Você está na página 1de 59

0

CURSO DE CIÊNCIAS DA NATUREZA - LICENCIATURA EM QUÍMICA

LAÍS STOLLER OLIVEIRA

A QUÍMICA DO SABÃO E AS QUESTÕES AMBIENTAIS


COMO TEMA GERADOR DO CONHECIMENTO QUÍMICO

CAMPOS DOS GOYTACAZES/RJ


2012, 2
1

LAÍS STOLLER OLIVEIRA

A QUÍMICA DO SABÃO E SUAS QUESTÕES AMBIENTAIS


COMO TEMA GERADOR DO CONHECIMENTO QUÍMICO

Monografia apresentada ao Instituto Federal de


Educação, Ciência e Tecnologia Fluminense
como requisito para conclusão do Curso de
Ciências da Natureza, Licenciatura em Química.
Orientadora: Dr ạ Cíntia Neves B. Carneiro
Coorientadora: Ms. Ingrid Ribeiro da G. Rangel

CAMPOS DOS GOYTACAZES/RJ


2012, 2
2

LAÍS STOLLER OLIVEIRA

A QUÍMICA DO SABÃO E SUAS QUESTÕES AMBIENTAIS


COMO TEMA GERADOR DO CONHECIMENTO QUÍMICO

Monografia apresentada ao Instituto Federal de


Educação, Ciência e Tecnologia Fluminense
como requisito para conclusão do Curso de
Ciências da Natureza, Licenciatura em Química.

Aprovada em 15 de abril de 2013

Banca Avaliadora:

....................................................................................................................................
Prof. Dr ạ Cíntia Neves Barreto Carneiro (orientadora)
Doutora em Biociência e Biotecnologia/UENF
Instituto Federal Fluminense, Câmpus Campos-Centro

...................................................................................................................................
Prof ạ Ingrid Ribeiro da Gama Rangel (coorientadora)
Mestra em Pedagogia/ UENF
Idem

....................................................................................................................................
Prof. Dr ạ Valéria Marcelino Terra
Doutora em Ensino de Ciências/UENF
Idem

...................................................................................................................................
Prof. José Carlos Salomão
Bacharel em Química Industrial / FRNL
Idem
3

Dedico este trabalho, primeiramente, a Deus pela força,


por me capacitar e guiar para conclusão deste trabalho.
Aos meus pais, Luíz Carlos e Maria da Glória, pelo amor
e paciência durante este tempo difícil. Aos amigos, pela
compreensão pelo grande tempo de ausência; não citarei
nome de nenhum para não correr o risco de esquecer e
ser injusta. E um agradecimento especial à minha
orientadora, Cintia Neves, pela paciência e dedicação.
4

Agradeço à minha orientadora e amiga Cíntia Neves por


todo apoio e por me proporcionar um grande aprendizado
ao longo dessa trajetória. Agradeço também à minha
coorientadora Ingrid Ribeiro por todo o apoio e criar em
mim um novo olhar sobre os aspectos pedagógicos da
educação. Ao Colégio Fidelense por abrir as portas para
a aplicação de minha monografia, principalmente aos
alunos do 3ọano pela receptividade e acolhida da
proposta.
5

ação.

Ninguém educa ninguém, e ninguém se educa sozinho.


É preciso tornar a educação um ato coletivo, solidário.
Paulo Freire
6

RESUMO

O conhecimento químico tem sido muito fragmentado e descontextualizado. A sociedade


moderna visa a formação de um cidadão crítico-reflexivo, um indivíduo que tenha a
capacidade de refletir sobre as mudanças sociais que o cercam. A distância entre o conteúdo e
a vivência do aluno vem sendo uma das grandes barreiras do ensino de Química. O presente
trabalho propõe o uso do sabão produzido por meio de óleo de cozinha reciclado, em uma
vertente ambiental e social, como um tema gerador do conhecimento químico em
contraposição à descontextualização e fragmentação na disciplina de Química. Desenvolveu-
se um material didático como um guia a fim de romper a barreira de contextualizações
propostas pelos livros que nem sempre vem fazer parte da vida do educando. A primeira etapa
da aula foi a aplicação de um vídeo educativo relatando uma visão ambiental sobre o óleo de
cozinha. Usou-se, também, o recurso do experimento para enriquecer e estimular os alunos,
frente ao assunto abordado, desenvolvendo-se a produção do sabão caseiro em pequena escala
com os alunos. Um ponto importante que foi observado é que 50% dos alunos não sabiam da
possibilidade do reaproveitamento do óleo de cozinha. Depois de realizada toda a parte
experimental, os alunos, em conversa informal, se mostraram muito interessados em
desenvolver um projeto de reciclagem de óleo pela escola, fato que confirma a eficiência
deste método de ensino, pois os alunos construíram seu próprio conhecimento, além disso,
desenvolveram uma consciência de cidadãos influentes e reflexivos.

Palavras-chave: Tema gerador. Experimentação. Contextualização. Sabão.


7

ABSTRACT

The chemical knowledge has been very fragmented and decontextualized. The modern society
aims the formation of a critical-reflective citizen, someone that has the capacity to reflect
about social changes that surrounds him. The distance between the content and the student’s
experience has been one of the big obstacles of the Chemical teaching. This work proposes
the using of the soap made by means of recycled cooking oil, in an environmental and social
slope, like a generator theme of the chemical knowledge in contraposition to the
decontextualization and fragmentation in the Chemical subject. A didactic material was
developed like a guide in order to break the contextualizations obstacle proposed by the books
that not always come to make a place in student’s life. The first class stage was the
application of an educational video reporting an environmental vision about cooking oil. An
experiment was also used to enrich and stimulate the students, about the approached topic,
developing the homemade soap production in a small scale with them. An important point
that was observed is that 50% of the students didn’t know the cooking oil reuse possibility.
After the experimental part performance, the students, in informal talk, showed themselves so
interested about developing an oil recycle project on the school, fact that confirms this
teaching method efficiency, because the students built their own knowledge, furthermore, an
influential and reflexive citizens consciousness was developed.

Key-words: Theme generator. Experimentation. Contextualization. Soap.


8

LISTAS DE FIGURAS

Figura 1: Estrutura do triacilglicerol ............................................................................... 30


Figura 2: Reação de formação de um triacilglicerol ......................................................... 32
Figura 3: Estrutura do dodecano de sódio ........................................................................ 33
Figura 4: Reação de saponificação ................................................................................... 34
Figura 5: Esquema do mecanismo da limpeza usando sabão ........................................... 35
Figura 6: Exemplos de estruturas de detergentes .............................................................. 36
Figura 7: Tensão superficial dos líquidos ......................................................................... 37
9

LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1: A Química é uma matéria abstrata?.................................................................. 42


Gráfico 2: Frequência com que os alunos relacionam a Química com o dia-a-dia.......... 43
Gráfico 3: Frequência de utilizado óleo de cozinha para frituras...................................... 43
Gráfico 4: Destino dado ao óleo usado.............................................................................. 44
Gráfico 5: Existência de posto de coleta de óleo usado..................................................... 45
Gráfico 6: Possível reutilização do óleo de cozinha.......................................................... 45
Gráfico 7: Influência do óleo de cozinha no meio ambiente............................................. 46
Gráfico 8: Sua cidade possui tratamento da rede de esgoto?............................................. 46
10

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO............................................................................................................. 11
1 TEMA GERADOR E A PEDAGOGIA DE PAULO FREIRE...................................... 15
1.1 Tema gerador .......................................................................................................... 17
1. 2 Experimentação no ensino de química .................................................................. 24
1. 3 O que é contextualização? ...................................................................................... 25
2 SABÕES: ASPECTOS QUÍMICOS E AMBIENTAIS................................................. 28
2. 1 Origem do sabão .................................................................................................... 29
2. 2 Conceitos químicos relacionados ao tema sabão .................................................. 30
2.2.1 O que são óleos e gorduras .......................................................................... 30
2.2.2 O que é o sabão? ......................................................................................... 32
2.2.3 Saponificação: reação de produção de sabão ............................................... 33
2.2.4 Ação do sabão na limpeza ......................................................................... 34
2.2.5 Tensoatividade ............................................................................................. 36
2.2.6 Biodegradabilidade do sabão ....................................................................... 37
3 APLICAÇÃO ................................................................................................................ 39
3.1 Desenvolvimento e aplicação do material didático ................................................ 39
3.2 Análise dos dados coletados ................................................................................... 41
3.3 A aula ...................................................................................................................... 47
CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................... 49
0 REFERÊNCIAS ........................................................................................................... 51
0 APÊNDICES ................................................................................................................ 55
0 Apêndice A: Questionário investigativo ...................................................................... 56
0 Apêndice B: Guia Didático: A química do sabão ........................................................ 58
11

1 INTRODUÇÃO

Este trabalho tem como título A química do sabão e suas questões ambientais como
tema gerador do conhecimento químico, tomando como partida um tema mais geral para que
este se desmembre em temas específicos referentes a partes de conteúdos da Química de
maneira mais contextualizada, a fim de proporcionar ao educando uma maior aproximação
entre o conteúdo e seu cotidiano. Este tema tem um enfoque ambiental, a fim de desmitificar a
Química somente como vilã do meio ambiente, mostrando que ela pode ajudar a solucionar
problemas ambientais e ser aplicada no dia-a-dia do educando tornando a aprendizagem
prazerosa e interessante.
No modelo de escola existente na contemporaneidade, boa parte das instituições de
ensino não corresponde às necessidades de formação do indivíduo atual. Em grande parte das
escolas, a Química é apresentada aos alunos de forma desvinculada do contexto. Os alunos
são treinados a responderem questões-padrão, o que os regula para uma memorização
excessiva. O sujeito fica condicionado a respostas prontas, desenvolvidas nos mesmos termos
em que foram apresentadas. Nas avaliações, são cobradas as respostas-padrão determinadas,
as quais, muitas vezes, somente respondidas da mesma forma são aceitas pelo professor. Esse
modelo de ensino didático tradicional é conhecido como transmissão/recepção de conteúdos
pré-estabelecidos pelos programas escolares, programas estes que devem ser seguidos à risca
pelo professor, que por sua vez é obrigado a impor um ritmo mais acelerado às aulas para que
o planejamento seja cumprido. Este fato é apontado até mesmo pelas Orientações Curriculares
Nacionais “[...] o que se observa de forma geral, nos programas escolares, é que persiste a
idéia de um número enorme de conteúdos a desenvolver, com detalhamentos desnecessários e
anacrônicos.” (BRASIL, 2006, p. 108). Este modelo, chamado por Freire de “educação
bancária” é carente em contextualização, problematização e interdisciplinaridade, além de
tudo não contem temas da atualidade, desconsiderando os acontecimentos sociais (FREIRE,
1987). É indiscutível a necessidade de mudança e um passo já foi dado com as novas metas
apresentadas nas Orientações Curriculares Nacionais:
O mundo atual exige que o estudante se posicione, julgue e tome decisões, e
seja responsabilizado por isso. Essas são capacidades mentais construídas nas
interações sociais vivenciadas na escola, em situações complexas que exigem
novas formas de participação. Para isso, não servem componentes
curriculares desenvolvidos com base em treinamento para respostas padrão.
Um projeto pedagógico escolar adequado não é avaliado pelo número de
exercícios propostos e resolvidos, mas pela qualidade das situações
propostas, em que os estudantes e os professores, em interação, terão de
produzir conhecimentos contextualizados. (BRASIL, 2006, p. 106).
12

Em um artigo publicado na Revista Química Nova na Escola, cujos autores são Eichler
e Del Pino, verifica-se uma proposta de educação mais voltada para a formação do cidadão:
Propõe-se que as atividades devam estar voltadas à formação do cidadão,
vinculando os conteúdos às dimensões sócio-político-econômicas e aos
conhecimentos prévios dos alunos. Espera-se que o aluno interaja com os
conteúdos e coopere com os colegas na construção dos conceitos e métodos
científicos. Defende-se que o aluno parta de questões concretas para
estabelecer relações abstratas entre os conceitos e os conteúdos presentes nas
atividades de aprendizagem. (EICHLER; DEL PINO, 1999, p. 6).

É visível que o maior obstáculo a ser vencido pelo tipo de educação atual é a barreira
que separa o conhecimento acadêmico e a realidade do educando. O aluno tem um papel
muito passivo frente à aula, além disso, o conteúdo é passado em forma de blocos o que leva,
muitas vezes, apenas a mera decodificação das informações.
No Encontro Nacional de Ensino de Química (ENEQ) de 2000, fez-se uma analogia
interessante, citada por Quadros em seu artigo, quando se comparou o ensino de Química a
pais que dão separadamente a seus filhos produtos como farinha, açúcar, leite, ovos, manteiga
e fermento, esperando que dentro do corpo estes ingredientes formassem um bolo delicioso
(QUADROS, 2011, p. 26). É isso que tem sido feito junto aos alunos. O conhecimento é
transmitido e espera-se que os discentes possam arrumá-lo em suas cabeças e construir uma
ponte entre o saber e seu mundo. Usa-se um modelo de ensino tradicional ligado à
memorização, mas se deseja que sejam formados indivíduos que tenham interação com a
turma, o professor e o saber; que este estabeleça relações abstratas entre os conceitos e os
conteúdos presentes nestas atividades acadêmicas.
As questões a serem levantas são inúmeras: como reduzir esta fragmentação do
conhecimento químico; como fazer o aluno se interessar pelo conteúdo de forma que ele
possa ver aplicação para este; será que apenas exemplos dentro de cada conteúdo seriam
suficientes para a fusão do conhecimento?; são muitas as questões que cercam a necessidade
de melhoria da metodologia de ensino a fim de resolver a fragmentação do conhecimento
químico. A proposta desta pesquisa utiliza o tema gerador para resolver estas questões acima
levantadas.
O conceito de tema gerador parte dos princípios centrais da linha de Freire: “a
problematização e a dialogicidade”. Propõe-se conhecer o contexto de vida do educando e
por meio disso escolher um tema central atual e desenvolver os demais conteúdos com
“investigação temática”, conforme indicado neste trecho de seu livro Pedagogia do oprimido:
13

Neste sentido é que a investigação do tema gerador, que se encontra contido


no “universo temático mínimo” (os temas geradores em interação), se
realizada por meio de uma metodologia conscientizadora, além de nos
possibilitar sua apreensão, insere ou começa a inserir os homens numa forma
crítica de pensarem seu mundo. (FREIRE, 1987, p. 97).

