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Produção Audiovisual

para Comunicação Comunitária

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Produção Audiovisual
para Comunicação Comunitária

Lilian Sagio Cezar


Geraldo Márcio Timóteo
Mariana Alcantara Vetromille

Editora da Universidade Estadual do


Norte Fluminense Darcy Ribeiro

Campos dos Goytacazes - RJ


2018
FICHA CATALOGRÁFICA
Preparada pela Biblioteca do CCH / UENF 01/2018

C421 Cezar, Lilian Sagio.

Produção audiovisual para comunicação comunitária / Lilian Sagio Cezar,


Geraldo Márcio Timóteo e Mariana Alcantara Vetromille. – Campos dos
Goytacazes, RJ, EdUENF, 2018.
56 f. : il.

Apostila do Projeto PESCARTE.


ISBN: 9788589479455.

1. Audiovisual. 2. Imagens nas Mídias. 3. Leitura - Uso e Composição de


Imagem e Som. 4. Diálogo Cultural e Comunicação Comunitária. 5. Projeto
PESCARTE. I. Timóteo, Geraldo Márcio . II. Vetromille, Mariana Alcantara.

CDD – 371.335
EXPEDIENTE

Reitor Coordenação da Obra


Luis Passoni Geraldo Márcio Timóteo

Vice-reitora Coordenação Pedagógica


Teresa de Jesus Peixoto Faria Silvia Alicia Martínez
Lucas Aragão Viana
Diretor do Centro de Ciências do Homem
Marcelo Carlos Gantos Conteúdo
Lilian Sagio Cezar
Coordenadora do Programa de Políticas Geraldo Márcio Timóteo
Sociais (UENF) Mariana Alcantara Vetromille
Paula Mousinho Martins
Revisão
Realização Sergio Arruda de Moura
Petrobras e Programa de Pós-Graduação Silvia Alicia Martínez
em Políticas Sociais (UENF)
Projeto Gráfico e Programação Visual
Coordenação do Projeto Pescarte Mariana Alcantara Vetromille
Geraldo Márcio Timóteo
Mônica do Nascimento Brito Desenhos
Ana Carolina Caetano R. T. Mariana Alcantara Vetromille

Petrobras: Unidade de Operações de Fotografia e Layout da Capa


Exploração e Produção da Bacia de Mariana Alcantara Vetromille
Campos – UO-BC
Editor-Chefe da EdUENF
Gerente Setorial de Meio Ambiente Leonardo Rogério Miguel
Marcelo Barbosa Carvalho
Impressão
Equipe Técnica de Socioeconomia Gráfica Express
Fabrício de Almeida Gonçalves Tiragem: 500 exemplares
Gabriela Nogueira Gonçalves
Graziela da Silva Rocha Oliveira Distribuição Gratuita Dirigida
Késia Ferreira de Souza
Larissa Santos de Paula
Marcelo Gonçalves Teles
Taynnara Garcia de Gouveia
Wander dos Santos Neto
ÍNDICE

O PROJETO 3
RESUMO 4
EI, PSIT! Ô DA POLTRONA! 5
Introdução

PARA INÍCIO DE CONVERSA, O QUE É IMAGEM? 10


MODERNIDADE E AS MARAVILHOSAS MÁQUINAS QUE PRODUZEM IMAGEM 13
• Fotografia
• Truques e Montagens Fotográficas
• Cinema e Vídeo
• Televisão Brasileira

ATIVIDADES PRÁTICAS DO CURSO 40


Atividade 1
• Roda de Conversa sobre o Tema: E os trabalhadores da pesca artesanal, como ficam nesse mar de ima-
gens midiáticas?
Atividade 2: Ei, psit, ô da poltrona! Bora fazer fotografia?
• Oficina de Produção de Imagens Fotográficas
Atividade 3
• Oficina de Produção de Vídeo

BIBLIOGRAFIA 54
O PROJETO

O Projeto PESCARTE tem como sua princi- objetivos: aperfeiçoar a atuação profissional
pal finalidade a criação de uma rede social dessas comunidades, seja na perspectiva,
regional integrada por pescadores artesa- seja da ampliação de sua produtividade,
nais e por seus familiares, buscando, por seja para poder melhor se organizar e reali-
meio de processos educativos, promover, zar atividades econômicas solidárias.
fortalecer e aperfeiçoar a sua organização
comunitária e a sua qualificação profissio- A intenção é reforçar as identidades pro-
nal, bem como o seu envolvimento na cons- dutivas dessas comunidades pesqueiras,
trução participativa e na implementação de de modo a favorecer a mitigação dos im-
projetos de geração de trabalho e renda. pactos negativos que as afetam e que são
decorrentes das atividades realizadas, na-
Por meio do Projeto PESCARTE as comu- quela região, pela indústria de exploração
nidades pesqueiras que vivem nos municí- e produção de petróleo e gás natural.
pios de Arraial do Cabo, Cabo Frio, Macaé,
Quissamã, Campos dos Goytacazes, São As ações e/ou atividades educativas são
João da Barra e São Francisco de Itabapoa- executadas sob a orientação de professo-
na são mobilizadas, incentivadas e orienta- res, pesquisadores e técnicos do Centro
das a participar de diferentes ações e/ou de Ciências do Homem da Universidade
atividades de natureza educativa. São ações Estadual do Norte Fluminense Darcy Ri-
e/ou atividades cuja realização tem como beiro (UENF).

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RESUMO

Essa apostila vai apresentar os princi- diovisuais visando a sua utilização pelas
pais pontos envolvidos na produção comunidades pesqueiras atendidas pelo
das mensagens geradas pelos grandes Projeto Pescarte e demais projetos de
meios de comunicação hoje existentes. mitigação e educação socioambiental
Vamos começar abordando o panorama crítica desenvolvidos pelo IBAMA.
histórico da produção e circulação das
imagens na mídia impressa, televisiva e Buscamos também apresentar os princí-
cinematográfica pensando seus diferen- pios básicos de leitura, uso e composi-
tes papéis, tanto para a construção de ção de imagem e som a fim de desen-
guerras como para a ampliação dos di- volver competências de utilização dos
reitos civis, a construção da democracia recursos audiovisuais para diálogo cul-
e da cultura de paz. Com olhar crítico tra- tural e comunicação comunitária. Obje-
taremos a produção e compartilhamen- tivamos propor ações visando a cons-
to de mensagens a partir dos princípios trução de princípios norteadores de
do diálogo intercultural e da comunica- divulgação das demandas comunitárias
ção comunitária. Ensinaremos o passo a por meio das diferentes redes e plata-
passo da produção de mensagens au- formas disponíveis na internet.

A Evolução da Mídia Tradicional para a Nova Mídia. Fonte: https://www.sutori.com/story/


the-evolution-of-traditional-media-to-new-media-ed91

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EI, PSIT! Ô DA POLTRONA!

Introdução
Durante quase 30 anos, o humorista e
embaixador da UNESCO Renato Aragão
alegrou os domingos com seu programa
semanal na TV Globo onde interpreta-
va o ingênuo e carismático personagem
Didi Mocó. Gerações e gerações cres-
ceram assistindo às peripécias da trupe
Os Trapalhões e, mais recentemente, Os
Amigos do Didi. Difícil encontrar alguém
que não tenha se divertido e que não co-
nheça o inesquecível bordão com o qual
Didi, olhando fixamente para a câmera, é
representado dizendo:
Renato Aragão. Fonte: https://veja.abril.com.br/
-“Ei psit? Ô da poltrona!?” galeria-fotos/renato-aragao/

Esse bordão*, aparentemente singelo, volvidas com a produção de som e ima-


explicita um dos elementos centrais da gem. Essas mensagens dão aos seus es-
construção das mensagens pela mídia: a pectadores a impressão de proximidade,
capacidade de se comunicar diretamen- pertencimento e vinculação. Mas quando
te com cada um dos mais diferentes es- paramos e nos questionamos sobre que
pectadores!!! Essa tarefa não é simples tipo de comunidade é essa subentendi-
e demanda uma grande quantidade de da nas mensagens midiáticas e a quali-
pesquisa, planejamento e de pessoas en- dade desse pertencimento e vinculação

BORDÃO
Frase ou expressão usada por uma personagem que funciona
como uma espécie de “marca registrada”, que a caracteriza e
identifica e, ao mesmo tempo, pode oferecer elemento irônico
ou satírico, que são elementos para a construção de cenas engra-
çadas e humorísticas. Quem não se lembra do “Tô certo, ou tô
errado” do Sinhosinho Malta (em Roque Santeiro), ou mais recen-
temente, Chico Anísio com o inesquecível Prof. Raimundo dizendo
ao final de cada episódio da Escolinha: “E o salário, ó!”

Chico Anysio representando o Prof. Raimundo. Fonte: https://observatoriodatelevisao.bol.uol.com.br/


historia-da-tv/2017/08/ha-27-anos-escolinha-do-professor-raimundo-se-tornava-um-programa-solo

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EI, PSIT! Ô DA POLTRONA!

Charge exagerada de todos os membros de família assistindo e controlando os canais da tv. Fonte: http://
laoblogger.com/image-post/192039-watching-television-sketches-clipart-9.jpg.html

certamente nos surpreendemos! Isso surpreendemos com o poder que as em-


porque as mensagens da mídia acabam presas de mídia passaram a exercer no
produzindo a ilusão de que pertence- cotidiano e na vida das pessoas a partir
mos àquele mundo e participamos dele da popularização dos aparelhos de rá-
mundo representado pelas imagens que dio, televisão, computadores, celulares,
nos chegam pelo televisor, que acabam tablets... Para nossos bisavós a vida esta-
nos dando a marcação da passagem do va pautada no regime do sol e da lua, da
tempo no dia a dia de nossas famílias, intensidade do calor ao longo do dia, do
que pautam nossas conversas com os regime das marés e das fases da lua, do
amigos, como se não houvesse outros clarear do dia e do escurecer da noite.
assuntos e temas que aqueles aborda-
dos pelo telejornal, novelas e programas Hoje o dia das pessoas está dividido
de entretenimento, pelas revistas eletrô- pela grade de horário dos programas
nicas dominicais, programas de auditó- televisivos das grandes emissoras de
rio, pela ação televisionada das igrejas, canal aberto! Acordamos, almoçamos e
enfim, por tudo que chega até nós por vamos dormir acompanhados pelo tele-
alguma forma de mediação. jornalismo, temos nosso lazer em frente
das novelas, seriados e filmes e adota-
Quando comparamos o ritmo de vida mos como nossas narrativas as histórias
e as marcações de tempo usadas pelos contadas pelos produtos audiovisuais
nossos bisavós em relação às nossas nos veiculados nas telas das tevês, cinemas

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EI, PSIT! Ô DA POLTRONA!

e celulares! Essa comunicação acaba impregnada pelo espetáculo, pelo ro-


projetando uma impressão de perten- mance e pela propaganda voltada ao
cimento a uma comunidade imagina- comércio e ao consumo de bens.
da que, na prática, acaba produzindo
o individualismo daquele que se vê em No médio e longo prazos a valorização
muitos momentos isolado e fragilizado crescente dos processos de comunica-
pela solidão do sofá, diante da televisão ção midiática no cotidiano das comuni-
e, mais recentemente, do computador dades gera uma predisposição das pes-
ou celular. Nesses processos as narra- soas para considerar mais relevantes
tivas das histórias das nossas famílias, informações que chegam pelos canais
dos bairros, comunidades e das cidades e meios de comunicação de massa, o
em que vivemos deixaram de exercer a que acaba contribuindo para a desva-
força atrativa por conta da concorrência lorização das narrativas pessoais, pau-
das imagens produzidas pela mídia, tão tadas que são nos conhecimentos tradi-

