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Universidade de Lisboa

Faculdades de Letras

Departamento de Língua e Cultura Portuguesa

Diálogo entre a linguística e a pedagogia: a voz dos docentes e


o seu conhecimento genológico.

Carolina Celeste Locci Costa

Dissertação orientada pelo Professor Doutor António Avelar

Mestrado em língua e cultura portuguesa

(PL2/PLE)

2012
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Universidade de Lisboa

Faculdades de Letras

Departamento de Língua e Cultura Portuguesa

Diálogo entre a linguística e a pedagogia: a voz dos docentes e


o seu conhecimento genológico.

Carolina Celeste Locci Costa

Dissertação orientada pelo Professor Doutor António Avelar

Mestrado em língua e cultura portuguesa

(PL2/PLE)

2012

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AGRADECIMENTO

Agradeço imensamente à minha família por oferecerem-me a oportunidade de


realizar mais esta conquista profissional e académica. Agradeço, também, a
todos os professores que fizeram parte desta jornada, e muito contribuíram
para a minha formação como mestre. Em especial, ao professor orientador
António Avelar, por toda ajuda e dedicação prestada, e também, pelas portas
que me ajudou a abrir. Na verdade, só tenho a agradecer; foram dois anos de
muita aprendizagem, tanto académica, quanto para a vida.

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Resumo

Esta dissertação em Linguística Aplicada tem como foco principal indagar


sobre o modo como o conhecimento genológico informa as práticas de ensino
das línguas no ensino básico e secundário, incluindo o ensino de Português
língua não materna.

Ao compreender o modelo de formação de professores, pretendemos contribuir


com propostas sustentadas para a (re) construção de um modelo de formação,
no que concerne à área do ensino das línguas. Para o efeito, levamos à prática
um inquérito junto de professores de língua (materna e não materna) que
revelou elementos significativos para o estabelecimento de nexos entre as
novas propostas curriculares e a praxis. Toda a análise dos dados do inquérito
está informada pela Teoria do Registo e do Género (J. Martin e J. Rothery) e
pelas propostas pedagógicas daí resultantes.

Investigamos a visão e as metodologias empregadas atualmente no uso e


ensino de textos e géneros textuais pelos professores de línguas com o intuito
de oferecer informações reais e melhorar o planeamento de cursos de
formação continuada, identificando caminhos e processos para a melhoria do
desempenho dos alunos portugueses no decorrer da vida escolar.

Palavras-chave: Literacia, Géneros textuais, Ensino e aprendizagem das


línguas, Texto, Contexto, Registo.

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Abstract

This paper, in Applied Linguistics, aims at questioning in what ways the textual
genre knowledge informs the practices of language teaching in basic and
secondary schools, including the teaching of Portuguese as a foreign language.

From understanding the teacher’s education model, we intend to contribute with


sustained propositions to a (re) construction of a training model, regarding the
language teaching area. In order to achieve it, we have developed an inquiry to
be answered by language teachers (mother tongue and second languages)
which has revealed meaningful elements for the establishment of nexus
between the newest curricular proposals and the practice. All the inquiry data
analysis is informed by the Genre and Register Theory (J. Martin and J.
Rothery) and by its pedagogical proposals.

We have investigated the language teacher’s vision, as well as, the


methodologies employed by them, nowadays, in the use and teaching of texts
and genres with the intention of offering real data and improving the planning of
teacher’s in-job training courses, identifying ways and processes to the benefit
of Portuguese students during their school years.

Keywords: Literacy, Textual genres, Language teaching and learning, Text,


Context, Register.

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Índice

Lista de abreviaturas ........................................................................................ 17


Lista de figuras, gráficos e tabelas ................................................................... 19
Introdução ........................................................................................................ 23

Capítulo I Referências teóricasBBBBBBBBBBBBBBBBBBBB.31


1. Fundamentos da Linguística Sistémico-Funcional nesta dissertação .......... 31
1.1 Língua em contexto social .......................................................................... 31
1.2 Contribuições de M. Halliday ...................................................................... 32
1.3 Conceito de género textual......................................................................... 36
1.4 Língua em contexto educacional ................................................................ 38
1.5 Teoria do Registo e do Género .................................................................. 39
1.5.1 Géneros: o ensino das línguas e através das línguas ............................. 43
2. Pedagogia Linguítica (genológica) .............................................................. 45
2.1 As etapas do processo de ensino e aprendizagem .................................... 45
3. Desenvolvimentos programáticos do pensamento genológico..................... 53
3.1 As famílias genológicas .............................................................................. 55
3.2 Desenvolvimento da metalinguagem ......................................................... 58
3.3 Texto em contexto ...................................................................................... 59
3.3.1 Padrões: texto, frase e palavra................................................................ 60
3.3.2 Contexto da cultura ................................................................................. 62
3.4 Evolução da teoria à prática ....................................................................... 63
4. Conversas entre a Linguística e a Pedagogia: uma possibilidade ............... 65
4.1 Estratégias tripartidas do R2L .................................................................... 68
4.1.1 Primeiro nível: Preparação antes da leitura ou Desconstrução,
Construção Coletiva e Escrita independente ................................................... 70
4.1.2 Segundo nível: Leitura detalhada, Construção coletiva e Reescrita
individual .......................................................................................................... 71
4.1.3 Terceiro nível: Reconstrução de estruturas, Ortografia, Escrita de frases
......................................................................................................................... 72
4.2 Seleção de textos ....................................................................................... 74
4.3 Avaliação da leitura e da escrita................................................................. 76

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Capítulo II Apresentação dos dados recolhidos ............................................... 79
1. Abordagem de análise dos dados ................................................................ 79
2. Apresentação dos resultados do inquérito ................................................... 81
2.1 Perfil dos inquiridos .................................................................................... 81
2.1.1 Ordenação por contexto de ensino ......................................................... 82
2.1.2 Ordenação por cilco de estudos .............................................................. 83
2.1.3 Ordenação por tempo de ensino ............................................................. 84
2.2 A voz dos inquiridos: práxis e opiniões ...................................................... 84
2.2.1 Opinião dos inquiridos quanto à autoria do ensino de línguas em Portugal
......................................................................................................................... 85
2.2.2 Projetos interdisciplinares com objetivos linguísticos .............................. 86
2.2.3 Grau de interferência creditado aos docentes de outras disciplinas ....... 87
2.2.4 Fontes utilizadas na seleção de textos escritos e orais ........................... 88
2.2.4.1 Finalidades da obtenção de textos de várias fontes ............................. 89
2.2.5 A escrita de textos individuais ................................................................. 92
2.2.5.1 Atividades de pré-escrita ...................................................................... 94
2.2.6 Escrita de textos coletivos e grau de intervenção do professor............... 96
2.2.6.1 Estratégias de intervenção mais comuns durante a escrita de textos
coletivos ........................................................................................................... 97
2.2.7 A prática de textos orais e as dificuldades apresentadas pelos alunos
portugueses...................................................................................................... 98
2.2.7.1 Fontes utilizadas na seleção de textos escritos e orais ...................... 100
2.2.8 Planeamento: a seleção de textos para o ensino da escrita quanto ao
tema, o tipo de texto e o uso mais comum ..................................................... 103
2.2.9 Os tipos de textos ou géneros .............................................................. 107

Capítulo III Análise dos dados apresentados ................................................. 109


1. Discussão dos dados obtidos desta investigação ...................................... 109
1.1 Acerca do perfil dos inquirirdos ................................................................ 109
2. Análise das relações entre as opiniões dos inquiridos quanto à autoria e o
grau de interferência creditada a outros espcialistas no ensino de línguas ... 112
2.1 Comparação ao grau de intervenção creditado aos outros especialistas 116
2.2 Análise da rara existência de projetos interdisciplinares .......................... 118

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3. O ensino da literacia através de tipos de textos diversos ........................... 118
3.1 Tipos de textos (géneros) mais recorrentes no ensino de línguas ........... 119
3.2 Quanto às principais finalidade para a seleção de textos de diversas fontes
....................................................................................................................... 122
3.3 Sobre a escrita de textos individuais e as etapas da pré-escrita .............. 130
3.3.1 Etapas da pré-escrita dos textos individuais em relação à escrita de textos
coletivos e aos tipos de texto trabalhados ...................................................... 134
3.2 Textos coletivos: análise dos graus de intervenção empregados nesta
modalidade de escrita .................................................................................... 139
3.3 Quais os textos orais mais produzidos e suas dificuldades...................... 141
3.4 Planeamento e as fontes de informação que baseiam a escolha de temas e
tipos de textos (ou géneros textuais).............................................................. 146

Capítulo IV Considerações finais ................................................................... 151


1. Reflexões sobre a práxis ............................................................................ 151
2. Reflexões sobre a formação linguística dos docentes ............................... 153

Referências bibliográficas .............................................................................. 157

Apêndice I Questionário ................................................................................. 161


Apêndice II Quadro 1: Opinião dos inquiridos quanto ao grau de interferência
creditada aos docentes de outras especialidades .......................................... 167
Apêndice III Quadro 2: Comparação entre à distribuição de autoria e de
capacidade de todos os docentes para o ensino da literacia ......................... 191
Apêndice IV Quadro 3: Fontes para seleção de textos e suas finalidades .... 221
Apêndice V Quadro 4: Textos individuais e atividade de pré-escrita ............. 264
Apêndice VI: Quadro 5: Textos coletivos: grau de intervenção ...................... 303
Apêndice VII: Quadro 6: Textos orais: dificuldades na produção dos mesmos
....................................................................................................................... 329
Apêndice VIII: Quadro 7: Planeamento: fontes de informações na seleção
temas e tipos de texto .................................................................................... 356
Apêndice XIX: Quadro 8: Tipos de texto mais trabalhados ............................ 381

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Lista de Abreviaturas

QECR = Quadro Europeu Comum de Referência para as Línguas

LSF = Linguística Sistémico-Funcional

R2L = Reading to Learn

TR&G = Teoria do Registo e do Género

LP = Língua Portuguesa

PLM = Português como língua materna

PLNM = Português como língua não-materna

PLE = Português como língua estrangeira

LE = Língua estrangeira

CNEB = Currículo Nacional do Ensino Básico

LPEB = Programas de Português do Ensino Básico

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Lista de figuras, tabelas e gráficos

Figura 1: Campo, relações e modo em relação às metafunções


Figura 2: Língua em relação ao registo e género
Figura 3: Estratificação da linguagem segundo a LSF
Figura 4: Género em relação ao Registo
Figura 5: Literacy in Society: The teaching cycle
Figura 6: Functional Model of language in context
Figura 7: Ciclo de aprendizagem por etapas
Figura 8: Três níveis de estratégias no programa R2L

Tabela 1: Adaptação do Mapa de géneros na escola “Map of genres in school”


Tabela 2: Seleção de fontes de textos com finalidades temática e genológica
Tabela 3: Fontes de informação para a seleção de textos sugeridas pelos
inquiridos

Gráfico 1: Perfil dos inquiridos: Ordenação por contexto de ensino


Gráfico 2: Perfil dos inquiridos: Ordenação por ciclo de estudos
Gráfico 3: Perfil dos inquiridos: Ordenação por tempo de ensino
Gráfico 4: Opinião quanto à autoria do ensino de línguas em Portugal
Gráfico 5: Envolvimento em projetos interdisciplinares.
Gráfico 6: opinião dos inquiridos quanto ao grau de interferência creditada aos
docentes de outras especialidades
Gráfico 7: Finalidades de seleção de textos fora dos manuais escolares
Gráfico 8: Número de textos individuais escritos por ano letivo segundo os
inquiridos
Gráfico 9: Atividades mais comuns realizadas pelos inquiridos antes da escrita
de textos
Gráfico 10: Média de textos coletivos escritos por alunos portugueses em um
ano letivo
Gráfico 11: Texto coletivo: estratégias de intervenção
Gráfico 12: A prática de textos falados em sala de aula
Gráfico 13: Apresentação das dificuldades mais comuns na produção do texto
oral

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Gráfico 14: Fontes usadas na seleção de textos quanto ao tema
Gráfico 15: Fontes para a seleção dos tipos de textos (géneros) ao planear
atividades de escrita
Gráfico 16:Tipos de textos mais recorrentes no ensino de línguas em Portugal
Gráfico 17: Percentagem de inquiridos que determinam o tema mas não o tipo
de texto a ser escrito por ordenação de tempo de serviço

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22
Introdução

O pensar sobre as línguas e o papel delas nas sociedades já levou muitos


investigadores a teorizar sobre esta relação. Nesta dissertação, considera-se
que as línguas fazem parte de toda a atividade humana, seja de forma oral ou
escrita. Consideram-se as línguas, portanto, desenvolvendo uma função social
através do seu uso, e não apenas confinadas ao seu sistema gramatical
(léxico-gramática). Trata-se de uma questão teórica que tem especial equidade
no âmbito desta dissertação já que, estão em causa duas dimensões
concorrentes, o ensino das línguas e o ensino através das línguas. Pretende-
se, também, demostrar a possibilidade de uma união e integração entre duas
das principais áreas de estudo ligadas ao desenvolvimento intelectual do ser
humano: a pedagogia e a linguística.

A visão usual e prática da língua vem sendo estudada há muitos anos, Bakhtin
(1986), por exemplo, ao tomar a língua como objeto de estudo disse ser
imprescindível que se determine a natureza dos enunciados estudados, para
que o objeto de estudo (a língua) não fique excessivamente abstrato, mas sim,
o mais próximo da vida, ou seja, da sua função social.

No mundo ocidental, é regra, e também senso comum, dizer que a escola é


responsável pela formação global das crianças e jovens e isso envolve, entre
muitas outras responsabilidades, a alfabetização e a formação literária dos
futuros cidadãos que irão gerir o mundo dentro de alguns anos. Em 1996, no
Relatório para a UNESCO “Educação, um tesouro a descobrir” da Comissão
Internacional sobre Educação para o século XXI, organizado por Jaques
Delors, Presidente da Comissão Europeia até 1995, preconizou-se que:

“À educação cabe fornecer, de algum modo, os mapas de um mundo complexo


e constantemente agitado e, ao mesmo tempo, a bússola que permita navegar
através dele.” (Delors,1996:89)

As estatísticas em várias partes do globo não são animadoras. Muitas


pesquisas mostram que os alunos de hoje não obtêm bom desempenho
escolar no que diz respeito ao uso e à compreensão das línguas. De acordo

23
com uma 1pesquisa, entre 2000 e 2009, a performance dos alunos portugueses
em níveis de leitura aumentou apenas 1% neste período com base nos últimos
resultados apresentados pelo relatório de PISA2.

Pensar a língua através de um olhar funcional e social pode facilitar a tarefa de


ensinar, e formar leitores críticos, capazes de interpretar e inferir, através da
leitura, escrita e fala, o mundo que os cerca, participando socialmente como
agentes de um período histórico.

“Em todo o mundo, a educação, sob as suas diversas formas, tem por missão
criar, entre as pessoas, vínculos sociais que tenham a sua origem em
referências comuns. Os meios utilizados abrangem as culturas e as
circunstâncias mais diversas; em todos os casos, a educação tem como
objetivo essencial o desenvolvimento do ser humano na sua dimensão
social. Define-se como veículo de culturas e de valores, como construção de um
espaço de socialização, e como cadinho de preparação de um projeto comum.”
(Delors, 1996:51) (sublinhado meu).

O ser humano é por natureza um ser social e a educação não pode ignorar
este fato, por isso, este e outros textos e relatórios costumam marcar
constantemente esta premissa. Talvez seja também por tais razões que, nos
dias de hoje, as teorias que, porventura, mais aceitação tem entre os
educadores são as construtivistas ou as sociointeracionistas, baseadas nas
teorias apresentadas, por exemplo, por Piaget (1959) e Vygotsky (1989)
respectivamente. Ambos teóricos estudaram a linguagem, assim como o
processo de ensino e aprendizagem do ponto de vista biológico, social e
psicológico.

Jean Piaget (1959), colaborou muito, com suas pesquisas epistemológicas e

1
Pesquisa realizada pelo professor Ulf Fredriksson, PhD. Associate professor Institute of
International Education (IIE) Department of Education in Stockholm University. Resultados
apresentados pelo autor em Conferência na Suécia, Estocolmo em 15 de maio de 2012.
2
PISA (Programme for International Student Assessment) é um estudo internacional realizado
pela OECD (The Organisation for Economic Co-operation and Development) desde 1997. O
principal objetivo do PISA é mostrar em que medida os alunos, no final da escolaridade
obrigatória, estarão preparados para fazer face às novas exigências da sociedade. Ocorre em
sistemas educacionais ao redor do mundo a cada três anos, avaliando competências dos
alunos com 15 anos de idade em disciplinas essenciais: leitura, matemática e ciências. Em
2009 65 países participaram do exame.

24
relatos de suas experiências, para a compreensão que se tem hoje de como os
seres humanos aprendem e por quais fases de aprendizagem passam no
decorrer de seu desenvolvimento. Piaget, através de inúmeras observações de
crianças em diferentes idades, realizando tarefas simples do quotidiano,
classificou o desenvolvimento humano enquanto pensamento e inteligência, em
quatro estágios: sensório-motor, pré-operatório, operatório concreto e de
operações formais. Enquanto Vygotsky (1989) classificou o pensamento
enquanto fases: fase pré-linguística do pensamento, pensamento verbal e
linguagem racional e fase pré-intelectual da linguagem. Esses conceitos não
serão aqui profundamente explorados, porém, estão mencionados por sua
relevância nos avanços entre as teorias psicológicas e também educacionais,
de base epistemológica, biológica e social. Ambos os autores e muito outros
como por exemplo, Henri Wallon (2004), contribuíram para a formação das
teorias genéticas de desenvolvimento psicológico dos seres humanos que, por
sua vez, transformaram o pensar em educação, de forma a se contrapor à
pedagogia tradicional que considerava a punição pelos erros e insucessos
cometidos pelos alunos, uma forma eficaz de ensino, com a qual os
professores podiam classificar, rotular e coagir os alunos, não só em relação à
aprendizagem de conteúdos escolares, mas também como ferramenta
ameaçadora para a manutenção da disciplina nas salas de aula.

Os conceitos construtivistas e sociointeracionistas sobre desenvolvimento e


aprendizagem se fazem sempre presentes, e levam investigadores e
professores à reflexão sobre tais processos. O papel do professor como
mediador da construção do conhecimento, sugerido por ambas as teorias é,
entretanto, muitas vezes mal interpretado, e em muitos casos, falível. A relação
entre a aprendizagem da língua, dos conteúdos escolares e suas relações com
o mundo, tendo em vista a formação de futuros cidadãos críticos e socialmente
participantes, são tarefas muito complexas para serem realizadas
independentemente, com alguma mediação (ajuda) do professor, considerado
o participante mais experiente do processo. Passar de um extremo autoritário
para outro extremo acabou, possivelmente, por diminuir a importância do papel
do professor na sociedade e pode ser considerado um dos índices do
decrescente nível de formação dos jovens atualmente.

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“The fact that some children can perform tasks like these without any apparent
teacher preparation is one factor behind the constructivism notion that Learning
emerges from within the individual and should not be constrained by teacher
instruction.” (Rose e Martin, 2012:10)

No que concerne à área da linguística, o construtivismo e o sociointeracionismo


são subsidiários do trabalho realizado no interior da sociolinguística,
amplamente estudada em várias partes do mundo. Esta área da linguística
estuda a língua sob a perspectiva da estreita relação existente entre a língua e
a sociedade onde se origina, portanto, funciona paralelamente à visão
sociointeracionista da linguagem em teorias educacionais; ambas partem do
pressuposto que a língua existe enquanto interação social, criando e
transformando-se em função do contexto sócio histórico. O contributo mais
significativo para o desenvolvimento desta terorização, terá sido do linguista
norte-americano William Lablov (1969, 1972, 1983), que em termos bem
gerais, estudou a linguagem em campo, registando-a, descrevendo-a e
analisando-a sistematicamente, tendo a variação linguística como seu principal
objeto de estudo. Enquanto teorias linguísticas e de desenvolvimento humano,
as teorias, acima citadas, contribuem muito para o progresso de seus
respectivos objetos de estudo.

Nesta dissertação tenho como referência o ensino das línguas em instituições


formais de ensino (escolas, universidade, institutos, liceus, entre outros) pelo
que é avisado não partir de um campo teórico que seja, em si, excludentes,
mas sim, capaz de somar-se aos conhecimentos que temos hoje sobre
desenvolvimento, aprendizagem e linguística. Como já foi mencionado
anteriormente, as teorias epistemológicas e psicológicas de ensino exerceram,
e ainda exercem muita influência sobre as práticas educativas; porém, os
resultados, apesar dos significativos contributos para o desenvolvimento
educacional das últimas décadas, têm-se mostrado insuficientes para diminuir
a lacuna de desempenho entre os alunos que aprendem mais ou melhor e os
que aprendem menos ou com menor qualidade, independentemente dos
fatores sócio económicos associados. Paralelamente, a imagem do papel do
professor na sociedade está um tanto deturpada. As reações a estes
fenómenos e a mudança de valores e conceitos vieram em forma de novas leis,
26
novos parâmetros de ensino, estudos de qualidade do ensino, relatórios
mundiais, entre muitos outros esforços que mereceriam destaque, porém cita-
se apenas alguns que tiveram impacto a nível mundial e europeu nos últimos
anos.

O Relatório Jacques Delors (1996), no seu quarto capítulo estabelece os


‘Quatro Pilares da Educação’. Neste documento introduziu-se definitivamente
na educação, a noção de competências que devem ser inicialmente adquiridas
durante a vida escolar, e utilizadas posteriormente, no que se nomeou
‘educação ao longo da vida'. Ao vivenciar em idade escolar os quatro pilares:
aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a conviver e aprender a ser,
todos os jovens deveriam sair da escola preparados para continuar aprendendo
ao longo da vida e, à medida que a sociedade em que vive transforma-se. Tais
preceitos foram repetidos em muitos outros documentos, já mais
detalhadamente, e dando maior importância à noção de aquisição de
competências, como é o caso o Quadro Europeu Comum de Referência para
as Línguas (2001) (doravante QECR) que dedica o capítulo quinto inteiro à
importância do desenvolvimento de competências gerais e específicas (em
especial comunicativas) no ensino das línguas. A noção de competências,
também se reflete nos níveis comuns de referência para as línguas, adotado
por toda a União Europeia, e já muito expandido em outras partes do globo,
como ferramenta para a avaliação dos níveis de proficiência em línguas. O
QECR revelou-se de grande utilidade e está adaptado para todas as línguas da
União Europeia.

As reações mundiais, ou como no último documento citado europeias, são


sempre seguidas pelas reações nacionais, que baseadas num tronco comum,
visam adaptar-se às novas tendências e tem por objetivo melhorar a qualidade
do ensino dentro de cada país. Algumas das mais recentes e importantes
medidas do governo português foram a publicação do novo Programa de
Português do Ensino Básico, em março de 2009 e a revisão da Organização
Curricular e Programas do Ensino Básico em Janeiro de 2004, entre outros.

No entanto, apesar de tantos avanços, pesquisas e eficientes diretrizes para a

27
avaliação, o desempenho dos alunos em Portugal e em outros países continua
desnivelado e apresenta dificuldades em superar seus problemas. Institutos e
universidades portuguesas dedicam parte substancial da sua investigação na
procura de formas sustentáveis para melhorar o desempenho geral dos alunos
e eliminar, ou pelo menos diminuir, a desigualdade nos níveis de
aproveitamento.

Acreditamos que pode coexistir, também, uma significante lacuna entre os


objetivos governamentais, teóricos e ideológicos, e a realidade das práticas
dentro das salas de aula, pelo que se justifica procurar saber o que pensam os
professores portugueses sobre como se ensina língua e o reflexo destes
conhecimentos em suas práticas educativas.

Foi a partir de um panorama semelhante a este, que os linguistas australianos


(Martin, Rose, Rothery, entre outros) foram buscar na linguística sistémico-
funcional, mais especificamente, nas ideias difundidas por Halliday, uma
solução para a diminuição das desigualdades dentro das escolas.
Esta dissertação, na senda do trabalho da Escola de Sydney, tem como
referência os princípios da linguística sistémico-funcional (doravante LSF), a
Teoria de Registo e Género, e o modelo de pedagogia linguística baseada na
abordagem genológica. Pretendo, deste modo, tentar contribuir para a melhoria
das propostas e serviços educacionais portugueses, ambicionando que estes
sirvam de exemplo para outras realidades no mundo lusófono. Estes
fundamentos teóricos estão apresentados no capítulo primeiro dedicado ao
enquadramento teórico.

Na tentativa de trazer à tona, as reais práticas de ensino da leitura e escrita nas


salas de aula portuguesas realizei um inquérito extensivo a um número
significativo de docentes portugueses profissionalizados. Trata-se de um
conjunto de questões pensadas com o objetivo de descobrir se, e até que
ponto, o conhecimento genológico informa as práticas de ensino das línguas no
ensino básico e secundário português, incluindo o ensino de Português língua
não materna.

28
No segundo capítulo desta dissertação, apresentam-se os dados da amostra
do inquérito realizado, cujo componente principal foi um questionário enviado
(principalmente por via eletrónica) a centenas de professores de línguas,
denominado ‘O conhecimento genológico (sobre géneros textuais) nas práticas
do ensino de línguas’. (Apêndice I) Neste capítulo apresentam-se os dados
recolhidos e alguns comentários prévios sobre os mesmos.

No terceiro capítulo são analisados e discutidos os dados frente aos


referenciais teóricos apresentados no capítulo primeiro, que por sua vez,
recaem sobre a abordagem genológica proposta pela Escola de Sydney, mais
recentemente desenvolvida através do projeto “Reading to Learn” e que está
sendo levada à prática em países europeus e de outros continentes; e também,
frente às propostas dos Programas Curriculares do Português no Ensino
Básico (2009), ou ao QECR (2001), ou ainda ao Currículo Nacional do Ensino
Básico (2001).

A partir da análise do questionário realizada sob a luz das teorias estudadas,


identificadas eventuais lacunas no processo de formação dos professores que
podem estar associadas ao baixo rendimento escolar obtido pelos alunos
portugueses (cf., por exemplo, o relatório PISA), apresentaremos nossas
propostas nas considerações finais.

29
30
Capítulo I
Referências Teóricas

O texto é considerado em todas as formas


possíveis, monológicas ou dialógicas,
interactivas ou não-interactivas, faladas ou
escritas, formais ou informais, ou outras. Não
importando se é composto por apenas uma
palavra ou por centenas delas, desde que tenha
significado em um determinado contexto. (Avelar,
2008:33).

1. Fundamentos da Linguística Sistémico-Funcional nesta


dissertação.

Antes de discutir propriamente as teorias escolhidas para o enquadramento


teórico desta dissertação, reafirmo a noção de língua enquanto realidade
semiótica, operando em contexto social como princípio orientador considerado
no decorrer deste trabalho.

Muitos teóricos em diferentes épocas, escolas e partes do mundo definiram os


conceitos de texto e contexto, tendo pensado as línguas na sua relação com o
contexto social. Referirei, brevemente, alguns destes autores, porém sem me
deter no aprofundamento destas teorias.

1.1 Língua em contexto social

Começando pela tradição americana, focada, sobretudo, nos estudos de


análise do discurso, sobressaem autores como Hymes and Fought (1981).
Hymes, em 1972, definiu competência comunicativa a partir da observação das
formas em que os falantes realizam o significado de um evento comunicativo.

Na tradição europeia, os contributos do contextualismo britânico, em especial o


trabalho de Monaghan (1979) e Mitchel (1957) que se dedicaram a examinar a
linguagem em contexto. Antes, o primeiro linguista a utilizar o termo “contexto
da situação”, Firth (1937 1966, 1970) havia construído um modelo de análise
da linguagem falada, baseado em contextos de situações que se repetiam no
processo social. De acordo com Firth (1937, 1966, 1970), o significado das

31
palavras resulta da relação de diversos fatores e suas interações com o meio.

Em outras palavras, o ambiente, os gestos, os participantes, os tons de voz, os


sons produzidos ou local de publicação, o comportamento dos envolvidos
direta ou indiretamente, juntamente com as palavras formam o “contexto da
situação”. Firth chama a atenção para outra palavra essencial no estudo das
línguas “meaning” (significado), defendendo que, tal como o contexto da
situação, o significado também é criado por e pertence às pessoas nele
envolvidas. Uma vez que os enunciados escritos ou orais se realizam num
contexto, o significado deste contexto e dos enunciados também é interpretado
e tem um valor único para cada participante, pois os indivíduos também são
seres únicos e capazes de produzir ou receber as mensagens de formas
distintas uns dos outros. Finalmente, Halliday, um dos discípulos de Firth, deu
continuidade ao seu esquema, reorganizando-o em um modelo tripartido, que
será apresentado na secção seguinte.

1.2 Contribuições de M. Halliday

A linguística sistémico-funcional foi desenvolvida para ser um modelo de


organização da linguagem em contexto, ordenada por subsistemas, ou seja,
por um lado é dada importância ao significado em contexto e, por outro,
estudam-se subsistemas linguísticos relacionados com semântica, léxico-
gramática, fonologia e fonética.

Halliday (1985, 1994, 2004) estabelece, na sua base teórica, uma relação
sistemática entre a língua e o ambiente. A sua construção teórica relaciona,
pois, a situação social, o texto, o sistema linguístico e o sistema social; por
outras palavras, Halliday descreve o sistema da língua, (no caso, língua
inglesa) e a formas pelas quais esse sistema se relaciona com os textos. Esta
visão da língua em contexto relacionada com o significado (base semântica) e
com o uso (base funcional), com estreita relação ao sistema social, é portanto,
aquela que aqui se considera ser a mais adequada para a obtenção dos
objetivos educacionais maiores, na senda de outros autores como Rothery:

32
“Given the framework of a model with sociocultural orientation to meaning such
as the systemic functional model, there exists the rich possibility for developing
an alternative perspective on language and learning (...) A strong and rich model
of language description enables us to model the curriculum in terms of its literacy
requirements, to map possible paths of development in literacy and learning and
to develop criteria for assessment and evaluation.” (Rothery,1996:87)

Desenvolveu-se, a partir das ideias hallidayanas (1985, 1994, 2004), uma


abordagem linguística que trata a língua de forma fundamental para a
experiência humana, designadamente porque se enfatiza que a língua não
pode estar dissociada do significado e como o próprio nome sugere, a função e
o significado são a base da linguagem humana e das atividades comunicativas.
Diferentemente das abordagens estruturais e chomskyanas que privilegiam a
sintaxe, a LSF inicia a análise da linguagem a partir do contexto social
procurando descrever o modo como a língua atua, é controlada e/ou
influenciada pelo contexto social, sendo o seu trabalho, em última análise, de
pendor semântico.

A definição de Halliday (1985, 1994, 2004) de contexto aponta para uma


sistemática relação entre o ambiente social e a função organizacional da
língua. No modelo organizacional da linguagem sugerido por Halliday, as
escolhas de vocabulário e estruturas feita pelos indivíduos são influenciadas
por três variações: Modo (Mode), Campo (Field) e Relações (Tenor). Estas
variações organizam a linguagem e cada uma delas realiza uma metafunção.
As três metafunções podem ser entendidas como mecanismos semânticos do
sistema linguístico, e relacionam a língua ao ambiente em que ocorre. Esta
organização foi representada por Halliday através do gráfico abaixo e será
mencionada muitas vezes no decorrer desta dissertação, por serem via
norteadora do trabalho dos linguistas da Escola de Sydney, cujas contribuições
serão apresentadas na próxima secção.

