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do Código Civil, que estabelece quais são as fontes do Direito: a lei, o costume e os
princípios gerais do Direito; o art. 2 do mesmo corpo legal, que dispõe a existencia
de limites espaço-temporais de entrada em vigor das leis; e o art. 3 do Código Civil,
que se refere aos critérios de aplicação e interpretação.mn Vê-se que as normas
secundárias são assim consideradas, tanto temporalmente, porque vão necessaria
mente depois da norma cujo defeito trata de corrigir, comofuncionalmente, pois são
menos importantes que ela.
Não obstante, o critério que não aparece coordenado na teoria de Hart é
o hierárquico, porque em um sistema jurídico evoluído as normas de reconhe
cimento, mudança e adjudicação são habitualmente normas hierarquicamente
superiores, são primárias combase no critério hierárquico. O que ocorre é que tal
objeção é menos relevante, ao estar o critério hierárquico pouco consolidado no
mundo do Direito, no qual duas normas, em relação hierárquica entre si, deno
minam-se respectivamente superior e inferior, mais que primária e secundária.
extensiva, mas não por analogia. Pelo contrário, as normas especiais admitem
também a aplicação analógica.
A diferença entre interpretação extensiva e interpretação analógica resi
diria, em grandes traços, em que, enquanto a primeira se limita a esclarecer lei
escura, mas sem nunca sair de seu âmbito, sem criar nada novo, limitando-se a
dar uma interpretação mais extensa possível dentro do sentido da lei, pelo con
trário, a interpretação analógica vai mais à frente, criando algo novo, que não
estava contido nem na letra nem no espírito da lei, inovando-a. Por exemplo,
uma interpretação extensiva da palavra “espanhol” poderia incluir também as
espanholas. É uma interpretação ampla, mas que não transborda os contornos
normais do conceito. Por sua parte, uma interpretação analógica de “espanhol”
seria a que inclui, junto aos nascidos na Espanha, os hispanos. Neste caso, acres
centamos um “plus”de conteúdo que não se encontrava no significado originário
do termo. Isto se reflete em algumas línguas, como o inglês, na existência de
dois vocábulos distintos para designar o espanhol da Espanha - “Spaniard”- e
o da Hispanoamérica ou hispano - “Spanish”
O fundamento da proibição da analogia no Direito excepcional se encontra,
segundo a Exposição de Motivos do Código Civil espanhol, no fato de que nas leis
excepcionais não existiriam lacunas, dado que, ao derrogar o Direito geral, os
casos não expressamente previstos têm de ser acolhidos por este último. Não
obstante, nem todos os autores concordam em não admitir a analogia para as
normas excepcionais ou, ao menos, não para todas as normas excepcionais. Sobre
estes temas voltaremos mais adiante, ao nos ocuparmos do argumento analógico.
Um tipo particular de norma excepcional é o privilégio. Existem duas
acepções possíveis do termo privilégio.
Em sentido amplo, significa uma norma jurídica/avoravel, seja por concessão
de uma vantagem, seja por isenção de uma carga, por exemplo, determinadas
isenções fiscais. Vemos assim como o privilégio é uma infração do princípio de
igualdade, mediante o qual se deve tratar igual aos iguais e desigualmente aos
desiguais, mas sempre em proporção à sua desigualdade e não, como no caso
do privilégio, arbitrariamente.
Em sua vertente estrita, o privilégio supõe uma disposição individual (“lex in
privos data”) , seja favorável ou odiosa. Há autores que sustentam que o privilégio
não é Direito, por lhe faltar generalidade, apesar de que, às vezes, revista a forma
de norma - na distinção feita, em linhas anteriores, seria lei formal, não material.
O Direito medieval se apoiava nos privilégios, em uma sociedade estamen
tal, claramente desigual, e em que se nascia em um estamento e se permanecia
nele por toda a vida. É a distinção entre o tradicional conceito de estamento e
a moderna noção de classe social que, ao não se apoiar em vínculos de sangue,
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mas sim na posse da riqueza econômica, como esta pode trocar de mãos, admite
a ascensão e a queda de umas classes a outras, a mobilidade social. Depois da
Revolução Francesa, com seu lema “liberdade, igualdade, fraternidade”, os
privilégios foram formalmente abolidos e, hoje em dia, são de caráter cada vez
menos frequente.