O desenvolvimento de pesquisas que busquem uma educação voltada para a formação


de um cidadão que possua o pensamento crítico e uma proposta de ensino que contemple
aspectos sociais relacionados com a cidadania, é destacado por Eichler e Del Pino:
[...] preocupação com aspectos relativos à cidadania utilizando temas de
interesse social, derivados do cotidiano, associando aspectos tecnológicos e
sócios econômicos. Procura-se transmitir o conhecimento químico
juntamente com uma formação crítica, que permita a reflexão sobre suas
implicações sociais e ambientais. (EICHLER; DEL PINO, 1999, p. 1).

Visa-se o desenvolvimento de um cidadão que pense de uma maneira mais


contextualizada, relacionando conteúdos buscando uma formação geral, desenvolvendo
capacidades cognitivas e operativas, sendo formado para o exercício da cidadania. Esta
preocupação também é frisada por Libâneo:
[...] o valor da aprendizagem escolar está justamente na sua capacidade de
introduzir os alunos nos significados da cultura e da ciência por meio de
mediações cognitivas e interacionais, providas pelo professor. (LIBÂNEO,
2007, p. 28).

A partir do desenvolvimento deste trabalho, verificou-se a importância do uso do tema


gerador no ensino de Química a fim de tornar a aprendizagem mais significativa, conceito este
que é apontado como uma solução para a fragmentação e descontextualização do conteúdo
com a finalidade de mostrar aos discentes a Química como uma disciplina interessante e
presente a cada momento do dia-a-dia. A proposta de um ensino em que os alunos sejam
habituados a aprender as realidades enfocadas nos conteúdos escolares de forma crítico-
reflexiva é um desafio aos docentes, já que os alunos estão apenas acostumados a receber
informações dos professores de uma forma passiva e cômoda, sem o esforço de pensar.
Retirá-los desta passividade requer muito esforço por parte do corpo docente que deve instigar
os alunos a pensar e resolver situações-problema, retirá-los do comodismo e fazê-los pensar
de uma forma nova. Descobrir uma nova forma de construção do conhecimento torna-se
necessário, buscar novas formas de trabalhar os conteúdos e, ainda, não os trabalhar de forma
compartimentalizada é emergencial para o sucesso da educação.
Diversas propostas para a resolução deste dilema têm sido apresentadas usando o
conceito de tema gerador, na visão de Freire, propostas estas que mostram que a mudança é
possível, propostas as quais procuram conhecer a realidade dos educandos na busca por temas
14

geradores que façam parte do contexto de vida dos educandos (FREIRE, 1987). Existem
trabalhos onde a água é usada como tema, outros onde os xampus e sabonetes, sachês de
maionese e catchup, biodiesel, alimentos, álcool e também os sabões conforme o enfoque
deste trabalho.
Vistos todos estes desafios a serem vencidos pela escola, a proposta central desta
pesquisa é usar o sabão como um tema gerador com o objetivo principal de permitir aos
professores trabalharem com a Química de uma maneira dinâmica, proporcionando uma
contextualização dos conteúdos abordados com o cotidiano do aluno, tendo como público
alvo os alunos do 3ọ ano do Ensino Médio do Colégio Fidelense, na cidade de São Fidélis,
estado do Rio de Janeiro. Além disto, discutem-se os impactos ambientais causados pelo
despejo inadequado de óleo comestível usado no meio ambiente, bem como o do sabão
desenvolvendo uma visão mais crítica das consequências dos nossos dejetos no meio
ambiente. O trabalho também visa a compreensão dos alunos do processo de fabricação do
sabão, assim como seus conteúdos químicos. A experimentação, por meio da produção de um
sabão caseiro, em pequena escala, será utilizada como estratégia de ensino. Foi elaborado um
material didático com todo o conteúdo, referente ao 3ọ ano do Ensino Médio, de Química
relacionado ao sabão como forma de mostrar aos docentes a importância da elaboração de seu
próprio material didático; fato apontado por Campos et al. que diz ser necessário não utilizar
apenas o material didático tradicional, mas o professor deve construir o seu próprio material
(CAMPOS et al., 2009, p. 276).
O principal objetivo da elaboração deste material didático, além da desvinculação com
o livro didático, é permitir que outros professores possam adaptá-lo e usa-lo em sua sala de
aula, já que o grande argumento para a não utilização de novas propostas é a falta de tempo, o
que é uma grande verdade para boa parte do corpo docente. Foi aplicado um questionário
investigativo, com questões fechadas e abertas, a fim de saber quais os conhecimentos que os
alunos obtinham sobre o assunto. Uma aula foi dada usando este material didático e observou-
se a receptividade dos alunos a proposta, avaliando o aprendizado com as propostas do
próprio material didático.
15

1 TEMA GERADOR E A PEDAGOGIA DE PAULO FREIRE

A linha teórica desta pesquisa tem como base a pedagogia progressista libertadora de
Paulo Freire, que “integra a teoria educacional crítica da modernidade, a qual, numa
‘abordagem sociocultural de ensino’ concebe o conhecimento numa perspectiva
interacionista.” (FREITAS, 2004, p. 55). Freire defende a autonomia pedagógica e o anti-
autoritarismo, uma escola vinculada à sociedade, “como um ato de intervenção no mundo”
(FREIRE, 1996, p. 122), defendendo que a educação não seja neutra, mas intervenha na
sociedade por meio do desenvolvimento de um pensamento crítico. A aprendizagem é feita
em cima de situações-problema que envolvam a realidade para serem resolvidas por meio de
uma análise crítica. Ao falar de intervenção, Freire deixa claro que tipo de intervenção seria
essa:
É preciso deixar claro que o conceito de intervenção não está sendo usando
com nenhuma restrição semântica. Quando falo em educação como
intervenção me refiro tanto à que aspira a mudanças radicais na sociedade, no
campo da economia, as relações humanas, da propriedade, do direito ao
trabalho, à terra, à educação, à saúde, quanto que, pelo contrário,
reacionariamente pretende imobilizar a História e manter a ordem injusta.
(FREIRE, 1996, p. 122-123).

Quando se fala na concepção progressista de educação originária das ideias de Paulo


Freire é importante ter total conhecimento de dois conceitos: a problematização e a
dialogicidade.
Para o autor o ato de problematizar vai muito além de simplesmente propor em sala de
aula situações que tenham relação com a vida do educando, por meio de conceitos pré-
estabelecidos pelo professor sem preocupação com o diálogo. Este conceito é discutido por
Nascimento e Linsingen quando apontam que a problematização “deve ser um processo no
qual o educando se confronta com situações de sua vida diária, desestabilizando seu
conhecimento anterior e criando uma lacuna que o faz sentir falta daquilo que ele não sabe.”
(NASCIMENTO, LINSINGEN, 2006, p. 104). Este modelo propõe uma educação em que o
educando não tenha um papel passivo diante do saber, mas que seja participante do processo
de aprendizagem, construtor de seu próprio conhecimento. Freire destaca que “Por isso é que
esta educação, em que os educadores e educandos se fazem sujeitos do seu processo,
superando o intelectualismo alienante, superando o autoritarismo do educador ‘bancário’,
supera também a falsa consciência de mundo.” (FREIRE, 1987, p. 75). O professor é visto
como mediador e não como transmissor como se observa na educação “bancária”, “para a
qual a educação é o ato de depositar, de transferir, de transmitir valores e conhecimentos, não
16

se verifica nem pode verificar-se esta superação.” (FREIRE, 1987, p. 59). Nesta concepção,
apenas o educador sabe, ocorre a “domesticação” do educando e da realidade (FREIRE, 1987,
p. 61).
A respeito da dialogicidade Freire é bem claro quanto a sua necessidade quando diz
que “o diálogo é uma exigência existencial” (FREIRE, 1987, p. 79). Esse diálogo citado não
se refere apenas a uma simples conversa do educador para com o educando, mas vem de algo
mais profundo, vem de uma interlocução. Ou seja, uma interação de ambas as partes. É neste
contexto que se insere o conceito de educador-educando, problematizador e dialógico que não
trata o conteúdo programático como:
[...] uma doação ou uma imposição — um conjunto de informes a ser
depositado no educandos —, mas a devolução organizada, sistematizada e
acrescentada ao povo daqueles elementos que este lhes entregou de forma
desestruturada.
A educação autêntica, repitamos, não se faz de A para B ou de A sobre B,
mas de A com B, mediatizados pelo mundo. (FREIRE, 1987, p. 83-84).

Diante desta afirmação, Nascimento e Linsingen destacam nas ideias de Freire que
“uma metodologia que permite a operacionalização da educação problematizadora: a
investigação do universo temático dos educandos ou o conjunto de seus temas geradores.”
(NASCIMENTO, LINSINGEN, 2006, p. 105). Esta investigação não se trata do homem em
relação ao seu físico, anatomicamente falando, mas ao seu pensamento, sua realidade, sua
vivencia de mundo com se encontram inseridos os seus “temas geradores” (FREIRE, 1987, p.
88). O que é novamente citado por Freire:
É importante reenfatizar que o tema gerador não se encontra nos homens
isolados da realidade, nem tão pouco na realidade separada dos homens. Só
pode ser compreendido nas relações homem-mundo. Investigar o tema
gerador é investigar, repitamos, o pensar dos homens referidos à realidade, é
investigar seu atuar sua práxis. (FREIRE, 1987, p. 98).

Observa-se, inserido neste contexto, o conceito de tema gerador abordado por Freire
em seu livro Pedagogia do oprimido, cujo significado é definido por ele mesmo em uma nota
de rodapé: “Estes temas se chamam geradores porque, qualquer que seja a natureza de sua
compreensão, como a ação por eles provocada, contém em si a possibilidade de desdobrar-se
em outros temas que, por sua vez, provocam novas tarefas a serem cumpridas.” (FREIRE,
1987, p. 93, nota de rodapé). Os temas gerados partem do que o educando já possui para que
ele próprio possa consolidar e ampliar a construção do seu próprio saber em níveis mais
abrangentes e politicamente consensuais. Deixa-se a ressalva que a questão dos temas
17

geradores pode ser lida como educação contextualizada, questão esta trabalhada também por
outros autores.
A busca por temas geradores parte de uma investigação temática, onde o contexto
local é estudado por meio de um levantamento preliminar para registrar como “os homens
constroem seu pensamento.” (NASCIMENTO, LINSINGEN, 2006, p. 106), sendo realizada
uma análise em conjunto pesquisador-pesquisado. A etapa seguinte é o estudo sistemático e
interdisciplinar dos dados e identificação de quais temas geradores seriam estes para então
levá-los ao ambiente de ensino.
Para a pedagogia libertadora, a forma de trabalho educativo é o grupo de
discussão, que conduz o processo educativo buscando os conteúdos
problematizadores, realizando as discussões, compartilhando as descobertas,
definindo as atividades e os temas geradores como ponto de partida para a
decodificação das sílabas e, principalmente, a decodificação do mundo social,
histórico, político e cultural onde vivem os oprimidos nas sociedades
desiguais. (TOZZONI-REIS, 2006, p. 104).

Ratifica a importância do uso de temas geradores, em uma visão de educação


progressista libertadora, como ponto de partida para a construção do conhecimento e possuem
não apenas enfoque nos conteúdos, mas com uma visão sócio-político-econômica,
objetivando a formação de um cidadão reflexivo que seja capaz de pensar por si próprio e
analisar as situações do cotidiano para a prática e o exercício da cidadania em uma ação
transformadora de sua realidade.

0 1.1 Tema gerador

Ao iniciar a discussão sobre o tema gerador é importante dizer por que ele se encontra
como uma metodologia a ser empregada em contraposição à descontextualização. Araújo, em
sua dissertação de mestrado, faz uma afirmativa muito interessante a respeito desta realidade
de inserção do conteúdo no meio em que os alunos vivem:
Na vida social, o conhecimento é sempre aplicado a um tema, ou seja, nunca
aparece de forma descontextualizada. Na escola, não deve ser diferente.
Portanto, deve-se privilegiar o desenvolvimento de propostas que considerem
as transformações sociais que se espera da sociedade nas quais os alunos
estão inseridos. (ARAÚJO, 2008, p. 63).
18

Como inserir o conteúdo acadêmico no dia a dia do educando? Uma nova postura por
parte dos educadores deve ser tomada. Diante de todos os desafios da educação na
contemporaneidade, já discutidos anteriormente, uma das possibilidades de contextualização é
o tema gerador, fato este confirmado por Araújo:
Diante das amplas possibilidades, o tema gerador deve surgir das idéias
compartilhadas pelos alunos, refletindo suas necessidades e inquietações,
conforme observa Freire (2005) ao avaliar a impossibilidade de se discutir
com os alunos enquanto suas preocupações apontam em outro sentido.
(ARAÚJO, 2008, p. 66-67).

