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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE ESTUDOS DA LINGUAGEM – IEL

CAMILA DALLA POZZA PEREIRA

A FORMAÇÃO DO LEITOR NO ENSINO FUNDAMENTAL


II: LEITURA SITUADA EM LIVROS DIDÁTICOS DE
LÍNGUA PORTUGUESA

CAMPINAS
2010
CAMILA DALLA POZZA PEREIRA

A FORMAÇÃO DO LEITOR NO ENSINO FUNDAMENTAL


II: LEITURA SITUADA EM LIVROS DIDÁTICOS DE
LÍNGUA PORTUGUESA

Monografia apresentada ao

Instituto de Estudos da Linguagem (IEL)

da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP),

para obtenção do Título de Licenciada em Letras.

Orientadora: Profª. Drª. Roxane Helena Rodrigues Rojo

CAMPINAS
2010

i
Dedico este trabalho de conclusão de
curso aos meus queridos e amados pais,
Nivania e Edson, que me deram a vida e
a oportunidade de ser quem eu sou e de
chegar até aqui, através de grandes
esforços e renúncias.

ii
Agradecimentos

Primeiramente agradeço imensamente à minha orientadora, Profª. Drª. Roxane


Helena Rodrigues Rojo, pela confiança, apoio, profissionalismo e amizade ao longo deste
trabalho. Com ela descobri minha verdadeira vocação e encontrei meu caminho
profissional. Foi uma honra trabalhar e estudar com ela. Espero que isso se repita.
Agradeço aos meus familiares pelo apoio e por me proporcionarem a rica
experiência de cursar Licenciatura em Letras na Universidade Estadual de Campinas – sem
eles, não teria chegado aqui.
Ao meu querido Rodrigo, pelo apoio, amor, amizade e compreensão neste
momento tão importante em minha vida.
Aos meus amigos de faculdade pela amizade, pelas risadas e pelas conversas
que tanto enriqueceram e alegraram este período. Agradeço especialmente à Cristiane,
Joana, Mayara, Natalia e Danilo e aos colegas de turma de orientação (Cláudia, Mariana,
Larissa, Talita, Fabiana, Katia e Fernanda) pela amizade e pelas contribuições dadas a este
trabalho. Foi um prazer aprender com pessoas tão competentes e amigas. Também agradeço
aos amigos e professores que compõem a banca de defesa deste trabalho, Heitor Gribl e
Fernanda Litron pela colaboração e apoio.
Ao Instituto de Estudos da Linguagem e seus funcionários que, direta ou
indiretamente, colaboraram na minha formação profissional.

iii
RESUMO
A leitura é parte importantíssima do ensino de Língua Portuguesa que tem sido
realizado, cada vez mais, através de materiais didáticos como os livros didáticos que, por
sua vez, são amplamente utilizados na rede pública brasileira de ensino. A leitura feita pelo
aluno e conduzida pelo livro didático e pelo professor deve ser situada, isto é,
contextualizada para que o leitor seja ciente de tudo o que cerca um texto, verbal ou não. O
ensino de leitura deve ter como objetivo formar leitores conscientes, reflexivos e críticos
que respondam ativamente ao que leem, colocando-se como sujeitos ativos na interlocução.
Por isso, este trabalho pretende analisar duas coleções de livros didáticos de Língua
Portuguesa, direcionadas ao 7º e 9º ano do Ensino Fundamental II, para avaliarmos se a
leitura situada e a atitude responsiva ativa são desenvolvidas no ensino de leitura e como
este é realizado no início e no término deste nível de escolaridade. As coleções foram
escolhidas por meio do Programa Nacional do Livro Didático 2008 (PNLD) e por terem
recebido avaliações distintas no eixo da leitura. Os referenciais teóricos que orientam a
análise das coletâneas textuais e das questões interpretativas dos livros didáticos são os do
Círculo de Bakhtin e outros referentes à leitura e letramento.

Palavras-chave

Leitura situada, Gêneros do Discurso, Livros didáticos, Atitude Responsiva Ativa.

iv
ABSTRACT
Reading is a very important part of the teaching of Portuguese language that has
been accomplished, increasingly, through educational materials such as textbooks which, in
turn, are widely used in Brazilian public schools. The reading done by the students and led
by the textbook and the teacher should be located, i.e. contextualized for the reader is aware
of everything that surrounds a text, verbal or otherwise. The teaching of reading should be
aimed at educating readers aware, reflective and critical to respond actively to what they
read, putting themselves as active subjects in dialogue. Therefore, this study aims to
examine two sets of textbooks for Portuguese, directed at 7º and 9º years of elementary
school II, to evaluate if the reading situated and responsive attitude active are developed in
teaching reading and how this is done at the beginning and at the end of this level of
schooling. The collections were chosen through the National Textbook Program 2008 and
have received separate assessments of reading axis. The theoretical framework underlying
the analysis of collections of textual and interpretive questions of the textbooks are the
Bakhtin Circle and others related to reading and literacy.

Key-words

Reading located, Speech Genres, textbooks, Responsive Attitude Turns.

v
Lista de Figuras e Tabelas

Figura 1: Quadro de Síntese das Coleções..................................................................... 33


Figura 2: Quadro comparativo entre as coleções escolhidas para comporem o corpus de
pesquisa..................................................................................................................... 37 e 38
Figura 3: Porcentagem de gêneros Português na Ponta da Língua 7º ano EFII.............57
Figura 4: Porcentagem de esferas Português na Ponta da Língua 7º ano EFII............. 57
Figura 5: Porcentagem de gêneros Português na Ponta da Língua 9º ano EFII............ 58
Figura 6: Porcentagem de esferas Português na Ponta da Língua 9º ano EFII............. 58
Figura 7: Porcentagem de gêneros Português: Uma Proposta para o Letramento 7º ano
EFII.................................................................................................................................. 62
Figura 8: Porcentagem de esferas Português: Uma Proposta para o Letramento 7º ano
EFII.................................................................................................................................. 62
Figura 9: Porcentagem de gêneros Português: Uma Proposta para o Letramento 9º ano
EFII.................................................................................................................................. 63
Figura 10: Porcentagem de esferas Português: Uma Proposta para o Letramento 9º ano
EFII.................................................................................................................................. 63
Figura 11: Exemplo de exercício Português na Ponta da Língua 7º ano EFII...............74
Figura 12: Exemplo de exercício Português na Ponta da Língua 9º ano EFII...............81
Figura 13: Exemplo de contextualização da coletânea textual Português: Uma Proposta
para o Letramento 7º ano EFII........................................................................................ 89
Figura 14: Exemplo de exercício Português: Uma Proposta para o Letramento 7º ano
EFII................................................................................................................................. 90
Figura 15: Exemplo de contextualização da coletânea textual Português: Uma Proposta
para o Letramento 9º ano EFII....................................................................................... 96
Figura 16: Exemplo de exercício Português: Uma Proposta para o Letramento 9º ano
EFII..................................................................................................................................97

vi
SUMÁRIO
Introdução_____________________________________________________________ 9

Capítulo 1 – Leitura: um panorama geral____________________________________ 13

Capítulo 2 – Leitura situada: conceitos e perspectivas__________________________ 16

Capítulo 3 - Análise dos critérios de avaliação de leitura do PNLD/2008 de Língua


Portuguesa____________________________________________________________ 23

Capítulo 4 - Metodologia de recorte e geração dos dados: da escolha dos livros


didáticos______________________________________________________________ 32

4.1 – Português na Ponta da Língua_________________________________ 34

4.2 – Português: Uma Proposta para o Letramento______________________ 36

4.3 - Comparação entre as duas coleções: conclusões cruciais para a escolha do


corpus________________________________________________________________ 37

4.4 – Da escolha dos volumes dos LDPs______________________________ 38

Capítulo 5 – Análise dos Manuais do Professor_______________________________ 40

5.1 – Português na Ponta da Língua__________________________________ 40

5.1.1 – Prática de compreensão de textos escritos___________________ 42

5.1.2 – Orientações para o trabalho de leitura______________________ 42

5.1.2.1 – Contextualização e preparação____________________ 43

5.1.2.2 – Pesquisa_____________________________________ 43

5.1.2.3 – Vocabulário___________________________________ 44

5.1.2.4 – Análise textual_________________________________ 44

5.1.2.5 – Argumentação_________________________________ 44

5.1.2.6 – Leitura em voz alta_____________________________ 45

5.1.2.7 – Leitura silenciosa_______________________________45

5.2 – Português: Uma Proposta para o Letramento_______________________46

vii
5.2.1 – Preparação para a leitura________________________________ 51

5.2.2 – Leitura oral__________________________________________ 52

5.2.3 – Leitura silenciosa______________________________________ 52

5.2.4 – Interpretação oral______________________________________ 52

5.2.5 – Interpretação escrita____________________________________ 53

5.2.6 – Sugestões de leitura____________________________________ 53

Capítulo 6 – Análise das coletâneas textuais__________________________________55

6.1 – Português na Ponta da Língua__________________________________ 55

6.2 – Português: Uma Proposta para o Letramento______________________ 61

6.3 – Comparação das coletâneas das coleções_________________________ 66

Capítulo 7 – Análise dos exercícios de interpretação e compreensão de textos_______68

7.1 – Português na Ponta da Língua__________________________________ 68

7.1.1 - Análise geral do volume de 7º ano_________________________ 69

7.1.2 – Análise de uma atividade representativa do volume de 7º ano____73

7.1.3 - Análise geral do volume de 9º ano_________________________ 76

7.1.4 - Análise de uma atividade representativa do volume de 9º ano____80

7.2 – Português: Uma Proposta para o Letramento_______________________ 82

7.2.1 - Análise geral do volume de 7º ano__________________________82

7.2.2 - Análise de uma atividade representativa do volume de 7º ano____ 88

7.2.3 - Análise geral do volume de 9º ano__________________________92

7.2.4 - Análise de uma atividade representativa do volume de 9º ano____ 95

Considerações finais_____________________________________________________101

Referências Bibliográficas________________________________________________ 105

Anexos________________________________________________________________ 108

viii
Introdução

A leitura é parte essencial do ensino de Língua Portuguesa que, na maioria das


vezes, é realizado a partir de livros didáticos (doravante LDs) comprados (no caso das
escolas da rede privada) ou distribuídos pelo Governo Federal (no caso das escolas das
redes estaduais e municipais – mesmo naquelas em que as secretarias de educação
estaduais estão elaborando e distribuindo materiais didáticos próprios, como é o caso de
São Paulo1), por meio do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD)2, mantido pelo
Ministério da Educação.
Segundo Batista (2003, p. 53 - 54) o setor editorial do Brasil mantém “uma
relação de forte dependência para com o subsetor de livros didáticos”, já que dados
mostram que grande parte da indústria editorial está voltada, desde a década de 1990, para a
produção de LDs. O autor confirma este fato ao afirmar que, em 1997, os LDs
corresponderam a 58% do total de exemplares vendidos e, no ano seguinte, esse percentual
subiu para 64% do total. Em 2008, onze anos após estes dados, números do relatório da
pesquisa sobre Produção e Vendas do Setor Editorial Brasileiro3, encomendada pela
Câmara Brasileira do Livro (CBL) e pelo Sindicato Nacional dos Editores de Livros
(SNEL), mostram que no ano de 2008 a produção de LDPs correspondeu a mais de 50% da
produção editorial brasileira, mesmo com uma queda de quase 18% que, de acordo com o

1
De acordo com o site da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, em 2010, os alunos da rede
receberam material de uso pessoal (mochila, cadernos, lápis etc) e o Caderno do Aluno “(...) material didático
elaborado pela Secretaria e distribuído às escolas da rede com os conteúdos das matérias (...)”, que serão
substituídos por novos a cada bimestre e custaram R$ 77 milhões de reais. Disponível em
http://www.educacao.sp.gov.br/noticias_2010/2010_19_01_a.asp, acesso em 15/04/2010.
2
Segundo Batista, o Programa Nacional do Livro Didático, edição 2008, “é uma iniciativa do Ministério da
Educação e seus objetivos básicos são a aquisição e a distribuição, universal e gratuita, de livros didáticos
para os alunos das escolas públicas do ensino fundamental brasileiro. (...) A fim de assegurar a qualidade dos
livros a serem adquiridos, o Programa desenvolve, a partir de 1996, um processo de avaliação pedagógica das
obras nele inscritas (...)” (2003, p. 25-26).
3
Disponível em http://www.anl.org.br/web/pdf/pesquisa_setor_livreiro/relatorio_FIPE_2008.pdf. Acesso em
23/04/2010.

9
relatório, deveu-se a “à oscilação verificada nas compras governamentais, o que é
característico desse segmento de mercado, pois suas decisões de compra pautam-se por
critérios próprios à administração pública e aos programas geridos pelo governo”
(Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas - FIPE, 2008, p. 5). Em 2008, 18.081 títulos
de LDs foram editados e 177.553.165 exemplares foram vendidos em todo o país, incluindo
obras dedicadas à Educação Infantil, Ensino Fundamental I e II e Ensino Médio.
Segundo Bunzen (2009), no início da década de 80 surgiu a imagem do professor
como tecnólogo e passivo em relação ao LD, já que a ideia que se tinha era a de que o
docente não sabia o que fazer em sala de aula e, por isso, utilizava “modismos
metodológicos, como os livros didáticos e manuais pré-programados” (SILVA, 2000 apud
BUNZEN, 2009, p. 200). Assim, a responsabilidade de preparar a aula, organizar os
conteúdos e didatizá-los ficou a cargo do autor do LD e não do professor.
No entanto, acreditamos que o docente é o maior responsável pela construção do
seu projeto didático e, assim sendo, ele deve apreciar valorativamente e responder
ativamente (conceitos bakhtinianos que desenvolveremos no 2º capítulo) aos recursos
didáticos disponíveis e isso seria uma atividade autoral, como afirma Bunzen (2009, p.
200). O autor ainda ressalta que alunos e professores não são consumidores passivos dos
LDs, pois “com base em seus interesses, crenças, valores, apreciação dos objetos de ensino
e dos sujeitos aprendizes, observamos um processo de diálogo – o que não exclui o conflito
– entre projetos didáticos autorais” (op.cit, p. 202).
Portanto, tendo em mente o papel do LD em sala de aula e a importância de um bom
ensino de leitura, objetivamos estudar, no campo da Linguística Aplicada, o modo de se
abordar a leitura nas coletâneas textuais e nos exercícios de interpretação de dois livros
didáticos de Língua Portuguesa (LDPs). São metas gerais do trabalho analisar se os textos
que compõem as coletâneas são contextualizados; se os LDPs, através dos Manuais do
Professor, orientam o docente nessa direção e, se sim, como o fazem; analisar se os
exercícios de interpretação textual desenvolvem a “atitude responsiva ativa” (BAKHTIN,
1997 [1979]) verificando assim aspectos importantes para a formação do aluno leitor.
As perguntas de pesquisa que orientam este trabalho são:

10
1. Os textos que compõem as coletâneas dos LDPs analisados são tratados
discursivamente pelos respectivos autores, isto é, são contextualizados? Se
sim, de que maneira isso é feito?
2. De que forma o uso situado é abordado? A leitura é trabalhada, de forma
situada, pelos LDPs através dos exercícios de compreensão e interpretação?
O que eles buscam desenvolver?
3. Como a postura didática dos LDPs referente à leitura guia o trabalho do
professor nas aulas de leitura, compreensão e interpretação de textos?
Os LDPs foram escolhidos através da leitura das resenhas presentes no Guia do
Livro Didático PNLD 20084 que é baseado nos critérios de avaliação de Língua Portuguesa
do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD). Os LDPs selecionados são Português
na Ponta da Língua escrito por Lino de Albergaria, Márcia Fernandes e Rita Espeschit,
publicado pela Quinteto Editorial e Português: Uma Proposta para o Letramento de Magda
Soares, lançado pela Editora Moderna, ambos destinados aos 7º e 9ª anos.
O primeiro livro mencionado recebeu uma avaliação positiva no eixo da leitura,
pois apresenta uma tendência metodológica de situar os textos; o segundo livro citado, por
sua vez, na resenha é avaliado positivamente neste aspecto, mas o Quadro Geral das
Coleções (BRASIL, 2007, p. 24) o coloca de maneira diferente, como explicaremos mais
adiante. Isto gerou dúvidas e, para nos certificarmos, escolhemos o segundo livro citado.
Optamos por LDPs de 7º e 9º anos do Ensino Fundamental II para termos uma noção de
como o ensino de leitura é realizado no início e no final deste ciclo escolar.
Para responder essas questões, a presente monografia se apresenta da seguinte
maneira: o 1º capítulo é dedicado ao aprofundamento teórico sobre a leitura e seu ensino no
Brasil; no 2º explicamos mais profundamente, baseadas em Bakhtin e seu círculo, o que
chamamos de leitura situada e o que é a “atitude responsiva ativa” (BAKHTIN, 1997
[1979]); o 3º capítulo traz a análise dos critérios de avaliação de leitura do PNLD 2008; no
4º explicamos a metodologia de recorte e geração dos dados; o 5º capítulo dedica-se à
análise dos Manuais do Professor, para verificarmos como os LDPs orientam o trabalho

4
Esta edição do Programa avaliou e distribuiu livros didáticos de 5ª a 8ª séries, atuais 6º e 9º anos do EFII.

11
docente; no 6º traçamos a análise quantitativa das coletâneas dos LDPs em termos dos
textos e gêneros que as compõem e de como os autores contextualizam estes textos e o 7º
capítulo dedica-se à análise qualitativa dos exercícios de interpretação. Em seguida as
discussões oriundas das análises anteriores são retomadas, tecendo-se as considerações
finais.

12
Capítulo 1 – Leitura: um panorama geral

Na Literatura encontramos várias concepções de leituras, cada uma com um


enfoque diferente que determina que tipo de leitor se quer formar através de determinadas
atividades. Segundo pesquisas realizadas por Kleiman (1989) sobre o ensino de leitura no
Ensino Fundamental, as concepções vigentes e, consequentemente, mais praticadas nas
escolas são as oriundas de modelos cognitivos. Elas estão baseadas no conceito
Estruturalista que concebe a língua como um código que deve ser decifrado pelo leitor por
meio de processos mentais como armazenamento, recuperação e transformação das
informações. De acordo com Jurado (2003), essess modelos sustentam que a mente humana
varie os modos de descrever esses processamentos quanto aos usos e as hierarquias de
regras explícitas que, por sua vez “determinam a manipulação de símbolos ou de maneira
serial ou de modo paralelo ou de modo circular, a que correspondem respectivamente os
modelos de leitura ascendente (bottom up), descendente (top down) e interativo”
(JURADO, 2003, p. 66).
A concepção ascendente de leitura visa, principalmente, desenvolver uma
capacidade decodificadora no leitor para se chegar à compreensão. A Linguística Estrutural
afirma que o ato de ler é um processo linear que se dá por meio da decodificação sonora da
palavra redigida. Kleiman (1989) comprova esse fato quando atesta que a leitura em voz
alta é muito utilizada em salas de aula nas quais o modelo bottom up é praticado; se o aluno
lê fluentemente, é sinal de que ele compreendeu o texto adequadamente. Porém, se o aluno
titubeia ou lê com dificuldade, isto pode ser interpretado como uma má compressão do
texto. Esse, por sua vez, é a chave da sua própria interpretação, já que essa concepção de
leitura prega que o leitor deve encontrar o significado real do texto dentro dele mesmo; o
uso do conhecimento prévio do aluno e o estabelecimento de relações com outras obras não
são permitidos. Não se fala aqui em contexto histórico e social, em enunciação, nem em
sujeito leitor; ou seja, as atividades de leituras baseadas no bottom up objetivam, apenas,
que o aluno decodifique o texto que, por sua vez, não é contextualizado já que isso não
importa para essa concepção de leitura.

13
Já o modelo top down visa um leitor que constrói o que lê lendo, alicerçado no
contexto linguístico em que a palavra aparece. Apesar de o leitor continuar sendo um mero
decodificador, podemos notar que há uma diferença entre esse modelo e o exposto acima: o
conhecimento prévio do leitor na concepção descendente de leitura é valorizado. Como
afirma Silva (2000, p. 41), “o texto apresenta então lacunas a serem preenchidas pelo leitor
com o seu conhecimento de mundo”. Apoiado nnesse aspecto, o leitor passa a ser capaz de
fazer inferências, hipóteses e seleções a fim compreender o significado do texto. O leitor,
anteriormente, era um agente passivo no ato de ler; agora ele se torna ativo, mas não tão
ativo a nosso ver, como explicaremos mais adiante. É bom salientarmos que o texto
continua autônomo, porém, como diz Jurado (2003, p. 68), “agora, em relação ao autor que
é completamente apagado”, o que impede uma real interlocução entre leitor e autor e,
consequentemente, o ato de ler.
O próximo modelo cognitivista que abordaremos é o interativo, que pressupõe o
uso combinado dos dois modelos descritos acima, porém, com um detalhe: o autor passa a
ser valorizado e, portanto, a ser visto pelo leitor. Nessa concepção, para que haja uma
compreensão textual eficaz, faz-se necessário que leitor e autor estejam, conforme Silva
(2000, p. 43), “sócio-historicamente determinados e ideologicamente constituídos”. Essa
perspectiva visa, através da interação entre leitor e autor, produzir sentidos utilizando as
diferentes estratégias dos modelos bottom up e top down. A decodificação, a localização
(scanning), os conhecimentos textuais, linguísticos e prévios, formulação de hipóteses e a
sua comprovação e a identificação das intenções do autor serão os instrumentos necessários
ao leitor para produzir sentidos.
Após esta análise, concluímos que esses modelos de leituras fazem parte do
processo do ensino/aprendizagem de leitura, mas aprender a decodificar as palavras, a
localizar frases e fazer inferências é apenas o início do aprendizado da leitura. Além do
mais, nenhuma destas concepções tem como objetivo contextualizar os textos e tratá-los
discursivamente, visando o desenvolvimento de uma “atitude responsiva ativa” (Bakhtin,
1997 [1929]) por parte do aluno. Quando dissemos acima que a concepção bottom up não
leva em consideração o conhecimento prévio do leitor, queremos dizer que suas
expectativas também não são consideradas e, assim, não há incentivo para que o aluno

14
pense e reflita sobre o que leu. Ao afirmamos que “o modelo top down visa um leitor que
constrói o que lê lendo, alicerçado no contexto linguístico em que a palavra aparece”,
comprovamos que o que esse modelo busca é apenas trabalhar a palavra dentro do texto e
não o texto como um todo dentro de um contexto, através de trechos parciais
descontextualizados, ou seja, “desprovidos das informações relevantes sobre o tempo e o
lugar em que foram escritos, textos incompletos” (KLEIMAN, 1999, p. 37). E em relação à
concepção interacionista, apenas de ele valorizar o conhecimento prévio do leitor e as
intenções do autor, por ser uma mescla dos outros dois, também não objetiva o leitor crítico
e reflexivo que almejamos.
O ensino de leitura também deve almejar desenvolver capacidades, estratégias e
práticas sociais utilizando gêneros do discurso e situando a prática da leitura em seu
contexto social, ou seja, os letramentos5. Salientamos o fato de que tanto os PCNs quanto o
PNLD 2008 fazem menção a esse conceito e apóiam o trabalho com os gêneros, sendo que
os PCNs são totalmente pautados na teoria dos Gêneros do Discurso bakhtiniana. Dois dos
critérios avaliativos contidos no Guia do Livro Didático 2008 em relação à coletânea
textual dos LDPs fazem menção aos gêneros do discurso e aos letramentos: “Os gêneros
discursivos são o mais diversos e variados possível, manifestando também diferentes
registros, estilos e variedades (sociais e regionais) do Português”; “A coletânea favorece o
letramento do aluno, e incentiva professores e alunos a buscarem textos e informações fora
dos limites do próprio LDP” (Guia do Livro Didático, 2008, p. 30).
Ao firmarmos esta posição, estamos alicerçados nos estudos linguísticos e
filosóficos de Mikhail Bakhtin, um grande pensador e teórico da linguagem do século XX
que, juntamente com o seu círculo, formulou pressupostos fundamentais que norteiam esta
pesquisa. A seguir, abordaremos o que achamos ser o ideal para formarmos um leitor
proficiente à luz de fundamentos bakhtinianos como a compreensão responsiva ativa, as
vozes, os temas, os gêneros do discurso e a apreciação de valor a fim de enunciarmos

5
Neste projeto, entendemos letramentos por “(...) o que as pessoas fazem com as habilidades de leitura e de
escrita, em um contexto específico (...) é o conjunto de práticas sociais relacionadas è leitura e à escrita em
que os indivíduos se envolvem em seu contexto social” (SOARES, 1998, p. 72 apud ROJO, 2002, p. 16).

15
como deve proceder um Livro Didático de Língua Portuguesa (doravante LDP) no
desenvolvimento da leitura na escola.

16
Capítulo 2 – Leitura situada: conceitos e perspectivas

Chamamos de situada a leitura contextualizada, na qual o aluno é ciente de tudo


o que envolve um texto com o objetivo de desenvolver no leitor o que Bakhtin (1997
[1979]) nomeia de “atitude responsiva ativa” através de atividades discursivas que
relacionem linguagem, história, sujeito e ideologia. Além disso, a leitura situada deve focar
também o letramento escolar, para o desenvolvimento de práticas letradas fora e dentro da
sala de aula. Nnesse momento, então, formula-se a seguinte questão: o que seria, na prática,
trabalhar a leitura situada a fim de desenvolver uma “atitude responsiva ativa” e os
letramentos?
Os PCNs que tratam do ensino da Língua Portuguesa dos 3º e 4º ciclos do
ensino fundamental, publicados em 1998, baseiam-se totalmente na teoria dos Gêneros do
Discurso bakhtiniana, com o objetivo de dar conta da interpretação e compreensão de textos
orais e escritos. Esta abordagem, no entanto, não refletiu de maneira satisfatória o discurso
de Bakhtin, já que os PCNs não assimilaram adequadamente sua teoria uma vez que, em
alguns momentos, a contradizem. Podemos encontrar um exemplo ao lermos que

Interagir pela linguagem significa realizar uma atividade discursiva:


dizer alguma coisa a alguém, de uma determinada forma, num
determinado contexto histórico e em determinadas circunstâncias de
interlocução. Isso significa que as escolhas feitas ao produzir um
discurso não são aleatórias - ainda que possam ser inconscientes
(...). (BRASIL, 1998, p. 20-21, ênfase adicionada).

