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DISCURSO DE EXCLUSÃO ESCOLAR PELA ANÁLISE DE DISCURSO

Cássio Araújo Corrêa¹

Resumo

A análise de discurso (AD) é uma disciplina que teve como um


dos precursores o filósofo francês Michel Pêcheux no século
XX. O presente artigo trata-se de um ensaio teórico que teve
como objetivo destacar a importância da AD como instrumento
teórico de identificação e compreensão de discurso de
exclusão no ambiente escolar. A AD se revelou importante na
medida em que: ela concebe a possibilidade de o discurso de
inclusão trazer sentidos de exclusão escolar; e de que o sujeito
pode ser um agenciador de modos de violência simbólica
tomado por uma ideologia de classe dominante do qual
desconheça.
Palavras-chave: Análise de discurso; Exclusão escolar;
Ideologia; Psicanálise; Linguística.

Abstract

The discourse analysis (DA) is a discipline that had as one of


the precursor the frenchmon philosopher Michel Pêcheux in the
20th century. The present article it’s a matter of a the oritical
essay of identification and comprehension of exclusion
discourse in the school environment. The DA was turn out
importante as far as: the DA conceive the possibility of the
inclusion discourse to bring senses of exclusion school; and the
person can be an agent of manners of simbolic violence was
full for an ideology dominant class that the unknown.
Key-words: Discourse analysis; Exclusion school; Ideology;
Psychoanalysis; Linguistics.

1 Graduado em Psicologia pela Universidade Federal do Maranhão e Especialista em


Neuropsicopedagogia pela Universidade Candido Mendes
I. INTRODUÇÃO

Este artigo procura refletir sobre como a teoria da análise de discurso (AD) dá
abertura para identificar e compreender discurso de exclusão dentro do ambiente escolar.
Será que a exclusão escolar é dirigida somente ao sujeito que não pôde acessar
o espaço físico escolar? Que não teve o privilégio de participar do processo de ensino
escolar? Se, por acaso, a escola, em sua supremacia ideológica, criar mecanismos de
discriminação e violência simbólica contra alunos que não se encaixam no perfil almejado
por ela, não poderia isso se configurar, também, como modo de exclusão?
Tal questionamento teve como resultado a elaboração deste trabalho que
propôs, como fundamento, discutir sobre a pertinência da AD para se compreender os
sentidos de exclusão que se dão pela linguagem discursiva dentro do ambiente escolar,
tendo como problematização a dificuldade de identificação desse tipo de discurso, visto que
sua veiculação é realizada através de ditos e não ditos dissimulados por um contexto que o
normaliza e o reproduz, sendo, portanto, necessário uma teoria tal como a análise de
discurso para identificar e compreender os meandros que o circunscreve.

II. A ANÁLISE DE DISCURSO PECHEUTIANA

A análise de discurso é o conceito que teve como um dos precursores o filósofo


francês Michel Pêcheux na década de 60 do século XX. Pêcheux, no intento de apontar o
discurso para outro sentido que não aquele dado na época, serviu-se de teorias marxistas,
relida por Althusser; da Linguística de Saussure; e da Psicanálise de Freud, pela releitura de
Lacan. Desse modo, Pêcheux forma o que ele denomina de tríplice aliança, incorporando a
sua teoria à Linguagem, à História e ao Sujeito (CARVALHO, 2008).
No tocante à Linguística, o filósofo foi mais além. Ele não estava interessado em
fazer a ciência da linguística de Saussure, levando em consideração aquilo que dela é
objetividade, a dizer, a língua. Não. Ele queria trazer a linguagem para AD naquilo que lhe
era singular, também. Para ele, a AD não era apenas estrutura, objetividade, supremacia
sobre o sujeito. Ela era, também, subjetividade, acontecimento, dinâmica. Com esse
pensamento, ele traz para cena a fala, aquilo que é a expressão do sujeito, inter-relação,
sujeito-linguagem, sujeito no mundo, sem, contudo, fazer oposição entre fala-língua,
sistema-realização, social-histórico.
A análise do discurso, como seu próprio nome indica, não trata da língua, não trata
da gramática, embora todas essas coisas lhe interessem. Ela trata do discurso. E a
palavra discurso, etimologicamente, tem em si a ideia de curso, de percurso, de
correr por, de movimento. O discurso é assim palavra em movimento, prática de
linguagem: com o estudo do discurso, observa-se o homem falando (ORLANDI,
2015, p. 13).

A ideia de formação discursiva (FD) surge justamente a partir dessa concepção.


