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MANUAL

MERCK
DE
VETERINÁRIA
7ª Edição

Primeira Edição 1955


Segunda Edição 1961
Terceira Edição 1967
Quarta Edição 1973
Quinta Edição 1979
Sexta Edição 1986
Sétima Edição 1991
O Manual Merck de Veterinária
é dedicado aos médicos veterinários
e a seus colegas e associados nas
Ciências dos Animais.
MANUAL
MERCK
DE
VETERINÁRIA
UM MANUAL DE DIAGNÓSTICO, TRATAMENTO,
PREVENÇÃO E CONTROLE DE DOENÇAS
PARA O VETERINÁRIO

7ª Edição

Clarence M. Fraser, B. S. A., D. V. M., M. V. SC., Editor


Jan A. Bergeron, V. M. D., Editor associado
Asa Mays, D. V. M., M. M . S., DIP. A. C. L. A. M., Editor associado
Susan E. Aiello, B. S., D. V. M ., Editor assistente

CONSELHO EDITORIAL
Harold E. Amstutz, B. S., D. V. M., DIP. A. C. V. I. M.
James Armour, CBE, PH. D., DR. (H. C.), M. R. C. V. S., F. R. S. E.
Douglas C. Blood, O. B. E., B. V. SC., HON. D. V. SC., F. A. C. V. SC., HON.
L . L. D., HON. ASSOC. R. C. V. S.
Cheryl L. Chrisman, D. V. M., M. S.
Franklin M. Loew, B. S., D. V. M., PH. D., DIP. A. C. L. A. M.
Glenn H. Snoeyenbos, D. V. M .

ROCA
Traduzido do Original
The Merck Veterinary Manual – Seventh Edition

Copyright © 1991, of Seventh Edition by Merck & Co, Inc.


ISBN: 911910-55-7

Copyright  1997 da 2ª Edição pela Editora Roca Ltda.


ISBN: 85-7241-185-2

Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida, guardada pelo


sistema “retrieval” ou transmitida de qualquer modo ou por qualquer outro
meio, seja este eletrônico, mecânico, de fotocópia, de gravação, ou outros,
sem prévia autorização escrita da Editora.

Tradução e Revisão Científica


Dr. Cristiano R. M. von Simson
Dra. Lúcia H. Maria Franco
Dr. Paulo Marcos Agria de Oliveira
Dr. Paulo Penteado Júnior

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Manual Merck de Veterinária : um manual de diagnóstico, trata-


mento, prevenção e controle de doenças para o veterinário /
Clarence M. Fraser, editor. -- 7. ed. -- São Paulo : Roca, 1996.

Título original: The Merck Veterinary Manual.

1. Medicamentos veterinários 2. Medicina veterinária 3. Medicina


veterinária – Diagnóstico I. Merck Sharp & Dohme. II. Fraser,
Clarence M.

CDD–636.089
96-3646 NLM–SF 745

Índices para catálogo sistemático:


1. Medicina veterinária 636.089
2. Veterinária 636.089

1997

Todos os direitos para a língua portuguesa são reservados pela

EDITORA ROCA LTDA.


Rua Dr. Cesário Mota Jr., 73
CEP 01221-020 – São Paulo – SP
Tel.: (011) 221-8609 – FAX: (011) 220-8653

Impresso no Brasil
Printed in Brazil
PREFÁCIO

O objetivo do MANUAL MERCK DE VETERINÁRIA é fornecer uma fonte de informação


concisa e bem fundamentada para aqueles interessados na saúde e bem-estar dos
animais. Com tantas informações relevantes que existem, ninguém pode se lembrar
de tudo. Já que nem todas estas informações podem ser resumidas num livro de
bolso, esperamos que nossos esforços sejam de grande ajuda para os veterinários
e para os especialistas em Ciência de Animais. A prevenção e controle da doença
são os objetivos primordiais e, obviamente, o diagnóstico e tratamento são compo-
nentes essenciais de controle.
Temos observado, com enorme prazer, que outras pessoas além de veteri-
nários utilizam o MANUAL , e esperamos que eles também achem útil e que seja
benéfico ao bem-estar e saúde do animal. Entretanto, para quaisquer problemas
com a saúde do animal, recomendamos consultar um veterinário, especialmente
antes de iniciar o tratamento.
O MANUAL é dividido em 10 partes. A Parte I, a qual é direcionada às doenças de
animais domésticos comuns, grandes e pequenos, é subdividida em 14 seções (ver
também Índice Geral, pág. VII). Como temos notado em edições anteriores, é impos-
sível categorizar as doenças da maneira que elas prendam a atenção de todos os
leitores, porém esperamos que a classificação seja um auxílio, particularmente para
aqueles com problemas diagnósticos. Recomendamos ler o Guia para os Leitores
(pág. VIII), bem como este Prefácio; estes facilitarão mais a utilização do MANUAL.
Uma outra tentativa em prestar ajuda no diagnóstico e na compreensão total do
controle da doença é o capítulo introdutório da maioria das seções. Estas introdu-
ções são revisões breves das funções dos sistemas orgânicos e das conseqüências
das lesões dessas funções.
Se o leitor souber o nome do assunto específico no qual a informação é solicitada,
o primeiro passo é olhar o Índice Remissivo. Este contém páginas de entrada em
negrito para principais discussões, e o tipo padrão para discussões específicas,
porém menos completas em qualquer lugar do livro. Se, entretanto, a ajuda é
solicitada num problema diagnóstico, a lista de assuntos nas páginas de abertura de
cada seção pode ser mais útil que o Índice Remissivo, particularmente se um
sistema orgânico for, obviamente, mais envolvido que outros. (Aquelas doenças que
comumente causam distúrbios em mais de um sistema são discutidas em Afecções
Generalizadas.)
A maior parte do conteúdo do MANUAL foi extensivamente revisada; muitas coisas
são “novas”. Há, com certeza, capítulos que lembram a(s) edição(ões) anterior(es),
mas não tanto nesta época de conhecimento rapidamente em expansão.
É difícil reconhecer adequadamente a direção do conselho editorial e as
contribuições feitas por 501 pessoas (listadas nas páginas XV-XXXVII) que foram
tão boas em dividir suas habilidades; seria impossível montar o livro sem tal ajuda.
Além disso, é um prazer agradecer as contribuições de Viveca Stamper, Fredicia
Westbrook, Pamela J. Barnes e Gary Zelko (Relações Públicas).
Como todos os leitores sabem, é muito difícil manter a cada edição o estilo de
nosso MANUAL. Um meio de reduzir o número de páginas é nosso uso extensivo de
Prefácio VI

abreviações. Ver página IX para lista daquelas usadas ao longo do texto. Em alguns
capítulos, abreviações adicionais são usadas; estas são inseridas logo após a(s)
palavra(s) a que se refere(m).
Tem sido despendido grande esforço para se atingir a precisão, particularmente
na nomenclatura científica e nas recomendações terapêuticas. Os microrganismos
ou as drogas que poderiam ser conhecidos por outros nomes por alguns leitores são
identificados por estes nomes entre parênteses após os termos mais aceitos ou mais
novos. As recomendações referentes ao uso das drogas são as de vários contri-
buintes: a citação de um remédio específico não constitui uma garantia expressa ou
implícita, nem implica o endosso de qualquer produto em relação a outros pela
Merck & CO., Inc.
Foram feitos todos os esforços para selecionar as drogas ou as preparações
representativas, mas isto não deve ser interpretado como restritivo, de algum modo,
para o julgamento clínico do veterinário na escolha de produtos correlatos ou na
substituição por outros remédios efetivos. Foi dedicada uma atenção especial às
quantidades e doses dos vários agentes citados, mas a experiência pessoal, as
modificações nas formações dos fabricantes ou circunstâncias incomuns podem
tornar desejável ou necessário não seguir estas recomendações. Os Editores não
podem dar nenhuma garantia em relação a estas recomendações. Em todos os
casos, as instruções da bula devem ser consultadas.
A relação veterinário-cliente-paciente é importante em todos os casos, mas
especialmente se as drogas tiverem de ser usadas em dosagens ou em doenças
não citadas na bula. A maioria das drogas está sujeita, atualmente, à regulamentação
governamental. Um objetivo específico destas regulamentações é a proteção da
Saúde Pública, garantindo que é seguro consumir quaisquer produtos comestíveis
dos animais tratados. Isto requer a definição dos momentos específicos para se
interromper a medicação e outras advertências e recomendações que governam o
uso de certos compostos. Algumas drogas não podem ser usadas para tratar
animais que estão produzindo leite ou carne para o consumo humano. Como o
estado regulador de qualquer droga específica está sujeito a mudanças a qualquer
momento e tende variar de país para país, o veterinário deve informar-se detalha-
damente das condições em que estes agentes devem ser usados e das cautelas
recomendadas durante o seu uso.

C.M. FRASER, Editor


Merck Sharp & Dohme Research Laboratories
Rahway, New Jersey, USA
ÍNDICE GERAL

Código Seção Página


PARTE I
SLC Sistema Sangüíneo, Linfático e Cardiovascular.. ................. . 1
DIG Sistema Digestivo .................................................................. 105
END Sistema Endócrino ................................................................ 307
OO Olho e Ouvido ....................................................................... 351
GEN Afecções Generalizadas ....................................................... 379
IM Sistema Imune ....................................................................... 509
MET Distúrbios Metabólicos .......................................................... 531
MUS Sistema Musculoesquelético ................................................. 555
NER Sistema Nervoso ................................................................... 681
FIS Influências Físicas ................................................................. 759
REP Sistema Reprodutivo ............................................................. 773
RES Sistema Respiratório ............................................................. 853
PEL Pele ....................................................................................... 933
URN Sistema Urinário .................................................................... 1053

PARTE II
COM Comportamento ..................................................................... 1085

PARTE III
VPC Valores e Procedimentos Clínicos ........................................ 1131

PARTE IV
ASL Animais Silvestres e de Laboratório ...................................... 1181

PARTE V
MCN Manejo, Criação e Nutrição ................................................... 1317

PARTE VI
FAR Farmacologia ......................................................................... 1565

PARTE VII
AVE Doença Aviárias .................................................................... 1867

PARTE VIII
TOX Toxicologia ............................................................................ 1979

PARTE IX
ZOO Zoonoses ............................................................................... 2109

PARTE X
IND Índice Remissivo ................................................................... 2119
GUIA PARA OS LEITORES

1. O Índice Geral (pág. VII) mostra o título de cada seção do MANUAL e suas
respectivas abreviações.
2. Cada seção inicia-se com seu próprio índice, lista de capítulos e subcapítulos.
3. Na maioria das vezes, o primeiro relato que segue o título do capítulo é uma
definição resumida da condição a ser discutida.
4. Muitas abreviações e símbolos são empregados literalmente para poupar
espaço. (Ver também o Prefácio.)
5. Devido à dificuldade em listar todas as marcas registradas de drogas, em
muitas ocasiões são usados nomes genéricos ou não registrados. Quando
usadas, as marcas registradas são escritas em letras maiúsculas, e em
ocasiões onde isto não se sobressai (por exemplo, no início de uma oração),
são usados entre aspas.
6. Cada cabeço da página à esquerda (páginas de números pares) indica o
título do primeiro capítulo discutido naquela página. Cada cabeço da página
à direita (páginas de números ímpares) indica o título do último capítulo
discutido naquela página.
7. As tabelas resumem dados importantes que aparecem no livro. Uma lista
destas tabelas aparece nas páginas X a XIV.
8. Para se localizar uma discussão específica de uma determinada doença, ou
síndrome, da qual o nome é conhecido, deve-se consultar o Índice Remissivo.
O MANUAL está baseado nos sistemas anatômicos e as condições específicas
são localizadas no sistema que é afetado primariamente. Condições que podem
afetar sistemas diferentes ou mais do que um são discutidas em Afecções Genera-
lizadas (GEN). Entretanto, o Índice Remissivo dá a página específica.
Se você se confrontar com uma síndrome, a disposição das condições nos
sistemas (ver Índice Geral) ajudará a encontrar a discussão, mas se o nome da
condição é conhecido, o Índice Remissivo promoverá um acesso mais fácil à
discussão apropriada, bem como as discussões de outros tópicos, no qual é
mencionado o assunto de principal interesse.
ABREVIAÇÕES E SÍMBOLOS
(Ver também GUIAS PARA REFERÊNCIAS RÁPIDAS, pág. 1175 para unidades do SI.)

ALT Alanina aminotransferase kg Quilograma


(SGPT) L Litro
AST Aspartato aminotransferase lb Libra
(SGOT) LCE Líquido cerebroespinhal
ATP Trifosfato de adenosina m Metro
bpm Batimento por minuto M Molar
BUN Nitrogênio uréico do sangue Mcal Megacaloria
C Celsius (centígrado) mEq Miliequivalente
Ca Cálcio mg Miligrama
cal Caloria min Minuto
CHCM Concentração hemoglobínica mL Mililitro
corpuscular média mm Milímetro
cm centímetro mOsm Miliosmol
CO Monóxido de carbono N Nitrogênio
CO2 Dióxido de carbono
Na Sódio
dL Decilitro
ng Nanograma
DNA Ácido desoxirribonucleico
nm Nanômetro
ECG Eletrocardiograma
P Fósforo
EM Energia metabolizável
pg Picograma
EV Endovenoso
F Fahrenheit pH Concentração do íon
g Grama hidrogênio
GI Gastrointestinal ppm Parte(s) por milhão
G6PD Glicose-6-fosfato-desidroge- Pq An Pequenos animais
nase RNA Ácido ribonucleico
Gr An Grande animal s Segundo
h Hora s.c. Subcutâneo
Hb Hemoglobina SI Sistema internacional de
H/E Hematoxilina e eosina medidas
HCM Hemoglobina corpuscular SNC Sistema nervoso central
média sp/spp espécie(s)
Ht Hematócrito U Unidade
Ig Imunoglobulina (com Classe UI Unidade internacional
A, D, E, G ou M) VCM Volume corpuscular médio
IM Intramuscular VHS Velocidade de hemossedi-
IP Intraperitoneal mentação
kcal Quilocaloria VO Via oral
° Grau % Porcentagem
α Alfa = Igual
β Beta < Menor
γ Gama ≤ Menor ou igual
µ Micro (10–6) > Maior
µg Micrograma ≥ Maior ou igual
µL Microlitro , Aproximadamente
/ Por ± Mais ou menos
TABELAS

Título Página
SLC
Classificação das cardiopatias .................................................................... 12
Sinais das cardiopatias ............................................................................... 12
Arritmias e antiarrítmicos ............................................................................ 15
Classificação das anemias ......................................................................... 18
Valores normais dos eritrócitos: algumas séries normais ........................... 20
Principais grupos sangüíneos de interesse clínico ..................................... 35
Diferenciação das microfilárias da Dirofilaria immitis e de
Dipetalonema reconditum ...................................................................... 89
Tripanossomos animais mais importantes transmitidos por
moscas tsé-tsé ....................................................................................... 96
Drogas comumente utilizadas no tratamento das tripanossomíases
em animais domésticos .......................................................................... 98

DIG
Diferenciação entre diarréias do intestino delgado e intestino grosso ........ 113
Fórmulas dentárias ..................................................................................... 135
Erupção dos dentes .................................................................................... 136
Problemas que resultam em malabsorção ................................................. 170
Tratamentos para doenças selecionadas de malabsorção ........................ 175
Distribuição etária das doenças diarréicas dos suínos ............................... 229
Cestóideos de cães e gatos da América do Norte ...................................... 292
Cestóideos de importância em Saúde Pública ........................................... 296

END
Exemplos de hiperfunção primária das glândulas endócrinas .................... 310

NER
Sinais clínicos associados com várias síndromes nervosas periféricas,
cerebrais e da medula espinhal ............................................................. 741

REP
Períodos de gestação ................................................................................. 776
Períodos de incubação ............................................................................... 776
Características do ciclo reprodutivo ............................................................ 777

URN
Dieta caseira para controle e prevenção da síndrome urológica felina ...... 1078

COM
Características de homeostasia comportamental relacionadas à
manutenção ........................................................................................... 1088
Tabelas XI

Título Página

Coito (Gr An) ............................................................................................... 1107


Anomalias do comportamento reativo ........................................................ 1110
Anomalias do comportamento ingestivo localizadas na boca .................... 1111
Anomalias do comportamento ingestivo ..................................................... 1112
Anomalias do comportamento reprodutivo ................................................. 1113
Anomalias do comportamento agonístico ................................................... 1114

VPC
Instruções para envio de amostras para exame toxicológico ..................... 1133
Exame de sangue periférico para patógenos microscópicos ..................... 1150
Temperatura corporal basal de várias espécies, em relação ao peso ....... 1169
Temperaturas retais .................................................................................... 1170
Freqüências cardíacas ................................................................................ 1170
Freqüências respiratórias em repouso ....................................................... 1170
Volume urinário ........................................................................................... 1170
Índices de referência hematológica ............................................................ 1171
Valores de leucócitos .................................................................................. 1172
Constituintes bioquímicos do soro .............................................................. 1173
Pesos atômicos (aproximados) de alguns elementos comuns ................... 1175
Equivalentes em Celsius-Fahrenheit .......................................................... 1175
Fatores de conversão SI para bioquímica clínica ....................................... 1176
Medidas lineares comparativas .................................................................. 1176
Medidas caseiras (aproximadas) ................................................................ 1177
Equivalentes métricos e farmacêuticos ...................................................... 1177
Prefixos e símbolos do sistema métrico ..................................................... 1177
Pesos e medidas do sistema métrico ......................................................... 1177
Conversões miliequivalente-miligrama ....................................................... 1178
Unidades básicas do sistema métrico do SI ............................................... 1178
Equivalentes em peso para aditivos alimentares ........................................ 1178
Fórmulas de conversão .............................................................................. 1179

ASL
Drogas para o uso em aquacultura ............................................................. 1194
Quantidade máxima de sangue recomendada que pode ser coletada
de espécies aviárias comuns ................................................................. 1212
Quantidades iniciais de fluidos EV para administração em bolo em
espécies aviárias comuns ...................................................................... 1212
Antibióticos recomendados para uso em aves ornamentais ...................... 1214
Antifúngicos para uso em aves ornamentais .............................................. 1216
Outras infecções virais de ratos e camundongos ....................................... 1240
Alguns dados fisiológicos dos animais de laboratório ................................ 1248
Terapêutica de primatas não humanos ...................................................... 1253
Vacinações recomendadas para mamíferos exóticos ................................ 1316

MCN
Avaliação da circunferência escrotal de touros .......................................... 1328
Tabelas XII

Título Página

Anormalidades do esperma bovino ............................................................ 1332


Parâmetros para a interpretação dos testes de transferência
passiva das imunoglobulinas colostrais ................................................. 1344
Algumas características físicas e composição do colostro e leite integral . 1348
Programa de controle de doenças recomendado para touros .................... 1371
Programa de imunização para proteção contra doenças pré-parto
do rebanho reprodutivo que podem afetar a produção .......................... 1376
Programa de imunização para proteção contra doenças dos
bezerros neonatos ................................................................................. 1376
Parâmetros de registro do rebanho reprodutivo utilizados para
a detecção de problemas reprodutivos .................................................. 1388
Fatores que afetam a atividade ovariana nos suínos ................................. 1393
Testes de prenhez para suínos .................................................................. 1395
Estimativas das quantidades diárias de ração para gatos .......................... 1410
Exigências mínimas para filhotes em crescimento ..................................... 1411
Exigências nutricionais para bovinos de corte em crescimento e
terminação .............................................................................................. 1430
Exigências nutricionais do rebanho reprodutor do gado de corte ............... 1432
Exigências nutricionais diárias do gado leiteiro em crescimento e dos
touros adultos ......................................................................................... 1436
Exigências nutricionais diárias das vacas prenhes e lactantes .................. 1437
Teores nutricionais recomendados para as dietas de gado leiteiro ............ 1438
Estimativas de não degradabilidade ruminal de proteínas em
ingredientes alimentares comuns .......................................................... 1442
Algumas boas fontes de cálcio e fósforo (conforme fornecido) .................. 1442
Teor estimado de nutrientes de alguns alimentos utilizados para
gado de corte e leiteiro ........................................................................... 1446
Equações para a estimativa da exigência energética de repouso
canina ..................................................................................................... 1458
Equações para a estimativa da exigência energética de manutenção
canina ..................................................................................................... 1458
Conversão da expressão de nutrientes de uma base como foi
oferecido a uma base de matéria seca .................................................. 1459
Limites do perfil dietético para condições fisiológicas
selecionadas em cães ............................................................................ 1463
Limites do perfil dietético para afecções patológicas selecionadas
em cães .................................................................................................. 1466
Dietas aviárias ............................................................................................. 1474
Dietas de mamíferos selecionados ............................................................. 1478
Exigências nutricionais diárias de eqüinos e pôneis em crescimento ........ 1490
Exigências nutricionais diárias de eqüinos e pôneis adultos ...................... 1491
Produção leiteira média das éguas ............................................................. 1491
Exigências energéticas de trabalho, eqüinos ............................................. 1492
Concentrações nutricionais exigidas na dieta para eqüinos e pôneis ........ 1494
Concentrados satisfatórios para utilização com fenos, como indicado
na Tabela 32 .......................................................................................... 1495
Tabelas XIII

Título Página

Exigências nutricionais e energéticas dos visons: porcentagem ou


quantidade por quilograma de matéria seca .......................................... 1507
Exigências nutricionais de suínos alimentados à vontade .......................... 1511
Consumos e exigências nutricionais diárias dos suínos
reprodutores de peso intermediário ....................................................... 1513
Exigências espaciais dos suínos em final de crescimento ......................... 1519
Exigências de proteínas e aminoácidos importantes das galinhas
na forma de porcentagem da dieta ........................................................ 1524
Exigências de proteínas e aminoácidos importantes dos frangos
de corte, como porcentagens da dieta ................................................... 1524
Exigências de proteínas e aminoácidos dos perus, como
porcentagens da dieta ............................................................................ 1525
Exigências nutricionais dos faisões e codornizes como porcentagem
ou como miligramas por quilograma de dieta ........................................ 1526
Exigências de vitaminas, minerais e ácido linoléico das galinhas
leghorn, como porcentagens ou como miligramas ou unidades por
quilograma de dieta ................................................................................ 1528
Exigências de vitaminas, minerais e ácido linoléico dos perus, como
porcentagens ou como miligramas ou unidades por quilograma
de dieta .................................................................................................. 1529
Exigências nutricionais de patos listrados, como porcentagens ou
como miligramas ou unidades por quilograma de dieta ......................... 1530
Exigências nutricionais dos gansos, como porcentagens ou como
miligramas ou unidades por quilograma de dieta .................................. 1530
Programa de vacinação para frangos de corte ........................................... 1531
Programa de vacinação para frangos de corte reprodutores ..................... 1532
Programa de vacinação para poedeiras comerciais ................................... 1533
Programas de vacinação para perus .......................................................... 1535
Programa de vacinação para patos reprodutores ....................................... 1536
Programa de vacinação para patinhos domésticos .................................... 1536
Exigências espaciais das aves poedeiras .................................................. 1537
Exigências espaciais das aves de corte ..................................................... 1538
Exigências de alguns nutrientes para coelhos ............................................ 1551
Exigências nutricionais diárias dos ovinos .................................................. 1553
Rações para ovelhas prenhes até 6 semanas antes do parto .................... 1559
Mistura de grãos para ovelhas prenhes ...................................................... 1559
Ração de cocho para cordeiros lactentes precocemente desmamados .... 1560
Fórmulas recomendadas para cordeiros em terminação ........................... 1561
Padrão para suplementos de pasto para ovinos ........................................ 1562
Misturas minerais sugeridas para ovinos .................................................... 1563

FAR
Concentrações de solutos importantes ....................................................... 1646
Composição dos líquidos parenterais ......................................................... 1658
Tranqüilizantes ou sedativos sem efeitos analgésicos: doses (mg/kg, exceto
quando indicado de outra forma), via e freqüência de administração ... 1696
Tabelas XIV

Título Página

Analgésicos: doses (mg/kg, exceto quando indicado de outra forma),


via e freqüência de administração ......................................................... 1697
Anticoccídicos para uso profilático nas aves domésticas ........................... 1784
Drogas para o tratamento da coccidiose nas galinhas ............................... 1786
Compostos comumente utilizados no tratamento da tripanossomíase
nos animais domésticos ......................................................................... 1790
Compostos comumente utilizados no tratamento da babesiose nos
animais domésticos ................................................................................ 1790
Compostos comumente utilizados no tratamento da teileriose nos
animais domésticos ................................................................................ 1790
Hormônios esteróides naturais considerados como promotores de
crescimento nos animais de grande porte ............................................. 1858
Alguns compostos hormonais sintéticos e não esteróides
considerados como promotores de crescimento nos animais
de grande porte ...................................................................................... 1859
Efeitos de alguns promotores de crescimento no desempenho dos
cordeiros ................................................................................................. 1860
Alguns promotores de crescimento antibacterianos utilizados na
criação de animais de consumo comercial ............................................ 1860

AVE
Microrganismos hematogênicos nas aves domésticas ............................... 1871
Helmintos comuns no trato digestivo das aves domésticas ....................... 1888

TOX
Toxicidade do etilenoglicol .......................................................................... 1999
Plantas tóxicas ornamentais/domésticas para animais de companhia ....... 2012
Micotoxicoses em animais domésticos ....................................................... 2036
Plantas tóxicas da América do Norte temperada ........................................ 2060

ZOO
Zoonoses .................................................................................................... 2109
COLABORADORES

Melvin K. Abelseth, D.V.M., D.V.P.H., PH.D., Voorheesville, New York.


William M. Adams, V.M .D., Albion, Pennsylvania.
Franklin A. Ahrens, D. V.M., PH.D., Department of Veterinary Physiology and
Pharmacology, College of Veterinary Medicine, Iowa State University, Ames,
lowa.
Jason S. Albertson, D.V.M., Irving, Texas.
D.J. Alexander, B .TECH., PH.D., F.I.BIOL., D.SC., Central Veterinary Laboratory,
Weybridge, Surrey, England.
T.J.L. Alexander, PH.D., M.V.SC., B.SC., M.R.C.V.S., D.P.M., Department of Clinical
Veterinary Medicine, University of Cambridge, Cambridge, England.
Mary E. Allen, PH.D., Allen & Baer Associates, Inc., Olney, Maryland.
M.B. Allworth, B.V.SC., M.V.S., F .A.C.V.S., Holbrook, N.S.W., Australia.
H.E. Amstutz, B.S., D.V.M., DIP.A.C.V.I.M., Professor Emeritus, Department of Veterinary
Clinical Science, Purdue University, West Lafayette, Indiana.
John F. Anderson, D.V.M., M.S., Professor, Clinical and Population Sciences, College
of Veterinary Medicine, University of Minnesota, Cannon Falls, Minnesota.
Roy C. Anderson, PH.D., Professor, Department of Zoology, University of Guelph,
Guelph, Ontario, Canada.
John J. Andrews, D.V.M., M.S., PH.D., Professor, Veterinary Diagnostic Laboratory,
College of Veterinary Medicine, Iowa State University, Ames, lowa.
Robert D. Appleman, PH.D., Extension Animal Scientist, Dairy Management, University
of Minnesota, St. Paul, Minnesota.
James Archibald, D.V.M., M .V.SC., DR.MED.VET ., DIP.A.C.V.S., F.R.C.V.S., O.ONT., Profes-
sor Emeritus, University of Guelph, Guelph, Ontario, Canada.
James Armour, CBE, PH.D., DR.(H.C.), M.R.C.V.S., F.R.S.E., Professor, Vice Principal,
Planning and External Relations, University of Glasgow, Glasgow, Scotland.
Steven Paul Arnoczky, D.V.M., DIP.A.C.V.S., Director, Laboratory of Comparative
Orthopaedic Research, The Hospital for Special Surgery, New York, New York.
Lawrence H. Arp, D.V.M., PH.D., Professor of Veterinary Pathology, College of
Veterinary Medicine, Iowa State University, Ames, lowa.
A.C. Asbury, D.V.M., Associate Dean, College of Veterinary Medicine, University of
Florida, Gainesville, Florida.
Matthew A.O. Atilola, D.V.M., M .SC., PH.D., Assistant Professor, Radiology Unit,
Department of Clinical Studies, University of Guelph, Guelph, Ontario, Canada.
David P. Aucoin, D.V.M., College of Veterinary Medicine, North Carolina State
University, Raleigh, North Carolina.
John R. August, B. VET. MED., M.S., M.R.C.V. S., Professor and Head, Department of
Small Animal Medicine and Surgery, College of Veterinary Medicine, Texas A &
M. University, College Station, Texas.
Lorne A. Babiuk, B.S.A., M.SC., PH.D., D.SC., Associate Director (Research), University
of Saskatchewan, Saskatoon, Saskatchewan, Canada.
Clell V. Bagley, D.V.M., Utah State University, Logan, Utah.
Brian G. Bagnall, D.V.M., PH.D., West Chester, Pennsylvania.
Colaboradores XVI

Gordon J. Baker, B.V.SC., PH.D., M.R.C.V.S., DIP.A.C.V.S., College of Veterinary Medicine,


University of Illinois, Urbana, Illinois.
R.M. Barlow, D. SC., D .V. M . & S., M .R. C.V .S ., F. R.C .PATH., Professor of Patho-
logy, Royal Veterinary College, Hawkshead Campus, Hatfield, Hertford-
shire, U.K.
H. John Barnes, D.V.M., PH.D., Professor, Avian Medicine, College of Veterinary
Medicine, North Carolina State University, Raleigh, North Carolina.
Thomas B.M. Barragry, PH.D., (N.U.I.), M.V.M., M.V.B., M.R.C.V.S., Senior Lecturer in
Veterinary Pharmacology, and Therapeutics, Faculty of Veterinary Medicine,
University College Dublin, Veterinary College, Ireland.
Donald W. Bates, B.S., M .S., Agricultural Engineering, St. Paul, Minnesota.
Roger M. Batt, B.V.SC., M .SC., PH.D., M.R.C.V.S., Professor, Department of Small Animal
Medicine and Surgery, The Royal Veterinary College, University of London,
Hatfield, Hertfordshire, England.
Louise Bauck, B.SC., D.V.M ., M.V.SC., Ocean County Veterinary Hospital, Lakewood,
New Jersey.
Sandra Ann Baxendell, B.V.SC.(HONS.), PH.D., M A.C.V.SC., Gidgegannup, Western
Australia, Australia.
Charles W. Beard, D.V.M., M .S., PH.D., Athens, Georgia.
Gary B. Beard, D.V.M., A.V.D.C., Baton Rouge, Louisiana.
Val Richard Beasley, D.V.M., PH.D., Associate Professor of Toxicology, Department
of Veterinary Biosciences, University of Illinois, Urbana, Illinois.
Bonnie V. Beaver, B.S., D.V.M ., M.S., Professor and Chief of Medicine, Department of
Small Animal Medicine and Surgery, College of Veterinary Medicine, Texas A &
M University, College Station, Texas.
Jamie R. Bellah, D .V. M., D. A.C .V. S., Department of Small Animal Clinical Sciences,
College of Veterinary Medicine, University of Florida, Gainesville, Florida.
Malcolm Bennett, B.V.SC., PH.D., M.R.C.V.S., Department of Veterinary Clinical Science,
Veterinary Field Station, “Leahurst”, Neston, Wirral, U.K.
John Bentinck-Smith, D.V.M., Professor Emeritus, Cornell University, Starkville,
Mississippi.
Herman A. Berkhoff, D.V.M., PH.D., Professor, Department of Microbiology, Pathology,
and Parasitology, College of Veterinary Medicine, North Carolina State University,
Raleigh, North Carolina.
J.D. Bezuidenhout, D.V.SC., Veterinary Research Institute, Onderstepoort, Republic
of South Africa.
Arthur A. Bickford, V.M.D., M.S., PH.D., Professor of Clinical Diagnostic Pathology,
School of Veterinary Medicine, California Veterinary Diagnostic Laboratory
System, University of California, Turlock, California.
LeRoy G. Biehl, D.V.M., M.S., College of Veterinary Medicine, University of Illinois,
Urbana, Illinois.
Michael L. Biehl, D.V.M., College of Veterinary Medicine, University of Illinois, Urbana,
Illinois.
Joseph T. Bielitzki, D.V.M ., M.S., Regional Primate Research Center, University of
Washington, Seattle, Washington.
William Black, D.V. M., M.SC., PH.D., Professor, Pharmacology and Toxicology,
Department of Biomedical Sciences, Ontario Veterinary College, University of
Guelph, Guelph, Ontario, Canada.
Colaboradores XVII

Barry R. Blakley, D.V.M., PH.D., Professor, Department of Veterinary Physiological


Sciences, Western College of Veterinary Medicine, University of Saskatchewan,
Saskatoon, Saskatchewan, Canada.
Douglas C. Blood, Professor Emeritus, University of Melbourne, Veterinary Clinical
Centre, Werribee, Victoria, Australia.
John C. Bloom, v. M.D., PH.D., Head, Clinical Pathology, Lilly Research Laboratories,
Eli Lilly and Company, Greenfield, Indiana.
Mark S. Bloomberg, D.V.M., M.S., DIP.A.C.V.S., Professor and Chairman, Department
of Small Animal Clinical Sciences, College of Veterinary Medicine, University of
Florida, Gainesville, Florida.
Herman J. Boermans, D.V.M., M .SC., PH.D., Assistant Professor of Toxicology,
Department of Biomedical Sciences, Ontario Veterinary College, University of
Guelph, Guelph, Ontario, Canada.
Dawn Merton Boothe, D.V.M., M.S., PH.D., DIP.A.C.V.I.M ., Assistant Professor, Clinical
Pharmacology Laboratory, Department of Veterinary Physiology and
Pharmacology, College of Veterinary Medicine, Texas A & M University, College
Station, Texas.
William T.K. Bosu, D.V.M., M .SC., PH.D., Professor and Chairman, Department of
Medical Sciences, School of Veterinary Medicine, University of Wisconsin,
Madison, Wisconsin.
Terry Boundy, B.V.SC., M.R.C.V.S., F.R.AG.S., Tegfan, Montgomery, Powys, U.K.
Kenneth C. Bovée, D.V.M., M.MED.SC., School of Veterinary Medicine, University of
Pennsylvania, Philadelphia, Pennsylvania.
Walter M. Boyce, D. V.M., PH.D., Assistant Professor of Parasitology, Department of
Veterinary Microbiology and Immunology, School of Veterinary Medicine, University
of California, Davis, California.
Gerald R. Bratton, D.V.M., PH.D., Professor and Head, Department of Veterinary
Anatomy and Public Health, College of Veterinary Medicine, Texas A & M
University, College Station, Texas.
Kyle G. Braund, B.V.SC., M.V.SC., PH.D., F.R.C.V.S ., D.A.C.V.I.M., Professor and Director
of Neuromuscular Research and Diagnostic Laboratories, Scott-Ritchey Research
Program, College of Veterinary Medicine, Auburn University, Auburn, Alabama.
Edward B. Breitschwerdt, D.V.M., DIP.A.C.V.I.M., Professor of Medicine, College of
Veterinary Medicine, North Carolina State University, Raleigh, North Carolina.
Nancy O. Brown, V.M .D., Plymouth Meeting, Pennsylvania.
R. Glenn Brown, B.SC., PH.D., Department of Nutrition, University of Massachusetts,
Amherst, Massachusetts.
Cecil F. Brownie, B.SC., D.V.M ., PH.D., D.A.B.V.T., D.A.B.T ., Associate Professor of
Pharmacology and Toxicology, College of Veterinary Medicine, North Carolina
State University, Raleigh, North Carolina.
Everett S. Bryant, D.V.M., Professor of Pathobiology, University of Connecticut,
Storrs, Connecticut.
John H. Bryner, PH.D., F.A.A.M., National Animal Disease Center, Ames, lowa.
William B. Buck, B.S., D.V.M., M.S., Professor and Director, National Animal Poison
Control Center, College of Veterinary Medicine, University of Illinois, Urbana,
Illinois.
John A. Bukowski, D.V.M ., M .P.H., Corporate Epidemiologist, Merck & Co. Inc.,
Rahway, New Jersey.
Colaboradores XVIII

Thomas J. Burke, D.V.M., M.S., Professor, College of Veterinary Medicine, University


of Illinois, Urbana, Illinois.
Mitchell Bush, D.V.M., A.C.Z.M., Veterinarian, National Zoological Park, Washington, D.C.
Robert B. Bushnell, D.V.M., Roseville, California.
Edward G. Buss, B.S., M.S., PH.D., Professor of Agriculture, Emeritus, The Pennsylvania
State University, University Park, Pennsylvania.
Jerry F. Butler, M.S., PH.D., Professor, Department of Entomology and Nematology,
University of Florida, Gainesville, Florida.
David Buxton, B.V.M. & S., PH.D., M .R.C.PATH., M.R.C.V.S., Moredun Research Institute,
Edinburgh, Scotland.
Jerry Callis, D.V.M., M .S., D.SC., Southold, New York.
Bruce W. Calnek, D.V.M ., M.S., Professor and Chairman, Department of Avian and
Aquatic Animal Medicine, College of Veterinary Medicine, Cornell University,
Ithaca, New York.
Clay A. Calvert, D.V.M., DIP.A.C.V.I.M., Associate Professor, College of Veterinary
Medicine, University of Georgia, Athens, Georgia.
Charles C. Capen, D.V.M., PH.D., Professor and Chairman, Department of Veterinary
Pathobiology, Ohio State University, Columbus, Ohio.
Clyde S. Card, D.V.M ., PH.D., Assistant Director, Agriculture & Natural Resources,
College of Agriculture, University of Arizona, Tucson, Arizona.
William W. Carlton, D.V.M., PH.D., Department of Veterinary Pathobiology, School of
Veterinary Medicine, Purdue University, West Lafayette, Indiana.
I.H. Carmichael, B.V.SC., D.V.SC., Vet Lab, Department of Agriculture, Adelaide, South
Australia.
Vicki R. Carruthers, B.AGR.SC., D.PHIL., Dairying Research Corporation, Hamilton,
New Zealand.
Gordon R. Carter, D.V. M., M .S., D.V .SC., Professor Emeritus, Department of
Pathobiology, Virginia-Maryland Regional College of Veterinary Medicine, Virginia
Polytechnic Institute and State University, Blacksburg, Virginia.
Sharon A. Center, D.V.M., Associate Professor, Department of Clinical Sciences , New
York State College of Veterinary Medicine, Cornell University, Ithaca, New York.
Peter R. Cheeke, PH.D., Department of Animal Science, Oregon State University,
Corvallis, Oregon.
Cheryl L. Chrisman, D.V.M., M.S., College of Veterinary Medicine, University of
Florida, Gainesville, Florida.
Vern L. Christensen, M .S., PH.D., Department of Poultry Science, North Carolina State
University, Raleigh, North Carolina.
William B. Christie, B.VET.MED., B.SC., M.R.C.V.S., Genus, Vallum Farm, Stamfordham,
Newcastleupon-Tyne, England.
Harold L. Chute, D.V.M., M .S., D.V.SC., Orono, Maine.
B.L. Clark, B.V.SC., DIP.BACT., Bulleen, Victoria, Australia.
Donald R. Clark, D.V.M., PH.D., DIP.A.C.V.I.M., Department of Veterinary Physiology and
Pharmacology, College of Veterinary Medicine, Texas A & M University, College
Station, Texas.
Keith A. Clark, D.V.M., PH.D., Marble Falls, Texas.
L. Kirk Clark, D.V.M., PH.D., Associate Professor, Department of Veterinary Clinical
Sciences, School of Veterinary Medicine, Purdue University, West Lafayette,
Indiana.
Colaboradores XIX

T.R. Cline, B.S ., M.S., PH.D., Professor, Department of Animal Sciences, Purdue
University, West Lafayette, Indiana.
Leroy Coggins, D.V.M., PH.D., Professor and Head, Department of Microbiology,
Pathology and Parasitology, College of Veterinary Medicine, North Carolina State
University, Raleigh, North Carolina.
M.S. Collins, B.SC.(HONS.), Ministry of Agriculture, Fisheries and Food, Central
Veterinary Laboratory, Weybridge, Surrey, England.
Ben H. Colmery III, D.V.M., DIP.A.V.D.C., Ann Arbor, Michigan.
Donal P. Conway, M .S., PH.D., Animal Health Group, Pfizer Inc., New York, New York.
Jim Corbin, PH.D., Professor Emeritus, University of Illinois, Urbana, Illinois.
Charles E. Cornelius, School of Veterinary Medicine, University of California, Davis,
California.
R.E. Corstvet, M.S., PH.D., Professor of Veterinary Microbiology, School of Veterinary
Medicine, Louisiana State University, Baton Rouge, Louisiana.
Susan M. Cotter, D.V.M., DIP.A.C.V.I.M., Professor of Medicine, School of Veterinary
Medicine, Tufts University, North Grafton, Massachusetts.
Geoffrey S. Cottew, M .SC., M .A.S.M., Burleigh Heads, Queensland, Australia.
Morris S. Cover, V.M .D., M .S., PH.D., Foristell, Missouri.
Rick L. Cowell, D.V.M., M.S., DIP.A.C.V.P., Associate Professor, Department of Pathology,
College of Veterinary Medicine, Oklahoma State University, Stillwater, Oklahoma.
Timothy A. Cudd, D.V.M., College of Veterinary Medicine, University of Florida,
Gainesville, Florida.
R.A. Curtis, D.V.M ., M.SC., Professor, Department of Health Management, Atlantic
Veterinary College, University of Prince Edward Island, Charlottetown, P.E.I.,
Canada.
A.J. DaMassa, PH.D., Lecturer, Research Associate, Department of Epidemiology
and Preventive Medicine, School of Veterinary Medicine, University of California,
Davis, California.
R.C.W. Daniel, B.V.SC., M.SC., PH.D., F .A.C.V.SC., Reader, Department of Farm Animal
Medicine and Production, University of Queensland, Queensland, Australia.
A.H. Dardiri, D.V.M., B.V.SC., M .SC., PH.D., Collaborator, U.S. Department of Agriculture,
Agricultural Research Service, Plum Island Animal Disease Center, Southold,
New York.
F. G. Davies, M .A., VET .M.B., M.R.C.V.S., Veterinary Research Laboratory, Ministry of
Agriculture, Nairobi, Kenya.
Richard B. Davis, D.V.M., M.S., Poultry Disease Research Center, Athens, Georgia.
Douglas J. DeBoer, D.V.M., DIP.A.C.V.D., Assistant Professor, Department of Medical
Sciences, School of Veterinary Medicine, University of Wisconsin, Madison,
Wisconsin.
Linda J. DeBowes, D.V.M., M.S., DIP.A.C.V.I.M., Assistant Professor, Department of
Clinical Sciences, College of Veterinary Medicine, Kansas State University,
Manhattan, Kansas.
Dominic L. DeGiusti, PH.D., Professor Emeritus, Department of Immunology and
Microbiology, Wayne State University, School of Medicine, Detroit, Michigan.
Antony James Della-Porta, B.SC., PH.D., C.S.I.R.O., Australian Animal Health
Laboratory, Geelong, Victoria, Australia.
Robert W. Dellers, D.V.M ., PH.D., Wisconsin Animal Health Laboratories, Madison,
Wisconsin.
Colaboradores XX

Walter J. DeLong, M.S., Research Associate, Caine Veterinary Teaching Center,


University of Idaho, Caldwell, Idaho.
Stanley M. Dennis, B.V.SC., PH.D., F.R.C.V.S., F.R.C.PATH., Professor, Department of Pathology,
College of Veterinary Medicine, Kansas State University, Manhattan, Kansas.
Robert C. DeNovo, D.V.M., M.S., DIP.A.C.V. I.M ., Associate Professor of Medicine,
Department of Urban Practice, College of Veterinary Medicine, University of
Tennessee, Knoxville, Tennessee.
J.B. Derbyshire, B.SC., PH.D., M .R.C. V.S., Department of Veterinary Microbiology and
Immunology, Ontario Veterinary College, University of Guelph, Guelph, Canada.
D.K. Detweiler, V.M .D., M.S., D.SC., Professor of Physiology, Emeritus, School of
Veterinary Medicine, University of Pennsylvania, Philadelphia, Pennsylvania.
Joyce A. DeVaney, PH.D., Melrose, New Mexico.
W. Jean Dodds, D.V.M., Director, Laboratory of Comparative Hematology, Wadsworth
Center, New York State Department of Health, Albany, New York.
Nicholas H. Dodman, B.V.M.S., Professor of Anesthesia, Tufts University, School of
Veterinary Medicine, North Grafton, Massachusetts.
Robert E. Dolphin, B.S., D.V.M., Corona, California.
Alan R. Doster, D.V.M., PH.D., Director, Veterinary Diagnostic Center, University of
Nebraska, Lincoln, Nebraska.
J.H. Drudge, D.V.M ., SC.D., Department of Veterinary Science, University of Kentucky,
Lexington, Kentucky.
J.P. Dubey, M.V.SC., PH.D., Microbiologist, Zoonotic Diseases Laboratory, Livestock
and Poultry Sciences Institute, U.S. Department of Agriculture, Agricultural
Research Service, Beltsville, Maryland.
Nicole E. Duffee, D.V.M ., PH.D., Assistant Professor, College of Veterinary Medicine,
Oregon State University, Corvallis, Oregon.
James L. Duncan, B.V.M.S., PH.D., M.R.C.V.S., Professor, Department of Veterinary
Parasitology, Faculty of Veterinary Medicine, University of Glasgow, Bearsden,
Glasgow, Scotland.
Robert W. Dunstan, D.V.M ., M.S., DIP.A.C.V.P., Associate Professor, Department of
Pathology, College of Veterinary Medicine, Michigan State University, East
Lansing, Michigan.
J.L. du Plessis, B.V.SC., M .MED.VET.(PATH.), D.V.SC., Veterinary Research Institute,
Onderstepoort, Republic of South Africa.
Andrew Eales, B.SC., B.V.SC., M.SC., PH.D., M .R.C.V.S., East Lothian, Scotland.
Robert A. Easter, B.S., M.S., PH.D., Professor, Swine Nutrition, Department of Animal
Sciences, University of Illinois, Urbana, Illinois.
Robert L. Eckroade, D.V.M., PH.D., School of Veterinary Medicine, University of
Pennsylvania, Kennett Square, Pennsylvania.
N. Edington, PH.D., B.V.SC., M.R.C.V.S., Microbiology, Royal Veterinary College,
London, England.
William C. Edwards, D.V.M., M.S., Veterinary Toxicologist/Professor, Oklahoma
Animal Disease Diagnostic Laboratory, Stillwater, Oklahoma.
Paul C. Estes, D.V.M ., PH.D., Director of Pathology, Pfizer Inc., Groton, Connecticut.
A. Konrad Eugster, DR.MED.VET., PH.D., Texas Veterinary Medical Diagnostic
Laboratory, College Station, Texas.
James F. Evermann, M.S., PH.D., College of Veterinary Medicine, Washington State
University, Pullman, Washington.
Colaboradores XXI

Julius Fabricant, V.M .D., B.S., M .S., PH.D., Professor Emeritus, Department of Avian
and Aquatic Animal Medicine, New York State College of Veterinary Medicine,
Cornell University, Ithaca, New York.
Aly M. Fadly, D.V.M., PH.D., Veterinary Research Scientist, U.S. Department of
Agriculture, Agricultural Research Service, Avian Disease and Oncology
Laboratory, East Lansing, Michigan.
Alicia M. Faggella, D.V.M ., Director, Intensive Care Unit, Angell Memorial Animal
Hospital, Boston, Massachusetts.
Ronald Fayer, PH.D., Zoonotic Diseases Laboratory, Livestock and Poultry Sciences
Institute, U.S. Department of Agriculture, Agricultural Research Service, Beltsville,
Maryland.
John F. Fessler, D.V.M., M.S., Professor of Large Animal Surgery, School of Veterinary
Medicine, Purdue University, West Lafayette, Indiana.
B.D. Firehammer, M.S., Professor, Veterinary Research Laboratory, Montana State
University, Bozeman, Montana.
Robert A. Foster, B.V.SC., PH.D., M. A.C.V.SC., DIP. A.C.V.P., Assistant Professor,
Department of Pathology, Ontario Veterinary College, University of Guelph,
Guelph, Ontario, Canada.
James G. Fox, D.V.M., M.S., Professor and Director, Division of Comparative Medicine,
Massachusetts Institute of Technology, Cambridge, Massachusetts.
Patricia Thomblison Franks, D.V.M., M.S., Technical Training Manager /Staff Clinician,
Hill’s Pet Products, Topeka, Kansas.
Andrew F. Fraser, M.R.C.V.S., M.V.SC., F.I.BIOL., Professor of Surgery (Veterinary),
Faculty of Medicine, Memorial University, Newfoundland, Canada.
David E. Freeman, M .V .B ., M .R. C.V .S ., PH .D., Assistant Professor of Surgery,
School of Veterinary Medicine, University of Pennsylvania, Kennett Square,
Pennsylvania.
D.B. Galloway, B.V.SC., F.R.V.C.S., M.A.C.V.SC., V.M.D., Department of Veterinary
Clinical Sciences, University of Melbourne, Werribee, Victoria, Australia.
Paul C. Gambardella, V.M .D., M.S., DIP.A.C.V.S ., Director of Surgery, Angell Memorial
Animal Hospital, Boston, Massachusetts.
Jack M. Gaskin, D.V.M., PH.D., Associate Professor, Department of Infectious Disea-
ses, College of Veterinary Medicine, University of Florida, Gainesville, Florida.
Clive C. Gay, D.V.M., M.V.SC., F.A.C.V.SC., Professor, Department of Veterinary Clinical
Medicine and Surgery, Washington State University, Pullman, Washington.
Kirk N. Gelatt, V.M.D., Professor of Comparative Ophthalmology, College of Veterinary
Medicine, University of Florida, Gainesville, Florida.
Jack Gelb, Jr., PH.D., Associate Professor, Department of Animal Science and
Agricultural Biochemistry, College of Agricultural Sciences, University of Delaware,
Newark, Delaware.
E. Paul J. Gibbs, B.V.SC., PH.D., F.R.C.V.S., College of Veterinary Medicine, University
of Florida, Gainesville, Florida.
Charles D. Gibson, D.V.M ., PH.D., Professor, Department of Large Animal Clinical
Sciences, College of Veterinary Medicine, Michigan State University, East
Lansing, Michigan.
Urs Giger, P.D., DR.MED.VET., F.V.H., DIP.A.C.V.I.M., Associate Professor of Medicine
and Medical Genetics, Department of Clinical Studies, School of Veterinary
Medicine, University of Pennsylvania, Philadelphia, Pennsylvania.
Colaboradores XXII

John S. Gilmour, B.V.M. & S., F .R.C.V.S., Moredun Research Institute, Edinburgh,
Scotland.
N.J.L. Gilmour, PH.D., D.SC., B.V.M.S., M.R.C.V.S., Moredun Research Institute, Edinburgh,
Scotland.
Robert D. Glock, D.V.M., PH.D., Director, Veterinary Diagnostic Laboratories, Colorado
State University, Fort Collins, Colorado.
W.L. Goff, M.S., PH.D., Research Microbiologist, Animal Diseases Research Unit,
U.S. Department of Agriculture, Agricultural Research Service, Washington State
University, Pullman, Washington.
Robert A. Goodnow, PH.D., Microbiologist, Rochester, New York.
Mark A. Goodwin, D.V.M., M.A.M., PH.D., Veterinary Pathologist, Georgia Poultry
Improvement Association, Georgia Poultry Laboratory, Oakwood, Georgia.
John R. Gorham, D.V.M ., PH.D., Animal Diseases Research Unit, U.S. Department of
Agriculture, Agricultural Research Service, Washington State University, Pullman,
Washington.
Rainer Gothe, D.T.V.M., Professor, Institut for Vergleichende Tropenmedizin und
Parasitologie der University Monchen, Munich, Germany.
R.E. Gough, F.I.M.L.S., M.I.BIOL., Poultry Department, Central Veterinary Laboratory,
Ministry of Agriculture, Fisheries and Food, New Haw, Weybridge, Surrey,
England.
David I. Grant, B.VET.MED., CERT.S.A.D., F.R.C.V.S., Veterinary Director, R.S.P.C.A., Sir
Harold Harmsworth Memorial Animal Hospital, London, England.
Gregory F. Grauer, D.V.M., M.S., DIP.A.C.V.I.M., College of Veterinary Medicine and
Biomedical Sciences, Colorado State University, Ft. Collins, Colorado.
Craig E. Greene, D.V.M ., M.S., Professor, Department of Small Animal Medicine,
College of Veterinary Medicine, University of Georgia, Athens, Georgia.
Paul Greenlee, D.V.M., PH.D., DIP.A.C.V.P., Dallas, Texas.
Paul R. Greenough, F .R.C.V.S., Professor, Department of Anesthesiology, Radiology
and Surgery, Western College of Veterinary Medicine, University of Saskatchewan,
Saskatoon, Saskatchewan, Canada.
Timothy R.C. Greet, B.V.M.S., M.V.M., CERT.E.O., F.R.C.V.S., Beaufort Cottage Stables,
Newmarket, Suffolk, England.
Dee Griffin, M.S., D.V.M., Beef Cattle Veterinarian, University of Nebraska, Great
Plains Veterinary Educational Center, Clay Center, Nebraska.
James E. Grimes, PH.D., Research Associate, Texas Veterinary Medical Diagnostic
Laboratory, College Station, Texas.
T. Keith Grove, D. D.S., M.S., V.M.D., DIP.A.V.D.C., DIP.A.B.P., Veterinary Dental Practice,
Vero Beach, Florida.
Frank S. Guillot, PH.D., Research Leader, Knipling-Bushland U.S. Livestock Insects
Research Laboratory, U.S. Department of Agriculture, Agricultural Research
Service, Kerrville, Texas.
Donald P. Gustafson, B.SC., D.V.M ., M.S., PH.D., Leo P. Doyle Professor of Virology,
Emeritus, Purdue University, West Lafayette, Indiana.
Borje K. Gustafsson, D.V.M ., PH.D., Dean and Professor, College of Veterinary
Medicine, Washington State University, Pullman, Washington.
Carlton L. Gyles, D.V.M ., PH.D., Professor, Department of Veterinary Microbiology and
Immunology, Ontario Veterinary College, University of Guelph, Guelph, Ontario,
Canada.
Colaboradores XXIII

William J. Hadlow, D.V.M., Veterinary Pathologist, Hamilton, Montana.


Allen W. Hahn, D.V.M., PH.D., Professor, Veterinary Medicine and Surgery, College of
Veterinary Medicine, Adjunct Professor of Computer Science, University of
Missouri, Columbia, Missouri.
David A. Halvorson, D.V.M., Professor, Department of Veterinary Pathobiology,
College of Veterinary Medicine, University of Minnesota, St. Paul, Minnesota.
Farouk Hamdy, D.V.M ., PH.D., Co-Director, U.S. -Mexico Commission for Prevention
of Foot and Mouth Disease and other Exotic Animal Diseases, Mexico D.F.,
Mexico.
Robert L. Hamlin, D.V.M., PH.D., DIP.A.C.V .I.M., Ohio State University, Columbus, Ohio.
U. Theodore Hammer, B.ED., B.A., M.S., PH.D., Professor, Department of Biology,
University of Saskatchewan, Saskatoon, Canada.
Lyle E. Hanson, D.V.M., M .S., PH.D., Professor Emeritus, Department of Veterinary
Pathobiology, College of Veterinary Medicine, University of Illinois, Urbana,
Illinois.
Robert M. Hardy, D.V.M., M .S., DIP.A.C.V.I.M., Department of Small Animal Clinical
Sciences, College of Veterinary Medicine, University of Minnesota, St. Paul,
Minnesota.
William H. Harris, D.V.M ., M.SC., PH.D., Department of Biomedical Sciences, Ontario
Veterinary College, University of Guelph, Guelph, Ontario, Canada.
William John Hartley, F .R.C.V.S., F.A.C.V.SC., F.R.C.PATH., M.V.SC., D.SC., Taronga Zoo,
Mosman, N.S.W., Australia.
Joe Hauptman, D.V.M., M.S., DIP.A.C.V.S., Associate Professor of Surgery, Department
of Small Animal Clinical Sciences, College of Veterinary Medicine, Michigan State
University, East Lansing, Michigan.
W.W. Hawkins, D.V.M., Dillon, Montana.
Audrey A. Hayes, V.M .D., DIP.A.C.V.I.M ., The Animal Medical Center, New York, New
York.
K.C. Hayes, D.V.M., PH.D., Foster Biomedical Research Laboratory, Brandeis University,
Waltham, Massachusetts.
Roger W. Hemken, B.S., M.S., PH.D., Professor, Animal Science Department, University
of Kentucky, Lexington, Kentucky.
Thomas H. Herdt, D.V.M ., M .S., DIP.A.C.V.I.M., Veterinary Clinical Center, Michigan
State University, East Lansing, Michigan.
David S. Herring, D.V.M., DIP.A.C.V.R., President, Radiopet, Floral Park, New York.
Werner P. Heuschele, D.V.M., PH.D., Director of Research, Center for Reproduction
of Endangered Species, Zoological Society of San Diego, San Diego, California.
Clair M. Hibbs, D.V.M., M .S., PH.D., Manhattan, Kansas.
F.W.G. Hill, PH.D., B.VET.MED., M .R.C.V.S., M.A.C.V.SC., Professor and Dean of Veterinary
Science, University of Zimbabwe, Harare, Zimbabwe.
Howard T. Hill, D.V.M., PH.D., Veterinary Diagnostic Laboratory, Iowa State University,
Ames, Iowa.
Mark Edward Hitt, D.V.M., DIP.A.B.V.P., DIP.A.C.V.I.M., Atlantic Veterinary College,
University of Prince Edward Island, Charlottetown, P.E.I., Canada.
Glen F. Hoffsis, D.V.M ., M.S., DIP.A.C.V.I.M., College of Veterinary Medicine, Ohio State.
University, Columbus, Ohio.
Peter H. Holmes, B.V.M.S., PH.D., M .R.C.V.S., Professor, University of Glasgow Veterinary
School, Bearsden, Glasgow, Scotland.
Colaboradores XXIV

F.D. Horney, D.V.M., DIP.A.C.V.S., Ontario Veterinary College, University of Guelph,


Guelph, Ontario, Canada.
Carl S. Hornfeldt, M.S., R.PH., Hennepin Regional Poison Center, Minneapolis,
Minnesota.
Thomas N. Hribernik, D.V.M., DIP.A.C.V.I.M ., Department of Veterinary Clinical Sciences,
School of Veterinary Medicine, Louisiana State University, Baton Rouge, Louisiana.
William T. Hubbert, D.V.M., Bowie, Maryland.
K.L. Hughes, M .V.SC., PH.D., DIP.BACT.(LOND.), M.A.C.V.SC., Dean of Veterinary Science,
University of Queensland, Queensland, Australia .
D. Bruce Hunter, D.V.M., M.SC., Associate Professor, Department of Pathology,
Ontario Veterinary College, University of Guelph, Guelph, Ontario, Canada.
Mark B. Hurtig, D.V.M., M.V.SC., DIP.A.C.V.S ., Assistant Professor, Department of
Clinical Studies, Ontario Veterinary College, University of Guelph, Guelph,
Ontario, Canada.
S.L. Ihle, D.V.M ., Boren Veterinary Medical Teaching Hospital, Oklahoma State
University, Stillwater, Oklahoma.
Dennis E. Jacobs, B.V.M.S., PH.D., M .R.C.V.S., Department of Veterinary Pathology,
The Royal Veterinary College, University of London, England.
Elliot Jacobson, D.V.M., PH.D., Professor, College of Veterinary Medicine, University
of Florida, Gainesville, Florida.
Lynn F. James, PH.D., Research Leader, U.S. Department of Agriculture, Agricultural
Research Service, Poisonous Plant Research Laboratory, Logan, Utah.
Oswald Jarrett, PH.D., B.V.M.S., M.R.C.V.S., University of Glasgow Veterinary School,
Bearsden, Glasgow, Scotland.
Donald E. Jasper, D.V.M ., M .S., PH.D., Professor Emeritus, Department of Clinical
Pathology, School of Veterinary Medicine, University of California, Davis, California.
L.B. Jeffcott, B.VET.MED., PH.D., F.R.C.V.S., D.V.SC., Professor of Veterinary Clinical
Sciences, and Director, Veterinary Clinic and Hospital, University of Melbourne,
Veterinary Clinical Centre, Werribee, Victoria, Australia.
William L. Jenkins, B.V.SC., M .MED.VET., PH.D., Dean, School of Veterinary Medicine,
Louisiana State University, Baton Rouge, Louisiana.
Marcus M. Jensen, PH.D., Department of Microbiology, Brigham Young University,
Provo, Utah.
Cheri A. Johnson, D.V.M., M.S., DIP.A.C.V.I.M., Associate Professor, Department of
Small Animal Clinical Sciences, College of Veterinary Medicine, Michigan State
University, East Lansing, Michigan.
Gareth E. Jones, B.V.SC., PH.D., M .R.C.V.S., D.T .V.M., Moredun Research Institute,
Edinburgh, Scotland.
J.B. Jones, D.V.M., Assistant Vice President for Research, Boyd Graduate Studies
Research Center, University of Georgia, Athens, Georgia.
Robert L. Jones, D.V.M., PH.D., DIP.A.C.V.M., Diagnostic Laboratory, College of Veterinary
Medicine and Biomedical Sciences, Colorado State University, Fort Collins,
Colorado.
Richard J. Julian, D.V.M., DIP.PATH., Ontario Veterinary College, University of Guelph,
Guelph, Ontario, Canada.
Francis A. Kallfelz, D.V.M., PH.D., D.A.C.V.N., Professor of Veterinary Nutrition, and
Director, Veterinary Medical Teaching Hospital, College of Veterinary Medicine,
Cornell University, Ithaca, New York.
Colaboradores XXV

Arnold F. Kaufmann, D.V.M ., M.S., Acting Chief, Mycotic Diseases Branch, Division of
Bacterial and Mycotic Diseases, Centers for Disease Control, Atlanta, Georgia.
T. S. Kellerman, B.SC.(AGR.), B.V.SC., Veterinary Research Institute, Onderstepoort,
Republic of South Africa.
Conrad J. Kercher, PH.D., C.A.S., Animal Science Department, University of Wyoming,
Laramie, Wyoming.
Ann B. Kier, D.V.M., PH.D., Associate Professor, Departments of Pathology and
Laboratory Animal Medicine, University of Cincinnati Medical Center, Cincinnati,
Ohio.
Robert L. Kilgore, D.V.M., Fayetteville, Arkansas.
Cleon V. Kimberling, D.V.M ., M.P.H., Veterinary Teaching Hospital, Colorado State
University, Fort Collins, Colorado.
John M. King, D.V.M., PH.D., Professor, New York State College of Veterinary
Medicine, Cornell University, Ithaca, New York.
Newton Kingston, B. A., M .SC ., PH .D ., Professor of Parasitology, Department of
Veterinary Sciences, College of Agriculture, University of Wyoming, Laramie,
Wyoming.
Rebecca Kirby, D.V.M., DIP.A.C.V.I.M., A.C.V.E.C.C., Director of Education, Veterinary
Institute of Trauma, Emergency and Critical Care, Animal Emergency Center,
Milwaukee, Wisconsin.
John H. Kirk, D.V.M., Large Animal Surgery and Medicine, College of Veterinary
Medicine, Auburn University, Auburn, Alabama.
Carl E. Kirkpatrick, B.S., V.M .D., PH.D., (Deceased), Urbana, Illinois.
Allan C. Kirkwood, Beer, Seaton, Devon, England.
Mark D. Kittleson, D.V.M., PH.D., Department of Medicine, School of Veterinary
Medicine, University of California, Davis, California.
Thomas R. Klei, PH.D., Professor of Parasitology, Department of Veterinary
Microbiology and Parasitology, School of Veterinary Medicine, Louisiana State
University, Baton Rouge, Louisiana.
Stanley H. Kleven, D.V.M ., PH.D., Professor, Department of Avian Medicine, College
of Veterinary Medicine, University of Georgia, Athens, Georgia.
Donald P. Knowles, Jr., D.V.M., PH.D., Veterinary Medical Officer, U.S. Department of
Agriculture, Agricultural Research Service, Animal Disease Research Unit,
Washington State University, Pullman, Washington.
Deborah T. Kochevar, D.V.M ., PH.D., Department of Veterinary Physiology and
Pharmacology, College of Veterinary Medicine, Texas A & M University, College
Station, Texas.
Erwin M. Kohler, D.V.M., PH.D., Food Animal Health Research Program, Ohio
Agricultural Research and Development Center, Wooster, Ohio.
Loren D. Koller, D.V.M., PH.D., College of Veterinary Medicine, Oregon State University,
Corvallis, Oregon.
Lloyd D. Konyha, D.V.M., M .S., U.S. Department of Agriculture-APHIS, Tampa,
Florida.
Joe N. Kornegay, D.V.M., PH.D., Professor of Neurology, College of Veterinary
Medicine, North Carolina State University, Raleigh, North Carolina.
Alan L. Kraus, D.V.M ., Professor and Chairman, Division of Laboratory Animal
Medicine, Professor of Pathology, and Director of the Vivarium, School of
Medicine and Dentistry, University of Rochester, Rochester, New York.
Colaboradores XXVI

Donald R. Krawiec, D.V.M., M.S., PH.D., College of Veterinary Medicine, University of


Illinois, Urbana, Illinois.
Ned F. Kuehn, B.A., D.V.M ., M.S., DIP.A.C.V.I.M., Chief of Staff, Professional Veterinary
Hospitals Specialists Center, Allen Park, Michigan.
S.E. Kunz, PH.D., Laboratory Director, Knipling-Bushland U.S. Livestock Insects
Laboratory, U.S. Department of Agriculture, Agricultural Research Service,
Kerrville, Texas.
J.L. Lancaster, PH.D., Veterinary Entomologist, Department of Entomology, University
of Arkansas, Fayetteville, Arkansas.
J.G. Lane, B.VET.MED., F.R.C.V.S., Department of Veterinary Surgery, University of
Bristol, Langford House, Langford, Bristol, U.K.
Thomas J. Lane, B.S., D.V.M., Extension Veterinarian, University of Florida, Gainesville,
Florida.
Garrick C.M. Latch, M.(AGR.)SC., PH.D., D.S.I.R. Plant Protection, Palmerston North,
New Zealand.
Michael J. Lees, D.V.M ., M.V .SC., Lecturer, Equine Surgery, Division of Applied
Veterinary Medicine, School of Veterinary Studies, Murdoch University, Murdoch,
Western Australia.
Peter Lees, B.PHARM., PH.D., F.I.BIOL., HON. ASSOC. R.C.V.S., Professor, Department of
Veterinary Basic Sciences, Royal Veterinary College, Hawkshead Campus,
Hatfield, Hertfordshire, U.K.
Louis Leibovitz, V.M.D., Professor Emeritus, Department of Avian and Aquatic Animal
Medicine, New York State College of Veterinary Medicine, Cornell University,
Ithaca, New York.
H.W. Leipold, D.V.M., PH.D., Department of Pathology, College of Veterinary Medicine,
Kansas State University, Manhattan, Kansas.
Norman D. Levine, PH.D., D.SC., Professor Emeritus, College of Veterinary Medicine,
University of Illinois, Urbana, Illinois.
Karl A. Linklater, B.V.M. & S., PH.D., F.R.C.V.S., Director, Scottish Veterinary Investigation
Service, The Scottish Agricultural College, Perth, Scotland.
Barry A. Lissman, D.V.M., Sachem Animal Hospital and Long Island Mobile Veterinary
Clinics, Holbrook, New York.
Peter B. Little, D.V.M., M .S., PH.D., Professor, Department of Pathology, Ontario
Veterinary College, University of Guelph, Guelph, Ontario, Canada.
Irwin K.M. Liu, D.V.M ., PH.D., Professor, Department of Veterinary Reproduction,
School of Veterinary Medicine, University of California, Davis, California.
John E. Lloyd, PH.D., Professor of Entomology, Department of Plant, Soil and Insect
Sciences, University of Wyoming, Laramie, Wyoming.
W. Eugene Lloyd, D.V.M., PH.D., Vet-A-Mix, Inc., Shenandoah, lowa.
Ted F. Lock, D.V.M ., M.S., DIP.A.C.T., College of Veterinary Medicine, University of
Illinois, Urbana, Illinois.
Walter F. Loeb, V.M .D., M .SC., PH.D., Ani Lytics Inc., Gaithersburg, Maryland.
Jeanne Lofstedt, B.V.SC., M.S., DIP.A.C.V.I.M ., Associate Professor, Department of
Health Management, Atlantic Veterinary College, University of Prince Edward
Island, Charlottetown, P.E.I., Canada.
Peter L. Long, D.SC., PH.D., Department of Poultry Science, University of Georgia,
Athens, Georgia.
Susan L. Longhofer, D.V.M., M .S., M.S.D.R.L., Rahway, New Jersey.
Colaboradores XXVII

Juan Lubroth, D.V.M., M.S., Comisión México-Estados Unidos para la Prevención de la Fiebre
Aftosa y Otras Enfermedades Exóticas de los Animales, Colonia Polanco, México.
Phil D. Lukert, D.V.M., PH.D., Department of Medical Microbiology, College of
Veterinary Medicine, University of Georgia, Athens, Georgia.
John H. Lumsden, D.V.M., M.SC., DIP.CLIN.PATH., Professor, Department of Pathology,
Ontario Veterinary College, University of Guelph, Guelph, Ontario, Canada.
R.L. Lundvall, D.V.M ., M .S., Professor, Veterinary Clinical Sciences, Veterinary
Teaching Hospital, Iowa State University, Ames, lowa.
George Lust, PH.D., Professor of Physiological Chemistry, New York State College
of Veterinary Medicine, Cornell University, Ithaca, New York.
Eugene T. Lyons, PH.D., Professor, Department of Veterinary Science, Gluck Equine
Research Center, University of Kentucky, Lexington, Kentucky.
Gordon K. Macleod, B.S.A., M.S., PH.D., Professor Emeritus, Department of Animal
and Poultry Science, University of Guelph, Guelph, Ontario, Canada.
Keith T. Maddy, D.V.M., M.P.H., Pesticide Health and Safety Advisor, California
Department of Food and Agriculture, Sacramento, California.
John E. Madigan, D.V.M., M.S., Department of Medicine, School of Veterinary
Medicine, University of California, Davis, California.
J.G. Manns, B .S .A ., M. SC ., PH .D ., University of Saskatchewan, Saskatoon,
Saskatchewan, Canada.
Douglas C. Maplesden, D.V.M., M .S.A., PH.D., Consultant, Fort Lauderdale, Florida.
Reuben J. Mapletoft, D.V.M., M .S., PH.D., Professor, Department of Herd Medicine and
Theriogenology, Western College of Veterinary Medicine, University of
Saskatchewan, Saskatoon, Saskatchewan, Canada.
Richard F. Marsh, D.V.M., PH.D., Professor, Department of Veterinary Science,
University of Wisconsin, Madison, Wisconsin.
A. Edward Marshall, D.V.M., PH.D., Associate Professor, Department of Anatomy and
Histology, College of Veterinary Medicine, Auburn University, Auburn, Alabama.
Charles L. Martin, D.V.M., M .S., Director, Veterinary Teaching Hospital, Professor,
Small Animal Medicine, College of Veterinary Medicine, University of Georgia,
Athens, Georgia.
Sharron L. Martin, D.V.M., M.SC., Professor, Department of Veterinary Clinical
Sciences, Ohio State University, Columbus, Ohio.
William J. Mathey, B.S., V.M .D., PH.D., Nipomo, California.
Carl Patrick McCoy, D.V.M., M .S., DIP.A.B.V.T., Associate Professor, College of Veterinary
Medicine, Mississippi State University, Mississippi State, Mississippi.
Leslie E. McDonald, D.V.M., PH.D., Stillwater, Oklahoma.
J.B. McFerran, PH.D., D.SC., M .R.C.V.S., F.R.AG.S., Professor, Veterinary Research
Laboratories, Stormont, Belfast, Northern Ireland.
C. Wayne Mcllwraith, B.V.SC., M.S., PH.D., M.R.C.V.S., Professor, Department of Clinical
Sciences, College of Veterinary Medicine and Biomedical Sciences, Colorado
State University, Fort Collins, Colorado.
Quintin A. McKellar, B.V.M.S., PH.D., M.R.C.V.S., Acting Head, Department of Veterinary
Pharmacology, University of Glasgow, Bearsden, Glasgow, Scotland.
Pauline E. McNeil, B.V.M .S., PH.D., M .R.C.V.S., Department of Veterinary Pathology,
University of Glasgow Veterinary School, Bearsden, Glasgow, Scotland.
M.S. McNulty, M.V.B., PH.D., M.R.C.V.S., Veterinary Research Laboratories, Stormont,
Belfast, Northern Ireland.
Colaboradores XXVIII

Charles A. Mebus, D. V . M ., PH. D., Laboratory Chief, U.S. Department of


Agriculture-APHIS, Foreign Animal Disease Diagnostic Laboratory, Greenport,
New York.
William Medway, B.S., D.V.M., PH.D., M.A.(HON), Professor Emeritus, School of Veterinary
Medicine, University of Pennsylvania, Philadelphia, Pennsylvania.
Gavin L. Meerdink, D.V.M., DIP.A.B.V.T ., College of Veterinary Medicine, University of
Illinois, Urbana, Illinois.
Paula I. Menzies, D.V.M., M.P.V.M., Assistant Professor, Department of Population
Medicine, Ontario Veterinary College, University of Guelph, Guelph, Ontario,
Canada.
Michael J. Meredith, M.A., B.SC., B. VET . MED., PH.D., M.R.C.V.S., Department of Clinical
Veterinary Medicine, University of Cambridge, Cambridge, England.
Donald J. Meuten, D.V.M., PH.D., Professor of Pathology, College of Veterinary
Medicine, North Carolina State University, Raleigh, North Carolina.
Janice M. Miller, D.V.M., PH.D., Veterinary Medical Officer, U.S. Department of
Agriculture, Agricultural Research Service, National Animal Disease Center,
Ames, lowa.
Richard B. Miller, B.SC., D.V.M., PH.D., DIP.A.C.V.P., Chairman and Professor, Department
of Pathology, Ontario Veterinary College, University of Guelph, Guelph, Ontario,
Canada.
Frank J. Milne, D.V.M., DR.MED.VET ., M .R.C.V.S., (Deceased), Guelph, Ontario, Canada.
Karen A. Moriello, D.V.M., DIP.A.C.V.D., Clinical Assistant Professor of Dermatology,
School of Veterinary Medicine, University of Wisconsin, Madison, Wisconsin.
A.J. Morley, B.V.SC., Rainbow Chicken Farms (Pty.) Ltd., Hammarsdale, Republic of
South Africa.
Debra Deem Morris, D.V.M., M.S., Associate Professor, Department of Large Animal
Medicine, College of Veterinary Medicine, University of Georgia, Athens, Georgia.
Mark L. Morris, Jr., D.V.M., PH.D., Veterinary Clinical Nutritionist, Topeka, Kansas.
Robert B. Morrison, D.V.M., PH.D., University of Minnesota, St. Paul, Minnesota.
W.l. Morrison, PH.D., B.V.M.S., Agricultural and Food Research Council Institute for
Animal Health, Compton Laboratory, Compton, Nr. Newbury, Berkshire, England.
Raymond L. Morter, D.V.M., PH.D., West Lafayette, Indiana.
Edward A. Moser, M .S., V.M.D., DIP.A.C.V.N., Veterinary Nutritionist, North East,
Maryland.
C. Anne Muckle, D.V.M., M .SC., PH.D., Assistant Professor, Department of Veterinary
Microbiology and Immunology, Ontario Veterinary College, University of Guelph,
Guelph, Ontario, Canada.
Thomas P. Mullaney, M.V.B., PH.D., M.R.C.V.S., Department of Pathology, Animal
Health Diagnostic Laboratory, Michigan State University, East Lansing, Michigan.
Peter C. Mullowney, M .V.B., M .S., M .R.C.V.S., Melcomb House, Newport, County Mayo,
Ireland.
Michael J. Murray, D.V.M ., M.S., DIP.A.C.V.I.M., Marion du Pont Scott Equine Medical
Center, Leesburg, Virginia.
Mitchell Durno Murray, B.SC.(VET.SC.), F.R.C.V.S., M.A.C.V.SC., Pymble, N.S.W., Australia.
Vinand M. Nantulya, M.D., PH.D., M.R.C.PATH., International Laboratory for Research
on Animal Diseases, Nairobi, Kenya.
Opendra Narayan, D.V.M., Professor of Comparative Medicine, Professor of Neurology,
The Johns Hopkins University School of Medicine, Baltimore, Maryland.
Colaboradores XXIX

Mark P. Nasisse, D.V.M., DIP.A.C.V.O., College of Veterinary Medicine, North Carolina


State University, Raleigh, North Carolina.
J.M. Ndung’u, B.V.M., PH.D., Ministry of Research, Science and Technology, Kenya
Trypanosomiasis Research Institute, Muguga, Kikuyu, Kenya.
T. Mark Neer, D.V.M., DIP.A.C.V.I.M., Associate Professor of Medicine, Department of
Clinical Sciences, College of Veterinary Medicine, Louisiana State University,
Baton Rouge, Louisiana.
Christian E. Newcomer, V.M. D., Clinical Associate Professor, Department of
Comparative Medicine, School of Veterinary Medicine, Tufts University, and
Director, Division of Laboratory Animal Medicine, Tufts-New England Medical
Center, Boston, Massachusetts.
John A. Newman, D.V.M., PH.D., Professor, Department of Veterinary Pathobiology,
College of Veterinary Medicine, University of Minnesota, St. Paul, Minnesota.
Paul Nicoletti, D.V.M., M .S., College of Veterinary Medicine, University of Florida,
Gainesville, Florida.
N. Ole Nielsen, D.V.M., PH.D., Dean, Ontario Veterinary College, University of Guelph,
Guelph, Ontario, Canada.
R.A.I. Norval, PH.D., D.SC., International Laboratory for Research on Animal Disea-
ses, Nairobi, Kenya.
Dennis P. O’Brien, D.V.M., PH.D., Department of Veterinary Medicine and Surgery,
College of Veterinary Medicine, University of Missouri, Columbia, Missouri.
Joan A. O’Brien, V.M .D., A.C.V.I.M., (Deceased), Philadelphia, Pennsylvania.
Michael W. O’Callaghan, B.V.SC., M.SC.V., PH.D., M.R.C.V.S., Department of Surgery,
School of Veterinary Medicine, Tufts University, North Grafton, Massachusetts.
Frederick W. Oehme, D.V.M., PH.D., Professor of Toxicology, Medicine and Physiology,
and Director, Comparative Toxicology Laboratories, Kansas State University,
Manhattan, Kansas.
J.E. Oldfield, PH.D., Professor Emeritus, Department of Animal Science, Oregon
State University, Corvallis, Oregon.
N. Bari Olivier, D.V.M ., PH.D., Assistant Professor, Internal Medicine and Physiology,
Department of Physiology and Small Animal Clinical Sciences, Michigan State
University, East Lansing, Michigan.
E. Christopher Orton, D.V.M., PH.D., Associate Professor, Veterinary Teaching
Hospital, College of Veterinary Medicine and Biomedical Sciences, Colorado
State University, Fort Collins, Colorado.
Gary D. Osweiler, D.V.M., M.S., PH.D., Veterinary Diagnostic Laboratory, College of
Veterinary Medicine, Iowa State University, Ames, lowa.
Richard L. Ott, B.S., D.V.M., Professor Emeritus, Washington State University,
Pullman, Washington.
Randall S. Ott, D.V.M., M.S., DIP.A.C.T., Professor, Department of Veterinary Clinical
Medicine, College of Veterinary Medicine, University of Illinois, Urbana, Illinois.
Robert Kenny Page, D V.M., M.S., Poultry Disease Research Center, Athens, Georgia.
N.C. Palmer, D.V.M., M.SC., PH.D., Veterinary Laboratory Services, Ontario Ministry of
Agriculture and Food, Guelph, Ontario, Canada.
Mary Rose Paradis, D.V.M., M.S., DIP.A.C.V.I.M., School of Veterinary Medicine, Tufts
University, North Grafton, Massachusetts.
Joane Parent, B.SC., D.V.M., M.VET.SC., DIP.A.C.V.I.M., Associate Professor, Department of
Veterinary Clinical Studies, Ontario Veterinary College, Guelph, Ontario, Canada.
Colaboradores XXX

Alan J. Parker, M.R.C.V.S., PH.D., Department of Veterinary Clinical Medicine, College


of Veterinary Medicine, University, of Illinois, Urbana, Illinois.
Jill E. Parker, V.M.D., DIP.A. C.V.S., Assistant Professor of Large Animal Surgery,
Department of Veterinary Clinical Sciences, Purdue University, West Lafayette,
Indiana.
Robert B. Parker, D.V.M ., DIP.A.C.V .S., Associate Professor and Chief, Small Animal
Surgery, College of Veterinary Medicine, University of Florida, Gainesville, Florida.
Wendy Parker, D.V.M., Associate Professor, Department of Clinical Studies, Ontario
Veterinary College, University of Guelph, Guelph, Ontario, Canada.
Willis G. Parker, D.V.M., M .SC., Clinical Theriogenologist, Veterinary Department,
American Breeders Service, DeForest, Wisconsin.
John R. Pascoe, B.V.SC., PH.D., DIP.A.C.V.S., Associate Professor, Department of
Surgery, and Chief, Equine Surgery Service, School of Veterinary Medicine,
University of California, Davis, California.
Nephi M. Patton, D.V.M., PH.D., Director, Rabbit Research Center, Oregon State
University, Corvallis, Oregon.
Sharon Patton, M.S., PH.D., Associate Professor, College of Veterinary Medicine,
University of Tennessee, Knoxville, Tennessee.
Robert D. Pechman, D.V.M., Veterinary Clinical Sciences, School of Veterinary
Medicine, Louisiana State University, Baton Rouge, Louisiana.
Niels C. Pedersen, D.V.M ., PH.D., Professor, Small Animal Internal Medicine,
Department of Medicine, School of Veterinary Medicine, University of California,
Davis, California.
Paul W. Pennock, B.S., D.V.M., M.SC., DIP.A.C.V.R., Professor, Department of Clinical
Studies, Ontario Veterinary College, University of Guelph, Guelph, Ontario, Canada.
Richard H.C. Penny, D.V.SC., PH.D., F .R.C.V.S., D.P.M., Austrey, Nr. Atherstone,
Warwickshire, England.
Maurice B. Pensaert, D.V.M., PH.D., Professor, Laboratory of Virology-lmmunology,
Faculty of Veterinary Medicine, State University of Gent, Gent, Belgium.
Brian D. Perry, B.V.M . & S., D.T .V.M., M.SC., D.V.M. & S., M .R.C.V.S., International
Laboratory for Research on Animal Diseases, Nairobi, Kenya.
Tilden Wayne Perry, B.ED., B.S., M.S., PH.D., Professor of Animal Nutrition, Department
of Animal Sciences, Purdue University, West Lafayette, Indiana.
Mark E. Peterson, D.V.M., Head, Division of Endocrinology, The Animal Medical
Center, New York, New York.
James E. Phillips, D.V.M. & S., B.SC., M.R.C.V.S., Department of Veterinary Pathology,
Royal (Dick) School of Veterinary Studies, University of Edinburgh, Summerhall,
Edinburgh, Scotland.
Guy L. Pidgeon, D.V.M ., DIP.A.C.V.I.M., Associate Director, Department of Veterinary
Affairs, Hill’s Pet Products, Topeka, Kansas.
Carlos Pijoan, D.V.M ., PH.D., College of Veterinary Medicine, University of Minnesota,
St. Paul, Minnesota.
Edwin I. Pilchard, D.V.M., M .S., PH.D., Silver Spring, Maryland.
Hugh M. Pirie, B.V.M.S., PH.D., M.R.C.V.S., F.R.C.PATH., Professor, University of Glasgow
Veterinary School, Bearsden, Glasgow, Scotland.
J.F. Prescott, M .A., VET.M.B., PH.D., Department of Veterinary Microbiology and
Immunology, Ontario Veterinary College, University of Guelph, Guelph, Ontario,
Canada.
Colaboradores XXXI

John M. Preston, B.V.M.S., PH.D., M.R.C.V.S., Executive Director, M.S.D. AGVET,


Rahway, New Jersey.
R.K. Prichard, B.SC., PH.D., Professor, Institute of Parasitology of McGill University,
Macdonald College, Ste-Anne de Bellevue, Quebec, Canada.
Jim E. Proctor, D.V.M., PH.D., Bristol-Myers Co., Evansville, Indiana.
George W. Pugh, Jr., D.V.M ., PH.D., National Animal Disease Center, U.S. Department
of Agriculture, Agricultural Research Service, Ames, lowa.
H. Graham Purchase, B.V.SC., M.R.C.V.S., PH.D., College of Veterinary Medicine,
Mississippi State University, Mississippi State, Mississippi.
Roger E. Purnell, D.SC., F .I.BIOL., F.R.C.PATH., PH.D., Technical Services Manager,
Animal Health Division, Pfizer Ltd., Sandwich, Kent, England.
Marc A. Rachofsky, M.S., D.V.M., DIP.A.C.V.D., Allergy and Dermatology Clinic for
Animals, Dallas, Texas.
O.M. Radostits, D.V.M., M .S., DIP.A.C.V.I.M., Professor and Head, Department of
Veterinary Internal Medicine, Western College of Veterinary Medicine, University
of Saskatchewan, Saskatoon, Saskatchewan, Canada.
William C. Rebhun, D.V.M ., DIP.A.C.V.O., DIP.A.C.V.I.M ., Professor of Ophthalmology
and Large Animal Medicine, New York State College of Veterinary Medicine,
Cornell University, Ithaca, New York.
Willie M. Reed, D.V.M., PH.D., Professor of Pathology, Animal Health Diagnostic
Laboratory and Department of Pathology, College of Veterinary Medicine, Michigan
State University, East Lansing, Michigan.
Hugh W. Reid, B.V.M . & S., D.T.V.M ., PH.D., M .R.C.V.S., Moredun Research Institute.
Edinburgh, Scotland.
Keith R. Rhoades, D.V.M., PH.D., Veterinary Medical Officer, National Animal Disease
Center, Ames, lowa.
James A. Richardson, D.V.M ., PH.D., Assistant Professor, Division of Comparative
Medicine, Department of Pathology, University of Texas Southwestern Medical
Center at Dallas, Dallas, Texas.
C. Riddell, D.V.M., PH.D., Western College of Veterinary Medicine, University of
Saskatchewan, Saskatoon, Saskatchewan, Canada.
Richard B. Rimler, PH.D., Microbiologist, National Animal Disease Center, Ames,
lowa.
Ronald J. Roberts, B.V.M.S., PH.D., M.R.C.V.S., F .R.C.PATH., F .I.BIOL., F.R.S.E., Professor,
Institute of Aquaculture, University of Stirling, Stirling, Scotland.
James T. Robertson, D.V.M., DIP.A.C.V.S., Veterinary Hospital, Ohio State University,
Columbus, Ohio.
C. Lee Robinette, D.V.M., PH.D., Associate Professor of Pharmacology and Toxicology,
College of Veterinary Medicine, North Carolina State University, Raleigh, North
Carolina.
James F. Roche, M.AGR.SC., PH.D., D.SC., Department of Animal Husbandry and
Production, University College Dublin, Ballsbridge, Dublin, Ireland.
Barton W. Rohrbach, V.M.D., M .P.H., Associate Professor, Department of Rural Practic-
e, College of Veterinary Medicine, University of Tennessee, Knoxville, Tennessee.
R.A. Roncalli, D.V.M., M .S., M.S.D.R.L., Rahway, New Jersey.
John K. Rosenberger, B.S., M.S., PH.D., Professor and Department Chairperson,
Department of Animal Science and Agricultural Biochemistry, University of
Delaware, Newark, Delaware.
Colaboradores XXXII

Robert C. Rosenthal, D.V.M., M.S., PH.D., DIP.A.C.V.I.M., Veterinary Specialists of


Rochester, Rochester, New York.
James N. Ross, Jr., D.V.M ., M.SC., PH.D., DIP.A.C. V.I.M., DIP.A. C.V.E.C.C., Professor and
Chairman, Department of Medicine, Tufts University School of Veterinary Medicine,
North Grafton, Massachusetts.
Linda A. Ross, D.V.M., M .S., DIP.A.C.V.I.M., Associate Professor, School of Veterinary
Medicine, Tufts University, North Grafton, Massachusetts.
Paul B. Rossiter, B. VET .MED., M.SC., PH.D., M.R.C.V.S., National Veterinary Research
Centre, Kenya Agricultural Research Institute, Muguga, Kikuyu, Kenya.
Loyd D. Rowe, D.V.M., M.S., DIP.A.B.V.T., U.S. Department of Agriculture, Agricultural
Research Service, Food Animal Protection Research Laboratory, College Station,
Texas.
Stanley I. Rubin, D.V.M., M.S., DIP.A.C.V.I.M., Professor, Department of Veterinary
Internal Medicine, Western College of Veterinary Medicine, University of
Saskatchewan, Saskatoon, Saskatchewan, Canada.
Michael D. Ruff, B.S., M.S., PH.D., Research Leader, Protozoan Diseases Laboratory,
Livestock and Poultry Sciences Institute, U.S. Department of Agriculture,
Agricultural Research Service, Beltsville, Maryland.
George R. Ruth, D.V.M., PH.D., DIP.A.C.V.P., Professor, Veterinary Diagnostic Laboratory,
University of Minnesota, St. Paul, Minnesota.
J.M. Rutter, B.V.M. & S., B.SC., PH.D., M .R.C.V.S., Veterinary Medicines Directorate, New
Haw, Weybridge, Surrey, England.
Y.M. Saif, D.V.M., PH.D., Professor, Food Animal Health Research Program, Ohio Agricultural
Research and Development Center, Ohio State University, Wooster, Ohio.
Tirath S. Sandhu, B.V.SC. & A.H., M .S., PH.D., Veterinarian, Department of Avian and
Aquatic Animal Medicine, New York State College of Veterinary Medicine, Cornell
University, Duck Research Laboratory, Eastport, New York.
F.T. Satalowich, D.V.M ., M.S.P.H., Director, Bureau of Veterinary Public Health,
Missouri Department of Health, Jefferson City, Missouri.
Charles M. Scanlan, D.V .M ., PH .D., Department of Veterinary Pathobiology, Texas
Veterinary Medical Center, Texas A & M University, College Station, Texas.
K.A. Schat, D.V.M., PH.D., Professor, Department of Avian and Aquatic Animal
Medicine, New York State College of Veterinary Medicine, Cornell University,
Ithaca, New York.
H. Bruno Schiefer, D.V.M., PH.D., Director, Toxicology Research Centre, University of
Saskatchewan, Saskatoon, Saskatchewan, Canada.
Donald H. Schlafer, D.V.M., M.S., PH.D., DIP.A.C.V.P., DIP.A.C.V.M., DIP.A.C.T., Associate
Professor, Department of Veterinary Pathology, New York State College of
Veterinary Medicine, Cornell University, Ithaca, New York.
D.G. Schmitz, D.V.M., M.S., Associate Professor, Department of Large Animal
Medicine and Surgery, College of Veterinary Medicine, Texas A & M University,
College Station, Texas.
Norman R. Schneider, D.V.M., M .SC., DIP.A.B.V.T ., Department of Veterinary Science,
University of Nebraska, Lincoln, Nebraska.
Philip J. Scholl, PH.D., Research Entomologist, Knipling-Bushland U.S. Livestock
Insects Laboratory, Kerrville, Texas.
Edward C. Schroeder, D.V.M., M.S., College of Veterinary Medicine, University of
Tennessee, Knoxville, Tennessee.
Colaboradores XXXIII

Kevin T. Schultz, D.V.M ., PH.D., Associate Professor, Department of Pathobiological


Sciences, School of Veterinary Medicine, and Unit Director Microbiology and
Immunology, Wisconsin Regional Primate Research Center, University of
Wisconsin, Madison, Wisconsin.
T. Michael Schwartz, D .V. M ., White House Station, New Jersey.
Robert M. Schwartzman, V.M . D., M . P.H ., PH .D ., Professor of Dermatology, School
of Veterinary Medicine, University of Pennsylvania, Philadelphia, Pennsylvania.
Milton L. Scott, PH .D., The Jacob Gould Schurman Professor of Nutrition Emeritus
at Cornell University, Ithaca, New York.
Charles J. Sedgwick, D .V. M ., DIP. A. C.L. A.M ., DIP.A .C. Z. M ., School of Veterinary
Medicine, Tufts University, North Grafton, Massachusetts.
Brad Seguin, D.V .M., M .S., PH.D., DIP.A .C.T. , Professor and Interim Chair, Department
of Clinical and Population Sciences, College of Veterinary Medicine, University
of Minnesota, St. Paul, Minnesota.
Robert F. Sellers, SC . D., M .R .C. V. S., F. I.BIOL ., F . R.S .E ., Guildford, Surrey, England.
J.M. Sharp, PH. D., B .V .M .S ., M .R. C.V .S ., Animal Diseases Research Association,
Moredun Research Institute, Edinburgh, Scotland.
Nicholas J.H. Sharp, B. VET .MED., M. V. M ., M .R. C.V .S ., DIP. A.C .V .S ., College of
Veterinary Medicine, North Carolina State University, Raleigh, North Carolina.
Linda G. Shell, D.V. M., DIP .A.C. V.I.M ., Department of Small Animal Clinical Sciences,
Virginia-Maryland Regional College of Veterinary Medicine, Virginia
Polytechnic Institute and State University, Blacksburg, Virginia.
J.E. Shelle, B .S ., M .S ., PH .D., Associate Professor of Animal Science, Michigan
State University, East Lansing, Michigan.
David M. Sherman, D. V. M., M. S., DIP. A. C.V .I. M ., Associate Professor, Department
of Medicine, School of Veterinary Medicine, Tufts University, North Grafton,
Massachusetts.
Chatur S. Sisodia, B. V. SC. & A. H., M. S., PH .D., Professor, Department of Veterinary
Physiological Sciences, Western College of Veterinary Medicine, University
of Saskatchewan, Saskatoon, Saskatchewan, Canada.
J. Owen D. Slocombe, D. I.C .T .A ., D. V. M., PH .D ., Department of Pathology, Ontario
Veterinary College, University of Guelph, Guelph, Ontario, Canada.
Alvin W. Smith, D. V. M., PH. D. , Professor, College of Veterinary Medicine, Oregon
State University, Corvallis, Oregon.
Bradford B. Smith, D. V. M., PH. D., College of Veterinary Medicine, Oregon State
University, Corvallis, Oregon.
Donald F. Smith, D. V. M., Professor of Surgery, and Associate Dean for Veterinary
Education, College of Veterinary Medicine, Cornell University, Ithaca, New
York.
H.J. Smith, B .SC .( AGR.), D. V. M., M. V.SC ., Research Scientist, Health of Animals
Laboratory, Health of Animals Division, Agriculture Canada, Sackville, New
Brunswick, Canada.
John M.B. Smith, PH .D., Associate Professor, Department of Microbiology,
University of Otago, Dunedin, New Zealand.
Joseph E. Smith, D. V.M ., PH. D., Head, Department of Pathology, College of
Veterinary Medicine, Kansas State University, Manhattan, Kansas.
L.L. Smith, D. V. M., M .SC ., Associate Professor, Department of Clinical Studies,
Ontario Veterinary College, University of Guelph, Guelph, Ontario, Canada.
Colaboradores XXXIV

Malcolm Herbert Smith, D.V.M ., PH.D., Professor and Chairman, Department of


Veterinary and Microbiological Sciences, North Dakota State University, Fargo,
North Dakota.
Mark M. Smith, V.M .D., Virginia-Maryland Regional College of Veterinary Medicine,
Virginia Polytechnic Institute and State University, Blacksburg, Virginia.
David R. Snodgrass, B.V. M.S., PH.D., D.SC., M.R.C.V.S., M.R.C.PATH., Moredun Research
Institute, Edinburgh, Scotland.
Glenn H. Snoeyenbos, D.V.M., Paige Laboratory, University of Massachusetts,
Amherst, Massachusetts.
Stanley P. Snyder, D.V.M., M .S., PH.D., Director, Veterinary Diagnostic Laboratory,
Oregon State University, Corvallis, Oregon.
Mark D. Soll, B.V.SC., M.S.D.R.L., Rahway, New Jersey.
Josip Spalatin, PH.D., Lecturer, Department of Veterinary Science, University of
Wisconsin, Madison, Wisconsin.
Glen L. Spaulding, D.V.M., DIP.A.C.V.I.M ., Director, Laboratory Animal Medicine, and
Assistant Professor, Department of Environmental Studies and Department of
Medicine, School of Veterinary Medicine, Tufts University, North Grafton,
Massachusetts.
Joseph S. Spinelli, D.V.M., Animal Care and Cell Culture Facility, University of
California, San Francisco, California.
Wilfred T. Springer, B.S., D.V.M., M.S., PH.D., Department of Veterinary Science,
Louisiana State University, Baton Rouge, Louisiana.
Robert R. Steckel, D.V.M., M .S., DIP.A.C.V.S., Assistant Professor of Surgery, School of
Veterinary Medicine, Tufts University, North Grafton, Massachusetts.
James H. Steele, D.V.M., M.P.H., Professor Emeritus, School of Public Health,
University of Texas, Houston, Texas.
George Stein Jr., B.S., D.V.M., M.S., Animal Health Laboratory, Maryland Department
of Agriculture, Salisbury, Maryland.
Toby D. St. George, D.V.SC., C.S.I.R.O., Long Pocket Laboratories, Indooroopilly,
Brisbane, Queensland, Australia.
Margaret E. Stoddart, B.SC., B.VET.MED., PH.D., D.V.R., M.R.C.V.S., Somerset, England.
J. Storz, D.V.M., PH.D., Professor and Head, Department of Veterinary Microbiology
and Parasitology, School of Veterinary Medicine, Louisiana State University,
Baton Rouge, Louisiana.
Michael K. Stoskopf, D.V.M., PH.D., DIP.A.C.Z.M., Professor and Department Head,
Department of Companion Animal and Special Species Medicine, College of
Veterinary Medicine, North Carolina State University, Raleigh, North Carolina.
Bert E. Stromberg, PH.D., Professor, Department of Veterinary Pathobiology, College
of Veterinary Medicine, University of Minnesota, St. Paul, Minnesota.
John David Summers, B.S.A., M .S.A., PH.D., Department of Animal and Poultry
Science, University of Guelph, Guelph, Ontario, Canada.
G. Sumner-Smith, B.V.SC., M.SC., D.V.SC., F.R.C.V.S., Professor, Department of Clinical
Studies, Ontario Veterinary College, University of Guelph, Guelph, Ontario,
Canada.
T.W. Swerczek, D.V.M., PH.D., Department of Veterinary Science, University of
Kentucky, Lexington, Kentucky.
Vincent N. Tanya, D.V.M., M .S., Department of Infectious Diseases, College of
Veterinary Medicine, University of Florida, Gainesville, Florida.
Colaboradores XXXV

David John Taylor, M.A., PH.D., VET.M.B., M.R.C.V.S., Department of Veterinary Pathology,
University of Glasgow Veterinary School, Bearsden, Glasgow, Scotland.
Stuart M. Taylor, PH.D., B.V.M.S., M.R.C.V.S., Senior Veterinary Research Officer,
Veterinary Research Laboratories, Stormont, Belfast, Northern Ireland.
A.B. Thiermann, D.V.M., PH.D., Deputy Administrator, International Services, Animal
and Plant Health Inspection Service, U.S. Department of Agriculture, Washing-
ton, D.C.
Charles O. Thoen, D.V.M., PH.D., Professor, Department of Microbiology, Immunology
and Preventive Medicine, College of Veterinary Medicine, Iowa State University,
Ames, lowa.
Annette D. Thomas, M.SC., M.A.S.M., Principal Microbiologist, Oonoonba Veterinary
Laboratory, Townsville, Queensland, Australia.
H. Thompson, PH.D., B.V.M.S., M.R.C.V.S., Department of Veterinary Pathology,
University of Glasgow Veterinary School, Bearsden, Glasgow, Scotland.
John R. Thornton, B.V.SC., M.SC., PH.D., Reader in Veterinary Medicine, Department
of Companion Animal Medicine and Surgery, University of Queensland,
Queensland, Australia.
Peter J. Timoney, M .V.B., M.S., PH.D., F .R.C.V.S., Professor, Maxwell H. Gluck Equine
Research Center, Department of Veterinary Science, University of Kentucky,
Lexington, Kentucky.
Ian R. Tizard, B.V.M . & S., PH.D., M.R.C.V.S ., Professor, Department of Veterinary
Pathobiology, College of Veterinary Medicine, Texas A & M University, College
Station, Texas.
Deoki N. Tripathy, B.V. SC. & A.H., PH.D., DIP.A.C.V.M., Professor, Department of
Veterinary Pathobiology, College of Veterinary Medicine, University of Illinois,
Urbana, Illinois.
Leander Tryphonas, D.V.M., PH.D., Ottawa, Ontario, Canada.
Alan Tucker, PH.D., Professor, Department of Physiology, Colorado State University,
Fort Collins, Colorado.
Harold W. Tvedten, D.V.M ., PH.D., DIP.A.C.V.P., Clinical Pathologist, Department of
Pathology, College of Veterinary Medicine, Michigan State University, East
Lansing, Michigan.
David E. Tyler, D.V.M., M.S., PH.D., Professor, Department of Veterinary Pathology,
College of Veterinary Medicine, University of Georgia, Athens, Georgia.
W.J. Tyznik, PH.D., Professor of Animal Science, Ohio State University, Columbus,
Ohio.
Norman R. Underdahl, B.A., M .S., Professor, Lincoln, Nebraska.
Louis van der Heide, D.V.M., PH.D., Department of Pathobiology, University of
Connecticut, Storrs, Connecticut.
Kent R. Van Kampen, D.V.M., PH.D., Chief Executive Officer, Virogenetics Corporation,
Troy, New York.
David C. Van Sickle, D.V.M ., PH.D., Professor and Head, Department of Anatomy,
School of Veterinary Medicine, Purdue University, West Lafayette, Indiana.
John F. Van Vleet, D.V.M ., PH.D., Professor of Veterinary Pathology and Associate
Dean of Academic Affairs, Department of Pathobiology, School of Veterinary
Medicine, Purdue University, West Lafayette, Indiana.
Stanley A. Vezey, D.V.M., Professor, Department of Avian Medicine, College of
Veterinary Medicine, University of Georgia, Athens, Georgia.
Colaboradores XXXVI

Jim C. Vulgamott, D.V.M ., DIP.A.C.V.I.M., Gulf Coast Veterinary Internists, Houston,


Texas.
Dennis P. Wages, D.V.M., Associate Professor, Avian Medicine, Department of Food
Animal and Equine Medicine, College of Veterinary Medicine, North Carolina
State University, Raleigh, North Carolina.
Richard Walshaw, B .V .MS., DIP. A.C .V .S., Department of Small Animal Clinical
Sciences, College of Veterinary Medicine, Michigan State University, East
Lansing, Michigan.
John R. Walton, PH.D., B.V.M .S., DIP.BACT., D.P.M ., M.R.C.V.S., Department of Veterinary
Clinical Science, University of Liverpool, Neston, South Wirral, U.K.
Thomas E. Walton, D.V.M., PH.D., Research Leader, U.S. Department of Agriculture,
Agricultural Research Service, Arthropod-borne Animal Diseases Research
Laboratory, Laramie, Wyoming.
Wallace M. Wass, D.V.M., PH.D., DIP.A.C.V.I.M., Professor, Department of Veterinary
Clinical Sciences, College of Veterinary Medicine, Iowa State University, Ames,
lowa.
Bruce E. Watkins, PH.D., Animal Nutrition Consultant, Durango Software/N-Squared
Computing, Durango, Colorado.
Steven H. Weisbroth, M.S., D.V.M., President, Anmed Biosafe, Inc., Rockville, Maryland.
G.A.H. Wells, B.VET.MED., M .R.C.V.S., Central Veterinary Laboratory, Ministry of
Agriculture, Fisheries and Food, New Haw, Weybridge, Surrey, England.
David M. West, B.V.SC., PH.D., F .A.C.V.S.C., Department of Veterinary Clinical Sciences,
Massey University, Palmerston North, New Zealand.
P.D. Whanger, PH.D., Professor, Department of Agricultural Chemistry, Oregon State
University, Corvallis, Oregon.
John D. Wheat, D.V.M ., Department of Veterinary Surgery, School of Veterinary
Medicine, University of California, Davis, California.
Stephen D. White, D.V.M., DIP.A.C.V.D., Associate Professor, Department of Clinical
Sciences, College of Veterinary Medicine and Biomedical Sciences, Colorado
State University, Fort Collins, Colorado.
Howard L. Whitmore, D.V.M., PH.D., Professor and Head, Food Animal Veterinary
Medicine and Surgery, College of Veterinary Medicine, University of Illinois,
Urbana, Illinois.
J.C. Williams, PH.D., Professor, Department of Veterinary Science, Louisiana
Agricultural Experiment Station, Baton Rouge, Louisiana.
Ralph E. Williams, PH.D., Professor, Department of Entomology, Purdue University,
West Lafayette, Indiana.
M.R. Wilson, B.V.SC., PH.D., M.R.C.V.S., Department of Population Medicine, Ontario
Veterinary College, University of Guelph, Guelph, Ontario, Canada.
Cedric Michael Wise, B.V.SC., M.S., DIP.A.C.T., M.A.C.V.SC., Glen Aplin, Queensland,
Australia.
Richard L. Witter, D.V.M., PH.D., U.S. Department of Agriculture, Agricultural Research
Service, Avian Disease and Oncology Laboratory, East Lansing, Michigan.
Kurt Wohlgemuth, D.V.M., Extension Veterinarian, Veterinary Science Department,
North Dakota State University, Fargo, North Dakota.
Alice M. Wolf, D.V.M., DIP.A.C.V.I.M ., Associate Professor, Department of Small Animal
Medicine and Surgery, Texas Veterinary Medical Center, College of Veterinary
Medicine, Texas A & M University, College Station, Texas.
Colaboradores XXXVII

Richard L. Wood, D.V.M., PH.D., Veterinary Medical Officer, National Animal Disease
Center, U.S. Department of Agriculture, Agricultural Research Service, Ames,
lowa.
Peter R. Woolcock, PH.D., M.SC., B.SC., Senior Research Associate, Cornell University,
Duck Research Laboratory, Eastport, New York.
Loveday O. Wosu, B.VET.MED., M.SC., PH.D., Department of Veterinary Medicine,
University of Nigeria, Nsukka, Nigeria.
Jeffrey D. Wyatt, D.V.M ., Associate Professor, Division of Laboratory Animal Medicine,
and Chief, Clinical Medicine, University of Rochester, School of Medicine and
Dentistry, Rochester, New York.
Richard Yamamoto, M.A., PH.D., Professor of Microbiology, Department of Epidemiology
and Preventive Medicine, School of Veterinary Medicine, University of California,
Davis, California.
G.O. Yang, PH.D., Professor, Chinese Academy of Preventive Medicine, Institute of
Nutrition and Food Hygiene, Beijing, China.
William D.G. Yates, D.V.M ., PH.D., Director, Health of Animals Laboratory, Agriculture
Canada, and Adjunct Professor of Veterinary Pathology, Western College of
Veterinary Medicine, University of Saskatchewan, Saskatoon, Saskatchewan,
Canada.
Juan Manuel L. Zertuche, M.V.Z., College of Veterinary Medicine, University of
Florida, Gainesville, Florida.
Dean R. Zimmerman, PH.D., Professor of Animal Nutrition, Department of Animal
Science, Iowa State University, Ames, lowa.
Gene M. Zinn, D.V.M., PH.D., Veterinary Extension Specialist, University of Illinois,
College of Veterinary Medicine, Simpson, Illinois.
PARTE I
SISTEMAS SANGÜÍNEO, LINFÁTICO E
CARDIOVASCULAR
SISTEMAS SANGÜÍNEO E LINFÁTICO, Introdução .................................. 3
Éritron ..................................................................................................... 3
Sistema Fagocítico .................................................................................. 5
Sistema Imunoespecífico ......................................................................... 6
Trômbon ................................................................................................... 7
SISTEMA CARDIOVASCULAR, Introdução ............................................... 8
Princípios de Terapia ............................................................................... 15
ANEMIA ..................................................................................................... 18
Anemias por Hipofunção da Medula Óssea ............................................ 20
Redução da Produção de Eritrócitos ................................................. 20
Lesão nas Células Precursoras da Medula ................................. 20
Substituição da Medula por Células Atípicas ............................... 20
Anemia Nutricional ....................................................................... 21
Redução da Produção de Hemoglobina ........................................... 21
Síntese de Heme Deficiente ........................................................ 21
Síntese de Globina Deficiente ..................................................... 22
Colapso Medular Imunomediado ....................................................... 22
Tireoidite Auto-imune ................................................................... 22
Drogas .......................................................................................... 22
Infecções Virais com Supressão da Medula ...................................... 22
Anemias por Perda de Eritrócitos Atípicos .............................................. 23
Eritrócitos com Conteúdo Enzimático Deficiente ............................... 23
Anemias Imunomediadas .................................................................. 24
Anemia Hemolítica Auto-imune ................................................... 24
Anemia Hemolítica do Bezerro Neonato ...................................... 25
Anemia Hemolítica do Potro Neonato .......................................... 26
Anemia Hemolítica do Leitão Neonato ........................................ 27
Anemia Hemolítica de Cães e Gatos Neonatos .......................... 28
Anemia Hemolítica por Fragmentação Intravascular ......................... 28
Anemia por Perda de Eritrócitos Normais ................................................ 29
Hemólise ............................................................................................ 29
Hemorragia e Parasitismo ................................................................. 31
Anemia Infecciosa Eqüina ....................................................................... 32
Anemia Infecciosa Felina ......................................................................... 33
GRUPOS SANGÜÍNEOS E TRANSFUSÕES SANGÜÍNEAS ...................... 34
Testes de Tipagem Sangüínea ................................................................ 35
Aplicação da Grupagem Sangüínea ........................................................ 35
Técnicas de Reação Cruzada ............................................................ 36
Transfusão de Sangue ............................................................................. 36
Riscos da Transfusão ........................................................................ 37
LEUCOSE BOVINA (ver GEN) ...................................................................... 472
Sistemas Sangüíneo, Linfático e Cardiovascular 2

LINFOMA MALIGNO CANINO ...................................................................... 38


ANOMALIAS CONGÊNITAS E HEREDITÁRIAS ......................................... 40
Anomalias das Derivações dos Arcos Aórticos ....................................... 41
Duto Arterioso Patente ....................................................................... 41
Arco Aórtico Direito Persistente ......................................................... 42
Estenose Aórtica ...................................................................................... 42
Estenose Pulmonar .................................................................................. 43
Defeitos do Septo .................................................................................... 43
Comunicação Interatrial ..................................................................... 43
Comunicação Interventricular ............................................................ 44
Tetralogia de Fallot .................................................................................. 45
LINFOSSARCOMA E LEUCEMIA FELINOS ................................................ 46
CARDIOPATIAS ............................................................................................ 47
Bulhas e Murmúrios Cardíacos ................................................................ 48
Arritmias ................................................................................................... 50
Hipertrofia Cardíaca ................................................................................. 54
Insuficiência Cardíaca .............................................................................. 55
Endocárdio ............................................................................................... 58
Miocárdio .................................................................................................. 60
Pericárdio e seu Conteúdo ...................................................................... 62
DISTÚRBIOS HEMOSTÁTICOS ................................................................... 63
Distúrbios Hereditários ............................................................................. 63
Distúrbios Adquiridos ............................................................................... 64
Trombocitopenia ................................................................................ 67
Trombocitopenias Canina e Felina .............................................. 68
Trombocitopenias Bovina e Suína ............................................... 69
Púrpura não Trombocitopênica Eqüina ............................................. 70
DISTÚRBIOS DOS LEUCÓCITOS ................................................................ 71
Leucocitose e Leucopenia ....................................................................... 71
Síndrome de Chédiak-Higashi ................................................................. 76
Hematopoiese Cíclica em Cães Collie Cinza .......................................... 76
Anomalia de Pelger-Huët ......................................................................... 77
LINFADENITE E LINFANGITE ..................................................................... 77
Linfadenite Caseosa das Ovelhas e Cabras ............................................ 77
Infecção dos Cavalos e Gado por Corynebacterium
pseudotuberculosis ............................................................................ 79
Linfangite Epizóotica (ver GEN) ............................................................... 418
Melioidose (ver GEN) ............................................................................... 435
Garrotilho (ver RES) ................................................................................. 901
Linfadenite Estreptocócica dos Suínos .................................................... 80
DOENÇAS PARASÍTICAS ............................................................................ 81
Anaplasmose ........................................................................................... 81
Babesiose ................................................................................................ 83
Doenças Rickettsiais Caninas (ver GEN) ................................................ 497
Citazoonose ............................................................................................. 86
Eperitrozoonose ....................................................................................... 87
Ehrlichiose Eqüina (ver GEN) .................................................................. 453
Doenças por Dirofilária ............................................................................ 87
Dirofilariose ........................................................................................ 87
Sistemas Sangüíneo e Linfático, Introdução 3

Infecção por Angiostrongylus vasorum .............................................. 90


Esquistossomíase (Trematódeos Sangüíneos) ....................................... 91
Teileríases ................................................................................................ 92
Febre da Costa Oriental ..................................................................... 93
Outras Teileríases .............................................................................. 94
Tripanossomíase ..................................................................................... 95
Tripanossomíase Transmitida pela Mosca Tsé-tsé ........................... 95
Surra .................................................................................................. 97
Sífilis Eqüina ...................................................................................... 97
Doença de Chagas ............................................................................ 99
Tripanossomos Não Patogênicos de Animais Domésticos ............... 99
POLIARTERITE (ver IM) ............................................................................... 522
POLICITEMIA ................................................................................................ 99
TROMBOSE, EMBOLISMO E ANEURISMA ................................................ 101
VASCULITE (ver IM) ..................................................................................... 521

SISTEMAS SANGÜÍNEO E LINFÁTICO,


INTRODUÇÃO
No nível celular, o sistema hemolinfático é composto por hemácias (eritrócitos),
plaquetas, granulócitos (neutrófilos, eosinófilos e basófilos), monócitos/macrófagos
e linfócitos. Os órgãos do sistema incluem os hematopoiéticos (medula óssea e
baço) e os tecidos linfopoiéticos (medula óssea, timo, linfonodos, tonsilas, baço e
placas de Peyer). Devido à diversidade funcional do sistema hemolinfático, seus
distúrbios podem ser melhor discutidos através de uma perspectiva funcional.
Diversas unidades funcionais estão presentes: o éritron, o trombócito (plaquetas),
o sistema fagocítico (granulócitos e macrófagos) e o sistema imunoespecífico
(linfócitos) (ver também SISTEMA IMUNE, pág. 509).

Éritron
A função do éritron é carregar oxigênio para os tecidos a uma determinada
pressão que permita sua rápida difusão do sangue para as células em metabo-
lismo. Tudo isso é feito por: 1. uma molécula carreadora (hemoglobina [Hb]); 2.
um veículo (eritrócito) capaz de trazer intacta a molécula carreadora no nível
celular; e 3. um metabolismo gerado para a proteção tanto do veículo quanto da
molécula carreadora a partir da lesão. Qualquer interferência na síntese de
hemoglobina, produção de eritrócitos ou metabolismo dos mesmos causará
distúrbios do éritron.
A hemoglobina (Hb) é uma molécula complexa, cujos principais componentes são
porfirina, heme e globina. Cada molécula é ligada a quatro unidades heme ligadas
a 4 globinas (2 α e 2 β-globinas). Uma vez que cada heme possui uma molécula de
ferro carreadora de oxigênio, cada hemoglobina pode carrear 4 moléculas de
oxigênio para os tecidos. A síntese de heme ocorre enzimaticamente nas mitocôn-
drias e envolve uma série de reações de condensação que requerem fosfato piridoxal
e cobre. O ferro é adicionado na última etapa pela enzima ferroquelatase. Muitas das
Sistemas Sangüíneo e Linfático, Introdução 4

etapas, incluindo a incorporação do ferro, podem ser bloqueadas por chumbo. A


síntese de globina é controlada geneticamente e regula a produção de heme.
Interferências na produção normal de heme ou globina levam a uma anemia
de defeito de maturação citoplasmática. As causas incluem deficiências de cobre,
ferro, fosfato piridoxal e intoxicação por chumbo. As talassemias e hemoglobinopa-
tias, importantes doenças genéticas descritas no homem, não foram observadas em
animais. Nessas condições, a produção de globinas (α ou β, ou ambas) não regula
a produção de heme, e a Hb não é funcional.
A massa de hemácias, e portanto a capacidade de carrear oxigênio, permanece
constante com o passar do tempo no indivíduo normal. Hemácias maturas possuem
um período de vida finito e sua produção e destruição devem ser cuidadosamente
reguladas, pois do contrário resultará numa doença.
A eritropoiese é regulada pela eritropoietina (que regula a produção normal e a
estimula quando há demanda). Hipoxia tecidual é o estímulo para a produção de
eritropoietina e, na maioria das espécies, acredita-se que o rim seja tanto o órgão
sensor como o maior sítio de produção. A eritropoietina age na medula em conjunto
com outros mediadores humorais para aumentar o número de células precursoras
(“stem cells”) iniciando a produção de eritrócitos, para reduzir seu tempo de
maturação e para causar uma liberação adiantada de reticulócitos. Há muitos outros
fatores envolvidos na eritropoiese, muitos dos quais permanecem insuficientemente
compreendidos. Estes incluem o suprimento de nutrientes (ferro, folato, vitamina
B12); distúrbios tais como inflamações, infecções, neoplasias, insuficiência renal ou
endócrina, interações célula-célula entre precursores eritróides, células linfóides e
outros componentes do microssistema hematopoiético.
A destruição dos eritrócitos também é regulada. Existem dois mecanismos para
a remoção de hemácias senescentes; ambos conservam os principais constituintes
da célula para reutilização. Aproximadamente 1% das hemácias envelhecidas
normalmente são removidas por hemólise intravascular, liberando a Hb; esta é
rapidamente convertida em dímeros de Hb, que formam complexos com haptoglo-
bina e são transportados para o fígado. Uma porção da hemoglobina livre também
pode ser convertida em metemoglobina, que é rapidamente quebrada em heme e
globina. As cadeias proteicas de globina podem ser imediatamente recicladas; o
heme é ligado a uma segunda proteína sérica carreadora, hemopexina, e transpor-
tado para o fígado e baço para ser processado pelo sistema monócito/macrófago
fixo. Tais sistemas de transporte podem operar para aproximadamente 100g de
Hb/dL; quando se ultrapassa este nível, como em anemias hemolíticas intra-
vasculares, a hemoglobina (e portanto o ferro) é excretada na urina.
A remoção da maioria dos eritrócitos envelhecidos normalmente se faz por
fagocitose pelos macrófagos fixos do baço. À medida que a célula envelhece, ela
perde sua flexibilidade devido a uma queda na produção de trifosfato de adenosina
(ATP) e acaba presa dentro do baço, pois é incapaz de se moldar para percorrer os
sinusóides esplênicos. Após a fagocitose, a Hb é convertida em heme e globina e,
mais tarde, é reciclada. O ferro é liberado da metade heme e armazenado pelo
macrófago como ferritina ou hemossiderina, ou liberado na circulação para o
transporte de volta à medula. A porfirina restante é convertida em bilirrubina livre,
que é liberada pelos macrófagos na circulação sistêmica, onde se complexa com a
albumina para transporte aos hepatócitos. Em anemias hemolíticas extravasculares,
os eritrócitos têm um período de vida diminuído e os mesmos mecanismos ocorrem
em um nível acelerado.
O metabolismo normal dos eritrócitos mantém tanto a integridade estrutural como
funcional da célula. A principal via metabólica dos eritrócitos é a glicólise, e na maioria
das espécies a principal fonte de energia é a glicose. A glicose penetra no eritrócito
por um mecanismo insulina-independente e na maior parte é metabolizada pela
Sistemas Sangüíneo e Linfático, Introdução 5

glicólise, produzindo ATP e NADH (nicotinamida adenina dinucleotídio) reduzido. A


energia do ATP é usada para a manutenção das bombas da membrana do eritrócito
que, por sua vez, são responsáveis pela forma e flexibilidade das hemácias. O
potencial de redução do NADH é utilizado na via de metemoglobina redutase para a
manutenção do ferro na Hb na sua forma reduzida.
A glicose não utilizada na glicólise é metabolizada por uma segunda via: o “shunt”
hexose monofosfato (HMP). Ao contrário da via metemoglobina redutase, não se
produz nenhuma energia por HMP; entretanto, seu principal efeito é o potencial de
redução, desta vez na forma de NADPH (nicotinamida adenina dinucleotídio fosfato).
Esta, em conjunção com o sistema glutationa redutase/peroxidase, mantém os
grupos sulfidrilas da globina em seu estado reduzido. A principal enzima do HMP é
a glicose-6-fosfato desidrogenase.
Muitos distúrbios de eritrócitos são conseqüência direta de metabolismo de
eritrócitos anormal: interferência na glicólise (por exemplo, deficiência herdada
de piruvatocinase , uma deficiência chave de enzima glicolítica) causa deficiência
de ATP, que leva a um período de vida de hemácias reduzido e anemia
hemolítica. Um estresse oxidante excessivo pode sobrecarregar o “shunt” de
HMP protetor ou a metemoglobina redutase, causando hemólise de corpúsculo
de Heinz ou formação de metemoglobina, respectivamente. Muitas anemias
hemolíticas induzidas por drogas, como a hemólise pela fenotiazina em cavalos
ou a hemólise por azul-de-metileno em gatos, são exemplos desse mecanismo
(ver também A NEMIA, pág. 20).

Sistema fagocítico
(Sistema imune não específico)
A principal função dos fagócitos é a de defesa contra microrganismos invasores,
ingerindo-os e destruindo-os; e por isso eles constituem um importante componente
da resposta celular inflamatória. Há 2 tipos de fagócitos: os mononucleares e os
granulócitos. Os fagócitos mononucleares surgem primariamente da medula e são
liberados no sangue como monócitos, onde podem circular por várias horas antes de
entrar nos tecidos, quando se diferenciam em macrófagos teciduais. Granulócitos
possuem um núcleo segmentado e são classificados de acordo com suas caracte-
rísticas cromáticas em basófilos, eosinófilos ou netrófilos. Foram identificados cinco
estágios diferentes no processo de fagocitose : 1. atração do fagócito (quimiotaxia)
aos microrganismos; 2. adesão ao organismo; 3. ingestão; 4. fusão de lisossomos
celulares com os microrganismos ingeridos e morte bacteriana; e 5. digestão.
Além da função fagocítica geral, muitas células possuem outras funções espe-
cializadas. Os monócitos formam um elo com o sistema de imunidade específico,
processando e apresentando antígenos aos linfócitos. Estes também são ligados aos
eritrócitos através de armazenamento e liberação de ferro para a síntese de
hemoglobina. Os eosinófilos, embora exerçam um papel como fagócitos, também
possuem funções mais específicas, como a defesa contra parasitas metazoários e
a modulação de processos inflamatórios. Eles respondem quimiotaticamente à
histamina, complexos imunes e ao fator quimiotático de eosinófilos de anafilaxia, uma
substância liberada pela degranulação de mastócitos. A eosinofilia pode ser obser-
vada em reações alérgicas sistêmicas e doenças parasitárias. Basófilos não são
fagócitos verdadeiros, mas contêm grandes quantidades de histamina além de
outros mediadores da inflamação, e são importantes na progressão normal da
resposta inflamatória aguda. Assim como os eritrócitos, a produção de níveis
sangüíneos de fagócitos é regulada e controlada rigidamente por uma série de
fatores humorais, incluindo fatores estimulantes de colônia e interleucinas. Por outro
lado, diferente da hemácia, que permanece circulando no sangue, o fagócito usa este
compartimento como uma estrada para os tecidos. Conseqüentemente, os níveis
Sistemas Sangüíneo e Linfático, Introdução 6

sangüíneos dessas células podem refletir uma série de circunstâncias nos tecidos,
como inflamação (duração e intensidade) e habilidade da medula óssea em suprir a
demanda tecidual para fagócitos. A sensibilidade com que fagócitos sangüíneos
refletem essas condições varia de espécie para espécie. Respostas anormais de
fagócitos podem resultar em doença. Finalmente, precursores de fagócitos podem
sofrer transformações malignas, resultando em leucemia.

Sistema imunoespecífico
Os linfócitos são responsáveis tanto pela imunidade humoral quanto celular.
Células desses 2 ramos do sistema imune não podem ser diferenciadas morfologi-
camente, porém elas diferem em sua dinâmica de produção e circulação. A
produção de linfócitos nos mamíferos origina-se na medula óssea, e a diferenciação
se faz por 2 vias diferentes. Uma porção dos linfócitos migra para o timo, e lá, sob
influência de hormônios tímicos, diferencia-se em “células T” que são responsáveis
pela imunidade celular. Algumas dessas células T semeiam os órgãos linfóides
secundários (baço e linfonodos). Os linfócitos restantes migram diretamente para os
órgãos linfóides secundários sem passar por modificações no timo e tornam-se
“células B”, que são responsáveis pela imunidade humoral.
Assim, os órgãos linfóides secundários possuem uma população tanto de
linfócitos T como de linfócitos B. Nos linfonodos, os centros foliculares são basica-
mente células B, e as zonas parafoliculares são primariamente células T. No baço,
a maioria dos linfócitos da polpa vermelha são células B, enquanto os linfócitos das
camadas periarteriolares são células T. É essencial para a função imune uma
associação próxima entre células B e T nos órgãos linfóides; a produção de
anticorpos por células B é regulada por células T.
O funcionamento dos linfócitos na imunidade celular tem tanto seus componen-
tes aferentes (receptores) como eferentes (executores). As células T de longa vida
do sangue periférico (que totalizam , 2/3 dos linfócitos circulantes na maioria das
espécies) são receptoras. Respondendo a antígenos aos quais foram previamente
sensibilizadas, elas deixam a circulação e sofrem transformações, tornando-se
células T ativadas, que por sua vez irão levar outras células T a sofrerem transfor-
mações blásticas, tanto local como sistematicamente. A maioria das células T
estimuladas dessa maneira são células executoras e produzem substâncias conhe-
cidas como linfocinas. As linfocinas executoras possuem um largo espectro de
atividades segundo o qual são nomeadas; o fator ativador de macrófagos atrai
macrófagos para as áreas de localização do antígeno; o fator de inibição de
migração evita a saída de macrófagos; as linfotoxinas, produzidas pelas células T
“killer”, são capazes de destruir uma variedade de tipos celulares.
O sistema imuno-humoral é composto por linfócitos B que produzem anticorpos
de diversos tipos; sua ativação é semelhante àquela dos linfócitos T. Quando o
antígeno encontra os linfócitos B sensibilizados, estes sofrem transformações blás-
ticas e se dividem. Linfócitos B ativados diferenciam-se em plasmócitos, a principal
fonte de anticorpos. Portanto, cada linfócito B inicialmente estimulado produz clones
de plasmócitos, todos produzindo o mesmo tipo de anticorpo específico.
As moléculas do anticorpo (imunoglobulinas [Ig]) são divididas em: IgG, IgM,
IgA, IgD e IgE. Nem todos os tipos foram descritos em todas as espécies. Cada
classe de anticorpo possui sua própria característica funcional; por exemplo, IgA
é o principal anticorpo das secreções respiratória e intestinal, enquanto IgG é o
principal anticorpo do sangue circulante e IgE é o principal anticorpo envolvido em
reações alérgicas.
Os anticorpos executam sua função combinando-se com os antígenos espe-
cíficos que estimularam sua produção. Os complexos antígeno-anticorpo podem
Sistemas Sangüíneo e Linfático, Introdução 7

ser especificamente quimiotáticos para fagócitos, ou podem ativar o complemen-


to, um processo que produz tanto lise celular como substâncias quimiotáticas
para neutrófilos e macrófagos. Dessa maneira, o sistema imuno-humoral relacio-
na-se e interage com o sistema imune não específico.
O sistema imuno-humoral também está relacionado ao sistema imune não
específico e ao sistema imunocelular de outros modos. Há boas evidências de que
uma das principais funções do sistema imunocelular é regular o sistema imuno-
humoral. Foram descritas classes de célulasT “helper” e “supressoras”. Células T
“helper” são requisitadas para a expressão completa de uma resposta imuno-humoral;
células T supressoras anulam a produção de um dado anticorpo. Células T “killer”
destroem tipos celulares estranhos. O processamento de antígenos por macrófagos
precede o reconhecimento do antígeno pelos linfócitos. Estes processos complexos
também são envolvidos na detecção de células neoplásicas e auto-reconhecimento.
A resposta linfocítica num distúrbio pode ser apropriada (ativação do sistema
imune) ou inapropriada (distúrbios imunomediados e linfoproliferativos) (ver tam-
bém SISTEMA I MUNE, pág. 509). Uma forma de distúrbio imunomediado resulta da
falha do sistema imune em reconhecer tecidos do hospedeiro como próprios. Por
exemplo, em anemia hemolítica auto-imune são produzidos anticorpos contra as
hemácias do próprio hospedeiro. Uma outra resposta inapropriada do sistema
imune é a anafilaxia. Em indivíduos alérgicos, anticorpos IgE a alérgenos são
ligados à superfície de basófilos e mastócitos. Quando ocorre a exposição ao
alérgeno, formam-se complexos antígeno-anticorpo e a degranulação dos mastó-
citos e basófilos libera grandes quantidades de aminas vasoativas que causam
choque.
As doenças linfoproliferativas são de diversos tipos e incluem o linfossarcoma e
as leucemias linfocíticas. Apesar da maioria representar processos neoplásicos
verdadeiros, algumas representam reações do organismo e são benignas, por
exemplo, a linfocitose persistente do gado infectado com o vírus da leucemia bovina
e o grande número de linfócitos atípicos algumas vezes observado na circulação de
animais vacinados com vírus vivo modificado.

Trômbon
Funcionalmente, as plaquetas formam o tampão hemostático inicial quando
ocorrem hemorragias; elas também são a fonte de fosfolipídios (Fator 3 de plaquetas
[FP3]), que são usados no processo normal de coagulação. As plaquetas têm um
papel importante na resposta inflamatória através da liberação de vários mediado-
res. São produzidas na medula óssea a partir de megacariócitos, cujo controle de
regulação ainda é pouco compreendido. A produção real das plaquetas ocorre com
a invaginação da membrana celular dos megacariócitos, e a formação de canais
citoplasmáticos e ilhotas. As ilhotas citoplasmáticas produzem as plaquetas pela
fragmentação do megacariócito.
Plaquetas maduras circulantes estão densamente cheias de estruturas que
contêm substâncias funcionais, incluindo grânulos densos contendo ATP, difosfato
de adenosina (ADP) e Ca++ , bem como serotonina, lisossomos, glicogênio, mitocôn-
drias e um sistema canalicular intracelular formado pelas invaginações da membra-
na celular externa da plaqueta. Glicogênio e mitocôndrias estão envolvidos na
produção de energia; os grânulos densos contêm as substâncias químicas essen-
ciais necessárias para a regulação e modulação da função plaquetária (e em certo
grau da função inflamatória) através da reação de liberação; e o sistema canalicular
funciona tanto como um sistema de transporte para os componentes do grânulo
quanto como uma fonte de FP3, que são encontrados em altas concentrações no
revestimento da membrana dos canais.
Sistemas Sangüíneo e Linfático, Introdução 8

Quando a parede de um vaso é danificada, há exposição de colágeno e as


plaquetas circulantes se aderem e sofrem mudanças na forma com a liberação
simultânea de ADP. O ADP estimula a agregação local de plaquetas com a formação
do tampão primário das mesmas. A mudança na forma das plaquetas e a reação de
liberação expõem o FP3 aos fatores de coagulação, proporcionando assim uma
superfície para coagulação e acelerando o processo de formação de fibrina e da
própria coagulação. O acúmulo de fibrina e plaquetas no local é conhecido como
formação de coágulo ou tampão hemostático. O coágulo se consolida com a ação
de proteínas contráteis das plaquetas.
Distúrbios plaquetários podem ser tanto quantitativos (trombocitopenias ou
trombocitoses) quanto qualitativos (trombocitopatias). A trombocitopenia é uma das
causas mais comuns de distúrbios de sangramento em animais. Em geral, os níveis
de plaquetas devem cair a < 50.000/µL antes de haver algum perigo de hemorragia.
Existem 3 formas de trombocitopenia: distributiva, destrutiva e hipoproliferativa.
As trombocitopenias destrutivas ou consumidoras são as mais importantes. São
condições nas quais há uma remoção aumentada de plaquetas, além de um aumento
da produção pela medula óssea. Uma forma comum de trombocitopenia consumidora
ocorre com a coagulação intravascular disseminada (CID), secundária a uma varieda-
de de doenças. Uma segunda forma é imunomediada, sendo as plaquetas cobertas por
anticorpos antiplaquetários e removidas da circulação por sistema de fagócitos fixos.
As trombocitopenias distributivas são associadas com o excessivo seqüestro de
plaquetas pelo baço, tal como ocorre no hiperesplenismo ou na insuficiência
cardíaca congestiva em cães. Tem-se estimado que, em casos de hiperesplenismo,
até 80% de todas as plaquetas circulantes podem ser seqüestradas.
As trombocitopenias hipoproliferativas caracterizam-se por uma diminuição da
produção de plaquetas na medula. Estas condições são freqüentemente idiopáti-
cas, mas podem ser causadas por uma série de drogas (por exemplo, diuréticos
tiazídicos e sais de ouro) ou associadas com síndromes mielotísicas ou mielofibróides.
Trombocitoses ocorrem raramente e com freqüência são idiopáticas. Podem ser
associadas a distúrbios primários de medula e sua ocorrência é bem documentada
em mielofibrose, tanto no homem como no cão. Leucemia plaquetária (mielose
megacariocítica ou trombocitemia primária) também é rara, mas já foi documentada
no homem, cão e gato.
As trombocitopatias compreendem um grupo de doenças pouco definido, no qual
o número de plaquetas é normal, porém sua função é deficiente. Diversas condições
já foram descritas, entre as quais as mais importantes são as deficiências de FP3
e serotonina plaquetária; disfunção plaquetária induzida por drogas; disfunções
hepática, tireóidea e renal; e trombastenia, na qual a retração do coágulo é
deficiente. A doença de von Willebrand, que tem sido relatada em cães, porcos e
coelhos, caracteriza-se tanto por um defeito de coagulação do plasma como por
trombocitopatia (ver também DISTÚRBIOS HEMOSTÁTICOS, pág. 182).

SISTEMA CARDIOVASCULAR,
INTRODUÇÃO
O sistema cardiovascular é o sistema de transporte que leva oxigênio, substratos,
hormônios e reguladores químicos para todas as células; transporta dióxido de
carbono e outros produtos nocivos do metabolismo das células para os pulmões ou
Sistema Cardiovascular, Introdução 9

rins; e redistribui o calor do corpo para o exterior ou vice-versa. Isto é realizado por
um sistema fechado de vasos que contêm sangue, que por sua vez carrega as
substâncias a serem transportadas. O sangue se move através do sistema devido
a gradientes de pressão produzidos pela ação bombeadora do coração. O ventrículo
esquerdo bombeia o sangue das veias pulmonares (mantendo a pressão venosa
pulmonar baixa) para o interior das artérias sistêmicas (mantendo a pressão arterial
sistêmica alta), enquanto o ventrículo direito bombeia sangue das veias sistêmicas
(mantendo aquela pressão baixa) para o interior das artérias pulmonares (mantendo
aquela pressão alta). Estes gradientes de pressão (altos nas artérias e baixos nas
veias) impulsionam o sangue através das circulações capilares (sistêmicas e
pulmonares), onde as substâncias são trocadas entre o sangue e as células. As
válvulas presentes no coração e nas veias asseguram um fluxo unidirecional.
A quantidade de sangue que o coração bombeia a cada minuto (débito cardíaco)
é o produto da freqüência cardíaca (bpm) pelo volume de sangue bombeado a cada
batimento (volume sistólico). Normalmente, o débito cardíaco é , 100mL/kg peso
corporal/min. Quanto menor o animal (por exemplo, cão versus cavalo), maior o
débito cardíaco/unidade de peso corporal. Durante o exercício, o débito cardíaco
pode aumentar até 10 vezes, principalmente (, 80%) devido a um aumento na
freqüência cardíaca, e um pouco por causa de um aumento do volume sistólico.
Vários parâmetros de funções cardíacas são importantes para a compreensão
das doenças e seu controle. Ritmo cardíaco, contratilidade, pré-carga e pós-carga
são 4 determinantes importantes do desempenho cardíaco que devem ser avalia-
dos em pacientes suspeitos de cardiopatias. O número de bpm é determinado pela
taxa de descarga do nódulo sinoatrial (SA) localizado na junção da veia cava cranial
com o átrio direito. A taxa de descarga e a velocidade de condução são determina-
das pelo equilíbrio entre a atividade eferente β-adrenérgica (aumenta o ritmo
cardíaco) e a atividade eferente vagal (diminui o ritmo cardíaco). Agentes que
mimetizam a atividade β-adrenérgica (por exemplo, adrenalina, isoproterenol) ace-
leram, e agentes que mimetizam atividade eferente vagal (por exemplo, edrofônio,
acetilcolina) desaceleram tanto o ritmo cardíaco como a velocidade de condução.
Agentes bloqueadores β-adrenérgicos (por exemplo, propranolol, atenolol) ou
agentes vagolíticos (por exemplo, atropina, glicopirrolato) diminuem ou aumentam
o ritmo cardíaco e a condução, respectivamente. O ritmo cardíaco de um cão em
repouso é normalmente irregular, aumentando durante a inspiração e diminuindo
durante a expiração, no que é denominado arritmia sinusal respiratória. O ritmo
cardíaco torna-se regular e mais rápido quando em exercício, excitação, febre, dor
ou diversos estados mórbidos.
As cavidades do coração normalmente pulsam em uma seqüência ordenada e
coordenada, na medida em que é determinada pelas suas estimulações elétricas.
Após a descarga do nódulo sinoatrial, o impulso se espalha pelos átrios, cria a onda
P do eletrocardiograma e inicia a contração atrial (sístole atrial). Enquanto a onda
se distribui através dos ventrículos, ela produz o complexo QRS do eletrocardiogra-
ma e inicia a contração ventricular (sístole ventricular). Na diástole, as cavidades do
coração são relaxadas e preenchidas por sangue. O mais fraco elo deste sistema
de condução atrioventricular é o nódulo atrioventricular (AV). Este nódulo possui
condução lenta e às vezes falha nesta condução (bloqueio AV).
A força de contração ventricular depende de 2 aspectos principais: a contratilida-
de do miocárdio (inotropia) e o volume de sangue na cavidade justo antes da
ocorrência da contração (pré-carga). Inotropia é uma propriedade intrínseca do
músculo, mas que aumenta com altos níveis (tanto humorais como neurais) de
catecolaminas, e diminui com o estímulo eferente vagal aumentado e com a maioria
dos estados mórbidos (por exemplo, inflamação do miocárdio, intoxicação por
drogas, miocardiopatias). A pré-carga é determinada pelo volume de sangue
Sistema Cardiovascular, Introdução 10

existente no sistema cardiovascular, retorno venoso do sangue ao coração, força


com que os átrios bombeiam sangue para os ventrículos e rigidez do miocárdio
ventricular. A lei de Frank-Starling determina que quanto maior for a pré-carga, maior
será a força de contração, permanecendo todos os outros fatores constantes.
Obviamente, a força gerada pelo ventrículo também é determinada pela resistência
encontrada pelo mesmo (pós-carga): se a pressão sangüínea arterial é baixa, o
ventrículo não gera muita força, apesar de mover facilmente o sangue das veias para
as artérias; do mesmo modo, se a pressão arterial estiver alta, o ventrículo poderá
gerar grande força, porém pouco sangue estará sendo transportado.
Esta diferença (pressão de pulso) entre pressão arterial sistólica e diastólica é
determinada pelo volume sistólico, complacência arterial, intervalo entre pulsações
cardíacas e o volume de sangue que deixa as artérias durante a diástole. Doenças
que produzem uma alta pressão de pulso incluem arteriosclerose, insuficiência
aórtica, duto arterioso patente e outras fístulas periféricas arteriovenosas. Pressão
de pulso fraca e limitada é característica de um baixo volume sistólico. Um volume
sistólico reduzido pode ocorrer devido a uma pré-carga reduzida ou preenchimento
ventricular inadequado (como em hemorragias, desidratação, tamponamento ou
efusão do pericárdio e taquiarritmias), contratilidade reduzida (como em miocardio-
patias, acidose, e muitas cardiopatias), ou pós-carga aumentada (hipertensão
arterial ou pulmonar, como ocorre em doenças renais ou dirofilariose canina). A
fração de ejeção (FE) é uma medida útil da função ventricular; é a razão entre o
volume sistólico e o diastólico final (pré-carga). A FE normalmente é > 0,6, indicando
que o ventrículo ejeta > 60% da pré-carga durante cada ejeção, e que , 40% desta
permanece dentro do ventrículo após ejetar um volume sistólico. O volume rema-
nescente é chamado volume sistólico final.
A pós-carga, ou seja a impedância à ejeção ventricular, resulta da necessidade de
acelerar o sangue para a aorta (a fim de superar sua inércia), da necessidade de
superar a rigidez dos grandes vasos e, sobretudo, da resistência periférica ao fluxo
sangüíneo. A resistência é determinada basicamente pelo diâmetro das arteríolas.
Uma vez que pressão média = fluxo sangüíneo × resistência periférica, então, pressão
sangüínea arterial média = débito cardíaco × resistência periférica. As arteríolas ou
vasos de resistência são basicamente determinantes de pós-carga e portanto do
desempenho cardíaco, bem como da pressão e do fluxo sangüíneos. O diâmetro
arteriolar é controlado por fatores neurais, hormonais e locais que influenciam a
musculatura lisa dos vasos. Existem diferenças regionais na influência relativa desses
fatores sobre os vasos sangüíneos ligados a ou dentro de diferentes órgãos. A
vasoconstrição geralmente resulta de um aumento na atividade simpática, especifica-
mente atividade α-adrenérgica eferente. Outros agentes que causam vasoconstrição
incluem as catecolaminas α-adrenérgicas (adrenalina, noradrenalina, fenilefrina),
vasopressina (ADH), angiotensina II, prostaglandinas A e F e serotonina (liberada de
plaquetas). Estados mórbidos que causem um aumento de qualquer destas substân-
cias obviamente aumentam a resistência periférica. Vasodilatadores arteriolares in-
cluem substâncias que bloqueiam receptores α-adrenérgicos (por exemplo, prazosina,
fenoxibenzamina) ou que estimulam receptores β2-adrenérgicos ou dopaminérgicos
(por exemplo, isoproterenol, dopamina) ou que ajam sobre a própria musculatura lisa
vascular para relaxá-la (por exemplo, hidralazina). Muitas substâncias liberadas local-
mente em resposta a um fluxo sangüíneo inadequado nos tecidos ou a perda tecidual
ou inflamação causam vasodilatação (por exemplo, O 2 diminuído, CO2 , H+, K +, adeno-
sina, histamina e bradicinina aumentados); quase não há tono venoso em repouso.
Portanto, embora a musculatura lisa venosa possa responder similarmente à muscula-
tura lisa arterial, só haverá venodilatação quando houver venoconstrição prévia.
Um ponto importante na compreensão tanto da cardiopatia como de seu tratamen-
to é o conceito de consumo de oxigênio pelo miocárdio. O miocárdio sempre consome
Sistema Cardiovascular, Introdução 11

quase todo o oxigênio que recebe através das artérias coronárias. A única alternativa
de mais oxigênio para o coração (se ele necessita de trabalho aumentado) é através
de um aumento no fluxo sangüíneo coronário. As artérias coronárias, portanto,
dilatam-se em resposta a substâncias vasodilatadoras produzidas pelo metabolismo
do miocárdio. Doenças que estreitam as artérias coronárias (arteriosclerose, ateros-
clerose) limitam severamente a capacidade do miocárdio de encontrar demandas
maiores. A quantidade de oxigênio requerida pelo miocárdio é determinada por 3
fatores: ritmo cardíaco, inotropia e a tensão nas paredes do miocárdio. Ritmos
cardíacos rápidos são deletérios, pois aumentam a demanda de oxigênio miocárdico
enquanto limitam o período de diástole, quando ocorre o preenchimento cardíaco e flui
a maior parte do sangue coronário. Quando o coração se dilata e precisa gerar mais
pressão para ejetar sangue, as paredes do miocárdio tornam-se mais tensas. Em
termos gerais, tensão máxima = pré-carga × pressão sangüínea arterial; e a pressão
máxima é freqüentemente denominada de pós-carga. Uma terapia bem-sucedida das
cardiopatias deve buscar uma desaceleração do coração no caso de taquicardias,
diminuição do tamanho cardíaco no caso de dilatação ou pré-carga aumentada (ou
ambas) e pós-carga reduzida no caso de aumento da pressão arterial.
Para que o sistema cardiovascular funcione adequadamente, o volume e a
pressão sangüíneos devem ser estritamente controlados. Detectores que monitoram
a pressão e o fluxo são distribuídos pelo corpo e mantêm os limites normais através
de reflexos neuro-humorais. Os exemplos incluem os receptores de pressão nas
artérias sistêmicas na região da bifurcação da artéria carotídea e do arco aórtico,
receptores de volume nos átrios com pressão relativamente baixa e receptores de
fluxo no aparelho justaglomerular dos rins. Estes detectores enviam sinais nervosos
ou humorais (ou ambos) para o hipotálamo e para a medula oblonga, que comparam
(integram) o nível detectado com o nível adequado para a função ideal. Uma vez que
é determinada uma discrepância entre o nível detectado e o desejado da variável,
o integrador envia sinais nervosos ou humorais (via vagal e/ou simpática) para o
coração e vasos sangüíneos para que mudem o seu funcionamento e se ajustem aos
níveis desejados da variável. Por exemplo, se a pressão sangüínea é baixa, os
receptores de pressão carotídea e aórtica enviam menos impulsos inibidores
nervosos para o cérebro; este manda impulsos nervosos para o coração que
aumentam o seu ritmo e força de contração, e para as arteríolas que são contraídas.
Todas estas ações elevam a pressão sangüínea arterial sistêmica.
Os diversos controles neuro-hormonais do sistema cardiovascular permitem que
os animais disponham de uma série de necessidades, como exercício e as deman-
das de uma lesão menor, reparação tecidual, inflamação, etc. Os distúrbios do
sistema cardiovascular são “compensados” por estes mecanismos de controle, e os
efeitos compensatórios e suas conseqüências freqüentemente podem ser detecta-
dos como sintomas da doença (por exemplo, taquicardia, pressão sangüínea alta,
distensão venosa jugular, aumento do tamanho do coração e retenção de fluidos).

Origem dos sintomas de cardiopatias


Funcionamento e estruturas anormais do coração produzem indicações obje-
tivas e subjetivas destas anormalidades (ver T ABELAS 1 e 2, pág. 12). A
farmacoterapia das cardiopatias é normalmente restrita aos casos em que os
sintomas (por exemplo, tosse, ascite, síncopes e murmúrio de duto arterioso
patente) indicam comprometimento da qualidade ou duração da vida.
A gravidade dos sintomas é graduada pela classificação funcional a seguir:
Classe I – não há sintomas, nem durante esforço; II – sintomas apenas após muito
esforço; III – sintomas após pouco esforço; IV – sintomas, mesmo quando em
repouso. Para a origem de sintomas específicos (por exemplo, murmúrios,
Sistema Cardiovascular, Introdução 12

TABELA 1 – Classificação das Cardiopatias


1. Valvular
Regurgitação (mitral, tricúspide, aórtica)
Estenose (pulmonar, aórtica)

2. “Shunts”
Esquerda para direita (defeito de septo atrial, defeito de septo ventricular e duto
arterioso patente)
Direita para a esquerda (tetralogia de Fallot, complexo de Eisenmenger)

3. Função Sistólica Diminuída


Arteriolosclerose – hipoxia
Miocardiopatia dilatadora
Intoxicação por drogas (halotano, adriamicina)
Fibrose do miocárdio
Miocardite

4. Função Diastólica Diminuída


Miocardiopatia hipertrófica
Hipoxia
Fibrose do miocárdio
Constrição do pericárdio

5. Arritmia
Fibrilação atrial
Bloqueio cardíaco completo
Síncope sinoatrial
Despolarização ventricular prematura

6. Diversos
Desequilíbrio eletrolítico – ácido-base
Dirofilariose
Hipertensão – renal
Hipoadrenocorticismo
Neoplasias (mixoma, quimiodectoma, linfossarcoma)
Pulmonar (cianose, altas altitudes)
Cardiopatia tireotóxica
Traumatismos (acidentes)
Cardiopatia urêmica

TABELA 2 – Sinais das Cardiopatias


1. Inspeção – Fraqueza, desorientação, abdução de membros, exoftalmia, pescoço esten-
dido, polidipsia, cianose, relutância ao decúbito, síncope, edema, ascite, fadiga,
dispnéia, distensão venosa jugular
2. Exame Clínico Geral – Desvio do choque precordial, distensão venosa, pulso fraco,
“waterhammer pulse”, hepatomegalia, tremores, taquicardia, bradicardia, arritmia
3. Auscultação – Tosse, murmúrios, fricção, crepitação, roncos, sons brônquicos, galopes
(B3, B4), estalos, desdobramento da segunda bulha cardíaca
4. Análise de Sangue – Eosinofilia, basofilia, neutrofilia, hiponatremia, microfilaremia, T 4
elevada ou deprimida, creatinina ou BUN elevado, policitemia, O2 diminuído,
sorologia
5. Exames Complementares (raio-X, ecocardiograma, ECG) – edema pulmonar, efusão
pleural, padrão alveolar, efusão pericárdica, dilatação, hipertrofia, batimentos ectó-
picos, alta/baixa voltagem, hipocinesia
Sistema Cardiovascular, Introdução 13

mudanças de voltagem no eletrocardiograma, mudanças dimensionais em eco-


cardiogramas ou radiografias), o leitor deve dirigir-se a textos sobre cardiologia.
Esta discussão está limitada à origem dos sintomas indicadores da maioria das
cardiopatias para as quais se pode instituir uma terapia.
Seja devido a um enfraquecimento da força sistólica, obstrução dos tratos de
saída de fluxo, um afrouxamento de válvulas, arritmia ou um aumento da rigidez
diastólica do ventrículo, o coração pode falhar, levando a circuitos venosos vazios,
a circuitos arteriais cheios ou a ambos. Sinais deste funcionamento inadequado
constituem a existência clínica de insuficiência cardíaca e insuficiência cardíaca
congestiva. Na primeira, os sinais resultam de um baixo débito cardíaco inadequado
absoluto ou relativo às necessidades dos órgãos perfundidos; na segunda, os sinais
resultam de capilares e veias congestos de sangue em órgãos específicos (ver
também CARDIOPATIAS, pág. 47).
Insuficiência cardíaca – Perfusão inadequada do cérebro, músculos esqueléti-
cos, rins e do próprio coração causa sérias doenças. Uma perfusão cerebral
inadequada leva a estados de confusão, mudança de temperamento ou, se muito
severa, a uma síncope. Uma perfusão renal inapropriada leva a azotemia, retenção
de sódio, oligúria, hipertensão arterial sistêmica e polidipsia – todas produzidas pela
ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona. Uma perfusão inadequada
dos músculos esqueléticos leva a fraqueza (principalmente nos membros pélvicos)
e descoordenação motora, normalmente mais pronunciada durante esforço ou
excitação quando as demandas são maiores. A perfusão inadequada da circulação
coronária leva a uma futura redução das funções sistólica e diastólica ou à arritmia,
ou a ambas.
Distúrbios primários dos sistemas nervosos central ou autônomo, rins ou mús-
culos esqueléticos podem produzir síndromes semelhantes.
Insuficiência cardíaca congestiva (CHF) – Os sinais que constituem uma
insuficiência cardíaca congestiva resultam de uma retenção de fluido e represamen-
to de sangue nas veias e capilares de órgãos, cujos vasos eferentes estão
prejudicados devido a uma falha ventricular. Podem ocorrer 2 síndromes (ou uma
combinação) de insuficiência cardíaca congestiva: uma devida ao represamento de
sangue nos pulmões por falha no ventrículo esquerdo (insuficiência cardíaca
congestiva esquerda – LCHF), e outra devido ao represamento de sangue nos
órgãos sistêmicos por falha no ventrículo direito (insuficiência cardíaca congestiva
direita – RCHF). Freqüentemente, os sinais de insuficiência cardíaca direita e
esquerda ocorrem concomitantemente devido à probabilidade de que a doença (por
exemplo, fibrose, intoxicação por cloridrato de doxorrubicina) comprometa a ambos
os lados simultaneamente.
Insuficiência cardíaca congestiva esquerda (LCHF) – Devido a uma falha
primária do ventrículo esquerdo, regurgitação mitral ou “shunts” da esquerda para
a direita, o volume sangüíneo aumenta e pode se represar no átrio esquerdo, veias
e capilares pulmonares. Isto torna o pulmão relativamente pesado e sua porção
ventral pode ficar comprimida. Tanto edema hilar quanto congestão pulmonar e
compressão resultam em diferenças marcantes na ventilação dos pulmões, dese-
quilíbrio entre perfusão e ventilação, hipoxia e cianose. Se a hipoxia for prolongada,
pode-se desenvolver uma policitemia. O pulmão também se torna mais rígido que
o normal; por isso um aumento no trabalho de respiração e um mínimo esforço
podem levar o animal à fadiga. A parte do pulmão que se comprime normalmente
durante a expiração, pode chegar a um estágio tal de compressão que se podem
escutar crepitações ao abrir e fechar das vias respiratórias. Para ajudar na
ventilação primária dos músculos, o animal afetado pode mostrar abdução dos
membros torácicos e cabeça estendida; se os músculos abdominais forem usados,
será produzida uma linha côncava. Uma vez que a posição deitada limita a
Sistema Cardiovascular, Introdução 14

movimentação do tórax e abdome e também facilita o retorno venoso ao coração,


animais com insuficiência cardíaca congestiva esquerda freqüentemente podem
permanecer em pé ou sentados até a exaustão. Se o animal for carregado, poderá
ficar mais hipóxico e até vir a desmaiar ou morrer por causa da restrição de
ventilação.
Devido à elevação da pressão capilar pulmonar, pode haver um extravasamento
de soro dos capilares pulmonares para o pulmão; e se isto excede a capacidade de
drenagem dos linfáticos pulmonares, desenvolve-se o edema pulmonar. O pulmão
torna-se então mais pesado, prejudicando a difusão de O2 entre os alvéolos e
capilares. Logo, não teremos apenas problemas de ventilação-perfusão, mas
também problemas de difusão que produzirão uma hipoxemia ainda maior.
Quando o átrio esquerdo está dilatado (especialmente por regurgitação mitral), ele
pode comprimir o ramo principal do brônquio esquerdo. Isto freqüentemente produz
uma doença respiratória caracterizada por tosse seca e taquiarritmias supraven-
triculares (por exemplo, batimentos atriais prematuros ou fibrilação atrial) devido a
estiramento e irritação do miocárdio atrial esquerdo. A produção de fator natriurético
atrial pelas células atriais é um sinal de distensão atrial. Esta substância promove
perda de sódio e água pelos rins, mas também antagoniza os efeitos da angiotensina
II. Finalmente, se o átrio esquerdo estiver dilatado o bastante e a pressão interna
particularmente elevada, ele poderá se romper, resultando em tamponamento
pericárdico e até em colapso agudo e morte.
Insuficiência cardíaca congestiva direita (RCHF) – Por falha do ventrículo direito
ou regurgitação tricúspide, também pode haver retenção de fluidos, e o sangue pode
se represar no átrio direito, veias cavas, veias que drenam dentro das veias cavas e
capilares que levam a tais veias. Logo, os órgãos sistêmicos – incluindo o fígado –
tornam-se aumentados (congestos) com sangue. Se a pressão hidrostática capilar do
fígado estiver muito alta, pode haver um extravasamento de soro dos capilares mais
rapidamente que a capacidade de absorção dos linfáticos da cavidade abdominal,
desenvolvendo-se ascite. Uma pressão capilar elevada em outras porções dependen-
tes do corpo (por exemplo, peito, membros e prepúcio) pode também causar edema
nestas regiões. Como agravante, quando o fígado se torna congesto, ele falha na
transaminação e manufatura da albumina; a baixa proteína sérica reduz a pressão
oncótica (hipoproteinemia) e o edema torna-se mais grave. Uma vez que todas as veias
ficam ingurgitadas, o clínico observa distensão da veia jugular e outras veias externa-
mente visíveis, do mesmo modo que um radiologista observará distensão das veias
pulmonares em insuficiência cardíaca congestiva esquerda.
Devido à elevação da pressão do átrio esquerdo e veias pulmonares, o ventrículo
é expandido a um volume maior que o normal durante a diástole (pré-carga
ventricular esquerda aumentada). Uma pré-carga aumentada pode significar tanto
um bom quanto um mau sinal, devido às suas conseqüências. A força de contração
ventricular irá aumentar desde que as fibras estejam mais esticadas. Entretanto, uma
pré-carga aumentada pode levar o miocárdio ventricular a consumir uma quantidade
de oxigênio muito maior para a pressão que está gerando. Isto pode causar um débito
de oxigênio para o miocárdio, levando à deterioração da função ventricular.
Um galope ventricular detectado numa auscultação cardíaca é um precioso sinal
clínico de insuficiência cardíaca em pequenos animais. Os galopes ocorrem quando
o ventrículo torna-se relativamente rígido – por causa de sua dilatação, hipertrofia,
hipoxia, fibrose ou intoxicação – impedindo o enchimento diastólico. A taxa de
enchimento pode mudar rapidamente – de muito rápida para lenta e, quando ocorre
a desaceleração repentina, estruturas cardio-hêmicas desenvolvem oscilações de
audiofreqüência que produzem uma bulha cardíaca extra imediatamente após a
segunda (galope B3) ou imediatamente antes da primeira bulha (galope B4). Galopes
B3 são freqüentemente associados aos ventrículos com volumes sobrecarregados
Sistema Cardiovascular, Introdução 15

(dilatado, miocardiopatia congestiva), enquanto galopes B4 estão freqüentemente


associados a ventrículos rígidos e hipertróficos (miocardiopatias hipertróficas).

PRINCÍPIOS DE TERAPIA
As metas da terapia são regular o ritmo e freqüência cardíacos, restaurar o volume
sangüíneo, reforçar o poder da sístole, mobilizar ou remover edemas fluidos, reduzir
a fração regurgitante e balancear a demanda e oferta de oxigênio do miocárdio.
A escolha da via terapêutica depende de quais são os aspectos do sistema
cardiovascular que estão modificados. Devido a um sistema de ignição falho ou
focos irritativos, ou nos átrios (denominados supraventriculares), ou no tecido
condutível especializado dos ventrículos (denominados ventriculares), o coração
pode bater muito rapidamente para permitir o enchimento da diástole, muito
lentamente ejetar quantidades suficientes de sangue na sístole, ou muito irregular-
mente para fazer ambas as coisas. Tais distúrbios são denominados arritmias.
Agentes que restauram o ritmo cardíaco a uma média normal são chamados
antiarrítmicos (ver TABELA 3). No entanto, os antiarrítmicos podem, na verdade,
provocar ou exagerar as muitas arritmias para as quais eles são dirigidos – um efeito
pró-arrítmico. Portanto, seu potencial para benefício deve ser avaliado em vista do
potencial para dano; o efeito pró-arrítmico de drogas antiarrítmicas pode ser letal.
Outra estratégia importante ao se tratar insuficiências cardíacas é fortalecer os
músculos de ventilação; eles foram enfraquecidos devido à má oxigenação e
necessitam gerar uma tensão maior que a normal para ventilar pulmões congestos
e/ou edematosos. Tanto a aminofilina quanto os digitálicos aumentam a força de
contração do diafragma; portanto exercem seus efeitos benéficos de 2 maneiras (isto
é, fortalecendo tanto o coração quanto o diafragma); a aminofilina provoca também
a broncodilatação das vias aéreas pequenas.
Se houver perda de sangue devida à hemorragia, desidratação ou simplesmente
por seqüestro de sangue por um determinado órgão, diminuirá a quantidade de
sangue que retorna ao coração e, conseqüentemente, a pré-carga. Pela relação de
Frank-Starling, a força de contração e o débito cardíaco enfraquecem. Os agentes
utilizados para restaurar o volume sangüíneo, assegurando uma pré-carga adequa-
da, são o sangue integral, plasma e soluções cristalóides/coloidais.
Devido a defeitos metabólicos (por exemplo, depleção de ATP) ou estruturais
(por exemplo, válvulas falhas e fibrose miocárdica), os ventrículos podem ser
insuficientes para gerar uma contração poderosa o bastante para bombear quanti-
dades adequadas de sangue. Se há sinais (por exemplo, fraqueza, desmaios e
oligúria) resultantes de um fluxo inadequado de sangue para órgãos específicos,
pode-se considerar o animal com insuficiência cardíaca. Pode-se fortalecer o poder
sistólico do músculo cardíaco (contratilidade miocárdica) com inotrópicos positivos

TABELA 3 – Arritmias e Antiarrítmicos


1. Taquicardia Sinusal, Taquicardia Atrial, Fibrilação Atrial
β-bloqueadores: propranolol, atenolol
Glicosídios digitálicos: digoxina, digitoxina
Bloqueadores do canal de cálcio: diltiazem, verapamil
2. Taquicardia Ventricular
Emergência: lidocaína
Crônica
a) Antiarrítmicos da Classe I: procainamida, quinidina, tocainida
b) β-bloqueadores: propranolol, atenolol
c) Se refratária: amiodarona, bretílio
Sistema Cardiovascular, Introdução 16

(por exemplo, digitálicos, dobutamina, milrinona). Se o ventrículo não esvazia o


sangue dos compartimentos venosos, seus leitos capilares tornam-se ingurgitados
e o soro extravasa dos capilares para o interstício dos órgãos envolvidos. Se a
quantidade extravasada exceder a capacidade de drenagem dos interstícios pelos
linfáticos, os tecidos tornam-se edematosos. Se houver evidências de sinais destes
capilares ingurgitados e edema, pode-se considerar o animal com insuficiência
cardíaca congestiva.
Cães de raças grandes podem apresentar insuficiência cardíaca devida à
deficiência de carnitina. Este aminoácido é encontrado na carne vermelha e
produtos derivados do leite. A carnitina é necessária para transportar a acetilcoenzima
A para o interior da mitocôndria, onde pode ser utilizada para a produção do ATP (a
fonte de energia para a contração e o relaxamento do miocárdio). Os gatos
necessitam de uma grande quantidade de taurina, um aminoácido que muitas vezes
é sintetizado em quantidades insuficientes. O papel exato da taurina na contração
ainda não é conhecido; no entanto, a deficiência provoca diminuição da contratilida-
de do miocárdio. É possível que a maior parte das miocardiopatias com dilatação em
cães e gatos resultem de deficiências na dieta e/ou diminuição da biossíntese destes
2 aminoácidos. Animais doentes devido a estas deficiências geralmente respondem
dramaticamente à suplementação. As considerações referentes à dieta na preven-
ção e terapia da insuficiência cardíaca são de extrema importância.
Devem-se mobilizar ou remover os fluidos de um edema. Isto pode ser feito
através de diuréticos (por exemplo, furosemida) e de uma dieta restrita de sódio; ou
se o fluido está “livre” dentro das cavidades, ele pode ser removido por paracentese.
Se a abertura das arteríolas estiver reduzida, oferecendo muita resistência ao fluxo
de sangue para os capilares; ou, se a aorta e outras grandes artérias estiverem
rígidas demais para acomodar facilmente o volume sistólico ventricular esquerdo
(isto é, a pós-carga é muito grande), então o ventrículo – particularmente se estiver
enfraquecido ou contraído por problema da válvula – será insuficiente para bombear
quantidades adequadas de sangue. Uma das metas da terapia é reduzir esta
interferência ao fluxo de sangue para e pelo sistema arterial e, daí, melhorar a
circulação periférica e reduzir a tensão no ventrículo. Os agentes que tornam a aorta
mais complacente e a luz das arteríolas sistêmicas maior (por exemplo, hidralazina,
captopril, prazosina) são denominados redutores de pós-carga.
Regurgitação mitral, uma condição na qual o sangue passa contra o fluxo do
ventrículo esquerdo para o átrio esquerdo, leva a dilatação, irritação e, possivelmente,
ruptura do átrio esquerdo e faz com que o compartimento comprima o ramo principal
do brônquio esquerdo. Uma meta da terapêutica é reduzir a fração regurgitante. Com
a redução da pós-carga no ventrículo esquerdo, a cavidade precisa de menos força
para suportar o fluxo positivo de sangue; logo, menos sangue estará passando de
volta através da válvula mitral insuficiente. Isto permite um tamanho diminuído do átrio
esquerdo e a redução dos sinais atribuídos à distensão daquela cavidade. Portanto,
os redutores de pós-carga melhoram o fluxo positivo quando o ventrículo está
insuficiente e reduzem a fração regurgitante (relação do sangue regurgitado àquele
bombeado para fora da válvula aórtica) na presença de insuficiência mitral.
Outra terapia para congestão pulmonar e edema, e para diminuir a regurgitação
mitral, é a que usa redutores de pré-carga (por exemplo, furosemida, nitroglicerina).
Estes agentes dilatam as veias sistêmicas, que são então preenchidas pelo sangue
dos vasos pulmonares. Quando o sangue muda dos vasos pulmonares para as
veias periféricas, isto causa pouco ou nenhum mal, devido a sua posição em um
compartimento quase inócuo; e a pressão no interior dos capilares pulmonares é
reduzida, de forma que o edema diminui, e o peso e rigidez dos pulmões são
aliviados. Além disto, conforme o volume atrial esquerdo diminui, o efeito dilatador
deste maior volume no orifício mitral (annulus) diminui, a dimensão do orifício mitral
Sistema Cardiovascular, Introdução 17

diminui, os folhetos da válvula mitral tornam-se mais competentes e a gravidade da


regurgitação mitral pode, de fato, diminuir.
Ocasionalmente, devido ao funcionamento pulmonar inadequado em virtude de
doença pulmonar (por exemplo, fibrose pulmonar, pneumonia, neoplasia) ou devido
a doenças das artérias coronárias intramurais (arteriolosclerose), algumas porções
do ventrículo – normalmente o endocárdio ventricular esquerdo – sofrem uma falta
de oxigênio (isquemia ou hipoxia). Se o déficit de oxigênio estiver intenso ou
prolongado, o tecido isquêmico poderá morrer ou servir como um foco de arritmia.
O tecido isquêmico não contribui com sua parte para a contração e é mais rígido que
o miocárdio normal; conseqüentemente, isso diminui a contratilidade miocárdica e
leva a uma redução da função ventricular. Uma arritmia séria, resultante do tecido
isquêmico, pode causar morte súbita.
Uma outra meta da terapia é equilibrar a demanda e a disponibilidade de
oxigênio. Os determinantes principais da demanda de oxigênio miocárdico são
ritmo cardíaco, contratilidade miocárdica e tensão máxima do miocárdio ventricu-
lar. Deve-se tentar ajustar estes determinantes aos níveis mínimos compatíveis
com o funcionamento ventricular adequado. Portanto, digitálicos, ou propranolol,
ou ambos podem ser usados para desacelerar o coração, e um redutor de pós-
carga, usado para diminuir a tensão máxima. Entretanto, há 2 dilemas: 1. embora
os digitálicos desacelerem o coração, diminuindo a demanda de oxigênio, tam-
bém aumentam a contratilidade, que aumenta a demanda do oxigênio; e 2. quan-
do se usa um redutor de pós-carga que baixa a pressão arterial sistêmica e a
pressão de perfusão coronária, há um risco de ocorrer uma diminuição no fluxo
sangüíneo coronário e na disponibilidade de oxigênio. Para aumentar a oferta de
O 2, devemos tentar melhorar o funcionamento pulmonar, usando broncodilatado-
res (por exemplo, aminofilina e terbutalina), antibióticos, antineoplásicos e
concentrações aumentadas de oxigênio inspirado, conforme indicado pelo diagnós-
tico clínico específico.
Corações com insuficiência cardíaca que foram “forçados” por excesso de
catecolaminas de alta atividade adrenérgica eferente possuem um número
reduzido de receptores β-adrenérgicos. Portanto, se surgir uma emergência na
qual o coração necessite de maior estímulo através de uma influência
simpatoadrenal, o coração não pode responder, pois existem muito poucos
receptores β-adrenérgicos aos quais as catecolaminas podem se ligar. Isto é
conhecido como “down-regulation” (diminuição) dos β-receptores e é uma ca-
racterística da insuficiência cardíaca crônica. Os β-receptores podem ser aumen-
tados (“up-regulated”), paradoxalmente, utilizando-se pequenas doses de subs-
tâncias que os bloqueiem (por exemplo, propranolol, atenolol). Embora estes β-
bloqueadores possam bloquear os receptores e enfraquecer o coração levemen-
te, o resultado final é um fortalecimento do coração através do aumento do
número de β-receptores e, portanto, do potencial para responder às catecolami-
nas. Desta forma, pequenas doses de β-bloqueadores oferecem meios de
reverter de fato o processo de insuficiência cardíaca. Eles também são antiar-
rítmicos e diminuem a necessidade de oxigênio do miocárdio, restaurando assim
o equilíbrio entre a demanda de oxigênio e sua disponibilidade.
Há muitas doenças cardiovasculares específicas para as quais existem soluções
imediatas. Para defeitos de comunicação (por exemplo, duto arterioso patente,
defeito do septo ventricular e defeito do septo atrial) ou para válvulas que falham na
abertura, o melhor tratamento é a cirurgia. Para animais que sofrem de pré-carga
diminuída devido à constrição do pericárdio, o melhor é a remoção do mesmo, sendo
que este está estrangulado.
Portanto, em alguns casos (por exemplo, duto arterioso patente, constrição pelo
pericárdio e miocardite bacteriana), o objetivo da terapia é a remoção da causa de
Sistema Cardiovascular, Introdução 18

base, enquanto em outros casos (por exemplo, regurgitação mitral, miocardiopatias


e arteriolosclerose) o objetivo é minimizar as conseqüências. Em ambos os casos, as
decisões e recomendações sobre terapêutica devem ser baseadas em: 1. tipo e
intensidade do processo mórbido; 2. condições financeiras; e 3. qualidade de vida.
Em geral, a restrição de sódio é recomendada a fim de minimizar a tendência para
retenção de fluidos. Dirige-se um manejo visando à minimização do trabalho cardía-
co com atividade física restrita, e normalização do ritmo cardíaco e carga(s) ven-
tricular(es).

ANEMIA
É uma doença caracterizada fisiologicamente pela insuficiência de hemoglobina
(Hb) circulante e clinicamente por tolerância reduzida a exercício e membranas
mucosas pálidas. Pode ser por produção diminuída, destruição aumentada, ou
perda de hemácias (eritrócitos). Determina-se a terapia de acordo com as 3
situações predominantes. A contagem de células policromáticas (corante de Wright)
ou reticulócitos (corante novo de azul de metileno) é o teste mais informativo para
determinar se a anemia é responsiva (hemólise ou hemorragia) ou não responsiva
(hipoproliferativa). As anemias são classificadas de modo a proporcionar uma base
racional para tratamento.
O diagnóstico laboratorial da anemia se baseia em valores de Hb, hematócrito
e hemácias. A caracterização das anemias é auxiliada ainda pelos índices
hematimétricos: volume corpuscular médio (VCM), hemoglobina corpuscular
média (HCM) e concentração de hemoglobina corpuscular média (CHCM). A
HCM e a CHCM fornecem informações semelhantes, porém a CHCM é conside-
rada mais precisa. Portanto, os 2 índices mais comumente utilizados são o VCM
e a CHCM. Conforme os rubrícitos (precursores de eritrócitos) maturam na
medula óssea, seu volume diminui conforme o conteúdo de hemoglobina aumen-

TABELA 4 – Classificação das Anemias


I. Hipofunção da Medula Óssea (anemia não responsiva)
A. Diminuição na produção de eritrócitos. Anemia nutricional, danos às células
germinativas, mieloftise (infiltração neoplásica), neoplasia hematopoiética
B. Redução da síntese de Hb. Deficiência de ferro, vitamina E ou vitamina B 6
C. Supressão ou destruição imunomediada das células germinativas
D. Infecções virais com supressão da medula (por exemplo, retrovírus, parvovírus)
II. Perda de Eritrócitos Anormais (anemia responsiva)
A. Eritrócitos com conteúdo enzimático deficiente. Anemia com corpúsculo de Heinz,
deficiência de piruvatocinase em cães basenji, anemia hereditária e nanismo em
malamutes do Alasca, deficiência de fosfofrutocinase em springer spaniels ingle-
ses
B. Anemias imunomediadas. “Espectador inocente”, isoimunes e idiopáticas; e
anemia hemolítica do recém-nascido
C. Anemia hemolítica devida à fragmentação intravascular. Vasculite de pequenas
artérias
III. Perda de Eritrócitos Normais
A. Hemólise de eritrócitos normais (responsiva). Esplenomegalia, parasitismo de
eritrócitos, lesão química ou física
B. Perda de eritrócitos normais (de pouco responsiva a responsiva). Hemorragia
externa ou interna, ou parasitismo
Anemia 19

ta; assim, os eritrócitos imaturos liberados na circulação nas anemias responsivas


possuem um VCM maior. Eritrócitos muito grandes (macrócitos) com um VCM
alto podem apresentar uma Hb total ou HCM normal, apesar da porcentagem
de saturação (ou CHCM) estar abaixo do normal. Estas células grandes contêm
RNA e coram-se de azul com o corante de Wright (policromatofílicas). Elas
maturam na circulação em 12 a 48h, completando a síntese de Hb, perda do RNA
e da aparência azul. Em 1 semana, elas perdem membrana suficiente para
tornarem-se normais em tamanho (VCM) e aparência (normocíticas). Como a
policromasia é curta (12 a 48h), a presença de eritrócitos policromáticos é o
indicador mais sensível de produção medular. Como os índices hematimétricos
são valores médios, é necessária uma alteração moderada a acentuada na
população de eritrócitos para distanciar os índices dos valores normais. Portanto,
uma anemia leve pode ser regenerativa e possuir índices hematimétricos
normais. Os índices hematimétricos são provavelmente mais úteis no reconheci-
mento da anemia por deficiência de ferro, na qual os eritrócitos tornam-se
menores (o que diminui o VCM) e contêm menos hemoglobina (o que diminui a
HCM e a CHCM). Portanto, a diminuição de VCM, HCM e CHCM indica anemia
ferropriva.
A avaliação da resposta eritróide da medula é mais acurada quando o sangue
é corado supravitalmente com novo azul de metileno e os reticulócitos são
contados como uma porcentagem das hemácias totais. O seu número absoluto
deve ser determinado para que o clínico possa avaliar o grau de independência da
anemia; por exemplo, em 1µL de sangue, um cão normal possui 6,5 × 10 6 (6,5 ×
10 12/L) eritrócitos com 1% (65.000) de reticulócitos; um cão anêmico pode ter 2 ×
10 6 (2 × 10 12/L) eritrócitos com 3% (60.000) de reticulócitos. Uma vez que a
produção de reticulócitos de ambos os cães é provavelmente a mesma, a resposta
do cão anêmico é pouco responsiva. Uma boa resposta é caracterizada por ≥ 3 ×
10 5 reticulócitos/µL de sangue, por exemplo, 3 × 106 (3 × 1012/L) eritrócitos com
10% de reticulócitos.
Um método mais simples para se avaliar a resposta eritróide é baseado na
contagem de eritrócitos policromáticos após o uso de corante de Wright ou similar.
O número médio de eritrócitos policromáticos é determinado por 10 campos em óleo
de imersão sobre a extensão de uma camada de sangue. Um hemograma normal ou
uma anemia não responsiva no cão terá de 0 a 1 eritrócito policromático por campo;
anemias pouco responsivas, 5 por campo; anemias moderadamente responsivas, 5
a 10 por campo; e anemias muito responsivas, 10 a 20 por campo. Números muito
inferiores (, 1⁄2 dos relatados em cães) são observados em gatos, e não se observa
policromasia (ou reticulocitose) em cavalos.
Para se ter uma estimativa grosseira de células/µL, multiplica-se o número de
células responsivas por campo em óleo de imersão (1.000×) por 8.000. Assim, se há
uma média de 10 eritrócitos policromáticos por campo, existem , 80.000/µL no
sangue. As plaquetas podem ser enumeradas do mesmo modo. Este método
subestima consistentemente a resposta quando comparado à contagem de
reticulócitos.
Os valores normais de eritrócitos para algumas espécies domésticas são dados
adiante.
Certos sinais são característicos das anemias, independentemente da causa ou
espécie. Geralmente há palidez de membranas mucosas, fraqueza, letargia, pouca
tolerância a exercício, anorexia, ritmos cardíaco e respiratório acelerados e, possi-
velmente, um murmúrio sistólico devido à redução da viscosidade do sangue. Se a
anemia é aguda ou hemorrágica, ou ambas, pode ocorrer hipotensão e choque. O
manejo e exame do animal anêmico devem ser feitos com muito cuidado, uma vez
que qualquer excitação pode levar a um colapso.
Anemia 20

TABELA 5 – Valores Normais de Eritrócitos: Algumas Séries Normais


Hemácias VCM
VTC Hb 106/µL µm3 CHCM
Espécies % g/dL (1012/L) (fL) g/dL
Cavalo
Raças leves 30 – 48 11 – 18 7 – 11 40 – 49 35 – 37
Raças pesadas 25 – 45 8 – 14 6– 9 37 – 52 32 – 38
Vaca 25 – 45 8 – 15 5 – 10 30 – 56 28 – 36
Ovelha 25 – 50 9 – 16 8 – 16 25 – 50 30 – 38
Cabra 20 – 37 8 – 14 8 – 18 18 – 34 30 – 40
Porco 32 – 50 10 – 16 5– 8 50 – 68 30 – 35
Cão 37 – 55 12 – 18 5– 9 62 – 70 33 – 35
Gato 27 – 45 8 – 15 5 – 10 40 – 55 30 – 35
Coelho 35 – 45 9 – 15 5– 7 60 – 68 31 – 35
Galinha 30 – 40 9 – 13 3 127 29
Peru 39 11 2 203 29

ANEMIAS POR HIPOFUNÇÃO DA MEDULA ÓSSEA


REDUÇÃO DA PRODUÇÃO DE ERITRÓCITOS
Lesão nas células precursoras da medula
Em anemias hipoplásicas e aplásicas, a redução de eritrócitos não é tão crítica
como a falta de plaquetas e neutrófilos. Na aplasia total, a morte ocorre em 10 a 14
dias devido a hemorragia e sepse. Raramente há uma aplasia de eritrócitos
imunomediada na qual as plaquetas e granulócitos são mantidos; nestes casos os
animais sobrevivem por mais tempo e se beneficiam de transfusões de sangue (ver
pág. 34) e imunossupressão.
A lesão em células precursoras (“stem cells”) da medula costuma ser uma
idiossincrasia individual e relacionada à exposição a drogas ou tóxicos. O cloranfe-
nicol e hidrocarbonetos cíclicos raramente causam aplasia, embora ocorra regular-
mente irradiação corporal na faixa de 200 a 500r. Intoxicação por broto de samambaia
(ver pág. 1989) em gado causará um surto de aplasia de medula no rebanho. O vírus
da panleucopenia (ver pág. 504) causa aplasia e pancitopenia em felídeos, porém a
morte é causada por agranulocitose, desidratação e trombocitopenia. Na maioria dos
casos, a anemia aplásica é idiopática. A doença deve ser confirmada pelo exame da
medula óssea.

Substituição da medula por células atípicas


(Mieloptise)
Raramente, um animal com infecção crônica ou no último estágio (exaustivo)
de uma leucemia mielogenosa, desenvolverá mielofibrose, na qual células
especializadas da medula serão substituídas por tecido conjuntivo. É muito mais
comum a invasão da medula por tumores linfóides, e menos freqüentemente, por
outros tipos de tumores, ou mielogenosos de origem ou sarcomas e carcinomas
metastáticos. Em qualquer caso, o aparecimento de rubrícitos em números
moderados a acentuados no sangue periférico na ausência de policromasia,
principalmente se a anemia for discreta ou ausente, deve alertar o clínico para a
possibilidade de haver substituição de células por tumor na cavidade medular.
Devem-se pesquisar células tumorais no sangue periférico e medula.
Anemia 21

Anemia nutricional
Tais anemias são devidas a uma redução na produção de eritrócitos e não a uma
redução de síntese de hemoglobina. Ácido fólico e vitamina B 12 são necessários para
a síntese de DNA; em animais deficientes há redução de mitoses eritróides,e
portanto, um número menor de eritrócitos. A doença no homem é macrocítica e
normocrômica, caracterizando-se por eritropoiese ineficiente ou células atípicas que
não são liberadas na circulação. Não há um equivalente exato em animais; entretan-
to, uma deficiência de cobalto (portanto de B12) ocorre com uma pequena redução no
volume sangüíneo, mas sem uma queda marcante na Hb. Foi descoberta recente-
mente uma deficiência de B12 em uma família de cães. Em animais, anemias por
deficiência de ácido fólico são suaves e limitadas àqueles com tumores de crescimen-
to rápido. Anemias por carência de carboidratos são suaves, enquanto deficiência de
proteína causa uma anemia mais grave acompanhada de uma queda no volume
sangüíneo. Tal efeito aparentemente não é específico e deve-se à debilidade geral
e redução da atividade. A recuperação é lenta e as proteínas do plasma são respostas
ao aumento na eritrogênese. Logo, deve haver um aumento no volume do plasma e
piora da anemia por um tempo, mesmo após a administração de dietas adequadas.
A principal causa de anemias nas doenças crônicas é a queda na produção de
eritrócitos, apesar de sempre existir algum aumento de hemólise. As razões para
este tipo de anemia incluem toxemia por abscedação ou uremia, falta de utilização
de ferro e nutrição inadequada. Em hepatopatias crônicas difusas, há uma
detoxificação inadequada de metabólitos normais e alteração no suprimento de
aminoácidos e metabolismo de gordura. Estas mudanças freqüentemente resultam
no aparecimento de eritrócitos-alvo no sangue periférico.

REDUÇÃO DA PRODUÇÃO DE HEMOGLOBINA


Síntese de heme deficiente
Estas anemias são causadas por redução da síntese de heme e, portanto, de Hb,
diferentemente das anemias macrocíticas devidas à redução da multiplicação
celular. O resultado é uma anemia microcítica e hipocrômica. A causa mais
importante é a deficiência de ferro, que, na maior parte das vezes, é secundária à
perda de sangue lenta devida a parasitas ou tumores gastrointestinais, úlceras
(cães, gato, cavalo), ou falta de ferro na dieta (suínos neonatos). Na deficiência
absoluta de ferro, não há hemossiderina na medula óssea.
Todos os animais em amamentação têm deficiência de ferro por algum tempo,
mas isto é regularmente crítico apenas em suínos. Os suínos devem receber ferro
parenteral ou VO durante a primeira semana de vida. Deve-se certificar, antes de
administrar ferro por qualquer via, que os porcos não apresentam deficiência de
vitamina E; qualquer histórico de deficiência de vitamina E no rebanho, ou evidência
prévia de intoxicação por ferro é razão para postergar a administração de ferro até ≥
24h após a administração de vitamina E (ver pág. 2028). Uma anemia persistente em
leitões jovens que não respondem a uma administração prévia de ferro deve invocar
a mesma precaução. A vitamina E é necessária para a síntese de heme, e normal-
mente há uma grande quantidade de heme presente que captura todo o ferro livre
proveniente da administração VO ou parenteral. Baixos níveis de vitamina E, portan-
to heme, permitem que o ferro livre circule, o que resulta em peroxidação das
membranas celulares e necrose, particularmente no coração, fígado e musculatura
esquelética (ver MIOPATIA NUTRICIONAL DOS CORDEIROS E BEZERROS, pág. 661 e HEPATOSE
DIETÉTICA EM SUÍNOS, pág. 663).
A deficiência de cobre pode ser absoluta ou condicionada por molibdênio (pág.
1453). O cobre é necessário para recarregar o sistema de enzimas de ferroxidase;
Anemia 22

a deficiência do mesmo bloqueia a utilização de ferro, o que resulta em anemia


ferropriva hipocrômica e microcítica. Nas anemias em que ocorre a deficiência de
cobre, a hemossiderina medular apresenta-se adequada ou abundante, no entanto,
o nível de ferro sérico é baixo. Normalmente, cobalto e cobre são adicionados aos
alimentos através de um bloqueio ou suplemento de sal.
A deficiência de vitamina B6 ou piridoxina reduz a síntese de heme e causa ane-
mia, mas não é uma condição reconhecida clinicamente, e presume-se que seja rara.

Síntese de globina deficiente


A síntese das cadeias α e β de globina que combinam-se com heme para formar
Hb é feita sob controle genético. Em animais, a deficiência de globina não foi
reconhecida, porém anemias em alguns ovinos causam uma “mudança” responsável
pela alternância de cadeias de globina que formam Hb “C”, a qual libera oxigênio mais
rapidamente aos tecidos quando comparada à hemoglobina normal A ou B; neste
aspecto, é semelhante à hemoglobina fetal e parece ser um mecanismo de proteção
que permite um transporte mais eficiente de oxigênio em baixos níveis de Hb.

COLAPSO MEDULAR IMUNOMEDIADO


Tireoidite auto-imune
Na última década, a freqüência de diagnósticos das doenças hematológicas
imunomediadas e doença auto-imune da tireóide no homem e no cão tem aumenta-
do. A anemia hemolítica imunomediada e/ou trombocitopenia são 2 seqüelas da
síndrome sistêmica poliglandular auto-imune que muitas vezes acompanha a tireoi-
dite auto-imune. A maioria destes distúrbios hematopoiéticos imunológicos não
respondem à terapia, em contraste com as doenças semelhantes porém responsivas
observadas até o fim da década de 70. Uma explicação para esta aparente mudança
é a infecção viral da medula (ver adiante) e/ou a supressão ou destruição das células
germinativas hematopoiéticas. Outra explicação é que a predisposição genética – no
homem e no cão – pode ter aumentado; por exemplo, cerca de 50 raças de cão são
consideradas hoje predispostas à doença auto-imune da tireóide hereditária e,
portanto, a vários outros distúrbios imunomediados.

Drogas
Nos seres humanos e outros animais, vários compostos terapêuticos são atual-
mente suspeitos de aumentar o número de reações hematológicas imunomediadas,
normalmente anemias induzidas por hapteno ou trombocitopenias, nas quais os
eritrócitos ou as plaquetas são envolvidos como “espectadores inocentes” (ver
também ANEMIAS IMUNOMEDIADAS, pág. 24). A maioria destes distúrbios parece ser
não regenerativa. Muitas drogas – até 30 ou mais em algumas estimativas – vêm
sendo associadas com estas reações, apesar de uma relação direta de causa-efeito
não ter sido estabelecida. A maior parte destas drogas parece disparar reações
imunológicas apenas em animais suscetíveis geneticamente ou por outras razões
(por exemplo, aqueles com doença imunológica preexistente, tireoidite auto-imune,
ou com histórico familiar destes distúrbios). Entre as drogas associadas com estas
reações estão as sulfonamidas, especialmente quando associadas ao trimetoprim,
e os agentes antiinflamatórios não esteróides quando utilizados por longos períodos.

INFECÇÕES VIRAIS COM SUPRESSÃO DA MEDULA


Alguns vírus induzem deficiências imunológicas, normalmente através de efeitos
na medula óssea. Alguns exemplos são o vírus da imunodeficiência humana
Anemia 23

(causador da AIDS no homem), vírus da imunodeficiência em símios, vírus da imuno-


deficiência felina e parvovírus humano e canino. Outros vírus similares são os vírus
da leucemia e panleucopenia felinas, anemia infecciosa eqüina, leucemia bovina,
leucose aviária e artrite caprina.
A supressão da medula óssea com displasia eritróide transitória (21 dias) ou
crônica/latente na presença ou ausência de trombocitopenia e neutropenia,
anemia hemolítica de Coombs positiva e trombocitopenia imunomediada foram
associadas a (isto é, talvez sejam causadas por) infecções por retrovírus ou
parvovírus no homem e em outras espécies. Além disto, as vacinas com
parvovírus vivo modificado para cães e vírus morto de leucemia felina são
suspeitas de causar (em animais geneticamente suscetíveis) estas doenças
hematológicas. O tratamento destes animais é baseado em corticosteróides ou
outra terapia imunossupressiva, L-tireoxina para estimular a hematopoiese e/ou
tratar a tireoidite auto-imune de base (ver anteriormente), esteróides anabolizan-
tes, antibióticos de suporte e outras terapias.

ANEMIAS POR PERDA DE ERITRÓCITOS ATÍPICOS


ERITRÓCITOS COM CONTEÚDO ENZIMÁTICO DEFICIENTE
Deficiência de glicose-6-fosfato desidrogenase (G6PD) – Esta enzima é parte
de uma cadeia metabólica intra-eritrocítica que protege a Hb da desnaturação
oxidativa. Em células deficientes, os oxidantes causam precipitação da globina,
resultando na formação de corpúsculos de Heinz e rápida lise celular. Eritrócitos
velhos, com baixo nível de G6PD, são mais suscetíveis à desnaturação oxidativa
que eritrócitos novos. Portanto, a exposição a uma droga oxidante como fenotiazina,
fenilidrazina ou primaquina causa hemólise seletiva de eritrócitos mais velhos. No
homem, baixos níveis de G6PD são geneticamente transmitidos, enquanto em
animais a suscetibilidade a oxidantes ocorre basicamente em indivíduos debilitados.
Em geral, não é preciso nenhum tratamento uma vez que a população jovem de
hemácias é poupada. Transfusões sangüíneas devem ser realizadas se o hemató-
crito tiver uma queda < 15%. A medula normalmente é funcional e a recuperação
espontânea é rápida. Uma condição semelhante foi observada em cães alimenta-
dos com grandes quantidades de cebolas ou vitamina K 1; anemias associadas à
alimentação com couves ou nabos para herbívoros também possuem uma
patogenia de corpúsculos de Heinz. A anemia por corpúsculos de Heinz ou G6PD
pode ser diagnosticada incubando-se 0,1mL de sangue heparinizado em
100mg/mL de acetilfenilidrazina em 2mL de tampão por 2h a 37oC. Os eritrócitos,
então, são corados com novo azul de metileno e examinados microscopicamente.
Os eritrócitos normais contêm poucos corpúsculos de Heinz e os deficientes em
G6PD contêm muitos.
A deficiência de piruvatocinase em cães basenji é uma deficiência de enzimas
de eritrócitos geneticamente transmitida, semelhante àquela observada no homem.
A doença é caracterizada por uma anemia congênita severa com notável resposta
eritróide policromática. Do mesmo modo, uma anemia hereditária, caracterizada por
estomatócitos e associada com nanismo esquelético, foi observada em cães
malamutes do Alasca.
A deficiência de fosfofrutocinase em springer spaniels ingleses foi descrita
recentemente, sendo similar ao distúrbio análogo dos humanos. Esta doença
herdada é caracterizada por surtos intermitentes de anemia hemolítica grave e
mioglobulinúria associada ao exercício, que induz alcalose respiratória e aumenta a
fragilidade dos eritrócitos.
Anemia 24

ANEMIAS I MUNOMEDIADAS
Ver também INFECÇÕES VIRAIS COM SUPRESSÃO DA MEDULA, página 22, ANEMIAS POR
COLAPSO MEDULAR IMUNOMEDIADO, página 22, DOENÇAS ENVOLVENDO ANTICORPOS
CITOTÓXICOS, página 428, e GRUPOS SANGÜÍNEOS E TRANSFUSÕES SANGÜÍNEAS, pági-
na 34.
Os eritrócitos podem se tornar alvos de anticorpos que cobrem suas superfí-
cies e causam sua remoção da circulação pelo sistema reticuloendotelial (SRE).
Esta condição pode ser diagnosticada por um anti-soro reagente específico à
globulina das espécies testadas. A combinação da antiglobulina reagente com a
globulina na membrana celular constitui um teste de Coombs ou antiglobulina
positivo.
A adsorção do vírus ao eritrócito, do mesmo modo que na anemia infecciosa
eqüina (ver pág. 32), pode causar uma crise hemolítica devido à ligação de
anticorpos antivirais aos vírus unidos aos eritrócitos. Estas células são então
destruídas pelo SRE, no que é conhecido como “reação do espectador inocente”.
Do mesmo modo, a adsorção de drogas aos eritrócitos raramente induz hemólises
imunes no homem e animais.
A anemia hemolítica isoimune ocorre naturalmente no cavalo, gato, cão e
porco, e em bezerros e leitões de matrizes vacinadas. Trata-se de uma anemia
aguda na qual os eritrócitos dos recém-nascidos são aglutinados ou hemolisados
por isoanticorpos específicos produzidos por suas matrizes.

Anemia hemolítica auto-imune


A anemia hemolítica auto-imune (AHAI), também chamada de anemia hemolítica
imune (AHI), ocorre no gato, cão e cavalo, e é qualitativamente similar à doença no
homem. Ocorre no cão como parte de uma síndrome incomum do lúpus eritematoso
sistêmico canino, junto com uma trombocitopenia e artrite reumatóide (ver também
ANEMIAS POR COLAPSO MEDULAR IMUNOMEDIADO, pág. 22, e DOENÇAS DO SISTEMA IMUNE,
pág. 421). A forma usual de AHAI, isto é, não associada com lúpus, não é rara e é
caracterizada por crises hemolíticas com um hematócrito variável, mas freqüente-
mente muito baixo (< 10%), policromasia marcante, esferocitose, agregação de
hemácias e, freqüentemente, um teste de Coombs direto positivo ou auto-aglutina-
ção espontânea de hemácias. Os casos mais típicos recentes em cães foram
marcados por anemias não regenerativas. Alguns destes casos ocorreram após a
exposição a parvovírus ou vacina de parvovírus vivo modificado, e alguns casos
progrediram para uma displasia eritróide transitória ou latente crônica (ver também
INFECÇÕES VIRAIS COM SUPRESSÃO DA MEDULA, pág. 22).
Em casos crônicos, há presença de icterícia devido à isquemia hepática. Se
forem feitas transfusões sangüíneas, estas devem ser realizadas com muito
cuidado e após sorotipagem somente para evitar maior sensibilização e exacerba-
ção do problema. Dexametasona, prednisona, ou prednisolona em altas doses
diárias por 5 a 7 dias, normalmente resultam em um aumento acentuado do
hematócrito e melhora na coloração e condição geral do cão. Esteróides anabólicos
administrados uma vez por semana também podem ser úteis. A dose de esteróides
deve ser reduzida a metade ou menos, da dose inicial em 5 a 7 dias e depois para
uma dose de manutenção diária a cada 1 ou 2 dias, que deve ser continuada por 6
a 8 semanas. Os esteróides podem ser necessários em níveis altos por até 3
semanas, a fim de induzir o aumento de hematócrito. Para estimular a hematopoiese
e/ou tratar a tireoidite auto-imune de base, uma terapia adjuntiva importante é a L-
tireoxina. Vincristina ou ciclofosfamida podem ser usadas se a terapia com esterói-
des falhar; entretanto, elas são mielotóxicas e a contagem de leucócitos deve ser
monitorada pelo menos diariamente. Recentemente, casos resistentes a esteróides
Anemia 25

têm respondido bem ao tratamento com ciclosporina por 5 dias consecutivos


semelhante ao regime usado no homem. Em casos não responsivos, a azatioprina
tem sido usada em conjunto com a ciclosporina e doses baixas de corticosteróides,
e seguimentos de cursos de 5 dias de ciclosporina em metade da dose inicial podem
ser necessários. Esplenectomia pode ser indicada como um último recurso se a
terapia com esteróides ou imunossupressores falhar.
A maioria das falhas terapêuticas resulta de terapia descontínua com esteróides
logo após o início da recuperação. Alguns pesquisadores e clínicos consideram a
dexametasona superior à prednisona ou à prednisolona no tratamento das anemias
imunomediadas ou trombocitopenias. Se uma crise hemolítica ocorrer após uma
recuperação esteróide-induzida, níveis ainda maiores de esteróides deverão ser
dados para que se mantenha a hemólise sob controle. Os cães devem desenvolver
sintomas semelhantes aos da doença de Cushing (ver pág. 331) durante o
tratamento de AHAI, mas retornam ao normal quando o tratamento é diminuído ou
quando dado em dias alternados. Hematínicos normalmente não são necessários
e ferro não é aconselhável, a não ser que os depósitos do mesmo estejam esgotados
nos casos de insuficiência crônica da medula.
A adsorção do vírus da anemia infecciosa eqüina (ver pág. 32) para os eritrócitos
do cavalo resulta numa síndrome semelhante. A AHAI também ocorre em gatos, e
provavelmente em outras espécies, mas não é reconhecida.

