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INSTITUTO POLITÉCNICO LOMAR

NÍVEL MÉDIO TÉCNICO PROFISSIONAL

SEMINÁRIO PREPARATÓRIO

Dr. Kelvin F. Zinio

Médico de Clínica Geral

Tema 1: Sistema Nacional de Saúde


O Sistema Nacional de Saúde (SNS) foi criado nos
anos 1970 como consequência da situação histórica
criada pela Independência Nacional.

Situação antes da independência


Acesso limitado ao sistema de saúde colonial.

Cuidados de saúde modernos eram facilmente


acessíveis só à população de origem Europeia e
Asiática, largamente urbanizada, e/ou à pequena
minoria de população Africana com alguma capacidade
económica (assimilados).
O acesso à saúde da população indígena
(Moçambicana) largamente rural, era de norma limitado
aos hospitais missionários, em número reduzido e mal
distribuídos, às campanhas de vacinação (por ex.
varíola) e de controlo ou erradicação de doenças
transmissíveis (por ex. doença do sono financiadas pelo
Estado Colonial, normalmente como medida de
protecção -cordon sanitaire- da população expatriada
metropolitana).
A independência: Nacionalização da saúde.
Logo após a independência (1975), com a Lei das
Nacionalizações dos Serviços de Saúde, Educação e Habitação e
outras medidas tomadas pelo Governo de Moçambique, a maioria
dos funcionários coloniais abandonaram o País; entre eles,
muitos técnicos e funcionários com nível de educação médio ou
superior.

No sector de saúde, só ficaram cerca de 60 médicos (eram


menos de 300 para 8 milhões de habitantes em 1974).

Muitos quadros técnicos de outras carreiras de saúde (farmácia,


radiologia, laboratório, enfermagem) também saíram do País.
A crise deixou Moçambique quase sem pessoal de
saúde, mas deu a possibilidade aos novos líderes do
País de conceber e realizar um SNS completamente
original.

O debate mundial sobre saúde


Na altura da independência, anos de experiências e
avanços na provisão de cuidados de saúde nos países
em desenvolvimento estavam a alimentar um debate
rico de ideias inovadoras.

Tais ideias foram consolidadas num documento político


unitário na Conferência de Alma Ata, cidade da então
União Soviética (1978).
De acordo com a nova visão, o modelo enfermidade/tratamento,
baseado sobre o conceito de doença como disfunção do
organismo humano foi substituído por um modelo holístico de
saúde que tinha em conta o contexto familiar e social dos
indivíduos.

Atrás deste conceito estava a definição de saúde como de “um


estado de bem-estar físico, mental e social, e não meramente
ausência de doença ou enfermidade” e o reconhecimento das
causas subjacentes de doença (pobreza e injustiça social, que
determinam as condições de acesso à educação, água, emprego
e terra, habitação e saneamento, assim como equidade entre
géneros e participação activa na vida pública).
Alma Ata representou uma revolução da forma de prestar
cuidados de saúde no 3° mundo, implicando uma mudança
radical do conceito de saúde baseado num novo relacionamento
entre profissionais de saúde (os prestadores dos serviços) e
indivíduos (as comunidades de usuários).

Declaração de Alma Ata


As estratégias de saúde aprovadas em Alma Ata resumem-se na
abordagem multi-sectorial, tecnologia apropriada, actividades de
promoção de saúde, participação comunitária, e
descentralização.
Importa considerar que o conceito de tecnologia apropriada
refere-se não só a equipamento, infra-estruturas ou
medicamentos, mas sim também às competências técnicas e ao
perfil profissional dos trabalhadores de saúde chamados a prestar
serviços num âmbito e com uma visão inéditos.

Cuidados de saúde primários


Alma Ata identificou como prioridades a nutrição apropriada, água
e saneamento, saúde materno-infantil, planeamento familiar,
imunização, prevenção e controle das doenças endémicas,
educação para saúde, tratamento apropriado das doenças mais
comuns e disponibilidade dos medicamentos essenciais.
Estes programas são agora implementados de rotina, e
as suas razões de ser parecem óbvias. Na altura,
representaram uma revolução da forma de pensar sobre
a saúde. Os programas foram operacionalizados como
“cuidados de saúde primários” (CSP). A idéia era que os
serviços de saúde fossem prestados de forma
integrada, como um continuum de intervenções
adequadas às necessidades de saúde de cada um. O
técnico de medicina nasceu como (e ainda é) um
quadro especialmente vocacionado para os CSP.
O MISAU/SNS após a independência
Moçambique foi um dos primeiros países que adoptou e
implementou ousadamente (em certos casos até antes da própria
conferência) os princípios da política de saúde enunciados em
Alma Ata e os CSP.

