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Coca-Cola vai ressuscitar um E se Michael Jackson não Radar "Shallow" descobre O mistério dos buracos Pesquisadores investigam Cientistas descobrem a
de seus fracassos graças a tivesse morrido? imensas geleiras soterradas negros  por que tomar café dá mutação genética que causa
"Stranger Things" no polo norte de Marte vontade de fazer cocô o lúpus

Comportamento

Guantánamo: Bem-vindo ao inferno Recomendado para você


O que faz cada lado do
por taboola

cérebro?
Em uma base militar no Caribe, fica a prisão mais dura do mundo. Suspeitos de
terrorismo são levados para lá e podem ficar presos para sempre, sem direito a
julgamento. Dos 166 detentos, 130 estão fazendo greve de fome. E um deles conta, pela
primeira vez, como as coisas são ali. Conheça a vida no pior lugar da Terra. Hitler não possuia 1, mas
664 Tesseracts feito de
Por Reportagem de Larry Siems, da revista Slate. Edição e tradução: Bruno Garattoni
urânio
 31 jan 2017, 18h53 - Publicado em 26 set 2013, 22h00

 O que signi cam as siglas


que os seguranças falam
 como QAP, QSL e TKS?


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Mohamedou Ould Slahi se apresentou voluntariamente à polícia de seu país NAS BANCAS
natal, a Mauritânia, em 20 de novembro de 2001. Foi preso, e uma semana 403 Junho 2019
Acesse o índice
depois, a pedido do governo dos EUA, transferido para a Jordânia. Slahi era
acusado de ligações com um atentado frustrado no aeroporto de Los Angeles,
Assine
em 1999. Por sete meses, foi interrogado pelas autoridades jordanianas, que não
acharam nada que o incriminasse. Insatisfeita, a CIA buscou Slahi e o levou até
Leia grátis por 30 dias no
uma base militar americana no Afeganistão.

Em 4 de agosto de 2002, ele foi encapuzado, algemado, drogado e colocado num


Leia também no
voo com 30 outros detentos, para uma viagem de 36 horas até a base de

Guantánamo, em Cuba, onde está até hoje. Slahi escreveu um livro de 466
páginas contando sua história. Partes dele acabam de ser divulgadas, e você irá Ciência
ler a seguir. Os trechos cobertos por uma tarja preta foram censurados, antes da O mistério dos buracos negros
liberação do texto, pelo governo dos EUA. As passagens em laranja foram
adicionadas pela SUPER para facilitar a compreensão do caso. Saúde
Sangue Novo
O interrogatório
Tecnologia
A vida privada de Steve Jobs
Os gritos dos outros presos me acordaram.

Cultura
Enquanto os guardas serviam comida, nós nos apresentávamos. Não podíamos
O plano realmente infalível de Mauricio de
ver uns aos outros, mas era possível ouvir as vozes. “Eu sou da Mauritânia.” “Eu Sousa
sou da Palestina.” “Síria.” “Arábia Saudita.”
Comportamento
“Como foi o voo?” Tatuagens da cadeia

“Eu quase congelei até morrer”, gritou um cara. “Eu dormi a viagem toda”,
respondeu [Trecho censurado].

Nós nos chamávamos pelos números de identi cação que tínhamos recebido. O Não perca nenhuma notícia.
meu era 760. Na cela à esquerda estava [Trecho censurado], de [Trecho Inscreva-se em nossa newsletter gratuita.
censurado]. Na cela à direita, havia um cara de [Trecho censurado]. Ele falava mal Aceito receber ocasionalmente ofertas especiais e
árabe e dizia que tinha sido capturado em Karachi (Paquistão), onde frequentava de outros produtos e serviços do Grupo Abril.

a universidade. Nas celas em frente à minha, colocaram dois sudaneses. Política de Privacidade

O café da manhã foi modesto, um ovo cozido, um pedaço de pão duro e uma E-mail CADASTRAR

outra coisa que não sei o nome. Foi minha primeira refeição quente desde a
Jordânia. O chá foi reconfortante.

Eu considerei a chegada a Cuba uma bênção, e disse aos meus irmãos. “Como
vocês não estão envolvidos em crimes, não têm o que temer. Eu vou cooperar,
porque ninguém vai me torturar.” Eu erroneamente acreditava que o pior tinha
passado. Eu con ava demais no sistema judicial americano.

“[Trecho censurado]”, disse um dos soldados enquanto segurava longas


correntes nas mãos. A palavra [Trecho censurado] é um código, signi ca que
você será levado para um interrogatório. Eu prudentemente obedeci às ordens, e
eles me levaram até o interrogador. O nome dele era [Trecho censurado], e ele
vestia um uniforme do Exército dos EUA. Falava árabe decentemente, com um
sotaque de [Trecho censurado]. Ele me disse que é de [Trecho censurado] e
costumava trabalhar como intérprete para os [Trecho censurado].

[Trecho censurado] era um cara amigável. Ele queria que eu contasse mais uma
vez toda a minha história. Quando cheguei à parte sobre (o que tinha passado)
na Jordânia, ele disse que sentia muito!

“Esses países não respeitam os direitos humanos. Eles até torturam gente.” Me
senti confortável por essa crítica a métodos cruéis de interrogatório; signi ca
que os americanos não fariam algo do tipo.

