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Teste de Avaliação – Unidade 1.

4
Fernando Pessoa, Mensagem

GRUPO I
A

Lê o poema seguinte.

Prece
Senhor, a noite veio e a alma é vil.
Tanta foi a tormenta e a vontade!
Restam-nos hoje, no silêncio hostil,
O mar universal e a saudade.

Mas a chama, que a vida em nós criou,


Se ainda há vida ainda não é finda.
O frio morto em cinzas a ocultou:
A mão do vento pode erguê-la ainda.

Dá sopro, a aragem – ou desgraça ou ânsia – ,


Com que a chama do esforço se remoça1,
E outra vez conquistemos a Distância –
Do mar ou outra, mas que seja nossa!

Fernando Pessoa, Poesia do eu, edição de Richard Zenith,


Lisboa, Assírio & Alvim, 2014, p. 370.

1. Apresenta uma justificação pertinente para o título do poema.


[20 pontos]

2. Esclarece a possibilidade que o sujeito poético exprime na segunda estrofe.


[20 pontos]

3. Identifica a última metáfora presente no texto, justificando.


[20 pontos]

B
1
renova

1
Lê o poema seguinte.

E vós, Tágides minhas


E vós, Tágides minhas, pois criado
Tendes em mi um novo engenho ardente,
Se sempre, em verso humilde, celebrado
Foi de mi vosso rio alegremente,
Dai-me agora um som alto e sublimado,
Um estilo grandíloquo e corrente,
Por que de vossas águas Febo ordene
Que não tenham enveja às de Hipocrene.

Dai-me hua fúria grande e sonorosa,


E não de agreste avena ou frauta ruda,
Mas de tuba canora e belicosa,
Que o peito acende e a cor ao gesto muda.
Dai-me igual canto aos feitos da famosa
Gente vossa, que a Marte tanto ajuda;
Que se espalhe e se cante no Universo,
Se tão sublime preço cabe em verso.
Luís de Camões, Os Lusíadas, edição de Emanuel Paulo Ramos,
Canto I, estâncias 4 e 5, Porto, Porto Editora, 1987, p. 72.

4. Insere o texto na estrutura interna da obra a que pertence, justificando.


[20 pontos]

5. Contrasta as duas formas de poesia referidas no texto, justificando.


[20 pontos]

GRUPO II

2
Lê o texto seguinte.

Era uma vez...


1.º de dezembro1 [1992]
Estou a escrever no sótão onde, ultimamente, tenho vindo pouco. O dia é de feriado
como (quase) todo o português sabe. Como é que o compêndio da escola dizia? – todo de
exaltação patriótica tecido: «Marcado o dia primeiro de dezembro, pouco antes das nove
horas da manhã, começaram a vir ao Terreiro do Paço, de cortinas corridas, coches,
carruagens blasonadas2, berlindas e liteiras3» – e por ali abaixo, com o octogenário D. Miguel
de Almeida à frente e o grito de «Liberdade! Liberdade! Viva El-Rei D. João IV!». E veio o padre
Nicolau da Maia, e os filhos de Filipa de Vilhena. O corregedor Albergaria varado 4 com duas
balas.
Era em tempos do Estado Novo e nós marchávamos ao som do hino da Mocidade («Lá
vamos, cantando e rindo / Levados, levados sim…». A gente a acertar o passo pelo tambor – o
queixo levantado, o peito para fora. Havia discursos na praça enquanto a bandeira das quinas
acenava ao alto, numa provocação a Castela.
Ficou no ouvido de todos os camaradas aquele armário onde se escondeu o
Vasconcelos que foi atirado pela janela fora e arrastado pela lama de Lisboa como um cão
morto.
Na altura eu tinha a cara redonda e lisa de rapazinho, pernas para aguentar de pé
horas de comemoração, e ingenuidade suficiente para levar a sério a sinceridade patriótica
daqueles senhores dos discursos.
Tantos anos passaram.
Agora estou aqui no sótão da minha casa onde não há nenhum sinal do primeiro de
Dezembro e da sua revolução. Os únicos sons que me chegam vêm do quintal, dos meus
netos, que jogam ao pião. As vozes, ouço-as, mas não chegam a perturbar a quietação do
sótão e das coisas que nele habitam – coisas sisudas, misturadas, com sinais de terem sido
violentadas pelo uso. Baças do tempo e da poeira que o vento faz infiltrar pelo telhado. Coisas
da natureza do que trago comigo – carunchosas, com a sombra de melancolia e de abandono,
a sussurrar baixinho do tempo que foi. O sentimento vivo de ser eu uma coisa assim usada
que já cumpriu o seu tempo de serviço e vai acabar entre os trastes 5 esquecidos do sótão.
[…]
27 de dezembro [1992]
Ultimamente estou mais frequentemente tristonho, que é diferente de melancólico –
que o melancólico até pode ser uma disposição propícia ao poético, ao literário. Comparada, a
melancolia é quase um estado de graça. Um «contentamento descontente», como diz Camões

