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UNIVERSIDADE LICUNGO

FACULDADE DE LETRAS E HUMANIDADE

LICENCIATURA EM ENSINO DE PORTUGUÊS

Bases Históricas do Estudo das Línguas Africanas

Elementos de Fonética e Fonologia

António Iacoleva

Esperança Armando

Francisco Zacarias

Ivone Gore

José Mafunga

Tunica Zobra

Beira

2022
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UNIVERSIDADE LICUNO

FACULDADE DE LETRAS E HUMANIDADE

LICENCIATURA EM ENSINO DE PORTUGUÊS

Bases Históricas do Estudo das Línguas Africanas


e
Elementos de Fonética e Fonologia

António Iacoleva
Esperança Armando
Francisco Zacarias
Ivone Gore
José Mafunga
Tunica Zobra

Cadeira: Estrutura das Línguas Bantu


Docente: dr. Meque Saguate

Beira
2022
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Índice

1. Introdução...........................................................................................................................3
2. A linguística e o estudo das línguas africanas...................................................................5
3. línguas Bantu em África................................................................................................6
4. centro de fragmentação do núcleo proto-bantu...........................................................7
4.1. Hipótese de Guthrie................................................................................................7
5. Classificação das línguas bantu segundo Doke...........................................................10
6. Classificação das línguas bantu segundo Guthrie......................................................10
7. Classificação das línguas moçambicanas segundo Guthrie.......................................11
8. Caracterização das línguas bantu...............................................................................12
8.1. Critérios subsidiários...............................................................................................13
9. Elementos de fonética e fonologia...................................................................................13
9.1. A fonética articulatória............................................................................................14
9.2. A fonética acústica....................................................................................................14
10. A Fonologia...............................................................................................................14
11. Ortografia e Sistemas Fonéticos e Fonológicos das Linguas Bantu..........................14
11.1. Ortografia.............................................................................................................15
12. Fonologia segmental.....................................................................................................20
12.1. Vogais....................................................................................................................20
12.1.1. Duas tabelas..........................................................................................................20
12.1.2. Sequência de vogais..............................................................................................21
12.1.3. Duração vocálica como característica fonológica...............................................23
12.1.4. Harmonização vocálica........................................................................................25
12.2. Consoantes............................................................................................................26
12.2.1. Modificações das consoantes............................................................................27
13. Fonologia suprassegmantal..........................................................................................28
13.1. Silaba e sua estrutura nas línguas bantu.............................................................28
13.2. Tom........................................................................................................................31
13.2.1. Tom lexical............................................................................................................33
13.2.2. Tom gramatical.....................................................................................................33
13.2.3. Expansão tonal......................................................................................................35
13.3. Acento....................................................................................................................36
13.3.2. Função distintiva..................................................................................................37
14. Conclusao......................................................................................................................38
15. Referências Bibliográficas...........................................................................................39
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1. Introdução
O presente trabalho, com os temas "Bases Históricas do Estudo das Línguas Africanas"
e "Elementos de Fonética e Fonologia", debruça sobre as bases históricas do estudo das
línguas africanas, a descoberta do sânscrito, o surgimento da linguística como ciência,
linguística descritiva e comparativa, e não menos importante os métodos tipológicos e
genealógicos que são utilizados no estudo das línguas africanas. Não obstante, o
trabalho também ilustra a classificação das línguas bantus segundo Doke e Guthrie e por
fim a caracterização das línguas bantus e os seus respectivos critérios.

Moçambique é um país com uma basta gama de línguas bantus, a ser assim, objetivo da
elaboração do trabalho é conhecer a história das línguas bantus batendo elas parte da
identidade e cultura nacional.

No que tange ao tema "Elementos de Fonética e Fonologia", mostraremos as vertentes


da mesma dando mais enfoque a fonética articulatória e a fonética acústica, a fonética
articulatória preocupa- se com o modo como os órgão se envolvem para a produção do
som e por sua vez, a fonética acústica preocupa-se com a forma como o som é recebido
pelo receptor. A fonologia preocupa-se sistemas de sons da fala, sua estrutura e sua
função na língua. Estas duas ciências tem uma relação, pois ambas se preocupa de certo
modo com o som da fala, porém de forma diferente.

2. Bases históricas das línguas bantus


O século XIX ocupa um lugar importante na história da humanidade. Com efeito, no
seculo XIX foram alcançados importantes progressos no campo das ciências naturais,
tendo a destacar-se "a teoria analítica das probabilidades “(LAPLACE 1812), em Física,
"a teoria de origem das espécies” (DARWIN 1859), mias conhecida por Teoria de
Selecção Natural, em Biologia, como duas mais celebres descobertas que testemunham
o avanço cientifico do referido seculo.

Na área das ciências sociais e humanas, mais concretamente no que diz respeito aos
estudos da linguagem, pode se afirmar que é o seculo XIX que se assiste ao nascimento
de uma nova ciência, linguística, que se define como ciência da linguagem, ou
simplesmente, "estudo científico da linguagem” (LYONS 1968:1).
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Esta nova acidência surge como resultado de muitos estudos que se desenvolveram no
princípio do século XIX, com o "Romantismo alemão e com o interesse avivado pelo
estudo das velhas línguas da índia antiga em especial do Sânscrito recém-descoberto "
(CARVALHO 1973;5).

A descoberta do Sânscrito pelos cientistas europeias permitiu que fossem identificadas


algumas semelhanças entre estas línguas e as línguas clássicas europeias,
nomeadamente, o Latim e o Grego. A observação destas línguas levou a conclusão de
que as línguas "Sânscrito, Latim e Grego surgiram da mesma fonte que provavelmente
não deve existir " (GREENBERG 1955:1).

Do estudo comparativo do Sânscrito, Latim e o Grego, surge a gramática comparada


que viária a incentivar aquilo que ficou chamado com Filologia indo-europeia e depois
Filologias germânicas e românica. Com este movimento começaram a delinear-se os
primeiros traços que deram forma a linguística como ciência. Contudo, afirmação da
linguística modernas! como disciplina académica viria a verificar-se nos princípios do
Século XIX, com a publicação póstuma do seu Curso de Linguística Geral em 1916.

Linguística histórica, procura investigar e descrever a forma como as línguas mudam


com ou mantem com o tempo, o seu domínio é, por conseguinte, o estiado da língua do
seu aspecto sincrónico.

Linguística descritiva, estuda a língua do ponto de vista sincrónico, ela estuda a língua
descrevendo e analisando as suas estruturas e as regras de funcionamento de acordo
com a maneira como é usada pelos falantes num determinado período.

Linguística comparativa," foi a primeira forma adaptada pela linguística moderna que
surge nos primórdios do romantismo europeu e participa no movimento do século XIX"
faz o estudo comparativo das línguas aliciando alguns métodos:

O método tipológico, que se baseia em traços destacados pela analise da estrutura da


língua em questão. Este método não implica nem parentesco genético nem aproximação
geográfica da língua, mas também não exclui" (BERTEN 1976:347).

O método genealógico, que se apoia em diferentes modelos que reflectem em línguas


derivadas dela, tais modelos são construídos com base em determinadas unidades
classificatórias, entre a quais: Família, Subfamília, Grupo de línguas, (Subgrupo de
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línguas), Línguas, e Dialectos. A unidade "Subgrupo de línguas" esta entre parenteses


para indicar que pode estar presente ou não.

3. A linguística e o estudo das línguas africanas


De acordo com Guthrie (1967-1971) foi Minho (1895) quem sugeriu pela primeira vez a
possibilidade de aplicação as línguas africanas dos mesmos métodos gerais que tinham
sido aplicados ao estudo das línguas indo-europeias. Wagner (1919) refere que foi
Beleco (1895) quem, depois de ter chamado pronominal prefixo linguajes (línguas de
prefixo pronominal) as línguas da Africa subsaariana que comparou e observou a
existência de um sistema comum de concordância por meio de prefixo, utilizou pela
primeira vez o termo Bantu par se referir a estas línguas.

Secundo Almeida (2012:207), beleco chegou a estas conclusões “ lizando Xoas como
língua base de suas reconstruções " que permitiram "produzir um estudo que choupava
uma parte considera da Africa ao sul do Equador". Foi assim que segundo os
paradigmas românticos e racialistas, que uniam raça e linguagem como facetas da
unidade nacional, beleco cunhou o termo bantu para designar distintos povos, reificando
suas semelhanças linguísticas em uma categoria étnica. (Almeida op.cit).

De acordo com a classificação de Greenberg (1963), as línguas bantu pertencem à


subfamília Níger-Congo da família Congo-Kordofaniana.

Classificação de Greenberg para o Xirima:

Congo-Kordofaniana

Níger-Congo

Bantu

Makhuwa

Xirima

Neste esquema, de cima para baixo, estão representados: uma família, uma subfamília,
um grupo de línguas, uma língua, e um dialecto.

4. línguas Bantu em África


O mapeamento da situação sociolinguística da África pré-colonial é feita com base na
reconstrução dos movimentos migratórios, com base na actual dispersão linguística do
7

continente. Foi através da aplicação do método comparativo ao estudo das línguas


africanas que permitiu que os cientistas descobrissem algumas características comuns
entre as línguas de um grupo a que mais tarde chamou de “Bantu”.

