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POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO


DIRETORIA GERAL DE ENSIO E INSTRUÇÃO
ESCOLA SUPERIOR DE POLÍCIA MILITAR
CURSO DE APERFEIÇOAMENTO DE OFICIAIS QOA/QOE

CONTEXTUALIZANDO OS REGULAMENTOS DISCIPLINARES DA PMERJ:


DA COLÔNIA ÀS NORMAS CONSTITUCIONAIS VIGENTES

CAP PM RG 46.009 MARCIO ERNESTO CABRAL PIRES

NITERÓI
NOVEMBRO - 2011
2

POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO


DIRETORIA GERAL DE ENSIO E INSTRUÇÃO
ESCOLA SUPERIOR DE POLÍCIA MILITAR
CURSO DE APERFEIÇOAMENTO DE OFICIAIS QOA/QOE

CONTEXTUALIZANDO OS REGULAMENTOS DISCIPLINARES DA PMERJ:


DO IMPÉRIO ÀS NORMAS CONSTITUCIONAIS VIGENTES

CAP PM MARCIO ERNESTO CABRAL PIRES

Artigo científico apresentado à Escola Superior


de Polícia Militar para cumprimento de exigência
do Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais do
QOA/QOE

Orientador: Major PM Moisés Pinheiro


Sardemberg

NITERÓI
NOVEMBRO - 2011

RESUMO
3

O presente artigo científico tem por objetivo contextualizar a história evolutiva


das leis e regulamentos adotados desde o período colonial até os dias atuais,
visando nortear a conduta profissional e pessoal dos integrantes dos corpos
militares, os quais são o arcabouço das polícias militares brasileiras, dentre
elas a atual Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro (PMERJ), mostrando
que a legislação sempre foi de encontro aos direitos individuais de seus
integrantes, primando sempre pelo rigor disciplinar, com a previsão de
punições duras que previam castigos físicos e até a pena de morte. Nos dias
atuais os códigos de ética e os regulamentos disciplinares que regem as
polícias militares acompanharam, ainda que timidamente, as novas tendências
sociais e políticas; no entanto, alguns regulamentos disciplinares, novamente,
incluindo-se o da PMERJ, possuem itens em total desacordo com a nova
ordem constitucional vigente, apontando para a necessidade de adequação do
texto regulamentar ao estado democrático de direito que vive atualmente o
país.

Palavras- chave: Norma, Regulamento, História, RDPMERJ, Legislação,


castigos

ABSTRACT
4

This research paper aims to contextualize the evolutionary history of the laws
and regulations adopted since the colonial period to the present day, in order to
guide the professional and personal conduct of members of the military corps,
which are the backbone of the Brazilian military police, among them the current
State Military Police of Rio de Janeiro (PMERJ), showing that the legislation has
always been against the individual rights of its members, always emphasizing
the disciplinary rigor, with the prediction of which provided harsh punishments
and corporal punishment to the penalty death. Nowadays the codes of ethics
and disciplinary rules governing the military police followed, though tentatively,
the new social trends and policies, however, some disciplinary regulations,
again, including that of PMERJ, items are in total disagreement with the new
constitutional order in force, pointing to the need to adapt the regulatory text to
the democratic state of law currently living the country.

Keywords: Rules, regulations, history, RDPMERJ, legislation, punishment

SUMÁRIO

1. RESUMO....................................................................................................3
2. ABSTRACT.................................................................................................4
3. INTRODUÇÃO........................................................................................... 6
4. OS PRIMÓRDIOS DOS REGULAMENTOS DISCIPLINARES NO BRASIL........8

2.1. OS DRACONIANOS “ARTIGOS DE GUERRA”........................................7


5

2.2. UMA TENTATIVA DE “AMENIZAR” OS CASTIGOS FÍSICOS................12

2.3. OS REGULAMENTOS DISCIPLINARES E SUAS PUNIÇÕES


PITORESCAS............................................................................................13

3. CONCLUSÃO................................................................................................18

4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...............................................................22
6

1. INTRODUÇÃO1

As normas e os regulamentos disciplinares no militarismo brasileiro surgiram na


época da colonização do Brasil, período em que foram criadas organizações
militares com o intuito de defender o território. A segurança pública, no período
Colonial, era executada pelos chamados "Quadrilheiros", corpo tradicional,
existente desde a Idade Média, responsável pelo policiamento urbano das
cidades e vilas de Portugal, e que foi estendido ao Brasil colonial. Eles eram
responsáveis pelo policiamento das 75 ruas e alamedas da Cidade do Rio de
Janeiro. Com a chegada da Família Real Portuguesa, ao Rio de Janeiro, no
ano 1808, houve uma explosão populacional na cidade, e tal fato fez com que a
criminalidade atingisse índices altíssimos; Roubos e assassinatos aconteciam
todos os dias, a qualquer hora e lugar; fato este corroborado pelo arquivista
Joaquim dos Santos Marrocos, numa das cartas ao pai, que ficara em Lisboa,
na qual relatava o seguinte: “Nesta Cidade e seus subúrbios temos sidos muito
insultados pelos ladrões. Em cinco dias, contaram-se em pequeno circuito 22
assassinatos, e numa noite defronte à minha porta fez um ladrão duas mortes e
feriu um terceiro gravemente” (GOMES Laurentino, 2007, pág.204 e 205).
Então os quadrilheiros não eram mais suficientes para fazer a proteção da
Corte. Diante do quadro caótico, foi criada em 10 de maio de 1808, a
Intendência Geral de Polícia, com o intuito de “civilizar” a cidade do Rio de
Janeiro, tornando-a mais parecida com uma capital européia. Em 13 de maio
de 1809, é criada a Divisão da Guarda Real da Polícia, embrião da atual Policia
Militar do Estado do Rio de Janeiro, e que era diretamente subordinada à
Intendência Geral de Polícia.

