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e
MARIALICE M. FORÀCCHI
EDUCAÇÃO
E
SOCIEDADE
[L e it u ra s d e so ci ol og ia da ed uc aç ão )
13? edição
COMPANHIA EDITORA NACIONAL
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BIBLIOTECA UNIVERSITÁRIA
Série 2-a — Ciência s Sociai s
Volume 16
Dados de Catalogação na Publicação (CIP) Internacional
(Câmara Br asileira do Livro, SP, Brasil)
Bi bl i ogra f i a.
Direitos reservados
1987
Im presso no Brasil
SUMARIO
PARTE I
A educação como objeto de estudo sociológico
1. Introdução .................................. 31
2. A educação como processo socializador: fun ção hom ogen eizado ra e
função diferenciadora (Émile D ur khei m ) ............................................ 34
3. Condicionamento sociocultural da personalidade (Ralph L inton ) 49
4. Fo rmas do processo educac ional (José Qu erino R ibei r o ) ................ 70
5. A educa ção como processo de con trole social: funçã o conservadora
e função inovadora (Wilbur B. Brookover ) .................................... 80
6. A educa ção como técnica social (Karl Mannheim ) ............................ 88
7. Fun ções das gerações novas (Karl Mannheim ) ................................. 91
PARTE III
O estudo sociológico da escola
1. Introdução ........................................... ......................: ............................. 101
2. A escola como gru po ins titu ído (Florian Znaniecki ) ...................... 104
3. A es tru tu ra da escola (Antonio Cândido ) ............................................. 107
4. O subgrupo de ensino (Karl M annheim e W. A. C. Stewart ) .., 129
5. Os sistemas escolares (Fernando de Azevedo ) ................................... 138
6. Com ponen tes burocráticos dos sist emas escolares (Peter M. B l a u ) 150
PA RTE I V
PARTE V
Educação e estrutura social:
Sociedade de Classes
1. Introdução ..................................................................................................... 251
2. Da sociedade estam ental à sociedade de classes (Oliver Cromwell
Cox) .............................................................................................................. 257
3. Educa ção e classe social (C. Wright M il l s ) ....................................... 268
4. Estru tura social e socialização (Ro bert K. M erton ) ......................... 287
5. A crise da sociedade con tem por âne a (Karl Mannheim ) ................ 321
6. “Planificação democrática’’ e educação (Karl M annheim ) ..................343
PARTE VI
Educação e desenvolvimento
Demais,
ou com nestesnecessárias,
a ênfase últimos nãoaspectos
se discutem, com adopenetração
concretos problema
educacional. Presos a orientações ortodoxas e tradicionais, que
fazem da educação mais uma perspectiva de análise do que
um objeto de investigação, esses manuais não cuidam suficien
temente da dimensão brasileira da questão educativa, focali
zando, de preferência, aspectos sistemáticos muitos gerais. Não
se pode, contudo, menosprezar sua influência formativa que,
no passado, foi considerável, notadamente num país onde os
especialistas
cumpriria ressaltar,
eram improvisados.
sobretudo, o cunho
Comodecontribuição
seriedade que,positiva,
com
base nas posições defendidas nesses trabalhos, se procurou dar
à formação científica do educador.
A persistência dessa orientação e sua flagrante inadequa
ção às transformações da sociedade brasileira fez, todavia,
com que a educação se convertesse num tema sem atrativos,
incapaz de mobilizar criadoramente o interesse do sociólogo
1
INTRODUÇÃO
I
A EDUCAÇÃ O COM O O BJE TO DE ESTUDO SOCI OLÓGI CO 5
SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO
COMO “SOCIOLOGIA ESPECIAL" (*)
Florestan F ernandes
TENDÊNCIAS NO DESENVOLVIMENTO
DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO (*)
Antonio C ândido
Conseqüências do exposto
A análise da escola
Sugestões finais
Não seria possível, nem desejável, reduzir a sociologia edu
cacional a uma sociologia da escola; mas parece conveniente
considerá-la como o seu eixo, no estado atual dos problemas
e dos estudos. A palavra eixo exprime a verdade ao colocar
o estudo da escola entre o estudo da educação como sociali
zação, que o precede, e da sua função social, que o sucede.