33
modo
campo

ideacional

relações interpessoal

Figura 1: Campo, relações e modo em relação às metafunções – adaptação a partir de Martin e


Rose, 2008:12)

“O estabelecimento das três variáveis é feito com base no pressuposto de que,


se a língua é, realmente, estudada nas suas instâncias situacionais, algumas
variáveis contextuais estão sistematicamente co-relacionadas com o modo como
a língua é realizada em texto: logo, semelhantes ambientes contextuais
conduzirão a idênticas instâncias textuais” (Avelar, 2008:43)

Como Halliday (1985, 1994, 2004) considera a língua um recurso para fazer
significados, sua perspectiva gramatical considera o papel dos itens linguísticos
de um texto em relação às suas funções na construção de significados. Por
esta razão, a classificação e nomeação dos itens linguísticos são baseados nas
respectivas funções que realizam.

“The purpose of functional labeling is to provide a means of interpreting


grammatical structure, in such a way as to relate in any given instance to the
system of the language as a whole” (Halliday, 1994:29)

O termo “função” em Halliday (1985, 1994, 2004) é utilizado para referir a


codificação do significado no interior da gramática, unindo as categorias
gramatical e semântica do estudo da linguagem, assim como as categorias de
função comunicativa.

O texto, segundo esta visão da linguística sistémico-funcional, é uma

34
realização social semiótica, dialógica e interativa. Portanto, pode-se dizer que é
uma realização dos tipos de contextos, e consequentemente, da atuação dos
membros culturais envolvidos em dada situação.

A figura 1 apresenta a organização da língua segundo Halliday (1985, 1994,


2004) e sua visão de linguagem tripartida em metafunções. Mais
detalhadamente, Modo (Mode) está associado à metafunção textual, que se
refere às escolhas linguísticas quanto ao vocabulário e estruturas, dependentes
do significado que se pretende transmitir. A metafunção interpessoal realizada
a nível do Registo pela variável relações, diz respeito à presença e ou ausência
de recursos linguísticos que demonstrem atitude, valor e o papel do autor do
texto na sociedade. E o Campo, associado à metafunção ideacional, refere-se
às evidências linguísticas textuais que exprimem recursos intertextuais,
conhecimentos que um discurso ou tema assume ser de conhecimento do
receptor da mensagem.

Em outras palavras, cada metafunção da linguagem tem um significado


funcional no contexto social. Quando se fazem escolhas linguísticas para
organizar experiências e significados interpessoais de forma linear e coerente
como um todo, faz-se uso do que Halliday (1985, 1994, 2004) nomeou (textual
meanings) significados textuais que se realizam no modo de um texto. Quando
se usa a língua para decodificar interação e para mostrar e defender opiniões,
atitudes e relacionamentos, faz-se uso do que Halliday nomeou como
(interpersonal meanings) significados interpessoais que se realizam nas
relações do texto. E ainda, quando se usa a língua para decodificar as
experiências de um indivíduo no mundo, ou seja, uma representação da
realidade, faz-se uso do que Halliday nomeou como (ideational meanings),
significados ideacionais que se realizam no campo do texto.

35
1.3 Conceito de Género Textual

A linha de pesquisa australiana foi inspirada nas pesquisas de Hasan (1977;


1984; 1985, Halliday e Hasan, 1980: apud Eggins e Martin, 1997). A
abordagem de registo sugerida por Halliday enfatiza a inter-relação sistémica
entre a organização da linguagem e a organização do contexto.

Um texto portanto possui muitos significados que se comunicam através de um


código, formado, por sua vez, de um sistema gráfico e fónico. Sendo assim,
qualquer amostra de língua que seja operacional e que funcione como uma
unidade semântica num determinado contexto de situação é considerado, pela
LSF como um texto. (Halliday & Hasan, 1976:293)

Por estes mesmos motivos e também, para facilitar o ensino da linguagem em


contexto escolar formal, a definição de Género, dos géneros ocorrentes numa
língua e cultura, impôs-se ao desenvolvimento deste trabalho. Depois de
muitos estudos feitos por Eggins e Martin (1997) e outros investigadores
australianos, o círculo do género correspondendo a um novo nível de
abstração) foi adicionado ao esquema de linguagem proposto inicialmente por
Halliday (1985, 1994, 2004) e pode ser visto na figura 2. O género corresponde
ao plano do contexto cultural das sociedades, como pode ser observado
abaixo:

género

Género
modo
Meta redundância
campo registo (realização)

ideacional

língua
relações
interpessoal

Figura 2: Língua em relação ao registo e género (Martin,1996:307 apud E. Pedro) – trad. minha

36
A cultura, conceito sempre de manuseamento difícil, encontra aqui uma nova
abordagem:

“... os sistemas linguísticos são estruturados pelo uso. E esse uso, enquanto
actividade de produção textual, faz-se em função de e no seio de contextos
particulares (...) De facto, um texto ocorre sempre em dois contextos, um dentro
do outro: o contexto de situação e o contexto de cultura.” (Gouveia, 2009:1-2)

A língua em uso e em contexto social é, portanto, o objeto de estudo de


aprendentes de línguas por todo o mundo. Sendo, a língua, um objeto de
estudo em uso e interrelacionado a contextos e aos seus participantes, é
possível afirmar que não é um objeto de estudo estático. Da mesma forma que
o ensino e aprendizagem das línguas não o pode ser, como nos coloca Rivers
ao comentar sobre o ensino e a aprendizagem de línguas:

“From time to time, we need to sit down, ponder the possibilities for the harvest,
and change course if we find our present direction is not leading us where we
need to go.” (Rivers,1983:133)

Apesar de estarem em constante movimento as línguas foram, ao longo do


tempo, estudadas e para isso, classificadas de diversas formas, os géneros
textuais são um exemplo.

Género é o termo usado para nos referirmos a determinados textos e tipos de


discurso que apresentam uma coesão interna idêntica e o mesmo propósito
social. A descrição de diferentes géneros textuais atua apenas como uma
sugestão dos tipos de texto, uma vez que estes são construídos socialmente, e
portanto, passíveis de constante mudança e evolução. Devido à possibilidade
humana de reinventar textos quase que constantemente ao usar a linguagem
para atuar nas situações do cotidiano, a descrição e classificação das
características de um ou outro género textual torna-se um grande desafio.

“Genres respond to cultural contexts in which they achieve their purposes, so


their realizations vary and evolve as they are created in new ways in different
contexts.” (Schleppegrell,2004:83)

Apesar deste objeto de estudo ser tão flexível, devido à evolução constante das
línguas, acreditamos ser de grande valia investir na classificação e ensino de

37
géneros em contexto escolar, com o intuito de melhorar o nível de formação
académica dos alunos. Uma vez que os géneros servem às necessidades
sociais, ter habilidades para expressar-se através da linguagem permite ao ser
social (aluno) compreender e participar de contextos sociais em que emergem
os diferentes géneros.

“Em sociedades multiculturais cada vez mais complexas, a educação deve


auxiliar-nos a adquirir as competências interculturais que nos permitam conviver
com as nossas diferenças culturais e não apesar delas. Os quatro princípios de
uma educação de qualidade definidos no Relatório da Comissão Mundial sobre
Educação para o Século XXI (aprender a ser, aprender a conhecer, aprender a
fazer e aprender a viver em conjunto) somente podem aplicar-se com êxito se a
diversidade cultural for seu elemento central.” (Unesco, 2009:16)

1.4 Língua em contexto educacional

Para que haja aprendizagem da leitura e escrita, as crianças precisam


aprender a decodificar um sistema linguístico, ou seja, reconhecer as letras e
sílabas ou fonemas das palavras. Precisam também compreender o significado
literal das palavras decodificadas dentro das orações, ou seja, do que ou de
quem se está falando, onde, como, porque ou o que estão fazendo. Além
disso, precisam ser capazes de compreender os significados inferenciais, nada
menos do que compreender os significados das conexões apresentadas ao
longo do texto, sejam de frase a frase ou de parágrafo a parágrafo. E ainda há
de se aprender os significados interpretativos, que representam as conexões
entre o texto e o contexto a que este se refere, em outras palavras, seu
propósito social, o tópico disciplinar em que está inserido e as relações que
provocam entre as pessoas.

A figura 3 abaixo, portanto, pode ser usada como modelo de organização do


processo de ensino e aprendizagem da leitura e escrita com base nos níveis de
estratificação da LSF.

38
3
Figura 3 – Estratificação da linguagem segundo a LSF

A partir desta estratificação o ensino da leitura e escrita através da genologia


foi organizado partindo do contexto, para depois focar-se nas fases do texto e
nas características da linguagem.

As diferenças de aproveitamento dentro de um mesmo grupo de alunos é


notável ao saber que todos os alunos saem da escola capazes de decodificar
um texto e escrever textos simples, portanto, tem vasta compreensão do
significado das palavras e conhecimentos dos significados das frases.
Entretanto, muitos não são capazes de compreender todos os significados do
texto, o que requer não apenas a compreensão do significado das palavras
mas também, habilidades de compreensão interpretativa e poucos com a
habilidade de produzir um texto que contenha variações linguísticas suficientes
para todas as etapas acima descritas o componham, esses dados podem ser
ainda piores ao considerarmos alunos de Português como Língua não-materna
ou de uma língua estrangeira.

1.5 Teoria do Registo e do Género

Ao agrupar enunciados que ocorriam em determinados contextos e ao estudá-


los a partir de sua função social, vários linguistas já aqui mencionados, como

3
Modelo apresentado em seminário em Lisboa, em 15 de dezembro de 2011.

39
Firth, Hasan, Martin, Christie, Rose entre outros contribuíram para a formação
do que é hoje mais largamente conhecido como ‘Register and Genre Theory’
(R&GT), (Eggins e Martin, 1997) ou, em português ‘Teoria do Registo e do
Género’ (TR&G) (Avelar, 2008).

A teoria do Registo e do Género surgiu da tentativa desses linguistas, de


diversas áreas, com objetivos educacionais ou não, de investigar como os tipos
de discurso ou textos diferenciam-se ou assemelham-se e suas razões para tal.
Martin, Rose, Christie entre outros teóricos, em especial no Reino Unido,
partiram dessas pesquisas e contribuem com a formação teórica da linguística
sistémico-funcional quanto à sua aplicação em contexto escolar através da
TR&G. A TR&G, baseada na perspectiva sistémico-funcional da linguagem,
será aqui apresentada porque, além do mais, fundamenta toda a futura análise
de resultados e a coleta de dados que será apresentada no segundo capítulo.
As pesquisas realizadas por Martin e Rose (2008), entre outros profissionais da
escola de Sydney, têm colaborado muito com os avanços no desempenho
escolar em parte da Austrália. J. Martin definiu os géneros textuais da seguinte
maneira:

“As a working definition we characterised genres as staged, goal oriented social


processes. Staged, because it usually takes us more than one step to reach our
goals; goal oriented because we feel frustrated if we don’t accomplish the final
steps; social because writers shape their texts for readers of particular kinds.”
(Martin,2008:6)

Esta definição sustenta o trabalho de descrição de alguns géneros escritos de


escolas primárias e secundárias da cidade de Sydney na Austrália e, no nosso
ver, ilustra com clareza a relação entre os géneros, os participantes e o
contexto social. Seja qual for a intenção ou forma de comunicação (oral ou
escrita) há sempre uma relação de dependência entre quem fala/escreve e
quem ouve/reage, sendo essa relação dialética e constante, como sugerido por
Halliday previamente (1985, 1994, 2004). Quando o enunciado não atinge o
seu objetivo, vêm a frustração e as tentativas de se atingir o objetivo social do
enunciado que passa a ser trabalhado, modificado até que se cumpra o
objetivo social.

40
A aprendizagem da leitura e escrita (literacia), sob este olhar, tem caráter de
processo e não é vista como produto a ser analisado. Essa é uma forma
simplista de explicar o conceito acima; ao refletirmos sobre textos escritos, o
processo pode ocorrer de outras formas, pois o escritor realiza os enunciados
com mais tempo de preparo, do que na fala espontânea; o que queremos
realçar com esta afirmação é que os géneros estão intimamente ligados ao
contexto e aos participantes, ou atores sociais.
A TR&G foi investigada através da comparação de diversos textos escolares,
na busca de encontrar diferenças e similaridades. Três áreas de investigação
foram utilizadas por Eggins e Martin (1997) com o objetivo de descrever formas
linguísticas (palavras e estruturas) são elas: formalidade textual, expressão da
atitude e conhecimento prévio, em uma primeira etapa da análise. A segunda
etapa constituiu na tentativa de explicar as diferenças linguísticas encontradas
na primeira etapa. Uma das conclusões deste estudo relaciona-se ao contexto:

“Our explanation has highlighted a very important observation about the text: that
each text appears to carry with it some influences from the context in which it was
produced. Context, we could say, gets ‘into’ text by influencing the words and
structures that text-producers use.” (Eggins e Martin, 1997:232)

A relação entre língua e contexto é fundamental para a compreensão de como


o contexto está dentro do texto. É através dos contextos que os participantes
de uma situação escolhem as estruturas e palavras que irão utilizar. Por
exemplo, dois economistas podem falar sobre a crise económica europeia,
tanto na mesa de um bar como em uma entrevista de trabalho e certamente, as
palavras e estruturas de língua que escolherão para expressar suas opiniões
quanto à crise económica serão muito diferentes, dada a situação em que se
encontram. Nesta perspectiva, texto e contexto são inseparáveis, a menos que
por razões de estudo e análise da língua.

A dimensão social do contexto, portanto, influencia a escolha das palavras e


estruturas que utilizaremos, tanto na fala quanto na escrita. Com o objetivo de
analisar as escolhas, similaridades e diferenças da língua, esta abordagem
genológica utiliza as três dimensões da linguagem, sugeridas por Halliday

41
(1985, 1994, 2004): modo, relações e campo, assim como suas respectivas
metafunções: textual, interpessoal e ideacional. Entretanto, como vemos na
figura 4 sugerida por Martin (1992, 1997) há um novo conceito representado
por um círculo que envolve toda a organização da linguagem: o género. Como
pode ser observado no gráfico a seguir.

Contexto (nível 2) Género – acima e para além das


metafunções
Género
modo

campo Contexto (nível 1) Registo - organizado por


metafunção
ideacional

Linguagem - organizada por metafunção


relações
interpessoal

Figura 4 – Género em relação ao Registo (Eggins and Martin, 1997:243) – trad. minha

O ensino e aprendizagem da literacia baseada na TR&G é realizada de cima


para baixo, isso quer dizer que o ensino inicia-se pelo género (propósito social
e cultural), depois passa para o registo (como, o que e para quem) e finalmente
para as estruturas de linguagem propriamente ditas (sentenças, palavras,
ortografia, etc.)

O conceito de registo também está intimamente ligado ao significado, citando


Eggins e Martin: “The concept of register is a theoretical explanation of the common-
sense observation that we use language differently in different situations”. (1997:234)
Mais especificamente, o contexto exerce influência na linguagem gerando
certos significados relacionados com a situação em questão. O Registo, nestes
termos, refere-se ao contexto da situação, enquanto o Género se refere ao
contexto da cultura e, portanto, são as duas principais dimensões de variação
entre os textos.

“P register and genre variation are two realizational planes in a social semiotic
view of the text. This view is inherently dialogic and interactive: text is both the

42
realization of types of context, and the enactment of what matters to cultural
members in situations.” (Eggins e Martin 1997:251)

1.5.1 Géneros: o ensino das línguas e através das línguas.

Um importante aspecto da TR&G, agora em relação ao ensino da literacia é o


fato de que esta considera fundamental a responsabilidade de todas as áreas
do currículo pelo ensino da linguagem, consequentemente, torna-se também
fundamental para a formação de professores.

Assim sendo, a experimentação dos diferentes contextos na escola faz-se


necessária, e isso pode ocorrer através de atividades direcionadas à
descoberta dos propósitos e efeitos funcionais das escolhas gramaticais
oferecidas pela língua, mesmo que o significado e a compreensão de tais
textos só se realizem em situações sociais reais.

Uma pedagogia baseada no ensino através de géneros textuais prevê o


envolvimento de todas as matérias escolares no ensino da leitura e escrita. A
linguagem falada ou escrita que envolve o ensino da matemática, ciências,
história, geografia, e assim por diante, merecem tanto destaque quanto a
literatura e os tipos de textos escolares de responsabilidade do ensino das
disciplinas de línguas. Cada profissional responsável pelo ensino das diferentes
áreas do currículo deve ter consciência dos tipos de texto relevantes ao ensino
do currículo das disciplinas nos diversos níveis escolares, assim como, deve
possuir recursos e habilidades para levar os seus alunos a compreender tais
textos, serem capazes de inferir significados e também de construí-los
independentemente, de maneira apropriada e coerente à área em questão. J.
Rothery menciona esta necessidade ao descrever as mudanças de currículos
educacionais australianos:

“Across a range of learning areas these documents state, not only that language
is learned through use, but it varies according to the context in which it is used.
This approach to language development is in marked contrast to that of earlier
decades where school subject English or Language Arts, was seen to have sole
responsibility for language developmentP” (Rothery,1996:86)

43
Na escola professores e alunos envolvem-se por meio de diferentes tipos de
texto, falados e escritos, em diversos contextos de acordo com as
necessidades dos níveis de escolaridade e da parte do currículo em questão.
Segundo a perspectiva sistémico-funcional, os alunos desenvolvem a escrita
gradualmente, e vão aos poucos, incluindo as características gramaticais
aprendidas em seu discurso argumentativo, até atingirem o nível de escrita
académica, e serem capazes de sintetizar um maior número de informações
em cada frase, adotando as propriedades estruturais e semânticas adequadas.

A leitura e a escrita, adequada aos níveis escolares, é aprendida a partir dos


recursos léxicos e gramaticais previamente aprendidos, mesmo ao iniciar a
escolarização, as crianças têm recursos lexicais e gramaticais aprendidos na
comunicação com adultos, que tem a tendência de ensinar, mesmo que não
formalmente ou conscientemente. Caso a aprendizagem dos recursos
linguísticos em qualquer das fases não ocorra de forma eficaz,
consequentemente, o desenvolvimento da leitura e escrita será prejudicado.
(Christie, 1998:52)

A fim de melhorar o desempenho escolar e, consequentemente, as habilidades


de participação social das crianças de hoje, é imprescindível que os
professores estejam cientes da realidade, e tenham formação adequada e
continuada para que todo o sistema educacional possa atingir seu maior
objetivo atual, formar cidadãos ativos e críticos. Já na década de 90, Delors
chamava a atenção para a necessidade de envolver a educação na formação
social para a conscientização do poder que tem os profissionais da educação
no mundo:

“A educação pode ser um fator de coesão, se procurar ter em conta a


diversidade dos indivíduos e dos grupos humanos, evitando tornar-se um fator
de exclusão social. O respeito pela diversidade e pela especificidade dos
indivíduos constitui, de fato, um princípio fundamental, que deve levar à
proscrição de qualquer forma de ensino estandardizado.” (Delors,1996:54)

O exemplo australiano, a partir da teorização sobre registo e género e sua


aplicação em diversas escolas, sugere que professores e linguistas
educacionais podem juntos contribuir para diminuição das lacunas encontradas

44
nos sistemas escolares que causam o fracasso de muitos alunos. Segundo
Rothery (1996:107) professores de vários estados australianos que testaram a
pedagogia baseada na TR&G, concluiram, através da prática, que a concepção
da pedagogia linguística com base genológica fornece estratégias para
planeamento, ensino e avaliação das aulas que promovem o desenvolvimento
da aprendizagem e da linguagem.

Acreditamos que a partir de uma pedagogia de base genológica e sociocultural,


baseada nos princípios da LSF, poderemos traçar planos seguros na busca
pela realização dos objetivos traçados para a educação em Portugal e não só.

2. Uma abordagem de base genológica

Depois de sete anos de pesquisa sobre como os professores australianos


lidavam com o ensino da literacia, Martin e Rothery (1996:92) investigaram o
ensino da leitura e escrita em escolas primárias a partir de uma perspectiva
linguística e sociocultural, partindo destes estudos para o desenvolvimento de
uma abordagem de ensino e aprendizagem baseada na linguagem. Foi
importante, pois, proceder a uma descrição dos géneros que envolviam o
currículo escolar tanto da escola primária como, posteriormente da escola
secundária.

2.1 As etapas do processo de ensino e aprendizagem

A primeira distinção na análise de textos é entre a fala e a escrita, cada um tem


formas particulares e muito diferentes de uso da linguagem. Sendo assim,
podemos dizer que o ensino através de uma pedagogia linguística permitirá ao
leitor prever os significados de um texto, a partir do contexto da situação e do
contexto cultural, assim como, deduzir em que contexto algum texto foi
produzido, a partir da análise das seleções de linguagem e do seu propósito
social. Este conhecimento sobre o funcionamento explícito da língua imbuído
de significado, facilita o aprendizado da escrita dos diversos géneros existentes
em uma sociedade.

45
A abordagem de base genológica está estruturada segundo um esquema que
envolve quatro etapas que abaixo sintetizo:

1. Negociação do campo (negotiating field) – representa as etapas antes


da desconstrução: definir o campo, qual parte será explorada, o que os
alunos já sabem sobre este, que experiências e atividades farão parte
da exploração, como serão organizadas e anotadas as informações
colhidas através das atividades.
2. Desconstrução (Deconstruction) – envolve o Contexto da Cultura: qual o
propósito social do género, quem o utiliza e por quê; o Contexto da
Situação: qual o registo, ou seja, campo, modo e relações; e o Texto:
qual a função dos estágios, algumas características da linguagem, como
saber sobre do que trata o texto, as relações entre o escritor e o leitor.
3. Construção conjunta (Joint Construction) – Preparação para a escrita
independente, reunindo informações sobre o campo através de
pesquisas, usando questões guiadas para atividades graduadas
incluindo: observações, entrevistas, filme e vídeo, exibições, leituras,
anotações.
4. Construção independente (Independent Construction) – escrita individual
de um texto do mesmo género (como na Construção Conjunta), pode
haver consulta com o professor e os colegas sobre a produção escrita,
edição ou reconstrução da escrita. Deve ocorrer uma avaliação crítica do
sucesso. A consolidação com o professor e colegas pode acontecer
durante ou depois da primeira escrita (que também pode conter
aspectos de edição, etc) em busca de uma Literacia Crítica quando os
alunos usam o género para desafiar ideologias, teorias e práticas.

O modo como estas etapas se desenvolvem e interrelacionam está


representado na figura 5:

46
Figura 5: Literacy in Society: The teaching cycle (Rothery, 1996:102)

O formato circular do esquema foi assim posto para indicar que há sempre a
possibilidade de voltar a uma ou outra etapa, dependendo do desenvolvimento
dos alunos no tópico (campo), constantemente avaliado pelo professor.

A denominação das etapas do ciclo fornece aos professores a metalinguagem4


necessária para a aplicação pedagógica, ou seja, torna explícita qual a função
de cada parte do género estudado no processo de obtenção dos objetivos de
uma unidade de trabalho. A seguir explicaremos a função de cada parte da
abordagem.

O início de uma intervenção pedagógica baseada na abordagem genológica


dá-se com a negociação do campo, isso ocorre, via de regra, porque os alunos

4
A metalinguagem a que nos referimos será apresentada mais adiante na secção 3.2

47
precisam estar familiarizados com o tema que envolverá a produção de textos,
para que sejam capazes de produzir textos de um determinado género de
forma eficaz. Os géneros são previamente escolhidos pois devem estar em
concordância com os objetivos do currículo para cada nível de escolaridade. A
etapa de negociação do campo envolve a construção de conhecimento sobre o
tema entre professor e alunos. É fundamental, nesta etapa, que o professor
conduza as aulas partindo do conhecimento prévio dos alunos e, dependendo
do tema, das suas experiências não escolares para envolve-los na
aprendizagem, além de aos poucos, introduzir o conhecimento curricular,
formal, necessário para a obtenção dos objetivos educacionais. Ao mesmo
tempo, professor e alunos estão construindo o conhecimento do campo e
aprendendo/ensinando a linguagem usada em determinada área de
conhecimento da língua em questão. Nesta etapa o objetivo do professor é
preparar os alunos para a leitura de um texto modelo do género selecionado.

“P as the work progresses the teacher will need to take a more strongly guiding
role in pointing students towards types of texts and areas of knowledge relevant
to understanding the text or texts students need to read in the Deconstruction
stage.” (Rothery, 1996:103)

O tempo ou o número de sessões desta etapa dependerá muito do


conhecimento que os alunos já possuem do tema e do nível de
aprofundamento requerido pelo estágio de escolaridade. Assim como, das
atividades e/ou experiências escolhidas para a exploração do tema e tipo de
organização do conhecimento acumulado (notas, gráficos, referências
bibliográficas) que oferecerão suporte aos alunos nas etapas seguintes.

O planeamento dessas estratégias é de fundamental importância, pois o


conjunto de pesquisas, resumos, notas, perguntas/respostas, vídeos, entre
outras atividades possíveis, não são essenciais apenas, para a aprendizagem
do tópico curricular, servirão também, de base para a futura construção da
escrita do género.

A etapa da desconstrução é relevante, principalmente, para a familiarização


dos alunos com o género; é o momento em que os textos modelo, previamente

48
selecionados pelo professor, serão lidos e desconstruídos em conjunto pelo
grupo de alunos e professor. Além de serem, por motivos óbvios, relacionados
ao tema discutido na fase de negociação do campo, os textos modelo devem
ser bons exemplos do género, para que a fase de desconstrução seja
completa. Reservaremos uma secção mais adiante para tratar da seleção de
textos. Esta etapa deve levar em conta o contexto cultural, ou seja, definir o
propósito social do género, quem os utiliza e por quais razões; e também, os
estágios de organização do texto, quanto às suas funções, às características
linguísticas e à relação entre escritor e leitor. Nas atividades e discussões que
envolverão a desconstrução do texto, o professor apresentará a
metalinguagem referente ao género que será de grande importância para a
etapa seguinte do processo, a construção conjunta.

Uma vez que os alunos adquiriram conhecimento técnico sobre o campo na


primeira etapa, e depois construíram conhecimento sobre o texto e a
metalinguagem que envolve o género estudado, sem perder de vista o currículo
escolar e o propósito social, os consideramos prontos para iniciar o processo
de escrita.

A terceira etapa do processo, construção conjunta, é feita com o auxílio da


metalinguagem aprendida na etapa anterior, com base nos conhecimentos
adquiridos sobre o campo, e sob o constante direcionamento do professor. “In
the Joint Construction stage the teacher is expected to take up a similar role
with the whole class, or with a small group.” (Rothery, 1996:105). Porém, o
trabalho do professor nesta fase envolve muita atenção, preparo e foco nos
objetivos do contexto, tanto cultural (género), quanto da situação (registo). É
essencial que a sequência de perguntas, e atividades preparadas pelo
professor guie as respostas dos alunos em direção à construção do género.

Estas atividades podem envolver, entrevistas, filmes, leituras, observações, etc.


O envolvimento de todos os alunos na construção conjunta também merece
atenção, principalmente, para aqueles alunos, que por diversas razões, tentam
esquivar-se da participação conjunta. Ninguém melhor que o professor para
saber quais perguntas ou comentários irão engajar os seus alunos,

49
independentemente, do quão próximo ou não eles estão do objetivo final da
etapa.

Finalmente, é papel do professor ensinar aos alunos a forma escrita da


linguagem, através de modelos de escrita do género ou mesmo, sugerindo
outras palavras e estruturas mais apropriadas à linguagem escrita. Nesta
etapa, os alunos farão uso das notas e atividades que fizeram nas etapas
anteriores para os apoiarem na construção conjunta, por isso, é importante que
os alunos aprendam a fazer notas, selecionar informações relevantes de um
texto e organizá-las devidamente.

Estas etapas podem demorar algum tempo, em especial, quando os alunos


estão aprendendo um novo Campo ou um Género escrito pela primeira vez;
porém, tornam-se mais curtas e fáceis de realizar à medida que os alunos se
tornam mais confiantes e independentes. Gradualmente, a seriação dos
géneros pode ser removida e os estudantes serão capazes de pesquisar e se
mover no ciclo de aprendizagem independentemente. (Rothery, 1996:107)

Em qualquer sistema pedagógico, os alunos desenvolvem-se em diferentes


ritmos, neste caso, alguns precisarão de mais tempo ou um maior número de
atividades na etapa de desconstrução dos textos, outros talvez na construção
conjunta, e assim por diante. Considerando o panorama real de uma sala de
aula, o ciclo apresentado na figura 5 não pode ser tratado de forma estanque,
movimentos dentro do ciclo devem ocorrer à medida que todos os alunos de
um grupo mostram-se prontos ou não a prosseguir.

Ao chegar á última etapa do ciclo, quando os alunos irão iniciar as suas


tentativas de construção independente do género trabalhado, as situações de
diferentes níveis de desenvolvimento continuam sendo reais, enquanto alguns
alunos não conseguirão atingir o nível esperado na primeira tentativa e
precisarão de mais apoio; outros o farão bem, neste momento, estes alunos
precisam ser desafiados de alguma forma, seja para aumentar o nível de
vocabulário, estruturas, ou o nível de escrita ou discurso do próprio campo, por
isso, o professor deve ter sempre atividades preparadas para as diferentes

50
respostas dos diversos alunos.

As etapas do ciclo de aprendizagem proposto servem a todos os níveis


escolares, e podem ser aplicadas a qualquer conteúdo, género, de qualquer
disciplina ou tópico a ser estudado, em outras palavras, são adaptáveis aos
currículos, transversalmente. De acordo com relatos da experiência de uso da
pedagogia linguística baseada em uma abordagem genológica já mencionada
anteriormente, à medida que os alunos se vão familiarizando com a forma de
ensino e aprendizagem sugerida, as etapas tornam-se cada vez mais curtas e
a aprendizagem mais eficaz em todas as disciplinas curriculares.

O conteúdo disciplinar é, via de regra, ensinado através de textos ou, pelo


menos, com textos de apoio, no caso de disciplinas mais práticas como
matemática e ciências. Em muitos casos, o fracasso ou a causa de dificuldades
de aprendizagem dos alunos em qualquer disciplina está na falta de
compreensão destes textos, por isso, a introdução de uma pedagogia
linguística pode trazer muitos benefícios à aprendizagem e à formação de
leitores competentes em qualquer área de conhecimento.

Contudo, a pedagogia linguística, apesar de focada no discurso (seja oral ou


escrito) não dispensa as técnicas, estratégias e recursos usados e necessários
ao ensino dos diversos conteúdos escolares, como por exemplo, a leitura de
mapas, os números e equações matemáticas, os recursos visuais dos livros,
entre tantos outros. Acreditamos, entretanto, que a união desses recursos, à
total compreensão dos textos, através de um sistema consistente de ensino de
leitura, compreensão e produção (seja oral ou escrita) de textos, tende a
melhorar o desempenho global dos alunos, assim como promover o processo
de formar alunos independentes, que no futuro serão capazes de dar
continuidade à aprendizagem ao longo da vida. Lê-se no QECR que:

“Pode ser, dependendo do esquema cognitivo do aprendente, que a


memorização de formas faladas seja grandemente facilitada pela sua associação
às formas escritas correspondentes ou vice-versa, que a percepção das formas
escritas possa ser facilitada, ou até fulcral, pela sua associação aos enunciados
orais correspondentes. Se assim for, a competência não exigida pelo uso – e,
consequentemente, não declarada como objectivo – pode, de algum modo, ser

51
integrada na aprendizagem da língua como um meio para atingir um fim. Deve
decidir-se (de forma consciente ou não) que competências, tarefas, actividades e
estratégias, como objectivos ou como meios, deverão ter algum papel no
desenvolvimento de um dado aprendente.” (Conselho da Europa, 2001:29)

Apesar de sabermos que o QECR não propõe um conjunto de estratégias para


o ensino, sabe-se que este está impregnado de algumas premissas da
chamada abordagem comunicativa. Ao ler a citação acima referente às
competências comunicativas necessárias à aprendizagem da leitura e escrita,
encontra-se ainda uma mistura de conceitos da pedagogia tradicional,
exemplificado pela necessidade de ‘memorização’; por outro lado, o conceito
de facilitação do conhecimento preconizado pela abordagem comunicativa; e
inclusive, podemos incluir alguma referência à abordagem genológica, quando
menciona a existência de textos orais e escritos e a relação entre eles, apesar
de não explicar nenhuma delas de forma clara.
O mais confuso, porém, e o que provocou a citação deste parágrafo aqui, foi a
última frase:

“Deve decidir-se (de forma consciente ou não) que competências, tarefas,


actividades e estratégias, como objectivos ou como meios, deverão ter algum
papel no desenvolvimento de um dado aprendente.” (Conselho da Europa,
2001:29)

Parece claro que o trabalho do professor em sala de aula ou fora dela, ao


planear tarefas, atividades e estratégias para atingir objetivos claros e
desenvolver competências, não é levado muito a sério quanto à consciência da
forma, em que serão apresentados conteúdos e em que será promovido o
desenvolvimento de competências.

