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http://www.fafich.ufmg.br/~psicopol/seer/ojs/viewarticle.php?id=46
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ARTIGO
ABSTRACT: The objective of this article is to tension the relation between life
and politics, rescuing basic points of the analyses of Michel Foucault about the
question of the life and the pretension of the contemporary power in capturing it.
Moreover, it tries to point to one other politic, itself vital, with the aid of the
considerations on the micro politics of Gilles Deleuze and Félix Guattari. It is
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intended, thus, to bring elements that contribute to the discussion on life and
politics in the field of social psychology contemporary.
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Nesta direção, Foucault teoriza sobre as condições através das quais a vida
veio a ser capturada por essa dimensão política, relacionando-as com uma
tecnologia específica de poder que tem como foco principal a vida, tecnologia
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Até final do século XVII, início do XVIII, imperou uma forma de poder no qual o
soberano detinha como grande privilégio o direito de vida e de morte, podendo
matar ou expor seus súditos à morte nas situações em que sua própria defesa
estivesse ameaçada. Trata-se de um poder que só é exercido sobre a vida dos
subordinados enquanto o soberano é capaz de matá-los. É um poder que se
manifesta como subtração, pois está relacionado a um direito de captação e de
apropriação da vida dos súditos para extingui-la ou arriscá-la em guerras. Fala-
se, então, de um poder negativo sobre a vida, aquele denominado “poder de
fazer morrer ou deixar viver” (Foucault, 1999:287).
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por ele, foi chamado de “poder de fazer viver e deixar morrer” (Foucault,
1999:294).
Assim, numa primeira face deste poder sobre a vida, seus mecanismos
passam a se direcionar aos corpos dos homens, ao corpo individual. Centrados
no corpo-máquina, surgem os procedimentos disciplinares de poder (Foucault,
1999:288), destinados ao adestramento, classificação, vigilância e treinamento
dos corpos, com o propósito mesmo de ampliar sua docilidade, suas aptidões,
sua força e utilidade. A multiplicidade dos corpos deveria ser educada e
controlada, utilizada e canalizada para os fins determinados pelo capitalismo.
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Aqui temos uma primeira aproximação desta relação entre vida e política com o
campo da Psicologia que será estruturado a partir do final do século XIX: foi
justamente esta “fabricação de indivíduos” que possibilitou a objetivação desse
elemento individual do qual a Psicologia moderna vai se ocupar. No caso da
Psicologia Social é interessante observar que esta objetivação ocupou-se
inicialmente do estudo das multidões (Le Bon, 1895/1963) que passavam a ser
entendidas como um mero agrupamento de indivíduos que deveria ser
adestrado conforme as regras do poder vigente. É em função disto que as
Ciências Humanas – e no caso específico a Psicologia – tiveram seus
primeiros desenvolvimentos associados ao problema da adaptação social dos
indivíduos frente aos ditames do poder capitalista. Daí o caráter normativo dos
primeiros desenvolvimentos da Psicologia em direção ao social. Podemos dizer
que a adaptação social constituía a própria estrutura da sociedade disciplinar
que, por este motivo, também pode ser chamada de sociedade de
normalização ou de regulamentação (Foucault, 1999:294). É, portanto, neste
conjunto de práticas disciplinares que encontraremos as condições necessárias
para o advento da própria Psicologia moderna.
O apogeu deste poder disciplinar seria a sua expansão para além das
instituições de confinamento e marcaria já um outro tipo de sociedade, as
Sociedades de Controle, tal como foi denominada por Deleuze: São as
sociedades de controle que estão substituindo as sociedades disciplinares (...)
formas ultra-rápidas de controle ao ar livre, que substituem as antigas
disciplinas que operavam na duração de um sistema fechado (Deleuze,
1992:220).
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Por meio deste apanhado teórico das análises foucaultianas, vimos que o
surgimento das técnicas disciplinares e reguladoras colocou em exercício um
novo diagrama de poder que passa a intervir na própria vida. Assim, é com as
estratégias de um biopoder – a partir do século XVII em suas duas facetas
complementares – que a vida marca sua entrada na história. Trata-se do
momento em que o problema da vida começa a problematizar-se no campo do
pensamento político, da análise do poder político (Foucault, 1999:288).
Com isto, quer-se realçar que neste momento, pela primeira vez, a vida se fez
presente como possível campo de intervenção e de controle do poder e das
técnicas políticas. Trata-se da entrada dos fenômenos próprios à vida da
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O que quer dizer Foucault com a vida escapa continuamente? Sem dúvida algo
fundamental no debate das políticas de vida em nosso presente. Além disso,
chegamos aqui num importante nódulo conceitual que une Foucault e Deleuze:
este escapar da vida. É o que passaremos a considerar adiante em nossa
discussão.
