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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE ESTUDOS DA LINGUAGEM

NAOMI KAWAKAMI

Estratégias de sumarização utilizadas por alunos do


ProFIS em avaliações de 2013 e 2014

CAMPINAS
2016

1

NAOMI KAWAKAMI

Estratégias de sumarização utilizadas por alunos do


ProFIS em avaliações de 2013 e 2014

Monografia apresentada ao Instituto de Estudos da Linguagem, da


Universidade Estadual de Campinas como requisito parcial para a
obtenção do título de Licenciado em Letras – Português.

Orientadora: Profª Drª Inês Signorini

CAMPINAS
2016

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AGRADECIMENTOS

À professora Inês Signorini, pela orientação e oportunidades.

Aos alunos do ProFIS, pelas experiências e materiais.

Aos amigos do IEL sem os quais o trabalho não seria finalizado, Cristiane, Thatyane,
Paulo.

À toda a família pela paciência e apoio.

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RESUMO

Esse trabalho tem por objetivo investigar as estratégias de sumarização utilizadas por
alunos do ProFIS (Programa de Formação Interdisciplinar Superior da Unicamp) para produzir
resumos na primeira avaliação de uma disciplina de leitura e produção de textos acadêmicos
realizada nos primeiros semestres dos anos de 2013 e 2014. Para tanto, procurou-se identificar e
descrever os diferentes processos de sumarização utilizados pelos alunos que cursaram a
disciplina nos dois anos estudados, realizando-se comparações entre as estratégias identificadas
em 2013 e 2014. Ao total, foram analisados 132 textos, 64 produzidos em 2013 e 68 em 2014.
Esses textos representam cerca de metade dos alunos dos respectivos anos. Escolheu-se analisar
as duas (entre quatro) turmas de cada ano com a maior variação de notas na avaliação. Os
resultados da comparação entre os dois anos também foram cotejados com o que é apresentado na
literatura sobre a produção de resumos. As pesquisas consultadas focam-se nos processos de
sumarização (BROWN & DAY, 1983; BROWN, DAY & JONES, 1983; HOWARD, 1992;
KINTSCH & VAN DIJK, 1978; KLEIMAN & TERZI, 1989; TELES, 2007) e paráfrase
(FUCHS, 1983; SANT’ANNA, 2003; RIGAT, 2013; WILSON & ABREU, 2010). Os resultados
dos textos de 2014, primeiro grupo analisado, estavam bastante próximos das previsões da
literatura: respeitavam a progressão do texto-fonte, com a operação de alterações gramaticais nos
trechos selecionados para compor os resumos. Os resumos de 2013 diferem do que foi
encontrado nos textos de 2014: são notavelmente mais curtos, contém menos referências ao
texto-fonte e procuram reformular passagens mais extensas de forma mais geral, com menor
correlação entre partes dos resumos e trechos específicos do texto-fonte. A recorrência de
padrões divergentes entre as estratégias empregadas nos dois grupos analisados aponta para as
instruções em sala de aula como fonte da definição da atividade de sumarização e do gênero
resumo. Essas definições ativam diferentes estratégias de leitura e escrita, que partem das
experiências escolares anteriores dos alunos, que possuem situações e níveis de letramento
escolar e acadêmico bastante diversos, pois acabam de ingressar na universidade após concluírem
o Ensino Médio em escolas da rede pública.

Palavras-chave: Resumo; Seleção de informações; Paráfrase. ProFIS,

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ABSTRACT

This research aims to investigate the summarisation strategies employed by students


enrolled in ProFIS (Programa de Formação Interdisciplinar Superior da Unicamp) for the
production of summaries during first term examinations in 2013 and 2014. To that effect, the
different processes of summarisation employed in the two exams were identified and described as
well as compared against each other. 132 texts were analysed, 64 from 2013 and 68 from 2014.
These amount to approximately half of the summaries written in each of the respective years. The
texts selected were from the classes with the most diverse grades. These results were also
compared to the literature about the production of summaries. The works used in the comparison
focus mainly on summarization processes (BROWN & DAY, 1983; BROWN, DAY & JONES,
1983; HOWARD, 1992; KINTSCH & VAN DIJK, 1978; KLEIMAN & TERZI, 1989; TELES,
2007) and paraphrase studies (FUCHS, 1983; SANT’ANNA, 2003; RIGAT, 2013; WILSON &
ABREU, 2010). The results in the analysis of the 2014 summaries, the first group, are very
similar to the results in previous studies: the summaries follow the organizational sequence of
information used in the text summarised (source-text), with grammatical changes to patch the
parts select from the source-text together. The results in the 2013 texts’ analysis are different
from the ones in 2014: the summaries are noticeably shorter, with fewer references to the source-
text and attempts to paraphrase longer passages, showing less correlation between parts of the
summaries and specific passages of the source-text. The recurrence of patterns in the summaries,
that differ in the two groups analysed, points to previous instructions as a source for the
definition of the summary, both as an activity as well as a written genre. These distinct
conceptions of summaries seem to activate different reading and writing strategies acquired
during school years, hailing from the very different and mixed school experiences of the students,
who have just started their undergraduate studies.

Key Words: Summary; Information selection; Paraphrase.

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ÍNDICE DE FIGURAS

Figura 1 - Página de impressão do texto-fonte de 2013 ................................................................. 23


Figura 2 - Bloco de informações ampliado .................................................................................... 23
Figura 3 - Cópia do texto-fonte de 2014 39 .................................................................................. 24

ÍNDICE DE TABELAS

Tabela 1 - Retomada de parágrafos do texto-fonte em resumos de 2014 ...................................... 26


Tabela 2 - Número de parágrafos nos resumos das turmas de 2013 e 2014 .................................. 31
Tabela 3 - Trechos selecionados no texto-fonte de 2013 ............................................................... 43
Tabela 4 - Palavras-chave do texto-fonte de 2013 ......................................................................... 45

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ÍNDICE DE QUADROS

Quadro 1 - Resumo 39 de 2014..................................................................................................... 24


Quadro 2 - Resumo 39 de 2014...................................................................................................... 25
Quadro 3 - Parágrafo 5 do texto-fonte de 2014............................................................................. 27
Quadro 4 - Resumo 44 de 2014..................................................................................................... 29
Quadro 5 - Resumo 60 de 2014 .................................................................................................. 30
Quadro 6 - Resumos 55 e 53 de 2013 e 63 de 2014 .................................................................... 34
Quadro 7 - Resumo 8 de 2013........................................................................................................ 36
Quadro 8 - Parágrafos 7 a 9 do texto-fonte de 2013 ...................................................................... 37
Quadro 9 - Descrições do conceito de rurbanizaçõa no reusmo 8 e texto-fonte de 2013 .............. 38
Quadro 10 - resumo 5 de 2013 ....................................................................................................... 39
Quadro 11 - Resumo 28 de 20........................................................................................................ 40
Quadro 12 - Resumo 23 de 2014.................................................................................................... 41
Quadro 13 - Resumo 32 de 2013.................................................................................................... 42
Quadro 14 - Resumo 21 de 2014.................................................................................................... 48
Quadro 15 - Resumo 69 de 2014.................................................................................................... 50
Quadro 16 - Resumo 59 de 2014.................................................................................................... 53
Quadro 17 - Resumo 23 de 2014.................................................................................................... 55
Quadro 18 - Resumo 30 de 2014.................................................................................................... 57
Quadro 19 - Resumo 66, 67 e 47 de 2014 ...................................................................................... 58
Quadro 20 - Resumo 43 de 2014.................................................................................................... 60
Quadro 21 - Resumo 43 de 2014.................................................................................................... 61
Quadro 22 - Resumo 4 de 2014...................................................................................................... 61
Quadro 23- Resumo 38 de 2013..................................................................................................... 63
Quadro 24 – Resumos 52, 58 e 57 de 2013.................................................................................... 64
Quadro 25 - Resumos 19 e 11 de 2013 e 71 de 2014 ..................................................................... 65

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SUMÁRIO

1. Introdução ................................................................................................................................. 10
2. Embasamento Teórico ............................................................................................................. 14
3. Texto-fonte 2014 ....................................................................................................................... 19
4. Texto-fonte 2013 ....................................................................................................................... 21
5. Metodologia .............................................................................................................................. 23
6. Seleção de informações nos resumos de 2014 ........................................................................ 26
6.1. Seleção de informações do texto-fonte .......................................................................................... 26
6.2. Organização e Progressão Textual................................................................................................ 28
6.3. Inversões .......................................................................................................................................... 30
7. Seleção de informações nos resumos de 2013 ........................................................................ 31
7.1. Número de parágrafos ................................................................................................................... 31
7.1.1. Parágrafo como unidade de organização e significação textual: comparação entre 2013 e 2014
............................................................................................................................................................. 32
7.2. Autonomia dos resumos ................................................................................................................. 34
7.3. Seleção de informações................................................................................................................... 35
7.3.1. Organização dos textos-fonte .................................................................................................... 35
7.4. Uso de aspectos fora do corpo do texto-fonte ............................................................................... 38
7.5. Trechos selecionados no texto-fonte.............................................................................................. 43
7.6. Palavras-chave ................................................................................................................................ 45
8. Reformulações nos resumos de 2014 ...................................................................................... 47
8.1. Alterações localizadas .................................................................................................................... 47
8.1.1. Apagamento .............................................................................................................................. 48
8.1.2. Substituição ............................................................................................................................... 49
8.2. Generalizações e Explicações......................................................................................................... 51
8.2.1. Generalização ............................................................................................................................ 52
8.2.2. Explicação ................................................................................................................................. 54
8.3. Adaptações ...................................................................................................................................... 56
8.4. Referência ........................................................................................................................................ 58
9. Reformulações nos resumos de 2013 ...................................................................................... 62
9.1. Generalizações ................................................................................................................................ 62
9.2. Referências ...................................................................................................................................... 63
10. Considerações finais ............................................................................................................... 66
Referências ..................................................................................................................................... 70
Textos-fonte: ................................................................................................................................. 71
Anexo 1 .......................................................................................................................................... 72
Anexo 2 .......................................................................................................................................... 76
Anexo 3 .......................................................................................................................................... 77

8

Anexo 4 .......................................................................................................................................... 81

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1. Introdução

1.1. Objetivos de Pesquisa

Este trabalho tem como objetivo geral investigar as estratégias de sumarização utilizadas por
alunos do ProFIS (Programa de Formação Interdisciplinar Superior da Unicamp) para produzir
resumos durante a primeira avaliação da disciplina LA083 - Leitura e Produção de Textos
Acadêmicos I nos anos de 2013 e 2014. Os objetivos específicos do trabalho são:
• Identificar e descrever estratégias de sumarização nos textos analisados;
• Comparar as estratégias identificadas em 2013 e 2014;
• Comparar as estratégias encontradas nos textos do ProFIS com o que é descrito e previsto
na literatura sobre processos de sumarização (BROWN & DAY, 1983; KLEIMAN & TERZI,
1989; TELES, 2007; HOWARD, 1993; KINTSCH & VAN DIJK, 1978; SHERRARD, 1989);
• Contribuir para a disciplina LA083 - Leitura e Produção de Textos Acadêmicos I na
formação dos alunos do ProFIS com um início de mapeamento do que os alunos produzem na
primeira avaliação do semestre.
Para tanto, o texto foi seccionado em 10 partes principais. Primeiramente, a Introdução
(seção 1) apresenta tanto o programa do ProFIS quanto a disciplina LA083 – Leitura e Produção
de Textos Acadêmicos I, procurando contextualizar a pesquisa realizada, assim como suas
motivações e justificativas. Em seguida, é descrito o Embasamento Teórico (seção 2) sobre o
qual a análise se apoia.
As duas seções (3 e 4) seguintes apresentam os textos-fonte, isto é, os textos que foram
resumidos em 2014 e 2013 respectivamente. A ordenação não segue a sequência cronológica de
produção dos resumos (ou seja, primeiro 2013 e, segundamente, 2014), mas a ordem em que as
análises dos respectivos grupos de textos foram realizados (no caso, primeiro 2014 e, depois,
2013).
Essas descrições dos textos-fontes naturalmente contêm interpretações que não deixam de
influenciar as análises. No entanto, diferentemente de alguns dos estudos sobre resumo
consultados (BROWN & DAY, 1983; HOWARD, 1993), que partem de noções prévias sobre
quais informações devem constar nos resumos para que se adéquem ao gênero — ou faixa etária,
nível de escolarização etc. —, nesta pesquisa procurou-se partir das produções dos alunos, sem

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previsões anteriores. Dessa forma, primeiramente, fez-se o mapeamento dos resumos e, depois, o
do texto-fonte, como descreve a seção de Metodologia (seção 5).
Finalmente, parte-se para as seções de análise. São quatro seções ao total: Seleção de
informações utilizadas nos resumos de 2014 (seção 6); Seleção de informações utilizadas nos
resumos de 2013 (seção 7); Reformulações nos resumos de 2014 (seção 8); Reformulações nos
resumos de 2013 (seção 9). Essas seções foram organizadas de modo que a comparar mais
facilmente as estratégias identificadas nos dois anos. Cada uma destas seções possui várias
subseções nas quais procurou-se agrupar e organizar os resultados das análises para melhor
comparação.
Como indicam os nomes das seções, a análise dos textos, focou primeiramente nas
estratégias de seleção de informações, procurando identificar quais foram retiradas do texto-fonte
(a partir do qual foram produzidos os resumos) e quais foram as mais recorrentes, assim como
elementos que ajudem na compreensão dessas estratégias. E, segundamente, em estratégias de
reformulação (FUCHS, 1985) dessas informações selecionadas para a confecção dos resumos.
O texto é encerrado com as considerações finais, nas quais procurou-se fazer uma
retomada breve dos resultados das análises e uma pequena discussão sobre esses achados.

1.2. ProFIS

O ProFIS, Programa de Formação Interdisciplinar Superior, é um curso sequencial do


Ensino Superior da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) criado para aumentar a
inclusão dentro da universidade, assim como promover uma formação interdisciplinar e ampla a
alunos de escolas públicas da região de Campinas após o término do Ensino Médio.
O programa consiste em 117 créditos, em período de aulas integral, levando entre 4 e 6
semestres para sua conclusão. Após o seu término, os alunos têm a oportunidade de ingressar em
diversos cursos de graduação da Unicamp, através de um sistema de ranqueamento baseado em
suas notas em disciplinas obrigatórias. Assim, o aluno com maior coeficiente de rendimento
(C.F.) nestas disciplinas faz sua opção de curso, seguido do aluno com o segundo maior C.F. e
assim por diante1.


1
Informações disponíveis no site oficial do ProFIS. Disponível em: <http://profis.prg.unicamp.br/> acesso em: 6 de Dezembro de
2016

11

Para ingressar no curso, os candidatos necessitam ter cursado todo o Ensino Médio na
rede pública e estar matriculados no terceiro ano do Ensino Médio em uma escola localizada no
município de Campinas. O cadastramento é realizado no site do ProFIS, de forma gratuita.
Os alunos são selecionados através de suas pontuações no ENEM (Exame Nacional do
Ensino Médio), com vagas distribuídas entre as instituições de Ensino Médio públicas do
município — uma vaga por instituição, sendo o restante das 120 vagas anuais atribuídas apenas
pela pontuação no ENEM, com um máximo de dois alunos por escola.
Em decorrência da forma de seleção dos alunos, as turmas do ProFIS costumam ser
bastante heterogêneas, em questão de históricos escolares e experiências, assim como letramentos
– especialmente letramentos acadêmicos. Isso se reflete nas disciplinas, principalmente as
ministradas no primeiro ano do curso, com expressivas variações de notas entre os alunos. Essa
heterogeneidade nas turmas traz desafios para os docentes, que devem considerar a diversidade
de perfis de alunos, assim como os objetivos específicos de suas disciplinas.
A investigação sobre os resumos produzidos como partes das avaliações de 2013 e 2014
parte inicialmente da necessidade de dados mais concretos sobre os textos produzidos por esse
grupo de alunos bastante diverso, de modo a contribuir para a formação destes alunos.

1.3. Disciplina LA083 – Leitura e Produção de Textos Acadêmicos I

A disciplina LA083 – Leitura e Produção de Textos Acadêmicos I tem como proposta a


introdução aos alunos de gêneros e textos correntes na academia, pensando nas diversas áreas do
conhecimento e trabalhando a sua leitura e produção. A disciplina é obrigatória no programa,
ministrada no primeiro semestre, sendo pré-requisito para a disciplina LA084 – Leitura e
Produção de Textos Acadêmicos II.
A disciplina é composta por aulas semanais teóricas (2 aulas por semana, 2 créditos) e
práticas (2 aulas por semana, 2 créditos). As turmas (A, B, C e D) são divididas em dois grupos
(A e B; C e D) que compartilham horários. As aulas teóricas focam a análise de textos
acadêmicos de gêneros variados e pertencentes a diferentes áreas do conhecimento, enquanto as
aulas práticas são realizadas em laboratórios de informática, envolvendo mais produções de
escrita e leitura, assim como trabalho com letramentos digitais — passando desde a apresentação

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de ferramentas de busca acadêmicas e uso apropriado de referências a produções de textos em
diferentes gêneros.
Os textos analisados, tanto de 2013 quanto 2014, foram produzidos como resposta à
primeira avaliação da disciplina LA083, a partir da pergunta: “Se tivesse que reportá-la [a matéria
de divulgação científica] a alguém, o que reportaria?”. Na avaliação de 2013 ela é a quinta e
última questão, antecedida por quatro perguntas que tratam do assunto geral, assunto específico,
objetivo e organização. A avaliação de 2014 possui uma atividade de aplicação de conectivos
seguida de duas questões sobre assuntos gerais e específicos, assim como objetivos da matéria,
terminando com a mesma pergunta que suscita o resumo utilizada em 2013.
O primeiro grupo de textos analisados foi selecionado a partir dos materiais de 2014, ano
no qual a presente pesquisa foi iniciada. Para compor o corpus da pesquisa, foi escolhido o grupo
com maior variação de notas na avaliação — em 2014, as turmas C e D — partindo-se do
pressuposto de que isso possibilitaria encontrar maior diversidade de estratégias de sumarização.
A proposta inicial era a de realizar a segunda análise a partir de textos produzidos no ano
de 2015, porém, o texto-fonte desse ano apresentava algumas diferenças com relação ao utilizado
no ano anterior: o texto-fonte de 2014 é uma matéria de divulgação científica publicada no Jornal
da Unicamp, enquanto o texto-fonte utilizado em 2015 é a adaptação de uma tese. Assim, optou-
se por utilizar o material do ano de 2013, no qual também foi utilizada como texto-fonte uma
matéria de divulgação científica publicada no Jornal da Unicamp. O mesmo grupo de turmas (C e
D) foi selecionado em 2013 para a segunda análise para aproximar as comparações entre os
resultados dos dois anos.

1.4. Questões de Pesquisa e Justificativa



No total, foram analisados 132 textos, 64 produzidos em 2013 e 68 em 2014. Embora as
notas das avaliações tenham servido como forma de seleção das turmas analisadas em 2014 —
isto é, foram selecionadas as turmas com as maiores variações de notas na primeira avaliação (C
e D) —, com as turmas correspondentes selecionadas em 2013, elas não configuram critérios de
análise na pesquisa. Assim, as análises não são feitas a partir de subgrupos das faixas de nota.
Através desta escolha de textos para a análise, resumos que compõe parte da primeira
avaliação de uma disciplina de primeiro semestre, foi possível observar esse momento de entrada

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dos alunos no ProFIS e no ambiente acadêmico, assim como as respostas desses alunos a práticas
de escrita e leitura acadêmicas.
Essas respostas trazem indícios de estratégias escolares e da forma como esses alunos
lidam com o (novo) ambiente acadêmico. Esses indícios são importantes tanto para a disciplina
LA083 quanto para o próprio ProFIS, pois o foco de ambos é preparar os alunos para a entrada
em cursos da graduação, de modo que entender as práticas e questões dos alunos pode auxiliar no
trabalho com esses alunos que formam grupos tão heterogêneos.
Além disso, como as avaliações pedem a produção de resumos, é possível observar
também as formas como os alunos lidam com a sumarização, parte importante em diversos
gêneros da esfera acadêmica (tais como resenhas, artigos científicos, dissertações, teses etc ) com
os quais os alunos entrarão em contato tanto ao longo do ProFIS quanto da graduação. Outro
fator importante é a situação avaliativa na qual os resumos foram produzidos, de modo que
representam indicações sobre as interpretações dos alunos com relação às expectativas da
disciplina, especificamente, mas também da própria esfera acadêmica e suas práticas de leitura e
escrita.