Com efeito, a independência, a mudança de regime político, a


ausência de organizações profissionais empenhadas em manter
as suas posições de influência (sobretudo pelo abandono em
massa dos médicos coloniais), permitiram fazer tabua rasa
(recomeçar da estaca “0”) dos conceitos, valores e formas de
actuação do sistema colonial. Na prática, a situação de “crise” do
sistema de saúde abriu uma oportunidade única para uma revisão
profunda da visão e missão do MISAU/SNS.
SNS gratuito e universal e centralismo democrático
O próprio regime socialista que foi adoptado pelo primeiro
Governo de Moçambique determinou as finalidades e
características organizativas do sector de saúde, em particular:

Universalismo e gratuidade na prestação dos serviços de saúde.


Num sistema de saúde gratuito e universal, todos têm direito a
cuidados de saúde adequados, de acordo com a evidência
científica e com base nos recursos do país, independentemente
da filiação, raça, religião, classe social, capacidade económica e
género.

Um sistema de saúde universalista é financiado através dos


impostos públicos gerais e não por meio de sistemas de seguros
ou pelo pagamento directo da prestação dos serviços.
Nos anos que seguiram a independência, o sistema promoveu a
equidade e aumentou o acesso à saúde: por exemplo, através da
expansão nas zonas rurais do sistema de saúde e do programa
alargado de vacinação (PAV).

Sistema fortemente centralizado de gestão técnica e


administrativa da República, baseado nos princípios do
Centralismo Democrático.
ORGANIZAÇÃO DOS ÓRGÃOS DO
MISAU/SNS: DIRECÇÕES, DEPARTAMENTOS
E PROGRAMAS.

O MISAU, como os outros Ministérios, é constituído por


Órgãos Centrais, Provinciais e Distritais. A mesma
estrutura do MISAU repete-se, de forma
progressivamente mais simplificada, a nível Provincial e
Distrital.
O MISAU, encabeçado pelo Ministro da Saúde,
coadjuvado por um Vice-Ministro e um Secretário
Permanente, está baseado em 5 Direcções Nacionais:

1. Planificação e Cooperação (DNPC),


2. Administração e Gestão (DNAG),
3. Assistência Médica (DNAM)
4. Saúde Pública (DNSP)
5. Recursos Humanos (DNRH).
Cada Direcção Nacional está dividida em
departamentos. Por exemplo, A DNRH compreende o
Departamento de Formação e Administração do
Pessoal.

Cada departamento está organizado em Repartições


(por ex. no Departamento de Formação encontram-se a
Repartição de Desenvolvimento Curricular, a Repartição
de Formação Contínua e Bolsa de Estudos e a de
Administração da Formação).
Direcção Nacional de Planificação e Cooperação
(DNPC)
Departamentos:
Objectivos:

 Produzir os planos de actividades gerais do sector de


saúde.

 Monitorizar/avaliar a sua actuação e coordenar


também os ciclos de planificação dos outros sectores
e subsectores do MISAU (direcções provinciais e
distritais, outras direcções nacionais) e do SNS.
Funções:
 Recolher e analisar mensalmente a informação relativa às
actividades produzidas pelo sistema de saúde, a partir de todas
as Unidades Sanitárias (US); - a informação das US é
recolhida pelos Serviços Distritais de Saúde (SDSMAS),
conferida e enviada às Direcções Provinciais que, por sua vez,
a analisam, sintetizam e enviam à DNPC.

 Assegurar que os planos das actividades avaliadas estão em


conformidade com a política do Governo.

 Dialogar com as agências de cooperação internacional,


coordenar a acção destas e recolher a informação necessária
sobre o seu desempenho.
 Trabalhar em coordenação com a DNAG em relação aos
limites orçamentais dos planos, a DNSP e DNAM, (que
respondem para o componente técnico das actividades do
MISAU e para os programas de actividades prioritários) para
assegurar que os planos são realísticos em relação aos
recursos humanos de saúde.

