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CAPÍTUL0 1

MITO EXPLICA O MUNDO

PERIODO HOMERICO

se estendeu do século XII ao século VIII a.C.


No período que
homérico, desenvolveram-se as bases da civilização gre
denominado
remontar ao ano
ga. Entretanto, origens desse período podem
as
a
tribos gregas-aqueus passaram
2000 a.C., quando as primeiras e as ilhas
o Peloponeso
a Grécia continental,
Ocupar, gradativamente, denominado de
Estabeleceu-se aí o que viria a ser
do mar Egeu.
1100 a.C.).
civilização micênica (1700 a e na
num artesanato desenvolvidos
Baseada numa agricultura e

civilização passou a ser dirigida por


uma

utilização do bronze, essa


militarmente organizada, enriquecida
pelo
nobreza de nascimento,
Era em torno do palácio que
girava a
saque e pela posse de terra.
centrali-
econômica, militar e religiosa,
organização política, social, desempenhava papel
funda
zada pelo rei. Nessa estrutura palaciana
e con
fiscalização,regulamentação
mental a escrita, utilizada para nesse
fundamental
r o l e da vida econômica e
social. A vida rural,

os aqueus e jónios já se encontravam

Diakov Kovaley (1976) afirmam que


e a
havendo documentos que atestam
do ano 2000 a.C.,
na Grécia a partir dos eólios
a.C. A época do aparecimento
presença dos jônios no século XIl século
não está determinada, mas,
segundo estes autores, a partir do
na região
jônios, eólios e dórios.
AI a.C. os gregos iá são formados de aqueus,
como aqueus,
gregos eram conhecidos
Glotz (1980) afirma que os primeiros
e de eólios.
veio a ser chamada de jônios
q u e é uma parte deles que

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perodo, bascavase no gèné cmantinha certa independncia em
várias
clação o palácio. No cntanto, o pagamento de tributos de
a morte,
Chpécien c obrigatório, O chele do gèné tornava-se, após
NCu protctor; o culto dos mortos c dos antepassados é uma religião
da lamili, vinculado ao tunulo c necessita dos descendentes para
continuá lo. Além da rcligiäo vinculada aos mortos, existia a religião
vinculada aos deusCs.

Por volta de 1200 a.C., grupo grego-0s dórios


um outro
conti-
passou a Ocupar a Grécia, tomando gradativamente, a Grécia
nental, o Peloponeso c as ilhas do mar Egeu. Uma das consequen
grega.
cias dessa invasão foi o primeiro movimento de colonização
Eólia e os jönios
Fugindo dos dórios, os cólios estabeleceram-se na
na fundando as colônias gregas na Ásia Menor (voltar-se-a
Jónia,
a falar destas colônias no período arcaico).
e economicamente
num regl-
Os dóri0s organizavam-se política
numn
estava organizada
me génos, enquanto a sociedade micênica
de
econ0
de servidão coletiva, em torno de um rei com poderes
regime forma
Foi a organização na
micos, politicos, militares e religiosos. então; 1550
a partir de
de gene e tribos que passou a predominar
com ela, o
de toda a estrutura palaciana e,
significou a destruição foi poSsivel
desaparecimento da escrita. Esta reorganização gentílica
em certa medida,
tal forma
também os aqueus haviam mantido,
pois Os
nos agrupamentos
rurais em torno do palácio.
de organização o
conhecimento técnico-
dórios trouxeram ainda um importante
do novo metal implicou o aprimo
do uso do ferro. A difusão do uso das forças
e uma grande expansão
ramento das armas de guerra

cidade grega, ao descrever os mo


2 Glotz (1980), no livro em que discute a
as fratrias e
mentos que civilização grega, caracteriza os genos,
originaram a
ele considera básicas. Afirma que:
as tribos, instâncias de organização que
chamavam patriá ou,
"Tinham por pátria o cl patriarcal a que precisamente
membros descendiam do mesmo antepassado
mais amiúde, génos, onde todos os
número maisou menos
reunidos
cadoravam o mesmo deus. Esses cls, em

