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CENTRO UNIVERSITÁRIO CURITIBA

FACULDADE DE DIREITO CURITIBA

INGRID FONSECA DA CRUZ

LIBERDADE RELIGIOSA: UMA ANÁLISE QUANTO A ESSE DIREITO


CONSTANTE NO ORDENAMENTO JURÍDICO

Curitiba
2022
1

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .................................................................................................. 3
CAPÍTULO I - SECULARIZAÇÃO E LAICIDADE: ASPECTOS GERAIS ....... 5

1.1 - A RELIGIÃO IMPOSTA PELA COROA ................................................. 5

1.2 - SECULARIZAÇÃO: A SEPARAÇÃO DO ESTADO E DA IGREJA ....... 6

1.3 – A INTOLERÂNCIA E A TOLERÂNCIA RELIGIOSA, E O PRINCÍPIO DA

IGUALDADE ................................................................................................ 7

1.4 – A LAICIDADE DO ESTADO ............................................................... 12

1.4.1 - DA INTERVENÇÃO DO ESTADO .............................................. 15

CAPÍTULO II – RELIGIÃO E LIBERDADE RELIGIOSA ................................ 16

2.1- O CONCEITO DE RELIGIÃO E LIBERDADE RELIGIOSA .................. 16

2.2 - A LIBERDADE RELIGIOSA E SUA PREVISÃO NORMATIVA ........... 18

2.3 - DOS LIMITES DO DIREITO FUNDAMENTAL A LIBERDADE DE RELIGIÃO

......................................................................................................................... 22

CAPÍTULO III - A RELIGIÃO ENVOLVENDO OUTROS AMBITOS DA SOCIEDADE


......................................................................................................................... 25

4.1 - DO ENSINO RELIGIOSO NAS ESCOLAS PÚBLICAS ...................... 25

4.2 - O USO DE ANIMAIS EM SACRIFÍCIOS RELIGIOSOS ...................... 28

4.3 - O USO DE SÍMBOLOS RELIGIOSOS EM LOCAIS PÚBLICOS ........ 33

4.4 - AS TESTEMUNHAS DE JEOVÁ E A TRANSFUSÃO DE SANGUE .. 36

4.5 - YAHUASCA E A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA .....................................38

CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................ 42

2
INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como objetivo realizar uma análise referente ao direito
de liberdade religiosa, sabendo-se que esta foi consagrada como um direito
fundamental do indivíduo, analisando a postura do Estado enquanto laico sobre esse
direito.
Analisaremos como ocorreu o processo de concessão do direito à liberdade
religiosa ao indivíduo, estando essa questão diretamente ligada a história do país em
que vivemos e seu desenvolvimento ao longo dos anos.
Incialmente, no capitulo I, é tratado a imposição religiosa que ocorre no brasil
devido a colonização portuguesa. Passando para o processo de secularização, que
se deu a separação do estado e da igreja, o como no brasil isso ocorreu logo após a
proclamação da independência, na constituição de 1824, onde foi também instituído
um princípio de liberdade religiosa. também é abordado a questão como a questão da
intolerância religiosa ficou cada vez mais evidenciado com a possibilidade de um
pluralismo religioso. Passando para o ponto da laicidade estatal e de como o estado
deve manter um posicionamento de neutralidade.

Aprofundando na questão do fundamento da laicidade e como o Estado deve


sempre adotar uma postura neutra com a finalidade de não favorecer nenhuma
religião em detrimento da outra, pois nenhuma é absoluta, pelo contrário, é conferido
aos cidadãos o direito de liberdade de crença e culto pela constituição federal, o qual
lhes assegura a liberdade de escolher e seguir a religião que se encaixar em seus
ideias ou até mesmo não seguir nenhuma, sem que sofra nenhum tipo de
discriminação, intolerância ou represália ocasionando uma certa segregação social,
não é totalmente a realidade presente, pois existem situações diárias de intolerância
religiosa sofrida por diversos grupos.
Também descrevendo sobre o dever do Estado, enquanto ente laico, de manter
uma posição de neutralidade parente questões envolventes de religião, a fim de que
não ocorra a influência de nenhum indivíduo ou até mesmo a imposição de um
sentimento de dever corresponder a escolha de religião indicativa do estado, tirando
assim o seu direito de escolha.

3
Próximo, no capítulo seguinte, passasse a ser tratado a religião e da liberdade
religiosa, passando a apontar um conceito do que significa esse direito e como fora
assegurado o título de direito fundamental, a previsão normativa desse direito e como
foi se desenvolvendo conforme a promulgação de diferentes constituições e
finalmente seus limites.

Relatando que o direito de liberdade religiosa, apesar de ser um direito


fundamental do indivíduo, não garante a este o direito de cometer atos controversos
ao ordenamento em nome da religião, uma vez que o direto a liberdade é fundamental
e protegido pelo Estado, que apesar de laico, tem este dever.
Destarte ser um direito fundamental, a liberdade de religião também é passível
de limitação. Assim como é passível de sofrer certa interferência por parte do estado
em determinadas situações.
No último capítulo é feita uma abordagem de como a religião está inserida
diversas esferas da sociedade, mas faz-se necessário uma análise sobre sua validade
por se tratar de um direito individual do ser.
Um meio que é discutido sobre sua validade ou não, é a utilização de animais
em sacrifícios religiosos, assim como o ensino religioso em escolas públicas, a
utilização de símbolos religiosos em locais públicos, o uso de animais em rituais
religiosos as testemunhas de jeová e a transfusão de sangue e o uso da Yehuasca e
sua previsão normativa. temas esses que serão abordados separadamente a fim de
esclarecimento sobre sua validade.

Diante da relevância do assunto, realiza-se um estudo sobre o tema para que


possa haver uma melhor compreensão deste direito que é a liberdade religiosa e o
limite de agir em seu nome, assim como o status do estado perante esse direito,
buscando esclarecer eventuais dúvidas a respeito deste direito.

4
CAPÍTULO I - SECULARIZAÇÃO E LAICIDADE: ASPECTOS GERAIS

1.1 – A RELIGIÃO IMPOSTA PELA COROA E A CONSEQUENTE


INTOLERÂNCIA GERADA

Com a vinda da coroa portuguesa para o Brasil, houve a colonização sobre os


povos que habitavam as terras brasileiras e consequentemente, houve a imposição
da religião oficial do império sobre os nativos que aqui habitavam.
Passou-se então a ser obrigatório seguir os regramentos impostos pelo
catolicismo, consequentemente gerando impactos negativos a vida daqueles que por
ventura escolhessem não ser adeptos a religião que fora determinada pelo império.
Conforme passou a ser obrigatório aderir a religião trazida pela coroa e imposta
como oficial, indígenas eram convertidos ao catolicismo, e em caso daqueles que se
recusavam a se converter, eram exterminados pela coroa; judeus se tornavam
cristãos sob o medo de sofrerem represálias e os indivíduos que eram escravizados
eram batizados no porto.1
A questão da religião era tratada de uma maneira muito mais política do que
religiosa, com o intuito de proteger a sociedade que estava em construção, onde não
se importava a questão do juízo de ideias pessoal do indivíduo. Alguns, porém,
apenas aparentavam seguir as normas religiosas impostas pela coroa, principalmente
aqueles que viviam mais distantes do clero, onde permaneceram com suas crenças,
mesmo que de modo mais privativo.
Lisías Nogueira Negrão afirma sobre a vinda da coroa portuguesa para o Brasil:

Sob o jugo da coroa portuguesa, o catolicismo foi imposto no Brasil, desde os


primórdios da colonização, como religião oficial do Império e a única com
permissão para realizar cultos públicos ou domésticos. Essa aliança entre a
casa real portuguesa e o Vaticano possibilitou ao império português legitimar
seus interesses temporais e seus métodos de atuação, sob o pretexto da
salvação de almas e da difusão da fé e cultura cristãs. 2

1
NOGUEIRA, Lísias Negrão. PLURALISMO E MULTIPLICIDADES RELIGIOSAS NO BRASIL
CONTEMPORÂNEO Lísias Nogueira Negrão. Artigo recebido em 10 abr. 2008 e aprovado em 6 jun.
2008.
2
Ibid., p. 262

5
Apesar de ainda haver uma religião oficial no país na época, houve, com a
vinda da família real veio para o Brasil, um relaxamento quanto a proibição de cultos
que não fossem católicos em solo brasileiro, sendo permitido a realização de cultos
voltados ao protestantismo, desde de que não pregassem blasfêmias contra a religião
oficial.
Com o acontecimento da proclamação da república, foram-se criando melhores
condições para que existisse uma sociedade laica e pluralista, na qual não se tinha
mais uma relação do estado com a igreja.

1.2 – A SECULARIZAÇÃO: A SEPARAÇÃO DO ESTADO E DA IGREJA

A secularização se trata do processo pelo qual se tem um abandono da cultura


apoiada em dogmas religiosos, ou seja, há uma separação da crença com os demais
aspectos da vida e até mesmo com o estado. Peter Berger fala que

Quando falamos sobre a história ocidental moderna, a secularização


manifesta-se na retirada das Igrejas cristãs de áreas que antes estavam sob
seu controle ou influência: separação da Igreja e do Estado, expropriação das
terras da Igreja, ou emancipação da educação do poder eclesiástico, por
exemplo. Quando falamos em cultura e símbolos, todavia, afirmamos
implicitamente que a secularização é mais que um processo sócio estrutural.
Ela afeta a totalidade da vida cultural e da ideação e pode ser observada no
declínio dos conteúdos religiosos nas artes, na filosofia, na literatura e,
sobretudo, na ascensão da ciência, como uma perspectiva autônoma e
inteiramente secular, do mundo.3

No Brasil, a secularização teve seu início com a separação do Estado com a


igreja, dando a oportunidade do direito de liberdade religiosa surgir, assim como o
pluralismo religioso, e novos cultos serem manifestados, fazendo com que a igreja
católica perdesse um pouco do seu espaço.
Mais especificamente, na constituição proposta logo após a proclamação da
república, a constituição de 1824, que foi instituído o princípio de liberdade religiosa,
o qual abrangia também as instituições de cunho religioso possibilitando assim a
realização de cultos diferentes de aqueles que até então eram somente permitidos

3
BERGER, Peter. O dossel sagrado: elementos para uma teoria sociológica da religião. São Paulo:
Paulus. 1985. P. 119
6
para a religião considerada oficial, no caso o catolicismo, ficando garantido ao
indivíduo uma liberdade de crença e de culto.
Apesar de haver uma liberdade de religião e de culto, as religiões descendentes
de cristo continuam vigente e com força na atualidade, onde muitas vezes os
dirigentes de centros religiosos propagam discursos que oprimem e deterioram
religiões diferentes daquela que fazem parte, como as religiões de origem africana.
Um exemplo que pode ser apontado deste tipo de ataques são os discursos
feitos pela Igreja Universal do Reino de Deus. Escreveu Ricardo Mariano:

Por mais que demonizassem as religiões afro-brasileiras e espíritas, as


lideranças dessas igrejas pentecostais não as atacavam direta, pública,
sistemática e até fisicamente como veio a ocorrer a partir dos anos de 1980.
Seu papel, nesse sentido, consistiu, sobretudo, em pavimentar o terreno para
posterior radicalização empreendida pela Universal do Reino de Deus, que
não só tornou a demonização dos cultos afro-brasileiros um de seus
principais pilares doutrinários, como partiu para o confronto direto contra eles,
elevando a hostilidade a esses grupos religiosos a um patamar inédito na
história do pentecostalismo brasileiro. Como bem observou Marisa Soares,
‘pela primeira vez, então, vê-se, por parte dos cristãos, pentecostais, uma
atitude frontal de enfrentamento. Essa é a grande novidade. 4

Há uma tentativa por parte do estado de punição, por meio de sanções, a esses
que propagam esses discursos, entretanto mesmo que ocorra uma condenação a
líderes religiosos, estes ainda impõe suas crenças sobre aqueles que os seguem,
impondo que sua crença é a única viável a ser seguida e aqueles que não optam por
seguir os dogmas impostos por ele sofre uma pressão e represália de tamanha
proporção que não conseguem aguentar a pressão e sedem ao que estão tentando
impor ou mesmo sofre intolerância.

1.3 – A INTOLERÂNCIA E A TOLERÂNCIA RELIGIOSA, E O PRINCÍPIO DA


IGUALDADE.

Pode a intolerância ser definida como uma serie de ideologias e atitudes


violentas para com diferentes crenças e práticas religiosas, sendo considerado um
crime de ódio que pode ferir o direito de liberdade e também a dignidade do indivíduo.

