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alpinismo industrial

Trabalho nas

ALTURAS
Alpinismo industrial atinge ponto culminante no setor de óleo e
gás, mas ainda precisa de regras claras e qualificação contínua
para ser exercida sem riscos.
por Maria Fernanda Romero

partir de técnicas de escalada li-


vre e com cordas em rocha, solu-
ções eficazes para assegurar o

Fotos: Divulgação
acesso de profissionais específi-
cos aos locais que deveriam so-
frer intervenções (reparos, manu-
tenção, etc.). Foi assim que co-
meçou a escalada industrial nas
operações offshore. A despeito
dos riscos, estes procedimentos,
na maioria dos casos, são a alter-
nativa mais segura de execução
da tarefa, mesmo nas condições
difíceis em que se aplicam, su-
perando em vários aspectos as
abordagens tradicionais (andai-
mes, balancins, plataformas sus-
pensas, etc.).

E
Regras são necessárias
Até os dias de hoje não há re-
m constante desen- zadas nas plataformas da Bacia gistro exato de quando e onde
volvimento, a ca- de Campos, há mais de dez anos. surgiu a escalada industrial de
deia produtiva de Hoje, porém, o alpinismo indus- forma profissional. Alguns fatos
petróleo e gás não trial galgou posições também no apontam para a década de 1970,
apenas alavanca a mundo onshore e continua uma quando empresas de engenharia
indústria naval e escalada bem sucedida, que alia da França, Espanha e Inglaterra
outros fornecedores de bens e tecnologia e espírito de aventura. perceberam as vantagens de subs-
serviços para a área offshore, O alpinismo industrial nasceu tituir a mão-de-obra tradicional
como também dá origem a novas da necessidade de se realizar, por escaladores de rochas, ou al-
empresas e profissões, que são com total segurança para os tra- pinistas. As primeiras empresas,
criadas para atender a uma de- balhadores, uma série de proce- hoje mundialmente reconhecidas
manda altamente especializada. dimentos em situações de alto ris- como precursoras da moderna
Foi neste cenário que surgiu no co, devido ao difícil acesso ao lo- indústria do acesso por corda,
Brasil a atividade do alpinista cal onde o trabalho deveria ser surgiram no final daquela déca-
industrial, um profissional cada efetuado – como, por exemplo, da na Grã-Bretanha.
dia mais requisitado pelo merca- estruturas de plataformas, laterais Com o aumento do número
do offshore. As primeiras escala- de cascos de FPSOs, etc. A gran- dessas empresas houve a neces-
das foram feitas em obras reali- de inovação foi desenvolver, a sidade de se criar regras mais cla-

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ras para o mercado, principal-
mente nos quesitos qualidade e
segurança: faltavam parâmetros
que diferenciassem o bom e o mau
procedimento no acesso por cor-
da. Foi então que, em 1987, um
grupo de empresas criou o Irata
(Industrial Rope Access Trade
Association, ou Associação Co-
mercial do Acesso por Corda),
primeira associação de empresas
do setor.
O Irata nasceu com o objetivo
de promover e manter o padrão
das atividades industriais do
acesso por corda. Depois de es-
truturada, a associação passou a
fornecer orientação no treinamen-
to e na certificação do pessoal
envolvido, e a produzir publica- rança global de todo o projeto.
ções técnicas sobre a importân- Daí o desenvolvimento e evolu-
cia do bom funcionamento de ção contínua do alpinismo indus-
equipamentos e do treinamento trial, que utiliza técnicas e equi-
dos procedimentos adotados. A pamentos derivados do alpinis-
entidade também divulga infor- mo tradicional, de forma a propi-
mações sobre a saúde e seguran- ciar ao operário maior seguran-
ça do escalador industrial, aju- ça, agilidade, mobilidade de as-
dando na elaboração da legisla- censão, descensão ou posiciona-
ção do trabalho em altura e no mento de trabalho, em áreas ver-
treinamento, formação e certifica- ticais, planos inclinados ou ain-
ção destes profissionais. da em vãos livres, como pontes,
No mundo, já existem leis e torres, under deck’s e outros.
entidades responsáveis pela ela-
boração de normas específicas Rota de expansão
para o exercício desta profissão. A expansão das atividades
No Brasil, no entanto, existem offshore no Mar do Norte contri-
poucas normas e leis referentes buiu, de forma significativa, não
a esta atividade. Recentemente, só para o crescimento do setor de
foi criada a NBR-14787 – norma trabalhos verticais em todos os
que regulamenta trabalhos em es- países da União Européia e Les-
paços confinados. Esta NBR tem te Europeu, como também nos
total afinidade com a escalada Estados Unidos, Austrália, Cin-
industrial. gapura, África do Sul, Uruguai e
Reduzir o número de trabalha- Brasil. Com o crescimento con-
dores expostos a situações de ris- tínuo da demanda, as empresas
co, minimizar o período da para- perceberam que não adiantava
lisação do equipamento, o tempo ter apenas técnicos de acesso
de execução do trabalho, os cus- por corda em seus quadros de
tos da obra e de possíveis inde- funcionários.
nizações são alguns dos objeti- Afinal, esses profissionais
vos deste método revolucionário. também devem executar outras
O principal é aumentar a segu- atividades além das técnicas de

