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O ANO
Nesta viagem, de que fiz mençã o, e em todas as que passei a Linha Equinocial 1 , vi
debaixo dela, o que muitas vezes tinha visto, e notado nos homens, e me admirou, que se
houvesse estendido esta ronha e pegado também aos peixes. Pegadores2 se chamam
estes de que agora falo, e com grande propriedade; porque sendo pequenos, nã o só se
chegam a outros maiores; mas de tal sorte se lhes pegam aos costados, que jamais os
desaferram3. De alguns animais de menos força e indú stria 4 se conta, que vã o seguindo
de longe aos Leõ es na caça, para se sustentarem do que a eles sobeja. O mesmo fazem
estes Pegadores, tã o seguros ao perto, como aqueles ao longe; porque o peixe grande
nã o pode dobrar a cabeça, nem voltar a boca sobre os que traz à s costas, e assim lhes
sustenta o peso e mais a fome.
Este modo de vida, mais astuto que generoso, se acaso se passou, e pegou, de um
elemento a outro, sem dú vida que o aprenderam os peixes do alto, depois que os nossos
Portugueses o navegaram; porque nã o parte Vizo-Rei ou Governador para as
Conquistas, que nã o vá rodeado de Pegadores, os quais se arrimam a eles, para que cá
lhe matem a fome, de que lá nã o tinham remédio. Os menos ignorantes desenganados
da experiência, despegam-se, e buscam a vida por outra vida; mas os que se deixam
estar pegados à mercê, e fortuna dos maiores, vem-lhes a suceder no fim o que aos
Pegadores do mar.
Rodeia a Nau o Tubarã o nas calmarias da Linha1 com os seus Pegadores à s costas,
tã o cerzidos5 com a pele, que mais parecem remendos ou manchas naturais, que os
hó spedes, ou companheiros. Lançam-lhe um anzol de cadeia com a raçã o de quatro
Soldados, arremessa-se furiosamente à presa, engole tudo de um bocado, e fica preso.
Corre meia campanha6 a alá -lo acima, bate fortemente o convés com os ú ltimos
arrancos, enfim, Morre o Tubarã o, e morrem com ele os Pegadores. […]
Considerai, Pegadores vivos, como morreram os outros que se pegaram à quele
peixe grande, e porquê. O Tubarã o morreu porque comeu, e eles morreram pelo que nã o
comeram. Pode haver maior ignorâ ncia, que morrer pela fome, e boca alheia? Que
morra o Tubarã o porque comeu, matou a sua gula; mas que morra o Pegador pelo que
nã o comeu: é a maior desgraça que se pode imaginar! Nã o cuidei, que também nos
peixes havia pecado original. Nó s os homens fomos tã o desgraciados7, que outrem
comeu, e nó s o pagamos. Toda a nossa morte teve princípio na gulodice de Adã o e Eva; e
que hajamos de morrer pelo que outrem comeu, grande desgraça! Mas nó s lavamo-nos
desta desgraça com uma pouca de á gua8, e vó s nã o vos podeis lavar da vossa ignorâ ncia
com quanta á gua tem o mar.
Padre Antó nio Vieira, Sermão de Santo António, Porto Editora, 2015
2. Nesta passagem do sermã o, o orador elege como tema uma espécie de peixes por ele
observados: os Pegadores.
Expõ e as características que, no primeiro pará grafo, lhe sã o atribuídas.
3. «Este modo de vida, mais astuto que generoso, se acaso se passou, de um elemento a
outro, sem dú vida que o aprenderam os peixes do alto, depois que os nossos
Portugueses o navegaram.»
Interpreta a frase transcrita, mostrando a sua relevâ ncia crítica.
6. No ú ltimo pará grafo, seleciona uma apó strofe, uma antítese e uma metá fora e
comenta a sua expressividade.
1. insignificante. 2. veio depressa (a posta era o mais rá pido meio de locomoçã o). 3. fogo, o quarto
elemento da Natureza.
Apresenta, de forma bem estruturada, as tuas respostas aos itens que se seguem.
3. «Dir-me-eis, Voador, que vos deu Deus maiores barbatanas, que aos outros de vosso
tamanho.» Assim se antecipa o contra-argumento possível do Voador.