A seguir ilustraremos alguns exemplos da semelhança do termo que significa “gente” ou


“pessoas” em algumas línguas moçambicanas, com relativas disparidades de caracter
fonológico:

 Gitonga: ba-thu
 Swahili: wa-tu
 Nyanja: wa-nthu
 Nyungwe: wa-nthu
 Shona: va-nhu
 Changana: va-nhu
 Yao: vaa-ndu
 Makonde: va-nu
 Makhuwa: a-thu
 Nyanja: a-nthu

Esta lista poderia ser mais longa e sempre se verificaria que as duas partes do vocábulo
seriam constantes em todas as línguas: o prefixo (de classe 2) “ba” (wa-, va-, a-) e um
tema nominal “-ntu” (-ndu, -nhu, -nthu, -thu, -tu).

o termo bantu é usado para se referia a um grupo de cerca de 600 línguas faladas por
mais 220 milhões de pessoas numa vasta região de África, que se estende desde os
Montes Camarões (a sul da Nigéria), junto a costa atlântica, até a foz do Rio Tana (no
Quénia), abrangendo os seguintes países: África do Sul, Angola, Botswana, Burundi,
Camarões, Comores, Congo, Gabão, Namíbia, Quénia, República do Congo, Ruanda,
Guiné Equatorial, Lesotho, Madagáscar, Malawi, Moçambique, Swazilândia, Tanzânia,
Uganda, Zâmbia, Zimbabwe. Nesta região existem, em alguns países, encaves de
línguas não bantu, nomeadamente: Khoi, San e Hotentote (Kalahari), na África do Sul e
Namíbia; Maasai e Luo, no Quénia; Hadza (Hatsa), Iraqw, Maasai, Sandawe, na
Tanzânia, e talvez outras linguas noutros países.

Além das anteriormente mencionadas, reconhece-se a existência de línguas de outras


duas famílias em África, a saber:
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Astronesiana, à qual pertence a língua malgaxe;


Indo-Europeia, à qual pertence a língua afrikaanse.

5. centro de fragmentação do núcleo proto-bantu


5.1. Hipótese de Guthrie
Esta hipótese surge da tentativa de reconstituição de uma possível proto-língua que se
poderia considerar ancestral das línguas bantu, isto é, uma língua que se pudesse
considerar proto-bantu. Esta hipótese baseia-se na classificação das línguas bantu mais
difundidas actualmente.

Esta classificação resultou da comparação de sonas, de morfemas (lexicais e


gramaticais) de cerca de 300 línguas bantu, das quais foram escolhidas 28 para uma
análise mais detalhada.

Para fazer a análise Guthrie usou do método léxico-estatísticos na comparação de 2.300


séries, que sintetizou as formas morfológicas mais comuns e mais representativas do
conjunto.

Guthrie sustenta que um importante centro de dispersão do núcleo proto-bantu deve-se


ter estabelecido na região de Shaba, planalto de Katanga, na actual República do Congo.

Guthrie considera duas fases de fragmentação a partir de Shaba:

Fase 1: dispersão para o ocidente

Fase 2: dispersão para o oriente, sendo este frupo de maior homogeneidade que o
primeiro.

A. Dispersão segundo Phillipson (baseando-se em dados arqueológicos, dividido


em 10 fases ao longo de mais de dois mil anos).
 Fase 1, por volta do ano 1000 a.n.e.

Desenvolvimento das línguas bantu na região camaronesa entre as populações utentes


de instrumentos de pedra que, relativamente cedo, conseguiram domesticar o gado
caprino e começaram a praticar a agricultura.

 Fase 2a, cerca de 1000-400 a.n.e.


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Dispersão em direcção ao oriente ao longo do limite da floresta equatorial. Entrando em


contacto com povos agricultores que se supõe sejam os antepassados dos falantes das
línguas sudânicas, de quem adoptaram a criação de gado bovino e ovino, bem como o
cultivo de sorgo. Nesse momento já dominavam as técnicas de produção de utensílios
de metal.

 Fase 2b, por volta de 1000-200, a.n.e.

Um segundo grupo dispersou-se dos Camarões rumo ao sul para a região do Baixo
Congo. Estes usavam utensílios de pedra e panelas de barro, e devem ter trazido consigo
as técnicas de produção de alimentos que já eram conhecidos pelos seus antepassados
na região do Camarões.

 Fase 3, cerca de 400-300

Os falantes das línguas bantu mencionados na fase 2a, os tais que se tinham deslocado
para o oriente a partir dos Camarões, fundaram uma cultura da Idade de Ferro Inferior
na região de entre lagos.

 Fase 4, cerca de 300-100

Deslocação para o ocidente, rumo ao Baixo Congo, dos povos que se tinham
estabelecido entre os flancos da floresta equatorial e as savanas do sul. Estes foram
responsáveis pela criação da Idade de Ferro Inferior junto dos mencionado em 2b.

 Fase 5, cerca d 100 a.n.e.

Uma dispersão para o sul do grupo do ocidente trouxe a cultura da Idade de Ferro
Inferior para o Baixo Congo através de Angola, para o norte da Namíbia, acompanhado
de falantes das línguas do grupo das Terras Altas Ocidentais.

A vaga oriental da Idade de Ferro Inferior dos povos que não se tinham deslocado para
o ocidente rumo ao Baixo Congo deslocou-se em direcção ao sul e ao oriente a partir da
região lacustre da costa do sul do Kenya e norte da Tanzânia.

 Fase 7a, cerca de 300-400, n.e

Uma grande expansão da vaga oriental da região lacustre para o sul passou pelas terras
altas do Lago Niassa em direcção a Transval. O facto de passar por regiões infestadas
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pelas moscas tsé-tsé no sul da Tanzânia, parece ter impedido que fossem até ao sul com
o seu gado.

 Fase 7b, cerca de 300-400, n.e.

Uma expansão paralela rumo ao sul a partir das planícies da região oriental do Lago
Niassa levou gente ao sul de Moçambique e a Transval oriental.

 Fase 8, 400-50, n.e.

Povos do grupo ocidental expandiram-se para o oriente, para o interior de Shaba e


região da Zâmbia. Nesta última região, foram estabelecidos contactos com os povos do
grupo oriental.

 Fase 9, por volta de 500-1000, n.e

Ocorrência em Shaba de um aumento substancial de povos da Idade de Ferro Inferior,


com um concomitante desenvolvimento económico, tecnológico e sociopolítico,
permitindo mais tarde a prática de cultura de Idade de Ferro Inferior pelos povos bantu
do grupo das Terras Altas Orientais.

 Fase 10, cerca de 1000-1110, n.e.

Expansão de falantes das línguas bantu das Terras Altas Orientais de Shaba introduziu a
cultura da Idade de Ferro Superior na metade oriental do sub-continente.

Segundo Phillipson (1977), podem distinguir-se dois grandes momentos de migrações


bantu. Primeiro momento, que vai desde a ano 1000 a.n.e até aos anos 300-400 da n.e, e
o segundo momento que vai desde os anos 400-500 da n.e até aos anos 1000-1100 da
n.e. Estas duas hipóteses não são as únicas colocadas pelos estudiosos sobre a
localização do ponto de dispersão do núcleo proto-bantu. Contudo, parece ser aceite por
ambas que o núcleo de dispersão do proto –bantu se localiza nos montes Camarões.

6. Classificação das línguas bantu segundo Doke


Doke (1945) propôs uma classificação das línguas bantu baseada em quatro (4)
elementos, nomeadamente: Zonas, Grupos, Línguas ou conjunto de dialectos, e
Dialectos.
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Zona são agregados de línguas que tem uma certa uniformidade ou similaridade de
fenómenos linguísticos, mas que não necessitam ser mutuamente inteligíveis. A divisão
em Zonas é basicamente geográfica. As Zonas são subdivididas em Grupos cujas
línguas têm traços fonéticos e gramaticais comuns, e são tão similares que chegam a ser
em grande medida mutuamente inteligíveis. (Cole, 1961: 81)

Língua ou conjunto de dialectos é uma unidade básica que tem o dialecto como sua
subunidade. Não há uma definição clara de linha de uma demarcação entre a língua e o
dialecto, e nem sequer existem critérios satisfatórios que permitam estabelecer a sua
distinção. Contudo, faz a referência de que os dialectos buscarpertencentes à mesma
língua devem ser mutuamente inteligíveis, mesmo que não sejam geograficamente
contiguas, e esta agregação não tem nenhuma relação com a divisão administrativa.

A classificação das línguas bantu segundo Doke é baseada em aspectos geográficos,


embora como se disse acima, o grau de inteligibilidade jogue algum papel. Assim, de
acordo com esta classificação, as línguas moçambicanas distribuem-se por cinco (5)
zonas, entre duas principais (50 e 60) e três (3) subsidiárias (51, 52 e 61).

7. Classificação das línguas bantu segundo Guthrie


Guthrie (1967-71) faz uma classificação geográfica-genealógica das línguas,
agrupando-as em quinze (15) zonas codificadas por letras maiúsculas, a saber,
A,B,C,D,E,F,G,H,K,LM,N,P,R,S.

