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C APÍTULO 1

IMPACTO DA TECNOLOGIA NOS


NEGÓCIOS E COMUNICAÇÃO
MERCADOLÓGICA

N este primeiro módulo exploraremos as


mudanças comportamentais catalisadas pela
tecnologia conectada e seu consecu5vo impacto
nas relações de negócios e comunicação entre
marcas e consumidores.

Também cobriremos os possíveis entendimentos


sobre o que vem a ser ‘plataformas digitais’ e
traremos alguns conceitos da área de Tecnologia
da Informação u5lizados nos negócios digitais.
Impacto da tecnologia nos negócios portanto, acabam balizando as decisões de negócio em
absolutamente todas as esferas empresariais.
e comunicação mercadológica
Como grande parte das inovações está ligada a novas
O “pensamento digital”, que engloba um conjunto de tecnologias, há um movimento natural de interseccionar
expectativas e motivações (a serem tratadas logo mais neste profissionais antes com duas áreas distintas de formação:
capítulo) catalisou mudanças em todo o ecossistema tecnologia e negócios.
corporativo através, entre outras coisas, da distribuição de
informação, automação/personalização e redução de custos,
impactando tanto as atividades de front-end (aquelas mais
expostas aos clientes e mercado, como as operações de
vendas, marketing e customer support), como de back-end
(necessárias para entrega de valor aos clientes, como
manufatura, planejamento, entre outras).

Enquanto o primeiro – tecnologia – sempre esteve ligado ao


desenvolvimento e eficiência técnica, o profissional de
negócios, até então, apenas recebia os desenvolvimentos feitos
pela área técnica para ‘empacotá-los’ e vendê-los ao mercado.

Com a fortíssima influência de soluções tecnológicas em todos


os pilares de negócios, há uma simbiose cada vez maior entre
o pensamento sistêmico e a preocupação com a experiência do
consumidor.

Questões como como agilidade, transparência, personalização Para se ter uma ideia, tomando, por exemplo, o onipresente e
e ganho de escala tomam novas dimensões em um ambiente amplamente conhecido modelo dos 4Ps, de Kotler, a
permanentemente conectado (dispositivos, pessoas, coisas) e, digitalização da vida cotidiana trouxe, entre outras coisas:

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Produto: implicações de desenvolvimento e manutenção de soluções
tecnológicas, além da necessidade de um pensamento
Personalização em massa; customização de experiências; sistêmico e capacidades de gerenciamento de projetos com
manufatura build-to-order; maior conhecimento sobre múltiplas variáveis e inter-relações.
hábitos de uso; automação de funções.
O conhecimento horizontal da tecnologia permite aos gestores
Preço: gerenciar melhor os especialistas técnicos, agora parte
Preços dinâmicos; pagamento conforme uso; serviços fundamental de sua equipe, ter maior autoridade sobre
on-demand; economia colaborativa e compartilhada. decisões de investimento, aproveitar oportunidades
tecnológicas para otimização de sua gestão, tendo em conta,
Ponto-de-venda (Place): claro, as inerentes limitações da tecnologia atual e,
fundamental em um ambiente cada vez mais mutável,
e-commerce; automatização de compra; showrooming;
fomentar a inovação em produtos, serviços e processos tendo
monitoramento online de estoques
a tecnologia como facilitadora.
Propaganda (Promotion):
A tecnologia deve ser vista como uma ferramenta para a
Redes sociais; mídia programática; e-CRM; Influencer solução de uma necessidade ou realização de uma tarefa,
marketing; neuromarketing. sendo, porém, secundária frente à necessidade dos clientes.

Independente da área de atuação ou indústria, a digitalização


Os profissionais neste cenário necessitam de conhecimentos
das relações humanas e comerciais afetou de forma similar
horizontais que unam estas, antes separadas, áreas de
todos os mercados. Alguns impactos diretos:
conhecimento. Aqueles que formação original em tecnologia
devem buscar compreender aspectos comportamentais dos
consumidores, modelos de monetização e aprofundar-se em
questões relacionadas à experiência do usuário (agora,
consumidor); os com formação original em negócios
(marketing, administração, comunicação, gestão) devem
ampliar seus conhecimentos através da compreensão das
possibilidades/oportunidades e limitações tecnológicas, as

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A Metromile é uma empresa de seguro de automóveis que
compra o consumidor de acordo com a quilometragem
rodada (o valor do seguro varia conforme o uso do
veículo).