Anemia hemolítica do bezerro neonato


A sensibilização espontânea do gado para antígenos de eritrócitos fetais é rara
ou não ocorre. Vacinas derivadas de sangue e usadas na prevenção de babesiose
e anaplasmose podem conter antígenos de eritrócitos que imunizam as matrizes. Se
o touro possuir os mesmos antígenos de eritrócitos que o doador do sangue da
vacina, os bezerros poderão possuir estes antígenos e desenvolver anemia hemo-
lítica isoimune ao receberem o colostro. A prenhez é normal. Os anticorpos dos
eritrócitos dos bezerros afetados mostraram-se como sendo IgG e, pelo menos em
alguns casos, hemolíticos. Uma simples dose de 2mL de vacina de Babesia em
poucas semanas antes do parto pode resultar em isoeritrólise neonatal, e os casos
fatais ocorrem quando as matrizes recebem 4 a 5 vacinações no período de 1 ano.
O teste de Coombs costuma ser altamente positivo. Os proprietários deverão notar
urina vermelha em bezerros recém-nascidos e a exacerbação do problema com a
revacinação das matrizes na suspeita de infecção neonatal.
Achados clínicos – A doença pode ser fraca ou hiperaguda, com os sintomas
aparecendo 12 a 48h após o nascimento. Em casos hiperagudos, a morte pode
vir 2h após os sinais de dispnéia forte e 12 a 16h após o nascimento. Casos
agudos são caracterizados por depressão, dispnéia, e ocasionalmente, febre que
aparece 24 a 48h após o nascimento. Os bezerros continuam a mamar, porém
enfraquecem e empalidecem, o que é mascarado em 1 a 2 dias por icterícia leve
a moderada. A morte ocorre em 4 a 5 dias. Bezerros, levemente afetados,
demonstram apenas tristeza e atividade reduzida.
Em casos hiperagudos há hemoglobinúria, hipofibrinogenemia e degradação
de produtos da fibrina elevada, com morte rápida, um grande baço esponjoso e
descoloração dos rins. Há um excesso de fluido pleural tingido de sangue e os
pulmões são congestos e edematosos. Na forma aguda, o hematócrito cai para
6 a 7% e freqüentemente há hemoglobinúria. A medula é responsiva, mas
inadequada; 1 a 2% de hemácias policromatofílicas e até 140 rubrícitos por 100
leucócitos são vistos. O teste de Coombs é positivo e o leite da vaca aglutina
hemácias do bezerro e, se o complemento for acionado, ocorre hemólise. Em
casos suaves, o hematócrito cai a 18% em 1 semana de vida e aumenta para 30%
na terceira semana. A anemia é normocrômica e macrocítica.
Anemia 26

Diagnóstico – Costuma ser feito por achados clínicos de uma anemia severa em
bezerros neonatos, cujas matrizes foram vacinadas com vacinas de origem sangüí-
nea. A confirmação é feita pela aglutinação de hemácias do bezerro e touro pelo
colostro e soro materno.
Tratamento – Não se costuma fazer transfusão sangüínea devido à incompatibi-
lidade de sangue do doador. Uma simples transfusão de uma vaca não vacinada ou
transfusão de eritrócitos maternos lavados com solução salina (3 vezes) pode ser
usada para aumentar o hematócrito a 25%. Antibióticos e esteróides podem auxiliar
o tratamento.
Profilaxia – Se houver suspeita de doença, pode-se determinar sua presença se
as vacas possuírem um título contra eritrócitos do touro. Quando for prático, o
colostro de vacas sem título deve ser usado até que as vacas positivas sejam
ordenhadas por 24 a 48h.

Anemia hemolítica do potro neonato


Potros afetados são normais ao nascimento, mas podem absorver quantidades
perigosas de isoanticorpos do colostro através do trato GI, por até 36h. Isoeritrólise
neonatal, clinicamente reconhecível, raras vezes ocorre em potros de éguas primíparas
e, em geral, não é observada até a égua ter o seu terceiro ou quarto potro. As éguas
são naturalmente isoimunizadas por rompimentos focais de placenta, que permitem
hemorragias fetoplacentárias do sangue do potro incompatível com a circulação
materna. Uma hemorragia fetoplacentária relativamente grande deve ser necessária
para isoimunizar inicialmente uma égua em grau significante. A reestimulação da
égua em prenhezes subseqüentes requer do potro muito menos sangue incompatí-
vel do mesmo tipo. Além disso, agentes terapêuticos como transfusões de sangue
e tecidos vacinais incompatíveis podem contribuir para o problema. A isoeritrólise
neonatal pode ocorrer somente quando o potro e seu pai possuírem um fator
sangüíneo ausente na égua. Alguns garanhões cruzados com éguas sensibilizadas
gerarão sempre potros suscetíveis, pois são geneticamente homozigotos para o fator
sangüíneo ofensor. Outros garanhões (heterozigotos) irão gerar potros em somente
metade das vezes que cruzarem. Apesar da eritrólise neonatal ocorrer em potros de
qualquer raça, é mais observada em puros-sangues e mulas.
Achados clínicos – A gravidade da anemia varia consideravelmente, depen-
dendo da quantidade e tipos de isoanticorpos consumidos. Os isoanticorpos
hemolíticos são os mais lesivos, e os maiores títulos existem no primeiro leite
colostral; conseqüentemente os potros que mamam vigorosamente ao nascer
podem ser os mais severamente afetados.
Sinais da doença podem se manifestar de 8h a 5 dias após o nascimento.
Observam-se letargia, icterícia, dispnéia, batimentos cardíacos fortes e, em casos
severos, hemoglobinúria. Os potros passam muito tempo deitados e os que estão
severamente afetados não conseguem se levantar. Eles mamam infreqüentemente
e por períodos curtos. A conjuntiva, esclera e mucosas tornam-se gradativamente
ictéricas em potros seriamente afetados. Os números de hemácias variam de , 2
a 4 × 10 6/µL(2 a 4 × 1012/L) e elas tendem a formar grumos no próprio plasma. Potros
com este nível de eritrócitos nas primeiras 24h exigem tratamento.
Diagnóstico – Pode ser feito em nível clínico. Um teste de Coombs positivo em
potro anêmico é uma forte evidência presuntiva, e a demonstração de anticorpo
específico contra eritrócito do potro em soro materno ou colostro é definitiva. Exceto
pela anemia, icterícia e, algumas vezes, hematúria, poucas lesões são encontradas
regularmente. Esplenomegalia e icterícia generalizada são freqüentemente vistas
em potros que morrem 24 a 48h após o nascimento.
Tratamento – Para os potros que não foram seriamente afetados, cuidados
ordinários acompanhados de antibióticos e restrição de exercício pela primeira
Anemia 27

semana geralmente resultam em recuperação. A transfusão de sangue é o único


método conhecido para se salvar um potro seriamente anêmico. Nem o sangue
íntegro da mãe nem o do pai podem ser usados nas transfusões, uma vez que contêm
o anticorpo hemolítico, mas eritrócitos lavados com solução salina da égua são
provavelmente o tratamento de escolha. Um doador compatível é difícil de ser
encontrado e deve ser selecionado para eritrócitos que não sejam aglutinados ou
hemolisados pelo soro ou colostro da égua, e cujo soro não contenha isoaglutininas
ou iso-hemolisinas de células do potro demonstráveis. A contagem de eritrócitos do
potro deve ser mantida em 3 a 4 × 106/µL (3 a 4 × 1012/L), ou o hematócrito ≥ 15% até
a recuperação. Se as hemácias da égua estão disponíveis, 2 ou 3 lavadas em solução
salina isotônica são essenciais. Cerca de 2 a 3 L de sangue da égua serão suficientes.
Como alternativa, a remoção de 3 a 7L do sangue do potro e a substituição por 4 a
6L de sangue do doador irão corrigir a anemia e aliviar temporariamente os sinais.
Transfusões adicionais podem ser necessárias e uma terapia de suporte é essencial.
Deve-se manter muita atenção para a detecção de infecções. Os potros afetados
normalmente possuem uma forte resposta da medula óssea, que é caracterizada por
uma marcante anisocitose de eritrócitos em esfregaços sangüíneos e por um desvio
no VCM de 45 a 50 para 50 a 55mm3 (fL). A esferocitose também está presente,
porém é de difícil confirmação. Eritrócitos policromáticos são raramente encontrados
no sangue periférico, e sua ausência deve ser considerada uma característica da
espécie e não insuficiência da medula. Rubrícitos e sideroleucócitos ocasionais
podem ser observados em casos graves. Haverá também uma leucocitose neutrofílica
associada. A contagem de leucócitos sobe de 15 a 25.000/µL (15 a 25 × 109/L) com
tratamento esteróide, que deve ser acompanhado por antibioticoterapia.
Profilaxia – Se o soro da égua mostrar um título definido de anticorpos (>1:2)
perto do final da gestação, ou se um teste do colostro da égua com células do potro
ao nascimento mostrar um título de anticorpos >1:8, a doença poderá ser evitada
afastando-se o potro de sua mãe logo ao nascimento por 36h. O potro deve ser
levado a uma mãe adotiva normal ou amamentado com colostro de éguas não
imunizadas. Este colostro deve ser armazenado congelado para este propósito. A
mãe do potro deve ser ordenhada para que se esgote o colostro. A doença
normalmente pode ser prevenida acasalando-se éguas, que já produziram um ou
mais potros afetados, com garanhões cujas hemácias não são aglutinadas ou
hemolisadas por isoanticorpos presentes no soro da égua. Entretanto, nestes
casos, o nível de anticorpos séricos deve ser medido durante a última gestação para
detectar o possível aparecimento de novos isoanticorpos.

Anemia hemolítica do leitão neonato


A sensibilização materna pode ocorrer tanto pelo uso de vacina de cólera suína,
de origem sangüínea e inativada por cristal violeta, como por sensibilização natural
transplacentária. A doença espontânea é primariamente uma trombocitopenia
isoimune com efeitos menores nos eritrócitos. Os leitões são normais ao nascimento
e a doença ocorre após a amamentação.
Os primeiros sintomas são devidos à destruição de eritrócitos e plaquetas no
sangue periférico. A princípio, a medula é responsiva e a doença é autocorrigida
durante a primeira semana. Com a continuação da absorção de anticorpos, há uma
depressão dos precursores da medula e as petéquias terminais são associadas à
diminuição da produção de plaquetas na aplasia medular. A anemia terminal ocorre
tanto por hemorragia quanto por hipoproliferação.
Achados clínicos – Os sinais aparecem 1 a 4 dias após o nascimento e
consistem em palidez, inatividade, dispnéia e icterícia. Estes sinais diminuem
gradualmente. Após 10 a 11 dias, aparecem múltiplas hemorragias petequiais
Anemia 28

sobre as áreas ventrais do corpo; a maioria dos leitões morre neste estágio. A
contagem de hemácias cai de um normal de 4,5 a 5,3 × 106/µL (4,5 a 5,3 × 1012/L)
no nascimento para 1 a 3 × 106/µL (1 a 3 × 1012/L) aos 4 dias de vida. Com o
desenvolver da anemia, anisocitose e policromasia aparecem junto com alguns
rubrícitos circulantes. O VCM aumenta de um normal de 70µm 3 (fL) ao nascimen-
to para 100 a 120µm3 em 1 a 2 semanas de vida e volta ao normal nos
sobreviventes em 4 semanas de idade. Os neutrófilos aumentam para 9 a 10 ×
10 3/µL (9 a 10 × 10 9/L) aos 4 dias de vida, quando os eritrócitos estão mais baixos
e depois voltam ao normal (3 a 4 × 103/µL [3 a 4 × 109 /L]). As plaquetas têm uma
resposta bimodal e caem de 300 × 103/µL(300 × 109/L) ao nascimento para 100
× 103/µL (100 × 10 9/L) no primeiro dia, depois sobem para o normal na primeira
semana; entretanto, ocorre uma severa trombocitopenia após 10 a 14 dias. A
medula óssea é hipoplásica em leitões que morrem, e há ausência de megaca-
riócitos. Os eritrócitos são positivos para Coombs nos primeiros 7 dias e
negativos no 14º dia.
Diagnóstico – Normalmente é feito ao se encontrar anemia, púrpura e icterícia
leve em leitões neonatos. A anemia é inicialmente hemolítica, macrocítica, normocrô-
mica e responsiva; mais tarde torna-se hipoplásica. A confirmação é feita pela
demonstração da aglutinação de eritrócitos e plaquetas do cachaço e do leitão pelo
soro e leite da matriz. A leptospirose pode ser descartada pela demonstração de
trombocitopenia ou pelo título materno.
Tratamento e profilaxia – Não se costuma tentar qualquer tratamento: uma porca
substituta pode ser usada. As porcas não devem reprocriar após terem leitões
afetados.

Anemia hemolítica de cães e gatos neonatos


A sensibilização espontânea de cadelas e gatas a antígenos de eritrócitos
fetais de filhotes que dividem a maioria dos antígenos do grupo sangüíneo
incompatíveis aos seus pais provavelmente ocorre com mais freqüência do que
se percebe. Dos cães, , 40% carregam o antígeno DEA 1, e dos gatos, , 90%
carregam o antígeno A. Portanto, a chance aleatória de acasalamento de um
animal que carrega o antígeno com um animal que não o carrega é de 40:60 e
90:10 para cães e gatos, respectivamente. O diagnóstico, manejo e tratamento
dos filhotes com doença hemolítica seguem os mesmos princípios anteriormente
discutidos para as grandes espécies animais.

ANEMIA HEMOLÍTICA POR FRAGMENTAÇÃO I NTRAVASCULAR


Doenças que causam vasculite ativam as plaquetas e o mecanismo de coagu-
lação e causam coagulação intravascular disseminada (CID) em algum grau. A
passagem de eritrócitos em alta velocidade através das arteríolas lesadas leva a
uma fragmentação à medida que eles atingem os leitos intraluminais de fibrina. As
células danificadas são então removidas pelo sistema reticuloendotelial. Esta
patogenia é conhecida como anemia hemolítica microangiopática (AHM) e é
caracterizada clinicamente por uma anemia com marcante poiquilocitose e reticu-
locitose. A AHM ocorre em bezerros novos com síndrome urêmica hemolítica, na
qual há anemia severa, poiquilocitose, uremia, hemoglobinúria e colapso. A AHM
em graus moderado a severo ocorre como parte da patogenia de muitas outras
anemias, nas quais há vasculite (por exemplo, anemia infecciosa eqüina, febre
catarral maligna, febre suína africana, cólera crônica suína) e em púrpuras trombó-
ticas. Anemias com poiquilocitoses marcantes podem ocorrer em algumas doenças
parasitárias, especialmente quando há extensa migração somática, como em
infestações por Strongyloides e na dirofilariose canina. Em um cavalo não anêmico,
Anemia 29

especialmente com cólica, a presença de algumas hemácias altamente distorcidas


é indicativa de AHM por vasculite parasitária da artéria mesentérica anterior. A AHM
ocorre também em casos de malignidade, especialmente se houver tecido tumoral
cavernoso ou necrótico como em hemangiossarcomas.

ANEMIA POR PERDA DE ERITRÓCITOS NORMAIS


HEMÓLISE
Hemólise por aumento de remoção reticuloendotelial, esplenomegalia e
hiperesplenismo – Qualquer condição que causa aumento do baço resulta num
aumento da atividade eritrofagocítica no órgão. A esplenomegalia pode ocorrer
como resultado de hiperplasia devida a infecção crônica, doença auto-imune ou
neoplasia esplênica. Hepatopatias que resultam em cirrose e hipertensão portal
causam esplenomegalia congestiva. A extensão do retículo esplênico com o aumen-
to do baço estimula tanto a fagocitose como a fibroplasia. O baço aumentado retém
sangue, formando um meio de baixa glicose e colesterol e alto pH, o que resulta
num envelhecimento prematuro ou “condicionamento” do eritrócito, que os torna
esferocíticos para serem removidos da circulação. A esplenomegalia então, apenas
por razões hemodinâmicas, pode progredir para hiperesplenismo, que é definido
como uma esplenomegalia por qualquer motivo, com hiperplasia da medula e
diminuição de um ou mais elementos celulares do sangue que se corrige com a
remoção do baço. O distúrbio clínico resultante do hiperesplenismo pode ser púrpura
trombocitopênica, anemia hemolítica ou neutropenia, ou qualquer combinação
destas. A doença será mais severa se fatores imunes forem adicionados à patogenia
congestiva. Nestes casos, a esplenectomia poderá ser a única alternativa. Há perigo
de doença trombótica no período pós-operatório imediato (1 a 2 dias) devido à perda
do controle esplênico da trombocitose. Esta complicação é refletida clinicamente por
extremidades frias, particularmente nas pontas das orelhas e cauda do cão. Se estes
sinais forem marcantes, drogas antiplaquetas (por exemplo, aspirina) ou anticoagu-
lantes (por exemplo, heparina ou varfarim) poderão ser necessários para o controle
da trombose.
Anemia hemolítica por parasitismo – O parasitismo das hemácias pode
resultar em hemólise intravascular com hemoglobinemia e hemoglobinúria, como na
babesiose (ver pág. 83). Alternativamente, os parasitas poderão ser removidos dos
eritrócitos pelo baço e as células retornadas à circulação, ou o eritrócito poderá ser
removido inteiro e destruído pelas células do SRE. Esta segunda patogenia ocorre
em hemobartonelose do gato (ver pág. 33), anaplasmose em bovinos e ovinos (ver
pág. 81), eperitrozoonose (ver pág. 87) e malária em mamíferos e aves. A ehrlichiose
em cavalos (ver pág. 453), cães (ver pág. 497), e provavelmente em bovinos, causa
anemia com púrpura trombocitopênica devido ao parasitismo de plaquetas e
leucócitos.
Os tripanossomos são comuns no sangue de bovinos na América do Norte, mas
em geral não são patogênicos. Raramente, um cão que tenha retornado da América
do Sul terá tripanossomos no sangue e desenvolverá anemia hemolítica aguda com
reticulocitose marcante. Cães que estiveram na área do Mediterrâneo podem estar
infectados com Leishmania spp transmitido por vetores artrópodes. Ocorre epista-
xe, mas somente uma anemia leve. A biópsia da medula óssea, linfonodos ou baço
mostrará Leishmania nas células do SRE.
Em geral, a medula é hiperplásica em anemias por parasitismo de hemácias e há
macrocitose, policromasia e reticulocitose significantes no sangue periférico. Se
houver hemoglobinúria com perda de ferro e proteínas, a recuperação será mais lenta.
A medula na ehrlichiose é hipoplásica. O diagnóstico é baseado nos títulos ou
Anemia 30

demonstração do microrganismo. O tratamento e a prevenção variam de acordo com


a doença. A demonstração de Haemobartonella em um gato anêmico, sem mostrar
uma resposta policromática marcante, é motivo para se procurar um neoplasma do
SRE que tenha abaixado a imunidade humoral. Testes de Coombs positivos já foram
demonstrados em algumas anemias de parasitismo de hemácias.
Lise de eritrócitos normais por ação de agentes bacterianos, vegetais,
químicos ou físicos – hemolisinas bacterianas – (Ver LEPTOSPIROSE, pág. 425 e
HEMOGLOBINÚRIA BACILAR, pág. 389) Bartonella bacilliformis geralmente causa ane-
mia hemolítica fatal no homem, cães e roedores. A doença manifesta-se mais
provavelmente em cães esplenectomizados. Conhecida como febre de Oroya, a
doença pode ser diagnosticada pela demonstração de microrganismos intra-
eritrocíticos em esfregaços sangüíneos. O tratamento de escolha é o cloranfenicol
EV, administrado diariamente, por 3 a 5 dias, na dose de 11 a 22mg/kg.
Hemolisinas vegetais – A maioria das plantas que causam anemia hemolítica,
como sorgo, couve, nabo e cebolas, o faz devido à depleção da enzima G6PD, com
produção de corpúsculos de Heinz, o que foi discutido anteriormente sob o título
ERITRÓCITOS COM CONTEÚDO ENZIMÁTICO DEFICIENTE. A lise direta da membrana das
hemácias pode ser causada pela saponina a partir da cutícula de cera das plantas
ou por ricina de mamonas. As hemolisinas são princípios tóxicos da maioria dos
venenos de cobras e aranhas.
Hemolisinas químicas – Uma grande variedade de compostos químicos pode
produzir hemólise e, em adição, anemia aplásica. Os agentes mais comumente
envolvidos neste segundo tipo de anemia são os hidrocarbonetos cíclicos como o
benzeno, tolueno, acetanilida e fenacetina. Metais pesados, como chumbo e prata,
inibem a síntese de Hb e arsenicais podem causar hemólises. Fenilidrazina e outros
compostos oxidantes, incluindo vitamina K 1, produzem corpúsculos de Heinz e
hemólise como descrito anteriormente (pág. 23). Anemias com estas causas devem
ser tratadas sintomaticamente até um diagnóstico toxicológico específico. Intoxica-
ção por chumbo produz sintomas nervosos, normalmente sem anemia. Em cães e
no homem, podem ocorrer granulações basofílicas nos eritrócitos e liberação
intermitente de altos números de rubrícitos e metarrubrícitos para sangue periférico,
com o aumento de níveis de chumbo no sangue.
Quantidades consideráveis de cobre podem ser acumuladas gradualmente sem
qualquer dano aparente, mas “intoxicação crônica por cobre” (ver pág. 1995) ocorre
congenitamente na doença de Wilson em bedlington terriers, e hepatite crônica ativa
em dobermans pinschers. Isto também pode ocorrer quando por algum estresse há
uma liberação súbita de cobre armazenado com anemia hemolítica aguda subse-
qüente, como ocorre em ovinos, suínos e bovinos. Em ovinos, a fonte de cobre
normalmente é fitógena, levando a altas concentrações de cobre no fígado que
podem ser liberadas por lesões hepáticas de qualquer causa, como intoxicação por
pirrolizidina alcalóide (ver pág. 2057) ou exercício forçado. O cobre pode ser incluído
na ração de suínos como um estimulante do crescimento. Em suínos com deficiência
marginal de vitamina E que desenvolvam hepatose dietética (ver pág. 663), pode
ocorrer uma necrose hepática suficiente para liberar o cobre armazenado e causar
icterícia e crise hemolítica.
O excesso de molibdênio (ver pág. 2032), normalmente de origem fitógena, inibe
o metabolismo intermediário de cobre e causa fraqueza, despigmentação da pele,
diarréia e anemia hipoplásica microcítica e hipocrômica. Recomenda-se a remoção
do molibdênio ou aumento de cobre na dieta.
Hemólise causada por agentes físicos – Queimaduras de espessura completa
na pele podem causar hemólise intravascular se a superfície afetada for > 20%. A
ingestão excessiva de água gelada, especialmente em bezerros, pode causar
hemólise, provavelmente de origem osmótica, com anemia, dispnéia e hemoglobi-
Anemia 31

núria. Ocasionalmente, uma anemia imune pode ser desencadeada pela exposição
ao frio (ver pág. 518) se o anticorpo envolvido for da aglutinina fria ou do tipo IgM.

HEMORRAGIA E PARASITISMO
Perda devida a hemorragia ou parasitismo externos – A hemorragia externa
pode ocorrer em ferimentos, prolapso uterino e lacerações ou trauma cirúrgico,
especialmente descorna e castração. Em hemorragias agudas, há hipovolemia e
hipotensão com hematócrito normal. Em hemorragias crônicas, o hematócrito é
baixo, geralmente com uma medula não responsiva devido à perda de ferro. Num
sangramento agudo, indicam-se fluidos EV e transfusões de sangue para a
reposição do volume sangüíneo, plaquetas e fatores de coagulação. A medula
normalmente é responsiva, e devem-se dar ferro parenteral a 3,4mg/g de Hb (perda
estimada) e hematínicos. Nas anemias por hemorragias crônicas, não há tanta
necessidade de transfusões, a menos que o animal seja acentuadamente anêmico,
especialmente se estiver se mantendo em pé e o sangramento já tiver cessado.
Ferro e hematínicos devem ser dados conforme já visto. Deve-se tomar cuidado no
manejo do animal anêmico, uma vez que o estresse pode ser fatal.
O parasitismo externo pode causar anemia, especialmente em animais jovens.
Em geral, insetos sugadores como os tabanídeos, moscas pretas e mosquitos
causam mais irritação que perda de sangue. Muitas vezes, bezerros podem se
tornar altamente infestados por piolhos, apresentando-se magros, fracos, e leve a
severamente anêmicos. Filhotes de cães e gatos podem desenvolver anemias
graves devido a grandes infestações por piolhos ou pulgas; em áreas endêmicas,
carrapatos sugadores infestam uma grande variedade de hospedeiros. Estas
anemias ocorrem primariamente por perda de sangue; os animais devem ser
tratados com ferro e aplicação de ectoparasiticidas. Bovinos, especialmente, sofrem
de depressão da medula em altas infestações por piolhos, e a recuperação é lenta.
Perda de eritrócitos normais por hemorragia interna ou parasitismo interno
– A hemorragia interna pode ser aguda ou crônica e ocorrer espontaneamente em
defeitos hemostáticos ou como resultado de cirurgias, ferimentos, tumores ou
abscessos e ulcerações no trato GI ou urinário. O diagnóstico costuma ser auxiliado
pela aspiração do tórax, abdome ou do tecido subcutâneo, exceto em coagulopatias
hereditárias, quando não é seguro fazê-lo. Se o sangramento for geral, deve-se
coletar o sangue periférico em tubos com anticoagulante adequado (citrato trissódico)
para análise. Em intoxicações por rodenticidas anticoagulantes ou trevo doce (ver
pág. 2105) e insuficiência hepática, o tempo de ativação da protrombina é baixo. Se
o sangramento GI ou urinário for fraco, porém muito prolongado, poderá haver uma
deficiência de ferro, e o tratamento deverá ser feito como descrito anteriormente (ver
DISTÚRBIOS HEMOSTÁTICOS, pág. 63).
Parasitismo interno (ver também pág. 285) – Uma anemia profunda pode ser
causada em cães e gatos em infecções por Ancylostomas. Em casos graves com
colapso, o tratamento anti-helmíntico deve ser precedido por transfusão de sangue.
No parasitismo intestinal, o ferro perdido não é reabsorvido, e em casos crônicos,
o ferro parenteral pode responder melhor que um anti-helmíntico. A medula costuma
ser produtiva se os estoques de ferro não estão esgotados e uma reticulocitose no
sangue periférico é acentuada por uma ocasional poiquilocitose grave. Em ovinos,
a infestação aguda por Haemonchus (ver pág. 251) pode causar morte por anemia
sem debilitação. A diarréia ocorre na maioria dos parasitismos GI de ovinos, exceto
por Haemonchus. Em bezerros ou novilhos, infestação crônica por Ostertagia (ver
pág. 246) causa caquexia, uma anemia com resposta fraca de reticulócitos e,
ocasionalmente, uma poiquilocitose marcante. O ferro deve ser administrado
parenteralmente se houver anemia severa ou se o ferro do soro estiver baixo.
Anemia 32

ANEMIA INFECCIOSA EQÜINA


(AIE, Febre dos pântanos)

É uma doença viral dos eqüinos, aguda ou crônica, encontrada onde quer que
existam cavalos. O vírus é semelhante ao lentivírus humano da AIDS , mas não se
conhece caso de infecção no homem.
Epidemiologia e transmissão – Em casos agudos, o vírus encontra-se no
sangue e em todos os tecidos e secreções. Ele persiste em leucócitos de cavalos
infectados por toda a vida e é relativamente estável na presença do soro, porém é
prontamente inativado por desinfetantes comuns que contenham detergentes.
A transmissão se dá por transferência de células sangüíneas de um cavalo
infectado. A inserção e a retirada de uma agulha hipodérmica podem fornecer um
inóculo adequado para transmissão. Em geral, a doença só é detectada esporadi-
camente, mas pode se alastrar em uma forma epidêmica a partir de cavalos
obviamente doentes, quando moscas sugadoras forem abundantes ou se agulhas
ou instrumentos cirúrgicos contaminados forem usados. As éguas podem infectar
seus potros in utero. O período de incubação varia de 1 a 3 semanas, mas podem
se estender por até 3 meses.
Achados clínicos – A doença é caracterizada por febre intermitente, depressão,
fraqueza progressiva, perda de peso, edema e anemia progressiva ou transitória;
tende a se tornar uma infecção inaparente, mas algumas vezes resulta em morte. Em
cavalos ativamente doentes, o hematócrito e a contagem de plaquetas estão diminuí-
dos e a contagem de monócitos aumentada; em infecções crônicas, o sangue pode
conter leucócitos com ferro corável e possuir um nível elevado de gamaglobulinas.
Lesões – Em casos agudos, há esplenomegalia e os linfonodos esplênicos
apresentam-se aumentados. Em casos subagudos ou crônicos, a necropsia revela
mucosas pálidas, emaciação, edema subcutâneo (especialmente ao longo da
parede ventral abdominal e membros), esplenomegalia e linfonodos abdominais
aumentados. Coagulação intravascular com embolia é freqüentemente observada
em casos terminais avançados.
Microscopicamente, há uma proliferação de células reticuloendoteliais em mui-
tos órgãos, e coleções periportal e perissinusoidal de células mononucleares no
fígado com acúmulo de hemossiderina nas células de Kupffer. Infiltração linfóide
perivascular também pode ocorrer em outros órgãos. Glomerulite proliferativa está
presente em alguns cavalos, e há uma deposição glomerular de imunoglobulinas
(IgG) e complemento (C3).
Diagnóstico – O diagnóstico clínico de AIE deve ser confirmado por testes de
“Coggins” ou imunodifusão que são testes sorológicos simples e altamente precisos
para a detecção da infecção. Potros que mamam em éguas infectadas poderão ser,
temporariamente, positivos para este teste, e testes em cavalos recentemente
infectados serão negativos por , 1 semana até a formação de anticorpos.
A AIE deve ser suspeitada em cavalos com histórico de perda de peso acompa-
nhada por febre periódica, ou se vários animais de um grupo desenvolverem
sintomas semelhantes após a introdução de novos animais no rebanho ou morte de
um cavalo no pasto.
Tratamento e controle – Não existe nenhum tratamento específico ou vacina.
Uma terapia geral de suporte deve ajudar em um caso individual, mas um cavalo
infectado, especialmente se estiver apresentando sintomas clínicos da doença,
deve ser visto como uma fonte provável de infecção para outros cavalos. Uma vez
que o diagnóstico tenha sido estabelecido, o animal infectado deve ser afastado dos
outros imediatamente e mantido em isolamento, se não sacrificado. A mosca do
cavalo é um importante vetor, logo a estabulação durante a época das moscas ajuda
na prevenção da expansão da doença.
Anemia 33

O controle de moscas dos estábulos e mosquitos deve ser feito com telas ou por
aerossóis. Equipamentos que possam causar abrasões na pele ou absorver secre-
ções ou excreções devem ser evitados ou desinfetados antes do uso. Agulhas
hipodérmicas e instrumentos cirúrgicos devem ser esterilizados antes de cada uso.
Potros nascidos de éguas infectadas, especialmente se elas mostrarem sintomas
clínicos, devem ser isolados dos outros animais até que se possa estabelecer a
ausência da infecção, com o desaparecimento dos anticorpos maternos.

ANEMIA INFECCIOSA FELINA


(AIF, Hemobartonelose)

Trata-se de anemia de gatos domésticos de muitas partes do mundo, aguda ou


crônica, causada por uma rickéttsia que se multiplica no sistema vascular.
Etiologia – O agente causal, Haemobartonella felis , é um microrganismo
cocóide, em forma de anel ou bastão cujas dimensões variam de 0,2 a 1µm de
diâmetro nas formas cocóides a até 3µm de comprimento nas formas em bastão.
Os microrganismos costumam ser encontrados em diversas quantidades nas
superfícies de eritrócitos, mas ocasionalmente são vistos livres no plasma.
Aparecem como corpúsculos escuros vermelho-violeta em esfregaços sangüí-
neos corados por Giemsa. O número de eritrócitos afetados varia com a intensi-
dade da infecção e com o estágio no ciclo de vida do parasita. A doença pode ser
transmitida experimentalmente por transferência oral ou parenteral de pequenas
quantidades de sangue íntegro infectado em gatos suscetíveis. A transmissão
intra-uterina está bem estabelecida, e as infecções podem ser transmitidas de
forma iatrogênica durante as transfusões de sangue.
Em casos induzidos experimentalmente, o período de incubação varia de 1 a
5 semanas e a recuperação não induz uma imunidade contra reinfecção. Não
foram estabelecidos ainda métodos de transmissão natural; entretanto, parece
que a doença surge mais em gatos de 1 a 3 anos, particularmente em machos.
Ferimentos por mordidas podem ser uma forma de transmissão. Uma porção
significante da população felina pode carrear a infecção numa forma latente, que
se exacerba na presença de doenças debilitantes ou estresse. Os gatos infecta-
dos podem formar anticorpos contra suas próprias hemácias, levando a uma
anemia hemolítica auto-imune (ver pág. 24).
Achados clínicos – Pode-se suspeitar, com razão, que qualquer gato anêmico
tenha anemia infecciosa felina. Em casos agudos, normalmente há febre de 39 a
41oC. A temperatura pode cair para subnormal em um gato moribundo. Icterícia,
anorexia, depressão, fraqueza e esplenomegalia são sintomas comuns. Em casos
crônicos ou de evolução lenta, pode haver uma temperatura normal ou subnormal,
fraqueza, depressão e emaciação, porém menos icterícia e esplenomegalia. Nos
dois casos, a dispnéia varia com o grau da anemia. Não são distintivos achados
macroscópicos da necropsia. O baço e linfonodos mesentéricos podem estar
aumentados, e hiperplasia da medula óssea pode estar presente.
Diagnóstico – A confirmação laboratorial depende da identificação do para-
sita no sangue periférico ou medula óssea. Uma série de esfregaços corados com
soluções de Giemsa ou Wright, por um período de vários dias, pode ser
necessária para um diagnóstico preciso, pois os corpúsculos eritrocíticos somen-
te se mostram periodicamente. Alguns elementos como corpúsculos de Howell-
Jolly podem ser confundidos com parasitas sangüíneos e devem ser cuidadosa-
mente eliminados. As lâminas devem ser muito limpas e os corantes filtrados
imediatamente antes do uso; partículas de sujeira e precipitados sangüíneos
podem mimetizar a aparência do microrganismo. Podem-se observar os mi-
Anemia 34

crorganismos em células afetadas coradas com laranja acridina e examinadas


sob luz ultravioleta.
No sudeste dos EUA, deve ser feita uma diferenciação a partir da citazoonose
felina (ver pág. 86). A Cytauxzoon felis mostra-se como um protozoário cocóide, em
bastão ou anel intracelular com 0,5 a 2µm de diâmetro dentro do eritrócito, enquanto
a H. felis tende a formar cadeias na superfície.
Modificações das células sangüíneas típicas de uma anemia regenerativa
podem ser vistas em esfregaços positivos. Estas incluem grânulos basofílicos
difusos nas células maiores, eritrócitos nucleados, policromasia, anisocitose, cor-
púsculos de Howell-Jolly e um número aumentado de reticulócitos. O número de
hemácias pode cair até 1 × 106/µL. São observados valores de Hb ≤ 7g/dL. O VCM
aumenta e há uma ligeira elevação na contagem de leucócitos com monocitose nas
formas agudas, número normal nas formas crônicas e leucopenia nos casos
moribundos. Uma vez que hemácias nucleadas podem estar presentes, um número
total corrigido de leucócitos deve ser calculado.
Deve-se investigar a presença de um estresse de base, em particular infecção
pelo vírus da leucemia felina, especialmente com infecções recorrentes.
Profilaxia e tratamento – Gatos gravemente dispnéicos necessitam de oxigê-
nio, e com freqüência recomendam-se transfusões de sangue, particularmente se
a anemia for aguda. Deve ser dado 30 a 80mL de sangue total, preferivelmente EV,
e repetido se necessário, talvez a cada 2 ou 3 dias.
Oxitetraciclina (20mg/kg, VO) ou cloridrato de tetraciclina (33 a 110mg/kg, VO,
3 ou 4 vezes ao dia) é eficaz. Para evitar recidivas, o tratamento com drogas deve
continuar por um período de 10 a 20 dias. A tiacetarsamida de sódio em 0,5mL/10lb
(0,1mL/kg), administrada EV em 1 dia, e repetida em 3 dias, parece ser eficaz.
Podem ocorrer reações tóxicas, e uma transfusão deve preceder a dosagem se o
hematócrito estiver < 20%. Cloridrato de oxifenarsina já foi utilizado com êxito, como
também a prednisolona, para diminuir a taxa de hemólise e reverter a depressão
associada à anemia grave.
Tendo em vista um conhecimento limitado da transmissão da doença, quase
nada pode ser recomendado quanto à profilaxia. Deve-se ter muito cuidado,
entretanto, na seleção de gatos doadores para transfusões de sangue em geral. Os
doadores devem ser checados para a evidência de uma infecção latente, testando-
se seu sangue em gatos esplenectomizados ou por exame de esfregaços sangüí-
neos a cada 2 dias por ≥ 2 semanas após esplenectomia.

GRUPOS SANGÜÍNEOS E TRANSFUSÕES


SANGÜÍNEAS
Grupos sangüíneos, como estamos chamando, referem-se a componentes
antigênicos da membrana do eritrócito, polimórficos e geneticamente controlados.
Os produtos alélicos de um locus genético particular são classificados como um
sistema de grupo sangüíneo. Alguns destes sistemas são altamente complexos,
com muitos alelos definidos em um locus; outros consistem de um único antígeno
definido. Os sistemas de grupos sangüíneos são geralmente independentes uns
dos outros e sua hereditariedade ajusta-se à dominância mendeliana. Para siste-
mas de grupos sangüíneos polimórficos, um animal geralmente herda um alelo de
cada pai, tanto que os animais expressam não mais que 2 antígenos de grupo
sangüíneo de um sistema. Uma exceção é o bovino, no qual alelos múltiplos ou
Grupos Sangüíneos e Transfusões Sangüíneas 35

“fenogrupos” são herdados. Normalmente, um indivíduo não tem anticorpos contra


quaisquer dos antígenos presentes em suas próprias hemácias, nem contra outros
grupos de antígenos sangüíneos daqueles sistemas de espécies, a não ser que
tenham sido induzidos por transfusão, prenhez ou imunização. Em algumas
espécies (homem, ovelha, vaca, gato, porco, cavalo e cão), os isoanticorpos de
“ocorrência natural”, não induzidos por transfusão ou prenhez, podem estar presen-
tes em títulos variáveis, porém detectáveis. No cão, , 50% de animais selecionados
ao acaso possuem uma ocorrência natural de crio-hemaglutinina, Tr. Além disso, os
anticorpos circulantes para antígenos de grupos sangüíneos de animais podem ser
induzidos por transfusões. Com transfusões de sangue aleatórias em cães, há 30
a 40% de chances de isossensibilização do receptor, basicamente devido ao
antígeno do grupo sangüíneo DEA 1 (inicialmente conhecido como antígeno A do
cão). Em cavalos, cães e gatos, possivelmente em visons e raramente em porcos
e cães, pode ocorrer imunização transplacentária de uma fêmea por um antígeno
fetal incompatível herdado do pai. A imunização também pode resultar quando
alguns produtos homólogos do sangue são usados como vacinas, por exemplo, para
anaplasmose em bovinos.

TESTES DE TIPAGEM SANGÜÍNEA


Os anti-soros usados para identificar grupos sangüíneos (reagentes de tipagem)
são normalmente produzidos como soro isoimune, mas são denominados
heteroimunes se forem produzidos em outras espécies. Suas características soroló-
gicas in vitro variam com as espécies. Muitos dos reagentes são hemaglutininas;
outros são hemolíticos e requerem complemento para completar a reação sorológi-
ca, por exemplo, em bovinos, nos quais as hemácias não se aglutinam rapidamente,
e em cavalos, nos quais os grumos de hemácias são um problema. Há ainda outros
reagentes de tipagem, nem hemaglutinantes nem hemolíticos que se combinam com
antígenos de hemácias em reações “incompletas”, pois não possuem os sítios
combinantes adicionais para aglutinar outras hemácias. Estes necessitam que seja
adicionada antiglobulina espécie-específica para que ocorra a aglutinação.

APLICAÇÃO DA GRUPAGEM SANGÜÍNEA


O número dos principais grupos sangüíneos reconhecidos varia de espécie para
espécie: bovinos 12; ovinos 7; eqüinos 9; suínos 16; cães 7; gatos 2; visons 5;
macacos Rhesus 6; ratos 4; camundongos (C57) 4; galinhas 11; coelhos 5. Os
grupos sangüíneos dos animais são tipificados para auxiliar a combinação entre
doadores e receptores e para identificar casais que possuem risco potencial de
produzir doença hemolítica na sua prole. Como a expressão dos antígenos dos
grupos sangüíneos é geneticamente controlada e as formas de herança são
conhecidas, estes sistemas podem também ser utilizados para substanciar pedigrees
no gado, cavalos, e raramente em cães. O aumento do uso da inseminação artificial,
criopreservação e transferência de embrião expandiu bastante a aplicação destas

TABELA 6 – Principais Grupos Sangüíneos de Interesse Clínico


Espécies Grupo sangüíneo
Cão DEA 1,1; 1,2 e 7
Gato A, B
Cavalo A, C, Q
Bovinos B, J
Ovinos B, R
Grupos Sangüíneos e Transfusões Sangüíneas 36

técnicas. A tipagem sangüínea dos touros doadores de sêmen é bastante empre-


gada. Garanhões, éguas e potros puros-sangues precisam ter sua tipagem sangüí-
nea realizada antes de serem registrados.

Técnicas de reação cruzada


Com os controles apropriados, o procedimento direto de reação cruzada é eficaz
para todas as espécies. Uma reação cruzada maior detecta anticorpos já presentes
no plasma do receptor que poderiam causar uma reação hemolítica quando fossem
transfundidos eritrócitos do doador; ela não detectará o potencial de desenvolvimen-
to de sensibilidade. São coletadas amostras de sangue com anticoagulante (EDTA
ou citrato) do doador e do receptor. Os eritrócitos do doador são lavados 3 vezes em
solução salina a 0,9% e a suspensão salina a 4% é feita a partir das células lavadas.
A reação cruzada principal consiste em combinar-se volumes iguais (0,1mL) da
suspensão de eritrócitos do doador e plasma do receptor. O tubo de controle contém
suspensão de eritrócitos a 4% e plasma do receptor. As amostras são incubadas a
37 oC por 15min. Após a incubação, todos os tubos são centrifugados a 1.000rpm por
1min. A hemólise é avaliada comparando-se a cor do sobrenadante da amostra em
teste com o da amostra de controle. Cada amostra é então delicadamente agitada até
que todas as células presentes no botão no fundo do tubo retornem à suspensão.
Novamente, compara-se o grau de aglutinação celular da amostra-teste com o da
amostra-controle. O teste é negativo ou compatível quando os eritrócitos são
prontamente suspensos. Um teste positivo ou incompatível pode apresentar hemó-
lise, hemaglutinação, ou ambas. Todos os testes julgados macroscopicamente como
hemaglutinação negativa devem ser confirmados microscopicamente com aumento
pequeno. Isto é especialmente importante nos cavalos, pois seus eritrócitos tendem
a formar rosetas. Todos os testes negativos devem então ser confirmados pelo teste
da antiglobulina: os eritrócitos são lavados 3 vezes em solução salina, adiciona-se
uma antiglobulina adequada (soro de Coombs), a amostra é incubada por 15min a
37 oC, centrifugada a 1.000rpm e avaliada quanto à hemaglutinação. O teste de
reação cruzada menor é o inverso do de reação cruzada maior, isto é, as células do
receptor são combinadas com o plasma do doador.

TRANSFUSÃO DE SANGUE
A necessidade para transfusões de sangue é freqüentemente alta, assim como
para hemorragias ou hemólise aguda. As transfusões são adequadas no tratamento
de anemias crônicas ou agudas, uma vez que haja também um esforço para
encontrar e eliminar a causa da anemia. Animais com distúrbios hemostáticos
freqüentemente precisam de transfusões repetidas, ou de sangue integral, plasma,
ou de preparados de plaquetas. As transfusões de sangue devem ser adminstradas
com cuidado, na medida em que elas têm o potencial para comprometer o receptor.
A diversidade de grupos sangüíneos existentes em animais e a falta de reagentes
para tipagem no mercado tornam difíceis a tipagem e o pareamento, mas não deve
ser motivo para que não se faça o uso clínico de transfusões. Em cavalos e cães,
os antígenos dos grupos sangüíneos mais comumente implicados em incompatibi-
lidade de transfusões são conhecidos, e torna-se possível a diminuição de sensibi-
lização de receptores selecionando-se doadores que não pertençam a tais grupos.
Pode-se fazer uma detecção prévia de sensibilização do receptor com teste de
reação cruzada, que impede a administração de sangue incompatível. Nos EUA, >
99% dos gatos são do grupo sangüíneo A, portanto o risco de transfusão incompa-
tível é pequeno.
Apesar de indicado quando há perda aguda de sangue, o sangue integral
freqüentemente não é o produto ideal a ser administrado. Por exemplo, se for
Grupos Sangüíneos e Transfusões Sangüíneas 37

necessária a reposição da capacidade do sangue para carrear oxigênio, apenas


hemácias serão mais apropriadas; se a reposição de volume circulatório for
necessária, soluções cristalóides poderão ser usadas para este propósito, com
hemácias conforme o necessário. O número de plaquetas aumenta rapidamente
após hemorragia e portanto a reposição não é necessária. As proteínas plasmáticas
se equilibram a partir do espaço intersticial, logo o plasma não é necessário, exceto
na hemorragia maciça (> 1 volume sangüíneo em 24h). Animais que necessitam de
fatores de coagulação irão se beneficiar mais com a administração de plasma fresco
congelado, o que diminui significantemente a incidência de sensibilização. O plasma
rico em plaquetas ou concentrados destas pode ser útil na trombocitopenia, apesar
da trombocitopenia imunomediada normalmente não responder à administração de
plaquetas, pois são rapidamente removidas pelo baço.
A quantidade de eritrócitos necessária para tratar a anemia baseia-se no volume
necessário para aumentar o hematócrito ou a concentração de hemoglobina até o
valor desejado. Todos os animais domésticos possuem volume sangüíneo de , 7%
do peso corporal, exceto o gato, que possui um volume sangüíneo de 4% do peso
corporal. Determinando-se o volume sangüíneo do receptor e sabendo-se o hemató-
crito do animal, o volume de eritrócitos a ser reposto pode ser calculado. Por exemplo,
um cão de 25kg possui um volume sangüíneo total de 2.000mL; com um hematócrito
de 15%, o volume de eritrócitos é de 300mL; se o hematócrito deve ser aumentado
para 20%, isto equivale a um volume de eritrócitos de 400mL. Portanto, são necessá-
rios 100mL de eritrócitos para aumentar o hematócrito do receptor até o nível deseja-
do. Um cálculo semelhante pode determinar o volume de sangue necessário para
fornecer a quantidade necessária de eritrócitos; por exemplo, 200mL de sangue de um
animal doador com hematócrito de 50% fornecerão 100mL de eritrócitos. Não se deve
coletar mais de 25% do sangue de um animal doador em uma coleta.
A coleta, transfusão e estocagem do sangue devem ser realizadas assepticamente.
Os anticoagulantes de escolha são ácido-citrato-dextrose (ACD) ou citrato-fosfato-
dextrose (CFD), algumas vezes com adição de adenina (CFD-A). As bolsas de
sangue comerciais que contêm a quantidade adequada de anticoagulante causam
menos dano às células sangüíneas que os tubos de coleta a vácuo, sendo portanto
preferidas. A heparina não deve ser utilizada como anticoagulante, pois possui vida
média maior no receptor e causa ativação de plaquetas; além disso, o sangue
heparinizado não pode ser armazenado.
O sangue coletado com ACD ou CFD pode ser seguramente armazenado a 4oC
por 3 semanas. Se o sangue não for utilizado imediatamente, o plasma poderá ser
removido por centrifugação (ou gravidade) e congelado e armazenado para uso
posterior como fonte de fatores de coagulação ou albumina para uma hipoalbumine-
mia aguda reversível. A hipoproteinemia crônica não é beneficiada pelo plasma, pois
o déficit corporal total de albumina é tão grande que não pode ser aliviado pela
pequena quantidade contida no plasma. O plasma precisa ser congelado entre –20o
a –30oC dentro de 6h da coleta para assegurar que os níveis de Fator VIII são
adequados e permanecerão assim por 1 ano. O Fator VIII concentrado, Fator de von
Willebrand, e fibrinogênio podem ser preparados a partir de plasma fresco congelado
como crioprecipitado.

Riscos da transfusão
Apesar da maioria das discussões sobre riscos de transfusão concentrarem-
se nas reações hemolíticas agudas, estas são raras nos animais domésticos. Os
cães raramente possuem anticorpos pré-formados clinicamente significantes, de
modo que apenas os que receberam transfusões repetidas correm riscos. A
reação hemolítica mais comum em cães que receberam várias transfusões é uma
Grupos Sangüíneos e Transfusões Sangüíneas 38

hemólise intravascular tardia, observada clinicamente como um encurtamento da


vida média dos eritrócitos transfundidos. Um teste de Coombs positivo confirma
esta reação. As causas de hemólise não imune incluem coleta ou separação
inadequada do sangue, congelamento ou superaquecimento dos eritrócitos, ou
infusão sob pressão através de uma agulha fina.
Outras complicações incluem sepse por sangue contaminado, hipocalcemia por
excesso de citrato, ou hipervolemia, especialmente em animais com cardiopatia pre-
existente ou em animais muito pequenos. Urticária, febre e vômitos são observados
ocasionalmente. As transfusões podem transmitir doenças do doador para o recep-
tor, por exemplo, parasitas de eritrócitos (por exemplo, Haemobartonella, Anaplasma,
ou Babesia) e vírus (por exemplo, retrovírus como o da leucemia felina ou bovina,
anemia infecciosa eqüina, ou outros lentivírus). Outras doenças, como as causadas
por rickéttsias ou bactérias, podem ocorrer se o doador estiver infectado.

LINFOMA MALIGNO CANINO


(Linfoma, Linfossarcoma, Leucemia linfocítica)

Uma doença progressiva fatal dos cães caracterizada por transformações


neoplásicas e proliferação das células linfóides, normalmente originando-se em
órgãos linfóides sólidos (linfossarcoma) ou na medula óssea (leucemia linfocítica).
Os sintomas variáveis dependem de quais órgãos estejam envolvidos. Em contraste
com a maior parte das outras espécies domésticas, não foi estabelecida etiologia
viral. A doença é histólogica e imunologicamente heterogênea e os vários subtipos
morfológicos podem se comportar diferentemente.
Esta é a neoplasia hematopoiética mais comum dos cães (incidência relatada
24:100.000). Todas as raças e ambos os sexos são afetados, embora a incidência
seja maior em boxers, golden retrievers e old english sheepdogs.
Achados clínicos – O sintoma clínico inicial mais comum é uma linfadenopa-
tia periférica não dolorosa, muitas vezes percebida primeiro nos linfonodos em
torno da garganta e pescoço. Subseqüentemente, sintomas não específicos,
incluindo anorexia, perda de peso, anemia e inatividade, desenvolvem-se gradu-
almente, conforme as células neoplásicas progressivamente infiltram-se nos
órgãos viscerais. Na forma alimentar, os sintomas estão associados a obstrução
gastrointestinal ou malabsorção; 80% dos cães afetados podem ter diarréia.
Outros tipos encontrados com menor freqüência incluem uma forma mediastinal
anterior com envolvimento inicial da área do timo, uma forma epiteliotrófica
(micose fungóide), e uma forma extranodal (atípica) que afeta um único órgão
(por exemplo, rim).
A hipercalcemia pode ser observada em 20% dos cães com linfoma maligno;
existem 2 mecanismos gerais: um deles é a elaboração local de um fator osteolítico
que induz a reabsorção dos ossos e a mobilização do cálcio quando a medula óssea
está infiltrada por células tumorais; o outro, provavelmente mais comum, é uma
hipercalcemia humoral na qual as células neoplásicas produzem uma substância
que age à distância (ver Hipercalcemia Humoral Maligna, pág.343) Em ambos os
casos, parece que há uma substância de reabsorção óssea produzida que é
imunologicamente diferente do paratormônio, prostaglandina E 2 e 1,25-
diidroxicolecalciferol. Os cães com hipercalcemia apresentam poliúria e polidipsia
ou colapso renal. Cães não tratados normalmente morrem dentro de 1 a 2 meses
após o diagnóstico. A excreção urinária de cálcio, fósforo e hidroxiprolina é
aumentada quando há hipercalcemia.
Linfoma Maligno Canino 39

Lesões – Normalmente, todos os linfonodos superficiais e vários internos têm o


seu tamanho aumentado de 3 a 10 vezes (forma multicêntrica). Os nódulos afetados
são livremente móveis, firmes, acinzentados com uma protuberância na superfície de
corte e sem demarcação cortical medular. Freqüentemente, há uma hepatospleno-
megalia com aumento difuso ou com a disseminação de nódulos pálidos, difusos e
de tamanho variável no parênquima. Outros órgãos ocasionalmente envolvidos são
a medula óssea, o trato alimentar, rins, coração, amígdalas, pâncreas e olhos.
Na forma alimentar, a segunda forma mais comum da doença, qualquer parte do
trato gastrointestinal ou linfonodos mesentéricos pode ser afetada, mas linfonodos
superficiais e baço são raramente envolvidos.
Diagnóstico – A leucemia linfocítica verdadeira é rara e deve ser diferenciada
de linfossarcoma por causa dos diferentes prognósticos e respostas à terapia. A
doença é caracterizada por uma contagem de leucócitos normal a aumentada com
uma predominância de células linfóides no sangue periférico e medula óssea. A
leucemia linfoblástica aguda, pouco diferenciada, é uma doença agressiva com
prognóstico ruim, enquanto a leucemia linfocítica crônica, bem diferenciada, é uma
doença de evolução lenta que responde relativamente bem à terapia. Freqüente-
mente, há uma esplenomegalia difusa. A maioria dos cães com linfossarcomas
possui um perfil hematológico normal. Nos estágios mais avançados, pode-se
desenvolver uma neutrofilia absoluta.
A maioria dos linfomas caninos são linfossarcomas difusos de alto grau (células
blastócitas), embora, 20% sejam tumores de baixo grau (bem diferenciados).
Tumores de alto grau respondem melhor à quimioterapia e apresentam tempo de
sobrevida e remissão mais extensos.
A célula de origem é o linfócito de linhagem da célula B ou T, embora algumas
sejam de origem indeterminada. Dois estudos separados descobriram que > 75%
dos linfomas caninos originam-se das células B e 10 a 20% da célula T. Tumores de
células B estão associados a melhor resposta e tempo de sobrevida e remissão mais
extensos que os neoplasmas de células T. Há uma forte correlação entre alguns
neoplasmas de células T e hipercalcemia, e estes tumores estão associados a taxas
de resposta, tempo de remissão e sobrevida menores.
O exame microscópico do tecido linfóide é necessário para o diagnóstico positivo,
uma vez que as linfadenopatias podem ter outras causas além de doenças
neoplásicas. O exame do sangue periférico ou medula óssea normalmente não é
diagnóstico, exceto em casos terminais ou em leucemia linfocítica.
Embora a citologia de remoção do linfonodo ou o esfregaço de amostras de
biópsia possam fornecer um diagnóstico, o exame histopatológico de um linfonodo
periférico envolvido é aconselhável e geralmente fornece um diagnóstico definitivo.
Devido aos nódulos submandibulares serem freqüentemente hiperplásicos, são
mais difíceis de serem avaliados e devem ser evitados se outros nódulos estiverem
aumentados.
Tratamento – A quimioterapia por combinação cíclica com doses utilizadas em
homens geralmente é tóxica também para uso em cães; entretanto, a remissão a
longo prazo pode ser alcançada em doses muito inferiores. As taxas de resposta à
quimioterapia podem ser esperadas de 70 a 80% e o tempo de sobrevida médio de
10 a 14 meses após o diagnóstico; 25% podem sobreviver ≥ 2 anos. A maioria dos
regimes de tratamento usa uma combinação de ciclofosfamida, vincristina e predni-
sona. A adição de asparaginase ou adriamicina tem melhorado as taxas de resposta.
Exames clínicos e laboratoriais periódicos são muito importantes no decorrer
de regimes quimioterápicos, uma vez que as drogas são citotóxicas. Podem ocorrer
reações adversas como supressão da medula óssea, suscetibilidade aumentada a
infecções e cistite hemorrágica pela ciclofosfamida. O uso de antibióticos na tentativa
de prevenir estas ocorrências é controverso. As transfusões podem ser necessárias.
Linfoma Maligno Canino 40

Geralmente, a quimioterapia é dividida em uma fase de indução, na qual é


administrada uma combinação de drogas intensivamente em um curto período, e
uma fase de manutenção. O protocolo seguinte tem se provado eficaz:
Indução – Semana 1: vincristina (0,7mg/m 2, EV), asparaginase (400UI/kg, IP),
prednisona (30mg/m 2, VO); semana 2: ciclofosfamida (200mg/m 2, EV), predniso-
na (20mg/m 2, VO); semana 3: doxorrubicina (30mg/m2, EV), prednisona (10mg/m2,
VO); semanas 4 a 6: como anteriormente para semanas 1 a 3,mas interromper
asparaginase e prednisona. (Para o cálculo das áreas de superfície corporal, ver
C ARDIOPATIAS, pág. 57.)
Manutenção – Manter a administração cíclica das drogas nas semanas 4 a 6,
porém prolongar o intervalo de tratamento a cada 2 semanas por 2 ciclos de tratamen-
to, depois a cada 3 semanas por 2 ciclos. Deve haver recorrência dentro deste
período (como é esperado em , 50% dos casos), a reindução usando asparaginase
e prednisona pode alcançar uma segunda remissão. (Para asparaginase, todas,
exceto a primeira, devem ser administradas IM ou s. c. a fim de reduzir as chances de
indução de anafilaxia.) A quimioterapia contínua é então reinstituída a cada 2 sema-
nas, administrando seqüencialmente ciclofosfamida, vincristina e metotrexato
(0,5mg/kg, EV) em associação com prednisona (1mg/kg, VO em dias alternados).
Devido a uma toxicidade cardíaca tardia, a dose cumulativa máxima de doxorru-
bicina deve estar entre 150 e 200mg/m2. Clorambucil (1,4mg/kg, VO, dividido em 2
doses) pode também ser substituído por ciclofosfamida após atingir-se a recupera-
ção. A forma alimentar difusa do linfossarcoma é pouco responsiva à quimioterapia,
entretanto, se a lesão for localizada em um segmento do intestino, deve-se fazer
uma ressecção cirúrgica seguida por quimioterapia. Neste caso, o prognóstico é
completamente protegido por resposta a longo prazo.
A bem diferenciada leucemia linfocítica pode ser tratada com clorambucil a
0,2mg/kg, VO, por 7 a 10 dias, seguido por uma dose reduzida de 0,1mg/kg
diariamente. Podem-se esperar recuperações por 1 a 2 anos. A leucemia linfoblástica
tem sido tratada com menos êxito, com tempo de sobrevida médio < 6 meses e uma
taxa de resposta completa de , 30%.

ANOMALIAS CONGÊNITAS E HEREDITÁRIAS


DO SISTEMA CARDIOVASCULAR
O aperfeiçoamento dos métodos clínicos e o maior interesse em doenças cardí-
acas resultaram num aumento de casos reconhecidos de cardiopatias congênitas,
especialmente em cães. Alguns destes podem ser corrigidos cirurgicamente. Os
casos discutidos adiante foram selecionados com base na sua possível significância
clínica em medicina veterinária (ver também CARDIOPATIAS, pág. 47).
Os tipos de lesões observadas em cães, em ordem aproximada de sua ocorrência
são: duto arterioso patente, estenose pulmonar, estenose subaórtica, arco aórtico
direito persistente, comunicação interventricular, comunicação interatrial e tetralogia
de Fallot. As malformações cardiovasculares ocorrem predominantemente em cães
de raça pura e certas anomalias específicas são mais observadas em determinadas
raças. Esta evidência, somada à união familiar entre cães afetados, mostra que os
fatores genéticos são importantes. Estudos indicam que a hereditariedade é comple-
xa. A taxa de prevalência de defeitos cardíacos congênitos em cães é mais alta do
que em gatos; malformações do complexo da válvula mitral, displasia da válvula
tricúspide, comunicação ventricular, estenose aórtica incluindo estenose supra-
Anomalias Congênitas e Hereditárias do Sistema Cardiovascular 41

valvular, canal atrioventricular comum persistente, duto arterioso patente e tetralogia


de Fallot estão entre as anomalias mais comuns dos gatos. Em bovinos e eqüinos, as
comunicações ventriculares aparecem com mais freqüência que as comunicações
interatriais; duto arterioso patente e tetralogia de Fallot também ocorrem. Estenose
aórtica possui uma base hereditária em suínos.
Em condições leves, como pequenas comunicações interatrais e interventricu-
lares e duto arterioso patente, os animais afetados podem atingir uma idade
avançada sem mostrarem sinais de cardiopatia. Quando a situação é mais séria, o
recém-nascido pode mostrar fraqueza, dispnéia, cianose e retardo de crescimento.
Os animais mais seriamente afetados morrem logo no período pós-natal. Se as
condições não forem óbvias logo após o nascimento, os sintomas de insuficiência
cardíaca congestiva podem aparecer mais tarde, geralmente antes da maturidade,
mas, algumas vezes, tão tarde quanto 5 a 7 anos de idade. Os sinais de insuficiência
cardíaca congestiva em um animal novo ou de meia-idade sugerem a possibilidade
da causa de base ser um defeito cardíaco congênito.
O reconhecimento precoce de cardiopatia congênita pode permitir ao proprietário
recuperar seu investimento, ou evitar que o produtor tente criar um animal que estará
destinado a morrer precocemente. Essencialmente, a correção cirúrgica completa
de certos defeitos, como duto arterioso patente, estenose pulmonar e arco aórtico
direito persistente, é possível sem qualquer equipamento extensivo especial.
Quando houver equipamento para hipotermia ou circulação extracorporal, pode-se
tentar a correção de outras malformações.
Os sintomas da insuficiência cardíaca congestiva (congestão venosa sistêmica,
hepatomegalia, ascite, congestão pulmonar e edema) podem ocorrer quando a
malformação congênita de base prejudicar gravemente o funcionamento cardíaco.
Os animais que apresentam tais sintomas devem apresentar uma melhora dramá-
tica quando tratados com repouso, dietas com pouco sódio, glicosídios cardíacos e
diuréticos. A não ser que o defeito de base seja cirurgicamente corrigido, a resposta
é normalmente temporária e uma insuficiência cardíaca congestiva irreversível,
eventualmente, resultará em morte.
No cão, os critérios clínicos para as malformações comuns aqui discutidas são
definidos o bastante para que um diagnóstico definitivo possa ser feito com base nos
sintomas físicos, radiográficos, ecocardiográficos e eletrocardiográficos. Quando a
correção cirúrgica for cogitada ou quando forem encontradas anomalias mais
complexas, recomendam-se estudos confirmatórios adicionais como angiocardiografia
e cateterização cardíaca. Os sintomas clínicos de malformações congênitas especí-
ficas em outras espécies, além do cão, não são bem conhecidos e, nestes casos, um
diagnóstico específico depende muito mais de tais estudos especiais.

ANOMALIAS DAS DERIVAÇÕES DOS ARCOS AÓRTICOS


Entre os arcos aórticos embrionários, que persistem nos mamíferos normais,
estão o terceiro esquerdo e direito, o quarto esquerdo e porções do sexto esquerdo
e direito. O terceiro par de arcos dá origem às artérias carotídeas. O quarto arco
esquerdo permanece como o arco definitivo da aorta, enquanto os sextos arcos dão
origem à artéria pulmonar, a seus ramos e ao duto arterioso.

Duto arterioso patente


Durante a vida fetal, existe uma comunicação importante entre a aorta e a artéria
pulmonar. Esta conexão é formada pelo sexto arco aórtico esquerdo e é chamada de
duto arterioso. Uma insuficiência do duto arterioso em se fechar logo após o
nascimento leva a uma anomalia conhecida por duto arterioso persistente ou patente.
Trata-se de uma das mais comuns anomalias cardiovasculares congênitas, clinica-
Anomalias Congênitas e Hereditárias do Sistema Cardiovascular 42

mente reconhecidas no cão, podendo ocorrer junto com outras anomalias cardíacas.
É herdada como um defeito poligênico em poodles toy e miniaturas.
Fisiopatologia – Durante a sístole, parte do sangue arterial é bombeada através
do duto patente para o sistema pulmonar (“shunt” esquerdo-direito) devido a uma
pressão maior na aorta. Se a resistência pulmonar permanecer baixa, haverá um
aumento de fluxo pelos pulmões, coração esquerdo e aorta ascendente, que constitui
o caminho do “shunt”; estas estruturas aumentam em resposta ao volume de sangue
aumentado que recebem. Se a resistência vascular pulmonar for alta, haverá
hipertensão pulmonar e hipertrofia do ventrículo direito e poderá ocorrer um “shunt”
direito-esquerdo através do duto, mandando sangue venoso para a aorta descen-
dente.
Achados clínicos e tratamento – Um murmúrio contínuo (ver pág. 49) está
presente durante a sístole e diástole no “shunt” esquerdo-direito. O pulso normalmen-
te é típico, distendendo rápida e fortemente a artéria (“pulso de martelo d’água”).
Pode haver evidência eletrocardiográfica de hipertrofia ventricular esquerda e
radiografias torácicas revelam aumento ventricular e atrial esquerdo, sinais da
vascularização pulmonar aumentados e dilatação da aorta ascendente.
Quando houver hipertensão pulmonar com “shunt” direito-esquerdo, o murmúrio
contínuo não estará presente, haverá uma salientação e divisão da segunda bulha
cardíaca, e evidência radiográfica e eletrocardiográfica de hipertrofia ventricular
direita. Normalmente ocorre uma policitemia secundária. As membranas mucosas
visíveis da cabeça normalmente não estão cianóticas, pois o sangue venoso penetra
na aorta após o ponto onde o tronco braquicefálico e a artéria braquial esquerda se
originam. Por esta razão, a anomalia pode permanecer não diagnosticada até que
o cão afetado demonstre fraqueza ou colapso dos membros posteriores, durante
exercício devido ao suprimento inadequado de oxigênio na região.
Recomenda-se a ligadura ou divisão cirúrgica completa do duto arterioso
patente; no entanto, quando há “shunt” direito-esquerdo e a hipertensão pulmonar
é grave, pode ocorrer uma insuficiência ventricular direita após a obliteração do duto
patente.

Arco aórtico direito persistente


Um arco aórtico representa uma anomalia vascular comum em cães, nos quais o
quarto arco aórtico embrionário direito persiste, deslocando o esôfago e a traquéia
para a esquerda. A traquéia e o esôfago estão confinados num anel vascular formado
pelo arco da aorta no lado direito, a artéria pulmonar embaixo, a base do coração
ventralmente, e o ligamento arterioso (ou duto arterioso) dorsalmente e à esquerda.
O arco aórtico direito persistente é raro no pastor alemão e setter irlandês. Esta
anomalia também já foi relatada em bovinos, eqüinos e gatos. Outras anomalias do
sistema dos arcos aórticos também podem resultar em anéis vasculares que
circundam a traquéia e o esôfago, parcial ou completamente. Isto pode comprimir
estes órgãos, resultando em disfagia e regurgitação. Normalmente a porção do
esôfago cranial à constrição está consideravelmente dilatada.
Para sintomas clínicos e tratamento, ver DILATAÇÃO DO ESÔFAGO, página 132.

ESTENOSE AÓRTICA
No cão e suíno, a estenose do trato de saída de fluxo do ventrículo esquerdo é uma
lesão congênita relativamente comum. Foi relatada principalmente em boxers e
pastores alemães e tem ocorrido em agregações familiares nestas 2 raças e em
terras-novas. Sabe-se pouco quanto à prevalência em outras espécies. Na maioria
das vezes, as válvulas não estão primariamente envolvidas, pois o estreitamento
ocorre abaixo delas na forma de um anel fibroso (estenose subaórtica fibrosa).
Anomalias Congênitas e Hereditárias do Sistema Cardiovascular 43

Fisiopatologia – O principal distúrbio é a obstrução ao esvaziamento do


ventrículo esquerdo, resultando na sua hipertrofia. Freqüentemente há uma dilata-
ção pós-estenótica da aorta ascendente.
Achados clínicos e tratamento – No cão, o murmúrio sistólico da estenose
aórtica é ordinariamente localizado no terceiro ou quarto espaço intercostal esquer-
do e segundo a terceiro espaço intercostal direito. Pode ser transmitido até a região
do pescoço. Desmaios e morte súbita não são raros. Pode haver evidência
eletrocardiográfica de hipertrofia ventricular esquerda e são freqüentes arritmias e
distúrbios de condução. Radiograficamente, aumento ventricular esquerdo e dilata-
ção pós-estenótica da aorta são sintomas proeminentes. A obstrução subvalvular
pode ser visualizada por ecocardiografia.
O tratamento com drogas bloqueadoras β-adrenérgicas diminui a demanda de
oxigênio do miocárdio podendo ser útil no controle de arritmias ventriculares. Não
é costume a prática de cirurgias para esta condição.

ESTENOSE PULMONAR
Nos cães, as estenoses pulmonares valvular, subvalvular e infundibular já foram
descritas. O tipo valvular é a forma mais comum e afeta apenas as válvulas. A
estenose valvular pulmonar é hereditária em beagles.
Fisiopatologia – O distúrbio funcional primário é uma interferência no esva-
ziamento do ventrículo direito que leva ao aumento da pressão sistólica e à
hipertrofia do ventrículo direito. A pressão arterial pulmonar é baixa ou inalterada.
Pode ocorrer uma dilatação pós-estenótica da artéria pulmonar, que produz, em
casos avançados, um aumento arredondado do vaso, lembrando um aneurisma.
Achados clínicos e tratamento – Um murmúrio sistólico áspero em um
crescendo-decrescendo, em geral acompanhado por um tremor, está freqüente-
mente presente, com um ponto de intensidade máxima localizado no terceiro ou
quarto espaço intercostal esquerdo, logo abaixo de uma linha horizontal traçada
à linha do ombro (área pulmonar). A silhueta cardíaca mostra um aumento das
margens atrial e ventricular direita e pode ser vista uma dilatação pós-estenótica
da artéria pulmonar. A gravidade da estenose pode ser calculada pelo gradiente
de pressão na ecocardiografia de Doppler, que registra a velocidade do fluxo
anormal de sangue. Eletrocardiograficamente, um desvio marcante à direita do
eixo elétrico médio costuma ocorrer e produz um ECG típico de um aumento
ventricular direito. É impossível a diferenciação entre uma estenose valvular e
subvalvular sem o auxílio de uma angiocardiografia.
Existe a possibilidade de uma valvulotomia pulmonar para estenose valvular,
entretanto, ela só deve ser considerada em casos graves, uma vez que suas
conseqüências são imprevisíveis. A princípio, em casos do tipo subvalvular, o
infundíbulo deve ser seccionado.

DEFEITOS DO SEPTO
Comunicação interatrial
O forame oval é uma abertura oblíqua no septo interatrial que normalmente
permite a passagem de um fluxo do átrio direito para o esquerdo durante a vida intra-
uterina. Ao nascimento, esta abertura é forçada a se fechar pelo aumento da pressão
no átrio esquerdo, que ocorre no início da respiração. Em cães, o fechamento
anatômico do forame oval é devido à fibrose e ocorre no período pós-natal (dentro
de 1 semana). O fechamento em eqüinos e bovinos é o resultado do colapso da
estrutura vascular no forame oval, que pode permanecer patente por alguns meses
e persistir durante toda a vida. Apesar de ser considerado um defeito anatômico,
este problema não causa anormalidades funcionais, uma vez que a pressão atrial
Anomalias Congênitas e Hereditárias do Sistema Cardiovascular 44

esquerda excede a pressão atrial direita. Esta válvula “para um lado só” pode ser
reaberta e permitir um desvio de sangue da direita para a esquerda se a pressão do
átrio direito tornar-se excepcionalmente elevada.
As verdadeiras comunicações no septo interatrial são as que constituem
verdadeiras aberturas. Comunicações do tipo septum secundum são as mais
comuns e ocorrem na porção fina do septo interatrial, ocupada pelo forame oval.
As comunicações do tipo septum primum estão situadas mais abaixo no septo
interatrial e normalmente também implicam as válvulas atrioventriculares.
Fisiopatologia – Quando existe um grande defeito do septo atrial, o sangue
passa do átrio esquerdo para o direito; este sangue adicional deve ser bombeado
como uma carga extra pelo lado direito do coração e, por vezes, causa dilatação ou
hipertrofia desta porção do coração. Como resultado de um grande aumento de fluxo
sangüíneo através do sistema pulmonar, pode ocorrer uma hipertensão pulmonar em
eqüinos e bovinos, seguida por insuficiência cardíaca congestiva. Normalmente, não
há desvio de sangue não oxigenado para circulação sistêmica. Entretanto, pode
aparecer uma fraca cianose, invocando um fluxo sangüíneo inverso do átrio direito
para o esquerdo, particularmente quando há presença de hipertensão pulmonar e
insuficiência cardíaca congestiva, ou quando uma lesão coexistente, como estenose
pulmonar causa um aumento na pressão do átrio direito.
Achados clínicos e tratamento – Um pequeno forame oval patente pode estar
presente sem que haja sintomas clínicos detectáveis. Em grandes comunicações do
septo, podem-se observar dispnéia, palpitação e cianose. Normalmente, pode-se
perceber um murmúrio sistólico áspero sobre a base do coração. A segunda bulha
cardíaca é aumentada em amplitude e pode se desdobrar. O ventrículo direito e a
artéria pulmonar estão aumentados. Sinais de aumento vascular pulmonar podem
estar evidentes em radiografias do tórax. A confirmação do defeito normalmente
requer uma visualização por ecocardiografia ou seguir o fluxo de sangue, através do
septo, por angiografia.
A técnica da parede atrial pode ser usada para correção cirúrgica em cães.
Facilita-se a visualização direta da reparação por um “bypass” do coração ao pulmão.

Comunicação interventricular
Varia em tamanho, desde pequenas aberturas de pouca importância funcional
até quase a ausência total do septo; a maioria ocorre na parte membranosa superior
do septo. Pode ocorrer em combinação com outras anomalias congênitas como duto
arterioso patente, comunicação interatrial e estenoses aórtica e pulmonar.
Fisiopatologia – Pequenas comunicações do septo interventricular levam
sangue do ventrículo esquerdo para o direito com uma força considerável. Entretan-
to, a quantidade de sangue que passa por uma pequena abertura tem pouco ou
nenhum efeito sobre a circulação geral.
Na presença de grandes comunicações sem estenose pulmonar, a direção do
“shunt” depende da resistência relativa do fluxo através do leito vascular intrapulmonar,
comparada com a do leito vascular sistêmico. Em animais jovens, a resistência do
leito vascular intrapulmonar é mais baixa que a resistência na circulação sistêmica
e o “shunt” é inteiramente da esquerda para a direita. Como conseqüência, a carga
do ventrículo direito é aumentada e leva a sua hipertrofia e dilatação, como também
da artéria pulmonar. Subseqüentemente, em eqüinos e bovinos (raramente no cão),
a resistência ao fluxo sangüíneo pulmonar deve aumentar devido a mudanças
obliterativas no leito vascular pulmonar. Em estágios precoces, quando a resistência
pulmonar atingir o nível da resistência sistêmica, pode haver um “shunt” intermitente
em qualquer direção, esquerdo-direito ou direito-esquerdo, mas depois, quando a
resistência pulmonar já ultrapassar o nível sistêmico, o “shunt” direito-esquerdo
predomina e normalmente aparece uma cianose.
Anomalias Congênitas e Hereditárias do Sistema Cardiovascular 45

Achados clínicos e tratamento – Uma simples e pequena comunicação do septo


não costuma manifestar sintomas externos de cardiopatia. Entretanto, geralmente os
sintomas físicos são distinguíveis e aparecem na forma de murmúrios ásperos, freqüen-
temente acompanhados de uma vibração distinta. O murmúrio e a vibração podem ser
melhor auscultados do segundo ao quarto espaços intercostais direitos, próximos à
margem esternal. Embora a lesão possa ter pouco efeito funcional, há um perigo
potencial de endocardites bacterianas, que podem se desenvolver ao longo das mar-
gens do defeito do septo. Esta complicação incomum já foi relatada em bovinos. Evi-
dências radiográficas de aumento do ventrículo direito e fluxo sangüíneo pulmonar
aumentado estão presentes em falhas de tamanho moderado a grande. Mesmo peque-
nas falhas podem ser visualizadas por ecocardiografia bidimensional ou localizadas por
análise de fluxo de Doppler. Animais com grandes comunicações do septo e extensas
lesões oclusivas no leito vascular intrapulmonar apresentam hipertensão pulmonar e
“shunt” direito-esquerdo. São cianóticos e mostram todos os sintomas de uma cardio-
patia congênita cianótica, como fadiga, anorexia, fraqueza e dispnéia.
A correção cirúrgica de uma comunicação do septo interventricular requer uma
circulação extracorporal ou uma profunda hipotermia. A comunicação é normalmen-
te obliterada com material plástico não reativo. Pequenas comunicações, em que as
mudanças funcionais são mínimas, talvez não encurtem notavelmente a vida se não
forem tratadas.

TETRALOGIA DE FALLOT
Esta malformação complexa consiste em estenose pulmonar, normalmente do
tipo subvalvular; comunicação interventricular; dextroposição da aorta, ultrapassan-
do o septo interventricular; e hipertrofia ventricular direita. A tetralogia de Fallot já foi
relatada em cães, bovinos, eqüinos e gatos. É hereditária na raça keeshond.
Fisiopatologia – A combinação da estenose pulmonar e comunicação interven-
tricular é funcionalmente similar àquela de uma grande comunicação interventricular
e hipertensão pulmonar. A obstrução do fluxo de saída do ventrículo direito eleva a
pressão sistólica ventricular, resultando num “shunt” direito-esquerdo através da
comunicação interventricular. O malposicionamento da aorta ultrapassa parcialmen-
te a falha no septo e recebe sangue de ambos os ventrículos, enquanto o fluxo de
sangue pulmonar é diminuído. A mistura de sangue arterial e venoso resulta em
cianose.
Achados clínicos e tratamento – Normalmente há cianose desde o nascimento
e se agrava por exercício, que provoca dispnéia e, freqüentemente, colapso. Pode
haver uma policitemia devida à hipoxemia crônica. Apesar de uma severa deficiên-
cia que acompanha este defeito, sabe-se que muitos cães vivem anos antes de
morrerem de insuficiência cardíaca congestiva ou fenômeno embólico.
Um murmúrio sistólico áspero e alto pode ser melhor ouvido na área pulmonar,
e do segundo ao terceiro espaço intercostal direito, perto da margem esternal. Pode-
se palpar um tremor nestas áreas. A hipertrofia ventricular direita é indicada por um
desvio marcante, à direita do eixo, no eletrocardiograma, acompanhado por grandes
ondas nas derivações precordiais esquerdas. Radiografias torácicas revelam au-
mento do coração direito com marcas de vascularização pulmonar normais ou
diminuídas. Geralmente, a aorta ascendente está dilatada. Os defeitos fundamen-
tais podem ser visualizados por ecocardiografia.
A criação de um duto arterioso artificial (“shunt” Blalock-Taussig) pode aumentar
o fluxo de sangue pulmonar e aliviar, em certo grau, a cianose. É preferível uma
correção completa por alívio da estenose pulmonar bem como o fechamento da
comunicação ventricular, porém isto requer uma cirurgia de coração aberto.
Linfossarcoma e Leucemia Felinos 46

LINFOSSARCOMA E LEUCEMIA FELINOS


(Leucemia e linfoma felino, Linfossarcoma)

Linfossarcoma é a mais freqüente doença neoplásica diagnosticada em gatos.


São reconhecidas as formas mediastinal, multicêntrica e alimentar. A forma medias-
tinal é mais comum em gatos jovens; o envolvimento de órgãos abdominais é
ocorrência típica em animais velhos. Leucemias linfóide e mielóide ocorrem com
menor freqüência.
Etiologia e epidemiologia – O vírus da leucemia felina pode ser demonstrado em
gatos com linfossarcoma em 90% dos casos mediastinais, 70% dos multicêntricos e
35% dos casos alimentares. Está presente na saliva de gatos infectados e a trans-
missão ocorre por contato gato a gato e congenitamente. Não há evidências de que
gatos infectados possam transmitir a doença para o homem. Os gatos podem apre-
sentar infecções subclínicas e desenvolver imunidade ao vírus ou, alternativamente,
podem se tornar infectados de forma persistente. A maior parte dos gatinhos despro-
tegidos in utero ou antes de 8 semanas de vida, tornam-se virêmicos. Gatos mais
velhos são muito menos suscetíveis. Tais gatos possuem uma predisposição marcan-
te a neoplasias ou a uma das doenças não malignas associadas ao vírus da leucemia
felina (ver adiante). A incidência da doença é maior em gatos em ambientes domés-
ticos, onde outros gatos já tiveram doenças associadas ao vírus da leucemia felina.
Achados clínicos – Freqüentemente, o gato afetado sucumbe a uma doença
definhante marcada por anemia, letargia e anorexia. O linfossarcoma mediastinal
anterior pode causar dispnéia ou disfagia. Radiografias podem indicar a presença
de uma massa mediastinal com deslocamento dorsal da traquéia, ou as estruturas
torácicas podem estar obscurecidas por efusões pleurais. Neste segundo caso,
pode-se diferenciar o linfossarcoma de outras causas de hidrotórax pela presença
de um grande número de linfócitos imaturos em esfregaços sangüíneos de fluidos
pleurais aspirados. Os sintomas da forma abdominal freqüentemente são aqueles
associados a enterite ou malabsorção. Um ou mais linfonodos mesentéricos fre-
qüentemente estão aumentados. A parede do estômago ou do intestino pode estar
discretamente espessada ou pode conter um tumor discreto. Infiltração renal exten-
siva pode resultar em uremia, e um envolvimento hepático pode causar anemia e
icterícia. O aumento das vísceras afetadas pode ser evidenciado em palpação ou
radiografias do abdome. Na forma multicêntrica, os linfonodos superficiais podem
estar envolvidos e grosseiramente aumentados. Pode ocorrer malignidade em muitos
outros casos, por exemplo, canal espinhal, olhos e pele. Em gatos com uma anemia
não regenerativa, leucopenia persistente ou evidência de linfocitose ou linfoblastos
no sangue deve ser feita uma aspiração da medula óssea. Em leucemia linfoblástica,
> 40% das células aspiradas são linfoblastos.
Além da neoplasia, o vírus da leucemia felina também causa doenças não
malignas. Destas, a anemia não regenerativa e imunossupressão são bem caracte-
rizadas. A segunda predispõe o gato a muitas doenças infecciosas, incluindo peri-
tonite e anemia infecciosas felinas. Entre outras doenças que foram associadas ao
vírus da leucemia felina estão a enterite e reabsorção fetal ou aborto.
Lesões – O linfossarcoma se origina no mediastino anterior. O tórax ventral
anterior pode estar cheio de tecido tumoroso lobulado e branco em volta do coração,
e deslocando o pulmão dorsal e posteriormente. Os órgãos abdominais afetados por
linfossarcoma são o intestino (íleo), linfonodos mesentéricos, rins, fígado e baço.
Diagnóstico – O linfossarcoma pode ser diagnosticado por exames histológicos
ou citológicos de tumores nos órgãos afetados. Observam-se freqüentemente
mudanças hematológicas em gatos com linfossarcoma, e a hematologia pode ser
útil no diagnóstico de leucemia. Uma forte associação entre uma infecção persisten-
te com o vírus da leucemia e o linfossarcoma torna o teste laboratorial, para a
Cardiopatias 47

detecção do vírus da leucemia felina no sangue, um procedimento diagnóstico de


grande utilidade.
Controle – Vacinas estão disponíveis, mas sua eficácia é controversa. A
quimioterapia pode estender a vida de um gato com linfossarcoma. Uma recupera-
ção a longo prazo (> 1 ano) ocorre em 10 a 15% dos casos, mas a recuperação média
é de , 6 meses. Os mesmos protocolos de quimioterapia utilizados no cão (ver
LINFOMA MALIGNO CANINO, pág. 38) podem ser usados nos gatos. Gatos tendem a
tolerar quimioterapia um tanto melhor que cães. O vírus da leucemia felina pode ser
erradicado de ambientes domésticos fechados pela remoção de gatos positivos
para o vírus no sangue. A desinfecção do local não é necessária, pois o vírus não
sobrevive no ambiente.

CARDIOPATIAS
Cardiopatias freqüentemente apresentam problemas de diagnóstico, embora
sejam tratadas raramente, exceto em cães e gatos. Os aspectos da cardiopatia, de
interesse primário para os clínicos, são discutidos adiante. As recomendações
quanto ao tratamento são limitadas às condições e espécies nas quais existe
alguma experiência substancial com tratamento (ver também ORIGEM DOS S INTOMAS
DE CARDIOPATIAS, pág. 11).
Exame e diagnóstico – É necessário um exame sistemático para se avaliar o
estado do coração. Este deve incluir a palpação do tórax para detectar frêmitos
(vibrações de baixa freqüência que podem ser sentidas com as pontas dos dedos)
e deslocamento cardíaco, auscultação meticulosa, percussão na área de silêncio
cardíaco, palpação do pulso arterial e exame das pulsações da veia jugular. O
exame radiográfico da silhueta cardíaca para distorções e aumentos é importante
para diagnóstico e prognóstico em pequenos animais, sendo mais esclarecedor do
que a percussão precordial. Deve-se fazer um eletrocardiograma (ECG), quando
possível. Os médicos que não possuem um aparelho para ECG devem solicitar que
seja realizado fora. Em áreas onde podem se encontrar dirofilárias, o sangue deve
ser examinado para microfilárias.
Devemos considerar o quadro de cardiopatia apenas quando encontrarmos um
sintoma confiável, pois muitas outras condições podem simulá-lo. Muitas vezes, os
animais são trazidos ao veterinário com uma queixa de intolerância ao exercício.
Embora isto, por si só, não seja um sintoma confiável, deve-se considerar cardiopa-
tia no diagnóstico diferencial.
Em cães não devemos diagnosticar cardiopatia se não houver pelo menos um
dos seguintes sintomas: 1. murmúrio sistólico Grau III na ausência de anemia; 2.
murmúrio diastólico ou som de preenchimento diastólico provocando um ritmo
galopante; 3. um frêmito precordial palpável; 4. ingurgitamento venoso generaliza-
do; 5. fibrilação atrial ou “flutter”; 6. taquicardia ventricular paroxística; 7. batimentos
ectópicos atriais ou ventriculares com presença consistente e freqüentes; 8.
bloqueio atrioventricular (AV) completo; 9. bloqueio de ramo esquerdo; 10 padrão
eletrocardiográfico de aumento ventricular direito (ver COR PULMONALE, pág. 58); 11.
evidência radiográfica ou ecocardiográfica de grande aumento cardíaco, dilatação
de 1 ou mais compartimentos, ou efusão pericárdica; ou 12. divisão pronunciada e
fixa da segunda bulha cardíaca.
Fibrilação atrial ou “flutter”, bloqueio AV completo, fricção pericárdica, sopros
intensos, frêmitos precordiais e ingurgitamento venoso generalizado são sintomas
confiáveis de cardiopatias em eqüinos e na maior parte das espécies domésticas,
Cardiopatias 48

incluindo os bovinos. Os sintomas de significância controvertida e especificidade


questionável incluem: batimentos ectópicos ventriculares infreqüentes, todas as
arritmias e distúrbios de condução que desaparecem após exercício, variações no
segmento RS-T, marca-passo migratório, sopros diastólicos (um sintoma confiável
em cães), e aumento da área de silêncio cardíaco. Os sopros sistólicos são comuns
em cavalos normais e, na ausência de outros sintomas, não podem ser considera-
dos evidência confiável de doença. Os sopros diastólicos geralmente indicam
cardiopatias nos eqüinos.
Os sintomas não específicos mais comuns e óbvios em animais com cardiopatias
são: 1. murmúrio sistólico; 2. dispnéia; 3. tosse; 4. edema pulmonar e ascite; e 5.
fraqueza e cansaço. Embora a cardiopatia seja altamente sugestiva, o diagnóstico
só pode ser feito após uma ou mais das condições anteriores terem sido evidenci-
adas, ou outras possibilidades rigorosamente descartadas. Em certas doenças
degenerativas do miocárdio, pode haver insuficiência cardíaca congestiva, sem
bulhas cardíacas anormais ou mudanças no diagnóstico eletrocardiográfico.
Ecocardiografia – As ondas refletidas do ultra-som podem produzir imagens
cardíacas bidimensionais detalhadas e movimentos lineares que variam em função
do tempo (ver pág. 1160). Além destes exames, a velocidade do fluxo sangüíneo
pode ser medida pela técnica de ecocardiografia de Doppler. A ecocardiografia
complementa os outros procedimentos diagnósticos através do fornecimento quan-
titativo dos eventos dinâmicos do ciclo cardíaco. Com estes procedimentos não
invasivos, as câmaras cardíacas e as dimensões da parede podem ser determina-
das, podemos visualizar a anatomia e a movimentação das válvulas, podemos
calcular os gradientes de pressão e o volume do fluxo sangüíneo, assim como vários
índices da função cardíaca. Ela também identifica algumas alterações na textura do
tecido miocárdico, indicativas de isquemia e fibrose, massas, vegetações valvulares
e muitos outros fatores previamente verificados somente à necropsia.

Bulhas e murmúrios cardíacos


Bulhas cardíacas normais e variantes – Quatro bulhas cardíacas podem ser
audíveis em eqüinos. A primeira bulha cardíaca (B1) é associada ao fechamento
das válvulas AV e a segunda bulha (B 2) ao fechamento das válvulas semilunares.
A terceira bulha (B3) ocorre no começo da diástole, no final do período de rápido
enchimento ventricular. A quarta bulha (B4) ou bulha atrial é relacionada à sístole
atrial. Embora todas estas bulhas possam ser ouvidas, freqüentemente apenas B1
e B2 podem ser detectadas.
Em bovinos, apenas B1 e B2 são normalmente audíveis. Tanto B3 como B4 são
ouvidas algumas vezes, porém são menos freqüentes em cavalos. Durante a
administração EV de fluidos, tais como solução de cálcio em bovinos com hipocal-
cemia, B3 ou B4, ou ambas podem ser acentuadas e tornam-se audíveis.
No cão, apenas B1 e B2 costumam ser audíveis. Ocorre um desdobramento
inspiratório de B2, mas o intervalo entre os 2 componentes é muito rápido para ser
audível. Bem menos provável, a primeira bulha pode se desdobrar, mas isto é
freqüentemente um complexo B4-B1.
As características das bulhas cardíacas em caprinos, ovinos e suínos têm sido
menos estudadas. Em geral, apenas B1 e B2 podem ser audíveis nestas espécies.
Sopros e outros sons anormais – A intensidade dos sopros cardíacos é
classificada como: Grau I – O murmúrio de menor intensidade que pode ser ouvido;
Grau II – Um leve murmúrio restrito a uma área localizada; Grau III – Um murmúrio
que se projeta amplamente e é imediatamente audível quando se inicia a ausculta-
ção; Grau IV – Um murmúrio auscultado no início da auscultação e acompanhado
por um frêmito; Grau V – O murmúrio mais alto que não se escuta quando o
Cardiopatias 49

estetoscópio está posicionado próximo do tórax, porém sem encostar; Grau VI –


Murmúrio extremamente alto que ainda pode ser ouvido quando o estetoscópio está
desencostado da parede do tórax.
Existem 2 tipos gerais de sopros sistólicos: de ejeção e de regurgitação. Os
sopros sistólicos de ejeção estão crescendo-decrescendo em intensidade (no
fonocardiograma, apresentam formato de diamante), com o pico de intensidade na
meia-sístole. Algumas vezes são produzidos pela estenose das válvulas semilunares,
estenose infundibular, dilatação da aorta ou da artéria pulmonar, ou aumento da taxa
de fluxo através do orifício da válvula semilunar. Os sopros sistólicos de regurgi-
tação são pansistólicos e freqüentemente de intensidade constante. Podem ser
causados por regurgitação da mitral ou da tricúspide, ou por um defeito do septo
ventricular. Estas anormalidades não invariavelmente produzem sopros que podem
ser reconhecidos como os do tipo por ejeção ou por regurgitação.
Os sopros diastólicos são quase sempre causados por insuficiência aórtica ou
pulmonar.
Os sopros contínuos ou mecânicos quase sempre indicam potência do duto
arterioso (ver pág. 41). Este sopro contínuo aumenta e diminui de intensidade com
a sístole e a diástole, apresentando intensidade máxima no momento de B 2.
Em cavalos, os sopros pré-sistólico, sistólico precoce, assim como o diastólico
precoce são freqüentemente audíveis na ausência de doenças cardiovasculares
ou anemia. Os sopros sistólicos precoces são os mais comuns, sendo geralmente
auscultáveis na base do coração (áreas de auscultação aórtica e pulmonar). Em
cavalos jovens e saudáveis não é raro se ouvir um sopro diastólico precoce curto,
de tom elevado, chiante, cuja maior intensidade se encontra perto do ápice
cardíaco (área mitral).
Ritmos diastólicos em galope – Os ritmos em galope triplo ou em 3 batidas
assemelham-se à cadência dos cavalos em galope. O som “extra” é classificado
como um galope diastólico precoce (ventricular), pré-sistólico (atrial) ou galope de
somação. Estes ruídos representam a exacerbação anormal de B3 e B4 em animais,
nos quais estes sons normalmente são inaudíveis. Em cães e gatos, o ruído de
galope (B3exagerado) diastólico precoce (ventricular) está associado com doenças
avançadas do miocárdio e insuficiências cardíacas congestivas. O ruído de galope(B4
exagerado) pré-sistólico (atrial) torna-se audível quando o intervalo entre as sístoles
atrial e ventricular (intervalo P-R no ECG) está prolongado. O galope de somação
resulta da fusão dos ruídos em galope atrial e ventricular e pode ocorrer na
insuficiência cardíaca congestiva com taquicardia. Estes 3 ritmos em galope podem
ser ouvidos em cavalos normais.
Estalidos sistólicos – Sabe-se que, freqüentemente, sons agudos, curtos e
transitórios denominados estalidos ocorrem durante a sístole, mas são raros em cães
e provavelmente em outras espécies domésticas. Costumam ser isolados, porém
podem ser múltiplos e desaparecer completamente em alguns ciclos. No homem, os
estalidos ou síndromes de sopros e estalidos têm sido associados ao prolapso da
válvula mitral para o interior do átrio esquerdo durante a sístole. Sua significância
clínica nos outros animais é incerta, mas devemos considerar as anormalidades na
válvula mitral, como o prolapso.
Desdobramento das bulhas cardíacas – Os desdobramentos audíveis tanto de
B1 como B2 podem ocorrer na ausência de outras anormalidades cardíacas. A B1
pode estar marcantemente desdobrada quando a contração de 2 ventrículos estiver
dessincronizada, assim como no bloqueio de ramos fasciculares e certos batimentos
ectópicos ventriculares. O desdobramento é muitas vezes confundido com um
complexo B4 -B1. A B2 pode ser desdobrada durante a inspiração em cães e durante
a inspiração ou expiração em cavalos. O desdobramento anormal de B 2 está
associado com a hipertensão pulmonar, assim como no caso do enfisema pulmonar
Cardiopatias 50

de cavalos e a infecção por larvas cardíacas em cães. Outras causas em cães (e


possivelmente em outras espécies) incluem defeito do septo atrial, estenose
pulmonar, bloqueio do ramo fascicular direito ou esquerdo e certos batimentos
ventriculares ectópicos.
Ritmos triplos – Os vários ruídos que produzem ritmos triplos podem ser
resumidos como se segue: 1. fisiológico – o terceiro ruído cardíaco em cavalos e
bovinos, o quarto ruído cardíaco em cavalos e bovinos, e o galope de somação em
cavalos durante a taquicardia; 2. anormal – estalido sistólico; e 3. patológico – galope
ventricular diastólico, galope atrial diastólico e o galope de somação diastólico.
Os desdobramentos de B 1 e B2 devem ser distinguidos dos ritmos triplos nos
quais 2 dos sons terminam quase juntos como em certos estalidos sistólicos em cães
e quando B4 preceder B1 muito de perto, em cavalos.
“Flutter”diafragmático sincrônico – O diafragma pode se contrair sincro-
nicamente com o coração produzindo altos ruídos em batidas na auscultação e
contrações que costumam ser visíveis na área do flanco. Esta síndrome resulta da
estimulação do nervo frênico por despolarização atrial e ocorre principalmente quando
existir marcante desequilíbrio eletrolítico ou ácido-básico, particularmente com hipo-
calcemia. É mais comum em cavalos e cães, e freqüentemente ocorre na eclâmpsia
(ver págs. 540 e 551). Isto ocorre mais comumente em associação com doenças
gastrointestinais que induzem mais comumente desequilíbrios eletrolíticos em cães.

Arritmias
São distúrbios na freqüência e ritmo cardíacos aumentados, quando houver
anormalidade na formação e/ou propagação do impulso elétrico através do sistema
de condução do coração, ou quando a descarga de foco ectópico irritante assumir
atividade de marca-passo. Podem ocorrer a partir de doenças primárias do miocár-
dio ou ser secundárias a irritabilidade aumentada ou diminuída do miocárdio como
resultado de efeitos tóxico, anóxico ou de drogas, ou desequilíbrio eletrolítico.
Arritmias graves e potencialmente fatais são as maiores complicações em casos de
traumas e também resultam de retorno venoso diminuído nas dilatações gástricas
agudas (ver pág. 281) em cães de grande porte. Este ritmo pode evoluir para uma
grave arritmia que justifique o tratamento com lidocaína EV. Arritmia pode também
ocorrer como resultado da variação normal no tono autonômico do coração. A
arritmia (em todas as espécies, exceto humanos) raramente ocorre como uma
variação fisiológica normal. A arritmia sinusal respiratória é o ritmo de repouso
normal no cão e o segundo grau do bloqueio AV é normal em eqüinos saudáveis e
quietos. Um ECG é necessário para o diagnóstico diferencial de muitas arritmias,
porque as terapias antiarrítmicas dependem do foco de origem e do tipo de ritmo
anormal. Clinicamente, as arritmias podem ser divididas em bradiarritmia, em que
a freqüência cardíaca é bastante lenta e taquiarritmias em que a freqüência cardíaca
é bastante rápida ou irregular. As bradiarritmias incluem bradicardia sinusal,
repouso sinusal, bloqueio sinoatrial, bloqueio AV e despolarizações prematuras. No
cavalo, a fibrilação atrial produz uma taxa irregular, porém não rápida durante o
repouso, enquanto irregular em outras espécies, geralmente produz taquicardia.
Taquicardias patológicas serão sempre suspeitas quando a freqüência cardíaca
estiver elevada, além daquela esperada para a condição clínica do animal.
Bradicardia sinusal – Esta é uma freqüência cardíaca lenta, que pode ser
normal em animais atletas, quando em repouso; mas também ocorre na hipocalce-
mia e com síndromes de pressão intracraniana aumentada. A bradicardia é
considerada presente quando as taxas sinusais em cães são < 45 a 55bpm; em
gatos, < 90bpm; e em cavalos, < 20bpm. Bradicardia também pode ocorrer no
hipotireoidismo, intoxicação digitálica, hipoxia, hipercalemia e insuficiência adreno-
cortical. O tratamento é restrito à correção da causa inicial.
Cardiopatias 51

Arritmia sinusal respiratória – É mais comumente detectada no repouso normal


do cão. Há uma variação no ritmo do coração, associada com variação na intensidade
do tono vagal. Aqui, intervalos R-R variam > 10%. A freqüência cardíaca geralmente
aumenta com a inspiração e diminui com a expiração. A arritmia sinusal é abolida
pelas influências que reduzem o tono vagal e aumentam a freqüência cardíaca, tais
como: excitações, exercícios e administração de atropina. A arritmia sinusal pode
estar associada com um marca-passo dentro do nódulo sinoatrial migratório e
intervalos variados de P-R e amplitude da onda P registrados no ECG em cães.
Repouso sinusal e bloqueio sinoatrial (SA) – No repouso sinusal há uma falha
de geração de impulsos no nódulo SA; com o bloqueio SA há uma falha de
propagação do nódulo SA para o átrio. Eles não podem ser diferenciados clinica-
mente e são tratados similarmente. Podem ocorrer como resultado de tono vagal
excessivo em todas as espécies, e de efeitos reflexos tais como pressão firme nos
olhos (reflexo oculocardíaco) e pressão no seio carotídeo em cães. Em cavalos
normais, um bloqueio SA ocasional ocorre ao repouso e na ausência de anormali-
dade da onda P. Em todas as espécies, episódios repetitivos de bloqueio SA
envolvendo 2 ou mais batidas e bloqueio SA ocorrendo em freqüências cardíacas
acima do normal em repouso, são sugestivos de doenças. O bloqueio SA tem sido
associado com síncope, especialmente em dobermans pinchers, schnauzers mini-
atura, daschunds, cocker spaniels e boxers jovens. Se a síncope for freqüente, o
tratamento com atropina ou isoproterenol pode ser terapêutico, mas freqüentemen-
te é insatisfatório. Existem alguns relatos de “átrio silencioso” em setters ingleses,
nos quais não há atividade atrial (ondas P) no ECG. A ecocardiografia confirma a
ausência de contração do miocárdio atrial.
Bloqueio atrioventricular (AV) – Há uma condução obstruída entre os átrios e
os ventrículos. No bloqueio AV incompleto ou de primeiro grau, o tempo de condução
é aumentado e o diagnóstico pode ser feito por demonstração de um intervalo P-R
aumentado no ECG.
Em bloqueio AV de segundo grau (bloqueio incompleto com batimentos espaça-
dos), impulsos ocasionais falham ao atravessar o nódulo AV e a contração atrial não
é acompanhada por contração ventricular. O bloqueio pode ocorrer a intervalos
regulares, ou ao acaso. Durante o bloqueio, não há o primeiro ou segundo som
cardíaco e não há pulso arterial. Em cavalos, o som associado com contração atrial
(B4) é comumente ouvido e a ocorrência de B4 não acompanhada por outros sons
cardíacos é diagnóstica de bloqueio cardíaco de segundo ou terceiro grau. B4 também
pode ser audível em cães. Em todas as espécies, uma onda jugular atrial pode ser
observada durante o bloqueio. Quando os intervalos P-R que precedem o batimento
perdido alongam-se progressivamente, o problema é conhecido como bloqueio do
Tipo I de Wenckebach ou Mobitz. Se os intervalos P-R não se alteram, o problema é
chamado de bloqueio do Tipo II de Mobitz. O diagnóstico definitivo é feito por ECG.
Em bloqueio cardíaco completo ou de terceiro grau, nenhum dos impulsos é
conduzido do átrio aos ventrículos. O ritmo ventricular é estabelecido a partir de um
nódulo ectópico ou marca-passo ventricular que descarrega a uma freqüência mais
lenta que o nódulo SA e o átrio e os ventrículos batem independentemente. A
freqüência cardíaca e o pulso são regulares, mas há uma bradicardia pronunciada
que é relativamente não responsiva a fatores, tais como exercício e excitação, que
normalmente aumentam a freqüência cardíaca. A diferença entre os ritmos de
contração atrial e ventricular provoca variações no preenchimento ventricular e
posicionamento variado das válvulas atrioventriculares, com variação na intensi-
dade da B1 e na amplitude do pulso arterial. Periodicamente, o átrio contrai-se
quando o ventrículo está em sístole, resultando em grandes pulsações na veia
jugular. Em alguns animais, as contrações atriais mais rápidas podem ser
detectadas com um estetoscópio.
Cardiopatias 52

O significado do bloqueio AV varia de espécie para espécie. Ambos os bloqueios,


de primeiro e segundo graus AV, podem estar presentes sem sinal clínico evidente
de cardiopatias. O bloqueio AV de primeiro grau pode resultar de excessivo tono
vagal e, geralmente, não é considerado significante no cão e no cavalo, a menos que
outra evidência de cardiopatia esteja presente. Em todas as espécies, o bloqueio AV
de segundo grau pode ser indicativo de cardiopatia. Contudo, no cavalo ocorre mais
comumente como resultado de tono vagal alto. É detectado a freqüências cardíacas
de repouso < 40bpm, e semelhante ao bloqueio SA, pode ser induzido ou abolido
por manobras que diminuem o tono vagal. O bloqueio AV completo é sempre
anormal e o prognóstico é grave. Freqüentemente está associado à síncope,
especialmente com exercício ou excitação.
O bloqueio AV pode ser causado por fibrose, neoplasia ou outras lesões no
nódulo AV ou pode ser secundário a influências tóxicas, eletrolíticas ou hipóxicas
sobre sua estrutura. O tratamento deve, primeiramente, corrigir a causa desenca-
deante. Bloqueio cardíaco completo, geralmente está associado com lesões irrever-
síveis. A terapia antiarrítmica geralmente é restrita a animais com bloqueio cardíaco
completo e visa aumentar a freqüência cardíaca pelo uso de atropina, probantina ou
isoproterenol. A terapia com drogas acha-se com sucesso limitado, e o único
tratamento cabível, para bloqueio cardíaco completo, é a instalação de um marca-
passo eletrônico. Estes aparelhos, quando instalados corretamente, podem melho-
rar a vida de animais que sofrem de síncopes relacionadas à arritmia. Apenas
geradores de pulso que percebam a ocorrência da despolarização ventricular
natural devem ser utilizados. Se um bloqueio AV desenvolve-se durante uma terapia
com digitálico, deve ser considerada a toxicidade digitálica.
O bloqueio do ramo de Bundle e a síndrome de Wolff-Parkinson-White são condições
anormais raras. Têm sido observadas em animais, mas podem ser diagnosticadas
somente por eletrocardiografia. Seu significado nos animais ainda não foi estabe-
lecido, porém no homem, podem predispor a certas arritmias ventriculares.
Contrações prematuras – Contrações prematuras ou ectópicas surgem a partir
de um foco irritante, dentro do tecido de condução ou miocárdio. Contrações ectó-
picas atriais e ventriculares podem resultar de doença primária do miocárdio ou
ocorrer secundariamente a efeitos tóxicos, anóxicos ou eletrolíticos. Estas arritmias,
especialmente as dos batimentos ectópicos ventriculares, são as irregularidades
mais comumente observadas na presença de cardiopatia. Contrações ectópicas
são sempre indicativas de anormalidade do miocárdio, mas há alguma dúvida
quanto ao significado clínico da contração ectópica não freqüente, que é auscultada
ocasionalmente durante exame, em todas as espécies, quando não houver outra
evidência de cardiopatia. Contrações prematuras ocasionais não requerem terapia
antiarrítmica específica e o tratamento é dirigido à correção da causa principal. Os
glicosídios digitálicos devem ser utilizados com cautela em todas as ocasiões.
Devemos ter um cuidado especial quando existem despolarizações ventriculares
prematuras. Taquicardias resultantes de descargas repetitivas podem requerer
terapia antiarrítmica específica. A toxicidade dos digitálicos sempre deverá ser
considerada uma causa, quando as contrações ectópicas desenvolverem-se duran-
te uma terapia digitálica.
Taquicardias supraventriculares – A atividade do marca-passo pode ocorrer
no nódulo sinusal, átrio, ou nódulo AV e é necessário um ECG para diferenciação.
As freqüências cardíaca e de pulso são rápidas, mas geralmente regulares. A
taquicardia sinusal ocorre normalmente com exercício ou excitação, mas também
com febre, anemia, hipertermia, toxemia e choque. As taquicardias atrial e
juncional ocorrem na presença de doença do miocárdio atrial. São freqüentemente
de natureza paroxística e caracterizadas por períodos de contrações rápidas,
normalmente regulares, que começam e param repentinamente. Pode ocorrer
Cardiopatias 53

síncope. Freqüentemente, elas são observadas em conjunto com contrações atriais


prematuras, e sua associação mais comum no cão é com fibrose valvular mitral
crônica que leva à dilatação do átrio esquerdo.
As taquicardias supraventriculares podem ser eliminadas por fatores que aumen-
tem o tono vagal, como digitálicos e pressão no seio carotídeo ou ocular, o que inicia
o reflexo oculocardíaco. Em indicações bem definidas e sob monitoração cuidado-
sa, os vasopressores, o propranolol e os agentes bloqueadores do canal do cálcio
(como o diltiazem ou o verapamil) podem ser úteis nas arritmias supraventriculares
refratárias. As dosagens precisas para cães e gatos ainda não foram estabelecidas.
Taquicardias ventriculares – Estas partem de um ou mais marca-passos
ectópicos dentro do miocárdio ventricular. Quando a descarga for consideravelmen-
te mais rápida do que aquela do nódulo SA, o marca-passo ectópico predomina e
as freqüências cardíaca e do pulso são rápidas e normalmente regulares. Quando
a freqüência do marca-passo ectópico se aproxima da do nódulo SA, ambos os
marca-passos podem influenciar o coração e pode haver uma forte irregularidade
no ritmo. Há marcada variação na intensidade dos sons do coração, da batida do
ápice e do pulso arterial, e um déficit do pulso pode estar presente. Freqüentemente
a arritmia é espasmódica. Há complexos QRS bizarros característicos no ECG.
Taquicardias ventriculares ocorrem com doença primária do miocárdio e são
comuns nos estados terminais de falha cardíaca. Podem também ser induzidas por
desequilíbrio de eletrólitos, toxicidade aguda e distensão gástrica ou trauma em
cães. Quando a função cardíaca já está comprometida pela insuficiência miocárdica
ou função anormal da válvula, há severa dispnéia e fraqueza, e a síncope pode estar
associada com taquicardias paroxísticas. Outros sinais de falhas cardíacas agudas
ou crônicas podem estar presentes. Quando a contratilidade é deprimida e a pressão
de enchimento está alta, taquicardias ventriculares progridem para fibrilação ventri-
cular. Lidocaína EV pode ser usada para controle imediato de uma taquiarritmia com
risco de vida, enquanto os níveis sangüíneos de quinidina ou procainamida estão
sendo estabelecidos. Deve ser evitada a excitação do paciente. Em situações menos
graves, somente a quinidina oral pode ser suficiente. O tratamento dirigido à correção
da causa predisponente é essencial (ver MIOCÁRDIO, adiante).
Fibrilação atrial – É caracterizada por um ritmo cardíaco irregular e rápido. A
despolarização e a repolarização atrial ocorrem sobre numerosas frentes e não há
contração atrial coordenada. A estimulação do nódulo AV ocorre freqüentemente,
mas de uma forma aleatória para resultar em uma freqüência cardíaca rápida e
fortemente irregular. A irregularidade produz variação no período de preenchimento
diastólico entre os batimentos e conseqüentemente, variação na intensidade dos
sons cardíacos e amplitude do pulso arterial. Com períodos diastólicos excepcional-
mente curtos, há preenchimento insuficiente dos ventrículos para produzir um pulso
arterial após contração ventricular. Em rápidas freqüências cardíacas, isto produz
uma freqüência de pulso que é consideravelmente mais baixa que a freqüência
cardíaca (déficit de pulso). O diagnóstico definitivo é dado pelo ECG, que mostra
ondas P substituídas por ondas rápidas e uma absoluta irregularidade nos intervalos
R-R. Em cães, a fibrilação atrial com altas freqüências cardíacas é indicativa de
doença cardiovascular grave. Ocorre em síndromes que produzem dilatação e
hipertrofia atrial e é um achado terminal comum da fibrose valvular mitral crônica.
Também ocorre em miocardiopatia dilatada idiopática e miocardiopatia hipertrófica,
sendo mais comum em raças gigantes (e ocorre com cardiopatia de base menos
intensa). Devido ao fato de esta arritmia não ocorrer com freqüência até o estágio
tardio das doenças cardíacas em cães, o tempo de vida raramente é > 1 ano. O
tratamento deve objetivar a diminuição do ritmo ventricular, normalmente com
glicosídios digitálicos, bloqueadores do canal do cálcio e β-bloqueadores adminis-
trados para retardar a condução através do nódulo AV. O propósito é diminuir o ritmo
Cardiopatias 54

cardíaco até um ritmo aceitável e eficiente, se possível eliminando o déficit do pulso,


assim como aumentar a eficiência do miocárdio. As doses e combinações de drogas
devem ser ajustadas de acordo com o ritmo cardíaco desejado e de modo a evitar
a intoxicação. A conversão com quinidina não apresenta probabilidade de sucesso,
exceto em cães jovens de raças grandes que não apresentam doença cardíaca
grave subjacente. A conversão elétrica algumas vezes é bem-sucedida, mas o
prognóstico a longo prazo é ruim, devido à cardiopatia subjacente que iniciou o
quadro.
Em ruminantes, a fibrilação atrial é algumas vezes espasmódica em associação
com distúrbios do trato gastrointestinal, mas também ocorre como uma seqüela de
cor pulmonale ou com doença cardíaca.
Em cavalos, como em outras espécies, a fibrilação atrial pode ocorrer em
conjunto com outras cardiopatias, tais como insuficiência mitral, caso em que ela se
estabelece como uma taquiarritmia. Também pode ocorrer na aparente ausência de
sérias doenças cardíacas predisponentes, e, em cavalos com elevado tono vagal,
pode se estabelecer com uma bradicardia. Há forte irregularidade do ritmo cardíaco
e variação na intensidade do som cardíaco e amplitude de pulso, mas não déficit de
pulso. Quando a freqüência de repouso estiver entre 26 e 48bpm, pode haver
poucos sinais de inabilidade cardíaca, exceto com exercício intenso. A freqüência
cardíaca aumentará em resposta a exercício moderado. Em freqüências muito
baixas podem decorrer vários segundos entre alguns batimentos e pode haver
síncope. A fibrilação atrial ocorre mais comumente em cavalos de tração e outros
cavalos de grande porte. Ocorre em cavalos de corrida em associação com uma má
performance, podendo ser espasmódica. A fibrilação atrial com uma freqüência
cardíaca baixa, de repouso, não é incompatível com a vida longa, mas cavalos
afetados não devem ser utilizados para corrida. A conversão com quinidina pode ser
utilizada e é freqüentemente acompanhada por um retorno ao bom desempenho em
animais de corrida. Os maiores sucessos ocorrem quando a conversão for atingida,
dentro de um curto período, a partir do período inicial de instalação.

Hipertrofia cardíaca
Qualquer aumento na resistência sistêmica ou pulmonar, como hipertensão
sistêmica ou cor pulmonale, leva a hipertrofia ventricular esquerda ou direita,
respectivamente. Animais que sofrem de doença pulmonar crônica desenvolvem
uma hipertrofia ventricular direita devido ao aumento da pós-carga no ventrículo
direito. Tanto a hipertrofia ventricular esquerda quanto a direita parecem ser
progressivas, mas a restrição do exercício pode diminuir a progressão. Em eqüinos,
a progressão também pode ser retardada evitando-se a exacerbação da laminite,
no caso da hipertrofia ventricular esquerda, e evitando-se a provocação alérgica de
cor pulmonale (enfisema eqüino) no caso da hipertrofia ventricular direita.
É importante que se evite o estresse metabólico, ambiental, de exercício ou de
transporte nas laminites crônicas para impedir episódios hipertensivos agudos; por
outro lado, é essencial no manejo de cavalos com uma árvore pulmonar sensibili-
zada, que se evitem ambientes empoeirados ou alimentos embolorados. Em cães
e gatos com hipertensão arterial sistêmica devida a um problema renal, a redução
da pressão arterial com anti-hipertensivos pode se mostrar útil.
A hipertrofia cardíaca em resposta a anomalias congênitas, como a estenose
aórtica e pulmônica ou duto arterioso patente e em resposta a doenças adquiridas,
como a dirofilariose em cães, também pode ser reconhecida clinicamente. Em cães,
os critérios de ECG para a hipertrofia ventricular direita estão razoavelmente bem
estabelecidos, enquanto os critérios para hipertrofia ventricular esquerda são muito
menos confiáveis. Nas outras espécies domésticas ainda não foram estabelecidos
critérios de ECG confiáveis para a hipertrofia das câmaras cardíacas.
Cardiopatias 55

Insuficiência cardíaca
Quando uma doença do coração ou outro órgão resultar em uma redução da
reserva cardíaca, o coração pode ser incapaz de atingir os requerimentos do corpo
em todas as circunstâncias. Quando a redução na reserva for tal que a diminuição
da função cardíaca ocorra somente sob condições extremas de exercício, existe um
estado de insuficiência cardíaca relativa. Com o aumento da perda da reserva,
ocorre aumento do grau de severidade, e quando o coração não puder preencher
sua função em termos da atividade do dia a dia, existe insuficiência cardíaca. A
insuficiência cardíaca pode resultar de um problema primário do miocárdio reduzin-
do a eficiência da função miocárdica. Também pode resultar de qualquer fator que
aumente a carga de trabalho do coração, e portanto, diminua a reserva cardíaca. As
causas comuns incluem doenças que produzem um excesso de pressão sobre o
coração, tais como estenose das válvulas de saída ou hipertensão arterial pulmonar
ou sistêmica, e anormalidades que causam uma sobrecarga de volume sobre o
coração, tais como insuficiência valvular, desvios intracardíacos da esquerda para
a direita (defeitos de septos – “shunts”), ou desvios extracardíacos, tais como duto
arterioso patente, ou desvios arteriovenosos periféricos (“shunts” arteriovenosos).
Causas menos comuns de redução da reserva cardíaca e conseqüentemente
insuficiência cardíaca incluem doenças que produzem distúrbios de preenchimento,
tais como efusões pericárdicas e estenose das válvulas AV, bloqueio cardíaco
completo, e redução na reserva arteriovenosa de oxigênio em anemia grave. Em
todas as formas de insuficiência cardíaca crônica geralmente há perda de reserva
de fluxo coronário resultante de hipertrofia ou dilatação cardíaca. A insuficiência
do coração em bombear o sangue adequadamente resulta em um aumento no
volume diastólico final e em uma pressão venosa aumentada. Também ocorre a
retenção de sódio e água, provavelmente como resultado de uma perfusão renal
inadequada e liberação aumentada de renina, que causa elevação da angioten-
sina e, conseqüentemente aumento da sede, vasoconstrição e retenção de sal e
água.
Clinicamente, a insuficiência cardíaca pode ser reconhecida como sediada no
lado esquerdo, no lado direito, ou generalizada. Quatro fases de descompensação
cardíaca são genericamente reconhecidas nos animais domésticos. Fase I, a fase
compensada, é assintomática; a cardiomegalia pode ser o único sintoma. Na Fase
II, alguns sintomas clínicos são observados após o exercício, como tosse e
tolerância reduzida ao exercício. Na Fase III a descompensação está presente
durante atividades mínimas; observamos edema pulmonar ou sintomas radiológi-
cos mais sutis e a intolerância ao exercício é marcante. A Fase IV é o estágio de
franca descompensação, marcado por sintomas associados a baixo débito cardíaco
(como caquexia), complicados por edema pulmonar e grande dispnéia em repouso;
o animal normalmente está em risco de morte súbita. À medida que se desenvolve
uma insuficiência localizada do lado esquerdo, diminuirá a tolerância ao exercí-
cio e ocorrerá dispnéia inadequada após o exercício e excitação. A pressão venosa
pulmonar aumentada resulta inicialmente em congestões pulmonar e bronquial e
em broncoconstrição reflexogênica (asma cardíaca). A tosse repetitiva após o
exercício e especialmente à noite tem sido vista em cães. A tosse é seca e
entrecortada. Ortopnéia com relutância em deitar, inquietação à noite, e ataques
espasmódicos de dispnéia também são comuns. Com uma insuficiência mais
severa, são evidentes o edema pulmonar com dispnéia severa ao repouso e
estertores à auscultação.
A insuficiência cardíaca localizada do lado direito é manifestada por conges-
tão venosa sistêmica. As veias jugulares estão ingurgitadas. Fígado e baço estão
aumentados e podem ser palpáveis em cães. Nos bovinos o fígado pode tornar-se
palpável atrás do arco costal direito, e pode ser aparente à examinação retal no
Cardiopatias 56

cavalo um notável ingurgitamento esplênico e venoso. Ocorre retenção de fluidos


em todas as espécies, mas as áreas de ocorrência variam. Em cães, a ascite é mais
comum e ocorre geralmente antes do desenvolvimento de edema subcutâneo,
hidrotórax ou hidropericárdio. Em gatos, hidrotórax é geralmente predominante. Em
grandes animais é mais comum o edema subcutâneo dependente. Em bovinos,
ocorre especialmente na região submandibular e no peito, enquanto em cavalos, ele
tende a iniciar na região prepucial ou mamária. Edema de membro, ascite, e
hidrotórax também ocorrem. Hidrotórax deve ser suspeitado quando houver um
abafamento dos sons do coração e respiratórios na parte ventral do tórax, com uma
redução em ressonância na percussão. Hidropericárdio produz abafamento dos
sons do coração e, quando intenso, produzirá um defeito no preenchimento e uma
pressão de pulso baixa. Ambos podem resultar em um ECG de baixa amplitude. A
presença de ascite, hidrotórax ou hidropericárdio pode ser confirmada pela aspira-
ção de fluido com uma agulha, com subseqüente análise do mesmo. A radiografia
e especialmente a ecocardiografia são métodos não invasivos úteis ao diagnóstico
de fluido nas cavidades do corpo, particularmente peito e pericárdio. Também
poderão ocorrer distúrbios na função gastrointestinal com diarréia devido à drena-
gem venosa reduzida do trato intestinal.
Na insuficiência cardíaca generalizada ocorrem sinais de ambas as insuficiên-
cias, direita e esquerda. Os achados na auscultação variam, dependendo da causa
inicial. Radiografia é um auxílio considerável ao diagnóstico do aumento do coração,
mas uma diferenciação entre hipertrofia e dilatação cardíaca é possível somente por
ecocardiografia.
Tratamento – Um primeiro intento na terapia na insuficiência cardíaca conges-
tiva é eliminar o edema, melhorar o estado contrátil do miocárdio e regular o ritmo
e a velocidade. O propósito da terapia convencional é reduzir o trabalho do coração
(restrição de exercício), reduzir o consumo de sódio, aumentar a eliminação de sódio
(e água) pelo uso de diuréticos, fortalecer o coração através de agentes inotrópicos
positivos (glicosídios digitálicos, milrinona, dobutamina, etc.), e diminuir a carga no
ventrículo com o uso de vasodilatadores.
Nos cães, a dieta pode ser balanceada para diminuir a ingestão de sódio. Dietas
pobres em sódio adequadas estão disponíveis comercialmente. Muitos alimentos
enlatados para cães contêm sódio em excesso (alimentos de origem animal contêm
muito sódio). Alimentos pobres em sal incluem vegetais frescos ou congelados sem
sal, cereais à base de trigo, arroz polido ou integral, leite dialisado e refeições com
óleo de soja. Carne, peixe e aves devem ser limitados assim como leite e derivados,
embora esses alimentos sejam usualmente tolerados desde que não seja usado sal
na sua preparação. Suprimentos públicos de água usualmente não contêm muito
sódio, porém água de poço e água leve podem ter teor mais elevado de sódio. A água
destilada ou deionizada pode ser útil nos casos que atingiram o estágio intratável de
insuficiência cardíaca.
O uso de diuréticos para aumentar a eliminação de sódio (e água) é importante
e permite a liberalização de sódio na dieta, a fim de que a palatabilidade possa ser
preservada. Em cães, os diuréticos mais eficientes são furosemida e derivados da
clorotiazida. A drenagem de fluido ascítico por abdominocentese é indicada somen-
te quando o volume interferir marcadamente na respiração e necessária para
conforto do animal. A retirada de líquido ascítico resulta em perda de proteína sérica
e o fluido abdominal é logo substituído se a compensação cardíaca e diurese não
apresentarem melhoras por terapia medicamentosa.
Glicosídios digitálicos diminuem a freqüência cardíaca e aumentam a força da
contração miocárdica. Embora o repouso, a restrição de sódio, e os diuréticos sejam
adjuvantes úteis à terapia medicamentosa da insuficiência cardíaca congestiva, os
digitálicos continuam sendo o agente terapêutico primário na medida em que agem
Cardiopatias 57

diretamente sobre a insuficiência (ver INOTRÓPICOS POSITIVOS NOVOS, VASODILATADO-


RES E D IURÉTICOS, adiante). Digitalização é raramente feita em outros animais além
de cães e gatos. Vários produtos digitálicos estão disponíveis no mercado, mas o
glicosídio digoxina é utilizado com maior freqüência. A digoxina é fornecida nas
formas VO e parenteral. A dosagem depende do fabricante, da forma (tablete, elixir),
e da situação gastrointestinal e renal do animal.
A digitalização é obtida quando os níveis teciduais são suficientes para produzir
ação terapêutica plena. Em geral, a droga deve ser administrada até que os níveis
terapêuticos sejam obtidos, o que é indicado pela melhora dos sintomas clínicos de
insuficiência cardíaca congestiva. Como a razão entre a dose terapêutica e a dose
tóxica é estreita em cães e gatos, estas drogas devem ser administradas com
cautela. Regimes antigos, que visavam atingir rapidamente as concentrações nos
tecidos, quase invariavelmente provocavam intoxicação; a administração rápida e
intensiva não é recomendada.
Administração de glicosídios digitálicos – O procedimento mais seguro é a
digitalização lenta, com uma dose diária de manutenção de digoxina de 0,01 a
0,02mg/kg, divididas em duas vezes ao dia. A digitalização geralmente é obtida em
3 a 5 dias. Cães maiores (> 16kg) necessitam de menos digoxina, dependendo da
relação peso/superfície corporal (PSC). A relação PSC em m2 é determinada pela
fórmula: PSC = kg2,3 × 0,112, ou pode ser encontrada em tabelas nos textos
veterinários padrão. Utilizando este método, a dose de manutenção é de 0,22mg/m2
de PSC, duas vezes ao dia. A concentração sérica terapêutica de digoxina em cães
deve estar entre 1 e 1,5ng/mL para diminuir a probabilidade de intoxicação mas
ainda produzir plenamente o efeito inotrópico; valores > 2ng/mL podem ser tóxicos.
A análise do soro deve ser realizada 8h após a última dose.
No edema pulmonar agudo fulminante, a furosemida (2 a 4mg/kg [cães]) é a
maneira mais eficiente de reduzir rapidamente o volume sangüíneo pulmonar e a
pressão de preenchimento ventricular, uma vez que (como a nitroglicerina) ela age
em , 30min mudando o sangue do pulmão para as veias periféricas.
Toxicidade digitálica – Como a tolerância individual aos glicosídios digitálicos
varia amplamente, o paciente deve ser observado cuidadosamente, procurando-se
por sinais de intoxicação, particularmente no período inicial da digitalização.
Anorexia e depressão são os sinais mais comuns. Diarréia suave é um sinal inicial
comum da intoxicação, mas não exige suspensão da droga. Entretanto, vômitos,
depressão, anorexia ou início de arritmias cardíacas são sinais da necessidade de
se suspender imediatamente a terapia de digitalização. Raramente ocorre um
aumento no intervalo P-R, e é um sinal do efeito dos digitálicos, mas não necessa-
riamente de toxicose. O agravamento de batimentos ventriculares prematuros pode
também ser observado. Quando ocorre intoxicação, o digitálico deve ser imediata-
mente suspenso, permitindo-se um intervalo de 24 a 48h para sua excreção e
regressão dos sintomas tóxicos; a terapia pode ser então reiniciada em uma
dosagem menor – normalmente 50 a 75% da utilizada anteriormente. Uma terapia
concomitante com diuréticos, esteróides ou distúrbios gastrointestinais pode
potencializar a hipocalemia, o que acentua a toxicidade dos digitálicos. As taquiar-
ritmias graves associadas à intoxicação por digitálicos podem exigir terapia antiar-
rítmica específica mas, felizmente, raramente ocorrem.
Inotrópicos positivos novos, vasodilatadores e diuréticos – Os glicosídios
digitálicos são efetivos, mas relativamente fracos inotrópicos positivos com um
princípio tóxico baixo. Em insuficiência cardíaca esquerda grave e aguda, a
contratilidade cardíaca é mais efetiva e seguramente suportada por dobutamina EV
(4 a 11µg/kg/min). Os efeitos pressores e cronotrópicos de dobutamina são
usualmente não evidentes a esses níveis de dosagem. A premissa mais urgente no
tratamento do edema pulmonar agudo é diminuir a pressão de preenchimento do
Cardiopatias 58

ventrículo esquerdo. Somando-se ao diurético de ação rápida (por exemplo,


furosemida), a administração EV do vasodilatador, nitroprusseto de sódio (4µg/kg/min,
aumentando-se a intervalos de 15min por 0,2µg/kg/min) para efeito pode funcionar
como pivô no tratamento. O efeito dilatador balanceado (venoso e arterial) desta
droga reduz a pressão de preenchimento enquanto facilita o esvaziamento ventri-
cular. Se uma infusão EV contínua não puder ser instituída, pomada de nitroglicerina
(ou emplastros) pode ser aplicada à pele para alcançar resultados semelhantes,
mas menos imediatos. A dose da pomada de nitroglicerina é empírica (,1cm/5kg).
Se continuada, a aplicação deve ser em dias alternados para evitar o desenvolvi-
mento de tolerância. Outros agentes vasodilatadores de ação direta como o dinitrato
de isosorbida, a hidralazina, o minoxidil, ou agentes bloqueadores α-adrenérgicos
como a fenoxibenzamina, podem também ser considerados parte da terapia para a
insuficiência do miocárdio.
Tratamento de ICC pode ser facilitado pelo uso de vasodilatadores balanceados
ativos orais como captopril ou enalapril (inibidores da enzima de conversão da
angiotensina). Aumento do BUN e da creatinina pode ocorrer com o uso do captopril.
Em estágios mais adiantados de miocardiopatia dilatada, o coração pode ser
incapaz de responder a estimulação inotrópica, e a modificação das condições de
carga pode ser a única maneira de melhorar a função cardíaca. Milrinona (não
disponível comercialmente), um análogo administrado VO da amrinona tem proprie-
dades combinadas, inotrópicas e vasodilatadoras, que fazem dela uma droga
especialmente útil para o tratamento de pacientes com insuficiência cardíaca em
ritmo sinusal. Se fibrilação atrial existir, a digoxina também será necessária.
Cor pulmonale é a denominação dada à cardiopatia secundária à doença
pulmonar. Hipertensão pulmonar leva a resistência vascular pulmonar direita
aumentada, hipertrofia e dilatação ventriculares; e em casos severos, CHF pode
ocorrer. Cor pulmonale é comum em caprinos seguida de pneumonia enzoótica e
em cães mais comumente em associação com dirofilariose crônica. No bovino que
pasta em grandes altitudes, hipertensão pulmonar ocorre em alguns animais com
conseqüente RCHF (ver DOENÇA DAS ALTAS MONTANHAS, pág. 765). Cor pulmonale
também resulta de doença pulmonar obstrutiva crônica ou enfisema nos eqüinos e
deve ser considerado ao exame de qualquer animal com doença respiratória e
DPOC. Dilatação cardíaca pode ser suficiente para resultar em insuficiência da
válvula tricúspide.

Endocárdio
Endocardite, geralmente de origem bacteriana, mais comumente envolve o
endocárdio valvular. Endocardite mural dos átrios ocorre na uremia dos cães.
Endocardite mural aguda de outras causas é ocasionalmente observada à necrop-
sia, mas é raramente detectada clinicamente. Endocardite valvular geralmente
segue um período prolongado de bacteremia subclínica e é com freqüência
secundária a condições, tais como piemia crônica, mastite, metrite e prostatite.
Streptococcus, Erysipelothrix rhusiopathiae e Corynebacterium pyogenes são os
microrganismos mais comumente envolvidos. Nos cavalos, larvas de estrôngilos
migrantes podem produzir tanto endocardite mural como valvular. As válvulas mitral,
tricúspide e aórtica (mas raramente a pulmonar) podem ser afetadas em todas as
espécies. Nos bovinos, a tricúspide é a mais freqüentemente envolvida; nas
outras espécies, endocardite das válvulas aórtica e mitral é mais comum. Indepen-
dentemente da válvula envolvida, o resultado é a contração das bordas livres das
válvulas e insuficiência valvular. Ocasionalmente, estenose de algumas válvulas e
insuficiência de outras ocorrem concomitantemente. Grandes lesões de aspectos
vegetativos são comuns com endocardite envolvendo as válvulas AV. Os achados
clínicos na endocardite se relacionam àqueles de septicemia crônica e embolismo
Cardiopatias 59

e a sinais resultantes primariamente de anormalidades valvulares. Há sempre


história de boa disposição com períodos de indisposição mais severa. O animal
pode estar em más condições com pêlo áspero. Uma febre baixa está geralmente
presente, mas durante episódios mais agudos, pode ocorrer febre alta. Pode haver
evidências de bacteremia crônica e embolismo. No bovino, tenossinovite, artrite e
evidências de infarto renal na urinálise podem estar presentes. Sinais relacionados
a danos valvulares dependem da válvula envolvida. Com a insuficiência da válvula
tricúspide ocorre um murmúrio pansistólico mais audível do lado direito, acima da
base do coração e normalmente um pulso jugular.
Geralmente, há um pulso jugular sistólico pronunciado e insuficiência cardíaca
direita com congestão venosa generalizada. Endocardite da válvula mitral está
associada com um murmúrio pansistólico mais audível acima do ápice do coração
do lado esquerdo e irradiando-se dorsalmente. Sinais de dispnéia e insuficiência
esquerda podem-se desenvolver. Insuficiência aórtica, que ocorre mais freqüen-
temente em pastores alemães e raças maiores, produz um murmúrio diastólico
mais audível acima da base do coração do lado esquerdo. O pulso arterial tem
uma grande amplitude. Insuficiência esquerda pode-se desenvolver. Com endo-
cardite bacteriana aguda ocorre, geralmente, uma pronunciada leucocitose.
Cultura sangüínea deve ser realizada. O prognóstico da endocardite é reservado,
especialmente quando sinais de insuficiência cardíaca congestiva estiverem
presentes. Requer-se terapia antibacteriana prolongada para controlar a infec-
ção e, quando possível, deve-se ter base em testes de sensibilidade. A remissão
é comum. Mesmo com a infecção controlada, podem ocorrer danos residuais à
válvula e o tratamento contínuo para a insuficiência cardíaca é geralmente
necessário.
Fibrose valvular crônica (endocardiose) – Fibrose crônica e espessamento
nodular das válvulas AV, com subseqüente distorção e função defeituosa, são as
causas mais comuns de cardiopatia em cães. A válvula mitral é, em geral, mais
severamente afetada do que a tricúspide e a lesão resulta em regurgitação. A causa
é desconhecida. O aparecimento da fibrose valvular ocorre relativamente cedo (, 4
a 5 anos) e o murmúrio sistólico associado pode ser detectado incidentalmente
durante o exame clínico por outras razões. Na maioria dos casos as lesões não
produzem sinais externos de anormalidades até que sinais de insuficiência cardíaca
se desenvolvam durante a meia-idade ou mais tarde e o cão geralmente tem uma
tolerância a exercícios diminuída e pode haver relatos de tosses após exercícios ou
excitação. Freqüentemente, há uma história de tosses noturnas que é repetitiva e
seca. Menos comumente, a queixa inicial do proprietário é uma distensão abdominal
ou edema pulmonar agudo. Há um murmúrio pansistólico, geralmente de Grau III,
ou mais alto, associado com insuficiência mitral ou tricúspide, ou ambas, além dos
sinais de insuficiência cardíaca. Um terceiro som cardíaco pode ser proeminente em
casos avançados. Evidências radiográficas de aumento atrial esquerdo e ventricular
e congestão pulmonar ou aumento biventricular podem ser observadas. As caracte-
rísticas clínicas podem ser muito similares à miocardiopatia dilatada, mas o
ventrículo esquerdo hipercinético da regurgitação mitral pode ser facilmente distin-
guido do ventrículo miopático hipodinâmico pela ecocardiografia. Não há mudanças
eletrocardiográficas típicas, mas evidências de aumento cardíaco podem estar
presentes. Aumento do átrio esquerdo e lesões vasculares predispõem a batimen-
tos atriais prematuros, os quais podem progredir para taquicardia atrial espasmódi-
ca e fibrilação atrial. Batimentos ventriculares prematuros ocorrem em estágios
avançados de insuficiência cardíaca. Seqüelas intratáveis são ruptura atrial esquer-
da com tamponamento pericárdico e ruptura das cordoalhas tendíneas, ambas
produzindo insuficiência cardíaca aguda. Cães com sinais iniciais leves podem
responder à terapia de restrição de sal e diuréticos ou redução pós-carga, mas
Cardiopatias 60

outras formas de terapia são indicadas para tratamento e controle em casos severos
à medida que a insuficiência miocárdica se desenvolve (ver INSUFICIÊNCIA CARDÍACA,
anteriormente).
Fibrose valvular crônica ocorre muito menos comumente em outras espécies,
mas lesões na válvula AV são observadas em cavalos idosos e bovinos, as quais
produzem um murmúrio audível, ocasionalmente, resultando em insuficiência
cardíaca clínica.
Cistos hemáticos valvulares ou hematomas são observados em mais de 75%
dos bezerros jovens < 3 semanas de idade. As válvulas AV são mais comumente
afetadas. Estas lesões são também vistas em jovens de outras espécies e seu
significado é desconhecido.
Hemorragias subendocárdicas são vistas na septicemia e toxemia e são
comumente observadas em animais submetidos à sangria ou após eutanásia com
pentobarbital sódico.

Miocárdio
Disfunções miocárdicas podem resultar de doenças miocárdicas primárias ou
podem ser secundárias às influências tóxicas ou metabólicas e a anormalidades
eletrolíticas. Mudanças degenerativas podem ocorrer em cordeiros, bezerros e
potros com doença do músculo branco; em suínos com doença do coração em
amora e hepatose dietética e em cavalos com mioglobinúria paralítica e após
picadas de cobra – particularmente cascavéis.Também ocorrem nas deficiências
graves de ferro, na deficiência de cobre e em intoxicação associada a selênio,
arsênio e ferro injetáveis.
A miocardite pode acompanhar infecções gerais de bactérias, vírus, parasitas e
protozoários em todas as espécies. É comum em doenças septicêmicas e em
infecções piêmicas em animais jovens. Miocardite significante acompanha infecção
com encefalomiocardite, vírus da aftose e vírus da doença da língua azul em animais
jovens. A miocardite pode ocorrer também na anemia infecciosa eqüina, carbúnculo
sintomático, septicemia hemorrágica e doença causada pela S. pullorum . Era uma
freqüente seqüela de infecção por parvovírus em cães jovens, antes da infecção se
tornar estabelecida na população e algumas miocardiopatias crônicas ocorreram
em cães, levando à suposição de que estes animais seriam sobreviventes de uma
miocardite por parvovírus quando filhotes.
Disfunção miocárdica é a causa de morte em envenenamentos com fluoroacetato
de sódio (1.080) e plantas, tais como espirradeira, dedaleira (digital) e Phalaris.
Também ocorre em toxemias agudas, uremia grave, cetoacidose diabética, disfun-
ção adrenocortical e em outras doenças com intenso desequilíbrio eletrolítico,
especialmente aquelas que envolvem potássio ou cálcio.
Infarto do miocárdio é raro em animais domésticos, apesar de ser ocasional-
mente observado em necropsias. Grandes infartos do miocárdio, comuns em
humanos devido à ateriosclerose coronária e obstrução das artérias coronárias
principais, são raros nos animais domésticos. Infartos causados por êmbolos devido
a uma endocardite vegetativa têm causado sintomas clínicos que lembram os do
infarto do miocárdio em humanos. No cão, pequenos focos de necrose miocárdica
em vários estágios de reabsorção e cicatrização são encontrados em associação ao
estreitamento esclerótico de pequenas artérias intramiocárdicas.
Muitas lesões miocárdicas, se extensas o suficiente, produzirão típicas mudan-
ças eletrocardiográficas, como depressão ou elevação do segmento S-T, depressão
da onda T, aumento da duração do QRS, baixa voltagem, registro anormal do
complexo QRS e certas arritmias, tais como fibrilação atrial, batimentos ventricula-
res ectópicos, taquicardia ventricular paroxística e bloqueio AV. Diagnóstico clínico
de miocardite freqüentemente é difícil ou impossível em casos suaves. Os mais
Cardiopatias 61

freqüentes sinais de diagnóstico da inflamação miocárdica ou degeneração são as


mudanças eletrocardiográficas listadas anteriormente, taquicardia fora de propor-
ção para a temperatura, arritmias, cardiomegalia e tolerância a exercício diminuída.
A terapia é geralmente restrita à correção ou tratamento da causa inicial. Bioquímica
sérica pode ser útil no diagnóstico em distúrbios eletrolíticos e metabólicos.
Isoenzimas LDH podem indicar danos miocárdicos. Quando ocorrer arritmia grave,
pode-se indicar terapia específica antiarrítmica (ver pág. 55).
Miocardiopatia idiopática dilatada caracterizada por áreas multifocais de
necrose miocárdica e fibrose com infiltração de células mononucleares ocorre no
cão e no gato. Nos gatos, a miocardiopatia foi associada a um baixo nível plasmático
do aminoácido taurina. A suplementação dietética com taurina aumentou os níveis
plasmáticos, e isto foi associado a um retorno ao normal da função do ventrículo
esquerdo. A maior parte dos fabricantes de ração para gato aumentou o nível de
taurina nos seus produtos e a prevalência da doença diminuiu. Em alguns cães, a
deficiência de L-carnitina foi associada à miocardiopatia dilatada reversível.
No cão, é mais comum em raças gigantes e em machos. Doberman pinschers
machos parecem ser os mais altamente vulneráveis a PVC e miocardiopatia. A
miocardiopatia em desenvolvimento geralmente não é detectada até que ocor-
ram sinais de doença cardíaca severa. Há usualmente fibrilação atrial ou
batimentos prematuros seguindo hipertrofia atrial esquerda. O desenvolvimento
dos sinais clínicos geralmente é rápido e há usualmente uma história de perda
repentina de peso, intolerância ao exercício, dispnéia e distensão abdominal. Há,
com freqüência, uma notável perda da musculatura, especialmente ao longo da
coluna. Os sinais estão associados a insuficiência cardíaca congestiva esquerda
e direita. Há freqüentemente aumento biventricular com dilatação do anel valvular
para produzir um leve murmúrio pansistólico da insuficiência da válvula AV.
Murmúrios não estão necessariamente presentes, e o grau de insuficiência AV
quase sempre é leve. O prognóstico é ruim, e cães afetados raramente vivem por
mais que alguns meses após a manifestação da doença. O tratamento é como
para insuficiência cardíaca de outras etiologias. Propranolol e diltiazem também
podem ser usados, quando o digitálico por si só não é eficaz suficiente para
reduzir o ritmo cardíaco com fibrilação atrial. A extensão da doença miocárdica
pode impossibilitar uma resposta significante às drogas inotrópicas e alteração
de condições de carga ventriculares com drogas vasodilatadoras pode ser o único
tratamento efetivo em estágios adiantados.
Em gatos é comum a síndrome de miocardiopatia hipertrófica. Não há idade
de maior incidência, mas a doença é mais comum em machos. Em gatos jovens,
endomiocardite de causa desconhecida progride para fibrose endomiocárdica
severa e em gatos velhos com hipertrofia ventricular esquerda, dilatação atrial
esquerda e, finalmente, cardiomegalia com formação de trombos aórticos e atriais.
A doença é insidiosa e freqüentemente nenhuma anormalidade é observada até o
aparecimento da insuficiência cardíaca ou da oclusão embólica arterial. Pode
ocorrer histórico de redução do apetite, letargia, dispnéia após exercício e uma leve
e indefinida claudicação. Geralmente, o primeiro sinal observado é o início súbito de
dispnéia ou dificuldades locomotoras dos membros posteriores ou ambas. Dispnéia
é tanto inspiratória como expiratória e resulta da insuficiência cardíaca esquerda.
Congestão pulmonar, edema pulmonar e efusão pleural podem ser detectadas
radiograficamente. O coração pode estar normal à auscultação, mas comumente há
um murmúrio pansistólico associado à dilatação do anel da válvula mitral. Um ritmo
de galope é freqüentemente audível. Exames radiográficos e eletrocardiográficos
mostram evidências de acentuado aumento do átrio esquerdo e, às vezes, aumento
ventricular esquerdo. Doença tromboembólica é comum. A oclusão das artérias
ilíacas costuma resultar em aparecimento repentino de paresia ou paralisia pos-
Cardiopatias 62

teriores. Está presente dor aguda com membros posteriores frios e sem tensão
do gastrocnêmio. O pulso femoral pode estar ausente ou variável entre os
membros posteriores. Tromboembolismo pode envolver outras áreas, como
artérias renais, produzindo infartos renais ou, ocasionalmente, doença renal
severa. O tratamento da miocardiopatia hipertrófica nos gatos baseia-se no uso
de diuréticos e inotrópicos negativos. A acepromazina também tem sido utilizada
nos embolismos, para aumentar os vasos sangüíneos colaterais para os mem-
bros. Para ser efetiva, a cirurgia para remover os êmbolos aórticos deve ser
realizada nas primeiras horas, mas geralmente não é mais eficiente que a terapia
medicamentosa conservadora. A aspirina e outros agentes anticoagulantes
podem diminuir a velocidade de formação de trombos perigosos, especialmente
na bifurcação aórtica. Informações recentemente obtidas sugerem que os digitá-
licos podem ser úteis neste tipo de miocardiopatia devido a sua capacidade de
melhorar a função atrial e portanto a pré-carga ventricular esquerda. Sinais
clínicos similares também ocorrem em gatos com a forma de miocardiopatia
dilatada. Uma distinção segura entre miocardiopatia dilatada e hipertrófica pode
ser feita somente por exame das dimensões do ventrículo esquerdo e índice de
contratilidade através da ecocardiografia.

Pericárdio e seu conteúdo


O pericárdio pode estar congenitamente ausente ou apenas parcialmente
formado. Estas anomalias usualmente não têm significado clínico.
Hidropericárdio pode ocorrer na CHF e hidremia, por exemplo, em parasitismo
com anemia associada. Pericardite com grande efusão sangüínea é uma entidade
clínica que pode ocorrer em cães. Os primeiros sinais clínicos usualmente notados
são dispnéia, fadiga fácil e ascite. Os sinais diagnósticos incluem sons cardíacos
abafados, baixo potencial eletrocardiográfico e, à fluoroscopia, a silhueta cardíaca
é circular e grandemente alargada; pulsações cardíacas não podem ser facilmente
discernidas, ou estão ausentes. Comumente, o ECG mostrará alternação elétrica –
deflexões alternantes em amplitude. Até mesmo pequenas efusões podem ser
identificadas por ecocardiografia bidimensional e modo-M, as quais são mais
definitivas como meios de diagnóstico não invasivo para a condição. A técnica é de
igual valor para animais de campo. O fluido assemelha-se muito ao sangue, mas não
se coagula. É bacteriologicamente estéril e sua remoção resulta em alívio dramático
dos sinais clínicos. A condição pode recidivar.
Efusões semelhantes algumas vezes estão presentes devido a neoplasias no
interior do saco pericárdico (por exemplo, tumores da base do coração e
hemangiossarcomas). Embora as neoplasias primárias no coração sejam extrema-
mente raras, certos processos metastáticos podem invadir o miocárdio provocando
desvios do segmento S-T ou despolarizações ventriculares prematuras. Nos bovinos,
o linfoma pode também invadir as estruturas cardíacas. Isto é difícil de diferenciar de
uma pericardite como seqüela de uma reticuloperitonite traumática (ver pág. 269).
Nestes casos a remoção do fluido é apenas paliativa. O sangue coagulado pode ser
retido em casos de tamponamento pericárdico devido à ruptura do átrio esquerdo ou
ferimentos por objetos penetrantes. Pericardite ocorre em várias doenças infecciosas
de grandes animais, e está associada com reticuloperitonite traumática. A detecção
clínica depende da detecção dos sons cardíacos abafados ou atrito do pericárdio. Se
a efusão pericárdica for acentuada, poderá ocorrer congestão venosa e uma pobre
amplitude de pulso. A ecocardiografia é especialmente útil para confirmar uma efusão
pericárdica ou demonstrar um espessamento no pericárdio. Exame laboratorial do
fluido aspirado do pericárdio é de grande valor para determinar a causa.
Distúrbios Hemostáticos 63

DISTÚRBIOS HEMOSTÁTICOS
Defeitos na hemostasia podem ser herdados ou adquiridos. Hemostasia efetiva
requer uma parede de vaso normal, nível normal de fatores da coagulação
sangüínea e número adequado de plaquetas funcionantes. Plaquetas devem aderir-
se à parede do vaso em locais de ruptura e depois ligar-se umas às outras para
formar um tampão hemostático. Este tampão precisa ser fortificado pela incorpora-
ção de fibrina. Uma deficiência na resposta do vaso, atividade plaquetária ou
geração de fibrina levará a uma hemostasia defeituosa.

DISTÚRBIOS HEREDITÁRIOS
Distúrbios hereditários da parede vascular freqüentemente não estão definidos
nos animais domésticos. Doenças do tecido conjuntivo, tais como a síndrome
Ehlers-Danlos no visom, cães e outras espécies podem resultar em trombocitopenia
vascular.
Vários tipos de deficiências da coagulação sangüínea hereditárias são obser-
vados em animais domésticos. Muitas delas são deficiências ou anormalidades
de um único fator, mas também foram relatados defeitos múltiplos de coagulação.
As hemofilias A e B são herdadas como características ligadas ao sexo e
comumente carreadas pela fêmea e manifestam-se clinicamente apenas no
macho, exceto quando machos hemofílicos forem acasalados com fêmeas
portadoras. A hemofilia A é a coagulopatia hereditária grave mais comum. Todos
os outros conhecidos defeitos hereditários da coagulação sangüínea são trans-
mitidos por características autossômicas.
Os defeitos herdados da coagulação sangüínea que têm sido relatados em
animais domésticos incluem: deficiência de Fator I (fibrinogênio) em cães e
cabras; deficiência de Fator II (protrombina) em boxers, otterhounds e cocker
spaniels ingleses; deficiência do Fator VII (proconvertina) em beagles, bulldogs
ingleses, malamutes do Alasca e mestiços; deficiência do Fator VIII (hemofilia
clássica, hemofilia A), coagulopatia herdada grave mais comum que ocorre em
praticamente todas as raças de cães e em cavalos de raça ou mestiços, bovino
hereford e gatos; deficiência do Fator IX (doença de Christmas, hemofilia B) em
16 raças de cães e em british shorthair, himalaios e em gatos siameses;
deficiência do Fator X (fator de Stuart) em cocker spaniels americanos e em um
mestiço; deficiência de Fator XI em springer spaniels ingleses, grandes pirineus,
weimaraners, kerry blue terriers e nos gado holstein; deficiência do fator de
Fletcher (pré-calicreína) em um poodle; deficiência do Fator XII (fator de Hageman)
em gatos, poodles standard e Pointers alemães de pêlo curto. Em mamíferos
marinhos normais, aves e na maioria dos répteis é natural uma deficiência do
Fator XII, mas não como resultado de uma sangria.
A doença de von Willebrand é um defeito hereditário, relativamente comum, e
relatado em 54 raças de cães de raça pura e em mestiços, gatos, coelhos e suínos.
Dobermans pinschers, pastores alemães, retrievers dourados, schnauzers miniatu-
ra, pembroke welsh corgis, terriers escoceses, pastores de sthetland, basset
hounds, poodles standard e terriers manchesters standard têm uma alta prevalência
da doença (10 a 70%) dentro de suas respectivas raças. A doença é caracterizada
por alta morbidade, baixa mortalidade e uma leve a severa discrasia sangüínea que
com freqüência é exacerbada por estresses físico e psicológico bem como por
doença concomitante (hipotireoidismo, infecção por parvovírus, doença auto-
imune). É um traço autossômico com duas formas de expressão genética e clínica:
1. indivíduos homozigotos nascem de pais heterozigotos assintomáticos (portado-
Distúrbios Hemostáticos 64

res – observados em suínos poland-China, terriers escoceses, shetland sheepdogs


e retrievers da baía de Chesapeake); e 2. a forma mais comum, não completamente
dominante na qual ocorre expressividade variável ou penetrância (homozigotos e
heterozigotos podem manifestar uma tendência a sangramentos). A homozigosida-
de é geralmente letal nesta forma de doença.
O defeito envolve tanto as plaquetas como a função de coagulação (Fator VIII).
Uma diminuição quantitativa no fator de von Willebrand é detectada pela redução no
antígeno do mesmo (FVW:Ag, anteriormente antígeno relacionado ao Fator VIII) ou
no cofator de coaglutinina. Estes são os testes mais diagnósticos. Um decréscimo
funcional no fator é detectado pelos testes sensíveis da função das plaquetas, como
o de tempo de sangramento da mucosa bucal em cães. O fator é necessário para
manter as funções plaquetária e vascular. A diminuição da atividade coagulante
(Fator-VIII-coagulante [VIII:C]) pode ser ocasionalmente detectada pelo tempo de
tromboplastina parcial ativada (TTPA), mas o TTPA freqüentemente é normal na
doença, embora seja o teste mais sensível clinicamente disponível para avaliar a
capacidade do Fator VIII para formar um coágulo.
Os defeitos hereditários da função plaquetária (trombopatias hereditárias) têm
sido relatados em otterhounds, basset hounds, gado simmental e ratos fawn-hooded.
O defeito plaquetário básico difere. Estes distúrbios podem não produzir sinais
clínicos, ou manifestarem-se por aumento na tendência a sangramentos, geralmente
devido às plaquetas reagirem pobremente à estimulação total ou incompleta por
colágeno, difosfato de adenosina e trombina, e assim falharem ao formar um tampão
hemostático adequado. Essas tendências a sangramento são exacerbadas com
freqüência por trauma ou cirurgia. A transmissão é uma característica autossômica.

DISTÚRBIOS ADQUIRIDOS
Podem resultar de diversas causas que afetam componentes específicos do
mecanismo de hemostasia e, exceto em famílias consangüíneas de animais de
companhia e pela doença de von Willebrand, tendem a ser mais comuns em animais
domésticos que os defeitos hereditários. Alterações na parede vascular acompanha-
das por petéquias ocorrem nas mesmas condições que a púrpura eqüina (ver pág.
70) ou em hipoxias da parede vascular devido a circulação precária ou anemia. O
escorbuto (deficiência de vitamina C) em cobaias pode resultar em púrpura vascular.
Distúrbios adquiridos da coagulação sangüínea geralmente envolvem defi-
ciências multifatoriais e podem resultar de síntese defeituosa, utilização exces-
siva ou inibição de um ou mais fatores de coagulação. Certos fatores coagulantes
na circulação sangüínea podem ser deprimidos por agentes na alimentação (ver
I NTOXICAÇÃO POR T REVO DOCE , pág. 2105), por drogas ou por várias doenças,
particularmente aquelas causadoras de dano hepático severo ou moderado .
Rodenticidas anticoagulantes (ver pág. 2089), tais como varfarim e seus compos-
tos mais recentes (brodifacoum, difacinona, clorfacinona) ou dicumarol deprimem a
produção de fatores da coagulação dependentes de vitamina K (Fatores II, VII, IX e
X). Uma vez que o fígado é o maior local de síntese dos fatores de coagulação, o dano
hepático pode resultar em coagulação sangüínea defeituosa. Os baixos níveis de
fatores coagulantes no plasma de animais recém-nascidos podem predispor a
sangramentos. Choque anafilático, hemólise intravascular, necrose tecidual exces-
siva (queimaduras, inflamação, neoplasia, trauma, cirurgia) ou endotoxinas bacteria-
nas podem levar a ativação de plaquetas sangüíneas e fatores de coagulação e
resultam em coagulação intravascular disseminada (CID, pág. 28) e tromboembolis-
mo. O líquido amniótico contém tromboplastinas potentes que podem ser introduzi-
das na circulação materna durante distocias, levando a coagulação intravascular.
Distúrbios Hemostáticos 65

Além da depleção de fatores da coagulação, a CID resulta na utilização de plaquetas,


atividade fibrinolítica aumentada e aparecimento de produtos da degradação da
fibrina (PDF) circulante, todos contribuindo para a tendência a sangramento decor-
rente. A atividade fibrinolítica aumentada tem sido reconhecida em cães como uma
causa de sangramento excessivo após trauma ou cirurgia.
O desenvolvimento de inibidores de fatores de coagulação tem sido relatado
no lúpus eritematoso sistêmico e no mieloma múltiplo em cães. Os inibidores são
anticorpos dirigidos contra proteínas pró-coagulantes específicas.
Doença de von Willebrand adquirida é agora reconhecida no homem e em
cães, associada a doença hereditária auto-imune da tireóide. Das 54 raças de
cães nas quais a doença de von Willebrand (ver anteriormente) tem sido relatada,
42 também transmitem hipotireoidismo hereditário. A prevalência de ambos as
condições parece ter aumentado rapidamente na última década. Nos cães, a
doença de von Willebrand é exacerbada por uma tireoidite auto-imune concorren-
te, independentemente do distúrbio ter progredido ou não para o estágio de
hipotireoidismo franco clinicamente. Os portadores assintomáticos da doença de
von Willebrand hereditária podem apresentar uma tendência a sangramento se
subseqüentemente desenvolverem tireoidite ou hipotireoidismo. Geralmente, é
impossível distinguir a doença de von Willebrand hereditária da adquirida em um
indivíduo por meio de técnicas de diagnóstico disponíveis atualmente.
As trombocitopenias adquiridas podem resultar de várias causas (ver TROMBO-
CITOPENIA CANINA, pág. 68), a maioria delas tem base imunológica.
Nos defeitos adquiridos da função plaquetária (trombopatias adquiridas), o
número de plaquetas pode ser normal mas sua função é anormal. A uremia resulta
em adesão plaquetária reduzida, agregação plaquetária anormal ao difosfato de
adenosina e colágeno, e um tempo prolongado de sangramento mucoso bucal.
Muitas drogas, tais como aspirina, fenilbutazona, derivados de promazina e
nitrofurantoína, interferem na função plaquetária normal e portanto na formação do
tampão hemostático, embora não freqüentemente em um nível significante. Outras
drogas que podem prejudicar a hemostasia incluem sulfonamidas, penicilinas,
estrogênios, fenotiazinas, anti-histamínicos, agentes antiinflamatórios e expansores
de plasma. Defeitos plaquetários qualitativos podem também estar associados com
hipotireoidismo cirrose hepática e leucemias. Em alguns defeitos adquiridos da
função plaquetária, o fosfolipídio plaquetário (Fator Plaquetário 3), essencial para a
coagulação sangüínea normal, é anormal, ou não é liberado pela plaqueta.
Diagnóstico – Dependendo da natureza do defeito hemostático, diferentes
sinais são observados. Os sintomas mais comuns esperados em uma trombocito-
penia incluem epistaxe persistente e hemorragias petequiais ou equimóticas. O
aparecimento das hemorragias maiores (por exemplo, hematomas), claudicações
migratórias recurrentes (hemartroses), ou sangramento em cavidades corporais
tende a indicar uma coagulopatia. As exceções ocorrem com sinais mais genéricos,
por exemplo, sangramento excessivo em cirurgias ou trauma.
Anormalidades da parede vascular – Defeitos na parede vascular são diagnos-
ticados por tempos prolongados de sangramento na ausência de outros defeitos no
mecanismo hemostático ou na causa óbvia como um aneurisma ou trauma rompido.
Anormalidades na coagulação sangüínea – O sistema de coagulação é
complexo e possui muitas interações, porém para o diagnóstico in vitro pode ser
simplesmente dividido em vias intrínseca, extrínseca e comum para localizar-se a
falha na coagulação. O tempo de tromboplastina parcial ativada (TTPA) é o teste
mais sensível clinicamente à disposição para checar todos os fatores de coagulação
exceto o Fator VII. O TTPA avalia os fatores envolvidos nas vias intrínseca e comum.
O tempo de protrombina (TP ou tempo de protrombina em um estágio) avalia o
sistema extrínseco (clinicamente, apenas o Fator VII) e a via comum. O tempo de
Distúrbios Hemostáticos 66

veneno da peçonha de Russel (TVPR), disponível com menor freqüência que o


TTPA e o TP, avalia os fatores da via comum. O tempo de trombina (TT) avalia o
fibrinogênio, podendo monitorar o nível eficaz de anticoagulantes como a heparina,
enquanto o tempo de trombina modificado é um método padrão para quantificar
fibrinogênio, mas insensível demais para monitorar terapias com anticoagulantes.
A utilização de várias combinações de testes pode freqüentemente identificar um
defeito em uma das vias. Um defeito na via intrínseca, como a hemofilia A (Fator VIII)
apresentaria um TTPA prolongado e um TP normal. A deficiência de Fator VII apre-
sentaria um TP prolongado e um TTPA normal. Um defeito na via comum ou defeitos
múltiplos, como deficiência de Fatores II, VII, IX e X na intoxicação por varfarim ou
rodenticidas semelhantes a este, apresentariam TP, TTPA e TVPR prolongados
com um TT normal.
Ensaios específicos para fatores de coagulação são necessários para determi-
nar qual(is) fator(es) em particular está(ão) deficiente(s), por exemplo, um defeito no
sistema intrínseco pode ser causado por deficiência nos Fatores VIII, IX, XI e/ou XII.
A coagulação intravascular disseminada (CID) causa consumo de plaquetas e
fatores de coagulação além e estimula o aumento da fibrinólise. Um diagnóstico
pode ser feito com confiança se todos os seguintes sintomas estiverem presentes:
1. trombocitopenia; 2. aumento no tempo de sangramento; 3. TTPA aumentado; 4.
TP aumentado; e 5. aumento dos produtos de degradação da fibrina. No entanto,
as respostas compensatórias freqüentemente trazem um ou mais destes testes
hemostáticos comuns de volta para a faixa normal; deste modo, apenas 3 dos 5
sintomas precisam estar presentes para diagnosticar-se CID. A trombocitopenia
combinada com evidências de coagulopatia (isto é, aumento de TTPA e/ou TP) é
uma evidência forte. Alguns laboratórios possuem testes mais sensíveis para CID,
como a antitrombina 3. Normalmente, o clínico não possui equipamento para
realizar outros testes além da contagem e estimativa de plaquetas (a partir de
esfregaços sangüíneos), tempos de sangramento e tempo de coagulação ativada.
Devem-se buscar informações quanto às amostras laboratoriais e controles
necessários para cada espécie, uma vez que a tipagem, coleta e processamento
apropriados do sangue são críticos.
Anormalidades nas plaquetas – Uma contagem acurada das plaquetas deve
ser realizada em sangue total fresco coletado por meio de venipuntura asséptica em
um tubo contendo EDTA ou citrato trissódico anticoagulante. O primeiro sangue a
preencher a agulha deve ser descartado, utilizando-se a técnica de 2 seringas ou
permitindo-se que o sangue flua pela agulha antes de acoplar-se a seringa ou o
“vacutainer”. A estimativa do número de plaquetas em um esfregaço corado é
suficiente para detectar as alterações marcantes. O sangue canino normal possui
, 8 a 29 plaquetas por campo em óleo de imersão. Uma trombocitopenia grave o
suficiente para provocar sintomas de sangramento apresenta sinais 0 a 3 plaquetas
por campo. Para monitorar melhor as alterações durante o tratamento, as estima-
tivas plaquetárias devem ser confirmadas por uma contagem de plaquetas. A
retração do coágulo de sangue total e o tempo de sangramento da unha do polegar
são testes insensíveis de função plaquetária. O tempo de sangramento da mucosa
bucal em cães é um teste sensível para a função plaquetária; cães normais param
de sangrar em 2,6 ± 0,5min. Nos defeitos qualitativos da função plaquetária, a
avaliação das plaquetas por testes especiais, como a resposta de agregação das
plaquetas ao difosfato de adenosina, trombina e colágeno, e medidas de
retenção plaquetária (adesividade), pode ser necessária. Nos defeitos qualitativos
das plaquetas, o tempo de sangramento da mucosa bucal é prolongado, mas a
contagem de plaquetas é normal. Medidas específicas de FVW:Ag ou outras
atividades do fator de von Willebrand relacionadas às plaquetas são necessárias
para um diagnóstico definitivo da doença de von Willebrand.
Distúrbios Hemostáticos 67

Tratamento – Em sangramentos externos, podem-se aplicar bandagens com-


pressivas, esponjas hemostáticas, trombinas tópicas ou adrenalina para auxiliar no
controle. Quando se lancetam hematomas superficiais pode-se provocar hemorragia
de difícil controle. Para reduzir a chance de sensibilização a antígenos eritrocitários e
subseqüentes reações a transfusão, as transfusões que não sejam de sangue total
semelhante e do mesmo tipo devem ser restritas a pacientes com acentuada perda de
sangue e sinais de anemia grave. Com um hematócrito < 13% em cães e 11% em
gatos é indicada a transfusão, embora uma anemia de evolução rápida cause um
desconforto respiratório em um hematócrito mais alto que nas anemias crônicas.
Na trombocitopenia e trombopatia, o plasma enriquecido com plaquetas deve
ser transfundido se possível. O plasma obtido de sangue fresco, coletado lenta-
mente e centrifugado em citrato e colocado em recipientes plásticos (600 a 800rpm
ou , 150 × gravidade por 8 a 10min) ou por centrifugação mais rápida do sangue
por um menor período de tempo (1.500rpm ou 300 × gravidade por 2 a 5min).
Nas deficiências de fator coagulante, o plasma baixo em plaquetas (citrato
sangüíneo fresco em giro de 3.000 a 5.000rpm ou 700 a 1.000 × gravidade por 15 a
20min) pode ser usado. Como vários fatores de coagulação são lábeis (por exemplo,
Fator VIII), o plasma deve ser preparado em recipientes plásticos estéreis e usados
o mais rapidamente possível. Como alternativa, a maioria dos fatores de coagulação
do plasma fresco pode ser preservada por mais de 12 meses a –20 oC ou preferivel-
mente a temperaturas ainda mais baixas (–40 a –70oC) por congelamento imedia-
tamente após a coleta. Fatores da coagulação específicos concentrados ainda não
estão disponíveis no comércio para uso em animais domésticos, mas um criopreci-
pitado para cães pode ser prontamente obtido de plasma recém-congelado.
A vitamina K1 é apenas indicada em avitaminose K, anormalidades do complexo
protrombina (tais como intoxicação por rodenticidas ou por trevo doce) e doença
hepática. A vitamina K3 normalmente é ineficaz. Rodenticidas mais modernos, como
difacinona, exigem terapia de longa duração com vitamina K1. A administração EV
pode causar anafilaxia. O ácido ascórbico pode ser útil para algumas púrpuras
vasculares e algumas doenças hepáticas. Esteróides ou outros imunossupressores
são os medicamentos de escolha para trombocitopenia imunomediada e também
têm sido usados para tratar distúrbios da coagulação e estados fibrinolíticos. A
eficácia nas duas últimas situações é questionável. A L-tireoxina (duas vezes ao dia)
é benéfica porque estimula a trombocitopoiese e aumenta a adesão plaquetária.
Estilbestrol pode melhorar a resistência capilar, porém pode ter um efeito tóxico em
algumas espécies, por exemplo cães, causando trombocitopenia (e bicitopenia ou
pancitopenia) e assim aumentando o sangramento.
Drogas conhecidas por interferirem na função plaquetária são contra-indicadas ou
devem ser usadas com cautela em animais com tendência moderada ou severa a
sangramentos (ver págs. 63 e 64). Sulfato de protamina tem sido usado para
neutralizar a heparina em casos de superdose desta ou heparinemia. Anticoagulan-
tes como a heparina ou varfarim têm sido usados em combinação com drogas
antiplaquetárias, tais como aspirina, e terapia de reposição do componente sangüí-
neo para tratar CID, mas o manejo específico requer identificação e alívio da causa
de base, quando possível.
Animais com defeitos hemostáticos severos, particularmente hemofílicos, devem
receber drogas VO, s.c. ou EV com uma agulha de pequeno calibre; a injeção IM pode
resultar em formação de hematomas no local da inoculação.

TROMBOCITOPENIA
É uma diminuição no número de plaquetas. As mesmas causas básicas, em
qualquer espécie, levam a este problema, que é a principal causa de sangramento.
Distúrbios Hemostáticos 68

Trombocitopenias canina e felina


Distúrbios hemorrágicos são associados a grave trombocitopenia, normalmente
quando o número de plaquetas é < 20.000/µL (20 × 10 9/L). Se o sangramento ocorrer
com um número de plaquetas > 50.000/µL, deverão ser consideradas causas
adicionais, por exemplo, doença de von Willebrand com hipotireoidismo concorrente
e CID com produtos de degradação da fibrina circulante atuando como anticoagu-
lantes. Ocasionalmente, os sintomas de hemorragia não são observados apesar da
trombocitopenia grave, talvez devido à presença de plaquetas maiores e mais
ativas. Pequenas hemorragias, como petéquias e equimoses na pele e membranas
mucosas, e epistaxe são sinais clínicos típicos.
Etiologia – A trombocitopenia normalmente ocorre devido à produção diminuída
em virtude de doença na medula óssea, destruição imunomediada, ou coagulopatia
consuntiva (CID). O diagnóstico de doença medular é feito por aspirado e biópsia.
Uma ausência de,ou diminuição marcante nos, megacariócitos indica um defeito na
produção. Números normais ou aumentados de megacariócitos indica maior des-
truição ou consumo de plaquetas pelas 2 outras causas genéricas. A CID é
diagnosticada por meio dos testes de hemostasia (ver anteriormente). A tromboci-
topenia imunomediada é diagnosticada pela exclusão das outras 2 e, em alguns
casos, por associação com uma droga em particular ou identificação sorológica ou
morfológica de um microrganismo como Ehrlichia canis ou E. platys. O mecanismo
da trombocitopenia em cães com E. canis é pouco compreendido: inicialmente, a
medula óssea é hipercelular e é possível uma remoção imunomediada de plaquetas,
ainda não provada. A erlichiose crônica pode resultar em pancitopenia aplásica com
dano medular irreversível. Testes diretos para a trombocitopenia imunomediada,
como o de Fator 3 de plaquetas ou ELISA, não estão prontamente disponíveis nem
são universalmente aceitos.
A trombocitopenia imunomediada pode acompanhar o lúpus eritematoso sistê-
mico (ver pág. 520) ou a anemia hemolítica imunomediada (ver pág. 24). Pode-se
suspeitar de anticorpos antiplaquetários induzidos por drogas quando a tromboci-
topenia é associada a drogas como quinidina, quinina, digitoxina, clorotiazidas,
fenitoína, fenilbutazona, penicilinas, anfetaminas, fenobarbital e combinações
trimetoprim-sulfonamida. Aproximadamente em 2/3 dos casos de trombocitopenias
crônicas e recorrentes há uma base imunológica; estes indivíduos podem desenvol-
ver auto-anticorpos contra suas plaquetas e/ou outros tecidos.
A trombocitopenia pode ser causada por alguma infecção viral ou pelo uso de
certas vacinas de vírus vivo modificado (por exemplo, parvovírus, raiva). Isto pode ser
devido a um dano imunomediado às plaquetas e/ou megacariócitos secundário a
alterações antigênicas relacionadas ao vírus, ou efeitos citotóxicos diretos do vírus.
A lesão tóxica da medula óssea em cães causada por estrogênios é menos
comum, porém a terapia estrogênica é uma causa potencial de trombocitopenia,
bicitopenia ou pancitopenia. Outras substâncias tóxicas à medula incluem ciclofos-
famida, 6-mercaptopurina, bussulfan, mostarda nitrogenada e outros agentes
quimioterápicos. O envolvimento leucêmico da medula pode repor células hemato-
poiéticas normais, como os megacariócitos. O dano original pode não ser conhecido
restando apenas gordura ou tecido fibroso, dando um diagnóstico morfológico de
pancitopenia aplásica ou mielofibrose.
Os collies cinza com hematopoiese cíclica (ver pág. 76) podem apresentar
trombocitopenia cíclica. Em vários distúrbios adquiridos (por exemplo, uremia,
doença hepática, neoplasia – incluindo distúrbios linfoproliferativas com paraprotei-
nemia), os defeitos plaquetários quantitativos e qualitativos podem coexistir.
Achados clínicos e diagnóstico – Petéquias e equimoses aparecem subita-
mente na pele visível e nas membranas mucosas. Elas podem ser acompanhadas
Distúrbios Hemostáticos 69

por epistaxe, melena, hematúria, sangramento prolongado provindo de pontos de


lesão e formação excessiva de abrasões ou hematomas após a palpação clínica de
rotina. Palidez, fraqueza e edema podem ocorrer em casos que também apresen-
tem anemia severa.
A contagem direta de plaquetas em sangue fresco coletado em EDTA ou outros
anticoagulantes quantifica a magnitude da trombocitopenia. Se forem notados
grumos de plaquetas no esfregaço, deve se providenciar uma amostra fresca. O
esfregaço de sangue periférico mostra uma ausência virtual (por exemplo, 0 a 3
plaquetas por campo de imersão em óleo) de plaquetas. Plaquetas grandes
sugerem trombopoiese acelerada. Os testes de função plaquetária, como o tempo
de sangramento ou retração de coágulo podem detectar a trombocitopenia. Um
teste de Coombs direto positivo associado a uma anemia hemolítica auto-imune, e
preparações LE positivas ou títulos de anticorpos antinucleares com lúpus eritema-
toso sistêmico podem sugerir indiretamente trombocitopenia imunomediada. A
forma imunomediada da trombocitopenia tem sido indicada pela detecção da
atividade antiplaquetária no plasma ou soro utilizando-se o teste de Fator Plaque-
tário 3 ou outros testes imunológicos, mas os testes diretos como estes, não estão
facilmente disponíveis nem são considerados confiáveis.
Tratamento – Nos animais que desenvolvem púrpura trombocitopênica após
terapia medicamentosa prolongada ou após uma curta exposição a uma nova droga,
uma causa iatrogênica é uma grande possibilidade; a droga suspeita deve ter sua
administração interrompida e o animal deve receber corticosteróides imediatamente
(por exemplo, dexametasona [0,25 a 0,5 mg/kg de peso corporal], ou prednisona ou
prednisolona [2 a 4 mg/kg] diariamente). A trombocitopenia induzida por drogas em
geral é prontamente revertida pela remoção do agente causador.
A trombocitopenia associada a tumor maligno ou mielofibrose e pancitopenia
aplásica é a mais difícil de tratar, uma vez que a identificação ou cura da causa
de base pode ser impossível.
A remissão da trombocitopenia imune normalmente pode ser obtida utilizando-
se o mesmo regime de tratamento usado para a anemia hemolítica auto-imune (ver
pág. 24). Muitos casos respondem à terapia convencional com corticosteróides,
mas podem ocorrer recidivas após períodos variáveis. A terapia com esteróides é
mantida por 1 semana nas dosagens citadas anteriormente, e então reduzida a
metade por outra semana. Doses de manutenção administradas diariamente e
depois em dias alternados freqüentemente têm que ser mantidas indefinidamente
para evitar recidivas. Drogas antimetabólicas como vincristina, ciclofosfamida, ou
ciclosporina têm sido úteis nos casos que não respondem aos esteróides. A
L-tireoxina (duas vezes ao dia) tende a estimular a trombopoiese e melhorar a
adesão plaquetária. A esplenectomia geralmente propicia um benefício apenas
limitado ou transitório, não sendo, portanto, recomendada.
As transfusões de sangue total são reservadas para uso emergencial para corrigir
graves anemias secundárias à perda de sangue. Para repor as plaquetas por meio
de transfusão, é necessário sangue total recém-coletado ou plasma rico em
plaquetas com citrato (ver GRUPOS SANGÜÍNEOS E TRANSFUSÕES SANGÜÍNEAS, pág. 34).

Trombocitopenias bovina e suína


A trombocitopenia em bovinos e suínos pode ocorrer com CID devido à sepse ser
imunomediada devido a reações a droga, ou ainda ocorrer em virtude de isoimuni-
zação de bezerros e leitões recém-nascidos, conforme discutido anteriormente em
anemia hemolítica do bezerro neonato (ver pág. 25). Em leitões, esta reação
primeiramente resulta em trombocitopenia em vez hemólise, e anemia é um evento
terminal proveniente do sangramento. Intoxicação por samambaia nos bovinos (ver
pág. 1989) também produz pancitopenia aplásica.
Distúrbios Hemostáticos 70

Diagnóstico, manejo e tratamento são semelhantes àqueles descritos para


pequenos animais (ver anteriormente). Esteróides e antibióticos podem ser
efetivos, mas na maioria dos casos o tratamento é impraticável.

PÚRPURA NÃO TROMBOCITOPÊNICA EQÜINA


É uma entidade clínica e imunomediada aguda dos eqüinos, freqüentemente
fatal e que não está associada à trombocitopenia. A púrpura não trombocitopê-
nica é uma vasculite imunomediada devida à deposição de complexos imunes. A
trombocitopenia verdadeira também ocorre secundariamente a CID e doença
medular primária.
Etiologia e patogenia – A púrpura eqüina é uma síndrome clínica que pode
ter mais de uma causa. Caracteristicamente, ela ocorre como seqüela de infecção
por Streptococcus equi nas vias respiratórias superiores (ver pág. 901) 1 a 3
semanas após o início da doença. Não se acredita que viroses causem a doença
diretamente, mas outras infecções piogênicas ou injeções de bacterinas (espe-
cialmente S. equi ) podem fazê-lo. A doença provavelmente é um tipo de reação
de Arthus e semelhante à “doença do soro” (ver DOENÇAS I MUNOCOMPLEXAS, pág.
512). A patogenia é baseada no antígeno, presumivelmente uma proteína
estreptocócica, persistindo na circulação. Na recuperação da infecção aguda,
são produzidos anticorpos que se combinam com o antígeno circulante. Devido
ao antígeno inicialmente estar em excesso, os imunoagregados formados são
muito pequenos e, portanto, solúveis, o que permite que eles se mantenham na
circulação. O complemento é retirado pela reação antígeno-anticorpo e esses
complexos solúveis causam dano vascular endotelial ao longo do corpo, resultan-
do em edema e púrpura. Normalmente, o anticorpo está em excesso e os
imunoagregados formados são grandes e insolúveis; e são rapidamente retirados
da circulação pelo sistema reticuloendotelial sem lesão vascular.
Achados clínicos – O sinal característico é o aparecimento súbito de edema
subcutâneo e petéquias nas membranas mucosas visíveis. Anéis urticariformes são
observados com freqüência. O edema é mais proeminente ao redor da cabeça,
olhos e lábios. O edema dependente do abdome (2 a 8cm de espessura) e membros
inferiores está presente. Há proeminência de edema nas vísceras e o mesmo é
evidenciado pelo edema pulmonar e, ocasionalmente, diarréia ou cólica devido a
hemorragias e edema no intestino. Há leucograma inflamatório com contagem de
plaquetas praticamente normal. A anemia ocorre em casos graves,ou pode ocorrer
hemoconcentração se a perda plasmática exceder a perda de eritrócitos. O sangue
coagula-se normalmente; o fibrinogênio deve manter-se em níveis normais, mas os
níveis de complemento geralmente caem. A urina pode estar escassa e com
proteinúria que, apesar de não relatada, deve ser esperada. A doença dura 1 a 2
semanas; a recuperação segue-se em , 50% dos casos. Recaídas são comuns,
assim como infecções bacterianas secundárias. A morte pode ser rápida devido a
asfixia ou anemia e toxemia devido a infecção secundária em casos complicados.
Lesões – O edema acentuado é a alteração mais característica; as hemorragias
podem ser esparsas ou extensas. Pode haver bloqueio edematoso das vias aéreas
da cabeça e congestão e edema em mosaico tanto no trato respiratório quanto no
intestinal. Geralmente, há um edema tingido de hemácias debaixo das cápsulas
hepática e renal com algum grau de ascite e lesões focais amplamente distribuídas
nos músculos esqueléticos e provenientes de isquemia (pálida) ou hemorragia
(escura). Abscessos profundos ou celulite piogênica devidos à doença primária são
freqüentemente encontrados; também com freqüência coleta-se S. equi .
Diagnóstico – Uma história de infecção piogênica recente ou imunização com
bacterina e de súbito aparecimento de edema angioneurótico e anéis urticariformes
Distúrbios dos Leucócitos 71

que progridem até se tornarem um edema extenso notadamente demarcado e


dependente, e de edema da cabeça sugere o diagnóstico. A púrpura é geralmente
mais extensa que as petéquias da anemia infecciosa eqüina (ver pág. 32). Em
alguns casos, pode não haver histórico de doença precipitante.
Tratamento – Uma vez que a doença provavelmente está relacionada à proteína
bacteriana circulante, a terapia antibacteriana é indicada para retirar o antígeno
causador do sangue. Penicilina com estreptomicina, tetraciclina, oxitetraciclina ou
sulfa tripla pode ser administrada. Os antibióticos, mas não as sulfas, podem ser
dados em dosagem de até 2 vezes a indicada. Corticosteróides podem ser indicados
nos casos devidos a injeções de bacterina, mas devem ser acompanhados por altos
níveis de antibióticos. A traqueotomia pode ser necessária se a asfixia for iminente. A
transfusão de sangue é indicada se a anemia for severa (Hb < 5g/dL e diminuindo). A
bandagem dos pulmões é útil, e bons cuidados de enfermagem são indispensáveis.

DISTÚRBIOS DOS LEUCÓCITOS


LEUCOCITOSE E LEUCOPENIA
Os leucócitos do sangue dos mamíferos incluem neutrófilos segmentados, basto-
netes (neutrófilos não segmentados), linfócitos, monócitos, eosinófilos e basófilos.
Estas células variam quanto ao seu local de produção,duração da circulação perifé-
rica, recirculação e quanto aos estímulos que afetam sua liberação para o leito
vascular e migração para fora deste. Estes fatores também variam entre as espécies.
Leucocitose é um aumento no número total de leucócitos circulantes; leuco-
penia é uma diminuição. Cada uma destas alterações deve ser interpretada à luz
das espécies, aparência morfológica dos leucócitos e números absolutos de cada
tipo de leucócito. A contagem diferencial de leucócitos é realizada identificando-se
e classificando-se os 100 primeiros leucócitos intactos encontrados na camada
única de um esfregaço sangüíneo.O número absoluto de cada tipo de leucócito é
então determinado multiplicando-se a porcentagem de um leucócito em particular
na contagem diferencial pela contagem leucocitária total. Os aumentos em qualquer
um dos vários tipos celulares são indicados pelo sufixo “filia” ou “citose” (por
exemplo, neutrofilia, linfocitose, monocitose, eosinofilia, basofilia); as diminui-
ções são indicadas pelo sufixo “penia” ou “citopenia” (por exemplo, neutropenia,
linfopenia, monocitopenia, eosinopenia, basopenia). Um aumento nos neutrófilos
imaturos (não segmentados) é chamado de desvio à esquerda, que pode ser
degenerativo ou regenerativo. Se o desvio à esquerda ocorre com uma leucoci-
tose por neutrofilia e o número absoluto de neutrófilos não segmentados não
excede o de neutrófilos segmentados, é chamado de desvio à esquerda regene-
rativo. Um desvio à esquerda que ocorre em quaisquer outras circunstâncias (por
exemplo, sem leucocitose ou neutrofilia, número de leucócitos não segmentados
excedendo o número de leucócitos segmentados) é chamado de desvio degenera-
tivo à esquerda. Ocasionalmente, uma acentuada leucocitose periférica é dificilmen-
te diferenciada de uma leucemia granulocítica, devido à magnitude do desvio à
esquerda e do aumento do número de leucócitos. Estas reações são chamadas
leucemóides.
Embora os eritrócitos nucleados sejam contados como leucócitos pela maioria das
técnicas de contagem, eles não devem ser incluídos na contagem diferencial de
leucócitos. A contagem total de células nucleadas deve ser corrigida para fornecer
uma contagem precisa de leucócitos se forem encontrados > 5 eritrócitos nuclea-
Distúrbios dos Leucócitos 72

dos/100 leucócitos durante a contagem diferencial. O número total de leucócitos deve


ser corrigido pela seguinte fórmula:
100
 × nº total de leucócitos= nº correto de leuc.
100 + (nº de eritr. nucl./100 leuc.)

O leucograma diferencial pode ser relatado ou em números totais (absolutos) de


células por volume de sangue (µL ou L) ou em porcentagens relativas do total. As
interpretações válidas só podem ser realizadas considerando-se os números
absolutos. Os valores de referência para o número total de leucócitos e leucograma
diferencial em números absolutos e em porcentagens para as espécies domésticas
comuns são fornecidos nas TABELAs 8 e 9, páginas 1171 e 1172.
No interior dos vasos sangüíneos, os leucócitos estão divididos em 2 subpopu-
lações: os “pools” central e marginal, em números aproximadamente iguais. Os
leucócitos nas amostras por venipuntura representam apenas o “pool” central; a
venipuntura falha ao coletar os leucócitos do “pool” marginal ao longo da superfície
endotelial. No entanto, vários fatores, incluindo a adrenalina e os glicocorticóides,
podem transferir células do “pool” marginal para o “pool” circulante, o que aumenta
o número total de leucócitos medidos. Esta e outras causas de alterações nos
leucogramas serão discutidas brevemente adiante.
Os neutrófilos, eosinófilos e basófilos são conjuntamente denominados de
granulócitos e produzidos na medula óssea a partir de uma célula progenitora
comum, o mieloblasto. Durante a maturação, eles formam grânulos (lisossomas de
segunda geração), cujo pH determina suas características de coloração. Pequenos
números de neutrófilos jovens (bastonetes) podem ser normalmente encontrados
no sangue periférico de algumas espécies (suínos, cães), embora isto seja raro em
eqüinos ou bovinos. Normalmente a maioria dos neutrófilos é madura (segmenta-
da). Os neutrófilos entram na corrente sangüínea e permanecem por uma vida
média de , 6h, saindo para realizar suas funções de fagocitose, eliminação de
bactérias e lise enzimática de bactérias fagocitadas e fragmentos de tecido nos
tecidos somáticos. Não retornam ao leito vascular.
Os linfócitos são produzidos nos tecidos linfopoiéticos, incluindo os linfonodos e
baço, mas podem também se originar na medula óssea. Os linfócitos maduros
consistem de 2 subpopulações: células B e células T. As células B (B de medula
óssea["bone marrow"] ou equivalente a bolsa) são as precurssoras das células
plasmáticas e produzem anticorpos para a imunidade humoral. As células T (T de
timo) são responsáveis pela imunidade celular (por exemplo, histocompatibilidade
e hipersensibilidade tardia). Um linfócito que está nos tecidos pode retornar ao leito
vascular e recircular. Alguns linfócitos têm vida longa e, em algumas espécies,
podem sobreviver por toda a vida do animal.
Os monócitos são formados na medula óssea, entram no sangue periférico por
um curto período e saem para os tecidos tornando-se macrófagos, células de
Kupffer, etc. Os monócitos e macrófagos podem realizar pinocitose e fagocitose,
além de formar células gigantes multinucleadas nos tecidos, particularmente em
resposta a corpos estranhos.
Os eosinófilos respondem à histamina e a outros produtos mastócitos ou
basófilos liberados pela estimulação de IgE. Os eosinófilos matam parasitas,
modulam reações alérgicas e podem causar dano aos tecidos.
Os basófilos são raros em todos os animais domésticos comuns. Enquanto eles
dividem sua função com os mastócitos dos tecidos, os basófilos não se transformam
nestes últimos. Além disto, entre as várias espécies, o número de basófilos no
sangue periférico normal varia inversamente ao número de mastócitos nos tecidos,
por exemplo, nos cães, os mastócitos são numerosos nos tecidos e os basófilos no
sangue são raros.
Distúrbios dos Leucócitos 73

As alterações morfológicas no citoplasma dos neutrófilos (por exemplo, corpús-


culos de Döhle, granulações tóxicas, basofilia difusa no citoplasma e vacuolização
no citoplasma) podem ocorrer durante a toxemia sistêmica e são chamadas de
“alterações tóxicas”. Apesar de todos os leucócitos circulantes estarem expostos à
mesma toxemia sistêmica, apenas os neutrófilos são avaliados quanto a alterações
tóxicas. As alterações tóxicas são graduadas subjetivamente, baseando-se no
número de neutrófilos afetados e na intensidade das alterações tóxicas, como leves,
moderadas ou intensas. O significado clínico é refletido pelo tipo de alteração tóxica
e sua intensidade. As toxinas bacterianas induzem as alterações mais graves. Os
corpúsculos de Döhle aparecem como inclusões citoplasmáticas pálido-azuladas
no interior dos neutrófilos. Mesmo quando presentes em grande número, os
corpúsculos de Döhle, por si só, nunca indicam mais que uma alteração tóxica leve.
Ocorrem tão facilmente nos gatos que alguns veterinários desconsideram sua
presença. Uma alteração tóxica mais grave é indicada quando uma granulação
tóxica, basofilia citoplasmática difusa e/ou vacuolização citoplasmática estão pre-
sentes em um número moderado a alto de neutrófilos do sangue periférico. A
granulação tóxica é identificada pela presença de grânulos intracitoplasmáticos
eosinofílicos nos neutrófilos; estes grânulos representam os grânulos primários não
se corados dos neutró filos. A basofilia citoplasmática difusa e a vacuoli-
zação citoplasmática freqüentemente ocorrem em conjunto. Acredita-se que a
basofilia citoplasmática seja devida a um aumento da síntese proteica, e a
vacuolização seja possivelmente devida à autodigestão da célula. Muitos neutrófilos
intensamente toxêmicos indicam um prognóstico ruim.
Tipicamente, nos neonatos o número total de leucócitos é mais variável e
freqüentemente maior que nos adultos. Valores de referência relacionados à idade
devem ser utilizados para avaliar hemogramas em animais jovens, nos quais os
linfócitos são mais numerosos (e os neutrófilos menos) que nos adultos. Isto pode
interferir na identificação de uma linfopenia. Nos eqüinos, os maiores valores
absolutos de linfócitos estão normalmente presentes nos potros de um ano.
Geralmente, o padrão de leucograma diferencial dos adultos é atingido próximo à
maturidade sexual.
A leucocitose fisiológica pode ocorrer como resultado de exercício ou excita-
ção. Isto é mediado por um aumento na adrenalina. A adrenalina centraliza o “pool”
marginal; desta forma, o efeito da excitação pode dobrar o número total de leucócitos
observados em minutos. Além disto, a contração esplênica libera leucócitos e
eritrócitos na circulação periférica.
Leucograma de estresse ou de glicocorticóides – O tratamento com glicocor-
ticóides ou sua liberação endógena resulta em um leucograma típico. O efeito final
no número total de leucócitos varia em função da espécie e sua contagem diferencial
normal. Em cães, nos quais os neutrófilos são os leucócitos circulantes que
predominam, os glicocorticóides provocam leucocitose, enquanto no gado, no qual
os linfócitos predominam, eles provocam uma leve leucopenia. Os leucogramas de
estresse possuem uma contagem diferencial característica que consiste de uma
neutrofilia madura, linfopenia e eosinopenia. Os números de monócitos são variá-
veis; no entanto, freqüentemente ocorre uma monocitose nas reações de esterói-
des/estresse dos cães e eqüinos.
Apesar das características específicas da leucocitose inflamatória e leuco-
penia variarem de espécie para espécie, existem algumas generalidades. Radiação
e drogas radiomiméticas (por exemplo, muitas drogas antineoplásicas) provocam
leucopenia. Os linfócitos são extremamente sensíveis à radiação. Os granulócitos
maduros, ao contrário dos seus precursores na medula óssea, não são particular-
mente radiossensíveis. A manutenção do número normal de neutrófilos na corrente
sangüínea periférica depende de uma reposição regular realizada a partir da medula
Distúrbios dos Leucócitos 74

óssea. Geralmente, as infecções virais, particularmente as infecções agudas não


associadas com necrose extensa de tecidos, provocam leucopenia como neutro-
penia. Isto pode estar associado a uma linfocitose leve. As infecções por parvovírus
podem provocar inicialmente uma intensa panleucopenia seguida de leucocitose. A
leucopenia persistente, freqüentemente associada a anemia, trombocitopenia, ou
ambas, pode ocorrer na erlichiose. A leucopenia ocorre precocemente nas infec-
ções bacterianas dos ruminantes devido a sua baixa reserva (estoque) de neutró-
filos na medula óssea e a linfopenia secundária a liberação de glicocorticóides
endógenos. Um desvio degenerativo à esquerda freqüentemente se desenvolve
nos ruminantes com doença inflamatória aguda; no entanto, isto não indica o mesmo
prognóstico ruim que nas outras espécies, a não ser que o número de leucócitos não
aumente em 2 a 3 dias. A leucopenia pode ocorrer em infecções bacterianas
intensas, especialmente nas septicemias por Gram-negativos ou endotoxemias em
todas as espécies. A leucopenia e trombocitopenia ocorrem na anafilaxia. Déficits
em certos tipos de leucócitos, hemácias e/ou plaquetas ocorrem nas aplasias de
medula óssea e nas raras lesões que ocupam espaço da medula óssea (mieloftise).
Nas infecções virais de maior duração (2 a 3 semanas) com complicações bacteria-
nas secundárias, o número total de leucócitos pode estar elevado ou dentro dos
limites normais devido a neutrofilia e linfopenia concomitantes.
A leucocitose por neutrofilia geralmente caracteriza infecções bacterianas e
problemas associados com extensa necrose tecidual, incluindo queimaduras, trau-
ma, cirurgias extensas e, algumas vezes, neoplasias malignas. A neutrofilia pode ser
extrema em infecções das cavidades fechadas. Na piometria e nos abscessos, a
parede da cavidade inibe a migração dos neutrófilos para o local da infecção, mas não
prejudica a liberação das substâncias químicas leucotáticas. O efeito final é um
grande número de neutrófilos na circulação periférica, que freqüentemente inclui um
aumento no número de imaturos (desvio regenerativo à esquerda ). Em cadelas com
piometria fechada, não é incomum um total de leucócitos de 100 × 103/µL.
A eosinofilia é provocada por histamina e substâncias aliadas, e pela IgE. Estas
indicam alergia e hipersensibilidade ou doenças parasitárias, nas quais a intensidade
da eosinofilia é um fator da intimidade do contato da quitina do parasita com os tecidos
do hospedeiro. Trichinella spp provocam uma intensa eosinofilia. A eosinofilia ocorre
em , 50% dos cães com dirofilariose. A intensidade da eosinofilia provocada por
pulgas depende da sensibilidade do hospedeiro e da intensidade da infestação. As
técnicas normais de contagem diferencial de leucócitos não são suficientemente
sensíveis para detectar confiavelmente a eosinopenia em um único exame de
sangue. A ausência de eosinófilos em repetidos hemogramas indica eosinopenia, o
que é mais comumente relatada em leucogramas de glicocorticóides (estresse).
A basofilia periférica é incomum; no entanto, ocorre em alguns animais com
vermes cardíacos (e outras causas de antigenemia sistêmica) ou lipemias patoló-
gicas. Uma basopenia é difícil de documentar e não possui significado diagnóstico.
A linfocitose periférica pode ocorrer por diversas razões, incluindo uma linfocito-
se fisiológica (adrenalina), leucemia linfocítica, e estimulação imunológica. A
estimulação imunológica (antigênica) está associada a inflamações crônicas e é
caracterizada pela presença de linfócitos reativos (imunologicamente estimulados).
Estes linfócitos possuem um citoplasma mais basófilo e um pouco mais abundante
devido ao aumento da síntese proteica. Ocasionalmente, estas células tornam-se
tão reativas que se apresentam como plasmócitos (imunócitos). Os linfócitos
reativos podem ocorrer em qualquer doença que cause uma imunoestimulação
sistêmica moderada a acentuada.
A linfopenia é uma anormalidade comum no leucograma. É mais comumente
associada a glicocorticóides endógenos (estresse) ou exógenos. Também ocorre
por outras causas, como extravasamento de linfa (linfangiectasia), linfopoiese
Distúrbios dos Leucócitos 75

prejudicada, e doenças por imunodeficiência (por exemplo, doença da imunodefi-


ciência combinada dos potros árabes).
A monocitose raramente é intensa, podendo estar associada a inflamações
crônicas, particularmente infecções micóticas e outras infecções granulomatosas,
ou reações a esteróides/estresse, especialmente em cães. As monocitopenias são
ocasionalmente observadas, mas não possuem significado diagnóstico.
A magnitude da neutrofilia induzida pela inflamação é uma função do tamanho do
“pool” de granulócitos de reserva da medula óssea, hiperplasia da medula, e taxa de
perda de leucócitos para os tecidos.O “pool” de reserva é bastante grande em cães,
e bem menor nos bovinos; os cães podem apresentar um leucograma reativo
>100×10 3/µL, enquanto contagens > 30 × 103/µL são raras no gado.
Em cães, a razão normal neutrófilos-linfócitos é , 3,5:1. Várias doenças
infecciosas e não infecciosas podem induzir alterações no leucograma. Respostas
inflamatórias, fisiológicas (adrenalina) e reações a glicocorticóides (estresse) são
causas comuns de leucocitose. No parto da cadela a leucocitose está tipicamente
presente. A hematopoiese cíclica dos collies cinza (ver pág. 76) provoca uma
neutropenia periférica em intervalos de 11 a 14 dias. Uma panleucopenia intensa
com um total de leucócitos bem < 1 × 103/µL freqüentemente caracteriza a infecção
por parvovírus, enquanto na infecção por coronavírus e na hepatite infecciosa, a
neutropenia pode ser mais moderada. Nos estágios mais avançados da cinomose
canina com infecção bacteriana secundária, o número total de leucócitos pode ser
normal com neutrofilia, linfopenia e, às vezes, com aumento dos neutrófilos imaturos
e alterações tóxicas. O exame da medula óssea nos estágios iniciais da erlichiose
pode revelar uma medula adequadamente celular ou hipercelular, apesar da
trombocitopenia, anemia e/ou leucopenia constatadas na circulação periférica.
Os gatos podem apresentar uma resposta neutrofílica intensa, apesar de menos
marcante que a dos cães. A peritonite infecciosa felina geralmente não provoca
leucopenia mas sim, com maior freqüência, uma neutrofilia e linfopenia. O vírus da
leucemia felina possui um efeito variável nas células sangüíneas periféricas. Na
ausência de linfoma ou leucemia (ver adiante), pode provocar uma panleucopenia
com acentuada neutropenia, alterações tóxicas e linfopenia leve, algumas vezes
com células atípicas, lembrando a infecção por panleucopenia felina.
Nos eqüinos, a razão normal neutrófilos–linfócitos é , 1,1:1. A magnitude da
resposta neutrofílica é bem menor que nos cães ou gatos. O número total de leucócitos
raramente é > 35 × 103/µL. Um total de leucócitos >12 × 103/µL deve ser interpretado
como leucocitose. Nos eqüinos, os glicocorticóides induzem neutrofilia, linfopenia,
eosinopenia e, freqüentemente, monocitose. Na artrite viral eqüina, uma leucopenia
inicial durante o episódio febril é seguida por uma linfopenia e uma neutrofilia leve. A
leucopenia ocorre na infecção por herpesvírus eqüino, influenza e, algumas vezes, na
fase febril inicial da anemia infecciosa eqüina. Na erlichiose eqüina pode haver
leucopenia, algumas vezes acompanhada por trombocitopenia e/ou anemia.
No gado, a razão normal neutrófilos–linfócitos é de , 0,5:1, e a resposta
neutrofílica é mais fraca que em qualquer outra espécie doméstica comum. O gado
com infecções sépticas, incluindo mastites ou peritonites sépticas, apresenta
caracteristicamente leucopenia, linfopenia e neutropenia nos primeiros dias. Um
retorno ao normal dos números absolutos de linfócitos e neutrófilos, ou uma
neutrofilia, é um sinal de bom prognóstico. Leucopenia persistente ou alterações
tóxicas nos neutrófilos indicam um prognóstico desfavorável. A infecção por
adenovírus induz leucopenia, com número total de leucócitos de 2,5 a 4,2 × 103/µL.
A leucopenia inicial associada às infecções bacterianas é normalmente mais longa
e mais pronunciada no gado que nas outras espécies.
Nos suínos, a razão normal neutrófilos–linfócitos é de 0,7:1. Os suínos são
capazes de uma resposta neutrofílica acentuada, possivelmente mais acentuada
Distúrbios dos Leucócitos 76

que nos cães. O estresse da venipuntura pode resultar numa duplicação da


quantidade dos neutrófilos circulantes em 30min, que persiste por 8h; isto pode
prejudicar estudos que exijam amostragens sangüíneas seriadas freqüentes. Du-
rante o parto as porcas manifestam neutrofilia, linfopenia e eosinopenia, similares
ao efeito dos glicocorticóides. Uma leucopenia acentuada (< 10 × 103/µL) ocorre na
cólera suína e na peste suína africana. A leucopenia também está presente na
influenza e na infecção por herpesvírus suis. A linfopenia pode ocorrer na infecção
por Hyostrongylus rubidus. Nas erisipelas, há uma neutrofilia inicial; os neutrófilos
segmentados aumentam em 12 a 36h e pode se seguir uma leucopenia. A eosinofilia
caracteriza a migração de larvas de parasitas e infecção por vermes pulmonares.
A leucemia (ver págs. 38, 46 e 472) e o linfoma (ver pág. 528) devem ser
considerados brevemente em conjunção com a leucocitose e a leucopenia. Em
alguns casos de linfoma sem leucemia, a necrose no interior do(s) tumor(es) provoca
uma neutrofilia. Raramente, uma infiltração linfomatosa ou leucêmica da medula
óssea resulta em leucopenia, geralmente associada a anemia e trombocitopenia. A
leucemia é definida como uma doença neoplásica maligna dos precursores de
leucócitos ou hemácias, com células neoplásicas na corrente sangüínea periférica
e/ou na medula óssea. A leucemia é geralmente reconhecida pela identificação de
grande número de blastócitos na corrente sangüínea periférica. A classificação dos
blastócitos (por exemplo, linfoblastos, rubriblastos, mieloblastos) pode ser difícil com
um microscópio ótico de rotina, podendo ser necessário o uso de corantes especiais
para enzimas celulares (por exemplo, peroxidase, α-naftol esterase) para identificar
corretamente a linhagem celular envolvida. A leucemia e a leucocitose podem se
assemelhar uma a outra; algumas vezes a distinção é difícil. A leucocitose intensa
(reação leucemóide) pode ser confundida com leucemia, particularmente com a
leucemia mielógena crônica, na qual existe uma leucocitose intensa e patente sem a
presença dos blastócitos característicos da maioria das leucemias.

