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A Vida secreta de Deus – Parte 4

A Escolha é Sua

No musical O Violinista no Telhado, Tevye, o pobre leiteiro, farto de levar uma vida
miserável às custas da sua única vaca, canta Se eu fosse um homem rico.
Ele fantasia sobre como sua vida seria luxuosa: uma casa com um lance de escada
para subir e outro ainda maior para descer; sua esposa, Goldie, "com o apropriado
queixo duplo", gritaria com os empregados; e ele teria sete horas por dia para
estudar os livros sagrados.
A música termina com a questão:
"Deus, que fez o leão e o cordeiro, decretou que eu devo ser o que sou; arruinar-
se-ia algum vasto plano eterno se eu fosse um homem rico?"
Tevye era destinado a ser pobre ou poderia ter ficado rico de algum modo?
Qual a relação entre destino e livre-arbítrio?
Em que medida somos livres para determinar os acontecimentos e as conquistas da
vida?
E até que ponto Deus realmente comanda o mundo?

O livre-arbítrio é a base da vida guiada pelos mandamentos.


A essência dos mandamentos é que você pode escolher obedecê-los ou
desobedecê-los, aproveitando as recompensas da sua escolha ou aceitando as
consequências.
Se Deus não quisesse o nosso livre-arbítrio, Ele poderia ter nos programado para
fazer a Sua vontade de modo natural e instintivo, como os animais.
Os animais não têm mandamentos.
O que um animal faz está sempre alinhado com a vontade de Deus.
Eles não têm livre-arbítrio e não são responsáveis por suas ações.
Segundo a Tradição Oral, o homem foi criado por último na história da Criação para
nos ensinar que se escolhemos fazer a vontade de Deus, somos o auge da Criação.
Mas se escolhemos agir contra a vontade de Deus, então até mesmo um inseto
minúsculo nos precede na linha da Criação e está mais perto de Deus, a Fonte de
tudo.
Ou seja, quando escolhemos cumprir os mandamentos, nos conectamos a Deus e
assim alcançamos o estado mais elevado que um ser jamais poderia esperar
alcançar.
Mas se não cumprimos, até um inseto, que sempre faz a vontade de Deus, está
mais próximo do Absoluto.
O livre-arbítrio é necessário para que o homem cumpra o propósito Divino para o
qual foi criado.
Sem o livre-arbítrio, não haveria mandamentos, responsabilidade pelas nossas
ações, luta, missão ou significado na vida.
Se tudo fosse determinado, se tudo já fosse planejado por Deus, seríamos apenas
marionetes, e as consequências que aproveitamos ou sofremos por nossas ações
seriam arbitrárias.

Maimônides, o grande filósofo do século 12, descreveu explicitamente o significado


do livre-arbítrio:
A todo ser humano é dada permissão.
Se alguém escolhe se inclinar a um caminho de bondade e justiça, o direito está em
suas mãos.
Se alguém se inclina a um caminho de maldade e perversidade, o direito está em
suas mãos."
(Mishne Torá, Leis de Penitência, 5)

Ou seja, você tem uma escolha: pode ser mau ou bom.


Maimônides continua:
"Não seja como os tolos que dizem que ser bom ou mau é um decreto de Deus.
Não é assim.
Cada indivíduo tem o potencial de ser bom como Moisés, nosso mestre, ou perverso
como o rei Jeroboão ben Nebat [que dividiu Israel em dois reinos e construiu
santuários pagãos para bezerros de ouro]."

Parece, então, que a situação é tão definida como preto e branco — há livre-
arbítrio.
Você tem a escolha de ser bom.
Você tem a escolha de ser mau.
Fim da história.

Bem que eu gostaria que fosse o fim da história — seria mais fácil escrever este
capítulo.
A questão, porém, é uma das mais complexas da Torá e da Cabalá.
Aprendi cedo que todos temos livre-arbítrio.
Após alguns anos estudando Cabala, descobri um livro intitulado Leshem Shevo
Veachlama, de um grande cabalista de Jerusalém, o Rabino Shelomo Eliyashiv
(1841-1925).
[O título do livro significa: "Opala, Ágata e Ametista" (Êxodo 28:19), uma
referência à descrição da Torá das pedras preciosas do peitoral do Sumo-
Sacerdote.]
No livro, ele apresenta tradicionais fontes judaicas que expressam uma quantidade
chocante de determinismo, que sugerem não sermos livres.
Mas não pode ser.
A solução desse dilema requer a exploração de ideias bastante polêmicas, mas, ao
final, tudo se esclarece.

