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DIREITO COMERCIAL I

2018/2019

TURMA B – DIA

REGÊNCIA: PROF. DOUTOR JANUÁRIO DA COSTA GOMES

CASO PRÁTICO N.º 10

Aníbal andou de farmácia em farmácia, na zona centro do país, durante 5 anos, a promover a
venda dos produtos cosméticos da prestigiada marca “Beauty for ever”, da sociedade com o
mesmo nome (BFE – Beauty for ever, S.A.). A rotina era sempre a mesma, definida por um
manual de procedimentos extremamente detalhado, preparado pela BFE. De acordo com tal
manual, distribuído a cada distribuidor no início da sua colaboração com a BFE, os
distribuidores deviam limitar-se a explicar aos donos das farmácias as maravilhas operadas por
cada um dos produtos constantes do catálogo, o quão fácil é vendê-los a senhoras descontentes
com o peso da idade e o quão rentáveis são, dada a diferença entre o preço de aquisição e o
preço de venda ao público. Do manual constavam instruções específicas quanto a encomendas e
pagamentos: não podiam “aceitar” encomendas ou pagamentos, mas apenas “transmitir”
internamente os pedidos dos clientes, a processar pelo departamento operacional. Do manual
constavam ainda regras claras quanto à apresentação: fato cinzento e gravata sóbria, sapatos
engraxados, cabelo curto e penteado, “sem modernices”; não podiam usar brincos, piercings ou
outros adereços que desvirtuassem a imagem que se pretendia sóbria. Deviam apresentar-se com
um cartão de visita da empresa e não podiam usar, nos seus contactos com os clientes, outro
endereço de e-mail que não o da empresa.

Do contrato assinado por Aníbal em 2013 constava (i) um prazo de 2 anos; (ii) um direito de
exclusivo na zona centro do país, (iii) que a sua remuneração se resumiria à comissão de 7,5%
do preço de cada produto vendido pela BFE às farmácias contactadas por Aníbal, incluindo esta
comissão a compensação pela clientela criada pelo que, findo o contrato, nada mais terá a haver
da BFE; e (iv) uma obrigação de não concorrência por um prazo de 5 anos após a cessação do
contrato.

Em janeiro de 2018, Aníbal conheceu Carlota que tem a mania que é rebelde e rapidamente fez
dele “gato-sapato” e, em fevereiro, fez várias tatuagens e adotou um penteado “radical” para
demonstrar que estava à altura do desafio. Os donos das farmácias com quem contactava
diariamente começaram a olhá-lo com desconfiança.

Entretanto, Carlota convenceu Aníbal a promover junto das farmácias, juntamente com os
produtos da BFE, umas “ervas medicinais”, por si plantadas, que, segundo a mesma, sendo
misturadas com chá, produziam um efeito rejuvenescedor imediato. Alguns farmacêuticos
compraram as ervas que rapidamente demonstraram ser um sucesso entre as senhoras de idade
que, diziam, as faziam sentir mais jovens do que algum dia foram. Descobriu-se em junho que,
entre tais ervas, havia canabis com fartura...

1. Em julho de 2018, a BFE escreveu a Aníbal, pondo fim imediato ao contrato. Aníbal,
incrédulo, disse que a BFE não tinha fundamento para isso: queria continuar a trabalhar e
a receber as comissões a que tinha direito.

2. Segundo Aníbal, mesmo que o contrato ficasse sem efeito, ele teria de ser compensado pela
clientela que criou. Afinal de contas, a BFE continuaria a receber os proveitos do seu
trabalho por muitos e bons anos: as farmácias que ele “mimou” ao longo de anos
continuariam a fazer encomendas sobre encomendas...

3. O advogado de Aníbal sustentou ainda que este deveria reclamar à BFE a comissão
contratualmente prevista por cada produto vendido por esta às farmácias do centro do país
através da loja online criada em 2016.

4. Em agosto de 2018, a BFE reclamou um pagamento em atraso à Deolinda Farmácia da


Mouraria, Lda. Esta afirmou que já pagou a Aníbal em maio desse ano, pelo que nada
deve à BFE.

5. Na sua carta de resposta, a Deolinda Farmácia da Mouraria, Lda. reclamou ainda uma
compensação pelo facto de a BFE não ter entregado os produtos por si encomendados
4 meses antes e que Aníbal garantiu que seriam entregues no mês seguinte.

6. Entretanto, em setembro de 2018, Aníbal decidiu montar o seu próprio negócio, aproveitando
um contacto da ECB - Empresa Cosmética Brasileira, S.A. que queria introduzir os seus
produtos no mercado português, aproveitando os contactos que Aníbal tinha nas
farmácias do centro do país. Para o efeito, Aníbal deveria comprar os produtos à ECB e
depois revendê-los pelas farmácias. Usaria para o efeito as marcas, os materiais
publicitários e as amostras da ECB. Aníbal não sabia se podia: lembra-se de uma
qualquer obrigação de não concorrência no contrato com a BFE e ligou ao seu advogado
a perguntar.
7. As coisas correram bem entre a ECB e Aníbal durante pouco mais de um ano. No final de
outubro passado, a ECB enviou uma carta a Aníbal denunciando o contrato com uma
antecedência de 10 dias. Aníbal está novamente incrédulo: fez investimentos
avultadíssimos na promoção dos produtos da ECB e na constituição de stocks, de acordo
com o plano de negócios desenhado em conjunto com a ECB.

8. Carlota, quando percebeu que Aníbal não teria onde cair morto, logo o trocou por Fausto,
jovem empresário de sucesso que pretende abrir um restaurante igualzinho aos H4 que
estão já espalhados por Lisboa e não sabe que contrato deve celebrar para o efeito.

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