Em nossa civilização, o eixo do processo educacional se en
contra de
ponto no seu aspecto podemos
referência, específico,definir
ou escolar. Tomando-o
coricretamente os como
agru
pamentos, papéis, relações, ligados à educação. Posta entre
estudos de psicologia, de um lado, e de pedagogia, de outro,
a análise sociológica da escola aparece como o terreno pro
priamente sociológico. Nesta comunicação foi acentuado o
aspecto interno da estrutura escolar, já porque é menos abor
dado, já porque constitui a base necessária para compreender
a posição e a função da escola na comunidade. Os recentes
trabalhosderealizados
Comitê pela Universidade
Desenvolvimento de Chicago,neste
Humano, representam, pelo sen
seu
tido, um novo passo que não poderia ter sido dado sem uma
compreensão nítida das “situações pedagógicas’’ encaradas so
ciologicamente, a partir do conhecimento da escola como grupo
social complexo (14). Nela é que se vêm refletir os valores e
a estrutura da sociedade na medida em que determinam o
processo educativo; atrás dela é que este se ordena e dá lugar
a determinadas formas de ajuste à vida social.
lita oPraticamente,
educador a ocompreender
conhecimento sociológico
a sua função e,dasobretudo,
escola habi
a
orie ntar convenien temente os problemas pedagógicos. Lembre
(14) Cf. A ugu st B. H ol l ingshe ad , E lm to w ris Y o u th : th ’ Im p a c t of Social
Classes on Adolescents, Jo hn Wiley an d Sons, Nova York , 1949. Lem bremo s o
trabalho de W arner , L o e b e H avic .hurst , Who Shall Be Educated 7, Kegan P aul,
I.ondre s, 1946 — revelando novo e spír ito no estudo das re lações en tre es trut ur a
social e escola, cuja dinâmica interna está sempre presente.
18 EDUCAÇÃO ESOCIEDADE
INTRODUÇÃO
Antonio C ândido
A es co la c o m o g r u p o soc ial :
II
sociabilidade
que nos levoudoa educa ndonosconforme
incluir o nível
seminários de idade.
do curso o livroFoideo
René F a u , Les groupes d’enfants et d’adolescents, de grande
interesse para o educador, em vista do período total que a
instruçã o abrange — teoricam ente dos seis aos vin te e três
anos. Quan to aos aspectos pró prios à adolescência, adotou-se
o livro de C. M. F l em ing , Adolescence.
Adquiridas as noções indispensáveis sobre a sociabilidade
da infância e da adolescência, podemos encarar a análise da
escola como agrupamento social dotado de uma estrutura pró
pria. Para tanto, figuremos um estabelecimento que preencha
as condições seguintes:
a) ciclo primário e. secundário
b) coexistência dos sexos
c) tradição escolar.
Isto posto, poderemos sugerir o seu panorama sociológico
de acordo com o esquema seguinte:
A Escola como Grupo Social
(sua estrutura interna)
3. Grupos associativos
4. Status
5. Grupos do ensino
I. F or m as d e a g r u p a m e n to : 1
1. Grupo s de ida de
2. Grupos de sexo
Assim como a idade, o sexo adquire um aspecto nitida
mente social na medida em que dá lugar a tipos de agrupa
mento e organização en tre os homens. Também os conceitos
relativos a ele variam segundo a cultura e o estádio cultural.
Sob este ponto de vista deve-se assinalar que o nosso tempo
(3) Cf. Re né H ube r t , Traitè de pêdagogie générale, 2.a ed., Presses Uni-
versitaires de France, Paris, 1949, pp. 169 e ss.; René F a U, op. cit., pp. 18-28;
N iel sen , op. cit., pp. 43-78.
114 ED UCAÇÃO E SOCIED AD E
3. Grupos associativos
São agrupamentos
de fumantes, cooperativos
as arruaças, de tipo
as conjurações difuso aostransgres
visando círculos
sões de toda espécie. São de tipo organizado as sociedades
secretas, igualmente com as mais variadas finalidades.
