é recomendado para gestantes, a fim de
evitar a sífilis congênita.

1.1 SÍFILIS CONGÊNITA

É a manifestação, na criança, da sífilis que foi transmitida ao feto


durante a gestação (transmissão vertical). Por isso, é importante fazer
o teste para detectar a sífilis durante o pré-natal e, quando o resulta-
do for positivo (reagente), tratar corretamente a mulher e sua parceria
sexual, para evitar a transmissão. Recomenda-se que a gestante seja
testada pelo menos em 3 momentos:

•• Primeiro trimestre de gestação


•• Terceiro trimestre de gestação
•• Momento do parto ou em casos de aborto

68
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
Sinais e sintomas
Quadro 2.1.2 - Manifestações clinicas de acordo com a evolução e
estágios da sífilis congênita.

Evolução Estágios Manifestações clínicas

Precoce

Tardia

Fonte: DDAH/SVS/MS.

Diagnóstico

Deve-se avaliar a história clínico-epidemiológica da mãe, o exame fí-


sico da criança e os resultados dos testes, incluindo os exames radioló-
gicos e laboratoriais. Exame direto, testes imunológicos treponêmicos
e não-treponêmicos, e exames complementares como hemograma,
perfil hepático e eletrólitos; avaliação neurológica, incluindo punção li-
quórica, raio-X de ossos longos e avaliação oſtalmológica e audiológica
são utilizados para diagnóstico confirmado da sífilis congênita. Por esse
motivo, é tão importante conhecer a história da mãe, sobre diagnóstico
e tratamento da sífilis.

Se você quiser saber como ocorre o mane-


jo de casos suspeito de sífilis congênita, dê
uma olhada nesta cartilha do estado de
São Paulo: http://bit.ly/guiasifilis

MINISTÉRIO DA SAÚDE
69
Prevenção

Adicionado à prevenção da transmissão sexual da sífilis, com o uso


correto e regular da camisinha feminina ou masculina, como tratare-
mos na última aula, o principal cuidado à criança é a realização de um
pré-natal de qualidade e o tratamento adequado da gestante.
Quando a sífilis é detectada na gestante, o tratamento deve ser ini-
ciado o mais rápido possível, como vimos anteriormente, com a Peni-
cilina benzatina, que é o único medicamento capaz de prevenir a
transmissão vertical. A parceria sexual também deverá ser testada e
tratada para evitar a reinfecção da gestante. São critérios de tratamen-
to adequado à gestante:

•• Administração de Penicilina benzatina;


•• Início do tratamento até 30 dias antes do parto;
•• Esquema terapêutico de acordo com o estágio clínico da sífilis;
•• Respeito ao intervalo recomendado das doses;
•• Testagem e tratamento adequado da parceria sexual.
•• Caso algum desses critérios não seja satisfeito, a atenção à saúde da crian-
ça precisa ser redobrada.

Tratamento

O tratamento da sífilis congênita inclui a Penicilina, no entanto, o se-


guimento da criança e tratamento complementar são bastante com-
plexos. Como o enfoque do nosso curso é a redução de danos, cabe
ao profissional de saúde que concentre seus esforços na prevenção da
ocorrência da sífilis congênita. Caso você se depare com um caso que
suspeite ser de sífilis congênita, fazer a notificação do caso e garantir o
acesso aos serviços de saúde para o tratamento apropriado, é a condu-
ta mais adequada.

2. GONORREIA

Conhecida também por blenorragia, blenorreia, esquentamento,


pingadeira, purgação, fogagem, gota matutina, gono e uretrite gonocócica,
a gonorreia é transmitida pela bactéria Neisseria gonorrheae e provoca a
inflamação da uretra (canal urinário) podendo contaminar outros órgãos
causando complicações como: artrite, meningite e problemas cardíacos.

70
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
Sinais e sintomas

No homem produz uma secreção branca amarelada que sai pela


uretra juntamente com ardor ao urinar e pode ser uma causa de infer-
tilidade masculina.
Em mulheres, a infecção pode não ser aparente. Se passar desperce-
bida, pode se tornar crônica e ascender, atingindo os anexos uterinos
(trompas, útero, ovários) e causar Doença Inflamatória Pélvica e mes-
mo infertilidade feminina.
Em gestantes não tratadas pode levar a oftalmia neonatal que é uma
conjuntivite do recém-nascido após contaminação durante o nascimen-
to, com secreções genitais da mãe. Surge no primeiro mês de vida do
bebê e pode levar à cegueira, se não prevenida ou tratada adequada-
mente.

Diagnóstico

Clínico, epidemiológico e laboratorial. O laboratorial é feito pela co-


loração de Gram ou pelos métodos de cultivo.

Prevenção

Não se trata de um agravo de notificação compulsória, mas o prin-


cipal objetivo das ações de vigilância são promover a interrupção da
cadeia de transmissão pela triagem e referência dos pacientes com IST
e seus parceiros, para diagnóstico e terapia adequados, bem como o
aconselhamento e a promoção do uso de preservativos.

Tratamento

O tratamento recomendado para essas infecções é antibiótico e o


Ministério da Saúde recomenda tratar simultaneamente gonorreia e
clamídia, com Ciprofloxacina, 500mg, dose única, VO, mais Azitromi-
cina, 1g, dose única, VO, ou Doxicclina, 100mg, de 12/12 horas, por 7
dias. Entretanto, o que tem causado atualmente grande preocupação,
é o fato de o agente etiológico dessa doença estar sofrendo mutações
genéticas e se tornando cada vez mais resistente a estes tratamentos
antimicrobianos.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
71
3. HEPATITES

Pode ser causada por vírus , uso de alguns remédios, álcool e outras
drogas, além de doenças autoimunes, metabólicas e genéticas. São doen-
ças silenciosas que nem sempre apresentam sintomas, mas quando estes
aparecem podem ser cansaço, febre, mal-estar, tontura, enjoo, vômitos,
dor abdominal, pele e olhos amarelados, urina escura e fezes claras.
Como veremos na aula sobre alcoolismo, a hepatite pode resultar
do consumo excessivo de álcool. Dentre as hepatites virais, no Brasil,
as mais comuns são as causadas pelos vírus A, B e C, cada um diferente
do outro. O vírus A tem contágio fecal-oral e está relacionado principal-
mente a condições precárias de saneamento básico e água, de higiene
pessoal e dos alimentos. O vírus B é transmitido principalmente por
relação sexual desprotegida e da mãe para o filho. Para ele há vacina
disponível na rede pública. O vírus C tem a principal forma de transmis-
são sanguínea, sendo que pode acontecer por compartilhamento de
seringas, realização de tatuagens, piercings e manicure/pedicure com
ferramentas não esterilizadas.
Devido à especificidade do modo de transmissão de cada uma delas,
e do público alvo das ações de redução de danos, nesta aula falaremos
mais especificamente das Hepatites B e C.

3.1 HEPATITE B E HEPATITE C

Sinais e sintomas

A hepatite B e C podem se apresentar de forma assintomática,


sintomática e, apesar de raramente, até fulminantes. As formas
sintomáticas são caracterizadas por mal-estar, cefaleia, febre baixa,
anorexia, astenia, fadiga, artralgia, náuseas, vômitos, desconforto no
lado direito do abdômen, aversão a alguns alimentos e ao cigarro, urina
escura e fezes sem cor e cor amarelada na pele e olhos. Na forma aguda,
os sintomas vão desaparecendo paulatinamente, mas algumas pessoas
desenvolvem a forma crônica. Na hepatite B o processo inflamatório
hepático pode durar mais de 6 meses, sendo que portadores de
imunodeficiência congênita ou adquirida evoluem para a cronicidade
com maior frequência. Na hepatite C, de um quarto a um terço dos
pacientes evolui para formas histológicas graves, num período de 20
anos. Esse quadro crônico pode ter evolução para cirrose ou câncer

72
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
de fígado, fazendo com que o HCV (vírus desse tipo de hepatite) seja,
hoje em dia, responsável pela maioria dos transplantes hepáticos
no Ocidente. O uso concomitante de bebida alcoólica, em pacientes
portadores do HCV, determina uma maior propensão para desenvolver
cirrose hepática.

Diagnóstico

O teste rápido (TR) para a hepatite B e hepatite C está disponível nos


serviços de saúde do SUS, sendo prático e de fácil execução, com leitura
do resultado em 30 minutos no máximo, sem a necessidade de estru-
tura laboratorial, que é ideal para ações de campo e visitas destinadas
à redução de danos. O TR das hepatites B e C é distribuído pelo Depar-
tamento das IST, do HIV/Aids e das Hepatites Virais/Secretaria de Vigi-
lância em Saúde/Ministério da Saúde (DIAHV/SVS/MS), como parte da
estratégia para ampliar a cobertura diagnóstica das hepatites no Brasil,
e a distribuição às estruturas regionais, municípios e equipes deve se-
guir a logística de outros materiais destinados ao controle de IST e Aids.
Para saber como ter acesso aos kits e ao treinamento para aplicação
dos testes consulte a secretaria de saúde da sua instância do SUS.

Prevenção

A Hepatite B é imunoprevenível. São três doses da vacina que podem


ser tomadas em qualquer idade e está disponível na rede pública.
Além disso, para prevenção das hepatites B e C é preciso usar cami-
sinha em todas as relações sexuais e não compartilhar objetos de uso
pessoal, como lâminas de barbear e depilar, escovas de dente, material
de manicure e pedicure, equipamentos para uso de drogas, confecção
de tatuagem e colocação de piercings.
Especial atenção é necessária à mulher grávida, que durante o pré-
-natal precisa fazer exames regulares para detectar a Hepatite B. Esse
cuidado é fundamental, pois o recém-nascido precisa receber uma
dose de imunoglobulina hiperimune para hepatite B logo após o parto,
junto a com uma dose da vacina hepatite B.

Tratamento

No quadro agudo, como norma geral, recomenda-se repouso relativo


até, praticamente, a normalização das alterações nas enzimas hepáticas
que por ventura foram detectadas em exames de sangue.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
73
O próprio paciente deve definir a sua dieta, de acordo com seu ape-
tite e aceitação alimentar. Deve-se suspender o consumo de álcool e
medicamentos não devem ser administrados sem recomendação mé-
dica especializada, para não agravar o dano hepático. O tratamento do
quadro crônico das hepatites B está previsto no Protocolo Clínico e
Diretrizes Terapêuticas das Hepatites Virais e os medicamentos são
distribuído pelo Ministério da Saúde.

4. HIV e AIDS

O vírus causador da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS)


chama-se Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV), sigla originada do
inglês. Ataca o sistema imunológico, responsável por defender o orga-
nismo de doenças. As células mais atingidas são os linfócitos T CD4+. É
alterando o DNA dessa célula que o HIV faz cópias de si mesmo. Depois
de se multiplicar, rompe os linfócitos em busca de outros para continu-
ar a infecção.

Sinais e sintomas

Quando não tratado, o HIV é quase que invariavelmente fatal, pois


ele destrói o Sistema Imune, resultando na Aids. Os estágios de pro-
gressão do vírus são três:

Estágio 1 - Infecção Aguda: 

Geralmente, dentro de 2 a 4 semanas após a infecção, o indivíduo


infectado pode sentir mal-estar, com sintomas semelhantes aos de um
quadro gripal ou viral. Chamada de resposta aguda ao HIV, ou infecção
primária, essa é a reação normal do corpo à presença do vírus.
Nem todos desenvolvem os sintomas agudos. Por não apresentarem
qualquer sinal de contaminação ou por confundirem os sintomas des-
critos com os de uma gripe, muitos não percebem que podem ter o HIV.
Durante esse período, uma grande quantidade de HIV é produzida
no corpo. O vírus usa células importantes do sistema imunológico –
linfócitos CD4 - para replicar suas próprias cópias. Nesse processo,
muitas células CD4 são destruídas e a sua contagem pode cair
rapidamente e o paciente apresentar sintomas de imunodeficiência,
como, por exemplo: candidose oral, herpes e pneumonias graves.
Uma pessoa com HIV pode transmitir o vírus em todos os estágios

74
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
da doença! Mas a capacidade de o paciente transmitir o HIV nessa fase
é maior, devido à grande quantidade de vírus (carga viral) na corrente
sanguínea.
Com o passar do tempo, na maioria dos casos, o sistema imunológi-
co consegue diminuir a quantidade de vírus no corpo a níveis estáveis.
Nesse momento, a contagem das células CD4 começa a aumentar, mas,
geralmente, não retorna aos níveis da pré-infecção.

Estágio 2 - Latência Clínica (Inatividade):

Esse período é chamado de infecção assintomática pelo HIV ou in-


fecção crônica. Durante essa fase, o HIV está ativo, mas em níveis bai-
xos. O paciente pode não apresentar sintomas e nem adoecer nesse
período. As pessoas que se encontram em tratamento antirretroviral
(TARV) podem viver em latência clínica por muitas décadas. Para pa-
cientes que não fazem o tratamento, esse período pode durar até uma
década, porém, a maioria progride para a doença sintomática de forma
mais rápida.
É importante lembrar que o paciente ainda é capaz de transmitir o
HIV durante esta fase, mesmo se ele estiver em tratamento antirretro-
viral, embora o risco diminua bastante. Da metade desse período até
o final, a carga viral do paciente começa a aumentar e as células de
defesa CD4 a cair. Quando isso acontece, o paciente pode apresentar
sintomas da infecção pelo HIV, já que o sistema imunológico se torna
fraco para proteger o paciente.

Estágio 3 - AIDS/SIDA (Síndrome da Imunodeficiência Adquirida)

Esse é o estágio da infecção pelo HIV que ocorre quando o sistema


imunológico está dramaticamente comprometido e o paciente se torna
vulnerável às infecções e tumores relacionados ao vírus, podendo con-
trair as doenças chamadas oportunistas.
Quando a contagem de células CD4 cai abaixo de 350 células/mm³,
considera-se que o quadro do paciente progrediu para AIDS, mesmo
que este não apresente qualquer sintoma da doença (contagens nor-
mais de CD4 ficam entre 500-1600 células/mm³).
O paciente também pode ser diagnosticado com AIDS se desenvolver
uma ou mais doenças oportunistas, independente da contagem de CD4.
Sem tratamento, os pacientes diagnosticados com AIDS geralmente

MINISTÉRIO DA SAÚDE
75
sobrevivem de três a cinco anos. Uma vez que o paciente apresente
uma doença oportunista grave, a expectativa de vida sem tratamento
cai para um ano.

Diagnóstico

Os testes rápidos permitem a detecção de anticorpos contra o HIV,


presentes na amostra de sangue do paciente, em um tempo inferior a
30 minutos. Por isso, podem ser realizados no momento da consulta
para que, assim, o paciente possa ter conhecimento do resultado e re-
ceba o aconselhamento pré e pós-teste, não havendo a necessidade do
exame de triagem. Os TR são distribuídos gratuitamente para serviços
de saúde da rede pública em todo o país.
Podem ser realizados com fluido crevicular gengival – mais conheci-
do como fluido oral (FO) – soro, plasma ou sangue total, o que permite
o uso de amostras obtidas por punção digital. Os TR são simples de
executar e podem ser utilizados fora do ambiente de laboratório, por
pessoal capacitado presencialmente ou à distância.

Se você acha que a testagem rápida


pode complementar a sua ação de re-
dução de danos, procure a secretaria
de saúde do seu município ou regio-
nal de saúde para saber mais sobre a
capacitação para executá-lo, ou pro-
mova uma parceria institucional para
que os testes sejam feitos!

Tratamento

Ainda não há cura para a AIDS. Os medicamentos antirretrovirais


surgiram na década de 1980, para impedir a multiplicação do vírus no
organismo. Eles não matam o HIV, mas ajudam a evitar o enfraqueci-
mento do sistema imunológico. Por isso, seu uso é fundamental para
aumentar o tempo e a qualidade de vida de quem tem AIDS. No Brasil,
esses medicamentos são distribuídos exclusivamente pelo SUS desde
1996 e, atualmente, todas as pessoas que adquiriram o vírus HIV de-
vem ser tratadas, independente do estágio da doença. Existem várias
combinações de antirretrovirais que devem ser prescritas por um mé-
dico infectologista e reavaliadas periodicamente de acordo com o Pro-
tocolo Clínico para o Manejo da Infecção por HIV, vigente e adequado.
76
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
A adesão ao tratamento talvez seja a missão mais difícil para ações
de redução de danos em pacientes infectados. Manter o paciente ade-
rido significa que ele está tomando os remédios prescritos pelo médi-
co nos horários corretos, mantendo uma boa alimentação, praticando
exercícios físicos, comparecendo ao serviço de saúde nos dias previs-
tos, entre outros cuidados. Quando o paciente não faz o tratamento
corretamente, o vírus HIV pode ficar resistente aos medicamentos an-
tirretrovirais, e com isso, diminui as alternativas de tratamento.
Seguir o tratamento adequadamente pode ser uma tarefa difícil para
os pacientes que não são consumidores de álcool e drogas, pois ele
interfere diretamente na rotina, sendo que os efeitos colaterais podem
ser bastante importantes.
Para o nosso público alvo, este é um desafio sem receita. Conhecer,
manter o vínculo, estar bem informado e fazer uma comunicação ade-
quada com os nossos pacientes podem ser estratégias, mas seu suces-
so depende de você.

Prevenção

A forma de prevenção à transmissão do vírus HIV mais barata, mais


eficaz e segura é o uso do preservativo masculino ou feminino de forma
adequada em todas as relações sexuais. No entanto, como o uso regular
do preservativo pode não ser realizado, principalmente em populações
chave, como é o caso dos usuários de álcool e drogas, outras formas de
prevenção da transmissão do vírus HIV estão disponíveis. Na aula que
diz respeito às ações de prevenção trataremos especificamente sobre
esse assunto.

Além das que mencionamos aqui, existem


outras infecções sexualmente transmissí-
veis. Para saber mais a respeito daqueles
circulantes no Brasil você pode ver o ál-
bum seriado do DIAHV clicando aqui.
Veja também as informações a respeito de
ISTs que foram organizadas em um álbum
seriado, com imagens, disponível para im-
pressão no site da Diretoria de Vigilância
Epidemiológica de SC.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
77
Resumo

Nesta aula abordamos conceitualmente as principais ISTs. Elas fo-


ram escolhidas, por sua importância epidemiológica e individual, sendo
que a prevenção é a melhor forma de manejá-las! A bactéria que causa
a gonorreia tem se tornado multirresistente a tratamento e a sífilis ad-
quirida pode ser transmitida para o feto e ocasionar a sífilis congênita.
As hepatites B e C são de difícil tratamento e são a principal causa de
transplante hepático no Brasil, e o HIV é um grande desafio para a saú-
de pública.
Muitas dessas infecções são transmitidas entre usuários de drogas
e por isso, precisamos entender melhor como a dependência química
funciona nas pessoas, o que será o tema da nossa próxima aula. Depois
de consolidados esses conceitos, estaremos mais instrumentalizados a
praticar ações efetivas de redução de danos.

78
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
AULA 2 : DEPENDÊNCIA QUÍMICA E ABORDAGEM
NEUROQUÍMICA DA DEPENDÊNCIA.

A Organização Mundial de Saúde define a dependência química


como o

“estado psíquico e,algumas vezes, físico resultante da interação entre um organis-


mo vivo e uma substância, caracterizado por modificações de comportamento e
outras reações que sempre incluem o impulso de utilizar a substância de modo
contínuo ou periódico, com a finalidade de experimentar seus efeitos psíquicos e,
algumas vezes, de evitar o desconforto da privação.”

Nesta aula, falaremos sobre como funcionam os mecanismos da


dependência no organismo e, nas aulas seguintes, abordaremos a
respeito das substâncias que causam dependência com mais detalhes.
Vamos começar ressaltando os aspectos biológicos, a seguir.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
79
1. Fatores que envolvem a dependência neuroquímica

A dependência é um fenômeno complexo, com diversas variáveis en-


volvidas. Dessa forma, não existe uma explicação etiológica - referente
às suas causas - simples e que consiga contemplar todas as facetas do
problema. Podemos pensar na dependência como um tripé:

•• Meio ambiente: é o cenário em que se desenrola o encontro do indivíduo


com a droga, bem como o contexto em que ela é utilizada. Nesse caso,
merecem atenção a disponibilidade da substância e o simbolismo de seu
uso. Como ilustração da importância desse elemento do tripé, basta refle-
tir sobre a diferença no consumo de álcool com amigos, em um brinde de
Réveillon, e o consumo imediatamente antes de conduzir um veículo.

•• Indivíduo: certamente o mais complexo dos três elementos, que pode ou
não se tornar um dependente, de acordo com a relação que estabelece
com a droga. Tal relação será influenciada diretamente por diversos fato-
res genéticos, biológicos e psicodinâmicos

a. Fatores biológicos: todas as substâncias com potencial de gerar abuso e


dependência agem em diversos sítios cerebrais, promovendo interação
complexa entre as várias vias de neurotransmissão. Entretanto, a ativação
da via de recompensa cerebral é o elemento comum a todas elas, gerando
reforço positivo (sensação agradável e prazerosa), que leva à intensificação
do consumo. Assim, tais substâncias agem sobre os corpos celulares de
neurônios dopaminérgicos da área tegmental ventral. Tais neurônios lan-
çam projeções para áreas límbicas, como o núcleo accumbens, a amídala
e o hipocampo (via mesolímbica). Essa via está ligada às sensações subje-

80
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
tivas e motivacionais do uso da substância. Além disso, projeções para o
córtex pré-frontal também são ativadas (via mesocortical), sendo respon-
sáveis pela experiência consciente dos efeitos da droga, bem como pela
fissura e pela compulsão ao uso. Veja seção a seguir para entender melhor
o sistema de recompensa e sua relação com a dependência.
b. Fatores genéticos: vários estudos envolvendo famílias com casos de de-
pendência química vêm evidenciando a importância do fator genético no
desenvolvimento do quadro. Todos os estudos, no entanto, são unânimes
em apontar que apenas parte do fenômeno pode ser explicada pelos ge-
nes, sendo que os demais fatores são determinantes de sua expressão ou
não. O gene responsável pela codificação do receptor dopaminérgico D2
parece ter papel-chave, uma vez que sua expressão está reduzida nos pa-
cientes dependentes químicos. Assim, para compensar esse hipofunciona-
mento dopaminérgico, esses indivíduos procurariam formas de estimular
tal via.
c. Fatores psicodinâmicos: o dependente químico pode ser compreendido
como um indivíduo que não completou adequadamente seu processo de
individuação, como se, no momento de se perceber como pessoa, o fizesse
frente a um espelho quebrado, no qual várias falhas e lacunas de seu ego
são expostas. Diante dessa situação, a substância atua como um fator de
estruturação do ego, gerando, assim, a sensação de profundo bem-estar,
que leva ao impulso incessante de consumo.

•• Substância: devemos considerar sua forma de apresentação, acessibili-
dade e custo, seu modo de uso, suas características químicas, como o po-
tencial para gerar dependência, e seus efeitos fisiológicos. Assim, o grau
de lipossolubilidade da substância está intimamente relacionado com a
capacidade de atravessar a barreira hematoencefálica. Rápido início de
ação e intensidade dos efeitos correlacionam-se com o maior ou menor
potencial de abuso. Substâncias com menor meia-vida, em geral, desenca-
deiam síndromes de abstinência mais intensas. As substâncias podem ser
classificadas em três tipos, de acordo com os efeitos que causam:

a. Estimulantes do sistema nervoso central: aumentam não só a atividade


do sistema nervoso central, mas também do sistema nervoso autônomo,
gerando taquicardia, vasoconstrição, hipertensão, além de exaltação do
humor e aceleração do pensamento. Nessa classe incluem-se a cocaína, o
crack, as anfetaminas, o ecstasy, a nicotina e a cafeína.
b. Depressores do sistema nervoso central: promovem uma redução das ati-
vidades cerebrais e das funções orgânicas de modo geral. Seus efeitos se
opõem aos dos estimulantes. Compõem esse grupo o álcool, os opioides,
os benzodiazepínicos e os solventes.
c. Perturbadoras do sistema nervoso central: alteram a percepção do tempo

MINISTÉRIO DA SAÚDE
81
e do espaço, bem como da realidade à volta daqueles que as consomem. O
LSD, a maconha e os cogumelos, além do ecstasy (droga com duplo efeito),
fazem parte dessa categoria.
d. Entendendo a complexidade da dependência química, qualquer tipo de in-
tervenção deve vir acompanhada de conhecimento destes elementos. Por
isso, é de fundamental importância que o profissional conheça as substân-
cias e mecanismos de ação das drogas no corpo (assunto que será aborda-
do na Aula 2 e na Aula 3 deste módulo) , bem como sua disponibilidade e
acessibilidade na sua área ou território de atuação. Para conhecer melhor
o indivíduo a estratégia é a anamnese, que é a caracterização detalhada
do consumo, questionando o paciente sobre todas as drogas consumidas,
quais as suas as motivações para o uso, a quantidade utilizada, o padrão
de uso, os aspectos circunstanciais do uso, os efeitos obtidos e o sentimen-
to pós-uso.

Desta forma, é possível identificar, dentre os diversos padrões de


consumo possíveis, os seguintes:

•• uso experimental: o uso se dá uma ou poucas vezes ao longo da vida, sem


que se estabeleça uma frequência de consumo;
•• uso recreativo ou ocasional: onde há um consumo frequente da substância,
porém sem que se possa estabelecer qualquer tipo de prejuízo decorrente;
•• uso nocivo ou abusivo: o paciente apresenta algum prejuízo concreto de
sua saúde física ou mental ou se expõe a riscos, em decorrência de seu
uso;
•• dependência: veja os seus mecanismos na próxima seção.

1.1 Funcionamento biológico da dependência

Cada droga de abuso tem o seu mecanismo de ação particular, mas


todas elas atuam, direta ou indiretamente, ativando uma mesma região
do cérebro: o sistema de recompensa cerebral. Esse sistema é forma-
do por circuitos neuronais responsáveis pelas ações reforçadas positiva
e negativamente. Quando nos deparamos com um estímulo prazeroso
nosso cérebro lança um sinal (aumento de dopamina – importante neu-
rotransmissor do SNC (Sistema Nervoso Central) – no núcleo accumbens
– região central do sistema de recompensa e importante para os efeitos
das drogas de abuso). Veja o quadro a seguir e acompanhe a explicação
mais detalhada do sistema de recompensa nos próximos parágrafos.

82
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
Quadro 2.2.1 Recompensa cerebral

SISTEMA DE
RECOMPENSA CEREBRAL

Córtex cerebral
Corpo caloso
Córtex frontal
(funções na
personalidade)

Postenor
(nuca)
Antenor
(testa)

Núcleo accumbens
Amygdala
Cerebelo
Tegmento ventral
Hippocampus
(funções na memória) Tronco
encefálico

Fonte: desenvolvido pelo autor

Normalmente existe um aumento de dopamina com estímulos praze-


rosos: comida, atividade sexual, estímulos ambientais agradáveis, como
olhar para uma paisagem bonita ou escutar uma música da qual gosta-
mos. As drogas de abuso agem no neurônio dopaminérgico, induzindo
um aumento brusco e exacerbado de dopamina no núcleo accumbens,
mecanismo comum para praticamente todas as drogas de abuso. Esse
sinal é reforçador, associado a sensações de prazer, fazendo com que
a busca pela droga se torne cada vez mais provável.Inúmeros estudos
demonstraram que as drogas de abuso ou estímulos ambientais natu-
rais (comer, beber água, fazer sexo, ouvir uma boa música), reconhe-
cidos pelo organismo como prazerosos, geram mudanças no cérebro,
mais precisamente nas substâncias químicas chamadas neurotrans-
missores, responsáveis pela comunicação entre os neurônios.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
83
As drogas de abuso agem sobre muitas estruturas do SNC, mas a
ação sobre o sistema mesolímbico e o sistema mesocortical, que
juntos constituem o sistema de recompensa cerebral, é de fundamen-
tal importância. O sistema mesolímbico é composto por projeções
dopaminérgicas que partem da área tegmentar ventral e chegam,
principalmente, ao núcleo accumbens. A área tegmentar ventral é
onde se localizam os corpos neuronais dopaminárgicos; a mesma tam-
bém é responsável pelas projeções desses neurônios para as demais
estruturas do sistema de recompensa e o núcleo accumbens é respon-
sável pelo aprendizado e pela motivação, bem como pela valorização
de cada estímulo. É importante salientar que existem projeções dopa-
minérgicas para outras estruturas cerebrais, tais como o hipocampo,
estrutura associada com aprendizagem e memória espaciais; e a amíg-
dala, estrutura responsável pelo processamento do conteúdo emocio-
nal de estímulos ambientais. O sistema mesolímbico está relaciona-
do ao mecanismo de condicionamento ao uso da substância, bem
como à fissura, à memória e às emoções ligadas ao uso.
O sistema mesocortical é composto pela área tegmentar ventral,
pelo córtex pré-frontal, pelo giro do cíngulo e pelo córtex orbitofron-
tal. O córtex pré-frontal é responsável pelas funções cognitivas supe-
riores e pelo controle do sequenciamento de ações. O giro do cíngulo,
por estar localizado acima do corpo caloso, tem conexões com diver-
sas outras estruturas do sistema límbico e tem as seguintes funções:
atenção, memória, regulação da atividade cognitiva e emocional; o cór-
tex orbitofrontal é responsável pelo controle do impulso e da tomada
de decisão. Portanto, as alterações que ocorrem no sistema meso-
cortical em decorrência do consumo de substâncias psicoativas estão
relacionadas com os efeitos de substâncias psicoativas, compulsão
e perda do controle para o consumo de drogas.
Ambos os sistemas, mesolímbico e mesocortical, relacionam-se, fun-
cionando paralelamente entre si e com as demais estruturas cerebrais
e configuram o sistema de recompensa cerebral.
A dopamina é o principal neurotransmissor presente no sistema
de recompensa cerebral, porém não é o único responsável por sua
ação. Neurotransmissores como a serotonina, noradrenalina, glutama-
to e o GABA são responsáveis pela modulação do SNC e também estão
presentes no sistema de recompensa.

84
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
Assista ao vídeo disponível aqui a respeito
do Sistema de Recompensa, pois ele pode
ajudar você a entender melhor esse conte-
údo teórico.

Você acabou de saber sobre como funcio-


PARA REFLETIR na o sistema de recompensa no cérebro.
Baseado nisso, pense a respeito de outras
formas de dependência que existem atu-
almente, tais como o uso de vídeo-games,
celular, pornografia, etc, e quais os seus efeitos no cérebro. Será que são os mesmos das
drogas químicas? Nesse caso, seria possível substituir um vício pelo outro? Que tipos de
atividades o ser humano pode praticar que tenham um efeito positivo no sistema de recom-
pensa e não se torne um vício nocivo?

2. Diagnóstico da dependência

Para diagnosticar a dependência, dois métodos podem ser adotados


e são baseados em instrumentos internacionais de classificação de do-
enças, o CID-10 e o DSM-V. O CID 10 é o critério adotado no Brasil pelo
Sistema Único de Saúde – SUS. Já O DSM-V abrange apenas os trans-
tornos mentais e tem sido mais utilizado em ambientes de pesquisa,
porque possui itens mais detalhados, em forma de tópicos.

Como nosso curso é voltado para pro-


fissionais do SUS, usaremos os critérios
adotados por ele como base. Mas você
pode encontrar informações um pouco
diferentes em alguma outra referência
que adotem os critérios do DSM-V.

