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COM A COLABORAÇAO DE
VALDEI LOPES DE ARAUJO
I
A major parte desse texto foi originalmente escrita em inglês. 'There is no Brasil: A Poet's
Writing of Cultural History, e publicado em Brazil200I: A Revisionary Histoiy ofBrazilian Literature
and Culture (University of Massachusetts Dartmouth, 2001): xvii-xxviii. Agradeço a Bluma Vilar a
traduçäo do texto em inglés.
2
Professor de Literatura Comparada da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
3
Andrade 45.
4 A relevância da
noçäo de paradoxo como forma de abordagem da cultura brasileira já foi desta-
cada por John Gledson: Brasil é um país de paradoxos, e um dos majores é que, embora o país
pareça se abrir para um fácil entendimento. quanto mais nos aproximamos dele, mais complexo e
contraditório se torna (6).
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18 JOÂO CEZAR DE CASTRO ROCHA NENHUM BRASIL EXISTE - PEQUENA ENCICLOPEDIA 19
[orrnaçao das estruturas econômicas e sociais, incluía um ativo progra- No sentido grego original, a afirmaçäo teórica era um pronuncia-
ma cultural cuja meta era tornar os brasileiros orguihosos de seu país mento que implicava um ato complexo de re-visão, envolvendo urn
nwdiante a descoberta e a promoçäo de potencialidades até então negli- grupo de testemunhas profissionais", cuja funçâo consistia em "assegu-
genciadas. Esse projeto levou à cooptação de boa parte da geraçäo rar que um dado evento tinha ocorrido" e podia assim tornar-se tema
modernista pelo Estado, incluindo o próprio Carlos Drummond de para consideraçâo no ámbito da cidade (Tarnen xii). Por definição, os
Andrade. Muito em breve, aliás, seria criada a Rádio Nacional do Rio de ouvintes desse pronunciamento nao tinham presenciado o evento refe-
Janeiro (1936), convertida num valioso instrumento para assegurar a rido pelos theoroi, era a credibilidade de sua posiçâo a responsável pelo
popularidade de Getúlio Vargas. Aparentemente, o
Brasil ali estava, ato suplementar de conferir veracidade ao relato. Tal autoridade, esclare-
pronto para ser dedfrado pelos brasileiros e adequadamente difundido ce Wlad Godzich, era atribuída a hrn de disdplinar os efeitos do discurso
na organização da ddade, mediante urna distinçäo precisa entre "reivin-
livros-
pelas ondas de rádio, filmes de propaganda política, artigos
romances, poemas, crônicas: todos os gêneros
de jornal,
cram bem- dicaçöes" e "afirmaçöes teóricas". Aquelas podiam ser feitas por qualquer
vindos, desde que confirmassem a versão ofidal. indivíduo, já estas cram prerrogativa dos oficiais designados para a fun-
Numa primeira leitura, portanto, o poema de Drummond parece çäo pública de theoros.5 Esse contexto particular cria urn cenário cuja
cui-
sugerir que o Brasil ofidal nao passava de um artifIcio resultante de cornplexidade pode ser relevante para a reflexäo sobre a escrita de histó-
dadosa orquestraçâo por parte dos revolucionários que tomaram o rias culturais e literárias. Em suma, o theoros tern de relatar urn evento
o se converte numa críti- por ele testemunhado a uma audiênda que nao estava presente à cir-
poder em 1930. Dessa perspectiva, parodoxo
ca: o 'Brasil" oficial nao coindde corn o Brasil. Talvez por isso, o Brasil cunstância a da relatada. Tal cena, vale frisar, produz na verdade dois
incxista e ao mesmo tempo proclame sua própria inexistência. Em atos de re-visâo, e distingüi-los propicia urna melhor compreensão do
outras palavras, há um Brasil que precede o Estado e, conseqüente- paradoxo intuído por Drummond. O primeiro, realizado pelo theoros, dá