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Ainda nesta direção, Deleuze afirmou que a definição de vida está ligada à
diferença e à multiplicidade (Deleuze, 2002). A vida, enquanto um fluir de
intensidades que se desdobram em sempre novas intensidades, é potência que
quer sempre abraçar cada vez mais potência. Isto significa que a vida é pura
potencialidade, eterna força produtiva, capacidade criadora, força em contínua
re-invenção.
Uma vida..., como traz Deleuze em seu último escrito (Deleuze, 2002), é devir,
diferenças livres, contradições em convivência. Uma vida é o habitat de forças
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Deleuze coloca lado a lado essas linhas de fuga da vida com as linhas de
resistência (Deleuze, 1996). Disto, podemos dizer que o que une vida e
resistência é a potencialidade, a multiplicidade, o devir sempre inventivo. Dessa
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constante captura da potência vital, ou antes, que passe por longe deste ofício
próprio das chamadas biopolíticas.
Dizem Deleuze e Guattari (1996:90) que tudo é política, seja macro, seja micro,
mas trata-se sempre de uma questão política. Insistem, no mesmo texto, que
numa sociedade, os fluxos e as linhas de fuga têm sempre primazia, as
reterritorializações, como operações próprias do poder, estão sempre em suas
pegadas, tentando estancar as vertentes desta matéria da vida, dos devires e
das singularidades advindas do caos.
Por outro lado, existe uma outra política, bastante sensível àquelas palpitações,
é a política dos fluxos e das intensidades, a micropolítica. Esta política,
enquanto variação e diferenciação contínua, uma vez que está atrelada aos
movimentos imanentes das singularidades e da própria potencialidade. Toda
problemática micropolítica consistiria exatamente em tentar agenciar os
processos de singularidade no próprio nível de onde eles emergem. E isso para
frustrar sua recuperação pela produção de subjetividade capitalística (Guattari
& Rolnik, 2000:130). Trata-se, portanto, de um processo de liberação de
intensidades e potencialidades que, ao operar sempre novas criações e
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Entendemos que essa política que é assinalada por eles não deixa de lado
qualquer dos pólos que apontamos acima, nem o dos fluxos, nem e o das
sedimentações, por ser também uma cartografia, isto é, por se ocupar em
analisar, num fenômeno, onde e como ambos estão sendo engendrados. No
entanto, nessa análise, uma preocupação é crucial: aquela que diz respeito à
vida. Isto justifica o fato de haver, sim, certa tendência, pois importa
potencializar as linhas de fuga, uma vez que é através delas que a vida pulsa
livremente. Conseqüentemente, importa distanciar-se das organizações e
estratificações, porque, segundo vimos acima, ali a vida está aprisionada,
despotencializada, sem conseguir manifestar diferenciações. Como se pode
ver, ativar um lado é necessário, o micropolítico, já que ali a vida tem mais
liberdade e potência para se diferenciar e criar sempre. No entanto,
ressaltamos que, se é a vida que importa à política, é a vida enquanto aquele
segundo conceito que vimos anteriormente: vida como potência, como
imanência, que não se cansa de inventar novos modos de existência e não,
obviamente, aquela vida nua, tomada como sobrevivência e mero fato
biológico. Podemos ver, com isso, a nova imbricação entre a política e a vida:
esta agora se mostra como aquilo a que a política deve priorizar e
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Trata-se, deste modo, de fazer dessa invenção permanente uma política que
seja também ética. Assim, se a vida é potência de metamorfose e se nossas
políticas conhecidas por biopolíticas vêm sempre tentando estancar a
potencialidade dessa vida, então se trata de fazer disso mesmo uma política
para que, com a força que ela tem de criar novas formas, faça com que
possamos resistir à submissão a modelos transcendentes de vida.
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Enfim, o que vale é abrir caminhos para a vida se manifestar livremente, pois
assim temos o suporte no qual se apóia a invenção de formas de uma
sociedade nova.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BADIOU. A. (2000). A vida como nome do ser (Paulo Nunes, Trad.). In:
ALLIEZ, E. (org.). Gilles Deleuze: uma vida filosófica. (pp. 159-167). São Paulo:
Ed. 34.
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CONTATO
e-mail: marcelepr@hotmail.com
e-mail: rosane.neves@ufrgs.br
Recebido em 24/04/2007
Aprovado em 05/07/2007
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