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Eloísa de Oliveira Simões Saliba1 Norberto Mário Rodriguez1 Sérgio Antônio Lemos de Morais2
Dorila Piló-Veloso3
REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
uma revisão geral sobre os principais aspectos Ligninas de plantas herbáceas são do tipo
relativos ao estudo de ligninas S-G, sendo mais parecidas com a ligninas de
angiospermas que de gimnospermas (SARKANEN
2. LIGNINAS & LUDWIG, 1971). Portanto, em uma conceituação
mais precisa, as ligninas são classificadas nos
2.1 Definição seguintes grupos: Tipo G; Tipo G-S; e Tipo H-G-S
Cabem aqui outras definições encontradas (CHen, 1991; PILÓ-VELOSO et al., 1993). Em
na literatura, além da definição puramente química. estudos realizados por SALIBA et al. em 1999a,
Lignina é um polímero derivado de unidades pode se verificar que a lignina da folha do milho é
fenilpropanóides denominadas C6C3 ou, do tipo H-G-S.
simplesmente, unidades C9, repetidas de forma Em plantas herbáceas, a lignina não pode
irregular, que têm sua origem na polimerização ser definida apenas como proveniente de derivados
desidrogenativa do álcool coniferílico. A lignina ácidos fenólicos. Deve-se trabalhar com as definições
deve ser definida claramente de acordo com o core e não core para descrever o material residual e
trabalho em questão, devido à grande diversidade de os componentes ácidos hidrocinâmicos liberados
maneiras de tratamento para seu isolamento. durante a hidrólise, respectivamente. Assim, essas
LAPIERRE (1993) classificou a lignina em core e definições, segundo RALPH & HELM (1993), são
não core, com base em sua susceptibilidade relativa convenientes para investigações dentro do aspecto
à hidrólise. nutricional das forragens, bem como para comparar a
- Lignina não core: consiste de compostos fenólicos composição das plantas, pois esta terminologia
de baixo peso molecular, liberados da parede celular discute aspectos moleculares da estrutura da lignina.
por hidrólise, que é representada por ácidos p- Portanto, somente derivados do ácido hidrocinâmico,
hidroxicinâmico éster-ligados. que estão covalentemente ligados aos polímeros da
- Lignina core: consiste de polímeros fenilpropanói- parede celular, são liberados durante a hidrólise,
des da parede celular, altamente condensados e constituindo a chamada lignina não core.
muito resistentes à degradação. Eles são compostos Conseqüentemente, derivados de ácidos
de unidades p-hidroxifenila (H), guaiacila (G) e hidrocinâmicos que compõem a lignina através de
siringila (S), em proporções diferentes, de acordo ligações inter-resistentes a hidrólise, pela definição,
com sua origem. constituem as ligninas core.
2.2 Nomenclatura
O sistema mais comum de nomenclatura
na química da lignina é o que se fundamenta na
unidade básica fenilpropanóide, C6C3, designando os
carbonos da cadeia alifática, C3, como α, no caso do
carbono benzílico, e β e γ, seqüencialmente, para os
demais átomos. O anel aromático é numerado,
iniciando-se a contagem pelo carbono ligado à
cadeia alifática1, C3.
cerca de 50% da lignina total do vegetal (FENGEL quantitativamente alguns picos de absorção
& WEGENER, 1984). observados (TAI et al., 1990; MORAIS et al., 1994;
SALIBA et al., 1998).
3 CARACTERIZAÇÃO DE LIGNINAS Devido ao fato de ser a da lignina material
amorfo e constituído de monômeros de estrutura
A estrutura das ligninas deve ser química de grande complexidade, de distribuição
determinada a partir de uma amostra pura, ou seja, variável no polímero ou, mesmo formada de
livre de carboidratos e outros extrativos. É diferentes frações de macromolécula, não é possível
importante também definir a escolha do aplicar a teoria de grupo para a interpretação de seus
procedimento de extração para que a lignina espectros IV (MORAIS, 1987). Na metodologia de
resultante tenha propriedades físicas e químicas interpretação de espectros IV de ligninas, são
semelhantes à protolignina in situ original, empregados compostos-modelo que podem ser
presente no vegetal. A seguir, determina-se o usados como padrões ou então para relacionar
percentual de grupos metoxílicos e outros grupos alguns picos de absorção. Assim, atribuições dos
funcionais, por métodos químicos e picos de absorção IV de ligninas não são feitas
espectroscópicos no infravermelho (IV), de apenas a partir de um simples espectro mas, sim,
ressonância magnética nuclear (RMN de 1 H e estudando comparativamente também os espectros
13
C). Faz-se também o estudo de reações de IV de alguns de seus derivados e de compostos-
degradação e oxidação com permanganato de modelo (TAI et al., 1990). Esses derivados são
potássio e nitrobenzeno, assim como de obtidos por reações de metilação, acetilação e
degradação por pirólise. Os produtos da redução com borohidreto de sódio e hidreto de lítio e
degradação e oxidação são, então, analisados por alumínio.
