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FOTOS CONTAM UMA HISTÓRIA DE

PORTUGAL EM PELOTAS
REJANE BOTELHO
ANA MARGARIDA PORTELA

FOTOS CONTAM UMA HISTÓRIA


DE PORTUGAL EM PELOTAS

Editora e Gráfica Universitária


UFPel

2010
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 5

Índice

Agradecimentos.............................................................7

Apresentação.................................................................9

Introdução.....................................................................11

Painéis de azulejo de meados do século XX................19

Arte sacra.....................................................................49

Ornamentação cerâmica do século XIX.......................57

Clarabóias e estuques................................................143

Túmulos oitocentistas.................................................153

Caixilharias e gradeamentos do século XIX...............163

Conclusão...................................................................173

Bibliografia..................................................................174
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Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 7

Agradecimentos

A todos os mestres que


por tempos passaram por
nossas vidas, aqueles que
apreciam e julgam o ser pelo
fazer e pelo caráter e
potencial de cada indivíduo.

Aqueles que, mais uma


vez, acreditaram no meu
trabalho, em especial: Prof.
Dr. Volmar Nunes – Editora e
Gráfica Universitária – UFPel
e Prof. Dr. Francisco Queiroz.
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Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 9

Apresentação

Registro fotográfico e histórico do legado decorativo


português na cidade de Pelotas. Este surge de pesquisa
realizada para publicação do Livro “Detalhes de Uma
Princesa” em 2009 quando, ao fotografar estátua Europa, não
foi possível encontrar registros, ocasionando uma ampla
busca pela internet. Localizei em Portugal os Prof. Dr.
Francisco Queiroz e Draª Ana Margarida Portela, e via e-mail
convidei-os a realizarmos um livro fotográfico de acervo
português na cidade de Pelotas, cabendo a eles a pesquisa
histórica e a mim o conteúdo fotográfico.

Rejane Botelho
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Introdução

Em 2009, quando a fotógrafa Rejane Botelho


entrou em contacto comigo (e com o meu colega e consorte,
Francisco Queiroz), solicitando informações sobre uma
estátua em faiança de proveniência portuguesa, existente em
Pelotas, já há alguns anos que eu mantinha contacto e
intercâmbio com pesquisadores, estudantes e fotógrafos
brasileiros, sobre o tema da ornamentação cerâmica de
origem portuguesa aplicada à arquitectura brasileira da
segunda metade do século XIX e dos primeiros vinte anos do
século XX. Essa correspondência acumulada, acompanhada
de diversas fotos - remetidas a partir de numerosas partes do
Brasil, é de inestimável (e cada vez maior) valor para a
compreensão global do fenómeno da importação de
artefactos cerâmicos portugueses, após o período colonial.
De facto, para uma só pessoa, torna-se quase inviável
empreender um levantamento fotográfico intensivo das peças
cerâmicas ainda subsistentes, num país tão vasto quanto o
Brasil. Mesmo em Portugal, a despeito da sua relativa
pequenez, em cada saída que faço, para uma cidade ou vila
ainda não fotografada detalhadamente, encontro quase
sempre novas peças do género, algumas com características
originais e invulgares. Por outro lado, o grau de transformação
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urbana a que têm estado sujeitas as mais antigas cidades


brasileiras (em muitos casos, constatando-se a quase
destruição de toda a sua arquitectura vernacular anterior ao
século XX), fez com que várias destas peças decorativas
cerâmicas, aplicadas à arquitectura, sejam hoje já muito
raras, mesmo em cidades brasileiras que as terão tido com
relativa abundância, a julgar por relatos escritos e por fotos
antigas.

É neste contexto que me parece estar a emergir,


no Brasil, um crescente interesse por peças de origem
portuguesa aplicadas à arquitectura brasileira do período pós-
colonial, e não necessariamente apenas em cerâmica. A cada
vez maior raridade destes elementos decorativos tem também
despertado algumas sensibilidades para a necessidade do
seu estudo, preservação e valorização. Porém, apercebo-me
de que esta tendência é ainda incipiente.

Por conseguinte, o meu primeiro agradecimento vai


para a Rejane Botelho, pela oportunidade que me deu de
colaborar nesta publicação, a qual se deve ao seu sentido de
oportunidade e à sua visão alargada sobre o Património
pelotense. De facto, todo o livro foi por ela idealizado. Eu
somente sugeri que se colocassem umas fotos e não outras,
acrescentando depois os meus comentários. E se esses
comentários tiveram em conta a comparação com a
arquitectura portuguesa do mesmo período, com base no
conhecimento que acumulei sobre a produção de fábricas de
cerâmica portuguesas, assim como sobre ferros decorativos e
outras artes aplicadas em Portugal, devo ressaltar que foram
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também fundamentais os contributos até aqui recebidos de


várias partes do Brasil. Por serem muitos nomes, e de modo a
não incorrer em omissões, mencionarei apenas aquelas
pessoas (todas com formação superior em Arquitectura ou em
Artes Visuais), que me ajudaram, de um modo mais directo, a
conhecer melhor a História de Pelotas e da sua arquitectura:
Natalia Naumova; Annelise Montone (Museu da Baronesa);
Luisa Durán Rocca (e seu marido); Amanda Dutra Corrêa;
Ana Paula Neto de Faria; Roberto Sawitzki e Carlos Schramm
Régio. A todos, a minha gratidão.

Em Pelotas, felizmente, a destruição do casco


urbano anterior ao século XX não foi tão massiva como em
outras importantes cidades brasileiras. Além disso, em
Pelotas, creio que já está latente alguma sensibilização para o
valor patrimonial de uma certa arquitectura típica da cidade no
chamado "período romântico", como resultado da fusão de
várias influências externas e internas. Aliás, no momento em
que este livro é publicado, decorre um prometedor projecto,
coordenado pelo Professor Carlos Alberto Ávila Santos,
intitulado "Elementos funcionais e ornamentais da arquitetura
eclética pelotense: 1870-1931", no âmbito do Departamento
de Artes e Comunicação do Instituto de Artes e Design da
Universidade Federal de Pelotas. Entre os objectivos do
projecto, inclui-se a inventariação e estudo sobre a origem e a
utilização desses elementos funcionais e ornamentais das
fachadas da arquitectura historicista pelotense, sejam em
metal, em estuque, em madeira, em vidro, em faiança ou em
massa.
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É claro que este livro é bem mais modesto que o


projecto referido, pois não pretende constituir um inventário
exaustivo, incidindo somente em alguns elementos
decorativos de origem portuguesa, dadas as limitações de
tempo e o facto de todo o texto que acompanha as fotos ter
sido escrito à distância de alguns milhares de quilómetros de
Pelotas. Por outro lado, várias peças fotografadas não se
encontram já no seu contexto original (especialmente
estátuas e também alguns azulejos). Por tais motivos, e
também porque o meu conhecimento sobre Pelotas é
indirecto, muito fragmentado e parcial, é possível que este
livro contenha imprecisões e lacunas, no que diz respeito à
História de Pelotas e à nomeação de antigos proprietários dos
edifícios apresentados. Peço ao leitor que compreenda o
invulgar formato em que este livro foi feito e que, portanto,
tolere as eventuais falhas. Creio que a novidade e o principal
mérito deste livro encontram-se sobretudo nas explicações
dadas sobre as peças em si, assim como nas fotos que
ilustram o valor artístico dessas mesmas peças, captadas
pela Rejane Botelho com um quase espírito de missão.

Inicialmente, previa-se que fossem sobretudo


publicadas fotos sobre peças de cerâmica. Porém, porque
foram sendo encontradas peças em outros suportes com
clara influência portuguesa, julgámos mais interessante que
fosse dada uma visão alargada. Mais interessante e também
mais pedagógico. De facto, no Brasil, subsiste uma certa
tendência a considerar que a influência portuguesa na sua
arquitectura praticamente terminou logo depois da
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 15

independência, sendo que, a partir de então, ter-se-á feito


sentir sobretudo a influência francesa. Ora, embora se trate
de uma mistificação compreensível, com raízes que me
parecem já antigas e fundadas numa certa visão nacionalista
- tendente a valorizar sobretudo as influências externas não
portuguesas, como sinal de emancipação cultural face à
antiga metrópole - a verdade dos factos não corresponde
exactamente ao que ainda é crença comum nos meios
académicos brasileiros. Como, muito bem, se diz no sítio da
Internet do Instituto Portucale de Cerâmica Luso-Brasileira
(http://www.institutoportucale.com.br), a relação entre
Portugal e Brasil "inicia-se com o achamento do Brasil;
intensifica-se com a chegada da família Real Portuguesa, em
1808, e adquire novos contornos a partir do final do século
XIX, com a chegada de imigrantes e de capital portugueses".
Efectivamente, depois do período colonial, uma das principais
vertentes da influência da arquitectura portuguesa no Brasil
passou pela importação de artefactos cerâmicos. Não por
acaso, o referido instituto, situado em São Paulo, possui um
importante acervo de peças cerâmicas originalmente
concebidas em Portugal para decoração de fachadas e
jardins, as quais foram sendo adquiridas um pouco para todo
o Brasil, embora com maior expressão para as cidades
cosmopolitas e portuárias.

Porém, tal influência não se limitou à cerâmica.


Embora me pareça importante empreender estudos mais
aprofundados sobre esta questão, creio que foram
especialmente três, as principais vias de influência da
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arquitectura portuguesa no Brasil, logo depois do período


colonial. Pelotas parece ser bem o exemplo destas três vias
de influência, aqui propostas como uma mera hipótese de
trabalho, a requerer futuro aprofundamento e confronto com
outros casos. De facto, os indícios que foram recolhidos
apontam para uma prevalência da influência portuguesa:

- nas áreas artísticas complementares à arquitectura em que


os artistas portugueses se posicionavam ao mesmo nível dos
melhores artistas europeus - sobretudo, na azulejaria e na
estatuária cerâmica;

- no contexto de obras executadas por artistas de eventual


origem portuguesa, estabelecidos no Brasil - sobretudo na
serralharia e estuques;

- ou no contexto de obras executadas a mando de


encomendadores com raízes em Portugal, fossem imigrantes
de primeira geração, ou não – não só na azulejaria e
estatuária cerâmica, na serralharia e nos estuques; mas
também na marcenaria e no gosto arquitectónico em geral.

Apesar de tudo indicar que foi na área da cerâmica


(e da estatuária, em particular) que mais se notou a influência
portuguesa na arquitectura de Pelotas da segunda metade do
século XIX e dos primeiros anos do século XX, essa influência
principal não terá sido bem a mesma em outras cidades
brasileiras. Por conseguinte, existe um vasto campo de
pesquisa ainda por explorar no Brasil, o qual deve ser
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encarado sem preconceitos ideológicos e de forma


minimamente equidistante.

Através deste livro, espero ter despertado um


renovado interesse e ter contribuído com dados relevantes
para a história da arquitectura pelotense, assim como para a
história das relações artísticas entre Portugal e Brasil.

Ana Margarida Portela

Coimbra (Portugal), Fevereiro de 2010


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PAI NÉI S DE AZ UL EJ O

DE M EADO S DO SÉCULO XX
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Iniciamos com um painel de azulejos muito


interessante: uma alegoria à amizade entre Portugal e Brasil,
bem adequada para ornamentar a habitação de um imigrante
de origem portuguesa. Não por acaso, este painel -
encontrado na fachada de uma casa em Pelotas - foi também
escolhido para abrir este livro. Junto a uma espécie de
pedestal, apoiam-se duas meninas muito parecidas, como se
fossem duas irmãs em fraterno abraço. Cada qual envolve-se
numa bandeira nacional. Do lado da bandeira portuguesa, vê-
se, ao fundo, a Torre de Belém, em Lisboa. Do lado da
bandeira brasileira, vê-se, ao fundo, o morro do Pão de
Açúcar, no Rio de Janeiro. O facto das duas meninas estarem
representadas como enfermeiras, conta certamente o resto da
história, a qual dificilmente poderemos conhecer, em
concreto, sem que seja desvendada primeiramente a própria
história da casa e dos seus primeiros proprietários.
Este painel de azulejos foi executado na Fábrica
Aleluia, em Aveiro, provavelmente na década de 1950 (ou em
finais da década anterior), a julgar pela data de um outro
painel dessa fábrica, existente na mesma fachada.
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O tema do milagre da transformação dos pães em


rosas, protagonizado pela Rainha Santa Isabel, é bem
conhecido em Portugal, mesmo entre as franjas mais
populares, embora exista maior devoção à Rainha Santa na
região de Coimbra, onde se encontra o seu túmulo e onde se
celebram importantes festividades em sua honra. Desse
modo, e na sequência de um reflorescimento do recurso a
registos devocionais em azulejo para decorar fachadas, bem
notório em Portugal no período mais reaccionário da ditadura
do Estado Novo, também em terras lusas existem painéis
semelhantes a este. Foi sobretudo por volta da década de
1920, com prolongamento até à década de 1950 (e, em casos
de cariz mais popular, até quase à década de 1970), que
voltaram a ser aplicados pequenos painéis de azulejos com
temática religiosa, em fachadas de edifícios portugueses.
Geralmente imitando estampas coloridas da mesma época,
estes registos em azulejos expressavam normalmente a
especial devoção do dono da casa por um determinado santo,
na sequência do que fora relativamente comum em fachadas
urbanas portuguesas da segunda metade do século XVIII,
embora os exemplos mais antigos invocassem sobretudo os
santos patronos da respectiva cidade, os santos patronos da
família e, sobretudo, os santos protectores das casas contra
incêndios.
Portanto, este painel de azulejos em Pelotas
reflecte uma gosto popular português bem típico de meados
do século XX, sendo de notar que estão representadas, no
brasão, as armas dos reinos de Portugal e de Aragão, visto
que a Rainha Santa Isabel era aragonesa de origem, apesar
de ter sido Rainha de Portugal. Note-se a decoração, com
rosas, das molduras de inspiração barroca, lembrando a
célebre justificação dada pela rainha ao rei, seu marido,
quando este a interpelou, perguntando-lhe o que escondia no
seu regaço: "São rosas, senhor!". Devido a este milagre, de
se transformarem em rosas os pães que ela levava aos
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pobres, a figura da Rainha Santa Isabel tem sido associada à


assistência aos pobres e à caridade para com os mais fracos.
Como se mostra pela marca, este painel de
azulejos com a Rainha Santa foi feito também na Fábrica
Aleluia, provavelmente na década de 1940 ou 1950.