Charge sobre o papel de “babá eletrônica” assumido pela tevê no cotidiano familiar brasileiro.
Fonte: Multimeios/Seed. http://www.gestaoescolar.diaadia.pr.gov.br/modules/galeria/detalhe.
php?foto=375&evento=10

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EI, PSIT! Ô DA POLTRONA!

cionais, transmitidos de boca a ouvido, nosso cotidiano de representações, bus-


de geração a geração. Esses saberes e cando realizar a proposta de leitura críti-
fazeres, apesar de terem sido elaborados ca delas. Assim, com base nas próprias
a partir das práticas eficientes de como imagens e em seus processos de produ-
lidar com os desafios e oportunidades ção, partiremos para a identificação dos
do cotidiano, não possuem caráter ex- potenciais de comunicação em rede a
traordinário ou espetacular e, dificilmen- fim de começarmos a produzir e com-
te, ganham a audiência das empresas de partilhar nossa produção de imagens
mídia. Isso acarreta em boa medida a para assim também poder contar nossas
desvalorização de tais saberes, o que di- histórias e narrativas, usando para isso
ficulta sua transmissão entre as distintas as redes sociais, principalmente aquelas
gerações, impactando na memória cole- que permitem a defesa e valorização da
tiva e na perda das referências locais que pesca artesanal brasileira.
são aquelas capazes de vincular as pes-
soas e de construir identidades coletivas, Essa abordagem dialoga com os linea-
comunitárias, geracionais e políticas. mentos da educação ambiental crítica, já
que, como ação educativa, instrumenta-
Ao longo dos últimos 30 anos a mídia liza os grupos sociais envolvidos, possi-
e, mais especificamente a tevê, passou bilitando que reflitam sobre a sua situa-
a ser encarada como aparelho capaz ção de vida, seus direitos e interesses, o
de desempenhar vários papéis sociais que leva a compreender melhor o lugar
e ganhou funções inusitadas sendo en- que ocupam na sociedade. Além disso,
carada por muitas pessoas como “babá estes sujeitos podem ganhar visibilidade
eletrônica” dos filhos; educador a dis- na sociedade por meio de seus próprios
tância, espécie de agência de turismo olhares e os das suas comunidades. Em
capaz de trazer imagens dos mais dis- consequência, os grupos envolvidos se
tintos destinos do universo conhecido entusiasmam e se fortalecem, podendo
para sua tela, entidade religiosa e filan- aumentar o seu poder de participação
trópica, defensora e guardiã do povo e nas decisões relativas à gestão ambiental
dos interesses econômicos e políticos, de seus territórios ao mesmo tempo que
desempenhando as vezes o papel de atuando como sujeitos políticos, visando
polícia e, até mesmo, de juíza da socie- à transformação social.
dade e dela mesma.
Pautada no exitoso projeto de comuni-
Nosso objetivo nessa apostila é ofere- cação intercultural Vídeo nas Aldeias, o
cer capacitação inicial para a produção objetivo da apostila é tornar acessível a
audiovisual e comunicação comunitária. produção e uso de imagens, em especial
Para isso partiremos da história e leitura do vídeo, para pescadores e pescadoras
das imagens que invadem e constituem artesanais atendidas pelo Pescarte, pro-

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EI, PSIT! Ô DA POLTRONA!

propiciar momentos de reflexão crítica, a


O Projeto Vídeo nas Aldeias desenvol- proposta de produzir fotografias e vídeos
ve desde 1987 processos de intervenção
e de realizar exposições e momentos de
focados na produção de vídeos pelas po-
pulações indígenas no Brasil. A produção encontro para assistir os vídeos comuni-
resultante do projeto é extensa e pode ser tários também sugerem novas formas de
acessada no canal de Youtube: ação, importantes para populações tra-
dicionais que tem sua forma preferencial
https://www.youtube.com/user/
de transmissão de conhecimento pauta-
VideoNasAldeias
da na oralidade e no exercício da memó-
Ou use a câmera do ria coletiva, por meio das quais saberes,
celular para capturar fazeres, valores e processos identitários
o código ao lado e
abrir o link na internet
são atualizados e ensinados às novas ge-
automaticamente. rações. A preservação de imagens signi-
ficativas para a memória coletiva adquire
novos sentidos quando colocadas à dis-
posição de suas comunidades de manei-
ra que esses sujeitos almejem se tornar
movendo processos educativos que per- protagonistas de seu futuro.
mitam a apropriação e manipulação de
suas imagens em acordo com seus proje- Assim, a apostila ora apresentada cons-
tos políticos e culturais. titui parte dos esforços de promoção
de educação continuada em prol da
Nos processos desenvolvidos a partir da organização comunitária empreendida-
produção, leitura e divulgação de foto- pelo Projeto Pescarte visando a cons-
grafias e vídeo pode acontecer a revisão trução de um olhar crítico e engajado
da própria imagem que as comunidades dos trabalhadores da pesca artesanal
constroem de si mesmas e a compreen- nas cidades atendidas. A promoção de
são dos processos de seleção de com- processos de leitura crítica de imagens
ponentes culturais que a constituem. A articulada à produção de comunicação
experiência de comunicação intercultu- comunitária busca permitir que pesca-
ral pelo vídeo permite a reordenação do doras e pescadores alcancem a com-
tempo e do espaço no qual cada grupo preensão do mundo cotidiano, dos de-
se situa. A circulação de documentos em safios apresentados pela falta de acesso
vídeo entre as distintas comunidades de às novas tecnologias da informação e,
pescadores artesanais pode permitir a concomitantemente, às novas possibili-
comparação e a integração das estraté- dades oferecidas por tais recursos visan-
gias encontradas por outros grupos para do à própria sustentabilidade dos em-
seu relacionamento com setores dife- preendimentos solidários que ora estão
renciados da sociedade envolvente. Por em fase de planejamento e licitação.

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PARA INÍCIO DE CONVERSA,
O QUE É IMAGEM?

Imagem da mão em negativo, localizada na ilha


indonésia de Celebes e datada de pelo menos 40
mil anos. Fonte: https://www.publico.pt/2014/10/11/
ciencia/noticia/a-mao-mais-velha-do-mundo-poe-em-
duvida-que-a-arte-tenha-nascido-na-europa-1672526

A origem da palavra imagem está tanto


ligada à raiz latina imitare, que significa
imitação, como à palavra imago, palavra
latina dada à máscara mortuária feita de
gesso ou cera, a partir do molde do ros-
to do morto, que era levada nos funerais
na antiguidade romana. Ligada à história
dos ritos funerários e, portanto, à arte
funerária e às possíveis metáforas e rela-
ções criadas pelos mitos que tematizam
a morte, a palavra imagem guarda tam-
bém uma relação de mimese e espectro
com algo ou alguém.

A partir da força metafórica da imagem,


o filósofo grego Platão em seu livro A Re-
pública narra o Mito da Caverna visando
permitir a reflexão sobre o que significa
conhecer o mundo.

10
Quadrinho de Maurício de Souza baseado no Mito da Caverna. Fonte: http://turmadamonica.uol.com.br/assombrasdavida/

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PARA INÍCIO DE CONVERSA,
O QUE É IMAGEM?

As imagens possuem caráter reconhe-


cidamente contraditório e paradoxal o
que, desde a Antiguidade, despertou
o debate entre filósofos como Platão
e Aristóteles, tidos como pais da Fi-
losofia Grega. Platão compreendeu a
imagem enquanto um tipo de segun-
do objeto que guarda relação direta
com aquilo que representa, de acor-
do com certas leis particulares. A ima-
gem, ainda segundo Platão, possui a Escola de Atenas. Pintura do renascentista italiano
característica de ser imitadora, o que Rafael na qual se pode ver a representação de
lhe confere também a capacidade de Platão e Aristóteles, entre outros filósofos. Fonte:
https://seteantigoshepta.blogspot.com.br/2009/10/
ser enganadora uma vez que permi- sofistas-falsos-sabios-ilusionistas-do.html
te seduzir partes mais fracas de nossa
alma a fim de desviá-las da verdade. tural; real e virtual; móvel e fixa; sagrada e
Por isso, para o filósofo, a única ima- profana; antiga e contemporânea; ligada à
gem válida seria aquela naturalmente vida e à morte; construtora e destruidora.
produzida, como o reflexo ou sombra,
sendo essas as únicas que poderiam É importante termos em mente que a
se tornar ferramentas da filosofia. Por imagem não é a coisa que representa;
sua vez, Aristóteles também considera ela se serve da coisa para falar de outra
a imagem imitadora, mas atribui valor coisa. Por exemplo, a fotografia de uma
positivo a essa característica, admitin- pessoa indica que ela um dia esteve na
do que por isso a imagem guarda em si frente de uma câmera, ou seja, que ela
a capacidade de educar e, assim, levar existiu e posou naquele exato momento
a processos prazerosos e eficientes de para a produção da fotografia. O resulta-
construção de conhecimento. do desse ato fotográfico é uma imagem
que representa a pessoa fotografada, ou
Toda imagem constitui uma forma de re- seja, que está no lugar da pessoa fotogra-
presentação do mundo e de ideias cria- fada, seja no celular ou na imagem que
das pelas pessoas. Elas têm múltiplas ori- se coloca na carteira, dando a sensação
gens e podem estar pautadas ao mundo de que a própria pessoa nos acompanha
dos sonhos, imagens verbais produzidas e pode ser apresentada a terceiros sem-
pelas metáforas, ao processo de reme- pre que necessário. Quando produzida
morar eventos passados e lembranças de e mostrada para outras pessoas que as
pessoas inclusive aquelas que estiverem reconhecem, acontece a produção da
mortas. A imagem pode ser imaginária e comunicação visual de algo que se asse-
concreta, visual e imaterial; fabricada e na- melha a outra coisa (representação).

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MODERNIDADE E AS MARAVILHOSAS
MÁQUINAS QUE PRODUZEM IMAGEM

Fotografia
A palavra fotografia é construída a partir
da junção do prefixo photo, que significa
luz, com o sufixo graphia, que significa
escrita ou desenho. A união resultante
constrói a palavra fotografia que signifi- Imagem
Objeto
ca literalmente desenhar com a luz. invertida

A fotografia é resultado da criatividade Furo


e invenção industrial que marcaram o
Representação da imagem invertida produzida
século XIX enquanto era da Revolução
pela câmara escura a partir dos princípios
Industrial, formada a partir da junção da ópticos da luz. Fonte: http://1.bp.blogspot.com/-
câmara escura com as experiências quí- lDnOm-3rqT0/TsrmzPfb9BI/AAAAAAAAAGU/
micas de sensibilização de sais de prata IOJDGzRcuvI/s1600/20061212080802-camara-
a partir da ação da luz. estenopeica.jpg

A primeira fotografia foi realizada em


A câmara escura é um aparato óptico
1826, pelo cientista francês Joseph Nicé-
conhecido desde o século XIV, feito a
phore Niépce que expôs por várias horas
partir do estudo e aproveitamento das
uma placa revestida com betume dentro
propriedades físicas da luz, aplicada
de uma câmara escura, apoiada no peito-
desde então para o auxílio dos pintores
ril da casa de campo de sua família.
na produção de suas obras de arte.

