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Todos os homens são filósofos. Mesmo quando não têm consciência de terem
problemas filosóficos, têm, em todo o caso, preconceitos filosóficos. A maior parte destes
preconceitos são as
teorias que aceitam como evidentes: receberam-nas do seu meio intelectual ou por via da
tradição.
Dado que só tomamos consciência de algumas dessas teorias, elas constituem
preconceitos no sentido de que são defendidas sem qualquer verificação crítica, ainda que
sejam de extrema importância para a ação prática e para a vida do homem.
Uma justificação para a existência da filosofia é a necessidade de analisar e de testar
criticamente estas teorias muito divulgadas e influentes.
Tais teorias constituem o ponto de partida de toda a ciência e de toda a filosofia. São
pontos de partida precários. Toda a filosofia deve partir das opiniões incertas e muitas
vezes perniciosas do senso comum acrítico. O objetivo é um senso comum esclarecido e
critico, a prossecução de uma perspectiva mais próxima da verdade e uma influência
menos funesta na vida do homem.
K. POPPER, Em Busca & um Mundo Melhor, trad. port.,Lisboa, Ed. Fragmentos, 1989, - 165
A atitude filosófica não é uma atitude natural. Qualquer indivíduo de forma imediata
face à realidade não começa a examiná-la de forma especulativa. Pelo contrário, o que é
natural é que se centre na resolução problemas práticos, que se guie pelo senso comum
tendo em vista resolver certas necessidades imediatas. Ninguém pode viver sem se
adaptar constantemente às condições do
seu mundo. Estas exigências de sobrevivência tendem, naturalmente a sobrepor-se a todas
as outras preocupações.
O homem está permanentemente se confrontado com novos problemas que o
colocam perante novas situações imprevisíveis, e que o obrigam a alargar os seus
horizontes de compreensão da realidade. Cada mudança pode representar, assim, uma
nova possibilidade para ampliar o conhecimento.
Estas mudanças frequentemente inquietam-nos ou maravilham-nos, despertando a
nossa curiosidade sobre o porquê das coisas, levando-nos a questionar o que nos rodeia.
Ao fazê-lo, estamos a distanciarmo-nos da realidade, que de repente se tornou estranha.
Esta atitude reflexiva, pode nos conduzir a uma atitude mais radical, a atitude filosófica.
Segundo Aristóteles:
“De fato, os homens começaram a filosofar, agora como na origem por causa da
admiração, na medida em que, inicialmente, ficavam perplexos diante das dificuldades
mais simples”.
O espanto, essa admiração e perplexidade referida por Aristóteles, é o que tira o indivíduo
da inércia e o lança à busca pelo conhecimento.
No Mito da Caverna, metáfora proposta por Platão, o filósofo também afirma a
importância do olhar crítico sobre a realidade e a necessidade da busca por novos saberes.
A dúvida. Ao filósofo exige-se que duvide de tudo aquilo que é assumido como uma
verdade única. Ao duvidar, ele se distancia das coisas, quebrando desta forma a sua
relação de familiaridade com as coisas. O que era natural torna-se problemático. O que
então emerge é uma dimensão inquietante de insatisfação e problematização. A reflexão
começa exatamente a partir do exame daquilo que se pensa ser verdadeiro. Se nunca
duvidarmos de nada, nunca saberemos o fundamento daquilo em que acreditamos.
A insatisfação. A filosofia revela-se uma desilusão para quem quiser encontrar nela
respostas para as suas inquietações. O que o aprendiz de filósofo encontra na filosofia são
perguntas e problemas para que não confie em nenhuma autoridade exterior à sua razão,
para que duvide das aparências e do senso comum. A única "receita" que os filósofos lhe
dão é que faça da procura do saber um modo de vida. Não se satisfaça com nenhuma
conclusão, queira saber sempre mais e mais.