Quando os PCNs afirmam que as escolhas realizadas ao produzirmos um


discurso podem ser inconscientes, não estão lidando com o conceito de sujeito bakhtiniano.
Para Bakhtin, o sujeito é sim consciente das escolhas que faz tanto que produz uma
compreensão responsiva ativa:
(o ouvinte ou o leitor) concorda ou discorda (total ou parcialmente),
completa, adapta, apronta-se para executar, etc., e esta atitude (...)
está em colaboração constante durante todo o processo de audição e
de compreensão desde o início do discurso; toda compreensão é
17
prenhe de resposta e, de uma forma ou de outra, forçosamente a
produz: o ouvinte torna-se locutor. (BAKHTIN, 1997 [1979], p.
290).

Como bem define Faraco (apud JURADO, 2003, p.75), a compreensão de


acordo com Bakhtin é uma atividade dialógica que visa, em nossa opinião, desenvolver um
leitor proficiente que encare o ato de leitura como uma situação de interlocução entre
leitor/autor/texto e que, através dela, (re) construa os sentidos do texto.
Podemos assim, concluir que os PCNs fizeram uma abordagem ineficiente dos
Gêneros do Discurso, já que, como afirma Pedrosa (2006, p. 30), “(os gêneros) destituídos
de sua contextualização sócio-histórica, terminaram gerando, deste modo, alguns
equívocos, uma vez que a definição de gênero é historicamente variável”. Apesar disso, a
intenção foi boa, pois de acordo com Rojo (2002), resultou em um avanço considerável nas
políticas linguísticas contra o iletrismo e em favor da cidadania crítica e consciente. A
autora relata que o objetivo dos PCNs é formar um leitor eficaz e competente da linguagem
escrita, “imerso em práticas sociais e em atividades de linguagem letradas, que, em
diferentes situações comunicativas, utiliza-se dos gêneros do discurso para construir ou
reconstruir os sentidos de textos que lê ou produz” (ROJO, 2002, p. 32).
Sendo assim o texto a unidade mais importante no ensino da língua materna, ele
deve ser entendido como um gênero do discurso ou como parte de um. Bakhtin (1997
[1979]) postulou que, em todas as esferas da atividade humana (familiar, escolar, jurídica,
acadêmica, jornalística etc) há relações com os usos da língua e, como os modos de
funcionamento internos das mesmas mudam historicamente, consequentemente os usos da
língua também se transformam. Estes, por sua vez, efetuam-se em forma de enunciados
(orais e escritos), concretos e não repetíveis que emanam dos integrantes das esferas.
Portanto, os enunciados refletem as condições e as finalidades das esferas, através de seu
conteúdo temático (sobre o qual nos aprofundaremos a seguir), de seu estilo e de sua
construção composicional. Então, segundo Bakhtin (1997 [1979], p. 262 ), “cada esfera de
utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados, sendo isso que
denominamos gêneros do discurso”.

18
Eles dividem-se entre primários (simples) que são aqueles oriundos de uma
“comunicação discursiva imediata” (Bakhtin, 1997 [1979], p. 263) e secundários
(complexos) que seriam o romance, a peça teatral, o discurso científico, o ideológico, entre
outros. A natureza do enunciado se dá na inter-relação entre os dois tipos de gêneros e no
processo histórico de formação dos mesmos e, saber dessa natureza é indispensável em
qualquer estudo.
De acordo com Rojo (2002), os gêneros do discurso apresentam três
dimensões essenciais e indissociáveis: os temas, a forma composicional e as marcas
linguísticas. Para nós, a principal delas são os temas que, segundo a autora, “são conteúdos
ideologicamente conformados que se tornam comunicáveis através do gênero” (Rojo 2002,
p. 37). Os temas e a significação são inseparáveis, já que Bakhtin (1992a [1929], p. 131)
denomina que “o sentido da enunciação completa” é o seu tema e ele deve ser único,
individual e não reiterável. O autor afirma que “ele se apresenta como a expressão de uma
situação histórica concreta que deu origem à enunciação” (Bakhtin, 1992a [1929], p. 131),
ou seja, o tema representa verdadeiramente a condição de produção do enunciado que, por
sua vez, determina também as outras duas dimensões do gênero. Nenhum gênero ou texto
pode ser compreendido se não tomarmos parte de sua condição de produção. Assim, o tema
não é determinado apenas pelas formas linguísticas que o compõem, mas também pelos
elementos não verbais da situação. Bakhtin (1992a [1929], p. 132) afirma que se perdemos
esses elementos, estaremos “pouco aptos a compreender a enunciação como se
perdêssemos suas palavras mais importantes”. Apenas a enunciação tratada como
fenômeno histórico possui um tema. Para nós, esse aspecto é muito importante, pois reflete
o que pensamos ser a leitura situada, na qual o aluno é posto frente a frente com a condição
de produção do gênero, situando-o na leitura e tendo o texto como um fenômeno histórico,
social e linguístico já que, para o autor, a linguagem é um fenômeno social e histórico e,
por isso mesmo, ideológico.
O tema pode ser chamado de ato ideológico, pois carrega um conjunto de
significações oriundas de sua passagem por diversas esferas. Pode-se dizer que o tema é
composto por signos e estes, por sua vez, são ideológicos. Se o tema expressa uma situação
histórica como dissemos acima, como o signo linguístico reflete e refrata (deforma) a

19
realidade? A língua muda, seus significantes mudam porque, justamente, os temas mudam
e, a reflexão e a refração da realidade também se transformam porque a língua precisa
refletir e refratar a nova realidade. Para Bakhtin, uma mudança de significante que tem um
deslocamento desse tipo gera a seguinte pergunta: o que mudou nas relações sociais que
permitiu a emergência de outro tema?
Isto pode ser trabalhado com os alunos através de um texto ou gênero que
aborde um assunto que sofreu mudanças de valores de acordo com o passar dos anos, como
por exemplo, a questão do namorar e do “ficar”. O escritor Ivan Ângelo publicou na revista
“Veja São Paulo” (da qual é colaborador a cada quinze dias) em 20 de junho de 2007 uma
crônica chamada “Balada dos homens antigos” na qual relembra os namoros de
antigamente. O autor revive todo o ritual de “paquera” daquela época: os rapazes e moças
se vestiam elegantemente apenas para passearem na praça onde se olhavam e conversavam
timidamente; o casamento era para toda a vida, o amor do homem era somente para uma
mulher (e vice-e-versa) e sexo era feito com amor e não somente por fazer etc. Lidar com
este assunto com os alunos seria muito proveitoso, pois se trata de um tema da realidade
deles que retrata a mudança de valores ocorrida com o passar do tempo. Debater o porquê
que isto ocorreu, o que mudou nas relações familiares e sociais de uma maneira geral que
acarretou nessa transformação de comportamento etc. Também é interessante ler e debater
as cartas enviadas pelos leitores da revista na semana seguinte à publicação desta crônica,
pois, a maioria foi escrita por pessoas mais velhas que sentem saudades desses velhos
tempos e criticam o “ficar” dos jovens de hoje em dia. As perguntas de interpretação podem
também focar esta discussão e provocar uma reflexão nos alunos ao questionar a opinião
deles.
Podemos concluir que não existe sentido sem tema e vice-e-versa. A
significação sem o tema não passa de ser apenas um potencial, segundo Bakhtin (1992a
[1929]) e não uma real capacidade da língua. O trabalho de compreensão, de acordo com o
autor, pode objetivar apenas a significação ou, ir mais além e ter como meta o tema. Se o
leitor optar por este último, ele irá estudar a “significação contextual” (Bakhtin, 1992a
[1929], p. 134) de um gênero ou texto em condições enunciativas completas. Somente
através da compreensão responsiva ativa podemos apreender o tema de um enunciado. De

20
acordo com Bakhtin (1992a [1929], p. 135), “a compreensão é uma forma de diálogo”;
assim, o aluno ciente da situação de produção de um enunciado, que o trata como fenômeno
histórico e social e que responde ativamente a ele é um leitor situado que desenvolve uma
leitura discursiva do gênero ou do texto. Portanto, os LDPs devem guiar o trabalho do
professor e o aprendizado dos alunos para o desenvolvimento da leitura crítica através da
ótica do gênero como um fenômeno histórico e social. Se o autor do LDP não o fizer, não
estará objetivando a leitura situada. Isto pode ser realizado na abordagem textual e nas
questões de compreensão.
Volochínov (1992a [1929] apud ROJO, 2002), estudioso integrante do Círculo
de Bakhtin, ressalta que as três dimensões dos gêneros do discurso também são
determinadas pela apreciação de valor (ou valorativa) do locutor ou do escritor a respeito
dos temas e dos ouvintes ou leitores do seu discurso. Assim, o autor afirma que toda
enunciação é determinada pelas suas reais condições de produção e, acima e antes de tudo
pela sua situação social mais imediata que, por sua vez, também determina a entoação
expressiva que, por outro lado, é onde o tema se realiza.
Pode-se dizer que cada autor possui sua apreciação de valor e sua entoação
expressiva específicas que são determinadas pela situação social imediata na qual se produz
o gênero ou o texto. No momento em que falamos ou escrevemos, isto é, momento da
interação, fazemos vários julgamentos de valor de acordo com o contexto no qual estamos
inseridos e aí se inicia um confronto de entoações e de visões de mundo. Entrar nesse
embate valorativo é responder ativamente ao que ouvimos e ao o que lemos:

“Na vida agimos assim, julgando-nos do ponto de vista dos outros,


tentando compreender, levar em conta o que é transcendente à nossa
própria consciência: assim levamos em conta o valor conferido ao
nosso aspecto em função da impressão que ele pode causar em
outrem [...]” (Bakhtin/Volochínov, 1992a [1929], p. 35-36).

A apreciação se revela pela entoação e, como de acordo com Bakhtin (1992


a [1929]) o signo é ideológico, ele se reveste de valoração. Assim, podemos concluir que
nenhum discurso é neutro de ideologia. Toda e qualquer palavra é 100% ideológica e
também atravessa todas essas relações e se espalha, penetra em todas as relações humanas.

21
A palavra é tecida por milhões de fios ideológicos e serve de trama à todas relações sociais.
Ela é o indicador mais sensível de todas as mudanças sociais. No âmbito da leitura situada,
é importante o aluno reconhecer a apreciação valorativa do autor para se chegar ao tema do
enunciado e desenvolver esse embate valorativo com o intuito de responder ativamente ao
texto.
Já que nenhum discurso é neutro, inferimos que dentro de um texto há
elementos não originais, ou seja, que não são exclusivos do autor e, como a compreensão é
dialógica, o aluno leitor deve saber que, inseridos em um texto há outros texto, outros
discursos. Segundo Bakhtin (1992a [1929]), o locutor não é o primeiro que rompe com o
silêncio de um mundo que não fala e, então pressupomos a existência de enunciados
anteriores, os nomeados já-ditos ou interdiscursos, com os quais o próprio enunciado se
vincula, se comunica. Como diria Bakhtin (1992a [1929], p. 272 ), “cada enunciado é um
elo na corrente complexamente organizada de outros enunciados”, que possibilita que
façamos (re) significações.
Os já-ditos se constituem no que o autor chama de vozes: um discurso é
composto por uma teia de vozes oriundas de outros discursos. Ao ler e ao ouvir, o sujeito
recebe muitas vozes sociais que não devem ser apenas decifradas, como bem diz Jurado
(2003), mas sim reelaboradas como afirma Marques (2001), já que “o ser, refletido no
signo, não apenas nele se reflete, mas também se refrata” (Bakhtin/Volochínov, 1992a
[1929], p.46 ). O aluno também deve estar ciente das vozes que compõem o texto estudado
e produzir sentidos a partir dos conhecimentos adquiridos através dos já-ditos e da leitura
do próprio autor do texto.
Ao final desta exposição dos conceitos bakhtinianos que nos interessam e
que justificam o que pensamos, podemos concluir que realizar um trabalho de leitura
situada em sala de aula não é impossível. O professor deve utilizar-se do conhecimento
prévio de seus alunos e proporcionar a eles uma verdadeira interação com os textos. O
LDP, ao expor um texto, deve situá-lo historicamente e socialmente e guiar o trabalho do
professor a fim de mostrar aos alunos todos estes conceitos sobre os quais falamos acima.
Segundo Orlandi (1999), há duas formas de repetição: a empírica ou efeito papagaio, na
qual não há deslocamento do sujeito e do dizer, e a histórica, na qual existe este

22
deslocamento. Ao usarmos qualquer material didático, devemos visar desenvolver no aluno
a repetição histórica na qual o sujeito se desloca entre os textos e forma a sua própria
opinião através de atividades discurvivas que podem ser formuladas no formato de
pergunta, já que os questionários são muito utilizados em todos os LDPs. No entanto,
simplesmente perguntar se o aluno gostou ou não do texto, concordou ou não com o autor,
não leva a uma atitude responsiva ativa; agora, se o LDP questiona o porquê da resposta do
aluno, este será levado a refletir e a argumentar para comprovar sua opinião. Fazer com que
o aluno estabeleça conexões, relações entre textos ou outros materiais, também o fazem
pensar de maneira crítica. Na análise qualitativa das atividades de compreensão textual do
corpus, mostraremos como elas podem levar ao desenvolvimento da leitura situada e da
atitude responsiva ativa.

23
Capítulo 3 - Análise dos critérios de avaliação de leitura do PNLD/2008
de Língua Portuguesa

Neste capítulo analisaremos os critérios avaliativos sobre leitura do PNLD de


Língua Portuguesa 2008 para que possamos compreender a visão de leitura do mesmo e
como ela se dá na prática já que, com certeza, os LDPs recomendados pelo Guia 2008
fazem jus ao que ele diz sobre este tema. Como já abordamos anteriormente, buscamos
desenvolver e praticar a chamada “leitura situada”, assim, analisaremos dois LDPs
resenhados e avaliados pelo PNLD com o intuito de verificarmos se algum deles faz uso da
leitura situada; para tanto, lemos todas as resenhas do Guia e a ficha de avaliação anexa ao
mesmo que é a mesma que foi respondida pelos avaliadores do PNLD 2008 para melhor
escolhermos nosso corpus de pesquisa.
Já na introdução, os autores do Guia justificam que seus princípios e seus
critérios baseiam-se não só nos PCNs como também na Definição de Princípios e Critérios
para a Avaliação de Livros Didáticos para o PNLD 2008, que foi formulada por vários
pesquisadores de diversas Universidades do país no Centro de Alfabetização, Leitura e
Escrita da Universidade Federal de Minas Gerais (CEALE – UFMG) que, por sua vez,
responde à Secretaria de Educação Básica do Ministério da Educação. A leitura, no PNLD,
é parte integrante de um grande bloco de conteúdos curriculares básicos da área da
linguagem: leitura, produção de textos, linguagem oral e reflexão sobre linguagem e língua.
Segundo o Guia, o ensino da Língua Portuguesa no Ensino Fundamental II
deve ser pautado em cinco objetivos centrais: fazer com que os alunos se apropriem das
linguagens oral e escrita e as desenvolvam em situações complexas e diversas; obter dos
alunos fruição estética e desenvolver neles apreciação crítica da produção literária
brasileira; desenvolver atitudes, habilidades e competências para os alunos compreenderem
as variações linguísticas; fazer com que eles dominem as normas urbanas de prestígio e,
finalmente, praticar a análise e reflexão sobre língua e linguagem. O Guia também afirma
que as práticas de uso da linguagem (leitura, compreensão e produção de textos orais e
escritos) em situações contextualizadas de uso devem ser prioridades nos LDPs.
24
Neste ponto, já podemos ter uma ideia da visão de leitura do Guia e que,
felizmente, encaixa-se no que pensamos ser o ideal para o ensino da mesma:
primeiramente, quando os autores falam em “apreciação crítica” acreditamos que eles
estejam se referindo ao que Bakhtin e Volochínov (1992a [1929]) nomearam de apreciação
valorativa, na qual o leitor julga e aprecia valorativamente um texto e o responde
ativamente, entrando em um processo de interação dialógica com o autor e com o próprio
texto. Já no momento em que os autores falam sobre situações contextualizadas de uso eles
também estão falando de leitura situada, já que o ato de ler deve ser contextualizado
socialmente a fim de desenvolvermos práticas de letramentos nos jovens.
Na parte em que aborda as diferentes metodologias de ensino, o Guia deixa
claro que, seja qual for o método escolhido pelos autores dos LDPs, deve-se atender a cinco
requisitos metodológicos básicos. Dentre eles, o que mais importa para nós é o que diz que
o LDP “deve mobilizar e desenvolver o maior número possível das capacidades básicas do
pensamento autônomo e crítico” (BRASIL/MEC, 2008, p. 13): compreensão, memorização,
análise, síntese, formulação de hipóteses, argumentação e planejamento. A nosso ver, todas
estas capacidades compõem um aluno crítico e proficiente, independente e que entenda o
processo de leitura como algo ativo e não passivo.
O trabalho de leitura em um LDP se dá, basicamente, através da coletânea
textual e dos exercícios de interpretação e compreensão de textos. Sobre o primeiro, o Guia
coloca os seguintes critérios: deve haver a máxima qualidade possível e que os textos
devem representar o que circula socialmente, além de respeitar a faixa etária dos educandos
e de proporcionar experiências de leitura significativas. Quanto aos textos literários, eles
devem estar significativamente presentes e toda a coletânea deve favorecer os letramentos
dos alunos e incentivar professores e alunos a buscarem novos textos, fora do LDP. Os
autores também afirmam que a coletânea deve proporcionar aos professores uma
diversidade de estratégias para se lidar com textos, tanto na leitura quanto na produção
textual e que seus temas contribuam para a formação dos alunos como cidadãos.
De acordo com o Guia, as atividades de exploração de textos tem como meta
desenvolver um leitor proficiente. Portanto, só se constituem como tais se seguirem os
seguintes critérios: encarem o ato de leitura como uma efetiva situação de interlocução

25
entre autor, leitor e texto (não se restringindo à localização de informações),
contextualizando a prática de leitura socialmente; colaborem para que o aluno consiga
reconstruir o sentido do texto através da discursividade; explorem os aspectos discursivos e
linguísticos dos textos; solicitem dos alunos suas apreciações valorativas de forma a
contribuir na formação do leitor crítico e que propiciem, através de rigorosa seleção de
textos literários, a formação do leitor literário. Além disso, os enunciados das questões
devem ser claros para o aluno e devem buscar desenvolver diversas capacidades e
competências em leitura.
A nosso ver, nessas diretrizes há a coexistência de diferentes concepções de
leitura já que acreditamos que todas façam parte de um longo processo de
ensino/aprendizagem. Apesar de pensarmos que os modelos cognitivos ascendente (bottom
up), descendente (top down) e interativo não atinjam plenamente o objetivo de desenvolver
a leitura crítica e proficiente, eles são o início do processo, pois desenvolvem capacidades e
habilidades primárias necessárias, como por exemplo, localização, seleção, formulação de
hipóteses, comprovações e inferências etc. A partir do momento em que o aluno consiga
lidar com estas práticas, ele está pronto para ir além e busca realizar uma verdadeira
interação com o autor e o texto, para que através dela se faça possível a (re) construção dos
sentidos. Na verdade, uma diretriz é consequência da outra, pois só se tem uma apreciação
de valor se houver uma (re) construção dos sentidos através da exploração de aspectos
discursivos (como o tema, as condições de produção e os interdiscursos, por exemplo) e
linguísticos e uma interação dialógica com o autor e seu texto. Além disso, não podemos
nos esquecer de que todo este processo deve estar contextualizado política, histórica e
ideologicamente.
Porém, devemos nos ater ao fato de que os idealizadores do PNLD permitem
que os autores dos LDPs utilizem a metodologia que julgarem adequadas, desde que
cumpram os cinco requisitos metodológicos descritos anteriormente. Então, pensamos que
não podemos concluir com total certeza que o PNLD utiliza determinadas teorias de leitura
ao enumerar seus objetivos neste quesito. Podemos apenas inferir, baseados em nossos
estudos.

26
Ao avaliar os LDPs aprovados, o PNLD detecta quatro principais tendências
metodológicas: vivência, transmissão, construção ou reflexão e uso situado. A primeira
consiste na ideia de que só se aprende algo vivenciando-o, como por exemplo, só se
aprende a ler lendo. Em se tratando de leitura, podemos dizer que esta tendência
corresponde ao modelo top down, já que este visa um leitor que construa o que lê lendo,
apoiando-se no contexto linguístico em que a palavra surge. A transmissão se dá pela
assimilação de conteúdo pelo aluno através de uma organização lógica feita pelo professor;
de acordo com os autores do Guia, este é o caso do ensino da gramática normativa no qual
há a definição dos conceitos, seguida de exemplos e de exercícios de aplicação, ou vice-e-
versa, já que muitos LDPs estão exemplificando os conceitos gramaticais a partir de um
dado, primeiramente, e depois os explicam e aplicam exercícios. A construção ou reflexão
requer, primeiramente, uma reflexão sobre o conteúdo e posteriormente uma produção de
inferências sobre o mesmo baseadas nas explicações do docente ou do próprio LDP ou
ainda de ambos, o que seria o ideal.
O uso situado, por sua vez, é aquele método no qual há um uso contextualizado
daquilo que se está aprendendo, por exemplo, aprender a formular uma propaganda
inserindo o aprendiz neste contexto. Como já dissemos no 3º capítulo, os PCNs basearam-
se totalmente na teoria dos Gêneros do Discurso bakhtiniana e isso refletiu na organização
dos LDPs em torno de eixos temáticos, isto é, cada unidade, capítulo ou módulo dos LDPs
é dedicado a um tema e neles o aluno é apresentado a vários gêneros que tenham a ver com
o tema. Podemos constatar este dado ao lermos que 75% dos livros resenhados organizam-
se em temas gerais (meio ambiente, educação, saúde, sociedade etc) e em temas associados
a gêneros nos quais os capítulos associam um assunto a um gênero, como por exemplo,
“crises existenciais dos adolescentes” com diário ou carta (BRASIL/MEC, 2008, p. 22).
Este dado corrobora o que Bezerra (2005) afirma quando diz que “há uma tendência em
estruturar-se as lições em torno de temas sociais (...), do interesse da faixa etária do público
a que de destinam os livros (família, animais de estimação, amor, esporte, mistério,
aventura, viagem) (...)” (BEZERRA, 2005, p. 40). A autora ainda ressalta que este é um
fenômeno recente, pois os LDPs mais antigos se restringiam a um texto principal e dois ou
três complementares (quando havia) e que, a partir da década de 90, os autores passaram a

27
abordar um tema “com uma coletânea de textos de variados gêneros, predominantemente,
autênticos, ou seja, não escritos com finalidades didáticas, mas com uso constante na nossa
sociedade letrada” (BEZERRA, 2005, p. 40). E são justamente estes textos, os das
coletâneas, que pensamos que devem ser contextualizados e situados pelo LDP, já que a
maioria deles não foi escrita, inicialmente, para fins didáticos e sim, foi “transportada” para
o LDP e assumiu, assim, uma nova função. Por exemplo, quando uma notícia é posta no
LDP, normalmente é requisitado do aluno uma leitura diferente da qual ele faria se lesse a
notícia do jornal de origem e isso deve ser explicado a ele. Verificaremos, no 7º capítulo, se
as atividades propostas pelos LDPs tendem a desenvolver uma leitura realmente discursiva
do gênero ou apenas “estrutural”, na qual somente a organização, a estruturação e as partes
constitutivas do mesmo são valorizadas, ou seja, se os LDPs propõem leituras “técnicas”.
Há também aqueles LDPs que se organizam em torno de projetos ligados à
gênero, nos quais cada capítulo, unidade ou módulo é dedicado a um determinado gênero e
tem como função explorá-lo o máximo possível. No resumo da verificação destas
metodologias nos LDPs, o Guia afirma que maioria dos aprovados (83,33%) recorre à
construção/reflexão principalmente no que diz respeito à interpretação de textos; este
tratamento ora associa-se com a vivência, ora com o uso situado e, a conclusão dos autores
do Guia é que, nestes casos específicos,

A aprendizagem da leitura é tratada como uma questão de resgate de


contextos sociais relacionados a vivências de leitura, eventualmente com
alguma informação teórica sobre gênero, tipo de texto, mecanismos de
coesão e coerência etc. (BRASIL/MEC, 2008, p. 21)

No entanto, entendemos que os autores de LDPs não devem se prender a esta


metodologia deste modo e sim fazer com que os alunos respondam ativamente ao texto. Da
maneira como vem sendo feito, o professor apenas explica a utilidade daquele gênero, seu
ambiente de circulação, sua escrita específica e sua estrutura. Talvez isso seja suficiente em
relação a cartões postais, relatos de viagem, alguns tipos de cartas ou de diários etc, ou seja,
para gêneros simples que circulem em esferas sociais espontâneas como família, círculo de
amizade e relação íntima. Porém, ao que concerne os gêneros secundários que circulam em
esferas complexas de relações sociais (meios acadêmico e científico, esfera política,

28
imprensa, publicidade, universo literário) como um romance, um texto jornalístico
(reportagem, entrevista, editorial dentre outros), uma propaganda, uma letra de música
dentre demais exemplos, isso é muito pouco. Os alunos devem aprender a usar a língua e a
linguagem em diferentes contextos; assim sendo, professores e LDPs devem atentar os
aluno sobre em qual esfera aquele determinado gênero circula, que significações (temas)
ele carrega consigo, como ele reflete e refrata a realidade, que já-ditos há dentro dele etc.
Passemos, neste momento, à análise da ficha de avaliação6. O Guia 2008
denomina leitura como “leitura de textos escritos” (BRASIL/MEC, 2008, p. 37) e a
subdivide em coletânea e conhecimentos e capacidades que concorrem para a leitura de
textos escritos.
As primeiras três perguntas a respeito da coletânea objetivam saber se os textos
que a compõem representam o que a cultura da escrita oferece e exige do jovem nos dias de
hoje; se há textos multimodais (ou seja, textos verbais, não-verbais e que integram imagem
e texto verbal) e se os gêneros selecionados estão associados à esferas sociais relevantes
para o aluno, isto é, se a coletânea textual proporciona experiências reais de leitura que
exemplifiquem práticas de leitura e de letramento cotidianas que os jovens terão de fazer
em seu dia-a-dia, já que todos nós circulamos por diversas esferas que suportam gêneros
variados, inclusive os multimodais. Assim, este é um ponto positivo a nossa ver. Quanto
aos temas abordados pela coletânea, a ficha questiona se eles são pertinentes para a
formação do aluno; se são abordados sob diferentes pontos de vista e se comtemplam a
diversidade sócio-cultural do aluno (urbano, rural, regional etc), ou seja, se os temas são
relevantes e contribuem para a formação social e cidadã do aluno e se são expostos aos
jovens são perspectivas distintas, tanto em relação a opiniões pessoais e institucionais,
quanto à diversidade de contexto, já que cada aluno tem uma história de vida diferente e
deve conhecer outras histórias, visões e outros posicionamento. Até porque eles terão de
aprender a lidar com isso ao longo de suas vidas social e profissional.

