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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS

CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

MONALISA SILVEIRA DE SOUZA

“UBERIZAÇÃO" NAS RELAÇÕES DE EMPREGO À LUZ DA CONSOLIDAÇÃO

DAS LEIS TRABALHISTAS (CLT) BRASILEIRA

Orientador: Prof. Dr. Zéu Palmeira Sobrinho

Natal/RN

2018
MONALISA SILVEIRA DE SOUZA

Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN


Sistema de Bibliotecas - SISBI
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro Ciências Sociais Aplicadas - CCSA

“UBERIZAÇÃO" NAS RELAÇÕES DE EMPREGO A LUZ DA CONSOLIDAÇÃO


DAS LEIS TRABALHISTAS (CLT) BRASILEIRA

Monografia apresentada como requisito


para obtenção do título de Bacharel em
Direito da Universidade Federal do Rio
Grande do Norte.
Orientador: Prof. Dr. Zéu Palmeira
Sobrinho

Natal/RN
2018
Souza, Monalisa Silveira de.
Uberização” nas relações de emprego à luz da Consolidação das Leis
Trabalhistas (CLT) brasileira / Monalisa Silveira de Souza. - 2018
77f.: il.

Monografia (Graduação em Direito) - Universidade Federal do Rio


Grande do Norte, Centro de Ciências Sociais Aplicadas, Departamento
de Direito. Natal, RN, 2018.
Orientador: Prof. Dr. Zéu Palmeira Sobrinho.

1. Uberização – Monografia. 2. Precarização do Trabalho -


Monografia. 3. Flexibilização – Monografia I. Sobrinho, Zéu Palmeira.
II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título.

RN/UF/Biblioteca Setorial do CCSA CDU 349.24

Elaborado por Eliane Leal Duarte - CRB-15/355


AGRADECIMENTO

A Deus por ter me dado saúde e força para superar as dificuldades.

Ao meu orientador Prof. Zéu Palmeira, por suas orientações e contribuições.

A minha família, pelo amor e apoio incondicional.

E a todos que direta ou indiretamente fizeram parte da minha formação, em


especial os motoristas de Uber que muito me incentivaram durante as breves
corridas. O meu muito obrigada.
RESUMO

O estudo em tela tem como escopo a análise do sistema de Uberização, que se


apresenta na forma de precarização do trabalho e flexibilização das relações
trabalhistas, processo esse que vem se intensificando concomitantemente ao
avanço da reorganização capitalista e da globalização. Diante desse cenário, a
pesquisa analisa inicialmente a diferença entre os conceitos de flexibilização e
precarização. Na segunda etapa, discorre sobre o aplicativo Uber, tomado como o
objeto principal do estudo devido a sua popularidade e por servir de título para esse
novo modelo de relação trabalhista. Por fim, analisa de que modo o aplicativo está
inserido na legislação vigente, discorrendo sobre a dubiedade de um vínculo
empregatício entre os motoristas e a plataforma. A pesquisa é justificada diante da
conjuntura econômica vivenciada atualmente, bem como em razão do propósito das
empresas, neste caso a Uber, de atingir um grande número de pessoas com
eficiência, fazendo com que a concorrência e o aumento da demanda tragam a
necessidade de flexibilizar as condições de trabalho. Tais circunstâncias geram a
errônea conclusão de que aqueles escolhem ser “parceiros” do aplicativo estão em
uma favorável relação empregatícia, quando, na verdade, há uma incerteza na
interpretação desse vínculo causada pela própria plataforma, a partir do momento
em que esta deixa uma margem interpretativa nas suas normas e termos de serviço
apresentados. Dessa forma, permite-se que sejam suprimidos direitos
historicamente conquistados, fortalecendo a condição de fragilidade do trabalhador
em nome do interesse capitalista. O presente estudo utilizou o método qualitativo
dedutivo, e, como técnica de pesquisa, a entrevista estruturada.

Palavras-chave: Uberização. Precarização do Trabalho. Flexibilização.


ABSTRACT

The study under analysis has as scope the work over of the Uberisation system,
which presents itself in the form of the precarization of work and the flexibilization of
labor relations, a process that has been intensifying concomitantly to the advance of
capitalist reorganization and globalization. Against this scenario, this research initially
analyzes the differentiation of the concepts of flexibilization and precarization. In the
second step, it discusses the Uber application, taken as the main study’s object due
to its popularity and its role as a flagship for this new model of labor relations. Finally,
it analyzes how the application is inserted in the current legislation, discussing the
dubiousness of an employment relationship between the drivers and the platform.
The research is justified by the current economic environment, and also because of
the companies’ purpose, in this case Uber, to reach a large number of people with
efficiency, causing competition and increased demand to bring the need to make
working conditions more flexible. Such circumstances leads to the uncertain
conclusion that those who choose to be “application partners” are in a favorable
employment relationship, when, in fact, there is an uncertainty in the interpretation of
this link caused by the platform itself, from the moment it leaves an interpretative
margin in its rules and service terms presented. In this way, historically conquered
rights are allowed to be suppressed, strengthening the condition of the worker's
fragility in the name of capitalist interest. The present study utilized the qualitative
deductive method, and, as a research technique, the structured interview.

Keywords: Uberisation. Precariousness Work. Flexibilization


LISTA DE ABREVIATURAS

APP - Acidentes Pessoais a Passageiros

App - Application, em português, aplicação

CCQ - Círculos de Controle de Qualidade

CF – Constituição Federal

CLT – Consolidação das Leis Trabalhistas

CNH - Carteira Nacional de Habilitação

CRLV - Certificado de Registro e Licenciamento de Veículo

EAR - Exerce Atividade Remuneratória

EUA – Estados Unidos da América

GMB – General, Municipal, Boilermakers, substantivo próprio do sindicato

GPS - Global Positioning System, em português, Sistema de Posicionamento Global

INSS - Instituto Nacional do Seguro Social

MTE – Ministério do Trabalho e Emprego

OIT – Organização Internacional do Trabalho

TRT – Tribunal Regional do Trabalho

UGT - União Geral dos Trabalhadores


SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 1
2 DIREITO DO TRABALHO BRASILEIRO E PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES
EMPREGATÍCIAS ................................................................................................................. 4
3 EMPRESA UBER E O REBAIXAMENTO DO CUSTO DA FORÇA DE TRABALHO ...... 14
3.1 O QUE É "ECONOMIA DE COMPARTILHAMENTO"? .............................................. 14
3.2 O QUE É A UBER? .................................................................................................... 15
3.2.1 Como funciona a plataforma? ........................................................................... 16
3.2.2 História do aplicativo Uber: Surgimento e popularização .............................. 18
3.2.3 Polêmicas e regulamentações do aplicativo Uber no Brasil .......................... 20
3.2.4. Polêmicas envolvendo a Uber e os Direitos dos Trabalhadores no contexto
internacional ............................................................................................................... 21
3.2.4.1 Estados Unidos ............................................................................................. 21
3.2.4.2 Inglaterra ....................................................................................................... 22
3.2.4.3 Espanha ........................................................................................................ 23
3.2.4.4 Bélgica .......................................................................................................... 25
4 UBER NO CONTEXTO DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS TRABALHISTAS VIGENTE .. 25
4.1. JUDICIÁRIO BRASILEIRO E A UBER NO BRASIL................................................... 26
4.1.1 Subordinação ..................................................................................................... 27
4.1.2 Habitualidade ..................................................................................................... 29
4.1.3 Onerosidade ....................................................................................................... 31
4.1.4 Pessoalidade ...................................................................................................... 34
4.2 PESQUISA DE CAMPO: ANÁLISE DAS ENTREVISTAS COM OS MOTORISTAS ... 36
4.2.1. Abordagem e Dificuldades ........................................................................... 36
4.2.2. Dados e análise ................................................................................................. 37
5 CONCLUSÃO......................................................................................................................40
REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 44
APÊNDICE I - ENTREVISTA............................................................................................... 49
1

1 INTRODUÇÃO

O sistema capitalista é marcado por suas recorrentes crises e ciclos,


inerentes ao seu funcionamento dinâmico. Por isso, eles representam ganhos para
alguns e perdas para outros, com consequências que são perceptíveis em toda a
cadeia produtiva.

Assim, com fito de adequar-se às novas conjunturas, são realizadas


adaptações e cortes na cadeia produtiva de acordo com o que é demandado pelo
mercado e, meio a isso, ocorre o fenômeno da flexibilização. Nas palavras de José
Francisco Siqueira Neto (1996, p.36), de forma sucinta, "consubstancia-se no
conjunto de medidas destinas a afrouxar, adaptar ou eliminar direitos trabalhistas de
acordo com a realidade econômica e produtiva".

Desses interesses econômicos decorreram, portanto, adaptações legislativas


sob discursos de que haveria defasagem das normas existentes ou ainda suas
indicações como fatores limitantes para o desenvolvimento financeiro. Esse é o caso
que ilustra, por exemplo, a concepção da recente reforma na legislação trabalhista
brasileira, Lei n° 13.467/17.

Ainda nesse cenário, aqueles que não se adaptam aos novos moldes
impostos ou, de qualquer modo, não estão inseridos no mercado de trabalho,
buscam outras formas de sobrevivência e findam se sujeitando ao que se conhece
por trabalhos precarizados. Como ilustração, citam-se os subempregos, atividades
temporárias, ciberproletariado1 ou trabalhos informais – camuflados na pregação da
independência do trabalhador quando na verdade sujeitam-nos à chefia.

Decorrente de discussões contemporâneas, emerge esse trabalho na


tentativa explicar e discutir acerca de um novo protótipo de precarização nas
relações de trabalho: a Uberização, a qual não é prevista diretamente na legislação
pátria em vigor e que, por isso, tem-se observado recorrentes conflitos resultantes
dessa.

1
Segundo Antunes, Ciberproletariado é uma classe de trabalhadores que surge decorrente das
tecnologias da informação, globalização e de gradação das condições de trabalho. O autor considera
esse tipo de mão de obra contraditório por utilizar tecnologia avançada, ser de ponta, ao mesmo
tempo que herda condições de trabalho do século XX. (In: Admirável mundo novo? Entrevista de
Ricardo Antunes por Christian Carvalho Cruz, O Estado de S.Paulo, 11/10/2009)
2

Esse fenômeno de rápido progresso, inicialmente, declarava ser uma forma


do indivíduo incrementar sua renda de maneira independente, no qual o "parceiro",
conectado a um aplicativo de celular e mediante contrato, propõe-se a seguir
algumas regras mínimas e acessíveis para realizar um serviço de qualidade. Uma
vez que conectado com outrem que necessite dessa prestação remunerada; ao
intermediador virtual caberia uma "taxa" pela conexão de qualidade e segura da
tarefa realizada.

Tribunais Nacionais e Internacionais têm debatido se o aplicativo que articula


o processo participa dessa cadeia como empregador, qual seja, aquele que “rouba
do tempo de trabalho alheio, sobre o qual se funda a riqueza atual” (ANTUNES,
2011, p. 54), havendo, por falta de tutela jurídica, divergências de interpretações e
entendimentos desse objeto.

Para além, derivado à tal controvérsia, aqui, portanto, questiona-se: o labor


vinculado à plataforma Uber, sob a ótica dos motoristas e à luz do direito nacional,
contribui ou não para a precarização das condições de trabalho?

Diante desse cenário, a pesquisa analisa inicialmente a diferença entre os


conceitos de flexibilização e precarização. Objetivando compreender essa matéria, o
presente exame tem o intuito de ponderar quanto à temática da flexibilização a partir
do conhecimento do modelo de precarização das relações de trabalho do direito
brasileiro, oriundo das novas tecnologias e sua massificação.

Na segunda etapa, discorre sobre o aplicativo Uber, tomado como o objeto


principal do estudo devido a sua popularidade e por servir de título para esse novo
modelo de relação trabalhista. Destaca-se, igualmente, pela dificuldade de
implementação de seu modelo de atuação perante a legislação trabalhista, não
somente no Brasil, mas também em outros países abordados.

Por fim, analisa de que modo o aplicativo está inserido na legislação vigente,
discorrendo sobre a dubiedade de um vínculo empregatício entre os motoristas e a
plataforma e objetivando, enfim, oferecer melhor elucidação do tema e possível
solução.

Para o desempenho da pesquisa, foi utilizado o método qualitativo dedutivo a


partir de referenciais teóricos indicados em seus respectivos capítulos, os quais
3

incluem: decisões judiciais proferidas em Varas do Trabalho e Tribunais Regionais


do Trabalho; legislação, quais sejam a Constituição Federal de 1988 (CF/88) e a
Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT); conceitos extraídos de manuais para
melhor definição, como, dentre outros, a obra “Uberização” de Tom Slee, “Adeus ao
trabalho?”, de Ricardo Antunes; periódicos que igualmente versem sobre o tema, a
exemplo, as Revistas da LTr; páginas virtuais que exponham sobre, como a da
própria Uber e outras diversas de notícias e; entrevistas realizadas com os
protagonistas desta pesquisa, os motoristas.

Ademais, destaca-se o uso do radical "Uber" por ser esta a designação da


principal plataforma atuante no segmento, ocupando, ainda, posição de destaque no
deslinde de contendas judiciais, em especial no Brasil, mas que isso não afasta
outros softwares da tipificação. Por causa ainda de tal protagonismo esse também
será o principal objeto em análise desta pesquisa.

A relevância desse trabalho justifica-se na insurgência de mais uma inovação


tecnológica, a informacional, a qual marca, concomitantemente, o início da Terceira
Revolução Industrial e da era pós-fordista e que, tratando-se de algo novo, a
sociedade deve analisar criticamente os vieses desse evento com fito de coibir
prejuízos para si maiores que os possíveis avanços.

Isto posto, esta pesquisa presta-se a demonstrar os danos à coletividade que,


quanto força de trabalho, a Uberização a tem gradualmente desvalorizado de forma
dissimulada e, por questões interpretativas de leis, não está sendo tutelada
juridicamente com diligência.
4

2 DIREITO DO TRABALHO BRASILEIRO E PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES


EMPREGATÍCIAS

Em seus estudos, Siqueira Neto (1996, p.36), entende que a flexibilização é


um fenômeno que ocorre quando há, supostamente, uma legislação rígida e que,
para fins mercadológicos, essa deve ser maleável, de forma a trazer benefícios aos
seus tutelados, sejam eles empregadores ou empregados. No entanto, isso pode ser
considerado falacioso, visto que normalmente quem tende a ser juridicamente
prejudicado é o proletariado.