Essa imagem, intitulada View from the Window at


Le Gras (Vista da janela em Le Gras), foi a primeira
Representação da Câmara Escura. Fonte: https:// fotografia feita na históris. Por Niépce em 1826.
www.infoescola.com/wp-content/uploads/2010/09/ Fonte: https://en.wikipedia.org/wiki/View_from_the_
camara-escura.jpg Window_at_Le_Gras

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MODERNIDADE E AS MARAVILHOSAS
MÁQUINAS QUE PRODUZEM IMAGEM

Publicidade das câmeras Kodak da década de 1870. Tradução: Artigos Esportivos – Câmera Kodak: “Você aperta o botão,
nós fazemos o resto”. A única câmera que qualquer pessoa pode usar sem instruções. Enviamos grátis o refil de filme. A
câmera Kodak é vendida em todas as lojas de artigos fotográficos. Companhia The Eastman Dry Plate and Film. Preço,
$25,00 para 100 imagens. Rochester, N.Y.”. Fonte: https://blogs.commons.georgetown.edu/cctp-802-spring2017/kodaking-
the-lense-of-george-eastman-and-case-study-of-kodak-company/

Grandes esforços e investimentos fi-


nanceiros foram realizados desde en- Publicidade das
Câmeras Kodak
tão por cientistas e empresários do
do natal de
ramo do entretenimento e resultaram 1910 trazendo
no patenteamento e disponibilização a imagem da
das fotografias que em meados do mulher como
século XIX revolucionaram o mundo, narradora e
produtora das
permitindo que as pessoas tivessem
recordações
acesso pela primeira vez a um mundo familiares.
de cópias fidedignas das mais distintas Fonte: http://www.
obras de arte, representação de luga- albertodesampaio.
com.br/
res distantes, artefatos e costumes de propagandas-
pessoas de diferentes culturas. da-kodak-para-
mulheres/

Para saber mais sobre a História da Foto-


grafia acesse o programa do History Channel Ao longo dos últimos séculos, imagens
disponível em: https://www.youtube.com/wat-
ch?v=GyNa1OdJJcg fotográficas se multiplicaram a partir
do barateamento dos equipamentos
Ou use a câmera do
e da adoção da técnica como elemen-
celular para capturar
o código ao lado e to narrativo das mais distintas histórias,
abrir o link na internet acompanhando e registrando o cotidia-
automaticamente.
no das famílias, da produção de notícias
nos jornais e revistas, na construção da
moda, publicidade, política, etc.

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MODERNIDADE E AS MARAVILHOSAS
MÁQUINAS QUE PRODUZEM IMAGEM

outros transmitem impressão de estra-


recorte não nhamento por darem a impressão de am-
indicado putação de membros importantes como
recorte cabeça, braços e pernas. Por isso obser-
ideal
var a composição do quadro, enquadrar
a imagem da pessoa dentro das margens
de composição é tão importante para o
resultado final da fotografia.

• São três os ângulos de composi-


ção fotográfica:

Câmera Normal (ou Natural)


Posição da câmera na altura dos olhos, a
frente do objeto ou assunto fotografado,
imitando a altura de uma pessoa. Esse
ângulo é usado para a maioria das com-
posições e transmite uma ideia de neutra-
lidade e imparcialidade do fotógrafo em
relação ao resultado da fotografia feita.
Truque de enquadramento em fotografia.
Fonte: https://www.tecmundo.com.br/fotografia- Plongée (mergulho)
e-design/38075-as-melhores-dicas-para-voce- Câmera posicionada de cima para bai-
enquadrar-fotos-para-o-facebook-ilustracao-.htm xo no momento da captura da imagem.
O elemento estético das imagens foto- Esse ângulo geralmente é usado para
gráficas se pauta no desenvolvimento da desvalorizar o assunto ou personagem
Arte Ocidental e pode ser resumido na fotografado, rebaixando-o, colocando
aplicação do posicionamento do ângulo numa escala de proporções que se asse-
de tomada da imagem e na Regra dos melha a da criança.
Terços. Basicamente existem três ângulos
de enquadramento distintos para a reali- Contra-Plongée
zação de fotografias. O enquadramento Câmera posicionada de baixo para cima
é a noção elementar da composição de no momento da captura da imagem. Esse
qualquer imagem e diz respeito a ação ângulo é geralmente usado para valorizar
prática de escolher o motivo ou cena a o assunto ou personagem fotografado
ser fotografada. Ao realizar imagens do por ser semelhante à convenção social
corpo humano é importante observar o aplicada às imagens sacras, em geral co-
recorte fotográfico uma vez que alguns locadas em altares para serem vistas de
cortes dão impressão de normalidade e baixo para cima.

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MODERNIDADE E AS MARAVILHOSAS
MÁQUINAS QUE PRODUZEM IMAGEM

A Regra dos Terços é outro importante ele-


mento de orientação para a construção de
imagens fotográficas. Essa regra está pau-
tada na observação da natureza e na cons-
tante matemática dos números que se pro-
põem a explicar as coisas do mundo.

Uma demonstração gráfica simplificada e im-


pressionante pode ser vista no link:
www.youtube.com/watch?v=2VuS8JOkr7s

Ou use a câmera do
celular para capturar
o código ao lado e
abrir o link na internet
automaticamente.

Para se obter uma imagem harmônica,


o fotógrafo deve seguir os princípios da
Proporção Áurea, a partir do enquadra-
mento de uma moldura que determinará
os limites da composição. A parte interior
desse retângulo deve ser dividida horizon-
tal e verticalmente em três partes iguais a
fim de se formar uma malha em que os
quatro pontos de intercecção, chamados
pontos de interesse, são os pontos de
maior impacto visual na fotografia. Esses
pontos servem de orientação para que o
fotógrafo que almeja alcançar a harmo-
nia na composição das imagens posicio-
ne a parte mais importante da cena a ser
capturada em uma das intersecções das Regra dos Terços para imagens horizontais e verticais.
linhas (representada por bolas vermelhas Fonte: http://desfocoblog.blogspot.com.br/2013/01/
nas figuras ao lado). mudando-o-olhar-regra-dos-tercos.html

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MODERNIDADE E AS MARAVILHOSAS
MÁQUINAS QUE PRODUZEM IMAGEM

Veja os seguintes exemplos de como seguir a regra dos terços na composição de ima-
gens fotográficas:

Regra dos Terços para imagens horizontais e verticais. Fonte: http://desfocoblog.blogspot.com.br/2013/01/


mudando-o-olhar-regra-dos-tercos.html

As imagens fotográficas desempenham


papel fundamental como elemento de
denúncia contra diversas modalida-
des de injustiça social. Exemplo disso
são as fotografias feitas pelo sociólo-
go e fotógrafo americano Lewis Hine
que denunciaram o trabalho infantil,
as condições degradantes de vida dos
imigrantes nos centros urbanos dos
Estados Unidos entre os anos 1900 e
1940, sendo peça fundamental para
a proposição de leis trabalhistas que
defendiam o trabalhador de formas de
trabalho análogas às da escravidão.
Regra dos terços para retratos. Fonte: https://
leituraeproducaodeimagem.wordpress.
com/2013/10/27/dicas-para-enquadramento/

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MODERNIDADE E AS MARAVILHOSAS
MÁQUINAS QUE PRODUZEM IMAGEM

Fotografias de Lewis Hine sobre o trabalho infantil nos EUA nas décadas de 1900 a 1930. Acima fotografia de
mulheres e crianças trabalhando em fábricas. Abaixo fotografia de meninos vendedores de jornal à frente das
escadarias do Congresso Nacional dos EUA, local onde deveria ser construída leis que garantissem o direito dessas
crianças à infância e educação. A ironia dessa fotografia está no fato de a exploração do trabalho infantil ser
mantida pelas duas forças sociais que deveriam, em teoria, zelar para a defesa da cidadania e dos direitos sociais:
as empresas de mídia e a casa legislativa.
Fontes: http://www.thinglink.com/scene/566636794083278850
http://www.alfabetizacaovisual.com.br/exposicoes/lewis-hine/

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MODERNIDADE E AS MARAVILHOSAS
MÁQUINAS QUE PRODUZEM IMAGEM

SUGESTÕES CULTURAIS
O fotógrafo brasileiro Sebastião Salgado construiu uma carreira interna-
cionalmente prestigiosa pautada no reconhecimento do papel social das
fotografias na produção de denúncias sobre situações de violação de di-
reitos sociais, exploração do trabalho e da dignidade da pessoa humana,
situações de risco à vida causadas por guerra e severas condições de de-
gradação ambiental. Para conhecer um pouco mais da vida e obra desse
artista e fotógrafo que por meio da produção de imagens vem incansa-
velmente trabalhando para a construção de um mundo mais igualitário,
solidário e pautado na cultura da paz, assista os filmes:
Fonte da foto: http://www.jornal3idade.com.br/?p=5980

Revelando Sebastião Salgado (2012) O Sal da Terra (2017)


Disponível em https://www.youtube.com/ Disponível em https://www.youtube.com/
watch?v=AYrNxCzSMmk watch?v=dT7wv2HSkYE

Ou use a câmera do celular para capturar um dos códigos acima e abrir um dos links para
assistir o vídeo escolhido.

19
MODERNIDADE E AS MARAVILHOSAS
MÁQUINAS QUE PRODUZEM IMAGEM

Truques e Montagens Fotográficas


Apesar de estarem pautadas no real, as que é muito difícil rastrear os arquivos di-
imagens fotográficas são produzidas a gitais, bem como a manipulação interna
partir de elementos de composição que e edição dos dados ali presentes. Ainda
permitem o recorte, reprodução, aumen- assim, a força constituinte das imagens
to e diminuição da proporção, apaga- fotográficas está pautada na convenção
mento de elementos e sobreposição, o social que afirma sua capacidade de ofe-
que propicia uma infinidade de possibili- recer aos espectadores o “testemunho
dades de montagens de novas imagens. ocular” dos quais as próprias fotografias
seriam resultado. Num mundo cada vez
mais repleto de imagens digitais, nunca
a alfabetização visual e leitura crítica des-
sas imagens foram tão importantes!

Menino Jornaleiro. Fotomontagem de 1940 feita pela


primeira fotojornalista brasileira, Hildegard Rosenthal.
Acervo IMS. Fontes: http://especiais.g1.globo.com/
pop-arte/2015/fotografia-brasileira-em-30-imagens/

Hoje, com a tecnologia das fotografias


digitais, as câmeras deixaram de usar os
filmes, que durante aproximadamente
um século e meio constituíram a prova
de autoria e da veracidade de cada uma
das imagens. Com as câmeras digitais es- Manipulação digital de fotografia. Fonte: https://i.
ses dois elementos se perderam uma vez ytimg.com/vi/H9XKciN3zNc/maxresdefault.jpg

20
MODERNIDADE E AS MARAVILHOSAS
MÁQUINAS QUE PRODUZEM IMAGEM

Cinema e Vídeo

Sala de cinema. Fonte: http://www.pavablog.com/wp-content/uploads/2017/12/002.jpg

de quadros fixos e contínuos que, ao


serem um a um, expostos à luz, na velo-
cidade de 16 quadros por segundo, da-
vam a ilusão de movimento às imagens,
conferindo “vida à cena”.