4
Texto apresentado por MARIANO, Ricardo. Pentecostais em ação: a demonização dos cultos afro-
brasileiros. In: Silva, Vagner Gonçalves da (org). Intolerância Religiosa: Impactos do
neopentecostalismo no campo religioso afro-brasileiro. São Paulo: Editora da Universidade de São
Paulo. P. 135
7
A religião pode fazer parte da vida, da identidade de um indivíduo, podendo
esta ditar como irão acontecer muitos aspectos de seu cotidiano e também auxiliar em
sua perspectiva moral, social e até mesmo política da vida.
Assim como a religião sempre esteve presente, a intolerância também pode ser
constatada como presente desde muito tempo dentro da sociedade, podendo ser
comprovada através de registros e relatos de eventos de intolerância, desrespeito e
até mesmo perseguições que ocorreram através da história, tendo esses fatos
ocorrido por diversos motivos, inclusive religiosos, podendo ser citado como exemplo
o caso de Jesus, que foi acusado e condenado por não seguir as regras do judaísmo5.
No Brasil pode-se dizer que a questão da intolerância teve início com a vinda
dos portugueses e junto deles o catolicismo que eles trouxeram e impuseram sobre
os que aqui habitavam, não tolerando que cultos de religiões diferentes da deles
ocorressem. Alexandre Brasil Fonseca e Clara Jane Adad falam que

O desenho da intolerância religiosa no Brasil colonial acompanha as questões


comerciais e a valorização do europeu versus o indígena e o africano. Por
esta razão, os estrangeiros europeus passaram a um patamar maior dos que
os atribuídos aos índios e aos negros, e, à custa de duras farpas,
conquistaram mais cedo e de forma paulatina um pouco mais de liberdade de
praticar seus cultos.6

Depois de declarada a independência do Brasil e instituído um princípio de


liberdade religiosa, passou-se a ter a possibilidade de um pluralismo religioso e com
isso diferentes grupos religiosos foram se estabelecendo.
Porém, conforme foi se abrangendo a diversidade de religiões presentes em
um país, foi se tornando também mais visível a intolerância que se fundia cada vez
mais, sendo muitas vezes propagada por aqueles que tem a concepção de que
somente deve ser aceito dentro da sociedade aqueles que fazem parte do mesmo
grupo religioso.
A partir do aumento de número de casos de crimes cometidos contra indivíduos
em função de sua escolha religiosa, fez necessário a criação de leis que culminavam

5
Bíblia Sagrada Almeida Século 21: Antigo e Novo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 2008.
Evangelho de João, capítulos 18 e 19.
6
Relatório sobre intolerância e violência religiosa no Brasil (2011- 2015): resultados preliminares /
Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial, da Juventude e dos Direitos Humanos ; organização,
Alexandre Brasil Fonseca, Clara Jane Adad. – Brasília: Secretaria Especial de Direitos Humanos,
SDH/PR, 2016.
8
como sendo crime essas atitudes intolerantes, tendo por sua finalidade a tentativa de
diminuir o número de indivíduos que sofrem ataques por questões religiosas e assim,
possam seguir sua religião sem o medo constante de sofrer opressão. Luciano
Odebrecht relata que

[...] essa liberdade de culto e crença tem sido desrespeitada até os dias
atuais, seja de forma explicita ou de forma velada. A intolerância religiosa,
assim como a discriminação de raça, origem, estética, econômica, entre
outras existe até os dias de hoje, inclusive no Brasil; até porque o ser humano
sempre quer prevalecer sobre o outro humano, não existindo a figura do “bom
selvagem”, e sim, a necessidade de se ensinar e aprender a respeitar o outro,
uma vez que os freios inibitórios são colocados através de uma educação
voltada para a tolerância, igualdade e solidariedade.7

A tolerância religiosa teve seu conceito surgindo a partir da busca pela


renovação religiosa, foi através da reforma protestante, cujo o objetivo era a defesa
da liberdade de consciência e a ideologia de separação entre Igreja e Estado. Apesar
de já terem surgido, os conceitos de tolerância foram ganhar mais notoriedade com a
publicação da “Carta sobre a tolerância” de John Locke e também no “Tratado sobre
a Tolerância” de Voltaire.
Diferentemente de Voltaire, que apesar de não ter propriamente conceituado,
defendia a tolerância religiosa e afirmava que a intolerância não passava de uma
atitude considerada barbara e irracional. Em outro viés, para Locke “a tolerância para
os defensores de opiniões opostas acerca de temas religiosos está tão de acordo com
o Evangelho e com a razão que parece monstruoso que os homens estejam cegos
diante de uma luz tão clara” 8, ou seja, para ele não existe uma coerência entre o
cristianismo e a violência e que o indivíduo deve seguir o que o próprio considera
verdadeiro.
Apesar de ter havido essa maior notoriedade no conceito de tolerância, ainda
sim eram atribuídos diversas definições e conceitos a tolerância, e muitas vezes ainda
sim o conceito da palavra acabava não reconhecendo a pratica de diferentes formas
religiosas e seus valores.
Clodoaldo Cardoso conceituou a tolerância na era moderna como

a atitude de suportar aquele ou aquilo que se apresentasse como desvio da


norma, do padrão e do modelo: a civilização européia. O ato de tolerar

7
ODEBRECHT, Luciano. Liberdade Religiosa. Londrina: Redacional Livraria, 2008. P.46
8
LOCKE, John. Carta sobre a tolerância. Lisboa: Edições 70, 1965, p. 10
9
referiase, pois, ao comportamento do superior em relação ao inferior,
conotação ainda presente em muitos dicionários. Este sentido de tolerância
expressa a ideologia do conquistador e colonizador europeu em seu projeto
de dominação universal. Assim, tolerância está ligada à atitude de admitir
algo ou alguém fora do paradigma, da regra. 9

Na atualidade, a tolerância também pode ter alguns sentidos, o que acaba


dificultando sua tarefa, que é encontrar um conceito para a palavra. Marcelo Andrade
tenta definir que

A tolerância seria, então, o valor e a atitude de aceitar a diversidade de


concepções últimas sobre a vida, principalmente as diferentes ofertas do que
venha a ser uma vida boa e feliz. Sem este valor atitude e sem a valorização
do diálogo não é possível uma ética civil, já que essa é em essência a
articulação dialogada de mínimos de justiça partilhados por todos a partir das
diferentes propostas de máximos de felicidades aos quais todos estão
convidados a participar livremente.10

E Reinert Forst diz que a tolerância se caracteriza sendo

[...] um conceito normativamente dependente, o qual, para que tenha um


determinado conteúdo (e limites especificáveis), carece de recursos
normativos adicionais que não sejam dependentes nesse mesmo sentido.
Tolerância não é, portanto, contrariamente a uma visão comum, ela mesma
um valor, mas, em vez disso, uma atitude requerida por outros valores ou
princípios [...].11

Assim sendo, a tolerância pode não ter um conceito propriamente definido, vez
que o entendimento do que se trata esse ato muda seu conceito de acordo com o
entendimento trazido por diferentes autores. Entretanto, uma informação que pode ser
tratado como comum dentro os diferentes conceitos produzidos, é de a tolerância
sempre vai se tratar de uma busca por um respeito a liberdade individual do ser, uma
vez que ela é importante para o convívio e manutenção da paz, já que se se existem
diferentes religiões e todas partem do mesmo princípio, que é o princípio da igualdade.

9
CARDOSO, Clodoaldo Meneguello. Fundamentos para uma educação na diversidade. Disponível
em:https://acervodigital.unesp.br/bitstream/unesp/155243/3/unespnead_reei1_ee_d01_s02_texto01.p
df. 9 ANDRADE, Marcelo. Tolerar é pouco?: Pluralismo, mínimos éticos e prática pedagógica. Rio de
Janeiro: Nova América, 2009., p. 186.
10
ANDRADE, Marcelo. Tolerar é pouco?: Pluralismo, mínimos éticos e prática pedagógica. Rio de
Janeiro: Nova América, 2009
11
FORST, Rainer. Os limites da tolerância, Novos estudos - CEBRAP, São Paulo, 2009. p. 18.
Disponível em:
https://www.scielo.br/j/nec/a/qn3hSHZzYJdr6tv9Xq44spG/?format=pdf&lang=pt
10
Disposto no artigo 5° 12 ,caput, da constituição federal de 1988, esse artigo
aclara a posição de igualdade de todos perante a lei. Portanto, resta garantido que o
Estado não poderá distinguir as pessoas entre si, assegurando-lhes suas liberdades
e direitos de igual maneira e magnitude.
Canotilho diz que “O princípio da igualdade, no sentido de igualdade na própria
lei, é um postulado de racionalidade prática: para todos os indivíduos com as mesmas
características devem prever-se, através da lei, iguais situações ou resultados
jurídicos.” 13
Assim, tratando-se de um princípio fundamental, o Estado deve zelar por este
princípio, garantindo que este seja aplicado tanto na esfera particular quando na
esfera social do indivíduo.
Dentro do âmbito da liberdade religiosa, o princípio da igualdade tem um dever
de proteção para com as minorias religiosas frente ao poder das maiorias, visando
amparar essas minorias das desigualdades existentes e afastar do sistema jurídico,
não com a finalidade de eliminar toda e qualquer diferença que existe entre estes
indivíduos, mas sim tentar manter e preservar as diferenças culturais, de forma que
consiga também manter a tolerância e a manutenção da paz.14
Apesar de existir o princípio da igualdade dentro da liberdade religiosa, esta
deve ser tratado de maneira a respeitar toda doutrina e costumes de todas as religiões,
de maneira que se tratar de uma, esta não prejudique outra.
A Assembleia Geral das Nações Unidas, sobre os assuntos, adotam os
seguintes posicionamentos: sobre a igualdade “Nenhum indivíduo ou nação deve ser
privado da possibilidade de se beneficiar do desenvolvimento. A igualdade de direitos
e de oportunidades entre homens e mulheres deve ser garantida.” 15 . Sobre a
tolerância

12
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
13
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7ª ed.
(reimpressão). Coimbra: Almedina, 2003, pg. 426/427
14
ODEBRECHT, Luciano. Liberdade Religiosa. Londrina: Redacional Livraria, 2008.
15
A Assembleia Geral das Nações Unidas, Declaração da Cúpula do Milênio das Nações Unidas.
Acesso em
>https://crianca.mppr.mp.br/pagina 407.html#:~:text=Aprovada%20na%20C%C3%BApula%20do%2
0Mil%C3%AAnio,de%20sempre%20 de%20dirigentes%20mundiais.<
11
Os seres humanos devem respeitar-se mutuamente, em toda a sua
diversidade de crenças, culturas e idiomas. Não se devem reprimir as
diferenças dentro das sociedades, nem entre estas. As diferenças devem,
sim, ser apreciadas como bens preciosos de toda a humanidade. Deve
promover-se ativamente uma cultura de paz e diálogo entre todas as
civilizações.”16

1.4 - A LAICIDADE ESTATAL

A existência de uma relação entre Estado e Igreja aconteceu durante muitos


anos, fazendo com que, dentro da sociedade, existisse uma chamada religião oficial.
No Brasil pode-se citar a constituição de 1824, que foi a primeira constituição a ser
outorgada pelo imperador, tendo esta as palavras “pela graça de Deus e da
Santíssima Trindade” 17
em seu preâmbulo, como exemplo da existência dessa
relação, pois esta ficou estabelecida em seu corpo de lei, em seu artigo 5°.18
Era certo que, anteriormente, tinha-se estabelecido uma confissão religiosa, ou
seja, existia uma união entre o Estado e a religião, fazendo com que ficasse declarada
uma religião oficial a ser seguida, deixando pouco espaço ou quase nenhum para a
existência e prática de demais cultos existentes. Entretanto, posteriormente, passou-
se a ter uma chamada “separação de regimes”, em que se havia uma liberdade de
culto juntamente de uma separação entre a religião e o Estado.
O processo de separação entre Estado e religião, no Brasil, foi um evento que
se deu depois de 100 anos do surgimento do 1° regime que instituiu a proibição da
existência ou acolhimento de qualquer religião em específico pelo Estado. 19
Foi a partir do decreto 119-A de 189020, que o Estado deixou de ter o status de
estado confessional. Assim sendo, a partir do decreto passasse a ter um Estado laico,
assim como, passou-se a ter a possibilidade de existência de uma sociedade com um
pluralismo religioso. Celso Bastos explica que

16
Assembléia Geral das Nações Unidas, Declaração da Cúpula do Milênio das Nações Unidas. Op.
Cit.
17
Santos, Michel Ferrari Borges dos. A configuração constitucional do direito fundamental à liberdade
religiosa e do princípio da laicidade: uma análise pautada na jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal / Michel Ferrari Borges dos Santos. – Joaçaba: Editora Unoesc, 2020, P.25
18
Art. 5. A Religião Catholica Apostolica Romana continuará a ser a Religião do Imperio. Todas as
outras Religiões serão permitidas com seu culto domestico, ou particular em casas para isso
destinadas, sem fórma alguma exterior do Templo. 17 MIRANDA, Jorge. Estado, liberdade religiosa e
laicidade
19
MIRANDA, Jorge. Estado, liberdade religiosa e laicidade.
20
Decreto n. 119-A, de 1890. Proíbe a intervenção da autoridade federal e dos Estados federados em
matéria religiosa, consagra a plena liberdade de cultos, extingue o padroado e estabelece outras
providências. (BRASIL, 1890a).
12
O Estado Brasileiro tornou-se desde então laico, ou não confessional. Isto
significa que ele se mantém indiferente às diversas igrejas que podem
livremente constituir-se, para o que o direito presta a sua ajuda pelo
conferimento do recurso à personalidade jurídica21.