As normas disciplinares que regiam as forças militares no período colonial


brasileiro estavam sob a égide do Código Afonsino1 (meados do século XV),
Código Manuelino2 (início do século XVI) e do Código Filipino3 (início do século
XVII). A partir do século XVIII, no ano de 1762, as forças militares brasileiras
7

passaram a ser regidas pelo Regulamento Disciplinar de Portugal, também


intitulado como “Artigos de Guerra”4, criados pelo inglês Willhelm Schaumburg
– Lippe, também conhecido como “Conde de Lippe”5; Tais Artigos perduraram
no meio militar brasileiro até o ano de 1865, quando foram substituídos pelo
Regulamento Correcional das Transgressões Disciplinares6, instituído pelo Luiz
Alves de Lima e Silva, o Duque de Caxias, em 1862. No século XX, existia a
Polícia Militar do Estado da Guanabara, que era regida por um regulamento
disciplinar instituído pelo Decreto Federal nº 3.274, de 16 de novembro de 1938
e a Polícia Militar do Antigo Estado do Rio de Janeiro, a qual teve seu
regulamento disciplinar instituído através do Decreto nº 3.367, de 30 de abril de
1938.

Com a fusão dos Estados da Guanabara e do Antigo Estado do Rio de Janeiro,


no ano de 1975, foi criada a atual Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro
(PMERJ), que tem como esteio o Regulamento Disciplinar da Polícia Militar do
Estado do Rio de Janeiro (RDPMERJ), instituído em 05 de março de 1983,
através do Decreto nº 6.579; cabendo ressaltar que este decreto foi revogado
em 23 de setembro de 2002, quando entrou em vigor o decreto nº 31.739, que
instituiu um “novo” RDPMERJ; contudo através do Decreto nº 32.667, de 23 de
janeiro de 2003, foram restaurados os efeitos do “velho” RDPMERJ, em vigor
na Corporação até a presente data.

1. Coletânea de leis promulgadas, como primeira compilação oficial do século XV, durante o reinado de Dom Afonso V.

2. Nova codificação que D. Manuel I promulgou, em 1521, para substituir as Ordenações Afonsinas.

3. Compilação jurídica resultou da reforma do código manuelino, como consequência do domínio castelhano, tendo
sido mais tarde confirmada por D. João IV.

4. A primeira legislação penal militar no Brasil, aprovados em 1763.

5. Guilherme de Schaumburg-Lippe (Londres, 9 de Janeiro de 1724 — Wölpinghausen, 10 de Setembro de 1777),


nascido Friedrich Wilhelm Ernst zu Schaumburg-Lippe (Frederico Guilherme Ernesto de Schaumburg-Lippe) e
conhecido em Portugal como Conde de Lippe.

6. Doutrina de Instrução, Emprego, Justiça e de Disciplina.


8

2. OS PRIMÓRDIOS DOS REGULAMENTOS DISCIPLINARES NO


BRASIL
2

Os regulamentos disciplinares militares norteiam o procedimento moral e


profissional dos integrantes das forças militares, e juridicamente tem a função
de codificar as condutas dos militares que venham de encontro aos ditames
que sustentam os pilares da vida castrense: a hierarquia e a disciplina, sem
que tais condutas, que podem ser ações ou omissões venham a configurar
crime militar, este sujeito a legislação própria, no caso do Brasil, inserta e
tipificada no Código Penal Militar; sendo estas denominadas “transgressões
disciplinares”, estando previstas e tipificadas nos diversos regulamentos
disciplinares que regem as Instituições Militares Brasileiras, sendo que na
Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro, as transgressões disciplinares
atualmente são punidas com simples advertência ou 3repreensão, passando
por medidas cerceadoras da liberdade, tais como detenção, prisão, prisão em
separado, chegando a exclusão a bem da disciplina.

Porém nem sempre foi assim, pois nos primórdios da Cidade do Rio de Janeiro,
a segurança da população era feita pelos chamados “Quadrilheiros”, tendo
estes como “regulamentos disciplinares” o prescrito nos livros que compunham
as ordenações Afonsinas, Manuelinas e Filipinas, que previam como “pena” a
ser imposta aos “Quadrilheiros”, o pagamentos de valores em espécie;
conforme pode ser verificado nos textos abaixo transcritos, insertos no Livro nº
I, das Ordenações, respeitando-se a grafia da época:

3. “[...]. E qualquer Quadrilheiro, que em sua quadrilha


consentir andarem as semelhantes pessoas, sem cumprirem o
que aqui hé mandado, incorrerá em pena de trezentos réis para
o Meirinho7, ou Alcaide8. E, além disso, se tal pessoa vadia, ou
estrangeira fizer algum furto ou dano, o Quadrilheiro com os da
sua quadrilha, que consentirem entre si andar a tal pessoa,
pagarão à parte danificada o dano, que receber.

