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O livre arbítrio visto por alunos do 10º ano

As alunas Irina Neves e Sara


Guerreiro, da turma 10º C, da
Escola Secundária D. João II,
em Setúbal, fizeram estes
trabalhos que o seu professor
de filosofia, O professor João
Paulo Maia, teve a
amabilidade de enviar para
publicação. Os trabalhos são,
O problema do livre arbítrio e
Será o livre arbítrio uma
ilusão.
O problema do livre arbítrio
Colocar o problema do livre-arbítrio é colocar um dos problemas
centrais da Filosofia da Acção que pode ser formulado deste
modo simples: temos ou não livre-arbítrio?
Por não concordar com a tese de que o livre-arbítrio seja uma
ilusão, vou argumentar a favor da tese inversa – a de que temos
livre-arbítrio.
Pressupor que o livre-arbítrio é uma ilusão leva-nos a pressupor
que o determinismo radical é verdadeiro, o que por sua vez nos
leva à chamada objecção fenomenológica ao determinismo
radical. Esta objecção constitui uma forte evidência racional
contra aquela teoria filosófica.

Passamos a expô-la:  
Não podemos deixar de pressupor o livre-arbítrio no que diz
respeito à acção humana. Por vezes quando agimos temos a
sensação de liberdade, de que o que estamos a fazer, seja
discutir ou outra coisa qualquer, é espontâneo. Agir é, pois,
pressupor o livre-arbítrio. Mas a tese defendida pelo
determinismo radical implica que a sensação de livre-arbítrio
seja uma ilusão, isto é, aquilo que experimentamos é um erro
sistemático que não podemos corrigir, o que enfraquece a
teoria, pois uma teoria que implique que fazemos um erro
sistemático é menos plausível do que uma teoria que não
implique esse erro sistemático. Neste caso as teorias
compatibilistas – como o determinismo moderado – ou até o
libertismo não implicam que o livre-arbítrio seja um erro
sistemático. Ora, isto faz com que neste ponto estas teorias
ganhem vantagem em relação ao determinismo radical, o que é
mesmo que dizer que ganha vantagem a tese de que temos
genuíno livre-arbítrio, ainda que limitado pelas condicionantes
físico-biológicas e histórico-culturais próprias da nossa espécie.

Vivemos, até certo ponto, num universo físico determinista


(com exclusão ao que parece do domínio micro-físico), em que
as leis da natureza e os acontecimentos anteriores determinam
a posição da Lua em relação à Terra, por exemplo. E muitas das
nossas acções (ou talvez mesmo todas) são influenciadas por
acontecimentos anteriores, como o exemplo de chumbar de ano
é o resultado de uma cadeia causal de não se ter estudado, de
se ter falta de atenção ou até de se ter faltado às aulas. Mas
quando tomamos genuinamente uma decisão, temos livre-
arbítrio, pois podíamos ter escolhido outra coisa para além
daquilo que decidimos. Logo, nas nossas genuínas acções o
livre-arbítrio não é uma ilusão, o que significa que a tese de que
temos livre-arbítrio é verdadeira, apesar de não haver uma
teoria totalmente satisfatória que justifique este fenómeno
humano. Mas a inexistência de prova cabal não implica a prova
de inexistência, neste caso de livre-arbítrio. E o chamado ónus
da prova cabe aos defensores do determinismo radical e não
aos defensores das outras teorias, pelas razões atrás expostas.
Logo, temos livre-arbítrio mesmo no caso de ainda não
dispormos de uma teoria totalmente aceitável – se é que alguma
vez poderemos dizer que a poderemos vir a ter – sobre este
arreigado fenómeno humano.

Será o livre-arbítrio uma ilusão?


Este é um problema central da Filosofia da Acção. Neste
pequeno texto, vou defender a tese de que o livre-arbítrio não é
uma ilusão, isto apesar de haver teorias filosóficas que negam
tal coisa, por exemplo, os defensores do chamado determinismo
radical.
Temos uma forte intuição de que temos livre-arbítrio. Claro
que as nossas intuições podem falhar, mas seria preciso
mostrar porquê, o que neste caso não é fácil. Ora, se tudo
estivesse totalmente determinado, não só o universo físico, mas
também o domínio das nossas acções, então parece que não
seríamos livres de fazer verdadeiras escolhas. Por exemplo, se
eu chutar numa pequena bola e se esta estiver determinada a
bater noutra bola (devido à força que nela apliquei e à direcção
em que o fiz), será que nunca conseguirei impedir isso? Claro
que sim. É-me possível, pelo menos em algumas circunstâncias,
desviar o percurso da bola de maneira a que esta não bata na
outra bola. Qualquer pessoa que defenda que o livre-arbítrio é
uma ilusão, pode defender que mesmo o meu desviar do
percurso da bola, também já estava determinado, quer por
acontecimentos anteriores quer pelas leis da natureza. Mas se
realmente o livre-arbítrio fosse uma ilusão, nós viveríamos com
a ilusão de temos essa capacidade, e por muito que
pensássemos que estávamos a agir livremente, isso seria
puramente uma ilusão. Mas uma teoria que defende que
cometemos um engano sistemático e que sabemos disso é
pouco plausível.

Se não tivéssemos livre-arbítrio éramos uma espécie de


máquinas complicadas, comandadas unicamente pelo Universo.
Mas mesmo que o Universo físico seja determinista, e nós
façamos também parte dele, não se segue que as nossas
acções o sejam. Nomeadamente, acções que sejam
intencionalmente em parte aleatórias não podem ser totalmente
determinadas, se forem realmente tomadas contando com o
acaso, como, por exemplo, se eu decidir que irei fazer aquilo
que estiver escrito num bilhete que irá sair de uma máquina em
que estão milhares de bilhetes escritos com indicações de
coisas que eu possa fazer.

Por tudo isto, concluo que o livre-arbítrio não é uma ilusão.

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