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Cara Patrícia

Sempre ouvimos comentários de "insiders de Castaneda" (as pessoas envolvidas com a


obra e o trabalho interior de Carlos Castaneda), sobre a qualidade medíocre das
traduções da obra em português.

Eu achava que havia exageros no julgamento, até que pacientemente fiz a comparação
do livro "O Presente da Águia" nas duas versões (português e inglês). Não há
palavras adequadas para fazer uma avaliação crítica sobre o que eles fizeram. É o
caos!

Eu sempre trabalhei como executivo de grandes e médias empresas e adquiri um certo


conhecimento de avaliação de equipes e resultados. Eu teria trocado toda a equipe
da editora a partir do produto final das edições do Castaneda. Um desastre.

O primeiro erro deles foi não utilizar pessoas envolvidas com o assunto, como
árbitros finais da qualidade das traduções. Sei apenas da sua revisão do Lado
Ativo do Infinito e da Roda do Tempo. E os outros????

O universo mental tolteca tem pré-requisitos conceituais cuja compreensão é


indispensável para quem faz as traduções. O tradutor tem que saber do que está falando!

O trabalho de CC sobre os videntes do Antigo México nunca foi entendido por eles
tradutores como a apresentação de uma das maiores tradições de trabalho interior do
planeta, algo comparável, como sabemos, ao Taoismo, Budismo, Judaismo, Hinduismo
e outros.
Ficou como se fosse um assunto de bruxos e xamãs obscuros, envolvidos com drogas
alucinógenas. O simples fato de terem traduzido a obra inicial "The teachings of
Don Juan" por "A Erva do Diabo" dá uma dimensão clara dos objetivos de marketing
da Editora Record / Nova Era em detrimento da qualidade dos livros em português.

A Cleagreen, guardiã dos direitos e ativos de CC deveria ter monitorado isto e não
o fez.

O segundo erro foi terem permitido uma trabalho de tradução, copy desk e
supervisão sofríveis. Não era preciso traduzir como o tradutor de Humberto Eco,
mas não tinham o direito de fazer o que fizeram. A visão que se tem hoje de CC
hoje como um representante de um movimento obscuro e discutível de índios,
drogados e bruxos, é resultado disso, além de ter contribuído para um desinteresse
do público no assunto.

Outro dia conversando com um "insider" aplicado e participante de seminários


internacionais, ouvi ele falar " Sempre achei "O Presente da Águia" um livro muito
difícil...", e então ficou claro para mim o engano em que as pessoas caem por não
conhecer a versão original: não é absolutamente difícil. A versão em inglês é
clara, explícita e precisa. Você, Patrícia, que conhece as três ( a espanhola
também) sabe isso. Foi a tradução que obscureceu os significados. Vide o anexo
onde isso fica claro pelas amostras de erros absurdos que eu colhi.
A Cleagreen, se deixar “o negócio” da obra de Castaneda com a Record, vai contribuir
para acabar com ele.
Acho que deveríamos alertá-los. Você me disse que a Record está re-traduzindo a
obra...mas eu penso o seguinte:
“quando CC estava no auge, dando dinheiro, eles fizeram esse estrago com péssimas
traduções, agora (quando ajudaram a estragar tudo), você acredita que vão fazer algo
melhor?

O CC previu que o seu trabalho ia despertar uma onda de detratores no mundo


inteiro. Aqui no Brasil não foi necessário. A Record fez o trabalho. Isso, afora o
lançamento do livro da Amy Wallace, que somente traz polêmica e é um livro cheio
de magoas, e de um ego ferido. Só que, como o povo adora esse tipo de fofocas,
provavelmente vai vender!

Gostaria muito de ver os livros revisados, cuidados. Você não pode se envolver?
Estou com vontade de escrever direto para a Cleargreen ou responsáveis pelos
direitos autorais. O que v. me diz?