Segundo a CID-10, um diagnóstico definitivo de DEPENDÊNCIA de


substâncias só pode ser feito se três ou mais dos seguintes critérios
tiverem sido detalhados ou exibidos em algum momento do último ano
(últimos 12 meses):

MINISTÉRIO DA SAÚDE
85
1. Forte desejo ou senso de compulsão para consumir a substância;
2. Dificuldades em controlar o comportamento de consumir a substância, em
termos de início, término e níveis de consumo;
3. Estado de abstinência fisiológica, quando o uso da substância cessou ou
foi reduzido, como evidenciado por síndrome de abstinência característica
para a substância, ou o uso da mesma substância com a intenção de aliviar
ou evitar sintomas de abstinência;
4. Evidência de tolerância, de tal forma que doses crescentes da substância
psicoativa são requeridas para alcançar efeitos originalmente produzidos
por doses mais baixas;
5. Abandono progressivo de prazeres e interesses alternativos, em favor do
uso da substância psicoativa, aumento da quantidade de tempo necessá-
rio para obter ou ingerir a substância ou para se recuperar de seus efeitos;
6. Persistência no uso da substância, a despeito de evidência clara de con-
sequências manifestamente nocivas, tais como: danos ao fígado, por con-
sumo excessivo de bebidas alcoólicas; estados de humor depressivos,
consequentes a períodos de consumo excessivo da substância; ou com-
prometimento do funcionamento cognitivo, relacionado à droga. Nesse
caso, deve-se fazer esforço para determinar se o usuário estava (ou se po-
deria esperar que estivesse) realmente consciente da natureza e extensão
do dano.

O profissional de saúde deve entender que a dependência de álco-


ol e outras drogas não ocorre da noite para o dia. O dependente já
foi um usuário inicial e passou por diferentes padrões de uso. Em geral,
os serviços de saúde têm contato com grande número de pessoas que
procuram os serviços por outro problema qualquer e, muitas vezes,
esse sintoma já pode estar relacionado com o uso de álcool e outras
drogas e perdem a oportunidade de fazer uma intervenção precoce po-
dendo evitar a evolução para a dependência.

Atualmente, há ferramentas importantes de identificação de níveis


de uso de álcool e outras drogas que facilitam o estabelecimento de es-
tratégias de ação e servem como um primeiro passo para evitarmos que
o uso dessas substâncias traga problemas de saúde para os usuários,
ou que eles se tornem dependentes. Essas ferramentas são conhecidas
como instrumentos de triagem. Entre os inúmeros instrumentos de
triagem para o uso de álcool e outras drogas no mundo e no Brasil,
traremos como exemplo neste curso o instrumento chamado de CAGE,

86
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
que foi desenvolvido com o apoio da Organização Mundial de Saúde e
serve principalmente para identificar dependentes mais graves.

Cage

O CAGE é o instrumento mais conhecido e de utilização extremamen-


te simples. Esse nome é uma abreviação das quatro perguntas existen-
tes no instrumento, na sua versão em inglês. Cada letra do instrumento
se refere ao tema da pergunta, como veremos a seguir.
O objetivo do instrumento é detectar principalmente casos de de-
pendência de álcool e qualquer profissional da área de saúde, assistên-
cia social, pode utiliza-lo. É rápido e simples (em média um minuto para
aplicar e somar os pontos).

Quadro 2.2.3 Cage

Quadro Cage SIM NÃO

Alguma vez o(a) sr.(a) sentiu que deveria diminuir a quantidade de


bebida ou parar de beber?

As pessoas o(a) aborrecem porque criticam o seu modo de beber?

O(a) Sr (a). se sente culpado(a) pela maneira com que costuma beber?

O(a) Sr (a). costuma beber pela manhã (ao acordar), para diminuir o
nervosismo ou a ressaca?

Fonte: autor

Para fazer a correção:


•• Atribua um ponto para cada resposta positiva (sim) a cada uma das per-
guntas;
•• Some os pontos das respostas;
•• Interpretação: dois pontos ou mais, ou seja, duas respostas afirmativas ou
mais indicam grande possibilidade de dependência de álcool.

Se você quiser conhecer mais a respeito de


como se dá a dependência química, assista
a este interessante vídeo aqui.
E leia um artigo a respeito neste site.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
87
Resumo

Nesta aula vimos que a dependência de substâncias depende de três


principais fatores: indivíduo, substância e ambiente. Neste curso iremos
saber um pouco mais sobre como cada indivíduo reage às substâncias.
Para isso, precisamos conhecer muito bem as substâncias envolvidas
na dependência, que será tema da nossa próxima aula. Mas ainda é
preciso considerar a condição ambiental, na qual podemos intervir com
ações de prevenção, promoção em saúde e empatia!

88
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
AULA 3 : ALCOOLISMO

O álcool é uma substância utilizada desde a antiguidade, sendo as


primeiras informações registradas em 6000 A.C. Frutas e verduras que
fermentavam em vasilhames primitivos produziam uma substância
que era ingerida pelo homem e lhe causava uma grande sensação de
bem-estar e coragem. Essa peculiaridade de fornecer energia e ser fa-
cilmente obtida, associada à ação euforizante tornou o álcool popular.
Infelizmente, o consumo crônico e exagerado dessa substância é um
problema bastante sério com repercussões sociais importantes. O al-
coolismo será o tema desta aula! Vamos começar?

Fonte: Projetado por Rawpixel.com - Freepik.com

MINISTÉRIO DA SAÚDE
89
1. Alcoólatra ou alcoolista?

É muito importante o cuidado com as palavras, com os termos que


usamos para classificar coisas e pessoas, porque essas palavras e ter-
mos têm poder de conferir identidade e, assim, estigmatizar publica-
mente, reduzir uma pessoa a uma única condição, apagando, negando
todas as demais, o que tem entre suas consequências a internalização
desse lugar social, vindo a pessoa a constituir, por si mesma, um obs-
táculo ao desenvolvimento de outro percurso, socialmente valorizado.
Piorar qualquer situação existente é tudo que um profissional de saúde
não pode fazer!
O termo alcoólatra confere uma identidade e impõe um estigma,
que anula todas as outras identidades do sujeito, tornando-o tão so-
mente aquilo que ele faz e que é socialmente condenado, não por fazê-
-lo, mas pelo modo como o faz. Em outros termos, não é a bebida em si,
mas aquela pessoa que bebe mal, isto é, de modo abusivo, desregrado,
que a leva à condição de ser socialmente identificada popularmente
como “alcoólatra”, ou seja, quem “idolatra”, “adora” e se tornou depen-
dente do álcool.
O termo alcoolista foi proposto por alguns pesquisadores como uma
alternativa menos carregada de valoração, isto é, de estigma. Segundo
eles, o termo não reduziria a pessoa a uma condição, como a de alcoó-
latra, mas a identificaria como uma pessoa que tem como característica
uma afinidade com alguma coisa, com alguma ideia. Por exemplo, uma
pessoa que torce no futebol pelo time Flamengo é flamenguista; é uma
característica, mas não reduz o indivíduo a ela, como uma identidade
única e dominante. Eis o porquê de, segundo estes autores, ser preferí-
vel designar uma pessoa como alcoolista e saber que ela é, ao mesmo
tempo, muitas outras coisas, inclusive alguém que pode deixar de ser
dependente de álcool. Isso ajudaria essa pessoa a não ser estigmatiza-
da, reduzida a uma única condição.
Geralmente os dois termos são empregados para designar pessoas
que são “dependentes de álcool”. Neste curso, usaremos essa expres-
são, e você, no seu dia-a-dia pode utilizá-lo também, ou adotar a forma
menos estigmatizada, alcoolista. Evite sempre utilizar as palavras ”bêba-
do” ou “bêbada”, pois tais palavras desvalorizam todas as outras coisas
que uma pessoa é, como por exemplo, pai ou mãe, trabalhador ou tra-
balhadora, reduzindo sua condição àquela de uma pessoa dependente.

90
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
2. Mecanismo de ação do álcool no corpo

O álcool é absorvido pela corrente sanguínea através de pequenos


vasos sanguíneos que se encontram nas paredes do estômago e do
intestino delgado. Dentro de minutos depois da ingestão de álcool, este
vai do estômago ao cérebro, onde rapidamente produz um efeito, re-
tardando a ação das células nervosas. Cerca de 20% do álcool é absor-
vido através do estômago. A maior parte dos 80% restantes é absorvida
através do intestino delgado.
O álcool também chega ao fígado pela corrente sanguínea. O fígado
elimina o álcool do sangue por um processo chamado “metabolismo”,
isso o converte em uma substância não-tóxica. O fígado só consegue
metabolizar certa quantidade de álcool de cada vez, deixando o exces-
so circular pelo corpo. É por isto que a intensidade do efeito do álcool
no corpo relaciona-se diretamente à quantidade de álcool consumido.
O álcool atrapalha a comunicação entre os neurônios, células do
sistema nervoso. Ele ativa a produção de substâncias que amplificam
a ação dos neurotransmissores (moléculas que controlam o fluxo de
informações entre os neurônios) responsáveis pelo prazer. A pessoa
fica eufórica e, geralmente, menos inibida. Conforme a quantidade de
álcool circulante vai aumentando a depressão, e perda da coordenação
motora e de parte dos sentidos começam a aparecer. Isso acontece
porque, em concentrações maiores, o álcool interfere na ação de outro
neurotransmissor que controla a entrada e a saída de íons dos neurô-
nios. Encharcada de etanol, essa substância deixa de controlar a entra-
da de íons de cloro nas células nervosas, gerando o efeito depressor. A
capacidade de metabolizar o álcool varia de acordo com uma série de
fatores, como etnia, sexo, idade e peso da pessoa. Mas é sempre um
processo lento – um quarto de litro de cerveja leva duas horas e meia
para ser eliminado do organismo. Por isso, a ingestão contínua de gran-
des quantidades de bebida alcoólica acaba causando embriaguez, que
é o conjunto de sintomas de intoxicação.
Hoje, acredita-se que a dependência do álcool está relacionada a
fatores ambientais, crenças, expectativas, história familiar e individual
(reveja a aula 2 deste módulo sobre os fatores relacionados à depen-
dência química). Segundo esta perspectiva, hábitos de consumo fre-
quente do álcool são aprendidos e se baseiam na obtenção de prazer e
na redução de tensão ou ansiedade. A pessoa desenvolve uma relação
com a droga que evolui para a dependência. Portanto, não existe um

MINISTÉRIO DA SAÚDE
91
único fator que determine, de forma definitiva, que pessoas ficarão de-
pendentes do álcool, mas uma combinação de fatores contribui para
que alguém tenha maiores chances de desenvolver problemas com re-
lação a essa substância.
Entre esses fatores, podem-se contar os efeitos que a bebida causa
fisicamente na pessoa e que não são idênticos para todos. Como esta
substância deprime o sistema nervoso central, deixando a pessoa mais
relaxada, é possível que, após passar o seu efeito, por exemplo, o or-
ganismo sinta falta do álcool e ela volte a beber, para voltar a “se sentir
bem”. Tal necessidade diz respeito a fatores de natureza biológica.
Os fatores psicológicos associados ao desenvolvimento do alcoolis-
mo podem incluir características de personalidade, como a tendência
à ansiedade, insegurança, medo ou angústia, para os quais o indivíduo
busca alívio por meio da bebida. Há pessoas mais frágeis para enfren-
tar adversidades e problemas e podem, diante deles, desenvolver pa-
drões inadequados de consumo de álcool.
Existem também os fatores ambientais que interferem nos padrões
de consumo de álcool, entre os quais os hábitos familiares, a cultura da
sociedade, estimulando ou restringindo o consumo, os rituais e costu-
mes da comunidade, a oferta de bebidas, a informação, a propaganda
e várias outras influências no desenvolvimento das relações da pessoa
com a bebida.
Enfim, é a interação desses fatores - biológicos, psicológicos e sociais
bem como as decisões e comportamentos do indivíduo, que podem
determinar o processo no qual a pessoa ficaria, gradualmente, ao longo
dos anos, dependente do álcool. A dependência alcoólica tem quatro
sintomas:

•• fissura: uma forte necessidade ou compulsão, à bebida; 


•• perda de controle: a incapacidade para controlar a ingestão de bebida em
qualquer ocasião;
•• tolerância: grandes quantidades de álcool são necessárias para que a pes-
soa tenha uma euforia;
•• dependência física: sintomas de abstinência, tais como náuseas, suores,
tremedeiras e ansiedade, acontecem quando o consumo de álcool é inter-
rompido depois de um período de consumo excessivo. Uma dependência
séria pode levar a pessoa a apresentar sintomas de abstinência que co-
locam sua vida em perigo, que começam de 8 a 12 horas após a última
bebida. O  delirium tremens  começa de 3 a 4 dias depois, e a pessoa fica
extremamente agitada, treme, alucina e desliga-se da realidade.

92
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
A seguir veremos como a dependência do álcool pode afetar o indi-
víduo de forma física, psico e socialmente.

3. Problemas físicos

O álcool está sempre na lista dos maiores causadores de problemas


de saúde no mundo, pois afeta quase todos os sistemas orgânicos em
diversos graus. Muitos pacientes dependentes do álcool e usuários de
drogas procuram, primeiramente, as Unidades Básicas de Saúde em
busca de ajuda para tratar de problemas clínicos (médicos) que vêm
apresentando. Uma boa parte desses pacientes não menciona o uso
abusivo de substâncias, se não for questionado pelo profissional de
saúde, e alguns chegam até a negar tal uso. Por isso é muito importante
o conhecimento das principais ocorrências clínicas relacionadas ao uso
crônico e abusivo de álcool e outras drogas (ver a aula correspondente),
para melhor abordagem e orientação dos pacientes.

Uma taça de vinho não faz mal! Sobre


possíveis efeitos benéficos para o cora-
ção e as artérias, relacionados ao uso de
álcool, é importante observar que eles só
ocorrem quando o consumo permanece
em baixas quantidades. O consumo pesado de álcool é claramente relacionado ao aumento
dos riscos de doenças cardiovasculares. Além disso, a alteração da percepção pode ficar
seriamente comprometida, o que se torna um perigo imediato, por exemplo, no caso de
alguém que vá dirigir um veículo e tenha ingerido certa quantidade de álcool, provocando
um acidente: isso pode provocar danos não apenas em si, mas em outras pessoas que de-
pendam da percepção do motorista.

Fígado

O fígado também é um órgão comumente atingido pelo uso pesado


de álcool. Há vários níveis de prejuízo e geralmente os sintomas podem
demorar muito a aparecer, mesmo quando já há dano grave. Alguns
dos agravos são:

•• esteatose hepática: é uma infiltração gordurosa do fígado que ocorre,


geralmente, sem sintomas e que pode progredir para a cirrose hepática
(invasão do fígado por tecido fibroso), que invariavelmente evolui para a
falência do órgão (insuficiência hepática);

MINISTÉRIO DA SAÚDE
93
•• cirrose: é o resultado de diversas doenças crônicas do fígado, que levam
a destruição gradual das células com a formação de cicatrizes, que vão se
acumulando até que a estrutura do fígado esteja deformada, com a forma-
ção de nódulos;
•• hepatite: inflamação e morte das células do fígado que pode ocorrer pelo
uso maciço de álcool. A hepatite também pode resultar de infecção viral
(hepatites virais) que correm mais frequentemente em usuários de drogas
(veja este assunto na unidade correspondente). Os sintomas agudos nos
dois casos são semelhantes, como dor e desconforto na região superior di-
reita do abdome, febre e icterícia (cor amarelada nos olhos, pelo aumento
das bilirrubinas, substâncias hepáticas), mas, muitas vezes, a inflamação
pode ocorrer de forma gradual e assintomática.

Pancreatite

O álcool também pode induzir pancreatite (inflamação do pâncreas)


aguda ou crônica, que causa dor, vômito e constipação intestinal, o que
requer, em alguns casos, a hospitalização do paciente para tratamento.
A pancreatite crônica pode ainda levar à falência da produção de im-
portantes substâncias, como a insulina, provocando diabetes mellitus.

Síndrome Disabsortiva

Pode ocorrer por efeito deletério do álcool sobre a mucosa intestinal,


somada à baixa produção de enzimas digestivas, produzindo diarreia
crônica e causando no paciente a deficiência de uma série de nutrien-
tes (folato e vitaminas, dentre outros). Vale ressaltar que esse quadro
também é agravado devido à má alimentação e consequente ingestão
insuficiente de nutrientes.

Sistema Cardiovascular

O uso abusivo de álcool parece aumentar significativamente as chan-


ces de o indivíduo apresentar hipertensão arterial, além de ter ação
tóxica direta sobre o músculo cardíaco, levando à miocardiopatia alco-
ólica, que ocasiona sintomas de cansaço aos mínimos esforços, falta
de ar e sinais de edema (inchaço nas pernas). Cerca de um quinto dos
pacientes com arritmia atrial (alterações do ritmo cardíaco) apresenta
diagnóstico de uso abusivo crônico de álcool.

94
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
Sistema Nervoso

O álcool é capaz de causar diversos problemas neurológicos, tanto


no nível central (Sistema Nervoso Central) quanto no nível periférico
(Sistema Nervoso Periférico). Dentre as doenças do SNC relacionadas
ao alcoolismo, a síndrome de Wernicke-Korsakoff é uma das mais re-
levantes, caracterizada pela encefalopatia de Wernicke, com sinais de
falta de coordenação motora, alterações dos movimentos dos olhos e
confusão mental. Geralmente, é seguida da amnésia de Korsakoff, ca-
racterizada por perda de memória recente (dificuldade de fixar fatos
novos).

A degeneração cerebelar, ou seja, a atrofia do cerebelo, importante


parte do cérebro responsável pela coordenação dos movimentos e
equilíbrio, ocorre principalmente entre os usuários crônicos de álcool
que são malnutridos. A morte difusa de células nervosas (neurônios),
por efeito direto e indireto do álcool, leva o indivíduo a apresentar a
demência alcoólica, de progressão gradual, que, ao final, pode ser difícil
de diferenciar de outras demências (não induzidas pelo álcool).

A neuropatia periférica é a principal disfunção do Sistema Nervoso


Periférico, encontrada em alcoolistas de longa data. É causada pela
deficiência de vitaminas do complexo B (como a tiamina) e é caracterizada
por alteração da sensibilidade das extremidades dos membros
inferiores e superiores (distribuição conhecida como “em luvas e botas”),
ocasionando dores e dormência, principalmente nas pernas.

Sistema Hematológico e imunológico

O álcool afeta negativamente a produção e a sobrevivência de várias


células sanguíneas. Os principais problemas encontrados são a anemia
(por baixo consumo de ferro, ácido fólico e vitamina B12, ou por peque-
nas hemorragias internas ocultas), a trombocitopenia (baixo número de
plaquetas) e a neutropenia (baixo número de leucócitos – importantes
no sistema de defesa do organismo).

MINISTÉRIO DA SAÚDE
95
Sistema Endócrino

Mulheres e homens que fazem uso abusivo crônico de álcool exibem


alterações hormonais que podem levar, nos homens, à atrofia (dimi-
nuição) dos testículos, desenvolvimento de mamas e impotência e, nas
mulheres, diminuição da fertilidade e menopausa precoce.

Quadro 2.3.2 Efeitos do álcool no organismo

EFEITOS DO ALCOOLISMO

Coração
Cérebro Batimento irregular
Perda de memória Acidente vascular
Mudança de humor Aumento da pressão
Demência sanguínea

Musculatura
Esôfago Fraqueza
Sangramento nas Perda de massa
varizes do esôfago muscular

Pulmões
Dificuldade para respirar
Baixo nível de óxido nítrico
Pâncreas
Pancreatite

Fígado
Inchaço Estômago
Cirrose Úlceras estomacais
Hepatite Gastrite crônica
Vomitos

Fonte: autor

4. Problemas psíquicos e comorbidades

O uso abusivo de substâncias que modificam o funcionamento men-


tal aumenta o risco de surgimento ou agravamento de transtornos

96
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
mentais. Também nesse caso pode ser difícil identificar o que é causa
e o que é consequência, pois pessoas que sofrem de problemas psíqui-
cos tendem a usar mais álcool ou drogas, os quais, por sua vez agravam
os problemas mentais. São chamados de comorbidades os quadros que
ocorrem ao mesmo tempo.

Neste curso não abordaremos quadros psí-


quicos tipicamente associados ao abuso de
substâncias, mas você pode saber um pou-
co mais nos seguintes sites:
Link 1, Link 2

5. Problemas sociais

É fácil pensar em fatores que influenciem o consumo de drogas, tais


como desemprego, más condições de saúde e educação, falta de op-
ções de lazer, dificuldades nos relacionamentos da família, convivência
constante com atividades criminosas, violência e carência de políticas
de assistência pública. Mas o contrário também é verdadeiro, pois o
consumo de álcool e drogas pode agravar os problemas sociais de um
indivíduo, da família, da comunidade e do país.
Os danos causados pelo uso do álcool são claramente relacionados
ao padrão de consumo (quantidade e frequência de uso). Assim, quan-
to mais uma pessoa bebe, maior o risco de provocar ou sofrer danos.
Vários estudos comprovam que há relação entre os acidentes de au-
tomóveis e o consumo do álcool, bem como aumento do número de
suicídios e tentativas de suicídio e ocorrência de violência.
Uso de álcool pode desencadear vários problemas no trabalho como
absenteísmo, atrasos e retirada do trabalho antes do final do expedien-
te, baixa produtividade, problemas nos relacionamentos com os cole-
gas e chefes no trabalho, problemas disciplinares e até ser responsável
pela rotatividade de funcionários, devido à morte prematura.
O profissional de saúde, conhecendo os efeitos da dependência do
álcool em seus pacientes, deve discernir a adequada intervenção, seja
por meio do tratamento da dependência de álcool, ou, se for mais ade-
quado, adotando estratégias de redução de danos relacionadas ao uso
dessa substância. A seguir, abordaremos um pouco sobre o tratamento

MINISTÉRIO DA SAÚDE
97
da dependência, enquanto que as estratégias de redução de danos (RD)
serão abordadas na próxima aula, quando falaremos das estratégias de
RD para outros tipos de drogas também.

6. Tratamento farmacológico

O objetivo do tratamento da Síndrome de Abstinência ao Álcool


(SAA) é prevenir a ocorrência de: convulsões, delirium tremens e morte
por complicações da SAA. O tratamento farmacológico da SAA inclui os
seguintes medicamentos:

•• Benzodiazepínicos (tranquilizantes, calmantes): diazepam e clordiazepó-


xido (benzodiazepínicos de longa ação) são as medicações de escolha para
o tratamento da SAA, pois são seguros e efetivos para prevenir e tratar
convulsões e delírios, mas não devem ser utilizados enquanto o paciente
estiver intoxicado por álcool;
•• Haloperidol: medicação antipsicótica que pode ser utilizada para tratar
agitação e alucinação. Deve ser administrada juntamente com benzodia-
zepínicos como o lorazepam, pois pode aumentar o risco de convulsões.

O tratamento farmacológico para a dependência do álcool é uma


ferramenta que deve ser considerada em um programa de tratamen-
to para dependência de álcool sob supervisão médica. Nesse trata-
mento, estão incluídos também os seguintes medicamentos:

•• Dissulfiram: tem sido utilizada desde a década de 40, apesar de sua efi-
cácia não estar comprovada. Inibe a metabolização do álcool, causando
reações desagradáveis quando consumido álcool. Essas reações vão desde
rubor facial, suor, náuseas e palpitações até reações mais intensas, como
falta de ar, diminuição da pressão arterial, tontura e convulsões. Reações
graves podem ocorrer, como infarto do miocárdio, perda da consciência,
insuficiência cardíaca e respiratória e morte. A intensidade das reações irá
depender da dose da medicação, da quantidade de álcool consumida e da
vulnerabilidade individual. O efeito perdura por até sete dias;
•• Naltrexone: foi aprovada para tratamento da dependência de álcool, em
conjunto com intervenções psicossociais (ex.: psicoterapia, orientação indi-
vidual e familiar). Os estudos iniciais mostraram que a medicação diminuía
os efeitos prazerosos do álcool e, com isso, também diminuía a vontade de
beber. Os resultados dos testes em pacientes alcoolistas mostraram que o

98
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
Naltrexone, quando combinado com intervenções psicossociais, diminuía
em 50% a chance de recaída, diminuía a vontade de beber e o número de
dias bebendo. A medicação é geralmente bem tolerada e os efeitos adver-
sos mais comuns são náuseas, dor de cabeça, ansiedade e sonolência;
•• Acamprosato: é uma das medicações recentemente aprovadas para tra-
tamento do alcoolismo, sendo efetiva na redução da recaída de pacientes,
além de aumentar o número de dias de abstinência de álcool. Não interage
com álcool e pode ser utilizado mesmo que o paciente tenha recaído.
•• Topiramato e Baclofeno: tratamento experimental, principalmente em ou-
tros países. Tem demonstrado promissores resultados clínicos para o trata-
mento do alcoolismo, porém ambos podem induzir a tolerância (Baclofeno)
e perfil de efeitos colaterais (Topiramato), o que pode limitar a sua utilização.

PARA REFLETIR Ao longo da história, o uso do álcool é


associado à celebração entre amigos – e
ficar bêbado é visto como o “objetivo da
festa” - ou tratado de forma romantiza-
da como o “afogamento das mágoas”.
O quanto essa questão cultural pode
afetar os índices de alcoolismo no nos-
so país e o que pode ser feito para que o
problema seja tratado pela raiz?

Se você quiser saber mais informações a


respeito do álcool (e outras drogas, que se-
rão tema da próxima aula), bem como as-
sistir depoimentos reais de usuários, entre
nos seguintes endereços eletrônicos:

Link 1, Link 2, Link 3, Link 4, Link 5, Link 6

MINISTÉRIO DA SAÚDE
99
Resumo

O alcoolismo é uma dependência das mais difíceis de lidar, pois o


consumo de álcool é licito e socialmente aceito. Entender como fun-
ciona a dependência dessa substância é importante para que o profis-
sional de saúde possa intervir e praticar a redução de danos de forma
mais efetiva, tanto no caso do uso crônico quanto no do agudo. Na pró-
xima aula, veremos a respeito de outras substâncias químicas e seus
efeitos no organismo.

100
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
AULA 4 : PRINCIPAIS DROGAS DE ABUSO E SEUS EFEITOS

Nesta aula nós vamos conhecer um pouco sobre as principais drogas


de abuso utilizadas no Brasil. Aboraremos cada uma e falaremos breve-
mente a respeito de seus efeitos imediatos no indivíduo, bem como os
efeitos resultantes do uso prolongado e a dependência.
É importante conhecermos esses conceitos para que o profissio-
nal de saúde tenha em mente como será a reação do indivíduo na sua
abordagem. Bons estudos!

MINISTÉRIO DA SAÚDE
101
1. Benzodiazepínicos

Fonte: Projetado por Freepik

São remédios tranquilizantes ou ansiolíticos, ou seja, diminuem a


ansiedade e facilitam a indução do sono. Aqueles com ação mais rápi-
da como triazolam, flunitrazepam, temazepam e midazolam oferecem
maior potencial de abuso.

Efeito imediato

Dificultam atividades que exigem atenção, como dirigir ou operar


máquinas. Usada juntamente com o álcool seus efeitos são potencia-
lizados.

Uso prolongado

Os efeitos mais comuns são:

•• sonolência, vertigem e confusão mental;


•• dificuldade de concentração e de memorização;
•• náusea, dor de cabeça, alteração da marcha;
•• problemas de sono;

102
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
•• ansiedade e depressão;
•• tolerância e dependência, após um período relativamente curto de uso;
•• sintomas significativos de abstinência, na sua retirada abrupta;
•• overdose e morte, se usados com álcool, opiáceos ou outras drogas de-
pressoras.

Dependência

O uso abusivo ou a dependência dos benzodiazepínicos é mais co-


mum em indivíduos que abusam de outras drogas, como o álcool, opi-
áceos ou estimulantes. Como se trata de um medicamento, caso o seu
uso seja por indivíduos que apresentem um grave transtorno de an-
siedade, indicadores clássicos de dependência - como uso continuado
apesar de problemas físicos ou psicológicos relacionados ao uso, esfor-
ços para reduzir a utilização e perda de interesse em atividades sociais
e recreacionais devido ao uso - não podem ser considerados para veri-
ficar abuso e dependência.

2. Solventes ou inalantes

Fonte: google imagens

MINISTÉRIO DA SAÚDE
103
São substâncias inaladas para obter alterações psíquicas, chamadas
popularmente de “barato”. Essas substâncias são comuns e existem em
grande variedade e são utilizadas para vários fins domésticos ou in-
dustriais. São exemplos de solventes: colas (cola de sapateiro, cola de
madeira), anestésicos, produtos de limpeza que contêm nitritos (limpa-
dores de cabeça de videocassete, limpadores de couro, aromatizadores
para carro), lança-perfume (cloreto de etila), combustíveis (tíner, aguar-
rás, e outros removedores, gasolina, gás de isqueiro etc.), produtos de
beleza (fixador de cabelo, acetona, esmalte, removedor de esmalte,) e
de papelaria (corretor líquido).
O uso de tais produtos é bastante comum em população de bai-
xa renda, de rua e em crianças, por serem de baixo custo, de fácil
aquisição e grande disponibilidade, além de causarem menos proble-
mas legais do que outras substâncias, pois não há legislação específica
para sua venda,

Efeito imediato

O efeito inicia rapidamente após ser inalado. A substância chega


rapidamente ao pulmão e de lá, pela pequena circulação, ao cérebro,
desencadeando 4 fases: inicialmente o usuário apresenta sintomas de
euforia, excitação, tonturas, perturbações auditivas e visuais, podendo
ocorrer náusea, espirros, tosse, salivação, fotofobia e vermelhidão na
face; logo em seguida há a depressão inicial do Sistema Nervoso Cen-
tral (SNC) caracterizando-se por confusão mental, desorientação e vi-
são embaçada, podendo surgir cefaleia e palidez; na terceira fase ocor-
re a depressão média do SNC com redução acentuada do estado de
alerta, incoordenação ocular e motora, fala pastosa e perda de reflexos;
finalmente ocorre a depressão profunda do SNC quando o indivíduo se
apresenta inconsciente, podendo ocorrer convulsões e mesmo mor-
te súbita, por problemas cardíacos ou parada respiratória.

Uso prolongado

Os efeitos crônicos podem ser específicos do tipo de substância ina-


lada com frequência. De forma geral, pela ação inalante podem ocorrer:

•• rinite crônica;
•• sangramento do nariz repetidamente;
•• mau hálito, feridas no nariz e na boca, conjuntivite e bronquite.

104
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
Além disso, falta de apetite (anorexia), irritabilidade, depressão,
agressividade; paranoia e neuropatia periférica são alguns sintomas
decorrentes da ação dos solventes no SNC.

Dependência

Para reconhecer uma pessoa que usa inalantes perceba se há for-


tes odores na roupa ou no hálito, ou sinais de tinta e outros produtos
escondidos sob a manga da roupa, se a pessoa parece bêbada ou de-
sorientada, se sua fala está alterada, se ela perdeu o apetite ou relata
náuseas, se está muito desatenta, irritável ou deprimida. Sintomas co-
muns de pessoas que usam inalantes com regularidade são:
•• sintomas semelhantes a um resfriado, sinusite, sangramento nasal, indi-
gestão, úlceras estomacais;
•• acidentes e lesões, perda de memória, confusão mental, depressão, agres-
sividade, dificuldade de coordenação, reflexo diminuído, hipóxia (falta de
oxigênio no cérebro, que pode causar desmaios);
•• vertigem e alucinações, sonolência, desorientação, visão embaçada, delí-
rio, convulsões, coma, danos nos órgãos (coração, pulmão, fígado, rins),
podendo levar à morte.

3. Drogas Opiáceas

Os opiáceos são substâncias


extraídas da papoula que, após corta-
da, elimina um líquido leitoso branco,
o qual, ao secar passa a ser chamado
de ópio. Seus derivados são poderosos
analgésicos, portanto, de grande im-
portância na medicina, sendo a mor-
fina e a codeína (inibidor da tosse) os
mais comuns. A heroína é um opiáceo
semissintético que, por ser lipossolú-
vel, atinge o SNC mais rapidamente.

