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2004
Preliminarmente, é fundamental que se deixe claro o entendimento a respeito do que seja uma
reforma orçamentária, dentro do escopo deste trabalho. Segundo Allen Schick (apud Core “Reforma
gerencial dos processos de planejamento e orçamento-2001”) todo o sistema orçamentário compreende,
basicamente, o desempenho de três funções: planejamento, gerência e controle. “Na operação dos
sistemas orçamentários, raramente o planejamento, a gerência e controle recebem igual atenção. Na
prática, planejamento, gerência e controle tenderam até a ser processos competitivos no orçamento,
sem haver uma clara divisão de funções entre os diversos participantes”.
“No entendimento de Schick, toda reforma altera o equilíbrio entre planejamento, gerência e
controle, mediante a atribuição de maior ênfase a alguma dessas funções. A predominância da função
controle, por exemplo, acarreta um deslocamento para o segundo plano das funções de planejamento e
gerência, que, no entanto, continuam presentes. A questão-chave é o balanceamento entre essas três
orientações ou funções com a atribuição de pesos para cada uma delas. Assim, todo o sistema
orçamentário contém características de planejamento, gerência e controle”.
“No orçamento tradicional, que caracteriza os primeiros estágios evolutivos da técnica orçamentária,
a orientação predominante é a do controle. Prevalece a preocupação com o cumprimento dos tetos
orçamentários e o estabelecimento de limites para as unidades orçamentárias no que se refere a tipos de
despesas (pessoal, serviços de terceiros, equipamentos, etc) e as classificações de despesas são
estruturadas com base em itens pormenorizados de objeto de gastos”.
“A predominância da orientação gerencial no processo orçamentário traduz uma preocupação maior
com o trabalho a ser feito e as realizações a serem alcançadas. As informações são estruturadas
segundo funções, projetos e atividades, evidenciando-se o trabalho ou serviço a ser cumprido, com
os respectivos custos. As categorias orçamentárias são classificadas em termos funcionais, com
mensurações que possibilitem a avaliação do desempenho das atividades previstas. Essas características
identificam o orçamento funcional ou de desempenho.
“A orientação para o planejamento marca o advento do orçamento-programa, que tem como
característica dominante a racionalização do processo de fixação de políticas, mediante o manuseio de
dados sobre custos e benefícios das formas alternativas de se atingir os objetivos propostos e a
mensuração dos produtos para propiciar eficácia no atingimento desses objetivos
Com base nessa concepção, pode-se identificar, dentre as tentativas de modernização administrativa
verificadas no Brasil nos últimos 40 anos, três importantes reformas orçamentárias: a primeira,
marcada pela edição da Lei nº 4320,de 17 de março de 1964, que introduziu um modelo de
orçamentação voltado para o controle e a gerência dos meios, preocupação com custos e análise
funcional da despesa (orçamento funcional ou de desempenho).
A segunda reforma, que embora cronologicamente coincida com a primeira (início da década de 60),
inovou com o orçamento-programa e sua preocupação em integrar o planejamento e a análise de
políticas ao processo orçamentário (predominância da função de planejamento). Como principal fonte
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conhecido como “lei de meios”. Contudo, é preciso reconhecer que ao se referir “ao custeio dos
serviços” o Decreto-lei nº 2416 já estava preparando o terreno para um possível orçamento funcional.
Conforme o “Manual de Classificação Econômica e Funcional das Transações Governamentais”
das Nações Unidas, o passo inicial para uma classificação funcional das despesas públicas consiste em
agrupar as atividades governamentais de acordo com os serviços que o governo presta às populações ou
são por ele financiados através de empréstimos e subvenções. Nesse sentido, o referido Decreto
agrupou as responsabilidades governamentais em dez títulos, incluindo a administração geral e
destacando a administração financeira.
Entretanto, esse embrião de um orçamento funcional nos termos do Decreto-lei 2416/40 não
prosperou como o desejado. Segundo Teixeira Machado (1973) isso se deveu, basicamente, “à falta de
sólida teoria que desse apoio à prática que se ia desenvolvendo a nível estadual e municipal, de vez que
a União ficava fora das normas do Decreto-lei nº 2416/40”. Dentre outros fatores que também
contribuíram para esse insucesso, ele aponta:
Com a Lei nº 4320/64, e um atraso, portanto, de mais de dez anos, houve, segundo boa parte dos
estudiosos da matéria, a introdução na administração pública brasileira do orçamento funcional ou de
desempenho. Em sua ementa, essa lei “estatui normas gerais de direito financeiro para a elaboração e
controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal”. No
âmbito deste trabalho, a Lei nº 4320/64 caracteriza a primeira reforma, uma vez que a orientação
orçamentária tem o seu balanceamento alterado, passando a predominar uma abordagem mais gerencial
e menos de controle.