A Fábrica Aleluia, inicialmente designada por


Fábrica de João Aleluia & C.ª, foi fundada à volta de 1905 por
um grupo de cinco operários saídos da Fábrica de Cerâmica
da Fonte Nova, em Aveiro. A nova sociedade foi desfeita no
ano seguinte, permanecendo apenas João Pinho das Neves
Aleluia (nascido em 1876), que se manteve como gerente
técnico, artístico e comercial, até 1935, ano da sua morte.
Posteriormente, a fábrica manteve o seu carácter familiar,
embora modernizando-se e crescendo. Hoje, a Fábrica
Aleluia é uma das poucas fábricas portuguesas com tradição
na azulejaria decorativa que ainda labora. Uma vez que
produziu sobretudo para a região norte e centro de Portugal –
onde mais se utilizaram os registos em azulejos para
decoração de fachadas populares, a Fábrica Aleluia foi uma
das principais produtoras deste género de trabalho artístico.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 25
26 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

Estamos perante outro pequeno painel executado


pela Fábrica Aleluia, com uma assinatura que poderá
corresponder ao pintor F. Santos (José Augusto Ferreira dos
Santos). O estilo é bem típico desta fábrica, com molduras tão
ou mais coloridas quanto a cena central, de um gosto
revivalista que oscila entre o barroco e o neoclássico. O
registo em causa representa a cena bíblica da Fuga para o
Egipto e, provavelmente, reflecte a vivência pessoal da
respectiva família, pois aludirá talvez às dificuldades por que
passam quase todos os que se vêem forçados a empreender
grandes viagens, em busca de melhores condições de vida. A
representação pintada nos azulejos sugere que as provações
da migração podem ser ultrapassadas, quando os migrantes
são guiados pela fé – do mesmo modo que os anjos de Deus
surgem na representação, vigiando e guiando a Sagrada
Família. A execução deste painel por parte da Fábrica Aleluia,
em 1956, é um forte indício de que o mesmo foi adquirido por
imigrantes provenientes de Portugal. Aliás, o painel encontra-
se na mesma fachada em que se vê o painel que serve de
capa a este livro, aludindo à amizade entre Portugal e Brasil.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 27

Este painel de azulejos foi executado na Fábrica


Aleluia e, de acordo com a assinatura nele colocada, foi
pintado por Samuel Fartura, em 1946.
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Samuel Fartura já trabalhava na dita fábrica antes


de 1944, sendo um pintor experiente à época em que
executou o referido painel. Curiosamente, sabe-se que
Samuel Fartura migrou depois para o Brasil, onde esteve
vários anos, embora acabando por regressar à Fábrica
Aleluia1. Tratando-se de um painel de tema épico português, o
enquadramento é de gosto neomanuelino, encimado pela
inevitável esfera armilar, e também pela Cruz de Cristo; isto,
ao contrário do que era mais habitual em registos devocionais
executados pela Fábrica Aleluia, nessa época. Porém, é de
notar que a cena de Camões está pintada em azul sobre
fundo branco, havendo policromia apenas no enquadramento.
Portanto, pelo tipo de painel e pela sua paleta de cores, não
podemos deixar de verificar certas semelhanças com o estilo
do célebre pintor de azulejos, Jorge Colaço.

1 Devemos esta informação ao Sr. António Limas, antigo pintor da Fábrica Aleluia.
Sobre esta fábrica, contámos também com achegas da Dra. Isabel Moura Ferreira e
da Dra. Sofia Vechina.
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A partir do período romântico, a representação de


temas relativos aos Descobrimentos foi sempre muito querida
dos portugueses fixados longe da sua pátria, por óbvias
razões de patriotismo e de identificação pessoal de qualquer
migrante com essa grande saga. Neste painel, visível na
fachada de uma vivenda em Pelotas (o qual foi também
executado na Fábrica Aleluia), para além de ter sido pintada
uma nau a navegar em alto mar, foram igualmente
adicionados versos de Tomás Ribeiro, alusivos às glórias da
pátria portuguesa. Os versos são excerto do extenso poema
elegíaco intitulado "A Portugal", incluído na obra "D. Jaime",
de 1862. Esta obra, de profundo carácter nacionalista, reflecte
bem o estilo ultra-romântico do seu autor, Tomás Ribeiro.
Note-se que Tomás Ribeiro (1831-1901), embora fosse
formado em Direito, foi também jornalista, poeta e
dramaturgo. Ocupou numerosos cargos políticos, desde o de
presidente da Câmara Municipal de Tondela (concelho de
onde era natural) ao de ministro, e até mesmo ao de
embaixador de Portugal no Brasil (em finais do século XIX).
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 31

Esta é uma típica cena de costumes portugueses,


encontrada numa casa de Pelotas. Trata-se da vindima. A
julgar pela paisagem e pelos trajes, poderá dizer respeito à
Beira Litoral. A representação de costumes portugueses em
azulejos (e não só) foi muito usual em Portugal, sobretudo no
período do Estado Novo, como uma das várias expressões
nacionalistas dessa época de ditadura. Trata-se também de
uma obra executada na Fábrica Aleluia, de Aveiro.
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Este painel de azulejos, existente em Pelotas, é de


interpretação mais difícil. Por não termos apurado a história e
vivências da família proprietária da casa, não sabemos ainda
qual a razão da escolha desta representação, que não possui
qualquer relação evidente com Portugal. De qualquer modo, o
painel – possivelmente copiado de alguma estampa
internacional de costumes – está assinado pelo pintor Luís
Pinho e encontra-se datado de 1946. Este pintor, falecido há
mais de trinta anos, foi um dos principais executantes de
painéis figurativos na Fábrica Aleluia, tendo sido companheiro
de trabalho do já referido Samuel Fartura.
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Painel com a alegoria à velhice feliz - mais um


executado pela Fábrica Aleluia, de Aveiro. A obra está
assinada por Samuel Fartura, em 1946. Dois velhos
posicionam-se junto a uma mesa, enquanto a chaleira aquece
na lareira. Trata-se de um painel que alude ao casamento
indissolúvel, duradouro e feliz, dentro de uma linha moralista
típica dessa época, em Portugal. O painel era também
apropriado para representar o calor humano que se pretendia
sempre presente numa casa de família.
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Embora este painel tenha sido executado pela


Fábrica Aleluia, supomos que constituiu encomenda
propositada, pois o tema é gaúcho. Está representada uma
cena rural, talvez aludindo aos criadores de gado do Estado
do Rio Grande do Sul.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 35

Tal como o painel anteriormente mencionado, este


também é de produção portuguesa, mas representa uma
cena brasileira, mais concretamente a paisagem agreste do
Alto do Itatiaia. O painel foi pintado na Fábrica Aleluia, em
1946, por Luís Pinho.
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Este painel de costumes é de um tipo comum em


Portugal, no período da ditadura do Estado Novo, quando
imperaram as inevitáveis exortações patrióticas, moralistas ou
de incentivo ao trabalho – como é o caso desta, onde se lê
"Semeia e cria. Terás sempre alegria". A cena de sementeira
passa-se no Alto Minho, pois tal é perfeitamente identificável
pelos trajes. O painel foi pintado por Samuel Fartura, em
1946, sendo mais uma obra da Fábrica Aleluia existente em
Pelotas.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 37

Este painel representa uma das célebres aparições


de Nossa Senhora à jovem Bernardete Soubirous, numa gruta
situada em Lourdes (sul de França). Apesar de remontarem a
1858 as aparições, só nos primeiros anos do século XX
começou a sedimentar-se em Portugal a devoção popular a
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Nossa Senhora de Lourdes, na sequência do impulso dado


pelo influente Bispo de Coimbra, D. Manuel Correia dos
Bastos Pina, que, na sua Quinta da Costeira (na Carregosa,
Oliveira de Azeméis), mandou erigir um santuário mariano
com essa invocação, inaugurado em 1902, na presença de
milhares de pessoas.
Embora do mesmo género de alguns painéis da
Fábrica Aleluia apresentados neste livro, este registo
devocional de azulejos foi executado na Fábrica do
Carvalhinho e está assinado por F. Gonçalves. Trata-se, pois,
do pintor Fernando de Oliveira Gonçalves, nascido no
concelho de Gaia em 1924.
Desde muito novo que Fernando Gonçalves
ingressou na Fábrica do Carvalhinho, uma das unidades
cerâmicas portuguesas que mais produziu pequenos painéis
figurativos – devocionais, de costumes, publicitários ou de
outros tipos – na primeira metade do século XX. Aliás, o
próprio Fernando Gonçalves executou e assinou nessa
fábrica (onde trabalhou praticamente até ao seu
encerramento) outros painéis que ainda existem em Portugal,
alguns dos quais marcantes, como os do escadório do
Santuário de Nossa Senhora dos Remédios, em Lamego, ou
o do antigo Bazar dos Três Vinténs, na Rua de Cedofeita, no
Porto.
A Fábrica do Carvalhinho, cuja qualidade neste tipo
de obra figurativa é geralmente reconhecida, encerrou há
cerca de trinta anos. Hoje, dela resta apenas a chaminé das
instalações de Vila Nova de Gaia (construídas no início da
década de 1920), assim como as ruínas das primitivas
instalações, no Porto. De facto, a Fábrica do Carvalhinho
laborou primeiramente no Porto, desde cerca de 1840, tendo
produzido sobretudo azulejaria de padrão para fachadas e
interiores, até ao início do século XX, só depois investindo na
produção de painéis figurativos.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 39

Cena bucólica de um pastor, inspirada na obra


poética do português Bernadim Ribeiro, cujos versos também
foram pintados sobre os azulejos. Trata-se de um painel
apropriado para decoração de habitação unifamiliar, de um
tipo que também se usou em Portugal durante o século XX.
De certo modo, ainda se usam em Portugal painéis com
cenas bucólicas nas fachadas de algumas moradias
construídas de novo, em contextos menos eruditos, embora
com muito maior preponderância da parte figurativa face à
parte de texto. Este painel, em Pelotas, foi executado na
Fábrica Aleluia, e, apesar de ser todo pintado em azul sobre
fundo branco, datará talvez da mesma época dos outros
painéis da mesma fábrica já anteriormente apresentados.
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Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 41

Mais um painel executado na Fábrica Aleluia,


embora com temática brasileira; certamente uma encomenda
propositada. Está representado Catulo da Paixão Cearense
(1863-1946), natural de São Luís do Maranhão, mas que
viveu depois no sertão agreste cearense, onde eram
fazendeiros os seus avós maternos, portugueses. Em 1880,
Catulo mudou-se para o Rio de Janeiro, onde passou a tocar
as suas modinhas, granjeando fama. Compositor autodidacta
e poeta popular, Catulo conseguiu guindar o violão ao
patamar de instrumento respeitável, o que até então não
sucedia no Brasil.
42 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

Uma criança com cacho de uvas; outro painel


executado na Fábrica Aleluia, mas cuja opção temática não é
fácil de explicar, sem conhecer em detalhe a história dos
primeiros proprietários da casa pelotense onde se encontra.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 43

Também não é totalmente claro o motivo de ter


sido colocado, numa casa de Pelotas, este painel executado
na Fábrica Aleluia, com a representação de duas bem
conhecidas espécies de flores ornamentais: o antúrio e a
estrelícia.
44 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

Na mesma fachada de Pelotas em que se vê o


painel que é capa deste livro, existem igualmente dois
pequenos painéis de formato circular. Um deles representa
uma borboleta no seu ecossistema. O outro, mostra a espécie
de flor conhecida como Vitória Régia, típica da região
amazónica. O nome desta flor foi dado em homenagem à
Rainha Vitória, quando um explorador alemão, ao serviço da
Coroa Britânica, levou sementes desta flor para os jardins do
palácio real. Em ambos os casos, podem ter sido
encomendas propositadas à Fábrica Aleluia, ainda que, à
distância, não se vislumbrem as marcas desta fábrica
pintadas nos azulejos.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 45

Painel representando um parque romântico


palaciano, dotado de esfinges e lago, onde nadam cisnes,
tudo enquadrado por decoração de motivos renascença.
46 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

O painel anterior é também uma obra da Fábrica


Aleluia, pintada por Samuel Fartura. Não foi possível apurar o
motivo da escolha desta representação para a casa pelotense
onde se encontra, parecendo-nos que o tema é muito
epigonal, atendendo à época em que foram pintados os
azulejos.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 47
48 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

Registo devocional com temática apropriada à


colocação na frontaria de uma habitação unifamiliar, apelando
ao carácter protector do Anjo da Guarda. É um tipo de
representação que também surge em casas portuguesas. Nos
azulejos, foram pintadas duas crianças sobre uma ponte de
madeira velha e algo periclitante, sob o olhar vigilante do anjo.
Trata-se de mais uma obra da Fábrica Aleluia, datada de
1956.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 49

ART E SACRA
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Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 51

No acervo do Museu da Baronesa, existem duas


interessantes imagens sacras de proveniência portuguesa.
Uma delas representa Santa Luzia, o orago da capela para a
qual terá sido adquirida. De facto, estas imagens estiveram
outrora na capela do antigo Parque Pelotense, depois
conhecido como Parque Sousa Soares. Por conseguinte, é de
supor que tenham sido trazidas para Pelotas a mando de
José Álvares de Sousa Soares, Visconde de Sousa Soares
(1846-1911). Natural do concelho de Vila do Conde, José
Álvares de Sousa Soares ficou órfão quando era novo e optou
por emigrar para o Brasil, onde já se encontrava um seu
irmão mais velho. José Álvares de Sousa Soares acabaria por
casar, fixando-se em Pelotas em meados da década de 1870,
cidade onde se dedicou à botânica aplicada à medicina, tendo
sido o criador do célebre "Peitoral de Cambará", à custa do
qual amealhou rapidamente fortuna. No parque que mandou
constituir, inaugurado em 1883, fazia-se a recolha de plantas
para a sua indústria farmacêutica, havendo ali também outros
equipamentos, como um bairro operário, um refeitório e uma
escola, estruturas para recreio e lazer (incluindo estátuas), a
sua própria casa e a referida capela. José Álvares de Sousa
Soares regressaria a Portugal, onde fundou uma empresa de
produtos farmacêuticos, no Porto, a qual passou mais tarde a
ter o estabelecimento de Pelotas como filial. Portanto, na hora
de dotar, com imagens de santos, a capela do seu parque
pelotense, a opção mais óbvia foi adquirir as peças junto dos
melhores santeiros da região do Porto – quase todos de
algum modo filiados na chamada "escola de escultura" de
Gaia, da qual subsistem numerosas peças no Brasil,
sobretudo datadas da segunda metade do século XIX e do
primeiro quartel do século XX. De facto, embora abrangendo
mais do que uma geração e tendo muitos deles trabalhado
em oficinas próprias, esta "escola" constituía-se como um
grupo relativamente homogéneo de bons artistas
modeladores (em barro, em madeira ou em outros materiais).
Alguns granjearam mesmo bastante fama. Dado que tinham a
52 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

sua oficina no Porto ou em Vila Nova de Gaia, posicionavam-


se no pólo nevrálgico do norte de Portugal, região que
alimentou os principais fluxos migratórios portugueses para o
Brasil, nessa época. Portanto, naturalmente, muitos dos
portugueses que emigravam para o Brasil acabavam por
tomar conhecimento (directo ou indirecto) do trabalho destes
artistas, bastante mais facilmente do que sucederia face aos
artistas da capital portuguesa - Lisboa.