Para o melhor estudo e compreensão sobre o assunto, faz-se necessário a


diferenciação entre laicismo e laicidade, e o papel do Estado, o qual Santos Junior
dispõe que

[...] laicismo é um sistema jurídico-político no qual há separação total entre o


Estado e a Religião. Neste sistema, Estado e organizações religiosas não
sofrem interferências recíprocas no exercício de suas atividades. Por outro
lado, laicidade é o caráter de neutralidade religiosa do Estado.22

Assim sendo, a laicidade é o estado neutro do Estado frente a religião por


respeito e esse fenômeno, o laicismo é uma questão mais intima, tendo o Estado a
postura de reprimir ela em espaços públicos.23 Ao definir um conceito para laicidade,
Pierre Bréchon diz que

Trata-se de uma ideologia, portadora de mobilização, caracterizada pela


defesa dos valores da República e de uma luta contra todos os
obscurantismos religiosos, notadamente no sistema escolar. Esta versão
militante de laicidade, forjada nos combates políticos da metade do século
XIX e da metade do século XX, não é a única. A ideologia laica se reduz hoje
a uma atitude de tolerância, de abertura a todas as posições filosóficas e
religiosas, ou por um simples silêncio que impõe nas aulas a ensinamentos
concernentes a opções religiosos ou políticas, de maneira a não influenciar
as crianças24

Portanto, a postura adotada pelo Estado é a de neutralidade, postura essa que,


no tocante a aplicação da ordem de valores sobre todos os cidadãos de uma mesma
sociedade, tem o dever de equivalência, ou seja, deve adotar uma postura que, de
alguma forma, garanta a todos que quando forem aplicadas essas ordens de valores,
serão feitas de uma maneira que busque manter a imparcialidade e a neutralidade

21
BASTOS, Celso Ribeiro e MARTINS, Ives Gandra. Comentários à Constituição do Brasil – volumes
1 e 2. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. P. 336
22
SANTOS JUNIOR. A Liberdade de Organização Religiosa e o Estado Laico Brasileiro. 2007. P. 63
23
Frosi, Julio Cesar. Liberdade religiosa e a teoria da justiça de John Rawls / Julio Cesar Frosi. –
Joaçaba: Editora Unoesc, 2017. – (Série Dissertações e Teses, v. 12). P. 91
24
BRÉCHON, Pierre. Institution de la laïcite ete dechristianion de la société française. P.1. Tradução
Ingrid Fonseca. Acesso em 01 outubro 2022. Acesso em 01 de outubro de 2020. Disponível em:
https://journals.openedition.org/cemoti/1687 <
13
para que estes possam afirmar e promover seus valores que lhe servem de base,
conforme diz Machado. 25.
Assim, diante da óptica de Machado, fica estipulado ao Estado o dever de não
determinar nada sobre qualquer que seja a religião ou mesmo negar sua existência,
a fim de não influenciar os cidadãos, garantindo a estes a liberdade de exercício de
crença26. Quanto a neutralidade do Estado, Schmitt afirmava que

Em última consequência este princípio tem de conduzir a uma neutralidade


geral frente a todas as concepções e a todos os problemas e a um tratamento
absolutamente igual, quando então, por exemplo, o que pensa em termos
religiosos não pode ser mais defendido do que o ateísta [...]. Daí se segue,
além disso, liberdade absoluta para toda espécie de propaganda, tanto da
religiosa quanto da anti-religiosa [...]. Esta espécie de ‘Estado neutro’ é o stato
neutrale e agnóstico que não faz mais distinções e é relativista, o Estado sem
conteúdo ou mesmo um Estado reduzido a um Minimum de conteúdo.27

No tocante ao assunto, Antônio Pinzani explica que

Um Estado laico é um Estado que leva a sério o princípio de neutralidade


religiosa e ideológica e, portanto, não garante nenhum privilégio especial a
nenhuma religião ou ideologia, considerando que a crença nessas últimas
constitui um fato privado que não pode interferir no estabelecimento de regras
comuns de convivência e de políticas públicas que tratem todos os cidadãos
como sujeitos iguais do ponto de vista jurídico.28

O Estado ao ser laico e assumir uma postura de neutralidade, não assume, por
consequente, uma postura de antirreligiosidade, pois este assegura ao cidadão o
direito de exercer sua liberdade de religião, seu direito de culto e até mesmo assegura
a tolerância religiosa entre as religiões, de maneira equivalente a todos. 29
O princípio da laicidade varia de acordo com o país, gerando a necessidade do
esclarecimento do que deve ser entendido por separação e laicidade, pois existem
países onde o Estado e a religião não são separados de maneira formal, entretanto,
quando se refere a forma política, estes baseiam-se na soberania popular e não a
partir de doutrinas religiosas. Assim sendo, um país sendo formalmente separado não

25
MACHADO, Jónatas E. M. Estado Constitucional e Neutralidade Religiosa: entre o teísmo e o
neo(ateísmo). 1ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2013.
26
MACHADO, 2013. Op. Cit.
27
SCHMITT, Carl. O conceito do político. 1. ed. Petrópolis, Vozes, 1992. P. 124
28
PINZANI, A. Estado laico e interferência religiosa. Florianópolis, Santa Catarina, Brasil, v.14, Pg. 294
29
SANTOS, Michel Ferrari Borges dos. A configuração constitucional do direito fundamental à liberdade
religiosa e do princípio da laicidade: uma análise pautada na jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal
14
implica que este seja laico, assim como, pode vir a ser laico sem que esteja
expressamente o Estado e a religião, sendo isso feito através de uma clausula
chamada “clausula de separação”. 30
Este princípio tem como fundamento principal garantir o direito de liberdade
religiosa, e conforme o local de que se refere, este irá ser tratado conforme a
institucionalização do local e suas concepções.31
Quando tratado este tema na Constituição Federal Brasileira atual, está
estipulado no artigo 19 e incisos32 sobre a função do estado em se manter neutro, a
fim de se ter uma proteção os direitos de liberdade religiosa, tratando a laicidade como
princípio.
Para que se houvesse a construção da laicidade como princípio, necessitou-se
que houvesse o estabelecimento de algumas diretrizes. Segundo Huaco, ao aplicar
os direitos de religião, deve ser feito de maneira harmônica com os valores e os
princípios fundamentais da constituição. Devendo, em caso de os direitos de religião
entrar em conflito com algum direito fundamental, o operador de direito oferecer
alguma solução a fim de solucionar o problema, de forma que favoreça estes.33

1.4.1 - INTERVENÇÃO DO ESTADO

O estado enquanto laico deve prezar pela sua neutralidade, não se envolvendo,
sem a devida necessidade, em questões envolventes quanto a liberdade de religião e
os direitos que advém desta.
Entretanto, o Estado pode produzir medidas necessárias em se tratando de
proteger os direitos dos cidadãos, inclusive tem capacidade para interferir na questão
da liberdade religiosa quando, se fazendo utilizar deste direito, indivíduos prejudicam
ou ameaçam a segurança pública, como diz Alexy.34

30
SANTOS, 2020 Op. Cit.
31
SANTOS. 2020, ibid.
32
Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - estabelecer cultos
religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus
representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de
interesse público; II - recusar fé aos documentos públicos; III - criar distinções entre brasileiros ou
preferências entre si.
33
HUACO, Marcos. A laicidade como princípio constitucional do Estado de Direito. In: LOREA, Roberto
Arriada (org.); ORO, Ari Predo et al. Em Defesa das Liberdades Laicas. Porto Alegre: Livraria do
Advogado Editora, 2008. Cap. 2, p. 33-80
34
ALEXY, Robert. Colisão de Direitos Fundamentais e Realização de Direitos Fundamentais no
15
Soriano esclarece que as atitudes que tenham por objetivo uma ilicitude
atentatória contra a liberdade de terceiro, à ordem e à segurança pública, é passível
uma intervenção na intenção de coibir.
O autor ainda completa dizendo que o Estado, quando referido a religião, deve
manter seu status de laicidade, não devendo portanto, dizer o que é certo e o que é
errado, devendo somente se ater ao combate de abuso do direito de liberdade, se
atendo para que não inviabilizar a legitimidade quanto ao direito de liberdade
religiosa35.

CAPÍTULO II – RELIGIÃO E LIBERDADE RELIGIOSA

2.1 – O CONCEITO DE RELIGIÃO E LIBERDADE RELIGIOSA

Com base nos entendimentos modernos, a religião pode ser entendida como
uma coisa independente, que tem uma ligação ao social e psicológica com o sujeito,
detento sua própria estrutura36.
A liberdade, direito que é fundamental ao homem, adquiriu sua existência
baseada na capacidade pensante do homem.
A partir desse pensamento, a religião é considerada uma forma de consciência,
a liberdade religiosa é uma forma de se expressar essa consciência, podendo cada
um de forma individual escolher qual vai seguir com base em seus valores de crença,
pois mais que abranger somente o direito de culto, essa liberdade alcança o direito de
crenças religiosas, a liberdade para se reunir em prol da religião e também a
associação/ organização religiosa 37 . Ao falar das modalidades de liberdade, Júlio
Cesar Frosi fala que

A liberdade religiosa abrange três liberdades: a) a liberdade de crença


permite aderir à qualquer religião ou até mesmo de não aderir a religião
alguma, tangenciando com a liberdade de consciência, já que assegura a

Estado Democrático de Direito. Luis A. Heck (trad.), Revista da Faculdade de Direito da UFRGS, Vol.
17, 1999. p. 203-214. apud WEINGARTNER NETO, Jayme. Liberdade Religiosa na Constituição:
fundamentalismo, pluralismo, crença, cultos. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. p. 193
35
SORIANO, Aldir Guedes. Liberdade Religiosa no Direito Constitucional e Internacional. São Paulo:
J. de Oliveira, 2002
36
Gaarder, Jostein, 1952- O livro das religiões / Jostein Gaarder, Victor Hellern, Henry Notaker ;
tradução Isa Mara Lando ; revisão técnica e apêndice Antônio Flavio Pierucci. — São Paulo:
Companhia das Letras, 2000. P.
37
Frosi, Julio Cesar. Liberdade religiosa e a teoria da justiça de John Rawls. P. 47
16
liberdade de descrença, o agnosticismo e a liberdade de ser ateu; b) a
liberdade de culto diz respeito à exteriorização do sentimento sagrado, de
praticar os ritos, orar em casa ou em público, e ter seus templos; c) a
liberdade de organização refere-se a possibilidade de uma determinada
religião ter uma estrutura organizacional, inclusive de personalidade jurídica,
até para suas relações com o Estado.38

O direito a liberdade religiosa é tratado como direito fundamental, muito se deu


esse titulo em virtude a intolerância religiosa que ocorreu durante a história. Friedrich
Muller diz que

Os direitos fundamentais são garantias de proteção, substancialmente


conformadas, de determinados complexos de ações, organizações e
matérias, individuais e sociais. Esses ‘âmbitos materiais’ são transformados
em ‘âmbitos normativos’ por meio do reconhecimento constitucional e da
garantia da liberdade no campo da prescrição normativa, do programa da
norma. Os âmbitos normativos participam da normatividade prática, isto é,
eles são elementos co-determinantes da decisão jurídica.39

Os motivos pelos quais os direitos de liberdade religiosa estão inseridos nos


direitos fundamentais é pelo fato de que as declarações de direito individuais
tradicionais, tem a liberdade em seu rol de direito e esses detém poderes. Júlio Cesar
Frosi diz que

Os dois principais argumentos para introduzir algumas liberdades entre os


direitos fundamentais são: a) a irredutibilidade das crenças; b) a crença de
que, quanto mais livre for o indivíduo, tanto mais poderá ele progredir
moralmente e promover também o progresso material da sociedade. Ora,
desses dois argumentos, o primeiro é irrelevante para justificar a exigência
de novos poderes, enquanto o segundo se revelou historicamente falso40