Segundo Core (2001), “a classificação por serviços ou funcional da despesa foi aperfeiçoada em
relação ao esquema do Decreto-lei n° 2416/40 e as informações econômicas assumiram maior
importância, com a transformação das despesas ordinárias e extraordinárias, respectivamente, em
despesas correntes e de capital, o que deu um outro sentido às análises macroeconômicas da despesa. O
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orçamento deixa de ser analítico e passa a ser sintético, isto é, o gasto, na lei orçamentária, é
discriminado apenas até elemento de despesa”.
Em face dessa orientação gerencial, a receita e a despesa, na Lei nº 4320/64, são estruturadas de
forma que evidencia a política econômico-financeira do governo e as ações passam a ser explicitadas
segundo programa contendo funções, atividades e projetos, havendo, ainda, a preocupação de que o
orçamento, em nome dos princípios da unidade, universalidade e anualidade, contivesse todas as
despesas do governo.
Nesse contexto, não padecem dúvidas quanto ao fato de que o orçamento da Lei nº 4320/64 seja,
efetivamente, um orçamento do tipo funcional ou de desempenho, onde, principalmente, prevalece a
preocupação com a eficiência e eficácia na realização das atividades constantes do seu programa de
trabalho.
Um outro aspecto de suma importância nessa primeira reforma refere-se à organização do processo
orçamentário, ou seja, a forma como as diferentes entidades governamentais se apresentam na peça
orçamentária. Nesse aspecto, a Lei n° 4320/64 foi bastante ousada, porquanto, ao aplicar o princípio da
universalidade, o fez em duas situações: no tocante à administração centralizada ou direta, constariam
da lei orçamentária todas as receitas e despesas segundo seus valores brutos (regra do orçamento
bruto); já no tocante à administração indireta ou descentralizada, as entidades se vinculariam ao
orçamento apenas pelos seus resultados, positivo ou negativo (orçamento líquido).
Cabe também mencionar, como reforço ao entendimento quanto à natureza gerencial do orçamento
da Lei nº 4320/64, a preocupação com a apuração de custos, ao estabelecer em um de seus artigos que
os serviços públicos industriais manteriam contabilidade especial para a determinação dos custos.
Em que pese todos esses preceitos emanados do que havia de mais moderno na técnica orçamentária
da época, o saldo das realizações não apontou para uma vivência de boas práticas na administração
pública brasileira. O que se pode observar é que a existência de uma lei não é suficiente para mudar o
comportamento administrativo calcado mais no controle formal da despesa do que na aferição dos bens
e serviços públicos efetivamente disponibilizados à sociedade.
As matrizes de comportamento não se modificaram pelo fato de o Decreto-lei nº 2416/40 ter sido
substituído pela Lei nº 4320/64. As novas concepções passaram a ser interpretadas com a mesma
matriz de raciocínio até então prevalecente, o que fez com que o processo decisório relativo à despesa
pública tenha permanecido o mesmo, com o seu acentuado viés jurídico e contábil. Como ilustração
desse fato, vale relatar o que sucedeu com os conceitos de despesas correntes e de capital.
Na esteira da revolução keynesiana surgiu o orçamento econômico, que influenciou a Lei nº 4320/64
quanto a divisão das despesas orçamentárias em correntes e de capital, que constituiriam dois
agrupamentos fundamentais para uma eficiente programação das operações governamentais. Contudo,
segundo Teixeira Machado (1973), a partir do momento em que a aplicação e a interpretação da lei e o
controle dos “Tribunais de Contas da União e dos Estados sobre as finanças municipais passaram para
os juristas, por formação profissional mais preocupados com o controle que com a programação,
desenvolveu-se a idéia de dois grupos dicotômicos aparentemente estanques: receitas e despesas
correntes, de um lado e receitas e despesas de capital, de outro, como se o orçamento não fosse uma
integridade programática. Deste modo, a classificação da receita passou a condicionar a da despesa,
perdendo o orçamento a flexibilidade necessária para ser um verdadeiro instrumento do planejamento
em termos monetários”.