Por incrível que pareça, os primeiros expe-


rimentos cinematográficos não construíam
narrativas e não contavam histórias com
Cena dos primeiros filmes realizados disponível no“The começo, meio e fim. Será somente com o
Lumiére Brothers: First films”. Fonte: https://www. tempo e com a inventividade dos pioneiros
youtube.com/watch?v=lW63SX9-MhQ
da sétima arte que acontecerá a constru-
O cinema, do grego: κίνημα - kinema ção da Linguagem Cinematográfica. Para
“movimento”, também conhecido como tanto, o diretor do filme construirá as filma-
a sétima arte, foi criado pelos irmãos Lu- gens de diferentes cenas usando pontos
miére no final do século XIX a partir da de vistas ativos, comparativamente distin-
utilização dos princípios químicos e físi- tos ao espectador do teatro que só pode
cos da fotografia, ao usar sais de prata assistir a uma peça a partir do ponto de
emulsionados numa base flexível de ace- vista de sua poltrona. O diretor de cinema
tado que permitia a captura e impressão usa a câmera para transitar e mostrar aos

21
MODERNIDADE E AS MARAVILHOSAS
MÁQUINAS QUE PRODUZEM IMAGEM

espectadores dos filmes imagens construí- As noções de espaço e tempo são repre-
das a partir de diferentes pontos de vista, sentadas de maneira descontinuada para
encadeadas a partir de uma sequência feita facilitar o processo de produção dos fil-
da junção de diferentes pedaços de celuloi- mes mas, a partir do corte e edição das
de. Esse é o elemento central de construção imagens, há a construção de um novo es-
da narrativa no cinema. paço fílmico que não existe na realidade
do mundo vivido. Para comprovar isso o
Em 1902, o ilusionista e cineasta George cineasta russo V.L. Kuleshov montou, em
Méliès explorou a fundo os elementos da 1920, o seguinte experimento fílmico a
construção da narrativa cinematográfica partir da filmagem de 5 cenas distintas:
em seu filme Viagem à Lua (A Trip to the
Moon/Le Voyage dans la lune) e em apro- “1. Um jovem caminha da esquerda
ximadamente 500 outros filmes feitos por para a direita.
ele que, em sua maioria, foram destruídos 2. Uma mulher caminha da direita
durante e após a Primeira Grande Guerra. para a esquerda.
3. Eles se encontram e se cumprimen-
tam com um aperto de mãos. O jo-
O filme Viagem à Lua está disponível em vem aponta.
www.youtube.com/watch?v=_FrdVdKlxUk 4. Mostra-se um grande edifício bran-
co, com ampla escadaria.
5. Os dois sobem as escadas.

Os pedaços, filmados separadamente,


foram montados na ordem dada e pro-
jetada na tela. Os trechos filmados foram
apresentados ao espectador dessa ma-
neira, como numa ação clara, ininterrup-
ta: um encontro de dois jovens, um con-
vite até a casa vizinha e a subida, pelas
Cena do filme Viagem à Lua (A Trip to the Moon/
Le Voyage dans la lune) realizado por George Mé-
escadas, até a entrada. Cada trecho se-
liès em 1902. Fonte: https://player.bfi.org.uk/free/ parado, entretanto, foi filmado num local
film/watch-a-trip-to-the-moon-1902-online
diferente: por exemplo, o jovem, perto
Ou use a câmera do
do edifício G.U.M., a mulher, perto do
celular para capturar monumento Gogol, o aperto de mãos
o código ao lado e perto do Teatro Bolshoi, e a casa bran-
abrir o link na internet
automaticamente.
ca era um trecho de um filme americano
(na verdade era a Casa Branca), enquan-
to que a subida da escadaria foi filmada
na catedral de São Salvador. O que re-

22
MODERNIDADE E AS MARAVILHOSAS
MÁQUINAS QUE PRODUZEM IMAGEM

Tristeza

Fome

Desejo

Esquema descritivo do experimento fílmico montado por Kuleshov que ficou designado como Efeito Kuleshov.
Fonte: https://revistamoviement.net/o-efeito-kuleshov-e-a-consci%C3%AAncia-intencional-c2bf78ca52bd

sultou disso? Embora a filmagem tenha tagem do close do ator russo Ivan Mo-
sido efetuada em locações variadas, o zzhujin seguidas de três distintas cenas:
espectador percebeu a cena como um uma mulher no caixão, um prato de co-
todo. Os trechos de espaço real apanha- mida próximo a um copo e uma mulher
do pela câmara apareciam concentrados, deitada no sofá. Apesar da expressão
dessa forma, na tela”(KULESHOV In XA- do ator não se alterar, as pessoas da-
VIER; 1983: 69-70). vam outras significações ao seu humor,
de acordo com a imagem justaposta a
É também de Lev V. Kuleshov o expe- seguir, o que permitiu a construção de
rimento fílmico feito a partir da justa- significados distintos por meio da asso-
posição de planos que permitiu obter ciação da imagem da primeira persona-
uma nova significação atribuída à cena. gem à imagem apresentada imediata-
Realizada por meio da filmagem e mon- mente após sua aparição.

23
MODERNIDADE E AS MARAVILHOSAS
MÁQUINAS QUE PRODUZEM IMAGEM

Esse mesmo princípio de associação foi quadramento produzidos pela fotografia


derivado para a utilização de músicas na adaptando-as para a especificidade de
composição de trilhas sonoras que am- sua linguagem. Foi assim que se padro-
bientam e criam a paisagem sonora dos nizou a Escala de Planos que hoje conhe-
filmes. Quem não se lembra da inesque- cemos e que pode ser minimamente re-
cível música de Tubarão, capaz de criar o sumida nos esquemas mostrados abaixo:
medo aterrorizante e o clima de suspen-
Zenital
se em diferentes momentos preparando
o espectador para a aparição, em geral, Plongée
da barbatana do bicho! Essa magia acon-
tece porque o diretor pode separar som
e imagem e produzir os dois de maneira Natural
independente para então juntá-las como
quiser, visando atingir os sentimentos e
emoções dos espectadores.
Contra
Para construir a dramaticidade das cenas Plongée
Nadir
o cinema aprimorou as técnicas de en-

PLANOS POR ÂNGULO

Plano Nadir ou Supino Plano Zenital


Câmera voltada 90o graus para cima. Câmera voltada 90o graus para baixo.

Plano Natural Plano Plongée


Ao nível dos olhos. Dá a impressão de Inclinado para baixo. O personagem pode ser
que fazemos parte do filme. visto como uma pessoa indefinida ou fraca.

24
MODERNIDADE E AS MARAVILHOSAS
MÁQUINAS QUE PRODUZEM IMAGEM

Plano Contra plongée Plano Aberrante/Inclinado


Inclinado para baixo, sugerindo força ou Com inclinação para o horizonte. Sugere
abuso de poder. desequilíbrio, algo estranho.

Fontes: http://untorrentedecine.blogspot.com.br/2017/09/tipos-de-planos.html
https://www.agambiarra.com/plongee-contra-plongee/

PLANOS DE ENQUADRAMENTO (SIGLAS)

PD PPP PP PMC PM

PML ou PA PI PG GPG

LEGENDA
PD Plano Detalhe PMC Plano Médio Curto (Busto) PI Plano Inteiro
PPP Primeiríssmo Primeiro Plano PM Plano Médio (Cintura) PG Plano Geral
PP Primeiro Plano PML ou PA Plano Médio Longo GPG Grande Plano Geral
ou Plano Americano

Fonte da foto: Asierromero / Freepik. http://www.freepik.com PG GPG

25
MODERNIDADE E AS MARAVILHOSAS
MÁQUINAS QUE PRODUZEM IMAGEM

A composição da história a ser narrada vos e as sequências na ordem de aparição


pela produção de um filme pode acon- no filme prevendo personagens, locação,
tecer a partir de um livro, de uma história cortes, superposições, trilha sonora etc.
vivida por alguma pessoa, de uma notí-
cia de jornal etc. Tendo uma determina- Já o argumento é uma espécie de resu-
da história a ser contada o diretor será a mo focado na problemática ou conflito
pessoa que criará uma forma específica central sobre o qual o filme se desenrola.
para que tal narrativa ganhe as telas a Deve falar da personagem central, do gê-
partir da linguagem cinematográfica que nero do filme e do problema que acome-
pode ser do tipo ficcional ou não-ficcio- teu a personagem. Para ajudar a escre-
nal (documental). Independentemente ver o argumento sugerimos as seguintes
do tipo, qualquer mensagem cinema- questões auxiliares:
tográfica pressupõe a resposta a cinco
questões mínimas que auxiliam a com- • Qual é o gênero (documentário,
posição e formatação da produção de drama, aventura, comédia) do filme
suas imagens e montagem da narrativa. que sua comunidade está pensando
As cinco questões são: em produzir?
• Qual o tema principal da história?
• O que? • Quais são as personagens principais
Qual história se irá contar. do filme?
• Com quem se passa a história? • Resuma brevemente o que acontece
Identificação das personagens. na história e por que acontece.
• Quando acontece a história narrada?
Tempo. A sinopse é uma espécie de apresen-
• Onde acontece a história narrada? tação concisa do filme cujo objetivo é
Espaço. promover o interesse de investimento e
• Como? ser entregue para um produtor, diretor
Qual o formato e estilo da narrativa. e pessoas que possam auxiliar na reali-
• Quanto custa fazer o filme? zação do filme.

Todo filme e produto audiovisual con- Desde os primórdios de sua realização, as


têm também um roteiro, um argumento imagens produzidas pelas máquinas de
e uma sinopse. visão e representação do mundo mais do
que registram cenas do real uma vez que,
O roteiro é produzido a partir da definição tanto nas imagens fixas (fotografia) como
de uma história a ser narrada por meio da nas imagens em movimento (cinema), o
produção audiovisual. Pode ser pautado processo de produção intencional adota
em ficção ou não-ficção e deve apresentar efeitos de trucagens para a construção da
com clareza todos os elementos narrati- narrativa sem que o espectador se dê con-

26
MODERNIDADE E AS MARAVILHOSAS
MÁQUINAS QUE PRODUZEM IMAGEM

ta dos artifícios ali empregados. Disso de-


corre a necessidade de crítica e desconstru-
ção do ideal de automatismo e impressão
de imparcialidade, convenções sociais que
protegem as imagens dando-lhes a conota-
ção de registro privilegiado do mundo real
e verdade factual do cotidiano.

Mesmo os filmes documentários, tam-


bém chamados de não-ficção, possuem
a característica de decomposição do
tempo e espaço apreendidos durante as
filmagens para a construção de planos e Cartazes do Filme Nannok o Esquimó realizado por
sequências independentes da tempora- Robert Flaherty em 1922. Fontes: http://perso.infonie.
be/wakeman/insc_n/nanouk_esquimau.jpg / http://
lidade e espacialidade representada nas perso.infonie.be/wakeman/insc_n/nanook_north.jpg
imagens. Certamente, tais imagens es-
tão pautadas no real, mas se apropriam
de elementos da ficção para a constru- Cartaz do Filme O
Homem de Aran de
ção da mensagem final (decomposição, Robert Flaherty, reali-
sobreposição, escolha e recorte, etc). zado em 1934. Fonte:
https://images-na.ssl-
-images-amazon.com/
Interessante notar que Robert Flaherty, images/M/MV5BMT-
M1NTAwNTMwOV5B-
considerado o criador do gênero de filmes Ml5BanBnXkFtZTYwM-
de não-ficção e primeiro cineasta a inau- DExNzk5._V1_.jpg

gurar a produção e direção de filmes do-


cumentários, escolheu contar a história de
grupos familiares ligados ao mar.

