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DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS FLORESTAIS/ESALQ/USP

LCF 335 – Fundamentos e Aplicações da Química de Produtos Florestais I

José Otávio Brito – Professor Titular


Francides Gomes da Silva Jr. - Professor Associado

Apontamentos de Aula No. 2 – Edição 02/2014

LIGNINA DA MADEIRA

1. INTRODUÇÃO

Ao lado da celulose a lignina é um dos mais abundantes e importantes polímeros


orgânicos do mundo vegetal. A sua presença é detectada nas plantas superiores, junto aos
tecidos vasculares. As plantas primitivas, tais como líquens e algas, não são lignificadas.
Na formação da célula, as primeiras membranas formadas são a lamela média e a
parede primária. a seguir, ocorre o espessamento da parede pela deposição de celulose e
hemiceluloses, compondo principalmente a parede secundária. Sòmente após é que ocorre
a deposição da lignina, processo que é denominado de lignificação, que se inicia no canto
das células e se difundem pela lamela média composta e pela parede secundária.
A teoria mais aceita é a de que a lignificação é um processo intra-celular, ou seja,
controlado pela célula individual, e que só começa a ocorrer quando a célula já tenha
encerrado o crescimento de sua parede em comprimento, largura e espessura. Quando a
lignificação se completa, a célula morre. A incorporação da lignina é considerada, portanto,
uma fase final de diferenciação da célula.
Sob o ponto morfológico, o crescimento das moléculas de lignina ocorre de modo
forçado por entre os elementos fibrilares de polissacarídeos pré-constituídos na parede das
células. Ela é considerada como elemento cimentante das fibras, dando-lhes características
de resistência contra o ataque de microorganismos, resistência físico-mecânica, densidade,
maior ou menor capacidade de movimentação dimensional, etc.
A lignina, a exemplo da celulose, é também um polímero, porém, diferencia-se dela
principalmente por apresentar estrutura irregular na constituição de sua macromolécula e
por ter natureza aromática.
De um modo geral, o teor de lignina na madeira pode variar entre 15 e 40%. Essa
amplitude de variação é bem maior do que a verificada para a celulose. O seu teor, em geral,
é maior nas madeiras de coníferas, comparadas às madeiras de folhosas. As folhosas
tropicais possuem maior teor que as folhosas temperadas.

2. ORIGEM E FORMAÇÃO DA LIGNINA

O mecanismo de formação da macromolécula de lignina nas plantas compreende


complicados mecanismos biológicos e bioquímicos. O repertório de estudos sobre tal
assunto é bastante amplo, havendo literatura específica para aqueles que pretendem se

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aprofundar no assunto. As unidades precursoras da lignina, produzidas nas árvores através
de diversos metabolismos enzimáticos são o álcool p-hidroxi cumarílico, o álcool coniferílico
e o álcool sinapílico ou siringílico (Figura 01 a 03). Tais unidades transformam-se em radicais,
mediante desidrogenação enzimática de suas moléculas, sendo então liberadas ligações que
permitem a união e formação da cadeia macromolecular da lignina. Polimerizadas, as
unidades precursoras podem então serem identificadas como hidroxi-fenil propano, guaicil
propano e siringil propano, respectivamente.

3. ESTRUTURA QUÍMICA E CLASSIFICAÇÃO DA LIGNINA

A lignina constitui-se no polímero natural que apresenta grandes dificuldades para o


estudo e conhecimento de sua estrutura química. Uma das principais causas está na
dificuldade para se chegar a um perfeito isolamento de sua macromolécula. É que os
métodos empregados, em geral, costumam induzir ao surgimento de reações secundárias e,
com isso, a lignina perde suas características originais encontras no vegetal, onde é
denominada de protolignina.
Atualmente, não existem dúvidas de que a lignina é composta apenas por carbono,
hidrogênio e oxigênio. Há apenas uma pequena diferença entre os teores desses elementos
em se considerando madeira de coníferas e madeira de folhosas. As coníferas possuem
lignina mais rica em carbono, sendo as folhosas mais ricas em oxigênio.
As Figuras 04 e 05 apresentam os exemplos mais comuns de ligações e de estruturas
resultantes das uniões das unidades básicas precursoras da lignina. O potencial para a
formação de ligações na cadeia de lignina é bastante amplo, o que torna sua estrutura
química bastante complexa.
O tipos de ligações que ocorrem entre as unidades formadoras da lignina ainda não
estão totalmente esclarecidos. Os principais tipos conhecidos são as ligações de éter e
ligações carbono-carbono. Este último é muito resistente à degradação química, o que
dificulta a liberação dos monômeros da lignina. Os tipos de ligações de éter de ocorrência
mais comuns são as “-4' e -alquilo”. As principais ligações carbono-carbono são as “-5'“,
“-'“, “-“ e “5-5’”.
De acordo com o predomínio da unidade precursora na formação do polímero a
lignina pode ser classificada como:
- lignina guaiacil (G): quando há o predomínio da estrutura do guaiacil propano.
- lignina guaiacil-siringil (GS): quando há a participação do guaiacil e do siringil propano.
- lignina guaiacil-siringil-p-hidrofenilpropano (GSH): quando ocorre a presença do guaiacil e
do sirigil propano, além do p-hidroxi-finil-propano.
De um modo geral, é aceito que as coníferas apresentam estruturas
predominantemente G-ligninas, as folhosas apresentam estruturas GS-lignina, e as
monocotiledoneas GSH-lignina. A título de exemplo, em Picea abies, a relação G:S:H é de
94:1:5 e para Fagus sylvatica a relação é de 56:40:4. No primeiro exemplo, trata-se de uma
conífera e no segundo caso trata-se de uma folhosa, com suas ligninas podendo serem
classificadas como G-lignina e GS-lignina, respectivamente.
As Figuras 06 e 07 apresentam exemplos de modelos de formação estrutural de
ligninas.