O plano de Deus
Muita gente já ouviu a famosa frase do Livro de Eclesiastes:
"Para tudo há uma estação e para todo propósito que se passa sob o céu há um
tempo."
O Midrash (literatura rabinica que elucida nuanças dos Cinco Livros de Moisés)
elabora:
"Havia uma hora para o homem entrar no Jardim do Éden e uma hora para sair."
Mas e o livre-arbítrio?
E se Adão tivesse escolhido não comer da Árvore do Conhecimento?
Ele e seus descendentes não teriam ficado no Éden para sempre?
Segundo o Midrash, ele tinha de sair.
Isso quer dizer que a sua saída — e, por conseguinte, o seu pecado — estava
predeterminada?
O Midrash continua: "Havia uma hora para Noé entrar na arca e uma hora para
sair."
O Dilúvio foi predeterminado?
Não foi consequência das más escolhas dos seres humanos, que escolheram
cometer crimes uns contra os outros em vez de viver em paz?
Mas o Midrash parece indicar que o Dilúvio era inevitável.
E Noé não foi salvo em razão do seu bom comportamento, que ele escolheu
livremente?
Ou era seu destino entrar na arca, não obstante suas escolhas e ações?
Novamente, o Midrash:
"Havia um momento para Abrahão receber a aliança. E havia um momento para se
passarem os mandamentos."
A aliança não foi a recompensa de Abrahão por ter descoberto o inefável Deus por
trás da Criação?
E se ele tivesse escolhido permanecer na fábrica de ídolos do pai?
Abrahão não tinha livre escolha?
E o povo judeu não recebeu os mandamentos porque escolheu aceitá-los e viver
conforme suas determinações?
Ainda assim, o Midrash parece estar dizendo que todos esses eventos já estavam
arranjados desde o começo.
Em outra passagem, o Midrash vai mais adiante e aumenta o nosso problema:
"Muitos foram designados antes de vir. A morte recebeu a ordem de vir ao mundo,
e Deus não a trouxe exceto através da serpente, que estava predestinada à morte."
Essa declaração parece contradizer a clássica escolha descrita no Livro de Gênesis.
Adão e Eva tinham de decidir se comiam da Árvore do Conhecimento, trazendo,
assim, a morte ao mundo, ou se obedeciam ao mandamento de Deus de não comer
daquela árvore específica.
Esse Midrash infere que houve uma armadilha, que a morte já estava destinada a
vir ao mundo, não obstante a escolha de Adão e Eva.
O Midrash comprova seu argumento citando um versículo de Gênesis (2:17):
"E ordenou o Eterno Deus ao homem, dizendo: De toda árvore do jardim podes
comer. E da Árvore do Conhecimento, do Bem e do Mal, não comerás dela; porque
no dia em que comeres dela, morrerás."
Deus não estava dizendo "se comeres" ou "talvez comas".
Ele disse "no dia em que comeres", ou seja, "irás comer. Sei que Eu te falei para
não fazer isso, mas sei que vais comer. E morrerás."
Se isso não é suficiente, o salmo 66 nos diz:
"Vinde perceber os feitos do Eterno, que por Sua grandeza despertam reverência
nos homens."
O Midrash, quando explica esse salmo, diz que Deus já havia orquestrado como a
morte deveria vir ao mundo por meio do ser humano.
E o Midrash continua a discutir outros acontecimentos predeterminados.
Se alguém ler tudo, pode equivocadamente concluir que não existe liberdade, não
existem escolhas, o roteiro já foi escrito e estamos apenas interpretando nosso
papel.
Para que, então, nos levantaremos amanhã se vamos apenas ler um roteiro que já
foi escrito?
Reflexões assim sobre o destino podem parecer metafísicas, mas em toda a nossa
vida passamos por acontecimentos e encontros que, em retrospectiva, parecem ter
sido destinados a acontecer.
Você já brigou com alguém muito próximo?
Você fica tão furioso que decide pegar um avião e voar ao Polo Norte.
Quanto mais longe, melhor.
Você chega à recepção de um iglu cinco estrelas e quem você encontra ali, fazendo
o check-in ao seu lado?
Seu amigo, tentando fugir para o lugar mais longe possível de você.
Então, ao fundo, o tema musical do seriado Além da Imaginação começa a tocar.

Às vezes olhamos para trás, para os encontros e eventos mais importantes da


nossa vida, e não sentimos que aconteceram por acaso ou por qualquer decisão
consciente nossa.
Pergunte a um casal bem-casado, um desses pares perfeitos, como se conheceram.
Ela trabalhava no serviço de atendimento ao consumidor e ele veio devolver um
telefone defeituoso.
E se ele não tivesse comprado o telefone com defeito?
E se ele tivesse pegado a outra caixa da prateleira, eles teriam se conhecido?
Impossível!
E o presidente de uma companhia que, no seu jantar de aposentadoria, revela que,
quarenta e cinco anos atrás, um estranho sentado ao seu lado no banco de uma
praça mencionou que aquela empresa procurava gente nova?
O Seder Olam ("Ordem do Mundo"), uma narração da história da humanidade
composta no século 2 da era comum, declara: "Deus mostrou ao primeiro homem
[Adão] toda a história. Deus lhe mostrou cada líder de cada geração, cada profeta,
cada oficial, cada tarefa particular de cada pessoa (..) Deus lhe mostrou o número
dos dias, das horas e até mesmo a soma total dos passos de todos."
De acordo com essa passagem, Adão conhecia cada um de nós.
O primeiro homem sabia que o David Aaron seria ruivo, moraria em Jerusalém e
teria dez filhos.
Ele sabia que o David Aaron fundaria o Instituto Isralight e escreveria este estudo.
Por isso me sinto tolo quando me lembro da busca agonizante pela qual passei,
decidindo o que faria da vida, decidindo se fundaria o Isralight, decidindo se
concentraria minha energia em escrever um terceiro livro.
Perdi meu tempo.
Deveria ter perguntando ao primeiro homem.
Ele poderia ter me dito.
Você provavelmente pensa que escolheu comprar ou pegar este estudo emprestado
de um amigo.
Mas o primeiro homem sabia que você leria este estudo.
Você pode ter ido à livraria procurando um manual ou um romance, mas, de algum
modo, teve de sair com este estudo nas mãos.
Você pode ter ido à casa de um amigo para jantar, mas, de algum modo, teve de
pegar este estudo emprestado.
Seus planos de hoje poderiam incluir inicialmente uma caminhada, um encontro ou
um bom filme, mas em vez disso você está sentado aqui lendo A Vida Secreta de
Deus.
E o primeiro homem sabia que você faria isso.
Então, o que está acontecendo?