Ademais, ainda cabe ressaltar que, apesar de estreitamente próximos, os


fenômenos de flexibilização e de desregulamentação são diferentes. Arnaldo
Sussekind aduz que:

A flexibilização pressupõe a intervenção estatal, ainda que básica, com


normas gerais abaixo das quais não se pode conceber a vida do trabalhador
com dignidade. Precisamente porque há leis em que
determinados preceitos devem ser flexíveis ou estabelecer fórmulas
alternativas para sua aplicação (SUSSEKIND, 2007, p.14).

Enquanto que, conforme definição do advogado Mário Antônio Lobato de


Paiva (2007, p. 14)2, desregulamentação é “a progressiva supressão de regras
imperativas, com o correspondente alargamento da liberdade de estipulação”. Logo,
entende-se que a desregulamentação ocorre com o afastamento do Estado como
responsável por tutelar determinada matéria, permitindo, desse modo, a auto
regulação das lides entre as partes.

Destarte, a título de comparação, flexibilização entende-se como a mudança


normativa realizada para atender interesses daqueles por ela atingidos, enquanto
que a desregulamentação é a retirada do Estado e, consequentemente, das normas,
em prol da auto-regulamentação das contendas.

Seguinte ao conceito de flexibilização do Direito do Trabalho, importa


ainda destacar qual o seu nível de abrangência, bem como estabelecer a definição
do que seria a precarização das relações empregatícias. Assim, uma vez que a

2
SUSSEKIND e PAIVA foram extraídos da Revista ANAMATRA.
5

norma trabalhista se torna maleável e as inovações adotadas prejudicam as


condições laborais do operariado, diz-se que houve precarização.

Cumpre asseverar ainda que essa pode se apresentar de forma subjetiva ou


objetiva. Segundo Linhart (2014, p. 51), a precarização subjetiva é perceptível em
casos nos quais, no local de serviço, é criado um ambiente concorrencial entre os
trabalhadores, não cooperativo, e que incentiva o individualismo, refletindo em
práticas de assédio moral e esgotamento profissional (burnout). Conforme Sá (2010,
p. 91-105), a precarização objetiva reflete-se mediante configuração de insegurança
no emprego, perda de regalias sociais, salários baixos e descontinuidade dos
tempos de trabalho, ora denominados de trabalhos temporários.

De acordo com Antunes (2011, p.190-192), as modificações nas condições de


trabalho costumam acontecer quando há crise estrutural no modelo produtivo e, sob
a premissa de que as novas regulamentações serão benéficas e protetivas à mão de
obra, visto que se intenciona garantia da existência do emprego, são adotadas
medidas flexibilizatórias.

Das mais recentes e marcantes crises do capitalismo, modelo predominante


mundialmente, salienta-se a Crise dos anos 73 na qual os estudiosos demarcam
como o declínio do modelo Taylorista de produção e ascensão do modelo Toyotista.
Antunes (2011, p. 47), em sua obra, exemplifica elementos que levaram a queda do
protótipo então vigente, quais sejam: 1) a crise estrutural do capital, que levou a sua
reestruturação; 2) o desmoronamento do Leste Europeu, onde, em contraponto ao
capitalismo, regido pelo socialismo, inspirava o coletivo de trabalhadores quanto a
melhores condições de trabalho e menos abusos dos empregadores; 3) o
desmoronamento da esquerda tradicional que levou à sua democratização, o que
gerou o enfraquecimento do sindicalismo de esquerda e, consequentemente, na
classe trabalhadora e; 4) a crise do Estado de bem-estar social (welfare state)
concomitante com a expansão do neoliberalismo, o que gerou regressão
da socialdemocracia e aproximou as duas agendas, dentre as medidas tomadas
foram a reestruturação produtiva, políticas fiscais e monetárias, enxugamento do
Estado e privatização acelerada.

Em decorrência disso, observou-se a diminuição da classe operária industrial


tradicional, expansão do trabalho assalariado e do setor de
6

serviços, heterogeneização do trabalho com a maior presença da mão de obra


feminina, o desemprego estrutural em função da automação, robótica e
microeletrônica, a subproletarização intensificada através do trabalho parcial,
terceirizado, temporário, atraindo imigrantes para os países centrais em busca do
bem-estar social, a exemplo dos gastabeiters na Alemanha e lavoro nero na Itália.

Já Delgado (G. N., 2015, p. 148) cita como apontamento que esse contexto
de esgotamento do padrão taylorista-fordista culminou com a queda da taxa de lucro
e aumento do preço da força de trabalho, maior concentração de capitais, aumento
das privatizações e crise do Estado Social de Direito.

De outro modo, Brenner (2015, p. 149) atribui o declínio desse modelo no


Ocidente ao “deslocamento do capital para as finanças, surgimento do excesso de
capacidade de produção, perda de lucratividade, diminuição das taxas de capital,
elevação do desemprego estrutural e precarização do trabalho”.

Com a devida relevância, soma-se a toda essa conjuntura as eleições de


defensores do pensamento liberal nos países centrais e principais economias
mundiais, que influenciaram os demais Estados de menor desenvolvimento. Logo,
preliminarmente a Europa, fundamentada no neoliberalismo, tratou de adotar
políticas de desregulamentação e gestão individualista, além de diminuir gastos
estatais, o que resultou na crise do Estado Social de Direito.

Nessa perspectiva, é possível observar a tangibilidade do que defendeu


Hegel em sua teoria do Estado Poiético. Segundo essa teoria, presencia-se o
exagero da individualidade humana em detrimento ao coletivo; o Estado passa a
atuar como meio de despersonalização sem compromisso com o ético e; a
sociedade civil procede como sistema das necessidades, preocupada com as
demandas econômicas mais que com o social, passando então a resumir o homem
à força do trabalho, com função única de produzir e cumprir obrigações, não sendo
visto como usuário da dialética do trabalho.

Como resultado disso tem-se que tal modelo estatal representaria a ruptura
do Estado de Direito e suas finalidades éticas, sendo esse submetido ao capital e
seus interesses econômicos, que representariam a base valorativa da nova
sociedade capitalista (Salgado, 1998, p. 56-58).
7

Assim, infere-se que, sendo o Direito do Trabalho parte dos direitos


fundamentais sociais e, pelo Estado Poiético hegeliano, em um contexto de
conjuntura econômica, o Estado age de forma antiética a atender a organização do
capital, conclui-se que a legislação trabalhista deve sofrer impactos também,
podendo ser, por exemplo, pela flexibilização ou desregulamentação das normas -
reestruturando-se, deste modo, o Estado Liberal de Direito sob a diretriz do
neoliberalismo.

Sob essa égide torna-se viável o exercício das práticas de gestão Toyotista
que trabalha de acordo com a demanda, ou produção enxuta, e o pronto
atendimento, ou just-in-time, exigindo, assim, menos força de trabalho.

Destarte, o encolhimento manufatureiro gera, por exemplo, a redução de


cargos que, pela mudança para normas mais favoráveis ao empregador, não
resultando em grandes prejuízos às empresas; a manutenção de pouca mão de obra
se torna menos onerosa; eventuais aumentos da demanda podem ser supridos com
cargos temporários ou terceirizados, ou seja, precarizados e; são reduzidos gastos e
despesas com estoque.

Consoante às atividades pós-tayloristas, encontra-se ainda os ensinamentos


de David Harvey (2007, p. 144), o qual propõe a existência de dois tipos de
trabalhadores: 1) o primeiro grupo composto pelos “centrais das empresas”,
altamente qualificados e com maior diversidade de habilidades, por isso gozam de
maior garantia de emprego, estabilidade e segurança dentro do trabalho; e 2) o
segundo grupo formado pelos “periféricos das empresas”, referente àqueles que
trabalham de acordo com as necessidades do mercado, com trabalho manual
menos especializado - são os subempregados, trabalhadores temporários, de tempo
parcial ou determinado, terceirizados, informais.

Como já foi colocado, o pensamento econômico emergente no último quarto


do século passado teve início nos países “centrais” e, consecutivamente, chegou às
nações “periféricas”.

No Brasil, a partir dos anos 1990 percebeu-se mais sensivelmente a


“desertificação neoliberal” devido a fatores determinantes como o Consenso de
8

Washington e a reestruturação produtiva nos setores da indústria e de serviços, o


que refletiu na organização laboral pátria. Antunes (2011, p. 105) aduz que

A necessidade de elevação da produtividade dos capitais em nosso país


deu-se, desde fundamentalmente o início dos anos 1990, através da
reorganização sócio-técnica da produção, da redução do número de
trabalhadores, da intensificação da jornada de trabalho dos empregados, do
surgimento dos CCQ’s (Círculos de Controle de Qualidade) e dos sistemas
de produção just-in-time e kanban, dentre outros elementos da lógica
simbiótica do Toyotismo flexibilizado.

Vislumbra-se, assim, como a economia brasileira adentrou mais intensamente


à agenda pós-taylorista, em um período no qual a política nacional abandonada o
modelo repressor adotado na Ditadura Militar e regressava ao Estado Democrático
de Direito sob o comando de governos neoliberais, tal quais as demais nações do
globo.

O doutrinador ainda pontua outras características relevantes desse então


novo modo de produção, como a implantação da acumulação flexível do ideário
japonês, a intensificação da produção enxuta (lean production), adoção das
subcontratações e terceirização de trabalhadores, mudança das indústrias para
locais onde fossem oferecidas mais vantagens econômicas como isenção tributária,
baixos salários, pouca ou nenhuma força sindical e alta demanda de trabalhadores
carentes de qualquer trabalho - um contexto favorável à possibilidade de
descumprimento de leis distante de fiscalizações.

Nesse sentido, de forma prática e favorável a esse quadro, tivemos, na


legislação pátria, a adoção de normas desregulamentadoras e flexibilizatórias já a
partir dos anos 70. Essas, portanto, aqui serão citadas as que estão em vigor
hodiernamente3.

A uma, Lei nº 6.019 de 1974, recentemente alterada pela Lei n° 13.429/2017,


regulamenta e conceitua, em seu art. 2º, o trabalho temporário como aquele que é
colocado “à disposição de uma empresa tomadora de serviços, para atender à
necessidade de substituição transitória de pessoal permanente ou à demanda
complementar de serviços”.

3
Dados organizados por PALMEIRA SOBRINHO, Zéu. Flexibilização. Revista Anamatra, Brasília, v.
XVIII , n. 53, p.14-24, 2° semestre de 2007. Semestral.
9

Contudo, não tão somente por definição é possível compreender seu caráter
precarizante. Observa-se, por conseguinte, o art. 4°-A, §2°, no qual é expresso que
não há “vínculo empregatício entre trabalhadores, ou sócios das empresas
prestadoras de serviços, qualquer que seja o seu ramo, e a empresa contratante”.

A princípio, a norma já autoriza que o operariado trabalhe para uma empresa,


a qual ele não é diretamente contratado, com fito de substituir uma mão de obra
essencial para o regular exercício da atividade empresarial sem que, contudo, tenha
obrigações para tal empregado, como pagamento de décimo terceiro ou a
concessão de férias remuneradas, e podendo, sob sua discricionariedade, tirar esse
funcionário do seu estabelecimento sem, mais uma vez, precisar custear com os
ônus previstos das verbas rescisórias. Aliado ao que a reforma supracitada propõe,
fica, definitivamente, afastado esses encargos daquele que usufrui plenamente do
serviço oferecido.

Logo, observando o que anteriormente foi posto, quanto a insegurança no


emprego e perda de regalias sociais serem características da precarização objetiva,
fica evidenciada que a legitimação da “Lei da terceirização” foi um marco
significativo na flexibilização das normas trabalhistas.

A duas, a Magna Carta de 1988 que trouxe como advento, em seu art. 7°, VI,
a “irredutibilidade do salário salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo”.
Mais uma vez, atentando-se às definições doutrinárias pertinentes, é regularmente
assinalado que alterações salariais desfavoráveis ou inferiores ao que é devido
trata-se de precarização das relações laborais. Assim, ao que chamam de
“Constituição Cidadã” resta questionado o quanto ela protege seus sujeitos de direito
se, por si, ela já permite que sejam violados o Estado Social de Direito e os
princípios da dignidade da pessoa humana e ao valor social do trabalho autorizando
a diminuição salarial.

A três, a vigência da Lei n° 7.855/89, que revogou parte da Consolidação das


Leis Trabalhistas (CLT), e, dentre as novas diretrizes, sob o argumento de isonomia
nas relações empregatícias, permitiu a inserção da mulher em atividades em
ambiente insalubre, perigoso, à jornada noturna, o trabalho na construção civil e em
minas e subsolo. Ou seja, permitiu a incorporação da mão de obra feminina em
10

trabalhos com ambientes e condições indignos de labor (Delgado, M.G., 2010, p.


899).

A quatro, a denúncia do Brasil à Convenção 158 da Organização


Internacional do Trabalho (OIT) em 1996, o então Presidente da República,
Fernando Henrique Cardoso, pelo Decreto nº 2.100/1996, declarou que o Brasil não
continuaria como signatário da norma internacional e deixaria de cumpri-la a partir
de novembro de 1997. Em suma, tal norma tratava da extinção do contrato de
trabalho por iniciativa do empregado e a vedação da dispensa sem justa causa
(ROMANO, 2015).

Atenta-se aqui de pronto dois fatores que convergem para a mesma


característica da precarização: a insegurança no trabalho. Uma vez que o
trabalhador não possui nenhuma garantia de estabilidade no emprego, dependendo
tão somente da arbitrariedade do empregador, esse pode, desmotivadamente e a
qualquer tempo, tirar daquele, hipossuficiente, sua fonte de renda e,
consequentemente, de seus dependentes. Ou seja, essa revogação normativa
explicita uma situação em que o Estado brasileiro curva-se à agenda do
neoliberalismo e trata o homem como força de trabalho apta a atender somente às
necessidades do mercado.