Também esta divisão tem algo de fictício na medida em que não se pode
dizer que haja normas absoluta e totalmente universais, ao menos não as normas
positivas. Em realidade, quando dizemos que uma norma é universal, designa
mos o fato de que seu âmbito de aplicação no espaço transcende os limites de
um Estado, sendo comum a uma pluralidade, mais ou menos extensa, deles.
Assim, poder-se-ia incluir aqui, por exemplo, o Direito internacional, especial
mente o Direito internacional em sentido estrito, ou seja, aquele praticado pela
comunidade internacional, mais que em sentido amplo e algo impróprio, como
sinônimo de Direito estrangeiro, quer dizer, o não nacional de um Estado. Tam
bém transcenderia o âmbito de um Estado, constituindo, de certo modo, Direito
universal, na esfera europeia, o chamado Direito comunitário. O mesmo caberia
pregar do Direito canônico, como aquele comum à Igreja Católica e, portanto,
extensível a uma grande pluralidade de Estados que compartilham este credo
religioso. Já na Idade Média existia essa ideia de cosmos, de universalidade, em
relação com o Império, na esfera laica, e com a Cristandade, no âmbito religioso;
com o Imperador e o Pontífice, como cabeças visíveis em cada uma das ditas
ordens. Assim, sendo praticado por uma pluralidade de Estados, o Direito da
Igreja Católica é Direito universal.
O Direito geral ou comum seria aquele que, embora de âmbito limitado a
um Estado, rege em todo o seu território. Seriam Direito deste tipo, por exem
plo, no âmbito privado, os distintos Códigos, e na esfera pública, a Constituição.
Finalmente, entende-se por Direito particular ou local o aplicado em
parte do território de um Estado, por exemplo, em uma determinada região ou
comarca ou em uma Comunidade Autônoma concreta. São Direito deste tipo,
no âmbito privado, as distintas Compilações forenses e, na esfera pública, os
Estatutos de Autonomia.
A) Pelos sujeitos
Por sua vez, do ponto de vista da relação jurídica, podemos fazer a distinção,
segundo os elementos da mesma: em primeiro lugar, os sujeitos e logo o objeto.
Dentro do critério dos sujeitos, cabe diferenciar dois aspectos: a natureza dos
mesmos e a posição que ocupam.
Pela “natureza do sujeito”, o Direito público seria aquele no qual o sujeito
que intervém na relaçãojurídica regulada pela norma é o “Estado ou outros entes
públicos dotados de imperium”, isto é, de poder - “potestas" - público. Pelo
contrário, o Direito privado é o conjunto de normas que regulam as relações
entre “particulares”, quer dizer, entre sujeitos em posição de igualdade entre si.
Não obstante, em que pese ser frequentemente acolhido pela jurisprudên
cia, este critério de distinção não se pode aceitar, ao menos não por si só, porque
às vezes entes públicos dotados de “imperium” - o próprio Estado - realizam
seus encargos sem utilizar sua prerrogativa ou poder de comando, como meros
particulares, em um plano de igualdade e de Direito privado. Assim, podem atuar
como comprador ou vendedor, ou como locatário. Por outro lado, cabe uma rela
ção jurídica de Direito público que se dê entre particulares, por exemplo, quando
se concede a um particular poder para expropriar os bens de outro particular.
Também não seria adequado o critério do sujeito, se o contemplarmos do
ponto de vista de quem é o sujeito que cría anormajurídica. Assim, dizer-se-ia que
é Direito público aquele cujas normas são dadas pelo Estado - leis, regulamentos
etc. -, enquanto o Direito privado seria o criado pelos particulares para regular
suas próprias relações: normas nascidas de contratos, de negócios jurídicos etc.
Mas esta distinção também não é inteiramente exata, porque, por exemplo,
em que pese ser o Direito civil ou o mercantil, sem dúvida, Direito privado, entre
tanto, o Código Civil ou o Código Comercial, que os recolhem, são normas criadas
pelo Estado, as quais, por conseguinte, devem se qualificar como Direito público.