Direcção (Nacional) de Administração e Gestão


(DAG)
Departamentos: Finanças, Administração, Logística e
Manutenção.
Objectivos:
 Proporcionar os recursos financeiros necessários para as actividades do
MISAU/SNS, equacionando os planos do Governo com os recursos
disponíveis.
 Supervisionar aquisição e uso apropriado dos bens do MISAU e do SNS.
Funções:
 Elaborar e apresentar os planos financeiros.
 Alocar os fundos entre os diferentes utilizadores e
supervisionar a execução orçamental para o ano financeiro
corrente.

 Administrar e gerir dos bens do MISAU/SNS.


 Executar a compra de bens incluindo equipamentos, através da
Central de Abastecimento e a gestão dos transportes.
 Manter a infra-estrutura do SNS e planificar a sua expansão.

 Coordenar com a DNPC e com o Ministério da Finanças e o


Ministério do Plano, a implementação do novo sistema de
contabilidade administrativa (chamado e-SISTAFE) para a
descentralização do controlo das despesas.
Direcção Nacional de Assistência Médica (DNAM)
Departamentos: De acordo com o novo organograma
(2010), a direcção está organizada em duas áreas
funcionais:

 Desenvolvimento dos Cuidados Clínicos:


Organização e Desenvolvimento da Rede Sanitária,
Cuidados de Saúde, Meios Auxiliares de Diagnóstico
(com foco nos Laboratórios Clínicos, Raios X e
Anatomia Patológica, para aquisição de equipamento,
consumíveis, reagentes, manutenção).
 Controlo de Qualidade:
• Programas e Cuidados Clínicos, Cuidados de
Enfermagem;
• Finalmente, faz cabo à DAM uma terceira instituição:
a Junta Médica, Exames Médicos e Incapacidades,
que trata de aspectos médico-legais (incapacidades).

Objectivos
Sobreintender à organização e ao funcionamento das
Unidades Sanitárias do País.
Funções
 Promover a integração entre os serviços de saúde.

 Supervisionar as actividades médicas, cirúrgicas e de


enfermagem e aprovar os protocolos clínicos de tratamento.

 •Propor novos modelos de organização dos serviços de acordo


com as necessidades de saúde.

 •Gerir a aquisição, distribuição e uso de medicamentos e o


serviço de transfusões de sangue (através de duas instituições
subordinadas: a Central de Medicamentos e Artigos Médicos –
CMAM -, que opera na área de aquisição e distribuição de
medicamentos, e o Serviço Nacional de Transfusão de Sangue
- SNTS).
 Autorizar tratamento médico no exterior com fundos públicos
quando não houver recursos apropriados no país.

Direcção (Nacional) de Saúde da Pública


(DSP)
Departamentos: Epidemiologia, Grandes Endemias, Saúde
Materno-infantil.
Objectivos:
 Promover o envolvimento activo dos cidadãos e das
comunidades para melhoria do seu estado de saúde.
 Promover as medidas de prevenção e controle das principais
doenças endémicas e contagiosas do país.
 Promover medidas de saúde específicas em prol dos grupos
prioritários da população (mulheres em idade fértil, crianças,
outros grupos vulneráveis).
Funções:
 É responsável pelas actividades de Mobilização Comunitária,
Saúde Reprodutiva e Saúde Infantil, Doenças Transmissíveis
(grandes endemias), Nutrição, Saúde Mental, Doenças
Crónicas não Infecciosas, Epidemiologia.

 Manter a vigilância epidemiológica no país, o que significa


produzir e manter a informação relativa às principais doenças
epidémicas.

 Coordenar a resposta apropriada em termos de medidas de


prevenção e saúde pública (por ex. no caso de epidemias de
cólera, meningite).
 Controlar doenças de particular relevância, como tuberculose,
malária, doenças de transmissão sexual (DTS), lepra e de
outras doenças não contagiosas.
 Gerir algumas componentes do Programa de controlo do
HIV/SIDA: prevenção da transmissão vertical (de mãe para
filho - PTV); prevenção comunitária, que compreendem
informação, educação, aconselhamento e testagem para HIV
enquadradas no Departamento de Mobilização Comunitária.

Programas Verticais. Os chamados “programas verticais” têm


importância particular na estrutura operacional do MISAU. Estes
programas surgiram em relação a doenças específicas (pela sua
importância epidemiológica consideradas “prioritárias” ou se
constituíram a volta de grupos de população prioritários.