A cinco, a sanção da Lei n° 9.601 de 1998, qual acrescentou o art. 59, à CLT,
em seu §2°, assimila que é aceito que o operários trabalhe mais sem que isso gere
custos ao empregador, em consonância seguem os §§ 5º e 6º do mesmo artigo,
bem como os arts. 59-A e 59-B, que versam sobre banco de horas.

Com essas condições, fica mais propício a competição entre empregados,


principalmente se o patrão utilizar do assédio moral para favorecer esse ambiente
concorrencial. Em consequência os subordinados ficarão propensos a trabalhar
mais, por mais tempo, para não ficar com a produtividade ultrapassada frente aos
demais, oportunizando ao seu superior persegui-lo quanto ao seu rendimento,
chegando, enfim, a situação denominada de burnout, que compromete sua
integridade física, psíquica e moral.

A seis, a validação da Lei n° 11.101 de 2005, conhecida como Lei de


Falências, prevê a perda de regalias sociais e desconsideração com a força de
11

trabalho. Os arts. 54 e 83, inciso I, dispõe acerca da desvalorização do labor, fator


qual gera perdas ao operariado, posto que sua mão de obra não será razoavelmente
recompensada, devido a limitação de seu pagamento, e este pode ser inferior àquilo
que lhe é pertinente.

Já na CLT é cabível citar o art. 71, §§ 3° e 4°, que, consoantes ao art. 1° da


Portaria MTE n° 1.095/2010, permitem a redução do intervalo intrajornada do
trabalhador mediante autorização do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE)
quando previsto em convenção ou acordo coletivo. Desse ponto, é válido destacar
que, assim como nos demais casos de flexibilização das normas, o empregado é
prejudicado em suas condições de labor, visto que seu intervalo atribuído,
comumente, para refeitório, pode ser desrespeitado sem mesmo ter sido observado
as necessidades individuais do trabalhador.

Por fim, a mais recente expressão da supressão do Estado Social de Direito,


o advento da Reforma Trabalhista de 2017, a Lei Federal n° 13.467/2017. Frisa-se
aqui que essa não será discutida por completa neste trabalho, pois não é o seu
objetivo, mas que serão destacadas a seguir normas que forem pertinentes a essa
pesquisa.

Temos, assim, a aquiescência do acordado sobre o legislado no qual o juiz


passará a observar os requisitos de validade baseado tão somente no Código Civil.

Pelo art. 59-A, da CLT, as partes podem estabelecer em acordo individual o


trabalho com doze horas seguidas por trinta e seis horas de descanso, não mais
sendo necessário o fazer por convenção ou acordo coletivo. Isso, acarreta, por
exemplo, no aumento do número de acidentes doenças ocupacionais, devido ao
cansaço que gera no trabalhador dos extensos períodos de trabalho.

A adoção do art. 71, §4°, que permitiu o fracionamento do intervalo


intrajornada e sua redução a, pelo menos, uma hora, o que reiteradamente prejudica
as condições laborais da mão de obra afetando questões de saúde e segurança no
12

trabalho, desrespeitando, nesse aspecto, o tempo para, principalmente, refeições do


coletivo operário.

Em desfavor ainda, releva-se a revogação do §2° do art. 134, da CLT, pelo


qual empregados menores de dezoito anos e maiores de cinquenta anos podem ter,
assim como os demais, as férias fracionadas em três períodos.

A principal inovação trazida foi a do art. 443, o qual trata sobre o trabalho
intermitente, essa passou a permitir a remuneração do trabalhador pelas horas
trabalhadas sem que se faça necessário o pré-estabelecimento de jornada de
trabalho. Com isso, o empregador pode, portanto, utilizar-se do serviço do
empregado conforme suas necessidades e pagando somente pela demanda, não
observando, nesses casos, o valor mensal estabelecido pelo salário mínimo. Na
prática, o coletivo obreiro tem que trabalhar mais, atender mais demandas, para
alcançar seu sustento, o que leva a precarização, seja pelo assédio moral, burnout,
redução salarial, aumento do período trabalhado.

Igualmente prejudicial nesse aspecto, trata-se no art. 75-A sobre o


teletrabalho, o qual deles são excluídos limites de tempo laboral, independente do
controle do patrão e, posteriormente, no art. 75-E, é transferido ao trabalhador a
responsabilidade de se comprometer a seguir as instruções “expressas e ostensivas
do empregador quanto às precauções a serem tomadas a fim de evitar doenças e
acidentes de trabalho”. Destarte, infere-se que não haverá controle das cargas
horárias, apenas recomendações que, a interesse das empresas, dificilmente serão
seguidas, uma vez que a elas importam apenas o cumprimento das metas
repassadas.

A seguir dita-se o art. 442-B que “a contratação do autônomo, cumpridas por


este todas as formalidades legais, de forma contínua ou não, afasta a qualidade de
empregado prevista no art. 3° desta Consolidação”. Ou seja, tal norma deu abertura
à pejotização do trabalhador nomeando-os “autônomos” o que, portanto, por esse
tratamento, muda a natureza do contrato e leva a descaracterização e perda dos
direitos protegidos pela CLT.
13

Enfim, frisa-se as ajudas de custo previstas no art. 457, §2°, da CLT, que
deixam de integrar a remuneração do empregado, não se incorporando ao salário e,
portanto, não constituem base de incidência de encargos trabalhista e previdenciário
e; em consonância a isso, tem-se o art. 75-D, que repassa os custos dos
instrumentos de trabalho e sua manutenção, aqui sendo, portanto, o carro, ao o
trabalhador. Logo, visualiza-se que, para se manter em sua função, o hipossuficiente
terá que também investir na produção, o que lhe confere prejuízos diante sua
remuneração.
14

3 EMPRESA UBER E O REBAIXAMENTO DO CUSTO DA FORÇA DE


TRABALHO

O fenômeno abordado no presente estudo é aplicável a outros aplicativos,


como cita Tom Slee, dentre eles o Zipcar e a Lyft, no entanto, por ser a Uber o
aplicativo mais popular e com maior número de parceiros, é natural que seja o mais
recorrente envolvido em contendas judiciais no Brasil e no mundo, merecendo,
portanto, o devido destaque. Logo, para fins de análise e estudo, torna-se
necessário esse recorte temático, atribuindo neste trabalho ênfase especial à Uber.
Além disso, e não menos importante, seu destaque deve-se ao fato de que é ele
quem intitula o novo modelo de trabalho precarizado.

A princípio, será trabalhado o conceito de Economia de Compartilhamento, a


qual esse coletivo de plataformas faz parte. Somente a partir disso será analisada a
Uber como unidade e serão esclarecidos sua origem, desenvolvimento,
popularização, principais polêmicas jurídicas em que está envolvido no Brasil, a
regulamentação segundo as normas brasileiras para aplicativos desse segmento e
as lides o qual é parte no cenário trabalhista internacional.

Para isso, o estudo aqui apresentado embasa-se, dentre outros, na obra de


Tom Slee, "Uberização - A nova onda do trabalho precarizado", nas próprias
palavras da Uber, nas normas brasileira, em especial a Lei n° 5587/16, e nas
decisões publicadas.

Assim, pretende-se esclarecer o funcionamento do software, desde sua base,


perpassando pelo seu envolvimento nas searas legislativas e judiciárias, para que,
enfim, seja possível melhor compreender como sua atividade chega a atingir seus
trabalhadores.

3.1 O QUE É "ECONOMIA DE COMPARTILHAMENTO"?

Inicialmente torna-se importante explicar, num plano global, em que meio


negocial a Uber surge para que assim possa ser melhor explicada e entendida em
tópico próprio. Aqui, portanto, não cabe discussão minuciosa sobre as economias de
15

compartilhamento por si, visto que esta já seria uma discussão a parte. Logo, será
dada apenas uma ideia geral dessa atividade econômica.

O teórico Tom Slee (2017, p.21), na sua obra “Uberização”, entende como
“economia de compartilhamento” o modelo de negócio se utiliza do meio virtual, no
qual é possível negociar produtos e serviços concretos, celebrando contratos
normalmente mediante contraprestação monetária, cabendo à plataforma o papel de
intermediador, não protagonizando diretamente a negociação.

Já segundo Schor (2014, p. 2), as atividades da economia em rede podem


ainda dividir-se em quatro categorias: 1) a recirculação de bens, 2) maior utilização
de bens duráveis, 3) troca de serviços e 4) compartilhamento de ativos produtivos.

O primeiro refere-se às plataformas nas quais é possível anunciar para troca


ou venda produtos novos e seminovos os quais o proprietário quer se desfazer, é o
caso do eBay, por exemplo. O segundo trata do maior aproveitamento de bens
duráveis aos quais é dado uso enquanto não está sendo útil ao proprietário, é o caso
de aluguel de carros, como ocorre na Lyft, de cômodos, como acontece no Airbnb,
ou de serviços de passeio, como a Uber. O terceiro é associado aos softwares que
trabalham com intermediação para prestação de serviço de trabalhos temporários,
como é o caso do TaskRabbit. Por fim, o último trata do compartilhamento de
espaços próprios para a produção de algo, não consumo final, como por exemplo, a
Skillshare, que se pode oferecer aulas sobre algum assunto que queira ensinar.

Slee frisa, enfim, que em comum esses sistemas se utilizam de um método de


avaliação das partes quanto a confiabilidade em negociar com outrem, permitindo
que os usuários aceitem melhor o fato de operacionalizarem com estranhos,
oferecendo, destarte, a ideia de maior proximidade entre os polos e, com isso, a
ideia de que as transações são meras trocas, ajudas mútuas, não serviços
propriamente.

3.2 O QUE É A UBER?


16

A partir dessa explicação quanto à “Economia sob demanda” é possível ter


alguma compreensão do que é a Uber nesse contexto, qual seja, genericamente,
uma empresa de maior utilização de bens duráveis que tem um software como
intermediador capaz de interligar um motorista (o que eles preferem nomear de
"parceiros") a um passageiro, ambos cadastrados e conectados ao aplicativo.

A empresa Uber auto define-se como uma empresa de tecnologia a qual,


através do seu aplicativo, liga aqueles que precisam se transportar àqueles que
estejam disponíveis para oferecer tal serviço. Considera-se ainda como mais uma
opção de locomoção “com mais estilo, segurança e conforto do que nunca”.

A partir do entendimento do seu exercício trabalha-se nesse tópico da


pesquisa acerca do surgimento, desenvolvimento e seus desdobramentos, como a
regulamentação brasileira, com relação a esse aplicativo, culminando em seu
relacionamento com uma das partes: os motoristas.

3.2.1 Como funciona a plataforma?

O funcionamento do aplicativo Uber se dá, inicialmente, de duas maneiras:


como usuário ou como motorista. A partir disso, desenvolvem-se variáveis que no
momento oportuno serão melhor explicitadas.

Como consumidor, o cliente deve, inicialmente, fazer o download do aplicativo


em seu dispositivo móvel. Com isso, será necessário a realização de cadastro
constando nome e sobrenome, número de telefone e e-mail para contato, por fim,
será opcional cadastrar o número de um ou mais cartões de crédito e/ou débito para
pagamento. É nesse momento ainda que são disponibilizados os termos de uso os
quais cabe ao consumidor aceitar ou não, de forma que as cláusulas não são
negociáveis.

Para utilizar o serviço, o usuário deverá estar com o GPS conectado e, com a
devida permissão, o serviço de geolocalização colocará como ponto de partida o
local que o dispositivo móvel encontra-se, podendo ser alterado à vontade de quem
o controla. Em seguida, deve ser colocado o endereço para onde pretende-se ir ou
até mesmo parar durante o percurso (é permitido ao cliente fazer paradas de até 3
17

minutos durante a corrida), e a partir disso, a depender ainda de fatores como local
de onde é pedido, disponibilidade de motoristas e histórico do cliente no app, é dada
estimativa de preço de acordo com as opções.

No Brasil operam principalmente as alternativas de Uber pool, na qual a


corrida será dividida com terceiros que estejam no trajeto ou proximidades e tenham
como destino final o mesmo local ou proximidades; UberX, consistente na maioria
dos carros cadastrados no sistema e; UberBlack, que é um grupo seleto de
automóveis que preenchem requisitos específicos de luxo. Cada opção terá um
custo ao consumidor que, ao escolher a modalidade que fará uso, lhe é facultada a
forma de pagamento, em dinheiro, no cartão de crédito ou débito, e finalmente
poderá ser confirmada a corrida.

Uma vez requisitada, o algoritmo desse sistema buscará o motorista mais


próximo e disponível ou que esteja terminando uma corrida nas proximidades;
avaliará o trânsito local através de geolocalizadores e então fará o cálculo de quanto
tempo o carro chegará ao ponto solicitado e o intervalo da viagem.

Do outro lado, encontra-se o motorista. Esses, para se cadastrarem, devem


preencher requisitos pré-estabelecidos pela Uber e devem ser submetidos para
análise, como Carteira Nacional de Habilitação (CNH) definitiva com a observação
de que Exerce Atividade Remuneratória (EAR), ter idade mínima de 21 anos e não
constar registro no atestado de antecedentes criminais.

Esses dados são consultados averiguar a veracidade e elegibilidade do


motorista. Sendo aprovado nessa primeira fase, deverá submeter o Certificado de
Registro e Licenciamento de Veículo (CRLV), que também será avaliado e
observado requisitos como ano de fabricação do carro, não sendo aceitos carros
com fabricação anterior a 2008, deve ter quatro portas e ar-condicionado. Não é
exigido, no entanto, que o motorista seja proprietário do veículo, podendo ser
alugado.

Após o envio dos documentos requisitados, será feita análise desses e, uma
vez aprovado, o motorista entra para a plataforma. Salienta-se que não há nenhuma
avaliação presencial de qualquer representante do aplicativo das questões
mecânicas ou de segurança do carro assim como não é exigido o seguro do
18

automóvel. Há, no entanto, o envio de um manual o qual recomenda-se ser


estudado para melhor atendimento de seus clientes.

Para funcionamento, o motorista deve entrar no aplicativo pelo dispositivo


móvel e deixar seu GPS ligado. A Uber é responsável por indicá-lo onde será a
corrida seguinte mais próxima a ele. No momento da chamada, o "parceiro" só vê o
local de onde está sendo solicitado, sua distância até o ponto de partida e avaliação
do passageiro, com isso, tem cerca de um minuto para aceitar. Caso tenha outro
motorista próximo, a corrida é direcionada a esse terceiro. Uma vez com o
requerente, serão disponibilizadas informações do usuário como forma de
pagamento e destino final, recebendo advertência caso rejeite reiteradas corridas
após deferimento.