Internamente cada Zona divide-se em vários grupos de línguas estabelecidos conforme


critérios de proximidade ou distanciamento linguístico e geográfico reflectindo um certo
grau de proximidade genealógica. Cada grupo de língua é codificado por um número
decimal sufixado à letra do código de respectiva Zona. Por exemplo P20, grupo Yao,
abrange as línguas Ciyao, Cimwela, Shimakonde, etc.

As línguas que constituem cada grupo são, por sua vez, codificadas através de unidades
dentro desse número decimal. Por exemplo, a língua Shimakonde tem o código 3 dentro
do grupo 20, da Zona P.

Assim, P23 significa, na classificação de Guthrie ora em análise, língua Shimakonde do


grupo Yao da Zona P.

Guthrie e Doke foram, de uma maneira, contemporâneos, mas não tem sido fácil
encontrar um único momento em que um tenha citado o outro. Pelo que, embora pelas
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datas a classificação de Guthrie pareça ter sido posterior à de Doke, é difícil dizer quem,
de entre os dois, foi o primeiro a realizar a classificação das línguas bantu. Comparando
os dois sistemas de classificação, o de Guthrie parece ser um aperfeiçoamento de do
Doke, além de que aquele foi revendo o seu trabalho ao longo de mais de trinta anos.

8. Classificação das línguas moçambicanas segundo Guthrie


De acordo com a classificação de Guthrie, na sua versão de acordo com a versão
actualizada (Maho, 2009), as línguas bantu de Moçambique distribuem-se por quatro (4)
zonas diferentes, a saber: G, P, N e S (de Norte a Sul). Distribuídas por estas zonas, as
línguas moçambicanas organizam-se em grupos da seguinte maneira:

1. Zona G:
Grupo: G40 (Swahili):
Línguas G42 Kiswahili
G45 Kimwani

2. Zona P:
Grupo: P20 (Yao):
Línguas P23 Shimakonde
P31 G: Emakhuwa do Rvuma
P311 Ekoti

3. Zona N:
Grupo: N30 (Cewa-Nyanja)
Línguas N31a Cinyanja
N31b Cicewa
N31c Cimang’anja
N44 Cisena
Vc

4. Zona S:
Grupo: S10 (Shona)
Línguas S15 Cindau
13

S61 Cicopi
S62 Gitonga

Segundo Guthrie existem oito grupos linguísticos (Swahili, Yao, Makuwa-Lomwe,


Nyanja, Nsenga-Sena, Shona, Copi, e Tswa-Ronga) em Moçambique distribuídos por
quatro zonas (G, P, N e S). O número de línguas varia de grupo para grupo, uma vez
que nem todas as línguas moçambicanas foram inventariadas por Guthrie.

A classificação linguística de acordo com Guthrie existe 8 grupos linguísticos que são:
Swahili, Yao , Makuwa, Nyanja, Nsengasena, Shona, Copi, e Tswa-ronga, no entanto
na sua classificação deixa um um espaço que não inclui aqui a lista de outras línguas
moçambicana mas , importa enaltecer ainda que segundo Guthrie o número de falantes
de cada língua varia, como pode ser atestado no documento do senso de 2007.

9. Caracterização das línguas bantu.


Relativamente a classificação das línguas bantu segundo os pesquisadores, se uma
língua pertence ao grupo bantu ou não, deve obedecer o seguinte critério:

a) Ter um sistema de géneros gramaticais não inferior ao número de cinco


apresentando as seguintes Característica:
 as classes devem associar-se regularmente em pares que opõem o singular ao
plural de cada género;
 quando uma palavra tem um prefixo independente (PI) , prefixo nominal , como
indicador de classe, toda a palavra a ela subordinada deve concordar com ela por
meio de um prefixo dependente.
b) Não deve haver correlação entre o género e a noção sexual outra qualquer oura
categoria semântica claramente definida.
c) Ter m vocabulário comum a outras línguas, a partir do qual se pode se formular
uma hipótese sobre a possível existência de uma língua ancestral comum.

9.1. Critérios subsidiários


 Ter um conjunto de radicais invariáveis a partir dos quais a maior parte de
palavras se forma por aglutinação de afixos apresentando os seguintes traços.
 Uma estrutura básica do tipo: CVC;
 Juntando-se os sufixos gramaticais devem formar bases verbais BV;
14

 Se um tema nominal tiver um género de duas classes, os morfemas e o padrão


tonal do tema devem ser idênticos nas duas classes.
 Entre o radical verbal e o sufixo de ser possível inserir-se um sufixo derivacional
chamado de morfema de extensão.
 Os radicais devem aparecer sem afixos.

É importante referir que o sistema de classes não e característica exclusiva das línguas
bantu, mas, é nelas que talvez melhor do que qualquer língua é mais desenvolvido,
regular e sistemático.

10. Elementos de fonética e fonologia


A Fonética e a fonologia São duas disciplinas que, dada a grande afinidade existente
entre elas, estiveram sempre ligadas durante muito tempo. Apesar de as duas disciplinas
estudarem os sons da fala humana, elas diferem uma da outra em função dos objectivos
de cada uma.

Segundo Trubetzkoy (1981) já Baudouin de Courtenay (1870) dizia que era necessário
distinguir duas fonéticas conforme se queira estudar sons concretos como fenómenos
físicos ou se queira estudar os sons como sinais fónicos empregues para fins de
intercompreensão no interior de uma comunidade linguística. A primeira é a Fonética
propriamente dita e a segunda é a Fonologia.

Em fonética, os sons da fala são produzidos pela anatomia e fisiologia humanas, o que
nos permite distinguir:

10.1. A fonética articulatória


Ela preocupa-se com o estudo da maneira como os sons são articulados ou produzidos,
bem como os órgãos do aparelho fonador envolvidos na produção dos sons da fala, sua
simbolização e transcrição. A produção de alguns sons requer maior esforço muscular
do que a de outros. Os sons cuja produção requer maior esforço muscular são menos
frequentes na maior parte das línguas do que os sons cuja produção requer esforço
relativamente menor. Por isso é que alguns sons (por exemplo, os sons explosivos)
ocorrem em quase todas as línguas do mundo enquanto outros sons (por exemplo,
cliques, ejectivos, implosivos) ocorrem em número reduzido de línguas.
15

10.2. A fonética acústica


HYMAN (1975:2), afirma a fonética acústica é o "estudo das propriedades físicas dos
sons da fala" quer em termos de número de vibrações de ar por segundo (frequência),
quer em termos de intensidade (que determina a amplitude), bem como a forma comoos
sons são percebidos.

11. A Fonologia
Estuda sistemas de sons da fala, sua estrutura e sua função na língua. Isto é, na língua,
há alguns sons que podem ser empregues para distinguir palavras de significados
diferentes, enquanto outros sons não podem ser usados para isso. Assim, enquanto um
estudo fonético fornece o inventário e a descrição dos sons da fala como fenómenos
físicos apenas, sem se interessar pela sua função na comunicação, na transmissão de
significado de palavras: um estudo fonológico não só faz o levantamento dos sons da
língua do ponto de vista fisico, como ainda estuda a sua estrutura e as regras que regem
a sua combinação no sistema, bem como a sua função na comunicação. Pelo que,
enquanto os fonemas, objecto de estudo da fonologia, permitem distinguir palavras de
diferentes significados, os fones, objecto de estudo da Fonética, são realizações
concretas (fonéticas) destes em determinados contextos sem contribuir para distinguir
palavras. Pelo que, os fones são variantes contextuais geralmente predizíveis a partir de
um certo contexto fonológico.

12. Ortografia e Sistemas Fonéticos e Fonológicos das Línguas Bantu


Por uma questão metodológico-didáctica, esta secção vai tratar de ortografia das línguas
bantu antes de discutir os outros fenómenos linguísticos relacionados com a Fonética e a
Fonologia das línguas bantu.

12.1. Ortografia
A questão da escrita como tentativa de representação da oralidade através de símbolos
gráficos é um assunto muito antigo entre os estudiosos das línguas e mesmo entre os
filósofos. Daí que desde muito cedo se tenha tentado reduzir à escrita os sons que eram
produzidos em diferentes línguas. Contudo, por causa de existirem muitas línguas no
mundo, discrepâncias não faltaram sobre como representar os diferentes sons. Assim,
enquanto alguns estudiosos tentavam encontrar formas de representar por escrito os
sons de línguas particulares, outros tentavam encontrar formas de representar por escrito
16

os sons de todas as línguas do mundo. Para ilustrar isto, Fromkim e Rodman (1988)
citam alguns exemplos tais como os que se seguem.

Cave Beck (1657) produziu o que chamou de "Universal Character” ("Caracter


Universal), descrito como Alfabeto Universal através do qual todas as nações do mundo
deveriam exprimir por escrito o que diziam oralmente nas diferentes línguas.

O Bispo John Wilkins (1668) produziu um alfabeto que depois de alguns anos de
circulação propô-lo a "alfabeto universal”. Lodwick (1686) propôs um alfabeto "que
poderia conter uma enumeração de todos os sons singulares e letras tal como são usadas
em qualquer língua” (Fromkim e Rodman 1988:56).

