Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Passagens Mishima No Brasil
Passagens Mishima No Brasil
passagens
dezembro 2009
apoio
Mishima no Brasil
Retrato do escritor quando Jovem
darci kusano
Uma tal passagem é uma cidade,
um mundo em miniatura.
passagens
a registrar e divulgar palestras,
intervenções ou conferências
que aconteceram no Fórum de Ciência
e Cultura da Universidade Federal
do Rio de Janeiro.
Este texto é em grande parte um complemento ao capítulo
“Mishima e o Brasil” do meu livro Yukio Mishima: o homem
de teatro e de cinema. Agradecimentos a Hiroko Nishizawa,
Rimi H. de Oliveira, Susumu Miyao, Helena Mizumoto
e Marcos Reigota, pelo auxílio na coleta do material de
pesquisa e troca de idéias.
Mishima no Brasil
retrato do escritor quando Jovem
darci kusano
Logo o pintor aborda a questão da derrota do Japão na II Guerra e Uma visão curiosa – isto sim é uma coisa rara nos Estados Unidos – em algu-
sua repercussão na colônia nipônica do Brasil: a ferrenha oposição entre mas das várias janelas, há necessariamente figuras matando o tempo, com os
o partido dos vitoristas (kachigumi), que sustentava que o Japão havia cotovelos fincados no parapeito das janelas, olhando a rua abaixo ou contem-
ganho a guerra, e o partido dos derrotistas ou esclarecidos (makegumi), plando distraidamente as nuvens.
que alegavam que havia perdido, e a sua posição nesse quesito. (...) a maioria é de mulheres. Não tricotam nem leem. A janela é o tricô e o livro
delas. Nessa paisagem de ‘mulheres nas janelas’, que certamente não combina
O patrocinador da exposição individual, que apresentei em São Paulo, era o com os edifícios modernos, há um gosto poético. É um costume colonial natu-
presidente de um jornal japonês. Dentre os inúmeros jornais em língua ja- ral, que elas têm. Nos colégios femininos do Brasil, deve-se ensinar que o há-
ponesa que há em São Paulo, este era do partido dos vitoristas. Vocês devem bito de ficar o dia inteiro olhando lá fora pela janela é maL educado, portanto,
saber que pós-guerra, o antagonismo ao partido dos vitoristas está firmemente é preciso parar com isso. Nesse ínterim, empenhe-se em limpar a casa ou leia.
enraizado entre os imigrantes japoneses no Brasil. O partido dos derrotistas não Entretanto, depois da formatura e passados alguns anos após o casamento, elas
é necessariamente de esquerda, mas o partido dos vitoristas é categoricamente se tornam estereotipadamente em ‘mulheres nas janelas’. (...)
ultranacionalista e, uma vez que se diz de direita, dedica-se exclusivamente, Provavelmente, a Graça Hosokawa também seja uma das mulheres nas janelas.
desde a manhã, a conversas sobre mulheres e bebidas. (...) A sua insatisfação também... Sim, não sei bem o quê, mas talvez seja a insatis-
Além disso, o pessoal deste jornal do partido dos vitoristas – não é que ainda fação que a janela lhe ensinou, que a vida ao redor da janela lhe ensinou. Para
pensem que o Japão venceu, mas é apenas uma designação que indica a dife- uma japonesa, é uma insatisfação um pouco de classe superior, por isso, talvez
rença de posição – me agradou um pouco. ela fique com vontade de alardeá-la.”
Em seguida, o contista introduz as personagens do título. Duas mu- A mulher o assedia tanto, que acabam tendo um caso no carnaval
lheres japonesas visitam a galeria e veem a exposição com óculos de sol. do Rio. E ele, por sua vez, termina incorporando o hábito das “mulheres
Uma é a Setsuko Tottori, cujo marido trabalha no Banco do Brasil e a nas janelas”.
outra, Graça Hosokawa, apelido da locutora. Mas na realidade, o marido
Na manhã seguinte, eu e a mulher, ainda de pijamas, nos debruçamos na janela
de Setsuko trabalhava no Banco América do Sul e a modelo real veio a fa-
e contemplamos o pavimento de manhã, deserto por um momento. De fato, a
lecer em julho de 2005. Certa noite, o casal Tottori e Graça o levam para
cidade dorme por um breve instante. (...)
sambar na boate Bambu, no subúrbio de São Paulo. O pintor esbalda-se e
Ao longe, a Baía de Guanabara brilhava.