Efeito imediato

Entre os efeitos mais comuns, os


opiácios produzem estado de sereni-
dade, calma momentânea após um
Fonte: freeimages.com/ Marco Michelini

MINISTÉRIO DA SAÚDE
105
período de agitação, analgesia, deprimem o centro da tosse, diminuem
o peristaltismo intestinal e estomacal, causam sonolência, diminuição
da frequência cardíaca e respiratória, diminuição da pressão arterial, e
contração acentuada da pupila.

Uso prolongado

Os efeitos mais comuns são:


•• Coceira, náusea e vômito;
•• sonolência;
•• constipação;
•• enfraquecimento dos dentes;
•• dificuldade de concentração e de memorização;
•• redução do desejo e do desempenho sexual;
•• tolerância e dependência, sintomas de abstinência, overdose e morte por
insuficiência respiratória;
•• efeitos comportamentais que podem resultar em dificuldades de relacio-
namento, problemas profissionais e financeiros e violações da lei.

Dependência

A síndrome de abstinência acontece quando a pessoa interrompe re-


pentinamente o uso dos opiáceos e pode ser muito intensa, com sinto-
mas que podem durar até 12 dias e incluem dilatação da pupila, dores
generalizadas, náuseas e vômitos, diarreia, câimbras musculares, cóli-
cas intestinais, lacrimejamento, corrimento nasal,. Os dependentes de
opiáceos são tratados, geralmente, pela terapia de substituição, onde o
usuário recebe diariamente uma dose de metadona, um agonista dos
opiáceos com uso controlado por médicos e que vai lentamente sendo
diminuído ao longo do tempo. A metadona tem efeito mais prolongado
que a heroína e menos intenso.

Você já viu este filme? Baseado em um livro


de mesmo nome, a protagonista usuária
de heroína passa por crises de abstinência
típicas! Vale a pena ver! A versão dublada
do filme está disponível aqui.

106
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
4. Cocaína

Fonte: google imagens

Isolada em 1862, pelo químico alemão, Albert Neiman, a cocaína é


o princípio ativo da folha da planta Erythroxylum coca, que era masca-
da pelos índios das Américas por suas propriedades anestésicas locais.
Na Europa do século XIX teve seu uso difundido como um energético,
indicado para o tratamento de depressão, fadiga e dependência de de-
rivados do ópio e era vendida sob a forma de medicação ou bebidas.
A cocaína pode ser usada sob forma de pó, aspirado pelo nariz, fu-
mada como crack ou pasta-base, ou por via injetável. Como o tempo
de absorção pela mucosa do nariz é maior, o início dos efeitos mentais
pode levar até 15 minutos, desaparecendo em cerca de 30 minutos.
Já o uso injetável ou fumado produz efeitos em cerca de 15 segundos,
desaparecendo após aproximadamente 15 minutos.

Efeito imediato

Sensação intensa de euforia e poder, estado de excitação,


hiperatividade, insônia, falta de apetite, perda da sensação de cansaço.
Dois efeitos da cocaína merecem destaque, pois podem dificultar o

MINISTÉRIO DA SAÚDE
107
contato com este usuário: fissura e paranoia. A fissura é identificada
pelo desejo intenso de usar drogas, fazendo com que o usuário neste
estado não esteja disponível para contato ou nenhuma outra atividade.
Ela também faz com que ele utilize (injete) a droga muitas vezes ao
dia, buscando eliminar esta sensação de ansiedade. Na paranoia, o
usuário sente-se perseguido e teme qualquer aproximação, julgando
ser prejudicial a ele naquele momento.

Uso prolongado

Entre os efeitos mais comuns estão:


•• irritabilidade, agressividade, delírios e alucinações, que caracterizam um
verdadeiro estado psicótico, a psicose cocaínica;
•• aumento da temperatura e convulsões, frequentemente de difícil trata-
mento, que podem levar à morte se esses sintomas forem prolongados;
•• dilatação pupilar, elevação da pressão arterial e taquicardia (os efeitos po-
dem levar até a parada cardíaca, uma das possíveis causas de morte por
superdosagem).

Dependência

Apesar de não serem descritas tolerância nem síndrome de absti-


nência inequívoca, observa-se, frequentemente, o aumento progressi-
vo das doses consumidas. Além disso, quanto mais rápidos são o início
e o término do efeito, maior a velocidade de estabelecimento de de-
pendência, por isso, o uso da cocaína por via injetável ou fumada gera
dependência tão rapidamente.

5. Anfetaminas

Fonte: google imagens

108
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
São substâncias sintéticas que foram usadas inicialmente para dimi-
nuir o cansaço, afastar o sono e reduzir o apetite. Existem várias subs-
tâncias sintéticas que pertencem ao grupo das anfetaminas. A principal
forma é por via oral e o efeito dura de 8 a 10 horas.
São exemplos de drogas “anfetamínicas”: o fenproporex, o metilfeni-
dato, o manzidol, a metanfetamina e a dietilpropiona. Seu mecanismo
de ação é aumentar a liberação e prolongar o tempo de atuação de
neurotransmissores utilizados pelo cérebro, a dopamina e a noradre-
nalina.

Efeito imediato

Alguns efeitos imediatos são:


•• euforia (sensação de alegria e bem-estar), grandiosidade (sensação de ser
poderoso, de ter muitas qualidades), hipervigilância (estado de alerta exa-
gerado, tentando prestar atenção a tudo que está à volta), irritabilidade;
•• agitação, prejuízo do julgamento;
•• taquicardia (aumento da frequência dos batimentos do coração), aumento
da pressão arterial, arritmias cardíacas;
•• suor, calafrios, dilatação das pupilas;
•• alucinações ou ilusões visuais e táteis;
•• ideias paranoides (sensação de estar sendo perseguido ou de que alguém
quer prejudicá-lo ou atacá-lo);
•• convulsões.

Uso prolongado

Os efeitos mais comuns são:


•• depressão, ansiedade, irritabilidade, agitação;
•• perda de interesse ou prazer nas coisas de que a pessoa costumava gostar;
•• fadiga, exaustão,insônia ou sonolência diurna;
•• aumento do apetite; fissura (vontade muito intensa) pela droga.

Além disso, a aceleração do coração associada à contração das arté-


rias coronarianas pode levar ao infarto agudo do miocárdio. No cére-
bro, o aumento da pressão arterial e a contração dos vasos sanguíneos
podem produzir acidentes vasculares cerebrais, os chamados “derra-
mes”. O uso crônico produz, pela contração das artérias, danos por
isquemia (insuficiente chegada de oxigênio, glicose e nutrientes). Tes-
tes especiais podem identificar diminuição da atenção, concentração

MINISTÉRIO DA SAÚDE
109
e memória. Também pode se instalar um quadro psicótico paranoide,
dependendo da quantidade e do tempo de uso.

Dependência

O uso pontual de medicações pode ser necessário para o tratamen-


to de quadros de intoxicação e abstinência de anfetaminas. Algumas
vezes, é necessário medicar os quadros psíquicos associados (comorbi-
dades), quer tenham surgido antes ou depois do início do uso da droga.

6. Crack

Fonte: google imagens

O crack é uma forma de levar a molécula de cocaína ao cérebro, sen-


do fumada. Já sabemos que a cocaína é uma substância encontrada em
um arbusto originado de regiões dos Andes. O crack é a mesma subs-
tância, em forma de pedra, mais barata de ser produzida que a cocaína,
portanto, mais barata de ser comprada, e com efeito mais rápido.

Efeito imediato

Quando a droga é fumada, isto faz com que grande quantidade de


moléculas de cocaína atinja o cérebro quase imediatamente, produzin-
do um efeito explosivo, descrito pelas pessoas que usam como uma

110
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
sensação de prazer intenso. A droga é, então, velozmente eliminada do
organismo, produzindo uma súbita interrupção da sensação de bem-
-estar, seguida, imediatamente, por imenso desprazer e enorme von-
tade de reutilizar a droga. Esta sequência é vivida pelos usuários com
um comportamento compulsivo em que os indivíduos caem, com frequ-
ência, numa espiral em que os atos de usar a droga e procurar meios de
usar novamente se alternam cada vez mais rapidamente. Os sintomas de
abstinência começam a aparecer de 5 a 10 minutos após o uso. Os sinto-
mas principais são: fadiga, desgaste físico, desâni-mo, tristeza, depressão
intensa, inquietação, ansiedade, irritabilidade, sonhos vívidos e desagra-
dáveis e intensa vontade de usar a droga (fissura). O auge da abstinência
ocorre em 2 a 4 dias. As alterações do humor podem durar meses.

Uso prolongado

Os principais efeitos do uso do crack são decorrentes da ação local


direta dos vapores em alta temperatura (como queimaduras e olhos
irritados) e dos efeitos farmacológicos estimulantes da substância. O
pulmão é o principal órgão exposto aos produtos da queima do crack.
Os sintomas respiratórios mais comuns são:
•• tosse com produção de escarro enegrecido, dor no peito com ou sem falta
de ar, presença de sangue no escarro e piora de asma;
•• aumento da frequência cardíaca e da pressão arterial, podendo ocorrer
isquemias, arritmias cardíacas, problemas no músculo cardíaco e infartos
agudos do coração;
•• acidente vascular cerebral (derrame cerebral), dor de cabeça, tonturas, in-
flamações dos vasos cerebrais, atrofia cerebral e convulsões.

Dependência

A dependência se caracteriza pela perda de controle do uso e por


prejuízos decorrentes dele nas diversas esferas da vida: pessoal, fami-
liar, trabalho, lazer, judicial, etc. O tratamento da dependência do crack
reside, em sua maior parte, em abordagens psicoterápicas e psicosso-
ciais. A abordagem ao usuário deve considerar não somente os sinto-
mas e os efeitos da droga no seu corpo e psiquismo, mas também os
fatores sociais e culturais presentes em seu contexto, já que, em algu-
mas situações, o crack é predominantemente usado por populações
em situação de vulnerabilidade social.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
111
7. Maconha

Fonte: freeimages.com/ Gerhard Taatgen jr.

É o nome dado no Brasil à Cannabis sativa. Suas folhas e inflorescên-


cias secas podem ser fumadas ou ingeridas. Há também o haxixe, pas-
ta semi-sólida obtida por meio de grande pressão nas inflorescências,
preparação com maiores concentrações de THC (tetrahidrocanabinol),
uma das diversas substâncias produzidas pela planta, principal respon-
sável pelos seus efeitos psíquicos.

Efeito imediato

Sensação de bem-estar, acompanhada de calma e relaxamento, me-


nos fadiga e hilaridade, enquanto, em outros casos, os efeitos podem
ser descritos como angústia, atordoamento, ansiedade e medo de per-
der o autocontrole, com tremores e sudorese. Há uma perturbação na
capacidade de calcular o tempo e o espaço, além de um prejuízo da me-
mória e da atenção. Com doses maiores ou conforme a sensibilidade

112
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
individual, podem ocorrer perturbações mais evidentes do psiquismo,
com predominância de delírios e alucinações. Hiperemia conjuntival (os
olhos ficam avermelhados); diminuição da produção da saliva (sensa-
ção de secura na boca); taquicardia com a frequência de 140 batimen-
tos por minuto ou mais.

Uso prolongado

O uso continuado interfere na capacidade de aprendizado e memo-


rização. Pode induzir um estado de diminuição da motivação, que pode
chegar à síndrome amotivacional, ou seja, a pessoa não sente vontade
de fazer mais nada, tudo parece ficar sem graça, perder a importância.
Problemas respiratórios são comuns, uma vez que a fumaça produzida
pela maconha é muito irritante, além de conter alto teor de alcatrão
(maior que no caso do tabaco) e nele existir uma substância chamada
benzopireno, um conhecido agente cancerígeno. Ocorre, ainda, uma
diminuição de 50% a 60% na produção de testosterona dos homens,
podendo haver infertilidade.

Dependência

Tolerância é observada apenas em casos de consumo elevado. Cerca


de 10% dos usuários crônicos apresenta fissura e centralidade na dro-
ga, sendo caracterizada como dependência. O indivíduo pode apresen-
tar ansiedade; insônia; perda do apetite; tremor das mãos; sudorese;
reflexos aumentados; bocejos e humor deprimido. A Síndrome de abs-
tinência é fracamente definida e de baixa intensidade; somente para
altas doses e em períodos prolongados de uso.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
113
8. LSD - Dietilamida do Ácido Lisérgico

Fonte: google imagens

É um líquido claro e a forma mais comum de ser encontrado é em


mata-borrão, isto é, papel absorvente impregnado com o líquido, com
figuras e desenhos. A sua absorção é rápida e os efeitos surgem após
20 a 60 minutos, com pico de ação após 3 horas. Os efeitos duram de
acordo com a dose consumida, podendo durar de 6 a 8 horas

Efeito imediato

Os efeitos dependem do indivíduo, da situação de uso e do estado


de humor em que o usuário se encontra. A “boa viagem” se caracteriza
por alucinações com formas coloridas e aumento da percepção visual
e auditiva; enquanto a “má viagem” se caracteriza por depressão, alte-
rações sensoriais assustadoras e sensação de pânico. Podem ocorrer

114
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
distorções perceptivas (cores e formas alteradas); sinestesia (fusão dos
sentidos, ex.: “ver um som”, “ouvir uma cor”); perda da discriminação de
tempo e espaço (minutos parecem horas); delírios, aumento da frequ-
ência cardíaca; dilatação da pupila; sudorese; náuseas e vômitos.

Uso prolongado

Há descrições de pessoas que experimentam sensações de ansieda-


de muito intensa, depressão e até quadros psicóticos por longos perío-
dos após o consumo do LSD. Uma variante desse efeito é o flashback,
quando, após semanas ou meses depois de uma experiência com LSD,
o indivíduo volta a apresentar, repentinamente, todos os efeitos psíqui-
cos da experiência anterior, sem ter voltado a consumir a droga nova-
mente, com consequências imprevisíveis, uma vez que tais efeitos não
estavam sendo procurados ou esperados e podem surgir em ocasiões
bastante impróprias.

Dependência

A tolerância desenvolve-se muito rapidamente com o LSD, mas tam-


bém há um desaparecimento rápido com a interrupção do uso da subs-
tância. Não há descrição de uma síndrome de abstinência se um usuário
crônico deixa de consumir a substância, mas, ainda assim, pode ocorrer
a dependência quando, por exemplo, as experiências com o LSD ou ou-
tras drogas perturbadoras do SNC são encaradas como “respostas aos
problemas da vida” ou “formas de encontrar-se”, que fazem com que a
pessoa tenha dificuldades em deixar de consumir a substância.

Nos seguintes sites você pode encontrar


mais informações a respeito das drogas e
o cuidado com os seus usuários:
Link 1, Link 2, Link 3

MINISTÉRIO DA SAÚDE
115
Resumo

Nesta aula você pode aprender a respeito de algumas drogas ilícitas


mais comuns e como elas agem no organismo e causam dependência.
Algumas têm um efeito devastador mais imediato, ao passo que outras
tem consequências a médio e longo prazo. Seja qual for o caso, todas
podem causar danos, como a transmissão de infecções, algo que a Re-
dução de Danos tenta evitar. Como fazê-lo? Veremos sobre o assunto
na última aula do Módulo 2, a seguir.

116
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
AULA 5 : AÇÕES DE PREVENÇÃO

Vamos relembrar a nossa trajetória até aqui? No módulo I já falamos


da política de redução de danos e de como ela se insere nas ações de
saúde. No módulo II, que estamos concluindo com esta aula, aborda-
mos alguns conceitos importantes ao conhecimento do profissional de
saúde, para que possa praticar ações de redução de danos conscientes
e adequadas. Introduzimos conceitos sobre as drogas de abuso e expli-
camos como elas agem no corpo; falamos um pouco sobre as doenças,
tais como as hepatites virais e as IST, que as ações de redução de danos
buscam evitar na população usuária. Agora, iremos abordar como de-
vem acontecer as ações de prevenção, considerando o tipo de droga e
as doenças mais preocupantes. Vamos lá?

Você lembra o que significa Redução de Danos?

No seu conceito mais estrito, podemos dizer que: “Redução de Da-


nos é uma política de saúde que se propõe a reduzir os prejuízos de
natureza biológica, social e econômica do uso de drogas, pautada no
respeito ao indivíduo e no seu direito de consumir drogas” (Andrade et
al, 2001). É, basicamente, um conjunto de medidas dirigidas a pessoas
que não conseguem ou não querem parar de usar drogas e têm como
objetivo reduzir os riscos ou danos causados pelo uso. Vejamos quais
são as medidas necessárias de acordo com cada caso.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
117
1. Redução de Danos para Drogas Injetáveis

É chamado uso de droga injetável a utilização de drogas por via


parenteral/endovenosa, por meio de seringas e agulhas. Várias solu-
ções de drogas podem ser injetadas, mas, no Brasil, a mais comumente
injetada é a cocaína. Dois efeitos da cocaína merecem destaque, pois
podem dificultar o contato com este usuário: fissura e paranoia. Como
vimos na aula a respeito do tema, a fissura é identificada pelo desejo
intenso de usar drogas, fazendo com que o usuário neste estado não
esteja disponível para contato ou nenhuma outra atividade. Ela tam-
bém faz com que ele utilize (injete) a droga muitas vezes ao dia, buscan-
do eliminar esta sensação. Na paranoia, o usuário sente-se perseguido
e teme qualquer aproximação, julgando ser prejudicial a ele naquele
momento.
O usuário de droga injetável (UDI) normalmente é um adulto jovem
desempregado, pertencente à classe social menos favorecida. Geral-
mente eles injetam cocaína e utilizam outras drogas concomitantemen-
te, como maconha, crack e álcool, sendo poliusuários. No caso das dro-
gas injetáveis, os riscos que podem ser evitados são principalmente:
contaminação pelo HIV, causador da AIDS, o vírus da hepatite C (HCV) e
o vírus da hepatite B (HCB).
Os usuários devem ser aconselhados a jamais compartilhar agu-
lhas e seringas e nunca reaproveitar equipamentos já utilizados.
Então, cada usuário deve usar seu próprio equipamento e descartá-lo
em local seguro após o uso, para que ninguém venha a reutilizá-lo e
para não ferir ninguém. Para isso, uma das estratégias é fornecer ao
usuário equipamentos novos, como está detalhado no quadro a seguir.

Os programas de redução de danos com estratégia de troca de seringas têm como


objetivo fornecer equipamentos de injeção estéreis aos usuários de drogas inje-
táveis e diminuir, através do recolhimento dos equipamentos usados, a disponi-
bilidade de seringas contaminadas, evitando o compartilhamento e a reutilização
desses materiais a fim de reduzir a disseminação do HIV, do HCV e do HBV entre os
usuários de droga injetável.
A cada seringa usada é oferecida uma nova em troca. A seringa usada recolhida
deve ser encaminhada ao lixo séptico. Como os UDI injetam várias vezes ao dia,
torna-se necessário trocar ou distribuir várias seringas por semana. Não existe um
número correto para distribuir. É necessário entender o padrão de consumo de
cada usuário atendido pelo programa. De qualquer forma, se o usuário levar se-
ringas a mais, alguém de sua rede de contatos provavelmente irá utilizá-las.
2. 2.

118
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
2. Redução de Danos para Drogas Ingeridas

As principais drogas ingeridas são aquelas que se apresentam na


forma de medicamentos, como benzodiazepínicos e ansiolíticos, e as
estimulantes como LSD e ecstazy. As medidas de RD para essas subs-
tâncias ingeridas incluem informação aos usuários sobre:

•• risco de dependências;
•• efeitos problemáticos (“bad trips”);
•• intoxicação aguda;
•• risco de desencadeamento de quadros psicóticos e de outros quadros psi-
quiátricos;
•• evitar de fazer uso desacompanhado;
•• procurar atendimento de emergência em caso de mal-estar físico ou psí-
quico e informar ao profissional de saúde que fez uso da substância;
•• evitar uso concomitante de outras drogas e/ou álcool.

Além das medidas acima, é importante que haja melhor controle


da prescrição e venda dos medicamentos. No caso de indivíduos que
façam uso abusivo ou já se tornaram dependentes, é importante que
sejam encaminhados para tratamento e que esse uso seja monitorado.

3. Redução de Danos para o Álcool

O simples fato de que o uso de álcool faz parte dos costumes da


sociedade brasileira, estando presente em diversas situações do dia-a-
-dia, desde celebrações religiosas a comemorações, já é suficiente para
que haja uma preocupação no sentido de tornar este uso mais seguro
para quem o faz e para a sociedade. E é exatamente este o objetivo
dos programas de Redução de Danos. É fundamental, portanto, que as
pessoas não apenas estejam informadas sobre os riscos decorrentes
do ato de beber, mas que também conheçam estratégias que possam
minimizar os riscos e possíveis danos, caso decidam ingerir bebidas al-
coólicas. É muito importante ressaltar que as estratégias de RD são in-
tervenções complementares às estratégias de controle da demanda
e da oferta da substância.

Tanto o uso crônico de álcool como a embriaguez aguda podem acar-


retar danos para o indivíduo que bebe e também para a sociedade, por
isso, as ações de redução de danos podem ser direcionadas a ambos.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
119
Para o uso crônico, a redução de danos estimula uma diminuição
gradativa do uso para reduzir as consequências prejudiciais do álcool
ou das drogas. Medicamentos que auxiliem neste processo podem ser
sugeridos. A redução de danos não é uma estratégia que se oponha
à abstinência, mas sim complementar a esta, e que pode funcionar,
inclusive, como meio para se chegar a um estágio em que a abstinência
seja possível. A característica principal dos tratamentos é uma atitude
inclusiva e sem preconceitos, o que se reflete em uma maior flexibilidade
para estabelecer as metas a serem atingidas na atuação terapêutica
e também em uma maior capacidade de atrair, para o tratamento,
pessoas que rejeitem tanto o rótulo de alcoolistas, como a proposta de
abstinência total.

A primeira estratégia é justamente tentar evitar que o ato de beber


se torne uma “bebedeira”, ou seja, tentar evitar o consumo exagerado
de bebidas alcoólicas. Algumas dicas são:
•• estabelecer um limite para o consumo de bebidas alcoólicas e aprender a
controlar o consumo;
•• beber lentamente e aumentar o intervalo entre uma dose e outra;
•• alternar bebidas alcoólicas com bebidas sem álcool;
•• não beber de estômago vazio;
•• aprender a beber menos e a recusar bebida.

Outra preocupação que os profissionais


de saúde devem ter é a alteração de com-
portamento decorrente do uso de álcool.
A primeira delas diz respeito a quem está
dirigindo um veículo motorizado. Atual-
mente a legislação brasileira referente ao Trânsito tem tolerância zero para pessoas que
ingerem álcool e dirigem. Portanto, informar sobre a legislação e o risco de acidentes de
trânsito que podem ser provados por motoristas alcoolizados também é uma ação impor-
tante de redução de danos.
A segunda preocupação é o comportamento sexual de alto risco entre pessoas que bebe-
ram. É muito importante que haja preservativos de fácil acesso nos locais onde existe con-
sumo de bebidas alcoólicas. Sabe-se que se os preservativos não estiverem prontamente
disponíveis para pessoas que são sexualmente ativas, o risco de contato sexual desprotegi-
do e, portanto, de doenças sexualmente transmissíveis, aumenta muito.
Muitos jovens terão contato com serviços de saúde devido a problemas decorrentes de um
episódio de “bebedeira”. Tais situações podem ser oportunidades únicas para iniciar uma
conversa franca em que sejam abordados o consumo de bebida alcoólica e os comporta-
mentos de risco associados.

120
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
4. Redução de Danos para Drogas Inaladas e/ou Aspiradas

A palavra aspirar diz mais respeito à via nasal, da cocaína, e inalar


corresponde mais à via oral, como como ocorre com o uso caso dos
solventes. A primeira ação de redução de danos relacionada a esse tipo
de drogas é orientar o usuário sobre o risco que ele corre ao usar a
substância. Nas aulas anteriores você viu os principais riscos relaciona-
dos a cada tipo de droga. É importante que ele saiba que não existe
nenhum tipo de uso que possa ser considerado seguro, porque os
riscos graves decorrentes do uso podem ocorrer numa primeira vez.
Dessa forma, existe apenas a possibilidade de um uso de menor risco.

Uma vez que o usuário recebeu as informações necessárias, e por


não conseguir ou não desejar descontinuar o uso, parte-se para as es-
tratégias propriamente ditas, como as descritas a seguir:
•• lavar as narinas com soro fisiológico após o uso para evitar lesões na mu-
cosa nasal;
•• usar canudos plásticos e não compartilhar os canudos, porque a cocaína
pode provocar sangramento nasal, facilitando assim a transmissão de do-
enças;
•• em caso de mal estar físico ou psíquico, procurar atendimento médico de
urgência em prontos-socorros e informar a substância e a quantidade uti-
lizada;
•• principalmente em caso de uso de solventes, é recomendado que não se
faça uso desacompanhado pelos riscos de parada respiratória;
•• evite misturar a substância com outras drogas, sobretudo com o álcool,
pelo grave risco de potencializar o efeito.

5. Redução de Danos para Drogas Fumadas

As principais drogas que são consumidas de forma fumada em nosso


meio são a maconha (cannabis) o crack e o tabaco. Em linhas gerais,
para todas as drogas fumadas, valem os princípios gerais de redução
de danos, dos quais sempre deve constar a informação, através de
folhetos explicativos. Além disso, os usuários devem ser encorajados e
incentivados a diminuir o uso ou a migrar para padrões menos danosos
de consumo. Devem, também, ser advertidos a procurar ajuda médica

MINISTÉRIO DA SAÚDE
121
em casos de mal-estar, sempre informando ao profissional do pronto-
socorro quais foram as substâncias consumidas.
Para a maconha especificamente, deve-se considerar que, embora
seja uma substância cujos riscos são menores quando comparados aos
danos provocados pelo crack e pela cocaína, não se pode deixar de in-
formar ao usuário sobre os riscos e prejuízos advindos do uso dessa
substância e estimulá-lo à diminuição ou parada.
Em se tratando de crack, várias estratégias de redução de danos sur-
giram nos últimos anos, a exemplo do uso do cachimbo, e a substitui-
ção do crack por drogas que causem, comparativamente, menor dano,
como o “mesclado” ou “freebase” (cigarro de maconha com crack) e a
maconha. O uso do cachimbo para usuários de crack é uma estratégia
empregada que surgiu como uma alternativa de evitar que o usuário
consuma a droga em recipientes nada higiênicos, como latas e copos
usados, os quais oferecem risco de intoxicação com resíduos de cer-
tos materiais, tais como plástico e metal. Dessa forma, são distribuídos
cachimbos e orienta-se o não compartilhamento dos mesmos ou, ao
menos, dos bocais removíveis.
Em relação ao tabaco, por se tratar de uma droga lícita e cujos efei-
tos deletérios demorarão muito para aparecer na grande maioria dos
casos, seu uso é muito mais tolerado em nosso meio. Desse modo, as
principais estratégias de RD existentes dizem respeito à proposta da
diminuição de consumo enquanto não se atinge a abstinência e restri-
ções no ambiente, como proibir seu uso em lugares públicos, fiscalizar
a venda para menores e oferecer tratamento aos que desejam aban-
donar o uso. Nesse sentido, existem programas estruturados para o
tratamento do tabagismo oferecidos pelo Ministério da Saúde.

Para conhecer mais a respeito do progra-


ma nacional de controle do tabagismo
clique aqui.

6. Prevenção combinada

Considerando a transmissão do vírus HIV como um das principais


agravos a serem evitados nas ações de redução de danos, e o uso do
preservativo insuficiente para a redução da transmissão do vírus em

122
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
populações chave, como é o caso dos usuários de drogas, o Departa-
mento de Vigilância, Prevenção e Controle das IST, do HIV/Aids e das
Hepatites Virais tem trabalhado na Prevenção Combinada como uma
estratégia mais eficaz.
A Prevenção Combinada é uma estratégia que faz uso simultâneo
de diferentes abordagens de prevenção (biomédica, comportamen-
tal e estrutural) aplicadas em múltiplos níveis (individual, nas parcerias/
relacionamentos, comunitário e social) para responder a necessidades
específicas de determinados segmentos populacionais e de determina-
das formas de transmissão do HIV.
As intervenções biomédicas são ações voltadas à redução do risco
de exposição, mediante intervenção na interação entre o HIV e a pessoa
passível de infecção. Essas estratégias podem ser divididas em dois gru-
pos: intervenções biomédicas clássicas, que empregam métodos de
barreira física ao vírus, já largamente utilizados no Brasil; e interven-
ções biomédicas baseadas no uso de antirretrovirais (ARV). Como
exemplo do primeiro grupo, tem-se a distribuição de preservativos
masculinos e femininos e de gel lubrificante. Os exemplos do segundo
grupo incluem o Tratamento para Todas as Pessoas (TTP); a Profilaxia
Pós-Exposição (PEP); e a Profilaxia Pré-Exposição (PrEP). Falaremos um
pouco mais de cada uma delas mais adiante.
As intervenções comportamentais são ações que contribuem para
o aumento da informação e da percepção do risco de exposição ao HIV
e para sua consequente redução, mediante incentivos a mudanças de
comportamento da pessoa e da comunidade ou grupo social em que
ela está inserida. Como exemplos, podem ser citados: incentivo ao uso
de preservativos masculinos e femininos; aconselhamento sobre HIV/
Aids e outras IST; incentivo à testagem; adesão às intervenções biomé-
dicas; vinculação e retenção nos serviços de saúde; redução de danos
para as pessoas que usam álcool e outras drogas; e estratégias de co-
municação e educação entre pares.
As  intervenções estruturais  são ações voltadas aos fatores e
condições socioculturais que influenciam diretamente a vulnerabilidade
de indivíduos ou grupos sociais específicos ao HIV, envolvendo
preconceito, estigma, discriminação ou qualquer outra forma de
alienação dos direitos e garantias fundamentais à dignidade humana.
Podemos enumerar como exemplos: ações de enfrentamento ao racis-
mo, sexismo, LGBTfobia e demais preconceitos; promoção e defesa dos
direitos humanos; campanhas educativas e de conscientização.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
123
Vejamos, a seguir, as ações de prevenção combinadas de forma mais
detalhada.

124
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
TRATAMENTO COMO PREVENÇÃO – TASP

O uso de medicamentos antirretrovirais faz com que as pessoas vi-


vendo com HIV/AIDS alcancem a chamada “carga viral indetectável”. As
evidências científicas também mostram que pessoas vivendo com HIV/
AIDS e que possuem carga viral indetectável, além de ganharem uma
melhora significativa na qualidade de vida, têm uma chance muito me-
nor de transmitir o vírus a outra pessoa.

PROFILAXIA PÓS-EXPOSIÇÃO – PEP

A PEP é a utilização da medicação antirretroviral após qualquer si-


tuação em que exista o risco de contato com o vírus HIV. A medicação
age impedindo que o vírus se estabeleça no organismo – por isso a
importância de se iniciar esta profilaxia o mais rápido possível após o
contato: em até 72 horas, sendo que o tratamento se torna mais eficaz
se iniciado nas duas primeiras horas após a exposição. O tratamento
deve ser seguido por 28 dias.

PROFILAXIA PRÉ-EXPOSIÇÃO – PrEP

A PrEP é a utilização do medicamento antirretroviral por aqueles in-


divíduos que não estão infectados pelo HIV, mas se encontram em si-
tuação de elevado risco de infecção. Com o medicamento já circulante
no sangue no momento do contato com o vírus, o HIV não consegue se
estabelecer no organismo.

A prevenção consiste na tomada diária de um comprimido com dois


medicamentos (Tenofovir + Entricitabina) que impedem que o vírus
causador da AIDS infecte o organismo, antes de a pessoa ter contato
com o mesmo.  A proteção inicia-se após 7 dias de uso para relação
anal e 20 dias de uso para relação vaginal, mas não protege de outras
infecções sexualmente transmissíveis e, portanto, deve ser combinada
com a camisinha.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
125
O medicamente utilizado na PrEP já está
disponível em vários estabelecimentos de
saúde, e você pode saber em quais no site
oficial do governo.
Informações para o público em geral tam-
bém podem ser obtidas aqui.