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4. GRUPOS FUNCIONAIS DA LIGNINA

Os grupos metoxilícos (OCH3) são os grupos funcionais mais característicos da


lignina. Apesar de aparecerem também nas hemiceluloses, cerca de 90% da sua presença na
madeira está vinculada à lignina. De uma maneira geral, a lignina das coníferas apresenta em
torno de 16% da OCH3 (0,95/unidade de fenil-propano) e das folhosas cerca de 22%
(1,40/unidade de fenil-propano).
Os grupos hidroxílicos (OH) da lignina representam cerca de 10% de seu peso
(1,1/unidade de fenil-propano) tanto para coníferas como para folhosas. Estes grupos, em
geral, são de natureza fenólica ou alcoólica (álcoois primários, secundários e terciários).
Na lignina ocorrem ainda outros grupos funcionais, dentre os quais se destacam os
grupos carboxílicos (COOH) em torno de 0,05/unidade de fenil-propano e grupos carbonilos
(CO) em torno de 0,10 a 0,20/unidade de fenil-propano.

5. PROPRIEDADES DA LIGNINA

A lignina, conforme se encontra na madeira, é uma substância sem cor e amorfa.


Seu espectro no ultra-violeta mostra um pico de absorção a 280 m. O peso molecular da
lignina nativa é indeterminado, mas, para se ter uma idéia de valor, o peso molecular de um
seu derivado, o ácido lignosulfônico, obtido durante o processo sulfito de produção de pasta
celulósica, varia entre 50 e 260 milhões.
Alguns autores consideram que exista apenas uma molécula de lignina dentro da
árvore, visto ser ela um polímero desordenado, tridimensional, que forma uma rede
contínua na árvore. Apesar de possuir muitos grupos hidroxílicos, ela é bastante hidrofóbica.
Existem inúmeras evidências de que a lignina ocorra na madeira unida a
carboidratos, especialmente hemiceluloses. Porém, há correntes de investigadores que
afirmam que o fenômeno não passa de simples incrustação.
A lignina mostra reações coloridas com certas substâncias, o que facilita a sua
identificação e o estudo da sua distribuição. Os principais corantes são o floroglucinol +
ácido clorídrico, que dá cor vermelha e a safranina verde, que se torna vermelha na
presença da lignina.
A reatividade da lignina tem sido intensivamente estudada pelos seguintes motivos
principais: elucidar sua estrutura química e analisar suas reações nos processos de
cozimento de madeira para a obtenção de pasta celulósica e o branqueamento das mesmas.

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Figura 01 – Figura 02 – Figura 03 –
Álcool p-cumarílico Álcool coniferílico Álcool siringílico ou
(Hidroxi-fenil propano) (Guaiacil propano) sinapílico
(Siringil propano)

Figura 04 - Ligação de éter entre monômeros formadores da lignina

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Figura 05 – Ligações carbono-carbono entre monômeros formadores da lignina

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Figura 06 – Modelo para a lignina de conífera proposto por Freudenberg

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Figura 07 – Modelo para a lignina de folhosas proposto por Nimz

Questionário de Apoio 04

1. Teça comentários sobre o processo de lignificação da madeira, em se considerando a


formação da parede da fibra.
2. Qual a origem e as funções principais da lignina na madeira?
3. Qual a caracterização básica da lignina em termos de composição química?
4. Quais as dificuldades do estudo químico da lignina da madeira?
5. Comente sobre os precursores químicos da lignina.
6. Qual a importância das ligações entre os monômeros da estrutura química da lignina
7. Quais as possibilidades de classificação da lignina em função dos tipos possíveis de
seus monômeros precursores?
8. O que são os grupos funcionais e o que eles representam para a lignina?
9. Teça comentários sobre algumas propriedades da lignina.

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