Entre os vários artistas pertencentes à referida


"escola de escultura" de Gaia, figura José Fernandes Caldas
(1866-1923), desenhador e escultor em madeira, o qual se
especializou na arte de santeiro e viveu em Vila Nova de
Gaia. Foi discípulo de João de Afonseca Lapa, também artista
modelador, do qual se sabe ter produzido várias obras para o
Brasil. Por outro lado, está documentada a colaboração de
José Fernandes Caldas e do seu antigo mestre João de
Afonseca Lapa com António Almeida da Costa, director da
Fábrica de Cerâmica das Devesas, também em Vila Nova de
Gaia. Esta fábrica, cujo principal protagonismo na modelação
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 53

era de José Joaquim Teixeira Lopes (pai do grande escultor


António Teixeira Lopes), produziu igualmente muitas peças
para o Brasil, e para Pelotas em particular, como se poderá
aferir nas páginas seguintes. Todos estes nomes pertenciam,
directa ou indirectamente, à referida "escola" de escultores de
Gaia. Era habitual que colaborassem entre si, de modo mais
ou menos frequente, unindo-se as suas famílias em
casamento e apadrinhando os filhos uns dos outros. Aliás,
José Fernandes Caldas foi pai de um outro escultor, José
Fernandes de Sousa Caldas, nascido em Gaia no ano de
1894, o qual foi apadrinhado pelo referido estatuário José
Joaquim Teixeira Lopes, director artístico da Fábrica de
Cerâmica das Devesas. Por outro lado, José Fernandes
Caldas foi mestre de um outro importante escultor de Gaia:
Diogo de Macedo.
Na mencionada imagem de Santa Luzia, assim
como naquela que se aborda em seguida – ambas
executadas em 1901 e colocadas na respectiva capela em
1903 – o santeiro José Fernandes Caldas contou com a ajuda
do pintor Albino Barbosa. Esta parceria não terá sido
acidental, pois estão documentadas outras imagens sacras
esculpidas por José Fernandes Caldas e pintadas a carácter
por Albino Barbosa.
Note-se que José Fernandes Caldas acrescentou,
à sua assinatura, a indicação "Portugal – V. N. de Gaya",
indiciando que a obra foi mesmo encomendada
propositadamente para o Brasil.
54 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 55

Outra obra do santeiro José Fernandes Caldas e


com pintura de Albino Barbosa, adquirida para a capela do
antigo Parque Sousa Soares, é este santo beneditino, com o
seu hábito negro, báculo e mitra aos pés. É possível que se
trate do próprio S. Bento, segurando a regra, embora fosse
mais habitual retratar o fundador desta ordem religiosa como
um ancião.
56 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

Albino Pinto Rodrigues Barbosa, artista ainda


injustamente omitido das principais obras sobre história da
arte portuguesa, viveu também em Vila Nova de Gaia.
Estudou na Academia Portuense de Belas Artes, em meados
da década de 1880, sendo, portanto, da mesma geração de
José Fernandes Caldas. Também Albino Barbosa estava
ligado, por razões de amizade e parentesco, à "escola de
escultura" de Gaia, até porque colaborou com a Fábrica de
Cerâmica das Devesas, na pintura de azulejos figurativos.
Apesar disso, Albino Barbosa não era propriamente escultor
ou ceramista. Era, sim, professor de desenho, retratista e
pintor, pintando sobretudo sobre cerâmica ou madeira. Foi um
dos pioneiros da fotografia retocada sobre porcelana e
também um dos mais talentosos pintores de santos, em
Portugal. A célebre imagem da Rainha Santa Isabel,
encomendada pela Rainha D. Amélia para a cidade de
Coimbra, foi por ele pintada, embora não tenha sido esculpida
por José Fernandes Caldas, mas sim por António Teixeira
Lopes, que era cunhado de Albino Barbosa. Curiosamente, a
imagem de Santa Luzia existente no Museu da Baronesa e a
imagem da Rainha Santa Isabel existente em Coimbra
apresentam diversas semelhanças na pintura, que é de
grande delicadeza e sobriedade.
Por último, refira-se que a bibliografia consultada
alude a outras peças de arte sacra existentes em Pelotas,
importadas de Portugal em finais do século XIX,
nomeadamente as que foram adquiridas para a Capela da
Beneficência Portuguesa.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 57

O RNAM ENT AÇÃO CERÂM I CA DO SÉCULO XI X


58 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

A influência da já referida "escola de escultura" de


Gaia parece ter sido ainda mais notória ao nível da
ornamentação cerâmica para aplicação em edifícios
pelotenses, a julgar pelos exemplos subsistentes. De facto,
aquando da elaboração deste livro, quase todas as peças
cerâmicas fotografadas em frontarias de Pelotas foram
identificadas como sendo de origem portuguesa e, dessas,
todas foram produzidas no Porto / Vila Nova de Gaia, tendo
sido certamente embarcadas para Pelotas através da foz do
Rio Douro. Destacam-se, sobretudo, as estátuas alegóricas,
mas também os balaústres, vasos e globos de remate, figuras
de animais e ainda alguns azulejos. O próprio palacete que é
hoje o Museu Parque da Baronesa recebeu diversas estátuas
executadas na Fábrica de Cerâmica das Devesas, de Vila
Nova de Gaia. Porém, ao nível de estátuas, o exemplo mais
antigo seleccionado para este livro saiu de uma outra fábrica
de Gaia – a de Santo António do Vale da Piedade, a qual
ficou conhecida no Brasil como "Fábrica de Santo Antônio do
Porto", pois tinha o seu depósito e loja no Porto, embora
apenas a escassas centenas de metros do seu edifício fabril,
situado do outro lado do rio.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 59
60 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

Esta estátua em cerâmica vidrada representa a


Europa. Embora o modelo que deu origem a esta estátua seja
de concepção anterior, a estátua propriamente dita terá sido
executada após cerca de 1865, devido ao tipo de caracteres
pintados na peanha. Porém, não deverá ser posterior a 1890.
A esta alegoria da Europa falta parte do braço que,
provavelmente, seguraria um ceptro, atendendo a outra
estátua de igual modelo que conhecemos. Esta estátua da
Europa existente em Pelotas poderá já não ter a cabeça na
sua posição original, tendo em conta que existe uma fenda na
zona do pescoço e que a cabeça está virada numa direcção
ligeiramente diferente daquela que se vê na outra
mencionada estátua de igual modelo.
Note-se, ainda, que a referida Europa executada
na Fábrica de Santo António do Vale da Piedade não está no
sítio original e os azulejos que se vêem em segundo plano
não parecem ser sequer de fabrico português. Geralmente, no
Brasil, esta estátua é emparelhada com uma similar
representando a América (no caso do proprietário ser um
imigrante europeu) ou, em conjuntos mais vastos
(nomeadamente em jardins), também complementada com a
África e a Ásia. Em casos raros, surge ainda a estátua da
Oceânia, como o quinto continente.
Refira-se que a Fábrica de Santo António de Vale da
Piedade foi das primeiras em Portugal a produzir estatuária
cerâmica para jardins, logo depois da instauração do
liberalismo em Portugal (1834), embora a unidade fabril
remonte a finais do século XVIII. A Fábrica de Santo António
do Vale da Piedade recebeu fôrmas e mão de obra
especializada proveniente da Fábrica de Miragaia, quando
esta entrou em crise, pelo que – no estado actual da
investigação – não é ainda possível saber se o modelo que
deu origem a esta estátua da Europa, localizada em Pelotas,
foi originalmente concebido na Fábrica de Santo António do
Vale da Piedade ou na Fábrica de Miragaia. Portanto,
hesitamos em atribuir a autoria desta estátua da Europa a um
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 61

determinado modelador. De qualquer modo, durante as


primeiras três décadas do liberalismo português, a estatuária
produzida pela Fábrica de Santo António do Vale da Piedade
foi muito clássica e algo estática em termos anatómicos,
sobressaindo a sua qualidade especialmente ao nível do
vidrado e dos detalhes dos atributos, muitas vezes feitos à
medida do gosto do cliente. Nas duas décadas seguintes, a
Fábrica de Santo António do Vale da Piedade terá
encomendado novos modelos para estatuária,
nomeadamente a dois dos melhores artistas portugueses da
época, ambos radicados em Gaia: António Soares dos Reis –
considerado o maior escultor português do século XIX; e José
Joaquim Teixeira Lopes – o qual, logo depois, viria a ser co-
fundador da Fábrica de Cerâmica das Devesas, onde laborou
durante cerca de quarenta anos, tendo concebido grande
parte dos modelos do seu catálogo de figuras alegóricas.
Apesar da Fábrica de Santo António do Vale da
Piedade ter produzido muitos artefactos para destinos
brasileiros, nomeadamente ao nível de estatuária e de outros
ornamentos cerâmicos para exteriores, a Fábrica de
Cerâmica das Devesas – fundada em meados da década de
1860 – viria a retirar-lhe a preponderância na exportação para
o Brasil, poucos anos depois de ter sido fundada. Portanto,
quando começaram a ser erguidos os principais casarões
eclécticos pelotenses, a Fábrica de Cerâmica das Devesas já
se posicionava como a melhor opção portuguesa para adquirir
elementos de remate destinados às novas fachadas, dado
que as suas estátuas eram bem modeladas e quase todas de
maior dimensão que as da Fábrica de Santo António do Vale
da Piedade, sendo estas mais apropriadas para colocação em
jardins, de modo a serem vistas de perto.
62 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

O palacete do Barão dos Três Serros, Aníbal


Antunes Maciel – actual Museu da Baronesa – é um exemplo
concreto de como a Fábrica de Cerâmica das Devesas terá
suplantado a Fábrica de Santo António do Vale da Piedade,
ao nível do volume de exportação de estátuas para o Brasil,
logo no início da época em que os edifícios novos (ou com
fachadas reformadas) deixaram de possuir o tradicional beiral,
passando a apresentar platibandas. De facto, são obra da
Fábrica de Cerâmica das Devesas, todas as estátuas que
podemos ver nos vários alçados do Museu da Baronesa –
palacete de um dos ramos da influente família Antunes
Maciel. São também todas elas em fosco (ou seja, não
vidradas), ao contrário do que foi habitual na produção da
Fábrica de Santo António do Vale da Piedade.
Estas estátuas de remate extravasam a fachada
principal do edifício do Museu da Baronesa, solução que – em
Portugal – também pode ser observada, embora apenas
numa minoria de edifícios de finais de Oitocentos e dos
primeiros anos do século XX. É claro que o edifício do Museu
da Baronesa também é um caso singular em Pelotas.
Contudo, em conjunto com outros, erigidos ou reformados no
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 63

último terço do século XIX e ainda subsistentes, este palacete


do Barão dos Três Serros reforça a ideia de que terá
vigorado, na época, um especial gosto pela estatuária
cerâmica para coroamento de vários alçados de um mesmo
edifício.
Apesar destas estátuas, no Museu da Baronesa,
fazerem parte de duas séries recorrentes neste tipo de
decoração arquitectónica – as estações do ano e os atributos
profissionais dos proprietários da casa (nomeadamente, o
Comércio, a Indústria, a Agricultura e as Artes) – séries estas
que, em edifícios portugueses, são usualmente dispostas com
uma certa lógica, o seu posicionamento no mencionado
palacete parece ter sido algo arbitrário e caprichoso. Também
é possível que as estátuas existentes no Museu da Baronesa
– no todo, ou em parte – já não se encontrem na sua posição
original, até porque vêem-se dois exemplares iguais de
algumas delas, encimando o edifício.
Em seguida, fazemos uma breve referência a
algumas das estátuas que coroam o Museu da Baronesa. No
entanto, convém recordar que nos baseámos em fotografias e
que a reportagem fotográfica não foi exaustiva. Além disso, as
mencionadas estátuas sofreram consideráveis danos e
mutilações ao longo do tempo, tendo sido também objecto de
restauros incorrectos e não informados, nas partes em falta,
prejudicando seriamente a correcta leitura visual das
mesmas. Portanto, foi impossível determinar todo o programa
iconológico deste conjunto de estatuária (se é que o programa
fazia realmente sentido e era passível de completa
determinação) e foi também extremamente difícil identificar
todas as estátuas das quais vimos fotografias, mesmo
confrontando-as com os modelos originais, constantes nos
catálogos da Fábrica de Cerâmica das Devesas. Por tudo
isto, é natural que possamos incorrer em algum erro de
análise. Será necessário mais algum estudo, para se
compreender integralmente este conjunto de peças.
64 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

Refira-se que a família Antunes Maciel, à qual se


liga o Museu Parque da Baronesa, tem raízes portuguesas,
mais concretamente em Viana do Castelo. Porém, os
primeiros proprietários do palacete oitocentista onde se
encontra o museu não eram imigrantes de primeira geração,
pois já no século XVII há notícia da presença dos Antunes
Maciel no Brasil. Ora, em 1863, um descendente – o Coronel
Aníbal Antunes Maciel – terá comprado esta chácara (embora
a casa existente não fosse ainda o palacete que hoje aí se vê)
para a oferecer ao seu filho homónimo, futuro Barão dos Três
Serros, aquando do seu enlace com Amélia Fortunata Hartley
de Brito. O casamento ocorreu em 1864. Posteriormente, o
casal terá mandado edificar o palacete, o qual servia como
residência de Verão. No Inverno, a família costumava ficar no
Rio de Janeiro. Note-se que o Barão dos Três Serros era
negociante de gado e que recebeu este título por ter
participado do acto que emancipou os escravos de Pelotas
em 1884 (quatro anos antes da abolição geral). Aliás, não foi
o único barão pelotense que recebeu título de nobreza devido
a acções abolicionistas.
A família Antunes Maciel ficou conhecida em
Pelotas pelos seus actos de caridade pública, tão típicos dos
novos titulares da época, em busca de projecção social,
apesar de não se poder considerar propriamente como
"novos-ricos" os Antunes Maciel da segunda metade do
século XIX, pois há muito que eram das mais influentes
famílias do Rio Grande do Sul. Aliás, outros membros desta
família eram igualmente proprietários de casarões em
Pelotas, nomeadamente de dois bem conhecidos palacetes
na Praça Coronel Pedro Osório, a ilustrar mais adiante: o do
2º Barão de Cacequi e o do 1º Barão de São Luís, primos do
Barão dos Três Serros. Não terá sido por acaso que todos os
três casarões dos três barões pelotenses de apelidos Antunes
Maciel receberam estátuas da Fábrica de Cerâmica das
Devesas para coroar as respectivas fachadas.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 65

Estátua do Estio, no palacete de Aníbal Antunes Maciel, o Barão dos


Três Serros (actual Museu da Baronesa).
66 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

Embora esta versão feminina da alegoria do Verão


tenha saído da Fábrica de Cerâmica das Devesas, o seu
braço direito já não é o de origem e nem sequer está na
posição correcta, de acordo com o modelo da fábrica,
faltando-lhe igualmente a foice. Do lado esquerdo, a estátua
segura um molho de cereais. O que também não faz parte do
modelo original – e, por certo, não foi adicionado
propositadamente pela Fábrica das Devesas aquando da
execução (tendo em conta a fraca modelação e o material
utilizado), é a flor que está na zona da cintura, do lado direito,
a qual não se vê nesta foto.

