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Resenha: Augusto Boal e o Teatro do Oprimido

Gabriel Franco

Tudo o que consigo pensar sobre ter assistido ao documentário Augusto Boal e o Teatro do
Oprimido é que essa experiência foi extremamente providencial. Digo isso especialmente por conta
do que compreendi ser a essência do teatro fórum: a proposta de incorporação de soluções
levantas pela audiência aos problemas postos aos personagens pela dramaturgia que está sendo
contada. Ao conceber e ter colocado em prática essa concepção de teatro, Augusto Boal
estimulou o exercício da materialização das ideias e, por consequência, criou espaços onde se
discutiram soluções nunca antes consideradas possíveis para problemas reais enfrentados mundo
afora. E esta é uma atividade que demorei anos para perceber que ainda não havia praticado.

De forma curiosa, assistindo aos relatos daqueles que já participaram deste exercício,
percebi que, por algum motivo (talvez até pelo caráter lúdico muitas vezes associado ao fazer
teatro), o espaço para discussão proposto nessas ocasiões era bastante atraente a todos, mas
principalmente aos que normalmente não têm lugar de fala na sociedade. Me parece que, uma
vez no palco, as pessoas genuinamente se sentiam capazes e livres para se expressar. E acredito
que foi nessa ideia que se sustentaram as inúmeras falas que documentavam: no teatro do
oprimido, a performance não é um fim em si mesmo, mas sim o começo de um longo e importante
processo de reflexão.

Para um jovem que aspira fazer da arte o seu ofício, todo esse material é muito valioso
uma vez que este tipo de teatro se mostrou extremamente eficiente no sentido de fazer da arte
um gatilho para a reflexão. Na minha concepção, esse deve ser o mais importante motivo pelo
qual o teatro do oprimido cursa esse caminho de sucesso até hoje. O que Boal propôs, e que me
demorou 21 anos de vida para tomar a coragem de fazer, é o questionamento dos valores em
vigor, é o repensar a minha condição de homem branco, é o finalmente deixar de concordar com
as opressões que nos afligem. Isso tudo me coloca em um lugar no qual acredito que finalmente,
primeira vez, comecei a compreender o que é a verdadeira empatia – e isso transborda para
todos os âmbitos da vida.

Além de prestar este papel humanizador para o mundo tão insensível e fendido em que
vivemos, a obra de Boal também oferece outros calorosos alentos aos estudantes de teatro como
as ideias de que “o personagem é uma potencialidade da sua personalidade” e “a vocação para
representar é intrínseca do ser humano”. Um exemplo é o caso da mulher que subiu no palco e
“era 100% ela e 100% o personagem”, nos mostrando que, talvez, o jeito mais brilhante de se
interpretar já está aí em algum lugar dentro de nós.

Ao reavivar minha busca pelo refinamento do pensamento sensível e alimentar o meu


chamado por produzir cultura que transforma, o documentário me pegou exatamente pelo que
acredito ter sido o principal objetivo de Boal: relembrar as pessoas de que elas são realmente as
protagonistas de suas próprias histórias.

“O teatro do oprimido não tem caminho, o caminhante é quem determina isso”


Augusto Boal

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