Tais grupos constituem por ventura o aspecto mais inte
ressante e menos estudado da vida escolar. Sob a aparente
tranqüilidade desta, eles subsistem e agem com uma força
constante, que, por exercer geralmente às encobertas e contra
a superordenação legal, lhes confere um poder integrador
rara mente alcançado po r outras formas de convivência. Cada
escola os terá desta ou daquela forma, em maior ou menor
número, com atividade mais ou menos eficiente. O fato porém
é que todas os possuem, e neles o educador poderá, não raro,
encontrar a chave para problemas que escapam à observação
superficial — que tende a ver na transgres são um ato qu ase
O ESTUDO SOCIOLÓGICO DA ESCOLA 117
4. “Status”
O processo de estratificação se manifesta na escola pelo
aparecimento de diferentes status, que,dispõem em níveis di
versos os membros da sua população.
A primeira diferenciação sob este ponto de vista é a que
superp õe educadores e educan dos. Visíveis à primeira vista,
118 EDUCAÇÃO E SOCIEDADE
de natureza servil.
Notemos, quanto ao sexo, a posição por vezes desprezível
a que os alunos do sexo masculino relegam as suas colegas
em escolas mistas, quando elas são minoria nítida.
Os fatores exte rno s — como a classe de srcem — são
geralmente redefinidos no âmbito da escola, de tal forma que
os meninos de melhor posição social podem constituir ver
dadeira camada de párias numa escola em que predominem
filhos do povo, reagindo estes a seu modo ante os refina
II. M e c a n is m o s d e su st en ta çã o d o s a g r u p a m e n to s :
I. Liderança
um a) O Educador
líder paternal, ésegundo
um líder Ginstitucional,
eiger segundo queWaallerpri,
(8). Entendo
meira conceituação é mais adequada, visto como a ação
exercida pelo professor independe, para configurar-se, das suas
qualidades de atração pessoal, fundando-se eminentemente na
faculdade socialmente conferida de superimpor aos educandos
um sistema de normas educativas e sociais preestabelecidas.
Ela se funda em três elementos principais: idade, força e po
sição.
(6) R. M. M a c I v e r e Charles P a g e , Society: an Introductory Analysis, R inehart
and Company, Nova York, 1950, p. 146.
(7) Georg Simmel , Sociologia (trad. cast.), Espasa-Calpe, Buenos Aires, 1939,
vol. I, pp. 138-40.
(8) Wíllard W aller , The Sociology of Teaching, John Wiley and Sons, Nova
York, 1932, passim. Theodor G eiger , A tipolo gia do líder (trad. bras.), São
Paulo, 1942, p. 30.
O ESTUDO SOCIOLÓGICO DA ESCOLA 121
peloselemento,
não alunos semas
baseia principalmente
condição no prestígio,
do seu exercício, e a quequevem
é,
eventualmente juntar-se a autoridade conferida, conforme as
escolas, pela ida de ou o sexo. Vale dizer que en quan to na
liderança do educádor o elemento institucional envolve e pre
domina em teoria sobre o elemento pessoal, na liderança de
alunos observa-se o contrário.
Já ficou sugerido antes, que há-nos grupos de imaturos
uma variação de estr utu ra co rrela ta aos níveis de idade. Nas
idades mais baixas, o tipo de solidariedade define antes bandos
que grupos, e a ação pessoal de controle varia, igualmente,
da ascendência irrefletida e momentânea do meneur à do líder,
organiz ada e durável (9). O meneur exerce autoridade ocasio
nal e geralmente limitada a cada ação específica do agrupa
mento (fuga, assalto ao qu intal vizinho, desacato ao bedel,
etc.), deixando de funcionar no intervalo; enquanto o líder
se caracteriza pela duração e a ordenação do mando, bem
como por certa submissão consciente dos liderados.