5. “[...] E os Juizes, tanto que os Tabelliães lhes derem o roes


dos culpados, darão perante um Tabellião a cada Quadrilheiro

7. Oficial de justiça da Idade Média.

8. Magistrado, de origem nobre, nomeado pelo rei, que desempenhava funções militares numa cidade ou
vila sede de município.
9
hum rol dos que devem ser presos. E os ditos Quadrilheiros
farão de maneira, que se cada hum dos culpados, que lhes os
Juizes derem em rol andar em sua quadrilha, o prendão,
lançando logo, onde quer que o virem, apellido, dizendo:
“Prendei foão da parte Del-Rei nosso Senhor”: á qual vóz
sairão logo todos os de sua quadrilha, e de quadrilha em
quadrilha o sigão, até ser preso, sob pena daquele
Quadrilheiro, ou quadrilha,por cuja culpa, ou falta o tal
homiziado, deixar de ser preso,pagar á parte danificada o que
lhe pagára o dito homiziado, se fora preso. E além disso o dito
Quadrilheiro que em sua quadrilha deixar andar alguma pessoa
das que lhe foram dadas em rol, incorrerá em pena de
quinhentos réis para o Meirinho, ou alcaide, que o acusar.”

2.1 OS DRACONIANOS “ARTIGOS DE GUERRA

De 1763 à 1865, esteve em vigor no meio militar brasileiro,o Regulamento


Disciplinar de Portugal, também chamado de “Artigos de Guerra”, criado pelo
inglês Wilhelm Shaumburg Lippe,também conhecido como Conde de Lippe.

Os Artigos de Guerra previam a aplicação de castigos físicos, tais como: a


imobilização em troncos de madeira, repreensões verbais e surras com espada
de prancha; castigos estes aplicados àquelas faltas disciplinares de natureza
“leve”; sendo aquelas mais “graves”, enquadradas como crime, julgadas por um
Conselho de Guerra, e se os militares fossem considerados culpados eram
punidos com surras, prisão perpétua com correntes de ferro no tornozelo e a
pena de morte; Para os delitos “menores, capitulados como “leves” eram, na
maioria das vezes aplicados castigos físicos;além do que continha artigos que
demonstravam claramente discriminação entre Oficiais e soldados; conforme
pode ser verificado nos textos abaixo, transcritos de acordo com a grafia da
época:

“Qualquer Soldado, que desamparar a sua guarda sem licença,


será logo prezo, e no outro dia castigado com cinqüenta
pancadas com a espada de prancha”.

“Todo Soldado, que logo que se tocar a rebate, não estiver no


lugar indicado para a Assembleia da sua Companhia, será
prezo, e no outro dia castigado com cinqüenta pancadas de
espada de prancha”. E as culpas leves cometidas por
descuido, ou inadvertência, serão castigadas com vinte, trinta,
ou cinquenta pancadas, dadas com a espada de prancha; ou
metido o Réu em prisão a pão, e agua: ou fazendo-lhe montar
guarda sem lhe competir: ou carregando-o de armas, huma, ou
muitas horas, os quais os castigos leves se darão sem
Conselho de Guerra.
10
“A qualquer Oficial Inferior, negligente em suas revistas,
incapaz de com exatidão dar a parte do ocorrido servirá, e será
pago por tempo de três meses como simples soldado.

Para os chamados delitos “maiores” (crimes militares), entre os quais, o motim,


o homicídio, a traição, tinham como sanção a pena de morte pelas armas, na
forca, outra morte mais severa, e os delitos capitulados como “graves”, eram
punidos com trabalhos forçados por meses, podendo chegar a anos, vejamos:

“Os delitos maiores, e sobre tudo, o motim, o homicídio


premeditado, e a traição, hão de ter pena de morte. O réu
passará pelas armas, será enforcado, ou padecerá morte mais
severa nos casos extraordinariamente atrozes, conforme julgar
o Conselho de Guerra, em conseqüência dos Artigos Militares.
Os delitos graves, que não forem com tudo capitais, se
castigarão mandando-se trabalhar os réus nas fortificações por
meses ou por anos. Estes criminosos trabalharão com grilhão
no pé, e na mão direita, hum rótulo nas costas, que declare o
seu delito. É de boa lembrança, que durante o cumprimento
dos trabalhos, de acordo com o item segundo: - [...] se
conservarão em estreita prisão, e não receberão de pão, e
paga mais que o precisamente necessitaria para sustentar a
vida.

Durante a vigência dos Artigos de Guerra, a severidade dos castigos impostos


aos integrantes das forças policiais eram registrados nos Livros Mestres onde
eram feitas todas as anotações referentes à vida na caserna contendo os
castigos físicos aplicados aos militares, inclusive a aplicação da pena capital,
demonstrando toda a tirania e severidade do Regulamento de Lippe; conforme
atestam os textos abaixo anotados,sendo conservada a grafia da época em
que foram redigidos:4

1. “Veio com passagem da 2ª Companhia do Corpo para esta


(1ª), em 13 de Setembro de 1847, por ser muito relaxado nos
seus uniformes. Foi castigado com 25 pranxadas em 22
d’Outubro de 1847, por desamparar a sentinella, e entrar na
casa do T.e Cor.el d’art.ª a prender um preto, a fim de receber
dinheiro.” (parte firmada no Livro Mestre de Assento de Praças
da 1ª Cia. do CORPO DE GUARDAS MUNICIPAIS
PERMANENTES9.
2. “... Foi castigado com 30 varadas em 1º de Agosto do
mesmo ano (1855), por ser encontrado completamente
embriagado na rua, sendo precizo vir para o Quartel em uma
rede... Foi outra vez castigado com 30 varadas em 16 de

9. Instituição criada pelo Padre Antônio Diogo Feijó, destinada a manter a ordem pública na Cidade
do Rio de Janeiro.
11
Outubro de supradito anno, por abandonar a sentinella do
passeio publico e ir contender com uma negra no boqueirão.”
(Assentamentos do soldado Antônio Leite Martins do CORPO
DE GUARDAS MUNICIPAIS PERMANENTES).