Em 1922, Flaherty lançou, depois de Filme disponível em: https://www.youtu-


sua quase ruina, o filme Nannok, of the be.com/watch?v=ZXYC5Sv_fOQ
north (Nannok, o esquimó) em que nar-
ra a saga de Nannok e sua família em Ou use a câmera do
seu cotidiano de vida em condições ex- celular para capturar
tremas de baixas temperatura. Poste- o código ao lado e
abrir o link na internet
riormente Flaherty dirige o filme sobre automaticamente.
uma família de pescadores irlandeses,
no clássico do cinema documentário O
Homem de Aran (1934).

27
MODERNIDADE E AS MARAVILHOSAS
MÁQUINAS QUE PRODUZEM IMAGEM

Durante aproximadamente 50 anos, o cine- to, a cineasta Leni Riefenstahl lança mão de
ma teve importância enquanto meio de co- técnicas avançadas de filmagem e edição,
municação de massa que permitia as pes- uso de contra-plongées para a construção
soas acessarem mensagens imagéticas das de ângulos e closes das personagens a fim
mais diversas. Em parte, o cinema se apro- de valorizar ícones e padrões estéticos atri-
priou dos gêneros narrativos já existentes buídos a uma possível raça ariana. São dela
no teatro e na literatura, como a comédia, o os polêmicos filmes O Triunfo da Vontade
drama, a tragédia, o terror, o épico etc. para (1935) e Olympia (1938). Somente anos
a construção de narrativas ficcionais. mais tarde o mundo e a própria Alemanha
conheceriam as imagens das atrocidades e
A partir das experiências jornalísticas de crimes de guerra cometidos pelos nazistas
uso das fotografias, os produtores de cine- nos campos de concentração e extermínio
ma passaram a construir também cinejor- em massa de pessoas.
nais visando levar ao público presente nas
salas as informações tidas como mais rele- As consequências da Segunda Guerra
vantes que impactavam o mundo, marca- Mundial e a perplexidade diante do uso
do pela experiência das Grandes Guerras da tecnologia para produção de campos
e dos eventos e conflitos globais que des- de extermínio em massa pelo nazismo ti-
de então se generalizaram. Tais filmes, que veram profundo impacto na crítica à so-
compunham os cinejornais, tinham o fi- ciedade capitalista e seus mecanismos de
nanciamento de empresas de publicidade produção de consenso e controle social
e propaganda, bem como a ação dos esta- usando os meios de comunicação, resul-
dos nacionais e eram apresentados antes tando na construção da Organização das
dos filmes de ficção, que tinham o caráter Nações Unidas e na Declaração Universal
de entretenimento e lazer. No Brasil, entre dos Direitos Humanos.
os anos de 1938 e 1946 foram produzidos
pelo Departamento de Imprensa e Propa- Os meios de comunicação ganharam
ganda 433 filmes com conteúdo jornalísti- atenção de um conjunto de pesquisado-
co denominados Cine Jornais Brasileiros. res pertencentes ao Instituto de Pesquisa
Social da Universidade de Frankfurt, na
O poder de convencimento do cinema foi Alemanha, que partiram do pressuposto
também eficazmente usado pela máquina de que tais meios eram parte constituinte
de guerra nazista, sendo uma das explica- da indústria cultural, ou seja, uma indús-
ções possíveis para que a população alemã tria capitalista voltada para a produção de
passasse a encarar judeus, ciganos, estran- bens culturais transformados em merca-
geiros em geral e homossexuais enquanto doria, baseada na divisão do trabalho e na
inimigos públicos que deveriam ser comba- racionalidade da produção visando os lu-
tidos em nome da construção da eugenia, cro. A indústria cultural constrói seus pro-
ou seja, de uma dita raça superior. Para tan- dutos adaptados ao consumo das massas,

28
MODERNIDADE E AS MARAVILHOSAS
MÁQUINAS QUE PRODUZEM IMAGEM

Importância da
escolha dos ângulos
para a produção de
imagens e cons-
trução de beleza
na obra de Leni
Riefenstahl, padrões
esses hoje usados
amplamente na fo-
tografia e cinema.
Fonte: https://www.
blouinart salesindex.
com/auctions/Leni-
-Riefenstahl-6364015/
Seilspringer-1936

Imagens de pessoas mortas no campo de concentração de Sachenhausen.


Fonte: http://operamundi.uol.com.br/conteudo/noticias/15630/hoje+na+historia+1944++nazistas+iniciam+expe-
riencias+de+castracao+em+gays+nos+campos+de+concentracao.shtml

29
MODERNIDADE E AS MARAVILHOSAS
MÁQUINAS QUE PRODUZEM IMAGEM

veiculando suas mensagens a partir de


um emissor ativo, capaz de construir e
transmitir sentidos e, no outro extremo,
recebendo tais mensagens, um receptor
passivo, que por ignorar os princípios de
composição e estruturação das informa-
ções imagéticas, não é capaz de criticar a
representação seletiva da realidade ope-
racionalizada por tal indústria. Se no sé-
culo XIX as pessoas foram submetidas à
lógica da produção industrial nas fábricas,
no século XX as máquinas produtoras e
transmissoras de mensagens invadiram as
O Juramento do Jogo da Péla foi o marco
casas das pessoas, induzindo que a lógica inicial da Revolução Francesa que se deu
capitalista de produção, consumo, divisão por meio de ideias iluministas. O quadro
de tempo, espaço e regime dos afetos se que retrata esse episódio foi pintado por
estendesse para os domínios privados e Jacques-Louis David em 1791. Fonte: https://
particulares das famílias. É nesse sentido pt.wikipedia.org/wiki/Juramento_do_Jogo_
da_P%C3%A9la#/media/File:Le_Serment_du_
que podemos afirmar que a indústria cul- Jeu_de_paume.jpg
tural é totalitária e consegue transformar
tudo em mercadoria, esvaziando o valor As experiências do nazismo e a ampliação do
de uso de qualquer bem que passa então alcance e do poder dos meios de comunica-
a valer somente aquilo que é negociado a ção de massa dentro do esquema capitalista
partir do mercado. de produção colocam em xeque a própria
promessa do Iluminismo, a noção de liber-
Historicamente, o Iluminismo ofereceu dade por meio da dominação econômica
as bases conceituais para a realização da de algumas pessoas poderosas sobre muitas
Revolução Industrial por meio do ques- outras que não possuem acesso dos controle
tionamento do mundo feudal buscando a e influência real sobre os meios de produção
superação do misticismo e do medo, ten- em massa de bens, serviços e mensagens.
do como premissas a consagração do co- O espectador é transformado em audiência
mércio, dos direitos civis e da necessidade que é encarada enquanto número de conta-
de produção e difusão de conhecimentos bilidade financeira a ser comercializado pelas
pautados na razão e na ciência. Segundo empresas de mídia em troca de tempo desti-
Adorno e Horkheimer as promessas do nado à publicidade em sua programação. Es-
Iluminismo estavam centradas na constru- quemas políticos locais e falta de regulação
ção da liberdade, dos direitos e na supera- e prestação de contas públicas das grandes
ção do medo e do terror que dominaram a empresas de mídia dificultam o cenário atual
Europa durante toda a Idade Média. das coisas, como veremos a seguir.

30
MODERNIDADE E AS MARAVILHOSAS
MÁQUINAS QUE PRODUZEM IMAGEM

Televisão Brasileira
Durante as décadas de 1950 e 1960,
uma revolução no cotidiano das comuni-
cações foi produzida a partir da invenção
e comercialização dos aparelhos de tele-
visão em todo o mundo. Em 1951, foram
iniciadas as primeiras transmissões tele-
visivas no Brasil pela TV Tupi do Rio de
Janeiro. Desde lá, várias foram as emis-
Imagem com o logotipo da TV Tupi, primeira emissora de
televisão brasileira e latino-americana, quarta do mundo,
soras inauguradas nas principais capitais
pertencente ao grupo de comunicação Diários Associados brasileiras, especialmente Rio de Janeiro
criada por Assis Chateaubriand. Fonte: https://rnews.com.
br/tv-tupi-a-primeira-emissora-da-america-latina.html
e São Paulo.

HISTÓRIA DA TELEVISÃO NO BRASIL


Inauguração da TV Tupi
em São Paulo por Assis
Chateaubriand
1950 Inauguração da TV Tupi
no Rio de Janeiro por
Assis Chateaubriand
Inauguração da TV Record 1951
Inauguração da
no Rio de Janeiro
TV Record
(Emissoras Unidas) 1953
Primeiro link entre Rio e
Inauguração da TV 1955 São Paulo com transmis-
Itacolomi (Diários Associados) são do Grande Prêmio
de Turfe (RJ)
Inauguração da 1957
TV Continental
1959 Inauguração do Jornal
Inauguração da TV do Comércio em Recife
Excelsior em São Paulo
1960
Inauguração da TV Inauguração da TV Rádio
Cultura em São Paulo 1962 Clube em Pernambuco
(Diários Associados)
1963
Inauguração Inauguração da TV Excelsior
da TV Alterosa no Rio de Janeiro

31
MODERNIDADE E AS MARAVILHOSAS
MÁQUINAS QUE PRODUZEM IMAGEM

TV Alterosa é 1964 Inauguração da TV Globo


comprada pelos no Rio de Janeiro
Diários Associados 1965
de Chateaubriand
1966 Inauguração da TV Ban-
TV Globo deirantes em São Paulo
compra a TV Paulista 1967

Inauguração da TV
1968 TV Cultura passa
para a Fundação
Universitária da Universida- Padre Anchieta
de Federal de Pernambuco 1969

TV Excelsior RJ e SP
1970 TV Continental
são tiradas do ar por é cassada
decisão do governo 1972

Inauguração 1975 TV Record Rio é


cassada
da TV E
1977

TV Tupi Rio e São 1980 Inauguração


Paulo são fechadas por do SBT
decisão do governo
1981
Inauguração da Rede
Manchete com canais em 1983 TV Rio volta
a funcionar
São Paulo, Belo Horizonte,
Recife Fortaleza e Brasília 1987
Primeira TV a
TV Record é vendida 1989 cabo: TV A
ao bispo Edir Macedo

1990
Rede Manchete é com-
TV A é comprada prada por paulistas e dá
pela Editora Abril 1991 lugar à Rede TV!

1999
Entra no ar pela primeira TV E é extinta para
dar lugar à TV Brasil
vez a TV digital no Brasil 2007

32
MODERNIDADE E AS MARAVILHOSAS
MÁQUINAS QUE PRODUZEM IMAGEM

seguintes princípios:
I – preferência e finalidades educativas,
artísticas, culturais e informativas;
II – promoção da cultura nacional e regio-
nal e estímulo à produção independente
que objetive sua divulgação;
III – regionalização da produção cultural,
artística e jornalística, conforme percen-
tuais estabelecidos em lei;
IV – respeito aos valores éticos e sociais
da pessoa e da família.”