mente, nao pode ser reduzido à imagern oficial. É como se o Brasil los- origem a urna afirmaçäo propriamente fantasmagórica, urna vez que
Sc um signo tao pleno de sentido que nao pudesse ser apreendido por "fantasmas vêrn sempre após alguma coisa" (Tarnen xiv). Nesse caso, o
urna simples operaçäo hermenêutica. O veiho clichê parece prevalecer
nessa leitura: tao exuberante quanto sua natureza, o Brasil, o Brasil- do -
ato de relatar vem após o de testemunhar um evento realmente ocorri-
muito embora o processo de ver/contar jamais coincida corn o
evento em todos os seus múltiplos aspectos. O segundo ato de re-visâo é
cm-si-mesmo, o Brasil bem brasileiro das declaraçöes ufanistas, só pode
ser sentido corn o coraçäo e nao interpretado racionalmente, pois, ante o mais irnportante para minha argumentaçâo. No caso dos ouvintes, seus
a plenitude do objeto, a linguagem parece incapaz de expressá-lo. fantasmas re-vistos "vêrn após coisa alguma, pois são simultâneos ao
No entanto, tal leitura nao dá conta da complexidade da intuiçâo discurso do theoros. O ouvinte nao tern a memória de ter presenciado urn
drummondiana. Se fosse satisfatória, como poderia a pergunta que evento real, mas predsa projetar no relato do theoros a credibilidade asso-
cnccrra o poema duvidar da existência dos próprios brasileiros? Se o ciada ao caráter público da função. Desse modo, a rnernória do ouvinte é
Brasil-em-si-mesmo excede sua ficção oficial, ele nao se tena inscrito no nao apenas socialrnas secundariamente engendrada, tornando-se urn
-
poyo origem da essência nacional, como afirmaria qualquer narrativa fato na medida em que é aceita corno representaçao fiel de urna realida-
romântica? Mais inquietante que pôr em dúvida a existência do Brasil é de prévia. Em síntese, a performance de contar urna história pressupu-
questionar a realidade dos brasileiros. Se o poyo é tao ficdonal quanto a nha originalmente o ato anterior de testemunhar urn evento.
narrativa que o Estado forja do país, entäo, onde estamos? Ou: o que
somos nós? Segundo Miguel Tarnen, encontramo-nos numa configura- da segunda modalidade de re-visäo -
Ora, projetos corno Nenhum Brasil existe constituem casos especiais
casos em que a complexidade da
Çã() fantasmagórica, somos fantasmas de nossas próprias projeçöes.
Na relaçâo entre presenciar e contar chega a seu limite. No tocante às his-
"introduçäo" a A Revisonary History ofPortuguese Literature, Tarnen mostra
como as noçöes de theoria e revisio estäo etimologicamente ligadas à idéia i A cidade necessitava de urna forma de conhecimento mais oficial e segura caso nao desejasse
dc fantasia e fantasma (Tarnen xii-xiii). As conseqüências dessa possibi-
perderse em infinitas reivindicaçôes e contra-reivindicaçöes. (...) somente o evento teoricarnen-
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lidade irnportam muRo para a reflcxio aqui empreendida.evaluation
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20 ioAo CElAR DE CASIU() ROCUA NENHUM BRASIL EXISTE - PEQUENA ENCICLOPEDIA 21
tórias Iitcrárias e culturais, nao há um evento que oriente a organizaçäo sentido que reforça a si próprio, a naçäo seria antes um significante
da narrativa. Na perspectiva grega, é como se nem o theoros, tampouco
OS OUViflteS tivessem testemunhado qualquer evento e aqui vale
Icmbrar que o verbo theorem significa 'oIhar parafl, "contemplar, "pes-
- vazio ao qual se atribui urna carga semântica segundo as diferentes
necessidades geradas pela contingência das circunstâncias históricas.
