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M
2020
Porto, junho de 2020
Relatório de estágio
À Prof. Doutora Isabel Almeida e ao Prof. Dr. António Marques por terem possibilitado a
realização deste estágio, assim como pela sua disponibilidade e conhecimento.
A todos os profissionais do INEM com quem contatei durante este estágio, que me integraram
nas suas equipas e tornaram esta experiência tão formativa.
À família e amigos sempre presentes ao longos dos últimos seis anos.
i
Resumo
A medicina de emergência e a emergência pré-hospitalar, em particular, são áreas cada
vez mais exploradas durante o curso de medicina em Portugal. No entanto, são ainda abordadas
num contexto maioritariamente teórica. Assim, um interesse especial e a falta de uma
componente prática nestas áreas constituíram as principais motivações para a realização de um
estágio de observação na Delegação Norte do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM).
Posso concluir que este estágio contribui muito para a minha formação,
complementando com uma componente prática a formação teórica adquirida ao longo do curso
de medicina, pelo que estou, hoje, melhor preparado para encarar situações emergentes com
que me possa deparar na minha carreira médica no futuro.
ii
Abstract
Emergency medicine and, particularly, pre-hospital care are areas each year more
explored during medical degree in Portugal. However, they are still teached in a mostly
theoretical context. Thus, a special interest and the lack of a practical component in these areas
were the main motivations for taking an observational internship in the northern delegation of
the National Institute of Medical Emergency (INEM).
INEM, as the responsible organism for guaranteeing the provision of emergency medical
care in Portugal, integrates and coordinates the pre-hospital assistance systems, transport,
hospital reception and the appropriate referral of urgent patients.
The internship took place at the northern delegation of INEM, between 17/12/2019 and
16/02/2020, consisting of a total of 81 hours distributed by the following vehicles: Emergency
Medical Ambulance (AEM) - Porto 4; Immediate Life Support Ambulance (SIV) - Gondomar;
Medical Emergency and Resuscitation Vehicle (VMER) – Centro Hospitalar Universitário do Porto
and Centro Hospitalar Entre-Douro-e-Vouga; and patients orientation center (CODU) - Northern
Delegation.
I can conclude that this internship contributed a lot to my training, complementing with
a practical component the theoretical knowledge acquired during the medical course. So today
I am better prepared to face emerging situations that I may encounter in my medical career in
future.
iii
Lista de siglas e acrónimos
Sigla Extensão
AA Ar Ambiente
AEC Alteração do Estado de Consciência
AEM Ambulância de Emergência Médica
AHA American Heart Association
AP Auscultação Pulmonar
ARR Amplo, Rítmico e Regular
AVC Acidente Vascular Cerebral
AVD Atividade de Vida Diária
CAPIC Centro de Apoio Psicológico e Intervenção em Crise
CHEDV Centro Hospitalar Entre-Douro-e-Vouga
CHSJ Centro Hospitalar São João
CHVNG/E Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia/Espinho
CHUP Centro Hospitalar Universitário do Porto
CIAV Centro Informação Antivenenos
CODU Centro de Orientação de Doentes Urgentes
CVP Cruz Vermelha Portuguesa
DAE Desfibrilador Automático Externo
DPOC Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica
DM Diabetes Mellitus
EAM Enfarte Agudo do Miocárdio
ECG Eletrocardiograma
EPH Emergência Pré-Hospitalar
ERC European Resuscitation Council
FC Frequência Cardíaca
FR Frequência Respiratória
GNR Guarda Nacional Republicana
GCS Escala de Coma de Glasgow
HTA Hipertensão Arterial
i-TEAMS INEM Tool for Emergency Alert Medical System
IC Insuficiência Cardíaca
ICARE Integrated Clinical Ambulance Record
ILCOR International Liaison Committee on Resuscitation
INEM Instituto Nacional de Emergência Médica
MEM Motociclo de Emergência Médica
MI Membro Inferior
MIE Membro Inferior Esquerdo
O2 Oxigénio
PA Pressão Arterial
PCR Paragem Cardiorrespiratória
PEM Postos de Emergência Médica
PSP Polícia de Segurança Pública
RS Ritmo Sinusal
SA Sem Alterações
SAV Suporte Avançado de Vida
SBV Suporte Básico de Vida
SDR Sinais de Dificuldade Respiratória
iv
SHEM Serviço de Helitransporte de Emergência Médica
SIV Suporte Imediato de Vida
SIEM Sistema Integrado de Emergência Médica
SpO2 Saturação Periférica de Oxigénio
VMER Viatura Médica de Emergência e Reanimação
v
Índice geral
Agradecimentos ............................................................................................................................. i
Resumo ......................................................................................................................................... ii
Abstract ........................................................................................................................................ iii
Lista de siglas e acrónimos ...........................................................................................................iv
Índice geral..................................................................................................................................... i
Índice de tabelas ........................................................................................................................... ii
Índice de figuras........................................................................................................................... iii
Introdução .................................................................................................................................... 1
Desenvolvimento .......................................................................................................................... 3
Descrição dos Meios INEM ........................................................................................................ 4
Abordagem à vítima .................................................................................................................. 7
1. Avaliação Primária ......................................................................................................... 7
2. Avaliação secundária ..................................................................................................... 8
3. A cadeia de sobrevivência ............................................................................................. 9
4. Public access Defibrillation .......................................................................................... 10
5. Vias Verdes .................................................................................................................. 11
Estágio realizado nos meios do Instituto Nacional de Emergência Médica............................ 11
Estágio realizado no CODU...................................................................................................... 31
Análise estatística das saídas testemunhadas ........................................................................ 32
Discussão..................................................................................................................................... 33
Recomendações .......................................................................................................................... 37
Conclusão .................................................................................................................................... 39
Tabelas e Figuras ........................................................................................................................ 40
Gráfico 1 ...................................................................................................................................... 44
Gráfico 2 ...................................................................................................................................... 45
Gráfico 3 ...................................................................................................................................... 46
Gráfico 4 ...................................................................................................................................... 47
Bibliografia .................................................................................................................................. 48
Anexos......................................................................................................................................... 50
Anexo 1 - Declaração de realização do estágio emitida pelo Instituto Nacional de Emergência
Médica ..................................................................................................................................... 50
i
Índice de tabelas
Tabela I – Distribuição das saídas nos diferentes meios do INEM durante o estágio………………40
ii
Índice de figuras
Figura 1 - Símbolo do INEM "Estrela da vida" com o significado das suas extremidades3,19…….41
Figura 2 - Representação da cadeia de sobrevivência3……………………………………………………………42
iii
Introdução
O presente relatório está organizado por capítulos e inicia-se com uma breve explicação
dos motivos de escolha de realização de estágio, os seus objetivos e também como decorreu. O
desenvolvimento inicia-se com uma breve contextualização sobre o SIEM e a entidade
responsável pela sua coordenação - o INEM. Neste capítulo é descrito o processo de resposta
de aos pedidos de ajuda de vítimas de emergência médica, com destaque para a abordagem
primária e secundária, cadeia de sobrevivência, Public-access defibrillation e vias verdes pré-
1
hospitalares. De seguida, apresenta-se a descrição das atividades realizadas no âmbito do
estágio e uma breve análise estatística das saídas testemunhadas. Na discussão está presente
uma apreciação global com algumas observações sobre a aquisição de competências, os pontos
fortes e as limitações do estágio. No capítulo das recomendações, apresentam-se algumas
sugestões para melhorar alguns dos aspetos apresentados no capítulo anterior.