3.1 Explicita o modo como o orador desfaz este contra-argumento, apresentando nova
argumentaçã o.
5. No fim, como é habitual neste sermã o, é evocado o exemplo de Santo Antó nio.
Relaciona esta evocaçã o com o assunto do excerto.
Jorge, Madalena
Madalena (falando ao bastidor) – Vai, ouves, Miranda? Vai e deixa-te lá estar até veres
chegar o bergantim; e quando desembarcarem, vem-me dizer para eu ficar descansada.
(Vem para a cena) Nã o há vento, e o dia está lindo. Ao menos nã o tenho sustos com a
viagem. Mas a volta… quem sabe? O tempo muda tã o depressa…
Jorge – Nã o, hoje nã o tem perigo.
Madalena – Hoje… hoje! Pois hoje é o dia da minha vida que mais tenho receado… que
ainda temo que nã o acabe sem muito grande desgraça… É um dia fatal para mim: faz
hoje anos que… que casei a primeira vez – faz anos que se perdeu el-rei D. Sebastiã o – e
faz anos também que… vi pela primeira vez a Manuel de Sousa.
Jorge – Pois contais essa entre as infelicidades da vossa vida?
Madalena – Conto. Este amor – que hoje está santificado e bendito no Céu, porque
Manuel de Sousa é meu marido começou com um crime, porque eu amei-o assim que o
vi… e quando o vi, hoje, hoje… foi em tal dia como hoje! – D. Joã o de Portugal ainda era
vivo! O pecado estava-me no coraçã o; a boca nã o o disse… os olhos nã o sei o que
fizeram; mas dentro da alma eu já nã o tinha outra imagem senã o a do amante… já nã o
guardava1 a meu marido, a meu bom… a meu generoso marido… senã o a grosseira
fidelidade que uma mulher bem nascida quase que mais deve a si do que ao esposo.
Permitiu Deus… quem sabe se para me tentar?… que naquela funesta batalha de Alcá cer,
entre tantos, ficasse também D. Joã o.
Almeida Garrett, Frei Luís de Sousa, Porto Editora, 2017
1. sentia por…
Apresenta, de forma bem estruturada, as tuas respostas aos itens que se seguem.
4. Explica a relaçã o afetiva que a personagem feminina estabeleceu com os seus dois
maridos.
5. Identifica o papel desempenhado por Frei Jorge neste diá logo e especifica as outras
funçõ es que lhe sã o atribuídas ao longo da peça.
Romeiro – Basta: vai dizer-lhe que o peregrino era um impostor, que desapareceu, que
ninguém mais houve novas dele; que tudo isto foi vil e grosseiro imbuste de inimigos
de... dos inimigos desse homem que ela ama... E que sossegue, que seja feliz. Telmo,
adeus!
Telmo – E eu hei de mentir, senhor, eu hei de renegar de vó s, como um vilã o que nã o
sou?
Romeiro – Há s de, porque eu mando.
Telmo (com grande ansiedade) – Senhor, senhor, nã o tenteis a fidelidade do vosso
servo! É que vó s nã o sabeis... D. Joã o, meu senhor, meu amo, meu filho, vó s nã o sabeis...
Romeiro – O quê?
Telmo – Que há aqui um anjo... uma outra filha minha, senhor, que eu também criei...
Romeiro – E a quem já queres mais que a mim, dize a verdade.
Telmo – Nã o mo pergunteis.
Romeiro – Nem é preciso. Assim devia ser. Também tu! Tiraram-me tudo. (Pausa) E
têm um filho, eles?... Eu nã o... E mais, imagino... Oh! Passaram hoje pior noite do que eu!
Que lho leve Deus em conta e lhes perdoe como eu perdoei já . Telmo, vai fazer o que
mandei.
Telmo – Meu Deus, meu Deus, que hei de eu fazer?
Romeiro – O que te ordena teu amo. Telmo, dá -me um abraço. (Abraçam-se) Adeus,
adeus, até...
Telmo – (com ansiedade crescente) Até quando, senhor?
Romeiro – Até ao dia de juízo.
Telmo – Pois vó s?