2. Embasamento Teórico

Processos de sumarização fazem parte de diversos gêneros e esferas de atividade humana,


presentes tanto em práticas orais quanto escritas. Nas atividades ligadas à escola e à academia, a
sumarização ajuda a compor gêneros não apenas cuja elaboração final é importante — como
artigos científicos, relatórios, resenhas etc. —, mas servem a funções de ensino — utilizada por
professores em sala de aula tanto oralmente quanto através de textos escritos —, à aprendizagem
— como forma de estudo, seja em resumos de conteúdos, seja em outros gêneros como
fichamento — e, ainda, à avaliação (BROWN & DAY, 1983; TELES, 2007).
Gêneros ligados à sumarização, em especial os resumos, são também utilizados para a
investigação de processos de leitura e escrita (BROWN & DAY, 1983; HOWARD, 1993;
KINTSCH & VAN DIJK, 1978; KLEIMAN & TERZI, 1985). Kintsch & van Dijk (1978)
propõem um modelo de compreensão e produção textual que parte das proposições menores do
texto — a microestrutura (microstructure; trad. nossa) — para compor uma representação maior

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de sua essência (gist; trad. nossa) — a macroestrutura (macrostructure; trad. nossa) —, através
de macrorregras (macrorules; trad. nossa) que governam a compreensão.
O modelo delineia processos mentais que regem a compreensão e retenção de
informações a partir da leitura de um texto. Os autores identificam três momentos nesse processo:
o primeiro consiste na organização do texto em um todo coeso, no qual algumas informações são
mais retidas através da repetição em seu processamento (p. 363); o segundo momento traduz
essas informações mais retidas na essência (gist trad. nossa) do texto; a etapa final consiste na
produção de novos textos como resultado do processo de compreensão, para preencher lacunas e
inter-relacionar as proposições restantes (p. 363).
Assim, os componentes menores do texto-fonte, proposições (propositions), são
processados diversas vezes e as proposições consideradas mais importantes (através da aplicação
das macrorregras) e, consequentemente, mais retidas em cada um dos processamentos das
informações, formam uma versão mais concentrada do texto-fonte, que recebe acréscimos a partir
desta versão mais breve.
É importante notar, assim como critica o próprio Kintsch (1982 apud SHERRARD,
1989), que os textos nos quais o modelo foi baseado e sobre os quais foi aplicado possuem
estruturas narrativas. Isso traz questões sobre o processo de compreensão de textos como as
matérias de divulgação científica utilizadas como textos-fontes nos resumos aqui analisados.
As estruturas narrativas possuem organizações temporais, sendo marcadas por sequências
de ações que se inter-relacionam (como causa e consequência de acontecimentos dentro de uma
estória, por exemplo), o que facilita sua análise, para a própria composição do modelo, mas
também são mais simples de serem processadas por leitores, seja em sua forma escrita ou oral
(SHERRARD, 1989, p. 2).
Textos da esfera acadêmica são majoritariamente expositivos e/ou argumentativos, ainda
que contenham partes de teor mais narrativo (como o texto-fonte de 2014, por exemplo). Dessa
forma, apoiam-se em conceitos que se inter-relacionam. A forma de condensação de ideias, de
acordo, é menos sequenciada do que a de textos cuja estrutura principal é a narração, pois, em
textos expositivos, é possível reformular a ordenação e as relações de sentido que são
estabelecidas com maior facilidade.
Embora apresente, assim, alguns problemas para a aplicação com textos da esfera
acadêmica, o modelo gerou diversos resultados interessantes em suas diferentes aplicações em

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diversas pesquisas (como será descrito a serguir). Além disso, parece considerar algumas
questões importantes, como os objetivos de leitura, sem os quais o processo de compreensão não
ocorre (p. 364), assim como experiências anteriores e familiaridade com o gênero (p. 371).
A partir do modelo de Kintsch & van Dijk (1978), outros autores (BROWN & DAY,
1983; BROWN, DAY & JONES, 1983; HOWARD, 1993; KLEIMAN & TERZI, 1985; TELES,
2007) desenvolveram experimentos e interpretações acerca tanto da própria atividade de
sumarização quanto de processos de leitura e escrita.
Essa literatura sobre a produção de resumos indica que algumas estratégias são bastante
recorrentes. Brown & Day (1983) identificam em sua pesquisa uma estratégia de sumarização
que chamam de estratégia de cópia e apagamento (copy-delete strategy; trad. nossa). A estratégia
se dá em três etapas: 1. A leitura sequenciada do texto; 2. A seleção de informações-chave; 3.
Cópia/Decalque das informações para a produção do resumo (BROWN & DAY, 1983).
As autoras interpretam a estratégia a partir das macrorregras da sumarização de van Dijk e
Kinstch (1977, 1978 apud BROWN & DAY, 1983), propondo que essa estratégia seja baseada na
regra de apagamento (deletion em BROWN & DAY, 1983), a mais simples e recorrente,
constituindo um processo bastante instintivo. As autoras concluem que o uso das regras seguintes
— supraordenação (superordination), seleção (selection) e invenção (invention), segundo
tradução de Teles (2007) — está diretamente ligado ao nível de escolaridade do resumidor.
Assim, resumidores mais maduros são capazes de ultrapassar os limites dos parágrafos,
rearranjando as informações por seus conteúdos tópicos, realizar inferências sobre conhecimentos
prévios do leitor com relação às informações no resumo e, finalmente, produzir enunciados novos
(BROWN & DAY, 1983; BROWN, DAY & JONES, 1983).
Howard (1993) encontra uma situação bastante próxima à estratégia de cópia e
apagamento nas produções de seus alunos universitários: a cópia de trechos do texto-fonte com o
apagamento de algumas palavras, alterações gramaticais ou substituições individuais de
sinônimos (p. 233), o que a pesquisadora renomeia como “patchwriting”, ou seja, uma escrita
remendada. A autora reflete, no entanto, sobre as implicações de que, mesmo com um nível de
escolaridade mais avançado, alunos ainda (re)produzam estratégias atribuídas a estágios iniciais
da escola.
Howard (1993), por fim, propõe que a falta de familiaridade com o texto resumido —
com relação aos gêneros acadêmicos, à linguagem ou aos discursos acadêmicos — seja um fator

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importante na proximidade da linguagem e estrutura entre os resumos de seus alunos e os textos-
fonte. Assim, seria necessário considerar a estratégia de “patchwriting” como passo inicial de
contato de alunos com novos textos e discursos, a partir do qual deve ser desenvolvido o ensino
de escrita e leitura (acadêmicas).
Kleiman & Terzi (1985), também partindo das propostas de Brown & Day (1983),
realizaram um estudo para observar o impacto do tipo de tarefa proposto aos resumidores: com a
presença ou ausência do texto-fonte na produção de resumos. As autoras concluem que a
presença do texto-fonte pode facilitar uma estratégia como a de cópia e apagamento, já que
possibilita que o resumidor apenas siga o texto-fonte, sem ter que apreender uma compreensão
mais global, como requer um resumo sem consulta. As autoras argumentam, ainda, que “a leitura
no contexto escolar não é necessariamente um processo de compreensão” (p. 86), já que, através
de estratégias como de cópia e apagamento, é possível a produção de resumos de textos que são
aceitos correntemente na escola (KLEIMAN & TERZI, 1985).
Adicionalmente, as autoras encontram em seus resultados, nos textos produzidos sem a
presença do texto-fonte, resumos que procuraram tomar informações do texto de forma mais
geral e coesa. As pesquisadoras argumentam que não se trata necessariamente de maturidade
escolar, como propõe Brown & Day (1983) e Brown, Day & Jones (1983), mas da forma como o
resumidor encara a tarefa de resumir e, assim, se relaciona com o texto-fonte.
Teles (2007), em sua tese, também retoma a estratégia de cópia e apagamento proposta
por Brown & Day (1983), utilizando, além disso, literatura sobre processos de leitura e escrita
para realizar uma análise de resumos produzidos por alunos universitários. A autora define a
sumarização partindo de um processo de leitura no qual aplica-se a estratégia de cópia e
apagamento, resultando em um “resumo mental”. Essa representação do texto-fonte é
retextualizada — termo utilizado pela autora, que parte dos conceitos de Marcuschi (2004 apud
TELES, 2007) para definir um texto produzido a partir de um “texto-base” (p. 24) — através da
aplicação das regras de generalização e construção extraídas do modelo de Kintsch & van Dijk
(1978), resultando em um “texto-resumo” (p. 24). A autora foca sua análise, no entanto, em
conceitos diferentes, com categorias de análise que se focam em aspectos de referenciação e
autoria (seções 3.1: Referência ao autor do texto-fonte; 3.2: Presença do autor do texto-fonte ou
ausência do retextualizador; e 3.3: Utilização da terceira pessoa gramatical e a imparcialidade do
resumidor); Fidelidade ao texto-fonte (seção 3.4); e concisão (seção 3.5).

17

Para auxiliar na análise sobre o que Teles (2007) trata de retextualização, foram também
consultados estudos sobre a paráfrase, considerando que muitas das estratégias descritas
encontram equivalências entre passagens dos resumos e trechos específicos dos respectivos
textos-fonte.
Os estudos sobre a paráfrase tomam formas bastante distintas. Como movimento de
linguagem, o parafrasear é bastante — e inicialmente — representativo na fala. Ele aparece tanto
na transmissão de informações de outras fontes — similar ao que o resumo se propõe — como
forma de reiteração ou esclarecimento da fala própria (HILGERT, 2000). Embora seja
perfeitamente possível a sumarização de um texto escrito de autoria própria do resumidor, há, na
escrita, um distanciamento próprio do momento do resumo, que procura apagar marcas de autoria
do resumidor na descrição do texto-fonte (SANT’ANNA, 2007 apud WILSON & ABREU,
2010).
Sant’Anna (2003), relacionando a paráfrase e a paródia, coloca a paráfrase como prática
de explicação, podendo conter adições de informações para esclarecimento — que, por sua vez,
pode ser tanto uma reformulação do próprio autor do texto-fonte quanto de um resumidor que o
interpreta. Este ponto também é levantado brevemente por Rigat (2013), que, partindo do campo
da linguística computacional, propõe que as relações entre enunciados parafrásicos sejam
bidirecionais — em uma relação recíproca de equivalência de sentido.
Rigat (2013), embora tome posicionamentos sobre os processos de paráfrase mais
indicados para a criação de modelos de representação que levem à identificação de paráfrases —
com o propósito de criação de programas que possam realizar essas identificações para a
contenção de plágio, focando o meio acadêmico —, também traz considerações importantes
sobre os estudos já realizados em campos diferentes sobre a paráfrase, que a autora considera
como objeto de estudo intrinsecamente multidisciplinar.
A autora levanta, por exemplo, diferentes níveis da paráfrase, podendo-se partir da
palavra (a sinonímia), passando por frases, até textos completos. Enquanto a ideia de
equivalência entre os processos nesses diferentes níveis traz problemas teóricos próprios
(apresentados por Fuchs (1985), discutida a seguir), pode-se propor que o resumo seja uma
paráfrase de um texto, possivelmente composta por paráfrases de enunciados mais específicos.
Fuchs (1985), em seu artigo, faz uma pequena análise sobre três concepções do fenômeno
parafrásico que norteiam as pesquisas do campo. A primeira, “a paráfrase como equivalência

18

formal entre frases” (p. 130), trata-se de um conceito lógico no qual dois enunciados são
paráfrases se “são conjuntamente verdadeiros ou falsos”. Segundo Fuchs (1985), essa abordagem
leva a trabalhos de reformulação sintática de enunciados, com “constância lexical”, produzindo
conjuntos de enunciados sintaticamente equivalentes, mas que desconsideram alterações
semânticas que o processo de derivação sintática pode causar.
A segunda abordagem identificada pela autora é “a paráfrase como sinonímia de frases”
(p. 131), que aplica teorias sobre a equivalência no nível da palavra, sinônimos, ao enunciado.
Esse conceito propõe que as paráfrases partam de equivalências baseadas em diferentes pontos de
vista, de forma que se mantém um “núcleo duro” do enunciado, alterando-se as “ideias
acessórias”, relacionadas às diferentes perspectivas que podem ser tomadas a partir de um mesmo
referente — parte da conceituação sobre sinônimos. Fuchs (1985) levanta, para essa abordagem,
questões sobre relações de sinonímia — partindo de um mesmo referente, nem todos os termos
possíveis são adequados a diferentes situações — e sobre as abstrações dos discursos que
perpassam as diferentes alterações dos enunciados.
A última perspectiva apresentada, “a paráfrase como reformulação” (p. 133), aproxima-se
de um conceito de tradução intralingual, focada em questões de interpretação. Esta abordagem
lida com questões sobre discurso, considerando que as paráfrases são produzidas a partir de
processos interpretativos e, portanto, variáveis, que procuram reconstituir significados de um
texto anterior.
A análise desenvolvida nas seções 6, 7, 8 e 9 procura identificar estratégias de paráfrase
de um texto-fonte para o desenvolvimento de resumos, considerando processos mais localizados
— quando é possível identificar trechos específicos do texto-fonte que são adaptados no resumo
— e comentando processos mais gerais.

3. Texto-fonte 2014

O texto resumido na avaliação de 2014 (ver anexos 1 e 2) é uma matéria de divulgação


científica intitulada “Substituição no futebol: entra o inteligente e sai o malabarista”, escrita por
Manuel Alves Filho e publicada no Jornal da Unicamp em março de 2014 (nº 590). A matéria

19

trata da pesquisa de Alcides José Scaglia, professor da Faculdade de Ciências Aplicadas da
Unicamp, na qual investiga o ensino-aprendizagem de futebol.
Segundo a reportagem, no mestrado, a partir de entrevistas de ex-jogadores, o pesquisador
identifica o jogo [de futebol] espontâneo, entendido como parte de uma pedagogia [de futebol]
de rua, como parte crucial na formação dos atletas. Assim, segundo os entrevistados, a prática e
contato com a bola de forma mais espontânea é parte crucial do aprendizado de futebol.
No doutorado, o foco é dado à investigação do jogo espontâneo propriamente, com uma
descrição e compreensão do processo, resultando no desenvolvimento de uma metodologia de
ensino de futebol para alunos iniciantes no esporte. A metodologia é baseada na prática do jogo
de futebol como treino para os times.
Depois do doutorado, na especialização, Scaglia realiza a transposição da metodologia
para outras etapas da prática de futebol, dessa vez com adultos, desde categorias amadoras até
profissionais. A matéria também relata a aplicação da metodologia em um clube do interior
paulista, com resultados bastante positivos, tanto para jogadores como para formadores e
administradores.
Em uma segunda parte do texto-fonte são apresentadas considerações mais específicas: o
pesquisador entrevistado fala sobre sua metodologia — os ganhos gerais na formação de
jogadores e ganhos específicos para os clubes, devidos à diminuição de custos; as dificuldades de
aceitação da nova metodologia pela quebra de práticas já estabelecidas — e sobre a situação do
futebol nacional — deficiente e retrógrada, especialmente se comparada às realidades de times
europeus, porém, em sua opinião, ainda esperançosa.
Assim, através do mapeamento do texto-fonte, duas seções ficaram visíveis: uma
primeira, de teor mais narrativo, na qual a trajetória da pesquisa e o desenvolvimento da
metodologia são descritos, assim como a formação do pesquisador — da graduação ao doutorado
— e, por fim, a descrição dos trabalhos com times de futebol nos quais a metodologia foi
aplicada; e uma segunda, mais expositiva e com mais trechos da entrevista, nos quais o
pesquisador explicita opiniões sobre diferentes assuntos relacionados à sua pesquisa.
Na versão impressa (reproduzida no anexo 2), o título possui uma fonte de tamanho
bastante superior ao restante do texto, marcada em duas cores: azul e preto. O texto é organizado
em quatro colunas, com duas imagens grandes ocupando o centro da página: uma foto de Scaglia,
pesquisador entrevistado, identificado na legenda acompanhada de uma citação direta (presente

20

no quinto parágrafo da reportagem); e uma foto de jogadores do Paulínia Futebol Clube, no qual
o projeto desenvolvido por Scaglia foi inicialmente aplicado.

4. Texto-fonte 2013
O texto-fonte utilizado na avaliação de 2013 (ver anexos 3 e 4) também é uma matéria de
divulgação científica publicada no Jornal da Unicamp em maio de 2013, intitulada “Da Selva de
Pedra ao Paraíso Perdido” e escrita por Carmo Gallo Netto. Nela, a autora apresenta a tese de
Carlos Eduardo Paranhos Ferreira, “Natureza e cidade: A conceituação e o tratamento do
residencial na publicidade imobiliária — análise contrastiva, décadas de 1970 e 2000”. Como
indica o título, a tese procura analisar as representações da natureza em anúncios imobiliários de
alto padrão da cidade de São Paulo nos dois períodos selecionados, realizando uma comparação
entre as construções e sentidos de natureza para as duas temporalidades.
Segundo a matéria, a tese propõe que, a partir dos anos 1970, inicia-se uma procura pela
natureza, como oposição à representação da cidade grande como selva de pedra, na procura por
uma maior qualidade de vida. Visualmente, essa época é marcada pela prevalência de cores
cinzas, ilustrando uma metrópole. Já nos anos 2000, a presença de cores nos anúncios e panfletos
ilustra uma união harmônica entre a cidade grande e áreas verdes, de modo que a presença de
elementos ligados à natureza e ao verde tornam-se bens comerciais que trazem acréscimo de
valor ao imóvel a ser vendido, mais uma vez relacionando natureza e qualidade de vida.
Segundo Netto, Ferreira vê os anúncios imobiliários como parte de um movimento de
ressignificação e revalorização da natureza que se estende a diversos universos, resultando em
uma ideologia verde, assim como economia verde. O pesquisador parece propor, ainda, que há
uma relação de alimentação mútua entre o uso de elementos da natureza em anúncios para a
sedução do público e a noção de que elementos da natureza sejam fonte de maior qualidade de
vida, de modo que os anúncios refletem e, com o trabalho de marketing, também ajudam a gerar
concepções e relações entre o mercado imobiliário e a natureza.
Diferentemente do texto-fonte de 2014, essa matéria de divulgação científica tem sua
divisão menos clara, focando-se nos resultados e conceitos utilizados na tese. Contudo, contém
subseções internas, marcados por fonte maiores em roxo. A primeira delas apresenta a pesquisa

21

desenvolvida, desde informações sobre o pesquisador até uma breve descrição da tese;
contextualiza a pesquisa na trajetória da formação do pesquisador; e apresenta conceitos
presentes nela — como mercadorias verdes e rurbanização, fusão de ambientes urbanos e rurais
devido ao aumento das áreas urbanas. Uma segunda seção intitulada “Diferenças e Semelhanças”
apresenta o contraste entre as duas épocas de fato, partindo de questões ideológicas — a
compreensão acerca do que é a natureza e sua representação —, passando por questões técnicas,
como a representação visual da natureza nas duas temporalidades, e finalizando com
considerações sobre estratégias dos anúncios para o marketing. E uma última seção,
Mercantilização, que traz os resultados finais da análise de Ferreira, discorrendo sobre a
centralidade na natureza para o mercado imobiliário e as expectativas de repercussão de sua
pesquisa socialmente.
Na versão impressa (reproduzida no anexo 4), o título possui fonte maior do que o
restante do texto, dividida em duas cores: preto (selva de pedra) e azul (paraíso perdido). A
reportagem possui cinco imagens, localizadas do centro da página, exemplificando os tipos de
anúncios imobiliários analisados. É possível observar, especialmente na comparação da imagem
superior esquerda, única em preto e branco, com o restante, coloridas, a diferença de aplicação de
cores nos anúncios — a legenda identifica a imagem em preto e branco como representante dos
anos 70 e o restante como recentes, exemplificando o “retorno à natureza”, provavelmente a
partir da presença de cores e folhagem (elementos verdes) presentes.
O canto inferior direito da página contém um bloco azul com informações sobre a
pesquisa, intitulado “Publicações”, com o título completo da tese, de seu autor, orientador e
unidade institucional na qual foi desenvolvido. Esse elemento não está presente no texto-fonte de
2014.