Depois que [Trecho censurado] terminou suas perguntas, me mandou de volta (à


cela).

Eles obviamente viam o quão doente eu estava. Eu parecia um fantasma


(registros o ciais indicam que Slahi, de 1,70 m, pesava apenas 49 quilos ao
chegar à base). No meu segundo ou terceiro dia em Guantánamo, eu desmaiei.
Os médicos me tiraram da cela. Vomitei tanto que quei completamente
desidratado. Recebi primeiros socorros e uma sonda intravenosa. Foi terrível,
eles devem ter colocado algum remédio ao qual sou alérgico. Minha boca secou,
e minha língua cou tão pesada que eu não conseguia falar para pedir ajuda.
Com gestos, pedi aos guardas que tirassem a sonda, e eles tiraram.

Mais tarde, os guardas me levaram de volta à cela. Eu estava tão doente que não
conseguia subir na cama. Dormi no chão o resto do mês. O médico me
prescreveu Ensure (suplemento nutricional) e um remédio para hipertensão.
Quando eu tinha crises de nervo ciático, os guardas me davam Motrin (anti-
in amatório). Embora eu estivesse sicamente muito fraco, os interrogatórios
não pararam.

Nos primeiros meses em Guantánamo, Slahi foi interrogado por agentes do FBI e
da Marinha, que utilizavam métodos tradicionais. Mas, em maio de 2003,
começou seu “interrogatório especial” – termo que os militares americanos
utilizam para se referir ao uso de técnicas mais fortes, que incluem certos tipos
de tortura. Slahi foi transferido para a solitária.

A escolta apareceu na minha cela. “Mexa-se.”

“Para onde vou?”

“Não é problema seu”, disse com raiva o guarda [Trecho censurado]. Mas ele não
era muito esperto, pois tinha anotado meu destino em sua luva. [Trecho
censurado] era (um lugar) reservado para os piores presos da base. Se você
fosse transferido para [Trecho censurado], muitas pessoas deveriam ter
autorizado, talvez (até) o presidente dos EUA. As únicas pessoas que eu
conhecia que tinham passado algum tempo em [Trecho censurado] eram [Trecho
censurado] al Kuwaiti e outro detento de [Trecho censurado].

Ao chegar ao bloco, a coisa começou. Tiraram todos os meus objetos, exceto por
um colchonete e um cobertor muito no, pequeno e velho. Fui privado dos meus
livros. Fui privado do meu Corão. Fui privado do meu sabonete. Fui privado da
minha pasta de dentes. Fui privado do rolo de papel higiênico que eu tinha.

A cela – ou melhor, a caixa – era refrigerada, o que me fazia car tremendo a


maior parte do tempo. Fui proibido de ver a luz do dia. De vez em quando, eles
me davam um tempo de recreação (fora da cela), à noite, para que eu não visse
nem interagisse com ninguém. Não me lembro de ter dormido direito uma noite;
pelos 70 dias seguintes, eu não saberia o que era dormir. Interrogatórios 24
horas, três turnos, às vezes quatro turnos por dia. Eu raramente tinha um dia de
descanso.

“Nós sabemos que você é criminoso.”

“O que eu z?”

“Me diga você, e reduzimos a sua sentença para 30 anos. Se você não cooperar,
vamos colocar você num buraco e apagar seu nome da nossa lista de detentos.”

Quando eu não dei a resposta que ele queria ouvir, ele me fez levantar. Fiquei
com as costas arqueadas (para trás), porque minhas mãos estavam
acorrentadas a meus pés e ao chão. [Trecho censurado] sempre me deixava
sofrendo durante seu almoço, que demorava duas a três horas. Ele gostava de
comida; nunca pulava o almoço. Fiquei pensando, como [Trecho censurado] pode
ter passado no teste físico do Exército (tendo uma forma física tão ruim)? Mas
faz sentido, ele está no Exército por um motivo.

Como nunca me deixavam ver a luz (do dia), eu “gostava” do curto trajeto entre
minha cela gelada e a sala de interrogatório. Era uma bênção quando eu sentia o
sol morno de Guantánamo. Sentia a vida voltando a cada centímetro do meu
corpo.

“Como você está?”, disse um dos guardas porto-riquenhos.

“Ok, obrigado, e você?”

“Não esquenta, você vai voltar para sua família,” ele disse. Quando ele falou isso,
eu não consegui evitar o [Trecho censurado]. Eu tinha me tornado tão vulnerável.
Uma mera palavra de conforto neste oceano de agonia era o su ciente para me
fazer chorar.

Em [Trecho censurado] nós tínhamos uma divisão de porto-riquenhos. Eles eram


diferentes dos outros americanos. Não eram tão vigilantes e hostis. Às vezes,
levavam presos para tomar banho [Trecho censurado]. Todo mundo gostava
deles. Por causa de sua atitude amigável e humana com os presos, arranjavam
problemas com os chefes da base.

“Hoje nós vamos falar sobre [Trecho censurado]”, disse [Trecho censurado]
depois de me empurrar uma cadeira de metal.

“Eu já disse o que sei sobre [Trecho censurado].”

“É mentira. Você vai nos dizer mais?”