É forçoso reconhecer que essa linha interpretativa também levou ao entendimento equivocado de
que, conforme ressalta Teixeira Machado (1973), as despesas correntes são, social e economicamente,
menos valiosas que as despesas de capital, pois que estas se transformam em bens de capital, e como tal
contabilmente registráveis no ativo governamental.
Infelizmente, o que se tem observado é que essa concepção distorcida quanto às operações correntes
e de capital influenciou legislações posteriores à Lei n° 4320/64, como a própria Constituição de 1988
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O Secretário Geral das Nações Unidas, em seu relatório “As Nações Unidas e a Década do
Desenvolvimento: Propostas para Ação”, publicação de 1962, que apresentou o “O Manual de
Orçamento por Programas e Realizações” afirma: “Os sistemas orçamentários de muitos países em via
de desenvolvimento não têm acompanhado a pressão da demanda que sobre os mesmos exerce o
enorme aumento do escopo de atividade do setor público e, em particular, carecem de uma
metodologia de planejamento para lidar com os problemas do desenvolvimento econômico”.(o
negrito não é do original).
Em seguida, o referido relatório ressalta a necessidade de elaboração de novos tipos de informações
sobre os fatos essenciais do setor público para a preparação de planos de desenvolvimento a longo
termo e, posteriormente, a necessidade de mudanças em conceitos e procedimentos no processo
orçamentário dos governos, a fim de que o orçamento anual se converta em um instrumento efetivo
para implementação dos planos e das políticas de desenvolvimento.
Com esse posicionamento, o relatório consolidou um entendimento que talvez seja uma das razões
mais fortes para o relativo insucesso das práticas de planejamento, sobretudo em países da América
Latina: a associação inexorável entre planejamento e plano, ou seja, o plano como resultado
incontornável do planejamento. Em vez de considerar o planejamento como uma das funções do
processo orçamentário, prevaleceu a idéia de que planejamento e orçamentação constituem atividades
paralelas: planejamento e planos de um lado e orçamentos do outro. Daí, o que recomenda é que sejam
integrados, mediante a adoção pelo orçamento de uma metodologia de planejamento, como se essa
metodologia não fosse parte integrante do próprio processo orçamentário.
Como vimos, o processo orçamentário, fundamentalmente, cumpre três funções: controle, gerencia e
planejamento. O que diferencia os orçamentos no tempo e no espaço é a predominância de uma dessas
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abrangeria as despesas correntes, o que denota uma mistura da classificação econômica com a
classificação programática. A Portaria nº 9/74 foi mais feliz no trato desses conceitos, ao desvincular
essas duas informações, estabelecendo que o projeto seria o conjunto de operações, limitadas no tempo,
das quais resulta um produto final que concorre para a expansão ou o aperfeiçoamento da ação de
governo e a atividade o conjunto de operações que se realizam de modo contínuo e permanente,
necessárias à manutenção da ação do governo. Assim, ambos podem ter despesas correntes e de
capital”.
A experiência com a prática do orçamento-programa, tanto no nível federal como nos governos
estaduais e municipais, deixou clara a dificuldade das administrações em perceber o planejamento
como uma função do processo orçamentário e não uma atividade paralela que teria como escopo
elaborar planos. Infelizmente, o fetiche do plano acabou prevalecendo e por conta disso os governos
continuaram apresentando planos dissociados da realidade orçamentária.
Nesse contexto, repetiu-se a história da Lei n° 4320/64, que não foi capaz de mudar os padrões de
comportamento administrativo. A idéia de planejamento, inerente à concepção de orçamento-programa,
também não foi competente para modificar os modelos mentais que presidiam o processo decisório na
administração pública. Com isso, verificou-se o que se poderia denominar de “tradicionalização do
orçamento-programa”, porquanto, na prática, continuaram prevalecendo os procedimentos tradicionais
de orçamentação, sem a presença de uma explicitação aceitável da produção pública.