Adicionalmente, a empresa tem utilizado o sensor


instalado no automóvel para monitorar o estilo de direção
Migração de um cenário de escassez de
do motorista e, com isso, poder aplicar descontos aos
informação para abundância de dados
motoristas mais cuidadosos e que respeitam os limites de
Em um ambiente desconectado (onde não há fluxo de velocidade das vias.
informação constante), a obtenção de dados é demorada e
fragmentada. Por conta disso, processos decisórios podem
tardar e/ou não serem tão assertivos. A maior visibilidade
gerada pela conectividade e tratativa de dados digitais
acelerou o processo, além de permitir análises e conclusões
mais certeiras.

Maior transparência e agilidade nas relações

A velocidade da comunicação e das transações aumenta


exponencialmente, demandando preparo por parte das
empresas para lidar com um público 24 x 7 e
permanentemente demandante. Juntamente com a
disponibilidade de dados, as consequências destas relações
tornam-se públicas e, portanto, passível de análise e
julgamento por parte de outros consumidores, potenciais
consumidores e sociedade em geral.

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Inteligência distribuída através das conexões
O Nubank é uma fintech brasileira que vem incomodando
entre pessoas e sistemas
fortemente grandes players de cartões de crédito, como a
própria Visa. A conectividade permite maior troca de dados e do resultado
Seus diferenciais incluem um aplicativo mobile que permite de seu processamento, ampliando os contatos e troca de
a visualização atualizada dos gastos, além de experiências e informações entre profissionais (ou melhor,
funcionalidades anteriormente, com outras operadoras de indivíduos) em todo o mundo.
cartão, acessíveis somente pelo telefone, como alteração do A inteligência distribuída acelera o conhecimento e elimina a
limite de crédito e bloqueio emergencial do cartão. barreira dos círculos sociais e limitações geográficas no
O app, no entanto, é apenas a operacionalização de um desenvolvimento de novos produto e soluções.
pensamento voltado ao mundo digital, desburocratizado e
qu e p re za p e l a au t o no mia d o s c o ns u mid o re s e
transparência na comunicação.

Antes de pensar em “melhorar o app”, as instituições


financeiras tradicionais devem repensar seus processos.

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Aumento do autosserviço e do pensamento DIY
(do-it-yourself)

A possibilidade da realização direta de tarefas que antes


dependiam de uma empresa intermediária moldou novos
O projeto SETI (acrônimo para Search for modelos de negócio e de relacionamento com clientes. No
Extraterrestrial Intelligence), da agência espacial norte- fundo, há maior amplitude entre o autosserviço e o
americana (NASA), utilizou a capacidade ociosa de pagamento pela curadoria ou simplificação de tarefas, à
computadores pessoais em diversos países para vontade do consumidor.
interpretação da enorme quantidade de dados recebidos
pelos satélites e radares do mundo. Um software protetor Empresas como AirBnb (que facilita a transação entre
de tela instalado pelos usuários residenciais utilizava parte proprietários de imóveis – ou cômodos – e inquilinos
do processamento do computador para processamento dos temporários) ou Monepp (aplicativo que permite que pessoas
dados, enviando-os de volta à NASA. comprem moeda estrangeira de outras, sem intermediação de
uma instituição financeira) são bons exemplos da chamada
economia colaborativa/compartilhada.

Novas empresas surgem, então, com o papel de facilitadores


(enablers) deste, de certa forma, autosserviço entre
consumidores. Outros modelos de negócio incluem curadores
de conteúdo que podem servir como um filtro de relevância na

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busca por informação, como o caso do serviço Trivago, que
permite a busca por quartos de hotel disponíveis em múltiplos
serviços, simultaneamente; ou o Biva, plataforma de
financiamento C2B (Consumer-to-business), com pessoas
físicas financiando iniciativas de negócio de pequenas
empresas (a taxas de juros de obtenção de capital menores e
de rendimento para investidores maiores do que as oferecidas
pelos bancos).