2
Desenvolvimento
Medicina de emergência é uma área extensa, que envolve o transporte inter-hospitalar
de doentes críticos e a prestação de cuidados em serviços de urgência e emergência, tanto intra
como pré-hospitalar, englobando esta última a assistência a situações emergentes fora do meio
hospitalar1.
O Sistema Integrado de Emergência Médica (SIEM) foi criado em Portugal em 1981 com
a finalidade de prestar assistência às vítimas de emergência de trauma ou doença súbita de
forma rápida, eficaz e eficiente2. O sistema envolve um conjunto de ações e entidades que
cooperam entre si, nomeadamente Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM), Polícia de
Segurança Pública (PSP), Guarda Nacional Republicana (GNR), Bombeiros, Cruz Vermelha
Portuguesa (CVP) e os Hospitais e Centros de Saúde. O acionamento do sistema em resposta a
um pedido de ajuda pressupõe o desenrolar de seis fases: Deteção, Alerta, Pré-socorro, Socorro,
Transporte e Tratamento na Unidade de Saúde. Estas etapas correspondem à identificação da
situação de emergência, à realização do pedido de ajuda e ao recurso de meios de comunicação
e equipamentos necessários para responder à situação de forma adequada3.
3
Emergência Médica (SHEM), dependendo da localização geográfica da vítima6. Por outro lado,
se se tratar de uma vítima urgente que carece de intervenção dentro de uma janela temporal
superior à anterior é atribuído o grau de prioridade P3, que leva ao acionamento de um meio
SBV (ambulância ou motociclo)6. Já se a chamada for triada como não emergente/urgente, é lhe
atribuída o grau de prioridade P5, resultando em não serem enviados de meios de emergência
ou levando à transferência da chamada para o SNS24, para o Centro Informação Antivenenos
(CIAV) em situações de intoxicação ou para o Centro de Apoio Psicológico e Intervenção em Crise
(CAPIC) em situações de crise psicológica, comportamentos suicidas, vítimas de abuso ou
violência, entre outros6.
Para além das já mencionadas, o CODU tem também como funções disponibilizar
aconselhamento pré-socorro às vítimas e aos acompanhantes no local sempre que indicado,
assim como garantir o acompanhamento das equipas de socorro no terreno e coordenar a
decisão sobre a referenciação hospitalar de todos os doentes com base em critérios clínicos e
geográficos e nos recursos da unidade de saúde de destino5. Assim, em cada instalação do CODU
– quatro a nível nacional – as funções estão distribuídas por cinco equipas distintas: o
Atendimento, o Acionamento e a Passagem de Dados, realizadas pelos Técnicos de Emergência
Pré-Hospitalar (TEPH), a Assistência Médica, realizada por um ou dois médicos, e o CAPIC, que
envolve um psicólogo6. O médico desempenha um papel fundamental no CODU, sendo
responsável pelo acompanhamento, apoio e controlo dos meios de emergência médica mais
diferenciados que estão no terreno. Outras responsabilidades a cargo do médico incluem:
validação de atos médicos delegados, quando os mesmos se encontrem devidamente
protocolados, validados e se apliquem na situação em causa; articulação e coordenação das
situações de emergência com os médicos das unidades de saúde, quando tal se revele útil ou
necessário; atendimento e aconselhamento no âmbito de situações de intoxicação (CIAV) e
aconselhamento médico a situações de emergência que se verifiquem a bordo de embarcações
(CODU Mar)11.
4
equipa médica (um médico e um enfermeiro, com experiência em emergência médica pré-
hospitalar e cuidados intensivos/abordagem do doente crítico) e dois pilotos, em presença física
permanente junto das aeronaves. Existem atualmente 4 helicópteros na frota INEM: Macedo de
Cavaleiros, Santa Comba Dão, Évora e Loulé6.
5
sediadas as AS (cedidas e equipadas pelo INEM). As suas equipas são constituídas por elementos
pertencentes às respetivas entidades que tenham o curso de Tripulante de Ambulância de
Socorro (TAS) e visam o transporte rápido da equipa até ao local da ocorrência, assim como
estabilizar e transportar doentes que necessitem de assistência, garantindo a possibilidade de
aplicação de medidas de SBV. Existem atualmente 332 AS sedeadas em PEM e 135 sedeadas em
Postos de Reserva6.
6
intervenção com vítimas de abuso/violação sexual14.Atualmente existem 4 UMIPE na frota do
INEM6.
Abordagem à vítima
Quando o acionamento do SIEM leva à ativação e envio de um meio de EPH, esta poderá
colocar em ação diferentes algoritmos de abordagem consoante a vítima. Antes da abordagem
desta, particularmente em ambiente pré-hospitalar ou quando são identificados riscos para a
segurança, a primeira preocupação deve ser a segurança da EPH, da vítima e/ou terceiros. Desta
forma, é fundamental realizar uma rápida avaliação do local da ocorrência para determinar a
segurança no local onde se encontra a vítima7.