Estátuas do Estio e, em segundo plano, do Inverno, no palacete do


Barão dos Três Serros (actual Museu da Baronesa).
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 67

A Fábrica de Cerâmica das Devesas foi a maior e a


melhor fábrica portuguesa de cerâmica ornamental para
edifícios, devendo muito do sucesso que teve ao talento dos
seus fundadores: o talento para a arte e a dedicação de José
Joaquim Teixeira Lopes (1837-1918) e o talento para o
negócio e a versatilidade de António Almeida da Costa (1832-
1915), o qual começou como modesto canteiro e terminou a
sua vida como abastado e respeitado industrial. Em volta da
sua fábrica, gravitaram alguns dos melhores artistas
executantes de Gaia e do Porto, não só na área da cerâmica,
mas também na das cantarias de ornato, na do ferro, e
outras, pois a Fábrica das Devesas produzia em vários
materiais. Apesar disso, foram os artefactos em cerâmica, e
sobretudo os de remate para fachadas (assim como os
destinados a telhados), aqueles que encontraram maior
aceitação no Brasil.
A Fábrica de Cerâmica das Devesas teve também,
como sócio, Feliciano Rodrigues da Rocha (1841-1930),
embora a sua acção na fábrica tenha sido mais discreta, até
porque não se terá desviado muito da sua formação prática
em cantaria de mármores.
Refira-se que a Fábrica de Cerâmica das Devesas
encerrou há cerca de vinte e cinco anos, época em que já se
previa que viesse a ser transformada em museu. Porém, até
hoje, nada foi concretizado, o que se traduziu em irreparáveis
perdas patrimoniais.
68 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

Estátua do Inverno, no palacete do Barão dos Três Serros (actual


Museu da Baronesa).
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 69

Embora já não ostentando o seu habitual atributo –


uma braseira aos pés – e tendo sofrido diversas mutilações, a
estátua da página anterior corresponde a um dos modelos
para a alegoria do Inverno constante dos catálogos da
Fábrica de Cerâmica das Devesas.
70 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

Estátua de Portugal, no palacete do Barão dos Três Serros (actual


Museu da Baronesa).
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 71

A esta estátua de Portugal, executada pela Fábrica


de Cerâmica das Devesas, faltam-lhe os respectivos
atributos: a lança e o escudo. Note-se que a cabeça e a mão
esquerda já não são as originais, para além não serem
sequer semelhantes, na dimensão e na estética, ao modelo
oitocentista. O recurso a esta alegoria de Portugal fazia todo o
sentido, num palacete cujo proprietário tinha raízes
portuguesas. Aliás, inversamente, em terras lusas também se
encontra ocasionalmente esta figura alegórica, emparelhando
com a do Brasil, em edifícios cujos antigos proprietários,
sendo portugueses, haviam estado emigrados no Brasil.
72 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

Estátua do Comércio, no palacete do Barão dos Três Serros (actual


Museu da Baronesa).
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 73

A Fábrica de Cerâmica das Devesas produziu mais


do que uma versão da alegoria do Comércio. Esta, que aqui
vemos, é uma figura feminina e foi representada com um
embrulho de encomenda debaixo de um dos pés. Falta-lhe já
o caduceu, que estaria na sua mão direita. Aliás, todo o seu
antebraço direito já não é o original. Refira-se que a bolsa
com moedas também parece ter sido adulterada e que este
modelo de alegoria, em versão vidrada e em melhor estado
de conservação, pode ser apreciado também na fachada de
outro casarão de um Antunes Maciel, em Pelotas (a abordar).
74 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

Estátua do Outono, no palacete do Barão dos Três Serros (actual


Museu da Baronesa).
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 75

Quanto a este Outono, note-se que, ao nível do


tronco, ele foi executado com a mesma fôrma usada para
executar o Comércio que também coroa este palacete. A
diferença está apenas em dois dos atributos. De facto, este
Outono – apesar de mutilado – tem, sob um dos pés, uma
cornucópia com frutos (símbolo da abundância das principais
colheitas, que, na Europa, se fazem nesta estação do ano) e,
numa das mãos, seguraria também um cacho de uvas.
76 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

Estátua das Artes, no palacete do Barão dos Três Serros (actual


Museu da Baronesa).
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 77

Este modelo para a alegoria das Artes também foi


parcialmente adoptado pela Fábrica de Cerâmica das
Devesas para produzir outras alegorias, mudando-se-lhes os
atributos, a posição das mãos e até mesmo a cabeça e o
penteado.
O carácter modular das fôrmas era bem
característico da estatuária cerâmica produzida em Portugal
no século XIX, pois a Fábrica de Cerâmica das Devesas não
foi a única a recorrer a um só tronco para produzir diferentes
figuras, ou a intercambiar braços, pernas e outras partes,
entre vários tipos de figuras alegóricas. Isso permitia, em
alguns casos, estátuas quase feitas ao gosto do cliente.
Os atributos que a Fábrica de Cerâmica das
Devesas afectou a esta alegoria das Artes estavam,
obviamente, relacionados com os variados ofícios artísticos.
Porém, este exemplar no Museu da Baronesa já perdeu os
atributos originais, pelo que a identificação que fazemos desta
estátua está sujeita a alguma margem de erro.
78 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 79

Esta peça chama-se "Petizes e pato com tronco" e


existe também no palacete de Aníbal Antunes Maciel, Barão
dos Três Serros (actual Museu da Baronesa). É em faiança e
foi originalmente concebida para rematar pequenos
chafarizes, com a água a brotar do bico do pato – o qual já
está mutilado, no caso do exemplar existente no museu.
80 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 81

Como já se referiu anteriormente, José Joaquim


Teixeira Lopes foi o principal modelador de estatuária da
Fábrica de Cerâmica das Devesas, sendo o seu estilo
reconhecível pela serenidade e aspecto clássico que
geralmente imprimia às suas figuras, sobretudo ao nível dos
rostos. Porém, o seu filho António Teixeira Lopes (1866-
1942), sobretudo quando era mais novo, modelou também
algumas figuras para esta fábrica.
É possível que este grupo, com dois meninos e um
pato, tenha sido obra de António Teixeira Lopes, dado o
naturalismo que brota da sua modelação, e que é bastante
evidente nos cabelos dos meninos.
Note-se que a Fábrica de Cerâmica das Devesas
também produziu uma versão deste grupo sem o tronco, e
ainda uma outra com o tronco diferente daquele que se vê na
foto.
82 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 83

A Fábrica de Cerâmica das Devesas também


produziu estátuas alegóricas apropriadas para o coroamento
de edifícios religiosos. É bem disso exemplo o edifício da
Santa Casa da Misericórdia de Pelotas. De facto, no
coroamento do frontispício da sua capela de São João
Baptista – edificada sob a responsabilidade de José Isella
Merotti e de Guilherme Marcucci, entre 1877 e 1884 – vêem-
se duas figuras alegóricas cerâmicas de gosto clássico, em
fosco. Uma delas é a Fé, cujo estilo sugere ter sido baseada
em modelo de José Joaquim Teixeira Lopes.
Note-se que esta estátua fabricava-se em
cerâmica, mas o atributo da cruz era adicionado em outro
material, nomeadamente a madeira ou o ferro. Por
conseguinte, em Portugal, as várias estátuas da Fé que
conhecemos deste modelo possuem geralmente cruzes de
diferentes tipos, algumas já não sendo as originais. Neste
caso, em Pelotas, a cruz também não é certamente a original,
pois é feita de cimento, sendo desproporcionada face ao
tamanho das mãos que a seguram.
84 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 85

Também na fachada principal da dita capela da


Misericórdia de Pelotas, e do lado oposto da Fé, encontra-se
esta outra estátua da Fábrica de Cerâmica das Devesas, a
qual representa a Caridade. Trata-se de uma das versões da
Caridade que a fábrica produziu, na qual a figura feminina
amamenta a criança que está no seu colo, enquanto outra se
coloca aos sus pés. Refira-se que existem alguns edifícios
assistenciais em Portugal onde as mesmas duas estátuas
podem ser vistas no coroamento das fachadas. Aliás, estas
estátuas da Fé e da Caridade também podem ser admiradas
em grandes túmulos de cemitérios portugueses. Porém, é
muito habitual que sejam acompanhadas de uma terceira
estátua: a da Esperança. Em conjunto, formam as três
principais virtudes cristãs.
Curiosamente, no quarteirão da Santa Casa da
Misericórdia de Pelotas, as três estátuas não surgem no
mesmo prospecto arquitectónico. De facto, era habitual
colocar ao centro a da Fé, no topo da empena ou frontão.
Porém, na fachada da capela da Misericórdia de Pelotas, o
topo é marcado por uma cruz, que – por si mesma – já
simboliza a fé, tornando até redundante o recurso à estátua
da Fé nesta fachada. Assim, não havendo lugar para a
estátua da Esperança na fachada da capela, ela foi colocada
no coroamento do alçado lateral do edifício da Santa Casa,
emparelhando com a estátua da Consciência, que é também
uma outra virtude.
86 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 87

A Fábrica de Cerâmica das Devesas enviou para


Pelotas, pelo menos, mais uma estátua da Consciência.
Trata-se deste exemplar em faiança vidrada, existente no
interior da Secretaria de Cultura. Como se pode verificar, a
fábrica servia-se de uma mesma fôrma para produzir a
alegoria da Consciência e também a da Fé. Apenas alguns
detalhes são diferentes. Por um lado, a alegoria da
Consciência está representada com um coração entre as
mãos, envolto numa fita. Por outro, os pés desta estátua
assentam numa base onde foram modelados ramos e flores,
ao invés do modelo da Fé, cuja base não possui estes
motivos. Segundo o célebre tratadista de iconologia, Cesare
Ripa, esta alegoria deveria ser representada com uma fita a
envolver um coração, de modo a conter um dístico em grego
sobre os atributos da Consciência. Aos pés da figura,
estariam simultaneamente flores e espinhos. A ideia era
simbolizar a necessidade de ter consciência do caminho a
escolher: o da virtude ou o do vício.
Infelizmente, a estátua da Consciência
representada na foto já não se encontra no seu contexto
original e nem sequer apurámos com exactidão de onde terá
vindo, apesar de se supor que coroaria a fachada de um
edifício em Pelotas, tal como a estátua do Inverno que surge
na foto seguinte.
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Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 89

Uma outra estátua da Fábrica de Cerâmica das


Devesas, existente hoje no interior da Secretaria de Cultura,
representa o Inverno. Note-se que a dita fábrica produziu
duas variantes deste modelo de Inverno, embora em ambos
os casos se trate de uma figura velha, como recomendavam
os cânones iconográficos. Na variante mais antiga, o seu
modelador - José Joaquim Teixeira Lopes - recorreu a uma
solução pouco convencional, que foi a de colocar a figura com
parcas vestes (ao ponto de mal cobrirem metade do corpo),
sendo estas de pele de animal. Desse modo, José Joaquim
Teixeira Lopes pôde conferir à imagem a expressão de frio,
dada através da posição das pernas, encolhidas, com um pé
sobre o outro; e também pelo facto de parecer que uma das
mãos se aquece no próprio bafo, enquanto a outra tenta
aconchegar a pele do animal ao corpo, como se não fosse
suficiente o aquecimento gerado pela pequena chama que
está a seus pés, servindo a braseira apenas como mero
atributo adicionado. Estava-se em meados da década de
1860, quando José Joaquim Teixeira Lopes concebeu esta
figura. A Fábrica de Cerâmica das Devesas assumia assim –
e em contraponto com o que fazia, até então, a Fábrica de
Santo António do Vale da Piedade – o início de uma nova
fase na produção de estatuária cerâmica portuguesa para
exteriores: figuras mais elegantes, um pouco mais
expressivas e menos presas a cânones, embora ainda
neoclássicas. Ora, o modelo do Inverno que vemos na foto da
página anterior é de outra variante: não está parcialmente
envolto numa pele de animal, mas sim numa túnica; possui a
mesma pose, mas nota-se menos expressividade, embora a
figura seja de muito boa qualidade.
Refira-se que existe um Inverno igual a este, no
coroamento da fachada do casarão que foi de Francisco
Antunes Maciel (2º Barão de Cacequi), a abordar mais
adiante. Nesta outra estátua do Inverno, ainda se pode ver a
flâmula da braseira. Esta flâmula já não existe, na estátua que
se mostra na página anterior.
90 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 91

Esta foto reporta-se a mais um modelo do Inverno


produzido pela Fábrica de Cerâmica das Devesas.
Juntamente com a alegoria do Estio apresentada na foto
seguinte, esta estátua do Inverno posiciona-se na fachada de
uma habitação da primeira metade de Oitocentos, ampliada e
reformada em finais desse século pelo português Eduardo
Mesquita de Menezes (situada na Rua Andrade Neves, em
Pelotas).
Em alternativa ao modelo do Inverno já
anteriormente referido (nas suas duas variantes), a Fábrica de
Cerâmica das Devesas também colocou ao dispor dos
clientes outros dois modelos, femininos e mais convencionais.
Em ambos os casos, as vestes cobrem ostensivamente a
figura. Porém, no outro modelo feminino – que não aquele
representado na foto – a figura coloca uma das mãos sobre a
chama, de forma a reforçar a ideia de frio.
92 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

Nesta foto, vemos mais um dos modelos que a


Fábrica de Cerâmica das Devesas concebeu para a alegoria
do Estio, a qual segura uma foice na sua mão direita e um
molho de cereal no outro braço. Trata-se de mais uma obra
provavelmente baseada em modelo de José Joaquim Teixeira
Lopes.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 93

Também nas históricas charqueadas de Pelotas,


foram sendo colocadas peças de ornamentação cerâmica
com origem portuguesa, sobretudo na segunda metade do
século XIX. É o caso da Charqueada São João, a qual terá
sido construída por volta de 1810, a mando do imigrante
português António José Gonçalves Chaves, cujo apelido
adoptado indicia, precisamente, a sua origem na região de
Chaves (norte de Portugal). Foi político, escritor de
convicções abolicionistas, negociante e uma das maiores
figuras do ciclo económico do charque. Aquando da
Revolução Farroupilha, juntou-se à facção republicana. Após
o assassinato do preceptor das suas filhas, retirou-se para o
Uruguai, onde estabeleceu uma outra charqueada e onde
viria a falecer, em Montevideu, no ano de 1837. António José
Gonçalves Chaves foi casado com Maria do Carmo Seco, de
quem teve vários filhos, entre os quais o político António José
Gonçalves Chaves Filho (Pelotas, 1813 – Rio de Janeiro,
1871), ainda a abordar mais à frente.
94 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 95

A Charqueada São João foi sendo renovada


esteticamente nas décadas que se seguiram à morte do seu
fundador, e mesmo durante o século XX, pelo que reflecte
uma certa amálgama de épocas, não sendo hoje tão clara a
influência portuguesa – a qual seria mais evidente em finais
do século XIX.
Em tempos idos, existiram no jardim desta
charqueada algumas estátuas de cerâmica, as quais
corresponderiam aos cinco continentes: América, África,
Europa, Ásia e Oceânia. Ora, para além do que resta da
estátua da América (foto da página anterior), subsiste
igualmente nesta charqueada a estátua de Minerva (foto
seguinte), ambas executadas na Fábrica de Cerâmica das
Devesas. Em relação às restantes estátuas, não obtivemos
mais informações em tempo útil, mas supomos que fossem
obra da mesma fábrica.
Também a referida estátua da América, em faiança
vidrada, foi feita com base num modelo de José Joaquim
Teixeira Lopes. O dito modelo já existia em finais da década
de 1860. Porém, nos inícios do século XX, ainda a fábrica
executava reproduções desta estátua. Subsistiram várias
iguais em Portugal, quer no topo de fachadas, quer em
jardins, conjuntamente com as alegorias de outros
continentes.
96 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 97

Quanto a esta estátua de Minerva, corresponde a


uma figura mitológica muito menos usada em Portugal,
embora não tenha sido somente a Fábrica de Cerâmica das
Devesas a conceber um modelo para a estátua de Minerva.
Portanto, embora estas estátuas da América e de Minerva
sejam bem posteriores à construção da Charqueada São
João (dado que a Fábrica de Cerâmica das Devesas só foi
fundada em meados da década de 1860), não temos
elementos para apontar a época exacta em que foram
colocadas na dita charqueada.
Refira-se que também se encontra uma estátua de
Minerva no Museu da Baronesa, do mesmo modelo e em tão
mau estado de conservação como esta que vemos na foto.
98 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 99

Este globo é obra da Fábrica de Cerâmica das


Devesas. Trata-se de uma peça desenhada para rematar
fachadas, a qual foi sendo produzida durante os últimos vinte
anos do século XIX e os primeiros dez anos do século XX,
quer em fosco, quer vidrada e com ligeiros marmoreados
azuis – como é o caso desta. O nome correcto da peça é
"globo com cabeça de carneiro", pertencendo este exemplar
ao acervo da Charqueada São João. Como é óbvio, encontra-
se hoje fora do seu contexto original.
100 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

Recebimento da Charqueada São João, vendo-se um portal com um


pequeno painel de azulejos, por cima do arco.