“Não, não tenho mais o que dizer.” [Trecho censurado] puxou a cadeira e me
derrubou.

“Vamos lhe ensinar sexo americano. Levante”, disse [Trecho censurado].

Assim que eu levantei, os dois [Trecho censurado] tiraram as blusas e


começaram a falar todos os tipos de baixaria que você possa imaginar. [Trecho
censurado] se encaixou em mim pela frente, e o [Trecho censurado] se encaixou
por trás, esfregando o corpo todo no meu. Enquanto faziam isso, eles falavam
coisas sujas comigo e brincavam com minhas partes sexuais. Vou poupar você
das coisas nojentas e degradantes que eu tive de ouvir do meio-dia até 10 horas
da noite.

Para ser honesto e justo, os [Trecho censurado] não tiraram minhas roupas em
nenhum momento; tudo aconteceu comigo vestido. O [Trecho censurado] sênior
estava assistindo. Fiquei rezando o tempo todo.

“Para de rezar, porra. Você está fazendo sexo com [Trecho censurado]
americanos e está rezando? Como você é hipócrita!”, disse raivosamente [Trecho
censurado] ao entrar na sala. Eu continuei rezando. Durante essa sessão, eu me
recusei a comer ou beber, embora eles tenham me oferecido água algumas
vezes. Eu queria desmaiar para não ter de sofrer; essa era a principal razão da
minha greve de fome. Eu sei que pessoas como eles não se impressionam com
uma greve de fome. Claro que eles não queriam que eu morresse, mas eles
sabem que há muitas etapas até que alguém morra.

“Você não vai morrer, nós vamos alimentar você pelo rabo,” disse [Trecho
censurado].

Registros o ciais mostram que, em julho de 2003, mais de um mês após o início
do “interrogatório especial”, Slahi foi questionado durante uma semana por um
novo interrogador, mascarado.

“Tragam de volta o lho da p…”, gritou [Trecho censurado], uma celebridade na


equipe de tortura. Ele tinha 1,80 de altura, era atlético e [Trecho censurado].

Conforme fui conhecendo [Trecho censurado] melhor, pensei em como um


homem tão inteligente quanto ele poderia aceitar um trabalho tão degradante,
que com certeza irá perturbá-lo para o resto da vida. Tempos depois, perguntei a
alguns dos guardas porque eles tinham executado a ordem de me impedir de
rezar, que é ilegal. “Eu poderia ter (ignorado a ordem), mas meu chefe teria me
dado um cargo de merda, ou me transferido para um lugar ruim.”

“Você não está ajudando o [Trecho censurado]”, continuou [Trecho censurado]


enquanto me arrastava até uma sala escura. Com ajuda dos guardas, ele me
jogou no chão sujo. A sala estava escura como o ébano. [Trecho censurado]
começou a tocar uma música muito alto. Muito alto mesmo. A música era Let
the Bodies Hit the Floor (da banda de heavy metal Drowning Pool). Talvez eu
jamais me esqueça daquela música. [Trecho censurado] ligou umas luzes
coloridas que machucavam os olhos. “Se você dormir, eu vou machucar você”.
Eu tive de escutar aquela música sem parar até a manhã do dia seguinte.

“Bem-vindo ao inferno”, disse o guarda [Trecho censurado]. Eu não respondi, não


valia a pena. Mas pensei, “você merece o inferno mais do que eu, porque você
está trabalhando arduamente para ir ao inferno!”

“Vou trazer umas pessoas para me ajudar a interrogar você”, falou [Trecho
censurado], sentado a poucos centímetros de mim.

[Trecho censurado] me ofereceu uma cadeira de metal. O convidado se sentou,


quase tocando meu joelho. [Trecho censurado] começou a me perguntar uma
coisa de que não lembro.

“Levanta, lho da p…”, gritaram ambos. Então uma sessão de tortura e


humilhação começou.

[Trecho censurado] colocou o ar-condicionado no máximo para me congelar.


Esse método era praticado na base pelo menos desde agosto de 2002. Eu vi
pessoas que foram expostas à sala de congelamento dia após dia, como [Trecho
censurado].

Os interrogadores queriam que o ar-condicionado chegasse a zero grau, mas


obviamente o aparelho não é projetado para matar. Na sala, bem isolada, o ar
chegou a 9,4 graus Celsius – muito, muito frio, especialmente para alguém que
teve de car ali por mais de 12 horas, não tinha roupa de baixo, tinha um
uniforme muito no, e vem de um país quente. Os interrogadores se vestiam
adequadamente. Por exemplo, [Trecho censurado] estava vestido como alguém
que vai entrar num frigorí co. Além disso, eles não cavam muito tempo com os
detentos. Os interrogadores cavam se movimentando na sala, o que signi ca
circulação sanguínea, o que signi ca se manterem quentes enquanto o detento
estava [Trecho censurado] o tempo todo, de pé a maior parte do tempo. Tudo o
que eu podia fazer era mexer meus pés e esfregar as mãos. Mas o marine
impediu que eu esfregasse as mãos. Ele trouxe uma corrente especial que
prendia minhas mãos nas laterais do quadril.