Para além disso, deve ser recolhida uma impressão geral das características da
ocorrência, de forma a que as seguintes questões possam ser identificados rapidamente: o tipo
de ocorrência, o número de vítimas e a sua localização, os meios de socorro disponíveis no local,
necessidades especiais ou a existência de problemas específicos7.
1. Há hemorragia exsanguinante?
3. A vítima respira?
Após este primeiro momento, todas as vítimas devem ser submetidas a uma abordagem
inicial sistematizada e metódica, consistindo na avaliação primária e na avaliação secundária.
1. Avaliação Primária
7
D. Disability: Disfunção Neurológica;
Qualquer condição com risco de vida identificada durante esta avaliação deve ser
imediatamente abordada e corrigida se possível, antes de continuar o processo de avaliação.
Isto implica que não se deverá avançar para o passo seguinte de avaliação antes de resolver a
condição que põe em risco a vida7.
2. Avaliação secundária
A avaliação secundária deve apenas ser iniciada após a conclusão da avaliação primária,
ou seja, em vítimas estáveis cujos valores dos sinais vitais não coloquem em risco a vida da
vítima7.
C: Circunstâncias do acidente;
A: Alergias;
M: Medicação habitual;
U: Última refeição.
8
3. A cadeia de sobrevivência
9
recomendado a implementação de programas Public-access defibrillation
(PAD) 15, 16.
A European Resuscitation Council (ERC) e a AHA são algumas das organizações que
defendem a implementação de programas PAD em locais de elevada densidade e movimento
de cidadãos, como aeroportos, estações ferroviárias, terminais de autocarros, recintos
desportivos, centro comerciais, escritórios e casinos, onde as PCR são geralmente
presenciadas15,16. É defendido que a colocação de DAEs em áreas onde é esperada uma PCR a
cada cinco anos é cost-effective16. Estes locais devem ter uma sinalização simples e clara a
informar da localização do DAE e do percurso mais rápido até este, otimizando o tempo de
resposta. Neste sentido está também recomendado o uso do sinal de DAE, criado pela
International Liaison Committee on Resuscitation (ILCOR) e reconhecido mundialmente16. O
número mínimo de equipamentos deve ser suficiente para garantir resposta pronta com DAE
em intervalo de tempo inferior a 3 minutos após o colapso, em qualquer localização abrangida
pelo respetivo programa18. Os DAE devem igualmente estar registados nos centros de
orientação de emergência, no caso de Portugal, o CODU, de forma a que possam orientar os
operadores de SBV ou acompanhantes da vítima para um DAE nas suas imediações, de forma a
diminuir o tempo até desfibrilhação15,16.
10
precoce16. Esta pode ser fundamental devido ao potencial dos bombeiros e agentes de
autoridade em atingir toda a população16.
5. Vias Verdes
11
1º Turno VMER – CHUP – 17/12/2019 – 8h-14h
1ª saída:
B: eupneica, FR = 16 cpm, SpO2 = 100% (Ar Ambiente), Auscultação Pulmonar (PA) = Sem
Alterações (SA);
Atuação: Acesso venoso [Fluidoterapia: cloreto de sódio 0,9%, 100 mL]. Transporte com
acompanhamento médico para o CHUP.
Comentários: O fato da situação clínica ter ocorrido num ambiente com temperatura elevada e
fechado, a última refeição da vítima ter sido no dia anterior com a avaliação da PA a mostrar
hipotensão parecem favorecer a hipótese de se ter tratado de uma crise vasovagal reflexa. No
entanto, apesar da vítima se encontrar estável, do evento ter ocorrido pela primeira vez e não
haver história de patologia associada, a sua avaliação hospitalar foi a medida mais prudente de
forma a excluir causas mais graves.
12
2ª saída:
Descrição: À chegada, doente sentado, estável, acompanhado pela esposa. No dia anterior
iniciou dor torácica associada a pirose, após refeição copiosa. A vítima negou AEC, sintomas pré-
sincopais, assim como irradiação e fatores agravantes ou aliviantes da dor e, ainda,
incumprimento terapêutico.
D: GCS = 15 (0=4, V=5; M=6); pupilas N; Sem défices sensitivos ou motores; glicemia
capilar = 108 mg/dl.
Comentários: Tratou-se do meu primeiro contacto com o MEM. O acionamento da VMER com
consequente avaliação eletrocardiográfica com exclusão precoce alterações sugestivas de
isquemia cardíaca.
No conjunto dos dois turnos de SIV, apenas se registou uma saída, que ocorreu no
segundo turno. No entanto, no primeiro houve oportunidade de confirmar a carga da
ambulância deste meio, com participação na verificação da check-list realizada no início do
13
turno. Para além disso, foi uma boa oportunidade para tomar conhecimento das diferenças de
carga de uma ambulância SIV relativamente às ambulâncias AEM e estudar os protocolos e
algoritmos de SIV.
Descrição: À chegada, doente sentado, a aplicar gelo sobre a face, roupa com vestígios de
sangue. A vítima refere epistáxis abundante, súbita, espontânea, tendo entrado no
estabelecimento comercial para pedir auxílio. Sem melhoria após aplicação de gelo sobre a face
durante 1 hora. Negou trauma, cefaleia, AEC, dor torácica, visão turva ou outras alterações da
visão, dispneia e incontinência urinária.
Antes do transporte: PA = 198/126 mmHg; SpO2 = 97% (AA); epistáxis controlada; restantes
parâmetros sem alterações.
Atuação: Aplicação de pressão direta, gelo e esponja hemostática. Transporte para CHSJ.
1ª Saída:
14
Antecedentes: Síndrome Hemiplegia Alternante com défices cognitivos, autónomo para se
vestir e se alimentar. Em 4º dia de tratamento de Otite Média Aguda.