De acordo com este sistema, todos os sons singulares tinham de ter únicos e distintos
caracteres, e nenhuma letra deveria corresponder a mais do que um som, nem um único
som deveria ser representado por mais do que um caracter. Tal como Cave Beck,
Lodwick e outros que o seguiram não usaram as letras latinas. Lodwick desenhou as
suas próprias “letras” de tal maneira que sons semelhantes eram representados por
símbolos semelhantes.

Estes alfabetos não eram inventados por "reformadores da escrita”, mas por académicos
interessados em métodos pelos quais os sons seriam descritos e simbolizados. Este
interesse levou a associação Fonética Internacional (AFI) a criar em 1888 um alfabeto
fonético que poderia ser usado para simbolizar os sons de todas as línguas. Uma vez que
muitas línguas conhecimentos pelos seus membros usam o alfabeto latino, os símbolos
fonéticos da AFI bascatar-se no alfabeto latino. Esses símbolos têm um valor
consistente, diferente das letras ordinárias usadas em alfabetos de línguas particulares,
que podem ou não representar os mesmos sons nas mesmas línguas ou nas diferentes
línguas. Este alfabeto primário é usado hoje em todo o mundo por foneticistas,
professores de línguas, patologistas de fala, linguistas, e qualquer um que queira
simbolizar a palavra falada.

Um alfabeto fonético inclui símbolos suficientes para representar as diferenças


"cruciais” entre os sons. Portanto, o alfabeto fonético não deve nem pode incluir
diferenças não cruciais porque tais diferenças existem em número ilimitado.
17

Enquanto, por um lado, as preocupações acima se iam pondo a nível sobretudo da


Europa, por outro lado, punha-se o caso da escrita das línguas africanas ("negro-
africanas”). Isto é, se seria possível ou não encontrar formas de escrever as línguas
negro-africanas, pois as metrópoles pouco ou não se preocupavam em considerer as
línguas locais (africanas) como sistemas com direito a formas de representação própria,
sendo escritas nas ortografias das línguas "coloniais”. E isto acontecia não obstante o
facto de muitas vezes os sons destas não "caberem" no sistema fonético nem fonológico
daquelas, resultando em “mutilações" e "adaptações” incorrectas.

Para tentar resolver os problemas postos pelos sistemas herdados sem relacionar os sons
das línguas locais (africanas) com as práticas ortográficas das metrópoles coloniais, mas
considerando cada língua de acordo com o seu sistema interno, o International Institute
of African Languages and Cultures (fundado em 1926), mais tarde chamado
International Institute (Tucker, 1971:618) achou necessário inventar uma escrita prática,
mas sistemática, para as línguas africanas. Visto que o alfabeto latino não satisfazia na
sua essência as exigências de muitos sons das línguas africanas, um subcomité do
Instituto encarregado de tratar do assunto decidiu aumentar o mero de letras deste
alfabeto e adoptá-lo para escrita das línguas africanas.

As intervenções de Westermann e seus colegas foram apresentadas no primeiro


“memorandum” do Instituto intitulado Pratical Orthography of African Languages
(POAL) mais conhecido por Africa Script, publicado pela primeira vez em 1928 e
revisto em 1930.

O novo alfabeto incorporava todas as letras do alfabeto latino sendo os valores


consonânticos aproximados aos do Inglês, à excepção de CeX (que receberam novos
valores sendo, no primeiro caso o de oclusiva ou africada palatal e no segundo o de
fricativa velar não- vozeada. Assim, o alfabeto latino aumentou em número com novos
símbolos, muitos dos quais adaptados do AFI.

A adopção do novo alfabeto pelo Conselho Executivo do Instituto Internacional


representou uma clara rejeição do uso de diacríticos e levou Carl Meinhof, membro
activo do Conselho, aresignar.

Apesar de muitos problemas, a Africa Script conseguiu uma existência definitiva em


muitos países negro-africanos. Contudo, as discussões continuam relativamente a
adopção de uma escrita uniforme para a África negra. Reuniões regionais dão à Africa
18

Script sempre nova vida e novo reconhecimento com as suas cinco vogais básicas (a, e,
i, o, u) e as quinze consoantes (b, d, f, g, h, k, l, m, n, p, r, s, t, v, z). Estas letras têm o
mesmo valor, isto é, representam os mesmos sons, em toda a África negra e em todo o
mundo onde se usa o alfabeto latino. As consoantes que não fazem parte deste grupo de
quinze são aquelas que, aparecendo no AFI, são representadas de diferentes maneiras
nas diferentes línguas. A tabela que se segue apresenta os caracteres do AFI na sua
versão mais recente (1989):

Alfabeto Fonético Internacional (AFI) (Ladefoged 1993).

Articul. Ponto
Modo bilabi Labiode Dental Alveo Pal- Retrod Palata Lab Vel Uvula Parlog Gl
al nt alv l . vel r .
Oclus. pb t d ʈ ɖ ɑ Ɉ kg
Explo
Nasal m ɱ n ɳ ɲ ŋ
Vibr. B r
Múltipla
Vibr. ɾ
Simpl.
Fricat. ɸβ f v ɞẟ z Z ʃ ʒ ȿ ʐ ç j x
Y
Fricat. ƚ ɮ
Lateral.
Aprox ɒ ɻ ǰ w ɰ
Aprox. ȷ ɭ ʎ L
Lateral
Ocl. po tB ʈP ɑa kb զb
Eject.
Ocl. ƥɓ ƈ ʃ ɠ
Implo.

Os símbolos em negrito são aqueles quinze que foram referidos acima como sendo os
que representar da mesma maneira os mesmos sons na ortografia de todas as línguas
19

negro-africanas. As ortografias das diferentes línguas fazem uso, em grande medida, das
quinze letras do Africa Script, aumentando-as em número e adaptando-as por meio de
diacríticos e outros mecanismos quando tal se justifique tendo em atenção em primeiro
lugar, os símbolos da AFI apresentados na tabela.

Tal como acontece em outras partes do mundo, em Moçambique já se realizaram


seminários sobre a padronização da ortografia das línguas moçambicanas, um em 1988
e outro em 1999. Destes seminários resultaram as propostas de representação dos
fonemas consonânticos em que se baseou a tabela que se segue.

Os símbolos em negrito são aqueles quinze que foram referidos acima como sendo os
que representar da mesma maneira os mesmos sons na ortografia de todas as línguas
negro-africanas. As ortografias das diferentes línguas fazem uso, em grande medida, das
quinze letras do Africa Script, aumentando-as em número e adaptando-as por meio de
diacríticos e outros mecanismos quando tal se justifique tendo em atenção em primeiro
lugar, os símbolos da AFI apresentados na tabela.

Tal como acontece em outras partes do mundo, em Moçambique já se realizaram


seminários sobre a padronização da ortografia das línguas moçambicanas, um em 1988
e outro em 1999.Bem como o que ainda tem resultado das reflexões dos estudiosos e
praticantes da escrita das dezassete línguas que se incluem nesta lista. É importante
mencionar que estas dezassete são apenas uma parte da lista das línguas moçambicanas
cuja pertença a este grupo não dependeu de nenhum estudo dialectológico prévio.

Tabela 2: Ortografia padronizada de línguas moçambicanas (NELIMO 1989 e Sitoe e


Ngunga 2000)

AF Mw Mk Yao Mkh Chw Nyj Nyg Sen My Nd Tw Bar Tng Cop Chg Tsh Rh
I
b B B b (b) b (bh) bh bh bh bh bh bh bh bh b bh b
ƃ - - - - - b b b b b b b b b hh bb b
d D D d (d) d (dh) dh dh dh dh dh dh dh dh d dh d
20

ɗ - - - - - d d d d d d d d d dd d d
ծ - - - - dh - - - - - - - - - - - -
g G G g (g) g g g g g g g g gh g g g g
Y - - - - - - - - - - - - g - - - -
c C C c c c c c c c c c c c ⸧tx c c c
cc
dʒ J J j (j) j j dj djʎ j j j j - j j j j
ʃ Th sh - x/sh - sh x x sh sh sh sh - x x x x
ʒ - - - - - - (j) (j) xh jh sh (xj) - xj xj xj xj
v - V - v v vh (vh) (vh) vh vh v (vh vh vh vh vh vh
)
u - - wu - - v v v v v v - v v v v v
v
β - - - - - - - - - - - - vb - - - -
g - - - - - - sw sw sv sv sv sv - (sv) sv sv sv
ʐ - - - - - - zv zw zv zv zv zv - (zv) zv zv zv
ps - - - - - ps ps ps - - - ps - ps ps ps ps
bʐ - - - - - bz bz bz - - - bz - bz bz bz bz
tȿ - - - - - - - - tsv tsv tsv - - - -
dʐ - - - - - - - - dzv dv dzv - i
ŋ Ng Ng ng ng ng ng ng ng n n n n n n n n n
Nb Nb Np Np Nb Np Nb Np Nb N'
l L L l l l l
r (r) r r r r r r r r r r
r Ir Ir
փ rh

13. Fonologia segmental


A Fonologia estuda a função dos sons tanto segmentais (sons vocálicos e sons
consonânticos) como os sons suprassegmentais, aqueles que pode afectar mais do que
um segmento tais como, a sílaba, o acento, o tom. Esta secção vai dedicar-se ao estudo
dos elementos segmentais, ou seja, ao estudo das vogais e consoantes das línguas bantu,
21

incluindo as regras da sua combinação na formação de unidades maiores (morfemas,


palavras ou mesmo frases), como se verá mais tarde.

