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Faculdade de Zootecnia, Veterinária e Agronomia – PUCRS

Curso de Medicina Veterinária


Cirurgia Veterinária I

4) DIÉRESE CIRÚRGICA DOS TECIDOS

Entende-se por diérese o conjunto de manobras, manuais e instrumentais, que visa a


separação dos tecidos para fins terapêuticos.

DIÉRESE DA PELE

Deve-se considerar a pele como um órgão, pois desempenha funções altamente


especializadas, como defesa orgânica, manutenção da pressão sanguínea (vasodilatação e
vasoconstrição), distribuição dos receptores dolorosos e sensitivos, além de servir de
“membrana” que proporciona a individualidade de cada ser.

# INSTRUMENTAL:
A separação da pele pode ser feita com bisturi, tesoura, bisturi e tesoura ou com
bisturi elétrico. Recentemente, pode-se também optar pela utilização do raio laser. O
cirurgião competente esforça-se em minimizar as lesões que ele próprio possa determinar
no paciente. Todo veterinário deverá adquirir conhecimento e capacidade de usar o
instrumento adequado no momento apropriado, com o mínimo de trauma ao paciente.

# TÉCNICA:

Pode desenvolver-se a partir de vários momentos:

a) Traçado da incisão: deve ser marcada através de:


• leve escarificação com a ponta do bisturi;
• auxílio da caneta cirúrgica ou com o uso de corante (azul de metileno);
• agulhas hipodérmicas.

b) Secção da pele: o cirurgião destro deve fixar e espichar a pele com a mão esquerda e
segurar o bisturi com a mão direita. O canhoto deve fazer o oposto. O sentido da
incisão deve ser da esquerda para a direita e o cirurgião deve estar com a cabeça do
paciente localizada no seu lado esquerdo. Quando no sentido vertical, a incisão deve
ser de cima para baixo (grandes animais).

c) Tipos de secção de pele:

• magistral: faz-se com um só movimento, sem levantar o bisturi. Deve-se mover


o pulso ao mesmo tempo que o braço é tracionado;
• magistral breve: incisão rápida, é feita somente com o movimento do pulso;
• serrilhada: quando o bisturi não apresenta-se muito afiado e os movimentos
serão como os de uma serra para atravessar a pele;
• punção: pequena incisão, introduzindo o bisturi pela ponta;

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• circular: pode ser feita em um ou em dois tempos;


• com tesoura: é feita na ausência do bisturi, ou em caso de recortes em cirurgia
reparadora.

DIÉRESE DO TECIDO SUBCUTÂNEO

Quando o paciente é magro, o tecido subcutâneo é escasso, sendo muitas vezes


seccionado pelo bisturi junto com a pele. Porém se o indivíduo for obeso é necessário
várias secções (em camadas), antes de ser transposta a espessa camada de gordura.

# MÉTODOS DE DIÉRESE SUBCUTÂNEA:

• secção com bisturi: em animal magro é às cegas, isto é, secciona-se junto com a
pele;
• por planos (em camadas): são feitas tantas incisões quantas necessárias para se
atingir a fáscia muscular;
• com tesoura: com o auxílio de pinças, eleva-se o tecido subcutâneo e promove-se a
secção do mesmo.

DIERÉSE DA APONEUROSE

Geralmente a linha de secção da aponeurose superficial é a mesma da incisão


cutânea. Na síntese, é a aponeurose que fornece o suporte necessário para uma sutura
muscular segura.

# EXPOSIÇÃO DA APONEUROSE: antes de ser incidida, a aponeurose pode ser


preparada ou limpa do tecido subcutâneo ou gorduroso, por meio de movimentos laterais
com a lâmina de bisturi.

# SECÇÃO DA APONEUROSE: podem ser adotados vários tipos de secções:

• com bisturi;
• com tesoura: é feita mediante prévio orifício, feito com bisturi ou tesoura;
• sobre tentacânula: é feita com o bisturi direcionado pela tentacânula (seccionar
somente a fáscia).

DIÉRESE MUSCULAR

Os músculos são estruturas importantes, pois através deles é que temos acesso às
estruturas mais profundas, como ocorre na maioria das intervenções. Os músculos
lesionados sofrem uma reação cicatricial que limita seu funcionamento em maior ou menor
grau.

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# INSTRUMENTAL: para diérese aguda usa-se o bisturi e para a romba usa-se a tesoura ou
os dedos.