ao sair, vê a constelação do Cruzeiro do Sul na noite estrelada. Ao receber Eu perdi o ânimo de até ontem e com os olhos um pouco abaixados, estendi o
um telegrama do Rio, decide partir de avião, que na época levava duas meu braço aos ombros da mulher, só de camisa, que parece melancólica mes-
DEBATE .Mishima Yukioshi kakonde: kiitari, kikasetari (Em torno do sr. Yukio Mishima: 1 Yukio Mishima. Cópia obtida nos arquivos do Museu da Imigração Japonesa em São
perguntando e ouvindo). São Paulo Shimbun, São Paulo, 9 de fevereiro de 1952 (parte I) e 12 de Paulo, sem procedência e sem data. Em 1952 na capital paulista, já existiam os jornais
fevereiro de 1952 (parte II). em japonês: São Paulo Shimbun, Brasil-Japão, Nambei Jiji, Notícias do Brasil e Jornal
Paulista.
KUSANO, Darci. Yukio Mishima: o homem de teatro e de cinema. São Paulo: Perspectiva, 2006.
2 Romancista Riichi Yokomitsu (1898–1947), pertencente ao movimento literário
MISHIMA, Yukio e KAWABATA, Yasunari. Correspondance (1945–1970). Paris: Albin Michel, neo-sensualista. Na época, ele era mais famoso do que Yasunari Kawabata, também
2000. Traduzido por Dominique Palmé. dessa escola.
MISHIMA, Yukio. Aporo no sakazuki (O Cálice de Apolo).In: Mishima Yukio zenshû (Obras 3 Debate “Mishima Yukioshi kakonde: kiitari, kikasetari” (Em torno do sr. Yukio
Completas de Yukio Mishima). Tokyo: Shinchôsha, 1975,vol. 26. Mishima: perguntando e ouvindo), em São Paulo Shimbun, parte I (9 de fevereiro de
− Bom deia seniora! (Bom Dia, Senhora!) e Shiroari no su (A Toca de Cupins). In:Mishima Yukio 1952) e parte II (12 de fevereiro de 1952).
guikyoku zenshû (Teatro Completo de Yukio Mishima). Tokyo: Shinchôsha, 1990, vol. 1. 4 MISHIMA, Yukio e KAWABATA Yasunari. Correspondance (1945–1970), p. 86–88
− Fumanna onnatachi (Mulheres Insatisfeitas). In: Mishima Yukio zenshû. Tokyo: Shinchôsha, 5 MISHIMA, Yukio. “Koyû uira Sabino”. Aporo no sakazuki, p.63–65
1988, p. 585–610.
6 MISHIMA, Yukio “Hakiri ari, hotaru, hachisuzume, dachô”. Aporo no sakazuki,
− Correspondência. Mishima Yukio zenshû. Tokyo: Shinchôsha, 1988. p.66–67
VIGLIELMO, Valdo H.. Mishima y Brasil: Un estudio de Shiroari no su. In:Estudios Orientales. 7 Idem, Aporo no sakazuki, p. 65
Mexico: El Colegio de Mexico, 1973, vol. VIII, n. 1.
8 VIGLIELMO, Valdo H. “Mishima y Brasil: Un estudio de Shiroari no su”, p. 10
9 MISHIMA,Yukio. Shiroari no su (A Toca de Cupins) ,em Mishima Yukio guikyoku
zesnhû, vol. I
10 MISHIMA, Yukio. Fumanna onnatachi (Mulheres Insatisfeitas),em Mishima Yukio
zenshû, p. 585–610
11 Carta a Mituto Mizumoto em Correspondência, Mishima Yukio zenshû, p. 896
12 Idem, ibidem, p. 897–898
13 Idem, “Watashi no naka no 25nen” (Os 25 anos dentro de mim), em Sankei Shim-
bun, 7 de julho de 1970
Beatriz Resende
coordenadora
Denilson Lopes
superintendente de difusão cultural
Heliane Rocha
superintendente administrativa
diagramação
José Antônio de Oliveira
palácio universitário da praia vermelha Júlio Ferretti
universidade federal do rio de janeiro Felipe Claudino
Av. Pasteur, 250 − 2º andar
cep 22295-900 | Urca | rj revisão
tel (21) 2295-1595 Magali Costa
www.forum.ufrj.br Clécia Oliveira