6
Neste momento, não iremos listar todas as questões presentes na ficha e sim resumi-las e analisadas como
um todo. Para quem deseja ler toda a ficha, a mesma pode ser encontrada no Guia do Livro Didático de
Língua Portuguesa de 2008, disponível em http://www.sed.sc.gov.br/secretaria/documentos/cat_view/89-
ensino/165-livro-didatico/166-guia-pnld-2008. Acesso 31/08/2010.

29
Em relação à textualidade, a questão é sobre a autenticidade e originalidade dos
textos, isto é, se a maioria dos textos são originais e autênticos e se circulam socialmente.
As perguntas seguintes, a respeito das adaptações e fragmentos textuais, vêm para
complementar a questão anterior, pois questiona se os textos mantém o sentido, mesmo
sendo fragmentos e se trazem indicações de cortes ou adaptações e se são compatíveis com
as atividades dedicadas a eles. Uma outra questão, que diz respeito à apresentação de textos
verbais e não-verbais complementa estas questões anteriores, já que pergunta se a
apresentação dos textos é fiel ao suporte original, quando pertinente.
Portanto, estas quatro perguntas têm o intuito de verificar de onde os textos da
coletânea foram extraídos (se de autores, suportes ou gêneros que circulam socialmente) e
como eles são expostos e trabalhados nos LDPs, já que o modo de exibição dos mesmos
influi diretamente no olhar do aluno e direciona o processo de ensino/aprendizagem
realizado pelo autor através dos exercícios e da contextualização da coletânea. Por
exemplo, se o LDP traz uma notícia de jornal e a exibe como ela foi apresentada no jornal
de origem, o aluno terá contato com toda a estrutura característica do gênero, como a
diagramação, título, subtítulo, os chamados “olho” e “lead” e, além disso, se houver uma
contextualização sobre qual tipo de jornal ela é originária, as questões poderão abordar o
objetivo da publicação, o público-alvo etc. Porém, se apenas o texto da notícia for exibido,
o gênero foi descaracterizado e nada do que mencionamos acima poderá ser explorado.
Temos consciência de que, quando um gênero sai de seu suporte de origem e é
posto dentro de um LDP, ele mudou de função. A notícia que tinha como meta informar os
leitores sobre um acontecimento, por exemplo, passou a ter como finalidade auxiliar o
aluno a aprender a ler uma notícia ou até a estudá-la. E o ensino com gêneros, para ser bem
realizado, deve ser situado, abordando as condições de produção, os temas, as memórias
discursivas e as valorações como explicamos no capítulo três. Fazer isso, a nosso ver, é
valorizar o conteúdo posto na coletânea textual.
No que diz respeito à apresentação de textos verbais e não-verbais, a ficha
questiona os avaliadores se os LDPs trazem os créditos completos dos mesmos (autor,
fonte, título original, editora, local e data de publicação, páginas de referência etc) e
legendas, quando necessário, além da pergunta sobre se a apresentação é fiel ao suporte

30
original quando pertinente que já analisamos acima. Esta questão sobre os créditos tem
como intuito verificar, apenas, se os autores obedecem à lei de direitos autorais trazendo
suas fontes de pesquisa para a formação da coletânea textual.
Passemos agora à análise das questões que visam avaliar as atividades de leitura
propostas pelos LDPs. A primeira das dezesseis perguntas é crucial para todas as outras, já
que, a nosso ver, direciona toda a avaliação em relação à leitura: as atividades de leitura
propriciam o desenvolvimento da proficiência em leitura?. Esta resposta depende da visão
de proficiência em leitura que o avaliador tem; ele pode pensar que saber decodificar e
localizar é ser proficiente; também pode acreditar que se o aluno realiza as tarefas
cognitivas da leitura corretamente ele é um leitor proficiente. A nosso ver, ser proficiente
em leitura é ser capaz de ler um texto criticamente e reflexivamente, desenvolvendo a
“atitude responsiva ativa” (BAKHTIN, 1997 [1979]) a partir do conhecimento de tudo o
que ronda um texto, como foi explanado anteriormente.
Ainda nas questões que dizem respeito às atividades de leitura, duas delas se
voltam para os modelos cognitivos de leitura (bottom up, top down e interacionista) do qual
falamos anteriormente: elas visam verificar se as atividades exploram a localização, a
reprodução de informações explícitas nos textos e a produção de inferências. Há uma outra
pergunta que objetiva verificar se há exploração dos recursos linguísticos-textuais, mas sem
questionar como isto é feito pelo LDP já que o mesmo pode focar apenas aspectos
gramaticais ou analisar estes recursos de modo que o aluno veja como eles colaboram para
o entendimento do texto, pois expressam possíveis intenções do autor ao usar um
determinado adjetivo, substantivo ou verbo, por exemplo.
As demais doze questões, a nosso ver, representam uma intenção do PNLD
2008: que os LDPLs desenvolvam, através de suas atividades de leitura, uma leitura
discursiva. Afirmamos isto porque o restante das questões avaliativas da ficha buscam
verificar se as atividades de leitura trabalham aspectos discursivos, como por exemplo, se a
leitura é situada em seu universo de uso social; se o contexto de produção é resgatado; se
existe uma definição de um objetivo de leitura; se colaboram para uma (re)construção de
sentidos pelo leitor; se exploram aspectos discursivos como a polifonia, efeitos de sentidos,
pressupostos, implícitos e argumentação; propõem apreciações valorativas, estéticas,

31
críticas, éticas, políticas e religiosas e se as atividades demonstram encararar a leitura como
uma interlocução entre leitor/texto/autor. Assim, concluímos que o intuito do PNLD 2008,
em relação à leitura, é que ela seja tratada e trabalhada discursivamente, tanto em textos
verbais como em textos não-verbais, já que os multimodais devem estar presentes e devem
ser trabalhados como os demais. Perguntas sobre se há estabelecimento de relações entre
diversos textos e linguagem e se há compreensão das relações entre o verbal e o não-verbal
também estão na ficha, além de questões que visam verificar se o LDP propõe outras
leituras que ele não comporta e se apresenta conceitos corretos, o que é fundamental.
Finalmente, chegamos às questões que visam avaliar a abordagem dos textos
literários. A primeira pergunta desta parte da ficha objetiva verificar se o LDP contribui
para a formação do leitor literário, no entanto, acreditamos que esta deveria ser a última
pergunta deste bloco, pois ela depende das respostas dadas às outras seis questões que a
acompanham. Dizemos isto porque as demais perguntas tem como finalidade verificar se o
LDP respeita as convenções e o modo constitutivo de ler um texto literário (já que não
lemos um romance como lemos uma reportagem, por exemplo); se o texto ou excerto
estudado é situado em relação à obra a qual faz parte (e isto engloba, a nosso ver, situar o
aluno também em relação ao contexto de produção dessa obra e não apenas dizer que o
capítulo lido faz parte do livro Dom Casmurro de Machado de Assis, por exemplo); se há
estímulo para que o aluno leia a obra a qual o texto estudado faz parte ou até outras à ele
relacionadas; se contempla a singularidade discursiva, linguística e cultural do texto em
relação à epoca na qual foi escrita, ao estilo estético próprio do autor etc; se leva em
consideração a organização particular do texto e sua relevância na apreensão de sentidos
pelo aluno e se aproxima adequadamente o aluno ao padrão linguístico do texto quando
necessário. Se todas ou a maioria das respostas para essas perguntas forem positivas, aí sim
a primeira pergunta também pode ser respondida positivamente, pois todas elas
representam aspectos e modos de abordar o texto literário que colaboram para a formação
do leitor literário. Assim, concluímos a análise da ficha avaliativa no que concerne a leitura
de textos escritos.

32
Capítulo 4 - Metodologia de recorte e geração dos dados: da escolha dos
livros didáticos

Como dissemos anteriormente, a escolha do corpus desta pesquisa foi feita


através da leitura de todas as resenhas avaliativas do Guia acerca dos LDPs selecionados
por seus organizadores, coordenadores e pareceristas. Este material está dividido em cinco
blocos de acordo com a organização das coleções: o primeiro bloco é composto por
coleções organizadas em unidades temáticas (12 no total), o segundo é constituído por
coleções que se organizam em unidades temáticas e/ou dedicadas a gêneros ou tipos de
textos (2 no total), o terceiro bloco contém as coleções organizadas em tópicos linguísticos
(2 no total), o quarto bloco é de coleções organizadas em projetos temáticos (4 no total) e o
quinto e último bloco é composto por coleções organizadas em projetos relacionados a
gêneros (4 no total) (BRASIL/MEC, 2008, p.35). Além disso, nos baseamos no Quadro de
Síntese das Coleções (BRASIL/MEC, 2008, p. 24) que organiza as coleções pelos blocos
explicados acima e pelas quatro tendências metodológicas descritas no capítulo anterior:
vivência, transmissão, uso situado e construção/reflexão. Ao analisarmos este quadro, nos
atentamos mais às coleções que recorrem ao uso situado já que esta é a tendência que mais
nos interessa.

33
Figura 1 – Quadro Síntese das Coleções. Fonte: Brasil/MEC, 2008.

No decorrer deste processo elaboramos as seguintes perguntas a fim de


selecionarmos as coleções que fariam parte do nosso corpus de análise:
1. Quais LDPs recorrem ao uso situado no trabalho com o eixo da leitura e
quais LDPs que não o fazem?
2. Quais LDPs trazem inovações no trabalho com o eixo da leitura?
3. Quais LDPs mantém uma postura conservadora no trabalho com o eixo da
leitura?
4. Quais LDPs buscam desenvolver reflexões sobre a sua coletânea textual e
assim formar leitores críticos?

34
A partir destas questões, selecionamos duas coleções que podem respondê-las:
Português na Ponta da Língua escrito por Lino de Albergaria7, Márcia Fernandes8 e Rita
Espeschit9, publicado pela Quinteto Editorial (cod.138) e Português: Uma Proposta para o
Letramento de Magda Soares10, publicado pela Editora Moderna (cod.065). A seguir,
resumiremos o que o Guia nos diz sobre estes dois materiais de análise em relação ao
trabalho de ambos no eixo da leitura.

4.1 Português na Ponta da Língua.


Esta coleção encontra-se no primeiro bloco de resenhas, pois ela é organizada
em unidades temáticas, assim, cada unidade dos LDPs é organizada em torno de um tema
diferente por meio de diversos gêneros. No Quadro de Síntese das Coleções
(BRASIL/MEC, 2008, p. 24) consta que esta coleção recorre à duas tendências
metodológicas no trabalho com o eixo da leitura: construção/reflexão e uso situado, o que
já nos chamou a atenção, já que apenas a metade das coleções, em relação ao eixo da
leitura, recorre à tendência de uso situado, ou seja, doze de vinte e quadro coleções
analisadas e aprovadas.
Já no início de sua resenha (BRASIL/MEC, 2008, p. 89) nos deparamos com a
afirmação de que “a principal qualidade desta coleção está no trabalho com a leitura”, pois
segundo o Guia, em todos os volumes, diversos gêneros são explorados, o contexto
sociocultural no qual o texto foi escrito é levado em consideração, a interlocução
leitor/autor/texto é realizada e a intertextualidade e a produção de inferências são

7
Licenciado em Letras pela Universidade Federal de Minas Gerais e em Comunicação pela Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG); pós-graduado em Editoração pela Universidade de
Paris, Mestre e Doutor em Literatura de Língua Portuguesa na PUC-MG. Autor de vários livros infanto-
juvenis foi editor em São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte.
8
Licenciada em Letras pela Universidade Federal de Minas Gerais e Mestre em Estudos Linguísticos pela
mesma instituição; ex-professora universitária e atual docente da rede pública de Belo Horizonte.
9
Licenciada em Comunicação pela Universidade Federal de Minas Gerais, é autora de diversos livros infanto-
juvenis, muitos deles vencedores de prêmios como o Jabuti, João de Barro, Estado do Paraná, Cruz e Sousa
etc. Roteirista de vídeos infantis foi editora em Belo Horizonte e cronista do Jornal Hoje em Dia.
Atualmente reside no Canadá e atua como jornalista.
10
Licenciada em Letras, Doutora em Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais e professora da
mesma instituição.

35
promovidas. Estas informações estão contidas na síntese da resenha e, logo abaixo dela, há
o Quadro Esquemático no qual estão expressos os pontos fortes e baixos, um item de
destaque, a adequação ao tempo escolar e referências ao manual do professor; o trabalho
com a leitura e as consequentes possibilidades de experiências relevantes devido à
variedade de gêneros e temas são os pontos fortes dessa coleção de acordo com o Guia,
juntamente com a produção de textos escritos e orais.
A seguir, o Guia descreve rapidamente os LDPs desta coleção, dizendo que
cada um possui cinco unidades temáticas nas quais um tema é abordado de diferentes
maneiras e sob pontos de vista diferentes. As apresentações das seções dos mesmos nos
interessou, já que há uma delas dedicada à compreensão dos textos principais das unidades,
chamada De Olho no Texto e outra que tem como meta desenvolver uma reflexão crítica
sobre os textos lidos intitulada Indo Além.
Português na Ponta da Língua é avaliado positivamente quanto à sua proposta
pedagógica que, segundo o Guia, é “consistente e bem articulada” pois “se manifesta em
práticas reflexivas e contextualizadas de compreensão” (BRASIL/MEC, 2008, p. 90).
Também é dito que em todos os volumes as habilidades de leitura são bem exploradas,
como, por exemplo, a localização e o cruzamento de informações como a produção de
inferências e a compreensão global que propiciam a formação de bons leitores. Aspectos
como a intertextualidade e o contexto em que os textos que compõem a coletânea foram
escritos são bem trabalhados para o Guia. Em relação às atividades propostas, as de análise
textual visam estudar as características de cada gênero, destacando os seus aspectos
composicionais, estilísticos (na análise qualitativa verificaremos se isto é realmente feito,
como dissemos no capítulo anterior) e sua diagramação. A única ressalva do Guia é que
esta coleção não contempla amplamente textos literários e, quando os utiliza, não aborda a
singularidade especial que cada texto requer; cabe ao professor “situar o texto em relação
ao conjunto da obra a que pertence e promover a apreensão” por parte do aluno
(BRASIL/MEC, 2008, p.92). Isso se deve ao fato de que estes LDPs abordem outros
gêneros de suportes e contextos de circulação distintas, priorizando a esfera jornalística;
este dado vem de encontro ao que Bezerra (2005) afirma ao dizer que, entre os textos que

36
não são da esfera literária, os mais encontrados são os jornalísticos – fragmentados ou
integrais, presentes nos livros de todas as séries.
Estes são os aspectos que nos chamaram a atenção para Português na Ponta da
Língua ser escolhido para compor o nosso corpus de pesquisa, principalmente a existência
da seção Indo Além que visa desenvolver uma leitura crítica e reflexivas sobre os textos.

4.2 Português – Uma Proposta para o Letramento


Esta coleção está igualmente situada no bloco um de resenhas e, no Quadro de
Síntese das Coleções (BRASIL/MEC, 2008, p. 24), no eixo da leitura, a única tendência
metodológica presente é a construção/reflexão, fato que nos fez ler a sua resenha com mais
atenção por não haver o uso situado. Na síntese de sua resenha e em seu Quadro
Esquemático (BRASIL/MEC, 2008, p. 69), a boa articulação entre leitura, conhecimentos
linguísticos e produção de textos orais e escritos é tida como um dos pontos fortes desta
coleção; de acordo com o Guia, a coletânea textual é composta por diversos gêneros que
abordam temas relacionados aos jovens alunos aos quais a coleção é destinada. As
atividades de leitura e as discussões propostas sobre os temas abordados são avaliadas
positivamente porque investem consistentemente na formação de leitores e “cidadãos
críticos e participativos” (BRASIL/MEC, 2008, p. 69).
Isso encaixa-se à tendência metodológica a qual a autora do LDP recorre mas,
uma dúvida vem à tona quando lemos o destaque da coleção no Quadro Esquemático: a
língua é considerada como prática social de interação e os exercícios propostos
“contextualizam as atividades de ensino em situações de uso, com finalidades específicas,
interlocutores reais e textos de circulação no meio social” (BRASIL/MEC, 2008, p. 69); já
na análise, fica claro que o objetivo deste LDP é desenvolver o letramento nos alunos e,
para tanto, a coletânea é variada quanto aos gêneros (de acordo com a resenha, há poemas,
anúncios, entrevistas, fábulas, contos, provérbios, cartas, editoriais, textos legislativos,
músicas etc) buscando representar o universo cultural dos adolescentes. Como isto pode ser
realizado sem recorrer ao uso situado? Se falamos em letramento, estamos falando de
contextualização social e histórica.

37
O Guia ainda afirma que a grande maioria dos textos é original, autêntica e
integral e, antes de sua leitura há uma seção chamada Preparação para a Leitura que
adianta o tema da unidade e já pretende discutir seu contexto de produção; depois da
apresentação do texto principal, há a seção Interpretação Oral que visa explorar e debater
aspectos como público-alvo, autor, assunto, época, local, objetivos e suporte original. Isto
tudo é muito positivo, pois é isso que objetivamos quando falamos em leitura situada
porém, se isto é realizado, os textos são contextualizados, situados mas, por que isto não é
exposto no Quadro de Síntese de Coleções?
Segundo a resenha avaliativa, as demais seções dedicadas à interpretação
(Interpretação Oral e Escrita) levam o aluno a compreender globalmente o texto lido, a
comparar e a articular informações e a elaborar inferências.
Devido às dúvidas expostas acima, resolvemos verificar se realmente Português
– Uma Proposta para o Letramento desenvolve, no eixo da leitura, tudo o que afirma o
Guia. Apesar do que está escrito na resenha, continuamos pensando que esse processo não
pode ser realizado sem recorrer ao uso situado como método pedagógico e nos faz por em
xeque a elaboração do próprio Guia, já que ele mesmo se contradisse ao esquematizar as
tendências metodológicas diferentemente do que é relatado na resenha pelo avaliador.

4.3 Comparação entre as duas coleções: conclusões cruciais para a


escolha do corpus.
Em relação às notas dadas a cada uma das coleções pela base de dados do
PNLD 2008, podemos fazer a seguinte comparação entre elas:
Coletânea Leitura Abordagem Nota Final
Metodológica

Português na Ponta da Língua 12,5 13,91 12,95 85,07


(REC)11
Português: Uma Proposta para o 13,75 20,00 15,00 95,38 (RD)12
Letramento

11
REC é a sigla que denomina que a coleção foi recomendada pelo Guia 2008.
12
RD é a sigla que denomina que a coleção foi recomendada com distinção pelo Guia 2008. Além desta sigla
e a da descrita acima, havia ainda a RR (recomendada com ressalva) e a EX (excluída); este sistema foi
abolido pelo PNLD 2011, que afirma em seu Guia apenas quais coleções foram aprovadas.

38
Total = Total = Total = 15 Total = 100
15 20
Figura 2 - Quadro comparativo entre as coleções escolhidas para comporem o corpus de pesquisa

O que nos chamou a atenção foi o fato de que, na resenha avaliativa do Guia
2008, a coleção Português na Ponta da Língua teve apontada, como seu ponto forte, seu
trabalho com a leitura e, na base de dados, por sua vez, recebeu uma nota de 12,5 em um
total de 15. Já a coleção Português: Uma Proposta para o Letramento recebeu uma nota
melhor em comparação à outra não só neste quesito, mas em todos, contrariando a sua
própria resenha avaliativa (Brasil/MEC, 2008, p. 69) e o Quadro de Síntese das Coleções
(Brasil/MEC, 2008, p. 24). Por que as resenhas diferem tanto da base de dados?
Devido à estas e demais dúvidas expostas anteriormente, resolvemos verificar
se realmente Português: Uma Proposta para o Letramento desenvolve, no eixo da leitura,
tudo o que afirma o Guia 2008. Apesar do que está escrito na resenha, continuamos
pensando que esse processo não pode ser realizado sem recorrer ao uso situado como
método pedagógico e nos faz pôr em xeque a elaboração do próprio Guia 2008, já que ele
mesmo se contradisse ao esquematizar as tendências metodológicas diferentemente do que
é relatado na resenha pelo avaliador.

4.4 Da escolha dos volumes dos LDPs


Optamos por analisar quatro LDPs ao todo, ou seja, dois volumes de cada
coleção, sendo dois do 7º ano (3º ciclo do Ensino Fundamental II, antiga 6ª série) e os
outros dois do 9ª ano (4º ciclo do Ensino Fundamental II, antiga 8ª série) do Ensino
Fundamental II para obtermos uma visão de como é realizado o ensino de leitura no início e
no fim neste nível da educação brasileira. Cada ano possui objetivos distintos em relação ao
eixo da leitura, já que os alunos do 6º ano são recém saídos do Ensino Fundamental I; por
outro lado, os alunos do 9º ano estão se preparando para ingressarem no Ensino Médio no
qual aspectos como argumentação, reflexão, inferências e letramento crítico são
fundamentais. Sendo assim, entendemos que no 7º ano os alunos aprenderão a localizar e a
selecionar informações, saber mais sobre léxico e começarão a fazer inferências, a formular

39
hipóteses para desenvolverem cada vez mais a leitura crítica e no 9º ano essas habilidades
deverão estar bem mais desenvolvidas.
Segundo os PCNs,

a tarefa da escola, nestes ciclos, é, além de expandir os procedimentos


básicos aprendidos nos ciclos anteriores, explorar, principalmente no que
se refere ao texto literário, a funcionalidade dos elementos constitutivos
da obra e sua relação com seu contexto de criação. (BRASIL/MEC, 1998,
p. 71).

Porém, é bom ressaltarmos que pensamos que é importante explorar os elementos


constitutivos em relação ao seu contexto de criação em todo e qualquer gênero e não apenas quando
tratamos de gênero literário. Já ao que tange os materiais didáticos, os PCNs afirmam que “ formar
leitores é algo que requer condições favoráveis, não só em relação aos recursos materiais
disponíveis, mas, principalmente, em relação ao uso que se faz deles nas práticas de leitura”
(BRASIL/MEC, 1998, p. 71). Por este motivo que, no próximo capítulo, analisaremos os Manuais
do Professor de cada coleção, já que é neles em que os autores escrevem a maioria das orientações
que guiarão os professores no uso diário do LDP. Em suma, queremos saber como começa e como
termina o ensino de leitura no Ensino Fundamental II brasileiro e, por isso, compomos nosso corpus
de pesquisa desta maneira.

40
Capítulo 5 – Análise dos Manuais do Professor

Inicialmente, faremos uma análise dos Manuais do Professor (doravante MP) de


cada LDP para verificarmos o alicerce teórico de cada um e quais os objetivos didáticos em
relação ao trabalho com o eixo da leitura traçados pelos seus autores. É importante
salientarmos que, às vezes, não são os autores das coleções que escrevem os MPs de seus
LDPs (que são o mesmo para todos os volumes, alterando-se apenas as respostas corretas
ou esperadas dos exercícios e as orientações para cada uma das atividades de leitura,
produção escrita e/ou oral e análise linguística); quem os escreve, nestes casos, são
profissionais das editoras que estão envolvidos no processo de elaboração e edição da
coleção. As editoras afirmam que esse procedimento é realizado porque os autores não
possuem tempo hábil para redigirem os MPs. A nosso ver, este detalhe pode interferir na
interlocução entre professor/LDP/autor, já que não é ele quem escreve o MP, o que o
distancia do docente.
Portanto, analisaremos os MPs sabendo da existência desta possibilidade e
levando em consideração somente os aspectos referentes à coletânea textual e a didatização
da leitura, que é o foco deste trabalho.