Ainda, pelo direito a religião ser tratado como um direito fundamental, está
constante a hipótese da colisão de direitos, situação na qual Luciano Odebrecht fala
“[...] havendo colisões de direitos, deve prevalecer o princípio da razoabilidade e da
proporcionalidade para a solução do caso em concreto, mas usualmente, deve se
atribuir a mais ampla e possível liberdade para a pratica do ritual religioso”.41

38
Frosi, Julio Cesar. Liberdade religiosa e a teoria da justiça de John Rawls. P .60
39
MÜLLER, Friedrich. Metodologia do Direito Constitucional. 4. ed. São Paulo: RT, 2010 apud
ALEXY, 2006, p. 78
40
MÜLLER, Friedrich. 2010, Op. Cit. P. 78
41
ODEBRECHT, Luciano, 2008, ibid. 119
17
2.2 – PREVISÃO NORMATIVA DA RELIGIÃO E DA LIBERDADE RELIGIOSA
NO SISTEMA JURÍDICO BRASILEIRO

Não se podia falar em liberdade religiosa no período do Brasil imperial de Dom


Pedro I, vez que em sua constituição de 1824 era possível encontrar em seu corpo de
texto descrito uma religião oficial do Brasil, e também devido ao fato de ainda haver
uma relação entre o Estado e a igreja.
Nobre Milton Ribeiro diz que

A Constituição do Império buscou cuidar da questão religiosa de forma clara,


adotando um certo tom liberal no tratamento da individualidade, na medida
em que o seu foro íntimo encontrar-se-ia livre para a escolha religiosa, o que
não se verifica no espaço público, na medida em que a manifestação exterior
ainda é proibida e o próprio Estado, por sua vez, encontrava-se atrelado a
uma religião oficial a católica.42

Já na constituição de 1891, pode ser encontrado uma mudança na questão da


liberdade religiosa, e há a separação da Igreja e o Estado. Reimer diz o seguinte em
relação a esta constituição

Pode-se, pois, dizer que a Constituição republicana assegurou o direito liberal


à liberdade religiosa em solo brasileiro, rompendo com o monopólio quase
exclusivo de um credo ao longo dos primeiros quatro séculos da grandeza
Brasil. Contudo, assim como os direitos humanos foram formulados de forma
ideal com pretensão universal, os dispositivos constitucionais referentes à
liberdade religiosa tardariam a se configurar na realidade, especialmente
levando em consideração que o país ainda se valia do modo de produção
escravagista, impedindo essas pessoas em situação de escravos de poder
gozar do benefício do caput do Artigo 72, quando o direito à liberdade ainda
não estava universalmente assegurado. Somente as subsequentes leis
referentes à libertação de escravos (Lei do Ventre Livre, Lei do Sexagenário,
Lei Áurea) viriam trazer uma mudança no plano jurídico, embora só
lentamente no plano fático.“ 43

Na constituição que foi promulgada depois dessa, a constituição de 1934, ficou


mantido os aspectos responsáveis pela liberdade religiosa, dando destaque para a

42
RIBEIRO, Milton. Liberdade religiosa: uma proposta para debate. São Paulo: Mackenzie, 2002.
P.9
43
REIMER, Haroldo. Liberdade Religiosa na História e nas Constituições do Brasil. São Leopoldo:
Oikos, 2013. P. 57
18
questão da inviolabilidade da liberdade de consciência e de crença, o livre exercício
dos cultos religiosas, e o reconhecimento do casamento religioso.44
As outras constituições, assim como a emenda constitucional de 69,
mantiveram com a seguridade do direito de liberdade religiosa, assegurando o direito
de culto e da liberdade de consciência.
Referente a constituição federal de 1988, a atual constituição vigente, Moraes
diz que “A conquista constitucional da liberdade religiosa é verdadeira consagração
de maturidade de um povo”.45
Portanto, na constituição de 1988 já se tem uma total separação do estado e
da igreja, assim como é impedido ao estado privilegiar alguma religião em especifico,
pois o Brasil agora se trata de um país laico. Passou também a liberdade religiosa a
fazer parte do rol do artigo 5°, que trata dos direitos fundamentais, sendo assegurado
o direito do indivíduo o livre exercício de culto, a proteção dos locais de culto.
Machado descreve que, a liberdade religiosa tratada na Constituição Federal
de 1988, será um tema que deve ser abordado visando os valores constitucionais de
uma ordem livre, plural e democrática46, assim como também os princípios dispostos
no artigo 1°, incisos II, III e V.47
Santos diz que não se deve, a liberdade religiosa, fazer-se valer de uma
“verdade religiosa”, para que possa ser melhor analisado a questão da
igualdade de liberdade concedida a cada indivíduo, fazendo esses o direito de
escolher um dogma religioso para si e segui-lo. 48
Ainda no tocante, Leite elucida uma dificuldade quanto a interpretação do
direito fundamental a liberdade religiosa perante os direitos fundamentais, pois existe
uma problemática quanto a inclusão de religiões que não são fiéis aos dogmas de
uma religião majoritária. 49

44
MANGUEIRA, Hugo Alexandre Espínola. Acordo Brasil-Santa Sé: uma análise jurídica. João Pessoa:
Ed. Universitária UFPB, 2009
45
Moraes, Alexandre de. Direito Constitucional. 12. ed. – São Paulo: Atlas, 2002, p. 73.
46
MACHADO, Jónatas Eduardo Mendes. Liberdade religiosa numa comunidade constitucional
inclusiva: dos direitos da verdade aos direitos do cidadão. Coimbra, Portugal: Coimbra Editora, 1996.
47
1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do
Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: [...]. II - a
cidadania III - a dignidade da pessoa humana; [...]. V - o pluralismo político. [...]
48
Santos, Michel Ferrari Borges dos. A configuração constitucional do direito fundamental à liberdade
religiosa e do princípio da laicidade: uma análise pautada na jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal / Michel Ferrari Borges dos Santos. – Joaçaba: Editora Unoesc, 2020
49
LEITE, Fábio Carvalho. Estado e religião: a liberdade religiosa no Brasil. Curitiba: Juruá, 2014,
19
Santos complementa dizendo que deve ser utilizado do princípio da dignidade
da pessoa humana “como valor jurídico-político na interpretação do direito
fundamental à liberdade religiosa de forma a se olhar para religiões minoritárias sob
uma perspectiva inclusiva e empática”.50
Quanto a essa empatia que deve existir, Michel Ferrari Borges dos Santos diz:

A empatia a ser utilizada na interpretação do direito fundamental à liberdade


religiosa possui relação com o olhar que reconhece como legítima a religião
de cada indivíduo ou grupo, sendo ou não ela a religião majoritária.”(...).(...)
“o direito fundamental à liberdade religiosa se configura como a mais
eloquente expressão da alteridade, onde a liberdade de um indivíduo o obriga
no dever de respeito à liberdade do outro”. 51

A constituição federal acaba por vedar que ocorra por parte do Estado um
favorecimento de uma religião em detrimento das outras, pois o indivíduo possui o seu
direito a liberdade religiosa. Santos Junior diz sobre a não possibilidade de privilegiar
uma religião em detrimento da outra, pois caso aconteça, ocorre um ferimento quanto
a igualdade quanto a expressão da crença do indivíduo52.
No tocante a aplicabilidade dos direitos fundamentais contidos no artigo 5° da
Constituição Federal, aplicabilidade que se da de forma imediata. Steinmetz afirma
ser imediata a aplicabilidade do direito de liberdade por se tratar de uma relação entre
particulares 53 . Ainda sobre esta questão, Santos complementa que “o direito
fundamental à liberdade religiosa vincula os particulares mesmo sem a existência de
norma de direito ordinário que o discipline.54”
Além de ser um direito que tem como característica a aplicabilidade imediata,
também faz-se valer de outras como a capacidade de vinculação entre entidades
públicas e privadas, o procedimento para uma possível restrição a esse direito tem
um procedimento dificultoso55, dentre outras.

50
Santos, Michel Ferrari Borges dos. A configuração constitucional do direito fundamental à liberdade
religiosa e do princípio da laicidade: uma análise pautada na jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal / Michel Ferrari Borges dos Santos. – Joaçaba: Editora Unoesc, 2020
51
Santos, Michel Ferrari Borges dos, op. cit. P. 57
52
SANTOS JUNIOR, Aloísio Cristovam dos. A Liberdade de Organização Religiosa e o Estado Laico
Brasileiro. São Paulo: Mackenzie, 2007
53
STEINMETZ, Wilson. A vinculação dos particulares a direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros,
2004
54
Santos, 2020, op. Cit
55
MACHADO, Jonatas Eduardo Mendes. Liberdade religiosa numa comunidade constitucional
inclusiva,
20
O direito a liberdade de religião vincula diversos direitos a ele elencados, e
sobre essa perspectiva de diversidade de funções, HESSE diz:

Como direitos subjetivos, eles garantem a liberdade de confessar uma fé


(...) individual ou coletivamente, ou também, de recusar e de calar sobre
ambas; eles fundamentam direitos a proteção diante de perturbações e a
omissão de qualquer coação para com uma confissão (...). Como elemento
fundamental da ordem objetiva democrática e estatal-jurídica, a liberdade de
fé, confissão e culto fundamenta a neutralidade do Estado (...) e serve não só
a finalidade de impedir as intervenções estatais e os abusos eclesiásticos,
mas ela é, simultaneamente garantida por causa de sua atualização.”56

Ainda nesse sentido, Teraoka, ao falar sobre a proteção constitucional sobre


esse direito, disse que o conceito de religião deve ser mantido o mais amplo possível,
com um intuito de evitar restrições ao seu exercício.57
A manifestação da liberdade religiosa se da de diferentes maneiras, vai
depender da vontade do indivíduo de escolher uma para seguir os seus dogmas ou
até mesmo escolher não seguir nenhuma.
De acordo com a Declaração Sobre a Eliminação de Todas as Formas de
Intolerância e Discriminação Fundadas na Religião ou nas Convicções, decretada pela
Assembleia Geral da Onu em 1981, tem-se disposto no artigo 6° os direitos a liberdade
e isso incluis as liberdades de:

a) A de praticar o culto e o de celebrar reuniões sobre a religião ou as


convicções, e de fundar e manter lugares para esses fins;
b) A de fundar e manter instituições de beneficência ou humanitárias
adequadas;
c) A de confeccionar, adquirir e utilizar em quantidade suficiente os
artigos e materiais necessários para os ritos e costumes de uma religião ou
convicção;
d) A de escrever, publicar e difundir publicações pertinentes a essas
esferas;
e) A de ensinar a religião ou as convicções em lugares aptos para esses
fins;
f) A de solicitar e receber contribuições voluntárias financeiras e de outro
tipo de particulares e instituições;
g) A de capacitar, nomear, eleger e designar por sucessão os dirigentes
que correspondam segundo as necessidades e normas de qualquer religião
ou convicção;
h) A de observar dias de descanso e de comemorar festividades e
cerimônias de acordo com os preceitos de uma religião ou convicção;

56
HESSE, Konrad. Elementos de direito constitucional da república federativa da Alemanha. P. 298-
299
57
TERAOKA, Thiago Massao Cortizo. A liberdade Religiosa no Direito Constitucional Brasileiro. 2010.
Tese de Doutorado em DIREITO – Universidade de São Paulo (FDUSP), 2010.
21
i) A de estabelecer e manter comunicações com indivíduos e
comunidades sobre questões de religião ou convicções no âmbito nacional
ou internacional

Ainda, em seu preambulo a ONU deixou destaca a importância da liberdade


religiosa para que se houvesse uma paz mundial pois a religião e convicções fazem
com que as pessoas tenham perspectiva de vida.58

2.3 - DOS LIMITES DO DIREITO FUNDAMENTAL A LIBERDADE DE RELIGIÃO

O direito fundamental da liberdade de religião deve ser tratado de maneira que


englobe a maior amplitude possível, juntamente com a laicidade do estado. A limitação
deve ter por objetivo o respeito aos demais direitos fundamentais constitucionalmente
garantidos, servindo esses de base para que sejam feitas as devidas restrições.59
Utilizando-se da “teoria externa” e de “suporte fático amplo” proposta por Alexy,
resta configurado a não existência de um conteúdo pré-definido referente as
limitações do direito fundamental.
Portanto, no tocante a esta teoria, Michel Ferrari Borges dos Santos concluiu
que:

[...]nessa linha de raciocínio, o direito fundamental à liberdade religiosa não


possui um conteúdo pré-estabelecido e suas limitações acontecem através
de regras, princípios e outros direitos fundamentais colidentes no caso
concreto (limitações externas). Em outras palavras: quando se olha somente
o direito fundamental à liberdade religiosa, seu âmbito de proteção é amplo,
mas ao ser aplicado no caso concreto sua incidência efetiva é diminuída, pois
pode sofrer limitações quando colidente com outros princípios.”60

Assim, quando os valores entram em conflito, o legislador é quem será o


responsável pela criação de uma conciliação ou, através de uma interpretação da
norma que será feita por parte da administração ou pelo judiciário.
Na visão de Steinmetz, quando dois princípios colidem entre si, a solução que
deve de ser utilizada é a da Ponderação, pois esse vai valorar as circunstâncias do

58
ADRAGÃO, Paulo Pulido. A Liberdade Religiosa e o Estado. Coimbra: Livraria Almedina, 2002. P.
90-92
59
WEINGARTNER NETO, Jayme. Liberdade Religiosa na Constituição: fundamentalismo, pluralismo,
crença, cultos. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007.
60
Santos, Michel Ferrari Borges dos. A configuração constitucional do direito fundamental à liberdade
religiosa e do princípio da laicidade: uma análise pautada na jurisprudência do Supremo Tribunal
Federa. 2020.
22
caso concreto que levaram os dois princípios a colidirem entre si, ficando um dos
princípios por ceder espaço para que o outro.61
Michel Ferrari Borges dos Santos quanto a esta teoria chegou à conclusão de
que

“É a precedência de um princípio em relação ao outro apenas para


determinado caso concreto, não havendo uma relação de hierarquia fechada
em abstrato entre os princípios, pois a depender do cenário é que prevalecerá
um ou outro princípio na solução da colisão”62

Segundo Weingartner Neto escreveu sobre a possibilidade de acontecer um


confronto de direitos fundamentais de titulares diversos, onde cada um defende a
própria crença.63
Para explicar essa colisão entre direitos fundamentais, Alexy explicou que o
direito de liberdade religiosa é um direito que colide com ele mesmo, pois o estado
como laico e também a existência do princípio da dignidade da pessoa humana, não
se tem reconhecido uma verdade religiosa objetiva, portanto sendo legitimo a
existência de diferentes verdades religiosas.64
A partir disso, Santos defende que “lidar com o direito fundamental à liberdade
religiosa é aceitar a liberdade do outro, que pode se caracterizar como uma verdade
religiosa completamente diferente”65
Quando da colisão de direitos fundamentais e a limitação do direito da
liberdade religiosa, Michel Ferrari Borges dos Santos elencou que

“O princípio da laicidade estatal foi trabalhado anteriormente enquanto um


legitimador da mais ampla liberdade e diversidade religiosas e enquanto uma
dimensão objetivo institucional dessa liberdade. Porém, quando se trata da
colisão entre princípios, a ampla liberdade religiosa pode ser limitada pelo
princípio da laicidade.”66

61
STEINMETZ, Wilson. 2004, ibid.
62
Santos, Michel Ferrari Borges dos. 2020. op. cit;
63
WEINGARTNER NETO, Jayme. Liberdade religiosa na Constituição: fundamentalismo, pluralismo,
crenças, cultos. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007.
64
ALEXY, Robert. Colisão de Direitos Fundamentais e Realização de Direitos Fundamentais no
Estado Democrático de Direito. Luis A. Heck (trad.), Revista da Faculdade de Direito da UFRGS, Vol.
17, 1999. p. 203-214. apud WEINGARTNER NETO, Jayme. Liberdade Religiosa na Constituição:
fundamentalismo, pluralismo, crença, cultos. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007.
65
Santos, Michel Ferrari Borges dos. A configuração constitucional do direito fundamental à liberdade
religiosa e do princípio da laicidade: uma análise pautada na jurisprudência do Supremo Tribunal
Federa. 2020.
66
Santos, Michel Ferrari Borges dos. A configuração constitucional do direito fundamental à liberdade
religiosa e do princípio da laicidade: uma análise pautada na jurisprudência do Supremo Tribunal
Federa. 2020.
23
Weingartner Neto alega que as limitações feitas frente ao direito fundamental à
liberdade religiosa resultam da leitura feita pelo legislador do teto constitucional em
um “quadro de concretização” 67 . Também elucida a importância da haver uma
harmonia entre os valores e princípios, dizendo que

Harmonizar (e ponderar) é realizar sucessivos cortes nos bens ou valores em


jogo, tornando-os gradualmente mais finos, leves e menos densos,
despojando-os de toda acidentalidade, tendo como limite o núcleo, o caroço,
o que os torna essenciais (identificáveis), a fim de que caibam, todos, no
mesmo espaço discursivo ou unidade argumentativa. E numa colisão
incontornável e fundamental, do entrechoque e do desbastar recíproco, há de
permanecer a realidade mais espessa. 68

Por fim, Michel Ferrari diz sobre as limitações feitas ao direito de liberdade
religiosa

As limitações ou restrições ao direito fundamental à liberdade religiosa foram


aqui apresentadas enquanto uma possibilidade na colisão com outros
princípios, bem como através de uma interpretação sistemática do texto
constitucional e da atividade legislativa (submetendo-se, como não poderia
deixar de ser, aos parâmetros constitucionais). Assim, entende-se que as
limitações e eventuais ponderações feitas pelo legislador são melhor
analisadas quando da verificação de sua aplicação na prática, através de
casos concretos ou de legislações enquanto objeto de controle de
constitucionalidade.69

Aldir Guedes Soriano elucida que os limites da liberdade religiosa advém de


uma necessidade existente entre um confronto e uma acomodação entre esse direito
para com os demais valores constitucionais.70
Ainda, existem princípios presentes no texto constitucional que elucidam essas
limitações, assim como existem princípios que, apesar de não se fazerem presentes
no corpo do texto, exercem o seu papel de limitador deste direito.

67
WEINGARTNER NETO, Jayme. Liberdade religiosa na Constituição: fundamentalismo, pluralismo,
crenças, cultos. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007.
68
WEINGARTNER NETO, Jayme. 2007. Op. Cit. P.198
69
Santos, Michel Ferrari Borges dos. A configuração constitucional do direito fundamental à liberdade
religiosa e do princípio da laicidade: uma análise pautada na jurisprudência do Supremo Tribunal
Federa. 2020. P.110/111
70
SORIANO, Aldir Guedes. Direito à liberdade religiosa sob a perspectiva da democracia liberal. In:
SORIANO, Aldir; MAZZUOL1, Valério (Org.). Direito à liberdade religiosa: desafios e perspectivas
para o século XXI, Belo Horizonte: Editora Fórum, 2009.
24
Assim, os limites da liberdade religiosa devem ser confrontados frente aos
demais direitos previstos na constituição federal e o caso concreto.

CAPÍTULO III - A RELIGIÃO ENVOLVENDO OUTROS AMBITOS DA SOCIEDADE

Nas discussões sobre a amplitude dos direitos e princípios que determinam que
o Brasil seja considerado um país laico, pode-se encontrar algumas controvérsias em
determinados assuntos quando se trata da liberdade religiosa, como por exemplo o
ensino religioso em escolas públicas, o sacrifício religioso de animais ou o uso de
símbolos religiosos dentro de espaços públicos, pois não se tem uma maneira fácil de
determinar os limites dessas ações e determinar a possível interferência do Estado.
Por tal motivo, será abordado cada questão separadamente, na tentativa de obter um
melhor esclarecimento sobre tais assuntos.

4.1 O ENSINO RELIGIOSO NAS ESCOLAS PÚBLICAS

A discussão acerca do ensino religioso em escolas públicas dever ou não fazer


parte da grade curricular tem gerado discussões e opiniões divergentes sobre o tema.
Enquanto alguns defendem que o ensino religioso é um direito e deveria fazer
parte da grade escolar regular do aluno, como por exemplo Heloísa Sanches que diz
que “matrícula na matéria religiosa não é um dever, mas um direito do aluno. Caso
contrário, a liberdade religiosa, um direito fundamental, estaria gravemente
contrariada”. 71
Ou também para Giumbelli, que diz que o ensino religioso e a noção de
laicidade tem ligação.72
Entretanto, existem aqueles que dizem o contrário. Existe a possibilidade de
ferir a neutralidade do estado diante das religiões quando se tem o ensino religioso
confessional e o princípio da laicidade envolvidos no âmbito monetário, levando em
consideração a remuneração que seria dada aos professores para ensinar.
Referente ao assunto, Hédio Silva Junior elucida:

71
CHEHOUD, Heloísa Sanches Querino. A liberdade religiosa nos Estados Modernos. 2. ed. São
Paulo: Almedina, 2017. pag.112.
72
Giumbelli, Emerson. A presença do religioso no espaço público: modalidades no Brasil, 2008
25
A norma do ensino religioso deve guardar rigorosa obediência e sintonia com
os limites e termos da laicidade estatal pelo que a adoção da norma
infraconstitucional que permitiu o financiamento público do ensino religioso,
bem como a ingerência estatal nesta área (Lei nº 9.475/97)117 afigura-se
irremediavelmente inconstitucional. 73

Assim, o autor entende que deve partir da escolha do aluno cursar ou não tal
matéria, sendo oferecida de maneira facultativa, conforme prevê o artigo 210, § 1º da
constituição federal, que dispõe que

“Serão fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a


assegurar formação básica comum e respeito aos valores culturais e
artísticos, nacionais e regionais. § 1º - O ensino religioso, de matrícula
facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas
de ensino fundamental.”74

Com o intuito de analisar a forma como o ensino religioso seria ministrado nas
instituições de ensino público de modo a não se ter um caráter confessional, foi
instaurada Ação Direta de Inconstitucionalidade de número 4.439, sendo analisada
pelo Supremo tribunal Federal, tendo os dispositivos da lei de Diretrizes e Bases da
75
Educação como o objeto de controle de constitucionalidade.
A lei de diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei n° 9.349/ 1996,
regulamenta a facultatividade do ensino religioso em escolas públicas brasileiras no
ensino fundamental. Em seu texto original, o artigo 33 de tal lei, que antes determinava
que seria ministrado o ensino religioso de maneira confessional ou interconfessional,
sendo essas aulas ministradas por aqueles que detinham credenciais advindas da
igreja.76

73
SILVA JÚNIOR, Hédio. A liberdade de crença como limite à regulamentação do ensino religioso.
Doutorado em Direito, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2003 69 BRASIL.
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
74
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
75
Santos, Michel Ferrari Borges dos. A configuração constitucional do direito fundamental à liberdade
religiosa e do princípio da laicidade: uma análise pautada na jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal / Michel Ferrari Borges dos Santos. – Joaçaba: Editora Unoesc, 2020.
76
art. 33 - O ensino religioso, de matrícula facultativa, constitui disciplina dos horários 25 normais das
escolas públicas de ensino fundamental, sendo oferecido, sem ônus para os cofres públicos, de
acordo com as preferências manifestadas pelos alunos ou por seus responsáveis, em caráter: I -
Confessional, de acordo com a opção religiosa do aluno ou do seu responsável, ministrado por
professores ou orientadores religiosos preparados e credenciados pelas respectivas igrejas ou
entidades religiosas;
II - interconfessional, resultante de acordo entre as diversas entidades religiosas, que se
responsabilizarão pela elaboração do respectivo programa."
26
Entretanto, posteriormente houve alteração na redação do artigo 77. A lei 9.475/
1997 determinou a respeito da diversidade cultural religiosa do brasil, sendo
vedado a conversão de alunos a certas causas ou religiões, passando as aulas a
serem ministradas por professores aptos através de remuneração.
Com o intuito de obter uma melhor resolução para a Ação direta de
inconstitucionalidade proposta pela Procuradoria Geral 78, vez que o assunto que está
sendo versado engloba diferente nichos, foi promovido uma audiência pública
buscando um diálogo entre sociedade e Corte, dialogo este que teve como resultado
uma concordância, por parte da maioria, ao discurso feito dela Procuradoria Geral.
A partir dos votos proferidos pelos ministros do Supremo tribunal Federal, que
se deram, principalmente, resguardando os fundamentos da laicidade e do direito
fundamental à liberdade religiosa, Michel Ferrari Borges dos Santos conclui que

[...] somente um ensino religioso não confessional se coadunaria com o


Estado laico brasileiro –, vislumbra uma interpretação mais sistemática da
ordem constitucional e reflete a preocupação com um Estado mais
responsável pela promoção de tolerância e respeito entre os adeptos de
diferentes concepções religiosas e não religiosas, realizando em uma maior
medida possível o princípio da laicidade estatal e o direito fundamental à
liberdade religiosa de todos.[...] 79

Ainda sobre o caráter facultativos do ensino religioso em escolas públicas,


Carlos Roberto Cury diz que

Para que o caráter facultativo seja efetivo e a possibilidade de escolha se


exerça como tal, é necessário que, dentro de um espaço regrado como o é o
das instituições escolares, haja a oportunidade de opção entre o ensino
religioso e outra atividade pedagógica igualmente significativa para tantos
quantos que não fizerem a escolha pelo primeiro. Não se configura como
opção a inatividade, a dispensa ou as situações de apartamento em locais
que gerem constrangimento. Ora, essa(s) atividade(s) pedagógica(s)
alternativa(s), constante(s) do projeto pedagógico do estabelecimento

77
Art. 33 - O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do
cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental,
assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de
proselitismo.
§ 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a definição dos conteúdos do
ensino religioso e estabelecerão as normas para a habilitação e admissão dos professores. § 2º Os
sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes denominações religiosas, para
a definição dos conteúdos do ensino religioso
78
Busca, por meio de métodos educacionais que englobem diferentes religiões, a adoção do modelo
de ensino religioso não confessional.
79
Santos, Michel Ferrari Borges dos. A configuração constitucional do direito fundamental à liberdade
religiosa e do princípio da laicidade: uma análise pautada na jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal / Michel Ferrari Borges dos Santos. – Joaçaba: Editora Unoesc, 2020. P. 128
27
escolar, igualmente ao ensino religioso, deverão merecer, da parte da escola
para os pais ou alunos, a devida comunicação, a fim de que estes possam
manifestar sua vontade perante uma das alternativas. Este exercício de
escolha, então, será um momento importante para a família e os alunos
exercerem conscientemente a dimensão da liberdade como elemento
constituinte da cidadania.”80

Assim sendo, tem-se que o ensino religioso ser facultativo é uma maneira de
tentar não ofender o princípio da laicidade.