Por isso, o critério da natureza do sujeito tem que ser completado com
o da “posição” que adote dito sujeito. Segundo esta nova perspectiva, que se
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B) Pelo objeto
1-1-2): “Publicum ius est quod ad statum rei romanae spedai; privatum quod ad
singulorum utilitatem pertinetn
Mas este critério também não é de todo convincente, pois o interesse de
toda norma é, em última instância, o interesse geral. Assim, por exemplo, na su
cessão hereditária se trata de interesses particulares - do testador, dos herdeiros,
dos terceiros -, mas a regulação total do fenômeno se fará sempre no patamar
do interesse geral - daí a reserva da legítima, porção da herança a que o testador
não pode dispor a seu livre desejo, mas sim deve ser destinada a determinadas
pessoas. Por outra parte, a realidade nos mostra também relações jurídicas de
Direito público, nas quais estão presentes interesses particulares. Desse modo,
por exemplo, as normas que preveem o acesso a um emprego público, em que há
interesses particulares de cada um dos que concorrem a tal posto; ou as normas
de Direito público que estabelecem uma redução ou uma isenção no pagamento
de determinado imposto, nas que concorrem também, como é lógico, os inte
resses particulares das pessoas afetadas pelo pagamento de dito tributo e por
essa possível isenção fiscal.
Neste contexto, do interesse objeto de amparo na relação jurídica e, ao
final, na norma, podemos fazer uma segunda distinção conforme a proteção
seja um interesse patrimonial, material ou econômico - Direito privado - ou um
interesse não patrimonial, mas simpessoaí-Direito público. A distinção entre os
interesses patrimoniais e os não patrimoniais repousa em ser ou não suscetíveis
de avaliação econômica.
No entanto, esta tese tampouco é de todo aceitável porque contradiz tanto a
realidade legislativa como a essência mesma do Direito. Dizemos que contradiz a
realidade legislativa porque o direito da pessoa - assim a tutela - e o denominado
Direito de família “puro” são ambos, Direito privado, incluídos no Código Civil
e, entretanto, não são Direito patrimonial. Nem todo Direito privado é Direito
patrimonial. Dizemos que contradiz a essência do Direito porque, devendo ser
o fim de cada norma servir ao bem comum, o dar a cada um - a comunidade e a
pessoa - o seu, não se pode considerar Direito uma norma que sirva só ao egoís
mo, ao interesse individual ou de uma classe - os proprietários, os burgueses...
C) A tese do Cica
2 A 3 Conclusão crítica
Notas
36. Sobre o tema, ver nosso trabalho: Algunas clasificaciones de las normas jurídicas.
Iu r is T a n tu m . R e v is ta d e la F a c u lta d d e D e r e c h o . U n iv e r s id a d A n a h u a c ,
M éxico, 10,
primavera-verano 1999, p. 137-157.
37 Sobre o tema, destacamos: Giuliano Amato. R a p p o r ti f r a n o r m e p r i m a r i e e se c o n d a r ie
( A s p e tti p r o b le m a tic i) . Milano: Giuffrè, 1962. R. A. Armstrong. P r im a r y a n d S e c o n d a r y
P re c e p ts in T h o m is tic N a tu r a l L a w T eaching. The Hague: MartinusNijhoff, 1966. Chris
topher Cherry. Regulative rules and constitutive rules. T h e P h ilo s o p h ic a l Q u a r te r ly ,
XXIII, 1973, p. 301-315. Giacomo Gavazzi. N o r m e p r im a r ie e n o r m e se c o n d a ry . Torino:
Giappichelli, 1962. Letizia Gianformaggio. Norme primarie e norme secondarie.
R iv is ta d i D i r i t to P r o c e s s u a le , XXIII, 1968, p. 563-572. Juan Ramón de Páramo. H. L.
A . H a r t y la te o r ia a n a litic a d e l derech o . Madrid: Centro de Estudios Constitucionales,
1984. K. K. Lee. Hart’s primary and secondary rules. Mind, LXXVII, 1968, p. 561-564.
Antonio Anseimo Martino. En torno a la norma fundamental. L a L e y , XXXIV, 1970,
p. 4-9. Constantin M. Stamatis. La systématicité du droit chez Kelsen et les apories
de la norme fondamentale. S y s te m e (L e) J u r id iq u e . A rc h iv e s d e P h ilo s o p h ie d u D r o it , t.
31 ,1 9 8 6, p. 45-56.
38. Seguimos a continuação de Norberto Bobbio. C o n tr ib u c ió n a la te o r ia d e l d e rech o ...
cit.,p. 317 ss.
NT 12. [Nota d a tr a d u ç ã o 1 2 ] Na atual ordem jurídica brasileira, as fontes do direito podem
ser encontradas no art. 4.° da LINDB:
“Art. 4.° Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os
costumes e os princípios gerais de direito”
Também podem os encontrar os critérios de interpretação e entrada em vigor das
normas brasileiras nos arts. l.° ao 6.° da LINDB.