confrarias no sentido mais amplo


grande, formavam associações mais extensas,
ou phratriai (fratrias), corporações
de guerra, cujos componentes eram conheci-
hetairoi. Quando as fra-
dos pelos nomes de phrátores ou phráteres, étai ou
num pequeno número,
trias se lançavam a grandes expedições, grupavam-se
sempre o de tribos ou
mesmo, cada uma dessas tribos tinha um deus
phulaí:
e um grito de guerra próprios, recrutava o seu corpo de exército, a phúlopis,
obedecia ao rei, o phulobasileus: mas, em conjunto, todas reconheciam
a
e
autoridade de um ser supremo, o basileús- chefe" (pp. 4, 5).

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dstivas, a melhoria dos instrumentos de trabalho agrícola c o
do artesanato.
desen volvimento
Esses fatores Jevaram a formação de um novo período na Gré
cia. que se caracterizou pela substituição da realeza (presente na
civilização micenca) pcla aristocracia, Em ugar de um rei todo
noderoso, desenvol veu-se durante esse período uma aristocracia que
passou a tomar as decisóes políticas e cconómicas. A organização
política, que antes girava em torno do palácio, passou a girar em
torno de ágora, sendo as decisõcs baseadas em discussõcs públicas,
ainda que delas participasse apenas uma parccla da população-
os cidadãos.

Nesse período, as comunidades estavam bascadas numa econo

mia rural, produção de cereais, 6leo, vinha, horticultura e


com a

pastoreio. Também a tecelagem, a fiação c o artesanato de metal


e cerámica eran atividades económicas importantes. Eram trazidos
de fora o metal necessário à produção de instrumentos de trabalho
e os escravos, conseguidos pela pilhagem e troca na forma de pre

sentes (que, freqúentemente, eram revestidos da conotação de com-


promissos de amizade ou cooperação).
Da união dos gèné, fratrias e tribos surgiram as cidades
como

centro de organização política. Nelas conviviam diferentes grupos

sociais: a aristocracia, os artesãos, os trabalhadores


liberais (arautos,
paternas, os
médicos etc.), que geralmente mantinham profissõcs
proprietários e os trabalhadores sem terra e sem qualquer
pequenos
Encontravam-se ainda escravos. Essa formna
profissão especializada.
momento, patriarcal
de escravidão caracterizou-se por ser, naquele
ou doméstica em que o trabalho escravo era feito lado a lado com

Glotz (1980) apresenta u m a caracterização


de ágora, a partir da qual se

mais gerais: ágora e r a a praça onde as

pode citar alguns de seus aspectos


formavam opiniões; era utilizada, também, para
pessoas passeavam, discutiam e
nela realizavam as assembléias plenárias das cidades gregas,
Comércio, se
cidadãos, quer para estes tomarem de
os
quer para comunicar decisões para marcante que a ágora era também parte dos
cisões; o caráter político e r a tão algumas cidades gregas tornou n e
de
acampanentos militares. O crescimento
local para as assembléias. Esses locais, e n -
Cessária a construção de u m outro
caráter público e e r a m suficientemente grandes para
mantiveram seu
tretanto,
abrigar grande número de cidad os.

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considerava-se dos der.
descendente
seu proprictário.' A aristocracía
ses e conservava cuidadosanente sua genealogia como torma de ga-
entanto, já começava a sET mpor
tantir condição privilegiada. No
tante também a riqueza, e as propriedades passaram a ser vistas

como fontc de poder.