Romeiro – Eu... Vai, saberá s de mim quando for tempo. Agora é preciso remediar o mal
feito. Fui imprudente, fui injusto, fui duro e cruel. E para quê? D. Joã o de Portugal
morreu no dia em que sua mulher disse que ele morrera. Sua mulher honrada e
virtuosa, sua mulher que ele amava... – oh, Telmo, Telmo, com que amor a amava eu! –
Sua mulher que ele já nã o pode amar sem desonra e vergonha!... Na hora em que ela
acreditou na minha morte, nessa hora morri. Com a mã o que deu a outro riscou-me do
mundo dos vivos. D. Joã o de Portugal nã o há de desonrar a sua viú va. Nã o, vai; dito por
ti terá dobrada força: dize-lhe que falaste com o romeiro, que o examinaste, que o
convenceste de falso e impostor... dize o que quiseres, mas salva-a a ela da vergonha e
ao meu nome da afronta. De mim já nã o há senã o esse nome, ainda honrado; a memó ria
dele que fique sem mancha. Está em tuas mã os, Telmo, entrego-te mais que a minha
vida. Queres faltar-me agora?
Telmo – Nã o, meu senhor, a resoluçã o é nobre e digna de vó s; mas pode ela aproveitar
ainda?
Romeiro – Porque nã o?
Telmo – Eu sei! Talvez...
Almeida Garrett, Frei Luís de Sousa, Porto Editora, 2017
1. Situa o excerto nas estruturas interna e externa da obra e justifica a tua resposta.
Apresenta, de forma bem estruturada, as tuas respostas aos itens que se seguem.
2. Caracteriza o quadro constituído pela Natureza retratada e pela personagem que nela
se enquadra: Joaninha.
5. Interpreta o comentá rio do narrador nos dois ú ltimos pará grafos do texto.
Eu amo a charneca.
E nã o sou romanesco. Româ ntico, Deus me livre de o ser – ao menos, o que na
algaravia de hoje se entende por essa palavra.
Ora a charneca dentre Cartaxo e Santarém, à quela hora que a passá mos, começava
a ter esse tom, e a achar-lhe eu esse encanto indefinível.
Sentia-me disposto a fazer versos... a quê? Nã o sei.
Felizmente que nã o estava só ; e escapei de mais essa caturrice. Mas foi como se os
fizesse, os versos, como se os estivesse fazendo, porque me deixei cair num verdadeiro
estado poético de distraçã o, de mudez – cessou-me a vida toda de relaçã o, e nã o sentia
existir senã o por dentro.
De repente acordou-me do letargo uma voz que bradou: – «Foi aqui!... aqui é que
foi, nã o há dú vida.»
– «A ú ltima revista do imperador.»
– «A ú ltima revista! Como assim a ú ltima revista! Quando? Pois?...»
Entã o caí completamente em mim, e recordei-me, com amargura e desconsolaçã o,
dos tremendos sacrifícios a que foi condenada esta geraçã o, Deus sabe para quê – Deus
sabe se para expiar as faltas de nossos passados, se para comprar a felicidade de nossos
vindouros...
Apresenta, de forma bem estruturada, as tuas respostas aos itens que se seguem.
1. melancó lico; 2. cordõ es, tipo atacadores, que fecham o gibã o (espécie de casaco curto, semelhante ao
colete); 3. arma antiga, com forma de machado; 4. có pia do original; 5. barra vertical que divide o vã o das
janelas em duas partes (construçõ es gó ticas); 6. D. Leonor de Teles, mulher de D. Fernando (ver crise de
sucessã o de 1383-85).
2. Na perspetiva de Frei Lourenço, Afonso Domingues devia estar grato a D. Joã o I, por
este o ter feito cavaleiro da casa real. Especifica se o velho cego partilha desta opiniã o e
justifica a tua resposta.
No terceiro dia à tarde, el-rei, que tinha passado o tempo em aparelhar-se para a
guerra com atos de piedade, desceu à crasta, acompanhado de Frei Lourenço e de outros
frades, e, chegando à porta do Capítulo, viu Martim Vasques e Ana Margarida junto à
pedra fria de Afonso Domingues, e este, pá lido e com as pá lpebras cerradas, encostado
nos braços deles.
O mancebo e a velha choravam e soluçavam, sem dizerem palavra.
