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A TRANSFERÊNCIA EM SUA PERSPECTIVA CLÍNICA

Virginia Ungar*

RESUMO

O artigo considera a transferência como um conceito essencial ao método


psicanalítico, seu traço mais distintivo. Trata-se de uma categoria central da teoria e,
ao mesmo tempo, uma ferramenta fundamental da prática. Por outro lado, a noção de
transferência e o uso que lhe outorgue cada analista na prática da mesma serão
determinantes de seu modo de trabalho.
Brevemente, segue o percurso pelo roteiro freudiano sobre a transferência, para
logo passar à visão kleiniana e pós-kleiniana do tema. Também reserva um espaço para
o que poderia se considerar uma discussão atual sobre a questão na Argentina.
A partir das idéias de Melanie Klein e das contribuições pós-kleinianas, a
transferência postula-se mais como um processo de externalização das relações com
os objetos internos, com uma presença e concretude no aqui e agora da sessão
psicanalítica, que como uma reatualização do passado. Por isso, a fundamentação
kleiniana da transferência encontra um obstáculo na idéia da repetição em termos do
passado. Não se repetiria o passado, senão que se repete aquilo que não pôde ser
passado. É no repetir mesmo em que isso repetido busca o enlace que lhe permita se
converter em lembrança. Enquanto não se encontre esse enlace, continuará se
externalizando como repetição transferencial.

Palavras-chave: Transferência. Repetição. Externalização. Passado. Lembrança.

A transferência é um conceito comum a


todos os analistas, seja qual for o background
teórico com que se trabalha. É a essência do
método psicanalítico, seu traço mais distintivo.
Trata-se de uma categoria central, o que
não quer dizer que todos os psicanalistas compar-
tilham uma teoria sobre a transferência. Constitui,
ao mesmo tempo, uma ferramenta fundamental
da prática, o que a privilegia para estudar o
método psicanalítico – a tal ponto que a noção de
transferência e o uso que lhe outorga cada analis-
*
Asociación Psicoanalítica de Buenos ta na prática serão determinantes de seu modo de
Aires. trabalho.

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Virginia Ungar

Minha intenção é fazer um breve xos que recebe na sua infância, adquire
resumo do percurso freudiano sobre o uma especificidade determinada para o
tema da transferência, para depois passar exercício da sua vida amorosa (...) Isto dará
à visão kleiniana e pós-kleiniana, além de como resultado, por assim dizer, um clichê
(ou vários) que se repete – é reimpresso –
reservar um espaço para o que poderia se
de maneira regular na trajetória da vida...
considerar uma discussão da questão na
região a qual pertenço.
Ou seja, agora aparecem na visão
Como se sabe, o descobrimento
de Freud duas formas de recordar: uma,
central da clínica freudiana foi a transfe-
pela rememoração do paciente a respeito
rência. Quando Freud encontrou-se com
do que aconteceu; outra, pela repetição,
ela, não duvidou em pensá-la, no início,
em sessão, do esquecido. Isto fica mais
como um obstáculo à sua prática.
claro no famoso trabalho de 1914, Recor-
Em Estudos sobre a histeria
dar, repetir, elaborar.
(Freud, 1895), três parágrafos antes de
mencionar pela primeira vez o termo trans- A partir de 1920, a teoria freudiana
ferência no sentido psicanalítico, e ao da transferência se enriquece e torna-se
falar das resistências, mas dirigindo-se mais complexa. Freud postula em Além
irremediavelmente ao conceito, diz Freud: do princípio do prazer que aquilo que é
“Este caso sobrevém quando o vínculo do convocado pela repetição não é somente
doente com o médico vê-se perturbado e o que se encontra sob a égide do Princípio
significa o mais aborrecedor dos obstácu- do Prazer, mas também pelo que está
los com que se pode tropeçar”. além do mesmo. Repete-se o que se
Poucas linhas depois, explica sua encontra dominado por tendências tanáti-
hipótese a respeito do falso enlace que cas.
permitia a transferência, para a figura do Da perspectiva atual, podemos afir-
médico, de conteúdos emergentes duran- mar que tanto a resistência como a trans-
te a análise. ferência, aqueles obstáculos iniciais, trans-
Anos mais tarde, descobriu-se que formaram-se rapidamente em guias e
o mencionado “obstáculo” podia conter ferramentas insubstituíveis e essenciais
uma valiosa informação: o paciente resis- da clínica freudiana. Como dissera Freud,
tia, mas o fazia repetindo com seu analista no epílogo de Dora (1905), e em Recor-
clichês (imagos internas) construídos no dar, repetir, elaborar (1914), é através
seu passado. Freud, em 1912, já dizia o da repetição transferencial (que aparece
que permanecerá referendado, em 1914, no clímax da resistência) que emergem as
em Recordar, repetir, elaborar: lembranças mais reveladoras de uma
análise.
...todo ser humano, por efeito conjuga- Assim como para Freud a clínica
do de suas disposições inatas e dos influ- com pacientes adultas, afetadas princi-