5.1 Português na Ponta da Língua


Esta coleção tem seu MP na parte final dos LDPs, dividido em três seções:
Orientações para o professor, Bibliografia e as respostas dos exercícios propostos. Em
resumo, na primeira seção os autores dialogam diretamente com o professor, pois explicam
desde o porque do título (a palavra “ponta” remete às novas tecnologias, dando à
construção “ponta da língua” um sentido referente à tecnologias e não ao ato de decorar
conteúdos), passando pela questão dos PCNs (os autores afirmam terem se baseado nos
PCNs no que concerne a reflexão sobre a língua oral e escrita para formarem alunos que
exercerão sua cidadania em nossa sociedade letrada através da dominação da linguagem
(discursiva e cognitivamente) e isto se dará por meio da abordagem dos gêneros textuais) e

41
pela contextualização teórica (os autores se dizem adeptos da Análise do Discurso13 e da
Linguística Textual14).
Os autores também abordam os objetivos do ensino da Língua Portuguesa, que
segundo eles, “é desenvolver a competência comunicativa natural do aluno, ampliando a
sua capacidade de comunicação, expressão e integração social pela linguagem”
(ALBERGARIA; FERNANDES; ESPESCHIT, 2008, p. 06 do MP). Para isto acontecer, o
aluno deve aprender a interpretar diversos tipos de texto e a produzir textos adequados às
diferentes situações; além do mais, estas capacidades devem ser levadas para além dos
muros da escola, ou seja, para a vida do aluno. O trabalho com a leitura deve mirar o
desenvolvimento de estratégias e habilidades de compreensão de textos variados quanto aos
gêneros: interação com o texto, utilização dos conhecimentos prévios do aluno, os
interdiscursos contidos nos textos, leituras possíveis etc. Os autores afirmam que
consideram o desenvolvimento destas habilidades ajudam o aluno a escrever bons textos e a
utilizar “socialmente sua própria voz” (ALBERGARIA; FERNANDES; ESPESCHIT,
2008, p. 07 do MP).
Passaremos, neste momento, à análise dos aspectos referentes à didatização da
leitura pelo LDP15: prática de compreensão de textos escritos, orientações para o trabalho
com a leitura, contextualização e preparação, pesquisa, vocabulário, análise textual,
argumentação, leitura em voz alta e leitura silenciosa.

13
Segundo Orlandi (2006, p. 13), a Análise do Discurso se constitui da relação da linguística, da
psicanálise e do marxismo e trabalha a língua, a história e o sujeito de acordo com estas ciências, sem se
confundir com as mesmas, apenas tendo seu método e seus objetos próprios que tocam os bordos da
linguística, da psicanálise e do marxismo. “E os pressupõe na medida em que se constitui da relação de três
regiões científicas: a da teoria da ideologia, a da teoria da sintaxe e da enunciação, e a teoria do discurso
como determinação histórica dos processos de significação. Tudo isso atravessado por uma teoria
psicanalítica do sujeito”.
14
De acordo com Koch (2001), a Linguística Textual teve várias facetas ao longo de sua existência
como ciência, já que em seu início, seu foco era no estudo da organização global dos textos e, com o passar
do tempo, “assumem importância particular as questões de ordem sócio-cognitiva, que envolvem,
evidentemente, as da referenciação, inferenciação, acessamento ao conhecimento prévio etc.; o tratamento
da oralidade e da relação oralidade/escrita; e o estudo dos gêneros textuais, este agora conduzido sob outras
luzes  isto é, a partir da perspectiva bakhtiniana, voltando, assim, a questão dos gêneros a ocupar lugar de
destaque nas pesquisas sobre o texto e revelando-se hoje um terreno extremamente promissor”.
15
Analisaremos estes aspectos seguindo a ordem com que eles são abordados no MP e mantendo os
nomes que os autores dão para os tópicos que tratam destes aspectos.

42
5.1.1 Prática de compreensão de textos escritos
Primeiramente, o MP reconhece a importância da leitura em toda sociedade
letrada e admite que o LDP representa um apoio fundamental, principalmente para as
camadas menos favorecidas, no desenvolvimento da mesma. Há ainda a afirmação que o
aluno necessita de um LDP adequado, já que a leitura se desenvolve através da própria
leitura, o que nos remete à teoria descendente de leitura. Segundo os autores do MP, eles
desejam formar leitores capazes de interagir com o mundo através da leitura, respeitando
sua criatividade, mas lembrando-se sempre que tanto o leitor quanto o texto delimitam as
possibilidades de interpretação. Assim, o sentido constrói-se no espaço entre o leitor e o
texto.
Os textos que compõem a coletânea da coleção buscam propiciar reflexões
sobre os usos sociais da língua e, os critérios para escolha dos mesmos foram os seguintes:
no início de cada unidade apresentar textos menos complexos quanto ao vocabulário e a
organização; diversidade textual quanto às formas, ou seja, os autores do MP quiseram
inovar inserindo no LDP roteiros de filmes e textos formatados para a internet;
intertextualidade entre todos os textos da mesma unidade e entre todas as unidades; ênfase
nos temas transversais propostos pelos PCNs; recortes de textos que não prejudicassem a
interpretação; utilização de textos não cortados internamente; utilização de várias
linguagens e escolha de autores literários de diversas épocas.

5.1.2 Orientações para o trabalho de leitura


A primeira frase desta seção nos chamou muito a atenção, pois é exatamente
isso que pensamos: “A forma de tratar os textos é fundamental para que o livro didático não
se torne apenas um conjunto de textos sobre os quais alguns questionários devem ser
resolvidos” (ALBERGARIA; FERNANDES; ESPESCHIT, 2008, p.09 do MP). Ao
fazerem tal afirmação, acreditamos que os autores irão propor questões interpretativas que
explorem competências como argumentação, produção de inferências e reflexão e não
somente localização. A seguinte citação reforça mais ainda esta intenção: “O trabalho
proposto pretende o desenvolvimento de habilidades de leitura, as quais devem preparar o
aluno para ler autonomamente” (ALBERGARIA; FERNANDES; ESPESCHIT, 2008, p.09

43
do MP). Para os autores, ser autônomo é conduzir-se por conta própria ao ler, “construindo
seu conhecimento pessoal numa recriação crítica do que leu” (ALBERGARIA;
FERNANDES; ESPESCHIT, 2008, p.09 do MP). A seguir, os autores enumeram os
princípios básicos que seguiram ao tratarem os textos que compõem a coletânea textual da
coleção:

5.1.2.1 Contextualização e preparação


Logo de início, os autores dizem que o professor não deve se restringir aos
textos do LDP e sim, utilizar outros materiais para fazer com que os alunos continuem
lendo fora da escola. Para eles, todo e qualquer trabalho com leitura pressupõe preparação
antecipada e, em seu desenvolvimento, um dos objetivos é utilizar o conhecimento prévio
dos alunos (o que nos remete ao modelo interacionista de leitura e ao conceito de
apreciação valorativa bakhtiniana que se baseia no conhecimento prévio de mundo e na
memória discursiva do leitor e/ou ouvinte) para facilitar a geração de inferências e o
estabelecimento de relações entre o conhecimento construído através da leitura e aquele que
o aluno já possui. Para tanto, o professor pode e deve disponibilizar aos seus alunos outros
livros e outros tipos de materiais que tenham relação com o tema que o texto do LDP irá
abordar; ler estas outras fontes em voz alta, valorizando a entonação, fazer com que os
alunos as dramatizem e participem são algumas sugestões feitas pelos autores.
Atitudes como mostrar os dados bibliográficos do texto, sugerir e estimular a
leitura do livro quando se trata de um fragmento, pedir que os alunos pesquisem a
bibliografia do autor estudado e situar o texto no espaço e no tempo são outras atividades
que contextualizam os textos propostas pelos autores. Ao nosso ver, essas indicações
contemplam o que pensamos ser contextualização de um texto porém, na análise da
coletânea textual e dos exercícios propostos iremos verificar se isto realmente é feito pelos
autores ou se os mesmos deixam esta incumbência ao professor.

5.1.2.2 – Pesquisa
Incitar para que serve uma pesquisa, o quanto de conhecimento ela pode trazer
são alguns dos argumentos que o professor deve usar para estimular os alunos a

44
pesquisarem através da leitura, de acordo com os autores. Novamente, analisaremos se esta
iniciativa parte do LDP ou se ela foi posta no MP para ficar a cargo somente do docente.

5.1.2.3 Vocabulário
O vocabulário deve ser sempre um ponto de atenção para o professor, mesmo
quando o LDP não o trabalha em determinado texto. O docente precisa ensinar aos alunos
maneiras eficientes de se lidar com palavras novas ou desconhecidas, por exemplo, atribuir
sentido pelo contexto, usar o dicionário etc. Se levarmos em consideração o que está escrito
no MP, a impressão que dá é que este trabalho com o vocabulário é exclusivo do docente.
Iremos verificar se o LDP realmente procede desta forma ou se faz algo com a questão do
vocabulário, através de glossários e/ou perguntas que explorem este aspecto.

5.1.2.4 Análise Textual


Segundo o MP, esta coleção incentiva, na análise textual, a argumentação e o
posicionamento por parte dos alunos que devem se atentar ao fato de que as questões
propostas exigem habilidades diferentes como localização, respostas inferenciais, uso do
conhecimento prévio e postura pessoal. Na análise dos exercícios, iremos verificar se eles
exigem outras habilidades como reconhecer interdiscursos, refletir sobre as intenções do
autor, dentre outras coisas. Porém, ao nosso ver, isto só pode ser feito depois de se situar o
texto no tempo e no espaço.

5.1.2.5 Argumentação
De acordo com os autores, “a interação social por intermédio da língua se
caracteriza, fundamentalmente, pela argumentação” (ALBERGARIA; FERNANDES;
ESPESCHIT, 2008, p.10 do MP). Eles afirmam que, ao lermos ou ouvirmos alguma coisa,
avaliamos, julgamos e criticamos aquilo, o que nos remete ao conceito de apreciação de
valor de Bakhtin (1992a [1929]). Dando continuidade ao raciocínio, os autores dizem que
ao escrevermos ou falarmos, tentamos influenciar a opinião do outro e assim, fazer com que
ele concorde conosco. Esta afirmação nos faz lembrar de Foucault (1996) que afirma que,
dentro de todo e qualquer discurso há um desejo de poder sobre o outro, poder de

45
convencimento ou persuasão. Quando pronunciamos um discurso crítico sobre algum tema,
estamos querendo convencer o nosso interlocutor de que estamos corretos e assim
queremos “impor” o nosso poder sobre o outro. Isso já vem de muito tempo atrás, com o
surgimento da retórica. Esse processo não tem fim e demonstra o que Foucault chamava de
“relações de poder” do discurso. Isso vem ao encontro do que Bakhtin diz sobre signos
ideológicos, ou seja, nenhum discurso está livre de ideologia e, pensar o contrário já
constitui um ato ideológico.

5.1.2.6 Leitura em voz alta


De acordo com os autores, a leitura em voz alta é um instrumento valioso, pois
através dela o professor pode avaliar a proficiência de leitura de seus alunos, já que permite
que o professor perceba o que o aluno faz enquanto lê, como por exemplo, se ele possui
cacoetes (como mover a cabeça para acompanhar o texto ou fazê-lo com os dedos); o
docente também pode notar como o aluno lê: palavra por palavra, sem entonação,
ignorando a pontuação etc. Todavia, os autores alertam os professores que não se pode
expor um aluno à má atuação, pois este tipo de leitura não serve para corrigir os erros de
um leitor; também avisam que a leitura em voz alta não deve ser empregada de maneira
mecânica. Como dissemos anteriormente, acreditamos que ser proficiente em leitura é
refletir, é (re)construir sentidos criticamente ao ler um texto. Um aluno que possui
disfluência de fala, como a gagueira por exemplo, pode não ler com fluidez em voz alta,
mas pode e deve ler de maneira crítica e reflexiva. Portanto, pensamos que a leitura em voz
alta é um parâmetro muito raso para afirmar se um aluno é um leitor proficiente ou não.

5.1.2.7 Leitura silenciosa


Para os autores, a leitura em voz alta e a silenciosa devem estar equilibradas no
ensino de leitura, pois cada um tem sua função. Eles ainda afirmam que a compreensão
costuma ser mais eficiente quando é realizada através da leitura em silêncio. De acordo
com o MP, no momento da leitura silenciosa, o aluno deve fazer hipótese, previsões e
verificá-las no decorrer da leitura, localizar e identificar elementos importantes como
personagens, tempo e lugar da ação, identificar conectivos que expliquem as relações

46
internas do texto, notar detalhes fundamentais e confrontar o que foi lido com o seu prévio
conhecimento. Para nós, os autores desta coleção enfatizaram mais a leitura em voz alta do
que a silenciosa, pois a dispensaram mais espaço e importância, o que é raso, a nosso ver.

5.2 – Português – uma proposta para o letramento


A coleção elaborada por Magda Soares apresenta as sugestões e orientações
sobre a coletânea textual e os exercícios de interpretação de texto página a página e não no
final dos livros. De acordo com a autora, essa atitude tem como meta promover uma
interação entre ela e o leitor (o professor) no mesmo momento em que as atividades de
ensino são realizadas. No final do livro encontra-se o MP propriamente dito, que é dividido
em três partes: Fundamentos da Coleção, Atividades de Aprendizagem e Complementação
Bibliográfica. É importante ressaltar que, neste momento, nos dedicaremos à análise dos
aspectos que julgamos fundamentais para a nossa pesquisa.
Na primeira parte, Soares escreve sobre a fragmentação do EF que, segundo a
autora, ocorre desde a alfabetização, se reflete nos LDPs e contraria o conceito chave deste
nível de ensino, pois
(...) (a fragmentação do ensino Fundamental) fere os princípios de
construção progressiva e contínua das habilidades e conhecimento, e
dificulta a utilização das alternativas que a legislação educacional (...)
hoje oferece para que a escola opte entre formas diversas de organização
(...)(SOARES, 2002, p. 3 do MP).

A autora se diz a favor de uma organização que pressuponha continuidade e não


ruptura do processo de aprendizagem e, para tanto, elaborou unidades teórico-
metodológicas que fundamentam e orientam a aprendizagem progressiva, contínua e
integral. A seguir, Soares resume o conceito de letramento, já que este orienta toda a sua
coleção:
Letramento é o estado ou condição de quem não só sabe ler e escrever,
mas faz uso competente da leitura e da escrita nas práticas sociais que
envolvem a língua escrita, conjungando-as adequadamente com as
práticas sociais de interação oral. (SOARES, 2002, p. 4 do MP)

A autora deixa claro que não considera a língua um mero instrumento de


transmissão de mensagens e sim, como um processo de “inter-ação” no qual os sujeitos

47
constroem sentidos e significados, oral ou verbalmente; estes sentidos e significados são
constituídos de acordo com as relações que cada pessoa possui com a língua e com a
linguagem, com o tema sobre o qual se escreve ou fala, lê ou ouve, segundo seus
conhecimentos anteriores, atitudes e “pré-conceitos”. As relações entre os interlocutores, as
condições e o contexto nos quais eles interagem também contam neste processo. É isso que
Soares chama de discurso e de práticas discursivas constituídas “segundo as condições de
produção do discurso” (SOARES, 2002, p. 5 do MP). Podemos perceber aí traços
bakhtinianos, pois é nas esferas de atividade humana que o discurso se dá entre os sujeitos
e, o modo como isto ocorre define os sentidos e significações finais.
Neste ponto, a autora assume claramente que o objetivo desta coleção de LDPs
é ensinar Língua Portuguesa mirando o desenvolvimento dos letramentos nos alunos
através de práticas discursivas materializadas nos textos orais e escritos de diversos gêneros
presentes nos LDPs. As condições de produção seriam trabalhadas através da elaboração de
questões como “quem escreve ou quem está falando?”; “o que se está falando ou
escrevendo?”; “quem é meu público-alvo quando falo ou escrevo?”; “para que falo ou
escrevo?”; “quando e onde falo ou escrevo?”, dentre outras possíveis. Estas perguntas são
de fundamental importância tanto no ensino da leitura quanto da produção textual, pois
guiam o aluno e são capazes de estimulá-lo a ler ou escrever se estiveram relacionados com
assuntos e temas que tenham a ver com ele e com a comunidade onde vive.
Esta atitude deve ser tomada desde as séries iniciais nas aulas de leitura e
produção de texto para que os alunos desde cedo tenham ciência do que é preciso se
lembrar ao ler ou escrever um texto e para interpretá-lo e resignificá-lo melhor e escrevê-lo
da maneira mais eficiente. Se isto não for feito, os alunos certamente não verão motivo para
escrever ou ler: “Muitas vezes, eles (alunos) tiveram de produzir textos sem função
comunicativa durante a escolaridade inicial e, por acreditarem que escrever é uma chatice,
são mais resistentes” (Rojo, 2009). Apesar desta citação se referir, especificamente, à
produção de texto, acreditamos que vale igualmente para a questão da leitura, já que ela
também deve ter um planejamento e um objetivo interessante e com intuito comunicativo
para atrair o aluno a ler e, assim, envolvê-lo nesse processo. Muitas escolas requisitam
leitura de livros para os alunos apenas para aplicar provas ou fazê-los escrever resumos e

48
isto os desinteressa totalmente, já que o único objetivo da leitura é testá-la em uma
avaliação; pensamos que as escolas deveriam investir mais em outras atividades e em
outros gêneros, como por exemplo, debates e seminários, já que são opções que integram e
envolvem mais os estudantes, pois os dá oportunidade de se expressarem e de responderam
ativamente o que leram.
Acreditamos também que os textos publicados no meio digital (sites de diversos
tipos nos quais há a exibição de textos como de jornais, revistas e os portais que possuem
várias pessoas como colaboradoras; blogs etc) podem ser uma boa alternativa no momento
de circular textos entre os alunos, já que a maioria deles, sem dúvida, acessa a internet, lê e
até mantém uma página como um blog, por exemplo. Isso faz com que os educandos se
aproximem mais de outros gêneros como reportagens, artigos, entrevistas, depoimentos,
diário virtual dentre outros e desenvolvam assim múltiplos letramentos.
A seguir, Soares esclarece quais são os objetivos do ensino de Língua
Portuguesa em sua coleção. O primeiro seria promover “práticas de oralidade e de
letramento de forma integrada” (SOARES, 2002, p. 5 do MP) a fim de levar os alunos a
identificarem as relações entre o oral e o escrito. A segunda meta seria “desenvolver
habilidades de uso da língua escrita em situações discursivas” (SOARES, 2002, p. 5 do
MP) variadas nas quais ocorram motivação e objetivação em ler e escrever textos de
diferentes tipos, gêneros e funções, interlocutores e escritos em diferentes condições de
produção. O terceiro objetivo seria desenvolver habilidades para produzir e ouvir textos
orais e escritos em diferentes gêneros e com as mais variadas funções que dependem dos
interlocutores, das suas finalidades, o assunto em pauta, o contexto dentre outras. O quarto
objetivo consiste em criar situações que propiciem aos alunos oportunidades de reflexão
acerca dos textos que lêem, redigem, dizem ou ouvem “intuindo, de forma contextualizada”
(SOARES, 2002, p. 5 do MP) a gramática, as características dos gêneros, o efeito
decorrente das condições de produção na construção e no sentido do discurso. E,
finalmente, o quinto objetivo pretende desenvolver habilidades de interação oral e escrita a
partir do grau de letramento prévio do aluno. Em nossa análise acerca dos exercícios de
interpretação textual, verificaremos se elas contribuem para que estes objetivos sejam
alcançados ou não.

49
Em seguida, a autora elucida o porquê de utilizar o texto como unidade básica
de ensino. De acordo com Soares, um material didático que vise o letramento deve ter
como unidade básica de ensino o texto, pois “a interação pela linguagem materializa-se em
textos” (SOARES, 2002, p. 7 do MP). Estes, por sua vez, caracterizam-se pelas suas
condições de produção, funções e finalidades e assim, se constituem em gêneros segundo a
autora. Já estes são organizados e estruturados de acordo com determinadas seleções
lexicais, textuais e sintáticas constituindo tipos diferentes de textos. A seguir, Soares afirma
que as possibilidades de interação são infinitas quando trabalhamos com gêneros e os tipos
textuais, nesse aspecto, são mais limitados. Isso se dá segundo Marcuschi (2002) porque os
gêneros textuais

situam-se e integram-se funcionalmente nas culturas em que se


desenvolvem (...) caracterizam-se muito mais por suas funções
comunicativas, cognitivas e institucionais (...) do que por suas
peculiaridades linguísticas e estruturais (MARCUSCHI, 2002, p. 20)

Os tipos textuais são o inverso dos gêneros textuais, pois são definidos pela
natureza linguística (como disse Soares) e abrangem cerca de cinco categorias: narração,
exposição, descrição, argumentação e injunção. O que o autor de LDP não pode fazer,
segundo Marcuschi (2002), é empregar esta concepção erroneamente. Ele exemplifica da
seguinte forma: “(...) quando alguém diz, por exemplo ‘a carta pessoal é um tipo de texto
informal’, ele não está empregando o termo ‘tipo de texto’ de maneira correta”
(MARCUSCHI, 2002, p. 25), pois uma carta qualquer é um gênero textual. O que existe
nos gêneros textuais são sequências tipológicas, como definiu Soares. Porém, esta sua
definição parece-nos confusa quando, a seguir, a autora afirma que em sua coleção há
“textos de muitos e diversos gêneros e tipos” (SOARES, 2002, p.7 do MP), o que nos dá a
impressão que gênero e tipo são coisas separadas e não uma inserida em outra.
Rapidamente, Soares explica o motivo pelo qual organizou sua coleção em
unidades temáticas: ela diz que as unidades são temáticas e constituídas por um conjunto de
textos de gêneros e/ou tipos diferentes que abordem um mesmo tema, visto por diferentes
pontos de vista para mostrar ao aluno que um mesmo tema pode materializa-se em diversos

50
gêneros e/ou tipos, buscando-se assim diferentes finalidades, formas e estruturas. Na
análise qualitativa da coletânea textual, verificamos se há mesmo vários pontos de vista,
sobre um mesmo tema, expostos para os alunos.
Já sobre a seleção dos textos para a coletânea, os critérios estabelecidos para a
escolha dos textos, pela autora, decorrem do que foi exposto acima, já que os textos foram
escolhidos de acordo com os temas abordados (dedicados ao universo dos jovens) e foram
pegos diferentes tipos e gêneros que os abordem sob vários pontos de vista. Há outros cinco
critérios que também foram utilizados: textos autênticos e não simplificados ou adaptados
de forma que ocorra desvirtuação para que o aluno interaja com textos originais e não
“didatizados”; textos que apresentam unidades estruturais e semânticas, ou seja, sentido
completo (se um texto é fragmento de outro maior, sua unidade semântica e estrutural é
assegurada por meio de contextualização e da abordagem dos conhecimentos prévios
necessários à preservação de sua autenticidade); textos curtos para que possam ser
trabalhados dentro do limite temporal estabelecido pelos currículos e horários; textos
oriundos de jornais, revistas, livros e outros suportes que, por sua vez, foram escolhidos de
maneira qualitativa em relação à editoração brasileira, buscando assim a variedade de
fontes e, finalmente, vários textos que representam as diferentes variedades da língua
escrita para que o aluno as reconheça e as interprete.
A nosso ver, estes cinco critérios foram adequadamente estabelecidos, pois
contemplam a leitura situada uma vez que buscam a contextualização ao mostrar seus
diferentes suportes e diagramação originais com o intuito de mostrar ao aluno diversos
gêneros e fontes com os quais ele terá que lidar por toda a sua vida. Em nossa análise
qualitativa da coletânea, verificaremos se isto realmente é feito pela coleção.
Sobre a questão do “transporte” do texto de seu suporte original para o LDP, a
autora admite que o mesmo sofre mudanças inevitáveis, mas necessárias já que o objetivo é
trabalhar com diferentes gêneros. Para amenizar esse problema, Soares afirma que
respeitou e preservou o máximo possível as características essenciais dos textos oriundos de
revistas, jornais, livros etc mostrando figuras e diagramação originais, por exemplo. Nestes
casos, tentou-se preservar sua autenticidade expondo uma pequena cópia da parte do jornal
da qual o texto foi retirado; já gêneros publicitários foram apresentados fielmente. Esse

51
aspecto para nós é positivo, pois demonstra que a autora objetiva contextualizar o máximo
possível os gêneros que adota, fazendo os alunos saberem onde e como eles foram
primeiramente publicados, o que implica em saber com quais finalidades, para que público
alvo, por quem foram escritos e dentre outras coisas.
A seguir, Soares se volta para o que chama de “áreas e atividades de
aprendizagem” que são leitura (preparação para a leitura, leitura oral e silenciosa,
interpretação oral e escrita e sugestões de leitura), produção de texto, linguagem oral,
língua oral – língua escrita, vocabulário e reflexão sobre a língua.

5.2.1 Preparação para a leitura


De acordo com Soares, a interpretação começa antes mesmo de se iniciar a
leitura do texto: ao formularmos hipóteses e criarmos expectativas a partir da apresentação
do modelo gráfico, do título, do gênero ou tipo do texto, do autor etc. Esse trabalho prévio,
para a autora, tem como objetivo estimular o uso de fatores externos pelos alunos,
necessários para se compreender um texto, como por exemplo, conhecimentos anteriores,
postura do aluno diante do texto, do autor e do gênero, interesse ou não pelo tema dentre
outros aspectos. Assim, Soares lista seis objetivos principais para esta seção: 1) discutir as
previsões, hipóteses e expectativas criadas através da exposição do gênero a ser lido, do
suporte, do autor etc.; 2) criação de hipóteses prévias; construção de conhecimentos prévios
(para nós, não são construídos e sim resgatados, pois se eles são construídos em um
determinado momento, não existiam antes disso e, portanto, não podem ser tidos como
conhecimentos prévios, ou seja, pré-existentes); 3) discussão das atitudes segundo o tema, o
autor, gênero ou tipo; 4) motivar os alunos a lerem o texto e este objetivo pode ser ligado
ao de resgate de conhecimentos prévios, demonstrando que os alunos já possuem um certo
conhecimento daquele tema; 5) propor um objetivo de leitura.
Este trabalho de preparação para a leitura, se bem realizado, pode produzir
excelentes resultados. Partir do conhecimento do aluno com o objetivo de fazê-lo se
expressar é fundamental para envolvê-lo na leitura e para valorizar sua memória discursiva.
A colocação de uma meta para a leitura, como vimos anteriormente, também é
imprescindível.

52
5.2.2 Leitura oral
Soares admite que este tipo de leitura não é a mais utilizada no dia-a-dia, mas
afirma que ela é necessária quando se trabalha com poemas e poesias nos quais a
sonoridade, o ritmo, a expressividade e a musicalidade são aspectos essenciais e quando o
texto trabalhado apresenta aspectos novos e difíceis, como por exemplo, uma diagramação
em colunas ou até mesmo quando se trata de uma peça de teatro. A autora, porém, faz uma
ressalva: estas razões cabem ao professor, ou seja, é ele quem deve ler em voz alta nesses
casos para mostrar como se faz. Além disso, Soares aponta outros três motivos para se
realizar a leitura oral: resgatar, por meio da leitura de contos, a tradição de contar e ouvir
histórias; aproveitar as oportunidades de desenvolver as competências de ouvir atentamente
e compreender (o que nos remete ao modelo bottom up) e desenvolver uma leitura fluente
tanto oral quanto silenciosa.