O homem (líder) do show começou a jogar cadeiras, me deu uma cabeçada e me


descreveu com todos os tipos de adjetivo, sem motivo. O cara era maluco; ele me
perguntou coisas das quais não tenho ideia e nomes que nunca ouvi. “Eu estive
em [Trecho censurado]”, ele disse, “e sabe quem foi nosso an trião? O
presidente! Foi agradável lá no palácio.” O marine fazia perguntas e respondia ele
mesmo. Ele trouxe água gelada e encharcou todo o meu corpo. Minhas roupas
grudaram em mim. Era horrível, eu tremia como um paciente de Parkinson. Eu
não conseguia mais falar. O cara era burro, ele estava literalmente me
executando devagar. [Trecho censurado] mandou ele parar de jogar água em
mim.

[Trecho censurado] mandou ele parar porque estava com medo da sindicância
que (resultaria) em caso da minha morte. Ele encontrou outra técnica; trouxe um
CD player com ampli cador e começou a tocar um rap. Eu não liguei para a
música porque ela me fez esquecer minha dor; na verdade, a música era uma
bênção disfarçada, eu quei tentando entender as palavras. Só entendi que a
música era sobre amor, você acredita? Amor! “Escuta isso, lho da p…!”, disse o
convidado ao sair, fechando violentamente a porta. “Você vai ter a mesma m….
dia após dia, e sabe o quê? Vai piorar. É só o começo”, disse [Trecho censurado].
Eu continuei rezando e ignorando o que eles estavam fazendo.

“Ó, ALÁ, me ajude… Ó, Alá, tenha piedade”, [Trecho censurado] ridicularizava


minhas rezas. “ALÁ… ALÁ … Não existe Alá. Ele te abandonou!”

Entre 10 e 11 da noite, [Trecho censurado] ordenou aos guardas que me


colocassem numa sala especialmente preparada. Era muito fria e cheia de fotos
mostrando as glórias dos EUA: arsenal, aviões, fotos de G. Bush. “Não reze, você
insulta o meu país se você reza durante o meu hino nacional. Nós somos o maior
país do mundo livre, e temos o presidente mais inteligente do mundo”, disse
[Trecho censurado]. A noite inteira eu tive de ouvir o hino dos EUA. De qualquer
forma, eu odeio hinos. Tudo o que consigo lembrar é o começo, “Oh say can you
see …”, repetido e repetido.

Entre 4 e 5 da manhã, [Trecho censurado] me soltou, para algumas horas depois


recomeçar a mesma coisa.

A viagem de barco
Em 24 de agosto de 2003, Slahi foi tirado da cela e levado numa viagem de barco
de três horas pelo Caribe.

Eu mal tinha acabado de comer, quando de repente [Trecho censurado] e eu


ouvimos uma confusão, guardas gritando alto, “Eu avisei, lho da p…”. Ouvi gente
pisando forte no chão, um cão latindo, portas fechando com força. Eu quei
paralisado.

Subitamente um grupo de três soldados e um pastor alemão entraram. [Trecho


censurado] me socou violentamente, o que me fez cair de cara no chão, e o
segundo cara continuou a me socar em todo o corpo, principalmente no rosto e
nas costelas. Ambos estavam mascarados.

“Eu avisei, você já era!”, disse [Trecho censurado]. O parceiro dele continuou a me
socar sem dizer nada; ele não queria ser reconhecido. O terceiro homem não
estava mascarado, ele cou na porta segurando a guia do cachorro, pronto para
soltá-lo em mim.

“Quem mandou vocês fazerem isso? Vocês estão ferindo o detento”, gritou
[Trecho censurado], que estava tão assustado quanto eu.

“Vendem o lho da p…! Ele está tentando olhar.” Um deles me acertou com força
no rosto e rapidamente colocou óculos nos meus olhos, abafadores nos ouvidos,
e um pequeno saco na minha cabeça. Eles apertaram as correntes nos meus
tornozelos e pulsos; eu comecei a sangrar. Achei que eles iriam me executar.

O outro guarda me arrastou e me jogou num caminhão, que começou a andar. A


sessão de espancamento duraria as próximas três a quatro horas, depois do que
eles me entregariam para outro time, com técnicas diferentes de tortura.

“Para de rezar, lho da p… você está matando pessoas”, [Trecho censurado]


disse, e me socou com força na boca. [Trecho censurado] e [Trecho censurado]
caram cada um de um lado e começaram a me socar e me bater contra o metal
do caminhão. Um dos caras me bateu (com tanta força) que minha respiração
parou e comecei a engasgar. Era como se eu estivesse respirando pelas
costelas.

Várias vezes percebi [Trecho censurado] esguichando amônia no meu nariz. O


engraçado é que [Trecho censurado] era ao mesmo tempo um (torturador e)
“salva-vidas”, como os guardas com os quais eu lidaria no ano seguinte; todos
tinham permissão para me medicar e dar primeiros socorros.

Depois de 10 a 15 minutos, o caminhão parou na praia. Meu time de escolta me


arrastou e me colocou numa lancha. Continuaram a me bater. Dentro do barco,
[Trecho censurado] me fez tomar água salgada, acho que direto do mar. Eu
vomitei. Eles colocaram um objeto na minha boca e gritaram, “engole, lho da
p…!” .