A cidade grega no era a reunião de indivíduOs isolados, mas
sim do conjunto de gènê e fratrias que a compunham e que nela
cram representadas nos conselhos e nas assembléias. A orzanizacãa
militar também era baseada nos gènë, fatriase tribos que compu-
nham a cidade. Havia um rei escolhido entre os chefes de tribas
gènê ou fratrias, e que era elevado a tal posição por apresentar
mclhor gencalogia dentro de todos. No entanto, esse rei era um entre
outros reis, já que todos os chefes também eram reis e também deti
nham poder sobre aqueles que formavam seu gènos.
As decisões políticas, militares e econômicas eram tomadas pelos
conselhos, geralmente compostos dos chefes dos gènë e iratrias, e as
decisöes mais importantes deviam ainda ser submetidas à assembléia
à qual compareciam todos os cidadãos que pertenciam à cidade. No
entanto, essas assembléias ainda não contavam com a participação
ativa do povo que a elas comparecia. Nas assembléias, de uma ma-
neira geral, o povo mantinha-se calado, e as decisões- já tomadas
pelo conselho e/ou pelo rei eram levadas à ágora, primordial
mente, para serem ratificadas.
Assistiu-se, assim, ao surgimento da pólis que, pela sua orga
nização econômica, política e administrativa, caracterizou a civiliza
ção grega. O processo de surgimento dessa nova forma de organi-
zação provocou no apenas profundas transformações na vida so
cial, mas tambén alterações fundamentais nos hábitos e nas idéias.
Vernant (1981) aponta algumas dessas alterações dentre as quais
duas podem ser destacadas. A, primeira delas refere-se ao reapare

Segundo Thomson (19746), podemos encontrar dois momentos na evolução


da sociedade escravista: a) um período inicial no qual o comércio era pouco
desenvolvido e a escravatura era patriarcal visando suprir, principalmente, as
necessidades imediatas. E ainda característica desse momento a existência de
grande número de camponeses, pequenos produtores e proprietários de terra;
b) um período de desenvolvimento pleno da escravatura no qual se desenvolve
ram o comércio, a propriedade privada e as relações monetárias. Nesse mo
mento, o escravo substitui o trabalhador livre e, diferentemente do momento
anterior quando era utilizado principalmente para atender às necessidades
imediatas-era, então, utilizado para a produção de mercadorias. Caracteriza
ainda este momento a pólis como forma de organização política.

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cimento da escrita, por volta do sculo IX a.C., com uma função
completamente diferente da que tinha durante a civilização mic
ao aparclho
nica, quando restrita aos cscribas c vinculada
estava
a função de divulgar
administrativo. A escrita reaparecia, agora, com
muito mais
tornando-se assim
aspectos da vida social c política, comum e no
Era pública sentido de atender ao interesse
pública. no
em opo
sentido de garantir processos abertos a
toda a comunidade,
atendia
aos interesses
palaciana a quc
exclusivos da estrutura
SIçao refere-se a espe
no período anterior. A segunda
dessas alterações
ao rei
cabia mais
sociais. Não
Cialização de determinadas funções elas
comando absoluto na tomada de todas as decisões-fossem
o
econômicas ou militares.
As decisões passaram
politicas, religiosas, mas
maneira absolutamente individual,
a ser tomadas não mais de
até da assem
da discussão e do apoio dos conselhos e
dependiam e econðmicas pas-
bléia. Dessa forma, as decisões militares, políticas
de dis-
de decisões humanas, resultado
saram a ser vistas como fruto
único rei divino.
dos homens e não de um
cussões e deliberações da tomada
já, dois aspectos
Essas características expressavam,
relacionados conceito de cidadania, que
ao
de decisão intimamente e o carater
grego: o
caráter humano
fundamental no mundo
foi tão o controle
dos destinos
isso, ampliou-se
público das decisões. Com de todos ao mundo espi-
homens e o acesso
humanos pelos próprios às formas de
raciocínio,
aos valores e
ritual e ao conhecimento, debate.
sujeitos à crítica e ao
se tornassem
permitindo que todos desenvolveriam plenamente, no en-