22

Figura 1 - Página de impressão do texto-fonte de 2013 Figura 2 - Bloco de informações ampliado

5. Metodologia

Os resumos analisados foram redigidos a mão durante uma avaliação, depois digitalizados
e armazenados para que pudessem ser trabalhados. O processo foi realizado inicialmente com os
textos do grupo de 2014 e, depois de finalizado, partiu-se para a análise do grupo de 2013.
Primeiramente, foram realizados mapeamentos dos resumos: procurou-se encontrar no
texto-fonte a localização das informações presentes nos resumos. Para tanto, foram utilizadas
cópias digitais do texto-fonte em formato .pdf retirados do site do Jornal da Unicamp2, nas quais
a formatação, incluindo imagens e legendas, era igual ao texto resumido pelos alunos. Dessa
forma, cada resumo era acompanhado por uma cópia do texto-fonte na qual foram marcadas as
passagens selecionadas.

2
http://www.unicamp.br/unicamp/ju/anteriores

23

Nessas cópias, essas informações selecionadas foram marcadas através de grifos de cores
diferentes. Desse modo, um período marcado em amarelo no resumo tinha suas informações
correspondentes marcadas em amarelo na cópia da reportagem. Assim, como as cópias dos texto-
fonte mantém a configuração de impressão, foi possível observar e, posteriormente, comparar a
progressão textual do resumo e do texto-fonte. No quadro 1 encontra-se a transcrição do resumo
39, acompanhada da cópia do texto-fonte correspondente, que ilustra um texto mapeado:

Resumo 39 (2014
A matéria da edição 590 do Jornal da
Unicamp, assinada pelo o Jornalista José Alves Filho
sobre a investigação de aspectos relacionados a
pedagogia do esporte, mostra uma metodologia
inovadora desenvolvida pelo o docente e
pesquisador da Unicamp Alcides José Scaglia. O
Pesquisador começou aplicando o método
inovador em um clube de futebol do interior
paulista, onde obteve êxito nessa nova
metodologia. Um fator que foi muito importante
na pesquisa de metrado de Alcides foi investigar o
ensino e a aprendizagem do futebol, entrevistando
ex-jogadores para entender como eles aprenderam
a pratica o esporte. Através das investigações,
Alcides concluiu pela a maioria dos depoimentos
que o futebol que era jogado na rua gerava uma
aprendizagem significativa por ser um jogo
espontâneo. Já no seu doutorado, Alcides passou a
investigar o significado do jogo espontâneo, onde
buscou compreender de forma ampla a pedagogia
das ruas.
Em sua pesquisa Alcides concluiu que
compreendendo o processo organizacional do jogo
é possível manipular e criar um método de
treinamento marcado pelas especificidades do
futebol. O objetivo desse método inovador é
formar jogadores inteligentes e não jogadores
malabaristas.
Segundo Alcides, para o Brasil se
transformar em uma referência na formação de
jogadores de futebol, é necessário que se mantenha
uma cultura. Esta cultura é oriunda do futebol que
é jogado na rua, onde este possui elementos como,
espontaneidade, criatividade e ludicidade. Figura 3 - Cópia do texto-fonte de 2014 39
Quadro 1 - Resumo 39 de 2014

24

No quadro 1, as informações são marcadas através de cores: rosa, roxo, azul, verde,
amarelo e laranja, respectivamente. As mesmas cores podem ser observadas na cópia do texto-
fonte correspondente. Dessa forma, é possível observar a correspondência entre passagens do
resumo e trechos do texto-fonte. Como a ordenação das cores é a mesma, também é possível
verificar que a seleção de informações do texto-fonte foi realizada de forma linear.
Após o mapeamento dos resumos, foi realizado também um mapeamento do texto-fonte,
com observações sobre o conteúdo e organização da estrutura do texto. A partir de uma primeira
análise dos trechos mais selecionados e esse mapeamento do texto-fonte, emergiu a importância
de elementos fora do corpo do texto, como título, subtítulo, imagens e legendas, resultando em
uma segunda análise dos resumos na busca de indícios de retomada desses elementos nas
sumarizações.
Para a identificação de estratégias mais localizadas, foram realizadas comparações entre
os trechos dos resumos e as passagens correspondentes dos textos-fonte. Isto é, o trecho marcado
em laranja do resumo 39 de 2014 foi comparado ao trecho em laranja na cópia 39 do texto-fonte
de 2014, como apresenta o quadro 2:

Resumo 39 (2014) Parágrafo 9 do texto-fonte (2014)


Segundo Alcides, para o Brasil se transformar em Na opinião de Scaglia, se o Brasil quiser se
uma referência na formação de jogadores de futebol, transformar novamente numa referência mundial
é necessário que se mantenha uma cultura. Esta na formação de jogadores de futebol, o caminho já
cultura é oriunda do futebol que é jogado na rua, está pavimentado. “A tradição das brincadeiras de
onde este possui elementos como, espontaneidade, bola com os pés ainda é forte no país. Ela contempla
criatividade e ludicidade. muita espontaneidade, criatividade e ludicidade. Se
valorizarmos essa cultura, certamente voltaremos a
dar as cartas na formação de atletas diferenciados”,
antevê. O docente da FCA assinala, entretanto, que
todos esses aspectos não mantêm qualquer relação com
a questão do dom, algo que está arraigado na mente dos
torcedores brasileiros. “Cada vez mais, as pesquisas
científicas comprovam que não existe dom, pelo menos
como está presente no imaginário popular. As pessoas
precisam saber que a competência adquirida é muito
importante”, pondera.
Quadro 2 - Resumo 39 de 2014

25

Nessas comparações entre partes do resumo e os trechos selecionados do texto-fonte,
como no ilustra o quadro 2, é possível observar o que é mantido, excluído e alterado entre os dois
trechos.
Os mesmos passos foram repetidos com o grupo de textos de 2013: primeiro houve o
mapeamento dos resumos e, posteriormente, do texto-fonte. Como a retomada de elementos fora
do corpo do texto (título, subtítulo, imagens e legendas) foi importante para a análise dos textos
de 2014, ela também foi considerada em 2013. O texto-fonte de 2013, no entanto, continha um
elemento diferente de 2014, um bloco com informações sobre a tese (o nome completo do
trabalho, autoria e instituição), que também foi considerado na análise.

6. Seleção de informações nos resumos de 2014

6.1. Seleção de informações do texto-fonte

Com o mapeamento dos resumos, foi possível identificar as passagens do texto-fonte de


2014 selecionadas com maior frequência:

Parágrafo
do texto- §1 §2 §3 §4 §5 §6 §7 §8 §9 §10 §11 §12
fonte
Total 61 29 43 25 46 45 41 19 26 22 5 25
% 86 41 60 35 65 63 58 27 37 31 7 35
Tabela 1 - Retomada de parágrafos do texto-fonte em resumos de 2014

Como ilustra a tabela 1, o primeiro parágrafo foi o mais utilizado nos resumos. Ele
consiste na apresentação do pesquisador entrevistado: informações como nome, ocupação e
pesquisa. Como o texto-fonte é uma matéria de divulgação científica, a apresentação do que era
divulgado, no caso, o pesquisador, Scaglia, e sua metodologia de ensino de futebol, são
essenciais. Dessa forma, a sua manutenção nos resumos indica que resumidores privilegiam a
contextualização dos assuntos sobre os quais o texto-fonte trata.

26

O segundo trecho mais retirado do texto-fonte, o quinto parágrafo (transcrito no quadro 3,
a seguir), contudo, é menos intuitivo em sua seleção. Ele está localizado após a narração da
formação superior do pesquisador entrevistado (graduação, mestrado e doutorado) e antes da
descrição da aplicação da metodologia desenvolvida em times de futebol profissionais, descrito
no parágrafo seguinte, o terceiro mais frequentemente retomado.
O momento descrito no quinto parágrafo parece interessante e, em termos da narrativa,
apresenta uma quebra entre o momento de formação e o momento de aplicação da metodologia.
No entanto, o trecho em si não apresenta informações novas ou uma versão especialmente sucinta
da metodologia — ela é descrita anteriormente —, estando centrado em um comentário do
pesquisador:

“O pesquisador concluiu que a metodologia desenvolvida para a iniciação poderia servir


de base para o ensino da modalidade em etapas posteriores, ou seja, desde as categorias amadoras
até o time profissional. “Ao entendermos o processo de organização do jogo, nós conseguimos
manipular esse mesmo jogo de modo a criar um método de treinamento marcado pelas
especificidades que o futebol requer. O objetivo era formar jogadores inteligentes e não
jogadores malabaristas. Estávamos interessados em atletas que conseguissem ler o jogo e tomar
decisões capazes de demonstrar uma defesa ou, ao contrário, neutralizar um ataque”, reforça o
professor da FCA. Na sequência, junto com outros ex-alunos da Faculdade de Educação Física
(FEF) da Unicamp, Scaglia criou, em Campinas, a organização não-governamental Associação
Futebol Arte (AFA). O espaço utilizado para as atividades foi cedido pela Escola Americana.”
Quadro 3 - Parágrafo 5 do texto-fonte de 2014

Observando o trecho com mais cuidado, notou-se que, nele estão contidos itens lexicais
apenas presentes no título, como jogadores malabaristas. O título contém uma citação desse
trecho da matéria, mas as expressões utilizadas pelo pesquisador, jogadores inteligentes,
jogadores malabaristas, só estão presentes nesse trecho, no título e no primeiro parágrafo
introdutório. Assim, é possível delinear uma conexão entre os dois trechos mais selecionados.
A indicação, portanto, é de que a seleção da passagem tenha sido motivada, ao menos
parcialmente, pela repetição de expressões específicas presentes no título. Após essa constatação,
foi realizada uma verificação da presença de palavras-chave do título, subtítulo, legendas e
indicações de uso das imagens nos resumos. Tanto título quanto subtítulo são utilizados com
bastante frequência, mas não se igualam às aparições do trecho em questão.

27

As legendas foram retiradas do texto-fonte, incluindo uma citação direta do quinto
parágrafo, da qual o título também foi retirado. Sua presença nos textos, no entanto, é menos
clara, pois nos casos em que a informação é retomada, geralmente é apresentada com outras
informações do parágrafo, indicando que foi retirada do corpo do texto e não a partir das
legendas. No entanto, apresenta mais uma indicação de importância do quinto parágrafo através
de um elemento fora do corpo do texto. As imagens não são referenciadas nos textos, embora
haja um foco na trajetória do pesquisador, cuja fotografia é apresentada.
Kleiman (1992) aponta para processos de leitura nos quais esses elementos anteriores ao
texto são utilizados como parte de estratégias de leitura, exemplificando, em sua análise, a
importância que esses aspectos anteriores ao corpo do texto possuem na configuração de um
texto jornalístico, de modo que a utilização do título como fonte de informação sobre o texto a ser
resumido seja parte de estratégias já encontradas em outros estudos. No entanto, no caso dos
resumos analisados, o título parece ter sido utilizado como indicador não de apenas de conteúdos
importantes na matéria, mas de itens léxicos a serem resgatados.

6.2. Organização e Progressão Textual

A maioria dos resumos de 2014 analisados segue a organização do texto-fonte, com


pequenas inversões dominando as mudanças de ordenação. Essa observação vai ao encontro tanto
da estratégia cópia e apagamento (BROWN & DAY, 1983) quanto das observações de Kleiman
& Terzi (1985), pois os alunos tiveram amplo acesso ao texto-fonte durante a avaliação.
Contudo, em 47 dos resumos (cerca de 70%), há casos em que a divisão dos parágrafos do
texto-fonte não é mantida. Isto é, há condensações de informações em partes distantes dentro de
um mesmo parágrafo, combinações de informações provindas de parágrafos diferentes e junções
de informações do fim de um parágrafo com as do início do parágrafo seguinte, como é possível
observar no exemplo a seguir:

28

Resumo 44 (2014) Parágrafo 5 do texto-fonte (2014)
“Posteriormente, junto a ex-alunos da “(…). Na sequência, junto com outros
Faculdade de Educação Física da ex-alunos da Faculdade de Educação
Unicamp, os educadores físicos Física (FEF) da Unicamp, Scaglia criou,
formaram uma equipe sub-12, que em Campinas, a organização não
passou a servir de projeto piloto.” governamental Associação Futebol Arte
(AFA). (…).”
Parágrafo 6 do texto-fonte (2014)
“Os educadores físicos selecionaram
meninos para formar uma equipe sub-
12, que passou a servir de projeto
piloto. (…).”
Quadro 4 - Resumo 44 de 2014

O exemplo no quadro 4 ilustra a quebra da divisão de parágrafos do texto-fonte no


momento de produção do resumo, pois o parágrafo do resumo 44 (2014) possui informações do
quinto parágrafo do texto-fonte (em vermelho) e do sexto parágrafo (em azul). Essa estratégia vai
de encontro ao que é descrito na literatura sobre a produção de resumos, que, partindo de Brown
& Day (1983) e a estratégia de cópia e apagamento, toma o parágrafo como unidade de
organização e significação textual (BROWN & DAY, 1983; KLEIMAN & TERZI, 1989) a partir
da qual se organizam as informações do resumo.
Brown, Day & Jones (1983) encontram quebras de organização, com combinações por
tópico de informações em parágrafos distintos, em grupos de alunos de ensino médio e (p. 974),
mas relacionam esse tipo de estratégia a resumos mais maduros, que operam alterações maiores e
se desprendem dos enunciados do texto-fonte. Nos textos analisados, no entanto, a maioria dos
trechos retirados mantém a ordem do texto-fonte, mas há, predominantemente, a junção de
informações do fim de um parágrafo e do início do parágrafo seguinte. Essa estratégia indica que
os resumos não se pautam nos parágrafos do texto-fonte como organização textual, mas seguem
sua progressão.
Enquanto esse distanciamento do que é previsto seja interessante, ele levanta questões
quanto à compreensão de texto por parte dos alunos, pois a literatura indica que a estratégia de
cópia e apagamento seja aplicada com o intuito de extrair as informações de parágrafos
individuais — ao menos inicialmente, como já mencionado, a estratégia se transforma nos
achados de Brown & Day (1983) e Brown, Day & Jones (1983).

29

6.3. Inversões

O uso de inversões é outra estratégia bastante encontrada nos resumos de 2014. Ela é
observada em diferentes formas, em níveis menores, como a inversão da ordem de palavras, ou
em trechos mais extensos, como pode ser observado no exemplo a seguir:

Resumo 60 (2014) Parágrafo 1 do texto-fonte (2014)


Tal estudo tem como autor (…). [A frase] proferida por um
Alcides José Scaglia, um ex-jogador ex-jogador profissional e atual
profissional, pesquisador da área do pesquisador de esporte [futebol], como
esporte, objetivando transformar as é o caso, ela ganha uma dimensão ainda
bases do ensino dos jogadores para maior. O autor é Alcides José Scaglia,
assim formar, segundo Scaglia: docente da Faculdade de Ciências
“jogadores inteligentes e não Aplicadas (FCA) da Unicamp, com
malabaristas”. campus em Limeira. Dedicado a
investigação do esporte, ele desenvolveu
um método original de treinamento
pautado no jogo. O objetivo é, como ele
diz, formar jogadores inteligentes e
não malabaristas de bola.
Quadro 5 - Resumo 60 de 2014

O exemplo no quadro 5 traz uma pequena inversão de ordem de informações. A mudança


é bastante simples, pois, no texto-fonte, primeiramente são apresentadas descrições do
pesquisador entrevistado (em vermelho) e, depois, seu nome (em azul). O que é interessante para
a observação é a retomada de informações através da identificação de um referente comum (o
pesquisador, Scaglia) e a localização de um sinônimo dentro do próprio texto-fonte (tanto o
trecho em vermelho quanto o em azul se referem ao pesquisador), realizada de forma deliberada
por parte do resumo. Assim, os exemplos de inversões indicam estratégias de seleção de
informações mais direcionadas em instâncias menores na configuração do resumo.

30

7. Seleção de informações nos resumos de 2013

7.1. Número de parágrafos

Uma primeira comparação mostrou uma diferença substancial no tamanho dos textos de
2013 e 2014, os primeiros mais curtos, os segundos, mais longos. É possível observar essa
distinção inclusive no número de parágrafos dos resumos, expostos na tabela 2:

Número de 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11
parágrafos

2013 25 7 18 3 7 0 3 1 0 0 1

2014 4 11 13 13 15 3 2 4 2 0 0

Total 29 18 31 16 22 3 5 5 2 0 2

Tabela 2 - Número de parágrafos nos resumos das turmas de 2013 e 2014

Como demonstra a tabela 2, a maioria dos resumos de 2014 flutua entre três e cinco
parágrafos, enquanto 2013 possui uma maioria de textos com apenas um parágrafo e uma
segunda concentração de textos com três parágrafos.
Teles (2007), em sua tese, analisa o número de parágrafos nos textos de seu corpus,
observando que alguns dos resumos possuem quantidades de parágrafos superiores à de seu
texto-fonte, informação que não apenas contraria a expectativa da literatura sobre o gênero, como
a intuição sobre sumarização — é importante observar que o texto-fonte de Teles (2007), descrito
como denso e teórico, contém apenas quatro parágrafos, de modo que não parece extrema a
presença de cinco e seis parágrafos nos resumos, mas fonte de informação interessante.
A autora salienta que não entende a presença de maior número de parágrafos como
questão estilística, propondo as seguintes explicações: ausência de preocupação com o número de
parágrafos por parte de seus resumistas, ausência de combinações prévias para a atividade,
dificuldade de identificação e reorganização das ideias centrais de cada parágrafo (TELES, 2007,

31

p. 72). Finalizando sua análise, Teles (2007) conclui que a diminuição do tamanho do texto não
configura necessariamente concisão (p. 72-73), indicando que, no ensino de sumarização e os
diferentes gêneros nos quais configura, seria necessário trabalhar formas de concisão e
retextualização de ideias, e não apenas a diminuição da extensão dos resumos em comparação
com os textos-fonte.
Nenhum dos textos analisados, seja em 2013 ou 2014, possui o mesmo número de
parágrafos que os textos-fonte correspondentes. Os textos-fonte são relativamente longos — a
matéria utilizada em 2013 possui 18 parágrafos, enquanto o texto de 2014, 12, ocupando páginas
completas do jornal da Unicamp —, de modo que, ainda que não houvesse expectativa sobre a
quantidade de parágrafos nos resumos analisados (tanto 2013 quanto 2014), seja durante a
disciplina, seja nas análises, não se esperava que os alunos mantivessem o número de parágrafos
dos textos.
No entanto, esperava-se um recorte de informações, resultando, provavelmente, na
diminuição do número de parágrafos. O dado, contudo, dá suporte ao que já havia sido
encontrado nos textos de 2014, nos quais os resumos parecem dar pouca importância às divisões
dos parágrafos no texto-fonte.