[Trecho censurado] e [Trecho censurado] estavam me escoltando na viagem de


lancha. O objetivo dessa viagem, primeiro, era torturar o detento e dizer que ele
“se feriu durante o transporte”, e, segundo, fazer o detento pensar que está sendo
transferido para alguma prisão secreta muito, muito longe.

Era noite. Minha venda não me impediu de ver umas lâmpadas fortes.

“Nós felizes por isso (sic). Talvez nós levamos ele pro Egito, ele diz tudo”, disse
um sujeito cuja voz eu nunca tinha ouvido, com um forte sotaque egípcio. O
inglês dele era ruim e pronunciado errado.

“Talvez depois”, disse [Trecho censurado].

Eu me afundei em pensamentos. Senti vergonha que o meu povo (árabe) estava


sendo usado para esse trabalho horrível por um governo que se diz o líder do
mundo democrático. O que o americano médio pensaria se ele ou ela soubesse o
que seu governo está fazendo com alguém que não cometeu nenhum crime?

Depois de uns 40 minutos, [Trecho censurado] instruiu o time árabe a começar.


Os dois caras me pegaram e, como eu não conseguia andar sozinho, me
arrastaram até o barco.

“Senta!”, disse o egípcio, o que mais falava. O egípcio se sentou do meu lado
direito. Um jordaniano sentou à esquerda.

Eles me puseram uma espécie de jaqueta grossa, que me prendia à cadeira. Era
uma sensação boa – mas que também tinha um lado horrível. Meu peito cou
tão apertado que eu não conseguia respirar. Eu não sabia exatamente o que
estava acontecendo, mas alguma coisa estava errada. “Puxe o ar”, disse
secamente o egípcio. Eu estava literalmente sufocando.

Eles encheram o espaço entre minhas roupas e eu com cubos de gelo, do


pescoço até os tornozelos, e conforme o gelo derretia eles colocavam mais
cubos. De vez em quando, um dos guardas me batia, geralmente no rosto. O gelo
servia tanto para me castigar quanto para eliminar marcas (hematomas no
corpo).

E se me mandassem para o Egito? Como o interrogatório seria? Eu esperava


choques elétricos. Quanta eletricidade meu corpo poderia aguentar?

(Mas) A festa terminou, e os árabes me devolveram para a equipe americana.


Eles me arrastaram para um caminhão. Quando o caminhão parou, [Trecho
censurado] e seu colega forte me pegaram e arrastaram por alguns degraus. E
eles me jogaram de cara no chão de metal da minha nova casa.

“Não se mexa, não apronte comigo, lho da p…!”, disse [Trecho censurado], com a
voz enfraquecida. Ele estava obviamente cansado, e foi embora.

Pouco tempo depois, senti alguém tirando (o capuz) da minha cabeça. Quando a
venda foi tirada, eu vi um [Trecho censurado]. Concluí que era um médico, mas
por que diabos ele está se escondendo atrás de uma máscara, e por que é do
Exército, sendo que a Marinha é a responsável pelos cuidados médicos dos
presos?

“Se você se mexer, eu vou machucar você!”

Fiquei pensando como eu poderia me mexer, que mal eu poderia fazer. Eu estava
acorrentado, e cada centímetro do meu corpo doía. Ele saiu e logo voltou com
algumas coisas médicas. Eu reparei no relógio dele; era 1h30 da manhã.

O médico começou a limpar o sangue do meu rosto com uma gaze. Depois
disso, ele me colocou num colchão – o único item da cela – com ajuda dos
guardas. “Não se mexa”, disse um guarda. O médico colocou muitas cintas
elásticas em volta do meu peito e costelas. Depois disso, eles me zeram sentar.
Eles me mexiam como um objeto. Mais tarde eles tiraram as correntes, e um dos
guardas me jogou um cobertor pequeno e no, e isso era tudo o que eu teria na
cela.

Demorou um tempo até que a medicação zesse efeito, e aí eu apaguei, e só


acordei quando um dos guardas chutou violentamente a porta. “Levanta, seu
merda!”. O médico mais uma vez me deu remédios e examinou minhas costelas.

“Já terminei com o lho da p…”, disse, e saiu em direção à porta. Eu quei
chocado de ver um médico agindo assim.

Slahi continuou em total isolamento durante setembro e outubro. Em 17 de


outubro de 2003, um interrogador enviou um e-mail para um psicólogo militar.
“Slahi me disse que está ouvindo vozes”. O psicólogo respondeu que a “privação
sensorial (como a experimentada na solitária) pode causar alucinações”.

Pelas primeiras semanas eu não tive banho, troca de roupa, nem pude escovar os
dentes. Não era permitido dormir. Para garantir isso, me davam garrafas com
740 ml de água a cada uma ou duas horas, dependendo do humor dos guardas,
por 24 horas. As consequências eram devastadoras. Não conseguia fechar os
olhos por dez minutos, porque passava a maior parte do tempo no banheiro
(privada da cela). Mais tarde, perguntei a um dos guardas. “Por que essa dieta de
água? Por que vocês não me mantêm acordado me obrigando a car de pé,
como em [Trecho censurado]?”

“Acredite, você não viu nada. Nós já mantivemos detentos presos embaixo do
chuveiro por dias, comendo, urinando e defecando no chuveiro!”