Temos muitas dúvidas sobre a época em que


foram colocados aqui os quatro azulejos da foto, pois os
mesmos foram concebidos para revestimento e não para este
tipo de apontamentos decorativos arquitectónicos. De
qualquer modo, o padrão de azulejo é oitocentista e, quase de
certeza, proveniente de Portugal.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 101

Este padrão de azulejo, existente na Charqueada


São João, é uma variante muito pouco habitual do "padrão
floral tipo Miragaia", padrão esse que foi muito usado no
revestimento de fachadas do Porto e de outros núcleos
urbanos do norte de Portugal. É possível que estes azulejos
em Pelotas tenham sido produzidos por uma fábrica do Porto
/ Vila Nova de Gaia.
102 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

Tal como os azulejos da


foto anterior, também estes
azulejos encontram-se a decorar
um portal da Charqueada São
João, embora cercando-o
totalmente e formando friso,
apesar dos azulejos terem sido
concebidos para formar um
padrão de revestimento. Portanto,
a época em que foram colocados
em volta do referido portal pode
ter sido posterior à aquisição dos
mesmos para a charqueada,
supondo que os ditos azulejos
foram mesmo adquiridos
originalmente para esta
propriedade no século XIX –
época em que os mesmos terão
sido produzidos.
Tal como os azulejos da
foto anterior, também estes
azulejos foram provavelmente
executados numa fábrica do Porto
/ Vila Nova de Gaia, talvez mesmo
a de Santo António do Vale da
Piedade, a qual sabemos ter
produzido azulejos deste gosto
floral e monocromático, entre
cerca de 1840 e cerca de 1880.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 103

Esta figura de leão é uma de duas que a Fábrica


de Santo António do Vale da Piedade terá executado para a
habitação do riquíssimo charqueador Joaquim José de
Assunção, 1º Barão do Jarau, concluída talvez em 1876,
atendendo à data assinalada na fachada principal. É
precisamente na entrada de um pátio anexo a esta casa que
aparecem as duas figuras de leão, em cerâmica vidrada,
pintadas a carácter. Formando um par, no coroamento dos
flancos do portal, estas figuras como que guardam a entrada
– função que poderia ser igualmente desempenhado por um
par de cães no mesmo material, pois a Fábrica de Santo
António do Vale da Piedade, assim como outras (a Fábrica de
Cerâmica das Devesas e a sua vizinha Fábrica Pereira
Valente, por exemplo), também produziram figuras de cães
para esse fim. Fossem leões ou cães, as peças cerâmicas
colocadas, em par, sobre as ombreiras dos portais tiveram
uso generalizado em Portugal, ao longo da segunda metade
do século XIX e nos primeiros anos do século XX.
104 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 105

Para além de figuras alegóricas, mitológicas,


religiosas e de animais, as fábricas de cerâmica portuguesas
– especialmente a Fábrica de Cerâmica das Devesas –
lograram colocar em Pelotas outro tipo de figuras de remate.
Em 1879, José António Campos mandou edificar o casarão
onde se encontra a estátua desta foto e a da foto seguinte,
edifício esse que foi depois da sua viúva, Maria Jacinta Dias
Campos, e ainda hoje se pode apreciar, na Rua Barão de
Santa Tecla. O pórtico que alberga a escadaria de acesso à
residência possui um tecto com florão de estuque,
semelhante a alguns tectos portugueses da segunda metade
do século XIX, sobretudo no norte do país. Este pórtico é
ladeado por pilares, onde assentam as duas estátuas, em
faiança vidrada. Na primeira foto, temos a "bailarina com
castanholas".
106 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 107

Nesta segunda foto do casarão da família Campos,


temos a "bailarina com coroa no braço", também da Fábrica
de Cerâmica das Devesas. Note-se que esta fábrica propunha
nos seus catálogos mais dois tipos de bailarinas: uma com
pandeireta e outra dançando com as mãos na cintura. Estas
estátuas de bailarinas eram muito apropriadas para fachadas
de teatros e de clubes recreativos, sendo que, em Portugal,
há alguns casos desse tipo de utilização. Desconhecemos,
porém, quais os motivos da colocação das duas bailarinas na
fachada do casarão Campos. Dado o modo como foram
colocadas e o local onde estão, lembram vagamente duas
figuras de convite barrocas, como se estivessem a dar as
boas-vindas a quem entrasse naquela casa, embora de um
modo mais jovial e – aos olhos dos mais conservadores –
talvez despropositado e de mau-gosto, tratando-se de uma
casa de família.
108 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 109

Esta estátua da América é outra obra da Fábrica de


Cerâmica das Devesas. Está na fachada da casa que
pertenceu a Cândida G. Dias, concluída em 1875, sob a
responsabilidade dos construtores José Isella Merotti e seu
irmão Bartolomeu (que viria a falecer durante a obra).
Localiza-se na Rua Andrade Neves, sendo mais conhecida
como "Casa Amarela". Na sua platibanda, existem balaústres
de faiança vidrada que serão também obra da Fábrica de
Cerâmica das Devesas, do mesmo modelo daqueles que se
encontram no importante conjunto de três palacetes da Praça
Coronel Pedro Osório (a referir mais adiante): o palacete do
Barão de Butuí (antiga casa do charqueador Viana), o de
Leopoldo Antunes Maciel (Barão de São Luís) e o de
Francisco Antunes Maciel (2º Barão de Cacequi).
Na chamada "Casa Amarela", ou de Cândida Dias,
existem igualmente vasos altos ornados, produzidos pela
mesma fábrica, iguais aos que surgem no referido palacete de
Francisco Antunes Maciel.
110 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 111

É muito interessante o modelo da estátua da


América existente na "Casa Amarela" (e que também existe
no mencionado palacete de Francisco Antunes Maciel, 2º
Barão de Cacequi), não sendo o mesmo modelo da já
apresentada América existente na Charqueada São João.
A Fábrica de Cerâmica das Devesas possuía
vários modelos para as figuras alegóricas mais solicitadas,
deduzindo-se que a América seria uma das mais adquiridas
para o Brasil, por razões óbvias. O modelo da América que se
vê na "Casa Amarela" deve-se, mais uma vez, ao talento de
José Joaquim Teixeira Lopes. Trata-se de uma figura
feminina, trajando de indígena, tendo um arco de flecha na
sua mão direita (já desaparecido, no caso do exemplar que se
vê na foto, até porque este arco era feito em outro material
que não a cerâmica). O braço esquerdo da estátua está
flectido para as costas, de modo a ir buscar uma flecha ao
seu carcaz. Para ter mais consistência, a estátua apoia-se
num tronco de texturas relevadas, talvez apelando ao
exotismo da floresta amazónica.
A outra estátua que existe na "Casa Amarela" (ou
de Cândida Dias) é a da Primavera (foto da página seguinte).
No palacete de Francisco Antunes Maciel (a abordar adiante)
existe uma estátua igual a esta Primavera, também ela
segurando uma grinalda de flores e estando coroada com
mais flores. A sua veste, assim como a mantilha, foram
primorosamente decoradas com um desenho puncionado,
imitando tecido rendado, conferindo-lhe assim um ar mais
jovial e fresco – tal como deve apresentar-se a Primavera.
112 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 113

Nesta foto, podemos ver um detalhe do alçado


lateral do casarão situado na esquina das ruas Marechal
Floriano e Barão de Santa Tecla. O edifício foi erguido em
1881 para a família do Comendador Faustino Trápaga, não só
atendendo à data e ao monograma – que surgem, em massa,
no frontispício do palacete – mas também devido ao facto do
prédio ter sido doado por Carmen Trápaga Simões, na
década de 1960, de modo a ali funcionar a Escola de Belas
Artes. Esta senhora era filha do referido Faustino Trápaga e
de sua mulher Vitoriana Zorrilla (ambos naturais de Espanha),
os quais casaram em Pelotas no ano de 1868, época em que
também aqui casou um irmão daquele, chamado Bernardo
Saenz Trápaga.
A habitação da família Trápaga é claramente
ecléctica, pois são notórias as evocações góticas no piso
superior, apesar de possuir uma balaustrada cerâmica mais
clássica, guarnecida de estátuas. São quatro as estátuas de
coroamento, todas saídas da Fábrica de Cerâmica das
Devesas, com as suas bem conhecidas características
classicizantes, em termos da pose das figuras e dos seus
panejamentos.
Uma delas é a América – não a do modelo que
está no topo da "Casa Amarela" (ou de Cândida Dias), mas
sim do mesmo modelo daquela que se encontra na
Charqueada S. João, abordada anteriormente.
114 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 115

Na habitação dos Trápaga, emparelhando com a


América, existe igualmente uma estátua alegórica da África,
correspondendo ao modelo n.º 20 no catálogo de 1910 da
Fábrica de Cerâmica das Devesas. É claro que a concepção
do modelo será vários anos anterior ao dito catálogo, ou não
teria sido colocada nesta fachada pelotense por volta de
1881. De qualquer modo, a Fábrica de Cerâmica das
Devesas produziu vários modelos da África e este terá sido
dos que menor aceitação teve em Portugal, pois raramente é
encontrado. Esta versão da África foi representada com uma
presa de elefante (a qual já não existe neste exemplar em
Pelotas) e uma pele de leão (atrás da estátua), estando a
figura a segurar uma cornucópia com folhelho de milho no
interior, de acordo com os cânones iconológicos há muito
estabelecidos para esta alegoria.
Note-se que, mesmo sendo imigrantes espanhóis, o
edifício de habitação dos Trápaga possui artefactos
portugueses, sugerindo que a escolha dos artefactos não se
devia apenas a uma mera identificação patriótica e saudosista
com a produção artística portuguesa, mas igualmente à boa
qualidade dos seus produtos e – eventualmente – também a
um processo de imitação da elite pelotense com origem
portuguesa, que claramente dominava a cidade, no último
terço de Oitocentos. É certo que Carmen Trápaga (filha do
primeiro proprietário do casarão em causa) casou com
Francisco de Paula Simões (Pelotas, 1874 – Pelotas, 1959),
filho de Francisco de Sales Lopes e de Teresa Augusta de
Resende. Ora, Francisco de Sales Lopes (Pelotas, 1846 –
Pelotas, 1914), foi gerado no primeiro casamento do 1º
Visconde da Graça (1817-1893), o qual era filho de um
imigrante português em Pelotas. Porém, o enlace de Carmen
Trápaga com Francisco de Paula Simões deu-se somente em
1906, cerca de vinte e cinco anos depois de concluído o
casarão que estamos a analisar. Por outro lado, não temos
indicação de que fosse português o arquitecto que riscou este
edifício, nem sequer as suas características o sugerem,
116 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

excepto quanto aos remates cerâmicos e balaustrada. Aliás,


encontrámos mesmo uma vaga referência de que o projecto
para o casarão dos Trápaga teria sido feito em Espanha.
Refira-se que, já em 1877 – e tal como sucedia em
várias cidades portuguesas – a Fábrica de Cerâmica das
Devesas mantinha no Brasil um depósito oficial para venda
dos seus produtos, situado no Rio de Janeiro, na Rua 7 de
Setembro, n.º 145. Portanto, e tratando-se de uma habitação
de família não portuguesa, cremos mais provável que as
peças cerâmicas ornamentais do casarão dos Trápaga
tenham sido adquiridas nesse depósito, ou então num outro
de criação posterior que ainda não esteja documentado,
nomeadamente no Rio Grande do Sul. Algum negociante de
Pelotas com origem portuguesa pode ter sido representante
da Fábrica de Cerâmica das Devesas e isso também
explicaria o facto desta fábrica ter, aparentemente, dominado
o mercado gaúcho de artefactos cerâmicos para exteriores. A
aquisição, pela família Trápaga, também pode ter sido feita
por encomenda directa à fábrica, após visionamento de um
catálogo, embora, para essa época, não estejam
documentados catálogos (estruturados como tal) da Fábrica
de Cerâmica das Devesas.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 117

Na fachada mais comprida do casarão dos


Trápaga, voltada à Rua Barão de Santa Tecla, encontram-se
as estátuas da Gratidão e da Náiade (na foto), saídas
igualmente da Fábrica de Cerâmica das Devesas.
Note-se que a estátua da Náiade resulta algo
bizarra nesta fachada, pois é uma ninfa aquática e cremos
que foi concebida sobretudo para guarnecer chafarizes de
jardim, jorrando a água a partir do seu cântaro. Porém,
também em Portugal nos surge este modelo de Náiade nas
duas posições possíveis: jorrando água (em espaldares de
chafariz), ou no topo de fachadas (em edifícios mais tardios e
menos eruditos). Esta constatação levar-nos-ia longe, caso
dissertássemos sobre a aparente ignorância que alguns
encomendadores demonstravam relativamente ao significado
e aos propósitos decorativos originais das estátuas que
adquiriam, não só no Brasil, mas também em Portugal.
118 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

Na Náiade que encima a fachada principal do


casarão dos Trápaga, o cântaro encontra-se adulterado e
tapado com massa. De qualquer modo, a estátua, em faiança
vidrada de branco, está em razoável estado de conservação,
evidenciando-se, assim, o virtuosismo da modelação de José
Joaquim Teixeira Lopes e a sua filiação assumida no gosto
clássico.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 119
120 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

Em relação à figura da Gratidão existente no


casarão dos Trápaga (foto da página anterior), refira-se que
existem em Pelotas mais dois exemplares, do mesmo
modelo, ambos no palacete de Leopoldo Antunes Maciel
(Barão de São Luís), a abordar adiante.
Em Portugal, esta estátua surge com maior
frequência em túmulos oitocentistas, pois trata-se de uma
alegoria que se prestava a ser usada por quem queria
expressar gratidão pública a alguém. No entanto, também
existem alguns locais em Portugal onde a alegoria da
Gratidão surge associada a estátuas das restantes virtudes:
Fé, Esperança e Caridade (e também a Consciência),
nomeadamente em jardins de santuários e em alguns outros
edifícios religiosos ou assistenciais.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 121