A terceira reforma orçamentária, de acordo com a cronologia constante deste trabalho, surgiu no
bojo de um movimento de âmbito internacional, por volta dos anos 80 do século passado, que, em
virtude da falência financeira dos Estados visava, sobretudo, conferir aos governos uma administração
enxuta, mais efetiva e eficiente. Como continuidade ao processo, por vezes atabalhoado, de
privatização, vários países entenderam ser indispensável, como forma de garantir um mínimo de
governabilidade, proceder a uma ampla reforma do aparelho do Estado, objetivando a configuração de
um governo o mais modesto possível, mas capaz de enfrentar e resolver os problemas públicos. Essa
nova abordagem passou a ser conhecida como “a nova administração pública” (new public
manegement), ou “o novo manejo gerencial” (new manegement) ou simplesmente “gerencialismo”.
No Brasil, esse movimento tomou corpo com a reforma gerencial da administração pública
brasileira, iniciada em 1995, e que tinha como motivação principal introduzir a idéia de uma
administração pública gerencial em substituição à burocrática. Segundo Bresser Pereira (2000), os
instrumentos chaves para a implementação dessa reforma seriam o Plano Plurianual e o Orçamento
Anual.
Cabe lembrar que essa conclusão quanto à importância do processo orçamentário como
implementador de reformas gerencialistas também se verificou em relação a outros países. A convicção
é de que a transformação do processo orçamentário, no sentido da evolução de um instrumento
orientado para controle dos gastos, em direção a um outro focado na produção pública, com a busca
sistemática de resultados específicos, é de fundamental importância para o bom êxito de quaisquer
reformas dessa natureza.
Essa importância assume, ainda, características mais decisivas em virtude da concepção ampla que
foi dada ao processo orçamentário pela Constituição Federal de 1988, que em seu art. 165, na seção
intitulada “Dos orçamentos”, explicita que leis de iniciativa do Poder Executivo, compreendendo todos
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em que é apenas elemento do diagnóstico. Como é uma categoria de fácil intuição, pois em relação ao
ator social produz mal-estar ou representa oportunidade que surge, ou mesmo ameaça que se avizinha,
ainda que o seu processamento comporte importantes sofisticações, coloca a ato de planejar ao alcance
de qualquer comunidade. Ou seja: o senso comum e a ciência se unem na percepção do problema como
categoria de análise, permitindo, assim, gradações diferenciadas de complexidades”.
Essa ênfase no problema a ser enfrentado tem sua inspiração na metodologia do Planejamento
Estratégico Situacional (PES), criação de Carlos Matus. Segundo, ainda, essa metodologia, a integração
plano/orçamento só será viável na medida em que tais documentos sejam estruturados de uma forma
modular e que os módulos sejam diferenciados. O orçamento-programa contém uma estrutura modular,
representada pelos programas, subprogramas, projetos e atividades, subprojetos, subatividades, mas em
virtude de sua tradicionalização, transformou-se mais em itens de classificação do que em propostas de
ação.
Quanto aos planos nunca foram estruturados em módulos de ação, mas segundo temas, setores, o
que sempre dificultou o processo de integração com os orçamentos. Considerando essas dificuldades, a
proposta da terceira reforma foi simplificar essas estruturas, no sentido de em vez de módulos distintos
e diferenciados, utilizar-se, apenas, um módulo, o programa, que surgiria no plano e, transportando-se
para os orçamentos, promoveria a especificação da despesa orçamentária. Isto é, o plano terminaria no
programa e o orçamento começaria no programa, o que garantiria, naturalmente, a tão buscada
integração.
A viabilização dessa proposta, contudo, exigiria a reavaliação de um elemento dos mais
representativos do sistema orçamentário brasileiro: a classificação funcional-programática, que
originária da Lei nº 4320/64, se propunha a agregar as diferentes áreas de despesa do governo, sendo,
posteriormente, alterada no sentido de também abrigar as informações relativas aos objetivos dos
programas da administração pública. Assim, trata-se de uma classificação híbrida, e como tal, de difícil
operacionalização, além da rigidez que implica, por ser uma estrutura prévia de cumprimento
obrigatório nos três níveis da federação.
Com a Portaria nº 42, de14 de abril de 1999, procedeu-se à separação desses dois tipos de
informações. As áreas de despesas, representadas pelas funções e subfunções, passaram a constituir a
classificação funcional, válida para os três níveis da federação, e tendo como papel principal
possibilitar a consolidação nacional das áreas de despesas de todas as ações do setor público. Quanto
aos programas, não constituiriam uma classificação prévia, mas seriam definidos em cada ente da
federação, de acordo com as características dos problemas a serem enfrentados.
