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A Rutura com o Senso Comum nas Ciências Sociais


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A Rutura com o Senso Comum nas Ciências Sociais

- Biografia Augusto Santos Silva:


-> Professor universitário- sociólogo,
-> Atual ministro dos negócios estrangeiros,
-> Licenciou-se em História e doutorou-se em Sociologia (no ISCTE),
-> Nasceu em 1957 (tem neste momento 64 anos),
-> Partido Socialista

- O presente texto está dividido em cinco partes:


1) O problema da rutura (p.29-32)
2) A Natureza e a cultura (p.32-39)
3) Indivíduos e Sociedade (p.39-45)
4) Nós e os outros (p.45-49)
5) As condições de rutura (p.50-53)

1) O problema da rutura

-> A constituição das Ciências Sociais está relacionada com a possibilidade histórica de
afirmação da autonomia social, ou seja, com os desenvolvimentos sócio-económicos,
políticos e teóricos existentes nos séculos XVII, XIII e XIX, impôs-se ideia de que existia
uma ordem social modesta e coletiva, que não era determinada pela vontade divina,
irredutível à ação individual e submetida a leis.
-> Assim, com a consolidação dos ritmos desiguais das várias disciplinas, decorreu a
criação de um saber especializado que assentava na reflexão teórica e na observação
empírica, ou seja, a idealização e a execução dessa, o que foi bastante importante pois
“apareceu” algo que diferia com tradição filosófica e que mudou o rumo do senso
comum.
-> Émile Durkheim, sociólogo, defendia que o homem não podia viver no meio das
coisas sem fazer delas ideias segundo as quais regula o seu comportamento. Defendia,
também, que os “produtos da experiência vulgar têm, antes de tudo, como objetivo
pôr as nossas ações em harmonia com o mundo que nos rodeia, ou seja, são formadas
pela prática e por ela”.
-> As disciplinas sociais são permeáveis às interpretações do senso comum.
-> Os homens (sociedade) necessitam de produzir ideias determinadas sobre as
instituições e situações coletivas para que seja mais fácil racionalizar e orientar a sua
prática.
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-> Faz-se uma interpretação demasiado restritiva do trabalho da rutura com o senso
comum. Daqui desmarcam-se dois continentes cognitivos – o vulgar e o erudito –
tornando-os, assim, incomunicáveis.
-> Os factos humanos são sempre factos interpretados, ou seja, são sempre analisados
ou explicados por cada um de nós. Então, importa dar conta das representações
coletivas, ou seja, as imagens e/ou noções com que nos deparamos no dia a dia qu
configuram o nosso património cognitivo, o qual partilhamos com os membros do
nosso grupo. Assim, aquilo a que chamamos de senso comum forma um dos objetos
centrais de qualquer ciência social.

2) Natureza e a Cultura

-> Uma das formas de explicar os factos sociais é a explicação naturalista.