7.1.1. Parágrafo como unidade de organização e significação textual:


comparação entre 2013 e 2014

Nos estudos sobre resumo consultados (BROWN & DAY, 1983; BROWN, DAY &
JONES, 1983; HOWARD, 1993; KLEIMAN & TERZI, 1989; TELES, 2007; BEEN &
STEENWYK, 1984), o parágrafo é identificado por diferentes autores como unidade de
organização e significação do texto, constituindo o bloco de informações sobre o qual as regras
de sumarização encontradas — como cópia e apagamento (BROWN & DAY, 1983),
patchwriting (HOWARD, 1993) e as macroregras de sumarização e compreensão de textos
(KINTSCH & van DIJK, 1978; van DIJK & KINTSCH, 1977 apud BROWN & DAY, 1983) —
são aplicadas.
Brown, Day & Jones (1983), como mencionado anteriormente, encontram quebras na
organização do texto-fonte quando as informações são retomadas nos textos de seu corpus,

32

relacionando esse desprendimento da estruturação inicial a estratégias de resumos mais maduros,
capazes de operar alterações maiores e se distanciarem mais dos enunciados do texto-fonte.
Kleiman & Terzi (1989), por outro lado, argumentam que a presença do texto-fonte no momento
de produção do resumo é um fator crucial para a organização da sumarização e, que, com a sua
ausência, os resumos procuram realizar resumos mais gerais, não tão apegados à organização e
linguagem do primeiro texto.
Nos dois casos, os resumos analisados pelos grupos de pesquisadores são, segundo as
descrições, construídos a partir da reorganização dos conteúdos dos textos-fonte, procurando
rearranjar as informações encontradas ou tratá-las de forma global. Os autores geralmente
atribuem tanto intencionalidade quanto motivações próprias ao emprego dessas estratégias
consideradas mais sofisticadas, maduras ou apenas interessantes. Dessa forma, as reorganizações
das informações que se distanciam da divisão dos parágrafos do texto-fonte possuem objetivos
próprios — na maioria das vezes, o rearranjo das informações do texto-fonte por tópicos que são
retomados e organizados de forma diferente originalmente.
Embora sua manifestação seja diferente — nos textos de 2014, cerca de 70% dos resumos
(47 de 68) apresentavam informações que apareciam em sequência, mas em parágrafos distintos
do texto-fonte rearranjadas em apenas um parágrafo do resumo; em 2013, a junção de trechos
mais distantes do texto-fonte é bastante comum, presente em aproximadamente 73% (48 de 64)
dos textos —, os dados de ambos os grupos indicam que a noção do parágrafo como unidade de
organização e significação do texto (KLEIMAN & TERZI, 1989; BROWN & DAY, 1983) está
bastante enfraquecida para os resumidores.
Enquanto as preferências parecem ser diferentes nos dois grupos analisados — os textos
de 2014 procuram manter a ordenação das informações, reconfigurando os limites dos
parágrafos; os de 2013 realizam junções ainda mais distantes —, mantém-se a indicação de que
os parágrafos não são fonte de informação importante como dicas de organização textual do autor
do texto-fonte, o que difere de uma reorganização direcionada.
Se esse distanciamento do que é previsto é interessante, ele também levanta questões quanto à
compreensão de texto por parte dos alunos, pois a literatura indica que a estratégia de cópia e
apagamento seja aplicada com o intuito de extrair as informações de parágrafos individuais — ao
menos inicialmente, como mencionado anteriormente, a estratégia se transforma nos achados de
Brown & Day (1983) e Brown, Day & Jones (1983). Assim, a indicação é de que os resumidores

33

não procuram reconstruir as ações e decisões do autor do texto-fonte — passo considerado
importante na literatura — e desconsiderando dicas de natureza textual que poderiam auxiliar
inicialmente na compreensão do texto a ser resumido e, posteriormente, em sua reorganização.

7.2. Autonomia dos resumos

Os resumos analisados fazem parte de uma avaliação, como já mencionado, e foram


produzidos a partir de uma questão: “Se tivesse que reportá-la [matéria assinada por Manuel
Alves Filho (Jornal da Unicamp nº 590)] a alguém, o que reportaria?”.
Como o resumo tinha sido trabalhado durante o módulo que o precede, embora outros
conteúdos também tenham sido tratados, esperava-se que os alunos resumidores produzissem
textos que sumarizassem as reportagens lidas. O objetivo parece ter sido claro, já que a maioria
dos textos produzidos na avaliação constituem — de diferentes formas e níveis de sucesso —
resumos. No entanto, foram encontrados também textos que partem de respostas metalinguísticas
à questão da prova, embora em quantidades menores: 6 resumos em 2014 (cerca de 9%) e 14 em
2013 (aproximadamente 22%). Alguns exemplos são apresentados no quadro a seguir:

Resumo 55 (2013) Resumo 53 (2013) Resumo 63 (2014)


Diria que li Eu falaria que o texto Reportaria que
um artigo que fala do crescente uso do tema apesar desse pesquisador já
apresentava uma tese “natureza” em construções de ter sido jogador de futebol,
desenvolvida no alto padrão. Na década de 1970 ele nunca deixou de lado os
Instituto de Artes da era apenas em estilo estudos, sabendo conciliar
Unicamp, que alternativo, usado pelos hipies as duas coisas e chegar a
investiga o uso da e que ao longo do tempo vem um método pautado nos
imagem da natureza se tornando algo necessário, jogos de futebol, ou seja,
nos anúncios tanto para a preservação para ele mesmo conseguiu unir a
publicitários de diminuir consequências como inteligência a uma coisa
imóveis na cidade de para promover uma melhor que e gostava, chegando
São Paulo. qualidade de vida. E era um assim a uma tática final.
estilo de alto padrão, mas que
esta sendo copiado pela classe
média.
Quadro 6 - Resumos 55 e 53 de 2013 e 63 de 2014

34

Embora de formas ligeiramente diferentes, é possível observar nos exemplos do quadro 6
o modo como os parágrafos introdutórios referenciam a questão posta: todos em primeira pessoa
— mais uma vez, em resposta à pergunta: “Como [você] reportaria?” —, com verbos que
retomam não apenas o termo utilizado — reportar — como ações de fala que poderiam ser
utilizadas como sinônimos em respostas diretas, que retomam indícios de oralidade — “diria”
(resumo 55 de 2013), “falaria” (resumo 53 de 2013) e “reportaria” (resumo 63 de 2014).

7.3. Seleção de informações

7.3.1. Organização dos textos-fonte

As diferenças entre estruturas dos dois textos-fonte (2013 e 2014) parecem trazer consigo
algumas mudanças de estratégias para os resumidores. O texto de 2014 é organizado através de
uma lógica temporal do desenvolvimento da pesquisa relatada, com uma segunda parte mais
expositiva, que trata da entrevista com o pesquisador. Os resumos de 2014 analisados são
bastante lineares com a seleção de informações, dando maior importância à parte narrativa, e
valendo-se de alterações localizadas para adaptar os trechos selecionados de forma a produzir um
resumo.
Na matéria de 2013, por outro lado, a organização é menos evidente — mesmo com a
presença de subdivisões no texto, que não parecem terem sido utilizadas nos resumos —, com
uma primeira apresentação geral da tese: comentários gerais sobre os resultados, assim como
conceitos importantes e informações adicionais, seguidos de uma retomada em mais detalhes da
diferenciação entre as duas temporalidades estudadas e finalizando com considerações sobre a
aplicação e consequências sociais dos achados da pesquisa. Os resumos de 2013 são menos
lineares, recolhendo informações mais distantes e procurando rearranjá-las, especialmente a
retomada das descrições dos dois períodos estudados, como no exemplo do quadro 7:

35

Resumo nº 8 (2013) Parágrafo 4 do texto-fonte (2013)
Essa característica de “ideologia verde” tem Já a partir do primeiro decênio do novo milênio, o
origem nos anos 70 com muita ligação ao marketing do mercado imobiliário passa a
movimento hippie, de ideias de contracultura, enxergar o elemento verde como uma nova
diferentemente do que se vê nos dias atuais, em commodity na comercialização de imóveis de alto
que esta imagem esta ligada a qualidade de padrão, aparentemente pretendendo recuperar a
vida. Essa é muito utilizada na divulgação de ideia de paraíso perdido. Paulatinamente, esse
empreendimentos de alto nível, porém dissipa- imaginário se transfere para as demandas
se para outras classes. Isso pode acarretar imobiliárias de outras classes sociais menos
novos fenômenos de “rurbanização” que é sofisticadas e de menores condições
basicamente uma sintese entre cidade e o financeiras. Com o estudo, diz o autor, “pretendi
compro, devido a grande valorização da registrar a cambiante representação de natureza
natureza. no mercado imobiliário da cidade de São Paulo”.

Parágrafo 8 do texto-fonte (2013)


O trabalho também procura mostrar que está
em curso um fenômeno que pode ser chamado
de “rurbanização”, resultante do crescimento
de extensas áreas que se urbanizam além dos
limites urbanos e terminam por misturar-se
aos espaços rurais, determinando grandes
conurbações. Nesse processo, as atividades
desenvolvidas nas áreas rurais se integram
cada vez mais com os espaços urbanos criando
uma simbiose entre campo e cidade.
Parágrafo 10 do texto-fonte (2013)
O pesquisador constatou que o apelo à
natureza é comum aos anúncios das duas
épocas confrontadas. Nos anos 70, a natureza
está bastante ligada às ideias de contracultura
do movimento hippie que preconiza a volta ao
campo e a uma vida comunitária. Já nos anos
2000 o apelo ao verde está mais ligado à ideia
de qualidade de vida que deve ser exercida em
espaços exclusivos e autossegregados, como os
condomínios de alto padrão. O escopo é o da
constituição da metacidade, uma cidade dentro da
cidade, que oferece serviços diversos ao morador,
possibilitando-lhe autonomia nessas ilhas de
excelência.
Quadro 7 - Resumo 8 de 2013

36

Como ilustra o quadro 7, no resumo 8 há a junção de elementos de parágrafos bastante
distantes no texto fonte. No caso, do quarto parágrafo (em roxo), oitavo (em azul) e décimo (em
vermelho). Também é interessante notar que esses parágrafos apresentam informações singulares,
desenvolvendo uma ideia específica. Essas ideias são retomadas pelo resumo, que procura
estabelecer relações entre elas. No entanto, como mostra o trecho em azul (referente ao oitavo
parágrafo do texto-fonte), as relações não são sempre as propostas na reportagem.
No parágrafo do resumo 8, é estabelecida uma relação entre a “ideologia verde”
(informação do sétimo parágrafo, exposto no quadro 8, a seguir); o movimento hippie da década
de 1970, a disseminação dessa “ideologia verde” a diferentes classes sociais; e o conceito de
“rurbanização”. As relações diretas estabelecidas no resumo não são parte do texto-fonte. Como
é possível observar no quadro 8, o conceito de “rurbanização” é apresentado de forma adicional,
isto é, embora a indicação seja de que, na tese, sejam estabelecidas relações entre o conceito e o
resto da temática, essas relações não são explicitadas no texto-fonte.

Parágrafos 7 a 9 do texto-fonte (2013)


Para o pesquisador, a crescente valorização da natureza, que se irradia para diferentes esferas da sociedade,
proporciona a criação de uma série de produtos a partir dos quais se pretende legitimar um caráter de “natural” em
sua composição, feitura e distribuição. Em consequência dissemina-se uma gama de bens e serviços constitutivos de
uma “ideologia do verde”, presente nas mais diferentes indústrias: da alimentação, do vestuário, da higiene e dos
cosméticos, dos esportes, do entretenimento, do lazer e do turismo. As “mercadorias verdes” parecem atender a uma
demanda por um espaço diferenciado do ponto de visto sócio ambiental e ecológico, garantindo, assim, o acesso ao
mito da “qualidade de vida”. Dessa forma, segundo ele, dissemina-se o conceito de uma “economia verde”, que se
manifesta também no mercado imobiliário.
O trabalho também procura mostrar que está em curso um fenômeno que pode ser chamado de
“rurbanização”, resultante do crescimento de extensas áreas que se urbanizam além dos limites urbanos e
terminam por misturar-se aos espaços rurais, determinando grandes conurbações. Nesse processo, as
atividades desenvolvidas nas áreas rurais se integram cada vez mais com os espaços urbanos criando uma
simbiose entre campo e cidade.
Este fenômeno não se restringe apenas às megalópoles e verifica-se em cidades menores. Essa integração de espaços
urbanos e rurais promove novas atividades econômicas que se desenvolvem de forma interurbana nas fábricas
deslocadas para os interstícios urbano-rurais, nos entrepostos comerciais, nos armazéns, nos centros comerciais, nos
parques temáticos, nas atividades de lazer e de turismo. Resulta daí uma sinergia cada vez mais intensa entre esses
espaços. Como exemplos o pesquisador cita originalmente o caso das cidades do ABCD e mais recentemente os
espaços situados entre São Paulo e Atibaia, Bragança, Sorocaba, Itu, Jundiaí, Valinhos, Vinhedo, Campinas,
Jaguariúna e ainda as cidades interligadas ao longo da Via Dutra.
Quadro 8 - Parágrafos 7 a 9 do texto-fonte de 2013

37

Além disso, no resumo (como apresentado em mais detalhe no quadro 9, a seguir), a
“rurbanização” é parte dos efeitos diretos da “ideologia verde”, e descrita de forma diferente da
reportagem:

Resumo 8 (2013) Parágrafo 8 do texto-fonte (2013)


(…) “rurbanização” que é basicamente uma sintese (…) fenômeno que pode ser chamado de
entre cidade e o campo, devido a grande valorização “rurbanização”, resultante do crescimento de
da natureza extensas áreas que se urbanizam além dos limites
urbanos e terminam por misturar-se aos espaços
rurais, determinando grandes conurbações. Nesse
processo, as atividades desenvolvidas nas áreas rurais
se integram cada vez mais com os espaços urbanos
criando uma simbiose entre campo e cidade.
Quadro 9 - Descrições do conceito de rurbanizaçõa no resumo 8 e texto-fonte de 2013

Através do exemplo no quadro 7, dessa forma, é possível observar a junção de trechos


mais distantes, uma estratégia importante para os resumidores de 2013. O uso dessa estratégia
indica uma leitura mais específica por parte dos resumidores, que procuram tanto informações
importantes quanto suas complementações no texto-fonte. No entanto, a forma de reorganização
desses informações no resumo é pouco produtiva, em questão de fidelidade (TELES, 2007) ao
texto-fonte, como demonstra o quadro 9, no qual o conceito de “rurbanização” é definido nem
um resumo de 2013, quando comparado à definição do texto-fonte de 2013, apresentada nos
quadros 8 e 9.

7.4. Uso de aspectos fora do corpo do texto-fonte

7.4.1. Título

Como mencionado anteriormente, a análise indica que os resumidores de 2013 não


parecem utilizar o título do texto-fonte em seus resumos. Foram encontradas poucas ocorrências
de apresentação do texto-fonte de forma específica (15 ocorrências, aproximadamente 23%) e
ainda menos usos dos termos que compõem o título ao longo dos textos, com 8 ocorrências
(12.5%). Essa é uma diferença grande com relação aos resumos de 2014, nos quais a reportagem
é apresentada através do título em cerca de 43% dos resumos, que parecem utilizar o título como
uma das forças norteadoras para a seleção de informações, retomando palavras-chave presentes

38

no nome da matéria com bastante recorrência ao longo dos resumos. O quadro 10 ilustra como o
título é retomado nos resumos de 2013:

Resumo 5 (2013) Resumo 22 (2013)


Esta matéria trás como foco uma tese denominada “Da Os anos 70 se distinguem, pelo tempo no qual a ideia de
ela de pedra ao paraíso perdido”. Esta tese relata a “selva de pedra” foi disseminada e foi marcada uma
construção da imagem de natureza nos anúncios emergência de “onda verde”
publicitários do mercado imobiliário a partir do ano
2000.
Quadro 10 - resumo 5 de 2013

No parágrafo do resumo 5 de 2013, o título é retomado de forma direta, na apresentação


do texto-fonte. No terceiro parágrafo do resumo 22 de 2013, transcrito no quadro 10, parte do
título é retomado ao longo do texto, indicado em vermelho. O caso é interessante, pois o restante
do título (paraíso perdido) não é retomado no resumo. Como selva de pedra está presente no
corpo do texto-fonte, também marcado por aspas, como conceito da tese reportada, não fica claro
se a retomada no resumo 22 (2013) é realizada a partir do título ou do corpo do texto.
O descarte do título como indicação de importância de informações do texto-fonte é ainda
mais interessante pois o título da reportagem de 2013 fornece indicações que podem ser bastante
úteis para a leitura do texto, apresentando dois conceitos que são atribuídas aos recortes
temporais (selva de pedra e paraíso perdido). Assim, essa estratégia é empregada em 2014 nem
sempre com sucesso, o que não ocorre em 2013, quando, potencialmente, poderia ser bastante
interessante para os resumidores.

7.4.2. Subtítulo

Por outro lado, tanto os resumidores de 2013 quanto os de 2014 utilizam o subtítulo, que,
em ambos os textos-fonte, contém sumarizações de seus conteúdos. Isso indica que há, também
nos dois grupos, a procura por sínteses já presentes no texto-fonte.
Nos quadros 11 e 12 são apresentados exemplos de uso do subtítulo em resumos de 2013
e 2014, respectivamente:

39

Resumo 28 (2013) Subtítulo do texto-fonte (2013)
Carlos Eduardo Paranhas Ferreira, Tese investiga a
orientado pelo professor Ivan Santo Barbosa, construção de imagens da
realizou junto ao insituto de Artes (IA), um natureza nos anúncios
trabalho de uma tese “centrado no mercado publicitários do mercado
imobiliário considerado de alto-padrão na cidade imobiliário
de São Paulo”, que procura dividí-lo em duas
épocas: as décadas de 70 e 2000.
Nos anos 70 surge a ideia de “selva de
pedra”. Essa década marca a emergência de uma
“onda verde” que mostra a necessidade do retorno
à natureza.
Carlos conta que o objetivo principal da
tese era entender a construção de imagens da
natureza nos anúncios publicitários do
mercado imobiliário.
Quadro 11 - Resumo 28 de 20

Resumo 23 (2014) Subtítulo do texto-fonte (2014)


Em uma matéria de Metodologia inovadora criada por
Manuel Alves Filho, professor da FCA é voltada à formação de
intitulada “Substituição no jogadores diferenciados
futebol: entra o inteligente e
sai o malabarista”, publicada
no Jornal da Unicamp, 590, é
descrita uma metodologia
inovadora criada por
Alcides José Scaglia,
docente da Faculdade de
Ciências Aplicadas (FCA)
da Unicamp, metodologia
esta, que consiste em
aprimorar a formação de
jogadores de futebol, com
um método de treinamento
pautado no jogo.

40

Primeiro parágrafo do texto-fonte (2014)
Eu já não tenho mais paciência para assistir a
um jogo inteiro pela televisão”. A frase, dita por
qualquer brasileiro apaixonado pelo futebol, já
mereceria atenção. Proferida por um ex-jogador
profissional e atual pesquisador do esporte, como é o
caso, ela ganha uma dimensão ainda maior. O autor é
Alcides José Scaglia, docente da Faculdade de
Ciências Aplicadas (FCA) da Unicamp, com
campus em Limeira. Dedicado a investigar aspectos
relacionados à pedagogia do esporte, ele desenvolveu
um método original de treinamento pautado no
jogo. O objetivo é, como ele diz, formar jogadores
inteligentes e não malabaristas da bola. Aplicada em
um pequeno clube do interior paulista, a metodologia
proporcionou ótimos resultados, abrindo perspectiva
para a superação do enfadonho momento do futebol
nacional.
Quadro 12 - Resumo 23 de 2014

Na maioria dos casos, o uso do subtítulo é facilmente identificável pela proximidade da


linguagem utilizada — como ambos os subtítulos de 2013 e 2014 procuram sintetizar suas
respectivas reportagens, seu uso nos resumos tende a se aproximar da cópia, com esporádicas
substituições de termos ou apagamentos de palavras localizadas, como o resumo 28 de 2013, no
quadro 11. Como traz o quadro 12, há também a fusão do subtítulo com informações do texto-
fonte, de modo que seu uso se torna ligeiramente mais camuflado. No resumo 23 de 2014, a
junção de informações do subtítulo e do primeiro parágrafo do texto-fonte se dá através da
repetição da identificação do pesquisador, Scaglia, marcada em vermelho.
Além de indicar a procura por sínteses já presentes no trecho, o uso do subtítulo também
parece indicar um aproveitamento de elementos anteriores ao corpo do texto — mais recorrentes
em 2014 do que em 2013, como já mencionado — que parecem também estar relacionados a
conhecimentos acerca do gênero dos textos-fonte, no caso, matérias de divulgação científica.
Esse dado é retomado na observação sobre os trechos mais selecionados dos textos-fonte.