Por ¡sso nem o Brasil, tampouco os brasileiros existem, ou rnelhor,
quisar" (Godzich 164). Transpondo esse problema para a construção somente existem através das imagens que deles construImos.
oltocentista do Estado-naço, fica claro que, à sua revelia, os historia- Ora, como observou Horni Bhabha, urna naço é antes de mais
dores da literatura e os seus leitores patriotas estavam engajados numa nada um problema de narração: "a figura ambivalente da naçäo é urn
empresa lúdica: a crença numa origem que nao podia ser identificada, problema de sua história transicional, de sua indeterminaçäo concei-
pois ¿i narrativa da história de urna nação nao pode contar corn urna
tual, de sua oscilaçäo entre vocabulários" (Bhabha 2). Narrar a nação
visau dc seu principio anterior à própria narrativa. A relaçäo clássica
sempre produz discursos que, apesar de prometerern urna inclusäo
necessita ser invertida, já que o relato deve mostrar-se bern-sucedido, a
total, são determinados sobretudo por exclusöes. Assim, a 1ocalidade'
11m dc forjar o testemunho retrospectivo: urna vez escoihido o evento
da cultura nacional nao é nern unificada nem unitária em relaçâo a si
originário, o olhar histórico organiza a escrita de acordo corn esse even- mesma" (Bhabha 4), e, por isso, engendra continuamente o "outro" no
tO. Por seu turno, tal ordenaçâo deve atestar a veracidade do relato. A
interior de um pretenso discurso homogéneo. Ademais, corno toda nar-
tautologia é incontornável.6 Nesse circuito, tanto o relato quanto sua rativa necessita apoiar-se nurna seleção inicial de elementos, nao pode
rccepçäo revelam-se substancialmente sern substância, vêm inexora-
velmente após coisa algurna, são fantasrnas de suas projeçöes, por assirn pretender ser urna representaçäo totalizante. Em conseqüência, revela-
se tanto sua arbitrariedade quanto os interesses a ela subjacentes.
nacional" de urna nação -
dizer. Nao podem pois fundamentar tentativas de desvendar o "caráter
e, urna vez mais, a redundância é inevitá-
vel. Leo Spitzer encontrou a formulaçào definitiva para o problema ern
Renan adrnitiu em célebre conferência: "Nenhum cidadâo francês sabe
se é burgúndio, alano, taifale, visigodo; todo cidadâo francés precisa ter
sua resenha de Poesía española, de Dámaso Alonso. Tal redundância esquecido São Bartolorneu, os rnassacres do Sul no século XIII.8
inaugura a "tautologia nacional", baseada na "afirmaçâo irnplícita de Portanto, nao é apenas a origem que se ignora, há muito mais para urn
que urna obra de arte espanhola é grande porque genuinarnente espa- cidadão esquecer a firn de se tornar "genuinamente" francés. Aqui a
nhola e genuinamente espanhola quando grande (Spitzer 354).7 Por agudeza da intuiçâo drummondiana se evidencia: tal narraçâo nao pas-
essa razào, o paradoxo drummondiano nao deve ser resolvido. Do con- sa de uma mise em abyme, quanto mais histórias nacionais forern escri-
trário, estaríamos condenados à mesma tautologia. De fato, o autor de tas, menos seus leitores serão capazes de apreender a totalidade da
"lino nacional" parece sugerir que, em lugar de signo repleto de um naçâo. E acaso há semeihante totalidade?
Em resumo, nao produzirnos coletâneas de ensaios de história
literária e cultural porque ainda nao sabemos quem são os brasile-iros e
6
Numa formulaçao perfeita, Wolfgang Iser resumiu o impasse criado por esse tipo de
tautologia: esperamos finalmente descobrir sua essência por meio da iniciativa. O
'Sempre que se postulam princIpios e fins, a história se transforma num testemunho das noçöes
preconcebidas, as quais devem revelar a si mesmas através da história, embora nao se reduzam à mais provável é que as organizamos porque nunca saberemos quern
história. Ademais, a compreensao dos fatos nao seria importante se considerarmos a história o são os brasileiros --- assirn como nao se pode saber quem são os chine-
processo de desenvolvimento de algo que a precede ou se considerarmos a história o caminho para
um objetivo que, por definição, encontra-se fora dela" (15er, The Range ses, uruguaios, portugueses, sul-africanos, etc., pois esse nao é urn pro-
ofinterpretation 58). No
tocante à obsessâo com a "identidade nacional, seu entendimento tautológico faz corn que a pró. blerna brasileiro, mas urna questão teórica associada à constituiçäo da
pria escrita de histórias literárias se revele desnecessária, ou, no melhor dos casos, um ocioso exer- sociedade moderna. A produçâo desse tipo de coletânea, portanto, con-
cício de antiquários cuja única obrigaçao é reunir fatos que confirmem a verdade que desde scm-
pre já era conhecida. Nesse contexto, atos de interpretaçäo nao sào exatamente bem-vindos.