A liderança de alunos constitui uma das vias principais
de manifestação dos tipos de personalidade, sendo além disso
fator importante de integração grupai, visto como o líder
encarna ou impõe valores ligados à dinâmica da vida social
da escola. A sua conduta sugere aos demais os tipos de
comportamento fundamentais a esta, seja no plano dos agru
pamentos e das normas oficialmente estabelecidas e sanciona
dos, seja no plano dos agrupamentos e das normas desen
(9) A organizaçSo do gru po escol ar é ao mesmo tempo autoc rática (o me
neur), aristocrática (o meneur tem asseclas), e democrática, este último aspecto
se acentuando com a idade dos alunos: H ube r t , op. cit., p. 271.
No temos a pro pó sit o de sta ob ra , m ere cid am ente m uito div ulg ada en tre nó s,
que H ubert simplifica demais o problema ao reduzir a complicada estrutura da
escola ao gr up o (social) escolar, e ao descon hecer, neste , a variação de lider an ça
que acomp anha as vari ações d e organ izaçáo. A sua análise acentua devidam ente
o tipo de gregarismo escolar e a emergência do meneur, mas desconhece o fenô
meno propriamente de liderança, tanto do professor quanto dos alunos.
O ESTUDO SOCIOLÓGICO DA ESCOLA v 123
de umEstaeduc
realidade se torna muito
ador transgredir o que clara
dele quando se dá
se espera. É oo exem
caso
plo clássico do professor ou chefe de disciplina “camaradas”
em estabelecimento mai s ou menos rígido. Apare ntem ente,
eles deveriam contar com o apoio dos alunos e obter destes
o melhor rendim ento — como teoricamente acontec e com a
aplicação de indulgência. A experiência mostra , todavia, que,
embora gozando de certa simpatia, se tornam rapidamente
joguetes nas mãos dos educandos, que subvertem por seu in
termédio todo o arcabouço administrativo que os comprime.
É que o seu comportamento escapa às normas traçadas, no
grupo, para o comportamento do educador.
b) Também o comportamento do aluno se estrutura se
gundo as três mencionadas ordens de expectativas; e se as
estabelecidas pela comunidade e pela Administração escolar
são importantíssimas, não o são menos as que se desenvolvem
a partir da sua própria sociabilidade.
As breves indicações sobre agrupamentos associativos
devem ter servido
dos grupos a que dápara mostrar
lug ar a sua quanto
interaçã depende
o. De talo modo
imaturo
que,
se o seu comportamento deve corresponder aos padrões gerais
da comunidade e às normas pedagógicas e administrativas,
deve também ajustar-se ao que dele esperam os demais co
legas, ou os membros do agrupamento de que faça parte na
escola.
A insubordinação, a desobediência, oficialmente avaliadas
como conduta desorganizada e passível de sanção, podem
exprimir,
midade doe imaturo
na verdade
com freqüentemente
outros padrões, exprimem,
não menos aimperiosos
confor
que os inculcados pelo educador. É o “coleguismo”, por
exemplo, a solidariedade de grupo que leva a tudo subordinar
aos interesses deste, e leva não raro a conflitos abertos com
O ESTUDO SOCIOLÓGICO DA ESCOLA 125
3. Sanções
Podemos reconhecer na escola três espécies de sanções:
a) administrativas;
b) pedagógicas;
c) grupais.
4. Símbolos
Mencionemos
cerimônias, apenas materiais,
dos símbolos o papel dos valores
como forçasimbólicos,
ponderável das
de
manutenção dos agrupamentos intra-escolares e da escola na
sua tota lidade. Bandeiras e flâmulas de grêmios e clubes es
portivos, fardas, medalhas, diplomas, colações de grau, festas,
distintivos, sinais cabalísticos de associações secretas.
A importância do sistema simbólico de uma escola, inclu
sive a sua tradição, se manifesta nitidamente no conjunto de
sanções impostas aos neófitos — os calouros — sujeitos em
todas
caçoadaas departes do mundo
meninos a provações
às práticas que vão dadas
brutais e deprimentes simples
esco
las superiores. O grupo, cônscio do seu significado, reforça
a solidariedade entre os próprios membros pelo tributo cobra
do aos que nele ingressam.