As punições disciplinares acima descritas demonstram o tratamento desumano


e cruel a que eram submetidos os militares no período imperial brasileiro, pois
eram contumazes os castigos físicos aplicados como forma de se manter a
disciplina; e abaixo se descreve a única punição de pena de morte,aplicada em
tempo de paz, de que se tem notícia em toda a história militar brasileira.

3. Sr. Commandante Geral do Corpo Municipaes Permanentes


Remetto a V. M.ce para informar, o requerimento incluso de
Pameria Maria da Conceição, em que péde perdão do castigo
de pranchadas a que está sugeito, pela falta que cometteo, seu
filho João Rodrigues, Soldado da Companhia Addida ao Corpo
do Commando de V. M.ce Deos Guarde a V. M.ce Paço em 1º
de Dezembro de 1841

Snr. Tenente Coronel Commandante Geral do Corpo de


Municipaes Permanentes.

4. ... Foi preso em 3 de abril de 1853 para sentenciar. Por


sentença do Conselho de Guerra, confirmada pelo Conselho
Supremo Militar e de Justiça, em 1º de junho do referido ano,
foi-lhe imposta a pena de morte, por se achar incurso na
segunda parte do artigo 8º dos de guerra, por haver ferido a um
oficial do Corpo quando em serviço no quartel da Ajuda, o
mandou recolher à prisão. Teve baixa do estado efetivo.

“Saídas

Teve baixa do estado efetivo em 3 de agosto de 1853, por


haver sofrido a pena que lhe foi imposta, e cuja execução foi
ordenada em Aviso da Repartição da Justiça de 18 de julho do
mesmo ano.

Ilm.º Sr.- De ordem do Emº Sr. general comandante das


armas,previno a V.S. que hoje se expediu ordem ao brigadeiro
commandante da fortaleza da Praia Vermelha,para em
cumprimento da ordem do governo, receba e conserve com
toda a segurança á disposição de V.S., o soldado do Corpo sob
seu comando Honorio Moreira da Rocha, que sendo
condemnado a passar pelas armas deve aí receber intimação
da sentença e os confortos religiosos, até final execução no
campo fronteiro á dita fortaleza. Deus guarde a V.S. – Quartel
General da Corte, 27 de julho de 1853. Sr. coronel Polidoro da
Fonseca Quintanilha Jodão, Commandante Geral do Corpo
Municipal Permanente – Agostinho Maria Piquet.”
12

2.2 UMA TENTATIVA DE “AMENIZAR” OS CASTIGOS FÍSICOS

Os Artigos de Guerra, implementados em 1763, pelo Conde de Lippe, vigeram


no meio militar brasileiro até o ano de1862, quando Luiz Alves de Lima e Silva,
o Duque de Caxias, promoveu uma “atenuação” na aplicação dos castigos
impostos, com a criação do Regulamento Correcional das Transgressões
Disciplinares, por não poder se abolir o Regulamento de Lippe, o qual vigorou
integralmente até o Brasil se tornar um país independente, Duque de Caxias,
determinou ao Arsenal de Guerra que fossem fabricadas espadas especiais;
conforme o modelo idealizado pelo próprio Caxias, justificando tal medida com
o texto abaixo:

“Por mais apropriadas e menos prejudiciais à saúde do


paciente, para ao menos atenuar suas conseqüências, tanto
quando possíveis sem torná-lo ilusório, até que outras
disposições substituam os regulamentos que os
estabeleceram.

Os artigos de Guerra de Lippe, só foram totalmente revogados da vida


castrense brasileira, no ano de 1891,quando entrou em vigor o Código Penal
da Armada, sem que fossem deixados de serem aplicados totalmente os
castigos físicos, visto que o Código ainda previa que as praças que
praticassem quaisquer atos ou omissões que caracterizassem transgressões
disciplinares, eram punidas com o “tronco”, e assim prescrevia o Código Penal
da Armada10:

Para as faltas leves, prisão a ferro na solitária, por um a cinco


dias, a pão e água; faltas leves repetidas, idem, por seis dias,
no mínimo; faltas graves, vinte e cinco chibatadas no mínimo.”

10. Primeiro Código Penal Militar Brasileiro, instituído em 1891.


13

2.3 OS REGULAMENTOS DISCIPLINARES E SUAS PUNIÇÕES


PITORESCAS

Necessário citar que mesmo com a tímida evolução do regulamento disciplinar


que regia a vida militar brasileira, ainda eram aplicadas punições por motivos
impensáveis nos dias atuais; conforme pode ser corroborado no teor das
transcrições abaixo, mantida a grafia original:

“Quartel do Commando Geral do Corpo Militar de Polícia da


Corte, Rio de Janeiro, 7 de Junho de 1870.