Percepção de diferença entre propriedade e


uso

Acostumados a mais de 2.000 anos de relações comerciais de


troca, a sociedade digital adota novos padrões
comportamentais ao questionar o real valor em possuir algo
cujo tempo de utilização e/ou custo de manutenção superem o
benefício do próprio uso deste bem. Tomemos como
referência um automóvel; segundo um estudo publicado pela
O Monepp é um aplicativo que permite a indivíduos UCLA1 (University of California) o tempo de utilização efetiva
(pessoas físicas) realizarem trocas de moedas a um valor de um automóvel durante a semana é ao redor de 5% do
de câmbio livre, acordado entre elas. tempo total da posse deste automóvel, ou seja, um indivíduo
Longe de ser uma “casa de câmbio”, o Monepp posiciona- utiliza efetivamente o automóvel (dirigindo-o) menos de um
se como um ‘conector de pessoas’, facilitando um processo décimo do tempo. Isto leva a um pensamento interessante, a
que, hoje, já ocorre naturalmente (buscar pessoas que maioria dos indivíduos pode não querer um automóvel, quer
disponham de moeda estrangeira ao invés de recorrer aos apenas chegar aos seus destinos.
bancos e casas de câmbio. Em uma outra visão, até o meio da década de 10 (2010..) as
pessoas ainda tinham a necessidade de se adquirir um

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conteúdo audiovisual (ou apenas sonoro), como músicas e
filmes – ainda que a posse fosse exercida sobre conteúdos
A digitalização da vida se dá a partir do momento em que
digitais, como arquivos MP3 ou MP4. Isto quer dizer que,
estes elementos passam a ser tratados como ‘conteúdos
ainda que com conteúdo digital, prevalecia o pensamento
disponíveis’ e não mais ‘bens’. Não há necessidade de se
comprar um MP3 pois o Spotify possui uma ampla biblioteca
de músicas; não há necessidade de se comprar um filme pois o
Netflix e HBO Now tem um vasto catálogo. Na verdade, o que
se paga neste tipo de serviço não é nem o conteúdo em si, mas
o trabalho feito em curadoria e disponibilização dele.
Curadores / distribuidores / enablers de mídia como o Spotify
ou Netflix, tem como real benefício a facilidade do acesso ao
conteúdo de qualidade mais do que o conteúdo em si (que,
guardadas devidas restrições jurídicas, poderia ser baixado
gratuitamente em serviços de torrent ou similares).

Todo serviço ou conteúdo que possa ser digitalizado reduz seu


senso de propriedade. Isto implica em menor tolerância do
consumidor a custos diretos ou indiretos (tempo, esforço) em
Curiosamente, a conectividade digital criou a “doença” e a processos desnecessários ou ligados exclusivamente à posse
“cura” no processo de gestão dos direitos autorais na área do bem (como mensalidades de cartões de crédito que já
musical. ganham dinheiro com as transações). Em resumo, o objetivo é
Os downloads ilegais de arquivos MP3 foram, em parte, mais importante que o processo para obtê-lo.
substituídos por serviços de streaming de música
A diferença entre “posse” e “uso” também é observada quando
(transmissão online), legais, à medida que estes serviços
levamos em consideração o esforço necessário para realização
tornaram-se mais relevantes e fáceis de usar quando
de uma tarefa. O próprio e-commerce, nesta perspectiva,
comparados ao processo de efetuar um download, ajustar a
eliminou a necessidade de um deslocamento físico ao local de
qualidade do áudio e transferir para um dispositivo.
compra, e todas as intempéries relacionadas a isso (trânsito,
pagar estacionamento, achar vaga, etc).
comercial próprio da transação de bens tangíveis.
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quanto ao momento de sua adoção, haja vista termos uma
população que se encontram em diferentes estágios de
conectividade.

Mesmo com uma grande massa de pessoas conectada, a


maturidade repertorial quanto a novas ferramentas e
utilização da rede apresenta uma considerável variação. Do
total de usuários, 5% dos usuários podem ser considerados
‘trend-setters’, altamente conectados são pessoas que buscam
a diferenciação através da busca e descobrimento.

Serviço de assinatura de produtos HomeRefill, que Junto com o grupo anterior, os heavy-users representam
periodicamente entrega na residência do cliente uma lista outros 14% do total de indivíduos conectados. Este grupo
de produtos de supermercado de uso recorrente (a lista de utiliza o espaço digital como uma extensão de sua vivencia
produtos e periodicidade é definida pelo cliente). física, produzem conteúdo, interagem online e mesclam seus
valores entre as experiências reais e virtuais. Apenas estes
dois primeiros grupos, que em média estão conectados 40h
por semana, consomem 70% de todo o trafego da internet.

