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Bruna.....

MUSSALIN, Fernanda. Análise do Discurso. In: BENTES, Anna; MUSSALIN,


Fernanda (orgs). Introdução à linguística: domínios e fronteiras. V. 2. 7ª ed. São Paulo:
Cortez, 2011. p. 101 – 142.

Ao começar o texto, Mussalin já nos diz que a Análise do Discurso pode


significar, primeiramente, algo vago e amplo, praticamente pode significar qualquer coisa, já
que toda produção de linguagem pode ser considerada “discurso”. No entanto, a Análise do
Discurso de que vamos falar neste capítulo trata-se de uma disciplina que teve sua origem na
França na década de 1960.
Uma análise do discurso, como apresentada por ela, serve para pensar o texto em sua
complexidade, levando em consideração a manifestação da linguagem. É um resultado da
convergência progressiva de movimentos com pressupostos diferentes, que surgiram nos
anos 60, que tinha por intenção um significado construído na busca social de se
compreender as manifestações orais e escritas.
A análise do discurso também se apoia em uma longa tradição de estudos de textos,
na qual a retórica, a hermenêutica literária ou religiosa, a filologia deixaram traços profundo.
Também sobre uma história, bem mais curta, acerca das ciências humanas sociais, da
psicanálise ou da filosofia.
Para entendermos essa disciplina é preciso compreender as condições que
propiciaram a sua emergência Maldidier (1994) apresenta a fundação da Análise do
Discurso através das figuras de Jean Dubois e Michel Pêcheux. Dubois, um linguista,
lexicólogo envolvido com os empreendimentos de sua época; Pêcheux, um filósofo
envolvido com os debates em torno do marxismo, da psicanálise, da epistemologia. O que há
de comum no trabalho desses dois pesquisadores com preocupações distintas é que ambos
são tomados pelos espaços do marxismo e da política, partilhando convicções sobre a luta de
classes, a história e o movimento social.
No âmbito estruturalista, a autonomia respectiva da linguagem é unanimemente
reconhecida. Devido ao recorte que as teorias estruturalistas da linguagem fazem de seu
objeto de estudo – a língua -, torna-se possível estudá-la a partir de regularidades e, portanto,
apreendê-la na sua totalidade, como por ela dito “pelo menos é nisso que crê o
estruturalismo”, já que as influências externas, geradoras de irregularidades, não afetam o
sistema por não serem consideradas como parte da estrutura. A língua não é apreendida na
sua relação com o mundo, mas na estrutura interna de um sistema fechado sobre si mesmo.
Daí “estruturalismo”: é no interior do sistema que se define, que se estrutura o objeto, e é
este objeto assim definido que interessa a esta concepção de ciência em vigor na época. 
Com isso, tendo o estruturalismo, a linguística acaba impondo, junto da sua relação
com às ciências humanas, como uma área que confere cientificidade aos estudos, já que
esses deveriam passar por suas leis, assim colocado por ela como se tornando uma ciência
piloto. Em vez de se agarrarem diretamente às instâncias socioeconômicas.
Assim pode-se entender melhor a afirmação de Maingueneau (1990) – “a linguística
caucionava tacitamente a linha de horizonte do estruturalismo na qual se inscreve o
procedimento althusseriano” – e entender também por que é que, como já foi dito presidem
o nascimento da Análise do Discurso e o marxismo e a linguística. O projeto althusseriano,
inserido em uma tradição marxista que buscava apreender o funcionamento da ideologia a
partir de sua materialidade, ou seja, por meio das práticas e dos discursos dos Aparelhos
Ideológicos do Estado, via com bons olhos uma linguística fundamentada sobre bases
estruturalistas. Mas uma Linguística saussuriana, uma Linguística da língua, não seria
suficiente; só uma teoria do discurso, concebido como o lugar teórico para o qual convergem
componentes linguísticos e socioideológicos, poderia acolher esse projeto.
Portanto é neste contexto que nasce o projeto da AD. Michel Pêcheux, pautado na
formação filosófica, promove um questionamento crítico acerca da linguística e,
diferentemente de Dubois, não pensa a instituição da AD como um progresso natural
permitido pela linguística, isto é, não idealiza que o estudo do discurso seja uma passagem
natural da Lexicologia (estudo das palavras) para a Análise do Discurso. A instituição da
AD para Pêcheux exige uma ‘ruptura’ epistemológica, que introduz o estudo do discurso
num outro terreno em que intervém questões teóricas relativas à ideologia e ao sujeito.
Assim é que, como afirma Maldidier (1994), o objeto discurso de que se ocupa Pêcheux em
seu empreendimento “não é uma simples ‘superação da Linguística saussuriana”’.
Ainda um outro elemento compõe o quadro epistemológico do surgimento da
AD: a psicanálise lacaniana. Abordando o pensamento lacaniano procurando evidenciar
como ele é fundamental neste memento inicial de fundação da Análise do Discurso. Para ele
o inconsciente assume-se em estrutura, como linguagem, tendo uma cadeia de significantes
latente que se repete e interfere no discurso efetivo. Atuando como houvesse, sempre, sob as
palavras, outras palavras, como se o discurso fosse sempre atravessado pelo discurso do
“Outro”. Ao ler isso, lembramos sobre quando ele fala da subjetividade da mente humana
em seu texto a subjetividade ganhou uma maior estruturação. No seu texto sobre o jogo do
espelho1 onde ele vai fundamentar de como se dá a subjetivação do sujeito. Que se percebe
essa presença do ‘Outro’, onde ele afirma sobre a relação do Je & Moi2, que constitui a base
da subjetivação do sujeito, logo que ele afirma que o jogo do espelho se dá devido o ser
humano ser o único animal dotado de consciência racional, mas por sua vez quando ele
nasce ele não aprende a se subjetivar como os demais animais que nasce com o instinto, uma
vez que esse instinto o apresenta as ações necessárias para estabelecer relação com o
ambiente.
Basta compreender o estádio do espelho como uma identificação, no sentido pleno
que a análise atribui a esse termo, ou seja, no sentido pleno que a análise atribui a
esse termo, ou seja, a transformação produzida no sujeito quando ele assume uma
imagem [...] Mas o ponto importante é que essa forma situa a instância do eu ,
desde antes de sua de sua determinação social, numa linha de ficção, para sempre
irredutível para o indivíduo isolado [...] Que uma Gestalt seja capaz de efeitos
formadores sobre o organismo é atestado por um experimento biológico, ele
próprio tão alheio à idéia de causalidade psíquica que não consegue resolver-se a
formulá-la como tal. (LACAN, p.99)