A seguir será apresentado um programa de ensino australiano baseado na


Teoria de Registo e Género aqui apresentada, fundamentado nos princípios da
Linguística Sistémico-Funcional e na Pedagogia Linguística de base
genológica. Este programa foi escolhido para servir de modelo nesta
dissertação, por ser um programa, consistente, coerente e principalmente, por
incluir um módulo de formação de professores consciente, considerado
cinequanom para o sucesso do programa e da aprendizagem.

52
3. Desenvolvimentos programáticos do pensamento genológico

As primeiras pesquisas da escola de Sydney tiveram início nos anos 80 com o


projeto “Writing Project and Language as Social Power” que teve como foco o
estudo da escrita nas escolas primárias australianas. Este projeto foi expandido
na década de 90 através do projeto “Write it Right” investigando e descrevendo
os géneros textuais que os alunos supostamente deveriam aprender a ler e
escrever durante a escola secundária. Nesta fase foram explorados géneros
em ciências e história, e a descrição feita através de uma base semântica. A
última grande fase deu origem ao projeto “Reading to Learn", desenhado por
volta do ano 2000, faz uso do conhecimento adquirido até então para criar uma
metodologia que integre a leitura e a escrita, na aprendizagem curricular tanto
em escolas primárias, secundárias quanto no ensino superior. (Rose e Martin,
2012:2)

Apresento o programa de ensino Reading to Learn (doravante R2L) porque


sustenta o que de mais recente há em pesquisas educacionais que tem como
foco o ensino das línguas e porque sustenta os princípios da TR&G e da LSF
apresentados no início desta dissertação. Considero um complemento sério de
base sedimentar na formação de qualquer professor de língua, seja qual for o
contexto em que for ensinada.

O programa de literacia foi desenvolvido para capacitar aprendentes, em todos


os níveis escolares, a ler e a escrever adequadamente em correspondência à
idade, área de estudo e nível escolar. De acordo com avaliações
independentes, as estratégias do R2L têm consistentemente acelerado a
aprendizagem, duas ou até mais de quatro vezes do que o esperado, da
experiência, nível ou escola estudados. Estes dados foram reportados por
Lovstedt, A. (2010); Carbines, R., Wyatt, T. & Robb, L. (2005), Culican, S.J.
(2006), entre outros profissionais envolvidos no programa, em especial, na
Austrália e na Suécia.

Este programa teve início há mais de dez anos, envolve professores do ensino
primário, secundário, médio e universitário na Austrália e em outros países, tem

53
por objetivo integrar a leitura e a escrita ao ensino curricular durante todo o
percurso escolar e em todos os níveis. As estratégias incluem avançadas
pesquisas sobre língua e sobre aprendizagem em sala de aula em consonância
com o currículo pré-estabelecido. Acredita-se que seja um modelo digno de ser
apresentado pela sua formatação acessível, prática e que visa atender às
necessidades de professores e estudantes, através de bases linguísticas
sólidas, já que tem a chancela, entre outros, dos linguistas J. Martin e D. Rose.
Um dos procedimentos do programa R2L consiste em desafiar os estudantes
com textos cada vez mais complexos, tendo em conta o nível de cada grupo
e/ou individuo. O programa apresenta-se ambicioso, ao desafiar os alunos a
todo momento com textos mais complexos; todavia, é sustentado numa
pedagogia que dá todo o suporte necessário à aprendizagem dos géneros
textuais escolares, ensinando língua para facilitar a aprendizagem eficaz de
todas as matérias escolares. Isso se dá através de um programa que visa
deixar os alunos continuamente engajados e preparados para superar cada
etapa.

A adaptação e tradução do R2L e dos géneros textuais para a língua


portuguesa não foram, no entanto, ainda realizadas. Entretanto, está a ser
construída por um grupo de professores e investigadores portugueses
envolvidos no Projeto Multilateral Comenius 5TeL4ELE (Teacher Learning for
European Literacy Education) como parte do Programa de Aprendizagem ao
Longo da Vida da União Europeia. Devido a estes fatores, a apresentação da
nomenclatura, nomeadamente, metalinguagem pedagógica, em inglês, terá
uma breve explicação em português, o que não corresponderá, porventura, à
tradução definitiva da metalinguagem, nem dos géneros escolares em língua
portuguesa, até porque, este não é um trabalho de simples tradução, mas de
adaptação dos géneros de uma língua para outra, cujas origens são bem
diferentes. O que importa nesta dissertação é que os propósitos sociais e
comunicativos (função dos textos), tanto na língua inglesa quanto na língua
portuguesa podem ser considerados semelhantes.

5
Este projeto consiste na exploração da pedagogia linguística baseada num modelo funcional
da língua e terá duração de dois anos, tendo sido recomendado pelo projeto Comenius:
European Core Curriculum for Mainstreamed Second Language – Teacher Education

54
3.1 As famílias genológicas

Para que possam escrever, os alunos precisam não só conhecer as


características gramaticais da língua em questão, mas saber quando e como
usá-las nos diferentes textos e contextos. Martin (1989) propôs três categorias
de classificação de géneros escolares. São elas: Personal, (Pessoal) Factual
(Factual) e Analytical (Analítica).

As três categorias de classificação de géneros escolares: Pessoal, Factual e


Analítico; resumem os propósitos e as características de sete géneros
escolares, são eles: recount (conto), narrative (narrativa), procedure
(procedimento), report (relato), account (relato), explanation (explicação) e
exposition (exposição). Cada uma das três categorias de géneros tem sua
própria sequência de desenvolvimento. O aumento da demanda gramatical
surge conforme estágios mais complexos são exigidos pela introdução de
textos mais avançados, no decorrer da vida escolar.

As famílias de géneros escolares sugeridas pela Escola de Sydney e utilizadas


no R2L têm fundamentação teórica na LSF e na TR&G e estão divididas por
três propósitos socio comunicativos, apresentados a seguir:

‘Envolver’ textos produzidos para envolver o leitor, podem ser construídos


através de uma sequência de eventos, nomeadamente ‘sequence of events’,
que por sua vez podem ou não apresentar uma complicação; e ainda, podem
ser construídos sem uma estrutura temporal nomeadamente, ‘not time
structured – news stories’ ou notícias.

‘Informar’ textos informativos como ‘histories – staged in time’, ou seja, histórias


cujo formato tem base cronológica, são exemplos, autobiografias, biografias e
textos históricos; ‘explanations – cause and effects’, ou textos informativos que
tenham causa e efeito, por exemplo, uma sequência de eventos ‘sequential’; ou
ainda, textos informativos escritos com base em várias causas produzindo um
resultado ‘factorial’; ou então o contrário, textos informativos que tenham uma
causa responsável por produzir múltiplos resultados ‘consequential’. ‘Reports’
textos descritivos não estruturados temporalmente que podem descrever algo

55
‘descriptive’; ou podem descrever várias coisas ‘classifying or taxonomic’; e
textos que descrevem partes de um todo ‘compositional’. Estes tipos de textos
são comumente encontrados em disciplinas escolares como ciências,
matemática e outras.

‘Instruir’ textos com função instrutiva, por sua vez, podem ser textos que
explicam como realizar uma atividade, ‘procedure’ por exemplo, receitas,
experimentos, algoritmos; textos que informem o que se deve ou não fazer,
‘protocol’ como regras, avisos e leis; e também textos os quais, recontam como
procedimentos foram realizados ‘procedural recount’, por exemplo, um texto
que informe como uma experiência científica tenha sido realizada na prática.

O quadro a seguir foi construído a partir dos propósitos socio comunicativos


envolvidos em cada tipo de texto reconhecido e apresenta os géneros
escolares, seus respectivos propósitos sociais e os estágios que apresentam
em suas estruturas, em outras palavras, as fases que os professores devem
reconhecer no texto, para poder ensinar seus alunos a fazerem o mesmo. O
quadro está ainda dividido pelo tipo de texto na margem esquerda. Explica-se,
mais uma vez, que a versão em língua inglesa foi mantida, porque a
metalinguagem e reformulação do quadro para a língua portuguesa está a ser
construída através do projeto TeL4ELE.

56
Tabela 1 – Adaptação do Mapa de géneros na escola “Map of genres in school” (Martin e
Rose, 2012:312) apresentado por D. Rose em Conferência do Projeto Tel4ELE, em Portugal
em 15 de dezembro de 2011.

57
Os estágios sugeridos para cada género são altamente variáveis e não
precisam, necessariamente, aparecer no mesmo parágrafo. Da mesma forma
que todo texto passa por uma série de estágios para atingir seu objetivo final.
Os passos mais facilmente reconhecidos em um texto são denominados
‘stages’ ou seja, estágios. Em uma narrativa, por exemplo, e como se pode
confirmar no quadro 1 os estágios são ‘orientation’, ‘complication’ e ‘resolution’
(orientação, complicação e resolução).

Os estágios são compostos por fases, e todas estas partes do texto que se
permeiam para construir significado foram nomeadas, com objetivos didáticos
para este programa, essa nomeação chama-se metalinguagem e precisa ser
ensinada clara e explicitamente, como descrito a seguir.

3.2 Desenvolvimento da Metalinguagem

Ao falar sobre os estágios de um texto, o professor vai ao mesmo tempo


introduzir a metalinguagem referente ao mesmo. Para que os diferentes
nomes, usados nesta metalinguagem, sejam claramente diferenciados,
enquanto a metalinguagem usada para os estágios dos géneros é escrita em
letras maiúsculas, as suas respectivas fases, são escritas com letras
minúsculas. Independentemente da estratégia escolhida para diferenciar estes
dois níveis de metalinguagem, a ênfase está em apenas, não apresentar listas
com nomes estranhos à realidade dos alunos, mas só apresentá-los em
contexto, ao passo que os estágios e fases aparecem no texto. Cada estágio
de um género pode incluir uma ou mais fases, que dependem não só do
estágio a que pertencem mas também do género e do campo do texto.

Os estágios, como visto no quadro 1, organizam a estrutura global do texto,


portanto, as fases são responsáveis por organizar como o texto se desenrola
dentro desta estrutura global.

“PFor this reason it is important to be able to identify the phases in a text, in


order to teach our students how to read it with understanding, and to write new
texts that use similar patterns.” (D. Rose, seminário em Glasgow, dia 23 de
fevereiro de 2012)

58
Isso vem reforçar a ideia da necessidade de oferecer aos professores mais
conhecimentos linguísticos em sua formação, seja na licenciatura, seja em
programas de educação continuada. Se o responsável pelo ensino não tem
pleno domínio da língua que ensina, seja de ensino de língua materna ou não,
não poderá formar leitores e escritores conscientes e capazes de usar a língua
em questão de forma clara e eficiente. Não se trata apenas de conhecer toda a
gramática, estruturas de frases e modelos de texto, trata-se de serem
profissionais tão competentes quanto um linguista, para interpretar, inferir,
discernir, avaliar os textos com os quais trabalha para poder formar cidadãos,
pessoas capazes de ler as entrelinhas, de fazer uso dos recursos linguísticos,
como as metáforas, por exemplo, de forma consciente.

3.3 Texto em contexto

O R2L também considera o texto sempre em contexto. A figura 6 representa


um modelo funcional de linguagem em contexto que serve o ensino das línguas
e suas adaptações à realidade escolar e ao processo de ensino e
aprendizagem. Faz-se importante ressaltar que, a primeira instância a ser
considerada no ensino baseado nesta pedagogia genológica é o contexto, e
assim por diante, como indica a seta de cima para baixo na figura.

Functional model of language in context

context
patterns
text within
paragraph the text

sentence patterns
within the
word group sentence

word
syllable patterns
letter pattern
within
the word

Figura 6 - Functional Model of language in context (Martin e Rose, 2012:215)

59
A seta indica que o contexto move-se de cima para baixo, permeando cada
etapa do modelo. Ao pensar o ambiente educacional, o contexto encontra-se
no tópico ou matéria escolar, nos participantes envolvidos no texto, e também
nos propósitos sociais inseridos no texto, ou seja, aquilo que os leitores,
escritores, falantes e ouvintes querem atingir.
Considerando o contexto escolar, ao comparar a organização tripartida da
língua segundo Halliday com a proposta deste modelo funcional de estudo da
linguagem temos:

• Padrões no interior dos textos- padrões encontrados primeiramente em


um género proveniente dos currículos das disciplinas, e que depois
representam os significados das estruturas nos textos, tanto dos
parágrafos quanto das ligações entre eles. Encontramos aqui o Campo,
a metafunção ideacional, que se refere às evidências linguísticas
textuais, exprime recursos intertextuais e conhecimentos de um discurso
ou tema.
• Padrões no interior das frases- que representam o conhecimento sobre
as estruturas do discurso e sobre as estruturas gramaticais, como formar
frases e quais grupos de palavras escolher dependendo do significado
que se quer atingir. Na organização de Halliday, Modo, a metafunção
textual, que diz respeito às escolhas linguísticas quanto ao vocabulário e
estruturas, dependentes do significado que se pretende transmitir, seja
em textos escritos ou orais.
• Padrões no interior das palavras- o conhecimento sobre o sistema
grafológico e fónico revelam a metafunção relacional, Relações, que
atribui a presença e ou ausência de recursos linguísticos que
demonstrem atitude, valor e o papel do autor do texto na sociedade
através da relação entre os falantes ou escreventes e leitores.

3.3.1 Padrões da língua: Texto, frase e palavra

O modelo funcional de língua em contexto exprimido na figura 6 expõe três


padrões que fazem parte do estudo das línguas através dos estudos
genológicos. Na instância dos padrões do texto existem, e são objectos de
60
ensino, o contexto cultural e também o situacional, que permitem explorar a
língua como um todo e ensinar aos alunos a ler conscientemente consoante
aos propósitos sociais do mesmo; assim como a organização do texto em si,
enquanto suas estruturas gramaticais, os parágrafos, formas mais comuns de
compor significados em um texto e que facilitam a identificação das
características comuns a um género.

Os objectos de estudo na instância dos padrões das frases são a gramática e a


estruturação e sistematização da língua através de conjuntos de palavras, que
se unem em uma frase para comunicar um significado. A leitura detalhada das
frases permite aos alunos descobrirem o conteúdo e a linguagem usada pelo
escritor para comunicá-lo. Portanto, leva-o a conhecer diferentes grupos de
palavras.

O estudo dos padrões na instância das palavras está posto por último, mas é
tão importante quanto os outros para uma comunicação eficaz em qualquer tipo
de género textual. Além da aprendizagem de vocabulário, a instância das
palavras envolve o ensino da ortografia, relação grafia e som, consciência
fonética, acentuação, entre outros, dependendo da língua em questão.

A complexa tarefa de aprender a ler e escrever é, de certa forma, simplificada


ao planear-se conjuntos de atividades coerentes que partem do
reconhecimento daquilo que faz sentido no mundo real (contexto) e do assunto
de que trata o texto (campo), para que depois todos os alunos se sintam
seguros, tanto para compreender como para escrever cada etapa de um texto.

Esse conhecimento inicial informa os alunos sobre o que se espera de um texto


ou sobre o caminho a seguir na produção do mesmo.
Depois desta etapa, passar para a compreensão das frases já tem significado e
a interação entre as frases faz sentido, por estas dependerem umas das outras
num texto, assim como a compreensão do significado das palavras só é
possível dentro de um grupo de palavras.

61
A aprendizagem da grafia, fonética, ortografia é mais abstrata, por isso,
aparentemente menos interessante, mas ao perceber a dependência dessa
aprendizagem para conseguir produzir significado, ou seja, produzir textos
compreensíveis a quem os vai ler ou ouvir, a aprendizagem das características
mais minuciosas da língua, sejam elas estruturas gramaticais, fonéticas,
silábicas, ou outras torna-se significativa e indispensável para o processo de
ensino-aprendizagem.

3.3.2 Contexto da cultura

Foi a partir dos propósitos sociais dos textos que se fez o agrupamento de
textos em géneros textuais, e também foi a partir daí, que J. Martin e D. Rose
(2008) definiram os géneros textuais escolares para a língua inglesa. O
contexto da situação primeiramente sugerido foi engobado ainda pelo contexto
da cultura, já que vivemos em um mundo globalizado.

O contexto da cultura leva em consideração a situação em que os textos,


escritos ou orais, ocorrem e seus propósitos sociais, assim como sugerido por
Firth, Halliday, e inclui nessa organização do sistema linguístico, as
peculiaridades culturais, tão variáveis em relação às diversas línguas ou
mesmo intrínsecas a uma só língua. Tendo em vista que cada língua apresenta
variações quanto ao estilo, vocabulário, estrutura e outros, dependendo da
comunidade cultural em que está sendo utilizada, seja dentro de um grupo ou
entre continentes; tendo sido aprendida como língua materna ou não-materna,
segunda ou estrangeira, as diversas culturas que envolvem as línguas devem
estar presentes no dia-a-dia da sala de aula, devem ser de conhecimento geral
dos professores e valorizadas, por representarem uma riqueza cultural
inestimável.

“As línguas são os vetores das nossas experiências, dos nossos contextos
intelectuais e culturais, dos nossos modos de relacionamento com os grupos
humanos, com os nossos sistemas de valores, com os nossos códigos sociais e
sentimentos de pertencimento, tanto no plano coletivo como individual. Sob o
ponto de vista da diversidade cultural, a diversidade linguística reflete a
adaptação criativa dos grupos humanos às mudanças no seu ambiente físico e
social. Nesse sentido, as línguas não são somente um meio de comunicação,

62
mas representam a própria estrutura das expressões culturais e são portadoras
de identidade, valores e concepções de mundo.” (UNESCO, 2009:12)

Como mencionado anteriormente os géneros são conhecidos, para além de


suas características semânticas e organizacionais comuns, também pelo seu
propósito social, ou seja, o propósito socio comunicacional de qualquer texto
ajuda a definir que tipo de género está sendo lido e/ou escrito.

Em qualquer tipo de comunicação os participantes de um texto passam por


etapas até atingirem seus objetivos comunicacionais. Consequentemente, os
textos em geral consistem em uma sequência de estágios que podem ser
reconhecidas. Assim, para ser possível identificar o género de um texto há que
se considerar os dois aspectos: o propósito social e os estágios do texto.

3.4 Evolução da teoria à prática

Um dos maiores desafios da implementação de um novo programa educacional


é a adaptação curricular, e/ou modificações curriculares que, normalmente, são
necessárias. O programa R2L sugere integrar as suas metodologias de ensino
da leitura e a escrita nos programas e o currículo existentes em cada nível
escolar, considerando tanto o desenrolar das habilidades de leitura adquiridas
nos diferentes estágios quanto os conteúdos a serem estudados em cada ano
letivo para cada área de conhecimento específica. No âmbito deste trabalho
daremos apenas atenção às questões do ensino da língua, todavia, o programa
R2L envolve todas as disciplinas escolares, pelo que será inevitável referir,
quando for apropriado, os diversos conteúdos escolares, mesmo não sendo
componentes principais da investigação.

Os promotores do programa acreditam ser possível unir o currículo referente


aos conteúdos a serem ensinados tendo como base linear um currículo de
desenvolvimento da leitura e escrita ao longo dos níveis escolares.

Sabe-se que muitas vezes a aprendizagem curricular inicia-se fora da escola,


geralmente em casa, através do convívio entre crianças e adultos. Nos dias de
hoje, podemos ainda acrescentar os vastos meios de comunicação presentes
63
no dia-a-dia das crianças desde a primeira infância pelo que, ao chegar à
escola, uma grande parte das crianças já possui habilidades e conhecimentos
de alguns conteúdos curriculares.

“Crucial to this is the talk around the text that many parents do with their children,
discussing the meanings in stories as they read. This preparation gives these
children an immense advantage when they start school” (J. Martin, seminário em
Lisboa, dia 15 de dezembro de 2011).

A aprendizagem da leitura fora da escola está relacionada geralmente ao


prazer e envolvimento das crianças com o mundo das letras, na maioria das
vezes os adultos têm uma tendência natural para ensinar quando interagem
com as crianças. Por exemplo, muitos adultos ao ouvirem uma criança
pronunciar ‘podo pegar a boneca’ ao invés de ‘posso pegar a boneca’, repetem
a frase com a pronúncia correta. Este exercício de dedução realizado
brilhantemente pelas crianças é comum, e parte do processo de
desenvolvimento da fala, até atingirem a forma correta. Considerando os textos
orais, há os diálogos da interação diária entre as pessoas, contos e relatos do
quotidiano, em que a criança participa ativamente ou apenas ouve, e que
também tem o seu papel de ‘ensinantes’ da língua.

Os grupos escolares, porém, são de tal forma heterogéneos que se torna


impossível analisar caso a caso, sendo assim, coloca-se a necessidade de
traçar planos consistentes para todos, o que é primeiramente definido pelos
currículos escolares e foi incrementado por este programa com um plano de
ação complementar, o currículo de leitura e escrita.

Nos primeiros anos escolares todas as crianças devem ser preparadas para se
tornarem leitores independentes, sejam quais tenham sido as suas
experiências fora da escola; positivas ou negativas, mais ou menos ricas ou
mesmo inexistentes, todas devem chegar o mais próximo possível dos
objetivos curriculares de cada nível escolar. Na segunda fase do ensino básico,
os alunos devem adquirir a habilidade de aprender a aprender através da
leitura, enquanto no ensino secundário a leitura torna-se uma habilidade
fundamental de aprendizagem.

64
“Successful readers spend six years developing their reading and writing skills
across the curriculum, so that they are well prepared for independent study at
university.” (D. Rose, seminário em Lisboa, dia 15 de dezembro de 2011)

O programa australiano R2L foi criado com o objetivo de diminuir a diferença


entre os alunos mais bem-sucedidos e os que apresentam dificuldades ao
ponto de abandonarem precocemente o sistema educativo sem assimilarem os
conteúdos, muitas vezes por conta das deficiências na aprendizagem da leitura
e escrita. Diminuir esta lacuna, porém, envolve questões políticas e
administrativas, culturais e sociais que têm feito a escola, ao longo dos anos,
colaborar com a desigualdade de formação em várias partes do globo. Visto
que, a premissa fundamental do programa é superar as grandes diferenças
entre as habilidades dos alunos em cada sala de aula, e em todas as áreas de
conhecimento. Tal como previmos na introdução deste trabalho, regista-se uma
lacuna entre os objetivos governamentais, teóricos e ideológicos, e a realidade
das práticas dentro das salas de aula.

A aprendizagem foi organizada em ciclos, por ser uma pedagogia de base


linguística, (vide figura 5, Literacy in Society: The Teaching cycle) e realiza-se
por meio de tarefas, o que não apresenta nenhuma grande novidade dentro
daquilo que os professores já fazem em sala de aula. O que esta forma circular
vem garantir é que todos tenham a oportunidade de realizar bem as tarefas e
aprender através delas.

4. Diálogo entre a Linguística e a Pedagogia: uma possibilidade

Segundo os proponentes do programa R2L, preparar os alunos para


responderem aquilo que se quer ouvir é uma habilidade muito importante que
todo professor deve adquirir. Por isso, a planificação das aulas deve ser
minuciosamente realizada, residindo aí a chave do sucesso na integração dos
conhecimentos linguísticos e pedagógicos. Quando se sabe qual a resposta
que os alunos precisam dar, elaborar o plano de aula e as perguntas indutoras
das tarefas permite uma gestão mais segura de cada momento de aula.
Permite guiar os alunos em direção às respostas mais corretas tendo como

65
pano de fundo o conteúdo curricular; iniciá-los na linguagem mais apropriada
para o tópico (conteúdo linguístico) e envolver todos no processo é uma das
exigências principais se colocadas a um professor que abrace esta pedagogia.

Esta estratégia também serve para promover a confiança do grupo, pois ao ter
as perguntas formuladas previamente, o professor já pensou nos seus alunos
que precisarão de apoio, e nos que precisarão ser desafiados, podendo incluir
no seu planeamento ferramentas suficientes para envolver a todos e manter o
grupo disciplinado. Todo o planeamento se faz, portanto, de forma circular,
como representado no gráfico abaixo.

Preparação Tarefa

Elaboração

Figura 7 – Etapas de apoio (Scaffolding learning cycle, apresentado por Martin e Rose em
Conferência do Projeto Tel4ELE, em Portugal em 15 de dezembro de 2011) trad. minha

Este ciclo de aprendizagem é aplicável a três escalas de aprendizagem que


podem ser unidades curriculares inteiras, atividades de uma aula ou a
interação entre professor-aluno em aula.

A nível curricular observou-se que o trabalho que envolve um tópico ou cada


unidade curricular leva em média um semestre ou em alguns casos a metade
de um semestre para completar-se. Para que isso aconteça de forma
sistemática é normal dividir os tópicos em subtópicos e estes em atividades
aplicáveis às aulas. A diferença sugerida está na sistematização da

66
aprendizagem dos conteúdos curriculares ao mesmo tempo que se ensina a
linguagem específica de disciplina. Daí a importância de se pensar o ensino
como algo cíclico, que pode ir e voltar dependendo das necessidades e/ou
barreiras encontradas no caminho em qualquer nível de aprendizagem, de
forma coletiva ou individual. Sendo assim, ao planear uma unidade didática, o
professor deve considerar que a preparação conterá diversas tarefas
elaboradas tanto anteriormente, como no decorrer da unidade e assim por
diante, e que podem ser interrompidas, ou mesmo repetidas, para que todos os
alunos atinjam o objetivo de aprendizagem em todas as unidades.

O mesmo pode ocorrer em uma aula, que geralmente envolve mais de uma
tarefa, para garantir que todos os alunos acompanhem as etapas de realização
de uma tarefa, seja ela de leitura, escrita, interpretação ou que envolva a
aquisição de conhecimentos específicos do conteúdo através das mais
diversas técnicas escolhidas pelos professores para suas turmas, a
flexibilidade cíclica desta forma de ver a sistematização da aprendizagem
ensina ao professor como e quando, pode ou deve, ir e vir dentro do ciclo.
Novamente, a diferença está em planear-se para que todos os alunos se
encontrem preparados para atingir os objetivos específicos de cada tarefa.

Considerando a interação entre professor e alunos, também não se foge muito


da já conhecida comunicação baseada em perguntas e respostas, com a
intenção de verificar a compreensão do que foi ensinado, envolver os alunos
em um tema, levá-los à reflexão, ou mesmo das perguntas que todos os
professores fazem ao longo do dia, de acordo com o que os alunos produzem e
dizem, com objetivos diversos como: expandir um assunto, exemplificar ou
generalizar, repetir uma ideia usando outros recursos linguísticos, fazer
ligações aos objetivos curriculares ou discutir em torno das experiências e do
conhecimento prévio dos alunos. Os princípios desta interação são mantidos, o
que se insere nesta interação diz respeito ao planeamento das tarefas feito
previamente pelo professor.

Assim que podemos concluir que o trabalho do professor antes das aulas é
bastante maior se feito desta forma, e como tudo o que se aprende na vida,

67
leva tempo de adaptação, esforço e flexibilidade, mas não se pode perder o
foco: diminuir as diferenças de desempenho existentes dentro das salas de
aula.

Outra importante questão em relação ao ir e vir do ciclo está em como isso


ocorre sob o olhar de uma pedagogia genológica. Nos três níveis acima citados
(preparação, tarefa e elaboração) é possível que a preparação para uma tarefa
não tenha sido suficiente, e portanto, há duas formas de se resolver o
problema, aperfeiçoar o momento da elaboração ou recomeçar com uma nova
preparação, para a mesma ou outra tarefa semelhante e/ou uma nova
elaboração, como já mencionámos, tudo leva tempo de adaptação, mas o ciclo
torna os planos de aula mais flexíveis e ao mesmo tempo mais objetivos por
serem detalhados.

4.1 Estratégias tripartidas do R2L

O projeto R2L inclui três níveis de apoio que podem ser integrados nos
programas de ensino em vários momentos. Este organiza-se em torno de
etapas ou níveis que passo a referir:

O primeiro nível Preparação para a leitura prepara os alunos para a leitura e


compreensão de textos previstos no currículo, usando posteriormente, estes
mesmos textos como modelos para escrita, que pode ser guiada ou
independente. Tal estratégia pode ser utilizada para qualquer aula no ensino
primário e secundário.

O segundo nível Leitura Detalhada é usado para que os estudantes


aprofundem a compreensão dos textos escritos, e possam utilizar as
informações e formas linguísticas encontradas em suas produções escritas.
Estas estratégias voltadas para os detalhe da oração permitem aos estudantes
lerem textos curriculares de maior complexidade com total compreensão dos
mesmos, e consequentemente, os leva a escrever bons textos, independente
do nível escolar em que se encontrem. Estas estratégias são, geralmente,

68
aplicadas diariamente no ensino primário e semanalmente no ensino
secundário.

O terceiro nível Estratégias Intensivas oferece apoio intensivo para que os


estudantes possam manipular as formas linguísticas em orações selecionadas,
praticar ortografia, estabelecer correspondência entre grafia e som e a escrita
fluente.

O Reading to Learn inclui um programa de aprendizagem profissional para que


os professores possam planear, implementar e avaliar com base nos altos
níveis de ensino de análise de textos exigidos pelo programa. As estratégias de
ensino envolvem o planeamento detalhado de interações em sala de aula, para
assegurar que todos os estudantes sejam capazes de participar ativamente e
mantendo níveis de produção elevados. O planeamento destas aulas também
exige conhecimento linguístico para a seleção de textos apropriados e para
análise das formas linguísticas.

A figura 8 foi construída para explanar as fases tripartidas do ciclo de


aprendizagem R2L.

Figura 8 – Três níveis de estratégias no programa R2L (Three levels of Strategies in Reading to
Learn) (Martin, 2012:147) – trad. minha

69
As etapas do ciclo devem ser interpretadas de fora para dentro, na figuração,
pelo que a primeira parte será dedicada ao ciclo de cor verde composto pela
preparação antes da leitura ou desconstrução, construção conjunta e escrita
independente. Mais adiante, dedica-se ao segundo ciclo, em vermelho,
designadamente leitura detalhada, escrita conjunta e reescrita individual, e em
seguida, ao terceiro ciclo, amarelo, referente a construção de frases, ortografia
e escrita de frases.

Como se pode observar, há em azul um outro círculo que está ligado aos
restantes, representando os fatores responsáveis pela organização,
sistematização, planeamento e avaliação de pedagogia a que se refere. Este
círculo e suas componentes estão mencionados em cada nível, já que são
interdependentes, e mesmo assim, serão explorados mais adiante na secção
que tratará da avaliação.