O foco no resultado a ser alcançado com a produção dos bens e serviços criou, também, a
necessidade de reavaliação dos conceitos de projeto e atividade então vigentes. Na verdade, o
orçamento, por ser um instrumento de enorme complexidade, contém uma série de despesas que não
têm conseqüência em termos de geração de bens e serviços, isto é, estão fora do ciclo produtivo, tais
como, encargos da dívida, financiamentos, refinanciamentos, indenizações, ressarcimentos e ações de
fomento.
Ademais, toda a produção pública, como vimos, integra os orçamentos da União, dos Estados e dos
Municípios, sendo que a Constituição Federal estabeleceu competências comuns aos três entes em
relação a várias áreas de atuação do poder público, especialmente no tocante a saúde e educação.
Existe, assim, uma produção compartilhada, em que um dos entes, por exemplo, apóia financeiramente
a realização de uma despesa de outro ente, a quem, de fato, cabe a materialização do bem ou a
prestação do serviço.
Nessas condições, e ante a necessidade de melhor visualizar o ciclo produtivo de cada orçamento,
sob pena de replicar-se a mesma despesa em outros níveis, surgiu a idéia de introduzir-se uma outra
categoria de programação, que fosse neutra em relação ao ciclo produtivo objeto da orçamentação. Essa
categoria seria as “operações especiais”, que englobaria aquelas ações que não geram produto, e não
geram contraprestação direta sob a forma de bens e serviços.
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A avaliação da chamada terceira reforma coloca em relevo uma deficiência crônica do processo
orçamentário brasileiro: a dificuldade em identificar no orçamento, de uma forma clara, os bens e
serviços a serem oferecidos à sociedade. Vale lembrar que a idéia de produção pública (bens e
serviços) associada ao orçamento não é uma inovação do orçamento por produto e resultado, mas já
constituía característica importante do orçamento-programa. Apenas, no orçamento por produto e
resultado, esse aspecto assume a condição de ser o próprio cerne da metodologia, razão porque essa
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prioridade da administração pública permanece sendo o controle da despesa pública, e para atingir esse
objetivo são usados os expedientes mais tradicionais de orçamentação e execução.
Em reforço a essa tradiconalização, verifica-se enorme dificuldade em se avançar numa melhor
identificação e mensuração dos produtos do orçamento e no desenvolvimento de um sistema de
apropriação de custos. Como o processo decisório continua tradicional, essas informações não são
julgadas relevantes, servindo os temas, apenas, para alimentar discussões teóricas, de pouco conteúdo
prático.
Naturalmente que, em se tratando de um processo de mudança ainda em fase de implantação, cabe a
esperança quanto a uma possível correção de rumos no que toca ao desenvolvimento de um efetivo
orçamento por produtos e resultados, embora o quadro fiscal adverso contribua para fortalecer as forças
tradicionais que vêem no controle dos meios o caminho a ser seguido pela administração pública.
5. Comentários Finais
O analista que se dedica ao estudo das reformas orçamentárias experimentadas pela administração
pública brasileira, ao se deparar com a força da tradição e do formalismo que acaba sempre
prevalecendo, muitas vezes é tomado de assalto por uma angustiante indagação: será que em países
periféricos e de economias dependentes é inviável a prática de modelos mais modernos de
orçamentação, tipo orçamento-programa ou por produtos e resultados?
Contudo, essa névoa se dissipa ao tomar conhecimento do balanço das reformas implementadas nos
chamados países desenvolvidos, que, geralmente, exibem pífios resultados em seus esforços de
modernização dos procedimentos e práticas orçamentárias. A propósito, é elucidativo o desabafo de
Wildavsky (apud “Política x Técnica no Planejamento-Perspectivas Críticas” -Bromley e Bustelo”-
1982) quando, a respeito do orçamento-programa nos Estados Unidos, assim discorre:
“O orçamento-programa deve ser tremendamente ineficiente. Nada se parece tanto com uma
máquina complexa sem finalidade em que as operações realizadas guardam pouca relação com os
resultados obtidos. Os dados de entrada para o orçamento-programa são enormes e seus resultados
políticos, minúsculos. Em todo governo federal a história é a mesma: ao se perguntar se o orçamento-
programa tem-se saído bem, aqueles com algo favorável a dizer invariavelmente citam as mesmas
poucas análises de políticas. Certa vez perguntei-me se o estudo de óleo betuminoso no Departamento
de Interior, e o programa de saúde materno-infantil no Departamento de Saúde, Educação e Bem-estar
era tudo que havia resultado de esforço de programação”.
