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Rodrigues, K. A. et al.

ARTIGO TÉCNICO

INFLUÊNCIA DA GLICOSE SOBRE O CONSUMO DE FENOL POR


ASPERGILLUS NIGER AN 400 EM REATORES EM BATELADA

THE INFLUENCE OF GLUCOSE ON THE PHENOL CONSUMPTION BY


ASPERGILLUS NIGER AN 400 IN BATCH REACTORS
KELLY DE ARAÚJO RODRIGUES
Engenheira Civil. Doutora em Hidráulica e Saneamento pela EESC/USP. Professora na área de Química e
Meio Ambiente – CEFETCE

GLÓRIA MARIA MARINHO S. SAMPAIO


Farmacêutica. Doutora em Hidráulica e Saneamento pela EESC/USP. Professora na área de Química e
Meio Ambiente – CEFETCE

MARCELO ZAIAT
Engenheiro Químico. Doutor em Hidráulica e Saneamento. Professor do Departamento de Hidráulica
e Saneamento da EESC – USP

SANDRA TÉDDE SANTAELLA


Química. Doutora em Hidráulica e Saneamento. Professora do Departamento de Engenharia Hidráulica
e Ambiental - UFC

Recebido: 21/11/06 Aceito: 30/04/07


RESUMO ABSTRACT
Aspergillus niger AN 400 foi inoculado em reatores em batelada Batch reactors were inoculated with Aspergillus niger AN
para remoção de fenol de meio sintético, na presença e ausên- 400 to remove phenol from synthetic media with and without
cia de glicose. O experimento possuía: 5 reatores de controle glucose. The experiment was set by: five blank reactors (group
(grupo 1) com meio contento apenas fenol; 5 reatores (gru- 1) with media containing only phenol; five reactors (group 2)
po 2) inoculados com fungos e com meio com fenol e sem inoculated with fungi and with media containing only phenol;
glicose; e 5 reatores (grupo 3) inoculados com fungos e com and five reactors (group 3) inoculated with fungi and with media
meio com fenol e glicose (5 g/L). Os reatores foram agitados containing phenol and glucose (5 g/L). These reactors were kept
a 200 rpm, a 30°C, durante 5 dias. A concentração média at 30°C under stirring of 200 rpm during 5 days. The mean
inicial de fenol foi de 323 mg/L e a de matéria orgânica, de initial concentrations of phenol and COD were 323 mg/L
696 mg DQO/L, meio sem glicose, e 6058 mg DQO/L, meio and 696 mg COD/L for the media without glucose, and
com glicose. Os reatores do grupo 2 removeram 48% de fenol 6058 mg COD/L for the media containing glucose. The reactors of
e 21% de DQO, enquanto que os reatores do grupo 3, 100% group 2 removed 48% of phenol and 21% of COD, while the reactors
de fenol e 93% de matéria orgânica. Não houve redução of group 3 removed 100% of phenol and 93% of COD. There was
significativa de fenol e de DQO nos reatores de controle. A no significant reduction of phenol and COD in the blank reactors.
assimilação foi a via principal de remoção de fenol. The assimilation was the main pathway of phenol removal.

PALAVRAS-CHAVE: Aspergillus niger, glicose, fenol, trata- KEYWORDS: Aspergillus niger, glucose, phenol, biological
mento biológico, água residuária. treatment, wastewater.
INTRODUÇÃO García et al, 2000; Kapdan e Kargi, sérios danos ao mesmo e, conseqüen-
2002; Sahoo e Gupta, 2005; Vinciguer- temente, ao homem. De acordo com
Os compostos fenólicos caracteri- ra et al, 1995). Prieto et al (2002), esses compostos
zam-se pela presença de hidroxila (OH-) De acordo com Martinelli e Silva são extremamente tóxicos tanto por
diretamente ligada a um anel benzênico (2003), o fenol é ainda um intermedi- ingestão como por inalação, ainda que
e fazem parte da composição de vários ário químico para a produção de xam- em baixas concentrações (1 mg/L).
efluentes industriais, tais como, os da pus, aditivos para óleos lubrificantes, Segundo Vinciguerra et al (1995),
indústria de beneficiamento da castanha desinfetantes e agentes anti-sépticos. a presença de anéis aromáticos constitui
de caju, das refinarias de petróleo, de Os fenóis são compostos ácidos, bac- o principal obstáculo para o tratamento
indústrias têxteis, de papel e celulose, tericidas, com efeitos carcinogênicos e de despejos que apresentem compostos
de azeite de oliva e fundições de metais, mutagênicos (Bolaños et al, 2001), cuja fenólicos em sua composição. Porém,
entre outros (Assadi e Jahangiri, 2001; presença no meio ambiente pode causar o interessante ao se utilizar fungos no