C lassificação das n o r m a s jurídicas 91
39. Sobre o tema, v.: Alberto Montoro Ballesteros. Significación y límites del carácter
general y abstracto de la norma jurídica. F ilo s o fía y D e re ch o . E s tu d io s en h o n o r d e l
P ro fe so r f o s é C o r ts G r a u , II, Universidad de Valencia, 1977, p. 1-30.
40. Giuseppe Lumia. P rin c ip io s d e te o r ía e id e o lo g ía d e l d erech o . Madrid: Debate, 1973, p.
38-40.
41. Em que pese o caráter normativo polémico das normas individuais, assinala Legaz y
Lacambra que são possíveis e plausíveis como verdadeiras normas jurídicas, já que a
norma individual não seria senão o estabelecimento para uma pessoa concreta daquilo
que se considera injusto para a generalidade dos sujeitos em situações afins. A norma
jurídica seguiria sendo geral, mas, em sentido qualitativo, não quantitativo. A norma
jurídica individual regularia assim a situação de uma só pessoa, mas não enquanto
pessoa individualmente determinada, e sim como representante ou encarnação de uma
situação jurídica determinada. O gênero contém várias espécies. A norma individual
dá validade a uma delas. Toda pessoa que se encontre em uma situação semelhante
à do destinatário da norma individual pode se acolher, ao menos “a p r i o r i ”, à mesma
regulação jurídica.
42. D. 1 ,3 ,1 6.
43. Temos seguido, nesta exposição, a distinção existente entre normas taxativas e dis
positivas de: Giorgio del Vecchio. F ilo s o fia d e l d e re c h o . 9. ed. rev. por Luis Legaz y
Lacambra. Barcelona: Bosch, 1969. A distinção entre normas taxativas e dispositivas
não deve nos induzir a engano sobre o caráter do Direito, que é sempre imperativo. O
caráter imperativo se verificaria inclusive nas normas dispositivas se levássemos em
conta que a norma jurídica é um imperativo hipotético ou condicionado, no qual só se
dão as conseqüências jurídicas previstas na norma quando se verificam as condições
expressas na hipótese de fato. Pois bem, uma espécie de tais condições pode consistir
precisamente em que as partes não tenham manifestado uma determinada vontade
contrária, como nas normas dispositivas. Ao ter fixado tais premissas como condição
de entrada em vigor da norma pertencente à vontade expressa na norma mesma e não
é um elemento que se oponha a ela nem que diminua ou anule seu caráter imperativo.
44. Seguimos em nossa exposição destes tipos de normas a Karl Larenz. M e to d o lo g ia d e
la c ie n c ia d e l d e rech o . Trad, e rev. Marcelino Rodríguez Molinero. Barcelona: Ariel,
1984. Especialmente a parte destinada à norma jurídica incompleta.
NT 13. [ N o ta d a tr a d u ç ã o 1 3 ] A compra e venda está disciplinada no Título VI, Várias Especies
de Contrato, Capítulo I, nos arts. 481 ss. do CCbrasileiro, enquanto a permuta ou troca
está disciplinada no Capítulo II, no art. 533. O instituto da doação está estabelecido
no Capítulo i y art. 538 ss.
45. Carlos Eduardo Alchourron e Eugenio Bulygin. Definiciones y normas. E l le n g u a je
d e l d erech o . H o m e n a je a G e n a r o R u b én G a r r ió . Buenos Aires: Abeledo Perrot, 1983, p.
11-42. Gianpaolo Azzoni. Il c o n c e tto d i c o n d iz io n e n e lla tip o lo g ia d e lle reg o le. Tesi di
laurea. Università di Pavia, 1985. Juan Ramón Capella. Notas sobre la definición legal.
A n u a r io d e F ilo s o fia d e l D e re ch o , X, 1963, p. 37-50. Vincenzo Gueli. Il “d ir itto sin g o la r e ”
e i l s is te m a g iu r id ic o . Milano: Giuffrè, 1942. José F. Lorca Navarrete. E l d e re ch o n a tu r a l
hoy. A p r o p ó s ito d e la s f ic c io n e s ju r íd ic a s . Prólogo de Francisco Elias de Tejada. Madrid:
Pirámide, 1976. E. Mari. Du’s ouffle pestilentiel de la fiction’dans le droit, à la theorie
du droit comme fiction. A c tu a lité d e la p e n s é e j u ñ d iq u e d e J e r e m y B e n th a m . Bruxelles:
92 L ições de T eoria G eral do D ireito