Uma grande massa de usuários vem em seguida,


Maturidade repertorial e fluência representando 69% dos indivíduos conectados. Geralmente
seguem o comportamento de grupo, “invadem” as novidades
digital tecnológicas apenas quando já estabelecidas; são
É importante, contudo, entender que ainda há um abismo em consumidores e replicadores e conteúdo, ávidos pelo
todo o mundo (e, claro, no Brasil) sobre o acesso à tecnologia reconhecimento dos pares.
e consequente repertório e maturidade em seu uso. Por fim, os web-funcionais são aqueles que enxergam a
Enquanto tecnologias inovadoras e disruptivas fazem brilhar conectividade e ferramentas digitais como meios para
os olhos daqueles envolvidos diariamente em seu estudo e execução de tarefas específicas (enviar mensagens, pesquisar
aplicação, a realidade brasileira exige uma análise crítica um assunto), mas demandam uma presença física em suas
relações sociais e comerciais.
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A partir de 2014, contudo, a popularização dos smartphones
empurrou uma grande leva de indivíduos que passou a gozar
dos benefícios da conectividade a partir deste dispositivo Platform adaptative:
móvel; quer dizer, o telefone celular acabou sendo o grande
A linguagem e formatos devem ser adaptados à forma de
responsável pela inclusão digital.
consumo de diferentes plataformas. Um gestor deve
Com uma mudança constante nesse cenário – e, de certa identificar o porquê da presença da marca em cada
forma, independente dele – iniciativas dentro do ambiente ferramenta digital e moldar esta presença em função da forma
digital devem ter como premissas algumas linhas de de uso dos consumidores.
pensamento ligadas ao Conteúdo (o que é oferecido ao
cliente), Dispositivo e Plataforma / Ferramenta:

Brand as utility (Content):

Conhecimento através da utilidade; deve-se tornar a marca


algo que faça diferença no dia-a-dia do potencial consumidor
encarando seu universo como algo muito maior do que a
utilização do produto em si (conteúdo orbital, explicado mais
à frente).

Device Agnostic:

O conteúdo e/ou serviço oferecido pela empresa deve estar


disponível independente do dispositivo utilizado para
acessá-los.

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Aspectos comportamentais dos produção de conteúdo. Anseio este que poderia ser ilustrado
como frases como:
consumidores / usuários
“Eu posso fazer isso!” – empresas podem se aproveitar da
Como dito, há uma retroalimentação entre a evolução vontade de participação dos indivíduos na construção de algo
tecnológica e mudanças comportamentais, que avançam (uma mensagem publicitária, um produto).
ciclicamente. O cenário neste ambiente de intensa
conectividade reforça três conceitos: “Olha o que eu fiz!” / “Olha pra mim” – a valoração do
indivíduo e/ou suas conquistas individuais em meio ao grupo
Prosumerism: e à comunidade ao redor da marca.

Connectivity:

Como decorrência do Prosumer da sociedade pós-moderna -


termo cunhado pelo escritor do livro “A terceira onda”, Alvin
Toffler – o indivíduo passa a, simultaneamente, exercer os A universal conectividade também se transporta para
papéis de produtor e consumidor, tanto na cadeia produtiva questões comportamentais na formação de comunidades,
como no fluxo de comunicação e produção de conteúdo. busca por pares e o reconhecimento do indivíduo dentro do
grupo, e o surgimento de embates com grupos antagônicos;
Enquanto, apenas como consumidor, era tratado como
também ilustrados por frases como:
receptor dos meios de comunicação e produção de serviços, a
partir do momento em que passa também a atuar como “Nós somos parecidos” – busca por iguais ou formação dos
‘produtor’, cria-se uma batalha pela atenção e exposição, em valores e gostos em função da busca por aceitação do grupo.
uma busca incessante pela ampliação do Warholdiano “15
minutos de fama”. “Nós podemos fazer isso juntos” – o valor percebido pela
formação de uma comunidade ou movimento, refletido, por
Como resultado, este novo produtor anseia pelo reforço e exemplo, em conceitos como o crowdfunding e na própria
endosso do poder conquistado, sobretudo quando tratamos da essência das redes sociais.
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“Nós somos melhores que eles” – utilizando um dos
mecanismos básicos de auto-afirmação: a busca por inimigos
comuns; a negação do outro para auto afirmação. Conteúdo orbital
Interactivity: Trata de um conjunto de temas expandido que pode ser
trabalhado na presença fixa de marca, agregando valor à
relação com consumidores.