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Consumo de fenol e glicose por Aspergillus niger AN 400 em reatores em batelada

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tratamento de despejos que contenham O objetivo do presente trabalho pH foi ajustado de pH 6 para 4, com
compostos desta natureza, reside na gran- foi estudar a capacidade do fungo ácido clorídrico a 10%, para favorecer
de habilidade destes microrganismos em Aspergillus niger (AN 400) para o tra- o desenvolvimento do Aspergillus niger.
produzirem enzimas (celulases, ligninases, tamento de água residuária sintética Após as adições de água residuária e
peroxidases, entre outras) (Luke e Burton, contendo fenol com concentração mé- inóculo (reatores RF e RFG), os frascos
2001), as quais tornam o organopoluente dia inicial de 323 mg/L e a influência foram vedados com tampão de algodão
mais acessível à biodegradação. do uso de glicose como fonte primária e gaze.
Os processos físico-químicos de de carbono.
tratamento possuem custos relativa- Operação em batelada
mente mais elevados que os biológicos MATERIAIS E MÉTODOS
(Kotsou et al, 2004) que têm a vantagem Os reatores foram mantidos em
de exercer menor efeito adverso sobre o Meio sintético mesa agitadora horizontal, sob agitação
meio ambiente (Kauffman et al, 1999; de 200 rpm e temperatura de 30oC e
Metcalf e Eddy, 1991). Desta forma, A composição do meio sintético é postos fora de operação em função de
dentre os diversos tipos de reatores mostrada na Tabela 1. A água emprega- diferentes tempos de reação, sendo
biológicos, os reatores com fungos da para preparo do meio foi esterilizada desmontados 1 (um) reator RC, 1 (um)
representam uma alternativa para o em autoclave durante 20 minutos sob RF e 1 (um) RFG por dia de operação.
tratamento de efluentes que possuem pressão de 1 atm e à temperatura de O experimento foi realizado durante
compostos aromáticos recalcitrantes, 120oC. 5 dias, período no qual se verificou a
como fenol e derivados. variação das variáveis: fenol — croma-
O tratamento de águas residuárias Inóculo tografia gasosa (HP INNOWAX – 30 m x
contendo compostos fenólicos pelo uso 0,25 mm x 0,25 Mm);; glicose — mé-
de reatores com fungos tem mostrado Aspergillus niger AN 400 foi uti- todo colorimétrico; DQO, pH e SSV,
ser viável devido à obtenção de efluen- lizado como inóculo, o qual foi doado de acordo com os métodos descritos em
te residual com menor toxicidade e pelo Laboratório de Saneamento do APHA (1998).
diminuição da concentração de fenóis Departamento de Hidráulica e Sane- A concentração de fenol adsor-
(Borja, Alonso e García, 1995, apud amento Ambiental da Universidade vido nas paredes da biomassa fúngica
García et al, 2000; Rodríguez, Ramos Federal do Ceará. O inóculo encontra- foi investigada. O micélio presente
– Cormenzana e Martínez, 1988). Os va-se na forma de solução de esporos e na amostra coletada de cada reator foi
fungos do gênero Aspergillus, assim foi adicionado em cada reator na con- separado do meio líquido por meio de
como Geotrichum, Phanerochaete e centração de 2 x 106 esporos/mL. centrifugação em tubos “racker” para
outros, utilizam compostos aromáticos separação das fases líquida e sólida
através da produção de enzimas catabó- Montagem dos reatores (micélio). O sobrenadante foi vertido
licas (García et al, 2000). dos tubos e à massa úmida adicionou-se
De acordo com Kyriacou et al Utilizaram-se 15 (quinze) frascos 1 mL de hidróxido de sódio (1 M). Os
(2005), várias espécies de Aspergillus têm de Duran, capacidade total de 500 mL, tubos foram submetidos a ultra-som
demonstrado eficiência na degradação de como reatores, sendo 5 (cinco) com durante aproximadamente 30 minutos
compostos fenólicos e na remoção de cor função de controle (RC), 5 (cinco) a fim de promover liberação de fenol
dos mais diversos despejos industriais, com fungos e meio sem glicose (RF) e adsorvido, na forma de fenolato. Após
especialmente a espécie Aspergillus niger 5 (cinco) com fungos e meio com este período, acrescentou-se 1 mL de
que vem sendo utilizada no tratamento glicose. Cada reator foi preenchido ácido sulfúrico (1 M), de modo a pro-
de águas residuárias com fenol por com 250 mL do meio sintético, cujo piciar a conversão do fenolato em fenol
apresentar boa eficiência na remoção
do composto, segundo os trabalhos de Tabela 1 – Composição do meio sintético
Miranda et al (1996), Garcia et al (2000)
e Cereti et al (2004). Na degradação de Constituinte Concentração (g/L)
compostos fenólicos por Aspergillus niger C6H11OH 0,30
é observada a participação de sistema
enzimático fenol hidroxilase e catecol NH4SO4 2,00
1,2-dioxigenases (Santos e Linardi, NaNO3 1,00
2004). KH2PO4 0,20
Alterações no pH do meio no qual
os fungos se encontram podem ocorrer MgSO4 0,25
como resultado da atividade metabólica CaCl2.2H2O 0,01
desses microrganismos (Griffin, 1994).
Devido Aspergillus niger possuir a capa- CuSO4.7H2O 0,08
cidade de produzir ácidos orgânicos, o H2MoO4 0,05
pH pode assumir valores característicos
de meio ácido, entre pH 2 e 4, o que MnSO4.7H2O 0,05
representa uma vantagem competitiva Fe2(SO4)3 0,05
em relação a outros microrganismos ZnSO4 0,04
(Kyriacou et al, 2005).