Eu comecei a alucinar e ouvir vozes claras como cristal. Ouvi minha família numa
conversa casual. Ouvi leituras do Corão com uma voz celestial. Ouvi música do
meu país. Mais tarde os guardas tentaram se aproveitar dessas alucinações, e
cavam falando com vozes engraçadas pelo encanamento, me encorajando a
tentar fugir.

Eu percebi que estava à beira de enlouquecer. Comecei a falar sozinho. Ouvia


vozes constantemente, dia e noite. Eu não sabia quando era noite, mas assumia
que era quando o ralo cava escuro.

Reuni minhas forças, estimei a direção de Meca, me ajoelhei, e comecei a pedir a


Deus. “Por favor me guie. Eu não sei o que fazer. Estou cercado de lobos.”
Quando estava rezando, eu caí em lágrimas, mas abafei para que os guardas não
ouvissem.

“Senhor,” eu disse, quando terminei minha reza. Um dos guardas apareceu


usando uma máscara de Halloween.

“Quê?”, disse friamente o guarda.

“Eu quero falar com o [Trecho censurado].”

Con ssões são como contas de um colar, se a primeira cai, as demais seguem.

“Nós gostaríamos que você escrevesse suas respostas no papel, nos dá muito
trabalho registrar o que você fala, e você pode se esquecer de coisas quando fala
conosco”, disse [Trecho censurado].

“Claro!”, eu respondi. Eu gostei da ideia, porque preferia falar com um papel do


que com ele. Pelo menos o papel não iria gritar ou me ameaçar. Depois disso,
[Trecho censurado] me afundou numa pilha de papéis, que eu obedientemente
preenchi com minha escrita. Era bom deixar sair minha frustração e depressão.

“Nós vamos dar a você uma tarefa relacionada a [Trecho censurado]. Ele está
preso na Flórida e eles não conseguem fazê-lo falar. Ele ca negando tudo. É
bom que você nos dê uma prova contra ele”, disse [Trecho censurado].

Eu quei tão triste. Como eu poderia fornecer uma prova sobre uma pessoa que
eu mal conhecia?

Ele me deu alguns papéis e voltei para minha cela. Peguei a caneta e escrevi todo
tipo de mentiras incriminatórias sobre um pobre sujeito, que estava tentando
obter asilo no Canadá e ganhar algum dinheiro para começar uma família. E ele é
aleijado. Eu me senti tão mal, cava rezando em silêncio, “nada vai lhe acontecer,
irmão”. Dizer a verdade sobre ele estava fora de questão, pois [Trecho censurado]
já tinha me dado as instruções.

“[Trecho censurado] está esperando o seu testemunho contra [Trecho censurado]


com extremo interesse!”

Eu dei o papel para [Trecho censurado], e depois da avaliação vi [Trecho


censurado] sorrir pela primeira vez. “O que você escreveu sobre Ahmed foi muito
interessante, mas nós queremos que você forneça informações mais
detalhadas”, disse ele.

“Como eu estou cooperando, o que vocês vão fazer comigo?”, perguntei a


[Trecho censurado]. “Depende, se você nos fornecer muita informação que nós
não tenhamos, isso será considerado na sua sentença. Por exemplo, a pena de
morte seria reduzida para perpétua, e a perpétua para 30 anos”, ele respondeu.

“Isso é ótimo”, respondi.

Me senti mal por todos que feri com meus falsos testemunhos. Eu tinha de vestir
o terno que os EUA cortaram para mim, e foi exatamente isso o que z.

A família
Os interrogatórios violentos prosseguiram pelos últimos meses de 2003. Slahi
continuava em completo isolamento.

“Sabe o que você é?”, disse [Trecho censurado].

“Hã.”

“Você é um terrorista”, continuou.

“Sim, senhor.”

“Se nós matarmos você uma vez, não será su ciente. Nós temos que matar você
3 mil vezes. Mas em vez disso, nós o alimentamos!”

“Sim, senhor.”

Ao longo de algumas semanas, eu quei com os cabelos brancos. Na minha


cultura, isso é considerado um sinal extremo de depressão.

Aí, aos poucos, os guardas receberam ordens para 1) permitir que eu escovasse
os dentes, 2) me dar mais refeições quentes, 3) me dar mais banhos. [Trecho
censurado] foi quem tomou os primeiros passos, mas tenho certeza que eles
decidiram isso numa reunião. Todos na equipe perceberam que eu estava a
ponto de enlouquecer, depois de tanto tempo em isolamento.

“Eu trouxe este presente para você”, ele disse, e meu deu um travesseiro. Sim, um
travesseiro. Eu recebi o presente com uma felicidade enorme – não porque
estivesse morrendo de vontade de ter um travesseiro, mas porque o interpretei
como um sinal de que as torturas físicas parariam.

Eu não tinha nada na cela. Na maior parte do tempo, eu recitava o Corão. O resto
do tempo, eu falava sozinho e pensava sobre minha vida, e as piores coisas que
poderiam acontecer comigo. Contava os furos da gaiola em que estava. São
cerca de 4.100. Quando me deram o travesseiro, eu cava lendo a etiqueta sem
parar.