Nesta imponente habitação dos Trápaga, existem


igualmente dois globos em faiança, com estrelas pintadas em
azul, assim como balaústres de faiança.
Relativamente aos globos, supomos que sejam de
fabrico português. Embora a Fábrica de Cerâmica das
Devesas tenha produzido vários tipos de globos, os que aqui
vemos em Pelotas não são totalmente iguais aos que a dita
fábrica possuía em catálogo, sobretudo atendendo ao
pedestal relativamente elevado e marmoreado. Mesmo assim,
o mais provável é que sejam também obra da Fábrica de
Cerâmica das Devesas.
Quanto aos balaústres do casarão dos Trápaga,
são mesmo da Fábrica de Cerâmica das Devesas, surgindo
no catálogo de 1910 com o n.º 541. Apesar disso, são de
modelo diferente daquele que se vê, não só na balaustrada
da casa que foi de Cândida Dias (a já referida "Casa
Amarela"), mas também nas balaustradas das três fachadas
contíguas de palacetes da Praça Coronel Pedro Osório, a
abordar em seguida (do 2º Barão de Cacequi; do Barão de S.
Luís e do Barão de Butuí - antiga casa do charqueador
Viana). Em todos estes casos, os balaústres constam com o
n.º 540, no catálogo de 1910 da Fábrica de Cerâmica das
Devesas.
122 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

O palacete da família do Barão de S. Luís,


Leopoldo Antunes Maciel (1850-1904), cuja fachada principal
se vê parcialmente nesta foto, possui a data de 1879 no
frontão, remetendo para o ano de conclusão do edifício. Este
casarão foi construído na importante Praça Coronel Pedro
Osório, onde – cerca de um ano antes – havia sido concluído
outro palacete, precisamente contíguo a este e pertencente a
um parente do Barão de São Luís: Francisco Antunes Maciel,
o 2º Barão de Cacequi (a abordar).
O projecto da edificação do palacete do Barão de
S. Luís dever-se-á ao arquitecto italiano José Isella Merotti.
Trata-se de um majestoso edifício decorado com ornamentos
de massa, quer na platibanda, quer emoldurando portas e
janelas, e até mesmo simulando pilastras. As platibandas,
parcialmente rasgadas em balaustradas, possuem balaústres
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 123

em faiança e estátuas no mesmo material, saídas da Fábrica


de Cerâmica das Devesas.
Convém referir que a cozinha deste casarão, assim
como a do contíguo palacete do 2º Barão de Cacequi,
alegadamente possuíam revestimento azulejar importado de
França. Porém, a Fábrica de Cerâmica das Devesas produzia
azulejo tão bom ou melhor que o azulejo francês
supostamente adquirido para as ditas cozinhas. É certo que
os produtos franceses eram geralmente vistos como mais
cosmopolitas. Porém, a cozinha era uma divisão da casa
divorciada da rua e que geralmente não estava sequer
acessível aos convidados. Por conseguinte, a suposta opção
por azulejaria francesa, em detrimento daquela que era
produzida pela mesma fábrica que forneceu a ornamentação
cerâmica da fachada do palacete, levanta questões, para as
quais ainda não temos resposta definitiva.
Já quanto ao facto da azulejaria de fachada não ter
surgido nessa época como moda em Pelotas – apesar disso
ter sucedido nas principais cidades portuguesas – podemos
adiantar algumas razões, como mera hipótese de trabalho.
Efectivamente, mesmo tendo em conta a destruição
sistemática de edifícios anteriores ao século XX no centro de
muitas cidades do Brasil, os indícios existentes apontam para
o facto da azulejaria de fachada ter despontado, com maior
ou menor grau, como fenómeno artístico típico do período
romântico, naquelas cidades brasileiras mais cosmopolitas ou
de maior influência portuguesa (como Rio de Janeiro,
Salvador da Baía, Belém do Pará, São Luís do Maranhão e
Recife). Porém, na mesma época, Pelotas era também uma
cidade dinâmica, em franco crescimento e de aspirações
cosmopolitas. Como explicar que o seu casario histórico
subsistente não inclua várias fachadas completamente
revestidas de azulejaria oitocentista, nomeadamente de
produção portuguesa, quando outras peças cerâmicas de
proveniência portuguesa surgem em várias das suas
fachadas do último terço do século XIX?
124 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

Por um lado, há que considerar a falta de boa


pedra para construção nos arredores da cidade, o que terá
levado, naturalmente, à emergência de uma importante classe
de rebocadores mais dotados, treinados para simular a
cantaria com massa. Por outro lado, tudo indica que as
principais construções pelotenses da segunda metade do
século XIX – aquelas que serviriam de modelo para as
demais – foram sobretudo desenhadas por imigrantes
italianos. Estes, obviamente, proporiam soluções baseadas
na sua experiência visual e formação adquirida no país de
origem, privilegiando especialmente as soluções clássicas
mais decorativas e eclécticas, as quais deveriam ser
materializadas em pedra de cantaria mas que, em Pelotas,
acabaram por ser substituídas por sucedâneos engenhosos e
menos dispendiosos: os trabalhos decorativos em massa.
Supomos ainda que os arquitectos de origem italiana em
Pelotas, também por questões de filiação cultural e estética,
facilmente proporiam balaustradas e platibandas com remates
escultóricos nos seus prédios, simulando, em pequena
escala, toda a tradição italiana da escultura aplicada a
fachadas palacianas e de grandes igrejas. E, de facto,
existem igualmente vários casos de fachadas pelotenses do
último terço de Oitocentos em que os referidos mestres
rebocadores terão criado em massa esses remates
pretendidos. É claro que, fazer em massa uma estátua, era
muito complicado e a solução poderia ser desastrosa em
termos estéticos, se a modelação não fosse atribuída a um
estatuário habilitado. Portanto, para os mais abastados
pelotenses de origem portuguesa, perante projectos de
arquitectura que previam remates elaborados e de execução
mais difícil, a solução preferível era adquirir no exterior peças
escultóricas já feitas, de boa qualidade. Assim, também
destacariam os seus edifícios daqueles que apenas
ostentavam remates em massa, produzidos localmente. Uma
vez que, em Itália, a estatuária dessa época era sobretudo
produzida em pedra e pensada para jardins ou fachadas de
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 125

palácios de maior dimensão – tornando-se, pois, muito


dispendiosa a importação de estátuas neste material nobre –
a solução mais viável para os encomendadores pelotenses
era a cerâmica. Ora, em Portugal havia boas fábricas a
produzir esses artefactos, sobretudo no Porto / Vila Nova de
Gaia. Portanto. Parece-nos, pois, lógico que os mesmos
artefactos fossem adquiridos (directa ou indirectamente) em
Portugal para – ironicamente – complementar o gosto
italianizante das fachadas dos mais elitistas edifícios
pelotenses. Uma vez que essas fachadas – com esse gosto
de feição italiana e com esse desenho volumétrico de
molduras – eram esteticamente quase incompatíveis com a
solução do completo revestimento exterior através de
azulejos, o fenómeno da azulejaria de fachada não tinha
grandes condições para se implantar em Pelotas. De qualquer
modo, há registos de casas pelotenses que ainda possuem
silhares de azulejaria portuguesa oitocentista, em alguns
compartimentos, para além de outros azulejos portugueses da
mesma época que não estão já no contexto original, como os
que foram aqui apresentados para a Charqueada São João.
126 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 127

Com a excepção das duas estátuas que ladeiam o


frontão, as restantes que surgem no palacete da família de
Leopoldo Antunes Maciel (Barão de São Luís), reportam-se a
alegorias profissionais saídas da Fábrica de Cerâmica das
Devesas: Indústria (na foto da página anterior), Comércio (na
foto da página seguinte), Agricultura e Artes.
Note-se que esta estátua da Indústria, assim como
a do Comércio e a das Artes, são de modelo idêntico às das
mesmas figuras alegóricas posicionadas na fachada do actual
Museu da Baronesa – casarão esse que pertencia a outro
ramo da família Antunes Maciel. Porém, as do Museu da
Baronesa (já mencionadas) são em fosco e estão em muito
pior estado de conservação. A Indústria que se encontra na
fachada do palacete do Barão de S. Luís está quase
completa, faltando-lhe apenas dois atributos. Um deles, que
se posicionava entre a bigorna e o braço esquerdo, era
também em faiança e terá partido. O outro – um martelo
empunhado pelo braço direito – não era em faiança.
128 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 129

Como já referimos anteriormente, a Fábrica das


Devesas produziu várias versões da alegoria do Comércio.
Esta, no palacete do Barão de São Luís, é a mesma versão
feminina que se vê no Museu da Baronesa, representada com
um embrulho de encomenda debaixo de um dos pés e com
uma bolsa aberta cheia de moedas, na sua mão esquerda.
Falta-lhe, porém, o caduceu, que estaria na outra mão.
130 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 131

Nesta foto, vemos a alegoria da Gratidão, existente


no coroamento da fachada principal do palacete do Barão de
S. Luís. Como já referimos, subsiste idêntica estátua no
casarão da família Trápaga. Contudo, no edifício do Barão de
São Luís, existem duas estátuas da Gratidão em posição
simétrica, nos flancos do frontão. Ora, supondo que as
estátuas iguais foram colocadas originalmente nesta posição,
estamos perante uma solução iconológica algo ingénua e
caprichosa; ou então uma solução assertiva, deixando
entrever alguma faceta menos conhecida da história da casa,
ou da biografia do seu primeiro proprietário.
132 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 133

Tanto nesta foto, como na seguinte (em primeiro


plano), podemos ver uma das versões concebidas pela
Fábrica de Cerâmica das Devesas para a alegoria da
Agricultura. Ora, a fôrma do corpo que foi usada para
executar esta estátua da Agricultura, foi a mesma que
permitiu a execução da estátua do Estio, subsistente no
actual Museu da Baronesa. Existem, porém, diferenças entre
as mencionadas estátuas, pois foram usados dois modelos
diferentes para a cabeça (e respectivo penteado), sendo que
um dos atributos também é diferente: enquanto que esta
Agricultura tem um cacho de uvas na mão, o Estio existente
no Museu da Baronesa segura uma foice.

Enquadramento da mesma estátua da Agricultura que se vê na foto


anterior.
134 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

Ao lado do casarão do Barão de S. Luís, existe um


outro, com mirante, o qual pertenceu à família do Barão do
Butuí. Nesta foto, vê-se parcialmente o referido mirante, em
plano secundário e mais elevado. No entanto, a casa
ecléctica à qual pertence o mirante é a adaptação de uma
outra, de feição arquitectónica colonial, a qual pertencia ao
charqueador José Vieira Viana. Por volta de 1880, essa
edificação mais antiga foi adquirida pelo também charqueador
José António Moreira (primeiro e único Barão de Butuí),
supostamente com o intuito de a oferecer ao seu filho Ângelo
Gonçalves Moreira (fruto do seu segundo casamento). Para
as obras de reforma e ampliação, terá sido contratado o
inevitável José Isella Merotti, arquitecto que já havia
projectado as duas outras construções da família Antunes
Maciel, com o n.º 8 (a abordar de seguida) e com o n.º 6
(abordada anteriormente), situadas mesmo ao lado. Note-se
que uma das filhas do Barão de Butuí casou com o Barão de
São Luís (Leopoldo Antunes Maciel), proprietário da dita casa
n.º 6, contígua à que o Barão de Butuí adquiriu e que fôra de
José Vieira Viana. Por outro lado, o Barão de Butuí teve
também por genro o Conselheiro Francisco Antunes Maciel
(2º Barão de Cacequi), cuja casa era a já mencionada n.º 8 e
situava-se logo a seguir à do Barão de São Luís. Portanto, a
quase completa unidade estética destes três casarões da
Praça Coronel Pedro Osório deveu-se certamente a razões
de parentesco, tendo uma (a n.º 8) sido construída por volta
de 1878; a outra (a n.º 6) construída em 1879; e, a que foi
adquirida pelo Barão de Butuí (a n.º 2), reformada por volta de
1880.
Terá sido aquando dessa profunda reforma que a
casa recebeu a platibanda com vasos de remate, assim como
os estuques, a abordar mais adiante. Ora, numa fotografia
antiga de Pelotas, podemos ver que este palacete era
igualmente coroado de estátuas, quer no mirante, quer na
fachada principal, embora não tenhamos apurado se
existiriam também estátuas na fachada lateral, mais
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 135

comprida. É provável que existissem, sobretudo, porque o tipo


de coroamento é semelhante ao da fachada principal,
proporcionado-se a ser complementado com estátuas (ou
outros artefactos de remate). Além disso, era usual – em
Pelotas e mesmo em Portugal – colocar-se estátuas nas
fachadas laterais dos edifícios de gaveto que tinham também
estátuas na fachada principal. A própria casa dos Trápaga
segue essa tendência.
As estátuas que se localizavam na fachada do
casarão n.º 2 da Praça Coronel Pedro Osório, já não estão no
local. No entanto, pelo tipo de vulto que se vê das mesmas
(na referida foto antiga); pelo facto do casarão ter sido
reformado ainda no século XIX e ter recebido certamente as
estátuas nessa época; e também porque as casas ao lado
ostentavam estátuas da Fábrica de Cerâmica das Devesas (o
que serviria de influência, atendendo igualmente à sequência
cronológica das obras das três casas e aos laços de
parentesco entre os seus proprietários), supomos que as
primitivas estátuas nesta casa do mirante fossem da mesma
fábrica de Gaia. Porém, as estátuas que hoje se vêem no
mirante propriamente dito não parecem ter proveniência
portuguesa e podem ser até já posteriores às obras de cerca
de 1880, embora ainda não conheçamos estudos sobre as
mesmas que sustentem esta asserção.
As quatro estátuas cerâmicas do mirante são
desproporcionadas e pouco expressivas na modelação,
podendo ser talvez de produção local. Aliás, parecem muito
semelhantes às da fachada de uma outra casa em Pelotas
que também é rematada com estátuas, situada sensivelmente
em frente da "Casa Amarela" que foi de Cândida Dias. Porém,
isso não significa que sejam necessariamente de má
qualidade todas aquelas estátuas de coroamento de fachadas
pelotenses que não tenham proveniência portuguesa. Pelo
contrário, subsistiram em fachadas de Pelotas várias estátuas
presumivelmente não portuguesas e de modelos muito
interessantes. Mencionemos as da casa do político Bernardo
136 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

José de Sousa (conhecida como "Casa dos Tarros", na Rua


Marechal Deodoro), de 1876, assim como as do Clube
Caixeiral e as do Jockey Club. Cremos que algumas destas
estátuas podem ser de produção alemã.
Por último, lembramos que os balaústres existentes
neste palacete do Barão de Butuí (n.º 2 da Praça Coronel
Pedro Osório, antiga casa do charqueador Viana) são em
faiança vidrada, da Fábrica de Cerâmica das Devesas, sendo
iguais aos que surgem nos palacetes de Leopoldo Antunes
Maciel (Barão de São Luís) e do Conselheiro Francisco
Antunes Maciel (2º Barão de Cacequi), assim como aos da
casa de Cândida Dias ("Casa Amarela").
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 137

Estátua do Outono, no palacete da família do Conselheiro Francisco


Antunes Maciel, 2º Barão de Cacequi.
138 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