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Rodrigues, K. A. et al.
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no meio líquido e, então, acrescentou-se RESULTADOS E damente, 9%. Nos reatores RF, os
100 ML do padrão interno (2-clorofenol), DISCUSSÃO maiores percentuais de redução de fenol
100 ML de ácido sulfúrico (1 M) e (48%) e DQO (21%) foram obtidos
0,60 mL de éter. Os tubos foram agitados O preparo da água residuária sin- no quinto dia.
em vórtex AP 56, sob agitação máxima tética, em cada reator, resultou em dife- Segundo Vinciguerra et al (1995),
por 1 minuto, centrifugados (centrifu- rentes concentrações iniciais de matéria o emprego de substrato primário no
ga Fanem 215) a 1200 rpm, durante orgânica, medida como DQO, e fenol, tratamento de efluentes é de grande
1 minuto, e ao final deste procedimento, conforme mostrado na Tabela 2. importância, pois propicia melhor
injetou-se 1 ML do líquido sobrenadante Nas Figuras 1 e 2 observa-se, degradação do poluente. A glicose
no cromatógrafo. respectivamente, a remoção de DQO representa uma fonte mais fácil de ser
Posteriormente, a concentração e fenol nos reatores RC, RF e RFG. assimilada, sendo um composto univer-
relativa ao volume da amostra de 2 mL O uso de glicose favoreceu a obtenção salmente assimilado pelos organismos,
foi padronizada em função do fator de de maiores reduções da concentração suprindo as necessidades energéticas
diluição (2:1000) e da biomassa úmida de fenol e de DQO. No último dia de quase todas as células (Marzzoco e
pesada, a fim de obter a concentração do experimento, nos reatores RFG, a Torres, 1999).
de fenol adsorvido por grama de massa concentração do poluente era inferior a A glicose é um composto mais
fúngica. 1 mg/L, concentração mínima detectá- facilmente degradado, resultando no
vel pelo método, tendo-se obtido 93% aumento mais rápido da biomassa, e,
Obtenção das velocidades de redução de DQO. consequentemente, da eficiência de
de consumo de substrato O percentual máximo de redução remoção de matéria orgânica, devido
de fenol nos reatores RC foi de 30% seu maior consumo pela população
As velocidades de consumo de (5o dia), contudo não se considerou microbiana, o que foi observado com
substrato (rs) resultaram da relação entre a eficiência de remoção do poluente a obtenção dos maiores percentuais de
concentração final (C) e concentração significativa, uma vez que não foi verifi- degradação pelos reatores RFG. Assim,
inicial (C o ) de fenol ao longo da cada redução gradual de fenol ao longo o uso de glicose favoreceu a assimilação
duração do experimento. Os dados de do tempo. Com relação à remoção de do poluente pelos fungos, a qual au-
C/Co foram ajustados em programa DQO, nos reatores de controle não mentou gradativamente ao longo do
computacional Microcal Origin ‘ 6.0, foi alcançada redução expressiva desse tempo até alcançar 100% de remoção,
obtendo-se decaimento de substrato parâmetro e o percentual máximo de no 5o dia.
(C/Co) em função do tempo (t), no remoção registrado foi de, aproxima-
qual o modelo matemático de Boltzman
(equação 1) foi o que apresentou melhor
representatividade. Na Equação (1): Tabela 2 – Concentração inicial de DQO e fenol na água residuária sintética
C/Co – concentração normalizada do no interior dos reatores
substrato (mg/L); (C/Co)i – concentra-
ção inicial normalizada do substra- Concentração (mg/L) Média Máximo Mínimo
to (mg/L); (C/Co)R – concentração DQO 1
696 ± 19 730 676
residual normalizada do substrato 2
DQO 6058 ± 150 6180 5920
(mg/L); Co – concentração inicial do
substrato (mg/L); C – concentração Fenol 323 ± 30 416 285
de substrato no tempo “t” (mg/L); 1
DQO relativa à água residuária sem adição de glicose (reatores RC e RF)
t – tempo t (dia); to – tempo inicial 2
DQO relativa à água residuária com adição de glicose (reatores RFG)
(dia); dx – tamanho do trecho onde a
variação em x implica na maior variação 1
em y. 0,9