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A transferência em sua perspectiva clínica

palmente por quadros de histeria, o levou ra e nos possibilita encontrar uma Klein já
à idéia da transferência como resistência mais velha, que nos convida a percorrer
e evocação repetitiva do passado, para sua própria história como psicanalista,
Melanie Klein foram outras experiências nos apresenta fragmentos das análises de
que determinaram o começo de sua práti- seus pequenos pacientes assinalando, em
ca. Suas conclusões, por isso, foram dife- cada situação, aspectos de sua teoria que cada
rentes daquelas do criador da Psicanálise. criança tratada lhe permitiu iluminar.
Como se sabe, Klein começou pri- Nesse texto, esclarece que seu
meiramente observando crianças. Logo trabalho analítico com adultos não é uma
se atreveu, alentada por seu analista, a aplicação da técnica do brincar, mas re-
tratar seu primeiro paciente, a quem cha- vela o quanto a tarefa com crianças a
mou Fritz (na realidade, seu filho Erich). muniu de uma compreensão profunda do
Estimulada por suas descobertas e pela desenvolvimento precoce, dos processos
publicação de seus primeiros trabalhos, inconscientes e da natureza das interpre-
bem como pela repercussão dos mesmos, tações psicanalíticas.
continuou analisando crianças de tenra Se seguirmos atentamente a leitu-
idade. ra dos artigos – que contêm abundantes
A experiência da relação transfe- exemplos clínicos de sessões com seus
rencial em seu trabalho diário na análise pequenos pacientes, descritos de maneira
de crianças pequenas parece ter se im- muito detalhada –, podemos ver como
posto com tanta força que, tanto as modi- Melanie Klein, ao se deparar com obstá-
ficações técnicas (por exemplo, seu des- culos na prática clínica, cria recursos
cobrimento da técnica do brincar), como técnicos que, por sua vez, a levam a novas
suas propostas teóricas surgiram de ma- inferências teóricas, numa contínua espi-
neira natural para Klein. ral que percorre sua obra do princípio ao
Não parece arriscado supor que fim.
todo o edifício teórico kleiniano construiu- Como ela própria diz, pode-se afir-
se a partir da experiência da transfe- mar que as bases de todo o edifício teórico
rência com seus pequenos pacientes. de Melanie Klein reside na análise de
É ela mesma que assim se expres- crianças. Suas afirmações a respeito do
sa em seu artigo “A técnica psicanalítica Édipo precoce, a intensidade da ação de
do brincar: sua história e significado” um superego precoce, a possibilidade de
(1955), no qual afirma que toda sua con- estabelecer transferência na analise de
tribuição à teoria psicanalítica deriva da crianças, a importância da detecção e
técnica do brincar desenvolvida com cri- interpretação da transferência negativa,
anças pequenas. Esse artigo, escrito cin- o estabelecimento de situação analítica
co anos antes de sua morte, é uma espé- através da interpretação da transferên-
cie de autobiografia psicanalítica da auto- cia, a existência de mecanismos de defe-

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sa muito precoces e de grande intensida- Quando o processo analítico co-