SÍNDROME DE CHÉDIAK-H IGASHI


Primariamente uma doença de imunodeficiência, transmitida por um autossômi-
co recessivo, que foi descrita em humanos, visons, gatos, gado hereford, camun-
dongos e orcas; todos apresentando uma maior suscetibilidade a infecções
piogênicas, maior tendência a sangramentos e albinismo oculocutâneo parcial. O
camundongo bege e o visom aleutiano exemplificam a diluição de pigmentos
observada na síndrome. Grânulos anormais gigantes parecem formar-se após a
fusão de lisossomos menores em muitas células dos humanos, visons, gatos e
gado, porém nos camundongos, isso ocorre apenas nos leucócitos. As caracterís-
ticas de coloração dos grânulos são semelhantes em todas as espécies. Foram
notados abscessos bacterianos disseminados no gado afetado, ocorrendo também
uma maior suscetibilidade a infecções virais. O diagnóstico se baseia na diluição dos
pigmentos, presença dos grânulos gigantes e maior suscetibilidade a infecções. A
diluição do pigmento lembra aquela associada à neutropenia cíclica dos cães e à
anemia hereditária dos camundongos.

HEMATOPOIESE CÍCLICA EM CÃES COLLIE CINZA


(Síndrome dos collies cinza, Neutropenia cíclica canina)

É uma imunodeficiência autossômica recessiva hereditária caracterizada por


infecções bacterianas intensas recorrentes, sangramento e diluição da cor do pelame.
Acredita-se que a base molecular seja um defeito cíclico na maturação da medula
óssea no nível das células primordiais hematopoiéticas pluripotenciais. A parada na
maturação ocorre em ciclos regulares de 11 a 14 dias de intervalo, e a neutropenia
Linfadenite e Linfangite 77

periférica dura de 3 a 4 dias, sendo seguida por uma neutrofilia. Todas as outras
células hematopoiéticas, incluindo os linfócitos, também são cíclicas com o mesmo
intervalo, porém ocorrendo em momentos diferentes ao da fase neutropênica. De-
monstrou-se que os fatores de crescimento hematopoiéticos (por exemplo, eritropoie-
tina) e outros hormônios (por exemplo, cortisol) também possuem um padrão cíclico.
Os filhotes afetados freqüentemente morrem no parto ou durante a primeira
semana, raramente sobrevivendo por mais de 1 ano. Os cães sobreviventes podem
ser raquíticos e fracos e desenvolver graves infecções bacterianas recorrentes duran-
te períodos de neutropenia, caracterizados por febre, septicemia, pneumonia e gas-
troenterite. Também apresentam uma tendência a sangramentos devido a uma
anormalidade na função plaquetária e desenvolvem amiloidose nos rins e outros órgãos.
Todos os cães afetados possuem uma coloração diluída na pelagem, conhecida
como efeito pleiotrópico, com os pelos fenotipicamente negros diluídos a cinza-car-
vão, e os pelos fenotipicamente marrons ou escuros diluídos a cinza-prata. O diagnós-
tico é baseado nos sintomas clínicos e em hemogramas completos repetidos por um
período de 2 semanas. Não foi observado nenhum novo caso na última década.
Um transplante de medula óssea no animal jovem elimina os efeitos da hemato-
poiese cíclica e efetua uma cura clínica. O tratamento com carbonato de lítio, apesar
de em níveis tóxicos, tem abolido a neutropenia recorrente. A administração de
fatores estimulantes de colônia granulócitos/monócitos recombinantes humanos
eliminou temporariamente a hematopoiese cíclica até o cão produzir anticorpos
contra eles.

ANOMALIA DE PELGER-HUËT
É um problema hereditário do homem, coelhos e cães, caracterizado pela
incapacidade de maturação dos granulócitos da forma imatura para a segmentada;
a hereditariedade parece ocorrer por meio de um autossomo dominante. As células,
particularmente os neutrófilos, são hipossegmentadas e a cromatina é condensada;
o leucograma mostra um “pseudodesvio” à esquerda aparente com um número
normal de leucócitos. Esta anomalia é geralmente um achado incidental de labora-
tório; a função dos leucócitos é normal e os heterozigotos não apresentam sintomas
clínicos. Nos coelhos, o estado de homozigose é letal e associado a deformações
esqueléticas e maior suscetibilidade a infecções. A pseudo-anomalia de Pelger-
Huët refere-se à hipossegmentação adquirida dos granulócitos e tem sido relatada
em ratos, cães e bovinos.

LINFADENITE E LINFANGITE
LINFADENITE CASEOSA DAS OVELHAS E CABRAS
É um abscesso caseoso dos linfonodos e órgãos internos causado por
Corynebacterium pseudotuberculosis. A doença ocorre em todo o mundo e é uma
infecção endêmica importante nas regiões onde há grandes criações de ovelhas e
cabras. As perdas econômicas resultam da redução do ganho de peso, capacidade
reprodutiva e produção de leite, bem como da condenação da carcaça e desvalo-
rização do couro. Embora principalmente uma infecção de ovelhas e cabras, a
doença esporádica também ocorre em eqüinos e bovinos (ver adiante) e no búfalo
d’água, ruminantes silvestres, primatas, porcos e aves. A linfadenite regional
raramente é manifestada no homem.
Linfadenite e Linfangite 78

Etiologia e patogenia – O bastonete Gram-positivo pequeno é um parasita


intracelular facultativo, encontrado no solo e em estrume contaminado com exsuda-
to purulento. Dois biótipos foram identificados: um grupo nitrato-negativo que infecta
ovelhas e cabras e um grupo nitrato-positivo que infecta cavalos (isolados bovinos
são um grupo heterogêneo). Todas cepas produzem uma exotoxina antagonica-
mente similar com atividade enzimática (fosfolipase D) que parece ser leucotóxica,
podendo lesar as células endoteliais e disseminar-se do local inicial de infecção para
linfonodos regionais e órgãos viscerais. A composição química de suas paredes
celulares (conteúdo lipídico elevado) capacita o microrganismo a resistir à morte por
meio dos fagócitos e a manter a infecção crônica.
A infecção pode ocorrer após penetração do microrganismo através da pele
intacta ou das membranas mucosas; entretanto, em muitos casos, é provável iniciar-
se por contaminação das feridas na pele superficial com material purulento dos
abscessos rotos de outras ovelhas e cabras. Abscessos pulmonares e superficiais
rotos são as frentes primárias de contaminação ambiental. Tonéis de banho, tosa
e equipamento de alimentação e manuseio contaminados são responsáveis pela
disseminação do microrganismo. O pus contém grande número de bactérias que
podem sobreviver durante meses no feno, raspadeira e no solo. A doença é
comumente introduzida em um rebanho pela entrada de um portador saudável
provindo de um rebanho infectado ou através do contato nos pastos.
Achados clínicos – A linfadenite caseosa (LAC) é uma doença recorrente e
crônica. Um abscesso que aumenta lentamente, localizado e não doloroso pode se
desenvolver no ponto de entrada da pele ou no linfonodo regional (LAC superficial
ou externa), a partir do qual pode se disseminar através do sangue ou do sistema
linfático e causar abscesso de linfonodos ou órgãos internos (LAC interna ou
visceral). Abscessos superficiais aumentam e podem romper-se, liberando pus
infeccioso. Em ovelhas de pastagem, ocorrem muitos abscessos superficiais nas
regiões pré-escapular e pré-femoral, provavelmente com transmissão ocorrendo no
momento da tosa. Eles ocorrem principalmente na cabeça e região do pescoço de
cabras e ovelhas para reprodução devido à transmissão por alimentos, cevador e
outros fomitos contaminados. Os animais não apresentam nenhuma característica
óbvia da doença, a não ser a localização do abscesso que interfere nas funções de
respiração ou deglutição. Pode haver recidiva no mesmo local. Comumente, os
abscessos renais, hepáticos e pulmonares causam “síndrome da ovelha magra”.
Outras manifestações incluem broncopneumonia caseosa, artrite, aborto,
abscedações do SNC e escrotal e mastite. A forma visceral geralmente é mais
extensa em cabras e ovelhas, com uma preponderância de envolvimento pulmonar.
Regularmente, a incidência de doença aumenta com a idade; a doença clínica é
mais prevalente em adultos, e até 40% dos animais num rebanho pode apresentar
abscessos superficiais.
A lesão típica maciça é um abscesso discreto distendido por exsudato espesso
e freqüentemente seco, purulento, branco ou amarelo-esverdeado. Em ovelhas, o
abscesso freqüentemente apresenta uma aparência de “rodela de cebola” laminada
classicamente descrita em corte transversal, com camadas fibrosas concêntricas
separadas por exsudato caseoso espessado. Em caprinos, o exsudato geralmente
é mole e pastoso.
Diagnóstico – O diagnóstico geralmente pode se basear em sinais clínicos e
história do rebanho. Para diagnóstico definitivo, um aspirado de abscesso deve ser
submetido a exame bacteriológico; C. pseudotuberculosis pode ser facilmente
isolada, embora possa ser recuperada em culturas mistas com outros microrganis-
mos piogênicos. A linfadenite supurativa e os abscessos também podem ser
causados por vários outros microrganismos piogênicos, tais como Actinomyces
pyogenes, Staphylococcus aureus e Pasteurella multocida. Abscessos escrotais
Linfadenite e Linfangite 79

geralmente não envolvem o epidídimo ou testículos como com Brucella ovis.


Animais definhados também devem ser examinados para pneumonia progressiva
ovina, paratuberculose e parasitismo.
O diagnóstico sorológico não é confiável; em rebanhos infectados, cabritos e
cordeiros desenvolvem um título após contato com animais infectados, mas a
relação do título à resistência de infecção não é consistente.
Tratamento e controle – O tratamento de LAC geralmente não é tentado, embora
o microrganismo seja suscetível à penicilina. A formação de abscessos limita a
penetração e eficácia dos antibióticos. Entretanto, o tratamento profilático e terapêu-
tico não eliminará a C. pseudotuberculosis de rebanhos ou indivíduos infectados, os
abscessos recorrem após drenagem ou tentativa de excisão cirúrgica.
A prevenção é baseada na transmissão reduzida do microrganismo a partir de
animais infectados a suscetíveis. Animais definhados e aqueles com abscessos
recorrentes devem ser separados. Quando são muito importantes para serem
separados, aqueles com desenvolvimento de abscessos devem ser isolados e estes
abscessos lancetados e lavados com solução de iodo. Animais jovens devem ser
criados isolados dos mais velhos, animais infectados, tendo-se em mente que os
fomitos podem transmitir a doença. Animais mais velhos e aqueles com abscessos
devem ser tosados por último, e os equipamentos desinfectados todas as vezes que
forem contaminados com o exsudato drenado. Ferimentos cutâneos devem ser
tratados topicamente e suturados se necessário.
É difícil a erradicação devido aos métodos diagnósticos não detectarem todos os
animais infectados num rebanho. A palpação de linfonodos externos não detecta
portadores subclinicamente infectados e inaparentes, incluindo aqueles com abs-
cessos internos.
Uma vacina bacteriana-toscóide natural está comercialmente disponível, porém
a documentação de sua eficácia neste campo é limitada.

INFECÇÃO DOS CAVALOS E GADO POR CORYNEBACTERIUM


PSEUDOTUBERCULOSIS
Em cavalos, a Corynebacterium pseudotuberculosis causa linfangite ulcerati-
va, uma infecção dos membros inferiores, e abscessos crônicos na região peitoral.
No gado, pode causar linfadenite ventral, abscessos e dermatite ulcerativa. No gado
do oeste dos EUA têm ocorrido surtos esporádicos. Dois a 5% das vacas podem ser
afetadas com lesões cutâneas ulcerativas extensas e linfangite. É variável a loca-
lização no animal. A cura ocorre freqüentemente sem tratamento ou com tratamento
tópico limitado. A produção de leite não parece ser afetada.
Patogenia e achados clínicos – O início da linfangite ulcerativa é lento e
geralmente manifestado por inflamação dolorosa, nódulos e úlceras, especialmente
na região do boleto; ocasionalmente, a tumefação edematosa pode progredir para
o membro todo. O exsudato é inodoro, espesso, branco-esverdeado e sanguinolen-
to. Geralmente, apenas uma pata é envolvida. As lesões e a tumefação progridem
lentamente e a doença pode tornar-se crônica com recidivas.
No oeste dos EUA, a infecção por C. pseudotuberculosis em cavalos é sazonal,
com um pico de incidência no final do verão e outono. Resulta em abscedação da
região peitoral inferior ou parede abdominal ventral com disseminação secundária
aos órgãos internos. Os sinais clínicos incluem tumefações difusas ou localizadas,
edema ventral comprimido. dermatite ventral da linha média, claudicação, tratos ou
abscessos drenados, febre, perda de peso e depressão. Leucocitose e neutrofilia
podem estar presentes. Febre acentuada ou prolongada indica seqüela intratável:
evacuação crônica, abscessos múltiplos ou internos ou infecção sistêmica com
Linfadenite e Linfangite 80

aborto. Os abscessos podem ser amplos, até 20cm de diâmetro antes de romperem-
se e levar meses para curar. Perda de peso, cólica ou ataxia podem ser os sinais de
abscessos internos. As lesões por dermatite são dolorosas e levemente pruríticas
com alopecia, exsudação e ulceração.
A entrada de bactérias ocorre provavelmente através de ferimentos cutâneos,
vetores artrópodes e contato cutâneo pelos fomitos, tal como equipamento aparador
e arreios contaminados. Condições úmidas e não higiênicas predispõem os animais
a infecções, particularmente dos membros inferiores e região ventral. Entretanto, a
doença também ocorre sob excelentes condições de tratamento.
Diagnóstico – O isolamento de C. pseudotuberculosis das lesões é necessário
para confirmação. Em todas as formas de linfangite em cavalos, as amostras para
cultura incluem os aspirados de abscessos, “swabs” de exsudato purulento debaixo
de escaras associadas com foliculite e biópsias em saca-bocado. O diagnóstico
diferencial inclui piodermia, abscessos, linfangite (causada por Staphylococcus
aureus, Rhodococcus equi, Streptococcus ou Dermatophilus ), dermatofitose,
esporotricrose, criptococose eqüina, blastomicose norte-americana e oncocercíase.
Tratamento – A linfangite e as tumefações dos abscessos precoces são tratadas
com envoltórios quentes, cataplasmas ou hidroterapia. Os abscessos são lanceta-
dos e lavados com solução de iodo. Abscessos grandes necessitam de cirurgia. As
lesões cutâneas e os membros grosseiramente contaminados são limpos diaria-
mente com um xampu de iodóforo. As combinações de trimetoprim-sulfa ou
penicilina têm sido usadas como antimicrobianos; entretanto, o tratamento antimi-
crobiano pode prolongar a doença através da maturação dos abscessos retardados.
A dor e a tumefação são aliviadas pela fenilbutazona. O apoio geral e o cuidado de
enfermagem estão indicados. Se o tratamento for bem-sucedido, a tumefação
regride gradualmente em dias ou semanas. Casos graves ou não tratados freqüen-
temente tornam-se crônicos e ocorrem fibrose e induração da pata.

LINFADENITE E STREPTOCÓCICA DOS S UÍNOS


(SLS, Abscessos mandibulares, Abscessos cervicais)

É uma doença contagiosa de suínos, caracterizada pela abscedação dos


linfonodos cervicais ou cefálicos,ou de ambos. Os suínos afetados geralmente
são os que possuem boa conversão alimentar e bom crescimento. A SLS pode
levar a perdas por condenação das cabeças afetadas e “tempo perdido” neces-
sário para higienização do abatedouro quando um abscesso for incisado aciden-
talmente.
O único hospedeiro conhecido do estreptococo do Grupo E (EGE) é o suíno
(embora o EGE também induza contaminação de feridas por infecções piogênicas
em humanos). Este microrganismo tem sido encontrado em várias partes do mundo,
porém a doença tem tido repercussão economicamente importante somente nos
EUA, onde a incidência está declinando consideravelmente desde meados da
década de 60.
Transmissão, epidemiologia e patogenia – A SLS é endêmica; uma vez que
ocorre numa criação, grupos sucessivos de suínos desenvolvem abscessos durante
os períodos de crescimento e de término. Os suínos podem se infectar pela ingestão
de EGE dos abscessos drenados; entretanto, os suínos portadores já recuperados
são as mais comuns e importantes fontes de infecção. Os suínos recuperados
carregam EGE em suas amígdalas e transmitem o agente rapidamente para os
suínos suscetíveis via contato e por contaminação da água e da lavagem. Os porcos
são resistentes à infecção nas primeiras 3 a 4 semanas de vida.
Os abscessos miliares dispersos se desenvolvem nos nódulos linfáticos dentro
de 7 dias após a infecção. Aproximadamente aos 21 dias, são comuns os abscessos
Doenças Parasíticas do Sangue e do Sistema Cardiovascular 81

medindo de 5 a 8cm de diâmetro; estes destroem a estrutura interna dos nódulos


afetados e podem envolver o tecido adjacente. A incidência pode exceder 50% em
determinados lotes de porcos comerciais, e algumas vezes se aproxima de 100%.
Os abscessos em desenvolvimento podem alcançar a pele, romper-se e drenar em
7 a 10 semanas. A lesão drenada cura-se por granulação, deixando um trato
subcutâneo denso e fibrinoso que é resolvido após várias semanas. Os abscessos
profundos podem permanecer ocultos até a eutanásia do animal; eles não tendem
a drenar para a faringe.
Sinais clínicos, lesões e diagnóstico – Os suínos expostos experimentalmente
ao EGE sofrem uma febre transitória, leucocitose, depressão e anorexia, porém
estes sintomas raramente são observados na infecção natural. Geralmente, os
abscessos são os únicos sinais observados pelo produtor. Os abscessos ocorrem
mais comumente nos linfonodos mandibular e retrofaríngeo. Raramente os linfono-
dos de outras partes do corpo estão afetados. A SLS é diagnosticada pelo
isolamento do EGE do exsudato dos abscessos. A infecção também pode ser
detectada sorologicamente através de um teste de aglutinação.
Tratamento e controle – A SLS pode ser controlada em pocilgas afetadas
através do desmame aos 21 dias e em criações de leitões recém-desmamados em
um ambiente livre de suínos mais velhos. A administração VO de antibióticos de
amplo espectro (tetraciclinas a 50g/ton de forragem) é efetiva profilaticamente, e 200
a 400g/ton de forragem têm resultado numa redução dos abscessos.

DOENÇAS PARASÍTICAS DO SANGUE E DO


SISTEMA CARDIOVASCULAR
ANAPLASMOSE
É uma doença infecciosa dos ruminantes que pode ser aguda ou crônica,
caracterizada por anemia, icterícia e febre. A anaplasmose é freqüentemente
endêmica nos trópicos e subtrópicos, sobretudo nas Américas e África, mas também
é prevalente na Austrália, Ilhas do Pacífico Sul e Ásia Meridional. Nos EUA já foi
identificada em todo o país, mas prevalece no sudeste, centro-oeste e Califórnia.
Etiologia – O agente etiológico, a rickéttsia Anaplasma marginale , é um corpús-
culo pequeno, esférico e sem citoplasma e localiza-se no estroma dos eritrócitos. Seu
diâmetro varia de 0,2 a 0,5µ e consiste em um corpúsculo inicial, que invade o
eritrócito. A multiplicação parece ser por fissão binária em um vacúolo, que
resulta em 2 ou mais corpúsculos iniciais dentro de inclusões que tendem a ser
encontrados nas margens do eritrócito. As inclusões podem atingir 1,0µm de
diâmetro.
A Anaplasma centrale, que se localiza mais centralmente no eritrócito, é uma
espécie relativamente não patogênica encontrada no gado em algumas regiões da
África; uma outra espécie, a Anaplasma ovis ocorre em ovinos e caprinos do mundo
todo e pode causar distúrbios em situações estressantes. Infecções por Anaplasma
spp também ocorrem em vários ungulados silvestres, como cervos e antílopes, sua
importância como reservatório não tem sido claramente estabelecida.
Transmissão e epidemiologia – A anaplasmose já foi trasmitida experimen-
talmente por pelo menos 20 espécies de carrapatos, entretanto, Boophilus e
Dermacentor spp são consideradas os vetores mais importantes. A transmissão
pelo carrapato é biológica. Após um ciclo de desenvolvimento complexo, a
Doenças Parasíticas do Sangue e do Sistema Cardiovascular 82

transmissão ocorre primariamente pela transferência via inter-hospedeiro de


carrapatos machos adultos, ou parcialmente de fêmeas ingurgitadas. Vetores
mecânicos igualmente importantes são moscas como as mutucas ( Tabanus spp)
e moscas dos estábulos (Stomoxys spp). Uma vez que a infecção é facilmente
trasmitida por transferência mecânica de sangue infectado, surtos de proporções
consideráveis já foram atribuídos a práticas de rebanho, como sangramento,
descornificação, castração, marcação de orelhas e vacinação.
Patogenia e sinais clínicos – A severidade da doença varia muito com a idade.
Bezerros sofrem infecções suaves, com pouca ou nenhuma mortalidade. Em
novilhos, a doença é severa, mas recuperação é a regra. No gado adulto, a doença
é mais grave; há uma anemia marcante e a mortalidade varia de 20 a 50%. Todas as
raças de bovinos são suscetíveis.
Os sinais mais precoces incluem depressão, inapetência, indolência e elevação da
temperatura normalmente de 40 a 41°C(104 a 106°F). Vacas em lactação mostram
um rápido declínio na produção de leite. Com o progresso da doença, desenvolve-se
uma anemia marcante, a perda de peso é pronunciada e a desidratação é notada.
Pode-se desenvolver uma icterícia marcante. Não raramente, os animais doentes
sucumbem à hipoxia quando movimentados ou manuseados para tratamento. Se o
animal sobreviver ao período de destruição de eritrócitos, em geral recupera-se
gradualmente, mas este tende a permanecer como portador por toda vida.
Diagnóstico – Em áreas endêmicas, a anaplasmose deve ser suspeitada em
bovinos adultos mostrando anemia sem hemoglobinúria. A icterícia freqüentemente
é um sinal importante. Entretanto, a única evidência indiscutível da doença é a
demonstração de microrganismos nos eritrócitos em esfregaços de sangue por
coloração de Giemsa. De 50 a 60% dos eritrócitos podem estar infectados. A
sorologia ajuda no diagnóstico: tanto o teste de fixação de complemento como o de
aglutinação rápida são usados extensamente, e tanto o teste de imunofluorescência
indireta (IFI) quanto a sonda de DNA estão sendo desenvolvidos atualmente.
Os achados de necropsia são associados à destruição de eritrócitos. O sangue
está fino e aquoso, e a icterícia normalmente é evidente. O baço está aumentado e
mole, o fígado está túrgido e freqüentemente com uma cor sarapintada de castanho-
avermelhado, a bile está espessa e castanho-esverdeada e a vesícula está disten-
dida. Se a morte for súbita sem anemia ou icterícia, pode-se interpretar como
carbúnculo por causa da aparência grosseira do baço.
Tratamento – Os mais efetivos tratamentos para anaplasmose aguda são as
tetraciclinas, principalmente se dadas no começo da infecção, durante o período de
multiplicação do Anaplasma. As formulações de oxitetraciclinas de longa ação,
contendo 200mg/mL, mantêm os níveis sangüíneos. Os esforços para clarear o
transporte de infecções com oxitetraciclina de longa ação têm sido variáveis, algum
sucesso foi relatado com a administração EV em 20mg/kg de peso corporal, 4 vezes
em intervalos de 3 dias ou 3 vezes em intervalos de 7 dias. O imidocarbodipropionato
é muito usado no tratamento de anaplasmose e babesiose (ver adiante), mas não é
aprovado nos EUA.
Um tratamento sintomático e de suporte é importante. Uma transfusão de 4 a 12L
de sangue normal é freqüentemente indicada, e pode ser repetida após 48h, se
necessário. Água, dada em grandes volumes por sonda estomacal, e administração
parenteral de dextrose ajudam muito. Laxativos leves, como óleo mineral podem ser
administrados, mas laxativos salinos devem ser evitados devido ao estado desidra-
tado do animal.
Acompanhando o tratamento, deve-se incomodar o animal o mínimo possível, e,
em casos de gado não acostumado ao manejo, deve ser contra-indicado, uma vez
que um mínimo esforço pode produzir hipoxia e morte. Animais doentes e convales-
centes respondem bem a um manejo cuidadoso e a uma boa nutrição no pasto, com
Doenças Parasíticas do Sangue e do Sistema Cardiovascular 83

acesso a sombra e água fresca. Uma aplicação de repelentes de insetos adequados


proporciona melhor conforto ao animal.
Controle – A incidência da doença pode ser reduzida eliminando-se ou repelindo-
se os vetores no hospedeiro com pós e sprays químicos. Para que estes sejam
efetivos, o gado deve ser banhado, pulverizado ou polvilhado a intervalos freqüentes
durante a estação de vetores. Nos EUA, as grandes moscas sugadoras, particulamente
as mutucas, são consideradas como os mais sérios vetores dos Estados do Golfo,
enquanto os carrapatos Dermacentor aparecem como os mais importantes vetores
naturais no centro-oeste e na costa oeste.
A profilaxia é feita por métodos diversos. Inoculação de sangue contendo
A. centrale (que produz uma infecção leve protegendo contra infecções subse-
qüentes pelo agente virulento A. marginale ) é usada na África, Ásia, Austrália
e em partes da América do Sul, mas não é permitida nos EUA. O uso de formas
isoladas virulentas e atenuadas de A. marginale para induzir premunição ou um
estado de portador crônico em bezerros é amplamente difundido pelo mundo
tropical onde a anaplasmose é endêmica. Os microrganismos virulentos podem
ser administrados a bovinos suscetíveis inoculando-se sangue de um animal
conhecidamente infectado ou uma vacina de anaplasmas do sangue congelado.
O uso de microrganismos virulentos em gado adulto é arriscado, e recomenda-
se o controle de infecção persistente com oxitetraciclina ou clortetraciclina para
acalmar o curso da infecção. A vacina de anaplasmas tem a vantagem de ter a
incubação ou período pré-persistente determinados, conhecendo-se, então, o
tempo de tratamento. Os anaplasmas virulentos geralmente podem ser dados
a bezerros < 1 ano sem tratamento.
A vacina preparada com A. marginale, atenuada por passagens seriadas em
carneiros, é encontrada comercialmente em alguns países latino-americanos, mas
não é aprovada para o uso nos EUA. Também pode ser encontrada uma vacina
inativada com adjuvantes aprovada nos EUA; isto reduz a severidade da infecção na
maioria dos casos.

BABESIOSE
É um grupo de doenças de portadores de carrapatos, causadas por
protozoários do gênero Babesia. A babesiose é um problema significante em
animais domésticos e silvestres, onde quer que existam carrapatos vetores
disponíveis, especialmente nos trópicos. As perdas econômicas mais importan-
tes são causadas no gado por B. bovis e por B. bigemia, atuando individual ou
conjuntamente no mesmo grupo de animais. Como estas 2 espécies dividem os
mesmos carrapatos vetores com a Anaplasma marginale (ver anteriormente),
alguns ou todos estes podem se combinar para produzir uma síndrome fatal
conhecida como febre dos carrapatos.
Transmissão e epidemiologia – Em grande escala, as principais espécies
de Babesia são específicas tanto com relação ao hospedeiro como ao vetor.
Desta forma, B. bovis e B. bigemia são encontradas exclusivamente em gado,
e sua distribuição coincide com aquela dos principal carrapato vetor, as Boophilus
spp. Alguns outros carrapatos podem atuar como vetores, e o mecanismo de
transmissão através da picada por moscas pode ocorrer. Nas Américas e na
Austrália, onde as Boophilus spp são os únicos carrapatos vetores, a doença
pode ser controlada através do tratamento acaricida rotineiro do gado para
eliminá-lo. A parte do ciclo de vida que ocorre no carrapato se inicia quando os
piroplasmas (merozoítas), que se encontram dentro dos eritrócitos do animal
infectado, são absorvidos pelo carrapato fêmea durante o seu ingurgitamento
Doenças Parasíticas do Sangue e do Sistema Cardiovascular 84

final e então são passados transovarianamente para sua progênie larval. O


desenvolvimento das larvas a partir dos ovos ocorre no solo após as fêmeas
ingurgitadas terem caído de seus hospedeiros. A larva então se prende a um
novo hospedeiro, no qual completa o resto do seu ciclo de vida. Este
desenvolvimento se passa num período de 3 semanas e o tratamento acaricida
do hospedeiro durante esta fase pode quebrar o ciclo. Entretanto, B. bovis é
transmitida exclusivamente por larvas em apenas poucos dias, ao contrário de
B. bigemina , que é transmitida por ninfas. Em áreas endêmicas, os animais
jovens estão protegidos por , 2 meses devido aos anticorpos colostrais e por
uma limitada resistência inata; existe uma imunidade que se reverte com a idade
nos rebanhos suscetíveis. Como o desafio da doença ocorre quando os animais
são levados para pastos frescos, habitados por larvas de carrapatos infectantes
recém-saídos da casca, eles devem ser vacinados com vacinas derivadas de
sangue antes da retirada, quando possível.
Patogenia, sinais clínicos e lesões – A infecção por Babesia pode ser extrema-
mente aguda, aguda, crônica ou inaparente. Em um caso agudo típico, o primeiro
sintoma é febre até 107°F ( até 42°C); esta é seguida por sintomas de mal-estar e
inapetência. Durante a alimentação do carrapato, os parasitas presentes na saliva do
carrapato passam para dentro da circulação sangüínea e penetram nos eritrócitos do
hospedeiro, sofrem fissão binária e saem para o plasma para invadirem novas
células. Este ato causa a hemoglobinúria característica (água vermelha) e também
ativa o sistema de calicreína, que aumenta a vasodilatação e a permeabilidade
vascular que é seguida por hemoglobinemia, anemia e anoxia. A anoxia anêmica
causa alterações em órgãos fortemente vascularizados dependentes da capacidade
do transporte de oxigênio do sangue. Assim, o fígado e rins tornam-se aumentados
e escuros, e o baço inchado e pulposo. No caso de infecção por B. bovis, as
congestões vasculares exacerbadas pela presença de fibrinogênio alterado podem
resultar na formação de um tampão que oclui o lúmen do vaso. Quando o SNC é
envolvido, podem resultar incoordenação, ranger dos dentes e mania, seguidos por
coma ou morte. Pode ocorrer icterícia em casos protraídos, porém menos comumen-
te que na anaplasmose. A morte por babesiose cerebral devido a B. bovis pode ser
diagnosticada por detecção no exame do tecido cerebral corado por Giemsa, de
eritrócitos infectados aglutinados preenchendo os capilares.
No caso de morte devida a infecção por B. bigemina , as lesões incluem edema
subcutâneo e IM, icterícia, gordura amarelada e gelatinosa, além de sangue aquoso
e ralo. O baço é muito aumentado, com a polpa esplênica escura e mole; o fígado é
aumentado, pálido e amarelado; a vesícula biliar é distendida com uma bile escura
e espessa. A hemoglobinúria é mais comum com B. bigemina que com B. bovis.
Diagnóstico – O diagnóstico definitivo da babesiose depende da demonstração
do microrganismo causador nos esfregaços sangüíneos finos corados por Giemsa.
Embora os parasitas sejam comuns nos casos agudos, em particular imediatamente
antes da hemoglobinúria característica, pode ser necessário recorrer aos esfregaços
espessos de sangue para confirmar os sintomas precoces (por exemplo, com
algumas cepas de B. bovis) ou para detectar outras Babesia spp (por exemplo, B.
canis). Para diagnóstico específico de babesiose existe disponível uma variedade de
testes sorológicos (fixação de complemento, hemaglutinação indireta e o teste de
imunofluorescência indireta – IFI). O teste IFI é o mais preciso e sensível.
O diagnóstico diferencial de Babesia spp depende da mensuração dos piroplasmas
intra-eritrocíticos; o estágio mais apropriado para mensuração é o piroforme duplo.
Embora todos dentro deste grupo sejam pleomórficos, eles caem em 2 categorias:
grande e pequena. A B. bigemina é uma típica representante da primeira forma,
possuindo piroplasmas piriformes de 4 a 5 × 2µm, enquanto B. bovis é uma típica
Babesia de pequeno tamanho, possuindo piroplasmas piriformes de 2 × 1,5µm.
Doenças Parasíticas do Sangue e do Sistema Cardiovascular 85

Tratamento e controle – A babesiose aguda responde bem a uma série de


tratamentos feitos logo no início, embora a transfusão de sangue possa ser
necessária em estágios mais tardios da doença. Compostos mais antigos, tais
como o sulfato de quinurônio ainda são usados com sucesso, embora o isetionato
de fenamidina, o diisetionato de amicarbalida, o aceturato de diminazeno e o
imidocarbodipropionato sejam mais amplamente utilizados. Para o aceturato de
diminazeno, o nível terápico recomendado é de 3 a 3,5mg/kg (1,4 a 1,6mg/lb) de
peso corporal via IM. Nos estudos de premunição, quantidades de até 0,5mg/kg
(0,25mg/lb) se mostraram eficazes na moderação do curso clínico da infecção e
do controle da parasitemia sem a eliminação da infecção. Para o imidocarbo-
dipropionato usado, particularmente na África, a dose recomendada é 2mg/kg
(1mg/lb); é também eficaz contra a anaplasmose em 3mg/kg(1,4mg/lb) e pode ser
usado profilaticamente para proporcionar várias semanas de proteção aos animais
suscetíveis que estão se locomovendo para uma área endêmica.
As vacinas derivadas de sangue, com cepas de B. bovis e de B. bigemina
atenuadas através de passagens em bezerros esplenectomizados, têm sido utiliza-
das na Austrália para imunizar o gado contra o desafio virulento, e são eficazes se
preparadas corretamente. Tais vacinas também têm sido utilizadas em escala
importante na África e na América Latina, sendo que as cepas da Austrália têm
demonstrado possuir uma ampla proteção cruzada. Se os microrganismos comple-
tamente virulentos forem utilizados para premunição, como em alguns países, a
reação dos animais inoculados deverá ser monitorada com cuidado, particularmen-
te no caso de animais mais velhos, e o agente terapêutico deverá estar à mão. Uma
estratégia de controle eficaz para a babesiose depende do controle dos carrapatos
vetores através do uso de acaricidas em banhos de imersão, pulverizadores de
carreira ou manuais. O uso freqüente e regular dos acaricidas em certas situações
ecológicas eliminará os carrapatos vetores, porém isto pode não ser economica-
mente apropriado em muitas situações nas quais os animais estão amplamente
dispersos e os carrapatos possuem uma sazonalidade marcante. Experiências na
Austrália têm permitido a definição de estratégias particulares de programas de
imersão em diferentes condições climáticas; a solução ideal provavelmente seja
uma situação de estabilidade endêmica resultante da vacinação dos animais de
risco, associada a um programa limitado de imersão.

Outras importantes Babesia spp


Existem > 70 outras espécies reconhecidas de Babesia spp em animais domés-
ticos e selvagens; em animais domésticos são importantes as seguintes:
Bovinos – Na Europa ocorre a Babesia divergens. É pequena como a B. bovis,
porém transmitida pela Ixodes ricinus. Em raras ocasiões ocorreram infecções fatais
em humanos esplenectomizados (em infecções no Novo Mundo devido a uma
babesia de roedor, a B. microti foi identificada em vários casos. No Extremo Oriente
ocorre a Babesia ovata. É uma babesia grande que divide o carrapato vetor,
Haemaphysalis longicornis com a Theileria orientalis (ver pág. 92). A Babesia
jakimovi é uma grande Babesia, é o agente da piroplasmose siberiana e é alojada
pelo corço e transmitida pelas moscas do gado, possivelmente por carrapatos do
gênero Ixodes.
Ovelhas e cabras – A Babesia motasi é encontrada na Europa, norte da África
e na Ásia. É uma grande Babesia transmitida pelo carrapato Haemaphysalis. A
Babesia ovis ocorre na Europa, norte da África e Ásia, porém considerada como
seriamente patogênica somente na Romênia e Bulgária. A transmissão dessa
pequena babesia é realizada pelos carrapatos Rhipicephalus bursa , Ixodes ricinus
e Dermacentor reticulatus.
Doenças Parasíticas do Sangue e do Sistema Cardiovascular 86

Cavalos – A Babesia caballi possui uma ampla distribuição nos trópicos e


subtrópicos, e no sul dos EUA onde existe um foco endêmico no sudeste da Flórida.
Esta grande Babesia é transmitida pela Dermacentor nitens nos EUA e por outras
Dermacentor e Hyalomma spp em outros locais. A Babesia equi possui uma ampla
distribuição e tem sido relatada em mulas, burros e zebras (o reservatório selvagem
na África). É uma pequena Babesia que possui um ciclo de desenvolvimento
incomum: têm sido relatados esquizontes nos linfócitos e é comum a divisão do
piroplasma em 4 microrganismos filhos. A B. equi é capaz de existir em uma ampla
variedade de carrapatos vetores (Dermacentor, Hyalomma e Rhipicephalus spp) e
nichos ecológicos. A patogenicidade e a resposta à quimioterapia de diferentes
cepas é bastante variável.
Porcos – Os suínos abrigam a B. perroncitoi, que é uma pequena Babesia,
e a B. trautmanni, que é uma grande Babesia; ambas são patogênicas, porém
sua distribuição e transmissão não estão claras. Com certeza ocorrem no sul da
Europa e no norte da África.
Cães – A Babesia canis possui uma ampla distribuição, porém causa mais
problemas no sul dos EUA e na África do Sul. É uma grande Babesia, sendo
transmitida principalmente pela Rhipicephalus sanguineus em climas mais quentes,
e pela Dermacentor marginatus nos climas mais frios.
A Babesia gibsoni está presente na Ásia e norte da África, onde os chacais e as
raposas são importantes reservatórios selvagens. É uma Babesia pequena, seme-
lhante a B. equi e é transmitida pela Haemaphysalis bispinosa.

CITAZOONOSE
É uma doença aguda, causada por protozoários, geralmente fatal, de gatos
domésticos, e ocorre de forma esporádica em áreas de mata densa do sul dos EUA.
Etiologia e transmissão – As características clínicas e histopatológicas asse-
melham-se àquelas produzidas pelas Cytauxzoon spp em várias espécies de
ungulados africanos. A Cytauxzoon felis aparentemente é uma nova espécie cujo
ciclo de vida termina em gatos hospedeiros. Suspeita-se de que os carrapatos do
gênero Ixodid sejam os vetores.
Sinais clínicos e lesões – Após 1 a 3 dias, a anorexia e a depressão são
seguidas por pirexia, ≥ 40°C( ≥104°F), e usualmente por desenvolvimento de anemia
e desidratação ou icterícia, ou ambas. A temperatura corporal cai abaixo do normal,
desenvolve-se dispnéia, e a morte se segue em 1 a 3 dias.
Os achados macroscópicos de necropsia incluem palidez generalizada e fre-
qüentemente icterícia; baço e linfonodos ocasionalmente muito aumentados; con-
gestão das veias mesentéricas; e, algumas vezes, petéquias hemorrágicas nos
pulmões, linfonodos, epicárdio e bexiga urinária. Histologicamente, os esquizontes
aparecem dentro de fagócitos mononucleares (macrófagos) que ocluem os princi-
pais canais venosos do pulmão, linfonodos, baço e outros órgãos.
Diagnóstico – É sugestivo o quadro clínico típico em uma área endêmica. A
demonstração de parasitas eritrocíticos em esfregaços sangüíneos corados por
Wright ou por Giemsa, e de parasitas em fase tecidual dentro de fagócitos mononu-
cleares em esfregaços corados de medula óssea ou baço, confirma o diagnóstico. A
Cytauxzoon sp deve ser diferenciada da Haemobartonella felis (ver pág. 33) que é
menor, mais densa e em forma de corrente, e também da Babesia felis. No caso de
Babesia sp, a fase sangüínea pode parecer idêntica, porém os membros da
Babesiidae não possuem fase tecidual (esquizonte). Em esfregaços sangüíneos
corados, as formas eritrocíticas possuem formato de corpos esféricos a ovais (0,5 a
2,0µ em diâmetro) com núcleo vermelho-escuro a púrpura e um citoplasma azul-
Doenças Parasíticas do Sangue e do Sistema Cardiovascular 87

pálido. Em esfregaços teciduais ou preparações histólogicas coradas com H & E,


numerosos esquizontes (2 a 75µm) ou merozoítas (0,5 a 2,0µm) aparecem no
citoplasma de fagócitos mononucleares que recobrem os canais vasculares em
muitos órgãos.
Tratamento e controle – Tentativas preliminares ao tratamento têm documenta-
do sucesso limitado. Parvaquona 10 a 30mg/kg, IM, 1 vez ao dia por 2 a 3 dias resultou
em 2 sobreviventes de 18 gatos. Tiacetarsamida de sódio 0,1mg/kg, EV, 2 vezes ao
dia por 2 a 3 dias resultou em 1 sobrevivente de 2 gatos. Cuidados intensivos mantidos
com líquidos e antibióticos de amplo espectro resultaram em 1 sobrevivente de 25
gatos. Assim, a sobrevida com drogaterapia ou cuidados agressivos mantidos é baixa.
A prevenção geral de exposição a carrapatos ou outros vetores em potencial pode
ajudar no controle.

EPERITROZOONOSE
É uma doença esporádica, febril e hemolítica do gado bovino, suíno, ovino e
de outros mamíferos causada por rickéttsias. Muitas infecções são subclínicas e
a incidência de doença evidente é baixa. Provavelmente a rickéttsia esteja
presente em muitos países e, no caso da Eperythrozoon ovis , as evidências
sorológicas da Nigéria (36%) e Austrália (16,9%) indicam que a incidência de
infecção subclínica é alta; nos EUA, a sorologia indica uma incidência de 15% de
E. suis. Diferentes espécies de parasitas existem em diferentes hospedeiros (por
exemplo, E. suis, E. ovis), e parece que cada um é relativamente hospedeiro-
específico. A transmissão dá-se principalmente pelos piolhos, porém os instru-
mentos cirúrgicos e as agulhas hipodérmicas também têm sido incriminados. Em
casos clínicos, existe um grau variável de anemia hemolítica, febre, anorexia,
fraqueza e icterícia. Muitos casos são leves e transitórios, e costumam ser
secundários a outras condições. Casos mais severos ocorrem em porcos jovens,
e em ovelhas e no gado podem estar associados ao estresse.
Deve ser realizada a diferenciação das anemias nutricionais (ver pág. 21) e
das condições ictero-anêmicas devido a outros agentes infecciosos ou substân-
cias tóxicas. O diagnóstico laboratorial da eperitrozoonose aguda deve ser
realizado pela demonstração de grandes quantidades de rickéttsias em esfrega-
ços de sangue corados por Giemsa. Os parasitas podem ser encontrados livres
no plasma circundando plaquetas ou na superfície dos eritrócitos.
A tetraciclina ou a oxitetraciclina dadas por via IM em doses ≥ 6,6mg/kg de
peso corporal são eficazes em doses únicas contra E. suis . São indicadas drogas
hematínicas (por exemplo,o cacodilato de sódio e a dextrana de ferro) e arseni-
cais (por exemplo, a neoarsfenamina). Se for necessário, a oxitetraciclina dada
oralmente é efetiva no tratamento de rebanhos.

DOENÇAS POR DIROFILÁRIA


DIROFILARIOSE
É uma doença clínica ou subclínica complexa causada pelo verme filariforme
Dirofilaria immitis. A doença apresenta uma distribuição cosmopolita ao nível do mar
dos trópicos e subtrópicos, mas é comum em muitas áreas de maiores elevações
e latitudes, incluindo o Japão, várias partes da Austrália, América do Norte e Europa.
Nos EUA, ocorre freqüentemente em todas as áreas infestadas por mosquitos,
particularmente no sudoeste, nos estados da costa do Atlântico e no meio-oeste. Os
Doenças Parasíticas do Sangue e do Sistema Cardiovascular 88

sintomas clínicos são observados principalmente em cães,embora os gatos e furões


também sejam suscetíveis à infestação.
Etiologia e patogenia – As fêmeas adultas possuem , 27cm de comprimento
e os machos , 17cm. As microfilárias que possuem , 315µm, são eliminadas na
corrente sangüínea onde permanecem ativas por 1 a 3 anos. Só se desenvolvem
melhor quando ingeridas por várias espécies de mosquitos. Dentro dos mosquitos,
o desenvolvimento das microfilárias até a fase de larva (infectiva) é completado em
, 2 semanas. A larva infectiva migra então para as partes bucais e, quando o
mosquito se alimenta novamente, ela é depositada na pele do cão e penetra através
ferimento pela mordida.
Os estágios imaturos se desenvolvem e crescem nos tecidos subcutâneo ou
subseroso por , 2 meses, então começam a migrar para o ventrículo direito,
chegando após 2 a 4 meses de infecção. São necessários mais 2 a 3 meses até que
as larvas atinjam a maturidade. Deste modo, as microfilárias começam a aparecer
na circulação periférica , 6 a 7 meses após o início da infecção. Os vermes adultos
são encontrados primariamente nas artérias pulmonares e no ventrículo direito,
embora em infecções fortes eles possam ser encontrados também no átrio
direito, veias cavas cranial e caudal, e veias hepáticas.
Os vermes impedem o fluxo sangüíneo e provocam endarterites, proliferação
endotelial e tromboses; as microfilárias circulantes podem formar complexos
imunes observáveis nos rins.
Achados clínicos – A duração e a gravidade da infestação, assim como a reação
individual do hospedeiro ao parasita, determinam a intensidade dos sintomas
clínicos. Os achados clínicos mais comuns nos cães são: tosse, diminuição da
tolerância ao exercício e perda de peso. Outros sintomas incluem dispnéia, febre e
ascite. Na síndrome caval, um grande número de vermes adultos no átrio direito e
veia cava provocam fraqueza súbita e, freqüentemente, morte. Isto pode ser
precedido por anorexia e icterícia.
Os sintomas mais comuns nos gatos são anorexia, letargia, tosse, desconforto
respiratório e vômitos. Outros sintomas incluem perda de peso e morte súbita. A
insuficiência cardíaca direita e a síndrome caval são raras nos gatos.
Lesões – As alterações mais comuns nas artérias pulmonares são endarterites,
proliferação das células musculares da subíntima e protrusões rugosas e vilosas no
lúmen. Pode ocorrer trombose de artérias menores resultante de morte de vermes.
O efeito destas lesões, em conjunção com a obstrução por fibrose, é o desenvolvi-
mento de uma hipertensão pulmonar e aumento secundário do coração direito. Os
rins podem apresentar evidência de glomerulonefrite e hemossiderose nos túbulos
contorcidos com moldes de heme na medula. Na síndrome caval, podemos observar
vênulas hepáticas aumentadas, veias hepáticas espessadas e necrose centrilobular.
Diagnóstico – Um diagnóstico provisório é baseado nos sinais, histórico e
exposição, sendo confirmado pela presença de microfilárias de D. immitis em uma
amostra sangüínea. O teste de Knotts modificado e miliporo ou os testes de filtro de
nucleoporo são provas comuns para detecção de microfilárias. As microfilárias de
D. immitis devem ser diferenciadas dos filarídeos não patogênicos da D. repens e
da Dipetalonema reconditum com base em sua morfologia e características
cromatológicas com fosfatase ácida. Como muitas infestações de adultos são
assintomáticas, um exame rotineiro por testes sorológicos (ELISA para antígenos
de D. immitis adulta) é freqüentemente realizado.
A confirmação do diagnóstico é complicada quando os animais são amicrofilarê-
micos. As infestações ocultas são observadas em , 20% dos cães infectados e >
80% dos gatos infectados. Nestes animais, o diagnóstico é baseado na combinação
dos achados clínicos com radiografias toráxicas e/ou testes de ELISA para antíge-
nos de vermes adultos. Os achados radiológicos típicos em cães incluem artérias
Doenças Parasíticas do Sangue e do Sistema Cardiovascular 89

TABELA 7 – Diferenciação das Microfilárias de Dirofilaria immitis e de Dipetalonema


reconditum
D. immitis D. reconditum
Comprimento > 290µm < 275µm
Espessura > 6µm < 6µm
Extremidade anterior cônica arredondada
Extremidade posterior reta às vezes em gancho
Formato do corpo reto crescente

pulmonares lobares aumentadas e por vezes tortuosas; maior proeminência da


artéria pulmonar principal; padrão parenquimal perivascular, com uma distribuição
arterial lobar caudal; e aumento do ventrículo direito. Nos gatos, o achado radioló-
gico mais comum é o aumento das artérias pulmonares lobares caudais.
A ecocardiografia pode auxiliar no diagnóstico da síndrome caval. A evidência
ecocardiográfica modo-M de adultos no átrio direito com movimento para o interior
do ventrículo direito é considerada patognomônica.
Tratamento e controle – Nos cães, o tratamento é dirigido inicialmente para a
destruição dos vermes adultos, seguido por uma terapia microfilaricida (exceto nas
infestações ocultas), e à medicação preventiva subseqüente para proteger contra
nova infecção. O adulticida comumente utilizado é o tiacetarsamida, porém é
potencialmente tóxico. Os testes laboratoriais pré-tratamento são utilizados para
identificar problemas coexistentes, mas a toxicidade aguda por tiacetarsamida é
difícil de prever; na maioria das vezes não há predisposição evidente. A atividade
enzimática aumentada em até 10 vezes não foi associada a aumento do risco. A
observação cuidadosa do animal tratado em busca de evidências precoces de
toxicidade é crítica. Cada cão deve ser examinado cuidadosamente e alimentado
30min antes de cada injeção. Deve ser examinada uma amostra de urina em busca
de evidência de bilirrubinúria, um dos primeiros sinais de toxicidade hepática.
O tratamento deve ser interrompido se o animal vomitar repetidamente, estiver
deprimido, anorético ou ictérico. A bilirrubinúria grosseira após a primeira ou
segunda injeção é uma indicação para que se prossiga com cautela apenas se não
houver nenhum outro sintoma de toxicidade. Se o tratamento for interrompido, deve-
se restringir a atividade do animal e fornecer uma dieta pobre em gordura e rica em
carboidratos. O tratamento adulticida completo deve ser reiniciado em , 4 semanas,
quando a toxicidade aguda é incomum.
O tiacetarsamida deve ser refrigerado, e descartado se apresentar descoloração
alaranjada ou conter precipitado. Cada injeção deve ser administrada em um local
diferente e em uma veia como a periférica quando possível. Se for utilizado um
cateter fixo, deve ser realizada uma verificação cuidadosa da integridade cateter-
veia antes de cada injeção. Tanto o cateter quanto o tiacetarsamida contribuem para
o risco de flebite e ruptura da veia. Se o tiacetarsamida extravasar, a região deve ser
tratada com dimetil-sulfóxido (DMSO) ou DMSO-dexametasona tópico 3 vezes ao
dia por vários dias.
Evidências radiológicas de doença arterial pulmonar grave ou tromboembolismo
são indicações para postergar temporariamente a terapia adulticida, devido ao
maior risco de complicações no tratamento. Durante o confinamento em jaula, são
administrados corticosteróides por 3 a 5 dias. O tratamento adulticida é reinstituído
quando há evidências clínica e radiológica de melhora significativa. Cães com
doença arterial pulmonar grave ou os que apresentam insuficiência cardíaca direita
parecem beneficiar-se de um confinamento prolongado em gaiolas concomitante a
um tratamento com aspirina antes, durante e após a terapia com tiacetarsamida. Os
Doenças Parasíticas do Sangue e do Sistema Cardiovascular 90

cães com síndrome caval devem ter seus vermes removidos por meio de uma
venotomia jugular emergencial.
Após a terapia adulticida, o exercício deve ser restringido por 4 a 6 semanas. A
anorexia, tosse, dispnéia, e febre atribuíveis a morte dos vermes, trombose e
inflamação podem ocorrer nas primeiras 4 semanas (mais freqüentemente em 10
a 17 dias) após o tratamento. Um tratamento antiinflamatório a curto prazo com
corticosteróides bem como o repouso em gaiola podem ser necessários.
O tratamento microfilaricida deve seguir o tratamento adulticida com intervalo de
3 a 6 semanas. O iodeto de ditiazanina é o único microfilaricida aprovado. A
“American Heartworm Society” recomenda o uso da ivermectina como microfilaricida,
mas esta não é uma utilização aprovada oficialmente. O milbemycin oxime, fention
e o levamisol também são utilizados. Quando há um grande número de microfilárias,
é comum uma reação à sua morte, mas não é provável que seja fatal.
O tratamento preventivo deve ser iniciado logo que possível após o tratamento
de infecções ocultas, ou logo que o tratamento microfilaricida se complete. Devem
ser realizados testes de concentração no final do tratamento microfilaricida, e
também repetidos várias semanas depois para detectar um recrudescimento das
microfilárias.
As medidas preventivas aceitas baseiam-se na administração oral de dietilcarba-
mazina, ivermectina ou milbemycin oxime. Estes compostos impedem o desenvol-
vimento do estágio tecidual da larva, o que impede os parasitas de alcançar o
coração. O DEC deve ser administrado diariamente a partir de 1 mês antes da
estação dos mosquitos até 2 meses depois; a ivermectina e o milbemycin oxime são
administrados uma vez por mês a partir do primeiro mês após o início da estação dos
mosquitos até dentro de 1 mês no final da estação. As regiões com população de
mosquitos constante exigem terapia durante o ano todo. Os produtos preventivos não
devem ser administrados aos cães positivos para microfilárias.
O tratamento em gatos é controverso. Pode ocorrer edema pulmonar agudo e
hemorragia, geralmente culminando com morte, em poucas horas após a primeira
ou segunda injeção de tiacetarsamida, que não é aprovada para uso em gatos. As
infecções subclínicas e aquelas caracterizadas por infiltrado pulmonar intermitente
com síndrome de eosinofilia podem não exigir tratamento adulticida. Há evidências
que infecções experimentais podem ser autolimitantes. Uma terapia sintomática
apropriada, como corticosteróides para tosse e infiltrados pulmonares, deve ser
administrada como indicado.

I NFECÇÃO POR ANGIOSTRONGYLUS V ASORUM


(Verme cardíaco francês)
Estas pequenas larvas cardíacas são encontradas ocasionalmente na artéria
pulmonar e no ventrículo direto de cães e raposas nos EUA, Europa e na antiga
URSS. Os machos possuem , 18mm e as fêmeas , 25mm de comprimento. Os
ovos eclodem nos pulmões e as larvas (, 350µm de comprimento) migram para a
faringe e são escretadas nas fezes. O ciclo de vida inclue um caramujo ou uma lesma
terrestre como hospedeiro intermediário.
Ovos ludibriados nos tecidos pulmonares causam formação de granulomas e
esclerose perivascular. A hipertrofia cardíaca e a congestão hepática com ascite têm
sido observadas em alguns casos graves e crônicos. Os animais podem morrer de
insuficiência cardíaca. A interferência no mecanismo de coagulação sangüínea
pode levar à formação de hematomas excessivos e de tumefações subcutâneas. O
diagnóstico é baseado na presença de larvas características nas fezes (as quais
possuem um botão cefálico e uma cauda ondulada com apêndices dorsais). A
diferenciação dos Filaroides é auxiliada pelo fato de as larvas serem mais ativas e
Doenças Parasíticas do Sangue e do Sistema Cardiovascular 91

geralmente muito mais numerosas que nas infecções por Angiostrongylus. A


administração subcutânea de levamisol tem sido eficaz no tratamento.

ESQUISTOSSOMÍASE
(Trematódeos sangüíneos)

Etiologia – Os esquistossomos são trematódeos finos, alongados, que chegam


até a 30mm de comprimento,e que vivem nos vasos sangüíneos do hospedeiro final.
A fêmea permanece dentro de um sulco longitudinal do corpo do macho. Vários
caramujos aquáticos atuam como hospedeiros intermediários. Os esquistossomos
patogênicos para os animais domésticos são amplamente distribuídos pela África,
Oriente Médio, Ásia e alguns países que margeiam o Mediterrâneo. Em muitas
áreas, encontra-se um alto percentual de animais infectados e embora a maioria
possua baixas cargas e seja assintomática, ocasionalmente são relatados graves
surtos devidos a pesadas infestações. Muitos esquistossomos patogênicos são
encontrados nos vasos sangüíneos mesentérico e portal, e os principais sinais
clínicos estão associados com a passagem dos ovos espiculados através dos
tecidos para o lúmen intestinal. Uma espécie, a Schistosoma nasale , é encontrada
nas veias da mucosa nasal de ruminantes e eqüinos, nos quais pode causar coriza
e dispnéia.
Os ovos excretados nas fezes devem ser depositados na água para que possam
eclodir e liberar os miracídios, que invadem os caramujos aquáticos adequados e
se desenvolvem em esporocistos primários e secundários para se tornarem cercárias.
Quando completamente maduras, as cercárias abandonam os caramujos e nadam
livremente na água, onde então permanecem viáveis por várias horas. As cercárias
invadem o hospedeiro final através da pele e das membranas mucosas; durante a
penetração, as cercárias se desenvolvem em esquistossômulos, que são transpor-
tados por via linfática e sangüínea para seus locais de predileção. O período de pré-
patência é de , 6 a 9 semanas.
Nas Áfricas Central e Meridional, a espécie predominante é a S. mattheei que
infecta ruminantes; nas áreas norte e leste é mais comum se encontrar S. bovis. Este
último parasita também ocorre em certas áreas do sul da Europa, no Oriente Médio.
Na Ásia, as espécies S. spindale, S. incognitum, S. (Ornithobilharzia) turkestanicum
e S. japonicum estão disseminadas. A última é de particular importância porque os
ruminantes infectados formam um reservatório para a doença em humanos. A
S. nasale ocorre na Índia subcontinental, Malásia e na área do Caribe.
Achados clínicos – O principal sintoma clínico associado com as formas
intestinal e hepática da esquistossomíase em ruminantes desenvolve-se após o
começo da excreção dos ovos e consiste de enterite hemorrágica, anemia e
emaciação. Os animais severamente afetados demonstram rápida deterioração e
geralmente morrem dentro de poucos meses após a infecção, enquanto aqueles
menos densamente infectados desenvolvem as formas crônicas da doença e
eventualmente podem se recuperar. Em áreas endêmicas da África, muitas cabeças
de gado mais velhas possuem um nível eficaz de imunidade contra a reinfecção. A
esquistossomíase nasal é uma doença crônica do gado bovino, cavalos e eventual-
mente de búfalos. Em casos graves, existe uma descarga mucopurulenta copiosa,
rouquidão e dispnéia; infecções mais leves freqüentemente são assintomáticas.
Lesões – As formas intestinal e hepática da esquistomíase são caracterizadas
pela presença dos trematódeos adultos nas veias portal, mesentérica e submucosa
e subserosa intestinais. As principais conseqüências patológicas, entretanto, estão
associadas aos ovos. Na forma intestinal, as lesões são causadas pela passagem
dos ovos através da parede intestinal, enquanto na forma hepática, menos comum,
Doenças Parasíticas do Sangue e do Sistema Cardiovascular 92

formam-se granulomas ou “pseudotubérculos” ao redor dos ovos. Outras alterações


hepáticas incluem a hipertrofia medial e a hiperplasia das veias portais, o desenvol-
vimento de nódulos linfóides e de folículos por todo o órgão, e fibrose em casos mais
crônicos. A formação de extensos granulomas também ocorre ao longo do trato GI,
especialmente no intestino delgado. Em casos graves são vistas numerosas áreas
de petequiação e de hemorragia difusa na mucosa, e grandes quantidades de
sangue descorado podem ser encontradas no lúmen intestinal. Os vasos sangüí-
neos parasitados freqüentemente estão dilatados e tortuosos. As lesões vasculares
também podem ser encontradas nos pulmões, pâncreas e bexiga de animais
densamente infectados.
Na esquistossomíase nasal, os trematódeos adultos são encontrados nos vasos
sangüíneos da mucosa nasal, porém novamente, as principais conseqüências
patogênicas estão associadas com os ovos, que causam abscessos na mucosa. Os
abscessos rompem-se e liberam ovos e pus na cavidade nasal, que eventualmente
levam a fibrose extensa. Além disso, é comum ocorrerem grandes crescimentos
granulomatosos na mucosa nasal, que ocluem as passagens nasais e causam
dispnéia.
Diagnóstico – A história clínica e os sinais são insuficientes; e é necessária a
identificação dos ovos nas fezes, nos raspados retais ou no muco nasal dos animais
afetados para se confirmar a afecção. Dos ovos com final espiculado, S. bovis e S.
mattheei têm forma de fuso (150 a 250 × 40 a 90µm), aqueles de S. spindale são
mais alongados e achatados de um lado (160 a 400 × 70 a 90µm), e os ovos em forma
de bumerangue da S. nasale possuem de 300 a 550 × 50 a 80µm. Os ovos elípticos
da S. japonicum são relativamente pequenos (70 a 100 × 50 a 80µm) com uma
pequena espinha lateral. Nos casos crônicos, pode não ser possível o encontro de
ovos nas fezes ou no muco nasal, e o diagnóstico deve ser confirmado à necropsia
pelo achado de trematódeos adultos nos vasos sangüíneos.
Controle – As medidas de controle raramente são praticadas em larga escala.
Muitas das doses disponíveis produzem resultados inconsistentes ou possuem
sérios efeitos colaterais. Os remédios mais antigos incluem numerosos compostos
antimoniais, porém se requer um grande cuidado em sua utilização devido a sua
toxicidade. Vários outros compostos têm sido demonstrados como tendo proprieda-
des esquistossomicidas, porém geralmente, o tratamento é antieconômico, já que
costuma requerer um grande número de repetidas doses a intervalos de 2 a 3 dias.
Tais drogas incluem o estibofen, o cloridrato de lucantona, hicantona e o triclorfon.
O praziquantel em 25mg/kg de peso corporal tem se mostrado eficaz, embora possa
necessitar de 2 tratamentos com intervalo de 3 a 5 semanas. Uma vacina radiada
incorporando S. bovis tem sofrido extensos estudos no Sudão e tem se mostrado
altamente eficaz; entretanto, ainda não está disponível comercialmente.
A infecção pode ser reduzida pelo controle do caramujo, que é o hospedeiro
intermediário, utilizando-se moluscicidas (por exemplo, o sulfato de cobre, a
niclosamida ou o trifenmorf), ou através da cercagem da zona de água contaminada
e fornecimento de água de bebida limpa. Estas medidas não somente reduzirão a
incidência de esquistossomíase como também ajudarão no controle de outros
trematódeos parasitas tais como Fasciola gigantica e Paramphistomum spp, que
similarmente possuem caramujos aquáticos como hospedeiros intermediários e
freqüentemente ocorrem nas mesmas localidades que os esquistossomos.

TEILERÍASES
É um grupo de doenças de animais causadas por protozoários parasitas do
gênero Theileria, transmitidos por carrapatos. As espécies mais importantes são a
Doenças Parasíticas do Sangue e do Sistema Cardiovascular 93

T. parva e a T. annulata que causam mortes disseminadas no gado bovino em áreas


tropicais do Velho Mundo.
Tanto o Theileria quanto o Babesia são membros da subordem Piroplasmorina.
Enquanto as babesias são principalmente parasitas de hemácias, o Theileria utiliza,
sucessivamente, leucócitos e hemácias para completar seu ciclo de vida no
hospedeiro mamífero. O estágio de esporozoíta infectante do parasita é transmitido
na saliva dos carrapatos infectados quando se alimentam. Os esporozoítas invadem
os linfócitos (e também monócitos, no caso da T. annulata) e em poucos dias
desenvolvem-se em esquizontes. O desenvolvimento dos esquizontes faz com que
o leucócito hospedeiro se divida; a cada divisão celular, o parasita também se divide.
Deste modo, a população de células parasitadas aumenta e, através de migração,
dissemina-se por todo o sistema linfóide. Posteriormente, uma parte dos esquizontes
sofre merogonia; os merozoítas resultantes infestam hemácias, dando origem a
piroplasmas. Os piroplasmas de Theileria parva sofrem divisão limitada nas hemá-
cias, mas em outras espécies, notadamente T. annulata, T. mutans e T. orientalis,
esta divisão representa uma segunda fase de multiplicação. A ingestão de hemá-
cias infectadas por piroplasmas por carrapatos vetores que se alimentam em
animais infectados é o início de um complexo ciclo de desenvolvimento no qual a
doença é posteriormente transmitida por carrapatos em seu próximo estágio
(transmissão transestagial). Não há transmissão transovariana, como a que ocorre
no Babesia. A ocorrência da doença está limitada pela distribuição geográfica do
carrapato vetor apropriado. Em algumas áreas endêmicas, o gado nativo possui um
grau de resistência inata. A mortalidade nestes animais é relativamente baixa, mas
o gado introduzido na área é particularmente vulnerável.

Febre da costa oriental


É uma doença aguda do gado bovino, caracterizada por febre alta, aumento dos
linfonodos, dispnéia e alta mortalidade, causada pela Theileria parva. Esta doença
é um sério problema nas Áfricas Central e Oriental.
Etiologia e transmissão – Os esporozoítas de Theileria parva são injetados no
gado pelos carrapatos vetores infectados,Ripicephalus appendiculatus, ao se
alimentarem. Com base nos parâmetros clínicos e epidemiológicos, 3 subtipos de
T. parva são reconhecidos, mas provavelmente não são subespécies verdadeiras.
ATheileria parva parva, transmitida principalmente entre gado, e a T. parva lawrencei,
transmitida principalmente dos búfalos para o gado, são altamente patogênicas,
enquanto a T. parva bovis, transmitida entre o gado, é bem menos patogênica .
Diagnóstico, patogenia e sinais clínicos – Há uma fase oculta de 5 a 9 dias
seguidos antes que os lifócitos infectados possam ser diagnosticados em esfrega-
ços corados por Giemsa de drenagem local dos linfonodos. Subseqüentemente, o
número de células parasitadas aumenta rapidamente pelo sistema linfóide e, a partir
do 14º dia em diante, são observadas células sofrendo merogonia. Isto é associado
a uma linfocitólise disseminada, marcante perda de linfócitos e leucopenia. Os
piroplasmas nas hemácias infectadas pelos micromerozoítas resultantes assumem
várias formas, mas tipicamente são pequenos e arredondados ou ovais.
Os sinais clínicos variam de acordo com o nível do desafio, e taxa de inaparente
ou leve para grave e fatal. A pirexia ocorre tipicamente em 7 a 10 dias após a picada
dos carrapatos infectados, continua durante o curso da infecção e pode ser > 42oC.
O aumento dos linfonodos se torna pronunciado e generalizado. Os linfoblastos
analisados em esfregaços de biópsia de linfonodos, corados por Giemsa, contêm
esquizontes multinucleares. Desenvolve-se a anorexia e o animal perde rapidamente
sua condição física; pode ocorrer lacrimejamento e descarga nasal. É comum a
dispnéia, terminalmente. Um pouco antes da morte, é comum uma queda abrupta da
temperatura e o corrimento de exsudato pulmonar pelas narinas. A morte geralmente
Doenças Parasíticas do Sangue e do Sistema Cardiovascular 94

ocorre após 18 a 24 dias. As lesões post mortem mais notáveis são aumento do
linfonodo o edema pulmonar maciço, a hiperemia e o enfisema. Hemorragias são
comuns nas superfícies serosas e mucosas de muitos órgãos, algumas vezes junto
com áreas óbvias de necrose nos linfonodos e timo. Diferente da babesiose, a anemia
não é o principal sintoma diagnóstico, já que é mínima a divisão dos parasitas nos
eritrócitos e, deste modo, não há destruição maciça deles.
Os animais que se recuperam ficam imunes a desafios subseqüentes com as
mesmas cepas, porém podem ser suscetíveis a algumas cepas heterólogas. A
maioria dos animais recuperados ou imunizados permanece portando a infecção.
Tratamento e controle – As perspectivas de sobrevida do gado com febre da
Costa Oeste ou infestação por T. annulata foram ampliadas pelo desenvolvimento
do parvaquone e seu derivado o buparvaquone, e a demonstração de que o sal
lactato do coccidiostático halofuginona possui ação antiteilerial. A clortetraciclina e
a oxitetraciclina, mesmo administradas em grandes doses e tão precocemente
quanto possível, são relativamente ineficazes. No entanto, a imunização do gado
usando um procedimento de infecção-e-tratamento é prática e vem ganhando
aceitação. Os componentes para este procedimento são um estabilizado
criopreservado da(s) cepa(s) apropriada(s) de Theileria derivadas de carrapatos
infectados e uma dose única de oxitetraciclina de longa ação ou buparvaquone
administrados simultaneamente, ou parvaquone administrado , 8 dias após a
infecção. O gado deve ser imunizado 3 a 4 semanas antes de ser solto em pastos
infectados. A incidência da febre da Costa Oeste pode ser diminuída através de um
controle rígido dos carrapatos, porém em muitas áreas isto significa tratamento
acaricida 2 vezes por semana.

Outras teileríases
As Theileria spp em animais domésticos de grande porte e animais selvagens
estão quase onipresentes em áreas do Velho Mundo infectadas por carrapatos, e,
a não ser no gado bovino, a sua diferenciação dentro das espécies não é clara. As
espécies seguintes são importantes: no gado bovino, a Theileria annulata está
amplamente distribuída na África do Norte, área costeira do Mediterrâneo, Centro-
Oeste, Índia, antiga URSS e Ásia. A causa é teileriose tropical ou mediterrânea
e é transmitida por carrapatos do gênero Hyalomma. A T. annulata pode causar
mortalidade de até 90%, porém existe uma variabilidade considerável na patogeni-
cidade das diferentes cepas. Os sinais característicos incluem a febre e o aumento
dos linfonodos superficiais. Subseqüentemente, o gado perde rapidamente sua
condição física e pode ocorrer hemoglobinúria. Os esquizontes e os piroplasmas
são morfologicamente similares àqueles da T. parva . Os esquizontes possuem um
formato mais comumente arredondado ou oval. Podem ser cultivados in vitro, e as
cepas atenuadas produzidas por passagens seriadas formam a base das vacinas
eficazes usadas em Israel, Irã e antiga URSS.
A Theileria orientalis (sergenti) ocorre no Extremo Oriente e, em menor intensida-
de, na Ásia e sul da antiga URSS, onde pode causar uma síndrome patológica em
associação com a T. annulata. A transmissão é efetuada por carrapatos do gênero
Haemaphysalis , e existem cepas levemente patogênicas do parasita na Europa e na
Australásia onde ocorrem as Haemaphysalis spp. Os piroplasmas são maiores que
aqueles da T. parva e T. annulata, e sua divisão intra-eritrocítica é o mais importante
método de multiplicação. A mortalidade é rara, particularmente no gado indígena,
porém é comum uma anemia crônica progressiva.
A Theileria mutans está presente na África e também tem sido relatada na
América Latina. A transmissão é feita por carrapatos do gênero Amblyomma, e a
multiplicação dá-se comumente por divisão intra-eritrocítica. Os piroplasmas são
Doenças Parasíticas do Sangue e do Sistema Cardiovascular 95

indistingüíveis morfologicamente daqueles da T. orientalis e da T. taurotragi (um


parasita africano do elã e do gado), porém os parasitas podem ser diferenciados por
testes sorológicos tais como o de IFI. Algumas cepas de T. mutans são patogênicas
em seu próprio direito. Além disso, as infecções concorrentes podem somar-se aos
elementos de patogenicidade da T. parva da síndrome da febre da Costa Oriental.
Em ovelhas e cabras, 2 espécies de Theileria têm sido amplamente distribuídas
com base em sua patogenicidade relativa. A Theileria hirci pode causar uma
mortalidade de aproximadamente 100%; é encontrada no sul da Europa, na Ásia,
e na África. Demonstrou-se ser transmitida pelo carrapato Hyalomma anatolicum na
Ásia. Os esquizontes podem ser prontamente demonstrados em esfregaços de
biópsia, corados por Giemsa, dos linfonodos superficiais aumentados. As Theileria
spp, (por exemplo, T. ovis ) são espécies não patogênicas e também amplamente
distribuídas; demonstrou-se ser transmitidas pelo carrapato R. evertsi na África e por
carrapatos Haemaphysalis punctata na Europa. Os piroplasmas destas espécies
são polimórficos.

TRIPANOSSOMÍASE
Tripanossomíase transmitida pela mosca tsé-tsé
É um grupo de doenças que afetam todos os animais domésticos, e que são
causadas por protozoários do gênero Trypanosoma. As principais espécies são T.
congolense, T. vivax, T. brucei e T. simiae.
Os principais animais afetados pelos 4 mais importantes tripanossomos transmi-
tidos pela tsé-tsé estão listados na TABELA 8 (adiante). Em ordem de importância,
aquelas que afetam o gado bovino, as ovelhas e as cabras são T. congolense, T.
vivax e T. brucei. Em porcos, a T. simiae é a mais importante. Em cães e gatos, a
T. brucei provavelmente seja a mais importante. É difícil assinalar uma ordem de
importância para cavalos e camelos.
Os tripanossomas que causam a tripanossomíase transmitida por tsé-tsé (doen-
ça do sono) no homem, T. rhodesiense e T. gambiense, se assemelham bastante
a T. brucei dos animais; os isolados de T. brucei de animais são lisados por soro
humano. Existem indicações de que ocorram alterações na resistência ao
soro humano em alguns isolados de T. brucei; portanto, devem ser tomadas as
precauções razoáveis quando se trabalha com estes isolados.
A T ABELA 8 também lista as principais áreas geográficas onde ocorre a
tripanossomíase transmitida pela tsé-tsé. A mosca tsé-tsé está restrita à África,
aproximadamente da latitude 15oN até 29oS.
Transmissão e epidemiologia – A maioria das transmissões por tsé-tsé é cíclica
e começa quando o sangue de um animal infectado por tripanossomo é ingerido pela
mosca. O tripanossomo perde sua capa superficial e multiplica-se na mosca então
readquire uma capa superficial e torna-se infeccioso. A Trypanosoma brucei move-
se do intestino ao proventrículo, à faringe, e eventualmente às glândulas salivares;
o ciclo para T. congolense pára na hipofaringe, e as glândulas salivares não são
envolvidas, o ciclo inteiro paraT. vivax ocorre na probóscide. A forma infecciosa para
o animal, que se encontra na glândula salivar da tsé-tsé, é conhecida como a forma
metacíclica. O ciclo de vida na mosca tsé-tsé pode ser tão curto quanto 1 semana com
T. vivax, ou estender-se por umas poucas semanas como no caso de T. brucei.
As moscas tsé-tsé pertencem ao gênero Glossina , que possui 3 das principais
espécies que habitam em ambientes relativamente distintos: a G. morsitans freqüen-
temente encontra-se em áreas de savana, a G. palpalis prefere áreas ao redor dos rios
e lagos, enquanto a G. fusca vive em áreas de alta floresta. As 3 espécies transmitem
tripanossomos, e todas se alimentam em uma variedade de mamíferos.
Doenças Parasíticas do Sangue e do Sistema Cardiovascular 96

TABELA 8 – Tripanossomos Animais mais Importantes Transmitidos por Moscas Tsé-tsé


Trypanosoma Principais animais afetados Principais distribuições
spp geográficas
T. congolense Gado bovino, ovelhas, cabras, cães, Regiões de moscas tsé-tsé
suínos, camelos, cavalos e a maioria na África
dos animais selvagens
T. vivax Gado bovino, ovelhas, cabras, África, Américas Central e do
camelos, cavalos e vários animais Sul, Índia Ocidental, Ilhas
selvagens Maurício. Nota: em áreas
não tsé-tsé, a transmissão é
feita por moscas picadoras

T. brucei Todos os animais domésticos e vários Regiões de moscas tsé-tsé


selvagens. Muito severa em cães, na África
cavalos e gatos
T. simiae Suínos domésticos e selvagens, Regiões de moscas tsé-tsé
camelos na África

A transmissão mecânica pode ocorrer através de moscas tsé-tsé ou outras


moscas picadoras. No caso deT. vivax, asTabanus spp e outras moscas picadoras
parecem ser os principais vetores mecânicos das áreas da tsé-tsé, como nas
Américas Central e do Sul. A transmissão mecânica requer somente sangue que
contenha tripanossomos infecciosos para serem transferidos de um animal para
outro. Outras espécies de tripanossomos, por exemplo, a T. congolense também
podem ser transmitidas mecanicamente, e ocasionalmente ser encontradas fora
das áreas da tsé-tsé da África.
Patogenia – As tsé-tsé infectadas inoculam tripanossomos metacíclicos na pele
dos animais,na qual os tripanossomos crescem por uns dias e causam tumefação
localizada (cancro). Eles penetram nos linfonodos e então na corrente sangüínea,
na qual se dividem rapidamente por fissão binária. Na infecção por T. congolense,
os microrganismos ligam-se às células endoteliais e alojam-se nos capilares e nos
pequenos vasos sangüíneos. A T. brucei e a T. vivax invadem os tecidos e causam
danos teciduais em vários órgãos.
A resposta imune é vigorosa, e os imunocomplexos causam inflamação, o que
contribui para os sinais e as lesões da doença. São produzidos anticorpos contra as
glicoproteínas da capa superficial e o tripanossomo é morto. Entretanto, os tripanos-
somos possuem múltiplos genes, o que codifica para diferentes glicoproteínas da
capa superficial que não são vulneráveis à resposta imune; esta variação antigênica
resulta na persistência do microrganismo. Não se sabe o número de tipos de glicopro-
teínas antigênicas que podem ser produzidas, porém este excede várias centenas.
A variação antigênica tem evitado o desenvolvimento de uma vacina, e permite que
haja a reinfecção quando os animais são expostos a um novo tipo antigênico.
Achados clínicos e lesões – A gravidade da doença varia com a espécie e a
idade do animal infectado e a espécie de tripanossomo envolvido. O período de
incubação costuma ser de 1 a 4 semanas. Em todos os casos, os sinais clínicos
primários são febre intermitente, anemia e perda de peso. No gado, muitos casos
possuem um curso crônico com alta mortalidade, especialmente se existir uma
deficiência na nutrição ou outros fatores de estresse. Os ruminantes podem se
recuperar gradualmente se o número de moscas tsé-tsé infectadas for baixo;
entretanto, se houver estresse, isto resultará em recaída.
Doenças Parasíticas do Sangue e do Sistema Cardiovascular 97

À necropsia, os achados são variáveis e não específicos para a doença. Em


casos de morte pela forma aguda, existem numerosas petéquias das membranas
serosas, especialmente na cavidade peritoneal. Os linfonodos e o baço também
costumam estar aumentados. Nos casos crônicos, há aumento dos linfonodos,
atrofia serosa da gordura e anemia.
Diagnóstico – O diagnóstico presuntivo baseia-se no encontro de um animal
anêmico, em más condições, dentro de uma área endêmica. A confirmação
depende da demonstração dos tripanossomos em esfregaços delgados ou grossos
de sangue corado, ou em montagens úmidas da área da capa flogística de um tubo
de micro-hematócrito após a centrifugação. A presença de outras infecções que
causam anemia e perda de peso, como babesiose, anaplasmose e teileriose, deve
ser eliminada pelo exame dos esfregaços sangüíneos corados.
Existem vários testes sorológicos que medem os anticorpos para tripanossomos,
porém seu uso é mais apropriado para rebanhos e investigação de áreas do que
para diagnósticos individuais; no entanto, testes para a detecção de antígenos
espécie-específicos dos tripanossomas circulantes no sangue periférico podem
brevemente estar à disposição tanto para diagnósticos individuais como para de
rebanho.
Tratamento e controle – Podem ser utilizadas várias drogas, as mais comuns
destas estão listadas na TABELA 9 (adiante). Muitas possuem um índice terapêutico
limitado, o que torna essencial a administração da dose correta. A resistência às
drogas ocorre e deve ser considerada nos casos refratários.
O controle pode ser exercido em vários níveis, incluindo a erradicação da mosca
tsé-tsé e o uso de drogas profiláticas. O controle parcial da mosca tsé-tsé pode ser
realizado através da pulverização e imersão de animais, pulverização de inseticidas
em áreas de reprodução de moscas, uso de telas impregnadas com inseticidas,
limpeza de matas e outros métodos. Nas áreas com alta população de moscas tsé-tsé
infectadas com tripanossomos, os animais deverão receber drogas profilaticamente.
O problema de resistência a drogas deve ser monitorado cuidadosamente através da
examinação sangüínea freqüente para tripanossomos nos animais tratados.

Surra
(Infecção por T. evansi )
Esta afecção é separada das doenças transmitidas pela mosca tsé-tsé, pois
usualmente é transmitida por outras moscas picadoras que se encontram fora da
área das moscas tsé-tsé. É essencialmente uma doença de camelos e cavalos. Está
presente na África do Norte, no Oriente Médio, Ásia, Extremo Oriente e nas
Américas Central e do Sul. A distribuição de T. evansi na África estende-se até as
áreas da tsé-tsé, onde é difícil a diferenciação de T. brucei. Todos os animais
domésticos são suscetíveis, e a doença pode ser fatal particularmente em camelos,
cavalos e cães. Trypanosoma evansi em outros animais parece não ser patogênica,
e estes animais servem como reservatórios da infecção.
A transmissão é feita primariamente por moscas picadoras, provavelmente
resultante das alimentações interrompidas. Alguns animais selvagens são suscetí-
veis à infecção e podem servir como reservatórios.
A patogenia, os sinais clínicos, as lesões, o diagnóstico e o tratamento são
semelhantes àqueles dos tripanossomos transmitidos por tsé-tsé (ver adiante). As
drogas para o tratamento estão listadas na TABELA 9.

Sífilis eqüina
É uma doença venérea crônica freqüente de cavalos, transmitida durante o
coito e causada por T. equiperdum. Foi reconhecida na costa mediterrânea da
Doenças Parasíticas do Sangue e do Sistema Cardiovascular 98

TABELA 9 – Drogas Comumente Utilizadas no Tratamento das Tripanossomíases em


Animais Domésticos (ver também pág. 1790)
Droga Sinônimos Animal Tripanossomo Ação principal
Aceturato de Berenil, babesin Gado bovino vivax, congolense, Curativa
diminazeno (como sal delactato) brucei (com a possí-
Ganaseg vel exceção
do brucei)
Cães evansi, congolense,
brucei
Brometo de Brometo de Gado bovino vivax, congolense, Curativa
homídio etídio brucei
Eqüídeos vivax
Cloreto de Cloreto de babídio,
homídio cloreto de etídio, Semelhante ao sal brometo
cloreto de novídio
Isometamídio Samorin Gado bovino vivax, congolense Curativa e
M&B 4180 profilática
Protídio Gado bovino vivax, congolense Curativa e
profilática
Sulfato de Sulfato de Gado bovino vivax, congolense Curativa
quinapira- antricida brucei, evansi
mina
Cavalos brucei, evansi,
equiperdum
Camelos evansi
Suínos simiae
Cães congolense, brucei
Quinapiramina Pró-sal antricida Gado bovino, vivax, congolense, Profilática
suínos simiae
Suramina Moranil, naganol Cavalos brucei, evansi, Curativa
equinum
Antripol Camelos evansi
Bayer 205, Cães brucei, evansi
nafurida,
germanina

África, no Oriente Médio, sul da África e na América do Sul; a distribuição é


provavelmente ampla.
Os sinais clássicos podem desenvolver-se num período de semanas ou
meses. Os primeiros sintomas incluem uma descarga mucopurulenta da uretra do
garanhão e da vagina na égua, seguido por edema grosseiro da genitália. Mais
tarde aparecem placas características de 2 a 10cm de diâmetro na pele, e o
animal se torna progressivamente emaciado. Em casos não tratados, a mortali-
dade é de 50 a 70%.
Policitemia 99

É difícil a demonstração de tripanossomos a partir de descargas uretrais ou


vaginais, nas placas da pele, ou no sangue periférico, a menos que o material seja
centrifugado. Os animais infectados podem ser detectados com o teste de fixação
de complemento, porém somente em áreas onde a T. evansi ou a T. brucei não
existem, já que eles possuem antígenos em comum.
Nas áreas endêmicas, os cavalos podem ser tratados (TABELA 9). Quando é
necessária a erradicação, tem sido bem-sucedido o controle rigoroso dos cruza-
mentos e a eliminação dos cavalos desgarrados. Como alternativa, os animais
infectados podem ser identificados pelo teste de fixação de complemento; a
eutanásia é obrigatória.

Doença de Chagas
(Infecção por T. cruzi )
O ciclo de transmissão comum dá-se entre os gambás, tatus, roedores e
carnívoros selvagens, com os percevejos da família Reduviidae servindo como
vetores. A distribuição se dá nas Américas Central e do Sul e em áreas
localizadas no sul dos EUA. A doença de Chagas é de grande importância na
América do Sul. Os animais domésticos podem tornar-se infectados e introduzir
o tripanossomo nas moradias humanas, onde os percevejos estão presentes; o
homem então torna-se infectado pela contaminação de feridas oculares ou por
ingestão de comida infectada com fezes de insetos que contenham tripanosso-
mos. O tripanossomo é patogênico para o homem, e ocasionalmente para cães
e gatos jovens; outros animais domésticos atuam como hospedeiros-reser-
vatórios.

Tripanossomos não patogênicos de animais domésticos


A T. theileri ou tripanossomos muito similares têm sido detectados em culturas
de sangue periférico de gado bovino em todos os continentes. A infecção com
tripanossomos similares também tem sido detectada em búfalos domésticos e
selvagens, e uma variedade de outros ungulados selvagens. Nas poucas áreas
estudadas, a transmissão se dá pela contaminação seguindo um ciclo de
desenvolvimento nas espécies de moscas tabanídeas. Embora a maioria dos
parasitemias seja subpatente, os tripanossomos podem ser observados em
esfregaços sangüíneos examinandos para protozoários patogênicos ou em uma
câmara hemocitométrica. A patogenicidade nunca foi demonstrada experimen-
talmente.
A T. melophagium das ovelhas também possui distribuição mundial e é
transmitida pelo piolho das ovelhas. A T. theodori, observada em cabras, pode ser
um sinônimo do mesmo tripanossomo.

POLICITEMIA
É um aumento relativo ou absoluto do número de eritrócitos circulantes. A
hiperviscosidade sangüínea resultante pode interferir na circulação normal.
Policitemia relativa – A redução do volume plasmático resulta em hemocon-
centração e é a causa mais comum de policitemia em animais domésticos.
Costuma ser um estado transitório devido à desidratação por perda de líquidos
associada a vômitos ou diarréia. O decréscimo de volume plasmático pode ser
Policitemia 100

devido à diminuição da ingestão de eletrólito (especialmente se a ingestão de água


for insuficiente), transporte de fluidos do espaço intra para o extracelular, resultante
de um aumento da permeabilidade vascular, diminuição da perfusão periférica
associada com o choque anafilático ou endotóxico ou fatores não específicos
relacionados ao estresse. A diminuição na concentração de água do plasma pode
ser acompanhada por um aumento temporário na concentração de proteína
plasmática. A hemoconcentração pode mascarar uma anemia.
Pode ocorrer um aumento temporário de eritrócitos circulantes como resultado
de uma contração esplênica e liberação de sangue rico em eritrócitos para dentro
da circulação. O grau de armazenamento esplênico e a liberação variam de acordo
com as espécies, porém é mais marcante em cavalos e cães, nos quais pode ocorrer
um aumento de 10 a 40% nos eritrócitos em poucos minutos.
A contração esplênica é iniciada por fatores como excitação, dor ou estresse;
porém a concentração das proteínas plasmáticas não é mudada. A informação
clínica é necessária para a diferenciação provável da causa do aumento da
concentração eritrocitária.
Policitemia absoluta – Este é um aumento absoluto dos eritrócitos circulantes
geralmente com um volume plasmático normal. O diagnóstico definitivo requer uma
determinação direta da massa de eritrócitos e/ou determinação do volume plasmá-
tico, que normalmente não está à disposição do clínico. O diagnóstico clínico baseia-
se em uma elevação persistente do hematócrito (portanto, não provocada por
contração esplênica) e ausência de resposta à administração de fluidos (portanto,
não causada por hemoconcentração).
A policitemia absoluta pode ser primária ou secundária. A policitemia primária ou
policitemia vera, um distúrbio mieloproliferativo de etiologia desconhecida, é rara,
porém tem sido relatada em cães, gatos e bovinos. A eritropoiese é aumentada,
enquanto o tempo de vida dos eritrócitos é normal, resultando em um aumento
acentuado do volume de eritrócitos (por exemplo,hematócrito > 60%). A esplenome-
galia, leucocitose e/ou trombocitose ocorrem com freqüência em humanos, mas
raramente são relatadas em cães. A concentração da eritropoietina sérica e a
saturação de oxigênio não são aumentadas.
Na policitemia absoluta secundária, o aumento na concentração de eritrócitos
desenvolve-se em resposta à eritropoietina ou a uma substância semelhante a esta.
Mais freqüentemente isto é resultado de hipoxia tecidual devido a doenças cardía-
cas ou pulmonares ou hemoglobinopatia. A policitemia absoluta secundária é
apropriadamente diagnosticada por uma menor pressão parcial de oxigênio arterial
e outras evidências de doença cardiopulmonar.
Carcinoma renal, anormalidades renais não neoplásicas (cistos renais, hidro-
nefrose) ou tumores não renais podem também aumentar a produção de eritropoie-
tina provocando uma policitemia absoluta secundária inapropriada na ausência de
hipoxemia. A concentração plasmática de eritropoietina é muito baixa na policitemia
vera, mas está aumentada na policitemia absoluta secundária. A contagem de
reticulócitos é útil para identificar uma produção aumentada de eritropoietina.
A reticulocitose é esperada na policitemia absoluta secundária, mas não na polici-
temia vera.
Se necessário, o tratamento das várias policitemias deve ser direcionado para a
correção dos mecanismos causadores. A policitemia vera pode ser aliviada por
flebotomias periódicas (por exemplo, 10 a 20mL/kg cada 48h, conforme o necessá-
rio) com ou sem o uso de agentes mielossupressivos, por exemplo, ciclofosfamida
ou hidroxiuréia.
Trombose, Embolismo e Aneurisma 101

TROMBOSE, EMBOLISMO E ANEURISMA


O trombo é um coágulo sangüíneo intravascular ainda no sítio de origem e pode
ser classificado, de acordo com sua localização, como venoso, arterial ou cardíaco
(valvular ou mural). A trombose venosa em animais de grande porte geralmente
envolve a veias jugulares ou a veia cava cranial, e acompanha flebite subseqüente ao
cateterismo venoso prolongado ou administração de soluções irritantes, tais como
fenilbutazona ou sais de cálcio. A trombose da veia cava posterior ocorre em
associação com abscedação hepática no gado e com freqüência resulta em pneu-
monia embólica e lesões arteriais pulmonares. Em cães, a doença pelo verme
cardíaco pode levar a uma trombose arterial pulmonar; o embolismo pulmonar é o
principal efeito secundário. O tromboembolismo pulmonar também é observado
em cães em associação a doenças que resultam em diminuição da concentração
da antitrombina III circulante, por exemplo, amiloidose renal, hiperadrenocorticis-
mo e glomerulonefropatia membranosa. Os trombos arteriais freqüentemente são
formados em associação à arterite parasitária, a forma mais comum de doença
arterial em grandes animais. Os trombos cardíacos sépticos estão associados à
endocardite e os nãosépticos estão associados às doenças do miocárdio. Parte do
trombo ou todo ele pode se destacar e ser carregada corrente abaixo na forma de
êmbolos que se alojam distalmente num ponto de estreitamento. A trombose e
embolismo arterial não sépticos geralmente resultam em isquemia dos tecidos
irrigados pela artéria afetada. Êmbolos sépticos resultam em bacteremia e infec-
ção localizada, bem como isquemia.
Um aneurisma é uma dilatação sacular ou cilíndrica de uma artéria devido a um
enfraquecimento da parede do vaso sangüíneo. O aneurisma pode se formar ao lado
de alterações degenerativas ou inflamatórias, ou por causa de uma ruptura parcial
da parede do vaso. Estas alterações podem afetar também o endotélio, e causa a
formação de trombos com subseqüente formação de êmbolos. Embora o aneurisma,
a trombose, e a formação de êmbolos possam ser reconhecidos simultaneamente,
as síndromes clínicas distintas que envolvem as condições separadas são reconhe-
cidas em certas espécies.
O tipo mais comum de aneurisma ocorre na artéria mesentérica cranial de cavalos
como resultado da arterite causada pela migração larval da Strongylus vulgaris.
Alterações semelhantes na aorta e na artéria ilíaca podem causar trombose ilíaca em
cavalos. O aneurisma da aorta torácica ocorre em alguns cães com granulomas
esofágicos causados por Spirocerca lupi. Aneurismas não parasíticos são vistos
ocasionalmente em todas as espécies. No gado bovino com trombose da veia cava
caudal, aneurismas associados à arterite pulmonar resultante de êmbolos infectados
podem provocar hemorragias nas vias aéreas com epistaxe e morte. A ruptura de
aneurismas aórticos dissecantes pode causar perdas significantes em perus jovens,
em rápido crescimento (ver pág. 1876).
Achados clínicos e diagnóstico – Os aneurismas não causam sintomas clínicos,
a menos que ocorra hemorragia ou se desenvolva um trombo associado. A não ser
pela ruptura aórtica em perus (com morte súbita), a hemorragia associada com a
micose da bolsa gutural dos cavalos, ou aneurisma pulmonar do gado, a hemorragia
aneurismática espontânea é rara, e os sinais clínicos costumam estar associados a
trombose. Os sintomas variam de acordo com o tamanho e a localização do trombo e
se ocorrer a formação dos êmbolos. Em alguns cavalos com aneurismas verminóticos
e trombose, os êmbolos se desenvolvem e ocluem parcial ou completamente os
ramos terminais das artérias mesentéricas. Os segmentos intestinais afetados mos-
tram alterações que variam de congestão passiva a infarto hemorrágico. As manifes-
tações clínicas são cólica, constipação ou diarréia. A cólica costuma ser recorrente e
Trombose, Embolismo e Aneurisma 102
os ataques podem ser severos e prolongados. O diagnóstico normalmente é baseado
em um histórico de cólicas recorrentes, associado à neutrofilia peritoneal sem evidên-
cia hematológica de sepse crônica localizada.
Um aneurisma da aorta abdominal e seus ramos podem ser palpados pelo exame
retal como tumefações firmes fixadas e com superfície irregular áspera que pulsam
com o batimento cardíaco. O frêmito pode estar presente. Nos casos de formação
excessiva de trombos, o pulso pode estar distalmente demorado e ter uma lenta taxa
de elevação da pressão ou estar ausente.
A trombose verminótica, com ou sem aneurisma da aorta terminal e das artérias
ilíacas proximais, produz uma síndrome característica em cavalos. Embora eles
pareçam normais ao repouso, o exercício gradual ocasiona um aumento da
severidade da debilidade das patas posteriores com claudicação uni ou bilateral,
tremores musculares e sudorese. Os animais gravemente afetados não podem
suportar exercícios; se tornam coxos e então caem ou se deitam. Após um pequeno
período de repouso, os sinais desaparecem e os animais parecem normais. Nota-
se temperatura subnormal dos membros afetados, associada a uma diminuição ou
ausência das pulsações arteriais e a demora e diminuição do preenchimento
venoso. Uma palpação retal cuidadosa pode evidenciar variação na amplitude do
pulso das artérias ilíacas internas e/ou externas e vasculatura assimétrica. Nos
casos graves desenvolve-se uma atrofia da musculatura da garupa e a claudicação
pode se tornar evidente em exercícios leves. A oclusão trombótica ou embólica
completa da aorta distal pode provocar paralisia bilateral aguda dos membros
posteriores e recumbência nos eqüinos. Os animais afetados ficam ansiosos, com
expressão de dor, e entram rapidamente em choque. Os membros posteriores ficam
frios e a palpação retal revela ausência de pulsação em ambas as artérias ilíacas.
Uma síndrome diferente ocorre nos gatos como resultado do embolismo aórtico.
Na maioria dos casos há um distúrbio cardíaco primário, mais comumente uma
miocardiopatia. A dinâmica circulatória anormal na miocardiopatia dilatada ou
hipertrófica predispõe à formação de trombos intracavitários, normalmente no átrio
esquerdo; os trombos freqüentemente se deslocam formando êmbolos que obstru-
em os ramos aórticos. O ponto usual de embolização é a trifurcação aórtica, com
obstrução das artérias ilíacas interna e externa e da artéria sacral mediana. Os
sintomas clínicos incluem o início súbito de paresia dos posteriores, dor intensa e
espasmos musculares. Os pulsos femorais são fracos ou ausentes e os membros
posteriores são frios. Se a trifurcação aórtica não for completamente ocluída, o gato
poderá apresentar paresia unilateral ou apenas leves déficits neurológicos em
ambos os membros posteriores. Um êmbolo pode também alojar-se em outros leitos
vasculares sistêmicos ou mais proximalmente na aorta. Tem sido postulado que os
fatores elaborados pelo êmbolo podem inibir a circulação colateral uma vez que a
ligação aórtica não reproduz os sinais clínicos do tromboembolismo aórtico, en-
quanto um trombo experimentalmente produzido o faz. A serotonina e o tromboxano
A2, ambos liberados por plaquetas ativadas, causam vasoconstrição e agregação
plaquetária que provavelmente inibem a circulação colateral e são importantes no
desenvolvimento dos sintomas clínicos.
Nos casos obscuros ou nos que se considera a cirurgia, a angiocardiografia pode
auxiliar a confirmar o diagnóstico de aneurisma, trombose, ou embolismo, e a avaliar
a circulação colateral. Devido à necessidade de anestesia geral, este procedi-
mento é muitas vezes pouco seguro em gatos com uma miocardiopatia dilatada
de base, e economicamente injustificável no gado.
A trombose da veia cava cranial provoca uma dilatação bilateral da jugular sem
pulso venoso. O edema da cabeça, área submandibular e peito com hiperemia
pronunciada da mucosa oral é comum. Pode ocorrer edema significativo da língua,
faringe e/ou laringe, resultando em disfagia e dispnéia. Um edema das vias respira-
Trombose, Embolismo e Aneurisma 103

tórias superiores pode representar perigo de vida, exigindo uma traqueostomia. A


trombose da cava cranial pode resultar de embolização de um trombo jugular ou
extensão de uma lesão de endocardite atrial direita. A trombose da veia cava caudal
pode resultar em embolismo pulmonar e abscedação pulmonar secundária, o que
provoca tosse, taquipnéia, dispnéia e sons pulmonares anormais. Os aneurismas
nas artérias pulmonares que contêm êmbolos sépticos podem romper-se e provocar
hemorragia intrapulmonar, ou os abscessos pulmonares podem erodir-se para o
interior de brônquios, resultando em hemorragia nas vias aéreas. Podem ocorrer
epistaxe e hemoptise. O tromboembolismo arterial pulmonar é uma complicação
freqüente da endocardite do coração direito no gado, mas raramente desenvolvem-
se aneurismas.
Tratamento – Nos eqüinos, os aneurismas causados por Strongylus vulgaris
raramente se rompem, e a maior preocupação é com a trombose e a formação de
êmbolos. Geralmente, a parede arterial está muito envolvida, tornando a remoção
do trombo impraticável, uma vez que outro provavelmente se formaria. O tratamento
antibacteriano e dosagem com anti-helmínticos para matar as larvas migrantes é de
considerável valor para a terapia. A abordagem mais racional para a trombose
mesentérica cranial e aórtico-ilíaca nos cavalos é prevenção e controle da estrongilose
(ver pág. 243).
Os êmbolos aórticos dos gatos podem ser removidos cirurgicamente; no entanto,
a doença cardíaca e especialmente a insuficiência cardíaca aumentam muito o risco
da anestesia geral, além do fato de que uma reperfusão aguda de leitos vasculares
que acumularam grandes quantidades de hidrogênio e potássio pode resultar em
hipercalemia aguda e acidose metabólica intensas o suficiente para provocar
parada cardíaca. A terapia médica, apenas, é mais recomendada, incluindo admi-
nistração judiciosa de líquidos (para manter a hidratação e a pressão sangüínea,
mas não exacerbar a insuficiência cardíaca congestiva), analgésicos e heparina.
Muitos gatos com tromboembolismo aórtico morrem apesar do tratamento, ou não
recuperam a função dos membros posteriores. Alguns gatos paralisados que
sobrevivem à crise cardiovascular inicial recuperam a capacidade de andar após 3
a 7 semanas. A gravidade da cardiopatia freqüentemente determina o prognóstico
a longo prazo.
Os tromboêmbolos pulmonares provocam dispnéia em cães na maioria das
vezes. As radiografias torácicas podem apresentar-se normais, não perfundidas na
região afetada, revelar uma artéria pulmonar principal e o coração direito aumenta-
dos, ou mostrar evidências de hemorragia/infarto pulmonares. A determinação dos
gases sangüíneos normalmente revela hipoxemia com pressão parcial de CO 2 baixa
ou normal. O diagnóstico pode ser confirmado pela angiografia pulmonar ou exame
de ventilação/perfusão com albumina e gases marcados com radioisótopos. As
recomendações terapêuticas são as mesmas que para a tromboembolia aórtica em
gatos. Drogas tromboembolíticas, por exemplo, estreptocinase ou ativador do
plasminogênio tecidual, não foram suficientemente avaliadas em gatos ou cavalos
para justificar sua recomendação terapêutica.
A aspirina (25mg/kg de peso corporal, VO, a cada 72h) é a terapia profilática mais
largamente utilizada para o tromboembolismo felino. A aspirina inibe a agregação
de plaquetas e preserva a circulação colateral inibindo a formação de tromboxano
A2. A terapia com aspirina (17mg/kg, VO, a cada 48h) também foi recomendada
como um auxiliar na prevenção da doença tromboembólica dos eqüinos.
O tratamento das tromboses venosas normalmente limita-se à terapia de
suporte, incluindo hidroterapia das veias acessíveis, agentes antiinflamatórios e
antimicrobianos sitêmicos para controlar a sepse secundária. Veias jugulares
trombóticas foram removidas cirurgicamente com sucesso em eqüinos. A trom-
bose da veia cava cranial ou caudal geralmente tem um prognóstico ruim e não
Trombose, Embolismo e Aneurisma 104

responde à terapia. As medidas para minimizar o trauma e as contaminações


bacterianas nas veias permanecem como os melhores meios para evitar as
tromboses. A terapia anticoagulante com heparina e varfarim tem sido tentada em
cavalos e gatos, sendo razoável no controle da extensão das tromboses, mas é
acompanhada por várias complicações como anemia e hemorragia fatal. Estas
drogas não resolvem um trombo existente.
SISTEMA DIGESTIVO
SISTEMA DIGESTIVO, Introdução ............................................................... 110
Doenças Infecciosas ................................................................................ 114
Introdução ao Parasitismo Gastrointestinal ....................................... 116
Tratamento de Doenças Infecciosas ................................................. 117
Controle de Doenças Infecciosas ...................................................... 118
Doenças Não Infecciosas ........................................................................ 118
Princípios de Terapia ............................................................................... 120
AMEBÍASE .................................................................................................... 120
CAMPILOBACTERIOSE ............................................................................... 121
COCCIDIOSE ................................................................................................ 123
Coccidiose de Gatos e Cães ............................................................. 125
Coccidiose dos Bovinos ..................................................................... 126
Coccidiose dos Caprinos ................................................................... 127
Cocciodiose dos Suínos .................................................................... 127
Coccidiose dos Ovinos ...................................................................... 128
Criptosporidiose ....................................................................................... 129
ANOMALIAS CONGÊNITAS E HEREDITÁRIAS DO SISTEMA
DIGESTIVO .................................................................................................... 130
Boca ..................................................................................................... 130
Dentes ..................................................................................................... 131
Cistos e Fendas Cervicais ....................................................................... 132
Dilatação do Esôfago ............................................................................... 132
Hérnias Abdominais ................................................................................. 132
Atresia ..................................................................................................... 133
Fístula Retovaginal .................................................................................. 134
ODONTOLOGIA ............................................................................................ 134
Desenvolvimento Dentário ....................................................................... 134
Estimativa da Idade pelo Exame dos Dentes .................................... 134
Odontologia, Gr An .................................................................................. 137
Odontologia, Pq An .................................................................................. 140
DOENÇAS EXÓCRINAS DO PÂNCREAS ................................................... 144
Pancreatite Aguda ................................................................................... 144
Insuficiência Pancreática Exócrina .......................................................... 146
Neoplasias Pancreáticas ......................................................................... 147
DOENÇAS DA BOCA, GR AN ...................................................................... 147
Fenda Palatina ......................................................................................... 147
Contusões e Feridas dos Lábios e Bochechas ........................................ 147
Palatite ..................................................................................................... 147
Paralisia da Língua .................................................................................. 148
Toxicose por Eslaframina ........................................................................ 148
Estomatite ................................................................................................ 148
DOENÇAS DA BOCA, PQ AN ...................................................................... 150
Queilite e Dermatite das Pregas Labiais .................................................. 150
Úlcera Eosinofílica dos Gatos .................................................................. 151
Sistema Digestivo 106

Granuloma Eosinofílico Canino ............................................................... 151


Glossite .................................................................................................... 152
Queimaduras da Boca ............................................................................. 152
Estomatite ................................................................................................ 153
Papilomatose Oral Canina ....................................................................... 155
Epúlides ................................................................................................... 155
Neoplasias Orais Malignas ...................................................................... 156
DOENÇAS DO RETO E ÂNUS ..................................................................... 156
Doença do Saco Anal .............................................................................. 156
Fístula Perianal ........................................................................................ 157
Tumores Perianais ................................................................................... 157
Hérnia Perineal ........................................................................................ 158
Constrições Retal e Anorretal .................................................................. 158
Neoplasias Retais .................................................................................... 159
Pólipos Retais .......................................................................................... 159
Prolapso Retal ......................................................................................... 159
Rupturas Retais ....................................................................................... 160
ÚLCERAS GASTROINTESTINAIS ............................................................... 161
GIARDÍASE ................................................................................................... 163
INFECÇÕES INTESTINAIS POR CLAMÍDIAS ............................................. 164
DOENÇAS HEPÁTICAS ............................................................................... 165
SÍNDROMES DE MALABSORÇÃO .............................................................. 169
PERITONITE .................................................................................................. 175
PARALISIA FARÍNGEA ................................................................................ 177
SALMONELOSE ........................................................................................... 178
Salmonelose em Bezerros ................................................................. 181
DOENÇA DE TYZZER ................................................................................... 182

DOENÇAS DO TRATO DIGESTIVO, GR AN


DISTÚRBIOS ABOMASAIS .......................................................................... 183
Deslocamento Abomasal à Esquerda e à Direita, e Vólvulo Abomasal .. 184
Úlceras Abomasais .................................................................................. 187
Impactação Abomasal por Dieta .............................................................. 189
Timpanismo Abomasal em Cordeiros ...................................................... 192
OBSTRUÇÕES INTESTINAIS AGUDAS ...................................................... 193
TIMPANISMO EM RUMINANTES ................................................................. 195
DIARRÉIA VIRAL BOVINA, COMPLEXO DE DOENÇA DAS MUCOSAS ..... 199
CÓLICA EM EQÜINOS ................................................................................. 201
Cólicas em Potros .............................................................................. 207
DOENÇAS DO ESÔFAGO ............................................................................ 207
Impactação ............................................................................................... 207
Divertículo Esofágico (Dilatação) ............................................................. 208
Sistema Digestivo 107

Espasmo Esofágico ................................................................................. 208


Estenose Esofágica ................................................................................. 209
Esofagite .................................................................................................. 210
DISTÚRBIOS DIGESTIVOS DO RÚMEN ..................................................... 210
Sobrecarga por Grãos ............................................................................. 210
Paraceratose Ruminal ............................................................................. 213
Indigestão “Simples” ................................................................................ 214
Indigestão Vagal ...................................................................................... 215
DOENÇAS ENTÉRICAS EM RUMINANTES ................................................ 216
Doenças Entéricas em Bovinos ............................................................... 216
Doenças Entéricas em Ovinos e Caprinos .............................................. 217
Diarréia Neonatal em Ruminantes ........................................................... 217
DOENÇAS ENTÉRICAS EM EQÜINOS ....................................................... 221
Doenças Diarréicas em Cavalos Adultos ................................................. 221
Salmonelose ...................................................................................... 222
Febre Eqüina de Potomac ................................................................. 223
Clostridiose ........................................................................................ 224
Colite-X .............................................................................................. 224
Parasitismo ........................................................................................ 225
Enteropatia por Areia ......................................................................... 225
Doença Infiltrativa .............................................................................. 225
Doenças Diarréicas em Potros ................................................................ 225
Diarréia do Cio do Potro .................................................................... 225
Diarréia Bacteriana ............................................................................ 226
Diarréia Viral ...................................................................................... 226
Causas Variadas ................................................................................ 226
Perda de Peso e Hipoproteinemia ........................................................... 227
Neoplasia Gastrointestinal ................................................................. 227
Doença Inflamatória Intestinal ........................................................... 227
Intoxicação por Fenilbutazona ........................................................... 228
Enterite Proximal ................................................................................ 228
DOENÇAS ENTÉRICAS EM SUÍNOS .......................................................... 229
Enterite por Clostridium perfringens Tipo C ............................................. 229
Doença do Edema ................................................................................... 230
Colibacilose Entérica ............................................................................... 230
Salmonelose Entérica .............................................................................. 231
Torção Mesentérica do Intestino Delgado ............................................... 232
Parasitose ................................................................................................ 232
Diarréia Epidêmica Porcina ..................................................................... 233
Enterite Proliferativa Suína ...................................................................... 235
Constrição Retal ...................................................................................... 235
Enterite por Rotavírus .............................................................................. 236
Enterite por Streptococcus dispar ............................................................ 237
Disenteria Suína ...................................................................................... 237
Gastroenterite Transmissível ................................................................... 238
Outras Viroses Entéricas dos Suínos ...................................................... 239
GASTRITE, GR AN ....................................................................................... 239
PARASITAS GASTROINTESTINAIS DOS CAVALOS ................................ 241
Infecção por Gasterophilus spp ............................................................... 241
Infecção por Habronema spp ................................................................... 242
Sistema Digestivo 108

Infecção por Oxyuris sp ........................................................................... 242


Infecção por Parascaris sp ...................................................................... 243
Infecção por Grandes Estrôngilos ............................................................ 243
Infecção por Pequenos Estrôngilos ......................................................... 244
Infecção por Strongyloides sp .................................................................. 245
Infecção por Vermes Chatos ................................................................... 245
Infecção por Trichostrongylus sp ............................................................. 245

PARASITAS GASTROINTESTINAIS DE RUMINANTES ............................. 246


Parasitas Gastrointestinais de Bovinos ................................................... 246
Infecções por Haemonchus, Ostertagia e Trichostrongylus spp ....... 246
Infecção por Cooperia spp ................................................................. 248
Infecção por Bunostomum sp ............................................................ 248
Infecção por Strongyloides sp ............................................................ 248
Infecção por Nematodirus spp ........................................................... 249
Infecção por Toxocara sp .................................................................. 249
Infecção por Oesophagostomum sp ................................................. 249
Infecção por Chabertia sp .................................................................. 250
Infecção por Trichuris spp .................................................................. 250
Infecção por Vermes Chatos ............................................................. 250
Parasitas Gastrointestinais de Caprinos e Ovinos ................................... 250
Infecções por Haemonchus, Ostertagia e Trichostrongylus spp ....... 251
Tricostrongilose Intestinal .................................................................. 251
Infecções por Bunostomum e Gaigeria spp ....................................... 251
Infecções por Nematodirus spp ......................................................... 252
Infecção por Oesophagostomum sp .................................................. 252
Infecção por Chabertia sp .................................................................. 252
Infecção por Strongyloides sp ............................................................ 253
Infecção por Trichuris spp .................................................................. 253
Infecção por Vermes Chatos ............................................................. 253
Diagnóstico de Parasitismo Gastrointestinal em Ruminantes ................. 254
Tratamento de Parasitismo Gastrointestinal em Ruminantes .................. 255
Medidas Gerais de Controle para Parasitismo Gastrointestinal
em Ruminantes .................................................................................... 257
Bovinos – Considerações Especiais .................................................. 257
Ovinos – Considerações Especiais ................................................... 258

INFECÇÕES POR TREMATÓDEOS EM RUMINANTES ............................. 259


Fasciola hepatica ............................................................................... 259
Fasciola gigantica .............................................................................. 261
Fascioloides magna ........................................................................... 261
Dicrocoelium dendriticum ................................................................... 262
Eurytrema spp .................................................................................... 262
Paranfístomos .................................................................................... 263
PARASITAS GASTROINTESTINAIS DE SUÍNOS ....................................... 263
Infecção por Ascaris sp ............................................................................ 264
Infecção por Macracanthorhynchus sp .................................................... 264
Infecção por Oesophagostomum spp ...................................................... 265
Infecções Verminóticas Estomacais ........................................................ 265
Infecção por Strongyloides sp .................................................................. 266
Infecção por Trichuris sp .......................................................................... 266
Sistema Digestivo 109

ABSCESSOS HEPÁTICOS NOS BOVINOS ................................................ 266


NECROSE DA GORDURA PERITONEAL ................................................... 267
ESTERTORES ABDOMINAIS (“RATTLE BELLY”) EM CORDEIROS ....... 268
RETICULOPERITONITE TRAUMÁTICA ...................................................... 269
DISENTERIA DE INVERNO .......................................................................... 272

DOENÇAS DO TRATO DIGESTIVO, PQ AN

COLITE .......................................................................................................... 273


CONSTIPAÇÃO/OBSTIPAÇÃO .................................................................... 274
GASTROENTERITE POR CORONAVÍRUS ................................................. 275
DOENÇAS DO ESÔFAGO ............................................................................ 276
Acalasia Cricofaríngea ............................................................................. 276
Dilatação do Esôfago (Megaesôfago) ...................................................... 277
Estenose Esofágica ................................................................................. 277
Esofagite .................................................................................................. 278
Corpos Estranhos .................................................................................... 278
ENTERITE ..................................................................................................... 279
DILATAÇÃO–VÓLVULO GÁSTRICOS ........................................................ 281
GASTRITE ..................................................................................................... 284
PARASITAS GASTROINTESTINAIS ............................................................ 285
Infecção por Spirocerca lupi .............................................................. 285
Infecção por Physaloptera spp .......................................................... 286
Estrongiloidose .................................................................................. 286
Ascaríase ........................................................................................... 287
Ancilostomíase ................................................................................... 288
Infecção pelo Verme Chicote ............................................................. 290
Infecção por Oncicola canis ............................................................... 290
Infecções por Cestóideos .................................................................. 290
Infecções por Trematódeos ............................................................... 291
Trematódeos Intestinais ............................................................... 291
Distomíase Hepática .................................................................... 297
GASTROENTERITE HEMORRÁGICA ......................................................... 298
DOENÇAS ENTÉRICAS DO RECÉM-NASCIDO ......................................... 299
PARVOVIROSE ............................................................................................. 299
DOENÇAS SALIVARES ................................................................................ 301
Ptialismo ................................................................................................... 301
Fístula Salivar .......................................................................................... 301
Tumores das Glândulas Salivares ........................................................... 301
Mucocele Salivar ...................................................................................... 302
Sialadenite ............................................................................................... 302
Xerostomia ............................................................................................... 303
OBSTRUÇÃO DO INTESTINO DELGADO .................................................. 303
Sistema Digestivo, Introdução 110

SISTEMA DIGESTIVO, INTRODUÇÃO


O trato digestivo inclui a cavidade oral e órgãos associados (lábios, dentes, língua
e glândulas salivares), o esôfago, o antro cardíaco (retículo, rúmen, omaso) dos
ruminantes e o estômago verdadeiro em todas as espécies, o intestino delgado,
fígado, pâncreas, o intestino grosso, reto e ânus. O tecido linfóide associado ao
intestino ([TLAI] amígdalas, placas de Peyer, tecido linfóide difuso) está distribuído
ao longo do trato GI. O peritônio reveste as vísceras abdominais e está comprome-
tido em muitas doenças do trato GI. Os esforços fundamentais no tratamento dos
distúrbios GI devem sempre estar direcionados para a localização da doença em um
segmento particular e para a determinação da causa. Pode-se, então, formular um
plano terapêutico racional.
Função – As funções primárias do trato GI incluem a apreensão de água e
alimentos; mastigação, insalivação e deglutição do alimento; digestão do alimento
e absorção de nutrientes; manutenção do equilíbrio de fluidos e eletrólitos; e
evacuação dos resíduos da digestão (ver também págs. 1665 e 1681). As funções
primárias podem ser divididas em 4 formas principais que correspondem a 4 formas
principais de disfunção: motilidade, evacuação, digestão e absorção.
A faceta mais importante da motilidade do trato GI normal é a atividade muscular,
que move a ingesta do esôfago ao reto; os movimentos segmentares, que misturam
e revolvem a ingesta; e a resistência segmentar e o tono dos esfíncteres, que retardam
a progressão aboral do conteúdo intestinal. Em ruminantes, estes movimentos são de
importância fundamental no funcionamento normal do antro cardíaco.
Fisiopatologia – A função motora anormal geralmente leva a diminuição da
motilidade. A resistência segmentar é geralmente reduzida e a taxa de trânsito
aumenta. A motilidade depende de estímulos gerados pelos sistemas nervosos
simpático e parassimpático, sendo assim dependente da atividade das partes
centrais e periféricas destes sistemas, e da atividade da musculatura gastrointestinal
e de seus plexos nervosos intrínsecos. Debilidade, acompanhada de fraqueza
muscular, peritonite aguda e hipocalemia, resulta em atonia da parede intestinal (íleo
paralítico). Os intestinos distendem-se com fluidos e gases e com diminuição da
produção fecal. Além disso, uma estase crônica do intestino delgado pode predispor
a proliferação anormal da microflora. Este crescimento bacteriano excessivo pode
causar malabsorção através de lesões às células da mucosa, competição por
nutrientes e pela desconjugação dos sais biliares e hidroxilação dos ácidos graxos.
A irritabilidade aumentada de um determinado segmento aumenta sua atividade,
o que rompe a progressão normal da ingesta do esôfago ao reto. Não apenas a taxa
de passagem de ingesta naquela direção se torna mais alta, mas também o aumento
do potencial de atividade de um segmento irritado pode produzir um gradiente
reverso para os segmentos anteriores, causando ondas peristálticas reversas. É
desta maneira que os conteúdos intestinais, mesmo as fezes, retornam ao estôma-
go são vomitados.
O vômito é um ato reflexo neural que resulta na ejeção de alimento e líquido do
estômago através da cavidade oral. Está sempre associado a eventos anteceden-
tes, como uma premonição, náusea, salivação ou tremores, sendo acompanhado
por contrações repetidas da musculatura abdominal.
A regurgitação é caracterizada por um movimento retrógrado passivo de material
previamente deglutido no esôfago. Em doenças do esôfago, o material deglutido
pode não chegar ao estômago.
Uma das principais conseqüências de motilidade subnormal é a distensão com
fluidos e gás. Boa parte dos fluidos acumulados constitui-se saliva e sucos
gastrointestinais secretados durante o processo normal de digestão. A distensão
Sistema Digestivo, Introdução 111

causa dor e espasmos reflexos dos segmentos intestinais adjacentes. Ela também
estimula a secreção de fluido para o lúmen intestinal, o que exacerba a distensão.
Quando a distensão exceder um ponto crítico, a capacidade de resposta da
musculatura da parede diminui, a dor inicial desaparece e se desenvolve o íleo
paralítico, no qual todo o tono muscular GI é perdido.
A desidratação, o desequilíbrio ácido-básico e eletrolítico e a insuficiência
circulatória são as principais conseqüências da distensão GI. O acúmulo de fluidos
intestinais estimula uma secreção adicional de fluidos e eletrólitos nos segmentos
anteriores do intestino, o que pode piorar as anomalias e levar a choque.
A dor abdominal associada às doenças do trato GI é geralmente causada por
distensão da parede do trato. A contração do intestino por si só não causa dor, porém
o faz por causar distensão direta e reflexa de segmentos vizinhos. Assim, o
espasmo, a contração segmentar exagerada de uma seção do intestino, resultará
na distensão do segmento imediatamente anterior, quando uma onda peristáltica
chegar. Outros fatores que podem causar dor abdominal incluem edema e deficiên-
cia local do suprimento de sangue, por exemplo, embolismo local ou torção do
mesentério.
As doenças específicas causam diarréia por mecanismos característicos e
variados; o reconhecimento destes é útil na compreensão, diagnóstico e terapêutica
das doenças GI. Os principais mecanismos da diarréia são permeabilidade aumen-
tada, hipersecreção e osmose. A hipermobilidade é freqüentemente secundária.
Existe um fluxo contínuo de água e eletrólitos através da mucosa intestinal dos
animais saudáveis. O fluxo secretório (do sangue para o intestino), bem como o fluxo
absorvido (do intestino para o sangue), ocorrem simultaneamente. Em animais
clinicamente normais, o fluxo absorvido excede o fluxo secretório, o que resulta na
absorção líquida. A inflamação dos intestinos pode ser acompanhada por um
aumento no “tamanho do poro” na mucosa, permitindo um fluxo maior através da
membrana (“vazamento”) por redução do gradiente de pressão do sangue para o
lúmen intestinal. Se a quantidade exsudada exceder a capacidade de absorção dos
intestinos, tem-se diarréia. O tamanho do material que vaza através da mucosa
varia, dependendo da magnitude do aumento do tamanho do poro. Grandes
aumentos no tamanho do poro permitirão a exsudação de proteína do plasma,
resultando em enteropatias com perda de proteína (por exemplo, linfangiectasia em
cães, paratuberculose em bovinos, infecções por nematóideos).
A hipersecreção é um efluxo intestinal líquido de fluidos e eletrólitos, que ocorre
independentemente de alterações da permeabilidade, da capacidade de absorção
ou dos gradientes osmóticos gerados de maneira exógena. A colibacilose enterotóxica
é um exemplo de doença diarréica resultante da hipersecreção intestinal: E. coli
enterotoxigênica produz enterotoxinas que estimulam o epitélio das criptas a
secretar fluido além da capacidade absortiva dos intestinos. Os vilos, com suas
capacidades digestiva e absortiva, permanecem intactos. O fluido secretado é
alcalino, isotônico, e livre de exsudatos. Os vilos intactos são benéficos ao animal,
pois a administração oral de um fluido que contém glicose, aminoácidos e sódio é
efetiva, apesar da hipersecreção.
A diarréia osmótica ocorre quando uma absorção inadequada resulta em coleção
de solutos no lúmen intestinal, provocando retenção de água devida à sua atividade
osmótica. Isto ocorre em qualquer distúrbio que resulte em malabsorção ou má-
digestão de nutrientes.
A malabsorção é uma deficiência da digestão e absorção decorrente de algum
defeito nas células digestivas e absortivas vilosas, as quais são células maduras que
revestem os vilos. Vários vírus epiteliotróficos infectam diretamente e destroem as
células epiteliais absortivas vilosas ou seus precursores, por exemplo, coronavírus,
vírus da gastroenterite transmissível dos leitões e rotavírus dos bezerros. Os vírus
Sistema Digestivo, Introdução 112

da panleucopenia felina e parvovirose canina causam destruição do epitélio glandu-


lar, o que resulta na deficiência de renovação das células absortivas vilosas e
colapso dos vilos; a regeneração é um processo mais longo após infecção parvoviral
do que nas infecções virais que afetam o epitélio das extremidades dos vilos (por
exemplo, coronavírus, rotavírus). A malabsorção intestinal também pode ser causa-
da por qualquer defeito que prejudique a capacidade absortiva, como problemas
inflamatórios difusos (por exemplo, enterite linfocítica plasmocítica, enterite
eosinofílica) ou neoplásicos (por exemplo, linfossarcoma).
Outros exemplos de malabsorção incluem defeitos da secreção pancreática, o
que resulta em má-digestão. Raramente, devido à deficiência em digerir a lactose
(que, em grandes quantidades, possui um efeito hiperosmótico), animais de grande
porte neonatos ou filhotes podem ter diarréia, enquanto estão sendo alimentados
com leite. A redução da atividade secretória da enzima digestiva na superfície das
extremidades vilosas das células é característica de infecções virais epiteliotróficas
reconhecidas nos animais de grande porte.
A habilidade do trato GI para digerir alimentos depende de suas funções
secretórias e motoras e, nos herbívoros, da atividade da microflora dos pré-
estômagos dos ruminantes, ou do ceco e cólon de eqüinos e suínos. A flora dos
ruminantes pode digerir celulose; fermentar carboidratos a ácidos graxos voláteis;
e converter substâncias nitrogenadas a amônia, aminoácidos e proteínas. Em
certas circunstâncias, a atividade da flora pode ser suprimida a ponto de a digestão
tornar-se anormal ou cessar. Dieta incorreta, inapetência ou inanição prolongadas
e hiperacidez, como a que ocorre na ingurgitamento por grãos, impedem a digestão
microbiana. Bactérias, leveduras e protozoários também podem ser adversamente
afetados pela administração oral de drogas antimicrobianas ou que alterem drasti-
camente o pH do conteúdo ruminal.
Achados clínicos – As manifestações de doenças do trato GI incluem salivação
excessiva, diarréia, constipação ou defecação insuficiente, vômitos, regurgitação,
hemorragia do trato GI, dor abdominal, tenesmo, distensão abdominal, choque e
desidratação, e desempenho subótimo. A localização e natureza das lesões que
causam má-função freqüentemente podem ser determinadas pelo reconhecimento
e análise dos achados clínicos. Além disso, anormalidades de preensão, mastiga-
ção e deglutição geralmente estão associadas a doenças da mucosa oral, dos
dentes, da mandíbula ou de outras estruturas ósseas da cabeça ou do esôfago. O
vômito ocorre mais comumente em animais com estômago único e, geralmente, é
devido à gastroenterite ou doenças não alimentares (por exemplo, uremia, piometria,
doença endócrina). A regurgitação pode significar doença do esôfago ou orofaringe
e não é acompanhada pelo sinal premonitório de vômito.
Diarréias intensamente aquosas, geralmente, estão associadas à hipersecre-
ção, por exemplo, na colibacilose enterotoxigênica dos bezerros recém-nascidos,
ou com os efeitos (osmóticos) da malabsorção. Sangue e fibrina nas fezes indicam
uma enterite hemorrágica fibrinonecrótica dos intestinos delgado ou grosso, por
exemplo, diarréia viral bovina, coccidiose, salmonelose ou disenteria suína. Fezes
escurecidas retidas (melena) indicam uma lesão hemorrágica no estômago ou parte
superior do intestino delgado. O tenesmo de origem GI geralmente é associado com
doença inflamatória do reto e ânus.
Pequenas quantidades de fezes moles podem indicar uma obstrução parcial dos
intestinos. A distensão abdominal pode resultar de acúmulo de gás, fluidos ou
ingesta, geralmente por hipomobilidade (obstrução funcional, íleo paralítico adinâ-
mico) ou obstrução física (por exemplo, corpo estranho ou intussuscepção). A
distensão pode, é claro, resultar de algo mais direto, como a superalimentação. Um
som metálico ouvido durante a auscultação e percussão do abdome indica uma
víscera cheia de gás. O aparecimento súbito de distensão abdominal severa, em
Sistema Digestivo, Introdução 113

ruminantes adultos, geralmente é devido a timpanismo ruminal. O rechaço e a


sucussão podem revelar sons de movimentação de fluidos quando o rúmen ou o
intestino estão cheios de líquido. Graus variados de desidratação e desequilíbrio
ácido-básico e de eletrólitos, que podem levar ao choque, ocorrem quando grandes
quantidades de fluidos são perdidas na diarréia ou seqüestradas na obstrução
intestinal ou no vólvulo abomasal ou gástrico.
A dor abdominal, que é devida à distensão ou inflamação das superfícies serosas
das vísceras abdominais ou do peritônio, pode ser aguda ou subaguda, e sua
manifestação varia entre as espécies. No cavalo, a dor abdominal aguda é comum
(ver CÓLICA, pág. 201). A dor subaguda é mais comum em bovinos e se caracteriza
pela relutância em mover-se e por mugidos a cada movimento respiratório ou
quando se faz a palpação profunda do abdome. A dor abdominal em cães e gatos
pode ser aguda ou subaguda e se caracteriza por gemidos, latidos, miados e
posturas anormais.
Exame do trato GI – Um histórico completo e acurado e um exame clínico de
rotina revelarão o diagnóstico, na maioria dos casos. Em surtos de doenças do trato
GI em animais de grande porte, o histórico e achados epidemiológicos são de
primordial importância. Se o histórico e os achados clínicos e epidemiológicos forem
consistentes com os de doenças do trato GI, as próximas etapas serão localizar a
lesão dentro do sistema e determinar seu tipo e sua causa.
A anormalidade pode ser localizada nos intestinos delgado ou grosso através do
histórico, exame físico, e características fecais (ver TABELA 1). A distinção é
importante pois diminui os diagnósticos diferenciais e direciona as investigações
subseqüentes.
As técnicas clínicas e laboratoriais e suas aplicações incluem: inspeção visual da
cavidade oral e do contorno do abdome para a distensão ou contração; palpação
pela parede abdominal ou pelo reto, para a avaliação da forma, tamanho e posição
das vísceras abdominais; percussão abdominal para detectar zunidos, o que sugere
a presença de gás nas vísceras; auscultação para determinar a intensidade,
freqüência e duração dos movimentos GI bem como para detectar sons de fluidos
associados ao estômago e intestinos cheios de líquido, e sons de movimento de
fluidos associados às doenças diarréicas; sucussão para revelar os ruídos
chapinhantes; rechaço para avaliar a densidade e tamanho dos órgãos abdominais,
por seus deslocamentos junto à parede abdominal e exame de fezes macroscopica-

TABELA 1 – Diferenciação entre Diarréias do Intestino Delgado e do


Intestino Grosso
Sintomas clínicos Intestino delgado Intestino grosso
Freqüência de defecação Normal ou Muito freqüente
levemente
aumentada
Volume fecal Grande quantidade de Pequenas quantidades, com
fezes volumosas ou freqüência
aquosas
Urgência Ausente Normalmente presente
Tenesmo Ausente Normalmente presente
Muco nas fezes Normalmente ausente Freqüente
Sangue nas fezes Escuro (melena) Vermelho (fresco)
Perda de peso Pode ocorrer Rara
Sistema Digestivo, Introdução 114

mente, para avaliar volume, consistência, cor e verificar a presença de muco,


sangue ou partículas alimentares não digeridas.
A digestão de filme de raio-X ou gel pode ser utilizada para pesquisar enzimas
proteolíticas nas fezes. Os estudos microscópicos incluem exame quanto à presença
de parasitas. O exame quanto à presença de gorduras quebradas e neutras após
coloração por Sudan III é um teste sensível para esteatorréia em pequenos animais.
A citologia de um esfregaço da mucosa retal ou colônica corado com novo azul de
metileno ou corante de Wright em busca de leucócitos fecais é útil para detectar doenças
inflamatórias nos intestinos. Os seguintes testes podem ser úteis (ou necessários):
cultura bacteriana e isolamento de vírus; endoscopia para visualizar a superfície da
mucosa do esôfago, estômago, cólon e reto; abdominocentese para coletar fluido de
vísceras distendidas ou da cavidade peritoneal para exames; radiografias para
diagnosticar doenças obstrutivas através da utilização de técnicas de contraste;
biópsia para obter amostras para exames microscópicos (amostras de intestinos e
fígado são úteis para diagnóstico de enterite crônica e doença hepática); testes de
digestão ou absorção para estimar e diferenciar malabsorção de má-digestão. Os testes
de absorção comuns incluem a tolerância a gordura oral (turbidez plasmática) e os
testes de absorção de glicose e xilose. A função pancreática pode ser avaliada pelo teste
de absorção de bentiromida oral e determinação da imunorreatividade sérica semelhan-
te a tripsina e por laparotomia para fornecer dados de biópsia nos casos em que o
diagnóstico não está claro ou que podem necessitar de correção cirúrgica.

DOENÇAS INFECCIOSAS
A seguir, estão relacionados alguns patógenos comuns de doenças do trato GI.

Vírus
Bovinos, ovinos e caprinos
Diarréia viral bovina
Rotavírus
Coronavírus
Peste bovina
Febre catarral maligna
Língua azul
Suínos
Gastroenterite transmissível
Rotavírus
Coronavírus
Cavalos
Rotavírus
Cães e gatos
Parvovírus canino
Coronavírus canino
Vírus da panleucopenia felina
Rotavírus felino e canino
Astrovírus felino e canino

Rickéttsias
Cavalos
Ehrlichiose (febre de Potomac)
Cães
Envenenamento pelo salmão
Sistema Digestivo, Introdução 115

Bactérias
Bovinos, ovinos e caprinos
Escherichia coli enterotoxigênica
Salmonella spp
Mycobacterium paratuberculosis
Fusobacterium necrophorum
Clostridium perfringens Tipos B, C e D
Actinobacillus lignieresii
Proteus spp
Pseudomonas spp
Yersinia enterocolitica
Suínos
E. coli enterotoxigênica
Salmonella spp
Treponema hyodysenteriae
Clostridium perfringens Tipo C
Cavalos
E. coli enterotoxigênica
Salmonella spp
Rhodococcus (Corynebacterium) equi
Cães e gatos
Salmonella spp
Yersinia enterocolitica
Campylobacter jejuni
Bacillus piliformis
Clostridium spp
Mycobacterium spp

Protozoários
Bovinos, ovinos e caprinos
Eimeria spp
Cryptosporidium spp
Suínos
Eimeria spp
Isospora suis
Cavalos
Eimeria spp
Cães e gatos
Isospora spp
Sarcocystis spp
Besnoitia spp
Hammondia sp
Toxoplasma sp
Giardia sp
Trichomonas spp
Entamoeba histolytica
Balantidium coli

Fungos
Bovinos e suínos
Candida spp
Sistema Digestivo, Introdução 116

Cavalos
Aspergillus fumigatus
Cães e gatos
Histoplasma capsulatum
Candida albicans
Ficomicetos

Algas
Prototheca spp

Parasitas (helmintos)
Estão relacionados nas discussões referentes a PARASITAS GASTROINTESTINAIS
DOS C AVALOS, página 241, RUMINANTES, página 246, SUÍNOS, página 263 e PEQUENOS
ANIMAIS, página 285.

Como a lista anterior indica, o trato GI está sujeito a infecções por diversos
patógenos, que são a causa principal de perdas econômicas devidas a doenças,
desempenho subótimo e morte. A disseminação destas infecções ocorre pelo
contato direto ou pelas vias fecal e oral. Muitos dos patógenos fazem parte da flora
intestinal normal e a doença só ocorre em conseqüência de um evento estressante,
por exemplo, a salmonelose que ocorre no cavalo após transporte, anestesia
prolongada ou cirurgia. A flora intestinal estabelece-se algumas horas após o
nascimento, daí a grande importância da ingestão precoce do colostro para fornecer
proteção contra septicemias e infecções intestinais.
O diagnóstico etiológico definitivo da doença infecciosa do trato GI depende da
demonstração do patógeno no trato ou nas fezes dos animais afetados. Em
epidemias de rebanho, tais como um surto de diarréia aguda indiferenciada em
bezerros ou leitões recém-nascidos, o melhor meio de se estabelecer um
diagnóstico é selecionar animais não tratados no estágio mais inicial da doença
e submetê-los à necropsia e a detalhado exame microbiológico da flora intestinal.
Quando a necropsia seletiva não for uma opção, uma série diária de amostras
fecais, coletadas cuidadosamente, deve ser submetida ao laboratório, com
requisição para técnicas especiais de cultura, dependendo da doença infecciosa
suspeitada.

Introdução ao parasitismo gastrointestinal


O trato GI pode ser habitado por muitas espécies de parasitas. Seus ciclos podem
ser diretos, nos quais ovos e larvas são eliminados nas fezes e seu desenvolvimento
se dá por estágios, até o estágio infectante, que é então ingerido pelo hospedeiro
final. Alternativamente, os estágios podem ser ingeridos por um hospedeiro interme-
diário, geralmente um invertebrado, no qual se processa o desenvolvimento
adicional; a infecção é adquirida quando o hospedeiro intermediário ou os estágios
de vida livre eliminados por aquele hospedeiro são ingeridos. Algumas vezes, não
há desenvolvimento no hospedeiro intermediário, que neste caso, é conhecido
como hospedeiro de transporte ou paratênico, o que depende de a larva estar
encapsulada ou nos tecidos. O parasitismo clínico depende do número e da
patogenicidade dos parasitas, que por sua vez depende do potencial biótico dos
parasitas ou, quando apropriado, de seu hospedeiro intermediário, do clima e das
práticas de manejo. No hospedeiro, resistência, idade, nutrição e doença concomi-
tante também influenciam o curso da infecção parasitária. A importância econômica
do parasitismo subclínico nos animais de grande porte é também determinada pelos
Sistema Digestivo, Introdução 117

fatores anteriores e está, hoje, bem estabelecido que animais levemente parasitados,
sem sinais clínicos de doença, possuem um desempenho menos eficiente, nos
casos de confinamento, produção leiteira ou engorda.
A conversão alimentar no parasitismo leve a moderado é adversamente afetada
tendo como causa primária a redução do apetite e a má utilização da proteína e
energia absorvidas. A qualidade e o tamanho da carcaça também são reduzidos,
resultando em prejuízos financeiros posteriores. Os parasitas internos de animais
de companhia podem causar doenças severas ou prejuízos econômicos e levam a
um aspecto esteticamente indesejável. Além disso, alguns destes parasitas também
podem infectar o homem.
Como o parasitismo é facilmente confundido com outras condições debilitantes,
o diagnóstico depende muito das características sazonais da infecção parasitária do
histórico prévio da fazenda e do exame de fezes, para evidência de oocistos ou ovos
de vermes. Os níveis elevados de pepsinogênio sérico podem ser indicativos de
algumas infecções abomasais, tal como é o nível elevado de enzimas hepáticas no
soro, na infecção hepática por fascícola. Técnicas sorológicas, tais como ELISA e
a produção de anticorpos monoclonais, estão em desenvolvimento; o sorodiagnóstico
está tornando-se mais usado, à medida que a especificidade dos testes aumenta.
Eles são particularmente úteis em animais de companhia, que abrigam parasitas
incriminados em zoonoses.
Avanços da epidemiologia (particularmente no que diz respeito aos fatores que
afetam o desenvolvimento sazonal dos estágios de vida livre e sua sobrevivência),
acoplados à descoberta de anti-helmínticos altamente eficientes e de amplo
espectro, têm feito com que o tratamento e o controle bem-sucedidos de parasitas
gastrointestinais sejam possíveis e práticos. A resposta à terapia é geralmente
rápida e tratamentos simples são suficientes, a menos que ocorra reinfecção ou que
as lesões sejam particularmente severas. O controle profilático em animais de
grande porte é, em geral, alcançado pela integração do manejo das pastagens com
o uso de anti-helmínticos. Os métodos avançados de aplicação de anti-helmínticos,
tais como as técnicas de “pour-on”* ou dispositivos para liberar ou manter os
batimentos também têm auxiliado. As estratégias para evitar parasitismo e perdas
de produção relacionadas são agora parte de qualquer programa moderno de
sanidade de rebanho ou haras. Programas preventivos similares são igualmente
importantes no controle do parasitismo de animais de estimação. Para a estimativa
da carga parasitária interna, ver página 1152. (O controle por vacinação é limitado
a vermes pulmonares: vacinas para bovinos estão disponíveis em vários países
europeus; a vacina contra o verme pulmonar ovino está disponível em algumas
partes do sudeste da Europa, e no Oriente Médio)

Tratamento de doenças infecciosas


Agentes antimicrobianos são utilizados para o tratamento de doenças bacteria-
nas e os anti-helmínticos para doenças parasitárias. Não existe terapia específica
para tratamento de doenças virais. Os antimicrobianos são comumente administra-
dos por via oral, diariamente, por vários dias até que a recuperação seja aparente,
porém existem poucas evidências objetivas de sua eficácia. A administração
parenteral de antimicrobianos é indicada nos casos de septicemia aparente ou
inevitável. A escolha do agente antimicrobiano dependerá da doença suspeitada,
dos resultados prévios e custos das drogas. Em surtos epidêmicos de rebanho, os
antimicrobianos podem ser adicionados aos suprimentos de alimento ou água, em

* N. do T. – Aplicação de anti-helmínticos na linha dorsal.


Sistema Digestivo, Introdução 118

níveis terapêuticos, por vários dias, seguido de níveis profiláticos, por um período
cuja duração dependa da pressão da infecção sobre a população. O suprimento de
alimento e água de animais em contato também pode ser medicado, numa tentativa
de impedir a ocorrência de novos casos.

Controle de doenças infecciosas


O controle efetivo das doenças infecciosas mais comuns do trato GI depende de
sanitarização e higiene, do desenvolvimento e manutenção de resistência não
específica do animal e, em certos casos, do fornecimento de imunidade específica
por vacinação do animal prenhe ou suscetível.
A sanitarização e a higiene efetivas são alcançadas, primariamente, pela
provisão de espaço adequado para os animais e limpeza regular das instalações e
remoção eficiente do esterco do ambiente próximo. O desenvolvimento e manuten-
ção da resistência não específica dependem da seleção genética dos animais que
tenham um nível razoável de resistência herdável e do fornecimento de abrigo e
nutrição adequados, o que minimiza o estresse e permite que o animal cresça e se
comporte normalmente. O desenvolvimento de animais clinicamente normais,
porém infectados, que podem disseminar os patógenos por semanas ou meses, é
um dos principais problemas de algumas doenças infecciosas do trato GI, por
exemplo, salmonelose. O ideal é que estes animais portadores sejam identificados
por meios microbiológicos, isolados do resto do rebanho até que estejam livres da
infecção ou descartados.
Certas doenças, por exemplo, colibacilose enterotoxigênica, em bezerros e
leitões, podem ser controladas por vacinação da mãe várias semanas antes do
parto. Este método depende da passagem de níveis protetores de anticorpos no
colostro. Existem exceções, porém, na maioria dos casos, a imunidade sistêmica
fornece pouca proteção contra as enterites infecciosas; a imunidade efetiva contra
as doenças GI depende de estímulo da imunidade intestinal local, após o período
neonatal. Durante o período neonatal, a proteção pode ser fornecida pela ação local
dos anticorpos derivados do colostro ou do leite. Por exemplo, o anticorpo IgA
secretório aumenta progressivamente no leite da porca, desde a época da parição
até o desmame, o que fornece ao leitão uma proteção diária durante o período de
aleitamento.

DOENÇAS NÃO INFECCIOSAS


As principais causas incluem: empanzinamento por excesso de alimento ou por
alimentos indigeríveis, agentes químicos ou físicos, obstrução do estômago e
intestinos causada pela ingestão de corpos estranhos ou por qualquer deslocamen-
to físico ou lesão do trato GI que interfiram no fluxo da ingesta, deficiências
enzimáticas, anormalidades da mucosa que interferem na função normal (úlceras
gástricas, doença intestinal inflamatória, atrofia vilosas, neoplasias) e defeitos
congênitos. As cólicas eqüinas são um caso especial, dada a alta prevalência de
lesões dos intestinos por parasitas, o que predispõe o animal a disfunções agudas
e subagudas. As causas de várias doenças são incertas; estas incluem doenças tais
como úlceras abomasais em bovinos, úlceras gástricas em porcos e potros, torção
gástrica em cães, e obstrução intestinal aguda e deslocamento do abomaso em
bovinos. Dentro do grupo de doenças não infecciosas do trato GI, geralmente,
apenas um único animal é afetado em um determinado período; são exceções as
doenças associadas à ingestão excessiva de alimento ou os envenenamentos que
ocorrem na forma de um surto no rebanho.
Algumas das doenças não infecciosas comuns do trato GI estão listadas
adiante.
Sistema Digestivo, Introdução 119

Cavidade oral
Estomatite
Doenças dos dentes e periodonto
Neoplasia

Esôfago
Esofagite traumática
Obstrução esofágica
Megaesôfago

Estômago simples
Gastrite (agentes químicos e físicos, doença inflamatória crônica)
Ulceração
Dilatação e torção
Retenção gástrica
Neoplasia

Estômagos de ruminante
Indigestão simples
Sobrecarga do rúmen (sobrecarga de grãos, acidose láctica ruminal)
Timpanismo ruminal (“bloat”)
Reticuloperitonite traumática e suas seqüelas
Deslocamento esquerdo do abomaso
Distensão direita com ou sem torção do abomaso
Úlcera abomasal
Impactação dietética do abomaso

Intestinos
Diarréia por superalimentação ou dieta indigerível
Inflamação (por exemplo, enterite eosinofílica ou linfocítica-plasmocítica)
Neoplasia
Obstrução
Enterite por envenenamento (sais de cobre, chumbo, arsênio inorgânico, fósforo,
fluoretos, molibdênio, produtos de petróleo, plantas tóxicas, águas salinas e
alcalinas)

Cólicas eqüinas
Dilatação gástrica
Cólica espasmódica
Timpanismo intestinal
Impactação do intestino grosso
Obstrução intestinal aguda
Cólica tromboembólica secundária à arterite mesentérica verminosa

Peritônio
Seqüela de necrose isquêmica do(s) estômago(s) ou intestinos
Perfuração traumática do(s) estômago(s) ou intestinos
Pós-cirúrgica
Tumores ou abscessos
Sistema Digestivo, Introdução 120

PRINCÍPIOS DE TERAPIA
Embora a remoção da causa da doença deva ser o objetivo primário, a parte
principal do tratamento é sintomática e de suporte, visando à atenuação da dor,
corrigindo as anormalidades e facilitando a cura (ver também págs. 1665 e 1681).
Um resumo dos princípios básicos de terapia inclui:
Remoção da causa primária – Agentes antimicrobianos, coccidiostáticos,
antifúngicos, anti-helmínticos, antídotos para venenos e correção cirúrgica de
deslocamentos (ver também pág. 116).
Correção da mobilidade anormal – A correção da mobilidade excessiva ou
deprimida parece racional, porém, freqüentemente, existe incerteza a respeito da
natureza e do grau de mobilidade anormal, e as drogas disponíveis podem não
fornecer resultados consistentes. Existem poucas evidências clínicas para reco-
mendar o uso rotineiro de medicamentos anticolinérgicos ou opiáceos para retardar
o trânsito intestinal. A diminuição do trânsito intestinal pode ser contraprodutiva para
o mecanismo de defesa da diarréia, agindo para evacuar os microrganismos nocivos
e suas toxinas. Em geral, as drogas anticolinérgicas provavelmente são justificadas
apenas como um alívio sintomático de curto prazo para a dor e o tenesmo
associados às doenças inflamatórias do cólon e do reto.
Reposição de fluidos e eletrólitos – Isto é necessário quando a desidratação
e o desequilíbrio ácido-básico e de eletrólitos ocorrerem, como na diarréia, vômito
persistente, obstrução intestinal ou torção do(s) estômago(s), nos quais grandes
quantidades de fluidos e eletrólitos são seqüestradas (ver pág. 1642).
Alívio da distensão – A distensão do trato GI com gases, fluidos ou ingesta pode
ocorrer em qualquer nível, devido a obstrução física ou funcional. A distensão pode
ser atenuada por medicamentos ou sonda estomacal (como no timpanismo em
ruminantes), ou por intervenção cirúrgica, que pode ser necessária (como na
obstrução intestinal aguda ou torção do abomaso em ruminantes, ou do estômago
nos monogástricos).
Alívio da dor abdominal – Podem ser administrados analgésicos para o alívio
da dor abdominal que afeta reflexamente outros sistemas corporais (por exemplo,
colapso cardiovascular), ou quando a dor levar o animal a machucar a si próprio, por
atividades violentas (rolamento, escoiceamento, investidas contra obstáculos). Os
animais tratados com analgésicos devem ser monitorados regularmente para
assegurar que o alívio da dor não forneça uma sensação falsa de segurança; a lesão
pode piorar progressivamente enquanto durar a influência do analgésico.
Reconstituição da flora do rúmen – Em casos de anorexia prolongada ou
indigestão aguda nos ruminantes, a microflora ruminal pode ser seriamente exau-
rida. A flora pode ser reconstituída pela administração oral de suco ruminal de um
animal normal (transfaunação), que contenha bactérias e protozoários do rúmen e
ácidos graxos voláteis.

AMEBÍASE
É uma colite aguda ou crônica caracterizada por uma diarréia persistente ou
disenteria prevalente nas áreas tropicais de todo o mundo. A amebíase é comum no
homem e em primatas não humanos, sendo algumas vezes observada no cão, mas
raramente em outros mamíferos. Várias espécies de amebas ocorrem nos animais,
porém o único patógeno conhecido é a Entamoeba histolytica. O homem é o hospedeiro
natural para esta espécie e é a fonte usual de infecção para os animais domésticos.
Campilobacteriose 121

Achados clínicos – Entamoeba histolytica pode viver no lúmen do intestino


grosso como um comensal ou invadir a mucosa intestinal, produzindo uma colite
ulcerativa e hemorrágica discreta a severa. Os pacientes com doença aguda podem
desenvolver disenteria fulminante, que pode ser fatal ou que progride para a
cronicidade ou recuperação espontânea. Nos casos crônicos, pode haver perda de
peso, anorexia, tenesmo, diarréia crônica ou disenteria, que podem ser contínuos
ou intermitentes. Raramente, as amebas podem se metastatizar a outros órgãos,
pele perianal e genitália. Os sintomas podem assemelhar-se aos de outras doenças
colônicas (por exemplo, tricuríase, balantidíase).
Diagnóstico – O diagnóstico definitivo depende do achado dos trofozoítas de E.
histolytica nas fezes pelo exame direto de esfregaços de soluções salinas, ou em
secções do tecido colônico afetado. Os trofozoítas medem, em média, de 20 a 40µm
de diâmetro e possuem um único núcleo vesicular. São vagarosamente móveis e
podem conter eritrócitos ingeridos. Esfregaços fecais fixados e corados podem ser
necessários para a identificação, pois podem-se confundir os leucócitos fecais com
as amebas. Os cistos de espécies não patogênicas de amebas e de E. histolytica
são raramente encontrados nas fezes de cães ou gatos.
Tratamento – Poucas informações sobre o tratamento em animais estão
disponíveis. O metronidazol (10mg/kg, VO, duas vezes ao dia por 1 semana) ou
furazolidona (2mg/kg, VO, três vezes ao dia por 1 semana) são sugeridos.

CAMPILOBACTERIOSE
A campilobacteriose gastrointestinal, causada pela Campylobacter jejuni ou
C. coli, é atualmente reconhecida como causa de diarréia em vários hospedeiros
animais, incluindo cães, gatos, bezerros, ovinos, furões, visom, várias espécies de
animais de laboratório e no homem. Nos humanos é uma das maiores causas
de diarréia. Campylobacter jejuni e C. coli também são recuperadas de fezes de
carreadores assintomáticos (ver também CAMPILOBACTERIOSE G ENITAL DOS OVINA, pág.
792). Os animais domésticos, incluindo cães e gatos (especialmente os recente-
mente adquiridos em abrigos ou canis), e os animais selvagens mantidos em
cativeiro podem servir como fontes de infecção para os humanos. O(s) agente(s)
também é isolado freqüentemente das fezes de galinhas, perus, porcos e outras
espécies.
A doença é cosmopolita e sua prevalência parece estar crescendo conforme as
técnicas de cultura apropriadas para C. jejuni e C. coli são melhoradas e atualizadas.
As manifestações clínicas podem ser mais graves em animais mais jovens. Em
estudos que utilizaram anticorpos monoclonais e policlonais, Campylobacter spp
(provavelmente não C. jejuni) foi associado a ileíte proliferativa em hamsters,
enterite proliferativa dos suínos e colite proliferativa dos furões. Não foi provada
experimentalmente a relação de causa e efeito, no entanto, devido a impossibilidade
de se desenvolver uma cultura de Campylobacter sp intracelular in vitro.
Etiologia – O Campylobacter é uma bactéria Gram-negativa, microaerofílica,
delgada, curva e móvel, com um flagelo polar. A Campylobacter jejuni é rotineira-
mente associada com doenças diarréicas, no entanto, a C. coli, distinguida da C.
jejuni com base na hidrólise do hipurato, é ocasionalmente isolada em animais
diarréicos e rotineiramente obtida de suínos assintomáticos. Mais recentemente, foi
isolada outra Campylobacter intestinal catalase-negativa, a “C. upsaliensis”, de
cães com diarréia, assim como em cães e gatos assintomáticos. O Campylobacter
(Vibrio) sp foi anteriormente associado à disenteria suína, mas hoje em dia reconhe-
Campilobacteriose 122

ce-se que ela é causada pela Treponema hyodysenteriae. A relação entre


Campylobacter sp e enterite proliferativa suína (ver pág. 235) não é clara. Um
Campylobacter gástrico recentemente descoberto, C. pylori, é acusado de causar
gastrite e úlceras gástricas e duodenais no homem, além de provocar experimen-
talmente gastrite em leitões gnotobióticos. Microrganismos gástricos semelhantes
foram isolados em primatas não humanos e furões. Serão necessários maiores
estudos para avaliar sua importância.
Devido às necessidades de crescimento lento e de condições microaerofílicas,
os métodos padrão utilizados para cultivo requerem meios seletivos nos quais é
incorporada uma grande variedade de antibióticos, para suprimir a microflora fecal
competidora. A C. jejuni e a C. coli crescem bem a 42°C em uma atmosfera de 5 a
10% de dióxido de carbono e de quantidades iguais de oxigênio. As culturas são
incubadas por 48 a 72h; as colônias são arredondadas, em relevo, translúcidas, e,
algumas vezes, mucóides. O microrganismo pode ser identificado por uma série de
testes bioquímicos facilmente disponíveis em qualquer laboratório de diagnóstico.
Transmissão e epidemiologia – Como a maioria dos patógenos entéricos, a
disseminação fecal–oral e a transmissão por alimento ou água parecem ser as
principais vias de infecção. Uma das fontes de infecção proposta para animais de
estimação, bem como para visons e furões, criados para propósitos comerciais, é
a ingestão de aves domésticas ou outros produtos da carne crus. Por períodos
prolongados, portadores assintomáticos podem eliminar o microrganismo nas
fezes, contaminando alimentos, água, leite e carnes frescas processadas (incluindo
carne de porco, carne bovina e produtos de aves domésticas). O microrganismo
pode sobreviver in vitro a 5°C por 2 meses e também nas fezes, leite, água e urina.
Pássaros selvagens também podem ser importantes fontes de contaminação da
água. Leite não pasteurizado é citado como uma das principais fontes de infecção
em vários surtos da doença no homem.
Achados clínicos – A diarréia parece ser mais severa em animais jovens. Os
sinais típicos, nos cães, incluem corrimento mucoso, diarréia com muco, aquosa e/
ou biliosa (com ou sem sangue), que dura 3 a 7 dias; anorexia parcial; e vômitos
ocasionais. Podem também estar presentes febre e leucocitose. Em certos casos,
a diarréia intermitente pode persistir por > 2 semanas e, em alguns casos, por vários
meses. Filhotes gnotobióticos inoculados com C. jejuni desenvolvem indisposição,
amolecimento das fezes e tenesmo, 3 dias após a inoculação.
Em bezerros, os sinais variam de suaves a moderados. A diarréia é caracterizada
por fezes mucóides e espessas com ocasionais estrias sanguinolentas visíveis no
muco; a temperatura pode não estar elevada. A diarréia com muco e sangue é
também observada em primatas, furões, visons e gatos. Em suínos, a Campylobacter
mucosalis e C. hyointestinalis têm sido isoladas de porcos com casos de adenomatose
intestinal. Diarréia e debilidade são também clinicamente evidentes nestes animais.
Microrganismos ultra-estruturalmente similares a Campylobacter spp são observa-
dos no epitélio da mucosa ileal hiperplásica de hamsters com ileíte proliferativa; C.
jejuni foi isolada de lesões ileais proliferativas mas não reproduziu a síndrome.
Campylobacter spp também têm sido associadas com colite proliferativa em furões
e há relatos de lesões intestinais hiperplásicas em cobaias e ratos. Microrganismos
semelhantes ao Campylobacter foram descritos em coelhos jovens com tiflite
aguda.
Lesões – Pintos de 3 dias de idade, infectados com C. jejuni , demonstraram
microrganismos no interior das células epiteliais e mononucleadas da lâmina
própria; o jejuno e o íleo foram severamente afetados. Cólon congesto e edematoso
foi encontrado em cães 43h após a inoculação; microscopicamente, houve redução
na altura epitelial, perda da orla em escova e diminuição das células claiformes do
cólon e ceco. As glândulas epiteliais hiperplásicas resultaram em uma mucosa
Coccidiose 123

espessada. Alterações histológicas nos bezerros envolvem primariamente o jejuno,


porém podem envolver o íleo e o cólon. As lesões podem variar de alterações
discretas a enterite hemorrágica severa. Os linfonodos mesentéricos são edematosos.
Foram identificadas uma enterotoxina e uma citotoxina na C. jejuni; entretanto, seu
papel na produção da doença não é conhecido.
Diagnóstico – O método padrão para o diagnóstico é a cultura microaerofílica
das fezes a 42°C; existe um meio especial, disponível comercialmente. O diagnós-
tico também é possível pelo uso da microscopia de contraste de fase ou de campo
escuro, na qual amostras fecais frescas são examinadas para a visualização da
característica motilidade rápida da C. jejuni. Esse método é especialmente útil
durante o estágio agudo da diarréia, quando grande número de microrganismos é
eliminado nas fezes. Uma variedade de técnicas pode ser utilizada para detectar os
anticorpos séricos para os vários antígenos de Campylobacter spp. Esquemas de
antígenos termolábeis ou termoestáveis estão sendo utilizados rotineiramente para
sorotipagem das várias cepas. Amostras séricas seriadas para a demonstração do
aumento do título de anticorpos são úteis no diagnóstico. Os vírus entéricos, bem
como outros patógenos bacterianos entéricos, devem ser excluídos em animais
com diarréia associada ao Campylobacter.
Tratamento e controle – O isolamento de C. jejuni ou C. coli das fezes diarréicas
não é, por si só, uma indicação para a antibioticoterapia. Como C. jejuni e C. coli
apenas recentemente foram reconhecidas como potenciais patógenos intestinais
nos animais, a eficácia da antibioticoterapia foi relatada com pouca freqüência. Em
certos casos em que os animais estão seriamente afetados ou representam uma
ameaça zoonótica, a antibioticoterapia pode ser indicada. Em geral, C. jejuni e C. coli
isoladas de animais são semelhantes às obtidas da população humana. Eritromicina,
a droga de escolha para a diarréia por Campylobacter no homem, também é eficaz
em outros animais. Podemos também utilizar gentamicina, furazolidona, doxiciclina
e cloranfenicol. Este último também foi utilizado para tratar a colite proliferativa nos
furões. A ampicilina é relativamente inativa contra a maioria das cepas de
Campylobacter. A maioria das cepas é resistente a penicilina. É relatado que a
resistência a tetraciclina e canamicina em algumas cepas de C. jejuni é mediada por
plasmídeos e transmissível entre os sorótipos de C. jejuni . A eficácia da
sulfadimetoxina e combinações de sulfas é variável. Antes que a terapia seja
instituída, devem ser realizados o isolamento e os testes de sensibilidade. Alguns
animais continuam a eliminar o microrganismo apesar da antibioticoterapia. Os
antibióticos de quinolona podem ser úteis para eliminar C. jejuni e C. coli dos
carreadores assintomáticos.

COCCIDIOSE
É uma invasão, geralmente aguda, com destruição da mucosa intestinal por
protozoários dos gêneros Eimeria, Isospora, Cystoisospora ou Cryptosporidium,
caracterizada por diarréia, febre, inapetência, perda de peso, emaciação e, algumas
vezes, morte. A coccidiose é uma doença séria em bovinos, ovinos, caprinos,
suínos, aves domésticas (ver pág. 1879) e também em coelhos, nos quais o fígado
bem como os intestinos, podem ser afetados (ver pág. 1287). Em cães, gatos e
cavalos é menos freqüentemente diagnosticada, porém pode resultar em enfermi-
dade clínica. Sob modernas condições de criação (criação em gaiolas suspensas),
raramente é um problema no visom. Outras espécies, tanto de hospedeiros quanto
de protozoários, são envolvidas (ver SARCOCISTOSE, pág. 678 e TOXOPLASMOSE,
Coccidiose 124

pág. 441). A coccidíase é a infecção dos animais por coccídios, porém sem sinais
clínicos aparentes. A coccidíase é muito mais comum que a coccidiose e acredita-
se que resulte em baixa eficiência alimentar sob condições de criação intensiva.
Etiologia e epidemiologia – Eimeria, Isospora, Cystoisospora e Cryptosporidium
tipicamente requerem apenas um hospedeiro no qual completam seus ciclos de
vida; Cystoisospora (e outros) podem utilizar um hospedeiro intermediário. A
infecção é o resultado da ingestão de oocistos infectantes, que entram no ambiente
através das fezes de um hospedeiro infectado. Nesta fase, os oocistos de Eimeria,
Isospora e Cystoisospora não são esporulados não sendo, portanto, infectantes.
Sob condições favoráveis de umidade e temperatura, os oocistos esporulam e se
tornam infectantes em alguns dias. Durante a esporulação, o protoplasma amorfo
se transforma em pequenos corpos (esporozoítas) no interior de cistos secundários
(esporocistos) no oocisto. Em Eimeria spp, o oocisto esporulado possui 4 esporocistos,
cada um contendo 2 esporozoítas; em Isospora e Cystoisospora spp, o oocisto
esporulado possui 2 esporócistos contendo 4 esporozoítas cada; em Cryptosporidium,
cada oocisto contém apenas 4 esporozoítas.
Quando o oocisto esporulado é ingerido por um animal suscetível, os esporozóitas
escapam do oocisto, invadem a mucosa intestinal ou as células epiteliais em outros
locais e se desenvolvem intracelularmente em esquizontes multinucleados (tam-
bém denominados merontes). Cada núcleo desenvolve-se em um corpo infectante,
denominado merozoíta; os merozoítas entram em novas células e repetem o
processo. Após um número variável de gerações assexuais, os merozoítas se
desenvolvem em micro (machos) ou macrogametócitos (fêmeas), os quais produ-
zem um único macrogameta ou vários microgametas numa célula do hospedeiro.
Após ser fertilizado por um microgameta, o macrogameta desenvolve-se em um
oocisto. Os oocistos, com suas paredes resistentes, são eliminados nas fezes na
forma não esporulada.
A coccidiose clínica ocorre mais freqüentemente em condições sanitárias inade-
quadas e de superlotação, nutrição deficiente ou após o estresse do desmame,
transporte, mudanças súbitas de alimentação ou severas de clima.
Das numerosas espécies de Eimeria, Isospora ou Cystoisospora que podem
infectar um hospedeiro em particular, nem todas são patogênicas. Infecções
concorrentes com 2 ou mais espécies, algumas das quais podem não ser normal-
mente consideradas patogênicas também influenciam o quadro clínico. Entre as
espécies patogênicas, pode haver cepas de patogenia variável.
A maioria dos animais adquire infecções de níveis variáveis por Eimeria, Isospora
ou Cystoisospora, entre 1 mês e 1 ano de idade; o Cryptosporidium geralmente é
adquirido antes de 1 mês de idade. Animais mais velhos geralmente são resistentes
à doença clínica, porém podem apresentar infecções esporádicas não aparentes.
Tais animais maduros, clinicamente sadios são, em geral, fontes de infecção para
animais jovens suscetíveis.
Achados clínicos – Os estágios assexuado ou sexuado das várias espécies
destroem o epitélio intestinal e, freqüentemente, o tecido conjuntivo subjacente à
mucosa. Isto pode ser acompanhado por hemorragia no lúmen do intestino, inflama-
ção catarral e diarréia. Os sinais podem incluir descarga de sangue, de tecido ou de
ambos, tenesmo e desidratação. Os níveis de eletrólitos e proteínas séricas podem
estar extremamente alterados, porém mudanças na concentração de hemoglobina
ou no hematócrito são observadas apenas em animais severamente afetados.
Diagnóstico – O encontro de número apreciável de oocistos de espécies
patogênicas nas fezes do hospedeiro serve como diagnóstico, porém como a
diarréia pode preceder a eliminação mais pesada de oocistos, por 1 a 2 dias, e pode
continuar após a descarga de oocistos ter retornado a níveis baixos, pode não ser
sempre possível encontrar oocistos em uma única amostra fecal; vários exames
Coccidiose 125

podem ser necessários. O número de oocistos presentes nas fezes é influenciado


pelo potencial reprodutivo geneticamente determinado das espécies, número de
oocistos infectantes ingeridos, estágio da infecção, idade e condição do animal,
exposição anterior, consistência das amostras fecais e método de exame. Portanto,
os resultados dos exames fecais devem ser relacionados com os sinais clínicos e
lesões intestinais (macroscópicas e microscópicas). Além do mais, deve-se deter-
minar se as espécies são patogênicas ao hospedeiro. O achado de numerosos
oocistos de espécies não patogênicas concorrente com diarréia não confirma um
diagnóstico clínico de coccidiose.
Tratamento – Os ciclos de vida de Eimeria, Isospora e Cystoisospora são
considerados autolimitantes e terminarão espontaneamente dentro de algumas
semanas, se não ocorrer uma reinfecção. Uma medicação imediata pode diminuir
ou inibir o desenvolvimento dos estágios resultantes da reinfecção e, assim, resultar
em um encurtamento do curso da infecção, reduzindo a descarga de oocistos,
aliviando a hemorragia e a diarréia, e diminuindo a probabilidade de infecções
secundárias e mortalidade. Os animais doentes devem ser isolados e tratados
individualmente até que seja possível garantir níveis terapêuticos da droga e
prevenir a contaminação de outros animais. As sulfonamidas intestinais, por exemplo,
a sulfaguanidina, ou as sulfonamidas facilmente absorvíveis, como a sulfamerazina
ou sulfametazina, podem ser utilizadas. A sulfaquinoxalina proporciona excelentes
resultados clínicos em bezerros de corte e leite, ovinos, cães e gatos. As sulfona-
midas solúveis podem ser administradas oral ou parenteralmente e, por isso, são
mais efetivas que as sulfonamidas entéricas. O amprólio é relatado como eficaz
durante os surtos em bezerros, ovinos e caprinos. Nos surtos de animais em confina-
mento ou em pastagens viçosas, deve-se atentar para o tratamento profilático dos
animais sadios expostos, como salvaguarda contra uma morbidade adicional.
Profilaxia – É baseada no controle da ingestão de oocistos esporulados por
animais jovens, para que as infecções se estabeleçam em proporções imunizantes,
sem causar sinais clínicos. Boas práticas alimentares e de manejo, incluindo
medidas sanitárias devem acompanhar este propósito. Os recém-nascidos devem
receber colostro. Os animais jovens suscetíveis devem ser mantidos em instalações
limpas e secas, e os comedouros e bebedouros devem ser mantidos limpos e
protegidos de contaminação fecal. Devem ser minimizados os estresses associados
ao desmame, a mudanças súbitas na alimentação e ao transporte.
A administração profilática de anticoccídicos é recomendada quando animais em
vários regimes de manejo podem estar predispostos a desenvolver a coccidiose.
Virtualmente em todos os casos, Eimeria spp está implicada. Antibióticos ionofóricos,
amprólio e decoquinato são efetivos em bovinos. A alimentação contínua com
baixos níveis de amprólio, sulfaguanidina ou antibióticos ionofóricos durante o
primeiro mês de confinamento foi relatada como de valor profilático em cordeiros.
Antibióticos ionofóricos e amprólio são efetivos em cabritos. Amprólio e sulfas são
efetivos em suínos.

COCCIDIOSE DE G ATOS E CÃES


Cerca de 21 a 22 espécies de coccídios infectam o trato intestinal de gatos e cães,
respectivamente. Exceto por Cryptosporidium parvum, que infecta ambos os
hospedeiros, todos os outros são hospedeiros específicos. Os gatos apresentam as
espécies Cystoisospora, Besnoitia, Toxoplasma, Hammondia e Sarcocystis . Os
cães apresentam as espécies de Cystoisospora, Hammondia e Sarcocystis. Cães
e gatos não apresentam Eimeria.
Cryptosporidium parvum é encontrada em fezes de filhotes de cães e gatos
saudáveis, bem como de animais com diarréia, alguns dos quais com infecções
Coccidiose 126

virais concorrentes. O significado clínico da infecção por C. parvum em filhotes de


cães e gatos não está bem estabelecido. Não existe tratamento conhecido.
Besnoitia (ver pág. 388), Sarcocystis e Toxoplasma (ver pág. 441) são discu-
tidos separadamente. Hammondia possui um ciclo de vida de 2 hospedeiros
obrigatório, sendo cães ou gatos os hospedeiros finais e roedores ou ruminantes
os hospedeiros intermediários, respectivamente. Oocistos de Hammondia são
indistinguíveis dos de Toxoplasma e Besnoitia , porém são não patogênicos para
qualquer hospedeiro.
Os coccídios mais comuns de cães e gatos são os Cystoisospora. Eram
denominados Isospora antes de se descobrir que, diferentemente de outros
isosporídeos, os de cães e gatos podem facilmente infectar outros mamíferos e
produzir em vários órgãos, uma forma encistada que é infecciosa para cães ou
gatos, como hospedeiros finais. Duas espécies infectam os gatos: C. felis e C.
rivolta. Quatro espécies infectam os cães: C. canis, C. ohioensis, C. burrowsi e C.
neorivolta. Em cães, apenas a C. canis pode ser identificada por estruturas de
oocistos; as outras 3 sobrepõem-se pelas dimensões e podem ser diferenciadas
apenas por características endógenas de desenvolvimento. Em gatos, ambas as
espécies podem ser facilmente identificadas pelos oocistos.
A coccidiose clínica, embora incomum, foi relatada em filhotes de cães e gatos < 1
mês de idade. Os sinais clínicos mais comuns, em casos severos, são diarréia (algu-
mas vezes sanguinolenta), perda de peso e desidratação. Geralmente, está associa-
da com outros agentes infecciosos, estados de imunossupressão ou estresse.
Em canis, onde as necessidades de profilaxia podem ser previstas, o amprólio
pode ser efetivo, embora seu uso não seja aprovado para cães. Somente em casos
severos, em adição à fluidoterapia para suporte da desidratação, as sulfonamidas,
como a sulfadimetoxina, 50mg/kg no primeiro dia, 25mg/kg/dia por 2 a 3 semanas,
daí em diante, ou a nitrofurazona a 20mg/kg/dia, têm sido consideradas como
coccidiostáticos. A sanitarização é importante, especialmente em gatis e canis, ou
onde grande número de animais estão alojados. As fezes devem ser removidas
freqüentemente. Deve-se impedir a contaminação fecal dos alimentos e da água.
Correntes, gaiolas e utensílios devem ser desinfectados diariamente. Carne crua
não deve ser administrada. Deve-se estabelecer um controle de insetos.

COCCIDIOSE DOS BOVINOS


Criptosporidiose
Infecções de bezerros, normalmente < 1 mês de idade, por Cryptosporidium
parvum (ver pág. 129) normalmente são autolimitantes, mas podem ser significati-
vas, tanto para os bezerros, quanto como fonte de infecção para outras espécies,
incluindo o homem.

Infecção por Eimeria


Das 13 espécies de Eimeria que infectam bovinos, E. zuernii e E. bovis são as mais
freqüentemente associadas com a doença clínica. Experimentalmente, outras espé-
cies têm demonstrado patogenicidade suave ou moderada. A coccidiose é comumen-
te uma doença de bovinos jovens (1 a 2 meses a 1 ano), sendo, em geral, esporádica
durante as estações úmidas do ano. “Coccidiose de verão” e “coccidiose de inverno”,
em bovinos em pastejo, são provavelmente o resultado de estresse devido ao tempo
severo e superlotação ao redor de uma fonte de água limitada, que concentra os
hospedeiros e parasitas em uma área restrita. Embora epidemias em bovinos em
confinamento particularmente severas tenham sido relatadas durante períodos
extremamente frios, eles são suscetíveis à coccidiose em todas as estações. Os
Coccidiose 127

surtos geralmente ocorrem no primeiro mês de confinamento. O período de incubação


é de 17 a 21 dias.
Em infecções leves, o bovino parece saudável e os oocistos estão presentes em
fezes normalmente formadas, mas a eficácia alimentar é um tanto reduzida. O sinal
mais característico de coccidiose clínica são fezes aquosas, com pouco ou nenhum
sangue e o animal apresenta apenas uma ligeira indisposição por alguns dias. Os
animais severamente afetados desenvolvem diarréia que pode continuar por ≥ 1
semana, que consiste de um fluido sanguinolento fino ou fezes pouco espessas que
contêm estrias ou coágulos de sangue, fragmentos de epitélio e muco. O animal
perde seu apetite, torna-se deprimido e desidratado; perde peso e os quarto
traseiros e a cauda ficam sujos de fezes. O tenesmo é comum. A morte pode ocorrer
durante o período agudo ou mais tarde, por complicações secundárias, como
pneumonia. Se o animal sobreviver ao período mais severo, pode recuperar-se,
porém terá significante perda de peso que não é rapidamente recuperada, ou pode
ter seu desenvolvimento prejudicado permanentemente.
Os coccídios patogênicos dos bovinos podem causar danos à mucosa do
intestino delgado inferior, ceco e cólon. A primeira geração de esquizontes de E.
bovis aparece como corpos macroscópicos brancos nos vilos do intestino delgado.
Para diagnóstico, profilaxia e tratamento, ver página 125.

COCCIDIOSE DOS CAPRINOS


De 10 a 12 espécies de Eimeria, bem como de Cryptosporidium parvum são
encontradas em caprinos na América do Norte. As Eimeria spp são específicas ao
hospedeiro e não são transmitidas de ovinos a caprinos. Cryptosporidium parvum
(ver adiante) infecta vários animais neonatos, incluindo caprinos.
Eimeria arloingi, E. christenseni e E. ninakohlyakimovae são altamente patogênicas
para os cabritos. Os sinais clínicos incluem diarréia com ou sem muco ou sangue,
desidratação, emaciação, fraqueza, perda de apetite e morte. Alguns caprinos, na
verdade, apresentam-se constipados e morrem agudamente sem diarréia. Os
estágios e lesões estão confinados ao intestino delgado, que pode apresentar-se
congesto, hemorrágico ou ulcerado e com placas macroscópicas, esparsas, ama-
relo-pálidas e esbranquiçadas sobre a mucosa. Histologicamente, o epitélio dos
vilos está desprendido e as células inflamatórias são observadas na lâmina própria
e submucosa. O diagnóstico é baseado no encontro de oocistos de espécies
patogênicas nas fezes diarréicas, geralmente em dezenas de milhares a milhões por
grama de fezes. É usual encontrar-se uma contagem de oocistos de até 70.000, em
cabritos sem que haja doença evidente.
Cabras angorás leiteiras, criadas sob práticas de manejos diferentes, podem
possuir os mesmos padrões de exposição que os cabritos. Logo após o parto, os
abrigos de aleitamento e as áreas vizinhas podem estar pesadamente contamina-
dos com oocistos das mães; a resistência à infecção diminui logo após o transporte,
mudança de ração, introdução de novos animais ou mistura de animais novos com
animais mais velhos. Podem ser administrados anticoccídicos a um rebanho,
imediatamente após o diagnóstico ou de maneira preventiva, nas situações alta-
mente previsíveis anteriormente citadas.
Para diagnóstico, profilaxia e tratamento, ver página 125.

COCCIDIOSE DOS SUÍNOS


Oito espécies de Eimeria, uma de Isospora e uma de Cryptosporidium infectam
os suínos nos EUA. Os leitões de 5 a 15 dias de idade são caracteristicamente
infectados apenas com C. parvum e I. suis, que produzem enterite e diarréia. Estes
agentes devem ser diferenciados de vírus, bactérias e helmintos, que também
causam diarréia em suínos neonatos.
Coccidiose 128

Relativamente pouco se sabe a respeito da C. parvum em leitões. Acredita-se que


seja prevalente, porém em geral, com baixas morbidade e mortalidade. A infecção
pode resultar em diarréia não hemorrágica (ver CRIPTOSPORIDIOSE, pág. 129).
Isospora suis é prevalente em suínos neonatos. A infecção é caracterizada por
diarréia aquosa ou gordurosa, geralmente de amarelada a branca e fétida. Os leitões
podem se mostrar fracos, desidratados e de tamanho reduzido; algumas vezes,
morrem. Os oocistos são geralmente eliminados nas fezes e podem ser identificados
por seu tamanho, forma e características de esporulação; no entanto, o diagnóstico
de infecções superagudas deve ser baseado no encontro de estágios do parasita em
esfregaços feitos por impressão ou secções histológicas do intestino delgado, pois os
suínos podem morrer antes que os oocistos sejam formados. Histologicamente, as
lesões estão confinadas ao jejuno e íleo e são caracterizadas por atrofia dos vilos
espessas, ulceração focal e enterite fibrinonecrótica, com estágios do parasita nas
células epiteliais. O controle profilático tem sido realizado pela administração de
anticoccídicos na ração das porcas, 2 semanas antes do parto, e por toda a lactação
ou na alimentação dos suínos neonatos, do nascimento ao desmame; a efetividade
do último método não foi confirmada. Pela remoção das fezes e desinfecção das baias
de parição, houve redução acentuada da infecção nas leitegadas.
Embora menos comumente associadas à coccidiose clínica, E. debliecki, E.
neodebliecki, E. scabra e E. spinosa são encontradas em suínos de , 1 a 3 meses
de idade, com diarréia. A enfermidade pode durar de 7 a 10 dias e os suínos podem
permanecer com mau aspecto.
Para diagnóstico, profilaxia e tratamento, ver página 125.

COCCIDIOSE DOS OVINOS


Cerca de 15 espécies de Eimeria bem como de Cryptosporidium parvum infectam
os ovinos. Historicamente, alguns Eimeria spp eram tidos como responsáveis por
infecção e transmissão entre ovinos e caprinos, porém os parasitas agora são
considerados hospedeiros específicos. Os nomes de algumas espécies de coccídios
de caprinos são ainda erroneamente aplicados a espécies de aparência similar
àquelas encontradas em ovinos. Cryptosporidium sp (ver adiante) parece infectar
numerosas espécies de animais neonatos, incluindo cordeiros < 1 mês de idade.
Eimeria ahsata e E. ovinoidalis (E. ninakohlyakimovae) são patógenos de cordeiros,
em geral, entre 1 e 6 meses de idade; a E. ovina parece ser relativamente menos
patogênica. Todos os outros Eimeria de ovinos são essencialmente não patogênicos,
mesmo quando grandes números de oocistos estão presentes nas fezes.
Os sinais incluem diarréia (que algumas vezes contém sangue ou muco),
desidratação, febre, inapetência, perda de peso, anemia, queda da lã e morte. Íleo,
ceco e cólon superior são geralmente os mais afetados; eles podem estar espessos,
edematosos e inflamados, e algumas vezes, há hemorragia da mucosa. Placas
espessas, opacas e brancas que contêm grande número de oocistos de E. ovina
podem se desenvolver no intestino delgado. Devido à elevada freqüência de
oocistos nas fezes de ovinos de todas as idades, a coccidiose não pode ser
diagnosticada apenas com base nos achados dos oocistos. Picos de contagem de
oocistos > 100.000/g de fezes foram relatados em cordeiros de 8 a 12 semanas de
idade aparentemente sadios. Entretanto, fezes diarréicas que contenham > 20.000/g
de oocistos de uma espécie patogênica são características da coccidiose ovina.
Cordeiros de 1 a 6 meses de idade, em abrigos de parição, áreas de pastejo
intensivo e confinamento, são os de maior risco no desenvolvimento da coccidiose,
como resultado do estresse de transporte, mudança de ração, superlotação,
mudanças climáticas severas e contaminação do ambiente com oocistos de ovelhas
ou outros cordeiros; a administração profilática de anticoccídicos por 28 dias
Coccidiose 129

consecutivos, iniciando-se alguns dias após a introdução dos cordeiros no ambien-


te, é economicamente viável, pois a coccidiose ou coccidíase nestes sistemas de
manejo são esperadas. O tratamento terapêutico dos indivíduos afetados com
anticoccídicos, logo que a coccidiose tenha sido diagnosticada, não é efetivo, porém
pode reduzir sua severidade se administrado no início do ciclo de vida.
Para tratamento, ver página 125.

CRIPTOSPORIDIOSE
É uma enterocolite autolimitante, de distribuição cosmopolita, causada pelo
parasita coccídio Cryptosporidium parvum. É comum em ruminantes jovens, particu-
larmente bezerros; um pouco menos comum no homem e suínos, e rara em cães,
gatos e cavalos. Outros criptosporídia causam doenças em répteis e pássaros. Em
bezerros, a doença é caracterizada por perda de peso e diarréia aquosa, é clinicamen-
te indistinguível das muitas outras causas de diarréia de bezerros. A menos que o
sistema imune esteja comprometido, é uma doença autolimitante. Existem muitos
relatos da infecção no homem, adquirida de bezerros clinicamente doentes.
Etiologia e transmissão – Cryptosporidium parvum é um pequeno protozoário
que é transmitido pela rota fecal – oral. Os oocistos eliminados nas fezes são
esporulados e, por isso, prontamente infectantes. O período médio de incubação é
de , 4 dias.
Achados clínicos e lesões – Bezerros de 1 a 3 semanas de idade parecem ser
os mais suscetíveis. Os sinais – anorexia, perda de peso, diarréia e tenesmo –
assemelham-se aos causados por vários outros patógenos entéricos; entretanto,
ocorrem casos assintomáticos. A criptosporidiose não complicada é raramente fatal.
Embora a C. parvum possa infectar virtualmente todo o trato intestinal, o intestino
delgado distal é em geral o mais severamente afetado. A infecção em cavalos é
limitada ao intestino delgado. As lesões macroscópicas podem consistir em hipere-
mia da mucosa intestinal e conteúdo intestinal amarelado. Microscopicamente, a
atrofia dos vilos, discreta a severa, com microrganismos esféricos nas orlas em
escova, é evidente.
Diagnóstico – Os microrganismos podem ser detectados em raspagens da
mucosa do intestino fresco ou por flotação das fezes em soluções de sacarose ou
sulfato de zinco. Devido ao seu pequeno tamanho e transparência, os oocistos
passam facilmente despercebidos. Eles devem ser pesquisados com objetivas de
grande aumento, preferencialmente em iluminação de contraste de fase. Os
oocistos de C. parvum medem , 5µm de diâmetro. Eles devem ser distinguidos
dos oocistos de C. muris (, 6 × 7µm), que infecta o abomaso de bezerros e é
considerada tanto não patogênica quanto responsável pela diarréia leve. Os
esfregaços fecais podem ser fixados com calor e corados por técnica de ácido
resistente. Os oocistos de Cryptosporidium coram-se em vermelho, enquanto as
leveduras, que têm tamanho e forma aproximados aos dos oocistos, ficarão azuis
ou verdes. Os oocistos não são eliminados continuamente, então, amostragens
repetidas podem ser necessárias para encontrá-los. Os bezerros geralmente
eliminam os oocistos por um período máximo de 2 semanas.
Tratamento e controle – Não existe tratamento efetivo específico; entretanto,
uma vez que a doença é autolimitante, apenas uma terapia de suporte, tal como
reidratação, é geralmente suficiente. Os oocistos podem ser mortos no ambiente
com solução de amônia a 5%. Já que a C. parvum possui uma ampla faixa de
hospedeiros, a infecção de outras espécies animais no local deve ser considerada.
Anomalias Congênitas e Hereditárias do Sistema Digestivo 130

ANOMALIAS CONGÊNITAS E HEREDITÁRIAS


DO SISTEMA DIGESTIVO
Boca
As fendas são as anomalias congênitas mais comuns que envolvem os lábios
dos pequenos animais. O modo de transmissão não está claro; provavelmente a
maioria seja hereditária, embora deficiências nutricionais maternas, estresses,
exposição a drogas ou químicos e interferência mecânica com o feto sejam fatores
prováveis. A queilosquise (fenda labial, lábio leporino) é devida a um distúrbio do
processo de formação das mandíbulas e da face, durante o desenvolvimento
embrionário. A fenda do lábio inferior é rara e geralmente ocorre na linha média. As
fendas do lábio superior, geralmente na junção do pré-maxilar e maxilar, podem ser
unilaterais ou bilaterais, incompletas ou completas e estão freqüentemente associa-
das com fendas do processo alveolar e palato. A palatosquise (fenda palatina) é,
ocasionalmente, encontrada em recém-nascidos de todas as espécies. A causa
isolada foi por muito tempo considerada hereditária, porém a ingestão de agentes
tóxicos, o uso de esteróides e algumas infecções virais durante a prenhez podem
ser causas. O defeito pode envolver apenas o palato, ou estender-se dos lábios ao
interior do palato através dos ossos alveolares da mandíbula superior. Isto é devido
à fusão incompleta dos processos embrionários da mandíbula superior. As fendas
palatinas podem estar associadas com outras anormalidades menos óbvias.
O sinal inicial é o gotejamento de leite pelas narinas, quando o recém-nascido
tenta mamar. Infecções respiratórias por inalação de alimento ocorrem comumente.
Se não tratadas, a morte ocorre por inanição ou infecção. A inspeção visual da boca
revela facilmente o defeito, exceto em potros que possuam apenas uma fissura no
palato mole, difícil de ser observada. Ocorre comumente com outros defeitos, tais
como artrogripose que, no gado charolês, é hereditária, por um gene autossômico
simples recessivo.
A correção cirúrgica é efetiva apenas se o defeito for pequeno. Se realizável, a
correção deve ser feita antes que a saúde geral do animal seja comprometida e
somente após terem sido feitas as considerações éticas. As fendas labiais causam
notável dificuldade no aleitamento, que portanto deve ser feito manualmente. A
correção da fenda palatina é muito mais difícil; em pequenos animais, só é realizável
, aos 3 meses de idade. Caso não se alcance sucesso nessa época, talas dentais
de acrílico podem ser feitas, quando o animal atingir a idade adulta, para se corrigir
temporariamente o defeito, por períodos variáveis. A eutanásia é admissível em
animais com defeitos grosseiros, e aqueles que alcançam sucesso no tratamento
cirúrgico não devem ser usados para reprodução.
Braquignatia (mandíbula inferior curta, boca de papagaio) em bovinos é herdada
como um fator poligênico. Também é observada como um fator letal associado a
dentes molares impactados. Também está associada a molares impactados e
osteopetrose (ver pág. 577) em bezerros angus e, ocasionalmente, em gado simental.
A braquignatia pode também ser causada por uma aberração autossômica, ou
associada a uma aberração cromossômica como a trissomia, que é letal. Uma gama
de defeitos nos ovinos, que variam de braquignatia a aplasia de mandíbula e agnatia,
é relatada como herdada por um gene autossômico simples e recessivo.
Agnatia, a ausência de desenvolvimento da mandíbula, foi postulada como
causada por homozigosidade de um gene autossômico recessivo simples nos
ovinos. Casos esporádicos ocorrem em bovinos. As estruturas faciais, incluindo o
maxilar, podem revelar vários defeitos em todas as espécies, mas particularmente
potros e bezerros. Em bezerros angus, um defeito facial caracterizado por uma face
Anomalias Congênitas e Hereditárias do Sistema Digestivo 131

larga e curta é acompanhado por osteoartrose de todas as articulações principais.


O defeito possui uma transmissão genética complexa.
Displasia craniofacial é suspeita de ser causada por homozigosidade de um
gene autossômico recessivo simples no gado limousin. O defeito é caracterizado por
um perfil convexo do focinho, mandíbula inferior curta, ossificação deficiente das
suturas frontais, exoftalmia, e língua grande.
Uma displasia facial, na qual a face é curta e larga, foi descrita no gado angus.
A condição é hereditária, mais provavelmente como poligênica. Todas as articula-
ções principais desenvolveram osteoartrose logo após o nascimento; os bezerros
afetados permaneceram recumbentes e relutavam em levantar e caminhar.

Dentes
Número anormal de dentes – Na maioria das espécies, é raro encontrar-se
redução do número de dentes, embora em cães, os molares e os pré-molares
possam não se desenvolver ou nascer. Dentes supranumerários são encontrados
ocasionalmente nas regiões incisiva ou molar dos cavalos; em cães, são geralmente
unilaterais e mais freqüentes na mandíbula superior. Geralmente, eles só são
removidos se causam interferência mecânica na mastigação ou, em cavalos, se são
irritados por um freio. Em cavalos, podem requerer raspagem ou desgaste periódi-
cos para impedir danos aos tecidos moles circunvizinhos.
Irregularidades do desenvolvimento ou da muda dos dentes – A erupção dos
dentes decíduos pode causar problemas transitórios. Algumas vezes, os dentes
decíduos se desprendem prematuramente, deixando uma depressão na gengiva,
circundada por uma margem inflamada que pode causar perda temporária de
condição, por desconforto ao comer. No caso dos dentes pré-molares, a raiz do
dente decíduo pode ser absorvida, porém a coroa pode persistir como uma
cobertura ou “cúpula” para a erupção do dente permanente; estas “cúpulas” são
facilmente removidas por fórceps, caso não se separem espontaneamente. A muda
retardada do dente canino decíduo em cães, é comum.
Anormalidades na posição e direção de determinados dentes – Em cavalos,
esta condição pode ser encontrada na região incisiva. Alguns dentes podem sofrer
rotação em torno de seu eixo maior, ou sobrepor-se aos dentes adjacentes. Em
cães, o terceiro pré-molar superior é o primeiro a sofrer rotação, em raças de focinho
curto. Posteriormente, todos os pré-molares superiores poderão sofrer rotação; os
molares são raramente afetados.
Aposição imperfeita dos dentes – O prognatismo ocorre quando a maxila se
sobrepõe à mandíbula, resultando em aposição imperfeita dos dentes incisivos
superiores e inferiores. O agnatismo (queixo proeminente, mandíbula de buldogue)
é a condição oposta. Se em um potro, qualquer uma das condições for muito
pronunciada, a amamentação é impossível. O tratamento, quando realizável, em
qualquer um dos casos, consiste no desgaste ou aparação dos pontos e projeções
dos dentes não apostos. Deve-se lembrar que as arcadas molares podem conter
projeções anteriores e posteriores, sem caracterizar o prognatismo ou agnatismo.
Ambas as condições ocorrem freqüentemente em cães. Em certas raças (por
exemplo, buldogues, bóxers), a agnatia é uma característica da raça; em outras,
qualquer uma das condições pode resultar em desqualificação em exposições. Já
que estes defeitos podem ter uma base genética, os proprietários devem ser
avisados das implicações da correção cirúrgica que está para ser realizada.
Dentes ectópicos – O melhor exemplo é o cisto dentígero, também denominado
odontoma temporal, por ser freqüentemente localizado no processo mastóideo e
reconhecido por um corrimento contínuo a partir do seio maxilar, ao longo das
bordas do pavilhão auricular. O único tratamento é a remoção cirúrgica da massa
teratomatosa de tecido dentário e da membrana secretória associada.
Anomalias Congênitas e Hereditárias do Sistema Digestivo 132

Cistos e fendas cervicais


Estas imperfeições do desenvolvimento fetal devem ser diferenciadas das
infecções das glândulas salivares, dos cistos ou das fístulas salivares. O cisto do
duto tireoglosso é o resultado da persistência pós-natal do primeiro duto tireoglos-
so embrionário. Este cisto raro é sempre único e encontrado na região medial do
pescoço, geralmente no nível do osso hióide e da laringe. Consiste de uma
protuberância lisa, arredondada, com bordas bem-definidas, ancorada no osso
hióide e nos tecidos profundos. Está raramente fixado à pele, a menos que uma
infecção seja superimposta. Não é macio, e contém líquido.
O cisto branquial (ou cervical lateral) desenvolve-se a partir da malformação
do aparato branquial, geralmente da segunda fissura. Os cistos branquiais, unilate-
rais ou bilaterais, ocupam uma posição lateral na porção cranial do pescoço e são,
em geral, apenas ligeiramente móveis. Seu tamanho varia consideravelmente e um
determinado cisto pode mudar periodicamente de tamanho quando seu conteúdo
escapa por uma pequena abertura na garganta ou por uma pequena fístula cutânea
(fístula cervical lateral ou fístula branquial).
É necessária a remoção cirúrgica do(s) cisto(s).

Dilatação do esôfago
A dilatação esofágica, um aumento generalizado ou regional no calibre do
esôfago, pode ser seguida de retenção alimentar (ver também pág. 208). Pode
resultar de: 1. constrição por fitas de tecido originadas do arco aórtico direito
persistente ou do ligamento arterioso, associada a aorta, artéria pulmonar e base do
coração; 2. paralisia congênita do esôfago torácico ou paralisia similar, em cães
velhos, considerada uma disfunção neuromuscular a partir de toxinas exógenas ou
metabólicas; 3. acalasia, na qual o esôfago terminal não se dilata quando o alimento
aproxima-se da cárdia como resultado de degeneração do plexo neural ou de
espasmos da cárdia. A dilatação secundária do esôfago cervical geralmente se
segue à dilatação esofágica torácica, a menos que sua causa seja removida.

Hérnias abdominais
É uma protrusão dos conteúdos abdominais para a subcútis, através de uma
abertura natural ou anormal na parede corporal. A protrusão através do diafragma
é denominada hérnia diafragmática (ver pág. 862). A herniação como resultado de
um trauma severo que leva ao rompimento da aponeurose abdominal é, freqüente-
mente, denominada de ruptura. Os melhores exemplos de hérnias não traumáticas
são as hérnias umbilical e inguinal ou escrotal, sendo a última meramente uma
extensão da hérnia inguinal.
Em bovinos, a conveniência da correção cirúrgica de uma hérnia umbilical é
discutível. Alguns casos são hereditários, outros possivelmente causados por
tração excessiva de um feto muito grande e corte do cordão umbilical muito próximo
à parede abdominal.
Nas hérnias escrotal ou inguinal, em todas as espécies, a correção cirúrgica
envolve quase que invariavelmente a castração simultânea. A hérnia perineal é
encontrada principalmente em cães adultos e difere dos outros tipos de hérnias
abdominais pelo revestimento peritoneal do saco hernial que está ausente ou é fino
e degenerado. Embora muitos fatores possam ser citados, a causa real da hérnia
perineal é desconhecida. A hérnia femoral (crural) é rara em animais domésticos,
especialmente nos grandes animais.
São reconhecidos 2 tipos de hérnias: redutível e irredutível. O tipo redutível é
caracterizado por um inchaço compressível, elástico, macio, indolor e não inflama-
tório, que pode variar de tamanho de tempos em tempos. O inchaço pode desapa-
Anomalias Congênitas e Hereditárias do Sistema Digestivo 133

recer por manipulação ou pela colocação do animal em uma posição adequada. O


diagnóstico da hérnia perineal no cão é baseado na presença de um inchaço ao lado
do ânus ou da vulva, entre a base da cauda e a tuberosidade ciática. A hérnia
geralmente pode ser reduzida mais facilmente se se elevarem os quartos traseiros
do animal.
As hérnias irredutíveis possuem as mesmas características das redutíveis, mas seu
conteúdo não pode ser retornado à cavidade abdominal. Isto é devido ou às aderências
entre partes dos conteúdos herniais, ao estreitamento do anel, ou à distensão da alça
do intestino. Os conteúdos podem ser encarcerados ou estrangulados.
Os abscessos umbilicais podem ser confundidos com hérnias e os 2 são
freqüentemente encontrados juntos, especialmente em porcos e bovinos. A punção
exploratória é algumas vezes necessária para a diferenciação. Os hematomas
também podem ser confundidos com hérnias. Se a área puder ser alcançada por
palpação retal, o diagnóstico de hérnia escrotal ou inguinal pode ser definitivamente
feito pela localização do anel e do intestino que o contém.
A hérnia inguinal é comum no porco macho e o processo geralmente estende-se
ao escroto. A suspensão do leitão pelas patas traseiras causa uma saliência hernial
pequena para tornar-se visível. Na porca, o defeito está invariavelmente acompa-
nhado pela parada do desenvolvimento genital; tais animais são estéreis e a cirurgia
é indicada apenas quando a extensão da lesão é uma ameaça ao crescimento do
porco, até o peso comercial.
A hérnia inguinal no potro macho, com freqüência, resolve-se espontaneamente,
até o primeiro ano de vida. Por esta razão, uma cirurgia corretiva precoce não é
indicada, a menos que a hérnia seja de tal magnitude que interfira na andadura do
animal ou esteja estrangulada. A hérnia inguinal estrangulada em garanhões é
razoavelmente freqüente, sendo caracterizada por sinais de dor abdominal severa
e constante. É facilmente reconhecida pela palpação retal. Quando diagnosticada
precocemente, pode ser freqüentemente aliviada por manipulação retal do intestino
encarcerado, com o animal sob anestesia geral. Se isto falhar, uma cirurgia radical
imediata será necessária.
A hérnia inguinal é rara em bovinos; entretanto, é algumas vezes encontrada no
macho. Quando a correção cirúrgica é realizada para conservar o potencial de
reprodução do touro nem sempre se alcança sucesso.
A hérnia perineal (ver pág. 158), que pode ser uni ou bilateral, pode ser corrigida
cirurgicamente. Se a prostatectomia, no cão macho adulto é indicada na mesma
época, a questão merece debate.
Quando se decide pelo tratamento, as hérnias umbilicais geralmente são
tratadas por cirurgia, realizada preferivelmente dos 3 aos 6 meses de idade. Em
bezerros, tem-se alcançado algum sucesso pela aplicação de uma atadura de
bandagem adesiva larga (10cm de largura), que é removida 3 a 4 semanas depois.
O proprietário deve ser avisado que o problema pode ser hereditário.

