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INSTITUTO POLITÉCNICO LOMAR

NÍVEL MÉDIO TÉCNICO PROFISSIONAL

SEMINÁRIO PREPARATÓRIO

Dr. Kelvin F. Zinio

Médico de Clínica Geral

Tema 4:ORGANIZAÇÃO GERAL DA REDE SANITÁRIA


Após a independência, a estrutura organizativa dos
serviços de saúde em Moçambique foi revista uma
primeira vez em 1991 e uma segunda em 2002.

Neste momento, foi delegada à DNAM uma terceira


revisão que tenha em conta as mudanças ocorridas na
prestação dos serviços (Maio 2010). Portanto, a
classificação actual será provavelmente substituída
ainda a curto prazo. A descrição que segue está
baseada no documento aprovado em 2002.
Unidade Sanitária
Entende-se com Unidade Sanitária (US) o conjunto
físico e funcional das infra-estruturas onde se prestam
cuidados de saúde.

O conceito de Unidade Sanitária do Sistema Nacional


de Saúde compreende desde os minúsculos centros de
saúde rurais de tipo II (com 2-3 locais para o
atendimento ao público) até os grandes hospitais
centrais do país (em Junho de 2010, Maputo, Beira e
Nampula).
Rede Sanitária
A rede sanitária é o conjunto das Unidades Sanitárias.

Nível da rede sanitária


Existem 4 níveis de atendimento de saúde. No primeiro nível é
prestada a esmagadora maioria dos cuidados de saúde a
população, com maior ênfase para a prevenção, promoção e
educação de comportamentos saudáveis. São prestados também
os cuidados clínicos básicos e o tratamento das doenças mais
importantes e frequentes do ponto de vista epidemiológico.

Os níveis de intervenção acima do primário são progressivamente


mais diferenciados, especializados e focados na componente
clínica.
Área de Saúde
Entende-se como área de saúde de uma US a área que inclui a
população sob responsabilidade da US. O conceito de área de
saúde é particularmente relevante para as US de nível primário.

Nível primário da rede de saúde

Rede de saúde primária


A rede de saúde primária perfaz o total das 1221 unidades
sanitárias (US) onde ocorre ou deveria ocorrer o primeiro nível de
contacto dos indivíduos, das famílias e da comunidade com o
Sistema Nacional de Saúde.
Em geral, trata-se das unidades sanitárias mais próximas aos
locais onde as pessoas vivem e trabalham.
Classificação das US de nível primário
As US de nível primário são classificadas como Centros de
Saúde (CS) rurais de tipo I (em número de 43) e de tipo II (em
número de 612), CS urbanos de tipo A (25) e de tipo B (48) e C
(31).

O nível de competências aumenta dos CS Rurais tipo II para os


CS Rurais tipo I e dos CS urbanos C para os CS urbanos tipo A.
Ainda, existem 362 postos de saúde (PS), que não têm
atendimento ao parto e oferecem só actividades ambulatórias
básicas.

Os PS estão a ser ou promovidos para CS rural tipo II ou


integrados na rede dos postos comunitários (que não faz parte do
SNS). Portanto, deveriam desaparecer.
Todos os CS rurais têm uma sala de parto e um pequeno sector
de atendimento aos partos. Os CS urbanos podem dispor ou não
dispor do serviço de maternidade. A tabela 1 na página seguinte
mostra as características mais importantes das US de nível
primário. Entre estas US, só os Centros de Saúde Rurais de tipo I
têm um sector para internamento geral (medicina, pediatria).

Área de saúde
A área de saúde de uma US de nível primário é constituída por
um círculo com 1-4 km de raio em ambiente urbano e 8 km em
ambiente rural e inclui a população sob responsabilidade do
Centro de Saúde (CS). Um círculo maior com raio de 40-50 km é
a área onde o Centro de Saúde ainda recebe casos (geralmente
graves) e onde exerce actividades de saúde através de brigadas
móveis
Actividades do nível primário da rede de saúde
 Educação para a Saúde, inclusive educação nutricional e
prevenção de doenças nutricionais;

 Saúde Materno-infantil e planeamento familiar (SMI/PF) e


Programa Alargado de Vacinações (PAV);