Descrição: À chegada, vítima em estado pós-ictal, em posição lateral de segurança por ação da
equipa de bombeiros, que chegara primeiro. Pais descrevem e mostram em registo de vídeo
uma crise convulsiva tónica presenciada, auto-limitada, com início por volta das 14h e duração
de cerca 10 minutos. Pais negam antecedentes de crises convulsivas e alterações de
comportamento pela vítima antes da crise.
Comentários: Neste caso, foi particularmente difícil avaliar a resposta verbal da vítima devido à
confusão que a vítima apresentava no estado pós-ictal. Para além disso, uma vez que esta
criança tinha défices cognitivos foi também difícil a comparação do seu estado na ocorrência
com o seu estado basal. Este caso constitui também uma oportunidade para observar o papel
do médico na gestão da equipa, nomeadamente na atribuição de tarefas de acordo com a
aptidão de cada membro, mas acima de tudo, neste caso, na gestão da ansiedade dos familiares
perante a situação clínica da vítima. Face a necessidade de transporte de familiar da vítima como
acompanhante na ambulância não foi possível a minha presença no acompanhamento médico
durante o transporte para o hospital pelo que não pude acompanhar a evolução do quadro
clínico da vítima.
15
2ª Saída:
C: FC = 198 bpm, Ritmo ECG: Pré-excitação Ventricular; PA = 121/70 mmHg pele SA;
1ª Saída:
16
Identificação: Feminino, 84 anos. Lar de idosos.
Antecedentes: Doença de Alzheimer; HTA; IC; acamada, totalmente dependente para as AVDs.
C: FC = 54 bpm, pulso ARR; Ritmo ECG: RS; PA = 130/100 mmHg; pele pálida e suada;
Comentários: Neste caso foi particularmente difícil avaliar a resposta verbal da doente face a
sua doença neurológica avançada. Neste caso tive oportunidade de auxiliar na avaliação da
vítima com colocação de elétrodos para ECG e pesquisa da glicemia capilar.
2ª Saída:
17
Descrição: À chegada, bombeiros no local, a realizar SBV há 10 minutos, sem sinais de
recuperação. Fora encontrado em PCR, com corpo estranho na orofaringe pelos familiares por
volta das 9h45. Ritmo no monitor de ECG: assistolia. A médica decide descontinuar manobras
de reanimação (hora da morte 10h:15). Foi realizada a verificação de óbito e contactado médico
assistente.
Comentários: Este foi o primeiro caso de PCR que presenciei, pelo que à chegada marcou-me o
estado de ansiedade em que se encontravam os familiares da vítima contribuindo para um
ambiente de caos enquanto a equipa de Bombeiros realizava SBV.
3ª Saída:
Descrição: À chegada, vítima em decúbito dorsal na cama encontrada em PCR pelos familiares
por volta das 11h20. Ritmo no monitor de ECG: assistolia. A médica decide não iniciar manobras
de reanimação (hora da morte 11h:45). Foi realizada a verificação de óbito e contactado médico
assistente.
Antecdentes: HTA, CMD, IC, BRE, DRC, história de AVC em 2014. Totalmente dependente para
as AVDs, mantém vida social.
Sintoma: Prostação.
18
Descrição: À chegada, doente em decúbito dorsal na cama, prostada, apenas reagindo à dor.
Tinha sido vista no seu estado basal pela última vez por volta das 18h, aquando da toma da
medicação. Começou a tomar baclofeno e uma dose maior de alprazolam 3 dias antes.
D: GCS = 8 (O=2; V=2; M=4); pupilas midriáticas; glicemia capilar = 190 mg/dL;
Durante o transporte: GCS = 14 (O=4, V=4, M=6), restantes parâmetros com valores
semelhantes.
Atuação: Acesso venoso [0,5 mg de Flumazenil; Fluidoterapia: cloreto de sódio 0,9%, 100 mL].
Transporte com acompanhamento médico para o CHEDV.
1ª saída:
19
Descrição: À chegada, equipa de bombeiros já no local, vítima em decúbito dorsal no chão, não
responsiva. Fora vista bem pela última vez por volta das 16h. Familiares referem que a vítima
iniciara recentemente nova medicação hipoglicemiante.
À chegada ao SU: vítima consciente; GCS = 14 (O=4; V=4; M=6), FR = 18 cpm; SpO2 = 97% (AA);
FC = 64 bpm, pulso ARR; pele SA; glicemia capilar = 202 mg/dl.
2ª saída:
20
Avaliação: À chegada: vítima pouco reativa. Abordagem ABCDE:
B: hiperpneica; FR = 30 cpm; c/ SDR; SpO2 = 70% (AA); AP: crepitações hemitórax direito
e metade inferior do hemitórax esquerdo;
C: FC = 102 bpm, pulso ARR; PA = 107/57 mmHg; extremidades pálidas e frias; Ritmo
ECG: RS;
À saída do local (20h25): vítima consciente; GCS = 14 (O=3; V=4; M=6), SpO2 = 80% (15L/min);
FR = 28 cpm; FC = 93 bpm; PA = 111/62 mmHg.
Comentários: Face as alterações encontradas à AP, é provável que esta vítima apresente
pneumonia por aspiração recorrente de conteúdo alimentar. Face a necessidade de transporte
acompanhante da vítima na ambulância não foi possível a minha presença no acompanhamento
médico durante o transporte para o hospital pelo que não pude acompanhar a evolução do
quadro clínico da vítima.
1ª saída:
21
Medicação: Dulaglutide, IBP, AAS, Ticagrelor, Irbesatan + Hidroclorotiazida, Empagliflozina,
Metformina, Amlodipina.
B: eupneica; FR = 14 cpm; SpO2 = 98% (AA); AP: MV presente e simétrico, sem ruídos
adventícios;
Comentários: Face à ausência de outras alterações para além da HTA de grau 3, a hipótese
diagnóstica mais provável foi crise hipertensiva. Tendo em conta a melhoria da PA da vítima,
esta preferiu manter-se no domicílio, sem transporte para o SU, monitorizando regularmente a
PA. A vítima assinou termo de responsabilidade, foi informada sobre os sinais de alarme a que
devia estar atenta e ficou sob vigilância dos familiares no domicílio. No entanto, tendo em conta
os antecedentes patológicos, penso que o mais prudente seria a vítima ter sido transportada
para o SU para monitorização e tratamento para descida gradual e vigiada da PA.