PRESERVATIVO MASCULINO / FEMININO e GEL LUBRIFICANTE

O preservativo masculino (camisinha) é o método mais eficaz para


prevenção das doenças sexualmente transmissíveis, como a AIDS, al-
guns tipos de hepatites e sífilis, além de evitar a gravidez não planejada.

O preservativo feminino também serve para prevenir contra a


AIDS, hepatites virais e outras doenças sexualmente transmissíveis. As-
sim como a opção masculina, também evita uma gravidez não deseja-
da. Por ficar dentro do canal vaginal, a camisinha feminina não pode ser
usada ao mesmo tempo em que a masculina. É feita de poliuretano, um
material mais fino que o látex da camisinha que envolve o pênis, e mais
lubrificada também.

O gel lubrificante, que deve ser sempre à base de água para não
danificar o preservativo, tem papel na prevenção da transmissão sexual
do HIV, dado que sua presença nas relações sexuais diminui o atrito e
a possibilidade de provocar microlesões das mucosas genitais e anais,
já que tais lesões podem funcionar como porta de entrada para o HIV
e outros microorganismos. Recomenda-se o uso do gel associado ao
preservativo, potencializando a prevenção, ou uso isolado, na lógica da
redução de risco.

O preservativo masculino, feminino e o gel lubrificante são disponi-


bilizados gratuitamente em toda rede pública de saúde.

 REDUÇÃO DE DANOS

Como o HIV e alguns vírus causadores de hepatite estão presentes


no sangue, há risco de infecção a cada vez que se compartilha seringas,
agulhas, alicates ou qualquer outro produto que corte ou fure.

126
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
Por isso, recomenda-se não compartilhar os equipamentos (serin-
gas, cachimbos, piteiras, etc.) para o uso de drogas. Essas recomenda-
ções fazem parte das estratégias de redução de danos do Ministério
da Saúde, que busca reduzir os prejuízos sociais e aqueles à saúde de
quem usa álcool e outras drogas. Este curso, que você está tendo opor-
tunidade de realizar, é uma das maneiras de qualificar os profissionais
de saúde para executar as ações da melhor forma possível.

 PREVENÇÃO DA TRANSMISSÃO VERTICAL

Toda mulher grávida deve fazer o pré-natal e os exames para detec-


tar o HIV e a sífilis (ver a respeito do assunto na primeira aula do Módulo
2). Esse cuidado é fundamental para evitar a transmissão da mãe para a
criança (transmissão vertical). O teste para diagnosticar a sífilis deve ser
feito na 1ª consulta do pré-natal, idealmente no primeiro trimestre da
gravidez, no início do 3º trimestre (28ª semana) e no momento do par-
to (independentemente de exames anteriores), pois a sífilis congênita
pode causar aborto e má-formação do feto, entre outros problemas. A
parceria sexual também deverá comparecer ao serviço de saúde para
ser orientada e tratada, a fim de evitar a reinfecção da gestante.
Já a testagem para o HIV é recomendada na 1ª consulta do pré-natal
ou 1º trimestre e 3º trimestre da gestação. Mas, no caso de gestantes
que não tiveram acesso ao pré-natal, o diagnóstico pode ocorrer no
momento do parto, na própria maternidade, por meio do teste rápido
para HIV. As gestantes que souberem da infecção durante o pré-na-
tal têm indicação de tratamento com os medicamentos antirretrovirais
durante a gestação e ainda no trabalho de parto para prevenir a trans-
missão. O recém-nascido também deve receber o medicamento antir-
retroviral por quatro semanas e ser acompanhado no serviço de saúde.
A transmissão do HIV também pode acontecer durante a
amamentação, por meio do leite materno, por isso a mãe que tem
o vírus não deve amamentar a criança. É orientada a suspensão da
amamentação e a inibição da lactação. Portanto, o leite da mãe deve
ser substituído por leite artificial.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
127
TESTAGEM PARA DIAGNÓSTICO DE HIV, OUTRAS IST
E HEPATITES VIRAIS

O teste para diagnóstico do HIV quando feito precocemente aumen-


ta a expectativa de vida do soropositivo (que apresenta o vírus no orga-
nismo). Quem busca tratamento especializado no tempo certo e segue
as recomendações do médico ganha em qualidade de vida. A infecção
pelo HIV pode ser detectada com, pelo menos, 30 dias a contar da si-
tuação de risco. Isso porque o exame (o laboratorial ou o teste rápido)
busca por anticorpos contra o HIV no sangue. Esse período é chamado
de janela imunológica.

O teste da sífilis está disponível nos serviços de saúde, como parte


da estratégia para ampliar a cobertura diagnóstica dessa IST.

Janela imunológica é o período entre a


infecção e a produção de anticorpos pelo
organismo contra o HIV em uma quantida-
de suficiente para serem detectados pelos
testes, como o teste rápido. O que isso
quer dizer? Por exemplo, se uma pessoa se testou dias depois de uma relação sexual sem
camisinha, pode apresentar resultados negativos nos testes, mesmo tendo sido infectada.
Isso acontece porque, se o teste é feito durante o período da janela imunológica (30 dias),
há a possibilidade de que ele apresente um falso resultado negativo. Portanto, é necessário
esperar no mínimo 30 dias para realizar o teste. Caso o resultado seja negativo e permane-
cer a suspeita de infecção, é importante que se refaça o teste em 30 dias. Nesse período, é
importante se proteger por meio de preservativo.

Se você quiser saber mais sobre a testagem


laboratorial relacionada às ISTs e HIV /Aids,
acesse o  TELELAB, um programa de educa-
ção continuada do Ministério da Saúde e
que disponibiliza CURSOS GRATUITOS, cujo
público alvo são os profissionais da área de
Saúde. O curso está disponível aqui.

128
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
 IMUNIZAÇÃO

A vacina contra Hepatite B é bastante eficaz, mas são necessárias as


três doses para garantir a proteção. Ela está disponível nos serviços de
saúde. Para a Hepatite C não existe vacina até o momento.

Atenção especial para vacinação de: gestantes, trabalhadores da


saúde, bombeiros, policiais, manicures, populações indígenas, doado-
res regulares de sangue, gays, lésbicas, travestis e transexuais, profis-
sionais do sexo, usuários de drogas, e pessoas com Infecções Sexual-
mente Transmissíveis (IST).

Você pode encontrar mais informações a


respeito da prevenção combinada aqui.

Resumo

Nesta aula falamos sobre como trabalhar a redução de danos pen-


sando nas diferentes formas de consumo de drogas, como injetáveis,
inaláveis, fumadas, ingeridas e álcool e destacamos a Prevenção Combi-
nada para evitar doenças sexualmente transmissíveis como a principal
estratégia de redução de danos a ser adotada para os usuários de álco-
ol e drogas. No Brasil, atualmente se recomenda associar, à educação
em saúde, a distribuição e a informação relacionada ao uso correto dos
preservativos, bem como o tratamento como prevenção. O tratamento
como prevenção é importante para o nosso público alvo, pois pode ser
oferecido antes ou depois da exposição de risco.
Agora que você já está mais instrumentalizado em relação à legisla-
ção da Redução de Danos no contexto nacional, e também a respeito
da dependência química e dos danos que as drogas podem causar no
organismo, bem como informado sobre algumas estratégias de pre-
venção e cuidados para os usuários de drogas, veja, no Módulo 3, a
respeito de ações de redução de danos na prática.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
129
GLOSSÁRIO  

AIDS: Síndrome de Imunodeficiência Adquirida – SIDA


CID: Classificação Internacional de Doenças. CID-10 é o critério adota-
do no Brasil pelo Sistema Único de Saúde – SUS. Ele abrange todas as
doenças e foi elaborado pela Organização Mundial de Saúde e está em
sua 10ª revisão.
DSM: Diagnostic and Statistical Manual que significa “Manual de Diag-
nóstico e Estatística” o DSM-V, abrange apenas os transtornos mentais
e tem sido mais utilizado em ambientes de pesquisa, porque possuem
itens mais detalhados, em forma de tópicos. O DSM foi elaborado pela
Associação Americana de Psiquiatria e está na sua 5ª revisão.
HCV: Vírus da Hepatite C
HIV: Vírus da Imunodeficiência Humana
HPV: Infecção pelo Papilomavírus Humano
IST: Infecções Sexualmente Transmissíveis
SAA: Síndrome de Abstinência ao Álcool
SNC: Sistema Nervoso Central
TR: Teste Rápido
TV: transmissão vertical
UDI: usuário de drogas injetáveis
 
REFERÊNCIAS
 
AULA 1:

BRASIL. Ministério da Saúde. Doenças Infecciosas e Parasitárias - Guia de


Bolso. 8a  edição revista ed. BRASÍLIA - DF: [s.n.].

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Para Atenção Integral às Pessoas com Infecções Sexualmente Transmissí-
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BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Depar-


tamento de Vigilância, Prevenção e Controle das Doenças Sexualmente
Transmissíveis, Aids e Hepatites Virais. Manual técnico para o diagnóstico
da infecção pelo HIV / Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em
Saúde, Departamento de Vigilância. Prevenção e Controle das Doenças
Sexualmente Transmissíveis, Aids e Hepatites Virais. – 2. ed. – Brasília :
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BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Depar-
tamento de Vigilância, Prevenção e Controle das Doenças Sexualmente
Transmissíveis, Aids e Hepatites Virais. O que são IST | Departamento
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n. 26, p. 56-57, 2015 Disponível em: <http://revista.lusiada.br/index.
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Vigilância Epidemiológica. HIV/AIDS: Sinais e Sintomas - www.aids.sc.
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Acesso em: 9 jul. 2018.
 
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lha para profissionais de saúde. 2008. http://www.prefeitura.sp.gov.br/
cidade/secretarias/upload/direitos_humanos/Cartilha para profissio-
nais da saude.pdf (accessed June 29, 2018).
 
AULA 5:

Andrade, T. M.; Lurie, P.; Medina, M. G. et al. “The opening of South


America´s first needle exchange program and an epidemic of crack use
in Salvador, Bahia-Brazil”. Aids and Behavior, San Diego, California-USA,
v. 5, n. 1, p. 51-64, 2001.

BRASIL, M. D. S. DO. Manual técnico. [s.l: s.n.]. v. 1


DEPARTAMENTO DE VIGILâNCIA, PREVENÇÃO E CONTROLE DAS IST, DO
H. DAS H. V. Profilaxia Pré-Exposição (PrEP). Disponível em: <http://
www.aids.gov.br/pt-br/publico-geral/prevencao-combinada/profilaxia-
-pre-exposicao-prep>. Acesso em: 9 jul. 2018.

IST, A. Prevenção combinada. [s.d.].


NIEL, M.; XAVIER, D.; SILVEIRA, D. DROGAS E REDUÇÃO DE DANOS: uma
cartilha para profissionais de saúde, 2008. Disponível em: <http://
www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/direitos_huma-
nos/Cartilha para profissionais da saude.pdf>. Acesso em: 29 jun. 2018

PAULO, S. GUIA BÁSICO DE PREVENÇÃO COMBINADA O Que É? Como


Fazer? Onde Saber Mais? 2017.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
133
MÓDULO III
Neste módulo iremos debater a respeito da Redução de Danos na
prática, levando em consideração as normas nacionais e internacionais
que sintetizam as evidências científicas atualmente disponíveis nesta
área, iniciando pela prevenção e promoção da saúde dos usuários de
drogas e abordando assuntos correlatos como: intersetorialidade e in-
tegralidade da assistência; entrevista motivacional, abordagem, acolhi-
mento, atendimento e reinserção social; vínculo ao tratamento e assis-
tência ao usuário de drogas portador do HIV/AIDS/HV.

Considerando a Redução de Danos e seus desdobramentos sob a


perspectiva do processo de cuidado, ,esse módulo propõe um cami-
nho possível a ser seguido a partir de análises de território, levando em
consideração as particularidades de cada região, a cultura, as relações
que as pessoas fazem com as drogas de abuso, o significado do uso
para cada cultura e pessoa e assim por diante. Questões, estas, que
precisam ser levadas em consideração, discutidas e refletidas antes de
qualquer intervenção ou política a ser implantada.

Você está pronto para o debate? Então siga em frente!

Curso
CAPACITAÇÃO EM
REDUÇÃO DE DANOS
AULA 1 : PREVENÇÃO E PROMOÇÃO DA SAÚDE DOS USUÁRIOS
DE DROGAS

No cotidiano do trabalho de saúde ou em qualquer roda de conversa


informal onde surge o tema das drogas uma das primeiras questões
que aparece é a prevenção e, junto com ela, alguns questionamentos,
tais como:

•• Qual o melhor momento para introduzir esta intervenção?


•• Em que locais deverá ser feita?
•• Que pessoas devem ser abordadas?
•• Quais as formas de abordagem mais adequadas?
•• Quais os horários com maior impacto?

De modo geral, dentro dos espaços acadêmicos e de cuidado da


saúde, e também na mídia, que tem grande influência na formação de
opinião do público leigo, existe um consenso de que as intervenções
de prevenção com relação ao uso ou abuso de substâncias psicoati-
vas (SPA) devem acontecer o mais precocemente possível, ou seja, com
estratégias voltadas para um desenvolvimento seguro e saudável de
crianças e jovens.Por outro lado, a forma como essa intervenção é feita
(quem são os responsáveis, como acontecem, em que cenários e con-
textos ocorrem)precisa ser analisada à luz da perspectiva científica, o
que muitas vezes não acontecem no nosso cotidiano.
Neste sentido, esta aula pretende trazer algumas reflexões e aponta-
mentos, demonstrar evidências científicas de estratégias de prevenção
ao cuidado bem-sucedidas em diferentes contextos, além de propor-
cionar um momento de análise e de crítica a respeito do nosso cenário
de prática, se este está sendo influenciado por opiniões leigas, sem em-
basamento científico, e sem levar em consideração o contexto de cada
pessoa e seu território.
Para nos auxiliar nesse debate, vamos abordar, como principal fer-
ramenta de reflexão e análise, os conteúdos das Normas Internacionais
Sobre a Prevenção do Uso de Drogas, do Escritório das Nações Unidas
Sobre Drogas e Crime (UNODC). Essas normas sintetizam as evidências
científicas atualmente disponíveis no cenário mundial, descrevem as in-
tervenções e políticas que resultaram em medidas de prevenção posi-
tivas e suas características, apontando, ao mesmo tempo, os principais
componentes e características de um sistema eficiente de prevenção
ao uso e abuso de drogas de um país.

136
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
Espero que, analisando essas Normas Internacionais em conjunto
com experiências brasileiras bem sucedidas, possamos discutir ferra-
mentas potentes que, de fato, impactem no cenário de práticas de cada
um de vocês, na construção e no desenvolvimento de programas, polí-
ticas e sistemas que funcionem como um investimento sólido e eficaz
no futuro de crianças, jovens, famílias e comunidade.
1. Prevenção do uso e abuso de Substâncias
Psicoativas (SPA)

O papel social da prevenção ao uso de SPA é auxiliar pessoas no geral


e, principalmente (mas não exclusivamente), os jovens, a fim de evitar
ou retardar o início do uso de drogas ou, caso isso já tenha sido iniciado,
evitar que desenvolvam relações prejudiciais com estas substâncias.

Fonte: Blog Sala de Imprensa

Nesse sentido, cabe destacar que o objetivo da prevenção do uso


de drogas inclui o desenvolvimento seguro e saudável de crianças e
jovens, de forma que percebam seus talentos e potenciais, tornando-
se membros que contribuam para o bem de suas comunidades e
da sociedade (UNODOC). Em outras palavras, um sistema eficaz de
prevenção do uso de drogas contribui significativamente para que
crianças, jovens e adultos participem de forma positiva nas atividades
familiares, escolares, comunitárias e no ambiente de trabalho.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
137
Promoção de saúde implica o forta-
lecimento da capacidade individual e
coletiva de lidar com a multiplicidade
dos determinantes e condicionantes
de saúde, buscando redução de riscos
ou vulnerabilidade e fortalecimentos
da proteção integral.

Dentro dessa perspectiva, o modelo mais aceito, na atualidade é o


de prevenção baseada em promoção de saúde, ou seja, um modelo
que prevê a redução dos riscos e aumento dos fatores de proteção, por
meio do empoderamento (capacitação) das pessoas e das comunida-
des para que elas mesmas modifiquem os determinantes da saúde em
benefício de sua qualidade de vida.

Fonte: Projetado por Freepik

Nos últimos 20 anos, a ciência de prevenção no campo do abuso


e dependência de drogas fez enormes avanços, fazendo com que os
profissionais da área da saúde, do social e os governantes tenham uma
melhor compreensão sobre o que torna as pessoas vulneráveis ao uso de
drogas ou ao seu consumo de forma abusiva (fatores de risco), tanto no
âmbito individual quanto no social. É importante lembrar que, durante

138
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
muito tempo, os programas de prevenção ao uso de drogas foram
demasiadamente concentrados no fornecimento de informações sobre
os malefícios do consumo dessas substâncias, com pouco ou nenhum
impacto sobre o comportamento destes programas. Na atualidade,
porém, as estratégias de prevenção baseadas em evidências científicas,
trabalhadas em conjunto com famílias, escolas e comunidades, podem
garantir que crianças e jovens cresçam e permaneçam saudáveis e
seguros até chegarem à vida adulta e à velhice.

Fonte: Ciclo Vivo por um Mundo Melhor

1.1 Fatores de Risco e de Proteção

Com relação aos fatores de risco, de acordo com o UNODOC, há evi-


dencias do desconhecimento de certos fatores, tais como: os processos
biológicos, traços de personalidade, transtornos mentais, negligência
e abuso na família, falta de vínculo com a escola e com a comunida-
de, normas sociais propícias e ambientes favoráveis ao uso abusivo de
substância, e crescimento dentro de comunidades marginalizadas e ca-
rentes (UNODC).

MINISTÉRIO DA SAÚDE
139
É importante ressaltar que os fatores de
risco mencionados muitas vezes fogem ao
controle de cada pessoa,(ninguém escolhe
ser negligenciado por seus pais, por exem-
plo), além de estarem vinculados a vários comportamentos de risco e transtornos de saúde
afins, tais como o abandonoescolar, agressividade, violência, comportamento sexual de ris-
co, depressão e suicídio. Além disso, um fator de risco nunca determina um comportamento
nem é sua causa, apenas indica que há maior chance de que o comportamento ocorra em
um grupo. Portanto, é uma operação matemática de comparação e probabilidade.

Nesse sentido, o conceito de risco costuma ser usado erroneamente


como sinônimo de perigo.No entanto, o risco sugere mais uma vulne-
rabilidade do que a certeza de que um prejuízo ou dano vá ocorrer.
Na epidemiologia, o cálculo do risco permite que se identifiquem os
grupos com mais chance de se exporem a um determinado dano.Em
outras palavras, é possível determinar o nível de vulnerabilidade de um
grupo a um determinado comportamento.
Vulnerabilidade pode ser entendida como um conjunto de fatores
que pode aumentar os riscos aos quais estamos expostos em todas as
situações de nossa vida. Essa vulnerabilidade pode variar por diversos
motivos, como gênero, faixa etária, classe socioeconômica, nível de es-
colaridade, local de moradia, condições sociais, autoestima, projeto de
vida, condições biológicas e psicológicas, dentre outros.
Assim como temos de um lado, os fatores de risco que aumentam
a vulnerabilidade de um indivíduo, temos também os fatores de pro-
teção, que devem ser analisados da mesma forma para o desenvolvi-
mento de estratégias de prevenção e de promoção da saúde. Dentre os
fatores de proteção reconhecidos recentemente como ativos, podemos
destacar: o bem-estar psicológico pessoal e emocional; habilidades so-
ciais e pessoais; forte apego aos pais, familiares e pais que cuidam e
se preocupam com seus filhos; e escolas e comunidades que são bem
amparadas e organizadas. Tais fatores diminuem a vulnerabilidade das
pessoas ao uso e abuso de drogas e outros comportamentos negativos.
Alguns dos fatores que tornam as pessoas vulneráveis (ou, inversa-
mente, resistentes) a usar drogas, segundo as pesquisas, diferem de
acordo com a idade. A ciência já identificou fatores de risco e de prote-
ção durante a infância e início da adolescência, particularmente relacio-
nados à parentalidade e ao vínculo com a escola. Ao longo da idade, as
escolas, locais de trabalho, espaços de entretenimento e a mídia são
fatores que podem contribuir na intensidade da vulnerabilidade das

140
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
pessoas ao uso e/ou abuso de drogas e a outros comportamentos de
risco (UNODC).

PARA REFLETIR Você sabia que a ciência da prevenção re-


vela que muitas das intervenções e políti-
cas de prevenção do uso e abuso de drogas,
também previnem outros comportamen-
tos de risco?

Entretanto, deve-se ressaltar que nenhuma intervenção política ou sistema de prevenção


eficaz podem ser desenvolvidos ou implementados por si próprios, ou isoladamente. Um
sistema de prevenção eficaz, local ou nacional, é incorporado e integrado no contexto de
um sistema de saúde maior que responda de forma mais direta e balanceada às drogas, que
aplique a lei e a oferta de redução de danos ao tratamento da dependência de drogas, e à
prevenção das consequências sociais e de saúde (ISTs, HIV, hepatites virais, overdose, etc.).

Pesquisa X Prevenção

Ao realizar uma análise mais acurada na literatura, observam-se muitas la-


cunas na ciência de prevenção. A maior parte da ciência origina-se de países de
renda alta na América do Norte, Europa e Oceania. Existem poucos estudos de
outros contextos culturais ou em países de baixa e média renda. Além disso,
a maioria dos estudos “eficazes”, examinam o impacto das intervenções em
contextos controlados, pequenos e bem amparados de recursos, ao passo que
poucos estudos investigaram a eficácia das intervenções em ambiente “real”.

Outro ponto a ser destacado, é que poucos estudos calcularam se as in-


tervenções e políticas possuem custo-benefício ou custo-eficácia (ao invés de
apenas eficazes ou efetivas). Por último, mas não menos importante, tem-se
observado que alguns estudos reportam dados desagregados por sexo.

Ainda neste sentido, outro desafio sugere que muitas vezes os estudos
não produzem informações suficientes para identificar de forma conclusiva os
“princípios ativos”, ou seja, o componente ou componentes que são realmente
necessários para que uma intervenção ou política seja eficaz ou efetiva, inclu-
sive no que diz respeito à aplicação das estratégias (questionando quem deve
aplicá-las e qual a formação e competências necessárias para tanto, e quais
métodos devem ser empregados, etc.).

MINISTÉRIO DA SAÚDE
141
É sabido que faltam recursos e oportunidades para realizar avaliações rigo-
rosas em determinados locais, principalmente em países como o Brasil. Isso
não significa que o trabalho realizado seja ineficiente. Algumas das avaliações
qualitativas realizadas refletem indícios promissores. No entanto, até que es-
sas estratégias sejam testadas de maneira científica e precisa, não é possível
afirmar se são eficazes ou não.
O que pode ser feito nesse meio tempo? Os governantes devem esperar
que as lacunas sejam preenchidas antes de implementar iniciativas de pre-
venção? O que pode ser feito para prevenir o uso e abuso de substâncias, e
garantir que crianças e jovens cresçam saudáveis e seguros HOJE?
Dentro deste cenário, é recomendado ter cautela com as lacunas na ciência,
mas isso não pode impedir o profissional da saúde de agir. Uma abordagem
de prevenção baseada em uma experiência bem sucedida em uma parte
do mundo é, provavelmente, uma opção mais eficaz que aquela criada
localmente na base da boa vontade e em suposições.
Além disso, as abordagens que falharam ou que até mesmo tiveram impac-
to negativo em alguns países são excelentes candidatas para o fracasso e para
efeitos iatrogênicos em outros lugares. Profissionais na área de prevenção,
formadores de políticas e membros da comunidade envolvidos na prevenção
às drogas e prevenção do abuso de substâncias têm o dever de levar em con-
sideração tais exemplos.

2. Promoção de Saúde na perspectiva da Prevenção aos


problemas relacionados ao uso de drogas

A promoção da saúde consiste em proporcionar às pessoas formas


de exercerem mais controle sobre sua saúde, identificando sua relação
com uma ampla gama de fatores políticos, econômicos, ambientais e
socioculturais, além dos biológicos. Ancora-se na condição da comu-
nidade em atuar em prol de si mesma, encorajando a ajuda recíproca
-cada um a cuidar de si próprio, do outro, da comunidade e do meio
ambiente natural.
O conceito de promoção da saúde surgiu na Primeira Conferência
Internacional sobre Promoção da Saúde, realizada em Ottawa (Cana-
dá), em 1986 que a definiu como “[...] o processo de capacitação da
comunidade para atuar na melhoria da sua qualidade de vida e saúde

142
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
[...]”. Essa conferência culminou na promulgação da Carta de Ottawa,
documento no qual se defende a promoção da saúde como fator fun-
damental para a melhoria da qualidade de vida das populações. O refe-
rido documento salienta, ainda, a intersetorialidade desse processo,
por entender que a promoção da saúde deve ser uma responsabilidade
compartilhada por diversos setores sociais e não exclusiva do setor da
saúde.
Além disso, a promoção da saúde precisa atingir toda a população
e não apenas aqueles considerados “de risco”, emponderando-os por
meio de oferecimento de alternativas para uma vida digna e saudável.

As estratégias de promoção de saúde


devem: Promover a qualidade de vida;
reduzir a vulnerabilidade e os riscos à
saúde; favorecer a preservação do meio
ambiente; prevenir as doenças e os
agravos à saúde; ser intersetoriais (es-
cola, saúde, grupo religioso, espaços de
lazer, espaços comunitários); articular
redes corresponsáveis no compromisso
da melhora da qualidade de vida.

Neste sentido, para que a promoção da saúde seja incorporada ao


cotidiano das pessoas, as ações devem ser intersetoriais, tendo o se-
tor sanitário público um papel de mediador das ações, exigindo ação
coordenada de governos, organizações não governamentais, meios de
comunicação e outros setores sociais e econômicos, como empresas,
escolas, igrejas e associações das mais diversas.
Uma das principais formas de disseminação desses meios de pro-
moção de saúde, tem ocorrido por meio das escolas, após a OMS de-
senvolver o conceito de Escolas Promotoras de Saúde. Entretanto, para
a escola tornar-se promotora de saúde, é necessário: construir uma po-
lítica escolar de promoção da saúde; adequar o ambiente físico e social
da escola; promover vínculo e parceria com a comunidade; desenvolver
habilidades pessoais de promoção da saúde em todos os atores escola-
res (professor, funcionários, alunos e comunidade); promover vínculo e
parceria com os serviços de saúde de referência das escolas.
Dentro desta perspectiva, o Ministério da Saúde, em parceria com o
Ministério da Educação, vem desenvolvendo, desde 2007, o Programa
Saúde na Escola (PSE) que objetiva a melhoria da qualidade de vida da

MINISTÉRIO DA SAÚDE
143
população na perspectiva da promoção da saúde e da prevenção de
agravos e doenças nas áreas adstritas da Estratégia Saúde da Família
(ESF). O PSE sugere uma série de ações para serem desenvolvidas na
escola pela equipe de saúde.Dentre elas, está incluída a prevenção do
uso de álcool e de outras drogas.
Assim, integra-se a prevenção do uso de drogaspautada na lógica
da promoção da saúde como política educacional. Notemos que a pre-
venção do uso de drogas que se baseia em promoção da saúde deve
se concentrar na criação de ambientes saudáveis, bem como em pes-
soas saudáveis, por meio do uso de estratégias personalizadas para
diferentes fases do ciclo de vida, reconhecendo as diferenças culturais
dos grupos. Nesse contexto, os resultados positivos não apenas redu-
zirão os problemas associados ao uso de drogas, mas também outros
riscos, como o suicídio de jovens, gravidez na adolescência, transtornos
alimentares, problemas relacionados com as ISTs, HIV, hepatites virais,
o crime e a violência.

2.1 Níveis de prevenção

Com relação à prevenção e suas subdivisões, na atualidade há duas


classificações reconhecidas sobre os níveis de prevenção alcançados
por programas ou atividades de prevenção. A primeira classificação foi
estabelecida na década de 70 e determinou três níveis de prevenção,
de acordo com a fase de consumo de drogas. Nessa classificação, as es-
tratégias de prevenção podem ser primárias, secundárias ou terciárias.

•• Prevenção primária: têm como papel evitar a experimentação inicial de


drogas e é destinada a pessoas que ainda não as experimentaram;
•• Prevenção secundária: destinada a pessoas que já experimentaram e
que fazem um uso ocasional de drogas, para evitar que esse uso se torne
abusivo e problemático, reduzindo as chances de que o abuso se transfor-
me em dependência;
•• Prevenção terciária: destinada a usuários de SPA que já apresentam uso
prejudicial e nesse caso, a intervenção preventiva é a indicação de trata-
mento acompanhado de profissionais especializados para redução dos
danos associados ao abuso da substância.

A segunda classificação de níveis de prevenção, mais recente, com-


plementa a primeira e se baseia na diferenciação de grupos por nível de

144
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
risco de exposição às drogas de abuso. Nessa classificação, um progra-
ma de prevenção pode ser universal, seletivo ou indicado:

•• Prevenção universal: direcionada à população geral, sem qualquer estra-


tificação de grupos por fatores de risco. Um exemplo é a divulgação pela
mídia de programas que apresentem os danos decorrentes do consumo
de drogas e/ou outros comportamentos;
•• Prevenção seletiva: voltada para populações com alguns fatores de risco
já identificados para o uso de SPA e/ou outros comportamentos.Sendo as-
sim, é destinada a pessoascom o maior risco para o consumo. Programas
seletivos não são, necessariamente, destinados a pessoas que já conso-
mem drogas, mas àquelas que têm mais chance de fazê-lo. Um exemplo
seria um programa realizado em uma escola de uma região de alta crimi-
nalidade e oferta de drogas (sendo, estes, os fatores de risco dessa região);
•• Prevenção indicada: engloba intervenções destinadas a pessoas identifi-
cadas como usuários de SPA ou com comportamentos de risco relaciona-
dos, direta ou indiretamente, ao uso de drogas, em programas que visem
reduzir não só o consumo de álcool e de outras substâncias, mas também
a melhora de aspectos da vida de cada pessoa, como a reinserção social.

2.2 Intervenções em fatores de risco e proteção ao uso de


drogas na perspectiva da Prevenção

Sabemos que a adolescência é considerada uma fase crítica e de


maior risco para o início do consumo de SPA. Porém, é reconhecido que
nem todos os jovens usam ou abusam de drogas. Não existe, evidente-
mente, uma regra que defina quem irá se tornar consumidor ou depen-
dente de drogas, mas há fatores de ordem biológica, psicológica e social
que aumentam ou diminuem a chance de que isso venha acontecer.
Dentro deste cenário, o meio científico é unanime em afirmar que
o uso e abuso de substâncias psicoativas é multifatorial e que os
principais fatores envolvidos são a curiosidade, obtenção de prazer, in-
fluência do grupo, pressão social, baixa autoestima e dinâmica familiar.
Nesse contexto, as escolhas feitas por nós estarão sujeitas a inúmeros
fatores externos e internos que, no balanço final, irão gerar uma atitu-
de diante da decisão de consumir drogas ou não.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
145
No âmbito da prevenção primária é possível compreendermos a di-
nâmica dos conceitos de fatores de risco e de proteção por meio de
uma balança de dois pratos, representando a relação do ‘peso’ de risco
contra o ‘peso’ de proteção, inferindo-se que a determinação do consu-
mo seria norteada pelo lado mais pesado da balança (Imagem 3.1.4).
Imagem 3.1.4: A balança dos fatores de risco e proteção: qual prato pesa mais?

- Timidez excessiva;
- Comportamento
agressivo frequente;
- Convívio com amigos
que fazem uso
de drogas;

Fonte: Adaptado de NUTE-UFSC, 2014.