de, a importância crucial das ansiedades meça a abrir caminhos no inconsciente,
precoces, entre outras, surgem claramente há um aumento da necessidade do paci-
da leitura de seus trabalhos marcados por ente de transferir experiências, relações
uma profusão de exemplos provenientes de objeto e emoções primitivas, que se
de sessões com seus pequenos pacientes concentram na pessoa do analista. Dessa
na década de 20. Rita, John, Pedro, Ruth, forma, o paciente maneja seus conflitos e
Trude, Erna, Dick, entre outras crianças, ansiedades utilizando os mesmos meca-
ofereceram a uma Melanie Klein recep- nismos de defesa que usou na etapa
tiva, grande observadora e dona de uma precoce de seu desenvolvimento. A in-
admirável coragem, as evidências clíni- trojeção estabelece as bases para a re-
cas que constituíram os primeiros alicer- lação com os objetos externos, num cons-
ces e, depois, a estrutura de uma obra tante interjogo entre estes “...verdadeiros
muito sólida, que teve enorme repercus- arquitetos da vida mental”, como Paula
são na época e cuja influência permanece Heimann denominou os dois mecanismos
até nossos dias. em seu célebre trabalho de 1943.
No artigo de 1955, anteriormente Naquele mesmo artigo, Klein men-
citado, Klein diz que já o trabalho analítico ciona o mecanismo de personificação,
com seu primeiro caso permitiu-lhe rea- processo baseado na dissociação e na
firmar a convicção de que a psicanálise projeção, mediante o qual o ego consegue
tem como tarefa principal explorar o mitigar a ansiedade provocada pelo con-
inconsciente, e que o meio para conquis- flito interno entre os impulsos do id e as
tar este fim é a análise da transferên- defesas do ego, ao colocar no personagem
cia. de uma brincadeira ou num brinquedo estas
Melanie Klein escreveu somente imagos internas ansiógenas. Klein afirma
um artigo dedicado especialmente ao tema que, assim como este mecanismo opera na
da transferência – “As origens da trans- brincadeira das crianças, é também a base
ferência” (1952) –, embora ele já surgisse do fenômeno transferencial, ao externali-
em todo seu trabalho teórico-clínico e em zar o conflito na pessoa do analista.
suas publicações dos anos 20. O texto de Assim é que o mecanismo de per-
1952 cobre, assim, um percurso de trinta sonificação, apresentado em 1929 (Klein,
anos de trabalho sobre o tema. 1929), como operando uma função pre-
Neste, esclarecendo que o fenô- ponderante na brincadeira das crianças, e
meno da transferência tem um valor uni- também como base do fenômeno da trans-
versal, uma vez que ocorre em todas as ferência, é retomado mais de duas déca-
relações humanas e ao longo da vida toda, das depois para reforçar a idéia da trans-
foca especificamente a transferência em ferência como externalização do conflito
Psicanálise. na pessoa do analista.

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A transferência em sua perspectiva clínica

Poder-se-ia sintetizar a idéia klei- manterá um vínculo de dependência de


niana da transferência como centrada na caráter introjetivo.
relação com o objeto interno. A trans- Donald Meltzer, um autor pós-klei-
ferência é, então, a aplicação a um niano, clínico brilhante, que deixou uma
novo objeto, o analista, do modelo da obra extensa, na qual revisitou Freud,
relação estabelecida com os objetos Melanie Klein e Bion, alertou-nos sobre
introjetados. as contribuições de Klein ao destacar que
Em 1952, Melanie Klein já tem a grande analista mostrou-nos que nós,
noção de transferência solidamente cons- humanos, vivemos em dois mundos: o da
truída e sustentada pelos conceitos de realidade externa e, fundamentalmente, o
relação com objetos internos, de mundo da realidade psíquica.
interno, da externalização do conflito in- A transferência, então, não pode
trapsíquico, da teoria das posições, da ser entendida apenas como uma reatua-
ação constante da fantasia inconsciente lização do passado, mas como a externa-
e, obviamente, pela noção-chave de iden- lização das relações com os objetos inter-
tificação projetiva. Essas idéias, cujos nos, com presença e concretude no aqui
alicerces já se deixavam transparecer e agora da sessão analítica.
nos anos 20, provêm da sua clínica princi- É neste ponto que, no meu enten-
palmente com crianças. der, caberia uma reflexão já formulada
A partir da síntese postulada sobre em trabalho anterior (Ungar, 2000).
as idéias kleinianas a respeito da transfe- Do meu ponto de vista, e à luz desta
rência, facilmente se pode ver que a aproximação, a fundamentação kleiniana
autora mostra um modelo teórico bem da transferência encontra um obstáculo
diferente do freudiano, no qual se privile- na idéia da repetição em termos do passa-
gia a “geografia” da fantasia em termos do. Se do que se trata é a externalização
de espaços na mente e nos objetos. Ao das relações com os objetos internos atra-
cindir-se e cindir seus objetos, um mundo vés do mecanismo de personificação, este
de imagos que, com o desenvolvimento da movimento implica uma noção de tempo-
teoria, tornar-se-ão objetos internos, con- ralidade que não se restringe à cronologia
formarão o “mundo interno”, a partir de clássica de passado-presente-futuro. No
1934. Esses objetos internos cumprem meu entender, não se repetiria o passado,
funções reguladoras de maneira concreta mas o que se repete é aquilo que não pôde
no dito mundo interno em que convivem, ser passado. É no repetir mesmo em que
de acordo com o momento de desenvolvi- isso repetido busca o enlace que lhe per-
mento, com figuras sádicas, propiciando mita se converter em lembrança. En-
ao ego defesas de igual teor. Com o quanto não se encontre esse enlace, con-
avanço de desenvolvimento, internalizar- tinuará se externalizando como repetição
se-ão bons objetos, com os quais o self transferencial.

