Você está na página 1de 3

A Costa dos Murmúrios

JORGE, Lídia. A Costa dos Murmúrios. Alfragide – Portugal: Publicações Dom Quixote, 2009. 143p.

XXXXXXXXXXXXXXXXXXX (UFRRJ)1
XXXXXX@gmail.com
Matrícula nº 2XXXXXXXX

A Costa dos Murmúrios é um romance escrito por Lídia Jorge que trata sobre a
ocupação portuguesa em Moçambique e eventos alusivos à Guerra Colonial. Foi publicado
originalmente em 1988 pela Editora Dom Quixote e encontra-se dividido em duas partes: um conto
e nove capítulos.
Como fruto de sua experiência no continente africano, a autora desse romance vale-
se de suas recordações acerca da guerra colonial portuguesa no sudeste da África.
É possível perceber que o romance visa a desconstrução e questionar as versões
oficiais exaradas acerca de momentos marcantes na história da colonização africana, tendo como
destaque Moçambique, consoante a perspectiva da autora.
Na narrativa observa-se o emprego de metáforas e a subversão das palavras que no
decorrer da trama conferem nova significação à língua, pois conduzem o leitor ao centro dos
eventos narrados.
O enredo construído por Lídia é uma mescla da história do país com a história de
amor entre Eva Lopo, denominada por Evita ou noiva e Luís Ferreira Alexandre, denominado por
Luís Alex ou noivo nas linhas que sucedem a história. Luíz Alex é um estudante de matemática que
reprovado em seus exames em Lisboa e que desapontado abraça a carreira militar e em
consequência à ideologia salazarista, sendo enviado à Moçambique.
Luís Alex, o Alferes, ao ser submetido às agruras das campanhas militares e duras
perdas em batalhas torna-se um soldado cruel, vingativo e desequilibrado emocionalmente. Razão
pela qual Eva Lopo (Evita) decepciona-se e em sua ausência o trai com Álvaro Sabino, um
jornalista, mulato natural daquela terra.
A autora aborda com sutileza o lado subterrâneo da guerra colonial portuguesa na
África e sua história oferece denúncia das terríveis ações e crimes praticados contra o povo africano
pelo governo português. Tais fatos ocorrem no romance em paralelo aos conflitos internos vividos

1 Graduando do curso de Letras Literaturas da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro -UFRRJ

2ª Avaliação da Disciplina Literatura Portuguesa III. “A costa dos murmúrios” (Resenha) Fl 1


pelos personagens ali representados, tendo como referencial o hotel Stella Maris, seus hóspedes e
funcionários. É assaz eficiente a demonstração e autora da relação de domínio entre colonizador e
colonizado, bem como sua influência nos relacionamentos entre os brancos e pretos no hotel e na
sociedade como um todo.
No conto “Os Gafanhotos” assunto da primeira parte do romance, a narrativa pontua o
processo colonial na África destacando a beleza, a harmonia e a perfeita sintonia no desenrolar das
ações e na descrição dos fatos. Entretanto, na segunda parte, a protagonista, Eva Lopo, altera este
relato e começa a desconstruir a verdade de “Os Gafanhotos”, haja vista ater-se ao fato histórico
em si, e o destaque aa violência, da barbárie, do medo e da destruição, eventos marcantes nas
campanhas militares e em manifestações na cidade. Por conseguinte a imagem gloriosa e
consagrada do Estado Português se desfaz, posto que na narrativa vai se revelando
progressivamente a decadência política e moral do governo. Vê-se também que os comentários
expressos pela personagem Eva são carregados de ironia à situação vivida naquele momento
beligerante.
Vale salientar que o conto “Os Gafanhotos” trata-se de um monólogo e nele alguns aspectos
característicos despertam a curiosidade no leitor, tais como: harmonia e encantamento na descrição
das cenas; a síntese e a velocidade nas falas e um final súbito e impactante. Marcado pelo senhorio
masculino, temos um narrador de terceira pessoa.
A personagem Evita é descrita no romance como passiva e subserviente sob a ótica dos
dominadores, o que alude simbolicamente ao branco colonizador. No escopo da obra, vemos
destacados os militares em suas funções e a ânsia que têm pela guerra e a glória que os tornaria
heróis.
Destarte (JORGE, 2009, p. 130), no relato de Eva Lopo, vinte anos mais tarde, induz-nos o
pensamento de que o tempo subverte a ordem estabelecida nos “Gafanhotos” e a partir daí dá-se
origem a uma nova identidade que tipifica o sujeito e a Nação.
Na análise do romance “A Costa dos Murmúrios” observa-se que é de narrativa longa, em
primeira pessoa e o tempo narrativo decorre em várias semanas de modo aleatório. É, pois,
marcado predominantemente por lembranças que revelam ao leitor a exploração dos nativos e o
desrespeito do colonizador para com o colonizado. Apresenta ainda, por meio das personagens
femininas a condição de submissão da mulher, de seu papel secundário na hierarquia familiar e
social, a que refere como um ente sem direitos voz ou expressão. Tais aspectos no romance são
bem colocados, pois destacam o aspecto sexual-procriativo e subserviente que as destina às tarefas
domésticas e a criação de filhos. Fenômeno social que pôde ser visto tanto no meio do colonizador
como no colonizado. Além disso, a protagonista concomitantemente à sua história demonstra nos

2ª Avaliação da Disciplina Literatura Portuguesa III. “A costa dos murmúrios” (Resenha) Fl 2


conflitos íntimos dos personagens aspectos da sociedade da época, os efeitos e desdobramentos da
guerra colonial.
Assim, em sua perspectiva de narradora personagem, Evita, propicia-nos inferir ou projetar
múltiplas versões e/ou concepções do mesmo fato em que o mundo interior e o exterior ganham
forma e unidade.
Por fim o romance “Costa dos murmúrios” representa bem mais do que o fato histórico ou
a guerra colonial e a relação de domínio entre colônia e metrópole; bem mais do que os conflitos
entre as etnias divergentes de nativos africanos ou o estabelecimento de poder entre uma ou outra
parte, mas simboliza a voz feminina, o sentimento e ponto de vista da mulher em relação ao mundo
do qual faz parte, de suas necessidades, sonhos e aspirações.
Lídia Jorge desconstruiu e anulou a ufania e glória das conquistas portuguesas de ‘além
mar’ no que tange à verdade de “Os Gafanhotos”, conferindo ao fato histórico outro sentido
através da força das palavras, suas palavras:
A pouco e pouco as palavras isolam-se dos objectos que designam, depois das
palavras só se desprendem sons, e dos sons restam só os murmúrios, o derradeiro
estádio antes do apagamento — disse Eva Lopo, rindo. Devolvendo, anulando Os
Gafanhotos. (JORGE,2009,p. 157).

Referência
JORGE, Lídia. A costa dos murmúrios. Disponível em: https://lelivros.love/book/baixar-livro-a-
costa-dos-murmurios-lidia-jorge-em-pdf-epub-e-mobi-ou-ler-online/. Acesso: 25/03/21

2ª Avaliação da Disciplina Literatura Portuguesa III. “A costa dos murmúrios” (Resenha) Fl 3

Você também pode gostar