“Orbitando” o produto e a marca, existem múltiplas camadas


temáticas que podem ser apropriadas para se trabalhar
presença fixa de marca de forma integrada. Esta expansão se
dá em um eixo que considera camadas de temas relacionados
ao produto/marca mas que não, necessariamente, tratam
Por fim, a, também presente, interatividade aparece na
diretamente do uso ou compra do produto/bem.
efemeridade de tudo, na possibilidade de se alterar o entorno,
identificado como “Cultura do Remix” por Lawrence Lessig No centro deste modelo orbital está o produto (bem / serviço)
em seu livro “Remix” – “o livro descreve o processo como em si que sempre possuirá uma percepção de valor menor
uma evolução à ultura do ‘read-only’, e que um pequeno para os consumidores que para a empresa. Explicando, na
grupo de produtores (gravadoras, estúdios, emissoras, etc) é maioria das vezes a empresa (seus funcionários,
responsável pelo consumo da massa.” departamento de marketing, vendas) carrega seu produto
(bem / serviço) com uma carga de valor percebido muito
Também para efeito de ilustração, poderíamos elencar frases
maior do que aquela atribuída por seus consumidores. Isto se
como:
deve ao fato de estarem diretamente envolvidos em sua
“Se eu quiser, eu posso mudar isso” – o empoderamento do concepção e venda, tendo suas vidas pessoais impactadas pela
indivíduo sobre o conteúdo e sua percebida liberdade sobre a dedicação dada a este processo (salário, plano de saúde dos
propriedade deste. filhos, vale-refeição). Os consumidores, por não terem esta
carga emocional relacionada ao produto, tendem a tratá-lo
“Eu quero ser parte disso” – novamente um reforço da busca
como “mais uma opção” e, portanto, são menos suscetíveis a
pela adaptação do mundo ao indivíduo; fazer a diferença.
aceitarem alguns apelos de comunicação feitos pelas
“Isso deveria ser diferente por minha causa”. empresas.

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Ter o próprio produto como tema central de sua presença fixa Subindo na escala, a empresa pode tentar ser referência na
de marca será relevante para os consumidores apenas e tão oferta de informação, serviços, etc no segmento onde está
somente quando este produto/empresa forem efetivamente inserida. Por exemplo, a XP Investimentos, através de seu
relevantes em aspectos cotidianos da vida deste público (como portal vertical Infomoney, auxilia pequenos e médios
um serviço utilizado por muitos), quando o produto/serviço investidores a interpretar as tendências de mercado,
apresentar efetivamente uma inovação disruptiva (como o independente de serem clientes da XP ou não.
lançamento do primeiro iPhone ou do carro autônomo da
O terceiro nível está ligado aos hábitos de uso do produto.
Tesla) ou com produtos/serviços cujo processo decisório seja
Enquanto faz uso de um produto ou serviço (seja da marca ou
totalmente racional e baseado em características técnicas
não), o consumidor aplica certas características pessoais ou
deste produto/serviço (por exemplo, a decisão pela compra de
adaptativas a esta utilização, bem como simultaneamente
uma carregadeira com lança de junta articulada – ok, o
pode estar realizando outras tarefas relacionadas. “Pipoca
exemplo foi específico, mas ilustrativo).
com guaraná” é uma associação conhecida pela forte
campanha da Antarctica nos anos 90; a empresa associou seu
refrigerante ao consumo de pipoca, comum enquanto se
assiste filmes, jogos ou outros programas na TV e cinema.
Com isto, tentou apropriar-se de um hábito. Usar o celular
(indústria de eletrônicos) enquanto dirige (montadora de
automóveis); escovar os dentes (indústria de beleza e higiene
pe ssoal) enquanto se ouve música (indústria do
entretenimento) são outras possíveis combinações.