5.2.3 Leitura silenciosa


Soares afirma que este tipo de leitura é a mais enfatizada na coleção, apesar de
se propor ler primeiramente os textos oralmente. Nas observações postas ao professor
página a página, há sempre a sugestão de que ele, após a leitura silenciosa, esclareça as
dúvidas quanto ao vocabulário e a compreensão. As ilustrações que acompanham os textos
também devem ser lidas e assim identificadas, analisadas e avaliadas em relação aos textos.
Ou seja, a leitura multimodal e silenciosa são valorizadas, apesar de sentirmos que a leitura
em voz alta, assim como na outra coleção, é mais valorizada do que a silenciosa.

5.2.4 Interpretação oral


Este tipo de interpretação é indicado para aqueles textos cujos aspectos são
melhores identificados, compreendidos e analisados através do “confronto de
interpretações” (SOARES, 2002, p. 12 do MP). A interpretação oral, segundo Soares, está
ligada nessa coleção às atividades de preparação da leitura e, para que este processo ocorra
adequadamente, o docente deve dirigir as discussões das respostas a cada questão com a
finalidade de compará-las e debatê-las e assim verificar quais as leituras possíveis. Neste

53
momento, de acordo com a autora, não se faz necessário procurar a resposta certa. A nosso
ver, Soares propõe que, neste momento, o professor promova um debate entre os alunos a
fim de fazê-los interpretar oralmente o que foi exposto na preparação para a leitura, o que é
importante e interessante, como já dissemos acima.

5.2.5 Interpretação escrita


As perguntas desta seção objetivam o aprofundamento individual e a
compreensão do aluno. A interpretação oral, deste modo, busca o debate de ideias e a
escrita a interpretação individual. Outros objetivos são postos para esta parte: reler
integralmente ou topicamente o texto conforme suas características; articular os
conhecimentos prévios com as informações contidas no texto (a nosso ver, isto pode ser
feito tanto oral quanto por escrito); relacionar entre si as partes do texto e assim estabelecer
sua progressão temática, ou seja, perceber o começo, o meio e o fim do mesmo; identificar
relações de causa e efeito, consequências, finalidades, oposição, concessão e conclusão;
interpretar metáforas, comparações, ironias etc; produzir inferências; avaliar opiniões,
ideias e se posicionar diante deles o que caracteriza a leitura crítica; estabelecer links entre
o texto trabalhado com as ilustrações, gráficos e tabelas que o acompanham.
Soares afirma ainda que o real e mais importante objetivo desta seção é
desenvolver as habilidades de interpretação, reflexão, síntese, avaliação e análise; encontrar
a única resposta correta, para ela, é secundário e depende do sentido que o aluno agrega ao
que leu, o que alicerça a possibilidade de haver mais de uma resposta correta. Esta
possibilidade, segundo a autora, deve ser discutida em sala para haver aprofundamento e o
desenvolvimento das habilidades argumentativas dos alunos através do debate coletivo ou
em grupos de educandos.

5.2.6 Sugestões de leitura

Para Soares, a formação do leitor possui duas facetas e cada uma delas deve ser
trabalhada em ambientes diferentes, ao mesmo tempo. Habilidades de leitura como
interpretação e compreensão de textos devem ser desenvolvidas na escola onde também

54
deve ocorrer o incentivo à leitura como lazer e prazer que, por sua vez, deve ser realizada
fora da sala de aula, na casa do aluno, por exemplo. Esse estímulo pode ser dado com a
ajuda do LDP uma vez que este sugere, quando convém, a leitura de livros inteiros que
tenham a ver com o tema ou o autor estudado; assim, o professor pode e deve promover
atividades que aticem o desejo de ler nos alunos. Deste modo a autora afirma sua posição
de dar apenas um empurrão nessa tarefa e delega o resto para o docente, também pensando
que, talvez, nem todas as escolas nas quais esta coleção foi adotada haja bibliotecas
adequadas ou que os alunos possam adquirir as obras sugeridas.
Soares deixa claro que, apesar da “escolarização” da literatura ser inevitável sob
seu ponto de vista, ela acredita que ela pode ser adequada se o ato de ler não for imposto
como atividade escolar e nem avaliado com notas formais como as provas, como dissemos
anteriormente. A autora acredita que existem muitas outras atividades que podem ser
realizadas com um livro, como por exemplo, debates, idas à bibliotecas e à livrarias (com o
intuito de aproximar os jovens dos livros), produção de cartas para os autores, seminários
dentre outras ao invés de resumos e preenchimento de fichas. Gostaríamos de dizer que
apoiamos essa posição, pois pensamos que certas atividades arruínam a formação do leitor
literário que, ao enfrentá-las, perde a vontade e o gosto de ler e ficam verdadeiramente
traumatizados, pois pensam que toda a leitura que fizerem será cobrada com resumos e
provas.
Após esta análise dos MPs das duas coleções, podemos dizer que ambas
afirmam coisas semelhantes, principalmente no que diz respeito aos objetivos do ensino de
Língua Portuguesa e metas na didatização da leitura, já que as duas coleções citam
produção de inferências, hipóteses, estabelecimento de relações e leitura crítica. A
impressão que tivemos é que o MP de Soares aprofunda a questão do letramento e da
organização temática e avança ao explicar como se dá a preparação da leitura proposta.
Nas análises das coletâneas textuais e dos exercícios de interpretação e
compreensão textual, verificaremos se o que os autores afirmaram nos MPs realmente é
realizado, na prática.

55
Capítulo 6 – Análise das Coletâneas Textuais

Neste momento, analisaremos quantitativamente os gêneros que compõem as


coletâneas textuais dos dois LDPs que formam o nosso corpus de pesquisa. É importante
salientar que levaremos em conta não só os gêneros verbais, mas também os não verbais,
ou seja, ilustrações diversas, fotos, infográficos, tabelas etc., assumindo, assim, o caráter
multimodal do LDP.
Para tanto, utilizaremos a base de dados das coletâneas dos livros avaliados
pelo PNLD 2008 feita pelos pesquisadores do projeto de pesquisa LDP-Properfil, do qual
falamos na Introdução deste trabalho16. Baseados nela, classificaremos os gêneros presentes
nos LDPs e realizaremos uma contagem dos mesmos, a fim de demonstrar a porcentagem
de cada gênero em cada LDP. Gostaríamos de dizer que alguns textos não constavam na
base de dados nomeada acima, portanto, adicionamos aqueles que faltavam e os
classificamos. Também é importante ressaltarmos que apenas os gêneros contidos nas
coletâneas textuais entraram nessa contagem, ou seja, os gêneros utilizados em questões de
compreensão, análise linguística e produção de texto não foram contabilizados. Também
analisaremos as esferas privilegiadas em cada coleção, em cada LDP. As bases com a
quantidade de cada gênero, em cada volume, estão anexadas ao final deste trabalho.
Daremos início com o Português na Ponta da Língua.

6.1 – Português na Ponta da Língua


Na resenha avaliativa no Guia 2008, os avaliadores afirmaram que, a maioria
dos textos das coletâneas textuais dessa coleção era jornalístico e, haveria poucos textos
literários. Ao realizarmos a contagem dos gêneros e das esferas, notamos algumas
discrepâncias em relação à afirmação contida na resenha avaliativa dessa coleção. Tanto no
livro dedicado ao 7º ano quanto para o 9º ano, o gênero mais presente é a reportagem (no
livro de 7º ano esse gênero responde a 21% dos gêneros e no de 9º ano, a 14%), mas a
esfera jornalística é, apenas, a segunda mais contemplada em ambos, com 23 e 24% das

16
Disponível em http://homepage.mac.com/rrojo/LDP-Properfil/Menu33.html, acesso em 29/04/2009.

56
esferas presentes nos livros de 7º e 9º anos, respectivamente. A esfera mais contemplada,
nos dois livros, é a literária com 41% no livro de 7º ano e 40% no livro de 9º ano. O
terceiro lugar, no livro do 7º ano, fica a cargo da esfera artística17 com 16% e no livro do 9º
ano corresponde à esfera escolar18 com 10%.
Já o segundo lugar, em relação aos gêneros, varia de ano para ano: no LDP do
7º ano, as “narrativa de aventura”19 correspondem a 15% dos gêneros abordados; já no LDP
para o 9º ano, este lugar pertence aos paradidáticos20, com 11%. O terceiro lugar, no livro
para 7º ano, fica a cargos dos poemas, com 13% do total e, no livro para o 9º ano, há um
empate entre textos didáticos21 e narrativas de aventura, ambos com 9% do total.
Pensamos que a diferença entre os primeiros lugares de gêneros e de esferas se
dá pela maior quantidade de ambos no livro do 9º ano (por este ser maior e por trazer uma
maior variedade de gêneros e, consequentemente, de esferas). Também devemos considerar
a abrangência de algumas esferas: a literária, por exemplo, envolve narrativas de aventuras,
contos, crônicas, poemas, romances etc; a divulgação científica reúne biografias,
paradidáticos (em determinados casos), glossários etc. O interessante é notar que, nessa
coleção, a esfera jornalística é representada, quase que exclusivamente, pela reportagem e
não por outros gêneros como a notícia, por exemplo.
Seguem, abaixo, os gráficos que expressam as quantidades (em percentuais) dos
gêneros e das esferas contempladas no Português na Ponta da Língua:

17
Como as bases de textos mostram, a esfera artística abrange vários gêneros como reprodução de pinturas,
fotos, histórias em quadrinhos, tiras etc.
18
A esfera escolar corresponde aos gêneros didáticos.
19
Narrativas de aventura são os gêneros extraídos de livros infanto-juvenis e apenas juvenis.
20
A categoria paradidático agrega gêneros que não são exatamentes didáticos, isto é, não são produzidos para
circularem na esfera escolar, mas são utilizados por professores e alunos para auxiliarem o processo de
ensino aprendizagem de determinado conteúdo. Vários gêneros, dependendo da situação, podem ser tidos
como paradidáticos, como por exemplo, instrucional, ficção, científico etc.
21
Consideramos textos didáticos aqueles textos que foram escritos pelos próprios autores do LDP para a
coleção, com o objetivo de explicar algum conceito.

57
Figura 3 – Porcentagem de gêneros Português na Ponta da Língua 7º ano EFII

Figura 4 – Porcentagem de esferas Português na Ponta da Língua 7º ano EFII

58
Figura 5 – Porcentagem gêneros Português na Ponta da Língua 9º ano EFII

Figura 6 – Porcentagem esferas Português na Ponta da Língua 9º ano EFII

Baseados nestes dados, podemos concluir que o foco dos autores desta coleção
não é formar apenas um tipo de leitor, como por exemplo, um leitor literário e sim formar
um leitor que leia uma grande variedade de gêneros (principalmente no 9º ano), enfatizando
aqueles que circulam nas esferas literária e jornalística. Na verdade, acreditamos que
iremos estabelecer realmente o tipo de leitor que se objetiva em cada coleção ao

59
analisarmos, também, os exercícios de compreensão e interpretação textual, pois são neles
que veremos se a leitura situada é desenvolvida e, se sim, de que maneira. Neste caso,
podemos afirmar que a variedade de gêneros é grande e isso é bom, pois coloca os alunos
em contato com diversos textos de diversas esferas.
Outro aspecto que notamos é que o LDP dedicado ao 9º ano contém uma maior
quantidade de gêneros e estes diferem do LDP do 7º ano. Em ambos os casos, na esfera
jornalística as reportagens são, quase que predominantemente, os gêneros mais utilizados,
já que a notícia, por exemplo, não é explorada e o artigo de opinião é utilizado apenas uma
vez no LDP do 9º ano. Neste caso, portanto, concluímos que os autores desta coleção,
aparentemente, objetivam formar leitores jornalísticos de reportagens e não de uma maneira
mais abrangente, que envolva outros gêneros desta esfera. A ausência de textos opinativos e
argumentativos como editorais e artigos de opinião é um aspecto que deve ser levado em
consideração, pois pode revelar que formar leitores e escritores de gêneros deste tipo não
seja a meta desta coleção. Claro que todo e qualquer gênero possui uma opinião de seus
autores e de suas vozes entremeadas, mas gêneros de essência argumentativa deveriam ser
mais trabalhados.
Em relação às narrativas de aventura, a diferença entre os LDPs não é
significativa, já que o LDP de 7º ano traz nove narrativas de aventura e o de 9º ano traz
sete. Podemos dizer que este gênero pertence à esfera literária e a preferência por ele em
detrimento ao conto e à crônica (gêneros pouco estudados), neste momento, não é possível
de ser explicada, já que neste momento estamos nos atentando à análise quantitativa dos
gêneros que compõem as coletâneas textuais. Talvez, na análise qualitativa dos exercícios
de compreensão, possamos explicar o porquê desta preferência. Aliás, pretendemos fazer
isto com todos os gêneros, em ambas as coleções.
Um outro aspecto que notamos foi a grande presença de autores brasileiros
nessa coleção, sem preferência aparente por um ou outro, já que há uma grande variedade.
O que sentimos falta foi de mais textos que contemplassem a diversidade sócio-cultural e
regional brasileira, que é lembrada, apenas, na unidade quatro do livro do 7º ano que trata
da temática do folclore brasileiro e na primeira unidade do livro do 9º ano que aborda a

60
temática da água e utiliza um fragmento de O Quinze, de Rachel de Queiróz, para retratar a
questão dos retirantes nordestinos que buscam água.
Aproveitando essa menção aos temas, passemos a eles. Podemos dizer que os
temas contemplam os temas transversais22 dos PCNs. No livro do 7º ano, a primeira
unidade é denominada “Viver bem depende de quem?” e aborda questões ambientais como
a poluição, questões de saúde como o estresse da vida moderna e questões sociais e
relativas ao trabalho, já que há a presença de textos que abordam a rotina de pessoas que só
trabalham e não possuem tempo para a família e para o lazer. A segunda unidade nomeada
“Corpos mutantes” traz à tona a adolescência e suas consequência, como por exemplo, as
mudanças físicas (surgimento de cravos e espinhas, crescimento, mudança da voz nos
meninos etc), psicológicas, sociais e relativas aos relacionamentos com pais e pares. A
terceira unidade trata do embate entre “Desemprego x tecnologia”, com textos que abordam
o dia-a-dia de um desemprego em busca de emprego, a questão da tecnologia que “rouba”
vagas, como uma família encara o desemprego do provedor e o desejo de ser um
determinado profissional. Já a quarta unidade aborda a cultura brasileira através do folclore,
pois chama-se “Festas, histórias & criaturas” e traz textos que tratam de festas e mitos
folclóricos. A quinta e última unidade deste livro, a “Corações solidários”, aborda a
solidariedade e a caridade.
Já o livro do 9º ano tem como tema de sua primeira unidade a água, pois a
intitula de “Planeta água” e traz textos que abordam este tema sob visões diferentes: sob a
ótica ambiental através do ciclo da água e da poluição e sob o aspecto literário através do
texto “O paraíba” de José de Alencar, “Chuva com lembranças” de Cecília Meireles e
“Retirantes” de Rachel de Queiróz. A segunda unidade, nomeada “Vizinhos”, aborda a
relação entre vizinhos através de textos que tratam de problemas de condomínios de
apartamentos como barulho e sujeira e suas soluções e regulamentações e também por meio
de textos que abordam relações interpessoais como o namoro. A terceira unidade contempla

22
Segundo os PCNs, os Temas Transversais visam contemplar “as demandas atuais da sociedade” através
do tratamento transversal dado a esses temas para que a “escola trate de questões que interferem na vida dos
alunos e com as quais se vêem confrontados no seu dia-a-dia”. Assim, temas como ética, saúde, meio-
ambiente, consumo, trabalho e sexualidade foram integrados aos PCNs como Temas Transversais
(BRASIL/MEC, 1998a, p. 65).

61
um tema pouco abordado na escola, a loucura e chama-se “Um grão de loucura”. Esta
unidade trabalha com textos que explicam os limiares entre saúde e doença mental, dos
direitos dos doentes mentais e a história dos manicômios no Brasil. Já a quarta unidade,
trata do tema trabalho e é nomeada de “Hora de trabalhar!”. Através de textos que abordam
aspectos como primeiro emprego, produção social, inflação, formação técnica e acadêmica
e profissões, esta unidade traz o tema trabalho que é muito recorrente entre os jovens. A
quinta e última unidade, “Uma língua, várias línguas”, traz à tona a questão linguística
brasileira por meio de textos que explanam a respeito da diversidade linguística.

6.2 – Português: Uma Proposta para o Letramento


Ao classificarmos e quantificarmos os gêneros contidos neste LDP, percebemos
que há muitas notas biográficas sobre os autores dos textos expostos ali, mesmo que
sintéticas e, junto com elas, há fotos dos mesmos, o que nos faz pensar que os textos são
contextualizados quanto aos autores e as condições de produção, ainda que de uma maneira
rasa. No livro dedicado ao 7º ano, as notas biográficas e as fotos respondem,
respectivamente, a 10% e 22% do total, sendo este o gênero em maior quantidade neste
livro; já no livro do 9º ano, estes mesmos gêneros respondem a 15% e 20%,
respectivamente, sendo os gêneros mais abundantes neste livro.Voltando ao LDP do 7º ano,
as resportagens ficaram com o segundo lugar com 11% do total de gêneros e as notas
biográficas, já mencionadas, ficaram em terceiro.
Já no LDP para o 9º ano, o terceiro lugar ficou com três gêneros empatados
com 8%: crônica, manchete e capa de livro, ou seja, cópias reduzidas das capas de livros
dos quais alguns textos foram retirados, o que novamente reforça a contextualização quanto
às condições de produção. Há também, mas em menor número, páginas de jornais e revistas
reduzidas que mostram como e onde os textos foram originalmente publicados, o que
permite uma exploração do suporte, público-alvo, objetivos etc. Seguem, abaixo, os
gráficos que demonstram estes dados estatisticamente:

62
Figura 7 – Porcentagem gêneros Português: Uma Proposta para o Letramento 7º ano EFII

Figura 8 – Porcentagem esferas Português: Uma Proposta para o Letramento 7º ano EFII

63
Figura 9 – Porcentagem gêneros Português: Uma Proposta para o Letramento 9º ano EFII

Figura 10 – Porcentagem esferas Português: Uma Proposta para o Letramento 9º ano EFII

Baseados nestes dados, podemos afirmar que há uma tentativa de se situar o


aluno em relação aos autores dos textos, aos livros, revistas e jornais nos quais eles foram
publicados e à diagramação dos mesmos, já que há várias cópias reduzidas de folhas de

64
jornais e páginas de revistas que mostram como os textos foram originalmente publicados.
Os dados também comprovam isto, já que no livro do 7º ano a esfera “divulgação
científica” é a segunda mais contemplada com 30% do total e no livro do 9º ano ela
responde a 43%, ficando em primeiro lugar.
Com isto, pode-se trabalhar e explorar questões como suporte (por exemplo,
uma revista é diferente de um jornal por vários motivos e entre esses mesmos suportes há
diferentes, já que a revista Veja é diferente da Isto É, por exemplo ou mesmo o jornal O
Globo é distinto da Folha de São Paulo); público-alvo (pois cada suporte possui um
público-alvo específico para o qual é voltado); disposição na página (a diagramação pode
revelar possíveis objetivos e intenções do suporte, já que a atenção pode ser voltada para
inúmeros aspectos como manchetes, “olho”, fotos etc) dentre outros. Investigaremos esse
aspecto ao analisarmos as questões interpretativas relativas à estes textos.
Porém, em relação a contextualização dos textos da esfera literária, podemos
dizer que ela existe, já que há notas biográficas e fotos sobre os autores e, em alguns casos,
há capas de livros de onde os textos foram retirados. Mas, ao lermos as instruções dadas
pela autora página a página, vimos que a contextualiação completa fica a cargo do
professor, pois Soares diz o que pretende com cada texto, foto, cópia reduzida etc.
Acreditamos que, por motivos de espaço, seria realmente impossível colocar todos os
aspectos que contextualizem um texto,uma imagem ou qualquer gênero multimodal23, mas
isso deve ser dito ao professor e a ele deve ser dado todo o suporte para fazer esse trabalho
e a autora o dá, revelando os objetivos de cada texto em seu livro e dando sugestões de
como o professor pode proceder.
No livro do 7º ano, a esfera jornalística é a mais contemplada, com 43% do
total e a literária é a terceira mais utilizada com 23%. Já no livro do 9º ano, a segunda
esfera mais contemplada é a literária com 28% do total e a terceira é a jornalística com
25%, ou seja, houve uma inversão de posições entre as esferas jornalística e literária, apesar
da diferença não ser muito significativa. Talvez isto tenha acontecido para aproximar os

23
No oitavo capítulo, das considerações finais, comentaremos de maneira mais ampla esta questão do espaço
e do suporte que o papel pode e não dar a professores e alunos.

65
alunos da literatura, já que o 9º ano é o último ano do EFII e, no EM, esta disciplina passa a
fazer parte, oficialmente, do ensino da Língua Portuguesa.
Nota-se que há uma maioria de autores brasileiros na coletânea, sem
preferência explícita por nenhum, já que há uma grande variedade. Sentimos falta de textos
que abordem a diversidade sócio, cultural e regional brasileira, mas acreditamos que isto se
deve ao fato de os temas das unidades não tratarem destes assuntos por serem, justamente,
temas globais e não especificamente brasileiros como o folclore, por exemplo.
Aproveitando este gancho, abordaremos os temas tratados em cada LDP de
Soares. No livro do 7º ano, a primeira unidade chama-se “Nós somos assim?” e traz a
adolescência à tona por meio de textos que falam sobre as tribos, tatuagens, sonho de
independência, namoro e leis que protegem a criança e o adolescente. A segunda unidade é
intitulada como “Jornais: a vida no papel?” e aborda o jornal como um todo através de
notícias, fotos e uma crônica sobre este mesmo assunto. A terceira unidade, “Diferentes,
mas iguais”, trata da questão da discriminação por cor de pele (etnia), por gênero
(masculino/feminino), condição social, idade e necessidades especiais por meio de
reportagens como “O mapa da exclusão”, de Rodrigo Almeida e cartazes de Elifas
Andreato. A quarta unidade complementa a terceira, pois chama-se “Iguais, mas diferentes”
e defende a ideia de que as pessoas são desiguais entre si, já que “cada um é cada um”
(SOARES, 2008, p. 176). A autora faz isto através de poemas de Carlos Drummond de
Andrade e reportagens que retratam estilos diferentes de vida.
No livro do 9º ano, a primeira unidade é intitulada de “Somos só nós no
universo?” e aborda a questão da existência ou não de vida extraterrestre por meio de um
artigo do físico brasileiro Marcelo Gleiser, de uma entrevista do pesquisador Peter Ward
que pensa que realmente estamos sós no universo e do relato de Orson Wells sobre a sua
falsa narração de uma invasão dos marcianos na década de 50. Já a segunda unidade,
chamada “O tempo e você”, trata sobre a questão filosófica da nossa relação com o tempo e
esta unidade traz, quase que exclusivamente, textos literários, crônicas essencialmente. A
terceira unidade também traz um tema filosófico, pois chama-se “O homem: lobo do
homem?” e aborda a questão de que, todos nós, temos um lado bom e um lado ruim, por
meio de fábula (O lobo e o cordeiro), poemas e artigos de opinião a favor e contra à

66
compra de armas pela população civil. A quarta e última unidade, “A língua que eu falo”,
trata justamente da Língua Portuguesa e seus usos por crianças, adolescentes e adultos, pois
traz textos que abordam as variedades da língua, como uma entrevista com José Paulo Paes
intitulada “Geração ‘tipo assim’” e crônicas de Lygia Fagundes Telles e Fernando Sabino.
Assim, podemos afirmar que os LDPs de Soares contemplam os temas
transversais dos PCNs, já que tratam de assuntos recorrentes no dia-a-dia dos jovens e
importantes na construção da cidadania. Também é importante dizer que, em cada página
inicial de cada unidade, há uma explicação da autora em relação ao tema da mesma e sobre
seus objetivos, além de sugestões de como o professor pode proceder com aquelas
atividades.

6.3 Comparação entre as coletâneas das coleções


Ao final desta análise das coletâneas textuais do nosso corpus, concluímos que
em termos de base de textos, ambas são semelhantes, pois privilegiam textos da esfera
jornalística (principalmente as reportagens) e deixam os textos literários em segundo plano,
apesar de que, quando os utilizam, recorrem a autores brasileiros consagrados como Carlos
Drummond de Andrade, Lygia Fagundes Telles, Machado de Assis, José de Alencar,
Manuel Bandeira, Rachel de Queiróz dentre outros, deixando à margem literaturas não
canônicas como a marginal e o cordel.
O Português na Ponta da Língua contempla mais a diversidade social ou sócio-
cultural e regional do Brasil do que o Português: Uma Proposta para o Letramento, até
porque aborda temas que possibilitam isto. O Português: Uma Proposta para o
Letramento, em contrapartida, fala sobre temas filosóficos que não deixam espaço para
isso, como é o caso das unidades dois e três do LDP do 9º ano que tratam, respectivamente,
da relação das pessoas com o tempo e da presença do bem e do mal dentro de cada um de
nós. Apesar disso, pensamos que ambas as coleções tratam, em seus LDPs, dos temas
transversais dos PCNs.
Quanto à contextualização dos textos das coletâneas, por meio desta análise,
pudemos observar que o Português: Uma Proposta para o Letramento oferece mais
recursos para tanto do que o Português na Ponta da Língua, já que faz uso de cópias

67
reduzidas de capas e páginas de livros, revistas e jornais que possibilitam que o aluno veja
como e onde o texto foi originalmente publicado, além de utilizar fotos e pequenas notas
biográficas dos autores dos textos literários. Obviamente, o professor ficará encarregado de
completar a contextualização, mas a atitude de Soares é um começo para este processo, pois
ela também traz sugestões para os mesmos.
Em suma, concluímos que ambas as coleções possuem coletâneas de qualidade,
comprovando o que afirmou o Guia do Livro Didático 2008: as duas apresentam gêneros
variados e não apenas verbais (já que os textos multimodais também são contemplados) e
privilegiam esferas socialmente relevantes como a jornalística, a literária e a artística. A
seguir, na análise dos exercícios de interpretação e compreensão de textos, iremos observar
como essa coletânea é trabalhada.