Ordem do Dia
Nº 66

Nesta data mando soltar o soldado da 3ª Companhia de


Infantaria João de Souza Pacheco que foi preso por ter estado
entre o povo que acompanhava o 2º Bat. da Guarda Nacional,
sem estar de serviço, em contravenção ás ordens
estabelecidas, e mando declarar de novo que é inteiramente
prohibido ás praças deste Corpo andarem no grupo do povo,
não estando de serviço, para que não diga que o Corpo Militar
tem em seu seio capoeiras, e que aquelle que for encontrado
em desreipeito a esta ordem será remetido para a Fortaleza da
Lage, por 8 dias.”

“A vista das informações dos Snrs. Commandantes da 2ª é 3ª


Comp.ª de Cavallaria, nas quaes declarão que não por falta de
praças que se tem deixado de rezar o Terço quando está
d’Estado Maior no Quartel de Estacio de Sá o Snr. Alferes João
Francisco Lucas mais sim pelo pouco caso e nenhuma
importancia que liga o mesmo Snr. Alferes ao cumprimento dos
seus deveres, determino que fique prezo e privado de fazer
serviço no mencionado Quartel a bem da disciplina e
regularidade do serviço.

Assignado – Joaquim Antonio Fernandes d’assumpção


Coronel Com.te Geral

Quartel do Comando – Geral do Corpo Militar de Polícia da


Corte, Rio de Janeiro, em 15 de março de 1883.

Ordem-do-dia

N.º11
14

Tendo chegado ao conhecimento deste comando que o Sr.


Alferes Upiano Fuentes Carqueija, depois de provocar a um
indivíduo com quem tinha rixas, à Rua do Lavradio, no dia 7 do
corrente, em pleno dia,consentira que esse indivíduo o
desfeitiasse, puxando-lhe as orelhas, sem reagir a tão
insultante afronta, e ainda mandou prendê-lo por uma praça do
Corpo, que casualmente passava, conduzindo-o à 10.ª Estação
da Guarda Urbana, onde depois de fazer queixa formal do
ocorrido, em presença de muitas pessoas, desistira do intento
de proceder na forma da lei, pedindo para ficar sem nenhum
efeito a prisão efetuada, dando mais uma prova de fraqueza e
de um critério; lamentando-se o fato provado no Inquérito que
foi mandado proceder, o repreendo asperamente, e determino
que seja preso por 15 dias, levando-se em conta os dias de
prisão já sofrida.

Assinado: Antônio Germano de Andrade Pinto


Tenente-Coronel Comandante - Geral

“Etapas de preços

Dora em diante as praças sentenciadas e para sentenciar não


terão direito, nos dias de festa nacional, aos extraordinários
fornecidos às outras praças, nem nos dias comuns a ração de
sobremesa no jantar. A aguardente só será fornecida àquelas
praças que, sendo presas, estiverem no serviço de faxina.

Sylvestre Rodrigues da Silva Travassos


Cel –Cmt

Os castigos físicos aplicados como punição disciplinar perduraram no ambiente


castrense brasileiro, até o ano de 1874, quando entrou em vigor a Lei nº 2.556,
de 26 de setembro, abolindo a aplicação de castigos corporais, isto no Âmbito
do Exército Brasileiro, e na Armada Brasileira, atualmente Marinha do Brasil, as
penas cruéis e de castigos físicos só findaram no ano de 1910, com a Revolta
da Chibata115

Com o Golpe Militar de 1964, todas as forças policiais foram inseridas numa
única legislação, e seus respectivos comandos ficaram a cargo de Oficiais do
Exército Brasileiro, aquelas forças policiais, ou milícias, passaram a ser
designadas pelo termo “Polícia Militar”, passando as transgressões
disciplinares cometidas pelos policiais militares, a serem punidas com base no
Regulamento Disciplinar do Exército (RDE).

No caso do Rio de Janeiro, até o ano de 1975, existiram duas Polícias Militares,
uma no Antigo Estado do Rio de Janeiro, que tinha como Capital a Cidade de

11. Movimento de militares da Marinha do Brasil, planejado por cerca de dois anos e que culminou com
um motim que se estendeu de 22 até 27 de novembro de 1910 na baía de Guanabara, no Rio de Janeiro,
à época a capital do país, sob a liderança do marinheiro João Cândido Felisberto
15

Niterói, e outra no Estado da Guanabara, capital Cidade do Rio de Janeiro, e


ambas eram regidas por regulamentos disciplinares editados no ano de 1938,
que previam em seus textos as penas de repreensão, prisão de até 30 dias
para Oficiais, Sargentos, Cabos e Soldados; e ainda era prevista a pena de
rebaixamento definitivo, para os Sargentos e Cabos. Em 1975, ocorreu a fusão
entre os estados da Guanabara e do Rio de Janeiro, sendo originado o Estado
do Rio de Janeiro, passando a Força Policial a denominar-se Polícia Militar do
Estado do Rio de Janeiro (PMERJ).

Em 05 de março de 1983, através do Decreto Estadual nº 6.579, entra em vigor


o Regulamento Disciplinar da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro
(RDPMERJ/R-9), que é cópia fiel do Regulamento Disciplinar do Exército
(RDE/R-4), implementado naquela Força Armada em 19 de julho de 1977,
através do Decreto Federal nº 79.985. A única diferença entre estes
regulamentos disciplinares e aqueles dos Períodos Colonial, Imperial, e dos
primórdios republicanos, é a abolição das penas cruéis e desumanas como
punições por transgressões disciplinares.