7
Um pouco adiante, sptizer completou sua crítica à "tautologia nacionaP corn urna
aguda obser- s Renan 20. A conferência foi realizada na Sorbonne, em I i de marco de 1882. Sem dúvida, a con-
vaçäo: "Devo confessar que sempre apreciei o emprego norte-americano do this country: como se o ferência representava urna resposta à derrota sofrida na guerra franco-prussiana, de 1 87 1 Renan
.
norte-americano entendesse o seu país como um entre os países possíveis, como se tivesse acaba-
poderla ter mencionado um massacre muito mais recente e perturbador: o da Comuna de Paris.
do de se estabelecer nele! Esta postura relativista, naturalmente impossível no veiho continente,
representa urna iiçäo saudvel para a autocrítica nacional" (371, nota 2). sacre dos communards -
Por isso, para ser um cidadäo francés, em 1882, exigia-se, antes de tudo, o esquecimento do mas-
requisito a que Renan nao deixou de obedecer.
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22 JoAo CEZAR DE CASTRO ROCHA NENHUM BRASIL EXISTE - PEQUENA ENCICLOPEDIA .
23
siste num empreendimento parcialmenie fictído, urna vez que a ficcio- Como a linguagem humana nao é capaz de exprimir a natureza perfeita
nalidade, segundo assinalou Wolfgang Iser, constitui um instrumento dc Deus, a única forma possível de definição é negativa. "Deus nao é
mediante o qual tentamos entrar em contato corn realidades alérn do imperfcito, nao é incompleto, nao é..."; desse modo, destaca-se, na insufi-
nosso alcance, embora reconheçamos a impossibilidade de apreendê- ciéncia da linguagem, a plenitude da referénda. Os principais pensadores
las em sua totalidade.9 Se Nenhum Brasil existe oferece um
aspecto diver-
so do habitualmente encontrado nesse género de coletânea, trata-se do
que se dedicam à tarefa de revelar o propriarnente brasileiro do Brasil ter-
minam às voltas corn urna melancólica descriçäo do que o país nao foi
- -
reconhecimento da ficcionalidade envolvida em tal esforço. moderno, democrático, etc. -, -
do que deixou de ser igualitário, ilumi-
Gostaria de concluir essas observaçöes preliminares sublinhando nista, -,
etc. do que ainda nao é país de prirneiro mundo, potencia
que o fato de se estar ciente dessa ficcionalidade nao implica que histó- mundial, etc. Dal sermos eternamente o "país do futuro", ou seja, somos
rias culturais e literárias nao devam ser escritas. Pelo contrário. tudo aquilo que um dia seremos. Essa intrigante contradição precisa ser
Entretanto, deveriam ser concebidas como perguntas filosóficas na mais bem estudada: é essa reflexão que se pretende iniciar com os textos
identificação da ausência deste ou daquele elemento, ao invés da análise dos fatores que efetiva- 12
0 leitor terá reconhecido a alusäo ao livro de Roberto DaMatta, O quefaz o brasil, Brasil. Rio de
mente definem o produto cultural estudado". Rocha, I 998, 79. Janeiro: Rocco, i 984.