Conceito cunhado por Foucault (SARGENTINI, sem ano), Pêcheux se utiliza dela para
incrementar aquilo que ele já vinha propondo desde o início em sua teoria: a de que o
discurso não advém de outro mundo, de um mundo paralelo (entenda-se esse mundo como
ideologia paralela). Ele acreditava que a formação discursiva só pode ter origem a partir de
outro discurso que esteja em vigor, mesmo que ela nasça com o objetivo opositor a ele.
Usando o exemplo da revolução que houve na França em 1789, Pêcheux demonstra que
não só a formação do discurso é constituinte de outro (s), mas que ela também é tomada
pelo acontecimento que a cerca, ela é atual, como destaca o autor, ao falar sobre
enunciado:
[...] todo enunciado é intrinsecamente suscetível de tornar-se outro, diferente de si
mesmo, se deslocar discursivamente de seu sentido para derivar para um outro (a
não ser que a proibição da interpretação própria ao logicamente estável se exerça
sobre ele explicitamente). Todo enunciado, toda seqüência de enunciados é, pois,
lingüisticamente descritível como uma série (léxicossintaticamente determinada) de
pontos de deriva possíveis, oferecendo lugar a interpretação. É nesse espaço que
pretende trabalhar a análise de discurso (PÊCHEUX, 2008, p.53).

“Para Pêcheux, um enunciado se insere nas condições de produção


determinadas pelas formações discursivas em um dado momento histórico” (CARVALHO,
2008, p.17). Ou seja, a produção de material significativo existe a partir de um contexto
histórico-social que tem por ordem uma matriz, que acontece em contexto social, dinâmico e
atual.
Essa conjuntura dinâmica e atual se dá pela enunciação que, numa
conceituação rasa do termo, pode-se dizer que se trata do dito em ação, da verbalização, do
ato de dizer. “Por enunciação deve se entender, então, ‘uma série de determinações
sucessivas pelas quais o enunciado se constitui pouco a pouco e que têm por característica
colocar o dito e em consequência rejeitar o não-dito’” (FUCHS; PÊCHEUX 1975/1997,
p.175-176 apud CARVALHO, 2008, p. 47-48). Nessa citação já podemos nos remontar e
relacionar o conceito de ideologia com sujeito, na medida em que a enunciação é a
possibilidade desse sujeito falar de sua singularidade através de algo que não está sob seu
domínio e é anterior a ele- a Linguagem-, mas que ele a atualiza e a presentifica na/pela sua
existência.
Contudo, antes de iniciarmos a relação sujeito-linguagem-ideologia, faz-se
necessário conceituar ideologia na acepção que será trabalhada aqui.
A "ideologia" é um conjunto de representações dominantes em uma determinada
classe dentro da sociedade. Como existem várias classes, várias ideologias estão
permanentemente em confronto na sociedade. A ideologia é, pois, a visão de mundo
de determinada classe, a maneira como ela representa a ordem social. Assim, a
linguagem é determinada em última instância pela ideologia, pois não há uma
relação direta entre as representações e a língua (GREGOLIN, 1995, p. 17).

Influenciado pela teoria marxista de Althusser sobre materialismo ideológico que


coloca que a ideologia tem como função transformar as pessoas em sujeitos sociais,
colocando-as em posições onde de lá possam atuar com a ilusão de estarem livres da
sobredeterminação ideológica (ALTHUSSER, 1980); Pêcheux introduz o sujeito psicanalítico
como modo de explicar como se dá o processo de assujeitamento deste à linguagem e, por
sua vez, à ideologia. Mas é necessário ir com calma, pois essa relação é complexa naquilo
que compete a três campos de saber, a dizer: as teorias linguística, psicanalítica e marxista.
Vamos mostrar a conexão entre Psicanálise e AD e, consequentemente, entre esta e a
Linguística e o marxismo.
Lacan, ao fazer a leitura de Freud, mostra que o sujeito psicanalítico é
atravessado pelo sentido e pelo não-sentido. Mas em que isso concerne à AD? Giorgenon e
Romão (2012) esclarecem:
AD e Psicanálise aproximam-se por trabalharem com a incompletude trazida pela
incidência do simbólico na linguagem, aquilo que descola o sujeito de uma relação
imaginária com o Outro, que permite ao sujeito reformular os discursos e os sentidos
que constrói em relação a suas palavras (p. 21).