Freire frisa muito a importância do diálogo entre os participantes do universo


educacional. Por isso, o autor diz que “ensinar exige respeito aos saberes dos educandos”
(FREIRE, 1996, p. 33). Abrir uma discussão com os alunos sobre os problemas das
comunidades que os cerca é um dos questionamentos levantados por Freire: “por que não
discutir com os alunos a realidade concreta a que deva associar a disciplina cujo conteúdo se
ensina, [...]” (FREIRE, 1996, p. 122-123). A base de uma educação como prática de liberdade
é ter os alunos envolvidos no processo educacional (TOZZONI-REIS, 2006, p. 102).
Em seu livro, Temas geradores: concepções e práticas, Corazza detalha todo o
histórico do tema gerador. Este conceito não é utilizado apenas por Freire, mas por outros
autores, conforme afirmado neste trecho: “Afirmamos que a originalidade da invenção
conceitual de Freire [...] haja sido a junção dos conceitos ─ TEMAS e GERADORES ─ para
deles fazer um.” (CORAZZA, 2003, p. 19). A autora afirma que o conceito de temas já havia
sido usado por outros autores, como por exemplo, Freyer e Pistrak; mas não se sabe se Paulo
Freire buscou, ou não, base nestes autores. Em relação ao termo gerador, acredita-se que
tenha vindo do conceito de “palavras-chave” ou “palavras-geradoras” conceitos estes
integrantes do “Sistema Paulo Freire de Educação” (CORAZZA, 2003, p. 19).
Para propor uma palavra geradora, é preciso uma investigação do meio que cerca o
educando; é o que Freire chama de investigação do “universo temático”, ou seja, identificar os
níveis de percepção que eles possuem da realidade que os cerca (FREIRE, 1987, p. 87). Freire
ainda evidencia que “devem-se representar situações conhecidas pelos indivíduos cuja
temática se busca, o que as faz reconhecíveis por eles, possibilitando, desta forma, que nelas
se reconheçam.” (FREIRE, 1987, p. 108). Este termo é bem definido por Corazza:
Freire concebe os ‘temas geradores’ como dispostos em concêntricos, que
partem do mais geral ao mais particular. Os ‘temas geradores gerais’
caracterizam-se por seu caráter universal e concernem a uma determinada
época histórica. O conjunto desses temas compõe o ‘universo temático’ de
uma época, [...]. (CORAZZA, 2003, p. 16).
19

Outro conceito envolvido no conceito de tema gerador é o de “situações-limite”, que


são barreiras a serem vencidas no dia a dia dos homens, obstáculos a serem transpostos. As
ações aplicadas para superar as "situações-limite" Freire as chama de "atos-limite". Conforme
destacado por Freire: “Os temas se encontram, em última análise, de um lado, envolvidos, de
outro, envolvendo as ‘situações-limite’, enquanto as tarefas que eles implicam, quando
cumpridas, constituem os ‘atos-limite’ aos quais nos referimos” (FREIRE, 1987, p. 93).
O tema gerador tem como objetivo aproximar o conteúdo do dia a dia do educando e
consequentemente, preparar o indivíduo para a vida em sociedade. A pedagogia de Paulo
Freire é marcada pela política, pela forma que a educação pode intervir nesta área, pela
formação das classes populares.
É importante destacar que o caráter político da pedagogia freireana faz-se
presente, de forma radical, nos temas geradores; isto é, temas geradores só
são geradores de ação-reflexão-ação se forem carregados de conteúdos
sociais e políticos com significado concreto para a vida dos educandos.
(TOZZONI-REIS, 2006, p. 103).

Tozzoni-Reis (2006) evidencia que a forma mais coerente de se trabalhar os temas


geradores é não se prender a uma metodologia tradicional e mecânica, mas estar aberta ao
rendimento de cada turma, de cada indivíduo, em vista disso considera o diálogo como
fundamental de forma democrática e participativa:
Então, os temas geradores são temas que servem ao processo de codificação-
decodificação e problematização da situação. Eles permitem concretizar,
metodologicamente, o esforço de compreensão da realidade vivida para
alcançar um nível mais crítico de conhecimento dessa realidade, pela
experiência da reflexão coletiva da prática social real. (TOZZONI-REIS,
2006, p. 104).

O uso de um tema presente na vida do educando facilitará que ele possa construir seu
próprio conhecimento e tenha uma visão de mundo ampliada; será um cidadão crítico e apto a
estabelecer relações com a sociedade e o conhecimento.
Alguns artigos nortearam a realização desta pesquisa, para um melhor entendimento
do assunto e a melhor forma de aplicá-lo feita uma busca em revistas on-line de 1999 até
2012. Boa parte dos artigos estão publicados na Química Nova na Escola, mas também serão
usadas como referências as revistas Ciência e Educação e Educar em Revista.
O artigo de Lucatto e Talamoni, A construção coletiva interdisciplinar em educação
ambiental no Ensino Médio: a microbacia do Ribeirão dos Peixes como tema gerador, trata
do tema ambiental como um tema gerador em um enfoque interdisciplinar na microbacia do
Ribeirão dos Peixes, o principal corpo de água do município de Dois Córregos, estado de São
20

Paulo (LUCATTO, TALAMONI, 2007). A comunidade enfrenta grandes problemas


ambientais relacionados à má conservação do corpo d’água, sejam eles devido a dejetos
domésticos e industriais ou pela degradação do leito do rio. Em meio a este contexto, os
autores da pesquisa usaram a microbacia do Ribeirão dos Peixes como tema para o
desenvolvimento de um projeto que envolvia todas as áreas do conhecimento. Os autores
buscaram como referência Paulo Freire:
A busca de uma fundamentação teórica que satisfizesse os princípios que
norteavam a pesquisa conduziu-me a um método participativo, com
possibilidades de transformações da realidade embasadas no diálogo que,
segundo Freire (1979), é o único meio que garante a comunicação, e,
portanto, indispensável nas questões vitais para a nossa ordem política e em
todos os sentidos da nossa existência. As reflexões e idéias desse educador
serão várias vezes referenciadas, por tratarem da utilização de temas
geradores como facilitadores do trabalho interdisciplinar, da importância do
diálogo, da educação emancipadora, e como ferramenta de engajamento
político, da autonomia do docente e da pesquisa como prática cotidiana dos
educadores. (LUCATTO, TALAMONI, 2007, p. 391).

O projeto é interdisciplinar, por isso, montou-se um grupo com professores de


diferentes disciplinas, como Biologia, Química, Física, Matemática, Geografia, História,
Língua Portuguesa, Língua Inglesa e Artes, com o objetivo de fazer um levantamento de
dados na etapa diagnóstica sobre o tema, “a proposta visou colocar os educadores diante da
realidade da dimensão ambiental da microbacia, bem como lhes possibilitar a aquisição e/ou
ampliação de conhecimentos que lhes permitissem o planejamento de suas futuras pesquisas e
ações didáticas.” (LUCATTO, TALAMONI, 2007, p. 394). Os dados coletados
posteriormente foram aplicados em ações didáticas com alunos do 3ọ ano do Ensino Médio,
cada professor com propostas dentro de sua área. Por exemplo, o professor de Química levou
os alunos até a estação de tratamento de água do município e realizou a análise físico-química
da água, após já ter explanado os conceitos teórico em sala de aula, com uma linguagem mais
apropriada para os alunos; a professora de História fez um resgate histórico dos fatos
ocorridos no ribeirão; a professora da Geografia fez maquetes que mostravam os aspectos
ambientais e geográficos da Bacia do Ribeirão; a de Biologia fez entrevistas pela comunidade
ribeirinha rural e estudos sobre a legislação ambiental referente aos rios; o professor de
Matemática trabalhos com os cálculos de consumo de água, geração de esgoto, as
consequências do aumento populacional e do desperdício de água; a professora de Língua
Portuguesa propôs a produção de textos sobre o ribeirão; já a de Inglês, a tradução de textos
ligados ao tema; e a de Artes trabalhou em conjunto na busca de imagens.
21

Os resultados foram expostos a toda a comunidade por meio de um seminário, do


município de Dois Córregos, inclusive contando com a presença de autoridades locais. A
discussão com a comunidade foi bem produtiva levando até a que providências fossem
tomadas referentes à preservação do rio por parte das autoridades.
Ao final do trabalho, uma nova discussão foi proposta, envolvendo somente os
professores, para tratar do trabalho realizado, indicando-se seus pontos positivos e negativos,
e concluíram:
[...] a proposta de um tema gerador que representasse uma questão real,
contextualizada, presente na vida dos participantes do processo; a discussão e
tomada de decisões conjuntas; a ampliação dos conhecimentos relativos ao
objeto de investigação e a apresentação de um produto final, de cunho social
e político e do Ensino por pesquisa (pautada na busca de conhecimentos que
permitiram uma melhor compreensão dos fenômenos e facilitou a busca de
soluções para o problema ambiental abordado) permitiu que fosse realizado
um trabalho interdisciplinar [...] (LUCATTO, TALAMONI, 2007, p. 396).

Outro artigo também possui um enfoque ambiental voltado para as preocupações


atuais com o meio ambiente e preservação dos recursos naturais. Este trabalho foi publicado
na revista Educar em Revista, e tem como título: Temas Ambientais como temas geradores:
contribuições para uma metodologia educativa ambiental, crítica, transformadora e
emancipatória; possui um foco semelhante ao artigo anterior, pois também é voltado para o
lado ambiental baseando-se nos Temas Ambientais como Temas Geradores, inspirados na
pedagogia de Paulo Freire. Tozoni-Reis, a autora do artigo usa como base da sua pesquisa as
ideias freirianas, fazendo o uso do Tema Gerador como:
[...] o ponto de partida para o processo de construção da descoberta, e, por
emergir do saber popular, os temas geradores são extraídos da prática de vida
dos educandos, substituindo os conteúdos ensinados de forma tradicional e
buscados através da pesquisa do universo dos educandos. (TOZONI-REIS,
2006, p. 94).

Destaca-se a importância crescente na preocupação com o meio ambiente, a busca pela


sustentabilidade e uma educação voltada para a prática social, crítica e transformadora
formando cidadãos conscientes de seu papel, usando os temas ambientais locais, como Tema
Gerador como “a largada” na construção do saber.
A educação crítica e transformadora exige um tratamento mais vivo e
dinâmico dos conhecimentos, que não podem ser transmitidos de um pólo a
outro do processo, mas apropriados, construídos, de forma dinâmica,
coletiva, cooperativa, contínua, interdisciplinar, democrática e participativa,
pois somente assim pode contribuir para o processo de conscientização dos
sujeitos para uma prática social emancipatória, condição para a construção de
sociedades sustentáveis. (TOZONI-REIS, 2006, p. 97).
22

A autora ainda destaca que o referencial usado refere-se a uma educação ambiental
voltada para a sustentabilidade destacando a importância da educação ambiental e de sua
abordagem como uma disciplina escolar desenvolvida de forma problematizada por
intermédio de “temas geradores locais”:
Ao tomar os temas ambientais como temas geradores de processos educativos
ambientais duas preocupações devem estar presentes: os temas têm que ter
significado concreto para os envolvidos e devem ter conteúdo
problematizador. Isso significa dizer que os temas ambientais devem ser
ponto de partida para a discussão mais ampla da crise do modelo civilizatório
que estamos a enfrentar, crise que dá sentido à busca de uma sociedade
sustentável. (TOZONI-REIS, 2006, p. 108).

A autora detalha toda a metodologia do tema gerador de Paulo Freire, no entanto não
propõe nenhuma situação de aplicação para o tema por ela escolhido.
Os demais artigos são da revista Química Nova na Escola e tratam de forma
semelhante o tema, sempre dando um exemplo de aplicação. O artigo de Quadros trata A água
como um tema gerador do conhecimento químico, em uma visão mais rural. A autora inicia
sua discussão citando problemas no ensino de Química como a fragmentação dos conteúdos
dentro da própria disciplina: “O conhecimento químico tem sido trabalhado na forma de itens
fragmentados, e espera-se que os alunos possam, um dia, juntar todo esse conhecimento e,
com ele, entender o mundo material.” (QUADROS, 2004, p. 26). Diante desta dificuldade,
propôs-se uma forma de trabalhar a água como um eixo temático de forma a relacioná-lo com
os conhecimentos químicos envolvidos, a fim de tornar a química mais atraente,
contextualizada. A autora manifesta o desejo de despertar nos alunos o gosto de pelo estudo
da química, modificando a visão da química como nociva ao meio ambiente, mostrando que
na maioria das vezes os problemas são solucionados (QUADROS, 2004, p. 27).
O tema foi escolhido devido a presença da água no dia-a-dia, destacando que o planeta
e o organismos dos seres vivos são constituídos em grande parte de água. A autora levanta um
questionamento importante “será que o aluno considera que aquela água abordada na Química
tradicional é a mesma água que ele usa para beber?” (QUADROS, 2004, p. 27).
É feito um detalhamento de como foi realizado o seu trabalho inclusive com exemplos
de como os questionamentos e com a presença de um mapa conceitual do tema “água” foram
feitos permitindo assim que aos docentes que tenham o acesso a este artigo possam adaptar a
ideia e aplicá-la em suas salas de aula, inclusive. Foram propostas aulas em eixos em que
foram trabalhados diversos conteúdos como: solubilidade, ligações iônicas, elementos
químicos e substâncias, oxi-redução, lei da conservação das massas e das proporções
definidas, ciclo da água e diversos outros.
23

Eichler e Del Pino trazem em seu artigo Jornais e revistas on-line: busca por temas
geradores, uma proposta bem simples de se utilizar um tema gerador em sala de aula: o uso
da internet para uma “aprendizagem de ciências mediadas” pelo computador (EICHLER,
DEL PINO, 1999, p.1). O artigo destaca algumas ferramentas de busca na internet bem como
sites de jornais online e como realizar busca nestes sites, para que destes sejam retiradas as
reportagens que possam ser abordadas e relacionadas com algum conteúdo em sala de aula.
Trata muito bem da finalidade de se usar temas geradores e da necessidade de se trabalhar de
forma diferente da conteudista:
Propõe-se que as atividades devam estar voltadas à formação do cidadão,
vinculando os conteúdos às dimensões sócio-político-econômicas e aos
conhecimentos prévios dos alunos. Espera-se que o aluno interaja com os
conteúdos e coopere com os colegas na construção dos conceitos e métodos
científicos. Defende-se que o aluno parta de questões concretas para
estabelecer relações abstratas entre os conceitos e os conteúdos presentes nas
atividades de aprendizagem. (EICHLER, DEL PINO, 1999, p. 1).