Já se disse que o palacete do Conselheiro


Francisco Bernardo Antunes Maciel (1844-1917) foi
projectado pelo arquitecto italiano José Isella Merotti, tal como
os dois palacetes anteriormente mencionados. Aquele,
porém, parece ter sido o primeiro dos três edifícios contíguos
a ficar concluído, datando talvez de 1878. Entre as várias
estátuas colocadas no coroamento dos alçados laterais e
principal (voltado para a praça), mencione-se os quatro
continentes: a Europa, a Ásia, a África e a América. Duas
destas estátuas terão sido furtadas em 2007. Porém, todos os
respectivos modelos podem ser apreciados no fundamental
catálogo de 1910 da Fábrica de Cerâmica das Devesas, onde
possuem, respectivamente, os números 13, 14, 15 e 16.
Lembramos que a América em causa é do modelo daquela
que existe na "Casa Amarela" (ou de Cândida Dias), e não do
modelo da existente na Charqueada São João, ambas já
apresentadas.
Quanto ao Outono que se vê na foto da página
anterior, ele foi produzido na Fábrica de Cerâmica das
Devesas, com base em modelo do inevitável José Joaquim
Teixeira Lopes. O modelo desta estátua já existia, pelo
menos, desde meados da década de 1860. Uma das
particularidades deste modelo é que poderiam ser
modificados, a gosto, os frutos constantes do cesto
(modelados à parte propositadamente) ou até mesmo
alterada a sua posição dentro do cesto. Existem várias
estátuas iguais em Portugal, quer em jardins, quer no topo de
fachadas, sobretudo em conjunto com as restantes alegorias
das estações do ano: Primavera, Estio e Inverno. É
precisamente o que sucede no palacete do 2º Barão de
Cacequi, embora uma das estações do ano também tenha
sido furtada desta fachada, em 2007. Veja-se, no entanto, a
Primavera subsistente, na foto seguinte.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 139
140 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

O modelo para esta alegoria da Primavera também


é da autoria de José Joaquim Teixeira Lopes, existindo
igualmente já em finais da década de 1860. Posteriormente
(ou sensivelmente na mesma época), foram concebidos
outros modelos para a mesma alegoria, de modo a variar a
oferta junto do cliente. Essa estratégia ajudou muito a que a
Fábrica de Cerâmica das Devesas se guindasse ao patamar
da melhor e mais bem sucedida do género em Portugal,
representando, de forma exemplar e perfeita, como é possível
a aliança entre arte e indústria.
Ao nível da estatuária, a Fábrica de Cerâmica das
Devesas raramente possuía em catálogo mais do que três
modelos diferentes para cada figura alegórica ou mitológica
(embora pudesse conceber figuras quase à medida do gosto
do cliente, intercambiando as diversas fôrmas). Porém, ao
nível de balaústres e, sobretudo, de vasos, a variedade de
oferta era muito maior. Por conseguinte, é curioso como, em
Pelotas, subsistem diversas peças iguais, de tipologias
ornamentais que a fábrica produzia com uma grande
variedade de modelos.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 141

Entre os inúmeros modelos de vasos que a Fábrica


de Cerâmica das Devesas produziu, encontra-se aquele que
vemos na foto, o qual foi designado pela fábrica como "vaso
alto ornado". Este exemplar, cujo vidrado já desapareceu em
muitas partes, encontra-se no coroamento da fachada do
palacete do Conselheiro Francisco Antunes Maciel,
juntamente com um outro, igual. Ora, na antiga Escola de
Belas Artes de Pelotas (casarão dos Trápaga), existem dois
vasos do mesmo modelo. Curiosamente, este parece ter sido
um modelo de boa aceitação para coroar fachadas elitistas de
Pelotas, pois cremos que quase não subsistiram outros
modelos de vasos da mesma fábrica, em fachadas
pelotenses. Contudo, em Portugal, este modelo de vaso era
sobretudo utilizado para adornar jardins e cemitérios,
colocando-se-lhe mesmo plantas, com ou sem flores. Refira-
se que, o recurso a vasos para adornar túmulos, era mais
142 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

recorrente no norte de Portugal. Apesar de tudo, em terras


lusas subsistem igualmente exemplares do referido "vaso alto
ornado", aplicados ao coroamento de fachadas, por vezes
rematados com ananases em folha de metal recortada.
O vaso que a foto regista tem pintada, na sua base,
uma alusão à fábrica onde foi produzido, não se vendo,
porém, os caracteres a que a Fábrica de Cerâmica das
Devesas mais vezes recorria para marcar os seus produtos.
Estes caracteres parecem-se, até, um pouco mais com os
habitualmente usados pela Fábrica Pereira Valente, que
também se situava nas Devesas, em Gaia, e que chegou a
publicar anúncios para não ser confundida com a Fábrica de
Cerâmica das Devesas de António Almeida da Costa, onde
José Pereira Valente havia trabalhado inicialmente. A Fábrica
Pereira Valente produziu igualmente peças para o Brasil, mas
só foi fundada em 1884. Portanto, é possível que a marca na
base deste vaso tenha sido repintada, talvez aquando de um
"restauro" menos próprio do mesmo, pois ele é de um modelo
típico da Fábrica de Cerâmica das Devesas. Ainda assim,
refira-se que temos conhecimento de marcas pintadas a
posteriori em peças do género existentes no Brasil, as quais
são forjadas e não correspondem à fábrica que produziu o
artefacto.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 143

CL ARABÓ I AS E EST UQ UES


144 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

No casarão do Conselheiro Francisco Antunes


Maciel (2º Barão de Cacequi), existe uma clarabóia muito
semelhante às que se colocavam nas coberturas de edifícios
da cidade do Porto, na mesma época. Com excepção do
remate metálico, esta clarabóia em Pelotas parece manifestar
influência portuguesa, não só na concepção da estrutura, mas
também no estilo, com o recurso às vidraças coloridas.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 145

Na cidade do Porto, assim como em outros núcleos


urbanos do norte de Portugal, a uma clarabóia oitocentista
imponente – posicionada no telhado de um edifício de classe
média-alta ou alta – correspondia normalmente um vão de
escada interior com estuques decorativos no seu tecto. Ora,
no casarão do 2º Barão de Cacequi, como se vê pela foto, os
estuques também surgem deliberadamente em redor do
arranque da clarabóia, desdobrando-se em finos relevos,
aproveitando, assim, a entrada de luz zenital para potenciar o
efeito claro-escuro.
146 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

Do mesmo modo, na cidade do Porto, e noutros núcleos


urbanos do norte de Portugal, qualquer casa dotada com clarabóia
oitocentista decorada de estuques, tinha geralmente ornamentação
em estuque também nos tectos dos principais compartimentos. No
casarão do 2º Barão de Cacequi, isso mesmo pode ser observado.
Na foto, temos o detalhe de um tecto estucado, no qual as molduras
definem campos recortados, contendo decoração rendilhada, embora
surgindo também uma figura no canto, emergindo de folhagens,
complementadas por uma grinalda de rosas. Trata-se,
provavelmente, de Cupido, atendendo ao seu arco e ao carcaz de
flechas. Tendo em conta a posição em que se encontra o suposto
Cupido, este parece estar a conversar com uma pequena fada que
lhe surge pela frente.
Embora a Fábrica de Cerâmica das Devesas também
tenha concebido e executado alguns estuques, estes, no casarão do
2º Barão de Cacequi, não só não são obra dessa fábrica, como não
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 147

devem ser sequer obra de um qualquer bom estucador português.


Os estuques da clarabóia ostentam um tipo de decoração muito
parecido com o que se fazia em Portugal nas décadas de 1850 a
1890, embora com maior rigidez de modelação. De facto, em
Portugal, e no Porto em particular, os trabalhos de estuque de casas
com dimensão equiparável apresentam desenho semelhante, mas
são melhores em termos de qualidade estética.
Essa diferença de qualidade é bem notória no caso do
canto do tecto que estamos a analisar. As mãos e os pés da figura
do suposto Cupido são muito pequenos, certamente por falta de
perícia do modelador.
148 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

Num outro canto deste mesmo tecto pelotense, vê-se uma


pequena figura ostentando uma espécie de filactera, onde talvez
tenha estado primitivamente pintado algum nome, ou palavra(s).
Mais uma vez, são notórias as limitações do artista em termos de
modelação anatómica. Apesar de não serem tão evidentes essas
limitações nas partes de ornato simples, pode-se – ainda assim –
concluir que o executante deste tecto não era propriamente exímio.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 149

Numa outra casa de Pelotas, situada bem próximo, podem


ver-se também estuques de provável influência portuguesa – estes já
com melhor qualidade, ao nível da modelação anatómica. Mesmo
assim, em virtuosismo, não são comparáveis aos melhores estuques
dessa época existentes em Portugal. A foto refere-se,
concretamente, a um tecto na residência conhecida como o casarão
n.º 2 da Praça Coronel Pedro Osório (entretanto adaptado a
Secretaria de Cultura). Lembramos que esta grande casa foi
edificada para o charqueador José Vieira Viana, nos inícios do
século XIX. Porém, os estuques em causa não são dessa época. Por
volta de 1880, sofreu uma profunda reforma, logo depois de ter sido
adquirida pelo - também charqueador - José António Moreira (Barão
de Butuí). Terá sido nessa época que se colocou a platibanda
150 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

coroada de vasos e de estátuas de cerâmica, assim como os


referidos estuques, sendo, os da foto, uma pequena amostra
daqueles que ainda existem no interior do edifício.
Não pudemos aprofundar a questão dos estuques
existentes nos casarões da referida quadra voltada à Praça Coronel
Pedro Osório. Mesmo assim, atendendo ao nível de virtuosismo
artístico patente nos diferentes tectos cujas fotos pudemos observar,
deduzimos que não tenha sido apenas um o artista responsável por
estas obras, apesar das mesmas serem todas atribuídas – ao nível
do projecto de arquitectura – a José Isella Merotti. Também
deduzimos que os referidos estuques tenham sofrido mesmo uma
qualquer influência portuguesa, atendendo ao seu estilo e ao modo
como foram gizadas as composições. Porém, temos dúvidas sobre
se esta influência foi directa, ou seja, através de estucadores que
eram imigrantes portugueses no Rio Grande do Sul.
Durante toda segunda metade do século XIX, o mercado
dos estuques ornamentais era dominado em Portugal pelos célebres
estucadores naturais de Afife e de outras freguesias limítrofes de
Viana do Castelo. Apesar de ser um tema ainda pouco estudado em
Portugal, está já minimamente documentado que estes artistas
estucadores tiveram uma mobilidade muito grande no território
português, devido à necessidade de se deslocarem até aos casarões
e palácios que estavam a ser construídos de novo (ou a ser objecto
de reforma) um pouco por todo o país. Alguns estucadores
oitocentistas nascidos na região de Viana do Castelo acabariam
mesmo por fixar-se em outras regiões portuguesas, movendo-se
depois somente dentro dessa região, conforme fossem surgindo as
solicitações de trabalho. Ora, é de supor que vários estucadores
portugueses tenham emigrado também para o Brasil, no século XIX.
Terá sido o caso dos que decoraram os tectos dos dois casarões
pelotenses cujas fotos apresentámos?
Um dos factores que nos faz duvidar de uma influência
directa dos estuques portugueses nos referidos tectos, prende-se
com o particular gosto, em Pelotas, pelos trabalhos em massa nas
fachadas eclécticas. Ora, ao nível das fachadas, os trabalhos em
massa com motivos renascença não são uma característica
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 151

tipicamente portuguesa da sua arquitectura romântica, apesar de


existirem alguns casos semelhantes nas cidades portuguesas de
Ovar e Espinho (além de outros escassos exemplos dispersos pelo
país), embora em menor quantidade e mais tardios que os de
Pelotas. Portanto, não podemos ignorar a hipótese dos autores de
trabalhos em massa nas fachadas pelotenses do último terço do
século XIX poderem ter também executado os estuques do interior
dessas casas. Alguns, poderiam até ser artistas portugueses. Porém,
cremos que existe ainda muito estudo por fazer sobre esta questão.

Capela da Beneficência Portuguesa, com a invocação de São Pedro, na Rua


Andrade Neves.
152 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

A fachada com trabalhos de massa cujo detalhe se vê na


página anterior é bem o exemplo de uma interessante tipologia
decorativa que é claramente pelotense e que, em Portugal, foi muito
pouco habitual na mesma época. Portanto, a inclusão desta foto no
livro deve-se ao facto da fachada ostentar orgulhosamente as armas
de Portugal, para além de que estamos perante uma instituição que
bem reflecte a influência da elite pelotense de origem portuguesa nos
destinos da cidade, em Oitocentos. De facto, a Sociedade
Beneficência Portuguesa foi fundada em 1857, por portugueses
residentes em Pelotas, com um propósito assistencial e de
entreajuda patriótica. O auxílio aos imigrantes portugueses mais
desamparados poderia chegar mesmo ao abonamento da viagem de
volta. Em 1858, a Sociedade recebeu, em legado, um terreno, onde
foram iniciadas as obras do seu hospital, o qual se ampliou após
1871. Porém, a Capela de São Pedro propriamente dita, foi
inaugurada em 1892. Refira-se que uma foto antiga deste hospital
mostra ter aqui existido balaustrada coroada por vasos e estátuas de
aparente proveniência portuguesa, até porque os pequenos trechos
de balaustrada que hoje restam, nos flancos da capela, ainda
possuem balaustres provavelmente produzidos em Portugal. Aliás,
correspondem ao modelo n.º 537, incluído no catálogo de 1910 da
Fábrica de Cerâmica das Devesas, embora a fábrica já os fabricasse
muito tempo antes da publicação desse catálogo.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 153

T ÚM UL O S DO SÉCUL O XI X
154 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

A influência portuguesa não é evidente na arte tumular do


Cemitério de Pelotas, cuja pedra empregue nos monumentos mais
antigos, assim como o estilo dos mesmos, aproxima-se bem mais do
gosto italiano. De qualquer modo, isso poderá ser explicado, em
parte, pela monumentalização relativamente tardia do cemitério.
Efectivamente, no Brasil em geral, as obras tumulares importadas de
Portugal são sobretudo as mais antigas do período romântico
(décadas de 1845 a 1870), antes, pois, de se generalizarem, nas
cidades brasileiras, as oficinas locais de marmoristas, muitas delas
estabelecidas por imigrantes de proveniência italiana. É claro que
podem ter existido artefactos tumulares tipicamente portugueses em
Pelotas, entretanto desaparecidos. No Cemitério de Piratini, por
exemplo, até há poucos anos existiam estátuas em faiança de
fabrico português, as quais seriam talvez de uma época em que já
laboravam oficinas de mármores na região. Portanto, atendendo ao
relativamente elevado número de estátuas cerâmicas que subsistem
ainda em alguns edifícios de Pelotas – a despeito da forte
transformação urbana e da passagem dos anos, é possível que
também no Cemitério de Pelotas tenha existido alguma estátua do
género.
Deixando de parte as especulações, apresentamos aqui as
fotografias de quatro túmulos. Um deles foi seguramente executado
em Portugal. Os restantes três, não sendo obra tipicamente
portuguesa, foram certamente mandados erigir por (ou para)
imigrantes portugueses, dos mais influentes em Pelotas. Portanto,
representam bem uma certa elite pelotense de origem portuguesa –
os barões do charque e outras figuras proeminentes da cidade.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 155