Essas características só se
o fato de
compreender
E assim que se pode exercidas
tanto, bem mais tarde. promulgadas e
momento, as
leis eram
serem
que,
ainda neste
e os mitos e que (por
conheciam a tradição deliberavam
por aqueles que interpretavam o presente e
com os deuses) ilustrativa a
aparentados A esse respeito é
essa interpretação. aos deu
de acordo com
"Mediador dos homens junto
(1980): Ao
afirmação de Glotz dos deuses entre
os homens.
representante essas
ses, o rei é ainda conhecimento das thémistes,
o cetro,
recebeu também o remover
todas as
receber
sobrenatural que permitem de
inspiraçoes de
origem a paz
interior por meio
especialmente,estabelecer intransferí-
e
dificuldades e,
uma relação pessoal
justas." (p. 35) Assim, exercício da justiça,
palavras fosse no
os deuses,
homens e atividades huma-
vel entre alguns fortemente as

fosse no da religio (que regulavahomens de maneira subjetiva.


controlava a
vida de outros
de Hesíodo (Os
e as
nas), Odisséia)
Homero (liada e documentos

As obras de
constituírem
além de
dias e Teogonia),
trabalhos e os
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nportantes para o entendimento histórico desse período, permitem
descortinar características do pensamento ento produzido.
Homero, que possivclmente viveu na Jônia no século IX a.C,
retrata em seus poemas liadac Odisséia momentos diferentes. A
liada mostra um periodo de guerra (guerra de Tróia 1280-1180
a.C.) descrevendo o comportamento de heróis em luta. A Odisséia
retrata uma época de paz (a vida doméstica, relaçõcs familiares).
Essa diferença de conteúdos c
situações ocorridas com
diferenças de
um século explica-se, possivelmente, pelo fato de os poemas homé
ricos terem sido compilados ou redigidos após cxistirem como tra
dição oral. A redação, após vários séculos dos acontecimentos que
os poemas retratam, possivelmente determina alterações nos fatos
históricos apresentados e a dificuldade na delimitação precisa da
época a que se referem: a liada apresenta características e fatos
que se desenrolaram durante a civilização micénica sendo, entretan-
to, dificil isolar os fatos que seriam de épocas posteriores; e a Odis-
séia, possivelmente, retrata o período posterior: relata, por exem-
plo. decisões tomadas não mais por um rei, mas por assembléia de
nobres.
Hesíodo nasceu em Ascra, na Beócia, e viveu entre o final do
século XIII a.C. e início do século VIl a.C.. No poema Os traba-
Ihos e os dias descreve a vida campestre, a vida vinculada ao tra-
balho, e na Teogonia propõe uma genealogia dos deuses e do mundo.
W. Jaeger (1986) faz uma análise de tais obras a partir da qual
se pode depreender sua importância. Homero e Hesíodo escreveram
a partir de locais sociais diferentes; enquanto Homero tem sua obra
marcada pela descrição da vida e do mundo do ponto de vista de, e
dirigida à aristocracia e a nobreza, Hesíodo coloca-se sempre numa
perspectiva que é própria das camadas populares especialmente
os camponeses. Essa diferença marca as distintas concepçoes desen
volvidas por eles.
Homero associava a noção de homem à noção de virtude que,
de alguma forma, definia o próprio homem. No entanto, as virtudes
eram sempre, para Homero, virtudes que só podiam ser encontra-
das entre os aristocratas, seja porque eram em si típicas dessa cama
da social, seja porque só podiam ser desenvolvidas por aqueles que
de nascimento as possuíam. A força, a destreza e o heroísmo eram

Tal diferença é também explicada pela possibilidade de Homero não ter


existido, ou de existir mais de um Homero.