Subindo um nível, tratamos do contexto de uso do


produto/serviço. Sua utilização pressupõe todo um
universo repertorial ao redor. Quem utiliza um tênis para
correr na verdade está envolvido com todo um universo
relacionado à prática do esporte; locais para correr,
alimentação adequada, programas de treinamento, formação
de grupos para correr. A empresa/marca pode criar utilizando
os elementos deste universo e, com isso, aproximar-se do
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público que já consome ou poderá consumir um dia seu relacionado à presença contínua da marca, a questões que não
produto. são alteradas a cada campanha publicitária) e parte-se para o
planejamento tático de como estas associações serão tratadas
A última camada trata de valores endossados e vividos
em cada plataforma.
por marcas. Há uma grande dificuldade em se atingir um
estágio no branding que permita às marcas firmar-se como Expectativas e motivações dos
“proprietária” daquele sentimento ou valor sem soar como um
oportunismo ou ação publicitária pontual. No marketing esta consumidores / usuários
percepção subjetiva de valor da marca é chamado de “brand
equity” – segundo a American Marketing Association, é “o
valor da marca. Pela perspectiva do consumidor, brand
equity é o valor baseado nos atributos positivos da marca e
nas consequências favoráveis do seu uso”.

A Apple apropriou-se da percepção de “design”, a RedBull das


ações “radicais”, a Nike da “superação de limites”, a Coca-Cola
esforça-se para apropriar-se da “felicidade”, ainda que possa
soar utópico. Estendendo o brand equity para o conteúdo
orbital, faria sentido, hipoteticamente, a Coca-Cola lançar um
parque de diversões (afinal, ela vende “felicidade”, não
refrigerante); faria sentido a Apple abrir uma universidade de
Design (pois é tida como grande referência no tema); a
RedBull já baseia todo seu marketing na realização de eventos
e ações que reforcem seu DNA de marca (como eventos com Trazendo para o universo das plataformas digitais, uma série
acrobacias de aviões, entre outros). de artigos, livros e teorias busca identificar padrões sobre os
desejos e anseios dos consumidores no meio digital.
No mundo da comunicação digital, o conteúdo orbital serve
para guiar as ações da empresa em todas suas plataformas. Um modelo adotado por agências de propaganda é conhecido
Identifica-se em que nível se quer trabalhar, qual a associação como Wave diagram, que coloca as expectativas básicas dos
desejada como essência da marca (lembrando que isto está consumidores digitais em 5 áreas:

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• Learning: busca por conhecimento, atualização, o Informar / explicar como funciona;
opiniões a respeito de temas diversos (incluindo
o Educar / ensinar;
produtos e marcas).
o Dar dicas / formas diferentes de uso;
• Relationship: atender aos anseios de pertencimento,
proximidade e compartilhamento com outros. o Ensinar sobre temas correlatos à marca.
• Recognition: desde auto-promoção à busca por
endosso de outras pessoas a partir de sua
auto-expressão; busca pelo respeito e reconhecimento.

• Diversion: divertir-se, trabalhar a criatividade de forma


descompromissada, escapar da realidade.

• Progression: evoluir financeiramente e na carreira;


adquirir bens e/ou formas para obtê-los.

Paralelamente a este pilares, destaca que a customização,


valorização e relação emocional são três ideias-chave
fundamentais que as marcas devem considerar em suas
estratégias. Mesmo antes do mundo digital, marcas de alimentos já
Um outro modelo, adaptado do livro “e-marketing”, de Tania ofereciam livros de receitas (que poderiam ou não serem
Limeira, leva em consideração 4 pilares: Informação, preparadas com os produtos da empresa).
Entretenimento, Serviço, Comunicação (ou Comunidade); A digitalização permitiu adicionar interatividade,
didaticamente colocado como modelo IESC. elementos multimídia (como vídeos) e, até mesmo,
formatar este tipo de conteúdo como um serviço ao, por
Informação
exemplo, pedir uma lista dos ingredientes disponíveis no
Muito próximo do marketing de conteúdo, trata de oferecer ao armário e apresentar receitas em função desta
consumidor (potencial, etc) informações a respeito de algum disponibilidade.
assunto relacionado ao produto ou seu conteúdo orbital.