cromatografia gasosa acoplada à espectrometria Na tabela 1, são mostrados os principais
de massa. Emprega-se ainda cromatografia de picos de absorção característicos no IV para ligninas
permeação em gel, para determinar a distribuição de madeira dura, que são do tipo guaiacila-siringila,
dos pesos moleculares de fragmentos que ligninas de madeiras moles, que são do tipo
compõem a lignina (NASCIMENTO et al., 1992). guaiacila (G); e gramíneas, que são do tipo
guaiacila-siringila-p-hidroxifenila (G-S-H).
3.1 ESTUDO DE LIGNINAS NO
INFRAVERMELHO (IV) Tabela 1 - Principais atribuições dos picos de absorção no IV de
ligninas.
A chamada radiação IV corresponde à
região do espectro eletromagnético situada entre a
COMPRIMENTO DE ONDA (CM-1)
região do visível e a das microondas. A porção de
maior utilidade para o estudo de moléculas orgânicas Madeira Madeira Gramínea Atribuição
situa-se entre 4000 e 400cm-1.. O espectro no IV é Mole (G) Dura (G-S) (G-S-H)
característico da substância como um todo, mas 3400 3400 3400 Grupos hidroxílico
certas ligações de grupos de átomos dão origem a 3000 3000 3000 C-H aromático
bandas que ocorrem mais ou menos na mesma 2936 2936 2936 C-H alifático
freqüência, independentemente da estrutura da 2850 2850 2850 C-H alifático
molécula. É justamente a presença dessas bandas 1720-1700 1720-1690 C=O
não conjugada
características de ligações de determinados grupos 1675-1660 1660-1650 C=O
que permite a obtenção, mediante simples exame do Conjugada
espectro e consulta a tabelas, de informações 1656 C = O Cetonas conjugadas
estruturais úteis (SILVERSTEIN et al., 1979). p-substituídas
1673 Ácido p-cumárico
A espectroscopia no infravermelho é 1470-1460 1470-1460 1470-1460 C-H de grupos metílicos
muito utilizada para a caracterização dos 1430-1415 1430-1415 C-C de anéis aromáticos
constituintes da cadeia polimérica, pois, permite C-H de grupos metílicos
determinar os tipos de ligações e grupos funcionais. 1270 1275 1265 C-O de anéis guaiacílicos
A região de interesse no espectro IV de ligninas é 1240-1230 C-O de anéis siringílicos
C-O de anéis guaiacílicos
também a mais comum para substâncias orgânicas C-O de fenóis
em geral, compreendida entre 4000 e 700cm-1 (2,5 a 1235 Unidades sinapila e
14,3µm). A literatura também mostra trabalhos p-cumarila
feitos no IV próximo, entre 7000 - 4000cm-1 (1,42 - 1140 1085 C-O de álcoois secundários
865-815 915-815 870 C-H aromáticos
2,5µm). (SARKANEN & LUDIWIG, 1971). A
caracterização de picos de absorção no IV se faz
principalmente de modo qualitativo, por comparação Tabela adaptada de:
- SARKANEN & LUDWIG (1971) H = P - hidroxifenila
com dados tabelados. Entretanto, alguns estudos têm - JUNG & HIMMELSBACH (1989) G = Guaiacila
sido desenvolvidos a fim de avaliar - MORAIS (1992) S = siringila
3.2 ESTUDO DE LIGNINAS POR Tabela 2 - Atribuição dos sinais de hidrogênio em oito regiões do espectro de RMN de
1
RESSONÂNCIA MAGNÉTICA H de ligninas.
NUCLEAR (RMN):
Região δ Tipo de hidrogênio responsável pelo sinal
Os maiores comprimentos de 1 8,00 - 11,50 Carboxílico e aldeídico
onda da radiação eletromagnética estão 2 6,28 - 8,00 Aromáticos e vinílicos
envolvidos no chamado espectro de 3 5,74 - 6,28 β-vinílico e benzílicos
RMN. As amostras são submetidas a 4 5,18 - 5,74 Benzílico
campos magnéticos fortes e irradiadas 5 2,50 - 5,18 Metoxílicos e muitos outros hidrogênios ligados à cadeia C3,
por radiofreqüências cujos valores que podem ser α,β e γ
6 2,10 - 2,50 Acetoxílicos aromáticos
dependem do nucleo do átomo 7 1,58 - 2,10 Acetoxílicos difáticos e acetocílicos aromáticos orto à ligação
estudado. O estudo do espectro RMN bifenílica
dá uma idéia das vizinhanças e dos 8 0,38 - 1,53 Alifáticos altamente blindados
arranjos relativos desses componentes.