41

7.4.3. Bloco de informações sobre a tese

Interessantemente, o texto-fonte de 2013 possui um bloco localizado no fim da página de


jornal com dados da tese tratada. O bloco é azul e possui o título Publicações. Nele estão o nome
da tese, de seu autor, seu orientador e unidade (no caso, faculdade/instituto) — sua imagem está
reproduzida na seção 4.
Esse bloco não está presente na matéria de 2014 e não foi considerado inicialmente na
análise, pois a maioria de suas informações estão presentes no texto-fonte, no segundo parágrafo
— o trecho mais recorrente nos resumos, como será apresentado a seguir —, e as apresentações
geralmente retomavam descrições da tese que estão presentes no parágrafo e não utilizam o título
da tese, única informação particular ao bloco final de informações.
Contudo, alguns resumidores se utilizaram das informações do bloco. Isso foi notado
através tanto do uso do título da tese como do apagamento de outras informações do segundo
parágrafo. Os números não são expressivos, com apenas três casos (menos de 5%), mas um deles
é apresentado no quadro 13:

Resumo 32 (2013) Bloco de informações (2013)


O artigo, do jornal “Jornal da
Unicamp”, “Da selva de pedra ao paraíso Publicações
perdido” escrito por Carmo Gallo Netto, Tese: “Natureza e cidade: A conceituação
trata da tese “Natureza e cidade” A e o tratamento do residencial na
conceituação e o tratamento do publicidade imobiliária – análise
residencial na publicidade imobiliaria – contrastiva, décadas de 1970 e 2000”
análise contrastiva, décadas de 1970 e Autor: Carlos Eduardo Paranhos Ferreira
2000” realizada por Carlos Eduardo Orientador: Ivan Santo Barbosa
Paranhos Ferreira, aluno do Instituto
de Artes da Unicamp. Unidade: Instituto de Artes (IA)

Quadro 13 - Resumo 32 de 2013

As cores (vermelho, azul e verde) indicam a retomada de informações do bloco do texto-


fonte de 2013 (nome da tese, de seu autor e instituição na qual foi realizada, respectivamente).

42

Enquanto o nome do autor e do instituto no qual a pesquisa foi conduzida estão presentes no
corpo do texto-fonte, de forma que não é possível afirmar que sua retomada parte do bloco ao fim
da reportagem, o nome da tese só é apresentado no bloco, de forma que é possível confirmar o
seu uso por parte do resumidor.
Como poucos resumidores utilizam essas informações finais, é interessante notar que é
mais uma instância em que há pouco uso de informações fora do corpo do texto — embora o
título da tese pareça uma informação importante, é interessante ressaltar que ele não aparece no
corpo do texto, o que pode ter sido tomado pelos resumidores como atribuição de uma
importância reduzida por parte do autor da matéria.

7.5. Trechos selecionados no texto-fonte

O parágrafo do texto-fonte de 2013 de uso mais recorrente nos resumos é o segundo,


como indica a tabela 3, que, assim como no texto de 2014, contém a apresentação da pesquisa
sobre a qual discorre a matéria resumida. Embora os resumidores, de ambos os anos, nem sempre
estejam claros sobre questões mais estruturais dos textos, a presença muito consistente das
informações sobre as pesquisas indicam que os resumidores entendem que o foco do texto-fonte,
como matéria de divulgação científica, é uma pesquisa.

§1 §2 §3 §4 §5 §6 §7 §8 §9 § § § § § § § § §
10 11 12 13 14 15 16 17 18
Total 29 45 27 23 13 10 16 17 5 22 4 6 2 1 10 10 4 13

% 45 70 42 36 20 16 25 26. 8 34 6 9 3 2 16 16 6 20
5
Tabela 3 - Trechos selecionados no texto-fonte de 2013

O segundo trecho mais utilizado, também expresso na tabela 3, é o primeiro parágrafo. No


texto-fonte, este apresenta uma pequena contextualização na qual propõe que, desde os anos
1970, dá-se crescente importância à natureza e aspectos “verdes” — o parágrafo parece ter como
objetivo apresentar o contexto que dá origem às perguntas centrais da pesquisa relatada. Seu uso
por parte dos resumidores é, contudo, bastante diferente, pois poucas informações são de fato

43

retiradas. O parágrafo parece ter indicado palavras-chave e temas gerais importantes no texto-
fonte — como será discutido mais a frente, há uma multiplicidade de palavras/conceitos-chave
indicados, mas sua retomada nos resumos é bastante irregular, no entanto, um dos termos de uso
mais recorrente está presente no primeiro parágrafo do texto-fonte: “maior qualidade de vida”
(também retomada no texto-fonte e nos resumos por “qualidade de vida”).
Um trecho bastante utilizado que parece exibir um propósito mais concreto nos resumos é
o subtítulo. Como já mencionado, ele apresenta um dos poucos momentos de sumarização
realizados pelo autor da matéria — semelhante ao que acontece também com o subtítulo no texto-
fonte de 2014, assim como o segundo parágrafo, em que há uma retomada mais clara da pesquisa
a ser descrita. Seu uso por parte dos resumidores nem sempre é muito produtivo, pois varia entre
a cópia, cópia com apagamento de palavras ou uso de partes do enunciado.
Os três parágrafos mais utilizados no corpo do texto (3º, 4º e 10º, em ordem) contêm
descrições das imagens da natureza nas duas épocas estudadas, indicando que os resumidores
identificaram sua importância para a matéria. No entanto, há um foco grande dado a palavras-
chave nas descrições, com a exclusão do título, utilizado nos parágrafos 3 e 4 como forma de
descrever e comparar como a natureza era tratada na concepção popular e pelos agentes de
marketing nas duas épocas, mas que não foi utilizado na maioria dos resumos.
O décimo parágrafo, que também é utilizado com certa frequência (ligeiramente menor do
que os trechos mencionados anteriormente), contém comparações entre as duas temporalidades
mais explícitas, mas é utilizado, de maneira generalizada, pela presença de palavras que parecem
atrair os resumidores — no parágrafo mencionado, trata-se do termo movimento hippie, parte da
discussão da próxima seção.
Como já discutido, o mapeamento dos resumos de 2013 foi menos claro do que o
realizado em 2014. Os resumos de 2014 possuíam passagens muito mais próximas das de seu
texto-fonte, que, por sua vez, continha menos repetições do que as presentes na reportagem de
2013. O segundo grupo, de 2013, por sua vez, possuía textos menos fiéis aos conteúdos de seu
texto-fonte, com a manutenção de palavras (chave ou não) retiradas da matéria de divulgação
científica resumida, na qual havia mais repetições de dados e informações mais dispersas.
Consequentemente, enquanto é possível observar o uso de conceitos e palavras retirados do texto-
fonte de 2013, assim como uma mobilização (nem sempre efetiva) de seus conteúdos, é mais
difícil identificar relações diretas entre trechos dos resumos e passagens da reportagem — as

44

repetições de informações fazem com que, a não ser que um trecho tenha sido copiado e alterado
diretamente no resumo, haja marcas de repetição no momento de mapeamento.
Assim, nos textos de 2013, ficam menos claras as estratégias de fato utilizadas, mas é
possível observar um distanciamento daquelas empregadas pelos resumidores de 2014 na maioria
dos casos — mantém-se, por exemplo, a preferência pelo subtítulo como fonte de informações já
sumarizadas, mas ignora-se o título como elemento norteador para a seleção de informações.

7.6. Palavras-chave

Nos textos de 2014, como as alterações são mais localizadas, a manutenção de palavras
nos enunciados selecionados do texto-fonte (sendo elas palavras-chave ou não) são mais comuns,
com alguns termos apagados e/ou substituídos quando o enunciado é utilizado no resumo. Nos
textos de 2013, por outro lado, há a manutenção de palavras-chave ou conceitos-chave. Essas
palavras e frases são destacadas no texto-fonte através do uso de aspas — tais informações
parecem proceder da tese e por isso são marcadas, valendo ainda observar que algumas, ao serem
repetidas ao longo do texto-fonte, não retêm as aspas. Esse termos, no entanto, são numerosos no
texto-fonte, e apenas alguns foram selecionados como palavras-chave pelos resumidores — e, na
maioria das vezes, não são marcadas por aspas, parecendo indicar que os resumidores não
entendem seu uso como recurso do autor do texto-fonte para marcar conceitos ou termos
retirados da tese.
Embora o uso dessas palavras-chave seja bastante recorrente nos resumos de 2013
analisados, não há muito consenso entre os resumidores acerca de quais conceitos são mais
centrais, pois vários deles são selecionados. Algumas das palavras-chave que são reproduzidas
também não são marcadas originalmente no texto-fonte, mas recebem aspas nos resumos.

Palavra- qualidade retorno à natureza verde onda verde rurbanização


chave de vida natureza (variações) (variações)
Total 32 10 44 28 12 13
% 50 16 69 44 22 20
Tabela 4 - Palavras-chave do texto-fonte de 2013

45

Dentre as palavras-chave identificadas nos resumos, apresentadas na tabela 4, pode-se
observar que a maior recorrência é de expressões relacionadas a natureza. No texto-fonte as
variações mais são: “natureza”, “retorno à natureza”, “imagens da natureza”, “valorização da
natureza”. Estes termos são os mais recorrentes, estando diretamente relacionadas à temática da
tese: a representação da natureza em anúncios publicitários de imóveis em São Paulo nas décadas
1970 e 2000.
Outro termo bastante presente nos resumos, como indica a tabela 4, é “(melhor)
qualidade de vida”. Também relacionado à temática, o conceito é retomado em ambas as épocas
analisadas na tese, de forma que as relações estabelecidas entre as representações da natureza nos
anúncios imobiliários e a qualidade de vida é parte importante da análise do pesquisador. É
interessante observar, no entanto, que mesmo a qualidade de vida tendo sido atribuída como
importante a ambos os recortes temporais, em momentos diferentes do texto, esse dado poucas
vezes é recuperado nos resumos, que, muitas vezes, atribuem a preocupação com a qualidade de
vida a apenas uma das faixas de tempo da análise.
Os últimos termos mais recuperados nos resumos indicados na tabela 4 estão relacionados
ao verde, termo que é usado em diferentes conceitos apresentados no texto-fonte, como: “onda
verde”, “ideologia do verde”, “mercadorias verdes”, “economia verde” e “simbologia do
verde”. Ainda que essa abundância de conceitos inter-relacionados através do elemento verde
indique que o termo tem bastante importância para a discussão desenvolvida tanto na tese quanto
na matéria de jornal, poucos desses termos são retomados, havendo um foco em onda verde e
ideologia verde.
Embora a presença e identificação de palavras/conceitos-chave nos textos de 2013 sejam
interessantes e tragam indicações sobre o que os resumidores tomam como importante para a
produção de resumos mais concisos e preocupados com o conteúdo da pesquisa exposta no texto-
fonte, não foi possível retirar apontamentos mais concretos de como funciona a seleção de
informação para os resumidores de 2013. Diferente de 2014, eles não utilizam o título da matéria
como indicação para a seleção de informações — havendo resumidores que não apresentam o
título em seus textos —, também não parece haver um uso expressivo das seções que dividem o
texto, legendas ou da caixa de informações no fim do texto.
O que a ausência de consistência nos achados indica, por outro lado, é que o foco dos
resumidores é o corpo do texto — o que parece condizer com os resumos mais curtos e centrados

46

na tese —, sem utilizar elementos anteriores ao corpo do texto-fonte como indicadores, e que a
própria seleção de informações é ainda difusa, aparentando não partir de estratégias muito
estruturadas ou, ao menos, comuns entre os próprios resumidores.

8. Reformulações nos resumos de 2014

Como descrito na seção 3, a matéria resumida em 2014 é organizada sem muitas


retomadas de informações, de modo que, nas análises dos textos de 2014, foi relativamente
simples identificar a origem das informações presentes nos resumos — um pouco diferente do
que acontece com o texto-fonte e resumos de 2013. A partir desse mapeamento das informações
selecionadas do textos-fonte e retomadas no resumo, foi possível observar as estratégias de
reformulação utilizadas pelos resumidores.
A maioria das estratégias identificadas nos textos de 2014 estão de acordo com os achados
da literatura consultada sobre resumos (BROWN & DAY, 1983; BROWN, DAY & JONES,
1983; HOWARD, 1993; KLEIMAN & TERZI, 1985; SHERRARD, 1989; TELES, 2007)
contando com a seleção de trechos do texto-fonte que são alterados para compor um resumo. No
entanto, é interessante observar aspectos do texto-fonte que podem interferir na análise.

8.1. Alterações localizadas



Além de certa singularidade das informações no texto-fonte de 2014, sua apresentação
nos resumos é muitas vezes bastante próxima de sua versão na reportagem, facilitando o
mapeamento dos textos. Essa proximidade de linguagem vai ao encontro do que é descrito por
Brown & Day (1983) na estratégia de cópia e apagamento e encontrado também por Howard,
(1993) assim como Kleiman & Terzi (1989). Portanto, a maioria das estratégias empregadas na
reformulação das passagens selecionadas do texto-fonte são localizadas, isto é, procuram adequar
o trecho selecionado para compor o resumo. Nos textos analisados, as alterações mais recorrentes
são: apagamento de palavras ou frases, substituição de palavras por sinônimos e/ou
generalizações e alterações sintáticas, como alteração de voz ativa para voz passiva e categoria
sintática.

47

8.1.1. Apagamento

Na literatura consultada (BROWN & DAY, 1983; KLEIMAN & TERZI, 1989; TELES,
2007), o apagamento aparece como primeira e mais recorrente estratégia para a construção de
resumos. Na análise, casos de exclusão de palavras e enunciados dentro de trechos para a costura
de um novo texto são bastante comuns, muitas vezes com múltiplas ocorrências dentro de um
mesmo resumo.
O exemplo a seguir apresenta apagamentos para a reformulação de um parágrafo através
da supressão de diferentes enunciados, apresentando tanto exclusões de trechos maiores dentro do
parágrafo quanto o apagamento de informações dentro de um trecho selecionado para compor o
resumo.

Resumo 21 (2014) Parágrafo 2 (2014)


Alcides Scaglia, já Scaglia abraçou a carreira acadêmica depois de
atuou como profissional tentar ganhar a vida nos gramados. Passou pelas
no Velho Clube time de categorias de base da Ponte Preta, de Campinas, e atuou
Rio Claro. Ingressou no como profissional no Velo Clube, de Rio Claro,
curso de Educação Física agremiação do interior de São Paulo. “Naquela época, eu
da Unicamp, fez já tinha claro que precisava estudar. Como não consegui
mestrado e doutorado. me destacar no esporte, prestei vestibular e ingressei no
Em 2010 tornou-se curso de educação física da Unicamp. Depois, fiz
docente da Unicamp. mestrado e doutorado. Em 2010, prestei concurso e
assumi o cargo de docente aqui na FCA”, relata. O
contato com o tema principal de suas pesquisas começou
logo no primeiro semestre da graduação, nas aulas do
professor João Batista Freire, que iniciou um projeto
sobre escolhinha de futebol.
Quadro 14 - Resumo 21 de 2014

No exemplo do quadro 12, o resumidor toma um parágrafo e recorta enunciados para


montar uma versão sintética deste, adaptando diferentes passagens de modo a combiná-las em
apenas um trecho — talvez as mais evidentes estejam presentes na transformação de um trecho
de uma citação direta do pesquisador em entrevista (em verde) para ser encaixada com o restante
do resumo. Há recortes maiores — como o primeiro período, do qual é retirado apenas o
sobrenome do pesquisador (em azul) como referência sobre de quem as informações presentes no

48

parágrafo tratam — e menores — como a localização mais minuciosa do Velo Clube (em
vermelho). A proximidade entre a linguagem do resumo e a do texto-fonte, entretanto, indica que
realmente se trata de uma estratégia de seleção e reprodução, como a de cópia e apagamento
(BROWN & DAY, 1983).

As autoras propõem que a regra de apagamento (deletion, no artigo) procura retirar


primeiramente informações supérfluas, seguidas de informações redundantes, podendo ser
aplicada também a, como propõe Teles (2007):

“conteúdos facilmente inferíveis a partir do conhecimento comum; exemplos;


explicações; justificativas; seqüências que têm apenas efeito estilístico; caracterizações
pormenorizadas; enfim, todas as informações dispensáveis à significação básica do
texto.” (TELES, 2007, p. 73)

A análise dos resumos aqui realizada parte de textos-fonte mais extensos do que os
utilizados nos experimentos das pesquisadoras, de forma que espera-se que o resumidor aqui
analisado tome mais decisões sobre informações que devem ou não ser transpostas do texto-fonte
para o resumo. Em virtude de sua extensão e, como já foi discutido, uma preferência por parte
dos resumidores por informações na primeira parte (mais narrativa), em muitos resumos há o
apagamento de parágrafos completos.
Partindo de uma análise das informações mais selecionadas e como não foi aplicada uma
gradação de importância às informações presentes no texto-fonte — diferentemente do método
utilizado em vários dos estudos realizados anteriormente (BROWN & DAY, 1983; BROWN,
DAY & JONES, 1983; KINTSCH & VAN DIJK, 1978) —, não é possível tirar conclusões sobre
quais informações são retiradas do texto ou o que as motivaram. Porém, como discutido
anteriormente, foi possível observar a utilização de apagamentos em diferentes níveis do texto,
com a exclusão desde palavras, passando por trechos maiores e períodos, até parágrafos
completos.

8.1.2. Substituição

As substituições de palavras em enunciados retirados do texto-fonte também são bastante


comuns, diretamente relacionadas à estratégia de cópia e apagamento (BROWN & DAY, 1983).

49

Na análise, as substituições mais comuns são (a) palavras — com escolhas lexicais que nem
sempre se adaptam bem, sendo sinônimos em instâncias que não se encaixam necessariamente no
contexto do enunciado no resumo —; (b) retomada de informações localizadas em outros
momentos do texto-fonte; e (c) generalizações.
As substituições levantam questões acerca de como constituem-se paráfrases, assim como
suas relações com a sinonímia e, finalmente, com o resumo. Segundo Fuchs (1985), o fenômeno
sinonímico parte da possibilidade de diferentes perspectivas para um mesmo referente, mas não é
sua única condição, pois é ainda possível atribuir conotações divergentes a um mesmo referente,
de modo que a compreensão central não se mantém — a autora utiliza como exemplo
acontecimentos que são entendidos como “milagres” por alguns e “catástrofes” por outros (p.
132).
Dessa forma, as substituições, operações baseadas na aplicação de sinonímia em termos
do texto-fonte, necessitam que os resumidores identifiquem os referentes para poderem até
mesmo utilizar sinônimos já propostos dentro do próprio texto-fonte, como será apresentado no
exemplo; também é necessário, no caso da construção de uma paráfrase, que o sinônimos seja
coerente com o contexto e restante do texto que está sendo construído, outra questão discutida no
exemplo do quadro 15:

Resumo 69 (2014) Parágrafo 5 (2014)


Scaglia desenvolveu um método “(…). O objetivo era formar
de treinamento para criar jogadores jogadores inteligentes e não
diferenciados, ou seja, jogadores com malabaristas. Estávamos interessados em
capacidade de demonstrarem sabedoria atletas que conseguissem ler o jogo e
em campo. tomar decisões capazes de desmontar
uma defesa ou, ao contrário,
neutralizar um ataque”, reforça o
professor da FCA.
Quadro 15 - Resumo 69 de 2014

No resumo 69, jogadores inteligentes é substituído por jogadores diferenciados (ambos


em azul), uma substituição bastante interessante, pois o termo utilizado no resumo
(diferenciados) aparece anterior e posteriormente no texto-fonte (primeiramente, no subtítulo,
depois, no terceiro e décimo parágrafos). Esse tipo de estratégia aparece em vários dos resumos,

50

indicando uma leitura mais global do texto-fonte por parte dos resumidores, que conseguem
estabelecer relações entre termos diferentes que possuem o mesmo referente e utilizá-los como
sinônimos, ainda que, fora do texto-fonte, não haja correspondência exata entre eles.
Além disso, o resumidor utiliza sabedoria em campo (em vermelho, no resumo) para
descrever as habilidades que a metodologia procurava desenvolver nos jogadores com os quais
foi aplicada (trecho em vermelho na cópia do texto-fonte). O uso de sabedoria parece ser
motivado pela presença de palavras como [jogadores] inteligentes no texto-fonte — considerando
que inteligência e sabedoria pertencem ao mesmo campo semântico relacionado a conhecimento
—, no entanto, sabedoria possui uma conotação diferente, de forma que destoa do restante do
texto, especialmente com a substituição anterior — ou seja, se houvesse a manutenção de
jogadores inteligentes, provavelmente sabedoria em campo seria aceito com mais facilidade, uma
vez que poderia ser estabelecida uma relação semântica entre os dois termos (inteligentes e
sabedoria).
Nos resumos analisados, tanto em 2014 quanto em 2013, as substituições parecem possuir
funções que não estão apenas relacionadas às reformulações, mas também às tentativas de
distanciamento entre o texto-fonte com relação à linguagem utilizada, de modo a não configurar o
plágio — o que, por sua vez, quando somado à estratégia de cópia e apagamento, reforça a noção
de aplicação de estratégias de sumarização escolares nas quais pequenas alterações em
enunciados do texto-fonte já constituem reformulações.