Deus, o Autor
Certa vez, uma professora minha disse:
"Quando você faz uma escolha ruim entre duas opções, pode não ser uma questão
de má escolha, mas apenas de falta de imaginação. Havia uma terceira opção que
você nem imaginava existir."
Há séculos os filósofos debatem sobre a questão do livre-arbítrio versus
determinismo.
No entanto, talvez isso seja um problema de imaginação fraca e exista uma terceira
opção além do "ou isso ou aquilo".
Antes de analisarmos essa terceira opção, quero lembrá-lo do aviso que fiz no
começo do estudo: sempre que falamos de Deus, necessariamente falamos em
metáforas.
Estou prestes a apresentar uma metáfora que, espero, vai lhe trazer um
sentimento diferente sobre suas escolhas, além de mostrar o quanto Deus está
envolvido na sua vida.
Porém, essa metáfora é apenas isto — uma metáfora.
Às vezes as pessoas interpretam literalmente as metáforas sobre Deus.
A metáfora-padrão da relação entre Deus e a humanidade é a do rei e súdito, ou a
do pai e filho.
Há outras metáforas: marido e mulher e até mesmo Deus como criança e o ser
humano como mãe.
Quanto mais metáforas, melhor.
Assim não nos prendemos a uma só analogia, pensando ser realidade.
Cada metáfora é como o olho mágico na porta, que nos deixa ver um pouco dos
diferentes tipos de relacionamento que temos com Deus.
A analogia seguinte é um novo olho mágico.
Deus é o Autor e nós somos os personagens de Deus.
Os escritos de um autor são um ato de auto expressão.
Cada personagem do livro tem um pouco do autor.
É por isso que os cursos de redação sempre nos recomendam escrever sobre o que
sabemos.
Não escreva sobre gueixas no Japão a menos que você tenha sido uma; um
romance sobre uma mulher suburbana de Nova Jersey pode ser menos dramático,
mas será mais bem escrito, porque o autor deve conhecer e ter alguma ligação com
seus personagens.
Cada personagem expressa um aspecto diferente do autor.
Cada personagem é criado a imagem do autor.
A Torá, no Livro de Genesis, faz uma afirmação estranha.
Diz que Deus criou o homem à Sua imagem.
O que isso quer dizer?
Deus criou o homem à Sua imagem do mesmo modo que um autor cria todos os
seus personagens à sua imagem.
Cada personagem na história expressa um aspecto diferente do autor.
Até mesmo a interação dos personagens é de certo modo uma descoberta da
verdade do autor.
Por outro lado, há outros personagens com os quais o autor não se identifica.
Toda boa história tem um antagonista, um vilão.
Todo bom livro tem um personagem-problema que cria toda a tensão.
Por que aquele personagem está ali?
Porque o vilão tem o papel essencial de trazer a tona a natureza mais profunda de
todos os outros personagens.
Esse papel é importante.
O papel dos maus na história é ajudar os bons a revelar seu mais profundo ser.
O vilão cria a oportunidade para que os outros personagens encarem seus desafios
e demonstrem coragem, força e assumam um novo compromisso.
O Talmud se refere às forças do mal no universo como o fermento na massa.
O fermento consiste de fungos microscópicos.
Quem quer comer fungo?
Mas é o fermento na massa do pão que age como o catalisador que a faz crescer.
Assim também o mal foi criado no mundo para ser um catalisador do crescimento e
do enriquecimento pessoal de outros.
Ele também serve o autor dentro dom contexto da história.
O Zohar, obra clássica da Cabala, descreve metaforicamente o mal do mundo como
uma prostituta contratada pelo rei para seduzir o príncipe.
É claro que o rei não quer que ela seja bem-sucedida; ele quer criar uma
oportunidade para o príncipe perceber sua própria integridade real ao resistir a essa
grande tentação e escolher agir de acordo com sua nobreza.
Até o momento desse teste, o status real do príncipe era apenas um titulo herdado
e um armário de roupas reais, mas não a expressão genuína de si mesmo,
conquistada através do poder de suas próprias escolhas e de seus próprios
esforços.