Vale ressaltar que há fatores que certamente são de risco para algu-
mas pessoas e de proteção para outras, já quedependem da cultura, da
faixa etária e do gênero. Por exemplo, o que é fator de risco para meni-
nas adolescentes do Afeganistão pode não o ser meninos adolescentes
canadenses. O que é fator de proteção para os adolescentes pode não
o ser protetor para os adultos.
Os fatores de risco e de proteção costumam ser divididos em
domínios, ou seja, são agrupados em algumas categorias que viram
pauta de intervenção preventiva. Os principais domínios da prevenção

146
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
são a família, a sociedade/comunidade, a escola e a pessoa. No que se
refere a cada pessoa, são exemplos de fatores de risco: insegurança,
busca descontrolada de prazer, insatisfação com a vida e genética.
Nesse mesmo domínio, são fatores de proteção: habilidades sociais,
autonomia, autoestima desenvolvida, capacidade de resolução de
problemas, etc.
Em geral, programas que abordam apenas um domínio não são efi-
cazes na prevenção, pois o comportamento de risco é resultado de uma
combinação de diversos fatores e das mais variadas interações sociais,
não se resumindo somente a um aspecto isolado da vida de cada pes-
soa. As intervenções preventivas mais promissoras abordam, portanto,
vários domínios de prevenção.

2.3 Modelos de prevenção baseados em evidências

A ciência da prevenção ao abuso e da dependência de substâncias


psicoativas avançou muito em experiência e conhecimento nos últimos
anos. Por isso, na atualidade dispomos de informações sobre progra-
mas de prevenção adequados que diminuem as chances do início do
consumo de drogas ou que retardam esse início. Apesar de toda a evo-
lução neste campo, a transferência do conhecimento científico para a
prática tem sido muito limitada.
Vale relembrar, que o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e
Crimes (UNODC) apresentou um documento com as Diretrizes Interna-
cionais sobre a Prevenção do uso de Drogas, o qual descreve as inter-
venções e políticas fundamentadas cientificamente, que promovendo
impactos expressivos em termos de prevenção. Esse documento discu-
te o papel, o desenvolvimento, a implementação, o monitoramento e a
avaliação dos programas de prevenção que, atualmente, podem ser di-
vididosem doze categorias, de acordo com a teoria central que alicerça
sua estrutura, conforme será detalhado no quadro a seguir.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
147
Quadro 3.1.5 - Programas de prevenção: categorias e base teórica

Fonte: autor

148
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
Análise crítica sobre os modelos de prevenção

Observamos que os programas preventivos apresentam algumas li-


mitações de modo geral, pois são pautados em apenas um desses prin-
cípios citados, comprometendo sua capacidade de atingir a diferentes
perspectivas psicossociais dos alunos.
Estratégias e táticas de amedrontamento, palestras com informação
científica sobre drogas e seus efeitos, visto com frequência nos diferen-
tes espaços, junto com a elevação da autoestima e a tomada de decisão
responsável, quando aplicadas de forma isolada, não demonstraram
ser particularmente eficazes na prevenção do uso e abuso das SPA. A
mesma falta de eficácia é identificada em programas de treinamento
para a resistência, base do tão disseminado programa Drug Abuse Re-
sistance Education (DARE), desenvolvido nos Estados Unidos da Améri-
ca e que foi adaptado em outros países.
Os principais estudos sobre eficácia de programas de prevenção do
uso de drogas, os programas alicerçados em habilidades de vida costu-
mam mostrar melhores resultados, pois são embasados em conceitos
de promoção da saúde. Como observado no quadro abaixo.

Quadro 3.1.6 – Características de eficácia em programas de prevenção

Um programa potencialmente eficaz de prevenção deve:

1. Permitir o amadurecimento emocional de crianças e de jovens;

2. Estimular a conscientização da criança e do jovem no processo de tomada de decisões;

3. Desenvolver valores que correspondam a uma vida saudável, tanto física


quanto moralmente;

4. Desenvolver a autonomia e a crítica;

5. Proporcionar habilidades necessárias para manter relacionamentos saudáveis;

6. Desenvolver a autoaceitação, trabalhando pela construção de uma autoimagem positiva


e real, permitindo, assim, o desenvolvimento da autoestima.

Fonte: autor

MINISTÉRIO DA SAÚDE
149
Nesta perspectiva, os projetos eficazes de prevenção ao consumo
de drogas apresentam princípios básicos que os sustentam, os quais
são destacados pelo National Institute on Drug Abuse (NIDA). Elencados
a seguir:
1. Aprimorar os fatores de proteção dos alunos e reduzir os fatores de risco;
2. Ter como objetivo focar todas as formas de abuso de drogas, incluindo o
consumo de tabaco e de álcool;
3. Incluir estratégias para resistir ao oferecimento de drogas e aumentar a
competência social (exemplo: na comunicação e relação com os pares, au-
toeficácia e assertividade);
4. Quando dirigidos aos adolescentes, incluir métodos interativos, tais como
grupos de discussão de colegas, e não apenas oferecer informação no mo-
delo de “aulas expositivas”;
5. Incluir atividades com pais, gerando oportunidades para discutir na família
o uso de drogas;
6. Ser de longo prazo (contínuo), com repetidas intervenções para reforçar as
metas originais;
7. Os esforços de prevenção centrados na família têm maior impacto que as
estratégias que são centradas unicamente nos professores;
8. Quanto maior o nível de risco da população-alvo, o esforço preventivo de-
verá ser mais intensivo e começar antes;
9. Os programas de prevenção devem ser específicos para a idade das pesso-
as às quais é dirigido e apropriado ao nível de desenvolvimento intelectual
e emocional da população-alvo;
10. Trabalhar o ajuste familiar e treinar os pais no enfrentamento diário da
educação dos filhos.

Diante do exposto, entendo ser importante ressaltar que, não é por


que um programa visa à prevenção do uso de drogas que ele efetiva-
mente reduzirá o consumo. Em alguns casos, os programas são inócu-
os; e, em outros, são iatrogênicos, ou seja, o próprio programa estimula
o uso de drogas.
Há relatos na literatura científica,de inúmeros casos de iatrogênia
em programas de prevenção. O mais famoso deles é o da Life Education,
programa australiano escolar para prevenção do uso de drogas, que
foi difundido no país inteiro antes de evidenciar eficácia. Quando foi
adequadamente testado, mostrou que alunos que passaram pelo pro-
grama haviam consumido mais drogas do que aqueles que não haviam
participado do programa.

150
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
O ideal é mapear o perfil do grupo que re-
ceberá a intervenção e, assim, estruturar
um programa que abarque o máximo pos-
sível de abordagens. O que importa é ofe-
recer ao grupo um programa que tenha capacidade de mudar o comportamento de maneira
contínua e que englobe diversos domínios de prevenção. Cabe lembrar que a prevenção
será tanto mais eficaz quanto melhor planejada esteja e quanto mais agentes preventivos
implicados no processo.

2.4 Prevenção na lógica de Rede

Quanto mais setores sociais envolverem-se na estrutura básica dos


programas de prevenção, mais ele será eficaz. O UNODC e o Ministé-
rio da Saúde elegeram recentemente o Unplugged, conhecido no Brasil
como #tamojunto, para adaptar e implantar como política pública a
prevenção ao uso de drogas por meio do PSE, sendo exemplo de suces-
so de intersetorialidade na prevenção.
O Programa #tamojunto trabalha as relações sociais, as habilidades
de vida e prevenção do uso de SPA, desenvolvido em doze aulas, as
quais foram planejadas para serem aplicadas durante um ano escolar.
Essas doze aulas se propõem a reduzir o número de adolescentes que
experimentam drogas e/ou retardar a passagem do uso eventual ao
consumo regular.
O programa trabalha com estudantes e apresenta conteúdos dire-
cionados aos pais, com o objetivo de complementar o conteúdo de-
senvolvido na escola. A implantação brasileira caracterizou-se como
um programa intersetorial, por integrar a Escola à Unidade Básica de
Saúde do bairro e os pais, por meio de reuniões presenciais de inte-
gração. Desta forma, professores mesclam suas funções preventivas
com ações na família e com o suporte técnico do sistema de saúde, que
oferece tratamento especializado para adolescentes e famílias necessi-
tadas, identificadas durante o desenvolvimento do programa.
O #tamojunto teve sua efetividade comprovada por meio de estudos
em oito países europeus: Bélgica, Alemanha, Espanha, Grécia, Itália,
Áustria, Suécia e República Tcheca. A base desse programa é o Modelo
de Influência Social Global, em que habilidades sociais, emocionais
e pessoais são desenvolvidas, integrando elementos do cotidiano
dos adolescentes de doze a quatorze anos, idade média do início do
consumo de álcool, tabaco e maconha. Nesses estudos, adolescentes
que receberam o #tamojunto apresentaram menores prevalências de
embriaguez, uso pesado de tabaco diário e uso, na vida, de maconha.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
151
As habilidades para a vida trabalhadas nesse programa compreen-
dem o desenvolvimento de pensamento crítico, a tomada de decisões,
a solução de problemas, o pensamento criativo, a comunicação eficaz,
a habilidade interpessoal, a autopercepção, a empatia e o manejo de
emoções. É importante destacarmos que esse programa está, ainda,
sendo adaptado à cultura brasileira e sua eficácia avaliada em nosso
contexto.
Entendendo a importância da articulação da rede de atenção à saú-
de (RAS) -assunto que foi abordado no primeiro módulo deste curso)
- para o sucesso das estratégias de prevenção, tanto do abuso do álcool
e outras drogas como das ISTs, HIV e hepatites virais, é necessário refle-
tir sobre o mapeamento da rede de saúde, principalmente partindo
da perspectiva territorial.Para tanto,é preciso considerar os seguintes
aspectos:

•• Identificar os equipamentos disponíveis da RAS, com ações e serviços da


Atenção Básica, urgência e emergência, atenção psicossocial, atenção es-
pecializada e hospitalar e vigilância em saúde, são essenciais para o início
desse processo.
•• Entender como estão organizados os serviços da Atenção Básica, como as
Unidades Básicas de Saúde, Estratégias de Saúde da Família e Consultórios
na Rua, que serão utilizados como suporte para a oferta das ações de pre-
venção nas suas diversas dimensões. Destaco aqui a prevenção combinada
com relação ao HIV, suas rotinas, fluxos e linhas de cuidado desenhadas.
•• Identificar e verificar, dentro do contexto das ISTs, HIV e as hepatites vi-
rais,a organização da rede de urgência e emergência e da atenção ambula-
torial especializada e hospitalar como o CTA e o SAE, para que se possam
fazer encaminhamentos seguros e compartilhados de profilaxia pós-expo-
sição (PEP), vinculação e retenção para o cuidado contínuo às pessoas com
resultados positivos de HIV. Acompanhar, ainda, as demandas das outras
redes e articulações intersetoriais para garantir o cuidado integral das
pessoas envolvidas neste processo.

Refletir sobre o mapeamento da rede de atenção à saúde vai


ao encontro de uma proposta de prevenção entendendo o cenário
complexo que envolve tanto o uso e abuso das múltiplas substâncias
psicoativas (MSPA), como as questões referentes às ISTs, HIV/AIDS e as
hepatites virais.Aprofundando o olhar sobre o território em que vive
cada pessoa,,é preciso também levar em conta outros fatores: quais

152
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
são as Organizações da Sociedade Civil (OSC) com experiência em
ações de prevenção do HIV e/ou abordagem comunitária, bem como as
lideranças comunitárias que atuam no território, ou outras estratégias
como alcoólicos anônimos(AA) narcóticos anônimos (NA)? Quais são os
determinantes sociais que impactam os índices epidemiológicos locais?
Quais são os segmentos populacionais mais afetados localmente pelas
ISs, HIV/AIDS e hepatites virais, além do uso e abuso das Múltiplas
Substâncias Psicoativas (MSPA)?
Nesse sentido, destaco, também, os contextos de vulnerabilidades
sociais tão caros na lógica da prevenção e identifica-los torna-se impe-
rativo para abordagens bem sucedidas, tais como: os espaços de socia-
bilidade do território adstrito das Unidades de Saúde, incluindo o con-
texto relacionado ao uso de drogas, com suas dinâmicas, tipos e formas
de uso, dentre outros aspectos, atividades de prostituição, violências
nas suas diversas dimensões e demais vulnerabilidades apresentadas
pela população vinculada às equipes da Atenção Básica e a rede sócio
assistencial de cada território.
Para uma visão mais ampliada, na perspectiva intersetorial, pode-
mos citar além dos serviços de saúde, outros equipamentos da rede
intersetorial presentes no território, como, por exemplo,na assistência
social - Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CRE-
AS), Centro de Referência de Assistência Social (CRAS), Centro POP,
abrigos e albergues; na educação - Educação de Jovens e Adultos (EJA),
ensino noturno e instituições que acolhem os alunos no contra-turno;,
no trabalho - iniciativas de geração de trabalho e renda e formação
profissional;, e na cultura - atividades culturais, oficinas de criatividade,
etc,, dentre outras políticas públicas.
A partir do exposto, é necessário aprofundar a discussão sobre uma
outra dimensão da proposta preventiva, que é a prevenção combina-
da, além de elucidar questões relacionadas às ISTs, HIV/AIDS e Hepati-
tes virais, que são temas centrais neste curso assim como o uso e abuso
das SPAs.

3.5 Prevenção Combinada: um novo paradigma na


prevenção do HIV/AIDS

Ao longo da evolução das estratégias de prevenção nas suas inúme-


ras dimensões, uma que merece destaque diz respeito ao HIV/AIDS. que
é a Prevenção Combinada do HIV. a qual remete à ideia de conjugação

MINISTÉRIO DA SAÚDE
153
de diferentes ações de prevenção, tanto em relação ao vírus HIV quanto
aos fatores associados à infecção, sendo este o ponto de partida para
sua conceituação. Nesse sentido, o termo pressupõe a combinação das
três abordagens possíveis na formulação de estratégias de prevenção
do HIV: a abordagem biomédica, a abordagem comportamental e a
abordagem estrutural.
A união de tais abordagens não encerra, contudo, todos os signi-
ficados do termo “Prevenção Combinada”.Ampliando está perspectiva
em relação ao termo, diferentes aspectos devem ser considerados em
estratégias de prevenção do HIV: a combinação de ações centradas nas
pessoas, em seus grupos sociais e na sociedade em que vivem. A pre-
missa básica estabelecida, assim, é a de que estratégias de prevenção
abrangentes devem observar, de forma concomitante, esses diferen-
tes focos, levando sempre em consideração as singularidades de cada
pessoa e as especificidades dos meios em que estão inseridas. A par-
tir dessas duas perspectivas, o Ministério da Saúde define “Prevenção
Combinada do HIV” como:

(...) uma estratégia de prevenção que faz uso combinado de intervenções biomé-
dicas, comportamentais e estruturais aplicadas no nível dos indivíduos, de suas
relações e dos grupos sociais a que pertencem, mediante ações que levem em con-
sideração suas necessidades e especificidades e as formas de transmissão do vírus.

Vejamos, a seguir, algumas reflexões sobre esse assunto, que foi


também abordado no Módulo 2 de forma mais objetiva.

PREVENÇÃO COMBINADA E SEUS COMPONENTES

Intervenções Biomédicas

São intervenções que agem diretamente nos sistemas biológicos pe-


los quais o vírus infecta uma pessoa. São todas as estratégias voltadas
à redução do risco de exposição, mediante intervenção na interação
entre o HIV e a pessoa passível de ser infectada. Essas estratégias po-
dem ser divididas em dois grupos: intervenções biomédicas clássicas,
que empregam métodos de barreira física ao vírus; e intervenções bio-
médicas, baseadas no uso de Antiretroviral (ARV) como medida de pre-
venção ao HIV.

154
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
Figura 3.1.7 – As intervenções biomédicas na Prevenção Combinada do HIV

Fonte: DIAHV/SVS/MS.

OBS: Para saber mais clique aqui.

Métodos de barreira

Os métodos de barreira configuram-se em estratégias de contracep-


ção e de prevenção às IST mediante as quais são utilizados anteparos
que impedem a liberação de esperma no interior da vagina, boca ou
ânus, bem como impossibilitam o contato entre suas respectivas mem-
branas. Entre os métodos de barreira, destacam-se o preservativo femi-
nino e o preservativo masculino, que podem ser usados conjuntamente
com gel lubrificante.
Dentro da lógica protetiva, o Ministério da Saúde (MS), recomenda
que seu uso deve ser estimulado mesmo nos casos em que outros mé-
todos de prevenção estejam em curso, como TTP, PEP ou PrEP. Neste
sentido, cabe reforçar que a oferta de preservativos deve ser realiza-
da sem restrições, sem limitações de quantidades de retiradas e sem
exigência de documentos de identificação, de forma a não dificultar o
acesso das pessoas a esses insumos.Mesmo diante das novas tecnolo-
gias de prevenção do HIV e suas combinações, é necessário reconhecer
que essa estratégia de prevenção continua importante e, apesar de am-
plamente divulgado e conhecido, precisa ser ainda valorizado e poten-
cializado juntamente com as outras formas de prevenção existentes.
Com relação à essa forma de prevenção, cabe ressaltar a importân-
cia do preservativo feminino, ainda pouco debatido e discutido nos
cotidianos dos serviços de saúde. As orientações sobre o uso correto
desse dispositivo precisam ser fornecidas em uma linguagem simples

MINISTÉRIO DA SAÚDE
155
e objetiva, enfatizando as medidas que preservem a sua integridade
e promovam o seu uso. É importante ressaltar que, em setembro de
2016, o Ministério da Saúde lançou a “Nota Informativa Conjunta SVS/
SAS nº 67/2016” (BRASIL, 2016d), que orienta sobre a oferta e o acesso
aos preservativos femininos na rede de serviços de saúde.
Entre outros aspectos, a Nota especifica que a dispensação desse
insumo deve contemplar todas as mulheres, considerando as necessi-
dades declaradas pela usuária e a disponibilidade do insumo nos ser-
viços de saúde do Sistema Único de Saúde (SUS). Ao mesmo tempo, a
Nota ainda reforça a priorização da oferta do preservativo feminino aos
seguintes públicos:
•• Mulheres trabalhadoras do sexo;
•• Mulheres que usam drogas e parceiras de usuários de drogas;
•• Mulheres em situação de violência doméstica;
•• Mulheres vivendo e convivendo com HIV;
•• Mulheres privadas de liberdade; e
•• Mulheres adolescentes e jovens.

Nesta perspectiva, algumas características desse insumo merecem


ser destacadas. O preservativo feminino é confortável para as mulheres
quando utilizado de forma correta, além de não apertar o pênis, inde-
pendentemente da dimensão deste. É também resistente e antialérgico
(sendo uma alternativa às pessoas com resistência ao látex), pode ser co-
locado algumas horas antes da relação sexual, não necessita aguardar a
ereção do pênis e, por ser bem lubrificado, proporciona às mulheres com
insuficiência de lubrificação maior conforto durante a relação sexual.
Além disso, foi observado, na prática assistencial que algumas mu-
lheres afirmam que a utilização do preservativo feminino é mais praze-
rosa quando comparado com o preservativo masculino, pois seu anel
flexível massageia levemente o clitóris. Além disso, o sexo oral pode ser
feito sobre o preservativo feminino, somado a isso, o insumo também
oferece proteção adicional ao recobrir a região dos lábios vaginais.

Circuncisão masculina

A circuncisão masculina voluntária é uma medida efetiva para a pre-


venção da infecção pelo HIV e deve ser utilizada como estratégia com-
plementar a um conjunto de outras intervenções. Sabe-se que o efeito
da circuncisão masculina sobre a saúde pública é maior em contextos

156
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
de epidemia generalizada. Considerando que no Brasil a epidemia é
concentrada em determinadas populações (chave e prioritárias), a cir-
cuncisão masculina não é recomendada como intervenção para preve-
nir a infecção pelo HIV.

Profilaxia Pós-Exposição ao HIV

A Profilaxia Pós-Exposição, ou simplesmente PEP, é uma medida de


prevenção com a utilização de antirretrovirais como profilaxia, o que
evita a multiplicação do vírus HIV no organismo de uma pessoa. A PEP
é indicada a usuários (as) que possam ter tido contato com o vírus em
alguma situação de risco, tais como:
•• Violência sexual;
•• Relação sexual desprotegida; e
•• Acidente ocupacional.

O uso do antirretroviral deve se dar de maneira ininterrupta por 28


dias seguidos, sob pena de insucesso dessa medida profilática. Além
disso, para ser efetiva, a PEP deve ser iniciada em até duas horas após a
exposição, podendo ser iniciada em até 72 horas da exposição ao risco.
Assim, o primeiro atendimento após a exposição ao HIV é considerado
pelo Ministério da Saúde um atendimento de urgência.

É importante ressaltar que, nos ca-


sos que envolvem violência sexual,
devem ser observadas, além das di-
retrizes apresentadas neste capítulo,
as que constam na Norma Técnica
“Prevenção e Tratamento dos Agra-
vos Resultantes da Violência Sexual
contra Mulheres e Adolescentes”, do
Ministério da Saúde.

Profilaxia Pré-Exposição

A Profilaxia Pré-Exposição ao HIV (PrEP) consiste no uso de antirre-


trovirais (ARV) por pessoas não infectadas pelo HIV, com o intuito de re-
duzir o risco de infecção pelo vírus nas relações sexuais. As evidências
científicas produzidas por recentes pesquisas demostram que o uso de

MINISTÉRIO DA SAÚDE
157
PrEP reduz em mais de 90% o risco de infecção pelo HIV. A indicação
de PrEP requer a avaliação do risco de exposição, o que inclui abordar:
•• Práticas sexuais;
•• Contextos de vulnerabilidade;
•• Populações com maior prevalência de HIV;
•• Parcerias sexuais.

Quadro 3.1.8 Segmentos populacionais prioritários e critérios


de indicação de PrEP

SEGMENTOS POPULACIONAIS PRIORITÁRIOS CRITÉRIO DE INDICAÇÃO DE PREP

Gays e outros HSH Relação sexual anal (receptiva ou insertiva)


ou vaginal, sem uso de preservativo nos
últimos seis meses
Pessoas Trans E/OU
Episódios recorrentes de IST
E/OU
Uso repetitivo de PEP
Trabalhadoras sexuais

Parcerias sorodiferentes para o HIV (parce-


ria heterosexual ou homosexual na qual Relação sexual ou anal com uma pessoa
uma das pessoas é infectada pelo HIV e a infectada pelo HIV sem preservativo
outra não)

Fonte: DIAHV/SVS/MS.
Imunização

O componente biomédico da Prevenção Combinada do HIV conta


com algumas ações que se endereçam às demais ISTs, dada a correla-
ção entre o acometimento por essas infecções e a maior probabilidade
de adquirir o HIV. Entre essas medidas está a vacina para a hepatite B,
que compõe umas das opções da prevenção no contexto das IST e des-
de 2016 foi universalizada para todas as faixas etárias.O Ministério da
Saúde recomenda que a vacina para a hepatite B seja ofertada salien-
tando-se sua segurança e alertando as pessoas que só haverá a imuni-
zação após a realização das três doses preconizadas (0, 1 e 6 meses).
Neste sentido, outra medida importante de imunização que deve ser
trabalhada no âmbito da Prevenção Combinada é a vacina para o HPV,
que foi incorporada ao calendário nacional de vacinação em 2013 para

158
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
meninas e, a partir de 2016, está preconizada também para meninos na
mesma faixa etária, de 9 a 13 anos.
Em relação às PVHIV, há recomendação da Organização Mundial de
Saúde (OMS) e do Comitê Consultivo em Práticas de Imunização (ACIP),
do Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos
(CDC), que indicam a vacinação para o HPV na rotina de adolescentes
e adultos jovens de 9 a 26 anos infectados pelo HIV, conforme previsto
na Nota Informativa Conjunta nº 046/2016 – CGPNI/ DEVIT-DDAHV/SVS/
MS (BRASIL, 2016f).

Tratamento para Todas as Pessoas (TTP)

Essa estratégia de prevenção do HIV pressupõe que as pessoas que


vivem com HIV (PVHIV) sob Terapia Antirretroviral (TARV), além de terem
uma melhor qualidade de vida, apresentam menor quantidade de vírus
em circulação em seus corpos (com carga viral baixa ou mesmo indetec-
tável), o que impacta na redução da transmissão do HIV na comunidade.
Essa asserção vem sendo reiteradamente corroborada por evidências
científicas.Para tal, essa abordagem requer a universalização do aces-
so à testagem do HIV e o tratamento imediato de todos os indivíduos
infectados pelo vírus. Não por acaso, essa estratégia se operacionaliza
mediante o binômio “testar e tratar”.
Além de levar o teste a todas as pessoas, em especial àquelas que
compõem as populações-chave e prioritárias e retirar os critérios clínicos
para início da TARV, um dos desafios trazido pela Prevenção Combinada
do HIV refere-se a estimular que todas as pessoas que forem diagnosti-
cadas com HIV entrem, o quanto antes, em tratamento, respeitando-se,
sempre, a autonomia dessas pessoas em relação a essa escolha.

Resposta à transmissão vertical do HIV

A transmissão vertical do HIV ocorre pela passagem do vírus da mãe


vivendo com HIV para o bebê durante a gestação, o trabalho de parto,
o parto propriamente dito (contato com as secreções cérvico-vaginais e
sangue materno) ou a amamentação, sendo que cerca de 35% dos ca-
sos dessa forma de transmissão ocorrem durante a gestação e 65% no
periparto, havendo um risco acrescido de transmissão pela amamenta-
ção entre 7% e 22% por exposição (mamada).
Evidencias científicas levantadas em 2015mostram uma redução
da taxa da transmissão vertical do HIV, apontada pelo MS em 2007,

MINISTÉRIO DA SAÚDE
159
para níveis entre 1% a 2% com a aplicação de todas as intervenções
preconizadas para a prevenção da transmissão vertical, quais sejam:
diagnóstico precoce, utilização de TARV na gestação, manejo obstétrico
por meio de cuidados específicos durante o parto vaginal e o parto
cesário, utilização do AZT injetável no parto, manejo clínico do recém-
nascido exposto e aleitamento artificial.
Neste cenário, o Brasil é signatário junto à Opas/OMS para a elimi-
nação da transmissão vertical do HIV e da sífilis nas Américas. Uma das
iniciativas brasileiras para alcançar essa meta foi a criação da Rede Ce-
gonha (2011). Entre as ações previstas no âmbito do componente pré-
-natal, encontram-se a prevenção e o tratamento das IST, do HIV/AIDS
e das hepatites virais, com disponibilização de testes rápidos de HIV e
sífilis para todas as gestantes.

Resumo

Nesta aula abordamos a prevenção e promoção da saúde dos usuá-


rios de drogas, considerando as evidencias científicas; a prevenção do
uso e abuso de Substâncias Psicoativas (SPA), na lógica da promoção de
saúde; os fatores de risco e de proteção no contexto da prevenção de
saúde; a promoção de saúde na perspectiva da prevenção aos proble-
mas relacionados ao uso de drogas; os níveis de prevenção; as interven-
ções em fatores de risco e proteção ao uso de drogas na perspectiva da
prevenção; os modelos de prevenção baseados em evidências; a pre-
venção na lógica de Rede; e a Prevenção Combinada, (considerando um
novo paradigma na prevenção do HIV/AIDS) e seus componentes A se-
guir iremos para a aula redução de danos associados ao uso de drogas.

160
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
AULA 02 : REDUÇÃO DE DANOS ASSOCIADOS
AO USO DE DROGAS

O tema Redução de Danos (RD) foi introduzido e analisado no pri-


meiro Módulo e tem sido abordado ao longo do curso. Nesta aula, ire-
mos fomentar novas reflexões e discussões sobre o tema, partindo do
entendimento de que a RD é uma forma de trabalho e cuidado, que
tenta compreender como cada pessoa se relaciona com a sua droga,
que lugar subjetivo e objetivo essa substância ocupa na vida dela, sen-
do isso mais relevante do que a droga em si mesma.
Neste sentido, pensar em ações de RD consiste em pensar práticas
de saúde que considerem a singularidade das pessoas, que valorizem
sua autonomia e que tracem planos de ação que priorizem sua quali-
dade de vida. É preciso lançar mão de estratégias que sejam mais inte-
ressantes conforme cada situação, seja o uso protegido, a diminuição
do uso ou a abstinência. Fazer este exercício cotidiano nos espaços de
cuidado é fundamental para o sucesso das estratégias de RD.

Fonte: Prefeitura de João Pessoa / PB

MINISTÉRIO DA SAÚDE
161
Estratégias de Redução de Danos

O significado e o conceito da RD já foi compreendido como uma es-


tratégia voltada, no princípio, para a prevenção de doenças de trans-
missão sanguínea entre usuários de drogas injetáveis. Esse conceito
foi evoluindo ao longo do tempo, pois a RD precisou acompanhar a
migração dos vários tipos de drogas, suas formas de uso, suas apre-
sentações, além de ocupar outros campos. Hoje, constitui-se em um
conjunto de políticas públicas ligadas ao enfrentamento dos eventuais
problemas relacionados ao uso de drogas, articulando distintas estra-
tégias: prevenção ao HIV/Aids e hepatites virais, promoção integral de
saúde às pessoas que usam drogas e diminuição da violência.
Assim, a RD não tem um conceito único ou estático, pois acompanha
a vida e a forma como as pessoas se relacionam com as drogas de abu-
so. A RD acompanha, também, a transformação da visão de mundo, das
posturas da sociedade diante das drogas, possibilitando diálogo mais
aberto no espaço social e a expressão das pessoas que usam drogas
sobre os seus usos, necessidades, desejos, direitos e deveres. Portanto,
a RD se traduz em atitudes e o profissional de RD precisa aprender a
ouvir a dor do outro, com uma postura ética frente às queixas de cada
pessoa, sem deturpá-las ou reduzi-las a um problema cerebral.
Nesse sentido, trabalhar a redução de danos nos espaços de saú-
de implica captar como cada pessoa se percebe usando a sua droga e
que significado esta tem na sua vida, permitindo a exposição de suas
angustias e frustrações, frente a relação prejudicial com a substância já
instalada, além de abrir a possibilidade para continuar o seu uso, resig-
nificando sua relação com a droga.
A perspectiva libertadora das estratégias de RD às vezes “assusta”
muitos profissionais e equipes da assistência, pois força uma relação
horizontal de cuidado e de empoderamento do usuário, a que não é
ensinada nos bancos acadêmicos. Além disso, há o falso imaginário em
confundir as estratégias de RD com o incentivo ao uso indevido de dro-
gas, embora essa seja uma concepção equivocada, pois a RD é uma
estratégia de prevenção ao uso de substâncias.

Para mais informações clique aqui.