8.2. Generalizações e Explicações



Teles (2007) propõe que, enquanto em um resumo a redução de sua extensão é uma
característica central, ela não significa simplesmente a diminuição do número de palavras, mas a
procura por concisão, conceito que a autora define como sendo “resultado do processo de
sumarização que acontece durante a leitura e expressa como a palavra justa à finalidade do texto”
(p. 73). Desse modo, uma sumarização necessita de maior trabalho de reformulação dos
conteúdos expostos — diferente do que foi apresentado na análise até o momento e encontrado
naliteratura. Pode-se observar nos resumos analisados, entretanto, um início de reformulações
maiores, tanto em 2014 quanto em 2013.

51

Para trabalhos com trechos mais extensos do texto-fonte é também necessária uma
compreensão mais profunda deste, de modo que os resumidores possam mobilizar informações
mais distantes e estabelecer relações que talvez não estejam indicadas na matéria apenas através
da ordenação. Observam-se duas direções: a generalização, em que não há uma dependência tão
grande com o texto-fonte em termos de estruturas de enunciados — estratégia recorrente em 2013
— e a explicação, através da qual procura-se explicitar relações implícitas ou conteúdos
dispersos.

8.2.1. Generalização

A generalização de trechos e seu uso como estratégia de resumo é bastante interessante,
pois traz indícios sobre o entendimento dos resumidores acerca da tarefa, assim como da própria
ação de resumir (KLEIMAN & TERZI, 1989). Ela aparece de formas diferentes na literatura:
Sherrard (1989), em sua análise bibliográfica, retoma a macrorregra de generalização derivada da
teoria de Macroestrutura de Kintsch & van Dijk (1978; VAN DIJK, 1980 apud SHERRARD,
1989); Brown & Day (1983), por sua vez, baseiam-se nesses autores propondo a regra de
substituição como parte do processo de sumarização, consistindo na substituição de listas por
hiperônimos; também identificam um trabalho textual mais geral, focado no que chamam de
essência do texto (gist of the text, trad. nossa), na Estratégia Madura (Mature Strategy, trad.
nossa), empregada por estudantes mais experientes (o equivalente a alunos de Ensino Médio e
cursos anteriores ao Ensino Superior).
Nos experimentos reportados pelas pesquisadoras, os textos resumidos são narrações com
a presença de listas — geralmente descritivas —, de forma que pudesse ser observado o uso da
regra de supraordenação ou sua ausência. Na matéria de jornal utilizada para a avaliação de 2014
que deu origem aos resumos analisados, por outro lado, não havia muitas listas, de modo que a
aplicação da regra de supraordenação não foi muito observada. Há casos esporádicos, mas nem
sempre com sucesso.
Textos que procuram fazer reformulações mais gerais são mais comuns, ainda que as
correspondências a trechos do texto-fonte sejam mais evidentes nos resumos de 2014, o que pode
ser atribuído, ao menos parcialmente, à estrutura da própria matéria de divulgação científica, que

52

não possui muitas repetições de informações. O exemplo a seguir trabalha com passagens um
pouco mais distantes e, no terceiro parágrafo, com um trecho mais longo, que é reformulado:

Resumo 56 (2014) Parágrafo 1 (2014) Parágrafo 3 (2014)


Com o objetivo de O objetivo é, Mais tarde, no mestrado, Scaglia
formar jogadores como ele diz, aprofundou suas investigações
inteligentes em campo e formar jogadores sobre o ensino-aprendizado do
não malabaristas, Scaglia inteligentes e não futebol. Para isso, ele entrevistou
realizou estudos e malabaristas da ex-jogadores para entender
entrevistas com ex- bola. como eles aprenderam a praticar
jogadores, a fim de o esporte. “Na época, os
entender como eles depoimentos deixaram muito
aprenderam a praticar claro que a questão da rua era
esporte, deixando claro a um ponto importante na relação
importância da sua que eles estabeleceram com a
origem. Em comum, os bola. A pedagogia da rua, que é
jogadores relatavam que marcada pelas brincadeiras da
era através das bola com os pés, estava presente
brincadeiras das bolas em todos os relatos. Esse foi um
nos pés, na rua, aspecto importante para a
denominada como sequência dos estudos. Nós
Pedagogia da rua. percebemos que o jogo
espontâneo, muito mais que o jogo
em si, contém elementos que
geram uma aprendizagem
significativa. Essa aprendizagem,
marcada por expressões lúdicas, se
diferencia muito da prática
deliberada adotada tanto nas
escolinhas quanto nos clubes. Em
outras palavras, ela é capaz de
formar jogadores diferenciados”,
afirma.
Quadro 16 - Resumo 59 de 2014

No resumo do quadro 16 existe ainda a manutenção de vários termos utilizados no texto-


fonte — por exemplo, entender como eles aprenderam a praticar (o) esporte ou, mesmo, deixar
claro (deixando claro no resumo e deixaram claro no texto-fonte), marcados em vermelho.

53

Contudo, é possível notar também um maior trabalho de reformulação, após a seleção de
informações essenciais do trecho em vermelho, indicando, desse modo, uma compreensão mais
profunda do teor do texto — e não apenas uma reformulação estrutural, como da estratégia de
cópia e apagamento, na qual a interpretação não precisa ser mais do que superficial (KLEIMAN
& TERZI, 1989; TELES, 2007) —, além de começar a se distanciar mais do plágio.
A maioria das reformulações mais gerais encontradas nos textos de 2014 são próximas ao
exemplo acima, sendo possível identificar a localização das informações mobilizadas para a
construção do resumo. Mais uma vez, o dado parece estar relacionado à estrutura do texto-fonte,
porém, é importante notar que não são comuns junções de informações muito distantes no texto-
fonte, de forma que as reformulações ainda são localizadas.

8.2.2. Explicação

Rigat (2013) propõe que as relações entre paráfrases são bidirecionais – isto é, “o texto A
é paráfrase do texto B se e somente se A compreende B e B compreende A” (RUS et al., 2009
apud RIGAT, 2013) —, de modo que é perfeitamente possível adicionar informações para a
formação de uma paráfrase, não apenas a exclusão. Em resumos e momentos de sumarização,
porém, as relações entre paráfrases são mais hierarquizadas, moldadas pelas relações de
intertextualidade que são estabelecidas, de forma que a adição de informações é mais rara.
Uma leitura mais elaborada do texto-fonte possibilita, no entanto, que o resumidor possa
adicionar informações que estejam dispersas no texto — estabelecendo relações através de uma
leitura mais global — ou, ainda mais comum, oferecer explicações ou explicitar conteúdos e
relações implícitos no texto-fonte: o que Brown & Day (1983) compreendem como a regra de
invenção (invention). O exemplo no quadro a seguir ainda é bastante simples, mas já inicia um
trabalho de estabelecimento de relações entre dois enunciados.

54

Resumo 23 (2014) Parágrafo 5 (2014)
O objetivo de Scaglia foi O pesquisador concluiu que a
formar jogadores inteligentes que metodologia desenvolvida para a iniciação
pudessem entender e ler o jogo na poderia servir de base para o ensino da
teoria, e não apenas na prática. modalidade em etapas posteriores, ou seja,
Logo depois, juntamente com outros desde as categorias amadoras até o time
ex-alunos da Faculdade de profissional. “Ao entendermos o processo de
Educação Físcia (FEF), Scaglia organização do jogo, nós conseguimos
criou um organização não manipular esse mesmo jogo de modo a criar
governamental, Associação Futebol um método de treinamento marcado pelas
Arte (AFA), em Campinas. especificidades que o futebol requer. O
objetivo era formar jogadores inteligentes
e não jogadores malabaristas. Estávamos
interessados em atletas que conseguissem
ler o jogo e tomar decisões capazes de
desmontar uma defesa ou, ao contrário,
neutralizar um ataque”, reforça o professor
da FCA. Na sequência, junto com outros
ex-alunos da Faculdade de Educação
Física (FEF) da Unicamp, Scaglia criou,
em Campinas, a organização não
governamental Associação Futebol Arte
(AFA). O espaço utilizado para as atividades
foi cedido pela Escola Americana.
Quadro 17 - Resumo 23 de 2014

Como colocado anteriormente, em relação à invenção, o exemplo do quadro 17 é ainda


um pouco rudimentar e há pequenos equívocos. O resumidor relaciona jogadores inteligentes e
atletas que conseguissem ler o jogo e tomar decisões capazes de desmontar uma defesa ou, ao
contrário, neutralizar um ataque (ambos em azul), reformulando de forma que estes
conhecimentos estratégicos sejam teoria. No texto-fonte, a nova metodologia de ensino de
futebol não parece muito relacionada a conhecimentos teóricos sobre o jogo, mas se foca no
desenvolvimento de estratégias a partir da prática de jogos, não de treinamentos localizados.

55

Dessa forma, ainda que o resumidor cometa enganos, em termos de estratégia de
sumarização, pode-se observar que há a tentativa de estabelecimento de relações entre dois
trechos que, embora indicadas pela ordenação, são, ainda, implícitas.

8.3. Adaptações

Como indicam os exemplos anteriores, a maioria das estratégias de resumo envolvem
alterações nos enunciados selecionados do texto-fonte, de forma a adequá-los para a formação do
resumo como um texto novo e coeso, buscando sua autonomia.
Dentre os tipos de alterações encontradas, além das mudanças que procuram adaptar
trechos, como ilustrado nas seções anteriores — em apagamentos e substituições, por exemplo —
, a transformação de trechos em voz ativa para voz passiva (e vice-versa) e alterações decorrentes
da transformação de citações diretas em indiretas são os mais expressivos. Ambas focam
adaptações centradas nas formas verbais, com a manutenção das raízes das palavras utilizadas no
texto-fonte, muitas vezes com mudança de categoria sintática.
O exemplo no quadro 18, a seguir, traz a transformação de uma citação direta para
indireta, com alterações focadas nas formas verbais:

Resumo 30 (2014) Parágrafos 5 e 6 (2014)


Com outros ex alunos da (…). Na sequência, junto com outros
faculdade de educação física, fundou a ex-alunos da Faculdade de Educação
organização não governamental Física (FEF) da Unicamp, Scaglia
Associação Futebol Arte (AFA), onde criou, em Campinas, a organização não
foram selecionados meninos para governamental Associação Futebol
formar uma equipe sub12, que serviu Arte (AFA). O espaço utilizou para as
como projeto piloto. Em um ano foi atividades foi cedido pela Escola
possível provar na prática que a idéia Americana.
era um sucesso, e que conseguiram Os educadores físicos
enfrentar outros times de igual para selecionaram meninos para formar
igual, chamando assim a atenção até uma equipe sub-12, que passou a servir
mesmo de times já existentes como o de projeto piloto. “(…). Em um ano, já
Paulínia, que aderiu a metodologia em estávamos comprovando na prática

56

suas categorias de base e até mesmo em que conseguíamos enfrentar de igual
seu time profissional conquistando para igual diversos times, inclusive os
títulos importantes. de São Paulo. Esse bom desempenho
despertou o interesse do Paulista
Futebol Clube, que estava em formação.
Estabelecemos uma parceria e
começamos a aplicar a metodologia no
clube, inicialmente nas categorias
amadoras e depois no time
profissional”, conta Scaglia.
Quadro 18 - Resumo 30 de 2014

Como pode-se observar no exemplo do quadro 18, o primeiro período do resumo, em


vermelho, contém informações do final do quinto parágrafo e do início do sexto do texto-fonte,
uma estratégia encontrada com frequência nos resumos de 2014. O segundo período, em azul, por
outro lado, parafraseia a citação do pesquisador, um trecho que se encontra no mesmo parágrafo,
com informações que estão presentes no primeiro período do resumo.
A transição da citação direta, em azul, para indireta é bastante precisa, com apagamentos
pequenos e manutenção da maioria das palavras e expressões utilizadas no texto-fonte — com
poucas substituições por sinônimos, focando a alteração de classe sintática das palavras já
presentes.
Desse modo é possível observar as adaptações que são feitas em vários níveis no trecho
selecionado: desde a alteração na organização — com a junção de dois parágrafos do texto-fonte
no resumo (trechos em vermelho) — até os pequenos apagamentos nos enunciados selecionados
e, finalmente, as adaptações que transformam uma citação direta, na primeira pessoal do plural (o
pesquisador entrevistado falando por si e seus colegas), em uma passagem em terceira pessoa,
parte do texto, como uma citação indireta (marcação sem azul), porém, ainda sem as referências
necessárias.
As adaptações referentes a citações levantam questões sobre construção de autoria
bastante interessantes. Como será discutido a seguir, a referenciação dos diferentes autores
presentes no texto-fonte — que, sendo uma matéria de divulgação científica, já continha uma

57

intertextualidade intrínseca própria do gênero — é uma questão importante, que traz à tona
reflexões tanto sobre os gêneros textuais envolvidos como as formas com as quais os alunos
resumidores se relacionam e se colocam frente a esses textos.

8.4. Referência

Um dos pontos importantes para a análise é como os resumidores lidaram com o texto-
fonte, entendendo-o como um texto anterior aos resumos. A maioria dos textos de 2014 contém
apresentações tanto do pesquisador e da tese desenvolvida — não apenas do conteúdo da
metodologia, por exemplo —, quanto informações que apresentam a própria matéria de
divulgação científica, especialmente seu título — mais uma indicação de sua importância na
percepção dos resumidores.
A forma como a apresentação do texto-fonte é realizada varia nos diferentes resumos,
especialmente com relação à escolha das informações apresentadas, podendo conter apenas o
jornal e autor, nome da matéria, até a data de publicação e número do jornal:

Resumo 66 (2014) Resumo 67 (2014) Resumo 47 (2014)


Na matéria A materia do Jornal A notícia
“Substituição no futebol: da Unicamo nº 590 de “Substituição no futebol:
entra o inteligente e sai o Março de 2014 diz sobre entra o inteligente e sai o
malabarista” de Manuel melhoras nos metodos de malabarista”, publicado
Alves Filho publicada no ensino no futebol pelo jornalista Manuel
jornal da Unicamp mostra, brasileiro, com base em um Alves filho no dia 17 a 23
o método que o atual diferenciado metodo de de março desse ano na
pesquisador docente da aprendizado e ensino do edição 590 pelo jornal da
Unicamp desenvolveu, futebol apresentado pelo Unicamp, relata sobre a
tendo como objetivo, docente Alcides José insatisfação dos torcedores
formar jogadores de Scaglia. e a nova metodologia
futebol diferenciados. (…) criada.
Quadro 19 - Resumo 66, 67 e 47 de 2014

58

Como indicam os exemplos do quadro 19, a variação das apresentações é grande.
Contudo, muitas vezes o parágrafo introdutório dos resumos contém, além das informações de
identificação do texto-fonte, um breve resumo geral. Não é possível identificar se essas
sumarizações gerais são parte de estratégias de produção do resumo ou um eco do próprio texto-
fonte que, como matéria de divulgação científica, traz uma apresentação do pesquisador e sua
metodologia logo no segundo parágrafo, ou, ainda, das atividades realizadas em sala de aula.
Como estratégia de sumarização, o resumo introdutório é interessante, pois apresenta o
foco do texto. Os focos encontrados, no entanto, não são sempre os mesmos, ocorrendo até
mesmo ambiguidades entre o texto-fonte propriamente dito e a pesquisa que este relata.
De fato, problemas com a separação entre o texto-fonte e a tese sobre a qual trata, assim
como entre os dois autores (o jornalista e o pesquisador), são bastante recorrentes — tanto em
2014 quanto 2013 —, indicando que ainda há questões, por parte dos resumidores, sobre leitura e
o próprio gênero da matéria de divulgação científica que não estão inteiramente claras — vale
observar, no entanto, que esta é a primeira avaliação do semestre e que questões sobre
referenciação são tratadas mais a fundo no módulo seguinte.

Resumo 43 (2014) Parágrafo 7 (2014)


(…). Posteriormente o “clube Como resultado da experiência,
virou um centro de referência em o Paulínia registrou algumas conquistas
formação de jogadores no país, e importantes com os times de base e
houve transferências destes jogadores também com o profissional. Além do
para agremiações de destaque”, mais, o clube virou um centro de
relata o autor. referência em formação de jogadores
no país. “Outra consequência foi a
transferência de alguns dos nossos
jovens atletas para agremiações de
destaque, como o Fluminense e o
Botafogo, ambos do Rio de Janeiro, e o
Real Madrid, da Espanha”. Ao mesmo
tempo em que formava jogadores, a

59

equipe também tratava de qualificar
professores, para que pudessem levar a
metodologia adiante. Scaglia ficou no
Paulínia até 2008. Em 2009, assumiu a
Secretaria de Esportes de Paulínia e, em
2010, como já dito, tornou-se docente
da Unicamp.
Quadro 20 - Resumo 43 de 2014

No exemplo do resumo 43 (2014), no quadro 20, há a fusão de um trecho da matéria e


uma citação direta do pesquisador entrevistado (em vermelho e verde na cópia do texto-fonte de
2014, respectivamente) em uma citação direta no resumo (também marcado em vermelho e verde
no resumo). Embora o resumo em questão possua várias instâncias de citações diretas e indiretas
em que o enunciador é marcado com maior clareza (geralmente por Scaglia, o pesquisador cuja
metodologia é foco da matéria de divulgação científica), o uso do termo autor é bastante
ambíguo. Além disso, com a fusão das duas vozes diferentes no mesmo trecho, a atribuição de
autoria a qualquer um dos dois (jornalista ou pesquisador) estaria equivocada.
A mistura de “vozes” dentro dos resumos, como no resumo 43 de 2014, não é incomum,
seja por ambiguidade, junção de trechos que contêm constatações tanto do jornalista quanto do
pesquisador (ambas expressas anteriormente), seja em simples atribuições incorretas — alguns
resumos, por exemplo, apresentam o texto-fonte, com seu título e publicação, mas atribuem sua
autoria ao pesquisador sobre o qual a matéria discorre.
Outra questão importante relacionada à referência é a das citações do texto-fonte
presentes nos resumos. O tipo de citação mais recorrente nos resumos é, como indicam vários dos
exemplos anteriores, a transformação de citações diretas da matéria sumarizada em partes do
texto corrido no resumo — esse tipo de transformação, como já discutido, muitas vezes causa
problemas para a atribuição de autoria às “vozes” dentro do texto ou, mais comum, com a
ausência de referências.
Outros tipos de citações também foram encontrados — desde casos mais problemáticos,
como a transformação de citações indiretas do pesquisador feitas na matéria (tanto paráfrases da
entrevista como da própria tese) em citações diretas atribuídas a ele, até a manutenção de citações

60

diretas que passam a impressão incorreta de que a entrevista que as produziu foi realizada entre o
pesquisador (Scaglia) e o próprio resumidor.
Enquanto vários problemas foram encontrados — não apenas relacionados a
ambiguidades e atribuições a enunciadores, mas também na própria reprodução dos trechos
selecionados no texto-fonte —, também foram encontradas reproduções de citações com maior
sucesso:

Resumo 43 (2014) Parágrafo 5 do texto-fonte (2014)


Este método visa formar “(…). O objetivo era formar
jogadores que saibam tomar decisões jogadores inteligentes e não jogadores
apartir do andamento do jogo, como malabaristas. Estávamos interessados
“desmontar uma defesa ou em atletas que conseguissem ler o jogo
neutralizar um ataque” — assim e tomar decisões capazes de desmontar
relata Scaglia na reportagem. uma defesa ou, ao contrário,
neutralizar um ataque”, reforça o
professor da FCA.
Quadro 21 - Resumo 43 de 2014

Resumo 4 (2014) Parágrafo 1 do texto-fonte (2014)


“Eu já não tenho mais “Eu já não tenho mais
paciência para assistir a um jogo paciência para assistir a um jogo
inteiro pela televisão”. Esta é a inteiro pela televisão”. A frase, dita
conclusão que Alcides Scaglia chega por qualquer brasileiro apaixonado pelo
em sua pesquisa. futebol, já mereceria atenção. Proferida
por um ex-jogador profissional e atual
pesquisador do esporte, como é o caso,
ela ganha uma dimensão ainda maior.