2ª saída:
22
Antecedentes: HTA.
Medicação: Amlodipina.
Descrição: À chegada, vítima em decúbito dorsal no leito, com sinais de morte estabelecida
(livores na região dorsal e rigidez mandibular). Vítima encontrada em decúbito ventral no chão
do quarto de manhã pelo filho, que fez o pedido de socorro. Realizada verificação de óbito e
contactado médico assistente.
Comentários: Este caso suscitou-me dúvida se não poderia ter havido uma melhor caraterização
da situação clínica aquando do pedido de ajuda de forma a não ter havido ativação da VMER
para verificação do óbito face os sinais de morte estabelecida que a vítima apresentava.
3ª saída:
B: hipopneica; FR = 6 cpm; c/ SDR, tiragem intercostal; SpO2 = 56% (AA); AP: roncos
dispersos bilateralmente;
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D: GCS = 3 (O = 1, V = 1, M = 1); pupilas midriáticas; glicemia = 350 mg/dL;
E: Temperatura = 37,9ºC
À saída do local:
À chegada ao SU: SpO2 = 99% (15L/min); AP: Roncos dispersos bilateralmente; FC = 54 bpm; PA
= 124/70 mmHg; pele N; Ritmo ECG: Bradicardia. Restantes parâmetros sem alterações.
Atuação: Aspiração de secreções das vias aéreas; Oxigenoterapia [por Máscara de Oxigénio de
Alta Concentração, 15L/min]; Acesso venoso [soro fisiológico NaCl 0,9%: 100 mL + 500 mL].
Transporte com acompanhamento médico para CHUP.
1ª saída:
24
Descrição: À chegada, vítima em decúbito dorsal no leito e equipa de Bombeiros já no local, que
observaram a vítima em PCR por volta das 9h20 e iniciaram manobras de SBV de imediato.
Vítima encontrada não responsiva e fria pelas irmãs, que fizeram o pedido de socorro. Ritmo de
ECG: assistolia e decisão médica de não iniciar SAV. Realizada verificação de óbito e contactado
médico assistente.
2ª saída:
Descrição: Alerta dado pelo filho que ligava todos os dias à vítima, tendo-se deslocado à sua
residência desta por não ter atendido as chamadas – comportamento que descreve como pouco
comum. O filho relata aumento da intensidade dos sintomas depressivos com uma semana de
evolução. À chegada, vítima com sinais de morte estabelecida (rigidez dos membros) num
quarto com braseiro e porta e janelas fechadas. Ritmo de ECG: assistolia e decisão de não iniciar
SAV. Realizada verificação de óbito, acionamento da autoridade e contactado médico assistente.
Comentários: Face às circunstâncias encontradas, o mais provável foi ter-se tratado de suicídio,
pelo que, foi muito importante a experiência da equipa da VMER para prestar o apoio
psicológico momentâneo aquando da transmissão da informação aos familiares da vítima que
se encontravam em choque.
25
Descrição: À chegada, equipa de bombeiros já no local, vítima em decúbito lateral no leito,
pouco reativo. Apresentava prostação com 2 dias de evolução, encontrado nesse dia em
decúbito ventral no chão.
À saída: PA = 104/54mmHg, FC = 110 bpm; Síncope quando foi colocado na cadeira para
transporte, tendo sido colocado em decúbito dorsal novamente com recuperação espontânea
da consciência.
Atuação: Acesso venoso [Soro fisiológico NaCl 0.9%: 100 mL + 500mL]. Transporte com
acompanhamento médico para o CHUP.
Descrição: À chegada, vítima em decúbito dorsal no leito. Vítima encontrada não responsiva e
fria pela neta, que fez o pedido de socorro. À avaliação, apresentava já rigidez dos membros.
26
Ritmo de ECG: assistolia e decisão de não iniciar SAV. Realizada verificação de óbito e contactado
médico assistente.
1ª saída:
Antecedentes: HIV.
Medicação: TARV.
Descrição: À chegada, vítima sentada, estável. Refere queda da própria altura na noite anterior,
desenvolvendo dor no joelho direito que o impossibilitava de caminhar sem auxílio. Nega
edema, rubor, dispneia e AEC.
Avaliação: Antes do transporte: consciente e orientado; GCS = 15, FR = 16 cpm; SpO2 = 98%
(AA); FC = 82 bpm, ARR; PA = 120/70 mmHg; pele = SA; pupilas N; MID: sem alterações.
Comentários: Apesar das queixas relatadas pela vítima, esta deslocou-se até ao interior da
ambulância pelo próprio pé não necessitando de auxílio. Face o quadro não urgente da vítima,
penso que não se justificava a ativação da ambulância.
2ª saída:
27
Descrição: À chegada, vítima sentada, estável, acompanhado pela esposa. Refere ter feito
medição da PA no domicílio com o resultado de 190/100 mmHg. No entanto, à avaliação,
apresentava HTA grau 1.
Avaliação: consciente e orientado; GCS = 15, FR = 16 cpm; SpO2 = 99% (AA); FC = 67 bpm, pulso
ARR; PA = 145/70 mmHg; pele = SA; pupilas N; Glicemia = 174 mg/dL.
Atuação: Vítima assina recusa de transporte, fica no domicílio acompanhado pela esposa. É
alertado para sinais de alarme a que deve ficar atento.
3ª saída:
Descrição: À chegada, vítima sentada na via pública, consciente, refere sentir-se bem. Refere ter
escorregado e batido com a cabeça, sem amnésia pós-queda, sem perda de consciência. Pedido
de ajuda realizado por civis que se encontravam no local. Última refeição às 10h.
Avaliação: À chegada: consciente e orientado; GCS = 15; FR = 16 cpm; SpO2 = 99% (AA); FC = 67
bpm, pulso ARR; PA = 165/80 mmHg; pele SA; pupilas N; glicemia = 124 mg/dl; escoriações de
pequenas dimensões na zona occipital, sem hemorragia ativa.
Atuação: Vítima assina recusa de transporte. É alertado para sinais de alarme a que deve ficar
atento, fica acompanhado pela esposa.