– Que temos de novo? – perguntou el-rei, chegando à porta e vendo aqueles dois
estafermos. – Completam-se ora os três dias de voto: ainda mestre Afonso teimará em
estar aqui mais tempo?
– Nã o senhor – respondeu Martim Vasques, com palavras mal articuladas –, nã o
estará aqui mais tempo; porque o seu corpo é herança da terra; a sua alma repousa com
Deus.
– Morto!? – bradaram a uma voz el-rei e Frei Lourenço, e correram para o cadá ver
do arquiteto, olhando, todavia, primeiro para a abó bada com um gesto de receio.
– Nada temais, senhores – disse Martim Vasques. – As ú ltimas palavras do mestre
foram estas: «A abó bada nã o caiu... a abó bada nã o cairá !»
O arquiteto, gasto da velhice, nã o pô de resistir ao jejum absoluto a que se
condenara. No momento em que, ajudado por Martim Vasques e Ana Margarida, se quis
erguer, pendeu moribundo nos braços deles, e aquele génio de luz mergulhou-se nas
trevas do passado.
El-rei derramou algumas lá grimas sobre os restos do bom cavaleiro, e Frei
Lourenço rezou em voz baixa uma oraçã o fervente pela alma generosa que, até ao
ú ltimo arranco, escrevera sobre o má rmore o hino dos valentes de Aljubarrota.
Alexandre Herculano, A Abóbada, Porto Editora, 2014
2. «Completam-se ora os três dias de voto: ainda mestre Afonso teimará em estar aqui
mais tempo?» O rei parece surpreendido com o que vê ao chegar à porta do Capítulo.
Explica esta reaçã o da personagem.
3. Expõ e o que receava o rei e Frei Lourenço ao entrar na Sala do Capítulo e o que os
levou a fazê-lo com maior tranquilidade.
4. Velhice, cansaço, ansiedade, fraqueza, satisfaçã o – tudo isto se conjugou para a morte
de D. Afonso Domingues.
Tendo em conta o que conheces da personagem, comenta esta afirmaçã o.
1. engana-o, ludibria-o.
3. Mostra como as falas de Joã o da Cruz contribuem para o retrato social e psicoló gico
da personagem.
Apresenta, de forma bem estruturada, as tuas respostas aos itens que se seguem.
1. O texto tem como questã o central a decisã o que Simã o Botelho teve de tomar. Indica
de que decisã o se trata.
3. «Â nsia de viver era a sua; nã o era já â nsia de amar.» Justifica, de acordo com o texto, a
aparente desistência do amor.
Apresenta, de forma bem estruturada, as tuas respostas aos itens que se seguem.
4. Os espaços físicos, n’Os Maias, raramente sã o apenas cená rios em que a açã o
acontece.
Realça o valor simbó lico do Ramalhete, tal como é apresentado no fragmento transcrito,
fundamentando a resposta.
Ega voltou a falar dos inundados do Ribatejo e do sarau literá rio e artístico que em
benefício deles se «ia cometer» no salã o da Trindade... Era uma vasta solenidade oficial.
Tenores do parlamento, rouxinó is da literatura, pianistas ornados com o há bito de S.
Tiago, todo o pessoal canoro e sentimental do constitucionalismo ia entrar em fogo. Os
reis assistiam, já se teciam grinaldas de camélias para pendurar na sala. Ele, apesar de
demagogo, fora convidado para ler um episó dio das Memórias dum Átomo: recusara-se,
por modéstia, por nã o encontrar nas Memórias nada tã o suficientemente palerma que
agradasse à capital. Mas lembrara o Cruges; e o maestro ia ribombar ou arrulhar uma
das suas Meditaçõ es. Além disso havia uma poesia social pelo Alencar. Enfim, tudo
prenunciava uma imensa orgia...
– E a Sr.ª D. Maria, acrescentou ele, devia ir!... É sumamente pitoresco. Tinha V. Ex.ª
ocasiã o de ver todo o Portugal româ ntico e liberal, à la besogne, engravatado de branco,
dando tudo que tem na alma!
– Com efeito devias ir, disse Carlos, rindo. Demais a mais se o Cruges toca, se o
Alencar recita, é uma festa nossa...