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No trabalho antes mencionado diana, o que importa é a idéia revelada no


(2000), postulei um possível modelo esté- devido lugar. Esse lugar é o nosso consul-
tico, baseando-me nas idéias de Donald tório, onde as idéias são submetidas à
Meltzer sobre o conflito estético. A pro- consideração dos nossos pacientes.
posta deste autor contrasta fortemente Nesse sentido, o vínculo analítico é
com os pressupostos filosóficos da Esté- um vínculo inédito no qual uma pessoa
tica, na qual o tipo de experiência a que se está disposta a compreender e a aceitar
refere corresponde a um dos níveis mais as próprias limitações ao conhecimento.
elevados a serem alcançados. A tolerância ao desconhecimento é um
Pelo contrário, Meltzer (1988), a dos componentes da atitude analítica,
partir de seu trabalho com crianças autis- juntamente com a capacidade de obser-
tas, propõe uma conjectura imaginativa vação, a receptividade, a atenção interes-
na qual o encontro inicial do recém-nasci- sada, a disponibilidade e disposição à
do com o seio da mãe, enquanto represen- conjetura imaginativa, tal como postulei
tante da Beleza do mundo, o coloca de numa oportunidade (Ungar, 2000a).
saída numa situação conflitante. A essên- Para o paciente, por outro lado,
cia do conflito estético é que não existe essa experiência de análise pode ser a
impacto da beleza sem conflito e este primeira e talvez única oportunidade de
acontece entre o que pode ser percebido, contar com alguém disponível, sem ne-
o exterior belo e o interior, que não é nhum outro interesse ou meta para ele ou
observável, é desconhecido, misterioso, ela que o de aliviar seus sintomas e ajudar
somente conjecturável e converte-se, dali seu desenvolvimento.
em diante, em fonte atormentadora de Junto com seu par, a contratrans-
toda ansiedade. ferência, a transferência pode ser consi-
O conflito estético faz surgir uma derada, em termos de Bion, como uma
combinação conflitante de paixão e das invariáveis do método analítico.
antipaixão, o que leva o autista a não Como sabemos, Bion (1965) pro-
poder tolerar a turbulência emocional, a pôs a teoria das transformações para a
desmantelar a integração da experiência prática e, sobretudo, para a observação
emocional e, assim, se desmentalizar. psicanalítica e definiu como invariáveis
Meltzer diz que a criança autista repre- os “...elementos que intervém para for-
senta a tragédia do fracasso do espírito mar o aspecto inalterado da transforma-
humano. ção”.
Se bem que o estudo de textos Este espaço não me parece apro-
comuns à Psicanálise e à Estética possa priado para me aprofundar no estudo da
conduzir a caminhos interessantes e de teoria das transformações bionianas; con-
abertura a novos conhecimentos, para os tudo, seria pertinente tomá-la no que nos
psicanalistas, no contexto da prática coti- convoca, dado que foi Bion quem propôs

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A transferência em sua perspectiva clínica

que a Psicanálise pode ser incluída no lhe algo do que ocorre em sua mente,
grupo das transformações. ajudando-o a continuar pensando.
É justamente Bion que estuda e Ainda nessa conferência, trouxe
inclui Meltzer em seus desenvolvimentos Meltzer a interessante idéia de que o
clínico-teóricos. analista pode ter a responsabilidade da
Tal como foi lembrado, Meltzer transferência durante um tratamento
retoma a idéia kleiniana da transferência analítico, e de que também o paciente
no sentido de que, longe de ser uma pode depositar sua confiança nele, pois
evocação repetitiva do passado, é a não é o analista que tem a responsabilida-
externalização das relações com os obje- de em relação a seu paciente, mas seus
tos internos no aqui e agora da sessão objetos internos que “carregam” a trans-
analítica. ferência. Disso surgirá a inspiração para
Numa conferência que esse autor a construção da transferência. Esta pos-
proferiu em Buenos Aires sobre transfe- tura outorga mais força à idéia kleiniana
rência (Meltzer, 1990), referiu-se à mes- da prevalência da realidade psíquica.
ma como o descobrimento em torno do Esta já é minha opinião. Daí a
qual se organiza a psicanálise. Definiu importância da análise didática, na qual o
Psicanálise como a arte e a ciência da analista treinou sua capacidade de confi-
interação entre transferência e contra- ar em si mesmo, em seus objetos internos
transferência como um processo. Nessa e tem de estar alerta às armadilhas que
mesma conferência, disse que o método seu próprio narcisismo lhe oferece para
psicanalítico tem uma qualidade estética, abandonar essa confiança.
porque juntos, paciente e analista, cons- Antes de entrar no que poderia se
troem um objeto – o objeto psicanalítico – considerar a polêmica atual sobre a trans-
que não é apreensível pelos órgãos dos ferência na região geográfica a qual per-
sentidos. tenço, América Latina e, em especial,
Na situação analítica, vemos per- Argentina, desejo acrescentar duas con-
manentemente a interferência da tribuições fundamentais na minha ativida-
antiemocionalidade com a emocionalidade, de clínica.
no contexto da flutuação entre as ansie- A primeira corresponde à noção
dades esquizoparanóides e depressivas. de transferência como situação total,
Na mesma oportunidade, Meltzer trazida por Betty Joseph (1985), que su-
arriscou ao propor que a transferência blinha uma frase de Melanie Klein no
não é um fato, mas uma construção na artigo sobre as origens da transferência.
mente do analista. E foi mais longe ao A citação de Klein diz: “Ao desentranhar
dizer que, ao formular sua interpretação, os detalhes da transferência, segundo
o que o terapeuta faz é aproximar uma minha experiência, é essencial concebê-
opinião para o paciente, e assim iluminar- la em termos de situações totais que se