A relação que pode se estabelecer entre Psicanálise e AD advém do próprio


conceito de sujeito que está totalmente imbricado com a noção de linguagem. O sujeito que
é marcado pela falta, instaurada pelo recalque, originário justamente pela lei simbólica,
marca o não-todo desse sujeito que, embora fale, nunca é capaz de se dizer por completo.
A linguagem, semelhante a ele, não é capaz de se dizer por si toda, ser transparente por
completa. É necessário que haja pessoas para que haja linguagem, embora esta última não
resulte apenas do acumulo daquelas para existir. Contudo, são os humanos que dão voz a
ela, por assim dizer (GIORGENON; ROMÃO, 2012).
É na própria constituição do sujeito que Pêcheux concebe a relação sujeito-
ideologia.
(...) se o sujeito, como afirma Lacan (1999), é o Outro e o inconsciente é o discurso
do Outro, é possível perceber como o recalque inconsciente e o assujeitamento
ideológico estão materialmente ligados, sem estarem confundidos na relação com o
significante. A AD baseia seu conceito de sujeito na incidência do recalque, que o
divide e o assujeita, o qual se mostra pela/na equivocidade da linguagem e
pelos/nos esquecimentos para que possa enunciar um discurso sobre si e sobre o
Outro; assim, caracteriza o sujeito como uma posição discursiva que, em
determinado contexto sóciohistorico, faz falar certos sentidos e não outros
(GIORGENON; ROMÃO, 2012, p.21).
Com dois tipos de esquecimento, Pêcheux (1983 apud MARTINS, 2004) explica
como este sujeito atualiza a ideologia em seu discurso: no esquecimento um, o sujeito tem a
ilusão de que ele é a fonte de todo o seu discurso, a origem dele, ficando “cego” aos
elementos externos que remetam à formação de seu discurso; no esquecimento dois, ele
acredita que o que profere tem apenas um significado e que esse é o que será
compreendido por aquele que o ouve.
Banhado pela linguagem, o sujeito ao dizer de si, diz do Outro, diz da linguagem,
uma linguagem que, como afirma Pêcheux ( apud MARTINS, 2004, p.07) “é uma importante
forma material da ideologia”. Com isso, o filósofo francês estabelece a conexão linguagem-
ideologia, colocando a difusão intra e interdiscursiva da ideologia pela existência da
linguagem.
Faz-se necessário explicitar que interdiscurso é
(...) aquilo que fala antes em um outro lugar, independentemente. Ou seja, é o que
chamamos memória discursiva: o saber discursivo que torna possível todo dizer e
que retorna sob a forma do pré-construído, o já-dito que está na base do dizível,
sustentando cada palavra (ORLANDI, 2015, p. 29).

Esse conceito denuncia a dependência do sujeito em relação ao simbólico, à


memória discursiva, pois para que ele fale, é necessário que haja palavras, sentido e
sintaxe. Ele pode até falar algo “à maneira dele”, mas as palavras e o sentido trazido por
elas são anteriores a ele e independem de sua existência.

III. COMO É POSSÍVEL QUE ALUNOS DENTRO DA ESCOLA SOFRAM


EXCLUSÃO ESCOLAR?