Baseados nesta ideia, os autores destacam a importância dos temas geradores e


propõem o uso da influência da mídia, por conseguinte ferramentas online como recurso de
pesquisa na busca por temas geradores dos conteúdos e contextos das atividades de
aprendizagem desenvolvidas em sala de aula (EICHLER, DEL PINO, 1999, p. 3).
O último artigo analisado cujo título é As questões ambientais e a Química dos Sabões
de Detergentes que trata de tema gerador com enfoque ambiental baseando-se no uso de
sabões e detergentes e a degradação ambiental do Rio Cachoeira nos municípios de Itabuna e
Ilhéus (BA). Destaca o papel do ensino atual nas vertentes sociais, política, filosófica,
econômica e ambiental; além de retomar a necessidade de mudança na prática docente em
relação ao ensino conteudista e descontextualizado:
A abordagem do conteúdo químico, por meio de temas que permitam uma
abordagem mais problematizadora, interdisciplinar e contextualizada, é
proposta por diferentes correntes no Ensino de Ciências em oposição à
fragmentação e descontextualização do ensino disciplinar e conteudista.
(RIBEIRO, MAIA, WARTHA, 2010, p. 169).

A proposta defendida no artigo foi de trabalhar os conceitos químicos de forma a


relacioná-los com o tema ambiental, visando novas leituras e problematizações relacionadas
ao cotidiano dos alunos. Foi desenvolvido um projeto em sociedade entre a escola pública de
educação básica (Centro Integrado Oscar Marinho Falcão – CIOMF) e uma universidade
pública (Universidade Estadual de Santa Cruz – UESC), tendo como público alvo as turmas
do 3ọ ano do Ensino Médio.
24

O ponto de partida das atividades foi estudo sobre a influência dos sabões e
detergentes na degradação do Rio Cachoeira pertencente à comunidade:
O problema em questão, a degradação do Rio Cachoeira e o consumo e a
produção de sabões e detergentes, foi escolhido por permitir estabelecer as
relações entre os conceitos químicos e as questões ambientais e, desse modo,
conscientizar nossos estudantes da importância e do papel do rio em nossa
cidade, de como a química pode nos auxiliar e manter uma nova relação
como o meio ambiente e de que fazemos parte desse meio. (RIBEIRO,
MAIA, WARTHA, 2010, p. 171).

O projeto foi descrito em etapas, pois - na opinião dos autores - o tempo necessário
para a realização depende de cada turma e professor. Não houve apenas preocupação com o
conteúdo, mas também como os alunos iriam organizá-lo. Foram trabalhados conteúdos
como: cálculos estequiométricos, solubilidade, tensão superficial, pH, ácidos e bases,
neutralização entre outros. Por fim, concluiu-se que ao se trabalhar com o cotidiano dos
alunos a Química proporcionou uma nova visão de mundo e da vida em sociedade. Os alunos
passaram a ter prazer em estudar a Química e passaram a ter um olhar mais crítico para as
transformações que os cercam principalmente em relação ao Rio Cachoeira. A proposta
sofreu algumas críticas devido ao tempo de execução, pois durou mais de dois bimestres, mas
a capacidade de reflexão desenvolvida pelos discentes deixou os autores na certeza que
estavam avançando para o desenvolvimento de uma educação problematizadora e
contextualizada.

1. 2 A experimentação no Ensino de Química

Muito tem sido pesquisado a respeito da influência da experimentação no ensino de


Química. Compreende-se que a experimentação pode facilitar a aprendizagem, mas qual a
forma correta de utilizá-la? – é um questionamento frequente dos docentes. Jesus, em artigo
escrito em conjunto com outros autores, relata a experiência da aplicação da atividade
experimental, utilizando o tema gerador para a contextualização e facilitando a decodificação
do conhecimento. Ao fim do trabalho, puderam concluir que “experimentação
problematizadora possibilita a apropriação do conhecimento científico pelo aluno de forma
crítica e reflexiva, a partir da formação na coletividade, da interação e do confronto de
ideias.” (JESUS et al., 2011, p. 1).
25

Devido a dificuldades na execução dos experimentos, seja por falta de material,


laboratório ou tempo, alternativas têm sido propostas como, por exemplo: “as simulações, as
“representações de papéis”, as práticas de iniciação e a experimentação orientada pelos
princípios do educar pela pesquisa.” (GONÇALVES, 2005, p. 25). A simulação é uma
proposta em que o experimento é usado como organizador da realidade simulada, ou ainda
como “as simulações podem cumprir o papel de substituição nos casos em que os
experimentos em sala de aula são inviáveis por questões de segurança dos alunos e do
professor.” (GONÇALVES, 2005, p. 25). Destaca-se que estas novas alternativas podem ser
utilizadas em casos em que a escola não possui um laboratório ou condições físicas ou
econômicas que viabilizem a realização de experimentos.
O experimento deve ter o papel de estimulador do processo de ensino-aprendizagem, o
aluno deve ter essa atividade como uma descoberta da articulação entre a prática e teoria.
Conforme apontado por Schutz:
Tornar a aprendizagem dos conhecimentos científicos em sala de aula num
desafio prazeroso é conseguir que seja uma atividade gratificante para todos,
tanto para o professor quanto para o conjunto de alunos que compõe a turma.
É transforma-lá em um projeto coletivo, em que a aventura da busca do novo,
do desconhecido, de sua potencialidade, de seus riscos e limites seja a
oportunidade para o exercício e o aprendizado das relações sociais e dos
valores. (SCHUTZ, 2009, p. 10).

Estas atividades, se aplicadas da forma correta, permitem uma melhor relação


interpessoal aluno-aluno e aluno-professor, proporcionando um relacionamento melhor entre
a classe. Jesus et al. destacam que “experimentação problematizadora” facilita a “apropriação
reflexiva e crítica do aluno do conhecimento científico, requerendo as trocas, a formação na
coletividade, a interação e o confronto de ideias.” (JESUS et al., 2011, p. 7). Segundo
Giordan apud Schutz, a experimentação no ensino de Química possui certo fascínio por parte
dos alunos, tendo um caráter motivador; permitindo ainda ao professor maior efetividade nos
aspectos pedagógicos (GIORDAN, 1999 apud SCHUTZ, 2009, p. 11).

1. 3 O que é contextualização?

Para iniciar a discussão sobre contextualização, apresenta-se uma definição de tal


conceito proposta por Silva: “a contextualização se apresenta como um modo de ensinar
conceitos das ciências ligados à vivência dos alunos seja ela pensada como recurso
26

pedagógico ou como princípio norteador do processo de ensino.” (SILVA, 2007, p. 10). A


contextualização dos conteúdos tem sido muito discutida, inclusive pelos documentos oficiais
como os Parâmetros Curriculares Nacionais, conforme discutido por Silva apresentava uma
forma incorreta de se referir à contextualização, no entanto isso foi corrigido nos “PCN+
(BRASIL, 2002), uma espécie de desdobramento dos PCNEM que ampliou a discussão da
contextualização no ensino de Ciências.” (SILVA, 2007, p. 13). No que se diz respeito ao
ensino de Química:
[...] é proposto que a contextualização contribua para dar significação aos
conteúdos, facilitando assim, o estabelecimento de relações desses conteúdos
com outros campos do conhecimento. Para tal, o ensino deve enfatizar
situações problemáticas reais, de forma crítica, que possibilite ao aluno
desenvolver competências e habilidades específicas como analisar dados,
informações, argumentar, concluir, avaliar e tomar decisões a respeito da
situação. Os PCN+, na área de Química, enfatizam que as escolhas do que
deve ser ensinado aos alunos, obrigatoriamente, passam pela seleção de
conteúdos e temas relevantes que favoreçam a compreensão do mundo
natural, social, político e econômico. (SILVA, 2007, p. 13).

A presença da contextualização nos documentos curriculares propicia um argumento


legal e oficial para a aplicação desta prática que relaciona a educação como transformadora,
para que os discentes, sujeitos históricos, assumam seu papel de transformadores sociais
(COELHO; MARQUES, s. d., p. 3). Este fato é citado também por Silva e Marcondes:
No âmbito da disciplina Química, essas orientações se manifestam, por
exemplo, nas sugestões dos Parâmetros Curriculares Nacionais para Ensino
Médio – PCNEM – quando sugerem (BRASIL, 1999) a utilização das
vivências dos alunos e os fatos do dia-a-dia, da tradição cultural para
construir conhecimentos químicos que permitam refazer leituras do mundo.
Os PCN+ (BRASIL, 2002) enfatizam que conteúdos e temas devem
favorecer a compreensão do mundo natural, social, político e econômico.
(SILVA; MARCONDES, 2010, p. 102).

Vários autores discutem diversos entendimentos de contextualização, Silva faz um


apanhado de todos estes conceitos e, de forma mais simplificada, os resume em um só:
[...] esses diferentes entendimentos podem ser pensados em três grandes
grupos de orientações: a contextualização como exemplificação, informação
ou mesmo entendimento do cotidiano, como fatos, fenômenos etc. com a
finalidade de se ensinar exclusivamente conceitos de ciências; a
contextualização como entendimento crítico de questões científicas e
tecnológicas relevantes que afetam a sociedade; e a contextualização como
perspectiva de intervenção na sociedade. O que é abordado remete à questão
do cotidiano vivido diariamente, de cunho mais individual do que social, até
as questões sociais, mais globalizadas. (SILVA, 2007, p. 17).

O conceito de contextualização, em uma visão social, remete a proposta de educação


como prática de liberdade de Freire. Um ensino na perspectiva de modificação social por
27

meio dos saberes práticos, do senso comum, do saber popular (SILVA, 2007, p. 26). A
contextualização está ligada diretamente a Freire e seus temas geradores, segundo Coelho e
Marques, que apontam para “a necessidade de uma exploração intensa do contexto, isto é, das
‘situações significativas’.” (COELHO; MARQUES, s. d., p. 9). Coelho e Marques elaboram
uma pesquisa sobre as contribuições de Paulo Freire na contextualização e de acordo com as
evidências encontradas durante o trabalho, acreditaram “que existe a possibilidade de que, se
alguns caminhos metodológicos forem percorridos, poderá haver uma aproximação entre a
proposta da contextualização por meio dos temas químicos sociais e a da educação
transformadora proposta por Freire.” (COELHO; MARQUES, s. d., p. 9).
Freire propõe uma educação transformadora, por isso a relevância de uma Química
voltada para a cidadania:
[...] um ensino de Química voltado à cidadania, do qual se parte da
proposição de um tema social para a contextualização do conteúdo, poderia
se aproximar ainda mais da proposta de contextualização de Paulo Freire.
Mas isto se os professores estivessem aptos a desvelar situações significativas
da comunidade em que atuam, o que favoreceria o empreendimento de um
ensino de Química transformador de contradições sociais. (COELHO;
MARQUES, s. d., p. 14).

A contextualização sendo feita de forma correta constitui um forte recurso a favor de


uma educação transformadora, uma aprendizagem significativa, que desperte interesse dos
alunos pela Química.
28

2 SABÕES: ASPECTOS QUÍMCOS E AMBIENTAIS

As agressões ao meio ambiente têm tomado uma proporção preocupante e em


contraposição têm sido aumentadas as políticas de preservação, conforme apontado por
Jacobi:
Em um mundo marcado pela degradação constante do meio ambiente e de
seu ecossistema, cria uma necessidade de articulação com a educação
ambiental, onde o envolvimento de diversos sistemas de conhecimento tem
que ser colocado em pratica unindo a capacitação de profissionais, junto com
a comunidade universitária formando níveis de educação formal e não formal
voltado para a transformação social relacionando o homem, a natureza e o
universo, sabendo que os recursos naturais se esgotam e que o principal
responsável pela sua degradação é o ser humano (JACOBI, 2003 apud
BALDASSO; PARADELA, HUSSAR, 2010, p. 217).

Dentre as preocupações com o desenvolvimento de uma consciência ambiental, pode-


se mencionar o lixo como um grande problema das áreas urbanas. Em áreas onde há alta
concentração demográfica e a produção de dejetos é muito acentuada, uma alternativa para
reduzir os impactos causados pelo lixo é a reciclagem, que nada mais é que a transformação
de um material que não seria usado mais em um novo material, gerando insumos. Os dejetos
domésticos são altamente nocivos para o ambiente. Segundo Campos et al. esses dejetos,
tratados ou não, quando lançados em corpos d’água alteram completamente as características
do ambiente aquático (CAMPOS et al., 2009, p. 269).
No meio dos contaminantes provenientes do lixo está o óleo de cozinha que,
descartado de forma inadequada, acarretam diversos problemas ao meio ambiente, fato este
destacado por vários autores, dentre eles Alberici e Pontes:
Muitos estabelecimentos comerciais (restaurantes, bares, lanchonetes,
pastelarias, hotéis) e residências jogam o óleo comestível (de cozinha) usado
na rede de esgoto. O óleo mais leve que a água, fica na superfície, criando
uma barreira que dificulta a entrada de luz e a oxigenação da água,
comprometendo assim, a base da cadeia alimentar aquática, os fitoplânctons.
Além de gerar graves problemas de higiene e mau cheiro, a presença de óleos
e gorduras na rede de esgoto, causa o entupimento da mesma, bem como o
mau funcionamento das estações de tratamento. Para retirar o óleo e
desentupir são empregados produtos químicos altamente tóxicos, o que acaba
criando uma cadeia perniciosa. Além de causar danos irreparáveis ao meio
ambiente constitui uma prática ilegal punível por lei. (ALBERICI; PONTES,
2004, p. 74).

Uma informação que se deve salientar é que um litro de óleo comestível contamina
aproximadamente um milhão de litros de água, o suficiente para o consumo de uma pessoa
por um período de 14 anos. Em média, uma residência com quatro pessoas consome um litro
29

de óleo por semana e um restaurante uma média de 10 litros por dia (BIODIESELBR, 2008;
OPABRAZIL, 2008 apud BALDASSO; PARADELA, HUSSAR, 2010, p. 217-218).
Baseando-se nesta evidência de necessidade de reutilização, o presente trabalho tem a
proposta de produção de sabão como forma de reutilização do óleo de cozinha já usado,
desenvolvendo nos alunos uma visão ambiental sobre o descarte deste material de forma
inadequada.