68
Capítulo 7 - Análise dos exercícios de interpretação e compreensão de
textos

Partiremos, agora, à análise qualitativa dos exercícios de interpretação textual


do nosso corpus, embasados no que observamos nos critérios de leitura do Guia 2008, no
que cada MP, de cada coleção, diz e nos resultados e conclusões da análise das coletâneas
textuais. Faremos dois tipos de análise: a primeira será uma análise geral de todas as
atividades, de todo o corpus e a segunda será uma análise de uma atividade representativa
de cada um dos quatro livros, na qual enfocaremos gêneros das três esferas mais
contempladas pelas duas coleções, enfatizando exercícios multimodais.
Para tanto, desenvolvemos alguns critérios que guiarão e embasarão esta
análise. O primeiro deles é verificar, por meio da leitura dos enunciados das questões e das
respostas esperadas pelos autores contidas nos MPs de cada LD, quais são as capacidades
leitoras objetivadas, ou seja, se são primárias24 (decodificação, localização, síntese,
formulação de hipóteses e inferências e estabelecimento de relações) ou “críticas”25
(ativação do conhecimento prévio ou memória discursiva do aluno, requerimento de sua
apreciação valorativa, opinião e argumentação e reflexão e uso da intertextualidade). O
segundo critério é avaliar se os gêneros utilizados nas coletâneas textuais, nos quais as
atividades de compreensão se baseiam, são favoráveis aos objetivos das mesmas, isto é, se
os gêneros são adequados ou não para as metas de cada questão interpretativa. O terceiro
critério é uma continuidade do segundo, já que visa avaliar se os gêneros usados nas
atividades são favoráveis à atitude responsiva ativa, isto é, à leitura crítica e reflexiva.
Criamos este critério pensando que há gêneros como bulas de remédio, gênero instrucional
(como um manual de instruções), receitas culinárias, dentre outros, que são adequados para
se desenvolver letramentos específicos, mas não a leitura crítica e reflexiva. O quarto e

24
Demos o nome de “primárias” para estas capacidades leitoras por as considerarmos iniciais, mas não menos
essenciais, no desenvolvimento do leitor. Como afirmamos no segundo capítulo deste trabalho, acreditamos
que estas capacidades são importantes e fundamentais no processo de ensino-aprendizagem da leitura, mas
não se pode parar nelas e sim deve-se ir além, ou seja, objetivar a leitura crítica.
25
Intitulamos de “críticas” estas capacidades, pois acreditamos que elas levam a uma leitura crítica e reflexiva
do aluno.

69
último critério serve para verificar se as questões, de alguma maneira, contextualizam e
situam o texto (histórica, social, política e ideologicamente) para o aluno.
Como os enunciados das questões moldam a interpretação do aluno, pois
trazem os objetivos dos autores dos LDs, através desta análise, desejamos verificar e avaliar
como a leitura é desenvolvida em nosso corpus: se a língua é usada para dar voz aos alunos,
pois acreditamos que eles têm o que dizer, com razão de dizer e para quem dizer, como
afirma Geraldi (1995); se o dialogismo (vozes e memória discursiva) é explorado e se a
leitura crítica e reflexiva é objetivada através da atitude responsiva ativa de Bakhtin (1997
[1979]) e se são desenvolvidas estratégias de como fazer isto. Obviamente que os autores
do LD podem colocar objetivos diferentes para os textos das coletâneas ou até mesmo para
um único texto (buscar informações, estudar, se distrair (aqui, então, entraria a fruição
estética)), já que como afirma Antunes (2003), existe “uma leitura não-uniforme, diferente,
portanto, em cada circunstância, dependendo do tema, do nível de formalidade e do gênero
do texto lido ou, ainda, dos objetivos e dos motivos implicados no ato de ler” (ANTUNES,
2003, p. 77) e com esta variação de gêneros e objetivos, as estratégias de leitura também
variam. Apesar disso, pensamos que mesmo que o objetivo da leitura seja por prazer, sem
cobranças, deve haver o desenvolvimento da atitude responsiva ativa (BAKTHIN, 1997
[1979]), já que a realizamos em todos os momentos de interação, seja com outras pessoas,
com textos, obras de arte, programas de TV, músicas etc.
Assim sendo, daremos início à análise dos exercícios interpretativos do nosso
corpus pelo Português na Ponta da Língua.

7.1 Português na Ponta da Língua


7.1.1 Análise geral do volume de 7º ano
Ao analisarmos as questões de interpretação e compreensão deste LD,
observamos que as capacidades leitoras mais objetivadas são a localização e formulações
de hipóteses e inferências, seguidas de estabelecimento de relações dentro de um mesmo
texto (consequentemente, a intertextualidade é pouco explorada) e realização de
comparações de diversas ordens, em menor número. Um exemplo de pergunta que requer
localização é a terceira sobre a reportagem “Gerente vê a mulher só no fim-de-semana”, de

70
Cynara Menezes: “O texto diz que Arthur é um exemplo de trabalhador globalizado. Que
informações confirmam isso?” (ALBERGARIA, FERNANDES & ESPESCHIT, 2008, p.
27). Além de pedir para que o aluno localize tais informações, a questão necessita que o
aluno saiba o que significa o termo “globalizado”, portanto mesmo que implicitamente, os
autores buscam acessar a memória discursiva dos alunos. Talvez, no 7º ano, os alunos ainda
não tenham estudado globalização, mas os autores sugerem que sim, já que na resposta
esperada desta questão não há nenhuma recomendação para que o professor explique a
palavra “globalizado” e de onde ela deriva.
Já um exemplo de pergunta que objetiva desenvolver a formulação de
hipóteses, podemos ver um na página 48, na primeira questão sobre a narrativa de aventura
“Crescendo” de Lino de Albergaria, autor do LD: “Por que o texto tem o título
Crescendo?” (ALBERGARIA, FERNANDES & ESPESCHIT, 2008, p. 48). Em relação às
inferências, podemos ver um exemplo de exercício na mesma página: “Como o leitor pode
saber que dona Amélia é a mãe de Alice?” (ALBERGARIA, FERNANDES &
ESPESCHIT, 2008, p. 48). Para respondê-la, o aluno deve voltar ao texto, localizar seu
trecho que cita dona Amélia, relê-lo e inferir.
O estabelecimento de relações é também uma capacidade de leitura
desenvolvida algumas vezes por este LD e ela se dá de duas formas: pede-se que o aluno
estabeleça relações entre dois textos ou entre sentenças do próprio texto. Encontramos um
exemplo de intertextualidade na sexta questão sobre o poema “Para comer depois” de
Adélia Prado: “Se o homem do texto Cinza e Verde vivesse na cidade do poema, você acha
que ele precisaria fugir para o campo?” (ALBERGARIA, FERNANDES & ESPESCHIT,
2008, p. 11). “Cinza e Verde” é uma reprodução de pintura de Semíramis Paterno exibida
nas páginas 8 e 9 do LD e esta questão pede para que o aluno o relacione o poema em
questão por meio de uma comparação. Já um exemplo de exercício que requer que o aluno
relacione aspectos ou sentenças de um mesmo texto pode ser lido na página 81, na segunda
questão sobre a narrativa de aventura “A notícia” de Cristina Agostinho: “Relacione o título
dado ao texto (A notícia) com o fato de a televisão, sempre sintonizada no noticiário
daquela hora, estar desligada” (ALBERGARIA, FERNANDES & ESPESCHIT, 2008, p.
81).

71
Um dos poucos exemplos de exercício que desenvolve a capacidade de
comparar textos é a quarta questão sobre a narrativa de aventura “O contador de histórias”
de Marcelo Xavier que pede para que o aluno leia a definição de mito de Leonardo Boff e a
compare com a definição do texto (ALBERGARIA, FERNANDES & ESPESCHIT, 2008,
p. 121).
Há algumas tentativas de acesso à memória discursiva dos alunos, mas elas não
são recorrentes. Um exemplo é a quarta questão sobre a reportagem “Uma revolução dos
bons modos” de Zuenir Ventura: “Baseando-se na sua observação da realidade, você diria
que esses fatos só acontecem nessa cidade? Justifique.” (ALBERGARIA, FERNANDES &
ESPESCHIT, 2008, p. 31).
Quando o gênero em questão é um texto não verbal, as questões visam a
interpretação da imagem e, em alguns casos, pede-se que o aluno o relacione com outro
gênero, como já exemplificamos anteriormente. A segunda questão sobre a reprodução de
pintura “Cinza e Verde” de Semíramis Paterno, demonstra isto: “Se a ordem das imagens
fosse modificada, você continuaria entendendo a história do mesmo jeito?”. A primeira
questão sobre a história em quadrinhos “Alex e Alfred”, de Sabine Wilharm, também é um
exemplo adequado de trabalho com textos não verbais: “As personagens falam em alemão.
Mesmo escrita em alemão, você entende a história? Por quê?” (ALBERGARIA,
FERNANDES & ESPESCHIT, 2008, p. 40).
Pudemos ver, acima, que os autores requisitam a utilização de mais de uma
capacidade de leitura, pois os enunciados dos mesmos são compostos de etapas e cada
etapa remete-se à uma capacidade leitora. Um exemplo disso é a primeira pergunta sobre o
textos “As faces do estresse”, de Tim Hindle, que diz: “Relacione a afirmação de que o
estresse pode ajudar na formação de campeões olímpicos com o parágrafo intitulado
“Efeitos nas pessoas”” (ALBERGARIA, FERNANDES & ESPESCHIT, 2008, p. 17). Para
respondê-la, primeiramente o aluno deve localizar a citada afirmação e o parágrafo
mencionado, relê-los e então relacioná-los; assim, duas capacidades leitoras são
requisitadas. Aproveitamos este exemplo para dizer que notamos que quando a localização
é desenvolvida, a releitura sempre a acompanha, pois o aluno sempre deve localizar uma

72
sentença ou um trecho, relê-lo com um objetivo e fazer algo com ele; mesmo que o
enunciado não diga explicitamente que o aluno deve reler, ele o leva a fazer isso.
Apesar de termos nos deparado com diversas questões que pedem para que o
aluno expresse sua opinião sobre os textos, pensamos que só podemos considerar como
questões que objetivam a desenvolver a leitura crítica e reflexiva aquelas que levam o aluno
a argumentar e a refletir realmente através de imperativos como “justifique” e “explique” e
questionamentos como “por quê”. É claro que pedir a opinião do aluno demonstra que os
autores do LD desejam que os alunos desenvolvam suas apreciações valorativas e isso é
positivo, porém, a didatização da leitura ficaria melhor e mais adequada se requisesse do
aluno, também, uma verdadeira argumentação e reflexão. Portanto, nem todas as questões
que pedem a opinião do aluno, a nosso ver, desenvolve a atitude responsiva ativa de
Bakhtin (1997[1979]).
Um exemplo de pergunta que pede apenas a opinião do aluno pode ser
encontrada na página 136, na seção De Olho no Texto sobre a narrativa de aventura
“Confissão” de Clarice Lispector: “O narrador comenta, em uma frase, que possui um vício
prejudicial à saúde. Em outra frase, ameaça tomar uma atitude que provocaria arrepios em
pessoas preocupadas com o meio ambiente. Que vício e que atitude são esses? Qual é a sua
opinião a respeito deles?” (ALBERGARIA, FERNANDES & ESPESCHIT, 2008, p. 136).
Já um exemplo que requer que o aluno argumente pode ser visto na página 110, sobre o e-
mail “Quando eu crescer vou ser...”: “(...) Após a leitura do texto, você diria que Vanessa
estava sendo irônica em seu título? Por quê?” (ALBERGARIA, FERNANDES &
ESPESCHIT, 2008, p. 110). A seção De Olho no Texto que mais possui exercícios que
pedem que o aluno expresse sua opinião é sobre a reportagem “Mensagens para deixar o
Rio mais lindo”, de Selma Schmidt e Sérgio Pugliese, já que possui duas perguntas desse
tipo e que pedem para que o aluno replique aos slogans (e apesar disso ainda pensamos que
é pouco): “Analise o primeiro slogan e diga: o que você acha de tentar ‘salvar’ um lugar às
custas de uma comparação com a sujeira do outro?” e “Na matéria, são apresentados
slogans que tentar educar o carioca pelo constrangimento (ou seja, envergonhando-o). Você
concorda com essa estratégica de constrangimento? Por quê? Que outras estratégias você
sugeriria?” (ALBERGARIA, FERNANDES & ESPESCHIT, 2008, p. 36).

73
Em relação ao segundo critério de análise, pensamos que a grande maioria dos
gêneros da coletânea textual deste LD é adequada às propostas dos exercícios e aos temas
de cada unidade, tanto no aspecto estrutural (como gênero) como no aspecto temático
propriamente dito. No entanto, há alguns gêneros que não são favoráveis ao
desenvolvimento da atitude responsiva ativa (BAKHTIN, 1997[1979]), como por exemplo
a bula do remédio “Stresstabs” (p. 19), a receita culinária “Salaminho de chocolate” (p. 54)
e as sinopses de filmes e seus respectivos horários (p. 62). Pensamos que estes gêneros
podem ser utilizados para desenvolver determinados letramentos e estratégias de leitura
através da exploração da estrutura e da diagramação dos mesmos, mas não para
desenvolver a leitura crítica.
Em relação à contextualização dos textos nos exercícios, podemos afirmar que
isto não ocorre neste LD, já que não há menção e aproveitamento de informações como
autor(es), suporte original, condições de produção, público-alvo dentre outras. Assim,
concluímos que o Português na Ponta da Língua do 7º ano do EFII pouco desenvolve a
leitura crítica e reflexiva por meio da atitude responsiva ativa (BAKHTIN, 1997[1979]) e
não situa os textos da coletânea textual nem nela mesma, nem nos exercícios de
interpretação textual.

7.1.2 – Análise de uma atividade representativa do volume de 7º ano


Escolhemos o texto número sete, da unidade cinco “Corações Solidários”,
intitulado “Gilvan ganha duas opções de trabalho” para analisarmos como atividade
representativa do Português na Ponta da Língua do 7º ano, já que é um exemplo da
didatização da leitura realizada por este LDP. Se trata de uma reportagem escrita por
Mônica Bergamo para o jornal Folha de São Paulo de 18 de maio de 1999 que relata a
consequência de outra reportagem publicada pelo mesmo suporte e utilizada na unidade três
“Desemprego x Tecnologia”, chamada “Roteiro de um Desempregado”, redigida pela
mesma repórter. O texto conta a rotina de Gilvan, um morador da cidade de São Paulo que
estava sem trabalho há nove meses e que saia de casa, todos os dias, para procurar
emprego, mas não obtinha sucesso. Já a segunda reportagem conta que, após dois dias da
publicação da primeira, Gilvan recebeu duas opções de trabalho.

74
Primeiramente devemos dizer que a reportagem não é, a nosso ver,
satisfatoriamente contextualizada, pois é acompanhada, apenas, pelos seus créditos. As
ilustrações que a acompanham não foi retirada do seu suporte original e, certamente, foi
desenhada pelo ilustrador da coleção, Robson Araújo. Isso só vem a reiterar o que
confirmamos no capítulo seis desta pesquisa, na análise das coletâneas textuais: Português
na Ponta da Língua não faz nenhum tipo de contextualização, fora os créditos. Vejamos, a
seguir, as cópias reduzidas da reportagem neste LDP:

Figura 11 – Exemplo de exercício Português na Ponta da Língua 7º ano EFII

Já em relação aos exercícios de leitura, podemos dizer que eles exemplificam o


que ocorre em todo o livro: as capacidades primárias de leitura são as mais desenvolvidas, a
intertextualidade, por vezes, é realizada e a leitura crítica é pouquíssimo visada. A primeira
questão pergunta o que o aluno acha das atitudes dos empresários de darem oportunidade
de emprego ao Gilvan, levando em consideração os vários motivos possivelmente
envolvidos. O MP coloca como resposta correta aquela que menciona que os empresários

75
fizeram isso para obter destaque na imprensa e, para responder isso, os alunos teriam de
inferir essa possibilidade pensando em como um jornal exerce seu papel na sociedade e
como as pessoas podem se valer disso. A pergunta foi direcionada sim, mas para mostrar
que nenhuma atitude é neutra de intenções.
A segunda questão propõe que os alunos relacionem as duas reportagens sobre
Gilvan, que mencionamos acima e pedem para que os alunos calculem quanto tempo
Gilvan levou para receber uma proposta de emprego e se esse tempo foi curto ou não e por
quê. Neste caso, temos um exemplo de intertextualidade entre textos de unidades diferentes
e de desenvolvimento de letramento para leitura de jornal, já que os alunos terão de
verificar as datas das publicações (o que, aqui, pensamos ser uma tarefa fácil, pois basta os
alunos lerem os créditos); além disso, os alunos terão de inferir que esse período foi curto e
argumentar o porque de pensarem assim. Porém, não consideramos isso leitura crítica, pois
a opinião do aluno não foi requisitada.
Já a terceira questão requer que os alunos localizem e infiram informações, pois
pergunta que fato foi fundamental para que Gilvan conseguisse um emprego e por quê. A
matéria, logo no início, menciona a reportagem anterior e ela é a resposta correta para esta
questão; o aluno terá de inferir (ou mesmo apenas localizar) que ela foi crucial para Gilvan
conseguir um trabalho porque deu destaque a ele. A quarta questão, por sua vez,
desenvolve apenas a localização, já que pergunta como a matéria não dá certeza de que
Gilvan conseguiu um emprego e, segundo o MP, a resposta correta é aquela que responder
que há dois trechos que mostram isso: “(Gilvan) pode26 finalmente conseguir trabalho” e
“Se a Redmetal contratar Gilvan tudo muda” (ALBERGARIA, FERNANDES &
ESPESCHIT, 2008, p. 91 do MP).
A quinta e última questão, dividida em a, b e c, pede para que os alunos
analisem o seguinte trecho: “Vou voltar a ser o que eu era, é tudo o que eu quero”. Ou seja,
um homem empregado”. A letra a pergunta o que Gilvan quer e os alunos devem responder
que ele quer ser um homem empregado; a letra b pergunta se o trecho acima permite outra
interpretação e, de acordo com o MP, a resposta certa seria que parece que Gilvan quer um

26
Grifo dos autores do LDP.

76
homem empregado; já a letra c pede para que os alunos reescrevam o trecho de modo que a
ambiguidade fosse excluída e, o MP, diz que o acréscimo do verbo ser (Ou seja, ser um
homem empregado) resolveria esta questão. A nosso ver, esse exercício é um exemplo de
muitos outros que retiram a frase de seu contexto e pedem para que ela seja analisada desta
forma, sem levar em consideração todo o restante e, mesmo assim, não vemos essa
ambiguidade, pois ficou claro que Gilvan quer ser um homem empregado pela frase
anterior, na qual ele diz que irá voltar a ser o que era. O verbo ser já está presente no
período, só que anteriormente.

7.1.3 – Análise geral do volume de 9º ano


As capacidades leitoras mais desenvolvidas nos exercícios de compreensão
deste LD são a localização, a formulação de inferências e hipóteses, seguidas da relação
entre textos (intertextualidade) e, em menor número, a argumentação e a reflexão. Em
comparação ao LD para o 7º ano, este desenvolve mais a leitura crítica, pois traz mais
questões com este objetivo (talvez por ser um LD dedicado ao 9º ano, que por sua vez, é o
último do EFII e depois deles os alunos seguirão para o Ensino Médio); porém, a leitura
crítica continua sendo a menos privilegiada. A multimodalidade é bastante trabalhada neste
LD, mais do que no de 7º ano e há exemplos de leitura crítica desenvolvida através dela.
A localização é a capacidade leitora mais desenvolvida neste LD que há seções
“De Olho no Texto” que contém mais de três questões com a objetivam. Um exemplo disso
pode ser visto já na página 10, nos exercícios numerados de três a seis sobre o texto “O
ciclo da água” de Paul Bennett: “De que forma o homem interfere nesse ciclo?”; “A água
da chuva pode ser recolhida em baldes e consumida pelas pessoas?”; “Por que o tratamento
do esgoto melhora a qualidade da água?” e “Que riscos podem correr as pessoas que usam
água de nascentes de poços?” (ALBERGARIA, FERNANDES & ESPESCHIT, 2008, p.
10). Segundo o MP deste LD, todas as respostas a essas perguntas são encontradas no
próprio texto, o que caracteriza a localização.
Já a inferência é requisitada em perguntas que trazem um aspecto do texto e, a
partir dele, pedem para que o aluno infira algo. Podemos ver um exemplo na página 34, na
nona questão sobre o relato “A natureza em fúria” de Ronaldo Ribeiro: “Os homens da

77
comunidade da Rocinha entraram no rio com suas canoas enquanto ele ainda estava
bastante perigoso, sob o efeito da pororoca. Que sentimento os levou a fazer isso?” (
ALBERGARIA, FERNANDES & ESPESCHIT, 2008, p. 34). A resposta não está explícita
no texto e deve ser inferida pelo aluno.
A formulação de hipóteses é desenvolvida através de questões que, de alguma
forma, explora a imaginação e o conhecimento prévio do aluno, como a quinta questão
sobre a carta “Prezado morador,...” de João das Neves: “Em relação aos direitos e deveres
desse prédio, que regra poderia ser escrita para constar do regulamento do condomínio, em
relação ao problema levantado?” (ALBERGARIA, FERNANDES & ESPESCHIT, 2008, p.
65).
A intertextualidade é mais desenvolvida neste LD de 9º ano do que no de 7º ano
por meio de exercícios que pedem, geralmente, para que o aluno relacione textos de uma
mesma unidade e, com menor frequência, relacione textos de unidades diferentes, sendo
eles verbais ou não. Aliás, o exercício que transcreveremos como exemplo de
intertextualidade é sobre um anúncio publicitário da página 90: “Relacione o título desta
publicidade com o anúncio anterior e com o assassinato de Maria Rita por Marcos
Humberto” (ALBERGARIA, FERNANDES & ESPESCHIT, 2008, p. 90). Os gêneros
mencionados estão na mesma unidade que este anúncio, mas há exemplo de
desenvolvidade de intertextualidade entre unidades na página 153: “Relacione a
personagem Albert Brock com Marcos Humberto, citado no texto Júri Simulado da
Unidade 2” (ALBERGARIA, FERNANDES & ESPESCHIT, 2008, p. 153).
Apesar de, neste volume, a leitura crítica ser mais desenvolvida do que no
volume anterior, ela continua sendo a capacidade leitora menos objetivada e, assim,
podemos concluir que esta coleção não desenvolve adequadamente a leitura crítica, situada
e reflexiva. Como dissemos anteriormente, há mais perguntas que requerem a simples
expressão da opinião do aluno do que questões que estimulam a argumentação e a réplica
ativa. Na página 176, na última questão sobre a narrativa de aventura “O Dr. Papagaio” de
Ledo Ivo, podemos observar um exemplo de questão que requer, apenas, a mera opinião do
aluno: “(...) Imagine que você seja um canário azul. Neste mundão, que lugar você gostaria
de conquistar?” (ALBERGARIA, FERNANDES & ESPESCHIT, 2008, p. 176). Já um

78
exemplo de leitura crítica pode ser lido na página 116, na primeira questão sobre a
entrevista do médico Keith G. Kramlinger: “Você concorda com a afirmação de que “a
sociedade ainda discrimina as pessoas com doenças mentais? Justifique” (ALBERGARIA,
FERNANDES & ESPESCHIT, 2008, p. 116). Através do imperativo “justifique”, os
autores fazem com que o aluno fundamente sua posição por meio da argumentação.
Outra semelhança com o volume do 7º ano é a existência de exercícios que
requerem mais de uma capacidade leitora; normalmente a localização e a releitura são as
capacidades mais recorrentes nesse tipo de questão, mesmo que implicitamente, já que para
responder, o aluno muitas vezes é levado a localizar algum trecho e relê-lo. Um exemplo de
questão que requer mais de uma capacidade pode ser visto na página 72, na terceira questão
da seção “Indo Além” sobre o texto paradidático sobre paródia: “O texto O Condomínio
Roma pode ser considerado uma paródia em relação a um texto sobre Roma? Por quê? Se
pode, corresponderia a qual ou a quais tipos de paródia, segundo o dicionário de literatura
Shipley?” (ALBERGARIA, FERNANDES & ESPESCHIT, 2008, p. 72). Para responder
esta pergunta, o aluno deve relacionar os textos “O Condomínio Roma” com o paradidático
sobre paródia (intertextualidade), dizer se o primeiro é uma paródia e justificar sua opinião
(leitura crítica) e, finalmente, reler o dicionário literário e verificar em quais categorias de
paródia ele se encaixa.
O debate é um gênero muito favorável à atitude responsiva ativa, pois gera uma
situação na qual os alunos devem argumentar de modo adequado para se saírem bem e,
neste LD, ele é utilizado uma única vez (enquanto que no volume para o 7º ano ele não é
trabalhado) na página 101 na primeira questão sobre um capítulo do romance Dom
Casmurro de Machado de Assis: no texto, há palavras escritas em vermelho e o enunciado
pede para que os alunos se dividam em grupos e discutam quais palavras poderiam
substituir as escritas em vermelho para tornar o texto mais atual; a seguir, o grupo leria em
voz alta o novo texto e a classe, então, debateria se as escolhas foram adequadas.
Acreditamos que o debate poderia ser mais trabalhado e explorado pelos autores do LD por
ser uma atividade em grupo muito rica no que tange à utilização e o desenvolvimento de
capacidades orais e argumentativas.