 Promoção do saneamento do meio e vigilância e de controlo da


higiene do ambiente;

 Prevenção e controlo das principais doenças


endémicas;
 Diagnóstico clínico e tratamento das afecções correntes;
inclusive primeiros socorros e outros cuidados de urgência aos
traumatismos mais vulgares;

 Distribuição de medicamentos essenciais;

 Referência para níveis superiores, dos problemas de Saúde


que não podem ser resolvidos ao seu nível;

 Recolha e tratamento de dados estatísticos, epidemiológicos e


demográficos de base e elaboração de relatórios periódicos;

 Supervisão aos níveis mais periféricos da Área de Saúde


(Aldeias e Localidades).
A partir dos últimos 5 anos, as doenças crónicas (em particular,
HIV/SIDA) têm adquirido importância crescente. O tratamento
anti-retroviral (TARV), inicialmente realizado nos hospitais mais
diferenciados, tem sido progressivamente descentralizado até ao
nível de cuidados de atenção primária.

Somente os casos complicados, graves e que já não respondem


devidamente á terapia são referidos para os hospitais provinciais
e centrais. Como consequência, entre os pontos mencionados,
“diagnóstico clínico e tratamento das infecções correntes”,
“prevenção e controlo das principais doenças endémicas”,
“recolha de dados estatísticos” têm assumido uma importância
crescente.
Estas áreas são focadas, neste momento, nas tarefas dos
técnicos de medicina. Não se confundam os CSP com a rede
sanitária de nível primário.
Nível secundário da rede de saúde
A rede de saúde secundária compreende Hospitais Distritais
(HD), Hospitais Rurais (HR) e Hospitais Gerais (HG). No total,
trata-se de 41 US. Nos hospitais distritais não se praticam
intervenções cirúrgicas maiores.

Geralmente, os hospitais rurais servem uma população mais


numerosa do que os hospitais distritais, possuem maior número
de camas, mais pessoal, e funcionam de referência para as
intervenções cirúrgicas do seu distritos e de distritos vizinhos que
não dispõem de hospitais rurais.
Os hospitais gerais, em número muito limitado, surgem em
ambiente urbano. O seu papel no tratamento das urgências,
sobretudo cirúrgicas, não é importante como no caso dos
hospitais rurais.
Frequentemente (Maputo) operam com um papel de filtro tratando
patologias que não precisam de referência para o nível
quaternário (Hospital Central de Maputo). A sua área de saúde é
geralmente limitada aos grandes distritos urbanos onde surgem.

Actividades do nível secundário da rede de saúde


De acordo com o Diploma Ministerial, e dentro da lógica dos
CSP: “Os Hospitais de Nível Secundário proporcionam um
primeiro nível de referência para os doentes que não encontram
solução para os seus problemas de saúde nos Centros de
Saúde”.

As funções principais do nível secundário são:


 Acolhimento e admissão de doentes enviados dos diversos
Centros de Saúde da sua zona de capacitação;

 Prevenção, tratamento e controlo das principais doenças


endémicas;

 Diagnóstico clínico, com apoio laboratorial de radiologia e de


outros exames complementares simples;

 Prestação de cuidados de urgência aos traumatismos e outras


afecções;
 Prestação de cuidados clínicos em regime de internamento aos
doentes que deles precisem;
 Tratamento das principais afecções prevalecentes na zona;
 Distribuição sob receita médica ou de outro profissional da
carreira de Medicina, de uma gama alargada de medicamentos
em instalações próprias - Farmácia do Hospital;

 Recolha e tratamento de dados estatísticos, epidemiológicos,


clínicos, de actividade, de qualidade dos serviços prestados, de
recursos e de custos;

 Supervisão e apoio logístico e técnico às acções de saúde


realizadas nos Centros de Saúde;

 Referência para níveis superiores dos problemas de saúde que


não possam ser resolvidos ao seu nível.
Nível terciário e quaternário da rede de saúde

Hospitais Provinciais (HP) e Centrais (HC).


HP e HC correspondem respectivamente ao nível
terciário e quaternário do SNS. Com efeito, deveriam
funcionar como hospitais de referências.