Ilustração sobre a censura. Fonte: https://jornalis- As empresas de televisão na prática exer-


moibmec.wordpress.com/2014/05/31/a-censura-no- cem pressão política difusa e não admiti-
-periodo-da-ditadura-militar/#prettyPhoto
da (lobby) junto às instâncias de poder e
No Brasil, a rede de televisão aberta cons- decisão nacionais (Congresso, Senado,
titui concessão pública regulada pelo es- Supremo Tribunal Federal, Presidência da
tado, que deveria estabelecer regras e República) a partir dos espaços e brechas
obrigações para as emissoras visando à para a utilização, em muitos casos pouco
democratização do acesso à informação adequada, das concessões de emissoras
e conhecimento. Diferentemente do que de rádio e televisão. Contribui para isso a
aconteceu na Europa e nos Estados Uni- frequente impossibilidade de acesso aos
dos, no Brasil, a construção das emisso- arquivos das grandes empresas de tevê
ras deu-se a partir da inciativa privada, privadas, até mesmo para o desenvolvi-
que se articulou e em muitos momentos mento de pesquisas com fins acadêmicos.
se aproveitou e/ou se adaptou às pres-
sões governamentais, como no caso do O modelo tecnológico geralmente utilizado
fechamento de várias emissoras durante pelas grandes empresas de tevê aberta no
a Ditadura Militar. Brasil baseia-se na existência de uma grande
central de produções responsável pela exe-
Após a democratização do país, as emissoras cução de grande parte dos programas gera-
de tevê passaram a encarar como censura dos e transmitidos. Esta transmissão depen-
qualquer tentativa de controle e verificação de diretamente da existência de pequenas
das prerrogativas constitucionais que regu- e médias emissoras-retransmissoras, cada
larizam o setor de comunicação no país. A qual afiliada a uma grande empresa de tevê,
Constituição Federal de 1988, em seu Artigo que cumprem o papel de receber via satéli-
n.° 221 (I e II) do Capítulo V estabelece que: te o “sinal” da programação e retransmitir o
mesmo num território que em média com-
“a produção e a programação das emis- porta 50 cidades. Em geral as afiliadas, além
soras de rádio e televisão atenderão aos de retransmitir a programação televisiva de

33
MODERNIDADE E AS MARAVILHOSAS
MÁQUINAS QUE PRODUZEM IMAGEM

grandes empresas, também produzem e a ampliação do número de políticos que se


transmitem, ainda que em diminuto espa- tornaram sócios de empresas de comuni-
ço de tempo diário, programação própria. cação, coisa que não é proibida pela Cons-
Apesar disso, pouco ou nenhum espaço é tituição Federal. Esses políticos acabam
dedicado aos interesses das camadas mais legislando em causa própria quando o as-
pobres da população das cidades, à repre- sunto é mídia e também alteram o regime
sentação das culturas locais, do reconheci- de possibilidades de produção e veiculação
mento da importância de seus saberes, fa- de notícias e informações em decorrência
zeres e suas histórias. de interesses particulares, construindo uma
espécie de coronelismo eletrônico. Outro
No plano econômico, as emissoras de tevê fator a impactar no cenário das empresas
recebem tanto pelos anúncios dos gover- de comunicação brasileira foi a mudança
nos federais, estaduais e municipais e das da base tecnológica, a partir da entrada
empresas estatais bem como pelos anun- em atividade da TV Digital e das provedo-
ciantes privados. Quase não é noticiado ras de TV a CABO e empresas de Internet
pelas grandes empresas de comunicação e celular banda larga que representam uma
que apenas cinco grupos familiares são do- considerável alteração do panorama até
nos e mandam nos conglomerados de mí- então estabelecido de concorrência entre
dia no país. Outro fato de preocupação foi as emissoras existentes.

Dicas de artigos para ampliar a compreensão do cenário atual das co-


municações no Brasil:

Observatório da Imprensa Intervozes e Repórteres Sem Levantamento Mapeia Do-


sobre Coronelismo Eletrônico Fronteiras Mapeiam os Donos nos da Mídia no Brasil.
https://www.youtube.com/ Da Mídia no Brasil Produzido pela Rede TVT
watch?v=RhXSnkW630g http://www.intervozes.org.br/ https://www.youtube.com/
direitoacomunicacao/?p=29753 watch?time_continue=100&-
v=p3R7mLM_HA4

Ou use a câmera do celular para capturar um dos códigos acima e abrir um dos links para assistir
o vídeo escolhido.

34
MODERNIDADE E AS MARAVILHOSAS
MÁQUINAS QUE PRODUZEM IMAGEM

São cinco as famílias donas de conglomera- alarmantes quanto à concentração de au-


dos de mídia no Brasil que aparecem lista- diência e marco regulatório. Dos 50 veícu-
da no ranking da pesquisa Monitoramento los de mídia listados com maior audiência,
da Propriedade da Mídia (Media Ownership 26 deles são controlados por apenas cinco
Monitor ou MOM), financiada pelo governo grupos. A Rede Globo é a líder de audiên-
da Alemanha e realizada em conjunto pela cia na tevê aberta e presenças relevantes na
ONG brasileira Intervozes e a Repórteres tevê a cabo (com a GloboNews e outros 30
Sem Fronteiras (RSF), baseada na França. canais); no rádio, com a CBN e a Rádio Glo-
Segundo notícia da revista Carta Capital bo; e na mídia impressa, com títulos como
de 31/10/2017, a pesquisa é resultado de os jornais O Globo, Extra, Valor Econômico,
um projeto global do Ministério de Coo- a revista Época, sem contar a popularidade
peração Econômica e Desenvolvimento da do Site G1.com. Ainda segundo a pesqui-
Alemanha que tem como objetivo promo- sa, o grupo Globo alcança sozinho audiên-
ver transparência e pluralidade na mídia ao cia maior que as audiências dos 2º, 3º, 4º e
redor do mundo. O Brasil atinge índices 5º maiores grupos brasileiros somadas.

1o

35
MODERNIDADE E AS MARAVILHOSAS
MÁQUINAS QUE PRODUZEM IMAGEM

2o

3o

36
MODERNIDADE E AS MARAVILHOSAS
MÁQUINAS QUE PRODUZEM IMAGEM

4o

5o

Fonte: https://www.cartacapital.com.br/sociedade/cinco-familias-controlam-50-dos-principais-veiculos-
-de-midia-do-pais-indica-relatorio

37
MODERNIDADE E AS MARAVILHOSAS
MÁQUINAS QUE PRODUZEM IMAGEM

A construção da Internet e a democrati- comunitária das mídias e das novas tecno-


zação do acesso às redes sociais e meca- logias de informação visando o combate à
nismos de produção de conteúdo, busca censura e a garantia de acesso à liberdade
de informação e compra chacoalharam de expressão e circulação de informações
por um tempo a relação de poder entre na Internet a partir da viabilização, inde-
os produtores de mensagens pertencen- pendência e sustentabilidade dos veículos
tes às grandes corporações midiáticas, os alternativos de mídia.
financiadores da produção e o público em
geral. Isso abriu um cenário que carece Compreendendo que o cenário de cons-
de maior compreensão de seus alcances trução das novas mídias poderia gerar
e limites, bem como dos riscos e brechas severos conflitos em relação aos usos
existentes, visando a proposta de regula- da comunicação e mídias a Organização
mentação pública e democrática de aces- das Nações Unidas para a Educação e
so a essas novas mídias. a Cultura (UNESCO), tentando equali-
zar os debates e construir uma agenda
Desde 2011 há também a prerrogativa mundial, lançou em 2013 a publicação
defendida no Fórum Social Mundial, em “Alfabetização midiática e informacio-
Dakar, para a construção e implantação nal: currículo para formação de profes-
de políticas públicas focadas na defesa e sores”. Essa publicação traduzida para
promoção do direito à comunicação e in- diferentes línguas, visa atuar juntamente
formação enquanto Direito Humano fun- a professores no sentido de prepará-los
damental e alienável a partir da construção para os desafios e possibilidades das
de marcos regulatórios e legislativos para Tecnologias da Informação e Comunica-
as mídias, principalmente para o estímulo ção (TICs) para a área da educação for-
à promoção, acessibilidade e apropriação mal, não-formal e informal.

“Por um lado, a alfabetização informacional enfatiza a importância do acesso à informa-


ção e a avaliação do uso ético dessa informação. Por outro, a alfabetização midiática
enfatiza a capacidade de compreender as funções da mídia, de avaliar como essas fun-
ções são desempenhadas e de engajar-se racionalmente junto às mídias com vistas à
autoexpressão. A Matriz Curricular e de Competências em AMI (Alfabetização midiática
e informacional) para formação de professores incorpora ambas as ideias. Diversas de-
finições ou conceitos de educação em alfabetização midiática e alfabetização informa-
cional apontam para competências que enfatizam o desenvolvimento de habilidades a
partir de investigações e a capacidade de engajamento significativo junto às mídias e
aos canais de informação independentemente das tecnologias usadas”. (Alfabetização
midiática e informacional: currículo para formação de professores, 2013. pg. 18).

38
MODERNIDADE E AS MARAVILHOSAS
MÁQUINAS QUE PRODUZEM IMAGEM

Em 2016, a UNESCO editou a publi- disposição e competências do país”, vi-


cação “Alfabetização midiática e infor- sando aprofundar os debates e plane-
macional: diretrizes para a formulação jando a retroalimentação do processo
de políticas e estratégias” e também o de formação de pessoas e construção
“Marco de Avaliação Global da Alfabe- de políticas públicas para o setor da co-
tização Midiática e Informacional (AMI): municação nas nações.

DICAS PARA PROPOR PARA AS ESCOLAS


ONDE NOSSAS CRIANÇAS ESTUDAM
A UNESCO possui uma série de publicações voltadas para a formação
continuada de professores e alunos, disponível gratuitamente online,
que podem ser adotadas como material didático e de apoio ao en-
sino nas escolas que atendem as comunidades pesqueiras atendidas
pelo Pescarte. Bora conhecer?

Alfabetização midiá- Alfabetização midiá- Educação para os


tica e informacional: tica e informacional: Objetivos de Desen-
diretrizes para a for- currículo para forma- volvimento Susten-
mulação de políticas ção de professores tável: objetivos de
e estratégias aprendizagem
http://www.unesco.org/
http://www.unesco.org/ new/pt/brasilia/commu- http://www.unesco.org/
new/pt/brasilia/about-this- nication-and-information/ new/pt/brasilia/about-this-
-office/single-view/news/ access-to-knowledge/ -office/single-view/news/
portuguese_version_of_ media-and-information- education_for_sustainab-
media_and_information_ -literacy/ le_development_goals_
literacy_policy/ learning_object/

Ou use a câmera do celular para capturar um dos códigos acima e abrir um dos links para
assistir o vídeo escolhido.