Enfim, ao entrar em contato com o passageiro, é recomendado seguir o


protocolo o qual lhes é sugerido, como usar de boas maneiras, oferecer água ou
doces (caso tenha), perguntar quanto à temperatura do carro, qualidade da música e
volume do som, e ao término ambas as partes são avaliadas subjetivamente – ao
usuário, esse pode julgar o motorista quanto à limpeza do veículo, se teve um
comportamento gentil, sua habilidade condutora. Já o piloto qualifica seu cliente de
acordo com o comportamento, fornecimento correto do destino da corrida, se
demanda muitas paradas no percurso, se pagou o valor cobrado corretamente.

Como citado anteriormente, as plataformas peer-to-peer trabalham com o


sistema de avaliação das partes para que funcionem, como uma espécie de controle
de qualidade. Caso aconteçam sucessivas avaliações negativas ou abaixo da
média, cabe ao aplicativo notificar ou penalizar a parte faltosa, podendo, por
exemplo, suspendê-la por determinado período (SLEE, 2017, p. 129-134).

3.2.2 História do aplicativo Uber: Surgimento e popularização

Torna-se mister explanar acerca do surgimento e popularização da Uber


posto que o contexto em que é criado e sua massificação contribuem para torná-lo o
que é hoje. Quem bem explica todo esse contexto é o escritor Tom Slee em sua
obra "Uberização" (2017, p. 99-102).
19

Inicialmente, seus criadores, Travis Kalanick e Garret Camp estavam em uma


viagem, na França, em 2009, e precisaram pegar um táxi, o qual não encontraram.
Disso, surgiu a ideia de um serviço eletrônico no qual fosse possível chamar um
carro com motorista particular via dispositivo móvel. Nesse mesmo ano, conceberam
o app por nome de UberCab e que já tinha o funcionamento similar ao que é hoje,
com a diferença que eram cadastrados apenas carros de luxo, dando sua
operacionalidade até o ano de 2013.

Uma vez percebido que, apesar de seu crescimento, outras plataformas,


como a Lyft, estavam à sua frente devido aos preços mais baixos, resolveram enfim
aderir às condições concorrenciais de seus rivais:

A Uber, então, lançou o Uberx, que, como a Lyft, apoiou-se em


motorista não licenciados com seus próprios carros, muitos sem
seguro. O Uberx expandiu-se na velocidade da luz: o número de
motoristas saltou de menos de dez mil, em janeiro de 2013, para
mais de 150 mil apenas dois anos depois. Em março de 2015, a uber
dizia estar presente em cerca de trezentas cidades de 55 países - à
diferença da Lyft, que operava apenas nos Estados Unidos. Em
agosto, eram quase 450 cidades em sessenta países. (SLEE, 2017,
p.100-101)

Salienta-se que esse sucesso dentre os consumidores, se deve à praticidade


para contatar o motorista, o pagamento virtual, através do próprio aplicativo, e os
descontos e prêmios oferecidos durante as corridas. Há ainda quem atribua seu
sucesso ao fato de que a empresa não aporta gastos com inspeções veiculares,
seguro, impostos e possui um serviço universalmente acessível. É o que Slee (2017,
p. 104) considera como "parasitismo nas cidades que habita". Além disso, desde
cedo a empresa recebeu fundos de capital de risco sem precedentes, mas são
indicados investidores como a Google Ventures, Goldman Sachs, Qatar Investment
Authority, Baidu, Amazon, o que contribuiu como base financeira para custear um
marketing tão poderoso.

Slee (2017, p. 22) destaca também dois apelos que são feitos pelas
Economias de Compartilhamento e claramente são percebidas na Uber: 1) o
primeiro é a mensagem de igualdade entre as partes, de um vizinho ou amigo que
ajuda o outro, omite-se a imagem hierárquica de quem detém o poder, de que há
alguém representando a mão de obra e de que a outra parte é o consumidor,
perceptível é apenas de que a Uber atuaria como intermediador; 2) o segundo é de
20

que o consumo colaborativo promete ser "uma alternativa sustentável para o


comércio de grande circulação, ajudando-nos a fazer um uso melhor de recursos
subutilizados".

Ao somar esses fatores, torna-se compreensível tamanha popularidade desse


aplicativo na maioria dos países em que atua. É esse mesmo marketing que
convence o consumidor de que eles são o futuro, são uma alternativa ao sistema
engessado de táxis e culpabilizam as regulações existentes para os serviços de
transporte individual privado pelos altos preços cobrados e baixa qualidade de
serviço (SLEE, 2017, p. 104).

3.2.3 Polêmicas e regulamentações do aplicativo Uber no Brasil

É relacionado a esse marketing que a Uber se envolve em polêmicas no


Brasil desde que chegou em 2014.

A primeira ocorreu ainda nos primeiros meses após sua entrada no mercado
nacional, no Rio de Janeiro, ganhando força e maior notoriedade ao começar a
operar em São Paulo, período em que ocorreram manifestações organizadas pelos
Sindicatos dos Taxistas dos respectivos municípios a fim de coibir seu
funcionamento após observar a perda de clientes. Isso ocorreu principalmente
devido aos baixos preços praticados pelas corridas e da falta de regulamentação
para um serviço com características tão próximas a dos taxistas que, por sua vez,
arcam com despesas fixas e altas, como o alvará de funcionamento, licença especial
e impostos.

Outra polêmica envolvendo esse sistema é quanto ao despreparo dos


trabalhadores no que se refere às rotas. Por não conhecer os percursos e guiarem-
se precipuamente pelos mapas dos dispositivos móveis, ocorreram casos em que se
colocou em perigo tanto o motorista quanto os passageiros sem que, com isso, a
Uber fosse responsabilizada.

Devido a problemas como esses aqui citados, restou ao poder público


regulamentar minimamente o funcionamento desse software de modo a reduzir as
reclamações recebidas. Desse modo, em 2018 foi aprovada no Senado a Lei n°
21

13.640/18, preliminarmente conhecida nas propagandas veiculadas pela Uber como


"Lei do Retrocesso".

Todavia, segundo o texto sancionado, os carros cadastrados no aplicativo não


precisariam usar placa vermelha, assim como os táxis, o veículo poderia pertencer a
terceiros, seria incumbido ao aplicativo informar às prefeituras municipais quem são
os motoristas cadastrados e a essas é designada a fiscalização dos trabalhadores.

Na cidade do Rio de Janeiro/RJ, o atual Chefe do Executivo Municipal,


Marcelo Crivella, autorizou Decreto que, além disso, exige, por exemplo, a
contratação de seguro de Acidentes Pessoais a Passageiros (APP) e de Seguro
Obrigatório de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Vias
Terrestres (DPVAT), comprovação de bons antecedentes criminais, prestar serviços
com exclusividade para os aplicativos, não podendo, portanto, ser cumulativamente
taxista, inscrição do como contribuinte individual do Instituto Nacional do Seguro
Social (INSS), ser portador de Carteira Nacional de Habilitação na categoria B ou
superior constando a informação de que ele exerce atividade remunerada.

Já em São Paulo/SP, em 2016, por certo tempo, um Decreto regulamentou a


Uber, mas de competência municipal. Segundo essa norma, seria concedido alvará
para circulação pela Uber para, em média, cinco mil carros, e seria cobrada uma
taxa de cerca de dez centavos para cada quilômetro rodado nesse sistema.

3.2.4. Polêmicas envolvendo a Uber e os Direitos dos Trabalhadores no


contexto internacional

Apresentado esse contexto em que se insere a Uber, aborda-se nesse


capítulo por fim, pelas contendas em que esteve e está envolvida diante de tribunais
de outros países, em especial, os que envolvem seus trabalhadores para que seja
alinhado ao recorte que tem o presente trabalho.

3.2.4.1 Estados Unidos


22

Nos EUA são identificados diversos processos envolvendo a Uber na seara


trabalhista, não obstante a isso, no ano de 2017 o Tribunal Federal do estado da
Carolina do Norte decidiu por certificar como ação coletiva os motoristas
litisconsortes sob a lei americana de Práticas Justas de Trabalho. Nesses, os
peticionários requeriam o pagamento de salário mínimo e horas extras, protegidos
por Lei Federal.

No estado da Califórnia, por sua vez, em 2016 foi reconhecida a relação


trabalhista entre os condutores e o aplicativo devido a fatores como o controle de
preços do trabalho, a existência de curso de formação dos motoristas, avaliação de
seus serviços e punições em casos de feedbacks negativos. Ao ingressarem na
justiça, assim como os norte-carolinenses, pediam pelos Unemployments benefits,
equivalente ao seguro desemprego brasileiro.

Apesar disso, devido a anuência dos motoristas assinada em contratos de


arbitragem, casos como esses deveriam ser apreciados em processos arbitrais, não
mais competindo ao judiciário a sua apreciação, o que é desvantajoso ao
trabalhador uma vez que suas acusações não são devidamente avaliadas, além de
que lá o procedimento arbitrado não pode ser amplamente difundido.

Outro exemplo de contenda envolvendo a Uber em cortes arbitrais foi


referente à decisão proferida em Nova Iorque no primeiro semestre de 2018. Nessa,
a plataforma foi obrigada a reservar a porcentagem de 25% de sua frota para carros
acessíveis a ser implementada até 2023. Isso comprova, aliás, que a empresa não
trata apenas de tecnologia, como se denomina, visto que se de fato fosse, tal
sentença não teria razão de ser.

3.2.4.2 Inglaterra

Nesse caso, foi aberto processo num Tribunal do Trabalho de Londres em


desfavor da Uber em outubro de 2016, representado pelo sindicato GMB (General,
Municipal, Boilermakers) que também representa outras companhias da economia
terceirizada, e esse, por sua vez, decidiu que os motoristas do Uber no Reino Unido
não são considerados autônomos, reconhecendo que há vínculo de emprego.
23

No procedimento, os motoristas James Farrar e Yaseen Aslam reivindicavam


por um salário com valor fixo de hora trabalhada, férias, licenças médicas e
descanso semanal remunerados dentre outros direitos, o que foi acatado pela Corte
Inglesa. Mediante tal decisão, a Uber entrou com recurso.

Nas palavras da Diretora Geral da GMB, Maria Ludkin,

Tivemos uma epidemia de empresas alegando que seus funcionários


são autônomos, quando, na verdade, se você examina seus direitos
e responsabilidades e o modo como atuam diariamente, fica muito
claro que são empregados em tempo integral ou trabalhadores que
têm direito a licença médica etc. . [...] Nós abrimos o caso do Uber
porque muitos motoristas nos procuraram. Examinamos seus
contratos e deduzimos que era uma ideia ridícula que 30 mil deles
fossem autônomos, como pretendia a firma.

A Uber, no entanto, apenas respondeu que iria recorrer de tal sentença, assim
como já fez em outros casos.

3.2.4.3 Espanha

Em dezembro de 2017 a Inspeção de Trabalho e Seguridade Social da


Espanha, órgão com serviço similar ao de auditoria fiscal do trabalho no Brasil,
considera que o serviço realizado pelo App Deliveroo é uma relação trabalhista e
que, portanto, a empresa deve arcar com os custos. Destaca-se que esse serviço
tem o funcionamento próximo ao da Uber, no entanto, de delivery – os motoristas
nesses casos buscam comida em um estabelecimento e as entregam ao requerente.

Com isso, a plataforma que alega ser apenas intermediador em seus


contratos, justifica dessa maneira o não pagamento de custas para com a
previdência social e o registro no quadro de trabalhadores; este custo, contudo, é
atribuído ao trabalhador em arcar com.

Segundo o relatório do órgão supracitado “apesar da existência formal de


contratos e faturas entre ambas as partes, a relação civil que pretendem criar
esconde, na realidade, uma relação de trabalho real. [...] O contrato verdadeiro no
pacto fingido ou pretendido deve prevalecer”.

Concluindo, de tal forma, pela existência de uma falsa autonomia. Ainda de


acordo com a instituição, devem ser observados os princípios-chaves da relação de
24

trabalho observadas pelo Direito do Trabalho espanhol: a dependência do


trabalhador e a fixação unilateral da compensação.

Em decorrência disso, em 2018, essa plataforma modificou seus contratos de


trabalho para "contratos de comércio autônomo no qual 70% deve vir da mesma
empresa", o qual busca forjar a relação de emprego existente. Quanto à decisão
proferida em corte, alegaram que "a companhia acredita que se demonstre a
condição de autônomos dos riders, como assim foram manifestadas sentenças
recentes no Reino Unido e França, onde foi garantido que os riders que colaboram
com a Deliveroo são autônomos" (tradução nossa)4.

Em 2015 essa organização já havia considerado o mesmo resultado quanto à


Uber, o que, todavia, não gerou consequências jurídicas propriamente. A Inspeção
do Trabalho espanhola, trabalha tão somente como órgão fiscalizatório e, mediante
seus resultados, compete-lhe emitir parecer quanto ao que avaliam.

Mister faz citar aqui que devido às demandas desse coletivo, foi criado na
Espanha um portal na União Geral dos Trabalhadores (UGT) para atender as suas
reivindicações, tendo essa como como pretensão apenas pleitear a aplicação das
normas laborais vigentes.

Rubéns Ranz, coordenador do site com o qual a UGT pretende unir-se a fim
de amparar os trabalhadores, entende que:

É urgente definir a situação desses trabalhadores. É evidente que


não são autônomos: dependem absolutamente das empresas digitais
para as quais trabalham. Por trás desta precariedade se escondem
situações muito difíceis. [...] A legislação define muito bem o que é
um autônomo e o que é um assalariado. E é preciso aplicar essas
normas. A Inspeção do Trabalho ou a Seguridade Social devem agir
de ofício.

Desde sua criação, o portal já foi requisitado pelo menos 124 vezes com
pedidos de informações e/ou ajuda. Pela sua proposta, o sindicato deve responder
às partes interessadas em até 24 horas, respeitando o anonimato.