Na realidade, muitos doentes ou por residirem em zonas


urbanas próximas aos HP e HC, ou por confiarem mais
no tratamento que se presta nos grandes hospitais,
procuram o seu primeiro contacto com o SNS nestas
mesmas US.
Existe um número de técnicos de medicina que trabalham no que
podem ser considerados como serviços ambulatórios de
primeiras consultas e/ou nos bancos de socorros.

Em seguida são descritas sumariamente as características


principais que, pelo menos em teoria, HC e HP deveriam ter, de
acordo com o Diploma Ministerial 127/2002:

Hospitais Provinciais (HP)


Existem 7 HP, (Lichinga, Pemba, Quelimane, Tete, Chimoio,
Inhambane e Xai-Xai); prevê-se para este ano (2010) a abertura
do HP de Matola.
A zona de captação dos Hospitais Provinciais compreende
populações entre 800.000 e 2.000.000 (contudo, para o HP de
Quelimane é de 4.000.000 habitantes). A capacidade de camas
varia em função dos parâmetros de utilização entre 200 e 450
camas.

Os HP deveriam dispor de: a) Serviços individualizados das 4


especialidades básicas (Medicina Interna, Pediatria, Cirurgia e
Obstetrícia e Ginecologia) e sempre de médicos especialistas
para tais especialidades; b) Serviços individualizados, pelo
menos, para Traumatologia, Doenças Infecto-contagiosas e,
eventualmente, Neurologia;
c) Capacidade de atendimento, pelo menos em regime
ambulatório, nos domínios da Otorinolaringologia, Oftamologia,
Dermato-Venereologia e Psiquiatria;
d) Serviço de Transfusão de Sangue e de Medicina Física e
Reabilitação, em anexo ao Serviço de Urgências e uma Unidade
de Cuidados Intensivos.

Hospitais Centrais
Os Hospitais Centrais do País (nível quaternário) são actualmente
3 (Maputo, Hospital de referência nacional, Beira e Nampula, mas
prevê-se a promoção para este nível do HP de Quelimane; Maio
2010).

Dispõem de recursos e equipamentos mais diferenciados e


sofisticados do que os HP e de serviços quais: Radiologia
(Ecografia, Mamografia), Laboratório (Bioquímica, Hematologia,
Microbiologia, Anatomo-Patologia, Imunologia,
Electrocardiografia, Electroencefalo-grafia, Electromiografia).
Os serviços de Medicina Interna, Pediatria, Cirurgia,
Obstetrícia e Ginecologia, Traumatologia e Ortopedia,
Doenças Infecto-contagiosas, Otorinolaringologia,
Oftalmologia, Psiquiatria e Dermatologia são
proporcionados por médicos especialistas.

Os HC podem dispensar também cuidados clínicos, em


regime de internamento e de ambulatório, das seguintes
especialidades: Neurologia, Cardiologia, Pneumonia,
Gastroenterologia, Hematologia, Nefrologia, Urologia,
Neonatologia, Neurocirurgia, Cirurgia Pediátrica,
Cirurgia Reconstrutiva, Oncologia, Geriatria, Medicina
Física e Reabilitação.
Os HC dispõem de Serviços de Urgências, em Unidades de
Cuidados Intensivos e eventualmente, de Unidades
especializadas de Cuidados Intensivos (por ex., Cardologia e
Cirurgia Cárdiovascular, politraumatismos, grandes queimados, e
Neurocirurgia). Serviços individualizados de Arquivo Clínico,
Epidemiologia e Estatística, Administração e Finanças, Análises
de Custos, Economato, Gestão de Recursos Humanos e de
Formação.

No SNS existem mais 2 hospitais psiquiátricos que são


considerados de nível quaternário (especializado).
ORGANIZAÇÃO DOS SERVIÇOS: AMBULATÓRIO
E INTERNAMENTO
Os serviços de saúde estão divididos em duas grandes
categorias: os serviços ambulatórios e de internamento.