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alpinismo industrial

acesso – como, por exemplo, ser- no ramo offshore na Bacia de Técnicos e engenheiros de
viços de solda, mecânica, caldei- Campos, região norte fluminen- segurança, bombeiros militares e
raria, inspeção, pintura, hidroja- se, as oportunidades de trabalho civis, membros de brigadas de
temaneto – assim como trabalhos aumentaram e, conseqüente- emergência e qualquer pessoa
na área de engenharia civil e mente, a concorrência se acirrou. interessada na capacitação nes-
geotécnia, entre outros. A versa- Hoje várias empresas disputam tas modalidades de resgate téc-
tilidade é o grande diferencial do esse filão. nico tanto em espaço confinado
alpinismo industrial, pois abre quanto em trabalhos em altura
um leque de possibilidades para Qualificação contínua pode participar. Para o nível I, os
problemas aparentemente sem A Climbtec é a única empresa pré-requisitos necessários são
solução. Diante da grande pro- do Rio de Janeiro a oferecer trei- que os alunos sejam maiores de
cura, a atividade foi se aprimo- namento para quem quer se qua- 18 anos, não tenham fobia por
rando e alcançou condições téc- lificar para o mercado. O curso, altura ou doenças que os impe-
nicas de executar serviços alta- que tem certificação internacional çam de executar tais atividades.
mente especializados em quase do Irata, é realizado mensalmen- Entretanto, nos demais níveis,
todos os segmentos da engenha- te em Niterói, na Região Metro- dependendo da empresa, é exi-
ria contemporânea. politana do Rio de Janeiro, tem gido dos alunos conhecimentos
No lugar das grandes monta- duração de cinco dias e qualifica básicos de técnicas verticais e
nhas, pontes, viadutos, navios e o profissional para a nova área manuseio de cordas.
plataformas de petróleo. Foi nes- de trabalho. Contudo, Rabelais ressalta que
te cenário que o alpinismo ga- De acordo com o diretor, os um alpinista esportista também pre-
nhou um novo espaço nas indús- cursos acontecem na base opera- cisa ser qualificado no setor de pe-
trias do Brasil e do mundo, so- cional e centro de treinamento da tróleo e gás para atuar nas indús-
bretudo no setor petroleiro. Atu- empresa, em Niterói. No período trias do ramo. Segundo ele, a gran-
almente o acesso por corda é uma de cinco dias os cursos têm dura- de vantagem do escalador (como é
atividade reconhecida no mundo ção de 48 horas e são constituí- chamado o alpinista industrial) é
todo e já conta com várias associa- dos em 98% de aulas práticas. que ele prepara e executa o traba-
ções de empresas espalhadas por Atuante em alpinismo indus- lho em curto espaço de tempo.
diversos países. O chamado aces- trial e há seis anos no mercado, a “As empresas gastam menos
so por corda é utilizado na exe- Climbtec já realizou trabalhos tempo e dinheiro ao contratar um
cução de serviços de limpeza, tra- como a limpeza dos tanques de alpinista industrial. A execução de
tamento e pintura de superfícies, carga (locais onde fica armaze- serviços, dos mais básicos aos mais
inspeções e instalações de equi- nado o petróleo) das plataformas complexos, em plataformas de
pamento, e é requisitado para P-48 e P-50; inspeção, montagem, petróleo e navios, por exemplo,
qualquer tipo de trabalho em lo- pintura e solda na P-17; e, em passou a ser possível em prazos
cais difíceis de se alcançar. 2008, pintou o flair de uma refi- cada vez mais curtos”, completou.
Países como África do Sul, naria carioca em apenas dez dias. A qualificação vai do nível 1,
Austrália, Canadá, Reino Unido, “Para atuar nesse mercado, a inicial, ao nível 3, mais avançado.
França, Espanha, Estados Uni- qualificação é o primeiro passo. Após os cinco dias de curso e, se
dos e Alemanha já contam com No dia-a-dia, o profissional pre- aprovado, o escalador recebe um
uma associação própria, mas ou- cisa lidar com ri- certificado que o torna potencial-
tras recorrem às estrangeiras, gorosos proces- mente requisitado num mercado
como é o caso do Brasil, Uruguai, sos de seguran- em que falta mão-de-obra especi-
Portugal, Panamá, Cuba e Méxi- ça e cumprir alizada e a demanda é crescente.
co, por exemplo. prazos. É uma Atividades de risco devem ser
Até meados da década de espécie de corri- executadas por quem conhece e
1980, o trabalho com acesso por da contra o tem- tem experiência no assunto, por
corda era desenvolvido no Bra- po, com altos re- isso serviços de desmontagem, sol-
sil sem muita regularidade, com quisitos de segurança e resulta- dagem, montagem, pintura, inspe-
as empresas sobrevivendo de dos muito bons para os clientes”, ções, caldeiraria, dentre outros, em
trabalhos esporádicos. No entan- explica Reinaldo Rabelais, dire- grandes alturas podem ser reali-
to, após a entrada de empresas tor da Climbtec. zados contando com alpinistas in-