Houve no ano de 2002, uma tentativa de modernização e humanização do


RDPMERJ, no governo de Benedita da Silva, com a promulgação do Decreto
Estadual nº 31.739, de 28 de agosto, que introduzia na PMERJ, o “novo”
RDPMERJ, que efetivamente só entrou em vigor trinta dias após a
promulgação; trazendo várias inovações tais como: a definição e classificação
do que seriam faltas leves, médias e graves; a prestação do serviço
extraordinário e a suspensão e o fim da detenção e da prisão, e ainda o efeito
suspensivo das punições aplicadas em caso de recurso interposto pelo militar
punido. Porém este “novo” regulamento teve vida curta, uma vez que em 23 de
janeiro 2003, foi promulgado pela então governadora do Estado Rosinha
Garotinho, o Decreto nº 32.667, o qual revogava o “novo” RDPMERJ, e
restabelecia os efeitos do “velho”; então mesmo recepcionado pela
Constituição Federal, promulgada em 05 de outubro de 1988, a chamada
“Constituição Cidadã”, por conter vários avanços nos campos social e político,
com a previsão de direitos individuais e coletivos, até então vedados aos
cidadãos, durante o período em que vigorou o regime militar, o RDPMERJ
contém diversos itens que vão de encontro à Carta Magna, mormente, no
chamado anexo I, onde está a relação de transgressões disciplinares, vejamos
alguns deles:
16

“II – Relação de Transgressões

...4- Freqüentar ou fazer parte de sindicatos ou associações


profissionais com caráter de sindicatos ou similares;

31- Contrair dívidas ou compromisso superior as suas


possibilidades, comprometendo o bom nome da classe;

38- Recorrer ao judiciário sem antes esgotar todos os recursos


administrativos;

42- Portar-se sem compostura em lugar público;

43- Freqüentar lugares incompatíveis com seu nível social, e o


decoro da classe;

67- Usar traje civil o cabo ou Soldado, quando isso contrariar


ordem de autoridade competente;

86- Deixar, quando estiver sentado, de oferecer seu lugar a


superior, ressalvadas as exceções prescritas no Regulamento
de Continências, Honras e Sinais de Respeito das Forças
Armadas;

87- Sentar-se a Praça, em público, à mesa em que tiver Oficial


ou vice-versa, salvo em solenidade, festividades, ou reuniões
sociais;

104- Autorizar, promover ou assinar petições coletivas dirigidas


a quaisquer autoridades;

Aliás, uma das maiores controvérsias relativas aos direitos individuais dos
militares brasileiros, está no cabimento ou não habeas corpus nas
transgressões disciplinares no âmbito castrense; contudo verifica-se que tal
remédio jurídico é vedado aos militares desde a promulgação da primeira
Constituição Brasileira, no ano de 1824 e na em vigor, promulgada em 1988;
conforme se vê abaixo:

1824 - “X. A’ excepção de flagrante delicto, a prisão não póde


ser executada, senão por ordem escripta da Autoridade
legitima. Se esta fôr arbitraria, o Juiz, que a deu, e quem a tiver
requerido serão punidos com as penas, que a Lei determinar.

O que fica disposto acerca da prisão antes de culpa formada,


não comprehende as Ordenanças Militares, estabelecidas
como necessarias á disciplina, e recrutamento do Exercito; nem
os casos, que não são puramente criminaes, e em que a Lei
determina todavia a prisão de alguma pessoa, por desobedecer
aos mandados da justiça, ou não cumprir alguma obrigação
dentro do determinado prazo.”

1988 - “Art. 142.


17
§ 2º - Não caberá "habeas-corpus" em relação a punições
disciplinares militares.

Como se observa, a não concessão de habeas corpus no caso de


transgressões disciplinares militares, já perdura cento e sessenta e quatro
anos, desde a primeira Constituição promulgada em 1824, passando pelas de
1891, 1934, 1937, 1946, 1967 e 1988; então verifica-se que pouca coisa
mudou na vida castrense, pois desde o surgimento dos regulamentos
disciplinares, estes visam tão somente disciplinar a conduta dos militares;
desde o surgimento das instituições militares brasileiras, com a aplicação de
penas cruéis e desumanas; e nos dias de hoje, no caso da Polícia Militar do
Estado do Rio de Janeiro, ainda são mantidas medidas cerceadoras de
liberdade, e supressão de direitos individuais e coletivos, mostrando-se o
regulamento disciplinar da PMERJ estar em total dissonância com o estado
democrático de direito que vige atualmente no Brasil.

Numa tentativa de modernizar, humanizar e adequar o RDPMERJ ao estado


democrático de direito que vigora atualmente no Brasil, o então Comandante
Geral da PMERJ, o CEL PM Mario Sergio de Brito Duarte, determinou no ano
de 2009, que:

As punições disciplinares de detenção e prisão aplicadas por


Comandantes, Chefes e Diretores das OPM, ocorram sem
retenção do Policial Militar, tanto para os serviços quanto para
seu repouso de folga.

Ficava suspensa a aplicação de pena restritiva da liberdade, o que era um


grande avanço dos até então, duzentos e um anos de história da Corporação;
contudo com a mudança do Comando Geral da PMERJ, em 2011, retorna a
aplicação das penas cerceadoras de liberdade, com o encarceramento dos
Policiais Militares, voltava a vigorar então a “velha” legislação disciplinar, com
todas as mazelas incorporadas ao longo da história da Polícia Militar do Estado
do Rio de Janeiro.