“Levante! Coloque as mãos pela porta!”, disse com voz hostil um guarda. Depois
que me acorrentaram, eles me levaram para fora do prédio, onde [Trecho
censurado] estava me esperando. Foi a primeira vez que vi a luz do dia. As
pessoas não dão valor a ela, mas, se você for proibido de vê-la, lhe dará valor. O
sol me atingiu misericordiosamente com seu calor. Eu estava apavorado e
tremendo.

“Nós trouxemos você para que possa ver o sol. Nós teremos mais recompensas
como esta.”

Não importa quão duros sejam os seus interrogadores, forma uma relação com
eles. É uma relação familiar, com todas as vantagens e desvantagens. Você não
escolheu sua família, nem cresceu com ela. Mas é uma família.

“Eu vou embora logo”, disse [Trecho censurado].

“É mesmo, por quê?”

“Está na hora. Mas o outro [Trecho censurado] vai car com você.” Isso não era
exatamente confortador. Eu quei inquieto, e não conseguia pensar num
argumento para convencer [Trecho censurado] a car.

“Nós vamos ver um lme juntos antes de eu ir embora”, disse [Trecho


censurado].

[Trecho censurado] saiu. Ele voltou alguns dias depois, com um laptop e dois
lmes.

“Você pode escolher qual deles quer ver.” Eu escolhi Falcão Negro em Perigo
( lme de 2001 sobre uma ação militar dos EUA na Somália), não lembro do outro.
O lme era violento e triste. Eu prestei mais atenção nas emoções de [Trecho
censurado] e dos guardas do que no lme em si. [Trecho censurado] estava
calmo. Ele pausava o lme de vez em quando para me explicar determinadas
cenas. Os guardas quase caram loucos de emoção, porque viam muitos
americanos sendo mortos.

Depois que terminamos de ver o lme,

[Trecho censurado] fechou seu computador.

“Ei, a propósito, você não me disse quando vai embora!”

“Você não vai mais me ver!” Eu congelei. Ele não tinha me dito que iria embora
tão cedo. Eu achava que talvez demorasse um mês, três semanas, algo assim,
mas hoje? Era como se a morte estivesse devorando um amigo seu, e você não
pudesse fazer nada.

“Puxa, tão cedo. Estou surpreso! Você não me disse. Adeus. Desejo tudo de bom
para você.”

“Eu tenho de seguir ordens, e deixo você em boas mãos.” E [Trecho censurado]
foi embora. Voltei à minha cela e comecei a chorar em silêncio, como se eu
tivesse perdido um [Trecho censurado] e não alguém cuja função é me ferir e
extrair informação.

“Posso ver meu interrogador, por favor?”, pedi aos guardas, esperando que
conseguissem alcançá-lo antes que ele chegasse ao portão principal.

“Vamos tentar.”

Logo depois, [Trecho censurado] apareceu na porta da minha cela. “Não é justo,
você sabe que eu fui torturado, e não estou pronto para outra rodada.”

“Você não foi torturado. Você tem de con ar no meu governo. Enquanto você
estiver dizendo a verdade, nada de mau vai acontecer a você!”

“Eu só não quero começar tudo de novo com novos interrogadores”, eu disse.

“Isso não vai acontecer,” disse [Trecho censurado]. “Além disso, você pode me
escrever. Prometo que vou responder todos os seus e-mails”, ele continuou.

“Não, eu não vou escrever.”

“Ok. Você está bem?”

“Não, mas você pode ir embora.”

“Eu não vou embora até você me garantir que está tudo bem”, [Trecho censurado]
disse.

“Eu falei o que tinha para falar. Tenha uma boa viagem. Que Alá guie você. Eu vou
car bem.”

“Tenho certeza que vai. Em no máximo uma semana você terá me esquecido.”

Eu não falei (mais nada) depois disso, apenas deitei. [Trecho censurado] cou ali
durante mais alguns minutos, repetindo, “Eu não vou embora enquanto você não
me garantir que está tudo bem.”

Eu sempre agi como se não soubesse onde estava. Os guardas diziam que eu
estava “no meio do nada”. Eles cavam tentando descobrir se eu sabia de algo, e
eu sempre respondia, “só sei que estou sendo detido pelo DoD (Ministério de
Defesa dos EUA), o lugar não importa.”

(Até que) [Trecho censurado] veio falar comigo. “Tenho de informar a você,
contra a vontade de muitos membros da nossa equipe, que você está em
Guantánamo. Você tem sido honesto, e nós devemos o mesmo a você.” Agi
como se (a informação) fosse novidade. Fiquei feliz, porque terem me contado
signi cava muito para mim.

Em 2005, a situação de Slahi tinha mudado completamente. Desde então, ele


tem recebido privilégios, e vive com outro preso num anexo, onde eles têm
permissão para plantar, escrever e pintar.

Os guardas queriam ser batizados com os nomes de Star Wars.

“A partir de agora nós somos os [Trecho censurado], e você vai nos chamar
assim. O seu nome é Travesseiro”, disse [Trecho censurado]. Mais tarde, eu
aprendi que [Trecho censurado] são os caras do bem, que lutam contra as forças
do mal. Eu representava as forças do mal, e os guardas, a força do bem.

[Trecho censurado] tinha 40 e poucos anos, era casado e com lhos, baixo, mas
forte. Ele passou um tempo trabalhando em [Trecho censurado], e então acabou
fazendo uma missão especial para [Trecho censurado].

