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Seção Judiciária do Distrito Federal

17ª Vara Federal Cível da SJDF


SENTENÇA: TIPO C
PROCESSO: 1001722-37.2021.4.01.3400
CLASSE: AÇÃO POPULAR (66)
AUTOR: KIM PATROCA KATAGUIRI, RUBENS ALBERTO GATTI NUNES
REU: EDUARDO PAZUELLO, UNIÃO FEDERAL

SENTENÇA

Cuida-se de ação popular, com pedido de provimento liminar, proposta pelos


cidadãos Kim Patroca Kataguiri e Rubens Alberto Gatti Nunes em face de Eduardo
Pazuello (ministro de estado da Saúde) e União Federal, objetivando, em síntese, o
afastamento do 1º requerido do cargo que atualmente ocupa.

Alegam os autores, em abono à sua pretensão, que a forma de gestão da


pasta da saúde atenta contra o postulado constitucional que garante o direito à saúde a
todos os brasileiros, sendo que a demandante destaca diversos eventos que, ao seu
entender, demonstram a inefetividade da conduta administrativa do atual titular da pasta
da Saúde, considerando-se, notadamente, o panorama de pandemia que acomete o
mundo todo.

Com a inicial vieram documentos e procuração.

Foi determinada manifestação prévia da parte requerida acerca dos termos


da tutela de urgência postulada. Em resposta, a União suscita a existência de conexão
deste feito com o processo n. 5000233-53.2021.4.04.7104, a inadequação da via eleita e,
no mérito, a ausência de comprovação de ato lesivo a ensejar o processamento desta
ação popular, Id. 421670440.

É o breve relatório. Decido.

Destaco, de logo, que é caso de indeferimento liminar da presente ação


popular, por inadequação da via eleita, ante a ausência de indicação de ato objetivo e
específico a ser desafiado nesta via processual.

Como se sabe, nos termos do art. 5.º, inciso LXXIII, da Carta Constitucional
de 1988, a ação popular é um dos instrumentos de participação política do cidadão na

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gestão governamental que se circunscreve à invalidação de atos ou contratos que
estejam maculados pelo vício da lesão ao patrimônio público, à moralidade administrativa,
ao meio ambiente e ao patrimônio histórico ou cultural.

Conferindo exegese ao dispositivo constitucional, o Supremo Tribunal Federal


tem entendido que "a Ação Popular, como regulada pela Lei nº 4.717, de 29.06.1965, visa
à declaração de nulidade ou à anulação de atos administrativos, quando lesivos ao
patrimônio público, como dispõem seus artigos 1º, 2º e 4º. Mas não é preciso esperar que
os atos lesivos ocorram e produzam todos os seus efeitos, para que, só então, ela seja
proposta" (cf. AO 506-QO/AC, Tribunal Pleno, da relatoria do ministro Sydney
Sanches, DJ 04/12/1998).

De modo que a ação popular tem fins preventivos e repressivos da atividade


administrativa ilegal e lesiva ao objeto legalmente salvaguardado, quer como forma de
prevenir a consumação dos efeitos lesivos do ato, quer como meio repressivo ou corretivo
da aludida lesão.

Sobre a temática, a Corte Constitucional assentou o posicionamento de que,


para o cabimento da ação popular, basta a ilegalidade do ato administrativo a invalidar,
por contrariar normas específicas que regem a sua prática ou por se desviar de princípios
que norteiam a Administração Pública, sendo dispensável a demonstração de prejuízo
material aos cofres públicos. Isso na consideração de que a norma constitucional abarca
não só o patrimônio material do Poder Público, como também o patrimônio moral, o
cultural e o histórico. (Cf. RE 170.768/SP, Primeira Turma, da relatoria do ministro Ilmar
Galvão, DJ 13/08/1999; RE 206.889/MG, Segunda Turma, da relatoria do ministro Carlos
Velloso, DJ 13/06/1997.)

Posicionamento esse que se viu reafirmado, em sede de repercussão geral,


no julgamento do ARE 824.781-RG/MT, no sentido de que "o art. 5º, inciso LXXIII, da
Constituição Federal, que tem como objetos a serem defendidos pelo cidadão,
separadamente, qualquer ato lesivo ao patrimônio material público ou de entidade de que
o Estado participe, ao patrimônio moral, ao cultural e ao histórico" (cf. Tribunal Pleno, da
relatoria do ministro Dias Toffoli, DJ 09/10/2015).

Na concreta situação dos autos, a leitura atenta da peça exordial revela que o
objeto da presente demanda é o afastamento do atual titular do cargo de ministro
de estado da Saúde. Não se identifica, de forma clara e precisa, qual seria o ato
administrativo aqui impugnado, cujos efeitos se busca invalidar judicialmente.

Nesse descortino, por dedução, infere-se que o ato a ser submetido ao


escrutínio judicial seria a escolha e nomeação realizada pelo presidente da República, a
partir da qual o 1º requerido passou a exercer a titularidade da pasta da Saúde. Com
efeito, ao meu sentir, o controle postulado ostenta inquestionável natureza política, a
escapar dos rígidos limites finalísticos e processuais da ação popular.

É certo que a condução de políticas públicas por agente público de forma


inefetiva, desproporcional, deficiente, inábil e incoerente reclama pronta e contundente
atuação judicial, através dos meios processuais adequados, o que, ao que se tem dos

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autos, ocorre na situação descrita pelos demandantes, uma vez que tramita perante o
Supremo Tribunal Federal e em outros foros instrumentos de controle visando sanar toda
a ordem de inconformidades acima reportadas.

Ocorre que, no presente caso, não se impugna ato concreto e específico


veiculado pelo ministro de estado da Saúde, mas, de outro modo, pugna-se pela
invalidação de sua nomeação, a partir da análise do “conjunto da obra” de sua gestão
administrativa. Conforme acima aludi, o objeto aqui perseguido não cabe nos estreitos
limites dessa via processual, estando aberta a utilização de outros instrumentos jurídicos
pelas partes legitimadas, além do insubstituível controle popular, a ser exercido,
oportunamente, através do voto.

Esse o quadro, não se presta a via da ação popular, como instrumento de


participação legítima do cidadão na atividade administrativa, para interferir politicamente
em ato de nomeação de ministro de estado, desvirtuando-se, dessa forma, da finalidade
jurídica do remédio constitucional.

Dispositivo

À vista do exposto, ante a inadequação da via eleita, indefiro liminarmente a


petição inicial, julgando extinto o processo sem resolução do mérito. Isso com apoio
no art. 485, incisos I e VI, do CPC/2015, c/c o art. 5.º, inciso LXXIII, da Carta Magna e art.
1.º, § 1.º, da Lei de Ação Popular.

Sem custas e honorários advocatícios (CF/88, art. 5.º, inciso LXXIII; Lei
9.289/96, art. 4.º, inciso IV).

Sentença sujeita ao duplo grau obrigatório de jurisdição (Lei 4.717/65, art.


19).

Publique-se. Intimem-se as partes e o Ministério Público Federal (Lei


4.717/65, art. 19, § 2.º). Cumpram-se.

Brasília/DF, 10 de fevereiro de 2021.

(Assinado Digitalmente)
Diego Câmara
17.ª Vara Federal - SJDF

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