79
A multimodalidade é outro aspecto bastante explorado neste volume e um
exemplo pode ser visto nas páginas 159 e 160, nas quais há a pintura “A cura da loucura”
de Bosch e os exercícios sobre ela quem requerem leitura de imagem, descrição as pessoas
encenadas, intertextualidade entre ela e o texto sobre o museu da loucura. A segunda pede
para que o aluno argumente sobre sua interpretação da pintura: “No quadro, o homem que
sofre a cirurgia – que seria, supostamente, o “louco” – é a figura mais estranha entre as
personagens? Justifique” (ALBERGARIA, FERNANDES & ESPESCHIT, 2008, p. 160).
Apesar de pensarmos que a palavra “estranha” direcionou a interpretação do aluno, não
deixa de ser um exemplo de leitura crítica multimodal.
Este direcionamento de interpretação ocorre mais algumas vezes neste volume,
através da exposição da opinião dos próprios autores nos enunciados das questões, como
podemos ver na terceira pergunta sobre o anúncio publicitário da seção “Indo Além” da
página 86: “Esse anúncio contribui para incentivar atitudes de agressão entre as pessoas.
Como ele faz isso?” (ALBERGARIA, FERNANDES & ESPESCHIT, 2008, p. 86). O
anúncio é de um carro e diz o seguinte: “Você sente orgulho, seu vizinho sente inveja. Os
dois são pecadores, mas pelo menos você é o dono do carro”. No MP, a resposta esperada é
aquela que diz que o anúncio estimula a competição de bens materiais entre vizinhos em
uma atitude materialista e individualista. A nosso ver, esta frase não incentiva violência
entre pessoas e sim traz à tona um sentimento que algumas pessoas sentem (a inveja) e que
pode acontecer entre vizinhos. Ao fazer esta afirmação, pensamos que os autores
direcionaram a interpretação do aluno; se o intuito era trabalhar a questão do materialismo e
do exibicionismo de bens materiais, isto poderia ser feito de outra maneira e com outros
textos que realmente demonstrem isso.
No capítulo anterior, dissemos que não encontramos nas coletâneas textuais
dessa coleção boxes de vocabulário que auxiliassem o aluno na compreensão de palavras
novas e notamos que isto pode ser intencional, já que há perguntas que pedem para o aluno
listar as palavras desconhecidas e procurá-las no dicionário. Porém, a oitava questão do
conto “Apartamento térreo” de Lêdo Ivo (que é a respeito de uma expressão usada no texto)
não oferece subsídios para o aluno responder, pois não há boxe de vocabulário e nem
requer que o aluno consulte o dicionário: “O que seria um “simulacro de biblioteca?”

80
(ALBERGARIA, FERNANDES & ESPESCHIT, 2008, p. 64). Pensamos que um aluno de
9º ano dificilmente sabe o que significa a palavra simulacro e não saberá se não consultar
um dicionário e, infelizmente, não podemos saber qual foi a intenção dos autores com esta
questão, pois eles não a colocaram em seu MP.
Quanto ao segundo critério criado por nós, acreditamos que todos os gêneros
utilizados na coletânea textual deste LD são adequados aos objetivos propostos nos
exercícios de interpretação e, salvo os verbetes e de uma receita de experiência usados nas
seções de leitura, todos os demais gêneros são favoráveis ao desenvolvimento da leitura
crítica e reflexiva.
Em relação ao critério que observa se o enunciado dos exercícios situam os
gêneros estudados, novamente comprovamos que não, como no volume anterior. As
questões, nessa coleção, vão diretamente aos seus objetivos e não situam os alunos acerca
dos aspectos discursivos dos gêneros e, assim, embasados nas análises das coletâneas
textuais e dos exercícios de compreensão, afirmamos que Português na Ponta da Língua
não contextualiza seus textos e pouco desenvolve a leitura crítica e reflexiva através da
atitude responsiva ativa.

7.1.4 – Análise de uma atividade representativa do volume de 9º ano


Escolhemos o texto seis, “O assassino”, na unidade três “Um grão de loucura”,
para analisarmos suas seção “Indo Além” como atividade representativa deste volume do
Português na Ponta da Língua; como no volume anterior analisamos um texto da esfera
jornalística, optamos por analisar, neste volume, um da esfera literária para, assim,
contemplarmos as duas esferas mais utilizadas nessa coleção. Também a escolhemos por
representar, através das capacidades leitora por ela desenvolvidas, a didatização da leitura
realizada por este LDP. Trata-se de uma narrativa de aventura de seis páginas, escrita por
Ray Bradbury e, tirando os créditos exigidos pela ficha de avaliação do PNLD, não há
nenhuma contextualização; as ilustrações foram feitas pelo ilustrador da coleção e não
contribuem para a compreensão do texto. Exibiremos, neste trabalho, por conta de espaço,
apenas a primeira página que mostra este texto, já que ele ocupa seis páginas e todas são
praticamente iguais acerca da diagramação:

81
Figura 12 – Exemplo de exercício Português na Ponta da Língua 9º ano EFII

A primeira questão pede para que os alunos façam uma lista das palavras que
não entenderam e procurem seus significados em um dicionário, depois de tentar
compreendê-las a partir do contexto. Nenhum texto dessa coleção possui um boxe de
vocabulário e questões como essa fazem com que os alunos listem palavras e procurem
seus sentidos no dicionário. Talvez os autores prefiram propor atividades como esta (de
pesquisa de vocabulário) a inserir boxes de glossário ou vocabulário. A segunda questão
requer dos alunos formulação de hipóteses e, possivelmente, que eles formulem inferência
local pelo contexto, já que pergunta onde o protagonista da história está: se em um hospital
ou em uma prisão. A resposta correta, segundo o MP, é que a personagem está em um
hospital psiquiátrico prisional e, para responder corretamente, os alunos devem inferir esse
cenário por meio da leitura das descrições do mesmo e/ou formular inferências locais a
aprtir do contexto para chegar a esta conclusão.
A terceira questão, basicamente, pede para que os alunos descrevam a
protagonista e seu psiquiatra e o espaço em que transcorre a cena, o que consideramos uma
capacidade primária de leitura. A quarta questão pergunta como era o cotidiano das pessoas

82
mostradas no texto e para responderem isto, os alunos devem, apenas localizar os trechos
que demonstram essas cenas e copiá-las, ou seja, este exercício desenvolve, somente, a
localização. A quinta questão objetiva traçar uma relação entre a vida das personagens da
narrativa e a vida no mundo de hoje; para tanto, os alunos terão de relacionar a história com
seu conhecimento de mundo.
Já a sexta questão é dividida em letras a e b e pede para que os alunos releiam o
seguinte trecho: “Depois, entrei na sala e atirei no aparelho de TV, aquela fera traiçoeira,
aquela Medusa, que transforma em pedra um bilhão de pessoas toda noite”. A letras a pede
para que os alunos pesquisem sobre a Medusa e a letra b para que eles expliquem uma
possível relação entre a Medusa e a TV. Mais uma vez vemos uma possível preferência por
atividades de pesquisa em detrimento de boxes de vocabulário, já que o termo “Medusa”
podeeria em um boxe. Já a letra b requer que os alunos estabeleçam relações entre a
Medusa e a TV, levando em consideração o trecho destacado. A sétima questão requer a
opinião dos alunos acerca se o protagonista da história é louco ou não e, em seguida, pede
para que eles relacione a suas atitudes com as de outras personagens. Novamente as
relações são requisitadas e a opinião do aluno é requisitada sem a argumentação e a
reflexão serem objetivadas. A oitava e última questão busca estabelecer relações, agora
através da intertextualidade entre textos de unidades diferentes: entre “O assassino” e “Júri
Simulado”, da unidade dois.
Gostaríamos de ter analisado atividades multimodais, mas as poucas existentes
nessa coleção não são representativas do que é recorrente nesses LDPs, já que os textos
multimodais são raros e, portanto, exceções. Esta atividade representa de forma satisfatória
como a didatização da leitura é realizada pelo Português na Ponta da Língua: a grande
maioria das capacidades leitoras desenvolvidas são primárias e a opinião dos alunos é
meramente pedida, sem objetivar a argumentação, a reflexão e a leitura crítica.

7.2 Português: Uma Proposta para o Letramento


7.2.1 – Análise geral do volume de 7º ano
Ao analisarmos os exercícios de compreensão e interpretação de textos,
observamos que as capacidades leitoras mais trabalhadas são a localização e a formulação

83
de inferências e hipóteses. A intertextualidade, a produção de comparação, a
multimodalidade e a leitura crítica são capacidades menos requisitadas. Notamos também
que estas capacidades, muitas vezes, estão presentes nos exercícios com o intuito de
desenvolver o que Soares chama em suas orientações ao professor, página a página, de
“habilidades básicas de leitura” (SOARES, 2008, p. 56) de cada gênero trabalhado na
coletânea textual. Ou seja, as capacidades leitoras, neste LD, são utilizadas para
desenvolver letramentos específicos de cada gênero, como a autora explicita em suas
orientações ao professor; elas trazem os objetivos de cada seção de atividades, juntamente
com sugestões de trabalho e com as respostas esperadas. Como elas estão dispostas página
a página e não no final do livro, a nossa análise e o trabalho do professor são facilitados.
Um exemplo disto pode ser visto na página 56, nas orientações à seção
“Interpretação Escrita” sobre a reportagem “Pesquisa mostra perfil do namoro” de
Guilherme Aragão que dizem o seguinte: “Como o texto é informativo, as questões buscam
desenvolver habilidades básicas de leitura desse gênero de texto: localizar informações,
identificar o referente de dêiticos e ideias implícitas (...)” (SOARES, 2008, p. 56). Ao
lermos as atividades, verificamos que isto realmente é realizado por meio de questões que
objetivam, principalmente, a localização: “Localize, no início do texto, a frase: “Não é por
acaso”. O que é que não é por acaso? Por que não é por acaso?” (SOARES, 2008, p. 56).
A inferência é outra capacidade de leitura bastante desenvolvida neste LD e,
além de explicitar esta intenção no enunciado das perguntas, a autora também o faz nas
orientações ao professor, como podemos observar na seção “Interpretação Oral” da página
57 sobre o infográfico que acompanha a reportagem acima citada: “Entre as perguntas da
pesquisa, não há nenhuma sobre o “ficar”, mas a pesquisadora afirma que esta é a opção
preferida ou a mais utilizada pelos jovens. Com base em qual dos gráficos ela pôde tirar
essa inferência?” (SOARES, 2008, p. 57). Esta atividade tem como meta mostrar ao aluno
como a pesquisadora inferiu tal dado e chegou a esta conclusão, fazendo o aluno ter o
mesmo raciocínio que ela.
A terceira capacidade leitora mais trabalhada é a formulação de hipóteses.
Podemos ver um exemplo na seção “Interpretação Escrita” sobre a crônica “Os Jornais” de
Rubem Braga: “Recorde a primeira frase da crônica e observe a palavra destacada: “Meu

84
amigo lança fora, alegremente, o jornal que está lendo e diz:”. Se, em seguida, o amigo
reclama contra o que lê no jornal, que só anuncia desastres e desgraças, de onde vem essa
sua alegria?” (SOARES, 2008, p. 81). Para responder esta questão, o aluno precisa
imaginar tal situação e criar uma hipótese para ela.
A intertextualidade é pouco explorada neste LD, mas poderia ser mais e melhor.
Na seção “Interpretação Escrita” sobre a reportagem “Somos todos um só”, de Norton
Godoy, podemos ver um exemplo: “Recorde: o editorial que você leu na unidade anterior
(p. 116) afirma que o único critério democrático para a determinação da raça de uma pessoa
é a autodefinição. No entanto, nos EUA, esse critério não é usado. Responda: Por que o
critério da autodefinição não é usado nos EUA?” (SOARES, 2008, p. 134). Para responder,
o aluno deve voltar à página 116, rever o conceito de autodefinição e estabelecer uma
relação entre os dois textos para explicar o motivo de os EUA não o usarem.
A comparação é outra capacidade pouco desenvolvida neste LD, mas temos um
exemplo ainda na página 134 do mesmo: “Reveja a cópia do trecho do questionário do
Censo brasileiro, na p.117, e recorde os cinco grupos raciais em que é distribuída a nossa
população. Compare-os com os sete grupos raciais em que é distribuída a população norte-
americana e conclua: (...)”(SOARES, 2008, p. 134). Outro aspecto pouco desenvolvido é o
acesso ao conhecimento prévio do aluno a fim de auxiliar a interpretação; o que ocorre é
verificar se o aluno sabe algo que é citado no texto, mas não explicado, isto é, algo que o
autor empírico27 entende que seu leitor já sabe. Na seção “Interpretação Escrita” da
reportagem “Histórias de pais em estúdios de tattoo”, do jornal Folha de São Paulo,
podemos ver um exemplo: “Recorde o início da reportagem: ‘A lei estadual sobre piercings
e tatuagens...’. O que é uma lei estadual?” (SOARES, 2008, p. 29).
A leitura crítica, a nosso ver, também é pouco desenvolvida neste LD, já que há
várias questões que indagam o aluno sobre o que ele pensa ou acha do assunto sem levá-lo
ou estimulá-lo a argumentar e a justificar sua resposta. Inclusive, existem perguntas que
visam verificar se o aluno concorda ou não com determinada afirmação do texto lido, mas
que não pedem para que ele argumente e fundamente sua posição. E, nestes casos, as

27
Chamamos de empírico o autor do texto contido na coletânea textual do LD, ou seja, o autor do conto, da
crônica, da reportagem etc.

85
orientações ao professor que, nas demais perguntas, traz sugestões e os objetivos das
mesmas, nestas apenas diz que a resposta é pessoal e individual de cada aluno. Podemos
ver um exemplo deste tipo na seção “Interpretação Escrita” sobre a entrevista do cantor
Martinho da Vila concedida ao Almanaque Brasil: “O entrevistador pergunta a opinião de
Martinho da Vila sobre o sistema de cotas (terceira pergunta): o cantor se declara favorável.
Que argumento ele apresenta em defesa de seu ponto de vista? Você concorda com este
argumento?” (SOARES, 2008, p. 158). Alguns alunos, ao responderem, podem justificar
sua opinião (mesmo a pergunta não pedindo isto), mas outros talvez não o façam,
infelizmente.
Ao lermos outras atividades que, aparentemente, buscam desenvolver a leitura
crítica e reflexiva, avaliamos que elas poderiam ser melhor elaboradas para que o aluno não
apenas exerça sua apreciação de valor, mas também reflita e refrate sobre o que estudou.
Na unidade três, por exemplo, há um cartaz de Elifas Andreato para o “Gênero e Raça: 1º
Encontro Latino-Americano” de 1990 e na seção “Interpretação Oral” respectiva a ela, há a
seguinte atividade: “Avaliem o cartaz: vocês acham que aimagem representa bem o tema
do Encontro? O cartaz é atraente? Motiva as pessoas a se interessarem pelo Encontro?”
(SOARES, 2008, p. 166). As perguntas são adequadas para o aluno apreciar o cartaz e
avaliar se ele atingiu seu objetivo, mas a autora deveria considerar a hipótese de que algum
aluno respondesse que não a estas perguntas e, assim, deveria formular uma atividade que
pedisse para que o aluno fizesse um cartaz que chamasse a atenção para o Encontro e,
portanto, esta atividade poderia estar na seção de interpretação escrita e não oral.
Já que mencionamos a atividade com este cartaz, aproveitamos para colocarmos
nossas conclusões sobre o trabalho com a multimodalidade deste LD. Pensamos que a
coletânea textual traz vários exemplos de multimodalidade como fotos, cópias reduzidas e
cartazes, mas as perguntas sobre os mesmos param na mera expressão da opinião do aluno,
como vimos acima. Há questões que visam a desenvolver a leitura de imagem, como
podemos observar na página 106, na seção “Interpretação Escrita” da foto exibida na
página 104 que retrata o corpo de um homem estendido na calçada de uma avenida do Rio
de Janeiro e um casal e um corredor que, apesar de estarem na cena, não se importam com

86
o homem morto: o exercício pergunta o que o casal está fazendo, onde a morte está na foto
e o que seria o “jogging28”.
Atividades que requerem mais de uma capacidade leitora não são constantes
neste LD, pois a grande maioria delas objetiva desenvolver uma capacidade de cada vez e
exibe, em seu enunciado, o trecho que o aluno deve relembrar ou reler para responder a
questão, ao invés de mandá-lo localizá-lo no texto. Podemos observar um exemplo desse
tipo de questão na seção “Interpretação Escrita” sobre a crônica “A Morcega” de Walcyr
Carrasco: “No início da crônica, o narrador recorda sua relação com o pai na adolescência:
‘Meu pai resistiu a tudo... só entregou os pontos quando me viu desbotando um jeans
novinho...’. ‘Meu pai resistiu a tudo’: como se comportou o pai até o momento em que viu
o filho desbotando um jeans novinho?” (SOARES, 2008, p.19).
Os poucos exercícios que requerem mais de uma capacidade, normalmente
desenvolvem a localização da resposta e a opinião do aluno, ou seja, pede para que o aluno
responda a uma pergunta baseado em uma afirmação do texto e, depois, pede sua opinião a
respeito disso ou sobre algo relacionado. Mesmo nesse tipo de questão, às vezes, a autora
exibe o trecho que deve ser relido e pede para que o aluno localize a resposta no texto. Um
exemplo pode ser visto na seção “Interpretação Escrita” sobre a reportagem “O sonho de
ser dono do próprio nariz” de Inês Amorim: “Recorde o título da reportagem: ‘O sonho de
ser dono do próprio nariz’. O que quer dizer “ser dono do próprio nariz?”; Em sua opinião,
este título é adequado ao conteúdo da reportagem? É atraente, motivando o leitor a ler a
matéria?” (SOARES, 2008, p. 36).
Quanto ao critério que avalia se os gêneros usados na coletânea textual são
adequados aos objetivos das questões, pensamos que eles são sim adequados para as
atividades propostas pela autora, já que são gêneros representativos de esferas socialmente
relevantes, como dissemos no capítulo anterior e pelos exercícios se concentrarem em
letramentos específicos para se ler cada gênero. Portanto, cada atividade de leitura foi
pensada de acordo com o gênero estudado naquele momento.

28
Nome dado ao corredor por Claudia Corbusier, autora do artigo de opinião “O casal, a morte e o
‘jogging’, exibido na página 105 do LD.

87
Também concluímos que os gêneros expostos são favoráveis a leitura crítica,
pelas mesmas razões que os consideramos adequados aos objetivos propostos, apesar de
pensarmos que a leitura crítica não é estimulada, incentivada e desenvolvida de maneira
satisfatória por este LD pelos motivos mencionados anteriormente.
As questões interpretativas, deste LD, situam (em alguns casos) os gêneros da
coletânea textual, mas esta função fica mais a cargo da seção intitulada “Preparação para a
Leitura”, que antecipa para o aluno que gênero ele lerá, qual seu tema etc. Esta seção
também traz, normalmente, cópias reduzidas dos gêneros e, portanto, quando o exercício
situa o gênero, apenas complementa o que já foi realizado na “Preparação para a Leitura”.
Um exemplo que mostra a contextualização realizada nessa seção e nas atividades de
interpretação pode ser visto na primeira unidade, mais especificamente no texto seis da
mesma, na qual a “Preparação para a Leitura” traz os seguintes dizeres: “(...) o texto que
vocês vão ler é informativo29. Ele foi publicado num jornal – vejam ao lado, na cópia
reduzida, o texto: ele informa sobre uma pesquisa a respeito de adolescentes. (...) (o texto
informativo) mostra os adolescentes não na percepção que os outros têm deles, mas pela
identificação do que eles são, segundo dados fornecidos por eles mesmos, obtidos por meio
de uma pesquisa.” (SOARES, 2008, p. 53). A primeira questão sobre essa reportagem
(“Pesquisa mostra perfil do namoro”) situa o aluno sobre o suporte na qual a mesma foi
originalmente publicada: “Como os jornais são feitos para serem lidos no mesmo dia em
que são publicados, o texto que você leu, publicado num jornal (...) (SOARES, 2008, p.
56).
Gostaríamos de ressaltar, rapidamente, que Soares possui em sua coleção duas
seções de interpretação, como já mostramos anteriormente: a interpretação escrita e oral e,
para cada uma delas, propõe um objetivo. Há textos que possuem essas duas seções e há
textos que possuem apenas uma delas, mas em ambos os casos a autora, em suas
orientações, explicita suas intenções. Pensamos que a existência da interpretação oral é um
ponto positivo neste LD, já que a oralidade não é muito desenvolvida nos materiais

29
Grifo da autora.

88
didáticos e esta seção propõe que os alunos discutam e debatam, juntamente com o
professor, as questões postas.

7.2.2 – Análise de uma atividade representativa do volume de 7º ano


Escolhemos como atividade representativa do Português: Uma Proposta para o
Letramento do 7º ano o texto seis da primeira unidade do LDP (“Nós Somos Assim?”) que
é uma reportagem de Guilherme Aragão para o jornal Estado de Minas do dia 12 de junho
de 1998 intitulada “Pesquisa mostra perfil do namoro”. Optamos por analisá-la por ela
conter e trabalhar um infográfico com dados estatísticos de uma pesquisa realizada pela
educadora sexual Lilian Geo Soares Berller sobre os relacionamentos afetivos dos
adolescentes; ou seja, a escolhemos por ser multimodal, por pertencer a esfera jornalística
(que foi a esfera mais contemplada neste LDP) e por representar a didatização da leitura
realizada por Soares neste volume.
Esta reportagem é contextualizada sobre seu suporte original na seção
“Preparação para a Leitura”, que a antecede. Nela, há uma cópia reduzida da página do
jornal no qual a reportagem foi publicada, além de uma explicação acerca do que é um
texto informativo. A seguir, uma cópia desta página:

89
Figura 13 – Exemplo de contextualização de coletânea textual em Português: Uma Proposta para o
Letramento 7º ano EFII

A seguir, temos cópias reduzidas dos gêneros propriamente estudados:

90
Figura 14 – Exemplo de exercício Português: Uma Proposta para o Letramento 7º ano EFII

A primeira questão é dividida em letras a, b e c e situa os alunos quanto ao


jornal, já que diz que ele é feito para ser lido no mesmo dia em que é publicado. Esta
atividade trabalha a noção de tempo no jornal, pois extrai os seguintes trechos: “No primeio
bimestre deste ano...” e “Hoje30 é dia dos namorados...”. A seguir, a letra a pede para que
os alunos descubram em que meses de que ano os adolescentes foram entrevistados; a letra
b pergunta a que data se refere a palavra hoje na frase inicial do texto e a letra c pergunta
onde os alunos encontraram essas informações. A nosso ver, este primeiro exercício
objetiva desenvolver o letramento para leitura de jornal, já que os alunos terão de saber
onde poderão localizar as informações requisitadas e, sendo assim, a capacidade leitora
objetivada é a localização, ou seja, uma capacidade primária.
A segunda questão recorda o início da reportagem: “Hoje é dia dos namorados,
mas [...] poucos terão o que comemorar”. A pergunta é por que poucos teriam o que

30
Grifos da autora.

91
comemorar nesse dia e, para responder corretamente, os alunos terão apenas de localizar a
informação de que somente 25% dos entrevistados estavam namorando. A terceira questão
requer a mesma capacidade leitora, já que pede para que os alunos localizem a frase “Não é
por acaso” e pergunta o que é que não é por acaso e por que não é por acaso. As respostas
para estas perguntas estão logo em seguida e são os resultados da pesquisa realizada pela
educadora sexual mencionada acima. A quarta questão segue pelo mesmo caminho, já que
pergunta que explicações a pesquisadora dá para a preferência dos jovens pelo “ficar” e
basta o aluno localizar esta resposta no texto. O que a destaca é o fato de ela perguntar se os
alunos concordam ou não com a pesquisadora, o que consideramos uma leitura crítica. Ela
poderia perguntar o porque da opinião dos alunos para enfatizar mais ainda a atitude
responsiva ativa. Porém, é bom salientarmos que este tipo de questão é uma das poucas em
todo o volume.
A quinta questão é dividida em letras a e b e também requer que os alunos
localizem as respostas certas, mas agora não só na reportagem, mas também no infográfico
que a acompanha. Novamente a autora retira uma frase do texto (“Mas isto nem sempre
acontece”) e pergunta o que nem sempre acontece (letras a) e por que isto nem sempre
acontece (letras b). Mesmo passando a analisar o gráfico, Soares o faz de maneira simplista
nessa questão, pedindo para que os alunos apenas localizem informações nele. A sexta
questão pergunta o que para a pesquisadora significa o “ficar” e o que não significa, isto é,
mais uma atividade de localização, já que a resposta está contida na reportagem.
A sétima e última questão é dividida em letras a e b e recorda um comentário
do jornalista: “...parece que os entrevistados acreditam que inteligência não faz parte do
caráter31...”. A letra a afirma que o jornalista tem uma opinião diferente da dos
entrevistados sobre as relações entre inteligência e caráter e pergunta qual é a opinião dele,
a qual está no quarto parágrafo da reportagem e basta os alunos a localizarem. A letra b
pergunta, agora, qual é a opinião dos alunos: se eles concordam ou não com o jornalista.
Novamente, temos uma questão que tende a desenvolver a leitura crítica, mas não requisita
nenhum tipo de reflexão ou argumentação por parte dos alunos. Alguns deles podem dizer

31
Grifo da autora.

92
os motivos pelos quais concordam ou não com o repórter, mas outros podem não dizer
porque a questão não pede.