13.1. Vogais
De uma forma geral, as sete vogais que caracterizaram o sistema vocálico proto-bantu
ficaram reduzidas a cinco em termos fonológicos e só se mantém o número de sete a
nível fonético em algumas línguas, como se pode ilustrar nos exemplos que se se
alguem:

13.1.1. Duas tabelas


Estas tabelas mostram que embora os sete sons vocálicos do proto-bantu (1) se tenham
mantido foneticamente em algumas línguas moçambicanas (), deve-se sublinhar que
estes ficaram foneticamente reduzidos a cinco vogais distintivas (til) em todas as línguas
moçambicanas. Portanto, embora com algumas ligeiras diferenças em termos de
qualidade de algumas vogais de certas línguas, resultantes ou não de alguma influência
de elementos suprassegmentais, os cinco fonemas vocálicos apresentados em (11) são
praticamente comuns a todas as línguas moçambicanas contemporâneas.

Por vezes as cinco vogais são divididas em dois grupos. Assaltas (fechadas) e a baixa
(aberta) são chamadas vogais primárias, enquanto as médias (semi-fechadas) são
chamadas vogais secundárias.

Em termos de traços fonéticos e do ponto articulatório, os membros destes dois grupos


não formam classes naturais. Todavia, se se tiverem conta o aspecto acústico, pode ser
que haja alguma razão para se considerar que os membros de cada um dos grupos
formam classes naturais. A relação que existe entre as vogais altas e a vogal baixa é que
na produção de cada uma das vogais deste grupo deixa-se um espaço muito grande o
que permite a circulação de uma massa aqui de ar relativamente grande, no tracto vocal,
o que não acontece na produção de vogais médias. Todavia, esta classificação de vogais,
apesar de encontrar justificação em fenómenos fonológicos, uma vez que a sequência de
duas vogais primárias no sentido ascendente (a+i; a+u) muitas vezes resulta em vogais
secundárias (médias) que podem ser anterior (ee) ou recuada (00) conforme a qualidade
(anterior ou recuada, respectivamente) da vogal alta interveniente. Em contrapartida, o
encontro entre uma vogal média e a vogal baixa pode resultar tanto em semivocalização
como em elisão conforme os casos. Se os dois fenómenos aconte cerem numa mesma
língua, será tarefa do linguista investigar as razões subjacentes a tal variação.
22

13.1.2. Sequência de vogais


Duma forma geral as línguas bantu não aceitam sequências de vogais, sendo obrigatória
a aplicação de algumas regras fonológicas (resolução de hiatos) tais como
semivocalização, elisão ou fusão. Contudo, há algumas linguas em que na escrita tais
sequências parecem admissíveis, como resultado de uso na representação gráfica de
ortografias de línguas europeias onde este tipo de sequências é admissível. Esta
confusão resultante do uso de ortografias de línguas não bantu, cria situações
problemáticas do ponto de vista da fonologia das línguas bantu. Exemplo:

(1)Ndau: a. mwana ʻcriançaʼ

b. Kuerenga ʻlerʼ

Sena: a. nyatwa ʻsofrimentoʼ

b.anazaduala ʻficará doenteʼ

É difícil explicar-se como é que em (1a) o u seguido de vogal passa para w, uma regra
cuja aplicação na escrita não se observa em (1b), como seria de esperar. Pelo que, o
leitor com ouvido e tacto treinados para fazer linguística bantu, em algumas regiões do
país deverá estar preparado para encontrar esta realidade embora consciente de que a
mesma vai contra as regras elementares de ortografia destas línguas que é basicamente
orientada para algumas regras fonológicas. Portanto, deve-se esperar que em algum
material escrito apareçam sequências do tipo ia, ea, ai, ui, oa, etc., enquanto o ideal
seria restringir a sequência das vogais através de imposição de obrigatoriedade de
aplicação de certas regras fonológicas que produzem diferentes resultados à superficie.

No segundo caso, as vogais altas semivocalizam antes de outras vogais, como se pode
observar nos exemplos que se seguem:

(2) Makonde: a. mwanda (<mu-anda>)


ʻviagemʼ

b. shomya (< kushomi-a >)


ʻensinarʼ

Yao: a. kwiinjila (< mu-anda >)


ʻentrarʼ
23

b. Kupya (< kupi-a >)


ʻqueimar-seʼ

Copi: a. mwana (< kumu-a >)


ʻbeberʼ

b. kudya (< kudi-a >)


ʻcomer

tonga: a.mwana (< mu-ama>)


ʻmachoʼ

b. gyanana (< ga-anana >)


ʻcriancaʼ

Estes exemplos demonstram que as vogais altas são semivocalizadas quando seguidas
de vogais diferentes delas. A semivocalização, como regra fonológica, pode ser
representada da seguinte maneira:

(3) v

[+alt]->G/_V

Isto é, uma vogal alta (i ou u) torna-se (>) ou realiza-se como semivogal, aproximante,
ou glide (G), no contexto ou ambiente (/) antes de ou em que ela estiver seguida de uma
outra vogal (-V).

Esta fórmula sintetiza a regra de semivocalização que é obrigatória em muitas línguas.


Contudo, deve acrescentar-se que esta não é a única regra usada pelas línguas para
resolver o problema de hiato (sequência indesejável de duas vogais). Outras regras tais
como fusão ou crase, clisão ou absorção, etc., são usadas com o mesmo fim.

4) Yao: Fusão: moova (<ma-uva <ma-dy-uva) sóis (cias)

meena (<ma-ina <ma-di-ina) 'nomesʼ

Elisão: mooto (< mu-oto) ʻfogoʼ

Tonga: Elisão: sanana (< si-anana) ʻcriancaʼ

Semivocalização: mwama (<mw-ama) ʻmachoʼ


24

gyanana (<gi-anana) ʻcriançaʼ

Como se nota, a juntar-se a regra de semivocalização que é obrigatória nestas línguas,


os exemplos em (4) conduzem à conclusão segundo a qual as diferentes línguas bantu
recorrem a diferentes mecanismos na resolução de hiato. Em Yao são as regras de
elisão, fusão e semivocalização que conspiram contra a ocorrência de hiato. Em Tonga
as regras de elisão, semivocalização e inserção são usadas na resolução de hiatos.
Outras línguas usam algumas (d) estas ou outras regras a serem aplicadas para se evitar
a ocorrência de sequências de vogais diferentes.

Outro aspecto importante a ser mencionado em relação às vogais diz respeito à duração
que numas línguas pode ser fonética apenas e noutras pode ser fonética, fonémica e
fonológica. A subsecção que se segue vai dedicar-se a este assunto, a duração vocálica.

13.1.3. Duração vocálica como característica fonológica


A duração vocálica é distintiva em línguas tais como Yao e Makhuwa. Nestas línguas,
mais abaixo mostraremos a diferença semântica de uma palavra em relação a outra pode
ser obtida somente através da duração de um segmento que ocorre em determinada
posição. Mais abaixo estão apresentados exemplos que ilustram duração fonémica ou
duração semanticamente contrastiva.

(5) Yao: a. Kupata 'obter cf. kupaata5 'sacudir

b. kupeta ornamentar cf kupeeta 'peneirar

Makh: a. omala 'acaba cf. omaala 'calar-se'

b. omela 'germinar cf. Comecla ʻdespirʼ

Mas além deste tipo de duração é possível encontrar em algumas línguas alongamento
de vogais devido ao seu posicionamento na palavra, de acordo com a natureza dos
fonemas precedentes ou seguintes. Como regra geral em Yao temos que toda a vogal
que ocorra antes de uma consoante pré-nasalizada é alongada, tal como o é depois de
uma consoante modificada através da semivocalização.

Outra pode ser obtida somente através da duração de um segment que ocorre em
determinada posição. Se, entretanto, um processo morfológico obrigar à co-ocorrência
de duas vogais da mesma qualidade, o resultado é uma vogal longa que depois da
ressilabificação passa a ser o núcleo de uma sílaba pesada. Por exemplo:
25

(8) Yao: a. ku-tivila 'mergulhar cf. tutiviile 'mergulhámos'

b. ku-pacila 'carregar cf. tupaciile carregámos?