Atresia
Nos cavalos a atresia segmental do cólon, que suspeita-se ser um defeito
genético, é rara. Nas vacas, uma pressão no eixo longitudinal do feto em desenvol-
vimento, durante o exame retal de prenhez entre os dias 37 e 41 pode causar a
atresia do cólon. No entanto, no gado holstein parece também haver um padrão
genético, possivelmente um gene autossômico recessivo, responsável por este
defeito. Os bezerros com atresia do cólon eliminam pouco ou nenhum mecônio e
desenvolvem cólica logo após o nascimento.
A aganglionose ileocolônica foi relatada em potros brancos descendentes de
pai e mãe overo. Apesar de os potros parecerem normais ao nascer, logo desenvol-
vem cólica e morrem no segundo dia. Os potros afetados são brancos e possuem
Anomalias Congênitas e Hereditárias do Sistema Digestivo 134

íris azuis. O diagnóstico pode ser confirmado pela falta de gânglios no cólon. Os
defeitos congênitos do reto e ânus geralmente resultam de parada no desenvolvi-
mento embrionário. A atresia anal ocorre quando a membrana dorsal que separa o
reto do ânus não se rompe. Os sintomas clínicos presentes no nascimento incluem
tenesmo, dor e distensão abdominais, retenção das fezes e ausência de abertura
anal. A remoção cirúrgica da membrana é indicada.
Aplasia segmentar (agenesia retal) ocorre quando o reto termina em um fundo
cego, antes de alcançar o ânus. A correção cirúrgica é difícil porque a localização
da parte terminal varia e podem ocorrer danos iatrogênicos aos nervos da área.

Fístula retovaginal
A fístula retovaginal é um trato fistuloso que liga a vagina ao reto; geralmente ocorre
em conjunção com o ânus imperfurado. A passagem das fezes através da vulva ou
sinais de obstrução colônica sugerem sua ocorrência. O diagnóstico pode ser
confirmado por enema de bário, que define a extensão do defeito no interior da vagina.
A identificação da fístula, sua correção cirúrgica e o restabelecimento das estruturas
anatômicas normais são imperativos. O prognóstico geralmente é reservado. Fre-
qüentemente são vistas complicações, tais como incontinências fecal e urinária.

ODONTOLOGIA
DESENVOLVIMENTO DENTÁRIO
A estimativa da idade de um animal pode ser auxiliada pelos tempos de erupção
e aparência dos dentes. O desenvolvimento dentário está sujeito a variações, o que
torna a determinação da idade apenas aproximada. Nos cavalos e bezerros jovens,
os momentos de erupção são critérios valiosos. As fórmulas dentárias decíduas e
permanentes, além do formato e desgaste dos dentes incisivos, também são úteis
na estimativa da idade. Os dentes são designados como incisivos (I), caninos (C),
pré-molares (P) e molares (M); os dentes decíduos são designados Di, Dc e Dp.

ESTIMATIVA DA IDADE PELO EXAME DOS DENTES


Cavalos – A idade de um cavalo que apresente uma boca e dentes normais pode
ser estimada. A aparência dos dentes incisivos é utilizada mais freqüentemente. Os
incisivos decíduos são menores que os permanentes e possuem um cólon bem
marcado. Os incisivos requerem , 6 meses desde a erupção até o início do
desgaste. A forma do dente é também de auxílio, como o é a “cúpula” ou cavidade
negra do infundíbulo dos incisivos. A estrela dentária é uma linha mais escura de
dentina que preenche a cavidade pulpar à medida que o dente se desgasta. O sulco
de Galvayne é uma goteira longitudinal no incisivo lateral superior, com freqüência,
vista em cavalos velhos. A “asa de andorinha”, saliência na extremidade lateral do
incisivo de canto superior, desenvolve-se em muitos animais , aos 7 anos de idade,
desgasta-se em 2 anos e reaparece aos 11 anos de idade.
A forma dos dentes incisivos é freqüentemente utilizada; a superfície oclusal é
uma oval longa em animais jovens, porém, com o desgaste, torna-se arredondada
em perfil e depois triangular, com o ápice em direção ao lado lingual. Adicionalmente,
o ângulo dos dentes incisivos muda com a idade do animal e o desgaste dos dentes
de aproximadamente perpendicular para mais ou menos paralelo.
Odontologia 135

TABELA 2 – Fórmulas Dentárias


Decíduos Permanentes
3 0 3 3 1 3–4 3
Cavalo 2 (Di  Dc  Dp ) = 24 2 (I  C  P  M ) = 40 – 42
3 0 3 3 1 3 3
Vaca 0 0 3 0 0 3 3
Carneiro 2 (Di  Dc  Dp ) = 20 2 (I  C  P  M ) = 32
Cabra 3 1 3 3 1 3 3

3 1 3 3 1 4 3
Porco 2 (Di  Dc  Dp ) = 28 2 (I  C  P  M ) = 44
3 1 3 3 1 4 3

3 1 3 3 1 4 2
Cão 2 (Di  Dc  Dp ) = 28 2 (I  C  P  M ) = 42
3 1 3 3 1 4 3

3 1 3 3 1 3 1
Gato 2 (Di  Dc  Dp ) = 26 2(I  C  P  M ) = 30
3 1 2 3 1 2 1

Os sinais mais úteis estão organizados cronologicamente na listagem a seguir:

05 anos: I 1 e I 2 nivelados, borda labial de I 3 em desgaste.


06 anos: Rasgamento de I 1.
07 anos: Todos os incisivos inferiores nivelados. Rasgamento de I 2. “Asa de
andorinha” em I 3 superior. Cimento desgastado, mudança de cor do
amarelo para o branco azulado.
08 anos: A estrela dentária aparece no I 1. Rasgamento de I 3.
09 anos: I 1 arredondado.
10 anos: I 2 arredondado. A extremidade distal do sulco de Galvayne emerge da
gengiva no I 3 superior.
13 anos: As manchas do esmalte são pequenas e arredondadas nos incisivos
inferiores. A estrela dentária está no meio da superfície da mesa.
15 anos: Estrelas dentárias arredondadas, escuras e distintas. Sulco de Galvayne
a meio caminho.
16 anos: I 1 triangular.
17 anos: I 2 triangular. As manchas do esmalte desaparecem dos incisivos
inferiores.

Bovinos – Como no cavalo, os sinais de desgaste são muito menos percep-


tíveis do que a erupção para a estimativa da idade. As épocas de erupção dos
incisivos permanentes são freqüentemente utilizadas para a estimativa da idade
dos bezerros, particularmente os de exposição. Exceto para os animais muito
velhos, os dentes são raras vezes utilizados para a determinação da idade dos
bovinos adultos.

05 anos: Todos os incisivos estão em desgaste. A superfície oclusal do I 1 está


começando a nivelar-se; isto é, as bordas da superfície lingual do dente
estão desgastadas e as bordas correspondentes da superfície oclusal
se tornam uma curva suave ao invés de uma linha em ziguezague.
06 anos: I 1 está nivelado e o cólon é visível.
07 anos: I 2 está nivelado e o cólon está visível.
08 anos: I 3 está nivelado e o cólon está visível. I 4 pode estar nivelado.
09 anos: C está nivelado e o cólon está visível.
Odontologia 136

TABELA 3 – Erupção dos Dentes


Cavalo Vaca Cabra/Carneiro Porco Cão Gato
Di 1 0 – 1 semana Antes do nascimento 0 – 1 semana 2 – 4 semanas 4 – 5 semanas 2 – 3 semanas
Di 2 4 – 6 semanas Antes do nascimento 1 – 2 semanas 6 – 12 semanas 4 – 5 semanas 3 – 4 semanas
Di 3 6 – 9 meses 0 – 1 semana 2 – 3 semanas Antes do nascimento 5 – 6 semanas 3 – 4 semanas
I1 21⁄2 anos 11⁄2 – 2 anos 1 – 11⁄2 ano 1 ano 2 – 5 meses 31⁄2 – 4 meses
I2 31⁄2 anos 2 – 21⁄2 anos 11⁄2 – 2 anos 16 – 20 meses 2 – 5 meses 31⁄2 – 4 meses
I3 41⁄2 anos 3 anos 21⁄2 – 3 anos 8 – 10 meses 4 – 5 meses 4 – 41⁄2 meses
Dc Sem erupção *0 – 2 semanas *3 – 4 semanas Antes do nascimento 3 – 4 semanas 3 – 4 semanas
C 4 – 5 anos *31⁄2 – 4 anos *3 – 4 anos 6 – 10 meses 5 – 6 meses 5 meses
Dp 2 0 – 2 semanas 0 – 3 semanas 0 – 4 semanas 5 – 7 semanas 4 – 6 semanas Superior: 2 meses
Inferior: nenhum
Dp 3 0 – 2 semanas 0 – 3 semanas 0 – 4 semanas 1 – 4 semanas 4 – 6 semanas 4 – 5 semanas
Dp 4 0 – 2 semanas 0 – 3 semanas 0 – 4 semanas 1 – 4 semanas 6 – 8 semanas 4 – 6 semanas
P1 5 – 6 meses
(dente de lobo) Nenhum Nenhum 5 meses 4 – 5 meses Nenhum
P2 21⁄ 2 anos 2– 21⁄ 2 anos 11⁄ 2 – 2 anos 12 – 15 meses 5 – 6 meses Superior: 41⁄2 – 5 meses
Inferior: nenhum
P3 3 anos 11⁄2 – 21⁄2 anos 11⁄2 – 2 anos 12 – 15 meses 5 – 6 meses 5 – 6 meses
P4 4 anos 21⁄2 – 3 anos 11⁄2 – 2 anos 12 – 15 meses 4 – 5 meses 5 – 6 meses
M1 9 – 12 meses 5 – 6 meses 3 – 5 meses 4 – 6 meses 5 – 6 meses 4 – 5 meses
M2 2 anos 1– 11⁄ 2 ano 9 – 12 meses 8 – 12 meses 6 – 7 meses Nenhum
M3 31⁄ 2 – 4 anos 2– 21⁄ 2 anos 11⁄ 2 – 2 anos 18 – 20 meses 6 – 7 meses Nenhum
* O dente canino dos ruminantes domésticos tem sido comumente considerado como o quarto incisivo.
Odontologia 137

Cães – Os dados fornecidos adiante são encontrados em , 90% das raças de


grande porte. Em cães de pequeno porte (especialmente as raças toy) e em cães
com agnatia ou prognatia são mais variáveis.

01 1⁄2 anos: Cúspides do I 1 inferior desgastadas.


02 1⁄2 anos: Cúspides do I 2 inferior desgastadas.
03 1⁄2 anos: Cúspides no I 1 inferior desgastadas.
04 1⁄2 anos: Cúspides do I 2 superior desgastadas.
05 anos: Cúspides do I 3 inferior levemente desgastadas. Superfícies oclusais do
I 1 e I 2 inferiores retangulares. Desgaste leve dos caninos.
06 anos: Cúspides do I 3 inferior desgastadas. Caninos grosseiramente desgas-
tados. Os caninos inferiores apresentam a impressão do I 3 superior.
(Em cães nos quais as “pontas” dos incisivos superior e inferior se
encontram, isto é, não engrenam em um corte de “tesoura”, os incisivos
desgastam-se muito mais rapidamente.)
07 anos: A superfície oclusal do I 1 inferior é elíptica, com um eixo maior sagital.
08 anos: Superfície oclusal do I 1 inferior está inclinada para a frente.
10 anos: I 2 inferior e I 1 superior possuem superfícies oclusais elípticas.
12 anos: Os incisivos começam a cair (a menos que se tome cuidado em manter
a gengiva e os tecidos periodontais saudáveis).

ODONTOLOGIA, GR AN
Das espécies domésticas de grandes animais comuns, a eqüina é a que
apresenta a maior parte dos problemas dentários. Em muitas cocheiras e hipódro-
mos, a profilaxia dentária de rotina dos cavalos é realizada por leigos. Na suinocultura
industrial, a remoção ou amputação dos dentes caninos decíduos dos leitões e a
amputação das presas dos cachaços reprodutores podem ser parte do manejo
rotineiro. As espécies exóticas também podem apresentar vários problemas dentá-
rios e de mandíbulas, por exemplo, presas impactadas em elefantes jovens, ou
periostite dentária maxilar e actinomicose em cangurus.
A maioria dos grandes animais é herbívora. Uma função dentária eficiente é a
chave para uma boa ingestão de alimentos e manutenção da condição física normal.
Os dentes dos herbívoros evoluíram de modo a compensar as forças que resultam
de um atrito dentário provocado por um pastejo quase contínuo (nos cavalos) ou
ruminação. As forças de desgaste foram equiparadas pelo desenvolvimento do
dente hipsodonte (coroa alta) com erupção contínua de coroa reserva. As arcadas
dentárias (6 dentes faciais nos eqüinos) possuem serrilhas regulares que expõem
as bordas agudas do esmalte para rasgar e triturar a celulose. Ao mesmo tempo, a
natureza quebradiça do esmalte dos dentes é protegida das forças do trabalho
dentário pela dentina e cemento.
Sintomas de doença dentária – Problemas dentários (por exemplo, dentes
quebrados, arcadas dentárias irregulares) são uma causa de base comum de
mau aspecto, perda de condição física ou desempenho reprodutivo ou de
aleitamento ruim (por exemplo, doença da boca quebrada nos ovinos), assim
como de qualquer das queixas seguintes. Os sintomas clássicos de problemas
dentários nos cavalos incluem dificuldade e morosidade na alimentação, e
relutância em beber água gelada. Durante o processo de mastigação, o cavalo
pode parar por alguns momentos e reiniciar a mastigação. Algumas vezes a
cabeça é mantida inclinada para um dos lados, como se o cavalo sentisse dor.
Ocasionalmente, o cavalo pode mascar a comida formando um bolo que deixa
Odontologia 138

cair da boca parcialmente mastigado. Por vezes, a massa semimastigada pode


ficar presa entre os dentes e a bochecha. Para evitar a utilização de um dente
dolorido, o cavalo pode engolir comida sem mastigar suficientemente, sofrendo
posteriormente de indigestão ou cólica. Os grãos não mastigados podem ser
notados nas fezes. Outros sintomas incluem salivação excessiva e muco tingido
de sangue na boca. Todos estes sintomas são acompanhados pelo hálito fétido
característico dos problemas dentários. Pode haver pouco desejo de comer grãos
duros acompanhado por perda da condição corporal ou mau aspecto da pelagem.
Uma degradação dentária excessiva com a periostite que a acompanha e
abscedação da raiz podem levar a um empiema dos seios paranasais e corrimen-
to nasal unilateral intermitente. Pode ocorrer inchaço facial ou mandibular e
desenvolvimento de uma fístula mandibular em uma infecção apical dos dentes
faciais inferiores.
Os proprietários podem requisitar exames de cavalos que relutam em colocar o
freio, sacodem a cabeça quando montados ou resistem às técnicas de treinamento.
Alguns destes problemas podem ser causados por dentes faciais com desgaste
irregular e bordas agudas nos dentes faciais maxilares acompanhados de laceração
da mucosa bucal. A presença de dentes “de lobo” nos cavalos pode ou não estar
associada à resistência ao freio.
Na maioria dos casos, há uma correlação entre o histórico, a idade do animal
e os sintomas clínicos. Em todos os casos, um exame físico completo deve
preceder um exame oral e dentário detalhado. O exame pode ser facilitado por
sedação e o uso de uma “mordaça”; no entanto, na maioria dos cavalos, o exame
dentário pode ser realizado com um mínimo de contenção e sem mordaça. Em
alguns casos, um exame oral completo só pode ser realizado sob anestesia geral;
nestas circunstâncias, a endoscopia oral ou a radiografia dentária também podem
ser utilizadas.
A profilaxia dentária de rotina é importante no cuidado com a saúde dos cavalos.
As bordas afiadas do esmalte devem ser removidas duas vezes por ano durante o
estabelecimento da dentição permanente e anualmente a partir de então. Normal-
mente isto pode ser feito com relativa facilidade sem contenção química. Os
principais procedimentos (por exemplo, extrações) exigem anestesia geral, prote-
ção das vias aéreas contra os debris e avaliação radiográfica. Na maioria dos casos,
a extração do dente afetado é a maneira mais fácil de resolver o problema. O alvéolo
deve ser completamente debridado, irrigado e a face oral deve ser coberta para
protegê-la da comida e saliva. O ferimento do acesso cirúrgico mandibular ou
maxilar deve ser limpo diariamente para permitir a cura por granulação.
Alterações congênitas e de desenvolvimento – Nos cavalos, a deformidade
oral congênita mais comum é a boca de papagaio, na qual o maxilar é ligeiramente
mais longo que a mandíbula. Nos eqüinos e bovinos, muitas formas de anomalias
no desenvolvimento dentário podem resultar de exposição a toxinas teratogênicas;
no entanto, devemos sempre considerar a possibilidade de um fator genético de
base. A fluorose sistêmica em bovinos e ovinos é acompanhada de irregularidades
dentárias. Na forma mais leve de fluorose, apenas a dentição pode ser afetada; nos
casos extremos, por exemplo, 40ppm na dieta por vários anos, também podem ser
observadas outras anormalidades esqueléticas.
Dentes supernumerários (poliodontia) ocorrem ocasionalmente. Isto é obser-
vado em cavalos e bovinos, nos quais uma dupla fileira de incisivos pode ocorrer,
assim como dentes faciais extras.
Erupção dentária anormal – A erupção anormal dos dentes permanentes é
muitas vezes uma seqüela de traumas mandibulares ou maxilares, por exemplo,
fraturas sinfiseais em bovinos e cavalos nos quais o embrião do dente permanen-
te é danificado nos processos de fratura ou reparo. Nos eqüinos, a erupção
Odontologia 139

retardada ou impactação dos dentes faciais é uma causa comum de osteíte apical
e subseqüente degeneração dentária. Isto afeta particularmente o terceiro dente
facial (quarto pré-molar) tanto na arcada superior como na inferior, sendo uma
seqüela de um grau leve de pouco espaço na arcada dentária. O deslocamento
medial do terceiro dente facial é outra forma de má erupção devida a falta de
espaço.
Irregularidades de desgaste – Com exceção dos suínos, a maioria dos
grandes animais possui um espaço intermandibular que é mais estreito que o
espaço intermaxilar, isto é, anisognático. Nos cavalos, este fato, juntamente com
o movimento naturalmente limitado da mandíbula, resulta no desenvolvimento de
pontas de esmalte nas bordas bucais das arcadas superiores e bordas linguais
nas arcadas inferiores. No gado bovino e ovino, como a articulação temporo-
mandibular permite um movimento lateral maior da mandíbula, estas irregularida-
des não ocorrem. Formas extremas deste problema, no entanto, são também
influenciadas por outras deformidades esqueléticas da face, por exemplo, podem
ocorrer pontas dentárias grandes quando há obliqüidade exagerada das mesas
molares. Isto é comum nos cavalos mais velhos e o tratamento normalmente é
insatisfatório.
As pontas de esmalte são melhor tratadas com uma profilaxia dentária regular
(flutuante) nos cavalos. Isto deve ser realizado duas vezes por ano enquanto a
dentição definitiva está se desenvolvendo; no mesmo momento os “dentes de leite”
que não caíram quando os permanentes surgiram devem ser removidos se
causarem desconforto oral ou ulcerações.
Boca ondulada e boca em escada são irregularidades causadas por desgaste
desigual dos dentes resultante de dor local. Com o tempo, desenvolvem-se doenças
secundárias da gengiva e alvéolo dentário, isto é, periodontite. Estes problemas são
melhor evitados por uma profilaxia dentária de rotina regular.
Periodontite – Em todos os animais, há um certo grau de alteração inflamatória
durante a erupção dos dentes decíduos e permanentes. Se, no entanto, ocorrer a
maloclusão, por qualquer motivo, uma periodontite severa é inevitável. Nos cavalos,
esta é uma seqüela comum de trauma oral, fraturas dentárias, impactações e
principalmente desgaste irregular.
Nos ovinos, a periodontite dos dentes mandibulares rostrais (incisivos) é muitas
vezes chamada de boca quebrada. Algumas vezes a viabilidade de ovinos em
pastejo é afetada drasticamente. Muitos ovinos alimentados no cocho têm uma vida
produtiva que é , 2 anos mais longa que a dos animais em pastejo. Pouco pode ser
feito para alterar o progresso desta doença, apesar de algumas rotinas de manejo
recomendarem profilaxia dentária e restauração da regularidade oclusal dos dentes
incisivos. Isto pode ser feito com a ferramenta de Drummel ou uma grosa de dentes
de lâmina fina.
Degeneração dentária – A infecção pode ser introduzida na cavidade pulpar
dentária por várias rotas. Nos cavalos, a hipoplasia do esmalte dos dentes faciais
superiores pode predispor ao desenvolvimento de cáries, o que leva a uma pulpite
e osteíte apical. Se o dente está rostral ao seio maxilar, desenvolvem-se celulite
local, periostite e periodontite alveolar. Se, no entanto, as raízes e a coroa de
reserva do dente se encontram no interior do seio maxilar, pode ocorrer um
empiema de seio paranasal. As características patológicas dos dentes degene-
rados são inespecíficas; conseqüentemente, a etiologia da infecção apical pode
ser obscura. Muitos casos não são examinados até que a infecção esteja
avançada e as fraturas dentárias podem ser tanto patológicas quanto primárias.
Estes problemas são melhor resolvidos pela extração do dente afetado ou, se a
cirurgia não é economicamente possível, o animal deve ser abatido (por exemplo,
ovinos e bovinos).
Odontologia 140

ODONTOLOGIA, PQ AN
DOENÇA PERIODONTAL
Uma infecção bacteriana do tecido em torno do dente que provoca inflamação da
gengiva, membrana periodontal, cemento e osso alveolar. Por fim, o dente é perdido
devido à degeneração dos tecidos que o suportam. Esta é a maior causa de perda
dentária em cães.
Etiologia – A doença periodontal é provocada por uma grande acumulação de
muitas bactérias diferentes na margem gengival, em parte devida à falta de higiene
oral apropriada. Por um período de semanas, a flora muda de bactérias sem
motilidade, Gram-positivas, coccóides, aeróbicas para bactérias mais móveis,
Gram-negativas, em formato de bastonetes e anaeróbias. A flora importante é
composta por Bacteroides asaccharolyticus, Fusobacterium nucleatum, Actinomyces
viscosus e A. odontolyticus.
Patogenia – Conforme a flora bacteriana local aumenta em massa para 10 a 20
vezes o normal, ocorre a gengivite. A acumulação de produtos do metabolismo
bacteriano aumenta a permeabilidade do epitélio nos desmossomos creviculares
epiteliais e permite que os antígenos façam contato com o tecido conjuntivo. Os
produtos do metabolismo bacteriano incluem sulfeto de hidrogênio, amônia, endo-
toxinas, hialuronidase, sulfatase de condroitina, mucopeptídeos, ácidos lipoteicos,
acetato, butirato, isovalerato e propionato. Estes produtos bacterianos e os meca-
nismos de defesa do hospedeiro provocam necrose tecidual. Os leucócitos polimor-
fonucleares (PMN) migram através do epitélio sulcular e formam uma barreira entre
as bactérias subgengivais e a gengiva. Com o aumento do desafio bacteriano, os
PMN morrem em número crescente liberando produtos de degradação. O sistema
imune produz linfocinas que participam da destruição tecidual, que segue o caminho
do suprimento vascular local. A destruição tecidual acelerada e o reparo inadequado
provocam perda do suporte periodontal. Duas formas de doença periodontal são
reconhecidas: gengivite e periodontite.
Gengivite – Nesta inflamação dos tecidos marginais da gengiva (induzida pela
placa bacteriana e que não afeta o ligamento periodontal ou o osso alveolar), há uma
alteração do rosa-coral da margem gengival para vermelho ou púrpura, aumento de
volume e um exsudato seroso ou purulento no sulco. A gengiva tende a sangrar ao
contato. O hálito fétido é comum. A gengivite é reversível com uma limpeza
apropriada dos dentes, mas se não tratada, pode levar a periodontite.
Periodontite – Um processo inflamatório destrutivo do periodonto induzido e
conduzido pela placa bacteriana que contém bactérias específicas para destruição
da gengiva, ligamento periodontal, osso alveolar e cemento da raiz. Isto normalmen-
te ocorre após anos de placa, cálculo e gengivite, resultando em perda permanente
do suporte dentário. Não é reversível. Há migração apical da ligação epitelial e
reabsorção do osso alveolar de suporte. Os dentes afetados podem mostrar
mobilidade crescente, gengivite concorrente e cálculos subgengivais.
A periodontite é normalmente caracterizada pela hiperplasia da margem
gengival nos cães e recesso do ligamento gengival nos animais de colônia. Os
animais de estimação também demonstram esta tendência; no entanto, a forma-
ção de bolsas infra-ósseas (áreas profundas e isoladas de perda óssea) é mais
comum em animais de estimação do que nos criados em colônias. Os cães
alimentados com dieta sólida apresentam menos problemas devido à ação
mecânica de limpeza da comida. Os dentes caudais apresentam mais problemas
que os rostrais. O maxilar é afetado com mais gravidade que a mandíbula, e as
superfícies bucais possuem mais doenças que as superfícies linguais. A gengivite
freqüentemente torna-se séria , aos 2 anos de idade e, se tratada, resolve-se.
Odontologia 141

A periodontite normalmente inicia-se aos 4 a 6 anos de idade e, se não tratada,


progride para perda dos dentes.
Tratamento – O princípio básico é que uma doença periodontal ativa não se
desenvolve em torno de um dente limpo.
Gengivites normalmente podem ser tratadas com limpeza dentária completa,
inclusive abaixo da margem gengival. Os casos que não se resolvem com tratamen-
to devem ser investigados quanto à presença de cálculos e placa, que devem ser
removidos nas limpezas posteriores. Os casos renitentes devem ser investigados
quanto a imunocompetência, defeitos celulares (por exemplo, quimiotaxia diminuí-
da dos neutrófilos), ou doença sistêmica (por exemplo, diabetes melito). As
gengivites se restabelecem se os dentes não forem mantidos limpos e livres de
bactérias. Portanto, os métodos de higiene oral em casa e a limpeza dentária regular
para prevenção da gengivite e sua progressão para periodontite devem ser
encorajados.
Periodontites precisam ser tratadas com limpeza completa acima e abaixo da
margem gengival. Nas áreas de maior profundidade subgengival (> 4mm), meios
cirúrgicos (normalmente gengivectomia) devem ser empregados, para que se tenha
acesso à superfície da raiz a ser limpa. Normalmente é possível salvar um dente que
tenha perdido até 75% de seu suporte ósseo. A radiografia das mandíbulas permite
esta avaliação, devendo ser realizada quando a doença periodontal está em estágio
avançado. Defeitos ósseos que têm caráter infra-ósseo (defeitos abaixo da crista do
osso alveolar) exigem cirurgia em retalho cirúrgico. Os defeitos na superfície
palatina dos dentes caninos maxilares, que possuem caráter infra-ósseo e invadem
ou aproximam-se da cavidade nasal, devem ser tratados com técnicas de enxertos
infra-ósseos antes que seja tomada a decisão de extrair-se o dente. A extração
destes dentes muitas vezes deixa fístulas oronasais (que precisam ser reparadas
cirurgicamente). Após a cirurgia, os casos de periodontite devem ser mantidos com
métodos de higiene oral em casa e quimioprofilaxia por ≥ 2 semanas com 0,1 a 0,2%
de clorexidina. As limpezas profiláticas freqüentes (a cada 3 meses a 1 ano) devem
ser encorajadas para evitar recidivas dos casos tratados com maior perda óssea.

HIPERPLASIA GENGIVAL
(Fibromatose gengival, Epúlide fibromatosa, Epúlide)
Ver também página 156.
A hiperplasia gengival é um supercrescimento benigno dos tecidos epitelial e
conjuntivo das gengivas, geralmente originado na região da gengiva marginal. O
tecido é relativamente insensível e resistente, com a densidade do tecido conjuntivo
fibroso. Os crescimentos geralmente possuem uma ampla base de fixação, são da
cor da gengiva normal ou mais pálidos, e podem crescer o suficiente para encobrir
completamente as superfícies de vários dentes. A predisposição a estes tumores
pode existir em raças braquicefálicas, nas quais a afecção é denominada hipertro-
fia gengival familial.
Epúlide é um termo usado para se referir à epúlide de células gigantes ou tumores
da gengiva do cão. Este tumor está geralmente localizado em um único dente. A biópsia
é encorajada para se estabelecer o diagnóstico, tratamento e prognóstico apropriados.
A hiperplasia gengival é mais comum em cães velhos que se apresentam
geralmente assintomáticos. Pêlos, alimentos e resíduos podem ficar retidos entre o
tumor e os dentes, causando irritação e halitose.
A gengivectomia por técnicas eletrocirúrgicas é o tratamento mais satisfatório. A
boca deve ser lavada com solução de cloreto de benzalcônio a 1:1.000 ou
clorexidina a 0,2% diariamente, após a cirurgia, até que haja completa recuperação
clínica (, 2 semanas).
Odontologia 142

DOENÇA ENDODÔNTICA
Hiperemia pulpar – A polpa pode sofrer uma inflamação aguda devido a traumas
ou lesões extensas próximas à mesma (por exemplo, cáries e reabsorção). Como
esta estrutura está totalmente confinada na dentina, o aumento de volume causado
pela inflamação pode resultar em necrose por pressão se a lesão for prolongada. A
gravidade da reação parece ser diretamente proporcional à extensão da lesão.
Portanto, pequenas lesões que provocam hiperemia transitória da polpa podem
resolver-se, restabelecendo-se a polpa saudável.
Os métodos para resolver uma hiperemia aguda da polpa são sedativos por
natureza. A limpeza das cáries e colocação de eugenol óxido de zinco nas reabsorções
e áreas onde localizavam-se as cáries permitem anestesia local e resolução da
hiperemia. Pode ser necessário um período de espera de várias semanas para
estabelecer-se, por radiografia, que o problema não resultou em pulpite.
Pulpite – É uma inflamação irreversível da polpa, com necrose de pressão e
abscedação. Em geral, a cavidade do abscesso é estéril, a não ser que o dente tenha
sido aberto para o ambiente oral por trauma, reabsorção ou cárie. O dente com
pulpite muitas vezes apresenta dor aguda e o animal ressente a manipulação ou
percussão do dente. Estes dentes muitas vezes assumem uma coloração marrom-
avermelhada ou cinza escuro, conforme o sangue é forçado para o interior dos
túbulos de dentina pela morte da polpa e aumento da pressão gasosa na cavidade
pulpar. O tratamento consiste em uma terapia endodôntica e restauração da
estrutura dentária; como alternativa, os dentes que não forem vitais para a oclusão
ou função da dentição, podem ser extraídos.
Lesões periapicais – Um abscesso periapical é uma lesão cavitária na extremi-
dade da raiz provocada por inflamação da polpa. Estas áreas geralmente podem ser
observadas nas radiografias como regiões circulares radiolucentes em torno da
extremidade da raiz. Estes abscessos podem, algumas vezes, ser palpados nas
proeminências ósseas das extremidades das raízes. Os abscessos podem se
estender, por drenagem sob pressão, para o osso adjacente e áreas de tecidos
moles, e sair extra-oralmente espaço de tecidos moles entre as mandíbulas, sob o
olho, ou no vestíbulo bucal. O tratamento consiste em terapia endodôntica (canal da
raiz) no dente associado, sendo que o abscesso e a fístula associada resolvem-se
em algumas semanas. Quando a terapia endodôntica não pode ser realizada, o
dente afetado deve ser extraído.
Os granulomas periapicais possuem uma aparência radiográfica e clinicamente
semelhante aos abscessos periapicais, mas significam uma duração maior do
comprometimento. Estes granulomas geralmente não são infectados e não pos-
suem fístulas associadas. Eles representam uma tentativa incompleta de reparo. O
tratamento envolve endodontia do dente afetado ou extração do mesmo, se a
endodontia não for possível.

CÁRIES DENTÁRIAS
A degeneração dentária é incomum em cães e gatos, possivelmente devido às
diferenças na flora oral e dietas basicamente livres de carboidratos prontamente
fermentáveis. Além disto, o pH ligeiramente ácido da saliva canina torna a boca mais
resistente. Nos cães, as cáries geralmente são observadas sob a forma de
depressões nas superfícies planas do cólon dos dentes molares.

LESÕES DO “CÓLON” EM GATOS


A reabsorção é uma forma comum de patologia na superfície de qualquer dente,
que inicia-se na área do “cólon” (junção cemento – esmalte) do dente. Superficial-
Odontologia 143

mente, estes dentes podem parecer normais. Os gatos afetados podem hipersalivar
um muco viscoso e hesitar em beber ou mastigar. O diagnóstico precoce é facilitado
passando-se uma sonda fina ao longo do dente sob a gengiva (sob anestesia)
durante a profilaxia dentária anual. Os dentes afetados devem ser restaurados ou
extraídos. Os dentes que apresentam reabsorção na polpa devem receber trata-
mento endodôntico antes da obturação. Estes dentes sem limite apical palpável na
cavidade devem sempre ser radiografados para assegurar-se de que a raiz não foi
gravemente reabsorvida. Se foi, é indicada a extração. As lesões no “cólon” são
comuns em gatos com gengivite persistente apesar das limpezas. Estes gatos
geralmente apresentam estomatites/faringites generalizadas, devendo-se conside-
rar a possibilidade de doença sistêmica. Falhas nos mecanismos normais de defesa
devidas a infecções virais persistentes (por exemplo, vírus da leucemia felina, vírus
da imunodeficiência felina, coronavírus), imunoincompetência hereditária, ou doen-
ça sistêmica debilitante podem explicar as gengivites ou estomatites extraordina-
riamente graves. Extrações de todos os dentes podem ser necessárias em gatos
anoréticos que não respondem à profilaxia repetida.

ANORMALIDADES DE DESENVOLVIMENTO
Maloclusão – A relação inadequada entre os dentes pode resultar de uma
mordida inapropriada devida ao posicionamento inadequado dos dentes na mandí-
bula. Isto ocorre freqüentemente quando os dentes decíduos são mantidos e os
dentes permanentes nascem adjacentes a eles, em vez de diretamente sob os
mesmos; as raízes dos “dentes-de-leite” não são reabsorvidas, levando os dentes
permanentes a assumir uma posição anormal. Outros tipos de maloclusão dentária
estão relacionados a uma proporção inadequada entre o tamanho dos dentes e o
tamanho da mandíbula; isto é, a mandíbula pode ser muito pequena para o tamanho
dos dentes que se desenvolvem nela, o que causa aglomeração e maloclusão
subseqüente. A maloclusão pode ser tratada por extração precoce dos dentes
decíduos retidos, extração seletiva dos dentes permanentes, ou ortodontia. Desta
forma é possível obter uma mordida funcional. As maloclusões esqueléticas
resultam de uma relação anormal entre as arcadas superior e inferior, apesar de
os dentes estarem bem alinhados nas mandíbulas. O tratamento é bem mais
difícil e deve-se tentar antes obter uma mordida funcional, do que uma oclusão
perfeita. Extrações seletivas, ortodontia e, nos casos graves, cirurgia ortognática
podem ser necessárias.
Hipoplasia do esmalte e manchas intrínsecas – Durante o desenvolvimento
do esmalte, febres e deposição de elementos químicos no interior do dente podem
causar dano permanente. Não é necessário tratamento quando a coroa do dente
possui uma integridade estrutural normal. Se o esmalte estiver esburacado e
irregular, podem ser necessárias obturações e coroas para evitar a retenção de
resíduos. A utilização de tetraciclina durante a formação do esmalte dos dentes
permanentes deve ser evitada quando possível.

TRAUMA MAXILOFACIAL
Os dentes fraturados devem ser observados quanto ao dano à polpa. Se as
fraturas estendem-se para a polpa, é necessária a terapia endodôntica, ou a
extração. Fraturas no comprimento que estendem-se até abaixo da margem
gengival podem ser de difícil restauração; se foi perdida uma porção substancial do
dente, o remanescente provavelmente deve ser extraído. Dentes fragmentados,
especialmente os com raízes múltiplas, muitas vezes são deixados para “ver o que
acontece”; a extração geralmente é melhor, devido ao mau resultado em geral. As
técnicas de restauração (coroas, obturações e restaurações compostas) podem
Odontologia 144

reparar defeitos na estrutura dentária de dentes tratados endodonticamente ou


dentes com defeitos restauráveis limitados às estruturas duras.
O fechamento por primeira intenção deve, quando possível, ser utilizado para
reparar os traumas em tecidos moles. Os resultados freqüentemente são bons
quando a sutura é realizada nas primeiras horas. O tecido espesso que tornou-se
avascular devido ao trauma deve ser removido.
As fraturas ósseas exigem estabilização por técnicas ortopédicas. Talas de
acrílico e barras em arco também podem ser utilizadas. Nas fraturas que não estão
exageradamente deslocadas, uma focinheira de gaze que permita uma abertura de
1cm nas mandíbulas fornece uma boa fixação nos cães com focinhos longos. O
animal pode comer se seu alimento for triturado.

DOENÇAS EXÓCRINAS DO PÂNCREAS


Os cães são afetados com maior freqüência que os outros animais domésticos.
A pancreatite aguda, que apresenta-se como um episódio único ou episódios
recorrentes de inflamação repentina e intensa, ocorre com maior freqüência. A
pancreatite crônica são episódios recorrentes ou inflamação menos intensa e
persistente que provocam perda progressiva da função pancreática. A insuficiência
pancreática exócrina (EPI), uma síndrome caracterizada por má-digestão, ocorre na
maior parte das vezes como uma atrofia pancreática idiopática; uma alta prevalência
em cães pastor alemão sugere uma predisposição hereditária nesta raça. A
pancreatite crônica ou a pancreatite aguda grave também podem resultar em EPI,
algumas vezes com diabetes melito coexistente. A pancreatite aguda e crônica e a
EPI são pouco diagnosticadas em gatos e raramente em cavalos e porcos. O
adenocarcinoma do epitélio acinar ou do duto são incomuns, mas insidiosos e
devastadores nas suas manifestações. Os tumores funcionais das células das
ilhotas (ver pág. 325) ocorrem ocasionalmente, provocando sintomas de hipoglice-
mia (ver também DIABETES MELITO, pág. 323).

PANCREATITE AGUDA
Etiologia – A causa é desconhecida, porém provavelmente envolve etiologia
múltipla. Acredita-se que os fatores nutricionais que contribuem para lesões nas
células acinares pancreáticas incluem obesidade, dietas ricas em gorduras e
hiperlipoproteinemia. As drogas suspeitas de provocar alguns casos de pancreatites
incluem os tiazídeos, furosemida, azatioprina, sulfonamidas, tetraciclina e corticos-
teróides. A manipulação cirúrgica, trauma abdominal grosseiro, doença do trato
biliar, oclusão dos dutos pancreáticos ou biliares e refluxo duodenal foram implica-
dos. Toxoplasmose, peritonite infecciosa felina e panleucopenia foram associadas
à pancreatite felina.
Fisiopatologia – Independentemente do insulto inicial, a isquemia pancreática
é central na patogenia da pancreatite. A gravidade da isquemia determina se uma
inflamação pancreática leve evoluirá para uma pancreatite grave, hemorrágica, com
risco de vida. A lesão às células acinares resulta na ativação e liberação de enzimas
digestivas no interior do interstício pancreático e tecidos circundantes. Ocorrem
autodigestão pancreática, com dano as células endoteliais, edema, isquemia,
hemorragia e necrose. A ativação subseqüente do complemento, aminas vasoativas,
coagulação e fibrinólise amplificam o dano pancreático e o envolvimento de vários
sistemas.
Doenças Exócrinas do Pâncreas 145

Achados clínicos – Os cães com pancreatite aguda tendem a ser de meia-


idade, inativos e obesos; muitas vezes comem restos da mesa ou lixo. As fêmeas
são afetadas com maior freqüência, enquanto cães de trabalho ou atléticos
raramente são afetados. Os sintomas clínicos são variáveis, mas normalmente
incluem vômitos agudos, anorexia, depressão e, algumas vezes, diarréia hemorrá-
gica. As manifestações graves podem causar choque e colapso. A desidratação,
febre e fraqueza são comuns. Dor abdominal intensa está presente na maioria,
porém não em todos os cães, podendo haver uma massa abdominal anterior
palpável. Os sintomas menos comuns incluem icterícia, taquipnéia, arritmias
cardíacas e coagulopatias.
Os sintomas da pancreatite crônica recorrente são inespecíficos e menos
intensos. Anorexia, vômitos intermitentes, dor abdominal, diarréia e perda de peso
são típicos. Uma diarréia volumosa, com odor rançoso, esteatorréica pode eventual-
mente ocorrer devido à diminuição progressiva da função exócrina. O apetite é
tipicamente voraz, apesar da profunda perda de peso causada pela má-digestão e
subseqüente malabsorção dos nutrientes. Alguns casos são ainda complicados por
um diabetes melito concorrente. A pancreatite crônica ocorre infreqüentemente nos
gatos e geralmente é um achado incidental de necropsia.
Diagnóstico – Apesar de não existir teste diagnóstico para a pancreatite aguda,
o histórico e os sintomas clínicos associados aos resultados de exames laboratoriais
selecionados podem estabelecer um diagnóstico provável. O aumento paralelo das
atividades da amilase e lipase séricas é bastante sugestivo de pancreatite aguda;
no entanto, aumentos marcantes em uma enzima podem ser acompanhados de
elevações mínimas da outra. Ocasionalmente, estas enzimas estão normais apesar
da pancreatite ativa. Leucocitose, freqüentemente com desvio à esquerda,
hemoconcentração e lipemia são achados comuns. A atividade das enzimas
hepáticas muitas vezes está aumentada e, em alguns casos, ocorre hiperbilirrubi-
nemia com icterícia clínica. A azotemia pode ocorrer devido a desidratação ou
colapso renal primário e, nesse caso, podem ser encontrados cilindros proteicos na
urina. A hiperglicemia é comum e acompanhada de glicosúria se ocorrer um
diabetes melito manifesto. Pode ocorrer uma hipocalcemia leve que não está
associada a sintomas clínicos de tetania. Os achados radiográficos corroboradores
incluem maior densidade e perda de detalhes na porção cranial direita do abdome,
deslocamento do duodeno para a direita e um padrão gasoso estático no duodeno
descendente. Os diagnósticos diferenciais incluem infecções sistêmicas como
parvovirose ou hepatite canina infecciosa, obstrução intestinal (corpo estranho ou
vólvulo), gastroenterite hemorrágica, pielonefrite aguda ou colapso renal, piometria,
prostatite, peritonite, diabetes melito cetoacidótico e outras causas de abdome
agudo.
Tratamento – É necessária uma fluidoterapia agressiva para corrigir o choque
e a desidratação, restaurando assim as perfusões pancreática e sistêmica. Devem
ser administradas soluções eletrolíticas balanceadas, como a solução lactato de
Ringer, EV, até que seja corrigida a desidratação e os vômitos cessem. Pode ser
necessária a administração de plasma, se a hipoproteinemia for grave. Os desequi-
líbrios ácido-básicos e de eletrólitos devem ser corrigidos. Muitas vezes ocorre
hipocalemia, devendo-se suplementar o potássio sérico quando necessário. Adicio-
nando-se 20mEq de um sal de potássio em 1L de fluido de manutenção, geralmente
é fornecida a quantidade adequada de potássio se administrado a 40mL/kg/dia via
parenteral. A função renal deve estar normal e o potássio EV não deve exceder
0,5mEq/kg/h.
Toda ingestão via oral deve ser suspensa por 48 a 72h para diminuir o estímulo
à secreção pancreática. Os antieméticos à base de fenotiazina diminuem os
vômitos, porém são hipotensivos. Eles podem ser usados com cautela por 24 a 48h
Doenças Exócrinas do Pâncreas 146

ou até que hidratação e fluidoterapia sejam adequadas. Anticolinérgicos, como o


sulfato de atropina, inibem o reflexo do vômito e a secreção pancreática; seu uso
deve ser limitado a 24 a 36h para evitar o íleo paralítico. Os corticosteróides são
indicados apenas em caso de choque. Os antibióticos, como ampicilina ou
cefalosporina, são utilizados quando há suspeita de infecção secundária ou sepse.
Analgésicos, como a meperidina, podem ser utilizados para dor abdominal intensa.
Uma dose baixa de heparina (100u/kg, três vezes ao dia) s.c. pode diminuir a
tendência a trombose e coagulação intravascular. Os casos graves que continuam
piorando apesar do tratamento de suporte podem ser beneficiados por transfusões
de plasma ou sangue total. A alimentação oral deve ser reiniciada 24 a 48h após os
vômitos terem cessado, começando por pequenas quantidades de água; se os
vômitos não recomeçarem, pequenas quantidades de comida de bebê ou canja de
galinha podem ser gradualmente acrescentadas. Se os vômitos recomeçarem, o
animal não deve receber nada VO por mais 24 a 48h. Recomendam-se dietas com
baixo teor de gordura e alto teor de carboidratos e proteínas para manutenção do
animal pelo restante de sua vida.
O prognóstico geralmente é bom, desde que o tratamento seja rápido e agres-
sivo. Se ocorrer colapso pancreático exócrino e/ou endócrino, o tratamento é mais
difícil. Torna-se necessária a suplementação da dieta com enzimas pancreáticas e/
ou insulina. A persistência ou recorrência de febre, dor ou massa abdominais,
leucocitose ou icterícia indicam um abscesso pancreático ou pseudocisto infectado.
É necessária a drenagem ou ressecção cirúrgicas; o prognóstico é ruim.

INSUFICIÊNCIA PANCREÁTICA EXÓCRINA


A perda progressiva de células pancreáticas exócrinas resulta na incapacidade
de absorção de nutrientes devida à síntese inadequada de enzimas digestivas. A
atrofia acinar pancreática espontânea é a causa mais comum da EPI e ocorre
predominantemente em cães adultos jovens, especialmente pastores alemães, nos
quais a predisposição para a doença pode ser hereditária. As causas menos comuns
de EPI incluem pancreatite crônica, má-nutrição calórico-proteica e hipoplasia
pancreática congênita. A EPI raramente é diagnosticada em gatos. Os animais com
EPI perdem peso apesar de apresentarem um apetite de normal a voraz. A polifagia
pode ser caracterizada por pica, coprofagia e polidipsia. A diarréia é comum,
caracterizada pela eliminação freqüente de grande volume de fezes semiformadas.
Pode ocorrer diarréia líquida explosiva. Um histórico longo de sintomas GI, como
desconforto abdominal, vômitos, borborigmo e flatulência não é incomum. Alguns
cães ficam muito emaciados, com pelagem ruim e perda muscular. Em alguns pode
ocorrer diabetes melito concorrente (ver pág. 323).
O diagnóstico é confirmado pela mensuração da imunorreatividade semelhante
a tripsina sérica (TLI; normal é > 5µg/L, na EPI é < 2,5µg/L). O exame microscópico
das fezes quanto a gordura e alimentos não digeridos, testes de turbidez plasmática,
e medida da atividade proteolítica fecal podem ser utilizados como testes simples
de eliminação; porém eles não são confiáveis. Para o teste de TLI é necessária uma
amostra de sangue em jejum.
A maioria dos cães pode ser tratada com sucesso através da suplementação da
dieta com um preparado enzimático em pó, não envolto em cápsula entérica. Uma
colher de sopa/10kg de peso corporal em cada refeição é geralmente eficaz, apesar
da dosagem variar de indivíduo para indivíduo. É recomendada uma dieta facilmente
digerível, pobre em fibras e gorduras, dividida em 3 ou 4 pequenas refeições por dia.
A adição de triglicerídios de cadeia média, que não necessitam da lipase pancreática
para serem absorvidos, facilita a absorção de gorduras e fornece calorias adicionais.
Um crescimento bacteriano exagerado no intestino delgado muitas vezes acompa-
Doenças da Boca, Gr An 147

nha a EPI, contribuindo para a malabsorção e diarréia. Os animais que não


respondem adequadamente a enzimas orais e dieta modificada devem ser tratados
com antibióticos orais como oxitetraciclina, metronidazol, ou tilozina. A suplemen-
tação com vitaminas lipossolúveis parenterais é aconselhada até que o ganho de
peso seja evidente. O prognóstico é geralmente bom, desde que o proprietário
entenda o custo de uma suplementação enzimática para toda a vida. O diabetes
melito concorrente exige terapia com insulina; estes casos são mais difíceis de tratar
e o prognóstico é ruim.

NEOPLASIAS PANCREÁTICAS
Os adenocarcinomas acinares ou do epitélio do duto pancreático podem ser
difíceis de diagnosticar. Eles ocorrem em cães mais velhos (média de 10,8 anos) e
são raros em gatos. São altamente malignos e muitas vezes apresentam metásta-
ses muito disseminadas, particularmente no fígado. Os sintomas clínicos são
inespecíficos, podendo incluir perda de peso, anorexia, depressão, vômitos e
icterícia. Dor abdominal e, ocasionalmente, uma massa abdominal anterior são
detectadas. Não existem testes laboratoriais específicos. A atividade plasmática da
lipase e amilase pode estar aumentada. Aumentos acentuados da fosfatase alcalina
e bilirrubina com um aumento menor da ALT (SGPT) são sugestivos de hepatopatia
obstrutiva. O diagnóstico definitivo é feito por laparotomia. O prognóstico é ruim pois
normalmente houve metástase no momento do diagnóstico.
Os tumores funcionais das células das ilhotas do pâncreas são discutidos na
página 325.

DOENÇAS DA BOCA, GR AN
FENDA PALATINA
Esta condição é encontrada ocasionalmente no recém-nascido de todas as
espécies (ver ANOMALIAS CONGÊNITAS, pág. 130).

CONTUSÕES E FERIDAS DOS LÁBIOS E BOCHECHAS


As feridas dos lábios e das bochechas são mais comumente encontradas no
cavalo, como resultado de quedas, coices, freios desumanos, mordidas ou pontas
de objetos pontiagudos. A vascularização da região proporciona, como regra geral,
uma cicatrização rápida, exceto quando a ferida é perfurante, originando uma fístula.
O tratamento é o de rotina: quando a laceração envolver a borda do lábio, a sutura
deve iniciar-se nessa borda para obter o melhor efeito cosmético; se não encontra-
das feridas profundas, suturas mais profundas devem ser feitas em adição àquelas
das extremidades cutâneas. Podem ser necessários enxertos de pele para correção
de grandes defeitos ou fístulas.

PALATITE
É uma inflamação transitória do revestimento mucoso do palato duro. A palatite
não é uma doença característica, mas pode ocorrer em cavalos jovens, durante a
erupção dos incisivos permanentes, ou em cavalos de qualquer idade, como
resultado de uma estomatite. A inflamação é autolimitante e não necessita de
tratamento.
Doenças da Boca, Gr An 148

PARALISIA DA LÍNGUA
(Glossoplegia)
É uma perda parcial ou completa da função da língua que pode ser de origem
periférica ou central. A manipulação brusca e tração excessiva da língua durante o
exame dentário pode ser uma causa do tipo periférico. Animais recém-nascidos
podem exibir paralisia da língua após o uso de uma alça obstétrica colocada sobre
a mandíbula e a língua, ou de edema da língua durante distocias quando a cabeça
do feto é comprimida na vagina da mãe. A laceração da língua por vidro quebrado
ou outros objetos contundentes na manjedoura de alimentação, bem como vários
procedimentos cirúrgicos realizados na língua para impedir a auto-sucção, também
causam paralisia da língua. A glossoplegia de origem central pode acompanhar ou
seguir condições, como garrotilho, infecção respiratória superior, meningite, botulismo,
encefalomielite, leucoencefalomalacia ou abscessos cerebrais no cavalo. A língua
afetada unilateralmente está desviada em direção ao lado não afetado; a língua
afetada bilateralmente fica flácida e com freqüência projeta-se através das mandí-
bulas relaxadas. Em casos leves, de origem periférica ou central, a fraqueza
muscular da língua é mais evidente.
A causa mais comum em bovinos é a actinobacilose (ver pág. 382). A paralisia
completa da língua pode estar acompanhada por graus variados de necrose da
ponta, uma condição que tem sido observada em forma de surtos em confinamentos,
possivelmente como resultado de uma infecção viral ou fúngica.
A identificação e remoção da causa ou transferência dos animais para ambientes
livres dos agentes causadores são os procedimentos iniciais de tratamento. Quando
uma doença específica, como o garrotilho ou a actinobacilose, é identificada, o
tratamento específico é indicado. Um acompanhamento cuidadoso, juntamente com
o fornecimento de alimentos bem conservados e livres de toxinas, bem como
suprimento adequado de água potável auxiliarão casos nos quais a recuperação
espontânea é esperada. A paralisia aparente da língua devida a um edema normal-
mente responde à massagem cuidadosa em um curto período. Neonatos imaturos ou
com síndrome do mau ajustamento neonatal (ver pág. 738) podem apresentar
paralisia parcial da língua, geralmente recuperando a função se sobreviverem.
Quando a condição persistir por > 6 semanas, a probabilidade de recuperar a
função normal é pequena.

TOXICOSE POR ESLAFRAMINA


(Fator sialorréico)
É uma doença não infecciosa que afeta cavalos e bovinos. Os cavalos são
particularmente suscetíveis. A causa é a ingestão de forragens, particularmente
trevos infectados com o fungo Rhizoctonia leguminicola, que produz um alcalóide
tóxico, a eslaframina. Os sinais clínicos podem estar limitados à salivação profusa,
embora possam estar presentes lacrimejamento aumentado, defecação e micção
freqüentes. Não foram descritas lesões e a mortalidade é nula.
O diagnóstico diferencial inclui língua azul, estomatite vesicular, exantema
vesicular e febre aftosa. A toxicose por eslaframina não causa lesões na boca,
úbere, tetas ou laminite. A remoção das forragens infectadas produz uma recupe-
ração rápida.

ESTOMATITE
Existem muitas doenças específicas, nas quais a estomatite é um sinal proemi-
nente. Esta discussão é sobre a inflamação não específica da mucosa da cavidade
Doenças da Boca, Gr An 149

oral, causada por traumas ou irritantes químicos. As causas mais comuns de lesão
traumática são as películas da cevada, capim-rabo-de-raposa, capim-barba-de-
bode, capins lanciformes e alimentos ou plantas infectadas por lagartas pilosas. A
estomatite química origina-se mais comumente do contato oral com as drogas
irritantes, tais como a cantaridina. O consumo de plantas da família das ranunculas
que contêm ranunculina (botão-de-ouro, croco, pulsatila, primavera) ou medicação
prolongada com mercuriais, arsenicais ou iodetos podem ocasionar estomatite.
O primeiro sinal clínico é sialorréia ou, no caso de espículas de plantas, relutância
na permissão para o exame manual da boca. Os animais freqüentemente exibem
evidência de irritação da boca, por exemplo, permanecem com a boca aberta e a
língua pendente ou mastigam com a cabeça virada para o lado. Desenvolvem logo
dificuldade em comer. O exame da cavidade oral e da língua revela áreas locais ou
disseminadas de inflamação aguda; a língua e a mucosa bucal podem ser ulcera-
das. Na estomatite quimicamente induzida, a mucosa bucal pode estar edematosa
e coberta com exsudato catarral. Geralmente, o hálito tem um odor pútrido ou
adocicado. Os linfonodos regionais podem estar aumentados. A actinobacilose
(língua-de-pau), febre aftosa, febre catarral maligna e diarréia viral bovina devem ser
consideradas para o diagnóstico diferencial em bovinos. Doenças epidêmicas, tais
como, língua azul em ruminantes e doença vesicular dos suínos, devem ser levadas
em consideração.
A maioria dos animais recupera-se rápida e tranqüilamente quando a causa é
removida. Tratamento adicional é necessário apenas em casos severos. Se existe
uma inflamação marcada, é aconselhável um tratamento com antibióticos de amplo
espectro. Anti-sépticos suaves, tais como uma solução a 0,5% de peróxido de
hidrogênio, 5% de bicarbonato de sódio ou 1 a 3% de clorato de potássio, usados
para lavagem bucal, podem apressar a recuperação.

Estomatite “micótica”
A estomatite “micótica” dos bovinos era tida anteriormente como uma doença
causada por reação alérgica a fungos e micotoxinas que infectavam as pastagens
ao final do verão e no outono. Testes sorológicos e de isolamento do vírus provaram
que a condição é causada pelo vírus da língua azul (ver pág. 471). A estomatite
vesicular (ver pág. 450) produz uma síndrome semelhante em eqüinos, bovinos,
ovinos e suínos.

Estomatite papular
É uma doença viral suave de bovinos de 1 mês a 2 anos de idade; até 100%
de um rebanho suscetível pode tornar-se afetado. As lesões ocorrem no focinho,
no interior das narinas e na mucosa bucal e consistem de pápulas lisas e
avermelhadas (0,5 a 1cm de diâmetro) que parecem ser ativas por , 1 semana
e, então, regridem. A evidência da cura da lesão pode estar presente por várias
semanas. Não há distúrbios sistêmicos; a doença é importante, principalmente
devido à confusão que pode causar no diagnóstico clínico das várias formas de
estomatite dos bovinos.

Estomatite flegmonosa e celulite


É uma inflamação aguda, profunda e difusa que se espalha rapidamente pela
mucosa oral, faringe e estruturas circunvizinhas, incluindo o tecido subcutâneo.
Ocorre esporadicamente em bovinos de todos os tipos e, endemicamente, em
algumas áreas de criação leiteira intensiva, no meio-oeste dos EUA. A causa não
está completamente esclarecida, porém estreptococos hemolíticos ou microrganis-
mos coliformes geralmente podem ser isolados no início da doença. Em casos de
Doenças da Boca, Gr An 150

duração moderada, a Fusobacterium necrophorum (Sphaerophorus necrophorus)


é comumente isolada.
O aparecimento de sinais clínicos é súbito. O animal pode passar de um estado
aparentemente normal a agonia em 24h. O primeiro sinal é salivação excessiva
geralmente associada a lacrimejamento excessivo. Estas alterações são acompa-
nhadas por uma reação febril, com uma temperatura de 40,5 a 41,5°C e um aumento
do pulso e freqüência respiratória. O animal geralmente se recusa a comer ou beber.
Existe um edema marcado dos tecidos da face, ao redor da boca e narinas, e no
espaço intermandibular; grandes bolsas de líquido podem se formar na região
mandibular e ao longo da traquéia. O hálito é fétido e grandes quantidades de epitélio
oral superficial são descamadas. Uma toxemia severa, com fraqueza, é caracterís-
tica.
Alguns casos mais suaves recuperam-se espontaneamente, porém os animais
afetados de forma mais severa, em geral morrem, a menos que sejam tratados.
Sulfonamidas, administradas EV, durante a fase aguda da doença, podem ser
efetivas no controle da infecção e a combinação sulfonamida – trimetoprim é
superior. A penicilina é menos efetiva. A terapia oral pode ser empregada quando
o animal é capaz de engolir. A intubação endotraqueal pode ser necessária nos
animais gravemente afetados.

DOENÇAS DA BOCA, PQ AN
QUEILITE E DERMATITE DAS PREGAS LABIAIS
É uma inflamação aguda ou crônica dos lábios e pregas labiais.
Etiologia – Feridas, variáveis em severidade, são as lesões labiais mais comuns
nos pequenos animais, resultado de lutas ou mastigação de objetos cortantes.
Espinhos, espículas, carrapichos e espinhas de peixe podem incrustar-se nos lábios
e causar irritação acentuada, ou feridas severas. Irritantes, tais como material
plástico ou plantas podem produzir inflamação dos lábios.
As infecções nos lábios podem ser secundárias a feridas ou corpos estranhos,
ou associadas à inflamação de áreas adjacentes. A extensão direta de uma doença
periodontal severa ou estomatite pode produzir queilite. A lambedura de áreas com
dermatite bacteriana ou de feridas infectadas pode disseminar a infecção para os
lábios e pregas labiais. A inflamação dos lábios também pode ser associada a
infecções parasíticas, doenças cutâneas auto-imunes e neoplasia.
A dermatite das pregas labiais é uma dermatite úmida crônica observada em
raças que possuem lábios superiores pendulares e pregas labiais inferiores (por
exemplo, spaniels, buldogues ingleses e são-bernardos) que acumulam alimentos
e saliva.
Achados clínicos e diagnóstico – Animais com queilite podem coçar ou
esfregar seus lábios, possuem hálito fétido e, ocasionalmente, salivam em excesso
ou têm anorexia. Com a infecção crônica das margens ou pregas labiais, o pêlo ao
redor destas áreas fica descolorido, úmido e aglutinado por exsudato de odor fétido,
espesso, amarelado ou marrom, e recobre a pele hiperêmica, algumas vezes
ulcerada. O animal pode dar patadas em sua boca e salivar excessivamente.
A queilite devida à extensão da infecção da boca ou outra área do corpo em geral
é detectada facilmente por causa da lesão primária.
Tratamento – A queilite normalmente é eliminada com uma limpeza mínima e
antibióticos apropriados se houver infecção bacteriana. As feridas nos lábios devem
Doenças da Boca, Pq An 151

ser limpas e suturadas se necesssário. O tratamento da periodontite ou estomatite


é essencial para evitar recidivas.
Uma queilite infecciosa que se originou de uma lesão em outro local normalmente
melhora com o tratamento da lesão primária, porém o tratamento local também é
necessário. Nas infecções graves, os pêlos devem ser tosados na área da lesão e
esta deve ser delicadamente limpa e seca. Os antibióticos são indicados se a
infecção for grave ou sistêmica.
O tratamento médico da dermatite das pregas labiais inclui tosa dos pêlos e
limpeza das pregas 1 a 2 vezes ao dia com peróxido de benzoil, além de mantê-las
secas; no entanto, devem ser esperadas recaídas se não for realizada correção
cirúrgica.

ÚLCERA EOSINOFÍLICA DOS GATOS


(Úlcera indolente, Úlcera de roedor)
Uma lesão comum da mucosa oral do lábio superior nos gatos, possivelmente
devida a hipersensibilidade (ver também pág. 959). Podem ocorrer placas e
granulomas eosinofílicos em gatos com úlceras indolentes, que podem ser uni ou
bilaterais.
As lesões são vermelhas, bem circunscritas, ulceradas e possuem bordas
elevadas. A úlcera aumenta gradualmente de tamanho e pode estender-se até o
nariz. A eosinofilia periférica ocasionalmente está presente. Não foi observada
predominância racial. Ocorre com maior freqüência nas fêmeas do que nos
machos.
O diagnóstico baseia-se no histórico, exame físico e biópsia da lesão. A
histopatologia revela uma dermatite ulcerativa crônica com neutrófilos, células
plasmáticas, células mononucleares e, ocasionalmente, alguns eosinófilos.
Os corticosteróides muitas vezes são eficazes: prednisona, 4,4mg/kg de peso
corporal, VO uma vez ao dia até que as lesões estejam curadas, ou acetato de
metilprednisolona, 20mg/gato, s.c., a cada 3 semanas por 3 tratamentos. As lesões
recorrentes podem ser tratadas com prednisona oral em dias alternados (adminis-
trada à tarde), ou injeções repetidas de acetato de metilprednisolona não mais
freqüentes que a cada 2 meses. A excisão cirúrgica pode ser eficaz, porém distorce
o lábio. O acetato de megestrol foi eficaz em úlceras indolentes de gatos, mas não
é recomendado devido aos seus efeitos colaterais. Outros tratamentos que foram
tentados com grau variável de sucesso são a radioterapia, crioterapia, terapia a
laser, vacinas de bactérias mistas e drogas imunomoduladoras. Os testes cutâneos
e a hipossensibilização foram recomendados para gatos que passaram a não
responder ao tratamento medicamentoso.

GRANULOMA EOSINOFÍLICO CANINO


É uma lesão rara, idiopática, nodular ou em placa na cavidade oral e pele. Foi
sugerido que a causa seria uma reação de hipersensibilidade, ou genética, pois
tendem a ocorrer em huskies siberianos. As lesões são mais comuns em machos
< 3 anos de idade.
As lesões orais, placas palatinas ulceradas e massas linguais vegetativas são
indolores. Ocasionalmente ocorre eosinofilia periférica. O diagnóstico se baseia
em achados de biópsia e histológicos, que incluem degeneração do colágeno,
infiltração celular eosinofílica e histiocítica, e granuloma envolvente.
O tratamento com glicocorticóides, por exemplo, prednisona (0,5 a 2,2mg/kg/dia,
VO), freqüentemente causa regressão das lesões em 10 a 20 dias. As lesões podem
resolver-se espontaneamente.
Doenças da Boca, Pq An 152

GLOSSITE
É uma inflamação crônica ou aguda da língua devida a agentes infecciosos,
físicos ou químicos; doença metabólica; ou outras causas. As causas locais incluem
irritação por excesso de tártaro e doença periodontal, corpos estranhos (penetran-
tes ou presos sob a língua), ferimentos traumáticos, queimaduras e picadas de
insetos. A glossite é um problema especialmente em cães de pêlo longo que tentam
remover carrapichos de sua pelagem.
Salivação excessiva e relutância em comer são sinais comuns, porém a causa
pode não ser descoberta, a menos que a boca seja examinada detalhadamente. A
periodontite pode causar avermelhamento, inchaço e ocasionalmente, ulceração
das bordas da língua. Uma linha, cordão ou elástico amarrado à lingua pode não
causar uma inflamação em seu dorso, porém a superfície ventral fica sensível,
apresentando irritação crônica ou aguda que é freqüentemente agravada por corpos
estranhos. Espinho de porco-espinho, de plantas e outros materiais estranhos
podem se tornar tão profundamente embebidos que não podem ser palpáveis. As
picadas de insetos causam um inchaço agudo e extenso da língua.
Em casos crônicos de glossite ulcerativa, há presença de uma exsudação fétida,
espessa e marrom e, ocasionalmente, sangramento. O animal, em geral, resiste a
qualquer tentativa de exame da boca.
Os corpos estranhos e dentes quebrados ou doentes devem ser removidos. A
glossite infecciosa deve ser tratada com um antibiótico sistêmico. Em alguns casos,
o debridamento e as lavagens bucais são benéficos. Podem ser necessária a
curetagem lingual se houver material estranho alojado na língua. Podem ser
necessários uma dieta leve e líquidos parenterais. Se o animal está debilitado e
incapaz de alimentar-se por um período prolongado, deve ser considerada a
necessidade de uma sonda inserida por faringostomia ou gastrostomia. A glossite
aguda devida a picadas de insetos pode exigir tratamento de emergência.
Se a glossite é secundária a uma outra condição, a doença primária deve ser
tratada. Os tecidos da língua cicatrizam-se rapidamente após a eliminação da
irritação e infecção.

Q UEIMADURAS DA BOCA
Queimaduras envolvendo a boca são comuns. A língua, lábios, mucosa bucal e
palato são freqüentemente envolvidos com queimaduras elétricas. As lesões podem
ser leves, com desconforto apenas temporário, ou pode ser muito destrutiva com
perda tecidual, formação de cicatriz e subseqüente deformidade a defeitos teci-
duais. A causa mais comum em filhotes de cães é a mastigação de fios elétricos (ver
QUEIMADURAS, pág. 763 e CHOQUE ELÉTRICO, pág. 760).
O proprietário pode ter observado o incidente, fornecendo, assim, um histórico.
O animal hesita em comer ou beber, saliva excessivamente, e ressente-se com o
manuseio de sua boca ou face. Se a destruição tecidual for acentuada, estomatite
gangrenosa ou ulcerativa podem desenvolver-se, com infecções bacterianas se-
cundárias. Se o contato com um composto químico corrosivo for observado e se este
for alcalino, a boca deve ser lavada com soluções leves de vinagre ou suco cítrico.
Se o químico for ácido, pode ser usada uma solução de bicarbonato de sódio.
Lavagens abundantes da boca com água podem auxiliar a remoção de certas
substâncias químicas. Mais comumente, o animal é apresentado muito tempo após
a exposição para a neutralização ser eficiente.
Animais que apresentam uma mucosa oral avermelhada, sem defeitos teciduais,
não requerem tratamentos específicos, além de uma dieta macia ou líquida até que
a lesão tenha cicatrizado. Se o dano tecidual é grave, lavagens freqüentes com
solução salina isotônica mantêm as áreas queimadas livres de restos necróticos e
Doenças da Boca, Pq An 153

partículas alimentares, o que acelera a cicatrização. Se a queimadura causa perda


extensa de tecido, a área pode precisar ser limpa e removida sob anestesia. O risco
de infecção secundária deve ser minimizado com antibioticoterapia, por vários dias.

ESTOMATITE
É uma inflamação da mucosa oral, que pode ser uma doença primária ou
secundária a uma doença sistêmica. A inflamação pode ser localizada, por exemplo,
gengivite, ou difusa. A natureza e severidade das lesões variam grandemente,
dependendo da etiologia e duração da doença.
Etiologia – Pode ser causada por agentes químicos; neoplasia; deficiência
metabólica, auto-imune ou doenças infecciosas; doença periodontal; trauma; quei-
maduras; ou radioterapia. Estomatite idiopática é o diagnóstico quando não é
possível determinar a causa. Os agentes infecciosos que foram associados à
estomatite, gengivite e ulcerações orais são herpesvírus felino, calicivírus felino,
vírus da leucemia felina, vírus da imunodeficiência felina, vírus da cinomose canina,
Leptospira canicola, L. icterohaemorrhagiae, Nocardia sp e Blastomyces dermatitidis.
A estomatite traumática pode ocorrer após exposição a plantas (espículas vegetais)
ou fibra de vidro para isolamento térmico. Dieffenbachia spp podem causar inflama-
ção oral e úlceras se forem mastigadas. O tálio é o principal metal pesado
responsável por lesões orais; a incidência desta intoxicação é baixa. A uremia pode
provocar estomatites e úlceras orais, sendo que as lesões são normalmente mais
graves em uma crise urêmica aguda. Ulcerações orais recorrentes ocorrem em
collies cinza-prata com hematopoiese cíclica (ver pág. 76).
Achados clínicos – Os sinais variam grandemente com a causa e extensão da
inflamação. Anorexia pode ocorrer especialmente em gatos. Halitose e salivação
excessiva são comuns, e a saliva pode estar tingida com sangue. O animal pode dar
patadas em sua boca e ressentir-se a qualquer tentativa de examinar a cavidade oral
devido à dor. Os linfonodos regionais podem estar aumentados e flácidos.
Tratamento – A periodontite deve ser tratada e controlada; se necessário, os
dentes e raízes dentárias remanescentes devem ser extraídos. Podem ser necessá-
rias radiografias da cavidade oral para localização de todas as raízes, especialmente
em gatos. Devem ser administrados antibióticos de largo espectro se houver infecção
bacteriana primária ou secundária. A realização de culturas das lesões e antibiogramas
é indicada em infecções crônicas ou recorrentes. O tratamento sintomático das
estomatites inclui alterações na dieta, antibióticos, debridamento e cauterização. O
debridamento do tecido necrótico pode promover a cura e ser realizado mecanica-
mente com uma esponja de gaze. O peróxido de hidrogênio (3%) auxilia na limpeza
das lesões e pode acelerar a recuperação. Outras soluções para lavagem bucal que
podem ser utilizadas são violeta gentiana a 1%, permanganato de potássio a 2%, ou
clorexidina a 0,2%. As áreas necróticas e ulceradas podem ser cauterizadas quimi-
camente com uma solução de nitrato de prata a 5%. Os gatos com úlceras orais
idiopáticas crônicas e testes de função de tireóide normais ocasionalmente respon-
dem a suplementação com hormônio da tireóide. Os animais incapazes ou que não
desejam alimentar-se devem receber fluidos parenterais ou subcutâneos para
prevenir a desidratação. A colocação de uma sonda por faringostomia ou gastrosto-
mia deve ser considerada em animais debilitados. A alimentação freqüente com
líquidos palatáveis e, posteriormente, alimentos semi-sólidos encoraja a ingestão.

Estomatite micótica
Uma doença de cães e gatos causada por um supercrescimento de Candida
albicans, caracterizada pelo aparecimento de placas cremosas brancas na língua
ou membranas mucosas. O tecido subjacente muitas vezes está vermelho e
Doenças da Boca, Pq An 154

ulcerado. Pode haver pequenas placas em torno de uma placa principal maior.
Acredita-se que a estomatite micótica está associada a outras doenças orais,
antibioticoterapia longa, ou imunossupressão. A periferia das lesões geralmente
está avermelhada. As lesões podem coalescer conforme a doença progride,
ocorrendo lesões semelhantes na orofaringe e outras junções mucocutâneas. O
diagnóstico diferencial inclui estomatite ulcerativa, e doenças de pele auto-imunes
bolhosas. O diagnóstico pode ser confirmado por cultura do microrganismo a partir
das lesões, ou por identificação das hifas de levedura em biópsias coradas com
ácido periódico Schiff.
Qualquer doença de base local ou sistêmica que afete a cavidade bucal deve ser
tratada. Deve ser administrado cetoconazol (10mg/kg, duas vezes ao dia) até que
se resolvam as lesões, após o que a antibioticoterapia deve ser interrompida. Deve
ser mantido um nível adequado de nutrição. O prognóstico é reservado quando as
doenças predisponentes não podem ser tratadas ou controladas adequadamente.

Estomatite das células plasmáticas


(Gengivite felina por células plasmáticas, Faringite)
Um problema caracterizado por gengivite–faringite persistente com lesões
elevadas, brilhantes, eritematosas e proliferativas nos arcos glossopalatinos com
aparência de paralelepípedos; as lesões podem estender-se caudalmente para o
arco palatofaríngeo e cranialmente até envolver a gengiva. Nos casos graves, a
margem gengival dos dentes caninos superiores fica inflamada e ulcerada. Suspei-
ta-se de uma etiologia imunomediada.
Halitose, ptialismo e disfagia são evidentes principalmente quando o gato tenta
ingerir comidas sólidas. Se o problema é grave e de longa duração, a perda de peso
pode ser evidente. A doença é lentamente progressiva e, se for oferecido alimento
macio e palatável, pode ficar razoavelmente grave antes de perceber-se que é
necessário o auxílio médico. Algumas vezes a linfadenopatia submandibular está
presente. Muitas vezes, devido à dor, a cavidade oral não pode ser adequadamente
visualizada sem sedação ou anestesia.
O diagnóstico é baseado na biópsia. Histologicamente, as lesões são hiperplásicas
e apresentam uma mucosa ulcerada com um infiltrado celular inflamatório na
submucosa, predominantemente composto por células plasmáticas.
O tratamento é dirigido primariamente para a obtenção e manutenção de uma
boa higiene oral. Doenças periodontais devem ser tratadas e recomenda-se a
profilaxia dentária periódica. As raízes dentárias fraturadas, quando presentes,
devem ser removidas (pode ser necessária a radiografia da cavidade oral). Os
tratamentos que foram tentados com resultados variáveis são dietas hipoalergênicas,
antibióticos, acetato de megestrol (não recomendado devido aos efeitos colaterais
potenciais), levamisol, prednisolona, e lavagens bucais. Até que a etiologia possa
ser determinada e/ou um tratamento mais eficaz seja encontrado, o prognóstico é
ruim.

Estomatite ulcerativa
(Gengivite ulcerativa necrosante aguda, Estomatite ulcerativa necrosante,
Estomatite de Vincent, Boca de trincheira)
É uma doença relativamente incomum dos cães caracterizada por gengivite
intensa além de ulceração e necrose da mucosa oral. Foram sugeridos vários
microrganismos como causa primária. Os bacilos fusiformes e espiroquetas, habi-
tantes normais da boca, foram sugeridos como causadores desta doença após
algum fator predisponente diminuir a resistência da mucosa oral. A Bacteroides
melaninogenicus também foi sugerida como agente causal primário.
Doenças da Boca, Pq An 155

A estomatite ulcerativa inicialmente apresenta-se como um avermelhamento e


inchaço das margens gengivais, que é doloroso e sangra com facilidade, progredin-
do para uma gengivite grave e recessão gengival. A extensão para outras áreas da
mucosa oral é comum, resultando em membranas mucosas ulceradas e necróticas,
e osso exposto nos casos graves. A halitose é intensa e o animal pode estar
anorético devido à dor. Pode ocorrer ptialismo e a saliva pode estar sanguinolenta.
A infecção pode disseminar-se causando pneumonia. O diagnóstico diferencial
inclui doença periodontal grave, doença de pele auto-imune, uremia, neoplasia e
outras doenças sistêmicas associadas às lesões orais.
O diagnóstico é feito com base na exclusão de outras etiologias. Os microrganis-
mos comumente obtidos nas culturas de lesões são estafilococos, Pseudomonas
spp e Pasteurella multocida. Esfregaços de impressão das lesões podem mostrar
um número aumentado de espiroquetas.
Limpeza dentária, debridamento mecânico e químico (nitrato de prata a 2 a 5%)
dos tecidos necróticos, antibioticoterapia por 3 a 6 semanas (amoxicilina, ampicilina,
clindamicina ou cefalosporinas) e lavagens bucais (clorexidina a 0,2% ou peróxido
de hidrogênio a 3% diluído a 1:1 em água) são indicados (ver também ESTOMATITES,
pág. 153).

PAPILOMATOSE O RAL CANINA


Os papilomas são tumores caninos benignos causados por um vírus. A
mucosa oral e comissuras labiais são mais comumente afetadas, porém as
massas (únicas ou, mais freqüentemente, múltiplas) podem afetar o palato e
orofaringe. É mais comum em animais jovens (ver PAPILOMATOSE, pág. 1035). Os
sinais ocorrem quando os papilomas interferem na preensão, mastigação ou
deglutição. Ocasionalmente, se os papilomas forem numerosos, o cão pode
mordê-los quando mastiga e eles podem sangrar e tornar-se infectados. Os
papilomas podem regredir espontaneamente, em algumas semanas e a remoção
geralmente não é necessária. Se a remoção for necessária, é melhor realizá-la
com o uso de técnicas eletrocirúrgicas. A remoção cirúrgica de um ou mais
papilomas pode iniciar a regressão. O uso de vacinas autógenas ou comerciais
para verrugas é geralmente desapontador. O caráter autolimitante da doença
torna a avaliação de qualquer tratamento difícil.

EPÚLIDES
Tumores do ligamento periodontal, as epúlides são os tumores orais benignos
mais comuns nos cães (ver também pág. 141). Os gatos raramente apresentam
tumores orais benignos. Os 3 tipos de epúlides são fibromatoso, ossificante e
acantomatoso.
Estes tumores podem ser observados em cães de qualquer idade, mas geral-
mente são encontrados naqueles > 6 anos. Os bóxers e buldogues ingleses podem
estar predispostos. Os tumores podem estar ulcerados e sangrando. Podem ser
encontradas epúlides solitárias ou múltiplas fibromatosas e ossificantes. Ambas são
não invasivas, mas podem tornar-se extensas e envolver os dentes. Uma epúlide
acantomatosa é um tumor mais agressivo com invasão do tecido local e envolvimen-
to ósseo.
A excisão cirúrgica ampla das epúlides fibromatosas e ossificantes é recomen-
dada se elas causam desconforto. Os crescimentos gengivais devem sofrer bióp-
sias para determinar o prognóstico e comportamento do tumor, pois nem todas as
epúlides se comportam do mesmo modo. As epúlides acantomatosas devem ser
excisadas cirurgicamente. Para evitar as recidivas, a excisão cirúrgica deve remover
todo o osso e tecido mole afetados.
Doenças da Boca, Pq An 156

NEOPLASIAS O RAIS MALIGNAS


Os tumores da boca e faringe são comuns e possuem grande probabilidade de
serem malignos. Nos cães, os 3 mais comuns são melanoma maligno, carcinoma
de células escamosas, e fibrossarcoma. As gengivas e as amígdalas são afetadas
com maior freqüência. A incidência de tumores orais malignos é maior em cães > 10
anos; os cocker spaniels e os pastores alemães estão predispostos.
Os carcinomas de células escamosas são, de longe, a neoplasia maligna oral
mais comum nos gatos; comumente afetam a gengiva e a língua, sendo altamente
invasivos e metastatizam prontamente. Os fibrossarcomas vêm a seguir; em gatos,
são localmente invasivos e apresentam um prognóstico ruim.
Achados clínicos – Os sintomas variam dependendo da localização e da
extensão da neoplasia. Halitose, relutância em se alimentar e hipersalivação são
comuns. Se a orofaringe está afetada, pode haver disfagia. Os tumores freqüente-
mente ulceram-se e sangram. A face pode inchar conforme o tumor aumenta de
tamanho e invade o tecido circundante. Os linfonodos regionais muitas vezes ficam
inchados antes que sejam observados os tumores orais e faríngeos.
Diagnóstico – Em alguns casos é possível um diagnóstico citológico a partir de
esfregaços de impressão ou um aspirado com agulha fina. A biópsia normalmente
é necessária para um diagnóstico definitivo. Os melanomas malignos são variados
quanto à aparência, pigmentados ou não, devendo fazer parte da lista diferencial
para qualquer tumor oral. Os carcinomas de células escamosas comumente afetam
a gengiva ou as amígdalas e o linfossarcoma deve fazer parte do diagnóstico
diferencial para uma amígdala aumentada. Os linfonodos regionais e os pulmões
devem ser avaliados em busca de metástases.
Tratamento – Os melanomas malignos são altamente invasivos e sofrem
metástase prontamente; conseqüentemente, o prognóstico é ruim. A ressecção
cirúrgica pode aumentar a sobrevida através da diminuição da recorrência local, que
é freqüente. O carcinoma de células escamosas não amigdalino é localmente
invasivo com baixa taxa de metástase, apresentando um bom prognóstico com
ressecção cirúrgica agressiva e/ou radioterapia. Os carcinomas de células escamo-
sas amigdalinos são agressivos e apresentam prognóstico ruim. Os fibrossarcomas
têm um prognóstico ruim devido a sua natureza localmente agressiva. A recorrência
do crescimento tumoral após a ressecção é comum.
Nos gatos, o carcinoma de células escamosas apresenta um prognóstico ruim,
sendo que a sobrevida longa só é observada no diagnóstico precoce. A remoção
local do tumor é possível por hemimandibulectomia.

DOENÇAS DO RETO E ÂNUS


DOENÇA DO SACO ANAL
A doença do saco anal é a afecção mais comum da região anal do cão. Cães de
pequeno porte são predispostos ao problema; os de grande porte ou gigantes são
raramente afetados. Também ocorre no gato, mais comumente na forma de impactação.
Etiologia e patogenia – A doença do saco anal pode ser categorizada como
impactação, infecção e abscedação. Permanência de fezes amolecidas nos sacos,
tono muscular fraco em cães obesos e seborréia generalizada (que produz hiperse-
creção glandular) levam à retenção dos conteúdos do saco. Tal retenção pode
predispor a fermentação, inflamação e infecção bacteriana secundária.
Doenças do Reto e Ânus 157

Achados clínicos, lesões e diagnóstico – Os sinais estão relacionados a dor


e desconforto ao sentar. Inquietação, lambidas e mordidas na área anal e defecação
dolorosa com tenesmo são comuns. Indurações, abscessos e tratos fistulosos são
comuns. O exame revela, no caso de impactação, massas duras e palpáveis na área
dos sacos; com infecção ou abscedação, dor severa e, freqüentemente, alteração
da cor na área. Tratos fistulosos formados a partir de sacos abscedados, e que
abrem na pele devem ser diferenciados das fístulas perianais.
O diagnóstico de impactação, infecção ou abscedação é confirmado pelo exame
digital do reto, quando os sacos podem ser comprimidos.
Tratamento – A impactação deve ser tratada pela espremedura manual delicada
dos sacos. Um agente amolecedor ou ceruminolítico pode ser infundido no saco se
o conteúdo for muito seco para expressar efetividade. Os sacos infectados devem
ser limpos com anti-sépticos e uma antibioticoterapia sistêmica e local é recomen-
dada. Fluxo de água repetido semanalmente, combinado com infusão de pomada
com esteróide–antibiótico pode ser necessário. Se o tratamento médico é ineficaz
ou se está presente uma neoplasia, indica-se uma excisão cirúrgica.
A incontinência fecal, que é uma complicação comum de cirurgia do saco anal, pode
resultar de danos ao ramo retal caudal do nervo pudendo e ser completada se ocorrem
danos bilaterais. A formação de fístula crônica pode ser observada quando a remoção
do saco for incompleta ou quando o saco anal se rompe. A formação de cicatriz no
esfíncter anal externo pode resultar de traumas cirúrgicos e produzir tenesmo.

FÍSTULA PERIANAL
É caracterizada por tratos que drenam exsudato crônico, purulento e malcheiroso
nos tecidos perianais. É mais comum em cães pastor alemão e é também observada
no setter e perdigueiro. Cães com > 7 anos de idade possuem maior risco.
Etiologia e patogenia – A causa não é conhecida. A contaminação, dos folículos
pilosos e glândulas da área anal, por material fecal e secreções do saco anal pode
resultar em necrose, ulceração e inflamação crônica da pele e tecidos perianais. Os
animais afetados podem estar predispostos a problemas generalizados de pele. A
probabilidade de contaminação é maior em cães que possuem a base da cauda
ampla; o hipotireoidismo e baixa competência das células T podem contribuir para
o aumento da suscetibilidade. A presença de dobras anais profundas pode causar
retenção de fezes no interior das glândulas retais e desempenha um papel
fundamental nesta doença. Os tratos fistulosos estão revestidos por tecido inflama-
tório crônico e, freqüentemente, estendem-se ao lúmen do reto e ânus. A infecção
pode se espalhar para as estruturas mais profundas, envolvendo o esfíncter anal
externo e, portanto, deve ser tratada prontamente.
Achados clínicos – Em cães, os sinais incluem mudança de atitude, tenesmo,
disquesia, diminuição do apetite, diarréia, letargia e tentativas de morder e lamber
a área anal. Os sinais em gatos são semelhantes aos dos cães, podendo haver
emaranhamento de pêlos e o hábito de permanecerem sentados em caixas de areia.
Tratamento – O tratamento médico não é efetivo. A cirurgia deve ser seguida por
antibióticos e uma dieta baixa em fibras. Pós-operatoriamente, a área anorretal deve
ser limpa pelo menos diariamente. A amputação da cauda em sua base tem sido
defendida como um adjunto a outras terapias. A incontinência fecal, constrição anal
e reincidência podem complicar a recuperação; a probabilidade de que isto ocorra
aumenta com a severidade da doença inicial.

TUMORES PERIANAIS
Ver TUMORES DE GLÂNDULAS HEPATÓIDES, página 1034 e TUMORES DAS GLÂNDULAS
APÓCRINAS DOS SACOS ANAIS, página 1033.
Doenças do Reto e Ânus 158

HÉRNIA PERINEAL
É a protrusão de um saco hernial revestido pelo peritônio lateralmente entre o
músculo elevador do ânus e o esfíncter anal externo ou músculo coccígeo. Cães
machos intactos, de 6 a 8 anos de idade, apresentam uma incidência desproporcio-
nalmente alta e os das raças welsh corgis e boston terriers, bóxers, collies e
pequinês são altamente suscetíveis.
Etiologia e patogenia – Muitos são os fatores desencadeantes, incluindo
predisposição racial, desequilíbrios hormonais, doença prostática, constipa-
ção crônica, e fraqueza do diafragma pélvico devida a esforços crônicos. A maior
incidência entre machos sexualmente intactos é evidência de que influên-
cias hormonais provavelmente desempenhem um papel primário. A hipertro-
fia prostática, atribuída ao desequilíbrio dos hormônios sexuais, está forte-
mente implicada. Estrogênios e androgênios são citados como agentes causa-
dores.
Achados clínicos e diagnóstico – Os sinais comuns incluem flatulência, dor à
defecação e movimentos intestinais irregulares. Tenesmo e inchaço perineal,
devidos ao desvio retal e subseqüente estrangulação, são característicos. A
herniação pode ser bilateral; mas 2⁄3 dos casos são unilaterais e > 80% destes são
observados do lado direito.
A massa é macia, flutuante e pode ser reduzida com os dedos. Um aumento de
volume firme e doloroso significa estrangulação, que comumente contém a bexiga
ou próstata. A determinação dos conteúdos é feita geralmente pelo exame retal.
Mais de 90% das hérnias perineais contêm um desvio retal que deve ser diferenci-
ado de uma saculação retal ou de um falso divertículo retal.
Tratamento – Raramente a hérnia perineal é uma emergência, exceto quando
a estrangulação da bexiga ocorre e o animal não é capaz de urinar. Se não for
possível realizar a cateterização, a urina deve ser removida por cistocentese e por
tentativa de redução da hérnia. A manutenção de um cateter urinário permanente
pode ser necessária para assegurar a desobstrução da uretra e impedir a recorrên-
cia da obstrução.
A correção cirúrgica é sempre indicada e uma castração concomitante é
recomendada para reduzir a recorrência. Se uma saculação retal estiver presente,
deve ser ressecada ou imbricada. O prognóstico deve ser reservado, dada a alta
incidência de recorrência (10 a 46%) e as complicações pós-operatórias, tais como
infecção, fístulas retocutâneas, fístula do saco anal, lesão dos nervos ciático e
pudendo e prolapso retal.

CONSTRIÇÕES RETAL E ANORRETAL


É um estreitamento do lúmen por tecido cicatricial. A lesão pode ser resultante
de corpos estranhos, traumas (por exemplo, feridas por mordidas, acidentes) ou
como uma complicação de doença inflamatória.
Neoplasmas, próstata aumentada e tecido cicatricial resultante da remoção de
fístula perianal ou abscessos do saco anal podem predispor à constrição extraluminal.
Em pequenos animais, a constrição anorretal é mais comum que as constrições
retais, porém nenhuma é de ocorrência freqüente. As constrições são mais comuns
em cães pastor alemão, beagle e poodle.
A constrição retal em bovinos pode ser resultante de trauma, neoplasma ou
necrose da gordura que comprime ou invade o lúmen, e de defeitos associados a
constrições retal e vaginal. As constrições retais nos suínos ocorrem secundaria-
mente à enterocolite, após reparo de prolapso retal e como uma seqüela de proctite
ulcerativa induzida por Salmonella. O tratamento é cirúrgico.
Doenças do Reto e Ânus 159

NEOPLASIAS RETAIS
As neoplasias retais malignas normalmente são adenocarcinomas em cães e
linfossarcomas em gatos. Os adenocarcinomas crescem devagar e são infiltrativos.
Pode ocorrer metástase local ou sistêmica antes de o animal apresentar tenesmo,
disquesia, sangue nas fezes ou diarréia. O tratamento de escolha para os adeno-
carcinomas é o cirúrgico, porém pode ser pouco compensador, pois a metástase
geralmente ocorre antes do diagnóstico. Os gatos com linfossarcoma retal são
tratados medicamente com drogas antineoplásicas.

PÓLIPOS RETAIS
Os pólipos retais adenomatosos são uma doença infreqüente, normalmente
benigna, principalmente em pequenos animais. Quanto maior o pólipo, maior o seu
potencial de malignidade. Os sintomas incluem tenesmo, hematoquezia e diarréia.
O pólipo geralmente é palpável pelo reto, sangrando facilmente com ulcerações de
superfície. Periodicamente, o pólipo pode prolapsar através do orifício anal. A
excisão cirúrgica é normalmente seguida de rápida recuperação clínica e longa
sobrevida. Novos pólipos podem ocorrer após a cirurgia. Deve sempre ser realizada
uma biópsia para diagnóstico histopatológico.

PROLAPSO RETAL
É a protrusão de uma ou mais camadas do reto através do ânus devida a tenesmo
persistente e associada com doenças intestinal, anorretal ou urogenital. O prolapso
pode ser classificado como incompleto, no qual apenas a mucosa retal sofre
eversão, ou completo, no qual todas as camadas retais protraem-se.
Etiologia – O prolapso retal é comum em animais jovens, em associação com
diarréia e tenesmo severos. Fatores causais incluem enterite severa, corpos
estranhos retais, lacerações, divertículos ou saculação, neoplasia do reto ou do
cólon distal, urolitíase, obstrução uretral, cistite, distocia, colite e doença prostática.
Hérnia perineal, ou outra interrupção da inervação normal do esfíncter anal externo,
também pode levar ao prolapso.
O prolapso pode ocorrer em animais de todas as idades e raças e em ambos os
sexos. O prolapso retal é provavelmente o problema GI mais comum em porcos
devido a diarréia ou fraqueza do tecido de sustentação retal na pelve. O prolapso em
bovinos pode estar associado à coccidiose ou raiva; ocasionalmente, “montas”
excessivas em touros jovens e lesão traumática associada podem ser a causa. É
comum em ovinos, especialmente cordeiros em confinamento nos quais rações
altas em concentrado podem causar o prolapso. O uso de estrogênios como
promotores de crescimento, ou exposição acidental a toxinas fúngicas de natureza
estrogênica, também podem predispor grandes animais ao prolapso retal.
Achados clínicos, lesões e diagnóstico – Uma massa alongada e cilíndrica que
protrai-se através do orifício anal é geralmente diagnóstica, porém deve ser feita uma
diferenciação à intussuscepção ileocólica prolapsada pela passagem de uma sonda,
instrumento cego ou o dedo entre a massa prolapsada e a parede retal interna. No
prolapso retal, é impossível inserir-se o instrumento, devido à presença de um fórnix.
São comuns ulceração, inflamação e congestão da mucosa retal. Inicialmente,
há um pequeno segmento inflamado e não ulcerado; depois, a superfície da mucosa
escurece e pode tornar-se congesta e necrótica.
Tratamento: pequenos animais – Identificar e eliminar a causa é de importância
primária. O tratamento inclui a imediata recolocação do tecido prolapsado viável a
sua localização anatômica apropriada ou amputação, se o segmento estiver
necrosado. A redução manual de um prolapso retal pequeno ou incompleto pode ser
Doenças do Reto e Ânus 160

realizada, em um paciente anestesiado, com a utilizacão de um dedo ou supositório.


Uma solução hipertônica de açúcar (50% de dextrose ou 70% de manitol), aplicada
diretamente sobre a mucosa, aliviará o edema e facilitará a redução. A aplicação de
uma sutura em bolsa-de-fumo no ânus, por 5 a 7 dias é indicada.
Quando a viabilidade do tecido é questionável e proíbe a redução manual, são
necessárias a ressecção e anastomose retais. Quando o tecido retal é viável, porém
não receptível à redução manual, a celiotomia, seguida da colopexia, é indicada
para impedir a recorrência. O tenesmo pode ser prevenido pela aplicação de um
anestésico tópico (ungüento de dibucaína a 1%) após a redução ou correção. No
pós-operatório, uma dieta umedecida e o uso de um emoliente de fezes (por
exemplo, sulfossuccinato sódico de dioctil) são recomendados. Diarréia após a
cirurgia pode necessitar de tratamento.
Grandes animais – A causa deve ser identificada e eliminada. A redução e a
retenção com uma sutura em bolsa-de-fumo são recomendadas. A sutura deve ficar
solta o suficiente para deixar uma abertura de um dedo no reto de suínos e ovinos,
e levemente maior no de bovinos e eqüinos. O prolapso retal em éguas, se
negligenciado, pode levar ao prolapso do cólon menor. O suprimento sangüíneo
para o cólon menor é facilmente interrompido e, como resultado, a recolocação do
prolapso retal seguida de uma sutura em bolsa-de-fumo no ânus terá um prognós-
tico ruim. Quando há necrose, deve ser realizada a ressecção da submucosa ou a
amputação. A amputação do reto deve ser realizada apenas nos casos mais graves.
A amputação completa apresenta maior incidência de formação de estreitamentos
retais. Um anel de prolapso, embalagem de seringa ou tubo plástico pode ser
utilizado como alternativa para a amputação completa em suínos e ovinos. Após a
cirurgia, o animal deve receber antibióticos e amolecedores de fezes. Em geral, não
é economicamente viável reparar prolapsos retais em cordeiros prontos para o abate.

RUPTURAS RETAIS
São separações, rasgões ou rupturas da mucosa retal ou anal, como resultado
de uma laceração imposta ao interior do lúmen. Corpos estranhos, como ossos
pontiagudos, agulhas e outros materiais cortantes têm sido implicados. Feridas por
mordeduras e, em grandes animais, traumas produzidos durante a palpação retal,
são causas comuns. A ruptura pode envolver apenas as camadas superficiais do
reto (ruptura parcial) ou atingir todas as camadas (ruptura completa).
Achados clínicos e diagnóstico – Constipação e relutância em defecar são
geralmente atribuídas à dor. O diagnóstico é baseado no tenesmo e na hemorragia,
na mudança de cor do períneo e na inspeção do reto e ânus; sangue fresco
encontrado em uma luva ou em fezes após o exame retal é boa evidência de uma
ruptura retal. O edema pode estar presente quando a lesão é persistente. A
integridade do esfíncter anal externo deve ser cuidadosamente avaliada.
Tratamento – Em todas as espécies, o tratamento deve ser imediatamente
iniciado. A área anorretal deve ser completamente limpa e devem ser administrados
antibióticos sistêmicos de amplo espectro. Podem ser administrados fluidos EV e
flunixin meglumina para prevenção ou tratamento do choque séptico e endotóxico.
Nos pequenos animais, após o debridamento, as lacerações podem ser suturadas
através do orifício anal, por laparotomia, ou através de uma combinação de ambas
as técnicas, dependendo da localização e do grau da laceração. Pós-operatoria-
mente devem ser administrados antibióticos e amolecedores fecais.
Em bovinos e eqüinos, uma perfuração acidental durante o exame retal exige
tratamento imediato para reduzir o risco de peritonite e morte. As rupturas retais nos
eqüinos foram classificadas de acordo com as camadas de tecido penetradas. As
rupturas de Grau I envolvem mucosa ou submucosa; as rupturas de Grau II implicam
Úlceras Gastrointestinais 161

em ruptura apenas das camadas musculares; as rupturas de Grau III envolvem


mucosa, submucosa e camadas musculares, incluindo as que se estendem até o
mesorreto; as rupturas de Grau IV implicam em perfuração de todas as camadas do
reto, atingindo a cavidade peritoneal.
As rupturas de Grau I podem ser tratadas conservativamente com antibióticos de
amplo espectro e fluidos EV. Pode ser administrado o flunixin meglumina para
prevenir ou tratar o choque endotóxico. É administrado óleo mineral, através de
sonda gástrica, para amolecer as fezes, e a dieta deve consistir em gramíneas ou
alfafa. Se ocorrer próxima ao ânus, uma ruptura de Grau I pode ser suturada através
da abertura anal. As rupturas de Graus II e III exigem cirurgias imediatas e mais
extensas. As rupturas de Grau IV acarretam um prognóstico grave; devem ser
reparadas apenas se a ruptura é pequena e o tratamento foi instituído antes de a
cavidade peritoneal ser muito contaminada.

ÚLCERAS GASTROINTESTINAIS
Em cães e gatos, a ulceração gástrica pode ocorrer espontânea ou secundaria-
mente a ingestão de comida estragada ou corpos estranhos, administração de
drogas antiinflamatórias esteroidais ou não esteroidais, uremia, ou neoplasia (tumor
mastocitário, gastrinoma). Foi relatada a ulceração por estresse. Os antagonistas do
receptor de histamina Tipo 2 (cimetidina, ranitidina, famotidina) e o sucralfato
tiveram sua eficácia relatada no controle das úlceras gástricas de cães e gatos. A
cimetidina tem sido eficaz no controle da gastrite urêmica. Os antiácidos são úteis,
porém precisam ser administrados freqüentemente.
As úlceras gástricas são importantes nos suínos, e as úlceras abomasais (ver
pág. 187) em bovinos adultos e bezerros jovens parecem estar aumentando em
importância. Nestas espécies, as úlceras jovens parecem estar associadas às
práticas de alimentação e ao estresse da alta produção e criação confinada, apesar
de as causas ainda não terem sido determinadas.

ÚLCERAS G ASTRODUODENAIS EM EQÜINOS


Etiologia – Várias síndromes de ulceração gastroduodenal (UGD) afetam os
potros, variando com a idade e localização anatômica das lesões. A ulceração da
mucosa glandular ocorre em 25 a 40% dos potros jovens com um distúrbio clínico
e, presumivelmente, a causa está relacionada ao estresse. Leve ulceração da
mucosa escamosa ocorre em 50% dos neonatos, porém a causa é desconhecida.
A ulceração duodenal pode ocorrer em potros com ou sem um problema clínico
simultâneo. Os fatores dietéticos e ambientais provavelmente não são relevantes.
Uma gastroparesia idiopática não obstrutiva tem causado ulceração gástrica em
alguns potros em desmame.
Nos cavalos adultos, as úlceras ocorrem com maior freqüência na mucosa
escamosa, ao longo do margo plicatus. A prevalência e gravidade das úlceras
gástricas são maiores em animais de alto desempenho. Tanto nos potros como nos
adultos, as drogas antiinflamatórias não esteróides causam úlceras gástricas
quando administradas em doses maiores que as recomendadas ou quando asso-
ciadas a um problema estressante.
Achados clínicos – A maioria dos potros neonatos com lesões leves na mucosa
escamosa é assintomática. Os sintomas clássicos de UGD em potros incluem
bruxismo, desconforto abdominal, diarréia, amamentação interrompida, ptialismo e
Úlceras Gastrointestinais 162

recumbência dorsal. A maioria dos potros com sintomas dolorosos apresenta lesões
na mucosa glandular ou duodeno. A diarréia foi associada a lesões na mucosa
escamosa. A ulceração gástrica causa mau aspecto e fezes cronicamente moles em
potros desmamados. Potros com ptialismo intenso e/ou refluxo nasal provavelmen-
te apresentam uma obstrução ao esvaziamento gástrico. Os potros com UGD
perfurada apresentam desconforto abdominal e podem estar em choque. A ulcera-
ção gástrica em animais adultos causa perda do apetite, perda de peso e mau estado
físico, desconforto abdominal e/ou alterações de atitude.
Diagnóstico e tratamento – A endoscopia é o meio diagnóstico mais preciso nos
potros e cavalos adultos. A radiografia pode auxiliar o diagnóstico em alguns casos
de potros, podendo ser utilizado o contraste de bário para avaliar o esvaziamento
gástrico. A análise de sangue oculto nas fezes pode diagnosticar sangramento
gástrico em potros jovens, mas é pouco sensível em potros mais velhos e adultos.
Na maioria dos casos, os valores de laboratório não refletem a presença de
ulceração gástrica. Podem ocorrer aumentos nas células e proteína do líquido
abdominal de potros com úlceras perfuradas.
Os antagonistas dos receptores Tipo 2 de histamina, a cimetidina e a ranitidina,
são eficazes no tratamento das UGDs em potros e adultos. Foi sugerido o sucralfato
para o tratamento da ulceração gástrica glandular e da ulceração duodenal. Os
antiácidos parecem aliviar os sintomas clínicos, mas devem ser administrados
freqüentemente para curar as úlceras. A cirurgia é necessária para a correção da
obstrução ao esvaziamento gastroduodenal.

ÚLCERAS ESOFAGOGÁSTRICAS EM SUÍNOS


Úlceras esofagogástricas afetam a porção esofágica dos suínos e provocam
casos esporádicos de hemorragia gástrica aguda ou debilidade devido a ulceração
crônica.
Etiologia – A causa da doença é desconhecida. Ocorre em todas as idades, porém
é mais comum em suínos em crescimento confinados (45 a 90kg) e alimentados com
ração finamente moída, que pode ser deficiente em fibra, e também em suínos
alimentados com grandes quantidades de leite desnatado ou soro. Os fungos podem
desempenhar um papel importante, especialmente se a dieta é alta em açúcar. Além
disso, o estresse do confinamento pode promover hiperacidez, o que pode contribuir
para o desenvolvimento da lesão. Uma combinação de confinamento, estresse de
transporte, privação de alimento, superlotação e a mescla com rebanhos desconhe-
cidos resulta em aumento significativo na incidência de úlceras gástricas em suínos
de crescimento rápido. A doença pode ser inaparente em um grupo de suínos de
engorda de crescimento rápido ou em marrãs jovens de reprodução até que algum
fator que cause ansiedade, tensão ou estresse físico precipite a doença aguda. Isto
é particularmente importante nos suínos que vão para o abate.
Achados clínicos – Na forma aguda, a hemorragia resulta em anorexia,
fraqueza, anemia, fezes enegrecidas e morte, em horas ou dias. Na forma crônica,
a debilidade, fezes enegrecidas e anemia são características, porém o animal pode
sobreviver por várias semanas. A forma subclínica pode fazer com que os suínos
afetados não alcancem a maturidade na época esperada. Nestes, a úlcera geral-
mente é reparada, permanecendo uma cicatriz. Em alguns rebanhos, até 90% do
lote de engorda pode ser afetado; em outros, ela ocorre apenas esporadicamente.
Com base em estudos em abatedouros, a incidência de úlceras parece ser muito
maior em porcos de engorda em um bom estado e que tiverem crescimento normal;
a doença clínica aparece apenas quando ocorre a hemorragia a partir da úlcera.
Lesões – A lesão terminal típica é encontrada na mucosa gástrica, perto da
abertura esofágica, em uma área branca, brilhante, não glandular e retangular de
Giardíase 163

epitélio escamoso. É comum encontrar-se uma cratera de 2,5 a 5cm ou mais de


diâmetro, rodeando o esôfago. A cratera aparece como uma área ulcerada de cor
creme ou acinzentada e pode conter coágulos sangüíneos ou resíduos. Na hemor-
ragia aguda, o estômago e o intestino delgado superior conterão sangue escuro. As
lesões iniciais são caracterizadas por hiperceratose e paraceratose do epitélio
escamoso, próximos à abertura do esôfago no estômago. Posteriormente, estas
lesões proliferativas sofrem erosão, formando a úlcera. A úlcera cicatrizada aparece
como uma cicatriz em estrela.
Diagnóstico e tratamento – Tanto o aparecimento de 1 ou 2 porcos anêmicos
e apáticos em uma baia, que apresentem anorexia, perda de peso, anemia, fezes
escurecidas e algumas vezes dispnéia quanto a morte súbita de um porco
aparentemente saudável são sugestivos de ulceração gástrica. Cimetidina (300mg/
porco, duas vezes ao dia) tem sido utilizada com algum sucesso no tratamento de
úlceras gástricas nos suínos em crescimento, mas seu uso pode não ser
economicamente viável. O aumento do teor de fibra da dieta para 7% e o
oferecimento de ração farelada no lugar de peletizada podem ser de algum valor.
A redução das condições de estresse, como superlotação, pode minimizar a
incidência. Os suínos em crescimento devem ser criados na mesma baia, até a
comercialização.

GIARDÍASE
É uma protozoonose entérica crônica que ocorre em todo o mundo no homem,
na maioria dos animais domésticos e em muitos pássaros. A infecção é comum em
cães e gatos, algumas vezes observada em ruminantes, e raramente em eqüinos
e suínos. Tem sido suposto, mas não provado, que o Giardia que infecta animais
domésticos pode infectar o homem.
Etiologia e transmissão – Os protozoários flagelados (trofozoítas) do gênero
Giardia habitam a superfície da mucosa do intestino delgado, onde se multiplicam
por divisão binária. A transmissão ocorre no estágio de cisto e pela rota fecal–oral.
Os períodos de incubação e pré-patente geralmente variam de 5 a 14 dias. As
classificações iniciais designavam diferentes espécies de Giardia para vários
hospedeiros; é consenso que todas as espécies que infectam mamíferos (exceto
alguns roedores) são morfologicamente similares.
Achados clínicos – Infecções por Giardia em cães e gatos podem não ser
aparentes, ou produzir perda de peso, diarréia crônica e/ou esteatorréia que pode
ser contínua ou intermitente, particularmente em cãezinhos e gatinhos. Bezerros
com giardíase clínica têm sido relatados. As fezes geralmente são moles,
malformadas, pálidas e contêm muco. A diarréia aquosa é rara em casos
descomplicados. A giardíase deve ser diferenciada de outras causas de malabsor-
ção de nutrientes (por exemplo, insuficiência pancreática exócrina [ver pág. 146] e
malabsorção intestinal [ver pág. 169]). Os achados clínicos laboratoriais são
geralmente normais. Lesões intestinais macroscópicas são raramente vistas, em-
bora lesões microscópicas, constituídas de atrofia de vilos e enterócitos cubóides,
possam estar presentes.
Diagnóstico – O estágio de trofozoíta, piriforme e móvel (em média 3 × 10 ×
15µm) pode ser ocasionalmente observado em esfregaços salinos de fezes muito
soltas ou aquosas. Os cistos (em média 10 × 14µm) são melhor detectados em fezes
concentradas por sulfato de zinco (gravidade específica 1,18) e submetidas à
técnica de flotação centrífuga. Os meios de flotação com cloreto de sódio, sacarose
Giardíase 164

e nitrato de sódio são muito hipertônicos, resultando em severa distorção dos cistos.
Os cistos corados com iodo auxiliam a identificação. Se existe suspeita de giardíase,
vários exames fecais podem ser necessários porque os parasitas são excretados
intermitentemente. Em cães, a aspiração duodenal para detecção de trofozoítas é
útil; entretanto, em gatos, o Giardia é mais prevalente no intestino delgado meso a
inferior. Um teste ELISA que detecta antígeno do Giardia nas fezes é disponível.
Tratamento – Não existem drogas aprovadas para o tratamento da giardíase em
animais. Quinacrina HCl (6,6mg/kg, VO, duas vezes ao dia, por 5 ou 6 dias) é efetiva
em cães com giardíase, porém os efeitos colaterais (por exemplo, êmese e urina
escura) são comuns. Metronidazol (25mg/kg, VO, duas vezes ao dia, por 5 a 7 dias)
é mais caro, sendo porém geralmente bem tolerado. O metronidazol é também
efetivo em gatos (10 a 25mg/kg, VO, duas vezes ao dia, por 5 dias) assim como a
furazolidona (4mg/kg, VO, duas vezes ao dia, por 5 dias). A furazolidona é menos
onerosa que o metronidazol e pode ser mais facilmente administrada, pois é
fornecida na forma de suspensão. Os cães também podem ser tratados com
tinidazol (44mg/kg, VO, diariamente por 3 dias). Os bezerros podem ser tratados
com quinacrina HCl (1mg/kg, VO, duas vezes ao dia por 7 dias), ipronidazol
(10mg/kg, duas vezes ao dia por 5 dias), ou dimetridazol (50mg/kg, diariamente por
5 dias). Os cavalos podem ser tratados com metronidazol (5mg/kg, VO, três vezes
ao dia por 10 dias).

INFECÇÕES INTESTINAIS POR CLAMÍDIAS


As clamídias foram isoladas de amostras fecais de bovinos, ovinos e suínos
clinicamente normais, em muitas partes do mundo. Animais com infecções intesti-
nais clinicamente inaparentes podem eliminar clamídias nas fezes por meses e,
possivelmente, anos. Deste modo, o trato GI serve como um importante reservatório
e fonte de transmissão destes microrganismos. A clamídia de Imunotipo 1, que pode
causar abortos e pneumonia (ver págs. 788 e 861), pode ser facilmente isolada em
fezes de ovinos ou bovinos normais. Foram obtidos isolados de Imunotipo 2 a partir
de amostras intestinais de animais afetados por poliartrite (ver pág. 565), encefalo-
mielite (ver pág. 746) e conjuntivite (ver pág. 354), mas não de animais normais. Um
isolado fecal de suínos representa o Imunotipo 5, mas numerosos isolados recentes
ainda não foram tipificados. A infecção intestinal tem um papel importante como
evento inicial na patogenia de várias doenças induzidas por clamídias. A fase de
infecção intestinal também tem papel importante na clamidiose aviária (ver pág.
1900).
Embora a maioria das infecções intestinais por clamídias sejam clinicamente
quiescentes, foi observada, em condições de campo, uma enterite induzida por
clamídia primária em bezerros neonatos. Estas infecções podem também levar a
uma alteração na ecologia da Escherichia coli no trato GI, com números anormal-
mente altos de E. coli no abomaso e intestino delgado superior. Os sintomas são
mais graves nos bezerros que não mamaram colostro ou nos que houve apenas
transferência parcial da imunidade colostral. Os bezerros recém-nascidos afetados
podem apresentar uma diarréia de aquosa a mucóide passageira, com febre leve e
corrimento nasal. Muitos laboratórios de diagnóstico veterinário não verificam
rotineiramente as fezes diarréicas quanto a clamídias; portanto, este exame deve
ser requisitado especificamente. Os tratamentos de escolha são altas dosagens
orais e/ou parenterais de tetraciclina
Doenças Hepáticas 165

DOENÇAS HEPÁTICAS
Etiologia – Algumas das causas mais comuns de doenças hepatobiliares nas
diferentes espécies animais são as seguintes:
Bovinos – Envenenamento por alcalóides de pirrolizadina, peste negra
(Clostridium novyi Tipo B), intoxicação por ferro devida a hematínicos injetáveis,
intoxicação por cobre devida a suplementos injetáveis, intoxicação por zinco,
aflatoxicose, envenenamento por algas azuis-verdes (Microcystis aeruginosa),
envenenamento por Kochia scoparia (“fireweed”), intoxicação por larva de
Lophyrotoma interrupta (“sawfly”), intoxicação por ração de arenque, neoplasia
hepática, colangiohepatite crônica, colelitíase, fotossensibilização hepatógena (vá-
rias plantas e fungos), abscessos hepáticos secundários a rumenite (Fusobacterium
necrophorum e Corynebacterium pyogenes) , fasciolíase, lupinose micótica
(Phomopsis sp que cresce nas sementes de tremosso), hemoglobinúria bacilar
(Clostridium haemolyticum, C. novyi Tipo D), lipidose hepática secundária a cetose,
e hepatite bacteriana secundária a septicemia.
Ovinos – Envenenamento por alcalóide de pirrolizidina, intoxicação por zinco,
intoxicação por cobre de suplementos injetáveis, aflatoxicose, envenenamento por
algas azuis-verdes (Microcystis aeruginosa), peste negra, neoplasia hepática,
abscessos hepáticos secundários a rumenite (Fusobacterium necrophorum e
Corynebacterium pyogenes), fasciolíase, lupinose micótica ( Phomopsis sp que
cresce nas sementes de tremosso), hemoglobinúria bacilar ( Clostridium
haemolyticum, C. novyi Tipo D), lipidose hepática secundária a cetose, doença do
fígado branco (deficiência de cobalto/vitamina B 12), fotossensibilidade hereditária e
icterícia em ovinos southdown, e síndrome semelhante à de Dubin-Johnson nos
ovinos corriedale.
Suínos – Peste negra, hepatose dietética (deficiência de vitamina E/selênio),
aflatoxicose, intoxicação por carvão mineral, intoxicação por cianamida, intoxicação
por algas azuis-verdes, fotossensibilização hepatógena (plantas e fungos), migra-
ção de ascarídeos (larvas) através do fígado, oclusão do duto biliar por ascarídeos
(adultos), lupinose micótica, toxicose por gossipol, e hepatite bacteriana secundária
a septicemia (Salmonella spp).
Eqüinos – Envenenamento por alcalóide de pirrolizidina, peste negra, doença de
Tizzer (Bacillus piliformis), intoxicação por ferro de hematínicos injetáveis em potros,
rinopneumonite neonatal, colangite, cirrose biliar (trevo híbrido, Trifolium hybridum,
e outras causas), colelitíase, doença de Theiler (insuficiência hepática aguda dos
eqüinos secundária à utilização de biológicos de origem equina), carcinoma hepá-
tico, aflatoxicose, hiperbilirrubinemia de jejum, fotossensibilização hepatógena
(várias plantas e fungos), hiperlipemia/lipidose hepática, leucoencefalomalacia
eqüina (envenenamento por milho embolorado, Fusarium moniliforme), e hepatite
bacteriana secundária a septicemia.
Gatos – Lipidose hepática idiopática, síndrome de colangite–colângio-hepatite,
oclusão do duto biliar comum (tumores, colélitos), síndrome da bile com sedimentos,
endotoxemia (hepatopatia tóxica), peritonite infecciosa felina, infecções ocasionais
com Toxoplasma, intoxicação por acetaminofenol, neoplasia (linfossarcoma, doen-
ça mieloproliferativa, adenocarcinoma do duto biliar) e anomalias vasculares
portossistêmicas.
Cães – Hepatite infecciosa canina; hepatite por leptospira; infecções ocasionais
por Toxoplasma, Neospora caninum, Salmonella ; anormalidades vasculares do
sistema porta; hepatite ativa crônica idiopática; hepatite lobular dissecante; hepatite
ativa crônica relacionada com a raça (dobermans pinschers, west highland white
terriers [possivelmente uma doença de reserva de cobre], bedlington terriers
Doenças Hepáticas 166

[doença de reserva de cobre semelhante à doença de Wilson em humanos]);


hepatite ativa crônica associada a reações idiossincráticas a drogas (primidona,
fenitoína); colestase associada a reações idiossincráticas a drogas (sulfa/trimetoprim,
esteróides anabolizantes); necrose associada a mebendazol ou oxibendazol; hepa-
topatia por glicocorticóides; colecistite (possivelmente com ruptura do duto biliar);
colelitíase; congestão passiva grave que leva à fibrose hepática (insuficiência
cardíaca associada a dirofilariose); e cirrose.
Todos os animais – Infecções bacterianas ( Actinobacillus, Campylobacter,
Clostridium, Corynebacterium, Escherichia, Haemophilus, Listeria, Mycobacterium,
Nocardia, Pasteurella, Salmonella, e Yersinia spp); muitas micotoxinas produzidas
por Aspergillus, Blastomyces, Penicillium, Phomopsis, e Pithomyces spp; toxinas
orgânicas (tetracloreto de carbono, arsenicais, dioxina); vitamina D (superdosa-
gem); e tumores primários (carcinomas) que afetam tanto o duto biliar como o fígado,
além de uma variedade de outros tumores metastáticos.
Achados clínicos e diagnóstico – Os sintomas clínicos dos distúrbios hepáticos
resultam da função hepatocelular comprometida devido a necrose intensa ou atrofia;
colestase intra ou extra-hepática; diminuição do fluxo sangüíneo hepático associada
a lesões adquiridas (fibrose, cirrose), lesões congênitas (anomalias vasculares
portossistêmicas), ou circulação sistêmica prejudicada (descompensação cardíaca);
ou função reduzida do sistema reticuloendotelial (SRE) hepático. Além disto, altera-
ções herdadas ou adquiridas na função bioquímica podem estar presentes sem
lesões morfológicas. Devido à grande reserva e à capacidade de regeneração do
fígado, podem ocorrer lesões que não provocam sintomas clínicos; os problemas
quase nunca são diagnosticados precocemente. Qualquer combinação de alterações
morfológicas e funcionais pode coexistir. Logo após o início da necrose hepática, pode
se desenvolver uma colestasia intra-hepática, seguida de uma regeneração sem
complicações em alguns dias, ou evoluir para uma hepatite que se autoperpetua. A
hepatite crônica pode progredir para fibrose de ligação, formação de nódulos
regenerativos com ou sem hiperplasia do duto biliar. A fibrose extensiva resulta em
colestasia, redução do fluxo sangüíneo hepático, hipertensão portal e, finalmente,
abertura e aumento das comunicações vasculares portossistêmicas. Qualquer doen-
ça hepática difusa grave pode estar associada à diminuição da função do SRE
hepático. O SRE hepático é o maior reservatório de macrófagos fixos no corpo; ele
remove debris particulados, endotoxinas e microrganismos bacterianos da circulação
portal, evitando assim sua entrada na circulação sistêmica.
Os sintomas clínicos de doença hepatobiliar podem incluir: febre intermitente,
inapetência, perda de peso, poliúria, polidipsia, icterícia, fotossensibilização por
retenção de filoeritrina (em cavalos e ruminantes), urina amarelo-esverdeada
devida à presença de pigmentos biliares, hepatomegalia ou redução do tamanho do
fígado, tendência a sangramentos devida a anormalidades nas plaquetas e proteí-
nas de coagulação, ascite (devida a hipoalbuminemia, retenção de sódio e/ou
hipertensão portal), e anormalidades neurocomportamentais (hepatoencefalopatia).
A hepatoencefalopatia pode ser caracterizada por um ou mais destes fatores:
letargia, amaurose, agressividade, histeria, depressão, alucinações aparentes e
ptialismo. Estes sintomas desenvolvem-se devido a alterações bioquímicas com-
plexas na função neuronal e no metabolismo cerebral e sistêmico, além da maior
permeabilidade da barreira hematoencefálica. Existem diferenças espécie-especí-
ficas nos sintomas clínicos associados à doença hepática; por exemplo, a icterícia
pode ser normal em cavalos e macacos-esquilo bolivianos após um jejum noturno;
em ruminantes, a icterícia é mais comum após uma crise hemolítica do que na
doença hepática. Algumas características patognomônicas da doença hepática são
inconsistentes; por exemplo, fezes gordurosas cinza ou cor de tijolo (acólicas) sem
pigmentos normais de bilirrubina, juntamente com ausência de urobilinogênio na
Doenças Hepáticas 167

urina, são classicamente associadas à obstrução extra-hepática do duto biliar. No


entanto, a pigmentação fecal e o urobilinogênio da urina podem estar normais se
houver uma hemorragia GI concorrente (resultante da deficiência de vitamina K).
Vários testes, que devem ser completamente compreendidos para abordagens
diagnósticas e prognósticas adequadas, podem ser utilizados para detectar desor-
dens hepatobiliares (ver também pág. 1139). Os testes de triagem e diagnóstico são
úteis na diferenciação da causa da icterícia (hemólise por colestasia), podendo ser
utilizados como indicadores de prognóstico. Neste último caso, podem ser avaliados
a regeneração, sucesso da terapia, danos residuais, e riscos da anestesia. As
atividades séricas de enzimas são testes de triagem úteis para detecção das
alterações reversíveis e irreversíveis na permeabilidade das membranas
hepatocelulares. ALT* (SGPT), AST (SGOT), sorbitol desidrogenase (SDH) e
arginase podem indicar necrose hepatocelular, indução enzimática ou alterações na
permeabilidade das membranas. A fosfatase alcalina e a γ -glutamiltransferase são
úteis na detecção de colestasia e indução enzimática. A indução enzimática é
especialmente comum em cães com vários problemas clínicos e após a exposição
a certas drogas (por exemplo, anticonvulsivantes, glicocorticóides e fenilbutazona).
Os testes reais de função hepática incluem: 1) “clearance” plasmático de ânions
orgânicos (bilirrubina, bromossulfoftaleína [BSP], verde de indocianina [ICG], ou
ácidos biliares); 2) a capacidade de metabolizar carboidratos, lípidios, proteínas,
amônia, e ácido úrico; 3) medição do fluxo sangüíneo hepático (“clearance”
plasmático de BSP, ICG, ácidos biliares séricos ou teste de tolerância a amônia). Em
cães e gatos a ultra-sonografia e as técnicas radiológicas de contraste podem ser
utilizadas para determinar o tamanho ou distorções hepáticos, e a presença e
localização de “shunts” portossistêmicos. A biópsia de fígado é normalmente
necessária para um diagnóstico definitivo.
Tratamento – O tratamento da doença hepática baseia-se em fornecer boa
nutrição, fluidos adequados e antimicrobianos dirigidos aos agentes infecciosos
específicos; e no alívio da retenção da bilirrubina, ácidos biliares, e outros produtos
metabólicos nocivos. Se as toxinas ou agentes causais puderem ser removidos
precocemente, pode ocorrer regeneração seguida de recuperação com pouco ou
nenhum dano residual. Se a doença é crônica, a resposta ao tratamento pode ser
diminuída por fibrose difusa e uma hepatite secundária autoperpetuante. As drogas
antiinflamatórias são apropriadas para algumas formas crônicas de doença inflama-
tória autoperpetuante. A obstrução extra-hepática do duto biliar normalmente exige
cirurgia para remover a oclusão e/ou criar um desvio biliar como na colecis-
tojejunostomia.
Como o custo do tratamento pode tornar o manejo inviável para muitos grandes
animais, a discussão a seguir enfoca o manejo da doença hepática em cães e gatos.
O suporte nutricional deve ser planejado para cada indivíduo. Se a função
hepática estiver adequada, recomenda-se uma alimentação balanceada de manu-
tenção. Se a função hepática está comprometida e suspeita-se de tendências
encefalopáticas, é melhor uma dieta de proteína reduzida composta de laticínios. A
maior parte das calorias deve ser fornecida sob a forma de carboidratos simples,
facilmente digeríveis, por exemplo, arroz branco cozido. As refeições devem ser
freqüentes e pequenas para maximizar a digestão e a absorção. Como muitas das
toxinas responsáveis pelos sintomas encefalopáticos são derivadas do trato GI,
particularmente do cólon, uma dieta que resulte em pouco resíduo colônico é
benéfica. Devido ao papel do fígado no armazenamento, ativação e síntese de
várias vitaminas e co-fatores, recomenda-se um suplemento multivitamínico, geral-

* N. do T. – ALT = alanina aminotransferase.


Doenças Hepáticas 168

mente no dobro da dosagem diária recomendada para os componentes hidrosso-


lúveis. Os suplementos lipotróficos que contém metionina devem ser evitados, pois
podem induzir uma crise encefalopática, se a função hepática estiver gravemente
reduzida.
Recomenda-se a suplementação com vitamina K (5 a 15mg administrados por
injeção IM profunda, duas vezes ao dia) se forem detectadas tendências a sangra-
mento ou se os testes de coagulação estiverem anormais e o animal ictérico. A
repleção de vitamina K pode ser diminuída quando o duto biliar extra-hepático está
obstruído, desenvolvendo-se complicações hemorrágicas dentro de 2 semanas
devidas à malabsorção de vitaminas lipossolúveis. A resposta à vitamina K1 é
dramática. Em 12h, ocorre uma correção > 30% nos tempos de protrombina e de
tromboplastina parcial. Muitas vezes, os testes de coagulação estão normais
apenas 24h após o tratamento. Em animais com doença parenquimal importante
associada à coagulopatia, o tratamento de triagem com a vitamina K pode ser
utilizado para determinar se a suplementação é necessária; a resposta é menos
dramática quando uma insuficiência parenquimal é o problema de base.
São aconselhados os antibióticos sistêmicos que não necessitam de importante
biotransformação ou eliminação hepática na doença hepática com suspeita de
comprometimento do sistema reticuloendotelial. Ampicilina, amoxicilina ou cefalos-
porinas são comumente utilizadas. O metronidazol é especialmente eficaz contra
microrganismos anaeróbicos, mas deve ser administrada uma dose reduzida
quando a função hepática está comprometida. A antibioticoterapia específica deve
ser baseada nas culturas e testes de sensibilidade do tecido hepático ou bile.
Os animais com sintomas de encefalopatia são tratados para reduzir a produção,
disponibilidade ou absorção das muitas toxinas causadoras derivadas do intestino.
A colestiramina ou o carvão ativado administrados VO podem ser utilizados para
reter endotoxinas intestinais e ácidos biliares na insuficiência hepática aguda. A
lactolose, VO, minimiza o efeito da amônia GI, a maior fonte de amônia no
organismo, através da redução do número de bactérias produtoras de urease,
inibindo a formação e absorção da amônia e causando catarse. Uma dose inicial de
0,25mL/4,5kg de peso corporal faz com que o animal elimine fezes pastosas 2 a 3
vezes ao dia. A neomicina (22mg/kg, duas vezes ao dia) pode ser administrada VO
para modificar a flora intestinal, o que reduz o número de bactérias produtoras de
toxinas. A neomicina e a lactolose são sinergísticas. Podem também ser utilizados
enemas para remover ou modificar o conteúdo do cólon em uma crise. Os enemas
mecânicos ou de retenção que utilizam soluções de 15 a 20mL de solução de
neomicina a 1%, lactolose (1:3 em água) ou povidona-iodo diluído (os enemas de
iodo não devem ser utilizados nas retenções) foram recomendados.
A anorexia e vômitos associados à doença hepática podem ser causados por
encefalopatia ou ulceração GI. Na doença hepática grave, o aumento da concentra-
ção de gastrina, redução do fluxo sangüíneo visceral, turnover retardado na mucosa
e excesso de ácidos biliares são ulcerogênicos. Cimetidina ou ranitidina combina-
das com o sucralfato têm sido úteis para este problema. Os estimulantes do apetite
(benzodiazepínicos) foram recomendados, mas geralmente são pouco confiáveis
pois promovem sedação e podem potenciar sintomas de encefalopatia. Eles
necessitam de metabolismo hepático para eliminação, e podem ligar-se aos
neurorreceptores promotores de encefalopatia no cérebro. A alimentação forçada
é imperativa em alguns casos, por exemplo, lipidose hepática idiopática felina.
Normalmente é necessária uma sonda nasogástrica ou de gastrostomia, preferindo-
se a última. As sondas de gastrostomia podem ser utilizadas efetivamente em casa,
tornando o tratamento crônico economicamente viável.
Os esteróides anabólicos como a oximetalona ou o estanozolol têm sido
utilizados como estimulantes do apetite, para promover ganho de peso e estimular
Síndromes de Malabsorção 169

a eritropoiese. É necessário fornecer-se a quantidade adequada de calorias para


permitir um efeito anabólico. Em alguns animais, pode se desenvolver icterícia e
colestasia com o uso destes agentes.
As drogas antiinflamatórias são utilizadas quando é diagnosticada uma doença
hepática crônica persistente e não pode ser determinada uma causa infecciosa. Os
glicocorticóides (1 a 4mg/kg/dia) são utilizados quando a doença crônica envolve
infiltrados de células redondas (linfócitos, monócitos, macrófagos, células plasmá-
ticas) e fibrose em desenvolvimento. Se a resposta ao tratamento for inadequada ou
ocorrerem efeitos colaterais adversos, normalmente tenta-se a azatioprina. O
metronidazol tem sido utilizado porque provoca alguma inibição da imunidade
mediada por células. O tratamento para uma fibrose hepática extensiva ou cirrose
pode incluir glicocorticóides, glicocorticóides com azatioprina, colchicina, penicila-
mina, suplementação com zinco, e/ou metronidazol. Apesar de cada um destes
medicamentos possuir efeitos antifibróticos benéficos, eles também têm efeitos
colaterais adversos e devem ser administrados criteriosamente.
Se forem reconhecidas secreções biliares espessas e tenazes (bile turva) e o
efluxo no trato biliar for patente, pode ser utilizada uma dose baixa de ácido
desidrocólico (10 a 15mg/kg, VO, duas a três vezes ao dia) como colerético. Deve
ser tomado cuidado nas terapias crônicas, pois o ácido desidrocólico pode ser
metabolizado pelos microrganismos intestinais para ácido litocólico, um ácido biliar
extremamente hepatotóxico. O ácido ursodesoxicólico foi utilizado recentemente
em humanos com colelitíase e doenças da árvore biliar que levam a fibrose hepática
(biliar). A informação disponível quanto ao uso em animais é limitada.
A ascite é um problema em cães com doença hepática crônica, mas é rara em
gatos. Ela é melhor tratada com repouso em gaiola, dieta pobre em sódio e, se
necessário, diuréticos que eliminam sódio. Quando são utilizados diuréticos, a
desidratação e a hipocalemia devem ser evitadas, pois promovem crise
encefalopática. A paracentese abdominal pode ser necessária para iniciar a
mobilização de fluido, mas deve ser reservada para os animais que não respondem
ao tratamento mais conservativo.

SÍNDROMES DE MALABSORÇÃO
As funções principais do intestino delgado incluem a mistura e propulsão do
conteúdo luminal, absorção de água e íons, digestão e absorção de nutrientes e
secreção de hormônios. A digestão e absorção dos nutrientes ocorrem em 3 fases
seqüenciais: digestão intraluminal, digestão e absorção mucosais e liberação dos
nutrientes para a circulação. Muitas doenças do trato GI causam malabsorção
crônica por interferirem nestes processos. As síndromes de malabsorção em cães
foram estudadas detalhadamente; no entanto, o diagnóstico básico e os princípios
terapêuticos são relevantes para outras espécies.
Fisiologia – O processo digestivo normal converte os nutrientes da dieta em
formas que podem cruzar a membrana com microvilos (em escova) das células
epiteliais absortivas do intestino, ou enterócitos. Muitos carboidratos da dieta são os
polissacarídeos amido e glicogênio, e os dissacarídeos sacarose e lactose. A
digestão intraluminal inicial do amido e glicogênio envolve a hidrólise pela amilase
pancreática obtendo os oligossacarídeos maltose, maltotriose e dextrinas α-limite.
Os oligossacarídeos e os dissacarídeos ingeridos são novamente hidrolisados para
monossacarídeos por enzimas localizadas na borda em escova das células epite-
liais intestinais. Os produtos finais da hidrólise mucosal (glicose, galactose e frutose)
Síndromes de Malabsorção 170

são transportados ativamente para o interior do enterócito por um processo mediado


por uma proteína carreadora. Uma vez na célula, os monossacarídeos difundem-se
por um gradiente de concentração através da lâmina própria e para a circulação
venosa portal. A digestão e absorção de proteínas seguem um padrão semelhante.
As enzimas proteolíticas do estômago e pâncreas degradam a proteína em
oligopeptídeos de cadeia curta, dipeptídeos e aminoácidos. Os oligopeptídeos são
ainda hidrolisados pelas peptidases da borda em escova para dipeptídeos e amino-
ácidos que cruzam a membrana microvilosa em proteínas carreadoras específicas.
As moléculas lipossolúveis não necessitam de carreadores específicos para
cruzar a barreira de fosfolipídios da membrana microvilosa. No entanto, a degrada-
ção intraluminal de lipídios grandes é essencial. A gordura no duodeno estimula a
liberação de colecistocinina, que, por sua vez, estimula a secreção da lipase
pancreática. Os triglicerídios são degradados pela lipase na superfície de gotículas
lipídicas emulsificadas para liberar monoglicerídios (MG) e ácidos graxos livres
(AGL). Antes da absorção, estes produtos devem ser solubilizados na fase aquosa
do conteúdo luminal através da sua combinação a agregados de ácidos biliares
chamados de micelas. Na membrana celular, os AGL e MG desagregam-se das
micelas, sendo absorvidos passivamente pela célula. Os ácidos biliares liberados
permanecem no lúmen, sendo reabsorvidos pelo íleo. Uma vez dentro da célula, os
AGL e MG são reesterificados em triglicerídios e incorporados nos quilomícrons, que
subseqüentemente penetram nas centrais lácticas dos vilos e são entregues à
circulação venosa via duto torácico.
Etiologia – A malabsorção ocorre como conseqüência de interferência em
mecanismos responsáveis pela degradação ou absorção dos constituintes da dieta.
Os principais problemas potenciais são resumidos na TABELA 4.
As doenças que interrompem a síntese ou secreção das enzimas digestivas
pancreáticas ou da bile causam má-digestão com malabsorção conseqüente. Uma
causa importante é a insuficiência pancreática exócrina (EPI, ver pág. 146), que
ocorre quando < 10 a 15% da massa pancreática está funcionando. Esta doença é
caracterizada por má-digestão e malabsorção graves de amido, proteína e, mais
notavelmente, gordura. A EPI é normalmente complicada por um supercrescimento
bacteriano no intestino delgado (SBID), que atrapalha ainda mais a digestão e a
absorção dos nutrientes.

TABELA 4 – Problemas que Resultam em Malabsorção


Problema Deficiência Malabsorção
Insuficiência pancreática α-amilase Amido
exócrina Proteases Proteína
Lipase Triglicerídios
Doença no intestino Dissacaridases Dissacarídeos
delgado (deficiências Carreadores de
secundárias) açúcar Monossacarídeos
Peptidases das
microvilosidades Oligopeptídeos
Carreadores de
peptídeos e aminoácidos Peptídeos e aminoácidos
Área superficial reduzida Lipídios
Doença na membrana Lactase Lactose
microvilosa
(deficiência primária)
Deficiência de sais biliares Sais biliares conjugados Lipídios
Síndromes de Malabsorção 171

Uma doença no intestino delgado pode causar malabsorção por redução do


número ou função de enterócitos individuais. As doenças mucosais ou da parede
intestinal difusas reduzem a atividade das enzimas dos microvilos, diminuem a
função mucosal carreadora de proteínas, diminuem a área da superfície absortiva
da mucosa e interferem no transporte final de nutrientes para a circulação. Os
nutrientes malabsorvidos exercem efeitos osmóticos intraluminais poderosos que
diminuem a área de superfície absortiva intestinal e colônica e interferem no
transporte final de nutrientes na circulação. Os nutrientes malabsorvidos exercem
efeitos osmóticos intraluminais poderosas que diminuem a absorção intestinal e
colônica de água e eletrólitos. As causas específicas incluem doenças intestinais
inflamatórias crônicas como a enterite linfocítica-plasmocítica, enterite eosinofílica
e atrofia vilosa idiopática. Histoplasmose, giardíase, enterites virais e bacterianas,
linfossarcomas e amiloidose são causas típicas de síndromes de malabsorção. As
doenças intestinais de cães geralmente resultam em malabsorção menos marcada
do que na EPI.
Os efeitos intraluminais das bactérias podem também ter importantes conse-
qüências. Como na EPI, o SBID com freqüência ocorre secundariamente a uma
doença difusa do intestino delgado. O SBID causa dano bioquímico ao epitélio
absortivo do intestino, diminuindo ainda mais as atividades enzimática e carreadora
de proteínas da mucosa. A desconjugação bacteriana de sais biliares interfere na
formação de micelas, o que resulta na malabsorção de lípidios. Os sais biliares
desconjugados e os ácidos graxos hidroxilados exacerbam a diarrréia através da
estimulação da secreção colônica. O SBID pode também ocorrer em cães como
uma doença primária, com conseqüências patológicas semelhantes; a ocorrência
em outras espécies é desconhecida.
A malabsorção de gorduras pode ocorrer na deficiência intraluminal de sais
biliares devida a doença hepática, obstrução ao fluxo biliar, ou doença ileal que
resulte em absorção deficiente dos sais biliares conjugados. A linfangiectasia
intestinal (dilatação patológica dos vasos linfáticos intestinais) também causa grave
malabsorção de gordura e perda de proteína intestinal.
A deficiência primária de lactase ocorre em cães e gatos; outras deficiências
enzimáticas do epitélio intestinal em escova não foram relatadas, exceto em
humanos. Acredita-se que a sensibilidade a componentes da dieta como o glúten
possa ser uma causa de base de algumas doenças de malabsorção (enteropatia de
sensibilidade ao trigo em setters irlandeses, atrofia idiopática dos vilos, doença
inflamatória do intestino).
Achados clínicos – A duração, intensidade e causa primária determinam a
gravidade dos sintomas, que incluem tipicamente diarréia crônica e pouco ganho de
peso, ou perda de peso. A ausência de diarréia não exclui a possibilidade de grave
doença GI. A perda de peso é geralmente considerável, a despeito do apetite voraz,
algumas vezes caracterizado por coprofagia. Os sintomas não específicos incluem
desidratação, anemia, ascite ou edema. As alças intestinais espessadas ou linfono-
dos mesentéricos com aumento de volume podem ser palpáveis.
Diagnóstico – A diarréia crônica e perda de peso são sintomas não específicos
comuns a várias doenças intestinais e sistêmicas. O diagnóstico começa com um
histórico detalhado para determinar a duração do problema. O passo seguinte é
excluir causas da dieta ou parasíticas e localizar a doença ao intestino delgado. As
características típicas que podem ajudar a diferenciar diarréia do intestino delgado
e diarréia do intestino grosso são resumidas na TABELA 1, página 113. A diarréia
crônica do intestino delgado é caracterizada funcionalmente para determinar se a
má-digestão (por exemplo, EPI) ou malabsorção estão presentes. O diagnóstico
definitivo é feito com auxílio de testes laboratoriais adicionais, radiografias, endos-
copia, biópsia e/ou resposta à terapia.
Síndromes de Malabsorção 172

As informações iniciais devem incluir um hemograma, perfil bioquímico, urinálise,


exame coproparasitológico e radiografias abdominais. As correlações hematológi-
cas das doenças intestinais incluem: anemia por perda crônica de sangue (microcítica-
hipocrômica), inflamação crônica (normocítica-normocrômica), ou desnutrição (ma-
crocítica); neutrofilia e/ou monocitose associadas a doenças intestinais inflamató-
rias ou histoplasmose; eosinofilia associada a parasitismo, enterite eosinofílica, ou
hipoadrenocorticismo; e linfopenia causada por linfangiectasia intestinal. A hipopro-
teinemia com freqüência ocorre secundariamente a uma enteropatia com perda de
proteínas; na maioria dos casos a albumina e globulina séricas estão baixas. A
enteropatia dos basenjis é uma exceção, na qual ocorre hiperglobulinemia com
hipoalbuminemia. Os testes bioquímicos e a urinálise excluirão doenças sistêmicas
que provocam diarréia crônica, principalmente o hipoadrenocorticismo, insuficiên-
cia renal e doença hepática.
O exame fecal deve incluir a inspeção macroscópica como um auxílio na
localização da doença ao intestino delgado. O exame parasitológico de fezes deve
incluir esfregaços salinos diretos para identificar trofozoítas de protozoários parasi-
tas, especialmente a Giardia canis, e exame de flotação fecal para identificar ovos
de metazoários. A centrifugação–flotação com sulfato de zinco é utilizada para
identificar cistos de protozoários, como Giardia e coccídios. A giardíase oculta
ocorre com freqüência. O diagnóstico, neste caso, baseia-se na identificação de
trofozoítas em aspirados duodenais ou, mais simplesmente, pela resposta à
tentativa terapêutica de metronidazol ou quinacrina. O exame microscópico dos
esfregaços fecais preparados com corante de Sudan direto e indireto, iodo de Lugol
e novo azul de metileno ou corante de Wright são testes simples e amplos utilizados
para identificar nutrientes não absorvidos, células inflamatórias e agentes infeccio-
sos. Uma coloração por Sudan direto fortemente positiva (gordura não digerida) é
caracterizada por numerosas gotículas de gordura, sendo compatível com EPI.
Numerosas gotículas de gordura em uma coloração indireta por Sudan (gordura
digerida) com um resultado negativo por Sudan direto são sugestivas de malabsor-
ção intestinal. O iodo de Lugol cora o amido não digerido; entretanto, este teste é
pouco confiável e varia de acordo com a dieta. Estes testes de triagem devem ser
realizados em muitas amostras fecais frescas para aumentar a confiabilidade. A
detecção de leucócitos em excesso em uma citologia fecal pode indicar uma doença
intestinal inflamatória crônica ou doenças infecciosas, como salmonelose ou
campilobacteriose, sendo então indicadas as culturas fecais. A citologia de raspa-
dos do cólon podem revelar espécimes de Histoplasma.
Uma vez que as causas dietéticas, parasitárias e infecciosas da diarréia
crônica do intestino delgado tenham sido eliminadas, a EPI deve ser diferenciada
da malabsorção intestinal. Numerosos testes de função pancreática exócrina,
incluindo a análise qualitativa/quantitativa da gordura fecal, testes de turbidez
plasmática, atividade proteolítica fecal, e os testes de bentiromida são muito
imprecisos ou pouco práticos para serem utilizados no diagnóstico da EPI. O
ensaio da imunorreatividade semelhante a tripsina sérica canina (TLI) é um teste
altamente sensível e específico para o diagnóstico da EPI em cães. Este ensaio
quantifica o tripsinogênio que normalmente extravasa do pâncreas para o san-
gue, fornecendo assim, uma avaliação indireta do tecido pancreático funcional.
Em cães com EPI, o tecido exócrino funcional está gravemente diminuído e as
concentrações séricas de TLI são extremamente baixas, distinguindo claramente
a EPI das outras causas de malabsorção. Este teste exige uma amostra de soro
em jejum. O teste de TLI sérica felina ainda não está disponível. O teste de várias
amostras fecais frescas quanto a atividade proteolítica, disponível em laborató-
rios de referência selecionados, é considerado o teste mais confiável para a EPI
em gatos.
Síndromes de Malabsorção 173

O diagnóstico de doenças do intestino delgado é difícil devido às limitações dos


procedimentos de triagem rotineiros, à necessidade de biópsia de intestino delgado
e, freqüentemente, à ausência de alterações histológicas diagnósticas. Os testes
úteis para confirmar e caracterizar a absorção intestinal anormal incluem o teste de
absorção de xilose e medidas da concentração sérica de folato e cobalamina
(vitamina B12). A administração oral de xilose e medidas cronometradas da concen-
tração sérica de xilose (0, 30, 60, 90, 120min) fornecem uma avaliação da função
do intestino delgado proximal. Os cães normais devem apresentar um pico de xilose
> 60mg/dL em 60 a 90min. Uma diminuição na absorção de xilose indica grave
malabsorção. Um atraso no esvaziamento gástrico e metabolismo bacteriano da
xilose devido a SBID podem causar resultados baixos falsos. Este teste é insensível;
não é incomum que a absorção de xilose esteja normal em animais com doença no
intestino delgado.
O folato é absorvido principalmente pelo intestino delgado proximal (jejuno),
enquanto a cobalamina é absorvida pelo intestino delgado distal (íleo). Assim, as
concentrações séricas de folato podem estar diminuídas em doenças do intestino
delgado proximal, as concentrações séricas de cobalamina podem estar diminuídas
em doenças do intestino delgado distal, e ambas podem estar diminuídas nas
enteropatias difusas. Um SBID proximal pode causar um aumento no folato sérico
e/ou uma diminuição na concentração da cobalamina sérica, pois muitas bactérias
entéricas podem sintetizar folato que é subseqüentemente absorvido no jejuno, mas
ligam a cobalamina, tornando-a indisponível para transporte. Concentrações séri-
cas normais destas vitaminas não excluem a possibilidade de doença no intestino
delgado, pois o prejuízo à absorção depende da natureza, extensão e duração da
anormalidade mucosal, além do tipo e número de microrganismos presentes no
SBID. O aumento no folato e diminuição da cobalamina também ocorrem freqüen-
temente na EPI, presumivelmente devido a um SBID secundário.
A detecção da permeabilidade intestinal através da medição de excreção urinária
de 51Cr-EDTA 24h após administração oral é um teste sensível para danos ao
intestino delgado. Uma maior permeabilidade mucosal permite maior passagem
desta substância, através da mucosa, para o sangue, sendo excretada pelos rins.
A administração EV de 51Cr envolve um outro princípio, sendo utilizada para
documentar enteropatias com perda de proteína. O 51Cr liga-se rapidamente à
albumina circulante, de forma que a excreção fecal em 3 dias deste marcador nos
fornece uma estimativa da perda de albumina para o lúmen intestinal.
O diagnóstico definitivo da maioria das doenças malabsortivas é mais bem feito
através de biópsias intestinais obtidas peroralmente com uma cápsula de biópsia de
sucção ou endoscópio, ou retiradas por laparotomia. Várias amostras de biópsia
devem ser coletadas em todas as porções do intestino delgado; se for realizada a
laparotomia, os linfonodos mesentéricos devem sofrer biópsias e os outros órgãos
devem ser examinados. Como as biópsias intestinais em toda a espessura não
cicatrizam bem em animais caquéticos e/ou severamente hipoproteinêmicos, as
técnicas de biópsia perorais são recomendadas. São aconselháveis as transfusões
de plasma pré-operatórias.
As anormalidades morfológicas evidentes podem ser mínimas ou ausentes,
apesar de considerável anormalidade da função intestinal. Além disto, as descrições
histológicas por si só podem fornecer poucas informações sobre os mecanismos de
dano à mucosa; por exemplo, a enterite linfocítica-plasmocítica (ELP), uma caracte-
rística de muitas enteropatias crônicas, provavelmente não é uma entidade distinta.
Este problema provavelmente representa uma resposta comum da mucosa a mais
de um agente, como antígenos bacterianos ou da dieta no lúmen intestinal. Foi
demonstrada uma associação direta entre ELP e o SBID, mas é improvável que seja
a única causa. Além disto, alguns problemas, como o SBID, podem provocar uma
Síndromes de Malabsorção 174

variedade de conseqüências funcionais sem dano histológico evidente. Na verdade,


sintomas clínicos de malabsorção associados a folato sérico aumentado e diminui-
ção da cobalamina sérica sugerem a presença de SBID, mesmo que a biópsia
intestinal esteja normal. O diagnóstico definitivo de SBID é feito por culturas
quantitativas de aeróbios e anaeróbios em aspirados do intestino delgado. Da
mesma forma, uma sensibilidade à dieta não provoca lesões patognomônicas, mas
pode ser suspeitada a partir do histórico e eliminação de outras causas potenciais
de dano intestinal. Isto pode ser confirmado apenas através da monitoração da
resposta à exclusão da dieta e desafio subseqüente. Alterações histológicas como
ELP e enterite eosinofílica foram relatadas em gatos, mas sabe-se pouco sobre as
causas de base de doença crônica do intestino delgado nesta espécie.
A resposta à terapia é um método válido de diagnóstico das doenças de
malabsorção, especialmente quando corroborada por resultados dos testes
iniciais de triagem. A giardíase (ver pág. 163) é uma doença comum em cães e
gatos, apesar de o diagnóstico baseado na identificação do microrganismo ser
difícil. Da mesma forma, a resposta a uma antibioticoterapia (tetraciclina,
metronidazol, ou tilosina) é um método prático para eliminar o SBID. Alterações
na dieta para excluir seletivamente componentes como o glúten, produtos
cárneos, ou aditivos alimentares podem ser úteis em algumas síndromes de
malabsorção.
Tratamento – Apesar de o tratamento específico exigir um diagnóstico definitivo,
a terapia empírica é útil quando o diagnóstico específico não pode ser realizado. Em
geral, o manejo dietético melhora os sintomas clínicos na maioria dos casos de
doença malabsortiva. As dietas devem ser facilmente digeríveis, consistindo de
proteínas com alto valor biológico e gordura, lactose e aditivos restritos. São
recomendadas dietas comerciais adequadas ou dietas feitas em casa que consis-
tam de arroz ou batatas como fonte de carboidratos, queijo fresco, iogurte, frango
cozido ou carne de carneiro como fonte de proteínas e suplementadas com óleo com
triglicerídios de cadeia média (TCM) para fornecer calorias. A razão de carboidra-
tos–proteínas deve ser de , 4:1. Devem ser oferecidas porções pequenas freqüen-
temente. A suplementação com enzima pancreática pode ser benéfica em cães mal
nutridos, pois a má nutrição proteico-calórica prejudica a função pancreática
exócrina. As dietas com gordura restrita devem ser suplementadas com óleo com
TCM (1 a 2mL/kg/dia). Além disto, as dietas devem ser suplementadas com
vitaminas, particularmente A, D, E e K, e ácido fólico (5mg/dia por 1 a 6 meses).
Também é recomendada a cobalamina parenteral (500µg/mês).
Os grãos que contêm glúten, como aveia, trigo, cevada e centeio devem ser
evitados, especialmente em animais suspeitos de enteropatia sensível a glúten. São
úteis prescrições de dietas livres de glúten.
Quando a causa de base da doença malabsortiva não é identificada, a eficácia
da terapia medicamentosa deve ser determinada por tentativa e erro. As drogas
antimicrobianas e imunossupressivas indicadas para doenças específicas estão
listadas na TABELA 5. Os corticosteróides são utilizados principalmente para tratar
doenças intestinais inflamatórias crônicas, devido às suas ações antiinflamatórias
e imunossupressivas. Os corticosteróides também melhoram as funções absortiva
e digestiva do intestino por indução das proteínas funcionais dos enterócitos. Como
os animais debilitados já estão em um estado catabólico e imunodeprimido,
devemos sempre ter cautela quando os tratamos com corticosteróides. O
metronidazol, além da sua ação antiprotozoários, é eficaz contra bactérias anaeróbicas
que muitas vezes causam SBID ou podem estar secundariamente envolvidas em
outras enteropatias crônicas. O metronidazol também suprime as respostas imunes
mediadas por células no intestino, o que pode explicar sua eficácia no tratamento
de alguns casos de doença intestinal inflamatória.
Peritonite 175

TABELA 5 – Tratamentos para Doenças Selecionadas de Malabsorção


Doença Tratamento
Insuficiência pancreática exócrina Suplementação com enzimas pancreáticas
em pó
Dieta com pouca gordura
Doença intestinal inflamatória crônica
Enterite eosinofílica Prednisona
Dietas baseadas em frango ou carneiro
Enterite linfocítica-plasmocítica Prednisona (considerar azatioprina)
sozinha ou combinada ao metronidazol,
tetraciclina ou tilosina
Dieta pobre em gordura e alta em proteína
Enteropatia imunoproliferativa Idem ao anterior
dos basenjis
Linfangiectasia Dieta pobre em gordura, óleo com triglicerídios
de cadeia média
Prednisona
Atrofia vilosa
Enteropatia por glúten Dieta sem glúten
Idiopática Prednisona, antibióticos, considerar dieta
sem glúten
Supercrescimento bacteriano Antibióticos (tetraciclina, metronidazol, ou
tilosina)
Giardíase Metronidazol ou quinacrina
Histoplasmose Anfotericina B, cetoconazol, itraconazol
Linfossarcoma Vincristina, ciclofosfamida, prednisona
(e outras drogas quimioterápicas)

PERITONITE
É uma inflamação do peritônio que pode ser aguda ou crônica, local ou difusa,
na maioria das vezes secundária a uma contaminação da cavidade peritoneal.
Etiologia – A peritonite primária é infreqüente. Pode ser causada por agentes
infecciosos como o vírus da peritonite infecciosa felina (ver pág. 502), Nocardia spp,
ou Mycobacterium spp. O acesso à cavidade peritoneal ocorre geralmente por via
hematogênica. A progressão de uma peritonite primária tende a ser crônica (dias a
semanas).
A peritonite secundária é freqüentemente aguda, resultando em doença sistêmi-
ca rápida e progressiva. Está, na maioria das vezes, associada a uma perfuração
GI ou deiscência de sutura de ferida visceral, ou a uma perfuração de outra víscera
infectada (por exemplo, abscesso prostático ou hepático, piometria). As lesões
abdominais penetrantes podem lacerar vísceras ou inocular a cavidade peritoneal
com material estranho e microrganismos. A peritonite pode também ocorrer secun-
dariamente a irritantes químicos (por exemplo, bile, urina) e a outras doenças que
permitam migração transmural de bactérias (por exemplo, neoplasia, isquemia
Peritonite 176

visceral). A peritonite por irritação química ou corpos estranhos (por exemplo,


compressa de gaze) pode ser séptica ou asséptica. A peritonite séptica pode
permanecer localizada se o omento ou mesentério contiver o processo séptico, o
que por vezes resulta na formação de um abscesso abdominal.
Os microrganismos associados à peritonite séptica refletem a fonte de contami-
nação. Uma população bacteriana mista é observada nas perfurações GI (coliformes,
anaeróbios), enquanto a perfuração de vísceras não gastrointestinais (por exemplo,
vesícula biliar, útero, próstata) está normalmente associada a um microrganismo
(Escherichia coli). Em eqüinos, Streptococcus equi e Rhodococcus (Corynebacterium)
equi podem estar associadas à peritonite.
Achados clínicos – Os sintomas variam dependendo do tipo da peritonite
(primária ou secundária) e da presença de infecção bacteriana. A dor abdominal pode
ser generalizada e intensa, de modo que o animal proteja o abdome, ande com um
passo duro ou permaneça em decúbito. A pirexia é comum, mas pode ser suprimida
por inibidores de prostaglandinas. A distensão abdominal, que pode ser inaparente,
normalmente é devida ao acúmulo de exsudato peritoneal, podendo ser acompanha-
da de hemorragia, septicemia, toxemia, íleo paralítico, choque e adesões. A transudação
de líquido seqüestra eletrólitos e proteínas para a cavidade abdominal e intestino
atônico. A estase venosa leva a hipotensão, desequilíbrios ácido-básicos e colapso
circulatório. A toxemia e bacteremia contribuem para o estado de choque. A icterícia
pode estar presente na peritonite generalizada por bile. Os animais com peritonite
secundária podem também apresentar sintomas da doença primária.
Em pequenos animais, anorexia e depressão muitas vezes são acompanhadas
por vômitos, podendo não ocorrer eliminação de fezes. Desidratação, hipovolemia
e sepse podem resultar em hipotermia e morte por perda de volume líquido
extravascular.
Em eqüinos, os sintomas clínicos incluem cólica intensa, íleo, distensão intestinal
ao exame retal, refluxo gástrico e, ocasionalmente, diarréia. O cavalo fica inquieto
e pode deitar-se e rolar intermitentemente. Taquicardia, pulso fraco, perfusão
periférica ruim e pirexia são comuns. A peritonite séptica é freqüentemente fatal
apesar do tratamento intensivo.
Em bovinos, cessa a ruminação e a produção leiteira cai. A percussão abdominal
pode detectar timpanismo ruminal.
Diagnóstico – O histórico e os achados de exames físicos e retais levam à
suspeita de peritonite. As radiografias abdominais podem ser avaliadas em busca
de evidência de obstrução GI (dilatação intestinal, gás abdominal livre), ascite e
material estranho radiopaco. A perda de detalhe serosal (um aspecto de “vidro
embaçado”) é indicativa de líquido abdominal. A ultra-sonografia é um exame
auxiliar valioso para estimar tamanho, forma e conteúdo de outras vísceras (por
exemplo, vesícula biliar, próstata) suspeitas de serem causa de peritonite. A
paracentese abdominal deve ser utilizada em grandes animais para obtenção de
líquido para exame citológico e cultura, e em pequenos animais para confirmar o
caráter do líquido peritoneal. A lavagem peritoneal diagnóstica é utilizada quando
não é possível obter pequenas quantidades de líquido na paracentese. O exame
citológico do líquido abdominal pode revelar inflamação supurativa séptica ou
asséptica com infecção por uma ou mais bactérias. Os neutrófilos são degenerativos
na presença de sepse. A hipoglicemia e trombocitopenia podem acompanhar a
peritonite séptica.
Tratamento – O tratamento inicial deve ser dirigido para a estabilização das
conseqüências metabólicas da peritonite. Pode ser necessária a reposição de
líquidos, eletrólitos, plasma, ou sangue total para manter o débito cardíaco. A terapia
antimicrobiana de largo espectro (por exemplo, aminoglicosídios com penicilina) deve
ser iniciada, sendo alterada de acordo com os testes de sensibilidade. Uma vez que
Paralisia Faríngea 177

o animal está estabilizado, é realizada a cirurgia para exploração do abdome e reparar


quaisquer defeitos (por exemplo, uma víscera rompida). Segue-se uma lavagem
peritoneal completa com uma solução balanceada de eletrólitos isotônica e isotérmica,
à qual podem ser adicionados agentes antimicrobianos não irritantes. Algumas vezes
são utilizados drenos abdominais para permitir lavagem peritoneal pós-operatória e
drenagem peritoneal aberta (pequenos animais) para tratamento de peritonite grave.
A terapia antimicrobiana parenteral é continuada após a cirurgia para assegurar a
biodisponibilidade, e não é administrado alimento até que a condição do animal
melhore. Pode ser necessária a hiperalimentação ou alimentação por sonda alimen-
tar de gastrostomia e cateter de jejunostomia em animais anoréticos.

PARALISIA FARÍNGEA
É uma desordem de origem periférica ou central que ocorre mais freqüentemente
como um sinal de encefalite e é de significância clínica especial na raiva em bovinos
e cães. É também um importante sinal na encefalomielite. É observada em muitas
intoxicações, por exemplo, botulismo e envenenamento crônico pelo chumbo no
cavalo, provavelmente em algumas intoxicações fúngicas, bem como na paralisia
geral da paresia puerperal. A paralisia periférica é infreqüente e pode ser resultante
de lesões do nervo glossofaríngeo, compressão por tumores ou abscessos, ou
lesões decorrentes de fraturas da base do crânio. A paralisia faríngea no cavalo,
devida à infecção por Aspergillus e por erosão da parede das bolsas guturais (ver
pág. 895) é relativamente comum (ver também FARINGITE, pág. 872).
Achados clínicos – O animal perde subitamente sua capacidade de engolir;
partículas de alimento e saliva escorrem pela boca e nariz, e sons de gorgolejo
emanam da faringe. Se o interior da faringe for palpado, não são produzidas
contrações musculares. Estes animais morrem de pneumonia por aspiração ou
exaustão. Os sintomas de paralisia faríngea de origem central são parcial ou
completamente mascarados por outros sinais da doença primária. O diagnóstico
rápido da doença primária com freqüência faz com que a paralisia faríngea passe
despercebida.
Diagnóstico – É importante saber que em animais, especialmente cães e
bovinos, com paralisia faríngea, a raiva é uma das possíveis causas, que devem ser
consideradas antes de se iniciar o exame físico. É principalmente importante
determinar se a origem da paralisia é central ou periférica. A passagem de uma
sonda estomacal é suficiente para se diferenciar a paralisia periférica de uma
obstrução esofágica. A presença de corpos estranhos na boca do cavalo pode levar
a erros no diagnóstico. Espigas de milho e galhos podem se alojar entre as arcadas
superiores dos dentes faciais.
O prognóstico é sempre reservado. Quando a paralisia é de origem central, ele
depende do processo primário; quando periférica, depende da possibilidade de
remoção da causa. Existe sempre o risco de pneumonia por aspiração.
Tratamento – Não há tratamento para paralisia local, a não ser esforços para
remoção da causa da paralisia e não se devem tentá-los antes da realização de um
exame completo. Na paralisia de origem periférica, ou naquela presente na
encefalomielite eqüina, o animal deve ser alimentado e hidratado por sonda
estomacal. O controle da desidratação pode salvar a vida do animal. Fazer com que
o animal abaixe a cabeça, o máximo possível, auxiliará na drenagem dos fluidos
acumulados e ajudará na prevenção de pneumonia por inalação.
Salmonelose 178

SALMONELOSE
É uma doença que ocorre em todos os animais, causada por muitas espécies de
salmonelas e clinicamente caracterizada por uma ou mais das 3 síndromes
principais – septicemia, enterite aguda e enterite crônica. O animal portador,
clinicamente sadio, é um problema sério em todas as espécies hospedeiras. A
doença ocorre em todo o mundo e sua incidência aumenta com a intensificação da
produção do rebanho. Bezerros jovens, leitões, cordeiros e potros são suscetíveis
e geralmente desenvolvem a forma septicêmica (ver DIARRÉIA EM RUMINANTES
NEONATOS, pág. 217 e DOENÇAS DIARRÉICAS EM POTROS, pág. 225). Bovinos, ovinos
e cavalos adultos desenvolvem comumente enterite aguda e enterite crônica pode
ocorrer em leitões em crescimento e ocasionalmente em bovinos (ver também
DOENÇAS ENTÉRICAS EM BOVINOS, pág. 216, EM SUÍNOS, pág. 229, em OVINOS E
CAPRINOS, pág. 217, EM EQÜINOS, pág. 221 e EM CÃES e GATOS, pág. 279). A incidência
da salmonelose no homem tem aumentado nos últimos anos e os animais são
incriminados como reservatório principal. A transmissão para o homem ocorre via
água de beber, leite, carne e ovos contaminados; e comidas como misturas
empastadas que utilizam ingredientes contaminados; suínos e aves domésticas (ver
pág. 1935) são também importantes fontes de infecção.
Etiologia e epidemiologia – Conquanto muitas outras espécies possam causar
a doença, as Salmonella spp mais comuns são: em bovinos – S. typhimurium, S.
dublin e S. newport; em ovinos e caprinos – S. typhimurium, S. dublin, S. anatum e
S. montevideo; em porcos – S. typhimurium e S. choleraesuis; em cavalos – S.
typhimurium, S. anatum, S. newport, S. enteritidis e S. arizonae. Embora os padrões
clínicos não sejam distintos, as diferentes espécies de Salmonella tendem a diferir
em sua epidemiologia. O perfil plasmídio e o padrão de drogas resistentes são
algumas vezes marcadores úteis para estudos epidemiológicos. As fezes dos
animais infectados podem contaminar alimentos e água, leite, carnes frescas e
processadas em abatedouros, produtos de origem animal e vegetal utilizados como
fertilizantes ou ingredientes alimentares, pastagens e pradarias, e muitos materiais
inertes. Os microrganismos podem sobreviver por meses em áreas úmidas e
quentes, como baias de suínos em terminação, ou em canaletas d’água. Roedores
e pássaros selvagens são também fontes de infecção. A prevalência da infecção
varia entre espécies e países, sendo muito maior que a incidência de doença clínica
que é comumente precipitada por fatores estressantes, tais como privação súbita de
alimento, transporte, seca, superlotação, parto recente e administração de algumas
drogas. A doença é comum em cavalos hospitalizados que tenham sido submetidos
a procedimentos cirúrgicos prolongados. Os agentes antimicrobianos orais são
algumas vezes fatores de risco para esta doença.
A rota usual de infecção é a oral e, após a infecção, o microrganismo se multiplica
no intestino e causa enterite. A penetração de bactérias na lâmina própria e a
produção de citotoxina e enterotoxina provavelmente contribuem com a lesão
intestinal e diarréia. A septicemia pode se seguir com subseqüente localização no
cérebro e meninges, útero gestante, porções distais dos membros e extremidades
das orelhas e cauda, o que pode resultar respectivamente, em meningoencefalite,
aborto, osteíte e grangrena seca dos pés, cauda e orelhas. O microrganismo,
freqüentemente, também se localiza na vesícula biliar e linfonodos mesentéricos, e
os sobreviventes eliminam-no intermitentemente nas fezes.
Os bezerros raramente se tornam portadores, porém quase todos os animais
adultos o são, por períodos variáveis – até 10 semanas em ovinos e bovinos, até 14
meses em cavalos. Bovinos adultos infectados com S. dublin excretam o microrga-
nismo por anos. A infecção pode persistir nos linfonodos ou amígdalas, sem a
Salmonelose 179

presença de salmonelas nas fezes. Como portador latente, o animal pode estar
eliminando o microrganismo, ou mesmo tornar-se um caso clínico, sob estresse. Um
portador passivo contrai a infecção do ambiente, porém não sofre invasão, se
retirado do ambiente, deixando de ser um portador.
Bovinos e ovinos – Em bezerros e cordeiros, a doença é geralmente endêmica
em uma determinada fazenda, com surtos explosivos esporádicos. No bovino
adulto, a infecção subclínica com surtos ocasionais no rebanho pode ocorrer.
Agentes estressantes que precipitam a doença clínica incluem privação de água e
alimento, transporte demorado, parição recente e promiscuidade e superlotação de
animais confinados.
Porcos – Surtos de salmonelose septicêmica em suínos são raros e, quando
ocorrem, a infecção geralmente é introduzida por um porco infectado, recentemente
adquirido. A aquisição de porcos para engorda de rebanhos livres de salmonela e
o uso do sistema “all-in/all-out” em unidades comerciais de terminação e a integra-
ção vertical de produtores de suínos são efetivos para evitar a exposição à doença.
Cavalos – Muitos cavalos podem ser portadores. Em adultos, a maioria dos
casos ocorre logo após o estresse de cirurgia ou transporte, especialmente após a
compra, quando o animal sofre privação de alimento ou água e é superalimentado
quando chega ao destino. A salmonelose em cavalos hospitalizados por outras
causas é um problema sério em clínicas de eqüinos e haras. Nessas circunstâncias,
os portadores são constantemente reintroduzidos, o ambiente fica persistentemen-
te contaminado e um grande número de cavalos vulneráveis fica em risco. A
salmonelose septicêmica é também comum em potros; pode ser endêmica em uma
determinada propriedade ou ocorrer em surtos.
Achados clínicos – A septicemia é a síndrome usual em bezerros, cordeiros,
potros e leitões recém-nascidos e, como surto, pode ocorrer em leitões com até 6
meses de idade. A doença é aguda, com depressão acentuada e febre freqüente
(40,5 a 41,5°C) e a morte ocorre em 24 a 48h. Em porcos, uma descoloração
vermelho-escura a púrpura da pele é comum, especialmente nas orelhas e abdome
ventral. Podem ocorrer sinais nervosos em bezerros e porcos; os porcos podem
também sofrer de pneumonia. Neste caso, a taxa de mortalidade pode alcançar
100%.
A enterite aguda é a forma comum em adultos e pode também ocorrer em
bezerros geralmente ≥ 1 semana de idade. Inicialmente, há febre (40,5 a 41,5°C)
seguida por severa diarréia aquosa, algumas vezes, disenteria e, freqüentemente,
tenesmo. Em um surto em um rebanho, o aparecimento da diarréia pode levar várias
horas, período no qual a febre pode desaparecer. As fezes variam consideravelmen-
te: podem ter um odor pútrido e conter muco, fibrina e mesmo fragmentos de
membrana mucosa e em alguns casos, grandes coágulos sangüíneos. O exame
retal causa severo desconforto, tenesmo e comumente disenteria. Dor abdominal é
comum e severa no cavalo. Os cavalos afetados ficam severamente desidratados
e podem morrer 24h após o aparecimento da diarréia; a taxa de mortalidade pode
atingir 100%. Leucopenia e neutropenia acentuadas são características da doença
aguda no cavalo.
A enterite subaguda pode ocorrer em cavalos e ovinos adultos, em fazendas
onde a doença é endêmica. Os sinais incluem febre baixa (39 a 40°C), fezes moles,
inapetência e certa desidratação. Pode haver uma alta incidência de abortamentos
em vacas e ovelhas, algumas ovelhas morrem após o abortamento e uma alta taxa
de mortalidade, devida à enterite, é vista em cordeiros com menos de algumas
semanas de idade. Em bovinos, os primeiros sinais podem ser febre e abortamento,
seguidos por vários dias de diarréia.
A enterite crônica é a forma comum em porcos e bovinos adultos. Há diarréia
persistente, emaciação severa, febre intermitente e fraca resposta ao tratamento.
Salmonelose 180

As fezes são escassas e podem ser normais ou conter muco, estrias ou sangue. Em
porcos em crescimento, a constrição retal pode ser uma seqüela, se a parte terminal
do reto estiver envolvida. Os porcos afetados são anoréticos; perdem peso; seu
abdome se distende grosseiramente. A lesão é óbvia à palpação digital e à
necropsia.
Cães e gatos raramente desenvolvem septicemia por salmonela, embora sejam
relatados surtos em filhotes. Cães e gatos podem atuar, entretanto, como portado-
res assintomáticos e muitos dos tipos importantes de salmonela de outros mamífe-
ros domésticos e do homem são isolados deles.
Várias espécies de Salmonella spp aparecem em raposas, especialmente nos
filhotes e produzem enterite superaguda. O furão e outros carnívoros de zoológicos
podem ser afetados. Alimento contaminado é freqüentemente a fonte de infecção.
Vários roedores, por exemplo, cobaias, hâmsters, ratos, camundongos e coelhos
são suscetíveis (ver ASL, pág. 1181). Os roedores comumente atuam como fonte
de infecção nas fazendas onde a doença é endêmica. Tartarugas de estimação são
uma fonte comum de infecção para o homem, porém os riscos têm sido eliminados
pela restrição do comércio de tartarugas.
Diagnóstico – Depende dos sinais clínicos e do exame laboratorial das fezes,
dos tecidos de animais afetados, dos alimentos (incluindo todos os suplementos
minerais utilizados), da água e das fezes de roedores e pássaros selvagens que
vivem nas instalações. As síndromes clínicas são geralmente características, porém
devem ser diferenciadas de outras doenças similares. Em bovinos: colibacilose
entérica, coccidiose, criptosporidiose, forma alimentar da rinotraqueíte infecciosa
bovina, diarréia viral bovina, enterite hemorrágica por Clostridium perfringens dos
Tipos B e C, envenenamento por arsênio, deficiência secundária de cobre
(molibdenose), disenteria de inverno, paratuberculose, ostertagíase e diarréia
dietética. Em suínos: colibacilose entérica dos suínos neonatos e desmamados,
disenteria suína, campilobacteriose, e septicemias comuns dos suínos em cresci-
mento que incluem erisipela, cólera suína e pasteurelose. Em ovinos: colibacilose
entérica, septicemias por pasteurela ou Haemophilus sp, e coccidiose. Em cavalos:
septicemia por Escherichia coli, Actinobacillus equuli e estreptococos, e doença da
colite X.
As lesões são aquelas de septicemias ou de enterite fibrinonecrótica. Técnicas
de cultivo que envolvam a supressão fecal de E. coli são geralmente necessárias e
várias culturas fecais diárias podem ser requeridas para se isolar o microrganismo.
Culturas de sangue de animais com septicemia podem ser gratificantes, mas são
caras. Testes sorológicos são de difícil interpretação.
Tratamento – Embora o tratamento precoce da salmonelase septicêmica seja
muito útil, existem consideráveis controvérsias a respeito do uso de agentes
antimicrobianos para salmonelose entérica. Acredita-se que os antibióticos orais
possam alterar, de forma deletéria, a microflora intestinal, interferir no antagonismo
competitivo e prolongar o período de “eliminação” do microrganismo. Existe também
preocupação com o fato de que cepas de salmonelas resistentes aos antibióticos,
selecionadas por antibióticos orais possam, por sua vez, infectar o homem. Os
antibióticos de amplo espectro são utilizados parenteralmente para tratar a septice-
mia. Uma mistura de trimetoprim e sulfadiazina é efetiva para o tratamento da
salmonelose em bezerros. A ampicilina também pode ser útil para o tratamento da
salmonelose septicêmica, em todas as espécies. O tratamento deve ser contínuo e
diário, por até 6 dias. A medicacão oral deverá ser ministrada na água de beber, pois
os animais afetados ficam sedentos, devido à desidratação e porque o apetite está
geralmente diminuído. Uma fluidoterapia para corrigir o desequilíbrio ácido-básico
e a desidratação é necessária. Bezerros, bovinos adultos e cavalos necessitam de
grandes quantidades de fluidos. Antibioticoterapia e a lise do microrganismo liberam
Salmonelose 181

endotoxina. Se ocorrer choque endotóxico, os corticosteróides podem ser úteis. Os


cavalos afetados com salmonelose entérica aguda apresentam-se severamente
acidóticos e hiponatrêmicos, e necessitam ser tratados, inicialmente com bicarbo-
nato de sódio a 5%, administrado EV, numa dose de 5 a 8L/400kg de peso corporal.
Isto é seguido de medicação para o equilíbrio de eletrólitos, que contenha potássio,
para corrigir a hipocalemia que ocorre após a correção da acidose. A salmonelose
septicêmica em suínos, em geral, responde favoravelmente se tratada no início.
Entretanto, é difícil tratar a forma intestinal efetivamente em todas as espécies.
Embora a cura clínica possa ser alcançada, a cura bacteriológica é difícil, sobretudo
em animais adultos, pois os microrganismos estabeleceram-se no sistema biliar e
são intermitentemente eliminados no lúmen intestinal, o que causa recidiva da
enterite crônica e contaminação do ambiente.
Controle e prevenção – Este é um dos principais problemas por causa dos
animais portadores e da contaminação dos ingredientes alimentares. Os princípios
de controle baseiam-se na prevenção da introdução e na limitação da disseminação
no rebanho.
Prevenção da introdução – Todo esforço deve ser efetuado para impedir a
introdução de um portador; animais devem ser comprados diretamente apenas das
fazendas reconhecidamente livres da doença. A certeza de que os suprimentos
alimentares estão livres de salmonelas depende da integridade do fornecedor.
Limitação da disseminação nos rebanhos – Quando um surto ocorre, certos
procedimentos devem ser seguidos. Estes incluem: 1. identificação dos animais
portadores e descarte ou isolamento e tratamento rigoroso dos mesmos. Os animais
tratados devem ser retestados várias vezes até se ter certeza de que não são
portadores; 2. o uso profilático de antibióticos nos suprimentos de alimento ou água
pode ser considerado (porém os riscos foram mencionados anteriormente); 3. deve-
se restringir a movimentação dos animais na fazenda, para limitar a infecção ao
menor grupo possível. Misturar os animais ao acaso deve ser evitado; 4. os
suprimentos de água e alimentos devem ser protegidos da contaminação fecal; 5.
as instalações contaminadas devem ser rigorosamente limpas e desinfetadas; 6. o
material contaminado deve ser descartado cuidadosamente; 7. todas as pessoas
devem estar cientes dos riscos de se trabalhar com animais infectados e da
importância da sua higiene pessoal; 8. o uso de uma vacina deve ser considerado,
embora as salmonelas mortas não sejam bons antígenos. Uma vacina autógena
pode ser feita e algumas vacinas comerciais vivas e avirulentas estão disponíveis;
9. o estresse deve ser evitado ou minimizado, tanto quanto possível, particularmente
em rebanhos infectados.

Salmonelose em bezerros
Embora as salmonelas possam infectar bovinos mais velhos (ver anteriormente),
a maioria dos casos ocorre em bezerros > 1 semana de idade. O quadro clínico em
bezerros jovens é determinado pelo nível de imunidade materna transferida (como
na colibacilose) e da virulência de determinada salmonela. Os bezerros ficam lentos,
febris e geralmente anoréticos. Podem existir invasão sistêmica e também diarréia,
que varia de quantidades aumentadas de fezes pastosas a líquidas, marrons ou
amarelas até disenteria com odor fétido característico. A perda de peso é acentuada.
À necropsia, existem algumas petéquias e o intestino está mais congesto do que na
colibacilose. A salmonela pode ser isolada dos tecidos.
A terapia é geralmente sem sucesso. A profilaxia depende da prevenção do
contato com os microrganismos causadores. A vacinação é de pouco ou nenhum
valor.
Doença de Tyzzer 182

DOENÇA DE TYZZER
(Infecção por Bacillus piliformis)

É uma infecção bacteriana aguda que ocorre em uma grande variedade de


animais (ver também págs. 1235 e 1286) em todo o mundo. Em animais de
laboratório ocorrem epidemias fatais agudas. Infecções fatais esporádicas em
potros são comuns, porém a doença é rara em cães, gatos e bezerros. Ela afeta
principalmente animais jovens estressados. Drogas imunossupressivas e alguns
antibacterianos, especialmente sulfonamidas, predispõem os animais à doença.
Algumas espécies parecem resistentes, a não ser quando estressadas ou
imunodeprimidas; enquanto outras são suscetíveis sem imunossupressão.
Etiologia e patogenia – A causa é a Bacillus piliformis, uma bactéria móvel,
filamentosa, Gram-negativa, formadora de esporo e obrigatoriamente intracelular.
Ela não cresce em meio sem células, mas pode ser cultivada no saco vitelino de
embriões de galinha. A fase vegetativa é muito lábil; os esporos podem sobreviver
em camas usadas na temperatura ambiente por 1 ano e podem também sobreviver
à temperatura de 56°C por 1h.
A patogenia não é bem compreendida. A infecção, muito provavelmente, resulta
de exposição oral; as fontes possíveis incluem esporos infectantes no ambiente,
contato com animais carreadores e, em potros, ingestão de fezes de eqüinos. O local
inicial da infecção é o trato intestinal inferior com disseminação subseqüente via
sangue ou vasos linfáticos. A bactéria tem afinidade pelo intestino (células epiteliais
e da musculatura lisa), hepatócitos e miócitos cardíacos. Fatores estressantes como
captura, superpopulação, viagens, e más condições sanitárias parecem ser predis-
ponentes. A administração de sulfonamidas predispõe coelhos à doença. A morta-
lidade é maior na idade de desmame, exceto em potros, nos quais a doença ocorre
entre 1 e 6 semanas, com a maioria dos casos entre 1 e 2 semanas de idade. Em
algumas espécies, a doença foi identificada concorrentemente a outras moléstias,
por exemplo, com peritonite infecciosa felina, com cinomose e pneumonia micótica
em cães, e com enterite por coronavírus e criptosporídios em bezerros.
Achados clínicos – O período de incubação em potros é de 3 a 7 dias após a
infecção experimental; em condições naturais, o período é desconhecido. Os
sintomas variam ligeiramente entre as espécies. A maioria dos potros é encontrada
em coma ou mortos. Os sintomas clínicos, se observados, são de curta duração e
variam de algumas horas a 2 dias. Os sintomas são variáveis; incluem depressão,
anorexia, pirexia, icterícia, diarréia e recumbência. Terminalmente, há convulsões
e coma. Os animais de laboratório podem apresentar depressão, pelagem arrepiada
e graus variáveis de diarréia aquosa; no início de um surto, muitas vezes são
encontrados mortos.
Os testes clinicopatológicos são de pouco valor em animais de laboratório, uma
vez que morrem tão rapidamente. Em potros, as enzimas séricas sorbitol desidro-
genase, AST (SGOT), fosfatase alcalina, lactato desidrogenase e γ-glutamiltrans-
ferase estão elevadas. Há também hiperbilirrubinemia, leucopenia ou leucocitose,
hemoconcentração e, terminalmente, hipoglicemia profunda (≤ 20mg/dL).
Lesões – As lesões características ocorrem no fígado, miocárdio, e trato
intestinal. No fígado, ocorrem poucos ou disseminados focos brancos, amarelos ou
cinzentos de necrose < 2mm de diâmetro. A necrose é mais acentuada em potros
e, além disto, há hepatomegalia acentuada. Nos coelhos, ocorrem graves lesões
nos intestinos e coração. A porção terminal do íleo, ceco e cólon proximal se
apresentam difusamente avermelhados. Uma hemorragia difusa (“em escova”) está
freqüentemente presente na serosa do ceco. Áreas manchadas de necrose mucosal
estão presentes no ceco e cólon, juntamente com edema acentuado da parede do
Distúrbios Abomasais 183

ceco. Os linfonodos mesentéricos podem estar aumentados em volume e


edematosos. Podem ser observadas faixas brancas no miocárdio, especialmente
próximo ao ápice. As lesões intestinais e cardíacas são geralmente mais leves ou
ausentes nos outros animais.
Microscopicamente, focos distribuídos aleatoriamente e coalescentes de necro-
se no fígado estão associados à pouca ou moderada infiltração de neutrófilos e
macrófagos. As bactérias causadoras são encontradas em um padrão cruzado nos
hepatócitos viáveis na periferia dos focos necróticos. No ceco e cólon de coelhos,
áreas necróticas em mancha estendem-se profundamente até a camada muscular
externa, com infiltrados de neutrófilos mucosal e submucosal associado. Podem ser
encontrados microrganismos no epitélio, mucosa muscular e muscular externa do
intestino afetado. Quando há lesões cardíacas, consistem em focos de fragmenta-
ção de fibras, vacuolização, perda de estrias, e infiltração mínima de leucócitos.
O diagnóstico definitivo baseia-se na demonstração de microrganismos nas
secções dos tecidos com colorações especiais. O microrganismo se cora mal por
colorações de H/E e Gram. Com o corante de Giemsa, o bacilo cora-se bem no
fígado e epitélio intestinal e em esfregaços de órgãos infectados, mas mal em
musculaturas lisa e cardíaca. Os corantes de prata de Levaditi ou Warthin-Starry são
preferíveis a outros corantes, pois o bacilo cora-se bem no citoplasma de todas as
células infectadas.
Tratamento e controle – A doença geralmente afeta animais bem nutridos em
períodos de estresse. Em condições laboratoriais, o estresse é criado por drogas
imunossupressivas ou outros fatores que podem ser facilmente identificados. Em
muitos experimentos, o estresse pode estar envolvido como parte do protocolo e,
quando ocorre a doença, é devastadora. Quando ela ocorre em uma colônia, não
é recomendado o tratamento, pois ele prolonga a doença e possivelmente produz
animais carreadores. É melhor descartar toda a colônia e tentar reabastecê-la com
animais livres da doença.
Pouco se conhece sobre a eficácia dos antibióticos no tratamento; sabe-se que
alguns agravam a doença. O microrganismo é sensível à tetraciclina; parcialmente
sensível a estreptomicina, eritromicina, penicilina e clortetraciclina; e resistente às
sulfonamidas e ao cloranfenicol.
Em potros, a doença parece ser quase 100% fatal; apesar de ser provável que
alguns potros sobrevivam, isto não é sabido, pois é difícil de obter-se um diagnóstico
clínico definitivo. Uma vez que a doença está presente em uma fazenda, pode
ocorrer esporadicamente ano após ano. Os casos suspeitos devem ser inicialmente
tratados com dextrose a 50% EV, seguida de dextrose a 10% (lentamente EV), outra
fluidoterapia, e antibióticos EV. A maioria dos potros responde dramaticamente à
terapia com dextrose, mas sofrem recaída e morrem em algumas horas. Como a
doença em potros é esporádica e não muito contagiosa, normalmente não são
indicadas medidas preventivas específicas. A redução dos fatores que causam
estresse e imunossupressão diminui a incidência da doença.

DISTÚRBIOS ABOMASAIS
Os distúrbios abomasais incluem deslocamento do abomaso para a esquerda ou
para a direita (DAE; DAD), vólvulo abomasal, úlceras, e impactação. O deslocamen-
to ou o vólvulo abomasal ocorrem comumente em vacas de leite, particularmente as
de alta produção, mas também ocorrem em touros, bezerros e pequenos ruminan-
tes. São raros em bovinos de corte. As úlceras são observadas em bovinos de leite
Distúrbios Abomasais 184

e de corte e em bezerros, porém raramente são reconhecidas em pequenos


ruminantes. As impactações podem ser primárias, as quais são mais freqüentes em
gado de corte, ou secundárias, as quais se desenvolvem na maioria das vezes em
vacas de leite como forma de indigestão vagal. Em algumas ovelhas, as impactações
podem ter base hereditária.

DESLOCAMENTO ABOMASAL À ESQUERDA E À DIREITA,


E VÓLVULO ABOMASAL
Como o abomaso fica frouxamente suspenso pelos omentos maior e menor, ele
pode ser movido de sua posição normal na porção ventral direita do abdome para
o lado esquerdo ou direito (DAE, DAD), ou girar no seu eixo mesentérico enquanto
se desloca para a direita (vólvulo abomasal). Ele pode mover-se de sua posição
normal para um deslocamento à direita ou para um deslocamento à esquerda em
um período relativamente curto. O vólvulo abomasal pode ocorrer rápida ou
lentamente a partir de um DAD não corrigido.
Etiologia – Apesar de o DAE, DAD e vóvulo abomasal (também chamado de
TAD – torção abomasal à direita) serem com freqüência considerados separadamen-
te, há evidências de que existe uma etiologia de base comum: podem ser manifesta-
ções diferentes do mesmo processo ou de processos patológicos semelhantes.
A etiologia é multifatorial, apesar de atonia abomasal e produção de gás
contribuírem para o desenvolvimento do deslocamento ou vólvulo. A atonia está
relacionada a dietas com muito concentrado e pouca forragem, que resultam em
maior produção de ácidos graxos voláteis os quais reduzem a mobilidade abomasal.
Além disto, as dietas ricas em concentrados resultam em um aumento linear da
produção de gás (principalmente dióxido de carbono, metano e nitrogênio). Outros
fatores que contribuem incluem a menor mobilidade abomasal associada a hipocal-
cemia, doenças concorrentes (mastite, metrite e cetose), alterações na posição de
órgãos intra-abdominais, e predisposição genética.
Aproximadamente 80% dos deslocamentos ocorrem em até 1 mês após o parto;
no entanto, eles podem ocorrer a qualquer momento. O DAE é muito mais comum
que o DAD (8:1), e os casos de vólvulo ocorrem com freqüência ainda menor (25
DAE: 1 vólvulo abomasal). Em algumas vacas, o DAD é um precursor do vólvulo.
Patogenia: DAE – Como resultado da atonia abomasal e da produção de gás,
o abomaso parcialmente distendido por gás fica deslocado para cima ao longo da
parede abdominal esquerda lateralmente ao rúmen. O fundo e a curvatura maior do
abomaso são as porções primariamente deslocadas, o que por sua vez, provoca o
deslocamento do piloro e duodeno. Omaso, retículo e fígado são também rotacionados
em graus variáveis. Há provavelmente alguma interferência no funcionamento da
goteira esofágica devido à leve rotação em sentido horário de todos os comparti-
mentos do estômago, impedindo a passagem de ingesta. A obstrução do segmento
deslocado é incompleta e, apesar de ele conter algum gás e líquido, uma certa
quantidade ainda pode escapar, mas a distensão raramente é grave. Como não há
interferência no suprimento sangüíneo, os efeitos do deslocamento são inteiramen-
te devidos ao prejuízo à digestão e à passagem de ingesta, o que leva à inanição
crônica. Uma alcalose metabólica leve com hipocloremia e hipocalemia é comum.
A alcalose metabólica hipoclorêmica é provavelmente resultado da atonia abomasal,
secreção contínua de ácido hidroclorídrico para o interior do abomaso e a obstrução
do refluxo abomasal parcial, com seqüestro de cloreto no abomaso e conseqüente
refluxo para o rúmen. A hipocalemia provavelmente é devida à diminuição da
ingestão de alimentos ricos em potássio e secreção contínua de potássio pelo rim.
A cetose secundária é comum, podendo ser complicada pelo desenvolvimento da
síndrome da vaca obesa (ver pág. 536).
Distúrbios Abomasais 185

DAD e vólvulo abomasal – A atonia, produção de gás e o deslocamento do


abomaso parcialmente cheio ocorrem no DAD assim como no DAE. Ocorrem
também uma alcalose metabólica, com hipocalemia leve e hipocloremia. Após esta
fase de dilatação, a rotação do abomaso no seu mesentério resulta em um prejuízo
circulatório local e isquemia. O vólvulo ocorre normalmente no sentido anti-horário,
quando visto por trás. O omaso está deslocado medialmente e muitas vezes
envolvido no vólvulo, com oclusão do seu suprimento sangüíneo. O fígado e o
retículo estão também normalmente deslocados.Uma grande quantidade de líquido
se acumula no abomaso; o cloreto é também sequestrado ali. Ocorre uma alcalose
metabólica hipoclorêmica e hipocalêmica. O comprometimento do suprimento
sangüíneo para o abomaso, e muitas vezes para o omaso, eventualmente resulta
em necrose isquêmica do abomaso, assim como desidratação e insuficiência
circulatória. Conforme isto progride, a acidose metabólica se sobrepõe à alcalose
metabólica.
Achados clínicos – O histórico típico nos deslocamentos inclui anorexia,
geralmente uma falta de apetite para grãos, com um apetite diminuído ou até
normal para forragem, e diminuição na produção de leite (geralmente significati-
va, porém não tão dramática como na reticuloperitonite traumática ou outras
causas de peritonite). No vólvulo abomasal, a anorexia é completa, a produção
de leite é reduzida de modo mais marcante e progressivo, e a deterioração clínica
é rápida. A temperatura e as freqüências cardíaca e respiratória geralmente estão
normais nos deslocamentos abomasais. A porção caudal do gradil costal do lado
do deslocamento pode parecer “saltada”. A hidratação parece subjetivamente
normal nos deslocamentos, exceto em alguns casos de maior duração. A
mobilidade ruminal pode estar normal, mas freqüentemente está reduzida em
freqüência e força das contrações. As fezes geralmente estão reduzidas em
quantidade e mais líquidas que o normal.
Os achados físicos mais importantes e diagnósticos são a auscultação e
percussão simultâneas de um zumbido no abdome, que devem ser feitas na área
marcada por uma linha que vai da tuberosidade coxal à ponta do cotovelo, e daí até
a patela. O zumbido característico de um DAE é mais comumente localizado em uma
área entre as costelas 9 e 13, no meio do terço superior do abdome; entretanto, o
zumbido pode estar mais ventral e/ou caudal. Os zumbidos associados com uma
bolha gasosa no rúmen, ou ao colapso ruminal estão geralmente mais dorsais, são
menos ressonantes e estendem-se mais caudalmente através da fossa paralombar.
O exame retal pode confirmar o rúmen repleto de gás ou um rúmen extremamente
vazio, que se correlaciona ao zumbido destes casos. Os zumbidos associados ao
pneumoperitônio são tipicamente menos ressonantes, presentes em ambos os
lados do abdome, e inconsistentes na sua localização em avaliações repetidas.
Freqüentemente está presente uma cetose secundária, que se manifesta por
cetonúria, cetolactia, ou um odor de cetonas no hálito ou no leite. A cetose que ocorre
em associação ao deslocamento abomasal responde apenas transitoriamente ao
tratamento e recorre (quando comparada à cetose primária, que se desenvolve no
início da lactação de vacas de alta produção e responde permanentemente ao
tratamento, se instituído precocemente).
O zumbido associado ao DAD também se localiza mais comumente na área sob
as costelas 9 e 13. A diferenciação entre as várias causas de um zumbido no lado
direito é difícil, em alguns casos. Um pequeno zumbido sob as costelas 12 ou 13,
que se estende para a frente até a costela 10 é comum em vacas com um íleo
funcional por várias causas. Está mais freqüentemente associado a gás no cólon
ascendente e resolve-se com a correção do problema de base. A dilatação e rotação
do ceco são caracterizadas por um zumbido do lado direito. O zumbido estende-se
pela fossa paralombar dorsal na dilatação do ceco, e normalmente se localiza mais
Distúrbios Abomasais 186

caudalmente (bem dentro da fossa paralombar) na rotação do ceco, quando


comparada ao DAD. A palpação retal é útil na diferenciação de um DAD de uma
dilatação ou rotação do ceco. Outros zumbidos do lado direito são produzidos pelo
pneumoperitônio ou por gás no reto, cólon descendente, duodeno ou, ocasional-
mente, no saco ventral do rúmen (na indigestão vagal crônica).
Sons espontâneos de líquidos movendo-se ou gás borbulhando podem ser
auscultados na área do zumbido ou no balotamento e auscultação simultâneos do
abdome (sucussão). Os achados característicos no exame retal associados ao DAE
incluem um rúmen e rim esquerdo deslocados medialmente. O abomaso raramente
é palpável no DAE, e apenas ocasionalmente no DAD.
Os sintomas clínicos associados ao vólvulo abomasal são mais graves que no
deslocamento simples, devido ao comprometimento vascular. No entanto, um
vólvulo abomasal precoce é indistingüível de um DAD, exceto pela posição anatô-
mica identificada na cirurgia. Em contraste com os casos de deslocamento, um
animal com vólvulo abomasal tem taquicardia proporcional à gravidade do proble-
ma. A área do zumbido geralmente é maior (estendendo-se para a frente até a oitava
costela), e a quantidade de líquido de sucussão é maior. O animal fica mais
deprimido, e desenvolvem-se sintomas de fraqueza, toxemia e desidratação confor-
me a doença progride. A extremidade caudal do abomaso normalmente pode ser
palpada pelo reto. Quando sem terapia, o animal geralmente fica recumbente de 48
a 72h após desenvolver o vólvulo. A morte ocorre por choque e desidratação, sendo
súbita se o abomaso isquêmico romper-se.
Diagnóstico – No deslocamento ou vólvulo, o diagnóstico se baseia na presença
do zumbido característico na auscultação e percussão simultâneas, além de
eliminar-se as outras causas de zumbidos no lado esquerdo ou direito. Parto
recente, anorexia parcial e diminuição na produção de leite sugerem deslocamento.
Uma cetose que responde apenas temporariamente ao tratamento é compatível
com deslocamento abomasal, que pode ser intermitente. Os sintomas típicos no
exame físico (além do zumbido), exame retal e avaliação laboratorial também
sustentam o diagnóstico. Melena ou sinais de peritonite (febre, taquicardia, dor
abdominal localizada, pneumoperitônio) com um DAE podem indicar uma úlcera
abomasal sangrando ou perfurada, respectivamente.
Tratamento – Apesar de o rolamento da vaca em um arco de 70°, após deitá-la
sobre seu lado direito, corrigir a maioria dos DAEs, a recorrência é provável. A
cirurgia (vários procedimentos) é geralmente bem-sucedida.
O tratamento auxiliar de animais com deslocamento inclui o tratamento de
qualquer doença concorrente, por exemplo, mastite, metrite e cetose. O borogliconato
de cálcio subcutâneo ajuda a restaurar a mobilidade abomasal em muitos casos. No
deslocamento simples, as anormalidades de líquido e eletrólitos corrigem-se
espontaneamente se o animal tiver acesso à água e ao sal em bloco. A administra-
ção de água com eletrólitos (60g de cloreto de sódio, e 30g de cloreto de potássio
em 19L de água) via sonda estomacal é útil em casos de maior duração. Os animais
com desidratação significativa e desarranjos metabólicos exigem terapia EV.
Ocasionalmente, animais com deslocamento abomasal ou vólvulo apresentam
fibrilação atrial, que acredita-se ter origem metabólica ou neurogênica. Isto é
caracterizado por um ritmo cardíaco irregular com déficits de pulso. A correção do
deslocamento ou vólvulo resulta na correção da fibrilação atrial, apesar de alguns
casos não se resolverem por ≥ 1 mês.
O prognóstico após a correção de um DAE ou DAD simples é bom, com sucesso
relatado de 75 a 95%. O vólvulo apresenta um prognóstico variável e menos
favorável; uma grande quantidade de líquido no abomaso, um alto déficit de ânions,
uma freqüência cardíaca alta; uma baixa concentração plasmática de cloretos, e a
acidose metabólica estão associados a um prognóstico ruim.
Distúrbios Abomasais 187

Prevenção – A incidência de deslocamentos pode ser diminuída pela adaptação


às dietas ricas em concentrados e evitando-se fornecer chumbo na ração, alimen-
tação com uma ração completa ao invés de grãos duas vezes ao dia, manutenção
de quantidade adequada de forragem na dieta, evitando a hipocalcemia pós-parto
e minimizando ou tratando prontamente a doença concorrente.