1
Na primeira entrada, o diarista refere-se ao feriado do 1º de Dezembro, no qual se comemora a
Restauração da Independência (1640) e se referem alguns acontecimentos e personagens históricas
relacionados com esse sucesso
2
«carruagens blasonadas» – carruagens da nobreza
3
«berlindas e liteiras» – tipos de carruagens pequenas para transportar os nobres
4
atravessado, morto
5
móveis já sem uso, esquecidos

3
do amor e, como este, capaz de pôr mais próximo das coisas, mais na intimidade delas – como
que uma serena migração do eu até onde acontecem os mitos e os rituais de iniciação.
A tristeza não. A tristeza é o desistir. É o ficar à margem – «o ficar sozinho por entre a
gente», desligado da vida e de tudo. Com uma indiferença que já não é deste mundo, encara-
se então a realidade da morte-quase-apetecida.

Fernando Aires, Era uma vez o tempo – diário (1982–2010),


Guimarães, Opera Omnia, 2015, pp. 506, 507, 512 e 513.

Responde aos itens que se seguem, registando a resposta no teu caderno. Seleciona a única
opção que permite obter uma afirmação correta.

1. A utilização do determinante possessivo presente em «[...] onde não há nenhum sinal do


primeiro de Dezembro e da sua revolução.» (ll. 19-20) concretiza um exemplo de coesão
[5 pontos]
(A) frásica.
(B) temporal.
(C) referencial.
(D) lexical.

2. No último parágrafo da primeira entrada, o diarista refere a realidade exterior através de


sensações respetivamente
[5 pontos]
(A) auditivas e visuais.
(B) olfativas e visuais.
(C) visuais e olfativas.
(D) táteis e visuais.

3. A inclusão de versos de Luís de Camões no texto (ll. 33 e 37-38) constitui um exemplo de


intertextualidade
[5 pontos]
(A) através de alusões.
(B) por meio de citações.
(C) concretizada numa paródia.
(D) através de paráfrases.

4. A referência ao sentimento da melancolia existente na segunda entrada tem como função


[5 pontos]
(A) possibilitar a definição precisa do que é o sentimento da tristeza.
(B) comparar dois sentimentos para detetar diferenças entre eles.
(C) possibilitar o contraste evidente entre dois sentimentos parecidos.
(D) distinguir sentimentos cujos sintomas estão próximos um do outro.

4
Responde, de forma correta, aos itens apresentados.

5. Indica o aspeto verbal presente nos complexos verbais da frase «Estou a escrever no sótão
onde, ultimamente, tenho vindo pouco.» (l. 2).
[10 pontos]

6. Indica o valor temporal presente no complexo verbal da frase «[...] já cumpriu o seu tempo
de serviço e vai acabar entre os trastes esquecidos do sótão.» (l. 28).
[10 pontos]

7. Refere a função sintática da oração subordinada presente em «Havia discursos na praça


enquanto a bandeira das quinas acenava ao alto, numa provocação a Castela.» (ll. 12-13).

[10 pontos]

GRUPO III
[50 pontos]

As comemorações de acontecimentos históricos são momentos importantes para


aprofundar a identidade nacional.

Redige um texto de opinião, no qual comproves que assim é, apresentando, pelo


menos, dois argumentos que comprovem este ponto de vista e respetivos exemplos.

O teu texto deve ter entre 200 e 300 palavras e estruturar-se em três partes lógicas.

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