O homem por não possuir esse mecanismo de ligação com o ambiente e abstrair
o necessário que precisa de forma individual, entra no que ele chama de jogo do espelho,
que é a abstração desse mecanismo de ligação a partir do reflexo de um outro humano – que
na AD se dá na ideologia - mas diferentemente do animal irracional que vê o seu reflexo no
espelho e idealiza o seu semelhante, o ser humano não, ele entende que é um reflexo dele
assim entrando em diálogo com essas experiências.

FASES DA AD: OS PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE E A DEFINIÇÃO


DO OBJETO: Para a primeira época da Análise do Discurso (doravante AD-1) explora a
análise de discursos mais “estabilizados”, no sentido de serem pouco polêmicos, por
permitirem uma menor carga polissêmica, isto é, uma menor abertura para a variação do
sentido devido a um maior silenciamento do outro (outro discurso/outro sujeito).
Como relação aos procedimentos de análise da AD-1, eles são realizados por
etapas, apresentadas a seguir:
a) primeiramente se seleciona um corpus fechado de sequências discursivas
(um manifesto político, por exemplo);
b) em seguida faz-se a análise linguística de cada sequência, considerando as
construções sintáticas (de que maneira são estabelecidas as relações entre os
enunciados) e o léxico ( levantamento de vocabulário);

1
JACQUES, Lacan. O estádio do espelho como formador da função eu. In: Escritos. JACQUES, Lacan.
(trad.) RIBEIRO, Vera. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1998.
2
É a expressão que Lacan usa em seu texto “O estádio do espelho como formador de função eu”, nessa
expressão ele está estabelecendo a relação de ‘eu e mim’ que o ser humano se conecta, onde isso se dá a partir
do momento que ele começa a se subjetivar após o fim do complexo de Édipo. Tendo em matérias de estrutura
na mente a divisão do eu com o ‘outro’, lado inconsciente que se conecta de forma latente – pré-inconsciente –
com o consciente, que se constrói dialogando sobre as experiências.
c) passa-se depois à analise discursiva, que consiste basicamente em construir
sítios de identidades a partir da percepção da relação de sinonímia ( substituição de
uma palavra por outra no contexto) e de paráfrase ( sequências substituíveis entre
si no contexto);
d) por fim, procura-se mostrar que tais relações de sinonímia e paráfrase são
decorrentes de uma mesma estrutura geradora do processo discursivo. (pg. 118). 

UMA ANÁLISE: O conceito de Formação Discursiva, já apresentado, é


utilizado pela AD para designar o lugar onde se articulam discurso e ideologia. Nesse
sentido é que podemos dizer que uma formação discursiva é governada por uma formação
ideológica, ela coloca em relação necessariamente mais de uma força ideológica, também
sempre colocará em jogo mais de um discurso.
A análise do discurso considera como parte constitutiva do sentido o contexto
histórico-social; ela considera as condições em que este texto, por exemplo, foi
produzido. (p.123)

No texto também ela apresenta que Bakhtin (1929/1988) “considera que a


verdadeira substancia da língua é constituída pelo fenômeno social da interação verbal e
que o ser humano é inconcebível fora das relações que o ligam ao outro. É partindo desse
pressuposto que critica a concepção de língua enquanto estrutura, pelo fato de, ao ser
tomada como alheia aos processos sociais, não ser articulável com uma pratica social
concreta, com a historia e tampouco com o sujeito. (pg. 127)”.
Assim ela introduz ao conceito de dialogismo, de Bakhtin, que ele não está
preocupado com a centralidade no dialogo ‘face a face’, mas sim numa dialogização interna
ao discurso. Nesse sentido o Bakhtin diz sobre o discurso se orientar para outros discursos,
instaurando-se numa plurivalência de sentidos.
Com isso a noção de sentido para a AD, considerando o que foi apresentado com
relação à noção de discurso com a qual a AD trabalha (conceitos de formação ideológica,
heterogeneidade, interdiscurso). A heterogeneidade constitutiva do discurso o impede, , de
ser um espaço “estável”, “fechado”, “homogêneo”, mas não o redime de estar inserido em
um espaço controlado, demarcado pelas possibilidades de sentido que a formação ideológica
pela qual é governado lhe concede. Uma formação discursiva, apesar de heterogênea, sofre
as coerções da formação ideológica em que está inserida.

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