– Pois está claro! gritou Ega, procurando o monó culo, já excitado. Há duas coisas
que é necessá rio ver em Lisboa... Uma procissã o do Senhor dos Passos e um sarau
poético!
Rolavam entã o pelo largo do Pelourinho. Carlos gritou ao cocheiro que parasse no
começo da rua do Alecrim: eles apeavam-se e tomavam de lá o Americano para o
Ramalhete.
6. «Demais a mais se o Cruges toca, se o Alencar recita, é uma festa nossa.» Refere-te à
representatividade, ao nível da crítica de costumes, das personagens aludidas por
Carlos.
Ideal
1. Explicita o modo como, nas duas primeiras estrofes, o sujeito poético caracteriza, aos
níveis físico e psicoló gico, o ser designado por «Aquela que eu adoro» (v. 1).
1.1 Mostra as implicaçõ es do processo usado na concretizaçã o dessa caracterizaçã o.
4. Relaciona o poema com o seu título, enquadrando-o na obra de Antero, no que diz
respeito à temá tica da busca de um Ideal.
2. Esclarece e interpreta o desejo que o sujeito poético exprime nas duas quadras.
2.1 Indica e comenta as formas verbais mais expressivas na formulaçã o desse desejo.
3. Interpreta a expressã o «dava / Minha estéril ciência, sem receio» relacionando-a com
os versos anteriores e com os dois seguintes.
4. Explica o sentido dos dois ú ltimos versos, relevando o valor das oraçõ es condicionais.
De verão
I
No campo; eu acho nele a musa que me anima:
A claridade, a robustez, a açã o.
Esta manhã , saí com minha prima,
Em quem eu noto a mais sincera estima
E a mais completa e séria educaçã o.
II
Criança encantadora! Eu mal esboço o quadro
Da lírica excursã o, de intimidade,
Nã o pinto a velha ermida com seu adro;
Sei só desenho de compasso e esquadro,
Respiro indú stria, paz, salubridade.
III
Andam cantando aos bois; vamos cortando as leiras1;
E tu dizias: «Fumas? E as fagulhas?
Apaga o teu cachimbo junto à s eiras2;
Colhe-me uns brincos rubros nas gingeiras!
Quanto me alegra a calma das debulhas3!»
IV
E perguntavas sobre os ú ltimos inventos
Agrícolas. Que aldeias tã o lavadas!
Bons ares! Boa luz! Bons alimentos!
Olha: os saloios vivos, corpulentos,
Como nos fazem grandes barretadas4!
V
Voltemos. Na ribeira abundam as ramagens
Dos olivais escuros. Onde irá s?
Regressam rebanhos das pastagens;
Ondeiam milhos, nuvens e miragens,
E, silencioso, eu fico para trá s.
VI
Numa colina azul brilha um lugar caiado.
Belo! E arrimada ao cabo da sombrinha,
Com teu chapéu de palha, desabado,
Tu continuas na azinhaga; ao lado
X
Exó tica! E cheguei-me ao pé de ti. Que vejo!
No atalho enxuto, e branco das espigas,
Caídas das carradas no salmejo5.
Esguio e a negrejar em um cortejo,
Destaca-se um carreiro de formigas.
XI
Elas, em sociedade, espertas, diligentes.
Na natureza trémula de sede,
Arrastam bichos, uvas e sementes
E atulham, por instinto, previdentes,
Seus antros6 quase ocultos na parede.
XII
E eu desatei a rir como qualquer macaco!
«Tu nã o as esmagares contra o solo!»
E ria-me, eu ocioso, inú til, fraco,
Eu de jasmim na casa do casaco7
E de ó culo deitado a tiracolo!
XIII
«As ladras da colheita! Eu, se trouxesse agora
Um sublimado corrosivo, uns pó s
De solimã o8, eu, sem maior demora,
Envenená -las-ia! Tu, por ora,
Preferes o româ ntico ao feroz.
XIV
Que compaixã o! Julgava até que matarias
Esses insetos importunos! Basta.
Merecem-te espantosas simpatias?
Eu felicito suas senhorias,
Que honraste com um pulo de ginasta!»