4.2 O SACRIFÍCIO DE ANIMAIS EM RITUAIS RELIGIOSOS

O sacrifício de animais em rituais religiosos consiste, segundo Kellen Josephine


Muniz de Lima e Ilzver de Matos Oliveira, “em um ato fundamentalmente
religioso que, de forma geral, tem por finalidade o agradecimento ou a obtenção de
graças ou favores das divindades”.81
Entretanto, conforme Mancini adverte, existem diversas controvérsias quanto a
essas práticas, vez que houve o surgimento de conflitos entre o direito à liberdade
religiosa e o sacrifício de animais para esses rituais, pois a proteção dos animais está
se mostrando deter cada vez mais forças.82
Conforme diz Santos, é necessário que seja feita uma interpretação
constitucional adequada em se tratando do sacrifício de animais em rituais religiosos,
pois a questão envolve o direito de liberdade de culto e liberdade de religião que
dispõe aqueles que são praticantes destes atos, sendo na realidade uma minoria
praticante de religião de matriz africana.83

80
CURRY, Carlos Roberto Jamil. Ensino Religioso na Escola Pública: o retorno de uma polêmica
recorrente. Revista Educação brasileira. Acesso em 25 de setembro de 2022. Disponível em >
https://doi.org/10.1590/S1413-24782004000300013 <
81
DE LIMA, Kellen Josephine Muniz; DE MATOS OLIVEIRA, Ilzver. Liberdade religiosa e a polêmica
em torno da sacralização de animais não-humanos nas liturgias religiosas de matriz
africana/Religious freedom and the controversy around sacralization of non-human animals in liturgies
of african-rooted religions. Revista Brasileira de Direito, v. 11. P. 102. Acesso em 25 de setembro de
2022. Disponível em > http://www.pos.imed.edu.br/index.php/revistadedireito/article/view/833 <
82
MANCINI, Fernanda Ferreira. Liberdade religiosa: questões polêmicas da atualidade. Curitiba:
Universidade Tuiuti do Paraná, 2013
83
Santos, Michel Ferrari Borges dos. A configuração constitucional do direito fundamental à liberdade
religiosa e do princípio da laicidade: uma análise pautada na jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal, 2020.
28
No âmbito Brasileiro, são recorrentes os projetos de lei que afetam as práticas
de cultos de matriz africana, muitas vezes gerando uma mobilização das comunidades
afrorreligiosas no âmbito político e social dizem Carvalho e Scuro84.
O início ao debate sobre o assunto se deu no estado do Rio Grande do Sul,
fazendo-o chegar até o Supremo Tribunal Federal.
Propondo a criação de um de um Código Estadual de Proteção aos Animais, o
deputado estadual e também pastor evangélico Manoel Maria dos Santos apresentou
este projeto de lei em 2003.
Em uma primeira versão, o projeto de lei declarava a proibição da realização
de cerimonias religiosas que envolvessem o uso de animais, conforme texto do artigo
2° do projeto de lei n° 447/1991, que foi inicialmente apresentado. 85
A redação de tal projeto acabou elencando debates nos meios afrorreligiosos
e afropolíticos, vez que o texto do projeto fazia menção a “cerimonias religiosas” e
“feitiços”, deixando claro o objetivo de atingir religiões de matrizes africanas, pois
estas são praticantes de tais cultos e utilizando-se do sacrifício de animais. A partir
disso, o deputado autor de tal projeto ficou obrigado a alterar o texto, tendo que redigir
uma nova versão do artigo.86
Após alterado, o artigo passou a ter o seguinte teor:

Artigo 2º: É vedado:


I - ofender ou agredir fisicamente os animais, sujeitando-os a qualquer tipo
de experiência capaz de causar sofrimento ou dano, bem como as que criem
condições inaceitáveis de existência;
II - manter animais em local completamente desprovido de asseio ou que lhes
impeçam a movimentação, o descanso ou os privem de ar e luminosidade;
III - obrigar animais a trabalhos exorbitantes ou que ultrapassem sua força;
IV - não dar morte rápida e indolor a todo animal cujo extermínio seja
necessário para consumo;

A nova redação se transformou na lei número 11.915/2003, que fez com


deixasse de ser proibido a realização de “cerimonias religiosas” e “feitiços” que

84
CARVALHO, Erico Tavares de; ORO, Ari Pedro; SCURO, Juan. O sacrifício de animais nas
religiões afro-brasileiras: uma polêmica recorrente no Rio Grande do Sul. Religião e Sociedade, Rio
de Janeiro, v. 37, n. 2, p. 234, 2017.
85
“Art. 2° - É vedado: realizar espetáculos, esporte, tiro ao alvo, cerimônia religiosa, feitiço,
rinhadeiros, ato público ou privado, que envolvam maus tratos ou a morte de animais, bem como
lutas entre animais da mesma espécie, raça, de sua origem exótica ou nativa, silvestre ou doméstica
ou de sua quantidade”
86
CARVALHO, Erico Tavares de; ORO, Ari Pedro; SCURO, Juan. O sacrifício de animais nas
religiões afro-brasileiras: uma polêmica recorrente no Rio Grande do Sul. Religião e Sociedade, Rio
de Janeiro, v. 37, n. 2. 2017. P.232
29
fizessem valer do sacrifício de animais para tal, tendo entretanto, determinado que
praticas que causassem dano ou sofrimento aos animais não dispunham de validação,
tendo a morte do animal que ser, portando, ser rápida e sem sofrimento.87
Mesmo com esta nova redação, houveram o surgimento de temores referentes
a possíveis proibições de práticas de sacrifício. Foi então que o deputado Edson
Portilho apresentou o projeto de lei 282/2003, objetivando o acréscimo de uma
exceção permissiva no artigo 2° da lei 11.91588, o qual buscava um meio pelo qual os
cultos de matrizes africanas não encontrassem obstáculos para a realização de tais
práticas, não podendo então, serem caracterizados pelas proibições dispostas no
referente artigo, o qual foi aprovado através da lei 12.131/2004.
Com a aprovação do projeto de lei, foi ajuizada uma Ação direta de
Inconstitucionalidade89 pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul, buscando que
fosse retirado o acréscimo auferido ao artigo 2°, que foi promovido pela lei
12.131/2004. Entretanto, restou reconhecida a constitucionalidade da lei pelo Tribunal
de Justiça, dispondo que

A norma impugnada não é inconstitucional sustentando que os rituais das


religiões de matriz africana pressupõem o sacrifício de animais domésticos
em suas liturgias, animais estes criados em cativeiros, para este fim
específico, não havendo afronta a Lei 9.605/98. Postulou a improcedência do
pedido, haja vista ausência de vício de inconstitucionalidade.90

Ainda, dispondo sobre a decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul


sobre a referida ação, Michel Ferrari Borges dos Santos diz que

A ação restou julgada improcedente no Tribunal de Justiça gaúcho, de modo


a entender que a legislação era constitucional ao prever os cultos e liturgias
das religiões de matriz africana como uma exceção às vedações constantes
no Código Estadual de Proteção aos Animais – assegurando o direito
fundamental à liberdade de culto e permitindo a imolação de animais em
rituais religiosos, ressalvando-se que a prática deve ocorrer sem excessos e
sem crueldade.91

87
CARVALHO; ORO; SCURO, 2017. Loc. Cit.
88
Foi acrescentado parágrafo único ao artigo 2°, o qual tinha o seguinte texto: Não se enquadra
nessa vedação o livre exercício dos cultos e liturgias das religiões de matriz africana.
89
Ação Direta de Inconstitucionalidade 70010129690 no Tribunal de Justiça estadual
90
ROBERT. Yannick Yves Andrade. Sacrificio de animais em rituais de religiões de matriz africanas.
Tese de graduação em direito. Acesso em 09 de outubro de 2022. Disponível em
https://www.pucrio.br/ensinopesq/ccpg/pibic/relatorio_resumo2008/relatorios/ccs/dir/yannick_yves_an
drade_robert.pdf
91
Santos, Michel Ferrari Borges dos. A configuração constitucional do direito fundamental à liberdade
religiosa e do princípio da laicidade: uma análise pautada na jurisprudência do Supremo Tribunal
30
Através de Recurso Extraordinário 92 interposto perante o Supremo Tribunal
Federal, pois esta é denominada como guardiã dos direitos fundamentais que dispõe
sobre este tema, o Ministério Público do Rio Grande do Sul alegou que a norma,
perante aquela corte, teria o caráter inconstitucional pois a lei estadual determina que
é permitido o sacrifício de animais no exercício de religiões especificas, portanto esse
fato seria um afronte ao princípio da isonomia e também seria não seria compatível
com o Estado laico.93
Quanto ao posicionamento perante tal recurso, restou este conhecido e
desprovido pela Procuradoria Geral, sendo o teor da decisão:

Decisão: O Tribunal, por maioria, negou provimento ao recurso extraordinário,


nos termos do voto do Ministro Edson Fachin, Redator 53 para o acórdão,
vencidos, em parte, os Ministros Marco Aurélio (Relator), Alexandre de
Moraes e Gilmar Mendes, que também admitiam a constitucionalidade da lei,
dando-lhe interpretação conforme. Em seguida, por maioria, fixou-se a
seguinte tese: “É constitucional a lei de proteção animal que, a fim de
resguardar a liberdade religiosa, permite o sacrifício ritual de animais em
cultos de religiões de matriz africana”, vencido o Ministro Marco Aurélio. Não
participaram da fixação da tese os Ministros Ricardo Lewandowski e Gilmar
Mendes. Ausente, justificadamente, o Ministro Celso de Mello.94

Santos, ao comentar sobre a decisão e os votos, disse que

[...] Os votos cuja tese venceu entenderam que o sacrifício de animais faz
parte da religiosidade de várias crenças e é uma prática legítima, mas que a
menção às “religiões de matriz africana” é constitucional porque são elas que
sofrem estigmatização social.95

E quando mencionado sobre a questão da laicidade estatal sobre o assunto,


Santos disse que

[...] Acredita-se que o Supremo Tribunal Federal construiu nessa decisão do


Recurso Extraordinário 494.601 uma concepção de laicidade estatal perante
a diferença, legitimando práticas religiosas plurais e acomodando minorias
religiosas enquanto legítimas manifestações (também culturais). 96

Federal / Michel Ferrari Borges dos Santos. – Joaçaba: Editora Unoesc, 2020. P. 146
92
Recurso Extraordinário 494.601
93
Santos, Michel Ferrari Borges dos. Op. cit
94
Presidência do Ministro Dias Toffoli. Plenário, 28.03.2019. (BRASIL. Recurso Extraordinário RE n.
494601, Relator Min. Marco Aurélio. DJ:28/03/2019, grifo nosso).
95
Santos, Michel Ferrari Borges dos. A configuração constitucional do direito fundamental à liberdade
religiosa e do princípio da laicidade: uma análise pautada na jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal. 2020. P. 150
96
Santos. 2020, op. Cit. P. 155
31
A constituição federal busca uma proteção quanto a fauna e a liberdade
religiosa, tema este que pode encontra uma difícil solução pois o exercício de um põe
em risco a existência do outro. Existem aqueles que defendem a predominância da
liberdade religiosa em seu preceito constitucional

A partir da teoria do sopesamento dos princípios, em que deve se realizar a


ponderação entre as normas colidentes, de modo que permaneça um mínimo
referente a cada uma, restringindo ao mínimo possível cada princípio, seria
inconstitucional e ilegítimo constatar a ilegalidade de tais atos. A proibição de
tais práticas violaria o preceito constitucional da liberdade de crença e
religião, e suprimiria o conteúdo mínimo essencial de tal norma. 97

Manoel Jorge e Silva Neto esclarecem quanto a existência dos limites dessa
liberdade religiosa

Na liberdade de culto, protege-se o indivíduo a fim de que se comporte de


acordo com as suas convicções religiosas durante as liturgias. [...] O direito
de livre exercício de culto somente admite as contenções impostas pela regra
de ouro da liberdade: a liberdade de alguém termina onde começa a liberdade
de outrem.98

Em que pese a existência de diversos debates acerca do sacrifício de animais


em rituais religiosos, assim como o conflito de direitos, resta elucidado a necessidade
de critérios para que se obtenha soluções entres esses conflitos, de maneira a garantir
que os direitos elencados a liberdade religiosa e os direitos dos animais possam ser
aplicados em sua máxima.