Comentários: Neste caso tive oportunidade de auxiliar na limpeza e desinfeção das feridas
apresentadas pela vítima. Uma vez que se tratou de um traumatismo ligeiro e que a vítima se
mobilizou voluntariamente após a queda, optou-se por não imobilizar a vítima.
28
4ª saída:
Descrição: À chegada, vítima consciente, estável, refere sentir-se bem. O pedido de ajuda foi
realizado por empregado de estabelecimento comercial onde a vítima entrara a pedir ajuda aos
gritos. A vítima refere ter sentido dor muito intensa na região lombar. Refere ainda tratar-se de
uma dor cónica com cerca de 17 anos de evolução. À chegada da AEM, a vítima refere que a
intensidade da dor já regressara ao padrão habitual e assina recusa de avaliação e transporte.
5ª saída:
Sintoma: Síncope.
Avaliação: Antes do transporte: consciente e orientado; GCS = 15, FR = 18 cpm; SpO2 = 94%
(AA); FC = 67 bpm, ARR; PA = 140/70 mmHg; pele suada e pálida; pupilas N;
29
13º turno: A.E.M. – Porto 4 – 16/02/2020 – 8h-14h
1ª saída:
Descrição: À chegada, vítima sentada, consciente. Refere prostação e anorexia desde do dia
anterior, sem outras queixas. Última refeição às 7h30.
Avaliação: Antes do transporte: consciente e orientada; GCS = 15, FR = 16 cpm; SpO2 = 98% (AA);
FC = 82 bpm, ARR; PA = 120/70 mmHg; pele = SA; pupilas N.
2ª saída:
Sintoma: Náuseas.
Descrição: À chegada, vítima sentada, consciente, acompanhada por familiares. A vítima refere
sintomas pré-sincopais ao preparar o pequeno-almoço com síncope, sem queda – amparada
pelos familiares – e sem memória de perda de consciência e com recuperação espontânea e
imediata da mesma. Negam movimentos tónicos-clónicos ou confusão após a perda de
consciência. Valores habituais de PA: 100/60 mmHg. Última refeição no dia anterior.
30
Avaliação: consciente e orientada; GCS = 15, FR = 17 cpm; SpO2 = 98% (AA); FC = 65 bpm, ARR;
PA = 90/50 mmHg; pele = SA; pupilas N.
3ª saída:
Descrição: À chegada, vítima sentada, muito queixosa. A vítima referia ter escorregado em
escadaria com queda de altura de 1,5 metros. Não se conseguia levantar desde então, com
agravamento ao movimento. Última refeição às 7h. Decidiu-se não imobilizar completamente a
vítima pois esta já se encontrava sentada quando a equipa chegou ao local, não apresentado
outros sinais de alarme.
Avaliação: consciente e orientada; GCS = 15, FR = 17 cpm; SpO2 = 99% (AA); FC = 105 bpm, ARR;
PA = 120/85 mmHg; pupilas N; glicemia capilar = 108 mg/dL; Edema da articulação tibio-társica
esquerda e dor com agravamento da dor à mobilização passiva do pé. Pulso pedioso esquerdo
presente. Dor 9/10.
31
Ao longo do turno, testemunhei o atendimento de 15 chamadas no total: chamada de triagem
dos Bombeiros (1); chamada de ambulância de SBV que não encontrava o local (1); transmissão
de dados de ambulância SBV ou SIV (2); acionamento VMER/SIV – algoritmo P1 (2); acionamento
SBV - algoritmo P3 (6); reencaminhamento para a linha de apoio Saúde 24 - algoritmo P5 (2);
chamada sem acionamento de meios – algoritmo P8 (1).
Durante o turno, não foi possível acompanhar de forma regular a atividade do médico
regulador de serviço. No entanto, foi-me possibilitado presenciar à gestão do envio de meios
para uma ocorrência multivítimas de forma a haver pelo menos um meio VMER disponível na
zona do Grande Porto na eventualidade de surgir nesta região outra ocorrência com necessidade
de uma equipa médica durante o mesmo intervalo de tempo.
Verificou-se, ainda, que na maioria dos casos (16 casos – 61%) ocorreu
acompanhamento hospitalar, tendo sido necessário acompanhamento médico em 23% das
saídas. No total de dez casos que não condicionaram acompanhamento hospitalar, seis
corresponderam a PCR com morte da vítima no local e os restantes quatro casos a situações de
recusa por parte da vítima. Dos acionamentos da VMER apenas um não condicionou transporte
da vítima para o SU.
32
Discussão
Ao longo do estágio no INEM, tive oportunidade de contatar com exemplos de casos
que representam os que mais frequentemente levam à ativação do SIEM, com exceção de
acidentes de viação, défices sensitivo-motores e dor abdominal ou problemas urinários10. Ao
mesmo tempo, as situações clínicas presenciadas constituíram casos desafiantes quer a nível
diagnóstico como a nível de estabelecimento das primeiras medidas terapêuticas, como os casos
de dispneia, AEC e hipoglicemia. As equipas do INEM com que fui contatando ao longo do estágio
permitiram a minha integração completa nestas, quer nas saídas como no tempo disponível na
base. Isto tornou possível a vivência das dificuldades caraterísticas dos casos clínicos
presenciados e das particularidades do trabalho das equipas de EPH no terreno. Como resultado,
assisti à aplicação de alguns dos principais protocolos de emergência médica, com observação e
consolidação de conhecimentos sobre técnicas de abordagem e avaliação clínica da vítima, de
procedimentos para a sua estabilização inicial e discussão dos principais diagnósticos
diferenciais. Para além disso, ao longo dos turnos foi possível aplicar na prática alguns dos
conhecimentos adquiridos durante o curso, nomeadamente ao nível de procedimentos como
abordagem a vítimas conscientes e inconscientes, avaliação clínica e monitorização da vítima.
Em algumas situações pude, por exemplo, auxiliar na colocação de elétrodos para ECG e leitura
de ECG, pesquisa de glicemia e ventilação com insuflador manual. Outro aspeto que considero
importante foi ter assistido à comunicação de más notícias, como o falecimento de familiares e,
em particular, na suspeita de suicídio. Nesses momentos marcou-me a carga emocional
presente e o cuidado que se deve ter com as palavras a que se recorre, assim como a entoação.