D $$ N  D $$ N 0,8
$  $ P J P 3
D$ N
DQO final / DQO inicial

$P P 3 @ U  UPJ 0,7
 F EY (1)
0,6
Foram obtidos valores da veloci-
dade de consumo (rs) pela diferenciação 0,5
da Equação (1) em função do tempo, de 0,4
acordo com a Equação (2), bem como
0,3
a velocidade máxima de consumo (rmáx)
para cada situação (reatores RFG e RF). 0,2
A velocidade média de consumo (rmédia) 0,1
foi calculada a partir da Equação (3).
0
ED $ N 0 1 2 3 4 5 6
$P J
ST  (2) Tempo (dias)
EU
 STEU RC RF RFG
SNFEJB  (3)
 EU Figura 1 – Remoção da concentração de DQO nos reatores RC, RF e RFG

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Consumo de fenol e glicose por Aspergillus niger AN 400 em reatores em batelada

ARTIGO TÉCNICO
Nos reatores RFG, a glicose foi 1
utilizada pelos fungos até o terceiro dia, 0,9
quando se registrou 99% de remoção
0,8
do referido composto (Figura 3),

Fenol final / Fenol inicial


sendo que, após sua exaustão, foram 0,7
alcançadas maiores remoções de fenol 0,6
no meio, pois os fungos, a partir deste 0,5
dia, passaram a utilizar exclusivamente
0,4
o fenol como fonte de carbono.
Nas Figuras 4a e 4b é mostrada 0,3
a normalização das concentrações do 0,2
substrato (fenol) para os reatores com
0,1
glicose (RFG) e sem glicose (RF), a partir
dos quais foram obtidas as velocidades 0
de consumo (rs) em função do tempo 0 1 2 3 4 5 6

(t) (Figuras 5a e 5b). Observou-se que Tempo (dias)


os reatores RFG apresentaram maiores RC RF RFG
velocidades de consumo de fenol, de mo-
Figura 2 – Remoção da concentração de fenol nos reatores RC, RF e RFG
do que a presença de glicose influenciou
na aceleração da remoção do fenol.
1
Na Tabela 3 são apresentados os
valores das velocidades máxima e média 0,9
de consumo de fenol pelos fungos nos
0,8
reatores RF e RFG. Verificou-se que, em
Glicose final / Glicose inicial

relação à velocidade máxima (rmáx), nos 0,7


reatores contendo glicose, o consumo 0,6
de fenol foi 5,4 vezes maior que nos
reatores que receberam inóculo fúngico 0,5
sem adição de glicose na água residuária 0,4
(RF). Da mesma maneira, a velocidade
média de consumo nos reatores RFG foi, 0,3
aproximadamente, 2 vezes maior que nos 0,2
reatores RF.
0,1
No presente trabalho, tanto nos
reatores com fungos e meio sintético 0
com fenol e glicose (RFG), como nos 0 1 2 3 4 5 6
que continham fungos e meio sintético Tempo (dias)
com fenol e sem glicose (RF), houve
Figura 3 – Remoção da concentração de glicose nos reatores RFG
assimilação gradual do poluente pelos
fungos, ao longo de todo o experimen-
to, fato comprovado devido à obtenção concentração do poluente e temperatu- suprimento da fonte de carbono e
de dados inerentes à concentração de ra (Goyal et al, 2003). Porém, estes da- produção de moléculas como polissaca-
fenol adsorvido à biomassa fúngica que dos confirmaram que a principal via de rídeos, proteínas e lipídios, compostos
cresceu no interior dos reatores RF e remoção de fenol foi a de assimilação, que favorecem também acúmulo do
RFG (Tabela 4). indicando que o composto foi realmen- peso seco. Além disso, muitos fungos
Verificou-se que a concentração te incorporado à célula fúngica. produzem amilases extracelulares que
de fenol não assimilado ou adsorvido Paralelamente ao consumo de lhes conferem capacidade de aderência
à biomassa fúngica, presente no inte- fenol, observou-se crescimento de (Carlile e Watkinson, 1994).
rior dos reatores RF e RFG, foi pouco biomassa nos reatores RFG, conforme Nos reatores RF, a biomassa en-
relevante, indicando que o mecanismo mostrado na Figura 6. O crescimento contrava-se “fragmentada” e dispersa
de adsorção teve pouca influência máximo foi alcançado no quarto dia, no meio líquido e o crescimento de
na remoção global do fenol do meio após o qual houve diminuição de bio- microrganismos foi muito inferior ao
sintético e que não está relacionado ao massa, provavelmente ocasionada pela observado nos reatores RFG, de modo
emprego de glicose. As concentrações exaustão de nutrientes no meio. Nesses que a maior produção de biomassa,
baixas de fenol adsorvido no micélio reatores, a biomassa apresentou-se sob a medida em mg SSV/L, no reator RFG,
fúngico são justificadas devido ao me- forma de pequenas esferas aglutinadas, no quarto dia de operação, foi 6 vezes
canismo de adsorção ser menos intenso formando pequenos blocos compactos, superior à obtida no reator RF, neste
em células vivas, conforme relatado cujo aspecto foi atribuído ao estímulo mesmo dia. Similarmente, Rodrigues
por Rao e Viraraghavan (2002), sendo da produção de polissacarídeos pelo et al (2004) observaram, em experi-
fortemente influenciado pelo pH e por uso de glicose. mento em batelada, biomassa disfor-
fatores como propriedades da superfície De acordo com Costa et al (2004), me e aglutinada de Aspergillus niger e
do microrganismo, fisiologia da célula, a glicose é composto essencial para Fusarium sp. ao utilizar mesma água