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24 ioAo CEZAR DE CASTRO ROCHA
NENHUM BRASIL EXISTE - PEQUENA ENCICLOPEDIA 25
Raízes do Brasil (1936).14 Urna que permitiu reunir um conjunto universal ilustrativo da assimilação
passagem no mínimo intrigante para de valores exógenos. Nesse contexto, nao se pode deixar de mencionar
um livro cujo título em princípio prometeria urna conclusão muito
15
Para urna reavaliação da idéia de antropofagia, ver Rocha & Ruffinelli.
13
Alencastro 9.
16
Refiro-me aos versos iniclais de Ulisses, poema de Mensagem: "0 mito é o nada que é tudo./
14
Trazendo de países distantes nossas formas de convívio, nossas
instituiçöes, nossas idéias, e
timbrando em manter tudo ¡sso e, ambiente muitas vezes desfavorável e hostil, somos ainda -I
o mesmo sol que abre os céusl É um mito brilhante e mudo O corpo morto de Deus,/ Vivo e
uns desterrados em nossa terra. Holanda 3. hoje desnudo. (...)'.
'7
Herkenhoff 23.
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26 ioAo CEZAR DE CASTRO ROCHA
NENHIJM BRASIL EXISTE PEQUENA ENCICLOPEDIA 21
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28 ioAo CELAR DE CASTRO ROCHA
NENHIJM BRASIL EXISTE - PEQUENA ENCICLOPEDIA 29
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30 ioAo CZAR DI CASTRO ROCHA
NI3NIIUM BRASIL EXISTE - PEQUENA ENCICLOPEDIA 31
-
analfabetismo no país, a oralidade consèrvou sua importância na trans-
misso da cultura isso, porém, nao deve ser entendido como um vItveis.
110
A essa altura, imaginojá estar clara a seguinte irnpossibilidade:
tocante escrita de histórias literárias e culturais, o resultado será
fenômeno exclusivamente baseado numa falta ou estaríamos renovan-
do a "arqueologia da ausência". Mais promissora é a sempre lacunar, pois nunca daremos conta de urn Brasil que nao exis-
perspectiva pro- le. Só aqueles que ainda acreditam ser possível atingir a totalidade, isto
posta por Caetano Veloso numa entrevista ao L'Express: Desde os anos
20 ou 30 em diante, a música popular brasileira tornou-se urna é, ainda pretendem apreender a essênda de urn país deixarão de ver
expres- cm tais lacunas urn irrecusável convite à escrita de outros ensaios e à
São que se considera confiável. Trata-se de urna
força que é respeitada organizaçäo de novas coletâneas.26 Que sejam bern-vindos futuros
porque diz a verdade da sociedade brasileira. (...) Há urna razäo rnuito
simples para explicá-lo: a pobreza do país, a precariedade da formaçâo volumes, pois só nos resta conjurar fantasmas corn outros fantasmas,
e da educaçäo. As cançöes isto é, as histórias da cultura que escrevernos.
populares são urna forrna de expressão aces-
sível a todos".25
Nao é, pois, urna surpresa que, nos anos 60 do século
XX, filmes Bibliografia
tenharn sido considerados instrumentos para revolucioná-
rnudanças
rias. A música popular, por Akncastro, Luiz Felipe de. O trato dos viventes. Formaçäo do Brasil no Atiântico Sul. São
exemplo, segue desernpenhando urn papel
significativo na definição de identidades brasileiras. Isto para nao men- Paulo: Companhia das Letras, 2000.
cionar as redes de televisão, que são o mais forte elemento de coesão na Andrade, Carlos Drummond de. Brejo das almas. Poesia e prosa (organizada pelo autor).
Rio de Janeiro: Editora Nova Aguilar, 1988 [19361.
sociedade brasileira contemporânea. Por isso, urna
exposição da histó- Ihahba, Homi. 'Introduction: Narrating the Nation'. Nation and Narration. Homi
ria cultural brasileira ficaria incornpleta se nao levasse ern conta a Bhabha (org.). Londres e Nova York: Routledge, 1990. 1-7.
dirnensão audiovisual. Nenhum Brasil existe caminha nessa liriesemeister, Dietrich e Schönberger, Axel (orgs.). Portugal heute. Politik. Wirtschaft.
direção.