ÚLCERAS ABOMASAIS
É uma doença de bovinos adultos e bezerros com várias manifestações
diferentes.
Etiologia e patogenia – Exceto pelo linfossarcoma do abomaso e pelas erosões
na mucosa abomasal que ocorrem nas doenças virais como a diarréia viral bovina,
peste bovina, e na febre catarral maligna bovina, as causas de ulceração abomasal
ainda não são bem compreendidas. Foram sugeridas diversas causas. Apesar de
a doença ocorrer em qualquer momento durante a lactação, as úlceras abomasais
são comuns em vacas leiteiras maduras de alta produção nas primeiras 6 semanas
após o parto, o que levou à especulação de que a causa seria uma combinação de
estresse do parto, começo de lactação e ração rica em grãos.
A doença aguda ocorre em bovinos de corte e leite após qualquer estresse
prolongado, como transporte ou doença, e em bovinos confinados que recebem
ração muito concentrada. As úlceras abomasais podem surgir associadas a distúr-
bios abomasais (deslocamento, vólvulo, ou impactação), linfoma, indigestão vagal,
ou problemas sépticos, ou parecem não estar relacionadas a outra doença.
As úlceras abomasais são comuns em bezerros amamentados manualmente
após serem desmamados do leite ou substituto e iniciarem a ingestão de forragem.
A maioria destas úlceras são subclínicas e não hemorrágicas. Podem ser causadas
pelo consumo de alimento seco. Ocasionalmente, bezerros alimentados com leite
< 2 semanas de idade são afetados por úlceras abomasais agudas hemorrágicas
que podem perfurar-se e causar morte rápida. Bezerros de corte bem nutridos e em
amamentação, com 2 a 4 meses de idade, podem ser afetados por úlceras
abomasais agudas quando soltos no pasto, no verão. Os tricobezoares abomasais
são comuns nestes bezerros, porém não é certo se as bolas de pêlo iniciaram a
úlcera ou se desenvolveram-se após a úlcera. Também são observadas úlceras e
erosões abomasais em bezerros com problemas sépticos, como enterite.
Achados clínicos – A síndrome varia dependendo se a ulceração é complicada
por hemorragia ou perfuração, e da intensidade da hemorragia ou da peritonite que
ocorre.
Um sistema de classificação é baseado na profundidade de penetração, ou no
grau de hemorragia ou peritonite provocado pela úlcera: Tipo I é uma erosão ou
úlcera sem hemorragia, Tipo II é hemorrágica, Tipo III é perfurada com peritonite
localizada aguda, e Tipo IV é perfurada com peritonite aguda difusa. Pode haver uma
única úlcera ou várias úlceras agudas e crônicas.
Os bovinos com úlceras abomasais sanguinolentas podem estar assintomáticos
exceto por sangue oculto intermitente nas fezes, ou podem morrer agudamente de
hemorragia maciça. Os sintomas clínicos comuns incluem leve dor abdominal,
ranger de dentes, anorexia de início súbito, taquicardia (90 a 100/min) e sangue
oculto nas fezes ou melena, que podem ser intermitentes. Os sintomas de perda
sangüínea ocorrem nas grandes hemorragias, incluindo taquicardia (100 a 140/min),
membranas mucosas pálidas, pulso fraco, extremidades frias, respiração curta e
rápida, e melena. Os sintomas mais graves incluem estase ruminal aguda, dor
abdominal generalizada com relutância em mover-se e um gemido ou grunhido
audível a cada respiração, fraqueza, e desidratação. Conforme o problema progride,
a temperatura corporal cai e o animal fica recumbente, morrendo em 6 a 8h.
Distúrbios Abomasais 188

Em geral, as úlceras sanguinolentas não se perfuram, e as úlceras perfuradas


não sangram no trato GI o suficiente para provocar melena; no entanto, hemorragia
e perfuração são observadas juntas ocasionalmente, em geral os de longa duração
e/ou associados a deslocamento do abomaso.
Os bezerros com ulcerações abomasais e tricobezoares podem apresentar um
abomaso cheio de gás e líquido que é palpável atrás do arco costal direito. A
palpação profunda pode revelar dor abdominal associada a peritonite local devida
a uma úlcera perfurada. Em bezerros, as úlceras perfurantes são mais comuns que
as hemorrágicas.
Lesões – A ulceração é mais comum ao longo da grande curvatura do abomaso.
A maioria das úlceras ocorre na parte ventral da região fúndica, com algumas na
borda entre as regiões fúndica e pilórica. A medida de uma única úlcera ou de úlceras
múltiplas varia de alguns milímetros a 5cm de diâmetro. A artéria afetada geralmente
é visível após a remoção da ingesta e do tecido necrótico de uma área ulcerada
sanguinolenta. A maioria dos casos de perfuração fica murado pelo omento, que
forma uma cavidade de 12 a 15cm de diâmetro a qual contém sangue degenerado
e debris necróticos. O material desta cavidade pode infiltrar-se amplamente na
gordura do omento. Podem ocorrer adesões entre a úlcera e os órgãos circundantes
ou a parede abdominal. Tricobezoares múltiplos são comuns no abomaso de
bezerros de corte com úlceras abomasais.
Diagnóstico – Em casos com apenas um pequeno sangramento e sintomas
clínicos leves, o diagnóstico pode exigir repetidas avaliações fecais para sangue
oculto. Outros problemas que podem causar anorexia parcial e diminuição da
produção leiteira devem ser descartados através dos exames físico e laboratorial,
incluindo a abdominocentese. Nos casos com melena, o diagnóstico pode ser
baseado apenas no exame físico. O hematócrito pode ajudar a determinar o grau de
hemorragia. Um exame de sangue oculto nas fezes pode confirmar melena. Os outros
problemas que resultam em sangue nas fezes devem ser eliminados. O sangue de
porções do trato GI distais ao abomaso reage nos testes de sangue oculto; normal-
mente é vermelho-vivo se originado no intestino grosso ou vermelho-escuro se
originado no intestino delgado. Os animais com linfossarcoma abomasal podem
apresentar uma síndrome de sangramento semelhante à associada às úlceras
abomasais, mas não respondem ao tratamento. Ocasionalmente, lesões orais,
faríngeas, e laríngeas sangram e o sangue engolido aparece nas fezes. Do mesmo
modo, abscessos pulmonares que formam-se como seqüelas de rumenites por
embolização nos pulmões e fígado podem erodir vasos sangüíneos e resultar em
hemoptises; se for engolido, este também pode resultar em melena. O sangue oculto
fecal também pode ser devido a vólvulo abomasal ou helmintos hematófagos.
O diagnóstico das úlceras abomasais perfurantes é baseado no exame físico e
na eliminação de outras causas de peritonite. A ulceração abomasal com perfuração
e peritonite local pode ser indistingüível da reticuloperitonite traumática crônica. Um
ímã no retículo (confirmado com auxílio de uma bússola) ou um histórico preciso de
ter administrado um ímã a uma porca antes do início dos sintomas diminui a
probabilidade de reticuloperitonite traumática. As radiografias reticulares podem
confirmar ou descartar a presença de corpos estranhos radiopacos no retículo. Em
alguns casos, há uma neutrofilia, possivelmente com desvio à esquerda. A avaliação
do líquido peritoneal confirmará a peritonite se a proteína total e a contagem de
células nucleadas estiverem elevadas. Raramente são observadas bactérias intra-
celulares ou neutrófilos degenerados porque, na maioria dos casos, a infecção é
rapidamente isolada. O diagnóstico de peritonite difusa devida à perfuração é
baseado no exame físico e na eliminação de outras causas. A ruptura de uma
víscera distendida, como no vólvulo abomasal ou rotação cecal provoca sintomas
semelhantes. Qualquer que seja a causa da peritonite difusa, o prognóstico é grave
Distúrbios Abomasais 189

devido a grande infecção e deterioração cardiovascular. Há neutrofilia com desvio


à esquerda acentuado e hemoconcentração. O líquido abdominal é geralmente de
fácil obtenção em grande quantidade e o nível da proteína está elevado; a contagem
de células nucleadas pode estar elevada, ou pode estar normal devido à diluição ou
utilização.
Tratamento – A maioria dos casos de úlceras abomasais é tratada medicamento-
samente. Isto inclui manejo da dieta, principalmente evitando concentrados (por
exemplo, milho muito úmido, silagem e concentrados muito moídos), e fornecendo
forragem de boa qualidade, assim como confinamento em baia e eliminação de outras
fontes de estresse. A antibioticoterapia de largo espectro (continuada por 1 a 2
semanas ou até que a temperatura retal esteja normal por 48h) é indicada nas úlceras
perfuradas. O uso de antiácidos é controverso, mas parece eficaz em alguns casos.
Como as drogas antiinflamatórias não esteróides podem contribuir para a ulceração,
seu uso é contra-indicado. O prognóstico para uma peritonite localizada associada a
uma úlcera abomasal perfurada é bom com tratamento medicamentoso e alteração
da dieta. A recuperação geralmente leva de 1 a 2 semanas e os animais que estão
plenamente recuperados em 1 a 2 semanas em geral não apresentam recaídas. Os
animais em fim de gestação tendem a ter uma progressão mais crônica, com
ulcerações repetidas e menor capacidade de isolar a perfuração. Normalmente a
cirurgia é indicada em casos de úlcera abomasal perfurada apenas quando o
abomaso está deslocado; no entanto, pode ocorrer contaminação abdominal signifi-
cativa no processo de rompimento das adesões e ressecção ou sutura da úlcera. Os
casos em que a área ulcerada é ressecada e suturada geralmente se recuperam.
Os animais com peritonite difusa após a perfuração de uma úlcera abomasal
raramente respondem à terapia e o prognóstico é grave. As tentativas de tratamento
consistem em fluidoterapia EV rápida e contínua, baseada no estado metabólico
corrente e antibióticos EV de largo espectro. Os corticosteróides são algumas vezes
utilizados em animais não prenhes inicialmente para contra-atacar o choque, mas
não devem ser continuados. Os poucos animais que recuperam-se de peritonites
difusas geralmente apresentam adesões abdominais massivas.
Nas úlceras sanguinolentas, podem ser necesárias transfusões de sangue e
fluidoterapia além do manejo da dieta, confinamento em baia e antiácidos orais. Se
a hemorragia é aguda, o hematócrito pode não refletir a gravidade do quadro, pois
o equilíbrio entre o líquido intra e extravascular após perda de sangue leva , 24h.
Além disto, a desidratação concomitante eleva o hematócrito. Geralmente é
necessária a transfusão se o hematócrito está < 14%. Normalmente não é neces-
sário o teste cruzado; uma única transfusão de 4 a 6L de sangue geralmente é eficaz.
Alguns bovinos exigirão mais de uma transfusão em vários dias. A recuperação
completa normalmente leva 1 a 2 semanas. O prognóstico é bom se não houve
desenvolvimento de anemia grave antes do início do tratamento. Se tratados
agressivamente, muitos se recuperam mesmo após desenvolverem anemia grave.
Quando o abomaso é deslocado em conjunção à úlcera sanguinolenta, o desloca-
mento deve ser corrigido assim que o animal esteja estável, pois geralmente resulta
no fim da hemorragia.
Prevenção – A incidência será reduzida se for minimizado o estresse através de
um bom manejo (espaço adequado, ventilação, acesso à agua, etc.), e providencian-
do-se uma dieta com forragem e concentrados suficientes com tamanho maior nas
partículas.

IMPACTAÇÃO ABOMASAL POR DIETA


A impactação ocorre durante os meses frios do inverno e quando bovinos são
alimentados com forragem de baixa qualidade. A doença é mais comum em vacas
Distúrbios Abomasais 190

de corte prenhes, que aumentam sua ingestão alimentar durante os dias extrema-
mente frios, numa tentativa de alcançar suas necessidades aumentadas. A doença
também ocorre em bovinos confinados, alimentados com uma variedade de rações
mistas, que contêm forragem picada ou triturada (palha, feno) e grãos de cereais,
e em vacas leiteiras no último estágio de prenhez, em dietas similares.
Etiologia – Considera-se como causa o consumo de quantidades excessivas de
forragens, que sejam baixas em proteína e energia digestíveis. A impactação com
areia pode ocorrer se bovinos pastejarem em solos arenosos ou se forem alimen-
tados com restos de culturas sujas, ou que contenha areia. Quando forragem inteira,
sem quantidades suficientes de grãos, é fornecida em dias extremamente frios, os
bovinos não ingerirão quantidades suficientes para satisfazer suas necessidades de
energia; deste modo, a forragem deve ser fornecida picada. A forragem picada é
comumente misturada com grãos, mas não em quantidades suficientes para
alcançar os requisitos energéticos. Assim, bovinos comerão mais desta mistura de
forragem de grãos picada, do que da forragem inteira, pois as partículas menores
passam através do antro cardíaco mais rapidamente, porém a impactação do
abomaso, omaso e rúmen pode ocorrer, dada a indigestibilidade relativa da forragem.
Os surtos podem afetar até 15% de todas as vacas prenhes, em determinadas
fazendas onde a temperatura ambiente caia até –26 ou menos por vários dias.
Patogenia – A forragem picada e os alimentos firmemente triturados passam
através do antro cardíaco mais rapidamente do que a forragem inteira e, talvez nesta
situação, a combinação da baixa digestibilidade do abomaso e ingestão excessiva,
leve ao acúmulo excessivo nos antros cardíacos e abomaso. Quando grandes
quantidades de areia são ingeridas, omaso, abomaso, intestino grosso e ceco
podem tornar-se impactados. A areia que se acumula no abomaso causa atonia
abomasal e dilatação crônica. Uma vez que a impactação do abomaso ocorreu, a
obstrução subaguda do trato GI superior desenvolve-se. Íons de hidrogênio e cloreto
são continuamente secretados no abomaso, a despeito da impactação, e resultam
em atonia abomasal e alcalose com hipocloremia. Graus variados de desidratação
ocorrem, pois os fluidos não se movem através do abomaso para serem absorvidos
no duodeno. Os íons potássio são também seqüestrados no abomaso, resultando
em hipocalemia. Ocorrem desidratação, alcalose, desequilíbrio de eletrólitos e
inanição progressiva. A impactação do abomaso pode ser severa o suficiente para
causar atonia abomasal irreversível.
Achados clínicos e lesões – Anorexia completa, fezes escassas, distensão
moderada do abdome, perda de peso, fraqueza e prostração são geralmente os
sintomas iniciais. A temperatura corporal é geralmente normal, porém pode ser
subnormal durante as épocas frias. Uma descarga nasal mucosa usualmente se
acumula nas narinas externas e no focinho; o focinho comumente está seco e
rachado, devido a deficiência do animal em lamber suas narinas e aos efeitos da
desidratação. A freqüência cardíaca pode estar aumentada e uma desidratação
suave é comum.
O rúmen está, em geral, atônico e cheio de conteúdo seco, mas pode conter
excesso de líquido, se o gado é alimentado com alimento finamente triturado. O pH
do líquido ruminal está geralmente normal (6,5 a 7). A atividade protozoária no rúmen
varia de normal a acentuadamente reduzida, com redução no número e atividade dos
microrganismos, demonstrados ao exame microscópico em pequeno aumento. O
abomaso impactado está geralmente no quadrante inferior direito no assoalho do
abdome. Em garrotes em confinamento e novilhas não prenhes, o abomaso e omaso
impactados podem ser facilmente palpáveis ao exame retal, mas pode não ser em
animais prenhes. A palpação profunda e a percussão forte do flanco direito podem
evocar um “grunhido”, como é comum na reticuloperitonite traumática aguda, prova-
velmente devido a distensão do abomaso e estiramento de sua serosa.
Distúrbios Abomasais 191

Bovinos seriamente afetados morrerão 3 a 6 dias após o aparecimento dos


sinais. A ruptura do abomaso ocorre em alguns casos, e morte a partir da peritonite
difusa aguda e choque ocorre precipitadamente, em algumas horas. Na impactação
por areia, existe uma considerável perda de peso, diarréia crônica com areia nas
fezes, fraqueza, prostração e morte, em algumas semanas.
Uma alcalose metabólica, hipocloremia, hipocalemia, hemoconcentração e
contagem global e diferencial de leucócitos dentro dos valores normais são comuns.
À necropsia, o abomaso está comumente aumentado até 2 vezes o seu tamanho
normal e impactado com conteúdo seco, semelhante ao do rúmen. O omaso pode
estar igualmente aumentado e impactado com conteúdo similar. O rúmen está
visivelmente aumentado e repleto de conteúdo seco ou fluido. O trato GI após o
piloro está caracteristicamente vazio e possui uma aparência seca. Graus variados
de desidratação e emaciação estão presentes. Se ocorre a ruptura do abomaso,
estão presentes lesões de peritonite difusa aguda.
Diagnóstico – O diagnóstico clínico é baseado no histórico nutricional, evidên-
cias clínicas de impactação e resultados laboratoriais. A doença deve ser diferen-
ciada da impactação abomasal secundária, como forma de indigestão vagal ou
impactação omasal.
A impactação do abomaso, como uma complicação da reticuloperitonite traumá-
tica, em geral, ocorre no final da gestação, comumente em apenas um animal, no
qual uma febre suave pode ou não estar presente e pode haver grunhidos quando
da palpação profunda do xifóide. O rúmen está usualmente aumentado e pode estar
atônico ou hipermóvel. Em muitos casos é impossível distinguir-se as 2 causas de
impactação do abomaso e uma laparotomia pode ser necessária para explorar o
abdome para lesões peritoneais.
Tratamento – O desafio é reconhecer-se os casos que responderão ao trata-
mento e os que não responderão, isto é, determinar quais os que devem ser
descartados imediatamente para abate. Vacas com abomaso severamente
impactado, que estão fracas e possuem taquicardia acentuada (100 a 120/min),
apresentam riscos de não responder ao tratamento e devem ser abatidas. O
tratamento racional consiste na correção da alcalose metabólica, hipocloremia,
hipocalemia e desidratação, e tentativa de movimentação do material impactado
com lubrificantes e catárticos ou esvaziamento cirúrgico do abomaso. Soluções
eletrolíticas balanceadas devem ser infundidas, EV, constantemente por até 72h, a
uma taxa diária de 100 a 130mL/kg de peso corporal. Alguns respondem muito bem
a essa terapia e iniciam a ruminação e passagem de fezes em 48h.
Sulfossuccinato sódico de dioctil (docusato de sódio) é administrado por tubo
estomacal, na dose de 120 a 180mL de uma solução a 25%, para um animal de
450kg, misturado com , 20L de água morna repetido diariamente, por 3 a 5 dias.
Alternativamente, pode ser utilizada uma solução de 10L de óleo mineral misturado
a um volume igual de água. A quantidade de óleo mineral pode ser aumentada para
15L/dia após o terceiro dia e mantida até que a recuperação seja aparente. O óleo
e o sulfossuccinato sódico de dioctil não devem ser administrados simultaneamente,
uma vez que o sulfossuccionato de dioctil pode potenciar a absorção de óleo mineral.
Uma resposta satisfatória não pode ser esperada em < 24h; a maioria dos bovinos
que responde ao tratamento o fará ao final do terceiro dia, após o início do tratamento.
A cirurgia pode ser considerada, mas os resultados são freqüentemente sem
sucesso, provavelmente devido à atonia abomasal, que parece piorar após a
cirurgia. Uma alternativa pode ser feita uma rumenotomia, esvaziar o rúmen e
infundir sulfoccinato sódico de dioctil diretamente no abomaso através do orifício
retículoomasal em uma tentativa de amolecer e promover a evacuação dos
conteúdos do abomaso. Impactações secundárias que ocorrem como uma seqüela
de reticuloperitonite traumática ou vólvulo abomasal geralmente mostram sinais de
Distúrbios Abomasais 192

indigestão vagal, e a impactação abomasal pode ser diagnosticada no momento da


cirurgia exploratória.
A indução do parto pela utilização de dexametasona (20mg, IM) pode ser
indicada em bovinos afetados que estejam a 2 semanas do parto a termo e nos quais
a resposta ao tratamento, por alguns dias, não tenha obtido sucesso. O parto pode
auxiliar a recuperação, dada a redução do volume intra-abdominal. Na impactação
por areia, bovinos afetados devem ser retirados do solo arenoso e alimentados com
feno de boa qualidade e uma mistura de gramíneas, que contenha melaço e
minerais. Bovinos severamente afetados devem ser tratados com grandes quanti-
dades de óleo mineral, ≥ 15L/dia.
Controle – A prevenção é possível pelo fornecimento dos nutrientes necessários
para vacas de corte prenhes estabuladas. Os requisitos devem ser ajustados para
climas frios e intempéries, quando as necessidades energéticas podem ser de 30
a 40% maiores que nos climas quentes. Quando forragem de baixa qualidade for
utilizada para vacas de corte prenhes estabuladas, esta deve ser analisada para
proteína bruta e energia digestível. Com base na análise, o grão é geralmente
adicionado à ração para suprir os requisitos de energia e proteína.
As exigências nutricionais do gado de corte (ver pág. 1423) são um guia para o
uso em condições abaixo da média; níveis nutricionais mais elevados que os
indicados podem ser necessários, particularmente durante os períodos de estresse
por frio. Quantidades adequadas de água de beber fresca devem ser fornecidas em
todas as épocas e a prática de forçar as vacas invernadas a obter suas necessidades
de água pela ingestão de neve, enquanto recebem forragem de baixa qualidade, é
perigosa. Se a forragem de baixa qualidade deve ou não ser picada ou triturada para
vacas prenhes, é uma controvérsia. A ingestão voluntária diária da forragem de
baixa qualidade pode ser aumentada pela picagem ou trituração, porém nenhum
dos dois métodos de processamento aumenta a qualidade ou digestibilidade; de
fato, a digestibilidade é, geralmente, diminuída. Se o consumo aumentado durante
os meses frios excede a capacidade física, pode ocorrer a impactação do abomaso.

TIMPANISMO ABOMASAL EM CORDEIROS


Os sistemas alimentares que permitem aos cordeiros beberem grandes quantida-
des de sucedâneo do leite, em intervalos infreqüentes, os predispõem ao timpanismo
abomasal. Esta situação pode ocorrer em alimentação à vontade, quando o sucedâ-
neo do leite for mantido a , 15°C ou mais e, particularmente, se este não está
disponível por várias horas, por exemplo, os cordeiros alimentados com sucedâneo
do leite aquecido à vontade, duas vezes ao dia, parecem ser muito suscetíveis ao
timpanismo abomasal. A alimentação à vontade com sucedâneos frios, que contêm
pouco ou nenhum ingrediente insolúvel e adequadamente resfriado, provoca pouco
ou nenhum timpanismo. Pensa-se que a causa é um superenchimento súbito do
abomaso, seguido por proliferação de microrganismos que liberam quantidades
excessivas de gás, que não pode escapar do abomaso. A distensão severa causa
compressão das vísceras abdominais e torácicas e dos vasos sangüíneos ligados
a elas. Isto resulta em asfixia e insuficiência cardíaca aguda. Os cordeiros afetados
terão seus abdomes visivelmente distendidos 1h após a alimentação e morrerão
alguns minutos depois de a distensão abdominal tornar-se clinicamente óbvia. À
necropsia, o abomaso está macroscopicamente distendido por gás, fluido e sucedâ-
neo do leite que geralmente não está coagulado. A mucosa abomasal é hiperêmica.
A adição de formalina (formaldeído a 37%), a uma concentração de 0,1 a 20%
dos sucedâneos sólidos do leite, minimizará a incidência do timpanismo abomasal
sem afetar o desempenho dos cordeiros aleitados artificialmente.
Obstruções Intestinais Agudas, Gr An 193

OBSTRUÇÕES INTESTINAIS AGUDAS,


GR AN
As obstruções intestinais ocorrem em todas as espécies de grandes animais,
mas são mais comuns nos eqüinos. Os bovinos são os ruminantes mais freqüente-
mente afetados; o diagnóstico em ovinos e caprinos é raro. Excetuando-se as
hérnias inguinais, as obstruções intestinais são reconhecidas infreqüentemente nos
suínos. Em geral, as obstruções são mecânicas ou funcionais, ocorrendo em
qualquer parte do trato intestinal. Elas podem interromper o fluxo de ingesta com ou
sem compromisso vascular (estrangulação ou obstrução simples, respectivamente).
Etiologia e patogenia – A causa incitadora de uma obstrução intestinal muitas
vezes não é determinada. As obstruções funcionais estão associadas a alterações
na motilidade intestinal, muitas vezes devidas a fatores dietários ou de manejo,
infecções parasitárias, enterites, ou peritonites. As obstruções mecânicas (bloqueio
físico da ingesta) ocorrem devido a anormalidades no lúmen intestinal, na parede ou
externas ao trato.
As causas específicas nos bovinos incluem dilatação cecal e rotação, intussus-
cepção, vólvulo do intestino delgado, e vólvulo na raiz do mesentério. A motilidade
diminuída provocada por acumulação de ácidos graxos voláteis, possivelmente
relacionada a rações ricas em concentrados ou aumento abrupto na razão concen-
trados – forragem, foi sugerida como causa de dilatação e rotação cecal em bovinos,
que também foi associada a prenhez avançada e íleo devido a doença concomitan-
te. Acredita-se que as intussuscepções sejam resultado de movimentos peristálticos
irregulares relacionados a enterites, parasitas intestinais, desordens na dieta e
tumores do intestino. A motilidade intestinal alterada também pode causar vólvulo
intestinal. As obstruções do intestino delgado podem ocorrer devido a uma varieda-
de de faixas fibrosas (por exemplo, adesões, cintas parovarianas, ligamento
falciforme), espessamento mural (por exemplo, adenocarcinoma intestinal), mas-
sas extramurais (por exemplo, linfossarcoma, necrose da gordura, abscessos
abdominais) ou herniações (inguinal ou umbilical). As adesões e os abscessos
abdominais podem ser formados subseqüentemente a peritonite, injeções IP, ou
cirurgia abdominal anterior.
Em eqüinos, são comuns as obstruções funcionais temporárias, assim como as
impactações alimentares, que normalmente envolvem a flexura pélvica. Infecção
por parasitas e/ou migração, anormalidades dentárias, e fatores de dieta ou manejo
muitas vezes estão implicados. As impactações e outras obstruções luminais
podem resultar de alimentos grosseiros, ingestão reduzida de água, enterólitos, ou
material estranho ingerido. Os locais de impactação, além da flexura pélvica, são
cólon menor, cólon transverso, cólon dorsal direito, ceco e íleo. As outras causas de
obstrução intestinal em eqüinos são o vólvulo (torção no eixo mesentérico), torções
(no sentido do eixo maior do intestino), e deslocamento do cólon maior (ascenden-
te); além de vólvulo de todo ou parte do intestino delgado. A motilidade alterada e
possivelmente exercício extenuante e rolamento podem ser causas iniciais. As
éguas de cria podem estar predispostas ao vólvulo, torção ou deslocamento do
cólon ascendente durante a gestação e logo após o parto. A obstrução ocorre devido
ao encarceramento do intestino (geralmente delgado) pela herniação através do
umbigo, canal inguinal, diafragma, falhas no mesentério ou forame epiplóico; ou
devido a cintas fibrosas (adesões, cintas mesodiverticulares, ou hastes de lipomas
pedunculados). Os garanhões e potros machos de puro sangue inglês desenvolvem
hérnias inguinais e escrotais com maior freqüência que os de outras raças. As
hérnias diafragmáticas e falhas mesentéricas podem ser congênitas ou induzidas
por trauma. As adesões nos eqüinos, na maioria das vezes, são seqüelas de
Obstruções Intestinais Agudas, Gr An 194

migrações parasitárias, que também ocorrem freqüentemente após cirurgias abdo-


minais; no entanto, a maioria das adesões são clinicamente assintomáticas. Os
lipomas pedunculados são comuns em cavalos mais velhos. As intussuscepções
ileocecais, cecocecais, cecocólicas e do intestino delgado também ocorrem. Os
linfossarcomas e outras neoplasias abdominais, assim como os abscessos abdomi-
nais, podem causar obstrução intestinal.
Achados clínicos – A obstrução intestinal nos eqüinos geralmente é manifes-
tada como dor abdominal (ver CÓLICA, pág. 201). Os sintomas de dor abdominal em
bovinos incluem pisoteamento, esticar-se, escoicear o abdome e, com menor
freqüência, rolar e mugir. Estes sintomas são geralmente mais sutis que nos cavalos
e normalmente estão relacionados a distensão do intestino delgado, tensão no
mesentério intestinal (devida ao peso da porção distendida), ou prejuízo vascular.
Apesar de observada em apenas uma pequena porcentagem de casos, a causa
mais comum em bovinos, normalmente chamada de indigestão, é uma obstrução
funcional que resulta de uma mudança abrupta na dieta. Os sintomas de dor são
relativamente consistentes, mas muitas vezes transitórios nas intussuscepções,
sendo observados apenas em alguns casos de rotação cecal. Os bovinos com
vólvulo do intestino delgado na raiz do mesentério estão gravemente afetados.
Normalmente os bovinos com obstrução intestinal estão anoréticos e eliminam
fezes em pouca ou nenhuma quantidade, e as vacas em lactação produzem menos
leite. As fezes eliminadas podem estar cobertas de muco ou misturadas ou cobertas
com sangue. Um sangue espesso e vermelho escuro misturado com poucas fezes
é característico de sangramento no intestino delgado, particularmente do associado
à intussuscepção. Podem também ocorrer em indigestões graves. O sangue
proveniente do cólon ou reto é geralmente de um vermelho mais vivo. A melena é
típica do sangramento abomasal.
A distensão abdominal, normalmente com um zumbido na auscultação e percus-
são simultâneas, ocorre no quadrante abdominal superior direito na rotação cecal.
A dilatação cecal não provoca distensão abdominal, mas geralmente há um zumbido
na fossa paralombar dorsal. Na dilatação e rotação cecais, o ceco está palpável por
via retal com o ápice apontando para a entrada pélvica (dilatação) ou como uma
estrutura curva, com formato de câmara de ar de pneu (rotação). A motilidade
ruminal geralmente está presente, e os desarranjos metabólicos e cardiovasculares
tendem a ser leves, exceto nas rotações cecais de longa duração.
Algumas vezes é observada uma distensão abdominal no quadrante inferior
direito nas distensões do intestino delgado. As alças distendidas do intestino podem
ser palpáveis no exame retal, e pode-se ouvir líquido quando o abdome é balotado
e auscultado simultaneamente. Podem ser ouvidas pequenas áreas de ressonância
timpânica na auscultação e percussão simultâneas. A intussuscepção e cintas
fibrosas que causam obstrução do intestino delgado podem ser palpadas pelo reto,
em alguns casos.
As alterações profundas nos parâmetros cardiovasculares, como taquicardia,
coloração anormal das membranas mucosas, tempo de preenchimento capilar
aumentado, e desidratação estão mais comumente associadas às obstruções
estrangulantes, como o vólvulo do intestino delgado. O vólvulo do intestino delgado
ou vólvulo na raiz do mesentério é caracterizado por um início agudo e deterioração
cardiovascular rápida. Isto em contraste com as dilatações ou rotações cecais ou
com as intussuscepções que podem prolongar-se por vários dias.
Os desarranjos metabólicos variam de alcalose metabólica hipocalêmica e
hipoclorêmica nas obstruções do intestino delgado e duodeno de longa duração, até
graves acidoses metabólicas nas obstruções estrangulantes. Normalmente, não
ocorrem desarranjos metabólicos nas obstruções funcionais leves e obstruções
mecânicas iniciais (simples), em especial se uma parte relativamente distal do trato
Timpanismo em Ruminantes 195

intestinal está envolvida. Pode se desenvolver hipocalcemia, presumivelmente


devido à menor absorção de cálcio pelo duodeno.
As alterações do líquido peritoneal refletem o grau de peritonite, podendo auxiliar
no diagnóstico dos bovinos e eqüinos, apesar dos resultados parecerem ser mais
variáveis nos bovinos. As obstruções estrangulantes são caracterizadas por um
aumento no número de hemácias, com elevações subseqüentes na proteína total
e na contagem de células nucleadas devido ao extravasamento através da parede
do intestino. Os neutrófilos tornam-se degenerativos, e são observadas bactérias
Gram-positivas e Gram-negativas intracelulares conforme é perdida a integridade
da parede intestinal. As partículas vegetais na cavidade peritoneal são indicativas
de ruptura intestinal ou enterocentese involuntária. As obstruções simples com
grande dilatação intestinal podem estar associadas a elevações na proteína total e,
com menor freqüência, a elevações na contagem de células nucleadas. A análise
do líquido peritoneal é normal na maioria das obstruções mecânicas e funcionais
mais simples. Quando há neoplasias, algumas vezes são identificadas células
neoplásicas no líquido peritoneal.
Tratamento – Para o tratamento das obstruções dos eqüinos, ver CÓLICA, página
201. O tratamento das obstruções funcionais nos bovinos é geralmente sintomático
e de suporte após a identificação e eliminação da causa inicial (por exemplo,
ingestão excessiva de grãos), dando-se tempo para que a motilidade intestinal
normal retorne. Alguns casos exigem correção (VO ou EV) de desidratação ou de
desequilíbrios eletrolíticos. As vacas em lactação muitas vezes são beneficiadas
pela administração subcutânea do borogliconato de cálcio, devendo-se tratar a
cetose secundária, quando presente. Ocasionalmente, os casos de obstrução
funcional exigem descompressão cirúrgica.
As obstruções mecânicas quase sempre exigem cirurgia. A terapia antibiótica
profilática deve ser iniciada pré-operatoriamente; a terapia de suporte, como
líquidos, eletrólitos e cálcio, deve ser administrada quando necessária. O prognós-
tico na maioria das obstruções funcionais é bom com a terapia de suporte apropri-
ada, particularmente se a causa é identificada e eliminada.
Os eqüinos que exigem laparotomia exploratória para corrigir uma obstrução
intestinal apresentam uma taxa de sobrevida total de 50%. As obstruções estrangulantes
possuem uma menor taxa de sobrevida quando comparadas às obstruções simples,
mas uma intervenção cirúrgica precoce pode melhorar o prognóstico.
Nos bovinos, a dilatação e a rotação do ceco apresentam um bom prognóstico,
apesar de haver recidiva em 10% e os casos de rotação cecal de longa duração
poderem desenvolver necrose isquêmica. Os casos de obstrução do intestino
delgado passíveis de ressecção e anastomose possuem um prognóstico de
razoável a bom. As vacas com vólvulo do intestino delgado ou na raiz do mesentério
têm um mau prognóstico, a não ser que seja diagnosticado e cirurgicamente
corrigido em poucas horas.
Prevenção – As alterações abruptas na alimentação e manejo, ingestão inade-
quada de água, infecções parasitárias, anormalidades dentárias e acesso a alimen-
tos grosseiros e material estranho devem ser evitados ou corrigidos.

TIMPANISMO EM RUMINANTES
(Timpanismo ruminal)

É uma superdistensão do rúmen e retículo com os gases de fermentação, tanto


na forma de uma espuma persistente misturada ao conteúdo ruminal, quanto na
Timpanismo em Ruminantes 196

forma de gás livre separado da ingesta. Apesar de ser predominantemente um


distúrbio dos bovinos, pode também ocorrer em ovinos.
Etiologia: timpanismo ruminal primário (timpanismo espumoso) – A causa
desse tipo de timpanismo é a retenção dos gases normais da fermentação em uma
espuma estável. Isto ocorre principalmente em pastos ricos em leguminosas ou com
dietas ricas em grãos, mas a suscetibilidade individual pode ser influenciada
geneticamente. A coalescência das pequenas bolhas de gás é inibida e a pressão
intra-ruminal aumenta porque a eructação não pode ocorrer. Animais suscetíveis
possuem uma maior concentração de pequenas partículas alimentares em suspen-
são no rúmen e o conteúdo é formado por pequenas bolhas amarelas antes da
alimentação. O efeito imediato da alimentação é provavelmente o de suprir nutrien-
tes para interromper a fermentação microbiana. Entretanto, o principal fator deter-
minante do timpanismo é a natureza do conteúdo ruminal. As proteínas das plantas
são os agentes espumantes primários. O conteúdo de proteínas e o grau de
digestibilidade da forragem refletem seu potencial como causador do timpanismo.
Num período superior a 24h, a forragem timpanizadora e fatores desconhecidos do
animal combinam-se para manter uma elevada concentração de pequenas partícu-
las alimentares e aumentam a suscetibilidade ao timpanismo. Leguminosas, como
a alfafa e o trevo branco, possuem uma maior porcentagem de proteínas e são
digeridas mais rapidamente. Em bovinos alimentados com alfafa, as pequenas
partículas alimentares contém , 50% de proteína. Outras leguminosas, como o
cornichão e pé-de-galinha, são ricas em proteína, mas não causam o timpanismo,
provavelmente porque elas contêm taninos condensados, que precipitam a proteí-
na, e são digeridas mais lentamente que a alfafa ou o trevo branco. O timpanismo
por leguminosas ocorre mais comumente quando o gado é colocado em pastagens
exuberantes, particularmente aquelas dominadas por leguminosas de rápido cres-
cimento, mas também pode ocorrer com o uso de feno de boa qualidade.
A causa da espuma no timpanismo em confinamento é incerta, mas pensa-se ser
devida tanto à produção de iodo insolúvel por certas espécies de bactérias ruminais
em bovinos alimentados com dietas altas em carboidratos, quanto à retenção de
gases da fermentação pelas finas partículas do alimento farelado, de uso comum
nos confinamentos. A matéria finamente particulada, como a do grão em confina-
mento, pode afetar acentuadamente a estabilidade da espuma. O timpanismo
ocorre mais comumente em gado que permanece em dieta exclusiva de grãos por
30 a 60 dias. Esse tempo pode ser devido ao aumento no nível de ingestão dos grãos
ou ao tempo que leva para as bactérias do rúmen produtoras de muco proliferarem
em número suficientemente grande.
Timpanismo ruminal secundário (timpanismo livre de gás) – A obstrução
física da eructação ocorre na obstrução esofágica causada por um corpo estranho,
estenose ou compressão de aumentos de volume de fora do esôfago (como nas
linfadenopatias). Interferências com a função do sulco esofágico na indigestão vagal
e hérnia diafragmática podem causar timpanismo ruminal crônico. Isso também
pode ocorrer no tétano. Tumores e outras lesões do sulco esofágico ou parede
reticular são causas menos comuns de timpanismo por obstrução. Pode existir
também interferência com as vias nervosas que mantêm o reflexo da eructação.
Lesões da parede do retículo (que contém receptores de tensão e receptores que
diferenciam gás, espuma e líquido) podem interromper o reflexo normal que é
essencial para o escape normal de gás do rúmen.
O timpanismo ruminal também pode ser secundário à atonia ruminal de início
agudo que ocorre na anafilaxia e na intoxicação por grãos. Isso causa redução do
pH ruminal e, possivelmente, esofagite e ruminite que podem interferir com a
eructação. O timpanismo ruminal crônico ocorre com relativa freqüência em bezer-
ros acima de 6 meses sem causa aparente; normalmente cura-se espontaneamente.
Timpanismo em Ruminantes 197

Posturas incomuns, em particular decúbito lateral, são comumente causa de


timpanismo secundário; ruminantes podem morrer acidentalmente de timpanismo
caso se deitem em decúbito dorsal ou outras posições que restrinjam os movimentos
de seus membros, como em veículos de transporte lotados ou canais de irrigação.
Achados clínicos – O timpanismo é causa comum de morte repentina. Como não
são observados de perto, bovinos de corte em regime extensivo, vacas leiteiras secas
e gado confinado geralmente são encontrados mortos. As vacas leiteiras em lactação,
que são observadas regularmente, começam a apresentar sintomas, em geral, 1h
depois de terem sido alimentadas com uma dieta timpanizadora. Elas podem
apresentar timpanismo no primeiro dia após terem sido colocadas na pastagem, mas
o mais comum é que apresentem timpanismo no segundo ou terceiro dia.
No timpanismo primário em pastagens, uma grande distensão do rúmen ocorre
repentinamente, e a distensão do flanco esquerdo pode ser tão severa que o
contorno da fossa paralombar estende-se sobre a coluna vertebral e todo abdome
aumenta de volume. Com o avanço do timpanismo, a pele sobre o flanco esquerdo
torna-se progressivamente mais esticada e, em casos severos, não pode ser
“pegada”. A dispnéia e os roncos são marcados e acompanhados por respiração
pela boca, protrusão da língua e extensão da cabeça. Ocasionalmente, ocorrem
vômitos. A motilidade do rúmen não aumenta até o animal ser timpanizado
severamente. Se o timpanismo continuar a piorar, o animal entrará em colapso e
morrerá. A morte pode ocorrer em 1h após o começo do pastejo, porém é mais
comum , 3 a 4h após o aparecimento dos sinais clínicos. Num grupo de bovinos
afetados, há normalmente muitos casos de timpanismo clínico e alguns de pequena
a moderada distensão abdominal.
No timpanismo secundário, o excesso de gás está normalmente presente como
uma capa de gás livre e situada acima dos conteúdos ruminais sólido e líquido,
embora o timpanismo espumoso possa ocorrer na indigestão vagal quando há um
aumento da atividade ruminal. No timpanismo por gás livre, a passagem de sonda
estomacal ou a paracentese resulta na expulsão de uma grande quantidade de gás
e redução da distensão.
Lesões – Os achados de necropsia são característicos. Há congestão acentua-
da e hemorragia dos linfonodos da cabeça e pescoço, do epicárdio e do trato
respiratório superior. Os pulmões estão comprimidos e a hemorragia intrabrônquica
pode ocorrer. O esôfago cervical revela congestão e hemorragia, mas a porção
torácica do esôfago está pálida e esbranquiçada – a demarcação conhecida como
“linha de timpanismo” do esôfago. O rúmen está distendido, mas o conteúdo
normalmente está muito menos espumoso que antes da morte. O fígado está pálido,
devido à expulsão de sangue do órgão.
Diagnóstico – Comumente o diagnóstico clínico do timpanismo espumoso é
óbvio. As causas do timpanismo secundário têm de ser reveladas pelo exame clínico
para determinar as causas da eructação.
Tratamento – Nos casos de risco de vida, uma rumenotomia de emergência é
necessária. Isso é seguido por uma liberação explosiva do conteúdo ruminal e
acentuado alívio do animal. A recuperação é geralmente tranqüila com apenas
pequenas complicações ocasionais.
Um trocarte e uma cânula devem ser usados para um alívio imediato, embora o
tamanho padronizado do instrumento não seja suficiente para permitir que a espuma
viscosa e estável, nos casos superagudos, escape rápido o suficiente. Um instru-
mento perfurante maior (2,5cm de diâmetro) é necessário, mas requer que uma
incisão seja feita através da pele antes da sua inserção nas camadas musculares
e no rúmen. Se a cânula falhar para reduzir o timpanismo e se a vida do animal estiver
comprometida, uma rumenotomia de emergência deve ser realizada. Se a cânula
fornecer algum alívio, o agente antiespumante de escolha pode ser administrado
Timpanismo em Ruminantes 198

através da mesma, que pode ser deixada no lugar até que o animal retorne ao
normal, geralmente após algumas horas.
Quando a vida do animal não está imediatamente ameaçada, a passagem de um
tubo estomacal do maior calibre possível é recomendada. Algumas tentativas
devem ser feitas para limpar o tubo por sopros e movimentos para trás e para frente,
na tentativa de encontrar grandes quantidades de gás do rúmen que possam ser
liberadas. No timpanismo espumoso, pode ser impossível reduzir a pressão com a
sonda e um agente antiespumante deve ser administrado enquanto a sonda estiver
no lugar. Em todos os casos nos quais o timpanismo não for rapidamente revertido
com o agente antiespumante, o animal deverá ser observado cuidadosamente nas
próximas horas para determinar se o tratamento obteve sucesso ou se uma terapia
alternativa será necessária.
Uma grande variedade de agentes antiespumantes é efetiva, incluindo óleos
vegetais (por exemplo, amendoim, milho e soja) e óleos minerais (parafinas), em
doses de 80 a 250mL. O sulfossuccinato sódico de dioctil, um surfactante, é
normalmente incorporado a um desses óleos; vendidos como remédios antitimpâ-
nicos, só surtem efeito se administrados no início.
Controle: timpanismo em pastagem – A prevenção do timpanismo em pasta-
gem pode ser difícil. As técnicas de manejo que têm sido utilizadas incluem
fornecimento feno antes de se soltar o gado no pasto, mantendo a dominância de
gramíneas no mesmo, ou utilização do pastejo em faixas para restringir a ingestão.
Para o feno ser eficaz, ele precisa compor pelo menos um terço da dieta. A
alimentação com feno ou pastejo em faixas pode ser confiável apenas quando o
pasto é apenas moderadamente perigoso, mas estes métodos são menos confiá-
veis quando o pasto está no estágio pré-floração e o potencial de timpanismo é alto.
Os pastos maduros têm menor probabilidade de causar timpanismo que os imaturos
ou em rápido crescimento.
O único método satisfatório disponível para prevenção do timpanismo em
pastagem é a administração estratégica de agentes antiespumantes. Eles têm sido
efetivos nos países de exploração extensiva, como a Austrália e a Nova Zelândia.
O método mais seguro é encharcar duas vezes ao dia, por exemplo, no momento
da ordenha, com agente antiespumante. A pulverização do agente sobre o pasto
com forte timpanismo é igualmente eficaz, desde que se garanta que os animais
tenham acesso somente ao pasto tratado. Este método é ideal para o sistema de
pastejo controlado mas não para o pastejo incontrolado. Os agentes antiespumantes
podem ser adicionados ao suplemento alimentar ou à água, mas o sucesso deste
método depende de uma ingestão individual adequada. Os agentes também podem
ser incorporados em blocos ou pincelados nos flancos dos animais, de onde podem
ser lambidos durante o dia. Estes métodos são devastadores e alguns animais não
lamberão e assim não estarão protegidos.
Agentes antiespumantes disponíveis incluem óleos, gorduras e surfactantes não
iônicos sintéticos. Os óleos e as gorduras são administrados na quantidade de 60 a
120mL/cabeça/dia; doses de até 240mL são indicadas durante períodos mais perigo-
sos. O poloxaleno, um polímero sintético, é um dos mais efetivos surfactantes não
iônicos e ministrado em 10 a 20g/cabeça/dia e até 40g em situações de alto risco. Ele
pode ser adicionado à água, às misturas de grãos e aos blocos de sais minerais.
Detergentes de álcool etoxilato têm igual efeito e são mais palatáveis que o poloxaleno.
O último objetivo no controle deve ser o desenvolvimento de uma pastagem que
permita uma alta produção, mas com uma pequena incidência de timpanismo. As
pesquisas atuais centram-se no desenvolvimento de variedades de leguminosas que
possuam baixo potencial timpanizador. Em bases práticas, o uso de pastos de trevo
e gramíneas, em quantidades iguais, chega bem perto desse objetivo. Alternativa-
mente, animais com pai ou mãe propenso a timpanismo não devem ser mantidos
Diarréia Viral Bovina, Complexo de Doenças das Mucosas 199

como reposição de rebanho. A pesquisa nesta área concentra-se na identificação do


animal geneticamente predisposto e sua eliminação dos programas de reprodução.
Timpanismo em confinamento – As rações de confinamento devem conter
pelo menos 10 a 15% de forragem cortada ou picada, misturada à ração completa.
Preferivelmente a forragem deve ser um cereal, palhas de grãos, feno de gramínea
ou equivalente. Os grãos devem ser triturados, mas não pulverizados. Rações
peletizadas feitas com grãos pulverizados devem ser evitadas. A adição de sebo (3
a 5% do total da ração) ocasionalmente pode ser útil, mas não é um método de
controle efetivo. Os surfactantes não iônicos, como o poloxaleno, não têm efeito na
prevenção do timpanismo em confinamento.

DIARRÉIA VIRAL BOVINA, COMPLEXO DE


DOENÇA DAS MUCOSAS
Trata-se de uma doença infecciosa dos bovinos causada por um pestivírus
(família Togaviridae). A infecção normalmente é subclínica ou leve, com alta
morbidade e baixa mortalidade, porém também ocorre a doença grave com
alta mortalidade. O vírus da doença viral bovina (DVB) é imunossupressivo e pode
predispor a, ou exacerbar, surtos de doença concomitante.
Epidemiologia – A doença foi reconhecida em diversas partes do mundo. Os
animais de todas as idades são suscetíveis, porém é mais comum em animais de 8 a
24 meses de idade. Apesar de os bezerros poderem receber anticorpos no colostro,
os níveis destes anticorpos declinam por volta dos 3 a 8 meses de idade e os animais
são infectados. A infecção de fetos com cepas não citopáticas do vírus da DVB antes
do mesmo adquirir imunocompetência (, 120 dias de gestação) pode resultar em
infecção persistente e imunotolerância. Estes bezerros podem nascer vivos e
sobreviver por períodos variáveis até a idade adulta; eles são carreadores persisten-
tes e eliminam o vírus da DVB; são soronegativos. Por isso, são importantes na
perpetuação da doença e podem ser uma fonte de infecção quando introduzidos no
rebanho. As pesquisas de soroprevalência indicam que a infecção é comum. O vírus
está presente em títulos altos nas secreções e excreções dos animais infectados, e
a transmissão ocorre por contato direto ou por alimentos e outros materiais contami-
nados; no entanto, os eliminadores persistentes são soronegativos. O período de
incubação é variável mas geralmente dura em torno de 5 a 10 dias.
Achados clínicos – Os casos graves são caracterizados por febre, anorexia,
depressão, erosões e hemorragias no trato gastrointestinal, diarréia e desidratação.
Nos casos leves, a diarréia pode não ser marcante. A maioria das infecções por DVB
são assintomáticas, com o curso da doença variando de 2 a 3 dias até 3 semanas;
no entanto, isto resulta em aumentos mensuráveis nos níveis de anticorpos. Os
bovinos com DVB aguda podem morrer em 48h. A maior parte dos animais afetados
é anorética e exibe lesões orais e diarréia leve por 2 a 4 dias. Os bezerros com DVB
sintomática são apáticos, deprimidos e anoréticos, podendo ocorrer leve timpanismo.
As temperaturas são de 40 a 41°C inicialmente, mas em geral retornam ao normal
ou abaixo dele em 1 a 2 dias, antes que ocorra a diarréia. Foi detectada uma
elevação de temperatura difásica em infecções experimentais, mas isto raramente
é observado em casos no campo. As freqüências cardíaca e respiratória geralmente
estão aumentadas. As fezes podem conter muco ou sangue e têm mau cheiro; pode
ocorrer diarréia aquosa, levando a rápida desidratação. Se a diarréia é profusa, o
prognóstico é grave.
Diarréia Viral Bovina, Complexo de Doenças das Mucosas 200

As lesões orais estão presentes em , 75% dos casos clínicos quando a diarréia
se inicia. Tipicamente, há um avermelhado difuso na mucosa oral e, posteriormente,
manchas puntiformes na mucosa que aumentam, tornando-se erosões epiteliais
rasas de 1 a 2cm. Os locais de erosão incluem os palatos duro e mole, dorso e
laterais da língua, gengivas e comissuras da boca. Nos casos iniciais, as papilas das
bochechas estão hiperêmicas e suas pontas descamam, deixando papilas encurta-
das e rombas, conforme a doença progride.
Sintomas adicionais ocorrem esporadicamente em animais isolados. Esses
incluem corrimento nasal mucopurulento, narinas externas hiperêmicas incrustradas,
erosões da faixa coronária e fenda interdigital, e opacidade corneal. Em alguns
surtos, as lesões orais e a diarréia são mínimas, e os sintomas proeminentes podem
sugerir doenças respiratórias. (Os sintomas respiratórios podem ser causados pela
atividade de outros agentes microbianos, e a infecção por DVB foi implicada no
“complexo da febre de transporte”). A leucopenia com linfocitose relativa é comum
no início da doença. Pode ocorrer leucocitose com infecções bacterianas secundá-
rias. O animal que ocasionalmente sobrevive à doença aguda normalmente está tão
debilitado que é economicamente inviável.
A infecção durante a prenhez pode resultar em morte embrionária ou aborto,
nascimento de bezerros pequenos e fracos, ou bezerros com infecção congênita.
Esta infecção muitas vezes é clinicamente inaparente na mãe; os efeitos no feto
variam com a cepa do vírus e com a idade e imunocompetência do feto. A morte fetal
com reabsorção ou mumificação, ou aborto pode ocorrer após a infecção no período
inicial a médio da gestação, até , 120 dias. Quando uma boa parte das matrizes são
suscetíveis, a evidência inicial da DVB pode ser infertilidade ou uma série de
abortos. A infecção no meio da gestação (, 120 a 150 dias) pode resultar em
bezerros com defeitos congênitos. Estes defeitos incluem hipoplasia cerebelar,
catarata, degeneração da retina, microftalmia, hipoplasia dos tratos óticos,
hidrocefalia, e pelagem espessa e crespa. A infecção congênita por DVB pode ser
um fator na síndrome do “bezerro fraco”. A doença mucosal aguda pode ser
provocada em bezerros de 1 ano ou bovinos adultos com infecção congênita quando
são expostos a cepas citopáticas de vírus da DVB antigenicamente relacionadas ou
antigenicamente diferentes ou por vários fatores desconhecidos. A síndrome da
doença mucosal ocorre como descrita anteriormente para a DVB grave, mas é
invariavelmente fatal. Quando a infecção (com o vírus da DVB citopático ou não
citopático) na matriz ocorre no final da gestação (>150 dias), pode ocorrer infecção
fetal com formação de anticorpos, mas não há efeitos adversos no feto.
Lesões – As lesões macroscópicas estão primariamente confinadas ao trato
alimentar. Microscopicamente, focos de células epiteliais degeneradas compõem
as lesões básicas. Estas desenvolvem-se em conseqüência do edema e da
vasculite que ocorrem imediatamente abaixo das superfícies epiteliais, resultando
em erosões do esôfago, pré-estômagos, abomaso e intestino. A necrose epitelial é
mais proeminente na doença das mucosas, na qual a ulceração é marcada,
especialmente nas áreas oronasais. A enterite catarral pode ser severa nas formas
mais crônicas da doença.
Ocorre necrose dos tecidos linfóides, particularmente naqueles associados ao
intestino. Na doença crônica das mucosas, a hemorragia resulta em focos necróticos
vermelho-escuros no íleo correspondendo às placas de Peyer afetadas. Microscopi-
camente, a destruição do revestimento epitelial de criptas de Lieberkühn no intestino
delgado inferior, ceco e cólon é uma lesão característica. Animais com esse tipo de
doença morrem com uma infecção sistêmica febril e colapso circulatório.
Diagnóstico – Como a peste bovina e a febre catarral maligna podem causar
síndromes parecidas, o diagnóstico das doenças semelhantes à DVB é muito
importante. Casos severos de infecção pela DVB geralmente podem ser diagnos-
Cólica em Eqüinos 201

ticados com base no histórico, achados clínicos e lesões post mortem . Infelizmente,
na maioria dos casos, os sinais clínicos são menos óbvios e chegar a um diagnóstico
preciso pode ser difícil. Dada a prevalência da infecção na população bovina em
geral, uma única titulação sérica positiva não é de significância diagnóstica;
amostras séricas pareadas devem ser tomadas para demonstrar uma seroconversão
ou uma titulação aumentada. Amostras clínicas (material lesado, sangue e secre-
ções nasofaríngeas e oculares) ou de necropsia (baço, linfonodos mesentéricos e
placas de Peyer) devem ser submetidas ao isolamento do vírus ou exame de
imunofluorescência indireta. O diagnóstico de aborto e a infecção congênita
associados à DVB requerem exames laboratoriais. Amostras apropriadas devem
ser submetidas à histologia e ao isolamento do vírus, junto com amostras de soro
coletadas antes da secreção do colostro. O diagnóstico em bovinos persistentemen-
te infectados requer isolamento do vírus do sangue, soro ou couro de boi.
Controle – Não existe tratamento específico para DVB, mas uma terapia de
suporte é recomendada. Vacinas de vírus vivo modificado e de vírus inativado estão
disponíveis e podem conferir proteção significativa. Em geral, as vacinas são
aplicadas aos 6 a 10 meses de idade, quando a imunidade pelo colostro cessar; os
fabricantes das vacinas recomendam um esquema de vacinação que deve ser
rigidamente seguido. Existem evidências de que a vacinação de bovinos persisten-
temente infectados e imunotolerantes com uma vacina de vírus de DVB citopático
atenuado pode resultar em doença severa da mucosa; no entanto, isto nem sempre
ocorre e estes animais podem desenvolver anticorpos neutralizantes para o vírus da
vacina. As vacinas inativadas para DVB também encontram-se disponíveis e seu
uso pode eliminar os problemas algumas vezes atribuídos ao uso de vacinas
atenuadas. Como os animais com infecção persistente podem agir como uma fonte
contínua de infecção no interior do rebanho, em teoria, eles devem ser detectados
e eliminados. No entanto, isto é caro, pois exige uma avaliação sorológica do
rebanho e isolamento do vírus a partir do sangue dos animais soronegativos. O uso
de sondas de ácido nucléico (genes) para detectar o vírus da DVB em amostras de
couro bovino pode reduzir o custo do teste. Ovelhas prenhes não devem ser
misturadas ao gado bovino, pois a infecção pelo vírus da DVB pode resultar na
doença da fronteira (ver pág. 403).

CÓLICA EM EQÜINOS
Trata-se de uma síndrome potencialmente fatal, manifestada por início de
peragudo a crônico, dor abdominal de leve a intensa e depressão.
Etiologia e patogenia – A dor visceral geralmente emana de uma desordem no
trato GI, mas algumas anormalidades no trato urogenital podem causar sintomas
idênticos. Outros problemas que devem ser considerados são as causas de dores
abdominais parietais (por exemplo, peritonite, torção uterina, pielonefrite) ou os de
sintomas que imitam dor abdominal (por exemplo, miosite generalizada ou tetania,
laminite, ou pleurisia). Inúmeros processos patológicos que causam alteração (ou
parada) no fluxo da ingesta, que resultem em distensão luminal gástrica e/ou
intestinal, inchaço mural, isquemia ou infarto transmural, ou inflamação crônica ou
aguda do intestino (devido a enterites infecciosas ou problemas ulcerativos das
mucosas) podem causar sintomas de dor abdominal em grau variável. As principais
causas estão divididas em obstruções simples (funcionais) ou estrangulantes.
As práticas incorretas de manejo, como rápidas alterações na dieta (um “acidente
alimentar”), podem causar uma mudança no pH da ingesta, uma alteração na flora
Cólica em Eqüinos 202

intestinal, fermentação com a produção de gás resultante e um íleo transitório que


causa timpanismo intestinal e dor. As obstruções intestinais intraluminais simples
que retardam ou impedem o movimento da ingesta podem ocorrer em qualquer nível
do trato GI, mas são tipicamente encontradas no íleo, junção ileocecal, ceco, flexura
pélvica do cólon maior (ascendente), cólon transverso, ou mesmo no cólon menor
(descendente). A impactação simples é comum, podendo ser causada por desidra-
tação relativa devido à privação de água e comida excessivamente seca (normal-
mente observada no inverno), uma dieta de forragem particularmente grosseira, ou
retenção prolongada do mecônio nos potros. Os corpos estranhos ingeridos
(materiais fibrosos, por exemplo, cordas, cordões no feno ou cercas) são acrescidos
de sais minerais da ingesta, gradualmente aumentando de tamanho e obstruindo
intermitentemente ou de forma aguda o cólon transverso ou flexura pélvica. Os
enterólitos formam-se espontaneamente ao longo de anos, concentricamente em
torno de um pequeno núcleo pelo mesmo processo de acréscimo de sais, obstruindo
o intestino no cólon transverso ou cólon menor proximal.
Os deslocamentos anatômicos (normalmente os ramos esquerdos do cólon
maior) simulam obstruções intraluminais simples, ao retardar ou impedir o fluxo de
ingesta e gás. Doenças extramurais, tais como adesões organizadas devido a
cirurgias ou peritonites anteriores, podem diminuir o fluxo local de ingesta devido a
inflamação ou alças intestinais “embaraçadas”. Os abscessos abdominais podem
ser dolorosos e aumentar de tamanho até causar uma peritonite inflamatória
generalizada, adesões intraluminais ou colapso extramural do intestino. Acidentes
vasculares devidos a traumas intra-abdominais (por exemplo, distocia), ou coagu-
lopatias podem causar hematomas murais ou mesentéricos com compressão
intestinal extramural, isquemia local, ou ambas.
As obstruções estrangulantes causam um comprometimento circulatório agudo
na porção afetada do trato GI (enquanto obstruem simultaneamente o fluxo de
ingesta), peritonite aguda asséptica e íleo paralítico concomitante. As causas intra-
abdominais incluem vólvulo do intestino delgado ou cólon maior; intussuscepção do
intestino delgado, ceco, ou cólon maior; rupturas no mesentério; bandas mesodi-
verticulares; hérnias gastroesplênicas; e encarceramentos do intestino delgado no
forame epiplóico. Os lipomas mesentéricos sobre pedículos delgados e longos
ocorrem em cavalos mais velhos, podendo enrolar-se em torno de uma alça
intestinal (geralmente intestino delgado), ocluindo a mesma extra-luminalmente e
resultando em sintomas fulminantes de cólica. As hérnias umbilicais e inguinais
(escrotais), ou diafragmáticas agudas causam obstrução por estrangulamento do
intestino fora da cavidade abdominal.
O infarto não estrangulante de uma porção do intestino ou da parede do órgão
é geralmente devido à migração de larvas de estrôngilos e está associado a arterite
mesentérica e tromboembolismo. Outras causas incluem encarceramento parcial
do intestino (hérnia parietal) ou avulsão do suprimento dos vasos mesentéricos (por
exemplo, durante distocia). Ocasionalmente, uma enterite infecciosa peraguda
(por exemplo, salmonelose peraguda) no intestino grosso ou delgado pode ser
fulminante o suficiente para provocar necrose transmural de porções do ceco, cólon
maior, cólon menor ou, ocasionalmente, duodeno e jejuno proximal. Problemas
inflamatórios intestinais agudos graves, apesar de inicialmente provocarem fezes
líquidas e aumento no peristaltismo, progridem para paralisia do trato GI, parada no
fluxo de ingesta, retenção de líquido e gás e, freqüentemente, dor intensa devido ao
timpanismo.
A ulceração do trato GI parece não causar sintomas em alguns animais; em
outros, particularmente potros e os que são exercitados regularmente e de forma
extenuante, os sintomas variam de uma vaga indicação de desconforto até cólica.
A endoscopia pode permitir um diagnóstico específico.
Cólica em Eqüinos 203

A dor causada por uma lesão no trato urogenital é infreqüente, sendo mais típica
em éguas pré- ou pós-parturientes. As lesões uterinas primárias (por exemplo, uma
ruptura de vaso uterino pré-parto, ou perfuração da parede durante o parto) podem
resultar em dor abdominal de moderada a intensa. Uma doença renal pélvica ou
cortical, apesar de rara, pode causar leves sintomas de cólica, normalmente em
adultos. Doenças do trato inferior, na maioria das vezes urolitíases, causam
hematúria e dor abdominal associada, geralmente em machos. A ruptura espontâ-
nea da bexiga pode ocorrer nos primeiros dias de vida dos potros machos.
A obstrução no fluxo de ingesta com acúmulo de líquido e gás, resultando em
distensão da víscera, é a causa da dor nos problemas obstrutivos simples. O tecido
isquêmico é, por si só, extremamente doloroso até que ocorra morte tecidual. Ambos
os componentes contribuem para os sintomas de cólica nos casos de obstrução por
estrangulamento.
A obstrução no fluxo da ingesta, devido a obstrução simples ou por estrangulamen-
to, infarto regional, ou enterite inflamatória, invariavelmente altera a seqüência normal
da secreção de fluidos no trato do intestino delgado e a reabsorção no ceco e cólon,
resultando em uma perda de volume circulatório. A rapidez da perda de líquido na
circulação e a hemoconcentração resultante e eventual síndrome do choque hipovo-
lêmico são geralmente determinadas pela localização da lesão ao longo do trato e
pela quantidade de tecido afetada pelo dano. As obstruções do trato superior
impedem a reabsorção cecal de secreções GI induzindo, portanto, um rápido início
de hipovolemia, enquanto as lesões distais ao ceco geralmente demoram para
provocar um choque cardiovascular (com exceção do vólvulo do cólon). A magnitude
da lesão, por exemplo, vólvulo mesentérico completo do intestino delgado ou vólvulo
completo do cólon, acelera o início do choque hipovolêmico devido à perda conside-
rável de sangue para o tecido estrangulado, assim como devido à interferência na
recuperação de fluidos secretórios GI. As alterações na flora luminal devido à estase
do fluxo de ingesta e à liberação de endotoxinas Gram-negativas resultantes
compõem o efeito da hipovolemia na dinâmica do líquido cardiovascular.
A causa da morte em casos graves é o choque cardiovascular, por si só ou
combinado à endotoxemia Gram-negativa. A maioria das causas é complicada pela
perda total de líquidos da circulação.
Achados clínicos e diagnóstico – A avaliação e a interpretação de todos os
achados físicos e laboratoriais devem ser consideradas, estando-se consciente de
que o cavalo pode já estar em, ou eventualmente atingir, choque cardiovascular. A
manifestação de dor é variável, independentemente do problema causador, apesar
de os sintomas geralmente estarem correlacionados com a intensidade da lesão ao
trato GI. Uma dor intensa e contínua deve ser interpretada como risco potencial à vida.
Na maioria dos casos, qualquer que seja a causa, os sintomas iniciais são
semelhantes, variando em intensidade. O animal pode demonstrar desconforto por
um ou vários dos sintomas a seguir: cavar, coicear o abdome, deitar-se e levantar-se,
rolar, olhar para o flanco e apresentar posturas anormais, por exemplo, sentar como
cão, adotar postura de “cavalete”, ou deitar-se em decúbito dorsal. Os surtos de dor
podem ser intermitentes (e subagudos), especialmente nos casos tratáveis por
medicamentos e inicialmente no curso de casos mais graves. Durante os surtos de
dor intensa, a atividade violenta pode resultar em traumas auto-infligidos. Outros
sintomas correlacionados à dor, por exemplo, sudorese, taquicardia, hiperpnéia e
policitemia relativa, podem ser indicações iniciais de choque cardiovascular iminente.
O estado cardiovascular do cavalo deve ser avaliado no primeiro exame e nos
exames subseqüentes (se forem necessários), pois os choques hipovolêmico e
endotóxico são seqüelas eventuais da perda de volume circulatório e obstrução do
fluxo de ingesta. Deve ser sempre coletada uma pequena amostra de sangue para
a realização do hematócrito e medida da proteína total. A leitura inicial é importante
Cólica em Eqüinos 204

quando o problema se alonga. A pressão sangüínea pode ser medida indiretamente


na artéria coccígea por aparelhos ultra-sônicos e oscilométricos. A hipotensão
sistêmica em um cavalo em pé corresponde a uma pressão sistólica coccígea de até
80mmHg. A amplitude palpável do pulso arterial diminui proporcionalmente. Outros
achados no colapso circulatório agudo incluem taquicardia; mucosa oral descorada
e manchada, com tempo de refil capilar aumentado; taxa de refil jugular ruim; orelhas
e membros frios à palpação; policitemia e hipoproteinemia relativas; azotemia pré-
renal; acidose metabólica, observada na forma de queda no pH sangüíneo e
concentração de bicarbonato (ou “CO2 total”), aumento na concentração sangüínea
de lactato, e um maior déficit de ânions; e uma depressão de moderada a marcante,
que pode mascarar a intensidade do desconforto demonstrado. Quanto mais
comprometido estiver o sistema circulatório, mais estes parâmetros desviam-se do
normal e maior é a urgência da terapêutica para choque.
Um exame físico completo, incluindo auscultação abdominal, palpação retal,
passagem da sonda nasogástrica e abdominocentese, é essencial. Devem ser
mantidas anotações por escrito e o exame deve ser repetido a cada 2h. Os sons
intestinais (borborigmos) podem ser altos nas cólicas espasmódicas; agudos nas
cólicas flatulentas; com maior freqüência nas cólicas espasmódicas e flatulentas e
enterites; e variar de normais a menores em freqüência e amplitude em outros
problemas. A ausência de sons intestinais não é prova de, mas muitas vezes ocorre
em, desordens intestinais sérias.
A quantidade, a consistência, a coloração e o odor das fezes devem ser
observados. A ausência de fezes no reto de um adulto é incomum e significativa.
Poucas cíbalas fecais ou completa ausência delas, e um reto seco, cheio de muco
são consistentes com uma obstrução simples do cólon descendente (por exemplo,
enterolitíase). Fezes aquosas ou, ocasionalmente, tintas de sangue, sugerem uma
enterocolite iminente como causa da dor abdominal. Partículas de areia palpáveis
nas cíbalas são consistentes com ingestão crônica de areia e provável impactação.
Ocasionalmente, pequenos estrôngilos adultos podem ser encontrados no braço do
examinador quando este é retirado do reto, indicando parasitismo intenso.
Um exame retal pode fornecer um diagnóstico etiológico, porém, na maioria das
vezes, é útil apenas na determinação da localização geral e tipo de obstrução, por
exemplo, intestino delgado versus cólon menor, ceco versus cólon maior. Proximal-
mente a uma impactação ou deslocamento, ocorre um segmento intestinal cheio de
líquido e/ou gás. Qualquer distensão intestinal deve ser notada e interpretada como um
sinal de possível obstrução ou deslocamento. O tipo, tamanho e localização das alças
intestinais são importantes na monitoração da progressão dos sintomas nos exames
subseqüentes. Em alguns casos, podem ser palpadas alças acentuadamente timpâ-
nicas do intestino delgado; em outros, uma faixa tensa do mesentério pode estar ao
alcance, esticada por uma alça intestinal cheia de líquido mais profunda no abdome.
Uma grande víscera timpânica pode obstruir a palpação além da entrada pélvica. O
timpanismo do intestino grosso é muitas vezes grave o suficiente para provocar
distensão abdominal evidente (timpanismo) em adultos; em potros, e ocasionalmente
em adultos, o timpanismo do intestino delgado pode ser evidente do mesmo modo.
O problema primário pode ser definitivamente palpado em alguns casos, por
exemplo, obstruções intraluminais da válvula ileocecal, ceco, e cólon maior e menor;
algumas intussuscepções e vólvulos; encarceramento através do anel inguinal;
constrição retal (como nos lipomas pedunculados); e encarceramento nefroesplênico
do cólon esquerdo. As cólicas flatulentas podem provocar algum timpanismo
intestinal. Não são palpadas anormalidades nas cólicas espasmódicas ou inicial-
mente no curso dos deslocamentos. Se o problema é uma arterite verminótica
mesentérica cranial, a artéria aumentada e encaroçada pode ser palpada na linha
média, caudalmente à ponta do rim esquerdo.
Cólica em Eqüinos 205

A distensão gástrica pode ser primária, porém, na maioria das vezes, é secun-
dária à obstrução do intestino delgado e, por vezes, à obstrução do duodeno devido
a intenso timpanismo do intestino grosso. Isto causa sintomas de desconforto
intenso e não é palpável. A passagem da sonda nasogástrica pode permitir a
descompressão gástrica espontânea, o que normalmente alivia os sintomas clíni-
cos. O volume de líquido retirado deve ser notado. Sua coloração varia conforme o
último alimento ingerido, porém um líquido verde e malcheiroso é típico. O pH do
líquido deve ser fortemente ácido; o líquido alcalino é típico com uma obstrução na
porção proximal do intestino delgado e/ou íleo. Pode ser observado sangue no
refluxo gástrico nas gastrites primárias (úlceras), duodenojejunites proximais, ou
obstruções por estrangulamento do intestino delgado proximal. A distensão secun-
dária à sobrecarga de grãos é difícil de aliviar pela sonda nasogástrica. O vômito ou
regurgitação nasogástrica espontânea é geralmente acompanhado por sintomas
dramáticos de dor imediatamente antes da ruptura gástrica.
A abdominocentese na linha ventral média é importante para o diagnóstico. A
amostra deve ser coletada sem contaminação por sangue periférico utilizando-se
uma cânula romba. As enterites, obstruções simples, deslocamentos, ou pequenas
lesões infartadas provocam poucas alterações no líquido peritoneal. Uma obstrução
intestinal estrangulante causa diapedese hemorrágica de hemácias na cavidade
peritoneal. Concomitantemente, a inflamação aguda provoca uma exsudação
variável de leucócitos e proteína. Deste modo, o líquido é obtido prontamente, com
coloração alterada e turvo (em proporção ao número e tipo de células presentes).
Podem estar presentes hemácias citologicamente livres ou fagocitadas, enquanto
os neutrófilos geralmente são as células nucleadas predominantes. Podem também
estar presentes macrófagos e células mesoteliais.
A concentração de lactato no líquido peritoneal aumenta em proporção ao grau
e à quantidade de isquemia intestinal. Na necrose completa de parede intestinal são
observadas bactérias fagocitadas e/ou livres, normalmente indicando um prognós-
tico ruim. A diferenciação de uma peritonite séptica primária (sem necrose intestinal)
pode ser difícil. A presença de microrganismos misturados, além de sangue e fibras
vegetais, é patognomônica de uma ruptura aguda de víscera. A enterocentese
acidental pode ser distinguida de uma ruptura de víscera pelo fato de as bactérias
não estarem fagocitadas, possível presença de ciliados, e morfologia de leucócitos
normal; em um intestino rompido, algumas bactérias podem estar fagocitadas e
muitos leucócitos estão acentuadamente degenerados.
A concentração sangüínea de bilirrubina não conjugada pode aumentar em
muitos casos de cólica; no entanto, nas colelitíases, tanto a concentração de
bilirrubina não conjugada como a de bilirrubina conjugada estão aumentadas.
Conseqüentemente, na colelitíase, o cavalo pode apresentar mucosas, esclera,
plasma, e líquido peritoneal ictéricos, com bilirrubinúria e aumento nas atividades da
fosfatase alcalina e γ-glutamiltransferase séricas.
Tratamento – A analgesia e/ou sedação leve devem ser utilizadas conforme
necessário para permitir um exame completo e apropriado e/ou tratamento ou
terapia medicamentosos para choque. Os cavalos que demonstram sinais vitais
consistentes com choque hipovolêmico (incluindo freqüência cardíaca >80/min)
devem receber um cateter EV jugular, iniciando-se a terapia de reposição de volume
líquido EV, baseada na avaliação clínica do grau de desidratação. Deve ser passada
uma sonda nasogástrica para pesquisar e aliviar o timpanismo gástrico e distensão
por líquidos. As impactações leves podem ser dispersadas com óleo mineral (2 a 4L
para um adulto) ou sulfossuccinato sódico de dioctil (7,5 a 30 g) via sonda naso-
gástrica. O sulfato de magnésio (0,5 a 1 g/kg de peso corporal por sonda nasogástrica)
age como um catártico osmótico, sendo útil em algumas cólicas por areia. A
reposição de líquido EV além das necessidades diárias de manutenção (super-
Cólica em Eqüinos 206

hidratação), combinada aos medicamentos anteriores, alivia efetivamente a


impactação do ceco e cólon. Nas cólicas de impactação ou por areia, o tratamento
deve ser seguido de correção na dieta, incluindo, para a última, remoção do cavalo
da fonte de areia. Acesso fácil à água também é essencial. Um cólon maior
marcadamente timpânico pode exigir descompressão por trocarterização através
do flanco superior. Os cavalos com sintomas relacionados a arterites verminóticas
podem ser beneficiados pelo tratamento com ivermectina (200µg/kg de peso
corporal); no entanto, as lesões causais levam semanas para regredir.
A atropina é contra-indicada em todos os casos de cólica, devido ao seu potencial
de provocar íleo paralítico. A dipirona (11mg/kg, EV e IM) é útil na analgesia em cólicas
espasmódicas. Os cavalos que exibem dor intensa necessitam de terapia analgésica
potente para prevenir autolesões. As drogas úteis incluem a xilazina (0,5 a 1mg/kg,
EV ou IM), flunixin meglumina (1mg/kg, EV ou IM), meperidina (1 a 2mg/kg, IM),
pentazocina (0,3 a 0,4mg/kg, EV ou IM), e hidrato de cloral (3,5 a 7g, EV, ou 15 a 16g
por sonda gástrica em um adulto). Os tranqüilizantes à base de promazina, apesar de
possivelmente úteis nas cólicas leves, são contra-indicados quando o estado cardio-
vascular pode estar comprometido, devido aos seus efeitos colaterais hipotensivos.
Os cavalos em terapia analgésica devem ser intensamente monitorados para que seu
estado clínico não deteriore. Cavalos com diminuição da função circulatória ou em
choque exigem terapia EV agressiva, com fluidos isotônicos poliônicos e, possivel-
mente, suplementação de bicarbonato. O flunixin meglumina (1mg/kg, EV ou IM) e
doses massiças de corticosteróides (1g de succinato sódico de prednisolona EV ou
100mg de dexametasona EV) podem ser úteis para prevenir ou tratar o choque. No
entanto, é melhor reservar o flunixin meglumina para os casos que foram definitiva-
mente diagnosticados; do contrário, a deterioração clínica geral pode ser mascarada
por suas poderosas propriedades analgésicas.
A terapia medicamentosa é adequada para a maioria dos casos de cólica; no
entanto, 6 a 10 % dos casos apresentam obstrução que exige cirurgia. As indicações
para cirurgia incluem cólica aguda não responsiva a terapia analgésica e medica-
mentosa, achados retais “positivos” (por exemplo, intussuscepção, obstrução, alças
intestinais marcadamente distendidas), estado circulatório declinante e histórico de
cólicas crônicas recorrentes. Nos lipomas mesentéricos pedunculados, o diagnós-
tico precoce e a correção cirúrgica são essenciais.
O prognóstico para sobrevida é melhor se a cirurgia for realizada antes que
ocorra, ou pelo menos nos estágios iniciais do, o choque cardiovascular; o choque
avançado geralmente impede um bom resultado após a cirurgia. O indicador clínico
precoce mais confiável para a necessidade de terapia cirúrgica é uma dor intensa
e/ou contínua. A manifestação de dor intensa precede o declínio dos parâmetros
cardiovasculares. Além disto, a manifestação de dor geralmente está correlaciona-
da com a gravidade da lesão GI. Os cavalos exibindo dor intensa devem ser
considerados como candidatos à cirurgia mesmo no primeiro exame.
Potros em desmame podem exibir cólica um dia após sua primeira vermifugação
devido a uma impactação por ascarídeos adultos, que normalmente ocorre no íleo;
a cirurgia exploratória é o tratamento definitivo. Outros cavalos jovens habitualmen-
te mastigam e ocasionalmente ingerem materiais fibrosos (madeira, corda) ou
sintéticos (náilon) que causam uma obstrução simples do cólon ascendente,
transverso, ou descendente, necessitando de remoção cirúrgica. Os mesmos
critérios para avaliar a necessidade de cirurgia em adultos podem ser utilizados nos
potros neonatos ou em desmame, exceto pela palpação retal. Da mesma forma,
uma terapia de suporte cardiovascular a tempo e a ação decisiva quanto à cirurgia
aumentam as chances de um prognóstico favorável.
Quando necessário, devem ser oferecidos cuidados dentários e conselhos sobre
alimentação, exercícios e manejo (incluindo controle parasitário).
Doenças do Esôfago, Gr An 207

Cólicas em potros
Várias lesões (ver anteriormente) são observadas em cavalos jovens com
cólicas, embora com menor freqüência geral. A cólica e a distensão abdominal nos
primeiros dias de vida são geralmente causadas por ruptura da bexiga, porém o
vólvulo do intestino delgado ou cólon é infreqüentemente observado. Novamente,
a manifestação de dor é o sintoma clínico discriminatório. Em potros jovens, a causa
mais comum de cólica que exige terapia cirúrgica é a intussuscepção jejunal.
A retenção de mecônio é uma causa comum de impactação do cólon maior em
recém-nascidos, particularmente em potros. Os sintomas iniciais são drámaticos,
mas as recorrências dos ciclos de dor podem ser evidentes e, por não haver
passagem fecal, as fezes são escassas, duras e recobertas por muco. Os casos
severos podem requerer o uso de fórceps cego ou, sobretudo se a retenção for maior
no trato, até de cirurgia para remoção da massa impactada. Usualmente, no entanto,
apenas enemas introduzidos cuidadosamente por um tubo flexível longo serão
suficientes. É recomendado administrar, em intervalos de , 4h, água com pequena
quantidade de sabão, ou água contendo um agente redutor da tensão superficial.
Também podem ser úteis pequenas doses, VO, de óleo mineral, aos mesmos
intervalos. Muitos acham aconselhável administrar um enema suave para todos os
potros após o nascimento e até quando persistir a passagem do mecônio.

DOENÇAS DO ESÔFAGO, GR AN
IMPACTAÇÃO
É uma obstrução do esôfago por massa alimentar ou corpos estranhos.
Etiologia – Cavalos engasgam muito freqüentemente ao comerem, muito
avidamente, grãos secos e, com menos freqüência, espiga de milho, batata ou um
bolo de feno e, por vezes, com pílulas medicinais. A impactação no cavalo
freqüentemente é uma complicação de estenose ou diverticulose, bem como de
uma esofagite. Os ruminantes, geralmente engasgam com objetos sólidos, como
maçãs, pêras, beterrabas, ameixas, batatas, nabos ou espigas de milho. Em raras
ocasiões, os bovinos engasgam com objetos estranhos obtidos no alimento. Em
grandes animais, a obstrução ocorre mais freqüentemente na porção cervical do que
na porção torácica do esôfago.
Achados clínicos: cavalos – O cavalo afetado exibe ansiedade, pescoço
arqueado e ânsia de vômito. A salivação é profusa e o alimento e a saliva são
regurgitados pelas narinas. A tosse é pronunciada e o animal pode bater as patas
no solo, deitar-se e mostrar outros sinais de aflição. O leite sai pelas narinas, nos
potros em amamentação, numa tentativa de engolir, e este sinal deve ser diferen-
ciado daquele causado pela fenda do palato. Após , 1h, os esforços espasmódicos
ou forçados de engolir tornam-se menos freqüentes e o animal pode ficar quieto.
Bovinos – O timpanismo (ver pág. 195) e a salivação são sinais característicos.
O grau do timpanismo varia com a extensão da estenose esofágica e com o período
de tempo no qual ela existe. Movimentos mastigatórios, protrusão da língua,
extensão da cabeça e do pescoço, dispnéia, grunhidos e tosse são freqüentemente
observados.
Diagnóstico – O diagnóstico é feito a partir do histórico e dos sintomas visíveis.
Um objeto causando a obstrução do esôfago cervical pode ser localizado pela
palpação externa ou passagem de uma sonda estomacal. As obstruções torácicas
podem ser diagnosticadas pela passagem cuidadosa de uma sonda estomacal.
Doenças do Esôfago, Gr An 208

Deve se considerar a possibilidade de raiva em qualquer animal que exiba dificul-


dade de deglutição.
Tratamento: cavalos – As obstruções por grãos ou feno tendem a se resolver
espontaneamente, à medida que o bolo se torna amaciado pela saliva. O curso
pode ser de algumas horas a vários dias; entretanto, há o risco de necrose por
pressão ou esofagite que resultam em estenose com dilatação. Pode ocorrer
pneumonia por inalação. Os procedimentos precipitados devem ser evitados. O
controle da dor com sedativos, confinamento do animal e permissão ao acesso à
água, porém não ao alimento, podem desencadear uma recuperação espontâ-
nea. A passagem de uma sonda estomacal até a obstrução e o bombeamento e
sifonamento repetidos podem aliviar a impactação por grãos. Pentazocina,
xilazina, acepromazina ou metampirona são os medicamentos iniciais necessá-
rios para o controle da dor e dos espasmos. Em alguns casos, as obstruções
torácicas sólidas podem ser gentilmente empurradas para o estômago com uma
sonda estomacal grande ou sonda esofágica, se o cavalo colaborar ou estiver
anestesiado.
Bovinos – O alívio do timpanismo é a primeira consideração, e no timpanismo
agudo do rúmen deve ser feita a punção com trocarte prontamente. Os objetos
sólidos na porção cervical do esôfago podem ser massageados para cima e
removidos através de um espéculo bucal, ou de uma alça de arame de aço nº 9,
passada através de um espéculo bucal, por trás do objeto e, então, retirada
vagarosamente. Quando os outros métodos falham, deve-se tentar uma sonda
esofágica. Tubos estomacais rígidos de grande calibre funcionam bem para esse
propósito. A desvantagem deste método é o risco de dano ao tecido e subseqüente
esofagite. Se a obstrução for próxima ao diafragma, deve ser realizada uma
rumenotomia para a remoção do objeto.
A esofagostomia pode ser escolhida na impactação cervical, em todas as
espécies, mas esta só deve ser indicada quando os outros métodos usuais de
tratamento falharem; ela é, freqüentemente, seguida por uma fístula esofágica, que
pode não cicatrizar, ou se o faz, pode resultar em constrição esofágica.

DIVERTÍCULO ESOFÁGICO (DILATAÇÃO)


Esta condição assume uma importância fundamental no cavalo. Na maioria das
vezes, é um complicador da estenose e, em conseqüência, pode estar indiretamente
associada a esofagite ou impactação crônica. Nos potros, o refluxo gastroesofágico
secundário a uma obstrução funcional ou mecânica ao esvaziamento gástrico pode
causar uma dilatação na porção distal do esôfago. A maioria dos divertículos
encontra-se nas porções cervical ou torácica do esôfago. Os sintomas importantes
são geralmente vistos após as refeições e são similares àqueles da impactação (ver
também pág. 131).
O diagnóstico é baseado no histórico e nos sintomas clínicos. Algumas dilatações
cervicais podem ser palpadas e até observadas por exame visual. A esofagoscopia
permite uma visualização direta da dilatação, assim como da região estenótica
associada. A radiografia de contraste tem sido usada no diagnóstico. A exposição
cirúrgica do divertículo e uma cuidadosa aposição da musculatura esofágica, sem
penetração na mucosa esofágica, são os únicos tratamentos efetivos.

ESPASMO ESOFÁGICO
(Esofagismo)
É um problema que ocorre mais comumente em cavalos jovens. Apesar de sua
etiologia exata não ser conhecida, ele tem sido observado em potros lactentes
Doenças do Esôfago, Gr An 209

quando eles começam a ingerir alimentos sólidos; em animais jovens convalescen-


do de infecções agudas debilitantes; em cavalos com esofagite aguda, tal como a
esofagite induzida pelo rompimento de uma cápsula contendo alguma droga
irritante; após uso de uma sonda estomacal, que possa ter lesado a mucosa; e após
injeção de grandes doses de morfina. O esofagismo pode também ocorrer nos casos
de tétano e raiva.
Os sintomas clínicos lembram aqueles vistos nos casos de obstrução esofá-
gica, mas não têm necessariamente nenhuma relação com a ingestão de
alimento. Algumas vezes, são desencadeados pela ingestão de água fria. O
queixo se volta para baixo e para trás; alguns animais fazem esforços convulsivos
para vomitar e colocam as patas por baixo do corpo e estendem a cabeça. Uma
saliva viscosa é descarregada pela boca e narinas, e a tosse é freqüente. Acessos
de espasmos podem ocorrer várias vezes ao dia, ou apenas em intervalos de
alguns dias. Algumas vezes, existe interferência com a passagem de uma sonda
estomacal. Os espasmos são sintomáticos e cessam, uma vez que a causa
primária seja removida. A atropina parece controlar os espasmos. Quando
severos, podem ser aliviados com morfina ou por algum outro agente espasmolítico,
tal como dipirona. Tranqüilizantes podem controlar os sintomas em animais
nervosos.

ESTENOSE ESOFÁGICA
Etiologia – A estenose pode ser causada por tecido cicatricial ou por compres-
são. A formação de tecidos cicatriciais no cavalo pode ser conseqüência das
obstruções esofágicas que causam danos à parede ou irritação desta pelo manuseio
bruto, na tentativa de remoção da obstrução. Cavalos velhos podem desenvolver
uma estenose da porção terminal do esôfago devido à fibrose da parede muscular.
Em raras ocasiões, químicos cáusticos podem causar esofagite e subseqüente
cicatrização. A compressão do esôfago ocorre ocasionalmente em bovinos com
linfossarcoma e a partir de aderências e reticulite traumática próximas ao hiato
esofágico. A compressão do esôfago por arco aórtico direito persistente (ver
pág. 42) é também relatada. Em ovinos, a compressão por linfadenite caseosa
(ver pág. 77), envolvendo os linfonodos mediastinais, é uma causa rara. Em
cavalos, a estenose é freqüentemente acompanhada por um divertículo ou este
pode causar estenose.
Achados clínicos – A estenose em cavalos resulta em ocorrências repetidas de
engasgo. A obstrução repetida leva a enfraquecimento das paredes e eventual
dilatação. Os sinais clínicos de impactação, descritos anteriormente, ocorrem
intermitentemente. A água é ingerida sem dificuldade. Os animais afetados cronica-
mente tendem a permanecer magros. O gado afligido tende a ter timpanismo crônico
e pode ter uma tendência a engasgar.
Diagnóstico – Em animais de grande porte, o engasgo habitual sugere estenose
e divertículo esofágico. Sondas estomacais de diâmetro crescente revelam o
estreitamento. Podem ser utilizadas sondas de diâmetro gradualmente maiores
para se determinar o grau da estenose. Radiografia por contraste pode ser usada
no caso de impactação cervical para se avaliar a área envolvida.
Tratamento – Uma alimentação à base de misturas finas e feno picado ajudará
a prevenir a obstrução, porém este procedimento é apenas paliativo e a eutanásia
deve ser considerada. Em alguns casos, o uso de “bougienage” (alargamento
forçoso da estenose por uma sonda com ponta cônica) foi eficaz. O procedimento
é realizado em várias ocasiões, resultando em rompimento do tecido conjuntivo
fibroso e restauração do lúmen esofágico. Se a causa primária é um divertículo, pode
ser possível corrigi-la cirurgicamente.
Doenças do Esôfago, Gr An 210

ESOFAGITE
É raramente diagnosticada como uma entidade clínica em grandes animais.
Pode ocorrer ocasionalmente em cavalos como uma seqüela de trauma causado
por corpos estranhos ou pelo uso descuidado de sondas estomacais; produtos
químicos irritantes podem infreqüentemente estar envolvidos. A esofagite em
potros, e ocasionalmente em cavalos adultos, resulta de refluxo gastroesofágico,
que ocorre secundariamente a uma obstrução ao esvaziamento estomacal. No
gado, esta condição pode ser secundária às doenças infecciosas, tais como diarréia
viral bovina, rinotraqueíte bovina infecciosa ou febre catarral maligna.
Em casos severos, disfagia, salivação, espasmos da musculatura esofágica e
cervical, vômitos e extensão da cabeça e do pescoço podem ser vistos.
A abstenção de água e alimentos por 2 dias geralmente alivia esta condição.
Eletrólitos, metampirona e corticosteróides devem ser administrados como uma
terapia de suporte e para controlar os espasmos. A água pode então ser oferecida
e se tolerada, misturas umedecidas podem ser administradas. Sulfonamidas ou
antibióticos podem ser usados para controlar a infecção.

DISTÚRBIOS DIGESTIVOS DO RÚMEN


Ver também GASTRITE, GR AN, página 239.

SOBRECARGA POR GRÃOS


(Acidose láctica, Impactação ruminal, Ingurgitamento por carboidrato)
É uma doença aguda dos ruminantes caracterizada por indigestão, estase ruminal,
desidratação, acidose, toxemia, incoordenação, colapso e, freqüentemente, morte.
Etiologia e patogenia – A doença é mais comum em gado que teve acesso
acidental a grandes quantidades de carboidratos, especialmente grãos. É também
comum em gado confinado quando introduzida dieta rica em grãos. As causas
menos comuns incluem ingurgitamento com maçãs, uvas, pão, resíduo de panifica-
ção, beterrabas, mangas ou grãos de cervejaria azedos que não foram completa-
mente fermentados. A quantidade de alimento necessária para provocar a doença
aguda depende do tipo de grão, experiência prévia do animal com o mesmo, estado
nutricional e condição do animal, e natureza da microflora. O gado acostumado a
dietas ricas em grão pode consumir 15 a 20kg de grãos e apresentar apenas doença
moderada, enquanto outros podem ter doença aguda e morrer após comer apenas
10kg de grãos.
A ingestão de quantidades tóxicas de carboidratos altamente fermentáveis é
seguida, em 2 a 6h, por uma alteração da população microbiana do rúmen. Há um
acentuado aumento no número de bactérias Gram-positivas (Streptococcus bovis),
que resulta na produção de grandes quantidades de ácido láctico. O pH do rúmen
cai para 5 ou menos, o que destrói os protozoários, microrganismos celulolíticos e
os que utilizam lactato, além de prejudicar a motilidade ruminal. O pH baixo permite
aos lactobacilos utilizarem carboidratos e produzirem quantidades excessivas de
ácido láctico. A sobreposição do ácido láctico e seu sal, lactato, aos solutos
existentes no líquido ruminal causa um aumento substancial na pressão osmótica,
o que atrai líquido para o rúmen e provoca desidratação.
O ácido láctico causa uma ruminite química e sua absorção resulta em acidose
láctica. Em adição a acidose e desidratação, as conseqüências fisiopatológicas são
Distúrbios Digestivos do Rúmen 211

hemoconcentração, colapso cardiovascular, insuficiência renal, fraqueza muscular,


choque e morte. Os animais sobreviventes podem desenvolver ruminite micótica,
em vários dias, ou necrobacilose hepática, algumas semanas ou meses após, ou
laminite crônica e evidências de cicatrização ruminal durante o abate.
Achados clínicos – A sobrecarga resulta em condições que variam de uma
simples indigestão (ver adiante) a uma acidose rapidamente fatal. O tempo entre a
sobrecarga e o aparecimento dos sinais é mais curto com alimentos triturados do
que com grãos inteiros e a severidade aumenta com a quantidade ingerida. Algumas
horas após o ingurgitamento, a única anormalidade detectável pode ser um rúmen
cheio e, possivelmente, alguma dor abdominal (escoiceamento da barriga). Na
forma suave, os movimentos ruminais estão reduzidos, porém não estão inteira-
mente ausentes; os bovinos são anoréticos, porém espertos e alertas; a diarréia é
comum. A ingestão de alimentos inicia-se normalmente em 3 a 4 dias sem qualquer
tratamento específico.
Dentro de 24 a 48h do aparecimento de uma sobrecarga severa, alguns animais
deitarão, outros ficarão cambaleantes, e outros permanecerão em posição de
estática. Todos deixarão de comer. Imediatamente após o consumo de grandes
quantidades de grãos secos, os bovinos podem ingerir muita água, porém uma vez
doentes, não mais beberão.
A temperatura do corpo é geralmente menor que a normal (36,5 a 38,5°C),
porém os animais expostos ao sol podem ter temperatura acima de 41°C. A
respiração tende a ser curta e rápida, de 60 a 90/min. A freqüência cardíaca está
geralmente aumentada, de acordo com a severidade da acidose; o prognóstico
para aqueles com freqüências de 120 a 140/min é ruim. A diarréia é comum e, em
geral, profusa; as fezes variam de pastosas a aquosas, levemente coradas e com
odor levemente azedo. As fezes freqüentemente contêm fragmentos não digeri-
dos do alimento que induziu a sobrecarga. Em casos suaves, a desidratação pode
ser igual a 4 a 6% do peso corporal e, no envolvimento severo, acima de 10 a 12%
do peso corporal.
Em sobrecarga severa, as contrações primárias do rúmen estão completamente
ausentes, embora os sons de gases passando por grandes quantidades de líquido
sejam geralmente audíveis à auscultação. O conteúdo ruminal, palpável através da
fossa paralombar esquerda, pode parecer firme e pastoso em bovinos que previa-
mente estavam em uma dieta de forragens e que consumiram uma grande
quantidade de grãos. Em bovinos que se tornaram enfermos com pequenas
quantidades de grãos, o rúmen estará necessariamente cheio, porém pode parecer
elástico, devido à quantidade excessiva de fluidos. Animais severamente afetados
ficam tontos e podem bater em objetos; seu reflexo palpebral é vagaroso ou ausente;
o reflexo pupilar à luz está geralmente presente, porém é mais vagaroso que o
normal. Eles muitas vezes ficam deitados e quietos, freqüentemente com a cabeça
virada para o flanco, e sua resposta a qualquer estímulo está muito diminuída,
assemelhando-se a casos de paresia parturiente.
A laminite aguda pode estar presente e é mais comum naqueles animais que não
foram severamente afetados; a laminite crônica pode ocorrer semanas ou meses
depois. Anúria é um achado comum em casos agudos, e a diurese após a terapia
líquida é um bom sinal prognóstico.
A morte pode ocorrer em 24 a 72h e um rápido desenvolvimento dos sinais
agudos, particularmente recumbência, sugere a necessidade de um tratamento
urgente e radical. A redução da freqüência cardíaca, o aumento da temperatura, o
retorno dos movimentos ruminais e a passagem de grandes quantidades de fezes
moles são sinais mais favoráveis. Entretanto, alguns animais parecem ter uma
melhora temporária, mas tornam-se outra vez severamente doentes no terceiro ou
quarto dia, provavelmente devido a uma ruminite fúngica severa; nestes, a morte por
Distúrbios Digestivos do Rúmen 212

peritonite difusa aguda geralmente ocorre em 2 a 3 dias. Em vacas prenhes que


sobrevivem à forma severa da doença, pode ocorrer o aborto 10 a 14 dias depois.
Diagnóstico – É geralmente óbvio se o histórico estiver disponível. Pode ser
confirmado pelos achados clínicos, baixo pH ruminal e exame da microflora do
rúmen. Quando apenas um animal está envolvido e não há histórico de ingurgitamento,
o diagnóstico é menos óbvio, porém os sinais clínicos – rúmen atônico com sons
fluídicos, diarréia, andadura cambaleante e temperatura normal – são caracterís-
ticos.
Embora a paresia da parturiente (ver pág. 544) possa simular a sobrecarga
ruminal, a diarréia e a desidratação não são típicas, a intensidade dos sons
cardíacos está reduzida e a resposta à injeção de cálcio é geralmente dramática.
Mastite superaguda por coliformes e peritonite difusa aguda também podem-se
assemelhar à sobrecarga, porém geralmente um exame cuidadoso revelará a causa
da toxemia.
Para evitar o aumento do pH com a exposição ao ar, o líquido ruminal obtido por
sonda estomacal ou paracentese deve ser checado imediatamente. Normalmente,
o pH de bovinos em forragens é de 6 a 7, naqueles em dieta de grãos, de 5,5 a 6.
Valores abaixo destes são fortemente sugestivos de sobrecarga e um pH < 5 indica
acidose severa. Um papel indicador de pH de ampla extensão (2 a 11) é aconselhá-
vel para o uso no campo. O líquido ruminal pode ser checado microscopicamente;
sob baixa energia, 5 a 7 protozoários estão normalmente presentes; na acidose, os
protozoários estão virtualmente ausentes. Um corante do líquido de Gram revelará
uma alteração de bactérias predominantemente Gram-negativas no animal normal
para bactérias predominantemente Gram-positivas em acidose.
Alterações adicionais estão presentes, por exemplo, aumento do lactato sangüí-
neo e dos níveis de fosfato inorgânico, hipocalcemia discreta e pH urinário reduzido,
porém é raramente necessário checar tais valores para se fazer um diagnóstico de
certeza. O problema diagnóstico é decidir quais os animais que necessitam de uma
terapia rigorosa (ou abate); os que necessitam de terapia de suporte; os que
possuem apenas uma indigestão suave que se corrigirá sozinha se for restrita a
ingestão de água e grãos e fornecidos feno e exercícios; e os que não necessitarão
de qualquer tratamento, além dos cuidados de rotina e ração.
Se a sobrecarga for detectada enquanto os bovinos estiverem ainda comendo,
é possível que alguns dos animais do grupo sejam classificados em cada uma das
diversas categorias, e um acompanhamento individual será necessário para mini-
mizar as perdas. Os bovinos encontrados durante a sobrecarga ou logo após devem
ser impedidos de ingerir concentrados ou água, porém devem ingerir feno de boa
qualidade por até 24h e ser forçados a se exercitar periodicamente. Aqueles que
parecem normais ao final do primeiro dia são provavelmente saudáveis, entretanto,
se algum animal do grupo estiver doente, é aconselhável um acompanhamento de
todos os animais por 48h. A maioria dos que ingeriram concentrado suficiente para
se tornarem seriamente doentes deve apresentar os sinais dentro de 6 a 8h.
Tratamento – Para todos os bovinos suspeitos de haverem ingerido quantidades
tóxicas de concentrado, é importante restringir a ingestão de água nas primeiras 18
a 24h. Se a sobrecarga for séria, o abate deve ser considerado; em animais de
engorda, próximos ao final do período, pode ser a escolha mais econômica. A
mortalidade é alta em animais severamente afetados, a menos que uma terapia
vigorosa seja iniciada precocemente. Em tais animais, a remoção do conteúdo
ruminal e a substituição deste por ingesta de animais saudáveis são necessárias.
Em animais que ainda estão de pé, o esvaziamento poderá ser realizado em animais
com sonda estomacal se houver água suficiente. Uma sonda grande de diâmetro
interno (2,5cm × 3m) é utilizada, adicionando-se água em quantidade suficiente para
distender a fossa paralombar esquerda, e esvaziando-se pelo fluxo de gravidade o
Distúrbios Digestivos do Rúmen 213

que ainda houver no rúmen. Se repetido este procedimento 15 a 20 vezes, serão


alcançados os mesmos resultados (requerendo quase o mesmo tempo) que os de
uma rumenotomia para esvaziar e limpar o rúmen com o sifão.
Isto deve ser seguido por uma transferência de fluido ruminal (ver pág. 1684) e,
se sinais de toxicose severa não acompanhados estiverem evidentes, por uma
rigorosa terapia fluídica para corrigir a acidose e desidratação e para retorno da
função renal. Inicialmente, por um período de aproximadamente 30min, uma
solução de bicarbonato de sódio a 5% deve ser administrada EV (5L/450kg).
Durante o próximo período de 6 a 12h, uma solução eletrolítica balanceada ou uma
solução salina de bicarbonato de sódio a 1,3% podem ser administradas EV, até
60L/450kg de peso corporal. (A micção deverá reduzir-se durante este período.)
Usualmente é desnecessária e mesmo indesejada a administração de antiácidos
por via oral (ou intraluminalmente) em adição à terapia mencionada anteriormente.
Nos casos menos severos, o esvaziamento do rúmen é desnecessário.
Nestes, o hidróxido de magnésio (450kg de peso corporal) deve ser adicionado
à água aquecida, bombeado para o rúmen e, então, misturado por massagem do
flanco. Isto pode ser tudo o que é necessário, se o pH do rúmen for maior que 5
e o animal ainda estiver de pé e razoavelmente alerta, algumas horas após a
sobrecarga. Uma freqüência cardíaca de 70 a 85/min, contrações ruminais fracas,
temperatura corporal normal e, especialmente, uma disposição para comer são
garantias adicionais de que a terapia foi suficiente. Se permanecer qualquer
dúvida, devem ser administrados fluidos adicionais. Durante o período de conva-
lescença, que pode ser de 2 a 4 dias, devem ser administrados fenos de boa
qualidade e nenhum grão, sendo que os grãos devem ser reintroduzidos gradu-
almente. O retorno do apetite dentro de 3 dias permite um bom prognóstico.
Entretanto, se o tratamento não foi iniciado em tempo suficiente para prevenir a
acidificação do conteúdo ruminal e é desencadeada uma infecção micótica da
parede ruminal, uma recidiva da condição clínica é provável dentro de 3 a 5 dias;
se isto ocorrer, o prognóstico é grave.
Prevenção – Deve se evitar o acesso acidental aos grãos, pois os bovinos os
comem com apetite e em quantidades a que não estão acostumados. Os bovinos
confinados devem ser introduzidos gradualmente nas rações concentradas por um
período de , 3 semanas, iniciando-se com uma mistura de 50% ou menos de
concentrado em alimento contendo forragem.

PARACERATOSE RUMINAL
É uma doença dos bovinos e ovinos caracterizada pelo endurecimento e
aumento das papilas do rúmen e que ocorre mais comumente em animais alimen-
tados com ração alta em concentrado no período de terminação. Também ocorre em
bovinos alimentados com rações peletizadas à base de alfafa tratadas pelo calor.
Não parece estar relacionada à ingestão de antibióticos ou de concentrados
proteicos. A incidência em um grupo pode ser de até 40%. Acredita-se que as lesões
sejam causadas pela diminuição do pH e pelo aumento da concentração de ácidos
graxos voláteis no suco ruminal (ver também INDIGESTÃO “S IMPLES”, adiante). As
lesões geralmente não ocorrem em bovinos alimentados com grãos inteiros não
processados (naqueles animais em que o ganho de peso é rápido ), o que pode estar
relacionado ao pH mais alto e à maior concentração de ácido acético comparada
com a dos ácidos graxos voláteis de cadeia longa no suco ruminal.
Muitas das papilas encontram-se aumentadas e endurecidas e várias podem-se
aderir umas às outras para formar placas. As papilas do saco ventral anterior são as
mais comumente afetadas. Nos bovinos, o teto do saco dorsal pode mostrar focos
múltiplos de paraceratose, cada foco medindo de 2 a 3cm2 em área. Nos ovinos, as
Distúrbios Digestivos do Rúmen 214

papilas anormais podem ser visíveis e palpáveis através da parede de um rúmen


fechado. As papilas afetadas contêm excessivas camadas de células epiteliais
ceratinizadas, partículas de alimentos e bactérias. Os rúmens dos bovinos afetados
são difíceis de serem limpos durante o preparo culinário. O epitélio anormal,
interferindo com a absorção, pode reduzir a eficiência de utilização dos alimentos e
a taxa de ganho, apesar de existirem muito poucas evidências que suportem esta
teoria.
A paraceratose ruminal pode ser prevenida engordando-se os animais com
rações que contenham ingredientes não moídos na proporção de uma parte da
forragem para três partes de concentrado. Atualmente, a necessidade e o custo-
benefício da prevenção são desconhecidos.

I NDIGESTÃO “SIMPLES”
(Indigestão alimentar discreta)
É um pequeno distúrbio na função gastrointestinal dos ruminantes que ocorre
comumente em bovinos e, raramente, em ovinos. É geralmente relacionado a
mudanças na qualidade ou quantidade da dieta.
Etiologia – Quase todos os fatores da dieta que podem alterar o ambiente do
rúmen podem causar indigestão simples. A doença é comum em bovinos leiteiros
de corte alimentados manualmente por causa da variabilidade na qualidade e
quantidade dos alimentos oferecidos. Bovinos leiteiros podem, repentinamente,
comer excessivas quantidades de alimentos palatáveis, tais como milho ou silagem
de gramíneas; bovinos de corte podem comer excessivas quantidades de forragens
de baixa qualidade relativamente indigeríveis durante o inverno. Durante os perío-
dos de seca, bovinos e ovinos podem ser forçados a comer grandes quantidades de
palha de baixa qualidade, cana ou resíduos de culturas. Uma mudança repentina na
alimentação, usando-se alimentos congelados ou estragados, introduzindo-se uréia
na ração, colocando-se os bovinos em pastagens novas de grãos de cereal, ou o
consumo das placentas, pelas vacas parturientes podem também resultar em
indigestão simples. Certo grau de indigestão simples é comum em bovinos confina-
dos que tenham sido introduzidos em uma ração alta em grãos.
A indigestão simples é primariamente uma atonia ruminal e pode ser conseqüên-
cia de uma repentina mudança no pH do conteúdo ruminal, causada por uma
fermentação excessiva ou putrefação dos alimentos ingeridos. A simples acumula-
ção de quantidades excessivas de alimentos, relativamente indigeríveis, pode
fisicamente prejudicar a função do rúmen por 24 a 48h.
Achados clínicos – Os sintomas dependem do tipo de animal afetado e da causa
do distúrbio. Bovinos leiteiros com indigestão simples, devido a um consumo
exagerado de silagem, são anoréticos e sua produção leiteira diminui moderada-
mente. O rúmen está geralmente cheio, firme e fofo; as contrações primárias estão
ausentes mas as contrações secundárias podem estar presentes. A temperatura, o
pulso e a respiração são normais. As fezes mostram uma consistência normal a
firme, porém em quantidades reduzidas. A recuperação espontânea geralmente
ocorre em 24 a 48h.
A indigestão simples por alimentação excessiva com grãos resulta em anorexia
e estase ruminal; o rúmen não se encontra necessariamente cheio e pode conter
quantidade excessiva de fluidos. As fezes são, em geral, moles e fétidas. Os animais
afetados estão espertos e alertas e, usualmente, começam a comer dentro de 24h.
Um mal-estar mais severo causado pela mesma indigestão está descrito na
discussão de sobrecarga por grãos (ver anteriormente).
Diagnóstico – É baseado grandemente na eliminação de outras possibilida-
des e no histórico de uma mudança na natureza ou quantidade da dieta. Reações
Distúrbios Digestivos do Rúmen 215

sistêmicas e respostas dolorosas à percussão vistas na reticuloperitonite traumá-


tica não são observadas. A ausência da cetonúria e o histórico ajudam a eliminar
cetose das considerações. O deslocamento do abomaso geralmente pode ser
eliminado por auscultação. A indigestão vagal e as torções abomasais tornam-se
facilmente detectáveis quanto mais progredirem, pois possuem um curso longo,
porém as diferenciações iniciais podem ser difícieis. A sobrecarga por grãos é
distinguível pela sua grande severidade e pela queda pronunciada do pH do
rúmen. Fitobezoares causam anorexia parcial ou completa e fezes escassas; em
exames retais, as alças intestinais distendidas e as massas firmes dos fitobezoares
são palpáveis.
Tratamento – O tratamento deve procurar corrigir os fatores suspeitos da
dieta. A recuperação espontânea é usual. A administração de 20 a 40L de água
morna ou salina, via sonda estomacal, seguida da massagem do rúmen, pode
ajudar a restaurar a função deste. O hidróxido de magnésio administrado
oralmente parece ser útil quando excessivas quantidades de alimentos altamente
energéticos forem ingeridas. Se grandes quantidades de uréia ou proteína forem
ingeridas, ácido acético ou vinagre deve ser administrado oralmente. Se a
atividade da microflora ruminal for reduzida, a administração de 4 a 8L de líquido
ruminal de uma vaca sadia ajudará (ver TRANSFERÊNCIA DE FLUIDO RUMINAL,
pág. 1684).

INDIGESTÃO VAGAL
As lesões que envolvem a inervação vagal dos pré-estômagos e abomaso
causam graus variáveis de paralisia destes órgãos e síndromes caracterizadas pelo
atraso da passagem da ingesta, distensão do abdome, anorexia e produção de
fezes moles e pastosas em pequenas quantidades. A condição é comum em
bovinos e foi relatada em ovinos. Em bovinos, a reticuloperitonite traumática (ver
pág. 269) é a causa mais comum de lesões do nervo vago. Em alguns casos, a lesão
do nervo vago não pode ser demonstrada. Os danos aos receptores de tensão,
situados na parede direita do retículo e que controlam reflexamente a atividade
vagal, podem explicar tais casos. É comum ao final da gestação, porém pode ocorrer
em vacas não prenhes. O aparecimento é insidioso e a maioria dos bovinos pode
ficar doente por vários dias ou semanas, até que eles sejam examinados pelo
veterinário. A temperatura é geralmente normal; a freqüência cardíaca pode ser
menor que a normal nos estágios iniciais, porém posteriormente varia de 84 a
100/min. O rúmen está geralmente distendido com fluido e pode estar atônico ou
hipermóvel. Isto pode ser confirmado pela palpação retal, exceto nos casos de
prenhez avançada quando a palpação do órgão é dificultada. A auscultação do
flanco esquerdo pode revelar sons ressonantes similares aos ouvidos nos casos de
deslocamento esquerdo do abomaso. O abomaso pode estar impactado e palpável
externamente através da parede abdominal atrás do arco costal direito ou do lado
direito no assoalho ventral do abdome. Em geral o reto está vazio, exceto por um
muco pegajoso. A maioria dos bovinos afetados morre de inanição secundária,
desidratação e desequilíbrios ácido-básico e de eletrólitos.
A resposta ao tratamento é insatisfatória. As vacas de maior valor que estejam
perto da parição (1 a 2 semanas) podem ser mantidas em terapia fluídica EV
contínua, utilizando-se eletrólitos balanceados e glicose. A rumenotomia fornece
alívio apenas temporário e o uso de catárticos, estimulantes GI e substâncias
lubrificantes não traz resultados. A terapia fluídica e a lavagem do rúmen com uma
sonda estomacal de grande diâmetro são indicadas. O parto pode ser induzido nas
vacas prenhes de mais de 8 meses (ver INDUÇÃO DO ABORTO E DO PARTO, pág. 786).
Doenças Entéricas em Ruminantes 216

DOENÇAS ENTÉRICAS EM RUMINANTES


DOENÇAS ENTÉRICAS EM BOVINOS
As doenças entéricas dos bezerros são discutidas separadamente a seguir,
embora alguns destes agentes também causem doenças entéricas em animais
mais velhos. A infecção por Salmonella spp (ver pág. 178) pode produzir diarréia em
animais de todas as idades, especialmente nos estressados, muito confinados ou
expostos a alimento ou água intensamente contaminados. A doença em animais
mais velhos manifesta-se por disenteria e toxemia, e a mortalidade pode ser
significativa. Rotavírus e coronavírus (ver pág. 217) ocasionalmente causam surtos
de diarréia em bezerros lactentes de 2 a 3 meses de idade. As fezes são volumosas
e podem conter muco. A toxemia não é evidente e a mortalidade é negligenciável,
porém há uma parada na produção. A diarréia viral bovina (DVB, ver pág. 199)
ocorre mais comumente em bovinos jovens (6 a 24 meses de idade) sendo
geralmente acompanhada por lesões típicas nas mucosas; ela deve ser distinguida
de outras doenças virais que produzem diarréia e lesões da mucosa. Estas incluem
febre catarral maligna bovina (ver pág. 480), que é geralmente uma doença
esporádica de bovinos mais maduros e a peste bovina (ver pág. 489), que pode
ocorrer na forma de surtos, porém é exótica na maioria dos países. A coccidiose (ver
pág. 123) ocorre, em geral, em bovinos < 1 ano de idade, especialmente em
situações de superlotação de baias e pastos. Ela é caracterizada por disenteria e
tenesmo e, em alguns casos, está acompanhada por sinais nervosos. Helmintíases
intestinais, particularmente ostertagiose (ver pág. 246), ocorrem em bovinos do
mesmo grupo de idade. A ostertagiose do Tipo I ocorre em bovinos em pastejo,
porém a do Tipo II pode ocorrer em animais confinados. Surtos explosivos de
diarréia em bovinos adultos são comumente associados à disenteria de inverno (ver
pág. 272), porém também podem estar associados com salmonelose quando existe
uma forte contaminação dos alimentos ou água. A diarréia crônica com debilidade
e emagrecimento ocorre como uma doença esporádica, mais comumente associa-
da à paratuberculose (ver pág. 483), porém também pode ser causada por
salmonelose crônica e infecções por DVB crônicas. A diarréia com enfraquecimento
também pode ser observada em bovinos individuais com insuficiência cardíaca
congestiva ou infecções crônicas da cavidade peritoneal. A diarréia persistente com
debilidade e ocasionalmente emaciação em bovinos adultos e de sobreano, pode
estar associada à deficiência secundária de cobre resultante do excesso de
molibdênio nas pastagens (ver pág. 1453), e a diarréia também pode acompanhar
a síndrome de mau aspecto que responde à administração de selênio nos bovinos
em crescimento.
Casos individuais ou surtos de diarréia podem estar associados a mudanças da
dieta. A diarréia pode seguir-se a casos de indigestão simples e é comum na
sobrecarga ruminal (ver pág. 210). Também segue-se à ingestão de quantidades
tóxicas de agentes químicos (por exemplo, arsênico, cobre, zinco e molibdênio) ou
certas plantas venenosas, além do envenenamento por dipiridil ou organofosfatos.
Os bovinos também podem hospedar Campylobacter jejuni no intestino; apesar
disso raramente estar associado à doença clínica nas vacas, a contaminação fecal
do leite pode levar a surtos de gastroenterite em humanos que consumam leite não
pasteurizado ou produtos lácteos. O adenocarcinoma intestinal ocorre em algumas
áreas geográficas, comumente associado à hematúria enzoótica bovina, e acredita-
se ser provocado pela interação de um carcinogênio na samambaia ( Pteridium spp)
e o vírus do papiloma (ver pág. 1989).
Em bovinos a determinação da causa da doença entérica é feita com base nos
achados clínicos, epidemiológicos e de laboratório. A terapia não específica inclui
Doenças Entéricas em Ruminantes 217

reposição dos fluidos e eletrólitos perdidos. A terapia específica e a prevenção estão


detalhadas no tópico sobre doenças individuais.

DOENÇAS ENTÉRICAS EM O VINOS E CAPRINOS


As causas e circunstâncias da diarréia em cordeiros e cabritos são similares
às dos bezerros recém-nascidos. Práticas de parição intensivas e o local de
parição aumentam o potencial para doença e desenvolvimento de agentes
infecciosos, e podem ser associados a sérios surtos de diarréia. Os sorótipos de
Escherichia coli enteropatogênica que causam diarréia secretória em bezerros
(ver adiante) também o fazem em cordeiros, e a abordagem diagnóstica, trata-
mento e controle apropriados são semelhantes. Similarmente, rotavírus (ver pág.
218), coronavírus (ver pág. 218) e criptosporídeos (ver pág. 129) também causam
surtos de diarréia em cordeiros. A disenteria dos cordeiros, causada por Clostridium
perfringens Tipo B (ver pág. 392), é uma doença entérica distinta que ocorre em
cordeiros na 1ª semana de vida. Ocorre principalmente em raças montanhesas
no Reino Unido e é caracterizada por morte súbita ou diarréia, disenteria e
toxemia. Nos EUA, Clostridium perfringens Tipo C (ver pág. 392) causa uma
síndrome similar. A coccidiose (ver pág. 123) e as helmintíases gastrointestinais
(ver pág. 251) são importantes causas de diarréia em ovinos lactentes e desma-
mados, com excessão da hemoncose.
A helmintíase gastrointestinal é a causa mais comum de diarréia nos ovinos em
pastejo. A coccidiose ocorre em associação, com superlotação de pastos ou em
confinamento intensivo e em más condições sanitárias; a infecção por Salmonella
spp (ver pág. 178) pode causar diarréia em todas as idades. As circunstâncias em
que a salmonelose ocorre em cordeiros jovens são semelhantes às dos bezerros.
A salmonelose também pode causar surtos de diarréia ao final da prenhez é
freqüentemente acompanhada por aborto. Ela é mais comum quando os ovinos ou
caprinos estão congregados intensivamente ou estressados, particularmente pelo
transporte. A diarréia pode estar presente na língua azul em ovinos (ver pág. 471)
e é acompanhada por lesões típicas da mucosa. Em caprinos, a diarréia é
freqüentemente uma característica proeminente da enterotoxemia associada com
Clostridium perfringens Tipo D (ver pág. 393). Esta não é uma característica da
doença clínica em ovinos porém pode estar presente em um grupo de animais de
um rebanho ovino afetado. Em ovinos confinados, a diarréia está mais comumente
associada à sobrecarga por grãos, salmonelose ou coccidiose.
Outras doenças entéricas de ovinos adultos podem-se manifestar com diarréia.
A infecção com C. perfringens Tipo C (asma, pág. 392) manifesta-se com dor
abdominal, esforço para defecar e morte rápida. Os ovinos com paratuberculose
(ver pág. 483) geralmente mostram emaciação progressiva sem diarréia. A emacia-
ção progressiva também é um sinal primário em ovinos adultos com adenocarcino-
ma intestinal, que pode ser prevalente em certas áreas geográficas, associado com
ingestão de samambaia (Pteridium sp – ver pág. 1989).

DIARRÉIA NEONATAL EM RUMINANTES


(Curso)
A diarréia é uma doença comum em bezerros, cordeiros e cabritos recém-
nascidos. A doença aguda é caracterizada por uma desidratação progressiva e
morte, às vezes em menos de 12h. Na forma subaguda, a diarréia pode persistir por
vários dias e a emaciação e desnutrição são resultantes. Nesta discussão, a ênfase
da doença é dada para bezerros, mas seus princípios de fisiopatologia e tratamento
aplicam-se a cordeiros e cabritos.
Doenças Entéricas em Ruminantes 218

Etiologia – Vários enteropatógenos estão associados à diarréia neonatal,


variando geograficamente em importância. A Escherichia coli é a causa bacteriana
mais comum de diarréia em bezerros; existem muitas variedades, e há pelo menos
2, e provavelmente 3, tipos distintos de diarréia causados por cepas diferentes deste
microrganismo. As cepas que podem invadir a parede do intestino e sobreviver no
soro geralmente provocam septicemia, que pode ou não ser acompanhada de
diarréia. As cepas que produzem enterotoxinas e possuem o antígeno fimbrial K99
provocam diarréia intensa sem septicemia. Normalmente, apenas bezerros < 3 dias
de idade são afetados por estes primeiros 2 tipos de E. coli . Um terceiro tipo, muito
menos comum, é conhecido como “produtor de verotoxina” ou “de ligação-e-
eliminação”. Este tipo de infecção parece ocorrer em bezerros > 3 dias de idade,
podendo ser acompanhado pela presença de sangue e produtos inflamatórios nas
fezes. As Salmonella spp, especialmente a S. tyiphimurium e a S. dublin, causam
diarréia em bezerros de 2 a 6 semanas de idade (ver também pág. 178). Os
Clostridium perfringens Tipos A, B, C, e E podem causar enterites hemorrágicas e
morte rápida em bezerros e carneiros. A Campylobacter jejuni pode estar presente
nas fezes de bezerros diarréicos, mas também pode ser encontrada nas fezes de
bezerros saudáveis.
Os rotavírus e coronavírus são causas comuns de diarréia em bezerros,
normalmente em animais de 5 a 15 dias de idade. Outros agentes virais e clamidiais
causam diarréias em bezerros, mas parecem ser menos prevalentes que os
rotavírus e coronavírus. Foi relatado que os vírus da diarréia viral bovina e da
rinotraqueíte infecciosa bovina causaram diarréia em bezerros, porém esta não é
uma manifestação comum destas infecções. As Cryptosporidium spp são protozoá-
rios que comumente provocam diarréia em bezerros de 5 a 35 dias de idade (ver
pág. 129).
A diarréia pode também ser provocada por excesso de leite ou pela utilização de
substitutos lácteos malformulados. Além disso, há evidências de que a deficiência
de vitamina C é um fator na diarréia de neonatos em alguns rebanhos.
Os enteropatógenos associados à diarréia de bezerros podem ser comumente
encontrados nas fezes de bezerros sadios e a infecção intestinal leva à diarréia na
dependência de vários determinantes. Vários determinantes epidemiológicos in-
cluem: transferência insuficiente de imunoglobulinas colostrais, falta de anticorpos
específicos no colostro de fêmeas que não foram expostas aos patógenos especí-
ficos, estresse causado por ambiente fechado ruim ou proteção inadequada contra
o clima, dieta insuficiente ou inadequada higiene inadequada, e manejo geral ruim.
Patogenia – A diarréia nos ruminantes neonatos geralmente está associada à
doença do intestino delgado, podendo ser provocada por hipersecreção ou malabsor-
ção. A diarréia hipersecretória ocorre quando um volume anormal de líquido é
secretado para o interior do intestino, excedendo a capacidade reabsortiva da
mucosa. Na diarréia malabsortiva, a capacidade da mucosa para absorver líquidos e
nutrientes está tão prejudicada que não pode acompanhar o influxo normal de líquidos
ingeridos e secretados. A diarréia malabsortiva pode ser agravada pela fermentação
colônica de nutrientes que normalmente seriam absorvidos no intestino delgado. Os
produtos da fermentação, especialmente o ácido láctico, parecem atrair,
osmoticamente, água para o interior do cólon, o que contribui para a intensidade da
diarréia. A maior parte das formas infecciosas de diarréia provavelmente possui os
componentes hipersecretório e malabsortivo combinados, apesar de um ou outro
geralmente predominarem. Ambos levam a rápida perda de água e eletrólitos
corporais, além do bicarbonato, resultando em grave desidratação e acidose.
As E. coli enterotoxigênicas (as que possuem um fator de ligação, como o
antígeno K99, e produzem uma enterotoxina) estimulam hipersecreção acentuada.
Outras formas de E. coli, assim como salmonelas, também podem produzir
Doenças Entéricas em Ruminantes 219

enterotoxinas que induzem hipersecreção, mas estas ainda não foram identificadas
quimicamente. Além da produção de enterotoxinas específicas, as bactérias tam-
bém podem induzir diarréia secundariamente devido à ação hipersecretória de
diversos produtos da inflamação. As salmonelas geralmente provocam septicemia,
além da diarréia. A C. perfringens patogênica produz toxinas necrosantes.
Os vírus geralmente provocam uma diarréia malabsortiva por destruição das
células absortivas da mucosa, encurtando assim os vilos intestinais. O mecanismo
pelo qual os criptosporídeos provocam a diarréia não é completamente entendido,
mas parece possuir um componente malabsortivo.
Os substitutos lácteos malformulados provocam diarréia por dois mecanismos,
ambos associados à malabsorção. Produtos vegetais (especialmente soja) são
comumente utilizados como fontes de proteína na manufatura dos substitutos
lácteos. Dependendo do grau de refinamento, estes produtos podem conter carboi-
dratos que são indigeríveis para os bezerros neonatos. Estes carboidratos não são
absorvidos no intestino delgado e podem contribuir para a diarréia pela fermentação
colônica. Além disso, a maior parte dos bezerros <3 semanas de idade parece ter
uma reação alérgica às proteínas da soja, o que resulta em atrofia vilosa, levando
a uma diarréia que é provavelmente malabsortiva.
Achados clínicos – Os principais sinais são diarréia, desidratação, fraqueza
profunda e morte em 1 a vários dias após o aparecimento. Geralmente, é difícil fazer
um diagnóstico etiológico definitivo baseado apenas nos achados clínicos. Entretan-
to, pela consideração do histórico, idade dos animais e sintomas clínicos, um
diagnóstico presumível pode ser possível.
A diarréia por E. coli enterotoxigênica (que possui K99) ocorre em bezerros < 3
a 5 dias de idade, raramente após. O início é repentino. Há eliminação profusa de
fezes líquidas e os bezerros rapidamente ficam deprimidos e em decúbito. O colapso
circulatório e a morte podem ocorrer em 12 a 24h. A temperatura corporal pode estar
elevada, mas geralmente está normal ou subnormal. A resposta à terapia com
fluidos e eletrólitos geralmente é boa, se administrada precocemente. A diarréia
causada por Salmonella spp normalmente não ocorre em bezerros <14 dias de
idade. É caracterizada por fezes fétidas, com sangue, fibrina e grande quantidade
de muco; a febre é comum. Os bezerros com salmonelose em geral perdem peso
rapidamente e muitas vezes morrem apesar da terapia vigorosa. A enterotoxemia
hemorrágica por C. perfringens Tipo B ou C é caracterizada por um início agudo de
depressão, fraqueza, diarréia sanguinolenta, dor abdominal e morte em poucas
horas. Normalmente ocorre em bezerros vigorosos de apenas alguns dias de idade,
com bom apetite e fonte de leite disponível. Os bezerros afetados por C. perfringens
geralmente morrem antes que possa ser instituído um tratamento.
A diarréia por rotavírus, coronavírus e outros vírus normalmente ocorre em
bezerros de 5 a 15 dias de idade. Os bezerros afetados ficam apenas moderada-
mente deprimidos e muitas vezes continuam mamando ou bebendo leite. As fezes
são volumosas, de moles a líquidas, e muitas vezes contêm grandes quantidades
de muco. A diarréia normalmente persiste por 3 a vários dias, sendo que alguns
casos de diarréia por coronavírus tornam-se crônicos. Os casos de diarréia viral que
não são complicados por outros patógenos geralmente respondem em poucos dias
à terapia com fluidos e eletrólitos bem como suporte nutricional adequado.
A criptosporidiose ocorre em bezerros de 5 a 35 dias de idade, sendo caracteri-
zada por diarréia persistente que não responde à terapia. A diarréia devida apenas
às Cryptosporidium spp é geralmente leve e autolimitante, apesar de a gravidade
poder estar relacionada ao estado geral do bezerro e à intensidade de exposição ao
microrganismo. As infecções combinadas de criptosporídeos, rota e/ou coronavírus
são comuns, resultando em diarréia persistente que muitas vezes é caracterizada
por emaciação e morte.
Doenças Entéricas em Ruminantes 220

As diarréias por dieta ocorrem em bezerros < 3 semanas de idade, sendo


caracterizadas por fezes volumosas de consistência pastosa a gelatinosa. Inicial-
mente os bezerros estão alertas e têm bom apetite. Eventualmente, no entanto, se
a dieta não for corrigida, ficam fracos e emaciados. As formas infecciosas de diarréia
muitas vezes são complicadas por dietas de má qualidade e/ou conteúdo nutricional
insuficiente.
Diagnóstico laboratorial – As amostras fecais podem ser submetidas ao
isolamento e à caracterização dos enteropatógenos comuns. Técnicas especiais
são necessárias para demonstração dos vírus, criptosporídeos e E. coli possuindo
K99. A demonstração dos vírus requer amostras fecais de bezerros nos estágios da
diarréia. A interpretação de microbiologia fecal pode ser dificultada por causa das
infecções mistas. Quando ocorrem surtos de diarréia, a melhor informação diagnós-
tica geralmente é obtida submetendo-se animais não tratados, afetados agudamen-
te, à necropsia. Isto permite o exame da mucosa intestinal em busca de evidências
de lesões diagnósticas e da presença física de enteropatógenos tais como os
criptosporídeos. O valor diagnóstico da necropsia diminui rapidamente com o tempo
após a morte; as lesões importantes podem desaparecer em minutos devido à
autólise. É importante sacrificar animais para necropsia quando se tentam diagnos-
ticar graves problemas no rebanho. Em todos os casos, devem ser coletadas
informações sobre o consumo de leite total ou de substituto lácteo. Quando se está
administrando substituto lácteo, a composição da dieta deve ser avaliada. A
imunidade não específica deve ser avaliada determinando-se as concentrações
séricas de imunoglobulina e vitamina A.
Tratamento – Muitos dos fatores envolvidos na resistência à doença são inespe-
cíficos; portanto, medidas preventivas importantes podem ser tomadas e a terapia
pode ser iniciada antes que se tenha estabelecido um diagnóstico etiológico. O
tratamento inclui reposição de fluidos e eletrólitos, alterações na dieta, terapia com
antimicrobianos e imunoglobulinas, uso de drogas antidiarréicas e adsorventes. A
vitamina C merece pelo menos uma tentativa nos surtos. A terapia de fluidos e
eletrólitos é a mais importante e deve ser iniciada logo que possível. Os bezerros que
ainda ficam em pé e mamam muitas vezes podem ser tratados apenas com eletrólitos
orais. Muitos preparados comerciais que contêm sódio, glicose e outros ingredientes
estão disponíveis e são formulados de modo a promover a absorção de sódio e água
através da parede intestinal. Estes preparados podem ser administrados por mama-
deira ou, se necessário, por sonda estomacal. A solução deve ser utilizada livremente
até que o animal esteja reidratado. A administração ou não de leite durante o período
de reidratação é controversa. A alimentação com leite pode aumentar o volume fecal,
mas fornece energia ao bezerro e pode promover cicatrização do intestino. Os
bezerros possuem grande necessidade de energia e poucas reservas. As soluções
de eletrólitos não suprem as necessidades energéticas dos bezerros; portanto, se o
leite for suspenso, não deve ser por mais de 24 a 36h.
Os bezerros que estão recumbentes e fracos, mostrando evidências de perda de
líquido ≥ 8% do seu peso corporal exigem terapia EV com fluidos e eletrólitos. Estes
bezerros geralmente estão em acidose, podendo-se corrigir o déficit de líquido e
base inicialmente pela administração de uma solução isotônica (13g/L) de bicarbo-
nato de sódio. O ritmo ideal de administração desta solução é de 100mL/kg de peso
corporal em 4 a 6h. Os bezerros freqüentemente estão hipoglicêmicos; a adição de
25 a 50g de dextrose à solução de bicarbonato muitas vezes é benéfica. A solução
de bicarbonato deve ser seguida por uma terapia líquida EV contínua com uma
solução de eletrólitos fisiologicamente balanceada administrada em 5 a 8mL/kg/h
pelas próximas 20h; taxas maiores podem ser necessárias, dependendo da inten-
sidade da diarréia. As soluções de eletrólitos orais podem, e provavelmente devem,
ser usadas concomitantemente com a terapia EV.
Doenças Entéricas em Eqüinos 221

O uso de antimicrobianos é controverso, e não foi corroborado pelos testes


clínicos. Várias drogas, como os derivados do ópio, que afetam a secreção e
mobilidade intestinais em algumas espécies, estão disponíveis, mas não possuem
eficácia estabelecida em ruminantes neonatos. Os géis e adsorventes intestinais,
como o caolim e a pectina, são de uso generalizado, porém seu único efeito
estabelecido é aumentar a consistência fecal.
Prevenção e controle – Devido à natureza complexa da diarréia neonatal, não
é realista, esperar-se pela prevenção total – um controle econômico deve ser o
objetivo principal. A incidência da doença clínica e a taxa de fatalidade são
dependentes do balanço entre o nível de exposição a agentes infecciosos e o nível
de resistência em bezerros. As diferenças no tamanho do rebanho; disponibilidade
de instalações, terra e trabalho; e os objetivos gerais de manejo tornam impossível
recomendarem-se procedimentos específicos de manejo que sejam aplicáveis a
todas as situações. Entretanto, existem três grandes princípios de manejo que
devem ser aplicados a todos os rebanhos: 1. reduzir o grau de exposição dos
animais recém-nascidos pelo isolamento de animais doentes, ou pela remoção e
erguimento dos bezerros para uma área separada, e pelas boas práticas de higiene;
2. fornecer resistência não específica máxima, com fornecimento de boa nutrição à
mãe e ao neonato e assegurar que bezerros recém-nascidos consumam ≥ 5% de
seu peso corporal de colostro de alta qualidade em 6h do nascimento; e 3. aumento
da resistência específica do recém-nascido pela vacinação da mãe ou do recém-
nascido. Uma parte significativa dos bezerros que mamam na mãe e que recebem
o colostro em mamadeiras não adquire as quantidades adequadas de imunoglobu-
lina devido à demora para mamar o colostro e/ou ingestão de um volume insuficiente
(ver INTERAÇÃO MANEJO-DOENÇA: BOVINOS, pág. 1343, e MANEJO DA REPRODUÇÃO:
BOVINOS, pág. 1367).
A imunização dos bezerros contra a colibacilose pela vacinação da vaca prenhe
pode controlar a colibacilose enterotoxigênica. O animal prenhe é vacinado 6 e 2
semanas antes do parto, para estimular anticorpos contra as cepas enterotoxigênicas
da E. coli; estes anticorpos são, então, passados ao recém-nascido através do
colostro (fornecido o bezerro ingere o colostro).
Um anticorpo monoclonal E. coli K99 está atualmente disponível para adminis-
tração oral em bezerros logo após o nascimento. É um substituto eficaz para o
anticorpo K99-específico no colostro das vacas vacinadas, apesar de os bezerros
que recebem este produto também precisarem do colostro devido à sua proteção
inespecífica. As vacinas contra rotavírus e coronavírus são utilizadas de maneira
semelhante; no entanto, a concentração de anticorpos no colostro ou leite que é
estimulada pelas vacinas disponíveis no momento pode não ser protetora.

DOENÇAS ENTÉRICAS EM EQÜINOS


A doença entérica nos eqüinos é sugerida por diarréia, perda de peso, hipopro-
teinemia e dor abdominal (ver CÓLICA, pág. 201).

DOENÇAS DIARRÉICAS EM CAVALOS ADULTOS


A diarréia em cavalos adultos pode ser aguda ou crônica. As causas conhecidas
de diarréia aguda incluem bactérias, como as salmonelas, Ehrlichia risticii e
clostrídeos. Uma doença diarréica aguda e fatal de etiologia desconhecida é
classificada como colite-X. A diarréia que persiste por mais de 1 mês é considerada
Doenças Entéricas em Eqüinos 222

crônica, sendo muitas vezes seu diagnóstico um problema desconcertante. Os


diagnósticos diferenciais incluem parasitismo, enteropatia por areia e lesões
infiltrativas. A alergia a componentes da dieta podem também ter seu papel na
diarréia crônica.

Salmonelose
As manifestações clínicas variam de assintomáticas (portadores) até diarréia
aguda intensa. A doença, na maioria das vezes, ocorre esporadicamente, mas pode
tornar-se uma epidemia, dependendo da virulência do sorótipo específico. A
infecção pode ocorrer via contaminação da comida ou água, ou por contato com
animais que estão eliminando ativamente a bactéria. O estresse parece ter um papel
importante na patogenia; um histórico de cirurgia, transporte e doença concorrente
muitas vezes precede a diarréia em 2 a 7 dias. Salmonella typhimurium, S.
enteritidis, S. agona, S. anatum, S. heidelberg, e S. newport são os sorótipos mais
comuns associados à diarréia em adultos. A identificação do sorótipo pode auxiliar
na obtenção de um prognóstico preciso. Alguns sorótipos, por exemplo, S.
typhimurium, parecem ser mais patogênicos que outros.
Achados clínicos – Três formas foram reconhecidas em cavalos adultos. A
primeira é o portador assintomático, que pode ou não estar eliminando ativamente
o microrganismo, mas tem o potencial de transmiti-lo para os animais suscetíveis.
Se estressado, o portador pode também desenvolver a doença clínica. Várias
culturas fecais podem ser necessárias para identificar esta forma, pois o microrga-
nismo é eliminado intermitentemente e em pequeno número.
A segunda forma é uma doença leve, com sintomas de depressão, febre,
anorexia e fezes moles, porém não aquosas. Os cavalos apresentam uma neutro-
penia absoluta. A doença clínica pode durar de 4 a 5 dias e normalmente é
autolimitante. Pode ser feita a cultura de salmonelas a partir das fezes. Os animais
recuperados podem continuar excretando o microrganismo em suas fezes por
algumas semanas; portanto recomenda-se o isolamento e desinfecção completa da
área contaminada.
A terceira forma é a mais comum, caracterizando-se por um início agudo de
depressão intensa, anorexia, neutropenia profunda e, freqüentemente, dor abdomi-
nal. A diarréia ocorre em 6 a 24h. As fezes são liquefeitas, fétidas, podendo conter
elementos da mucosa e, raramente, sangue vivo. Estes animais desidratam-se
rapidamente. A acidose e perda de eletrólitos (Na +, K+, Cl–) ocorre conforme a
condição se deteriora. A salmonelose grave é também uma enteropppatia com
perda de proteínas. Os níveis plasmáticos de proteína podem ficar perigosamente
baixos após alguns dias de diarréia. Ocasionalmente estes animais sofrem bacte-
remia. Se não tratada, esta forma é normalmente fatal.
Diagnóstico – É feito sobre os sintomas clínicos, neutropenia intensa e cultura
positiva de fezes ou sangue. O cultivo de pequenas quantidades de fezes tem sido
mais bem-sucedido na identificação dos portadores que o cultivo de “swabs” retais.
Como as salmonelas não podem ser consistentemente obtidas em culturas de
animais que as estão eliminando ativamente, é necessário utilizar várias amostras
coletadas em momentos diferentes. A cultura adicional de biópsias de mucosa retal
aumenta a probabilidade de isolamento do microrganismo. As amostras devem ser
colocadas em caldo de selenito no momento da coleta para minimizar o crescimento
de outras bactérias fermentadoras de lactose.
Tratamento – O tratamento da forma grave de salmonelose é baseado na
reposição EV de líquidos e eletrólitos. Uma solução balanceada de eletrólitos, por
exemplo, lactato de Ringer, é boa para reposição de volume. Como o líquido está
sendo secretado ativamente para o lúmen intestinal, podem ser necessários
Doenças Entéricas em Eqüinos 223

volumes de 40 a 80L. As deficiências de eletrólitos e o desequilíbrio ácido-básico


podem ser corrigidos utilizando-se fluidos enriquecidos com cloreto de potássio e
bicarbonato de sódio.
A terapia antimicrobiana específica é questionável. Já foi desenvolvida resistên-
cia a vários antibióticos; a resistência parece ser maior a ampicilina, cloranfenicol e
gentamicina. Os padrões de sensibilidade podem mudar ao longo do curso de um
surto. A seleção do antibiótico deve ser determinada pelo padrão de sensibilidade
do microrganismo isolado.
O uso de protetores GI, por exemplo, subssalicilato de bismuto e carvão ativado,
pode ser benéfico, mas isto ainda não foi provado. Baixas doses de flunixin
meglumina administradas sistemicamente ajudam a evitar os efeitos das endotoxi-
nas que são liberadas.
Os proprietários devem ser advertidos da natureza zoonótica das Salmmonella
spp. Devem ser mantidas práticas estritas de higiene quando se lida com animais
infectados.

Febre eqüina de Potomac


(Erlichiose monocítica eqüina, Colite erlichiosa eqüina)
(Ver ERLICHIOSE EQÜINA, pág. 453.)
Trata-se de uma síndrome diarréica aguda inicialmente descrita nos cavalos que
estavam próximos ao Rio Potomac em Maryland e na Virgínia, e no vale do Rio
Susquehanna, na Pensilvânia. O agente causador foi identificado como sendo a
Ehrlichia risticii. Subsequentemente, foram encontrados anticorpos contra E. risticii
em cavalos de 18 estados dos EUA e no Canadá. A doença não foi relatada fora da
América do Norte. Ocorre esporadicamente, freqüentemente com apenas um
animal acometido na fazenda.
Devido à natureza sazonal da doença (alta incidência no verão e no outono) e pelo
fato de ser transmitida pela inoculação sangüínea, suspeita-se de um vetor artrópode.
A maioria das rickéttsias é transmitida por carrapatos, pulgas ou piolhos. Até o
momento, nenhuma espécie em particular foi incriminada como vetor da E. risticii.
Achados clínicos – Os primeiros sintomas após um período de incubação de 9
a 15 dias são depressão, anorexia, febre, membranas mucosas congestionadas e
íleo. A diarréia pode ser observada em 24h após os primeiros sintomas. Nas
populações completamente suscetíveis, desenvolve-se uma diarréia aquosa leve
em , 30% dos cavalos afetados, e uma diarréia aquosa intensa em , 50%. A cólica
e a laminite podem ocorrer em até 30% dos casos.
A contagem de leucócitos é variável; é comum uma leucopenia marcante seguida
de leucocitose. A linfopenia e um desvio à esquerda levemente neutrofílico ocorrem
muitas vezes no início da febre e depressão.
A gravidade varia consideravelmente, mas na falta de tratamento, a mortalidade
aproxima-se dos 30%, com a morte sendo causada principalmente por desidratação
e choque hipovolêmico, ou devido a uma laminite que exige eutanásia. Os achados
de necropsia incluem conteúdo líquido no ceco e cólon maior. As lesões intestinais
variam de manchas de hiperemia e petequiação até uma enterocolite difusa.
Diagnóstico – Pode ser feito com base nos sintomas clínicos, leucopenia
transitória (especificamente linfopenia) no início da manifestação clínica, impossi-
bilidade de cultivo de Salmonella spp, e talvez a presença de um alto título sérico de
anticorpos contra E. risticii, medido por testes de anticorpos imunofluorescentes e
ELISA. Infelizmente, os títulos de testes de anticorpos imunofluorescentes estão
próximos de seu máximo no momento do início da diarréia; portanto, pode não
ocorrer alteração no título entre as amostras das fases aguda e convalescente.
Outro fator complicante é que os títulos podem-se manter elevados (> 1:320) por
Doenças Entéricas em Eqüinos 224

mais de 1 ano. Por estas razões, a interpretação clínica dos resultados da titulação
pode não ser válida com base em casos individuais.
O isolamento da E. risticii é o método mais acurado de diagnóstico, porém é
difícil. Raramente, o microrganismo causador pode ser observado no interior de
monócitos em esfregaços sangüíneos corados por Giemsa ou Wright.
Tratamento – O regime terapêutico para a febre eqüina de Potomac é semelhan-
te ao da salmonelose aguda, que é o diagnóstico diferencial principal. Deve incluir
fluidoterapia EV agressiva e reposição de eletrólitos. A Ehrlichia risticii parece ser
mais sensível à oxitetraciclina tanto nos estudos in vitro quanto nos in vivo.

Clostridiose
Clostridium perfringens do Tipo A, pela produção de enterotoxinas, pode causar
diarréia aguda e toxemia nos eqüinos. A incidência é esporádica, podendo ser
afetados cavalos de todas as idades. O prognóstico depende da intensidade da
intoxicação.
Os sintomas são semelhantes aos outros casos de diarréia aquosa peraguda a
aguda. A depressão, a desidratação e a alteração na cor das membranas mucosas
são evidentes. A freqüência cardíaca pode ser > 100 batidas/min. A leucopenia pode
ser seguida de leucocitose. Uma elevação no AST (SGOT) indica dano hepático,
que pode ser confirmado pela biópsia.
Os achados de necropsia incluem tifilite e colite hemorrágica ou necrosante. O
intestino delgado também pode estar afetado. A degeneração do miocárdio pode ser
evidente microscopicamente. Hiperemia, edema, hemorragia e superinflação pul-
monares são observados consistentemente. A cultura fecal e a quantificação das
bactérias são necessárias para a confirmação. Uma contagem de 102 ou mais
unidades formadoras de colônias de C. perfringens/g de fezes é considerada
diagnóstica. Este microrganismo raramente é isolado de fezes normais.
A terapia de suporte (EV) com uma solução balanceada de eletrólitos é importan-
te. Na Suécia, os animais afetados são tratados com um produto lácteo que é
produzido a partir de uma cepa produtora de ácido láctico de estreptococos; isto
parece ser eficaz, apesar de a ação farmacológica ser desconhecida. Foi relatado
algum sucesso terapêutico com a utilização de antitoxina Tipos C e D para C.
perfringens, 250mL diluídos em 2L de solução de lactato de Ringer e administrados
lentamente por via EV. Uma vez que o animal se recuperou da fase aguda da
doença, deve ser repousado por pelo menos 1 mês para permitir que uma possível
lesão do miocárdio se cure.

Colite-X
É uma doença peraguda, fatal, de etiologia desconhecida e caracterizada por
início súbito de diarréia aquosa profusa e desenvolvimento de choque hipovolêmico.
Muitos cavalos afetados têm histórico de estresse.
Clinicamente, pode haver um breve período febril, porém a temperatura logo
retorna ao normal ou subnormal. A taquipnéia, taquicardia e depressão marcante
estão presentes. Desenvolve-se uma diarréia explosiva, seguida de desidratação
extrema. O choque hipovolêmico e, provavelmente, o endotóxico são manifestados
em tempo de preenchimento capilar ruim, membranas mucosas arroxeadas e
extremidades frias. A morte pode ocorrer em 3h do início ou, nos casos menos
agudos, em 24 a 48h. A maioria dos cavalos permanece em pé até o estágio terminal.
Na necropsia, há um edema e hemorragia acentuados na parede do cólon maior e
ceco, e o conteúdo intestinal é liquefeito e tingido de sangue.
Tipicamente, o hematócrito é > 65%, mesmo logo após o início. O leucograma
varia de normal a neutropenia com desvio à direita degenerativo. A acidose
Doenças Entéricas em Eqüinos 225

metabólica e os desequilíbrios eletrolíticos que são associados à diarréia também


estão presentes.
O início da doença muitas vezes está diretamente associado ao estresse, tais
como cirurgia e transporte. A salmonelose peraguda pode causar sintomas idênticos
aos da colite-X, mas, nesta última, as Salmonella spp não podem ser cultivadas a
partir das fezes ou de órgãos. Outras doenças diarréicas que podem imitar a colite-
X são a anterotoxemia causada pela C. perfringens Tipo A, a febre eqüina de
Potomac, o choque endotóxico experimental em pôneis e a anafilaxia. Uma manifes-
tação semelhante pode ser observada após o uso de tetraciclina ou lincomicina.
O tratamento da colite-X é semelhante ao da salmonelose (ver anteriormente).
Grandes volumes de líquido EV são necessários para contrabalançar a desidrata-
ção intensa, e a reposição de eletrólitos e bicarbonato é necessária. A flunixin
meglumina pode ajudar a evitar os efeitos das endotoxinas.

Parasitismo
Tanto os grandes estrôngilos quanto os pequenos foram incriminados como
causa da diarréia crônica (ver PARASITAS GASTROINTESTINAIS DOS CAVALOS, pág. 241).
A giardíase (ver pág. 163) é relatada como sendo uma causa possível de diarréia
intermitente em cavalos.

Enteropatia por areia


A ingestão de grandes quantidades de areia pode provocar irritação ou obstrução
GI. A areia é ingerida quando o cavalo pasta em locais arenosos ou é alimentado
com fenos e grãos jogados ao chão. A irritação na mucosa pode provocar diarréia
antes que se note a obstrução. O diagnóstico pode ser realizado com base no
histórico de ambiente arenoso e presença de areia nas fezes. O tratamento envolve
a utilização de um produto à base de hemicelulose que pode ser administrado via
sonda nasogástrica ou adicionado diariamente à ração (125 a 175g).

Doença infiltrativa
Qualquer processo que cause espessamento das paredes do cólon maior pode
interferir na absorção de água, resultando assim em diarréia crônica. Isto inclui
neoplasias, inflamação e formação de cicatrizes devidas a uma colite aguda
anterior. O exame retal pode ajudar a detectar uma neoplasia. A biópsia retal pode
ser benéfica no diagnóstico, mas uma biópsia de cólon, obtida cirurgicamente, é
mais confiável.

DOENÇAS DIARRÉICAS EM POTROS


A diarréia é bastante comum em potros < 6 meses de idade. Muitos episódios são
leves e autolimitantes, mas alguns podem ser fatais se o potro estiver séptico ou
desidratado. A diarréia do cio do potro, assim como bactérias e vírus são as causas
mais comuns de diarréia em potros.

Diarréia do cio do potro


Entre 4 e 14 dias após o parto, os potros desenvolvem uma diarréia leve e
autolimitante. Durante este período a égua normalmente está passando pelo seu
primeiro ciclo estral, daí o nome de diarréia do cio do potro. Apesar de a causa ainda
ser obscura, pode estar associada à alteração da flora microbiana do potro ou a um
aumento na forragem introduzida no cólon maior. Não parece ser causa infecciosa
ou parasitária.
Doenças Entéricas em Eqüinos 226

O potro permanece ativo e alerta, e o apetite não é afetado. Os sintomas vitais


se mantêm dentro dos limites normais. A consistência fecal pode variar de mole a
aquosa. É importante a observação para garantir que a condição do animal não
piore.
Não é necessário o tratamento específico, mas a aplicação de óxido de zinco em
torno do períneo ajuda a evitar assaduras. O subsalicilato de bismuto VO pode ser
útil em alguns casos prolongados.

Diarréia bacteriana
A enterite/colite bacteriana em potros neonatos é muitas vezes um componente
da septicemia neonatal. Os microrganismos que podem estar envolvidos incluem a
Salmonella, Escherichia coli e a Klebsiella. São necessários terapia antimicrobiana
intensiva, correção de desequilíbrios de fluido e eletrolíticos e cuidados de enferma-
gem. Como a maioria dos potros afetados pode não ter recebido colostro adequado,
as transfusões de plasma podem ser indicadas (ver SEPTICEMIA NOS POTROS, pág.
457).
Uma diarréia hemorrágica aguda e fulminante com alta mortalidade que ocorre
em potros jovens está associada a Clostridium perfringens dos Tipos B e C. As
infecções podem ser esporádicas ou disseminadas em uma fazenda. A depressão
intensa e a rápida deterioração do estado cadiovascular são seguidas de morte em
24 a 48h. Na necropsia encontra-se uma hemorragia intraluminal e necrose extensa
de mucosa do intestino delgado.
Outras bactérias que foram associadas às diarréias de potros são Bacteroides
fragilis, Clostridium difficile e Rhodococcus (Corynebacterium) equi. As duas primei-
ras ocorrem em potros < 2 semanas de idade e exigem tratamento de suporte
intensivo. Apesar de a R. equi ser primariamente uma infecção respiratória, podem
ser observadas enterites agudas e crônicas; a diarréia é observada em potros de 1
a 4 meses de idade. O diagnóstico é mais fácil se há pneumonia. A bactéria pode
ser cultivada a partir de lavado traqueal. A cultura fecal positiva não é útil, pois a R.
equi é normalmente encontrada nas fezes de potros saudáveis. A eritromicina
combinada à rifampina é o tratamento de escolha.

Diarréia viral
O rotavírus é a principal causa de diarréia em potros. É altamente contagioso
e pode atingir todos os potros em uma fazenda em 3 a 5 dias. A doença é
caracterizada por depressão, anorexia e diarréia aquosa profusa. Normalmente
é observada em potros < 2 meses de idade, afetando mais gravemente os mais
jovens. A diarréia normalmente dura de 4 a 7 dias, apesar de poder persistir por
semanas.
O vírus destrói os enterócitos absortivos no intestino delgado, o que causa
malabsorção. Há também uma deficiência de lactase, o que resulta na passagem
da lactose para o intestino grosso, induzindo uma diarréia osmótica.
O diagnóstico é realizado pela identificação do vírus nas fezes por microscopia
eletrônica ou ELISA. O teste de ELISA é rápido e conveniente.
O tratamento geralmente é de suporte. A utilização de um preparado comercial
de lactase adicionado ao leite pode auxiliar os potros com infecção persistente.

Causas variadas
Pode ocorrer uma diarréia nutricional por superalimentação, como quando o
potro é reunido à mãe após um período de separação; e por nutrição imprópria, como
quando potros órfãos são alimentados com leite de vaca, ou potros que recebem
Doenças Entéricas em Eqüinos 227

sacarose. A intolerância à lactose em potros foi relatada, porém é rara e pode ser
determinada pelos testes de desafio à tolerância à lactose. A diarréia em potros pode
também estar associada à Strongyloides westeri e à criptosporidiose. Pode ser
observada uma doença intestinal em potros árabes com síndrome de imunodefi-
ciência combinada.

PERDA DE PESO E HIPOPROTEINEMIA


As causas para perda de peso nos cavalos são numerosas, podendo envolver
quaisquer dos sistemas corporais. Esta discussão se limita às doenças do trato GI.
A perda de proteínas pode ou não estar associada à perda de peso. Os distúrbios
que estão comumente associados com um destes sintomas são neoplasia GI,
doença inflamatória intestinal e intoxicação por fenilbutazona.

Neoplasia gastrointestinal
O carcinoma de células escamosas do estômago e a forma alimentar de
linfossarcoma são as formas mais comuns de neoplasia GI nos eqüinos. A perda de
peso crônica pode ser a única queixa. Uma diarréia crônica e hipoalbuminemia
podem ser observadas em cavalos nos quais o linfossarcoma se infiltrou na parede
intestinal.
Como a incidência de neoplasias GI é baixa, as outras causas de perda de peso
devem ser investigadas primeiro. O diagnóstico geralmente é realizado por exclusão
destas outras causas e pela necropsia. O carcinoma de células escamosas do
estômago pode ser diagnosticado por gastroscopia; é necessário um endoscópio de
fibra óptica de 2 a 3m para examinar-se a mucosa gástrica de cavalos adultos. No
linfossarcoma, a palpação retal pode detectar linfonodos aumentados ou intestino
espessado. Uma laparotomia exploratória, com biópsia intestinal, pode fornecer um
diagnóstico definitivo.
Não há tratamento específico disponível para neoplasia GI em eqüinos. O
prognóstico é grave.

Doença inflamatória intestinal


A enterite granulomatosa e a gastroenterite eosinofílica crônica devem ser
consideradas no diagnóstico diferencial de perda de peso e hipoproteinemia.
Ambas as doenças envolvem a infiltração do intestino delgado, grosso e linfono-
dos regionais por células inflamatórias. Isto resulta em malabsorção e numa
enteropatia com perda de proteínas. A diarréia pode ou não ser uma característica
clínica.
O diagnóstico de quaisquer destas síndromes é feito pelos sintomas clínicos,
presença de espessamento intestinal na palpação retal, proteína sérica baixa, e
biópsia intestinal ou retal. Um teste de tolerância à glicose oral ou um teste de
absorção de D-xilose pode verificar a presença de malabsorção.
A fisiopatologia destas síndromes em eqüinos não é totalmente compreendida.
Foram sugeridas como causas a tuberculose, a migração parasítica e as causas
imunomediadas.
Várias terapias medicamentosas foram tentadas com sucesso limitado. Corticos-
teróides, metronidazol, e o antimetabólito azatioprina foram utilizados com eficácia
variável. O manejo nutricional de suporte deve incluir alimentação freqüente com
alimentos de boa qualidade e ricos em energia. A alimentação forçada por sonda
nasogástrica pode ser necessária em cavalos anoréticos. (A utilização de fórmulas
para alimentação humana em eqüinos está sendo pesquisada.) O prognóstico é
grave.
Doenças Entéricas em Eqüinos 228

Intoxicação por fenilbutazona


A fenilbutazona pode causar uma gastroenteropatia em eqüinos com perda de
proteínas, quando administrada em dose > 8,8mg/kg de peso corporal. Os pôneis
e potros parecem ser mais sensíveis aos efeitos tóxicos desta droga que os
adultos. Os sintomas podem incluir ulceração oral, anorexia, depressão, perda de
peso e edema ventral. A hipoproteinemia ocorre devido à saída de proteínas
através da parede intestinal; isto pode ocorrer sem uma ulceração visível no
intestino delgado ou grosso. No entanto, a ulceração gástrica é muitas vezes a
seqüela da intoxicação por fenilbutazona. Pode também ocorrer uma necrose
papilar renal.
O diagnóstico pode ser feito com base em um histórico de administração de
fenilbutazona, sintomas clínicos e presença de hipoproteinemia. A ulceração
gástrica pode ser confirmada por gastroscopia, com a utilização de um endoscópio
de fibra óptica de 2 a 3m.
A utilização de fenilbutazona ou qualquer outra droga antiinflamatória não
esteróide deve ser interrompida. As medicações antiúlceras, como a cimetidina,
ranitidina e sucralfato, podem ser úteis no tratamento das úlceras gástricas. Pode
ser necessário um período de convalescença de vários meses para que a hipopro-
teinemia se resolva.

Enterite proximal
(Enterite anterior, Duodenite-jejunite)
É uma síndrome caracterizada por dor abdominal de moderada a intensa, íleo e
distensão gástrica. Os cavalos afetados geralmente estão taquicárdicos e podem
apresentar um leve aumetno na temperatura corporal. Se não tratados, estes
animais desenvolvem choque e, possivelmente, ruptura gástrica. O hematócrito e
a proteína sérica podem estar aumentados, indicando uma desidratação. O
leucograma periférico varia entre os casos. As amostras de paracentese abdominal
geralmente apresentam uma contagem normal de leucócitos, mas os níveis de
proteína peritoneal freqüentemente são > 3g/dL.
Esta síndrome deve ser diferenciada da obstrução do intestino delgado, com a
qual possui muitos sintomas clínicos em comum. Diferenças importantes são
notadas na palpação retal e na resposta ao esvaziamento gástrico. Na obstrução do
intestino delgado, a palpação retal geralmente revela alças de intestino delgado
muito distendidas; na enterite proximal, pode ser sentido um intestino delgado
levemente distendido ou espessado, mas o reto também pode estar normal.
A passagem da sonda nasogástrica, em ambas as síndromes, pode resultar em
grandes quantidades de refluxo gástrico. Os cavalos com enterite proximal ficam
muito aliviados após este procedimento, enquanto os cavalos com obstrução no
intestino delgado continuam a piorar.
Os cavalos com enterite proximal podem continuar apresentando refluxo de
grandes quantidades de líquido para o estômago por vários dias. O tratamento inclui
descompressão nasogástrica repetida ou contínua. Devido ao grande volume de
fluido perdido, 40 a 60L de fluidos EV podem ser necessários diariamente. Drogas
antiinflamatórias não esteróides podem ser necessárias para aliviar a dor e fornecer
proteção contra as endotoxinas. Apesar de não ter sido identificado nenhum agente
etiológico, a antibioticoterapia de amplo espectro pode ser útil.
As complicações possíveis incluem pneumonia por aspiração e laminite. O
prognóstico é reservado, mas com cuidados intensivos, muitos destes animais
sobrevivem.
Doenças Entéricas em Suínos 229

DOENÇAS ENTÉRICAS EM SUÍNOS


Suínos de todas as idades são suscetíveis às doenças entéricas. A diarréia é o
sinal comum a quase todos os distúrbios entéricos. A transmissão das enteropatias
infecciosas ocorre pelas vias oral e fecal. Pelo menos 12 diferentes agentes
etiológicos, incluindo bactérias, vírus e parasitas, podem causar doença entérica
primária. A diarréia em um rebanho pode ser devida a um único agente, porém
infecções concorrentes são comuns. Dado que algumas doenças são idade-
dependentes, é útil fazer-se o diagnóstico diferencial por grupos etários (ver TABELA 6).

ENTERITE POR CLOSTRIDIUM PERFRINGENS TIPO C


É uma enterite necro-hemorrágica altamente fatal causada por infecção do
intestino delgado por cepas Tipo C de C. perfringens (welchii). Afeta mais
comumente leitões de 1 a 5 dias de idade, mas pode ocorrer em porcos de até 3
semanas ( e em outras espécies, ver também pág. 392).
Etiologia e patogenia – O microrganismo penetra entre as células absortivas do
jejuno superior, elaborando β-toxina, uma exotoxina potente, sensível à tripsina e
termolábil que causa necrose de todos os componentes estruturais dos vilos. A
inflamação necrótica em geral estende-se profundamente, afetando as criptas
mucosas. A infecção pode-se estender caudalmente e envolver o íleo, mas
raramente afeta o cólon. A necrose da mucosa é acompanhada por passagem de
sangue para o lúmen intestinal.
Achados clínicos – O súbito aparecimento de diarréia hemorrágica seguida de
colapso e morte é característico da doença em leitões de 1 a 3 dias de idade. Os

TABELA 6 – Distribuição Etária das Doenças Diarréicas dos Suínos


Grupo etário
Final de
crescimento,
Amamentação Desmame reprodução
Doenças bacterianas
Enterite por Clostridium perfringens Tipo C ++ – –
Colibacilose entérica +++ +++ –
Enterite proliferativa porcina – + +++
Enterite por Salmonella + + +++
Disenteria suína + + +++
Parasitismo
Crysptosporidium sp + + –
Isospora suis +++ + –
Strongyloides ransomi + + +
Trichuris suis – – ++
Doenças virais
Diarréia epidêmica porcina + ++ +++
Enterite por rotavírus +++ +++ +
Gastroenterite transmissível +++ +++ ++
Outras (adeno, êntero, pararrotavírus) + + –
– = rara ou não ocorre;
+ = incomum;
++ = comum;
+++ = muito comum.
Doenças Entéricas em Suínos 230

casos menos agudos desenvolvem uma diarréia líquida, amarronzada, em 3 a 5


dias. Raramente, porcos de 1 a 3 semanas de idade desenvolvem uma diarréia
acinzentada, pastosa e persistente e tornam-se progressivamente emaciados. Nos
casos superagudos, a região perineal está corada pelo sangue.
Lesões – O intestino delgado mostra-se vermelho-escuro, hemorrágico e
preenchido com líquido hemorrágico; nos casos menos agudos, de 3 a 5 dias,
freqüentemente vêem-se bolhas de gás na parede do jejuno e necrose da mucosa
do jejuno e íleo. Aqueles casos com curso mais crônico têm intestino delgado
espesso, revestido por uma membrana necrótica acinzentada ou amarelo-pálida,
fortemente aderida à submucosa.
Diagnóstico – Os achados da necropsia são geralmente suficientes para se
estabelecer o diagnóstico na forma hemorrágica e superaguda e na forma aguda
com enfisema jejunal. Um diagnóstico provável rápido pode ser feito pela demons-
tração de formas coccídicas em esfregaços da mucosa corados por Gram. Obser-
vações histológicas das áreas da necrose dos vilos com colonização da mucosa por
numerosos bastonetes Gram-positivos é adequada para a confirmação. As formas
subaguda e crônica da doença, em leitões com 6 a 14 dias de idade, são facilmente
confundidas à necropsia com a enterite por Isopora suis , porém o diagnóstico é
geralmente possível pelo exame histológico do jejuno e íleo ou por observação de
clostrídios ou coccídios em esfregaços de mucosa corados por Gram ou Giemsa.
Tratamento e controle – O tratamento dos porcos com sinais clínicos é de
pouca utilidade, pois as lesões geralmente são irreversíveis quando a diarréia
aparece. Num surto de doença aguda, a administração profilática de antitoxina
Tipo C e/ou antibióticos parenterais ou orais aos leitões recém-nascidos fornece
proteção, se ministrados até 2h do nascimento. A doença tende a recidivar em
instalações infectadas. A vacinação das porcas gestantes, 6 e 3 semanas antes
do parto, com bacterina-toxóide Tipo C confere alguma imunidade lactogênica
passiva às leitegadas subseqüentes, desde que os leitões consumam o colostro
logo após o nascimento. Uma vez imunizadas com duas injeções de bacterina-
toxóide, as porcas devem receber uma injeção de reforço cerca de 3 semanas
antes de cada parto subseqüente.

DOENÇA DO EDEMA
(Enterotoxemia por E. coli)
É um distúrbio neurológico agudo e altamente fatal (ver pág. 723) que ocorre
geralmente de 5 dias a 2 semanas após o desmame, ocasião em que pode ser
acompanhado por diarréia.

COLIBACILOSE ENTÉRICA
É uma doença comum dos leitões neonatos, em amamentação e desmamados,
causada pela infecção do intestino delgado por cepas enterotoxigênicas de E. coli.
Etiologia e patogenia – Certas cepas de E. coli possuem fímbrias ou pêlos que
permitem sua aderência e colonização nas células do epitélio absortivo do jejuno e
íleo. Os três tipos antigênicos de pêlos associados com a patogenicidade são K88,
K99, 987P e F41. As cepas patogênicas produzem enterotoxinas que promovem o
aumento da secreção de líquido e eletrólitos para o interior do lúmen intestinal,
resultando em diarréia, desidratação e acidose. A infecção neonatal é comumente
causada por cepas K88 e 987P, enquanto a colibacilose pós-desmame é quase
sempre devida a cepas K88.
Achados clínicos – Diarréia profusa aquosa com desidratação rápida, acidose
e morte é comum. Raramente, os leitões sofrem colapso e morrem, antes de haver
perda de líquidos.
Doenças Entéricas em Suínos 231

Lesões – Desidratação da carcaça com distensão do intestino delgado por muco


amarelado, fluido e levemente mucoso é característica. O cólon mostra conteúdo
similar. A porção fúndica da mucosa gástrica está freqüentemente avermelhada. Os
porcos morrem subitamente e apresentam áreas de eritema cutâneo. Histologica-
mente, os vilos são de tamanho normal e possuem muitos bastonetes bacterianos
pequenos aderidos aos enterócitos absortivos.
Diagnóstico – A confirmação está baseada na observação histológica da
colonização bacteriana nos vilos; demonstração dos antígenos pilosos K88, K99,
F41 ou 987P em raspados intestinais, por imunofluorescência ou outros procedi-
mentos imunológicos; e isolamento do microrganismo do intestino delgado. Dado
que a E. coli é um agente secundário comum, é importante considerar-se a
possibilidade de envolvimento de outros agentes, como vírus ou coccídios.
Tratamento e controle – A terapia inclui o tratamento imediato com drogas
antibacterianas, juntamente com a restauração do balanço de fluidos e eletrólitos.
Testes de sensibilidade de drogas antibacterianas são úteis para identificar a
medicação efetiva. A prevenção inclui a redução dos fatores predisponentes, como
umidade e friagem; a melhora das condições sanitárias, como pela substituição do
assoalho de concreto sólido ou ripa por assoalho de tela de arame; e vacinação das
porcas gestantes com vacinas piloespecíficas. O estímulo da imunidade intestinal
ativa pela administração oral de antígenos piloespecíficos é útil na fase final do
período de aleitamento e no período pós-desmame.

SALMONELOSE ENTÉRICA
Salmonelas enteropatogênicas causam inflamação e necrose dos intestinos
delgado e grosso, resultando em diarréia que pode estar acompanhada de sepse
generalizada. Todas as idades são suscetíveis, porém a doença é mais comum em
suínos desmamados e em crescimento-término.
Etiologia e patogenia – Salmonella choleraesuis var. kunzendorf é a espécie
mais comum de salmonela que afeta os suínos. Algumas vezes, produz enterocolite
necrosante, porém mais comumente é uma doenca septicêmica caracterizada por
hepatite, pneumonia e vasculite cerebral. S. typhimurium, S. typhisuis e uma
variedade de outras espécies afetam primariamente o trato GI. A infecção do
intestino resulta numa inflamação necrótica e não supurativa da mucosa e submucosa
do íleo, ceco e cólon; freqüentemente a mucosa está ulcerada. Geralmente, há
extensão para os linfonodos regionais e, ocasionalmente, septicemia generalizada.
As fontes de infecção incluem suínos portadores, roedores e alimentos contamina-
dos (ver também SALMONELOSE, pág. 178).
Achados clínicos – Os leitões em amamentação podem desenvolver diarréia,
porém geralmente sucumbem à septicemia generalizada. Poucos desmamados ou
em crescimento-término são febris e apresentam fezes líquidas que podem ser
amarelas ou conter restos necróticos.
Lesões – Os porcos infectados por S. typhimurium possuem cólon e íleo
inflamados, discretamente espessos e geralmente com restos necróticos na super-
fície da mucosa. Os linfonodos mesentéricos estão aumentados e, algumas vezes,
vermelhos. A ulceração da mucosa pode ou não ser evidente. Uma pequena
quantidade de hemorragia pode ser observada nos casos agudos. Ocasionalmente,
podem se desenvolver constrições retais (ver adiante). Outras salmonelas ente-
ropatogênicas, com exceção da S. typhisuis, produzem lesões semelhantes às da
S. typhimurium, porém menos severas. As lesões da enterite por S. typhisuis são
distintas, tipicamente manifestadas como úlceras redondas (botonosas) e amarelas
no cólon, ceco e menos comumente no íleo.
Diagnóstico – A cultura de amostras fecais ou da mucosa intestinal em um meio
seletivo pode revelar o microrganismo; entretanto, Salmonella spp são freqüente-
Doenças Entéricas em Suínos 232

mente isoladas (e mais confiáveis) a partir dos linfonodos mesentéricos aumentados


por semeadura direta em meio seletivo, como ágar verde-brilhante ou por inocula-
ção em meios de enriquecimento. O exame histológico do intestino e fígado
afetados, para diferenciar a salmonelose da enterite proliferativa e da disenteria
suína, é um procedimento suplementar valioso.
Tratamento e controle – A administração parenteral de drogas antibacterianas
a porcos com a doença aguda e a medicação do grupo afetado, via água ou alimento,
podem diminuir a severidade do surto. As medicações mais comumente utilizadas
na água de bebida são a neomicina e as nitrofurazonas. Geralmente, o tratamento
não produz melhora surpreendente, e a recuperação freqüentemente é vagarosa.
Testes de sensibilidade do microrganismo isolado são úteis na seleção da droga
antibacteriana apropriada. Através da limpeza e desinfecção das instalações
contaminadas e eliminação da fonte de microrganismos, diminui-se a probabilidade
de epidemias repetidas.

TORÇÃO MESENTÉRICA DO I NTESTINO DELGADO


É uma causa de morte esporádica, súbita e inesperada em leitões de crescimento
rápido.
Etiologia e patogenia – Não foi identificada uma causa específica para esta
condição. Os fatores predisponentes podem incluir exercício vigoroso, lutas, amon-
toamento ou alimentação irregular. Porcos de maior comprimento lombar são os
mais propensos a desenvolver a torção mesentérica. A rotação de todo intestino
incluindo a parte posterior do duodeno e a parte anterior do reto, ao redor da raiz do
mesentério, obstrui o fluxo de sangue venoso, porém permite que o fluxo arterial
prossiga. Isto causa estagnação sangüínea no intestino e logo resulta em infarto. A
rotação pode ser apenas parcial sendo difícil de se demonstrar à necropsia, o que
torna o diagnóstico mais difícil.
Achados clínicos – Morte súbita, inesperada e com distensão abdominal é
geralmente tudo o que se observa. Os porcos exibem sinais de dor abdominal
um pouco antes da morte. Todo o curso clínico da doença dura cerca de 2h. Algumas
vezes, apenas um porco de um grupo é afetado, porém é comum vários porcos em
crescimento em uma mesma baia morrerem em um período de 2 a 3 semanas.
Lesões – Os porcos afetados são geralmente bem nutridos. Existem áreas de
eritema cutâneo e distensão do abdome. Os intestinos grosso e delgado são
vermelho-escuros e preenchidos com um líquido hemorrágico não coagulado. O
estômago está geralmente cheio de alimento e o duodeno anterior não é afetado.
O cólon está deslocado cranioventralmente e a parede está hiperêmica. A palpação
da raiz do mesentério revela a torção mesentérica.
Diagnóstico – Os achados da necropsia são suficientes para estabelecer o
diagnóstico. O exame histológico do jejuno e íleo revela ingurgitamento maciço dos
vasos e hemorragia por toda a mucosa e submucosa. A deterioração agônica e post
mortem da mucosa resulta no desprendimento da maioria do epitélio mucosal.
Controle – Não existe tratamento. Alimentação regular, fornecimento de espaço
adequado nos comedouros e redução do estresse físico podem auxiliar a minimizar
as perdas.

PARASITOSE
Ver também páginas 123, 129 e 263.
Ascaris suum – É o nematóideo intestinal mais comum dos suínos. Os vermes
adultos do intestino reduzem a eficiência alimentar e as infecções severas causam
emaciação. A migração larval incita inflamação no fígado e pulmões.
Doenças Entéricas em Suínos 233

Cryptosporidium sp – É um coccídio que se adere ao epitélio da mucosa intestinal


de porcos de 10 dias de idade ou mais, causando atrofia dos vilos no intestino
delgado inferior o que pode resultar em malabsorção e diarréia.
Eimeria spp – Os coccídios deste gênero são comuns nos suínos, porém o
aparecimento da doença é raramente observado. As infecções pesadas podem
causar enterocolite severa em leitões em crescimento.
Hyostrongylus rubidus – É o verme estomacal comumente encontrado em
suínos criados em pastagem; este parasita geralmente produz pequeno efeito
prejudicial.
Isospora suis – Uma forma comum e importante de coccidiose em leitões de 6
dias a 3 semanas de idade. A infecção causa necrose e atrofia dos vilos do íleo e
jejuno. A infecção bacteriana secundária da mucosa intestinal lesada é comum. A
mortalidade é freqüentemente de 20 a 25% e muitos porcos param de crescer. O
diagnóstico pode ser baseado na identificação de formas coccídicas imaturas em
esfregaços diretos da mucosa do intestino corados com Giemsa ou no exame
histológico do intestino afetado. O sucesso da prevenção depende mais comumente
da limpeza completa das maternidades para minimizar o número de oocistos. Após
a limpeza, a desinfecção completa com 50% de alvejante tem sido útil. Algumas
vezes, são ministrados coccidiostáticos às porcas na ração 2 semanas antes do
parto ou administrados VO para os leitões a partir do nascimento até 3 semanas de
idade.
Oesophagostomum spp – Os nódulos dos vermes adultos ficam no intestino
grosso e causam pouco dano, porém uma infecção pesada por larvas encistadas na
parede intestinal pode levar à emaciação.
Strongyloides ransomi – As larvas deste verme intestinal podem ser transmitidas
pelo colostro ou pela pele contaminada da mãe. Leitões fortemente infectados
desenvolvem diarréia severa, dos 10 aos 14 dias de idade, com alta mortalidade. O
diagnóstico pode ser baseado na observação microscópica direta de restos da
mucosa.
Trichuris suis – Estes vermes penetram a mucosa do ceco e cólon, causando
inflamação multifocal. As infecções pesadas causam diarréia e emaciação. As
fezes podem ser hemorrágicas; portanto, estas infecções podem ser confun-
didas clinicamente com disenteria suína ou enterite proliferativa. O diagnóstico
pode ser baseado na observação direta dos vermes no intestino grosso ou
flotação fecal.

DIARRÉIA EPIDÊMICA PORCINA


Trata-se de uma diarréia por coronavírus (ainda não reconhecida no hemisfério
ocidental) que afeta porcos de todas as idades, assemelhando-se clinicamente à
gastroenterite transmissível (GET, ver adiante) em muitos aspectos.
Etiologia e epidemiologia – O vírus da diarréia epidêmica porcina (VDEP) não
está relacionado a qualquer outro membro da família Coronaviridae. Os porcos são
os únicos hospedeiros que se conhecem a ser infectados. Não foram encontrados
anticorpos para VDEP em porcos selvagens ou outras espécies animais. A infecção
ocorre na maioria dos países europeus e na China. Em 1969, houve grandes
epidemias na Europa; não foram encontrados anticorpos em soros coletados antes
de 1969. Desde então, o vírus tornou-se disseminado e endêmico em vários países
europeus, sendo que os surtos agudos tornaram-se raros. Nas grandes fazendas,
de criação, o vírus persiste em leitegadas consecutivas de porcos após terem sido
desmamados e perdido sua imunidade lactogênica. Nestas fazendas o VDEP pode
ser associado à diarréia do desmame. Na Bélgica, o VDEP é mais comumente
associado à diarréia em porcos de engorda logo após terem sido trazidos das
Doenças Entéricas em Suínos 234

diversas fazendas de criação e reunidos em grandes unidades de engorda. O vírus


foi demonstrado em material fecal em 80% destes grupos. As informações
epidemiológicas de outros países são raras. A disseminação do vírus ocorre
principalmente por via direta, através de porcos infectados e indiretamente através
de fomitos contaminados pelo vírus, além dos caminhões de transporte.
Patogenia – A patogenia e os mecanismos imunes são semelhantes aos
relatados para GET. A infecção oral resulta em replicação viral nas células epiteliais
que cobrem os vilos do intestino delgado. As células nos vilos do cólon também são
infectadas. Não foi demonstrado tropismo em nenhum outro tecido. O vírus é
excretado nas fezes.
Achados clínicos – A diarréia é o único sintoma observado diretamente induzido
pelo vírus. Um surto agudo em uma fazenda de criação suscetível assemelha-se a
um surto de GET, sendo caracterizado por diarréia aquosa em porcos de todas as
idades. No entanto, quando comparado à GET, o período de incubação é mais longo
(3 a 4 dias), nem todas as leitegadas de leitões em amamentação ficam doentes e
a mortalidade de leitões neonatos é menor (média 50%). Além disso, a dissemina-
ção da doença na fazenda ocorre mais lentamente. Em todos os surtos, os sintomas
são observados mais consistentemente em porcos em engorda, terminação e
adultos – eles parecem ser mais suscetíveis, pois os surtos muitas vezes iniciam-
se nestes grupos etários. Na diarréia epidêmica porcina (DEP), os animais mais
velhos ficam mais letárgicos e deprimidos que na GET. Os animais doentes parecem
ter cólicas.
Os surtos agudos em suínos em terminação suscetíveis são caracterizados por
diarréia aquosa, mas um número acentuadamente aumentado de mortes agudas
pode ser observado, particularmente em animais infectados no final do período de
terminação e em linhagens estressáveis. A morte pode ocorrer até durante o período
de incubação.
Lesões – As lesões macroscópicas estão confinadas ao intestino delgado, com
o encurtamento dos vilos sendo a principal característica. Estas lesões parecem-se
muito com as observadas na GET. Não foram descritas lesões no cólon. Um achado
consistente é a necrose aguda da musculatura do dorso.
Diagnóstico – A diferenciação clínica da GET é difícil. A GET na sua forma
tipicamente epidêmica causa uma diarréia rapidamente disseminada em animais de
todas as idades com alta mortalidade de neonatos. Na DEP, a disseminação da
diarréia ocorre em uma velocidade menor e, apesar de a diarréia ser observada na
maioria das leitegadas, algumas permanecem saudáveis mesmo na ausência de
imunidade. A morbidade é de 100% em animais mais velhos, que são afetados
intensamente. Mortes agudas observadas em animais adultos e em terminação
devido à necrose muscular e ocorrendo durante um surto de diarréia é típico de DEP,
não sendo observada em nenhum outro tipo de diarréia infecciosa.
O diagnóstico laboratorial em neonatos é feito por imunofluorescência direta em
porções por criostato do intestino delgado e cólon. O teste de ELISA para detectar
antígenos virais nas fezes ou conteúdo intestinal é mais útil em animais mais velhos.
Os anticorpos podem ser detectados em amostras pareadas de soro através do
bloqueio de ELISA.
Controle – Não há nenhum tratamento específico disponível. As medidas
tomadas durante um surto de DEP são de natureza geral. Os animais com diarréia
devem ter acesso livre à água e os suínos em terminação devem ser privados de
alimentação por 1 a 2 dias.
Nas fazendas de criação, diante de um surto, a disseminação do vírus para as
maternidades pode ser temporariamente evitada por medidas sanitárias. Se forem
realizadas juntamente com a infecção deliberada de porcas prenhes, as perdas em
neonatos podem ser diminuídas. Não há vacina disponível.
Doenças Entéricas em Suínos 235

ENTERITE PROLIFERATIVA SUÍNA


(Adenomatose intestinal porcina, Enteropatia hemorrágica proliferativa)
É uma doença diarréica comum em suínos em crescimento-terminação e em
reprodutores jovens, caracterizada por hiperplasia e inflamação do jejuno, íleo e
cólon. É freqüentemente uma doença autolimitante suave, porém algumas vezes
causa diarréia persistente, enterite necrótica severa ou enterite hemorrágica com
alta mortalidade.
Etiologia e patogenia – A etiologia é obscura, porém Campylobacter sputorum
ou C. hyointestinalis está consistentemente presente no citoplasma das células
epiteliais da mucosa nas áreas afetadas do intestino. A doença é disseminada pelo
contato com os porcos infectados, porém seu mecanismo de aparecimento não é
conhecido (ver também CAMPILOBACTERIOSE, pág. 121).
Achados clínicos – A forma não hemorrágica, mais comum, da doença afeta
com freqüência porcos de 18 a 36kg e é caracterizada pelo aparecimento súbito de
diarréia. As fezes são aquosas a pastosas, amarronzadas ou tenuemente tingidas
de sangue. Cerca de 2 dias após, alguns leitões podem expelir fibrinonecróticos
amarelos, que se formaram no íleo. A maioria dos animais afetados recupera-se
espontaneamente, porém um número significativo desenvolve enterite necrótica
crônica com emaciação progressiva. A forma hemorrágica é caracterizada por
palidez cutânea, fraqueza e eliminação de fezes hemorrágicas ou escuras. Marrãs
prenhes podem abortar.
Lesões – Podem ocorrer em qualquer parte da metade inferior do intestino
delgado, ceco ou cólon, porém são mais freqüentes e óbvias no íleo. A parede do
intestino é espessa e o mesentério pode estar edematoso. Os linfonodos mesentéricos
estão aumentados. A mucosa intestinal parece estar espessa e rugosa, pode estar
coberta com uma membrana fibrinonecrótica amarela ou marrom e, algumas vezes,
com pequenos pontos de hemorragia. Cilindros necróticos amarelos podem ser
encontrados no íleo ou passando pelo cólon. Necrose difusa completa da mucosa
nos casos crônicos causa rigidez intestinal, parecendo uma mangueira de jardim.
Lesões proliferativas da mucosa estão com freqüência presentes no cólon, porém
são detectáveis apenas por cuidadosa inspeção à necropsia. Na forma hemorrágica
profusa, as fezes são vermelhas ou escuras no cólon, e o íleo contém sangue
coagulado.
Diagnóstico – A confirmação é baseada na observação histológica da prolifera-
ção característica e inflamação das críptas da mucosa. O microrganismo Campylobacter
intracelular pode ser demonstrado por corantes de prata. A cultura bacteriana dos
linfonodos e do intestino exclui a infecção por Salmonella; o exame histológico e a
cultura do ceco e cólon excluem a disenteria suína, sendo procedimentos adicionais
essenciais. O cólon deve ser também examinado para vermes capilares.
Tratamento e controle – Várias drogas antibacterianas, administradas paren-
teralmente a animais seriamente afetados e no alimento ou água ao restante do
grupo, auxiliam a redução da severidade da enterite e impedem o desenvolvimento
da enterite necrótica crônica irreversível. Não estão disponíveis métodos para
detectar animais portadores.

CONSTRIÇÃO RETAL
Nos porcos em crescimento, as constrições retais são seqüelas de prolapsos
retais gravemente traumatizados (ver pág. 159) ou infecções que interferem com a
irrigação sangüínea retal. A primeira causa resulta em casos esporádicos; a última
pode ser epidêmica. Uma das causas pode ser a infecção por Salmonella typhimurium
(ver anteriormente), provocando uma proctite ulcerativa que cicatriza de modo que
Doenças Entéricas em Suínos 236

a função normal não é restituída. A constrição é relatadamente o resultado de fibrose


do tecido retal devido à isquemia persistente causada por uma infecção em área de
suprimento sangüíneo limitado.
Achados clínicos – Vários porcos inchados em estágios variados de emaciação
são geralmente observados em um grupo de suínos em crescimento. Outros
sintomas clínicos, incluindo surtos anteriores de diarréia intensamente debilitante,
são comuns porém nem sempre relatados. O dedo indicador pode ser passado pelo
reto sem resistência considerável.
Lesões – Na necropsia, o cólon está bastante distendido e o intestino está cheio
de gás e fezes verdes. A lesão predominante é um canal retal estreitado, devido a
úlceras anulares fibróticas ou constrição retal, encontrado 2 a 5cm cranial ao ânus.
Diagnóstico – Uma epidemia de constrições retais sem prévios prolapsos é
indicativa. A cultura de fezes e dos linfonodos regionais normalmente revela S.
typhimurium. No entanto, não é possível determinar quem ocorreu primeiro: a lesão
ou a infecção.
Tratamento e controle – O diagnóstico precoce e tratamento da diarréia são
imperativos para o controle. Boas instalações, manejo e medidas sanitárias, com
movimentação “all-in/all-out” dos suínos, é o melhor método para prevenir outros
surtos. Acredita-se que a cirurgia não seja economicamente compensadora.

ENTERITE POR ROTAVÍRUS


É uma doença comum do intestino delgado dos suínos. Todas as idades são
suscetíveis, porém a doença diarréica significante geralmente ocorre em leitões
amamentando ou após o desmame.
Etiologia e patogenia – O rotavírus causador infecta e destrói os enterócitos dos
vilos em todo o intestino delgado, porém as lesões são mais severas no terço médio
do intestino. A perda do epitélio dos vilos resulta em atrofia parcial destes,
malabsorção e diarréia osmótica. Tipos antigênicos múltiplos do rotavírus afetam os
suínos. Podem-se disseminar facilmente por contato direto. Porcas portadoras
sadias podem eliminar o vírus nas fezes durante o período periparturiente, expondo
assim sua leitegada à infecção.
Achados clínicos – Se os porcos neonatos não recebem níveis protetores de
anticorpos maternos, provavelmente estão propensos a desenvolver diarréia aquo-
sa profusa, a partir de 12 a 24h de idade. Mais comumente, a infecção é endêmica
no rebanho e as porcas possuem níveis variados de anticorpos no colostro e leite,
o que fornece níveis variáveis de proteção passiva aos leitões em amamentação. A
diarréia freqüentemente inicia-se em porcos de 5 dias a 3 semanas de idade ou
imediatamente após o desmame. Nos estágios iniciais, as fezes dos porcos em
amamentação são freqüentemente amarelas ou cinzas e pastosas, passando a
cinzas e pastosas após , 2 dias. A diarréia persiste por 2 a 5 dias. Os porcos com
diarréia tornam-se emaciados e com pêlo áspero, porém a mortalidade é geralmente
baixa. Os porcos desmamados possuem fezes aquosas, contendo alimento pouco
digerido. Os desmamados tornam-se inapetentes e não competitivos, resultando
em emaciação, interrupção no desenvolvimento e predisposição provável à pneu-
monia e a outras doenças.
Lesões – O intestino delgado mostra parede fina, o ceco e o cólon contêm fezes
líquidas.
Diagnóstico – São necessários procedimentos de laboratório. A conformação é
baseada na demonstração histológica da atrofia de vilos no jejuno, demonstração
à microscopia eletrônica de vírions no conteúdo intestinal e procedimentos de
imunodiagnóstico para demonstrar o antígeno viral na mucosa intestinal ou nas
fezes. Os diagnósticos diferenciais incluem GET endêmica, enterite por Isospora
suis e colibacilose entérica.
Doenças Entéricas em Suínos 237

Tratamento e controle – Não existe tratamento específico. Minimização da


perda de calor e fornecimento adequado de água para manter a hidratação são
úteis. A vacinação de porcos pode ser útil. Infecção intercorrente por E. coli
enterotoxigênica é comum; portanto, uma terapia antibiótica pode reduzir a
mortalidade. Fornecer aos leitões desmamados com diarréia um ambiente seco,
aquecido e livre de corrente de ar e, freqüentemente, alimentação restrita auxilia
na prevenção de inanição, doenças secundárias e parada permanente do
crescimento.

ENTERITE POR STREPTOCOCCUS DISPAR


É uma doença diarréica de leitões em amamentação normalmente com 5 a 10
dias de idade, que foi associada à colonização do intestino delgado por S. dispar.
O diagnóstico pode ser auxiliado pela observação de cocos Gram-positivos aderi-
dos aos vilos das células epiteliais. Antibacterianos como a penicilina devem ser
úteis no tratamento.

DISENTERIA SUÍNA
(Diarréia sanguinolenta)
É uma doença diarréica muco-hemorrágica comum em suínos, que afeta o
intestino grosso.
Etiologia e patogenia – O agente causador essencial é a Treponema
hyodysenteriae, um espiroqueta anaeróbico que produz uma hemolisina, apesar de
outros microrganismos poderem contribuir para a gravidade das lesões. Ela prolifera
no intestino grosso, provocando a degeneração e inflamação da mucosa superficial,
hipersecreção de muco pelo epitélio mucosal e pontos multifocais de sangramento
na superfície da mucosa. O microrganismo não penetra além da mucosa intestinal.
A capacidade diminuída da mucosa para reabsorver secreções endógenas do
intestino delgado não afetado resulta em diarréia.
Achados clínicos – Os primeiros sintomas são anorexia parcial com ou sem
febre e a eliminação de fezes moles. O curso é variável. Alguns animais morrem
peragudamente. Mais freqüentemente, desenvolve-se uma diarréia mucóide com
estrias de sangue, progredindo para uma diarréia aquosa muco-hemorrágica. Após
varios dias, as fezes ficam marrons e contêm estrias de fibrina e debris. Os porcos
com diarréia ficam desidratados, profundamente fracos, magros e emaciados.
Lesões – As lesões difusas confinam-se ao ceco, cólon espiral e reto. A mucosa
afetada está recoberta por uma camada de muco acinzentado ou transparente,
muitas vezes com estrias de sangue em suspensão, nos estágios iniciais; uma
mistura de sangue, fibrina e debris necróticos nos casos mais avançados; e debris
amarelados e necróticos no final da doença.
Diagnóstico – Os sintomas clínicos e os achados de necropsia são normalmente
suficientes para um diagnóstico presuntivo. A confirmação é baseada na demons-
tração das lesões histológicas típicas no intestino grosso e no isolamento da T.
hyodysenteriae por cultura anaeróbica. As doenças concomitantes não são inco-
muns. O diagnóstico diferencial inclui enterites proliferativas, salmoneloses e
infecções intensas por vermes capilares.
Tratamento e controle – O uso terapêutico de antibacterianos é eficaz se
iniciado precocemente. A medicação na água é preferida no início. Como as cepas
resistentes a drogas são prevalentes, é essencial que se escolha uma droga à qual
o microrganismo seja sensível. Bacitracina, carbadox, lincomicina, nitroimidazóis,
tiamulina e virginiamicina são utilizadas comumente. A doença pode ser erradicada
das instalações infectadas por um programa persistente e cuidadosamente plane-
Doenças Entéricas em Suínos 238

jado que inclui o tratamento dos porcos portadores com drogas bactericidas e
limpeza e desinfecção completa das instalações vazias.

GASTROENTERITE TRANSMISSÍVEL
É uma doença viral comum do intestino delgado que causa vômito e diarréia
profusa em porcos de todas as idades.
Etiologia e patogenia – O coronavírus causador infecta e destrói as células
epiteliais dos vilos do jejuno e íleo, resultando em atrofia severa do vilo, malabsor-
ção, diarréia osmótica e desidratação. O período de incubação é de cerca de 18h.
A disseminação da infecção pelo ar ou contato é rápida. Os porcos recuperados
podem portar o vírus em seu trato respiratório por 4 meses ou mais. As epidemias
mais severas ocorrem comumente durante os meses de inverno em virtude da maior
sobrevida do vírus em baixas temperaturas.
Achados clínicos – Em rebanhos não imunes, o vômito é, com freqüência, o
sinal inicial; este é seguido por diarréia aquosa profusa, desidratação e sede
excessiva. As fezes dos leitões em amamentação freqüentemente contêm leite não
digerido. A mortalidade é de cerca de 100% em leitões com menos de 1 semana de
idade, enquanto porcos com mais de 1 mês raramente morrem. As porcas gestantes
ocasionalmente abortam e as lactantes freqüentemente exibem vômito, diarréia e
agalactose. A diarréia nos leitões lactentes que sobrevivem continua por , 5 dias,
porém os leitões maiores podem ter diarréia por um período menor.
Em grandes rebanhos com GET endêmica, os sinais clínicos são variáveis,
dependendo do nível de imunidade e magnitude da exposição. A imunidade
lactogênica é geralmente suficiente para proteger os leitões de até 4 a 5 dias de
idade. Com o decréscimo do nível de anticorpos na secreção mamária, a infecção
e a doença do leite podem ocorrer. Dependendo do nível da imunidade e exposição,
a diarréia pode ser suave em algumas leitegadas, porém severa em outras. Se a
proteção passiva é suficiente para proteger os leitões durante o período de
amamentação, a diarréia desenvolve-se freqüentemente durante os primeiros dias
após o desmame.
Lesões – Os leitões que morrem de GET estão severamente desidratados e a
pele está suja com fezes líquidas. O estômago pode estar vazio, porém geralmente
contém leite. O intestino delgado tem paredes finas e todo o intestino contém um
líquido aquoso esverdeado ou amarelo com restos de leite não digerido. Os leitões
mais velhos mostram poucas lesões visíveis, exceto o cólon que contém mais
líquido que fezes formadas. A atrofia dos vilos pode ser observada pelo exame da
mucosa do intestino delgado com o auxílio de lupas de mão.
Diagnóstico – Os sinais clínicos na forma epidêmica geralmente justificam um
diagnóstico presumível. Na forma endêmica suave, são necessários procedimentos
de laboratório. Exame histológico e imunofluorescência do intestino delgado de-
monstram lesões típicas e a presença do antígeno GET viral, confirmando as
evidências. Em alguns surtos, a encefalomielite por coronavírus (ver, pág. 469) pode
provocar sintomas semelhantes.
Tratamento e controle – Não existe tratamento específico. O aumento da
temperatura das maternidades para minimizar as perdas de calor corporal e o
fornecimento de soluções de eletrólito para combater a desidratação são úteis. O
desmame de leitões mais velhos que já estão se alimentando no cocho pode reduzir
a mortalidade.
A imunidade protetora é dependente da presença do anticorpo no intestino
delgado. A proteção passiva dos leitões é fornecida pela amamentação contínua em
porcas imunes. A imunidade protetora ativa desenvolve-se após a GET da mucosa
intestinal. A injeção parenteral de porcas com vacinas contra GET incita a produção
Gastrite, Gr An 239

de altos níveis de anticorpos no colostro, porém abaixa apenas os níveis de


anticorpos no leite pós-colostral. A administração de vacinas, por via oral e
parenteral, oferece proteção um tanto melhor, pois a infecção do intestino incita uma
resposta de IgA secretória. A infecção ativa do intestino com vírus virulento fornece
imunidade protetora por 6 a 18 meses. A vacinação de porcas naturalmente imunes
multiplica a imunidade o suficiente para proteger os neonatos, sendo particularmen-
te útil em rebanhos endemicamente infectados.
A infecção planejada de porcas prenhes, em rebanhos sabidamente infectados
com vírus virulento, pelo menos 2 a 4 semanas antes do parto, fornecerá uma
imunidade adequada. Isto pode ser realizado misturando-se terra, intestinos infec-
tados pelo vírus GET e fezes na ração de porcas em gestação. Devido aos riscos
óbvios deste procedimento, ele deve ser realizado apenas se um surto epidêmico
nas maternidades for inevitável. O material infeccioso deve ser usado apenas no
mesmo rebanho do qual foi coletado e deve-se determinar, com toda a certeza
possível, que os tecidos estejam livres de outros patógenos de suínos.
Devido ao vírus da GET disseminar-se facilmente durante uma epidemia por
pessoas, animais e fomitos, cuidados especiais devem ser tomados para impedir a
disseminação para grupos não expostos e rebanhos vizinhos.

OUTRAS VIROSES ENTÉRICAS DOS SUÍNOS


Adenovírus – A infecção do intestino de leitões em aleitamento por adenovírus
suíno causa formação de inclusões intranucleares nas células epiteliais proliferati-
vas próximas ao tecido linfóide organizado do íleo. Leitões gnotobióticos com
infecção experimental pelo adenovírus desenvolvem diarréia severa, porém há
poucas evidências de que esta doença seja economicamente significativa para a
indústria suína.
Enterovírus – Os enterovírus estão comumente presentes no intestino. A diarréia
é provocada em leitões infectados experimentalmente, porém há poucas evidências
que sugiram que a infecção intestinal por enterovírus seja de significado prático.
Pararrotavírus – São morfologicamente similares aos, porém antigenicamente
distintos dos, rotavírus. Os pararrotavírus provocam lesões e diarréia similares às
da infecção pelo rotavírus em porcos jovens (ver pág. 236).