Como se ve, a penúltima sílaba das formas do passado é sempre longa em consequência
do processo de afixação da marca do passado adoptado para verbos com radical
bissilábico como os apresentados em (8). Existem outras línguas tais como o Makonde
em que o alongamento da vogal da penúltima silaba é uma das características
fonológicas fundamentais, como se pode ilustrar com os seguintes exemplos:

(9) Makonde: kumanya ʻsaberʼ

Kukomela ʻpregarʼ

Dibangili ʻpulseiraʼ

Lidodo ʻpernaʼ

Kukamula ʻpegarʼ

Nos exemplos acima, a vogal da penúltima sílaba é sempre longa, e sempre acentuada.
Portanto, trata-se de mais um caso de alongamento fonológico que é causado pelo seu
posicionamento na palavra (penúltima silaba). Tal como o fonético, o alongamento
fonológico não precisa de ser representado na escrita pode ser usado para distinguir
palavras, não é contrastivo, é predizível. Este alongamento pode ser representado
através de uma espécie de fórmula do tipo:

(10) V–VV/ -o#

Onde: o simboliza sílaba; # indica fim da palavra. E o traves são (-) indica o espaço da
sílaba que precede a última sílaba. Portanto, a fórmula deve ser lida da seguinte
maneira: Uma vogal breve torna-se longa na posição antes da última sílaba. Resumindo
ficas uma vogal torna-se longa na penúltima sílaba. Como se viu, em Yao e em
Makhuwa, a duração vocálica é geralmente contrastiva (não é predizível) e, por isso, a
sua representação gráfica é obrigatória. Nestas línguas para não complicar as regras de
escrita, uma vez que existem vogais longas contrastivas que devem ser obrigatoriamente
representadas na escrita, é muito prático estabelecer-se que todas as vogais longas
(fonéticas, fonémicas, fonológicas) devem ser escritas conforme são produzidas e
ouvidas tal como se propôs em Lichingå em relação ao Yao.
26

Em Makonde e outras línguas onde a vogal longa é predizível (não é contrastiva, é


fonológica), o alongamento não é representado na escrita. Para terminar o estudo das
vogais, a seguir vai fazer-se uma breve apresentação da noção de harmonia vocálica.

13.1.4. Harmonização vocálica


A harmonização vocálica, intende-se como o modo da articulação de uma vogal é
influenciada pelas propriedades de outras vogal na mesma palavra ou no mesmo grupo
de palavras. Noutra perspetiva, a harmonização vocálica em situações de derivação é
um fenómeno extraordinário nas línguas moçambicanas, temos como exemplo a língua
YAO que acontece os processos de afixação de sufixos verbais.

a. –pit-il-a "passar por"

b. – put-il-a "apagar com"

c. – pat-il-a "ganhar com"

d. – pet-el-a "ornamentar
com"

e. – pot-el-a "torcer com"

Como podemos notar no exemplo acima, todos os segmentos são iguais em todos os
cinco verbos excepto as vogais dos radicais e as dos sufixos verbais que precedem a
vogal final –a. Vogal radical - /i, u, a/ Vogal do sufixo verbal - /e/

Olhando para a natureza dos dois conjuntos pode concluir-se que o facto de as duas
vogais /e, o/ serem médias faz com que a vogal do sufixo seja também média do sufixo
deve estar em harmonia com a ultima vogal média do radical, então a ultima vogal não
media do sufixo há-de estar em harmonia com a ultima vogal não média radical.

Exemplos de radicais longos na língua Sena:

a. –lir-ir-a "chorar por"

-pit-ir-a "passa por"

b.

-gon-er-a "dormir sobre"


27

- pemb-ess-a "fazer pedir"

13.2. Consoantes
As consoantes são  sons ou fonemas produzidos sob a influência de obstáculos do
aparelho fonador. Diferentemente das vogais, cujos sons formam-se a partir da simples
vibração do ar nas pregas vocais, as consoantes precisam dos lábios, dentes, língua,
palato, véu palatino, úvula ou qualquer outro obstáculo para serem pronunciadas.
Segundo o relatório do I seminário de Padronização sobre a Ortografia de Línguas
Moçambicanas reposta 27 símbolos consonânticos destas línguas, sendo variável o
numero correspondente a cada língua particular, que se pode dividir em dois grupos,
que são:

I. b, c, d, f, g, j, k, l, m, n, ny, p, r, s, t, v, w, y,z.

II. Um grupo de 8 que só ocorrem em algumas línguas e cuja representação


escrita nas línguas e que ocorrem é variável.

ng`n`, nasal velar; sv/sw, fricativa alveolar labializada não vozeada; zv/zw, fricativa
alveolar labializada vozeada retroflexa; vh/vb, fricativa bilabial vozeada; bz/by,
africada lábio alveolar vozeada; x/sh, fricativa alveopalatal não-vozeada; xj/zh, fricativa
alveopalatal vozeada; Ih/ly, aproximante lateral palatal.

Nota-se que em algumas línguas as oclusivas vozeadas são predominantemente


produzidas com o ar bucal inspirado, e só em raras ocasiões (empréstimos, por
exemplo) com o ar expirado. As consontes do grupo (a) são representadas pelos
grafemas não modificados (b, d, j, g) enquanto as do grupo (b) pelos mesmos grafemas,
mas com alguma modificação marcada ou por dois grafemas, ou por apóstrofo, ou por h
que não tem intenção de indicar aspiração (dj, b`/bh,d`/ dh, j`/jh, g`/gh).

Como podemos notar na língua Ndau, os seguintes exemplos:

a. bhuku "livro"

dhorobha "cidade"

b. Kubata "agarrar"

kubuda "sair"
28

O exemplo acima ilustra a representação gráfica de consoantes oclusivas vozeadas


explosivas e as consoantes oclusivas vozeadas implosivas.

13.2.1. Modificações das consoantes


Todas as consoantes das línguas moçambicanas podem sofrer uma ou combinação das
seguintes modificações: pré-nasalização, lábio-velarização, palatalização, aspiração.
Estas modificações, nas línguas em que ocorrem, são marcadas por: m ou n precedendo
a consoante pré-nasalizada (182) um w (18b) ou umy (18c) a seguir a consoante lábio-
velarizada ou palatalizada; e um h a seguir a consoante aspirada (18d, e), como se pode
ver:

(18) Ronga: kufamba ʻirʼ

Nsenge ʻbananaʼ

Changana: kubinwana ʻenfastiarʼ

Tonga: gyanana ʻcrianccaʼ

Khigyo ʻé istoʼ

Nyanja: nchito ʻtrabalhoʼ

Além dos modificadores que constituem dígrafos (duas letras) com a consoante
'modificada para exprimir um único som nos exemplos em (18), também aparecem os
diacríticos (sinais que se colocam por baixo, por cima, ou ao lado do grafema) para lhe
modificar a realização. Por exemplo, n' e ng representam a nasal velar em diferentes
línguas, como nos seguintes exemplos:

(19) Mwani: ngʻombe ʻboiʼ

Nyanja: ng'ombe ʻ boiʼ

changana: -n'we ʻ um'

Em algumas línguas, o apóstrofo que se coloca entre uma consoante oclusiva vozeada e
uma vogal indica que a aquela consoante é explosiva (nos casos em que as oclusivas
vozeadas são maioritariamente implosivas na língua).

(20) Chang: a. b'aso 'fumo de inalar, incenso' (Sitoe 1986)


29

b. -b'usa regalar-se' (Sitoe 1986)

Nestes casos, o apóstrofo tem a função que o h costuma ter depois de oclusivas
vozeadas em contextos em que ele não marca aspiração, como se viu acima nos
exemplos em Ndau. Depois destas breves considerações que dizem respeito aos
segmentos e sua representação.

14. Fonologia suprassegmantal


São chamadas elementos suprassegmentais ou prosódicos todas as unidade linguísticas
da cadeia falada que se encontram “acima” dos segmentos. Ou seja, aquelas unidades
que fazem parte da melodia, e que podem abarcar mais do um segmento. Alguns
exemplos de suprassegmentos, e que serão objecto de estudo neste trabalho são: sílaba,
tom e acento.

14.1. Silaba e sua estrutura nas línguas bantu


A sílaba (ό) pode ser definida como “unidade de som situada 10 nível imediatamente
superior ao do fonema".

(Wiesemann et, al. 1983). Diz-se que ela é um suprassegmento porque se situa “acima"
do segmento, na medida em que ela pode abranger mais do que um segmento. Embora
universalmente se reconheça uma certa estrutura de sílaba, as diferentes línguas
"escolhem" a forma específica da sua sílaba que é adequada à organização do seu
sistema fonológico.

Em termos universais, há também várias propostas de estrutura de sílaba apresentadas


por diferentes estudiosos. Entretanto, como teremos ocasião de ver, todos os estudiosos
são unânimes no facto de que toda a sílaba tem um núcleo, que geralmente é uma vogal.

Em casos particulares, o núcleo de uma silaba pode ser uma consoante, geralmente uma
nasal ou uma líquida.