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Rodrigues, K. A. et al.
ARTIGO TÉCNICO

1,0 1,0

0,8 0,9

0,8
C/Co

0,6

C/Co
0,4 0,7

(a) (b)
0,2 0,6

0,0 0,5

0 1 2 3 4 5 0 1 2 3 4 5

Tempo (dia) Tempo (dia)


Figura 4 – Normalização das concentrações de substrato (fenol) obtidas durante o ensaio
em batelada nos reatores RFG (a) e RF (b)

-0,16
-1,0 rmáx
-0,14

-0,8 rmáx -0,12

-0,10
-0,6

-0,08
(-) rs
(-) rs

-0,4
-0,06

-0,04
-0,2

-0,02

0,0
0,00
0 2 4 6
0 2 4 6
Tempo (dias)
Tempo (dias)
Figura 5 – Variação da velocidade de consumo de fenol durante o ensaio em batelada
nos reatores RFG (a) e RF (b)

Tabela 3 – Velocidades de consumo de fenol obtidas durante o experimento em batelada


Reatores rmáx (d-1) rmédia (d-1)
RF 0,14 0,094
RFG 0,76 0,18

residuária sintética empregada nessa pelos reatores RFG devido à maior com fenol em reatores com Aspergillus
pesquisa em reatores em batelada, produção de ácidos orgânicos, a partir niger e Fusarium sp. observaram redu-
sob condições de temperatura não do consumo de glicose, conforme ção inicial nos valores de pH, sendo
controlada e agitação por meio de relatado por Assas et al (2002). que nos reatores que dispunham de
aeradores de aquário. Não se observou Assas et al (2002) obtiveram re- glicose a diminuição do pH foi mais
crescimento de biomassa no interior sultados semelhantes na utilização de rápida em relação aos demais reatores,
dos reatores de controle (RC). Geotrichum candidum no tratamento como reflexo de atividade microbiana
A variação de pH ao longo do do efluente da indústria de azeite de mais intensa.
experimento é apresentada na Figura 7. oliva e a diminuição do pH foi atribu- D e a c o r d o c o m Ky r i a c o u
Houve diminuição do pH em todos os ída à geração de ácidos orgânicos. Da et al (2005), a atividade microbiana é
reatores estudados, contudo os valores mesma forma, Rodrigues et al (2004) diretamente influenciada pela quan-
menores de pH foram apresentados ao empregar água residuária sintética tidade de biomassa, observando-se se

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Consumo de fenol e glicose por Aspergillus niger AN 400 em reatores em batelada

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Tabela 4 – Concentração de fenol adsorvido no micélio presente nos reatores RF e RFG
Reatores Fenol inicial Fenol no meio após Remoção de % Fenol % Fenol
no meio final da operação fenol da água adsorvido assimilado
(mg/L) (mg/L) residuária (%)
RF1 300 269 10,33 0,470 9,74
RF2 319 273 14,42 0,130 14,29
RF3 350 252 28,00 0,220 27,78
RF4 295 165 44,07 0,210 43,86
RF5 330 172 47,88 0,010 47,87
RFG1 314 280 10,80 0,570 10,23
RFG2 324 240 25,31 0,060 25,25
RFG3 311 220 27,78 0,063 27,72
RFG4 294 20 93,88 0,002 93,88
RFG5 250 0 100,00 0,000 100,00

melhor remoção de DQO. Ainda 1 140


segundo os autores, menores valores
de pH são alcançados como resultado 120
0,8
da atividade metabólica de Aspergillus
Fenol final / Fenol inicial