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Serviços E, resgatando o exemplo anterior, muitas vezes as empresas
transformam sua oferta de conteúdo em um formato de
Relacionado ao produto ou a seu conteúdo orbital, pode-se serviço, buscando otimizar o tempo do consumidor:
oferecer um serviço que auxilie o público em seu dia-a-dia,
não necessariamente ligado à utilização direta do produto.

• Ajuda o consumidor a resolver algo na vida;

• Facilita a vida do consumidor economizando seu tempo;

• Pode ou não estar atrelado ao produto.

O “Prepara pra mim” foi uma iniciativa da Hellmann’s


onde o consumidor enviava um tweet para a empresa
indicando o que tinha disponível na geladeira e a empresa
respondia com uma receita de uma refeição utilizando
estes ingredientes.
Através de seu app, a marca de guitarras Gibson oferece
Neste caso, vale destacar o aspecto mercadológico da
tablaturas musicais, aulas de guitarra e um afinador para
própria ação mercadológica. Mais que transformar este
instrumentos de corda.
serviços em algo permanente, a empresa/marca buscava
gerar earned media com a iniciativa inusitada.

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Entretenimento

Comunicação / Comunidade A marca oferece, através da aplicação de seus valores,


ferramentas e momentos de descontração para o consumidor.
A marca, neste caso, trata de conectar e reunir pessoas com
interesses comuns (e que possam ser apropriados pela • Consumidor usa tempo livre de forma divertida ou
marca). Ao agir como agregadora de interesses, cria uma base relaxante;
de influenciadores de marca e torna-se referência no tema.
• Pode ser interativo ou passivo;
• Promove a comunicação entre pessoas;
• Remete a momentos bons / felizes.
• Aproxima interesses comuns;

• Estimula influenciadores;

• Forma comunidades ao redor de conceitos que a marca


endossa.

A Ford Motors, durante muito tempo,


manteve um clube para donos de pick-ups
(da marca ou não), que tinham como
diversão realizar passeios e trilhas aos finais
de semana.

Através do Clube do Picapeiro, a marca A série de filmes “Transformers” é, praticamente, um


promovia estes encontros e aproximava-se comercial de 2h cada da General Motors. Todos os
de seus consumidores atuais e potenciais. ‘mocinhos’ do filmes (Autobots) são veículos da marca,
enquanto os ‘vilões’ (Decepticons) são modelos disfarçados
de seus principais concorrentes.

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Importante mencionar que esta divisão conceitual e didática Tanto a presença fixa como as campanhas pontuais devem ter
não deve ser considerada excludente, isto é, um consumidor suas estratégias estruturadas de acordo com características de
pode facilmente ter motivações que contemplem dois ou mais cada ‘media type’, seguindo o modelo P.O.E. da Nokia.
destes pilares, assim como as estratégias das empresas (por
Repare que a divisão de modelos não atende a tipos de mídia,
exemplo, fornecer informação com entretenimento); contudo,
senão a formas como são utilizadas:
um deles sempre terá maior peso ou exposição que outro
(neste exemplo, a informação é o fator de atração enquanto o
entretenimento é a forma como a informação é apresentada).
Paid:
Modelo P.O.E.
Ações onde a marca/empresa necessita pagar para estar ou
Planejar para plataformas digitais pressupõe o entendimento ser referenciada. Aqui entra a compra de espaço publicitário
sobre os conceitos de Paid, Owned e Earned Media. (on e off-line), publieditoriais, pagamento de influenciadores,
etc.
Baseado em um modelo de espaços midiáticos criado pela
Nokia, trata de classificar as iniciativas mercadológicas de No modelo Paid, a empresa detém o controle dos meios de
acordo com sua estratégia de propagação. propagação da informação (pois fazem parte de seu plano de
mídia) e da mensagem passada. A credibilidade do que é
transmitido, porém, é reduzida, já que é claro aos
consumidores que se trata de “propaganda” não isenta.