Quadro 22 - Resumo 4 de 2014

Como pode-se verificar nos exemplos dos quadros 21 e 22, a maioria das citações diretas
realizadas nos resumos de 2014 ainda contém alguns problemas, seja de alterações —

61

especialmente apagamentos, como em vermelho no quadro 21 — no que é indicado como cópia
do texto-fonte, seja com a leitura feita sobre o trecho citado, ou, ainda, a questão da referência a
trechos da entrevista que é citada na matéria, mas da qual os resumidores não participam — uma
aproximação de situações acadêmicas que necessitam da marcação apud, indicando que se trata
de uma citação contida em outro texto anterior.
Cabem, também, questionamentos quanto à seleção dos trechos mantidos — dentre as
citações encontradas nos resumos, muitas são informações adicionais (como em azul no quadro
22) ou que necessitariam de maior trabalho de reflexão e/ou contextualização. Contudo, a
presença dessas tentativas já indica movimentos muito interessantes por parte dos resumidores ao
estabelecer uma referenciação marcada, assim como indicações explícitas da intertextualidade
que rege o resumo.

9. Reformulações nos resumos de 2013

9.1. Generalizações

Como indicado anteriormente, a generalização é uma estratégia bastante recorrente nos


resumos, tanto em 2014 quanto em 2013. Além disso, como também foi discutido nas seções
sobre generalização e explicação nos resumos de 2014, a seleção de informações é central para
que generalizações sejam formas efetivas de sumarização e não representem simples apagamento
de informações que especificam ou explicam dados importantes.
Os textos de 2013 são mais curtos e condensados, com menor presença de trechos
retirados do texto-fonte e adaptados — como os de 2014 —, mas com tentativas de
reformulações que focam-se no conteúdo da tese sobre a qual discorre o texto-fonte. Com esse
foco e a redução da extensão dos textos, há a exclusão de informações mais específicas e o uso de
termos que procuram generalizar conceitos trabalhados.
Há informações que não são recuperadas nos resumos de forma a manter suas relações
iniciais no texto-fonte, assim como o uso de sinônimos ou palavras em campos semânticos
próximos, mas que não se adéquam ao uso presente no resumo. No exemplo a seguir — um dos

62

mais curtos analisados —, encontramos não apenas uma resposta direta ao enunciado da questão
que pede o resumo, mas simplificações e apagamentos que levam a informações que não se
alinham com o que está presente no texto-fonte.

Resumo 38 (2013)
Eu reportaria que os campos imobiliários tem mudado dos anos 70 até os
anos atuais, pois passaram a introduzir mais áreas verdes em seus projetos
trazendo melhorias ao meio ambiente.
Quadro 23- Resumo 38 de 2013

Embora certamente trate-se de um exemplo extremo de simplificação — como é possível


constatar apenas pela extensão do texto —, pode-se observar, no quadro 23, apagamentos e
generalizações que não se alinham ao que é colocado no texto-fonte.
O resumo 38 (2013) se distancia da matéria inicialmente por excluir a questão da
publicidade, focando o mercado imobiliário. O mesmo ocorre com o foco dado a áreas verdes,
sem trabalho com a questão da construção de imagens da natureza. Há, além disso, a seleção de
apenas uma das épocas estudadas, criando-se um continuum entre 1970 e 2013 no qual a análise é
realizada. O exemplo demonstra, dessa forma, como os apagamentos e simplificações das
informações selecionadas causam problemas de conteúdo com relação ao texto-fonte.
Também é interessante o apagamento do dado sobre a cidade de São Paulo nas descrições
da pesquisa e da tese sobre as quais fala o texto-fonte. Com essa omissão, não se perde todo o
contexto da pesquisa, mas é uma informação importante que é quase sempre apagada nos
resumos de 2013.
A presença ainda mais acentuada de generalizações nos resumos de 2013 parece estar
diretamente relacionada à interpretação do gênero resumo feita pelos resumidores do ano: textos
mais curtos, menos específicos, procurando trazer informações gerais.

9.2. Referências
Como discutido anteriormente, os textos de 2013 apresentam menos referências ao texto-
fonte do que os de 2014, nos quais o número se aproxima da totalidade. De fato, a maioria dos

63

resumos analisados focam o conteúdo da pesquisa descrita, ignorando as relações intertextuais
entre a pesquisa, matéria de divulgação científica (texto-fonte) e resumo:

Resumo 52 (2013) Resumo 58 (2013) Resumo 57 (2013)


Uma pesquisa Na tese defendida Desde os anos 70, observa-se
realizada na Unicamp, cujo por Carlos Eduardo a presença de imagens da natureza em
objetivo é mostrar a Paranhos Ferreira bacharel diversos anúncios publicitários,
relação entre propagandas em comunicação social, principalmente nos imobiliários.
mobiliárias dos anos 70 e centrada no mercado Dessa forma, uma tese desenvolvida
2000 e o uso da natureza imobiliário, o autor analisou por um bacharel da Unicamp visa
como foco dessas as décadas de 1970 e 2000. reportar a notória e frequente
propagandas. O uso da presença dessas imagens, analisado
natureza nos anúncios de modo especial as décadas de 1970
publicitarias são comum e 2000.
nas duas épocas — porém A tese analisa a crescente
com enfoque diferente. valorização da natureza e a forma
como imagens com belas paisagens
verdes e ecológicas são
frequentemente usadas em anúncios
imobiliários.
Quadro 24 – Resumos 52, 58 e 57 de 2013

O quadro 24 traz exemplos de apresentações da pesquisa sobre a qual o texto-fonte


discorre, mas não o referenciam, de modo que parecem resumos da tese, não da matéria de jornal.
Parte do dado pode ser atribuído ao tipo de resumos que, mais curtos, parecem focar o conteúdo
geral da tese sobre a qual trata o texto-fonte, procurando trabalhar essas informações.
No entanto, mesmo que muitas vezes de forma equivocada, a maioria dos textos, tanto de
2014 quanto 2013, traz introduções que procuram contextualizar um texto anterior — sejam as
matérias de divulgação científica, sejam as pesquisas (teses, em ambos os casos). Isso é
interessante tanto para a configuração do resumo como gênero — pois ele requer que a referência
a um texto-fonte seja feita — quanto para a autonomia dos textos, considerando que são
produzidos como respostas a uma questão em uma avaliação, de modo que alguns poucos a
respondem diretamente em vez de produzirem um resumo, como no quadro a seguir:

64

Resumo 19 (2013) Resumo 11 (2013) Resumo 71 (2014)
Que essa matéria Reportaria os Reportaria para
foi defendida em tese, tem trechos onde estão pessoas que assistem
o carater informativo, que contidos as informações jogos de futebol, mostraria
nos mostra a forma como a essênciais para o para essas pessoas o
publicidade pode nos entendimento do texto, metodo que na opinião de
influenciar em nossos sendo elas: a introdução e Scaglia tem a teoria do
ideais de qualidade de as idéias defendidas na balde:
vida. tese. “O tamanho do
balde é algo inato. É o
recipiente no qual você
colocará coisas boas,
coisas ruins ou poderá
enchê-lo apenas pela
metade. Nesse sentido, por
hipotese, alguém com um
balde grande pode
completa-lo somente com
balde pequeno podera
enche-lo com o que dara a
garantia de um sucesso
maior que o obtido pelo
dono de um baldão”.
Quadro 25 - Resumos 19 e 11 de 2013 e 71 de 2014

Em 2014, o número de textos que são respostas diretas, marcadas, à questão da avaliação
é pequeno, 6 (aproximadamente 9%). Em 2013, embora não se trate da maioria, encontram-se
mais exemplos como os apresentados acima (14 exemplos, cerca de 22% dos resumos).
Considerando o formato dos textos desse segundo grupo, seu foco no conteúdo e mesmo sua
extensão, como grupo, eles se aproximam de respostas à pergunta, se comparados aos textos de
2014.
Adicionalmente, foi possível observar que o uso de citações nos textos de 2013 é bastante
pequeno, apenas 3 (menos de 5%) — enquanto em 2014, um número significativo traz citações,
27 (aproximadamente 40%), sejam elas diretas ou indiretas, como indicado anteriormente. Esse
dado parece também estar relacionado ao próprio texto-fonte, que, além de ser menos seccionado
entre descrição da tese e entrevista (parte na qual há mais citações diretas longas), contém menos
citações diretas do pesquisador.

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10. Considerações finais

Embora as turmas estudadas, tanto de 2014 quanto de 2013, fossem bastante
heterogêneas, assim como costumam ser as turmas de ingressantes no ProFIS, foi possível
encontrar algumas estratégias recorrentes em ambos os grupos. O primeiro grupo de textos
analisados, produzidos em 2014, apresentam indícios de estratégias bastante recorrentes na
literatura sobre resumos (BROWN & DAY, 1983; BROWN, DAY & JONES, 1983; HOWARD,
1993; KLEIMAN & TERZI, 1985; TELES, 2007), enquanto os do segundo grupo, de 2013,
fogem mais às expectativas das pesquisas consultadas e das estabelecidas a partir da primeira
análise (dos resumos de 2014).
Os textos de 2014, assim, partem de seleções sequenciais de informações do texto-fonte,
realizando adaptações nos trechos selecionados para compor um novo texto-resumo (BROWN &
DAY, 1983; HOWARD, 1993; KLEIMAN & TERZI, 1985; TELES, 2007).
A maioria das reformulações encontradas nos textos de 2014 estão presentes na literatura,
de maneira especialmente concisa em Howard (1993): “[os alunos pareciam] copiar a partir de
um texto-fonte e, então, deletar algumas palavras, alterando estruturas gramaticais ou
introduzindo sinônimos palavra por palavra” (p. 233). Dessa forma, as reformulações de
passagens específicas contêm apagamentos (de palavras e enunciados mais longos), substituições
de palavras por sinônimos e alterações gramaticais que parecem procurar “camuflar” o trecho
selecionado do texto-fonte, assim como adaptar os diferentes recortes para que o resumo seja
constituído de forma coesa.
Também são encontradas generalizações e explicações, operações que mobilizam pedaços
maiores do texto-fonte e até mesmo distantes. Essas estratégias começam a se aproximar do que
alguns dos pesquisadores consideram como estratégias mais maduras (BROWN, DAY & JONES,
1983), nas quais o trabalho de reformulação realizado utiliza trechos mais extensos do texto-fonte
e se distancia mais da linguagem utilizada pelo autor do texto-fonte.
Os resumos de 2014 costumam conter referências tanto ao texto-fonte quanto à pesquisa
sobre a qual discorre. Também foram encontradas citações diretas e indiretas, inclusive de
trechos da entrevista realizada com o autor da pesquisa, embora a diferenciação entre as vozes do

66

pesquisador entrevistado e do autor da reportagem (texto-fonte) nem sempre fiquem claras nos
resumos.
Como parte de resultados que não foram previstos pela literatura sobre resumos
encontram-se o uso do título e subtítulo no processo de seleção de informações. O título, em
especial, parece servir de guia, pois os dois trechos do texto-fonte de uso mais recorrente nos
resumos de 2014 são os únicos dois parágrafos nos quais o título é retomado.
Outro ponto de divergência com relação ao que é proposto na literatura é a organização
das informações do texto-fonte nos resumos. Sendo geralmente sequencial, a transposição de
elementos da reportagem nas sumarizações não obedece os limites dos parágrafos do texto-fonte.
Isto é, as informações seguem a ordem do texto-fonte, mas são agrupadas de forma diferente.
Esses resultados, somados ao fato de que todos os resumos possuem números de
parágrafos inferiores ao do texto-fonte, indicam que os resumidores em questão não realizaram
processos de sumarização pautados nos parágrafos como unidade de organização e significação
textual, como indicam tanto Brown & Day (1983) quanto Kleiman & Terzi (1989). Embora a
dependência à organização do texto-fonte não seja marca de estratégia mais desenvolvida, parece
importante que esses aspectos da macroestrutura do texto-fonte sejam considerados no momento
de sumarização, o que não parece ser o caso.
Os textos de 2013, por outro lado, desenham um cenário diferente. Os resumos são
substancialmente mais curtos (com múltiplos exemplares compostos por apenas um parágrafo) e
a correspondência entre trechos dos resumos e passagens do texto-fonte de 2013 é menos clara.
Em termos de conteúdos, os resumos de 2013 realizam reformulações mais gerais sobre a
temática da tese, apresentando um trabalho com trechos mais extensos e/ou distantes no texto-
fonte. Nas introduções, boa parte dos textos apresenta a pesquisa da qual trata a reportagem, mas
poucos fazem referência ao texto-fonte de fato.
O texto-fonte de 2013 difere do utilizado em 2014, contendo mais conceitos da pesquisa
apresentada, com retomadas de tópicos já discutidos em passagens diferentes da matéria. As
estratégias de seleção de informação são, de acordo, menos claras.
Como o título e subtítulo emergiram na análise dos textos de 2014 como fatores
norteadores desse processo de recolhimento de dados, eles também foram investigados nos textos
de 2013. No entanto, a presença do título, seja para a apresentação do texto-fonte, seja ao longo
dos resumos, possui baixa recorrência. O subtítulo aparece com maior frequência, indicando que

67

os resumidores possuem sensibilidade para trechos que contêm sumarizações dentro do próprio
texto-fonte — semelhante ao que é encontrado na análise dos resumo de 2014.
Os diferentes conceitos relativos à pesquisa apresentada na reportagem de 2013 são
marcados através de aspas. Como o título não parecia ser um ponto forte para o direcionamento
da seleção de informação do grupo de resumidores de 2013, levantou-se a hipótese de que esses
termos-chave poderiam ser elementos norteadores nos processos de seleção de informação. No
entanto, a variedade de palavras-chave presentes na reportagem e a irregularidade de suas
retomadas nos resumos não permitem conclusões tão diretas quanto as feitas acerca da seleção de
informações nos resumos de 2014. Há, contudo, uma notável manutenção de algumas palavras-
chave, assim como do léxico utilizado na reportagem de 2013.
Os resumos analisados, entretanto, não consistem da junção de trechos da reportagem
reformulados, indicando, juntamente à manutenção já mencionada, que os resumidores
procuraram realizar sumarizações próprias, mais distantes no texto-fonte. Em grande parte dos
casos, contudo, os conteúdos expressos nos resumos diferem do que é apresentado na matéria a
ser resumida, de modo que há problemas em relação à fidelidade ao texto-fonte (TELES, 2007),
outro fator crucial nos processos de sumarização.
Com relação ao que propõem os estudos sobre resumo, os textos de 2013 também diferem
do que é previsto: procuram ser mais gerais, focando a essência do texto, mas ainda sem muito
sucesso. Assim, os resumos de 2013 se aproximam dos resultados de Brown, Day & Jones
(1983), que falam de reorganização de textos através dos tópicos trabalhados. Porém, em seus
resultados, as reorganizações parecem ser mais claras do que as encontradas na análise dos
resumos de 2013.
O que os resultados indicam são duas concepções da tarefa colocada, considerando-se que
os resumos foram produzidos em resposta a uma mesma questão em situação avaliativa. Os
textos de 2014 parecem mais próximos de conceitos escolares de resumos, como identificam
diversas pesquisas que descrevem as variações dessa concepção de sumarização (BROWN &
DAY, 1983; BROWN, DAY & JONES, 1983, HOWARD, 1993; KLEIMAN & TERZI, 1985;
TELES, 2007). Os textos de 2013, por outro lado, aproximam-se tanto de respostas de avaliações
escolares, mais curtas e gerais, como de estratégias consideradas mais maduras (BROWN &
DAY, 1983; BROWN, DAY & JONES, 1983), pois não se prendem tanto à estrutura superficial
do texto-fonte.

68

A tarefa proposta é a mesma, mas, enquanto não coube a esse trabalho a análise dos
materiais utilizados anteriormente às avaliações observadas, a indicação parece ser de que a
concepção tanto da tarefa quanto da sumarização trabalhadas em aula ativam estratégias
diferentes nos alunos. Parte da divergência dos conceitos pode ser atribuída ao trabalho que
precede a avaliação, realizado com grupos de colaboradores diferentes.
Ainda assim, como são primeiras avaliações desses resumidores do ProFIS, alunos
ingressantes, observa-se que várias das estratégias consistem na transposição de formas de
escrever escolares para práticas e textos-fonte próprios do ambiente acadêmico. Os resumos de
2014 seguem estratégias já identificadas na literatura (BROWN & DAY, 1983; HOWARD,
1993; KLEIMAN & TERZI, 1985; TELES, 2007) como parte do processo escolar: sequenciais e,
pautados no decalque — cópias de trechos com alterações localizadas. Os resumos de 2013, por
sua vez, assemelham-se mais a respostas a questões isoladas em avaliações escolares, sendo mais
breves e focados em conteúdos específicos.
Deste modo, a forma como a tarefa é compreendida, assim como o gênero resumo, parece
afetar diretamente as produções dos resumidores. Kleiman & Terzi (1989) propõem que as
situações da tarefa sejam mais influentes para o leitor-escritor menos experiente. Howard (1993),
em uma linha de pensamento similar, postula que a entrada de seus alunos no ambiente
acadêmico, que possui práticas letradas mais rígidas e definidas, cause dificuldades na
assimilação dessas práticas, assim como dos discursos que as perpassam. Assim, os alunos
resumidores cujos trabalhos foram analisados parecem trazer práticas escolares para a entrada na
academia, com a ativação de estratégias diferentes a partir de suas concepções de tarefa — tanto
o propósito a ser cumprido como o gênero a ser configurado.

69

Referências

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Expertise. Journal of Verbal Learning and Verbal Behavior. Technical Report No. 270. P. 1-14.
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FUCHS, C. A paráfrase linguística: Equivalência, sinonímia ou reformulação? Tradução de João
Walderley Geraldi; Caderno de Estudos Linguísticos. Nº 8. P. 129-134. 1985.
HILGERT, J. G. Procedimentos de Reformulação: Paráfrase. In: Dino, P. (Org). Análise de
Textos Orais. Humanitas: São Paulo, 7ª Edição. P. 117-146. 2010.
HOWARD, R. M. (1992). A Plagiarism Pentimento. Journal of Teaching Writing. v. 11. n. 2.
p233-45. 1992.
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KLEIMAN, A. Oficina de leitura: teoria e prática. Campinas, SP: Editora da Universidade
Estadual de Campinas. 1992.
KLEIMAN, A & TERZI, S. Fatores determinantes na elaboração dos resumos: maturação ou
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PROFIS. Disponível em: <http://profis.prg.unicamp.br/> acesso em: 6 de Dezembro de 2016
RIGAT, M. V. Paraphrase Scope and Typology . A Data-Driven Approach from Computational
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Universitat de Barcelona. 2013.
SANT’ANNA, A. R. Paródia, Paráfrase & CIA. São Paulo, SP: Editora Ática. 2003
SHERRARD, C. Teaching students to summarize: Applying textlinguistics. System. Vol. 17. Nº
1. P. 1-11. 1989.
TELES, M. E. S. Um estudo do resumo acadêmico em curso de graduação. Dissertação
(Mestrado). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. 2007.
WILSON, V. & ABREU, A. R. Letramento acadêmico: a construção de paráfrases em resenhas.
SOLETRAS Ano 10. Nº 20. P. 76-90. 2010.

70

Textos-fonte:
ALVES FILHO, M. Substituição no futebol: entra o inteligente e sai o malabarista: Metodologia
inovadora criada por professor da FCA é voltada à formação de jogadores diferenciados. Jornal
da Unicamp, Campinas-SP, nº 590, 2014. Disponível em:
http://www.unicamp.br/unicamp/ju/590/substituicao-no-futebol-entra-o-inteligente-e-sai-o-
malabarista> Acesso em: 06 de Dezembro de 2016.
GALLO NETTO, C. Da selva de pedra ao paraíso perdido: Tese investiga a construção de
imagens da natureza nos anúncios publicitários do mercado imobiliário. Jornal da Unicamp,
Campinas – SP, nº 555, 2013. Disponível em: < http://www.unicamp.br/unicamp/ju/555/da-
selva-de-pedra-ao-paraiso-perdido> Acesso em 06 de Dezembro de 2016.