Os serviços ambulatórios prestam cuidados de saúde a um


público de doentes (diagnóstico e tratamento) e a um público de
indivíduos saudáveis (prevenção e promoção de saúde). Embora
haja inúmeras sobreposições entre a área de clínica e a área de
prevenção (por ex., pessoas “doentes” recebem cuidados
preventivos e sessões de educação para saúde, assim como
pessoas aparentemente saudáveis são por vezes diagnosticadas
e tratadas por doenças cuja existência se desconhecia), é
oportuno considerar separadamente os serviços de atendimento
ao doente e os serviços materno-infantis. Os primeiros são mais
virados para o tratamento, os segundos para prevenção.
Os serviços de atendimento ao doente compreendem duas áreas
principais: as consultas externas, que podem ser primeiras
consultas e consultas marcadas (referidas ou de doentes
crónicos).

N.B. O Programa Nacional de Controlo da Tuberculose e Lepra


(PCNTL), cuja actividade principal realiza-se no sector
ambulatório, não está integrado nas consultas externas; existem
gabinetes e pessoal próprio do sector. O PCNTL é um típico
“programa vertical”.

As consultas de SMI incluem visitas pré-natais, pós-natais, de


planeamento familiar; consultas de crianças sadias, que incluem
as vacinações, e consultas de crianças em risco.
Internamento
Medicina, Pediatria, Obstetrícia nos Centro de Saúde Rural I,
Hospital Distrital e Hospital Rural e (II) Enfermaria de Cirurgia nos
Hospitais Rurais. Camas para internamento de doentes cujas
condições não podem ser tratadas em ambulatórios são
presentes nos Centros de Saúde Rurais de tipo I e nos Hospitais
Distritais (Enfermarias de Obstetrícia, Medicina e Pediatria. Nos
centros de saúde de pequenas dimensões, a Pediatria fica
frequentemente junta à enfermaria de Medicina Feminina).

Nos Hospitais Rurais e Gerais existe pelo menos um bloco


operatório e uma enfermaria de cirurgia.
Os cuidados clínicos são mais diferenciados e a disponibilidade
de medicamentos é maior. O sector de traumatologia pode estar
funcionalmente ou fisicamente separado. Nem sempre existe um
serviço separado para cuidados intensivos. Pode haver um sector
particular de tisiologia para doentes com tuberculose internados
durante a primeira fase de tratamento intensivo.

As pediatrias podem estar funcionalmente divididas (por exemplo


em serviços de cuidados intensivos pediátricos, doenças
transmissíveis e reabilitação nutricional).

Os Bancos de Sangue permitem a execução de transfusão de


sangue com relativa segurança (o sangue é testado para HIV,
malária, sífilis e tuberculose) nas US com internamento. Nos
hospitais de nível secundário há médicos de clínica geral.
Nos hospitais rurais deveria haver especialistas para as áreas
principais (medicina interna, cirurgia, ginecologia/obstetrícia,
pediatria) ou pelo menos médicos de clínica geral com interesse
para estas áreas.

Em todas as US com internamento devem existir quartos ou


sectores para isolamento, destinado a doenças transmissíveis.
Em caso de epidemias de cólera, aprontam-se sítios próprios
isolados, onde é mais fácil manter um controlo especial,
frequentemente em tendas.

As US dispõem de serviços auxiliares, cuja capacidade varia de


acordo com o nível da US (sector administrativo, que inclui
manutenção e transportes, farmácia, depósito de medicamentos,
laboratório clínico, radiologia, lavandaria e cozinha, central
telefónica).
Centros de saúde rurais de tipo II dispunham basicamente de
‘micro-laboratórios’ apetrechados apenas para a microscopia
óptica (BK, hematozoário, exame parasitológico das fezes,
urinas). A descentralização do TARV tem levado ao aumento de
capacidade em algumas destas US (hematologia, bioquímica).
Hospitais distritais e rurais já dispõem rotineiramente de
hematologia e bioquímica.

Exames mais complexos como a conta dos linfócitos CD4 estão


normalmente disponíveis a níveis de US mais avançados. Para
microbiologia e carga viral é preciso recorrer a laboratórios
nacionais de referência.
Ao mesmo tempo, as equipas de saúde básicas estabelecidas
por cada nível de atendimento já não respondem em muitas
unidades sanitárias ao aumento de número de doentes.

Por fim, as brigadas móveis prestam serviços itinerantes de


informação, vacinações, saúde materno-infantil, estomatologia
(sobretudo nas escolas), e, por vezes, clínica. As saídas das
brigadas móveis dependem geralmente da disponibilidade de
transportes e fundos a nível local.
FIM

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