162
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
A esse respeito, já vimos no Módulo I a relação entre a perspectiva
da RD a visão que comumente se tem do uso de drogas. Vamos, agora,
retomar esse assunto e refletir um pouco mais sobre o cenário do uso
de drogas no Brasil e trazer para discussão duas filosofias que orientam
as políticas públicas sobre drogas, destacando que ambas são norte-
adas pelo caráter punitivo, em contraponto com a perspectiva da RD.
Quadro 3.2.2 Filosofias que orientam políticas públicas brasileiras

Fonte: Adaptada de Nascimento (2006)

Essas duas perspectivas apontadas dizem respeito, sobretudo, à


questão das drogas ilícitas, e estão geralmente imbricadas. A pessoa
é “descriminalizada” desde que submetida ao tratamento médico, ou
seja, o poder policial é relativizado pelo poder médico que passa a ser
central a partir do momento em que a questão das drogas de abuso se
institue como problema de saúde.
As influencias das políticas públicas que preconizam medidas re-
pressivas para uma “sociedade livre das drogas” advém da filosofia or-
questrada pelos EUA de War on Drugs. Embora seja evidenciado seu

MINISTÉRIO DA SAÚDE
163
fracasso, ainda há continuidade nas propostas de cunho repressivo na
realidade brasileira.
Dentro da lógica embasada por tais filosofias que orientam as po-
líticas públicas, é comum observar certo grau de pressão, geralmente
exercida pela família, ao incentivar as pessoas com problemas decor-
rentes do uso de drogas a iniciarem o tratamento. vinculando-o com a
internação. Desta forma, os significados, indicações e objetivos desta
prática geralmente conflitam entre as equipes e os familiares. Tal con-
flito nos remete à terceira perspectiva, que é a da religião, essa está na
cultura de cada família, além de ser uma perspectiva mais antiga.
A perspectiva religiosa, no entanto, não percebe o usuário como cri-
minoso e nem como doente, mas sim como um pecador. Nesse senti-
do, o tratamento para a pessoa com problemas relacionados ao uso de
drogas não é a clínica psiquiátrica, não é o hospital geral e nem mesmo
a punição, mas sim a conversão. Portanto, “se você se converter, estará
curado e os problemas com o abuso das drogas resolvidos”.
Está perspectiva filosófica/religiosa tem implicações importantes na
orientação das políticas públicas sobre drogas, colocando em discussão
um dualismo no cuidado e tratamento para pessoas que abusam de
SPA, resultando a abstinência e a RD como dois paradigmas que dispu-
tam o mesmo campo.
Dentro desse contexto, outro aspecto observado nos últimos anos
é a aproximação das Comunidades Terapêuticas (CT), que são espaços
religiosos com o Ministério da Justiça, por meio da Secretária Nacional
de Políticas Sobre Drogas (SENAD). As Comunidades Terapêuticas são
ambientes de caráter residencial especializados, que oferecem progra-
mas de tratamento estruturados e intensivos, visando o alcance e ma-
nutenção da abstinência das drogas, inicialmente em ambiente prote-
gido, com encaminhamento posterior para internação parcial e/ou para
o ambulatório, conforme as necessidades de cada pessoa.
Essa aproximação vem acontecendo de forma gradual nos últimos
anos, implicando mudanças neste cenário. Um exemplo, disso foi o fato
de, em 2001, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), apro-
var a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) nº 101/2001, que estabe-
leceu o Regulamento Técnico para o Funcionamento das Comunidades
Terapêuticas, serviços de atenção a pessoas com transtornos decorren-
tes do uso ou abuso de SPA, conforme modelo psicossocial.
Neste sentido, as mudanças propostas no modelo das CT’s pelas en-
tidades, Federação Brasileira de Comunidades Terapêuticas (FEBRACT),
Federação Evangélica de Comunidades Terapêuticas (FETEB), Cruz Azul

164
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
do Brasil e a Federação Norte e Nordeste de Comunidades Terapêuticas
(FENNOCT), implicaram em 2011, a revogação a RDC nº 101/2001 pela
ANVISA e a criação da RDC nº 29/2011, com o intuito de se aproximar
do Modelo de CT proposto pelas instituições citadas. Desta forma, as
CTs deixaram de se adequar às normas gerais de um serviço de saúde,
tal qual um hospital ou centro de tratamento, em favor de seu caráter
residencial e de convívio familiar.

Conheça o regulamento sobre CT aqui.


E veja mais a respeito aqui.

Como podemos ver, A RD sofre interferências e ruídos no cotidiano


dos serviços de saúde e socioassistenciais. E, considerando a ideia de
que um país livre do uso de drogas é utópica, há um descompasso en-
tre realidade, legislação e políticas públicas no contexto brasileiro. Em-
bora estejamos acostumados a relacionar a proibição à periculosidade
oferecida pelas distintas SPA’s, o que define quais drogas são legais e
quais são ilegais não é a ausência ou presença de riscos.
As práticas de RD, surgidas como uma alternativa para as estraté-
gias proibicionistas do tipo “Guerra às Drogas”, baseiam-se em princí-
pios de pragmatismo, tolerância e compreensão da diversidade. São
pragmáticas porque compreendem ser imprescindível continuar ofere-
cendo serviços de saúde e sócio assistenciais, visando principalmente
à preservação da vida, para todas as pessoas com problemas relaciona-
dos ao abuso das SPA’s, não perdendo de vista aquelas que continuam
usando drogas, mesmo após o tratamento ofertado.
Entendendo a diversidade e a complexidade do cuidado em rede e
compreendendo que, para muitas pessoas, o ideal seria que as pesso-
as não usassem mais drogas, sabemos que isso pode ser muito difícil,
demorado ou em alguns casos inalcançável. Entretanto, nesse sentido,
é necessário oferecer serviços, inclusive para aquelas pessoas que não
querem ou não conseguem interromper o uso dessas substâncias. O
oferecimento desses serviços pode evitar que se exponham a situações
de risco e viabilizar a sua aproximação das instituições, abrindo a possi-
bilidade de que peçam ajuda posteriormente.
A Estratégia de RD é tolerante, pois evita a compreensão moral
sobre os comportamentos relacionados ao uso de substâncias e às
práticas sexuais, evitando intervenções autoritárias e preconceituosas.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
165
A diversidade é contemplada ao compreender que cada pessoa
estabelece uma relação particular com as substâncias e que a utilização
de abordagens padronizadas como pacotes prontos e impostos para
todos é ineficaz e excludente, especialmente porque muitos serviços
que trabalham com a lógica da exigência da abstinência excluem
usuários que não querem ou não conseguem manter-se abstinentes.

Experiências inovadoras de Redução de Danos

Uma experiência inovadora dentro da perspectiva da RD


foi realizada no Canadá, em Vancouver. Lá havia uma área,
nas imediações da rua East Hastings, no centro da cida-
de, onde há alguns anos aglomeravam-se pessoas de-
pendentes de heroína, vivendo na rua em condições
que lembram as áreas de concentração de usuários de
crack no Brasil, as chamadas “cracolândias”. O governo
local, em parceria com organizações não governamen-
tais (ONG’s), implantou um projeto de recuperação da re-
gião e de cuidado a seus habitantes.

Em 2008, foram iniciadas ações de RD que incluem oferecimento de habita-


ção, assistência social, alimentação, cuidados de higiene e saúde, treinamento
profissional e oferta de trabalho. No local, há múltiplos serviços para os usuá-
rios, incluindo o oferecimento de substituição da heroína por metadona e uma
sala de uso seguro de SPA. No mesmo prédio, há dois andares com serviços
de internação para cuidado e tratamento para as pessoas em situação de de-
pendência grave.

Na sala de uso seguro, as pessoas podem usar sua dro-


ga em ambiente seguro e sob a supervisão de enferma-
gem. Essas inovações permitiram o reerguimento da
área e das condições sociais, de saúde e dignidade dos
usuários. Nessa área, já em 2013, florescia o comércio
tradicional em meio aos serviços para os usuários de
SPA e, por suas ruas, essas pessoas e os consumidores
não usuários de drogas transitam e convivem cotidiana-
mente. Vale destacar, evidentemente, que o exemplo não
pode ser trazido de forma idêntica para nossa realidade, pois há muitas di-
ferenças sociais e culturais, a começar pelo tipo de droga mais problemática.

166
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
PARA REFLETIR Desafios para o cuidado na perspectiva da
Redução de Danos: estudo de caso

Será apresentado um caso clínico a seguir,


para que você possa fazer suas reflexões e
os julgamentos cínicos que achar necessário a partir da lógica da RD, trazendo seus conheci-
mentos ao longo da unidade e do curso, não perdendo de vista o cuidado na perspectiva da
integralidade. Esse caso tem caráter apenas reflexivo.

O caso Olavo

Olavo é um jovem de 29 anos, filho único, com história de abuso de múltiplas SPA há mais
de 15 anos, e início precoce aos 13 anos com maconha. Referiu separação dos pais há 16
anos, destacou ter presenciado vários episódios de brigas entre seus pais durante toda sua
infância, referiu pouco vínculo com pai, sem conseguir falar mais detalhes desta relação.
Nos últimos anos vêm abusando do uso do álcool de forma constante, comprometendo seu
rendimento no estudo e no seu vínculo com o trabalho, reforçou ter perdido o emprego
há 3 meses. Com história de uso experimental de várias substâncias, com intervalos de
uso e abuso, principalmente da cocaína, nas suas diversas formas de exposição, reforçou
que consegue estabelecer relações com diversas substâncias, pois escolhe a droga confor-
me a atividade (social) que vai desenvolver ou até mesmo dependendo do seu estado de
humor; reflete que de alguma forma as drogas sempre estão presentes nas suas relações
sociais. Destacou que, em um período de abuso de múltiplas substâncias, envolveu-se em
situações criminosas (assalto, sequestro relâmpago e furto de carros) tudo para satisfazer
o desejo de usar suas drogas de preferência naquele momento da sua vida. As implicações
dessa fase foi passar um período de 1 ano detido no presídio, onde teve inúmeras vivên-
cias. Diz que não têm desejo em cessar o uso das drogas, pois elas apresentam um papel
importante na sua vida. No momento, com medo de ter contraído uma IST por ter tido
relações sexuais desprotegidas com várias pessoas, destacou que esse comportamento
sempre acontece quando está sob efeito das substâncias e nestas situações não escolhe
seus parceiros (as). Entendendo que o CAPS ad pode ser um serviço para auxiliá-lo neste
momento, Olavo procura atendimento.

Resumo

Nesta aula abordamos a Redução de Danos associada ao uso de


drogas, considerando as particularidades de cada pessoa que faz uso
ou abuso de SPA; as estratégias de Redução de Danos, acompanhan-
do a evolução da apresentação das MSPA e considerando cada usuário
na sua singularidade também foram trazidas para cena; as filosofias
que orientam políticas públicas brasileiras sobre drogas, seus desdo-
bramentos e influencias no processo do cuidado, além de experiências
inovadoras de Redução de Danos foram apontadas como reflexões. O
próximo ponto a ser tratado será a respeito da intersetorialidade e da
integralidade da assistência.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
167
AULA 03 : INTERSETORIALIDADE E INTEGRALIDADE
DA ASSISTÊNCIA

Nesta aula será abordada a proposta do cuidado segundo a pers-


pectiva da integralidade e a utilização das ferramentas intersetoriais,
discutindo a construção de redes de cuidados e suas articulações.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
169
1. Cuidado integral às pessoas que usam drogas

Quando se aborda o cuidado de pessoas que usam substâncias psi-


coativas (SPA) e que desenvolveram problemas relacionados a este
comportamento, é necessário perceber a pessoa a partir de sua singu-
laridade e complexidade, incluindo a relação prejudicial que as pessoas
estabelecem com as drogas de abuso e com o que está em seu entor-
no. Neste sentido, o curso vem desenvolvendo com você uma série de
assuntos e temas que tratam dessa complexidade e cabe aqui destacar
o proposto pelo National Institute on Drug Abuse (NIDA), estabelecendo
que o tratamento deve partir de uma perspectiva integral, conside-
rando estratégias que incluam aspectos neurobiológicos, psicossociais
e médicos do uso indevido de substâncias (NIDA, 2010).

PARA REFLETIR A noção de integralidade como princípio


deve orientar para ouvir, compreender e, a
partir daí, atender às demandas e necessi-
dades das pessoas, grupos e comunidades
num novo paradigma de atenção a saúde.

Embora muitas vezes possamos perceber que as pessoas que apre-


sentam graves problemas relacionados com o abuso de drogas podem
ter certas características e comportamentos semelhantes entre si, cada
uma delas é diferente, e a diversidade é evidente quando considera-
mos todas as pessoas que usam ou já usaram qualquer tipo de droga,
de formas diferentes.
Cabe lembrar que, não apenas a forma de usar a droga é diferen-
te entre experimentadores, usuários e abusadores, mas também cada
pessoa tem características biológicas distintas, uma história de vida que
é só dela e vive em grupos de familiares, amigos, vizinhos, ou seja, em
meios sociais e culturais diferentes. Mesmo as pessoas que são depen-
dentes de uma substância, muitas vezes, têm formas de usar e trajetó-
rias muito diferentes.

170
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
Fonte: Amritanshu Sikdar Fonte: Projetado por Fonte: Google Imagens
on Unsplash Lyashenko - Freepik.com

Desconhecer essa diversidade pode provocar visões equivocadas,


quando se generaliza uma experiência singular para o coletivo de pes-
soas que usam drogas. Talvez seja esse um dos motivos para a existên-
cia de formas tão discordantes de compreender e propor ações para os
problemas relacionados com o abuso de drogas.
É nesse nível de entendimento, que a integralidade do cuidado pro-
põe olhar para cada pessoa, tendo em vista o leque de competências
exigidas no processo de trabalho em saúde, o que requer uma visão
voltada para a construção de projetos coletivos. A noção de cuidado
integrado em saúde que se propõe aqui compreende um saber fazer
de profissionais, docentes, gestores e usuários pela produção da saúde,
feito por gente que cuida de gente.

PARA REFLETIR O cuidar de pessoas implica em espaços


de escuta, acolhimento, diálogo e relação
ética e dialógica entre os diversos atores
envolvidos na produção do cuidado.

Dentro desse cenário, a política brasileira sobre drogas e a rede de


atenção psicossocial em construção no Brasil contempla a diversidade
das pessoas que usam drogas criando serviços diferentes. Desta forma,
cada ponto de atenção pode trabalhar de acordo com a lógica de cada
usuário, ou para a mesma pessoa em momentos diferentes. Entenden-
do que, cada modalidade de serviço tem características próprias no que
tange a objetivos, instalações, recursos terapêuticos, perfil de equipe
profissional, intensividade e duração do atendimento. Por isso, a im-
portância de você conhecer as características de cada ponto de aten-
ção, para que cada pessoa possa receber o atendimento adequado em
momento oportuno.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
171
1.1 A construção do cuidado em rede

A construção do cuidado em rede não significa apenas construir e


adaptar instalações físicas e capacitar profissionais, mas também arti-
cular os elementos da rede e coordenar as ações.
A relevância em realizar o cuidado de forma integrada está funda-
mentada na articulação de todos os passos na organização do processo
assistencial e no restabelecimento da saúde. Nesta perspectiva, pro-
põe-se mapear a integralidade da assistência pelo acompanhamento
da linha de cuidado, evitando-se assim a sua fragmentação. Cada pes-
soa deverá ser acompanhada segundo determinado projeto terapêuti-
co instituído, comandado por um processo de trabalho cuidador.
O referido processo de cuidado deve considerar a clínica ampliada e
a construção de planos terapêuticos singulares e intersetoriais. A clínica
ampliada visa não apenas à pessoa e à doença, mas também à família
e ao contexto social, tendo como objetivo produzir saúde e aumentar a
autonomia da pessoa, da família e da comunidade.
A garantia do princípio da Integralidade na atenção à pessoa usu-
ária de álcool e outras drogas implica em condições relacionadas não
somente às práticas profissionais nas diversas fases da atenção à saú-
de, ao processo de cuidar, mas também à organização dos serviços,
às diversas formas de acesso e ao relacionamento do profissional de
saúde com estas pessoas, articulando ações preventivas e assistenciais
em busca da qualidade da atenção à saúde.

O atendimento às pessoas que usam


drogas deve ser feito na perspectiva
da atenção psicossocial, sustentan-
do-se sobre o tripé: acolhimento,
vínculo e corresponsabilização, como
condição para o cuidado.

Embora a política de atenção integral a pessoas usuárias de álcool


e outras drogas traga avanços em seu contexto, na prática há, ainda,
dificuldades quanto à prevenção do uso de drogas, com foco em ações
pautadas na redução de danos, por exemplo. Torna-se perceptível a
necessidade de articulação entre a prevenção do consumo de SPA e a
assistência à pessoa usuária de álcool e outras drogas, para que se pos-
sa atingir verdadeiramente a atenção integral à população.

172
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
2. Intersetorialidade

Entende-se Intersetorialidade como sendo a intervenção coordena-


da de diversas instituições socioassistenciais e econômicas no desen-
volvimento de ações de atenção integral para tratar de problemas de
saúde, bem-estar e qualidade de vida da população. No cenário dos
problemas de saúde, como os relacionados ao uso de álcool e de outras
drogas, dependem de ações de outros setores, como o da assistência
social, educação, segurança, lazer, esportes, trabalho, dentre outros,
para que de fato possamos cuidar na lógica da integralidade.

Imagem 3.3.4 RAS

RAS

Fonte: adaptado de Mendes, 2011

A importância de uma rede de serviços diversa, que atenda às pesso-


as que abusam das drogas, é um reflexo da multiplicidade de dimensões
dos problemas relacionados ao abuso destas substâncias. Entenden-
do que o abuso das drogas envolvem questões médicas, psicológicas,
sociais, legais entre outras, fica evidente que não há possibilidades de
concentrar todos os recursos em um só tipo de serviço. Cabendo des-
tacar então, a importância desses serviços estarem distribuídos no ter-
ritório de cada pessoa o mais próximo possível dos locais onde moram,
trabalham ou circulam.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
173
O trabalho em rede entre diversos atores sociais, serviços e insti-
tuições se apresenta como um grande desafio apregoado nas últimas
décadas por diversas políticas sociais, entre elas, a saúde. Este desafio
coloca-se frente à configuração fragmentada e desarticulada da im-
plantação das políticas públicas brasileiras, o que por vezes dificulta o
atendimento das necessidades da população em sua totalidade.
O termo rede remete à ideia de conexão, ações complementares e
relações horizontais entre parceiros, para garantir a integralidade da
atenção, isto é, uma ‘horizontalização’ dos dispositivos e profissionais
de saúde, superando a fragmentação das atividades no interior das uni-
dades de saúde. Para isso, a rede requer uma articulação interseto-
rial, ou seja, entre diversos setores, instituições e pessoas, agregando
saberes e experiências, estabelecendo um conjunto de relações inter-
dependentes. Nesse sentido, a rede assistencial em saúde organiza-se
sob os princípios da integralidade e da intersetorialidade.
Para que essa rede possa ser usada da melhor forma possível, faz-
-se necessário: conhecer a rede; estabelecer contatos pessoais; saber o
tipo de atendimento que cada serviço oferece; limites de idade, sexo,
etc.; e qual é o horário de atendimento, da chegada e a forma de enca-
minhamento. Visitar os serviços da rede é uma boa forma de ter, por
conseguinte, essas informações e estabelecer, também, contatos pes-
soais entre as equipes.
O debate sobre a intersetorialidade nas políticas públicas não é re-
cente. No que se refere à política de saúde, esse debate remonta ao
século passado e está associado à questão das determinações sociais
no processo saúde-doença. Em outros termos, isso significa dizer que
já faz algum tempo que se reconhece que a saúde das pessoas é re-
sultado das condições sociais e econômicas em que nascem, crescem,
trabalham e envelhecem e que, portanto, ter saúde não depende ape-
nas de serviços de saúde, mas também de escolas, moradia, emprego,
transporte, entre outros serviços.
Nesse sentido, para se garantir a saúde das pessoas, faz-se neces-
sário integrar os serviços de saúde aos demais órgãos públicos, arti-
culando políticas e programas que impactam na saúde. Isso significa
que, na área que envolve a prevenção e cuidado aos problemas re-
lacionados ao uso de álcool e outras drogas, os serviços de atenção
integral no âmbito do SUS (por exemplo, os centros de atenção psi-
cossocial, consultórios de/na rua e leitos de desintoxicação em hospi-
tais gerais) devem estar articulados aos demais serviços e programas
existentes na política de saúde, como o Programa Saúde da Família, o

174
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
Núcleo de Apoio à Saúde da Família, ambulatórios especializados, tes-
tagem rápida para HIV e outras doenças sexualmente transmissíveis.
Tais serviços devem também estar articulados com outras políti-
cas, como a de assistência social (casas de acolhimento temporário
e auxílio-moradia, por exemplo), de educação (como creches, eleva-
ção de escolaridade e qualificação profissional), de emprego e renda
(a exemplo do PRONATEC), dentre outras políticas, de forma que os
recursos financeiros, tecnológicos, materiais e humanos disponíveis
sejam potencializados, se evite duplicidade de meios para os mesmos
fins e possa se dar atenção às diversas necessidades sociais de saúde
e dos usuários de drogas.
Nesse cenário brasileiro, a intersetorialidade se transforma em um
paradigma essencial no desenvolvimento das políticas públicas sociais
e econômicas. Em situações complexas como a de exclusão social bra-
sileira, a intersetorialidade nas políticas públicas é um grande desafio,
mas um desafio necessário e urgente, que deve ser assumido como
compromisso de todos: governantes, gestores, profissionais, usuários,
lideranças e instituições de ensino, no sentido de garantir mais saúde e
melhor qualidade de vida à maioria da população brasileira.

2.1 Exemplos de práticas intersetoriais na saúde

Na relação entre os serviços, é muito potente a lógica do matricia-


mento, conforme vimos no Módulo I. A necessidade do matriciamento
decorre do fato de que cada serviço não possui recursos para cuidar de
todas as necessidades inerentes a todos os casos. Ademais, em cada
serviço, os profissionais não têm o conhecimento e a experiência para
cuidar de todos os aspectos de cada caso. Cabe registrar, no entanto,
que os profissionais de um serviço que tenham mais experiência com
determinado aspecto podem dar suporte aos de outro serviço com me-
nos experiência.
Com isso, evita-se que o usuário tenha de ser atendido em múltiplos
serviços. Por exemplo, um usuário psicótico que esteja bem vinculado
a um CAPS geral não necessita ser atendido também em um CAPS AD
apenas porque usa drogas. Os profissionais do CAPS geral podem, nesse
contexto, discutir o caso com os profissionais do CAPS AD para que estes
sugiram estratégias para a abordagem do problema relacionados com
as drogas. Nesse exemplo, a discussão do caso pelos profissionais do
CAPS AD e pelos do CAPS geral constitui uma prática de matriciamento.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
175
Um bom exemplo de como estabelecer parcerias e articulação en-
tre os serviços é a experiência do Fórum AD do Rio de Janeiro. É uma
reunião mensal em que participam profissionais de quaisquer serviços
que atendem usuários de drogas no estado do Rio de Janeiro. As reu-
niões contam com profissionais de CAPS AD, CAPSi, CAPS gerais, hospi-
tais gerais e psiquiátricos, serviços da assistência social, como os CREAS
e CRAS, Conselho Tutelar, etc. Além disso, muitas vezes profissionais
da justiça, como os promotores, participam do Fórum AD. Geralmente,
são discutidos casos que são atendidos por vários serviços. A discussão
desses casos ajuda a articular a rede e estabelecer contatos.

Resumo

Nesta aula foi abordado o cuidado integral às pessoas que usam dro-
gas, destacando a diversidade de cada pessoa; a construção do cuidado
em rede também foi discutida com uma ferramenta que apoio a lógica
integral, assim como exemplos de práticas intersetoriais na saúde fo-
ram debatidas. Na aula seguinte veremos a respeito da entrevista mo-
tivacional, abordagem, acolhimento, atendimento e reinserção social.

176
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
AULA 04: ENTREVISTA MOTIVACIONAL, ABORDAGEM, ACOLHI-
MENTO, ATENDIMENTO E REINSERÇÃO SOCIAL

Nesta aula, você aprenderá quais são os estágios de um processo de


mudança e como motivar os usuários de álcool e outras drogas de risco
para que comecem esse processo de mudança, além de tratar questões
referentes à abordagem psicossocial, acolhimento e sua importância
neste cenário, e atendimento e reinserção social da pessoa com relação
prejudicial com o álcool e outras drogas.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
177
1. Entrevista Motivacional (Em)

A proposta desta aula é relacionar os conteúdos desenvolvidos até


este momento no curso com o processo das intervenções junto a pes-
soas que apresentam problemas decorrentes do abuso do álcool e de
outras drogas. Nesta perspectiva, apresentamos o estado da Entrevista
Motivacional (EM) no cenário científico, como uma técnica que visa au-
mentar a motivação das pessoas nos processos de mudança e que vem
sendo descrita pela literatura internacional de forma consistente.
Dentro deste cenário, para os pesquisadores que desenvolveram a
técnica da EM, motivação é um estado de prontidão ou disposição
para mudança, caracterizando-se como um processo dinâmico, po-
dendo variar de tempos em tempos ou de uma situação para outra.
Cabe destacar que é um estado interno, mas que pode ser influenciado
(positiva ou negativamente) por fatores externos (sejam pessoas ou cir-
cunstâncias).
Essa prontidão ou disposição para mudança, bem descrita na lite-
ratura, ocorre em estágios chamados Estágios de Mudança. A iden-
tificação do estágio em que a pessoa se encontra permitirá que você
avalie o quanto ela está disposta a mudar suas atitudes decorrentes do
uso de substâncias ou o seu comportamento de estilo de vida. Desta
forma, com essa identificação, você saberá como se posicionar durante
a intervenção.
Os conceitos de motivação, ambivalência e prontidão para a mudan-
ça, são dispositivos essenciais para a compreensão do processo das
dependências, são os pressupostos norteadores desta abordagem. A
EM surgiu a partir de experiências clínicas com dependentes de álcool
e atualmente sua eficácia é consagrada para tratar o consumo proble-
mático de álcool e outras dependências químicas.
Esse modelo considera a mudança comportamental como um pro-
cesso e leva em conta que as pessoas passam por diferentes estágios
motivacionais, descritos a seguir.

1.1 Estágios motivacionais

Estágio 1: Pré-Contemplação

Estágio em que a pessoa não considera a necessidade de ajuda, não


demonstrando consciência suficiente de que tem problemas relacionados

178
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
com o uso de SPA’s, embora outras pessoas do seu convívio possam estar
cientes disso. Essas pessoas, neste estágio, são atendidas geralmente na
Atenção Primária à Saúde (APS) e nos serviços de assistência social.
É necessário ressaltar que pessoas nesse estágio, primeiramente,
não se mostram dispostas a mudar seu comportamento, porém estão
abertas a receber informações sobre o risco associado ao seu nível e
modo de consumo de drogas. Portanto, é nesse momento que é im-
portante fornecer informações precisas e com segurança, você pode
encorajá-las a refletir sobre o risco do uso nocivo de substâncias e pen-
sar, juntamente com usuário, sobre possibilidades de redução ou até
mesmo interrupção do uso.

Uma pessoa no estágio de PRÉ-CONTEM-


PLAÇÃO necessita de informações e de um
retorno do profissional, explicando em que
tipo de uso de substâncias ela se classifica.
Isso pode ajudá-la a tomar consciência de
seu problema e considerar a possibilidade
de mudança.

Estágio 2: Contemplação

Nesse estágio, as pessoas começam a vislumbrar a possibilidade de


diminuir ou até mesmo cessar o uso das substâncias, pois visualizam
seu consumo como um problema e apresenta possibilidade de mudan-
ças. Neste momento, fica evidente o aparecimento do que chamamos
de ambivalência, ou seja, ela tanto considera a necessidade de mudar
seu comportamento quanto a rejeita. Em geral, os indivíduos que se
encontram nesse estágio conseguem perceber tanto os aspectos bons
quanto os ruins em relação ao seu uso de drogas.
A abordagem, neste estágio, precisa fornecer informações sobre os
riscos relacionados ao consumo de drogas, refletir junto com usuário
sobre a relação que ele estabelece com as substâncias. É importante
fazer o usuário pensar na sua saúde e nas implicações desse compor-
tamento, incentivá-lo a falar sobre as vantagens (prós) e desvantagens
(contras) de seu uso de substâncias, além de orientá-lo sobre estraté-
gias para reduzir o consumo ou cessá-lo.
Chamo sua atenção para que utilize as desvantagens mencionadas
como importantes ganchos para refletir a relação prejudicial com as
drogas de abuso. Muitos pesquisadores sugerem que essas vantagens

MINISTÉRIO DA SAÚDE
179
e desvantagens mencionadas pela pessoa podem ser melhor trabalha-
das quando escritas em um papel, uma vez que saem do campo verbal
e entram no campo visual do indivíduo.
Quadro 3.4.1 Prós e contras do uso de drogas

Fonte: autor

Seguindo esta lógica, destaco outra sugestão para trabalhar a ambi-


valência sobre o uso de SPAs como uma balança. De um lado da balan-
ça coloque os aspectos prazerosos que a pessoa tem ao usar a droga e
as desvantagens que teria caso mudasse seu comportamento (razões
para continuar na mesma situação). Do outro lado da balança, coloque
as desvantagens do uso atual da substância e os benefícios que ele
teria, caso deixasse de usar ou reduzisse o consumo (razões para mu-
dança). As mudanças serão mais prováveis desde que as razões para a
mudança pesem mais do que as razões para continuar na mesma situ-
ação. Mesmo se as vantagens do uso forem em maior número do que
as desvantagens, argumente mostrando que o peso dos problemas na
vida dele é mais importante do que o prazer momentâneo.
Imagem 3.4.2 Balança da decisão

GANHOS POR
NÃO MUDAR GANHOS COM
A MUDANÇA

Fonte: autor

180
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
Estágio 3: Preparação

Nesse estágio, as pessoas começam a pensar em tentativas para


mudar seu comportamento e, geralmente, são descritas na literatura
como prontas para a ação, reconhecendo o seu uso de drogas como
sendo o causador de seus problemas. Assim, a pessoa se propõe a mu-
dar de comportamento, desenvolvendo um plano ou estratégias que a
ajudem a colocar em prática essa mudança.
Neste estágio, é improtante que se desenvolva, junto com a pessoa,
um plano para a mudança de comportamento, identificando situa-
ções de risco para o uso de substâncias, além de fornecer orientação
sobre algumas estratégias para enfrentar as possíveis dificuldades rela-
cionadas à mudança proposta.

Estágio 4: Ação

Nesse estágio, a pessoa coloca em prática as estratégias, metas e


planos (desenvolvidos no estágio anterior) para a modificação do com-
portamento aditivo envolvendo tentativas concretas de modificar esses
comportamentos, experiências e/ou o meio ambiente, a fim de superar
os problemas decorrentes da relação prejudicial com as drogas.

Apesar de motivada a mudar de com-


portamento, muitas vezes a pessoa
pode manifestar dúvidas sobre se
conseguirá ou não realizar a mudan-
ça (autoeficácia). Se isso acontecer,
você deve encorajá-la e fortalecê-la,
ajudando-a a manter sua decisão.

Estágio 5: Manutenção

Finalmente, o sucesso da mudança ocorre no estágio de manuten-


ção, em que a pessoa modifica seu estilo de vida, evitando situações de
abuso de substâncias, atingindo abstinência se for o seu desejo e con-
solidando as mudanças. Vale ressaltar que o estágio motivacional de
cada pessoa foi estudado e considerado como um fator preditor (pre-
nunciador) de efetividade no seu tratamento.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
181
E se houver retornos ao uso, mesmo quan-
do a proposta da pessoa for cessá-lo?

O retorno ao uso de substâncias são nor-


mais, e até esperados, quando a pessoa busca mudar seu padrão de comportamento. É im-
portante atentar aos sinais de mudança de estágios motivacionais, pois quando as pessoas
retornam ao uso, podem voltar à estágios anteriores, como: pré-contemplação, contempla-
ção e ação.

Por outro lado, podem ocorrer também apenas lapsos (ou “deslize”), que é quando uma
pessoa utiliza a substância após um período de abstinência, porém sem voltar ao padrão
de uso habitual. Assim, um lapso remete a um ato isolado, um consumo ocasional, de modo
que a pessoa se mantém no estágio de manutenção, ao invés de retornar aos estágios de
mudança anteriores. Importante neste momento trabalhar os significados deste uso oca-
sional e refletir com a pessoa o que está por trás deste comportamento. Lembre-se sempre:

•• Realizar uma mudança não garante que ela será mantida;


•• Durante esse estágio, o desafio é manter a mudança obtida;
•• A pessoa estará tentando manter o comportamento mudado e para isso necessita ser
continuamente apoiada e encorajada.