39
ATIVIDADES PRÁTICAS DO CURSO

Ao longo dessa apostila foram sintetizadas de comunicação interna às comunidades de


as bases teóricas e premissas para reflexão pescadores artesanais, contribuindo assim
crítica e produção de materiais audiovisuais. para a ampliação do quadro de referências
Nossa intenção é encorajar as comunida- e possibilitando a reflexão crítica sobre os
des pesqueiras a produzirem suas próprias processos decisórios, conflitos e soluções
imagens, sejam elas em fotografias ou em encontradas por diferentes comunidades.
vídeos, usando seus repertórios culturais a Agora, apresentamos uma série de exercí-
fim de que suas histórias sejam narradas e cios visando colocar em prática e exercitar
compartilhadas entre as próprias comuni- a produção de imagens a partir do uso de
dades da pesca artesanal visando à troca tecnologias acessíveis e da proposição de
de informações e experiências para a defe- eventos de divulgação e projetos de veicu-
sa de seus interesses políticos e econômi- lação dos resultados aqui obtidos, por meio
cos. Dessa maneira, o Projeto Pescarte se das redes sociais ligadas aos Movimentos
propõe a estimular a construção de redes Sociais que apoiam a categoria.

Atividade 1
Roda de Conversa sobre o tema:
“E os trabalhadores da pesca artesanal? Como ficam nesse mar de imagens midiáticas?”
Aproveitando os debates e conversas midiáticas no Brasil. Esse pode ser o estí-
paralelas que surgem ao longo das ati- mulo para que os trabalhadores da pesca
vidades expositivas vamos nos lançar a artesanal se apropriem de conhecimentos
debater as mensagens veiculadas sobre sobre formas de comunicação comunitária
a pesca artesanal nos diferentes meios de para usar em seu dia a dia visando inclu-
comunicação. As pescadoras e os pesca- sive a defesa de direitos e denúncia eficaz
dores artesanais se sentem contemplados de ameaças à sustentabilidade de sua ati-
com as informações que as empresas de vidade profissional e modo de vida.
comunicação disponibilizam sobre a pes-
ca? Os pescadores, pescadoras e seus Essa atividade de reflexão e debate sobre a
familiares utilizam a internet para obter mídia e suas formas de representar a pesca
informações importantes que dizem res- artesanal pode ser realizada em cada uma
peito ao setor da pesca artesanal em seu das divisões do próprio curso e nos auxilia-
cotidiano? Quais seriam os principais sites rão no processo educativo crítico, uma vez
visitados pelos trabalhadores da pesca? que as imagens e mensagens midiáticas pre-
sentes no cotidiano das pessoas constroem
Parte fundamental desse curso é ofere- parte da significação atribuída à ordem das
cer mecanismos de alfabetização visual coisas e do mundo, o que dificulta o proces-
e compreensão do contexto e interesses so de crítica, compreensão e construção de
relacionados à produção das mensagens protagonismo diante das mesmas.

40
ATIVIDADES PRÁTICAS DO CURSO

Atividade 2
Ei, psit, ô da poltrona! Bora fazer fotografia?
Oficina de Produção de Imagens Fotográficas

1
Agora é hora de colocar a mão na de seus direitos. Para isso pode-se orga-
massa, ou melhor, no celular ou câ- nizar uma oficina que resulte numa expo-
mera fotográfica que estiver disponí- sição de fotografias. Geralmente há espa-
vel e partir para a ação! Vamos começar ços no município que podem ser parceiros
treinando a sua habilidade de olhar o mun- das iniciativas culturais e palco de realiza-
do a sua volta buscando um bom assunto ção da oficina e da exposição. Aproveite
para transformar em fotografia! As fotos para convidar a mídia local se o objetivo
são sempre construídas a partir do mundo da atividade pretender dar visibilidade a
visível e é nele que devemos buscar nossa alguma problemática que merece atenção
fonte de motivação. Em geral, fotografa- do Ministério Público ou de algum órgão
mos nosso cotidiano familiar pois essa é estatal dedicado à regulação.

2
uma forma importante de construir nosso
registro das pessoas e momentos vividos Que tal agora exercitarmos nossas
uma vez que sabemos que tudo aquilo habilidades de enquadrar e produzir
passa. Essas fotos acabam sendo auxilia- imagens a partir da utilização da Re-
res para nossa memória! gra dos Terços? A proposta é reunir a comu-
nidade e delimitar temas importantes para
Será que não podemos ter essa mesma realização de fotografias. Cada participante
atitude para com nossa comunidade? irá fazer suas fotografias colocando o objeto
Você ou sua família, amigos ou vizinhos ou pessoa fotografada numa das intersec-
certamente têm fotografias antigas que ções formadas a partir da utilização da Regra
mostram como era o local onde você dos Terços, conforme o esquema abaixo:
mora, os locais onde você trabalha, ou
onde se diverte no passado. Você con-
segue ver alguma diferença entre essas
imagens e tais locais na atualidade? Ten-
te produzir fotografias dessas paisagens
usando o mesmo ângulo anteriormente
Regra dos Terços para
tomado para compor o antes e o depois. imagens horizontais e
Esse exercício pode auxiliar a comunidade verticais.
Fonte: http://desfocoblog.
a verificar possíveis impactos ambientais blogspot.com.br/2013/01/
sofridos nas comunidades pesqueiras e mudando-o-olhar-regra-
-dos-tercos.html
refletir sobre seu papel na busca e defesa

41
ATIVIDADES PRÁTICAS DO CURSO

3
Ao longo da apostila mostramos a da a partir de visita de campo. A comunidade
existência de três ângulos distintos pesqueira pode realizar também ao longo da
para a realização de fotografias. oficina de fotografia a experiência de cami-
São eles: nhadas fotográficas com o intuito de que os
participantes da oficina possam em conjunto
Câmera Normal (ou Natural) explorar o mundo visível e o tema proposto
Posição da câmera na altura dos olhos, a pela própria comunidade a partir da tomada
frente do objeto ou assunto fotografado, de imagens nesses três ângulos distintos.

4
imitando a altura de uma pessoa. Esse
ângulo é usado para a maioria das com- Para um exercício mais avançado,
posições e transmite uma ideia de neutra- pode-se propor a realização de fo-
lidade e imparcialidade do fotógrafo em tografias não somente a partir dos
relação ao resultado da fotografia feita. três ângulos como a partir das escalas de
enquadramentos de cena proposto pelo
Plongée (mergulho) cinema. O final dessa atividade também
Câmera posicionada de cima para baixo no pode acontecer nas sedes do Pescarte ou
momento da captura da imagem. Esse ân- de outros PEAs, em museus, espaços cul-
gulo geralmente é usado para desvalorizar turais, colônias de pescadores, saguão de
o assunto ou personagem fotografado, re- teatro, universidades a partir da realização
baixando-o, colocando numa escala de pro- de uma exposição dos trabalhos finais dos
porções que se assemelha à das crianças. participantes da oficina.
Contra-Plongée • A realização de uma exposição pode
Câmera posicionada de baixo para cima ter um formato simples, feito a partir de
no momento da captura da imagem. Esse barbante e prendedor de roupa. O im-
ângulo é geralmente usado para valorizar o portante serão as imagens realizadas e
assunto ou personagem fotografado por ser as histórias contadas a partir das narrati-
semelhante à convenção social aplicada às vas visuais expostas.
imagens sacras, em geral colocadas em al-
tares para serem vistas de baixo para cima.

A partir da delimitação de um tema im-


portante para a comunidade, propõe-se
a realização de fotografias sobre o assun-
to (suas possíveis causas e efeitos) onde
cada participante realize ao menos uma
fotografia usando cada um dos três ângu-
los de tomada de fotos. Exemplo de montagem de um Varal Fotográfico como
modelo de exposição das imagens realizadas nas oficinas.
Fonte: http://blog.atelie.com.br/2010/11/sandra-pagano-fa-
Essa é uma atividade que merece ser realiza- la-do-i-varal-fotografico-da-apsp/#.Wlasw5Opl0s

42
ATIVIDADES PRÁTICAS DO CURSO

Atividade 3
Ei, psit, ô da poltrona! Bora fazer um vídeo que fala da sua comunidade?
Oficina de Produção de Vídeo

Foto de Glauber Rocha


do Arquivo Nacional do EXEMPLOS
Brasil. Fonte:
https://i.pinimg.com/ Defumador Artesanal Como consultar
originals/a3/85/2f/ https://www.youtu- o Seguro Defeso
a3852f0da274ec87bf- be.com/watch?v=x- https://www.youtube.com/
1108906958c7bc.jpg Zx7XzirM5w watch?v=rN0QqPvP4pA

O cineasta brasileiro Glauber Rocha cunhou a


célebre frase: - “Uma câmera na mão e uma
ideia na cabeça”. Vemos hoje esse princípio
ser usado pelos Youtubers que lançam nas
redes sociais informações sobre os mais dis-
tintos assuntos do cotidiano. Como o Youtu-
be e o Vimeo são plataformas (relativamente) Ou use a câmera do celular para capturar um dos códi-
gos acima e abrir um link para assistir o vídeo escolhido.
gratuitas de compartilhamento de vídeos,
estão ao alcance dos usuários da internet de
maneira livre e oferecem opções interessantes vídeos com caráter educativo e explicativo.
de troca, sugestão e divulgação. Tais instru-
mentos passaram a fazer parte do cotidiano Agora, com base nesses exemplos, responda
dos mais distintos segmentos de internautas. se há interesse em fazer um vídeo de sua co-
munidade. Sobre o que seria? Onde aconte-
O compartilhamento rápido e acessível des- ceria? Quem seriam as personagens? Quando
ses vídeos tem o potencial de gerar repercus- aconteceria? Como você contaria essa histó-
são pública para assuntos e informações que ria? E, finalmente, para quem você contaria
de outra forma provavelmente não entrariam sua história? Veja, de maneira bem resumida,
no circuito de produção de notícias dos gran- retomam-se as 5 questões apresentadas na
des canais midiáticos. página 26 na descrição do Cinema e Vídeo de
forma proposital pois essas questões nos au-
Os mecanismos de produção e compartilha- xiliam a formular a narrativa e começar a cons-
mento de vídeos tem auxiliado muitas pes- truir as estratégias de produção audiovisual!
soas e movimentos sociais de defesa da ci-
dadania, dos direitos sociais construídos com Em ambos os casos é necessário se ter em
longa trajetória de reivindicação e luta políti- mente qual a mensagem que se quer cons-
ca. Também estão sendo produzidos muitos truir e comunicar a partir do vídeo?

43
ATIVIDADES PRÁTICAS DO CURSO

PASSO A PASSO

Ideia Roteiro Pré-Produção Gravação

Sair
da ideia
e produzir um vídeo
Edição

O roteiro é produzido a partir da definição do problema que acometeu a personagem.


de uma história a ser narrada por meio da Para ajudar a escrever o argumento e o roteiro
produção audiovisual. Pode ser pautado sugerimos as seguintes questões auxiliares:
em ficção ou não-ficção e deve apresentar
com clareza todos os elementos narrativos • Qual é o gênero (documentário, drama,
e as sequências na ordem de aparição no aventura, comédia) do filme que sua co-
filme, prevendo personagens, locação, cor- munidade está pensando em produzir?
tes, superposições, trilha sonora etc.. Já o • Qual o tema principal da história?
argumento é uma espécie de resumo foca- • Quais são as personagens principais
do na problemática ou conflito central sobre do filme?
o qual o filme se desenrola. Deve falar da • Resuma brevemente o que acontece
personagem central, do gênero do filme e na história e por que acontece.

ARGUMENTO E ROTEIRO

O que gravar? Qual a finalidade? Qual o público?

Como gravar? Formato?