0-2. 1 Origem do sabão

O processo de fabricação do sabão é um dos mais antigos. No entanto, não existem


fatos documentados sobre o prelúdio do sabão, cuja descoberta é considerada como um
fenômeno acidental. Os primeiros fatos documentados foram relatados pelo historiador Plínio,
o Velho (23-79 d.C.).
Segundo Reis, o sabão teria sido “descoberto” ainda na pré-história. Após chuvas
fortes, ocorreria o aparecimento de espuma em torno dos resíduos do fogo se havia assado
carnes, ou seja, existia gordura animal e cinzas. A água com espuma era armazenada e
utilizada posteriormente e observa-se que o recipiente e as mãos ficavam mais limpos quando
da presença deste material. Em escavações efetuadas na antiga Babilônia foram encontrados
os primeiros indícios de materiais semelhantes ao sabão. Os relatos apontam que este povo
fervia em água gordura animal e óleos vegetais com sais alcalinos, provavelmente cinzas.
Todavia não se mencionava o uso do sabão como utensílio de limpeza, o produto era usado
em ferimentos ou penteados (REIS, s.d., s.p.).
Reis ainda destaca que o indício mais plausível da produção de sabão encontra-se em
uma lenda romana. De acordo com a lenda, a origem do sabão se deu no Monte Sapo, lugar
onde se realizavam a imolação de animais em pilhas crematórias. Quando chovia, a água da
chuva conduzia uma mistura de sebo animal derretido com cinzas para as margens do Rio
Tibre, ponto onde se lavavam as roupas. Percebeu-se aos poucos que ao usar a mistura da
terra com a tal água fazia-se com que as roupas ficassem mais limpas. Julga-se que o termo
saponificação tenha surgido pelo nome deste monte. No início, o sabão não era usado na
limpeza corporal; apenas nos últimos séculos de dominância do Império Romano o sabão
passou a ser receitado por médicos como favorável para a pele. Só então o sabão foi
disseminado. Existem relatos que os povos celtas teriam desenvolvido uma substância feita de
30

cinzas e sebo que era usada para tingir os cabelos de vermelho, higiene pessoal e lavagem de
roupas antes dos romanos (REIS, s.d., s.p.).
Conforme descrito por Reis, após a queda do Império Romano, o sabão foi
disseminado. O sabão produzido na Idade Média era feito com óleo de oliva, o que lhe
conferia uma qualidade bem superior aos produzidos com gordura animal. Aos poucos o
sabão foi ganhando novos ingredientes como óleos essenciais e fragrâncias, além do
aparecimento de outros tipos, para o cabelo, barba, banho e roupa. O sabão desempenhou um
papel importante na história no que se diz respeito ao controle de doenças e higiene corporal
(REIS, s.d., s.p.).

0-2. 2 Conceitos químicos relacionados ao tema sabão

0.0.0. 2.2.1 O que são óleos e gorduras?

Os óleos e gorduras são compostos presentes na alimentação; a gordura deve compor


aproximadamente 20% da dieta humana variando de indivíduo para indivíduo. Apresentam
função estrutural na composição dos fosfolipídios constituintes da membrana celular,
possuem grande potencial energético, e ainda conferem sabor e aroma ao alimento
(MERÇON, 2010, p. 78). As gorduras constituem um grupo de compostos existentes na
natureza, são misturas de triacilgliceróis, ésteres formados pela reação entre um álcool e um
ácido. Os óleos e gorduras podem receber outros nomes como triacilgliceróis, glicerídeos ou
lipídeos. Segue abaixo a estrutura do triacilglicerol:

Figura 1: Estrutura do triacilglicerol


Fonte: LISBOA, 2010, p. 361.
31

O que vem a diferenciar os óleos e das gorduras? Lisboa detalha bem essas diferenças
destacando que a classificação se dá de acordo com os ácidos graxos contidos na composição
das gorduras naturais:
Gorduras ricas em cadeias saturadas de ácidos graxos tendem a se solidificar
em temperaturas mais baixas, devido ao seu arranjo espacial próximo ao
linear. A manteiga, o sebo de porco, a capa de gordura da picanha, a gordura
do coco e a manteiga de cacau são exemplos de alimentos com alto teor de
gordura saturada e sólidos a temperatura ambiente.
Gorduras ricas em cadeias de ácidos graxos insaturados e poli-insaturados
são líquidas a temperatura ambiente. Uma vez que a conformação cis
predomina na insaturação dos ácidos graxos naturais, a disposição espacial
dos respectivos triacilgliceróis dificulta a cristalização da mistura. As
gorduras líquidas são denominadas óleos, como os óleos vegetais de soja,
milho, oliva (azeite), girassol e os extraídos de peixes. (LISBOA, 2010, p.
361).

Muito tem sido discutido em torno das gorduras e uma vida mais saudável. É crescente
a preocupação do efeito dessas substâncias no corpo a curto e longo prazos. Nas embalagens
dos alimentos sempre há referência a esses compostos; sempre encontram-se frases como por
exemplo “livre de gordura trans”, “baixo teor de gorduras saturadas”, “ redução de 50% no
teor de gordura”. Que as gorduras são importantes para o metabolismo humano já se sabe.
Então, o que a diferencia na classificação dos lipídeos? Qual a diferença de gorduras
insaturadas, saturadas e trans?
Apesar das diferenças estruturais dos óleos, estes são formados predominantemente
por triacilgliceróis e outros componentes em menor proporção como é apontado por Reda:
“Além de triacilgliceróis, os óleos contêm vários componentes em menor proporção, como
mono e diglicerídeos (importantes como emulsionantes); ácidos graxos livres; tocoferol
(importante antioxidante); proteínas, esteróis e vitaminas.” (REDA; CARNEIRO, 2007, p.
61). Como apresentado anteriormente, estes compostos, os lipídeos, se formam pela reação de
ácidos carboxílicos com alcoóis formando ésteres por meio de uma reação de condensação
conhecida como esterificação ou ainda esterificação de Fisher.
A Figura 2 exibe, de forma geral, a “reação química de formação de um triacilglicerol:
um éster formado a partir do glicerol (álcool) e três moléculas de ácidos graxos (ácidos
carboxílicos de ocorrência natural) em um processo catalisado por enzimas (lipases) ou meio
ácido.” (MERÇON, 2010, p. 78). O que diferencia os gliceróis são as cadeias carbônicas a
serem incorporadas em sua estrutura, em sua grande maioria não contém ramificações e
podem ser saturados ou insaturados. Os lipídeos insaturados permitem a ocorrência de
estereoisômeros, as duas conformações cis e trans. Devido ao impedimento estérico, dois
grupos volumosos do mesmo lado, a conformação trans é mais favorecida em relação à cis,
32

sendo está última menos estável. No entanto Merçon faz uma observação importante que
“Apesar disso, devido à estereoespecificidade das enzimas, na natureza, os isômeros cis são
formados preferencialmente na biossíntese de lipídeos” (MERÇON, 2010, p. 78-79).

Figura 2: Reação de formação de um triacilglicerol


Fonte: TITO; CANTO, 2007, p. 701.

Existem fontes naturais de ácidos graxos trans, como alimentos provenientes de


ruminantes. Estes animais ingerem o isômero cis que passa por processos enzimáticos no
animal e acaba por se tornar trans (MERÇON, 2010, p. 79). No entanto, essa não é a única
possibilidade de formação dos ácidos graxos trans. Segundo Merçon eles também podem ser
formados por meio de isomerização de ácidos graxos cis por intermédio de dois processos
térmicos: a desodorização industrial, que tem como objetivo a remoção de componentes de
odor e sabor indesejáveis; e reaproveitamento de óleos de frituras (MERÇON, 2010, p. 79). O
consumo excessivo de ácidos graxos saturados, destacando-se o colesterol, apresenta efeitos
prejudiciais à saúde devido ao aumento de nível de colesterol no sangue; por isso devem ser
evitados (MERÇON, 2010, p. 80).

0.0.0. 2.2.2 O que é sabão?

Oliveira define o conceito de sabão como sendo “[...] sais de metais alcalinos obtidos a
partir de ácidos carboxílicos de cadeia longa.” (OLIVEIRA, 2005, p. 25). Como visto
anteriormente, a origem do nome sabão estaria na lenda romana do Monte Sapo, sendo a
reação de formação a reação de saponificação. A reação de saponificação é um tipo de
hidrólise em meio alcalino, onde um éster reage com base produzindo um álcool e um sal de
ácido, essa reação será mais discutida no próximo tópico (OLIVEIRA, 2005, p. 25).
33

O sabão é uma espécie química que possui uma cadeia carbônica extensa, parte
hidrofóbica1, e com um ou mais grupos hidrofílicos2. Abaixo a estrutura do dodecano de sódio
ou laurato de sódio, principal componente do sabão de coco:

Figura 3: Estrutura do dodecano de sódio


Fonte: TITO; CANTO, 2007, p. 701.

A parte apolar, grupo hidrofóbico, possui afinidade com a gordura e a parte polar,
parte hidrolífica, interage com a água, o que permite que o sabão remova a gordura das
superfícies. Segundo Oliveira a eficiência do sabão é medida por seu potencial de
emulsificação de gorduras, esse processo de dá quando os íons do sabão circundam a sujeira,
formando uma micela (OLIVEIRA, 2005, p. 26). A formação da micela será abordada no
tópico: Ação do sabão na limpeza (2.2.4).

0.0.0. 2.2.3 Saponificação: reação de produção de sabão

A hidrólise ácida de óleos e gorduras, ésteres, produzirá apenas glicerol e ácidos


graxos, mas quando submetidos à hidrólise básica produzirá o glicerol e os sais de ácidos
graxos, sais que são o sabão propriamente dito. A seguir tem-se um exemplo de reação de
saponificação:

1
Hidrofóbico: que não possui afinidade com a água, parte apolar (OLIVEIRA, 2005, p. 26).
2
Hidrofílico: que possui afinidade com a água, parte polar (OLIVEIRA, 2005, p. 26).
34

Figura 4: Reação de saponificação


Fonte: TITO; CANTO, 2007, p. 700.

Segundo Tito e Canto, “[...] aquecendo-se a gordura em presença de uma base,


realizamos uma reação química que produz sabão. Essa reação, a hidrólise básica de um
triéster de ácidos graxos e glicerol, é chamada de saponificação.” (TITO; CANTO, 2007, p.
700).
A base mais comumente usada para a produção de sabão é o hidróxido de sódio,
NaOH, por seu menor custo em relação ao hidróxido de potássio, KOH, que produz maiores
rendimento mas, no entanto, tem um maior custo. Alguns tipos de sabão exigem este tipo de
base, o KOH, como por exemplo, os cremes de barbear.

0.0.0. 2.2.4 Ação do sabão na limpeza

Conforme discutido anteriormente, o sabão possui a capacidade de interagir tanto com


substâncias polares quanto apolares e, graças a essa capacidade exerce a função de limpeza.
Esse caráter do sabão é chamado de caráter anfótero (CAMPOS et al., 2009, p. 270)
Segundo Tito e Canto, o sabão ao entrar em contato com óleo ou gordura irá interagir
com estas substâncias através de sua parte apolar (cadeia carbônica), assim envolvendo-as
formando-se a micela. Quando se adiciona a água, ela interage com a outra parte da molécula
do sabão, parte polar (carbonila), sendo a micela arrastada pela água (TITO; CANTO, 2007,
p. 701). Estes autores ainda citam os conceitos de emulsificação: “O processo de formação de
35

micelas é denominado emulsificação. [...] Dizemos que o sabão atua como emulsificante ou
emulsionante, ou seja, ele tem a propriedade de fazer com que o óleo se disperse na água na
forma de micelas.” (TITO; CANTO, 2007, p. 702). Esse processo é representado pela figura
abaixo:

Figura 5: Esquema do mecanismo da limpeza usando sabão


Fonte: TITO; CANTO, 2007, p. 702.

Zago Neto e Del Pino destacam um ponto importante da eficiência do sabão:


Sabões alcalinos são mais eficientes que os próximos da neutralidade. Seu
poder de limpeza é maior devido ao aumento de interações que realizam com
as sujidades. Por outro lado, a alcalinidade excessiva torna-o impróprio para a
utilização, devido a sua ação cáustica. O poder espumante de um sabão está
ligado diretamente ao efeito detergente, mas a espuma nem sempre é sinal de
poder de limpeza. Muitas vezes as indústrias de produção de sabões podem
adicionar espessantes ao produto final. Essas substâncias reduzem mais ainda
a tensão superficial produzida pelo sabão, aumentando, com isso, a produção
de espuma. O contrário também é verificado, certos sabões recebem uma
carga de aditivos que reduzem seu poder espumante (sabões em pó para
máquinas de lavar roupa, por exemplo). (ZAGO NETO; DEL PINO, s.d., p.
35).

Os detergentes atuam de forma semelhante aos sabões, no entanto sua estrutura se


diferencia um pouco. Segundo Tito e Canto:
Os sabões são sais de ácidos carboxílicos de cadeia longa, e detergentes
sintéticos, na grande maioria, são sais de ácidos sulfônicos de cadeia longa.
Atualmente existem muitos outros tipos de detergentes com estruturas
diferentes, mas que, invariavelmente, possuem uma longa cadeia apolar e
uma extremidade polar. (TITO; CANTO, 2007, p. 702).
36

Abaixo seguem alguns exemplos de estruturas de detergentes:

Figura 6: Exemplos de estruturas de detergentes


Fonte: TITO; CANTO, 2007, p. 702.

0.0.0. 2.2.5 Tensoatividade e o sabão

Antes de discutir a relação do sabão com a tensoatividade, deve-se saber o conceito de


tensão superficial. Segundo Zago Neto e Del Pino a tensão superficial é:
[...] uma propriedade dos líquidos que se relaciona intimamente com as
forças de atração e repulsão entre as moléculas. Quanto maiores as forças de
atração existentes entre as moléculas do líquido, maior será a tensão
superficial. Estas moléculas estarão mais atraídas umas pelas outras,
conferindo ao líquido uma maior viscosidade e uma menor tendência a
esparramar-se. (ZAGO NETO; DEL PINO, s.d., p. 34).