4.3 O USO DE SÍMBOLOS RELIGIOSOS EM LOCAIS PÚBLICOS

Com a implementação do Estado laico, passou-se a questionar a presença de


símbolos religiosos em espaços públicos, vez que em sua grande maioria, os símbolos
utilizados são crucifixos, símbolo este representante do catolicismo. Este fato ocorre
até nos dias atuais, em que se é possível encontrar estes símbolos nos recintos de
diversas instituições judiciarias, legislativas ou de administração pública.

97
CARVALHO, Ana Beatriz Gonçalves de; CÂMARA, Delano Carneiro da Cunha. Multiculturalismo e
colisão de direitos: A liberdade religiosa e o sacrifício de animais em rituais religiosos de matriz
africana. Jus Navigandi, Teresina, ano 19, n. 3928, 3 abr. 2014. Acesso em: 25 de setembro de 2020.
Disponível em: < https://jus.com.br/artigos/27281/multiculturalismo-e-colisao-de-direitos >
98
NETO, Manoel Jorge e Silva. Curso de Direito de Constitucional. p. 682 e 683
32
Esses questionamentos partem dos ditames impostos pelo artigo 19 da
Constituição Federal, que, baseando-se no princípio da laicidade, preconiza pela
separação do Estado e da Igreja.
Sobre a presença de símbolos religiosos em espaços que são considerados
públicos, partindo do pressuposto que o Estado é laico, Antonio Pinzani diz:

“(...) particularmente no Brasil, país no qual a laicidade do Estado nunca


passou de um princípio abstrato escassamente respeitado, começando pela
presença invasiva de símbolos religiosos nos espaços públicos (como no
caso da exposição de crucifixos nos tribunais ou nas escolas, da presença de
bispos católicos e, recentemente, evangélicos nas cerimônias públicas – até
chegar ao lema “Deus seja louvado” impresso nas notas da moeda oficial,
numa estranha combinação de Deus e Mamona).99

O Estado enquanto laico tem o dever de preconizar pela sua neutralidade, pois
ao exibir, em locais de repartições públicas, símbolos religiosos, especialmente o
crucifixo, que é o símbolo utilizado e mantém uma posição de exposição em locais de
destaque, acaba por mostrar que ainda existe a presença de uma relação do Estado
com a religião; também acaba por causar um sentimento de coação sobre aqueles
que não são adeptos a aquela doutrina, assim como tem um caráter discriminatório
para com as demais religiões, tornando estas secundarias a aquela que é exposta
pelo Estado.100
A permanência de símbolos religiosos em repartições públicas apenas constata
a existência de uma latente discriminação com as minorias religiosas, pois
constantemente os dogmas apresentados pela religião a qual o símbolo representa,
detém um preconceito e/ ou discriminação perante essas minorias. Sobre essa
prática, Daniel Sottomaior diz:

“Esses símbolos não foram afixados como resultado da busca pelo bem
comum, ou considerando o respeito à diversidade, à igualdade ou aos direitos
humanos, que são objetivos de Estado bem posteriores a essa prática. Pelo
contrário, eles eram parte integrante de um amplo processo de
homogeneização da prática e do pensamento religioso e do sequestro do
Estado pelos interesses religiosos. Esse cenário é próprio de um país regido
por uma fé obrigatória, não o de uma pátria multicultural.”101

99
PINZANI, A. Estado laico e interferência religiosa. Pg. 280
100
SOTTOMAIOR, Daniel. O Estado Laico, São Paulo, 2014
101
SOTTOMAIOR, Daniel. Op. Cit., pg. 59

33
Ainda se referir sobre essa interferência na liberdade de crença causada pelo
uso de símbolos em locais públicos, Sarmento dispõe: “[...] a promiscuidade entre os
poderes públicos e qualquer credo religioso, por ela interditada, ao sinalizar endosso
estatal de doutrinas de fé, pode representar uma coerção, ainda que de caráter
psicológico, sobre os que não professam aquela religião.”102
Para uma busca de uma total neutralidade do estado perante as religiões
existentes, faz-se necessário que haja um tratamento totalmente igualitário entre as
elas, ainda sobre o assunto, Sottomaior complementa:

“A exibição de tais símbolos não apenas viola a laicidade do Estado e se torna


elemento de coação contra aqueles que não são adeptos daquela fé, mas
também possui um papel claramente discriminatório, o que é apoiado pela
análise das causas históricas de sua presença.” 103 .

No ano de 1991 foi proposto, pelo Presidente da Assembleia legislativa de São


Paulo, mandado de segurança 104 com o intuito da retirada dos crucifixos da
assembleia, sendo este ato impetrado por outro mandado de segurança, este
objetivando a manutenção dos símbolos religiosos, ato este que deferido e portanto,
mantido os símbolos religiosos sob a alegação de não violação do artigo 5°, inciso VI
da constituição105. Assim como a utilização do argumento de que tais objetos seriam
apenas de enfeite. Sobre esse argumento, Daniel Sottomaior elucida que “[...] Manter
tais símbolos sob a alegação de que se trata de mero traço cultural implica obter, para

102
SARMENTO, Daniel. O Crucifixo nos Tribunais e a laicidade do Estado. In: LOREA, Roberto
Arriada (Org.). Em Defesa das Liberdades Laicas. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2008
103
Sottomaior, Daniel. O Estado Laico. 2014. P. 57
104
MANDADO DE SEGURANÇA – Autoridade Coatora – Presidente da Assembléia Legislativa do
Estado – Retirada de crucifixo da sala da Presidência da Assembléia, sem aquiescência dos
deputados – Alegação de violação ao disposto no artigo 5º, inciso VI da Constituição Federal, eis que
a aludida sala não é local de culto religioso – Carência decretada. Na hipótese não ficou demonstrado
que a presença ou não de crucifixo na parede seja condição para o exercício de mandato dos
deputados ou restrição de qualquer prerrogativa. Ademais, a colocação de enfeite, quadro e outros
objetos nas paredes é atribuição da Mesa da Assembléia (Artigo 14, inciso II, Regulamento Interno),
ou seja, de âmbito estritamente administrativo, não ensejando violência a garantia constitucional do
artigo 5º, VI da Constituição da República. (TJ/SP, Mandado de Segurança nº 13.405-0, Relator
Desembargador Rebouças de Carvalho, julgado em 02.10.1991 -0)
105
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: VI - e inviolável a liberdade de
consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na
forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;
34
a religião privilegiada, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo
alguém em erro, mediante artifício[...]”106
Ainda na tentativa de retirada dos crucifixos das salas de assembleia, foi
solicitado pelo Concelho Nacional de Justiça que fossem tomadas providencias
quanto a esse tocante. Entretanto, com base nos argumentos a seguir ditos por Daniel
Sarmento, o pleito foi rejeitado:

(a) O caráter tradicional e costumeiro da prática impugnada; (b) a inexistência


de qualquer vedação legal a ela; (c) o caráter positivo da mensagem que
porta o crucifixo como “símbolo que homenageia princípios éticos e
representa especialmente a paz”; (d) a ausência de qualquer violação de
direitos ou de discriminação na exibição de crucifixos nos tribunais; (e) a
autonomia administrativa dos tribunais para decidirem livremente a respeito
do assunto, tendo em vista a ausência de balizas legais. 107

Em uma opinião oposta a esta, pode-se ser elucidada a de Paulo Roberto Lotti
Vecchiatti que diz que

O uso de símbolos religiosos em órgãos estatais é inconstitucional, por


afronta ao princípio da laicidade estatal por caracterizar verdadeira relação
de aliança com a fé cristã e/ou, ainda, por causar descabido incômodo
àqueles que não professam a fé cristão que ingressem em ditas repartições
públicas.108

Ainda, no tocante do mesmo assunto, Daniel Sottomaior diz o seguinte

[...] Um Estado laico, portanto, não pode ser pluriconfessional, ou estará


apenas ampliando o rol de privilegiados. Não cabe ao Estado, ou aos seus
representantes, tutelar, coibir ou coagir as consciências de seus cidadãos em
matéria religiosa, mas apenas e tão-somente garantir a liberdade religiosa[...]
109

Assim, o uso de Símbolos religiosos em instituições públicas tende a deixar a


impressão de um favorecimento de uma religião em especifico, afrontando
diretamente o princípio da laicidade do estado. Destarte, causa desconforto de outras

106
Sottomaior. Ibid. p. 62
107
SARMENTO, Daniel. O crucifixo nos tribunais e a laicidade do estado. In: MAZZUOLI, Valério de
Oliveira; SORIANO, Aldir Guedes (Coord.) Direito à liberdade religiosa: desafios e perspectivas para
o século XXI. Belo Horizonte: Fórum, 2009. p. 212.
108
VECCHIATTI, Paulo Roberto Iotti . Laicidade Estatal tomada a sério.REVISTA JUS NAVIGANDI,
ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13 , n. 1830, 5 jul. 2008 . Acesso em 27 de setembro de 2020.
Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11463/laicidade-estatal-tomada-a-serio
109
SOTTOMAIOR, Daniel. O Estado Laico, p. 59
35
minorias religiosas por não obterem os mesmos tratamentos igualitários que são
impostos.

4.4 AS TESTEMUNHAS DE JEOVÁ E A TRANSFUSÃO DE SANGUE

As testemunhas de Jeová fazem parte de um grupo religioso que fazem


trabalhos de evangelização batendo de porta em porta nas residências das pessoas
para repassar as palavras escritas na bíblia. O objetivo desse grupo, é tornar
conhecido o Reino de Jeová Deus, quem eles acreditam ser o criador do universo,
conforme trecho publicado em uma das edições de sua revista:

O objetivo desta revista, A Sentinela, é honrar a Jeová Deus, o Supremo


Governante do Universo. Assim como as torres de vigia nos tempos antigos
possibilitavam que uma pessoa observasse de longe os acontecimentos, esta
revista mostra para nós o significado dos acontecimentos mundiais à luz das
profecias bíblicas. Consola as pessoas com as boas novas de que o Reino
de Deus, um governo real no céu, em breve acabará com toda a maldade e
transformará a Terra num paraíso. Incentiva a fé em Jesus Cristo, que morreu
para que nós pudéssemos ter vida eterna e que agora reina como Rei do
Reino de Deus. Esta revista, publicada sem interrupção pelas Testemunhas
de Jeová desde 1879, não é política. Adere à Bíblia como autoridade.110

Esse grupo faz o uso da bíblia, inclusive sendo está a origem de seu nome, e
inclusive reconhecendo esta como única autoridade.
O caso que envolve as testemunhas de Jeová é a problemática da transfusão
de sangue para eles, pois eles não podem aceitar sangue de ninguém, tendo inclusive
passagem na bíblia falando sobre essa problemática:

Gênesis 9:4. “Mas não comam carne com sangue, que é vida.” Embora
tivesse permitido que Noé e sua família passassem a se alimentar de carne
animal após o Dilúvio, Deus os proibiu de comer o sangue. Ele disse a Noé:
“Somente a carne com a sua alma — seu sangue — não deveis comer.”
Desde então, isso se aplica a todos os humanos, porque todos são
descendentes de Noé;

Levítico 17:14. Porquanto a vida de toda a carne é o seu sangue; por isso
tenho dito aos filhos de Israel: Não comereis o sangue de nenhuma carne,
porque a vida de toda a carne é o seu sangue; qualquer que o comer será
extirpado. “Não deveis comer o sangue de qualquer tipo de carne, porque a
alma de todo tipo de carne é seu sangue. Quem o comer será decepado da
vida.” Para Deus, a alma, ou vida, está no sangue e pertence a Ele;

110
A SENTINELA, 2008, p. 3, revista que é publicada pelas testemunhas de Jeová.
36
Atos 15:20. “Abstenham-se do sangue.” Deus deu aos cristãos a mesma
proibição que deu a Noé. A História mostra que os primeiros cristãos não
consumiam sangue, nem mesmo para fins medicinais.