4
“La Inspección de Trabajo ha presentado una propuesta basada en un modelo de relación con riders
que ya no está vigente en España. La compañía confía en que se demuestre la condición de autónomos
de los riders, como así lo han manifestado sentencias recientes en el Reino Unido y Francia, en las que
se ha avalado que los riders que colaboran con Deliveroo son autónomos” (RODRÍGUEZ, Ara. 2017)
25

3.2.4.4 Bélgica

De acordo com o entendimento da Comissão Europeia, a economia


colaborativa seria uma grande fonte de emprego, o que chama atenção dos seus
membros quanto à falta de proteção comunitária, fazendo advertência, inclusive,
sobre sua importância.

Dentro desse grupo, o Comitê de emprego manifestou preocupação com a


questão da saúde e segurança do trabalhador, visto que a Uber não contemplava
férias, licença por razões de doença nem ofereciam qualquer tipo de proteção.
Dessa precariedade existem consequências negativas como estresse causado pela
dependência do sistema de avaliações e do pouco tempo com a qual são avisados,
a dificuldade em conciliar a vida familiar devido a necessidade em passar mais
tempo trabalhando a fim de ganhar o mínimo para compensar o dia ou a falta de
momentos de descanso.

No caso desse país, o Executivo belga pretende reformar a diretriz regulatória


dos contratos de trabalho para que possa também representar esse coletivo de
trabalhadores, formado principalmente por jovens, e que dá insegurança e excessiva
flexibilidade laboral.

4 UBER NO CONTEXTO DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS TRABALHISTAS


VIGENTE

Após a explicação do que seria flexibilização e precarização no primeiro


capítulo e como se dá o funcionamento do aplicativo Uber, com sua história,
polêmicas e regulamentações, chega-se, enfim, a esta parte do estudo na qual se
analisa a atuação da empresa Uber à luz da legislação e jurisprudência brasileira e
identifica-se a percepção dos motoristas da plataforma sobre as suas condições de
trabalho.

Como já dito, nos demais países já foram levadas às respectivas cortes do


trabalho contendas envolvendo a Uber, nas quais essa atuou e atua como polo
passivo, enquanto os autores das demandas pleiteiam pelo seu reconhecimento
26

como empregados do aplicativo, afastando o rótulo de “parceiros”, forma que a


sociedade empresária divulga.

Logo, tal conflito de interesses chega com a discussão sobre se há ou não


relação empregatícia segundo a Consolidação das Leis Brasileiras (CLT) e os
princípios do Direito do Trabalho e não se encontra, enfim, um consenso. Enquanto
o presente estudo está sendo produzido, o entendimento majoritário é de que não se
visualiza, formalmente, um contrato de trabalho entre as partes, contudo, o objetivo
desta pesquisa é defender que há um vínculo laboral entre os envolvidos e que esse
se dá de forma precária a partir da interpretação flexibilizada das normas e doutrinas
vigentes.

Para a elucidação deste capítulo, então, serão analisadas decisões judiciais


proferidas nas Varas do Trabalho e Tribunais Regionais do Trabalho, além de lições
doutrinárias como as de Paulo Castilho e, outrora citado, Ricardo Antunes, com fito
de demonstrar porquê e como a Uberização é uma nova forma do trabalho
precarizado.

Além disso, baseado também em entrevistas realizadas com um dos lados


protagonista desse assunto, os motoristas, será possível explicar como é o seu
trabalho na prática e, portanto, se o jurídico brasiliano está observando com o devido
cuidado esse relacionamento emergente.

4.1. JUDICIÁRIO BRASILEIRO E A UBER NO BRASIL

Com a análise das decisões judiciais envolvendo a Uber em seara trabalhista,


depreende-se inicialmente se há ou não vínculo empregatício entre a parte e os
motoristas.

Mister se faz, portanto, entender o que configura uma relação de emprego.


Quem define isso é a própria Consolidação das Leis Trabalhistas, no seu art. 2°,
versando que “considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de
natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário”.
Logo, esse relacionamento exige a presença da pessoalidade, habitualidade,
subordinação e onerosidade concomitantemente.
27

Dito isso, analisemos alguns argumentos que embasaram as decisões


jurídico-trabalhistas brasilianas.

4.1.1 Subordinação

Na sentença identificada pelo documento digital ID. 59e6da7, proferida pelo


Juiz do Trabalho substituto Filipe de Souza Sickert, da 37ª. Vara do Trabalho de
Belo Horizonte, julgou-se improcedente o reconhecimento do vínculo empregatício
fundamentando-se, inicialmente, pela inexistência da subordinação jurídica de
acordo com o art. 3°, caput, da CLT.

Segundo Castilho (2017, p. 391), entretanto, o levantamento deste


instrumento normativo é uma questão interpretativa, dado que, literalmente, tal
norma fala “sob a dependência deste” (empregador). Ou seja, motoristas que, em
sua maioria, sem outra fonte de renda, sujeitam-se ao contrato disposto pela Uber
com a finalidade de auferir minimamente seu próprio custeio, dedicando-se a isso
consideráveis horas de seu dia. Como não se falar que dela depende?

Ao indeferir o pedido do autor ainda, quedou-se desconsiderada, todavia, a


interpretação cumulativa ao art. 6°, § 1º, da CLT, que aduz que “os meios
telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para
fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e
supervisão do trabalho alheio”.

Isso é, se observado no plano fático, de acordo com o que foi pontuado no


capítulo anterior deste trabalho, a plataforma tem pleno controle do trabalho a ser
exercido pelo motorista posto que ela que escolhe a corrida a ser realizada, sendo
discricionariedade do empregado apenas escolher se vai fazê-lo ou não, no entanto,
reiteradas negativas as ordens passadas a mão de obra pode, por entendimento da
Uber, expulsá-lo da plataforma independente de sua vontade. Logo, torna-se
irrazoável afastar a subalternidade.

Além disso, analisando o sistema de avaliação da plataforma, entende-se que


essa é uma forma de controle e supervisão do cumprimento da obrigação pois,
através dessa, o app pode qualificar o serviço prestado, sendo ainda sugeridos por
28

ele critérios pelos quais o motorista pode ser avaliado e expõe-no a punição, como
suspensões temporárias até o desligamento da plataforma. Diante disso, cita-se:

O ex-coordenador de operações da empresa, [...] em depoimento ao


Ministério Público do Trabalho da 1ª Região explicou, minuciosamente,
como funcionavam as suspensões e afastamentos:
‘(...) se o motorista ficasse com média entre 4,4 e 4,7, tomaria os "ganchos"
(de dois dias a cada vez) e teria nova chance, até três vezes, antes de ser
desativado; que se ficasse com média abaixo de 4,4 era desativado
diretamente, sem que pudesse aplicar novamente; que caso aplicasse
novamente, não mais seria aceito’.
‘(...) que também havia a hipótese de um bloqueio temporário ("gancho")
que ocorria quando o motorista não aceitava mais do que 80% das viagens
e esses ganchos eram progressivos, ou seja, 10 minutos, 2 horas e até 12
horas off-line, ou seja, bloqueado; que esse gancho era automático do
sistema e não passava por qualquer avaliação humana’. (Desemb.
CAMPOS, 2017, Num. 75181a9)

Destarte, não há razão para não se falar em subordinação quando o player


utiliza de meios informatizados de comando e controle, devendo ser, desse modo,
aplicável à relação “uberista” a consideração quanto haver subordinação. Castilho
(2017, p. 389, apud SILVA, 2016) bem pontua que “no mundo contemporâneo, o
celular mais escraviza que liberta... Ilusório alguém achar que o empregador precisa
ter rosto: ao contrário, o empregador sem rosto, que emite ordens a dez ou vinte mil
quilômetros de distância, talvez seja o mais temido”. Essa nova forma de
subalternidade é, portanto, a que cabe ao modelo de produção vigente, não sendo
mais somente a determinação direta e incisiva.

Bem-dito pelo supracitado magistrado na mesma decisão:

Afinal, já não é mais necessário o controle dentro da fábrica, tampouco a


subordinação a agentes específicos ou a uma jornada rígida. Muito mais
eficaz e repressor é o controle difuso, realizado por todos e por ninguém.
Neste novo paradigma, os controladores, agora, estão espalhados pela
multidão de usuários e, ao mesmo tempo, se escondem em algoritmos que
definem se o motorista deve ou não ser punido, deve ou não ser
"descartado".

Em um outro posicionamento favorável ao motorista, ora proferido em corte


diversa, o Desembargador da Terceira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da
3ª Região (Minas Gerais), Milton V. T. de Almeida, em fase de Recurso Ordinário do
Processo n° 001119-47.2017.5.03.0185, justificou ainda que:
29

O pacta sunt servanda obriga o contratante ao cumprimento das obrigações


assumidas no contrato, mas se esse contrato contém um adendo
regulamentar e disciplinar, ele não é um contrato bilateral típico do Direito
Civil, e sim um contrato de trabalho típico, que submete o empregado aos
“Códigos de Conduta” do empregador. A submissão do trabalhador a um
regime de regras de conduta em serviço tipifica a subordinação
empregatícia, conforme entendimento jurisprudencial e doutrinário no Direito
Comparado, que se aplica como fonte subsidiária do Direito do Trabalho
brasileiro (artigo 8º, caput, da CLT)

Destarte, reiteradamente é levantada a questão do “código de conduta” que,


de acordo com os próprios motoristas, não lhes é imposto, mas é deixado como
sugestão e é critério de avaliação ao final do serviço, em caso de não seguimento de
determinada postura, as consequências serão refletidas com avaliações ruins e seus
efeitos.

Ainda quanto à sua autodenominação, o player diz ser empresa de


tecnologia, não de transporte. Fato é que as economias de compartilhamento
enriquecem em seu ramo sem mesmo possuir seus principais instrumentos de
trabalho – o Airbnb não possui um quarto sequer de hotel, a Uber não possui
veículos, a Deliveroo não possui bicicletas. No entanto, observada a decisão
Californiana do caso Douglas O' Connor vs. Uber Tecnologies:

A decisão preliminar da Comissão do Trabalho expressamente reconheceu


que os condutores proporcionam um serviço indispensável para a Uber, e
que a empresa não poderia sobreviver sem eles, que potencialmente são
fiscalizados a todo momento, que recebem pautas de serviço, podem ser
suspensos do sistema em razão de baixa avaliação por parte dos clientes e
também são descredenciados se não aceitarem as novas condições, como,
por exemplo, a adesão impositiva ao “UBER POOL”. (LEME, 2017, p.
215/216)

Ou seja, além de ratificar quanto a subordinação, fiscalização e autoritarismo,


é dada a devida importância àqueles sem os quais a sociedade empresária não
existiria.

4.1.2 Habitualidade

No Processo dirimido pelo Juiz do Trabalho Substituto, na sentença de ID.


53c26ac, processo n° 0010044-43.2017.5.03.0012, o Exmo. Dr. Marcos Vinícius
30

Barroso, da 12ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte/MG, foi considerado pela


eventualidade. Argumentou que:

Não eventualidade seria, mais uma vez em singelas linhas, a forma de


contratar pela qual o empregado se obriga a aguardar ou executar ordens
do seu empregador, com certa regularidade temporal (uma vez por semana,
uma vez por mês, todos os dias da semana, apenas nos finais de semana,
etc.).
(...) confessou ele, ainda, que dirigia no aplicativo quando quisesse, na hora
que quisesse e nos dias que quisesse, ficando evidente a ausência de
períodos ou regularidades. Não provada a não eventualidade, e confessa a
autonomia no período em que prestaria serviços, impossível a
materialização da não eventualidade.

De fato, a disponibilidade no aplicativo é escolha do motorista, tanto sua


frequência quanto o tempo de serviço. Contudo, consoante ao princípio da primazia
da realidade que rege o Direito do Trabalho e observado o apêndice deste trabalho
com entrevistas realizadas com os próprios condutores, é comum que aqueles que
não possuam ocupação laboral, dispendam de boa parte do seu dia e frequência
regular prestando serviços como condutores, enquanto os que possuem ofício são,
normalmente, os que trabalham em regime diferenciado de jornada de trabalho e,
quando não estão cumprindo suas responsabilidades de labor formais, dedicam-se
ao adendo dirigirem para a plataforma.

Para mais, ao que se posiciona Castilho (2017, p. 391), a não fixação de


horário é faculdade do empregador que, para o funcionamento de sua economia,
não exige que o empregado esteja em tempo integral à sua disposição, pois esse
tem diversos outros motoristas às ordens.

Em vista disso, torna-se indissociável a configuração de habitualidade com a


prática desse coletivo.

Defensor desse posicionamento, o juiz paulista Eduardo R. Pires (2017)


declarou que:

Parece correto dizer que a plataforma da ré admite o trabalho eventual. As


testemunhas ouvidas em audiência afirmaram, de fato, que não existe um
limite de tempo para o motorista permanecer inativo ("off line"), tampouco
existe uma imposição de número mínimo de horas de trabalho por dia ou
por semana. Todavia, dizer que o trabalho eventual é admitido não equivale
a dizer que o trabalho de todos os motoristas é eventual. (Sentença ID.
e852624)
31

Afinado à essa tese, o magistrado Dr. Márcio Toledo Gonçalves conclui que:

(...) será considerado eventual o trabalhador admitido em virtude de um


determinado e específico acontecimento ou evento, ensejador de obra ou
serviço na empresa. Nesses casos, a duração do serviço será transitória,
condicionada a existência do motivo da contratação. (2017, Id. 2534b89)

Considerando o art. 62, I e III, da CLT, é normatizado que a jornada de


trabalho regular de oito horas diárias não é aplicável aos empregados que exerçam
“atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho” e aos
“empregados em regime de teletrabalho.

Nessa senda, o magistrado Gonçalves menciona Luiz Carlos Robortella ao


alegar que:

(...) o smartphone do obreiro não era apenas ferramenta de trabalho, mas


também relógio de ponto altamente desenvolvido, verdadeiro livro de
registro das atividades realizadas, que confirmam as conclusões do jurista
Francês Jean-Emmanuel Ray de que a máquina, ao contrário de reduzir o
poder de fiscalização do empregador, viabiliza maior controle sobre o
trabalho do empregado.