Em uma definição mais física conforme Zago Neto e Del Pino a tensão superficial
corresponde à energia, em forma de trabalho, necessária para a expansão da superfície do
líquido, ou seja, quanto mais aderentes as moléculas estiverem, maior o trabalho a ser
realizado para separá-las e consequentemente, maior a tensão superficial (ZAGO NETO; DEL
PINO, s.d., p. 34). A Figura 7 ajuda a entender melhor este efeito:
37

Figura 7: Tensão superficial dos líquidos


Fonte: ZAGO NETO; DEL PINO, s.d., p. 34.

Observando-se a Figura 7, pode-se constatar que o mercúrio é o líquido que possui


maior tensão superficial seguido da água e o álcool etílico. Tensão superficial está
diretamente ligada às possíveis ligações que os átomos de cada molécula podem realizar entre
si. O mercúrio é uma liga metálica e leva-se em consideração a coesão das moléculas no
retículo metálico; quanto à água e o álcool leva-se em consideração as ligações covalentes
intermoleculares (ZAGO NETO; DEL PINO, s.d., p. 34).
O sabão possui características polares e apolares por isso, ao entrarem em contato com
líquidos, tanto polares quanto apolares, interagem com as moléculas causando uma dissolução
nas interações intermoleculares e, consequentemente, reduzindo, assim, sua tensão superficial;
por esse motivo os sabões e detergente são considerados substâncias tensoativas (ZAGO
NETO; DEL PINO, s.d., p. 35).

0.0.0. 2.2.5 A biodegradabilidade do sabão

Segundo Zago Neto e Del Pino, o sabão feito de óleo reciclado é um produto
biodegradável, ou seja, é um composto que consegue ser decomposto pela natureza;
possibilidade esta que não isenta o sabão de ser poluente ao meio ambiente, mas possibilita a
sua decomposição por bactérias (normalmente as aeróbicas). O tempo de ação destas bactérias
irá variar de acordo com o número de ramificações da estrutura do sabão, em média o
processo ocorre em 24 horas. O sabão pode vir a ser um poluidor quando despejado junto com
as sujidades por ele removidas em corpos d’água sem o devido tratamento.
Esses microrganismos aeróbios se alimentam da mistura de sabão e de matéria
orgânica. Com o aumento da oferta desses compostos essas bactérias acabam por se
38

proliferar; com esse aumento da população bacteriana ocorre o aumento do consumo de


oxigênio. Este fato é apontado por Zago Neto e Del Pino:
Como grande parte desses organismos necessitam de oxigênio para
sobreviver, acabam reduzindo a quantidade do mesmo que está dissolvida em
água, e que, conseqüentemente, leva os microorganismos aeróbicos à morte.
A partir deste momento, a degradação é realizada, com maior intensidade,
por bactérias anaeróbicas que, ao invés de produzirem CO2 (dióxido de
carbono) e H2O (água) como produtos finais, formarão CH4 (metano), H2S
(ácido sulfídrico) e NH3 (amônia), que são mais tóxicos e prejudiciais ao
meio ambiente. (ZAGO NETO; DEL PINO, s.d., p. 42).

Por um equívoco, o sabão é visto como grande poluente de rios pela grande formação
de espuma. No entanto, como visto anteriormente, o sabão é biodegradável; então, o que vem
a provocar espuma nos corpos d’água? O vilão deste tipo de poluição é o detergente não-
biodegradável, também conhecido como sintético, tipo este que é proibido pela legislação
brasileira por ser um grande poluidor e não ser biodegradável. Segundo Zago Neto e Del Pino
a espuma, ao encobrir o rio, impede a entrada dos raios solares e a interação com o ar da
atmosfera acarretando a morte de peixes e plantas. O detergente não-biodegradável não se
decompõe porque suas moléculas não são metabolizadas pelos microrganismos degradadores
e permanecem na água; em caso de agitação do corpo d’água, gera espuma sobre a água.
(ZAGO NETO; DEL PINO, s.d., p. 42). O detergente poluidor não pode mais ser fabricado,
por esse motivo foram criados os detergentes biodegradáveis, desenvolvidos para substituir os
não-biodegradáveis já que estes estavam proibidos, segundo Zago Neto e Del Pino a cadeia
carbônica linear e sem ramificações semelhantes a dos sabões permite que este tipo de
detergente seja degradado pelos microrganismos possibilitando assim, que estes degradem a
molécula (ZAGO NETO; DEL PINO, s.d., p. 47-48).
.0.0.
39

3 APLICAÇÃO

Esta pesquisa objetiva o uso do tema sabão como gerador do conhecimento químico.
Após a realização de um levantamento bibliográfico do tema, elaborou-se um material
didático a ser utilizado na aula de aplicação. Após a elaboração deste material, foi passado um
questionário na turma na qual a temática seria aplicada como forma de conhecimento da
realidade, para inteirar-se dos conhecimentos prévios dos discentes sobre o assunto. A partir
de então, aplicou-se o guia didático em duas aulas, de 50 minutos cada. O público alvo foram
10 alunos de uma turma do 3ọ ano do Ensino Médio do Colégio Fidelense, na cidade de São
Fidélis, estado do Rio de Janeiro. Os passos da aplicação desta pesquisa serão descritos nos
próximos tópicos.

0 3.1 Elaboração do material didático

Devido aos diversos problemas no Ensino de Química que vem sendo discutidos ao
longo deste trabalho, elaborou-se um guia didático sobre o tema como forma de ruptura dos
laços da educação tradicional. A busca de novas possibilidades tem sido muito grande. O
ensino precisa estar vinculado com a realidade do educando, mas não só isso; deve
corresponder à realidade da escola; não adianta o docente buscar soluções que não podem ser
aplicadas em sua comunidade escolar. Muitas escolas não possuem laboratórios, por isso não
é coerente que se busque atividades experimentais que necessitem de aparelhagem sofisticada,
ou até mesmo, em escolas que não possuem recursos de multimídia, buscar-se projetos com
recursos on-line ou ainda que usem vídeos. O professor deve buscar soluções que estejam
inseridas no cotidiano dos alunos e dentro da realidade escolar. Esta visão é destacada por
Eicher e Del Pino:
Para que o ensino se torne realmente significativo, os conteúdos abordados
devem ser coerentes com a realidade da escola em que estão inseridos,
facilitadores do acesso à cultura e ao saber por parte dos alunos, ajudando-os
a interagir de modo participativo consciente das relações sociais. Isto também
é responsabilidade do professor, uma vez que não basta que os conteúdos
sejam apenas ensinados, ainda que bem ensinados; é preciso que se liguem,
de forma indissociável, à sua significação humana e social. (EICHER; DEL
PINO, s.d., s.p.).
40

O uso de livros didáticos é bem criticado pois nem sempre a contextualização proposta
pelo livro faz parte da vivência da comunidade em que está sendo aplicado. Por exemplo, um
mesmo livro didático pode estar sendo usado em uma comunidade indígena no Amazonas, em
uma comunidade rural do Sul ou em uma metrópole altamente industrializada. Será que essas
comunidades possuem a mesma realidade social e econômica? É certo que não. Essa
diferença pode ocorre até mesmo dentro de uma mesma cidade, pois cada escola possui um
tipo de clientela e uma realidade econômica diferente. Cabe ao professor observar estas
diferenças e adaptar o conteúdo à realidade de sua comunidade. Essa universalização dos
programas de Química é apontada e criticada por Eicher e Del Pino: “os programas de
química nas escolas são, usualmente, determinados pelos autores dos livros didáticos
tradicionais e estes se sucedem num copismo fantástico que decreta a quase universalidade
dos programas.” (EICHER; DEL PINO, s.d., s.p.).
Outro ponto destacado por Eicher e Del Pino é que o uso do livro didático acaba por
não permitir que o professor exercite sua criatividade, pois não participa das escolhas dos
temas abordados, sendo passivo frente à metodologia adotada (EICHER; DEL PINO, s.d.,
s.p.).
Campos et al. também propõem que o professor deve elaborar seu próprio material
didático e planejar suas atividades sem prender-se ao livro didático tradicional, com a escolha
de seus próprios temas e a forma vai abordá-los; assim o professor exerceria sua autonomia:
Para o bom desenvolvimento das aulas de química, o professor, no desenrolar
do currículo programático da disciplina, deve, não só se utilizar do material
didático convencional, mas ao planejar suas atividades, procurar ter como
alicerce, a discussão com o discente, baseado na premissa ‘o que, como e
para que ensinar química’.
[...] Assim, é fundamental que o educador produza um material didático-
prático, que este esteja em correspondência com seus alvos e percepções, seja
coeso com as necessidades dos seus alunos e pertinente com as diretrizes
educacionais. (CAMPOS et al., 2009, p. 276).

Essa ruptura implica em uma mudança de pensamento do educador que deixará de ser
um mero transmissor para vir a ser um investigador junto com os discentes.
Baseando-se em todas estas visões, elaborou-se um material didático que envolve um
tema como ponto de partida para o desenvolvimento dos conteúdos químicos referentes a ele
em uma visão ambiental. O material aborda alguns possíveis conteúdos relacionados ao tema,
voltados para o 3ọ ano do Ensino Médio.
41

0 3.2 Análise dos dados coletados

O questionário foi aplicado como uma forma de conhecer o que os alunos já sabiam
sobre o assunto e como eles veem a disciplina de Química. Os questionários são definidos por
Miranda como:
[...] uma técnica de investigação composta por um número grande ou
pequeno de questões apresentadas por escrito que tem por objetivo propiciar
determinado conhecimento ao pesquisador. É um processo rigoroso e dele
dependem a medição das variáveis da investigação. (MIRANDA, 2011, p. 7).

O questionário foi elaborado com perguntas fechadas e algumas alternativas com


possibilidade de respostas abertas. Nas perguntas iniciais o enfoque era a visão que os alunos
tinham sobre a Química e a forma que relacionam o conteúdo e seu cotidiano. As demais
perguntas já se relacionam com o tema que será abordado posteriormente, sobre o que eles
sabem sobre o assunto sabão e, principalmente, sua visão ambiental sobre o tema. O
questionário foi aplicado a uma turma de 3ọ ano do Colégio Fidelense, na cidade de São
Fidélis, a turma possui 10 alunos. Este foi aplicado antes da aula para se obter informações
sobre o que os alunos pensam sobre o assunto. O questionário encontra-se no Apêndice 1
deste trabalho.
O primeiro questionamento tem relação com o que os alunos pensam sobre se a
Química, se ela é considerada uma matéria interessante. A resposta foi unânime: todos
consideram a Química uma matéria interessante. Uma pergunta semelhante foi feita por
Oliveira em questionário investigativo, sua dissertação de mestrado, e foi constatado que boa
parte dos alunos responderam que consideram a Química uma matéria interessante, mas no
entanto conforme relatado pela autora boa parcela estes alunos, cerca de 55,20%, não se
encontravam motivados pelo estudo da Química por não considerarem a matéria relacionada
com o seu dia-a-dia, contudo 44,80% dos alunos que responderam ao questionário
consideraram a matéria importante pela sua relação com os acontecimentos diários
(OLIVEIRA, 2005, p. 50-51)
Conforme relatado na pergunta anterior, a Química é considerada distante dos fatos
diário e abstrata, por isso buscou-se investigar se os alunos entrevistados nesta pesquisa
concordam com este ponto de vista. Um fato interessante foi obsevado boa parte da turma não
considera a Química uma matéria abstrata; no entanto, 1 aluno considera a Química uma
disciplina abstrata (Gráfico 1). Esta turma possui um pensamento um pouco contraditório com
o que se tem sido pesquisado, por grande parte das pesquisas desenvolvidas na área de Ensino
42

de Química aponta essa dificuldade a abstração como um grande problema na aprendizagem


química. Quadros relata que tornar a Química uma matéria que os alunos tenham prazer em
aprender não é uma tarefa muito fácil (QUADROS, 2004, p. 26). Este resultado pode indicar
que o conhecimento químico vem sendo trabalhado de forma correta pois maior porcentagem
dos alunos não considera a matéria abstrata. Este resultado propõe uma reflexão, será que
estes alunos compreenderam a pergunta já que o resultado se mostra tão contraditório.

Muitas pessoas consideram a química uma


matéria difícil por ser muito abstrata. Você
concorda com essa afirmação?

Sim

9 Não

Gráfico 1: A Química é uma matéria abstrata?

O terceiro questionamento realizado foi se no cotidiano dos alunos estes conseguiam


observar a Química nos fenômenos à sua volta. Esse questionamento tem como objetivo
observar como a disciplina vem sendo usada pelos alunos. Será que estes vêm fazendo o link
entre o conteúdo e sua vida, já que um dos maiores problemas do ensino de Química é a falta
de contextualização como apontado por diversos autores já citados nesta pesquisa; como por
exemplo Freire(1987), Quadros(2011), Eicher e Del Pino(1999), Libâneo(2007)e Campos et
al.(2009). As respostas em média foram relativamente satisfatórias, pois nenhum aluno
relatou não conseguir fazer essa conexão e apenas 1 aluno raramente conseguem, 7 consegue
fazer este link frequentemente e 2 não apresentam dificuldade de observar a Química no
cotidiano. Oliveira novamente faz uma pergunta semelhante a esta e observa que apenas
31,04% dos alunos entrevistados conseguem relacionar a Química com o seu cotidiano
(OLIVEIRA, 2005, p. 51). Mesmo que esta turma tenha demonstrado boa percepção da
Química no dia-a-dia, ainda se observa a necessidade de inserção do conteúdo na vida do
educando a fim de superar essa barreira (Gráfico 2).
43

Você consegue relacionar as situações do


seu dia-a-dia com a Química estudada na
escola?