Giorgenon e Romão (2012) realizaram uma pesquisa qualitativa que procurou


investigar os sentidos dados por professores de uma escola de Ensino Fundamental de
Ribeirão Preto/SP sobre a inclusão em ensino regular de alunos que, utilizando o termo dos
professores investigados, tinham “deficiência mental”. Durante a pesquisa, foi constatado
que questões relacionadas à aprendizagem foram silenciadas por esses professores,
colocando o processo de inclusão restrito, em suma, à questão da socialização, o que
deixava subtendido que isso já era o suficiente para crianças com deficiência mental que
apresentavam pouca (ou nenhuma) capacidade de aprendizagem. Em consonância com a
historicidade do processo de inclusão/exclusão, os autores salientaram que, semelhante ao
encontrado em sua pesquisa, a história aponta que, até quando o posicionamento
assinalava a favor da inclusão de pessoas com deficiência, esta ressoava sentidos de
exclusão.
Essa pesquisa reforça a análise de discurso como meio para se escutar a
ideologia que circula sobre determinado objeto de estudo em determinado contexto,
levando-se em consideração o tempo, a linguagem e o inconsciente. Como observado no
trabalho realizado por Giorgenon e Romão (2012), a AD possibilitou que eles analisassem
os sentidos emitidos pelos enunciados dos docentes para além da fala consciente e do
contexto imediato, na medida em que mostrou um discurso ancorado a uma história (a da
deficiência mental) e à descentralização do sujeito, demonstrando o avesso daquilo que os
professores pretendiam dizer, qual seja, enunciados que expressavam sentidos de
exclusão.
Esse avesso do qual nos referimos, via de regra, está presente nos discursos
extremistas, trazendo em seu bojo aquilo que eles mais rejeitam. No texto: Delimitações,
inversões, deslocamento (1990) de Pêcheux, ele explica, de modo magnífico, tal
processo, a ponto de afirmar que na construção da ideologia revolucionária, esta se ancora,
justamente, naquilo que ela mais resiste- no poder dominante. Para tanto, explica ele: chega
um momento, durante a revolução, que se destaca a figura do porta-voz para negociar com
o governo- agora todas as vozes serão representadas por uma única voz-. O porta-voz terá
um contato imediato com seu adversário exterior. O governo possivelmente não se dirigirá
mais ao povo, mas a ele que, numa negociata, dará outro retoque a reivindicação- agora se
tratará de um negócio de Estado. Nesse momento, não será a voz do povo que ele trará no
processo de negociação, mas a sua e a do governo. Para tanto, ele terá que recorrer ao
trabalho revolucionário de sua memória, “onde os discursos sedimentados de todos aqueles
que o precederam neste destino o esperam para agarrá-lo, penetrá-lo, servir-lhe e reviver
através dele” (PÊCHEUX, p. 18, 1990).
Pode se conjecturar daí, afirma Pêcheux (1990), que aquilo que surge a partir da
negociata é algo de uma “ordem estatal revolucionária”, fazendo da oposição (Estado x
Revolução) uma imbricação.
Ressalva-se, ainda, neste artigo que a exclusão escolar pode se dar não apenas
às pessoas com deficiência, ela pode se estender a qualquer aluno que não se enquadre no
perfil exigido pela instituição escolar. Isso porque a escola carrega consigo valores, normas
etc. da sociedade da qual faz parte, sendo parte influenciada e influenciadora da estrutura
social que advém- no caso, da sociedade capitalista; e, como tal, sua finalidade se legitima
pela dominação de uma classe sobre outra (s).
(...) existe um poder invisível, ignorado, todavia, um poder de construção da
realidade, que é o poder simbólico. Os sistemas simbólicos são estruturas
sistematizadas de produção simbólica, como a língua, a arte, a religião, etc. A sua
função política é a de impor ou de legitimar a dominação, assegurando a dominação
de uma classe sobre a outra. O poder de violência simbólica é aquele que chega a
impor significações como legítimas, dissimulando as relações de força que estão na
base de sua atuação. A violência simbólica pode ser identificada na escola através
da imposição de uma cultura escolar própria à classe dominante, que serve para a
reprodução das estruturas de poder (BOURDIEU; PASSERON, 1975 apud BISPO;
LIMA, 2014, p.164).

O discurso de exclusão pode ser difícil de ser detectado, embora possa ser
pungente, promotor de violência simbólica. Isso porque advém de uma ideologia dominante
e uma das características desta é a propriedade naturalizante que possui. “Alias, é próprio
da ideologia impor (sem o parecer, pois que se trata de ‘evidências’) as evidências como
evidências, que não podemos deixar de reconhecer, e permite as quais temos a inevitável
reação de exclamarmos: ‘é evidente! É isso! Não há dúvida!’” (ALTHUSSER, 1980, p.96).
Daí a razão de o sujeito acreditar que determinados constructos culturais é algo que sempre
existirá e não o pensa como alguma coisa que possa ser modificado.
Žižek (2009 apud BISPO; LIMA, 2014) descreve a violência simbólica como sutil,
difícil de ser detectada, apresentando-se através de “(...) palavras, nomeações,
classificações e formas de utilização da linguagem, não sendo, muitas vezes, reconhecida
como violência, mas produzindo efeitos de forma mais insidiosa” (p.163). O autor afirma
ainda que em relação à escola, ela pode tanto ser transformadora do uso social da
linguagem, como também promover através de suas práticas, burocrática e administrativa,
tal violência.
Bispo e Lima (2014) referindo-se ao efeito nefasto da violência simbólica às
crianças e adolescentes, afirmam que ela é capaz de produzir destinos trágicos ao sujeito,
pois rotulações negativas podem gerar discriminações e exclusão social.
Essa perspectiva, quando pensada na lógica institucional escolar, pode ser
exemplificada da seguinte forma: quando um aluno é taxado de fracassado (“burro”, “zé
ninguém”, “ sem futuro”), provavelmente isso terá os mais diversos efeitos para ele, tendo
em vista que vivemos em uma sociedade meritocrata, que valoriza sujeitos eficientes e
brilhantes. Uma das consequências para esse sujeito seria o de se sentir à margem das
expectativas escolares.
Levando em consideração ainda a teoria da ideologia althusseriana, podemos
pensar que essa exclusão não produzirá só um efeito de fora para dentro, ou seja, esse
sujeito não enxergará essa exclusão como um sistema separado de si, que o atinge do
exterior para o interior (caso levemos em consideração a máxima althusseriana de que a
ideologia interpela o indivíduo transformando este em sujeito). Uma possibilidade que pode
ser apontada é que ele mesmo, enquanto interpelado por tal ideologia, pode acreditar que,
de fato, ele é um fracassado e que, por consequência, não conseguirá ser “ninguém na vida”
e que aos (outros) fracassados, de modo geral, ele destinará resultado semelhante.
Esse singelo exemplo serve para denotar como o discurso é histórico
(enunciativo) e atual (enunciação) e, ainda, como o sujeito, dividido pelo recalque e
assujeitado a linguagem pode perpetrar uma violência contra si e contra outros sem ter
plena consciência da estrutura ideológica-social que o usa no processo de reprodução e
naturalização de modos de exclusão.