100
niger. Maior produção de biomassa
de A. niger foi obtida por O’Donnell

SSV (mg/L)
0,6
80
et al (2001) em pH 3 (5,1 g/L),
registrando-se valores menores em 60
pH 7 (1,9 g/L), fora da faixa ótima 0,4
de pH para o crescimento da espécie, 40
ao investigar o efeito do controle 0,2
do pH sobre a atividade de enzimas 20
proteases.
Nesse trabalho, observou-se que o 0 0
pH diminuiu até o 4o dia de batelada, 0 1 2 3 4 5
quando o crescimento de biomassa Tempo (dias)
atingiu o valor máximo, passando a
apresentar início de fase endógena no Fenol SSV
último dia, motivado pela exaustão Figura 6 – Variação de SSV e fenol nos reatores RFG
de nutrientes no meio. No final
do experimento, o pH manteve-se
constante em relação ao dia anterior,
5
com valores em torno de 2,4, indican-
do que os ácidos orgânicos gerados pela
fermentação do meio ainda não teriam
sido consumidos. 4
O processo de fermentação favo-
rece a produção de ácidos orgânicos
(Fadil et al, 2003) e, em função da
pH

3
concentração de glicose no meio, pode
ocorrer alteração da via oxidativa de
respiração aeróbia para fermentação 2
(Griffin, 1994). Segundo Fadil et al
(2003), com o consumo dos ácidos
gerados na fermentação, o pH tende
a subir, voltando a valor próximo do 1
inicial. 0 1 2 3 4 5 6
Assim, a presença de glicose Tempo (dias)
propiciou o aumento de biomassa no RC RF RFG
interior dos reatores RFG e, conse-
qüentemente, teria ocorrido maior Figura 7 – Variação de pH nos reatores RC, RF e RFG

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Rodrigues, K. A. et al.
ARTIGO TÉCNICO

produção de ácidos orgânicos nesses REFERÊNCIAS MIRANDA, M. P. et al. Color elimination