Estratégias de mudança de comportamento

Para que as pessoas mudem seu comportamento, elas precisam


sentir-se prontas, dispostas e capazes de mudar (empoderadas). O
conjunto de métodos empregados para ajudar as pessoas a aumentar
a motivação intrínseca trazido pela EM, ao explorar e resolver a ambi-
valência sobre a mudança de um comportamento específico, é funda-
mental para o desenvolvimento desse processo. Estar pronto e dispos-
to a reduzir ou parar o uso está relacionado à importância que cada
pessoa dá para a sua mudança. Pensar em mudar é importante, mas
nem sempre é suficiente para que uma pessoa passe para a fase de
ação. Para ajudá-la nesse processo, é preciso fazer uso adequado da
entrevista motivacional, como detalhada no quadro a seguir.

De modo geral, a Entrevista Motivacional é composta por 5 princípios gerais:

1. Expressar empatia: a atitude que fundamenta o princípio da empatia


pode ser chamada de aceitação. É importante observar que a aceitação não
é a mesma coisa que concordância ou aprovação. Ou seja, é possível que
você aceite e compreenda o ponto de vista da pessoa sem necessariamente

182
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
concordar com ela. Isso significa acolher, aceitar e entender o que ela diz, sem
fazer julgamentos a seu respeito. Com uma “escuta reflexiva”, “qualificada”,
você deve buscar compreender os sentimentos e as perspectivas de cada
pessoa, sem julgá-la, criticá-la ou culpá-la. A empatia do profissional de saúde
está associada à boa resposta da pessoa à intervenção.
2. Desenvolver discrepância: um dos princípios da Entrevista Motivacional
é mostrar para cada pessoa a discrepância entre o seu comportamento, suas
metas pessoais e o que pensa que deveria fazer. Um bom modo de ajudá-la a
compreender esse processo é fazer uma comparação, mostrando que muitas
vezes existe uma discrepância entre ONDE SE ESTÁ E ONDE SE QUER, OU SE
GOSTARIA DE ESTAR. Muitas vezes, perguntar a pessoa como ela se imagina
daqui a algum tempo (2 ou 3 anos, por exemplo) e o que ela está fazendo para
atingir sua meta, poderá ajudá-la a entender essa discrepância.
3. Evitar a confrontação: A todo o momento você deve evitar confrontar
diretamente a pessoa. Abordagens desse tipo as torna resistente à interven-
ção. Coloque seus argumentos de modo claro, mas sempre convidando a pes-
soa a pensar/refletir sobre o assunto.
4. Lidar com a resistência da pessoa: Muitas pessoas podem se mostrar
resistentes às sugestões e propostas de mudanças feitas por você. Mas lem-
bre-se de que ela não é um adversário a ser derrotado. Ou seja, o que fazer
quanto a um problema é uma decisão dela e não sua. Entenda que a ambi-
valência e a resistência para a mudança de comportamento são normais em
todas as pessoas e sua atitude, como profissional, deve ser no sentido de levar
a pessoa a considerar novas informações e possibilidades, em relação ao uso
da substância.
5. Fortalecer a autoeficácia de cada pessoa: autoeficácia refere-se à cren-
ça de uma pessoa em sua capacidade de realizar e de ter sucesso em uma ta-
refa específica. Existem várias mensagens que promovem a autoeficácia, uma
delas é a ênfase na responsabilidade pessoal (autonomia), ou seja, devemos
mostrar a pessoa que ela não somente pode, mas deve fazer a mudança, no
sentido de que ninguém pode fazer isso por ela. Encoraje-a e estimule a pes-
soa a cada etapa vencida. Ela se sentirá fortalecida.

3. Acolhimento

o acolhimento é referido na Política Nacional de Humanização (PNH),


como ato ou efeito de acolher e expressa, em suas várias definições,
uma ação de aproximação, um “estar com” e um “estar perto de”, ou
seja, uma atitude de inclusão.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
183
Fonte: Centro de Acolhida de Transexuais SP

Esse ato de acolher, inclui, com efeito, aspectos objetivos e subjeti-


vos. Dentre os aspectos objetivos, está a existência de espaço adequa-
do e acolhedor, os horários disponíveis e as práticas de registro. Mas o
mais importante em todas as atividades de acolhimento são os aspec-
tos subjetivos indispensáveis, como a disponibilidade dos profissionais
e a escuta atenta, qualificada e empática.

O acolhimento se coloca como a prin-


cipal forma assistencial e humaniza-
da de desenvolvimento nas ações em
saúde, sendo responsável por todo
processo assistencial de cada pessoa,
aliado à produção de vínculo e pro-
cessos de responsabilização.

Importa destacar neste momento que, por empatia, entendemos a


capacidade de se colocar no lugar da outra pessoa e levar em conside-
ração os seus sentimentos. Neste momento de encontro com o outro,
devemos escutar a pessoa que vem ao atendimento sem julgá-la, ou
seja, sem ter preconceitos morais pré-estabelecidos, quer seja pelo fato
de ser usuário (a) de drogas, quer seja por apresentar outros compor-
tamentos. Neste sentido, você precisa avaliar as demandas, escutar a
queixa, os medos e as expectativas, identificar os riscos e a vulnerabili-
dade, acolhendo também a avaliação de cada pessoa, e se responsabi-
lizar para dar uma resposta ao problema. Com esse funcionamento, o
ato de acolher deixa de ser uma ação pontual e isolada dos processos
de produção de saúde e se multiplica em inúmeras outras ações, as

184
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
quais, partindo do complexo encontro entre a pessoa profissional de
saúde e a pessoa demandante, possibilitam que sejam analisados al-
guns aspectos importantes neste processo:

•• O ato da escuta e a produção de vínculo como ação terapêutica;


•• As formas de organização dos serviços de saúde (de acordo com as de-
mandas das pessoas);
•• O uso ou não de saberes e afetos, para a melhoria da qualidade das ações
de saúde, e o quanto esses saberes e afetos estão a favor da vida;
•• A humanização das relações em serviço;
•• A adequação da área física e a compatibilização entre a oferta e a demanda
por ações de saúde;
•• A governabilidade das equipes locais; e
•• Os modelos de gestão vigentes na unidade de saúde.

Estas ferramentas são fundamentais para que possamos de fato re-


alizar as avaliações sistematizadas do processo do cuidado desenvol-
vidas nas unidades de saúde como um todo, entendendo o quanto é
importante a abordagem, o acolhimento e o atendimento.

No cenário de práticas, é comum as pes-


soas que buscam ajuda chegarem nos
serviços trazendo muito desespero, de-
sesperança e buscando soluções urgentes e até mesmo “mágicas” para dar conta de todo o
sofrimento envolvido neste processo de envolvimento com as drogas. São inúmeras deman-
das, porém as mais frequentes envolvem múltiplos aspectos, como o sofrimento físico e
emocional, conflitos familiares, problemas e carências sociais, envolvimento com questões
legais e outros.
Nesse sentido, vale ressaltar a necessidade de as equipes serem constituídas de forma
multiprofissional, pois na avaliação das demandas, é fundamental definir quais as priori-
dades. É importante lembrar que acolher as demandas não significa que a equipe precisa
solucionar imediatamente todos os pedidos de cada pessoa e de sua família.
É necessário que cada pessoa e seus familiares percebam que essas demandas são, efe-
tivamente, levadas em consideração e que o serviço e seus profissionais constituem um
espaço privilegiado para encontrar soluções. Mas é preciso deixar claro para quem busca
ajuda o que é oferecido pela instituição e o que não é. É extremamente importante, explicar
os limites do serviço e dos profissionais desde o primeiro atendimento, para evitar frustra-
ções futuras.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
185
4. Abordagem, atendimento e a reinserção social

Nesta aula tivemos a oportunidade de dialogar até o momento so-


bre Entrevista Motivacional e o Acolhimento, e entendemos que os
pressupostos que embasam essas ações são base fundamental para
que possamos discutir as abordagens de um modo geral e a postura
frente as questões que estão envolvidas no contexto do uso e abuso do
álcool e de outras drogas. Por isso, falar em abordagem neste momen-
to significa refletir na perspectiva de um posicionamento ético, político
e estético frente as demandas de cada pessoa que apresenta relação
prejudicial com as drogas de abuso.
Visto isso, é preciso reforçar que a abordagem que melhor dialoga
com o que estamos desenvolvendo ao longo deste curso é a psicosso-
cial, pois ela compreende que a nossa história de vida é marcada pelas
relações em rede, cuja o contexto social e familiar, bem como as expe-
riências culturais, se manifestam no cotidiano, constituindo a pessoa
em sua totalidade, sendo que esta afeta e é afetada nas suas relações,
enfatizando a interação e a interdependência dos fenômenos biopsi-
cossociais e buscando pesquisar a natureza dos processos dinâmicos
do indivíduo em sua vivência cotidiana.
A dimensão psicossocial contempla, portanto, articulações entre o
que está na ordem da sociedade e o que faz parte da subjetividade, do
psíquico, concebendo cada pessoa na multidimensionalidade da vida,
na qual estão envolvidos aspectos de interação entre o físico, o psíquico
e o social.
A perspectiva psicossocial é uma ação e tenta compreender a com-
plexidade do ser humano em seus processos de troca e no desenvol-
vimento de ligações baseadas nas experiências singulares e coletivas.
Portanto, esta prática assistencial se volta para o sofrimento ou pro-
blemas decorrentes da dimensão psicossocial, ressalta ações dirigidas
para a atenção a cada pessoa, em uma lógica integral, o que requer o
questionamento de posições reducionistas, voltadas somente para as
intervenções bioquímicas e direcionadas para as perspectivas fisiopa-
tológicas das pessoas.
Para que possamos entender e refletir melhor a complexidade en-
volvida nesta abordagem, destaco três dimensões fundantes: a família,
a comunidade e a rede social.

186
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
4.1 Família e seu contexto social

A partir do exposto sobre a abordagem psicossocial, fica evidente


que o papel da família no cuidado às pessoas com relação prejudicial
com o álcool e outras drogas é fundamental, entender sua dinâmica
familiar, suas relações socioculturais, seu papel em cada território, sua
influência sobre o comportamento dos seus membros, os papeis de
cada membro da família, entre outras são essenciais para o sucesso
do acompanhamento do familiar com problemas relacionados ao uso
abusivo de drogas.
Quero chamar sua atenção, que neste momento não vamos traba-
lhar conceitos de família, suas transformações ao longo dos tempos,
nem mesmo trazer conceitos contemporâneos sobre família, o foco é
destacar o quanto é fundamental a abordagem familiar na perspectiva
psicossocial, para o sucesso de qualquer intervenção.

Para saber mais sobre família e seus


conceitos acesse o Caderno nº 34 Saúde
Mental na Atenção Básica.

Sendo assim, preciso destacar que a inclusão da família no processo


do cuidado às pessoas com relação prejudicial com as drogas de abu-
so, precisa acontecer o mais precoce possível em todas as ações em
saúde, o que torna fundamental conhecê-la, em suas potencialidades e
fraquezas, suas redes e suas determinações para as possibilidades de
mudanças, que temática fundamental neste contexto. Nesta perspec-
tiva, torna-se imperativo o protagonismo da família em todo o processo
de acompanhamento de seu familiar.

A família e o contexto cultural são fatores


importantes na determinação da relação
de consumo com o álcool e de outras dro-
gas. Há várias evidências de que os padrões
culturais têm papel significativo no desen-
volvimento dos problemas relacionados ao
uso dessas substâncias. Acesse esse outro
material para aprofundar sobre as aborda-
gens familiares aqui.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
187
Diante do exposto, é preciso trazer para aprofundar a reflexão sobre
o contexto familiar, que seus membros passam a receber atenção não
só para suas angústias, mas também começam a receber informações
fundamentais para a melhor compreensão do sofrimento que de cada
pessoa afetada nestas relações. Portanto, saber abordar, avaliar, acom-
panhar e tratar a família torna-se imperioso.
4.2 A Comunidade e suas relações

Entendendo não só a importância da abordagem psicossocial que


estamos trabalhando nesta aula, mas percebendo o quão é importante
situar a pessoa em seu contexto social, analisar suas relações, seu pa-
pel e também seu comportamento neste cenário, trabalhar o conceito
de comunidade se coloca com questão fundamental.
Nesta perspectiva, é preciso destacar que comunidade abarca não
somente o conjunto de pessoas que a constituem, mas também a
de considerar as complexas relações sociais que se fazem entre seus
membros, os sistemas de crenças que professam e as normas sociais
que a regem. Neste sentido, analisar a relação singular de cada comu-
nidade é essencial para a compreensão das pessoas que nela vivem e,
em decorrência de como tomam decisões que afetam a sua saúde e
seu bem-estar.

4.3 A rede social e suas conexões

A rede social é entendida como o conjunto de relações interpesso-


ais concretas que vinculam pessoas a outras pessoas, tecendo laços
de reciprocidade e cooperação. Esse conceito vem se modificando e
ampliando a cada dia, à medida que se percebe o poder da cooperação
como atitude que enfatiza pontos comuns em um grupo para gerar so-
lidariedade e parceria.
Outro aspecto a se considerar sobre rede social e relações interpes-
soais neste campo de atuação, é que elas podem influenciar signifi-
cativamente na definição da personalidade e na evolução da vida das
pessoas. Essas relações não são uma questão de escolha, são forças
sociais complexas que interagem, determinando as condições para que
a pessoa, famílias e comunidade que vivem em determinado lugar se
relacionem em grupos específicos. Essa relação é mediada por caracte-
rísticas pessoais, afinidades, interesses comuns e estatus socioeconô-
mico, entre outros fatores.

188
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
Numa busca mais profunda por estudos que abrangem as relações
sociais, a ideia básica encontrada diz respeito ao fato de que a maneira
como uma pessoa vive depende, em grande parte, da forma com que
ela interage em uma larga rede de conexões sociais. Essa temática, têm
sido objeto de estudo não somente do campo da saúde, mas também
no âmbito da religião, da filosofia e das ciências sociais.
No contexto de redes sociais, a função do apoio e/ou suporte so-
cial é central para pensar processos de intervenção psicossocial, pois
descreve o conjunto de pessoas que oferecem ajuda e apoio de forma
real e duradoura a pessoa ou à família. Cabe destacar que, no âmbito
dos recursos psicossociais, a rede social e o apoio social constituem
constructos diferentes, porém relacionados.
Neste sentido, a rede social pode ou não oferecer diferentes tipos
de apoio, e em graus diversos. Os efeitos benéficos da rede pessoal de
apoio dependem da possibilidade de suprir os auxílios esperados por
cada pessoa. Portanto, rede social pode ser concebida como a estrutu-
ra social por meio da qual o apoio é fornecido. Assim sendo, pensar em
apoio social remete às relações pessoais significativas, constituídas em
forma de redes:
Imagem 3.4.5 Rede social

Primárias: aquelas relações Secundárias: relações


organizadas de maneira
pessoa no decorrer e toda
sua existência, não só no Apoio integrantes possuem papéis
âmbito familiar, mas -
também social, como
amigos, vizinhos e compa-
Social dos de acordo com os
lugares que ocupam em
nheiros de trabalho (família determinadas instituições
e comunidade (instituições sociais)

Fonte: SENAD-MJ/NUTE-UFSC, 2015.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
189
4.4 Reinserção Social

O tema reinserção social, colocado no final desta aula não o torna


menos importante que os demais, muito pelo contrário, ele é funda-
mental para o processo de recuperação das pessoas que apresentam
problemas relacionados com o abuso das drogas. Neste sentido, vamos
encerrar esta aula trazendo reflexões a cerca desta temática, buscando
fazer inclusive uma revisão (nível reflexivo) do que já foi tratado, pois
são temas que andam juntos no processo do cuidado e foram separa-
dos apenas por motivos didáticos.
Deste modo, a reinserção social tem o caráter de reconstrução das
perdas, pois a relação estabelecida com as drogas de abuso, usualmen-
te têm implicações negativas de modo global, sendo por vezes acompa-
nhada por isolamento, cisão dos laços sociais e comunitários, relaciona-
mentos interpessoais fragilizados, entre outros.
Neste contexto, o processo de reinserção começa com a avaliação
social, momento em que se mapeia a vida das pessoas em seus aspec-
tos significativos que darão suporte à retomada de seu projeto origi-
nário ou à construção de um novo projeto de vida. Perante o que foi
visto, faz-se necessário assumir uma postura de acolhimento, tema já
discutido nesta aula, no qual a atitude solidária e a crença na capacida-
de do outro construir e/ou restabelecer sua rede social irá determinar
o estabelecimento de um vínculo positivo entre quem cuida e quem é
cuidado. É uma parceria na qual a porta para o cuidado estará sempre
aberta, desde que o trânsito seja de mão dupla.
Por isso, torna-se necessário entender que a reinserção social é um
processo longo e gradativo que implica, inicialmente, a superação dos
próprios preconceitos, nem sempre explícitos.

Resumo

Nesta aula tratamos sobre a entrevista motivacional, o reconheci-


mento dos seus estágios, o entendimento e a aplicação de seus princí-
pios, assim como a abordagem psicossocial das pessoas que abusam
de SPA, o atendimento e a lógica de reinserção social, considerando a
família e seu contexto social e o acolhimento na perspectiva da PNH.
A seguir, iremos abordar sobre vínculo e tratamento.

190
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
AULA 05: VÍNCULO AO TRATAMENTO

O vínculo estabelecido entre a pessoa com relação prejudicial com


álcool e outras drogas e os profissionais da rede de atenção que as as-
sistem é indispensável para o sucesso do tratamento. É nesta relação
de trocas, de confiança e de comprometimento com o outro que se
alicerça todo esse cenário de cuidado. Nesta aula iremos rever alguns
conceitos, situar a abordagem psicossocial, reafirmar o papel da rede,
pois falar em vínculo, significa expressar relações que se fazem entre
pessoas com pessoas e essas com os serviços.

Fonte: Projetado por Ijeab - Freepik.com

MINISTÉRIO DA SAÚDE
191
1. Vínculo e afetos

Vínculo é uma forma de se relacionar por meio da qual ocorre a


aproximação entre a pessoa e o profissional, nunca perdendo de vista
os serviços. Esse vínculo, a ser elucidado nesta aula, é construído pela
existência de objetivos comuns (a busca pela saúde coloca-se como um
bom exemplo) em uma convivência de apoio e respeito mútuos.
Nesta perspectiva, vincular-se é um processo que requer o desenvol-
vimento de confiança, compromisso e respeito ao longo do qual cada
pessoa constrói a convicção de que pode contar com a atenção e em-
penho do profissional, além da infraestrutura ofertada pelos diferentes
serviços. Esse processo “amarra”, por meio de uma ligação afetiva e
ética, a pessoa que usa o serviço ao profissional que presta o cuidado.
Está relação não significa, todavia, que o profissional vai tornar-se “ami-
go” da pessoa a ser cuidada, mas que esta relação seja compreendida
pelo assistido como uma relação de cuidado ético e comprometido com
o seu problema.
Seguindo nessa mesma lógica, o engajamento pessoal e o envolvi-
mento emocional são essenciais na criação de uma aliança terapêu-
tica (UNODOC). Tanto profissionais quanto as pessoas que se utilizam
dos serviços, individualmente ou coletivamente, depositam, perceben-
do ou não, afetos diversos uns sobre os outros. Uma pessoa pode as-
sociar um profissional com um parente e vice-versa.

Nesse contexto, tentando situar o papel de


quem cuida e de quem é cuidado, vale lem-
brar o significado da palavra terapia: do
grego: therapeia, significa acolher, ser ca-
loroso, servir, atender. Assim, podemos en-
tender que, terapeuta é aquele que cuida
dos outros de forma calorosa, acolhedora.

Do mesmo modo, um profissional que tem uma experiência nega-


tiva com a polícia não vai sentir-se da mesma forma ao cuidar de uma
pessoa que tem esta profissão. Isso não significa uma relação melhor
ou pior, mas é necessário perceber e prestar atenção a estas sensa-
ções, às vezes evidentes, mas muitas vezes sutis. Isto ajuda a melhor
compreender-se e a compreender o outro, aumentando a chance de
apoiar a pessoa com problemas decorrentes com o uso de drogas a

192
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
ganhar mais autonomia e a lidar com o seu problema de modo provei-
toso para ela.
Essas considerações são fundamentais, não somente para que você
comesse a perceber o que está por traz de todo o processo da criação
de vínculo, mas também compreender os sinais que possam de alguma
forma indicar prejuízo nos vínculos estabelecidos entre os atores so-
ciais envolvidos e o próprio serviço.
Nesse processo, o papel da equipe é muito importante, porque a re-
lação de cada membro da equipe com o usuário do serviço e familiares
é singular, permitindo que as possibilidades de apoiar essa pessoa se
multipliquem. Vale destacar que, dentro da própria equipe, estes sen-
timentos inconscientes também podem ser influentes na relação entre
seus profissionais.

2. O processo de vínculo e suas implicações

Segundo pesquisas (UNODC), qualidade, desempenho e resultados


são os principais fatores que influenciam a atratividade de programas de
tratamento para as pessoas com relação prejudicial com as drogas de
abuso. A qualidade do tratamento para esse problema é o resultado de
uma combinação de fatores que incluem, entre outros, boa infraestrutu-
ra, um número suficiente de pessoal competente, uma atuação em equi-
pe, tempo adequado dedicado a cada pessoa, regras clínicas e legislação
clara em relação às drogas, uma variedade de métodos de tratamento
oferecidos, recursos disponíveis e gerenciamento de casos. Programas
de tratamento de qualidade disponibilizam um serviço que é atraente e
acolhedor para os usuários em potencial.
Nesse sentido, quando uma equipe acredita que um jeito de viver é
o certo, tende a orientar o usuário a ter um tipo de comportamento ou
hábito. A pessoa orientada, no entanto, pode encontrar dificuldade em
seguir “as ordens”, ter outras prioridades ou mesmo discordar das orien-
tações da equipe. Se esta não tiver flexibilidade, quando percebe que a
pessoa não seguiu as suas recomendações, é bem possível que se irrite
com ela, fazendo cobranças que só fazem com que a pessoa também se
irrite com a equipe, num círculo vicioso que não é bom para ninguém.
Algum grau de pressão é muitas vezes usado para incentivar as pes-
soas com problemas decorrentes com o uso das drogas a iniciarem o
cuidado e aumentarem a sua permanência no tratamento, o que pode
variar entre uma pressão informal exercida pela família e amigos e uma

MINISTÉRIO DA SAÚDE
193
Fonte: Policlínica Rodolpho Rocco RJ

pressão formal legal para participar de um tratamento como alternati-


va à prisão ou outras sanções legais. Mas é preciso refletir sobre tais
pressões e sobre o efeito positivo ou negativo que possa ter sobre a
pessoa assisitida.

Podemos entender, que a “culpa” paralisa, gera resistência, além de


poder humilhar. É mais produtivo tentar construir uma proposta
terapêutica pactuada com cada pessoa e com a qual ela se corres-
ponsabilize. O fracasso e o sucesso, dessa forma, dependerão tanto
da pessoa quanto da equipe e a proposta poderá ser mudada sempre
que necessário.
Contudo, cabe lembrar que a questão clínica do abuso ou dependên-
cia de drogas não será jamais estática, porque as pessoas que utilizam
estas substâncias são dinâmicas e movimentam-se traçando caminhos
próprios, muitas vezes indicando-nos, nesses movimentos, as possibili-
dades de construção das redes que necessitam.

194
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
Fonte: Projetado por Aopsan - Freepik.com

Para que a criação de vínculo ocorra de forma satisfatória, um ponto


que merece atenção diz respeito ao uso da linguagem e da forma de
comunicação. Primeiro, é preciso cuidar com os vícios de linguagem
no cotidiano dos serviços. Se o que queremos é ajudar a pessoa a viver
melhor, e não torná-la submissa à nossa proposta, não façamos das
perguntas sobre a doença o centro de nossos encontros. Não come-
çar por perguntas tão “batidas” (Comeu? Não comeu? Tomou o remé-
dio? Etc.) ou infantilizantes (Comportou-se?) é fundamental para abrir
outras possibilidades de diálogo. Outro cuidado também deve ser o da
compreensão da linguagem da equipe com o usuário. Habituar-se a
perguntar como foi entendido o que foi dito ajuda muito. Também é
importante entender sua opinião sobre as causas de sua relação com
as drogas de abuso.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
195
2.1 Auxiliando o assistido a lidar com crises

É comum que o abuso de drogas apareça após um estresse, como


falecimentos, desemprego ou prisão na família. Ao ouvir as associações
causais, a equipe poderá lidar melhor com uma piora em situações si-
milares, ajudando a pessoa a ampliar sua capacidade de superar a crise.
Assim como seus agravos clínicos, que se modificam e se alteram
muitas vezes muito rapidamente, impondo a necessidade de alteração
na estratégia clínica anteriormente traçada, também os frágeis ou mes-
mos bruscos movimentos do assitido podem auxiliar no desenho da
rede que melhor poderá acolhê-los e vinculá-los, construindo por vezes
saídas singulares para a vida e seus possíveis novos movimentos.
É importante, nesses casos, que a equipe tenha uma boa capacidade
de escuta e diálogo, já que parte do cuidado ou da melhora depende da
pessoa aprender novas formas (menos danosas) de lidar com as situ-
ações estressantes/agressivas. A ideia de que todo sofrimento requer
uma medicação é extremamente difundida, mas não deve seduzir uma
equipe de saúde que aposte na capacidade de cada pessoa experimen-
tar a lidar com os revezes da vida de forma mais produtiva. Isso não
quer dizer que não se deva medicar as pessoas que realmente necessi-
tam desta intervenção.
A vida é mais ampla do que os meios que vamos encontrando para
que ela se mantenha saudável. O processo de “medicalização da vida”
faz diminuir a autonomia e aumenta a dependência ou a resistência
ao tratamento, ou seja, comprometendo o vínculo, fazendo, de uma
interminável sucessão de consultas, exames e procedimentos, o centro
da vida.

PARA REFLETIR A medicação deve ser encarada como se


fosse um pedido de tempo numa partida
esportiva: permite uma respirada e uma
reflexão para continuar o jogo. Mas o es-
sencial é o jogo e não sua interrupção.

Alguns estudos apontam que equipes de campo e outros profissio-


nais de trabalho terapêutico ou social buscam estabelecer vínculos com
pessoas que estabelecem relação prejudicial com as drogas de abu-
so que ainda não estão em tratamento, com o objetivo de motivá-las

196
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
a iniciarem tratamento. Essas intervenções comportamentais podem
conter certo grau de persuasão que ajuda as pessoas a mudarem seu
comportamento antes que elas tenham alcançado motivação suficiente
para reduzir ou cessar o uso de drogas (UNODOC).
A disponibilidade de ações de tratamento e cuidados eficazes, aces-
síveis e humanizados que atendam às necessidades clínicas e sociais
variadas de pessoas com transtornos por uso de drogas na comuni-
dade irá facilitar a adoção voluntária de tratamento, além de prevenir
crimes relacionados com as drogas.
Dentro deste cenário, vejo como importante destacar a necessidade
de potencializar a formação e as atualizações dos profissionais que
trabalham em todos os pontos dessa rede, pois o encontrado é o aper-
feiçoamento da assistência, que se dá apenas pela prática, no cotidiano
compartilhado do trabalho e do cuidado, pela participação responsá-
vel dos diversos profissionais e usuários comprometidos na construção
desse cuidado, e pela contribuição das atividades de pesquisa e avalia-
ção permanente sobre a produção de cuidado em curso nessa rede.
Encerrando a aula, entendo que seja necessário, após tudo que foi
dito e dialogado, que oferecer serviços com uma vasta gama de trata-
mentos humanizados e programas de apoio com base em evidências
científicas de efetividade, aumentando a motivação e o empoderamen-
to dos usuários, promovendo vínculos com o terapeuta, a família e a
comunidade, pode ser a melhor maneira de transformar essa rede de
atenção psicossocial em oportunidades para a coesão e recuperação
efetiva baseada em ambientes comunitários (UNODC).

Resumo

Nesta aula tratamos sobre o vínculo e afetos estabelecidos entre os


profissionais e as pessoas que abusam das SPA, incluindo o processo
de estabelecimento de confiança compromisso e respeito nesta rela-
ção, bem como as implicações do vínculo na trajetória do cuidado. Na
aula seguinte iremos abordar a assistência ao usuário de drogas porta-
dor de HIV/AISDS/HV.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
197
AULA 06: ASSISTÊNCIA AO USUÁRIO DE DROGAS PORTADOR
DO HIV/AIDS/HV

Atender pessoas com diagnóstico de HIV, hepatites e outras ISTs,


que apresentam relação prejudicial com o álcool e outras drogas é uma
questão complexa e de difícil manejo/abordagem nos diversos pontos
da rede de atenção psicossocial (RAPS). Requer, portanto, a abordagem
de uma equipe multiprofissional, que atue na perspectiva da atenção
psicossocial, exercendo um cuidado articulado, ou seja, interdiscipli-
nar e em rede. Tratar deste tema na nossa última aula será como uma
revisão de todos os conteúdos expostos até o momento para estudo,
acrescentando o debate e a reflexão. Vejamos, a seguir todos os aspec-
tos envolvidos nessa questão.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
199
1. Vulnerabilidade

Vulnerabilidade é o conjunto de fatores que pode aumentar os ris-


cos aos quais estamos expostos em todas as situações de nossa vida.

As pessoas que fazem abuso das SPAs se encontram numa situação


de grande vulnerabilidade pelo aumento do risco em se contaminar
pelo vírus do HIV ou transmiti-lo para seus pares. Em outras palavras,
as pessoas com relação prejudicial com o álcool e outras drogas são
descritas, de modo geral, como uma população sob risco ampliado com
relação a diferentes agravos de natureza infecciosa em associação com
seus diferentes padrões e hábitos de consumo de substâncias, e de
suas respectivas vias de autoadministração das diferentes drogas, além
dos contextos adversos em que estão habitualmente inseridas.
No cenário de abuso das drogas, é importante notar a frequência ele-
vada do relato de sexo em troca de dinheiro/droga. Portanto, o sexo co-
mercial é uma fonte relevante de renda nessa população, com diferenças
marcadas por gênero, que chegam a atribuir à prática de sexo comercial,
o financiamento integral do hábito de consumo de SPA entre as mulhe-
res. Essas considerações estão associadas a situações de vulnerabilidade
social de pessoas usuárias de crack ou similares em cenas de uso.
Nesse contexto, em função da complexa interrelação entre esses fa-
tores, podemos verificar taxas mais elevadas de infecção do que aque-
las observadas na população em relação a vias de transmissão e for-
mas de contágio

200
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
Quadro 3.6.1 Vias de contágio de patógenos em pessoas usuárias de crack e
similares em cena de uso.

Vias de Transmissão Formas de contágio

Patógenos de transmissão sanguínea Quando existir uso compartilhado ( de


forma direta ou indireta) de drogas autoad-
ministradas pela via injetável;

Patógenos de transmissão sexual Em função de uma frequência relevante de


comportamentos de risco e prática do sexo
desprotegido;

Patógenos de veiculação hídrica Nos casos em que a substância a ser injeta-


da for diluída em água contaminada;

Patógenos de transmissão interpessoal A depender dos contextos em que se con-


que não exigem contato íntimo gregam t ais usuários (cenas d e uso), da
maior ou m enor aglomeração d e pessoas
infectadas nesses l ocais e das condições
mais o u menos salubres e m que estão
inseridos.

Fonte: Pesquisa nacional sobre Crack e similares / Adaptação – Fonseca 2018.