Na globalidade das saídas da VMER, penso que tenha havido um correto acionamento
deste meio. No entanto, considero que há algumas exceções. Em alguns casos de PCR, face a
presença de sinais evidentes de morte estabelecida da vítima, uma melhor caraterização da
situação em causa no momento da triagem poderia ter evitado o acionamento de um meio de
emergência. Já noutros casos, como os testemunhados no primeiro turno VMER, a ativação
deste meio parece ter sido excessiva para a situação clínica em causa. No entanto, o seu
acionamento pode ser compreensível face a presença de caraterísticas de maior dúvida que
possam apontar para um desfecho menos favorável, carecendo de intervenção médica.
Também em algumas saídas da AEM, como a primeira saída do décimo segundo turno, pude
verificar que a gravidade atribuída durante a triagem do pedido de socorro fora superior à
gravidade real testemunhada. Face a ausência de necessidade de medidas terapêuticas e
transporte urgentes ou emergentes, penso que, neste caso, não se justificava a ativação de
33
meios de emergência. Esta discrepância entre a gravidade atribuída e a real pode ter várias
razões: transmissão, durante o pedido de ajuda, de informações que traduzissem uma maior
gravidade do que a real, por desconhecimento ou de forma não deliberada; manipulação das
informações fornecidas ao CODU para que ocorresse o envio de meios; atribuição excessiva de
gravidade pelo protocolo de triagem com falsos positivos.
Ao longo dos turnos na VMER, pude observar que, principalmente fora dos grandes
centros urbanos, geralmente a ambulância (AEM, AS ou “não INEM”) foi o primeiro meio a
chegar ao local da ocorrência. Tal verificou-se em alguns casos de PCR, pelo que quando a equipa
da VMER chegou junto da vítima, a equipa de bombeiros já se encontrava a realizar manobra de
SBV. Dada a localização mais próxima das corporações de bombeiros, assim como dos agentes
de autoridade, à população, nomeadamente em zonas mais rurais, considero fundamental que
estes agentes de socorro tivessem habilitação e equipamento para, quando indicado e sob
validação por parte da equipa médica no CODU, realizassem desfibrilhação nas situações
pertinentes. Esta medida pode ser particularmente importante dado o potencial destes agentes
de socorro em atingir toda a população16.
O turno realizado no CODU permitiu contatar com a parte do SIEM que antecede o
acionamento de meios, complementando o meu conhecimento sobre a organização e
funcionamento do mesmo, permitindo também uma melhor compreensão de como o processo
34
de triagem é realizado. Ao longo do turno foi confrontado com uma amostra do tipo de
chamadas recebidas pelo CODU diariamente e pude constatar que geralmente quem faz o
pedido de ajuda se encontra num estado muito ansioso ou desconhece as informações básicas
requeridas que precede o envio de meios, dificultando a sua compreensão das questões
colocadas pelo operador para melhor caraterizar as queixas. Este fato torna o processo de
triagem mais complexo e demorado, dificultando a correta identificação da situação clínica e,
consequentemente, a seleção mais demorada dos meios a acionar. Nestas circunstâncias pude
verificar a capacidade adaptativa e de empatia que os operadores apresentam, conseguindo
acalmar quem faz o pedido de socorro, tornando a comunicação mais simples e clara, com
fornecimento eficaz de informação pela vítima ou acompanhantes sobre a situação em causa e
respetivos conselhos, por parte dos operadores, de aplicação de medidas básicas, antes da
chegada dos meios do INEM ao local. Para além disso, tornou possível tomar consciência da
importância da correta identificação de situações de risco e da gestão eficiente dos meios
disponíveis.
Uma das principais limitações do estágio foi ter sido maioritariamente observacional,
limitando a minha participação às necessidades da equipa no local. Em algumas situações, não
foi autorizado o meu acesso ao acompanhamento médico da vítima durante o transporte para
o hospital. Uma vez que durante o mesmo pode haver evolução da situação clínica da vítima
decorrente da instituição das medidas primárias de tratamento, a falta de acesso pode ter
restringido a minha aprendizagem e experiência. A impossibilidade de controlo da quantidade
de acionamentos em cada turno levou a um número heterogéneo de saídas entre os vários
turnos, tendo não havido nenhuma saída num dos turnos de SIV, e vários turnos de VMER e um
de SIV com apenas um acionamento. A tipologia das situações clínicas é igualmente imprevisível,
pelo que não testemunhei a ativação de nenhuma via verde pré-hospitalar ou a aplicação de
SAV, o que limitou a abrangência dos casos clínicos testemunhados e dos protocolos aplicados.
É de salientar, no entanto, que se tratam de aspetos caraterísticos desta área da medicina,
constituindo sempre uma limitação deste tipo de estágios.
35
negativos”, isto é, diminuição das situações de gravidade para as quais não era acionado
qualquer meio de emergência ou não era acionado o meio mais indicado11. Por outro lado, este
sistema retirou totalmente a autonomia aos operadores do CODU e pode estar associado a uma
tendência para sobrestimar a gravidade da situação em causa, com aumento dos falsos
positivos, levando a um acionamento desnecessário de meios. Isto vai de encontro ao que, ao
longo do estágio, foi constado em alguns casos e relatado pelos profissionais do INEM, quer no
CODU, quer nas equipas no terreno. Por exemplo, a grande maioria das chamadas recebidas
pelo CODU em 2019 levou ao acionamento de meios (94%)11. Apesar do INEM considerar que
não tem havido uma taxa excessiva de falsos positivos que coloque em causa a correta
rentabilização de meios de socorro11, estas situações provocam alguma frustração nos
elementos das equipas de EPH e faz com que os meios não se encontrem disponíveis em caso
de serem necessários para situações verdadeiramente emergentes. No mesmo ano, houve a
introdução da aplicação Integrated Clinical Ambulance Record (ICARe), que permitiu a
articulação entre os meios no terreno, o atendimento efetuado no CODU e as unidades de
saúde, melhorando os tempos de chegada dos meios ao local da ocorrência e a integração da
informação11. No entanto, foi possível observar que em alguns dos meios esta aplicação não se
encontra disponível. Contudo, este problema pode vir a ser resolvido com a implementação
prevista da aplicação INEM Tool for Emergency Alert Medical System (i-TEAMS), que visa a
criação de uma rede integrada de resposta de emergência médica à vítima, envolvendo todas
as outras entidades que cooperam com o SIEM, nomeadamente as unidades hospitalares, que
passarão a contar com a informação em tempo real sobre todos os doentes que se encontram
a caminho do seu Serviço de Urgência11.