0
2 1 nunca
raramente

7 frequentemente
sempre

Gráfico 2: Frequência com que os alunos relacionam a


Química com o dia-a-dia

As perguntas a seguir têm relação com o óleo de cozinha e o meio ambiente e a visão
dos alunos sobre esse assunto. A primeira investiga o quanto o óleo de frituras está presente
no dia-a-dia destes alunos e de suas famílias. Constatou-se que o óleo está fortemente presente
no cotidiano destes alunos; 9 deles usam em suas casas o óleo de cozinha no mínimo duas
vezes por semana. Destes, 5 alunos usam o óleo para frituras todos os dias em sua residência,
fato preocupante devido aos efeitos prejudiciais das gorduras no organismo humano. Schutz
destaca ainda que o óleo reutilizado novamente para frituras pode ser cancerígeno: “[...] o
produto da degradação do óleo de cozinha é a acroleína, que é carcinogênica. Por esta razão
não podemos reutilizar o óleo de cozinha várias vezes.” (SCHUTZ, 2009, p. 17). E os outros
4 usam de três a duas vezes por semana, um consumo relativamente alto, e apenas 1aluno
utilizam o óleo de cozinha uma vez por semana (Gráfico 3).

Com que frequência é utilizado óleo de cozinha


para frituras em sua residência?
0 0

1 todos os dias

5 2 a 3 vezes por semana


4
1 vez por semana

raramente

não é usado

Gráfico 3: Frequência de utilizado óleo de cozinha para frituras

Perguntou-se qual o destino dado ao óleo usado, essa pergunta busca investigar a
consciência ambiental destes alunos. As respostas não foram muito satisfatórias, pois 4 alunos
não sabem qual o destino dado ao óleo usado em suas casas. Um dado preocupante é que 2
alunos descartam o óleo usado na rede de esgoto, contaminando os corpos d’água. Sendo que
44

apenas 2 alunos recolhe para a coleta seletiva. Ainda há uma parte que o destina para a
fabricação de sabão, 1 aluno, o que indica que alguns alunos já tem conhecimento do
conteúdo que será abordado (Gráfico 4). Schutz em um trabalho com um enfoque semelhante
a este também perguntou aos alunos o destino dado ao óleo de cozinha em sua residência, 23
alunos armazenam o óleo em garrafas ou potes, desta porcentagem 22 jogam no lixo depois e
apenas 1 destina para a reciclagem; e 13 descartam na rede de esgoto (SCHUTZ, 2009, p. 18).
Se for feita uma comparação os alunos desta pesquisa não apresentam uma satisfatória
consciência ambiental.

Qual o destino dado ao óleo usado em sua


residência?

descarte na pia ou vaso


1 2 sanitário
recolhido para coleta
2 seletiva
4
não tenho essa
informação
outro(doado para
vizinha fabricar sabão)

Gráfico 4: Destino dado ao óleo usado

Uma parte dos alunos na pergunta anterior afirmou que o óleo era destinado a coleta
seletiva, mas será que existe coleta seletiva na cidade em questão, São Fidélis? A Prefeitura
Municipal de São Fidélis, na pessoa do secretário de Meio Ambiente o Sr Leandro, informou
que existe um projeto em andamento que visa reutilizar o óleo comestível usado para a
produção de biodiesel, o projeto ainda não foi colocado em prática devido a em janeiro nova
equipe ter assumido a secretaria e por isso ainda não conseguiram colocar o projeto em
prática. Existem apenas nos bairros pessoas que por iniciativa própria recolhem o óleo usado
para a produção de sabão caseiro. Nesta pergunta 9 alunos tem consciência que não existe
coleta de óleo, e apenas 1 doa para um vizinho reciclar (Gráfico 5).
45

Você conhece algum posto de coleta de óleo


usado em sua cidade?
0
1
não

sim, um vizinho recolhe


9 e recicla
sim, existe um posto de
coleta

Gráfico 6: Existência de posto de coleta de óleo usado

Nesta pergunta, procurou-se averiguar se os discentes sabiam de alguma possibilidade


de reaproveitamento do óleo de cozinha, e qual seria uma possível alternativa. Quanto às
alternativas de reaproveitamento do óleo foi unânime a produção de sabão. Todos
responderam conhecer uma possibilidade para o reaproveitamento do óleo usado, metade dos
alunos, apontara a produção de sabão como solução. E a outra parte não conhece nenhuma
alternativa para reutilizar o óleo usado (Gráfico 6).

Você já ouviu falar ou sabe de alguma


informação sobre o reaproveitamento do óleo de
cozinha?

não
5 5
sim, fabricação de sabão

Gráfico 6: Possível reutilização do óleo de cozinha

Um pergunta bem simples foi feita: se a água e o óleo de cozinha se misturam. Todos
responderam que não se misturam o que mostra que possuem o conhecimento de polaridade
das moléculas.
Agora os alunos são questionados sobre a relação do óleo com o meio ambiente. A
primeira pergunta foi se estes sabiam se o óleo causa algum impacto sobre o meio ambiente, e
todos afirmaram que sim. Para os que responderam sim, perguntou-se ainda qual seria este
impacto. A poluição das águas foi o impacto citado por 7 alunos. Os dois outros impactos
também se encaixam na poluição as águas, mas foram colocados separados para que se
pudesse analisar melhor a amplitude da visão dos alunos sobre o assunto (Gráfico 7).
46

Possíveis influências do despejo inadequando do


óleo de cozinha.

1
2
poluição das águas
7 não missível na água

mortandade de peixes

Gráfico 7: Influência do óleo de cozinha no meio ambiente

A última pergunta questionava se a cidade onde eles moram possui rede de tratamento
de esgoto, 5 alunos disseram que São Fidélis não tem tratamento de esgoto; 4 disseram que o
município possui e 1 não soube responder. Metade da turma (Gráfico 8) tem consciência que
sua cidade não tem tratamento de esgoto, portanto sabem que os dejetos serão descartados no
rio sem nenhum tipo de tratamento, rio este, o Rio Paraíba do Sul, que é responsável pelo
abastecimento de água da cidade e mesmo com estas informações descartam o óleo na pia,
contaminando o rio. Alguns alunos se mostram mal informados, pois São Fidelis não possui
nenhum tipo de tratamento para o esgoto produzido tanto na cidade quanto no interior.

Sua cidade possui tratamento da rede de esgoto?

1
4 não tenho essa
informação
não
5

sim

Gráfico 8: Sua cidade possui tratamento da rede de esgoto?

A partir dos dados coletados, pode-se ter uma ideia dos conhecimentos prévios dos
alunos, frente à temática que seria desenvolvida. Concluiu-se quais assuntos deveriam ser
frisados, pois muitos apontaram que o óleo não se mistura à água e é potencialmente poluente
da mesma, mas, no entanto, boa parte dos alunos descarta este mesmo óleo na rede de esgoto
o que vem a contaminar o corpo d’água que abastece a cidade. Outro aspecto seria que o
sabão poderia não ser uma novidade para todos, já que muito disseram que sua fabricação
pode ser uma solução plausível para o reaproveitamento do óleo comestível usado.
47

0 3.3 A aula

O desenvolvimento deste projeto foi pautado no guia didático elaborado pela autora da
presente pesquisa. A primeira etapa da aula foi a aplicação de um vídeo educativo cujo titulo é
Momento Ambiental: reaproveitamento do óleo de cozinha, relatando uma visão ambiental
sobre o óleo de cozinha, destacando, inclusive, um papel social para reciclagem deste óleo
como fonte de renda para muitas comunidades. Este vídeo teve a finalidade de provocar nos
alunos uma reflexão sobre a influência dos dejetos, principalmente o óleo de cozinha,
descartados de forma inadequada no meio ambiente. Durante a discussão inicial, após o vídeo,
pode-se constatar que muitos consideravam um ato banal o descarte do óleo de cozinha na pia
ou no vaso sanitário; alguns não consideram o óleo de cozinha uma grande ameaça aos corpos
d’água por ser um alimento, e se espantaram em saber que a poluição deste tipo de óleo em
um ano, por exemplo, na Baia de Guanabara é maior do que a do último grande desastre de
derramamento de óleo de petróleo. O vídeo ainda ajudou a levantar outras questões em
relação ao lixo produzido e o impacto deste lixo em longo prazo no meio ambiente. Como o
vídeo mostra a produção do sabão caseiro os alunos ficaram curiosos pelos processos
químicos envolvidos, como ocorre essa reação; para que adicionar cada ingrediente e qual a
influência de cada um no processo final.
Após esta discussão inicial, começou-se a trabalhar com o guia didático. Não usou-se
slides para a aula, o próprio guia didático foi projetado para que os alunos acompanhassem. A
primeira parte do guia trata da parte ambiental e os alunos já estavam bem informados sobre o
assunto após o vídeo e continuou-se a discussão sobre a responsabilidade ambiental de cada
um como um cidadão participante da vida em comunidade. Como esta pesquisa se baseia nas
ideias de Paulo Freire, buscou-se um debate voltado para uma vertente social, instigando que
os próprios alunos formassem sua consciência ambiental. Essa parte foi extremamente
proveitosa, pois a turma se mostrou bem proativa, observando o que poderia vir a ser feito em
sua comunidade, soluções plausíveis dentro do contexto de vida de sua cidade.
O momento no qual se trabalhou a origem do sabão foi de descontração na turma, pois
consideraram engraçada a lenda do Monte Sapo, e o fato das pessoas não usarem o sabão para
a limpeza do corpo na Idade Média. Finalmente ao chegar-se à parte Química do sabão, os
alunos se mostraram muito interessados e sempre motivados a responder aos questionamentos
propostos ao longo do guia, o indicava que aprendizagem estava sendo prazerosa. Novamente,
um espaço de debate foi iniciado sobre a influência da gordura trans no organismo, já que
50% dos alunos responderam que, em sua residência, usa-se óleo para frituras todos os dias.
48

Entender quimicamente o processo de formação do sabão foi uma experiência


proveitosa, pois uma reação química ensinada de forma tradicional não seria tão incorporada
quanto uma reação ministrada com contextualização, se pode entender o porquê de formação
dos produtos e suas utilidades.
Contudo, a parte mais aguardada pelos alunos é a parte experimental, já que a escola
não possui um laboratório de ciências e experiências são pouco executadas. Em relação ao
experimento cumprido pela autora, pois a reação é extremamente exotérmica e perigosa,
mesmo sendo quase demonstrativo, houve uma grande receptividade por parte dos alunos.
Alguns aspectos que nem estavam previstos puderam ser trabalhados, como por exemplo o
caratê higroscópico do hidróxido de sódio, eles se mostraram surpresos e ainda questionaram
se seria este material o usado nos armários para combater o mofo, a discussão foi proveitosa,
pois pode-se discutir que não apenas o hidróxido de sódio possui esse caráter mas outras
substâncias como o cloreto de cálcio, que é o produto usado para retirar a unidade de
ambientes fechados, e a sílica gel. Eles puderam distribuir a massa de sabão pelos potes e
levar o sabão feito para suas casas.
Depois de realizada toda a parte experimental os alunos, em conversa informal, se
mostraram muito interessados em desenvolver um projeto de reciclagem de óleo pela escola.
Este fato confirma a eficiência deste método de ensino, pois os alunos construíram seu próprio
conhecimento, além disso, desenvolveram uma consciência de cidadãos influentes e
reflexivos em sua comunidade.
49

0 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na gênese desse trabalho de conclusão da graduação, aspirou-se contribuir para a


melhoria do Ensino de Química a favor de um ensino que seja contextualizado, que se
preocupe com as questões ambientais e sociais. Observa-se que a ruptura com o ensino
tradicional é um grande desafio para os docentes: sair da posição de um mero transmissor do
conhecimento em que não existem questionamentos e o ensino é passivo para uma nova
vertente de trabalho na qual participa ativamente com os alunos da formulação do
conhecimento, esta aberto a questionamentos e aprende junto. O professor deve estar atento a
essas novas mudanças para que se tenha um ensino diferente pautado na necessidade de
formação de indivíduos para uma sociedade diferente. A elaboração do próprio material
didático já vem como grande ferramenta para a desvinculação, pois o professor irá elaborar
um material que se encontre dentro do contexto do aluno, fará as questões voltadas para o que
o aluno vivência no seu dia-a-dia. Não pode-se deixar de mencionar o tempo a ser gasto pelo
professor na elaboração do seu material didático, grande é o desafio pelo tempo dedicado e
todo o trabalho sem contar que a elaboração de um material que tenha elementos gráficos,
figuras textos em posições diferentes exige do docente um certo domínio mínimo da
informática. Pode-se concluir que este método que utiliza o tema gerador como instrumento
de contextualização do conteúdo pode ser uma alternativa para o enfrentamento de problemas
pela educação em Química na contemporaneidade de 2013. Introduzir a vida do educando
para o ensino propicia a ele perceber uma aplicação para o conteúdo científico.
Contudo deve-se questionar se os docentes estão preparados para o uso desta metodologia,
certo que não. A falta de formação e formação continuada prejudica o uso de novas
estratégias de ensino, elas existem sabe-se que funcionam, mas ainda pouco se sabe qual a
forma correta de serem aplicadas.
Ensinar por meio do uso da contextualização faz com que o aluno entenda o seu
cotidiano e assimile os conceitos, sem ainda deixar de destacar o aspecto social e ambiental.
Por meio das observações feitas durante a aula e o questionário, pode-se concluir que os
alunos se mostraram interessados pela disciplina de Química, pois aprenderam de forma mais
significativa conseguindo relacionar o conteúdo trabalhado com o seu dia-a-dia. Uma simples
e correta contextualização permite ao aluno perceber que o conteúdo não se encontra distante,
mas próximo e aplicável.
50

A experimentação também auxiliou no processo de aprendizagem, os alunos


mostraram-se mais motivados e conseguiram relacionar o conteúdo teórico com o
experimento prático fazendo com que a aprendizagem fosse significativa. O uso da
experimentação pode ser visto não apenas como uma forma de contextualização, mas como
uma ferramenta eficaz na socialização da turma, na melhoria da relação professor-aluno e
aluno-aluno, além do caráter motivador.
Os desafios para que se tenha uma educação de qualidade são inúmeros, necessidades
de novas metodologias, formação para usa-las, falta de tempo para pesquisa e elaboração de
aulas articuladas entre outros. O que se deve ter em mente é que não é um método que salvará
o ensino, mas o olhar de cada docente que utiliza a estratégia, o mais importante é olhar para
quem se educa.
51

REFERÊNCIAS

ALBERICI, Rosana Maria; PONTES, Flávia Fernanda Ferraz. Reciclagem do óleo


comestível usado através da fabricação de sabão. Engenharia Ambiental: pesquisa e
tecnologia, Espírito Santo do Pinhal. v.1, n.1, p. 73-76, jan./dez., 2004. Disponível em:
https://ferramentas.unipinhal.edu.br. Acesso em: 2 fev. 2013.