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BOLAÑOS, R. M. L. et al. Phenol degradation
de remoção, no 5o dia da batelada. O in horizontal-flow anaerobic immobilized
de fenol pelo uso de reatores biológicos com fungos.
uso de glicose favoreceu obtenção de In: XI SIMPÓSIO LUSO-BRASILEIRO DE
biomass (haib) reactor under mesophilic
ENGENHARIA SANITÁRIA E AMBIENTAl
maiores velocidades (média e máxi- conditions. Water Science and Technology. v. 44, n. 4,
– SILUBESA. Natal, RN: ABES, p. 58 – 59,
ma) de consumo do fenol e resultou p. 167 – 174, 2001.
Abril, 2004.
em maior crescimento de biomassa e CARLILE, M. J., WATKINSON, S. C. The
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Brace & Company, 482p, 1994.
e DQO do meio sintético. industrial effluents – identification and
O pH atingiu valores menores COSTA, J. M., CORBELLINI, V. A., degradation potential. Process Biochemistry, v. 39,
nos reatores RFG, indicando maior SCROFERNEKER, M. L. Study of different p.1001 – 1006, 2004.
nitrogens sources on glucose uptake and production
produção de ácidos orgânicos duran- of melanin precursos and fungal mass of Fonsecaea
SAHOO, D. K., GUPTA, R. Evaluation of
te a degradação da matéria orgânica lignolytic microorganisms for efficient decolorization
pedrosoi cultered in tricyclazole. Process Biochemistry.
of a small pulp and paper mill effluent. Process
(fenol e glicose), refletindo a maior v. 39, p. 633 – 636, 2004.
Biochemistry, v. 40, p. 1573 – 1578, 2005.
atividade metabólica nos reatores onde FADIL, K. et al. Aerobic biodegradation and
os fungos dispunham inicialmente de VINCIGUERRA, V. et al. Correlated effects
detoxification of wastewaters from the olive oil
during the bioconversion of waste olive waters by
glicose e indicando a necessidade do industry. International Biodeterioration &
Lentinus edodes. Bioresourse Technology. n. 51,
uso de fonte primária de carbono para Biodegradation. v. 51, n. 1, p. 37 – 41, 2004.
p. 2211 – 276, 1995.
uma melhor eficiência do processo. GARCIA, I. G. et al. Removal of phenol compounds
Verificou-se que a principal via from olive Mill wastewater using Phanerochaete
chrysosporium, Aspergillus niger, Aspergillus terreus
de remoção do poluente do meio foi and Geotrichum candidum. Process Biochemistry, Endereço para correspondência:
através do mecanismo de assimilação, n. 35, p. 751 – 758, 2000.
tanto nos reatores desprovidos de fonte Kelly de Araújo Rodrigues
GOYAL, N. JAIN, S. C., BANERJE, E.