Em toda história, o antagonista traz as oportunidades para os outros personagens


fazerem grandes escolhas que incorporam grande bondade.
O vilão serve aos melhores interesses dos outros personagens, e, claro, do autor
(sobre quem a história realmente é).
Portanto, cada personagem serve o autor.
Mas alguns personagens servem o autor diretamente, como expressões diretas no
mundo que ele criou.
E alguns o servem indiretamente, criando oportunidades para que outros façam o
serviço direto.
Essa é a essência das escolhas de todo personagem.
Servir ou não servir não é a questão, nem a escolha.
Todo personagem serve o autor.
A escolha é apenas sobre como servir — diretamente, no papel de her6i, ou
indiretamente, no papel de vilão.
E que diferença faz se você serve direta ou indiretamente?
Não faz diferença para o autor — a história será escrita.
Mas certamente faz diferença para você, o personagem.
As suas escolhas determinam não apenas o resultado da sua cena final como
também a qualidade da sua vida durante toda a história.
Como sabemos, o mocinho sempre vence no final.
Ele pode até perder algumas batalhas no caminho, mas sempre ganha a guerra.
E mesmo que pareça derrotado, muitas vezes esta vencendo, porque em cada
momento da luta ele alcança uma transformação pessoal e uma profunda sensação
de identificação com o autor.
O Talmud ensina que a Shechiná, a Presença Divina — manifestação feminina de
Deus (assunto do qual trataremos no próximo capitulo) — deseja viver neste
mundo.
Como?
Através de você e de mim, quando escolhemos seguir os mandamentos e servir
diretamente a Deus, o Autor.
Esse não é o caso do vilão.
Ele caminha para o pior dos finais, e mesmo a sua jornada, a qualidade da sua vida
cotidiana, é vazia da satisfação Divina que a vida neste mundo imperfeito oferece.
O vilão é derrotado no final.
Ele pode pensar ser um vencedor, mas todo seu sucesso aparente é o que o conduz
ao seu derradeiro fim.
Pior que a grande punição que o espera na cena final é a dor diária da sua
insegurança existencial.
Ele não luta para crescer, superar o mal e escolher o bem.
Ele não se interessa em usar suas imperfeições como ponto de partida rumo a se
aperfeiçoar e, assim, servir a Deus e ser Seu agente.
Por isso, o vilão se priva do major prazer de todos — viver uma vida repleta da
presença de Deus.
Sua alma é alienada da Fonte Divina e seu mundo interior não tem conexão com a
realidade absoluta de Deus, sendo, portanto, destituído de qualquer valor ou
significado duradouro.
Ele pode até ter bastante dinheiro, viver em uma mansão elegante, vestir a moda
mais cara e atual e realizar todas as suas fantasias sexuais.
Mas o seu mundo interior é um inferno.
De fato, é ele que cria seu próprio inferno.
"Os maus são como o mar revolto que náo descansa, e suas águas arremessam
lodo e lama. Não há paz, diz Deus ao perverso" (Isaias 57: 20-21).

Agora entendemos melhor o verdadeiro significado das expressões "servir a Deus"


e "não servir a Deus".
Muitas vezes, quando as pessoas leem na Bíblia sobre servir a Deus, sentem-se
indignadas: "Por que eu quereria servir a Deus? Ser servil? Parece um tanto
degradante."
Mas se você é um personagem da história, como poderia não querer servir o autor?
É quem você é.
É a maior honra do mundo.
O que significa servir o autor diretamente?
Significa que sou um veiculo para a expressão do autor nesta história.
Mal posso esperar para servir o autor, porque quanto mais eu o sirvo, mais a sua
presença permeia todo o meu ser e mais eu descubro que sou uma centelha sua.
Não se trata de obediência.
Trata-se de auto expressão.
É quem você é, por que você é, quem é Deus e por que Ele cria.
Kurt Vonnegut, em Café da Manhã dos Campeões, escreve sobre urn autor que
decide entrar em sua própria história e se apresentar ao protagonista.
Mas o personagem sai correndo, recusando aceitar que tem um autor e que é
apenas uma invenção da imaginação deste.
Em completo contraste com a história de Vonnegut, o Livro de Genesis conta sobre
um encontro entre o Autor Divino e um de seus personagens principais, Abrahão.
Mas o resultado é bem diferente.
Deus, o Autor, diz a Abrahão: "Você está disposto a trabalhar para Mim? Esta
disposto a Me servir? Esta disposto a ser um veiculo para a Minha presença neste
mundo? Porque Eu quero participar deste mundo. E quero viver nele através de
você."
E Abrahão responde com um sonoro "sim".
Essa é a história da aliança de Abrahão.
Usando a metáfora do autor-personagem, você pode começar a olhar a sua vida de
modo diferente.
Pode dizer a si mesmo: "Realmente quero servir a um propósito mais elevado.
Quero fazer parte da história maior. Quero servir diretamente a Deus, o Autor, e
fazer o meu papel da melhor maneira possível."

Monólogo ou diálogo?
Agora vamos falar sobre a questão de termos livre-arbítrio ou da nossa vida ser
predeterminada.
A história da vida é um monólogo em que o autor fala em vozes diferentes consigo
mesmo através de seus personagens e as suas vidas são totalmente determinadas?
Ou a história da vida é urn diálogo em que os personagens interagem com o autor
e contribuem para a história por meio de suas escolhas livres?
A resposta é sim e sim.
O livre-arbítrio e o determinismo coexistem — a história da vida vai além de "ou
isso ou aquilo".
Durante o processo criativo, a maioria dos grandes escritores atestam que, em suas
passagens mais brilhantes, sua escrita tomou vida própria.
Os personagens criaram vida e contribuíram para a história.
E esse é o mistério da história.
Ela é um monólogo dentro de Deus (por assim dizer) e escrito com detalhes, mas
também é, paradoxalmente, um diálogo entre Deus e nós,
Seus personagens — uma obra escrita em conjunto por Deus e pelo homem.
Ingmar Bergman, o famoso diretor, respondeu certa vez à pergunta "Como você
dirige um filme?":
"Não dirijo filmes. Deixo os filmes me dirigirem. O mais importante no trabalho
criativo é deixar a intuição lhe dizer o que fazer. Estou escrevendo um roteiro e o
plano para esse homem é que ele vai fazer tal e tal; todas as outras coisas na
trama vão se acomodando. Mas a minha intuição me diz que de repente esse
homem não vai fazer tal e tal. Então pergunto à minha intuição o porquê. E ela me
diz: 'Nunca lhe direi por quê. Você tem de descobrir sozinho.' Então você vai a um
longo safari na floresta para seguir a sua intuição. Mas se eu rejeito a minha
intuição, apenas arranjo as coisas. Os meus personagens não me obedecem. Eles
seguem seu próprio caminho. Se eles tivessem de me obedecer, morreriam."