GASTRITE, GR AN
(Gastrite catarral)

Etiologia – A gastrite pode ocorrer com ou sem comprometimento de outras


porções do trato GI. Pode ser causada pela ingestão de químicos cáusticos ou
irritantes, mas nesses casos é geralmente acompanhada por certo grau de estomatite
e enterite. Distúrbios gástricos com gastrite acompanhante podem suceder a
superalimentação, mudanças súbitas da dieta ou ingestão de alimentos muito
quentes, congelados, embolorados ou deteriorados, ou ingestão de areia ou corpos
estranhos. A gastrite é uma seqüela comum de refluxo enterogástrico, secundário
a uma obstrução intestinal mecânica ou funcional. A ruminite química pode ocorrer
na sobrecarga por grãos em bovinos e freqüentemente é seguida por uma ruminite
fúngica ou bacteriana (ver pág. 210 para discussão sobre ruminantes).
Os bezerros alimentados com leite podem apresentar uma falha no reflexo do
sulco reticular e ter esse leite desviado para o rúmen; ocorre uma ruminite e há uma
atrofia associada dos vilos do duodeno e jejuno. A ulceração abomasal e a
Gastrite, Gr An 240

abomasite são comuns em bezerros jovens e estão freqüentemente associadas


com a ingestão de palha ou outras forragens pouco digeríveis, ou com outros tipos
de estresse nutricional. Em todas as espécies, as infecções parasitárias gastrointes-
tinais são uma causa comum de reação inflamatória.
As úlceras abomasais ocorrem no carbúnculo e na pasteurelose dos ovinos e o
infarto venoso gástrico é comum nas doenças toxêmicas e septicêmicas agudas dos
suínos. A gastrite é comum nas doenças virais erosivas e vesiculares dos ruminan-
tes e ocorre em conjunção com muitas doenças entéricas em todas as espécies.
Achados clínicos – A síndrome é indistinta e varia com a causa. Em eqüinos,
a gastrite aguda geralmente resulta de refluxo enterogástrico. A gastrite aguda
também ocorre em cavalos ou potros severamente sépticos. A laminite pode
acompanhar estes problemas.
A dilatação gástrica aguda nos cavalos na maioria das vezes resulta de refluxo
enterogástrico secundário a uma obstrução mecânica do intestino delgado. A
alimentação em excesso, ingestão de alimentos muito fermentáveis, excesso de
consumo de água e ulceração gástrica também foram implicados na dilatação
gástrica.
A dor severa é característica de dilatação gástrica aguda em cavalos. A
desidratação e o choque desenvolvem-se rapidamente. A depressão inicial das
funções cardíaca e respiratória é seguida por freqüências cardíacas e respiratórias
aumentadas conforme produtos tóxicos são absorvidos. O prognóstico é cuidadoso.
A ruptura gástrica é uma possível seqüela.
Em porcos, o vômito é o sinal cardinal da gastrite, ocorrendo com depressão,
inapetência e evidências de dor abdominal.
Em ruminantes, a abomasite manifesta-se por depressão, inapetência e queda da
produção. A temperatura corporal e a freqüência de pulso estão, em geral, discreta-
mente elevadas e a ruminação está deprimida. Ocasionalmente, uma reação de dor
pode ser provocada por percussão do abomaso. A sobrecarga ruminal aguda produz
uma síndrome característica (ver pág. 210). A ulceração abomasal em bezerros pode
provocar uma síndrome de fraqueza, porém em geral é clinicamente inaparente, a
menos que haja perfuração suficiente para provocar peritonite local. A ruminite em
bezerros causada por leite no rúmen causa timpanismo, inapetência, distensão
abdominal, fezes com aparência de argila e redução na taxa de crescimento.
A maioria das infecções parasitárias do estômago produz uma gastropatia com
perda de proteína, na qual observam-se fraqueza e diarréia, mas sem evidência de
dor abdominal. Já a hemoncose pode manifestar-se como uma anemia severa sem
diarréia, e a hiostrongilose em porcos adultos pode simplesmente provocar uma
síndrome de emagrecimento crônico.
Tratamento – Na dilatação gástrica aguda dos cavalos, a passagem da sonda
nasogástrica para remoção do excesso de gás e fluido é imprescindível. Nos outros
casos, a primeira e mais importante medida é a remoção da causa. A alimentação
deve ser interrompida até que a causa da gastrite e/ou dilatação gástrica seja
resolvida, e a função e patência do trato GI tenham sido confirmadas. Enquanto a
alimentação está suspensa, podem ser administrados líquidos orais, porém, se há
incerteza quanto à função ou à possível obstrução do intestino delgado, os fluidos
devem ser administrados EV. A alimentação deve ser reiniciada gradualmente, em
pequenas quantidades de alimentos facilmente digeríveis como capim verde,
mingau de grãos ou ração peletizada. Se o problema foi causado por alimentos
estragados ou irritantes, a evacuação do trato GI com um laxante leve (por exemplo,
óleo mineral) é indicada. Se há suspeita de infecção, devem ser administradas
sulfonamidas ou antibióticos orais. Podem ser administrados agentes protetores de
mucosa, por exemplo, caolim, subnitrato de bismuto, ou sucralfato, para proteger a
mucosa gástrica irritada. Os sedativos são indicados nas gastrites agudas ou
Parasitas Gastrointestinais dos Cavalos 241

dilatações gástricas dos eqüinos. Os agentes antiinflamatórios não esteróides são


úteis na prevenção do desenvolvimento de laminite subseqüente. As drogas
antiespasmódicas dão alívio dramático em alguns casos de hipermobilidade funcio-
nal, mas seu uso deve ser evitado nos casos de gastrite ou dilatação gástrica devido
ao perigo de provocar atonia intestinal. A lavagem gástrica com solução salina
isotônica deve ser tentada nos casos de gastrite química e quando tenha ocorrido
impactação. A fluidoterapia (EV) e outras medidas para combater o choque (ver pág.
1659) devem ser iniciadas.
Nas impactações ou sobrecargas graves em bovinos ou ovinos, a remoção da
massa alimentar é indicada (ver pág. 212). Após a eliminação dos sintomas, o animal
deve retornar lentamente para a dieta normal. No gado, a gastrite freqüentemente
resulta em desequilíbrio da flora ruminal normal. A transferência de fluido ruminal
(ver pág. 1684) com conteúdo ruminal fresco pode auxiliar a recuperação.
Ver PARASITAS GASTROINTESTINAIS DOS CAVALOS, adiante, RUMINANTES, pág. 246
e SUÍNOS, pág. 263, para o tratamento da gastrite parasitária).

PARASITAS GASTROINTESTINAIS DOS


CAVALOS
INFECÇÃO POR GASTEROPHILUS
Os bernes eqüinos, que são encontrados no estômago, são larvas de moscas,
Gasterophilus spp. As três principais espécies estão distribuídas por todo o mundo
e um menor número de espécies ocorre em regiões da Europa, África e Ásia. As
moscas adultas não são parasitárias e não se alimentam; morrem tão logo os
nutrientes conseguidos na fase larval se esgotem, geralmente em , 2 semanas. As
três importantes espécies podem ser diferenciadas em qualquer estágio de seu
desenvolvimento. Os ovos de G. intestinalis (o berne comum) estão grudados aos
pêlos de quase todas as partes do corpo, mas especialmente dos membros
dianteiros e paletas. As larvas eclodem em cerca de 7 dias, quando estimuladas,
geralmente pela lambida do animal. Os ovos de G. haemorrhoidalis (o berne da
narina ou lábio) estão presos aos pêlos dos lábios. As larvas emergem em 2 a 3 dias
sem estímulo e migram para a boca. G. nasalis (o berne da garganta) deposita seus
ovos nos pêlos da região submaxilar. A eclosão se dá em , 1 semana sem estímulo.
As larvas das três espécies aparentemente permanecem na boca embebidas na
língua ou mucosa bucal por cerca de 1 mês, após o que passam para o estômago
onde se prendem nas regiões cárdica ou pilórica e, no caso de G. nasalis na mucosa
da parte inicial do intestino delgado. Após o período de desenvolvimento de , 8 a
10 meses, passam para as fezes e permanecem como pupas no solo por 3 a 5
semanas. Os adultos emergem cerca de 1 mês após. O principal efeito patogênico
é causado pelas larvas, que prendem seus ganchos orais na mucosa do estômago.
Isto induz erosões e ulcerações no local e reação hiperplásica ao redor.
Achados línicos e diagnóstico – A infecção por bernes causa gastrite suave,
porém grande número de parasitas pode estar presente sem a apresentação de
sinais clínicos. Os primeiros estágios migratórios na boca podem causar estomatite
ou produzir dor ao comer. As moscas adultas são responsáveis por muitos
aborrecimentos quando estão depositando seus ovos, durante os meses de verão.
O diagnóstico específico de uma infecção por Gasterophilus é difícil e pode ser feito
apenas pela demonstração das larvas quando elas passam nas fezes. A infecção
é sempre diagnosticada na época chuvosa. O histórico individual, o conhecimento
Parasitas Gastrointestinais dos Cavalos 242

do ciclo sazonal da mosca numa região em particular e a observação de ovos (1 a


2mm) branco-cremosos do berne no pêlo do animal são úteis.
Tratamento – Em áreas temperadas, supõe-se que a maioria dos animais seja
infectada no final do verão. O tratamento único tradicional, no final das águas ou
começo do inverno após o desaparecimento das moscas, é geralmente adequado.
Entretanto, triclorfon, diclorvos e ivemectina são efetivos contra todos os estágios
do berne e, quando usados como parte de um programa rotineiro de controle
parasitário, fornecem controle efetivo do berne por toda a estação. Embora não
exista método satisfatório para proteção dos animais expostos contra o ataque das
moscas adultas, quando aplicados para todos os cavalos de uma região, os
programas de controle do berne reduzem acentuadamente o número de moscas e
as infecções larvais.

I NFECÇÃO POR HABRONEMA


Amplamente distribuídos, os adultos dos vermes estomacais Habronema muscae,
H. microstoma (majus) e Draschia (Habronema ) megastoma podem variar em
tamanho de 6 a 25mm. Draschia ocorre em nódulos semelhantes a tumores na
parede do estômago. As outras espécies estão livres na mucosa. Os ovos ou larvas
são ingeridos pelas larvas da mosca doméstica ou de estábulo, que servem como
hospedeiros intermediários. Os cavalos são infectados pela ingestão de moscas
que contêm larvas infectantes ou por larvas livres que emergem das moscas,
conforme estas se alimentam ao redor dos lábios (ver também HABRONEMÍASE
CUTÂNEA, pág. 976).
Uma gastrite catarral com excessiva produção de muco pode resultar de
infecções pesadas por vermes adultos. Draschia produz as lesões mais severas –
nódulos semelhantes a tumores com até 10cm em diâmetro. Estes estão preenchi-
dos com material necrótico e grande número de vermes e são recobertos por epitélio
intacto, exceto por uma pequena abertura, através da qual os ovos passam. Estes
nódulos raramente rompem-se e causam peritonite fatal. As larvas de Habronema
spp e Draschia têm sido encontradas nos pulmões de potros associadas com
abscessos por Rhodococcus equi (ver pág. 899). Os sinais clínicos estão geralmen-
te ausentes, exceto quando os granulomas associados à infecção por Draschia
levam à obstrução mecânica ou à ruptura.
O diagnóstico ante mortem é difícil, pois os ovos e as larvas são facilmente
despercebidos nos exames fecais. Os vermes e os ovos podem ser encontrados por
lavagem gástrica. A maioria dos anti-helmínticos não foi testada contra Habronema
spp ou Draschia sp, embora ivermectina tenha provado ser ativa contra larvas
cutâneas e adultos da Habronema muscae.

INFECÇÃO POR OXYURIS


Os adultos do oxiúro, Oxyuris equi, são encontrados principalmente no intestino
grosso. Este é o maior oxiurídeo conhecido, tendo a fêmea de 7,5 a 15cm de
comprimento; os machos são menores em tamanho e número. As fêmeas grávidas
vão em direção ao reto para depositarem seus ovos no períneo em torno do ânus.
As massas de ovos e cimento ao redor do ânus aparecem como massa dura branca
a amarela. Os ovos, que têm um lado achatado, tornam-se embrionados em poucas
horas e infectantes em 4 a 5 dias.
Os oxiúros adultos são de pouca importância no intestino, mas causam irritação
perineal após a postura de ovos. Estagnação das regiões da cauda e anal, que
resulta em perda de pêlos e manchas desnudas na cauda e nas nádegas, é
característica e sugere a presença de oxiúros. Os exames fecais podem ou não
revelar uma infecção por oxiúros. As amostras coletadas em volta da região perineal
Parasitas Gastrointestinais dos Cavalos 243

podem apresentam fêmeas secas ou ovos. Pode ser utilizado o celofane adesivo em
torno do períneo, ou a raspagem da área com um depressor de língua para coletar
ovos para o exame microscópico.
A maioria das drogas de amplo espectro recomendadas para os estrôngilos (ver
adiante) é eficaz contra os oxiúros.

INFECÇÃO POR PARASCARIS


Os adultos do ascarídeo de eqüinos, Parascaris equorum , são vermes rígidos e
esbranquiçados, com até 30cm de comprimento e três lábios proeminentes. O ciclo
de vida é similar ao do ascarídeo do suíno, com um período pré-patente de 10 a 12
semanas. Os ovos infectantes podem persistir por anos em solos contaminados. Os
animais adultos abrigam muito poucos vermes. A principal fonte de infecção para
potros jovens é a pastagem, cocheiras ou cavalariças contaminadas com ovos
eliminados por potros do ano anterior.
Em infecções graves, as larvas migrantes podem produzir sintomas respiratórios
(“resfriados de verão”). Em infecções intestinais severas por vermes adultos, os
potros apresentam fraqueza, perda de energia e, ocasionalmente, cólica. A obstru-
ção e perfuração intestinais têm sido relatadas. O diagnóstico é baseado na
demonstração dos ovos nas fezes. Se doença devida a uma infecção pré-patente
é suspeitada, o diagnóstico pode ser confirmado pela administração do anti-
helmíntico, depois da qual um grande número de vermes imaturos pode ser
observado nas fezes.
Nas fazendas onde a infecção é comum, a maior parte dos potros é infectada logo
após o nascimento. Conseqüentemente, a maioria dos vermes é adulta quando os
potros atingem , 4 a 5 meses de idade. O tratamento deve ser iniciado com , 8
semanas e repetido em um intervalo de 6 a 8 semanas até que os potros completem
1 ano. Piperazina ou piperazina-tiabendazol são eficazes contra os vermes adultos
e têm considerável ação contra as fases imaturas, e todos os anti-helmínticos de amplo
espectro para eqüinos são efetivos; além do mais, os ascarídeos são facilmente
controlados por um programa de controle de vermes apropriadamente realizado.

INFECÇÃO POR G RANDES ESTRÔNGILOS


Os grandes estrôngilos de cavalos são conhecidos como escleróstomos ou vermes
vermelhos, vermes sangüíneos e vermes de paliçada. As três espécies principais e
seus respectivos tamanhos são: Strongylus vulgaris com até 25mm; S. edentatus com
até 40mm; e S. equinus com até 50mm (ver também Triodontophorus spp, pág. 244).
Sob condições favoráveis, as larvas desenvolvem-se até o estágio infectante em 7 a
14 dias após a postura dos ovos. A infecção se dá pela ingestão de larvas infectantes,
que fazem a muda no intestino e migram extensivamente antes da maturidade no
intestino grosso. O período pré-patente é de 6 a 11 meses. A larva de S. vulgaris migra
extensivamente na artéria mesentérica cranial e seus ramos, onde pode causar
trombose parasitária e arterite. As larvas das duas outras espécies podem ser
encontradas em várias partes do corpo, incluindo fígado, tecidos perirrenais, flancos
e pâncreas. Estas espécies não produzem lesões nas artérias mesentéricas. Infec-
ções mistas de grandes e pequenos estrôngilos são a regra.
Achados clínicos – Grandes estrôngilos adultos têm grandes cápsulas bucais
e se alimentam ativamente, ingerindo fragmentos da mucosa, enquanto se movem
pelo intestino. A conseqüente perda sangüínea pode levar à anemia. Fraqueza,
emaciação e diarréia também são comumente observadas. S. vulgaris é especial-
mente importante devido aos danos causados à artéria mesentérica cranial e seus
ramos. Como resultado de intereferência com o fluxo sangüíneo para o intestino e
do tromboembolismo, qualquer uma das condições a seguir pode ocorrer: cólicas;
Parasitas Gastrointestinais dos Cavalos 244

enterite gangrenosa; ou estase intestinal, torção ou intussuscepção, e possivelmen-


te ruptura. A nematoidíase cerebroespinhal (ver pág. 731) pode causar uma
variedade de lesões, dependendo da parte do SNC afetada.
Diagnóstico e tratamento – O diagnóstico de infecções mistas de estrôngilos
é baseado na demonstração de ovos nas fezes. O diagnóstico diferencial pode ser
feito pela identificação das larvas infectantes após cultura fecal. Quando existir a
suspeita de cólica por arterite verminótica, um aumento de volume doloroso na raiz
do mesentério pode ser palpável pelo reto. O diagnóstico sorológico baseado no
aumento de β-globulina é recomendado, mas não é específico para S. vulgaris.
Lesões arteriais parasitárias têm sido demonstradas usando-se arteriografia.
A cólica causada por lesões arteriais foi controlada com sucesso utilizando-se
grandes doses de tiabendazol. A invermectina, na sua dosagem padrão, é eficaz
contra os estágios larvais da S. vulgaris; o fenbendazol e o oxfendazol, em doses
maiores que para o parasita adulto, também são eficazes contra infecções larvais.
Vários anti-helmínticos incluindo os benzimidazóis, diclorvos, pirantel e invermectina
são ativos contra grandes e pequenos estrôngilos adultos.
Os programas de controle de parasita supõem que cavalos em regime de pasto
estejam infectados; portanto, os tratamentos de rotina são ministrados para minimizar
o nível de contaminação do pasto e reduzir os riscos associados à migração das larvas.
Os tratamentos rotineiros ou a intervalos são tradicionais, sendo que o intervalo
entre estes depende do período em que uma droga em particular mantém as fezes
livres de ovos (geralmente de 4 a 8 semanas). A freqüência do tratamento é também
influenciada pelo valor dos animais, variando com o acesso ao pasto e às práticas de
manejo. Entretanto, tratamentos freqüentes podem levar a estrôngilos resistentes aos
anti-helmínticos. Menos tratamentos podem ser eficazes no controle, desde que
administrados estrategicamente. Nas áreas temperadas do norte, quando os animais
adultos recebem 2 a 3 tratamentos na primavera e verão, a contaminação do pasto e
transmissão de parasitas são significativamente reduzidas. A remoção das fezes dos
piquetes e pastos manualmente ou por meios mecânicos também ajuda no controle.
Nos programas de controle parasitário, todos os cavalos de uma fazenda devem
ser tratados, e os que ficam juntos no mesmo pasto ou piquete devem ser tratados
ao mesmo tempo. Os cavalos hospedados ou os que estão retornando após um
longo período devem ser isolados ou vermifugados antes de serem admitidos nas
instalações da fazenda. Na administração dos anti-helmínticos, é importante que
todos os cavalos recebam a dose adequada. A utilização de classes de anti-
helmínticos alternadas ou não, seja em rotação rápida (mesmo poucas semanas)
ou lenta (anualmente, nos climas temperados) para evitar o desenvolvimento de
cepas resistentes de parasitas, vem sendo debatida. Qualquer que seja o programa
utilizado, deve-se fazer o exame periódico de amostras de fezes para manter o
controle da eficácia do programa.
A cólica pode estar associada à utilização de anti-helmínticos. Devem ser
tomadas precauções especiais quando se utilizam produtos organofosforados
(triclorfon ou diclorvos): utilização simultânea de outros compostos organofosforados
ou fenotiazínicos (incluindo tranqüilizantes) pode ter efeitos indesejáveis; a
succinilcolina não deve ser utilizada < 1 mês após a administração dos organofosfatos.

INFECÇÃO POR PEQUENOS ESTRÔNGILOS


Muitas espécies dos diversos gêneros de “pequenos estrôngilos” são encontradas
no ceco e no cólon. A maioria deles é consideravelmente menor que os “grandes
estrôngilos”, mas alguns podem ser quase tão grandes quanto as S. vulgaris, por
exemplo, as Triodontophorus spp, que são classificadas por alguns como grandes
estrônglios não migratórios. Uma das espécies, Triodontophorus tenuicollis, produz
Parasitas Gastrointestinais dos Cavalos 245

graves úlceras na parede do cólon. A maioria dos pequenos estrôngilos alimenta-se


superficialmente na mucosa intestinal. Aparentemente, não há migração extra-
intestinal das larvas no hospedeiro; o desenvolvimento da larva se dá na parede do
intestino grosso. As larvas podem sofrer hipobiose e permanecer dormentes na parede
intestinal por longos períodos. Em áreas temperadas, uma síndrome aguda de diarréia
e morte em pôneis e cavalos jovens tem sido relatada. Isto é associado com a
emergência em massa das larvas da parede intestinal e pode ter alguma similaridade
com a ostertagíase do Tipo II em gado jovem. A resposta ao tratamento é variável e
o melhor modo de se evitar a situação é a adoção de um bom programa de controle
de vermes. Para tratamento e controle, ver GRANDES ESTRÔNGILOS, anteriormente.
Diversas espécies de pequenos estrôngilos são resistentes a muitos
benzimidazóis. A resistência em pequenos estrôngilos é um traço hereditário e não
reversível. Pequenos estrôngilos resistentes ao benzimidazol são suscetíveis a
piperazina, pirantel, diclorvos e ivermectina. A eficácia da droga pode ser determi-
nada pela comparação da contagem de ovos dos vermes na época do tratamento
e entre 10 e 14 dias depois. Uma droga eficaz reduz a contagem de ovos a zero ou
a níveis muito baixos.

I NFECÇÃO POR STRONGYLOIDES


A Strongyloides westeri é encontrada no intestino delgado. As larvas são
eliminadas pelo leite e pode ser observada diarréia em potros, a partir de 10 dias de
idade. Os detalhes do ciclo de vida do verme nos cavalos parecem não diferir
significativamente dos do Strongyloides nos porcos (ver pág. 266). Tiabendazol,
cambendazol e ivermectina são eficazes, assim como alguns modernos benzimidazóis
em doses crescentes.

INFECÇÃO POR VERMES CHATOS


Três espécies de vermes chatos são encontradas em cavalos: Anoplocephala
magna, A. perfoliata e Paranoplocephala mamillana. Seu comprimento varia de 8 a
25cm (o primeiro é geralmente o maior e o último o menor). A. magna e P. mamillana
geralmente ficam no intestino delgado, mas também podem ocorrer no estômago;
A. perfoliata ocorre principalmente no ceco, mas também pode ocorrer no intestino
delgado. O ciclo de vida é como o das Moniezia spp em ruminantes e envolve ácaros
oribatídeos de vida livre como hospedeiros intermediários. O diagnóstico é feito pela
presença dos ovos característicos nas fezes, mas como a eliminação de proglótides
é esporádica, um simples exame de fezes pode não revelar uma infecção por
vermes chatos. Em infecções brandas, não surgem sintomas da doença; em
infecções graves, podem ocorrer distúrbios GI. Abatimento e anemia têm sido
relatados. A ulceração da mucosa ocorre freqüentemente na área onde a A.
perfoliata se prende e é sugerido que isso seja uma causa de intussuscepção. O
pamoato de pirantel, numa dosagem 2 vezes superior à indicada, é eficaz contra a
A. perfoliata. Niclosamida e diclorofeno também são recomendados.

INFECÇÃO POR TRICHOSTRONGYLUS


O pequeno verme do estômago de cavalos, Trichostrongylus axei , é também
encontrado em ruminantes. Os adultos são delgados medindo até 8mm de compri-
mento. Os detalhes do ciclo nos eqüinos ainda não foram cuidadosamente estuda-
dos, mas é sabido que as larvas penetram a mucosa. Estes vermes causam uma
gastrite catarral crônica e podem resultar em perda de peso. As lesões compreen-
dem áreas nodulares de mucosa espessa, circundadas por uma zona de congestão
e recobertas com quantidades variáveis de muco. As lesões podem ser pequenas
Parasitas Gastrointestinais dos Cavalos 246

e irregularmente circunscritas ou podem ser coalescentes e envolver grande parte


ou toda a porção glandular do estômago, podendo ser vistas erosões e úlceras.
O diagnóstico definitivo, com base no exame de fezes, é difícil porque os ovos são
similares aos do estrôngilo. As fezes podem ser cultivadas e, em aproximadamente
5 dias, as larvas infectantes podem ser identificadas. Alguns dos benzimidazóis e
ivermectina são eficazes contra T. axei.

PARASITAS GASTROINTESTINAIS DE
RUMINANTES
PARASITAS GASTROINTESTINAIS DE BOVINOS
Infecções por Haemonchus, Ostertagia e Trichostrongylus
Os vermes estomacais dos bovinos mais comuns são Haemonchus placei
(verme capilar, verme estomacal grande, verme arame), Ostertagia ostertagi (verme
estomacal médio ou marrom) e Trichostrongylus axei (verme estomacal pequeno).
Em alguns países tropicais ocorre a Mecistocirrus digitatus, um grande verme de até
40mm de comprimento. O Haemonchus placei é principalmente um parasita de
regiões tropicais, ao passo que o O. ostertagi e, em menor grau o T. axei preferem
climas temperados. Os machos adultos de Haemonchus chegam a 18mm de
comprimento e as fêmeas atingem até 30mm. Os adultos de Ostertagia medem 6
a 9mm de comprimento e os Trichostrongylus, aproximadamente 5mm.
Os ciclos de vida pré-parasitária dos três grupos são geralmente semelhantes.
Com temperaturas favoráveis, as larvas eclodem pouco depois dos ovos terem sido
expelidos nas fezes e alcançam o estágio infectante em , 2 semanas sob
temperaturas ideais (24°C). O desenvolvimento para o estágio infectante é retarda-
do durante o clima frio. Em áreas com estreita variação diária de temperatura, os
meses com uma temperatura máxima média de 18ºC e com índice pluviométrico
superior a 5cm são propícios para o desenvolvimento das fases de vida livre de H.
placei, mas onde ocorrem variações, a temperatura média mínima de 10°C é um
padrão mais exato. As formas pré-parasitárias de O. ostertagi e T. axei desenvol-
vem-se e sobrevivem melhor em condições mais frias, mas seus limites máximos de
sobrevivência são menores. Se a temperatura for desfavorável ou existirem condi-
ções adversas, as larvas infectantes podem permanecer dormentes nas fezes por
semanas até que as condições sejam novamente favoráveis, depois do que um
grande número de larvas infectantes surge.
O período pré-patente de O. ostertagi é normalmente de 18 a 25 dias. As larvas
ingeridas penetram o lúmen das glândulas abomasais e fazem a muda no quarto dia;
elas permanecem ali durante o período pré-patente, crescendo e sofrendo uma última
muda antes de saírem para o lúmen do abomaso como adultos jovens. A presença
de larvas nas glândulas gástricas causa hiperplasia celular e resulta na formação de
nódulos, esparsos ou confluentes. Severa lise de células epiteliais pode ocorrer
quando a larva emerge. Neste momento, as células parietais são substituídas por
células não diferenciadas que se dividem rapidamente. Como conseqüência, em
infecções severas, o pH do abomaso sobe de 2,0 para mais de 6,0. A gastroenteropatia
com perda proteica é resultante e, juntamente com a anorexia e a digestão dificultada
de proteínas, leva a hipoproteinemia e perda de peso. A diarréia é constante. A doença
resultante de infecções recentes é definida como ostertagíase Tipo I e, neste caso,
a maior parte dos vermes presentes é adulta e há reação positiva aos tratamentos anti-
Parasitas Gastrointestinais de Ruminantes 247

helmínticos. A doença Tipo I ocorre primariamente em bezerros de 7 a 15 meses de


idade. É comum a partir do momento do desmame e nos meses seguintes em regiões
de temperatura quente, e em bovinos jovens durante o verão e início do outono em
regiões temperadas frias.
Na ostertagíase Tipo II, grandes números de larvas, que tinham desenvolvimento
dormente ou inibido no quarto estágio larval inicial, emergem das glândulas. Isto
ocorre principalmente em bezerros de 12 a 20 meses de idade. Em regiões
temperadas quentes, as larvas propensas à inibição são adquiridas na primavera,
e a doença pode resultar quando grandes números de larvas recomeçam o
desenvolvimento ao estágio adulto no fim do verão/outono. Em regiões temperadas
frias, a aquisição de larvas propensas à inibição ocorre durante o fim do outono, e
a maturação durante o fim do inverno/início da primavera. A inibição larval (hipobiose)
na O. ostertagi e outros nematóideos é considerada como análoga à diapausa em
insetos. Tem sido interpretada como um mecanismo de sobrevivência no qual os
estágios pré-parasíticos no pasto evitam as condições adversas do inverno em
regiões frias, bem como condições quentes e secas ou quentes e alternadamente
úmidas e secas de muitas regiões quentes. Os fatores que causam inibição não são
completamente conhecidos, porém experimentalmente foi demonstrado que o
condicionamento das larvas infectantes ao frio é importante em uma região de clima
frio temperado. Nas regiões quentes de ambos os hemisférios, o condicionamento
dos estágios pré-parasitários à inibição ocorre principalmente durante a primavera,
antes do verão quente e seco. Os fatores que estão envolvidos na maturação são
ainda mais obscuros, mas podem incluir os efeitos do parto, nutrição, infecção
concomitante, resposta imune do hospedeiro ou simplesmente lapso de tempo.
H. placei também permanece dormente durante o inverno e retoma o desenvol-
vimento na primavera, infectando as pastagens com ovos em tempo hábil para seu
desenvolvimento. Ambos os estágios, larval e adulto, são patogênicos porque são
sugadores de sangue. T. axei causa gastrite com erosão superficial e hiperemia da
mucosa e diarréia. A perda de proteína pela mucosa lesada e anorexia causa
hipoproteinemia e perda de peso. A hipobiose não ocorre no mesmo grau com T. axei.
Achados clínicos – Animais jovens são os mais freqüentemente afetados, mas
animais adultos não expostos anteriormente comumente apresentam sintomas e
sucumbem à infecção. Infecções por Ostertagia e Trichostrongylus são caracteriza-
das por profusa diarréia aquosa, que é geralmente persistente. No caso da
hemoncose e da infecção por Mecistocirrus, há pouca ou nenhuma diarréia, mas
possivelmente períodos intermitentes de constipação. Anemia em graus variados é
um sintoma característico de hemoncose.
Concomitantemente com a diarréia, devido às infecções por O. ostertagi e T.
axei, e à anemia causada por infecção por Haemonchus, há freqüentemente
hipoproteinemia e edema, principalmente abaixo da mandíbula inferior (“bottle
jaw”) e, algumas vezes, ao longo do abdome ventral. Infecções muito severas
podem provocar a morte antes do surgimento dos sintomas clínicos. Outros sinais
variáveis são progressiva perda de peso, fraqueza, pêlos eriçados e anorexia.
Lesões – Os vermes podem ser facilmente observados e identificados no
abomaso, e pequenas petéquias podem ser vistas onde os vermes se alimentavam.
As lesões mais características das infecções por Ostertagia são pequenos nódulos
umbilicados, de 1 a 2mm de diâmetro, disseminados por todo o abomaso. Eles
podem ser discretos, mas em infecções graves tendem a coalescer dando ao
abomaso uma aparência de “calçamento” ou de “couro marroquino”. Os nódulos são
mais marcantes na região fúndica, mas podem cobrir toda a mucosa abomasal. Se
o pH subir para 6 ou 7, o excesso de pepsinogênio pode ser reabsorvido e altos
níveis podem ser encontrados no plasma. Há também evidências de que a presença
de adultos de Ostertagia pode causar a secreção direta de pepsinogênio. O edema
Parasitas Gastrointestinais de Ruminantes 248

é geralmente pronunciado e, em casos graves, pode-se estender por todo o


abomaso, intestino delgado e omento.
Nas infecções por T. axei, a mucosa do abomaso apresenta congestão incipiente
a discreta, mas erosões superficiais, às vezes cobertas por exsudato fibrinonecrótico,
podem ser vistas.
Diagnóstico, Tratamento e Controle ver página 254.

Infecção por Cooperia


Diversas espécies de Cooperia ocorrem no intestino delgado de bovinos; C.
punctata, C. oncophora e C. pectinata são as mais comuns. Os adultos, vermelhos
e espiralados, medem de 5 a 8mm de comprimento e o macho possui uma grande
bolsa. É difícil observá-los macroscopicamente. Seu ciclo de vida é essencialmente
o mesmo dos outros tricostrôngilos. Estes vermes aparentemente não sugam
sangue. A maior parte deles é encontrada nos primeiros 3 a 6m do intestino delgado.
O período pré-patente é de 12 a 15 dias.
Os ovos geralmente podem ser diferenciados dos de outros nematóideos gastro-
intestinais comuns pelos seus lados quase paralelos, mas a cultura de larvas das
fezes é necessária para diagnosticar com certeza a infecção por Cooperia em animais
vivos. Em infecções graves por C. punctata e C. pectinata ocorrem diarréia profusa,
anorexia e emaciação, mas não anemia; a porção superior do intestino delgado
apresenta marcada congestão da mucosa, com pequenas hemorragias. A mucosa
pode apresentar uma fina camada necrótica superficial semelhante a uma renda. A
Cooperia oncophora produz uma doença mais leve, mas pode ser responsável por
perda de peso e produtividade ruim. Geralmente é necessária uma raspagem da
mucosa para revelar Cooperia spp, que devem ser diferenciadas de Trichostrongylus,
Strongyloides papillosus e formas imaturas de Nematodirus.
Para diagnóstico, tratamento e controle, ver página 254.

Infecção por Bunostomum


O macho adulto da Bunostomum phlebotomum mede , 15mm e a fêmea
, 25mm. Estes vermes duodenais possuem cápsulas bucais bem-desenvolvidas,
com as quais se prendem à mucosa; placas cortantes na borda anterior da cápsula
bucal são usadas para desgastar a mucosa durante a alimentação. O período pré-
patente é de aproximadamente 2 meses. A infecção pode ser por ingestão ou por
penetração pela pele; a última é a mais comum.
A penetração larval dos membros inferiores pode causar desconforto e irritação,
particularmente em gado estabulado. Os vermes adultos causam anemia e rápida
perda de peso. Diarréia e constipação podem-se alternar. Pode ocorrer edema
hipoproteinêmico, mas a “bottle jaw” raramente é tão severa como nos casos de
hemoncose. Durante o período patente, o diagnóstico pode ser feito pela demons-
tração da presença de ovos característicos nas fezes.
À necropsia, a mucosa pode estar congesta e edematosa, com numerosos
pontos hemorrágicos pequenos onde os vermes estavam fixados. Os vermes são
facilmente vistos no início do intestino delgado e o conteúdo é, em geral, tinto de
sangue. Uma quantidade de 2.000 vermes pode causar a morte em bezerros.
Lesões locais, edema e formação de crostas podem resultar da penetração das
larvas na pele de bezerros resistentes.
Para diagnóstico, tratamento e controle, ver página 254.

Infecção por Strongyloides


O verme intestinal, Strongyloides papillosus, tem um ciclo de vida incomum.
Somente as fêmeas ocorrem na fase parasitária do ciclo. Estas têm de 3,5 a 6mm
Parasitas Gastrointestinais de Ruminantes 249

de comprimento e se alojam na mucosa da parte superior do intestino delgado.


Pequenos ovos embrionados são eliminados nas fezes, rapidamente eclodem e
podem-se desenvolver diretamente em larvas infectantes ou em adultos de vida
livre. A descendência destes adultos de vida livre pode-se desenvolver em outra
geração de adultos de vida livre ou em larvas infectantes. O hospedeiro é infectado
pela penetração através da pele ou por ingestão; a transmissão das larvas
infectantes pelo colostro pode ocorrer como em outras espécies do gênero. O
período pré-patente é de aproximadamente 10 dias.
As infecções são mais comuns em bezerros jovens, particularmente em gado
leiteiro. Embora os sintomas sejam raros, eles incluem diarréia intermitente, perda
de apetite e peso e, às vezes a presença de sangue e muco nas fezes. Um grande
número de vermes no intestino provoca enterite catarral com petéquias e equimoses,
especialmente no duodeno e jejuno.
Para diagnóstico, tratamento e controle, ver página 254.

Infecção por Nematodirus


Embora muitas outras espécies, por exemplo, Nematodirus spathiger e N. battus,
possam infectar o gado, a N. helvetianus é geralmente reconhecida como a espécie
mais comum em bovinos. Os machos adultos de N. helvetianus têm aproximadamen-
te 12mm de comprimento, e as fêmeas de 18 a 25mm. Os ovos se desenvolvem
lentamente; o terceiro estágio infectante é atingido dentro dos ovos em 2 a 4 semanas
e pode permanecer aí por vários meses. Os ovos podem-se acumular nas pastagens
e eclodir em larga escala, após as chuvas, para provocar violentas infecções em um
curto período. Os ovos são altamente resistentes e aqueles eliminados pelos bezerros
de uma estação podem-se manter vivos e contaminar os bezerros da estação
seguinte. O estágio adulto é alcançado em aproximadamente 3 semanas, após
ingestão das larvas infectantes. Os vermes são mais numerosos em 3 a 6mm do piloro.
Os sintomas incluem diarréia e anorexia. Estes sintomas desenvolvem-se
geralmente na terceira semana de infecção, antes que os vermes estejam sexual-
mente maduros; infecções clínicas têm sido observadas em bezerros acima de 6
semanas. Durante o período pré-patente, o diagnóstico é difícil; durante o período
patente, o diagnóstico é feito facilmente, com base nos ovos característicos. Este
parasita produz um número relativamente pequeno de ovos. A resistência a uma
reinfecção é desenvolvida rapidamente. A necropsia pode mostrar apenas uma
mucosa edematosa e espessa.
Para diagnóstico, tratamento e controle, ver página 254.

Infecção por Toxocara


O ascarídeo Toxocara vitulorum é um verme esbranquiçado e rijo (machos de 20
a 25cm, fêmeas de 25 a 30cm) que ocorre no intestino delgado de bezerros com
menos de 6 meses de idade; bezerros mais velhos são resistentes. As larvas que
eclodem dos ovos ingeridos passam para os tecidos e, em vacas prenhes, movem-
se no final da gestação e são transmitidas para o bezerro pelo leite. Os ovos aparecem
nas fezes dos bezerros a partir de 3 semanas de idade, sendo facilmente reconheci-
dos pela sua casca espessa e com depressões circulares. Em algumas partes do
mundo, esta infecção é considerada séria, particularmente em bezerros de búfalos.
Para diagnóstico, tratamento e controle, ver página 254.

Infecção por Oesophagostomum


Os adultos de Oesophagostomum radiatum (verme nodular) têm de 12 a 15mm
de comprimento e a cabeça é inclinada dorsalmente. Os ovos são muito semelhan-
Parasitas Gastrointestinais de Ruminantes 250

tes aos de H. placei e, freqüentemente, são agrupados a estes nos exames fecais
de rotina. O ciclo de vida é direto. As larvas penetram na parede inferior do intestino
delgado, 3 a 6m, mas também no ceco e cólon, onde permanecem por 5 a 10 dias
e, então, retornam ao lúmen como larvas de quarto estágio. O período pré-patente
em animais suscetíveis é de aproximadamente 6 semanas. Entretanto, nas
reinfecções subseqüentes, as larvas ficam retidas por algum tempo e muitas delas
podem nunca retornar ao lúmen (encistamento no hospedeiro).
Os animais jovens sofrem o efeito dos vermes adultos, enquanto nos animais
mais velhos o efeito dos nódulos é mais importante. A infecção causa anorexia;
diarréia escura e fétida severa e constante; perda de peso; e morte. Em animais mais
velhos e resistentes, os nódulos que envolvem as larvas calcificam-se, reduzindo
assim a mobilidade do intestino. A estenose ou a intussuscepção ocorrem ocasio-
nalmente. Os nódulos podem ser palpados pelo reto e os vermes e nódulos podem
facilmente ser observados à necropsia.
Para diagnóstico, tratamento e controle, ver página 254.

Infecção por Chabertia


Os adultos do verme intestinal de boca grande, Chabertia ovina, têm aproxima-
damente 12mm de comprimento inclinados ventralmente na extremidade anterior.
Possuem um ciclo de vida direto típico. As larvas penetram a mucosa do intestino
delgado logo após a ingestão; posteriormente elas emergem e vão para o cólon. O
período pré-patente é de pelo menos 7 semanas. As larvas e adultos podem causar
pequenas hemorragias com edema no cólon e a emissão de fezes recobertas com
muco. A chabertíase clínica é muito raramente observada em bovinos.
Para diagnóstico, tratamento e controle, ver página 254 e seguintes.

Infecção por Trichuris


As infecções por Trichuris spp são comuns em bezerros jovens e de sobreano,
mas o número de vermes raramente é grande. Os ovos são resistentes e as
infecções podem persistir em propriedades-problemas. Os sinais clínicos são
improváveis, mas em infecções intensas ocasionais, diarréia com fezes escuras,
anemia e anorexia podem ser observadas.
Para diagnóstico, tratamento e controle, ver página 254.

Infecção por vermes chatos


Os vermes chatos anoplocefalídeos Monienzia expansa e M. benedeni são
encontrados em bovinos jovens. Os vermes deste grupo são caracterizados pela
ausência de rostelo e ganchos, e os segmentos geralmente são mais largos que
compridos. Os ovos são triangulares ou retangulares e são ingeridos por ácaros
oribatídeos de vida livre, que vivem no solo e no pasto. Depois de um período de 6
a 16 semanas, os cisticercóides infectantes estão presentes nos ácaros. A infecção
ocorre pela ingestão dos ácaros; o período pré-patente é de aproximadamente 5
semanas. Monienzia são normalmente consideradas não patogênicas em bezerros,
mas foi relatada a estase intestinal.
Para diagnóstico, tratamento e controle, ver página 254.

PARASITAS GASTROINTESTINAIS DE CAPRINOS E OVINOS


Várias espécies de nematóideos e cestóideos são capazes de provocar gastrite e
enterite parasitárias em caprinos e ovinos. As mais importantes são Haemonchus
contortus, Ostertagia circumcincta, Trichostrongylus axei, espécies intestinais de
Trichostrongylus, Nematodirus spp, Bunostomum trigonocephalum e Oesophagostomum
Parasitas Gastrointestinais de Ruminantes 251

columbianum. Cooperia curticei, Strongyloides papillosus, Trichuris ovis e Chabertia


ovina também podem ser patogênicos em ovinos; estas e as espécies congêneres
foram discutidas junto com os helmintos de bovinos (ver anteriormente).

Infecções por Haemonchus, Ostertagia e Trichostrongylus


Os principais vermes estomacais dos ovinos e caprinos são Haemonchus
contortus, Ostertagia circumcincta, O. trifurcata e Trichostrongylus axei e, em
algumas regiões tropicais, Mecistocirrus digitatus. A transmissão cruzada de
Haemonchus entre ovinos e bovinos pode ocorrer, mas não tão facilmente quanto
em transmissões em espécies homólogas. Os ovinos são mais suscetíveis às
espécies de bovinos que os bovinos o são às espécies de ovinos. Para informações
sobre o tamanho e o ciclo de vida destes vermes, ver PARASITAS GASTROINTESTINAIS
DE BOVINOS, anteriormente.
Haemonchus é a espécie mais comum nas áreas tropicais ou subtropicais ou em
áreas com verão chuvoso, enquanto Ostertagia e T. axei são mais comuns nas áreas
com inverno chuvoso. As últimas espécies predominam nas zonas temperadas.
A hemoncose ovina pode ser classificada como hiperaguda, aguda ou crônica.
Nos casos de doença hiperaguda, a morte pode ocorrer em 1 semana por violenta
infecção, sem sintomas significativos. A doença aguda é caracterizada por anemia
severa, acompanhada de edema generalizado; a anemia é também uma caracte-
rística de infecção crônica, geralmente com pouco ônus e acompanhada de
progressiva perda de peso. A diarréia não é um sintoma de hemoncose; as lesões
são aquelas associadas à anemia. O abomaso é edematoso e, na fase crônica, o
pH eleva-se, o que causa disfunção gástrica. Os bovinos adultos podem desenvol-
ver infecções sérias ou mesmo fatais, particularmente durante a lactação.
As lesões, patogenias e sintomas das infecções por Ostertagia e T. axei são
similares às encontradas em bovinos. Mesmo em níveis subclínicos de infecção,
causam diminuição do apetite, redução da digestão gástrica e da utilização da
energia metabolizável e proteína. Ostertagia é o principal gênero envolvido no
aumento da contagem de ovos fecais no período periparto nos ovinos e, nas
infecções graves, pode causar diarréia e diminuir a produção de leite das ovelhas.
A eliminação dos ovos funciona como a principal fonte de contaminação para os
cordeiros. O mesmo tipo de desenvolvimento inibido (hipobiose), visto em bovinos,
ocorre tanto com Ostertagia quanto com Haemonchus.
Para diagnóstico, tratamento e controle, ver página 254.

Tricostrongilose intestinal
O ciclo de vida do Trichostrongylus intestinal (T. colubriformis, T. vitrinus, T.
rugatus) é direto; as larvas desenvolvem-se enterradas superficialmente nas criptas
da mucosa e tornam-se formas adultas e poedeiras de ovos, em 18 a 21 dias.
Anorexia, diarréia persistente e perda de peso são os principais sintomas. Ocorre
atrofia dos vilos que resulta em digestão prejudicada e malabsorção; ocorre perda
de proteína pela mucosa lesada. Não há lesões diagnósticas e uma contagem total
dos vermes deve ser realizada para comprovar a infecção e avaliá-la.
Para diagnóstico, tratamento e controle, ver página 254.

Infecções por Bunostomum e Gaigeria


Os adultos da Bunostomum trigonocephalum (vermes duodenais) são encontra-
dos no jejuno. O ciclo de vida e os achados clínicos são essencialmente os mesmos
dos ancilostomídeos de bovinos. Quantidades de apenas 100 vermes podem
causar sintomas clínicos. Gaigeria pachyscelis é encontrada na África e na Ásia, e
assemelha-se ao Bunostomum em tamanho e forma (2 a 3cm). As larvas de
Parasitas Gastrointestinais de Ruminantes 252

G. pachyscelis penetram somente pela pele. É uma voraz sugadora de sangue e


provavelmente a mais patogênica dos ancilostomídeos.
Para diagnóstico, tratamento e controle, ver página 254.

Infecções por Nematodirus


As espécies de Nematodirus que ocorrem no intestino delgado dos ovinos são
similares em morfologia e ciclo de vida na N. helvetianus (ver pág. 249). Infecções
clínicas por Nematodirus são de considerável importância na Grã-Betanha, Nova
Zelândia e Austrália, onde têm sido relatadas perdas de 20% dos cordeiros em
rebanhos afetados. Nos EUA, os parasitas são endêmicos em algumas partes das
Montanhas Rochosas, onde ocasionalmente causam a doença clínica em cordeiros.
Nestas áreas onde as infecções clínicas são comuns, a doença freqüentemente
possui um padrão sazonal característico. Muitos dos ovos expelidos pelos cordeiros
afetados permanecem dormentes durante o restante da estação de pasto e no
inverno, aparecendo um grande número de larvas no início da estação de pasto do
ano seguinte. Portanto, os cordeiros de uma estação contaminam o pasto para os
cordeiros da estação seguinte e conseqüentemente o ciclo de vida pode ser
interrompido, se a mesma área não for usada como pasto para cordeiros em anos
consecutivos. A maioria das infecções clínicas ocorre em cordeiros de 6 a 12
semanas de vida.
A N. battus ocorre na Grã-Betanha e em outras partes da Europa e tem sido
recentemente relatada na América do Norte. Ela parece ser mais patogênica que as
outras espécies; por causa das técnicas de manejo usadas nestas áreas e pelos
ovos não eclodidos até serem expostos a condições de frio, a doença ocorre com
grande regularidade na primavera. Como os ovos são muito resistentes e não
eclodem a não ser em condições favoráveis de umidade, eles se acumulam no
período da seca e eclodem em grande quantidade depois das chuvas, sendo que
os surtos da doença manifestam-se 2 a 4 semanas depois. Nematodirus spp
ocorrem freqüentemente em regiões de baixa pluviosidade (por exemplo, Karroo, na
África do Sul e no interior da Austrália) onde outros parasitas raramente ocorrem.
A doença é caracterizada por surgimento repentino, desânimo, abatimento,
diarréia profusa e visível desidratação, ocorrendo a morte em 2 a 3 dias após o início
da manifestação. A nematodirose normalmente é restrita a cordeiros ou carneiros
recentemente desmamados, mas em regiões pouco chuvosas onde os surtos são
esporádicos, os animais mais velhos podem sofrer graves infecções. As lesões
geralmente consistem de desidratação e moderada enterite catarral, mas pode
ocorrer inflamação aguda de todo o intestino delgado. Contagens de pelo menos
10.000 vermes, juntamente com os sintomas característicos e históricos, são indica-
tivos de infecções clínicas. Os cordeiros afetados podem eliminar uma grande
quantidade de ovos, que podem ser facilmente identificados; entretanto, como o surto
pode preceder a maturação dos vermes fêmeas, isto não é um achado constante.
Para diagnóstico, tratamento e controle, ver página 254.

Infecção por Oesophagostomum


O verme nodular dos ovinos, Oesophagostomum columbianum, é semelhante
morfologicamente no seu ciclo de vida ao verme nodular dos bovinos (ver pág. 249).
A diarréia geralmente desenvolve-se durante a segunda semana de infecção. As
fezes podem conter muco excessivo, assim como estrias de sangue. À medida que
a diarréia progride, os animais vão se tornando emaciados e fracos. Estes sintomas
com freqüência decrescem no final do período pré-patente, mas a presença
contínua de numerosos vermes adultos pode resultar numa infecção crônica, na
qual os sintomas podem não se desenvolver por vários meses. Os animais tornam-
Parasitas Gastrointestinais de Ruminantes 253

se fracos, perdem peso, apesar de terem bom apetite, e apresentam períodos


intermitentes de diarréia e constipação.
À medida que se desenvolve a resistência, formam-se nódulos em volta das
larvas e estes podem-se tornar caseosos e calcificados. A formação de nódulos
geralmente é mais pronunciada em ovinos que em bovinos. Os carneiros afetados
têm um andar duro e freqüentemente as costas arqueadas. Estenose e intussuscep-
ção podem ocorrer em casos graves. O diagnóstico é difícil durante o período pré-
patente, o qual deve ser baseado largamente nos sinais clínicos, embora os nódulos
freqüentemente possam ser palpados pelo reto.
Para diagnóstico, tratamento e controle, ver página 254.

Infecção por Chabertia


Os vermes adultos causam sérios danos à mucosa do cólon, resultando em
congestão, ulceração e pequenas hemorragias. Os carneiros infectados são fracos;
as fezes são moles, contêm muito muco e podem ter estrias de sangue. A imunidade
desenvolve-se rapidamente e as recidivas são observadas somente sob condições
de estresse severo.
Para diagnóstico, tratamento e controle, ver adiante.

Infecção por Strongyloides


Infecções severas por vermes adultos causam uma doença que lembra
tricostrongilose. A infecção geralmente se dá por penetração da pele, mas também
pode ocorrer via leite. O dano à pele entre as unhas, produzido pela penetração da
larva, lembra os estágios iniciais da podridão do casco e pode ajudar a penetração
dos agentes causadores de podridão. A maior parte das infecções é transitória e sem
conseqüências.
Para diagnóstico, tratamento e controle, ver adiante.

Infecção por Trichuris


As infecções graves por vermes chicotes não são comuns, mas podem ocorrer
em cordeiros muito jovens ou em condições de seca prolongada, onde os carneiros
comem cereais no chão. Os ovos são muito resistentes. Congestão e edema da
mucosa cecal, acompanhados de diarréia e fraqueza, são observados.
Para diagnóstico, tratamento e controle, ver adiante.

Infecção por vermes chatos


A patogenicidade da Moniezia expansa em ovinos tem sido longamente discu-
tida. Muitas das primeiras observações que associavam esta doença a diarréia,
emaciação e perda de peso, não faziam diferença entre as infecções por vermes
chatos e infecções por certos pequenos nematóideos (por exemplo, Trichostrongylus
colubriformis). Hoje sabe-se que os vermes chatos são relativamente não patogê-
nicos, mas infecções violentas podem causar fraqueza suave e distúrbios GI. O
diagnóstico pode ser feito encontrando-se as proglotes em forma de sino e de
coloração amarelada ou branco-perolada nas fezes ou protruindo a partir do ânus,
ou pela demonstração dos ovos característicos no exame de fezes. O ciclo de vida
envolve um ácaro oribatídeo que vive nas pastagens. O período pré-patente nos
ovinos é de 6 a 7 semanas. Os cordeiros desenvolvem resistência rapidamente e
são raras as infecções após , 4 ou 5 meses de idade.
Thysanosoma actinioides, o “verme chato franjado”, habita o intestino delgado,
assim como os canais biliares e pancreáticos. Este verme é comumente encontrado
em ovinos das áreas das Montanhas Rochosas dos EUA. Embora não tenha sido
Parasitas Gastrointestinais de Ruminantes 254

associado a doenças clínicas, sua importância econômica é devida ao fato de os


fígados serem condenados quando os vermes chatos são encontrados nos canais
biliares.
Para diagnóstico, tratamento e controle, ver adiante.

DIAGNÓSTICO DE PARASITISMO GASTROINTESTINAL EM RUMINANTES


Os sintomas clínicos associados ao parasitismo gastrointestinal são comuns a
muitas doenças e situações; entretanto, o diagnóstico presumível baseado em
sintomas, histórico, características das pastagens e condições climáticas é freqüen-
temente possível. A infecção, em geral, pode ser confirmada pela demonstração dos
ovos e por exame de fezes (ver ESTIMATIVA DE CARGA PARASITÁRIA INTERNA, pág. 1152).
Na avaliação clínica dos exames fecais, dois aspectos devem ser lembrados: 1. o
número de ovos por grama (OPG) não é sempre um indicador preciso do número de
vermes adultos presentes; e 2. a identificação específica dos ovos é impraticável
exceto em laboratórios especializados. A contagem de OPG pode ser nula ou muito
baixa quando existe uma grande quantidade de vermes imaturos; mesmo quando há
presença de muitos vermes adultos, a contagem pode ser baixa se a produção de
ovos tiver sido suprimida por reações de imunização ou tratamento anti-helmíntico
anterior. Variações na capacidade produtiva de ovos dos diferentes vermes (signifi-
cativamente mais baixa em Trichostrongylus, Ostertagia e Nematodirus que em
Haemonchus) também podem distorcer o quadro real. Os ovos de Nematodirus,
Bunostomum, Strongyloides e Trichuris são característicos, mas uma diferenciação
confiável dos ovos das espécies mais comuns de nematóideos em ruminantes é difícil.
Pelas culturas fecais pode-se fazer a distinção das larvas de terceiro estágio, se a
diferenciação ante mortem for importante.
O advento de anti-helmínticos de amplo espectro, seguros e eficazes, tem
reduzido amplamente a necessidade de diferenciação dos gêneros e espécies
destes parasitas. Em áreas onde predominam as Ostertagia spp, o exame do soro
para evidenciar níveis plasmáticos de pepsinogênio elevados é uma ajuda útil para
o diagnóstico. Geralmente níveis > 3,0UI de tirosina estão associados a sintomas
clínicos. Podem surgir problemas de interpretação em animais imunes submetidos
ao desafio, nos quais não há sintomas clínicos, mas os níveis de pepsinogênio
podem estar elevados devido à reação de imunização. Onde predominam
Haemonchus spp, o volume celular estimado no sangue heparinizado fornece uma
rápida informação de grau de anemia. Em alguns países, o diagnóstico sorológico
(ELISA) de infecções por espécies importantes, como Ostertagia e Cooperia em
bovinos, é feito. Até agora não há informação suficiente sobre a correlação entre
títulos sorológicos e a carga parasitária.
Em muitas situações de manejo, infecções significativas certamente ocorrerão,
particularmente depois de temperaturas favoráveis e chuvas em certas estações.
“Tratamento forçado com fins diagnósticos” é recomendado nos casos em que os
ovos são raros ou ausentes, mas o histórico e os sintomas sugerem infecções. Uma
resposta clínica a um anti-helmíntico seguro e de amplo espectro permite um
diagnóstico retrospectivo, mas os animais devem ser colocados em pastagens
“livres” depois do tratamento para evitar reinfecção.
O exame post-mortem é o método mais direto para identificar e quantificar o
parasitismo gastrointestinal. O sacrifício de um ou mais animais pode fornecer dados
parasitológicos valiosos sobre o estado do restante do rebanho ou plantel. O exame
post mortem rotineiro é de inestimável valor para o diagnóstico, sendo recomendado.
Em exames post-mortem, os adultos ( ou mesmos vermes jovens de desenvol-
vimento avançado) de Haemonchus, Bunostomum, Oesophagostomum, Trichuris
e Chabertia podem ser vistos facilmente. Ostertagia, Trichostrongylus, Cooperia e
Parasitas Gastrointestinais de Ruminantes 255

Nematodirus são difíceis de serem vistos exceto pelos seus movimentos no líquido
da ingesta. As infecções clinicamente importantes destes gêneros podem ser
facilmente despercebidas e o conteúdo total de todas as lavagens deve ser
ministrado num volume conhecido, e deve ser realizada uma contagem de vermes
para que a gravidade da infecção possa ser avaliada. Amostras medidas de
conteúdo GI e raspagens da mucosa devem ser examinadas microscopicamente
(pequeno aumento). Os nematóideos menores podem ser corados (5min) com uma
solução forte de iodo. Depois que a ingesta e os tecidos são descorados com
tiossulfato de sódio a 5%, os pequenos nematóideos ficam facilmente visíveis. A
significância do número de vermes presentes varia de acordo com as espécies dos
vermes e dos hospedeiros, por exemplo, em cordeiros, a presença de apenas 100
vermes Haemonchus poderá ser de importância clínica, enquanto provavelmente
seriam necessários de 5.000 a 10.000 vermes Ostertagia para terem a mesma
importância. Quando os animais apresentam diarréia por alguns dias, os vermes
podem estar sendo expelidos, e o tipo e a gravidade das lesões macroscópicas
também podem ser de considerável utilidade no diagnóstico.
Causas multifatoriais devem ser consideradas na avaliação dos achados clíni-
cos, laboratoriais e de necropsia. Infecções parasíticas mistas são a regra. A febre
de transporte, distúrbios GI ligados à nutrição, salmonelose, paratuberculose,
diarréia viral, deficiência de microelementos, fasciolose, vermes pulmonares, etc.
devem ser considerados ao se fazer um diagnóstico diferencial.
O diagnóstico da ostertagiose no gado durante o período de inibição larval (pré-
Tipo II) apresenta problemas técnicos, particularmente para a criação industrial de
corte nos EUA. A contagem de ovos nas fezes e a análise do pepsinogênio plasmático
não fornecem informações úteis, e os métodos imunológicos de detecção de larvas
inibidas ainda não foram desenvolvidos. Os fatores que predispõem à inibição devem
ser considerados, incluindo a origem geográfica do gado, época do ano ou estação
da chegada, idade do gado, histórico prévio de pastejo e manejo, condições
prevalentes do tempo durante o último período de pastejo e prevalência de O.
ostertagi na região de origem.
A informação referente a estes fatores normalmente não é disponível para o gado
de corte. Se chegaram após uma primavera pastando no sul, ou outono pastando
no norte dos EUA, podem ter um grande número de larvas inibidas. Bezerros mais
leves provenientes de áreas de alta prevalência do parasita também podem ter este
problema. Está se tornando mais aceito que uma das causas significativas de
doença clínica ou problemas na eficiência alimentar do gado de engorda é o
parasitismo, possivelmente ostertagiose. É aconselhável que o gado recebido de
uma área suspeita em uma época do ano suspeita seja prontamente tratado com um
anti-helmíntico eficiente contra as larvas inibidas.

TRATAMENTO DE PARASITISMO GASTROINTESTINAL EM RUMINANTES


Um controle efetivo de vermes não pode ser alcançado somente pelo uso de
drogas, apesar de os anti-helmínticos desempenharem um papel importante. Eles
devem ser usados para reduzir a contaminação da pastagem particularmente nos
períodos críticos de sobrevivência dos estágios pré-parasíticos. A coordenação de
outros métodos de controle, tais como pastejo por diferentes espécies de hospedei-
ros, rotação de pastagem integrada de diferentes grupos etários de uma mesma
espécie (incluindo pastagem serpenteante) e alternância de pastagem e alimenta-
ção no cocho, é outra técnica de manejo que pode dar bons resultados econômicos
quando combinada com o tratamento anti-helmíntico.
O “anti-helmíntico ideal” deve ser seguro, altamente eficaz contra os estágios
adultos e imaturos (incluindo larvas em hipobiose) dos vermes mais importantes, de
Parasitas Gastrointestinais de Ruminantes 256

rápida e completa metabolização, disponível em formulações convenientes, de uso


econômico e compatível com outros compostos mais comumente usados. Atual-
mente, várias drogas satisfazem todos ou a maior parte destes requisitos (ver
também pág. 1791). O tiobendazol foi o precursor dos modernos anti-helmínticos e
estabeleceu um novo padrão de eficiência e segurança. Apesar de uma menor
eficiência contra larvas de Ostertagia hipobióticas em bovinos e contra uma ou duas
outras espécies de verme, ele continua sendo largamente usado. Depois do
tiabendazol e mebendazol, outros benzimidazóis (como o fenbendazol, oxifendazol
e albendazol) e probenzimidazóis (tiofanato, febantel e netobomin) foram desenvol-
vidos; estes compostos são eficazes contra a maioria dos parasitas gastrointestinais
dos ruminantes, incluindo os níveis variantes de atividade contra larvas hipobióticas.
O levamisol e o grupo pirantel também são anti-helmínticos de amplo espectro,
altamente eficazes e seguros exceto contra larvas hipobióticas em bovinos. A
invermectina é altamente eficaz contra os estágios adultos e larvais, incluindo as
larvas hipobióticas de todos os nematóideos gastrointestinais comuns dos ruminan-
tes, e alguns dos ectoparasitas importantes.
Além de injeções e derramamento no dorso do animal, outros meios de adminis-
tração (por exemplo, incorporação ao alimento, água de beber e blocos minerais ou
de energia) são usados no intento de diminuir os custos da mão-de-obra e podem
ser úteis em sistemas de confinamento ou quando os animais, além da pastagem,
recebem alimentação suplementar. Outras vantagens destas rotas “alimentares” é
que se pode obter uma administração contínua da droga em baixos níveis e uma
redução da contaminação das pastagens durante os períodos ideais para o
desenvolvimento das formas de vida livre dos parasitas. As desvantagens incluem
consumo inadequado do anti-helmíntico, acúmulo inaceitável de resíduos nos
tecidos e desenvolvimento de resistência a drogas, devido à exposição contínua.
Outro meio de diminuir a mão-de-obra na vermifugação é o “pour-on”, tratamento
dérmico desenvolvido para alguns organofosfatos, como triclorfon, e atualmente
usado para levamisol e invermectina. O bolo de liberação contínua à base de
morantel tem sido particularmente eficaz na prevenção do parasitismo da primavera
para o verão em regiões de temperaturas frias.
O arseniato de chumbo, a niclosamida e os mais novos benzimidazóis
(albendazol, fenbendazol e oxfendazol) são eficazes contra vermes chatos
(Moniezia spp) em bovinos e ovinos. O tratamento da Thysanosoma actinioides
tem apresentado problemas, mas foi relatado que a niclosamida é eficaz na dose
de 250mg/kg. Além disso, o bitionol (200mg/kg) foi utilizado e o praziquantel
provavelmente é eficaz.
Devem ser considerados os seguintes pontos quando do tratamento de animais
clinicamente afetados: 1. fornecer nutrição adequada; 2. tratar todos os animais do
grupo, como uma medida preventiva e para reduzir posteriores contaminações das
pastagens; e 3. mover o gado para as pastagens “livres”, a fim de minimizar os riscos
de reinfecção. A definição de pastagens livres varia de acordo com os diferentes
climas e depende do conhecimento do local da mortalidade sazonal das larvas
infectantes.
Finalmente, o desenvolvimento da resistência a drogas por populações de
Haemonchus contortus, Trichostrongylus spp e Ostertagia spp em ovinos e caprinos
ao tiabendazol e outros benzimidazóis, levamisol e ivermectina tem sido demons-
trado. Apesar de esta resistência ser atualmente um problema apenas em certas
áreas, ela deve ser considerada quando a resposta à terapia é inferior a esperada
e outros fatores podem ser descartados, por exemplo, dosagem imprópria, reinfecção
rápida, má nutrição, ou outra doença que não seja parasitismo. A resistência a
drogas nos parasitas dos bovinos ainda não foi demonstrada definitivamente, mas
a utilização excessiva e tratamento indiscriminado devem ser evitados.
Parasitas Gastrointestinais de Ruminantes 257

MEDIDAS GERAIS DE CONTROLE PARA PARASITISMO


GASTROINTESTINAL EM RUMINANTES
A palavra “controle” geralmente implica supressão da carga parasitária abaixo
dos níveis capazes de provocar perdas econômicas. Para se fazer isto eficientemen-
te é necessário um conhecimento abrangente dos fatores epidemiológicos e
ecológicos que regulam as populações larvais nas pastagens e do papel da
resistência do hospedeiro à infecção.
Os objetivos do controle são: 1. prevenir grandes exposições em hospedeiros
suscetíveis (o restabelecimento de infecções graves é sempre lento); 2. reduzir os
níveis totais de contaminação das pastagens; 3. minimizar os efeitos da carga
parasitária; e 4. estimular o desenvolvimento de imunidade ou resistência.
O uso estratégico de anti-helmínticos é planejado para reduzir a carga parasitária
e, portanto, a contaminação das pastagens; seu uso é baseado no conhecimento
das mudanças sazonais da infecção e da epidemiologia regional de várias
helmintoses. O uso tático é baseado no pronto reconhecimento das condições
favoráveis ao desenvolvimento da doença parasitária, como condições climáticas,
hábitos de pastejo e perda de peso.
Por exemplo, no Reino Unido, onde o padrão da doença causada pela infecção
por Nematodirus em ovinos é claramente definido, os tratamentos estratégicos com
2 a 3 doses de anti-helmínticos em intervalos de 3 semanas, iniciando-se antes do
aparecimento característico da doença, são recomendados. De modo semelhante,
no norte dos EUA, Canadá ou Europa ocidental, os níveis de larvas de Ostertagia
nas pastagens e outros parasitas crescem substancialmente após meados de julho,
isto é, o padrão geral de infectividade é mínimo na primavera, mas aumenta
rapidamente até níveis máximos no final do verão e início do outono. As práticas
atuais nestas áreas indicam a eficácia de 2 ou mais tratamentos com anti-
helmínticos (normalmente a intervalos de 3 a 5 semanas) administrados quando o
gado é solto no pasto pela primeira vez na primavera. Um tratamento único com
subseqüente transferência dos animais para um pasto seguro e o tratamento
associado à soltura atrasada na primavera também têm sido eficazes.
Em outros países de clima temperado quente ou frio, controles similares devem
ser utilizados se o padrão sazonal da doença é conhecido, mas na maior parte das
regiões é empregado um uso tático de anti-helmínticos, por exemplo, durante as
épocas quentes e úmidas.

Bovinos – Considerações especiais


Problemas com vermes ocorrem com mais freqüência em gado de corte jovem
a partir da época de desmame e vários meses seguintes, e em grupos isolados de
bezerros, durante sua primeira estação no pasto. A imunidade aos nematóideos
gastrointestinais é adquirida de forma lenta e normalmente requer duas estações de
pastejo antes que um nível considerável seja alcançado. Em áreas endêmicas, as
vacas podem continuar abrigando pequena carga e isto pode ser causa de baixa
produção. O controle do parasitismo gastrointestinal em rebanhos jovens pode ser
conseguido pelo uso de anti-helmínticos de amplo espectro em conjunção com o
manejo das pastagens para limitar a reinfecção; esta última inclui transferência para
pastagens “livres”, como as áreas de conservação de pasto ou pastos anuais
recentemente estabelecidos no inverno, pastejo alternado com outras espécies de
hospedeiros ou rotação de pastagem integrada, na qual os bezerros suscetíveis são
seguidos por adultos imunes. A rotação de pastagens simples não é eficaz porque
a massa fecal bovina pode proteger as larvas por vários meses de fatores ambientais
adversos e, portanto, os bezerros em rotação podem ser submetidos a uma
reinfecção numa data posterior.
Parasitas Gastrointestinais de Ruminantes 258

Em rebanhos de corte, é de grande valia o tratamento anti-helmíntico, particu-


larmente nos bezerros que vão para confinamento, por exemplo, como substitui-
ção da criação de bezerros ou como bezerros a serem alimentados. Gado
engordado em pastos deve receber tratamento após o desmame e a intervalos
durante os 12 meses seguintes e, se possível, deve ser transferido para pasta-
gens livres.
Quando o gado não pode ser transferido facilmente para outros pastos, devem
ser ministrados tratamentos estratégicos para limitar a contaminação das pasta-
gens e rápida reinfecção; por exemplo, no norte dos EUA ou na Europa ocidental,
estes devem ser dados em duas ou três ocasiões, na primavera e no início do
verão. Alternativamente, a introdução no rúmen de cápsulas contendo tartarato
de morantel (liberação contínua por 60 a 90 dias), ou oxfendazol, albendazol ou
levamisol (liberação em pulsos com intervalos de 21 a 30 dias) pode ser feita em
países onde seu uso é permitido. Nas regiões temperadas mais quentes do
mundo, como Austrália, Nova Zelândia e sul dos EUA, além das grandes regiões
de criação de gado do sul do Brasil, Uruguai e Argentina, o gado jovem pode
receber pelo menos dois tratamentos no final do verão e início do outono para
prevenir o grande aumento na contaminação dos pastos e infectação durante o
inverno e primavera. A aplicação de 2 a 3 tratamentos estratégicos com pequenos
intervalos a partir do momento do desmame nestas regiões pode ser tão eficaz
quanto os tratamentos administrados na primavera nas regiões temperadas mais
frias. No entanto, a sobrevida das larvas infectantes no pasto desde o tempo do
desmame de outono nas regiões temperadas mais quentes é bastante comum,
e os intervalos maiores entre os tratamentos (por exemplo, no desmame, durante
o inverno e no final da primavera) podem ser mais aplicáveis. Todavia, em muitas
áreas, os anti-helmínticos são simplesmente administrados a intervalos regulares
após o desmame. Os intervalos entre os tratamentos devem necessariamente
variar de acordo com a epidemiologia local. Quando a ostertagiose Tipo II é um
problema, o tratamento com um anti-helmíntico eficaz contra larvas hipobióticas
é recomendado antes do momento em que se espera o surto.

Ovinos – considerações especiais


Um tratamento estratégico especial é necessário na maioria das regiões para
se contrapor à queda de resistência (aumentada no periparto, etc.) observada em
ovelhas. O tempo exato de tal tratamento varia entre regiões e para as diferentes
espécies de parasitas, mas em geral parece ser adequado o tratamento entre o
mês anterior e o mês posterior às parições. Outra aplicação estratégica de anti-
helmínticos é um tratamento 2 semanas antes do nascimento, como parte de um
programa “intensivo”. Técnicas de manejo complementares, após o tratamento,
incluem transferir os ovinos dos pastos contaminados para pastos de gado
bovino, para áreas não pastadas ou pelo menos não pastadas por ovinos por
vários meses. Este período varia de acordo com o padrão sazonal de mortalidade
das larvas em diferentes países, e pode ser de até 1 ano em alguns países de
clima temperado.
Os ovinos são mais suscetíveis aos efeitos adversos dos vermes que outras
criações. As doenças clínicas são mais comuns. A resistência não é forte e
tratamentos freqüentes podem ser necessários, particularmente no primeiro ano
de vida.
Infecções por Trematódeos em Ruminantes 259

INFECÇÕES POR TREMATÓDEOS EM


RUMINANTES
Fasciola hepatica, o mais importante trematódeo dos ruminantes domésticos, é
a causa mais comum de distúrbios hepáticos por trematódeos em áreas temperadas
do mundo. Nos EUA, é endêmica ao longa da Costa do Golfo do México, da Costa
oeste dos EUA e da região das Montanhas Rochosas e outras áreas. Está presente
no leste do Canadá, na Colúmbia Britânica e América do Sul, e é de particular
importância econômica nas Ilhas Britânicas, oeste e leste da Europa, Austrália e
Nova Zelândia. Fasciola hepatica é economicamente importante na África e Ásia, e
tem sido relatada no Havaí. Fascioloides magna tem sido descrita em pelo menos
21 estados (EUA) e na Europa. Na América do Norte, a Dicrocoelium dendriticum
está confinada principalmente a Nova Iorque, Nova Jersey, Massachussets e
províncias Atlânticas do Canadá. É também encontrada na Europa e Ásia. As
Eurytrema spp, os trematódeos pancreáticos, parasita ovinos, suínos e bovinos no
Brasil e partes da Ásia. Várias espécies de paranfístomos ou trematódeos ruminais
são encontradas em ruminantes na maior parte do mundo.

Fasciola hepatica
(Trematódeo hepático comum)
Etiologia – Fasciola hepatica (30 × 12mm e formato de folha) tem uma larga
distribuição mundial e uma grande faixa de hospedeiros. Economicamente impor-
tantes, as infecções ocorrem em bovinos e ovinos com três formas: crônica,
raramente fatal em bovinos, mas freqüentemente fatal em ovelhas; subaguda ou
aguda, principalmente em ovelhas e freqüentemente fatal; e em conjunto com a
“doença negra”, quase exclusivamente em ovinos e geralmente fatal.
Os ovos expelidos nas fezes desenvolvem-se nos miracídios em aproximada-
mente 2 a 4 semanas, dependendo da temperatura e eclosão na água. Os miracídios
infectam caramujos limineídeos, nos quais ocorre multiplicação e desenvolvimento
através dos estágios de esporocistos, rédias (algumas vezes rédias filhas) e
cercárias. Após aproximadamente 2 meses (ou mais, em baixas temperaturas) as
cercárias saem dos caracóis e se encistam na vegetação aquática. Os caracóis
podem aumentar o período, dada a hibernação durante o inverno. As cercárias
encistadas (metacercárias) podem permanecer viáveis por muitos meses, a não ser
que elas se dessequem.
Após a ingestão pelo hospedeiro, geralmente com a forragem, os trematódeos
jovens são liberados no duodeno, penetram a parede intestinal e entram na
cavidade peritoneal. Os trematódeos jovens penetram a cápsula hepática e vagam
pelo parênquima por várias semanas, crescendo e destruindo os tecidos. Eles
penetram os dutos biliares, tornam-se maduros e começam a produzir ovos. O
período pré-patente é geralmente de 2 a 3 meses, dependendo da carga de
trematódeos. O trematódeo adulto pode viver nos dutos biliares dos ovinos por anos;
a maioria é emitida pelo bovino em 5 a 6 meses. As infecções pré-natais têm sido
descritas em bovinos.
Achados clínicos – A fasciolose em ruminantes varia em gravidade de uma
doença devastadora em ovinos a uma infecção assintomática em bovinos. O curso
geralmente é determinado pelo número de metacercárias ingeridas em um curto
período. Em ovinos, a fasciolose aguda ocorre sazonalmente e é manifestada por
um abdome distendido e dolorido, anemia e morte repentina. As mortes podem
ocorrer dentro de 6 semanas após a infecção. A síndrome aguda deve ser
diferenciada da “doença negra”, hepatite necrótica infecciosa (HNI, ver pág. 394).
Infecções por Trematódeos em Ruminantes 260

Na doença subaguda, a sobrevivência é maior (7 a 10 semanas), mesmo em casos


de grande dano hepático, mas mortes ocorrem devido a hemorragias e anemia.
Casos de fasciolose crônica ocorrem em todas as estações; os sintomas podem
incluir anemia, fraqueza, edema submandibular e redução da secreção de leite, mas
mesmo severamente infectados, os bovinos podem não demonstrar sinais clínicos.
Infecção crônica grave é fatal em ovinos.
Os ovinos parecem não desenvolver resistência à infecção, e as lesões hepáticas
crônicas vão se acumulando com os anos. Em bovinos, há evidência de diminuição
da suscetibilidade após fibrose de tecidos hepáticos e calcificação de dutos biliares.
Lesões – Os trematoídeos imaturos errantes destroem o tecido hepático e
causam hemorragia. Danos extensivos levam à fasciolose aguda, na qual o fígado
está aumentado e friável, com deposição de fibrina na cápsula. As marcas de
migração podem ser vistas e a superfície fica com aparência irregular. Em casos
crônicos, desenvolve-se cirrose. Trematódeos adultos lesam os dutos biliares que
se tornam aumentados, ou mesmo císticos, e apresentam paredes espessadas e
fibrosadas. Em bovinos, as paredes do duto são muito espessas e, freqüentemente,
calcificadas. Trematódeos são, com freqüência, encontrados em locais anormais,
por exemplo, nos pulmões. Infecções mistas com F. magna podem ocorrer em
bovinos.
A destruição tecidual por trematódeos errantes pode criar um microambiente
favorável à ativação de esporos de clostrídios.
Diagnóstico – Os ovos operculados, ovais e acastanhados de 130 a 150 × 65
a 90µm devem ser distinguidos dos paranfístomos (trematódeos ruminais), que são
maiores e mais claros. Os ovos de F. hepatica não podem ser demonstrados nas
fezes na fascioliose aguda. Na doença subaguda ou crônica, o número varia de dia
a dia e exames fecais repetidos são necessários. À necropsia, a natureza da lesão
hepática é diagnóstica. Os trematódeos adultos são facilmente vistos nos dutos
biliares e os estágios imaturos podem ser espremidos ou raspados da superfície de
corte.
Controle – As medidas de controle para as infecções por F. hepatica são dirigidas
para a redução do número de trematódeos no hospedeiro animal, redução da
população de caramujos no ambiente e redução da exposição do plantel a solo
infestado com caracóis. Os tratamentos de rotina do plantel, no outono e primavera,
são aconselháveis; tratamentos adicionais são determinados por fatores epidemioló-
gicos locais; por exemplo, nos estados da Costa do Golfo (EUA), os bovinos devem
ser tratados antes das estações chuvosas começarem (o que reduz a contaminação
das pastagens) e novamente no final da primavera. No noroeste dos EUA, os bovinos
devem ser tratados no fim da estação de pasto (novembro a dezembro) e novamente
no fim de janeiro ou fevereiro. Os animais transferidos para confinamentos podem
requerer tratamento na chegada e novamente em 8 semanas. Quando o medicamen-
to seguro permitir, os animais prenhes devem ser tratados algumas semanas antes
do parto para garantir-se que não fiquem anêmicos durante a lactação. Certos
produtos são proibidos para vacas leiteiras em lactação.
Mais recentemente, um número de compostos, tais como oxiclozanida,
dianfenetida (não ativa em bovinos), rafoxanida, nitroxinil, albendazol, closantel,
triclabendazol, netobimin e clorsulon, tem se tornado disponível. (Apenas o albendazol
e o clorsulon são atualmente aprovados para uso nos EUA.) Alguns destes
(dianfenetida, 100mg/kg; nitroxinil, 15mg/kg; closantel, 10mg/kg; triclabendazol,
10mg/kg; e clorsulon, 7mg/kg) são ativos contra trematódeos imaturos.
A escolha de um fasciolicida deve ser baseada na situação da doença, hospe-
deiro animal, condições ambientais e regulamentações locais; as contra-indicações
devem ser observadas e as precauções de uso seguidas. Vacinações de ovinos
contra hepatite necrótica infecciosa são essenciais em alguns países.
Infecções por Trematódeos em Ruminantes 261

O caramujo hospedeiro intermediário pode ser controlado pela drenagem da


terra, por manejo adequado e pelo uso de moluscocidas. O composto ideal deve
matar os caracóis e seus ovos quando usados em baixas concentrações, e ser
inofensivo aos mamíferos e peixes. O tratamento de rotina de uma área, várias
vezes ao ano, pode ser necessário para conseguir-se um controle adequado.
Compostos de cobre, pentaclorofenato de sódio e trifenmorfo são os moluscocidas
comumente usados e são efetivos, se aplicados corretamente.
O manejo adequado e o uso de cercas podem ser empregados para que os
animais que estejam pastando não entrem em contato com os caramujos. O controle
é dificultado pelos reservatórios das infecções em cavalos e animais silvestres,
como veados e coelhos. Quando ovinos e bovinos pastam juntos, é necessário tratar
ambos em um plano de controle.

Fasciola gigantica
(Trematódeo hepático gigante)
Fasciola gigantica tem a forma semelhante à da F. hepatica, mas é maior (75mm)
e com limites claramente definidos. Ocorre em climas mais quentes (Ásia, África) em
bovinos e bufalinos, nos quais é responsável pela fasciolose crônica; e em ovinos,
nos quais a doença é freqüentemente aguda e fatal. O ciclo de vida é similar ao da
F. hepatica, exceto pelas espécies de caramujos hospedeiros intermediários. A
patologia da infecção, os procedimentos para diagnóstico e as medidas de controle
são semelhantes aos da F. hepatica.

Fascioloides magna
(Grande trematódeo hepático americano, Trematódeo hepático gigante)
A Fascioloides magna tem até 100mm de comprimento, é espessa e oval;
distingue-se das Fasciola spp pela falta de um cone projetante anterior. Ocorre em
ruminantes domésticos e silvestres; os veados são os hospedeiros normais. O ciclo
de vida assemelha-se ao das Fasciola spp.
O ciclo de vida não se completa nos bovinos. Neste hospedeiro, a patogenicidade
é baixa e as perdas estão resumidas em condenações do fígado. Em ovinos e
caprinos, alguns parasitas podem provocar a morte, devido à incapacidade do
hospedeiro de limitar a migração dos trematódeos no parênquima hepático. Em
veados, há pouca reação tecidual e os parasitas estão envolvidos por finos cistos
fibrosos que se comunicam com os dutos biliares. Em bovinos, a F. magna causa
reação tecidual severa, resultando em encapsulamento de paredes espessas que
não se comunicam com os dutos biliares. Em ovinos, os encapsulamentos não se
desenvolvem e os parasitas migram no fígado e em outros órgãos, causando graves
lesões. À secção, os fígados infectados de bovinos, ovinos, e veados mostram
caminhos tortuosos negros, formados pelas migrações dos trematódeos jovens.
Enquanto os ovos de F. magna assemelham-se aos da F. hepatica, este aspecto
é de uso limitado; desde que os ovos geralmente não ocorram em bovinos. A
recuperação de parasitas à necropsia e a diferenciação entre F. hepatica e F.
gigantica é necessária, para um diagnóstico definitivo. Quando ruminantes domés-
ticos e veados compartilham a mesma pastagem, a presença da doença devido à
F. magna deve ser considerada. Infecções mistas com F. hepatica ocorrem em
bovinos.
Oxiclozanida tem sido apontada como efetiva contra F. magna em veados de
cauda branca, e rafoxanida tem sido usada com sucesso contra as infecções
naturais em bovinos. Albendazol (7,5mg/kg), clorsulon (15mg/kg) e closantel
(15mg/kg) têm demonstrado eficácia contra os trematódeos de ovinos. Atualmente
nenhum produto é aprovado para uso contra esses trematódeos nos EUA. Os
Infecções por Trematódeos em Ruminantes 262

veados são necessários para que o ciclo de vida se complete; se eles forem
excluídos das áreas de pastagem de bovinos e ovinos, pode-se propiciar um
controle efetivo. O controle do hospedeiro intermediário (caracóis limneídeos) pode
ser possível, desde que tenham sido identificados na região e que a natureza do seu
hábitat tenha sido examinada.

Dicrocoelium dendriticum
(Trematódeo lanceiforme, Pequeno trematódeo hepático)
O trematódeo lanceiforme é delgado e tem 6 a 10mm de comprimento. Tem uma
grande distribuição em muitos países e infecta uma grande variedade de hospedei-
ros finais, incluindo os ruminantes domésticos. Outra espécie, D. hospes, é comum
na África. O primeiro hospedeiro intermediário é um caracol terrestre (Cionella
lubrica, nos EUA) do qual as cercárias emergem e ficam agregadas em uma massa
de muco viscoso (bola-viscosa). As cercárias são ingeridas por um segundo
hospedeiro intermediário, que são formigas (Formica fusca, nos EUA), e encistam-
se na cavidade abdominal. Uma ou duas metacercárias no gânglio subesofágico da
formiga causam comportamento anormal, fazendo com que formigas se fixem na
pastagem, o que aumenta a probabilidade de sua ingestão pelo hospedeiro
definitivo. Os trematódeos jovens migram para o fígado, via duto biliar, e iniciam a
oviposição em aproximadamente 10 a 12 semanas após a infecção.
Não há imunidade aparente e grande número de parasitas pode-se acumular (até
50.000 trematódeos em uma ovelha adulta). Ocorre cirrose e os dutos biliares
podem estar espessos e distendidos. As perdas econômicas são devidas primaria-
mente à condenação dos fígados. Sinais clínicos não são óbvios, mas podem ser
vistos em infecções maciças. Os ovos são muito pequenos (40 × 25µm), assimétri-
cos, marrom-amarelados e contêm miracídios.
O ciclo de vida complexo torna difícil o combate aos hospedeiros intermediários,
a não ser que as agregações de caracóis e formigas possam ser localizadas e
eliminadas. Contra os trematódeos, hetolina (19 a 22mg/kg), albendazol (20mg/kg),
fenbendazol (50mg/kg), netobimin (20mg/kg) e praziquantel (50mg/kg) têm 90% de
eficácia ou mais já relatada, mas seu uso não é aprovado em todos os países.

Eurytrema spp
(Trematódeo pancreático)
O trematódeo tem 8 a 16mm de comprimento, 6mm de largura e um corpo
espesso. É um parasita de dutos pancreáticos e, ocasionalmente, de dutos biliares
de ovinos, suínos e bovinos no Brasil e Ásia. Três espécies, E. pancreaticum, E.
coelomaticum e E. ovis são reconhecidas. Os primeiros hospedeiros intermediários
são caracóis terrestres (Bradybaena spp), e as carcárias encistam-se em gafanho-
tos (Conocephalus spp), que é o segundo hospedeiro intermediário. Após a ingestão
de um gafanhoto, os trematódeos imaturos são liberados e migram para o duto
pancreático, onde amadurcecem e produzem ovos em aproximadamente 11 a 14
semanas.
Não há sintomas clínicos evidentes. Os ovos semelhantes aos de Dicrocoelium
podem ser demonstrados nas fezes. As infecções leves causam inflamação
proliferativa dos dutos pancreáticos, que podem se tornar aumentados e ocluídos.
Em infecções maciças ocorrem lesões degenerativas, fibrosas e necróticas. As
perdas relatadas são devidas à condenação do pâncreas, mas a patogenia sugere
uma perda adicional da produção.
Como no caso do Dicrocoelium, o controle de hospedeiros intermediários pode
ser impraticável. O tratamento com praziquantel (20mg/kg, por 2 dias) tem sido
relatado como eficaz.
Parasitas Gastrointestinais de Suínos 263

Paranfístomos
(Anfístomos, Trematódeos ruminais, Trematódeos cônicos)
Há numerosas espécies (Paramphistomum, Calicophoron, Cotylophoron) em
ruminantes em todo o mundo. Os parasitas adultos tem forma de pêra, são rosados
ou vermelhos, com até 15mm de comprimento e ligam-se ao revestimento do rúmen.
Formas imaturas aparecem no duodeno e têm 1 a 3mm de comprimento.
Ovos são eliminados nas fezes e os miracídios eclodem na água, infectando
caracóis planorbídeos ou bulinídeos. O desenvolvimento no caracol é semelhante
ao da Fasciola hepatica, com o caramujo emitindo cercárias que se encistam na
pastagem. No hospedeiro ruminante, os trematódeos jovens excistam e permane-
cem no intestino delgado por 3 a 5 semanas, migrando posteriormente através do
retículo para o rúmen. Os ovos são produzidos 7 a 14 semanas após a infecção.
Os trematódeos adultos não causam doença evidente e podem ser encontrados
em grande número. Os parasitas imaturos prendem-se no duodeno e, às vezes, à
mucosa do íleo por meio de uma grande ventosa posterior e causam severa enterite,
possivelmente com necrose e hemorragia. Os animais afetados apresentam anore-
xia, polidipsia, prostração e diarréia severa. Grande mortalidade pode ocorrer,
especialmente em bovinos e ovinos jovens. Animais mais velhos podem desenvol-
ver resistência à reinfecção, mas podem continuar a abrigar numerosos trematódeos
adultos.
Os ovos grandes, claros e operculados são facilmente reconhecidos, mas na
paranfistomíase aguda pode não haver ovos nas fezes. A ocorrência já é conhecida
na área, e o exame de fezes diarréicas pode revelar trematódeos imaturos, muitos dos
quais são expelidos nestes casos. O diagnóstico é comumente feito na necropsia.
O caracol hospedeiro pode ser combatido como descrito no controle da fascioliose
(ver pág. 261). Os trematódeos imaturos, em ovinos, são suscetíveis à niclosamida,
niclofolan, bitional, oxiclozanida e rafoxanida, mas o resorantel e a oxiclozanida são
considerados os anti-helmínticos de escolha, com uma eficácia superior a 90% e
atividade contra os trematódeos ruminais adultos e imaturos nos bovinos e ovinos.
Nem todos estes compostos têm seu uso aprovado em todos os países.

PARASITAS GASTROINTESTINAIS
DE SUÍNOS
Queda da imunidade no período periparto em porcas – Durante este período
(2 semanas antes do parto a 6 semanas após), há uma queda da imunidade das
matrizes e, se infectadas por estrôngilos, um aumento marcante nas contagens de
ovos fecais ocorre. No desmame, há um decréscimo abrupto na eliminação de ovos
e muitos vermes, principalmente Oesophagostomum, são eliminados. Este fenôme-
no é considerado epidemiologicamente importante, pois o ambiente dos leitões fica
contaminado.
Controle de vermes – Além dos preceitos higiênicos básicos nas pocilgas, que
devem ser enfatizados, o controle geralmente baseia-se em anti-helmínticos. Os
produtos adicionados à ração incluem os benzimidazóis, levamisol e diclorvos. Um
programa anti-helmíntico simples é o seguinte: tratar as matrizes e marrãs , 10 dias
antes da cobertura e novamente antes do parto; tratar os porcos desmamados e em
engorda antes de entrarem em instalações limpas; tratar os cachaços a intervalos
de 6 meses. Alternativamente, uma injeção de ivermectina, que também é efetiva
contra piolhos e carrapatos, pode ser dada em um programa similar.
Parasitas Gastrointestinais de Suínos 264

INFECÇÃO POR ASCARIS


Os adultos do grande verme redondo, Ascaris suum , são encontrados princi-
palmente no intestino delgado, mas podem migrar para o estômago ou dutos
biliares. Eles têm 30cm ou mais de comprimento e são muito grossos. Grandes
números de ovos são produzidos (por volta de 250.000/dia); que se desenvolvem
ao estágio infectante em 2 a 3 semanas e são resistentes aos agentes químicos.
Quando os ovos são ingeridos, as larvas saem do intestino, penetram a parede
intestinal e entram na circulação portal. Após um período no fígado, elas são
carreadas pela circulação aos pulmões, onde passam através dos capilares para
os espaços alveolares. Aproximadamente 9 a 10 dias após ingestão, as larvas
deixam o pulmão, subindo pela árvore brônquica, e retornam ao sistema GI,
depois amadurecendo no intestino delgado. Os primeiros ovos são eliminados 2
a 2,5 meses após a infecção.
Achados clínicos – Os vermes adultos podem reduzir significativamente o
padrão de crescimento de animais jovens; se eles são suficientemente numerosos,
podem causar obstrução mecânica do intestino ou migrar para os dutos biliares e
oclui-los, produzindo icterícia.
A migração de larvas através do fígado causa hemorragia e fibrose, que se
apresenta como “pontos brancos” sob a cápsula. Em infecções maciças, as larvas
podem causar edema pulmonar e consolidação, e exarcebar as infecções pela
influenza suína e pneumonia endêmica. Os animais afetados mostram respiração
abdominal, comumente referida como “batedeira”. Somando-se aos sinais respira-
tórios, o animal demonstra fraqueza acentuada e perda de peso. Parada permanen-
te do crescimento pode ser um resultado em porcos de até 4 a 5 meses.
Diagnóstico – Durante o período de patência, o diagnóstico pode ser feito pela
demonstração de ovos típicos nas fezes. Contudo, muitos leitões mostram sinais
(principalmente de envolvimento respiratório) durante o período pré-patente. Um
diagnóstico presuntivo pode ser feito, baseado no histórico e nos sintomas, e pode
ser confirmado pela demonstração de formas jovens à necropsia. Em casos agudos,
nos quais os vermes não são encontrados no intestino, é possível recuperar as
larvas do tecido pulmonar afetado.
Tratamento – O tratamento de suporte e a terapia para infecções bacterianas
secundárias podem ser necessários durante a fase respiratória da infecção. Muitas
drogas têm sido usadas para remover os ascarídeos adultos. Preparações de
piperazina têm baixa toxicidade e custo moderado e, há alguns anos, vem sendo a
droga de escolha. Os benzimidazóis e probenzimidazóis, doclorvos, ivermectina,
levamisol e pirantel são eficazes e possuem um espectro de atividade maior que a
piperazina.
O antibiótico higromicina é ativo contra os ascarídeos, quando administrado em
baixos níveis, como aditivo alimentar. Muitas drogas têm sido testadas quanto à
eficiência na destruição das fases migratórias; o pirantel mostra ser a maior
esperança neste aspecto. Os efeitos benéficos na redução das lesões pulmonares
e hepáticas merecem estudo minucioso.

INFECÇÃO POR MACRACANTHORHYNCHUS


Os adultos Macracanthorhynchus hirudinaceus (verme com cabeça espinhosa)
geralmente estão no intestino delgado. Podem ter 30cm de comprimento e 3 a 9mm
de largura, são levemente rosados e têm o exterior coberto por pregas transversais.
A extremidade anterior ostenta probóscide ou rostelo retrátil espinhosos, por meio
dos quais o parasita fixa-se firmemente à parede intestinal. Os ovos são ingeridos
por larvas de vários besouros que servem como hospedeiros intermediários.
Parasitas Gastrointestinais de Suínos 265

Os sintomas não são específicos; o diagnóstico ante mortem é difícil, uma vez
que os ovos não flutuam com segurança em soluções salinas. O local de fixação
pode ter um centro necrótico circundado por uma zona de inflamação. Estas lesões
geralmente podem ser vistas através da serosa. O rostelo pode perfurar a parede
intestinal e causar peritonite e morte.
O levamisol é efetivo para o tratamento. O controle depende de se evitar o uso
de lotes ou de pastagens completamente contaminados.

INFECÇÃO POR OESOPHAGOSTOMUM


Oesophagostomum spp são predominantes no mundo todo; O. dentatum é a
espécie mais comum. Os adultos são encontrados no lúmen do intestino grosso; eles
têm 8 a 12mm de comprimento, são finos e brancos ou acizentados. O ciclo de vida
é direto com a infecção resultando da ingestão de larvas. Estas penetram na mucosa
do intestino grosso após algumas horas da ingestão e retornam ao lúmen em 6 a 20
dias. As moscas mostram um aumento na eliminação de ovos no período periparto,
o que é uma importante fonte de infecção para os leitões. A maioria das infecções é
assintomática, mas animais severamente infectados podem apresentar anorexia,
emaciação e distúrbios GI. A serosa mostra pequenos nódulos, com tamanho
refletindo nas espécies e exposição anterior. Em casos severos, a parede intestinal
pode estar espessada e necrótica. Em infecções patentes, os ovos de estrôngilos
típicos são encontrados em fezes, freqüentemente em grandes números. Esses
podem ser diferenciados daqueles de Hyostrongylus pela cultura larval. Na necropsia,
os vermes e as lesões são facilmente vistos. Os benzimidazóis, o levamisol, as
piperazinas, os diclorvos, o tartarato de pirantel e a ivermectina são efetivos.

INFECÇÕES VERMINÓTICAS ESTOMACAIS


Três tipos de vermes estomacais ocorrem em suínos: um verme fino, Hyostrongylus
rubidus (verme vermelho do estômago) e dois vermes estomacais grossos, Ascarops
strongylina e Physocephalus sexalatus. O verme estomacal fino tem aproximada-
mente 6mm de comprimento, é delgado, e tem um ciclo de vida direto. Os vermes
estomacais grossos têm ≥ 12mm de comprimento e são muito robustos e têm
besouros coprófagos como hospedeiros intermediários.
Achados clínicos – Estes vermes são mais comuns em porcos em regime de
pasto. Quando presentes em grande número ou quando as condições do hospedei-
ro estão diminuídas por nutrição deficiente ou outros fatores, eles podem causar
alteração do apetite, anemia, diarréia e perda de peso. Hyostrongylus sp é
encontrada caracteristicamente sob um grande exsudato catarral ou mucoso e pode
provocar lesões da mucosa, semelhantes às das Ostertagia spp em ruminantes,
exceto que as hemorragias são mais comuns. O desenvolvimento retardado de
estágios larvais na mucosa é análogo ao da Ostertagia. Em porcas, os vermes
latentes reiniciam o desenvolvimento por volta da parição e podem causar gastrite
severa e, ainda, contaminar o ambiente dos leitões.
Diagnóstico e tratamento – Outros sinais clínicos, que não a fraqueza, não são
evidentes. Hemorragias fatais têm sido descritas em hiostrongilose. Os exames
fecais podem mostrar os ovos inconfundíveis de Physocephalus e Ascarops –
pequenos (35 a 40 × 20µm), com casca fina contendo uma larva ativa. Os ovos de
Hyostrongylus assemelham-se aos de outros estrôngilos (Oesophagostomum,
Globocephalus) e coproculturas são necessárias para a obtenção de larvas in-
fectantes para o diagnóstico diferencial.
À necropsia, os vermes adultos, principalmente de Physocephalus e Ascarops,
são facilmente vistos. Raspados de mucosa para exame microscópico são essen-
ciais para a detecção de Hyostrongylus imaturos.
Parasitas Gastrointestinais de Suínos 266

Tiabendazol, levamisol e diclorvos são eficazes contra Hyostrongylus. Os novos


benzimidazóis, probenzimidazóis e ivermectina são altamente efetivos e também
eliminam os estágios latentes. Dissulfeto de carbono ou o complexo com piperazina,
que é ativo no estômago, são recomendados contra Physocephalus e Ascarops,
mas ainda faltam dados precisos.

I NFECÇÃO POR STRONGYLOIDES


O ciclo de vida da Strongyloides ransomi (verme filamentoso intestinal) é
aparentemente semelhante ao da S. papillosus dos bovinos (ver pág. 248). A
transmissão das larvas de S. ransomi pelo colostro é a via de infecção mais comum
em leitões neonatos e explica a natureza séria da infecção. Os vermes adultos
(somente fêmeas no ciclo parasitário) escavam a parede do intestino delgado. Em
infecções leves e moderadas, os animais geralmente não apresentam sintomas. Em
infecções pesadas, podem ser observadas diarréia, anemia e emaciação. A morte
pode sobrevir.
A demonstração de ovos embrionados característicos, pequenos e com casca
fina nas fezes ou de adultos em raspados da mucosa é de valor diagnóstico. Os ovos
de Strongyloides devem ser diferenciados dos grandes ovos de Metastrongylus
(verme pulmonar suíno), que também são embrionados em fezes frescas. À
necropsia, os vermes imaturos podem ser recuperados de fragmentos de tecidos
colocados em um aparelho de Baermann.
Os benzimidazóis são efetivos contra infecções intestinais. Se administrados no
alimento, por vários dias antes e após a parição, eles reduzem a infecção em leitões
lactentes. A ivermectina é efetiva contra os adultos e, se dada à matriz 7 a 14 dias
antes da parição, controlará a transmissão aos leitões.

INFECÇÃO POR TRICHURIS


Trichuris suis tem 5 a 8cm de comprimento com a porção anterior afilada e o terço
posterior engrossado. A infecção ocorre pela ingestão de ovos embrionados.
Infecções severas podem causar lesões inflamatórias no ceco e intestino grosso
adjacente, acompanhadas por diarréia e fraqueza. Os ovos bioperculados são
diagnósticos. Diclorvos, levamisol e alguns benzimidazóis são eficazes.

ABSCESSOS HEPÁTICOS NOS BOVINOS


Os abscessos hepáticos secundários à ruminite ocorrem em gado de todas as
raças e idades, em qualquer local que sejam criados, mas são mais comuns em gado
confinado para engorda: até 95% de um grupo de bovinos em engorda pode ser
afetado. Os abscessos reduzem a eficiência da conversão alimentar, e os fígados
afetados são condenados.
Etiologia e patogenia – A Fusobacterium necrophorum, uma bactéria Gram-
negativa, obrigatoriamente anaeróbica, que é um componente normal da microflora
ruminal, é o principal agente etiológico. Dos 3 biótipos (A, B e C), apenas o A e o B
foram implicados. As cepas Tipo A são isoladas de , 85% dos abscessos, sendo
geralmente encontradas em culturas puras. As cepas do Tipo B são isoladas de
, 15% dos abscessos e sempre encontradas em culturas mistas, presentes com o
Tipo A ou outras espécies bacterianas. Corynebacterium pyogenes, estreptococos,
estafilococos, e Bacteroides spp são os mais freqüentemente obtidos em culturas
mistas.
Necrose da Gordura Peritoneal 267

A ruminite é geralmente resultado de fermentação intra-ruminal rápida de


carboidratos da dieta com subseqüente aumento da acidez do líquido ruminal. As
rações com altos níveis de carboidratos são a causa principal, mas a textura do
alimento pode contribuir. A incidência de ruminite do gado de engorda é significa-
tivamente maior quando ele é transferido diretamente de uma ração de forragem
para uma de terminação. A Fusobacterium necrophorum, sozinha ou com outra
bactéria, coloniza a parede ulcerada do rúmen. Êmbolos bacterianos provenientes
de lesões invadem o sistema portal hepático, sendo transportados para o fígado,
onde podem estabelecer focos de infecção de necrobacilose que eventualmente
desenvolvem-se em abscessos.
Achados clínicos, lesões e diagnóstico – O gado com abscessos hepáticos
raramente exibe sintomas clínicos. O gado de engorda com abscessos hepáticos
tem menor eficiência alimentar, sendo que os gravemente abscedados ganham 5
a 15% menos peso por dia que o gado livre de abscessos. A maioria dos abscessos
hepáticos são lesões ocultas que regridem para uma cicatriz estéril; alguns se
rompem e drenam para a cavidade peritoneal, vasos sangüíneos hepáticos, ou veia
cava caudal. Morte súbita e distúrbios GI e respiratórios vagos estão associados a
estes abscessos rompidos.
As lesões ruminais são caracterizadas por uma reação inflamatória marcante e
necrose. Ocasionalmente, os abscessos são observados nas camadas mais
profundas da parede do rúmen. As lesões de necrobacilose hepática com menos de
6 dias de duração são esféricas, amarelo-pálidas, com contornos irregulares, sendo
caracterizadas por necrose de coagulação dos hepatócitos. Os abscessos mais
velhos possuem um núcleo que é progressivamente encapsulado por tecido
conjuntivo fibroso. Os abscessos geralmente têm 4 a 6cm de diâmetro. Os fígados
afetados normalmente têm 3 a 10 abscessos, mas podem ter até 100.
Os abscessos hepáticos são encontrados em , 10% do gado abatido nos EUA.
A cultura raramente é feita para confirmar o diagnóstico. Ocasionalmente, os
abscessos hepáticos devidos à F. necrophorum devem ser distinguidos daqueles
causados por reticuloperitonite traumática (ver pág. 269).
Tratamento e controle – A clortetraciclina administrada continuamente na
ração, na dose de 70mg/cabeça/dia durante o período de terminação reduz
significativamente o número de abscessos hepáticos e aumenta a eficiência
alimentar e ganho de peso, mas tem pouco ou nenhum efeito na prevalência de
lesões ruminais. Menos lesões ruminais ocorrem quando a razão de concentrados
para forragem é diminuída e quando o período de transição de uma ração com
forragem para uma com terminação é aumentado. A maior quantidade de forragem
na ração e várias porções diárias aumentam o tempo de mastigação e o fluxo de
saliva; isto aumenta o tamponamento do rúmen e fornece uma fermentação
contínua e uniforme que reduz o pH intra-ruminal, que, por sua vez, diminui o número
de lesões ruminais e, indiretamente, o número de abscessos hepáticos.

NECROSE DA GORDURA PERITONEAL


Ocorre em bovinos com 2 anos de idade ou mais, após pastagem prolongada em
pasto alto de festucas infectadas por Acremonium coenophialum (ver também
TOXICOSE DE VERÃO POR FESTUCAS, pág. 2045). O problema é observado por todos
os EUA, nos locais onde a festuca alta é utilizada como principal planta no pasto.
Mais de 90% destes pastos estão infectados. Formam-se massas duras de gordura
necrótica no omento, mesentério e gordura perirreal, podendo causar doença clínica
Necrose da Gordura Peritoneal 268

quando comprimem o intestino, obstruem o canal do parto, ou comprimem ureteres.


O exame retal é útil no diagnóstico e na determinação da prevalência em um
rebanho. A remoção do gado dos pastos infectados pelo endófito ou a diluição da
ingestão por fornecimento de outras gramíneas ou leguminosas provoca uma
redução lenta no tamanho das massas.
Uma segunda forma, menos bem definida, parece estar relacionada a problemas
pancreáticos. Apesar de não estar relacionada a uma síndrome clínica, não é raro
encontrá-la na necropsia; as lesões (massas de tecido adiposo necrótico discretas
ou confluentes) podem ser encontradas em todo o abdome.
Uma terceira forma, uma necrose focal da gordura abdominal e retroperitoneal, é
observada mais freqüentemente em ovinos, mas também em suínos, eqüinos e outros.

ESTERTORES ABDOMINAIS (“RATTLE


BELLY”) EM CORDEIROS
(Baba, Sialorréia)

Trata-se de uma doença dos rebanhos intensivos de ovinos no Reino Unido que
pode causar graves perdas em carneiros neonatos. Ocorre mais freqüentemente
em ovinos com 12 a 72h de vida. A morbidade em um rebanho pode ser de até 30%
e, se não tratada, a maioria dos animais afetados morre. Um problema aparente-
mente semelhante pode ocorrer em ovinos mais velhos, mas quase certamente
possui etiologia diferente.
Etiologia – A doença foi induzida em ovinos pela infecção oral com uma
variedade de cepas de Escherichia coli que, na maioria das situações, se esperaria
serem não patogênicas. Acredita-se que a rápida multiplicação destas bactérias no
intestino resulte na produção de endotoxinas que provocam a doença. A passagem
de bactérias ingeridas oralmente para o intestino foi facilitada pela falta de acidez do
abomaso dos ovinos neonatos; a multiplicação acelerada no intestino foi acentuada
pela motilidade diminuída, característica das primeiras 48h de vida. Além disto, a E.
coli é comumenta obtida em casos de campo. Outras bactérias podem estar
envolvidas. Apesar da aparente etiologia bacteriana, não há evidências de contágio.
O problema é mais comum em gêmeos ou trigêmeos, em cordeiros de ovelhas em
más condições e em cordeiros de ovelhas muito jovens ou muito velhas. A ingestão
de uma quantidade adequada de colostro (50mL/kg) na primeira hora de vida reduz
consideravelmente a suscetibilidade.
Achados clínicos e patogenia – Os sintomas iniciais incluem apatia, perda de
reflexo de sucção, lacrimejamento e salivação excessiva (sialorréia). Em poucas
horas, o abomaso fica distendido por gás e a mobilidade intestinal está deprimida
ou ausente. O aumento de pressão no abdome pode prejudicar a respiração.
Desenvolve-se bacteremia. Se não tratada, a morte ocorre em 12 a 24h por
hipoglicemia, hipotermia e toxemia.
Lesões – Nos estágios iniciais, há inflamação do intestino delgado ou grosso, ou
ambos. Em casos fatais, o abomaso está aumentado e pode conter quantidade
copiosa de fluido, os intestinos estão inflamados, há sinal de toxemia e as reservas
de gordura estão exauridas.
Diagnóstico – Um diagnóstico seguro só pode ser feito pelo exame clínico de
cordeiros nos estágios iniciais da condição, antes que os efeitos secundários da
inanição, toxemia e timpanismo abdominal sobrevenham. O diagnóstico diferencial
diferencial inclui inanição primária e enterite infecciosa.
Reticuloperitonite Traumática 269

Tratamento – O tratamento de suporte é essencial. Antibióticos parenterais


devem ser administrados diariamente. Um mínimo de 50mL de um eletrólito e 10%
de solução de glicose contendo uma preparação antibiótica oral solúvel em água
(neomicina e/ou estreptomicina) deve ser administrado pela sonda estomacal, três
vezes ao dia; se o cordeiro não estiver sugando, o volume de cada alimentação deve
ser aumentado para 100 a 200mL. O tratamento deve ser continuado até os sinais
se resolverem e o cordeiro estiver sugando novamente.
Controle – Boas práticas de manejo são importantes. Deve haver aumento do
fornecimento e produção abundante de colostro por meio de boa nutrição da
ovelha. Os apriscos devem ser mantidos limpos para reduzir a contaminação
bacteriana. Os cordeiros devem ingerir colostro adequado (50mL/kg) na primeira
hora de vida; não se devem castrar cordeiros com anéis de borracha nas primeiras
24h de vida, pois isto diminui o consumo de colostro. Se estas medidas falharem,
a administração de antibióticos (orais ou injetáveis), na primeira hora após o
nascimento, tem sido eficaz.

RETICULOPERITONITE TRAUMÁTICA
(Gastrite traumática, Doença das ferragens)

É uma doença de bovinos resultante da perfuração do retículo. É importante no


diagnóstico diferencial de doenças marcadas por estase do trato GI devido a seus
sinais serem semelhantes àqueles de outras doenças. É mais comum no gado
leiteiro maduro, ocasionalmente observada em gado de corte e raramente relatada
em outros ruminantes.
Objetos estranhos são comuns no estômago de bovinos porque não diferen-
ciam materiais duros na ração e mastigam incompletamente seu alimento. A
doença é comum quando a silagem e o feno são feitos de pastagens delimitadas
por cercas velhas enferrujadas e de arame farpado, ou de áreas onde construções
tenham sido recentemente edificadas, queimadas ou demolidas. A ração de
grãos também pode ser uma fonte devido à adição de metal acidental ou
intencional.
Etiologia – Os objetos metálicos deglutidos, como pregos ou pedaços de
arame, caem diretamente no retículo ou caem no rúmen e subseqüentemente são
carreados da dobra ruminorreticular para a porção cranioventral do retículo por
contrações ruminais. O orifício retículo-omasal está acima do assoalho, o que
favorece a retenção dos objetos pesados no retículo, e a mucosa semelhante a
favos de mel do retículo atua como uma armadilha para objetos pontiagudos. As
contrações reticulares promovem a perfuração da parede pelo objeto estranho.
A compressão do ruminorretículo pelo útero no final da gestação, o esforço
durante o parto e a monta durante o estro aumentam a probabilidade de uma
penetração inicial do retículo, podendo também romper aderências causadas por
uma penetração anterior.
A perfuração da parede do retículo permite vazamento da ingesta e bactérias,
que causa contaminação da cavidade peritoneal. Segue-se uma peritonite local
freqüentemente resultando em aderências. Menos comumente desenvolve-se uma
peritonite mais severa. A peritonite difusa é rara. O objeto pode perfurar o diafragma
e entrar na cavidade torácica (causando pleurite e, algumas vezes, pneumonite) e
no saco pericárdico (causando pericardite, algumas vezes, seguida de miocardite,
endocardite e septicemia). Ocasionalmente, outros órgãos (fígado, baço) podem
ser perfurados e tornar-se infectados.
Reticuloperitonite Traumática 270

Achados clínicos – O ataque inicial é caracterizado por atonia ruminorreticular


de início súbito e uma queda brusca na produção de leite. O volume fecal
excretado diminui. A temperatura retal com freqüência está ligeiramente elevada
e o ritmo cardíaco é normal ou levemente elevado. A respiração geralmente é
superficial e rápida. Inicialmente, o animal apresenta o dorso arqueado, expres-
são ansiosa, relutância a se mover e um passo difícil e cuidadoso. Movimentos
bruscos forçados e os atos de defecar, urinar, deitar, levantar e passar sobre
obstáculos podem ser acompanhados de grunhidos. Um grunhido pode ser
provocado ao aplicar-se pressão sobre o xifóide, ou ao elevar-se esta área
firmemente e pinçar-se a espinha, provocando extensão do tórax e abdome
inferior. O grunhido pode ser detectado colocando-se um estetoscópio sobre a
traquéia. O tremor do tríceps e a abdução do codilho podem ser observados. Nos
casos mais crônicos, a ingestão de alimentos e excreção de fezes estão reduzi-
dos, além da produção leiteira permanecer baixa. Os sintomas de dor abdominal
cranial tornam-se menos aparentes e a temperatura retal geralmente retorna ao
normal conforme a inflamação aguda subside e a contaminação peritoneal é
isolada. Alguns bovinos desenvolvem indigestão vagal crônica, possivelmente
devido a adesões que se formam após a perfuração pelo corpo estranho,
particularmente aquelas na região ventromedial do retículo.
Os animais com pleurite ou pericardite devido a uma perfuração por corpo
estranho normalmente estão deprimidos, taquicárdicos (>90bpm) e apresentam
pirexia (40°C). A pleurite se manifesta por uma respiração superficial e rápida,
abafamento dos sons pulmonares, e possíveis ruídos de fricção pleurítica. A
toracocentese pode produzir vários litros de líquido. A pericardite traumática em
geral é caracterizada por abafamento dos sons cardíacos, possivelmente com
ruídos de fricção pericárdica e, ocasionalmente, por sons de gás e líquido se
movimentando durante a auscultação. Isto foi descrito como “murmúrio de
máquina de lavar roupas”. A distensão da veia jugular com um pulso jugular
pronunciado está presente precocemente no curso da doença, e a insuficiência
cardíaca congestiva com edema submandibular e de barbela marcantes é uma
seqüela freqüente. O prognóstico é grave com estas complicações. A perfuração
do miocárdio geralmente provoca hemorragia abundante no interior do saco
pericárdico e morte súbita.
Diagnóstico – Pode ser baseado no histórico (quando disponível) e nos
achados clínicos se o animal for examinado quando os sintomas aparecem
inicialmente. Sem um histórico preciso e quando o problema está presente por
vários dias ou mais, o diagnóstico é mais difícil. Outras causas de peritonite,
particularmente as úlceras abomasais perfuradas, podem ser difíceis de distinguir
da reticuloperitonite traumática. Os diagnósticos diferenciais devem incluir doen-
ças que possam provocar sintomas GI variáveis ou inespecíficos, por exemplo,
indigestão, linfossarcoma, ou obstrução intestinal. O deslocamento do abomaso
ou vólvulo deve ser eliminado pela auscultação e percussão simultâneas. A
pleurite ou pericardite de origem não traumática provoca sintomas similares aos
associados à perfuração por corpo estranho. Apesar de nem sempre necessários,
os exames laboratoriais podem ser úteis. Em muitos casos, há um aumento nos
neutrófilos com desvio à esquerda. O fibrinogênio e, nos casos crônicos, a
concentração de proteína plasmática total podem estar elevados. O estado ácido-
básico e os níveis de eletrólitos plasmáticos estão tipicamente normais, uma vez
que a absorção abomasal e do intestino delgado permanecem normais. No
entanto, pode ocorrer alcalose metabólica marcantemente hipocalêmica e
hipoclorêmica, presumivelmente devido a um íleo adinâmico causado pela
peritonite que pode afetar a mobilidade abomasal e GI, além da reabsorção das
secreções abomasais. A alcalose metabólica pode ser criada ou exacerbada pelo
Reticuloperitonite Traumática 271

tratamento com agentes alcalinizantes, como o hidróxido de magnésio utilizado


como laxante.
A análise do líquido peritoneal pode ser útil na determinação da presença de
peritonite. No entanto, o número de células nucleadas e o nível de proteína retornam
ao normal conforme a contaminação é borrada.
As radiografias podem detectar material metálico no retículo. Para determinar
se houve perfuração do retículo, o corpo estranho deve ser visualizado além da
borda do retículo, ou deve ser identificado um abscesso. Os aparelhos portáteis
de radiografia não conseguem penetrar a área reticular de um bovino adulto em
pé, conseqüentemente a vaca terá de ser transportada para um local que possua
um aparelho com potência suficiente. A área pode ser radiografada com um
aparelho portátil se o estado sistêmico não impedir que se coloque o animal em
decúbito dorsal. Um corpo estranho perfurante permanecerá na face ventral do
retículo, rodeado por gás.
Os detectores eletrônicos de metal identificarão o metal no retículo, mas não
distinguem entre corpos estranhos perfurantes e não perfurantes.
A ultra-sonografia do coração e do tórax é útil no diagnóstico de pleurite e
pericardite.
Tratamento – O tratamento dos casos típicos, diagnosticados precocemente,
pode ser cirúrgico ou médico; qualquer um destes aumenta as chances de
recuperação de aproximadamente 60% em casos não tratados para 80 a 90%. A
cirurgia envolve rumenotomia com remoção manual do objeto ou objetos, e se
houver um abscesso aderido ao retículo, deve ser aspirado (para confirmar tratar-
se de um abscesso) e então drenado para o interior do retículo. Os antibióticos
devem ser administrados perioperatoriamente. O tratamento médico envolve tera-
pia antibacteriana para controlar a peritonite e administração de ímã para prevenir
a recidiva. Devido à presença da flora intestinal na lesão, deve ser utilizado um
agente antibacteriano de amplo espectro, como a oxitetraciclina (6,6 a 11mg/kg). A
penicilina (22.000 UI/kg, IM, duas vezes ao dia) é largamente utilizada, sendo eficaz
em muitos casos, apesar do seu espectro limitado. Animais afetados podem ser
mantidos imobilizados por 1 a 2 semanas e colocados em um plano inclinado para
limitar penetração posterior por corpo estranho. A terapia de suporte, como líquidos
orais ou ocasionalmente EV e borogliconato de cálcio s.c., deve ser administrada
quando necessária. A inoculação ruminal é benéfica em alguns casos com estase
ruminal prolongada e perda da flora normal. O uso de detectores de metal magnético
flexível introduzidos oralmente ou através de uma incisão no flanco para ajudar na
remoção de objetos tem sido descrito.
Os casos mais avançados, nos quais se tornam óbvias as complicações
secundárias, ou aqueles que não respondem às medidas terapêuticas ou cirúrgi-
cas iniciais, devem ser avaliados do ponto de vista econômico: se o animal é de
valor limitado, o abate deve ser considerado se a carcaça for igualmente
inspecionada.
Prevenção – Evitar o uso de cercas de arame farpado, magnetizar os depósitos
de preparo e estocagem do alimento, manter os animais longe dos locais de novas
construções e remover completamente construções e cercas velhas são medidas
preventivas. Como uma medida de precaução adicional, barras magnéticas podem
ser administradas por VO, preferivelmente após jejum de 18 a 24h. Os imã
geralmente permanece no retículo e segura objetos ferromagnéticos em sua
superfície. Há boas evidências de que se ministra imãs para todo o rebanho de
reposição, novilhas e touros, até aproximadamente 1 ano de idade, minimiza a
incidência da reticuloperitonite traumática.
Disenteria de Inverno 272

DISENTERIA DE INVERNO
(Curso do inverno)

Trata-se de uma doença aguda e altamente contagiosa dos bovinos, caracteri-


zada por um breve ataque de diarréia ou disenteria grave e por alta morbidade mas
baixa mortalidade. Pode levar a desidratação, perda de peso e condição física e, em
animais lactantes, uma queda de moderada a grande na produção leiteira. A doença
ocorre em vários países, mas a incidência relatada é maior no norte dos EUA,
Canadá e Europa.
Etiologia e epidemiologia – Um coronavírus, estreitamente relacionado à cepa
da diarréia de bezerros do Nebraska, foi detectado nas fezes do gado clinicamente
doente com disenteria de inverno e parece estar associado à causa da doença.
No hemisfério norte, a doença ocorre de novembro a março. O período de
incubação é curto e a doença em geral se dissemina rapidamente no rebanho; 100%
dos bovinos suscetíveis podem apresentar doença em 4 a 5 dias após o início do
surto. Todas as idades podem ser afetadas, porém a doença é mais comum e grave
em adultos, especialmente vacas leiteiras pós-parturientes. Os surtos de disenteria
de inverno podem ocorrer em uma área ou comunidade por um curto período e a
doença geralmente não se repete por 3 a 4 anos.
Achados clínicos – Na maioria dos surtos, várias vacas desenvolvem diarréia
aquosa profusa com um odor ligeiramente fétido ou bolorento no primeiro dia, sendo
que o restante do rebanho é afetado rapidamente. A diarréia pode ser precedida por
febre baixa, corrimento nasolacrimal e tosse úmida. As fezes variam de marrom-
escuro até preto-esverdeado, muitas vezes contendo muco e sangue. Se não
ocorrerem complicações, a temperatura é normal quando os sintomas clínicos estão
aparentes, assim como os ritmos cardíaco e respiratório. O apetite pode estar
ligeiramente deprimido, mas a sede está aumentada. Os animais gravemente
afetados podem mostrar evidências de dor abdominal. As vacas em lactação
apresentam uma diminuição de moderada a grave na produção leiteira, sendo que
as que pariram recentemente são as mais gravemente afetadas. A produção normal
do rebanho pode voltar ao normal apenas após várias semanas ou meses após o
surto. O curso individual é de 3 a 4 dias, e as mortes são incomuns.
Lesões – A lesão predominante é uma inflamação catarral do trato GI, principal-
mente jejuno e íleo, caracterizada por paredes intestinais edematosas, vasos
sangüíneos da serosa congestos, e mucosa inchada e congestionada. O conteúdo
intestinal é escuro, liquefeito e pode conter muco e sangue. As placas de Peyer e
os linfonodos mesentéricos podem estar inchados e edematosos. Microscopica-
mente, há necrose focal e degeneração das criptas do epitélio do cólon.
Diagnóstico – A incidência sazonal da doença, a idade e número de animais
afetados, e o início agudo são úteis no diagnóstico. A diarréia viral bovina,
coccidiose, outras parasitoses, salmonelose, peste do gado, alterações na dieta, e
agentes tóxicos devem ser considerados no diagnóstico diferencial.
Profilaxia e tratamento – Os animais recentemente introduzidos no rebanho
devem permanecer em isolamento por 2 semanas. Qualquer animal sofrendo de
diarréia aguda, independentemente da causa, deve ser separado do rebanho até
que se recupere. O acesso às instalações deve ser restrito e todas as pessoas que
têm contato com o gado devem sempre se certificarem da limpeza de seus calçados,
roupas e equipamento. Não há vacina específica disponível.
A maior parte do gado com disenteria de inverno não necessita de tratamento,
pois recupera-se espontaneamente em poucos dias. Os animais gravemente
afetados podem receber adstringentes orais e terapia com fluidos e eletrólitos.
Colite 273

COLITE
Trata-se de uma causa comum de diarréia aguda ou crônica em cães e gatos,
caracterizada por inflamação do cólon.
Etiologia e patogenia – A colite aguda pode ocorrer após ingestão de lixo ou
outro material estranho irritante. Uma diarréia crônica do intestino grosso pode
resultar de: doenças inflamatórias do intestino grosso (linfocíticas-plasmocíticas,
histiocíticas ulcerativas, eosinofílicas, granulomatosas, supurativas), ou parasitá-
rias (Trichuris, Giardia, Ancylostoma, Uncinaria, Entamoeba histolytica, Balantidium
coli), infecciosas (Histoplasma capsulatum, Salmonella, Campylobacter, Yersinia
enterocolitica, Prototheca, Clostridium difficile), não inflamatórias (síndrome do
intestino irritável, inversão cecal, intussuscepção ileocólica, secundária a distúrbios
malassimilatórios do intestino delgado), ou neoplásicas (pólipos, leiomioma, adeno-
carcinoma, linfossarcoma, leiomiossarcoma, plasmacitoma, tumor de mastócitos).
A diarréia crônica pode também acompanhar distúrbios metabólicos como uremia,
hipoadrenocorticismo, hipotireoidismo e pancreatite recorrente.
A colite resulta em mobilidade alterada do cólon, menor absorção de água e
eletrólitos e excesso de secreções. A perda das contrações rítmicas segmentares
normais permite que o peristaltismo mova as fezes de forma mais rápida aboralmente.
A maior sensibilidade ao reflexo de defecação resulta em maior freqüência desta.
O tenesmo resulta de uma estimulação direta do reflexo de defecação pelo processo
inflamatório. A absorção prejudicada de sódio e água resulta em maior volume fecal.
A irritação da mucosa estimula a secreção de muco. O desnudamento do epitélio
superficial pode provocar ulceração e hemorragia, resultando em sangue fresco nas
fezes.
Achados clínicos – Os sintomas da colite aguda são um início súbito de diarréia
aquosa, algumas vezes sanguinolenta e mucóide, e vômitos ocasionais. O animal
pode estar deprimido, desidratado, febril e com dor abdominal. O exame retal pode
revelar fezes sanguinolentas e material estranho, por exemplo, ossos, plástico,
madeira ou papel-alumínio.
Os animais com colite crônica defecam com maior freqüência, mas eliminam um
volume pequeno de fezes a cada vez. A defecação é muitas vezes associada a uma
sensação de urgência, podendo haver tenesmo. As fezes podem estar semiformadas
ou líquidas; sangue fresco e muco podem estar presentes. Perda de peso, vômitos,
letargia e anorexia são infreqüentes. O exame físico normalmente nada revela, a
não ser pela perda de peso nos casos graves. A palpação abdominal pode revelar
uma massa abdominal, linfadenopatia sublombar, ou espessamento do cólon. O
exame retal pode revelar o caráter das fezes, mucosa retal áspera e enrugada,
massa ou estreitamento retal.
Diagnóstico – Os sintomas são indicativos de colite (ver também: EXAME DO
TRATO GI, pág. 113). Os exames laboratoriais de rotina podem descartar outras
causas de diarréia crônica, por exemplo, doenças não inflamatórias do cólon. Os
exames repetidos de flotação fecal e esfregaços diretos em solução salina podem
ser necessários para identificar ou descartar causas parasitárias; deve ser realizada
cultura das fezes em busca de bactérias patogênicas. A protoscopia, normalmente
realizada após um jejum de 24 a 48h, ou a endoscopia são úteis. Devem ser
administrados enemas com água morna ou uma com uma solução oral de lavagem
GI que contenha polietilenoglicol antes do exame. A sedação ou anestesia geral é
geralmente desejável. A mucosa normal do cólon é facilmente distendida por ar, lisa,
brilhante, rosa-pálida e possui vasos submucosos visíveis. Os animais com doença
no cólon apresentam uma granulosidade aumentada na mucosa, não permitindo a
visualização dos vasos submucosos. A mucosa pode estar excessivamente friável
Colite 274

e sangrar após o contato com o endoscópio. A parede do cólon pode estar menos
distensível que o normal. Podem ser observados erosões, úlceras, hemorragias,
parasitas, constrições, tumores e excesso de muco. A biópsia de mucosa é
necessária para o diagnóstico definitivo. Um enema de bário pode ser útil quando
há suspeita de uma intussuscepção cecocólica ou ileocólica, constritura ou neo-
plasia.
Tratamento – Se possível, o tratamento deve ser dirigido à causa primária. A
colite aguda inespecífica deve ser tratada sintomaticamente com líquidos e antibió-
ticos parenterais. Os antiespasmódicos (propantelina, difenoxilato, imodium, codeí-
na) podem ser administrados se houver tenesmo ou dor abdominal. O animal deve
jejuar 24 a 48h para repouso do intestino.
O manejo da dieta é um dos passos mais importantes no tratamento da colite
crônica. Pequenas e múltiplas refeições de uma dieta leve e hipoalergênica, por
exemplo, arroz misturado com ricota, ou uma dieta hipolergênica comercial, são
inicialmente administradas. Se houver suspeita de uma alergia alimentar, pode ser
necessária uma dieta de eliminação para determinar o antígeno em questão. Os
animais que respondem bem a uma dieta hipoalergênica podem eventualmente
voltar a uma ração comercial normal. Para os animais que apresentam uma resposta
parcial ao manejo dietético, pode ser adicionada fibra à dieta, na forma de farelo de
trigo ou psílio.
Os antimicrobianos úteis na colite crônica incluem a sulfassalazina, tilosina e o
metronidazol. Os modificadores de mobilidade podem ser utilizados durante a
exacerbação aguda da diarréia e quando acredita-se que o problema é relacionado
ao estresse (por exemplo, síndrome do intestino irritável). Os modificadores de
mobilidade incluem as drogas anticolinérgicas (brometo de propantelina, isopro-
pamida/proclorperazina), analgésicos narcóticos (tintura de ópio, paregórico, codeí-
na, loperamida, difenoxilato), e combinações de depressores do SNC e anties-
pasmódicos (clordiazepóxido/clidínio, isopropamida/proclorperazina). As drogas
imunossupressivas como a prednisona ou a azatioprina podem ser úteis em animais
refratários a outras terapias medicamentosas.

CONSTIPAÇÃO/OBSTIPAÇÃO
Constipação é uma doença na qual os movimentos intestinais são infreqüentes
ou ausentes: as fezes são excessivamente duras ou ressecadas, havendo um
volume fecal reduzido e tenesmo. A obstipação é o estado de constipação intratável
no qual a defecação tornou-se impossível. A obstipação não corrigida pode levar ao
megacólon, uma condição de dilatação extrema do cólon com impactação fecal.
Etiologia – Ambos os problemas podem resultar da ingestão de ossos, material
estranho ou pêlos; alteração dos padrões normais de defecação devido a alteração
no ambiente; lesões anorretais dolorosas (saculite anal, constrituras retais, fístulas
perianais, tumores retais); obstrução intraluminal ou extraluminal (corpo estranho,
hérnia perineal, divertículo retal, fratura pélvica, aumento de volume prostático,
pseudocoprostase, ou um tumor colônico, retal, anal, pélvico ou prostático); doença
neurogênica (doença na medula espinhal, disfunção neuromuscular congênita);
doença metabólica e endócrina (hipotireoidismo, hiperparatireoidismo, hipocalemia);
induzida por drogas (anticolinérgicos, sulfato de bário, diuréticos, opiáceos); e
anomalias congênitas (ânus imperfurado).
Achados clínicos – O tenesmo, normalmente precedendo a defecação, é
notado na constipação crônica. Fezes duras e quebradiças ocasionalmente man-
Gastroenterite por Coronavírus 275

chadas de sangue podem ser eliminadas. Fezes macias de pequeno diâmetro (em
“forma de fita”) são sugestivas de uma lesão constritiva. Se a constipação persistir,
o animal fica deprimido, inapetente, fraco, desidratado, podendo vomitar ocasional-
mente. Fezes aquosas, marrons e pútridas podem ser eliminadas quando o fluido
passa em torno da massa fecal endurecida. A palpação abdominal revela fezes
endurecidas no cólon. Um cólon grandemente aumentado e impactado com fezes
pode ser diagnóstico para megacólon. O exame digital do reto é ressentido.
Diagnóstico – Um histórico de defecação difícil, dolorosa ou infreqüente e a
palpação da massa fecal impactada no cólon são patognomônicos. As radiografias
abdominais simples revelam um cólon distendido. Devido às dificuldades técnicas
na realização de um enema de bário, a proctoscopia/endoscopia do cólon é
preferida para visualização de massas obstrutivas ou estreitamentos. A celiotomia
exploratória pode ser necessária para uma avaliação acurada.
Tratamento e controle – Nas constipações simples, um enema (água morna ou
solução salina), pequenas quantidades de lubrificante ou surfactante (óleo mineral,
sulfossuccinato sódico de dioctil [DSS]) administrados VO, ou supositórios (bisacodil,
DSS) são eficazes. Em animais gravemente constipados, o equilíbrio fluido e
eletrolítico deve ser restabelecido por meio da administração EV de uma solução
balanceada. O tratamento pode então prosseguir com laxantes orais (bisacodil),
surfactantes (DSS), enemas e/ou remoção manual do material fecal impactado sob
anestesia geral. Os laxantes surfactantes, como o DSS, podem também ser
adicionados ao líquido do enema. Pode ser necessária a quebra manual delicada
da massa ou, em casos mais graves, manipulação cuidadosa com fórceps. A
remoção diária de porções de uma impactação persistente permitirá tratamento
medicamentoso entre as manipulações. A cirurgia pode ser necessária em casos
refratários aos enemas e quebra mecânica. Os enemas de retenção de fosfato de
sódio não devem ser utilizados em cães pequenos com constipação de moderada
a grave, ou em gatos; eles foram associados a hiperfosfatemia, hipernatremia,
hipocalcemia e morte. O tratamento bem-sucedido a longo prazo exige a identifica-
ção e remoção ou atenuação da causa subjacente. O manejo a longo prazo inclui
alteração na dieta e medicação. O farelo de trigo ou psílio pode ser misturado na
comida. Os laxantes surfactantes (por exemplo, DSS) ou lubrificantes (por exemplo,
óleo mineral) ou preparados comerciais mais palatáveis de petrolato-vitaminas são
úteis quando administrados rotineiramente.
A impactação persistente em gatos pode levar ao megacólon; pode ser neces-
sária a colectomia subtotal ou total.

GASTROENTERITE POR CORONAVÍRUS


É uma doença entérica de cães de qualquer idade, altamente contagiosa e
caracterizada, principalmente, por vômitos e diarréia. Os sinais clínicos são menos
severos em adultos que em jovens. É sabido que apenas cães, coiotes e raposas
desenvolvem a doença; entre o vírus multiplica-se em gatos sem produzir a doença,
e é provável que outros carnívoros sejam suscetíveis. A doença já foi relatada na
Europa, América do Norte e Austrália. Sua distribuição provavelmente é universal.
Etiologia, transmissão e patogenia – O coronavírus canino (CVC) é um vírus
RNA de margem única, envolto e antigenicamente relacionado aos coronavírus
felino (vírus da peritonite infecciosa felina e coronavírus entérico felino) e ao vírus
da gastroenterite transmissível suína. Ele é sensível aos solventes de gordura e à
maioria dos desinfetantes.
Gastroenterite por Coronavírus 276

A ingestão de material fecal de cães infectados ou de outros carnívoros


infectados é o principal meio de infecção. Depois da ingestão, o vírus infecta as
células epiteliais dos vilos do intestino delgado. Viremia e infecção de outras
vísceras não foram observadas. Alguns cães portadores assintomáticos podem
eliminar o vírus por períodos prolongados.
Achados clínicos – Os sintomas são mais suaves do que os da infecção pelo
parvovírus canino (ver adiante), mas anorexia, diarréia, vômitos e depressão,
freqüentemente repentinos, ocorrem. As fezes são líquidas ou moles, podem conter
sangue e muco e costumam ter um odor particularmente fétido. Pode haver forte
desidratação. A contagem de leucócitos é normal. As infecções experimentais por
CVC causam apenas uma doença branda; o período de incubação é de 24 a 36h.
As infecções mistas com o CVC e o parvovírus canino (PVC) provavelmente serão
graves.
Lesões – As lesões em infecções experimentais não são graves, consistindo de
alças intestinais dilatadas, preenchidas com material aquoso verde-amarelado. Os
casos de ocorrência natural, especialmente aqueles com infecções mistas, apre-
sentam lesões severas com franca hemorragia na mucosa intestinal e linfonodos
mesentéricos aumentados e congestos.
Diagnóstico – Um histórico de gastroenterite contagiosa em um canil pode
sugerir a possibilidade de uma enterite viral. Embora o isolamento do vírus confirme
o diagnóstico, o CVC é geralmente de difícil cultivo in vitro. Portanto, a observação
de partículas do coronavírus em fezes frescas ao microscópio eletrônico é o principal
método de diagnóstico. Exames histopatológicos do intestino delgado fresco
também podem revelar atrofia e fusão dos vilos intestinais, aprofundamento das
criptas, aumento da celularidade da lâmina própria e achatamento das células
epiteliais.
Tratamento e controle – Não há um tratamento específico, mas a terapia de
suporte à base de líquidos e o tratamento com antibióticos, como prescrito para a
gastroenterite hemorrágica canina ou enterite por parvovírus canino, devem ser
usados. Uma vacina morta já está disponível. As medidas de prevenção devem-se
concentrar em evitar o contato com animais infectados e suas excreções, melhora do
manejo sanitário, e vacinação de cães de alto risco, por exemplo, de canil e exposição.

DOENÇA DO ESÔFAGO, PQ AN
ACALASIA CRICOFARÍNGEA
É uma doença de causa desconhecida caracterizada pelo relaxamento inade-
quado do músculo cricofaríngeo, que leva a uma relativa inabilidade do animal para
deglutir alimentos ou líquidos. Ocorre principalmente em filhotes jovens e ocasional-
mente em cães de meia-idade. Tentativas repetidas de engolir são seguidas por
náuseas e regurgitação; a pneumonia por aspiração é uma complicação comum.
Um diagnóstico preciso requer observação fluoroscópica da deglutição após a
administração oral de um material contrastante (sozinho ou misturado com alimen-
to). O funcionamento anormal (perda do relaxamento) do músculo cricofaríngeo
resulta na retenção do bário na região posterior da faringe.
O tratamento consiste em miotomia cricofaríngea; a deglutição normal ocorre
imediatamente após a cirurgia. A pneumonia por aspiração, se presente, deve ser
tratada agressivamente com antibióticos sistêmicos, baseados em cultura e antibi-
ograma, quando possível.
Doença do Esôfago, Pq An 277

DILATAÇÃO DO ESÔFAGO
(Megaesôfago)
A dilatação esofágica em animais jovens pode ser resultado de uma anomalia de
anel vascular ou devida a uma causa desconhecida. O megaesôfago idiopático pode
ocorrer também em cães adultos, e o esôfago pode-se dilatar secundariamente a
doenças sistêmicas, como a miastenia grave, lúpus eritematoso sistêmico, polimio-
site, cinomose, hipoadrenocorticismo, intoxicação por metais pesados, hipotireoi-
dismo, neoplasia no SNC, ou trauma. A dilatação esofágica foi provocada experi-
mentalmente por meio da administração crônica de inibidores da colinesterase;
pode também ocorrer anteriormente a um estreitamento esofágico, neoplasia ou
compressão extra-esofágica.
O sintoma principal é a regurgitação. Um filhote com megaesôfago congênito
caracteristicamente começa a regurgitar quando começa a comer alimentos sólidos.
Inicialmente, a regurgitação ocorre logo após a deglutição; conforme o problema
progride, o esôfago aumenta e a comida é retida por mais tempo. Os filhotes
afetados geralmente têm aspecto pior e são menores que seus irmãos. Uma
pressão aplicada no abdome pode provocar aumento de volume do esôfago na
entrada do tórax. A pneumonia por aspiração é uma complicação comum, e os
sintomas associados são febre, tosse e corrimento nasal. Os adultos com
megaesôfago regurgitam e, geralmente, perdem peso. Os sintomas respiratórios
podem predominar, com pouco ou nenhum histórico de regurgitação. As radiogra-
fias torácicas revelam ar, líquido ou comida no esôfago dilatado. O esôfago torácico
normalmente está dilatado de maneira uniforme, podendo haver um grande desvio
ventral anterior ao coração. O esôfago cervical pode também estar dilatado.
Estreitamentos, corpos estranhos ou um anel vascular anormal devem ser descar-
tados com um esofagograma ou uma esofagoscopia.
Nos cães adultos, as doenças associadas (por exemplo, miastenia grave) devem
ser tratadas. A cirurgia é indicada para a anomalia do anel vascular. O tratamento
medicamentoso é indicado para o megaesôfago congênito ou idiopático adquirido. A
consistência da dieta que melhor previne a regurgitação varia em cada cão; uma pasta
mole funciona bem em muitos, mas alguns se dão melhor com comida seca. Prefere-
se um esquema de alimentação com várias pequenas refeições. A alimentação com
um prato elevado (que force o animal a comer com os membros anteriores mais altos
que os posteriores) ou segurar-se o cão em pé por 10 a 15min após a refeição permite
que a gravidade auxilie a passagem do alimento para o estômago. A cirurgia na junção
gastroesofágica normalmente não melhora os sintomas de um megaesôfago idiopá-
tico; o prognóstico geral é ruim, e muitos morrem de pneumonia por aspiração.

ESTENOSE ESOFÁGICA
(Estreitamento esofágico)
O estreitamento patológico do lúmen pode ocorrer após trauma, esofagite,
cirurgia, ou invasão por tumor. A maioria das estenoses ocorre na entrada torácica.
Os tumores esofágicos são raros, mas a associação do sarcoma esofágico e da
infecção por Spirocerca lupi (ver pág. 285) exige consideração nas áreas onde o
parasita é prevalente.
Os sintomas clínicos são semelhantes aos associados a corpos estranhos. A
radiografia contrastada pode mostrar dilatação do esôfago anterior à estenose. Um
esofagograma é importante para avaliar o número de estenoses, seu comprimento
e localização.
O tratamento com dilatação através de um cateter com balão inflável tem tido
sucesso; a “bougienage” é outra técnica disponível, porém mais traumática. A
Doença do Esôfago, Pq An 278

ressecção cirúrgica, apesar de nem sempre bem-sucedida, pode ser necessária.


Qualquer tratamento deve induzir algum grau de esofagite, que deve ser tratada
para diminuir a probabilidade de a estenose se formar de novo.

ESOFAGITE
A inflamação do esôfago, um problema mais freqüente em cães que em gatos,
é normalmente causada por refluxo gástrico. A esofagite por refluxo gástrico está
associada a anestesia, drogas que diminuem o tono do esfíncter esofágico inferior
(por exemplo, atropina, acepromazina) e vômitos agudos ou crônicos. Outras
causas incluem trauma devido a ingestão ou alojamento de corpos estranhos,
ingestão de substâncias cáusticas ou irritantes, ou complicações de megaesôfago.
A cardioplastia, irritação causada por instrumentos ou sondas de faringostomia,
neoplasmas e infecção por Spirocerca lupi (ver pág. 285) podem também causar
esofagite. O calicivírus em gatos raramente causa esofagite.
A regurgitação é o sintoma clássico de doença esofágica; no entanto, uma
esofagite leve pode não apresentar sintomas clínicos associados. A esofagite
moderada a intensa pode ser dolorosa, resultando em depressão e anorexia. Outros
sintomas são disfagia, salivação excessiva, tentativas repetidas de engolir, e
extensão da cabeça e pescoço.
A endoscopia permite a visualização de corpos estranhos esofágicos e avaliação
diretta dos danos ao esôfago. As radiografias simples e esofagogramas são de
pouco ou nenhum benefício no diagnóstico da esofagite. A fluoroscopia pode ser
utilizada para identificar a mobilidade diminuída, secundária à inflamação esofágica.
A avaliação histopatológica de uma biópsia em saca-bocado confirmará o diagnós-
tico clínico, sendo essencial nos raros casos que não apresentam patologia visível
macroscopicamente.
A esofagite leve normalmente não necessita de tratamento. Se existem sintomas
clínicos, a terapia medicamentosa deve ser iniciada. Os bloqueadores dos recepto-
res de H2 (por exemplo, cimetidina, ranitidina) diminuem a produção de ácido
gástrico. A metoclopramida aumenta o tono do esfíncter esofágico inferior e as
contrações esofágicas.
Deve ser oferecida uma alimentação macia, pobre em gordura, 3 a 4 vezes ao
dia. Se a esofagite é grave, pode ser utilizada uma sonda de gastrostomia para
descansar o esôfago. Nas esofagites intensas, a administração de glicocorticóides
por 2 a 3 semanas pode diminuir a probabilidade de formação de estreitamentos.
Normalmente é administrado um antibiótico de amplo espectro para evitar compli-
cações bacterianas.

CORPOS ESTRANHOS NO ESÔFAGO


Os corpos estranhos esofágicos são mais comuns nos cães que nos gatos.
Ossos são os mais comuns, mas agulhas, anzóis, madeira, objetos de metal, etc.
podem ser encontrados. Normalmente estes objetos se alojam na entrada torácica,
base do coração, ou na porção caudal do esôfago, logo acima do diafragma;
ocasionalmente podem-se alojar no esfíncter esofágico superior.
Salivação, náusea e extensão do pescoço são sintomas de corpos estranhos
cervicais. Uma obstrução completa causa uma regurgitação após ingestão de
alimento ou água; obstrução parcial permite a passagem de líquidos e possivelmen-
te de alimentos macios. Os sintomas dependem da localização e composição do
corpo estranho e do grau e duração da obstrução esofágica. Anorexia e perda de
peso podem ser os sintomas predominantes em casos de obstrução crônica.
A perfuração do esôfago cervical pode resultar em abscedação local ou, na
porção torácica, em pleurite, mediastinite, piotórax, pneumotórax, ou fístula
Enterite 279

broncoesofágica. Outros problemas secundários potenciais são esofagite, lacera-


ção de mucosa, estreitamento esofágico e divertículo esofágico. A pneumonia por
aspiração pode ser uma complicação séria da regurgitacão. Muitos corpos estra-
nhos esofágicos são radiopacos, mas um esofagograma de contraste pode ser
necessário para avaliar lacerações de mucosa ou corpos estranhos radiolumines-
centes. Se houver suspeita de perfuração, deve ser utilizado um meio de contraste
aquoso à base de iodo, no lugar das suspensões de sulfato de bário. A esofagoscopia
permite o exame direto do corpo estranho e da parede esofágica. Os corpos
estranhos esofágicos cervicais podem ocasionalmente ser localizados por palpação
externa.
Quando possível, o objeto deve ser removido per os com um endoscópio flexível
e fórceps, ou um esofagoscópio rígido e uma pinça jacaré. Nos cachorros e nos
gatos pequenos a médios, pode ser utilizado um proctoscópio rígido; nos cães
grandes, um esofagoscópio rígido. Deve-se ter cuidado para evitar lacerar ou
perfurar o esôfago. Se o corpo estranho é liso, pode ser inserido um cateter uretral
de Foley e distendido aboralmente ao corpo estranho, e então removido oralmente,
trazendo o corpo estranho com ele.
Se um corpo estranho não puder ser removido per os, ele pode ser empurrado
para o estômago onde pode ser digerido (por exemplo, ossos lisos), eliminado ou
removido via gastrotomia. Quando um objeto está alojado na parede esofágica ou
possui ponta afiada, se os dois primeiros métodos não têm sucesso, se o esôfago
está necrótico ou perfurado, ou se é improvável que o objeto possa ser movido sem
lacerar ou perfurar o esôfago, a cirurgia é indicada; no entanto, o prognóstico é ruim.
A esofagite deve ser tratada medicamentosamente após a remoção do corpo
estranho (ver ESOFAGITE, anteriormente). Devem ser utilizados antibióticos e, se o
comprometimento torácico for significativo, drenos torácicos.

ENTERITE
Trata-se de uma inflamação aguda ou crônica do intestino delgado. As enterites
podem existir como uma doença isolada, afetando apenas o intestino delgado, ou
mais comumente, como parte de um processo mais generalizado que afeta o
estômago ou cólon.
Etiologia – A enterite aguda é causada por vários distúrbios, incluindo exageros
na dieta ou intolerância a alimentos específicos (por exemplo, glúten), parasitas
intestinais, agentes infecciosos (virais, bacterianos, fúngios), drogas e toxinas. Em
geral, a enterite causada por parasitas, medicamentos, ou ingestão de alimentos
estragados ou contaminados tende a ser leve e autolimitante; as doenças infeccio-
sas são mais graves e com risco de vida. As causas específicas da enterite crônica
são menos definidas; as síndromes reconhecidas incluem enterite linfocítica-
plasmocítica, enterite eosinofílica, atrofia vilosa, enteropatia de sensibilidade ao
trigo, enteropatia imunoproliferativa dos Basenjis, supercrescimento bacteriano no
intestino delgado, linfangiectasia e linfossarcoma. Estes problemas freqüentemente
causam malabsorção intestinal (ver pág. 169).
A enterite é muitas vezes causada por parasitas intestinais, especialmente
Ancylostoma caninum, Giardia canis e coccídeos. As infecções virais são uma
causa importante de enterite aguda, grave ou fatal em cães e gatos. Os vírus
entéricos caninos incluem parvo-, corona-, rota-, astro- e o vírus da cinomose. O
parvo- (panleucopenia), o corona- e o rotavírus felino, assim como os vírus da
peritonite infecciosa felina, leucemia felina e imunodeficiência felina podem provo-
Enterite 280

car enterites graves. As bactérias não são freqüentemente diagnosticadas como


causas primárias de enterite em cães e gatos. Os patógenos bacterianos que podem
causar doença entérica ao invadir enterócitos ou produzindo toxinas entero-
patogênicas são Escherichia coli, Salmonella, Yersinia, Campylobacter, Clostridium
perfringens, Bacillus piliformis, e Mycobacterium. De importância particular são
Salmonella, Campylobacter e Yersinia, pois são patógenos humanos significativos.
Os patógenos micóticos incluem a Histoplasma capsulatum e raramente Aspergillus
spp, Pythium spp e Candida albicans. As infecções por rickéttsias com Neorickettsia
helminthoeca ou N. elokominica causam enterites graves e freqüentemente fatais
em cães que ingeriram salmão cru que abriga este vetor; o noroeste do Pacífico é
uma área endêmica. Várias drogas, incluindo antibióticos, antiinflamatórios não
esteróides, antineoplásicos e inseticidas, além de toxinas como metais pesados,
herbicidas e fungicidas podem causar doença intestinal.
Achados clínicos – A diarréia aquosa aguda é o sintoma clínico mais importan-
te. A inapetência, letargia e vômitos ocorrem na maioria, especialmente se a porção
proximal do intestino ou o estômago está comprometida. O tenesmo, evacuação
freqüente e fezes mucóides são característicos de comprometimento do intestino
grosso. Fezes verde-escuras a pretas ocorrem devido a sangramento trato GI
superior, enquanto da hemorragia no intestino grosso resultam de fezes tintas com
sangue fresco. A febre, distensão abdominal e dor, membranas mucosas pálidas e
desidratação indicam doença grave. A intensidade e duração dos sintomas clínicos
varia com a etiologia e com a idade do animal; em geral, animais imaturos
apresentam sintomas clínicos mais intensos. A doença crônica pode apresentar
apenas os sintomas de diarréia recorrente e perda de peso.
Diagnóstico – O diagnóstico presuntivo é feito rapidamente a partir do histórico,
sintomas clínicos e exame físico; o estabelecimento da causa pode exigir trabalho
laboratorial extenso. O histórico deve rever o estado de vacinação, medicações,
dieta e ambiente. O exame fecal de esfregaços diretos em solução salina, além das
provas de flotação e sedimentação (em busca de ovos, larvas, cistos e trofozoítos)
devem ser acompanhados por uma inspeção macroscópica em busca de tênias e
material estranho. Os animais com diarréia hemorrágica intensa acompanhada por
sintomas sistêmicos de febre, desidratação, fraqueza, letargia, ou dor abdominal
justificam um aumento da base de informações. Devem ser feitos um hemograma,
um perfil bioquímico e uma análise de eletrólitos e da urina. Devem ser tiradas
radiografias abdominais simples; os estudos com contraste são indicados se houver
suspeita de lesão mecânica ou obstrutiva. Os testes virológicos devem ser levados
em consideração, assim como culturas fecais para Salmonella e Campylobacter;
são necessárias técnicas seletivas de cultura.
Tratamento – Toda comida deve ser completamente suspensa por pelo menos
24h após o início. A desidratação e o desequilíbrio eletrolítico devem ser tratados por
administração parenteral de líquidos. O tipo de líquido depende da intensidade dos
vômitos que ocorreram em relação à diarréia. Se os vômitos forem predominantes,
tende a se desenvolver uma alcalose hipoclorêmica; a solução salina a 0,9% (NaCl)
deve ser utilizada para repor os déficits. Se a diarréia predominar, a acidose
metabólica é mais comum; recomenda-se a solução de lactato de Ringer. Estas
soluções devem ser suplementadas com sais de potássio, desde que a função renal
esteja adequada. Em geral, 20mEq de sal de potássio adicionados a 1L de líquido
fornecem uma solução que pode ser seguramente administrada por via parenteral
baseando-se em um volume total de líquido de 40mL/kg/dia. A velocidade da
suplementação de potássio EV não deve exceder 0,5mEq/kg/h, e o potássio sérico
deve ser monitorado com atenção. A dextrose pode ser adicionada aos fluidos EV
para fazer uma solução a 2,5% para tratar a hipoglicemia, que freqüentemente é
observada na enterite por parvovírus e na septicemia.
Dilatação-Vólvulo Gástricos 281

Em geral, os antieméticos devem ser utilizados sintomaticamente em situações


nas quais o distúrbio subjacente foi diagnosticado ou quando os vômitos são tão
profusos que os equilíbrios hídrico, eletrolítico e ácido-básico são difíceis de
controlar. O uso indiscriminado destas drogas pode mascarar a doença primária e
retardar o diagnóstico. As fenotiazinas de ação central (clorpromazina ou
proclorperazina) são as mais eficazes. Estas drogas são hipotensivas; elas não
devem ser utilizadas até que a desidratação seja corrigida. A metoclopramida possui
efeitos antieméticos centrais, assim como um efeito pró-cinético no esôfago distal,
estômago e porção proximal do intestino delgado. É muito útil no controle dos
vômitos causados por enterite viral aguda e por quimioterapia. A terapia antiemética
deve ser limitada a 24 a 36h.
Os narcóticos analgésicos são mais eficientes no controle sintomático da
diarréia. O paregórico, o difenoxilato e a loperamida aliviam as dores abdominais e
espasmos, além de diminuir a freqüência e o volume da diarréia. O seu uso deve ser
limitado a 48h. Estas drogas modificadoras da mobilidade são contra-indicadas nas
diarréias infecciosas. Os preparados que contêm subsalicilato de bismuto diminuem
a perda fecal de água, possuindo ação antimicrobiana e antiinflamatória no intestino.
Seu uso é recomendado na enterite aguda, especialmente quando suspeita-se de
infecção bacteriana. Os compostos de bismuto tornam as fezes marron-escuras ou
pretas, o que pode ser erroneamente interpretado como melena.
Os antibióticos devem ser utilizados em animais com diarréia hemorrágica
(gastroenterite hemorrágica, parvovírus) e nos casos de enterocolite com compro-
metimento sistêmico (febre, membranas mucosas congestionadas, leucocitose ou
leucopenia). Recomenda-se o tratamento agressivo com antibióticos parenterais
eficazes contra anaeróbios Gram-positivos e bactérias Gram-negativas. Uma
combinação de ampicilina com um aminoglicosídio é eficaz e segura, desde que a
hidratação e a função renal estejam adequadas. A terapia para infecções específi-
cas deve ser baseada em provas de cultura e sensibilidade. Em geral, Salmonella
é suscetível a sulfa-trimetoprim, cefalotina e cloranfenicol; Campylobacter a
eritromicina, furazolidona, cloranfenicol e aminoglicosídios; Yersinia a sulfa-
trimetoprim, tetraciclina, cloranfenicol e aminoglicosídios. O metronidazol e a
quinacrina são eficazes contra Giardia sp. O metronidazol também é eficaz contra
anaeróbios, podendo ser útil em alguns casos de doença inflamatória intestinal
inespecífica. A sulfassalazina é especialmente indicada para colites ulcerativas e
granulomatosas.
Uma vez cessados os vômitos, pode ser iniciada uma dieta leve com sopas, caldos,
comida de bebê, arroz, ovos cozidos (moles), queijo fresco, e pequenas porções de
carne magra. O animal deve ser passado gradualmente para uma dieta normal.
A enterite que acompanha as doenças infecciosas ou a uremia é resolvida
tratando-se da doença primária, além dos tratamentos anteriores. O desfecho dos
envenenamentos com metais pesados pode ser favorável se foi realizado um
diagnóstico precoce e o tratamento com o antídoto específico foi instituído. Devem
ser utilizadas a fluidoterapia parenteral e drogas antidiarréicas.

DILATAÇÃO-VÓLVULO GÁSTRICOS
(DVG, Torsão gástrica, Timpanismo)

Trata-se de uma dilatação do estômago provocada por aerofagia, comida,


secreções GI e gás proveniente de fermentação. A distensão ocorre como simples
dilatação ou, mais freqüentemente, como dilatação com vólvulo. A dilatação-vólvulo
Dilatação-Vólvulo Gástricos 282

gástricos (DVG) é uma emergência com risco de vida que se inicia como uma
alteração mecânica da anatomia normal e progride para uma grave doença
metabólica. A DVG foi identificada primariamente em raças grandes e gigantes de
cães (com tórax profundo), mas foi relatada em raças menores como o dachshund,
e em outras espécies.
Etiologia e patogenia – A DVG tem sido associada a várias causas possíveis.
Em cães, estas causas incluem anatomia (cães grandes com tórax profundo e
estômagos pendulares sujeitos ao alongamento crônico dos ligamentos
hepatogástrico e hepatoduodenal), exercício paraprandial, e predisposição heredi-
tária. Os fatores adicionais associados à DVG são dietas baseadas em cereais
versus em carne, disfunção pilórica, e níveis séricos elevados de gastrina. Não está
claro se a anormalidade primária é a dilatação gástrica como resultado de retenção
gástrica, ou vólvulo gástrico resultante de lassidão dos ligamentos gástricos. Pelo
menos em alguns casos, o vólvulo está presente antes da dilatação.
A ingestão de comida e água, e a aerofagia iniciam a dilatação gástrica. O
exercício vigoroso ou alteração da posição corporal parecem complicar o processo.
O vólvulo gástrico impede o vômito efetivo, mas ainda permite que o ar seja engolido
(e a sonda orogástrica pode ser passada). O piloro também está obstruído. A
dilatação gástrica leva a um aumento da pressão intra-abdominal, o que reduz
significativamente o fluxo sangüíneo venoso na veia cava caudal e sistema portal.
O débito cardíaco diminui devido ao menor retorno venoso. Conforme a dilatação e
o vólvulo progridem, o fluxo arterial gástrico pode ficar comprometido. A estase
sangüínea e a hipoxia tecidual resultam em seqüestro de fluido e acúmulo de
endotoxina nos órgãos esplâncnicos. A hipotensão arterial causa diminuição do
fluxo sangüíneo coronário, com hipoxia do miocárdio. Deste modo, as formas de
choque cardiogênico, hipovolêmico e endotóxico contribuem para os desarranjos
fisiológicos observados na DVG. As complicações adicionais incluem a produção de
um fator depressor do miocárdio pelo pâncreas hipóxico, hipoxemia devida à
redução da amplitude do movimento diafragmático (hipoventilação) e alteração da
troca de gás pulmonar, múltiplas anormalidades ácido-básicas e coagulação
intravascular disseminada (CID).
Achados clínicos e diagnóstico – O histórico é variável. A dilatação gástrica
simples pode ter ocorrido anteriormente. A dilatação gástrica aguda simples não
pode ser diferenciada da dilatação com vólvulo apenas pelo exame físico. Início
agudo de inquetação, desconforto abdominal, dor epigástrica localizada, ânsias e
ptialismo excessivo são relatados com freqüência. A porção cranial do abdome está
marcantemente distendida e timpânica à percussão. A passagem de uma sonda
orogástrica não descarta o vólvulo. As radiografias evidenciam um estômago
grande, cheio de gás. A vista em decúbito lateral direito muitas vezes mostra o
deslocamento do piloro cheio de gás dorsocranialmente e para a esquerda da região
fúndica. O bário pode também ser utilizado para avaliar a posição do estômago. A
esplenomegalia e distensão do intestino delgado por gás podem também ser
observadas. O vólvulo gástrico pode também ser identificado na laparotomia.
Conforme o problema piora, desenvolvem-se choque e depressão acentuada. A
dispnéia e taquipnéia são comuns. Não ocorrem formas crônicas de dilatação
gástrica e vólvulo gástrico.
Lesões – O estômago está aumentado e atônico. O vólvulo gástrico geralmente
ocorre no sentido horário, quando observado da vista cranial para a caudal. O
aumento de volume e alteração da coloração dos órgãos esplâncnicos é comum. A
parede gástrica, ao longo da grande curvatura, muitas vezes está comprometida,
variando de hiperêmica à enegrecida. Os danos à mucosa gástrica são freqüente-
mente severos. A distensão e necrose da parede gástrica ocasionalmente resultam
em perfuração gástrica e peritonite.
Dilatação-Vólvulo Gástricos 283

Tratamento – É necessário tratamento de emergência. A descompressão


gástrica é obtida preferencialmente pela passagem de uma sonda orogástrica de
diâmetro adequado. A elevação da extremidade cranial do cão e manipulação
delicada da sonda e do animal podem facilitar a passagem. Se isto falhar, a
descompressão pode ser feita com uma agulha de calibre 16 a 18, com 3,8cm de
comprimento, pela região paracostal direita, após o que, a sonda orogástrica pode
muitas vezes ser passada. Pode ser realizada a lavagem gástrica com água morna,
para remover o conteúdo estomacal. A sedação geralmente não é necessária,
porém se utilizada, recomenda-se o demerol ou a oximorfona. O equipamento para
intubação endotraqueal de emergência deve estar à mão antes que se efetue a
sedação. Se necessária, a gastrostomia temporária pode ser efetuada pela área
paracostal direita com um bloqueio anestésico local em “L” utilizando lidocaína. A
descompressão pode ser mantida pelas sondas de gastrostomia ou faringostomia,
até que possa ser realizada a cirurgia.
O choque deve ser avaliado e tratado rapidamente. Devem ser colocados 1 ou
2 cateteres EV de grande calibre e uma sonda urinária, iniciando-se a fluidoterapia
com uma solução poliônica isosmótica em volumes iniciais de 70 a 90mL/kg de peso
corporal. As amostras de urina e sangue devem ser coletadas para obtenção de
informações gerais, estado eletrolítico e ácido-básico. Deve ser administrado EV um
corticosteróide hidrossolúvel e de ação rápida (succinato sódico de prednisolona,
30mg/kg; ou fosfato sódico de dexametasona, 2mg/kg), assim como a ampicilina ou
a penicilina G sódica. O bicarbonato de sódio não é comumente recomendado sem
as análises de gases sangüíneos e do estado ácido-básico: as várias anormalidades
ácido-básicas muitas vezes se contrabalançam e deixam o animal com um pH
normal, sendo que a super-reação e hiperosmolaridade devidas ao uso de bicarbo-
nato de sódio podem causar descompensação. O pulso, ECG, hematócrito, proteína
total e produção de urina devem ser monitorados durante o tratamento.
A laparotomia é necessária para corrigir o vólvulo gástrico. A gastropexia na
parede abdominal direita é sempre indicada após uma DVG. Sem a fixação do
estômago, a taxa de recidiva é de 60 a 80%; com a cirurgia, a taxa de recidiva é de
2 a 4%. A necrose isquêmica esplâncnica (normalmente gástrica) e a endotoxemia
parecem ser os principais fatores determinantes da sobrevida após o tratamento ter
sido iniciado. A necessidade de gastrectomia parcial devido à necrose isquêmica
está associada a menor intensidade e maior mortalidade. A esplenectomia é
indicada apenas se houver trombose ou infarto esplênicos.
O manejo pós-operatório é crítico. O choque irreversível, arritmia cardíaca, CID,
insuficiência renal aguda e complicações cirúrgicas são comuns. As disritmias
cardíacas incluem taquicardia ventricular paroxísmica, contrações ventriculares
prematuras e fibrilação atrial. A utilização de um bolo EV de lidocaína a 1 a 2mg/kg
e então 60 a 100µg/kg/min EV em taxa constante de infusão é recomendada quando
as taquiarritmias ventriculares são >150bpm ou são multiformadas. O uso concor-
rente ou subseqüente de quinidina ou procainamida pode ser benéfico. A quinidina
pode também ser útil na conversão da fibrilação atrial. A monitoração deve ser
continuada por pelo menos 72h. A cimetidina (10mg/kg, IM, duas a três vezes ao dia)
pode diminuir a produção de ácido hidroclorídrico gástrico, reduzindo assim a lesão
à mucosa gástrica e a acidose metabólica. A metoclopramida (0,2 a 0,4mg/kg, s.c.,
três vezes ao dia) pode ser utilizada para estimular o esvaziamento gástrico e
acelerar o retorno da mobilidade gástrica. O manejo da CID é controverso; no
entanto, a transfusão de sangue total e a terapia com baixas doses de heparina
(dose de ataque 100 u/kg, dose de manutenção 20 u/kg, s.c., quatro vezes ao dia)
são freqüentemente recomendadas.
Os métodos atualmente sugeridos que podem prevenir ou reduzir a recorrência
de DVG em cães suscetíveis incluem: fornecer 2 a 3 refeições menores a cada dia,
Dilatação-Vólvulo Gástricos 284

estar atento aos sintomas iniciais de DVG, evitar exercícios vigorosos 1h pré-
prandial e 2h pós-prandiais, e evitar mudanças abruptas na dieta.

GASTRITE
É uma inflamação discreta com erosões superficiais da mucosa gástrica causada
por excesso de alimento, ingestão de comida estragada ou material indigerível (por
exemplo, ossos, pêlo, papel, brinquedos), administração de drogas irritantes (por
exemplo, aspirina) ou como uma seqüela da torção gástrica. A gastrite está também
associada com doenças infecciosas (por exemplo, cinomose, hepatite viral,
leptospirose e pielonefrite), insuficiência renal crônica, pancreatite aguda e parasi-
tas gastrointestinais. Ingestão de cáusticos, arsênico, mercúrio, chumbo, tálio ou
fenol pode provocar gastrite corrosiva aguda.
A gastrite subaguda ocorre quando a gastrite aguda é impropriamente tratada ou
quando a ingestão crônica de materiais irritantes continua. Vômito crônico pode
também estar presente na neoplasia gástrica, gastrite hipertrófica ou gastrite infiltrativa.
Achados clínicos – Vômito, abatimento e dor abdominal são os sinais principais.
Os animais podem exibir sede excessiva, mas vomitam logo após a ingestão de
água. Se a lesão mucosa for extensa, os vômitos podem ser repetitivos a despeito
da ingestão de comida. Se os agentes corrosivos causarem gastrite, o vômito
poderá conter sangue e fragmentos da mucosa gástrica. Os animais podem recusar
o alimento ou exibir um apetite “depravado” (lamber concreto, mastigar lixo). A dor
pode-se manifestar por inquietação e objeção à palpação do abdome anterior. Os
animais podem assumir uma posição curvada ou estirar-se sobre uma superfície
fria. Quando a gastrite é grave, freqüentemente uma enterite a acompanha. A
gastrite subaguda manifesta-se por vômito continuado, perda de peso, desidratação
e desequilíbrio eletrolítico.
Diagnóstico – Na maioria dos casos de gastrite aguda, o diagnóstico é baseado
no histórico, sintomas clínicos e resposta à terapia. Se os sintomas persistirem, a
radiografia gástrica pode revelar a presença de corpos estranhos ou anormalidades
na posição ou contorno do estômago. Como é difícil visualizar úlceras e neoplasmas
em radiografias simples, ela pode ser necessária para distender o estômago com
técnicas de contraste médio ou duplo. A hipertrofia das pregas gástricas não é um
achado radiográfico constante. A avaliação endoscópica e histopatológica de
biópsias mucosas fornecem um diagnóstico mais confiável.
Tratamento – Na gastrite aguda, a ração deve ser suspensa por pelo menos 24h.
O consumo de água deve ser controlado, fornecendo-se ao animal cubos de gelo
para lamber, se o vômito for persistente. Se a gastrite for secundária corpos
estranhos, torção gástrica, ou uma lesão similar, a causa básica deve ser corrigida.
Se as perdas hídricas forem significantes, a terapia com fluidos parenterais deve ser
instituída, para compensar a desidratação e o desequilíbrio eletrolítico. Como os
vômitos prolongados podem causar alcalose metabólica, hipocalemia e hipocloremia,
os exames laboratoriais apropriados devem ser utilizados nos casos graves.
A meperidina pode ser utilizada nos casos de gastrite corrosiva para minimizar
a dor. Um antiemético agindo centralmente (por exemplo, clorpromazina ou
proclorperazina) pode ser necessário até que uma terapia específica para doenças
de base se torne eficaz. Se um veneno foi ingerido, um emético (por exemplo,
apomorfina) deve ser administrado logo após a ingestão, a menos que a substância
engolida seja corrosiva. Para intoxicação, o antídoto deve ser administrado
imediamente, ou lavagem GI ou gástrica pode ser utilizada para remover o material
estranho irritante do estômago.
Parasitas Gastrointestinais, PQ AN 285

Após as primeiras 24h, pequenas quantidades de água podem ser fornecidas,


seguidas por caldo, sopa ou leite fervido. No dia seguinte, uma dieta leve (rica em
carboidrato, baixa em gordura), consistindo de pábulo e leite, mingau de aveia,
farelos, arroz cozido ou pudim de leite, pode ser instituída. Esta dieta deve ser
fornecida em pequenas quantidades, 3 a 4 vezes ao dia e gradualmente modificada,
até que o animal volte à dieta normal.

PARASITAS GASTROINTESTINAIS, PQ AN
INFECÇÃO POR SPIROCERCA LUPI
(Verminose esofágica)
Spirocerca lupi adultas são vermes vermelhos e brilhantes de 40mm (macho) a
70mm (fêmea) de comprimento, geralmente localizados dentro de nódulos nas
paredes esofágica, gástrica ou aórtica. A infecção é encontrada nas áreas do
sudeste dos EUA e também nas regiões tropicais de todo o mundo. Os cães são
infectados ao comer um hospedeiro intermediário (geralmente besouro do esterco)
ou um hospedeiro transportador (por exemplo, galinhas, répteis ou roedores). A
larva migra através da parede da aorta torácica, onde permanece geralmente por
cerca de 3 meses. Os ovos são eliminados nas fezes aproximadamente 5 a 6 meses
após a infecção.
Achados clínicos – A maioria dos cães com infecção por S. lupi não mostra
qualquer sinal clínico. Quando a lesão esofágica é muito grande, como geralmente
o é quando se torna neoplásica, o cachorro tem dificuldade em engolir e pode
vomitar repetidamente após tentar comer. Tais cães salivam profusamente e
eventualmente ficam magros. Estes sinais clínicos, sobretudo se acompanhados
por espondilite ou aumento de volume das extremidades característico de uma
osteopatia, são fortemente sugestivos de espirocercose com neoplasia associada,
particularmente nas regiões onde o parasita é prevalente. Ocasionalmente, um
cachorro morrerá de repente, como resultado de hemorragia na cavidade torácica,
após a ruptura da aorta danificada pelos vermes em desenvolvimento.
Lesões – As lesões características são aneurisma da aorta torácica, granulomas
reativos de tamanhos variados ao redor dos vermes, e freqüentemente, mas não
sempre, espondilite ossificante deformante das vértebras torácicas posteriores.
Sarcoma esofágico, comumente com metástases, está às vezes associado (apa-
rentemente de forma causal) com infecção por S. lupi, sobretudo em raças de caça.
Cães com sarcomas relacionados à espirocercose, com freqüência, desenvolvem
osteopatia pulmonar hipertrófica (ver pág. 589).
Diagnóstico – Pode ser feito pela demonstração dos ovos alongados caracte-
rísticos contendo a larva no exame fecal (ver pág. 1152), embora os ovos sejam
evacuados esporadicamente em fezes e freqüentemente perdidos. Uma gastroscopia
ocasionalmente pode revelar um nódulo ou um verme adulto. Um diagnóstico
provável pode ser feito por exame radiográfico, quando se revelam densas massas
no esôfago. O bário ajuda a definir a lesão.
Muitas infecções não são diagnosticadas até à necropsia. Os granulomas variam
grandemente de tamanho e localização no esôfago, mas em geral são bastamte
característicos para o diagnóstico, mesmo se os vermes não estiverem mais
presentes. Vermes e granulomas podem estar presentes no pulmão, traquéia,
mediastino, parede do estômago ou outra localização abdominal. Os aneurismas
cicatrizados da aorta persistem por toda a vida do cachorro e são diagnósticos de
Dilatação-Vólvulo Gástricos 286

infecção prévia. Quando os sarcomas estão associados com a infecção, a lesão


esofágica é normalmente maior e, com freqüência, contém cartilagem ou osso. As
metástases destas lesões, freqüentemente estão presentes nos pulmões, linfono-
dos, coração, fígado ou rins.
Controle – Em áreas endêmicas, os cães devem ser impedidos de comer
esterco, rãs, camundongos, lagartixas, etc., e de se alimentar de pedaços crus de
galinha. O tratamento não é prático embora estudos preliminares mostrem que o
levamisol, disofenol e albendazol podem ser úteis. A remoção cirúrgica geralmente
é malsucedida por causa das grandes áreas do esôfago envolvidas.

INFECÇÃO POR PHYSALOPTERA


(Verme do estômago)
Várias espécies destes nematóideos do estômago de cães e gatos ocorrem em todo
o mundo. Elas estão geralmente grudadas à mucosa gástrica ou duodenal através de
dois potentes lábios. Os machos têm cerca de 30mm e as fêmeas , 40mm de
comprimento. Os ovos são ovais, 32 × 55µm, de casca grossa e larvados.
As larvas infectantes encistadas de Physaloptera spp têm sido encontradas em
várias espécies de besouros, baratas e grilos. Camundongos e rãs podem ser
carreadores paratênicos. Seguindo a infecção, pela ingestão do hospedeiro inter-
mediário ou paratênico, o desenvolvimento da larva adulta é direto. Estes parasitas
causam gastrite, duodenite, ou ambas, e freqüentemente resultam em vômito,
anorexia e fezes de cor escura. Áreas ulceradas hemorrágicas permanecem na
mucosa do estômago quando os parasitas movem-se para outros locais; em
infecções severas, anemia e perda de peso podem-se desenvolver. A gastroscopia
e a indentificação dos ovos característicos nas fezes são úteis para o diagnóstico.
Tratamentos utilizando palmoato de pirantel e dissulfato de carbono são eficazes.
O Ollulanus tricuspis é um verme diminuto, ≤ 1mm de comprimento, que infecta
várias espécies de animais e ocasionalmente provoca uma erosão leve ou gastrite
catarral em gatos. As fêmeas são vivíparas, assim as infecções grandes podem
desenvolver-se endogenosamente. A transmissão é via vômito e o diagnóstico é
feito pela demonstração microscópica de vermes no vômito. O tratamento com
fenbendazol ou pirantel pode ser tentado.

ESTRONGILOIDOSE
O Strongyloides stercoralis é um pequeno e fraco nematóideo que, quando
adulto, penetra a mucosa da metade anterior do intestino delgado de cães. Os
vermes são quase transparentes, mas é possível vê-los sem ajuda de uma lupa à
necropsia. Geralmente as infecções são associadas a abrigos quentes, úmidos,
fechados e insalubres. Algumas evidências sugerem que as espécies encontradas
no cachorro são idênticas àquelas encontradas no homem. Outras espécies em
cães incluem S. planiceps e S. fuelleborni; a S. cati e a S. tumefaciens são
encontradas nos gatos.
Os vermes parasitas são todos fêmeas. Os ovos embrionam-se rapidamente e
muitas larvas eclodem antes de os ovos serem eliminados nas fezes. Sob condições
apropriadas de calor e umidade, o desenvolvimento extracorporal é rápido. O
terceiro estágio larval pode ser alcançado em pouco mais de 1 dia. Algumas destas
larvas desenvolvem-se em larvas filariformes infectantes; outras desenvolvem-se
em vermes de vida livre que se acasalam e produzem progênie similar àquela da
fêmea parasita. As larvas filariformes penetram a pele, mas também podem
contaminar um hospedeiro através da mucosa oral. A transmissão pelo colostro é
altamente suspeita, mas não definitivamente provada. A progênie pode ser elimina-
da nas fezes, 7 a 10 dias após infecção.
Parasitas Gastrointestinais, Pq An 287

Os sinais clínicos indicam uma infecção grave que se iniciou há algumas


semanas. Diarréia mucóide e com estrias de sangue é característica, vista principal-
mente nos animais jovens durante a estação quente e umida. O emagrecimento é
visível e a redução da taxa de crescimento pode ser um dos primeiros sinais. O
apetite, em geral, é bom e o animal está normalmente ativo nos primeiros estágios
da doença. Na ausência de infecções intercorrentes há pouca ou nenhuma elevação
da temperatura. Usualmente nos estágios avançados, há respiração superficial
rápida e pirexia, e o prognóstico é grave. À necropsia, há evidências de pneumonia
verminosa com grandes áreas de consolidação nos pulmões, e enterite marcante
com hemorragia, descamação da mucosa e muita secreção de muco.
O saneamento ruim e a associação de animais suscetíveis com infectados levam
a um rápido desenvolvimento da infecção, em todos os animais de um canil ou jaula.
Os animais com diarréia devem ser imediatamente isolados dos cães assintomáti-
cos. A insolação direta, temperaturas elevadas do solo ou superfícies e dessecamento
são nocivos a todos os estágios larvais livres. Uma cuidadosa lavagem das
superfícies de madeira e assoalhos com soluções concentradas de sal ou cal,
seguida de enxágüe com água quente, é eficaz para acabar com a infecção nestes
locais. Já que a doença no homem pode ser séria, cuidados devem ser tomados ao
se lidar com cães infectados.
Uma dose única de invermectina ou várias doses de tiabendazol podem dar bons
resultados, porém apenas em dosagens que podem ser tóxicas. Por outro lado,
podem ser tentadas a dietilcarbamazina ou a ditiazanina. Doses menores de
tiabendazol podem ser administradas continuamente para evitar a infecção adulta.

ASCARÍASE
Os grandes helmínticos cilíndricos (nematóideos ascarídeos) de cachorros e
gatos são comumente encontrados, especialmente em cachorrinhos e gatinhos.
Das três espécies, Toxocara canis, Toxascaris leonina e Toxocara cati , a mais
importante é T. canis, não somente porque as larvas podem migrar no homem, mas
porque as infecções fatais podem ocorrer em filhotes de cachorro. T. leonina ocorre
mais freqüentemente em cães adultos e, menos freqüentemente, em gatos. Estas
espécies também ocorrem nos carnívoros selvagens.
Em cãezinhos, o modo usual de infecção com T. canis é a transferência trans-
placentária; se os filhotes < 6 semanas de idade ingerirem os ovos embrionários, as
larvas eclodidas, ao alcançar os pulmões são expelidas pela tosse e engolidas,
maturando em adultos capazes de colocar ovos no intestino delgado. Entretanto,
quando ovos infectivos de T. canis são engolidos por cachorros mais velhos, as larvas
eclodem, penetram a mucosa intestinal e migram para o fígado, pulmões, músculos,
tecido conectivo, rins e muitos outros tecidos. Na cadela prenhe, estas larvas hiber-
nantes são mobilizadas e migram para o feto em desenvolvimento e, eventualmente,
alcançam o intestino dentro de 1 semana logo após o nascimento. Algumas larvas
migram para a glândula mamária, de forma que o cachorrinho pode ser reinfectado
pelo leite. Durante este período perinatal, a imunidade da cadela à infecção por
ascarídeo é parcialmente suprimida e grande número de ovos pode ser eliminado.
As larvas dos nematóides ascarídeos podem migrar pelos tecidos de vários
animais, fornecendo assim uma fonte alternativa de infecção, particularmente para
gatos e carnívoros selvagens. Esta migração também ocorre se os ovos forem
engolidos pelo homem. A maioria das infecções humanas é assintomática, porém
febre, eosinofilia persistente e hepatomegalia (algumas vezes com comprometi-
mento pulmonar) podem ocorrer, provocando uma doença conhecida como larva
migrante visceral. Raramente, a larva pode alojar-se na retina, causando prejuízo
à visão (larva migrante ocular).
Dilatação-Vólvulo Gástricos 288

Os ciclos de vida da T. cati e da T. leonina são similares, exceto pelo fato de que,
na primeira, não ocorre infecção pré-natal, enquanto na segunda, a migração é
restrita à parede intestinal, de forma que não ocorre transmissão pré-natal nem
transmamária.
Achados clínicos e lesões – A primeira indicação de infecção nos animais
jovens é a falta de crescimento e a perda da condição física. Animais infectados
têm pêlos eriçados e são freqüentemente “barrigudos”. Vermes podem ser
vomitados e comumente evacuados nas fezes. Nos primeiros estágios, podem
ocorrer lesões pulmonares devido à migração das larvas; estas podem-se
complicar com pneumonite bacteriana, de modo que dificuldade respiratória de
gravidade variada pode sobrevir. Diarréia com excesso de muco pode ser
evidente.
Nas infecções graves em cachorrinhos, são comuns pneumonia verminótica,
ascite, degeneração gordurosa do fígado e enterite mucóide. Granulomas
corticorrenais contendo larvas são observados com freqüência em cães novos.
Diagnóstico – A infecção em cães e gatos é diagnosticada pela detecção de
ovos nas fezes. É importante distinguir os ovos esféricos e de casca irregular de
Toxocara spp do ovo oval de casca lisa de T. leonina, devido à importância dos
primeiros em saúde pública.
Tratamento – Os sais de piperazina ainda são largamente utilizados. Os
compostos de maior espectro incluem diclorvos, febantel, fenbendazol, flubendazol,
mebendazol, nitroscanato, oxfendazol e pamoato de pirantel. A dietilcarbamazina e
a ditiazanina também são empregadas.
Controle – Os ovos no solo e as larvas somáticas das cadelas são os
reservatórios principais de infecção. A transmissão perinatal de infecção é
grandemente reduzida por doses diárias de febendazol administradas às cadelas
do 40º dia de gestação até o 14º dia após o parto. Se isto não for feito, para
minimizar a saída de ovos, os filhotes devem ser tratados tão cedo quanto
possível; idealmente, o tratamento deve ser iniciado 2 semanas após o nascimen-
to e repetido a intervalos de 2 a 3 semanas até os 3 meses de idade. As cadelas
em lactação devem ser tratadas nos mesmos dias. Os programas profiláticos para
vermes cardíacos que utilizam estirilpirídio ou oxibendazol combinado à
dietilcarbamazina também ajudam a controlar a infecção intestinal por ascarídeos.
Como os ovos aderem-se às patas, pêlos, pele e outras superfícies, além de se
misturarem ao solo e à poeira, a higiene rigorosa deve ser observada pelas
pessoas, particularmente crianças, expostas a animais ou ambientes potencial-
mente contaminados.

ANCILOSTOMÍASE
Ancylostoma caninum é a principal causa de ancilostomíase canina na maioria
das áreas tropicais e subtropicais do mundo. O A. tubaeforme de gatos tem uma
distribuição similar, porém mais esparsa. O A. braziliense de gatos e cães está
esparsamente distribuída da Flórida à Carolina do Norte, nos EUA. Uncinaria
stenocephala é o principal ancilóstomo canino das regiões mais frias e é o único no
Canadá e na orla nordeste dos EUA, onde é primeiramente um parasita da raposa.
Os machos de A. caninum têm aproximadamente 12mm de comprimento; as
fêmeas, 15mm; as outras espécies são um pouco menores. As larvas infectantes
dos ancilóstomos caninos, particularmente de A. braziliense, podem penetrar e
migrar sob a pele do homem, causando a larva migrante cutânea.*

* N. do T. – Bicho-geográfico.
Parasitas Gastrointestinais, Pq An 289

Os ovos alongados (maiores de 65µm), de paredes finas, nos estágios iniciais da


clivagem (2 a 8 células), são primeiro eliminados nas fezes, 15 a 20 dias após a
infecção; eles completam a embrionação e eclodem em 24 a 72h, em solo quente
e úmido. A infecção comumente resulta da ingestão de larvas infectantes do
ambiente ou, com A. caninum, do colostro ou leite de cadelas infectadas. As
infecções intestinais tanto por A. caninum como por A. braziliense também podem
resultar da invasão larval através da pele, mas esta via é de pouca significância para
U. stenocephala. A penetração pela pele em cachorrinhos é seguida de migração
das larvas através do sangue até os pulmões, onde elas são expelidas pela tosse
e engolidas, amadurecendo no intestino delgado. Porém, nos animais com mais de
3 meses, a migração das larvas de A. caninum, após a migração através dos
pulmões, é seguida por uma parada nos tecidos somáticos. Estas larvas presas são
ativadas durante a prenhez e acumulam-se nas glândulas mamárias.
Achados clínicos – Uma anemia normocítica, normocrômica aguda, seguida
por anemia microcítica, hipocrômica por “deficiência de ferro”, característica nos
cachorrinhos novos e freqüentemente fatal, é a manifestação clínica da infecção por
A. caninum. Cachorrinhos sobreviventes desenvolvem alguma imunidade e mos-
tram sinais clínicos menos intensos. Contudo, animais debilitados e mal-alimenta-
dos podem continuar inúteis e sofrer de anemia crônica. Cães maduros e bem-
desenvolvidos podem abrigar alguns vermes sem mostrar sinais. Estes são de
interesse primário como fonte de infecção direta ou indireta para filhotes. A diarréia
com fezes escuras e alcatroadas acompanha as infecções graves. Hidremia,
emagrecimento e fraqueza desenvolvem-se na doença crônica.
Lesões – A anemia resulta diretamente da sucção de sangue pelos parasitas e
das ulcerações hemorrágicas, formadas quando A. caninum muda seu local de
alimentação. A quantidade de sangue perdido em 24h devido a um único verme tem
sido estimada em até 0,1mL. Não há interferência com eritropoiese na ancilostomíase
não complicada. O fígado e outros órgãos podem parecer isquêmicos e com certo
grau de infiltração gordurosa do fígado. Nem A. braziliense nem U. stenocephala são
vorazes chupadores de sangue e a anemia não ocorre. Entretanto, a hipoproteine-
mia é característica; a perda de soro em volta do local de fixação do verme no
intestino pode reduzir a proteína sangüínea em mais de 10%. Enterite hemorrágica
com mucosa intestinal edematosa, mostrando manchas vermelhas, pequenas
úlceras e vermes fixados, é geralmente vista nos casos agudos fatais.
Dermatite pela penetração da pele pelas larvas pode ocorrer com qualquer
ancilóstomo, mas tem sido mais freqüentemente relatada nos espaços interdigitais
e por U. stenocephala. Pneumonia e consolidação do pulmão podem ser observa-
das em infecções muito severas em filhotes.
Diagnóstico – Os ovos característicos ovais e de casca fina são facilmente vistos
na flotação de fezes frescas de cães contaminados. A anemia aguda e morte por
infecções lactogênicas podem ser observadas nos filhotes, antes que os ovos sejam
eliminados nas fezes.
Tratamento e controle – A cadela deve ficar livre de ancilostómos antes da
reprodução e ficar afastada de áreas contaminadas durante a prenhez. Os filhotes
devem ser paridos e aleitados em cômodos sanitários. Cercados de concreto, que
possam ser lavados pelo menos 2 vezes por semana nos meses quentes, são os
melhores. Solários de terra ou areia podem ser descontaminados com borato de
sódio (1kg/2m2). Profilaxia química com estirilpirídio ou oxibendazol geralmente
é utilizada em combinação com dietilcarbamazina para prevenir tanto a
ancilostomíase quanto a dirofilariose; o milbemicin oxima também controla
ambas as infecções. O fenbendazol administrado às cadelas prenhes do 40º dia
da prenhez até o 14º dia após o parto reduz significativamente a transmissão
transmamária para os filhotes.
Dilatação-Vólvulo Gástricos 290

Os tratamentos de dose única incluem o diclorvos, pamoato de pirantel e


nitroscanato, que são administrados VO sozinhos ou com comida, além do butamisol
e do disofenol, administrados por injeção. Os últimos possuem margens de
segurança relativamente pequenas. O butamisol não deve ser utilizado conjunta-
mente à bunamidina, enquanto tratamentos repetidos com disofenol são contra-
indicados. Outras drogas são mais eficazes quando administradas em doses
divididas. Estas drogas incluem a ditiazanina, febantel, fenbendazol, flubendazol,
mebendazol e tênio. As recomendações e precauções do rótulo devem sempre ser
observadas. Quando a anemia é grave, a quimioterapia pode ter de ser apoiada por
transfusão sangüínea ou suplementação com ferro, ou ambas, seguida de uma dieta
rica em proteínas até que o nível de Hb esteja normal.

INFECÇÃO PELO VERME CHICOTE


(Tricuríase)
Os adultos de Trichuris vulpis têm 40 a 70mm de comprimento e consistem de
uma porção anterior longa e fina, e um terço posterior grosso. Eles comumente
habitam o ceco, onde estão firmemente aderidos à parede intestinal, com a
extremidade anterior penetrada na mucosa. Os ovos de casca grossa, com
opérculos bipolares, são eliminados nas fezes e se tornam infectantes em 2 a 4
semanas, num ambiente quente e úmido. Embora os ovos possam permanecer
viáveis num ambiente propício por até 5 anos, eles são suscetíveis à dessecação.
O ciclo de vida é direto. Seguindo a ingestão de ovos infectantes, o desenvolvimento
larval ocorre na parede do jejuno e os adultos maturam-se no ceco, em aproxima-
damente 11 semanas. Eles podem permanecer por até 16 meses.
Nenhum sinal é visto em infecções leves, mas com o aumento da quantidade de
vermes, a reação inflamatória (e por vezes hemorrágica) no ceco torna-se mais
pronunciada e perda de peso e diarréia ficam evidentes. Sangue fresco pode sair nas
fezes de cães severamente contaminados, podendo causar ocasionalmente anemia.
Além do tratamento anti-helmíntico regular dos cães, vantagens devem ser
tiradas da suscetibilidade dos ovos à dessecação. Mantendo-se limpas e secas as
instalações, a infecção dos cães pode ser reduzida consideravelmente, embora
infecções por T. vulpis possam dificultar o controle. Os compostos eficazes incluem
diclorvos, febantel, fenbendazol, flubendazol, mebendazol e pamoato de oxantel,
que são administrados VO sozinhos ou com comida. O butamisol é administrado por
injeção, mas a margem de segurança é pequena, não devendo ser utilizado em cães
infectados com vermes cardíacos ou juntamente com bunamidina. A ftalofina e o
glicobiarsol também têm sido utilizados.

INFECÇÃO POR ONCICOLA CANIS


Estes parasitas acantocéfalos têm sido raramente encontrados no intestino
delgado de cães e gatos no hemisfério ocidental. Eles são de cor branca, de
aproximadamente 12mm de comprimento e suas cabeças espinhosas ficam embe-
bidas na mucosa. As fêmeas põem ovos marrons, de casca grossa, ovais e
embrionados (45 × 65µm). Seu ciclo de vida não é completamente conhecido, mas
acredita-se que inclua um hospedeiro intermediário, um artrópode, e hospedeiros
paratênicos, tais como perus ou tatus. Muitas infecções não causam sinais clínicos.

INFECÇÕES POR CESTÓIDEOS


(Infecções por solitária)
Muitos cães e gatos urbanos comem rações preparadas e têm acesso restrito à
presa natural. Tais animais podem adquirir Dipylidium caninum da pulga. Gatos com
Parasitas Gastrointestinais, Pq An 291

acesso a tocas contaminadas (ou ao ar livre) de camundongos e ratos também


adquirem Taenia taeniaeformis. Cães suburbanos, rurais e de caça têm mais acesso
a vários pequenos mamíferos e carne crua e restos de ungulados domésticos e
selvagens. Um número de cestóideos pode ser esperado em tais cães (ver TABELA 7).
Nos ranchos de ovelhas e onde quer que os ungulados selvagens (particularmente
Cervidae) e lobos sejam comuns, os cães podem adquirir Echinococcus granulosus.
O E. multilocularis selvagem, previamente conhecido somente no ártico da América
do Norte, agora ocorre no meio-oeste e oeste dos EUA e Canadá; mas até agora, as
infecções em gatos ou cães são raras. A convivência com cães infectados pode
resultar em infecção humana com metacestóideos de E. granulosus, E. multilocularis,
T. multiceps, T. serialis ou T. crassiceps, em vários tecidos, ou D. caninum adulto no
intestino. A presença de metacestóideos em animais produtivos pode limitar o uso
comercial de suas carcaças ou restos da carne. Assim, cestóideos de cães e gatos
podem ser de importância em saúde pública (ver TABELA 8).
Cestóideos adultos no intestino de cães e gatos raramente causam doença séria,
e sinais clínicos, se presentes, podem depender do grau de infecção, da idade,
estado e espécie do hospedeiro. Sinais clínicos variam de debilidade, mal-estar,
irritabilidade, apetite inconstante e pêlos ásperos a cólica, diarréia suave e, raramen-
te, emagrecimento e ataques. O diagnóstico está baseado na descoberta da
proglótide ou ovos nas fezes. Os ovos de Taenia spp e Echinococcus spp não podem
ser facilmente diferenciados por exame microscópico.
O controle dos cestóideos intestinais de cães e gatos requer terapia e prevenção.
Os animais que perambulam livremente, em geral, ficam reinfectados por
metacestóideos disponíveis na carniça ou em animais que eles matam. D. caninum
é diferente, pois seu ciclo desenvolve-se em pulgas que estão associadas com
animais infectados confinados; dessa forma, um diagnóstico preciso é necessário
para um programa eficaz na prevenção da reinfecção.
O tratamento eficaz de animais infectados deve remover os escólices fixados no
intestino delgado. Compostos de bunamidina são eficazes contra Echinococcus spp
e Taenia spp maduras, mas são menos eficazes contra Echinococcus spp e
Dipylidium spp imaturas. Bunamidina é também eficaz contra Spirometra sp em
gatos. Niclosamida e seu sal piperazínico são razoavelmente bons contra Taenia
spp em cães e gatos, mas muito menos eficazes contra Dipylidium spp e Echinococcus
spp; vômito e diarréia podem ocorrer. O cloridrato de quinacrina e diclorofeno
também são utilizados, embora nenhum seja tão eficaz quanto algumas das outras
drogas listadas anteriormente. O mebendazol pode ser utilizado para remover a
maioria das formas adultas de Taenia spp do intestino de animais infectados, como
o febantel, fenbendazol e flubendazol, mas não é tão eficaz contra E. granulosus.
Praziquantel é mais eficaz tanto contra larvas quanto contra estágios adultos da
maioria dos cestóideos de cães e gatos, mas não é tão ativo contra os ovos.