3. CONCLUSÃO
18

Ao longo da história que permeia o ambiente das instituições policiais


brasileiras, desde os primórdios da Cidade do Rio de Janeiro, que tem como
predecessores os “quadrilheiros”, e após a chegada da Família Real
Portuguesa, no ano de 1808; diante da explosão demográfica da cidade,
tornou-se necessário “civilizá-la”, sendo então criada a Intendência Geral de
Polícia, e posteriormente a Divisão da Guarda Real de Polícia, arcabouço da
atual da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro (PMERJ). Ao longo dos
mais de dois séculos de história da PMERJ, depreende-se que esta sempre foi
regida por leis e regulamentos que primavam pela severidade, que previam
castigos físicos como as pranchadas, as chibatadas, dentre outros, chegando
até a aplicação da pena capital.

Da simples análise da história das leis e regulamentos que regem a PMERJ,


verifica-se que estes ainda trazem muitas mazelas, estas oriundas dos
períodos Colonial, Imperial, e ditatorial brasileiro, sendo comuns as punições
que vão de encontro ao estado democrático de direito que vige atualmente no
País, bem como regras de comportamento pessoal e profissional
discriminatórias.

A conta de tais fundamentos, exsurge que se faz necessária a elaboração de


um6novo regulamento disciplinar que preserve os princípios basilares da vida
militar: a hierarquia e a disciplina, e contenham mecanismos de correção a
serem aplicadas em desfavor daqueles que descumpram as obrigações
inerentes à vida castrense, seja por ação ou omissão, e venham a acarretar
transtornos e prejuízos para a Corporação e para os cidadãos. Contudo
também é de bom alvitre que a nova legislação não seja apenas mais uma
simples cópia de legislações anteriores, devendo conter a previsão legal do
respeito aos direitos individuais e coletivos dos militares estaduais, não
havendo margem para quaisquer tipos de afronta à Carta Magna, e assim
garantir a tranqüilidade destes servidores que diuturnamente arriscam suas
vidas na defesa dos demais cidadãos do Estado do Rio de Janeiro. Cabe
ressaltar que em 16 de dezembro de 2010, foi publicado no Diário Oficial da
União, o texto da Portaria Interministerial SEDH/MJ nº. 2, de 15 de dezembro
de 2010, a qual estabeleceu as Diretrizes Nacionais de Promoção e Defesa
19

dos Direitos Humanos dos Profissionais de Segurança Pública, e esta em seu


Item 1 , do anexo , assevera que:

“1) Adequar as leis e regulamentos disciplinares que versam


sobre direitos e deveres dos profissionais de segurança pública
à Constituição Federal de 1988.

Como se vê existe a inadiável necessidade da criação de um regulamento


disciplinar mais moderno e humano, devendo os legisladores buscarem
inspiração em todos os códigos, leis, e quaisquer documentos, nos quais sejam
previstas e cumpridas todas as normas que protejam o militar, que também é
cidadão; pois desde os primórdios das sociedades organizadas existe a
preocupação com os direitos dos cidadãos, sendo os direitos individuais
sempre objeto de leis; como podemos ver na Magna Charta Libertatum12,
promulgada pelo Rei Inglês João - sem-terra13, no ano de 1215, já previa que:

Nenhum homem livre será detido ou sujeito à prisão, ou privado


dos seus bens, ou colocado fora da lei, ou exilado, ou de
qualquer modo molestado, e nós não procederemos nem
mandaremos proceder contra ele senão mediante um
julgamento regular pelos seus pares ou de harmonia com a lei
do país.

12. Declaração solene que o Rei João da Inglaterra, dito João Sem-Terra, assinou, em 15 de junho de 1215,
perante o Alto Clero e os Barões do Reino.
213. Documento que limitou o poder dos monarcas da Inglaterra

Apesar de termos a clara compreensão do papel moral da punição para que a


hierarquia e a disciplina sejam preservadas, por serem princípios essenciais
das Corporações Militares; mas tais punições não devem ser motivadas ou
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aplicadas apenas como vingança ou castigo do aparelho estatal, entendemos


também que o RDPMERJ é um instrumento da Administração Pública que tem
ação pedagógica sobre os Policiais Militares do Estado do Rio de Janeiro,
independente de posto ou graduação, contudo, ainda sim, se faz urgente a
confecção de um novo RDPMERJ, que contenha a previsão de formas
alternativas de aplicação das penas previstas para as transgressões
disciplinares, desde as mais leves até aquelas que culminam com o
cerceamento de liberdade dos Militares Estaduais; além do que seja abolido o
caráter subjetivo no julgamento e aplicação das penas, que muitas das vezes
podem permitir o cometimento de injustiças e abuso de autoridade, sem que
isso venha a configurar e muitos menos promover o desvirtuamento ou o
afrouxamento dos princípios basilares que norteiam a vida castrense, muito
pelo contrário tais mudanças se fazem necessárias para que tenhamos um
Policial Militar mais motivado, ciente dos seus direitos e deveres, e não aquele
insatisfeito e oprimido com vemos nos textos abaixo transcritos:

“[Deveria haver] apenas democracia, e não ditadura, para que o


policial tratasse o usuário da mesma forma. (...) Infelizmente,
na Polícia, temos superiores arbitrários, 1inconseqüentes,
ladrões, que só pensam em ferrar os subordinados. Nunca me
arrependi tanto de ser empregado dessa instituição. (...). Na
minha opinião, o regulamento é muito rígido, não deveria existir
a pessoa faltar a um serviço e fica dez ou quinze dias sem ver
seus familiares. Por que não dá serviço extra para o faltoso?
(...) Na minha opinião,isso não passa de um abuso de
superiores. Isso tem que acabar um dia. (...) Não existe o
policial ser excluído só por indisciplina, sem cometer qualquer
crime ou falta grave fora do seu serviço. (...) É um abuso,uma
covardia. (...) Um abuso de autoridade!”.14

Fica claro, ante aos depoimentos acima elencados, e aquele transcrito logo
abaixo que ainda existe um enorme “abismo” entre Oficiais e praças, que
infelizmente sempre esteve presente desde a criação dessa bicentenária
Corporação; contudo o Comando vem adotando medidas saneadoras visando
melhoram a relação interpessoal entre os integrantes da Corporação, sem que
isso signifique a quebra da hierarquia e da disciplina que são os pilares das
Instituições Militares brasileiras.

“O maior problema nas condições de trabalho são os nossos


comandantes. Nós somos punidos com privação de nossa
liberdade, com ofensas humilhações, devido a faltas pequenas,
como estar com o coturno sujo depois da jornada de trabalho,
tirar o chapéu num dia quente, chegar alguns minutos
21
atrasando devido aos constantes congestionamentos no
trânsito ou estar com a barba aparecendo depois de 12 horas
de serviço. Muitas vezes,os nossos comandantes não querem
nem escutar as nossas explicações. Tiram-nos do convívio de
nossos familiares.”15

“Gostaria de ser mais respeitado pelos oficiais da nossa


corporação, pois a tropa está com medo, não da criminalidade,
mas sim das covardias que ocorrem em nosso meio policial.
(...) Os policiais de nosso têm coragem, mas com essa política
de primeiro prender para depois apurar, isso não dá. Temos de
mudar isso, pelo amor de Deus. (...) O regulamento está
arcaico, sem critério algum de punições, superior a tudo, até
mesmo à Constituição Federal ou a qualquer outro tipo de
regulamentação no país. (...) Por isso, considero que é preciso
acabar com o desrespeito total dos superiores [oficiais] às
praças.” 16

Ao final concluímos que se faz urgente e imperiosa a implementação da


equidade e do respeito pessoal e profissional, como valores maiores a serem
promovidos e protegidos na legislação disciplinar que rege a conduta dos
Policiais Militares do Estado do Rio de Janeiro, e assim seguir as tendências da
modernidade, trazendo um modelo mais adequado e humano de justiça
disciplinar a ser aplicada em nossa querida e amada Polícia Militar do Estado
do Rio de Janeiro.

14. MINAYO, Maria Cecília de Souza.. Missão Prevenir e Proteger – Condições de vida, trabalho e saúde dos
policiais militares do Rio de Janeiro.
15. idem.
16. Idem.

4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

NEVES, Bernardo de Souza: História da Polícia Militar do Distrito Federal


desde a época de sua fundação – período de 1920 a 1930 – vol. 3 – Rio de
Janeiro: Departamento de Imprensa Nacional, 1953.
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FABBRI, Ferrúccio; Erque-se e fala o passado da PMERJ – vol. 1 – Rio de


Janeiro: Edição da Irmandade de Nossa Senhora das Dores da PMERJ.
F, Silveira do Prado: A Polícia Militar Fluminense no tempo do Império (1835 -
1889) – Rio de Janeiro: S Ge Ex – Imprensa do Exército, 1969.
HALLOWAY, Thomas H: Polícia no Rio de Janeiro: repressão e resistência
numa cidade do século XIX – tradução de Francisco de Castro Azevedo – Rio
de Janeiro: Editora Fundação Getulio Vargas, 1997.
DA SILVA, Julio Cesar Lopes: O surgimento do Regulamento Disciplinar Militar
no Brasil- www.jurisway.org.br : postado em 15/04/2011 acessado em
03/10/2011, às 19;40h.
JUNIOR, Raimundo Salgado Freire: Origem e Evolução Histórica dos
Regulamentos Disciplinares Militares no Brasil e a Necessidade Inadiável das
Polícias Militares Apresentarem Regulamento Disciplinar –
forumsegurança.org.br: postado em 05/07/2011.Acessado em 03/10/2011, às
20:15h.

DE MELLO, Gustavo Moncorvo Bandeira: História da Polícia Militar do Distrito


Federal desde a época de sua fundação – período de 1809 a 1889 – vol. 1 –
Rio de Janeiro: Imprensa da Polícia Militar, 1925.

GOMES, Laurentino: 1808: Como uma rainha louca, um príncipe medroso e


uma corte corrupta enganaram Napoleão e mudaram a História de Portugal e
do Brasil – São Paulo – Editora Planeta do Brasil, 2007.

MINAYO, Maria Cecília de Souza: Missão Servir e Proteger: Condições de


vida, trabalho e saúde dos policiais militares do Rio de Janeiro – Rio de
Janeiro: Editora Fiocruz, 2008.

Regulamento Disciplinar da Polícia Militar do Estado da Guanabara: RD nº 2

Decreto nº. 31.739 de 28 de agosto de 2002.

Portaria Interministerial SEDH/MJ Nº. 2, de 15 de dezembro de 2010:


Estabelece as Diretrizes Nacionais de Promoção e Defesa dos Direitos
Humanos dos Profissionais de Segurança de Segurança Pública.
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