O segredo é que quando levantamos o véu do mistério do "livre-arbítrio versus


determinismo", encontramos um paradoxo.
Esse paradoxo é simbolizado pelos dois nomes de Deus usados com mais
frequência na Torá: YHVH, o nome impronunciável de Deus, conhecido como
Tetragrama, e Elohim, o nome de Deus usado também com a conotação de "juiz".
YHVH, fusão de foi, é e será, sugere que Deus é a realidade absoluta — não há
nada além Dele.
Portanto, toda a história da vida tem de ser um monólogo dentro do Divino.
Mas há também o nome Elohim, que representa Deus como Criador do ser humano
à Sua própria imagem — Deus que colocou em nós o poder da escolha e que julga
as nossas escolhas.
Segundo essa verdade sobre Deus, a história da vida é um diálogo entre os seres
humanos e Deus.
A história é uma obra escrita e produzida em conjunto por Deus e pelo homem.
Os dois lados do paradoxo são verdade.
A vida é um monólogo, predeterminado e escrito por Deus.
Mas, misteriosamente, é também um diálogo escrito por Deus e por nós através
das escolhas livres que fazemos.
É algo além do "ou isso ou aquilo".
Vivemos a verdade desse paradoxo.
Sentimos, de algum modo, a perfeição de como cada cena foi escrita.
Ainda assim, por outro lado, sentimos que estamos contribuindo na cena, que as
nossas escolhas fazem a diferença.
Como pode ser?
Imagine uma mosca andando em um quadro.
Embora a pintura esteja completa, a mosca tem a liberdade de escolher como
andar nela.
Há inúmeras possibilidades de como aquela mosca pode explorar a pintura, e sua
experiência será totalmente diferente dependendo da rota que ela segue.
Quando finalmente voar sobre o quadro, a mosca verá que havia uma pintura
pronta, mas as suas escolhas determinavam a sequência de acontecimentos à
medida que ela os vivia.

De acordo com a nova teoria física do contínuo espaço-tempo, o tempo é uma


dimensão e é como se toda a história fosse pintada em uma tela.
Mas nós só enxergamos uma pequena porção da pintura inteira.
E somos livres para escolher como ver o quadro, que já está determinado.
Nossas escolhas criam a nossa visão única e pessoal da pintura suprema que já
existe.

A Escolha Suprema
Uma maravilhosa história no Talmud, sobre um rabino chamado Eliezer ben Pedat,
ensina bastante sobre como fazermos o nosso papel e sobre as verdadeiras
escolhas que deveriam nos interessar.
O Rabi Eliezer era um homem muito, muito pobre.
Ele sobrevivia com uma dieta escassa de pão e alho.
Um dia, o rabino estava tão faminto que desmaiou.
Inconsciente, ele dialogou com Deus.
Quando foi reanimado por seus alunos, anunciou: "Deus falou comigo."
"O que Ele disse?"
"Perguntei a Deus: 'Por que você não me criou como um homem rico? Por que
tenho de sofrer assim?'
E Deus respondeu:
'Rabi Eliezer, meu querido filho, você preferiria que eu destruísse e recriasse o
mundo inteiro para que você talvez nascesse com um destino diferente?'
Eu disse: 'Destruir o mundo todo? E seria apenas um talvez? Não terei
seguramente um papel diferente no próximo roteiro que Você escrever?'
Deus respondeu: 'Isso mesmo."
Vamos medir a profundidade do que essa conversa revela.
Cada um de nós tem o papel certo.
E o mundo inteiro teria de ser destruído e recriado, toda a história teria de ser
apagada e reescrita, para uma tentativa de nos dar outro papel.
E mesmo depois de tudo isso, não há nenhuma promessa de que teríamos um
papel melhor na peça.
Isto porque todo o tecido da história é interligado.
Deus leva em consideração o papel de todo mundo quando Ele escreve o nosso
papel.
Deus não pode simplesmente nos tirar da história para escrever uma cena diferente
para nós.
Somos todos parte da história.
Cada um de nós com nossos problemas, desafios, alegrias e dores, estamos todos
no roteiro conforme um plano vasto e eterno.
O Rabi Eliezer ben Pedat (como muitos outros antes e depois dele) perguntou:
"Não posso fazer o papel do rico? Não posso ter um papel diferente no roteiro?"
A resposta de Deus é que o roteiro é tão interconectado, os personagens são tão
ligados uns com os outros, que tirar uma pessoa e lhe dar outro papel significaria
ter de reescrever toda a história.
Então, como o Rabi Eliezer ben Pedat respondeu a essa revelação?
Ele perguntou:
"Mestre do Universo, eu já passei da metade da minha vida?"
Deus respondeu: "Sim, já passou."
E o Rabi Eliezer disse: "Bom, então eu fico com o meu papel."
Este é o fim enigmático da história.