A espectroscopia de RMN Fonte: MORAIS (1992)
tem sido grandemente utilizada em
muitos estudos de análise estrutural de ligninas 3.2.2 ANÁLISE DE LIGNINAS POR RMN DE
13
(HIMMELSBACH & BARTON II, 1980; C
HIMMELSBACH et al., 1983; BARTON II, 1988;
JUNG & HIMMELSBACH, 1989; SALIBA, 1998). Nimz (1976) apud MORAIS, 1992, em
estudos de lignina de madeira moída (LMM) da Faia
ANÁLISE DE LIGNINAS POR RMN DE 1H (Fagus silvatica), introduziu a RMN de 13C para
auxiliar na caracterização de ligninas. Como na
As ligninas são substâncias de alto peso RMN de 1H, para um estudo da atribuição dos
molecular (PM). Portanto, assim como os polímeros, deslocamentos químicos em unidades δ, relativos
são problemáticas para a análise por RMN. Formam aos sinais de 13C da molécula, foi necessário o uso
soluções viscosas, nas quais as moléculas possuem de compostos-modelo, os quais possibilitam
pouca mobilidade, não permitindo a obtenção de um caracterizar os vários tipos de ligações encontradas
bom sinal. Seus espectros apresentam bandas na estrutura das ligninas. Esta metodologia tem sido
bastante largas e de difícil identificação, podendo de grande emprego na caracterização de ligninas por
conter em suas constituições hidrogênios blindados RMN (FERREIRA et al., 1993 e 1995; PILÓ-
por determinados grupos químicos. A RMN de 1H VELOSO et al., 1993; DRUMOND, 1992, ALVES,
aplicada ao estudo de ligninas tem sua principal 1995; SALIBA, 1998).
vantagem na possibilidade do cálculo, a partir do Na tabela 3, estão relacionados os valores
espectro, do número total de hidrogênios ligados a de deslocamentos químicos 13C em δ e suas
cadeias alifáticas e aos núcleos aromáticos. Pode-se, respectivas atribuições para ligninas.
ainda, obter uma estimativa do número de Na figura 1, apresentam-se os compostos-
hidrogênios hidroxílicos alifáticos e aromáticos, modelo, juntamente com a proposta estrutural para a
assim como do número de hidrogênios metoxílicos lignina da Faia, onde são representados carbonos
(PILÓ-VELOSO et al., 1991; CHEN & ROBERT, que possibilitam as atribuições da tabela 1.4. Mante-
1988). Devido à dificuldade de solubilização de ve-se a numeração estabelecida pelos autores para
ligninas nos solventes usualmente empregados para unidades estruturais e compostos-modelo.
a obtenção de espectros de RMN de 1H, procede-se à
sua acetilação. Uma vez acetilada a lignina, o 3.3 ESTUDO DE GRUPOS FUNCIONAIS E DE
derivado obtido torna-se totalmente solúvel nos FÓRMULAS MÍNIMAS
solventes orgânicos (MORAIS, 1992). Em
Os grupos funcionais presentes na ma-
espectrômetros que operaram em altas freqüências
cromolécula da lignina que sobressaem são: hidro-
(270-400 MHZ), podem-se observar segmentos de
xílicos alifáticos e aromáticos, éteres, carbonilas e
estruturas presentes em pequenas proporções e, metoxilas, além de unidades dos tipos siringila,
portanto, os sinais de hidrogênios de grupos guaiacila e p-hidroxifenila. Para o estudo de cada um
aldeídicos e de estruturas formadas por ligações desses grupos funcionais e unidades, envolve-se a
comuns em ligninas do tipo β-5, β-β, β-4, etc. combinação de métodos químicos e espectroscópi-
A tabela 2 mostra as oito regiões cos. Como a lignina, por definição, é um polímero
principais do espectro de RMN de 1H de ligninas. composto de unidades do tipo fenilpropanóides (C9),
13
Figura 1 - Fragmentos de esquema estrutural de lignina e compostos-modelo utilizados para atribuições dos sinais de RMN de C, na
tabela 3.
Parte dos objetivos deste trabalho foi FERREIRA, M.A., DRUMOND, M.G., PILÓ-VELOSO, D.
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