IV. CONCLUSÃO

A AD é uma proposta válida para analisar o discurso de uma maneira complexa


na medida em que imbrica três campos do saber que são pertinentes quando nos referimos
às Ciências Humanas- Linguística, Psicanálise e História. Acreditamos que ela é viável para
escutar discurso de exclusão escolar naquilo que lhe é capcioso e complexo, por três
motivos que estão ligados pela relação entre esses três campos do saber:
1. Tal teoria (a AD) concebe que a ideologia não segue uma linha de
racionalidade e unicidade, podendo haver em discurso de inclusão, aquilo que é opositor a
ele, ou seja, sentidos de exclusão.
2. O de que o sujeito é tomado por um discurso ideológico pelo qual ele acredita
que é originado nele, mas que se trata, na realidade, da utilização desse sujeito como
veículo desse discurso onde provavelmente ele desconheça todo seu enredamento.
3. Com o conceito de formação discursiva, a AD mostra a condição histórica da
linguagem e seu modo de reprodução pelo sujeito, afirmando que aquilo que ele fala, na
autenticidade do momento, é obrigatoriamente ancorada a uma cadeia de significação
histórica, revelando o fato de que esse sujeito, ao falar, atualiza algo presente na memória
discursiva.
Esses três tópicos foram o suficiente para explicitar ao longo deste trabalho que
a escola, enquanto instituição capitalista, com suas normas, valores etc é uma instituição
agenciadora de modos de exclusão, onde todos aqueles que não se enquadram no modelo
estabelecido por ela, modelo regido pela elite detentora do poder ideológico, são, em algum
sentido, marginalizados.
Os três tópicos ainda destacam a formação discursiva como conceito
fundamental para clarificar a ideia de que existem pontos históricos emaranhados
formadores do discurso de exclusão escolar, revelando a importância de se entender como
a história dos modos de exclusão tem atingido os sujeitos contemporâneos que tem se
ocupado com a formação e manutenção das instituições de aprendizagem. Isso pode ser
uma das explicações para entender porque os sujeitos, no intento de realizar o seu trabalho
docente ou, mais especificamente, o de promover a inclusão, tornam-se, interpelados pela
ideologia da classe burguesa dominante, promotores da exclusão a qual no plano da
consciência, muito deles, menosprezaria.
Necessitamos agregar às diretrizes de investigação e discussão da Política de
Inclusão Escolar propostas que identifiquem e compreendam modos de exclusão escolar em
todos os níveis; e não apenas, o físico (ex: a arquitetura inclusiva) ou pedagógico (ex.:
Libras como proposta pedagógica), mas principalmente o do discurso, pois este, por se
tratar do campo do Humano nas mais diversas dimensões (histórica, cultural, psicanalítica,
política e outros), abre a possibilidade para compreensão dos outros meios de inclusão,
inclusive os aqui mencionados, afinal todos eles passam pelo campo da linguagem.
A título de conclusão, reiteramos a urgência em abrirmos nossos ouvidos para
escutar as minúcias daquilo que é discursado pela boca do Sujeito que diz: se a inclusão é
uma questão a ser discutida, não podemos distanciar a exclusão do Eu, colocando-a como
uma terceira pessoa, uma pessoa distante, pelo contrário, a exclusão é tão Tu quanto a
inclusão, precisamos de um diálogo frente a frente.

REFERÊNCIAS

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