O que incomodava o Rabi Eliezer ben Pedat?


Ele temia, porque seu personagem era tão difícil, não conseguir fazer seu papel
segundo a vontade de Deus.
Ele tinha medo de fazer algo errado.
Sua pobreza era tão aflitiva que ele se preocupava com a possibilidade de se tornar
amargo e descontar sua frustração em outra pessoa ou pecar de algum outro
modo.
Era isso que o preocupava.
Ele não se importava em ser pobre.
Só queria ser bom.
Mas quando Deus disse que ele já havia passado da metade da vida, o Rabi Eliezer
viu que não estava tão mal.
Estava fazendo bem o seu papel.
Era isso que o interessava.
É triste quando as pessoas têm inveja porque pensam que alguém tem um papel
melhor.
Cada um de nós serve a Deus a seu modo.
As verdadeiras questões são: escolhemos servir a Deus e ser um canal vivo que
traz Deus ao mundo, ou fingimos que não existe um autor?
Fingimos ser os únicos escritores da novela?
Rejeitamos nosso personagem e simulamos ser alguém que não somos?
O ser humano é a única criatura na Terra capaz de ser falsa.
Os animais nunca são falsos.
Um gato nunca pensa que é um cachorro.
Gato é gato.
Mas o ser humano pode se confundir e pensar que é alguém que na verdade não é.
(Confesso que já vi, no David Letterman Show, um gato latir. Parece que sempre
há uma exceção à regra...)
Quando a minha filha Leyadya tinha nove anos, sua classe fez uma peça para a
escola.
Era um teatrinho de vinte minutos, mas para uma menina da quarta série era a
Broadway.
A Leyadya chegou em casa muito triste porque lhe deram o papel do varredor de
rua.
Ela queria ser a rainha!
Tente explicar a uma criança de nove anos que fazer bem o seu papel, qualquer
que seja, é mais importante do que ter um papel chamativo.
Infelizmente, muitos adultos não aprendem esta mesma lição.

Na seção Ética dos Pais, do Talmud, está escrito:


“Amado é o que foi criado à imagem de Deus. Mais amado ainda é o que sabe
disso."
Cada personagem da história é criado à imagem de Deus, o Autor, exceto o vilão,
responsável por fazer todos os outros expressarem sua imagem Divina.
Todos são criados à imagem de Deus, mas nem todo mundo sabe disso.
A alegria de viver é saber; saber que não existe apenas o meu pequeno show na
minha casa, com os meus filhos e meu trabalho, mas que há também uma grande
epopeia cósmica.
(Afinal, que papel você prefere ter: o protagonista na peça da escola ou uma ponta
no próximo filme do Steven Spielberg?)
Você é importante porque faz parte do grande drama para o qual Deus criou este
mundo.
E o seu papel, até mesmo nos pormenores, não pode ser mudado sem que seja
preciso destruir e recriar o mundo inteiro.
Deus escreveu a peça, planejou as cenas e o cenário e determinou quem vai atuar
com você.
Você pode fugir disso ou pode fazer o seu papel conscientemente, entendendo que
cada cena trata das escolhas que você faz, das atitudes que toma, da consciência
que alcança e do significado que você atribui a cada situação.
Você é livre para conhecer Deus e expressar as qualidades Divinas em todo
momento da sua vida.
Seja em um momento de dor ou de prazer, de sucesso ou de fracasso, de ganho ou
de perda, de alegria ou de tristeza, você é livre para escolher o bem e crescer.
Esse é o significado do versículo do Livro de Jeremias (9:22):
"Deus diz: ‘Não deixe que o sábio se orgulhe de sua sabedoria, que o rico se gabe
de suas riquezas ou o forte de sua força. Somente aquele que Me conhece, que faz
justiça, pode se orgulhar’”.
Ou seja, se você é esperto, rico ou forte, nenhuma dessas qualidades são
realmente conquistas suas das quais você pode se orgulhar.
As verdadeiras conquistas de uma pessoa são as escolhas que ela faz.
Você escolheu conhecer Deus e fazer o bem?
É isso que realmente importa.
As suas realizações não acontecem no palco do mundo para que todos vejam e
admirem.
As verdadeiras conquistas acontecem dentro de você.
São as lições que você aprende, as atitudes que toma e as suas qualidades de
bondade, justiça, honestidade, clemência e compaixão.
Mesmo que você fique milionário e saia na capa da revista Fortune, não pode ter
crédito pelo seu sucesso.
Você é rico porque Deus lhe deu o papel de rico.
Ele lhe deu sua aptidão para os negócios.
Ele orquestrou a vaga de última hora na faculdade de administração Wharton
School of Business.
Ele armou a improvável oportunidade de encontro com aquele corretor de valores
— quando seu carro pifou às duas da manhã na estrada — e Ele (não o corretor)
lhe deu aquela dica quente que duplicou o seu dinheiro.
Esses não são os resultados necessários dos seus esforços.
Várias coisas poderiam ter acontecido para estragar a negociação.
Os seus verdadeiros patrimônios na vida, que serão para sempre seus, são as
escolhas de fazer e enxergar o bem.
Essas escolhas estão dentro de você.
Elas criam o seu mundo interno.
No final, não importa quanto dinheiro, propriedade ou fama você conseguiu
acumular.
O que importa não é o que tem, mas quem você é.
Essa é a única conquista real, duradoura e realmente sua.
Ela irá com você deste mundo para o próximo porque representa quem você é.
E não se sinta mal quando você decide fazer o bem, mas o seu esforço não produz
resultados.
Você não é responsável pelos resultados — estes são departamento de Deus.
Podemos até dizer que você e Deus são co-autores da peça da vida.
Você escreve as escolhas e Ele, os resultados.
Você é responsável apenas pelas escolhas.
O resto está nas mãos de Deus.
Deus escreve o roteiro para todas as cenas representadas no palco do mundo.
No entanto, você tem os direitos para escrever o roteiro do mundo interno da sua
alma.
Você escolhe os pensamentos, as atitudes, as percepções, as interpretações, os
sentimentos, as respostas e assim por diante.
Você deve sempre se lembrar de que quando escolhe ser bom, tem sucesso no seu
mundo interior.
Digamos que você escolha levantar R$50.000,00 para um orfanato com
dificuldades financeiras, mas só consegue arrecadar R$10.000,00, mesmo que
tenha se empenhado muito.
Não pense que fracassou.
O seu sucesso foi a sua boa escolha e o seu esforço — o resto está nas mãos de
Deus.
Ou seja, você se torna bom mesmo quando apenas escolhe fazer o bem, embora,
por circunstâncias além do seu controle, você não consiga sempre alcançar seu
objetivo.
O Talmud ensina que quando uma pessoa escolhe fazer o bem mas algo a impede
de exercitar essa escolha, a recompensa é a mesma, como se a pessoa tivesse
conseguido completar a ação.
Foi a escolha que a fez mudar.
A recompensa é quem você se torna.
Segundo o Talmud, não há recompensa neste mundo para o cumprimento dos
mandamentos.
Este mundo é passageiro e nossas conquistas aqui também são transitórias.
A recompensa de cumprir os mandamentos está no mundo interior, na alma, que é
eterna.
Quando você internaliza essas verdades e vive de acordo com elas, compreende
que em cada cena da sua vida, Deus está com você. E o que importa não é a cena
final, porque Deus já sabe o fim.
O que importa são as escolhas que determinam como você vai interpretar a cena
atual — se vai usar de honestidade e integridade, segundo a imagem de Deus,
escolhendo o bem e o crescimento.
Você não pode levar consigo as posses materiais, mas quem você é será algo seu
eternamente.
Como diz o ditado, "onde quer que você vá, ali está você".
O céu e o inferno não são lugares para onde se vai, mas estados da mente que
você cria dentro de si, o mundo interior perpétuo da alma.
Somente suas escolhas e esforços de conhecer Deus e de fazer a Sua vontade são
sua responsabilidade.
O resto está nas mãos de Deus.
Tome cuidado para não se iludir, ultrapassar seus limites e invadir o âmbito do
Divino.
É isso que aprendemos com a história do Rei Ezequias, contada no segundo Livro
dos Reis.
O Rei Ezequias era um bom rei do reino de Judá, herdeiro da dinastia do Rei David.
Certa vez ele ficou gravemente doente.
O profeta Isaías o visitou e lhe informou que ele iria morrer e que não viveria no
mundo vindouro.
Neste momento o Talmud relata o diálogo entre o rei e o profeta.
Ezequias pergunta por que vai sofrer esse destino.
Isaías responde que essa é a punição por ele não ter cumprido o mandamento
"frutificai e multiplicai".
Ezequias explica que não se casou nem teve filhos porque viu profeticamente que
um de seus filhos seria perverso.