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transferem do passado para o presente, quele momento, é a que o paciente comu-


assim como as defesas emocionais e as nica mediante as pressões que exercem
relações ‘objetais’” (Klein, M. 1952). sobre o analista.
Assim como, inicialmente, a trans- O segundo ponto refere-se à no-
ferência era entendida apenas quando ção de transferência precoce, uma con-
apareciam, no discurso do paciente, refe- tribuição de R. Horacio Etchegoyen.
rências diretas à pessoa do analista, tal A noção de transferência precoce
idéia acabou mudando, na visão de Jose- implica em nova ampliação do conceito
ph, para uma noção que inclua tudo o que de neuroses de transferência. É outra das
o paciente traz para a relação. formas especiais da transferência pos-
Para compreender a transferên- tuladas pelo autor, que não diz respeito à
cia, devemos estar atentos para o que configuração psicopatológica em jogo,
ocorre no contexto da relação terapêuti- mas ao desenvolvimento, ou seja, refere-
ca, que supõe movimento, atividade e se a critérios evolutivos. Ao postular isso,
troca permanente. A autora sugere que a Etchegoyen assume a posição, certamente
transferência só será compreendida se controversa, de que essa transferência
conseguirmos captar como os pacientes precoce existe e pode ser definida, carac-
depositam seus sentimentos em nós – por terizada e estudada com o método psica-
meio da identificação projetiva – e como nalítico.
procuram nos atrair para seu sistema Essa proposta se apóia nas idéias
defensivo, ou seja, seu modo inconsciente de Melanie Klein, que utiliza o conceito de
de atuar na transferência (acting out). A desenvolvimento precoce, baseado em
isso se deve acrescentar a tentativa in- fatos empíricos, que nascem da sua prá-
consciente de nos fazer atuar com eles tica na análise de crianças, iniciada nos
(enactement). São experiências muito anos 20 e desenvolvida e consolidada ao
primitivas que, na maioria das vezes, não longo de toda sua vida.
encontram na palavra o meio de transmis- Já vimos como Klein propôs, no
são adequado. É através da contratrans- seu artigo dedicado à transferência (1952),
ferência do analista que encontram sua sua tese básica das etapas precoces do
expressão. desenvolvimento surgidas na transferên-
Tais conceitos são de grande im- cia e, assim, passíveis de serem captadas
portância clínica. Betty Joseph enfatiza e reconstruídas.
um fato que merece ser considerado em Os eixos que ancoram o conceito
relação à técnica. As interpretações que de transferência precoce são: a existên-
se dirigem às associações verbais só cia de relações objetais do começo da
abrangerão a parte adulta da personalida- vida (que implicam uma abolição da no-
de do paciente. Aquela parte infantil, que ção de narcisismo primário); a noção de
é a que necessita ser compreendida na- fantasia inconsciente (que está em cons-