Não foi fácil encontrar túmulos oitocentistas de fabrico


português, em Pelotas. Este, cujo detalhe aqui apresentamos, foi
erigido para António Joaquim Dourado e para o seu filho menor,
Elísio.
156 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

Trata-se de um monumento constituído por alto pedestal,


dotado, em cada face, de duas tabelas sobrepostas, e encimado por
uma urna ossuária apoiada em quatro esferas. Por sua vez, a urna
remataria com uma cruz, que já não existe. Trata-se de um túmulo
maioritariamente em pedra lioz, extraída nos arredores de Lisboa,
embora – pelo estilo – seja claramente uma obra de mestre canteiro
do Porto. Refira-se que, no Porto, não existia pedra lioz, pelo que os
canteiros desta cidade tinham de a encomendar a colegas seus de
Lisboa, dado que foi a pedra mais pretendida pelas elites, em
túmulos românticos portugueses.
A tipologia em causa no cemitério de Pelotas parece
derivar do particular gosto decorativo de Emídio Carlos Amatucci,
ornatista de mármores fixado no Porto a partir de meados da década
de 1830, em cuja oficina chegou a trabalhar António Almeida da
Costa, antes de abrir oficina própria e, mais tarde, estabelecer uma
fábrica de cerâmica em conjunto com José Joaquim Teixeira Lopes –
a Fábrica de Cerâmica das Devesas. Portanto, é bem provável que
este túmulo em Pelotas tenha saído da oficina portuense de António
Almeida da Costa. Curiosamente, António Almeida da Costa era
descendente de canteiros, teve irmãos à frente de oficinas próprias
de cantaria e dois sobrinhos terão até mantido uma oficina de
mármores no Rio de Janeiro, em finais do século XIX e inícios do
século XX.
Quanto a António Joaquim Dourado, sabemos que era de
origem portuguesa e pertenceu mesmo à Sociedade Portuguesa de
Beneficência de Pelotas, desde o seu início, em 1857. Podemos
ainda deduzir, pelo tipo de túmulo evocativo da sua memória, que
António Joaquim Dourado tinha raízes ou relações comerciais
privilegiadas com o Porto (ou com o norte de Portugal).
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 157
158 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

Relativamente a túmulos não executados em Portugal,


mas ligados à memória de ilustres imigrantes portugueses em
Pelotas, começamos com o mausoléu dedicado ao Comendador
Domingos António Félix da Costa, nascido no Porto em 18 de
Fevereiro de 1811, o qual veio para o Brasil por volta de 1826 e
faleceu em Pelotas em 13 de Junho de 1881. Ele foi casado com a
viúva Maria Francisca Antunes Maciel (1815-1858), neta de Bernardo
Antunes Maciel, patriarca desta família de origem portuguesa fixada
no Rio Grande do Sul, onde exerceu grande influência,
nomeadamente na cidade de Pelotas. Do seu primeiro casamento
(com o Major Mateus Gomes Viana, primeiro promotor público de
Pelotas), Maria Francisca Antunes Maciel gerara Francisco Antunes
Gomes da Costa (1838-1912), posterior Barão de Arroio Grande, o
qual recebeu o apelido Costa do seu padrasto, o Comendador
Domingos António Félix da Costa. O túmulo em causa terá sido
mandado executar precisamente pelo Barão de Arroio Grande. Ele
casou com a sua prima Flora Antunes Maciel (1843-1924), filha do
Coronel Aníbal Antunes Maciel e neta paterna do Capitão Francisco
Antunes Maciel. A Baronesa de Arroio Grande era, pois, irmã do
Barão dos Três Serros (Aníbal Antunes Maciel) e prima, quer do
Barão de São Luís (Leopoldo Antunes Maciel), quer do 2º Barão de
Cacequi (Conselheiro Francisco Antunes Maciel).
O mausoléu dedicado ao Comendador Domingos António
Félix da Costa (foto da página anterior) é um pedestal prismático em
mármore, com duas pequenas alas semicirculares, onde se apoiam
duas crianças, flanqueando uma coluna – tudo decorado com flores
apropriadas à simbologia da morte romântica. O jazigo está
enquadrado por gradeamento em ferro forjado.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 159
160 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

Quanto ao mausoléu neogótico da página anterior, em


mármore e com gradeamento em ferro fundido dentro do mesmo
gosto revivalista, foi mandado erigir por João Simões Lopes (Filho),
1º Visconde da Graça (1817-1893). Ele era filho de outro João
Simões Lopes (Lisboa, 1779 - Pelotas, 1853) e de sua mulher Isabel
Doroteia Carneiro da Fontoura (consorciados em Pelotas).
João Simões Lopes (Filho), 1º Visconde da Graça, casou
primeiramente com Eufrásia Gonçalves Vitorino, a qual faleceu em
consequência da célebre epidemia global de "cholera morbus", em
1855, juntamente com uma sua filha. João Simões Lopes (Filho)
casou depois com Zeferina Antónia da Luz. Entre os numerosos
filhos do 1º Visconde da Graça, mencione-se Francisco de Salles
Lopes (genro do Barão de São José) e Cândida Clara Simões Lopes,
mulher do abastado Joaquim José de Assunção, 1º Barão do Jarau -
proprietários da casa cujos leões cerâmicos do portal se registam
neste livro. O Visconde da Graça foi influente político, assim como
comerciante e proprietário.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 161
162 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

Ainda mais marcante que os anteriores, pelo facto de ser


rematado por um busto, é o mausoléu da família do Comendador
António José de Oliveira Castro e do seu genro, José António
Moreira – o abastado Barão de Butuí. O Comendador António José
de Oliveira Castro era charqueador e foi casado com Francisca
Alexandrina. A sua única filha, Maria Josefa de Castro (1819-1844),
casou, em 1835, com o referido José António Moreira, posterior
Barão de Butuí, que dela enviuvou, tendo casado em segundas
núpcias com Leonídia Braga Gonçalves, de quem também enviuvou.
O Barão de Butuí nasceu no Porto em 1806, sendo filho
de António José Moreira e de sua mulher, Maria da Apresentação.
Por volta de 1817, rumou ao Brasil, onde se fixou, tendo falecido em
Pelotas no ano de 1876. Lembramos que duas filhas do Barão de
Butuí casariam com membros da família Antunes Maciel: com o
Barão de São Luís (Leopoldo Antunes Maciel) e com o 2º Barão de
Cacequí (Conselheiro Francisco Antunes Maciel), ambos
proprietários dos já referidos casarões coroados com estátuas de
proveniência portuguesa, na Praça Coronel Pedro Osório. O próprio
Barão de Butuí poderá ter chegado a viver num também já
mencionado casarão, ao lado dos palacetes de seus dois genros.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 163

CAIXILHARIAS E GRADEAMENTOS DO SÉCULO XIX


164 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 165

Um outro aspecto em que se verifica influência portuguesa


na arquitectura de Pelotas é nas caixilharias de madeira das janelas
de alguns edifícios, sobretudo dos que ainda remontam ao período
colonial. É o caso desta janela de guilhotina na Charqueada São
João, a qual – recordamos – terá sido edificada por volta de 1810, a
mando do imigrante português António José Gonçalves Chaves.
166 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

Já depois da emancipação do Brasil face à sua antiga


metrópole, mas ainda antes do período áureo da chamada
arquitectura ecléctica, Pelotas continuou a receber novos edifícios
com clara influência portuguesa, não só na arquitectura, mas
também nos seus detalhes decorativos de madeira e ferro. É o que
sucede com este sobrado situado na Rua Gonçalves Chaves,
fazendo esquina com a Rua Voluntários da Pátria. As origens da
casa podem remontar ainda ao período colonial, pois a mesma é
geralmente associada ao português António José Gonçalves
Chaves, o já referido proprietário de Charqueada São João. Contudo,
o prédio subsistente parece ser uma obra já da época do seu filho,
António José Gonçalves Chaves Filho (Pelotas, 1813 – Rio de
Janeiro, 1871).
O Dr. António José Gonçalves Chaves Filho foi cônsul em
Montevideu, entre 1838 e 1843, sendo de supor que o sobrado em
causa tenha sido edificado, tal como hoje se encontra, depois de ele
ter voltado a Pelotas. Ao que parece, a família Gonçalves Chaves
era das mais conservadoras de Pelotas, no seu modo de viver,
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 167

identificando-se claramente com as suas raízes portuguesas.


Também o sugere a arquitectura das casas desta família em Pelotas
– a casa ligada à produção de charque e a habitação da cidade.
168 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

O aludido sobrado de sabor português, da família


Gonçalves Chaves, possui janelas de guilhotina no seu alçado mais
comprido, que não é o principal, pois não possui sacada. Este tipo de
janela foi massivamente usado na arquitectura urbana de Portugal,
em meados do século XIX, época em que se ergueu o referido
casarão pelotense. Porém, as molduras de massa dos vãos deste
edifício de Pelotas são pouco comuns em Portugal – país onde
quase todas as regiões possuem boa pedra para construção. Por
outro lado, o facto da caixilharia superior de cada janela desse
alçado possuir um semicírculo com pétalas irradiantes, afasta-se
ligeiramente do que foi mais habitual em Portugal na mesma época.
Trata-se de uma solução híbrida, entre a grelha geométrica da
guilhotina e o motivo da bandeira irradiante – motivo esse muito
comum na arquitectura romântica de inspiração neoclássica e que se
vê nos vãos da sacada do referido casarão. A grade corrida desta
sacada, de ferro forjado, ostenta o mesmo motivo da caixilharia, em
três rosetas irradiantes posicionadas de forma equidistante,
demonstrando que houve preocupação em criar unidade estética
entre o trabalho em madeira e o trabalho em ferro.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 169

Ao contrário do que sucede com as estátuas de cerâmica


oitocentistas, sabemos que muitas peças decorativas em ferro, para
jardins e edifícios brasileiros da mesma época, foram importadas
directamente de Inglaterra, Escócia, França, Espanha e também de
Portugal, sendo algumas até de produção brasileira. Portanto, pela
própria natureza das peças, é difícil classificar com segurança a
proveniência de peças de ferro em fachadas pelotenses. Mesmo
assim, à distância de milhares de quilómetros, podemos indicar
probabilidades, com base em vários indícios, técnicos e estéticos.
No caso desta grade em ferro forjado, existente num
edifício da Rua Andrade Neves, esquina da Rua Dr. Cassiano, a
influência portuguesa é muito evidente. Mesmo assim, não é certo
que seja obra de importação. Fazemos notar que se trata de uma
peça de ferro forjado e não de ferro fundido. Portanto, a sua
produção dispensava o trabalho de modelação e enformagem,
podendo ser feita por qualquer serralheiro com diminuta oficina. Ao
170 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

invés, peças de maior dimensão e com muito ornato, como grandes


chafarizes em ferro fundido, só podiam ser produzidos em fábricas
de fundição experimentadas. A solução mais fácil e prática para
adquirir essas peças complexas era a importação.
No caso de peças mais simples em ferro forjado, na
segunda metade do século XIX, supomos que os vários artífices de
Pelotas dariam conta das encomendas. Alguns desses serralheiros
pelotenses poderiam ser imigrantes portugueses, ou então os
desenhos seriam inspirados no que existia em Portugal.
São as duas grandes explicações para o caso da grade
deste edifício de meados do século XIX, o qual foi outrora o Clube de
Recreação Pelotense. Cabe ainda esclarecer que as semelhanças
entre esta grade e trabalhos similares existentes em Portugal é
sobretudo notória se a comparação for feita com grades da cidade do
Porto datadas de cerca de 1840-1880. Portanto, e tal como sucede
com as demais expressões artísticas registadas neste livro, também
parece ter sido do Porto (e do norte de Portugal em geral) a
influência portuguesa que mais se fez sentir nos ferros decorativos
de Pelotas.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 171

Na chamada "Casa da Banha" (antigo Quartel Legalista,


situado na Praça Coronel Pedro Osório), as grades apresentam
também algumas semelhanças com a serralharia portuguesa de
meados do século XIX. Ainda assim, registam-se algumas
originalidades de composição, talvez próprias do gosto pelotense e
dos seus artífices, nomeadamente o florão central fundido, ao passo
que toda a restante grade é em ferro forjado e de malheiro mais
vertical e estático.
172 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

No actual edifício do SANEP (Serviço Autônomo de


Saneamento de Pelotas), as grades de sacada também apresentam
certas semelhanças com a serralharia portuguesa de meados do
século XIX, embora não tão evidentes ao nível da composição.
Refira-se que o referido edifício do SANEP terá sido
construído a mando do charqueador Domingos de Castro Antiqueira,
1º Visconde de Jaguari, falecido em Pelotas no ano de 1852, depois
de ter sido casado por três vezes. Uma vez que o gosto subjacente a
esta grade de ferro forjado estava em vigor na época em que morreu
o visconde, não é fácil saber se a mesma terá sido colocada debaixo
das suas ordens. Pode ter sido obra ordenada pela sua viúva,
Leocádia Amália da Silveira (falecida em 1866) ou até pela família de
Zeferina Maria Gonçalves da Cunha, que adquiriu o sobrado em
1867.
Fotos contam uma história de Portugal em Pelotas 173

Conclusão

Apesar do seu centro histórico ter perdido muita da


coerência e homogeneidade que detinha em finais de Oitocentos,
Pelotas ainda conserva um conjunto apreciável de edifícios dessa
época, com tipologias interessantes e marcadamente identitárias.
Contudo, a arquitectura de Pelotas dessa época constitui uma
amálgama de estilos revivalistas e uma fusão de influências
internacionais. É assim que deve ser entendida e valorizada. O que
tentámos fazer neste livro foi focar algumas características da
arquitectura pelotense que mais se devem à influência portuguesa.
Porém, as fotos e os comentários que esta obra contém são
despretensiosos. Não arriscaríamos fazer um inventário exaustivo
dos detalhes de origem portuguesa na arquitectura de Pelotas,
sobretudo estando nós, autoras deste livro, separadas por um tão
vasto oceano. Contudo, é também essa separação que torna este
livro igualmente útil para os dois povos irmãos. De facto, o
desconhecimento é grande e existe de ambos os lados: assim como
a influência portuguesa na arquitectura brasileira da segunda metade
de Oitocentos tem sido algo esquecida no Brasil – como resultado de
uma necessidade em enfatizar a emancipação cultural face à antiga
metrópole; também a influência brasileira na arquitectura portuguesa
da mesma época tem sido empolada – servindo depois como
argumento para atribuir um menor valor à referida arquitectura. O
resultado destes equívocos é, por vezes, bizarro: livros publicados de
um lado do Atlântico, afirmando que certas tipologias arquitectónicas
são tipicamente portuguesas, ao passo que, do outro lado do
oceano, as mesmas tipologias são conotadas como tipicamente
brasileiras. É como se ainda existissem características órfãs na
arquitectura dos dois povos. Ora, é necessário assumir que as
influências existiram, foram muito fortes e, apesar dos estudos já
carreados, ainda está muito por fazer. E se este livro pode conter
hipóteses explicativas arriscadas, quiçá insuficientemente
fundamentadas, pelo menos sentimo-lo como um contributo positivo
para ultrapassar barreiras e preconceitos, ao nível do estudo de uma
História e de um Património comuns.
174 Rejane Botelho | Ana Margarida Portela

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