Ao que se depreende, a inércia da tradição na área orçamentária não escolhe latitudes ou longitudes,
nem poderio econômico, sendo inerente à própria natureza desse campo de atuação da administração
pública. Talvez contribua para isso o fato de que, sendo o orçamento sempre associado a dinheiro,
acaba predominando o entendimento que coloca o espírito conservador como indispensável a todos
quantos lidam com numerário.
Contudo, existem alguns empecilhos às reformas que assumem maior gravidade em países
emergentes, como a forma não muito correta de se enfrentar a chamada corrupção endêmica. Em
qualquer circunstância, o enfrentamento desse problema, em vez de atacar as verdadeiras causas,
sempre opta pelo aprofundamento de mecanismos de controle dos meios orçamentários, o que inibe o
gestor que, por conta de uma desejável modernização orçamentária, busca atingir resultados nas suas
ações.
Essa situação, associada às exigências decorrentes do infindável ajuste fiscal, atingiu, atualmente,
um estágio em que o rigoroso constrangimento dos meios orçamentários tem contribuído para a
premissa de que o bom administrador não é aquele que realiza, mas o que cumpre burocraticamente as
regras e procedimentos relacionados com o controle da despesa. A virtude passa a ser a não-ação, ou
parafraseando, a inação, isso tudo em meio a uma reforma que enfatiza a cobrança de resultados na
administração pública.
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Ainda sobre o ajuste fiscal, vale ressaltar a mudança de foco no que se refere ao exercício da
atividade orçamentária. Até a segunda reforma, o conhecimento básico para o desempenho dessa
atividade era detido pelos juristas, contadores e administradores. Com a introdução do orçamento-
programa, além dessas especializações, assumiu papel preponderante o trabalho do economista,
importância essa que, inclusive, se vem consolidando em praticamente todas as ramificações da
administração pública.
Esse reducionismo econômico no trato dos problemas públicos vem se intensificando,
principalmente a partir do momento em que a explicitação e o controle das metas fiscais, determinados
pela Lei de Responsabilidade Fiscal, passou a constituir a informação mais importante no processo
decisório do orçamento. Com isso, a atividade orçamentária, atualmente, limita-se quase que
exclusivamente ao manejo dos agregados macroorçamentários, que é o campo preferido de atuação do
economista, nesse caso, macroeconomista, ficando o aspecto microorçamentário relegado para um
segundo plano. Só cabe análise em relação àquelas despesas que impactam os resultados fiscais.
Nesse contexto, reformas orçamentárias que têm como foco a produção pública e os seus efetivos
resultados na solução dos problemas da sociedade, não sensibilizam os decisores de política
econômica, que endereçam todas suas preocupações para o cumprimento das metas fiscais. Assim,
continua prevalecendo o viés do controle, ainda que macroorçamentário, que é a marca do
tradicionalismo em termos de prática orçamentária.
A forma equivocada como sempre é visto o planejamento também é um fator que obstaculiza a
evolução do processo orçamentário. Além de entender como função precípua do planejamento a
geração de planos, a idéia da plurianualidade da despesa também dá margem a uma série de
desencontros conceituais. Desde a Constituição de 1988, tem surgido a dúvida: a plurianualidade da
despesa, que é um elemento fundamental dos orçamentos modernos, reside no plano plurianual ou na
lei orçamentária? Embora ao primeiro exame, considerando que a lei orçamentária é anual, possa
parecer óbvio que seja no plano, a estrutura e o conceito de planejamento que prevalecem podem levar
a uma outra visão.
Na ordem constitucional anterior havia plano nacional e orçamento plurianual de investimentos. A
partir de 1988, passou a vigorar plano plurianual e orçamento anual e com isso o entendimento de que
quem lida com o futuro é o planejamento e não o orçamento. Trata-se de concepção não muita
atualizada do que seja atividade de planejamento, que tem no presente o seu campo relevante de
atuação. O presente deve ser o fim do planejamento e os dados do futuro representam os meios. A
realidade é construída no presente.