ARAÚJO, Paulo César Ramos. O resíduo da água como tema gerador para o
desenvolvimento do processo de ensino aprendizagem de química. 2008. 161f. Dissertação
(Mestrado em Ensino de Ciências) - Instituto de Física, Química e Biologia, Universidade de
Brasília. Disponível em: http://hdl.handle.net/10482/1879. Acesso em: 28 jan. 2013.

BALDASSO, Erica; PARADELA, André Luis; HUSSAR, Gilberto José. Reaproveitamento


do óleo de fritura na fabricação de sabão. Engenharia Ambiental: pesquisa e tecnologia,
Espírito Santo do Pinhal. v. 7, n. 1, p. 216-228, jan./mar. 2010. Disponível em:
https://ferramentas.unipinhal.edu.br. Acesso em: 2 fev. 2013.

BRASIL. Ministério da Educação. Orientações curriculares para o ensino médio: Ciências


da Natureza, Matemática e suas tecnologias, v. 2. Brasília. 2006. p. 101-140. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/book_volume_02_internet.pdf. Acesso em 21 jan.
2012.

CAMPOS, Débora Barni de et al. Investigando a aprendizagem da química orgânica por meio
de uma postura docente empreendedora: processo de reciclagem de óleo vegetal e a obtenção
de sabões em um estudo exploratório. In: I SIMPÓSIO NACIONAL DE ENSINO DE
CIÊNCIA E TECNOLOGIA, 2009. Anais ... Universidade Tecnológica Federal do Paraná,
Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciência e Tecnologia, 2009. p. 266-278.
Disponível em: http://www.utfpr.edu.br/estrutura-universitaria/diretorias-de-gestao/dircom/
editora-universitaria-1/catalogo-1 . Acesso em: 2 fev. 2013.

COELHO, Juliana Cardoso; MARQUES, Carlos Alberto. Contribuições freireanas para a


contextualização no ensino de Química. Ensaio Pesquisa em Educação em Ciências, v. 9, n.
1, p. 1-17. 2007. Universidade Federal de Minas Gerais. Disponível em: http://redalyc.
uaemex.mx/src/inicio/ArtPdfRed.jsp?iCve=129516644005. Acesso em: 9 ago. 2012.

CORAZZA, Sandra Mara. Tema Gerador: concepções e práticas. 3 ed. Ijuí, RS: Unijuí, 2003.

EICHLER, Marcelo; DEL PINO, José Claudio. Jornais e revistas on-line: busca por temas
geradores. Química Nova na Escola, n. 9, p. 6-8, maio. 1999. Disponível em:
http://qnesc.sbq.org.br/online/qnesc09/eqm.pdf. Acesso em: 17 dez. 2011.
52

EICHER, Marcelo; DEL PINO, José Claudio. Interquímica: formação de professores e


produção de material didático. Área de Educação Química, Instituto de Química,
Universidade Federal do Rio Grande do Sul.[S.l.]: [s.n.], [s.d.]. Disponível
em:http://www.google.com.br/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=2&ved=0CDFJ
AB&url=http%3A%2F%2Fwww.iq.ufrgs.br%2Faeq%2Fproducao%2Fdelpino%2Fresumos%
2FRedePOP.pdf&ei=-KZYUaKPOIeZ0QHgkIDIAg&usg=AFQjCNHCj4-FTX-
3TNid1KLi7BFO-hVp4Q&bvm=bv.44442042,d.dmQ. Acesso em: 2 fev. 2013

FERREIRA, Luiz Henrique; HARTWING, Dácio Rodney; OLIVEIRA, Ricardo Castro.


Ensino Experimental de Química: Uma Abordagem Investigativa Contextualizada. Química
Nova na Escola, v. 32, n. 2, p. 101-106, maio 2010. Disponível em:
http://qnesc.sbq.org.br/online/qnesc32_2/08-PE-5207.pdf. Acesso em: 28 jan. 2013.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 34. ed.
São Paulo: Paz e Terra, 1996.

______. Pedagogia do oprimido. 17. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.

FREITAS, Ana Lúcia de. Educação Libertadora: desafios à conscientização. In: ______
Pedagogia da conscientização: um legado de Paulo Freire à formação de professores. 3. ed.
Porto Alegre, RS: Edipucrs, 2004. p. 71-125.

GONÇALVES, Fábio Peres. Experimentação: uma discussão pedagógica e epistemológica.


In: O texto de experimentação na educação em Química: discursos pedagógicos e
epistemológicos. 2005. 168f. Dissertação (Mestrado em Educação Científica e Tecnológica) -
Centro de Ciências Físicas e Matemáticas; Centro de Ciências da Educação; Centro de
Ciências Biológicas, Universidade Federal de Santa Catarina. 2005. Disponível em:
http://www.joinville.udesc.br/portal/professores/maria/materiais/DissertExperimenta__EnsQu
im.pdf. Acesso em: 28 jan. 2013.

GUIMARÃES, Orliney Maciel. O Papel Pedagógico da Experimentação no Ensino de


Química. Núcleo de Educação em Química do Departamento de Química da Universidade
Federal do Paraná. Disponível em: http://www.eduquim.ufpr.br/matdid/novomat/pdf/
Capitulo2.pdf. Acesso em: 28 jan. 2013.

JESUS, Edislei Maria de et al. A experimentação problematizadora na perspectiva do aluno:


um relato sobre o método. Ciência em Tela, v. 4, n. 1, p. 1-8. 2011. Disponível em:
http://www.cienciaemtela.nutes.ufrj.br/artigos/0111_guimaraes.pdf. Acesso em: 9 ago. 2012.

LIBÂNEO, José Carlos. Profissão ou Adeus professor, Adeus Professora? — exigências


educacionais contemporâneas e novas atitudes docentes. In: ______. Adeus professor, adeus
professora: novas exigências educacionais e a profissão docente. 10. ed. São Paulo: Cortez,
2007. p. 13-51.
53

LISBOA, Julio César Lisboa (Org.). Química: ser protagonista. V. 3. São Paulo: Edições SM,
2010. 464p.

LUCATTO, L. G.; TALAMONI, J. L. B. A Construção coletiva interdisciplinar em Educação


Ambiental no Ensino Médio: A Microbacia Hidrográfica do Ribeirão dos Peixes como Tema
Gerador. Ciência & Educação, v. 13, n. 3, p. 389-398, set/dez. 2007. Disponível em:
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-73132007000300008. Acesso
em: 4 fev. 2012.

MERÇON, Fábio. O que são gorduras trans?. Química Nova na Escola. v. 32, n. 2 , p.78-83,
maio 2010. Disponível em: http://qnesc.sbq.org.br/online/qnesc32_2/04-CCD-9509.pdf.
Acesso em: 15 fev. 2013.

MIRANDA, Fernando. Investigação por questionário: Teoria e Prática, Síntese das Aulas.
2011. 16f. Trabalho de Metodologias de Investigação, Mestrado Educação – Instituto de
Educação, Universidade de Lisboa. Disponível em: http://www.google.com.br/url
?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=1&ved=0CDQQFjAA&url=http%3A%2F%2Fmr
as.ptservidor.com%2Fmestrado%2FS%25C3%25ADntese%2520das%2520aulas%2520%252
0Total_Fernando_Miranda.pdf&ei=gk9XUaeSB6vG0gHowoGICw&usg=AFQjCNG7FpNU
XwlagjICUOQsILEhdXnBAw

NASCIMENTO, Tatiana Galieta; LINSIGEN, Irlan von. Articulações entre o enfoque CTS e
a pedagogia de Paulo Freire como base para o ensino de ciências. Convergência Revista de
Ciências Sociales, v. 13, n. 42, p. 95-116, set/dez. 2006 Disponível em:
http://redalyc.uaemex.mx/pdf/105/10504206.pdf. Acesso em: 17 dez. 2011.

OLIVEIRA, Ana Maria Cardoso de. A química no ensino médio e a contextualização:


fabricação do sabão como tema gerador de ensino aprendizagem. 2005. 119f. Dissertação
(Mestrado em Ensino de Ciências Naturais e Matemática) - Universidade Federal do Rio
Grande do Norte. Disponível em: http://bdtd.bczm.ufrn.br/tedesimplificado/tde_arquivos/36/
TDE-2007-12-20T003616Z-1006/Publico/AnaMariaCO.pdf. Acesso em: 12 dez. 2012.

QUADROS, Ana Luiza de. A água como tema gerador do conhecimento químico. Química
Nova na Escola, n. 20, p. 26-31, nov. 2004. Disponível em: http://qnesc.sbq.org.br. Acesso
em: 17 dez. 2011.

REDA, Seme Youssef; CARNEIRO, Paulo I. Óleos e gorduras: aplicações e implicações.


Revista Analytica, n. 27, p. 60- 67, fev/mar. 2007. Disponível em: http://www.revista
analytica.com.br/ed_anteriores/27/art07.pdf. Acesso em: 16 fev. 2013.
54

REIS, Maria Carlos. A história do sabão. [S.l.]: [s.n.], [s.d.] Disponível em:
http://naturlink.sapo.pt/Natureza-e-Ambiente/Interessante/content/A-historia-do-sabao?bl=1&
viewall=true#Go_1. Acesso em: 2 fev. 2013.

SILVA, Erivanildo Lopes da. Contextualização no Ensino de Química: idéias e proposições


de um grupo de professores. 2007. 144f. Dissertação (Mestrado em Ensino de Ciências) -
Instituto de Física, Instituto de Química, Instituto de Biociências e a Faculdade de Educação,
Universidade de São Paulo. Disponível em: http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/
arquivos/File/marco2012/quimica_artigos/conex_ens_quim_dissert.pdf. Acesso em: 12 dez.
2012.

SILVA, Erivanildo Lopes da; MARCONDES, Maria Eunice Ribeiro. Visões de


contextualização de professores de química na elaboração de seus próprios materiais
didáticos. Ensaio, v. 12, n. 1, p.101-118, jan./abr. 2010. Belo Horizonte. Disponível em:
http://www.portal.fae.ufmg.br/seer/index.php/ensaio/article/view/262. Acesso em: 8 jul. 2012.

SCHUTZ, Denise. A experimentação como forma de conhecimento da realidade. 2009. 41f.


Dissertação (Graduação em Licenciatura em Química) – Instituto de Química, Universidade
Federal do Rio Grande do Sul. Disponível em: http://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/18768.
Acesso em: 12 dez. 2012.

TITO, Francisco Miragaia Peruzzo; CANTO, Eduardo Leite do. Química na abordagem do
cotidiano. 3. ed. São Paulo: Moderna, 2007. 759p.

TOZZONI-REIS, Marília Freitas C. Temas ambientais como “temas geradores”:


contribuições para uma metodologia educativa ambiental crítica, transformadora e
emancipatória. Educar em Revista, n. 27, p. 93-110, jan/jun. 2006. Disponível em:
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-40602006000100007&script=sci_arttext. Acesso
em: 4 fev. 2012.

ZAGO NETO, Odone Gino; DEL PINO, José Cláudio. Trabalhando a química dos sabões de
detergentes. Universidade Federal do Rio Grande do Sul - Instituto de Química, s.d., p. 72.
Disponível em: http://www.iq.ufrgs.br/aeq/html/publicacoes/matdid/livros/pdf/sabao.pdf.
Acesso em: 2 fev. 2013.
55

APÊNDICES
56

Apêndice A: Questionário investigativo


57

CURSO DE CIÊNCIAS DA NATUREZA - LICENCIATURA EM QUÍMICA


TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO
Licenciando: Laís Stoller Oliveira
Orientadora: Cíntia Neves Barreto Carneiro

QUESTIONÁRIO DE INVESTIGAÇÃO

1. Você considera a Química uma matéria ( ) Não


interessante? ( ) Sim, um vizinho recolhe e recicla.
( ) Sim. ( ) Sim, existe um posto de coleta.
( ) Não. Por quê?___________________
__________________________________ 7. Você já ouviu falar ou sabe de alguma
informação sobre o reaproveitamento do
2. Muitas pessoas consideram a química uma óleo de cozinha?
matéria difícil por ser muito abstrata. Você ( ) Não.
concorda com essa afirmação? ( ) Sim. Qual? _____________________
( ) Não. __________________________________
( ) Sim.
8. O óleo de cozinha se mistura na água?
3. Você consegue relacionar as situações do ( ) Não.
seu dia-a-dia com a Química estudada na ( ) Sim.
escola?
( ) Nunca 9. Será que o óleo de cozinha descartado no
( ) Raramente. meio ambiente sem tratamento pode
( ) Frequentemente. provocar algum desequilíbrio?
( ) Sempre. ( ) Não.
( ) Sim. Qual? _____________________
4. Com que frequência é utilizado óleo de __________________________________
cozinha para frituras em sua residência?
( ) Todos os dias 10. Sua cidade possui tratamento da rede de
( ) 2 a 3 vezes na semana esgoto?
( ) 1 vez por semana ( ) Não tenho essa informação.
( ) Raramente ( ) Não.
( ) Não é usado ( ) Sim.

5. Qual o destino dado ao óleo usado em sua


residência?
( ) Descarte na pia ou vaso sanitário
( ) Recolhido para coleta seletiva
( ) Não tenho essa informação.
( ) Outro. Qual?_____________________

6. Você conhece algum posto de coleta de


óleo usado em sua cidade?
58

Apêndice B: Guia Didático: A Química do sabão

Você também pode gostar