Reunir a comunidade pesqueira a partir da das, necessidades pautadas nas memórias e


proposta de produção de um vídeo pode histórias locais, mensagens geralmente que
ser uma boa estratégia de se pensar alter- não estão retratadas pelos meios de comu-
nativas viáveis e comunicação das deman- nicação convencionais!

44
ATIVIDADES PRÁTICAS DO CURSO

PASSO A PASSO DO VÍDEO COMUNITÁRIO


Gravação feita a
Ideia desen- Pré-pro- a partir do rotei-
volvida a Roteiro ro coletivamente
dução que
partir da dis- produzido produzido e com
envolva as
cussão com a em oficinas participação
pessoas da
comunidade coletivas das pessoas da
comunidade
comunidade

Sai
r da
ideia Edição - voz
e prod
uzir um vídeo da comunida-
de e não do
diretor

Mas, falta ainda o treinamento técnico de


filmagem e edição da imagem. PROPOSTA DO EXERCÍCIO FINAL
PARA SER DESENVOLVIDO JUNTO
COM OS GRUPOS GESTORES
Dicas para gravar e editar um vídeo:

1
• Qual história sugerimos?
Planeje a história que quer contar Ações dos GGs no Pescarte e seu papel na
para seu público. Selecione as per- mediação da escolha dos projetos de GTR
sonagens e o local onde irá filmar. Produzir um vídeo para contextualizar os projetos
de GTR escolhidos a partir das demandas das co-
munidades pesqueiras – narrar o processo de esco-
• Quem são os personagens? lha dos projetos.
• Quem irá falar o quê ? Planejar a or-
• Por que tais projetos de GTR são importantes?
dem de fala dos personagens; Para quem?
• Onde vão acontecer as filmagens? Pla-
• Com quem se passa a história?
nejar a filmagem em locais silenciosos Identificação das personagens (os GGs de cada município).
e sem vento;
• Planejar a luz. Não filmar contra uma • Quando acontece a história narrada?
Tempo: Sugestão de narrar o processo desde a eleição
fonte luminosa que deixará sua imagem dos GGs até o presente momento.
pouco nítida;

45
ATIVIDADES PRÁTICAS DO CURSO

2
Decida se seu vídeo será gravado de
uma vez só, numa imagem contínua,
ou se irá fazer um vídeo composto
de imagens com vários cortes e de maior
tempo de duração. Se fizer um vídeo cur-
to, com uma única sequência, você pode-
rá realizá-lo diretamente no celular fazendo
transmissão ao vivo pelo Facebook ou, em
seguida, transferi-lo para o YouTube.

Para enviar o vídeo


diretamente para o YouTube
1. Acesse a sua conta Google

2. Clique no ícone de upload (seta para


cima no canto direito da página do Youtube)

Anúncio explicativo do aplicativo Android VivaVideo.


Fonte: https://play.google.com/store/apps/details?id=com.
3. Selecione o vídeo. quvideo.xiaoying&hl=pt_BR

No caso da produção de um vídeo mais lon-


go, com vários cortes, você poderá usar o
aplicativo VivaVideo que é um software livre
que permite a produção e edição gratuita
de vídeos e filmes tendo até cinco minutos
de duração. Para baixar o software no celu-
Você também pode enviar o vídeo ao Google
Drive e abri-lo em seguida no YouTube. Para isso, lar ou tablet é só acessar a Play Store da
vai precisar se conectar à conta associada ao site. Google, procurar e baixar o aplicativo.

46
ATIVIDADES PRÁTICAS DO CURSO

3 6
Cuide da iluminação do local e Agora, abra o aplicativo VivaVideo
dê preferência a fazer a filmagem no tablet ou celular.
de dia aproveitando a luz natural.

7
Nunca filme contra a fonte de luz pois isso
irá deixar o rosto das pessoas e as coisas Edite o vídeo nesse programa se-
filmadas na penumbra. Se precisar, utilize guindo os seguintes passos:
uma luminária indireta no ambiente.

4
Cuide da captação de som evitan- • Selecione a opção EDITAR, conforme
do ambientes com vento, motor, qualquer uma das opções destacadas
música ou televisão ligada. Peça às de roxo e indicadas pelas setas roxas
personagens que falem alto e claro. do esquema.

5
Ligue a câmera do tablet (pode ser
do celular também!) para fazer a gra-
vação. Você pode ter que repetir a
filmagem algumas vezes até que a gravação
fique boa. Isso é normal e até os mais premia-
dos diretores de cinema gravam mais de uma
vez a mesma cena! Para estabilizar a captação
da imagem, você pode usar o auxílio de um
“pau de self” ou apoiar os braços no encosto
de uma cadeira ao filmar entrevistas.

Aproveitando as dicas de fotografia dessa


apostila você pode fazer várias imagens do
local e das personagens do filme para pos-
teriormente fazer a edição dessas imagens
utilizando-as como ilustração e conexão de
sentido durante o vídeo.

DICA
Deixe gravando por mais cinco segundos
após o final da fala da personagem para que
tenha espaço suficiente entre a edição de
um trecho e o próximo. Para deixar de filmar
aperte o botão “Parar” no dispositivo. Em
geral o vídeo é salvo automaticamente.

47
ATIVIDADES PRÁTICAS DO CURSO

• Selecione agora a opção VÍDEO na • O programa também disponibiliza a


aba acima da tela e escolha qual clipe opção de inserir e editar fotografias
virá primeiro na edição. em seus vídeos. Esse recurso é impor-
tante, pois imagens fotográficas e ma-
pas são eficientes ilustrações para os
filmes! Para tanto selecione a opção
Foto na parte de cima da tela do pro-
grama, ao invés da opção Vídeo e rea-
lize sua seleção de imagens!

• Clicando no ícone sobre cada um dos


clipes você poderá assistir à cena com-
pleta e selecionar o trecho que será
usado no seu vídeo realizando assim
Opção de
o corte de cada um dos trechos. Essa seleção
operação deve ser repetida a cada um de fotos!
dos trechos que comporão o filme.

O programa dá
dicas de uso!

Clique em PRÓXIMO
para concluir a etapa

Selecione o tempo
de cada clipe!

Clique em ADICIONAR Visualize os clipes já


para concluir a etapa cortados e em sequên-
cia de edição!

48
ATIVIDADES PRÁTICAS DO CURSO

• A Linha de Tempo mostra de manei- • O VivaVideo também oferece uma vas-


ra intuitiva o andamento da edição ta opção de músicas (liberadas do pa-
feita a partir da sua seleção e recor- gamento de Direitos Autorais) para que
te! Várias opções são oferecidas pelo você possa escolher a trilha sonora que
programa VivaVideo que facilitam e melhor se adeque a sua edição.
enriquecem as possibilidades de co-
municação a partir do vídeo! Tente
experimentar cada uma delas:

Quanto mais para a esquerda, maior o


volume da música, se sobrepondo ao
áudio gravado durante a filmagem.

Tabela com opções


de músicas e opção
de escolha da dura-
ção das canções

Linha do Tempo
da edição

Opções:
corte, texto, filtro, adesivos,
efeitos, som, transição e adi-
cionar clipe.

49
ATIVIDADES PRÁTICAS DO CURSO

• Lembre-se de apresentar as persona- • Por fim, é hora de acrescentar o letrei-


gens do seu filme a partir da inserção ro inicial com o nome do vídeo, que
de letreiros com os nomes e profissão deve ser escolhido com muito carinho,
de cada pessoa, na ordem de aparição pensando na divulgação do mesmo!
das mesmas! Também é tempo de se colocar as
cartelas no início e fim com os crédi-
tos do vídeo, onde todos aqueles que
contribuíram de alguma forma, sendo
na ideia, produção, roteiro, filmagem,
edição ou como personagem e inter-
locutor do filme deve ter seu nome e
Concluir
função mencionados. Também é im-
portante agradecer a todos aqueles
que contribuíram direta e indiretamen-
te para a realização do vídeo! Para isso,
é só selecionar na aba TEMAS a última
opção que é justamente a de Textos!

Para inserir textos e


alterar tamanho, cor e
fonte dos caracteres

Opcões:
Formas de Aparição, Balões de
Texto, Alinhamento de Texto,
Localização da posição do texto.

50
ATIVIDADES PRÁTICAS DO CURSO

• Após a finalização é hora de enviar profissionais que realizam imagens e se va-


seu vídeo para o YouTube (ou Vímeo) lem delas para o exercício de seus ofícios e
e compartilhar o endereço entre seus atividades laborais.
amigos e colegas da pesca artesanal!
Esse é o intuito da produção audiovi- O Direito ao Uso de Imagem de um in-
sual compartilhada que permite o for- divíduo diz respeito ao controle do uso
talecimento dessa rede de informação! de sua imagem (independentemente de
ser representação do tipo indicial, icôni-
ATENÇÃO ca ou simbólica). Cabe ao indivíduo au-
torizar expressamente a utilização de sua
O YouTube também está cheio de imagem por terceiros sendo-lhe faculta-
pessoas que podem querer ofen- do agir assim gratuitamente ou mediante
der. São os bullies e trolls da inter- pagamento. A utilização da imagem de
net. Uma dica pode ser desativar os outrem sem a obtenção da devida auto-
comentários dos seus vídeos. rização incorre em violação do direito à
imagem e pode gerar sanções como o
Nunca copie ou plagie outros vídeos pois pagamento de indenizações. Assim, to-
você estará cometendo um crime contra das as pessoas que tiverem suas imagens
os direitos autorais. Com a reforma e siste- representadas, seja por fotografia ou ví-
matização de diferentes códigos jurídicos deo, precisam disponibilizar sua autori-
ocorridas na última década, em especial zação expressa, que pode ser feita por
com o fim da Lei de Imprensa, a preocu- meio de um documento. Na próxima
pação a respeito da definição do Direito página, trazemos exemplo do modelo
Autoral e Direito de Uso de Imagem en- simplificado de Autorização de Uso de
trou em pauta de discussão entre todos os Imagem e Voz.

Desde 1967, o jornalismo e, por conseguinte, o fotojor-


nalismo contaram com legislação específica para o setor,
a “Lei da Imprensa”, que lhes fiava o direito de gerar ima-
gens desde que as pessoas fotografadas estivessem no
espaço público. Com o fim da Lei da Imprensa em 30 de
abril de 2009, todos os profissionais da imagem passaram
a estar sob a regulamentação do Código Penal de 1942,
alterado posteriormente em 1984, da Constituição Federal
de 1988 e do Código Civil de 2002.
Fonte da imagem: http://livraria.senado.leg.br/media/catalog/product/cache/1/ima-
ge/265x/3bd21382e7fb7de3f646c4456b98a4d0/c/f/cf_livro_livraria_1_1.jpg

51
ATIVIDADES PRÁTICAS DO CURSO

52
ATIVIDADES PRÁTICAS DO CURSO

Praia Grande em Arraial do Cabo. Fonte: Acervo de fotos do Projeto Pescarte. Fotógrafo: Ademir Alves.

Agora que temos esse passo a passo, vamos exercitar o que aprendemos até aqui?

Esperamos que tenham gostado dessa apostila e da proposta de comunicação comuni-


tária a partir da produção e compartilhamento de fotografias e vídeos!

Quem sabe, em breve, a gente possa construir uma grande Rede de Comunica-
ção da Pesca Artesanal!

53
BIBLIOGRAFIA

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ADORNO, T. W. A indústria cultural. COHN, G. Comunicação e Indústria Cultural. São Paulo, Editora
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