Nurna resenha sobre a coletânea de ensaios heute. Politik. Kultur. Bibliotheca Ibero-Americana, Vol. 64, Frankfurt: Vervuert Verlag, 1997.
Portugal
Wirtschaft. Kultur, organizada por Dietrich Brieserneister e Axel Candido, Antonio. Formaçäo da literatura brasileira (Momentos decisivos). Belo Horizonte:
ltatiaia, 1981 [1959].
Schönberger, Paulo de Medeiros fez urn comentário bastante lúcido.
-.----. "Literatura e cultura de 1900 a 1945'. Literatura e sociedade: Estudos de teoria e
Ernbora questionasse a organização do volume em determinados história literária. 7 ed. São Paulo: Editora Nacional, 1985. 109-38.
aspectos, Medeiros nao deixou de perceber que a principal conquista (:anlpos, Haroldo de. O seqüestro do barroco na Formação da literatura brasileira: O caso
do volume era ter explicitado "o quanto os estudos Gregório de Mattos. Salvador: Fundação Casa de Jorge Amado, 1989.
portugueses preci-
sam reavaliar seus objetivos, seus métodos e suas Chiappini, LIgia. "Os equívocos da crítica à Formaçâo. Dentro do texto, dentro da vida. Ensaios
práticas" (Medeiros sobre Antonio Candido. Maria Angela D'Incao & Eloisa Fana Scarabôtolo (orgs.). São
229). Sou o prirneiro a reconhecer as eventuais lacunas de Nenhum
Paulo: Companhia das Letras/ Instituto Moreira Salles, 1992. 170-480.
Brasil existe, mas espero que possa contribuir
significativamente para Coutinho, Afrânio. Conceito de literatura -brasileira. Rio de Janeiro: Livraria Académica,
urna reavaliação serneihante dos estudos brasileiros. Corno esta
nea se destinava originalmente ao público de
meira vez que se fazia urna apresentação tao
coletâ-
lIngua inglesa e era a pri-
1960.
Paure, Michel. "Caetano Veloso. L'Entretien
brésilienne'. L'Express ( 1 7/2/2000): 10-3.
-
'La Musique dit les vérités de la société
abrangente da literatura e
da cultura brasileiras nessa lIngua, lacunas eram Freyre, Gilberto. Brazil, 'An Interpretation. Trad. Samuel Putnam. Nova York: Knopf, 1945.
(e permanecem) me- Gledson, John. Brazil: Culture and Identity. Liverpool: Universidade de Liverpool,
Instituto de Estudos Latino-Americanos, 14, 1994.
25
Entrevista concedida a Michel Faure. Vale recordar
que Arto Lindsay, na apresentaçäo do CD
já o havia observado corn agudeza: A música popular brasileira desempenha um
Beleza tropical. 26
Nao quero concluir sem destacar urna série de volumes muito próximos ao projeto de Nenhum
papel mais destacado na vida cultural brasileira do que a música Brasil existe. Em primeiro lugar, os dois importantes tomos organizados por Lourenço Dantas Mota,
popular em outros países. Foi
somente na segunda metade do século XX que a maloria da lntroduçäo ao Brasil. t.m banquete no trópico, publicados em 1999 e 2000, respectivamente, pela
população alfabetizou-se. E urna lditora SENAC. Carlos Guilherrne Mota, também pela Editora SENAC, organizou Via,qein incomple-
ampla maioria dos brasileiros ainda vive abaixo da linha de
pobreza. Talvez esses fatos tenham
contribuIdo para a importância das tradiçöes orais no Brasil. fa. A experiência brasileira. Formaçäo: Histórias ( 1500-2000), em 1999, e Viagem incompleta. A experiên-
cia brasilcira: A grande transaçdo ( i 500.2000), em 2000, reunindo urna releVante coleção de ensaios.
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32 ioAo CEZAR DE CASTRo ROCHA
-.
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