INFECÇÕES POR TREMATÓDEOS


Trematódeos intestinais
Nanophyetus (Troglotrema) salmincola, o chamado trematódeo do “envene-
namento pelo salmão”, é um trematódeo pequeno e oval (0,5 × 0,3mm), encontrado
no intestino delgado de cães, gatos e muitos carnívoros selvagens no noroeste dos
EUA, sudoeste do Canadá e Sibéria. Os ovos, que são eliminados nas fezes de
hospedeiros infectados, são marrom-claros, têm 55 × 45µm e são indistintamente
operculados com um pequeno nódulo no pólo oposto. O ciclo de vida inclui um
período extenso (3 meses) de embrionação do ovo. Os primeiros hospedeiros
intermediários são caramujos encontrados em locais endêmicos (por exemplo,
Oxytrema silicula nos EUA). As cercárias destes caramujos penetram na pele de
Parasitas Gastrointestinais, Pq An 292

TABELA 7 – Cestóideos de Cães e Gatos na América do Norte (Em ordem de importância)


Hospedeiro intermediário Características para o diagnóstico
Cestóideoa Hospedeiro definitivo e órgãos invadidosb dos vermes adultos Observações
Dipylidium Cão, gato, coiote, lobo, Pulgas e mais raramente Estróbilos de 15 a 70cm de comprimen- É provavelmente o cestóideo
caninum (verme raposa, outros animais piolhos; livres na cavida- to e até 3mm de largura máxima. De 30 mais comum nos cães,
filiforme de poro de corporal a 150 ganchos rostelares, na forma de menos comum nos gatos e
duplo, dos cães) espículas em três ou quatro círculos; cosmopolita. Ocasional-
os maiores ganchos de 12 a 15µm, os mente infecta o homem,
menores de 5 a 6µm de comprimento. particularmente crianças
Os segmentos na forma de semente
de pepino com poros próximos à me-
tade de cada margem lateral
Taenia taeniae- Gato, cão, lince, lobo, Vários ratos, camundongos, Estróbilos de 15 a 60cm de compri- Cestóideo comum em gatos,
formisc outros animais outros roedores; em gran- mento, 5 a 6mm de largura máxima. raro em cães; cosmopolita
des cistos no fígado De 26 a 52 ganchos rostelares em
fila dupla; ganchos maiores de 380
a 420µm, ganchos menores de 250
a 270µm de comprimento. Sem pes-
coço. Ramos laterais do útero sacu-
lado dificultam a contagem
Taenia pisiformis Cão, gato, raposa, lobo, Coelhos e lebres, raramen- Estróbilos de 60cm a 2m de comprimento, Particularmente comum em
coiote, lince, outros te esquilos e outros roe- 5mm de largura máxima. Ao redor de 34 cães caçadores, de fazen-
animais dores; na cavidade pélvi- a 48 ganchos rostelares em fileira dupla; das e suburbanos que co-
ca ou peritoneal aderida grandes ganchos de 225 a 290µm; pe- mem coelhos e suas vísce-
às vísceras quenos ganchos de 132 a 177µm de ras
comprimento. De 5 a 10 ramos laterais,
em cada lado do útero grávido
Taenia hydatigena Cão, lobo, coiote, lince, Animais domésticos e sel- Estróbilos de até 5m de comprimento e Em cães de fazenda, mais
raramente gato vagens de casco bipartido, 7mm na largura máxima. Cerca de 26 a raramente em cães caça-
raramente em lebres e ro- 44 ganchos rostelares em fileira dupla; dores; cosmopolita
edores; no fígado e cavi- ganchos maiores de 170 a 220µm,
dade abdominal ganchos menores de 110 a 160µm de
comprimento. De 5 a 10 ramos laterais
em cada lado do útero grávido
Parasitas Gastrointestinais, Pq An 293

Hospedeiro intermediário Características para o diagnóstico


Cestóideoa Hospedeiro definitivo e órgãos invadidosb dos vermes adultos Observações
Diphyllobothrium Homem, cão, gato, ou- Encistadas em vários ór- Estróbilos de 10m de comprimento e Canadá, Alasca e vários ou-
sppd tros animais comedo- gãos ou livres na cavida- 20mm na largura máxima, porém tros estados dos EUA;
res de peixe de do corpo de vários pei- geralmente menores. Escólice com Rússia e outras áreas
xes duas ranhuras (bótrio) e sem gan-
chos. Poros genitais na linha média
ventral do segmento
Echinococcus Cão, lobo, coiote, possi- Ovinos, caprinos, bovinos, Estróbilos de 2 a 6mm de comprimento Os focos, especialmente em
granulosus velmente raposa e vá- suínos, cavalos, cervos, com 3 a 5 segmentos. De 28 a 50, ovinos norte-americanos e
(tênia hidática) rios outros carnívoros alces e alguns roedores, geralmente de 30 a 36 ganchos nos cães a eles associa-
selvagens ocasionalmente homem e rostelares em fila dupla; ganchos dos, são conhecidos; ciclos
outros animais; comumen- maiores de 27 a 40µm, ganchos alce-lobo selvagem onde
te no fígado e pulmões, menores de 21 a 25µm de compri- esses animais ocorrem;
ocasionalmente em outros mento provavelmente cosmopolita
órgãos e tecidos
Echinococcus Raposas árticas verme- Roedores com microdentes, Estróbilos de 1,2 a 2,7mm de compri- Leste europeu, Rússia,
multilocularis lhas e cinzas; coiotes, ocasionalmente no ho- mento, com 2 a 4 segmentos; apare- Alasca, meio-oeste dos
(tênia hidática gatos, cães mem; no fígado ce junto a espécies menores de EUA e Canadá; ainda as-
alveolar) cestóideos no cão; de 26 a 36 gan- sim, um ciclo significante
chos rastelares em fileira dupla; gan- em cães e gatos norte-
chos maiores de 23 a 29µm, ganchos americanos não foi reco-
menores de 19 a 26µm nhecido
Echinococcus Cão, cachorrro-do-mato Pacas e outros roedores Estróbilos de 4 a 5,5mm em compri- América Central e nordeste
vogeli mento, com três segmentos; 28 a 36 da América do Sul
rostelos em ganchos de fila dupla;
ganchos maiores de 49 a 57µm, gan-
chos menores de 30 a 47µm; o útero
no segmento grávido não apresenta
ramos laterais
(Continua)
Parasitas Gastrointestinais, Pq An 294

TABELA 7 (Cont.) – Cestóideos de Cães e Gatos na América do Norte (Em ordem de importância)
Hospedeiro intermediário Características para o diagnóstico
Cestóideo a Hospedeiro definitivo e órgãos invadidosb dos vermes adultos Observações
Mesocestoides spp Muitos canídeos selva- O histórico de vida completo Estróbilos com 10cm de comprimento Relatadas em cães e gatos
gens, felídeos, muste- é desconhecido; suspeita- e 2 a 5mm de largura. Escólice com do meio-oeste e oeste; em
lídeos; outros animais, se de artrópode como hos- quatro sugadores, porém sem animais selvagens de to-
incluindo cão e gato pedeiro intermediário; tetra- rostelos ou ganchos. Poro genital das as partes dos EUA e
tiridia juvenil na cavidade ventral na linha média do verme. Canadá; provavelmente cos-
abdominal e em outros Segmentos grávidos com órgãos mopolitas
lugares de vários mamífe- parauterinos
ros, aves e répteis; conhe-
cem-se tetratiridias na ca-
vidade do corpo dos cães
que podem entrar no intes-
tino através da parede in-
testinal
Taenia multiceps Cão, lobo, coiote e ra- Ovinos, caprinos e outros Estróbilos de 40 a 100cm de compri- Rara em carnívoros domésti-
posa ruminantes domésticos ou mento e de 5mm de largura máxima. cos do oeste da América do
selvagens, raramente o Escólice com quatro sugadores e 22 Norte; mais comum em ani-
homem. Geralmente no a 32 ganchos em fila dupla; ganchos mais selvagens; provavel-
cérebro e medula espinhal maiores com 150 a 170µm, ganchos mente cosmopolita
menores com 90 a 130µm de com-
primento. Vagina com curva reflexa
próxima ao canal excretório lateral.
De 9 a 26 ramos laterais no útero
grávido
Taenia serialis Coiote, lobo, cão, rapo- Coelho, lebre, esquilo, rara- Estróbilos de 20 a 72cm de compri- Primariamente em canídeos
sa mente o homem; no teci- mento e de 3 a 5mm em largura. De selvagens; considerada por
do conjuntivo subcutâneo 26 a 32 ganchos em fila dupla; gan- algumas autoridades como
ou retroperitônio chos maiores de 110 a 175µm, gan- uma forma não distinta de
chos menores de 68 a 120µm de T. multiceps
comprimento. Vagina com curva re-
flexa próxima ao canal excretório
lateral. De 20 a 25 ramos laterais no
útero grávido
Parasitas Gastrointestinais, Pq An 295

Hospedeiro intermediário Características para o diagnóstico


Cestóideoa Hospedeiro definitivo e órgãos invadidosb dos vermes adultos Observações
Taenia crassiceps Raposa, lobo, coiote, Vários roedores, talvez ou- Estróbilos de 70 a 170mm de compri- Relatada no Canadá, nor-
cão tros animais, um relato no mento e 1 a 2mm de largura. Escólice deste dos EUA, incluindo o
homem; subcútis e em ca- com 30 a 36 ganchos em fila dupla. Alasca
vidades do corpo Ganchos maiores de 126 a 132µm,
pequenos ganchos de 121 a 140µm
de comprimento. De 16 a 21 ramos
laterais no útero, algumas vezes tor-
nando-se difusos
Taenia krabbei Lobo, coiote, cão, gato Alce, cervo, cervo-rei; nos Estróbilos de , 20cm de comprimento Relatada no Canadá e noro-
músculos estriados e 9mm de largura máxima. Escólice este dos EUA, incluindo
pequeno com 26 a 36 ganchos em Alasca; considerada por al-
fila dupla; ganchos maiores com 146 guns como uma subespécie
a 195µm, ganchos menores com 85 a de T. ovis
141µm de comprimento. De 18 a 24
ramos laterais estreitos e retos no
útero grávido
Taenia ovis Cães, gatos (raramen- Ovinos e caprinos; na mus- Estróbilos de 45 a 110cm de compri- Ocasionalmente em cães de
te) culatura, raramente em mento e 4 a 8,5mm de largura máxi- fazenda do oeste dos EUA;
outro lugar ma. Escólice com 32 a 38 ganchos cosmopolita
em fila dupla; ganchos maiores com
160 a 202µm de comprimento. Com
20 a 25 ramos laterais no útero
grávido. A vagina cruza o ovário no
lado do poro do segmento
a Taenia polyacantha, raramente relatada em cães no Alasca, aqui está excluída.
b Em todos os casos onde o ciclo de vida é conhecido, os cães e gatos tornam-se infectados comendo animais, ou parte deles, que contenham o metacestóideo
infectante. Estes hospedeiros intermediários se tornam infectados pela ingestão dos ovos cestóideos (exceto no caso de Mesocestoides spp e Diphyllobothrium
spp, que possuem um estágio extra em seu ciclo de vida), que são eliminados nas fezes do hospedeiros definitivo.
c Várias outras Taenia spp de ganchos grandes ocorrem em gatos selvagens maiores, porém a maioria usa lagomorfos e ungulados como hospedeiro
intermediário, portanto, os gatos domésticos são raramente expostos.
d Várias espécies de Diphyllobothrium foram relatadas em cães e gatos da América do Norte; elas necessitam de estudos extensivos antes que possam ser
identificadas com certeza.

DIG
Parasitas Gastrointestinais, Pq An 296

Tabela 8 – Cestóideos de Importância em Saúde Pública*


Taenia Taenia solium Diphyllobothrium Echinococcus Echinococcus
saginata spp** granulosus multilocularis
Hospedeiro do verme Somente o homem Somente o homem Homem, cão, gato e Cão, lobo, raposa e Canídeos e o gato do-
adulto outros mamíferos vários outros carní- méstico
que se alimentam de voros selvagens
peixes e pássaros
Nome ou metacestói- Cisticerco ou “canji- Cisticerco ou “canji- Procercóide em copé- Cisto hidático “Cisto” multilocular ou
deo intermediário quinha da carne bo- quinha da carne podes, plerocercóide alveolar ou hidátide
vina” suína” em peixes
Medidas do metaces- 9 x 5mm 6 a 10 x 5 – 10mm 2 a 25 x 2,5mm Diâmetro de 50 a Variável, penetra pro-
tóideo 100mm, às vezes ≥ vavelmente o tecido
150mm neoplásico
Hospedeiros interme- Bovinos Porco, cão (o homem Os copépodes são os Ovinos, bovinos, suí- Camundongos do
diários principais tanto pode ser o hos- primeiros hospedei- nos, alces, cervos, campo, arganazes,
pedeiro intermediário ros, depois os peixes raramente o cão, lemingues, às vezes
quanto o definitivo) gato e o homem os mamíferos do-
mésticos e o homem
Localização do meta- Músculos cardíaco e Músculos esquelético Tecidos mesentéricos, Comumente no fígado Vários órgãos e teci-
cestóideo esquelético e cardíaco, ocasio- testículos, ovários e e nos pulmões, oca- dos
nalmente o sistema músculos sionalmente em ou-
nervoso tros órgãos e tecidos

* Infecções humanas por metacestóideos de Taenia crassiceps, T. multiceps, T. serialis, Mesocestoides sp e outros cestóideos ocorrem raramente.
** Uma vez que várias espécies de Diphyllobothrium infectam o homem na América do Norte, não é prudente referir-se a todas essas infecções como devidas
a D. latum.
Parasitas Gastrointestinais, Pq An 297

peixes salmonídeos jovens e encistam-se (metacercárias) entre seus músculos e


órgãos. Cães e outros animais ficam infectados ao comer peixe contaminado cru ou
preparado impropriamente.
Como estes trematódeos aderem-se profundamente entre os vilos do intestino,
a infecção com um grande número deles pode causar enterite. A maioria das
infecções, porém, é complicada com o desenvolvimento do complexo envenena-
mento pelo salmão (ver pág. 501), causado por microrganismos rickettsiais, que o
trematódeo transmite. O praziquantel é um tratamento eficaz.
Alaria alata, A. canis e outras espécies Alaria são pequenos trematódeos
(0,5mm) geralmente encontrados no intestino delgado do cachorro, gato, raposa e
visom no hemisfério ocidental, assim como na Europa, Austrália e Japão. A parte
anterior do corpo é achatada e a parte posterior é cônica. Os ovos são ovais,
marrom-claros e razoavelmente grandes (120 × 65µm). O ciclo de vida inclui
caramujos de águas frescas (Planorbis spp) como os primeiros hospedeiros
intermediários. As cercárias emergem das lesmas e penetram em rãs; cães e outros
hospedeiros definitivos ficam contaminados ao se alimentarem de rãs. As
metacercárias podem encistar-se novamente em pássaros, cobras e roedores
quando estes se alimentam de rãs, e os cães também podem ficar contaminados ao
se alimentarem destes animais. Os treamtódeos novos migram através das várias
vísceras do hospedeiro definitivo antes de alcançarem o intestino delgado. Embora
sejam geralmente considerados como não patogênicos, um grande número de
trematódeos pode causar enterite. Estes trematódeos podem contaminar o ho-
mem. As infecções podem ser tratadas com bitionol, praziquantel, albendazol ou
niclosamida.
Outras espécies de trematódeos, geralmente não patogênicas, têm sido encon-
tradas ocasionalmente no intestino de cães, gatos e outros carnívoros; estas
incluem Heterophyes heterophyes em alguns países do norte da África e Ásia;
Metagonimus yokogawai na Ásia; Cryptocotyle lingua nos EUA, Canadá, Japão,
Sibéria e Europa; e Apophallus donicum na América do Norte e Europa Oriental.
Seus ciclos de vida incluem o caramujo como primeiro hospedeiro intermediário e
o peixe como segundo hospedeiro intermediário no qual as metacercárias ficam
encistadas.
Heterobilharzia americanum tem sido encontrada nas veias mesentéricas de
cães e animais selvagens no sudeste dos EUA. Os ovos espinhosos passam dos
tecidos do intestino ao lúmen e são eliminados com as fezes. Do caramujo, as
cercárias escapam para a água e penetram na pele de cães e outros hospedeiros
definitivos, migram para o fígado, alcançam maturidade, e movem-se para os vasos
mesentéricos. Granulomas em volta dos ovos são formados na parede do intestino
e outras partes do corpo. A enterite pode transformar-se em uma infecção grave.
“Dermatite aquosa”, às vezes, é provocada quando as cercárias penetram na pele.
Praziquantel pode ser eficaz para o tratamento.

Distomíase hepática
Trematódeos nos dutos e vesícula biliares causam fibrose discreta a severa.
Muitas espécies de trematódeos distomatódeos têm sido relatadas no fígado de
cães e gatos em muitas partes do mundo. Infecções suaves podem passar
despercebidas; porém, quando a infecção é grave, os cães podem desenvolver
fraqueza progressiva, terminando em completa exaustão, coma e morte. Os
seguintes são alguns destes trematódeos mais comumente encontrados.
Opisthorchis tenuicollis (felineus) é parasita dos dutos biliar e pancreático bem
como intestino delgado de cães e gatos na Europa Oriental e partes da Ásia. O.
viverrini ocorre em cães e também em gatos domésticos e selvagens no sudeste da
Dilatação-Vólvulo Gástricos 298

Ásia. Eles são pequenos (9 × 2mm) e alongados. Seu ciclo de vida inclui certas
lesmas (Bithynia sp) e certos peixes ciprinídeos como hospedeiros intermediários.
Uma espécie relatada, Clonorchis sinensis, o trematódeo do fígado do homem
oriental, também tem sido encontrada nos dutos biliar e pancreático de cães, gatos
e outros animais. Ela é maior que as Opisthorchis spp. Os ovos operculados destes
parasitas podem ser identificados nas fezes de animais contaminados.
A presença, por longo tempo, destes trematódeos no duto biliar causa espessa-
mento adenomatoso e fibrose de sua parede. Carcinomas do fígado ou pâncreas
têm sido observados nos casos crônicos e graves.
Platynosomum fastosum (conicum) é um pequeno trematódeo (6 × 2mm)
encontrado nos dutos biliares de felinos no sudoeste dos EUA, Porto Rico e outras
ilhas no Caribe, América do Sul, algumas ilhas do Pacífico e partes da África. Seu
ciclo de vida inclui o caramujo Sublima octona como hospedeiro intermediário e
certos lagartos como hospedeiro intermediário e certos lagartos como hospedeiros
paratênicos. Gatos adquirem o parasita ao se alimentarem de lagartos infectados.
Nos casos suaves, sinais crônicos vagos de debilidade podem ser observados.
Infecções graves, porém, podem causar a síndrome de “envenenamento pelo
lagarto” caracterizada por anorexia, vômito persistente, diarréia e icterícia, levando
à morte. Tratamentos com praziquantel e nitroscanato têm sido utilizados com
algum sucesso.
Metorchis albidus e M. conjunctus são dois trematódeos miúdos (5 × 1,5mm) que
têm sido encontrados nos dutos biliares e vesícula biliar de cães, gatos e outros
carnívoros na América do Norte, Europa e União Soviética. Raramente causam
quaisquer sinais clínicos reconhecíveis. O ciclo de vida inclui certas lesmas de água
corrente e peixes ciprinídeos como hospedeiros intermediários. Seus ovos são
pequenos (27 × 15µm).

GASTROENTERITE HEMORRÁGICA
É uma síndrome caracterizada por início agudo de vômitos, colapso, diarréia
sanguinolenta, curso rápido e morte dos animais não tratados.
Etiologia – A causa é desconhecida; no entanto, a cultura do conteúdo intestinal
dos cães afetados revelou grande número de Clostridium perfringens, o que sugere
que este microrganismo (ou suas toxinas) é a causa primária. Além disto, sintomas
clínicos semelhantes foram observados em modelos experimentais de choque
endotóxico, anafilaxia, e doença intestinal imunomediada em cães. Não há nenhu-
ma evidência direta de que estes mecanismos sejam operantes na gastroenterite
hemorrágica (GEH). As raças toy e miniatura estão predispostas, particularmente
schnauzers e poodles toy, apesar de todas as raças poderem ser afetadas.
Achados clínicos – Choque repentino, colapso parcial, vômitos e disenteria,
esta última freqüentemente com consistência de “geléia” e odor característico, são
os sintomas mais comuns. A temperatura retal é normal ou abaixo do normal. A dor
abdominal geralmente está ausente. A hemoconcentração não é refletida pela
perda de turgor cutâneo.
Os contrastes de bário podem passar vagarosamente, ou não passam; o abdome
em tais cães demonstra a existência de íleo paralítico no intestino delgado. O
aumento do hematócrito, da contagem de hemácias e da concentração de hemoglo-
bina é característico da doença. A contagem de leucócitos pode ser baixa, normal
ou elevada. Na maioria dos casos, a contagem de plaquetas é baixa ou abaixo do
normal. Um hematócrito >70% é sinal de doença grave.
Parvovirose 299

Diagnóstico – O diagnóstico é feito com base nos sinais clínicos e no aumento do


hematócrito. A infecção por parvovírus, corpo estranho GI, intussuscepção, vólvulo,
insuficiência adrenocortical e pancreatite aguda são os diagnósticos diferenciais.
Tratamento – A reposição agressiva de líquido é o ponto principal da terapia,
normalmente resultando em recuperação rápida. Deve ser administrada uma
solução balanceada de múltiplos eletrólitos, como a de lactato de Ringer, por via EV.
Nos casos graves, a velocidade de infusão deve ser de 90 mL/kg/h até que o tempo
de refil capilar retorne ao normal e o hematócrito seja <50%. Os fluidos EV são então
administrados em velocidades menores, conforme o necessário para manter o
hematócrito <50% e permitir circulação adequada. Os glicocorticóides, por exemplo,
succinato sódico de metilprednisolona ou fosfato sódico de dexametasona, podem
ser necessários para animais em choque hipovolêmico. Devem ser administrados
parenteralmente antibióticos eficazes contra bactérias aeróbicas e anaeróbicas. Se
os vômitos forem intensos, um antiemético, como a metoclopramida, pode ser útil.
A comida e a água são suspensas até que os vômitos e diarréia tenham cessado.
Pode-se então fornecer pequenas quantidades de comida leve.

DOENÇAS ENTÉRICAS DO
RECÉM-NASCIDO
Embora o gatinho e o cachorrinho obtenham uma pequena porção de sua
imunidade materna transferida transplacentariamente, o colostro é a fonte mais
importante. Contanto que os filhotes mamem, tão logo seja possível após o
nascimento e certamente em 8h de idade, a doença entérica neonatal infecciosa, em
geral, não constitui um problema. Porém, uma reação ao leite da mãe, ou a
quaisquer agentes terapêuticos que esta recebeu e que são eliminados no leite,
pode causar diarréia. Antibióticos eliminados no leite da mãe podem afetar adver-
samente o desenvolvimento normal da microflora intestinal do recém-nascido. A
maioria dos casos de diarréia responde à terapia de suporte com fluidos e eletrólitos.
Os antibióticos (ampicilina, trimetoprim/sulfa, cefalotina) devem ser administrados
parenteralmente nos casos de diarréia sanguinolenta, pois a barreira sangue-
mucosa pode estar rompida, havendo risco de que a infecção se torne sistêmica.

PARVOVIROSE
Trata-se de uma enterite de início agudo, com morbidade e mortalidade variáveis,
causada por um parvovírus que foi reconhecido inicialmente em 1978; hoje é
encontrado em todo o mundo. Apesar de cães de todas as idades serem afetados,
os filhotes parecem ser mais suscetíveis. Apenas os membros da Canidae (cães,
lobos, coiotes) são sabidamente suscetíveis à infecção natural.
Etiologia e patogenia – O parvovírus canino, um vírus DNA de fita única não
envolto, é intimamente relacionado ao vírus da panleucopenia felina, vírus da
enterite do visom, e parvovírus do raccoon. Uma solução de hipocloreto de sódio
(água sanitária) é um desinfetante eficaz após o material orgânico, como fezes, ter
sido removido, porém o vírus é bastante resistente no ambiente; ele permanece
viável fora do hospedeiro por anos. A ingestão de material fecal de animais
Parvovirose 300

infectados é a principal rota de infecção. Os cães infectados eliminam o vírus nas


fezes por , 2 semanas.
Após a ingestão, as criptas tonsilares e as placas de Peyer são infectadas primeiro,
seguidas por uma viremia e infecção das criptas intestinais. O colapso dos vilos
intestinais é o resultado da necrose das células das criptas. Pode ocorrer morte por
desidratação, desequilíbrio eletrolítico, choque endotóxico, ou septicemia secundária.
Achados clínicos – O parvovírus canino produz 2 formas diferentes de doença:
miocardite e enterite. A miocardite com morte súbita em filhotes predominantemente
de 4 a 8 semanas de idade era observada comumente quando a infecção surgiu; as
cadelas imunes e os anticorpos maternos nos cães recém-nascidos previnem esta
forma de doença hoje em dia. A incidência de enterite foi grandemente reduzida, mas
ela ainda ocorre. A morte é infreqüente, mas a mortalidade entre filhotes de 8 a 12
semanas pode ser bastante alta. O período de incubação é de 5 a 11 dias. Anorexia,
letargia e desidratação rápida são outros sintomas. O vômito é muitas vezes o sintoma
inicial, podendo ser intenso e prolongado. A diarréia é geralmente observada em 24
a 48h. As fezes são manchadas com sangue ou francamente hemorrágicas, perma-
necendo liquefeitas até a recuperação ou morte. Alguns cães apresentam febre,
especialmente na fase inicial da doença. A linfopenia, mas nem sempre a leucopenia,
pode ser observada na maioria dos cães afetados. Uma morte súbita “semelhante ao
choque” pode ocorrer precocemente, apenas 2 dias após o início da doença. A doença
prolongada é incomum. Os cães morrem ou recuperam-se rapidamente.
Lesões – O intestino delgado é o principal afetado. A congestão intestinal é
variável, apesar de que, em filhotes novos, o intestino pode estar branco. Os
intestinos estão espessados ou inelásticos, e a superfície serosa possui uma
aparência granular. A mucosa está em mau estado, e o conteúdo é líquido com
flóculos de debris epiteliais ou sangue vivo. Há atrofia do timo.
Na forma miocárdica da doença, o edema pulmonar é o principal achado. A
microscopia revela um diagnóstico de miocardite com perda de fibras, edema e
inclusões basofílicas intranucleares. Infiltração linfocítica considerável e fibrose são
observadas nos casos crônicos.
Diagnóstico – Vômitos, diarréia hemorrágica, aumento da temperatura, e
linfopenia não são exclusivos da enterite por parvovírus. O isolamento do vírus nas
fezes ou a demonstração do vírus por microscopia eletrônica confirmam o diagnós-
tico. Na necropsia, a necrose das células das criptas, dilatação das criptas, colapso
dos vilos intestinais e inclusões intranucleares (nem sempre presentes) confirmam
o diagnóstico. A demonstração de IgM vírus-específica no soro indica infecção por
parvovírus em cães que não foram vacinados nas 3 últimas semanas.
Tratamento – O cuidado intensivo imediato, incluindo fluidoterapia, atropina, e
antibióticos, tem obtido sucesso. O tratamento pode ter de prosseguir por 72h. A via
EV é a preferida para a fluidoterapia. Nos casos graves, pode ser necessária a
suplementação com potássio e bicarbonato.
Profilaxia –Estão disponíveis vacinas com parvovírus canino modificado, vírus
da panleucopenia felina e parvovírus canino inativado. Todas protegem os cães da
doença se os anticorpos maternos não impedirem a imunização; no entanto, nem
todos os cães ficam imunes com o parvovírus felino modificado a menos que o título
de vírus na vacina seja extremamente alto. Os cães mais velhos respondem menos
à vacinação com parvovírus que os animais jovens em crescimento.
Os filhotes com baixos níveis de anticorpos maternos são suscetíveis ao vírus
virulento, apesar de não responderem ao vírus da vacina. Como um período de
suscetibilidade não pode ser evitado, os cães desmamados devem ser vacinados
a cada 2 a 3 semanas até as 18 semanas de idade. A revacinação anual é
recomendada para todos os cães.
Os cães doentes devem ser mantidos em isolamento.
Doenças Salivares, Pq An 301

DOENÇAS SALIVARES, PQ AN
PTIALISMO
(Sialose)
Trata-se da hipersecreção de saliva caracterizada por baba profusa. O
pseudoptialismo ocorre quando há uma quantidade normal de saliva, mas um
aumento da baba devido à disfagia. O ptialismo e o pseudoptialismo serão
discutidos em conjunto como ptialismo.
O ptialismo pode resultar de: 1. drogas, por exemplo, organofosfatos ou venenos;
2. irritação ou inflamação local associada a estomatite, glossite (especialmente em
gatos), corpos estranhos ou neoplasmas orais, lesões, ou outros defeitos da
mucosa; 3. doenças infecciosas, por exemplo, raiva, forma nervosa da cinomose,
ou outros distúrbios convulsivos; 4. enjôo de movimento, medo, nervosismo e
excitação; 5. relutância a engolir devido a irritação do esôfago ou estimulação dos
receptores GI com gastrite ou enterite; 6. mucocele salivar sublingual; 7. amigdalite;
8. administração de medicamentos em algumas espécies (especialmente gatos); 9.
defeitos de conformação; 10. distúrbios metabólicos, por exemplo, encefalopatia
hepática, uremia; 11. abscessos ou outro bloqueio inflamatório ou distúrbio da
glândula salivar.
A possibilidade de raiva deve ser eliminada antes do exame.
A causa subjacente, local ou sistêmica, deve ser determinada e tratada. Para o
tratamento de envenenamentos, ver TOXICOLOGIA, página 1979. Para tratar estomatites
e glossites, ver DOENÇAS DA BOCA, PQ AN, pág.150. Os sedativos, drogas antienjôo
de movimento, ou tranqüilizantes podem ser úteis nos distúrbios reflexos e nervo-
sos. Se necessário, um agente anticolinérgico pode ser administrado para suprimir
a salivação até que a causa seja determinada.
Uma dermatite úmida e aguda dos lábios e face pode-se desenvolver se a pele
não for mantida tão seca quanto possível. A limpeza com uma solução diluída de
clorexidina pode ser útil. Se uma piodermia superficial (ver, pág. 1003) se desen-
volver, pode ser aplicado um creme antibiótico tópico.

FÍSTULA SALIVAR
É um problema raro seguindo trauma das glândulas mandibular, zigomática ou
salivares sublinguais. Os ferimentos da glândula parótida são mais prováveis a
desenvolver uma fístula. Um trato drenante descarregando saliva das glândulas é
causado mais comumente por uma ferida que penetra a glândula, ruptura espontânea
de abcessos da glândula ou cirurgia anterior na área com ruptura iatrogênica. As
fístulas da glândula parótida podem ocorrer seguindo uma ressecção da orelha
lateral. O fluxo constante de saliva previne a cicatrização e desenvolve-se uma fístula.
O histórico de lesão na área da glândula, a localização da fístula e a natureza da
descarga são característicos. Uma fístula salivar deve ser diferenciada de um seio
de drenagem (devido à penetração de um corpo estranho) na região do pescoço ou
de seios originários de defeitos congênitos.
A completa remoção cirúrgica da glândula e do trato fistuloso é o único tratamento
satisfatório.

TUMORES DAS GLÂNDULAS SALIVARES


São raros em cães e gatos, não havendo predileção por raça ou sexo; a maioria
ocorre em animais ≥ 10 anos de idade. A maior parte é maligna, sendo que o
adenocarcinoma ocorre com maior freqüência.
Doenças Salivares, Pq An 302

A metástase para os linfonodos regionais é comum, e a recidiva local após a


excisão cirúrgica é alta. A radiação possivelmente seria uma terapia auxiliar eficaz.

MUCOCELE SALIVAR
(Sialocele)
Trata-se de um acúmulo de saliva mucóide no interior do tecido, que foi formado
após dano ao duto ou glândula salivar. Este é o problema mais comum nas glândulas
salivares de cães e gatos. Apesar de qualquer glândula salivar poder ser afetada,
a glândula sublingual é mais comumente envolvida. Normalmente a saliva é
coletada na região intermandibular ou cervical cranial (mucocele cervical). Pode
também ser coletada nos tecidos sublinguais ou no assoalho da boca (rânula). Um
local menos comum é a parede faríngea.
A causa pode ser bloqueio traumático ou inflamatório, ou ruptura do duto das
glândulas salivares sublingual, mandibular, parótida ou zigomática. Normalmente a
causa não é determinada.
Os sintomas dependem do local de acúmulo da saliva. Na fase aguda de uma
mucocele cervical, a área está inchada e dolorida. Freqüentemente este estágio não
é observado pelo proprietário, e o primeiro sintoma notado pode ser uma massa
flutuante não dolorosa, que aumenta lentamente na região cervical. Uma rânula
pode não ser observada até que seja traumatizada e sangre. Uma mucocele
faríngea pode obstruir as vias aéreas resultando em desconforto respiratório que
varia de moderado a intenso.
Uma mucocele é detectável como uma massa macia, flutuante e indolor que deve
ser diferenciada de abscessos, tumores e outros cistos de retenção do pescoço. A
dor e a febre podem estar presentes se a mucocele tornar-se infectada. Uma
mucocele salivar geralmente pode ser diagnosticada por palpação e aspiração da
saliva dourada, ou tinta de sangue, característica. Normalmente, a palpação
cuidadosa, com o animal em decúbito dorsal, pode determinar o lado afetado; se
não, a sialografia pode ser útil.
A cirurgia é recomendada para remover a glândula salivar afetada e seu duto, o
que geralmente compreende a remoção do complexo glandular mandibular-
sublingual. As mucoceles cervicais podem ser tratadas com drenagem periódica, se
a cirurgia não for uma opção possível. A drenagem, marsupialização, ou remoção
da glândula têm sido recomendadas para o tratamento de rânulas e mucoceles
faríngeas.

SIALADENITE
(Inflamação da glândula salivar)
A inflamação aguda ou crônica da glândula salivar pode estar associada a
formação de mucocele ou abscessos da cabeça e pescoço. Pode também ocorrer
como uma entidade em separado.
A causa pode ser trauma, geralmente por feridas penetrantes como mordidas, ou
infecção da glândula salivar ou tecido circundante. A sialadenite como componente
de doenças sistêmicas foi relatada na raiva, cinomose, e com o paramixovírus que
causa caxumba em humanos.
Os sintomas incluem febre, depressão e glândulas salivares inchadas e dolori-
das. A ruptura de uma glândula abscedada descarrega pus no tecido circundante ou
na boca. A ruptura através da pele pode provocar a formação de uma fístula salivar.
O inchaço da glândula parótida é mais proeminente abaixo da orelha, o inchaço da
glândula mandibular ocorre no ângulo da mandíbula e o inchaço da glândula
zigomática é imediatamente caudal ao olho. O comprometimento da glândula
Obstrução do Intestino Delgado, Pq An 303

zigomática pode resultar em inchaço retrobulbar, estrabismo divergente do olho


afetado, exoftalmia, lacrimejamento excessivo e relutância a abrir a boca ou comer.
Os abcessos das glândulas zigomática e parótida são agudamente doloridos; o
animal pode manter sua cabeça rígida e ressentir qualquer manipulação envolvendo
a cabeça ou pescoço.
As radiografias e os exames laboratoriais geralmente não são úteis, apesar de
a avaliação do líquido em um abscesso por vezes levar ao diagnóstico. A histopa-
tologia do tecido glandular da saliva pode revelar alterações inflamatórias agudas
ou crônicas ou necrose.
A sialadenite leve não exige tratamento, havendo normalmente uma recupera-
ção rápida e completa. Um abscesso desenvolvido deve ser drenado através da pele
que o cobre ou, se envolve a glândula zigomática, drenado atrás do último molar
superior do lado afetado. Devem ser administrados antibióticos sistêmicos.
A não resolução ou a recidiva implicam na necessidade de remoção cirúrgica da
glândula afetada.

XEROSTOMIA
(Aptialismo)
É uma secreção salivar diminuída, caracterizada por boca seca; incomum em
cães e gatos.
Secreção salivar diminuída pode resultar da utilização de certas drogas (por
exemplo, atropina), de extrema desidratação, de pirexia ou anestesia. É observada
em alguns cães com ceratoconjuntivite seca e pode ser imunomediada. Ocasional-
mente, a secreção salivar diminuída é devida a doenças da glândula salivar.
A determinação e tratamento de qualquer causa primária é de suma importância.
Colutórios fisiologicamente balanceados aliviam o desconforto que resulta da
xerostomia. Líquidos podem ser administrados para corrigir a desidratação, se
presente.

OBSTRUÇÃO DO INTESTINO DELGADO,


PQ AN
Etiologia – A obstrução parcial ou completa do intestino delgado pode ser causada
por material estranho indigerível, massas de parasitas, aderências pós-operatórias,
neoplasias, granulomas e abscessos. Além disso, vólvulo, intussuscepção e encar-
ceramento da hérnia podem causar obstrução completa do intestino delgado e
oclusão de sua integridade vascular. A paralisia ou estase de um segmento do
intestino delgado, provocada por peritonite local ou generalizada, enterite ou pancrea-
tite, ou após laparotomia, pode causar sintomas de obstrução intestinal.
O vólvulo mesentérico é raro nos pequenos animais enquanto a intussuscep-
ção é mais freqüente, particularmente nos animais jovens que sofrem de enterite
aguda ou forte infecção parasitária. A intussuscepção ocorre comumente no jejuno
ou íleo proximal, ou na junção ileocecal. A ingestão de corpos estranhos é mais
comum em cães e gatos jovens, mas pode ocorrer em qualquer idade. Brinquedos,
bolas de borracha, pedras, ossos, pano, anzóis e agulhas são ingeridos com
freqüência. Os gatos ingerem especialmente corpos estranhos lineares (por exem-
plo, barbante). Eles também podem ingerir grande quantidade de pêlos, que podem
formar uma massa no estômago ou intestinos.
Obstrução do Intestino Delgado, Pq An 304

Achados clínicos – Os sintomas de obstrução por corpo estranho são extrema-


mente variáveis. Alguns animais podem vomitar intermitentemente, com apetite
normal e pouca ou nenhuma perda de peso. Os corpos estranhos (dependendo das
suas características de superfície e tamanho) podem causar gastrite aguda ou
obstrução do esvaziamento gástrico, com vômitos freqüentes não associados à
alimentação, ou vômitos várias horas após a refeição. As bolas de pêlo (tricobezoares)
no estômago dos gatos podem causar ânsia e engasgos, vômitos, inapetência e
perda da condição física. Os sintomas dos corpos estranhos intestinais dependem
da localização, duração e extensão da obstrução; os mais consistentes são vômitos,
depressão e anorexia. A distensão abdominal, diarréia e dor abdominal também
podem ocorrer. Freqüentemente, o objeto estranho pode ser delineado ou a
intussuscepção típica “com formato de salsicha” pode ser palpada. Os sintomas de
obstrução duodenal completa são náusea, vômitos de bile, dor abdominal, anorexia,
desidratação e fraqueza. A perda de água e eletrólitos é rápida. A ruptura intestinal,
peritonite e choque endotóxico são complicações da obstrução do intestino delgado.
A obstrução no intestino delgado distal pode ser tolerada por mais tempo que a
obstrução proximal. O vômito é semelhante às fezes e o começo da desidratação
e fraqueza pode ser retardado. A distensão abdominal desenvolve-se devagar. As
alças intestinais cheias de gás e fluído ou uma massa abdominal mole podem ser
palpadas.
A obstrução intestinal parcial causa sinais prolongados ou intermitentes, pareci-
dos com os da obstrução do intestino delgado distal. O animal apresenta consumo
de comida e água reduzido e perda de peso crônica, contudo permanece ativo. As
fezes são reduzidas em volume, líquidas, sanguinolentas e pútridas. Uma resposta
temporária à terapia antibiótica prévia já foi notada.
Diagnóstico – Um histórico de mastigação de objetos estranhos, anorexia,
vômito, desidratação e palpação das alças intestinais dilatadas ou com objetos
estranhos sugere a obstrução intestinal. Se a tensão abdominal prevenir a palpação,
um relaxamento suficiente pode ser conseguido pela aplicação de meperidina. Sons
peristálticos normais podem ser não auscultados, mas borborigmos podem ser
ouvidos nas alças intestinais dilatadas. Radiograficamente, objetos estranhos
radiopacos, alças intestinais vazias e dilatadas por gás, ou fluido com gás em
diferentes níveis do intestino dilatado são vistos antes da obstrução. O aumento da
densidade dos tecidos moles da intussuscepção pode ser visto nas radiografias
abdominais. Corpos estranhos radioluminescentes podem ser demonstrados por
meio de radiografias contrastadas com bário. A endoscopia é um excelente método
para confirmar a presença de um corpo estranho gástrico.
Tratamento – A obstrução intestinal pode ser uma emergência cirúrgica. A
apomorfina pode ser administrada em alguns casos selecionados para induzir o
vômito de pequenos corpos estranhos lisos, porém o vômito não deve ser induzido
se há uma chance de o corpo estranho lacerar, perfurar ou obstruir o esôfago.
Pequenos objetos podem, algumas vezes, ser removidos durante a endoscopia,
com auxílio de fórceps ou laçadas; deve-se ter cuidado para evitar lesar o esôfago.
Pequenos objetos pontiagudos, como agulhas, alfinetes ou tachinhas, podem
passar com segurança através do trato GI. Se esta abordagem for escolhida, o
animal deve ser cuidadosamente observado além de receber uma dieta rica em
fibras e lubrificantes. Os corpos estranhos intestinais, especialmente se não
eliminados em 48h, normalmente exigem remoção cirúrgica. A remoção cirúrgica de
corpos estranhos gástricos será necessária se eles não forem eliminados ou não
puderem ser removidos durante a gastroscopia. A fluidoterapia e a correção dos
desequilíbrios eletrolítico e ácido-básico devem ser feitas antes da cirurgia.
O tratamento médico inclui a meperidina para aliviar a dor e a administração de
fluidos e eletrólitos EV antes e durante a cirurgia. Os desequilíbrios eletrolíticos e
Obstrução do Intestino Delgado, Pq An 305

ácido-básicos não são previsíveis, sendo recomendados os exames laboratoriais


apropriados. Se as informações sobre os gases sangüíneos e o pH não estiverem
disponíveis, deve ser administrada uma solução eletrolítica balanceada com antibió-
ticos EV de amplo espectro, continuando-se pós-operatoriamente. Quando coexiste
um choque circulatório, pode ser necessária a administração de sangue completo
ou plasma. Os líquidos orais e uma dieta de baixo resíduo são introduzidos
gradualmente após 1 a 3 dias; uma dieta normal pode ser oferecida após 5 a 7 dias.
As bolas de pêlo nos gatos geralmente são eliminadas com as fezes após a
administração de petrolato ou outro produto à base de petróleo; podem ser
necessários 2 a 3 dias de tratamento. A remoção cirúrgica raramente é necessária.
SISTEMA ENDÓCRINO
SISTEMA ENDÓCRINO, INTRODUÇÃO ...................................................... 307
Tipos de Hormônios ........................................................................... 308
Lesões Proliferativas em Glândulas Endócrinas ............................... 308
Mecanismos das Doenças Endócrinas .............................................. 309
GLÂNDULAS ADRENAIS ............................................................................. 314
Córtex Adrenal ......................................................................................... 314
Hiperadrenocorticismo ....................................................................... 315
Hipoadrenocorticismo ........................................................................ 319
Medula Adrenal ........................................................................................ 321
GÔNADAS (ver REP) .................................................................................... 775
PÂNCREAS ................................................................................................... 321
Diabetes Melito .................................................................................. 323
Tumores Funcionais das Células da Ilhota ........................................ 325
Tumores Secretores de Gastrina das Células Não β
da Ilhota ....................................................................................... 326
GLÂNDULAS PARATIREÓIDES .................................................................. 327
Hormônios Reguladores de Cálcio .................................................... 328
Hormônio Paratireóideo ............................................................... 328
Calcitonina ................................................................................... 328
Colecalciferol (Vitamina D) .......................................................... 329
HIPÓFISE ...................................................................................................... 329
Tumores Secretores de ACTH Associados ao
Hipercortisolismo .......................................................................... 331
Tumores Hipofisários Não Funcionais ............................................... 332
Hirsutismo Associado a Adenomas da Pars Intermedia .................... 332
Pan-hipopituitarismo do Adulto .......................................................... 333
Pan-hipopituitarismo Juvenil .............................................................. 334
Diabetes Insípido ............................................................................... 335
TIREÓIDE ...................................................................................................... 337
Hipotireoidismo .................................................................................. 338
Aumento Não Neoplásico da Glândula Tireóide (Bócio) ............. 341
Hipertireoidismo ................................................................................. 342
HIPERCALCEMIA HUMORAL MALIGNA .................................................... 343
TUMORES DE TECIDOS NEUROENDÓCRINOS ........................................ 346

SISTEMA ENDÓCRINO, INTRODUÇÃO


Glândulas endócrinas são coleções de células especializadas na síntese,
armazenamento e liberação de suas secreções diretamente na corrente sangüínea.
Elas captam e emitem sinais por dispositivos que estão localizados no fluido
extracelular e são capazes de, respondendo às mudanças dos meios interno e
externo, coordenar atividades que mantêm a homeostasia. As secreções endócri-
nas são proteínas, esteróides, peptídeos, catecolaminas ou hormônios de iodotironina
Sistema Endócrino, Introdução 308

que são transportados pelo sangue para influenciar a atividade funcional das
células-alvo em outro local do corpo. Outras populações de células preocupam-se
com a degradação do hormônio, depois de este ter exercido suas funções fisiológi-
cas. A degradação é realizada pelas peptidases da superfície da célula por meio das
enzimas dos lisossomos, depois de serem englobados pelas células, ou pela
excreção na bile ou urina, após a conjugação com glicuronídio ou sulfato.
As glândulas endócrinas são pequenas quando comparadas a outros órgãos do
corpo; são ricamente supridas pelo sangue e existe uma relação anatômica muito
íntima entre as células endócrinas e a rede de capilares.

TIPOS DE HORMÔNIOS
Hormônios polipeptídeos – O sítio primário de ação para os hormônios
polipeptídeos é a superfície externa da membrana plasmática das células-alvo, que
contêm receptores proteicos para o hormônio. Esses hormônios são hidrossolú-
veis, têm uma meia-vida curta no sangue (usualmente medida em minutos) e
geralmente não possuem proteínas carreadoras específicas no plasma. Os hormô-
nios receptores realizam 2 funções-chave: 1. eles reconhecem as diminutas quan-
tidades de hormônio ativo, ligando-o ao sítio receptor para formar um complexo
hormônio-receptor reversível; e 2. eles carregam a mensagem para o interior da
célula-alvo. A magnitude deste sinal depende da concentração do hormônio, da afi-
nidade do receptor para com este e da concentração de receptores na célula-alvo.
Uma vez atingido o receptor, os hormônios polipeptídeos transmitem o seu sinal
através da membrana celular e causam uma segunda mensagem, freqüentemente
um monofosfato de adenosina cíclica (AMPc), para ser liberada no interior da célula.
Esta segunda mensagem geralmente tem efeitos únicos para a célula, pois as
células-alvo têm funções muito específicas.
Células que produzem hormônio polipeptídeo têm um retículo endoplasmático
bem desenvolvido com muitos ribossomos fixos onde o hormônio se une, e um
proeminente complexo de Golgi para estocá-los dentro de grânulos para armazena-
mento intracelular e transporte. Grânulos secretórios são únicos para hormônios
polipeptídeos e para células endócrinas secretoras de catecolaminas e são munidos
de um mecanismo para armazenamento intracelular de quantidades substanciais
de hormônio ativo pré-formado. O hormônio sintetizado em excesso pelo organismo
é degradado pela fusão dos grânulos que contêm hormônios com os lisossomos.
Hormônios esteróides – Células secretoras de hormônio esteróide são carac-
terizadas pela presença de corpúsculos lipídicos no citoplasma, que contêm co-
lesterol e outras moléculas precursoras. Uma biossíntese contínua é necessária
para manter a taxa de secreção de hormônios esteróides normal.
Hormônios esteróides têm uma meia-vida longa no sangue (tipicamente medida
em horas) e alta afinidade por ligações reversíveis, ligando-se a proteínas especí-
ficas no plasma. Eles são lipossolúveis, o que facilita o seu transporte através da
membrana celular; seu sítio primário de ação é o núcleo das células-alvo.
Catecolaminas e iodotironina – Esses hormônios são derivados de tirosina.
Eles incluem as catecolaminas (adrenalina, noradrenalina) secretadas pela medula
adrenal e as iodotironinas (tireoxina, triiodotironina) produzidas pela glândula
tireóide. As catecolaminas apresentam mecanismos de ação similares aos dos
hormônios polipeptídeos, enquanto as iodotironinas têm características mais inti-
mamente parecidas com as dos hormônios esteróides.

LESÕES PROLIFERATIVAS EM GLÂNDULAS ENDÓCRINAS


As neoplasias derivadas de células endócrinas secretoras de hormônio usual-
mente são constituídas de um tipo celular predominante e podem estar associadas
Sistema Endócrino, Introdução 309

à hipersecreção de um ou mais hormônios. Entretanto, investigações imunocitoquí-


micas e de microscopia eletrônica sugerem que alguns tumores endócrinos sejam
compostos por mais de um tipo de célula neoplásica e sejam capazes de sintetizar
múltiplos hormônios.
A classificação histológica entre hiperplasia focal (nodular), adenoma ou carci-
noma freqüentemente é difícil nas glândulas endócrinas, uma vez que em muitas
(especialmente células C da tireóide, células secretoras da medula adrenal e célu-
las secretoras de hormônios específicos tróficos da adeno-hipófise) parece haver
um espectro contínuo de lesões proliferativas entre hiperplasia difusa ou focal e
adenomas derivados de uma população específica de células. A estimulação
prolongada de uma população de células endócrinas secretoras parece predispor
a um desenvolvimento subseqüente de uma incidência mais alta que a esperada dos
tumores. A estimulação por um longo tempo pode levar ao desenvolvimento de
clones de células dentro das glândulas endócrinas hiperplásicas, as quais crescem
mais rapidamente que o resto e são mais suscetíveis à transformação neoplásica
quando expostas a combinações certas de carcinógenos ou são mais provavelmen-
te suscetíveis a mutações espontâneas.
Muitas neoplasias derivadas de glândulas endócrinas são funcionalmente
ativas, secretam uma excessiva quantidade de hormônio, contínua ou esporadica-
mente, e causam dramáticas síndromes clínicas por excesso de hormônio. Exem-
plos clássicos incluem a hipoglicemia por neoplasias das ilhotas pancreáticas
secretoras de insulina em cães, hipertireoidismo associado a adenomas e hiper-
plasia nodular derivada das células foliculares da tireóide em gatos, hipercalcito-
ninismo em touros com tumores das células C da tireóide e hipercortisolismo asso-
ciado tanto a adenomas secretores de ACTH (hormônio adrenocorticotrófico) da
glândula hipófise quanto a neoplasias do córtex adrenal em cães. A quantificação
dos níveis de hormônio no soro ou plasma no estado basal, suprimido ou estimulado,
e a mensuração dos metabólitos hormonais na urina, por um período de 24h de
excreção, são essenciais para confirmar se um tumor endócrino é funcional.

MECANISMOS DAS DOENÇAS ENDÓCRINAS


Distúrbios do sistema endócrino são encontrados em muitas espécies animais e
representam problemas diagnósticos desafiadores. Os exemplos que se seguem
são os principais mecanismos responsáveis pelos distúrbios da função endócrina
que resultam em doenças clinicamente importantes nos animais. Para cada catego-
ria, inúmeras doenças problemáticas específicas são usadas para ilustrar a respos-
ta de uma glândula endócrina particular ao rompimento da função.
Muitas doenças do sistema endócrino são caracterizadas por distúrbios funcionais
dramáticos e alterações clinicopatológicas características que afetam um ou vários
sistemas orgânicos. Estas alterações podem envolver primariamente a pele (perda do
pêlo causada pelo hipotireoidismo), sistema nervoso (convulsões causadas pelo
hiperinsulinismo), sistema urinário (poliúria causada por diabetes melito, diabetes
insípido ou hipercortisolismo) ou sistema esquelético (fraturas induzidas por hiperpa-
ratireoidismo ou hipercortisolismo). Se o problema endócrino básico for reconhecido
logo no início do curso da doença, ele é freqüentemente amenizado ou pela remoção
cirúrgica da fonte do excesso de produção do hormônio ou pela suplementação do
hormônio específico secretado em quantidades inadequadas pela glândula doente.
Hiperfunção primária de uma glândula endócrina – É um dos mecanismos
patológicos mais importantes e comuns. A neoplasia derivada de células endócrinas
freqüentemente sintetiza e secreta hormônio autonomamente em quantidade
excessiva em relação à capacidade do organismo para utilizá-lo e subseqüente-
mente degradá-lo, resultando, desse modo, em distúrbios funcionais de excesso de
Sistema Endócrino, Introdução 310

hormônio. Inúmeros exemplos que ocorrem em diferentes espécies animais estão


resumidos na TABELA 1, adiante.
A secreção autônoma do hormônio paratireóideo (PTH) resulta numa progressiva
e generalizada desmineralização do esqueleto, levando à hipercalcemia, a qual
resulta em mineralização de tecido mole e desenvolvimento de cálculos renais. A
reabsorção osteoclástica acelerada dos ossos resulta num marcado adelgaçamen-
to e passagem osteoclástica do osso cortical e predispõe o osso a fraturas patoló-
gicas.
A hipersecreção autônoma de tireoxina(T4) e triiodotironina (T3) está sendo
observada com freqüência crescente em gatos (ver HIPERTIREOIDISMO, pág. 342) e é
associada a uma grande quantidade de lesões proliferativas das células foliculares.
Lesões funcionais da tireóide em gatos são potencialmente malignas porque uma
baixa porcentagem de adenocarcinomas pode metastatizar para linfonodos regio-
nais.
Os distúrbios funcionais de hiperatividade, perda de peso apesar do aumento de
apetite, hipertermia e taquicardia refletem estimulação crônica de múltiplas popula-
ções de células-alvo pelos níveis sangüíneos dos hormônios da tireóide anormal-
mente elevados.
Hiperfunção secundária de uma glândula endócrina – Uma lesão em um
órgão resulta na secreção excessiva de hormônio trófico que leva a estimulação
crônica e hipersecreção de hormônio pelo órgão endócrino-alvo. O clássico exem-
plo é o tumor secretor de ACTH derivado dos corticotrofos hipofisários em cães
(ver pág. 331). Os sinais clínicos e lesões no animal resultam primariamente de
elevados níveis de cortisol sangüíneo associados a hipertrofia estimulada pelo
ACTH e hiperplasia do córtex adrenal. A síndrome do excesso de cortisol em cães
é caracterizada por alopecia progressiva, hiperpigmentação e fraqueza muscular
causada pelos efeitos catabólicos proteicos dos glicocorticóides. Em alguns cães,
particularmente poodles, que apresentam um aumento adrenocortical acentuado

TABELA 1 – Exemplos de Hiperfunção Primária das Glândulas Endócrinas


Hormônio Animal mais Principais lesões
Enfermidade secretado em freqüentemente ou distúrbios
excesso afetado funcionais
Adenoma ou carcinoma Hormônio Cão Osteíte fibrosa
das células principais paratireóideo generalizada
Adenoma ou carcinoma Calcitonina Touro Osteosclerose
de células C da tireóide vertebral
Adenoma ou carcinoma Insulina Cão Hipoglicemia
das células β (ilhotas
pancreáticas)
Tumor das células de Estrogênios Cão Feminização do
Sertoli (testículos) macho
Feocromocitoma Noradrenalina, Cão Hipertensão,
(medula adrenal) adrenalina hiperglicemia
Adenoma de célula folicu- Tireoxina, Gato Aumento da taxa
lar ou hiperplasia multi- triiodotironina metabólica,
nodular tireóideos perda de peso
Adenoma ou carcinoma Cortisol Cão Síndrome de
adrenocortical Cushing
Sistema Endócrino, Introdução 311

similar e evidências clínicas de excesso de cortisol, não existe a evidência de um


tumor na glândula hipófise. Estes cães parecem sofrer uma mudança na tendência
característica do sinal do “feedback” negativo (cortisol sangüíneo). Isto pode ser
causado por um acúmulo anormal de certas substâncias neurotransmissoras pró-
ximo aos neurônios no hipotálamo que secretam fator liberador de hormônio cor-
ticotrófico. O resultado final é a hiperplasia corticotrófica, elevados níveis de ACTH
no sangue e estimulação crônica do córtex adrenal, que acarreta a hiperplasia do
último e a síndrome clínica do excesso de cortisol.
Hipofunção primária de uma glândula endócrina – A secreção de hormônio é
subnormal devido à extensiva destruição das células secretoras pelo processo pato-
lógico, à deficiência de uma glândula endócrina para se desenvolver adequadamente,
ou ao resultado de um defeito bioquímico específico na síntese do hormônio.
A lesão imunomediada causa hipofunção de inúmeras glândulas endócrinas em
animais, incluindo a paratireóide, córtex adrenal e tireóide. A tireoidite causada por
esse mecanismo é caracterizada por uma considerável infiltração de linfócitos e
plasmócitos, e deposição de complexos imunes eletrodensos ao longo das membra-
nas basais foliculares com progressiva destruição do parênquima secretório (ver
DOENÇAS ENVOLVENDO IMUNOCOMPLEXOS, pág. 520).
A deficiência no desenvolvimento também resulta numa hipofunção primária de
uma glândula endócrina. Em animais, o exemplo clássico desse mecanismo é a
falha do ectoderma orofaríngeo para diferenciar-se completamente em células
tróficas secretoras de hormônio da adeno-hipófise em cães, resultando num
nanismo hipofisário e numa falha na maturação somática. Nesses cães, um cisto
grande e multicompartimentado está presente na porção ventral do cérebro na
região hipofisária. O cisto comprime a neuro-hipófise normalmente desenvolvida e
resulta num distúrbio do metabolismo hídrico (ver também HIPÓFISE, pág. 329).
Outra forma de hipofunção primária é a deficiência da síntese de hormônio
causada por um defeito determinado geneticamente no mecanismo biossintético ou
perda de uma enzima específica. Um exemplo bem documentado desta condição
em animais é o raquitismo dependente de vitamina D em suínos. Ele é causado pela
falta de uma enzima nos túbulos contornados proximais do rim, que é necessária
para sintetizar a forma hormonal da vitamina D. Os níveis sangüíneos de cálcio e
fósforo diminuem progressivamente devido à habilidade subnormal dos suínos
para produzir a forma hormonal biologicamente ativa da vitamina D (1,25-diidroxico-
lecalciferol) no rim. As reduzidas concentrações sangüíneas de cálcio e fósforo
levam a uma falha na mineralização de osteóide, crescimento de cartilagem nas
fises e severas deformações esqueléticas associadas.
O bócio disormonogenético congênito em ovinos, caprinos e bovinos é outro
exemplo de hipofunção primária causada pela falha de síntese hormonal. Os
baixos níveis de T3 e T4 e a evidência clínica de hipotireoidismo severo nesses
animais são devidos a uma inabilidade das células foliculares para sintetizar
tireoglobulina. O defeito molecular é devido a um defeito no processamento da
mensagem do ácido ribonucléico (RNAm) na transmissão primária da tireoglobulina
e transporte anormal do RNAm do núcleo para os ribossomos. Isso resulta numa
quantidade subnormal de tireoglobulina RNAm em células foliculares, particular-
mente o RNAm que é ligado às membranas endoplasmáticas do retículo no
citoplasma.
Hipofunção secundária de uma glândula endócrina – Uma lesão destrutiva
em um órgão, como a hipófise, interfere na secreção de hormônios tróficos. Isto
resulta na hipofunção de glândulas endócrinas-alvo. Neoplasias hipofisárias ex-
tensas, endocrinologicamente inativas, em cães adultos, gatos e outras espécies
podem interferir na secreção de múltiplos hormônios tróficos hipofisários e resultar
na hipofunção clinicamente detectável do córtex adrenal, células foliculares da
Sistema Endócrino, Introdução 312

tireóide e gônadas. O córtex adrenal de animais com neoplasia hipofisária extensa


desse tipo tem uma atrofia marcante e degeneração das zonas internas dependen-
tes de ACTH; entretanto, a zona glomerular secretora de aldosterona, que não está
sob controle direto do ACTH, permanece intacta. A função da tireóide pode estar
subnormal devido à falta de tireotrofina e à atrofia das células foliculares, mas as
células C secretoras de calcitonina funcionam normalmente, já que elas não são
controladas pelos hormônios tróficos hipofisários.
Hiperatividade endócrina secundária a doenças de outros órgãos – O melhor
exemplo para caracterizá-la é o hiperparatireoidismo que se desenvolve secunda-
riamente a insuficiências renais crônicas ou desequilíbrios nutricionais. Na forma
renal, a retenção precoce de fósforo e a subseqüente destruição progressiva das
células dos túbulos contornados proximais interferem na ativação metabólica de
vitamina D por uma enzima renal. Essa etapa-limite padrão na ativação metabó-
lica de vitamina D é firmemente controlada pelo hormônio paratireóideo e por vários
outros fatores. A diminuição de absorção intestinal de cálcio resulta no desenvolvi-
mento de uma hipocalcemia progressiva, a qual leva a uma estimulação crônica da
paratireóide e a um subseqüente desenvolvimento de desmineralização generaliza-
da do esqueleto. Muitos ossos, particularmente os ossos gradeados do crânio,
tornam-se enfraquecidos e mais suscetíveis a fraturas.
O hiperparatireoidismo nutricional (ver pág. 581) desenvolve-se em animais com
dietas alimentares anormais que são pobres em cálcio, ricas em fósforo ou (para
certos primatas não humanos) deficientes em colecalciferol (vitamina D3). As dietas
alimentares exclusivamente proteicas, não suplementadas para carnívoros, falham
ao oferecer as necessidades diárias de cálcio, levando a uma progressiva hipocal-
cemia que estimula a atividade da glândula paratireóide. Nestes animais, os rins
normais respondem a um aumento do hormônio paratireóideo por meio do aumento
da excreção de fósforo e da redução do nível deste no sangue.
Hipersecreção de hormônios ou substâncias semelhantes a estes por tu-
mores não endócrinos – A hipersecreção, pelos tumores não endócrinos, de
“substâncias humorais semelhantes a hormônios”, similares química ou biologica-
mente (ou ambos) aos hormônios nativos secretados pela glândula endócrina, foi
recentemente reconhecida em animais, incluindo o homem. A maior parte dessas
substâncias secretadas pelos tumores não endócrinos são peptídeos. Esteróides e
iodotironinas requerem mecanismos biossintéticos mais complexos e não parecem
ser secretados pelos tumores não endócrinos. Um clássico exemplo desse mecanis-
mo patológico é o adenocarcinoma derivado das glândulas apócrinas do saco anal
em cães. Este tumor produz uma substância humoral denominada “peptídeo relacio-
nado com PTH” que estimula células-alvo no osso e no rim. A resultante mobilização
acelerada de cálcio dos ossos pelos osteoclastos leva ao desenvolvimento de uma
hipercalcemia persistente, mesmo que as glândulas paratireóides do animal sejam
menores que o normal e compostas de células principais inativas e os níveis do
paratormônio circulante estejam subnormais. Esta neoplasia se desenvolve predo-
minantemente em cadelas de idade avançada, é composta por áreas sólidas e
glandulares, e é diferente do tumor glandular perianal que ocorre comumente em
cães machos.
Após a remoção cirúrgica do adenocarcinoma apócrino, os níveis séricos de
cálcio e fósforo retornam ao normal, os níveis de hormônio paratireóideo imunorreativo
aumentam rapidamente e os níveis sangüíneos do metabólito da vitamina D ativa
diminuem.
Disfunção endócrina devido a falha de resposta das células-alvo – Hormô-
nios esteróides e iodotironina penetram na membrana celular, ligando-se a recep-
tores citossólicos, e são transportados para o núcleo onde interagem com a
informação genética dentro da célula para aumentar a síntese de novas proteínas.
Sistema Endócrino, Introdução 313

Hormônios polipeptídeos e catecolaminas ligam-se a receptores na superfície das


células-alvo e ativam uma enzima ligada à membrana, que produz uma mensagem
intracelular (AMPc) para provocar uma resposta fisiológica.
A falha das células-alvo ao responder ao hormônio pode ser devida à perda de
adenilato ciclase na membrana celular ou à alteração nos receptores hormonais na
superfície celular. O hormônio é secretado em quantidades normais ou aumentadas
pelas células da glândula endócrina. Certas formas de resistência à insulina
associadas com obesidade resultam de uma diminuição no número de receptores
na superfície das células-alvo. Isto se desenvolve em resposta ao aumento da
secreção crônica de insulina estimulado pela hiperglicemia resultante de um
excesso de ingestão de alimentos. Células secretoras, na glândula endócrina
correspondente (ilhotas pancreáticas), sofrem hipertrofia compensatória e hiperpla-
sia na tentativa de secreção adicional de insulina. As ilhotas pancreáticas normais
contêm predominantemente células β granuladas, ao passo que as células β em
ilhotas aumentadas e provenientes de um animal obeso e diabético são considera-
velmente hiperplásicas e desprovidas de grânulos secretórios que contêm insulina.
Falha da função endócrina fetal – A função subnormal do sistema endócrino
fetal, especialmente em ruminantes, pode interromper um desenvolvimento fetal
normal e resultar numa gestação prolongada. Em algumas raças de bovinos, uma
deficiência do desenvolvimento da adeno-hipófise, determinada geneticamente
(apesar de a neuro-hipófise desenvolver-se normalmente), resulta em perda da
secreção de hormônios tróficos pituitários fetais durante o último trimestre e
desenvolvimento hipoplásico dos órgãos endócrinos-alvo, como córtex adrenal,
gônadas e células foliculares da glândula tireóide. O desenvolvimento fetal é normal
até , o sétimo mês, mas logo depois cessa, independentemente do período em que
o feto viável será mantido no útero.
O prolongamento da gestação em ovinos resulta da ingestão, na fase inicial da
gestação, de uma planta que culmina com o desenvolvimento de extensas malfor-
mações no SNC e hipotálamo do feto. Embora a adeno-hipófise esteja presente, ela
perde o controle necessário, derivado da liberação de hormônios do hipotálamo,
sobre a capacidade de secretar quantidades normais de hormônios tróficos, por
exemplo, adrenocorticotrofina) (ver GESTAÇÃO PROLONGADA NOS BOVINOS E NOS
OVINOS, pág. 841).
Os conceitos que surgiram do estudo dessas 2 síndromes são: 1. os hormônios
fetais são necessários para o crescimento final e o desenvolvimento in utero de
certos animais; e 2. o parto normal a termo, nessas espécies, requer um eixo
hipotalâmico-adeno-hipofisário-adrenocortical fetal intacto, trabalhando em combi-
nação com trofoblastos da placenta.
Embora a presença ou a ausência do tecido adeno-hipofisário funcional determi-
ne se o feto continua seu crescimento in utero, a patogenia do prolongamento da
gestação é similar nestes 2 exemplos. Em bezerros e cordeiros, o desenvolvimento
subnormal do córtex adrenal fetal resulta numa secreção inadequada de cortisol e
numa falha da indução da 17-hidroxilase na placenta, que converte moléculas
precursoras, como a progesterona, em estrogênios. Como resultado, os níveis
circulantes de progesterona na mãe permanecem altos e o aumento marcante de
estrogênios necessários para o parto, normalmente vistos até o termo, não ocorre.
A oscilação normal de estrogênio durante o parto estimula a síntese de prostalglandina
no útero, a qual causa contração dos músculos lisos e alterações bioquímicas no
colágeno ao longo do canal de nascimento que permitem a liberação do feto.
Disfunção endócrina resultante da degradação anormal de hormônio – Em
animais com degradação anormal de hormônio, a secreção deste pela glândula
endócrina é normal, mas os níveis sangüíneos são persistentemente elevados. Uma
diminuição na taxa de degradação estimula o estado de hipersecreção. A doença
Sistema Endócrino, Introdução 314

renal crônica em animais pode estar associada com concentrações sangüíneas


subnormais, normais ou elevadas de cálcio. A hipercalcemia associada a certas
formas de doença renal pode estar relacionada, em parte, à degradação diminuída
de hormônio paratireóideo com diminuição da excreção urinária de cálcio pelo rim
doente. O hormônio paratireóideo biologicamente ativo é degradado nos rins tanto
pelas peptidases da superfície das células tubulares quanto pelas enzimas lisossô-
micas depois da captação do hormônio do filtrado glomerular.
Síndromes iatrogênicas por excesso de hormônio – A administração de
grandes doses de hormônio exógeno, direta ou indiretamente, pode influenciar a
atividade das células-alvo e resultar em distúrbios clínicos. A administração diária
prolongada de potentes preparações de corticosteróides adrenais, em doses
impróprias no tratamento sintomático de várias doenças, reproduzirá a maioria dos
distúrbios funcionais associados com hipersecreção endógena de cortisol. Esses
distúrbios incluem astenia muscular, perda de pêlo acentuada e adelgaçamento e
deposição mineral na pele. Os níveis sangüíneos elevados de cortisol exógeno
resultam em considerável atrofia do córtex adrenal.
Recentemente, relatou-se que a administração de certos prostogênios resulta
indiretamente numa síndrome de excesso de hormônio. A injeção de acetato de
medroxiprogesterona para prevenção do estro na cadela estimula um aumento da
secreção do hormônio de crescimento, resultando em muitas manifestações clíni-
cas de acromegalia. As excessivas pregas cutâneas, a expansão dos espaços
interdentais e a distensão abdominal em cães com acromegalia iatrogênica estão
relacionadas com os efeitos anabólicos proteicos do hormônio de crescimento nos
tecidos conjuntivos.

GLÂNDULAS ADRENAIS
As glândulas adrenais dos mamíferos estão localizadas perto do pólo cranial dos
rins e consistem de 2 porções distintas que diferem na morfologia, função e origem.
Devido à sua íntima relação estrutural, o córtex externo e a medula interna da
glândula adrenal são considerados partes de um único órgão.

CÓRTEX ADRENAL
O córtex adrenal é subdividido em 3 camadas ou zonas, embora a delimitação
entre as zonas freqüentemente não seja distinta. A zona glomerular (multiforme) é
a camada externa cortical. Ela é responsável pela secreção de hormônios minera-
locorticóides. A zona fasciculada, camada do meio, compreende , 70% do córtex
e é composta por células que contêm abundantes lipídios citoplasmáticos e hor-
mônios glicocorticóides. A zona reticular contém os 15% restantes do córtex; esta
camada interna é responsável pela secreção de esteróides sexuais pela glândula
adrenal.
Os mineralocorticóides, dos quais o mais potente na natureza é a aldosterona,
são esteróides adrenais cujo principal efeito é no transporte de íons pelas células
epiteliais, resultando em perda de potássio e conservação de sódio. As glândulas
sudoríparas e as “bombas” de eletrólitos controladas enzimaticamente nas células
epiteliais do túbulo renal respondem aos mineralocorticóides conservando o sódio
e o cloro e excretando o potássio. No túbulo distal contornado dos néfrons dos ma-
míferos, um mecanismo de troca de cátions reabsorve sódio do filtrado glomerular
e secreta potássio para o lúmen. Essas reações são aceleradas pelos mineralo-
Glândulas Adrenais 315

corticóides, sendo que a velocidade do processo é muito lenta na sua ausência.


Uma perda da secreção dos mineralocorticóides (como na doença dos cães
semelhante à síndrome de Addison) pode resultar numa retenção letal do potássio
e perda do sódio.
O cortisol e, em menor quantidade, a corticosterona são os mais importantes
glicocorticóides secretados pela glândula adrenal em muitas espécies. Em geral, as
ações dos glicocorticóides no metabolismo dos carboidratos, proteínas e lipídios
resultam numa diminuição da utilização de glicose e numa tendência a hiperglicemia
e aumento da produção de glicose. Além disso, eles promovem uma diminuição da
lipogênese e aumento da lipólise no tecido adiposo, o que resulta em liberação de
glicerol e de ácidos graxos livres.
Os glicocorticóides também suprimem as respostas inflamatórias e imunoló-
gicas, atenuando, desse modo, a destruição do tecido associado e a fibroplasia.
Entretanto, altos níveis de glicocorticóides reduzem a resistência a fungos
bactérias e vírus, e favorecem a disseminação de infecções. Os glicocorticóides
podem diminuir a resposta imunológica em qualquer estágio da internação inicial
e processamento de antígenos pelas células do sistema reticuloendotelial, por
meio da indução e proliferação de linfócitos imunocompetentes e subseqüente
produção de anticorpos. A inibição de algumas funções das células linfóides é a
base da imunossupressão.
Os glicocorticóides podem exercer um profundo efeito negativo na cicatrização
de feridas. Altos níveis terapêuticos de corticosteróides adrenais ou a síndrome de
hipercortisolismo podem causar deiscência de pontos após cirurgia. O mecanismo
básico envolvido é a inibição da proliferação de fibroblastos e a síntese de colágeno,
levando a uma diminuição na formação de tecido cicatricial.
Progesterona, estrogênios e androgênios são hormônios sexuais adrenais. O
excesso de secreção pode estar associado com uma neoplasia da zona reticular.
A manifestação de virilidade, o desenvolvimento sexual precoce ou a feminização
dependem de qual esteróide está sendo secretado em excesso, do sexo do indi-
víduo e da idade de início.

Hiperadrenocorticismo
(Excesso de cortisol, Síndrome de Cushing, Doença de Cushing)
Os sinais clínicos e lesões associados com hiperadrenocorticismo resultam
primariamente da elevação crônica do cortisol. O excesso de cortisol é uma das
endocrinopatias mais freqüentes em cães adultos e idosos, mas é raro em outros
animais domésticos. Cães afetados desenvolvem um espectro de distúrbios funcio-
nais e lesões conseqüentes aos efeitos combinados da gliconeogênese, lipólise,
catabolismo proteico e efeitos antiinflamatórios dos hormônios glicocorticóides em
muitos sistemas orgânicos. A doença é insidiosa e lentamente progressiva.
Etiologia e patogenia – A elevação dos níveis de cortisol circulante em cães
pode resultar de um dos vários mecanismos patogênicos; o mais comum é um
adenoma corticotrófico funcional (secretor de ACTH) da glândula hipofisária (pars
distalis ou pars intermedia), que causa hipertrofia e hiperplasia bilaterais do córtex
adrenal. O hipercortisolismo associado com hiperplasia idiopática do córtex adrenal
ocorre mais freqüentemente em poodles que em outras raças. O córtex de ambas
as adrenais é consideravelmente espessado. Neoplasias funcionais da adrenal
são a causa menos freqüente da síndrome do excesso de cortisol nos cães
semelhante à síndrome de Cushing (10 a 15% dos casos). Muitos dos sinais e lesões
do hiperadrenocorticismo que ocorrem naturalmente podem ser induzidos pela
administração diária e prolongada de grandes doses de corticosteróides para o
tratamento de outras doenças. Para distinguirem-se os mecanismos patogênicos
que podem resultar na síndrome do excesso de cortisol, devem-se avaliar os níveis
Glândulas Adrenais 316

de cortisol plasmático em estado basal (repouso) e em resposta à dexametasona


(dose alta ou baixa) e à estimulação de ACTH exógeno.
Achados clínicos e lesões – Apetite e ingestão de alimentos são freqüentemen-
te aumentados, como resultado direto do hiperadrenocortisolismo ou pelo envolvi-
mento do centro do apetite no hipotálamo por um grande tumor hipofisário. Os
músculos abdominais e das extremidades tornam-se fracos e atrofiados, com uma
gradual distensão abdominal, lordose e tremores musculares, e o animal mantém-
se com os membros abertos. A hepatomegalia devida ao aumento da deposição de
gordura e glicogênio pode contribuir para que o abdome se torne distendido e
freqüentemente pendular. A astenia muscular e a debilidade são o resultado do
catabolismo aumentado de proteínas estruturais, combinado com a diminuição da
síntese proteica sob influência de um excesso crônico de cortisol.
As lesões cutâneas ocorrem freqüentemente em cães com hiperadrenocorti-
cismo e são inicialmente observadas em pontos de apoio (por exemplo, pescoço,
flancos, atrás das orelhas e sobre proeminências ósseas). Estas lesões dissemi-
nam-se bilateral e simetricamente para envolver uma porção significante da super-
fície corporal. Há atrofia da epiderme e do aparelho pilossebáceo, combinada à
perda de colágeno e elastina na derme e subcútis. A pele apresenta textura fina e
a maioria dos folículos pilosos são inativos. A epiderme é marcadamente delgada
e consiste de apenas 1 a 2 camadas. Entretanto, o estrato córneo é consideravel-
mente espessado, devido ao acúmulo de múltiplas camadas de ceratina na su-
perfície; estes agregados de ceratina podem-se tornar extensos e aparecer como
grandes placas envolvidas.
A mineralização cutânea é uma lesão característica em cães (, 30 a 40%) com
hipercortisolismo. Embora a deposição mineral possa ocorrer em qualquer região da
pele, a linha média dorsal, o abdome ventral e a região inguinal são afetados
mais freqüentemente. Numerosos cristais minerais são depositados ao longo das
fibras de colágeno e elastina na derme e subcútis externa, e podem protrair através
da epiderme delgada e atrófica. A epiderme permanece intacta nos casos menos
severos e parece irregularmente elevada pelos depósitos minerais firmes, opacos
e brancos. Uma estreita margem de hiperemia e uma inflamação granulomatosa por
corpo estranho freqüentemente rodeiam as áreas de mineralização. Os depósitos
minerais ocorrem apesar de os níveis sangüíneos de cálcio e fósforo estarem
normais, provavelmente devido à ação da gliconeogênese e do catabolismo
proteico de cortisol. Mineralização severa também ocorre em vários outros tecidos
do corpo, mais freqüentemente nos pulmões e às vezes na musculatura esquelética
ativa e na parede do estômago.
Além dos adenomas corticotróficos (secretores de ACTH) na hipófise, o excesso
de cortisol pode resultar de um tumor no córtex adrenal.
Adenomas do córtex adrenal são mais freqüentemente observados em cães
idosos e esporadicamente em eqüinos, bovinos e ovinos. Adenomas corticais são
bem definidos, geralmente são nódulos únicos em uma glândula adrenal, mas
podem ser bilaterais. Grandes adenomas corticais são amarelos a vermelhos,
distorcem o contorno externo da glândula afetada e são parcial ou completamente
encapsulados. O parênquima cortical adjacente é comprimido e o tumor pode-se
estender para a medula.
Carcinomas do córtex adrenal ocorrem menos freqüentemente que os ade-
nomas e têm sido relatados mais freqüentemente em bovinos e cães adultos a
idosos, sem aparente prevalência racial ou sexual. Os carcinomas adrenais são
maiores que os adenomas e mais provavelmente são bilaterais. Em cães, eles
são compostos de um tecido amarelo-avermelhado, friável e pintalgado, que
incorpora a glândula adrenal afetada. Eles freqüentemente são fixos em sua
localização devido à extensa invasão dos tecidos ao redor e dentro da veia cava
Glândulas Adrenais 317

posterior (formando um grande trombo de células tumorais). Os carcinomas podem


atingir tamanhos consideráveis em bovinos (até 10cm ou mais de diâmetro),
apresentar múltiplas áreas de mineralização ou ossificação, e geralmente obliterar
completamente a adrenal afetada.
Alguns carcinomas e adenomas do córtex adrenal em cães são funcionais e
secretam excesso de cortisol. Eles podem comprimir órgãos adjacentes e invadir a
aorta ou a veia cava posterior, levando a hemorragia intra-abdominal e metástase em
locais distantes (por exemplo, fígado, rins, linfonodos mesentéricos e pulmões).
Adenomas e carcinomas corticais funcionais estão associados com atrofia profunda
do córtex contralateral, devido à inibição hipofisária da secreção de ACTH, pelos
níveis sangüíneos elevados de cortisol. A medula adrenal torna-se expandida e é
relativamente mais proeminente devido à perda do parênquima cortical.
Diagnóstico – Vários procedimentos laboratoriais acham-se facilmente dispo-
níveis para auxiliar no diagnóstico do hipercortisolismo. A involução do tecido lin-
fóide resulta numa significante linfopenia. Existe uma destruição intravascular de
eosinófilos e seqüestro de eosinófilos circulantes no pulmão e baço, que leva a uma
eosinopenia. Em muitos cães, a contagem total de leucócitos é moderadamente
elevada e a porcentagem de neutrófilos é aumentada. Em virtude do prolongamento
da vida dos neutrófilos na circulação, o núcleo pode tornar-se hipersegmentado.
Cães com hiperadrenocorticismo normalmente apresentam concentrações sé-
rica normais de sódio, potássio e cloro, embora um achado consistente seja a
excreção de grandes volumes de urina diluída com baixa densidade específica
(≤ 1.007). Uma vez que o excesso de cortisol estimula a síntese e libera uma
isoenzima de fosfatase alcalina, níveis muito elevados desta última são observados
com freqüência. A glicose sangüínea é moderadamente elevada e ocasionalmente
desenvolve-se uma acentuada hiperglicemia. A concentração sérica de colesterol
pode elevar-se para 250 a 400mg/dL.
O teste mais direto e sensível para diagnosticar e elucidar a patogenia é a
mensuração dos níveis de cortisol plasmático pelo uso de técnicas precisas e
sensíveis de radioimunoanálise. Os níveis de cortisol em repouso em cães normais
variam de 1 a 5µg/dL; entretanto, como os níveis basais em cães com excesso de
cortisol freqüentemente estão abaixo deste limite, os testes da estimulação e
supressão são essenciais para se fazer um diagnóstico preciso. Se o córtex
adrenal está hiperplásico ou tem neoplasias benignas que permanecem sob
controle trófico, ocorre um aumento marcante dos níveis de cortisol plasmático
dentro de 90min após a administração de ACTH.
Outro teste diagnóstico é o teste da supressão pela dexametasona em combina-
ção com a estimulação com ACTH. Em cães normais e naqueles com hiperplasia
idiopática cortical adrenal, o cortisol plasmático é reduzido para <1µg/dL, 8h após
a injeção IM de 0,01mg/kg de peso corporal de dexametasona. A supressão apenas
parcial do cortisol plasmático ocorre em cães com hiperplasia cortical adrenal,
associada a tumores funcionais hipofisários após a administração de dexameta-
sona; nenhuma supressão significativa dos níveis de cortisol plasmático ocorre em
cães com tumores funcionais do córtex adrenal. Uma alta dose de dexametasona
no teste da supressão (1mg/kg, IM) pode ser benéfica na diferenciação dos casos
questionáveis de excesso de cortisol, causados por tumores funcionais hipofisários
em cães, daqueles causados por um tumor do córtex adrenal. Os níveis de cortisol,
na maioria dos cães com tumores hipofisários, tornam-se deprimidos com esta dose
mais alta de dexametasona, ao passo que não há depressão em cães com tumores
funcionais do córtex adrenal.
Tratamento – Cães com hiperadrenocorticismo confirmado por laboratório
podem ser tratados medicinal ou cirurgicamente. Cães com a síndrome do excesso
de cortisol causada por uma hiperplasia cortical difusa (adenoma corticotrófico da
Glândulas Adrenais 318

hipófise ou hiperplasia adrenal idiopática) podem ser tratados pela administração


oral de mitotano (o,p’DDD). O programa de tratamento recomendado envolve a
administração inicial de 50mg/kg/dia por 5 a 10 dias. Se o cão apresenta polidipsia,
a monitoração do consumo de água é útil na regulação da dosagem. Quando o
consumo de água diminui acentuadamente, a administração diária da droga é
interrompida, e a dose de manutenção de 50mg/kg é administrada uma vez por
semana para prevenir a recidiva dos sinais clínicos.
Existe uma considerável variação na sensibilidade individual ao mitotano em
cães; os proprietários devem ser prevenidos quanto à possibilidade do desenvolvi-
mento de um hipoadrenocorticismo evidente após vários meses do tratamento de
forma que eles estejam alerta para sinais sugestivos, como vômito e diarréia. Alguns
cães requerem aumento gradual das doses do medicamento para a manutenção da
remissão clínica adequada, mas outros parecem tornar-se progressivamente mais
sensíveis à administração prolongada. Deste modo, os cães devem ser rigorosa-
mente monitorados durante a terapia. O uso da determinação do cortisol basal em
combinação com a estimulação do ACTH é útil para estabelecer se uma quantidade
suficiente de células secretoras de cortisol foi destruída pela droga.
Os sinais clínicos do excesso de cortisol são rapidamente revertidos em cães
tratados com o mitotano. A redução do consumo de água, da freqüência de micção
e do apetite são as respostas iniciais à terapia. O vigor muscular e a atividade física
aumentam dentro de poucas semanas e um recrescimento piloso substancial ocorre
usualmente em 1 a 3 meses. Os níveis de cortisol plasmático declinam progressi-
vamente. O aumento exagerado de corticosteróides plasmáticos, como resposta à
estimulação pelo ACTH em cães com hiperplasia do córtex adrenal, é eliminado
após o tratamento com mitotano. As doses semanais de mitotano devem ser
continuadas por toda a vida do cão para prevenir a recidiva dos distúrbios
funcionais e lesões decorrentes do hipercortisolismo. Se as doses intermitentes de
mitotano forem descontinuadas, pequenas porções de células corticais viáveis se
regenerarão e os distúrbios funcionais e as alterações bioquímicas retornarão.
Os efeitos colaterais do mitotano nas doses recomendadas são usualmente
suaves. Sinais clínicos de irritação gastrointestinal, incluindo vômito e anorexia, são
observados em alguns cães. Distúrbios no SNC, hipoglicemia suave e aumento
moderado dos níveis séricos de fosfatase alcalina têm sido observados. Se ocorrem
sinais como depressão ou ataxia, a dose diária dividida em 2 partes iguais,
administradas a intervalos de 8 a 12h, geralmente alivia estes efeitos colaterais.
Os níveis de mitotano que são efetivamente citotóxicos para o córtex adrenal
hiperplásico não destruirão adenomas e carcinomas do córtex adrenal funcional em
cães. Doses mais elevadas da droga são tóxicas para o parênquima de vários
órgãos.
Quando existem evidências de um tumor no córtex adrenal, o tratamento
recomendado é a remoção da glândula afetada. À cirurgia, ambas as glândulas
devem ser observadas para eliminar a possibilidade de tumores bilaterais. O manejo
médico cuidadoso antes, durante e depois da cirurgia é de grande importância.
Mesmo que uma adrenalectomia unilateral seja realizada, o cão terá uma insufi-
ciência funcional do córtex adrenal após a cirurgia devido à atrofia prolongada do
córtex adrenal da glândula contralateral adrenal. Um corticosteróide com alta
atividade mineralocorticóide (como o acetato de desoxicorticosterona [DOCA]) e a
prednisolona são administrados por 24 a 48h antes da cirurgia. Durante a cirurgia,
a administração EV de succinato sódico de prednisolona, dissolvido em 5% de
dextrose e 0,9% de solução salina, deve ser realizada. Após a cirurgia, os níveis
séricos de sódio e potássio são cuidadosamente monitorados e o DOCA é mantido,
se necessário, para preservar a proporção sódio:potássio. O cão deve ser rigo-
rosamente monitorado contra o choque pós-cirúrgico e tratado apropriadamente
Glândulas Adrenais 319

com cortisol ou prednisolona. O uso contínuo de glicocorticóides ou mineralocorti-


cóides provavelmente não é necessário no estágio pós-cirúrgico agudo, a menos
que o paciente tenha sofrido adrenalectomia bilateral.

Hipoadrenocorticismo
(Doença de Addison)
Uma deficiência em hormônios adrenocorticais tem sido comumente observada
em cães jovens e de meia-idade e ocasionalmente em cavalos. A causa da insu-
ficiência primária adrenocortical usualmente não é conhecida, embora a maioria dos
casos provavelmente resulte de um processo auto-imune. Outras causas podem ser
a destruição da glândula adrenal por doenças granulomatosas tumores metastáti-
cos, hemorragia, infarto ou superdosagem de mitotano.
Achados clínicos – Muitos dos distúrbios funcionais da insuficiência adrenal
crônica não são altamente específicos e incluem episódios recorrentes de gas-
troenterite, uma perda lenta e progressiva da condição corporal e deficiência para
responder apropriadamente ao estresse. Embora o hipoadrenocorticismo ocorra em
cães de qualquer raça, sexo ou idade, a insuficiência adrenocortical idiopática ocorre
mais freqüentemente em adultos jovens. Isto pode estar relacionado à sua suspeita
patogênica imunomediada.
Uma redução na secreção de aldosterona, o principal mineralocorticóide, resulta
em alterações marcantes nos níveis séricos de potássio, sódio e cloro. A excreção
renal de potássio é reduzida, o que resulta em progressivo aumento nos níveis séricos
de potássio, e uma quantidade menor de sódio e cloro é reabsorvida pelos túbulos
renais, o que leva ao declínio dos seus níveis sangüíneos. A hipercalemia severa
causa uma arritmia cardíaca com alterações no ECG. Em alguns cães, desenvolve-
se uma bradicardia pronunciada (freqüência cardíaca ≤ 50/min), que não é responsiva
a exercícios e predispõe a fraqueza ou colapso circulatório após mínimo esforço.
Embora o desenvolvimento dos sinais clínicos freqüentemente seja insidioso e
não seja facilmente perceptível, ele geralmente leva ao colapso circulatório agudo
e evidência de insuficiência renal. Uma progressiva diminuição no volume sangüíneo
contribui para hipotensão, fraqueza e miocardia. O colapso circulatório periférico
pode resultar da hemoconcentração progressiva. O aumento da excreção de água
pelos rins, devido à diminuição da reabsorção de sódio e cloro, resulta em desidra-
tação progressiva e hemoconcentração. Êmese, diarréia e anorexia são comuns e
contribuem para a deterioração do animal. A perda de peso é freqüentemente severa.
Uma produção diminuída de glicocorticóides resulta em vários distúrbios funcio-
nais característicos. Gliconeogênese diminuída e aumento da sensibilidade à
insulina contribuem para o desenvolvimento de uma hipoglicemia moderada. A
hiperpigmentação da pele ocorre em alguns cães devido à perda de “feedback”
negativo da hipófise e ao aumento da liberação de ACTH (e possivelmente de
hormônio estimulante de melanócitos). Os níveis de cortisol plasmático em cães
com hipoadrenocorticismo variam de 0,1 a 1,5µg/dL e ocorre pequeno ou nenhum
aumento nos níveis de cortisol sangüíneo após a administração de ACTH.
Lesões – A lesão mais freqüentemente observada em cães com hipoadreno-
corticismo é a atrofia adrenocortical idiopática bilateral, na qual todas as camadas
do córtex estão acentuadamente reduzidas em espessura. O córtex adrenal é
reduzido para um décimo ou menos de sua espessura normal e consiste primaria-
mente da cápsula adrenal. A medula adrenal é relativamente mais proeminente e,
com a cápsula, compõe o tamanho da glândula adrenal remanescente.
Todas as 3 zonas do córtex adrenal estão envolvidas, incluindo a zona glome-
rulosa (a qual não está sob controle do ACTH), mas não têm sido observadas lesões
hipofisárias evidentes em cães com atrofia idiopática do córtex adrenal.
Glândulas Adrenais 320

Uma lesão hipofisária destrutiva, que leva à diminuição na secreção de ACTH


é caracterizada por atrofia severa das 2 zonas corticais internas da glândula
adrenal; a zona glomerulosa permanece intacta.
Diagnóstico – O diagnóstico requer avaliação definitiva da função adrenal.
Depois de se obter uma amostra sangüínea basal, 1u de gel de ACTH/lb de peso
corporal é administrado IM e uma segunda amostra sangüínea é obtida 1 a 2h
mais tarde. Os cães afetados podem apresentar níveis de cortisol baixos e há uma
pequena resposta à administração de ACTH. É possível completar este teste na
maioria dos animais antes de a reposição da terapia hormonal ser iniciada.
Um diagnóstico preliminar e o tratamento da doença de Addison baseiam-se na
história e na presença de anormalidades laboratoriais de suporte, embora inespe-
cíficas. Estas incluem hiponatremia, hipercalemia, proporção de sódio:potássio
< 25:1, azotemia, acidose leve e anemia normocítica normocrômica. Ocasional-
mente, uma leve hipoglicemia pode estar presente. A hipercalemia resulta em
alterações no ECG evidenciadas por uma elevação da onda T, um achatamento ou
ausência da onda P, um prolongamento do intervalo PR e um alargamento do
complexo QRS. Fibrilação ventricular ou assístole pode ocorrer com níveis de
potássio > 11mEq/L.
O diagnóstico diferencial inclui distúrbios gastrointestinais primários, insufi-
ciência renal, pancreatite aguda e ingestão de toxinas.
Tratamento – Uma crise adrenal é uma emergência médica aguda. Introduz-se
um cateter EV e inicia-se a infusão de solução salina a 0,9%. Se o cão está hipo-
glicêmico e não desidratado, a solução salina pode incluir dextrose a 5%. Se o
animal está desidratado, dextrose a 50% (0,45mL/lb [1mL/kg]) pode ser dada
separadamente por um período de 10min. Se o animal está hipotenso, fluidos devem
ser dados na dose de 20 a 40mL/kg/h nas primeiras 1 a 2h. A produção de urina deve
ser monitorada para se ter certeza de que o cão não está anúrico. Os fluidos devem
ser mantidos na dose de 50 a 60mL/kg/dia até os eletrólitos sangüíneos, a uréia e
a hidratação retornarem ao normal.
Succinato sódico de prednisolona 4,4 a 22mg/kg de peso corporal ou dexa-
metasona 2,2 a 4,4mg/kg de peso corporal devem ser administrados por via EV
tão logo seja possível e a administração de prednisolona ou prednisona 1mg/kg IM
em 2 vezes ao dia deve ser continuada por vários dias. A dose deverá ser então
reduzida para 0,25 a 0,5mg/kg em 2 vezes ao dia. Os principais sinais relatados são
desequilíbrios eletrolíticos, perdas hídricas e problemas circulatórios resultantes.
Portanto, é essencial que o acetato de desoxicorticosterona (DOCA) mineralo-
corticóide, 0,22 a 0,44mg/kg, seja dado por via IM no início do curso da terapia e
continuado diariamente. Os eletrólitos deverão ser monitorados para prevenir o
desenvolvimento de hipocalemia devida à administração de mineralocorticóide.
Em casos de hipercalemia severa não responsiva, a glicose a 10% na dose de
4,4 a 11mL/kg pode ser administrada, por 30 a 60min numa infusão de solução salina
para aumentar a atividade do potássio intracelular. Insulina regular, 0,28 a 1,1u/kg
IM, pode ser administrada para aumentar o uso da glicose e do potássio, mas deverá
ser administrada com 20mL (EV) de glicose a 10%/unidade de insulina a fim de evitar
hipoglicemia. Em pacientes severamente doentes, a acidose pode ser tratada pela
reposição de 25% do déficit calculado ou administrando-se 2,2mEq/kg de bicarbo-
nato de sódio EV nas primeiras 6h. O tratamento da doença de Addison crônica é
menos intensivo e pode requerer apenas tratamento com DOCA e prednisolona. Se
a insuficiência adrenal for secundária à rápida retirada da terapia com glicocorticói-
des, o tratamento esteróide deverá ser reiniciado e removido em doses decrescen-
tes após o que não será necessário tratamento adicional.
Para terapia de manutenção a longo prazo, o acetato de fludrocortisona mine-
ralocorticóide, por VO, é administrado na dose de 0,1 a 0,5mg/dia, dependendo do
Pâncreas 321

tamanho do cão. Eletrólitos séricos deverão ser monitorados semanalmente até que
a dose adequada seja determinada. Comprimidos de sal (NaCl) (1 a 5g) deverão ser
dados 1 vez por dia. Alguns cães requerem também tratamento oral com glicocor-
ticóide diariamente, até o animal mostrar uma aparência melhor. A dose de acetato
de cortisona é 1 a 2mg/kg de peso corporal e de prednisolona, 0,2 a 0,4mg/kg. Cães
com hipoadrenocorticismo crônico devem ser reexaminados a cada 3 a 6 meses.
O tratamento em cavalos com a doença deve seguir a mesma orientação:
reposição agressiva de fluidos, esteróides e glicose, se necessário, na crise adrenal.
Terapia de suporte e repouso são indicados nos casos de doença crônica de
Addison.

MEDULA ADRENAL
A medula adrenal, embora aparentemente não seja essencial à vida, tem um
papel importante na resposta ao estresse ou à hipoglicemia. Ela secreta adrenalina
e noradrenalina, a qual aumenta o rendimento cardíaco, eleva a pressão e a glicose
sangüíneas e reduz a atividade GI.
Feocromocitomas podem-se desenvolver em animais domésticos, mais fre-
qüentemente em bovinos e cães. Estes secretam adrenalina e/ou noradrenalina e
têm causado aumento da taxa cardíaca, edema e aumento do coração nos poucos
casos relatados. Outros tumores, como neuroblastomas e ganglioneuromas, po-
dem-se desenvolver na medula a partir de células do sistema nervoso simpático.
Tumores podem-se desenvolver em qualquer outro local, seja por invasão direta,
seja por invasão metastática (ver também pág. 347).

PÂNCREAS
A função endócrina do pâncreas é realizada por pequenos grupos de células
(ilhotas de Langerhans), que são completamente circundadas por células acinares
(exócrinas) que produzem enzimas digestivas. Existe uma estreita relação entre as
porções endócrina e exócrina do pâncreas (ver pág. 144) durante o desenvolvimen-
to. Evidências sugerem que as ilhotas, as células acinares e os dutos se desenvol-
vem a partir de uma célula precursora multipotencial.
Ilhotas pancreáticas de animais normais contêm células α, β e δ, cada uma das
quais sintetiza um único hormônio polipeptídeo. Células β são células secretórias
predominantes e sintetizam insulina; as células α são menos numerosas que as β
e secretam glucagon, e as células δ secretam somatostatina. Células F estão
presentes nas ilhotas dos processos uncinados de cães, mas não em todas as
espécies animais.
As ilhotas pancreáticas funcionam como órgãos microendócrinos discretos, e
estão embutidas por todo o pâncreas com uma característica padrão de inter-
relação celular para garantir um equilíbrio hormonal apropriado. Em algumas
espécies, as células β secretoras de insulina, que representam 60 a 70% da
população das ilhotas, estão localizadas em uma massa central relativamente
homogênea. As células α produtoras de glucagon estão primariamente localizadas
na periferia da ilhota num invólucro externo. As células δ secretoras de somatosta-
tina estão entremeadas entre a camada externa das células α e o núcleo interno das
células β. Vasos aferentes e nervos entram na ilhota nesta região tricelular
periférica. A íntima relação anatômica das células α, β e δ nesta região cortical
heterogênea pode funcionar como um “sensor de glicose local”, permitindo uma
Pâncreas 322

produção coordenada de insulina e glucagon em resposta às flutuações de glicose


sangüínea. Junções firmes especializadas entre as membranas das células endó-
crinas adjacentes tendem a separar o espaço intercelular e podem permitir à
somatostatina exercer um controle local direto (“parácrino”) na secreção de glucagon
pelas células α.
A insulina é formada inicialmente como uma única cadeia polipeptídea de 81 a
86 resíduos de aminoácidos. Este pró-hormônio (proinsulina) contém as cadeias A
e B da molécula de insulina, mais um peptídeo de conexão. A proinsulina é
convertida enzimaticamente a insulina antes do armazenamento em grânulos
secretórios limitados pela membrana, os quais são estocados até que haja um
estímulo apropriado para secreção.
O maior estímulo fisiológico para a liberação de insulina das células β é a glicose.
Existem “glicorreceptores” específicos na membrana plasmática das células β que
se unem à glicose. Um nível apropriado de íon de cálcio no fluido extracelular é um
pré-requisito para a secreção de insulina. Em alguns distúrbios hipocalcêmicos (por
exemplo, hipocalcemia da parturiente em vacas), a secreção de insulina pode ser
inibida pelo baixo nível de cálcio no fluido extracelular e isto pode resultar em
hiperglicemia.
Embora a alteração na concentração de glicose no fluido extracelular seja o
estímulo fisiológico principal para a liberação de insulina, outros açúcares (frutose,
manose, ribose), aminoácidos (leucina, arginina), hormônios (glucagon, secretina),
drogas (sulfoniluréia, teofilina), ácidos graxos de cadeia curta e corpos cetônicos
também podem estimular a secreção de insulina sob certas condições. As células
β pancreáticas têm a propriedade singular de serem capazes de responder a um
estímulo fisiológico específico com a liberação do hormônio estocado de forma
modulada, em vez de liberar todo o hormônio estocado de uma vez.
A insulina afeta, direta ou indiretamente, a função de todos os órgãos do corpo.
Tecidos especialmente responsivos à insulina incluem o esqueleto, a musculatura
cardíaca, o tecido adiposo, os fibroblastos, o fígado, os leucócitos, as glândulas
mamárias, a cartilagem, o osso, a pele, a aorta, a hipófise e os nervos periféricos.
A principal função da insulina é estimular as reações anabólicas que envolvem
carboidratos, gorduras, proteínas e ácidos nucléicos. Ela catalisa a formação de
macromoléculas usadas na estrutura celular, estoca energia e regula muitas
funções celulares. O fígado, as células adiposas e os músculos são os 3 principais
sítios de insulina. Em geral, a insulina aumenta a transferência da glicose e de
certos outros monossacarídios, alguns aminoácidos, ácidos graxos, íons de mag-
nésio e potássio através da membrana plasmática das células-alvo; eleva a oxi-
dação de glicose e a glicogênese; estimula a lipogênese e a formação de ATP, DNA
e RNA. A insulina também diminui a taxa de lipólise, proteólise, cetogênese e gli-
coneogênese.
O glucagon é secretado em resposta à redução da glicemia. Ele promove a
mobilização do estoque de nutrientes geradores de energia pelo aumento da
glicogenólise, gliconeogênese e lipólise. Em concentrações fisiológicas, o glucagon
aumenta a gliconeogênese e a glicogenólise hepática, elevando desse modo a
glicemia.
A insulina e o glucagon agem em conjunto para manter a concentração de glicose
nos fluidos extracelulares dentro de limites relativamente estreitos. Um “sensor de
glicose” existente nas ilhotas pancreáticas controla quantidades relativas de in-
sulina e glucagon secretadas pelas células α e β. O glucagon controla a liberação
de glicose pelo fígado para o espaço extracelular, e a insulina controla o transpor-
te de glicose do espaço extracelular para tecidos sensíveis à insulina, como a
gordura, o músculo e o fígado.
Pâncreas 323

DIABETES MELITO
É um distúrbio crônico do metabolismo de carboidratos devido a uma deficiência
relativa ou absoluta de insulina. O diabetes melito é uma endocrinopatia comum em
cães (incidência relatada de 1:200). A maioria dos casos de diabetes espontâneo
ocorre em cães adultos, cerca de duas vezes mais freqüentes em fêmeas que em
machos. A incidência parece ser maior em certos cães de pequeno porte, como
poodles miniaturas, dachschunds, schnauzers, terriers cairn e beagles, mas qual-
quer raça pode ser afetada.
Etiologia e patogenia – Os mecanismos patogênicos responsáveis pela menor
disponibilidade de insulina são múltiplos, mas geralmente ocorre destruição das
ilhotas secundariamente à pancreatite severa ou por degeneração seletiva das
células da ilhota. Em cães, as ilhotas pancreáticas quase sempre são destruídas
secundariamente a uma doença inflamatória do pâncreas exócrino. Pancreatite
recidivante crônica com perda progressiva de células exócrinas e endócrinas e sua
substituição por tecido conjuntivo fibroso é uma causa freqüente de diabetes melito;
o pâncreas torna-se firme, multinodular, e freqüentemente com áreas dispersas de
hemorragia e necrose. Posteriormente no curso da doença, uma tênue banda
fibrosa ou nódulo próximo ao duodeno e estômago pode ser a única coisa que restou
do pâncreas. Infiltrações seletivas das ilhotas com amilóide, glicogênio e colágeno
com destruição das células da ilhota são causas menos freqüentes de diabetes
melito em cães que em gatos. Em outros casos, várias células β estão diminuídas,
vacuolizadas, e, se o processo for crônico, é difícil de se achar as ilhotas. Resistência
à insulina e diabetes melito secundário também são observados em muitos cães
com hiperadrenocorticismo e a administração crônica de glicocorticóides ou proges-
togênio pode predispor ao diabetes melito. A obesidade também é um fator
predisponente à resistência à insulina em cães e gatos.
Gatos com diabetes melito geralmente apresentam lesões degenerativas espe-
cíficas localizadas seletivamente nas ilhotas de Langerhans, enquanto a porção
remanescente do pâncreas parece estar normal. A deposição seletiva de amilóide
nas ilhotas, com alterações degenerativas nas células α e β, é a lesão pancreática
mais comum em gatos com diabetes; entretanto, depósitos de amilóide dispersos
nas ilhotas pancreáticas ocorrem em muitos gatos sem o desenvolvimento dos
sinais clínicos de diabetes melito. Outra lesão comum das ilhotas em gatos é a
degeneração vacuolar hidrópica das células α e β. A área citoplasmática das células
β é expandida pela acumulação maciça de glicogênio, o qual desloca as organelas
secretórias para a periferia das células β. Esta lesão seletiva das ilhotas tem sido
observada em gatos resistentes a grandes doses de insulina exógena. Degenera-
ção vacuolar com acúmulo de glicogênio em gatos parece se desenvolver nas
células β como resposta a uma superestimulação crônica (exaustão) devido à
resistência à insulina. Gatos obesos são particularmente propensos a este fenô-
meno.
A infecção com certos vírus pode causar lesão seletiva na ilhota ou pancreatite,
e tem sido implicada como responsável em certos casos pelo rápido desenvolvimen-
to de diabetes melito. A degeneração seletiva e a necrose das células β são
acompanhadas pela infiltração de linfócitos e macrófagos nas ilhotas. Estresse,
obesidade e administração de corticosteróides ou progestogênios podem aumentar
a severidade dos sinais clínicos.
Achados clínicos – O início do diabetes é freqüentemente insidioso e o curso
clínico é crônico. Os sinais freqüentemente associados com diabetes melito em cães
incluem polidipsia, poliúria, aumento do consumo alimentar mas com perda de peso,
catarata bilateral e fraqueza. Os distúrbios no metabolismo hídrico desenvolvem-se
primariamente devido a uma diurese osmótica. Em cães com hiperglicemia persis-
Pâncreas 324

tente, os rins são incapazes de reabsorver toda a glicose filtrada e conseqüentemen-


te ocorre glicosúria e produção excessiva de urina.
Animais diabéticos têm resistência diminuída a infecções bacterianas ou fúngi-
cas e freqüentemente desenvolvem infecções crônicas ou recidivantes, como cistite
supurativa, prostatite, broncopneumonia e dermatite. Esta suscetibilidade aumen-
tada à infecção pode ser em parte devida às funções microbicidas, fagocíticas e
quimiotáticas diminuídas, com diminuição da aderência de leucócitos polimorfonu-
cleares. Evidências radiográficas de cistite enfisematosa (rara) são sugestivas de
diabetes melito devido a infecções por microrganismos fermentadores de glicose,
como Proteus sp, Aerobacter aerogenes e Escherichia coli, o que resulta em
formação de gás na parede e lúmen da bexiga. O enfisema também pode-se
desenvolver na parede da vesícula biliar em cães diabéticos.
A hepatomegalia devida ao acúmulo de lipídios é comum em cães diabéticos. O
fígado gorduroso resulta do aumento da mobilização de gordura do tecido adiposo.
Células hepáticas individuais ficam muito aumentadas pelo acúmulo de múltiplas
gotículas de lipídios neutros.
A catarata se desenvolve freqüentemente em animais com diabetes melito pouco
controlado. A opacidade lenticular aparece inicialmente ao longo das linhas de
sutura das fibras da lente e possui um formato estelar (asteróide). A formação da
catarata em animais diabéticos ocorre pela deposição única de sorbitol pela qual a
glicose é metabolizada nas lentes, o que leva ao edema das últimas e à ruptura da
transmissão normal da luz.
Outras lesões extrapancreáticas associadas com o diabetes melito como
insuficiência renal crônica, cegueira e gangrena das extremidades são resultado
de microangiopatia crônica com espessamento das membranas das bases
capilares. Estas lesões ocorrem em cães e gatos mas raramente possuem
importância clínica.
A completa expressão dos complexos distúrbios metabólicos no diabetes melito
parece ser o resultado de anormalidade biormonal. Embora uma deficiência relativa
ou absoluta da ação da insulina em resposta ao aumento da concentração extrace-
lular de glicose tenha sido reconhecida como o maior fator patogênico, a importância
de um aumento absoluto ou relativo da secreção de glucagon tem sido avaliada mais
recentemente. A hiperglucagonemia no diabetes pode ser o resultado de um aumen-
to na secreção de glucagon pancreático, enteroglucagon ou de ambos. O aumento
do glucagon sangüíneo parece contribuir para o desenvolvimento de uma hiperglicemia
endógena severa pela mobilização hepática de depósitos de glicose e para o desen-
volvimento de cetoacidose pelo aumento da oxidação de ácidos graxos no fígado. A
maior conseqüência glicorregulatória da deficiência de insulina é a entrada reduzida
de glicose nos tecidos dependentes de insulina (por exemplo, gordura e musculatu-
ra) junto com um aumento na produção de glicose hepática, resultando em marcante
hiperglicemia.
Diagnóstico – O diabetes melito é diagnosticado clinicamente pelo achado de
hiperglicemia por jejum, glicosúria e freqüentemente uma cetonemia num animal
com sinais clínicos típicos. O valor normal do açúcar sangüíneo em cães em jejum
é de 75 a 120mg/dL. Níveis de açúcar sangüíneo consistentemente > 120mg/dL em
animais em jejum estão presentes no diabetes melito, e níveis > 500mg/dL têm sido
relatados.
Tratamento – O sucesso a longo prazo depende do entendimento e da coope-
ração do proprietário. O diabetes moderado é incomumente reconhecido mas pode
ser controlado por uma combinação de redução de peso e uma dieta rica em
carboidratos complexos e fibra. Fêmeas intactas devem ser castradas. Uma
pesquisa deve ser feita com relação às drogas ou às doenças que predispõem ao
diabetes. Se a dieta e a redução no peso não controlarem a doença, devem-se
Pâncreas 325

administrar protamina-zinco e insulina ultralente, NPH ou lente, ajustando-se a dose


até que a doença esteja sob controle e a urina contenha apenas traços intermedi-
ários de açúcar. As doses de manutenção são de , 0,5 a 1u/kg/dia. Aproximada-
mente 25% das calorias diárias totais devem ser dadas no momento da administra-
ção de insulina, e os 75% restantes devem ser dados 1 a 2h antes do efeito máximo
da insulina. Se a insulina administrada resultar em hipoglicemia, 5 a 20g de glicose
devem ser dados por via oral ou parenteral, e a dose diária de insulina deve ser
reduzida. Agentes hipoglicêmicos orais raramente têm valor no tratamento do
diabetes melito canino devido à presença de alterações degenerativas nas
células β.
A cetoacidose é uma séria complicação do diabetes melito e deve ser considera-
da como uma emergência médica. Os objetivos da terapia incluem: correção da
desidratação pela administração endovenosa de fluidos, como solução de cloreto de
sódio a 0,9% ou lactato de Ringer; redução da hiperglicemia e cetose pela
administração de insulina de zinco cristalino (regular); manutenção cuidadosa dos
níveis de eletrólitos séricos, especialmente do potássio, por meio da administração
suplementar de soluções eletrolíticas apropriadas; e identificação e tratamento das
doenças de base e suas complicações, como pancreatite aguda ou infecções.
Numerosos métodos de controle da terapia com insulina têm sido usados no
tratamento do diabetes melito cetoacidótico. Um deles é um regime de insulina
intermitente, no qual 0,2u/kg de insulina regular são administradas IM como dose
inicial, seguido pela administração de 0,1u/kg de hora em hora. Se a glicemia for
< 250mg/dL, a insulina deve ser injetada por via subcutânea, numa dosagem entre
0,1 e 0,4u/kg a cada 4 a 6h, monitorando-se cuidadosamente a glicemia a cada 1
a 2h. Durante o tratamento agressivo com insulina, a glicemia pode cair rapidamente
e requerer a adição de dextrose a 2,5 a 5% aos fluidos EV.
Quando a terapia com insulina for instituída, a glicemia deve ser verificada
freqüentemente até que a dose de manutenção adequada seja determinada. Se o
animal estiver em terapia de manutenção e a condição for estável, ele deve ser
avaliado 2 ou 3 vezes por ano.

TUMORES FUNCIONAIS DAS CÉLULAS DA ILHOTA


O mais freqüente tumor dessas células é um carcinoma derivado das células β que
secretam insulina. Estas neoplasias com freqüência são endocrinologicamente
ativas e secretam insulina imprópria para a glicemia, o que leva à hipoglicemia.
Outros tumores pancreáticos parecem ser derivados de células multipotenciais do
epitélio de dutos, com diferenciação em um dos vários outros tipos celulares das
ilhotas pancreáticas, que não secretam insulina. Neoplasias das células β das ilhotas
pancreáticas são observadas mais freqüentemente em cães com 5 a 12 anos de
idade. Também ocorrem em bovinos idosos e podem estar associadas a convulsões
periódicas.
Achados clínicos – As alterações clínicas observadas com tumores funcionais
de células β resultam da excessiva secreção de insulina, o que leva a um aumento
da taxa de transferência de glicose do fluido extracelular para os tecidos corporais
causando conseqüentemente severa hipoglicemia. Os sinais clínicos são um reflexo
da hipoglicemia e não são específicos para hiperinsulinismo associado a neoplasias
de células β. Os sinais iniciais incluem fraqueza posterior, fadiga após exercício, es-
pasmos e fraqueza musculares generalizados, ataxia, confusão mental, e altera-
ções no temperamento. Os cães são facilmente excitáveis e há períodos intermiten-
tes de excitabilidade e repouso. Convulsões clonicotônicas periódicas ocorrem
posteriormente na doença e aumentam progressivamente em freqüência e intensi-
dade.
Pâncreas 326

Os distúrbios causados por neoplasias funcionais das células β são caracteris-


ticamente episódicos e ocorrem inicialmente num amplo espaço de tempo, mas
tornam-se mais freqüentes e prolongados com o progresso da doença. Os ataques
hipoglicêmicos podem ser precipitados por exercícios físicos (aumento da utilização
de glicose) ou jejum (diminuição da disponibilidade), assim como pela ingestão de
alimento (estimulação da liberação de insulina). A administração de glicose alivia
rapidamente os sintomas.
A predominância de sinais clínicos associados ao SNC demonstra a dependên-
cia primária do cérebro no metabolismo da glicose para energia. Quando o cérebro
não é suprido com glicose, a oxidação cerebral diminui e aparecem manifestações
de anorexia.
Como os cães com tumores funcionais nas células das ilhotas apresentam sin-
tomas compatíveis com doença primária do SNC, eles podem ser diagnosticados
erroneamente como portadores de epilepsia idiopática, tumores cerebrais, ou outra
doença neurológica orgânica. Repetidos episódios de hipoglicemia prolongada e
severa podem resultar em degeneração neuronal irreversível por todo o cérebro. A
inabilidade neurológica permanente provavelmente leva ao coma terminal, ausên-
cia de resposta à glicose e eventual morte de alguns cães.
Lesões – Adenocarcinomas de ilhotas pancreáticas, chamados de insulinomas,
geralmente são nódulos únicos, amarelos a vermelho-escuros, esféricos, pequenos
(1 a 3cm) e visíveis a partir da superfície serosa. São similares em consistência mas
ligeiramente mais firmes que o parênquima pancreático circundante. Adenocarci-
nomas funcionais de células da ilhota ocorrem como nódulos únicos ou, ocasional-
mente, como nódulos múltiplos no mesmo lobo ou em lobos diferentes do pâncreas.
Uma fina camada de tecido conjuntivo fibroso separa a neoplasia do parênquima
adjacente. Adenocarcinomas de células da ilhota freqüentemente metastatizam
para os linfonodos regionais e/ou o fígado, antes do diagnóstico. Adenomas
benignos verdadeiros das células da ilhota são raros.
Diagnóstico – Uma determinação da glicemia deve ser feita em cães idosos com
história de convulsões periódicas. O achado de hipoglicemia em jejum (≤ 60mg/dL)
em cães de meia-idade a idosos é um forte indício para um provável “insulinoma”.
Concentrações séricas de insulina no momento da hipoglicemia são tipicamente
> 30µu/mL. O diagnóstico diferencial inclui hipoadrenocorticismo, insuficiência hepáti-
ca, grandes neoplasias extrapancreáticas, sepse, policitemia, superdosagem de
insulina e erro laboratorial. Excluir outras causas de hipoglicemia e cirurgia explorató-
ria são as medidas freqüentemente mais efetivas para se confirmar o diagnóstico.
Tratamento – Embora adenocarcinomas de células β sejam geralmente únicos
em cães, o pâncreas inteiro deve ser examinado cuidadosamente com relação à
existência de múltiplos tumores. A complexa excisão de adenocarcinomas solitários
das células da ilhota melhora a hipoglicemia e os sinais neurológicos associados, a
menos que haja alterações irreversíveis no SNC ou que metástases não visualizadas
estejam presentes. Ainda que o potencial de malignidade dos “insulinomas” seja alto,
pode-se prolongar a sobrevivência (> 1 ano) em muitos cães pelo “debulking” de
todos os tumores visíveis na cirurgia. Cães com tumores inoperáveis podem ser
controlados razoavelmente bem com múltiplas alimentações/dia e pela adminis-
tração de glicocorticóide (0,5 a 1mg/kg/dia). A droga diazóxido (20 a 80mg/kg/dia,
3 vezes ao dia) também pode aliviar os sinais clínicos em alguns cães.

TUMORES SECRETORES DE GASTRINA DAS CÉLULAS NÃO β


DA I LHOTA
Estes tumores pancreáticos foram relatados em humanos, cães e um gato. A
hipersecreção de gastrina em humanos resulta na bem documentada síndrome de
Glândulas Paratireóides 327

Zollinger-Ellison, que consiste na hipersecreção de ácido gástrico e na ulceração


péptica recidivante no trato GI. Os tumores, derivados de células APUD (“amine
precursor uptake decarboxylase”) ectópicas no pâncreas produzem um excesso
do hormônio gastrina, o qual normalmente é secretado pelas células das mucosas
antral e duodenal.
Achados clínicos – A incidência desses tumores em cães e gatos é rara; eles
ocorrem menos freqüentemente que as neoplasias de células β secretoras de
insulina. Nos poucos casos documentados, os cães e os gatos apresentavam
anorexia, hematêmese, diarréia intermitente (geralmente com sangue escuro
presente), progressiva perda de peso e desidratação. Os distúrbios funcionais
proeminentes parecem resultar das múltiplas ulcerações da mucosa GI que se
desenvolvem a partir da hipersecreção de gastrina.
Lesões – Os animais estudados que apresentam uma síndrome semelhante à
de Zollinger-Ellison possuíam tumores únicos ou múltiplos e de tamanhos variáveis
no pâncreas. Eles freqüentemente eram firmes à palpação devido ao aumento de
tecido conjuntivo fibroso no estroma, e todos apresentavam evidências de metás-
tases antes do diagnóstico.
Diagnóstico – Os níveis séricos de gastrina foram avaliados em um número
limitado de cães com tumores das células não β da ilhota. Níveis de gastrina em cães
com síndrome semelhante à de Zollinger-Ellison variam de 155 a 2.780pg/mL,
enquanto o meio sérico de gastrina em cães clinicamente normais (controle) é de
70,9pg/mL. O achado de úlceras gastroduodenais recidivantes em cães sem uma
causa identificada justifica uma cirurgia exploratória e inspeção cuidadosa do
pâncreas.
Tratamento – Deve-se tentar a excisão da massa secretora de gastrina no
pâncreas. Todos os tumores pancreáticos secretores de gastrina estudados em
cães tinham evidência de invasão local no parênquima adjacente e tinham me-
tastatizado para os linfonodos regionais e o fígado. Os cães possuem ulcerações
únicas ou múltiplas na mucosa gástrica e/ou duodenal associadas à presença
de sangue livre no lúmen. Condutas médicas com antagonistas de receptores H2
(cimetidina ou ranitidina) ou com o novo inibidor “proton pump”, omeprazol,
podem permitir o alívio temporário dos sinais clínicos nos animais com doença
inoperável.

GLÂNDULAS PARATIREÓIDES
As glândulas paratireóides secretam o hormônio paratireóideo (PTH, parator-
mônio), que aumenta os níveis séricos de cálcio (Ca) e potencializa a excreção renal
de fósforo (P). Os níveis de íon de cálcio regulam a liberação de calcitonina (CT,
tirocalcitonina) de uma segunda população de células endócrinas na tireóide, a qual
favorece a homeostasia do cálcio. O paratormônio mantém concentrações de cálcio
ionizado no fluido extracelular por aumento da reabsorção óssea, absorção GI de
cálcio na presença de vitamina D e redução da excreção urinária de cálcio. A
secreção do paratormônio é regulada por alterações na concentração sangüínea
de cálcio.
Como o metabolismo aberrante de Ca e P é refletido no sistema esquelético,
síndromes específicas estão presentes nesta seção (ver DISTROFIAS ASSOCIADAS AO
CÁLCIO, F ÓSFORO E VITAMINA D, pág. 578 e também HIPERCALCEMIA HUMORAL M ALIGNA,
pág. 343).
Glândulas Paratireóides 328

HORMÔNIOS REGULADORES DE CÁLCIO


A concentração de Ca no sangue dos mamíferos é de , 10mg/dL, com algumas
variações de acordo com a espécie (por exemplo, em eqüinos e coelhos, concen-
trações de até a 13mg/dL são consideradas normais), idade, dieta e com o método
analítico. O Ca sangüíneo é composto por uma proteína ligante e por frações
difusíveis. O cálcio difusível consiste de cálcio ligado a ânions, como fosfato e citrato,
adicionado ao cálcio livre (iônico) biologicamente ativo.
O íon de cálcio desempenha um papel-chave em muitos processos biológicos
fundamentais, incluindo contração muscular, coagulação sangüínea, atividade enzi-
mática, excitabilidade neural, mensagens secundárias, liberação de hormônio e
permeabilidade das membranas, além de ser um componente estrutural essencial
do esqueleto. O controle preciso do íon de cálcio nos fluidos extracelulares é vital
para a saúde. Os 3 principais hormônios (PTH, CT e vitamina D) interagem para
manter uma concentração constante de cálcio, apesar das variações na ingestão e
excreção; outros hormônios, como os corticosteróides da adrenal, os estrogênios, a
tireoxina, a somatotrofina e o glucagon, podem também contribuir para a manuten-
ção da homeostasia do cálcio.

Hormônio paratireóideo
O PTH é sintetizado e estocado nas células principais das glândulas paratireói-
des. A síntese é regulada por um mecanismo de “feedback” que envolve o nível de
Ca sangüíneo (e, em menor grau, o magnésio). Além disso, aminas biológicas,
peptídeos, esteróides e várias classes de drogas podem influenciar a secreção de
PTH.
A função primária do PTH é controlar a concentração de cálcio no fluido
extracelular, o qual funciona na mudança de posição da função padrão de transfe-
rência de cálcio para dentro e para fora do osso, reabsorção nos rins e absorção a
partir do trato gastrointestinal. O efeito nos rins é o mais rápido e causa reabsorção
de cálcio e excreção de fósforo. O mais importante efeito inicial do PTH no osso é
a mobilização do cálcio do osso para o fluido extracelular; posteriormente, a
formação óssea é incrementada. O PTH não afeta diretamente a absorção de cálcio
do intestino; em vez disso, é preferencialmente mediado de forma indireta pela
regulação da síntese de um metabólito ativo de vitamina D.

Calcitonina
(CT, Tirocalcitonina)
É um hormônio polipeptídeo secretado pelas células parafoliculares da tireóide
em mamíferos e por um tecido ultimobranquial em aves e outras espécies de
submamíferos.
A concentração do íon de cálcio nos fluidos extracelulares é o principal estímulo
para a secreção de calcitonina pelas células C. Ela é secretada continuamente sob
condições de normocalcemia, mas em condições de hipercalcemia sua taxa de
secreção é aumentada notavelmente por uma rápida descarga do hormônio
armazenado nas células C para os capilares interfoliculares. Hiperplasia de células
C ocorre em resposta a uma hipercalcemia prolongada. Quando o cálcio sangüíneo
é baixo, o estímulo para a secreção de calcitonina é diminuído e numerosos grânulos
secretórios acumulam-se no citoplasma das células C. O armazenamento de
grandes quantidades de hormônio pré-formado nas células C e a liberação rápida
em resposta a elevações moderadas de cálcio sangüíneo provavelmente refletem
o papel fisiológico da calcitonina como um hormônio de “emergência” para a
proteção contra o desenvolvimento de hipercalcemia. A secreção de calcitonina é
Hipófise 329

aumentada em resposta a uma refeição com alto teor de cálcio, freqüentemente


antes que uma significante elevação de cálcio plasmático possa ser detectada, o
que sugere que os hormônios gastrointestinais sejam importantes no estímulo para
liberação precoce da calcitonina.
A administração de calcitonina ou a estimulação da secreção endógena resulta
num desenvolvimento de graus variáveis de hipocalcemia e hipofosfatemia. Esses
efeitos são mais evidentes em animais com aumento da remodelação do esqueleto.
A calcitonina exerce sua função pela interação com células-alvo, primariamente em
tecidos ósseo e renal. As ações de PTH e calcitonina são antagônicas na reabsorção
óssea, mas sinérgicas na diminuição da reabsorção tubular renal de fósforo. Os
efeitos hipocalcêmicos da calcitonina são primariamente resultantes da diminuição
da entrada de cálcio do esqueleto para o plasma devido a uma inibição temporária
da estimulação da reabsorção óssea do PTH. A hipofosfatemia desenvolve-se a
partir de uma ação direta da calcitonina, aumentando a taxa de movimentação de
fósforo fora do plasma para dentro dos tecidos moles e ossos, bem como a inibição
da reabsorção óssea. Uma ação da calcitonina é a inibição da reabsorção óssea
estimulada pelo PTH e outros fatores.

Colecalciferol
(Vitamina D)
O terceiro hormônio mais importante, envolvido na regulação do metabolismo do
cálcio e na remodelação do esqueleto, é o colecalciferol ou vitamina D3. Embora
esse composto tenha sido, por muito tempo, classificado como vitamina, evidências
recentes sugerem que ele possa igualmente ser considerado como um hormônio.
O colecalciferol é ingerido em pequenas quantidades, mas, em adição, é sintetizado
na epiderme a partir de uma molécula percursora (7-desidrocolesterol) por meio de
uma forma intermediária da pré-vitamina D 3. Esta reação é catalisada por radiação
ultravioleta.
A vitamina D deve ser metabolicamente ativada antes de poder exercer suas
funções fisiológicas. O primeiro metabólito do colecalciferol é produzido no fígado
e transportado para os rins, onde sofre posterior hidroxilação sob a influência de
uma enzima nas células do túbulo proximal contornado para criar uma forma
biologicamente ativa (hormonal) o 1,25-diidroxicolecalciferol. Esta conversão nos
rins é autolimitante no metabolismo da vitamina D e é parcialmente responsável pela
demora entre a administração da mesma e o aparecimento de seus efeitos
biológicos. O hormônio paratireóideo e as condições que estimulam sua secreção,
bem como o baixo teor de fósforo no sangue, aumentam a formação do metabólito
ativo da vitamina D. Altos níveis de fósforo no sangue têm efeito oposto. Sob certas
condições, prolactina, estradiol, lactógeno placentário e possivelmente somatotrofina
têm um efeito estimulante similar. O aumento da secreção desses hormônios,
isoladamente ou em combinação, parece ser importante na eficiente adaptação às
importantes demandas de cálcio da gestação, lactação e crescimento.

HIPÓFISE
A hipófise (glândula pituitária) possui 2 partes distintas, a neuro-hipófise (lobo
posterior) e a adeno-hipófise (lobo anterior).
Adeno-hipófise – Em adultos, a hipófise é completamente separada da cavida-
de oral. A adeno-hipófise, que circunda a pars nervosa do sistema neuro-hipofisário
em graus variáveis nas diferentes espécies, consiste de 3 porções, a saber, a pars
Hipófise 330

distalis, a pars tuberalis e a pars intermedia. A pars distalis é a maior e contém


múltiplas populações de células endócrinas. A pars tuberalis funciona primariamen-
te como um “andaime” para a rede capilar do sistema portal da hipófise. A pars
intermedia forma a junção entre a pars distalis e a pars nervosa. Ela contém 2
populações de células em cães, uma das quais sintetiza o hormônio
adrenocorticotrófico (ACTH).
Uma população específica de células endócrinas na pars distalis (e nas pars
intermedia, no caso do ACTH em cães) sintetiza e secreta cada um dos hormônios
tróficos hipofisários. As células hipofisárias possuem um ciclo secretório e iniciam
uma fase de síntese ativa em resposta ao aumento da demanda de um hormônio
particular. Células secretórias na adeno-hipófise são freqüentemente subdivididas
em cromófilas (acidófilas, basófilas) e cromófobas com base na interação de
grânulos secretórios com manchas histoquímicas que dependem do pH.
Os acidófilos são posteriormente subdivididos em somatrófilos, que secretam
hormônio de crescimento (GH, somatotrofinas) e lactotróficos que secretam pro-
lactina. Os basófilos incluem os gonadotróficos, que secretam o hormônio luteini-
zante (LH) e o hormônio folículo-estimulante (FSH) e os tireotróficos que secretam
o hormônio tireotrófico (TSH). Os cromófobos incluem células endócrinas envolvi-
das na síntese do ACTH e do hormônio estimulante de melanócitos (MSH), células
foliculares não secretórias e células indiferenciadas.
As células endócrinas na adeno-hipófise estão sob o controle de hormônios
liberadores hipotalâmicos correspondentes. Estes hormônios liberadores são trans-
portados pelo sistema portal hipofisário para células específicas na adeno-hipófise,
onde eles estimulam a rápida liberação dos hormônios tróficos pré-formados.
Existem hormônios liberadores hipotalâmicos separados que regulam a taxa de
secreção de cada hormônio trófico da adeno-hipófise. Para a maioria dos hormônios
tróficos hipofisários, um controle de “feedback” negativo é acompanhado por uma
volta de “feedback” envolvendo a concentração sangüínea do hormônio produzido
pela glândula endócrina-alvo (por exemplo, tireóide, córtex adrenal, ovário e testícu-
lo). Hormônios como a prolactina, o GH e o MSH têm mecanismos de “feedback” mais
complexos; por exemplo, a prolactina age primariamente na glândula mamária e o
GH tem seu principal efeito no fígado – ambos tecidos não endócrinos. O “feedback”
negativo em ambos os casos inclui metabólitos e outros “mensageiros” (por exemplo,
Fator I de crescimento semelhante à insulina produzido pelo fígado). No caso do GH,
há um regulador hipotalâmico estimulatório (hormônio liberador do GH) assim como
inibitório (somatostatina).
Neuro-hipófise – A neuro-hipófise (pars nervosa, lobo posterior) possui 3
subdivisões anatômicas. Os grânulos secretórios que contêm os hormônios da
neuro-hipófise, ou seja, oxitocina e hormônio antidiurético (ADH, vasopressina), são
sintetizados no hipotálamo mas são liberados na corrente sangüínea da pars
nervosa. O pendúculo infundibular liga a pars nervosa ao hipotálamo adjacente.
ADH, um octapeptídeo sintetizado no hipotálamo, é “embalado” em grânulos
limitados por membrana com uma proteína de ligação correspondente (neurofisina)
e transportado para a pars nervosa, onde é liberado para a circulação. O ADH liga-
se a receptores específicos na porção distal do néfron e do duto coletor do rim; ele
aumenta a reabsorção tubular renal de água a partir do filtrado glomerular.
A produção de ADH está diretamente relacionada ao grau de hidratação do
corpo. A hidratação do corpo inibe a liberação de ADH, o que causa uma menor
reabsorção de água do filtrado glomerular, removendo, dessa forma, o excesso de
água do corpo. A desidratação do corpo ou injeções de soluções eletrolíticas
hipertônicas favorecem a liberação de ADH, que por sua vez causa aumento na
reabsorção de água do filtrado glomerular, resultando em diluição e diminuição da
osmolaridade dos fluidos corporais. Outros fatores, como barbitúricos, éter, cloro-
Hipófise 331

fórmio, morfina, acetilcolina, nicotina e dor aumentam a liberação de ADH, levando


a uma menor formação de urina. O etanol inibe a liberação de ADH, o que leva à
diurese.
O efeito do ADH na pressão sangüínea é menos proeminente que o efeito
antidiurético. Em uma dose várias centenas de vezes maior que a dose antidiurética,
o ADH apresenta um pronunciado efeito na pressão, podendo também levar à
constrição coronária. O mecanismo contrátil dos capilares, assim como da muscula-
tura uterina e GI, é estimulado, e segue-se uma prolongada elevação da pressão
sangüínea. A oxitocina possui efeitos específicos na musculatura lisa do útero e nas
células mioepiteliais da glândula mamária. Não está estabelecida uma função
fisiológica no macho, embora sugira-se um efeito no transporte espermático.

TUMORES SECRETORES DE ACTH ASSOCIADOS AO


HIPERCORTISOLISMO
Tumores funcionais que se desenvolvem na hipófise geralmente são derivados
das células corticotróficas (secretoras de ACTH), ou na pars distalis ou na pars
intermedia. Eles causam uma síndrome clínica de excesso de cortisol (doença de
Cushing). Estas neoplasias desenvolvem-se mais freqüentemente em cães adultos
a idosos e têm sido relatadas em algumas raças, principalmente boxers, terriers
boston e dachshunds. Elas são raras em outros animais. A superprodução crônica
de hormônios glicocorticóides pelo córtex adrenal hiperplásico resulta em combi-
nações gliconeogênicas, lipolíticas, catabólicas de proteínas e antiinflamatórias em
muitos sistemas orgânicos.
Achados clínicos – Desenvolvem-se muitas alterações funcionais e clínicas
distintas. A redistribuição centrípeta do tecido adiposo leva a aumentos gordurosos
proeminentes na linha média dorsal do pescoço, dando ao último e aos ombros uma
aparência grossa. A ingestão de alimento pode aumentar ou pela estimulação direta
do centro do apetite pelo excesso de cortisol ou como resultado da destruição do
“centro da saciedade” no hipotálamo pelo adenoma.
A musculatura do abdome e das extremidades torna-se enfraquecida e atrofiada.
A perda de tono da musculatura abdominal e músculos do esqueleto abaxial resulta
em desenvolvimento gradual de uma aparência “barriguda”, lordose e tremores
musculares, e o animal mantém-se com os membros abertos para poder suportar
o peso do corpo. Atrofia profunda dos músculos temporais pode resultar em
reentrâncias côncavas e proeminências palpáveis dos ossos adjacentes do crânio.
A hepatomegalia, devida em parte ao aumento da deposição de gordura e glicogênio
e vacuolização das células hepáticas, pode contribuir para o desenvolvimento de um
abdome distendido e freqüentemente pendular.
Lesões – A hipófise é aumentada em cães com adenomas corticotróficos. Nem
a ocorrência nem a severidade dos distúrbios parecem estar relacionadas dire-
tamente ao tamanho da neoplasia. O crescimento do tumor hipofisário pode
comprometer o segundo, o terceiro e o quarto pares de nervos cranianos, levando
a distúrbios funcionais correspondentes.
Há aumento bilateral das glândulas adrenais em cães com adenomas cortico-
tróficos funcionais. Este aumento freqüentemente é marcante e ocorre devido ao
aumento do parênquima cortical. Nódulos nos tecidos corticais de coloração
amarelo-alaranjada freqüentemente são encontrados na porção externa da cápsu-
la na gordura periadrenal, bem como estendendo-se para a medula adrenal. A
secreção excessiva de cortisol nestes cães pode ser diminuída pela administração
de mitotano (o,p’DDD), uma droga adrenocitotóxica.
Adenomas derivados das células corticotróficas da pars intermedia desenvol-
vem-se nas raças braquicefálicas com menos freqüência que em outros cães. Os
Hipófise 332

adenomas da pars intermedia em cães podem estar associados com a secreção de


um excesso de ACTH, levando à hiperplasia adrenocortical bilateral e à síndrome
do excesso de cortisol. Os sinais clínicos dos adenomas corticotróficos funcionais
que se desenvolvem na pars intermedia são semelhantes aos dos adenomas da
pars distalis.
Tumores hipofisários que se desenvolvem na pars intermedia de cães freqüen-
temente invadem a pars nervosa e pendúnculo infundibular, e resultam em distúr-
bios no metabolismo hídrico na fase inicial do seu desenvolvimento.

TUMORES HIPOFISÁRIOS NÃO FUNCIONAIS


Ocorrem em cães, gatos, roedores de laboratório e periquitos, mas são raros em
outras espécies. Embora os adenomas cromófobos pareçam ser endocrinologica-
mente inativos, eles podem causar atrofia devido à compressão das porções
adjacentes da hipófise e se estender para o cérebro. Distúrbios clínicos ocorrem ou
por ausência de secreção dos hormônios tróficos hipofisários e diminuição da
função dos órgãos-alvo (por exemplo, córtex adrenal), ou pela disfunção do SNC.
Os animais afetados freqüentemente estão deprimidos, incoordenados e fracos,
podendo ter um colapso ao exercício (ver também PAN-HIPOPITUITARISMO DO ADULTO,
adiante).
Adenomas hipofisários endocrinologicamente inativos freqüentemente atingem
tamanhos consideráveis antes de causarem sinais óbvios (ou morte). As células
tumorais proliferativas incorporam as estruturas remanescentes da adeno-hipófise
e do pendúculo infundibular. O hipotálamo inteiro pode tornar-se comprimido e ser
substituído pelo tumor.

HIRSUTISMO ASSOCIADO A ADENOMAS DA PARS INTERMEDIA


(Hipertricose)
É uma doença que se desenvolve em cavalos idosos, mais freqüentemente em
fêmeas; está usualmente associada com um adenoma hipofisário derivado de
células da pars intermedia. Estes adenomas quase sempre comprimem severamen-
te o hipotálamo sobrejacente. O hipotálamo é o centro primário da regulação
homeostática da temperatura corporal, do apetite e da queda cíclica do pêlo.
Achados clínicos e lesões – Os sinais são poliúria, polidipsia, apetite voraz,
fraqueza, sonolência, hiperpirexia intermitente e hiper-hidrose generalizada. O
hirsutismo freqüentemente torna-se evidente devido à ausência da queda estacio-
nal cíclica dos pêlos. O pêlo, na maior parte do tronco e extremidades, é longo (até
10 a 12mm), anormalmente grosso, ondulado e freqüentemente emaranhado.
Os cavalos com tumores maiores podem apresentar hiperglicemia (insulina-
resistente) e glicosúria, provavelmente como resultado de uma regulação decres-
cente dos receptores de insulina nas células-alvo, induzida pela ingestão excessiva
e crônica de alimentos e pela hiperinsulinemia.
Estes são os tumores hipofisários mais comuns em cavalos; eles variam de
amarelos a brancos, são multinodulares e incorporam a pars nervosa. O cortisol
plasmático e os níveis de adrenocorticotrofina imunorreativa são modestamente
elevados; os níveis de cortisol diminuem seu ritmo diurno, e não são suprimidos nem
por doses altas nem por doses baixas de dexametasona.
Diagnóstico – Hiperglicemia e certa insensibilidade à insulina são altamente
sugestivas de adenomas hipofisários em eqüinos. Outros achados inespecíficos
incluem neutrofilia absoluta ou relativa, eosinopenia, linfopenia, lipemia, hiperco-
lesterolemia e uma anemia normocítica normocrômica leve. As enzimas hepáticas
podem estar elevadas. Os eletrólitos normalmente estão normais. A urinálise é normal
exceto por uma glicosúria ocasional e uma gravidade específica baixa a normal.
Hipófise 333

O diagnóstico definitivo é baseado na resposta aos testes de estimulação do eixo


hipófise-adrenal. O cortisol basal fica no seu limite superior de normalidade até
levemente elevado. A resposta ao ACTH (1u/kg/EV) pode ser exagerada (> 2 vezes
a taxa normalmente observada após 2h) em alguns cavalos. A dexametasona
(40µg/kg, IM) freqüentemente não suprime os níveis de cortisol a um mínimo de 30%
do valor basal ou < 1µg/dL, o que ocorre em cavalos normais 6h após a adminis-
tração.
O diagnóstico diferencial inclui síndromes que resultam em debilitação crônica,
por exemplo, manejo e nutrição precários, parasitismo e doenças sistêmicas
crônicas. A polidipsia/poliúria deve ser diferenciada daquela causada por insuficiên-
cia renal crônica ou diabetes insípido. A hiperglicemia, a glicosúria e a poliúria/polidipsia
devem ser diferenciadas do diabetes melito primário. Os feocromocitomas podem
causar hiper-hidrose, hiperglicemia e taquipnéia, embora eles geralmente não
sejam funcionais e apenas encontrados incidentalmente à necropsia.
Tratamento – Poucos cavalos têm sido tratados com sucesso, mas a adminis-
tração diária de ciproeptadina (0,13 a 0,26mg/kg, VO) tem sido útil para alguns
animais. Esta dose é mantida por 3 meses, após os quais pode-se tentar terapia em
dias alternados. Uma diminuição na PUPD deverá ser vista dentro de 1 a 2 meses
se a terapia for bem-sucedida. O pergolida, um agonista dopaminérgico, também
tem sido usado com sucesso em alguns cavalos, numa dose diária de 4 a 11µg/kg,
VO. Embora não tenham sido observados, os efeitos colaterais potenciais são
aqueles relacionados aos efeitos vasoconstritores da droga.

PAN- HIPOPITUITARISMO DO ADULTO


Endocrinologicamente inativos, os tumores hipofisários não funcionais ocorrem
com freqüência em cães, gatos e periquitos, porém são raros em outras espécies.
Desenvolvem-se com maior freqüência no animal adulto e no velho. Não parece
haver predisposição por raça. A causa mais comum é um adenoma cromófobo que
surge na pars distalis. Outras causas não freqüentes incluem: destruição inflamatória
extensa do tecido hipofisário; necrose isquêmica da hipófise devida a infarto causado
por invasão de células tumorais; êmbolos parasitários ou sépticos; necrose difusa
associada à toxemia; invasão por neoplasias de estruturas adjacentes (como as
meninges, osso esfenóide, cavidade nasal, etc.) e hemorragia extensa e cicatrização
posterior a lesões traumáticas. Os cães e gatos com adenomas não funcionais
desenvolvem distúrbios clínicos relacionados a falta de hormônios tróficos hipofisá-
rios e diminuição da função do órgão-alvo ou disfunção do SNC.
Achados clínicos – Os cães afetados, em geral, apresentam-se deprimidos,
incoordenados e colapsam com exercício; ocasionalmente, exibem uma mudança
na atitude. Eles podem tornar-se não responsivos às pessoas e desenvolver uma
tendência a esconder-se na menor provocação. Nos casos de longa duração, pode
haver evidência de cegueira, com pupilas dilatadas e fixas, devido à compressão e ao
rompimento dos nervos ópticos pela extensão dorsal do tumor hipofisário. Os cães
afetados freqüentemente têm perda progressiva de peso com atrofia muscular
devida à perda do efeito anabólico proteico do hormônio de crescimento. A compres-
são das células secretoras de hormônios gonadotróficos ou do hormônio liberador do
hipotálamo correspondente resulta em atrofia das gônadas. Os distúrbios no equilí-
brio hídrico são o resultado de uma interferência na síntese do hormônio antidiurético
ou sua liberação para os capilares da pars nervosa. O lobo posterior, o pedúnculo
infundibular e o hipotálamo são comprimidos ou rompidos pelas células neoplásicas.
Os animais com pan-hipopituitarismo parecem estar desidratados, apesar do consu-
mo maior de água. Os cães e os gatos com grandes tumores hipofisários não
funcionais normalmente excretam grandes volumes de urina com baixa densidade
Hipófise 334

específica (≤ 1,007) e os que estavam acostumados a urinar em casa podem fazê-lo


fora dela. Os sinais clínicos não são muito específicos e podem ser confundidos com
outros desajustes do SNC (como tumores cerebrais e encefalite) ou doença renal
crônica.
O hipopituitarismo causado pelos tumores hipofisários deve ser incluído no diagnós-
tico diferencial das enfermidades caracterizadas por incoordenação, depressão,
poliúria, cegueira e mudança súbita do comportamento em animais adultos ou
idosos. Devido à cegueira ser de origem central, o exame oftalmoscópico geralmente
não revela lesões significativas. Não há efeito sobre a estatura corporal associado à
compressão da pars distalis e à provável interferência da secreção do hormônio de
crescimento, porque estas neoplasias normalmente aparecem em cães que já
tenham completado seu crescimento. Os periquitos com adenomas cromófobos
freqüentemente desenvolvem exoftalmia devida à extensão das células neoplásicas
ao longo do nervo óptico.
Lesões – Os adenomas hipofisários endocrinologicamente inativos geralmente
atingem um tamanho considerável antes de causar sinais evidentes ou morte. As
células tumorais proliferativas incorporam as estruturas restantes da adeno-hipófise
e do pedúnculo infundibular. O hipotálamo pode estar totalmente comprimido e ser
substituído pelo tumor.
As glândulas tireóideas de cães e gatos com grandes adenomas hipofisários são
freqüentemente menores que o normal, embora num grau muito menor que o córtex
adrenal. As glândulas adrenais são pequenas e consistem primariamente de tecido
medular circundado por uma zona estreita do córtex. Os túbulos seminíferos são
pequenos e mostram pouca evidência de espermatogênese ativa.
A atrofia da pele e a perda de massa muscular podem estar relacionadas à perda
dos efeitos anabólicos proteicos do hormônio de crescimento em cães ou gatos
adultos. A interferência na secreção de hormônios tróficos hipofisários freqüente-
mente causa atrofia gonadal que resulta tanto na diminuição da libido ou anestro,
como na hipoglicemia por atrofia do córtex adrenal.

PAN- HIPOPITUITARISMO JUVENIL


O nanismo hipofisário ocorre mais freqüentemente em pastores alemães,
principalmente nos da mesma ninhada ou de ninhadas relacionadas, o que sugere
uma herança autossômica recessiva. Também é relatado em outras raças como
spitz, pinscher miniatura e cães carelian bear (da Dinamarca).
Normalmente está relacionado com uma incapacidade do ectoderma orofarín-
geo do duto faríngeo cranial (bolsa de Rathke) para diferenciar-se nas células
secretoras de hormônios tróficos da pars distalis. Conseqüentemente, a adeno-
hipófise não está completamente desenvolvida. A segunda causa mais comum é um
craniofaringioma, um tumor benigno derivado do ectoderma orofaríngeo da bolsa de
Rathke. Comparado com todos os outros tipos de neoplasias hipofisárias, os
craniofaringiomas desenvolvem-se em cães mais jovens. Eles causam pan-hipopi-
tuitarismo e nanismo em cães jovens devido à secreção subnormal de somatotrofina
e de outros hormônios tróficos começando em idade jovem, antes do fechamento
das placas de crescimento.
Achados clínicos – Os cães anões são indistinguíveis de seus irmãos normais
quando nascem e permanecem assim até , 2 meses de idade. Posteriormente, a
velocidade de crescimento menor que a de seus irmãos, a retenção da pelagem
infantil e a falta de pêlos primários gradualmente põem em evidência os cães com
nanismo. Os pastores alemães com nanismo hipofisário se assemelham aos coiotes
ou raposas devido ao seu tamanho e à pelagem suave e lanosa. Gradualmente,
desenvolve-se uma alopecia simétrica bilateral que, com freqüência, progride até
Hipófise 335

uma alopecia completa, exceto na cabeça e extremidades. A dentição permanente


apresenta-se retardada ou completamente ausente. O fechamento das epífises
demora até 4 anos, dependendo da severidade da insuficiência hormonal. Os testí-
culos e o pênis são pequenos, a calcificação do osso peniano é retardada ou
incompleta e o prepúcio é flácido. O córtex ovariano é hipoplásico e o estro se
apresenta irregular ou ausente. A vida média nesses cães é curta como resultado não
só do pan-hipopituitarismo como também das disfunções endócrinas secundárias,
como hipotireoidismo e hipoadrenocorticismo.
Lesões – Os cistos são hipofisários preenchidos com muco e eventualmente
ocupam toda a área hipofisária e comprimem severamente a pars nervosa e o
pedúnculo infundibular.
Os craniofaringiomas são grandes áreas císticas sólidas que se estendem no
hipotálamo sobrejacente. Também podem crescer ao longo da face ventral do
cérebro, onde incorporam vários nervos cranianos que resultam em deficiências
específicas na função dos mesmos.
Diagnóstico – Os níveis de tireoxina, triiodotironina e cortisol são reduzidos ou
têm valores normais mínimos. Naqueles animais uma mudança equívoca na con-
centração basal de hormônio, as respostas a agressões com tireotrofina ou adreno-
corticotrofina exógenas são subnormais, devido à hipoplasia das glândulas tireói-
deas e córtex adrenal. Outro auxílio diagnóstico útil inclui a comparação do peso dos
cães com o de seus irmãos, radiografias das linhas epifisárias abertas e biópsia
cutânea. As lesões cutâneas incluem hiperceratose, ceratose folicular, hiperpigmen-
tação, atrofia dos anexos e perda das fibras de elastina, assim como a perda da rede
de fibras colágenas na derme. A haste dos pêlos é ausente e os folículos pilosos
encontram-se primariamente na fase telogênica do ciclo de crescimento.
A atividade da somatomedina (um peptídeo promotor de crescimento de cartila-
gens, produzido no fígado a partir da somatotrofina) é reduzida nos cães anões. A
atividade intermediária da somatomedina está presente nos antepassados fenotipi-
camente normais suspeitos de serem portadores heterozigotos. Os ensaios com
somatomedina proporcionam uma medida indireta da atividade do hormônio de
crescimento circulante em cães com suspeita de nanismo hipofisário. As concentra-
ções basais do hormônio de crescimento canino circulante podem ser detectadas,
porém são reduzidas (limites normais: 1,75 ± 0,17ng/mL) nos anões hipofisários e
não aumentaram depois do teste de agressão para secreção de hormônio de
crescimento por meio da injeção de clonidina (30µg/kg, por via EV), como no caso
dos cães normais. Tem-se demonstrado hipersensibilidade à insulina em cães com
nanismo hipofisário, provavelmente devido a uma alteração no número de recepto-
res de insulina ou na afinidade de ligação em resposta às concentrações reduzidas
do hormônio de crescimento.

DIABETES INSÍPIDO
É um distúrbio que ocorre devido à reduzida secreção de hormônio antidiurético
(ADH), ou devido à incapacidade das células-alvo nos rins, que não dispõem do
mecanismo necessário para responder à secreção normal ou elevada dos níveis
hormonais circulantes. Isto ocorre em cães, gatos, ratos de laboratório e raramente
em outros animais.
Etiologia – A forma hipofisária de diabetes insípido (DI) desenvolve-se como
resultado da compressão e destruição da pars nervosa, do pendúnculo infundibular
ou do núcleo supra-óptico no hipotálamo. As lesões responsáveis por este rompi-
mento na síntese ou secreção do ADH no diabetes insípido hipofisário incluem
grandes neoplasias hipofisárias (endocrinologicamente ativas ou inativas), um cisto
que se expande dorsalmente ou um granuloma inflamatório e uma lesão craniana
traumática, com hemorragia e proliferação glial no sistema neuro-hipofisário.
Hipófise 336

Achados clínicos e lesões – Os animais afetados eliminam grandes volumes


de urina hipotônica e ingerem grandes quantidades de água. A osmolalidade
urinária encontra-se abaixo da osmolalidade normal do plasma (, 300mOsm/kg),
tanto na forma nefrogênica quanto na hipofisária de DI, mesmo quando a ingestão
de água é controlada. A elevação da osmolalidade urinária acima da plasmática, em
resposta à administração de ADH exógeno, ocorre na forma hipofisária, mas não na
nefrogênica, e é útil na distinção clínica das 2 formas da doença.
O lobo posterior, o pedúnculo infundibular e o hipotálamo são comprimidos ou
rompidos por células neoplásicas. Isto interrompe os axônios não mielinizados que
transportam ADH do local de produção (o hipotálamo) para o local de liberação (a
pars nervosa).
Diagnóstico – Baseia-se na poliúria crônica que não responde à desidratação
e que não se deve a uma enfermidade renal primária. Para avaliar a capacidade do
animal para concentrar urina, deve-se fazer uma prova de privação hídrica, se o
animal não estiver desidratado e não apresentar doença renal. Esvazia-se a bexiga
e proíbe-se o animal de ter acesso à água e aos alimentos (geralmente por 3 a 8h)
para proporcionar um estímulo máximo à secreção de ADH. O animal deve ser
monitorado durante esse período para evitar uma perda > 6% do peso corporal e
uma desidratação grave. A osmolalidade da urina e do plasma deve ser determina-
da; entretanto, estas provas não estão à disposição da maioria dos veterinários e,
em seu lugar, freqüentemente usa-se a determinação da densidade específica de
urina. No final da prova, a densidade específica (DE) da urina deve ser > 1,025 nos
animais que apresentam apenas uma deficiência parcial de ADH ou naqueles com
o antagonismo da ação do mesmo, como no caso do hipercortisolismo. Há poucas
mudanças na DE nos animais com perda total da atividade de ADH, seja por perda
primária de ADH, seja por falta de resposta por parte dos rins.
A seguir, deve-se fazer uma prova de resposta ao ADH para diferenciar o DI de
outras afecções que podem resultar na formação de grandes volumes de urina que
é cronicamente baixa em DE mas sob outros aspectos é normal. Estas afecções
incluem DI nefrogênico (uma incapacidade dos rins para responder ao ADH) DI
psicogênico (uma polidipsia em resposta a certos distúrbios psicológicos, porém
com resposta normal ao ADH [ver pág. 1124]) e hipercortisolismo (que resulta numa
deficiência parcial da ação de ADH devido ao antagonismo da ação do cortisol nos
rins). Este teste também pode ser usado para avaliar animais nos quais a prova de
privação hídrica não pôde ser feita. A DE urinária é determinada no início da prova;
injeta-se tanato de vasopressina em óleo pela via IM (2,5u para gatos e cães
pequenos, 5u para cães maiores); esvazia-se a bexiga 2h depois e mede-se a DE
da urina 4, 8, 12, 18 e 24h após a administração de ADH. A DE alcançará seu valor
máximo em > 1,026 em animais com deficiência primária de ADH, sendo significa-
tivamente maior que o nível induzido com a privação hídrica nos animais que
apresentam deficiência parcial da atividade de ADH, e mostrará pouca alteração nos
que sofrem de DI nefrogênico.
Se a osmolalidade for medida, a proporção entre a osmolalidade da urina e a do
plasma, depois da privação hídrica, será > 3 nos animais normais, de 1,8 a 3 nos que
apresentam deficiência moderada de ADH e < 1,8 nos que apresentam deficiência
severa. A proporção da osmolalidade urinária após a administração de ADH em
comparação à privação hídrica será > 2 em animais com deficiência primária de
ADH, de 1,1 a 2 em animais com inibidores da ação de ADH e < 1,1 em animais que
não respondem ao ADH.
O DI também deve ser distinguido de outras enfermidades acompanhadas por
poliúria. As mais comuns são diabetes melito com glicosúria e DE urinária elevada,
e nefrite crônica com uma DE urinária normalmente elevada e evidência de
insuficiência renal (proteinúria, cilíndrica, etc.).
Tireóide 337

Tratamento – A poliúria deve ser controlada. Podem ser usadas 2 drogas: tanato
de vasopressina em meio oleoso (2 a 5u, pela via IM, segundo a necessidade,
usualmente a cada 2 a 4 dias) e acetato de desmopressina, um análogo sintético do
ADH. A dose inicial deste último é de duas gotas aplicadas nas mucosas nasais ou
conjuntivais; ela é gradualmente aumentada até se atingir uma dose mínima eficaz.
O efeito máximo usualmente ocorrerá 2 a 6h depois e perdurará por 10 a 12h. Não
se deve restringir a água. O tratamento deve ser efetuado 1 a 2 vezes/dia, durante
toda a vida do animal.

TIREÓIDE
Todos os vertebrados possuem glândula tireóide. Em mamíferos, ela geralmente
é bilobada e localizada caudalmente à laringe, adjacente à superfície lateral da
traquéia. Os 2 lobos podem ser conectados por um istmo fibroso (por exemplo, em
ruminantes e eqüinos) ou por um istmo de conexão que pode ser indistinguível (por
exemplo, em cães e gatos). A glândula é extremamente vascularizada. Em aves, é
encontrada dentro da cavidade torácica; ambos os lobos localizam-se próximos à
siringe, adjacentes à artéria carótida e próximos à origem da artéria vertebral.
O tecido acessório ou ectópico da tireóide é relativamente comum na maioria das
espécies, principalmente em cães e gatos. Ele pode estar localizado em qualquer
lugar, da laringe ao diafragma, e pode ser responsável pela manutenção da função
normal da tireóide após uma tireoidectomia. Além disso, esse tecido ocasionalmen-
te é sítio de hiperplasia ou neoplasia.
Fisiologia – Os hormônios tireóideos são os únicos compostos orgânicos
iodados do corpo. Tireoxina (T4) é o principal produto secretório da glândula tireóide
normal. Entretanto, a glândula também secreta 3,5,3’-triiodotironina (T3), T 3 reversa
e outros metabólitos deioidados. A triiodotironina é , 3 a 5 vezes mais potente que
a T4, enquanto a T3 reversa é tiromimeticamente inativa.
Embora toda a T4 seja secretada pela tireóide, uma quantidade considerável de
T3 é derivada de T4; por isso, a T4 tem sido chamada de pró-hormônio. Sua ativação
à T3 mais potente é um passo regulado individualmente por tecidos periféricos.
Secreções de hormônio tireóideo são reguladas primariamente por “feedback”
negativo, por meio de uma resposta coordenada do eixo hipotálamo-hipófise-tireóide;
o hormônio liberador de tireotrofina (TRH) une-se à célula tireotrófica na hipófise e
estimula a secreção de tireotrofina (hormônio estimulador da tireóide, TSH), que se une
à membrana celular folicular e estimula a síntese e a secreção de hormônio tireóideo.
Hormônios tireóideos são compostos lipofílicos, insolúveis em água, que se
unem às proteínas plasmáticas (proteína unida à tireoxina, pré-albumina unida à
tireoxina [transtiretina] e albumina). A principal função das proteínas ligadas ao
hormônio tireóideo provavelmente é promover uma reserva de hormônio no plasma
e liberá-lo nos tecidos. Em um animal eutireóideo normal, , 0,1% da T4 total sérica
está livre (não unida a proteínas ligadas ao hormônio tireóideo provavelmente), ao
passo que , 1% da T3 circulante está livre. A maioria das evidências sugere que as
frações de T4 livre circulante e T3 livre determinam a quantidade de hormônio que
está disponível para entrar nos tecidos.
Ação dos hormônios tireóideos – Os hormônios tireóideos agem em muitos
processos celulares diferentes; entretanto, nenhuma reação isolada ou evento
metabólico pode ser comparado com sua ação. Embora T 4 e T3 tenham atividades
metabólicas intrínsecas, T3 é 3 a 5 vezes mais potente em unir-se a receptores
nucleares e similarmente mais potente em estimular o consumo de oxigênio.
Tireóide 338

Os efeitos dos hormônios tireóideos geralmente são divididos em 2 categorias:


1. aqueles que se manifestam dentro de minutos a horas após a união com o
hormônio receptor e não requerem síntese proteica; e 2. aqueles que se manifestam
mais tarde (geralmente > 6h) e requerem síntese de novas proteínas. Cerca de
metade do aumento no consumo de oxigênio produzido pelos hormônios tireóideos
está relacionada com a ativação de Na+/K+ ATPase ligada à membrana plasmática;
os hormônios tireóideos também estimulam o consumo de oxigênio mitocondrial.
Estas alterações são ligadas diretamente aos efeitos calorígenos dos hormônios
tireóideos. Os efeitos mais crônicos invariavelmente são relacionados às ações
celulares que requerem interação com receptores nucleares de T3 seguidas por um
aumento na síntese proteica crucial para processos fisiológicos como crescimento,
diferenciação, proliferação e maturação.
Hormônios tireóideos, em quantidades fisiológicas, são anabólicos. Em união
com o hormônio de crescimento e a insulina, a síntese proteica é estimulada e a
excreção de nitrogênio é reduzida. Entretanto, em excesso (hipertireoidismo), eles
podem ser catabólicos com gliconeogênese aumentada, destruição proteica e
perda de nitrogênio.

HIPOTIREOIDISMO
A produção e a secreção diminuídas de hormônios tireóideos resultam em
diminuição da taxa metabólica. Este distúrbio é mais comum em cães, mas também
se desenvolve raramente em outras espécies, inclusive em gatos e em grandes
animais domésticos.
Etiologia – Embora uma disfunção em qualquer local do eixo hipotálamo-hipófise-
tireóide possa resultar em deficiência de hormônio tireóideo, > 95% dos casos
clínicos de hipotireoidismo canino parecem resultar da destruição da própria tireóide
(hipotireoidismo primário). As 2 causas mais comuns de hipotireoidismo primário
que se inicia em cães adultos incluem a tireoidite linfocítica e a atrofia idiopática da
tireóide. A tireoidite linfocítica, provavelmente imunomediada, é caracteriza-
da histologicamente por uma infiltração difusa da glândula por linfócitos, plasmóci-
tos e macrófagos e resulta em destruição progressiva dos folículos e fibrose
secundária. A atrofia idiopática da glândula tireóide é caracterizada histologicamen-
te por perda do parênquima tireóideo e substituição por tecido adiposo (ver também
TIREOIDITE AUTO-IMUNE, pág. 523).
Em cães, a causa mais comum de hipotireoidismo secundário é a destruição de
tireotrofos hipofisários e a ocupação do espaço por um tumor em expansão. Devido
à natureza não seletiva, que resulta em atrofia compressiva e substituição do tecido
hipofisário por estes grandes tumores, geralmente também ocorrem deficiências de
outros hormônios hipofisários (um ou mais).
Outras formas raras de hipotireoidismo canino incluem destruição neoplásica do
tecido tireóideo e hipotireoidismo congênito (ou juvenil). O hipotireoidismo primário
congênito pode resultar de uma das várias formas de disgenesia tireóidea (por
exemplo, atireose, hipoplasia tireóidea) ou de disormonogenesia (geralmente uma
incapacidade herdada para organificar iodeto). Hipotireoidismo secundário congê-
nito tem sido documentado apenas em pastores alemães com nanismo hipofisário
associado à bolsa de Rathke cística. Entretanto, o grau de deficiência de TSH
nesses cães é variável e os sinais clínicos em geral são causados primariamente por
uma deficiência de hormônio de crescimento ( em vez de hormônio tireóideo).
Em gatos, o hipotireoidismo iatrogênico é causado principalmente pelo trata-
mento de um hipertireoidismo com radioiodo, tiroidectomia ou pelo uso de uma
droga antitireóide.
Achados clínicos – Embora o início seja variável, o hipotireoidismo é mais
comum em cães com 4 a 10 anos de idade. Geralmente os animais afetados
Tireóide 339

pertencem a raças de porte médio a grande; as raças toy e miniatura raramente são
afetadas. Raças relatadas como predispostas incluem golden retriever, doberman
pinscher, setter irlandês, schnauzer miniatura, dachshund, cocker spaniel e terrier
airedale. Parece não haver prediletação sexual, mas fêmeas castradas apresentam
um risco maior de desenvolver hipotireoidismo que fêmeas não castradas.
Uma deficiência de hormônio tireóideo afeta a função de todos os sistemas
orgânicos, e como resultado, os sinais clínicos são difusos, variáveis, com frequência
inespecíficos e raramente patognomônicos. Embora o distúrbio seja altamente
sugestivo, o superdiagnóstico deve ser feito com cautela, porque muitas doenças,
principalmente as da pele, podem ser diagnosticadas erroneamente como hipoti-
reoidismo.
Muitos dos sinais clínicos associados ao hipotireoidismo canino estão diretamen-
te relacionados com diminuição do metabolismo celular. Isto resulta no desenvolvi-
mento de apatia, letargia, intolerância ao exercício e ganho de peso sem um
correspondente aumento de apetite. Obesidade moderada a marcante desenvolve-
se em alguns cães. Dificuldades em manter a temperatura corporal podem levar à
hipotermia franca; o cão hipotireóideo “clássico” procura locais quentes. Alterações
na pele e pelagem são comuns; pêlo áspero, excessiva queda de pelame e
crescimento retardado do mesmo geralmente são as alterações dermatológicas
iniciais. O adelgaçamento não prurítico do pêlo ou alopecia (em geral bilateralmente
simétrica na distribuiçâo), podendo envolver a porção ventral e lateral do tronco, a
superfície caudal das coxas, o dorso da cauda, a região cervical ventral e o dorso
do nariz, ocorre em aproximadamente dois terços dos cães com hipotireoidismo.
Como o adelgaçamento do pêlo ou a alopecia às vezes estão associados com
hiperpigmentação, eles freqüentemente iniciam-se sobre pontos de apoio. Ocasio-
nalmente, observa-se piodermia secundária (que pode produzir purido).
Nos casos moderados a severos, observa-se espessamento da pele secundário
ao acúmulo de glicosaminoglicanos (principalmente ácido hialurônico) na derme.
Em tais casos, o mixedema é mais comum na fronte e face, resultando em uma
aparência inchada e no aparecimento de pregas cutâneas acima dos olhos. Este
edema, associado às dobras cutâneas acima das pálpebras, dá a alguns cães uma
expressão facial “trágica". Estas alterações têm sido descritas no trato GI, coração
e músculos esqueléticos.
Em cães intactos, o hipotireoidismo pode causar vários distúrbios reprodutivos:
em fêmeas, insuficiência no anestro ou ciclo esporádico, infertilidade, aborto ou
ninhada com pouca sobrevivência; e em machos, diminuição da libido, atrofia
testicular, hipospermia ou infertilidade.
Coma por mixedema, uma síndrome rara, é a expressão extrema do hipotireoi-
dismo severo. O curso pode-se desenvolver rapidamente; a letargia progride para
estupor e posteriormente coma. Os sinais comuns de hipotireoidismo (por exemplo,
perda de pêlo) estão geralmente presentes, mas outros sinais de hipoventilação,
hipotensão, bradicardia e hipotermia profunda são geralmente observados.
Durante o período fetal e nos primeiros meses de vida, os hormônios tireóideos são
cruciais para o crescimento e o desenvolvimento do esqueleto e do SNC. Portanto,
além dos sinais bem reconhecidos do hipotireoidismo com início na vida adulta,
nanismo desproporcional e desenvolvimento mental prejudicado (cretinismo) são
sinais proeminentes de hipotireoidismo congênito de início juvenil. No hipotireoidismo
congênito primário, o aumento da glândula tireóide (bócio) também pode ser detec-
tado, dependendo da causa do hipotireoidismo. Sinais radiográficos de disgenesia
epifisária (superdesenvolvimento das epífises por todos os ossos longos), encurta-
mento dos corpos vertebrais e retardamento do fechamento das epífises são comuns.
Em cães com hipopituitarismo congênito (nanismo hipofisário), pode haver graus
variáveis de deficiência gonadal, tireóidea e adrenocortical, mas os sinais clínicos
Tireóide 340

primariamente relatados referem-se à deficiência de hormônio de crescimento. Os


sinais incluem nanismo proporcional (em vez da forma desproporcional de nanismo
característica do hipotireoidismo congênito), perda dos pêlos primários com reten-
ção da pelagem do filhote, hiperpigmentação da pele e alopecia bilateral simétrica
do tronco.
Os achados hematológicos e bioquímicos séricos clássicos associados com
hipotireoidismo são uma anemia normocítica, normocrômica e não regenerativa e
hipercolesterolemia. As concentrações de triglicerídios séricos são diminuídas.
Diagnóstico – A determinação da concentração sérica total basal de T4 por
técnicas de radioimunoensaio pode fornecer informações importantes para carac-
terizar o hipotireoidismo. Como a T4 é produzida apenas pela glândula tireóide, cães
hipotireóideos podem, na maioria dos casos, ser distinguidos de cães normais com
base na baixa concentração sérica de T4. Entretanto, muitas doenças não tireóideas
e certas drogas também podem “falsamente” provocar a diminuição das concentra-
ções séricas basais de T4 em cães. Mesmo quando os achados físicos e a anamnese
não sugerem outros fatores que possam diminuir a T4 sérica, o diagnóstico de
hipotireoidismo deve ser confirmado com um teste da função tireóidea dinâmica (por
exemplo, teste de estimulação pelo TSH).
Como a T3 é o hormônio tireóideo mais potente no nível celular, seria lógico medir
a sua concentração para fins diagnósticos. Entretanto, concentrações séricas de T3
podem estar baixas, normais ou (ocasionalmente) altas em cães com hipotireoidis-
mo documentado. O valor diagnóstico da determinação sérica de T3 parece
particularmente pequeno durante o início da insuficiência tireóidea, porque a
“tireóide deficiente” tende a aumentar a síntese e a secreção relativas de T3 acima
das de T4. Em cães hipotireóideos nos quais valores séricos de T3 são altos, deve-
se suspeitar de anticorpos T3, que produzem resultados falsos na maioria dos testes
de radioimunoanálise de T3.
A administração de TSH bovino exógeno após a mensuração da T4 sérica fornece
uma importante informação diagnóstica, pois testa a reserva secretória da tireóide.
O teste de estimulação pelo TSH é o teste não invasivo mais definitivo para
diagnosticar o hipotireoidismo primário. Um protocolo amplamente usado é coletar
uma amostra sangüínea basal para determinar a T4 sérica, administrar 0,1u/kg de
TSH EV (dose máxima de até 5u) e após 6h coletar uma nova amostra para
determinar a T4 sérica.
No hipotireoidismo primário, a concentração sérica de T4 após a administração de
TSH permanece abaixo da taxa normal para T4 basal (< 1µg/dL, < 10nmol/L) e
raramente ultrapassa 0,2µg/dL (2,5nmol/L) acima do valor basal. Com o teste de
estimulação pelo TSH, o hipotireoidismo primário pode ser distinguido de outras
causas de diminuição das concentrações séricas de T4 (por exemplo, drogas e
doenças não tireóideas), nas quais a resposta da T4 sérica pode ser suprimida, mas
o aumento na sua taxa é semelhante ao normal. Para caracterizar o quadro de
hipotireoidismo, a concentração de T4 após a aplicação de TSH deve aumentar para
pelo menos 2µg/dL (25nmol/L) acima do seu valor basal ou exercer a sua concen-
tração basal, 6h após a injeção de TSH. Os cães que não se enquadrarem nesse
critério podem ser considerados hipotireóideos e deve-se avaliar a resposta à terapia
com hormônio tireóideo.
A biópsia da tireóide é um método diagnóstico útil e seguro e diferencia as formas
primárias e secundárias de hipotireoidismo.
Tratamento – Tireoxina (T 4) é o composto hormonal de escolha em cães. Com
poucas exceções, a terapia de reposição de hormônio tireóideo é necessária pelo
resto da vida do animal; um diagnóstico inicial cuidadoso e tratamento são essen-
ciais. A dose de reposição de T4 recomendada para cães varia de uma dose total
0,02 a 0,04mg/kg, diariamente, ou dividida em duas vezes ao dia.
Tireóide 341

O indicador mais importante do sucesso da terapia de reposiçâo da tireóide é a


melhora clínica. A reversão das alterações na pelagem e no peso corporal deve ser
avaliada apenas após 1 a 2 meses de terapia. Quando a melhora clínica é marginal
ou são observados sinais de tireotoxicose, as observações clínicas podem ser
mantidas pela monitoração terapêutica das concentrações séricas de hormônio
tireóideo ("teste de post-pill"). Com a administração diária de T4, as concentrações
séricas de pico deste hormônio em geral devem ser ligeiramente altas acima do
normal 4 a 8h após a administração da droga e devem estar abaixo do normal a
normais 24h depois. Animais que recebem o medicamento duas vezes ao dia
provavelmente podem ser avaliados em qualquer horário, mas as concentrações de
pico podem ser esperadas na metade do intervalo entre as dosagens (4 a 8h) e o
nadir imediatamente antes da próxima dose. Quando a dose do cão estiver
estabilizada, recomenda-se avaliar 1 a 2 vezes por ano as concentrações séricas de
T4 (com ou sem T3).
Se os sinais clínicos de hipotireoidismo persistem apesar do uso de doses
razoáveis de hormônios tireóideos, deve-se considerar: 1. a dose ou freqüência de
administração é imprópria; 2. o proprietário não está obedecendo às instruções ou
não está administrando o produto com sucesso; 3. o animal não está absorvendo
bem o produto ou este está sendo metabolizado e/ou excretado muito rapidamente;
4. o produto está vencido; ou 5. o diagnóstico é incorreto.

Aumento não neoplásico da glândula tireóide


(Bócio)
É um aumento não inflamatório e não neoplásico da glândula tireóide que se
desenvolve em todos os mamíferos domésticos, assim como em aves. As principais
causas do bócio incluem deficiência de iodo, substâncias bociogênicas, excesso de
iodo dietético e defeitos enzimáticos hereditários na biossíntese dos hormônios
tireóideos. Muitos animais com bócio parecem permanecer eutireóideos, mas os
sinais clínicos de hipotireoidismo podem-se desenvolver em alguns, principalmente
em neonatos.
Deficiência de iodo – A deficiência de iodo resultando na hiperplasia da tireóide
era comum em muitas áreas bociogênicas por todo o mundo, antes da difusão da
suplementação de sal iodado nas dietas animais. Embora surtos de bócio por
deficiência de iodo sejam agora esporádicos, sendo poucos animais afetados,
a deficiência de iodo é responsável pela maioria dos casos de bócio em grandes
animais domésticos.
A insuficiência de iodo reduz a habilidade da tireóide para produzir hormônio
tireóideo. Com níveis circulantes de hormônios tireóideos reduzidos, a hipófise
secreta mais TSH, que age como estímulo para a hiperplasia da tireóide e o bócio.
A glândula hiperplásica geralmente compensa a disponibilidade reduzida de iodo;
dessa forma, o bócio não é sinônimo de hipotireoidismo. Entretanto, filhos de fêmeas
que receberam dietas deficientes em iodo mais provavelmente desenvolverão
aumento severo da tireóide e terão sinais clínicos de hipotireoidismo.
O bócio causado pela deficiência de iodo é mais comum em leitões, cordeiros,
bezerros e potros recém-nascidos, em territórios deficientes em iodo. Os lobos da
tireóide de animais jovens geralmente são pelo menos duas vezes o tamanho
normal, macios e de coloração vermelho-escura. Nos casos severos, ocorre queda
de pêlo (principalmente em suínos) ou lã (ovinos). O pescoço geralmente encontra-
se macroscopicamente aumentado e a pele e outros tecidos podem estar espessa-
dos, flácidos e edematosos. Nos animais levemente afetados, o tratamento com sal
iodado (contendo ≥ 0,007% de iodo) pode resolver o bócio e os sinais clínicos
associados, mas muitos morrem antes ou logo após o nascimento. A profilaxia é
mais efetiva que o tratamento. O uso de sal iodado é recomendado em todas as
áreas em que se sabe ou se suspeita de deficiência de iodo.
Tireóide 342

Substâncias bociogênicas – A alimentação com certas plantas pode produzir


bócio quando ingeridas em quantidades suficientes, principalmente na ausência de
ingestão adequada de iodo. As soja é a mais notável, mas o repolho, a couve e o
nabo contêm bociogênicos menos potentes. O cozimento ou aquecimento (e o
processamento comum de farinha de soja) destrói as substâncias bociogênicas
dessas plantas. Todas as substâncias bociogênicas agem interferindo na produção
de hormônio tireóideo. Como na deficiência de iodo, a hipófise responde em níveis
reduzidos de hormônio tireóideo pelo aumento na secreção de TSH, o que resulta
em aumento da glândula tireóide. No animal adulto, a doença geralmente não é
significante, mas aumento severo da tireóide e hipotireoidismo podem-se desenvol-
ver em recém-nascidos.
Toxicidade do iodo – Potros recém-nascidos de éguas que ingerem excesso de
iodo podem desenvolver aumento extremo da tireóide e podem morrer antes de
nascer ou pouco tempo depois. Os sinais clínicos podem incluir fraqueza geral,
pelagem longa, e marcantes anormalidades nos membros.
Bócio disormonogenético familial – Tem sido relatado em ovinos, bovinos,
caprinos e suínos, e parece ser herdado como um gene autossômico recessivo.
Essencialmente, é um defeito enzimático genético na biossíntese dos hormônios
tireóideos. Como na deficiência de iodo, a produção reduzida de hormônio tireóideo
leva a secreção de níveis aumentados de TSH e subseqüente bócio. Os sinais
clínicos podem incluir taxa de crescimento abaixo do normal, desenvolvimento
anormal da lã ou pelame rarefeito, mixedema dos tecidos subcutâneos e fraqueza.
Muitos animais afetados morrem logo após o nascimento ou são muitos sensíveis
às condições ambientais adversas.

HIPERTIREOIDISMO
A secreção excessiva dos hormônios tireóideos, tireoxina (T4 ) e triiodotironina (T3),
resulta em sinais que refletem uma taxa metabólica aumentada e produzem o hiper-
tireoidismo clínico. Esta desordem é observada com maior freqüência no gato de
idade madura a velho, embora também se desenvolva, ainda que raras vezes, no cão.
A causa mais comum de hipertireoidismo felino é o adenoma tireóideo funcional
(hiperplasia adenomatosa); em , 70% dos casos, ambos os lobos da tireóide estão
aumentados. O carcinoma tireóideo, a causa primária de hipertireoidismo no cão, é
raro em gatos (1 a 2% dos casos de hipertireoidismo).
Achados clínicos e diagnóstico – Os sinais mais comuns de hipertireoidismo
incluem perda de peso, hiperexcitabilidade, aumento de apetite, polidipsia, poliúria e
aumento palpável da glândula tireóide. Os sinais gastrointestinais também são co-
muns e podem incluir vômito, diarréia e aumento do volume das fezes. Sinais cardio-
vasculares podem incluir taquicardia, sopros sistólicos, dispnéia, cardiomegalia e
insuficiência cardíaca congestiva. Dos gatos hipertiróideos, , 10% apresentam sinais
apáticos (por exemplo, anorexia, letargia e depressão); perda de peso é comum.
Concentrações séricas elevadas de T4 e T 3 confirmam o diagnóstico; entretanto,
são subjetivas para um amplo grau de variação, e mais de uma mensuração basal
pode ser necessária.
Tratamento – O hipertireoidismo espontâneo pode ser tratado por tireoidectomia,
terapia por radioiodo ou administração crônica de uma droga antitireóidea. Nos casos
dos tumores tireóideos unilaterais, a hemitireoidectomia corrige o estado hipertiróideo
e, normalmente, não é necessária a administração suplementar de tireoxina. Nos
animais com tumores tireóideos bilaterais, é indicada a tireoidectomia completa, mas
com preservação da função paratireóidea para evitar hipocalcemia pós-operatória. A
tireoidectomia completa deve ser seguida pela administração de tireoxina suplemen-
tar que deve ser iniciada 1 a 2 dias após a cirurgia. Se não se desenvolver hipo-
paratireoidismo iatrogênico, também se indica o tratamento com vitamina D e cálcio.
Hipercalcemia Humoral Maligna 343

O radioiodo proporciona um tratamento simples e seguro para o hipertireoidismo:


ele se concentra dentro da glândula tireóide, irradiando e destruindo seletivamente
o tecido tireóideo hiperfuncionante. Para a maioria dos veterinários, a principal
desvantagem deste tratamento é a falta de disponibilidade do radioiodo.
O tratamento com metimazol, uma droga antitireóidea, controla o hipertireoidismo
pelo bloqueio da síntese de hormônio tireóideo. O propiltiouracil, outra droga an-
titireóidea, não é recomendado para uso em gatos devido à alta incidência de sérios
efeitos colaterais (principalmente anemia hemolítica e trombocitopenia). A dose
diária inicial recomendada de metimazol é de 10 a 15mg dividida em 2 ou 3 doses. A
dose é ajustada para manter as concentrações de hormônio tireóideo circulante
dentro da taxa normal, e a droga é administrada diariamente. Efeitos colaterais
adversos, sendo os mais severos a agranulocitose e a trombocitopenia, desenvolvem-
se em < 5% dos gatos tratados. Se isto ocorrer, o metimazol deve ser descontinuado
e deve-se instituir uma terapia de suporte; estas reações adversas devem-se resolver
dentro de 2 semanas. Para manter níveis normais de hormônio tireóideo e para
monitorar reações adversas durante os três primeiros meses de tratamento (quando
se desenvolve a maioria dos efeitos colaterais associados à terapia com metimazol),
deve-se repetir, a cada 2 a 4 semanas, um hemograma completo com determinação
sérica de hormônio tireóideo, e a dose da droga deve ser ajustada conforme o
necessário. Subseqüentemente, as concentrações séricas de T 4 devem ser medidas
a cada 3 a 6 meses para monitorar a dosagem requerida e a resposta ao tratamento.

HIPERCALCEMIA HUMORAL MALIGNA


(HHM, Pseudo-hiperparatireoidismo)

É um distúrbio metabólico no qual os peptídeos semelhantes ao hormônio


paratireóideo (PTH) ou outras substâncias que causam reabsorção óssea são
secretados em excessivas quantidades por tumores malignos não originários da
paratireóide.
Hipercalcemia e hipofosfatemia ocorrem em cães, gatos, cavalos e no homem,
juntamente com várias neoplasias malignas na ausência de metástases ósseas e
lesões funcionais nas glândulas paratireóides. Em animais, neoplasias associadas
com esta síndrome incluem adenocarcinomas derivados de glândulas apócrinas do
saco anal, carcinoma de células escamosas do estômago, linfoma maligno e
adenocarcinoma de glândula mamária.
Etiologia e patogenia – Evidências sugerem que a hipercalcemia e a hipofos-
fatemia sejam o resultado de uma secreção de substâncias ósseo-reabsorventes
pelas células tumorais. As células tumorais podem produzir várias substâncias
humorais que induzem a mobilização de cálcio do osso; elas incluem proteínas
semelhantes ao hormônio da paratireóide, prostaglandinas, proteínas, interleuci-
na-1 (fator ativador de osteoclasto) e fator de crescimento transformado. Outros
fatores de crescimento, como o fator derivado da plaqueta e o fator epidérmico de
crescimento, parecem estimular diretamente a reabsorção óssea in vitro.
Fatores semelhantes ao PTH unem-se aos receptores do PTH dos ossos e rins,
mas não apresentam reação imunologicamente cruzada com o PTH nativo. Estes
fatores estimulam a adenilato ciclase nas células ósseas e renais a se unir aos
receptores do PTH e estimular a reabsorção óssea. A interleucina-1 estimula a
reabsorção óssea in vivo e in vitro e age sinergicamente com o PTH. Fatores de
crescimento transformantes α e β podem estimular a reabsorção óssea in vitro e têm
sido encontrados certos tumores associados com HHM.
Hipercalcemia Humoral Maligna 344

A purificação da atividade semelhante à do PTH do adenocarcinoma do saco anal


canino e múltiplos tumores humanos associados com HHM têm resultado na
identificação de novas proteínas, designadas proteínas relacionadas com PTH
(PTHrP).É provável que seja importante na patogenia de manifestações clínicas de
HHM, no metabolismo do cálcio da glândula mamária e do feto, e na diferenciação
das células epidérmicas.
O linfossarcoma canino está associado com hipercalcemia em 20 a 40% dos
casos. Alguns cães com linfossarcoma e hipercalcemia têm HHM. Os cães afetados
apresentam aumento do jejum e da excreção de Ca de 24h, aumento da excreção
do fósforo fracionário, aumento do monofosfato de adenosina cíclico (AMPc)
nefrogênico e não apresentam alteração no PTH sérico ou nos níveis de 1,25
diidroxicolecalciferol. Aumento na reabsorção osteoclástica está presente nos
ossos sem evidência de metástase tumoral. A hipercalcemia pode ser induzida por
fatores semelhantes ao PTH circulante no linfossarcoma canino, que pode estar
relacionado a ou a mesma conforme PTHrP.
Alguns paciente humanos com linfossarcoma e hipercalcemia têm níveis séricos
aumentados de 1,25 diidroxicolecalciferol, que podem ser responsáveis pela
indução de hipercalcemia. Não é certo se este mecanismo resulta em hipercalcemia
em outros animais com linfossarcoma, mas dados clínicos têm identificado alguns
cães com linfossarcoma, hipercalcemia e aumento nas concentrações séricas de
1,25 diidroxicolecalciferol.
Achados clínicos – O exemplo mais característico de HHM em animais ocorre
em associação com adenocarcinoma derivado das glândulas apócrinas dos sacos
anais (ver pág. 1033), uma síndrome caracterizada por hipercalcemia e hipofosfate-
mia persistentes. Valores séricos de Ca variam de 11,4 a 24mg/dL (média ,16mg/dL).
Distúrbios funcionais em cães com HHM são primariamente devidos à hipercalce-
mia severa, e incluem fraqueza generalizada, anorexia, vômito, braquicardia, de-
pressão, poliúria e polidipsia. Anorexia, vômito e constipação resultam da diminuição
da excitabilidade da musculatura lisa gastrointestinal. Fraqueza generalizada da
musculatura esquelética desenvolve-se como resultado da diminuição da excitabili-
dade neuromuscular, o que também pode causar depressão dos reflexos neuro-
nais motores baixos (por exemplo, hiporreflexia patelar, do gastrocnêmio e reflexo do
tríceps). Mudanças comportamentais, depressão, estupor, coma, convulsões e mio-
clonias na musculatura têm sido observados em cães com hipercalcemia. Arritmia
cardíaca, diminuição do intervalo Q-T e prolongamento do intervalo P-R (bloqueio
cardíaco de primeiro grau) podem ser detectados pela avaliação eletrocardiográfica.
Fibrilação ventricular pode-se desenvolver em casos de hipercalcemia extrema.
Polidipsia e poliúria são encontradas precocemente no curso das doenças
caracterizadas por hipercalcemia. Inicialmente, a poliúria e a polidipsia são indepen-
dentes dos sinais urêmicos da insuficiência renal primária; entretanto, a uremia
pode-se desenvolver como resultado dos efeitos tóxicos da hipercalcemia persis-
tente nos rins. Desidratação severa ocorre com freqüência devido aos efeitos
combinados de poliúria, êmese e falta de ingestão de água.
Lesões – Adenocarcinomas apócrinos desenvolvem-se como massas firmes na
área perirretal, ventrolateral ao ânus, numa íntima associação com o saco anal, mas
não são ligados com a pele sobrejacente. São histologicamente diferentes dos tumo-
res de glândulas perianais mais comum (circum-anal) (ver pág. 1034), que ocorre
predominantemente em cães machos . As glândulas paratireóides dos cães afetados
são pequenas e difíceis de ser localizadas, ou não são visíveis macroscopicamente.
Os adenocarcinomas apócrinos não produzem uma substância que estimula a secre-
ção do PTH, mas as glândulas paratireóides sofrem atrofia em resposta à hipercalce-
mia persistente. As células C da tiróide freqüentemente respondem à elevação
persistente do Ca sangüíneo pelo desenvolvimento de hiperplasia difusa ou nodular.
Hipercalcemia Humoral Maligna 345

A desmineralização do esqueleto em cães com HHM é leve em comparação com


outras causas de hipercalcemia, por exemplo, o hiperparatireoidismo primário, e
usualmente não detectável pelos métodos radiográficos convencionais. Células
neoplásicas de adenocarcinomas perirretais raramente metastatizam para os ossos
e causam osteólise localizada. Números variáveis de osteoclastos são detectados
nas superfícies ósseas em cães com hipercalcemia marcante, possivelmente re-
fletindo diferentes estados no curso da doença e fases de remodelação óssea. O
volume trabecular ósseo parece ser significativamente diminuído quando compa-
rado aos dos cães-controle igualmente velhos. A superfície de reabsorção total é
significantemente aumentada na produção do número de osteoclastos.
Diagnóstico – O critério para o diagnóstico inclui: 1. hipercalcemia e hipofosfa-
temia persistentes; 2. ausência de evidências radiográficas ou patológicas de
metástases tumorais nos ossos; 3. atrofia da glândula paratireóide e hiperplasia das
células C na glândula tireóide; 4. remissão da hipercalcemia quando o tumor é
destruído ou excisado; 5. demonstração de peptídeos biologicamente ativos ou de
outras substâncias de reabsorção óssea no tecido tumoral; e 6. exacerbação da
hipercalcemia se ocorrer recidiva do tumor após a terapia.
Os sinais são associados primariamente à hipercalcemia persistente (≥ 12mg/dL)
e à massa no períneo. Os adenocarcinomas perirretais freqüentemente requerem
cuidadosa palpação retal para confirmar a sua presença, uma vez que o seu
tamanho varia de 7 até ≥ 8mm de diâmetro. Além disso, os cães com este tipo de
tumor apresentam hipofosfatemia moderada (< 3mg/dL), diminuição nos níveis
(séricos) do PTH imunorreativo, níveis séricos normais do principal metabólito da
prostaglandina E2 e aumento da excreção urinária de Ca, fósforo e AMPc.
Os cães afetados têm níveis inadequados (manutenção dos níveis nos limites
normais) de 1,25-diidroxicolecalciferol para o grau de hipercalcemia. Isto sugere que
o fator humoral produzido pelas células neoplásicas seja capaz de estimular a 1-α-
hidroxilase renal e aumentar a formação dos metabólitos ativos da vitamina D (1,25-
diidroxicolecalciferol), mesmo na presença de hipercalcemia acentuada.
O linfossarcoma (linfoma maligno) é a neoplasia mais comum associada à hiper-
calcemia em cães e gatos, e assim deve ser considerado em diagnóstico diferencial
de HHM (ver LINFOMA MALIGNO CANINO, pág. 38 e LINFOSSARCOMA FELINO, pág. 46). As
estimativas da prevalência de hipercalcemia no linfoma variam de 10 a 40% em cães.
Linfadenopatia periférica pode ou não ser detectada, mas existe usualmente uma
evidência de envolvimento mediastinal ou visceral anterior. Não se sabe exatamente
se a hipercalcemia se desenvolve devido à produção de substâncias humorais pelas
células neoplásicas ou devido à desorganização física das trabéculas ósseas em
virtude do freqüente envolvimento da medula óssea, ou em decorrência de ambas.
Outras causas esporádicas de hipercalcemia em animais incluem tumores
sólidos metastatizando amplamente para os ossos, malignidades hematológicas na
medula óssea, hipoadrenocorticismo, insuficiência renal em eqüinos e cães,
hipervitaminose D (decorrente de excessiva suplementação dietética, ingestão de
vermífugos, consumo de plantas calcinogênicas que contêm metabólitos ativos da
vitamina D ou doenças granulomatosas associadas com a superprodução de 1,25
diidroxicolecalciferol pelos macrófagos), hemoconcentração com hiperproteinemia,
imobilização e osteomielite.
Tratamento – A remoção cirúrgica do tumor na área perirretal resulta num rápi-
do retorno aos níveis normais de cálcio, fósforo, hormônio imunorreativo da parati-
reóide e 1,25-diidroxicolecalciferol. Entretanto, metástases sublombares ocorrem
em >90% de cães com este tumor e estão associadas com a recrudescência de
alterações bioquímicas no soro e na urina.
A desidratação exacerba muitos dos graves defeitos da hipercalcemia; devem-
se corrigir distúrbios no equilíbrio de fluidos. Devem-se administrar fluidos de
Hipercalcemia Humoral Maligna 346

reposição como soluções isotônicas, lactato de Ringer ou cloreto de sódio a 0,9%


por via endovenosa; a calciurese pode ser aumentada pela administração de cloreto
de sódio a 0,9% por via endovenosa, pois o sódio adicional presente nos túbulos
renais diminui a reabsorção de Ca. Se a concentração sérica de Ca estiver apenas
moderadamente aumentada (12 a 14mg/dL), essas medidas isoladas podem re-
sultar numa diminuição inicial adequada do Ca sérico. Medidas adicionais podem
ser necessárias quando os sinais clínicos e a elevação do Ca são mais severos
(> 15mg /dL). Furosemida e sulfato de sódio são agentes calciuréticos que podem
ser usados. O volume adequado do fluido extracelular deve ser mantido apropria-
damente pela administração de fluidos EV enquanto se usam estes diuréticos.
Existem relatos de que a administração de furosemida em 5mg/kg EV a cães com
hipercalcemia experimental reduz a concentração sérica de cálcio. Diuréticos de
tiazida reduzem a excreção urinária de Ca e são contra-indicados nos casos
de hipercalcemia. Diálise peritoneal é um método alternativo para remover o Ca do
organismo, principalmente nos animais urêmicos.
Os glicocorticóides podem diminuir a concentração sérica de Ca, provavelmente
pela inibição da absorção intestinal e aumento da excreção urinária. Além disso, a
atividade direta antitumoral pode ser responsável pela redução na concentração
sérica de Ca, mais notavelmente no caso do linfossarcoma. Nas crises hipercalcê-
micas, a administração EV de bicarbonato de sódio pode temporariamente reduzir os
efeitos tóxicos pela diminuição nos níveis de Ca ionizado associados com alcalose.
Como fatores pré-renais estão comumente associados com hipercalcemia, a
terapia com fluidos também ajuda a manter a perfusão renal, portanto minimizando
as lesões isquêmicas progressivas aos néfrons. Nenhuma terapia elimina as lesões
renais já presentes; entretanto, as lesões tubulares podem ser reparadas por
regeneração e adaptação funcional se a hipercalcemia puder ser controlada e o
animal viver o suficiente. Os depósitos minerais podem-se dissolver, embora este
seja um processo lento.

TUMORES DE TECIDOS
NEUROENDÓCRINOS
Tecidos neuroendócrinos derivados da crista neural embrionária estão ampla-
mente dispersos por todo o corpo. Nos mamíferos, eles encontram-se no centro da
glândula adrenal e estão relacionados com a síntese e secreção de catecolaminas
hormonais (adrenalina e noradrenalina). As células C da glândula tireóide dos
mamíferos também são derivadas da crista neural e durante o início do desenvol-
vimento embrionário são incorporadas à última bolsa faríngea (ultimobranquial), que
subseqüentemente se funde com cada um dos lobos da tireóide. As células C estão
relacionadas com a biossíntese de calcitonina, um hormônio envolvido na regulação
da homeostase do cálcio e no turnover esquelético.
Os tumores desenvolvem-se ocasionalmente a partir das células neuroendócrinas
na medula adrenal, tireóide e corpos da carótida e aorta. Eles têm importância clínica
pela ruptura física dos tecidos normais adjacentes pela massa tumoral e possivel-
mente pelo excesso de secreção autônoma do hormônio.

MEDULA ADRENAL
Hiperplasia da medula adrenal – A hiperplasia medular difusa ou nodular
parece preceder o desenvolvimento de feocromocitoma em touros com tumores de
Tumores de Tecidos Neuroendócrinos 347

células C da glândula tireóide. Esta proliferação difusa de células cromafins não é


encapsulada mas comprime o córtex adrenal circundante. Em touros com hiperpla-
sia medular difusa proeminente, há freqüentemente alguns focos de intensa
proliferação nodular de células medulares.
Neuroblastomas e ganglioneuromas – Os neuroblastomas se desenvolvem a
partir de células neuroectodérmicas primitivas, freqüentemente em animais jovens,
e formam uma grande massa intra-abdominal. Eles diferem dos feocromocitomas,
sendo compostos de pequenas células tumorais com um núcleo hipercromático e
uma pequena quantidade de citoplasma. Freqüentemente assemelham-se a linfó-
citos e tendem a formar pseudo-rosetas. Podem-se demonstrar neurofibrilas ou
fibras nervosas desmielinizadas nos neuroblastomas.
Os ganglioneuromas geralmente são tumores pequenos, bem diferenciados,
que apresentam células ganglionares multipolares e neurofibrilas. São tumores
benignos da medula, compostos por células ganglionares multipolares e neurofi-
brilas com um estroma proeminente de tecido conjuntivo fibroso. O córtex adrenal
circundante é severamente comprimido. Células neoplásicas em tumores medula-
res ocasionalmente diferenciam-se em duas direções, resultando em feocromoci-
tomas e ganglioneuromas adjacentes na mesma glândula adrenal.
Feocromocitomas – Esses são tumores de células cromafins e estão quase
sempre localizados nas glândulas adrenais. São os tumores mais comuns na
medula adrenal de animais, e desenvolvem-se mais freqüentemente em bovinos,
ratos de laboratório e cães, e infreqüentemente em outros animais domésticos. Em
touros e ratos, os feocromocitomas desenvolvem-se concomitantemente com
tumores de células C secretoras de calcitonina da glândula tireóide. Isto pode
representar uma transformação neoplásica de múltiplos tipos de células endócrinas
de origem neuroectodérmica num mesmo indivíduo. O feocromocitoma maligno
designa um tumor medular que invade a cápsula adrenal e as estruturas adjacentes
(por exemplo, a veia cava posterior) e/ou metastatiza para locais distantes (por
exemplo, fígado, linfonodos regionais ou pulmões). Feocromocitomas funcionais
são raramente relatados em animais; entretanto, vários cães e eqüinos com feo-
cromocitomas apresentam taquicardia, edema e hipertrofia cardíaca atribuída ao
excesso de secreção de catecolaminas.
Embora o tamanho varie consideravelmente, eles geralmente são grandes
(≥10cm de diâmetro) e incorporam a maior parte da adrenal afetada. Pode-se
encontrar freqüentemente uma pequena sobra de glândula adrenal em um dos
pólos. Os tumores menores são bem encapsulados por uma margem fina e com-
primida de córtex adrenal. Os feocromocitomas grandes são multilobulares e
multicoloridos, marrom-brilhante a vermelho-amarelado, devido às áreas de hemor-
ragia e necrose; eles podem exercer pressão e invadir os tecidos adjacentes, par-
ticularmente a veia cava e a aorta, que pode ser parcialmente ocluída. Em cães,
metástases no fígado, linfonodos regionais, baço e pulmões ocorrem em , 50% dos
feocromocitomas.

TUMORES DAS CÉLULAS C DA TIREÓIDE


Os tumores derivados das células C (parafolicular, ultimobranquial) da tireóide
são mais comuns em touros e eqüinos adultos a idosos, e em certas linhagens de
ratos de laboratório. Uma grande porcentagem de touros idosos tem desenvolvido
tumores de células C (≥ 30%) ou hiperplasia destas e derivados ultimobranquiais
(≥ 15 a 20%). Estes não têm sido observados em vacas que se alimentam de dietas
semelhantes. A incidência aumenta com o avanço da idade em touros e está
freqüentemente associada com o aumento da densidade vertebral. Tumores
endócrinos múltiplos, em especial feocromocitomas bilaterais e ocasionalmente
adenomas hipofisários, são detectados coincidentemente em touros (e pessoas)
Tumores de Tecidos Neuroendócrinos 348

com tumores de células C. Uma alta freqüência de tumores de células C da tireóide


e feocromocitomas tem sido relatada em uma família de touros gernsey, o que
sugere um padrão de herança autossômica dominante. Uma hiperplasia difusa ou
nodular de células secretórias na medula adrenal freqüentemente precede o
desenvolvimento de feocromocitoma.
Adenomas – Adenomas de células C aparecem em um ou em ambos os lobos da
tireóide como nódulos discretos, únicos ou múltiplos, de cor cinza a marrom. São
menores (, 1 a 3cm de diâmetro) que os carcinomas e são separados do parênquima
da tireóide por uma cápsula fina e fibrosa de tecido conjuntivo. A tireóide adjacente
é comprimida mas não é invadida pelo tumor. Em eqüinos, adenomas de células C
podem resultar em um aumento palpável na região cervical anterior. Os adenomas
maiores de células C incorporam a maioria do lobo da tireóide, mas uma margem de
tireóide marrom-avermelhada e escura freqüentemente está presente em um lado.
Hiperplasia focal e/ou nodular das células C freqüentemente precede o desen-
volvimento de neoplasmas nas mesmas. A hiperplasia nodular das células C
consiste de focos menores que o tamanho de um folículo preenchido por colóide,
enquanto um adenoma de células C da tireóide é uma massa de células discreta,
expansiva e maior em tamanho que um folículo colóide distendido. A imunorreati-
vidade da calcitonina localiza-se no citoplasma de células C hiperplásicas.
Carcinomas – Carcinomas de células C da tireóide causam aumentos multi-
nodulares extensos de um ou ambos os lobos da tireóide e podem incorporar toda
a glândula. Metástases múltiplas nos linfonodos cervicais anteriores geralmente são
grandes e apresentam áreas de necrose e hemorragia. Metástases pulmonares são
raras e aparecem como nódulos pardos e discretos por todos os lobos do pulmão.
A estimulação crônica das células C por ingestão dietética de excesso de cálcio
por longos períodos parece aumentar a incidência desses tumores em touros;
touros adultos freqüentemente são alimentados com 3,5 a 6 vezes mais que a quantidade
de cálcio normalmente recomendada para manutenção, e um declínio significante
na incidência de tumores foi relatado quando eles receberam uma menor quantida-
de de cálcio.
Síndromes associadas com anormalidades na secreção de calcitonina são
reconhecidas muito menos freqüentemente que os distúrbios envolvendo o hormô-
nio paratireóideo (PTH). A hipersecreção de calcitonina tem sido relatada em
pessoas, touros e ratos de laboratório com neoplasias da medula da tireóide
(ultimobranquial) derivadas das células C. A síndrome freqüentemente envolve
muitos indivíduos em uma família humana. Em adultos com secreção excessiva
crônica de calcitonina, os níveis séricos de cálcio e fósforo geralmente permane-
cem abaixo do normal, em virtude de a taxa do turnover ósseo ser relativamente
lenta e de haver aumento compensatório na secreção do PTH. Alterações osteos-
cleróticas têm sido relatadas em touros com esta síndrome, mas a relação da
secreção excessiva de calcitonina a longo prazo com a patogenia das lesões
esqueléticas e sua ocorrência em outras espécies não é clara.