Owned

Trata de ambientes ou situações cujo controle editorial é da


própria empresa. Desde ambientes físicos como lojas
próprias, passando por seu website corporativo ou perfis em
Imagem do post original, de Daniel Goodall, relatando o modelo de planejamento
ferramentas sociais, é claro a todos que ali ‘é a empresa
em mídias digitais. falando’, com sua falta de isenção e, ao mesmo tempo,
compromisso, entendidos por todos.
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Earned produtos. Por exemplo, Ford, “as pessoas querem comprar
um Ford Ka mesmo quando a campanha que está no ar e em
Erroneamente tido como sinônimo de ‘Social Media’, a destaque é a do Ford Focus”.
Earned media surge de forma espontânea (parte do próprio
público) ou induzida (a partir de ações Paid ou Owned da Desta forma, as empresas e suas agências deveriam preocupar
empresa) mas não envolve nenhum tipo de pagamento nem constantemente com toda sua linha de produtos e todos os
controle direto ou indireto da empresa sobre a mensagem. processos envolvidos no relacionamento com clientes, o
tempo todo, 24x7, em diferentes plataformas onde o
Além de entender esta classificação, é necessário confrontar consumidor estivesse e tratando dos assuntos que ele
modelos de planejamento publicitário antes e depois das quisesse. Reforça-se o conceito de presença contínua ou fixa
plataformas digitais. de marca e plataformas digitais, onde campanhas deveriam
A publicidade era geralmente planejada de forma cíclica, ser vistas como esforços adicionais (mas não principais na
alternando campanhas de acordo com a época do ano, construção do branding) para destacar temas específicos ao
lançamentos, eventos externos ou qualquer outro critério que longo do tempo).
empresa e agência de publicidade estabelecessem.

Porém, quando o contato entre consumidores e marcas / Como dito, ações de Paid e Owned podem servir de gatilho
empresas passa a ser mais próximo, transparente e acessível para uma repercussão orgânica na Earned Media, que só será
graças às plataformas digitais, surgiu a necessidade de se considerada como tal quando a presença da empresa for
pensar a presença contínua (ou fixa) de marca, independente imperceptível na conversa entre os indivíduos sobre o tema
de campanhas publicitárias pontuais que visassem destacar relacionado a ela (seu produto ou conteúdo orbital).
um ou outro produto em detrimento do restante da linha de

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A tabela abaixo, traduzida de modelo desenhado pela
Forrester Reseach Inc., dá uma visão geral de cada
abordagem:
Abordagem
Definição Exemplos Papel / Objetivo Benefícios Desafios
de mídia
• Website
• Site Mobile
• Controle
• Blog Construído para • Eficiência de • Sem garantia da boa
• Perfil no relacionamentos de receptividade
Canais / custo
Twitter longo prazo com • Baixa credibilidade
Owned Plataformas • Fanpage no consumidores
• Longevidade
para comunicação
Media que a marca
Facebook potenciais e ponto de
• Versatilidade
corporativa
controla • Canal no chegada para earned • Construção de • Leva-se tempo para
audiências de
YouTube media ganhar escala
• Perfil no nicho
Snapchat
Canais / • Anúncios • Sobrecarga da
Alavancar / • Sob demanda
Plataformas • Links mensagem publicitária
Paid Alimentar os acessos • Imediatez
que a marca Patrocinado • Taxas de resposta
Media paga para s
à owned media e criar • Escalabilidade
decadentes
• Patrocínios earned media
• Controle
aparecer • Baixa credibilidade
Quando os • Word-of- Ouvir e responder - • Credibilidade
earned media é
consumidore Mouth • Papel-chave na • Ausência de controle
geralmente o
Earned
Nos exemplos acima, ficou clara a questão do tipo de mídia e Media
s / sociedade
tornam-se o
(boca-a-
boca)
resultado de uma
maioria das
vendas
• Pode ser negativa
• Escalonável
owned e paid medias
canal de • Buzz • Transparência • Difícil de mensurar
forma de uso de cada uma. Não significa, por exemplo, que propagação • "Viral"
bem executados
coordenados
e
e humanização

ações no Facebook (uma rede social) são, naturalmente,


earned media. Uma fanpage no Facebook, como um perfil no
Snapchat ou canal no YouTube seguem sendo Owned media,
ainda que dentro de um canal social, pois a empresa detém o
controle editorial do que está sendo transmitido.

Ações como o Red Bull Stratos (quando Felix Baumgarten


saltou de paraquedas, e uma roupa especial, de um balão na
estratosfera batendo diversos recordes de velocidade, queda
livre, etc) são iniciativas Owned que, por serem inusitadas e
com alto potencial viral, acabam por ganhar uma media
Earned bastante grande.

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