-> Do ponto de vista das Ciências Sociais, as condicionantes biológicas representam um
dado continuamente utilizado e transformado pela sociedade. Este reconhecimento
(como por exemplo, a vida e a morte) vai de acordo com a identificação de que os
conteúdos e as formas de conduta são tipicamente culturais.
-> A ação do homem está em permanente tensão com as suas bases e limites
biológicos.
-> A recusa de formas de reducionismo naturalista permite não só a troca produtiva de
informação entre as disciplinas sociais como torna possível integrar dados de ordem
biológica na investigação social.
-> É questionado o como é que a persistência das interpretações de tipo naturalista
são explicadas. Como resposta a esta questão, o autor dá-nos a sociobiologia e o que
ela representa – o retorno o inatismo, a busca de comportamentos universais, comuns
a várias espécies e a biologização da investigação social. Primeiramente, constitui, até
certo ponto, uma tentativa de capitalização do desenvolvimento convergente de
disciplinas como a genética com aplicação à nossa espécie de modelos;
posteriormente, temos os biologismos que estão relacionados com o paradigma
positivista que ainda está bastante patente nas Ciências Sociais.
-> Ao voltarmos às formulações do senso comum, importa reter uma outra dimensão
do problema: os argumentos de tipo naturalista são usados, maioritariamente, em
contexto de conhecimento corrente que não se enquadra no que supomos por
conhecimento preciso/cientifico. Para ilustrar esta afirmação, o autor dá-nos o
exemplo do facto de que, em Portugal, a esmagadora parte da população feminina
escolhe cursos como Letras ou Medicina, enquanto os rapazes preferem as
Tecnologias ou Economia. Temos aqui, então, a diferenciação entre sexos, o que tem a
haver diretamente com as diversas condições sociais e não com diversas naturezas
biológicas e psicológicas. A interpretação corrente do tipo naturalista desempenha
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uma função decisiva no conjunto, ou seja, a vocação feminina para certas tarefas tidas
por menores constitui um vetor ideológico do esquema decisivo dos esquemas de
socialização dirigido ao sexo feminino. A persistência da frequência de cursos escolares
em termos de escolha e vocação está relacionada com a conversão pelos atores
sociais.
-> A persistência e eficácia do senso comum não podem ser “entregues” à “ignorância”
popular do conhecimento cientifico. Assim, as Ciências Sociais enfrentam uma situação
peculiar: ou evitam a rutura e ficam condenadas à reprodução mais ou menos
sofisticada ou assumem até ao fim e têm, então, de assumir integralmente a postura
critica em que se colocaram.

3) Indivíduos e Sociedade

-> As interpretações do saber prático tendem a ser unitários. Ao contrário do


naturalismo, o individualismo constitui uma matriz ideológica decisiva do mundo
contemporâneo.
-> No século XIX, a burguesia liberal usou o utilitarismo e o individualismo como
bandeiras doutrinárias para a implantação do sistema político e económico liberal, o
que fez com que a ideia de que a sociedade era um agregado de indivíduos singulares
fosse analisada.
-> Temos que perceber, primeiramente, como é que é possível, no ponto de vista das
Ciências Sociais, encarar a dialética entre ação individual e determinismos e,
posteriormente, ultrapassar os preconceitos ideológicos a esse propósito.
-> Porém, levarmos o individualismo ao extremo, conduz à contestação da própria
existência das Ciências Sociais.
-> Com isto, é correto afirmar que o problema da relação entre indivíduos e
coletividade continua aceso; não cabe às Ciências Sociais soluciona-lo.
-> Indivíduos e sociedade não são realidades separáveis, ou seja, para estudarmos um,
teremos que envolver sempre o outro.
-> Muitos sociólogos tentaram resolver este problema. Como exemplo, o autor
apresenta-nos Anthony Giddens que propõe resolver esta questão. Como afirmava, a
Sociologia estuda as formas de produção e reprodução da Sociedade. Esta ação não é
indeterminada, não é escolhida pelo sujeito consoante as suas condições.
-> O argumento de que a explicação científica nega o livre-arbítrio e a autonomia da
ação individual só faz sentido para aqueles que conhecem a ciência segundo os
parâmetros de determinismo absoluto, o qual já foi ultrapassado há algum tempo.
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-> Toda esta questão ainda não teve fim. De um lado, temos os que sustentam que as
Ciências Sociais devem partir das regularidades verificáveis pelo estudo dos processos
intra e inter-individuais; do outro, os que defendem que tais regularidades só podem
ser apercebidas pela análise dos factos e instituições, porque são nestas que se
concentram as causas determinante das condutas pessoais.

4) Nós e os outros

-> O autor começa por nos introduzir um novo tema: etnocentrismo.


-> Definição de etnocentrismo: visão demonstrada por alguém que considera o seu
grupo étnico ou cultura o centro de tudo. Ethno: Nação/tribo, Centrismo: Centro
-> Foi uma palavra introduzida nos princípios do nosso século e serve para
designar duas atitudes internamente relacionadas:
- Sobrevalorização do grupo e da cultura à qual pertencem os sujeitos
- A correlativa depreciação das culturas e das organizações sociais
diferentes-> Trata-se de uma maneira de entender a relação entre o “Eu/Nós”
(identidades de um certo grupo), e os “outros”.