Ao olhar da sociedade, esse grupo é muito julgado por essa passagem, sendo
muitas vezes vítimas de intolerância religiosa. O motivo pelo qual as testemunhas
tomam essa decisão é por acreditarem que seus corpos são de propriedade de Deus
e que este tratamento pode acarretar em sua própria contaminação.
Quando se tratado do direito de recusar a transfusão de sangue no Brasil, este
direito está arrolado na classificação do direito geral de liberdade no rol de direitos
fundamentais, mais especificamente no artigo 5°, que dispõe que “ninguém será
obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”, assim sendo
pode-se concluir que o direito à liberdade é um direito disponível podendo restar
restrito caso o estado demonstre que se trata de uma restrição legitima 111. Sobre a
exceção desse direito

Penalistas como Luiz Régis Prado entendem que, pela determinação do


Código Penal de perigo de vida, deve ser entendida somente a iminente e
concreta probabilidade de um resultado letal. O mal causado, que consiste
na violação da liberdade pessoal, deve ser menor do que aquele que se
pretende evitar, a morte.112

Um dos receios a esse direito, é quando o direito a vida é colocado em perigo


e esse acaba batendo de frente com o direito a liberdade religiosa. portanto, por mais
que o direito a vida tenha uma condição melhor sobre outros, é importante ressaltar
que a sua flexibilização pode acarretar em tragédia e também o funcionamento dos
demais direitos, vistos que este é pré-requisito.113
Quanto a avaliação desse direito, Julio Cesar Frosi diz que

O que é relevante no caso, não é avaliar o mérito da convicção religiosa, o


acerto ou desacerto do dogma sustentado pelas Testemunhas de Jeová. O
que realmente deve ser considerado é o direito destes indivíduos de
orientarem suas próprias vidas de acordo com o padrão ético que
escolherem, e até mesmo de abandoná-los a qualquer momento.114

111
Frosi, Julio Cesar. Liberdade religiosa e a teoria da justiça de John Rawls / Julio Cesar Frosi. –
Joaçaba: Editora Unoesc, 2017. – (Série Dissertações e Teses, v. 12). P 87
112
PRADO, 2007,P. 50 apud Frosi. ibdi, P.88
113
Frosi, 2017, P. 88
114
Ibid. P. 89
37
Assim, a manifestação de vontade do sujeito prevalece devido a predominância
da autonomia presente na dignidade da pessoa humana, sendo o consentimento para
a realização de procedimentos médicos sempre necessários que não se enquadram
com as suas liberdades de religião e de consciência.

4.5 – YAHUASCA E A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA

Originalmente utilizado pelas tribos pré-colombianas, quando faziam o


consumo de chá produzido pela decocção do caule do cipó Jagube e das Folhas da
Chacrona, o Ayahuasca, de acordo com Garrido e Sabino, “provém da língua quéchua
e significa “trepadeira-da-alma”, relacionada ao cipó principal componente, ou “vinho
das almas”, a bebida propriamente dita”115
Bruno Ramos define o Ayahuasca como

nome dado a um chá de efeito psicoativo, feito a partir da mistura de algumas


plantas de origem amazônica com o cipó Jagube (Banisteriopsis caapi), que
vem sendo usado de forma ritual por culturas indígenas há muito tempo. Este
uso se espalhou por diversas regiões do Brasil e do mundo e se
diversificou.[...] 116

A utilização do Ayahuasca tinha por objetivo o alcance a um estado de transe


dos xamãs em rituais buscando cura e proteção para a tribo117.
O consumo deste chá fora das tribos indígenas se deu através de um
nordestino, chamado Irineu, que levou o chá para centros urbanos de sua região,
ocasionando assim o surgimento de rituais mais ocidentalizados no Brasil118.
Com essa introdução do chá aos centos urbanos e a criação de novos rituais,
esses foram pautados em religiões já existentes, sendo a principal linha religiosa o
Santo Daime119.
Sobre o Santo Daime, Garrido e Sabino dizem

115
GARRIDO, Rodrigo Grazionoli, SABINO, Bruno Duarte. Ayahuasca: entre o legal e o cultural.
Saúde, Ética & Justiça 14(2), 2009. P. 44
116
Gomes, Bruno Ramos. O uso ritual da ayahuasca na atenção à população em situação de rua /
Bruno Ramos Gomes. - Salvador: EDUFBA, 2016. P. 17
117
Garrido e Sabino. Ibid. p. 45
118
Gomes, 2016. Ibid. p. 18 114
119
Gomes. Loc.cit. p. 18
38
O uso do chá permitiu a Irineu que em uma das suas “mirações” tomasse
contato com uma mulher chamada Clara, que se dizia Nossa Senhora da
Conceição, a Rainha da Floresta3, o que mostra a influência das crenças
católicas populares trazidas pelos nordestinos migrantes na Doutrina do
Santo Daime que se iniciava. Foi nesta revelação que Irineu recebeu o nome
da bebida, “Santo Daime”, e as normas para o ritual. O nome estaria
relacionado ao próprio verbo “dar”, no sentido de servir aos necessitados.
Tanto que, segundo Bettencourt3 , são expressões típicas desta doutrina
“Daime amor, Daime luz, Daime força”.120

Quanto ao uso do chá do santo daime, Garrido e Sabino elucidam que “o uso
não é mais restrito às tribos, tem se estendido a vários movimentos místicos como a
União do Vegetal (UDV) e o Centro Espírita e Culto de Oração Casa de Jesus Fonte
de Luz (Barquinha), além dos participantes da própria doutrina do Santo Daime” 121
O consumo do chá, para quem participa desta religião, se da em rituais
religiosos, praticando meditações, cantos cristãos e rezas católicas.122
A regularização do uso da Ayahuasca é tratada de forma diferente, dependendo
de casa região da sociedade do mundo, podendo ser o seu uso ritualístico proibido ou
não. No Brasil, o processo para a regulamentação para o uso do chá, rendeu o
nascimento de resoluções que permitiriam o uso de forma ritualística do chá, abrindo
possibilidade para que houvessem estudos sobre a sua utilização em diversas áreas
e também sobre o uso terapêutico dele123.
As resoluções feitas sobre o uso do chá por parte do CONAD (conselho
nacional de políticas sobre drogas) são as resoluções de número 4 feita em
04/11/2004 e a resolução número 1, feita em 25/01/2010.
Na resolução de número 4, o CONAD aprovou o parecer da Câmara de
Assessoramento Técnico-Científico que, por meio de parecer, reconheceu a
legitimidade, jurídica, do uso da ayahuasca de forma religiosa124. Um dos argumentos
considerados pelo CONAD foi

[...] importância de garantir o direito constitucional ao exercício do culto e à


decisão individual, no uso religioso da ayahuasca, mas que tal decisão deve
ser devidamente alicerçada na mais ampla gama de informações, prestadas
por profissionais das diversas áreas do conhecimento humano, pelos órgãos

120
GARRIDO, Rodrigo Grazionoli, SABINO, Bruno Duarte. Ayahuasca: entre o legal e o cultural.
Saúde, Ética & Justiça 14(2), 2009. P. 45
121
GARRIDO e SABINO, 2009. Op. Cit.. p. 45
122
. Ibid. p. 46
123
Gomes, Bruno Ramos. O uso ritual da ayahuasca. P. 6
124
CONAD. Acesso em 06 de outubro de 2022. Disponível em:
https://www.normasbrasil.com.br/norma/resolucao-4-2004_100851.html
39
públicos e pela experiência comum, recolhida nos diversos segmentos da
sociedade civil.125

Na resolução de número 1 se deu em detrimento ao que foi decidido na


resolução 4, restou decidido pelo GMT (grupo multidisciplinar de trabalho), o
reconhecimento do uso da ayahuasca voltados a objetivos religiosos. Assim sendo, o
uso da ayahuasca é permitido em território nacional

Trata-se, pois, de ratificar a legitimidade do uso religioso da Ayahuasca como


rica e ancestral manifestação cultural que, exatamente pela relevância de seu
valor histórico, antropológico e social, é credora da proteção do Estado, nos
termos do art. 2º, caput, da Lei nº 11.343/2006 (6). e do art. 215, § 1º, da CF.
Devem-se evitar práticas que possam pôr em risco a legitimidade do uso
religioso tradicionalmente reconhecido e protegido pelo Estado brasileiro, 11
incluindo-se aí o uso da Ayahuasca associado a substâncias psicoativas
ilícitas ou fora do ambiente ritualístico126

No tocante a comercialização da planta que produz o chá, o CONAD deixou


estipulado que quem participa diretamente do armazenamento, a coleta, o preparo
são atos de fé e não de comércio, pois na visão deles “Quem vende Ayahuasca não
pratica ato de fé, mas de comércio, o que contradiz e avilta a legitimidade do uso
tradicional consagrado pelas entidades religiosas127. Apesar da comercialização ser
proibida, essa não pode ser confundida com o custeio para a manutenção desta
prática.
O uso por parte de menores de idade cabe aos pais decidirem e o uso por
parte de grávidas, como o uso do chá através do século não restou demonstrado como
danoso, é permitido, cabendo a elas a responsabilidade da dose.128
Destarte, a partir das resoluções o uso da ayahuasca é permitido por lei, seu
uso religioso e terapêutico, e também a possibilidade da inserção em âmbito religioso.

125
CONAD. Ibid.
126
CONAD, 2010. Acesso em 06 de outubro de 2022. Disponível em:
https://www.normasbrasil.com.br/norma/resolucao-1-2010_113527.html
127
CONAD. Ibid.
128
CONAD. 2010, Ibid.
40
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Preliminarmente, fora estipulado a inserção da religião católica em nosso país


e como está fora imposta sobre os habitantes. Vimos o desenvolvimento do
relaxamento da chamada religião oficial e como esta cedeu espaço para outras,
criando-se assim um direito de liberdade de religião.
Entretanto, esse direito não veio livre, tendo trazido consigo uma nova
problemática, que é a intolerância religiosa.
Portanto, a religião deixou de ser uma coisa que é imposta sobre os outros,
sem esses terem o direito de escolha, como ocorreu na época da colonização,
mediante métodos abusivos, e passou a ser um direito de escolha e individual de cada
ser. Entretanto, por mais que tenha havido esse relaxamento na religião oficial e
passemos a ter a presença de religiões diversas, estão presentes no dia a dia
constantes casos de intolerância religiosa sofrida por diferentes grupos que não
aqueles da religião que foi trazida pela coroa e até os dias de hoje é a considera
“normal”.
Atos de intolerância são considerados crimes, pois todos tem o direito a
liberdade religiosa e com essa vem o direito à liberdade de culto, liberdade de reunião,
liberdade de escolher qual religião quer seguir e a liberdade de exercer publicamente
sua religião sem que sofra nenhum tipo de discriminação
A secularização e a laicidade são processos distintos, pois enquanto a
secularização trata separação da religião do estado, a laicidade se refere ao
posicionamento de neutralidade do Estado em relação a religião, pois assim, em tese,
este não favoreceria nenhum grupo acima de outro.
Entretanto, o Estado, ainda que adotado de uma postura de neutro, acaba com
que envolva questões religiosas no particular de pessoas, pois ao adotar medidas que
possa conflitar com o direito individual da pessoa sobre a religião isso é contra o
princípio de neutralidade que este deve adotar.
Assim sendo, chega-se a conclusão que a liberdade religiosa é um direito
fundamental que possibilita sim um pluralismo religioso nos dias de hoje, mas que
encontra muitos problemas de aceitação, pois ainda está enraizado o catolicismo em
uma grande maioria da sociedade que não aceitam cultos diferentes dos seus e tendo
ações que ferem os direitos de outros, sendo portanto a limitação desse direito,

41
mesmo não existindo um pré-estabelecido, a colisão com outros direitos, sendo o
respeito aos demais direitos fundamentais a base para que seja feitas intervenções,
devendo prevalecer o princípio da razoabilidade e da proporcionalidade para a
solução do caso em concreto, mas usualmente, deve se atribuir a mais ampla e
possível liberdade para a pratica do ritual religioso.

42
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