Segundo Kindell (1981), numa sílaba pode-se identificar núcleo (Ne) e margem ou
margens (consoante ou conjunto de consoantes, simples ou modificada[s]) que
ocorre(m) antes e/ou depois do núcleo. A(3) consoante(s) que precede(m) o núcleo
chama-se margem prénuclear (M) e a que segue o núcleo chama-se margem pós-nuclear
(m) constituindo uma estrutura que pode representar como se segue:
30

(M) Nc (m)

Em exemplos acima é apresentado um exemplo de uma estrutura plana de sílaba, um


pouco na linha de Kindell (Ibd.) tal como se apresenta na definição acima. Contudo,
para outros autores (Mateus e Andrade 2000, por exemplo) a sílaba possui uma estrutura
hierarquizada que compreende um ataque (A) e uma rima (R) em que, por sua vez, se
identifica um núcleo e uma coda (Cd), o que se pode representar da seguinte maneira:

A R

A Cd

No esquema acima temos uma estrutura hierarquizada de uma sílaba onde aquilo que é
núcleo e margem pós-nuclear em (21), pertencem a um nível inferior ao da margem pré-
nuclear. Esta posição difere ligeiramente.

Hyman (1975:188) para quem a sílaba é constituída por três partes fonéticas: (a) 'ataque'
(margem pré-nuclear; onset), (b) o núcleo e (c) a coda (margem pós-nuclear), portanto,

uma estrutura semelhante à proposta por Kindell (op. cit.). Para fins fonológicos,
entretanto, Hyman diverge de Kindell ao afirmar que apesar da distinção da sílaba em
três partes fonéticas, apenas uma única divisão entre (a) margem pré-nuclear e (b) rima
(R), constituído pelo pico fonético e a coda combinados, é relevante. Ou seja:

( A) R
31

Em (23), eis o que, para Hyman (op. cit.) são as partes relevantes da estrutura da sílaba
para efeitos fonológicos. Esta é que é, também, a estrutura básica da sílaba nas línguas
bantu, aquela que informalmente se abrevia como sendo CV(V). Isto é, com a hipótese
de vogal poder ser longa (bimórica, na teoria mórica a que muitas vezes faremos alusão)
ou pesada, como nos seguintes exemplos:

(24)

Yao: a.-peta ʻornamentarʼ

b.-peeta ʻpeetaʼ

Makh.: a.-mala ʻacabarʼ

b-maala ʻcalar-se’

Os segmentos em acima em (a) nestes exemplos são núcleos de silabas leves, breves ou
monomóricas, e os segmentos em negrito em (b) em ambas as línguas são núcleos de
sílabas pesadas, longas ou bimóricas. Como se vê, as silabas têm a estrutura CV(V).
Portanto, as silabas nestas línguas são sempre abertas ou livres (terminam em vogal),
excepto nos casos em que elas sejam nasais silábicas como se viu anteriormente, pois
não têm margens pós-nucleares.

Nestas duas línguas, o peso silábico é contrastivo, isto é, há palavras que só se


distinguem por causa de terem ou não urna sílaba monomórica numa posição onde outra
palavra tem uma sílaba bimórica tendo as duas os mesmos segmentos organizados na
mesma ordem. Por isso se diz que a duração nestas línguas tem função comunicativa,
portanto serve para estabelecer contraste entre palavras. Noutras línguas, o peso silábico
não tem essa função, sendo, portanto, redundante. Em muitas delas a sílaba longa
localiza-se

em alguma posição na palavra e atrai o acento. Por isso, na ortografia corrente de tais
línguas não se marca a vogal Tonga como se pode ver nos seguintes exemplos:

(25). Makonde: libata ʻpatoʼ

jujumunu ʻmãeʼ

b. Nyungwe: kucemera ʻchamarʼ

mfunguro 'chaveʼ
32

kucingulira 'ir ao encontro de

quem vemʼ

Em todos estes exemplos, a penúltima vogal é longa recebendo, por conseguinte, acento
tónico. Por serem predizíveis os contexto nem que ocorrem, nem o acento tónico nem a
sílaba longa que são marcados. As vezes as silabas pode não ter nenhuma margem, por
exemolo:

tshwa: utela ʻcheiroʼ

chuwabus: oja ʻcomerʼ

Nas linguas bantus a silaba pode ter apenas o núcleo e não ter nenhuma margem. Como
já se fez menção, casos haverá em que uma nasal constituirá por si só uma silaba.
Mesmo nesses casos, a operação de separação das sílabas não deverá constituir
nenhuma dificuldade depois de já se ter descrito, como se fez acima, o processo
fonológico que cria nasal silábica. Depois de vista a sílaba, é momento de se passar ao
estudo do tom e da sua função nas línguas em que existe.

14.2. Tom
Muitas línguas moçambicanas são tonais, como o são a maioria das línguas do mundo.
Isto é a altura de sílabas de algumas palavras pode servir para distinguir significados
diferentes. Portanto, nas línguas moçambicanas podem encontrar-se duas ou mais
palavras com a mesma sequência de segmentos (consoantes e vogais) cujos significados
diferem somente devido à variação de altura de algumas sílabas, como se ilustra nos
seguintes exemplos:

Ronga: mavélé ʻseiosʼ

Màvelé ʻmilhoʼ

Yao: Citùúndù ʻcestoʼ

Como se vê em nos exemplos acima, as palavras em cada para de palavras de cada uma
das línguas seriam completamente ambíguas se o tom não tivesse sido marcado, pois em
cada par de palavras de cada língua a parte segmental pode significar tanto uma como
outra coisa. Note-se que nos exemplos em as marcas () e () indicam o tom alto (A) e o
tom baixo (B), respectivamente, formas adoptadas para representar os dois tipos de tons
na maioria das línguas moçambicanas e em muitas línguas do mundo, mas não são as
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úncas. Há muitas outras formas de representar o tom nas línguas do mundo, mas aqui
não se vai fazer alusão a elas por não se considerar pertinente num trabalho desta
natureza. Nos relatórios dos Seminários sobre a Padronização da Ortografia de Línguas
Moçambicanas (NELIMO 1989 e Sitoe e Ngunga 2000), foi sempre referido que o tom
eta um assunto que precisava de mais investigação.

Contudo, foi proposto que a ser marcado, que se marque o tom menos frequente na
língua. Isto é, se numa determinada língua o tom menos frequente for o baixo como em
Changana, então marcar-se-á o tom baixo. Na língua onde o tom alto for menos
frequente do que o baixo, então marcar-se-á o tom alto. por exemplos:

Changana: nyimbu kwatsi

Ndluvu xihloka

Yao: cigaayo nguúnda

Ditíinji disóoka

Como se vê em nos exemplos acima, na língua Changana o tom alto é mais frequente do
que o tom baixo. Daí que o tom baixo seja marcado, Em contrapartida, língua Yao, tom
baixo é mais frequente do tom alto. Daí que o tom alto seja marcado nesta língua.
Contudo, nos seminários acima referidos foram feitas tentativas no sentido de reduzir a
quantidade de marcas tonais no texto escrito. A este respeito, foi sugerido que se deveria
considerar a relevância do tom com base na distinção que se faz em termos de tom
gramatical tom lexical e verificar a relevância de cada um deles para se decidir, sendo
apenas um tipo de tom a ser marcado, qual é que se deve marcar tendo em vista evitar a
ambiguidade que não pode ser evitada com base no contexto.

A este respeito, em algumas línguas foi notado que a marcação do tom gramatical se
afigurava indispensável. Portanto, deve ser marcado. Em outras línguas, foi sugerido
que todo o tom "menos frequente", seja gramatical ou lexical, deveria ser marcado,
Imaginando-se a dificuldade de marcação do tom por parte dos escreventes e escritores
das línguas moçambicanas, foi proposto que este acto só fosse obrigatório em trabalhos
científicos (gramáticas, dicionários, artigos científicos de análise linguística para
publicação em revistas ou livros/estudos de especialidade ou para apresentação em
eventos científicos, etc.).
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Nesta secção sobre o tom, não se vai entrar em detalhes sobre o estudo deste assunto, o
que poderá ser matéria de análise em estudos de línguas particulares. Nas subsecções
que se seguem vai-se proceder, de forma muito breve ao estudo do tom de acordo com a
sua função na língua, uma vez que nesta perspectiva este pode ser lexical ou gramatical.
Veja-se primeiro o tom lexical, a seguir.

14.2.1. Tom lexical


Fala-se de tom lexical quando este desempenha a sua função distintiva a nível do léxico.
Isto é, quando ele é portador do significado lexical, ou seja, quando duas palavras
podem ser incluídas no dicionário (com sentidos diferentes evidentemente) só porque se
distinguem a nível suprassegmental embora sejam iguais a nível segmental, como se
pode ver nos seguintes exemplos:

(31) Yao: a. katúundu bagagem' cf. katuúndu'cesto

pequeno

b. cipasta 'espaço cf. cipáátá 'doença

entreʼ ʼvenerea

Chang: a.'atar ʼ cf. kukhònà introduzir

b. kukhapà 'transbordar' cf. kukhàpà acom-panhar

Como se ilustra em nos exemplos acima, todas estas palavras têm de aparecer no
dicionário das respectivas línguas da maneira como estão aqui escritas. Caso contrário,
o leitor pode ser conduzido a uma ambiguidade, pois nenhum dos significados é
predizível sem a marcação do tom. Não obstante a sua importância nas línguas, em
muitos materiais escritos na maioria das línguas bantu o tom nunca aparece
representado. Uma consequência imediata disso é o facto de a leitura se transformar
num exercício de adivinha que exige um conhecimento resultante de prática antecipada,
quase memorização do texto (se for para ser lido em público) sob o risco de ele não ser
entendido.