De acordo com a tabela, observa-se que o abuso de SPA tem uma


aproximação importante com os diversos patógenos, além de abrir
possibilidades de infecções de diversas ordens nessas pessoas. Um
exemplo dessa situação é o caso Olavo – abordado na segunda aula
deste módulo. Este caso ilustra bem a forma como a RD precisa atuar
nesse contexto, e nos faz refletir sobre as estratégias de cuidado, inter-
venções possíveis, cuidado em rede, limites dessa rede, possibilidades
e potencialidades das diversas formas de cuidar.
Outro tema a ser discutido nesse cenário diz respeito às comorbida-
des psiquiátricas. Pensando nas diversas implicações na saúde mental
das pessoas que abusam do álcool e de outras drogas, diversas pesqui-
sas buscam elucidar a associação entre uso abusivo de substância e/ou
dependência química à doenças psiquiátricas (depressão, ansiedade,
transtornos de personalidade, fobia social, transtornos psicótico, entre
outros). Essa associação precisa ser considerada sob diversos aspec-
tos, mas considerando o tema central dessa aula, essas comorbidades

MINISTÉRIO DA SAÚDE
201
podem aumentar os riscos de exposição das ISTs, AIDS/HIV e hepatites
virais, pois certos aspectos dos transtornos mentais (comorbidades)
podem contribuir para o desenvolvimento de comportamentos de ris-
co, como:

•• A dificuldade em estabelecer uniões estáveis;


•• Encontrar-se social e economicamente em desvantagem;
•• Ser vítima de abuso sexual;
•• Estar com o juízo crítico prejudicado, principalmente nas crises psicóticas;
•• Impulsividade;
•• Baixa autoestima.

Vale lembra-lo, que algumas situações


de risco não são únicas apenas para
pessoas com algum transtorno mental,
mas podem ser vivenciadas mais fre-
quentemente por elas.

Além disso, considerando a perspectiva biológica, as pessoas que


fazem uso abusivo do álcool e de outras drogas, somado a situações
de vulnerabilidade social, estão muitas vezes com sua imunidade com-
prometida, em função de diversos fatores, que podem ou não estar
associados com o abuso das substâncias. Entre os diversos fatores de
vulnerabilidade, destacamos: condições inadequadas de moradia, má
nutrição, vínculos comprometidos em programas de rastreamento de
infecções, doenças graves (como câncer cervical, associado à infecção
pelo papilomavírus humano, e infecção crônica pelos vírus das hepa-
tites B e C) e vacinação atrasada ou não realizada, estando as pessoas,
por esse motivo, mais suscetíveis às infecções e doenças transmissí-
veis de forma geral.
Com relação às hepatites virais transmitidas por via parental
e sexual, como o vírus hepatite B (HBV) e o vírus hepatite C (HCV),
também há taxas mais elevadas de infecção na população usuária de
drogas. Além dos comportamentos de risco associados à transmissão
de ISTs, o compartilhamento de aparatos para uso de drogas não
injetáveis (como o canudo para uso da cocaína, ou o cachimbo para
uso do crack), está associado à infecção por HBV e HCV, ainda que
a eficiência desses modos de transmissão continue a ser objeto de
debate na literatura internacional.

202
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
A assistência das pessoas que abusam de
drogas com o diagnóstico das ISTs, AIDS/
HIV e hepatites virais, deve ocorrer na ló-
gica da redução de danos. Para mais infor-
mação, clique aqui.

2. Situações de risco relacionadas às ISTs, AIDS/HIV e


hepatites virais

Para abordar esse tema, vejamos a seguir os resultados da Pesquisa


Nacional Sobre Crack no Brasil (2014), realizada pela Fiocruz, por
encomenda da Secretaria Nacional Sobre Drogas (SENAD), para que
sirva de reflexão a partir do cenário apresentado, não perdendo de
vista a assistência do usuário de drogas vivendo com ISTs, Aids/HIV e
hepatites virais.
A pesquisa em questão traz vários apontamentos importantes. Um
deles demonstra que viver em situação de rua constitui um fator agra-
vante, por vezes, determinante, no que diz respeito ao risco de contrair
doenças infecciosas transmissíveis, uma vez que a literatura aponta a
população em situação de rua como mais vulnerável a diferentes agen-
tes transmissíveis.
Outra descoberta é preocupante e diz respeito à variável comparti-
lhamento de “apetrechos” para utilização do crack e similares, pois 71,01%
dos usuários disseram fazer uso compartilhado destes objetos nos 30
dias anteriores à pesquisa. E, acrescentando o dado de que mais da
metade da população de estudo informou já ter colocado piercing e/ou
feito tatuagem, surgem questionamentos tais como: em que situações
o compartilhamento de apetrechos e as intervenções estéticas na pele
foram feitas?
O uso de drogas injetáveis, que serve de base para introdução das
estratégias de redução de danos no roteiro internacional, também apa-
receu na pesquisa. Sua utilização na vida foi referida por 9,21% dos
usuários, dos quais 29,23% afirmaram ter compartilhado aparatos para
uso injetável, como seringas e/ou agulhas.
O uso inconsistente de preservativo, quando da prática do sexo
oral e anal, também foi bastante elevado com proporções de 79,05% e
62,00%, respectivamente, de não uso do preservativo em alguma des-
sas relações sexuais. A maior parte dos usuários que fizeram sexo vagi-
nal nos 30 dias anteriores à entrevista não utilizaram preservativo em
pelo menos uma dessas relações. Uma pequena proporção, 5,50% dos

MINISTÉRIO DA SAÚDE
203
usuários, informou já ter realizado sexo com parceiro (a) sabidamente
portador de HIV no último ano. Embora pequena, esta proporção é pre-
ocupante devido ao alto risco a que estavam expostos.
Entretanto, a despeito do risco ampliado de contrair o HIV, mais da
metade dos usuários de crack e/ou similares 53,87% nunca havia sido
testada para o HIV. Apenas uma pequena proporção dos usuários,
6,13%, informou já ter ouvido de um profissional de saúde que era por-
tador do vírus de hepatite ou que estava doente em função de alguma
hepatite viral.
É importante ressaltar que não somente estas situações de vulne-
rabilidade social (como, por exemplo, morar na rua), determina o que
foi levantado na pesquisa. As evidencias científicas são robustas com
relação às ISTs, AIDS/HIV e hepatites virais, pois esses agravos podem
atingir pessoas de diferentes classes sociais, etnias e níveis culturais.
Mesmo com o desenvolvimento de novos métodos diagnósticos e no-
vas terapêuticas, as infecções sexualmente transmissíveis (IST) continu-
am um grave problema de saúde coletiva, com grande impacto socioe-
conômico e psicológico em todo o mundo.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que ocorram mais de
340 milhões de novos casos de IST curáveis (bacterianas e protozoárias)
anualmente, no mundo, acometendo homens e mulheres entre 15 e 49
anos de idade, sendo que quase 80% desses casos ocorrem nos países
em desenvolvimento. No Brasil, a incidência anual estimada das IST é
de 10 a 12 milhões de casos. Além disso, estima-se que uma proporção
significativa de casos de IST não curáveis, tais como a herpes genital,
o papilomavírus humano (HPV), a hepatite B e o HIV, também ocorra
anualmente.

3. Orientações para a realização da testagem das ISTs, AIDS/


HIV e hepatites virais

Vamos, agora, analisar uma prática orientada nos serviços de saúde.


Neste caso, destacamos o CAPS AD ou qualquer ponto de atenção
psicossocial que realiza testes para ISTs, AIDS/HIV e hepatites virais.
Levando em consideração tudo que foi dito sobre as vulnerabilidades
a que estão sujeitas as pessoas com relação prejudicial com as drogas
de abuso. A oferta de testagem deve ser sempre acompanhada
pelo fornecimento de orientações, momento em que as pessoas
são informadas sobre o processo de realização de testagem e seus

204
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
significados, de acordo com as suas necessidades e o contexto
apresentado, com o cuidado de que essa oferta não torne o processo
prescritivo, burocrático ou rígido.

Testes Rápidos

Os testes rápidos (TR) são ensaios de execução simples e que não ne-
cessitam de estrutura laboratorial, embora, a depender da amostra tra-
balhada, sejam necessários cuidados essenciais de biossegurança. Por
isso, os TR são fundamentais para a ampliação do acesso ao diagnóstico,
sendo recomendados primariamente para testagens presenciais.

Fonte: Hoje em Dia

MINISTÉRIO DA SAÚDE
205
Quadro 3.6.3 Orientações pré e pós-teste

206
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
MINISTÉRIO DA SAÚDE
207
Fonte: DIAHV/SVS/MS.

208
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
Vale lembrar a importância dos cuidados
que devem ser observados, com o resul-
tado em mãos: o sigilo, o acolhimento dos
sentimentos despertados pelo resultado
informado (angústias, medos, dúvidas e outros) e orientações sobre prevenção, além do en-
caminhamento e vinculação aos serviços de saúde de referência para o seguimento. A co-
municação do resultado deve ser objetiva e clara, mas sem perder a capacidade de acolher e
escutar. Vale lembrar que esse é um momento importante para o fortalecimento do vínculo,
da adesão à prevenção, e, em caso de resultado reagente, da adesão ao tratamento também.

4. Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDT), na


perspectiva do Cuidado

Entendendo a relevância da assistência às pessoas com relação


prejudicial com o álcool e outras drogas, associado as IST’s, HIV/AIDS
e/ou às hepatites virais, falar sobre os Protocolos Clínicos e Diretrizes
Terapêuticas (PCDT) torna-se imperativo na assistência prestada a es-
sas pessoas.
PCDT são documentos que visam garantir o melhor cuidado de
saúde possível diante do contexto brasileiro e dos recursos dispo-
níveis no Sistema Único de Saúde (SUS). Podem ser utilizados como
material educativo dirigido a profissionais de saúde, como auxílio
administrativo aos gestores, como parâmetro de boas práticas assis-
tenciais perante o Poder Judiciário e como documento de garantia de
direitos aos usuários do SUS.
Além disso, esses documentos estabelecem os critérios para o diag-
nóstico de uma doença ou agravo à saúde, orientam o tratamento
preconizado incluindo os medicamentos e demais tecnologias apro-
priadas, indicam as posologias recomendadas, apontam os cuidados
com a segurança dos doentes, os mecanismos de controle clínico e o
acompanhamento e a verificação dos resultados terapêuticos a serem
buscados pelos profissionais de saúde e gestores do SUS.
Nesse sentido, os medicamentos e demais tecnologias recomenda-
das nos PCDT se relacionam às diferentes fases evolutivas da doença
ou do agravo à saúde a que se aplicam, bem como incluem as tecnolo-
gias indicadas quando houver perda de eficácia, contraindicação, sur-
gimento de intolerância ou reação adversa relevante, provocadas pelo
medicamento, produto ou procedimento de primeira escolha.
Dentro desse contexto de segurança clínica, chama-nos a atenção

MINISTÉRIO DA SAÚDE
209
o fato de que a nova legislação estabeleceu que a elaboração e
atualização dos PCDT será baseada em evidencias cientificas, o
que significa dizer que levará em consideração os critérios de eficácia,
segurança, efetividade e custo-efetividade das intervenções em saúde
recomendadas. Para tanto, a constituição ou alteração dos PCDT foi
instituída pela Portaria GM n° 2009 de 2012, ficando a cargo de uma
Subcomissão Técnica de Avaliação (CONITEC).

Consulte: Protocolo Clínico e Diretrizes


Terapêuticas para Manejo da Infecção
pelo HIV em Adultos, disponível aqui.

Diante do exposto é importante destacar para você algumas ações e


cuidados referentes aos PCDT das ISTs e das hepatites virais, a seguir.

Acompanhamento Clínico

Entendendo o quão importante é uma abordagem que atue na pers-


pectiva da integralidade do cuidado, vejamos algumas formas de inter-
venção, iniciando pelas hepatites virais. A hepatite C é uma doença que
exige a atenção da pessoa e a compreensão do profissional de saúde,
com a rápida identificação de situações que interfiram, de forma signi-
ficativa, no sucesso do acompanhamento e da adesão ao tratamento.
Assim, é fundamental que o profissional de saúde estabeleça uma sóli-
da relação (vínculo) com cada pessoa a ser cuidada.
Além de pesquisar as comorbidades e coinfecções pelo vírus da he-
patite B (HBV) e HIV, é necessária uma cuidadosa avaliação pré-trata-
mento das condições clínicas, psiquiátricas e sociais de cada pessoa.
Além disso, cabe o rastreamento de todas as ISTs. Desta forma, é im-
portante o correto controle de todas as comorbidades, particularmente
as relacionadas à síndrome metabólica, pois o uso de medicações po-
tencialmente hepatotóxicas deve ser evitado.
Outro aspecto a ponderar, é em relação ao uso de álcool e outras
drogas. Nesse caso, recomenda-se a avaliação em conjunto com a pes-
soa e, se preciso, utilizar estratégias de matriciamento de serviços espe-
cializados em saúde mental, álcool e outras drogas, sobre o tipo de uso
(eventual, recreativo ou dependente), o tipo de droga e o tipo de via de
administração (inalada, ingerida, fumada ou injetada).

210
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
Todas as pessoas com hepatite C devem ser imunizadas contra as
hepatites A e B, e, se apresentarem cirrose, devem ser imunizados con-
tra influenza e pneumococo, além de serem orientadas a não doar san-
gue, sêmen ou tecidos. Nesse sentido, as orientações de prevenção às
hepatites virais devem ser compartilhadas com os contatos domicilia-
res e parceiros (as) sexuais. Desta forma, a prevenção requer atitudes
e práticas mais seguras, como o uso adequado do preservativo e o não
compartilhamento de instrumentos perfurocortantes e objetos de hi-
giene pessoal, como escovas de dente, alicates de unha e lâminas de
barbear ou depilar. Essas orientações devem permear todos os mo-
mentos do atendimento, sobretudo, por não existir uma vacina contra
o vírus da hepatite C (HCV).
Trazendo sua atenção para a hepatite B, o objetivo principal do tra-
tamento é reduzir o risco de progressão da doença hepática e de seus
desfechos primários, especificamente a cirrose. Os cuidados e orienta-
ções iniciais vão ao encontro das orientações para a hepatite C, no que
tange orientações de prevenção, vínculo ao tratamento, pesquisas de
comorbidades e coinfecções.
Cabe destacar que, devido às características fisiopatológicas da in-
fecção crônica pelo vírus da hepatite B (HBV), é necessário que as con-
sultas sejam realizadas, no mínimo, duas a quatro vezes ao ano. Essa
periodicidade deve ser individualizada para as pessoas em que a tera-
pêutica tenha sido recém-iniciada ou em que o risco de eventos adver-
sos exija cuidado prioritário.
Para ampliar a proposta de cuidado, facilitar o monitoramento das
pessoas com hepatite B crônica e auxiliar no melhor uso dos recursos
técnicos e financeiros, o Departamento de Vigilância, Prevenção e Con-
trole das Infecções Sexualmente Transmissíveis, do HIV/Aids e das He-
patites Virais (DIAHV), com o apoio do Comitê Técnico Assessor (CTA),
recomenda exames complementares conforme listados no PCDT para
HBV. Contudo, salienta-se que exames adicionais ou modificações na
rotina de exames poderão ocorrer conforme a presença de comorbida-
des e a consequente instituição ou não de tratamento antiviral.
Finalizando as intervenções e cuidados no tocante às hepatites vi-
rais, chamo sua atenção, neste momento para as ISTs. o PCDT evidencia
que muitas pessoas com IST não buscam tratamento porque são assin-
tomáticas (maioria) ou têm sinais e sintomas leves e não percebem as
alterações. Por outro lado, as pessoas sintomáticas podem preferir tra-
tar-se por conta própria ou procurar tratamento em farmácias ou junto
a curandeiros tradicionais. Mesmo aqueles que buscam atendimento

MINISTÉRIO DA SAÚDE
211
na unidade de saúde podem não ter uma IST diagnosticada ou tratada
corretamente. No final, apenas uma pequena proporção de pessoas
com IST pode chegar à cura e evitar a transmissão.
Todas as intervenções devem ser acompanhadas da promoção da
busca adequada aos serviços de saúde. Os demais passos estão ligados
ao acesso a serviços de qualidade, envolvendo infraestrutura, equipa-
mentos, insumos, recursos financeiros e humanos e educação perma-
nente. Esses serviços devem ter condições mínimas de atendimento,
além de estarem inseridos em uma rede de atenção que possibilite o
encaminhamento para níveis mais complexos, quando necessário.

Outros cuidados relevantes

O cuidado ofertado deve considerar uma anamnese precisa, a iden-


tificação das diferentes vulnerabilidades e o exame físico, que deve
ser constituído de importantes elementos diagnósticos das IST. Os pro-
fissionais de saúde necessitam conhecer a anatomia e a fisiologia do
trato masculino e feminino. Durante o exame físico procede-se, quan-
do indicado, à coleta de material biológico para exame laboratorial.
Sempre que disponíveis, devem ser realizados exames para triagem de
gonorreia, clamídia, sífilis, HIV e hepatites B e C, precedidos de uma
abordagem profissional adequada. A notificação compulsória dessas
infecções deve fazer parte da atenção às pessoas com IST.
É importante que as amostras para os exames laboratoriais indi-
cados sejam colhidas no momento da primeira consulta, e, caso os
resultados não estejam disponíveis imediatamente, a conduta terapêu-
tica não deve ser postergada até a entrega destes. A consulta clínica
se completa com a prescrição e orientação para tratamento, além do
estabelecimento de estratégia para seguimento e atenção às parcerias
sexuais e o acesso aos insumos de prevenção, como parte da rotina de
atendimento.

5. Atenção e cuidado no caso de HIV

Finalizando esta aula, vejamos a seguir algumas considerações para


melhor compreender o processo de cuidado, vínculo, retenção e adesão
ao tratamento do HIV. Esse processo passa pelos seguintes momentos:

212
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
1. Diagnóstico oportuno;
2. Vinculação da pessoa HIV positivo a um serviço de saúde;
3. Sua retenção no seguimento, por meio do acompanhamento e realização
de exames periódicos;
4. Início da Terapia Antirretroviral (TARV) e sua promoção para uma boa ade-
são ao tratamento, a fim de alcançar os objetivos finais do cuidado;
5. A supressão da carga viral e o alcance de uma qualidade de vida compará-
vel à das pessoas que não possuem o HIV.

Esses cinco momentos são representados como uma sequência de


degraus na chamada “Cascata de cuidado contínuo do HIV”, e têm
sido usados globalmente para estabelecer metas e monitorar os avan-
ços relativos ao cuidado das pessoas que vivem com HIV (PVHIV). É
percebido que coexistem diversos conceitos de “adesão” na literatura
científica, mas considerar a singularidade de cada pessoa - como ela se
identifica vivendo com o HIV, como é a expressão do sofrimento frente
ao diagnóstico - e acolher seus medos, angústias e dúvidas parecerem
ser elementos consistentes no processo de “adesão” ao tratamento do
HIV. No que diz respeito ao cuidado clínico e à atuação nos serviços
brasileiros, definem-se os momentos de “vinculação”, “retenção” e “ade-
são” da seguinte forma:

Vinculação: é o processo que consiste no acolhimento, orientação,


direcionamento e encaminhamento de uma pessoa recém-diagnosti-
cada com HIV ao serviço de saúde para que ela realize as primeiras
consultas e exames o mais brevemente possível e desenvolva autono-
mia para o cuidado contínuo. O desfecho principal para considerar uma
PVHIV vinculada é a realização da 1ª consulta no serviço de atenção
para o qual foi encaminhada e, de preferência, seu início de tratamento
o mais rápido possível.
Retenção: é o processo que consiste no acompanhamento clínico
regular e contínuo da pessoa que vive com HIV já vinculada ao serviço
de saúde, garantindo que ela compareça às consultas, faça exames re-
gularmente e, se estiver em terapia, realize também o seguimento do
seu tratamento, respeitando a sua autonomia. Um paciente retido no
serviço é aquele que realiza exames e/ou retira os medicamentos antir-
retrovirais sistematicamente, sem faltar às consultas.
Adesão ao tratamento: consiste na utilização ideal dos medicamen-
tos ARV da forma mais próxima possível àquela prescrita pela equipe

MINISTÉRIO DA SAÚDE
213
de saúde, respeitando as doses, horários e outras indicações. A adesão
também é um processo colaborativo que facilita a aceitação e a integra-
ção de determinado esquema terapêutico no cotidiano das pessoas em
tratamento, pressupondo sua participação nas decisões sobre a terapia.

Consulte o Manual Técnico de Elabora-


ção da Cascata de Cuidado Contínuo do
HIV (2017)

Cuidado Contínuo: vinculação, reten-


ção, adesão e revinculação das pessoas
vivendo com HIV (2017)

Considera-se como adesão suficiente a tomada de medicamentos


com uma frequência de, pelo menos, 80% para alcançar a supressão
viral e sua manutenção. Ressalta-se que a má adesão é uma das princi-
pais causas de falha terapêutica.
Um dos métodos mais utilizados para estimar a adesão ao tratamen-
to na prática clínica é o autorrelato da pessoa que vive com o HIV. Suge-
re-se que um dos integrantes da equipe de saúde monte com o usuário
um breve plano de adesão para que a pessoa possa compreender e
seguir a utilização rotineira do tratamento.

Algumas abordagens discursivas podem facilitar a adesão, tais como:

•• Você terá que tomar “X” comprimidos por dia, todos os dias. Apesar de
parecer fácil, nós sabemos que as pessoas esquecem. Será mais fácil to-
mar seu comprimido se pensarmos agora sobre como você fará no seu
dia-a-dia;
•• Vamos pensar como você fez para tomar medicações em outras situações
na sua vida: quando você teve que tomar remédio, como fez para se lem-
brar de tomá-lo? Qual foi a coisa mais importante que o fez lembrar-se de
tomá-los?
•• Quantas vezes você perdeu doses de medicação nas últimas quatro (duas
ou última) semanas? Por favor, diga quais dificuldades você teve para
tomá-lo.

214
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
Fatores que Facilitam a Adesão:
•• Esquemas terapêuticos simplificados, como doses fixas combinadas, que
permitam o uso de diferentes medicamentos em um mesmo comprimido;
•• Conhecimento e compreensão sobre a enfermidade e o tratamento; aco-
lhimento e escuta ativa de cada pessoa pela equipe multidisciplinar;
•• Vínculo com os profissionais de saúde, a equipe e o serviço de saúde;
•• Capacitação adequada da equipe multidisciplinar;
•• Acesso facilitado aos ARV, mediante o funcionamento e localização ade-
quados da UDM;
•• Eeducação entre pares, em parceria com Organizações da Sociedade Civil
e apoio social.

Fatores que Dificultam a Adesão:

•• Complexidade do esquema terapêutico (diferentes drogas, quantidade de


doses);
•• Faixa etária do paciente (criança, adolescente e idoso);
•• Baixa escolaridade;
•• Não aceitação da soropositividade;
•• Presença de transtornos mentais, como ansiedade e depressão;
•• Efeitos colaterais do medicamento;
•• Relação insatisfatória do usuário com o profissional de saúde e os serviços
prestados;
•• Crenças negativas e informações inadequadas em relação ao tratamento
e à doença;
•• Dificuldade de adequação à rotina diária do tratamento;
•• Abuso de álcool e outras drogas;
•• Dificuldade de acesso ao serviço;
•• Medo de sofrer com a discriminação, precariedade ou ausência de suporte
social/exclusão social.

A partir do exposto, fica evidente a complexidades do processo do


cuidado da pessoa que vive com HIV colocando-se como um desafio
importante para as equipes, sendo que o papel da equipe multipro-
fissional é fundamental no sentido de ajudar essas pessoas em serem
protagonistas no que refere a adesão do tratamento.

MINISTÉRIO DA SAÚDE
215
Resumo

Nesta aula tratamos a respeito da assistência ao usuário de drogas


portador de IST/HIV/AIDS e Hepatites virais, contextualizado as situa-
ções de riscos, expondo as orientações para a realização da testagem
(testes rápidos) e seus desdobramentos, destacando os Protocolos Clí-
nicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) discutidos na perspectiva do cui-
dado. Também ressaltamos a importânica do acompanhamento clíni-
co de forma contextualizada, e apontamos a vulnerabilidade como um
conjunto de fatores que pode aumentar os riscos aos quais as pessoas
estão expostas em todas as situações da vida.
Assim concluímos o nosso último módulo, onde você teve acesso a
informações que lhe permitiram compreender a importância da diversi-
dade das pessoas que usam e/ou abusam das drogas, além de entender
a necessidade de serviços com características diferentes articulados em
rede para atendê-las. Você também pode conhecer melhor as Estraté-
gias de Redução de Danos, sua potencialidade como prática inclusiva e
seus desafios em múltiplos contextos, podendo desenvolver um julga-
mento crítico sobre essas estratégias e como aplicá-las no seu trabalho.

216
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
GLOSSÁRIO  

AA: Alcoólicos anônimos


ACIP: Comitê Consultivo em Práticas de Imunização
AIDS: Síndrome da Imunodeficiência Adquirida
ANVISA: Agência Nacional de Vigilância Sanitária
APS: Atenção Primária à Saúde
ARV: Antiretroviral
CAPS ad: Centro de Atenção Psicossocial para Álcool e Outras Drogas
CAPS i: Centro de Atenção Psicossocial Infanto juvenil
CAPS: Centro de Atenção Psicossocial
CDC: Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos
CONITEC: Subcomissão Técnica de Avaliação
CRAS: Centro de Referência de Assistência Social
CREAS: Centro de Referência Especializado de Assistência Social
CT: Comunidades Terapêuticas
CTA: Centro de Testagem e Aconselhamento
DARE: Drug Abuse Resistance Education
DIAHV: Departamento de Vigilância, Prevenção e Controle das IST, do
HIV/ Aids e das Hepatites Virais
EJA: Educação de Jovens e Adultos
EM: Entrevista Motivacional
ESF: Estratégia Saúde da Família
EUA: Estados Unidos da América
FEBRACT: Federação Brasileira de Comunidades Terapêuticas
FENNOCT: Federação Norte e Nordeste de Comunidades Terapêuticas
FETEB: Federação Evangélica de Comunidades Terapêuticas
Fiocruz: Fundação Oswaldo Cruz
HBV: vírus da hepatite B
HCV: vírus da hepatite C
HIV: vírus da imunodeficiência humana (do inglês human immunodefi-
ciency virus)
HPV: Papilomavírus Humano
HSH:  Homens que fazem Sexo com Homens
HV: Hepatites Virais
IST: Infecções sexualmente transmissíveis
MS: Ministério da Saúde
MSPA: Múltiplas substâncias psicoativas
NA: Narcóticos anônimos
NIDA: National Institute on Drug Abuse

MINISTÉRIO DA SAÚDE
217
OMS: Organização Mundial da Saúde
ONG: Organização não governamental
OSC: Organizações da Sociedade Civil
PCDT: Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas
PEP: Profilaxia pós-exposição
PrEP: Profilaxia Pré-Exposição ao HIV
PRONATEC: Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego
PSE: Programa Saúde na Escola
PVHIV: Pessoa Vivendo com HIV
RAPS: Rede de atenção psicossocial
RAS: Rede de Atenção a Saúde
RD: Redução de Danos
RDC: Resolução da Diretoria Colegiada
SAE: Serviço de Atenção Especializada
SAS: Secretária de Atenção à Saúde
SENAD: Secretária Nacional de Políticas Sobre Drogas
SPA: Substâncias Psicoativas
SUS: Sistema Único de Saúde
SVS: Secretaria de Vigilância em Saúde
TARV: Terapia antirretroviral
TR: Testes rápidos
TTP: Tratamento para Todas as Pessoas
UNODC: Escritório das Nações Unidas Sobre Drogas e Crime

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222
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
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Hepatites Virais. Protocolo clínico e diretrizes terapêuticas para he-
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BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Depar-

MINISTÉRIO DA SAÚDE
223
tamento de Vigilância, Prevenção e Controle das IST, do HIV/Aids e das
Hepatites Virais. Protocolo clínico e diretrizes terapêuticas para he-
patites B e coinfecções.Brasília: Ministério da Saúde, 2018

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de Saúde Mental/ Sexualidade & DST/AIDS: discutindo o subjetivo
de forma objetiva. Rio de Janeiro: Instituto Franco Basaglia/IFB-2002.

224
CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
CURSO DE CAPACITAÇÃO EM REDUÇÃO DE DANOS
PARA PROFISSIONAIS DE SAÚDE DE SANTA CATARINA

Realização

Gerência da Escola de Saúde Pública (GESAP) / Secretaria de Saúde de


Santa Catarina / Ministério da Saúde / SVS

Apoio

Escola Virtual de Administração Pública - DEAP virtual DE.

Coordenação  

Rosilene Brasil Alves (GESAP)

Professores responsáveis pelo conteúdo do curso

Tânia Maris Grigolo (Módulo I): 

Doutora em Psicologia Clínica e Cultura pela Universidade de Brasília


(UnB), Mestre em Sociologia Política (UFSC) e Especialista em Saúde
Mental Coletiva (UFSM). Docente da Faculdade CESUSC, mantida pelo
Complexo de Ensino Superior de Santa Catarina, no Curso de Psicolo-
gia. Coordena o Grupo de Ensino e Pesquisa Sofrimento Psíquico Reco-
very e Cidadania do CESUSC/Cnpq. Participa como pesquisador do Gru-
po de Pesquisa &quot;Clínica da Atenção Psicossocial e Uso de Álcool
e outras Drogas&quot;, coordenado pelo PSICLIN/UFSC. Professora Co-
laboradora do Mestrado Profissional em Saúde Mental e Atenção Psi-
cossocial da UFSC. Psicóloga Clínica do Núcleo de Apoio à Saúde da
Família (NASF) da Secretaria de Saúde de Florianópolis (SC).Tem experi-
ência profissional no campo das políticas públicas de saúde mental, ál-
cool e outras drogas e da clínica da atenção psicossocial. Atua principal-
mente nos seguintes temas: Políticas de Saúde e Saúde Mental, Rede de
Atenção Psicossocial, Clínica da Atenção Psicossocial, Supervisão clíni-
co-institucional de Centros de Atenção Psicossocial - Transtornos Men-
tais e Álcool e outras Drogas, Organização e Avaliação de Serviços da
Rede de Atenção Psicossocial, Educação Permanente e Pesquisa em
Saúde Mental, Álcool e outras Drogas.
Maria Cristina Willemann (Módulo II):

Possui Graduação em Enfermagem pela UFSC (2007), é mestre em Saú-


de Pública (2009) e Doutoranda (2017) pela UFSC em Saúde Coletiva.
É egressa da 10ª turma do Episus (CDC-Atlanta/Ministério da Saúde) e
possui especialização em Avaliação em Saúde (Fiocruz -2014) e Vigilân-
cia em Saúde (Sírio Libanês - 2017). Atua na área de epidemiologia e
saúde pública/coletiva. 

Denilson Rodrigues Fonseca (Módulo III)

Mestre em Ciências da Saúde (UNESC, 2014), especialista em Saúde Men-


tal e Atenção Psicossocial pela Escola de Saúde Pública do Estado de San-
ta Catarina (2011), especialista em Enfermagem Saúde Pública (UFPel,
2008), especialista em Saúde Pública com Ênfase em Serviços (UnC, 2006),
graduado em Enfermagem e Obstetrícia (UFPel, 2003). Atua como docen-
te e Supervisor Clínico Institucional para Rede de Atenção Psicossocial Ál-
cool Outras Drogas. É enfermeiro da Unidade de Atenção Psicossocial do
HE-UFPel/EBSERH e do Centro de Atenção Psicossocial (CAPS III-SC). tutor
do curso de Apoio Matricial com Ênfase no NASF – AB pela Fiocruz e tutor
do Programa Municipal de Educação Permanente em Saúde Mental e
Coletiva da Secretaria Municipal de Saúde de Criciúma SC.

Equipe de Apoio

Coordenação 
Valmira Dubiela -  engeventos@engeventos.com.br

Design Educacional e Revisão


Daniela Maria Ioppi -  danielaioppi@hotmail.com

Design Gráfico
Rogério Garcia da Silva Júnior -  gerogarciajr@gmail.com

Ilustração (Professores)
Rodrigo Macedo Rizzi -  rorizzi.bio@gmail.com

Coordenação do Ambiente Virtual


Lucas Maltempi Monfardine -  lucas@maltempimonfardine.com

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