III. Conclusão:
logiaO da
estudo sociológico
Educação, por da escola foi
Willard desenvolvido,
W aller na Socio
, cujo livro The
Sociology of Teaching (1932), po uco . divulga do entre nós, é
das contribuições mais importantes a esta disciplina. W aller
mostrou claramente — em bora nem sempre com o desejável
rigor sistemático —a existência do que chamou “the separate
culture of the school”, a cultura própria à escola. O presente
resumo procurou sugerir de modo voluntariamente esquemá
tico a existência, na escola, de uma estrutura social distinta,
cuja análise pode ser feita segundo um roteiro teórico do
tipo que ficou sugerido, e pode ser mobilizado na pesquisa
mediante o ajustamento das técnicas correntes de Sociologia.
Procurou ainda' mostrar que tal análise é importante para o
educador, fornecendo-lhe elementos para uma revisão das ati
tudes geralmente assumidas em face da educação escolar.
128 ED UCAÇÃO E SOCIE DA DE
tisfaz àe imensa
dades aptidõesvariedade das exigências
individuais”. sociais educativos,
Nesses sistemas e das necessi
em
que, por essa* forma, as sociedades assimilam ou uniformizam
para diversificarem, em seguida, em especializações as mais
variadas, e, estabelecendo o que há de “genérico” nos inte
resses do grupo total ou da nação, atendem à variedade das
necessidades “específicas” dos grupos e dos habitat, verifica-se
ainda certo número de princípios comuns de organização admi
nistrativa, tais como: a gratuidade e a obrigatoriedade no curso
dos primeiros anos de ensino; a divisão do ensino em diferentes
ordens, segundo a idade dos alunos e os cursos prosseguidos
(ensino primário, médio ou secundário geral, profissional e
técnico, e superior), a gratuidade do sistema de subvenções e
de bolsas no curso das escolaridades secundária e superior; pre
paração profissional dos professores» e a colação de graus, pelo
Estado, nos diversos instit utos. Mas essa semelhança de estr u
tura interna e de princípios fundamentais de organização não
deve fazer esquecer a extrema diversidade de formas que reves
tem os sistemas educativos “a variedade de soluções que tra
zem os Estados às questões de princípios que lhes são postas”.
A maior parte dos problemas fundamentais de organiza
ção prendem-se à necessidade que se manifesta por toda parte
de uma melhor adaptação da escola às novas exigências sociais,
variáveis de um povo para outro e às necessidades e condições
comuns do mundo moderno. Para a solução raci onal desses
problemas é preciso preliminàrmente exam inar a questão em
que ainda nãp se deteve suficientemente a atenção dos soció
logos e que é “a distinção entre os hábitos e as tendências
gerais da humanidade e as aptidões e as tendências específicas
tais quais são constituídas pelas diversas culturas” —distinção
impossível de se estabelecer com clareza senão mediante o
estudo, pelo método comparativo, das relações do homem com
o mundo orgânico e inorgânico, das relações dos homens entre
si e daquilo que Franz B o a s chama “relações condicionadas
O ESTUDO SOCIOLÓGICO DA ESCOLA 149
Anísio T ei x ei r a
Logo,
escola mesmo
primária vemcomo escola
buscando seletiva,não
selecionar o nos
espírito com
parece que a
o mais
recomendado para a conjuntura que estamos atravessando.
A realidade, porém, é que a escola primária não pode ser
simplesmente seletiva, mas precisa de cuidar seriamente dos
alunos de todos os tipos e todas as inteligências, que a procuram
— e que até obrigatoriamente a devem pro curar — para lhes
dar aquele lastro mínimo de educação, capaz de nos estabilizar
e dar à Nação as necessárias condições de gravidade e respon
sabilidade. Queb rado s os óbices à unificação democrática do
povo brasileiro, percorre, com efeito, todas as suas camadas,
e sobretudo as mais baixas, um ímpeto de ascensão social a
que só a educação pode rá da r ordem e esta bilid ade. A ordem
e a estabilidade numa sociedade democrática são mantidas por
critérios conscientes de valor e hie rarquia . Tai s çritérios não
392 ED UC AÇA O £ SOCIEDA DE
eNação
o pensador,
para o que
seu irão constituir os cultural
desenvolvimento corpos especializados
e científico. da
Nessa escola prim ária, a idade é o elemento fundamental
de graduação e classificação, organizando-se as séries com pro
gramas de atividades escolhidas à luz dos interesses e impulsos
dos vários grupos em cada idade, com as diversificações de
correntes dos difere ntes quoci entes intelectuais. Daí consti-
tuírem-se os grupos quase sempre de duas idades: 7/8 na l.a
série, 8/9 na 2.a série, 9/10 na 3.a série, 10/11 na 4.a série,
11/12
ou 2.a na 5.a série ou l.a complementar e 12/13 na 6.a série
complementar.