-> Esta atividade etnocentrista é a atividade legitimadora muitas vezes


inconscientemente de domínio -> o que por vezes não tem tanto a ver com a ideia de
superioridade, mas com a “não abertura” a outros grupos. “O que vale a pena
conhecer, é o que é nosso”.

-> Por outro lado, durante a História da Humanidade temo-nos vindo a deparar com
formas mais duras de etnocentrismo: racismo, fanatismo religioso…
Exemplos do autor: A independência politica da generalidade do país; a
crescente afirmação geoestratégica do hemisfério sul…

-> Contudo, os mais entendidos também acham que não devemos restringir o
etnocentrismo à sua forma mais histórica e política e que devemos dar especial
atenção às expressões mais violentas que persistem nas relações intra-civilizadas
(porque isto também acontece nas relações entre grupos diferentes mas da mesma
sociedade).

-> Do ponto de vista da produção de conhecimento cientifico sobre a realidade social o


maior obstáculo está nas formas não elaboradas e inconscientes de etnocentrismo… É
relativamente fácil ultrapassar o racismo porque se apresenta explicito, mas mais
difícil é quando surgem de forma implícita.
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-> A propensão para o etnocentrismo, constitui ao nível do senso comum, um factor de


identificação do grupo “nós”. Um “instrumento decisivo da luta simbólica entre
grupos”.
-> Outro dos obstáculos no qual tropeçam os cientistas sociais, é na forma
etnocentrista de pensar: por preconceito -> que se forma por ideias feitas que acabam
por se tornar verdades absolutas, e indiscutíveis.

-> O autor volta-nos a dar conhecimento de outro termo: Anacronismo.


-> Definição de anacronismo: erro em cronologia, expressado na falta de alinhamento/
consonância/ correspondência com uma determinada época. Ocorre quando pessoas,
eventos, palavras, ou outras coisas que pertencem a uma determinada época são
erroneamente retratadas noutra época.
Analisamos uma época projetando nela os quadros mentais da nossa.

->Muitos argumentaram que a única forma de ultrapassar este anacronismo era


acabar com a comparação e teorias: o que é FALSO. Uma analise histórica implica
sempre, o diálogo do presente e dos seus valores com o passado.

-> O ponto 4 encerra com a afirmação de importante realce “ o estudo das economias
camponesas e sobretudo nas questões ligadas ao desenvolvimento, economistas e
sociólogos correm constantemente o risco de assumir consciente ou
inconscientemente preconceitos etnocentristas”.

5) As condições de rutura

-> Um dos mais importantes princípios de explicação em Ciências Sociais estipula que a
razão de ser dos factos sociais deve ser procurado em outros factos sociais.

-> Existe, ainda, uma grande barreira entre a argumentação típica do senso comum e
as exigências analíticas do trabalho de investigação:
Focámos neste capitulo três das principais matrizes ideológicas:
- relação entre Natureza e Cultura,
- Indivíduos e Sociedade,
- Grupos e Culturas

-> Realça-se também que a pesquisa cientifica deve partir de princípios e


problemáticas e deve utilizar conceitos e proposições distintas das que estruturam o
conhecimento cientifico.

-> Mas ATENÇÃO: rutura não significa separação absoluta pois tal não era possível.
Como exemplo disto temos a biologia, pois com mais ou menos intensidade, todas as
disciplinas cientificas estão sujeitas à influencia de elementos simbólico-ideológicos.
Contudo, a pesquisa cientifica também tem meios para analisar estes elementos
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simbólico-ideológicos e é por isso que são inadmissíveis na ciência qualquer tipo de


preconceitos.

-> Os processos de produção de conhecimento cientifico têm então três processos


epistemológicos:
- A rutura com o senso comum,
- Construção de um objeto de análise, - Verificação da validade da
teoria.
-> A rutura com o senso comum é um processo contínuo e sempre incompleto… “Sem
esta continuidade e conflitual separação de territórios não haveria ciência” .

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