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Cena do Corregedor e Procurador

O Corregedor, magistrado com autoridade sobre os juízes ordinários, é o primeiro a entrar em


cena carregado de feitos, ou seja, de processos representativos da sua profissão e símbolo dos
seus pecados e com a sua vara na mão, símbolo do poder judicial. Dirige-se ao Diabo e
pergunta-lhe, presunçoso se ali se encontra o "senhor juiz". O Diabo responde-lhe
ironicamente apelidando-o de "amador de perdiz". As perdizes eram símbolo da corrupção
daqueles que se deixavam subornar. O Corregedor, convidado pelo Diabo a entrar na Barca do
Inferno, argumenta de imediato com o seu estatuto profissional e pergunta se não haverá lá
um "meirinho do mar", ou seja, um oficial de justiça marítima que o possa auxiliar. Começa
também a introduzir no seu discurso expressões latinas usadas na sua profissão e que ele
acredita conferirem-lhe prestígio. Para calar a indignação do Corregedor, o Diabo responde-lhe
num latim macarrónico acusando-o de ter aceite subornos. Assim, com o discurso do Diabo em
latim macarrónico, o autor delineia uma cena onde predomina o cómico de linguagem. O
Corregedor defende-se acusando a sua mulher de ter aceite subornos sem o seu
conhecimento, mas o Diabo reforça a sua acusação lembrando-o de como tinha enriquecido à
custa dos mais pobres sem nunca os ter defendido. O Diabo esclarece-o de que no Inferno terá
muita companhia de outros que como ele roubavam e enganavam em nome da Justiça. Neste
momento da cena, entra o Procurador, carregado de livros, símbolo da sua profissão e dos
seus pecados. O Procurador também se recusa a entrar na Barca do Inferno. Explica ao
Corregedor, que trata com o respeito devido aos superiores, que morreu sem ter tido tempo
de se confessar. Já o Corregedor, morreu confessado, tendo, no entanto, encoberto todos os
pecados ao seu confessor. O autor aproveita. assim, para fazer mais uma crítica à Igreja.
Ambos se dirigem à Barca da Glória, mas são recebidos por um Anjo enfurecido que lhes roga
pragas e pelo Parvo que, adoptando um latim macarrónico, os acusa de roubo e de
desrespeito para com a Igreja. O Anjo manda-os de volta para a Barca do Inferno onde eles
acabam por entrar resignados. A cena termina com um breve diálogo entre Brízida Vaz e o
Corregedor que dá a entender que ambos tiveram negócios ilícitos em vida.

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