Estendido o tempo da escola primária pelo dia letivo
completo e pelos -seis anos mínimos de estudos, teríamos a
possibilidade de reorganizá-la para a educação de todos os alu
nos e não apenas dos poucos selecionados. Para isto seriam
necessários o enriquecimento do currículo pela forma antes
recomend ada e a formação de magistério adeq uado . Temos,
quanto à última tarefa, a da formação do magistério, a expe
riência das escolas de enfermeiras e das escolas de serviço
social. Deveríamos elevar as escolas normais à categoria pro
fissional dessas duas escolas, não direi para torná-las de cho
fre, de nível superior, mas para acentuar-lhes o espírito de
formação nitida mente profissional. Antes, porém, do currículo
novo e do novo professor, teríamos de alterar a própria ordem
394 ED UCAÇAO E SOCIED AD E
profissional
cursos porquede são
nível médio,
mais ou do
fáceis se estão
que osapenas procurando tais
de colégio.
Em todo caso, trata-se de uma nova tendência que deve
ser observada com cuidado. Todos os cursos médios profis
sionais são de natureza mais prática do que os dos colégios,
tendo, a par disto, professores de mais baixo preparo que os
do secundário, podendo, caso a maioria dos seus alunos pro
curem o ensino superior, ser responsáveis pelo fraco índice de
preparo revelado pelos candidatos nos exames vestibulares.
Chegados, afinal, ao ensino superior, registra-se, então,
algo de surpreendente: cessam quase as reprovações.' Q ensino
superio r é o menos mortífe ro dos períodos escolares. Quase
todos os seus alunos acabam p or graduar-se. Não será isto
mais uma coYnprovação do caráter propedêutico de todos os
396 ED UCAÇA O E SOCI ED AD E
ima função
nental. Se suplementar
for desviadadadeste
escola e não
mais impa ortante
sua função funda-a
objetivo,
:scola deixará de exercer a sua função primordial, que é a
le ser a grande estabilizadora social, para se fazer até uma
ias causas de instabilidade social.
Poderá parecer is to algo de reacionário. Na realid ade não
o é. A educação escolar é uma necessidade, em nosso tipo de
civilização, porque não há nível de vida em que dela não
precisemos para fazer bem o que, de qualquer modo, teremos
primeiro
sempre de fazer.
nos permitir viver Deste modo, a sua
eficientemente em função é
nosso nível de vidaa de
e
somente em segundo lugar, a de nos permitir atingir um novo
nível, se a nossa capacidade assim o permitir. Se toda educa
ção escolar visar sempre à promoção social, a escola se tornará,
de certo modo, repito, um instrumento de desordem social,
empobrecendo, por um lado, os níveis mais modestos de vida
e, por outro lado, perturbando excessivamente os níveis mais
altos, levando-lhes elementos que, talvez, não-estejam devida
mente aptos para o novo tipo de vida que a escola acabou
por lhes facilitar.
Palavras duras essas, sem dúvida, mas temos de dizê-las,
pois os países subdesenvolvidos são os que mais rapidamente
se deixam perder pela miragem da educação como exclusivo
processo de promoção social. E este será, sem dúvida, o mais
grave defeito de todo o nosso sistema escolar. Fazendo-se,
como se vem fazendo, um simples sistema seletivo, a escola,
ajudada pelo caráter democrático de nossa população, se está
constituin do um processo de desorganização da vida nacion al,
deixando nas atividades fundamentais da sociedade somente
os que não se podem educar e levando todos os que logrem
qualquer êxito em seus cursos, mais formais do que eficientes,
a condições de vida em que não vão ser mais produtivas, mas
apenas conduzir existências mais amenas, senão parasitárias.