4.1.1 Primeiro nível: Preparação antes da Leitura ou Desconstrução,


Construção Coletiva e Escrita Independente

A primeira fase do primeiro nível, Preparação para a Leitura, já é realizada por


muitos professores em muitas das suas aulas, a intenção do programa é que a
mesma seja levada a sério, planeada e que ocorra sempre que haja um texto
novo a ser trabalhado. As estratégias são simples e comuns aos educadores e
visam garantir que todos os alunos tenham conhecimentos gerais sobre o texto
que irão ler, portanto, cabe ao professor resumir o que irá acontecer no texto
oralmente, para dar suporte aos alunos em relação ao tema. A diferença está
na escolha do texto, se o texto selecionado estiver no nível de compreensão de
todos os alunos, essa preparação vai fazê-los perder o interesse na leitura já
na primeira frase. O que estas estratégias trazem de benefício é a possibilidade
de usar, nas aulas, textos cujo nível de linguagem seja superior ao da média do
grupo, desafiando-os e colaborando para que possam aumentar o nível de
leitura com compreensão total do texto.

A estratégia de Preparação para a Leitura também favorece a aprendizagem


da escrita. Neste caso, usa-se um pequeno texto ou seleciona-se um trecho de

70
um texto para que sirva de modelo para a escrita do género a ser aprendido. A
partir deste modelo, os alunos irão construir um texto em conjunto (do mesmo
género).

Na fase da Construção Coletiva é fundamental que o professor guie os alunos


na construção do texto, e preferencialmente, faça o trabalho da escrita para
que os alunos concentrem-se no conteúdo e formato do género, posteriormente
o texto coletivo será distribuído (ou copiado) por todo o grupo, pois este
também lhes vai servir de apoio para as respectivas Construções Individuais,
quando os alunos escreverão um texto, seguindo o mesmo modelo, e serão,
consequentemente avaliados em suas produções individuais.

Este primeiro nível é o que está mais intimamente ligado ao currículo escolar,
ao planeamento das aulas e à seleção dos textos usados para ensinar e avaliar
o que os alunos aprenderam.

4.1.2 Segundo nível: Leitura Detalhada, Construção Coletiva e Reescrita


Individual

A Leitura Detalhada será, porventura, a etapa do ciclo mais importante,


podendo levar algum tempo até que se atinja o objetivo principal: fazer com
que todos os alunos de um grupo compreendam o texto e possam fazer uso
das estruturas que contenha em sua própria produção.
Para este fim, um pequeno excerto do texto lido é previamente selecionado
pelo professor para a Leitura Detalhada. Detalhada, aqui, significa que o
professor irá ler o pequeno texto criteriosamente selecionado, e em seguida, ler
cada frase com os alunos identificando e sublinhando grupos de palavras
encontrados ao longo do texto.

A escolha do excerto do texto deve ser cuidadosa e consciente quanto ao nível


elevado de estruturas que se quer levar à compreensão dos alunos. Lembre-se
que esta pedagogia utiliza textos de nível mais avançado, se comparados aos
textos que os alunos já conseguem ler sozinhos, e deve sempre considerar

71
tanto os alunos mais avançados, quanto os que precisam de maior suporte,
para gradualmente diminuir a distância entre eles.

Após ter o texto todo sublinhado, o professor guiará os alunos para uma
Construção Coletiva deste pequeno excerto de texto. Neste momento, os
alunos vão emprestar, do texto lido, as estruturas sofisticadas que estão lendo,
provavelmente, pela primeira vez. Esta preparação e leitura têm como foco o
género do texto modelo, e as fases e passos de cada estágio. Esta mesma
técnica pode ser usada depois pelos alunos na Escrita Individual.

A Leitura Detalhada é realizada, geralmente, antes da Construção Coletiva.


Usa-se o excerto de texto rico em estruturas do género a ser aprendido,
realiza-se a tarefa de reconstrução deste texto de forma muito guiada e dando
todo o suporte necessário aos alunos, depois realiza-se outra tentativa de
construção do género individualmente, com base no mesmo trecho variando,
agora, apenas o tema.

A Leitura Detalhada visa a identificação, compreensão e preparação para as


primeiras tentativas de utilização de estruturas de frases sofisticadas, e das
estruturas que ligam e compõem as frases, em sua escrita ou fala.

“In sum, where wordings are comparatively easy to read and understand, they
can be prepared with literal ‘wh’ cues; but where they may not be understood,
they are prepared with synonyms or paraphrases. (P) Any text worthy of
Detailed Reading will involve inferential and interpretative levels of meaning that
are scaffolded in elaborations, even where the literal wordings are apparently
transparent.” (Martin e Rose, 2012:158)

4.1.3 Terceiro nível: Reconstrução de Estruturas, Ortografia e Escrita


de Frases

Como já mencionado acima, ao fazer referência às estratégias específicas


deste nível, os alunos terão todo o suporte necessário para desenvolver as
habilidades necessárias à compreensão da leitura, ortografia e escrita.
A primeira atividade desta etapa, Reconstrução da Estruturas, é feita com o
excerto do texto já utilizado previamente, por ser conhecido e compreendido

72
por todos os alunos. As estratégias para se chegar ao objetivo desta atividade
vão variar de acordo com a disponibilidade de materiais e com as habilidades
dos diversos grupos de alunos, o importante é que eles sejam capazes de
manipular a língua contida naquelas frases de forma a reconstruí-las utilizando
os mesmos grupos de palavras e mais, que sejam levados a perceber que o
significado das palavras pode mudar, ou não fazer sentido se postos de outra
maneira.

É importante que o professor tenha o excerto impresso/escrito em caracteres


grandes, para que os alunos do primeiro ciclo recortem os grupos de palavras
assim como foram previamente sublinhados, e possam literalmente manipulá-
los em grupos e discutir como eles se relacionam para recompor o texto. Em
grupos etários mais avançados na pedagogia é aconselhável propor novas
possibilidades de uso para aqueles grupos de palavras.

A aprendizagem da Ortografia também é feita a partir deste mesmo excerto de


texto previamente escolhido. O professor deve selecionar palavras que julgue
serem necessárias para atividades de ortografia. Mais uma vez, a intenção é
que os alunos manipulem as letras, as sílabas e os sons das palavras. Na
sequência do exemplo dado, os alunos continuam com a mesma técnica,
recortam as palavras para dividi-las em estruturas menores (sílabas, sons), as
reconstroem e reescrevem em uma lousa ou caderno. Para os níveis mais altos
de escolaridade pode-se desafiá-los a encontrarem sinónimos, ou outras
estruturas do mesmo género mantendo o significado.

Depois de manipular frases e palavras novas, porém já conhecidas em pelo


menos três contextos diferentes dentro de um mesmo género (Leitura
Detalhada, Construção Coletiva e Reescrita Individual), é imprescindível que os
alunos voltem a colocar as palavras aprendidas (quanto à grafia e fonética) na
frase a que pertenciam, para perceberem que elas pertencem a um grupo
semântico apesar de terem significado próprio, e muitas vezes aprender que,
porventura, o significado de uma palavra pode mudar quando posto de volta ao
contexto de onde foi retirado. Esta fase, nomeadamente Escrita de Frases, é
um momento riquíssimo para que o professor explore a área da semântica em

73
contexto e fora de contexto, e de como os autores em um ou outro género
fazem uso das palavras para produzir significados.

O número de atividades e o tempo que se levará em cada fase e em cada nível


dependerá da necessidade do grupo; e ainda podem ser indicadas outras
atividades para serem feitas em casa, se algum aluno precisar. Ou seja, as
etapas do ciclo podem ser realizadas com inúmeras estratégias (muitas já
utilizadas pelos professores) e de forma coletiva ou individual, dependendo das
necessidades encontradas no processo de ensino e aprendizagem.

Novamente aqui, a forma cíclica de aprendizagem não acontece de maneira


rígida e igual para todas as turmas, disciplinas e textos, a organização da
sequência de atividades, usando os três ciclos de aprendizagem, varia de
acordo com o tempo, o currículo e o nível escolar.

Importante é ressaltar que como ponto de partida sempre está a Preparação


antes da Leitura, tanto para os textos previstos em todo o currículo, como para
os excertos de textos escolhidos para as Leituras Detalhadas.

4.2 Seleção de Textos

Um dos objetivos desta dissertação é tentar nos aproximar da realidade dos


professores portugueses de línguas para prever, como estão habituados a
fazer uso de textos em sala de aulas e também, de quais fontes fazem uso
para selecionar os textos para as aulas, mais adiante na análise dos resultados
da pesquisa faremos referência à seleção de textos novamente. No momento,
utilizaremos as sugestões do programa australiano, sob a ótica da genologia,
com a intenção de simplificar esta tarefa.

Consideramos três critérios para a seleção de textos quando planeia-se aulas


sob esta ótica, são eles: o campo, o género e o modo. Analisa-se o campo do
texto à luz do currículo, para ponderar a sua relevância em relação a este, ao
ser um texto selecionado para a Leitura Detalhada, por exemplo, este deve
conter o conteúdo principal do tópico a ser estudado. Ao mesmo tempo,

74
espera-se que seja um texto interessante e bem escrito, para engajar os alunos
nas atividades

Em segundo lugar, deve-se considerar o género do texto, em uma pedagogia


linguística, como já dito anteriormente, currículo escolar é acompanhado por
um currículo linguístico, sendo assim, o género textual que apresenta o
conteúdo curricular será também ensinado, para que isso ocorra de forma
simples, a seleção de bons modelos de textos do género em questão é
essencial. Vários textos serão usados nas diversas atividades planeadas, e
mesmo aqueles textos que não serão usados como modelo para a escrita nas
etapas acima descritas, servem sempre, de certa forma, como modelos para os
alunos, sendo bons modelos do género podem contribuir significativamente
para a compreensão do género, sua análise e descrição durante as leituras dos
mesmo.

O terceiro critério, não menos importante, é o modo, pois é o que define o nível
da linguagem textual apropriada para cada estágio de aprendizagem, nível
escolar e idade dos alunos. É importante que os textos sejam apropriados ao
nível escolar, mas também, que sejam desafiadores, sugere-se que os textos
trabalhados em sala de aula sejam sempre um nível superior ao nível de leitura
independente da média dos grupos.

De acordo com o programa R2L a avaliação da leitura e escrita tem três


propósitos, são eles: ter acesso ao progresso de aprendizagem dos alunos ao
longo das aulas, e decidir o quanto ainda precisam desenvolver-se para atingir
o nível esperado para determinado nível escolar; criar um relatório de
desenvolvimento para os alunos, pais e para o Estado; e ainda, saber que
recursos e habilidades linguísticas os alunos já possuem, para que se possa
planear o programa de ensino e discutir explicitamente sobre essas habilidades
e recursos com os alunos em sala. (D. Rose, seminário em Estocolmo, 15 de
maio de 2012). Para um professor experiente, não há nada de novo nestas
ideias, o que sugere-se é um modo de avaliação da leitura e escrita.

75
4.3 Avaliação da leitura e escrita

De acordo com o programa R2L a avaliação da leitura e escrita tem três


propósitos, são eles: ter acesso ao progresso de aprendizagem dos alunos ao
longo das aulas, e decidir o quanto ainda precisam desenvolver-se para atingir
o nível esperado para o nível escolar; criar um relatório de desenvolvimento
para os alunos, pais e para o Estado; e ainda, saber que recursos e habilidades
linguísticas os alunos já possuem, para que se possa planear o programa de
ensino e discutir explicitamente sobre essas habilidades e recursos com os
alunos em sala. Para um professor experiente, não há nada de novo nestas
ideias, o que sugere-se é um modo de avaliação da leitura e escrita.

Ao avaliar a leitura considera-se aqui três níveis de compreensão: literal,


inferencial e interpretativo, assim como preocupa-se em ensinar os três níveis
de compreensão simultaneamente. Apesar de saber-se que estes acontecem
em simultâneo em um texto, para que os alunos possam responder a questões
corretamente precisam reconhecer cada nível, e para que isso aconteça
precisam ser guiados passo a passo pelo texto. Analisar os níveis de
compreensão dos textos pode ajudar os professores a planear melhor e de
forma a aprofundar o conhecimento dos alunos cada vez mais.

Guiar os alunos passo a passo em um texto significa ensinar os alunos a


encontrar os significados no texto, em outras palavras, mostrar aos alunos o
que fazer para encontrar as respostas das diversas perguntas de compreensão
de texto.

O significado literal é ensinado desde os primeiros anos e muitas vezes nem


precisa ser ensinado propriamente, pois está escrito nas frases dos textos, uma
vez que a Leitura Detalhada tenha sido feita corretamente, e as Estratégias
Intensivas tenham sanado todas as dúvidas dos alunos, provavelmente,
poucos alunos precisarão de especial atenção na compreensão do significado
literal de um texto e poderão responder às perguntas deste tipo.

76
O significado inferencial, por sua vez, não está explícito no texto como o literal,
e pode estar em outros lugares, outras frases ou palavras, secções do texto, ou
mesmo em ilustrações. Este significado envolve também a aprendizagem de
metáforas, expressões idiomáticas, expressões fixas, parábolas, entre outros
recursos linguísticos usados na escrita dos textos. Para a compreensão destes
recursos os alunos precisam aprender como relacionar o significado literal das
palavras e o significado inferencial, ou seja, o que significa, mas não está
necessariamente expresso em palavras.

O significado interpretativo, por sua vez, está fora do texto, e envolve as


experiências vividas, as atitudes, os conhecimentos prévios sobre o tópico,
tanto da parte do leitor quanto da parte do escritor.

O ensino e a avaliação da compreensão em todos os seus significados são


feitos de forma explícita neste programa. Isso se deve ao fato de acreditar-se
que os alunos precisam ter conhecimento sobre os níveis de compreensão, e
saber o que precisam fazer para responder corretamente às questões.

O ensino da compreensão também foi organizado em três níveis, como se


segue. Primeiro, é preciso considerar os três níveis de compreensão no
momento de planear as aulas de leitura. Sugere-se que o professor comece
com seis questões de compreensão para o texto que irá usar em aula, duas
para cada significado. Durante a leitura, o professor vai usá-las como modelo
de compreensão, ou seja, durante a leitura o professor faz pausas, coloca as
questões planeadas aos alunos, e os guia para encontrar as respostas.

Depois das outras atividades previstas no planeamento, que podem variar


entre leitura e escrita, as questões de compreensão são dadas aos alunos
escritas, como em um teste de compreensão. Neste momento, o professor
ainda está usando este texto e estas perguntas como modelo, portanto, levará
os alunos a encontrarem as respostas no texto, inserindo a metalinguagem
literal, inferencial e interpretativa. Assim todos os alunos terão um modelo
correto e construídos em conjunto. Em outra aula, com outro texto, as
atividades podem ser repetidas, mas desta vez com menos controle da parte

77
do professor, ao invés de levar os alunos às respostas corretas, pode-se
sugerir que trabalhem em grupos e discutam as respostas antes de as
anotarem. Depois que todos os alunos tenham a compreensão necessária dos
diferentes significados e possam responder perguntas de compreensão de
texto independentemente, em um ou outro género a ser trabalhado, é que se
usa os testes de compreensão da escrita como ferramenta avaliativa.

Como mencionado no início desta dissertação, as crianças já possuem


conhecimentos do sistema linguístico ao entrar na escola, portanto, o papel da
escola é tornar esse conhecimentos, e o aprofundamento da aprendizagem
linguística conscientes.

Ao propor este ciclo de realização de tarefas, o programa R2L acredita estar


reforçando o conhecimento consciente das estruturas linguísticas das crianças
enquanto lêem.

Para que o ensino ocorra em via dupla e através de discussões sobre como
funcionam as línguas, usa-se a metalinguagem funcional, que segundo os
próprios autores não vem substituir os nomes tradicionais das partes do
discurso, mas sim, adicionar-se a eles e organizá-los, para que possam ser
usados de forma consciente e explícita. Além disso, o foco desta
metalinguagem não poderia ser outro que senão, o significado, os reais
significados das estruturas de linguagem que encontramos ao ler e utilizamos
ao escrever.

Na sequencia a este capítulo daremos início à apresentação e discussão de


dados recolhidos através das respostas dos professores de língua portugueses
ao questionário proposto.

78
Capítulo II

Apresentação dos dados recolhidos

A operacionalização específica será feita na


perspectiva de cada disciplina ou área
curricular tendo em conta os saberes,
procedimentos, instrumentos e técnicas
essenciais de cada área do saber e visando o
desenvolvimento pelo aluno destas
competências. (Ministério da Educação
Português, 2001:18) (competências gerais
curriculares).

1. Abordagem de análise dos dados

Este capítulo é dedicado à apresentação dos dados recolhidos para esta


dissertação. Além da apresentação será feita uma breve descrição das ideias
que serão mais profundamente analisadas no terceiro capítulo.

O inquérito por questionário foi respondido por professores de língua


profissionalizados, preferencialmente em exercício, incluindo os professores de
português como língua não-materna, ou qualquer outra língua estrangeira
ensinada aos alunos do ensino básico e secundário em Portugal. Os inquiridos
foram assim selecionados porque a pesquisa bibliográfica está voltada para o
ensino de línguas (materna ou não-materna), mais especificamente, em
relação às metodologias empregadas no uso e ensino de textos e géneros
textuais.

Além disso, considero que novas soluções e propostas em educação, quando


ocorrem dos níveis escolares mais baixos para os mais altos, ao serem levadas
à prática, podem ser avaliadas e melhoradas em processo, para depois serem
ampliadas aos níveis mais altos de escolaridade, possibilitando também a
familiarização dos alunos com novas práticas desde o princípio da
escolarização. Partir da escola básica, e consequentemente a secundária, foi,
portanto, a melhor forma encontrada para iniciar uma pesquisa que ambiciona
contribuir com informações para a melhoria do ensino da língua portuguesa
como um todo, e quiçá servir como referência para o ensino de outras línguas.

79
Para o efeito, analiso o inquérito respondido por professores de língua
(materna ou não) que revela elementos significativos para o estabelecimento
de nexos entre as novas propostas curriculares e a praxis. Destaco aqui, três
competências gerais, pregadas pelo Currículo Nacional, aquelas quais
colaboram para a justificação e análise desta pesquisa:

“(2) Usar adequadamente linguagens das diferentes áreas do saber, científico e


tecnológico para se expressar; (3) Usar correctamente a língua portuguesa para
comunicar de forma adequada e para estruturar pensamento próprio; (4) Usar
línguas estrangeiras para comunicar adequadamente em situações do
quotidiano e para apropriação de informação; P”(Ministério da Educação,
2001:15)

Além de basear o trabalho de análise nas referências bibliográficas discutidas


no primeiro capítulo, relacionarei as novas propostas programáticas com as
práticas de ensino apresentadas pela amostra de professores participantes
nesta investigação. Pretendo assim, compreender o modelo de formação de
professores quanto ao ensino das línguas e contribuir com propostas
sustentadas para a (re) construção de um modelo mais adequado de formação
continuada de professores, designadamente, os professores de língua.

Os professores responderam ao questionário anonimamente por meio


eletrónico, através da plataforma ‘Google Docs.’; ou em versão impressa,
ambos os meios ofereceram aos inquiridos total privacidade, assim como,
forneceram ao investigador as ferramentas necessárias para uma análise mais
transparente dos dados. Cerca de dez professores colaboraram ao responder o
questionário, ainda em fase de elaboração (pré-teste), para a construção de um
questionário com questões claras, fáceis de serem compreendidas e
rapidamente respondidas.

Fazer chegar o questionário aos professores não foi uma tarefa fácil, mas com
a colaboração de colegas ligados ao ILTEC6, professores portugueses do

6
ILTEC: Instituto de Linguística Teórica e Computacional.

80
ensino básico e secundário, e alguns centros de formação de professores
conseguimos atingir o número significativo de 160 respostas.
O questionário teve por objetivo principal indagar sobre o modo como o
conhecimento genológico informa as práticas de ensino das línguas no ensino
básico e secundário, incluindo o ensino de português língua não materna.
As primeiras questões são dedicadas à apresentação dos inquiridos, mesmo
que anónimo, o questionário foi montado de forma a oferecer informações
sobre o contexto de ensino, os ciclos nos quais realizam suas atividades, assim
como, o ano de formação aproximado dos inquiridos.

As seguintes questões estão propriamente focadas no planeamento e na


prática de sala de aula, ou seja, em como os professores usam os recursos
que possuem para ensinar língua aos alunos portugueses nos diferentes níveis
de ensino. Tendo como horizonte uma hierarquia de pensamento cujo vértice é
ocupado pela voz dos docentes ao expressarem suas opiniões e a respectiva
praxis.

2. Apresentação dos resultados do inquérito

A seguir apresentarei as respostas dos inquiridos, através de gráficos e


comentários, que serão brevemente analisadas nesta secção. Mais adiante os
dados aqui apresentados serão analisados tendo em conta as novas propostas
programáticas e às pretensões da autora em contribuir para a melhoria do
ensino de línguas, em especial, a língua portuguesa sob a luz das teorias
estudadas, nomeadamente, a abordagem baseada em Género, que tem como
referência a Teoria de Registo e do Género e a Linguística Sistémico-
Funcional.

2.1 Perfil dos inquiridos

Os gráficos 1, 2 e 3 mostram o perfil dos inquiridos, respectivamente quanto ao


contexto de ensino no qual atuam, quanto aos ciclos de estudos com os quais
trabalham e por fim, quanto aos anos de profissionalização.

81
Sabe-se que muitos professores de línguas costumam trabalhar em mais de
um contexto de ensino ao mesmo tempo, por exemplo, professores de
português como língua materna (doravante PLM), podem perfeitamente serem
professores de português como língua não-materna (doravante PLNM) ao
mesmo tempo. Da mesma forma que podem atuar em diferentes ciclos em um
mesmo ano letivo. Sendo assim, os inquiridos puderam assinalar mais de uma
opção quanto ao contexto de ensino e aos ciclos de estudos portugueses,
consequentemente, a percentagem dos dois primeiros gráficos apresentados
pode somar mais do que 100%. Este fato se repetir-se-á ao longo do
questionário, para todas as perguntas de escolha múltipla, cujas respostas,
possam conter mais de uma alternativa assinalada.

2.1.1 Ordenação por contexto de ensino

Uma primeira arrumação dos inquiridos que importa apreciar é feita a partir do
contexto de ensino em que os inquiridos desenvolvem a sua atividade.

Ordenação por contexto de ensino


Série2 Série1

PLNM 39%
62

PLE 19%
30

LE 31%
50

PLM 74%
118

Gráfico 1: Perfil dos inquiridos: Ordenação por contexto de ensino

Dentro da amostra, os professores de PLM representam a maioria (74%),


seguidos por professores de PLNM (39% dos inquiridos), e por professores de
outras línguas estrangeiras (doravante LE), que representam 31% da amostra.
Por fim, temos os professores de português como língua estrangeira
(doravante PLE), representando 19% dos inquiridos. Este últimos podem
também atuar em centros de ensino de línguas e explicações, não

82
necessariamente em escolas regulares, esta percentagem minoritária pode
significar que os professores de PLE em Portugal atendem a uma pequena
parcela de crianças e jovens em idade de escolarização básica e secundária,
ou também, que este último grupo de professores esteja à margem da
formação continuada de professores e do contato com outros professores e
instituições de formação, tendo menores oportunidades de responder ao
questionário.

2.1.2 Ordenação por ciclo de estudos

A segunda arrumação considerada para enquadrar os inquiridos é feita a partir


dos ciclos de estudos dos alunos portugueses.

Ordenação por ciclo de estudos


Série2 Série1

53%
secundário
84

54%
ciclo 3
86

18%
ciclo 2
28

9%
ciclo 1
14

Gráfico 2: Perfil dos inquiridos: Ordenação por ciclo de estudos.

A maioria dos inquiridos trabalha no terceiro ciclo (41% dos inquiridos) e no


ensino secundário (40%). Temos alguma representação do segundo ciclo (13%
da amostra) e pouca representatividade do primeiro ciclo, apenas 7% dos
inquiridos. É relevante ressaltar que grande parte dos professores que trabalha
com alunos do secundário, também trabalha com alunos do terceiro ciclo.

83
2.1.3 Ordenação por tempo de ensino

A última questão feita para a arrumação do perfil da presente amostra aprecia


o tempo de profissionalização dos inquiridos para exercer o ofício, ou seja,
quando qualificaram-se para dar aulas de línguas para alunos do ensino básico
e/ou secundário português. Esta ordenação é muito relevante ao ter em
consideração as últimas mudanças legislativas e/ou de referências para a
educação portuguesa e europeia, no sentido de verificar se o tempo de
profissionalização representa alguma diferença na opinião dos professores.

Ordenação por tempo de ensino


Série2 Série1

64%
mais de 15 anos
106

15%
entre 10 e 15 anos
22

12%
entre 5 e 10 anos
18

9%
5 anos ou menos
14

Gráfico 3: Perfil dos inquiridos: Ordenação por tempo de ensino

Os números mostram que 64% dos inquiridos se profissionalizaram há mais de


quinze anos, uma considerável diferença em relação aos restantes, divididos
entre 15% de professores formados de dez a quinze anos atrás, 12% formados
entre cinco e dez anos de e 9% a cinco anos ou menos.

2.2 A voz dos inquiridos: práxis e opiniões

Nesta secção apresento as repostas que trazem à luz a práxis realizada nas
salas de aula portuguesas, o que revela por um lado, parte7 da formação dos

7
Uso a palavra parte porque a formação de um professor não se limita à formação
linguística.
84
professores, e por outro, abre os caminhos para futuras propostas de formação
continuada, no que concerne ao ensino de línguas.

2.2.1 Opinião dos inquiridos quanto a autoria do ensino de línguas


em Portugal

A primeira questão revela a opinião dos professores de línguas sobre a


responsabilidade da autoria do ensino das línguas. Pergunto-lhes se
consideram que o ensino de línguas, seja materna ou não materna, deve ser
da única responsabilidade dos professores de línguas ou não. Logo após
responderem sim ou não, os inquiridos são levados a justificarem a sua
escolha.

As respostas afirmativas (SIM) somam 30 e as negativas (NÃO) 130. Isso quer


dizer que apenas 19% dos inquiridos acreditam ser os professores de línguas,
os únicos responsáveis pela autoria do ensino das línguas, enquanto 81% dos
inquiridos acreditam que a responsabilidade pelo ensino das línguas possa ser
repartida entre todos os professores envolvidos no processo de ensino e
aprendizagem dos alunos.

Opinião quanto à autoria do ensino


de línguas em Portugal
2; 19%

1; 81%

Gráfico 4: Opinião quanto à autoria do ensino de línguas em Portugal.

No que concerne aos estudos apresentados no primeiro capítulo, e a intenção


de capacitar a todos os professores para o ensino das línguas nas
especificidades de cada disciplina, esta é uma avaliação muito positiva.
Hipoteticamente, a maioria dos professores de línguas mostra-se disposto a
dividir conhecimentos e responsabilidades.

85
O quadro 1 (apêndice II) contém as justificativas dadas pelos inquiridos em
relação a esta resposta, nomeadamente quais os responsáveis pela autoria do
ensino das línguas e seus porquês. Note que ambas as respostas eram
obrigatórias. As respostas SIM/NÃO da quarta coluna explicam-se: SIM,
considero as aulas de língua, as únicas responsáveis pela aprendizagem do
conteúdo programático da disciplina e NÃO, considero que todos os
professores sejam responsáveis pelo ensino da língua, independentemente da
disciplina que ensinem. Para facilitar o trabalho de análise, as justificativas
foram agrupadas; primeiramente, todas as respostas afirmativas ‘SIM’ e
posteriormente, as negativas ‘NÃO’. Em negrito, no quadro 1, encontram-se as
frases consideradas mais relevantes para futura análise entre as diversas
respostas.

2.2.2 Projetos interdisciplinares com objetivos linguísticos

Após descobrir a opinião dos inquiridos quanto à autoria do ensino das línguas
importa verificar quantas vezes por ano os inquiridos desenvolvem projetos
com colegas de outras disciplinas, tendo em vista a formação linguística dos
alunos. A pergunta foi assim elaborada para que os projetos com foco cultural,
de cidadania, entre outros, muito comuns e igualmente importantes, mas que
não contenham ao menos um objetivo linguístico, fossem desconsiderados
pelos inquiridos. Os resultados estão expostos no gráfico a seguir.

Envolvimento em projetos
interdisciplinares
Série2 Série1

respostas anuladas 3%4


mais do que 4 11% 18
três (1 por período) 13% 20
1a2 34% 54
nunca 40% 64

8
Gráfico 5: Envolvimento em projetos interdisciplinares.

8
Duas das respostas não foram consideradas por não conter o conteúdo numérico
solicitado.
86
Em linhas gerais, a maioria dos inquiridos (74%) não realiza projetos em
comum com outras disciplinas tendo em vista objetivos de ensino das línguas,
ou então, realiza apenas de um a dois projetos interdisciplinares por ano letivo.
Dado que 81% dos professores acredita que o ensino das línguas possa ser
partilhado entre todos os professores, como foi constatado, essas informações
me parecem um tanto adversas e serão analisadas no capítulo III.

Outros 20 inquiridos (13% da amostra) realizam projetos interdisciplinares


tendo objetivos linguísticos três vezes ao ano. Assim como, 11% dos inquiridos
que realizam tais projetos com maior frequência. Somando-os, cerca de 24%
dos inquiridos realizam projetos interdisciplinares com algum foco no ensino
das línguas.

2.2.3 Opinião dos inquiridos quanto ao grau de interferência creditada


aos docentes de outras especialidades

A próxima questão indaga os professores de língua suas opiniões, de acordo


com experiências profissionais individuais, até que ponto os professores de
história, geografia, ciências naturais, matemática, artes, química, entre outras
disciplinas curriculares estão aptos a contribuir para a formação dos alunos em
língua materna ou não-materna. Três opções de respostas eram possíveis e
encontram-se representadas no gráfico 6.

87
Grau de interferência creditada aos
docentes de outras especialidades.
Série2 Série1

SERIAM CAPAZES SE TIVESSEM 34%


FORMAÇÃO COMPLEMENTAR 54

6%
NÃO SÃO CAPAZES DE CONTRIBUIR
10

60%
SIM, SÃO CAPAZES DE CONTRIBUIR
96

Gráfico 6: opinião dos inquiridos quanto ao grau de interferência creditada aos


docentes de outras especialidades.

O gráfico parece animador, considerando que a maioria dos professores de


línguas (60%) vê a possibilidade de obter contribuições dos docentes de outras
disciplinas na formação linguística de seus alunos, enquanto apenas 6% dos
professores não crêem nesta possibilidade. Ressalto que 34% dos inquiridos
mostram-se preocupados com a necessidade de formação complementar, via
norteadora desta pesquisa.

O quadro 2 combina as duas respostas para facilitar futura análise dos dados,
contendo informações sobre a opinião quanto à autoria do ensino de línguas
em Portugal, representada no gráfico 4; e quanto ao grau de interferência
creditada aos professores de outras especialidades sobre esta questão. O
quadro foi dividido de acordo com as respostas SIM e NÃO respectivamente,
para facilitar a posterior análise.

2.2.4 Fontes utilizadas pelos inquiridos na seleção de textos escritos e


orais

Depois de obter dados sobre a opinião dos professores, as duas questões que
seguem fornecem informações sobre as fontes utilizadas pelos inquiridos para
a seleção dos textos escritos e orais que utilizam em sala de aula e
consecutivamente, as finalidades pretendidas para o uso de tais textos. O

88
quadro 3 (apêndice IV) traz estes dados, apresentados quanto às diferentes
categorias de tempo de profissionalização, o que será útil para a análise
posterior. Neste momento, apenas apresento os dados gerais.