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virtudes a serem buscadas
desenvolvidas por homens que já as
e
possuiam em germe, por nascimento. A elas associava-se a altivez.
o direito
que alguns possuíam (os nobres, os virtuosos) à honra e
a serem reconhecidos lado dessas qualidades que
como tal; ao
per
mitiam ao homem atuar, deviam ainda desenvolver seu espirito, e
assim, adquirir as capacidades da refkxão. O reconhecimento,. por
parte da comunidade, das virtudes e honradez de um homem. e mais.
o reconhecimento público disso, era fundamental como medida desse
homem homem era tão mais virtuoso quanto mais pudesse
demonstrar e encontrar reconhecimento disso entre seus pares.
J á Hesíodo associava à concepção de homem a noção de que
apenas pelo trabalho se atingia a virtude. O trabalho-apesar de
árduo e dificil não devia ser visto como uma carga. mas com
a torma propriamente humana absolutamente necessäria de se atin-
gir a virtude. Assim, ao invés de pensar o homem como um guer
reiro, pensava-o como um trabalhador. Não associava trabalho à
acumulação desenfreada de riquezas e não o associava com a mise
ria do trabalho mal pago, mas apenas com a dignidade da produgão
de uma existência virtuosa. Outra noção central à sua concepcão d
homem era a de justiça. Enquanto entre os animais imperava o direito

do mais forte, assumia que entre os homens imperava o direito de


justiça. Para Hesíodo, essa era a distinção fundamental que
marcava

os homens e que devia ser buscada. O direito que assegurava a jus-


trabalho os trazia de
tiça era de todos os homens, e associado ao
e n c o n t r a r uma vida
volta a uma ordem natural onde era possivel
satisfatória e virtuosa.
de maneira radical Homero
Se a concepção de homem distingue
realidade de uma sociedade em que a
vida
e Hesíodo, isso traduz a
indivíduos marcada por profundas diferenças. dadas as con-
dos era
viviam um mesm
sociais. No entanto, Homero e Hesíodo
dições de v a
momento histórico em que
todos os gregos emancipavam-se
de uma herança c o m u m . pre
partir
lhas e arraigadas tradições a e,

paravam um novo modo de viver.


túmulo. inter
mortos, essencialmente ligado ao
O culto aos
dos costumes causadas pela
rompido função das transformações
em
sobrevivem só nos
os ancestrais
invasão dória e pelas migrações:
r e n o v a em torno
de novos chefes devido ao
mitos, e o culto não se
dos cadáveres. Como afirma Brandão
novo hábito de incineração
do corpo.
alma do morto, separada para sempre
(1986),. (.. . ) a domicilio e da vida de seus
definitivo excluida de seu
estava em nem a es
nada mais a temer
descendentes, não havendo. portanto,
perar da psiquê do falecido" (p. 120). O contato com
origens e
grupos de
muito diferentes favorecia a ruptura com as
costumes
Ihas tradições; fazia com ve
que partissem do que eles tinham em
comum com suas
crenças religiosas. Os deuses perdiam sua
dade, sacrali
ganhavam humanidade, podiam tornar-se objeto de
afastando-se o mistério. Assim, narrativa
a religiao dos deuses tomava
da religio dos mortos. lugar
E ai, talvez, que se encontre
explicaçao para a preocupacão
a
que era comum a Homero e a Hesiodo:
aproximar os deuses dos
homens, criar um laço entre homens e deuseS que
tormasse a vida
terrena mais racional e
compreensível.
A relação homem-deuses estabelecida tanto por
como por Hesíodo- tem
Homero
um duplo caráter. De um lado, valori.
zava o homem, na medida em que humanizava
deuses que tinhamos
forma e sentimentos humanos medida em que a ele
e na
ações que possibilitavam o desenvolvimento pleno de suascabiam as
De outro lado, estabelecia uma virtudes.
aos deuses, que eram vistos
dependéncia dos homens em relação
como imortais e com
ferir nas vidas humanas. Se isso poderes para inter
submetia, de uma certa forma, o
homem às divindades, também dava
significado à vida humana que
passava a ser vista como tendo uma certa razão de
ser.
Outro aspecto que marcou a
de Homero e Hesíodo, foi a busca da
relação homem-deuses, nos mitos
seus fenómenos, através da
compreensão do Universo e de
ordenação dos deuses que passaram a
ser vistos como existindo dentro de
uma certa ordem e
segundo uma
hierarquia que limitava, inclusive, seus poderes sobre a vida humana.
Tais mitos, chamados cosmogônicos ou teogônicos, buscavam
descrever a ordem do Universo, do Cosmos,
surgindo a partir do
Caos, e de uma genealogia dos deuses. Essa preocupação com a ori-
gem era abordada no mito de maneira que lhe é própria. Segundo
Vernant (1973), no mito a noção de origem se confunde com nasci-
mento e a noção de produzir com a de gerar, assim (..) "a ex
plicação do devir assentava na imagem mítica da união sexual. Com-
preender era achar o pai e a mae: desenhar a árvore genealógica"
(p. 301). Através le nascimentos sucessivos, frutos da união de
forças qualitativamente opostas ou do confronto de tais forças, esta
belecia-se a ordem no mundo e entre os deuses. O mundo dos deuses
refletia o mundo dos homens e através da racionalização dos deuses