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A transferência em sua perspectiva clínica

tante atividade em relação aos objetos - O desenvolvimento precoce se


primários, habilitando o analista a inter- expressa na transferência e pode ser
pretar cada vez que se infira seu funcio- reconstituído durante o processo analítico
namento), e a ênfase na interpretação da e testado pela resposta do analisando.
transferência negativa (eixo da polêmica - O conflito precoce, correspon-
M. Klein-Anna Freud, em 1927). dente ao período pré-verbal, se expressa
Recapitulando, a transferência ori- na situação analítica através da lingua-
gina-se nos mesmos processos que deter- gem pré e paraverbal, ou seja, a lingua-
minam a relação de objeto nos estádios gem de ação, e corresponde aos mecanis-
precoces do desenvolvimento. A partir mos psicóticos.
disso, Klein conclui que o fenômeno trans- - O conflito infantil – que corres-
ferencial não deve ser entendido somente ponde ao período edípico, descrito por
como referência direta ao analista no Freud – aparece sob a forma de repre-
material do paciente, já que ao aprofundar sentações verbais e lembranças encobri-
suas raízes nos estratos mais profundos doras e corresponderia aos mecanismos
da mente o fenômeno transferencial apa- da serie neurótica.
rece como mais amplo e abrangente. - Em algumas oportunidades, pode-
Em relação ao manejo clínico da se apreciar uma estratificação dos três
transferência, Etchegoyen lança uma pro- pólos do conflito, o precoce, o infantil e o
posta referida à validade da interpretação atual, incrustados na mesma estrutura.
transferencial na reconstrução do desen- - O método analítico revela a ver-
volvimento precoce. Sua posição se esta- dade histórica, ou seja, a maneira como o
belece com rigor metodológico num tra- paciente processou os eventos de sua
balho apresentado no XXXII Congresso vida, constituindo as teorias que ele tem
Internacional em Helsinque, em 1981, de si mesmo e não a verdade material em
artigo que passou a constituir o capítulo si mesma.
XXVIIII de seu livro (Etchegoyen, 1986). De tais considerações, depreende-
O autor parte do material clínico se a proposta de que o conflito precoce é
detalhado de sessões do tratamento ana- analisável, transação difícil pelo grande
lítico de um paciente de 35 anos de idade, compromisso contratransferencial, mas
a quem chama de Mr. Brown, para mos- possível.
trar a maneira pela qual o desenvolvimen- Etchegoyen diz:
to precoce está presente na personalida-
de e aparece na relação transferencial. 9) o manejo adequado e rigoroso da
Sustentado nas inferências que relação transferencial permite analisar o
obtém a partir do processo analítico do conflito precoce sem recorrer a nenhum
paciente, oferece uma série de propostas tipo de terapia ativa nem regressão contro-
que, sucintamente, são as que seguem. lada, porque a análise não se propõe cor-

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rigir os fatos, mas sim conceituá-los nova- relação analítica repetem-se “clichês”
mente; 10) Se aceitarmos que existe uma direcionados sobre a figura do analista –, ou
transferência precoce, capaz de desenvol- se na relação entre paciente e analista
ver-se plenamente no tratamento e susce- ocorrem fatos que evidenciariam a exis-
tível de ser resolvida com métodos psica-
tência de fenômenos que não se limitam
nalíticos, abrimos a possibilidade de usá-
la como teoria e pressuposto para investi-
às repetições do passado, mas que, ainda
garmos o desenvolvimento precoce, e tes- assim, são de relevância na clínica psica-
tarmos as teorias que procuram explicá- nalítica. Os defensores desta linha
lo... (Etchegoyen, 1986:327). (Berenstein, Moreno, Puget), sustentam
que a interpretação desses emergentes
Sua proposição, de que interpreta- novedosos1 ou inéditos em termos de
ção e reconstrução são fases comple- repetição do passado poderia anular seu
mentares de um mesmo processo, é im- efeito possível no trabalho terapêutico.
portante. Isso quer dizer que, ao pensar a Berenstein propõe, por exemplo,
transferência como uma suposição do caracterizar “...a transferência analítica
passado e presente, não é possível sus- como um vínculo, uma estrutura onde se
tentar que uma interpretação no aqui e relacionam dois ou mais, neste caso, dois
agora possa se dar fora da perspectiva sujeitos do desejo, paciente e analista, que
do passado. Da mesma forma, não se propõem, um ao outro, dois trabalhos a
pode restaurar a história sem responder realizar simultânea e sucessivamente”
ao compromisso transferencial. (Berenstein, 2001). Logo, o autor especi-
Tal como propus no início, quero fica que a primeira tarefa será a de
agora apresentar um breve apanhado do desenvolver as experiências infantis do
que considero o estado atual da discussão paciente com a colocação em cena de
sobre a transferência, centrado em al- suas relações de objeto. Isso implica uma
guns autores argentinos. sutil tarefa de articular determinações
precoces de semelhanças e diferenças no
Estado atual da discussão transcorrer do tempo, ou seja, no funcio-
sobre a transferência namento mental entre a percepção de
novas experiências e a estrutura das que
Considero que um dos eixos de ocorreram na infância.
discussão neste momento é se a transfe- Outro trabalho será o que se dá em
rência é um fenômeno ligado à repetição, ambos os sujeitos no momento do encon-
seguindo a clássica idéia apresentada por tro com o outro da relação, com ajenidad2
Freud (Freud, S. 1912) – em que na que não é atribuível a nenhuma experiên-