Logo, empiricamente, entende-se que: o labor dos motoristas é externo, é


prevista a liberdade de horário, ainda assim é identificado uma espécie de controle
através dos dispositivos móveis qual seja o login e o logout no app, informações
essas que são guardadas pela Uber, sendo, destarte, um análogo ao livro de ponto
que, no entanto, só é arguido para figurar a eventualidade já presumida.

4.1.3 Onerosidade

Em outro processo envolvendo a mesma reclamada, corrido na Vara do


Trabalho de Gama, Brasília, a magistrada responsável pela resolução da lide, a Dra.
Tamara Gil Kemp, no processo n° 0001995-46.2016.5.10.0111 em um de seus
argumentos alegou que:

Ademais, pelo depoimento do autor, observa-se que houve um acerto de


divisão dos ganhos pelos serviços prestados no elevado percentual de 75%
do total arrecadado. Vale salientar que a remuneração à base de 75% dos
32

serviços prestados não se enquadra no conceito de salário, pois, representa


mais da metade da produção do reclamante. Desta forma, inevitável
constatar que o reclamante trabalhava de forma autônoma, na condição de
parceiro, partilhando ganhos com a reclamada. (2017, Id. 2772f1d)

Pois bem, é fato que a Uber fica com 20 a 25% da remuneração do motorista
e que isso não representa metade da produção da força de trabalho. Contudo,
etimologicamente a juíza erra ao dizer que houve um acerto; há, no entanto, uma
imposição, visto que ao postulante a contratado só resta aceitar a cláusula contratual
ou a ela não aderir.

Acrescenta-se outro fato de que a Uber tem o poder de aumentar sua


porcentagem de ganhos discricionariamente durante o contrato e que, caso não seja
de conivência do motorista, sua opção é sair da plataforma. Logo, sua liberdade
quanto a seu recebimento é novamente prejudicada.

Ademais, a demandada tem o pleno controle do capital, regulando as


operações financeiras do operariado, fixando valores, recebendo os pagamentos
feitos de cada corrida e só os repassando já descontando sua fatia independente da
forma de pagamento. Percebe-se, desse modo, que o empregado não recebe nem
controla autonomamente seus ganhos, não se deve falar, destarte, em soberania.

De mesmo modo ainda, tratou o magistrado Pires (2017):

(...) a mão de obra do motorista é fator de produção na geração da


mercadoria (serviço de transporte), cuja circulação propicia o excedente
econômico à ré. Além disso, o preço do serviço final é estabelecido
unilateralmente pela ré, cabendo ao motorista apenas a ciência do
percentual que lhe caberá quando concluir a viagem que aceitar. Parece
evidente que o empreendimento como um todo, o negócio, é da empresa ré,
e não do motorista. (Sentença ID. e852624)

Além disso, apesar de ficar com a maior parcela do recebimento, ao motorista


cabem despesas com toda a manutenção do carro, quais sejam a gasolina, manter o
automóvel limpo, os impostos veiculares em dia, pagamentos de multas e avarias.

Isso resume-se no que bem disse o magistrado supracitado quando


fundamenta que “não existe pagamento de remuneração pelo motorista à empresa,
em razão do fornecimento da plataforma; existe, isso sim, remuneração paga pela ré
ao motorista, pelo trabalho desempenhado por ele na atividade econômica da
empresa”.
33

Outra prática que ratifica sua administração dos ganhos, é o ato de controlar
os valores de acordo com a demanda. Se não houvesse interesse nos lucros dos
motoristas, a suposta empresa de tecnologia limitar-se-ia a conexão entre motoristas
e passageiros respeitando a ordem de chamadas.

Aliás, se ela fosse somente uma empresa de tecnologia, como se auto afirma,
qual seu interesse em investir persistentemente em publicidade no horário nobre da
programação aberta ou em carros autônomos?

Uma observação cabível quanto à publicidade, é a de que em perquirição do


Inquérito Civil n° 001417.2016.01.000/6, o Ministério Público do Trabalho da 1ª
Região identificou que “de um total de 105 (cento e cinco) empregados formalmente
contratados pela Uber do Brasil Tecnologia, 24 (vinte e quatro) ocupam o posto de
‘gerentes de marketing’, vale dizer, quase 25% do total”.

Quando a plataforma chega a uma nova região, logo ela trata de fazer sua
divulgação utilizando-se de cupons de desconto para seus clientes como forma de
divulgação. Os motoristas, no entanto, não recebem com abatimentos, mas
integralmente ao final da semana. Como então não falar que tal empresa assume,
minimamente, seus riscos?

Essa problemática é assumida quando a própria empresa afirma que:

Alguns usuários possuem descontos ou promoções, e este valor é


descontado também das viagens em dinheiro, por isso o valor pode ser
reduzido ou até R$ 0. Não se preocupe, estes descontos são custos da
Uber e você receberá normalmente o valor da viagem em seu extrato.

Em argumentação ilativa, propondo que há vínculo empregatício, o


magistrado Pires (2017) fundamentou que

(...) o modelo capitalista de sociedade se ampara em uma célula


fundamental: a forma mercadoria. Daí a referência ao produto em sentido
amplo, que abrange a noção de serviço oferecido no mercado (...). No que
mais importa no caso concreto, para compreender a natureza da relação
jurídica de que se trata, a questão é indicar qual é a mercadoria de que
a ré extrai o seu excedente econômico.
E a resposta deve ser enunciada de maneira clara: a mercadoria da ré é o
serviço de transporte. Nenhuma dúvida me ocorre quanto a isso. Não é
por outra razão que é da ré (e não do motorista) o poder fundamental de
quantificar o valor na circulação da mercadoria. É a ré que fixa o preço do
serviço de transporte que o passageiro irá pagar.
34

(...). Ora, fosse a relação jurídica pertinente ao serviço de transporte


unicamente entre o passageiro e o motorista (que é a tese da defesa), a
fixação do preço ocorreria por negociação entre eles - isto é, entre o
motorista e o passageiro. (...)
(...). Mas isso não ocorre: o valor que cabe à empresa é extraído do serviço
de transporte prestado ao consumidor passageiro. Logo, como o
excedente do capitalista é extraído na circulação da sua mercadoria,
conclui-se com segurança que a mercadoria com que a ré atua não é o
aplicativo, e sim o serviço de transporte. (...) a ré atua na exploração de
serviços de transporte. (Sentença ID. e852624)

Dito de outro modo, processos econômicos que, em sua essência material,


dependerem da extração e apropriação do trabalho das quais derivam mercadorias
e serviços, serão aplicadas as normas trabalhistas sob o risco de, em caso diverso,
ensejar retrocesso civilizatório.

4.1.4 Pessoalidade

Nas palavras da própria plataforma digital:

Os termos e condições da Uber proíbem o compartilhamento das contas de


parceiros. Ter outro parceiro usando a sua conta representa um problema
grave de segurança. Se soubermos que o motorista não é a mesma pessoa
que aparece no perfil exibido pelo aplicativo do cliente, a conta será
suspensa imediatamente para investigação.
Temos uma política de tolerância zero para reclamações confirmadas dessa
natureza. Os parceiros que violam essa regra são removidos
permanentemente da plataforma.

Fica evidente, portanto, o caráter personalíssimo da prestação do serviço,


posto que o próprio site da Uber claramente proíbe e prevê sanção aos que
descumprirem.

Para além, mediante chamado, ela escolhe quem atenderá ao requerente,


não sendo isso facultado às partes entre si e, é passível de ocorrer que o condutor
mais próximo não ser aquele cuja a distância é de fato menor.

Em decisão proferida pela Desembargadora Maria Estela Álvares Silva


Campos, da 9ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais, no
processo n° 0011359-34.2016.5.03.0112 (Recurso Ordinário), Voto de ID. 75181a9,
a magistrada alegou, por seu turno que:
35

Ao exame dos fundamentos da r. sentença recorrida no que respeita ao


primeiro requisito do artigo 3º da CLT, a pessoalidade (id. 2534b89 - pág.
12/14, subitem 2.10.1), dissinto da conclusão do julgado. Diversamente do
que se entendeu na origem, não há prova da pessoalidade na prestação de
serviços, na medida em que o reclamante poderia, sim, fazer-se substituir
por outro motorista, que também fosse cadastrado na plataforma.

No entanto, no mesmo julgado é pontuado que:

O cadastramento dos motoristas, tal como posto na defesa, se dava por


questões de segurança, a fim de se evitar mau uso da plataforma, pois se
os motoristas pudessem compartilhar contas, tornar-se-ia inviável sua
identificação, colocando em risco o sistema, sua própria segurança e a dos
usuários. E a existência desse cadastramento não interfere no requisito em
análise - importa é que o veículo do autor era dirigido por ele e por outros, e
ainda, que era possível cadastrar para o veículo um motorista auxiliar. A
reclamada não exigia que fosse o autor e apenas ele a conduzir o veículo.

De tal argumento é possível inferir que há contradição ao se dizer que não se


trata de pessoalidade quando essa se faz necessária para o melhor uso da
plataforma e afastar de riscos o sistema, os motoristas e clientes.

Quanto ao fato de que um motorista auxiliar poder dirigir o veículo quando o


primeiro não puder fazê-lo, mantém-se a pessoalidade visto que apesar de não ser o
proprietário do automóvel, está igualmente cadastrado na plataforma e só poderá
atender às chamadas usando perfil próprio, auferindo os ganhos com as corridas.

No voto divergente, em desfavor à plataforma, Pires (2017) defende-se que

A substituição de um trabalhador por outro, de forma indistinta, é vedada. O


cadastro do motorista no aplicativo é feito intuitu personae, até mesmo com
foto e identificação. A ré, em depoimento pessoal, referiu inclusive que "não
mais" exige atestado de antecedentes criminais, a sugerir que isso ocorrera
no passado. (Sentença ID. e852624)

Ou seja, disso, conclui-se que a prestação do serviço exige que, por uma
questão de segurança para todos os envolvidos neste vínculo, esse seja
personalíssimo, mediante apresentação de foto legível e identificação, ou de forma
diversa, a credibilidade depositada pelo consumidor na empresa seria afetada e,
consequentemente, o seu apelo mais consistente quanto à confiança, parceria e
relacionamento amistoso seria desacreditado, ocasionando o fracasso da sociedade
empresária
36

4.2 PESQUISA DE CAMPO: ANÁLISE DAS ENTREVISTAS COM OS


MOTORISTAS

Enfim, ressalta-se a pesquisa realizada com parte protagonista deste


trabalho, os condutores, na qual identifica-se a percepção deste grupo quanto às
condições de labor.

4.2.1. Abordagem e Dificuldades

Neste do estudo é feita análise dos depoimentos dados pelos motoristas


mediante perguntas previamente elaboradas, realizadas e gravadas com anuência
dos entrevistados durante as corridas feitas entre março e maio de 2018.

A amostragem é de doze condutores, o que pode parecer um número ínfimo


frente a sua totalidade no Brasil, que ao final de outubro de 2017 contabilizavam
meio milhão de condutores. No entanto, no grupo estudado, é possível perceber que
as perguntas mais relevantes para a caracterização desse trabalho precário tiveram
respostas mais próximas.

Inicialmente foi perguntado quanto a idade, na tentativa de identificar algum


padrão, o que não foi obtido.

Depois foi questionado ao grau de escolaridade e ocupação dos


entrevistados. Nessas questões buscou-se identificar se a adesão à plataforma
poderia estar ligada à ao grau de informação e ao desemprego. De fato, o contexto
pós crise e a consequente contenção de gastos das empresas corroborou para tal
quadro, mas que não necessariamente à mão de obra menos qualificada. Tratavam-
se de recém-formados que não alcançaram o primeiro emprego ou desempregados
depois de 2015.

Posteriormente, as perguntas intencionavam caracterizar esse modelo de


trabalho com fito de fazer o contraponto com o entendimento popularmente
conhecido de pessoalidade, habitualidade, onerosidade e subordinação,
37

demonstrando como a Uberização renovou esses conceitos ao mesmo tempo que


expressa desinteresse e despreocupação com o trabalhador. Além disso, de
demonstrar que as informações submetidas não são apuradas de forma
transparente.

A partir da identificação desse perfil, portanto, foi entendida a percepção dos


condutores sobre suas condições de trabalho e conclui-se que não é vista com
clareza pelos motoristas a forma que eles se relacionam com a Uber, principalmente
devido à propaganda da própria plataforma que alega oferecer independência aos
seus empregados e que, pelos argumentos aqui expostos, não é suficiente para
afastar a relação de emprego que aqui se dá de modo precário.

4.2.2. Dados e análise

Durante a realização deste trabalho, foram feitas entrevistas com uma mostra
de doze condutores da plataforma Uber com fito de conhecer in loco o labor das
pessoas protagonistas desse estudo.

A primeira pergunta referia-se à idade dos motoristas a fim de perceber se


havia alguma faixa etária específica atingida pela Uberização. Ao que se pôde
constar, não há, foram identificados indivíduos nas mais diversas fases da vida.

A questão seguinte foi quanto ao nível de escolaridade, posto que, pelo


próprio funcionamento da era Toyotista, a exigência quanto à multifuncionalidade do
empregado é maior, logo, o nível de formação tende a ser mais alto para a inserção
do indivíduo no mercado.

Ainda assim, na mostra obtida, mais da metade (58,33%) dos entrevistados


possuía Ensino Superior Completo e outros 25%, Superior incompleto. Isso reflete,
não no alto padrão de conhecimentos para fazer parte da plataforma, mas, de outro
modo, que o mercado está absorvendo menos mão de obra, até mesmo a
qualificada, o que ratifica o contexto de crise que leva o “enxugamento da máquina”.

O dado seguinte foi quanto à ocupação dos entrevistados. Desses, 66,66%


não possuem outra ocupação e dependem dos ganhos com a Uber. Como não
aplicar aqui, como já dito, o art. 3° da CLT?
38

Ratifica o contexto de crise supracitado se for levado em conta que, desses


que se dedicam apenas ao player, 1/3 está relacionado ao corte de gastos ou baixa
remuneração na empresa que trabalhou formalmente e que do total, metade aderiu
a esse tipo de serviço no ano de 2016, ou seja, período pós crise global de 2015.
Logo, é concluso que diretamente ligado às crises do sistema econômico, está a
emergência e adoção da massa desempregada aos trabalhos precarizados a fim de,
deles, tirar seu sustento.