7.2.3 – Análise geral do volume de 9º ano


A partir de agora analisaremos os exercícios de interpretação e compreensão de
textos do Português: Uma Proposta para o Letramento dedicado ao 9º ano. As capacidades
leitoras mais desenvolvidas nessas atividades são, novamente, a localização e a formulação
de inferências e hipóteses, seguidas da intertextualidade, da comparação, do acesso ao
conhecimento prévio do aluno e, finalmente, da leitura crítica. O uso dessas capacidades
para desenvolver letramentos específicos para se ler determinados gêneros continua
constante neste volume, como no LD do 7º ano.
Na seção “Interpretação Oral” da entrevista realizada pela revista Veja com o
cientista Peter Ward, podemos ver um exemplo de como as atividades se voltam aos
letramentos específicos: “Vocês leram o texto que introduz a entrevista. O texto que em
geral precede as perguntas e respostas, em entrevistas jornalísticas, pretende dar ao leitor
informações que motivem e orientem a leitura. (...) Qual é o tema? Sob que perspectiva o
entrevistado discutirá o tema? (...) Quem é o entrevistado? Por que foi escolhido para ser
entrevistado?” (SOARES, 2008, p. 42). A autora, nas orientações ao professor, explicita
que o objetivo das questões é levar os alunos a identificar características de um texto
introdutório em uma entrevista e também analisar os recursos de estilo jornalístico.
A localização é, sem dúvida, a capacidade leitora mais requisitada neste LD,
pois ela está presente (mesmo que implicitamente) na maioria das perguntas; até naquelas
nas quais o enunciado já traz o trecho correto para o aluno reler, a localização das respostas
no texto é pedida, como podemos observar na seção “Interpretação Escrita” do texto “O
tempo e você”, de Alexander Martins Vianna: “Recorde a primeira frase do texto: ‘Nós
estamos sempre construindo convenções de tempo’. O texto fala de três das convenções de
tempo que nós construímos: Quais são Elas? Por que são consideradas convenções?”
(SOARES, 2008, p. 66).
A produção de inferência é a segunda capacidade de leitura mais desenvolvida.
Podemos ver um exemplo de pergunta que a objetiva na seção “Interpretação Escrita” da

93
crõnica “O relógio”, de Rubem Alves: “ ‘Só muito mais tarde vim a entender o que ele
dizia: ‘Tempus fugit’’. Relógio não fala... como o relógio dizia ‘Tempus fugit’?”
(SOARES, 2008, p. 93). O aluno, então, teria de imaginar o relógio de parede da crônica,
lembrar de como ele funciona e inferir que ele fala através de suas batidas.
A formulação de hipóteses é a terceira capacidade mais objetivada neste LD e
está ligada a imaginação dos alunos, baseada no que o texto diz. Na seção “Interpretação
Escrita” da fábula “O lobo e o cordeiro”, de La Fontaine, podemos ver uma atividade que
exemplifica a produção de hipóteses: “Sabe-se que, quando La Fontaine publicou esta
fábula, o preceito moral dela foi criticado por muitas pessoas, que não concordavam com
ele. Em sua opinião, que argumentos podem ser apresentados contra o preceito moral da
fábula?” (SOARES, 2008, p. 107). As orientações da autora explicam que a resposta é
pessoal, mas também fornecem ao professores as possíveis respostas.
O estabelecimento de relações entre textos, por meio da intertextualidade, é
mais utilizada na primeira unidade do volume, na qual o tema é a existência ou não de vida
extraterrestre e o objetivo, segundo Soares, é a leitura, interpretação e produção de textos
argumentativos e, portanto, as atividades focam nos argumentos e a intertextualidade é
usada para estabelecer relações entre diferentes textos que abordam opiniões distintas sobre
o assunto. Na seção “Interpretação Escrita” sobre a reportagem “A hora do encontro”, da
revista Superinteressante, podemos ver o primeiro exemplo de exercício intertextual da
unidade: “Qual seria a opinião do autor do texto anterior (Onde estão os Ets?) sobre os
pontos de vista apresentados nessa reportagem (...)?” (SOARES, 2008, p. 22). O segundo
exemplo está na seção “Interpretação Oral” sobre a entrevista do cientista Peter Ward para
a revista Veja: “Recordem as palavras do entrevistado, citadas no fim do texto. Qual ou
quais dos cientistas que vocês conheceram nos textos 1 e 2 concordariam com o
entrevistado? Quais não concordariam?” (SOARES, 2008, p. 43). Como podemos notar,
estes exercícios possuem o intuito de fazer com que os alunos confrontem opiniões
divergentes através dos argumentos de cada pessoa.
As capacidades de leitura menos requisitadas neste volume são a comparação e
o acesso ao conhecimento prévio do aluno que, a nosso ver, deve ser valorizado e utilizado
para melhorar e complementar a interpretação e compreensão. A comparação, por vezes,

94
está ligada à intertextualidade, pois pode ser usada para comparar aspectos de dois textos,
como podemos ver na seção “Interpretação Oral” da crônica “O relógio”, de Rubem Alves,
na qual há o capítulo “A pêndula” de Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de
Assis: “O efeito de bater do relógio sobre o narrador é diferente, na crônica O relógio e em
A pêndula. Comparem e expliquem: Na crônica, o bater do relógio durante a noite causava
medo no narrador (...) Em A pêndula, o bater do relógio durante a noite fazia mal ao
narrador (...)” (SOARES, 2008, p. 96). Então, o enunciado pede para que o aluno compare
que mensagens o bater do relógio transmitia ao narrador de cada texto.
Já o conhecimento prévio do aluno, nas seções de interpretação textual, é
requisitado em poucas oportunidades, como por exemplo, na seção “Interpretação Oral”
sobre o artigo de opinião que é contra a compra de armas pelos cidadãos comuns, publicado
no jornal Folha de São Paulo: “(...) Relacionem a posse de armas com certas atividades e
prodissões e concluam: que cidadãos escapariam à proibição de compra de armas?”
(SOARES, 2008, p. 121). Na verdade, a seção “Preparação para a Leitura” é a que se
dedica a contextualizar o texto que irá ser lido e a explorar o conhecimento prévio do aluno.
Um bom exemplo é a da página 27, que situa o aluno sobre a transmissão de A Guerra dos
Mundos, de H. G. Wells por Orson Welles.
Através da análise quantitativa da coletânea textual, verificamos que há muitos
textos multimodais como fotos, cópias reduzidas de páginas de jornais e revistas, capas de
livros e reproduções de pintura. No entanto, ao analisarmos as atividades de leitura,
concluímos que estes textos foram utilizados para situar o aluno em relação ao tema, ao
autor ou ao suporte original do texto, o que é muito positivo, mas eles são foram
aproveitados no momento da compreensão textual. Um exemplo disso está na segunda
unidade, mais especificamente na parte em que a fábula de La Fontaine, “O lobo e o
cordeiro”; ela é seguida de um desenho feito por Gustavo Doré para a mesma, porém,
nenhuma questão da seção “Interpretação Escrita” faz menção a ele, o que poderia ser
realizado. A autora, em sua orientação ao lado do desenho, propõe que o professor oriente a
análise do mesmo pelos alunos, chamando a atenção deles para o jogo de luz e sombra, o
movimento da vegetação e do rio e a postura do lobo e do cordeiro; a nosso ver, isso
poderia ser realmente feito e não apenas sugerido.

95
A leitura crítica, por sua vez, é mais desenvolvida neste volume de 9º ano do
que no anterior, de 7º ano. Todavia, um aspecto é comum entre os volumes: há mais
questões que requisitam apenas a opinião do aluno do que perguntas que pedem a opinião, a
fundamentação e argumentação. Há até exercícios que perguntam se o aluno concorda ou
não com algo, mas não pedem justificativa, como é o caso da mesma seção de interpretação
da fábula mencionada acima: “Você concorda ou não com o preceito moral da fábula?”
(SOARES, 2008, p. 107). Um dos poucos exemplos de perguntas que desenvolvem a
leitura crítica e reflexiva, totalmente, pode ser visto na seção “Interpretação Escrita” sobre a
entrevista de José Paulo Paes dada ao Jornal do Brasil: “Você concorda que os jovens não
tem o costume de conversar, não tem o que comunicar um ao outro? Justifique.” (SOARES,
2008, p. 171).
Outro traço semelhante ao volume anterior é a rara presença de questões
formuladas com o intuito de desenvolver mais de uma capacidade de leitura e isso se dá
neste volume pelos mesmos motivos: a exibição dos trechos que devem ser relidos nos
enunciados das questões e a presença de um único objetivo.
Pensando no segundo e no terceiro critério de análise, concluímos que os
gêneros utilizados na coletânea textual deste volume são adequados aos objetivos das
questões e a leitura crítica e reflexiva, por serem representativos de esferas sociais
relevantes e, consequentemente, por representarem o que circula socialmente em veículos
de comunicação e na literatura.
Em relação ao terceiro critério, pensamos que algumas questões interpretativas
situam os textos estudados, mas não são todas. O melhor exemplo é a seção “Interpretação
Escrita” da crônica “Bilhete ao futuro”, de Affonso Romano De Sant´Anna, que em três
atividades exibe boxes que contextualizam o aluno sobre algumas coisas citadas no texto
como ecologia, Perestroika e a terra prometida na Bíblia.

7.2.4 – Análise de uma atividade representativa do volume de 9º ano


Escolhemos como atividade representativa do Português: Uma Proposta para o
Letramento de 9º ano o primeiro texto da unidade três (“O homem: lobo do homem?”) que
é a fábula de Jean de La Fontaine intitulada “O lobo e o cordeiro”. A escolhemos por ser da

96
esfera literária (uma das mais contempladas neste LDP), por conter uma ilustração feita por
Gustavo Doré (que ilustrou várias fábulas do autor francês) e por representar como a
didatização da leitura é desenvolvida neste volume, inclusive em relação aos textos
multimodais, como é o caso deste desenho.
A contextualização da fábula é feita na seção “Preparação para a leitura”, na
qual há um conceito de fábula extraído do dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, uma
foto e uma pequena biografia de Jean de La Fontaine, como podemos ver a seguir:

Figura 15 – Exemplo de contextualização de coletânea textual Português: Uma Proposta para o


Letramento 9º ano EFII

Abaixo, cópias reduzidas das páginas nas quais estão a fábula, o desenho de
Gustavo Doré e a primeira questão de interpretação:

97
Figura 16 – Exemplo de exercício Português: Uma Proposta para o Letramento 9º ano EFII

A seguir, há a fábula em uma página e, na outra, a ilustração de Gustavo Doré e


a primeira questão da seção “Interpretação Escrita” que, dividida em letras a, b, c e d,
objetiva que os alunos entendam a dinâmica e a ordem dos acontecimentos da fábula por
meio da localização das seguintes informações: primeiro argumento do lobo que justifica
sua ameaça ao cordeiro; o lobo apresenta esse argumento com fingida mágoa: com que
objetivo ele finge estar magoado?; o contra-argumento do cordeiro e a atitude do lobo
diante do contra-argumento do cordeiro.
A segunda questão pede para que os alunos identifiquem o segunda argumento
do lobo, o segundo contra-argumento do cordeiro e a reação do lobo ao contra-argumento
do cordeiro. Apesar de pedir para identificar, a autora quer, na verdade, que os alunos
localizem essas informações na fábula e o mesmo ocorre na questão número três, já que ela
pede para que os alunos identifiquem o terceiro argumento do lobo e que pressuposto está
subjacente a esse argumento, o terceiro contra-argumento do cordeiro e a resposta do lobo e
seu pressuposto subjacente.

98
A quarta questão pergunta se era o lobo ou o cordeiro que tinham razão; a
resposta correta é dizer que o cordeiro tinha razão, já que o lobo inventava fatos para seus
argumentos. Acreditamos que os alunos responderiam facilmente esta questão, por se tratar
de entender a fábula. A quinta questão recorda as palavras finais do lobo (“Necessária a
vingança se faz”) e pergunta se foi mesmo por vingança que o lobo devorou o cordeiro e
ainda requer que o aluno justifique. Para responder esta questão, o aluno terá que perceber e
inferir que o lobo não tinha motivos para se vingar e o fez por razões que a fábula não
menciona. Já a sexta questão pede para que os alunos identifiquem a moral da história, a
expliquem e a relacionem com a fábula; para tanto, basta os alunos localizarem a primeira
frase (“A razão do mais forte vai sempre vencer”) e inferirem que o lobo “ganhou” por ser
mais forte do que o cordeiro.
A sétima questão diz em seu enunciado que quando esta fábula foi publicada,
muitos criticaram sua moral, pois não concordavam com ela. A letra a pergunta se, na
opinião dos alunos, que argumentos podem ser apresentados contra a moral da história e a
letra b se os alunos concordam ou não com o preceito moral da fábula. Para responder a
letra a, os alunos terão de levantar hipóteses e, na letra b, os alunos dirão se concordam ou
não com a moral da história, mas a pergunta não pede argumentação e reflexão, novamente.
A oitava questão pede para que os alunos revejam a definição de fábula, que diz que nelas
os animais agem como pessoas e pede para que os alunos pensem que modos de agir dos
seres humanos é semelhante ao modo de agir do lobo e do cordeiro. São respostas pessoais
que deverão ser embasadas na memória discursiva dos alunos.
A nona e última questão recorda uma frase de uma página anterior, da mesma
unidade: “Homo homini lupus: O homem, lobo do homem. O homem é um lobo para outro
homem”. A letra a desta questão pede que os alunos expliquem esta frase e a letra b retoma
o nome da unidade (O homem: lobo do homem?) e pergunta qual é o objetivo de apresentar
essa frase como pergunta.
Como pudemos observar, a ilustração de Doré foi posta ali para exemplificar a
fábula em uma representação artística ou até mesmo para preencher aquela página, já que
não foi aproveitada e explorada em nenhum atividade de leitura. As capacidades leitoras
mais objetivadas foram as primárias e, novamente, a leitura crítica não foi satisfatoriamente

99
realizada, já que Soares pede, apenas, a mera opinião do aluno sem nenhum argumento ou
reflexão.

100
Considerações Finais

Ao fim de todas as análises realizadas anteriormente, pensamos que podemos


responder às questões de pesquisa feitas na introdução deste trabalho; perguntas que
poderiam ser para qualquer material didático, livro ou apostila (e futuramente um cd-rom
ou um site, talvez), pois são questionamentos que acreditamos ser fundamentais no
momento de se produzir, escolher e utilizar um material didático, segundo nosso
posicionamento e fundamentação teórica. Porém, antes de respondê-la, sintetizaremos as
conclusões que foram feitas ao longo desse trabalho a fim de relacioná-las entre si e entre
as respostas às questões de pesquisa.
O primeiro aspecto analisado foi o MP de cada coleção no que tange o trabalho
com a didatização da leitura e, nessa análise, concluímos que os MPs de ambas as obras são
semelhantes (salvo que o do livro Português: Uma Proposta para o Letramento aprofunda-
se mais ao explicar sua base teórica), pois possuem, basicamente, os mesmos objetivos de
ensino em Língua Portuguesa e em desenvolvimento da leitura. Essa semelhança de
pensamentos se confirma nas análises seguintes, referentes às coletâneas textuais e aos
exercícios de interpretação e compreensão textual, já que concluímos que as duas coleções
não contextualizam satisfatoriamente no que diz respeito à discursividade e não
desenvolvem a atitude responsiva ativa através da leitura crítica e situada nas seções de
questões.
Além disso, ambas as coletâneas são semelhantes, pois possuem boa qualidade
(apresentam variados gêneros, multimodais e não apenas verbais e privilegiam esferas
sociais relevantes, como afirma o Guia do Livro Didático 2008). Isso vem de encontro à
primeira pergunta de pesquisa que referia-se sobre a contextualização das coletâneas
textuais e questionava se elas eram tratadas discursivamente. Concluímos que Português na
Ponta da Língua não trata de maneira discursiva os textos de suas coletâneas e,
consequentemente, não os contextualiza nem através dos enunciados das atividades de
leitura, como mostramos na análise dos exercícios. Afirmamos isto através da constatação
de que os textos, salvo por seus créditos, não são contextualizados, já que não há nenhuma
informação sobre seus autores, suas condições de produção, seus suportes originais etc. Ao
101
observarmos este fato e lermos seu MP, pensamos que essa contextualização deve ficar sob
a responsabilidade do professor e isto demonstra, a nosso ver, que os autores de Português
na Ponta da Língua não consideram esse tratamento discursivo importante, senão o teriam
feito.
Em relação ao Português: Uma Proposta para o Letramento, podemos dizer
que este LDP trata um pouco mais discurivamente sua coletânea textual, já que apresenta a
seção “Preparação para a Leitura” que situa o aluno quanto ao tema do texto, seu autor, seu
suporte original e quanto ao gênero propriamente dito, alguma vezes através de fotos dos
autores e suas biografias, cópias reduzidas dos livros, revistas e jornais dos quais os textos
foram retirados etc. No entanto, concluímos que a autora o faz para ensinar letramentos
específicos e o faz de maneira rasa, já que uma foto e uma pequena biografia dos autores
não contextualiza de maneira abrangente e completa e, daí, o professor deve e pode
interferir e fazer a sua própria contextualização do texto a ser estudado. Comprovamos isso
ao concluírmos, baseados na análise dos exercícios de leitura, que a real intenção da autora
ao fazer isso, principalmente quando se trata de textos da esfera jornalística, não é
contextualizar o aluno sobre tudo o que ronda o texto e sim desenvolver nele letramentos
específicos para determinadas leituras. Afirmamos isto porque há uma ênfase em se
explicar e em se explorar características específicas dos gêneros, como a diagramação, o
estilo, os recursos, o suporte etc. Pensamos que isto é positivo, sem dúvida, mas Português:
Uma Proposta para o Letramento poderia ter também a intenção de contextualizar os
textos para desenvolver a leitura crítica e reflexiva dos alunos.
Aliás, pensando nessa questão da contextualização e da sua dependência do
espaço das páginas do LD como o temos hoje, em papel, se faz cada vez mais presente e
atual a necessidade de se modificar o formato do LD; com o advento tecnológico pelo o
qual passamos, o papel não tem dado mais conta de suportar, digamos assim, gêneros
multimodais como músicas, vídeos de diversos tipos (clips, documentários, filmes, etc), já
que quando coloca-se uma música em um LD, pode-se trabalhar apenas com sua letra, já
que o PNLD não autoriza os LDs a terem uma mídia como um cd-rom, CD ou DVD como

102
satélite32 e, então, a multimodalidade do gênero não é trabalhada. O ideal seria se o LD
pudesse ser desenvolvido em ambiente digital, para que professores e alunos pudessem
utilizar todas as formas composicionais e estilísticas do gênero. Obviamente, isso depende
de mudanças estruturais, financeiras e até culturais, já que escolas, professores e alunos
teriam de mudar seus espaços físicos, obter recursos como computadores, projetores, telões
e outras ferramentas e mudar seus costumes em relação ao uso de um LD.
Passemos agora à segunda questão de pesquisa, que visava verificar como a leitura
era trabalhada pelos LDPs através dos exercícios de interpretação e compreensão textual,
ou seja, o que eles buscavam desenvolver. Para esta pergunta, a resposta é, novamente,
semelhante para as duas coleções analisadas, já que ambas desenvolvem muito mais as
capacidades primárias de leitura em detrimento da intertextualidade, da multimodalidade e
da leitura crítica e reflexiva através da atitude responsiva ativa. O que diferencia uma
coleção da outra é que Português: Uma Proposta para o Letramento, além de fazer isso,
propõe atividades que visam desenvolver letramentos específicos nos alunos, como leitura
de gêneros da esfera jornalística, como já mencionamos acima. Salvo este fato, ambos os
LDPs, a nosso ver, tratam a leitura de maneira rasa, sem aprofundá-la e levá-la para a
crítica e a reflexão, o que empobrece a didatização da mesma. Assim sendo, concluímos
que nosso corpus não dá voz aos alunos e portanto, não faz os professores ouvirem o que
seus educandos têm a dizer.
Assim sendo, atestamos que a pesquisa realizada por Kleiman (1996) continua
atual, pois, ao analisarmos apenas duas amostras de LDP de Ensino Fundamental,
concluímos que os modelos cognitivos e estruturais (ascendentes, descendentes e
interativos), insuficientes para os letramentos críticos, ainda vigoram no cenário do ensino
de leitura brasileiro.
A terceira e última questão de pesquisa buscava entender como a postura
didática de cada LDP, em relação a leitura, guiava o trabalho do professor. Obviamente
que, para termos certeza de nossas conclusões, deveríamos observar aulas de Língua

32
Salvo os LDs de línguas estrangeiras modernas (Inglês e Espanhol) que devem conter CDs de áudio. Para
saber mais, acesse o Guia dos Livros Didáticos de Línguas Estrangeiras Modernas 2001 através do link
http://www.fnde.gov.br/index.php/pnld-guia-do-livro-didatico. Acesso em 27/10/2010.

103
Portuguesa nas quais estas coleções são usadas, mas acreditamos que tanto Português: Uma
Proposta para o Letramento quanto Português na Ponta da Língua deixam a cargo do
professor a contextualização dos textos para que esta auxilie na leitura crítica, já que
Português: Uma Proposta para o Letramento realiza esta contextualização para fins de
letramentos e de maneira rasa, como dissemos anteriormente. Pensamos que o trabalho do
professor que optar por essas coleções será diferente do que ele pensou que seria ao ler as
resenhas avaliativas das mesmas no Guia do Livro Didático 2008, pois através de nossas
análises, encontramos diferenças entre o que as resenhas afirmam e o que os LDPs
realmente fazem, como também já dissemos anteriormente.
Por exemplo, ancorados no que lemos no Guia do Livro Didático 2008,
achávamos que o Português: Uma Proposta para o Letramento não contextualizaria seus
textos e que o Português na Ponta da Língua o faria com maestria e, no fim das contas,
comprovamos o contrário. Portanto, talvez também a própria avaliação do PNLD não
atribua a esse aspecto a importância devida e esta atitude pode dificultar, em algum
momento, o trabalho em sala de aula do professor que, como nós, ao ler a resenha
avaliativa de uma das coleções, pensou uma coisa e se deparou com outra.
Finalizamos este trabalho de conclusão de curso com a certeza de que a
avaliação pelo PNLD deve ser repensada quanto à redação das resenhas avaliativas e em
relação ao que elas devem enfatizar quando o olhar do parecerista está voltado para a
leitura, já que a noção dele de leitura irá moldar completamente a avaliação deste eixo de
ensino. Também estamos certo de que há muito o que se estudar, pesquisar e fazer no
campo da leitura crítica e reflexiva, já que ela é desenvolvida de maneira pouco satisfatória
e este fato somente prejudica a formação de leitores críticos pela escola. Almejamos que os
alunos possam ler criticamente e reflexivamente na escola e fora dela, para tomarem
atitudes autônomas e conscientes de tudo o que está em jogo e a sua volta.
Precisamos ouvir o que os jovens estudantes tem a dizer; precisamos dar
importância para o que eles pensam e fazer com que eles saibam perceber tudo o que está
envolvido no momento da interação, seja com o autor de um livro, de uma reportagem; seja
com um pintor, um cartunista; seja com o seu amigo de sala, com seus pais e professores
etc. Precisamos torná-los seres pensantes, ativos e protagonistas.

104
Referências Bibliográficas

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105
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SOARES, M. Português: Uma Proposta para o Letramento. Moderna: São Paulo, 2008. 7º
e 9º anos do EFII.

107
Anexos
Anexo A - Gêneros da coletânea textual do Português na Ponta da Língua
7º ano EFII
Gêneros contidos na coletânea textual do Português na Ponta da Língua do 7º ano do EFII
Gênero Quantidade
Anúncio 1
Biografia 1
Bula de remédio 1
Classificados 1
Conto 1
Crônica 1
E-mail 1
Didático 2
Glossário 2
História em quadrinhos (HQ) 1
Legenda 1
Lista telefônica 1
Mito 1
Narrativa de aventura 9
Paradidático 5
Poema 8
Receita 1
Reportagem 13
Reprodução de Pintura 7
Resenha 1
Sinopse e horário 1
Tirinha 3

Anexo B - Gêneros da coletânea textual do Português na Ponta da Língua


9º ano EFII
Gêneros contidos na coletânea textual do Português na Ponta da Língua do 9º ano do EFII
Gênero Quantidade
Anúncio 3
Artigo de Opinião 1
Biografia 2
Carta 3
Conto 4
Crônica 4
Didático 7
Entrevista 1
Folheto 1
Foto 1
Instrução 1
Letra de canção 1
Narrativa de aventura 7
Panfleto 1
Paradidático 9
Paródia 1
Peça teatral 1
Poema 5
Receita 1

108
Regulamento 1
Relato 1
Romance 3
Reportagem 11
Reprodução de Pintura 3
Resenha 1
Tira 1
Verbete 6

Anexo C - Gêneros da coletânea textual do Português: Uma Proposta para


o Letramento 7º ano EFII
Gêneros contidos na coletânea textual do Português: Uma Proposta para o Letramento do 7º ano do EFII
Gêneros Quantidade
Artigo de lei 2
Artigo de opinião 1
Capa de livro 3
Capa de revista 2
Cartaz 3
Chamada 1
Citação 2
Conceito 1
Conto 1
Cópia reduzida 1
Crônica 5
Editorial 1
Entrevista 1
Foto 14
Infográfico 2
Manchete 3
Nota biográfica 6
Notícia 1
Poema 3
Reportagem 7
Reprodução de pintura 1
Resumo 1
Romance 1
Seção de cartas do leitor 33 1
Verbete 1

Anexo D - Gêneros da coletânea textual do Português: Uma Proposta para


o Letramento 9º ano EFII
Gêneros contidos na coletânea textual do Português: Uma Proposta para o Letramento do 9º ano do EFII
Gêneros Quantidade
Artigo de opinião 3
Capa de livro 7

33
Trata-se de uma cópia de uma página de jornal que contém a chamada “seção de cartas do leitor” que nada
mais é do que a seção do jornal para a qual os leitores escrevem cartas com sugestões, críticas, reclamações,
opiniões etc.

109
Capa de revista 2
Citação 1
Conceito 2
Conto 1
Cópia reduzida 1
Crônica 7
Didático 1
Entrevista 2
Fábula 1
Foto 16
Glossário 1
Manchete 7
Mapa 1
Nota biográfica 12
Poema 4
Relato 1
Reportagem 3
Reprodução de pintura 2
Resumo 2
Romance 1
Sumário 1
Tabela 1
Verbete 1

110

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