XV
E enfim calei-me. Os teus cabelos muito loiros Luziam, com doçura, honestamente;
De longe o trigo em monte, e os calcadoiros9, Lembravam-me fusõ es de imensos
oiros,
E o mar um prado verde e florescente.
Cesá rio Verde, Cânticos de Realismo e Outros Poemas, INCM, 2015
1. «No campo; eu acho nele a musa que me anima:/A claridade, a robustez, a açã o.» (vv.
1 e 2)
Confirma, com elementos do texto, cada uma das três características que o sujeito
poético encontra no campo por ele percorrido.
A débil
B.
1. O excerto situa-se no capítulo V, na segunda parte da Exposiçã o do Sermão, correspondente aos vícios
dos peixes em particular, neste caso, o vício do Voador.
2.1 Ao Voador começa por ser apontado o vício de querer ser ave, voando, nã o se contentando com nadar.
2.2 Ao mesmo tempo que o critica, o orador aconselha o Voador a olhar para a sua condiçã o de peixe e
contentar-se com o mar que Deus lhe destinou para nadar, largando o há bito de voar.
3. A possível contra-argumentaçã o do Voador (Deus deu-lhe barbatanas maiores do que as dos outros
peixes do seu tamanho) é antecipada pelo orador, que apresenta, de imediato, nova argumentaçã o:
mesmo sendo maiores, as barbatanas nã o sã o asas, e ao ser levado pela ambiçã o de andar pelos ares, o
Voador é apanhado pelas velas ou pelas cordas dos navios e acaba por morrer.
4.1 Representa a ambiçã o (provocada pela vaidade de ser mais do que os outros).
5. Santo Antó nio é evocado como contraponto do vício que o orador acabou de criticar através da figura
do Voador. Segundo o texto, o Santo, que tinha as asas da Sabedoria natural e sobrenatural, nã o as
aproveitou para subir acima dos outros homens, pelo contrá rio, fez-se simples, a ponto de ser
considerado ignorante. Santo Antó nio é, assim, uma vez mais, apontado como exemplo, agora de
simplicidade.
B.
1. Este excerto localiza-se no ato III, numa fase adiantada da açã o, depois do Reconhecimento, em que
surge ainda uma hipotética possibilidade de mudar o rumo dos acontecimentos: encontramo-nos,
portanto, na segunda parte da peça, ou seja, no «Conflito»
2. A personagem revela grande humanidade, nobreza de cará ter e firmeza. Estas características sã o
evidenciadas pela compreensã o das vacilaçõ es de Telmo: «Assim devia de ser», pela capacidade de ter em
conta o sofrimento dos que o fizeram sofrer; «Oh! Passaram hoje pior noite do que eu!», pelo
arrependimento e firme intençã o de remediar o mal que causou; «Fui imprudente, fui injusto, fui duro e
cruel (...) salva-a a ela da vergonha e ao meu nome da afronta.»
3. Telmo, o velho escudeiro, revela vá rias mudanças ao nível do seu estado de espírito: da rejeiçã o – «E eu
hei de mentir, senhor, hei de renegar de vó s, como um vilã o que nã o sou?» – passa à hesitaçã o – «Meu
Deus, meu Deus, que hei de eu fazer?» – e, por fim, à aceitaçã o – «Nã o, meu senhor, a resoluçã o é digna de
vó s, mas pode ela aproveitar ainda?»
4. A conjugaçã o do recurso à exclamaçã o – «Também tu!» –, à repetiçã o – «Oh, Telmo, Telmo, com que
amor a amava eu!» – e à frase suspensa – «Eu sei! Talvez...» – sublinha a forte tensã o emocional vivida por
ambas as personagens, a complexidade da decisã o que estã o a discutir e a importâ ncia das revelaçõ es que
entretanto se processam.
B.
1. Na sua deambulaçã o de Lisboa a Santarém, o narrador, ao chegar à charneca ribatejana, começa por
exprimir a sua emoçã o e passa depois à reflexã o suscitada por um breve diá logo. O excerto é, de facto,
exemplar do estilo digressivo de Viagens na Minha Terra.
2. A Natureza, aqui materializada na charneca, é verdadeiramente inspiradora, cria no narrador um
sentimento estético que o leva a desejar fazer poesia.
