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A diferença entre Estado laico e laicismo


(Muitos defendem o Estado laico, mas se confundem com as idéias de laicização)

Tenho visto inúmeras pessoas falando, nas redes sociais, sobre a importância
do Brasil ser um Estado laico; o que de certa forma concordo. Contudo, julgo
que seja fundamental que aqueles que defendem essa premissa saibam
diferenciar Estado laico de laicismo.
Ora, Estado laico, secular ou não confessional é aquele que não adota uma
religião oficial, de modo que não existe envolvimento entre os assuntos do
Estado e a fé. Entretanto, o fato do Estado não ter uma religião oficial não o
caracteriza como Estado antirreligioso.
O laicismo, ao contrário caracteriza-se pelo Estado que assume uma postura
de intolerância religiosa, ou seja, a religião é vista de forma negativa e
pejorativa. Nessa perspectiva, enquanto o Estado laico defende a livre
expressão religiosa, o laicismo tenta a todo custo calar a boca dos religiosos
não permitindo com que estes emitam opiniões.
Desta forma, quando a Constituição Federal brasileira de 1988 ("CF/88"),
instrumento que representa o conjunto de leis fundamentais que organiza e
rege o funcionamento do nosso país, declara em seu art. 5º, inciso "vi", que
todas as pessoas são iguais perante a lei e que é inviolável a liberdade de
consciência e de crença destas pessoas, sendo desta forma assegurado o
livre exercício dos cultos religiosos e sendo garantida a proteção aos locais
de culto e a suas liturgias, ela está declarando que o Brasil é um país laico.
Indo ainda mais além, a CF/88, no seu art. 19, inciso "i", veda que a União,
os Estados, o Distrito Federal e os Municípios estabeleçam ou custeiem
cultos religiosos ou igrejas, que dificultem o seu funcionamento ou até mesmo
que mantenham com eles, ou com os seus representantes, relações de
dependência ou aliança, fazendo apenas ressalva aos casos de colaboração
de interesse público.
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Apesar de que alguns intolerantes, marxistas e gramscista tem tentado imprimir


no Brasil outra realidade e não o Estado laico. Antes, pelo contrário, a idéia de
partidos políticos de viés comunista é instalar um estado antirreligioso e acima
de tudo anticristão. O que de um ponto de vista lúcido é absolutamente
antidemocrático, e claro, inconstitucional.
Temos, assim, por determinação constitucional, não apenas a nossa
liberdade de escolher em o que vamos crer, qual culto, religião, ou crença
pretendemos seguir, como temos também a perspectiva de escolher não crer
e/ou nem seguir nenhum deles. Desta forma, é dever do nosso Estado
brasileiro, por meio de seus representantes, não privilegiarem ou
desprivilegiarem qualquer culto religioso ou igreja e, além disso, respeitarem
todos os cidadãos independentemente da opção religiosa de cada um.
Vale ressaltar que nem sempre o Brasil foi declaradamente laico. A
Constituição brasileira de 1824, por exemplo, estabelecia que a religião do
Império era a "Religião Catholica Apostolica Romana" e que o culto das
demais religiões deveria ser apenas no âmbito doméstico do indivíduo, sendo
proibida, portanto, a sua manifestação em público.
Uma curiosidade é que ainda na atualidade existem Estados que não são
laicos, sendo chamados de "Estados Religiosos" ou "Estados Confessionais",
pois reconhecem uma religião como seu culto oficial. Para além disso,
existem Estados que apesar de não reconhecerem uma determinada religião
como a oficial, declaram apoio a alguma crença específica, por exemplo:
Vaticano, os Estados Islâmicos e a nossa vizinha, a Argentina.

Sabemos que na sociedade existe pluralidade de crenças e de valores. O


Brasil, em especial, como resultado de um contínuo processo de
miscigenação cultural ao longo dos anos, possui uma grande diversidade
religiosa. A CF/88, ao falar que "todos são iguais perante a lei, sem distinção
de qualquer natureza", declara que a igualdade entre todo cidadão deve ser
vista de forma universal, e que não será uma diferença de crença ou de
religião que permitirá que as pessoas não sejam vistas de maneira igualitária
perante o Estado.

Esses debates englobam questionamentos como, por exemplo: (i) a


peculiaridade do próprio preâmbulo da CF/88 fazer expressa menção à
"proteção de Deus"; (ii) se em locais públicos, como o Congresso Nacional e
o Supremo Tribunal Federal ("STF"), deveriam existir símbolos religiosos,
como, por exemplo, crucifixos com a imagem de Jesus Cristo; (iii) se na
cédula da moeda nacional deveria também haver menção a "Deus"; (iv) se
caberia ao Estado nomear ruas ou praças públicas em homenagem a algum
líder religioso; ou (v) se deveriam existir feriados nacionais brasileiros oficiais
embasados em datas comemorativas religiosas.
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Apesar de sabermos que a palavra “DEUS” é comum e não se refere a “esse”


ou àquele “deus”. A religião é criação humana, não divina.
No que se refere ao mencionado preâmbulo da CF/88, na Ação Direta de
Inconstitucionalidade nº 2076, o STF entendeu que não há afronta ao
princípio da laicidade e que o preâmbulo "reflete, simplesmente, um
sentimento deísta e religioso, que não se encontra inscrito na Constituição" 3.
Foi levado também ao STF, pela Procuradoria-Geral da República, o
questionamento a respeito do ensino religioso confessional em escolas
públicas. Nesta Ação Direta de Inconstitucionalidade ("ADI") 4 defendia-se
que o ensino público religioso não deveria ser direcionado a uma religião
específica, mas sim voltado à história e à doutrina de diversos cultos e
crenças.
Em uma votação bastante apertada (6 x 5 votos) a maioria do STF entendeu
que o ensino religioso nas escolas públicas poderia sim ser vinculado
especificamente a determinada religião. Um dos argumentos utilizados foi o
de que sendo a matrícula na matéria facultativa, o aluno não estaria
obrigado a frequentar estas aulas e, portanto, o princípio da laicidade do
Estado restaria respeitado.
Isso posto, percebe-se que apesar do Brasil ser considerado, nos termos da
CF/88, um Estado laico, na prática diversas situações colocam em dúvida
essa questão. Cada caso concreto, portanto, merece uma reflexão específica
e a nós, cidadãos brasileiros, cabe questionarmos eventuais condutas que
entendamos conflitantes com a laicidade estatal defendida pela Carta Magna.
__________
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes: (...)

VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o


livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção
aos locais de culto e as suas liturgias;

(STF: Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) STF: Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4439.)

https://www.migalhas.com.br/coluna/constituicao-na-escola/300193/voce-acha-que-o-brasil-e-um-estado-laico

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