“O seu trabalho terminou. Eu estou quebrado”, eu disse.

Embora [Trecho censurado] seja um cara duro, ele é humano. [Trecho censurado]
entende o que muitos guardas não entendem. Se você fala e diz aos
interrogadores o que eles querem ouvir, você tem de receber alívio.

“Meu trabalho é fazer você ver a luz”, disse [Trecho censurado] enquanto eu
comia minha refeição. [Trecho censurado] sempre gritava e me assustava, mas
nunca me bateu. Acho que o sonho da vida dele é se tornar um interrogador. Que
sonho dos infernos.

“Você é meu inimigo”, ele disse.

“Sim, senhor.”

“Então vamos falar de inimigo para inimigo.”

Durante nossas conversas, ele sorrateiramente tentava me fazer assumir coisas


que eu não pratiquei. “Qual foi seu papel no 11 de Setembro?”

“Eu não participei do 11 de Setembro.”

“Mentira!”, ele gritou. Eu percebi que não seria uma boa parecer inocente, pelo
menos não por enquanto.

Então eu disse, “Eu estava trabalhando para AQ (o grupo terrorista Al Qaeda), em


telecomunicações.”

Ele pareceu mais feliz com a mentira. “Qual era o seu cargo?”.

“Eu era tenente.”

Eu odiava e gostava quando era o turno dele. Eu odiava o interrogatório, mas


gostava porque ele me dava mais comida e uniformes novos. Ele começou a me
ensinar lições, e me fez treiná-las. As lições eram provérbios e frases que eu
deveria memorizar e praticar na minha vida. Eu ainda me lembro de algumas
lições. “1) Pense antes de agir. 2) Não confunda generosidade com fraqueza”
etc.

Meu relacionamento com [Trecho censurado] melhorava a cada dia, e


consequentemente com o resto dos guardas, porque eles o respeitavam muito.

“F…-se! Quando eu olho para o Travesseiro, eu não vejo um terrorista, eu vejo um


velho amigo meu, gosto de jogar com ele”, disse aos outros guardas.

Relaxei um pouco e ganhei autocon ança. Os guardas descobriram em mim um


cara bem-humorado. Começaram a me dar seus PCs e DVDs para que eu
consertasse; em troca, eu podia ver um lme.

Nós começamos a nos tornar um grupo, fofocar sobre os interrogadores e criar


apelidos para eles. Nessa época, [Trecho censurado] me ensinou a jogar xadrez.
Antes da prisão, eu não sabia nem a diferença entre um peão e um cavalo.

[Trecho censurado] me trouxe um tabuleiro de xadrez, para que eu pudesse jogar


sozinho. Quando os guardas viram o tabuleiro, quiseram jogar comigo. No
começo, eles sempre ganhavam. O mais forte era [Trecho censurado].

“Não foi assim que ensinei você a jogar”, [Trecho censurado] comentou
irritadamente quando eu venci um jogo.

“O que eu deveria fazer?”

“Você tem de criar uma estratégia, e organizar seu ataque! É por isso que os p…..
dos árabes nunca têm sucesso.”

“Por que você não joga e pronto?”, perguntei.

“Xadrez não é só um jogo”, ele disse.

“Imagine que você está jogando contra um computador!”

“Eu pareço um computador para você?”

“Não.”

No jogo seguinte, eu tentei fazer uma estratégia para deixar [Trecho censurado]
ganhar.

“Agora você entendeu como se joga xadrez”, ele comentou. Eu sabia que [Trecho
censurado] não gostava de perder, então não gostava de jogar com ele, não me
sentia confortável. [Trecho censurado] acredita que existem dois tipos de
pessoa, os americanos brancos e o resto do mundo. Americanos brancos são
inteligentes e melhores do que todo mundo. [Trecho censurado] odeia o resto do
mundo, especialmente árabes, judeus, franceses e cubanos. O único outro país
que ele mencionou positivamente foi a Inglaterra.

Depois de um jogo de xadrez, ele virou o tabuleiro.”Minha esposa me chama de


c….”, disse, orgulhoso.

É engraçado como as pessoas ocidentais têm uma visão falsa dos árabes:
selvagens, violentos, insensíveis e frios. Eu posso dizer com con ança que os
árabes são pací cos, sensíveis, civilizados e muito amorosos, entre outras
qualidades. Eu disse a [Trecho censurado], “vocês dizem que nós somos
violentos, mas se vocês ouvirem música árabe, ou poesia árabe, é tudo sobre
amor.” Durante meu tempo com [Trecho censurado], escrevi muitos poemas.
[Trecho censurado] tem todos.

Um dos meus poemas diz:

A página seguinte do livro foi censurada pelas autoridades militares dos EUA.

Mohamedou Ould Slahi continua preso na base militar de Guantánamo. Em 2010,


recebeu um habeas corpus na Justiça americana, que ordenou a soltura dele. O
governo recorreu, e Slahi continuou preso. A Justiça deverá analisar novamente o
caso até o nal do ano. Até a conclusão desta edição, quase 80% dos presos de
Guantánamo permaneciam em greve de fome – alguns deles pelo quarto mês
consecutivo. Os detentos em estado de saúde mais grave são amarrados e
alimentados à força, por meio de uma sonda nasogástrica.

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