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trabalho nas alturas

dustriais experientes e qualifica- taformas de petróleo e navios, dos uns 15 a 20 dias. Mas em geral
dos nas certificações Irata. mais básicos aos mais complexos, são de oito a nove horas por dia,
São profissionais que, além e em prazos cada vez mais curtos. de segunda a sexta-feira. Entre-
da formação em segurança indus- Wallace de Souza Lima, esca- tanto, quando necessário, também
trial e experiências nos serviços lador da Climbtec há dois anos, trabalhamos finais de semana e fe-
de risco, são conhecedores de ati- diz que sempre gostou do alpi- riados até acabarmos o serviço”,
vidades técnicas específicas, o nismo como esporte e, apesar de diz Lima, que afirma ter aproxi-
que os torna qualificados na exe- não praticar muito antes, quis se madamente 1.700 horas de corda.
cução de serviços especiais. aventurar na nova profissão. “Há Além de escalador, Wallace
“Até mesmo o alpinista es- cinco anos, morava no Rio Gran- Lima tem curso de inspeção em
portista precisa do Irata para tra- de do Norte e comecei a observar LP (líquido penetrante) e também
balhar como escalador ”, disse o essa área de inspeção... me inte- é supervisor de SMS da empre-
diretor da Climbtec. Além dis- ressei pelo alpinismo quando vi sa. O profissional afirma que,
so, de acordo com Reinaldo Ra- um mercado amplo nessa área para a Climbtec a segurança de
belais, para um supervisor ní- em Macaé. Vim para o Rio, fiz o seus escaladores, assim como a
vel 3, por exemplo, a remune- curso na Climbtec e acabei me en- de seus funcionários, é essen-
ração pode chegar a R$ 700 por cantando de fato por essa práti- cial. “A empresa oferece um óti-
dia de trabalho. ca”, conta o escalador. mo sistema de treinamento e, du-
Dependendo do tipo do servi- rante todo o ano, distribui carti-
Das montanhas aos estaleiros ço realizado, a carga horária de lhas e realiza palestras sobre a
O crescimento do mercado bra- um escalador pode variar bastan- importância da segurança nos tra-
sileiro de alpinismo industrial ga- te, assim como sua remuneração. balhos contratados. Afinal, servi-
rantiu para os profissionais do se- “Depende muito do serviço. Às ve- ço de qualidade implica em se-
tor a execução de serviços em pla- zes, trabalhamos direto durante gurança”, lembra o escalador.

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