# TÉCNICA DA DIÉRESE MUSCULAR:

• simples: quando todos os planos são incididos na mesma direção da incisão da pele.
Ex: cesariana de flanco em bovinos;
• complexa: quando os planos musculares são atravessados no sentido de suas fibras,
sem levar em conta a direção da incisão da pele. Ex: cesariana na égua.

# TIPOS DE DIÉRESE MUSCULAR:

• Secção magistral: sempre com o bisturi, pode utilizar-se o auxílio de duas pinças
musculares para a tração dos músculos;
• secção com tesoura: de forma aguda ou romba;
• secção com os dedos: rasga-se o tecido no sentido das fibras.

SUGESTÃO DE LEITURA:

LAZZERI, L. Fases fundamentais da técnica cirúrgica. São Paulo:Varela, 1977. 190 p.

5) TÓPICOS ESPECIAIS

5.1) HEMORRAGIA E HEMOSTASIA NA CIRURGIA

HEMORRAGIA:

Hemorragia é a fuga ou o extravasamento de sangue dos vasos, quer por diapedese


através das paredes intactas, quer por fluxo através das paredes lesadas. Sua gravidade vai
depender da quantidade de sangue perdido e do estado geral do paciente.

# CLASSIFICAÇÃO:

• hemorragia arterial: jato de sangue oscilante, que aumenta durante a sístole e


diminui na diástole. O sangue arterial é vermelho claro;

• hemorragia venosa: o sangue sai de maneira contínua enchendo aos poucos e


formando poças. Este sangue é de coloração mais escura;

• hemorragia capilar: é a típica hemorragia que ocorre em capa, na qual a ferida


cobre-se lentamente de sangue, proveniente de inúmeros pontos microscópicos;

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• hemorragia mista: é a combinação das três anteriores.

# TRAUMA DOS VASOS:

• feridas arteriais: podem ser totais ou parciais. Na total observa-se uma retração dos
vasos seccionados e uma hemorragia em forma de jatos oscilantes. Após alguns
minutos observa-se um espasmo reflexo e, como conseqüência, temos uma
diminuição ou mesmo uma parada total da hemorragia. Este espasmo reflexo é mais
observado nos pequenos vasos do que nos grandes vasos, que ocorre, mas não é tão
acentuado. Nas feridas parciais observa-se a hemorragia, existe o espasmo reflexo,
mas não há a retração do segmento, e a hemorragia é mais persistente;

• feridas venosas: o espasmo reflexo não é tão intenso devido à escassez de fibras
musculares, mas, em compensação, são facilmente colabáveis e com um
tamponamento se consegue deter a hemorragia;

• secção de capilares: a hemorragia é combatida através do tamponamento;

• contusão de vasos: verifica-se que a parte externa dos vasos não apresenta lesão,
porém a camada íntima (interna) está lesionada, facilitando a trombose e
complicando o pós-operatório.

# CONSEQUÊNCIAS DA LIGADURA DE GRANDES VASOS:

• artérias: a ligadura de artérias pode ocasionar gangrena e levar a uma amputação;


• veias: a ligadura de veias pode originar congestão e edema gigante (anasarca) em
uma determinada região.

# CONSEQUÊNCIAS DAS HEMORRAGIAS:

• ameaça a vida (hipovolemia) e dificulta a pronta recuperação do paciente;


• impede a visualização das estruturas;
• deixa coágulos que favorecem a infecção e a fibrose.

# EXTRAÇÃO DO SANGUE DERRAMADO:

Tem por finalidade evitar a dificuldade de visão no trans-operatório e impedir que os


coágulos permaneçam como corpos estranhos no pós-operatório. Pode ser realizada por
dois métodos:
• secagem: onde utiliza-se a compressa cirúrgica, gaze ou algodão. Não é o melhor
método, pois podem irritar os tecidos pela fricção e deixar resquícios de suas fibras
no ferimento cirúrgico;

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• por aspiração: feita através do aspirador cirúrgico. É o melhor método, não irrita os
tecidos e remove com maior eficiência o sangue entre as vísceras.

HEMOSTASIA

É o conjunto de medidas destinadas a prevenir ou a coibir as hemorragias.