A seguir, foram questionados quanto à documentação exigida para se tornar


“parceiro”. Em todos os casos, foi exigido aos condutores que submetesse
documento de Carteira Nacional de Habilitação com a observação de Exercer
Atividade Remunerada (CNH com EAR), o que contribui para a caracterização da
pessoalidade, uma vez que além das informações cadastrais, é possível que o
sistema confira individualmente os dados dos postulantes. Após o aceite no app,
aquele cadastro é pessoal e intransferível, como supracitado, sob penalização de
ser excluído da plataforma.

Foi colocado por uma parte que lhes solicitaram a ficha de antecedentes
criminais (33,33%). Dedutível que seja para a segurança dos envolvidos, todavia,
não ficou claro porque essa certidão não foi resposta unânime dos entrevistados.

A outros (50%), foi dito que lhes estabeleceram condições mínimas para o
carro a ser utilizado, quais sejam quatro portas com ar condicionado e fabricação a
partir de 2008. Por outro lado, uma menor parcela (25%) alegou terem lhes
requisitado a documentação dessa ferramenta de trabalho. Da primeira informação,
a conclusão é de que o meio de produção pode não ser da empresa, mas ela exige
o padrão para poder entrar no seu grupo; então como falar em autonomia do
hipossuficiente quando há um requisito material a ser cumprido? Possível seria falar
de autonomia se com o simples cadastro o interessado tivesse a liberdade de
exercer sua atividade. Quanto a segunda informação, é deduzível que seja para
confirmar a primeira, sob o risco de ter o registro negado.

Em conformidade, todos responderam que não sabem como essas


informações que a eles são requeridas e por eles apresentadas são averiguadas,
assim como não há contato pessoal com os representantes da Uber, seja para curso
de formação ou revisão do carro. Isso pode soar falho para o critério de segurança
39

ferrenhamente utilizado em sua publicidade: como então eles têm certeza de que o
automóvel cadastrado é aquele que roda na prática? Como garantir que seus
passageiros estão fazendo uso do seu serviço em carros com bom estado de uso e
que não representam perigo técnico para o usuário e o obreiro? Aliás, caso haja
algum problema envolvendo o consumidor, a Uber será, não se falando em culpa
exclusiva do motorista.

Aos motoristas não é exigido curso de formação, mas é usado como critério
de avaliação o uso de boas maneiras, de boas condições do carro, sendo sugerido o
fornecimento de cortesias como água e balinha. Enfim, não há como justificar a
cobrança de determinados comportamentos para ter boas notas e, assim, se manter
na plataforma, se não por ser essa uma forma de subordinação e controle do
empregador que, em caso de desobediência, pode desativar discricionariamente os
trabalhadores.

A fim de analisar o critério da habitualidade, reiteradamente pontuado por


magistrados como inexistente nessa relação laboral, lhes foi questionado quanto
tempo passavam disponíveis na plataforma, a frequência e se faziam intervalos
durante suas jornadas de trabalho.

Dos doze entrevistados apenas quatro (33%) fazem 44 (quarenta e quatro)


horas ou menos semanalmente no aplicativo. Um deles ainda estuda, outros dois
possuem ocupação diversa, no entanto serve à Uber durante suas folgas, enquanto
somente um faz desse um trabalho mais ameno, com folgas de dois dias e carga
horária reduzida (cinco horas). Desse conjunto, dois (16,66%) não trabalham
regularmente por, pelo menos, cinco dias na semana.

Destoante, assim sendo, é o entendimento do judiciário, como aqui


demonstrado, de que há não eventualidade nessa relação laboral quando, apesar de
permitir livre jornada, o trabalhador dispende nela o que o faria em qualquer outro
emprego formal ou até mais.

Outra violação ao Direito do Trabalho está em permitir que essa mão de obra
exerça sua atividade ultrapassando os limites legais permitidos tanto de horas por
dia quanto a inobservância do descanso semanal, afrontando questões de saúde e
segurança do operariado, sem que isso enseje em consequências. Nos Estados
40

Unidos, por exemplo, a própria sociedade empresária reconhece a imoderação da


flexibilidade dessa jornada gera prejuízos e decidiu, unilateralmente, limitar a jornada
de trabalho a doze horas por dia.

Quanto aos intervalos feitos, observada a CLT vigente e pós reforma, apenas
um dos entrevistados desconsidera o tempo para intervalo quando faz mais que seis
horas de ofício.

Versando ainda sobre saúde e segurança do trabalho, foi observado que


metade dos que fazem uso do app estão trabalhando a mais de um ano
ininterruptamente, ou seja, sem férias, com intervalos que não chegam a dez dias, o
que é ilegal. De acordo com o art. 134 da CLT, após o período aquisitivo, o obreiro
tem direito ao recesso que pode ser fracionado desde que um dos períodos tenha,
no mínimo, quatorze dias e, para além, de acordo com o art. 142, §3°, da mesma
norma, casos de recebimento por porcentagem, comissão ou viagem, deve haver
remuneração de acordo com a média recebida pelo empregado nos últimos doze
meses.

Enfim, esse estudo in loco encerrava com a pergunta sobre a possibilidade de


ter o próprio sustento dedicando seu trabalho com exclusividade à Uber. Nessa
pesquisa, onze motoristas (91,66%) responderam ser possível manter-se com esse
trabalho. Isso ratifica o que é postulado no art. 3° da CLT quando, para definir
relação de trabalho emprega “sob a dependência deste”.

Ou seja, diante o que foi aqui exposto e, principalmente, observando os dados


levantados com parte protagonista desse vínculo, é possível concluir que, sob o
aspecto do princípio da primazia da realidade, as características intrínsecas à
configuração da relação de emprego não são somente concretas como também são
abusivas e precárias ao trabalhador, em especial, ferindo o valor social do trabalho e
a dignidade da pessoa humana.
41

5 CONCLUSÃO

Diante do que foi exposto neste trabalho, depreende-se a presença de mais


uma mudança inerente ao capitalismo. Na nova era tecnológica-informacional
ocorreram inovações nos vínculos de emprego, na sua dinâmica e,
consequentemente, no Direito do Trabalho brasileiro, igualmente marcado por
modificações na sua legislação que, por sua vez, são necessárias a essa realidade
social e econômica, trazendo prejuízos e benefícios.

Para isso, inicialmente foram expostos os conceitos de flexibilização e


precarização das relações de trabalho, fenômenos globais manifestados
principalmente em conjunturas estruturais. Tais circunstâncias, por seu turno, são
mais palpáveis diante a emergência de tecnologias que, de forma marcante, mudam
a sociedade. A mais recente destas foi a internet, tecnologia rápida e amplamente
massificada.

Como demais setores sociais, a web inovou as relações de trabalho. Aqui, por
exemplo, foi trabalhada a Uberização, fruto das economias de rede, um sistema
econômico o qual baseia-se no compartilhamento de bens ou serviços ociosos,
gratuito ou por meio de recebimento monetário, previamente estabelecido.

Disso foi dado o recorte à Uber que, como defendeu Tom Slee, utilizando-se
desse sistema e em proveito das lacunas legislativas, jurídicas e doutrinárias,
desenvolveu-se e, sob intenso marketing, popularizou-se, convencendo a seu favor
seus “parceiros” e clientes, oferecendo ainda supostos benefícios com o intuito de
ofuscar o pensamento crítico dos envolvidos.

As entrevistas realizadas são exemplos que demonstram a falta de percepção


dos motoristas nesse vínculo; as decisões judiciais corroboram para a nebulosidade
dessa relação ao passo que igualmente é influenciada pelo mercado. Como
resultado, os trabalhadores ficam distantes de encontrar proteção e têm seus
direitos flexibilizados, o que os encaminha a resignação à sua situação, aqui
configurada, como precária.

Ao não ser visualizado o contrato de trabalho entre essas partes, essa mão
de obra reitera-se marginalizada e suscetível às imposições do empregador
42

camuflado em um discurso de que a economia de compartilhamento seria um modo


de ajudar os indivíduos supostamente vulneráveis a ter autonomia, sendo
microempreendedores através de um modelo de labor virtual, flexível e auto
gerenciável.

Enfim, depreende-se que a despeito de ser objeto de inovação tecnológica, o


aplicativo não tem servido para a melhoria das condições de labor da mão de obra,
mas somente para rebaixamento do custo da força de trabalho e superlucro das
empresas.

É importante destacar também, pelo disposto por Siqueira e Accioli (2007)


que onde houve flexibilização desenfreada, presenciou-se o aumento do
desemprego, sendo, de outro modo, a fonte geradora de empregos o
desenvolvimento econômico, sem a tangibilidade da precarização do trabalho. Logo,
é de se perceber que as soluções que estão sendo dadas ao desemprego num
cenário pós-crise, como a Reforma Trabalhista de 2017 e o adimplemento acrítico à
Uberização, não contribuem construtivamente ao coletivo.

O que foi possível perceber em contextos que a força de trabalho é


desrespeitada é que essa encontra solução no exercício de labor precarizado.
Nesse caso em específico, além de perder a proteção do Direito do Trabalho por
não ter seu vínculo reconhecido, o coletivo obreiro ainda tem que submeter-se a
condições prejudiciais à sua saúde e integridade física, mental e moral como foi
explorado na análise das entrevistas com os motoristas. Ou seja, a flexibilização
para essa situação aqui estudada permite a imposição de condições e fere,
diretamente, o princípio infraconstitucional da indisponibilidade dos Direitos
Trabalhistas.

Noutro pórtico, não é somente esse princípio a ser violado. Afronta-se


também, diretamente, princípios constitucionais como o da proteção, que se embasa
na aplicação da norma mais favorável ao trabalhador e objetiva proteger o
empregado quanto hipossuficiente frente ao desequilíbrio de forças do plano fático
contrapondo àquele que o emprega; o preceito da primazia da realidade, o qual faz
prevalecer os fatos em detrimento de contratos, o ato jurídico sobrepondo-se a
forma; desacata-se ainda o valor social do trabalho, posto que este é desmerecido e,
em consequência, a dignidade da pessoa humana.
43

Dito isso, é possível concluir que a jurisprudência aqui analisada, favorável à


plataforma, é passível de ser considerada inconstitucional, posto que desrespeita
fontes constituintes do direito e ratifica uma situação insegura ao trabalhador.

Para melhor atender aos direitos sociais, portanto, inicialmente, seria


necessário que o Judiciário redimensionasse o problema sob a ótica do empregado,
e não do desenvolvimento tecnológico, reavaliando seu posicionamento quanto à
consideração jurídica de tal grupo para, desse modo, honrar com preceitos infra e
constitucionais. Ao passo que, mediante o caso concreto, julgaria ou não o vínculo
pelo emprego, sendo favorável ao empregado quando esse depender
financeiramente dos rendimentos da plataforma e quando a ela se dedicar com
habitualidade dispendendo de parte significativa do seu dia, com fito de evitar a
consolidação deste tipo de precariedade laboral no ordenamento brasileiro.

Noutro pórtico, o legislador foi conciso em definir o que seria trabalhador


temporário ou o que configuraria o trabalho doméstico, qual seria a dificuldade em
elucidar as características de um ciberproletário?

Outra solução pontuada pelo pesquisador Rafael Zanatta em entrevista para a


TV GGN é a do “cooperativismo de plataforma”, consistente em fazer esse trabalho
em escala local no qual todos os participantes dele, seja como prestador ou usuário,
são capazes de participar do poder de decisão e atuar para o bem maior do
conjunto, distribuindo os rendimentos de forma mais justa e clara, desde que com
uma boa organização de suporte, ou seja, estrutura de apoio jurídico e técnico para
o pleno funcionamento. Ele cita exemplos ocorridos em João Pessoa, Paraíba, que
os locais organizaram um sindicato e, a partir dele criaram sua própria plataforma
regional para concorrer com a Uber, 99 Pop e similares, e cita a possibilidade da
criação de organizações de bairro que atue de forma próxima a do Airbnb mas que
os recursos sejam distribuídos entre os moradores ou aplicados em benefícios para
o bairro. Destarte, vislumbra-se como uma forma de, através da organização da mão
de obra, a riqueza produzida torna-se, sobretudo, feita por e para os trabalhadores.
44

REFERÊNCIAS

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49

APÊNDICE I - ENTREVISTA

Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Curso de Bacharelado em Direito

Discente Monalisa Silveira de Souza

Apêndice A

Entrevista realizada por gravação com motoristas de Uber com fito de


conhecer uma mostra dos “parceiros” do aplicativo e compreender a visão destes
quanto ao seu papel na plataforma
1. Idade: 23
2. Nível de escolaridade: Ensino Superior incompleto
3. Atualmente, possui alguma outra ocupação?
( ) Sim (x) Não
a) Se sim, qual?
b) Se não, qual foi a última e por que saiu? Apenas estuda
4. Quando entrou na plataforma Uber?
Novembro de 2016
5. Foi feita alguma exigência para se tornar “parceiro”? Em caso afirmativo,
lembra de qual/quais?
CNH com EAR; carro com quatro portas e ar condicionado, fabricação a partir
de 2008
6. Foi submetido a algum curso de formação?
( ) Sim (x) Não
7. Seu carro passou por algum teste ou revisão por parte da Uber?
( ) Sim (x) Não
8. Você sabe como as informações submetidas à Uber são averiguadas?
( ) Sim (x) Não
9. Com que frequência fica disponível no aplicativo e por quanto tempo? Quatro
a cinco horas, dependendo do dia
50

a) Nos casos em que se dedica seis horas ou mais, faz algum intervalo?
Quanto tempo? Não se aplica
10. Qual foi o maior intervalo que ficou sem ativar o aplicativo? Teve alguma
consequência?
Uma semana. Sem consequências.
11. Na sua opinião, dedicando-se com exclusividade à Uber, é possível garantir o
próprio sustento?
(x) Sim ( ) Não