Dos 160 inquiridos, apenas quatro responderam somente fazer uso de textos
escritos e orais trazidos nos manuais escolares adotados. Todos os outros
professores, eventualmente, obtêm, em outras fontes, textos escritos e orais
que possam ser utilizados em sua prática docente. Ao buscarem modelos de
textos em outras fontes, os inquiridos demonstram que, conscientemente ou
não, há necessidade de fornecer aos alunos vários modelos dos tipos de textos
(géneros) trabalhados.

Independentemente dos objetivos, considero uma prática valiosa para esta


investigação. O hábito de pesquisar textos facilitará muito o trabalho dos
próprios professores ao serem levados a trabalhar com os diversos géneros
textuais através de uma pedagogia linguística.

2.2.4.1 Finalidades da obtenção de textos de diversas fontes

O gráfico 7 mostra as principais finalidades dos inquiridos ao selecionar textos


de outras fontes, que não os manuais escolares adotados pelas instituições de
ensino em que trabalham. Foram criadas opções de respostas a partir dos
objetivos curriculares portugueses e com base nos programas atuais, para que
a análise que realizarei frente aos mesmos seja coerente e o mais próximo da
realidade, quando analisadas. Vale ainda ressaltar que, mais uma vez, os
inquiridos puderam assinalar mais de uma resposta, e neste caso, podiam
também incluir uma resposta pessoal na alternativa ‘outro’. O Programa de
Português do Ensino Básico (doravante LPEB) ao referir-se à questão da
seleção dos textos coloca já para o primeiro ciclo:

“Salienta-se que, mesmo na fase inicial de aprendizagem da leitura, deve haver


uma preocupação muito grande em seleccionar textos de autor, com qualidade,
mesmo que isso signifique que há palavras que as crianças ainda não
conseguem ler. Nas obras traduzidas, a qualidade da tradução deve ser
igualmente um componente a considerar.” (Ministério da Educação, 2008:75)

89
Seleção de textos: finalidades

G 2%
3
F 46%
74
E 55%
88
D 75%
120
C 68%
109
B 68%
108
A 88%
140

Série2 Série1

Gráfico 7: Finalidades de seleção de textos fora dos manuais escolares.

A. Leitura para informação extra relativamente ao conteúdo abordado.


B. Leitura para formação de modelos autênticos e atuais dos tipos de texto
trabalhados.
C. Para reflexão sobre a estrutura do tipo de texto a ser trabalhado.
D. Para usar em atividades de ortografia, sintaxe, vocabulário, etc.
E. Para desvendar os propósitos sociais do tipo de texto a ser trabalhado.
F. Para análise e desconstrução de bons modelos do tipo de texto em
questão.
G. Outro.

A resposta mais popular entre os inquiridos foi a primeira, 88% dos inquiridos
buscam textos de outras fontes para que seus alunos tenham mais material de
leitura em relação ao conteúdo que está a ser abordado.

A segunda finalidade mais assinalada por 120 inquiridos (75% da amostra),


relaciona-se ao estudo da gramática, os professores precisam recorrer a textos
extras para construir mais exercícios de ortografia, sintaxe, vocabulário e
outros. Este resultado era esperado, uma vez que estas práticas são comuns e
usadas há muito tempo dentro do ambiente escolar, considerando a maioria de
inquiridos profissionalizados há mais de 15 anos.

90
Muitos deles, 68% dos inquiridos, fazem uso de tais textos para a reflexão
sobre a estrutura textual e os usam como material de leitura para formação de
modelos autênticos e atuais dos tipos de textos trabalhados. Considero este
um número significativo na obtenção de melhores resultados de aprendizagem
da literacia em Portugal, pois tanto o exercício da reflexão sobre as estruturas,
quanto o uso de modelos autênticos nas salas de aula são etapas
fundamentais para a melhor formação linguística dos professores.

Outros 88 inquiridos (55%) usam textos de outras fontes para desvendar os


propósitos sociais do tipo de texto a ser trabalhado. Apesar de não saber como
esta estratégia é levada a cabo, podemos afirmar que existe entre muitos
professores portugueses a preocupação e intenção de ensinar que os textos,
sempre são escritos com algum propósito social, mesmo que seja uma simples
nota sobre uma ligação telefónica. Outra importante característica constatada
para o objetivo desta dissertação.

Apesar de ser a finalidade menos assinalada, 74 inquiridos, que representam


quase metade da amostra (46%), responderam que fazem uso de textos extras
para análise e desconstrução de bons modelos do tipo de texto em questão.
Este dado é animador considerando que mesmo que os manuais que a escola
adote ainda tragam textos adaptados ou estejam desatualizados, o que é
comum acontecer, dependendo do nível socioeconómico da escola ou região,
boa parte dos professores da amostra fazem uso de materiais autênticos para
o ensino das línguas.

Outras teorizações sobre o ensino de géneros textuais também trabalham com


a desconstrução e análise de textos, o que pode também favorecer a
implantação de novas teorias linguísticas na educação portuguesa.

Por fim, há que considerar as três respostas dadas por inquiridos na opção
‘outros’, transcritas a seguir: “Para reescrever criativamente, resumir, sintetizar,
esquematizar, parafrasear e outras transformações de texto (de narrativo para
dramático) ”; “Para alargar horizontes culturais.”; “Fomentar o gosto pela leitura e
escrita.”

91
Os 2 últimos citaram questões importantes, mas que não são tratadas
especificamente nesta dissertação, as questões culturais e o gosto pela leitura,
ambas atuais e necessárias. A primeira entretanto, usa técnicas muito ligadas à
linha de pesquisa aqui apresentada como a reescrita, o parafrasear e o uso,
mesmo que inconsciente de géneros textuais “P de narrativo para dramático.”

2.2.5 A escrita de textos individuais

Duas questões foram levantadas acerca da escrita individual, ou textos escritos


por cada um dos alunos, sem a colaboração de outros colegas ou do professor.
Ambas apresentadas no quadro 4 (apêndice V), mais uma vez organizado pelo
tempo de profissionalização dos inquiridos.

A primeira pergunta pedia um número aproximado de quantos textos


individuais os alunos escreviam por ano letivo. Cinco destas respostas foram
desconsideradas por não divulgarem um número aproximado.

De forma abrangente, temos alunos que escrevem de 3 a 36 textos individuais


por ano letivo, demonstrando uma grande disparidade. Mais adiante tentarei
analisar e tirar conclusões para tal diferença. Agora chamo atenção para os 40
inquiridos (25%) cujos alunos escrevem cerca de 10 textos individuais e
representam a maioria das respostas. Em seguida, apresentam-se 27
inquiridos (17%) cujos alunos escrevem 6 textos por ano letivo, o que pode
significar a escrita de 2 textos por cada período; e ainda 2 grupos
representados por 12 inquiridos, cujos alunos escrevem 5 ou 20 textos por ano
letivo. Há os que escrevem 12 textos por ano, 10% da amostra, e também
podem escrever três textos por período, dependendo da organização escolar, o
que pode ser um número razoável, devido à grande extensão dos programas,
segundo os próprios inquiridos mencionaram em algumas justificativas vistas
no quadro 1 quanto à autoria do ensino de línguas em Portugal.

92
Número de textos individuais escritos
por ano letivo
Série2 Série1

1Xaula 2%
3
anulados 3%
5
36 textos 3%
4
20 textos 8%
12
18 textos 1%
2
15 textos 4%
6
12 textos 10%
16
10 textos 25%
40
9 textos 4%
6
8 textos 6%
10
6 textos 17%
27
5 textos 8%
12
4 textos 5%
8
3 textos 6%
9

Gráfico 8: Número de textos individuais escritos por ano letivo segundo os inquiridos.

Há que considerar, ainda, os poucos (cerca de 5%) que escrevem de 3 a 4


textos por ano letivo, o que considero uma produção muito baixa para a escola
básica e secundária. Em via contrária, não podem ser esquecidos os poucos,
mas significativos para este trabalho, que escrevem 18 ou 36 textos por ano, o
que demonstra que estes alunos, 1% e 3% respectivamente, apesar de não
terem muita representação na amostra, devem escrever respectivamente 6
textos por período e um texto a cada quinzena, números mais interessantes
dependendo do ciclo de estudos, uma vez que o ano letivo em Portugal é
dividido em três períodos.

Há ainda um dado que me soa demasiado, principalmente, ao considerar os


níveis mais baixos de escolaridade: alunos que produzem um texto em todas
as aulas. Mais adiante, cuidarei de analisar melhor esta curiosidade.

93
2.2.5.1 Atividades de pré-escrita

A segunda questão, relacionada a escrita de textos individuais, questiona quais


as atividades de preparação para a escrita dos textos, mais utilizadas pelos
inquiridos. Foram fornecidas nove alternativas para serem assinaladas, e uma
denominada: ‘outro’ para atividades não sugeridas. Os inquiridos puderam
assinalar tantas quantas utilizassem. As alternativas foram construídas a partir
das práticas mais comuns e também, visando a análise da práxis frente às
teorias estudadas.

O gráfico 9 expõe as atividades mais frequentes, em correspondência com as


letras A – J aqui descritas:
A. Determino o tema e/ou título do texto + o tipo de texto (e.g. história,
relatório...)
B. Determino o tema e/ou título do texto, mas não específico o tipo de texto
C. Determino o tipo de texto a ser escrito (ex. história, relatório...) mas, deixo o
tema à escolha dos alunos
D. Analiso e desconstruo um modelo do tipo de texto a ser pedido
E. Forneço informações sobre o tema sugerido
F. Forneço informações sobre o tema sugerido
G. Peço aos alunos que pesquisem outros modelos do tipo de texto sugerido
H. Escrevemos textos colectivos para ensinar como (estrutura textual) devem
ser escritos os diversos tipos de texto
I. Escrevemos textos colectivos para ensinar quais os propósitos sociais de
um certo tipo de texto
J. Outro

O gráfico revela 132 inquiridos (83%) que determinam o tema e/ou título do
texto + o tipo de texto, não permitindo ao aluno usar da sua criatividade para a
escolha de um tema na produção dos textos trabalhados; 116 inquiridos (73%)
afirmam fornecer informações sobre o tema sugerido, assim se estes últimos
assinalaram também a primeira alternativa, podemos concluir que trabalha-se
muito com atividades dirigidas para a construção de textos bem específicos, e

94
que se valoriza a necessidade de prover conhecimento sobre o conteúdo a ser
escrito.

Atividades de pré-escrita
Série2 Série1

J 10%
16
I 26%
42
H 65%
104
G 24%
38
F 73%
116
E 65%
104
D 64%
102
C 45%
72
B 25%
40
A 83%
132

Gráfico 9: Atividades mais comuns realizadas pelos inquiridos antes da escrita de textos.

Outro dado significativo vem dos 104 inquiridos (65%) que afirmam escrever
textos colectivos para ensinar como devem ser escritos os diversos tipos de
texto (estrutura textual), o mesmo número de inquiridos fornece informações
sobre o tema sugerido. Um número muito próximo a este, de 102 inquiridos
(64%) afirma analisar e desconstruir um modelo do tipo de texto trabalhado.
Considero as três práticas de imenso valor na obtenção de melhores resultados
nacionais para o processo de ensino e aprendizagem das línguas.

Quanto à opção, ‘determino o tipo de texto a ser escrito mas, deixo o tema à
escolha dos alunos’, assinalada por 72 inquiridos (45%) demonstra que alguns
inquiridos têm maior preocupação com a forma do que com o conteúdo,
saberemos adiante se esta visão está misturada entre as categorias de
ordenação do perfil.

Cerca de 5% dos inquiridos afirmam utilizar três práticas: determinar o tema


e/ou título do texto, sem especificar o tipo de texto; pedir aos alunos que

95
pesquisem outros modelos do tipo de texto sugerido; escrever textos colectivos
para ensinar quais os propósitos sociais de um certo tipo de texto. Tais práticas
podem revelar avanços no caminho à excelência em ensino de línguas,
promovidas, também, por influência de outras linhas de pesquisas anteriores à
pedagogia linguística, as quais já mencionei no primeiro capítulo.

Há ainda 16 inquiridos, que representam apenas 2% da amostra, os quais


sugeriram outras alternativas que serão discutidas no terceiro capítulo.

2.2.6 Escrita de textos coletivos e grau de intervenção do professor

Interessa aqui apreciar a média de textos coletivos escritos por alunos


portugueses em um ano letivo; e ainda que tipos de estratégias de intervenção
são mais comuns entre o professorado português ao realizar tal tarefa.

O gráfico 10 revela que a maioria dos professores portugueses (26%) escreve


textos coletivos com seus alunos três vezes por ano letivo, imagino que este
número reflita que seja escrito um texto coletivo por cada período. Logo a
seguir cerca de 15% dos inquiridos representam dois números muito distintos
de produção: 15% dizem não promover a escrita coletiva; outros 15% dizem
que seus alunos escrevem 2 textos coletivos por ano.

Depois ainda temos alguma representatividade de inquiridos (cerca de 10%)


que promovem a escrita coletiva, uma, quatro ou dez vezes ao ano; e por fim
os menos representativos promovem os textos coletivos cinco, seis ou oito
vezes ao ano, respectivamente, 6%, 8%, 3% dos inquiridos.

O dado mais geral é coerente, já que um texto por período pode fazer sentido
dependendo do nível de estudos que representam, e do tipo de texto a ser
trabalhado. Os outros números propostos não me parecem, no momento,
coerentes a nenhuma linha teórica, o que pode se relacionar a muitas variantes
do ensino. Deixo portanto, deixo a discussão mais aprofundada desses dados
para o próximo capítulo.

96
Escrita de textos coletivos
Série4 Série3 Série2 Série1

9% 14
10 textos coletivos
3% 4
8 textos coletivos
8% 12
6 textos coletivos
6% 10
5 textos coletivos
10% 16
4 textos coletivos
26% 42
3 textos coletivos
14% 22
2 textos coletivos
9% 14
1 texto coletivo
16% 26
nenhum texto coletivo

Gráfico 10: Média de textos coletivos escritos por alunos portugueses em um ano letivo

2.2.6.1 Estratégias de intervenção mais comuns durante a escrita de


textos coletivos

O gráfico 11 revela os tipos de estratégia mais comuns utilizados pelos


inquiridos na forma de intervenção durante a escrita de textos coletivos. Foram
fornecidas três alternativas de resposta, aquelas que acredito serem mais
comuns ao trabalhar-se textos coletivos com um ou vários grupos.

Esta questão não era de resposta obrigatória, uma vez que se os inquiridos
podem não utilizar textos coletivos em suas aulas, por outro lado, a questão
permitia assinalar mais de uma alternativa.

Como previsto os 26 inquiridos que afirmaram não utilizar textos coletivos para
o ensino de línguas nas suas aulas, consequentemente, não responderam a
esta questão. Estes dados podem ser verificados no quadro 5 que contém o
número de textos coletivos escritos por ano letivo e as respectivas respostas
quanto às estratégias de intervenção.

97
Os outros inquiridos dividem-se em 34% de professores que usam, mais
frequentemente, a estratégia de guiar toda a turma na construção de um só
texto coletivo, em percentagem muito próxima, 32% dos inquiridos costumam
pedir a grupos de alunos que construam os textos coletivos e os monitoriza,
auxiliando na construção do tipo de texto pedido.

Texto coletivo: estratégias de intervenção


Série1 Série2 Série3 Série4 Série5 Série6 Série7
Série8 Série9 Série10 Série11 Série13 Série12
90
84 78
80
70
58
60
50
40
24 30
20
10
36% 53% 49% 15%
0
Pede a grupos que Guia toda a turma na Pede a grupos que os Não responderam
construam um texto construção de um só construam e
e se coloca à texto monitoriza os grupos,
disposição para tirar auxiliando na
eventuais dúvidas; construção do tipo de
texto pedido.

Gráfico 11: Texto coletivo: estratégias de intervenção.

Outros 24% pedem a grupos de alunos que construam um texto coletivo,


apenas colocando-se à disposição para tirar eventuais dúvidas, o que parece
um número ainda muito elevado, dada a complexidade conhecida do ensino
das línguas atualmente.

2.2.7 A prática de textos orais e as dificuldades apresentadas pelos


alunos portugueses.

Textos escritos e textos orais têm o mesmo peso e medida no ensino das
línguas se se adotar uma qualquer das abordagens de ensino

98
contemporaneamente dominantes, designadamente as de base genológica.
Perguntei, portanto, aos inquiridos quais textos orais seus alunos praticam em
aula. Consequentemente, os indaguei sobre as diversas dificuldades
apresentadas pelos alunos na produção destes textos, já que sabemos que
estes, ainda não representam géneros escolares privilegiados, apesar de
aparecerem no Currículo Nacional, diretrizes para as competências do modo
oral no ensino da língua portuguesa (2001:32) e também, através das diretrizes
para a comunicação, expressas repetidamente na parte dedicada ao ensino
das línguas estrangeiras (2001:38-54).

A primeira pergunta continha algumas opções, aquelas quais julguei mais


comuns entre as possíveis respostas, todavia, para não limitar as respostas
dos professores, estes poderiam escrever outros tipos de texto oral praticado
por seus alunos em sala de aula no campo ‘outro’. A resposta a esta questão
era obrigatória e os inquiridos podiam assinalar mais de uma resposta. Segue-
se o conjunto de alternativas postas tal como no inquérito: Diálogos em
diversas situações da vida quotidiana; entrevistas; discurso; debate;
apresentação de pesquisa; seminários sobre conteúdo específico;
dramatizações e outro.

Textos orais praticados na sala de aula


Série2 Série1

Outro 5%
8

Dramatizações 65%
104

Seminários 16%
26

Apresentação 85%
136

Debate 71%
114

Discurso 35%
56

Entrevistas 51%
82

Diálogos 78%
125

Gráfico 12: A prática de textos falados em sala de aula.

99
O gráfico 12 expõe os dados assinalados pelos professores, revelando maior
preferência pela forma oral de apresentação de pesquisa, 85% dos inquiridos;
seguida pelos diálogos, muito comuns em aulas de LE e PLE, 78% dos
inquiridos; e pela promoção de debates, 71%.

Considero as 104 respostas (65%) de inquiridos que praticam o texto dramático


em aula muito significativas, não só pelo riquíssimo género textual que
representa, mas por revelar que o ensino das artes também modificou-se na
escola, no decorrer do tempo, esta é uma mudança cujos louros pertencem em
grande escala às linhas educacionais psicológicas.

Menos representativos, mas não menos importantes, aparecem


consecutivamente os seguintes géneros: entrevista (13%); discurso (9%) e
seminários sobre conteúdos (4%). Ressalvo que este último costumava ser um
dos únicos géneros orais praticados na escola antes da rutura com as teorias
da pedagogia tradicional, o que pode explicar o baixo interesse por tal género
na atualidade.

2.2.7.1 Dificuldades mais comuns na produção do texto oral.

Exponho agora as dificuldades mais comuns, entre os alunos portugueses, na


produção dos textos que os inquiridos afirmaram praticar com os mesmos na
secção anterior, segundo os seus professores. Nesta segunda questão, sobre
os textos orais, perguntei quais as dificuldades que os alunos apresentam na
produção de tais textos, a resposta apesar de aberta, era obrigatória.

O quadro 6 (apêndice VII) contém os tipos de textos orais mais praticados e as


respectivas respostas quanto às dificuldades apresentadas. As dificuldades
agrupadas de A a J para a feitura do gráfico 13 foram retiradas da interpretação
das respostas mais recorrentes, que podem ser facilmente identificadas através
das diferentes cores na última coluna. Assim como a coluna dedicada aos tipos
de textos, também foi marcada por diferentes cores para facilitar a visualização
das respostas de cada inquirido, por sua vez, agrupados por tempo de
profissionalização.

100
O gráfico 13 quantifica as dificuldades mais comuns agrupadas da seguinte
maneira:
A. Vocabulário pobre ou inadequado
B. Incorreção gramatical / dificuldades sintáticas
C. Dificuldades com ortografia, pontuação e acentuação
D. Dificuldades de pronúncia ou fluência
E. Dificuldades quanto ao tema ou quanto ao conteúdo e falta de
criatividade
F. Interferência linguística (entre línguas maternas e não-maternas)
G. Desenvolvimento estrutural do texto, coerência de discurso,
argumentação critica, sistematização das ideias, coesão e coerência
H. Compreensão dos modelos, géneros textuais e das tarefas
I. Desenvoltura e postura na prática oral.
J. Planificação e uso de suporte escrito

Dificuldades mais comuns na


produção de textos orais
Série2 Série1

J 10%
16
I 29%
46
H 16%
26
G 51%
82
F 4%
6
E 10%
16
D 8%
12
C 19%
30
B 28%
44
A 35%
56

Gráfico 13: Apresentação das dificuldades mais comuns na produção do texto oral.

Observamos que 51% inquiridos mencionam que seus alunos têm dificuldades
ao estruturar os textos orais, assim como com a coerência do discurso, a

101
capacidade de argumentar criticamente, e de sistematizar as ideias, outros
mencionam ainda falta de coesão e coerência.

Outro número alto, 35% dos inquiridos apresenta dificuldades relacionadas às


escolhas de vocabulário nas produções orais. A seguir, temos uma média de
30% dos inquiridos que comentam dificuldades quanto à correção gramatical e
sintática, assim como, dificuldades quanto à postura e desenvoltura ao
expressarem-se oralmente.

Inquiridos que representam por volta de 20% da amostra comentam sobre


dificuldades acerca de ortografia, pontuação e acentuação que serão mais bem
exploradas no próximo capítulo.

Outros 16% comentam dificuldades em relação à compreensão dos modelos


de textos fornecidos previamente, ou do género em questão, e até mesmo falta
de compreensão das tarefas e dos enunciados propostos. Esta questão tem
especial relevância numa dissertação que trata da formação docente. O baixo
número de comentários deste tipo pode ser positivo ou não.

Entre as dificuldades apresentadas menos citadas (cerca de 10%) estão: as


relacionadas com a pronúncia ou fluência, características essenciais dos textos
falados, mas mais comumente avaliadas em aulas de LE ou PLE que não
representam a maior parte desta amostra; as dificuldades quanto à escolha ou
desenvolvimento do tema ou conteúdo, assim como a falta de criatividade.
Espanta-me imaginar que crianças e jovens não tenham criatividade, portanto,
uni estas características no mesmo grupo por acreditar que a falta de
criatividade ou imaginação citadas esteja relacionada, justamente, com as
estratégias de ensino dos temas e/ou conteúdos escolares; e ainda,
dificuldades quanto à planificação e o uso de suporte escrito, ambas
características presentes na produção do texto oral.

A dificuldade comentada pelo menor número de inquiridos refere-se às


interferências linguísticas, os quais creio que sejam provenientes de inquiridos

102
que ensinem PLE, LE ou PLNM, o que será mais largamente analisado no
terceiro capítulo.

2.2.8 Planeamento textual: a seleção de textos para o ensino da


escrita

A última etapa do questionário centra-se na seleção de textos, pretendendo


saber quais as fontes de informações mais comuns usadas pelos inquiridos na
seleção dos temas abordados e na seleção dos tipos de textos (narrativas,
artigos, relatos, discursos, debates, etc.) a serem ensinados, na fase do
planeamento das aulas.

Tais questões são de múltipla escolha e foram organizadas com o objetivo de


descobrir se os professores portugueses se prendem apenas aos manuais
escolares; se conhecem e usam os documentos oficiais europeus e
portugueses; e também, se fazem uso de recursos do quotidiano que estejam
próximos da realidade dos alunos. Entre as alternativas estavam os manuais
escolares, a Internet, o Currículo Nacional do Ensino Básico 2001, o Programa
de Português do Ensino Básico de Dezembro de 2008, o Plano Nacional de
Leitura (1 e 2 ciclos), o Quadro Europeu Comum de Referência para o ensino
das línguas, e ainda havia a possibilidade de preencher o campo ‘outros’, como
alternativa. Estas respostas estão organizadas no quadro 7 (apêndice VIII), por
sua vez, dividido por ciclos de ensino para futura análise.

A primeira questão sobre a seleção de textos inquiriu sobre as fontes de


informação usadas para a seleção dos temas abordados na escola, ao planear
aulas que envolvem a escrita ou preparação para a escrita de textos. Os
resultados obtidos estão apresentados no gráfico 14.

103
Fontes para seleção de temas
Série7 Série6 Série5 Série4 Série3 Série2 Série1

15% 24
Outros

44% 70
Q.E.C.R. para o ensino das línguas

35% 56
Plano Nacional de Leitura (ciclos 1/2)

29% 46
Programa de Português do Ensino Básico

21% 34
Currículo Nacional do Ensino Básico

71% 114
Internet

94% 150
Manuais escolares

Gráfico 14: Fontes usadas na seleção de textos quanto ao tema.

Os dados da pesquisa mostram que 94% dos inquiridos usam os manuais


escolares como referência para a escolha dos temas a serem trabalhados.
Julgo uma atitude normal e razoável, afinal, os autores dos manuais devem
apoiar-se no currículo e programas nacionais. Nota-se que 71% dos inquiridos
também faz uso da Internet para os apoiarem na escolha dos temas, creio que
muitas vezes este recurso é usado para tratar de assuntos momentâneos que
nenhum manual escolar á capaz de conter, ou ainda para tratar de assuntos
atualizados relacionados ao tema principal da unidade ou aula.

As outras fontes selecionadas apresentam-se na seguinte ordem: 44% usam o


QECR; 35% o Plano Nacional de Leitura (1º/2º ciclos); 29% o Programa de
Português do Ensino Básico (2008); e 21% o Currículo Nacional do Ensino
Básico (2001).

O Currículo Nacional não é popular entre os professores de línguas para a


seleção de temas, porque não contém sugestões de temáticas para nenhum

104
nível de ensino. De certa forma, ao serem interpretadas, tanto a parte dedicada
à língua portuguesa, quanto a parte das línguas estrangeiras direcionam o
planeamento, através de diretrizes traçadas, para a seleção dos tipos de
textos.

Outros textos foram citados como fontes para a seleção de temas, como livros,
revistas, outros programas, planificações, entre outros, que serão melhor
explorados na análise de dados.

A outra questão relacionada às fontes utilizadas no planeamento, para a


seleção de textos no ensino da leitura e escrita, inquiriu sobre os tipos de texto
(géneros textuais) mais utilizados. As alternativas de respostas eram as
mesmas da questão anterior, apenas dispostas em diferente ordem.

De acordo com o gráfico 15, mais uma vez, a maioria dos inquiridos (95%) faz
uso dos manuais escolares para seleccionar os tipos de textos que ensinarão
aos alunos portugueses, colocando uma grande responsabilidade sobre este
recurso. Contudo, existe uma significativa percentagem (80%) de inquiridos
que afirmam fazer uso da internet para a seleção dos tipos de textos (géneros
textuais), o que pode significar que apesar de apoiarem-se nos manuais,
buscam outros géneros na internet para tornar o ensino da literacia mais útil e
significativo sob a perspectiva do alunado.

Uma das competências gerais de transversalidade disciplinar preconizada pelo


currículo nacional visa a comunicação de forma correta e adequada em
diversos contextos e com seus objetivos particulares. (cf. Currículo Nacional,
2001:31)

O Plano Nacional de Leitura para o 1º e 2º ciclo é utilizado por 65% dos


inquiridos, dado que releva-se pelo fato de termos uma pequena
representatividade da amostra que trabalha com estes ciclos de estudos, juntos
somam apenas 27% dos inquiridos.

105
Fontes para seleção de tipos de texto
Série6 Série5 Série4 Série3 Série2 Série1

13%
20
Outros

40%
64
Q.E.C.R. para o ensino das línguas

65%
104
Plano Nacional de Leitura (ciclos 1/2)

53%
84
Programa de Português do Ensino Básico

40%
64
Currículo Nacional do Ensino Básico 2001

80%
128
Internet

95%
152
Manuais escolares

Gráfico 15: Fontes para a seleção dos tipos de textos (géneros) ao planear atividades de
escrita.

O Programa de Português do Ensino Básico (2008) vem logo em seguida no


gráfico, sendo utilizado por mais da metade dos inquiridos (53%). Cerca de
40% dos inquiridos afirmam fazer uso do Q.E.C.R. e do Currículo Nacional do
Ensino Básico (2001). Suponho que aqueles que utilizam o QECR devem
representar em sua maioria por professores de LE e PLE que juntos somam
50% da amostra.

Entre as respostas dos inquiridos que afirmam fazer uso de outras fontes para
a seleção de textos destaco livros, artigos de jornais e revistas; textos dos
média, programa de línguas, fontes autênticas, plano nacional de leitura do 3º
ciclo, entre outros que serão abordados na análise dos dados.

106
2.2.9 Os tipos de textos ou géneros escolares mais recorrentes em
Portugal

Antes de partir para a análise mais detalhada dos dados, verificaremos quais
os tipos de textos (ou géneros textuais) que os inquiridos utilizam em sala de
aula com maior frequência. A questão perguntava quais os tipos de texto que
os inquiridos costumam usar no ensino da língua. Foram fornecidas oito
opções e a possibilidade de escrever outros tipos de textos trabalhados, que
não estivessem na lista de escolha múltipla. Mais de uma alternativa podia ser
selecionada. Todas as respostas podem ser verificadas no quadro 8 (apêndice
XIX) e estão quantificadas no gráfico a seguir.

Tipos de textos mais recorrentes


Série4 Série3 Série2 Série1

26%
Outros 41

31%
Resenhas 50

74%
Relatos pessoais 118

39%
Relatos históricos 62

80%
Relatos biográficos 128

36%
Relatórios 58

41%
Procedimentos 66

93%
Narrativas 148

84%
Histórias 134

Gráfico 16:Tipos de textos mais recorrentes no ensino de línguas em Portugal.

O gráfico 16 mostra que o tipo de texto mais usado pelos professores são as
narrativas (93%), como era esperado, uma vez que os textos narrativos sempre
foram privilegiados no ensino das línguas, desde os tempos da pedagogia
107
tradicional. As histórias são um tipo de texto narrativo, portanto, não poderiam
estar muito atrás, representando 84% da amostra.

A seguir os tipos de textos mais populares são os relatos biográficos e os


relatos pessoais. Estes últimos são tipos muito comuns de textos no ensino
escolar, para que os alunos possam expressar-se enquanto agentes deste
mundo, quanto aos relatos biográficos, podem ser autobiográficos ou sobre a
biografia de outrem e servem a todos os níveis de escolarização.

Os relatos históricos (39%), relatórios (36%) e procedimentos (41%) têm menor


representatividade para os professores de línguas, talvez, por serem mais
comumente encontrados em outras disciplinas, por exemplo, relatórios de
experiências científicas; relatos sobre um período histórico marcado por algum
acontecimento específico, como uma guerra ou a mudança de um governo;
entre outros.

Por fim, temos as resenhas com representatividade de apenas 31% dos


inquiridos. Este, como no caso dos seminários (texto oral) citado na secção
2.2.7, era um tipo de texto muito comum na escola tradicional, o que pode
explicar, de certa forma, a baixa percentagem.

Os dados acima apresentados serão melhor explorados no capítulo a seguir,


que fará referência aos números e dados, gráficos e quadros.

Concluímos por ora que certas práticas docentes apresentadas condizem tanto
com as pretensões estatais para o ensino das línguas, quanto para os objetivos
desta dissertação, enquanto outros dados podem significar entraves à
reelaboração da formação continuada dos professores de línguas (e não só),
porém, estes não parecem representar maiorias nesta amostra.