primária de carbono (RF) como nos Comparative studies on the microbial adsortion of DIPPG/CEFETCE
que receberam adição de glicose (RFG), heavy metals. Advances in Environmental Research, Av. Treze de Maio, 2081
indicando que o mecanismo de adsor- v. 7, p. 311 – 319, 2003.
60040-531 Fortaleza - CE - Brasil
ção teve pouca influência na remoção GRIFFIN, D. H. Fungal Physiology. Wiley-Liss, Tel: (85) 3307-3600
global do poluente da água residuária e New York, 344 p, 1994. E-mail: kelly@cefetce.br
não esteve relacionado ao emprego de KAPDAN, I. K., KARGI, F. Simultaneous
glicose como co-substrato. biodegradation and adsorption of textile dyestuff
in an activated sludge unit. Process Biochemistry,
n. 37, p. 973 – 981, 2002.
AGRADECIMENTOS
KAUFFMANN, C., PETERSEN, B. R.,
Ao CNPq pela bolsa de estudos BJERRUM, M. J. Enzymatic removal of phenols
from aqueous solutions by Coprinus cinereus
concedida para a realização do curso peroxidase and hydrogen peroxide. Journal of
de Doutorado e pelo financiamento da Biotechnology, n. 73, p. 71 – 74, 1999.
pesquisa pelo projeto no. 475375/2001
KYRIACOU, A. et al. Combined bioremediation
do Edital Universal. À Profa. Dra. Ana and advanced oxidation of green table olive
Paula Paim, da UFPE, e à Maria Ân- processing watewater. Process Biochemistry, n. 40,
gela Talarico e à Elisabete Moraes, do p. 1404 – 1408, 2005.
Laboratório de Processos Biológicos, do LUKE, A. K., BURTON, S. G. A novel
Departamento de Hidráulica e Sanea- application for Neurospora crassa: progress from
mento da Escola de Engenharia de São batch culture to a membrane bioreactor for the
Carlos, pelo apoio técnico e científico. bioremediation of phenols. Enzyme and Microbial
Technology, n. 29, p. 348 – 356, 2001.
À Profa. Dra. Iracema Crusius, do Insti-
tuto de Botânica de São Paulo, à Profa. MARTINELLI, F. R., SILVA, E. L. Estudo de
biofilme em partículas suporte para reator anaeróbio
Dra. Regina Monteiro pela imprescin- de leito fluidificado na degradação de fenol. In: II
dível ajuda na elucidação de aspectos SEMINÁRIO DO PROJETO TEMÁTICO, São
sobre a fisiologia do Aspergillus niger. À Carlos, SP: SHS, p. 194 – 201, Julho, 2003.
Iolanda Duarte e à Luisa Oliveira, pela METCALF, E. Wastewater engineering: treatment,
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Graw-Hill. 1334p, 1991.

Eng. sanit. ambient. 228 Vol.12 - Nº 2 - abr/jun 2007, 222-228

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