1
No sentido de novidade, em português. (N. do T.)
2
No sentido de alheio, em português. (N. do T.)

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A transferência em sua perspectiva clínica

cia infantil, inaugurando um campo de conhecido interfere ao outorgar significa-


novidade que Berenstein chamará novi- ções prévias ao que está ocorrendo e
dade radical. O primeiro modelo enqua- pode mesmo impedir a emergência de
drar-se-ia no campo da relação de objeto significações que se produzem no novo
e do outro como objeto, enquanto o segun- encontro.
do seria o da relação com o outro propri- Pessoalmente, considero auspicio-
amente dito. sa a aparição desse debate. Se bem que
A emergência do novo pode se dar estes três últimos autores, passíveis de
em três modalidades: no sentido de uma serem incluídos no que se poderia chamar
nova versão de um texto imutável; na desenvolvimento da “teoria vincular” em
modificação por agregados a um texto; ou Psicanálise – com ampla repercussão na
um texto nunca produzido antes. Neste América Latina, que determina outro
caso, seria “radicalmente novo”. modelo de concepção da mente –, tam-
Julio Moreno (2002) propõe tam- bém são descendentes dos pioneiros da
bém considerar a transferência como um Psicanálise argentina em sua genealogia
vínculo, em que duas vertentes podem se psicanalítica.
diferenciar: a associativa e a conectiva. Do meu ponto de vista, a funda-
A associativa remete à noção freudiana mentação kleiniana da transferência en-
de deslocamento de imagos inconscien- contra um obstáculo na idéia da repetição
tes sobre o analista, enquanto a conectiva em termos do passado. Se do que se trata
relaciona-se à possibilidade de encontro é da externalização das relações com os
com algo que não é associável; não con- objetos internos através do mecanismo de
siste em algo previamente existente do personificação, este movimento implica
ponto de vista associativo, mas que se uma noção de temporalidade que não se
produz no próprio encontro. É o encontro restringe à cronologia clássica de passa-
produtivo entre o alheio do próprio analis- do-presente-futuro. No meu entender, não
ta e o não representado (ou não inscrito) se repetiria o passado, mas sim o que não
no acervo representacional do paciente. foi possível ser passado. É no próprio
Janine Puget (2001) trabalha com repetir que o repetido busca o enlace que
a idéia de que “...a situação analítica não lhe permita se converter em lembrança.
é somente repetição de outra que já acon- Enquanto não encontra esse enlace, con-
teceu, mas sim uma situação específica, tinuará se externalizando como repetição
que cria novos significados e uma nova transferencial.
história, que o paciente supõe já vivida
mas que ainda falta viver”. Conclusões
Para esta autora, há uma oposição
entre a “transferência repetição” e a Um tema tão central para a Psica-
“transferência criativa”. Nesse sentido, o nálise, como o é o da transferência, re-