A idéia de que a plurianualidade da despesa esteja, portanto, no plano, o tem levado a uma
abrangência e detalhamento excessivos, a ponto de conter as mesmas especificações do orçamento, o
que gera complicações adicionais quanto a compatibilizarão desses dois instrumentos. Como pela
terceira reforma os resultados estão no plano e os produtos no orçamento, a interpenetração entre plano
e orçamento gera uma situação em que se tem, às vezes, a plurianualidade ora dos produtos ora dos
resultados, com enormes prejuízos na consistência das informações.
A verdade é que, enquanto o planejamento não passar a ser entendido como uma função do
orçamento, que tem na plurianualidade um de seus elementos constitutivos, as forças da tradição e da
inércia o manterão na condição de um mero ritual, que pouco contribui para a modernização das
práticas orçamentárias.
Um outro aspecto também inibidor da implementação das reformas orçamentárias tem sido a
fragilidade histórica das organizações públicas. As reestruturações administrativas sempre foram muito
presentes, com extinção e fusão de órgãos e entidades, o que confere uma instabilidade que prejudica o
desenvolvimento das programações. Em vista dessa insegurança organizacional, reforça-se o
entendimento de que, em vez dos planos e orçamentos pertencerem às organizações, essas se
apresentam como meras executoras desses instrumentos. Esse fato é bem concreto no tocante ao que
ocorreu na recente reforma do orçamento por produtos e resultados.
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Cabe, também, uma observação quanto aos recursos humanos. A literatura já consagrou a qualidade
e o engajamento do corpo técnico de funcionários como de suma importância para o bom êxito de uma
reforma. Quanto a qualidade, vale o registro do enorme progresso alcançado na administração pública
brasileira, a partir da instituição de carreiras específicas que, no poder executivo federal, atuam no
chamado ciclo de gestão. Trata-se de um efetivo bem formado, intelectualmente, sujeito a um processo
permanente de treinamento e atualização. Em termos de qualificação e motivação, embora a
remuneração ainda esteja defasada em relação aos outros poderes, dificilmente irá se constituir em
empecilho ao bom andamento de uma reforma.
Contudo, ainda no que se refere a recursos humanos, vale mencionar um aspecto comportamental
que pode explicar algumas atitudes. A cultura prevalecente entre os funcionários e técnicos que militam
na área orçamentária é de que, nesse tipo de tarefa, o tempo de descanso regulamentar (sábados e
domingos) deve ser considerado, praticamente, como dias úteis.
Esse fato, associado a uma escala remuneratória não muito condizente, além de ocasionar alta
rotatividade nas equipes, o que explica a pouca ocorrência de analistas seniores, gera problemas
familiares que afetam a produtividade e criatividade do corpo técnico (funcionário produtivo é o
funcionário feliz). Nesse quadro, é compreensível o pouco entusiasmo verificado, às vezes, por ocasião
da implantação das reformas orçamentárias.
Referências Bibliográficas
CORE, Fabiano (2001), “Reforma Gerencial dos Processos de Planejamento e Orçamento” -ENAP-
Textos para Discussão nº 44-out/2001.
MOOJEN, Guilherme, “Orçamento Público”, Rio de Janeiro, 1959.
TEIXEIRA J. Machado Jr (1973), “O Orçamento-Programa no Brasil”. Revista do Serviço Público,
vol. 108, nº 1, jan/abr.
BRESSER PEREIRA, Luiz Carlos (2000), “A Reforma Gerencial do Estado de 1995”. Revista de
Administração Pública. FGV, julh/ago.
WILDAVSKY, Aaron, “Salvando a Análise de Políticas do Método de Orçamento-Programa”.(apud
“Política x Técnica no Planejamento- Perspectivas Críticas- Bromley e Bustelo- 1982- Ed.
Brasiliense)”.
Resenha Biográfica
Dados complementares:
Órgão a que pertence: Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão.
Lotação: Secretaria de Orçamento Federal
Endereço: SEPN 516-Bloco “D” - Lote 08- Edifício SOF
70.770545 Brasília, DF-Brasil.
Telefone: (061) 3482414
Fax: (061) 3408443
E-mail: Fabiano.core@planejamento.gov.br
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