Apêndice B

1. Idade: 27
2. Nível de escolaridade: Ensino Superior completo
3. Atualmente, possui alguma outra ocupação?
(x) Sim ( ) Não
a) Se sim, qual? Vendedor online
b) Se não, qual foi a última e por que saiu?
4. Quando entrou na plataforma Uber? Outubro de 2016
5. Foi feita alguma exigência para se tornar “parceiro”? Em caso afirmativo,
lembra de qual/quais? CNH com EAR
6. Foi submetido a algum curso de formação?
( ) Sim (x) Não
7. Seu carro passou por algum teste ou revisão por parte da Uber?
( ) Sim (x) Não
8. Você sabe como as informações submetidas à Uber são averiguadas?
( ) Sim (x) Não
9. Com que frequência fica disponível no aplicativo e por quanto tempo? Nove
horas, de segunda a sábado
a) Nos casos em que se dedica seis horas ou mais, faz algum intervalo?
Quanto tempo? Duas horas
10. Qual foi o maior intervalo que ficou sem ativar o aplicativo? Teve alguma
consequência? Uma semana. Sem consequências
51

11. Na sua opinião, dedicando-se com exclusividade à Uber, é possível garantir o


próprio sustento?
(x) Sim ( ) Não

Apêndice C

1. Idade: 26
2. Nível de escolaridade: Ensino Superior completo
3. Atualmente, possui alguma outra ocupação?
( ) Sim (x) Não
a) Se sim, qual?
b) Se não, qual foi a última e por que saiu? Analista de sistema. Baixo salário
4. Quando entrou na plataforma Uber? Abril de 2018
5. Foi feita alguma exigência para se tornar “parceiro”? Em caso afirmativo,
lembra de qual/quais? CNH com EAR e antecedentes criminais
6. Foi submetido a algum curso de formação?
a. ( ) Sim (x) Não
7. Seu carro passou por algum teste ou revisão por parte da Uber?
( ) Sim (x) Não
8. Você sabe como as informações submetidas à Uber são averiguadas?
( ) Sim (x) Não
9. Com que frequência fica disponível no aplicativo e por quanto tempo? Oito a
dez horas por dia, cinco dias por semana.
10. Nos casos em que se dedica seis horas ou mais, faz algum intervalo? Quanto
tempo? Uma hora
11. Qual foi o maior intervalo que ficou sem ativar o aplicativo? Teve alguma
consequência? Dois dias. Sem consequências
12. Na sua opinião, dedicando-se com exclusividade à Uber, é possível garantir o
próprio sustento?
(x) Sim ( ) Não
52

Apêndice D

1. Idade: 28
2. Nível de escolaridade: Ensino Superior incompleto
3. Atualmente, possui alguma outra ocupação?
(x) Sim ( ) Não
a) Se sim, qual? Vigilante em sistema de escala de 12h/36h
b) Se não, qual foi a última e por que saiu?
4. Quando entrou na plataforma Uber? Abril de 2017
5. Foi feita alguma exigência para se tornar “parceiro”? Em caso afirmativo,
lembra de qual/quais? CNH com EAR, antecedentes criminais, carro com
fabricação a partir de 2008 e CRLV
6. Foi submetido a algum curso de formação?
( ) Sim (x) Não
7. Seu carro passou por algum teste ou revisão por parte da Uber?
( ) Sim (x) Não
8. Você sabe como as informações submetidas à Uber são averiguadas?
( ) Sim (x) Não
9. Com que frequência fica disponível no aplicativo e por quanto tempo? Sempre
que está de folga. Durante o dia, de oito a nove horas, mas quando pode,
doze horas, com trabalho noturno
A) Nos casos em que se dedica seis horas ou mais, faz algum intervalo?
Quanto tempo? Meia hora
10. Qual foi o maior intervalo que ficou sem ativar o aplicativo? Teve alguma
consequência? Oito a nove dias. Sem consequência
11. Na sua opinião, dedicando-se com exclusividade à Uber, é possível garantir o
próprio sustento?
(x) Sim ( ) Não

Apêndice E

1. Idade: 35 anos
2. Nível de escolaridade: Ensino Médio completo
3. Atualmente, possui alguma outra ocupação?
53

( ) Sim (x) Não


a) Se sim, qual?
b) Se não, qual foi a última e por que saiu? Técnico de telecomunicação.
Contenção de gastos na empresa
4. Quando entrou na plataforma Uber? Dezembro de 2016
5. Foi feita alguma exigência para se tornar “parceiro”? Em caso afirmativo,
lembra de qual/quais? CNH com EAR, antecedentes criminais e carro com
fabricação a partir de 2008
6. Foi submetido a algum curso de formação?
( ) Sim (x) Não
7. Seu carro passou por algum teste ou revisão por parte da Uber?
( ) Sim (x) Não
8. Você sabe como as informações submetidas à Uber são averiguadas?
( ) Sim (x) Não
9. Com que frequência fica disponível no aplicativo e por quanto tempo? Oito
horas por dia, de segunda a segunda
a) Nos casos em que se dedica seis horas ou mais, faz algum intervalo?
Quanto tempo? Meia hora
10. Qual foi o maior intervalo que ficou sem ativar o aplicativo? Teve alguma
consequência? Quinze dias. Recebia e-mails indicando que havia alta
demanda na sua região
11. Na sua opinião, dedicando-se com exclusividade à Uber, é possível garantir o
próprio sustento?
(x) Sim ( ) Não

Apêndice F

1. Idade: 48 anos
2. Nível de escolaridade: Nível Superior incompleto
3. Atualmente, possui alguma outra ocupação?
( ) Sim (x) Não
a) Se sim, qual?
b) Se não, qual foi a última e por que saiu? Trabalhava em uma multinacional.
Corte de gastos na empresa.
54

4. Quando entrou na plataforma Uber? Novembro de 2016


5. Foi feita alguma exigência para se tornar “parceiro”? Em caso afirmativo,
lembra de qual/quais? CNH com EAR, antecedentes criminais e CRLV
6. Foi submetido a algum curso de formação?
( ) Sim (x) Não
7. Seu carro passou por algum teste ou revisão por parte da Uber?
( ) Sim (x) Não
8. Você sabe como as informações submetidas à Uber são averiguadas?
( ) Sim (x) Não
9. Com que frequência fica disponível no aplicativo e por quanto tempo? Nove a
onze horas por dia de segunda a sexta e, quando trabalha aos sábados, entre
4 e 6 horas
a) Nos casos em que se dedica seis horas ou mais, faz algum intervalo?
Quanto tempo? Meia hora para almoço e outros conforme necessidade ao
longo do dia
10. Qual foi o maior intervalo que ficou sem ativar o aplicativo? Teve alguma
consequência? Três a quatro dias. Sem consequência
11. Na sua opinião, dedicando-se com exclusividade à Uber, é possível garantir o
próprio sustento?
(x) Sim ( ) Não

Apêndice G

1. Idade: 48 anos
2. Nível de escolaridade: Ensino Médio completo
3. Atualmente, possui alguma outra ocupação?
(x) Sim ( ) Não
a) Se sim, qual? Funcionário Público
b) Se não, qual foi a última e por que saiu?
4. Quando entrou na plataforma Uber? Novembro de 2017
5. Foi feita alguma exigência para se tornar “parceiro”? Em caso afirmativo,
lembra de qual/quais? CNH com EAR e antecedentes criminais
6. Foi submetido a algum curso de formação?
( ) Sim (x) Não
55

7. Seu carro passou por algum teste ou revisão por parte da Uber?
( ) Sim (x) Não
8. Você sabe como as informações submetidas à Uber são averiguadas?
( ) Sim (x) Não
9. Com que frequência fica disponível no aplicativo e por quanto tempo? Oito
horas por dia, seis vezes por semana
a)Nos casos em que se dedica seis horas ou mais, faz algum intervalo?
Quanto tempo? Faz dois intervalos de meia hora
10. Qual foi o maior intervalo que ficou sem ativar o aplicativo? Teve alguma
consequência? Um dia. Sem consequências.
11. Na sua opinião, dedicando-se com exclusividade à Uber, é possível garantir o
próprio sustento?
(x) Sim ( ) Não

Apêndice H

1. Idade: 23 anos
2. Nível de escolaridade: Nível Superior completo
3. Atualmente, possui alguma outra ocupação?
( ) Sim (x) Não
a) Se sim, qual?
b) Se não, qual foi a última e por que saiu? Não teve anterior
4. Quando entrou na plataforma Uber? Maio de 2017
5. Foi feita alguma exigência para se tornar “parceiro”? Em caso afirmativo,
lembra de qual/quais? CNH com EAR, carro com quatro portas, ar
condicionado e fabricação a partir de 2008
6. Foi submetido a algum curso de formação?
( ) Sim (x) Não
7. Seu carro passou por algum teste ou revisão por parte da Uber?
( ) Sim (x) Não
8. Você sabe como as informações submetidas à Uber são averiguadas?
( ) Sim (x) Não
9. Com que frequência fica disponível no aplicativo e por quanto tempo? Oito a
nove horas por dia, todos os dias
56

a)Nos casos em que se dedica seis horas ou mais, faz algum intervalo?
Quanto tempo? Quatro a cinco horas
10. Qual foi o maior intervalo que ficou sem ativar o aplicativo? Teve alguma
consequência? Um mês, sem consequência
11. Na sua opinião, dedicando-se com exclusividade à Uber, é possível garantir o
próprio sustento?
(x) Sim ( ) Não

Apêndice I

1. Idade: 36 anos
2. Nível de escolaridade: Nível Superior completo
3. Atualmente, possui alguma outra ocupação?
( ) Sim (x) Não
a) Se sim, qual?
b) Se não, qual foi a última e por que saiu? Trabalhava em termoelétrica.
Cortes na empresa.
4. Quando entrou na plataforma Uber? Outubro de 2016
5. Foi feita alguma exigência para se tornar “parceiro”? Em caso afirmativo,
lembra de qual/quais? CNH com EAR, carro com quatro portas, ar
condicionado e fabricação a partir de 2008
6. Foi submetido a algum curso de formação?
( ) Sim (x) Não
7. Seu carro passou por algum teste ou revisão por parte da Uber?
( ) Sim (x) Não
8. Você sabe como as informações submetidas à Uber são averiguadas?
( ) Sim (x) Não
9. Com que frequência fica disponível no aplicativo e por quanto tempo? Cinco
horas por dia de quinta a segunda, com exceção aos domingos que faz dez
horas
a) Nos casos em que se dedica seis horas ou mais, faz algum intervalo?
Quanto tempo? Pelo menos meia hora
10. Qual foi o maior intervalo que ficou sem ativar o aplicativo? Teve alguma
consequência? Uma semana. Sem consequências.
57

11. Na sua opinião, dedicando-se com exclusividade à Uber, é possível garantir o


próprio sustento?
(x) Sim ( ) Não

Apêndice J

1. Idade: 25 anos
2. Nível de escolaridade: Ensino Superior completo
3. Atualmente, possui alguma outra ocupação?
( ) Sim (x) Não
a) Se sim, qual?
b) Se não, qual foi a última e por que saiu? Não teve anterior
4. Quando entrou na plataforma Uber? 2016
5. Foi feita alguma exigência para se tornar “parceiro”? Em caso afirmativo,
lembra de qual/quais? CNH com EAR
6. Foi submetido a algum curso de formação?
( ) Sim (x) Não
7. Seu carro passou por algum teste ou revisão por parte da Uber?
( ) Sim (x) Não
8. Você sabe como as informações submetidas à Uber são averiguadas?
( ) Sim (x) Não
9. Com que frequência fica disponível no aplicativo e por quanto tempo? Dez
horas por dia, todos os dias da semana
a) Nos casos em que se dedica seis horas ou mais, faz algum intervalo?
Quanto tempo? Duas horas intercaladas
10. Qual foi o maior intervalo que ficou sem ativar o aplicativo? Teve alguma
consequência? Não soube informar
11. Na sua opinião, dedicando-se com exclusividade à Uber, é possível garantir o
próprio sustento?
( ) Sim (x) Não
58

Apêndice K

1. Idade: 24 anos
2. Nível de escolaridade: Nível Superior completo
3. Atualmente, possui alguma outra ocupação?
(x) Sim ( ) Não
a) Se sim, qual? Advogado
b) Se não, qual foi a última e por que saiu?
4. Quando entrou na plataforma Uber? Março de 208
5. Foi feita alguma exigência para se tornar “parceiro”? Em caso afirmativo,
lembra de qual/quais? CNH com EAR, carro com quatro portas, ar
condicionado, direção hidráulica e fabricação superior a 2009
6. Foi submetido a algum curso de formação?
( ) Sim (x) Não
7. Seu carro passou por algum teste ou revisão por parte da Uber?
( ) Sim (x) Não
8. Você sabe como as informações submetidas à Uber são averiguadas?
( ) Sim (x) Não
9. Com que frequência fica disponível no aplicativo e por quanto tempo? Quatro
horas por dia, de segunda a sábado, sábados e domingos o dia todo
A) Nos casos em que se dedica seis horas ou mais, faz algum intervalo?
Quanto tempo? Caso hajam muitas viagens, não faz intervalo
10. Qual foi o maior intervalo que ficou sem ativar o aplicativo? Teve alguma
consequência? Uma semana. Sem consequências.
11. Na sua opinião, dedicando-se com exclusividade à Uber, é possível garantir o
próprio sustento?
(x) Sim ( ) Não

Apêndice L

1. Idade: 60 anos
2. Nível de escolaridade: Nível Superior completo
3. Atualmente, possui alguma outra ocupação?
( ) Sim (x) Não
59

A) Se sim, qual?
b) Se não, qual foi a última e por que saiu? Fechou empresa própria.
4. Quando entrou na plataforma Uber? Junho de 2017
5. Foi feita alguma exigência para se tornar “parceiro”? Em caso afirmativo,
lembra de qual/quais? “Documentação necessária”
6. Foi submetido a algum curso de formação?
( ) Sim (x) Não
7. Seu carro passou por algum teste ou revisão por parte da Uber?
( ) Sim (x) Não
8. Você sabe como as informações submetidas à Uber são averiguadas?
( ) Sim (x) Não
9. Com que frequência fica disponível no aplicativo e por quanto tempo? Dez
horas por dia, seis vezes por semana
a) Nos casos em que se dedica seis horas ou mais, faz algum intervalo?
Quanto tempo? Meia hora
10. Qual foi o maior intervalo que ficou sem ativar o aplicativo? Teve alguma
consequência? Dois dias. Sem consequências.
11. Na sua opinião, dedicando-se com exclusividade à Uber, é possível garantir o
próprio sustento?
(x) Sim ( ) Não

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