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A Resenha: esclarecimentos gerais sobre seu caráter, finalidade e modo de elaboração

Prof. Genauto Carvalho de França Filho (NPGA/UFBA)

Diferentemente de um resumo, a resenha pode ser considerada como uma síntese


comentada de um trabalho – seja este um livro, ou um artigo, etc.. Sua finalidade, enquanto texto
analítico e reflexivo, é aquela de expor o pensamento de alguém, um autor ou autores cujo texto
constitui objeto de estudo. Aquele que escreve uma resenha portanto deve ser capaz de entender
como pensa o autor, suas idéias (a articulação entre elas) e como estas idéias se sustentam.

Quanto a forma, uma resenha responde duas questões fundamentais: Qual o objetivo do
texto e o que ele trata. A resposta a essas duas perguntas orienta metodologicamente toda a
construção do texto resenhístico. A resposta à primeira pergunta abre a resenha, em geral, sendo
desenvolvida normalmente em no máximo um parágrafo. Aqui o objetivo é apreender o sentido do
texto para o autor, qual sua finalidade, o que ele pretende mostrar com tal trabalho. Isto demonstra
já (por parte daquele que elabora a resenha) uma capacidade de apreensão da totalidade do trabalho.

A resposta à segunda pergunta vêm refletir a estrutura do texto. Aqui o propósito é de


recompor o percurso metodológico do autor para cumprir seu objetivo (que fora objeto da primeira
pergunta). Dito de outro modo, “o que ele trata” quer dizer como o autor estruturou o seu texto. O
texto resenhístico pretende pois dissecar essa estrutura, ou seja, expor e discutir a seqüência das
idéias/argumentos desenvolvidos pelo autor. Isto permite apreender/identificar/perceber o nível de
coerência do texto analisado, bem como sua consistência, ou seja, os fundamentos da argumentação
do autor.

Um texto resenhístico visa assim apresentar, em síntese, o objetivo do texto e a estrutura


das idéias desenvolvidas pelo autor para atingir seu objetivo. Tal síntese pode ser acrescida de
comentários pessoais (daquele que elabora a resenha). Comentários estes sob a forma de apreciação
crítica do argumentário desenvolvido no texto. Tal comentário pode se fazer pontualmente, em
certas passagens específicas do texto, ou no seu final. De uma ou de outra forma, tal comentário não
constitui uma obrigatoriedade ou condição indispensável para um texto dessa natureza
(resenhístico).

A natureza do texto resenhístico, parece sempre oportuno lembrarmos, identifica-se com


aquela do texto científico, que possui caráter monográfico, podendo assumir diferentes formas: a
exemplo de uma dissertação de mestrado, de uma tese de doutorado, ou de relatórios de pesquisa.
Distinguem-se pois, tais tipos de texto, daqueles trabalhos (textos) de natureza jornalística ou
literária, entre outros. Neste sentido, convém afirmar a importância da prática de elaboração de
resenhas enquanto exercício privilegiado para o processo de aprendizagem do texto científico.

Como todo texto de natureza científica portanto, a resenha é marcada por um estilo
redacional bastante característico. Nesta, o autor da obra analisada aparece permanentemente citado,
a fim de tornar claro ao leitor que trabalha-se com idéias de outrem. Neste sentido, o texto
resenhístico aparece caracterizado por uma espécie de “diálogo com o autor”. Expressões como
“para o autor...”, “segundo o autor...”, “ele pensa que...”, são recursos habituais de linguagem no
texto resenhístico, aparecendo em geral, em cada parágrafo de uma resenha.

Quando definimos a resenha como uma “síntese comentada” (ver primeiro parágrafo
acima), a expressão “comentada” se refere aqui menos a possibilidade de acrescentar-se ao texto as
opiniões (ou comentários) daquele que escreve a resenha – como forma de apreciação crítica do
texto analisado -, já que tais comentários não são uma pré-condição para o texto resenhístico, sendo

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facultado aquele que escreve; mas, tal expressão diz respeito muito mais a este estilo redacional
próprio do trabalho científico que também vai marcar o texto de resenha.

A seguir sugerimos, de modo bastante objetivo, alguns passos para aquele iniciante à
prática do texto resenhístico:
a) em primeiro lugar parece bastante aconselhável partir-se de um texto resumo – base útil para
transformá-lo em resenha. Entretanto aqui uma questão elementar se coloca: como elaborar o
resumo ? Um dos caminhos possíveis é aquele de proceder uma leitura do texto marcando as
passagens consideradas mais relevantes na identificação das idéias fundamentais defendidas
pelo autor. Após, deve-se reunir todas estas passagens marcadas num único texto, onde tais
passagens aparecem transcritas sempre necessariamente com o auxílio das aspas (obtém-se aí
um esboço de texto-resumo);
b) o segundo passo, final, consiste justamente em transformar este texto-resumo (esboçado) em
texto resenhístico. Para tanto faz-se necessário acrescentar aquele estilo redacional sugerido
(marcado justamente pelo “diálogo com o autor”). O iniciante irá aqui retrabalhar com suas
próprias palavras uma série destas transcrições que aparecem no resumo, dispensando dessa
forma, evidentemente, o uso das aspas. Outras transcrições permaneceram como foram postas
no resumo, aparecendo pois na resenha sob a forma de citação, isto é, entre aspas. Mas,
sobretudo, uma preocupação forte aqui consiste em articular estas várias passagens resumidas
do texto, a fim de expor a estrutura lógica e coerente, enfim o fio condutor, que identifica a
construção do pensamento do autor analisado.

Talvez resida precisamente neste último ponto a grande dificuldade na elaboração do texto
resenhístico, isto é, a capacidade que terá aquele que escreve a resenha de penetrar no pensamento
do autor e mostrar como ele conduz seu raciocínio, isto é, como ele pretende demonstrar, através de
um conjunto articulado de idéias, seus argumentos principais.

No final das contas, o texto de resenha pode ser visto como um produto do texto resumo,
onde retrabalhou-se alguns parágrafos a fim de explicá-los com suas próprias palavras e manteve-se
outros sob a forma de citações, mas sobretudo buscou-se articular, mais uma vez com suas próprias
palavras, as várias passagens ou parágrafos a fim de apreender-se o fio condutor da argumentação
do autor.

O estilo redacional, próprio ao texto resenhístico e marcado pelo que chamo de um “diálogo
com o autor”, mais do que uma simples questão de forma, visa refletir justamente aquilo que parece
constituir a essência de uma resenha: a honestidade intelectual daquele que escreve. Antes de
pretender demonstrar suas próprias idéias é preciso mostrar que se conhece idéias de outrem, até
para reconhecer-se em que medida sua próprias idéias são originais, ou inspiram-se de idéias
alheias.

A tentação em transcrever literalmente idéias de um texto sem a devida atenção às aspas ou


a referência ao autor, constitui prática corriqueira daqueles que não tem o hábito da reflexão escrita.
O desafio portanto da elaboração do texto resenhístico parece situar-se no plano do aperfeiçoamento
da reflexão escrita com a devida atenção ao valor da honestidade intelectual, ou seja, da capacidade
de discernimento entre o que são suas idéias e o que são idéias de outros. Por estas razões, a prática
da resenha, enquanto trabalho de reflexão escrita, nos parece constituir um exercício indispensável
aqueles que ingressam no mundo da pesquisa científica, refletindo desse modo um meio
privilegiado para o seu aperfeiçoamento.

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