108
Capítulo III

A necessidade e o desejo de comunicar surgem


numa situação específica e a forma e o conteúdo da
comunicação são uma reacção a essa situação.
(Conselho da Europa, 2001:75)

1. Discussão dos dados obtidos nesta investigação

Este capítulo é dedicado à discussão dos dados recolhidos e apresentados no


segundo capítulo. Esta investigação é tanto quantitativa, como apreciado nos
gráficos expostos no segundo capítulo, quanto qualitativa tendo por base as
teorias estudadas e já apresentadas no primeiro capítulo.
A discussão dos dados será realizada tendo como referência o Currículo
Nacional do Ensino Básico de 2001 (doravante CNEB), os programas LPEB de
2008, ao QECR de 2001 e o campo teórico já apresentado, na tentativa de
trazer à tona relações entre o que pensam e fazem os professores ao ensinar
língua nas salas de aula e os objetivos oficiais expostos nos documentos acima
citados.

1.1 Acerca do perfil dos inquiridos

Inicio esta análise por apreciar os dados do perfil da amostra que obtive nesta
investigação. Os inquiridos representam, como vimos, maioritariamente
professores que ensinam o português como língua materna, mas não só; dos
118 professores que lecionam PLM, 72 também ministram aulas de outras
línguas ou de língua portuguesa (doravante LP) em outros contextos. Estes são
seguidos pelos professores que se dedicam ao ensino de PLNM que somam
62 inquiridos, dentre os quais 46 também lecionam PLM. Isso significa que
apenas 16 professores de PLNM não lecionam PLM, o fator mais provável para
a apresentação deste quadro deve ser o crescente número de imigrantes ou
filhos de imigrantes presentes nas salas de aulas em Portugal.

Apesar de tal questão não ter sido levantada neste inquérito, podemos criar a
hipótese de que este quadro se deve ao crescente número de alunos
estrangeiros dentro das salas de aulas das escolas regulares portuguesas.

109
Sendo assim, os professores que inicialmente atendiam um público que tinha o
português como língua materna, tornaram-se por via das circunstâncias,
professores de português como língua não-materna também. Concluo que já
existe uma considerável preocupação das escolas que atendem alunos do
ensino básico e secundário, cujas línguas maternas podem ser outras que não
a portuguesa, em capacitar professores para ensinar PLNM.

Os professores que trabalham com PLE representam apenas 30 dos inquiridos


da amostra, ressalto aqui que estes professores podem atuar tanto em centros
de ensino de línguas e de explicações, assim como em escolas regulares, pois
acredito que todas as instituições de ensino, desde que trabalhem com
professores profissionalizados, exercem influência sobre a formação dos
alunos. Sendo assim, foram consideradas respostas de professores de línguas
que trabalhassem em realidades outras que não a escola regular, desde que
atendessem alunos portugueses dentro da faixa etária determinada.

Como citamos na secção 2.1.1, o baixo número de respostas de professores


de PLE pode ter dois significados. O primeiro, e que considero mais fiável, é o
fato de os professores de PLE em Portugal atenderem uma pequena parcela
de crianças e jovens em idade de escolarização básica e secundária, pois
sabe-se que o público do ensino de PLE é mais alargado nos programas de
intercâmbios entre universidades, ou seja, de jovens que já passaram da faixa
etária desta amostra, ou o público adulto, imigrante ou não. Os alunos desta
amostra, devido à delimitação da faixa etária escola, estão mais largamente
representados nas aulas de PLNM que ocorrem em escolas regulares de
ensino.

Outra hipótese que levanto é a possibilidade deste grupo de professores estar


à margem da formação continuada de professores e do contato com
professores de outras áreas e institutos de formação. Não podemos esquecer
que, se há público adulto imigrante, consequentemente, há uma parcela de
indivíduos em idade escolar, filhos(as) destes imigrantes nas escolas regulares.
A contribuição dos professores especialistas em PLE nestes casos poderia ser
muito valiosa.

110
Segundo dados do Ministério da Educação, em 2004 havia mais de 81 mil
alunos estrangeiros nas escolas portuguesas. (cf. Jornal Público, 15 de
dezembro de 2006, em www.publico.pt/educação). Estes últimos (alunos de
PLNM) são considerados nos programas LPEB, como especiais e aos quais se
dedica especial atenção.

“Se muitas vezes designamos o Português como língua materna, não o fazemos
certamente por acaso: naquela imagem representa-se bem a noção de que a
língua que aprendemos (e que a escola depois incorpora como matéria central)
está directamente ligada à nossa criação e ao nosso desenvolvimento como
seres humanos. Naturalmente que são diferentes destas as vivências dos alunos
que não têm o Português como língua materna, alunos cuja integração na língua
de acolhimento se processa em termos que, como é óbvio, são distinto e para os
quais existem orientações.” (Ministério da Educação Português, 2008:6)

Acrescento ainda que o documento de referência considerado mais apropriado


para o ensino de PLE é o QECR para as línguas, pois abrange diretrizes
comuns a todas as línguas estrangeiras, inclusive a LP ensinada e aprendida
como tal. Nesta investigação os inquiridos que ensinam LE e PLE somam 80,
um número significativo de professores que se mostram interessados e
envolvidos nas questões de aprendizado ao longo da vida e que podem
contribuir positivamente para a formação da literacia dos alunos como um todo.
De acordo com o QECR, um dos objetivos das políticas linguísticas europeias
está em:

“ P responder às necessidades de uma Europa multilingue e multicultural,


desenvolvendo de forma considerável a capacidade dos europeus comunicarem
entre si, para lá de fronteiras linguísticas e culturais, o que exige um esforço bem
alicerçado ao longo da vida, que deve ser encorajado, visto numa base mais
organizada e financiado em todos os níveis de ensino pelas autoridades
competentes;” (Conselho da Europa, 2001:22)

Ainda em relação ao perfil dos inquiridos há considerável diferença entre os


inquiridos que representam os dois primeiros ciclos, em relação aos demais,
portanto, afirmo que esta análise abrange mais os professores e o ensino do
terceiro ciclo e do ensino secundário. As razões que levaram a esta realidade
podem ser tão diversas que não nos caberá discutir, apenas ponderar. Outra
ponderação significativa para esta análise é o fato da maioria dos inquiridos

111
terem sido profissionalizados há mais de 15 anos, ou seja, tiveram sua
formação antes das tendências atuais de ensino e aprendizagem das línguas, e
também da realidade multilingue e multicultural citada acima.

2. Autoria e grau de interferência creditada a outros especialistas no


ensino das línguas.

A teoria de registo e do género e a proposta da escola de Sydney suporta a


ideia de que a língua deve ser aprendida enquanto permeada por todo o
currículo, além da dedicação especial para os estudos peculiares e gerais da
língua nas aulas de línguas maternas ou não. Ao identificar que os próprios
professores de línguas acreditam poder dividir esta tarefa com colegas de
outras áreas, penso que é possível capacitar todos os professores da escola
básica para ensinar as linguagens específicas de suas áreas de conhecimento
como a linguagem matemática, científica, histórica e assim por diante. Almejo,
ainda, a possibilidade de ter a colaboração dos especialistas em línguas e
linguística para que o projeto seja bem estruturado e que faça parte das
equipes de professores de dentro de cada escola, ao invés, de receberem
informações apenas dos que vem de fora, a academia, eles poderão ter a
oportunidade de aprender uns com os outros assim como seus alunos o fazem.

No que diz respeito à opinião dos inquiridos quanto a autoria do ensino de


línguas em Portugal e suas razões para tal, apresentadas na secção 2.2.1 e no
quadro 1 (apêndice II) constata-se que aqueles inquiridos que consideram as
aulas de língua, as únicas responsáveis pela aprendizagem do conteúdo
programático desta disciplina, e portanto, responderam ‘SIM’ (vide quadro 1)
são minoria. Em geral, atribuem esta responsabilidade aos professores de
línguas por estes “dominarem” a língua, terem especialização na área da
linguística, deterem as ferramentas necessárias ao ensino, assim como
habilitação e competência para a realização de tal tarefa.

Os inquiridos que partilham desta opinião são em sua maioria


profissionalizados há mais de 15 anos, quando as diretrizes para o ensino eram
outras e, consequentemente, mais ligadas ao ensino multidisciplinar.

112
Acrescento ainda o facto de apenas 2 dos inquiridos deste grupo trabalhar no
primeiro ciclo, enquanto os outros dividem-se em sua maioria em ensinantes do
terceiro ciclo e secundário, com alguma representatividade no segundo ciclo.

Outro dado relevante, apresenta-se em 6 comentários sobre a existência de


equipas multidisciplinares responsáveis pelo ensino das línguas, a palavra
interdisciplinaridade aparece em apenas 2 respostas como algo existente.
Infiro, portanto, que as equipas multidisciplinares devem ser responsáveis pela
veiculação da interdisciplinaridade, considerando que ao unir em uma só
equipa pessoas especialistas em diversas disciplinas, estas estarão pensando
em um foco comum.

Alguns traços da transversalidade da língua aparecem em algumas


justificativas, apesar da descrença na partilha da autoria do ensino das línguas.
A maior parte delas, com relação à necessidade de correção de erros
cometidos e ao bom uso da língua pelos docentes para que sirvam de bons
modelos - outra evidência da formação de docentes profissionalizados a mais
de 15 anos. (vide quadro1)

As respostas deste grupo que mais chamam atenção enquanto um discurso


mais elaborado sobre necessidade de ter as línguas como transversais ao
ensino remontam às contribuições quanto às competências linguísticas
específicas de cada disciplina, à necessidade de formação dos docentes para
poderem assumir tal responsabilidade e à grande extensão dos programas de
português. Os traços da transversalidade das línguas aparecem como uma
vertente central no LPBE como se constata na citação:

“P se o ensino do Português previsto nestes programas se desenrola numa aula


específica e com um professor formado para tal efeito, isso não significa que
nessa aula e com esse professor se esgote, para o aluno, a aprendizagem do
idioma e a sua correcta utilização.” (Ministério da Educação, 2008:6)

Ao mesmo tempo, o LPBE responsabiliza a extensão do ensino da LP a:

“um coletivo de instrumentos e de agente com responsabilidades próprias: os


materiais didácticos (em particular os manuais) P; as famílias P; os

113
equipamentos escolares PTodos estes e antes deles os professores, com a
formação de base que possuem e com formação complementar de que
regularmente carecemP” (Ministério da Educação Português, 2008:6)

Mesmo concordando com a necessidade de um ambiente de ensino favorável


e com a importância do apoio social e familiar, não acredito que a
“aprendizagem do idioma e sua correcta utilização”, como acima mencionado,
seja eficientemente cumprida, sem a ajuda de outros professores, assim como
a maioria dos inquiridos, os quais responderam que consideram o ensino das
línguas de responsabilidade de todos os professores envolvidos no processo
de ensino aprendizagem dos alunos do ensino básico e secundário.

Esta possibilidade é mencionada no documento citado ao fazer referência a


uma observação feita na Conferência Internacional sobre o Ensino do
Português9 quando foi sugerido que os professores de todas as disciplinas
cooperassem em vista da correta aprendizagem linguística em todos os
momentos. (cf. Ministério da Educação, 2008:6)

Em princípio, pode-se dizer que a balança é positiva se considerarmos a TR&G


e ao compararmos este quadro, à proposta de criação de um currículo
linguístico paralelo ao de conteúdos específicos, via norteadora do R2L.
Entretanto, ao analisar cada justificativa, inclusive daqueles que representam a
maioria e responderam ‘NÃO’, distribuindo a autoria do ensino das línguas
através das áreas curriculares, apenas uma delas refletiu real conhecimento
sobre a genologia e a importância de se ensinar a ler e escrever textos de
todas as áreas curriculares, preocupando-se com os géneros específicos de
cada disciplina. Outro inquirido cita a necessidade do conhecimento das
metalinguagens de cada disciplina, porém a delimita ao público de PLNM;
ainda outro, comenta a possibilidade de formar professores em ensino
aprendizagem de línguas não maternas com o intuito de tornar as equipas
capazes de trabalhar junto aos professores de PLNM, apesar de não ver esta
possibilidade como uma probabilidade. (Essas justificativas estão destacadas
em vermelho no quadro 1).

9
Conferência Internacional sobre o Ensino do Português realizada em Lisboa, na Universidade
Aberta em 2008.

114
Vale anotar que estas repostas foram dadas por professores profissionalizados
em épocas diferentes, apesar de todos exercerem seu ofício com alunos do
terceiro ciclo e ensino secundário.

Sob outra perspectiva, muitos inquiridos dividiram suas opiniões entre PLM e
PLNM, dando especial atenção aos grupos de alunos em PLNM e afirmando
que este é o público que precisa da colaboração de toda a comunidade
escolar. Torna-se relevante apontar que 18 professores consideram a língua
como um meio para ensinar ou um meio de comunicação essencial para que
ocorra aprendizagem; 10, citam a existência das várias linguagens que
envolvem o ensino curricular em relação ao vocabulário e a uma forma de
acrescentar na formação linguística dos alunos; 24 professores mencionam a
palavra transversal, principalmente em relação à língua materna, o conceito de
língua não fica claro, mas todos eles entendem que a língua transpassa os
outros conteúdos curriculares e este dado é muito positivo, considerando as
intenções deste trabalho.

Vale ressaltar que sete professores mencionaram agentes extra escolares


como a família, os pais, a comunidade e a sociedade como também
responsáveis pelo ensino das línguas.

Por último, verificamos que, assim como alguns professores do primeiro grupo
responderam (SIM), alguns dos que responderam NÃO, também vêem a
responsabilidade dos professores das demais disciplinas limitadas ao uso
correto da língua (10 menções/referências) e à necessidade de correção
gramatical, tanto oral, quanto escrita e em algumas vezes, também como forma
de punição através das avaliações das diversas disciplinas (5 menções).

Apesar de os professores em geral verem a língua como o meio pelo qual se


aprende e se ensina nas escolas, percebe-se que a atribuição de
responsabilidades aos professores de todas as disciplinas está ainda muito
ligada à avaliação, à soma de conhecimentos e ao vocabulário específico de
cada disciplina, traduzida na tentativa de somar as várias aptidões das diversas
especialidades.

115
2.1 Comparação ao grau de intervenção creditado aos outros
especialistas

Quando indagados sobre o grau de interferência creditada aos docentes de


outras especialidades na formação linguística dos seus alunos, (secção 2.2.3)
60% dos inquiridos assinalaram que professores de outras disciplinas são
capazes de colaborar com a formação linguística dos alunos, o que condiz com
a resposta da maioria dos inquiridos acima, ao creditarem a autoria do ensino
das línguas às diversas áreas curriculares. Também é positivo notar que
poucos inquiridos negam esta possibilidade. (vide gráfico 6)

Por outro lado, apenas 34% dos inquiridos mostram preocupação com a
necessidade de formação complementar para a realização de tal tarefa, via
norteadora desta pesquisa. Levanto aqui duas hipóteses: ou boa parte dos
professores de línguas portugueses confiam nos seus colegas, acreditando
serem capazes de o fazer, sem nenhuma capacitação extra, ou então, o
conceito das estruturas e propósitos socias dos diferentes géneros textuais, em
suas diversas especialidades, ainda não esteja bem claro entre os inquiridos.

Ensinar uma língua tendo como base paralela um currículo linguístico,


ultrapassa a leitura e compreensão de textos. Todos os professores, neste
caso, devem estar aptos a ensinar seus alunos a lerem critica e
conscientemente, descobrindo e deduzindo os propósitos sociais dos textos
trabalhados. Isso decorre da aprendizagem das estruturas típicas de cada
género, das suas componentes, da ordem em que se realizam e as razões
para tal, das estruturas textuais, grupos de palavras, entre outros, utilizados
para transmitir certos conteúdos disciplinares, seja na forma oral ou escrita,
visando formar alunos também capazes de produzir textos dos diversos
géneros com segurança e consciência. Segundo o CNEB cabe ao professor
“Apoiar o aluno na escolha de linguagens que melhor se adeqúem aos objectivos
visados, em articulação com os seus interesses” (Ministério da Educação, 2001:15)

Ao comparar os gráficos 4 e 6 cabe aqui referir a uma notável diferença nas


respostas, que se reafirmam na distribuição de autoria e da capacidade de

116
todos os docentes no ensino da literacia. Para facilitar a análise desta
comparação construí o quadro 2 (apêndice III) que compara as respostas
quanto à distribuição de autoria e da capacidade de todos os docentes no
ensino da literacia. Note que as opiniões positivas nas duas colunas possuem o
símbolo ‘•’, enquanto os que não creditam autoria de ensino de línguas a todos
os professores não estão assinalados e as diferentes respostas quanto à
capacidade dos professores em geral, na contribuição ao ensino de línguas
foram copiadas no quadro.

Cerca de 22% dos inquiridos (34) não creditam autoria de ensino das línguas a
outros professores, que não os especialistas da área, entre eles 14 creem na
capacidade dos outros especialistas em poder ensinar línguas, enquanto
apenas 4 afirmam não acreditar nesta possibilidade - todos profissionalizados
há pelo menos mais de 10 anos. Os outros 16 inquiridos mencionam a
necessidade de capacitação linguística para os especialistas de outras
disciplinas. Este grupo de inquiridos está bem distribuído entre os diferentes
níveis de ensino. (destacados em amarelo no quadro 2)

Podemos também perceber, através do quadro 2, que 6 dos inquiridos crentes


na autoria do ensino transversal das línguas, opinam em sentido contrário
quando avaliam a capacidade de colegas de outras disciplinas. (destacados em
verde no quadro 2). Este dado comprova a hipótese levantada de que nem
todos os inquiridos que opinam positivamente sobre a autoria do ensino de
línguas transdisciplinar acreditam que os outros professores sejam capazes de
ensinar línguas. Ressalvo que nenhum deles trabalha no primeiro ciclo,
dividindo-se entre os outros níveis.

O mais relevante, todavia, é o facto de que entre os crentes na autoria do


ensino de línguas repartido, há 38 inquiridos que acreditam na possibilidade de
contribuição, sob a condição de capacitação prévia, vindo de encontro ao
objetivo deste trabalho. Estes, por sua vez, também se distribuem bem entre os
diferentes níveis de ensino. (destacados em vermelho no quadro 2)

117
Acredito que este resultado positivo abre algumas portas quanto à
possibilidade de implantação de um sistema curricular linguístico que
transpasse todo o currículo.

2.2 Projetos interdisciplinares

A partir da análise dos dados apresentados no quadro 2, analiso agora o


gráfico 5 que expõe uma maioria de inquiridos que não costuma realizar
projetos interdisciplinares com objetivos linguísticos. Independentemente de
suas opiniões, isso pode se dar devido ao fato de que as ideias individuais não
contribuam para o funcionamento das equipas de trabalho, ou do planeamento
curricular. Outra hipótese relaciona-se com capacitação dos professores; pode
não haver formação suficientemente adequada para este tipo de trabalho nos
ambientes escolares, ou pode ainda existir certa resistência por parte de alguns
professores, de línguas ou não, em envolver-se no ensino da linguagem.
Levanto estas hipóteses à luz dos dados previamente analisados, já que 81%
dos inquiridos dizem acreditar que a autoria do ensino das línguas possa ser
partilhada entre todos os professores. (vide gráfico 4)
Em relação aos que realizam projetos interdisciplinares com objetivos
linguísticos temos, inquiridos que o fazem uma vez a cada período do ano
letivo ou três vezes ao ano; e outros que trabalham em projetos com
professores de outras disciplinas mais do que quatro vezes ao ano. Apesar de
a percentagem não ser muito significativa, temos indícios de algumas escolas
atendendo à necessidade de uma formação linguística mais holística e não só
literária.

3. O ensino da literacia realizado através de tipos de textos diversos

Antes de analisar como o ensino da literacia através dos diversos tipos de


textos ocorre em Portugal, analisaremos os dados do quadro 8 e do gráfico 16,
que expõem os tipos de textos usados mais comumente no ensino de língua
segundo os inquiridos desta amostra.

118
3.1 Tipos de textos (géneros) mais recorrentes no ensino de línguas
em Portugal

O termo ‘tipos de textos’ foi utilizado no questionário, e será utilizado nesta


análise por ser do senso comum, e mesmo assim, expressar bem a ideia que
aqui se pretende transmitir. Não usamos, repetidamente, o termo géneros
textuais pois este termo é usado com valores diversos nos documentos oficiais,
e junto da generalidade dos professores por falta de teorização adequada;
além do mais, ainda não foram definidos e estudados para língua portuguesa
um quadro dos géneros escolares, segundo as propostas da TR&G. O que não
significa que os tipos de textos utilizados no questionário, não possam ser
considerados géneros textuais escolares, pelo contrário, é a partir do que se
conhece e do que já é utilizado nas escolas que poderemos construir uma
tabela comum de géneros textuais escolares da língua portuguesa para os
diferentes níveis de ensino. Daí a ambição de que estes dados e de que a voz
dos professores desta amostra possam colaborar para a melhoria do ensino de
línguas em Portugal.

Além dos 93% de inquiridos que trabalham as narrativas10, há 84% deles que
também trabalham com histórias, um tipo de texto narrativo, a diferença está no
nível de ensino em que costuma ser empregado, histórias fazem parte de um
género textual, apropriado ao ensino nos primeiros anos de escolarização, no
processo de ensino dos textos narrativos.

Apesar disso, colocamos as duas alternativas de resposta por prever que nem
todos os professores têm consciência desta diferença. O que foi comprovado
pelo elevado número de professores que a selecionaram, muitos mais do que
os 27% de inquiridos que atendem ao público dos dois primeiros ciclos desta
amostra.

Observamos no quadro 8, dividido por níveis de ensino, que 86 inquiridos


trabalham com histórias no 3º ciclo e no ensino secundário, assim como os

10
Exemplo de termo que, seguramente é entendido como domínio retórico e que tem um valor
genológico na definição dos géneros inspirada pela Escola de Sydney.

119
mesmos 86 dizem trabalhar com a narrativa, demonstrando o frágil
conhecimento sobre os diversos géneros textuais. As narrativas, contudo,
foram selecionadas por 22 inquiridos que não trabalham com histórias nestes
níveis de ensino. Entre estes 22 inquiridos 2 dizem ensinar apenas narrativas,
16 também trabalham com relatos biográficos e com relatos pessoais, 8 com
relatórios, 6 com relatórios históricos, 4 com resenhas, 2 com procedimentos.

Concluo que entre os inquiridos que sabem que o género história não é
comumente ensinado nos últimos níveis de escolaridade, a maioria também
ensino os relatos pessoais e biográficos, que representam os tipos de textos
mais populares depois das histórias e narrativas.

É comum em todos os níveis escolares que os alunos escrevam sobre suas


experiências de vida (relatos pessoais), mas mais uma vez creio que este tipo
de texto deveria ser mais comum nos primeiros anos de escolarização, ou com
objetivos outros, que não sejam necessariamente linguísticos nos últimos dois
níveis de escolaridade. Quanto aos relatos biográficos, são importantes tipos
de textos para o ensino, para que compreendam a significância de cada
história contada sobre a vida de indivíduos significantes ao ensino das diversas
áreas do saber.

Os relatos históricos, relatórios, procedimentos e resenhas com menor


representatividade entre os professores de línguas, são mais comumente
encontrados em disciplinas como história, ciências, geografia, matemática. O
que importa apreciar enquanto especialistas em línguas e em educação é qual
o grau de conhecimentos, as capacidades, e o tempo que tais professores tem
ou já despendem no ensino explícito de tais géneros textuais.

A segunda parte do quadro 8 expõe os tipos de textos mais comuns usados por
inquiridos que trabalham no ensino básico (1º, 2º 3º ciclos). Em geral, 34
inquiridos ensinam histórias, 30 narrativas, 26 relatos biográficos, 24 relatos
pessoais, 16 relatos históricos, 12 procedimentos e 8 resenhas.

120
Mais uma vez, os procedimentos e as resenhas são menos ensinados, o que
para o ensino básico pode ser prejudicial, uma vez que alguns procedimentos
como receitas, como utilizar uma ferramenta digital, como jogar um jogo, fazem
parte do quotidiano das crianças atualmente. Assim como, fazer uma resenha
sobre um texto estudado, ensina aos alunos como escrever um resumo
criticamente, e se começarmos a ensinar estes géneros desde o princípio da
escolaridade com textos curtos, de linguagem apropriada ao chegarem no
ensino secundário estes alunos terão menos dificuldades.

Neste grupo, apenas 2 inquiridos, professores do 1º ciclo em contexto de PLM


não selecionaram o tipo de texto história e sim narrativa, o que pode significar
que ensinem outros tipos de textos narrativos, até porque alguns deles
mencionaram no campo outros ‘notícias’ e ‘panfletos’.

Outros 6 não selecionaram narrativas, mas todos estes selecionaram histórias,


os 2 que trabalham com o 1º ciclo, também selecionaram relatos pessoais,
sendo que um deles incluiu a leitura de imagens, muito comum nas histórias
infantis, mas que envolve estudos de multimodalidade e não serão discutidos
neste trabalho. Os outros 4, ensinantes do 2º e 3º ciclos, também trabalham
procedimentos, relatórios, relatos biográficos, relatos históricos e relatos
pessoais, um deles incluiu o ensino de texto poético.

Outra separação por ciclo de ensino engloba os inquiridos que trabalham


simultaneamente com alunos dos 2º, 3º ciclos e secundário. Em termos gerais,
o quadro não se diferencia muito dos demais grupos; a maioria, 14 inquiridos
ensina histórias, narrativas, relatos biográficos e relatos pessoais. Enquanto os
relatórios, resenhas, procedimentos, relatos históricos têm baixa representação
de ensino no quadro. O que neste caso é um pouco mais grave, pois estes
professores, além de trabalharem com o ensino básico, estão também no
ensino secundário, dos quais esperava uma maior diversidade de géneros,
dada a diversidade do público que atendem.

121
3.2 Principais finalidades para a seleção de textos de diversas fontes.

A seleção de textos é tratada na TR&G e no R2L como tarefa crucial para a


preparação de uma boa aula de ensino da literacia, independente dos objetivos
traçados. Os professores portugueses nas secções 2.2.4 e 2.2.4.1 revelaram
que realizam tal tarefa com diferentes finalidades. O número de docentes que
utiliza outras fontes, que não os manuais escolares, para a seleção de textos é
relevante, o que considero fundamental para a promoção da melhoria no
ensino de forma menos dramática, quero dizer que, ao ter o hábito de
selecionar textos, aperfeiçoar esta prática pode ser mais fácil, ao passo que
para aqueles que pouco pesquisam fontes fora dos manuais, este seria mais
um desafio.

Quanto às finalidades apresentadas (vide quadro 3) é inevitável notar ainda


traços marcantes da pedagogia tradicional, que porventura, promoveu a
diversificação de textos para aumentar e/ou facilitar os conhecimentos em
relação ao conteúdo, assim como conhecimentos gramaticais de ortografia,
sintaxe e vocabulário, etc. Lembrando que a maior parte dos inquiridos foram
profissionalizados há mais de 15 anos estes dados não são inesperados.

Entre os 14 professores com menos tempo de profissionalização (5 anos ou


menos) encontramos estas mesmas finalidades ainda muito presentes; em
contrapartida, há inquiridos neste grupo que não demonstram nenhum
resquício de tal prática, tendo focado as suas respostas na formação de
modelos autênticos e atuais dos tipos de texto trabalhados, na reflexão sobre a
estrutura do tipo de texto, desvendando os propósitos sociais destes e
permitindo a análise e desconstrução de bons modelos textuais. Estes, mesmo
que poucos, representam todos os níveis de ensino investigados.

Quanto aos 18 profissionalizados entre 5 a 10 anos atrás também observa-se


uma boa distribuição entre os níveis de ensino. Todos eles assinalaram a
primeira opção ‘Leitura para informação extra relativamente ao conteúdo
abordado’ e ainda há forte presença (14 inquiridos) que assinalam do uso de
textos em atividades de ortografia, sintaxe, vocabulário, 2 deles afirmam usar

122
textos de outras fontes com esta única finalidade. Considerando que ambos
inquiridos se profissionalizaram, no máximo, há 10 anos, esta é uma resposta
que chama atenção para a possibilidade da formação de professores, quanto
às novas propostas educacionais não atingir a todos, via de regra, dado
estatístico comum em qualquer pesquisa.

Por outro lado, os outros inquiridos deste grupo, além de promoverem a leitura
para obtenção de mais informações sobre o conteúdo, também fazem uso dos
textos para outros fins. O mais popular é a ‘leitura para formação de modelos
autênticos e atuais dos tipos de texto trabalhados.’ (14 inquiridos) seguido pela
leitura ‘para reflexão sobre a estrutura do tipo de texto a ser trabalhado.’ (12
inquiridos); ‘desvendar os propósitos sociais do tipo de texto a ser trabalhado.’
(10 inquiridos) e por último ‘para análise e desconstrução de bons modelos do
tipo de texto em questão’. (8 inquiridos). Dois deles assinalaram todas as
opções e nenhum apresenta grande discrepância em relação às escolhas que
fizeram.

Analisando os (22) inquiridos profissionalizados entre 10 anos e 15 anos,


observa-se um quadro parecido, a maioria (16) também assinalou a primeira e
a quarta opção respectivamente: ‘Leitura para informação extra relativamente
ao conteúdo abordado’ e ‘para usar em atividades de ortografia, sintaxe,
vocabulário, etc..’ Entretanto, neste grupo nenhum inquirido limita o uso dos
textos retirados de fontes diversas a estas finalidades.

Dois deles, inclusivamente, também selecionaram todas as alternativas,


revelando que há possibilidade de haver entre os professores de línguas,
conhecimento linguístico suficiente para a realização de todas as etapas da
aprendizagem da leitura e escrita segundo as teorias apresentadas. Estes
inquiridos em particular lecionam PLM, LE e PLNM no terceiro ciclo. Dos acima
mencionados, um também lecciona PLM, LE e PLNM no terceiro ciclo,
enquanto o outro leciona PLM ao segundo ciclo.

Outros 14 inquiridos deste grupo selecionaram a finalidade ‘para reflexão sobre


a estrutura do tipo de texto a ser trabalhado.’; 12 inquiridos selecionaram

123
‘leitura para formação de modelos autênticos e atuais dos tipos de texto
trabalhados.’; 10 inquiridos assinalaram ‘desvendar os propósitos sociais do
tipo de texto a ser trabalhado.’; e 10 ‘para análise e desconstrução de bons
modelos do tipo de texto em questão’.

Intriga-me, neste grupo, a descontinuidade das finalidades assinaladas por


cada inquirido; por exemplo, espera-se que para desvendar os propósitos
sociais de um tipo de texto, seja feita a análise e desconstrução de bons
modelos do tipo de texto em questão, porém, apenas 6 inquiridos assinalaram
ambas as opções. Assim como a leitura de modelos autênticos e atuais dos
tipos de textos a serem trabalhados deveria levar à reflexão sobre a estrutura
do texto e a descoberta dos propósitos sociais dos mesmos, estas três opções,
contudo, só foram assinaladas ao mesmo tempo por 4 inquiridos. Há um
número mais significativo, de 10 inquiridos, que assinalou a leitura de modelos
autênticos e a atuais, seguidos da reflexão sobre a estrutura do tipo de texto, o
que não significa que os mesmos dêem continuidade ao trabalho de analisá-los
e desconstrui-los, desvendando os propósitos sociais e fazendo uso das
atividades de ortografia, sintaxe, vocabulário, para a construção de textos do
mesmo tipo posteriormente.

Até o momento, nenhum inquirido havia sugerido outra finalidade para o uso de
textos retirados de outras fontes, que não dos manuais escolares. O que
aparece entre a maioria dos inquiridos profissionalizados a mais de 15 anos. Já
citadas na secção 2.2.4.1 são elas: “Para reescrever criativamente, resumir,
sintetizar, esquematizar, parafrasear e outras transformações de texto (de narrativo
para dramático) ”; “Para alargar horizontes culturais.” e “Fomentar o gosto pela leitura
e escrita.”