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Virginia Ungar

quer um inevitável recorte na hora de tanto nas crianças como nos adultos a
apresentar as idéias de quem tenha feito situação analítica”.
contribuições fundamentais para a questão. Acredito ser fundamental, além de
Como disse inicialmente, a con- reconhecê-la, pensarmos o que nós, ana-
cepção de transferência e, sobretudo, a listas, fazemos com a transferência, ou
maneira como se trabalha com ela na seja, o manejo clínico da mesma. Alguns
sessão analítica vai depender do modelo de nós a interpretam, dentre eles há quem
de mente que tem cada analista. Esse pense que nem todas as interpretações
modelo se depreende de certos elemen- devem ser transferenciais e que, segundo
tos que se conjugam de maneira constan- nos relembra Etchegoyen, a interpreta-
te e que se relacionam com a concepção ção “completa”, em termos de Pichon
de mente e da teoria do desenvolvimento Rivière, deve considerar o conflito infan-
emocional precoce que cada autor tem. til, o conflito atual e a transferência. Se
Sendo assim, escolheu-se neste artigo retomarmos a idéia da transferência pre-
uma determinada perspectiva que enfati- coce desenvolvida por Etchegoyen, po-
za os desenvolvimentos kleinianos e pós- deríamos postulá-la como um quarto fator
kleinianos. a considerar em relação à interpretação
Percorremos o tema da transfe- completa.
rência partindo de Freud, passando para a Há correntes psicanalíticas que
perspectiva kleiniana, em que tentamos preferem trabalhar “em transferência”,
sublinhar como hipótese a importância do sem necessidade de formular a interpre-
trabalho psicanalítico desta autora ter se tação transferencial. Existe uma grande
iniciado com crianças pequenas. Melanie quantidade de matizes e terreno fértil
Klein reconhece-o em seus escritos e, para discussões frutíferas.
seguindo sua obra, podemos notar o quan- O debate persiste, prova disso está
to a noção de transferência com seus na constante publicação de expoentes e
pequenos pacientes se lhe impôs com trabalhos sobre o tema da transferência
uma força irrefutável a partir da experi- em nossa região e no mundo inteiro. Creio
ência empírica. que isso ocorre em grande parte porque a
Melanie Klein além de reconhecê- obra dos nossos mestres operou como
la, interpretou-a em seus pequenos paci- modelo de fertilidade e abertura. Esse
entes. Vale aqui lembrar uma frase sua, modelo pode continuar propiciando o cres-
escrita já em 1926 (Klein, 1926), sobre cimento da teoria e prática psicanalítica
como se estabelece a situação analíti- em futuras gerações de analistas com-
ca: “...interpretações adequadas, resolu- prometidos com a apaixonante tarefa de
ção gradativa das resistências, e persis- levar adiante um processo analítico.
tente descobrimento pela transferência
de situações anteriores – isto constitui Tradução de Marta Úrsula Lambrecht

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A transferência em sua perspectiva clínica

SUMMARY

Transference in its clinical perspective

The article considers transference to be an essential concept for the psychoana-


lytic method; indeed its most distinctive trait. Transference is at the same time a central
category in the theory and a fundamental tool in the clinical practice of psychoanalysis.
Moreover, the notion of transference and the use that each analyst confers on it in his
clinical practice will go on to determine his very way of working.
The paper takes a brief look through Freud’s essential ideas on the subject and
then moves on to deal with those of Melanie Klein and postkleinian authors. Space is
also given over to contemporary discussions on the issue, especially concerning
Argentine authors.
Starting form Kleinian and postkleinian ideas, transference is, therefore, closer
to externalization in a new object, the analyst, of the same kind of relationship
established with the introjected objects and has a presence and a concreteness, in the
here and now of the psychoanalytic session.
In this way, the Kleinian theoretical support for the transference concept
encounters an obstacle in the idea of repetition in terms of the past. The hypothesis of
the paper is that it is not the past that is repeated, but a present that has not been able
to become past. As long as this linkage is not found, it will remain externalizing as a
transferential repetition.

Keywords: Transference. Repetition. Externalization. Past. Memories.

RESUMEN

La transferencia en su perspectiva clínica

El artículo considera a la transferencia como un concepto esencial al método


psicoanalítico, su rasgo más distintivo. Se trata de una categoría central de la teoría,
y a la vez una herramienta fundamental de la práctica. Por otra parte, la noción de
transferencia y el uso que le otorgue cada analista en la práctica a la misma, van a ser
determinantes de su modo de trabajo.
Sigue brevemente el recorrido por el derrotero freudiano sobre la transferencia
para pasar luego a la visión kleiniana y postkleiniana sobre el tema y también reserva
un espacio para lo que podría considerarse una discusión actual sobre la cuestión en
la Argentina. A partir de las ideas de Melanie Klein y de los aportes postkleinianos la
transferencia se postula mas como un proceso de externalización de las relaciones con
los objetos internos con una presencia y concretud en el aquí y ahora de la sesión
psicoanalítica que como una reactualización del pasado.

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Virginia Ungar

Es entonces que la fundamentación kleiniana de la transferencia encuentra un


obstáculo en la idea de la repetición en términos del pasado. No se repetiría el pasado,
sino que se repite aquello que no ha podido ser pasado. Es en el repetir mismo donde
eso repetido busca el enlace que le permita convertirse en recuerdo. Mientras no se
encuentre ese enlace, se seguirá externalizando como repetición transferencial.

Palabras-clave: Transferencia. Repetición. Externalización. Pasado. Recuerdo.

Virginia Ungar
Rep. de la India 2921, piso 11
1425 Buenos Aires , Argentina
Fones: (54 11) 4807-5858 (home); (54 11) 4801-9312 (office)
E-mail: virgungar@fibertel.com.ar

Recebido em: 10/11/2008


Aceito em: 20/12/2008

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