Temos examinado, em nossos estudos, este aspecto da escola
brasileira sob vários ângulos. Hoje, desejamos apresentá-lo,
mais uma vez, à luz da verd adeira finalidade da escola. Há
como que o esquecimento da função por excelência estabili
zadora da educação e o exagero da função de promotora do
progresso individual.
Como explicar tal fenômeno em uma sociedade, sob outros
aspectos, tão conservadora como a sociedade brasileira?
398 ED UC AÇÃ O E SOCIED AD E
(2) Note -se a alta m atríc ula relativa ne sse ensino em com paração com a
matrícula referida à p. 395.
EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO 399
de trabalho,
ilustrar emergentes
com certas do profissionais
tinturas surto industrial, mas, apenas,
os elementos a
já per
tencentes às pequenas classes superiores e médias e que encon
travam em suas próprias classes todos os estímulos e condições
necessárias à sua formação propriamente dita.
Por isto mesmo, a educação secundária e, sobretudo, a
superior, era uma educação de tempo parcial, servida de pro
fessores eminentes, mas, em sua maioria, de cultura geral, rela
tivamente pouco especializados, o que dava às próprias escolas
superiores profissionais um ar de academias de cultura do
espírito, um tanto ornamentais e um tanto divagantes e ver-
balísticas, salvas as poucas exceções de expoentes destacados,
tanto na cátedra, quanto na prática profissional, nos setores
de medicina e engenharia.
Tomada de imprevisto e sem os recursos necessários para
o novo empreendimento educacional, a sociedade brasileira não
se apercebeu de que a alternativa à sua negligência seria a
expansão, para as novas camadas em ascensão social, do sistema
existente, destinado às suas reduzidas classes média e superior,
sistema satisfatório, talvez, para a sociedade estabilizada senão
estagnada da década de 30, mas absolutamente inadequado às
novas condições sociais.
Tal sistema tinha a seu favor, para uma expansão ime
diata, a vantagem de ser um sistema de educação de custeio
EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO 401
O chamado
o ensino sistema
secundário de educação
de caráter da elite, ao
propedêutico compreendendo
superior e o
ensino superior gratuito expandiram-se fora de todas as pro
porções, e o sistema popular, compreendendo o ensino primário
e o técnico, não somente não se expandiu nas mesmas propor
ções, como se vem também tornando propedêutico ao ensino
superior, meta final a que todos aspiram, sem nenhuma cons-
’ ciência do que representa o custo dessa educação, logo que
deixa de ser de cultura geral para se fazer, como é necessário
que se faça, de cultura especializada e profunda.
A modesta sociedade brasileira do princípio deste século
podia dar-se ao luxo de um a escola superior gratu ita para a
sua dim inu ta classe de lazer — gratuid ade apenas apar ente,
pois, localizada em alguns poucos e grandes centros urbanos,
obrigava as famílias a deslocar e manter seus filhos nessas
UFR&S
■ I Bt m U CA St TO I X L 0 [ e m c íc H
402 ED UC A ÇÃO E SOCIED AD E
Conclusão
valor do estudante,
disfarçável a dívida dá-la gratuita,
que está ele acaracterizando
assumir para de modo
com in-
a socie
dade. A educação mais alta qu e assim está a receber nã o lhe
dá direitos nem o faz credor da sociedade, antes lhe dá deveres
e responsabilidade, fá-lo o devedor de um débito que só a sua
produtividade real poderá pagar.
Bem sei quanto é difícil criar, entre nós, um tal espírito.
Muitos dirão que será mesmo impossível. Persisto em crer o
contrário. Os nossos jovens das escolas superiores podem não
possuir a consciência
vilegiados. perfeitamente
Mas, é indiscutível que osnítida
agita de
umquanto são pri
certo senso de
dever social. Esclarecimentos como estes que estive aqui a
procurar prestar justar-se-ão a outros, até que se forme a cons-
EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO 413
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