14.2.2. Tom gramatical


O tom gramatical é aquele que aparece na gramática da língua, e não no dicionário. Por
outras palavras, o tom gramatical é aquele que serve para exprimir aspectos gramaticais
da língua. Por exemplo, às vezes, a diferença entre os tempos verbais pode ser expressa
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através do tom, o mesmo acontecendo com as diferenças de modos verbais, presença ou


ausência de marcas de objecto na estrutura da forma verbal, presença ou ausência de
marcas de negação ou 'ele quer de afirmação, etc. Mesmo este tom gramatical, que se
pode considerar indispensável, tem sido ignorado em muitos escritos destas

línguas. exemplo:

(32) Mak: a. ápali ‘ele não está cf. apali está

b. álota ele não vai cf. alota querer

Yao: a. citúkayice Siremos cf. citúkáyice 'que nós

Os exemplos em acima só são uma pequena ponta de iceberg. O leitor pode ver neles os
diferentes elementos gramaticais que cles indicam, detalhes que não serão vistos neste
espaço. Liphola 2001, e Hyman e Ngunga 1994) em relação às línguas referida em (32).
Os autores de materiais de alfabetização de lingua Makonde bem como os linguistas da
Sociedade Internacional de Linguística (SIL) que se dedicam ao estudo da desta língua
defendem que se marque o tom gramatical (nas formas verbais negativas).

Segundo eles, uma vez que o grafema h não tem nenhuma função nesta língua, propõe-
se que este seja usado para se marcar o tal tom. Assim, as formas da língua Makonde
dadas em (32) devem escritas, de acordo com o que se propõe, da seguinte maneira:

(33) Mak: a. hapali "ele) não está cf apali ʻ(ele)

b. halota (ele) não vai querer' cf. alota (ele)

quer

Portanto, o grafema na posição inicial das palavras hapali "ele) não está' e halota (ele)
não vai querer' representa o tom alto na primeira sílaba da palavra. É uma convenção sui
generis, jamais encontrada em manuais de fonologia. Mas é o que se propõe embora
careça de discussão aprofundada.

Os participantes do á referido Seminário de formação de autores de materiais de


alfabetização da língua Yao, realizado na Cidade de Lichinga em julho de 2000,
aceitaram que o tom alto porque relativamente raro deveria ser marcado fisicamente
para evitar que o leitor tenha sempre de repetir duas ou três vezes qualquer frase escrita
antes de dizê-la em voz alta, o que faria da leitura um exercício muito lento e, portanto,
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pouco produtivo. A aplicação desta proposta em Yao não se restringe ao tom


gramatical, ele estende-se ao tom lexical, uma proposta interessante cuja aplicação
precisa apenas de preparação dos escreventes e escritores.

14.2.3. Expansão tonal


O tom pode expandir-se uma mora (u) à esquerda ou à direita, dependendo das línguas.
Em Yao por exemplo, onde existem dois tons fonémicos (A e B), o fenómeno de
expansão tonal permite saber o número de padrões tonais existentes nesta língua como
se mostra a seguir:

Д Д

A partir desta regra pode-se concluir que nem sempre uma sequência tonal de superfície
corresponde a uma sequências subjacente, pois os tons que se vêem/ouvem à superfície
podem set resultado de regras de expansão tonal que tem as suas consequências como
sejam, permitir: (a) o aparecimento de dois tons adjacentes à superfície a partir de um
tom subjacente, (b) a associar um tom flutuante à mora seguinte. Considerem-se os se
guintes exemplos: dois tons adjacentes à superfície:

a. nguku ʻgalinhaʼ

b. jaangu ʻminhaʼ

A palavra ngúkn que aparece a nível subjacente (no dicionário), com um único tom,
aparece com dois tons à superfície (na gramática), ou seja, num sintagma em que ela
seja seguida por algum outro material.

c. ngúkú jaangu 'minha galinha

Neste caso aplica-se a regra de expansão formalizada em (34) onde o tom se expande
uma mora à direita.

j. associação de um tom flutuante à mora seguinte

a. kuwútúka 'correrʼ

b. cilo ‘noiteʼ
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A nível subjacente, cada uma destas duas palavras aparece, primeira com um único tom
que se expande uma mora à direita. A segunda com um único tom na última mom.
Quando as duas palavras se juntam para formar um sintagma, temos:

c. kuwútúka cíló 'correr à noite onde a primeira mora da segunda palavra já passa a
ter tom alto.

Como a última mora de kuwritúka continua com tom baixo, a única solução é
pensarmos que entre esta palavra e a seguinte havia um tom flutuante, um tom não
associado a nenhuma mora enquanto não houvesse material a seguir-lhe. Logo que
aparece o tal material, ele associa-se à primeira mom deste.

A última parte do proposto estudo dos suprassegmentos vai debruçar-se sobre o acento,
que será o tema da próxima subsecção.

14.3. Acento
Segundo KINDELL (1988) acento é a força articulatória e respiratória que se exerce
com maior intensidade sobre uma determinada porção (sílaba ou simplesmente vogal)
de uma palavra ou uma expressão que acaba sendo destacada em relação às outras. Em
transcrição fonética o acento representa-se marcando com uma espécie de "apóstrofo" ()
antes da sílaba acentuada. Em ortografia corrente de línguas onde este tem diferentes
funções, geralmente o acento é marcado através de um diacrítico (acento agudo ou outra
forma para o efeito convencionada). Nas diferentes línguas, o acento pode ter pelo
menos uma das três funções seguintes:

14.3.1. Função demarcativa

Função demarcativa é quando o acento é fixo, não muda de posição, é apenas um traço
da língua, como acontece tias seguintes línguas:

(36) Swahili: a. mapatano ʻacordarʼ

b. uzito ʻpesoʼ

Sena: a. masamba ʻfolhaʼ

Mapatano b. akumwe ʻ senhorʼ

Em todas as palavras dos exemplos em (36), a penúltima silaba é acentuada. Por


conseguinte, elas se pronunciam com uma duração ligeiramente maior do que as
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restantes sílabas. Todavia, dada à sua predizibilidade - o acento só ocorre na penúltima


silaba este não se marca na ortografia corrente. Contudo, o acento pode ocorrer, de
forma impredizível, em outras posições. Tal é o que acontece na língua portuguesa, por
exemplo, onde o acento tem a função demarcativa na penúltima sílaba, mas pode-se
encontrar também em outras sílabas com uma outra função:

14.3.2. Função distintiva


Função distintiva é quando o acento é usado para distinguir o sentido das palavras,
como se ilustra nos seguintes exemplos:

Port. a. fábrica (nome) cf. fabrica (verbo)

término (nome) cf. termino (verbo

b. maracujá cf. Paladino 2

Como se pode verificar, nos exemplos em (37) torna-se necessária a presença "física"
do acento uma vez que sem isso as palavras seriam ambíguas, isto é, não se poderia
distinguir os verbos dos substantivos. Em parte, esta língua funciona como as línguas
em (36), onde o acento na penúltima sílaba tem função demarcativa. Por isso, ele não é
marcado graficamente nesta posição. Contudo, quando o acento se desloca para uma
outra posição tal como acontece em (378) ou não (37b) podendo servir para distinguir
palavras, aí ele tem de ser marcado graficamente. Numa língua como o Português, o
acento gráfico marca-se também sempre que a sílaba proeminente for uma outra
diferente da penúltima, seja ela antepenúltima ou última (veja-se Mateus e Andrade
2000, para mais pormenores sobre o acento em Português). (ii) Função enfática, quando
o acento é usado para enfatizar uma determinada parte do discurso, da frase ou da
palavra, como se pode ver nos seguintes exemplos de Português:

Ex: Este é o meu sobrinho.

Em (38) vê-se que a palavra sobrinho que, como mandam as regras, tem acento na
penúltima sílaba por isso não é marcado graficamente possui um acento de ocasião
devido à importância que esta palavra ocupa nesta frase. Este acento, o acento enfático,
recai, neste caso, sobre a primeira sílaba sem, contudo, anular o seu acento 'natural que
recai sobre a penúltima silaba. Chegados aqui, pode-se considerar completa esta parte
sumária de aspectos de Fonética e Fonologia.
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15. Conclusão
Com esta pesquisa, esperamos aprofundar o conhecimento sobre "Bases Históricas do
Estudo das Línguas Africanas" e sobre os "Elementos de Fonética e Fonologia" na
cadeira de estrutura de línguas bantu de modo a diminuir as dificuldades no que tangem
aos bases e aos elementos que fizemos alusão. Esperamos também incentivar mais o
hábito de leitura e estudos a respeito dos elementos da fonética e da fonologia e o seu
envolvimento no estudo das línguas bantu.

Com este trabalho, encontramos todas as formas de compreender como as línguas de


grupo bantu funcionam a nível fonético e fonológico, conhecer as suas bases e
entendemos que estes elementos são importantíssimo para o estudo das línguas,
sobretudo das línguas bantu.

16. Referências Bibliográficas


NGUNGA, A. Introdução à Linguística Bantu. Maputo, Imprensa Universitária /UEM,
2004.

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