Deus, por meio de Isaías, respondeu: "Que interesse você tem nos segredos do
Misericordioso?"
Ou seja, não é da sua conta se seu filho vai acabar sendo perverso.
Deus escreveu o roteiro.
A sua tarefa, Ezequias, como a de todo mundo, é simplesmente escolher fazer a
vontade de Deus.
Ezequias escolheu ser sagrado, por isso não queria o papel de pai de um filho ruim,
que lhe sucederia no trono e desfaria tudo de bom que ele conseguiu.
Dá para entender sua resistência em fazer esse papel.
A resposta de Deus, no entanto, foi que ou ele cumpre o seu papel, ou está fora da
peça — para sempre.
O título "Os segredos do Misericordioso" sugere que o futuro (que preferivelmente
deve permanecer secreto) é o resultado da misericórdia de Deus, embora aqui, no
meio do ato 324, nós não vejamos essa misericórdia porque não podemos ver o
final da peça.
O conselho de Isaías é que Ezequias deveria ter cumprido o mandamento que
recebeu, ter filhos, deixando que Deus determinasse o resultado.
Ezequias cedeu, recuperou-se da doença, casou-se com a filha de Isaías e teve um
filho, o perverso Menashe.
Menashe escolheu ser um rei perverso que assassinou o próprio avô, o profeta,
adorou ídolos e trouxe destruição ao povo judeu.
Ninguém gostaria de ter um filho tão maldoso, muito menos o bom Ezequias, que
trabalhou em seu reinado para livrar sua nação da idolatria.
Porém, o trabalho de Ezequias na vida, como o de todos os outros personagens no
roteiro de Deus, é escolher o bem — que também significa seguir os Seus
mandamentos e deixar o resto a cargo de Deus.
Agora podemos entender por que a Torá proíbe todos os meios astrológicos e
mediúnicos de se prever o futuro.
Nosso trabalho não é adivinhar o futuro.
O futuro, o desenvolvimento do enredo, não é da nossa conta.
Saber o futuro prejudicaria nossa habilidade de representar perfeitamente a cena
de hoje.
Disseram-me que em Hollywood, se um filme tem uma cena de morte, grava-se
essa cena primeiro para que os atores possam relaxar e encenar o resto do filme.
Senão, a iminente cena de morte dificultaria as cenas felizes.
Você pode imaginar como seria difícil para os atores interpretar uma cena de amor
se eles soubessem que vão ser atropelados por um ônibus na próxima cena?
Como você não sabe o que vai acontecer na próxima cena, deve fazer a cena atual
da melhor maneira possível.
Se uma onda de fome invade a Etiópia, você não pode supor que milhares de
pessoas vão morrer.
Talvez seu papel seja ajudar na organização de uma força-tarefa internacional.
Do mesmo modo, se você foi vítima de violência infantil, não pode prever o destino
de seus filhos baseado na suposição de que "crianças violentadas geralmente são
adultos violentos".
Talvez seu papel seja provar o contrário.
O reconhecimento do destino não pode nos impedir de fazer as escolhas certas no
presente.
Já que o futuro é um segredo conhecido apenas por Deus e o resultado de cada
cena está em Suas mãos, você escreve sua história pessoal, escolhe o bem e se
transforma.
Segundo o Talmud, o Rei Salomão escreveu o Livro de Eclesiastes depois de ver
profeticamente que seu reino e o Templo que trabalhou tão arduamente para
erguer seriam destruídos.
Imagine como deve ter sido devastador saber que ele investiu a vida toda em
coisas que seriam destruídas.
É de se entender o seu lamento, "Futilidade das futilidades... Que real valor há para
uma pessoa em todo o seu trabalho sob o sol?"
Porém, como mencionamos anteriormente, sua resolução final foi:
"Reverencia Deus, vive conforme os Seus mandamentos — pois isso é tudo para o
homem."
O Rei Salomão percebeu que a nossa verdadeira conquista não é construir o
Templo ou um reinado na Terra, mas sim o que fazemos de nós — o reinado e o
templo que construímos em nosso mundo interior.
Isso não significa que não devemos construir neste mundo.
É preciso reconhecer que o que construímos "por fora'.', no mundo material, não é
o objetivo, mas sim o meio pelo qual chegamos a construir algo internamente.
Os pioneiros que corajosamente reabitaram a Terra de Israel muitas vezes
cantavam: "Viemos construir esta terra e ser construídos por ela."
A característica de real e duradouro do que construímos por fora é como aquilo nos
constrói por dentro.
Quando vivemos com essa compreensão, não nos entristecemos quando nosso
reino e nosso templo são destruídos.
Sabemos que fizemos a vontade de Deus — construir o reino e o templo.
E mesmo que estes estejam destruídos, o que construímos dentro de nós nunca
será arruinado.
Não é como se o passado não serviu para nada e temos de recomeçar tudo outra
vez.
Agora temos oportunidades de continuar a nos construir por meio dos desafios e
das escolhas que a destruição criou.
Não viemos à Terra para construir este mundo, mas para nos construirmos, nos
expressando como a imagem viva de Deus.
Sempre podemos crescer, mesmo quando o mundo à nossa volta está se
desmoronando.
Às vezes o vencedor é o perdedor, e vice-versa.
Se o vencedor não aprende nada com a vitória e não se torna uma pessoa melhor,
se passa a ser apenas arrogante, então, embora segure o troféu, ele é um
perdedor.
Mas se o perdedor aceita seu fracasso com humildade, supera sentimentos de raiva
e pena de si mesmo e escolhe ser feliz com o que tem, ele de fato termina com a
maior das vitórias — se tornar um ser evoluído.
Ele próprio é o troféu.

Em suma
É um paradoxo.
A história do mundo e a sua história pessoal são um monólogo escrito por Deus... e
ainda assim, misteriosamente, são também um diálogo escrito em conjunto por
Deus e por nós.
Deus cria as cenas, determina o enredo e orquestra cada ato nos mínimos detalhes.
Mas as cenas oferecem aos personagens a escolha de aproveitar a maior
oportunidade de conhecer Deus, de fazer o bem e de ser bom.
O Talmud ensina que tudo o que nos acontece é sempre para o bem.
As pessoas supõem que isso significa que se eu perco meu emprego, um emprego
ainda melhor cruzará o meu caminho.
Não estou certo de que é sempre assim.
Perder aquele ótimo emprego pode ser para o bem porque o próximo trabalho, que
paga menos e é em uma companhia de pessoas muito difíceis, me dá um contexto
melhor para algumas escolhas importantes sobre conhecer Deus e fazer o bem.
Nesse novo trabalho ruim, ganho menos e me torno mais.
No final, o melhor não é o que acontece por fora, mas o que acontece
internamente.
As suas escolhas fazem sim a diferença, mas a verdadeira diferença é como essas
escolhas irão modificá-lo.

Continua

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