As duas últimas sugestões citam questões importantes, mas que foram


brevemente abrangidas neste trabalho, tratam de questões culturais e do gosto
pela leitura, ambas as quais considero significativas e necessárias no contexto
escolar.

124
A primeira, todavia, comenta o uso de técnicas muito ligadas à linha
pedagógica aqui apresentada como a reescrita, o parafrasear e o uso, mesmo
que inconsciente, de géneros textuais “P de narrativo para dramático.” Face a
esta afirmação, vinda de um(a) professor(a) com mais de 15 anos de trabalho,
com alunos do ciclo 3 e do ensino secundário, lecionando em contextos de
PLM e PLNM, sinto-me impelida a considerar que os programas de formação
continuada em Portugal podem, na verdade, estar contribuindo para mudanças
na educação e que uma parcela dos professores representados por esta
pequena amostra pode estar plantando sementes em várias escolas pelo país.

No geral, este grupo (101 inquiridos) também privilegia a ‘leitura para


informação extra relativamente ao conteúdo abordado’, assinalado por 82
inquiridos e o ‘uso em atividades de ortografia, sintaxe, vocabulário, etc.’
assinalado por 72 inquiridos, e na maioria das vezes, são assinaladas pelo
mesmo inquirido.

O que muda positivamente em relação ao grupo anterior é a organização do


pensamento, parece-me aqui que os professores seguem uma linha de
raciocínio mais coerente no planeamento das aulas de leitura e escrita e dos
seus objetivos. Isso revela-se através das combinações de opções assinaladas
mais comuns entre eles.

Entre os 101 inquiridos, 18 assinalaram todas as opções; apenas 2 inquiridos


assinalaram uma única opção que foi ‘Leitura para informação extra
relativamente ao conteúdo abordado.’

Os outros 81 assinalaram mais de uma opção. Sendo que, 10 assinalaram 2


opções variando entre as seguintes combinações expostas nos esquemas
abaixo:

125
Desvendar os propósitos
sociais do tipo de texto a ser
trabalhado.

Leitura para informação extra


relativamente ao conteúdo Reflexão sobre a estrutura do
abordado. tipo de texto a ser trabalhado.

Atividades de ortografia,
sintaxe, vocabulário, etc.

Leitura para formação de Atividades de ortografia,


modelos autênticos e atuais sintaxe, vocabulário, etc.
dos tipos de texto trabalhado.

As seleções destes 10 inquiridos revelam traços das teorias psicológicas da


aprendizagem mencionadas na introdução deste trabalho. As mudanças na
visão do ensino da língua partiram da ideia de leitura para obtenção de
informação extra, para reflexão sobre os tipos e propósitos sociais dos textos,
assim como já se falava em usar textos autênticos ou ao invés dos que eram
adaptados aos manuais; e isso ocorreu, principalmente, nos níveis escolares
mais altos. Contudo, os inquiridos acima referidos ainda revelam traços da
pedagogia tradicional no ensino da gramática, por ainda não haver recursos
mais bem fundamentados para o ensino da mesma. Uma das falhas do ensino
baseado no construtivismo ou sócio construtivismo, em relação ao ensino das
línguas, estará na falta de diretrizes para o ensino da gramática, fazendo com
que os professores continuem a usar estratégias e conceitos que já conheciam.

Outros 28 inquiridos selecionaram 3 opções, cujas combinações estão


expostas nos esquemas abaixo, cada um dos esquemas representa quatorze
inquiridos, dados que também podem ser conferidos no quadro 3 (apêndice IV).

126
Desvendar os propósitos
sociais do tipo de texto a ser
trabalhado.

Leitura para formação de


modelos autênticos e atuais
dos tipos de texto trabalhado.
Leitura para
informação extra Atividades de ortografia,
relativamente ao sintaxe, vocabulário, etc.
conteúdo
abordado.
Reflexão sobre a estrutura do
tipo de texto a ser trabalhado.

Análise e desconstrução de
bons modelos do tipo de texto
em questão.

As respostas reforçam o sentido do comentário acima sobre processo de


mudança da pedagogia tradicional para uma pedagogia mais funcional e social,
baseada a princípio nas teorias sócio psicológicas.

Análise e desconstrução de
bons modelos do tipo de texto
em questão.
Leitura para
formação de
Atividades de ortografia,
modelos
sintaxe, vocabulário, etc.
autênticos e
atuais dos tipos
de texto Reflexão sobre a estrutura do
trabalhados. tipo de texto a ser trabalhado.

Desvendar os propósitos
sociais do tipo de texto a ser
trabalhado.

127
A outra metade se distingue por não ter selecionado a primeira opção, tendo
em comum outra finalidade, combinada, mais uma vez com diferentes
alternativas expostas no esquema acima.

Estes inquiridos já revelam maiores mudanças em relação às estratégias


tradicionais, e psicológicas do ensino das línguas, considerando a leitura de
textos autênticos como uma ferramenta de formação dos tipos de textos
combinados à reflexão sobre as estruturas textuais, e também levando estas
ideias mais adiante analisando e desconstruindo os modelos, assim como
descobrindo os propósitos sociais dos mesmos; e consequentemente,
ensinando os pormenores das línguas significativamente.

Outros 10 inquiridos, por sua vez, assinalaram quatro opções. A maioria, mais
uma vez, tem em comum a primeira opção, observe o esquema de
combinações de finalidade

Desvendar os propósitos
sociais do tipo de texto a ser
trabalhado.

Leitura para formação de


modelos autênticos e atuais
Leitura para dos tipos de texto trabalhado.
informação extra
relativamente ao Atividades de ortografia,
conteúdo sintaxe, vocabulário, etc.
abordado.
Reflexão sobre a estrutura do
tipo de texto a ser trabalhado.

Análise e desconstrução de
bons modelos do tipo de texto
em questão.

Assim como dentre os inquiridos que assinalaram 3 opções há um grupo de 4


inquiridos aqui que também tem em comum a finalidade ‘Leitura para formação
de modelos autênticos e atuais dos tipos de texto trabalhados’ combinados da
seguinte forma:

128
Análise e desconstrução de
bons modelos do tipo de texto
em questão.
Leitura para
formação de
Atividades de ortografia,
modelos
sintaxe, vocabulário, etc.
autênticos e
atuais dos tipos
de texto Reflexão sobre a estrutura do
trabalhados. tipo de texto a ser trabalhado.

Desvendar os propósitos
sociais do tipo de texto a ser
trabalhado.

Ainda dentro do grupo de profissionalizados há mais de 15 anos, 16 inquiridos


assinalaram 5 opções deixando apenas uma de lado. Ao analisá-las percebo
diversidade nas exclusões, sendo que:
• 4 Inquiridos excluíram a finalidade “Desvendar os propósitos sociais do
tipo de texto a ser trabalhado”.
• 2 Inquiridos excluíram a finalidade “Atividades de ortografia, sintaxe,
vocabulário, etc.”
• 1 Inquirido excluiu a finalidade “Análise e desconstrução de bons
modelos do tipo de texto em questão”.
• 1 Inquirido excluiu a finalidade “Leitura para a formação de modelos
autênticos e atuais dos tipos de texto trabalhados”.

Outras teorizações sobre o ensino de texto também trabalham com a


desconstrução e análise de textos, o que pode também favorecer a
implantação de nova informação sobre a praxis de base genológica na
educação portuguesa.

129
3.3 Sobre a escrita de textos individuais e as etapas da pré-escrita

Na secção 2.2.5, deparamo-nos com um quadro muito diverso tendo em conta


o número de textos individuais escritos pelos alunos portugueses. Tentarei
agora, com o apoio dos dados organizados por tempo de profissionalização, no
quadro 4, descobrir quem são esses alunos e inferir sobre os porquês de tal
disparidade, com base nos número e nas formas com que esses textos são
trabalhados com os alunos previamente.

Entre os inquiridos profissionalizados há menos de cinco anos (9% da amostra)


houve uma resposta anulada. Os alunos dos outros 13 inquiridos deste grupo
escrevem de 3 a 8 textos individuais por ano letivo. Dado que parece muito
baixo, ao analisar os ciclos de estudos que atendem descobri que os inquiridos
que trabalham com o 1º ciclo e são professores de PLM dizem que os seus
alunos escrevem 6 textos individuais por ano, tendo o ano letivo 3 períodos,
podemos concluir que estes escrevem cerca de 2 textos por período.

Os outros inquiridos deste grupo trabalham em sua maioria com alunos do 3º


ciclo e do ensino secundário, porém, lecionam LE e/ou PLE, o que justifica o
baixo número de textos individuais que variam de 3 a 8. A justificativa mais
racional para o fato é que estes alunos frequentem essas aulas poucas vezes
por semana, o que é comum neste contexto de ensino.

Passando para o grupo de profissionalizados entre cinco e dez anos, temos


apenas 2 inquiridos que trabalham com o primeiro ciclo, sendo que um trabalha
com PLM e PLNM e o outro só com PLM, responderam que seus alunos
escrevem 10 e 9 textos por ano letivo, respectivamente. Considerando que
estes contextos de ensino, via de regra, acontecem em uma escola regular,
para o primeiro ciclo de estudos, três textos individuais por período é uma boa
estatística.

Outros quatro inquiridos trabalham com alunos do segundo ciclo, 2 em contexto


de PLM e outros 2 em contextos diversos, PLM, PLNM, LE; porém, todos
responderam que seus alunos escrevem 10 textos por ano. Em comparação

130
com o primeiro ciclo, pode parecer que não há aqui nenhum avanço, mas ainda
assim, à luz das teorias estudadas considero um bom número para a faixa
etária, porque o ensino de textos na educação básica demanda tempo, e o
segundo ciclo, não deixa de ter a função de consolidar, as primeiras
aprendizagens formais de literacia e dos géneros trabalhados. De acordo com
o CNEB, as competências específicas por ciclo baseiam-se para os dois
primeiros ciclos no desenvolvimento da consciência linguística, alargamento da
compreensão dos diversos géneros, consolidação das técnicas instrumentais
necessárias para a escrita, enfim, o domínio progressivo das competências
necessárias à aprendizagem da literacia. (cf. Ministério da Educação, 2001: 33-
35)

O restante e maioria dos inquiridos atendem alunos do 3º ciclo e secundário, a


maioria destes alunos escrevem cerca de 10 textos individuais por ano letivo,
aqui, considero que o número pode ser baixo, dado o avançado nível de
conhecimentos, capacidades e compreensão de formas complexas da língua,
tanto oral quanto escrita, esperadas que os alunos atinjam ao final do 3º ciclo e
a caminho do ensino secundário. (cf. Ministério da Educação, 2001: 33-35)

Se a maior parte dos alunos no final do terceiro ciclo atingem as metas


traçadas pelo CNEB, acredito que sejam capazes de produzir mais textos por
ano letivo e, provavelmente, conhecerem vários géneros textuais. Pelo menos
aqueles que representam alunos de PLM e PLNM em contexto escolar regular,
uma vez que entre estes inquiridos, oito são professores de PLM, mas não só,
seis deles também lecionam PLE ou PLNM ou LE, 2 lecionam apenas LE e
outros 2 apenas LE e PLE.

No grupo de inquiridos profissionalizados entre dez e quinze anos temos,


novamente, apenas quatro representantes do 1º ciclo, sendo que 2 deles
trabalham em outros ciclos de estudos também. Os que trabalham
exclusivamente no 1º ciclo e são professores de PLM dizem que os seus
alunos escrevem trinta e seis textos individuais em um ano letivo, comparado
aos dados descritos acima, creio que seja um número excessivo. Ao entrar em
contato com um género textual, pela primeira ou segunda vez na vida escolar,

131
é necessário que ocorram muitas etapas prévias à escrita de um texto
individual. O mais interessante notar é que estes mesmos inquiridos dizem
analisar e desconstruir um modelo do texto pedido, assim como, escrever
textos coletivos com foco na estrutura textual, além de fornecer e solicitar
informações sobre o tema. Para que tenham tempo de escrever 36 textos,
imagino que a escrita se limite a poucos géneros, o que configura as práticas
reveladas pelos poucos estudos disponíveis sobre o assunto.

Os outros 2 inquiridos que lecionam no 1º ciclo, também lecionam no 2º e 3º


ciclos, estes responderam que seus alunos escrevem 5 ou 6 textos individuais
por ano letivo, fazendo mais sentido ao considerar, os 1º e 2º ciclos, mas como
já mencionei, considero um número baixo para alunos do 3º ciclo. Outros 2
inquiridos que trabalham apenas no 2º ciclo também responderam 6 textos, em
concordância com as ideias acima. Outros 2 responderam que seus alunos
escrevem 10 textos individuais, mas como também são professores do 3º ciclo
e foi perguntado um número médio, não representam disparidades.

Quanto aos alunos do 3º ciclo e secundário, segundo os inquiridos, podem


escrever de quatro a dezoito textos individuais em um ano letivo. Os inquiridos
cujos alunos escrevem apenas quatro textos são professores de LE e parece-
me um número razoável devido à modalidade de ensino. Porém, 2 inquiridos
professores de PLM e PLNM afirmam que seus alunos do ensino secundário
escrevem apenas cinco textos por ano letivo, o que me parece muito pouco,
dado o número de géneros textuais que devem ser aprendidos durantes estes
anos de escolaridade. Para o ensino secundário sugere-se o conhecimento de
cerca de 20 tipos de textos, entre orais e escritos, em cada ano letivo deste
nível. (cf. Ministério da Educação, 2002:33-47).

Os inquiridos restantes trabalham com 10, 12 ou 18 textos individuais por ano,


em contextos de PLM, PLNM, PLE e inclusive LE. Mais uma vez, reafirmamos
que a pergunta pedia um número médio, sendo que estes dados podem variar
dependendo do contexto de ensino.

132
Os inquiridos profissionalizados há mais de quinze anos são maioritariamente
professores do 3º ciclo e do ensino secundário, como nos demais grupos, há
poucos representantes do 1º ciclo (4) e do 2º ciclo (26), sendo que quase todos
os professores do segundo ciclo também lecionam nos demais ciclos de
ensino, são professores de PLM, alguns deles também lecionam PLNM, LE ou
PLE, cujas respostas que variam de 8 a 36 textos individuais por anos letivo,
mais uma vez, apresenta-se uma grande discrepância de dados nos primeiros
ciclos e no ensino de PLM.

Entre os demais inquiridos que lecionam no 3º ciclo ou secundário, temos 32


professores de LE, sendo que os alunos destes escrevem no máximo seis
textos por ano letivo, um número aceitável para este contexto de ensino, como
já discutido anteriormente. Alguns destes 32 professores, também lecionam
PLM, neste cenário os números variam entre 6, 10 e 20 textos individuais por
ano; outros lecionam também PLNM, cujos alunos escrevem 4, 8, 6 ou 12
textos individuais, estas variações são um pouco mais distintas e devem
depender muito dos contextos escolares.

A grande maioria dos professores deste grupo, 84 inquiridos, são professores


de PLM e a maioria deles também leciona LE, PLNM, PLE, e entre os que
lecionam apenas PLM a diversidade de respostas também é grande, por isso,
não os separei dos demais. Segundo a lista abaixo, os alunos do 3º ciclo e
secundário escrevem de 3 textos individuais por ano letivo a um texto por aula.

Esses dados são discrepantes e revelam a falta de diretrizes mais específicas


que visem a unidade do ensino para que toda a população estudantil tenha
oportunidades mais igualitárias.
• 2 inquiridos cujos alunos escrevem 1 texto por aula;
• 1 inquiridos cujos alunos escrevem 36 textos;
• 12 inquiridos cujos alunos escrevem 20 textos;
• 3 inquiridos cujos alunos escrevem 15 textos;
• 10 inquiridos cujos alunos escrevem 12 textos;
• 20 inquiridos cujos alunos escrevem 10 textos;

133
• 4 inquiridos cujos alunos escrevem 9 textos;
• 10 inquiridos cujos alunos escrevem 6 textos;
• 8 inquiridos cujos alunos escrevem 5 textos;
• 8 inquiridos cujos alunos escrevem 3 textos.

A maioria deles, 57 inquiridos, diz que seus alunos escrevem entre 9, 10, 12,
15 e 20 textos que acaba por ser uma média mais razoável para a maioria dos
alunos de PLM neste grupo. Por outro lado, alunos de 26 inquiridos escrevem
apenas de 3 a 6 textos individuais por ano letivo, o que é muito pouco
considerada a faixa etária dos alunos e os objetivos educacionais portugueses
e europeus.

Há ainda, que considerar o oposto os pouco alunos do 3º ciclo e secundário


que escrevem 1 texto individual por aula, o que já me parece muito. E outros,
alunos de apenas 1 inquirido desta amostra, que escrevem 36 textos
individuais por ano letivo, considerando os três períodos e a média de semanas
por período, podemos concluir que estes alunos escrevem 1 texto individual por
semana, o que julgo ser ideal, para estes níveis de ensino, tendo por base as
etapas de pré-escrita e a escrita coletiva, depois da análise e desconstrução de
bons modelos do género. Um grupo de alunos destes níveis escolares, já
familiarizados com a pedagogia linguística e o ensino das línguas por géneros
textuais poderiam perfeitamente escrever com sucesso um texto a cada
semana, não necessariamente de géneros diferentes. Como foi mencionado no
primeiro capítulo a aprendizagem de um género textual e todas as suas facetas
demora o quanto for necessário nas distintas realidades.

3.3.1 Etapas da pré-escrita dos textos individuais em relação à escrita


de textos coletivos e aos tipos de texto trabalhados.

Os inquiridos profissionalizados a 5 ou menos dizem que ao preparar os alunos


para as atividades de escrita costumam usar as seguintes estratégias:
• Determino o tema e/ou título do texto + o tipo de texto (e.g. história,
relatórioB);

134
• Determino o tipo de texto a ser escrito (ex. história, relatório...) mas,
deixo o tema à escolha dos alunos;
• Forneço informações sobre o tema sugerido;
• Peço aos alunos que pesquisem sobre o tema;
• Escrevemos textos colectivos para ensinar como (estrutura textual)
devem ser escritos os diversos tipos de texto;
• Escrevemos textos colectivos para ensinar quais os propósitos sociais
de um certo tipo de texto.

Dois deles usam apenas a primeira estratégia, revelando entre os professores


recém-formados práticas pouco elaboradas do ponto de vista teórico atual. Os
outros 2, porém fazem uso de todas as estratégias acima mencionadas, o que
comprova que parte desses professores fazem uso de algumas das estratégias
necessárias para o ensino da literacia do ponto de vista aqui defendido, apesar
de pularem a etapa de análise e desconstrução de bons modelos dos textos,
fundamental para a formação do conhecimento explícito. Como sugere o CNEB
relativamente ao conhecimento explícito na parte direcionada ao ensino da LP:

“Desenvolver a consciência linguística, tendo em vista objectivos instrumentais e


atitudinais, e desenvolver um conhecimento reflexivo, objectivo e sistematizado
da estrutura e do uso do Português padrão.”

Entre os profissionalizados entre 5 e 10 anos (18 inquiridos) quanto às


estratégias na fase de pré-escrita, todas as nove alternativas foram
selecionadas por 2 inquiridos que trabalham no 3º ciclo e foram
profissionalizados a mais de 5 anos e menos de 10, portanto, espera-se que a
formação destes os habilitem para considerar, todas as alternativas, das mais
antigas às mais recentes, que apresentam-se na lista abaixo.
A. Determino o tema e/ou título do texto + o tipo de texto (e.g. história,
relatórioB);
B. Determino o tema e/ou título do texto, mas não especifico o tipo de
texto;
C. Determino o tipo de texto a ser escrito (ex. história, relatório...) mas,
deixo o tema à escolha dos alunos;
D. Analiso e desconstruo um modelo do tipo de texto a ser pedido;

135
E. Forneço informações sobre o tema sugerido;
F. Peço aos alunos que pesquisem sobre o tema;
G. Peço aos alunos que pesquisem outros modelos do tipo de texto
sugerido;
H. Escrevemos textos colectivos para ensinar como (estrutura textual)
devem ser escritos os diversos tipos de texto;
I. Escrevemos textos colectivos para ensinar quais os propósitos sociais
de um certo tipo de texto.

Em geral, 16 inquiridos selecionaram a estratégia B; 14 inquiridos a estratégia


G; 10 deles as estratégias A, D, E e H; e apenas 6 inquiridos assinalaram as
estratégias C e I.

A maioria de 16 inquiridos que utiliza a estratégia B, muito comum em qualquer


nível de escolaridade e condizente com a pedagogia linguística dependendo da
fase de trabalho. De qualquer forma, vale ressaltar que 2 dos inquiridos
selecionaram apenas esta alternativa trabalham com o primeiro ciclo, em
contextos de PLM e PLNM, e foram profissionalizados entre cinco e dez anos
atrás.

Nesta época, a formação de professores de línguas já considerava muitas


outras técnicas para atividades de pré-escrita, provenientes das diversas
teorias em voga desde os anos 60, por isso, considero estas respostas muito
limitadas, ainda mais por tratarem-se de alunos do primeiro ciclo, que
costumam ser mais dependentes e precisar de maior acompanhamento e
informações para a realização de tarefas.

Os dez inquiridos deste grupo, os quais utilizam a estratégia mais controlada,


definindo tanto o tema quanto o tipo de texto a ser produzido, trabalham com
alunos dos 2º e 3º ciclos e secundário, em contextos diversos, PLM, PLNM, LE
e PLE. No segundo ciclo esta é uma estratégia que me parece bastante
coerente, mas deve ser gradualmente diminuída durante os níveis seguintes,
quanto à determinação do tema, para que os alunos criem mais autonomia e
exercitem mais o exercício da investigação.

136
Os outros assinalaram também estratégias como pedir aos alunos que
pesquisem, assim como fornecer informações sobre o tema; alguns escrevem
textos coletivos com o objetivo de ensinar a estrutura textual e de desvendar os
propósitos sociais do tipo de texto a ser trabalhado. Um dos professores deste
grupo que trabalha em contexto de PLM no ensino secundário também sugeriu
outras alternativas, nomeadamente:

‘Faço uma síntese das aprendizagens construídas sobre o género de texto e


explico como essa síntese não só orienta a escrita como também a auto ou
heterorrevisão e a avaliação do texto. Tenho muitas vezes em conta a evolução,
quando há versão inicial no início de uma sequência de ensino.’(inquirido de
número 55, vide quadro 4)

Este é o único comentário deste grupo de inquiridos que revela conhecimentos


sobre a genologia e o uso de estratégias mais elaboradas no ensino das
línguas.

Quanto à estratégia B ‘Determino o tema e/ou título do texto, mas não


especifico o tipo de texto’ há um número relevante de 6 inquiridos deste grupo
que o utilizam, somados a 2 do primeiro grupo analisado (profissionalizados a 5
anos ou menos), formam um grupo de oito inquiridos que por vezes solicitam a
escrita de textos sem especificar o género. Todos eles trabalham com o ensino
secundário e/ou o 3º ciclo, não justificando tal atitude, sendo que os alunos
destes níveis de ensino já possuem conhecimentos sobre muitos géneros
textuais.

Esta prática, mais esperada entre os inquiridos profissionalizados a mais tempo


foi selecionada por seis professores entre os 22 profissionalizados entre 10 e
15 anos atrás estes e apenas 24 vezes entre os 106 profissionalizados há mais
de 15 anos, ao colocá-los em uma escala obtemos o gráfico a seguir, que
contraria minha primeira hipótese, mostrando que a maioria dos inquiridos que
usam desta estratégia foram profissionalizados entre 5 e 15 anos atrás.

137
Determino o tema e/ou título do
texto, mas não especifico o tipo de
texto
Série3 Série2 Série1

menos de 5 anos 14%

entre 5 e 10 anos 33%

entre 10 e 15 anos 27%

mais de 15 anos 23%

Gráfico 17: Percentagem de inquiridos que determinam o tema mas não o tipo
de texto a ser escrito por ordenação de tempo de serviço.

Outro dado que interessa apreciar relaciona-se com a construção de textos


coletivos, cujos graus de intervenção serão analisados na próxima secção.
Entre os inquiridos deste grupo (profissionalizados entre 5 e 10 anos atrás)
somados aos poucos inquiridos profissionalizados a 5 anos ou menos, temos
14 inquiridos que trabalham textos coletivos para ensinar sobre as estruturas
textuais e 10 que trabalham textos coletivos para desvendar os propósitos
sociais dos textos, ambas as práticas são importantes em todos os níveis.
Apesar disso, a habilidade de desvendar propósitos sociais de um texto, deve
ser mais praticada a partir do segundo ciclo, pois depende muito da capacidade
de aprendizagem abstrata, da maturidade cerebral tão bem definida por Piaget
quando descreve o nível de desenvolvimento cognitivo a que nomeou
operatório formal, quando a criança passa a ter habilidade de engajar-se no
raciocínio proposicional. As deduções lógicas realizam-se através do
pensamento formal abstrato. Sendo assim, constato que 8 destes inquiridos
trabalham com esta faixa etária, e os outros 2 apenas com alunos do primeiro
ciclo. Não é impossível tratar de propósitos sociais com estes alunos, mas há
que se planear muito bem as intervenções e formas de apresentação do texto
para que a aprendizagem realmente ocorra.

Entre os profissionalizados a mais de 15 anos temos apenas 24 inquiridos que


trabalham os propósitos sociais dos textos, entre os quais nenhum trabalha no

138
primeiro ciclo. Este dado pode ser considerado esperado, do ponto de vista do
tempo de profissionalização, mas por outro lado, evidencia a necessidade de
melhorias na formação continuada da língua.

Quanto às alternativas que envolvem a investigação, temos nos dois primeiros


grupos (profissionalizados entre 5 e 10 anos) 22 inquiridos que costumam pedir
aos alunos que pesquisem sobre os temas estudados, 18 que fornecem
informações sobre os temas e 8 que pedem aos alunos que pesquisem outros
modelos do tipo de textos trabalhado.

No grupo dos profissionalizados entre 10 e 15 anos atrás há 14 inquiridos que


costumam pedir aos alunos que pesquisem sobre os temas estudados e que
fornecem informações sobre os temas; e também 8 inquiridos que pedem aos
alunos que pesquisem outros modelos do tipo de textos trabalhado. Não
apresentando grandes diferenças de resultados por tempo de
profissionalização.

Entre os inquiridos profissionalizados há mais de 15 anos, há 74 inquiridos que


costumam pedir aos alunos que pesquisem sobre os temas estudados para 68
que fornecem informações sobre os temas; em contrapartida, apenas 18
inquiridos que pedem aos alunos que pesquisem outros modelos do tipo de
textos trabalhado. Há, claramente, uma maior diversidade na diferença de
resultados entre os que promovem a pesquisa de outros modelos do tipo de
texto estudado. Talvez o facto de as teorias de base genológicas serem muito
recentes explique tal diversidade.

3.2 Textos coletivos: graus de intervenção usados nesta modalidade


de escrita.

Como pudemos observar no gráfico 10, 84% dos inquiridos trabalham com
textos coletivos, sendo que entre os alunos dos inquiridos profissionalizados há
menos de 5 anos e entre 5 e 10 anos são escritos de 1 a 6 textos coletivos num
ano letivo. Já nos dois grupos seguintes, profissionalizados entre 10 e 15 anos
e há mais de 15, a variação vai de 1 a 10 textos coletivos, sendo que estes

139
últimos representam, em sua maioria, professores do 3º ciclo e secundário.
Considero os números praticados por estes mais significativos e que os mais
recentemente formados não deveriam aumentar o número de textos coletivos
que escrevem com seus alunos, pelo menos que seja escrito um texto coletivo
para cada género ensinado.

Se nos voltarmos ao quadro 8, a maioria dos inquiridos, independente do


tempo de profissionalização, afirma mais recentemente trabalhar no mínimo 3
tipos de textos diferentes.

Sabemos também que a intervenção mais popular entre os inquiridos é a de


guiar toda a turma na escrita de um só texto, seguidos pela construção do texto
em grupos e consequente monitorização, em menor escala os alunos estão
mais livres para construir tais textos, estando o professor apenas disponível
para tirar dúvidas (vide gráfico 11).

Vale a pena apreciar que 22 inquiridos utilizam as três estratégias de


intervenção sugeridas, entre eles há professores de PLM, LE e PLNM, todos
trabalham com alunos do 3º ciclo e/ou ensino secundário. Nestes níveis de
ensino é possível utilizar as várias estratégias desde que os alunos estejam
familiarizados com o tipo de construção textual e suficientemente envolvidos na
tarefa, para evitar que apenas alguns trabalhem.

Segundo a pedagogia de base linguística proposta pela Escola australiana, a


escrita do texto coletivo é uma etapa de desconstrução do modelo de texto a
ser estudado, por isso, sugerem que toda a turma seja guiada na construção
de um só texto.

Entre os 136 inquiridos que promovem a escrita coletiva, existem 50 nesta


amostra que não utilizam esta estratégia, dividindo-se entre os que utilizam a
construção coletiva em grupos mais ou menos controladas e outros que dizem
fazer uso das duas estratégias de intervenção. Estes representam professores
em todos os níveis de ensino do 1º ciclo ao ensino secundário.

140
Considerando as diversidades culturais, o número de alunos em sala de aula,
entre outros fatores regionais, concluo que o resultado geral é positivo. A
escrita de textos coletivos em grupos pode servir a muitos objetivos
educacionais, como a promoção do trabalho em grupo, a convivência entre
pessoas diferentes, entre outros. Porém, para concretizar objetivos linguísticos,
acredito que a monitorização constante deste trabalho seja imprescindível e
que a melhor estratégia de intervenção na desconstrução e análise de géneros
textos é a construção de um só texto, dando oportunidade a todos os alunos
que participem e tendo a possibilidade de sanar todas as dúvidas a partir das
contribuições individuais, como já mencionamos anteriormente. Ninguém
melhor que o professor para saber administrar o seu grupo de alunos em uma
atividade coletiva, pois este conhece as dificuldades e sucessos de cada um
poderá fazer uso deste conhecimento durante a aplicação da estratégia.

Ao não guiar toda a turma corremos o risco de a aprendizagem só ocorrer para


os alunos mais bem-sucedidos, os medianos e fracos podem ficar à margem;
uns podem tentar aprender, os últimos, por muito que estejam motivados
acabam por soçobrar perante o grau de complexidade que as tarefas
relacionadas com o texto lhe oferecem. Outra hipótese que levanto é de que os
alunos que já saibam mais deixem o trabalho na mão dos outros não se
interessando pela atividade e afinal, não promovendo nem a aprendizagem
linguística, nem os objetivos sociais e internacionais da estratégia.

3.3 Textos orais mais produzidos e suas dificuldades

De acordo com a apresentação dos dados na secção 2.2.7, os tipos de textos


orais mais frequentemente produzidos são a apresentação de pesquisas, os
diálogos do quotidiano, os debates e as dramatizações.

Primeiramente, interesso-me por descobrir quem são os inquiridos cujos alunos


não dialogam, ou mais provavelmente, não consideram os diálogos um tipo de
texto avaliável em sala de aula. Como previsto a maioria deles são professores
de PLM (26 inquiridos), porém um número significativo de 12 inquiridos que
trabalham no contexto de PLNM também não consideram os diálogos do

141
quotidiano um tipo de texto oral importante, assim como me espanta saber que
2 professores de PLE, e outros 2 de LE, também têm a mesma opinião. Os
diálogos corriqueiros como, por exemplo, a apresentação de um indivíduo a um
grupo, diálogos sobre o tempo, as horas, profissões, etc. costumam ser os
primeiros textos orais presentes em qualquer manual de ensino de línguas
estrangeiras, seja qual for a língua.