Um abraço

Luiz Arnaldo

ERROS, ENGANOS, ABSURDOS, AJEITADAS E AMADORISMOS DA


TRADUÇÃO DO LIVRO "PRESENTE DA ÁGUIA" DE CARLOS CASTANEDA
FEITO PELA EDITORA RECORD/NOVA ERA

1- As "Six explanatory Propositions" foram traduzidas em português como"Cinco


proposições explicativas" porque o título da Sexta foi suprimido por engano ou
deliberadamente, e o texto dela foi simplesmente colocado na sequência do final do
texto da Quinta. Além do absurdo da "colagem", os textos da Quinta e Sexta
conceitualmente não poderiam ter sido misturados pois são coisas diferentes

2- A palavra "seer" em inglês foi traduzida (num contexto de tradutor


amador) fora dos conceitos do autor do livro, e da tradição tolteca. A palavra foi
traduzida por "observador" (em inglês é "watcher" ou “onlooker, ou “observer”) . Isso
apesar de claramente estar definida no decorrer da obra a palavra “seer” como "aquele
que vê a energia como ela flui no Universo".
Qualquer aluno de línguas traduziria por "vidente". Qualquer bom tradutor
colocaria vidente e acrescentaria uma "nota do tradutor" explicando o que caracteriza
esse vidente, ou seja o que esse vidente "vê".

3- No final da página 143, a expressão "shallow dent" foi traduzida por "nossa
raça" quando o correto seria "mossa rasa", ou "depressão rasa". A impressão que se
tem é que uma pessoa falava em voz alta a tradução e outra (meio surda) anotava. Já
que o som de “nossa raça” é parecido com “mossa rasa”, dane-se o leitor! Nossa raça
ou mossa rasa...dá no mesmo!

4 - Na página 142, "every living thing" foi traduzido como "toda coisa humana" e
não "toda coisa viva". No contexto, isso cria um mal entendido porque atribui
coisas de todos os seres vivos (animais, plantas) para só os humanos.

5 - Na página 153, "head-on collision" ou "batida de frente" foi traduzido como


"queda de cabeça"

6 - A palavra "skimming" que foi corretamente traduzida na versão espanhola por


"desnatar" (quando verbo) e "desnate" (quando substantivo), ou seja "filtrar",
"escolher algo, descartando outra coisa que não interessa". Em português traduziram por
"vestígio". Um primor! Isso que é hermetismo. Ninguém então entende “o processo
fundamental pelo qual o ser humano deixa de ver a realidade e passa a ver somente o
que a socialização ensina, e quer que ele veja.”

7 - Na página 232 traduziram "Era como se estivesse corrente" o texto em inglês


"I was as if I were racing". (correndo!)

8 - Há trechos inteiros suprimidos na tradução. Para compensar há trechos inteiros


inseridos.

9 - Há casos onde a tradução conduz a um entendimento não só diverso, mas


contrário do original

Mas não há só isso. Além dos erros em cada livro, é pior ainda se compararmos as
Traduções das palavras e expressões entre os 12 livros que compõem o conjunto. Não
há padronização entre palavras que exprimem a mesma coisa. A palavra "intento", por
exemplo (expressão central do ensinamento) é traduzida aleatoriamente por intenção,
vontade, volição, intuito, propósito e às vezes, (que bom!) intento mesmo. Em inglês é
sempre "intent". Abaixo transcrevo "ipsis literis" as Notas de Tradução da tradutora do
livro "Encontros com o nagual", que acusou algumas dessas falhas apresentadas na obra
de CC:

Notas da tradutora

Os livros de Carlos Castaneda usam algumas terminologias que na tradução para a


língua portuguesa foram alterados por tradutores que não conhecem o tema com
profundidade. Isso afeta de modo importante os significados de alguns conceitos da
obra de Castaneda. Mas, por esses equívocos já terem se consagrado nas diversas
edições dos livros de Carlos Castaneda, decidimos manter os termos com os quais os
leitores já se habituaram. Entretanto, fazemos as seguintes observações:

1. Na versão em português, o termo "vontade" é usado em algumas ocasiões de forma


incorreta. O mais preciso seria "intento".
2. Outro termo inadequado é o de "Ponto de Aglutinação". O correto seria "Ponto de
Encaixe". Em espanhol, como em português, aglutinar não é o mesmo que encaixar.

3. Optamos por manter o termo original da língua espanhola "ensueño", criando a


palavra "ensonho". Sonhar não é o mesmo que ensonhar. Como essa última palavra não
existe na língua portuguesa e a diferença entre elas na língua espanhola é
significativa, acreditamos que o leitor ganhará mais incorporando à bela língua
portuguesa essa nova palavra: ensonhar.

4. E finalmente, a expressão usada em português "Pequenos Tiranos", procurando


traduzir "Pinche Tiranos" não é adequada. O termo "pinche" originalmente significa
algo entre "merda" e "maldito".

Em resumo Patrícia, é o samba do crioulo doido. E veja você, só comparamos a


tradução de um livro. E superficialmente, já que não sou tradutor! E já chega.
Estamos satisfeitos.

----- Original Message -----

From: Luiz Arnaldo

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