# MÉTODOS:

• Hemostasia temporária: diminui ou suprime a corrente sangüínea por um período


transitório durante o ato cirúrgico ou durante um só tempo operatório.

a) torniquete: usado na amputação de membros, amputação de cauda


e amputação de útero ou pênis. Antes de colocar o torniquete
deve-se efetuar a deplessão sanguínea do membro, esta deplessão
sanguínea esta contra-indicada nos casos de gangrena ou tumores;

b) posição anti-hemorrágica: consiste em elevarmos a região que


vamos operar acima do nível do coração. Este procedimento
diminui o fluxo sanguíneo;

c) vasoconstritores locais: são fármacos utilizados para promover a


vasoconstrição de vasos periféricos. Ex: adrenalina;

d) distensão dos tecidos: a hemorragia capilar do tecido subcutâneo


diminui ao se distender às bordas da ferida;

e) tamponamento compressivo momentâneo: feito com gaze ou com


compressa cirúrgica durante 5 minutos. Ex: conchectomia;

f) compressão digital momentânea: feita com os dedos em casos de


emergência;

g) ligadura e pinçamento transitório: geralmente feita em grandes


vasos para a obstrução temporária do fluxo sanguíneo. Ex:
compressão com pinças atraumáticas, fitas ou fios.

• Hemostasia definitiva: oclui permanentemente a luz dos vasos.

a) substâncias coagulantes de aplicação local:

a.1) nitrato de Prata: substância utilizada em mucosas, produzindo


cauterização química;

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a.2) água oxigenada: destrói os eritrócitos e plaquetas, produzindo


grande quantidade de fibrinogênio para a coagulação;

a.3) trombina tópica: colocada na ferida combina-se com o fibrinogênio


do sangue acelerando a coagulação. Ex: gelatina absorvível (Gelfoam);

b) coagulação térmica: é a chamada cauterização. Ex: bisturi


elétrico e ferro aquecido;

c) coagulação elétrica: feita com bisturi elétrico;

d) pinçamento ou forcitorção dos vasos: realizado através de pinças


hemostáticas;

e) ligadura: consiste em obstruir o vaso com uma laçada;

f) ligadura por transfixação e suturas hemostáticas: ex: sutura em


massa e sutura em colchoeiro.

5.2) BASES ELETRO E CRIOCIRÚRGICAS EM VETERINÁRIA

ELETROCIRURGIA

É quando são utilizadas correntes eletrocirúrgicas para incisar tecidos ou coagular


pequenos vasos.

# BISTURI ELÉTRICO:

Contém uma unidade de potência, um cabo de força, eletrodos, uma placa terra e um
pedal de acionamento.
A placa terra deve em contato com uma grande área de superfície por meio de
pastas condutoras ou compressas encharcadas. Se o retorno da corrente for inadequado
devido a uma pequena área de contato, poderão ocorrer queimaduras com destruição
tissular em nível dos tecidos que estão em contato com a placa terra.

# INDICAÇÕES:

• secção da pele e fáscias;


• secção muscular (manter uma alta freqüência para evitar a contração muscular);
• coagulação de pequenos vasos (com diâmetro menor que 1mm);
• ponta de fogo.

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CRIOCIRURGIA

É um método cirúrgico praticado com o auxílio de instrumentos especiais para o


congelamento local dos tecidos anormais, sem atingir as estruturas saudáveis adjacentes. A
criocirurgia é freqüentemente utilizada para a destruição de neoplasias.

# INDICAÇÕES:

• tumores;
• remoção do cristalino;
• furunculose anal;
• fístula perianal.

# VANTAGENS:

• propriedades analgésicas;
• indicada para animais velhos;
• evita metástases tumorais;
• estimula a resposta imunológica do organismo.

# DESVANTAGEM:

• custo alto do equipamento.

# PRINCIPAIS FLUIDOS CRIOCIRÚRGICOS:

• dióxido de carbono (-78,50C);


• óxido nitroso (-89,50C);
• nitrogênio liquido (-195,80C).

# MÉTODOS DE APLICAÇÃO:

Por meio de:


• ponteiras;
• cotonetes;
• derramamento;
• disco de cobre;
• spray.

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# MÉTODOS DE PROTEÇÃO DOS TECIDOS VIZINHOS:

Por meio de:


• vaselina pasta;
• plásticos.

# TÉCNICAS DE CONGELAMENTO:

• rápido congelamento e degelo lento;


• congelamento duplo.

# PRECAUÇÕES:

• deve atingir 5mm além da borda suspeita do tumor.

# COMPLICAÇÕES MAIS COMUNS:

• recidivas dos tumores.

# TEMPERATURA MÉDIA PARA LESAR A MAIOR PARTE DOS TECIDOS:

• -20 a –40ºC.

# Sugestão de leitura para a prova prática:

KNECHT, C.D., ALLEN, A.R., WILLIAMS, D.J., JOHNSON, J.H. Técnicas


fundamentais em cirurgia veterinária. São Paulo: Roca, 1985. cap. 3: Padrões de sutura, p.
54-71.

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