Estes programas mantêm fortes ligações com as Organizações de Saúde


multilaterais das Nações Unidas (principalmente, OMS, UNICEF, FNUAP) e,
por vezes, adquirem fundos e assistência técnica directos da Cooperação
Bilateral. Os programas verticais estão enquadrados na Direcção de Saúde
Pública (por ex., o programa de SMI, o programa nacional de controle da
tuberculose e lepra –PNCTL-, o programa nacional da malária).
A excepção mais importante é HIV/SIDA. O programa do
HIV/SIDA é particularmente complexo e beneficia de fundos
avultados. As componentes deste programa são repartidas entre
a DNSP (prevenção da transmissão vertical, educação,
aconselhamento e testagem em saúde e a DNAM (tratamento
anti-retroviral – TARV e IO - infecções oportunistas).

Os programas verticais tendem a manter sistemas autónomos ou


semi-autónomos de informação e de gestão de medicamentos
(por exemplo em relação aos medicamentos do TARV; à
informação do PNCTL e à formação contínua do pessoal afecto
nestes programas). Entre os programas verticais, o Departamento
de Saúde Materno-Infantil assume particular relevância, porque
foca em actividades historicamente centrais aos CSP.
Os programas de saúde materno-infantil têm uma organização
parcialmente autónoma dentro do MISAU e beneficiam
frequentemente de fundos directos pela cooperação bilateral.

Direcção (Nacional) de Recursos Humanos (DRH)


Departamentos: Administração do Pessoal e Formação.
Objectivos:
Planificação, administração e formação de recursos
humanos (RH) para saúde.
Funções:
 Elaborar, monitorar e supervisionar os planos de RH de saúde,
sendo estes análise das necessidades, distribuição, previsão
de novos ingressos e custos, tendo em conta as metas,
finalidades e objectivos gerais do sector público de saúde
(DPC) e seus limites orçamentais (DAG).

 Responsável pela contratação, colocação, pagamento salarial


e outros benefícios, incluindo segurança social, progressão na
carreira, disciplina e reforma dos funcionários de saúde.

 Responsável pela coordenação e implementação de formações


iniciais e de formações contínuas do pessoal .
A formação inicial dos técnicos de nível básico, médio e bacharel,
planificada a partir dos planos de RH, é cumprida em 4 Institutos
de Ciências de Saúde, 6 Centros de Formação Provinciais e 3
centros de formação subordinados. A formação contínua é
planificada, organizada e financiada, na maioria dos casos a partir
dos programas verticais do MISAU.

As universidades que graduam profissionais de saúde caem sob


a responsabilidade do MINED (Ministério da Educação). O
Departamento de Formação é responsável para a pós-formação
(especialização) dos médicos e outros técnicos de saúde e pelas
bolsas de estudo no estrangeiro. No País existe um número de
instituições privadas de ensino superior.
Pode ser útil considerar 2 direcções do MISAU de área
programática (técnica):
 DNAM e DNSP, e

3 de Área operacional (ou de gestão):


 DNPC, DNRH, DNAG
Direcções Provinciais de Saúde (DPS)
Existem 10 Direcções Provinciais de Saúde (DPS), mais a
Direcção de Saúde da Cidade de Maputo que tem estatuto de
DPS. A organização do MISAU em Direcções reflecte-se nas
DPS, assim que as direcções nacionais se tornam departamentos
e os departamentos do MISAU se tornam “repartições”.

Por exemplo, na Direcção Provincial de Nampula, existem o


Departamento de Planificação, o de Recursos Humanos,
Administração e Finanças, Assistência Médica e Saúde da
Comunidade. Como única excepção, o sector da Formação é
elevado ao nível de Departamento Provincial: portanto, em cada
DPS existe um Departamento de Formação.
Serviços Distritais de Saúde, Mulher e Acção
Social
Nas Direcções Distritais de Saúde (cujo nome foi
mudado recentemente em Serviços Distritais de Saúde,
Mulher e Acção Social - SDSMAS), os departamentos
do nível provincial têm o nível de “repartições”.

A equipa de gestão do SDSMAS é constituída por um


director, um médico chefe, um responsável da farmácia,
um para estatística e um para assistência médica. Por
vezes, devido a falta de pessoal, o mesmo funcionário
toma conta de duas pastas.
No processo actual (2010) de descentralização
administrativa, os SDSMAS vão adquirindo maiores
competências e responsabilidades de gestão. Por
exemplo, nos distritos onde o novo sistema de gestão
financeira do Sector Público (e-SISTAFE) estiver
operacional, os SDSMAS recebem os fundos para o seu
funcionamento e prestam contas directamente à
Administração Distrital e não à DPS, como acontecia
anteriormente.
FIM

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