3. A partir da referência que o companheiro de viagem faz à passagem de D. Pedro, o líder dos liberais, o
narrador inicia uma reflexã o melancó lica e triste sobre a guerra civil, os danos que causou e os benefícios
que dela se retiraram. É uma reflexã o crítica, desde logo de pendor filosó fico (contra a guerra em geral e a
guerra civil em particular), ao mesmo tempo que reflete sobre a situaçã o concreta do país que dela
resultou (que o narrador ajudou a construir e que tanto se afastou dos ideais do Liberalismo).
4. Coloquialidade:
«Na ligaçã o com o leitor: Deus me livre de o ser − ao menos, o que na algaravia de hoje se entende por
essa palavra»
«Sentia-me disposto a fazer versos... a quê? Nã o sei.»
«O breve diá logo com o companheiro de viagem»
Ironia:
«Româ ntico, Deus me livre de o ser»
«e escapei de mais essa caturrice.»
B.
1. Desenlace da narrativa.
2. Afonso Domingues fizera dois votos quando se comprometera a reerguer a abó boda da Sala do
Capítulo. O primeiro era que a obra estaria pronta em quatro meses; o segundo, que nã o sairia de baixo da
abó bada durante os três dias seguintes ao retirar das vigas, tá buas…, tudo o que sustentava o teto da sala
capitular. Os dois prazos foram cumpridos. Por isso o rei nã o percebia por que razã o o velho continuava
no mesmo sítio, sem dar mostras de querer sair dali.
3. Receavam que a abó bada caísse, como já acontecera com a anterior. Entraram a medo, chocados com a
notícia da morte do arquiteto, entraram mais seguros depois de ouvirem, por Martim Vasques, as ú ltimas
palavras de Afonso Domingues.
4. Afonso Domingues estava velho e cego. O esforço que fizera para acompanhar durante quatro meses a
reconstruçã o da abó bada deve tê-lo levado a um cansaço extremo. A ansiedade provocada pela
expectativa de sucesso de uma obra difícil e sem precedentes em Portugal era um estado emocional
inevitá vel. O jejum a que se forçara, durante os ú ltimos três dias, passados sentado numa pedra fria
colocada debaixo da abó bada, tiraram ao velho arquiteto a pouca força física que ainda lhe restava. A
satisfaçã o do dever cumprido, do sonho realizado, da gló ria e imortalidade conseguidas, tudo isto foi
demais para o fragilizado artista.
5. A metá fora das linhas 20-21 associa a memó ria dos guerreiros de Aljubarrota à arte que os imortaliza.
O mosteiro da Batalha é uma cançã o de louvor, mú sica gravada na pedra, o sonho de um guerreiro artista,
tornado realidade.
B.
1. O excerto corresponde a um momento da intriga principal, logo apó s a publicaçã o da carta de Dâ maso
na Corneta do Diabo, o que levou Ega a chamar Carlos a Lisboa.
2. Guimarã es representa o surgimento do passado e da histó ria familiar desconhecida pelos
protagonistas.
B.
1. Uma vida atormentada, dominada pela angú stia existencial («este viver dorido», «esta noite de tal
frio»), pela sensaçã o de desagregaçã o psíquica («meu pobre existir, meio partido»).
2. O sujeito poético deseja ser protegido, consolado e acarinhado por uma figura materna, uma Mã e, que
adormeça a sua dor, vele o seu sono, o prenda à vida, acompanhe a sua dolorosa caminhada, ilumine, com
a sua presença, a escuridã o da existência tã o angustiada.
2.1 Formas verbais: «adormente», «vele», «ate», «me leve», «me banhe», «lave».
B.
1. A caracterizaçã o organiza-se, de facto, em torno dos campos lexicais de:
− beleza: «bela»; «esbelta e fina»; «loura»; «branca»;
− fragilidade: «frá gil»; «assustada»; «fraca»; «Uma pombinha tímida e quieta»; «ténue»; «dó cil»;
«recolhida»;
− simplicidade: «Esse vestido simples, sem enfeite»; «Adorá vel! Tu, muito natural / Seguias a pensar no
teu bordado»; «Com elegâ ncia e sem ostentaçã o»;