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e racionalidade para a vida humana."
dos mitos estabelecia-se uma
deuses e na qual atri-
A hierarquia que Homero estabelecia entre os
nessa direção. Citando
buia um poder maior a Zeus parece apontar
um pensamento religioso
aeger (1936): "Assim, vemos na Iliada
o problema de pôr em
emorai já bastante avançado debater-se com
e local da maioria dos
concordäncia o caráter originásrio, particular
do mundo." (p. 56).
deuses com a exigência de um comando unitário
encontrava
tendo o trabalho como
A causa que Hesíodo para
de determinado momento,
sido instituído pelos deuses, a partir um

como fruio de um ato eraconsiderado imoral (o roubo), assimn


que
deuses, em
como o estabelecimento de uma genealogia clara para os

deusa da Justiça (Dike), represen-


que se pode destacar o fato de a
tante de algo tão importante, ser filha de Zeus, o deus maior, tam-
entre os deusees
bém apontam para a busca de uma racionalidade
que, em última inst ncia, espeiha a racionalidade do mundo, ao
A esse
mesmo tempo em que justifica e garante essa racionalidade.
vontade divina de
respeito, Jaeger (1986) afirma: "A identidade da
Zeus com a idéia do direito e a criação de uma nova personagem
intimarnente a Zeus, o deus supremo, são
ligada
divina, Dike, tão
da seriedade moral com
a imediata conseqüência da força religiosa e

a classe camponesa e os
nascente habitantes da cidade sentiram
que
a exigência da proteção do direito." (p. 68)
Essa racionalidade mítica envolve ambigüidade: (.. .)
uma
o mesmo fenô-
"operando sobre dois planos, o pensamento apreendesimultaneamente
da terra das águas,
meno, por exemplo, a separaçao
como fato natural no mundo visível e como geração divina no tempo

primordial." (Vernant, 1973, p. 300.) Caberá ao período que se


contida no mito e dar um novo caráter
segue superar ambigüidade
a

à elaboração do pensamento.

6 Pode-se dizer que se encontra uma racionalidade no âmbito do mito porque


racional buscam u m a ordem no universo.
tanto o mito commo o pensamento
Entretanto, essa racionalidade está dentro dos limites do mito. A preocupação
cosmológica dos primeiros jônicos, considerados como iniciadores do pensa-
mento racional, já está presente nos mitos teogônicos de Hesíodo (como aponta
Thomson, 1974a, a partir dos trabalhos de Cornford). Esses mitos apresentam
os elementos da natureza- como água, terra e t c . - se confrontando ou se
segregando (e não mais se unindo sexuaimente) para formar o cosmos, como
farão posteriormente os físicos jônicos; entretanto tais elermentos no mito
mantêm caracteristicas humanas que se perderão ao serem racionalizados. As
sim, a transição do mito à razão não pode ser analisada como se uma mentali-
dade pré-racional fosse irredutível à racional

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