Há por outro lado, quatro inquiridos, 2 professores de PLM do 1º ciclo,


profissionalizados há 5 anos ou menos afirmam que seus alunos só praticam
diálogos em diversas situações da vida cotidiana, tais alunos apresentam
dificuldades ‘na construção de um discurso coerente’ e ‘dificuldades comuns à
idade’, o que provavelmente se deve à falta de intervenção do professor; assim
como à falta de promoção do ensino de textos orais. Os outros inquiridos, cujos
alunos apenas praticam diálogos cotidianos são professores de PLM e PLNM,
trabalham com o 2º e 3º ciclos e estão profissionalizados a mais de 15 anos, as
justificativas destes porém, recaem sobre os textos escritos, afinal não
consideram diálogos textos orais passíveis de correção e avaliação, nem
trabalham outros tipos de textos orais.

Os inquiridos que não trabalham com a apresentação de pesquisa, por sua


vez, estão bem distribuídos na amostra, trabalham em contextos de LE, PLE,
PLM, PLNM, em níveis de ensino e tempo de profissionalização variados.

Os debates que possuem grande representação na mostra, como tipos de


textos ensinados na escola, são comuns aos meios de comunicação, e muito
importantes na formação da cidadania das crianças; afinal, para realmente
compreender um debate político, por exemplo, em todas as suas entrelinhas, é
preciso conhecer bem o género, ou seja, ser capaz de distinguir as
possibilidades genológicas á disposição do falante no interior dos “argumentos”
(e.g. exposição, discussão) e até da “reação a textos” (eg. Opinião, resenha e
interpretação). Por isso, é relevante saber quais os professores que não se
interessam por este tipo de texto e qual o público mais afetado.

142
Neste grupo há 20 inquiridos que ensinam PLM, especialmente no 3º ciclo e
ensino secundário, porém também tem alguma representatividade no 1º ciclo.
Estes são seguidos pelos 12 inquiridos em contexto de LE que também
ensinam principalmente alunos dos dois últimos níveis considerados e tem
alguma representatividade do 2º ciclo. Os últimos inquiridos que ensinam PLE
(4) e PLNM (4) seguem o mesmo quadro pois em geral são os mesmos
inquiridos trabalhando em diferentes contextos.

Os textos dramáticos, ensinados por 65% dos inquiridos tem uma boa
dispersão entre os contextos de ensino, os ciclos de estudos e mesmo entre os
diversos inquiridos em suas especialidades e tempo de profissionalização.

Os géneros, entrevista e discurso, têm maior representatividade entre o público


mais velho, a partir do 2º ciclo, mas em especial, no 3º e secundário. Poucos
professores que trabalham no 1º ciclo também assinalaram o género discurso,
que é um dado interessante e possível, apesar de não muito comum nesta
faixa etária. Assim como os textos dramáticos, os poucos inquiridos que
trabalham o género seminário sobre conteúdos específicos tem uma boa
dispersão entre os contextos de ensino, os ciclos de estudos e quanto às
especialidades e tempo de profissionalização dos inquiridos.

Outras sugestões de textos orais foram somadas à lista de opções


apresentada, são elas: ‘declamação e apresentação de tertúlias’ em aulas de PLM
no 3º ciclo; ‘leitura expressiva’ em contexto de PLM e PLNM no 3º e secundário;
‘exposição, sinopse de livro ou filme, relato de vivências’ em contexto de PLM ou LE
no 3º ciclo e secundário. As duas primeiras são géneros textuais orais
coerentes com o nível e contextos de ensino, além de muito válidos para
posterior construção dos géneros escolares da LP; a segunda pode ser
considerada um tipo do género dramático, se interpretarmos a leitura
expressiva, por um leitor que expressa através da fala e dos gestos as
expressões interpretadas da leitura que está fazendo em voz alta. O terceiro e
último mistura géneros escritos e textuais, as exposições podem conter ambos
os géneros e envolver recursos visuais, mais uma vez caímos na área da
multimodalidade, que afinal, parece muito presente entre as atividades

143
escolares. As sinopses de filmes e livros são géneros escritos, o que pode ter
sido confundido com comentários ou resumos orais, e por fim, os relatos de
vivências que já foram mencionados como géneros escritos mas ocorrem
frequentemente na forma oral, a ainda pode representar um rico momento de
avaliação das dificuldades dos alunos na oralidade, por ser um género informal.

Quanto às dificuldades apresentadas pelos alunos, expostas no quadro 6 e no


gráfico 13, observamos que a maioria dos inquiridos sente que seus alunos não
atingem bons níveis de desenvolvimento genológico ou seja, têm dificuldades
em estruturar o texto oral ou um discurso coerente, em relação às ideias a
serem apresentadas e/ou comentadas; assim como dificuldades na construção
frásica, sequência de parágrafos e uso correto dos articuladores do discurso.

Isto pode significar que o ensino e a aprendizagem de géneros textuais orais


não sejam muito populares na escola, apesar de a comunicação ser um dos
principais focos no ensino das línguas, na atualidade. Levanto aqui a hipótese
de que uma boa parte dos professores de línguas não têm uma categorização
adequada para os géneros, designadamente os que são prioritariamente
ensinados e/ou observados e aprendidos no contexto formal escolar.

Muitos inquiridos citam problemas de desenvoltura e postura para a prática


oral, muitas vezes expressadas pela timidez e vergonha, mas que podem
evidenciar a falta de conhecimento da apresentação em público, nas diversas
situações da vida, produzindo diferentes textos orais.

Outros inquiridos mencionam dificuldades sintáticas e de incorreção gramatical,


que podem, dependendo do contexto de ensino, interromper ou mesmo impedir
a comunicação. Dificuldades na articulação temática, algumas vezes ligada à
falta de conhecimentos do conteúdo estudado, outras em relação ao tema
estudado e à falta de criatividade são dificuldades que podem ser facilmente
superadas caso os alunos detenham o conhecimento do género e passem a
sentir-se desafiados em cumprir com todos os requisitos para uma boa
produção em um discurso, uma apresentação ou qualquer outro tipo de texto
oral.

144
Alguns inquiridos apontam dificuldades na escolha e/ou conhecimento de
vocabulário apropriado aos géneros; outros em relação a dificuldades acerca
de ortografia, pontuação e acentuação. Faz-se necessário explicar porque
considerei estas respostas, já que se trata da análise de textos orais. Alguns
professores citaram a construção de painéis, digitais ou de outros tipos para
apresentações, daí concluo que os erros ortográficos citados sejam
provenientes dos recursos visuais utilizados em geral. Quanto à pontuação e
acentuação, levanto duas hipóteses. Podem os inquiridos estar ainda a
referir-se aos recursos visuais? Podem, também, estar a referir-se às pausas,
entoação, ritmo e outros aspectos próprios do texto oral que se relacionam com
as características de pontuação e acentuação da forma escrita?

Observamos também que uma pequena parcela dos inquiridos, porém não
menos importante, cita dificuldades encontradas na compreensão de
leitura/audição dos modelos oferecidos, e também dos enunciados
apresentados aos alunos; assim como mencionam as dificuldades na
desconstrução dos modelos oferecidos para poderem argumentar criticamente
e de forma consistente.

Com respeito ao planeamento, seja na organização de uma apresentação ou


discurso, preparação para a fala, em especial quanto às escolhas
léxico-sintáticas, postura, sistematização e expressão de ideias, em suma, no
processo de construção de textos orais formais, muitos alunos apresentam
dificuldades, e isso se dá, muito provavelmente, pelo fato de que a fase de
planeamento do texto oral não seja explicitamente ensinada.

O uso de suporte escrito, característica presente na produção de textos orais


formais, como a apresentação de uma pesquisa, é visto como algo negativo
por alguns inquiridos, o que chama a minha atenção para as ferramentas
tecnológicas visuais altamente valorizadas nos dias de hoje, e frequentemente
utilizadas pelos próprios professores em suas aulas. Se os adultos utilizam
recursos escritos para a produção de textos orais, o que falta é ensinar aos
alunos como se deve fazer uso destes, não impedi-los.

145
3.4 Planeamento e as fontes de informação para a escolha de temas e
tipos de textos (ou géneros escolares)

Nesta secção trataremos dos dados referentes aos gráficos 14 e 15, fazendo
referência aos dados organizados no quadro 7. Verificamos que os inquiridos,
em sua maioria, fazem uso de vários materiais de diferentes fontes quando
selecionam os textos que a serem trabalhados em suas aulas de ensino das
diversas línguas.

Tanto para a seleção temática quanto para a seleção genológica (tipos dos
textos), quase todos os inquiridos utilizam os manuais escolares e a internet.
Imagino que os manuais escolhidos por cada escola ou pelo governo devam
ser seguidos, pois devem estar de acordo com as novas tendências e leis
educacionais.

Considerando as restrições apresentadas por um manual escolar em número


de textos, sendo que a finalidade de um manual não se delimita a fornecer
modelos de textos aos alunos, considera-se o uso da internet para a busca de
modelos autênticos, ou de outros modelos dos géneros trabalhados, assim
como temas trazidos pelos manuais que podem ser melhor explorados com
ferramentas encontradas na rede uma simples e rápida opção aos professores.
A única ponderação que coloco é em relação à realização de uma boa seleção
de textos; ter objetivos traçados antes de ir em busca do texto ideal para cada
momento da aprendizagem. O apoio da internet também pode trazer as
notícias do mundo para a sala de aula em tempo real, além de ter criado novos
géneros textuais, como os correios eletrónicos, que contém algumas estruturas
do género carta, mas ao mesmo tempo pode ser tão diverso.

Quanto aos demais recursos listados para a seleção temos maiores diferenças
entre os mais frequentemente usados para a seleção de temas e os mais
utilizados para a seleção dos tipos de textos. Isso ocorre porque cada
documento dedica-se a um fim diferente. A partir desta comparação poderemos
inferir sobre o grau de consciência que os professores de línguas têm sobre os

146
documentos oficiais em prol do ensino em Portugal e na Europa. A tabela
abaixo compara os números expostos nos gráficos do capítulo II.

Documento Seleção temática Seleção genológica


Plano Nacional de 35% 65%
Leitura (1º/2º ciclos
Programa de Português 29% 53%
do Ensino Básico
(2008)
Currículo Nacional do 21% 40%
Ensino Básico (2001).
QECR 44% 40%
Tabela 2: Seleção de fontes de textos com finalidades temática e genológica

O Currículo Nacional não é popular entre os professores de línguas para a


seleção de temas, o que considero razoável, ou que podemos considerar 21%
um número alto sob esta perspectiva. Isso se deve ao fato de o CNEB (2001)
basear-se em competências essenciais, sejam elas gerais ou específicas, que
informam os docentes quanto às capacidades, conhecimentos e percursos de
aprendizagem a serem seguidos, com o objetivo de levar os ão alunos, dos
diferentes níveis de ensino, a atingir os respectivos graus de autonomia
esperados, não contendo sugestões de temas, mas sim direcionando o
planeamento, através de diretrizes traçadas, para a seleção dos tipos de
textos.

O QECR, como previsto, é mais largamente utilizado por professores de LE,


PLE e PLNM, porém alguns inquiridos que se dedicam ao ensino de PLM
também fazem uso deste documento. Vale ainda ressaltar que a maior parte
dos inquiridos que selecionou o QECR como fonte de informação temática
também o selecionou como fonte de informação para a escolha dos tipos de
textos a serem ensinados, o que é coerente, pois este documento destina-se
ao público acima citado e traz referências para ambas as informações.

147
O Programa de Português para o ensino básico, assim como, o Programa de
português para o 10º, 11º e 12º anos fornecem diretrizes mais operacionais
para os professores de PLM e alguma referência aos de PLNM. Considerando
que estas são as ordenações por contexto de ensino mais representadas nesta
amostra esperava que o número de utilizadores deste documento fosse maior
do que os 29% e 53% respectivamente, para a seleção de temas e de tipos de
textos.

Seleção temática Seleção genológica


Livros: narrativas, poesia e teatro),
Livros de didática da língua
jornais e revistas

Planificação anual de Inglês Plano Nacional de Leitura do 3º ciclo

Temas atuais Revistas

Exames nacionais e GAVE:


gabinete de avaliação do Ensino
que produz itens para os Jornais e revistas
exames de avaliação, em
especial, no ensino secundário
Textos de minha autoria, outros
Livros
textos recolhidos

Materiais autênticos Revistas, livros e jornais

Programas do ensino
Textos dos mass media
secundário

Livros de diversas tipologias Livros e artigos de jornais

Revistas, livros e jornais Autores portugueses

148
Textos dos mass media

Leituras pessoais

Tabela 3: Fontes de informação para a seleção de textos sugeridas pelos inquiridos

O mais curioso foi notar que muito professores que não trabalham nos dois
primeiros níveis de ensino, utilizem o Plano Nacional de Leitura desenhado
para tais ciclos. No quadro 7 podemos notar que 26 inquiridos que se dedicam
ao ensino do 3º ciclo e secundário fazem uso do Plano na seleção de textos
tendo em vista ambos objetivos.

A maioria dos inquiridos que trabalham com os três primeiros ciclos de


escolarização também faz uso deste documento, os que não utilizam o Plano
de Leitura são os 4 professores que limitam suas fontes de informação aos
manuais escolares.

Outras fontes de informação foram sugeridas por alguns inquiridos na seleção


de textos quanto ao tema e também quanto aos tipos de textos. Estes
encontram-se organizados na tabela 2 abaixo.

A maioria das sugestões vem de jornais, revistas e livros diversos, ou seja,


materiais autênticos, no sentido de que tem estrutura formalizada e propósito
social definido. Essas podem ser ricas fontes de textos, se bem selecionados,
pois nem tudo o que se publica na imprensa, representa um bom modelo dos
géneros de imprensa, como artigos, anúncios, propaganda, notícias, entre
outros.

Em negrito, encontram-se as sugestões que considero mais significativas para


esta análise, apesar de poucos, alguns professores demonstram conhecimento
sobre os documentos que norteiam o trabalho de suas especialidades, há
também a preocupação com os exames, presentes na educação portuguesa. E
ainda o apoio da leitura dos livros didáticos que são escritos com o propósito

149
de auxiliar os professores em suas práticas, mas muitas vezes, não atingem
seu objetivo.

Destacadas em itálico, estão as sugestões que me preocupam. ‘Textos de


minha autoria’ serão adaptações de textos originais feitas por um professor de
PLM do 3º ciclo, ou serão textos que este escreve e publica ou não, mas que
pertence a um género e tem propósito social?
‘Livros de diversas tipologias’ e ‘Autores Portugueses’ podem ser fontes
interessantes, mas devem ser selecionadas com cuidado e de acordo com o
público e o nível de ensino a que se destinam, com base nas diretrizes
traçadas, neste caso ao ensino de PLM. Quanto às ‘leituras pessoais’ a
preocupação é maior, pois como leituras de um professor de PLM
profissionalizado a mais de 15 anos podem servir ao ensino das línguas nos 2º
e 3º ciclos, e no ensino secundário?

Algumas questões ficam, mas no quadro geral, a maioria dos professores de


línguas faz uso de fontes fiáveis e coerentes ao nível e contexto de ensino.

150
Capítulo IV
Considerações Finais

P aqueles que aprenderam uma língua


sabem muito acerca de várias outras
línguas, sem que necessariamente se dêem
conta disso. A aprendizagem de mais
línguas possibilita geralmente a activação
deste conhecimento e torna-o mais
consciente, o que é um factor a considerar e
não a ignorar. (Ministério da Educação,
2001:233)

1. Reflexões sobre a práxis

Esta dissertação nasceu do contato com propostas baseadas em género para


os problemas da compreensão e expressão escrita que afligem grande parte
dos professores, designadamente, os professores de língua. A Escola de
Sydney promove um conjunto de ideias cuja aplicação tem vindo a ser
comprovada em vários contextos suficientemente poderoso para alimentar o
desenvolvimento completo de um programa; ideias essas que informam os
parâmetros utilizados para analisar os dados recolhidos através do inquérito
por questionário a professores portugueses de línguas (materna ou não-
materna).

Senti ser necessário considerar a perspetiva do professor para, a um tempo,


entender o estado do conhecimento ou sensibilidade dos agentes de ensino
sobre as questões do género e perspetivar o possível terreno a percorrer em
termos de formação de professores.

As propostas dos autores do R2L são bem simples, mas globais. A forma
circular do esquema pedagógico sugerido permite que se trabalhe em um só
ciclo, por exemplo, partindo da Desconstrução para a Construção Coletiva e
direto para a Escrita Individual. Isso acontece muito nos últimos anos
escolares, no ensino secundário, quando se tem menos tempo para aprofundar
as peculiaridades da língua e há mais conteúdos específicos a serem
estudados.

151
Considerando, aqui, uma escola que inicie este programa no primeiro ano do
primeiro ciclo, provavelmente, poucas dificuldades seriam apresentadas nos
últimos níveis de ensino, pois os alunos nesta idade já estariam acostumados à
pedagogia e saberiam lidar com as dificuldades, inclusivamente, colocando
suas dúvidas quando preciso; e o professor teria total liberdade para realizar as
etapas de Leitura Detalhada e Construção Conjunta ou Reescrita Individual, ou
mesmo usar as estratégias do ciclo amarelo (vide figura 8) sempre que for
necessário, possível ou importante, e isso poderá ser feito com todo o grupo ou
de forma individualizada em todos os níveis escolares.

Introduzir novas técnicas e estratégias de estudo no decorrer da vida


académica dos grupos, pode significar maiores desafios para alguns alunos e
mesmo para os professores, porém, não é impossível, devido à flexibilidade de
adaptação dos ciclos de aprendizagem.

As sugestões e propostas apresentadas não são, com efeito, novidade


absoluta para o mundo escolar e para o conhecimento pedagógico
contemporâneo; porém, é importante sublinhar que se trata de ideias que
juntam a linguística à pedagogia pelo que exigem reflexão adequada em
ambos os domínios.

Considerando a maioria de inquiridos que acreditam na possibilidade de


aprimoramento do ensino das línguas através da cooperação dos colegas de
outras disciplinas, em especial, se através de formação complementar, vejo
nesta dissertação informações valiosas para a reconstrução de um modelo de
formação continuada para o ensino das línguas, seja para os professores de
língua ou não.

No que diz respeito à lacuna entre os objetivos governamentais, teóricos e


ideológicos, e a realidade das práticas analisadas, por vezes encontrada na
discussão dos dados, concluo que não representem uma grande barreira à
implantação de novas estratégias no ensino das línguas, devido à
disponibilidade revelada pela maioria dos inquiridos para compartilhar
conhecimentos com colegas de outros grupos em prol da melhoria dos

152
resultados linguísticos dos alunos. Tal constatação sugere a necessidade da
formulação de um currículo consistente e explícito, coerente na construção
interna dos conceitos.

Os docentes que na amostra desta investigação se apresentaram muitas vezes


interessados no ensino dos vários tipos de textos, propondo sugestões ou não,
ao mesmo tempo que, em larga escala, se apresentam navegando entre
teorizações e objetivos diversos, sem um norte comum. Algumas vezes por
falta de interesse, outras por falta de conhecimento da legislação, outras por
falta de coerência entre os diversos recursos educacionais de base, seja em
forma de documentos legais, seja em forma de teorias pedagógicas e
linguísticas, ou proveniente dos manuais escolares.

2. Reflexões sobre a formação linguística dos docentes portugueses

A falta de congruência entre os recursos educacionais oferecidos aos docentes


e algumas diretrizes vagas preconizadas pelos documentos oficiais, como já
referido, explicam os traços marcantes das práticas provenientes da pedagogia
tradicional na sala de aula. Tais práticas são, via de regra, rechaçadas pelas
abordagens comunicativas do ensino das línguas, baseadas em teorias
construtivistas e sociointeracionistas; porém, pudemos constatar, através da
voz dos docentes, que elas ainda fazem parte do dia-a-dia escolar. Assim
como pudemos constatar que as práticas mais atualizadas e informadas se
realizam muitas vezes de forma incompleta, principalmente evidenciadas na
apresentação das finalidades de seleção de textos.

Em contrapartida, foram observadas evidências do conhecimento genológico,


em muitas respostas apresentadas pelos inquiridos da amostra, por exemplo,
quanto ao número de textos individuais escritos por ano letivo e a realização de
várias importantes etapas para a boa produção de um género. Muitas vezes
estas apareceram de forma incoerente, e poucas realmente demonstraram total
desconhecimento da necessidade de se ensinar os vários géneros, da
importância das etapas de desconstrução e construção de modelos, assim
como do ensino dos propósitos sociais dos mesmos. Estes dados denotam

153
maior confiança nas teorias apresentadas, na importância do envolvimento da
linguística na área da educação, mais especificamente, das influências
positivas que a TR&G e a LSF podem oferecer à promoção do ensino em
Portugal. Primeiramente, o ensino de língua, mas que como pudemos
observar, com reflexo por todas as áreas curriculares, uma vez que, a
transversalidade das línguas no ensino formal, além de real, já faz parte do
inconsciente coletivo dos docentes.

Entre as mais recentes sugestões programáticas para o ensino da literacia,


tanto os alunos do secundário, quanto os alunos do ensino básico têm uma
lista de cerca de 20 tipos de textos, entre escritos e orais, em seus respetivos
programas. (cf. Ministério da Educação, 2002:33-47 e Ministério da educação,
2008: 42-60) para serem aprendidos. Constatamos; porém, que o conceito de
géneros e do ensino funcional da língua ainda é incipiente, assim como faltam
estudos neste domínio, resultando na dependência dos professores em
teorizações ditas ultrapassadas, que podem afinal, não serem assim tão
descartáveis. Por outro lado, a maioria dos inquiridos informaram-nos que
mesmo que inconscientemente, todos eles entendem que a língua transpassa
os outros conteúdos curriculares, na maioria das vezes sob uma visão
avaliativa, de correção gramatical e de aprendizagem de vocabulários
específicos às diversas áreas de conhecimento.

Para que os objetivos intervencionistas almejados neste trabalho possam servir


à formação linguística dos docentes há que ser ter em conta muitos aspetos,
em especial, a falta de clareza em relação ao ensino e aprendizagem das
estruturas textuais que formam os géneros, e produzem propositalmente
significados, que por sua vez, têm propósitos socias nos diferentes contextos
em que são empregados nas sociedades.

Outra consideração primordial refere-se às diferenças constatadas entre o


ensino de textos escritos e orais. Apesar de não ser um facto inédito, dado que
o ensino da escrita sempre foi privilegiado no ambiente escolar, as mudanças
educacionais, tecnológicas, o estreitamento do mundo levaram-nos a
considerar os textos orais de igual importância no ensino das línguas, daí um

154
dos grandes sucessos da abordagem comunicativa para o ensino das línguas,
em especial LE e PLE.

Os inquiridos, porém, não revelaram grande preocupação com o ensino dos


textos orais ensinados e/ou observados e aprendidos no contexto formal
escolar, fato provavelmente, decorrente da falta de informação genológica na
formação dos docentes. Até os inquiridos mais recentemente formados, não
apresentaram respostas significativas quanto ao ensino de géneros textuais,
nem mesmo os especialistas em LE e PLE.

As perplexidades reveladas por este inquérito, neste domínio, encontram forte


confirmação nos manuais, na sua organização, categorização e propostas de
exploração textual. Já dissemos anteriormente que os manuais não são
exclusivamente desenhados para o ensino de textos, mas tendo a
comunicação como principal foco do ensino das línguas, parece-me que os
manuais, também não contêm informações genológicas suficientemente
detalhadas e explícitas, capazes de orientar os professores para o ensino dos
géneros, em especial os géneros orais.

Além da necessidade de se construir uma tabela de géneros textuais escolares


para cada nível de ensino da LP, algo já iniciado no CNEB, será preciso formar
os professores aproveitando o potencial relevado, trazendo-os a um
conhecimento funcional da TR&G.

Acredito que os professores, conscientes ou não das lacunas existentes por


entre as suas práticas mais bem-intencionadas, sejam capazes de interpretar
os objetivos estatais e os resultados produzidos no ensino das línguas de
forma a encarem o sucesso dos seus alunos, designadamente na
compreensão e expressão escrita, como um desígnio alcançável através de
práticas de base genológica.

155
156
Referências Bibliográficas

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visualizado em 02/09/2012

159
160
Apêndice I

Questionário

Pesquisa em Linguística Aplicada: O conhecimento genológico (sobre


géneros textuais) nas práticas de ensino das línguas

Este questionário deve ser respondido preferencialmente por professores de


língua em exercício, seja Português língua materna ou não-materna, ou
qualquer outra língua estrangeira ensinada aos alunos do ensino básico e
secundário. Este inquérito é peça importante de uma investigação em
Linguística Aplicada que visa relacionar as novas propostas programáticas com
as práticas de ensino, pretendendo contribuir para a construção de um modelo
mais adequado de formação continuada de professores, designadamente, os
professores de língua. Pretendemos indagar sobre o modo como o
conhecimento genológico informa as práticas de ensino das línguas no ensino
básico e secundário, incluindo o ensino de Português língua não materna. A
participação dos professores é essencial para a realização desta pesquisa, por
isso, desde já agradecemos imensamente vossa disponibilidade. Precisamos
de cerca de 5 minutos do vosso tempo. Muito obrigado! Carolina Costa aluna
de Mestrado em Língua e Cultura Portuguesa Faculdade de Letras da
Universidade de Lisboa

Selecione (x) em quais categorias se inscreve: *Pode ser mais de uma


categoria

• Sou professor(a) de Língua Portuguesa como língua materna


• Sou professor(a) de Língua Estrangeira (inglês, francês, alemão, hindi,
etc.)
• Sou professor(a) de Português como língua estrangeira
• Sou professor(a) de Português língua não materna

Selecione (x) em quais categorias se inscreve: *Caso não esteja trabalhando


em uma escola do ensino básico ou secundário, mas sim, com explicações ou
em cursos livres, também pode responder a esta questão, seleccionando o
ciclo ao qual pertençam seus alunos. Pode marcar mais de uma categoria.

• Trabalho com alunos do ciclo 1


161
• Trabalho com alunos do ciclo 2
• Trabalho com alunos do ciclo 3
• Trabalho com alunos do ensino secundário

Há quanto tempo se profissionalizou? *Quando terminou a licenciatura ou curso


equivalente que lhe permita ser professor.

• 5 anos ou menos
• entre 5 e 10 anos
• entre 10 e 15 anos
• mais de 15 anos

Considera que o ensino das línguas, materna ou não-materna, sejam de


responsabilidade única dos professores destas disciplinas? *

• SIM
• NÃO

Justifique aqui a resposta da pergunta anterior. *Se sim, porque acredita que
apenas os professores de língua são responsáveis por ensinar as línguas? Ou
se não, porque ou com quem compartilha ou poderia compartilhar esta
responsabilidade?

Quantas vezes por ano desenvolve projetos com colegas de outras disciplinas,
tendo em vista a formação linguística dos alunos? *Pode ser um número
aproximado, caso não desenvolva projetos nesse sentido coloque 0.

Até que ponto os professores de história, geografia, ciências naturais,


matemática, artes, química, entre outras disciplinas curriculares estão aptos a
contribuir para a formação dos alunos em língua materna? *Queremos saber a
sua opinião, de acordo com as suas experiências profissionais ao longo dos
anos de serviço.

• sim, são capazes de contribuir


• não são capazes de contribuir
• seriam capazes de contribuir se tivessem formação complementar

162
Quais os tipos de texto que costuma usar no ensino da língua? *Assinale
apenas os que realmente utiliza e use ‘outro’ para adicionar outros tipos de
texto que utilize.

• Histórias
• Narrativas
• Procedimentos
• Relatórios
• Relatos biográficos
• Relatos históricos
• Relatos pessoais
• Resenhas
• Outro:

Além dos textos escritos e orais fornecidos nos manuais adotados, faz uso de
textos retirados de outras fontes? *Responda SIM ou NÃO

Se respondeu sim à questão anterior, com qual finalidade usa tais textos
selecionados de outras fontes? Pode assinalar mais de uma opção.

• Leitura para informação extra relativamente ao conteúdo abordado.


• Leitura para formação de modelos autênticos e atuais dos tipos de texto
trabalhados.
• Para reflexão sobre a estrutura do tipo de texto a ser trabalhado.
• Para usar em atividades de ortografia, sintaxe, vocabulário.
• Para desvendar os propósitos sociais do tipo de texto a ser trabalhado.
• Para análise e desconstrução de bons modelos do tipo de texto em
questão.
• Outro:

Quantos textos individuais os teus alunos costumam escrever por ano


letivo? *Pode ser um número aproximado, se não escrevem textos individuais
use 0.

Ao solicitar a escrita de textos individuais quais das etapas abaixo realiza


previamente? Assinale as que utiliza com frequência, pode assinalar mais de
uma alternativa.

163
• determino o tema e/ou título do texto + o tipo de texto (e.g. história,
relatório...)
• determino o tema e/ou título do texto, mas não especifico o tipo de texto
• determino o tipo de texto a ser escrito (ex. história, relatório...) mas, deixo o
tema à escolha dos alunos
• analiso e desconstruo um modelo do tipo de texto a ser pedido
• forneço informações sobre o tema sugerido
• peço aos alunos que pesquisem sobre o tema
• peço aos alunos que pesquisem outros modelos do tipo de texto sugerido
• escrevemos textos colectivos para ensinar como (estrutura textual) devem
ser escritos os diversos tipos de texto
• escrevemos textos colectivos para ensinar quais os propósitos sociais de
um certo tipo de texto
• Outro:

Quantos textos coletivos seus alunos costumam escrever em um ano


letivo? *Pode ser um número aproximado, caso não escrevam textos coletivos
use 0.

Ao pedir que os alunos escrevam textos coletivos, qual o grau de intervenção


que mais utiliza? Assinale os que utilize mais frequentemente na sua prática
em sala de aula.

• Pede a grupos que construam um texto e se coloca à disposição para tirar


eventuais dúvidas
• Guia toda a turma na construção de um só texto
• Pede a grupos que os construam e monitoriza os grupos, auxiliando na
construção do tipo de texto pedido

Que textos orais praticam os seus alunos em aula? Assinale apenas os que
são praticados pelos seus alunos em sala de aula. Pode ter mais de uma
resposta.

• Diálogos em diversas situações da vida quotidiana.


• Entrevistas
• Discurso
• Debate
• Apresentação de pesquisa

164
• Seminários sobre conteúdo específico
• Dramatizações
• Outro:

Que tipos de dificuldades seus alunos apresentam na produção destes


textos? *Sinta-se à vontade para escrever o que analisa e avalia em sua sala
de aula.

Ao planear aulas que envolvem a escrita ou preparação para a escrita de


textos, de quais fontes de informações faz uso para a seleção dos temas
abordados? Assinale todas as que utilizar, pode ser mais do que uma e
escreva no campo ‘outro’ outras fontes utilizadas.

• Manuais escolares
• Quadro Europeu Comum de Referência para o ensino das línguas
• Plano Nacional de Leitura (1 e 2 ciclos)
• Internet
• Currículo Nacional do Ensino Básico 2001
• Programa de Português do Ensino Básico de Dezembro de 2008
• Outro:

E para selecionar os tipos de textos (narrativas, artigos, relatos, discursos,


debates, etc.) a serem ensinados, faz uso de quais fontes:
Assinale todas as que utilizar, pode ser mais do que uma e escreva no campo
‘outro’ outras fontes utilizadas.

• Manuais escolares
• Internet
• Currículo Nacional do Ensino Básico 2001
• Programa de Português do Ensino Básico de Dezembro de 2008
• Plano Nacional de Leitura (1 e 2 ciclos)
• Quadro Europeu Comum de Referência para o ensino das línguas
• Outro:

165
Apêndices II a VIII em CD anexado.

166

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