71

Anexo 1

Substituição no futebol: entra o inteligente e sai o malabarista


Metodologia inovadora criada por professor da FCA é voltada à formação de jogadores
diferenciados
Texto:
MANUEL ALVES FILHO
Fotos:
Antonio Scarpinetti
Divulgação
Edição de Imagens:
Diana Melo

“Eu já não tenho mais paciência para assistir a um jogo inteiro pela televisão”. A frase,
dita por qualquer brasileiro apaixonado pelo futebol, já mereceria atenção. Proferida por um ex-
jogador profissional e atual pesquisador do esporte, como é o caso, ela ganha uma dimensão
ainda maior. O autor é Alcides José Scaglia, docente da Faculdade de Ciências Aplicadas (FCA)
da Unicamp, com campus em Limeira. Dedicado a investigar aspectos relacionados à pedagogia
do esporte, ele desenvolveu um método original de treinamento pautado no jogo. O objetivo é,
como ele diz, formar jogadores inteligentes e não malabaristas da bola. Aplicada em um pequeno

72

clube do interior paulista, a metodologia proporcionou ótimos resultados, abrindo perspectiva
para a superação do enfadonho momento do futebol nacional.
Scaglia abraçou a carreira acadêmica depois de tentar ganhar a vida nos gramados. Passou
pelas categorias de base da Ponte Preta, de Campinas, e atuou como profissional no Velo Clube,
de Rio Claro, agremiações do interior de São Paulo. “Naquela época, eu já tinha claro que
precisava estudar. Como não consegui me destacar no esporte, prestei vestibular e ingressei no
curso de educação física da Unicamp. Depois, fiz mestrado e doutorado. Em 2010, prestei
concurso e assumi o cargo de docente aqui na FCA”, relata. O contato com o tema principal de
suas pesquisas começou logo no primeiro semestre da graduação, nas aulas do professor João
Batista Freire, que iniciou um projeto sobre escolinha de futebol.
Mais tarde, no mestrado, Scaglia aprofundou suas investigações sobre o ensino-
aprendizado do futebol. Para isso, ele entrevistou ex-jogadores para entender como eles
aprenderam a praticar o esporte. “Na época, os depoimentos deixaram muito claro que a questão
da rua era um ponto importante na relação que eles estabeleceram com a bola. A pedagogia da
rua, que é marcada pelas brincadeiras da bola com os pés, estava presente em todos os relatos.
Esse foi um aspecto importante para a sequência dos estudos. Nós percebemos que o jogo
espontâneo, muito mais que o jogo em si, contém elementos que geram uma aprendizagem
significativa. Essa aprendizagem, marcada por expressões lúdicas, se diferencia muito da prática
deliberada adotada tanto nas escolinhas quanto nos clubes. Em outras palavras, ela é capaz de
formar jogadores diferenciados”, afirma.
No doutorado, o atual docente da FCA avançou um pouco mais os meias, para usar uma
linguagem própria do futebol, e passou a investigar o que significava de fato o jogo espontâneo.
Scaglia buscou entender o processo organizacional e sistêmico, o que permitiu que tivesse uma
compreensão ampla acerca da pedagogia da rua e da transição dela para uma posterior
sistematização. “De 1992 a 2000, nós sistematizamos o método e construímos um currículo de
formação direcionado aos garotos que estavam se iniciando no futebol”, lembra. Em 2003, o
Scaglia percebeu que o que tinha sido feito em relação à iniciação dos jogadores precisava ter
continuidade, agora no campo da especialização.
O pesquisador concluiu que a metodologia desenvolvida para a iniciação poderia servir de
base para o ensino da modalidade em etapas posteriores, ou seja, desde as categorias amadoras
até o time profissional. “Ao entendermos o processo de organização do jogo, nós conseguimos
manipular esse mesmo jogo de modo a criar um método de treinamento marcado pelas
especificidades que o futebol requer. O objetivo era formar jogadores inteligentes e não jogadores
malabaristas. Estávamos interessados em atletas que conseguissem ler o jogo e tomar decisões
capazes de desmontar uma defesa ou, ao contrário, neutralizar um ataque”, reforça o professor da
FCA. Na sequência, junto com outros ex-alunos da Faculdade de Educação Física (FEF) da
Unicamp, Scaglia criou, em Campinas, a organização não governamental Associação Futebol
Arte (AFA). O espaço utilizado para as atividades foi cedido pela Escola Americana.
Os educadores físicos selecionaram meninos para formar uma equipe sub-12, que passou
a servir de projeto piloto. “Procuramos clubes como Ponte Preta e Guarani, entre outros, para
apresentar a metodologia. Entretanto, nenhum deles se interessou. Queríamos mostrar que, com
método pautado somente no jogo, nós conseguiríamos ganhar deles. Em um ano, já estávamos
comprovando na prática que conseguíamos enfrentar de igual para igual diversos times, inclusive
os de São Paulo. Esse bom desempenho despertou o interesse do Paulista Futebol Clube, que
estava em formação. Estabelecemos uma parceria e começamos a aplicar a metodologia no clube,
inicialmente nas categorias amadoras e depois no time profissional”, conta Scaglia.

73

Como resultado da experiência, o Paulínia registrou algumas conquistas importantes com
os times de base e também com o profissional. Além do mais, o clube virou um centro de
referência em formação de jogadores no país. “Outra consequência foi a transferência de alguns
dos nossos jovens atletas para agremiações de destaque, como o Fluminense e o Botafogo, ambos
do Rio de Janeiro, e o Real Madrid, da Espanha”. Ao mesmo tempo em que formava jogadores, a
equipe também tratava de qualificar professores, para que pudessem levar a metodologia adiante.
Scaglia ficou no Paulínia até 2008. Em 2009, assumiu a Secretaria de Esportes de Paulínia e, em
2010, como já dito, tornou-se docente da Unicamp.
Além dos ganhos evidentes dentro de campo, o método desenvolvido por Scaglia também
se destaca por outros aspectos. “Ele não tem empresários e não requer alojamentos. Os garotos,
preferencialmente da região, treinam uma vez ao dia e depois retornam para suas casas. Isso
reduz muito os custos”, assegura. O docente diz estar convencido de que o modelo pode ser a
saída tanto para as deficiências técnicas e táticas do futebol brasileiro, quanto das dificuldades
relacionadas à gestão do esporte. “Nós trabalhamos o conceito da periodização do jogo. Nossa
proposta é acabar com o adágio popular segundo o qual treino é treino e jogo é jogo. O que nós
defendemos é que treino é jogo e jogo é treino. Por isso é que as coisas dão tão certo”, pontua
.

Scaglia admite, no entanto, que a proposta representa uma quebra de paradigma, e que por
isso mesmo ainda deverá continuar encontrando resistências para ser adotada por parte dos
clubes. “De fato, não é uma decisão trivial seguir esse método. Por ele, toda a lógica atual teria

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que ser transformada. Certezas ‘absolutas’ teriam que ser abandonadas. Mesmo assim, entendo
que é inevitável que a metodologia comece a ser gradualmente assimilada. Na Europa, há muitos
anos que o modelo de treinamento aplicado no Brasil foi abandonado, daí o sucesso de vários
clubes de lá. Isso explica, por exemplo, porque muitos jogadores brasileiros não se adaptam ao
futebol europeu. Alguns sequer conseguem treinar. Na Holanda, por exemplo, a discussão de se
trabalhar com o jogo vem da década de 1970, com o técnico Rinus Michels!”, compara.
Na opinião de Scaglia, se o Brasil quiser se transformar novamente numa referência mundial na
formação de jogadores de futebol, o caminho já está pavimentado. “A tradição das brincadeiras
de bola com os pés ainda é forte no país. Ela contempla muita espontaneidade, criatividade e
ludicidade. Se valorizarmos essa cultura, certamente voltaremos a dar as cartas na formação de
atletas diferenciados”, antevê. O docente da FCA assinala, entretanto, que todos esses aspectos
não mantêm qualquer relação com a questão do dom, algo que está arraigado na mente dos
torcedores brasileiros. “Cada vez mais, as pesquisas científicas comprovam que não existe dom,
pelo menos como está presente no imaginário popular. As pessoas precisam saber que a
competência adquirida é muito importante”, pondera.
Para sustentar a sua posição, o professor da FCA menciona a “teoria do balde”. Conforme
essa proposição, cada ser humano nasce com um balde, sendo que alguns são grandes e outros,
pequenos. “O tamanho do balde é algo inato. É o recipiente no qual você colocará coisas boas,
coisas ruins ou poderá enchê-lo apenas pela metade. Nesse sentido, por hipótese, alguém com um
balde grande pode completá-lo somente com elementos desinteressantes. Ao passo que alguém
com balde pequeno poderá enchê-lo com o que é essencial para resolver as questões mais
prementes no campo profissional, o que lhe dará a garantia de um sucesso maior que o obtido
pelo dono de um baldão”.
Atualmente, Scaglia continua dando sequência as seus estudos, com a colaboração do
Paulínia Futebol Clube. As investigações, que contam com a participação de alunos de graduação
e pós-graduação, são realizadas no Laboratório de Estudos em Pedagogia do Esporte (LEPE),
coordenado pelo docente. “O interessante desse trabalho é que, inicialmente, nós levamos a
metodologia para o clube. Agora, nós vamos buscar no clube elementos para alimentar nossas
novas pesquisas”, diz, acrescentando que tem mantido contato com algumas agremiações
interessadas em conhecer melhor o método desenvolvido por ele. Quem sabe sairá dessa
tabelinha o gol de placa que falta ao futebol nacional?

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Anexo 2

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Anexo 3
Da selva de pedra ao paraíso perdido

Tese investiga a construção de imagens da natureza nos anúncios publicitários do mercado


imobiliário

TEXTO: Carmo Gallo Netto


FOTOS: Reprodução Edição de Imagens: Luis Paulo Silva

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Pelo menos desde os anos 1970 assiste-se à emergência de uma “onda verde”, expressa
através da questão ambiental e da procura por uma “melhor qualidade de vida”. A
contemporaneidade elege o “retorno à natureza” como um de seus axiomas, tendo a questão
ecológica destaque especial no discurso de suas representações simbólicas, enfoque
especialmente presente na publicidade e no turismo.
Centrada no mercado imobiliário considerado de alto-padrão na cidade de São Paulo, uma
tese desenvolvida no Instituto de Artes (IA) procura recortá-lo em duas diferentes
temporalidades: as décadas de 1970 e 2000, interpretando e contrastando os anúncios e catálogos
impressos desse mercado nesses dois períodos. O trabalho foi desenvolvido por Carlos Eduardo
Paranhos Ferreira, bacharel em comunicação social, com especialidade em cinema, com
orientação do professor Ivan Santo Barbosa.
Com o recorte temporal, o autor procurou analisar as décadas de 1970 e 2000. Os anos 70
podem ser vistos como aqueles nos quais começa a se disseminar a ideia de “selva de pedra” e se
distinguem pelo início do interesse pelas áreas verdes e pela qualidade de vida e marcam a
emergência de uma onda verde que revela o desejo de retorno à natureza. Os níveis de poluição
eram altíssimos, sem nenhum mecanismo de controle, tanto que indústrias e carros não
utilizavam ainda catalizadores.
Já a partir do primeiro decênio do novo milênio, o marketing do mercado imobiliário
passa a enxergar o elemento verde como uma nova commodity na comercialização de imóveis de
alto padrão, aparentemente pretendendo recuperar a ideia de paraíso perdido. Paulatinamente,
esse imaginário se transfere para as demandas imobiliárias de outras classes sociais menos
sofisticadas e de menores condições financeiras. Com o estudo, diz o autor, “pretendi registrar a
cambiante representação de natureza no mercado imobiliário da cidade de São Paulo”.
Ele explica que a tese teve como objetivo principal entender a construção de imagens da
natureza nos anúncios publicitários desse mercado, que de certa forma traduzem o imaginário
contemporâneo na busca de um paraíso perdido e de um axis mundi, um eixo do mundo, local
onde se pode estar em equilíbrio e em comunhão com os deuses: “São elementos de apelo e de
sedução constantes no marketing desses empreendimentos imobiliários”, constata.
Movido por experiências adquiridas ao longo do mestrado, também realizado na
Unicamp, o autor teve o interesse despertado por questões envolvendo a cidade de São Paulo.
Chamou-lhe particularmente a atenção a representação recorrente da natureza nos anúncios do
mercado imobiliário de alto padrão. Uma certa ideia de natureza evidenciava o imaginário
contemporâneo na construção de paisagens idílicas e edênicas, ou seja, as imagens utilizadas
remetem a temas bucólicos e pastoris e a uma espécie de retorno ao Éden, o paraíso perdido.
Embora a pesquisa tenha sido feita com base na cidade de São Paulo, ele acredita que os seus
resultados podem ser aplicados em todo o país, especialmente em locais de significativa presença
da classe média: “Como estamos tratando de um desejo de natureza e do elemento verde,
expressos nos anúncios publicitários, essa ideologia emocional aparece inclusive em cidades
menores e em outras regiões do país”, afirma.
Para o pesquisador, a crescente valorização da natureza, que se irradia para diferentes
esferas da sociedade, proporciona a criação de uma série de produtos a partir dos quais se
pretende legitimar um caráter de “natural” em sua composição, feitura e distribuição. Em
consequência dissemina-se uma gama de bens e serviços constitutivos de uma “ideologia do
verde”, presente nas mais diferentes indústrias: da alimentação, do vestuário, da higiene e dos
cosméticos, dos esportes, do entretenimento, do lazer e do turismo. As “mercadorias verdes”
parecem atender a uma demanda por um espaço diferenciado do ponto de visto sócio ambiental e
ecológico, garantindo, assim, o acesso ao mito da “qualidade de vida”. Dessa forma, segundo ele,

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dissemina-se o conceito de uma “economia verde”, que se manifesta também no mercado
imobiliário.
O trabalho também procura mostrar que está em curso um fenômeno que pode ser
chamado de “rurbanização”, resultante do crescimento de extensas áreas que se urbanizam além
dos limites urbanos e terminam por misturar-se aos espaços rurais, determinando grandes
conurbações. Nesse processo, as atividades desenvolvidas nas áreas rurais se integram cada vez
mais com os espaços urbanos criando uma simbiose entre campo e cidade.
Este fenômeno não se restringe apenas às megalópoles e verifica-se em cidades menores.
Essa integração de espaços urbanos e rurais promove novas atividades econômicas que se
desenvolvem de forma interurbana nas fábricas deslocadas para os interstícios urbano-rurais, nos
entrepostos comerciais, nos armazéns, nos centros comerciais, nos parques temáticos, nas
atividades de lazer e de turismo. Resulta daí uma sinergia cada vez mais intensa entre esses
espaços. Como exemplos o pesquisador cita originalmente o caso das cidades do ABCD e mais
recentemente os espaços situados entre São Paulo e Atibaia, Bragança, Sorocaba, Itu, Jundiaí,
Valinhos, Vinhedo, Campinas, Jaguariúna e ainda as cidades interligadas ao longo da Via Dutra.

DIFERENÇAS E SEMELHANÇAS

O pesquisador constatou que o apelo à natureza é comum aos anúncios das duas épocas
confrontadas. Nos anos 70, a natureza está bastante ligada às ideias de contracultura do
movimento hippie que preconiza a volta ao campo e a uma vida comunitária. Já nos anos 2000 o
apelo ao verde está mais ligado à ideia de qualidade de vida que deve ser exercida em espaços
exclusivos e autossegregados, como os condomínios de alto padrão. O escopo é o da constituição
da metacidade, uma cidade dentro da cidade, que oferece serviços diversos ao morador,
possibilitando-lhe autonomia nessas ilhas de excelência.
Nos anúncios analisados, a “selva de pedra” dos anos 70 é retratada através da utilização
de matizes de cinza em contraposição à policromia dos anos recentes. Esse, diz o pesquisador,
parece ser um constructo do urbano contemporâneo da cidade de São Paulo, sugerindo um
processo de intensa transformação. Com efeito, à medida que a maior preocupação com o meio
ambiente resulta em uma ampliação e incorporação de novas áreas verdes reais ou imaginarias à
cidade, esse cromatismo se reflete nos folders, que do cinza vão à policromia. O que antes era
visto como o estereótipo de uma cidade sempre cinza e nublada ganha agora a conotação, não
menos estereotipada, de uma cidade que vive em comunhão com seus parques, jardins e áreas
verdes. Se nos anos 70 os empreendimentos privilegiavam a técnica e o material empregado, os
do novo milênio destacam especialmente a “simbologia do verde”.
Embora o marketing de empreendimentos de padrão superior destaque a oferta de
equipamentos e espaços para esporte, lazer, fitness, gastronomia, reforçando a oferta de uma ilha
autossuficiente, esse somatório de disponibilidades oferecidas é sempre emoldurado por uma
idealização de espaços verdes.
A proximidade de outras áreas verdes é mais um entre vários elementos que pretendem
valorizar o imóvel situado em áreas privilegiadas em que o verde está ao alcance de quem almeja
a tão propalada qualidade de vida, longe de quaisquer tipos de poluição.
O autor lembra ainda que a preocupação em destacar a centralidade do empreendimento,
o acesso fácil, a proximidade do transporte, particularmente o metrô, leva à utilização nos
impressos de mapas esquemáticos de localização, simplificados e com fotos ilustrativas que não
correspondem às escalas reais.

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Na essência, a tese trabalha com o poder de sedução que os anúncios procuram expressar. Detém-
se na falta e na distância da natureza que a publicidade constrói como mito e linguagem, que
evidenciam essas carências e esse desejo de natureza. Diante da escassez do verde, a lógica
publicitária propaga e publiciza uma ideologia emocional e de mercado em constante processo de
expansão. “Quanto menos se tem dessa preciosa mercadoria tanto mais ela é apregoada,
espelhada e espalhada e seus signos produzidos e consumidos, ao menos simbolicamente”,
constata o autor.

MERCANTILIZAÇÃO

Carlos Eduardo considera que a análise dos dados indica que a busca pelos ideais de uma
centralidade, de um axis mundi, expressos também pelo caráter idílico e edênico das paisagens
urbanas – intrínsecos à construção da imagem nos anúncios publicitários – se direciona ao que é
relevante para o habitante da grande metrópole: estar próximo das grandes artérias, do lazer, dos
parques, do comércio e do transporte diferenciado, preservando para si a individualidade de um
espaço exclusivo e aprazível junto à natureza, em concordância com os conceitos globais que
mercantilizam tudo e a todos. A valorização dessa centralidade é diretamente proporcional à
contiguidade de áreas verdes e constitutivas de “paisagens de poder”. Estes espaços privilegiados
de certos segmentos sociais, segregados e encastelados, delimitados muitas vezes pela criação de
uma fronteira verde, configuram as metacidades.
A paisagem é, antes, o produto de um imaginário construído segundo uma sacralidade
ancestral perdida, desejosa de restabelecer-se através da manifestação do sagrado presente na
ideia de Centro do Mundo, pois “viver perto de um Centro do Mundo equivale em suma a viver o
mais próximo possível dos deuses”, diz ele citando Mircea Eliade. Na grande metrópole
paulistana o centro do mundo está nas zonas nobres, preferencialmente junto aos grandes
parques, como Ibirapuera, Villa-Lobos, Aclimação, Parque do Carmo, próximo aos serviços
(shoppings), às grandes artérias e ao metrô. Ele acredita que o estudo possa contribuir para uma
reflexão sobre as expectativas, soluções e encaminhamentos adotados pela sociedade
contemporânea e pelo mercado imobiliário para atender a propósitos mercantis e, ainda,
sobretudo, para as análises feitas à luz da antropologia visual e da semiótica. Espera, também,
que as suas conclusões possam permear as discussões contemporâneas não apenas dos
administradores públicos mas também particularmente da população, de forma a possibilitar-lhe
o desenvolvimento de uma cidadania que reflita e influa nas políticas públicas e nas questões
urbanas.

Publicações
Tese: “Natureza e cidade: A conceituação e o tratamento do residencial na publicidade
imobiliária – análise contrastiva, décadas de 1970 e 2000” Autor: Carlos Eduardo Paranhos
Ferreira Orientador: Ivan Santo Barbosa Unidade: Instituto de Artes (IA)

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Anexo 4

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