36
Recomendações
No sentido de melhorar alguns dos aspetos menos positivos anteriores, apresento de
seguida algumas sugestões.
De forma a maximizar o potencial pedagógico dos estágios, deveria haver uma maior
coordenação dos estágios com informação prévia das equipas sobre as datas dos mesmos. No
mesmo sentido, seria importante estabelecer diretrizes sobre os objetivos a atingir durante o
estágio de forma a auxiliar os orientadores de cada turno a decidir em que tarefas podem os
estagiários ter um papel mais ativo ou até executar de forma a minimizar o impacto da
aleatoriedade do conhecimento e experiência adquirida através dos casos testemunhados e das
equipas contatadas.
37
contínua dos cuidados pré-hospitalares é fundamental investir também na formação destes
agentes assim como na rede de ambulâncias. Por exemplo, parece-me fulcral que não só todos
os agentes envolvidos na emergência pré-hospitalar, mas também os agentes de autoridade
tivessem formação e treino em SBV e uso de DAE. No mesmo sentido, todas as ambulâncias e
viaturas da autoridade deveriam estar equipadas com um DAE.
Uma estratégia a longo prazo e mais dirigida à população geral, seria a formação desta,
através de ações de sensibilização, do uso dos meios de comunicação social, da inclusão de
conteúdos escolares obrigatórios sobre esta temática, ou outras estratégias dirigidas. Seria
importante abordar quais as informações fundamentais a transmitir aquando da realização de
um pedido de ajuda, assim como das situações que carecem de assistência médica emergente
em contraponto aos casos que podem levar a outro tipo de resposta. Considero que também
seria relevante promover uma formação de base da população sobre cuidados pré-socorro,
como posição lateral de segurança, SBV e uso de DAE, ou até gestos básicos para contenção de
hemorragia. No mesmo sentido, tendo em conta o envelhecimento crescente da população,
parece-me fundamental que haja investimento na formação dos cuidadores e técnicos dos lares,
não só nestes gestos de pré-socorro, mas também em cuidados mais gerais como aspiração de
secreções respiratórias, devendo os lares possuir os respetivos equipamentos.
38
Conclusão
Os objetivos propostos com a realização deste estágio foram na sua maioria cumpridos.
Considero que o número e a duração dos turnos passados em cada meio do INEM foram
adequados. Ao longo do estágio tive oportunidade de contatar com uma grande variedade de
situações de emergência, o que me permitiu, não só, assistir à aplicação de alguns dos principais
protocolos de emergência médica, mas também participar ativamente nos procedimentos
exercidos pelos profissionais. Com esta experiência, considero ser agora capaz de identificar as
principais situações de emergência do foro médico e traumatológico, pelo que permitiu
complementar com uma componente prática a formação adquirida na área da medicina de
emergência, que é maioritariamente teórica durante o curso de medicina. Foi-me possível
verificar o papel preponderante do médico na liderança das equipas de EPH, assim como a
importância da empatia, gestão de ansiedade e capacidade comunicativa com as vítimas,
familiares e acompanhantes. Pude, ainda, observar como os agentes de socorro desenvolvem
um trabalho em equipa e de entreajuda centrado na prestação de cuidados com qualidade,
responsabilidade e ética profissional. Foi também possível verificar nas diversas equipas com
quem contatei, e que me acolheram sempre muito bem, o cuidado em cultivar um ambiente de
profissionalismo e de partilha de experiências e competências, sendo merecedores de
admiração pelo trabalho que desenvolvem apesar dos riscos a que estão sujeitos diariamente.
Em suma, este estágio foi uma mais valia no meu percurso académico, complementou
a formação teórica adquirida ao longo do curso de medicina e permitiu uma confiança reforçada
para encarar situações emergentes com que me possa deparar na minha carreira médica no
futuro.
39
Tabelas e Figuras
Tabela I - Distribuição das saídas (motivo e número) nos diferentes meios do INEM durante o estágio
PCR 4
Dor torácica 2
Total 9
PCR 2
Dispneia 1
Crise convulsiva 1
Taquicardia 1
Total 8
Total 1
Trauma 3
Crise hipertensiva 1
Distúrbio psiquiátrico 1
Total 8
40
Figura 1 - Símbolo do INEM "Estrela da vida" com o significado das suas extremidades3,19
41
Figura 2 - Representação da cadeia de sobrevivência3
42
Figura 3 - Sinal internacional de DAE, criado pela ILCOR20
43
Gráfico 1
3,5
2,5
1,5
0,5
0
VMER SIV AEM
44
Gráfico 2
7%
4%
4%
0%
8%
46%
8%
23%
<15 15 24 25 - 34 35 - 44 45 - 54 55 - 64 65 - 74 >75
Gráfico 2 - Representação gráfica distribuição das vítimas assistidas durante o estágio por faixa etária
45
Gráfico 3
10
0
VMER SIV AEM
Gráfico 3 - Representação gráfica da distribuição da tipologia de meios INEM por saídas que
condicionaram transporte da vítima para o SU
46
Gráfico 4
9
8
7
6
5
4
3
2
1
0
VMER
Gráfico 4 - Representação gráfica distribuição das saídas da VMER que condicionaram ou não transporte
da vítima para o SU, com ou sem acompanhamento médico, e casos em que a morte foi verificada no
local no local da ocorrência
47
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program-bls-347-systematic-review. Consultado em: 13/06/2020.
49
Anexos
Anexo 1 - Declaração de realização do estágio emitida pelo Instituto Nacional de
Emergência Médica
50