ÓRGÃOS QUIMIORRECEPTORES
Barômetros sensitivos das alterações de dióxido de carbono e oxigênio e do pH
sangüíneo ajudam na regulação da respiração e da circulação. Embora os tecidos
quimiorreceptores pareçam ser amplamente distribuídos no corpo, os tumores se
desenvolvem principalmente nos corpos aórticos e carótideos, mais freqüentemente
no primeiro em animais e no último no homem. Estes tumores ocorrem primariamente
em cães e raramente em gatos e bovinos. Raças de cães braquicefálicos, como boxer
e terrier boston, são predispostas a tumores dos corpos aórticos e carotídeos.
Tumores de corpos aórticos aparecem mais freqüentemente como massas
únicas ou nódulos múltiplos dentro do saco pericárdico próximo à base do coração.
Tumores de Tecidos Neuroendócrinos 349

Eles variam consideravelmente em tamanho (0,5 a 12,5cm), com carcinomas, em


geral sendo maiores que os adenomas. Adenomas pequenos e solitários são unidos
à adventícia da artéria pulmonar e aorta ascendente ou são embebidos no tecido
conectivo adiposo entre estes importantes troncos vasculares. Eles têm uma
superfície externa homogênea e ao corte são brancos e marmorizados, com áreas
vermelhas a marrons. Adenomas maiores podem cortar o átrio ou deslocar a
traquéia, são multilobulares e circundados parcialmente pelos importantes troncos
arteriais na base do coração.
Em cães, tumores malignos de corpos aórticos ocorrem menos freqüentemente
que os adenomas. Os carcinomas podem-se infiltrar na parede da artéria pulmonar
para formar projeções no lúmen ou invadir a parede do lúmen dos átrios. Embora as
células tumorais freqüentemente invadam os vasos sangüíneos, metástases nos
pulmões e fígado ocorrem raramente em cães com carcinomas de corpos aórticos.
Tumores de corpos aórticos nos animais não são funcionais (ou seja, eles não
secretam excesso de hormônio para a circulação), mas podem provocar lesões que
ocupam espaço as quais resultam em vários distúrbios funcionais. Estes incluem
manifestações de descompensação cardíaca devidas à pressão nos átrios, veia
cava, ou ambos, associadas com adenomas e carcinomas maiores de corpos
aórticos. Tumores de corpos aórticos tendem a ser mais benignos que tumores de
corpos carotídeos. Eles crescem lentamente por expansão e exercem pressão na
veia cava e no átrio. Os carcinomas de corpos aórticos podem invadir localmente os
átrios, o pericárdio e os vasos adjacentes grandes com paredes finas.
Um tumor de corpo carotídeo desenvolve-se próximo à bifurcação da artéria
carótida comum e geralmente aparece como uma massa unilateral de crescimento
lento. Os adenomas possuem diâmetro de , 1 a 4cm, são bem encapsulados e
possuem uma superfície externa homogênea. A bifurcação da artéria carótida é
incorporada à massa e as células tumorais são firmemente aderidas à túnica
adventícia. Os adenomas são firmes e brancos com áreas esparsas de hemorragia
e são extremamente vasculares. A excisão completa ou biópsia freqüentemente é
difícil devido ao alto grau de vascularização e íntima relação com importantes
troncos arteriais no pescoço.
Tumores malignos de corpos carotídeos são maiores e mais grosseiramente
multinodulares que adenomas. Embora os carcinomas pareçam ser encapsula-
dos, as células tumorais invadem a cápsula e penetram nas paredes de vasos
adjacentes e linfáticos. A veia jugular externa e vários nervos cranianos podem ser
incorporados pelo neoplasma. Metástases de tumores de corpos carotídeos ocor-
rem em , 30% dos casos e têm sido encontradas nos pulmões, linfonodos
mediastínicos e brônquicos, fígado, pâncreas e rins. Transformações neoplásicas
multicêntricas do tecido quimiorreceptor ocorrem freqüentemente em raças
braquicefálicas de cães.
As características histológicas dos tumores de quimiorreceptores ("quimiodec-
tomas") são essencialmente semelhantes se forem derivadas dos corpos aórticos
e carotídeos.
Embora a etiologia dos tumores de corpos aórticos e carótideos seja desco-
nhecida, sugere-se uma predisposição genética agravada pela hipoxia crônica,
podendo contribuir para aumentar o risco em certas raças braquicefálicas. Os
corpos carotídeos de vários mamíferos, incluindo cães, sofrem hiperplasia quando
sujeitos à hipoxia crônica quando vivem em ambientes de alta altitude.
OLHO E OUVIDO
OFTALMOLOGIA .......................................................................................... 351
Exame Físico do Olho .............................................................................. 351
Pálpebras ................................................................................................. 352
Anormalidades Conformacionais ....................................................... 352
Inflamação .......................................................................................... 353
Aparelho Lacrimal .................................................................................... 353
Conjuntiva ................................................................................................ 354
Córnea ..................................................................................................... 354
Úvea Anterior ........................................................................................... 355
Glaucoma ................................................................................................. 356
Lente ..................................................................................................... 357
Fundo de Olho ......................................................................................... 357
Retinopatias Hereditárias ................................................................... 357
Coriorretinite ....................................................................................... 358
Órbita ..................................................................................................... 358
Prolapso do Olho ..................................................................................... 359
ONCOLOGIA OFTÁLMICA ........................................................................... 359
Oncologia Oftálmica Bovina ..................................................................... 359
Oncologia Oftálmica Canina .................................................................... 360
Oncologia Oftálmica Eqüina .................................................................... 361
Oncologia Oftálmica Felina ...................................................................... 361
CONJUNTIVITE POR CHLAMYDIA ............................................................. 362
UVEÍTE EQÜINA ........................................................................................... 363
VERMES OCULARES ................................................................................... 365
Vermes Oculares de Grandes Animais .................................................... 365
Vermes Oculares de Pequenos Animais ................................................. 367
CERATOCONJUNTIVITE INFECCIOSA ...................................................... 367
SURDEZ ........................................................................................................ 369
DOENÇAS DA ORELHA EXTERNA ............................................................. 370
Doenças da Pina ...................................................................................... 370
Hematoma Auricular .......................................................................... 371
Síndrome Necrótica da Orelha de Suínos ......................................... 371
Otite Externa ............................................................................................ 372
Tumores do Canal Auditivo ...................................................................... 376
OTITES MÉDIA E INTERNA ......................................................................... 376

OFTALMOLOGIA
EXAME FÍSICO DO OLHO
O exame ocular inicial deve avaliar a simetria, conformação e lesões macroscó-
picas; o olho deve ser observado a menos de 1m, com boa iluminação e com mínima
Oftalmologia 352

movimentação da cabeça. O segmento anterior do olho e os reflexos da pupila são


examinados detalhadamente com luz forte e sob aumento, em um ambiente escuro.
O teste de lágrima de Schirmer, coloração com fluoresceína, citologia e cultura da
córnea e conjuntiva, medida da pressão intra-ocular (tonometria), eversão das
pálpebras para exame e lavagem do duto nasolacrimal são procedimentos auxilia-
res para avaliar enfermidades do segmento anterior do olho. As doenças do humor
vítreo e fundo de olho são detectadas ou avaliadas por oftalmoscopia, freqüente-
mente executada após indução de midríase e testes de visão (trajeto com obstá-
culos).
O teste de lágrima de Schirmer e as culturas corneoconjuntivais podem ser
executados antes da instilação de anestésico tópico. A coloração com fluoresceína
e a eversão palpebral não requerem anestésico tópico, mas a medida da pressão
intra-ocular (tonometria), o exame da superfície posterior da membrana nictante, as
citologias conjuntival e corneal, a gonioscopia e a lavagem do duto nasolacrimal
devem ser realizados após instilação deste anestésico.
Os exames especiais, tais como a biomicroscopia com lâmpada de fenda ou
eletrorretinografia, podem requerer sedação ou anestesia local, regional ou geral.

PÁLPEBRAS
Anormalidades conformacionais
Entrópio – É uma inversão total ou parcial das margens palpebrais que pode
envolver uma ou ambas as pálpebras e os cantos. O entrópio geralmente está
associado a um defeito hereditário da pálpebra em muitas raças caninas e ovinas,
à formação de cicatriz ou a um severo blefarospasmo devido a dor ocular ou
periocular. A inversão dos cílios ou dos pêlos faciais cria um desconforto adicional,
irritações conjuntival e corneal, e se prolongada, causa cicatrizes na córnea,
pigmentação e talvez ulceração. O entrópio espástico precoce pode ser revertido
se: 1. a causa inicial for removida; ou 2. a dor for aliviada com eversão dos pêlos
palpebrais para fora do olho com suturas em colchoeiro na pálpebra, injeções (por
exemplo, de penicilina procaína) na pálpebra adjacente ao entrópio, ou por bloqueio
do nervo palpebral. O entrópio estabelecido pode requerer correção cirúrgica.
Ectrópio – É uma pálpebra frouxa, de margem evertida, geralmente com uma
grande fissura palpebral; é um defeito de conformação bilateral comum em várias
raças caninas; a contração de cicatrizes na pálpebra ou paralisia do nervo facial
podem produzir ectrópio unilateral em qualquer espécie. A exposição conjuntival
resultante leva a uma conjuntivite crônica ou recorrente por irritantes ambientais ou
infecção bacteriana. As preparações tópicas de antibiótico-corticosteróide podem
controlar temporariamente as infecções periódicas, mas a correção cirúrgica é
indicada em muitos casos. Os casos moderados podem ser controlados por
lavagens periódicas repetidas com soluções descongestionantes suaves.
Lagoftalmia – A incapacidade de fechar as pálpebras e proteger a córnea do
ressecamento e de traumatismos pode ser o resultado de órbitas de pouca
profundidade, exoftalmia devida a uma lesão orbital que ocupa espaço, ou paralisia
do nervo facial. Lesão da córnea, pigmentação e ulceração são resultados gerais de
lagoftalmia. A não ser que a causa possa ser corrigida, a terapia consiste em
lubrificantes tópicos e redução cirúrgica ou fechamento da(s) fissura(s) permanente
ou temporariamente, dependendo da causa. Pregas cutâneas nasais excessivas e
pêlos faciais podem agravar o dano causado pela lagoftalmia.
Anormalidades dos cílios – Cílios maldirecionados na margem palpebral
podem produzir epífora ou lesão corneal e ulceração. Em muitos casos, cílios
anômalos são muito finos e não produzem sinais clínicos nem lesão. Entretanto,
cílios maldirecionados que penetram através da conjuntiva palpebral são capazes
Oftalmologia 353

de produzir sinais de dor profunda. Se os sinais se correlacionam com cílios extras,


a excisão ou criortermia dos folículos ciliares é indicada. Anormalidades dos cílios
são comuns em algumas raças de cães e provavelmente são hereditárias.

Inflamação
A blefarite (inflamação das pálpebras) pode resultar da extensão de uma dermatite
generalizada, de conjuntivite ou infecções locais, ou de irritantes, tais como óleos
vegetativos ou exposição solar. As pálpebras podem ser o sítio original do comprome-
timento por agentes que progridem para uma dermatite generalizada. Dermatófitos,
Demodex canis , e bactérias, tais como os estafilococos, estão freqüentemente
envolvidos. A junção mucocutânea da pele e conjuntiva pode ser o sítio de doenças
imunomediadas como o pênfigo. Infecções glandulares locais podem ser agudas ou
crônicas (hordéolo e calázio). Na blefarite generalizada, é freqüentemente indicada
a terapia sistêmica além do tratamento tópico. Terapia de suporte com compressas
quentes e freqüente limpeza é comumente indicada em casos agudos. Se as
preparações não oftálmicas podem ser usadas para tratar as pálpebras, indica-se
cautela na aplicação para evitar-se a irritação da córnea. Esfregaços de pele,
culturas e biópsias podem ser necessárias para se chegar a um diagnóstico correto.

APARELHO LACRIMAL
Hipertrofia e prolapso da glândula da terceira pálpebra (olho de cereja) são
comuns em cães jovens. Em estágios agudos, a grande massa vermelha incha, há
protrusão da margem da terceira pálpebra e uma secreção mucopurulenta. Embora
a tumefação possa retroceder por curtos períodos, ela eventualmente permanece
prolapsada, mas raramente produz sinais desfavoráveis nos estágios crônicos.
Visto que é uma glândula lacrimal importante, deve ser preservada por uma sutura
de apoio à borda orbital, ou por excisão parcial. A excisão completa pode resultar
em uma ceratoconjuntivite seca (ver adiante).
Dacriocistite é uma inflamação do saco lacrimal normalmente causada por
obstrução do duto nasolacrimal proximal por debris inflamatórios, corpos estranhos,
ou massas que pressionam sobre o duto. Produz lacrimejamento (epífora) e
conjuntivite secundária refratária ao tratamento.
Abscedação do saco lacrimal pode ocorrer. A irrigação do duto nasolacrimal
revelará uma obstrução do duto ou refluxo de secreção mucopurulenta do orifício,
ou ambos. Radiografias do crânio após injeção de contraste dentro do duto podem
ser necessárias para estabelecer o sítio e a causa da obstrução. O tratamento
consiste na manutenção da abertura do duto e instilação de soluções antibióticas
tópicas. Pode ser necessária a implantação de um tubo de polietileno no duto para
manter a abertura.
Atresia dos orifícios lacrimais é uma causa de epífora no cão e no gato,
enquanto a atresia do extremo nasal do duto nasolacrimal é uma causa de
dacriocistite em eqüinos e bovinos jovens. A terapia consiste em abrir cirurgicamen-
te o orifício e manter sua abertura.
Ceratoconjuntivite seca (CCS) é devida a uma deficiência de lágrimas e
geralmente resulta em uma conjuntivite mucopurulenta e cicatrizes e úlceras da
córnea. A síndrome é comum em cães, nos quais está freqüentemente associada
à adenite auto-imune. Cinomose, tratamento crônico com sulfonamidas e trauma-
tismos são causas pouco freqüentes de CCS. A doença é infreqüente em gatos e
rara em cavalos. O tratamento tópico consiste em lágrimas artificiais, e combinações
de antibiótico-esteróide se não houver ulceração. Os lacrimogêneos, tais como a
pilocarpina misturada à ração podem ser úteis (para um cão de 10 a 15kg, iniciar com
2 a 4 gotas de policarpina a 2%, duas vezes ao dia). Ciclosporina tópica a 2%
Oftalmologia 354

(embora não esteja disponível comercialmente como preparação tópica) dada duas
vezes ao dia aumenta a produção de lágrima em muitos cães. Os agentes
mucolíticos, por exemplo, a acetilcisteína a 10%, lisam o excesso de muco e
restauram a capacidade de difusão de outros agentes tópicos. Em casos de CCS
crônica, a terapia médica é inadequada para controlar a progressão das cicatrizes
da córnea e é indicado o transplante do duto parotídeo.

CONJUNTIVA
Hemorragia subconjuntival pode surgir de um trauma ou de discrasias sangüí-
neas; não requer terapia, mas é um sinal que merece ser examinado para determinar
se alterações intra-oculares mais importantes ocorreram. Se não há evidências ou
história definitiva de trauma, então o exame sistêmico é indicado para se determinar
a causa da hemorragia espontânea.
Quemose ou edema conjuntival ocorre em algum grau em todas as conjuntivites,
mas os exemplos mais dramáticos são vistos nas reações alérgicas, trauma e picada
de insetos. A última é tratada com corticosteróides tópicos e normalmente resolve-
se rapidamente. É indicada a terapia específica para o agente etiológico.
Conjuntivite é uma doença comum em todos os animais domésticos e os agentes
etiológicos podem variar de infecciosos a irritantes ambientais. Os sinais de conjun-
tivite são hiperemia, quemose, secreção ocular, hiperplasia folicular e um leve
desconforto ocular. A aparência da conjuntiva geralmente não é distinta o suficiente
para sugerir o agente etiológico, e o diagnóstico específico depende do histórico,
exame físico, esfregaços da conjuntivite e cultura, teste de lágrima de Schirmer e, às
vezes, biópsia. Conjuntivite unilateral indica condição isolada de um olho, tal como
corpo estranho, dacriocistite ou CCS (ver adiante). No gato, o micoplasma e
aChlamydia cati podem produzir conjuntivite que começa em um olho e torna-se
bilateral após , 1semana. O diagnóstico específico é feito pela demonstração de
inclusões ou do agente infeccioso em esfregaços conjuntivais. A conjuntivite bilateral
é comum em uma variedade de infecções virais em todas as espécies. O herpesvírus
produz conjuntivite no gato, na vaca, no cavalo e no porco e passageiramente no cão.
Secreção purulenta indica um componente bacteriano, mas este pode ser oportunis-
ta devido à debilidade da superfície da membrana mucosa. Os irritantes ambientais
e alérgenos são causas comuns de conjuntivite em todas as espécies. Se está
presente exsudato mucopurulento, é indicada a antibioticoterapia, mas esta pode
não ser curativa se outros fatores predisponentes estão envolvidos. Fatores mecâ-
nicos, tais como corpos estranhos, irritantes ambientais e defeitos de conformação
devem ser removidos ou corrigidos. A tetraciclina tópica é indicada para o tratamento
de infecções causadas por Chlamydia; preparações antivirais tópicas, tais como
idoxuridina, são indicadas para as infecções por herpesvírus.

CÓRNEA
Ceratite superficial é comum em todas as espécies e é caracterizada por
vascularização e opacificação da córnea, que podem ser devidas a edema, infiltrado
celular, pigmentação ou fibroplasia. Se a ulceração está presente, dor evidenciada
por epífora e blefarospasmo é um sinal notável. Ceratite unilateral é freqüentemente
de origem traumática. Fatores mecânicos, tais como defeitos de conformação
palpebral e corpos estranhos, devem sempre ser eliminados, bem como suas
possíveis causas, visto que a melhora não ocorrerá até que os transtornos sejam
resolvidos. Ceratite ulcerativa pode ser complicada por uma invasão secundária por
bactérias e, nos cavalos, por fungos saprófitas. Ceratite superficial bilateral pode ser
imunomediada ou associada à ausência de lágrimas, defeitos conformacionais e
agentes infecciosos.
Oftalmologia 355

Ceratite superficial crônica (doença de Uberreiter, pannus oftálmico) é uma


ceratite superficial bilateral progressiva e proliferativa, que começa lateralmente no
limbo e, eventualmente, estende-se a todos os quadrantes para cobrir a córnea. É
mais comum no cão pastor alemão. O tratamento específico para a ceratite
superficial consiste de antibióticos tópicos, agentes antivirais ou antimicóticos
quando apropriados, remoção de irritantes mecânicos quando presentes, suple-
mentação lacrimal quando deficiente e corticosteróide quando a doença é imunome-
diada. O último tem que ser continuado indefinidamente e a freqüência varia
dependendo da resposta.
Ceratite intersticial é um envolvimento profundo do estroma e está presente em
todos os casos crônicos e em muitos casos agudos de uveíte anterior. A neovas-
cularização da córnea é menos ramificada e profunda que na ceratite superficial e
freqüentemente o edema da córnea é marcante se o endotélio tiver sido afetado.
Doenças sistêmicas, tais como a hepatite infecciosa canina, febre catarral maligna,
micoses sistêmicas e septicemias que se localizam nos olhos, são causas de
ceratite intersticial uni ou bilateral. A terapia é direcionada à uveíte anterior, à
infecção sistêmica ou a ambas.
Ceratite ulcerativa pode ser superficial, profunda, profunda com descemetocele
ou perfurante. Dor, irregularidade da córnea, edema e, eventualmente, neovascula-
rização são sinais de ulceração. Um denso infiltrado branco na margem da úlcera
indica intensa leucotaxia e envolvimento bacteriano. Para detectar pequenas
úlceras, fluoresceína sódica tópica pode ser administrada. No cão e no cavalo, a
maioria das úlceras é de origem mecânica; na vaca e na ovelha, agentes infecciosos
e causas mecânicas são importantes; no gato, herpesvírus. Todas as úlceras têm
potencial para contaminação bacteriana secundária ou "digestão" enzimática endó-
gena do estroma. O tratamento para úlceras superficiais é geralmente medicamen-
toso, consistindo de antibiótico(s) tópico(s), atropina tópica para iridocicloplegia e
correção de qualquer fator mecânico. As síndromes de úlceras superficiais que
cicatrizam muito lentamente ocorrem no cão, no gato e no cavalo; no gato, deve se
suspeitar do herpesvírus; no cão, elas podem ser devidas a patologias da membrana
basal e ser recidivantes. Múltiplos furos na membrana basal com agulha de calibre
25 estimulam a cicatrização da maioria das úlceras indolentes dentro de 7 a 10 dias.
“Flaps” da terceira pálpebra (ou suaves lentes de contato) atuam como bandagem
de pressão e freqüentemente são terapêuticas. Úlceras profundas são tratadas
medicamente de modo similar às úlceras superficiais, mas, além disso, muitas
requerem cirurgia para o fortalecimento rápido da córnea.
Dermóides são massas carnosas cobertas com pêlos que podem envolver a
córnea, o limbo, a conjuntiva, a membrana nictante e as pálpebras em todas as
espécies. Estão presentes desde o nascimento do animal e geralmente são
detectadas precocemente; a excisão local é curativa.
Nódulos inflamatórios da córnea e conjuntiva, como fasciíte nodular em cães e
ceratoconjuntivite proliferativa em collies, podem mimetizar neoplasias devido à sua
aparência carnosa e às recidivas. O tratamento é à base de corticosteróides tópicos,
excisão local, criotermia ou azatioprina. Em gatos, a ceratite eosinofílica apresenta
sinais clínicos semelhantes e é tratada com corticosteróides tópicos, acetato de
megestrol por via oral ou pela excisão local.

ÚVEA ANTERIOR
Membranas pupilares persistentes são remanescentes de uma rede vascular
congênita que preencheu a região pupilar. A persistência de filamentos pigmentados
que cruzam a pupila de uma área da íris a outra, ou para a lente ou córnea, não é rara
no cão e ocorre eventualmente em outras espécies. No basenji, a condição é herdada.
Oftalmologia 356

Atrofia da íris é comum no cão e pode envolver a margem pupilar ou o estroma.


A atrofia da margem pupilar cria uma borda recortada e um enfraquecimento do
músculo do esfíncter, que se manifesta como uma pupila dilatada ou reflexos
pupilares lentos. A atrofia do estroma resulta em orifícios acentuados na íris e,
freqüentemente, deslocamento da pupila. Nenhuma outra forma parece causar
prejuízos à função visual. Animais com deficiência no esfíncter funcional da íris
podem ter blefarospasmos quando expostos à luz brilhante.
Cistos da íris no cão geralmente são esferas pigmentadas flutuantes no humor
aquoso. No gato, os cistos freqüentemente são ligados à margem pupilar; no cavalo,
estão presentes no estroma da íris. A terapia raramente é necessária, mas a
aspiração pode ser feita. A transiluminação demonstrará sua natureza cística e os
diferenciará de neoplasias.
Uveíte anterior ou iridociclite quando aguda é manifestada por miose, aumento
de proteínas e células na câmara anterior, hipotonia, injeção vascular conjuntival
seletiva, fotofobia e blefarospasmo. Glaucoma, catarata e opacificação da córnea
podem ser complicações da uveíte anterior. Causas de uveíte anterior podem ser
separadas em exógenas e endógenas. Traumatismos penetrantes ou não, doenças
infecciosas sistêmicas e, raramente, neoplasias e helmintos intra-oculares são
causas de uveíte unilateral. Doenças infecciosas sistêmicas e imunomediadas são
as causas mais comuns de uveíte bilateral. Exemplos das primeiras são hepatite
infecciosa canina, peritonite infecciosa felina, leucemia felina, toxoplasmose, micoses
sistêmicas, brucelose canina, leptospirose, febre catarral maligna, rinotraqueíte
infecciosa bovina, arterite viral eqüina, cólera suína, ehrlichiose canina e infecções
bacterianas neonatais (articulares, umbilicais e intestinais) dos bezerros. Uveíte
recidivante, que é ao menos em parte imunomediada, afeta eqüinos (uveíte eqüina,
ver pág. 363) e cães (panuveíte com despigmentação dérmica). Um completo
histórico, exame da córnea para descobrir lesões, exame físico e centese do
humor aquoso para cultura e citologia são auxiliares do diagnóstico.
A terapia não específica consiste de atropina atópica em 2 a 4 vezes ao dia,
corticosteróides tópicos (se a causa não for bacteriana) 4 a 6 vezes ao dia, ambiente
escuro e inibidores de prostaglandinas (tais como, aspirina, flunixin meglumina e
fenilbutazona). Se for de origem bacteriana, antibióticos tópicos, sistêmicos e até
intra-oculares são indicados. Os processos imunomediados podem requerer corti-
costeróides sistêmicos ou subconjuntivais, bem como tópicos.

GLAUCOMA
É um conjunto de sintomas que se manifesta pelo aumento da pressão intra-ocular
que lesa a retina e o nervo óptico. Os sinais que o acompanham são: pupila dilatada,
fixa ou de reação lenta; injeção conjuntival seletiva; edema corneal e rigidez do globo.
O estiramento do globo ocular pode resultar no deslocamento das lentes e no rompi-
mento da membrana de Descemet. A dor normalmente é manifestada por mudanças
no comportamento em vez de blefarospasmo. A condição é classificada como primá-
ria ou secundária conforme o ângulo de abertura da câmara anterior esteja aberto ou
obstruído (fechado). Os glaucomas primários, dos quais se suspeita terem predis-
posição genética, eventualmente tornam-se bilaterais; o glaucoma primário com ângulo
aberto em beagles é hereditário e associado a um gene autossômico recessivo. O
cocker spaniel americano e o basset hound também são comumente afetados. Os
glaucomas secundários estão associados a doenças intra-oculares adquiridas que
interferem no escoamento do humor aquoso. Inflamação intra-ocular é a causa mais
comum, mas neoplasias, hifema e deslocamento das lentes são causas adicionais.
Visto que a alta pressão intra-ocular pode lesar permanentemente os olhos em
poucos dias, o glaucoma agudo deve ser tratado como uma emergência. A terapia
Oftalmologia 357

consiste em administrar manitol por via endovenosa, inibidores da anidrase carbô-


nica por via oral, e pilocarpina ou timolol tópicos. A maioria dos animais com
glaucoma primário é candidata à cirurgia ou ciclocriotermia, uma vez que a pressão
ocular normal não pode ser mantida medicamente por mais de 2 a 3 dias. A terapia
para glaucoma secundário varia com a resposta ao medicamento e se a causa
secundária pode ser removida cirurgicamente. Os olhos cegos devido ao glaucoma
podem ser tratados por enucleação, prótese intra-ocular, ciclocriotermia ou injeção
de 10 a 25mg de gentamicina no vítreo.

LENTE
Catarata é uma opacidade da lente ou de sua cápsula, e deve ser diferenciada
do aumento normal na densidade nuclear (esclerose nuclear) que ocorre em
animais mais velhos. As cataratas são classificadas geralmente pela sua idade de
início (congênita, juvenil ou senil), localização, causa, grau de opacificação (inci-
piente, imatura, madura e hipermadura) e forma. A maioria das cataratas pode ser
detectada por dilatação da pupila e exame da região pupilar contra a retroiluminação
do fundo de olho. Os cães sofrem de catarata (freqüentemente hereditária) mais
comumente que outras espécies. Outros agentes etiológicos são o diabetes melito,
desnutrição, inflamação e traumatismo. No gato e no cavalo, a maioria das cataratas
é secundária a inflamações. Em geral, a única terapia para cataratas que são
severas o suficiente para provocar cegueira é a remoção cirúrgica do cristalino.
Cataratas juvenis podem ser reabsorvidas o suficiente até haver recuperação da
visão; cataratas congênitas nucleares podem melhorar com o crescimento das
lentes. Animais com cataratas imaturas (incompletas) podem se beneficiar com atropi-
na 2 a 3 vezes por semana, que permite visão ao redor de uma densa zona central.
Deslocamento da lente é visto em todas as espécies, mas é comum como um
defeito hereditário primário em várias raças de cães terrier. O deslocamento
completo da câmara anterior produz sinais agudos e, freqüentemente, é acompa-
nhado por glaucoma e edema de córnea. O tratamento é a remoção cirúrgica.O
deslocamento posterior na cavidade vítrea é assintomático ou associado a inflama-
ção ocular ou glaucoma. As lentes subluxadas são reconhecidas por uma afacia
crescente e tremor da íris (iridodonese). A decisão pela remoção das lentes
subluxadas é baseada na severidade dos sinais e no julgamento próprio quanto ao
papel que a lente desempenha na produção dos mesmos. O deslocamento das
lentes também pode ser causado por traumatismos, estiramento do globo e
variações zonulares degenerativas com cataratas crônicas.

FUNDO DE OLHO
Doenças do fundo de olho (retina, coróide e disco óptico) podem ser isoladas no
olho ou podem ser manifestações de doenças sistêmicas. As anormalidades
herdadas podem ser congênitas ou aparecer tardiamente, e são importantes na
patogenia das retinopatias nos cães. Traumatismo, distúrbios metabólicos, infec-
ções sistêmicas, neoplasias, discrasias sangüíneas e deficiências nutricionais são
possíveis causas primárias de retinopatias em todas espécies.

Retinopatias hereditárias
Anomalia ocular do cão collie é um defeito congênito, recessivamente herda-
do, com expressão variável. A lesão básica é uma área de hipoplasia coriorretinal
lateral ao disco óptico. Os cães afetados mais severamente terão lesões
colobomatosas adicionais da papila ou região peripapilar e destacamento da retina.
A tortuosidade vascular da retina é comum e pode ocorrer hemorragia intra-ocular.
Oftalmologia 358

A visão não é apreciavelmente afetada, a menos que o destacamento da retina


esteja presente.
Atrofia retinal progressiva (ARP) é um grupo de retinopatias degenerativas que
consiste de várias doenças fotorreceptoras herdadas que têm aspecto clínico similar.
É uma característica recessiva em várias raças caninas; descreve-se uma doença
similar em gatos. A idade de aparecimento dos sinais clínicos varia com o tipo de ARP,
variando de 4 a 6 meses nos cães setter irlandeses e collies, 3 a 5 anos em poodles
miniatura e outras raças. A cegueira noturna é notada precocemente e progride para
cegueira total num período de meses a anos. As lesões oftálmicas são um aumento
simétrico bilateral na refletividade do fundo tapetal, diminuição da pigmentação do
fundo não tapetal, atenuação e diminuição do número de vasos da retina e, finalmente,
atrofia da papila óptica. As cataratas corticais progressivas são comuns tardiamente
no curso da ARP e podem mascarar a retinopatia primária. Não existe terapia eficaz.
Um segundo tipo de degeneração retinal em cães é a atrofia retinal progressiva
central (ARPC), que primariamente envolve o pigmento retinal do epitélio distrófico.
As raças mais freqüentemente afetadas são labrador retriever, collies de pêlo
crespo e pêlo liso, collies border, shetland sheepdog e briard. ARPC é hereditária
em labrador retriever como característica dominante de penetrância variável. Os
achados oftalmoscópicos iniciais são pequenos focos de pigmentação irregular no
fundo tapetal, que eventualmente coalescem e murcham, conforme sua refletividade
aumenta. O fundo não tapetal torna-se mosqueado, os vasos retinais desaparecem
e o nervo óptico atrofia-se. Progressiva diminuição da visão ocorre gradualmente
após vários anos. Não existe tratamento efetivo.
Displasia retinal é um maldesenvolvimento da retina, local ou generalizado, de
origem congênita, que pode surgir de um trauma, defeito genético ou lesão intra-
uterina, tal como uma infecção viral. Áreas focais de maldesenvolvimento retinal
podem ser assintomáticas ou interferir na visão central. Displasia grave é manifes-
tada como um destacamento da retina. As cataratas podem acompanhar a síndro-
me, e no cão labrador retriever pode estar associada à displasia esquelética
(encurtamento) dos membros anteriores.
Hipoplasia do nervo óptico pode ser hereditária no poodle miniatura; no gato,
pode ser resultado de uma infecção de panleucopenia no útero. A condição pode ser
uni ou bilateral. O envolvimento bilateral é manifestado por cegueira no neonato. O
envolvimento unilateral é com freqüência encontrado incidentalmente na velhice do
animal, ou manifesta-se se o olho normal for afetado pela doença.

Coriorretinite
A coriorretinite freqüentemente é uma manifestação de uma doença infecciosa
sistêmica; ela é importante como indício de diagnóstico e como prognosticador
da função visual. A menos que as lesões sejam generalizadas ou envolvam o
nervo óptico, elas freqüentemente são “silenciosas”. As cicatrizes podem ser
diferenciadas das lesões ativas pela turvação e bordas maldefinidas das
últimas. A coriorretinite pode estar presente na cinomose canina, micoses
sistêmicas, prototecose, toxoplasmose, tuberculose, septicemias bacterianas,
peritonite infecciosa felina, meningoencefalite tromboembólica, febre catarral
maligna, cólera suína, leptospirose eqüina e oncocerquíase. A terapia geralmente
é direcionada à doença sistêmica.

ÓRBITA
Os sinais de celulite orbital são dor aguda ao abrir a boca, prolapso unilateral
da membrana nictante, deslocamento adiante do globo ocular e conjuntivite. A
ceratite pode se desenvolver a partir de lagoftalmia (ver pág. 352). A condição é vista
Oncologia Oftálmica 359

predominantemente em cães de raças grandes; em pequenos cães, geralmente


deve-se a abscessos dentários. Corpos estranhos, como arestas de pasto migrató-
rias e sialadenite zigomática, são causas adicionais. Hemorragia orbital e neoplasia
mimetizam a inflamação, exceto quando não há dor ao abrir a boca. Em casos
agudos, antibióticos de amplo espectro são geralmente curativos, mas se a
tumefação estiver presente atrás do último molar, a drenagem da área é indicada.
Recidivas podem ocorrer, e radiografias são indicadas para detectar abscessos
dentários. Compressas quentes e lubrificantes tópicos são também indicados para
proteger a córnea.

PROLAPSO DO OLHO
O prolapso agudo do olho é um resultado de traumatismos, sendo mais comum
em cães e gatos. Deve-se tentar repor o globo se a condição física do animal permitir
a indução de anestesia geral. O canto lateral é incisado e o globo manualmente
recolocado. As suturas das pálpebras e membrana nictante previnem recidivas. A
lesão traumática é tratada por via sistêmica. O prognóstico para a recuperação da
visão é ruim, mas bom para a manutenção do globo.

ONCOLOGIA OFTÁLMICA
O olho e as estruturas associadas a ele podem desenvolver neoplasias de
diferentes tecidos dentro da órbita;eles também podem ser sítios de metás-
tases.Neoplasias oftálmicas variam em freqüência e importância nas diferentes
espécies.

ONCOLOGIA OFTÁLMICA BOVINA


A neoplasia oftálmica mais freqüente em bovinos é o carcinoma de células
escamosas e a infiltração orbitária associada ao linfossarcoma. O último, com
invasão extensa das estruturas orbitárias, resulta em exoftalmia progressiva,
reduzida mobilidade ocular, ceratite e ulcerações na córnea, que podem perfurá-la.
O carcinoma bovino de células escamosas do olho (câncer oftálmico) pode afetar
pálpebras, conjuntivas e membrana nictante, porém é mais freqüente a partir das
regiões medial e lateral do limbo (junção corneosclerótica). As lesões cancerosas
ou pré-cancerosas são bilaterais ou múltiplas no mesmo olho em , 28% dos casos.
Ocorre mais freqüentemente em herefords, com menos freqüência em simmentals
e holstein-friesians, e raramente em outras raças.
O carcinoma de células escamosas do olho é a neoplasia mais comum no gado
bovino; ele resulta em significante perda econômica devido à rejeição em matadou-
ros e a uma diminuição da vida produtiva. A idade de maior incidência é 8 anos. A
etiologia é multifatorial com envolvimento da hereditariedade, luz solar, nutrição e,
talvez, viroses. As manifestações das pálpebras têm sido relacionadas à falta de
pigmentação, ao passo que as do globo ocular não se relacionam, mas ambas
também têm uma base hereditária. Radiação ultravioleta e planos elevados de
nutrição são fatores contribuintes. O vírus da rinotraqueíte infecciosa bovina e do
papiloma têm sido isolados de neoplasias, mas sua importância é desconhecida.
As lesões geralmente se iniciam como benignas, lisas, com placas brancas na
superfície conjuntival, que podem progredir para um papiloma e então para um
carcinoma de células escamosas, ou ir diretamente para o estágio maligno. As lesões
palpebrais começam, geralmente, como uma lesão ulcerativa e hiperceratótica (pro-
Oncologia Oftálmica 360

trusão cutânea). Durante este estágio benigno é estimado que , 30% dos casos
podem regredir espontaneamente. O tumor pode tornar-se bastante grande, sem
invadir o globo, pois a invasão do olho e da órbita e metástases de linfonodos regionais
são estágios mais avançados da doença. O diagnóstico geralmente é feito pela
aparência clínica típica, mas a confirmação rápida pode ser feita por exame citológico
de impressão dos esfregaços. A invasão intra-ocular do tumor deve ser diferenciada
de olhos severamente perturbados após traumatismo e ceratoconjuntivite infecciosa.
Carcinomas de células escamosas têm respondido ao tratamento médico,
excisão, crioterapia, hipertermia, radioterapia e imunoterapia. Tanto a crioterapia
quanto a hipertermia têm produzido excelentes resultados a curto prazo, mas a
recidiva no mesmo local ou em local diferente é , 25%.
Para lesões avançadas confinadas ao globo ocular, a enucleação é recomenda-
da. Quando tecidos adjacentes também são afetados, deve-se realizar a exentera-
ção (remoção do globo e de todo o conteúdo orbitário). A imunoterapia ainda é
experimental e a regressão do tumor pode ser temporária. A radioterapia não é
praticada no campo, mas pode ser uma opção para animais valiosos internados.
Proprietários de gado com problemas devem ser advertidos quanto ao fator
hereditário, e os animais afetados e seus descendentes devem ser descartados
para diminuir a incidência.

ONCOLOGIA OFTÁLMICA CANINA


Neoplasias orbitárias são massas que vão progressivamente ocupando espaço,
produzindo exoftalmia, tumefação conjuntival e palpebral, estrabismo, ceratite e
incapacidade de retropulsão do globo. Geralmente não causa dor. Devido ao fato de
que 90% das neoplasias são malignas e 75% crescem dentro da órbita, o prognós-
tico para uma sobrevivência a longo prazo é pobre. O tipo de neoplasia deve ser
determinado pela biópsia, e a extensão da massa pelo exame físico, radiografias do
crânio incluindo procedimentos contrastados e ultra-sonografia antes do tratamento
cirúrgico ou radioterapia.
Neoplasias palpebrais são o grupo mais freqüente de neoplasias oftálmicas em
cães. Adenoma e adenocarcinoma da glândula de Meibom são as neoplasias
palpebrais mais comuns; desfiguramento local e irritação associados à massa
indicam a necessidade de excisão local, que geralmente é satisfatória. Adenocar-
cinomas sebáceos são localmente invasivos e histologicamente malignos, mas não
sofrem metástase. Melanomas palpebrais que aparecem como massas pigmenta-
das e difusas nas margens palpebrais devem ser amplamente excisados. Outras
neoplasias palpebrais freqüentes incluem histiocitoma, mastocitoma e papiloma.
Neoplasias corneais e límbicas são raras em cães e podem ser confundidas com
fasciíte nodular e ceratoconjuntivite proliferativa em collies. Melanomas malignos
límbicos são massas focais, geralmente superficiais e pigmentadas, que se esten-
dem tanto sobre a córnea e caudalmente através do meio do globo. Após um
acurado exame intra-ocular, incluindo gonioscopia, para detectar uma possível
penetração da esclera, a excisão cirúrgica em toda a extensão escleral freqüente-
mente é satisfatória. Se ocorrer invasão intra-ocular, deve-se realizar a enucleação.
Melanomas malignos, a neoplasia uveal mais comum, geralmente são pigmen-
tados e freqüentemente envolvem a íris e o corpo ciliar. Os sinais clínicos de
melanomas uveais anteriores podem incluir a presença de massa evidente, iridociclite
persistente, hifema, glaucoma e dor. Adenoma e adenocarcinoma são as neopla-
sias epiteliais mais freqüentes da úvea anterior. Os sinais podem incluir hifema,
glaucoma e geralmente a presença de uma massa não pigmentada atrás da íris e
da pupila. Neoplasias de origem neuroectodérmica são raras. O tratamento geral-
mente consiste na enucleação. Adenocarcinomas uveais secundários são relativa-
Oncologia Oftálmica 361

mente raros e têm origem em sítios distantes. Outras neoplasias como o tumor
venéreo transmissível e o hemangiossarcoma podem metastatizar para a úvea
anterior. Linfossarcoma é o tumor ocular secundário mais freqüente e geralmente
manifesta-se como uveíte anterior e glaucoma secundário.

ONCOLOGIA OFTÁLMICA EQÜINA


Em eqüinos, tumores da pele, olhos e sistema genital são os mais freqüentes e , 80%
das neoplasias oculares são malignas. Neoplasias das pálpebras e conjuntiva são os
tumores oftálmicos mais freqüentes em eqüinos; a maioria é carcinoma de células
escamosas ou sarcóides. Neoplasias orbitárias são raras e geralmente são extensões
de tumores das pálpebras, conjuntiva ou seios. Neoplasias intra-oculares são raras.
Carcinomas de células escamosas ocorrem mais freqüentemente em eqüinos
idosos (média 9,8 anos) e podem ocorrer frequëntemente naqueles que possuem
pálpebras não pigmentadas ou pouco pigmentadas. As pálpebras, conjuntivas,
membrana nictante e regiões límbicas podem ser afetadas; um ou ambos os olhos
geralmente são envolvidos. O carcinoma de células escamosas dos nictitans invade
mais provavelmente a órbita que outros locais. O tratamento do carcinoma de
células escamosas oftálmico em eqüinos é semelhante ao dos bovinos, embora a
apresentação para o tratamento seja geralmente no início dos sintomas, e exista
uma maior preocupação com relação à aparência após a terapia.
O sarcóide eqüino geralmente afeta eqüinos jovens (média 3,8 anos) e representa
, 40% de todas as neoplasias em eqüinos. Devido ao fato de que os sarcóides são
localmente destrutivos e têm uma alta taxa de recidiva após a cirurgia, o tratamento
efetivo quando os tecidos perioculares são envolvidos apresenta problemas cosmé-
ticos e funcionais. Os sarcóides aparecem inicialmente como massas subcutâneas
nas pálpebras ou canto; eles geralmente crescem rapidamente e podem invadir a
pele, aparecendo como massas carnosas avermelhadas. O tratamento pela cirurgia,
hipertermia, crioterapia e quimioterapia apresenta sucesso limitado. Após tentativas
de remoção cirúrgica, a recidiva pode ser rápida, e precede a cicatrização da lesão. A
radioterapia para o sarcóide eqüino também tem sucesso limitado. A imunoterapia
com BCG (bacilo de Calmette-Guérin) como potencializador do sistema imunocelular
é consideravelmente promissora. Após o “debulking” cirúrgico de grandes sarcóides,
a preparação do BCG (7,5mg de extrato de parede celular purificado, suspenso em
10mL de solução salina) é injetada diretamente no interior da massa remanescente
(2mL/sítio). As injeções podem ser repetidas a cada 2 a 4 semanas até que a massa
desapareça. Corticosteróides sistêmicos e antiprostaglandinas podem ser indicados
antes e depois do tratamento, uma vez que podem ocorrer reações anafiláticas.

ONCOLOGIA OFTÁLMICA FELINA


Neoplasias oftálmicas em gatos são menos freqüentes que em cães. Tumores
conjuntivais e palpebrais são as neoplasias oftálmicas primárias mais freqüentes.
Ao contrário dos cães, estas neoplasias em gatos geralmente são malignas,
invasivas e mais difíceis de serem tratadas. Carcinomas de células escamosas são
mais comuns em gatos brancos com margens palpebrais despigmentadas e podem
envolver pálpebras, conjuntivas e membrana nictante; eles são massas brancas,
ásperas, irregulares ou densamente ulceradas. Outras neoplasias incluem adeno-
carcinomas, fibrossarcomas, neurofibrossarcomas e carcinomas de células basais.
O tratamento varia com relação ao tipo de tumor, localização, tamanho, e inclui
excisão cirúrgica, radioterapia e criotermia.
A neoplasia intra-ocular primária mais comum em gatos é o melanoma maligno.
Os sinais clínicos e tratamento são idênticos aos dos cães (ver anteriormente). O
sarcoma intra-ocular em gatos pode estar associado a trauma ocular anterior.
Oncologia Oftálmica 362

O complexo leucemia-linfossarcoma felino (FeLLC) é a neoplasia secundária


mais comum. Gatos com FeLLC ocular apresentam sinais clínicos que vão desde
lesões oculares isoladas até severa doença sistêmica; um ou ambos os olhos podem
ser afetados. Anomalias corneais podem incluir ceratite, edema, neovascularização,
infiltrados corneais e hemorragias dentro do estroma. Pode ocorrer ceratite ulcera-
tiva. Massas podem surgir nas conjuntivas e pálpebras. Anormalidades pupilares
incluindo midríase, anisocoria, irregularidades pupilares e perda do reflexo pupilar
à luz podem ocorrer. Uveíte anterior é o achado clínico mais comum no FeLLC.
Outros sinais incluem hipotonia, alterações na pigmentação da íris, precipitados
ceráticos, hifema, sinéquias anterior e posterior, miose e dilatação aquosa.
Alterações no segmento posterior incluem hemorragias retinais, vasos dilatados
tortuosos, embainhamento perivascular, destacamento e degeneração retinais.

CONJUNTIVITE POR CHLAMYDIA


É uma doença infecciosa importante em gatos, cordeiros, caprinos e porqui-
nhos-da-índia.
Etiologia e epidemiologia – Diferentes cepas de Chlamydia psittaci causam
infecção ocular em animais. Estas infecções são ocasionalmente transmitidas ao
homem (ver também INFECÇÕES INTESTINAIS POR C LAMÍDIAS, pág. 164). Os microrga-
nismos que causam tracoma e inclusão por conjuntivite no homem pertencem à
espécie C. trachomatis.
A doença em gatos também é conhecida como pneumonite felina. Este é um
nome errôneo, pois a Chlamydia raramente causa pneumonia em gatos; a infecção
geralmente envolve o olho e a mucosa do trato respiratório superior (rinite, sinusite,
faringite). Estudos sorológicos indicam que 2 a 12% dos gatos, dependendo da
idade e da localização geográfica, possuem anticorpos fixadores de complemento
para Chlamydia.
Ceratoconjuntivite por Chlamydia em caprinos e ovinos pode ter um significante
impacto econômico, principalmente no caso de rebanhos confinados, nos quais
mais de 90% dos animais podem se tornar infectados. Concomitantemente, cordei-
ros apresentam com freqüência poliartrite por Chlamydia (ver pág. 565). Aborto por
Chlamydia (ver pág. 789) tem sido também observado em rebanhos caprinos
afetados simultaneamente com a ceratoconjuntivite.
Infecções conjuntivais por Chlamydia, às vezes assintomática, são comuns em
rebanhos de porquinhos-da-índia (ver pág. 1242). A conjuntivite geralmente é
observada em animais de 4 a 8 semanas de idade. Infecções genitais causam
salpingite e cistite em fêmeas e uretrite em machos.
Ceratoconjuntivite por Chlamydia tem sido relatada em cães, bovinos, eqüinos
e suínos, podendo ser produzida experimentalmente nessas espécies.
Achados clínicos – Os sintomas em gatos variam de conjuntivite serosa a muco-
purulenta e rinite. Os sinais iniciais são conjuntiva unilateralmente avermelhada e
ligeiramente edemaciada. O período de incubação após a exposição é de 3 a 10
dias para o gato infectado. Conjuntivite bilateral desenvolve-se após alguns dias
e as conjuntivas tornam-se hiperêmicas e quemóticas, com folículos proeminentes
no interior da terceira pálpebra, nos casos mais severos. Os sinais são mais severos
9 a 13 dias após o início e depois diminuem em 2 a 3 semanas depois. Alguns gatos
apresentam ceratite vascular, pannus e úlcera de córnea, independentemente da
presença de infecções secundárias bacterianas ou por Mycoplasma. Em alguns gatos,
os sinais clínicos podem durar semanas, apesar do tratamento. A recidiva é comum.
Uveíte Eqüina 363

Lesões oculares semelhantes ocorrem em ovinos e caprinos. Infecções secun-


dárias são comuns nesses animais e, se não são tratadas, podem causar compli-
cações severas.
Lesões – Ocorrem reações inflamatórias nas conjuntivas e infiltrados de várias
células como neutrófilos, linfócitos, plasmócitos e macrófagos no curso inicial da
doença. Estas células, junto com as células epiteliais da conjuntiva contendo
inclusões clamidiais, são encontradas em raspados conjuntivais. Células do epitélio
gástrico de gatos também são infectadas. Ceratite ulcerativa com penetração
resultante da câmara anterior também pode ser encontrada em gatos severamente
afetados ou nos que apresentam infecções secundárias.
Diagnóstico – O diagnóstico pode ser confirmado pela demonstração de
inclusões clamidiais em preparações citológicas esfoliativas ou pelo isolamento
da Chlamydia. Os raspados são realizados com uma espátula que é movida
ligeira mas firmemente sobre a conjuntiva e o material coletado é colocado
sobre uma lâmpada de vidro; a preparação é secada à temperatura ambiente e
corada. Os corpos elementares aparecem basofílicos ou púrpuras se corados
com Giemsa, e avermelhados se corados com Gimenez. O material também
pode ser inoculado em embriões de galinha ou em culturas de células para o
isolamento. Um diagnóstico sorológico é difícil e requer amostras pareadas,
coletadas durante as fases aguda e convalescente da doença para compararem-
se os níveis de anticorpos; resultados falsos-negativos ocorrem ocasionalmente.
Conjuntivite por Chlamydia em gatos necessita ser diferenciada de infecções por
herpes e calicivírus, e em ovinos e caprinos de infecções por Mycoplasma e outras
infecções bacterianas (por exemplo, conjuntivite aguda).
Profilaxia e tratamento – Vacinas contra clamidiose estão disponíveis para
gatos, mas não para outras espécies. A vacina não protege o gato completamente,
mas reduz significantemente a severidade e os índices de infecção.
Todas as C. psittaci isoladas são suscetíveis à tetraciclina. Em gatos, pomadas
oftálmicas que contêm tetraciclina podem ser a única terapia necessária. Entretanto,
em casos severos ou recidivantes, é conveniente a utilização de tetraciclinas orais
ou parenterais. Gatas gestantes ou com doença renal devem ser tratadas com
eritromicina.
O tratamento sistêmico é melhor que o tratamento oftálmico, com a utilização
de oxitetraciclina (20mg/kg/dia) ou tilosina; deve ser realizado no início da doença
em ovinos e caprinos. A administração diária de 150 a 200mg de clortetraciclina na
ração de cordeiros afetados também reduz a incidência de conjuntivite e poliartrite.
Para reduzir a recidiva, o tratamento em gatos, assim como em ovinos e caprinos,
deve se estender por 7 a 10 dias após o desaparecimento dos sintomas clínicos.

UVEÍTE EQÜINA
(Oftalmia periódica, Iridociclite recidivante, Cegueira noturna)

Episódios recorrentes de inflamação de um ou de ambos os olhos encontram-se


em eqüinos, jumentos, mulas ou pôneis. Uveíte eqüina tem sido descrita por séculos
e, embora a incidência varie geograficamente, é reconhecida mundialmente.
Inflamação do trato uveal (íris, corpo ciliar e coróide) é responsável pelos sinais
clínicos e seqüelas que fazem desta doença a causa principal de cegueira em
cavalos.
Etiologia – Muitas causas têm sido propostas, mas poucas verificadas. A
leptospirose e as microfilárias de Onchocerca cervicalis têm considerável evidência
Uveíte Eqüina 364

de respaldo. Outras influências, como bacterianas, virais, genéticas, nutricionais e


lunares, têm sido sugeridas mas não têm suporte em dados científicos embora um
trabalho recente sugira que a raça appaloosa apresente predisposição genética.
Aparentemente, a maioria dos casos é devida a uma reação inflamatória
imunomediada no trato uveal. Isto está de acordo com uveíte em muitas outras
espécies, inclusive no homem. Outras causas de uveíte eqüina têm sido confirma-
das atualmente, mas o tratamento é similar, sem importar a causa específica.
Achados clínicos – Sinais oftálmicos de uveíte eqüina aguda incluem graus
variados de blefarospasmos, lacrimejamento, fotofobia, injeções conjuntival e ciliar,
edema corneal periférico e vascularização, dilatação aquosa, hipópio ou hifema,
miose, íris opaca, hipotonia, inflamação vítrea e vasculite retinal ou inflamação
peripapilar. Um só caso não mostrará todos estes sinais. Alguns casos têm baixo
grau ou são insidiosos, e podem não ser notados pelo proprietário por um longo
período; outros são dolorosos e é óbvio que estes serão observados imediatamente.
Casos de uveíte subaguda, crônica ou periódica têm algumas das mesmas
lesões e também podem deixar seqüelas (sinéquias anterior e posterior, catarata,
luxação do cristalino, alterações na pigmentação da íris, debris vítreos, cicatrizes
retinais peripapilares ou destacamento da retina) além das lesões agudas. Catara-
tas e exclusão ou oclusão papilar são as causas mais freqüentes de cegueira em
eqüinos sofrendo de uveíte. Ocasionalmente, glaucoma com buftalmia desenvolve-
se secundariamente à luxação do cristalino, sinéquia anterior ou exclusão pupilar.
A fibrose do trato uveal termina em phthisis bulbi . Qualquer combinação de seqüela
é possível em casos crônicos. Em muitos casos, lesões do vítreo ou da retina não
podem ser apreciadas devido a inflamação severa do segmento anterior, ou
seqüelas. Em casos de agressões múltiplas, as lesões são bilaterais.
Diagnóstico – Sinais oftálmicos são suficientes para o diagnóstico. Doenças
ulcerativas da córnea devem ser descartadas por coloração com fluoresceína. Além
dos sinais oftálmicos, o soro deve ser submetido à titulação para leptospira e para
outros microrganismos que possam ser suspeitados (vírus, Toxoplasma spp). Se
microfilárias de Onchocerca cervicalis (pág. 978) forem suspeitas como causa de
ceratoconjuntivite no quadrante temporal da córnea ou granulomas conjuntivais, a
biópsia conjuntival ou esfregaços úmidos são indicados. Títulos de anticorpos de
Leptospira pomona > 1:1.600 no teste de microaglutinação são sugestivos de
infecção recente ou crônica (ver também pág. 429). É importante considerar estes 2
patógenos quando a uveíte é endêmica dentro de um estábulo ou grupo de cavalos.
Estudos recentes da doença de Lyme (ver pág. 434) como causa potencial da uveíte
em eqüinos podem necessitar de sorologia para o diagnóstico. Eqüinos com a
doença de Lyme apresentam geralmente enfermidade sistêmica assim como
uveíte.
Tratamento – O tratamento deve ser agressivo para reduzir rapidamente a
inflamação ocular, prevenir o maior número possível de seqüelas e reduzir a
probabilidade de uma inflamação ativa crônica ou episódios que se repetem
rapidamente. Os corticosteróides tópicos de alta qualidade e alta potência são
indicados desde que outros esteróides não sejam eficazes em reduzir a inflamação
no trato uveal. Os produtos tópicos devem conter 0,1% de dexametasona ou 1% de
acetato de prednisolona e devem-se administrá-los de 4 a 12 vezes ao dia,
dependendo da severidade da inflamação e da preparação. A atropina tópica é outra
medicação essencial; ela não somente dilata a pupila como também promove
analgesia através de sua ação cicloplégica, prevenindo espasmo ciliar doloroso.
Atropina (1%) deve ser usada freqüentemente (4 a 8 vezes ao dia) até que a pupila
se dilate e, então, diminuída a aplicação para 2 ou 3 vezes ao dia.
Injeções subconjuntivais de corticosteróides de depósito, por exemplo, acetato
de metilprednisolona (0,5 a 1,0mL) ou betametasona, são muito úteis se injetados
Vermes Oculares 365

abaixo da conjuntiva bulbar. Os antiinflamatórios não esteróides sistêmicos, tais


como fenilbutazona, aspirina ou flunixin meglumina, podem ser usados nas dosa-
gens normais para proporcionar atividade antiinflamatória contra a porção da
inflamação ocular mediada por prostaglandina e promover analgesia.Os corticoste-
róides sistêmicos raras vezes são indicados, exceto nos casos severos ou quando
microfilárias de Onchocerca tenham sido identificadas como causa, e todos devem
ser usados criteriosamente para evitar indução de outros problemas médicos.
Os antibióticos sistêmicos geralmente não são indicados, a não ser que a uveíte
pareça ser séptica, o cavalo esteja febril ou leptospirose ou doença de Lyme tenham
sido identificadas como causas. Na uveíte causada por O. cervicalis, medicação
larvicida é indicada depois que a inflamação ativa tenha sido controlada. Ivermectina
(200µg/kg, dose única) ou uma dose diária de dietilcarbamazina (4,4 a 6,6mg/kg VO
por 21 dias) também tem sido usada, apesar de a ivermectina não ser completamen-
te efetiva; com qualquer uma das duas drogas, os olhos devem ser tratados
topicamente com corticosteróides durante o decorrer da terapia larvicida para
prevenir a inflamação associada a morte das microfilárias. O efeito microfilaricida da
ivermectina permanece por dias, e a terapia com esteróides deve ser prolongada de
acordo com a permanência desses efeitos. A freqüência do tratamento tópico pode
ser reduzida quando ocorrer melhora clínica, mas ela deve continuar por, no mínimo,
3 a 4 semanas. Isto vai além da melhora clínica aparente, mas considera a evidência
histológica da inflamação e pode prevenir a rápida recidiva observada em alguns eqüinos
que tiveram pouco tempo de terapia.
Prognóstico e prevenção – O prognóstico varia diretamente com a duração dos
sinais antes da instituição de uma terapia adequada; após decorridos vários dias,
podem-se desenvolver seqüelas permanentes, como sinéquias e perda de visão.
Em uveítes crônicas de baixo grau, o proprietário pode ter ignorado a severidade do
problema até que seqüelas permanentes já existam. Em casos superagudos, com
tratamento imediato, prolongado e intensivo, o prognóstico para preservação da
visão é de favorável a bom. Isto também requer uma instrução do cliente para que
este fique atento ao aparecimento de ataques futuros em um ou ambos os olhos em
intervalos não previstos. Com ataques repetidos ou inflamação ativa crônica, as
seqüelas são inevitáveis.
Em qualquer avaliação de saúde, deve ser recordada e julgada a evidência
presente ou passada de uveíte.
Quando L. pomona tiver sido identificada como causa de uveíte endêmica em
um grupo de cavalos, a vacinação dos animais resistentes com bacterina dá bons
resultados no controle de novos casos. Todos os cavalos (inclusive os acometidos)
devem ser vacinados duas vezes para se estabelecer imunidade primária e receber
vacinações a cada 6 a 12 meses.

VERMES OCULARES
(Telazíase)

VERMES OCULARES DE GRANDES ANIMAIS


Etiologia e epidemiologia – Vermes oculares (Thelazia spp) são parasitas
comuns de eqüinos e bovinos em muitos países, inclusive em algumas áreas da
América do Norte. Os cavalos são infectados principalmente por uma espécie, T.
lacrymalis ; os bovinos, principalmente por três, T. gulosa, T. skrjabini e T. rhodesii.
A última é mais comum e nociva para bovinos em muitos países, mas tem estado
Vermes Oculares 366

ausente em informes recentes sobre gado bovino do leste da América do Norte.


Thelazia spp também são encontradas em suínos, ovinos, caprinos, veados, búfalos
d'água, dromedários, coelhos, cães, gatos (ver adiante), pássaros e no homem.
Várias espécies de moscas muscida servem como hospedeiros intermediários. A
mosca da face, Musca autumnalis, é um vetor comum. Os hábitos alimentares destas
moscas incluem uma propensão para secreções oculares, o que proporciona uma
relação ideal para a transmissão. Os detalhes do ciclo de vida das Thelazia spp são
escassos: as fêmeas são ovovivíparas e descarregam suas larvas nas secreções
oculares; as larvas são ingeridas pela mosca e tornam-se infectantes em < 2 a > 4
semanas. As larvas infectantes são depositadas nos olhos do hospedeiro pela mosca,
mecanicamente, durante sua alimentação. O desenvolvimento dos vermes sexual-
mente maduros no hospedeiro vertebrado leva de 3 a 4 semanas para T. rhodesii e 6
semanas para T. gulosa nos bovinos, e 10 a 11 semanas para T. lacrymalis em pôneis.
Infecções são encontradas por volta de um ano, mas os surtos da doença clínica,
particularmente nos bovinos, em geral estão associados às atividades das moscas
durante a estação quente. Animais jovens são relativamente mais suscetíveis.
Patogenia – A glândula lacrimal e seus dutos são sítios comuns para T.
lacrymalis e T. gulosa ; as glândulas da membrana nictante e dutos nasolacrimais
são menos afetados. As localizações superficiais na córnea, no saco conjuntival e
sob as pálpebras e membrana nictante são mais típicas para T. skrjabini e T.
rhodesii, mas T. lacrymalis e T. gulosa estão freqüentes nestes sítios também. Os
vermes também se encontram nos pêlos periorbitais ou pele durante a anestesia ou
após migração post mortem. Uma hipótese tem responsabilizado a irritação e a
inflamação sobre a cutícula serrada dos vermes, especialmente T. rhodesii. A
invasão da glândula lacrimal e dos dutos excretores pode causar inflamação e
exsudação necrótica; a oclusão dos dutos reduz a produção de lágrimas. Inflamação
de dutos e sacos lacrimais tem sido relatada nos cavalos. São comuns conjuntivites
e blefarites de moderadas a severas. Ceratite, incluindo opacidade, ulceração,
perfuração e fibrose permanente, pode se desenvolver em casos severos, particu-
larmente em infecções por T. rhodesii em bovinos.
Achados clínicos e diagnóstico – Infecções assintomáticas em eqüinos e
bovinos parecem ser típicas de telazíase na América do Norte. A infecção pode ser
encontrada incidentalmente durante a cirurgia, e relatos recentes indicam uma
surpreendente e elevada prevalência quando uma pesquisa específica é feita na
necropsia. Na Europa e na Ásia, a telazíase é comumente associada a manifesta-
ções clínicas severas, incluindo conjuntivite, fotofobia e ceratite. Caracteristicamen-
te, há conjuntivite crônica com hiperplasia linfóide e um exsudato seromucóide.
Não existe uma técnica clinicamente possível para uma detecção segura do
verme ocular adulto. A inspeção macroscópica dos olhos pode revelar os vermes
e é geralmente recomendada para T. rhodesii, comumente encontrada no saco
conjuntival. No entanto, T. gulosa e T. skrjabini nos bovinos, e T. lacrymalis nos
eqüinos tendem a ser mais invasivas e menos prováveis de serem observadas.
Anestésicos tópicos são úteis para a detecção e a recuperação das últimas
espécies, por promoverem a liberação e a movimentação para sítios mais superfi-
ciais. Exame microscópico dos fluidos lacrimais para larvas pode ser tentado. Os
sinais clínicos podem ajudar no diagnóstico diferencial. Telazíase tende a ser uma
conjuntivite crônica. Nos bovinos, a ceratoconjuntivite infecciosa (ver adiante) é uma
infecção aguda da córnea, que se dissemina rapidamente. Nos cavalos, as larvas
infectantes de vermes do estômago, Draschia e Habronema spp, podem produzir
lesões nas pálpebras que são estabelecidas próximas ao canto medial e são
elevados granulomas ulcerativos, freqüentemente contendo placas amarelas ca-
racterísticas com “grânulos de enxofre” de 1 a 2mm de diâmetro. Microfilárias de
Onchocerca sp invadem o olho e podem resultar em uma variedade de manifesta-
Ceratoconjuntivite Infecciosa 367

ções. A presença de nódulos pequenos (< 1mm), elevados e brancos na conjuntiva


pigmentada adjacente ao limbo temporal é patognomônica de infecção por
Onchocerca. Despigmentação de conjuntiva bulbar nesta área também ocorre com
freqüência. Outras lesões de oncocerquíase envolvem a córnea e incluem edema
e opacidade em pontos ou riscos do estroma, erosões superficiais da córnea e uma
ceratite esclerosante em forma de cunha derivando do limbo temporal. Estruturas
intra-oculares também podem ser afetadas por microfilárias de Onchocerca sp (ver
pág. 978).
Tratamento e controle – Remoção mecânica com fórceps após instilação de um
anestésico local é útil para T. rhodesii em bovinos. Isto também pode ser utilizado
para as mais invasivas T. gulosa ou T. skrjabini nos bovinos, ou T. lacrymalis nos
eqüinos. Irrigação dos olhos com 50 a 75mL de solução aquosa de 0,5% de iodo e
0,75% de iodeto de potássio tem sido recomendada para T. gulosa e T. skrjabini.
Isto também pode ser eficaz para T. lacrymalis em eqüinos. Aplicação tópica de
0,03% de iodeto de ecotiofato ou de 0,02% de isoflurofato tem obtido sucesso para
T. lacrymalis em eqüinos. O uso concomitante de uma pomada antibiótica-esteróide
para combater a inflamação e invasores secundários é recomendado. Estes
agentes tópicos devem também ser úteis para T. gulosa e T. skrjabini nos bovinos.
Certos anti-helmínticos administrados sistematicamente têm mostrado ação contra
vermes oculares, embora nenhum seja aprovado para Thelazia spp em bovinos ou
eqüinos nos EUA. No entanto, levamisol em vários níveis de dosagem e ivermectina
a 0,2mg/kg têm mostrado atividade contra as 3 espécies de Thelazia nos bovinos.
Para T. lacrymalis em cavalos, doses únicas de anti-helmínticos comumente
usados, incluindo ivermectina a 0,2mg/kg, apresentam efeito limitado, ou nenhum,
contra vermes oculares; ao passo que o regime de multidoses de fenbendazol
(10mg/kg, durante 5 dias consecutivos) é eficaz contra este verme. As medidas de
controle das moscas, dirigidas especialmente contra a mosca da face, ajudam no
controle da telazíase, tanto em eqüinos quanto em bovinos.

VERMES OCULARES DE PEQUENOS ANIMAIS


Thelazia californiensis e T. callipaeda são encontradas em cães, gatos e outros
animais, incluindo o homem, no oeste dos EUA e outras áreas do mundo. Elas têm
uma cutícula serrada, medem de 7 a 19mm e deslocam-se com rápidos movimentos
em serpentina através do olho. Até 100 vermes podem ser vistos no saco conjuntival,
dutos lacrimais e na conjuntiva sob a membrana nictante e as pálpebras. Moscas da
sujeira (Musca spp, Fannia spp) aparentemente funcionam como hospedeiros inter-
mediários e depositam larvas infectantes no olho enquanto se alimentam de secre-
ções oculares.
Os sinais clínicos incluem lacrimejamento excessivo, conjuntivite, opacidade da
córnea, ulceração e raramente cegueira. Após anestesia local, o diagnóstico e o
tratamento são rapidamente realizados pela observação e remoção dos parasitas
com uma pinça. Soluções oculares (levamisol a 2%) ou ungüentos (levamisol a 1%
ou morantel a 4%) também podem ser efetivos.

CERATOCONJUNTIVITE INFECCIOSA
(Oftalmia infecciosa, Conjuntivite )

É uma doença infecciosa dos bovinos, ovinos e caprinos caracterizada por


blesfarospasmo, conjuntivite, lacrimejamento e vários graus de opacidade e ulcera-
Ceratoconjuntivite Infecciosa 368

ção da córnea. As síndromes clínicas nas 3 espécies são distintas e aparentemente


causadas por agentes específicos para cada espécie.
Nos bovinos, Moraxella bovis é a causa mais comum, embora o vírus da
rinotraqueíte infecciosa bovina (RIB) e o Mycoplasma tenham se mostrado capazes
de produzir conjuntivite e opacidade transitória da córnea; os 2 últimos podem
potencializar a doença da M. bovis . Nos ovinos, Neisseria ovis , rickéttsias e
micoplasmas têm sido associados à ceratoconjuntivite. Embora muitas das síndro-
mes dos caprinos jovens sejam causadas pelo Mycoplasma agalactiae (ver AGALACTIA
CONTAGIOSA, pág. 796), são também causadas por Moraxella capri e Mycoplasma
conjunctivae.
Achados clínicos – A doença é geralmente aguda e tende a disseminar-se
rapidamente. Um ou ambos os olhos podem ser afetados. Nos bovinos, ambientes
secos e com poeira, estresse de transporte, luz solar brilhante e agentes irritantes
como pólens, grama e moscas tendem a predispor e a exacerbar a doença. As
moscas também servem como vetores. Nos bovinos e caprinos, os animais jovens
são mais freqüentemente afetados; nos ovinos, somente os adultos são acometi-
dos, e a doença freqüentemente segue rebanhos fechados ou à época da parição.
Os sinais iniciais são fotofobia, blefarospasmo e lacrimejamento excessivo; poste-
riormente, a secreção ocular pode tornar-se mucopurulenta. Conjuntivite, com ou
sem variados graus de ceratite, está sempre presente. Geralmente, os animais têm
somente uma leve diminuição do apetite quando afetados. O curso clínico varia de
poucos dias a várias semanas, salvo se complicado por outras doenças.
Lesões – As lesões variam em severidade. Nos bovinos, uma ou mais pequenas
úlceras ocorrem próximas ao centro da córnea (mas ocasionalmente próximas ao
limbo) sem opacidade corneal. Inicialmente, a córnea está clara ao redor da lesão,
mas em poucas horas uma turvação leve aparece, e, subseqüentemente, passa a
ficar mais densa. A regressão pode ocorrer nos estágios mais precoces ou as lesões
podem continuar a progredir. Após 48 a 72h em casos severos, a córnea inteira pode
estar opaca e o animal estar cego daquele olho. Aproximadamente 7 dias após o
aparecimento da primeira lesão, os vasos sangüíneos começam a invadir a córnea
(vascularização adventícia) a partir do limbo em direção à úlcera. Raramente, a ação
ulcerativa continuada pode causar a ruptura da córnea. Em ovinos e caprinos, a
doença raramente progride, além de uma suave opacidade da córnea, acompanha-
da por úlcera e conjuntivite. A recidiva pode ocorrer em qualquer estágio de
recuperação, mas lesões posteriores não são tão severas quanto as iniciais.
Diagnóstico – Deve-se tomar cuidado para garantir que as lesões não sejam
devidas a corpos estranhos ou parasitas (ver VERMES OCULARES EM EQÜINOS E
BOVINOS, anteriormente). Na rinotraqueíte infecciosa bovina (RIB), predominam
sinais respiratórios superiores e conjuntivite, enquanto a ceratite acompanhada por
ulceração é rara. No catarro maligno bovino, são proeminentes sinais respiratórios
e a ceratite resolve-se a partir do centro da córnea; na ceratoconjuntivite infecciosa
bovina, as lesões da córnea resolvem-se do limbo para o centro. Lesões causadas
somente por micoplasmas não envolvem a córnea dos bovinos. Em ovinos e
bovinos, o diagnóstico normalmente é feito com base nos sinais clínicos. O
envolvimento da esclera tem sido considerado patognomônico nos ovinos. O
isolamento e a identificação dos agentes causadores nas 3 espécies animais
também são úteis no diagnóstico diferencial.
Profilaxia e tratamento – Bovinos recuperados parecem ser imunes, embora
possam permanecer portadores de M. bovis. Vacinas preparadas a partir de
antígenos de M. bovis parecem oferecer alguma proteção, mas ainda não foi
provada sua segurança. Vacinas contra RIB conferem imunidade ocular a bovinos
vacinados. As infecções por Moraxella bovis podem ser controladas por vários
antibióticos (penicilina, nitrofurazona, tetraciclina ou gentamicina), a menos que
Surdez 369

cepas resistentes tenham se desenvolvido. Eles podem ser administrados topica-


mente como soluções ou ungüentos, ou por injeções subconjuntivais; a aplicação
ocular repetida pode ser necessária, e animais afetados devem ser colocados em
áreas com sombra. Os corticosteróides injetados por via subconjuntival com
antibióticos têm sido eficazes em alguns casos. Injeções subconjuntivais e blefarorrafia
envolvendo ambas as pálpebras e as membranas nictantes são eficazes em muitos
casos de ulceração corneal severa. A blefarorrafia é feita usando-se uma sutura
intermarginal com fio absorvível. Em ovinos e caprinos, antibióticos eficazes contra
Mycoplasma e Chlamydia (tetraciclina e cloranfenicol), bem como penicilina,
estreptomicina e nitrofurazona são recomendados. O tratamento geralmente é
limitado aos casos nos quais há óbvio envolvimento da córnea.

SURDEZ
A surdez adquirida pode ocorrer devido à oclusão bilateral dos canais auditivos
externos, como na otite externa crônica, ou porque houve destruição do ouvido
médio ou interno. Outras causas de surdez são traumatismo do osso temporal
petroso, ruídos de alta potência (por exemplo, disparo de canhão), condições
desmielinizantes, drogas ototóxicas (por exemplo, antibióticos aminoglicosídios
[gentamicina, canamicina, neomicina, estreptomicina] ou salicilatos), neoplasias do
ouvido ou cérebro, e idade avançada. A surdez unilateral e/ou perda parcial da
audição é possível em alguns dos casos anteriores.
A surdez congênita ocorre a partir de uma característica hereditária ou de um dano
no desenvolvimento do feto (devido a um agente tóxico ou viral). Um gene autossô-
mico em gatos provoca pelagem branca, olhos azuis e surdez; é dominante, com
completa expressão na produção de pêlos brancos e expressão incompleta para
surdez e íris azul. A surdez é, neste caso, devida a alterações degenerativas
cocleossaculares que ocorrem na primeira semana de vida. A pelagem merle e a
branca estão associadas à surdez congênita em cães e em outros animais. As raças
comumente afetadas incluem dálmata, heeler australiano, setter inglês, shepherd
australiano, boston terrier, old english sheepdog, great dane e boxer. A lista das raças
afetadas sofre alterações com o tempo devido à popularidade racial e à eliminação
do problema pela seleção genética; por exemplo, o cocker spaniel apresentava
com freqüência surdez hereditária, o que não é mais comum nessa raça.
O diagnóstico requer observação cuidadosa da resposta do animal ao som. É
importante considerar a descrição do proprietário em relação ao comportamento do
animal e realizar uma anamnese apropriada. A resposta aos estímulos visuais, táteis
e olfatórios deve ser diferenciada da resposta ao som. Em animais jovens ou animais
mantidos em grupos, a surdez pode ser difícil de se detectar, pois o indivíduo
suspeito seguirá a resposta dos outros integrantes do grupo. Se o animal for
observado individualmente após uma idade em que as respostas aos estímulos
auditivos são perceptíveis (, 3 a 4 semanas para cães e gatos), a surdez poderá
ser detectada. O sinal primário é a deficiência para responder ao estímulo auditivo.
Um exemplo disso é a dificuldade para acordar o cão com a produção de ruídos ou
dificuldade para alertá-lo com relação a uma fonte sonora. Outros sinais incluem
comportamento incomum, como latido excessivo, voz anormal, hiperatividade,
confusão quando são dados comandos vocais e perda dos movimentos reflexos de
alerta e atenção das pinas. Um animal que gradualmente foi se tornando surdo,
como um cão idoso, pode não responder ao meio ambiente e ao chamado do
proprietário. A surdez unilateral é difícil de ser detectada, exceto pela observação
Surdez 370

cuidadosa ou por procedimentos eletrodiagnósticos. O exame otoscópico da orelha


externa, radiografia da bula timpânica e o exame neurológico podem revelar a
causa, principalmente nos casos de surdez adquirida. Na surdez congênita, estes
procedimentos geralmente revelam estrutura normal, mas sem sinais de audição,
exceto nos casos de surdez unilateral. Um teste eletrodiagnóstico da resposta aos
estímulos auditivos (BAER) pode ser usado para determinar a presença e o nível de
um defeito auditivo em uma ou em ambas as orelhas. A audiometria de impedância
pode avaliar a integridade da orelha média e do sistema de condução.
A surdez devida à oclusão do canal auditivo externo geralmente responde ao
tratamento médico ou cirúrgico apropriados. A surdez devida a infecções bacteria-
nas da orelha média e interna pode responder ao tratamento antibiótico apropriado.
A recuperação da surdez devida a barulho intenso, trauma ou infecções virais pode
ser completa, parcial ou nula. Qualquer recuperação está na dependência do tempo.
A recuperação de surdez causada por drogas ototóxicas é rara. A surdez hereditária
pode ser eliminada de uma raça pelo afastamento dos portadores do programa de
cruzamento. O modo da herança da surdez característica pode ser determinado
pelo estudo de pedigrees ou pelo teste de acasalamento. Mais recentemente, o
BAER tem sido usado para identificar cães afetados uni e bilateralmente, que podem
ser eliminados do programa de cruzamento.

DOENÇAS DA ORELHA EXTERNA


DOENÇAS DA PINA
Várias doenças por ectoparasitas causam lesões na pina. Escabioses canina e
felina estão associadas a descamação e escoriações das margens da pina e
extremo prurido. Dermatite por picada de moscas em cães é causada pela mosca
de estábulo, Stomoxys calcitrans, que se alimenta na ponta da orelha de cães com
orelha ereta, no verão. Os sinais incluem agitação e coceira nas orelhas. As lesões
consistem na presença de crostas hemorrágicas e escoriações nas pontas das
pinas. O tratamento consiste em manter o cão em local fechado durante o dia ou na
aplicação freqüente de inseticidas repelentes na ponta das orelhas.
Placas aurais de eqüinos (uma variação da papilomatose eqüina, ver pág. 1036)
podem estar associadas a uma resposta de hipersensibilidade crônica a antígenos
salivares de moscas negras que se alimentam na superfície interna das pinas. As
lesões consistem de placas cinza-esbranquiçadas, planas, bem circunscritas e não
pruriginosas, que geralmente são cobertas com uma crosta ceratinosa pálida.
A dermatose auricular marginal afeta dachshunds. A causa é desconhecida, mas
pode estar associada à microcirculação anormal na pina. As lesões iniciais consis-
tem de alopecia, crostas e escamas ao redor das margens das pinas. Em casos
crônicos, a pina inteira pode se tornar alopécica e podem ocorrer ulceração precoce,
fissuras e liquenificação ao redor das margens.
Várias doenças imunomediadas, incluindo pênfigo foliáceo, pênfigo eritematoso,
penfigóide bolhoso, lúpus eritematoso sistêmico, lúpus eritematoso discóide, doen-
ça por aglutinina fria e erupções por drogas causam alopecia, crostas e ulceração
na pina. Inflamação e prurido na pina são freqüentes na atopia canina e na
hipersensibilidade alimentar.
Ulceração pelo frio pode causar descoloração da extremidade das orelhas.
Lesões actínicas da pina podem ocorrer em gatos brancos que são cronicamente
expostos à luz solar intensa. As lesões inicialmente aparecem como eritema e
Doenças da Orelha Externa 371

escamação nas extremidades das orelhas. Crostas, exsudação e ulceração podem


se desenvolver como uma ceratose actínica que sofre transformação para carcino-
ma de células escamosas. Durante os estágios iniciais da doença, o tratamento
consiste na redução da exposição à luz ultravioleta através do confinamento ou do
uso de protetores solares tópicos. Carcinomas de células escamosas das pinas são
tratados pela remoção cirúrgica, sozinha ou em combinação com a radioterapia.

Hematoma auricular
É uma tumefação preenchida por líquido que se desenvolve na superfície
côncava da pina em cães, gatos e suínos. As lesões podem se desenvolver como
resultado da ruptura de vasos sangüíneos dentro da pina, devido aos meneios de
cabeça ou ao ato de coçar a orelha com a pata em virtude do prurido auricular.
Ocorre mais comumente em cães com pinas pedunculares. Também tem sido
proposto que as lesões resultam de uma doença auto-imune dos tecidos das pinas
em vez de trauma pinal. Em suínos, sarna sarcóptica, pediculose e alimento digerido
nas orelhas (comedores cheios) têm sido implicados como causas de meneios de
cabeça que levam aos hematomas aurais. Mordidas de outros suínos também
podem ser uma causa (ver também SÍNDROME NECRÓTICA DA ORELHA, adiante).
O tratamento é cirúrgico para permitir a drenagem e o debridamento. Causas de
base de desconforto ótico, como doenças parasitárias e hipersensibilidade, devem
ser identificadas e tratadas para prevenir a recidiva.

Síndrome necrótica da orelha de suínos


(Necrose da orelha, Dermatite auricular necrótica)
É uma condição caracterizada por necrose uni ou bilateral das pinas que
ocorre esporadicamente em porcos desmamados e em crescimento, criados sob
todos os tipos de sistemas de tratamento. Porcos afetados crescem pouco e
freqüentemente desenvolvem artrite séptica ou morrem devido a uma septicemia
bacteriana secundária.
Etiologia, transmissão e patogenia – As causas não têm sido conclusivamente
determinadas. Uma evidência circunstancial sugere que a doença seja devida a
traumatismos (brigas) e subseqüente invasão bacteriana da lesão tecidual.
As lesões desenvolvem-se passando por uma dermatite superficial leve até uma
inflamação profunda severa com exsudação, ulceração, trombose e necrose. Nos
casos leves, a resolução ocorre sem perda tecidual da orelha. Nos casos severos,
as margens, as extremidades ou ainda a pina inteira podem ser perdidas. Os
resultados de exames histológicos e bacteriológicos sugerem que a lesão erosiva
agressiva seja devida à infecção bacteriana secundária. Nas fases precoces da
doença, um grande número de Staphylococcus hyicus e um baixo a moderado
número de estreptococos β-hemolíticos são encontrados no exsudato superficial;
mais tarde, durante o estágio ulcerativo e necrótico, um grande número de
estreptococos é encontrado profundamente nas lesões. Existe a hipótese de que o
S. hyicus colonize o tecido traumatizado e prepare o caminho para os estreptococos
altamente invasivos, e que estes induzam alterações que levem a ulcerações e
necrose. Tentativas para reproduzir a doença por inoculação experimental dos 2
microrganismos não têm sido bem-sucedidas.
Achados clínicos, lesões e diagnóstico – A natureza e a extensão dos sinais
clínicos dependem da severidade da lesão local e do desenvolvimento de septice-
mia bacteriana secundária. Assim, pode-se ver um espectro de sinais incluindo
incapacidade de crescer, inapetência, febre, artrite séptica, colapso e morte.
Lesões leves consistem de arranhaduras superficiais cobertas com crostas
marrons, secas e finas. Edema ou eritema leves podem estar presentes próximo aos
Doenças da Orelha Externa 372

arranhões. Nos casos mais severos, crostas marrons, espessas e úmidas cobrem
as úlceras profundas. Na maioria dos casos severos, há extensa necrose.
O diagnóstico é feito pela aparência das orelhas afetadas.
Controle – Tintura de iodo aplicada topicamente 2 vezes ao dia, por 7 dias, tem
reduzido a incidência e a severidade da doença. Drogas antibacterianas administra-
das na alimentação são eficazes em alguns casos, mas não trazem benefícios em
outros. A falta de eficácia pode ser devida à resistência à droga. Em casos nos quais
os agentes antibacterianos são ineficazes, devem-se colher as amostras
assepticamente a partir da porção mais profunda da lesão ulcerativa, fazer a cultura
e determinar sua sensibilidade antimicrobiana. Os acontecimentos traumatizantes
devem ser minimizados. Fatores de manejo (ventilação, localização e funcionamen-
to dos bebedouros, projeto dos boxes, tamanho do grupo e mistura) e os fatores
nutricionais (ingestão de sal e proteína) têm sido sugeridos como contribuintes para
incidência de mordidas nas orelhas (ver também INTERAÇÃO MANEJO-DOENÇA:
SUÍNOS, pág. 1358).

OTITE EXTERNA
É uma inflamação aguda ou crônica do epitélio do meato auditivo externo, às
vezes envolvendo a pina, e se caracteriza por eritema, aumento da descamação do
epitélio e graus variados de dor e prurido. É a doença mais comum do canal auditivo
de cães e gatos, tendo geralmente uma etiologia multifatorial. É rara em grandes
animais e ocasionalmente observada em coelhos, sendo geralmente devida ao
ácaro Psoroptes cuniculi.
Etiologia – Determinando-se se a causa é primária, predisponente ou perpetuante,
pode-se fornecer um prognóstico mais acurado e formular um plano terapêutico
seguro e específico.
Causas primárias – Fatores internos e externos podem induzir diretamente
inflamação e prurido no canal auditivo externo. Fatores externos geralmente são
identificados com facilidade, e se prontamente removidos, freqüentemente resultam
em cura. Entretanto, infelizmente, muitos casos refratários são devidos a causas
primárias decorrentes de problemas metabólicos de vida longa. Causas primárias
incluem parasitas, corpos estranhos, hipersensibilidade, distúrbios da ceratinização
e doenças auto-imunes.
Causas predisponentes – Pequenas mudanças no microclima ótico podem al-
terar o delicado balanço das secreções normais e da microflora, resultando
em infecções oportunistas. Estas causas incluem conformação, maceração do
canal auditivo, erros de tratamento, doenças auriculares obstrutivas, pirexia e
doença sistêmica.
Fatores perpetuantes – Uma vez que o ambiente do canal auditivo foi alterado
por uma combinação de fatores primários e predisponentes, podem ocorrer infec-
ções oportunistas e alterações patológicas, que impedem a resolução da doença.
Estes fatores incluem bactérias, leveduras, otite média e alterações patológicas
progressivas.
Achados clínicos e diagnóstico – A menos que todas as causas sejam
identificadas e tratadas, podem-se esperar recidivas. Alterações patológicas crôni-
cas nas orelhas podem também ser reflexo de uma doença cutânea ou sistêmica
generalizada.
Uma história dermatológica completa pode fornecer muitas informações e pode
ser sugestiva de outros problemas, por exemplo, hipersensibilidade ou distúrbios de
ceratinização. Os sinais são importantes; certas raças de cães são predispostas a
distúrbios conformacionais do canal auditivo, hipersensibilidade e distúrbios de
ceratinização.
Doenças da Orelha Externa 373

Um exame físico e dermatológico completo deve preceder o exame profundo das


orelhas. Distúrbios hormonais, endócrinos e imunes podem estar aparentes em
outros locais do corpo e afetar as orelhas. Raspados cutâneos, exame sob lâmpada
de Wood e cultura para dermatófitos podem fornecer informações sobre uma
dermatose generalizada que se disseminou para os canais auditivos.
As pinas e as regiões periauriculares devem ser inspecionadas para evidenciar
a presença de traumatismo auto-inflingido, eritema e lesões cutâneas primárias e
secundárias. Deformações da pina sugerem desconforto ótico crônico e meneios de
cabeça.
Para animais com sinais unilaterais, a orelha não afetada deve ser examinada
primeiro: 1. o problema pode, de fato, ser bilateral, sendo um lado mais severamente
afetado; 2. o animal pode se tornar mais obediente ao se inspecionar a orelha
afetada posteriormente; 3. isto pode prevenir contaminação iatrogênica da orelha
não afetada por microrganismos, por exemplo, Pseudomonas aeruginosa ou
Proteus mirabilis, que podem estar presentes na orelha doente.
Podem ser necessárias sedação ou anestesia para um exame otoscópico
completo, se a orelha estiver dolorida ou se o canal estiver obstruído com exsudato
ou com tecido inflamatório proliferativo. Recomendações semelhantes devem ser
feitas para todos os animais com sinais recidivantes uma vez que corpos estranhos
profundos, infecções leves por Otodectes cynotis e membranas timpânicas rompi-
das podem não ser observados durante um exame mais superficial.
Durante um exame otoscópico, o canal auditivo deve ser inspecionado com
relação a alterações no diâmetro, alterações patológicas na pele, quantidades de
cerume, quantidade e tipo de exsudato, presença de parasitas (principalmente
Otobius megnini [carrapato espinhoso da orelha de grandes animais], Otodectes
cynotis ,e ocasionalmente Psoroptes cuniculi ou outros), corpos estranhos, neopla-
sias e alterações na membrana timpânica.
Exames laboratoriais feitos a partir de materiais coletados do canal auditivo
horizontal podem fornecer informação diagnóstica imediata. Culturas microbianas e
citológicas, quando indicadas, são realizadas antes da otoscopia ser completada.
Em cães grandes, devem-se inserir os "swabs" quando o cone do otoscópio estéril
for primeiramente inserido no interior do canal horizontal. A membrana timpânica
deve ser examinada para evidenciar doença ou ruptura da mesma antes do "swab"
ser introduzido, já que o mesmo pode empurrar debris para o canal e obscurecer
a membrana. Pode ser impossível passar um "swab" através de um cone usado
para cães pequenos e gatos; pode ser preferível para remover o cone e introduzir
delicadamente um pequeno "swab" no interior do canal para coletar uma amostra.
Culturas citológicas são feitas esfregando-se o "swab" sobre uma lâmpada de
vidro, e deixando-as secar à temperatura ambiente. Coloração de Wright modificada
é adequada para estas preparações. Após exame sob magnificação de baixa
potência, as amostras devem ser avaliadas sob alta potência (preferencialmente
utilizando-se óleo de imersão) com relação ao número e à morfologia das bactérias,
leveduras e leucócitos; evidência de fagocitose de microrganismos; parasitas;
cerume; corpos estranhos; hifas fúngicas e células neoplásicas.
O canal auditivo externo da maioria dos cães e gatos abriga pequenos números
de bactérias comensais e potencialmente patogênicas; entretanto, a cultura pode
determinar rapidamente se o crescimento microbiano está presente. Microrganis-
mos na forma de cocos geralmente são estafilococos ou estreptococos. Microrga-
nismos na forma de bastonetes geralmente são Pseudomonas aeruginosa ou
Proteus mirabilis, e sua aparência deve ser observada pela cultura bacteriana e
teste de sensibilidade, devido à sua resistência a muitos agentes antimicrobianos.
A presença de muitos neutrófilos fagocitando bactérias confirma a natureza patogê-
nica dos microrganismos.
Doenças da Orelha Externa 374

A levedura Mallassezia canis é encontrada em pequeno número no canal


auditivo de muitos cães e gatos normais. Devido ao fato delas colonizarem a
superfície do canal auditivo, elas são mais facilmente encontradas aderidas às
células escamosas esfoliadas. Não mais que 2 a 3 microrganismos devem estar
presentes sobre qualquer agregado de células em um animal normal. São comuns
infecções bacterianas concomitantes, principalmente com cocos Gram-positivos.
O material citológico deve ser examinado com relação à presença de ovos, larvas
ou adultos do ácaro auricular Otodectes cynotis, já que uma pequena população de
ácaros pode ser perdida no exame otoscópico. Da mesma forma, o material
citológico de coelhos e caprinos deve ser examinado com relação à presença do
Psoroptes cuniculi. Raramente, a otite externa ceruminosa refratária pode estar
associada à proliferação de Demodex spp no canal auditivo externo de cães e gatos.
Grandes números de ácaros adultos podem ser observados no exame do cerume.
A cultura e o antibiograma auxiliam na seleção dos agentes antimicrobianos
sistêmicos quando a otite externa crônica é complicada por infecções bacterianas
oportunistas. Alguns acreditam que o insucesso no uso da terapia antimicrobiana é
uma causa predisponente e perpetuante importante da doença auditiva crônica em
cães. Achados que estimulam a utilização do teste de sensibilidade e cultura
microbiana incluem uma infecção bacteriana profunda na pele do canal auditivo
externo, uma história de insucesso terapêutico com agentes antimicrobianos
tópicos ou a presença de infecções auriculares crônicas recidivantes, a presença de
muitos bastonetes ou microrganismos Gram-negativos em esfregaços citológicos e
de uma otite média. Os "swabs" para cultura devem ser feitos a partir do canal
horizontal, que é a região onde se desenvolve a maioria dos processos infecciosos
e um sítio conveniente para coletar exsudatos da orelha média nos casos de ruptura
timpânica.
As culturas fúngicas raramente fornecem mais informações que a citologia.
Mallassezia canis é prontamente identificada ao exame microscópico e o seu
número facilmente determinado; quando fungos ou hifas não identificados são
vistos em número significante na citologia, devem-se identificar as espécies através
da cultura.
Embora as alterações histopatológicas associadas à otite externa crônica
sejam freqüentemente não específicas, a biópsia pode ser indicada para animais
com prurido confinado aos canais auditivos, principalmente quando outros testes
diagnósticos não revelaram a causa. A evidência histopatológica de uma resposta
de hipersensibilidade reforça uma recomendação para o uso de testes alérgicos
intradérmicos ou de uma dieta hipoalergênica. Além disso, biópsias de animais
com otite externa unilateral, obstrutiva e crônica podem revelar se alterações
neoplásicas estão presentes.
A radiografia da bula óssea é indicada quando as presenças de cerume,
exsudato ou tecidos proliferativos impedem a adequada visualização da membrana
timpânica; quando se suspeita de otite média como uma causa da otite bacteriana
externa recidivante; e quando sinais neurológicos acompanham a otite externa. A
presença de fluidos densos e alterações ósseas líticas ou proliferativas fornece
evidências de envolvimento da orelha média.
Tratamento – Os seguintes princípios aplicam-se quando se trata de otite
externa:
1. Identificar e corrigir os fatores primários de base, predisponentes e perpetuantes.
Quando a otite externa é secundária à ventilação e drenagem insuficientes do meato
acústico externo, a área periauricular deve ser presa de forma suspensa e o pêlo das
orelhas aparado. A maceração do canal auditivo deve ser minimizada pelo uso de
adstringentes tópicos em cães que nadam freqüentemente e pela prevenção da
entrada de água nos canais auditivos durante o banho.
Doenças da Orelha Externa 375

2. Lavar e secar as orelhas antes de iniciar-se o tratamento. A terapia tópica é


ineficaz se os exsudatos e o cerume evitarem que os medicamentos atinjam o
epitélio ou os agentes infecciosos, e é menos efetiva se um grande número de
bactérias e fungos permanecer no canal auditivo infectado. Nos animais com otite
externa aguda dolorosa ou crônica, a apropriada limpeza dos canais auditivos
requer anestesia geral. As orelhas podem ser lavadas com uma solução anti-séptica
como clorexidina ou poliidroxidina, ou com uma solução ceruminolítica como o
sulfossuccinato sódico de dioctil (SSD). Se a membrana timpânica estiver rompida,
detergentes e SSD são contra-indicados; anti-sépticos leves (por exemplo, peróxido
de carbamida, uréia, propilenoglicol) devem ser usados para lavar a orelha. Um
enxágüe completo deve sempre ser feito. Após todos os debris terem sido removi-
dos, o canal deve ser lavado com solução salina estéril para prevenir uma irritação
química externa e das orelhas médias, e depois secado.
3. Manter a terapia específica e básica. Fatores que contribuem para a doença
devem ser tratados específica e agressivamente. Em geral, medicações tópicas que
contêm combinações de drogas devem ser usadas para problemas específicos: a)
agentes antibacterianos em combinação com corticosteróides devem ser usados no
tratamento de otite bacteriana aguda externa. Os corticosteróides reduzem a
exsudação, dor, edema e diminuem as secreções glandulares. A resolução pode ser
acelerada se os corticosteróides tópicos forem utilizados durante 4 a 7 dias, a menos
que o animal tenha um distúrbio hipersensível de base; b) superinfecções bacte-
rianas desenvolvem-se em alguns animais tratados com fungicidas, e cresci-
mentos fúngicos desenvolvem-se em alguns animais tratados com agentes
antibacterianos; o tratamento deve ser feito com drogas antibacterianas e
antifúngicas quando estas infecções se desenvolvem; c) animais com otite
bacteriana externa recidivante e com uma história de infecção por Otodectes
cynotis devem ser tratados com um produto tópico que contenha agentes
antiparasitários e antibacterianos para assegurar que infecções parasitárias em
baixo grau sejam eliminadas.
4. Selecionar a terapia tópica baseada no estágio da doença. Adequadamente
aplicada, a medicação ideal cobre o epitélio do canal auditivo externo com um filme
delgado. Soluções ou loções não oclusivas devem ser usadas para otite externa
exsudativa crônica ou aguda. Ungüentos oclusivos que contêm óleo devem ser
usados em lesões secas e escamosas dentro dos canais auditivos. Se houver
alteração na pele dos canais auditivos durante o tratamento, pode ser necessário
o uso de uma base ou veículo medicamentoso diferente.
5. Tratar por um período adequado. A terapia tópica para infecções bacterianas
deve ser administrada por um período ≥ 2 semanas, e para infecções fúngicas ≥ 3
semanas. Animais portadores de infecções por Otodectes cynotis ou Psoroptes
cuniculi devem receber tratamento parasiticida apropriado nas orelhas e em todo
o corpo por ≥ 4 semanas. Infestações por Otobius megnini são melhor tratadas pela
remoção manual dos carrapatos, seguida por uma preparação ótica com um
acaricida/corticosteróide.
6. Adicionar terapia sistêmica quando indicada. Por exemplo, a otite externa
alérgica resolve-se mais rapidamente quando administram-se anti-histamínicos ou
corticosteróides sistêmicos associados aos agentes antibacterianos.
7. Evitar medicações irritantes. Elas causam edema do tecido de revestimento do
canal auditivo e um aumento nas secreções glandulares, o que predispõe a
infecções oportunistas. Pós formam concreções irritantes dentro do canal auditivo.
8. Manter os canais auditivos secos e bem ventilados. A maceração crônica
prejudica a função de barreira da pele, que predispõe a infecções oportunistas. Além
disso, a umidade crônica nos canais auditivos estimula as secreções glandulares.
Adstringentes óticos profiláticos podem diminuir a freqüência de infecções bacteria-
Doenças da Orelha Externa 376

nas e micóticas nos canais auditivos úmidos. Cortar os pêlos do interior da pina e
ao redor do meato auditivo externo e do canal auditivo aumenta a ventilação e
diminui a umidade das orelhas.

TUMORES DO CANAL AUDITIVO


São relativamente raros se comparados aos tumores cutâneos em outros locais
do corpo; eles podem se desenvolver a partir de qualquer estrutura de revestimento
ou de sustentação do canal auditivo, incluindo o epitélio escamoso, as glândulas
sebáceas ou ceruminosas ou os tecidos mesenquimais. Eles se desenvolvem mais
provavelmente no canal auditivo externo e no meato auditivo que nas cavidades
auditivas média e interna.
Os sinais incluem secreções óticas crônicas e odor, edema ou abscessos ao
redor das orelhas, surdez e sinais de envolvimento da orelha média ou interna,
incluindo deambulação lateral, ataxia, nistagmo ou síndrome de Horner. Devido ao
fato de que os sinais associados aos tumores do canal auditivo freqüentemente
mimetizam os observados na otite externa crônica, as lesões podem estar avança-
das no momento em que um diagnóstico definitivo é feito.
Carcinomas de células escamosas são mais freqüentes nas pinas e são os
tumores mais comuns da orelha média e interna. As lesões geralmente são
ulceradas. Quando presentes nas orelhas média e interna de gatos, os sinais
incluem paralisia facial, ataxia, deambulação lateral, nistagmo e síndrome de
Horner. O prognóstico é ruim. A terapia consiste de uma intervenção cirúrgica
combinada com radioterapia para diminuir a progressão da doença local.
Para tumores das glândulas ceruminosas, ver página 1033.

OTITES MÉDIA E INTERNA


São inflamações das estruturas das orelhas média e interna. A otite média ocorre
geralmente devido a uma extensão de uma infecção do canal auditivo externo ou
penetração da membrana timpânica por um corpo estranho. Ocorre em todas as
espécies, mas é mais comum em cães, gatos e coelhos. Extensão de uma infecção
desde a trompa de Eustáquio é vista em cães, gatos e suínos. Uma disseminação
hematógena da infecção para estas áreas é possível, mas ocorre raramente. A otite
média pode levar à otite interna, podendo causar perda do equilíbrio e surdez no lado
afetado.
Sinais clínicos e diagnóstico – Os sinais de otite média e externa são um
tanto semelhantes (ver anteriormente). Meneios de cabeça, esfregação da orelha
afetada no chão, giro da cabeça para o lado afetado, dor na orelha, alterações
inflamatórias e secreção no canal auditivo geralmente estão presentes. Devido
ao fato de o trajeto dos nervos facial e simpático atravessar a orelha média, pode
ocorrer paralisia do nervo facial e/ou síndrome de Horner (miose, ptose, enoftalmia)
no mesmo lado da otite média. Se há otite interna, a rotação da cabeça para o lado
afetado é mais pronunciada. Além disso, o animal anda em círculos, cai para o
lado afetado e apresenta incoordenação generalizada – se a incoordenação for
muito severa, o animal pode ser incapaz de se levantar. O nistagmo também pode
ser observado com a otite interna e, caracteristicamente, é espontâneo, do tipo
horizontal a rotatório, com a fase rápida distante do lado afetado. Raramente, a
infecção ascende dos nervos vestibulococlear e facial para o tronco cerebral,
resultando em meningite, abscesso do tronco cerebral e morte.
Otites Média e Interna 377

Deve-se suspeitar de otite média nos casos de otite externa purulenta severa ou
quando a membrana timpânica tiver sido perfurada por um objeto estranho, ou tiver
sido rompida devido a uma otite externa crônica. O diagnóstico pode ser confirmado
por edema, descoloração ou ruptura da membrana timpânica. Presença de fluido na
cavidade timpânica ou alterações escleróticas da bula timpânica podem ser detec-
tadas radiograficamente. Exame citológico (coloração de Gram e Wright), cultura e
antibiograma do exsudato podem ser benéficos.
Deve-se suspeitar fortemente de otite interna quando os sinais vestibulares
anteriormente mencionados estiverem presentes. O exame otoscópico e as radio-
grafias da bula timpânica podem confirmar uma otite média concomitante.
Tratamento e prognóstico – Devido à possibilidade de diminuição da acuidade
auditiva e lesão do aparato vestibular, deve-se instituir uma terapia antibacteriana
sistêmica de longa duração (3 a 6 semanas), assim que for feito o diagnóstico.
Cloranfenicol, ampicilina, combinações de sulfa-trimetoprim ou tetraciclina devem
ser usados até que se saiba o resultado dos testes de sensibilidade bacteriana. Se
o tímpano está rompido, a cavidade timpânica deve ser cuidadosamente lavada
usando-se um otoscópio, uma pinça longa em forma de jacaré e jatos de solução
salina. Pequenas perfurações da membrana irão cicatrizar. Se houver otite externa
associada, esta deverá ser tratada cuidadosamente. Além disso, doses antiinflama-
tórias de glicocorticóides usados nos primeiros 5 a 7 dias de tratamento poderão
diminuir as alterações inflamatórias nos nervos vestibulococlear, facial ou simpático.
No caso de otite média e interna em que a orelha externa apresenta-se normal
e limpa, mas com uma membrana timpânica edematosa ou descolorida, pode ser
vantajoso realizar-se uma incisão no tímpano para permitir a cultura do fluido, aliviar
a pressão (e portanto a dor) e permitir a remoção do exsudato inflamatório, o qual
pode causar uma deficiência auditiva permanente. A terapia antibiótica sistêmica
baseada no teste de sensibilidade deve ser continuada por 3 a 4 semanas e
possivelmente ≥ 6 semanas na otite interna. No caso de otite média crônica com
alterações radiográficas de osteomielite ou presença de fluido na bula timpânica,
pode ser necessária uma osteotomia.
A otite média com uma membrana timpânica intacta responde bem à terapia
antibiótica sistêmica, mas quando há otite externa crônica e uma membrana
timpânica rompida, as chances de sucesso no tratamento são reduzidas. Quando
houver déficits nos nervos facial e simpático, estes podem persistir mesmo depois
que a infecção tiver sido debelada. A otite interna geralmente responde bem a uma
terapia antibiótica a longo prazo, mas alguns déficits neurológicos (como incoorde-
nação, meneios de cabeça e surdez) podem persistir por toda a vida do animal. Os
animais que se recuperam de uma otite interna devem passar por um tempo de
adaptação a algumas deficiências neurológicas persistentes.
AFECÇÕES GENERALIZADAS
AFECÇÕES GENERALIZADAS DE MAIS DE UMA ESPÉCIE
ACTINOBACILOSE ....................................................................................... 382
ACTINOMICOSE ........................................................................................... 383
Nos Bovinos ............................................................................................. 383
Nas Outras Espécies ............................................................................... 384
AMILOIDOSE ................................................................................................ 385
CARBÚNCULO ............................................................................................. 385
BABESIOSE (ver SLC) .................................................................................. 083
BESNOITIOSE ............................................................................................... 388
CLOSTRIDIOSE ............................................................................................ 389
Hemoglobinúria Bacilar ............................................................................ 389
Cabeça Grande ........................................................................................ 390
Carbúnculo Sintomático ........................................................................... 391
Enterotoxemias ........................................................................................ 392
C. perfringens dos Tipos B e C .......................................................... 392
C. perfringens do Tipo D .................................................................... 393
Hepatite Necrótica Infecciosa .................................................................. 394
Edema Maligno ........................................................................................ 395
Botulismo ................................................................................................. 396
Tétano ...................................................................................................... 398
ANOMALIAS CONGÊNITAS E HEREDITÁRIAS ......................................... 400
Doença de Akabane ................................................................................ 402
Doença da Fronteira ................................................................................ 403
ERISIPELA .................................................................................................... 405
Erisipela Suína ......................................................................................... 405
Poliartrite Não Supurativa nos Cordeiros ................................................. 407
Claudicação Pós-banho de Imersão nos Ovinos ..................................... 408
FEBRE AFTOSA ........................................................................................... 408
INFECÇÕES FÚNGICAS (SISTÊMICAS) ..................................................... 411
Aspergilose .............................................................................................. 412
Candidíase ............................................................................................... 413
Cromomicose ........................................................................................... 414
Coccidioidomicose ................................................................................... 415
Criptococose ............................................................................................ 416
Entomoftoromicose .................................................................................. 417
Linfangite Epizoótica ................................................................................ 418
Geotricose ................................................................................................ 418
Histoplasmose .......................................................................................... 419
Mucormicose ............................................................................................ 420
Micetomas ................................................................................................ 421
Blastomicose Norte-americana ................................................................ 421
Oomicose ................................................................................................. 422
Afecções Generalizadas 380

Pecilomicose ............................................................................................ 423


Peniciliose ................................................................................................ 423
Rinosporidiose ......................................................................................... 424
Esporotricose ........................................................................................... 424
LEPTOSPIROSE ........................................................................................... 425
Nos Bovinos ............................................................................................. 426
Nos Cães ................................................................................................. 428
Nos Eqüinos ............................................................................................. 429
Nos Suínos ............................................................................................... 430
Nos Ovinos ............................................................................................... 430
LISTERIOSE .................................................................................................. 430
DOENÇA DE LYME ....................................................................................... 434
MELIOIDOSE ................................................................................................. 435
NEOSPOROSE .............................................................................................. 436
NOCARDIOSE ............................................................................................... 437
PESTE BUBÔNICA ....................................................................................... 438
FEBRE Q ....................................................................................................... 439
ENFERMIDADE DA TRANSPIRAÇÃO ......................................................... 440
TOXOPLASMOSE ......................................................................................... 441
TUBERCULOSE ............................................................................................ 443
Nos Animais Ungulados, Exóticos e Cativos ........................................... 445
Nos Gatos ................................................................................................ 446
Nos Bovinos ............................................................................................. 446
Nos Cães ................................................................................................. 446
Em Primatas Não-humanos ..................................................................... 447
Nos Suínos ............................................................................................... 447
Nos Ovinos e Caprinos ............................................................................ 447
Outras Infecções Micobacterianas além da Tuberculose ........................ 448
TULAREMIA .................................................................................................. 448
ESTOMATITE VESICULAR .......................................................................... 450

INFECÇÕES GENERALIZADAS NOS EQÜINOS

ENFERMIDADE EQÜINA AFRICANA .......................................................... 451


EHRLICHIOSE EQÜINA ................................................................................ 453
ANEMIA INFECCIOSA EQÜINA (ver SLC) .................................................. 32
ARTERITE VIRAL EQÜINA .......................................................................... 454
MORMO ......................................................................................................... 456
SEPTICEMIA NOS POTROS ........................................................................ 457
GARROTILHO (ver RES) .............................................................................. 901
Afecções Generalizadas 381

AFECÇÕES GENERALIZADAS DE SUÍNOS


FEBRE SUÍNA AFRICANA ........................................................................... 458
ENCEFALOMIOCARDITE VIRAL ................................................................. 459
DOENÇA DE GLÄSSER ............................................................................... 460
CÓLERA SUÍNA (Febre Suína) .................................................................... 461
INFECÇÕES ESTREPTOCÓCICAS ............................................................. 463
Infecções por Streptococcus suis ............................................................ 463
Infecções Estreptocócicas e Outras dos Grupos C e L ........................... 465
Infecções Estreptocócicas do Grupo E .................................................... 466
DOENÇA VESICULAR SUÍNA ...................................................................... 466
TRIQUINELOSE ............................................................................................ 467
EXANTEMA VESICULAR DOS SUÍNOS ...................................................... 469
DOENÇA DO VÔMITO E DA EMACIAÇÃO ................................................. 469

INFECÇÕES GENERALIZADAS DOS RUMINANTES


ANAPLASMOSE (ver SLC) ........................................................................... 081
LÍNGUA AZUL ............................................................................................... 471
LEUCOSE BOVINA ....................................................................................... 472
FEBRE PETEQUIAL BOVINA ...................................................................... 474
FEBRE BOVINA (ver RES) ........................................................................... 876
ARTRITE E ENCEFALITE CAPRINAS ......................................................... 475
FEBRE HEMORRÁGICA DA CRIMÉIA-CONGO ......................................... 477
FEBRE EFÊMERA ........................................................................................ 477
ÁGUA NO CORAÇÃO ................................................................................... 478
FEBRE CATARRAL MALIGNA .................................................................... 480
DOENÇA OVINA DE NAIRÓBI ..................................................................... 482
PARATUBERCULOSE (Doença de Johne) .................................................. 483
PASTEURELOSE DE OVINOS ..................................................................... 485
Pasteurelose Pneumônica (Pneumonia Enzoótica) ................................. 485
Pasteurelose Sistêmica ........................................................................... 485
PESTE DOS PEQUENOS RUMINANTES .................................................... 486
FEBRE DO VALE DO RIFT ........................................................................... 488
PESTE BOVINA ............................................................................................ 489
FEBRE ORIUNDA DOS CARRAPATOS ...................................................... 490
PIEMIA POR CARRAPATOS ........................................................................ 492
DOENÇA DE WESSELSBRON .................................................................... 494
Afecções Generalizadas 382

INFECÇÕES GENERALIZADAS DE PEQUENOS ANIMAIS


CINOMOSE CANINA ..................................................................................... 494
HERPESVIROSE CANINA ............................................................................ 496
LINFOMA MALIGNO CANINO (ver SLC) ..................................................... 038
DOENÇAS RICKETTSIAIS CANINAS .......................................................... 497
Ehrlichiose Canina ................................................................................... 497
Trombocitopenia Infecciosa Cíclica Canina ............................................. 499
Febre da Fascíola de Elokomin ............................................................... 499
Febre Maculosa das Montanhas Rochosas ............................................. 500
Doença do Envenenamento por Salmão ................................................. 501
ANEMIA INFECCIOSA FELINA (ver SLC) ................................................... 033
PLEURITE E PERITONITE INFECCIOSA FELINA ...................................... 502
LINFOSSARCOMA E LEUCEMIA FELINOS (ver SLC) ............................... 046
PANLEUCOPENIA FELINA .......................................................................... 504
HEPATITE INFECCIOSA CANINA ............................................................... 505
LEISHMANIOSE VISCERAL ......................................................................... 507

ACTINOBACILOSE
É uma doença que afeta mais freqüentemente os tecidos moles e os linfonodos,
embora também possa envolver as estruturas ósseas por extensão direta; é
semelhante à actinomicose (ver adiante). As várias espécies de agentes causado-
res estão relacionadas com as várias espécies hospedeiras e com as suas
características bioquímicas. Actinobacillus lignieresii (bovinos e ovinos), A. equuli e
A. suis (eqüinos e suínos, especialmente os animais jovens), A. capsulatus (coelhos
– artrite) e A. (Haemophilus) pleuropneumoniae (suínos – pleuropneumonia). A
Actinobacillus seminis (carneiros – epididimite) pode não se constituir em um
membro válido do gênero.
Nos bovinos, a actinobacilose clássica afeta geralmente a língua (“língua-de-
pau”), o rúmen e o retículo e, menos freqüentemente, outros tecidos, tais como os
músculos esqueléticos e o fígado. Os pequenos abscessos com uma proliferação
difusa e extensa do tecido conjuntivo constituem uma característica de destaque. O
alastramento por meio do sistema linfático e a invasão dos linfonodos locais ajudam
a distinguir a infecção por A. lignieresii de uma actinomicose. Nos ovinos, a
actinobacilose é uma doença purulenta da pele, dos linfonodos, dos pulmões e dos
tecidos moles da cabeça e do pescoço. A epididimite é comum nos carneiros. Nos
suínos, têm-se descrito septicemia, lesões articulares supurativas, endocardite,
osteomielite, pneumonia e infecções das glândulas mamárias e dos tecidos moles
da cabeça. Nos potros, ocorrem septicemia e infecções incapacitantes, especial-
mente nas articulações.
O pus proveniente das lesões pode conter grânulos branco-acinzentados ou
“rosetas” < 1mm de diâmetro, que são menores que os “grânulos sulfurosos” da
actinomicose. Tais grânulos, que são encontrados apenas nas lesões dos bovinos
Actinomicose 383

e ovinos, contêm corpúsculos semelhantes a bastões que se originam radialmente


a partir do centro, e que são compostos de bacilos Gram-negativos e depósitos
celulares. Esses bastões podem ser fracamente ácido-resistentes. A ausência de
filamentos Gram-positivos distingue essa doença da actinomicose.
Podem-se tratar as lesões circunscritas por meio de uma excisão completa. A
resposta aos iodetos geralmente é drástica. As sulfonamidas e vários antibióticos de
largo espectro também são efetivos. A estreptomicina ou a gentamicina tornam-se
possivelmente as drogas de escolha. As lesões crônicas podem ser polimicrobianas
e conter outras bactérias, por exemplo, a Actinomyces bovis.

ACTINOMICOSE
É uma doença granulomatosa, supurativa, crônica e local ou sistêmica que
afeta uma larga variedade de animais domésticos e, raramente, animais silves-
tres. Os agentes causadores incluem a Actinomyces bovis, a A. viscosus (isolada
primeiramente a partir de placas gengivais de hamsters com periodontopatias,
mas hoje conhecida como um patógeno importante de cães, e em menor grau, de
suínos e caprinos), a A. hordeovulneris e a A. suis . Ainda não se decidiu a
classificação taxonômica exata dessa última espécie. Isolou-se a Actinomyces
bovis apenas a partir de infecções bovinas. Ocasionalmente, podem-se isolar
tipos predominantemente humanos, tais como a A. israelii, a partir de lesões em
outros animais. Têm-se isolado várias espécies ( A. denticolens, A. howellii e A.
slackii) a partir da placa dentária bovina, mas não se determinou o seu potencial
patogênico.

ACTINOMICOSE NOS BOVINOS


(Mandíbula encaroçada)
É uma doença crônica da mandíbula, do maxilar e de outros tecidos ósseos da
cabeça; raramente envolve tecidos moles. A actinomicose da mandíbula e do
maxilar se caracteriza por inchaço, abscessos, tratos fistulosos, fibrose extensa,
osteíte e granulomas. Torna-se característica a deformação do osso afetado devido
à deposição do novo osso. Os dentes caem e a mastigação fica difícil. O inchaço da
cavidade nasal pode causar dispnéia. Ocorre uma emaciação gradual. A incisão da
lesão revela uma coalescência de abscessos que contêm pus amarelado, viscoso
e mucóide e “grânulos sulfurosos”, de 2 a 5mm de diâmetro. Os tratos fistulosos se
estendem através da pele, drenam pus por um período, e depois se obstruem,
deixando cicatrizes fibróticas profundas.
Diagnóstico – Uma história de inchaço de desenvolvimento lento no maxilar ou
na mandíbula, com abscessos flutuantes ou tratos fistulosos, sugere uma
actinomicose. Para a confirmação do diagnóstico, deve-se coletar o pus em um tubo
e agitá-lo com uma solução salina para dissolver o muco. Derrama-se então o
conteúdo em uma placa de Petri, reconhecem-se os “grânulos sulfurosos”, esma-
gam-se esses grânulos em uma lâmina de vidro e cora-se pelo método de Gram. O
“grânulo sulfuroso” se apresenta como uma massa central de bactérias Gram-
positivas, circundada por uma roseta periférica de “bastões”, que se coram como
Gram-negativos. Sob uma objetiva de imersão em óleo, a A. bovis aparece como
longos filamentos Gram-positivos (algumas células mais velhas podem ser Gram-
negativas), bastonetes e cocos. No meio líquido, predominam pequenos bastonetes
ramificados (morfologia do tipo difteróide). A presença dessas estruturas confirma
Actinomicose 384

a A. bovis e a diferencia dos microrganismos causadores da actinobacilose (ver


anteriormente) e da estafilococose, que também produzem pus que contém grânu-
los amarelados. Pode-se obter uma confirmação adicional do diagnóstico por meio
de técnicas laboratoriais bacteriológicas e histológicas.
Tratamento – As lesões actinomicóticas são sempre crônicas por um curso de
muitos meses. Raramente se pode impedir a infecção da mandíbula ou do maxilar,
exceto quando se diagnosticar e se tratar vigorosamente em seu início. Quando as
lesões forem pequenas e circunscritas, a cirurgia será o tratamento de escolha; se
as lesões não forem circunscritas ou se os abscessos se encontrarem adiantados,
devem-se curetar as fístulas e os abscessos. Em qualquer caso, deve-se cobrir o
ferimento com gazes embebidas em tintura de iodo.
A Actinomyces bovis é sensível à penicilina. No entanto, como se encontra
freqüentemente protegida por sua localização profunda nos tratos sinusais e nos
ossos, ou circundada por exsudatos ou tecido de granulação, indica-se uma terapia
prolongada. Não se recomendam mais os iodetos. Desconhece-se o valor dos
antibióticos ativos contra anaeróbios, por exemplo, a clindamicina e o imipenem, no
tratamento da actinomicose nos animais inferiores. Ao contrário da actinobacilose
(com a qual se tem confundido a infecção pela A. bovis ), não se recomendam os
aminoglicosídios. Porém, não se pode ignorar a possibilidade de infecções intercor-
rentes por A. bovis e Actinobacillus lignieresii nas lesões orais crônicas.
Uma vez que a osteíte rarefaciente se torna extensa, o tratamento prolonga a vida
do animal, mas não se deve esperar uma recuperação completa. A radioterapia
reduzirá temporariamente o tamanho das lesões, mas ela não destrói a infecção e
deve ser repetida.

ACTINOMICOSE NAS O UTRAS ESPÉCIES


Suínos – A Actinomyces suis (e a A. bovis?) causa uma mastite supurativa e
granulomatosa crônica primária. Os pequenos abscessos no úbere contêm um pus
amarelado, viscoso e coesivo circundado por uma larga zona de tecido conjuntivo
denso. Como nos bovinos, os grânulos mineralizados amarelados se disseminam
por todo o pus. Alguns dos abscessos mais profundamente localizados se rompem
e drenam exsudato através de fístulas. Podem-se observar grandes ulcerações
cutâneas granulomatosas e irregulares na abertura das fístulas. Observam-se
nódulos ou abscessos granulomatosos por baixo da pele do abdome. Ocasional-
mente, a A. suis causa uma infecção generalizada com nódulos piogranulomatosos
por todo o pulmão, baço, rins e outras vísceras.
O prognóstico é ruim, já que uma ou mais mamas se encontram destruídas e a
infecção não responde favoravelmente à quimioterapia. Freqüentemente, deve-se
excisar a glândula mamária infectada para se salvar a vida da porca e torná-la
aceitável para o abate.
Eqüinos – Um micróbio anaeróbio semelhante à A. bovis, e sinergístico com a
Brucella abortus ou a B. suis, é uma causa aparente da cernelha fistulosa ou do mal
da nuca (ver pág. 565). O anaeróbio sozinho causa abscessos com tratos fistulosos
na região submaxilar, faringe e região cervical. Os linfonodos da região contêm
nódulos, abscessos e fístulas drenantes.
Cães – A Actinomyces viscosus causa uma pleurite granulomatosa crônica.
Freqüentemente, também se encontram presentes lesões subcutâneas (abscessos
e tratos fistulosos), que podem se seguir a mordeduras. O prognóstico é ruim, já que
a infecção geralmente é notada muito tarde. Ocorrem grânulos com bactérias
filamentosas ou cócicas, mas sem os bastões circundantes.
Tem-se isolado a Actinomyces hordeovulneris , uma espécie recentemente
descrita e claramente distinta, a partir de infecções caninas torácicas, abdominais
Carbúnculo 385

e localizadas recidivantes que se encontram algumas vezes associadas com a


barba do capim-rabo-de-raposa (Hordeum sp).

AMILOIDOSE
Amilóide é o nome dado a determinadas proteínas depositadas nos tecidos como
resultado de uma inflamação crônica ou de um tumor em uma célula plasmática
(mieloma) (ver também pág. 1066). Todas as proteínas amilóides consistem de
lâminas β-pregueadas de aminoácidos, uma estrutura que os torna quase totalmen-
te refratários à decomposição enzimática; conseqüentemente, ao se depositarem
nos tecidos, não são removidos. Existem 2 proteínas amilóides principais. Uma,
chamada AA, é liberada a partir dos hepatócitos sob a influência da interleucina-1.
Como a interleucina-1 liberada por macrófagos estimulados, as infecções crônicas
levam a um prolongamento da produção de interleucina-1 e a uma liberação do
excesso de AA dos hepatócitos. A segunda, a AL, é composta de cadeias leves de
imunoglobulinas parcialmente degradadas produzidas pelas células plasmáticas
malignas. Ocorrem vários outros tipos menores nos animais idosos e em determi-
nadas doenças metabólicas. Por isso, o amilóide se deposita nos tecidos nos
animais que tenham infecções crônicas, tais como artrite, reticulite traumática ou
osteomielite, e nos animais com mielomas ou outras gamopatias monoclonais.
A doença é causada pela substituição das células normais por depósitos de
amilóide, principalmente no fígado, baço, cérebro e rins. Devido a essa deposição
difusa e ao seu início insidioso, a amiloidose torna-se difícil de se diagnosticar
clinicamente, embora ela seja freqüentemente observada na necropsia. Se, no
entanto, ela danificar os glomérulos e os túbulos renais, podem se tornar aparentes
sinais clínicos de insuficiência renal. Deve-se suspeitar de amiloidose se ocorrer uma
insuficiência renal em animais com infecções ou inflamações crônicas. A amiloidose
do fígado leva a sinais de insuficiência hepática. Não há tratamento efetivo.

CARBÚNCULO
(Febre esplênica, Carbúnculo, Pústula maligna)

É uma doença febril e aguda de virtualmente todos os animais de sangue quente,


incluindo o homem, causada pela Bacillus anthracis . É mais comumente uma
septicemia caracterizada principalmente pelo curso rapidamente fatal. Ocorre
mundialmente, e se encontra irregularmente distribuído nos distritos onde ocorrem
surtos repetidos. Nos EUA, existem áreas reconhecidas de infecção na Dakota do
Sul, no Nebraska, no Arkansas, no Mississipi, na Louisiana, no Texas e na Califórnia;
existem pequenas áreas em vários outros estados.
Etiologia e epidemiologia – A Bacillus anthracis é uma bactéria formadora de
esporos, imóvel e Gram-positiva (4 a 8 × 1 a 1,5µm). Após a drenagem a partir de
um animal infectado ou quando se expõem os bacilos de uma carcaça aberta ao
oxigênio livre, eles formam esporos que são resistentes aos extremos de tempera-
tura, aos desinfetantes químicos e à dissecação. Por essa razão, não se deve
necropsiar a carcaça de um animal morto por carbúnculo.
Os surtos de carbúnculo se encontram associados comumente com solos
calcários alcalinos ou neutros, que servem como “áreas incubadoras” para os
Carbúnculo 386

microrganismos. Nessas áreas, os esporos revertem aparentemente para a


forma vegetativa e se multiplicam em níveis infecciosos quando ocorrerem
condições ambientais ideais de solo, umidade, temperatura e nutrição. Bovinos,
eqüinos, asininos, ovinos e caprinos podem se infectar facilmente ao pastarem
em tais áreas. Os surtos provenientes de uma infecção originária do solo ocorrem
primariamente em estações em que a temperatura diária mínima seja > 16°C. A
epidemia tende a ocorrer em associação com uma alteração climática ou
ecológica acentuada, como chuvas pesadas, inundações ou secas. Mesmo nas
áreas endêmicas, o carbúnculo ocorre irregularmente, freqüentemente com
muitos anos passados entre as ocorrências. Durante uma epidemia, as moscas
e os outros insetos mordedores podem transmitir mecanicamente a doença de
um animal para outro, mas esse modo de transmissão tem pouca importância. A
infecção também pode ser causada por meio de ingredientes alimentares artifi-
ciais ou naturais contaminados, tais como a torta ou os resíduos de matadouro.
Colheitas tais como as de feno cultivado em solo contaminado causam ocasional-
mente pequenos surtos. Suínos, cães, gatos, visons e animais silvestres em
cativeiro adquirem a doença a partir do consumo de carne contaminada.
O homem pode desenvolver lesões cutâneas localizadas (carbúnculo maligno)
a partir do contato de uma solução de continuidade cutânea com tecidos ou sangue
infectados, pode adquirir uma mediastinite hemorrágica altamente fatal (doença do
classificador de lã) a partir da inalação de esporos ao manipular lã ou pêlos
contaminados, ou um carbúnculo intestinal a partir do consumo de carne não cozida.
Achados clínicos – Tipicamente, o período de incubação é de 3 a 7 dias (varia
de 1 a ≥ 14 dias). O curso clínico varia de superagudo a crônico. A forma superaguda
se caracteriza por um início súbito e por um curso rapidamente fatal. Podem ocorrer
cambaleios, dispnéia, tremores, colapso, alguns movimentos convulsivos e morte
nos bovinos, ovinos ou caprinos sem qualquer evidência anterior de enfermidade.
No carbúnculo agudo dos bovinos e ovinos, ocorre uma elevação abrupta na
temperatura corporal e um período de excitação seguido por depressão, letargia,
comprometimento cardíaco ou respiratório, cambaleios, convulsão e morte. A
temperatura corporal pode atingir 41,5°C, cessa-se a ruminação, reduz-se conside-
ravelmente a produção de leite e os animais prenhes podem abortar. Podem ocorrer
descargas sanguinolentas a partir dos orifícios corporais naturais.
As infecções crônicas se caracterizam por um inchaço edematoso, subcutâneo
e localizado, que pode ser muito extenso. As áreas mais freqüentemente envolvidas
são a face ventral do pescoço, o tórax e os ombros.
A doença é aguda nos eqüinos. Eles podem apresentar febre, calafrios, cólica
severa, anorexia, depressão, fraqueza, diarréia sanguinolenta e protuberâncias na
região do pescoço, esterno, baixo abdome e genitália externa. A morte geralmente
ocorre dentro de 2 a 3 dias após o início.
Alguns suínos de um grupo podem morrer de carbúnculo agudo sem terem
apresentado nenhum sinal anterior. Outros podem exibir um inchaço rapidamente
progressivo ao redor da garganta, o que pode causar morte por sufocamento. Muitos
suínos do grupo podem desenvolver a doença em uma forma crônica suave e se
recuperar gradualmente. No entanto, alguns deles, quando abatidos como animais
normais, podem apresentar evidências de infecção por carbúnculo nos linfonodos
cervicais e nas amígdalas.
Lesões – O rigor mortis está freqüentemente ausente ou incompleto. Pode-se
verter sangue escuro a partir da boca, das narinas e do ânus com um timpanismo
acentuado e uma rápida decomposição do corpo. Caso se abra inadvertidamente a
carcaça, observam-se lesões septicêmicas. O sangue fica escuro e espesso, e falha
em se coagular facilmente. São comuns hemorragias de volumes variáveis nas
superfícies das serosas do abdome e do tórax, assim como do epicárdio e do
Carbúnculo 387

endocárdio. Encontram-se presentes comumente efusões edematosas e tingidas de


vermelho por baixo da serosa de vários órgãos, entre os grupos dos músculos
esqueléticos e na subcútis. Ocorrem hemorragias freqüentemente ao longo da
mucosa do trato gastrointestinal, e úlceras podem se fazer presentes, particularmen-
te sobre as placas de Peyer. Torna-se comum um baço aumentado, vermelho-escuro
ou negro, amolecido e semifluido. Fígado, rins e linfonodos ficam geralmente
congestos e aumentados.
Nos suínos com carbúnculo crônico, as lesões ficam geralmente restritas às
amígdalas, aos linfonodos cervicais e aos tecidos circundantes. Os tecidos linfáticos
da área ficam aumentados e ficam mosqueados de salmão a uma cor de vermelho-
tijolo na superfície de corte. Podem estar presentes úlceras ou membranas diftéricas
sobre a superfície das amígdalas. A área ao redor dos tecidos linfáticos envolvidos
fica geralmente gelatinosa e edematosa.
Diagnóstico – Um diagnóstico baseado nos sinais clínicos pode ficar difícil,
especialmente quando a doença ocorrer em uma nova área. Portanto, deve-se
realizar um exame laboratorial confirmatório. A amostra preferida consiste em uma
pequena quantidade de sangue coletado assepticamente a partir de um vaso
superficial, tal como a veia jugular. Como os suínos com doença localizada são
raramente bacterêmicos, deve-se enviar um pequeno pedaço do tecido linfático
afetado que tiver sido coletado assepticamente. Antes do envio, deve-se contatar o
laboratório para se determinar os procedimentos de expedição apropriados.
Deve-se diferenciar o carbúnculo das outras afecções que causam morte súbita.
Nos bovinos e nos ovinos, podem-se confundir o carbúnculo com as infecções
clostridianas, o timpanismo e a apoplexia por raios. Nos bovinos, também se devem
considerar a leptospirose aguda, a hemoglobinúria bacilar, a anaplasmose e os
envenenamentos agudos por samambaia, trevo doce e chumbo. Nos eqüinos, a
anemia infecciosa aguda, a púrpura, as cólicas variadas, o envenenamento por
chumbo, a apoplexia por raio e a insolação podem lembrar o carbúnculo. Nos suínos,
a cólera suína aguda, a febre suína africana e o edema maligno faríngeo constituem-
se em considerações diagnósticas. Nos cães, devem-se considerar as infecções
sistêmicas agudas e os inchaços faríngeos devidos a outras causas.
Tratamento e controle – Como o carbúnculo freqüentemente é fatal, tornam-se
essenciais um tratamento inicial e uma implementação vigorosa de um programa
preventivo. Ao ocorrer um surto originário do solo, é melhor utilizar antibióticos para
os animais doentes e imunizar todos os animais aparentemente bem no rebanho e
nas propriedades circundantes. Se o surto estiver associado a uma fonte discreta,
tal como a farinha de osso contaminada, o tratamento antibiótico dos animais
expostos e a remoção da fonte podem ser mais efetivos que a vacinação na redução
das perdas. Os animais domésticos respondem bem à penicilina se forem tratados
nos estágios iniciais da doença. A oxitetraciclina administrada diariamente em
doses divididas também é efetiva. Também se podem utilizar outros antibacteria-
nos, por exemplo, a eritromicina ou as sulfonamidas, mas ainda não se avaliou em
situações de campo a sua efetividade em comparação com a da penicilina e das
tetraciclinas.
Pode-se controlar de modo amplo o carbúnculo dos animais domésticos por meio
da vacinação anual de todos os animais pastejadores na área endêmica e por meio
da implementação de medidas de controle durante os surtos. Utiliza-se a vacina da
cepa de Sterne não encapsulada quase que universalmente para a imunização dos
animais domésticos. Deve-se realizar a vacinação 2 a 4 semanas antes da estação
em que se pode esperar os surtos. Não se devem vacinar os animais dentro de 2
meses antes do abate. Por ser uma vacina viva, não se devem administrar antibió-
ticos dentro de 1 semana após a vacinação. Devem-se determinar os procedimentos
exigidos pelas leis locais antes da vacinação do gado leiteiro durante um surto.
Carbúnculo 388

Os procedimentos de controle específicos, além da terapia e da imunização, são


necessários para conter a doença e impedir o seu alastramento. Esses procedimen-
tos incluem: 1. notificação dos oficiais reguladores apropriados; 2. cumprimento
rígido de uma quarentena; 3. eliminação imediata dos animais mortos, do estrume,
da cama ou de outros materiais contaminados por meio de cremação ou de
enterramento profundo; 4. isolamento de animais doentes e a remoção dos animais
saudáveis das áreas contaminadas; 5. desinfecção dos estábulos, cercados, salas
de ordenha e equipamentos utilizados nos animais domésticos; 6. uso de repelentes
de insetos; 7. controle de animais necrófagos que se alimentam dos animais mortos
pela doença; e 8. observação dos procedimentos sanitários gerais por parte do
pessoal que estiver em contato com os animais doentes, para a sua própria
segurança e para impedir o alastramento da doença.

BESNOITIOSE
É uma doença por protozoários da pele, do tecido subcutâneo, dos vasos
sangüíneos, das membranas mucosas e de outros tecidos.
Etiologia e transmissão – O agente causador da dermatopatia nos bovinos é
a Besnoitia besnoiti, e o causador nos eqüinos e nos asininos a B. bennetti. Tem-
se descrito a Besnoitia jellisoni e a B. wallacei nos roedores; a B. tarandi nas renas;
a B. darlingi nos lagartos, nos gambás e nas cobras; e a B. sauriana nos lagartos.
Têm-se isolado cepas viscerotrópicas da B. besnoiti nos antílopes africanos; e
encontrou-se uma Besnoitia sp não identificada nos caprinos. Tem-se descrito a
Besnoitia besnoiti no sul da Europa, África, Ásia e América do Sul, mas não se tem
descrito nos bovinos da América do Norte. Esses microrganismos semelhantes ao
Toxoplasma se multiplicam nas células endoteliais, nas células histiocíticas e em
outras células, e produzem grandes cistos característicos de parede espessa,
repletos de bradizoítas.
No caso de B. besnoiti, B. wallacei e B. darlingi, descreveu-se a transmissão
cíclica experimental dos estágios sexuais intestinais, em um hospedeiro definitivo,
o gato. Em estudos subseqüentes, não se confirmou a transmissão da B. besnoiti
dos bovinos para os gatos. As moscas mordedoras ou os carrapatos podem
transmitir a B. besnoiti mecanicamente a partir de bovinos cronicamente infectados;
pode-se transmitir algumas Besnoitia spp artificialmente a hospedeiros adequados
por meio da inoculação com agulha em tecidos que contenham cistos.
Achados clínicos – Os bovinos infectados freqüentemente não apresentam
nenhum sinal clínico além dos poucos cistos na conjuntiva escleral. A enfermidade
começa com uma febre seguida de anasarca. Também se observam inapetência,
fotofobia, rinite, inchaço das glândulas linfáticas e orquite. A anasarca dá lugar a uma
esclerodermatite. A pele se torna dura, espessa e enrugada, e desenvolve racha-
duras que permitem que se desenvolvam uma infecção bacteriana secundária e
uma miíase; a movimentação torna-se dolorosa. Ocorre perda de pêlos e de
epiderme. Os animais severamente afetados ficam emaciados. Aparecem cistos na
conjuntiva escleral e na mucosa nasal. Embora a mortalidade seja baixa, a
convalescença é lenta nos casos severos. Os touros severamente afetados podem
se tornar permanentemente estéreis. Os animais afetados permanecem como
carreadores por toda a vida.
Os sinais em equinos são similares aos dos bovinos.
Profilaxia e tratamento – Em alguns países, imunizam-se os bovinos com uma
vacina viva adaptada de cultura de tecidos. Devem-se isolar os animais afetados e
Clostridiose 389

tratá-los sintomaticamente. Em estudos limitados sobre a B. besnoiti nos coelhos,


tanto os complexos antimoniais como os sulfanilamídicos impediram o desenvolvi-
mento de cistos.

CLOSTRIDIOSE
Os membros do gênero Clostridium são microrganismos em forma de basto-
nete, formadores de esporos, anaeróbios e relativamente grandes. Os esporos
são ovais, algumas vezes esféricos, e são centrais, subterminais ou terminais
quanto à sua posição. As formas vegetativas dos clostrídios nos fluidos teciduais
dos animais infectados ocorrem solitariamente, em pares ou raramente em
cadeias. A diferenciação das várias espécies patogênicas e relacionadas se
baseia nas características de cultura, na forma e na posição do esporo e na
especificidade sorológica da toxina ou dos antígenos somáticos. Os hábitats
naturais dos microrganismos são o solo e o trato intestinal dos animais, inclusive
do homem. Os animais suscetíveis podem adquirir cepas patogênicas tanto por
meio da contaminação de ferimentos como por meio da ingestão. As doenças
assim produzidas constituem uma constante ameaça à criação bem-sucedida de
animais domésticos em muitas partes do mundo.
Podem-se dividir as clostridioses em 2 categorias: 1. aquelas nas quais os
microrganismos invadem ativamente e se reproduzem nos tecidos do hospedei-
ro, com a produção de toxinas que potencializam o alastramento da infecção e
são responsáveis pela morte, e que são algumas vezes referidas como grupo
da gangrena gasosa; e 2. clostridioses caracterizadas pela toxemia resultante
da absorção das toxinas produzidas pelos organismos dentro do sistema
digestivo (as enterotoxemias), no tecido desvitalizado (tétano) ou no alimento
ou na carniça, externamente ao corpo (botulismo). Caso se tente o tratamento
do primeiro grupo, indicam-se grandes doses de antibióticos para o estabeleci-
mento de níveis efetivos no centro do tecido necrótico onde se encontram os
clostrídios.

HEMOGLOBINÚRIA BACILAR
(Doença da Água Vermelha)
É uma doença toxêmica, aguda, infecciosa, primariamente dos bovinos e
causada pela Clostridium haemolyticum (C. novyi do Tipo D). Tem sido encontrada
nos ovinos e raramente nos cães. Ela ocorre na parte ocidental dos EUA, ao longo
do Golfo do México, na Venezuela, no Chile, na Grã-Bretanha, na Turquia e
provavelmente em outras partes do mundo.
Etiologia – A espécie Clostridium haemolyticum é um microrganismo originá-
rio do solo que pode ser encontrado naturalmente no trato alimentar dos bovinos.
Pode sobreviver por longos períodos no solo contaminado ou nos ossos de
carcaças de animais que tenham sido infectados. Após a ingestão, os esporos
latentes se alojam finalmente no fígado. O período de incubação é extremamente
variável, e o início depende da ocorrência de um local de anaerobiose no fígado.
Tal foco de germinação é mais freqüentemente causado por uma infecção por
fascíolas, e muito menos freqüentemente por um alto teor de nitratos na dieta, por
uma perfuração acidental do fígado, por uma biópsia do fígado ou por qualquer
outra causa de necrose localizada. Ao ocorrerem condições favoráveis de
anaerobiose, os esporos germinam e as células vegetativas resultantes se
Clostridiose 390

multiplicam e produzem toxina β (fosfolipase C), que causa uma anemia hemo-
lítica aguda.
Achados clínicos – Podem-se encontrar bovinos mortos sem sinais premonitórios.
Geralmente, ocorre um início súbito de depressão severa, febre, dor abdominal,
dispnéia, disenteria e hemoglobinúria. Encontram-se presentes graus variáveis de
anemia e de icterícia. Pode ocorrer edema na carne do peito. Os níveis de
hemoglobina e hemácias são muito baixos. A duração dos sinais clínicos varia de
, 12h nas vacas prenhes a , 3 a 4 dias nos outros bovinos. A mortalidade nos
animais não tratados é de , 95%. Alguns bovinos sofrem ataques subclínicos da
doença e subseqüentemente agem como portadores imunes.
Lesões – Após a morte, estabelece-se o rigor mortis mais rapidamente que o
comum. Encontram-se presentes desidratação, anemia e, algumas vezes, edema
subcutâneo. Surge um fluido sanguinolento nas cavidades abdominal e torácica.
Não se afetam macroscopicamente os pulmões, e a traquéia contém uma espuma
sanguinolenta com hemorragias na mucosa. O intestino delgado, e ocasionalmente
o grosso, tornam-se hemorrágicos e o seu conteúdo se constitui freqüentemente de
sangue livre ou coagulado. Um infarto anêmico no fígado torna-se virtualmente
patognomônico; esse infarto fica ligeiramente elevado, mais claro na coloração que
o tecido circundante e delimitado por uma zona de congestão vermelho-azulada . Os
rins ficam escuros, friáveis e geralmente salpicados com petéquias. A bexiga
contém urina vermelho-arroxeada.
Diagnóstico – O quadro clínico geral geralmente permite um diagnóstico. O sinal
mais notável consiste em uma urina típica com coloração de vinho do Porto, e que
forma espuma livremente quando evacuada ou quando agitada. A presença do
infarto hepático típico é suficiente para um diagnóstico presuntivo. O tamanho e a
consistência normais do baço servem para excluir o carbúnculo e a anaplasmose.
Devem-se também considerar o envenenamento por samambaia e a leptospirose.
Pode-se confirmar bacteriologicamente o diagnóstico por meio do isolamento da
C. haemolyticum a partir do infarto hepático, mas a cultura do microrganismo é
difícil. Pode-se obter um diagnóstico rápido e acurado através da demonstração do
microrganismo no tecido hepático por meio de um teste de imunofluorescência, ou
da demonstração da toxina no fluido na cavidade peritoneal ou em um extrato salino
do infarto.
Controle – Torna-se essencial o tratamento inicial com penicilina ou com
antibióticos de largo espectro. O hemograma completo e a fluidoterapia também
são úteis.
A bacterina de Clostridium haemolyticum preparada a partir de culturas comple-
tas confere uma imunidade por , 6 meses. Nas áreas onde a doença é sazonal, uma
dose pré-sazonal se torna geralmente adequada; onde a doença ocorre por todo o
ano, torna-se necessária uma imunização semi-anual. Devem-se imunizar os
bovinos que estiverem em contato com animais de áreas onde essa doença for
endêmica, já que estes podem ser portadores.

CABEÇA G RANDE
É uma doença infecciosa, aguda, causada pela Clostridium novyi, pela C. sordellii
ou raramente pela C. chauvoei, e caracterizada por um inchaço edematoso, não
hemorrágico e não gasoso da cabeça, face e pescoço dos carneiros jovens. Essa
infecção se inicia nos carneiros jovens por meio das cabeçadas contínuas que dão
entre si. Os tecidos subcutâneos golpeados e feridos propiciam condições adequa-
das para o crescimento de clostrídios patogênicos, e as soluções de continuidade
na pele oferecem uma oportunidade para sua entrada. O tratamento consiste em
penicilina ou antibióticos de largo espectro.
Clostridiose 391

CARBÚNCULO SINTOMÁTICO
É uma doença febril e aguda dos bovinos e dos ovinos, causada pela Clostridium
chauvoei (feseri) e caracterizada por um inchaço enfisematoso, geralmente nos
músculos volumosos. Encontra-se a doença mundialmente.
Etiologia – A Clostridium chauvoei ocorre naturalmente no trato intestinal dos
animais. Ela pode permanecer viável no solo provavelmente por muitos anos,
embora não cresça ativamente. Ocorrem surtos de carbúnculo sintomático nos
bovinos nas fazendas em que tenham ocorrido escavações recentes, o que
sugere que distúrbios do solo possam ativar os esporos latentes. Os microrganis-
mos são provavelmente ingeridos, passam através da parede do trato digestivo
e, após ganharem acesso à corrente sangüínea, se depositam nos músculos e
nos outros tecidos.
Nos bovinos, a infecção do carbúnculo sintomático é endógena, ao contrário
do edema maligno (ver adiante). As lesões se desenvolvem sem qualquer história
de ferimentos, embora possam se precipitar equimoses em alguns casos.
Comumente, os animais que contraem o carbúnculo sintomático são de raças de
corte, estão com saúde excelente, ganham peso e são geralmente os melhores
animais do seu grupo. Ocorrem surtos quando se encontram alguns novos casos
a cada dia por vários dias. A maioria dos casos ocorre nos bovinos de 6 meses
a 2 anos de idade, mas também pode afetar bezerros viçosos de 6 meses de idade
e bovinos de 10 a 12 anos de idade. A doença ocorre geralmente no verão e no
outono e é incomum durante o inverno. Nos ovinos, a doença não se restringe aos
jovens, e a maioria dos casos segue alguma forma de lesão tal como os cortes
de tosquia, corte de cauda, de descorna ou de castração. O carbúnculo sintomá-
tico endógeno nos ovinos é incomum nos EUA; é muito mais comum na Nova
Zelândia, onde se observa o carbúnculo sintomático mais freqüentemente nos
ovinos do que nos bovinos.
Achados clínicos e lesões – Geralmente, o início é súbito e podem-se encontrar
alguns bovinos mortos sem sinais premonitórios. São comuns claudicações agudas
e uma depressão acentuada. Inicialmente, ocorre febre, mas no momento em que
os sinais clínicos se tornam óbvios, a temperatura pode estar normal ou subnormal.
Os inchaços crepitantes e edematosos característicos se desenvolvem no quadril,
ombro, peito, dorso, pescoço ou em qualquer lugar. Primeiramente, o inchaço é
pequeno, quente e doloroso. À medida que a doença progride rapidamente, o
inchaço aumenta, ocorre crepitação à palpação e a pele se torna fria e insensível à
medida que o suprimento sangüíneo diminui na área. Os sinais gerais incluem
prostração e tremores. Ocorre morte em 12 a 48h. Em alguns bovinos, as lesões se
restringem ao miocárdio e ao diafragma, sem evidências ante mortem confiáveis da
lesão localizada.
Diagnóstico – Uma doença febril e rapidamente fatal em bovinos jovens bem-
nutridos, particularmente nos de raça de corte, e com inchaços crepitantes nos
músculos volumosos sugere um carbúnculo sintomático. O músculo afetado fica de
vermelho-escuro a negro, seco e esponjoso, apresenta um odor adocicado e se
encontra infiltrado com pequenas bolhas, mas com pouco edema. Podem-se
encontrar lesões em qualquer músculo, mesmo na língua ou no diafragma. Nos
ovinos, como as lesões do tipo de ocorrência espontânea são freqüentemente
pequenas e profundas, pode-se não observá-las. Ocasionalmente, as alterações
teciduais causadas por C. septicum, C. novyi, C. sordellii e C. perfringens podem
lembrar as alterações do carbúnculo sintomático; às vezes, podem-se isolar tanto
a C. septicum como a C. chauvoei a partir das lesões de carbúnculo sintomático,
particularmente quando se examinar a carcaça ≥ 24h após a morte, o que
proporciona tempo para uma invasão post mortem dos tecidos por parte da
Clostridiose 392

C. septicum. Os diagnósticos de campo são confirmados por demonstração labora-


torial da C. chauvoei nos músculos afetados. Devem-se obter as amostras do
músculo tão logo após a morte quanto possível. O teste de imunofluorescência para
a C. chauvoei é rápido e confiável.
Controle – Uma bacterina que contenha C. chauvoei e C. septicum é segura
e confiável tanto para os bovinos como para os ovinos. Devem-se vacinar os
bovinos duas vezes, com intervalos de 2 semanas, entre 2 e 6 meses de idade;
nas áreas de alto risco, a revacinação pode ser necessária em 1 ano e a cada 5
anos daí para a frente. Ao se encontrar surtos, devem-se vacinar todos os
bovinos suscetíveis e tratá-los profilaticamente com penicilina para evitar
novos casos, que podem se desenvolver por até 10 dias, quando a bacterina
proporciona proteção. Em algumas áreas, autorizam-se vacinas clostridianas
multicomponentes. Pode-se tentar o tratamento dos casos clínicos com injeções
parenterais e locais múltiplas de penicilina, mas isso freqüentemente não obtém
sucesso.

ENTEROTOXEMIAS
(Infecção por Clostridium perfringens )
A Clostridium perfringens se encontra largamente distribuída no solo e no trato
alimentar dos animais, e se caracteriza por sua capacidade de produção de
exotoxinas potentes, algumas das quais são responsáveis por enterotoxemias
específicas. Identificaram-se 6 Tipos (A, B, C, D, E e F) com base nas toxinas
produzidas, mas apenas 3 (B, C e D) são importantes. No entanto, suspeita-se que
o Tipo A, embora presente no intestino de muitos animais clinicamente normais, seja
a causa da enterite hemorrágica em bovinos, eqüinos e ovinos.

Enterotoxemia causada por C. perfringens dos Tipos B e C


A infecção com os Tipos B e C causa enterite severa, disenteria, toxemia e alta
mortalidade em cordeiros jovens, bezerros, suínos e potros. O Tipo C também causa
enterotoxemia em bovinos adultos, ovinos e caprinos. As doenças se encontram
listadas a seguir, classificadas pelo hospedeiro e pelo que causam (ver também
DOENÇAS ENTÉRICAS EM EQÜINOS, pág. 221). Também se tem associado a Clostridium
perfringens com a enterite hemorrágica nos cães.
Disenteria dos cordeiros – C. perfringens do Tipo B em cordeiros de até 3
semanas de idade. Enterotoxemia dos bezerros – Tipos B e C em bezerros bem
alimentados de até 1 mês. Enterotoxemia dos suínos – Tipo C em leitões durante
os primeiros poucos dias de vida. Enterotoxemia dos potros – Tipo B nos potros
na primeira semana de vida. “Ataque”: Tipo C nos ovinos adultos. Enterotoxemia
dos caprinos – Tipo C nos caprinos adultos.
Achados clínicos – A disenteria dos cordeiros é uma doença aguda dos
cordeiros < 3 semanas de idade. Muitos podem morrer antes que se observem
sinais, mas alguns animais recém-nascidos param de mamar, ficam apáticos e
permanecem deitados. Torna-se comum uma diarréia fétida e tingida de sangue, e
geralmente ocorre morte dentro de poucos dias.
Nos bezerros, ocorre uma diarréia aguda, disenteria, dor abdominal, convulsões
e opistótono. Pode ocorrer morte em poucas horas, mas os casos menos severos
sobrevivem por uns poucos dias e torna-se possível uma recuperação por um
período de vários dias. Os suínos ficam agudamente doentes dentro de poucos dias
após o nascimento e ocorrem diarréia, disenteria, avermelhamento do ânus e uma
alta taxa de fatalidade; a maioria dos leitões afetados morre dentro de 12h. Nos
potros, ocorrem disenteria aguda, toxemia e morte rápida. O ataque nos ovinos
adultos se caracteriza por morte sem sinais premonitórios.
Clostridiose 393

Lesões – A enterite hemorrágica com ulceração da mucosa é a principal lesão


em todas as espécies. Macroscopicamente, a porção afetada do intestino fica roxo-
azulada profundo e, à primeira vista, parece ser uma infartação associado a torção
mesentérica. Podem-se examinar os esfregaços do conteúdo intestinal quanto a um
grande número de bactérias Gram-positivas em forma de bastonete, e podem-se
fazer filtrados para a detecção da toxina e a subseqüente identificação por meio da
neutralização por um anti-soro específico.
Controle – O tratamento geralmente é inefetivo devido à severidade da doença,
mas se for disponível, indica-se um soro hiperimune específico e a administração
oral dos antibióticos pode ser útil. Controla-se melhor a doença por meio da
vacinação da fêmea prenhe durante o último trimestre da prenhez: inicialmente, 2
vacinações com um intervalo de 1 mês, e depois disso anualmente. Quando
ocorrem surtos em animais recém-nascidos originários de fêmeas não vacinadas,
deve-se administrar o anti-soro imediatamente após o nascimento.

Enterotoxemia do Tipo D
(Doença do rim polposo, Doença da superingestão)
É uma enterotoxemia dos ovinos, menos freqüentemente dos caprinos e rara-
mente dos bovinos. É a enterotoxemia clássica dos ovinos. É mundial quanto à sua
distribuição e pode ocorrer em animais de qualquer idade. É mais comum nos
jovens, ou nos cordeiros < 2 semanas de idade ou nos cordeiros desmamados em
rebanhos de engorda com dieta rica em carboidratos ou, menos freqüentemente,
com o pastejo de capim viçoso. Tem-se suspeitado da doença em bezerros de corte
bem nutridos que estejam mamando em vacas de alta produção que estejam
pastando capim viçoso, e na síndrome da morte súbita nos bovinos em engorda,
mas ainda faltam evidências laboratoriais de suporte para a última suspeita.
Etiologia – O agente causador é o C. perfringens do Tipo D. No entanto, os
fatores predisponentes também são essenciais; o mais comum desses fatores é a
ingestão de quantidades excessivas de alimento ou de leite nos cordeiros muito
jovens, e de grãos nos cordeiros em rebanhos de engorda. Nos cordeiros jovens, a
doença geralmente se restringe aos cordeiros filhos únicos, pois raramente uma
ovelha com gêmeos dá leite suficiente para permitir que uma enterotoxemia se
desenvolva. No rebanho de engorda, a doença geralmente ocorre nos cordeiros
com dietas ricas em grãos. À medida que o consumo de amido aumenta, ele
proporciona um meio adequado para o crescimento das bactérias causadoras, que
produzem a toxina ε. Um efeito importante da toxina é causar danos vasculares,
particularmente nos capilares do cérebro. Muitos ovinos carreiam cepas de
C. perfringens do Tipo D como parte da microflora normal do intestino, e servem
como fonte de microrganismos para infectarem o recém-nascido. A maioria de tais
carreadores apresenta uma antitoxina não vacinal em seus soros.
Achados clínicos – Geralmente, as mortes súbitas nos cordeiros melhor
condicionados constituem a primeira indicação de enterotoxemia. Em alguns casos,
ocorrem excitação, incoordenação e convulsões antes da morte. O opistótono, a
andadura em círculos e a extensão da cabeça em direção a pontos fixos constituem
sinais comuns do envolvimento do SNC; freqüentemente, observa-se hiperglicemia
ou glicosúria. Pode ou não se desenvolver diarréia. Ocasionalmente, afetam-se
ovinos adultos; eles apresentam fraqueza, incoordenação e convulsões, e morrem
dentro de 24h. Os bezerros agudamente afetados e não encontrados mortos
apresentam mania, convulsões, cegueira e morte em poucas horas. Os bezerros
subagudamente afetados ficam apáticos por uns poucos dias e podem se recuperar.
Nos caprinos, observam-se diarréia e sinais nervosos, e ocorre morte em várias
semanas.
Clostridiose 394

Lesões – A necropsia pode revelar apenas algumas áreas hiperêmicas no


intestino e um saco pericárdico preenchido por fluido. Esse é particularmente o caso
dos cordeiros jovens. Nos animais mais idosos, podem-se encontrar áreas hemor-
rágicas no miocárdio e petéquias e equimoses nos músculos abdominais e na
serosa do intestino. Ocorrem freqüentemente edema pulmonar bilateral e conges-
tão, mas geralmente não nos cordeiros jovens. O rúmen e o abomaso contêm
alimento em abundância, e freqüentemente se encontra alimento não digerido no
íleo. Podem-se observar edema e malacia microscopicamente nos gânglios basais
e no cerebelo dos cordeiros. A rápida autólise post mortem dos rins leva ao nome
popular de doença do rim polposo, embora de qualquer forma, nem sempre se
encontrem rins polposos nos cordeiros jovens, e raramente eles sejam encontrados
nos bovinos e caprinos.
Diagnóstico – Um diagnóstico presuntivo da enterotoxemia se baseia nas
mortes súbitas e convulsivas nos cordeiros com alimento rico em carboidratos. Os
esfregaços do conteúdo intestinal revelam muitos bacilos grossos, curtos e Gram-
positivos. A confirmação exige a demonstração da toxina ε no fluido do intestino
delgado. Deve-se coletar o fluido e não a ingesta em um recipiente estéril dentro de
poucas horas após a morte, e enviá-lo sob refrigeração para um laboratório para a
identificação da toxina. O clorofórmio, adicionado a uma gota para cada 10mL de
fluido intestinal, estabilizará qualquer toxina presente.
Controle – O método de controle depende da idade dos cordeiros, da freqüência
com que a doença aparece em uma propriedade particular e do método de criação.
Se a doença ocorrer consistentemente nos cordeiros jovens de uma propriedade,
a imunização das ovelhas se torna provavelmente o método de controle mais
satisfatório. As fêmeas reprodutoras devem receber 2 injeções do toxóide do Tipo
D em seu primeiro ano e uma injeção, de 4 a 6 semanas antes do parto e a cada ano
depois disso.
Pode-se controlar a enterotoxemia nos cordeiros em engorda por meio da
redução da quantidade de concentrado na dieta. No entanto, isso pode não ser
econômico, já que a imunização de todos os animais com o toxóide quando entram
pela primeira vez no rebanho de engorda reduzirá provavelmente as perdas a um
nível aceitável. Duas injeções, com um intervalo de 2 semanas, os protegerão por
todo o período de engorda. Ao se utilizar bacterinas ou toxóides precipitados em
alumínio, deve-se administrar a injeção em um lugar de onde se possam remover
facilmente os abscessos frios (que se desenvolvem comumente no local da injeção)
durante o tratamento normal e de modo que não se possa danificar a carcaça.

HEPATITE NECRÓTICA INFECCIOSA


(HNI, Infecção por Clostridium novyi [oedematiens], Doença negra)
É uma doença infecciosa e aguda dos ovinos, algumas vezes dos bovinos, e
raramente dos suínos e dos eqüinos.
Etiologia e patogenia – O agente etiológico, a Clostridium novyi do Tipo B, é
originário do solo e está freqüentemente presente nos intestinos dos herbívoros;
pode também estar presente nas superfícies cutâneas e se constituir em uma fonte
potencial de infecções de ferimentos. A contaminação fecal do pasto por animais
portadores é a fonte mais importante de infecção. O microrganismo se multiplica nas
áreas de necrose hepática causada pela migração das fascíolas hepáticas e produz
uma toxina necrosante potente. A doença possui distribuição mundial, onde quer
que os ovinos e as fascíolas hepáticas coexistam.
Suspeita-se, mas não se confirmou, que a Clostridium novyi seja a causa da morte
súbita nos bovinos e nos suínos alimentados com dietas de grãos de alto nível, e nos
quais as lesões preexistentes do fígado não foram detectáveis. As toxinas letais e
Clostridiose 395

necrosantes (primariamente a toxina α) danificam o parênquima hepático, permitindo


assim que as bactérias se multipliquem e produzam uma quantidade letal de toxina.
Achados clínicos – Geralmente, a morte é súbita e sem nenhum sinal bem
definido. Os animais afetados tendem a ficar para trás do rebanho, assumem um
decúbito esternal e morrem dentro de poucas horas. A maioria dos casos ocorre no
verão e no início do outono, quando a infecção por fascíolas hepáticas está em seu
pico. A doença é mais prevalecente nos ovinos de 1 a 4 anos de idade e se limita
aos animais infectados com fascíolas hepáticas. A diferenciação da fasciolíase
aguda pode ser difícil, mas as mortes superagudas de animais que exibem lesões
típicas na necropsia devem levantar suspeita de HNI.
Lesões – As lesões mais características são os focos necróticos amarelo-
acinzentados no fígado, que freqüentemente seguem as trilhas migratórias das
fascíolas jovens. Outros achados comuns incluem um aumento do saco pericárdico
preenchido com um fluido cor-de-palha e o excesso de fluido nas cavidades
peritoneal e torácica. Geralmente, ocorre uma ruptura extensa dos capilares no
tecido subcutâneo, o que faz com que a pele adjacente se torne negra, daí o nome
comum de “doença negra”.
Controle – Pode-se abaixar a incidência por meio da redução do número de
caramujos, geralmente os Lymnaea spp, que agem como hospedeiros intermediá-
rios para as fascíolas hepáticas, ou por outro lado, por meio da redução da infecção
por fascíolas hepáticas dos ovinos. No entanto, esses procedimentos não são
sempre práticos, e a imunização ativa com o toxóide do C. novyi é mais eficiente.
Produz-se uma imunidade a longo prazo por meio de uma única vacinação. Após
isso, apenas as novas introduções ao rebanho (os cordeiros e os ovinos trazidos de
outras áreas) precisam ser vacinadas. Isso é melhor realizado antes do final do
verão.

EDEMA MALIGNO
É uma toxemia aguda e geralmente fatal dos bovinos, eqüinos, ovinos,
caprinos e suínos, e geralmente causada pela Clostridium septicum , freqüente-
mente acompanhada por outras espécies clostridianas. Não é incomum uma
infecção semelhante no homem. A doença ocorre mundialmente. Os outros
clostrídios implicados nas infecções de ferimentos incluem C. chauvoei ,
C. perfringens, C. novyi e C. sordellii.
Etiologia – A Clostridium septicum se encontra no solo e no conteúdo intestinal
dos animais (inclusive do homem) por todo o mundo. A infecção ocorre geralmente
por meio da contaminação dos ferimentos que contenham tecido desvitalizado, terra
ou algum outro debilitante do tecido. Os ferimentos causados por acidente, castra-
ção, corte de cauda, vacinação não higiênica e parto podem se tornar infectados.
Achados clínicos e diagnóstico – Os sinais gerais, tais como a anorexia, a
intoxicação e a febre alta, bem como as lesões locais, se desenvolvem dentro de
poucas horas a poucos dias após a lesão predisponente. As lesões locais correspon-
dem a inchaços macios que deixam marcas sob pressão e se estendem rapidamente
devido à formação de grandes quantidades de exsudato que infiltram os tecidos
subcutâneo e conjuntivo IM das áreas afetadas. Os músculos em tais áreas tornam-
se marrom-escuros a negros. O acúmulo de gases é incomum. Ocorre um edema
severo da cabeça dos carneiros após a infecção dos ferimentos infligidos por uma
luta. O edema maligno associado com as lacerações da vulva no parto se caracteriza
pelo edema acentuado da vulva, por uma toxemia severa e por morte em 24 a 48h.
A semelhança com o carbúnculo sintomático (ver anteriormente) é acentuada, e
a diferenciação feita na necropsia não é confiável; a confirmação laboratorial é o único
procedimento seguro. Os eqüinos e os suínos são suscetíveis ao edema maligno,
Clostridiose 396

mas não ao carbúnculo sintomático. (A Clostridium septicum também causa a febre


carbuncular nos ovinos, uma infecção altamente fatal caracterizada por toxemia e
inflamação da parede abomasal. Essa doença parece estar confinada principalmen-
te aos ovinos europeus alimentados com pasto “congelado”.)
Pode-se confirmar rapidamente o diagnóstico com base na coloração por
imunofluorescência do C. septicum a partir do esfregaço tecidual. No entanto, a
C. septicum é um invasor post mortem extremamente ativo do intestino, e a sua
presença em uma amostra coletada de um animal que esteja morto há ≥ 24h não-
significativa.
Controle – Utilizam-se bacterinas para a imunização. A Clostridium septicum
encontra-se geralmente combinada com a C. chauvoei em uma vacina contra o
edema maligno e o carbúnculo sintomático, e encontra-se disponível em vacinas
multicomponentes. Nas áreas endêmicas, devem-se vacinar os animais antes de
castrá-los, descorná-los ou cortar-lhes as caudas. Devem-se vacinar os bezerros
com , 2 meses de idade. Duas doses com intervalos de 2 a 3 semanas geralmente
concedem proteção. Nas áreas de alto risco, indica-se a vacinação anual, assim
como a revacinação após um trauma severo.
Indica-se o tratamento com altas doses de penicilina ou com antibióticos de largo
espectro no início da doença. A injeção de penicilina diretamente na periferia da
lesão pode minimizar o alastramento da lesão, mas geralmente os tecidos afetados
ainda se desprendem necrosados.

BOTULISMO
(Lamziekte)
É uma paralisia motora rapidamente fatal e causada pela ingestão da toxina da
Clostridium botulinum; o microrganismo prolifera no tecido animal em decomposi-
ção e algumas vezes no material vegetal.
Etiologia – O botulismo é uma intoxicação, e não uma infecção, e resulta da
ingestão da toxina no alimento. Existem 8 tipos e subtipos de C. botulinum,
diferenciados quanto à especificidade sorológica das toxinas: A, B, C α, Cβ, D, E, F
e G. Os Tipos A, B e E são os de maior importância no botulismo humano; o Cα em
patos selvagens, faisões e galinhas; o Cβ em visons, bovinos e eqüinos; e o D nos
bovinos. Sabe-se que o Tipo F causou apenas 2 surtos, ambos no homem. Não se
sabe se o Tipo G, que foi isolado no solo da Argentina, já esteve envolvido em algum
surto de botulismo tanto no homem como nos outros animais. A fonte comum da
toxina são as carcaças em decomposição ou os materiais vegetais, tais como os
grãos, o feno, o capim em decomposição e a silagem estragada. As toxinas de todos
os tipos possuem a mesma ação farmacológica.
Não se conhece com exatidão a incidência do botulismo nos animais, mas ela é
relativamente baixa em bovinos e eqüinos, provavelmente mais freqüente nas
galinhas, e alta nas aves aquáticas silvestres. Na maioria dos anos, perdem-se
provavelmente 10.000 a 50.000 aves, com as perdas alcançando 1 milhão ou mais
durante os grandes surtos no oeste dos EUA. A maioria das aves afetadas são os
patos, embora os mergulhões, os mergansos, os gansos e as gaivotas também
sejam suscetíveis (ver também BOTULISMO [AVE], pág. 1949). Cães, gatos e suínos
são comparativamente resistentes a todos os tipos de toxina botulínica administra-
dos pela boca.
A maior parte do botulismo nos bovinos ocorre na África do Sul, onde uma
combinação de agricultura extensiva, deficiência de fósforo no solo e C. botulinum
do Tipo D nos animais cria condições ideais para a doença. Os bovinos deficientes
em fósforo mastigam qualquer osso que acompanhe as sobras de carne que eles
encontram no pasto; se esses ossos forem provenientes de um animal carreador de
Clostridiose 397

cepas do Tipo D da C. botulinum, é provável que resulte uma intoxicação. Um grama


ou equivalente da carne seca de tal carcaça pode conter toxina suficiente para matar
uma vaca adulta. Qualquer animal que ingerir esse material também ingere esporos,
que germinam no intestino e, após a morte do hospedeiro, invadem a musculatura,
que por sua vez se torna tóxica para os outros bovinos. As cepas do Tipo C também
causam botulismo nos bovinos de modo semelhante. Esse tipo de botulismo nos
bovinos é raro nos EUA, embora se tenham descrito alguns casos no Texas, sob o
nome de doença do lombo, e alguns casos tenham ocorrido em Montana.
Encontra-se botulismo nos ovinos da Austrália, não associado com a deficiência de
fósforo como nos bovinos, mas com a deficiência de proteínas e carboidratos, o que
resulta nos ovinos ingerirem carcaças de coelhos e de outros pequenos animais
encontrados no pasto.
Botulismo toxicoinfeccioso é o nome dado à doença na qual a C. botulinum
cresce nos tecidos de um animal vivo onde produz toxinas. As toxinas são liberadas
a partir das lesões e causam o botulismo típico. Tem-se sugerido que se constitua
em um meio de produção da síndrome do potro tremedor. As úlceras gástricas,
os focos de necrose no fígado, os abscessos no umbigo e nos pulmões, e os
ferimentos na pele e nos músculos constituem-se locais predisponentes para o
desenvolvimento do botulismo toxicoinfeccioso. Essa doença dos potros e dos
eqüinos adultos parece lembrar o “botulismo de ferimento” no homem.
O botulismo nos visons geralmente é causado pelas cepas do Tipo C β que
tenham produzido toxina na carne ou no peixe crus picados. Raramente envolvem-
se as cepas do Tipo A e do Tipo E.
Achados clínicos – Os sinais de botulismo são causados pela paralisia
muscular e incluem paralisia motora progressiva, perturbação da visão, dificuldade
na mastigação e na engolição e fraqueza progressiva generalizada. A morte
geralmente se deve a uma paralisia respiratória ou cardíaca. A toxina impede a
síntese ou a liberação de acetilcolina nas placas finais motoras. A passagem dos
impulsos inferiores aos nervos motores e a contratilidade dos músculos não ficam
grandemente impedidas; afeta-se apenas a passagem dos impulsos dos nervos
para as placas finais motoras. Não se desenvolvem lesões características e podem-
se atribuir as alterações patológicas mais a uma ação paralítica geral da toxina,
particularmente nos músculos do sistema respiratório, do que ao efeito específico
da toxina em qualquer órgão em particular.
Ocorreram epidemias em rebanhos leiteiros nos quais até 65% das vacas
adultas desenvolveram botulismo clínico e morreram 6 a 72h após o início do
decúbito. Os principais achados clínicos incluíram salivação, incapacidade de
urinar, disfagia e decúbito esternal, que progrediu para decúbito lateral imediata-
mente antes da morte. A sensibilidade cutânea fica geralmente normal, e os
reflexos de retirada dos membros ficam fracos. Inicialmente, os sinais clínicos
lembram a febre do leite de segundo estágio, mas as vacas não respondem à
terapia com cálcio.
Na síndrome do potro tremedor, os potros são geralmente < 4 semanas de idade.
Podem ser encontrados mortos sem sinais premonitórios; mais freqüentemente,
exibem sinais de paralisia motora simétrica progressiva. A andadura com os
membros esticados, os tremores musculares e a incapacidade em se manter em pé
por mais de 4 a 5min constituem características salientes. Outros sinais clínicos
incluem disfagia, constipação, midríase e micção freqüente. À medida que a doença
progride, ocorrem dispnéia com extensão da cabeça e do pescoço, taquicardia e
parada respiratória. A morte ocorre mais freqüentemente 24 a 72h após o início dos
sinais clínicos. Os achados de necropsia mais confiáveis incluem o edema e a
congestão pulmonares e o excesso de fluido pericárdico, que contém filamentos de
fibrina em flutuação livre.
Clostridiose 398

Diagnóstico – Embora se suspeite freqüentemente de casos esporádicos de


botulismo devido à paralisia motora característica, torna-se algumas vezes difícil o
estabelecimento do diagnóstico por demonstração da toxina nos tecidos ou soros
animais ou no alimento suspeito. O diagnóstico é feito comumente por meio da
eliminação das outras causas de paralisia motora. Devem-se testar os filtrados dos
conteúdos estomacal e intestinal quanto à toxicidade nos camundongos, mas uma
resposta negativa se torna não confiável. Obtém-se a evidência de suporte primária
por meio da alimentação de animais suscetíveis com o material suspeito. Nos casos
superagudos, a toxina pode ser detectável no sangue por meio de testes de
inoculação em camundongos, mas geralmente não é detectável no caso de campo
médio nos animais de fazenda. No botulismo toxicoinfeccioso, pode-se cultivar o
microrganismo a partir de tecidos de animais afetados.
Controle – Devem-se corrigir quaisquer deficiências dietéticas, e eliminar as
carcaças, se possível. Deve-se retirar da dieta o capim em decomposição ou a
silagem estragada. A imunização dos bovinos com toxóides dos Tipos C e D obteve
sucesso na África do Sul e na Austrália. O toxóide também é efetivo na imunização
dos visons e também foi utilizado nos faisões.
Tem-se utilizado a antitoxina botulínica no tratamento de graus variáveis de
sucesso, dependendo do tipo de toxina envolvida e da espécie de hospedeiro. O
tratamento dos patos e dos visons com a antitoxina do Tipo C freqüentemente obtém
sucesso; no entanto, raramente se utiliza tal tratamento nos bovinos. Tem-se
descrito o tratamento com cloridrato de guanidina, a 11mg/kg de peso corporal, para
superar um pouco da paralisia causada pela toxina; no entanto, seu uso não tem sido
extenso o suficiente para determinar o seu valor.

TÉTANO
É uma toxemia causada por uma neurotoxina específica produzida pela Clostridium
tetani no tecido necrótico. Quase todos os mamíferos são suscetíveis a esta doença,
embora os gatos pareçam ser mais resistentes que qualquer outro mamífero
doméstico ou de laboratório. As aves são muito resistentes; a dose letal para os
pombos e as galinhas é 10.000 a 300.000 vezes maior (com base no peso corporal)
do que a para os eqüinos. Os eqüinos são os mais sensíveis de todas as espécies,
com a possível exceção da humana. Embora o tétano apresente uma distribuição
mundial, existem algumas áreas, tais como a seção setentrional das Montanhas
Rochosas nos EUA, onde raramente se encontra o microrganismo no solo e onde
praticamente se desconhece o tétano. Em geral, a ocorrência da C. tetani no solo
e a incidência do tétano no homem e nos eqüinos são mais altas nas partes mais
quentes dos vários continentes.
Etiologia e patogenia – Encontra-se a Clostridium tetani, um anaeróbio com
esporos esféricos e terminais, no solo e nos tratos intestinais. Na maioria dos casos,
ela se introduz nos tecidos por meio dos ferimentos, particularmente dos ferimentos
profundos por perfuração, que proporcionam um ambiente anaeróbico adequado.
Entretanto, freqüentemente nos ovinos, e algumas vezes nas outras espécies, o
tétano se segue ao corte da cauda ou à castração. Algumas vezes, não se torna
possível o encontro do ponto de entrada, já que a própria lesão pode ser pequena
ou estar cicatrizada.
Os esporos da C. tetani são incapazes de crescer em um tecido normal, ou mesmo
em ferimentos se o tecido permanecer no potencial de oxidorredução do sangue
circulante. Ocorrem condições adequadas para a multiplicação quando uma peque-
na quantidade de terra ou um corpo estranho causam necrose tecidual. As bactérias
permanecem localizadas no tecido necrótico no local original da infecção e se
multiplicam. À medida que as células bacterianas passam por autólise, libera-se uma
Clostridiose 399

neurotoxina potente. Geralmente, os nervos motores absorvem a toxina na área e a


deixam passar pelo trato nervoso da medula espinhal, onde ela causa tétano
ascendente. A toxina causa contrações tônicas e espasmódicas dos músculos
voluntários por meio da interferência na liberação dos neurotransmissores. Caso se
libere mais toxina no local da infecção que os nervos circundantes possam absorver,
retira-se o excesso por meio da linfa na corrente sanguínea e conseqüentemente no
SNC, onde a toxina causa tétano descendente. Até um estímulo pequeno do
indivíduo afetado pode disparar os espasmos musculares característicos.
Achados clínicos – O período de incubação varia de uma a várias semanas,
mas a média é de geralmente 10 a 14 dias. Observa-se primeiro uma rigidez
localizada, envolvendo freqüentemente os músculos massetéricos e os do
pescoço, os membros posteriores e a região do ferimento infectado; a rigidez
geral se acentua , 1 dia mais tarde, e tornam-se evidentes espasmos tônicos e
hiperestesia.
Os reflexos aumentam em intensidade e o animal se excita facilmente em
espasmos gerais e mais violentos por meio de um movimento ou de um ruído
súbitos. Os espasmos dos músculos da cabeça causam dificuldade na apreensão
e na mastigação do alimento, daí a denominação comum de trismo ou “mandíbula
travada”. Nos eqüinos, as orelhas ficam eretas, a cauda rígida e estendida, as
narinas dilatadas e a terceira pálpebra prolapsada. A andadura, as curvas e o recuo
tornam-se difíceis. Os espasmos dos músculos do pescoço e das costas causam a
extensão da cabeça e do pescoço, enquanto a rigidez dos músculos da perna faz
com que o animal assuma uma postura de “cavalete”. Freqüentemente ocorre
transpiração. Os espasmos gerais perturbam a circulação e a respiração, o que
resulta em um aumento da freqüência cardíaca, uma respiração rápida e a
congestão das membranas mucosas. Os ovinos, os caprinos e os suínos freqüen-
temente caem no chão e apresentam opistótono quando assustados. Não se afeta
a consciência.
A temperatura geralmente permanece ligeiramente acima do normal, mas pode
subir até 42° a 43°C em direção ao fim de um ataque fatal. Nos ataques suaves, o
pulso e a temperatura permanecem próximos do normal. A mortalidade assume uma
média de , 80%. Nos animais que se recuperam, ocorre um período de convales-
cença de 2 a 6 semanas; a imunidade protetora geralmente não se desenvolve após
a recuperação.
Controle – Pode-se obter uma imunização ativa com um toxóide tetânico. Se
ocorrer um ferimento perigoso após a imunização, deve-se administrar outra injeção
de toxóide para elevar o anticorpo circulante. Se não se imunizar previamente o
animal, deve-se tratá-lo com 1.500 a 3.000UI ou mais de antitoxina tetânica, que
geralmente proporciona proteção passiva por até 2 semanas. Deve-se administrar
o toxóide simultaneamente com a antitoxina e repeti-lo em 30 dias. Aconselham-se
injeções anuais de reforço do toxóide. Devem-se vacinar as éguas durante as
últimas 6 semanas de prenhez e os potros de 5 a 8 semanas de idade. Nas áreas
de alto risco, pode-se administrar a antitoxina tetânica nos potros imediatamente
após o nascimento e a cada 2 a 3 semanas até que atinjam 3 meses de idade,
momento em que se pode administrar o toxóide. A decisão de vacinar os cordeiros
ou os bezerros depende da prevalência da doença na área.
Devem-se conduzir todos os procedimentos cirúrgicos com as melhores técnicas
possíveis. Após tal cirurgia, devem-se transferir os animais para um solo limpo,
preferivelmente pastos de capim. Para matar os esporos, deve-se confiar somente
nos desinfetantes oxidantes, tais como o iodo e o cloro.
Quando administrados nos estágios iniciais da doença, os agentes curariformes,
os tranqüilizantes ou os sedativos barbitúricos, em conjunto com 300.000UI de
antitoxina tetânica a cada 12h, têm sido efetivos no tratamento dos eqüinos. Têm-
Clostridiose 400

se obtido bons resultados nos eqüinos com a injeção de 50.000UI de antitoxina


tetânica diretamente no espaço subaracnóideo através da cisterna magna. Deve-se
auxiliar tal terapia com uma drenagem e uma limpeza de ferimentos e a administra-
ção de penicilina ou de antibióticos de largo espectro. A boa assistência não é
valiosa durante o período agudo de espasmos. Deve-se colocar o animal em uma
baia quieta e escura, com dispositivos de alimentação e fornecimento de água altos
o suficiente para permitir o seu uso sem que o animal precise baixar a cabeça.
Podem ser úteis tipóias nos casos em que ficar em pé ou levantar seja difícil.

ANOMALIAS CONGÊNITAS E HEREDITÁRIAS


Têm-se descrito defeitos estruturais e funcionais nos animais neonatos que
ocorrem de variantes entre o defeito, a imperfeição e o desvio do padrão até a
malformação e a monstruosidade. O desenvolvimento defeituoso pode ser expresso
por mortalidade embrionária, morte fetal, aborto, natimortalidade ou a viabilidade ou
a inviabilidade do neonato (ver também as discussões sobre ANOMALIAS C ONGÊNITAS
nas seções SLC, NER, REP, PEL e URN; muitas das doenças mencionadas adiante
se encontram discutidas mais completamente em outras partes do MANUAL, e podem
ser localizadas por meio do índice.)
A suscetibilidade a ambientes lesivos ou aos agentes genéticos varia com o
estágio de desenvolvimento e espécie, e diminui com a idade fetal. O zigoto é
resistente a teratogênio mas suscetível a mutações genéticas e aberrações cromos-
sômicas. O embrião é altamente suscetível a teratogênios, mas isso se reduz à
medida que o embrião envelhece e passam os períodos críticos de desenvolvimento
de vários órgãos ou sistemas orgânicos. O feto torna-se altamente resistente a
agentes teratogênicos, exceto nas estruturas de diferenciação tardia, tais como o
cerebelo, o palato e o sistema urogenital.
Muitos defeitos congênitos não têm uma causa claramente estabelecida; outros
são causados por fatores ambientais, nutricionais, ou genéticos, ou por interação
ambiental/genética.
Fatores ambientais – Os fatores teratogênicos incluem plantas tóxicas, vírus,
drogas, microelementos minerais e agentes físicos, tais como a irradiação, a
hipertermia e a pressão durante o exame retal.
A doença do bezerro torto, que se caracteriza por contraturas articulares,
torcicolo, escoliose ou cifose, e vários graus de fissura do palato e combinações
desses defeitos, se deve à ingestão de Lupinus caudatus , L. sericeus e
L. nootkatensis . As vacas alimentadas com o tremoceiro entre o 40º e 70º dia de
gestação produziram bezerros com essas deformidades. Identificou-se o alcalói-
de anagirina como o teratogênio. O desenvolvimento fetal corresponde ao maior
risco quando as vacas prenhes pastam o tremoceiro no início do seu crescimento
ou durante a formação da semente. Reproduziram-se deformidades semelhantes
através da alimentação das vacas com a Conium maculatum entre o 50º e o 75º
dias de prenhez. As outras plantas suspeitas de causarem defeitos semelhantes
nos bezerros incluem Senecio, Cycadales, Blighia, Papaveracea, Colchicum e
Vinca spp; Indigofera spicata ; astrágalos; tabaco; e plantas relacionadas.
Ocorreram epidemias de defeitos ciclopianos nos cordeiros em bandos de
ovinos no centro-sul e no sudoeste de Idaho enquanto pastavam Veratrum
californicum em determinados pastos de montanha. Ocorreram epidemias de
artrogripose em fazendas de Kentucky quando porcas ingeriram talos de tabaco
durante a prenhez.
Anomalias Congênitas e Hereditárias 401

Tem-se incriminado o pasto de sorgo (Sorghum vulgare) como causa da


artrogripose nos eqüinos, e o Sorghum sudanense pode ter causado artrogripose
em bezerros.
O envenenamento por astrágalo a partir das plantas dos gêneros Oxytropis e
Astragalus em todos os tipos de animais domésticos de pasto (mais comumente
bovinos, ovinos e eqüinos) resultou em vários sinais clínicos tais como a emaciação,
a deterioração visual, os sinais neurológicos, a adoção de manias, o aborto e os
defeitos congênitos. O astrágalo produziu defeitos musculoesqueléticos nos bezer-
ros e nos cordeiros, e hipoplasia de testículos e aumento das vesículas seminais nos
carneiros. O envenenamento por Swainsonia e astrágalo nos bovinos em cresci-
mento pode ter semelhanças com a manosidose genética nos bovinos Angus, uma
vez que o alcalóide indolizidina-1,2,8-triol é um inibidor potente e específico da
enzima hidrolítica α-manosidase.
O ronel (fenclorfós) administrado por VO em doses terapêuticas em raposas
azuis (Alopex lagopus) prenhes para tratamento de parasitismo reduziu o tamanho
da ninhada a 1,2 filhotes por raposa (comparado aos 9,5 nas raposas cinzentas de
controle) e causou ossificação incompleta dos ossos craniais, uma palatosquise e
hidrocefalia.
Pode-se causar atresia intestinal, particularmente do cólon, por meio de pressão
externa sobre o âmnio durante a palpação retal entre o 35º e o 40º dia de gestação.
As infecções virais pré-natais podem ser teratogênicas em bovinos, ovinos,
caprinos, suínos, cães e gatos, mas não têm sido incriminadas nos defeitos eqüinos
comuns. Em bovinos, ovinos e caprinos, a infecção intra-uterina com o vírus
Akabane (ver adiante) causou abortos, nascimentos prematuros e defeitos congê-
nitos (artrogripose e hidranencefalia).
O vírus da diarréia viral bovina (DVB) pode causar defeitos tais como displasia
cerebelar, braquignatia, alopecia, desmielinogênese, hidrocefalia interna, neurite
óptica, dismaturidade (retardo do crescimento intra-uterino) e deterioração da
imunocompetência. As diferentes cepas do vírus da DVB podem ter efeitos diferen-
tes no desenvolvimento do feto e a lesão resultante depende do estágio da prenhez
em que a vaca suscetível foi exposta.
O vírus da língua-azul (LA) causa hidranencefalia, porencefalia e artrogripose
nos ovinos. A infecção pré-natal com o vírus da LA nos bezerros pode resultar em
abortos, natimortalidade e defeitos congênitos, tais como artrogripose, campilognatia
e a prognatia com um crânio em forma de domo. Também se têm observado
hidranencefalia e uma síndrome do “bezerro deprimido” (inatividade, embotamento
e distúrbios comportamentais).
O vírus da doença de Wesselsbron causou comprovadamente uma porencefalia
e uma hipoplasia cerebelar congênitas nos bezerros na África do Sul.
A infecção pré-natal com o togavírus da hipomielinogênese congênita nos
cordeiros (cordeiros “felpudos” ou “despenteados”) ou doença da Fronteira (ver
adiante) se manifesta por morte embrionária ou fetal, o que leva ao aborto ou a
natimortos de termo completo, e/ou a uma dismorfogênese do SNC, do esqueleto
e da pele/velo, e ao nascimento de cordeiros fracos e pequenos com um crescimento
e uma viabilidade fracos. Ocorre uma mielinogênese defeituosa devida ao retarda-
mento do processo de mielinização, que se torna parcialmente reversível se o
cordeiro sobreviver. O velo felpudo se deve à queda na proporção de folículos
lanígeros secundários a primários, tamanho aumentado e alteração da estrutura das
fibras de lã primárias.
O vírus da cólera suína, um togavírus, é teratogênico nos leitões, e causa a
microencefalia, a hidrocefalia interna e a hipoplasia cerebelar. Os achados associa-
dos comuns incluem ascite, cirrose, defeitos renais, hipoplasia pulmonar severa e
defeitos do focinho, do ouvido e dos membros.
Anomalias Congênitas e Hereditárias 402

A síndrome do tremor congênito dos leitões consiste de vários defeitos de


desenvolvimento etiológica e patologicamente distintos do cérebro e da medula
espinhal.
Os fetos suínos infectados experimentalmente com o vírus da influenza suína
desenvolveram uma hipoplasia pulmonar.
A infecção natural e experimental das gatas prenhes com o vírus da panleucopenia
felina causou uma hipoplasia cerebelar nos gatinhos recém-nascidos. A injeção
intra-uterina desse mesmo vírus em furões prenhes também resultou em hipoplasia
cerebelar.
Fatores nutricionais – A deficiência de um ou mais nutrientes durante a prenhez
pode causar defeitos congênitos no recém-nascido. As deficiências severas podem
interromper a prenhez ou resultar em filhotes fracos ou inviáveis. A deficiência de
iodo é endêmica em determinadas áreas e pode causar bócio ou cretinismo em
todas as espécies. A deficiência de cobre causa ataxia enzoótica nos cordeiros; uma
deficiência de manganês causa deformidades nos membros nos bezerros. A
deficiência de vitaminas pode causar o raquitismo neonatal (vitamina D) ou os
defeitos oculares ou ainda o lábio leporino (vitamina A). Induziram-se experimental-
mente efeitos teratogênicos por deficiências de colina, de riboflavina, de ácido
pantotênico, de cobalamina e de ácido fólico, e também por hipervitaminose A.

DOENÇA DE AKABANE
É uma doença viral transmitida por insetos que causa anormalidades congênitas
do SNC nos ruminantes. Foi descrita na Austrália, China, Israel, Japão, Coréia e
África do Sul; encontraram-se anticorpos contra ela no Chipre. A doença clínica
afeta os fetos de bovinos, ovinos e caprinos. Demonstrou-se sorologicamente uma
infecção assintomática em eqüinos, bufalinos, veados e cães (mas não no homem
ou nos suínos) nas áreas endêmicas.
Etiologia, transmissão e epidemiologia – O agente causador, o vírus de
Akabane, é um membro do sorogrupo Simbu dos Bunyaviridae. Foi isolado a partir
de mosquitos e Culicoides na Austrália, Japão e Quênia. Também foi isolado a partir
do sangue de bovinos-sentinela saudáveis e de fetos de ovelhas que se
soroconverteram naturalmente. Reproduziu-se a doença experimentalmente.
O vírus de Akabane é comum em muitas áreas tropicais e subtropicais entre
, 35°N e 35°S. Nessas áreas endêmicas, os herbívoros são picados pelos vetores,
tornam-se infectados em uma idade precoce e desenvolvem uma imunidade sólida
no momento da reprodução; logo, raramente se observam anormalidades congêni-
tas. No entanto, se por qualquer razão, tal como um verão úmido e extenso, o vetor
(e portanto o vírus) se alastrar para novas áreas, podem-se esperar surtos de
infecção congênita. Esses surtos geralmente ocorrem nos limites setentrionais e
meridionais da distribuição normal dos insetos-vetores, ou nas áreas de maior
altitude. Semelhantemente, os ruminantes prenhes de áreas livres da doença que
foram transportados para áreas infectadas pelo vírus ficam em risco.
Achados clínicos e lesões – A patogenia e os sinais clínicos dependem da
espécie do animal e do momento da infecção. Os bezerros infectados no final da
prenhez podem nascer vivos, mas incapazes de ficar em pé, ou ficarem incoordenados
ou ainda demonstrarem uma encefalomielite disseminada na necropsia. Os bezer-
ros infectados precocemente (durante o segundo trimestre) apresentam uma
fixação rígida dos membros, geralmente em flexão (artrogripose) e algumas vezes
também torcicolo, cifose e escoliose com atrofia muscular neurogênica associada
devida à perda dos neurônios motores espinhais. (Esses bezerros geralmente
causam distocia.) Os bezerros afetados precocemente (no final do primeiro trimes-
tre) nascem geralmente vivos, mas andam mal e ficam deprimidos e cegos. Esses
Anomalias Congênitas e Hereditárias 403

bezerros apresentam graus variáveis de cavitação dos hemisférios cerebrais;


geralmente encontra-se presente uma hidranencefalia extrema. Alguns bezerros
podem ser afetados tanto com artrogripose como com hidranencefalia. Ocasional-
mente ocorre cavitação cerebelar.
Nos cordeiros e nos cabritos, podem ocorrer lesões semelhantes à artrogripose
e à hidranencefalia. No entanto, na Austrália, os cordeiros afetados morrem
imediatamente após o nascimento, ou exibem sinais neurológicos e apresentam
uma microencefalia suave a extrema, com ventrículos laterais dilatados.
Também ocorre aborto com ou sem anormalidades no desenvolvimento do SNC.
Diagnóstico – Pode-se obter um diagnóstico presuntivo com as lesões macros-
cópicas no SNC, mas deve-se diferenciar a doença de outras infecções e afecções
genéticas. Pode-se obter a confirmação da infecção por meio do teste de soros de
filhotes afetados não amamentados e das suas mães quanto à neutralização sérica
dos anticorpos contra o vírus de Akabane.
Também foram descritos recentemente 2 vírus adicionais que causam sinais
semelhantes. Tem-se isolado o vírus de Aino, um outro vírus do sorogrupo Simbu,
a partir de mosquitos e Culicoides no Japão e na Austrália, onde foi associado com
alguns casos de artrogripose e hidranencefalia bovinas. Têm-se encontrado anticor-
pos nos bovinos, nos ovinos, nos bufalinos e no homem. No Japão, o vírus de
Chuzan (um reovírus) é transmitido pela Culicoides oxystoma e causa infecções
congênitas nos bezerros, semelhantes às do vírus de Akabane.
Tratamento e controle – Não há tratamento. A introdução de um rebanho de
áreas não endêmicas em áreas endêmicas deve ser feita bem antes do primeiro
acasalamento.

DOENÇA DA FRONTEIRA
(“Doença do pêlo despenteado”)
A doença da fronteira (Grã-Bretanha) ou doença do pêlo despenteado (Austrália
e Nova Zelândia) é um distúrbio congênito dos cordeiros, caracterizado por um baixo
peso ao nascimento e uma baixa viabilidade, uma má conformação, tremores e um
pelame excessivamente espesso ao nascimento em raças de pelame normalmente
uniforme. Também podem-se afetar os cabritos, e uma afecção semelhante
também ocorre ocasionalmente nos bezerros. Reconheceu-se a doença na maioria
das áreas criadoras de ovinos do mundo, inclusive no oeste dos EUA.
Etiologia, patogenia e epidemiologia – A doença da fronteira (DF) é causada
pela infecção do feto no início da prenhez com um pestivírus (Togaviridae)
intimamente relacionado ou idêntico ao vírus da diarréia viral bovina/complexo da
doença das mucosas (ver pág. 199). Os cordeiros sobreviventes tornam-se persis-
tentemente virêmicos, e o vírus se encontra presente em suas excreções e
secreções, incluindo o sêmen. Os ruminantes, e possivelmente também os suínos,
podem se infectar facilmente pelo contato com esses excretores persistentes ou
com ovinos agudamente infectados. As infecções agudas nos animais imunocom-
petentes são geralmente transitórias e subclínicas, e resultam na imunidade ao
desafio com cepas homólogas, mas não heterólogas, do vírus.
Os vírus adquiridos no início da prenhez por animais não expostos anteriormente
atravessam a placenta e invadem o feto. Ocorre placentite 10 a 30 dias após a
infecção e pode-se causar morte fetal com expulsão, reabsorção ou mumificação.
Pode ocorrer aborto em qualquer estágio da prenhez, e pode-se não notá-lo já que
há pouco mal-estar materno.
Nas prenhezes mantidas, o vírus se distribui largamente pelos tecidos fetais, mas
as alterações patológicas tornam-se mais óbvias na pele, esqueleto e SNC. Podem
nascer cordeiros afetados 2 a 3 dias mais cedo, e muitos deles morrem antes ou
Anomalias Congênitas e Hereditárias 404

durante o desmame. Nos sobreviventes, os sinais clínicos regridem gradualmente,


mas tais animais permanecem infectados e excretam o vírus pelo resto de suas
vidas, o que constitui um risco para a sua progênie e os seus companheiros de
rebanho. Pode ocorrer morte por uma síndrome semelhante à doença das mucosas
bovina nesses ovinos de pêlo despenteado “recuperados” a qualquer momento.
Nos rebanhos, na primeira estação de uma nova infecção, até 50% ou mais dos
cordeiros nascidos podem ficar afetados pela DF. Depois disso, diminui-se a
prevalência, embora a doença possa se tornar endêmica ao se manter os cordeiros
“recuperados” para acasalamento.
Achados clínicos – Os rebanhos afetados são provavelmente reconhecidos
primeiro no momento do parto devido ao aumento no número de ovelhas estéreis
e no nascimento de cordeiros anões com um velo excessivamente espesso e
algumas vezes também excessivamente pigmentado. Alguns cordeiros exibem
tremores musculares involuntários, particularmente no tronco e nos membros
posteriores. Os tremores se reduzem no repouso e se exacerbam em um movimento
intencional. Em outros cordeiros, podem predominar defeitos esqueléticos tais
como rebaixamento da quartela e braquignatia mandibular. Os cordeiros afetados
possuem uma taxa de sobrevivência fraca. Nos sobreviventes, os sinais nervosos
desaparecem gradualmente dentro de 3 a 4 meses. Mesmo na ausência de
cordeiros de pêlos despenteados típicos, os surtos de baixa fertilidade nas ovelhas
e de fraca viabilidade e mau rendimento nos cordeiros estão se tornando associados
mais freqüentemente com a infecção pelo vírus da DF.
Lesões – Nos casos severos, pode-se observar uma cavitação do cérebro à
necropsia. Por outro lado, as lesões características são microscópicas e envolvem
a matéria branca do SNC. Ocorrem uma deficiência de mielina e uma elevação das
células gliais intrafasciculares, nas quais podem se acumular gotículas lipídicas
semelhantes à mielina. Essas alterações tornam-se mais óbvias nos recém-
nascidos e se resolvem gradualmente.
Diagnóstico – Os achados clínicos geralmente permitem um diagnóstico,
embora nas raças de ovinos de pelame áspero, a pilosidade anormal do pelame do
nascimento possa não ficar aparente. Deve-se confirmar o diagnóstico por meio da
demonstração histológica das lesões patognomônicas no SNC. Nos cordeiros de
pêlos despenteados típicos, pode-se isolar o vírus facilmente em uma cultura
tecidual a partir de coágulos sangüíneos e tecidos. O soro pré-colostral não contém
anticorpos neutralizadores de vírus, mas o soro materno contém tais anticorpos em
títulos altos, a menos que a fêmea seja um sobrevivente persistentemente infectado
de uma infecção fetal precoce. As diferenças antigênicas entre as cepas de
pestivírus podem causar dificuldades no sorodiagnóstico.
No diagnóstico diferencial, devem-se considerar as outras causas do aborto
ovino, por exemplo, Chlamydia sp, Salmonella spp, Campylobacter spp, Toxoplas-
ma gondii e Rickettsia spp. Nos cordeiros nascidos vivos, deve-se diferenciar a DF
da curvatura da espinha (ataxia enzoótica), da meningoencefalite bacteriana, da
encefalomalacia simétrica focal e da doença do “cordeiro demente”.
Controle – Não há tratamento efetivo. Deve-se realizar a sorologia nas mães dos
cordeiros afetados. A maioria deve ter altos níveis de anticorpos e ser imune a um
desafio posterior com a mesma cepa do vírus nas prenhezes subseqüentes.
Qualquer uma que não tenha títulos de anticorpos pode se constituir em uma
excretora persistente do vírus, e deve ser descartada. Não se devem manter os
animais recuperados para acasalamento, mas deve-se misturá-los com o lote
de reposição imediatamente antes da estação de acasalamento para maximizar as
oportunidades de o último lote se infectar e desenvolver imunidade antes das cruzas
subseqüentes.
Erisipela 405

ERISIPELA
A Erysipelothrix rhusiopathiae (insidiosa) apresenta uma distribuição muito
difundida e é capaz de viver em água, solo, matéria orgânica em decomposição, limo
dos corpos dos peixes e nas carcaças, mesmo após o processamento. Essa
bactéria possui um período de sobrevivência variável no solo, mas geralmente não
> 35 dias; no entanto, os suínos carreadores (ou outros hospedeiros) podem causar
recontaminação. Esse agente causa a erisipela suína em suas várias formas; a
artrite não supurativa nos cordeiros e menos freqüentemente nos bezerros e nos
cabritos; a claudicação pós-banho de imersão nos ovinos; incomumente, mal das
juntas (ver pág. 608); e uma septicemia aguda nos perus, patos, e ocasionalmente,
nos gansos e em outras aves (ver pág. 1904); No homem, a infecção geralmente é
localizada sendo denominada erisipelóide. (Não se deve confundi-la com a erisipela
no homem, uma celulite superficial causada pelos estreptococos β-hemolíticos do
Grupo A.)
Na doença aguda, a E. rhusiopathiae geralmente ocorre como um bastonete
Gram-positivo pequeno, de , 1 a 2µm de comprimento. Nas lesões crônicas e nas
culturas velhas, freqüentemente aparece como uma mistura de filamentos e
bastonetes com até 20µm de comprimento. É resistente a determinados anti-
sépticos comumente utilizados, tais como formaldeído, fenol, peróxido de hidrogê-
nio (água oxigenada) e álcool, mas é facilmente destruído pela soda cáustica e pelos
hipocloretos. É muito sensível à penicilina e um pouco menos às tetraciclinas. As
muitas cepas variam acentuadamente quanto à patogenicidade.

ERISIPELA SUÍNA
É uma doença infecciosa principalmente dos suínos em crescimento, comum em
muitas áreas do mundo. Embora a erisipela suína septicêmica aguda cause a morte,
as maiores perdas econômicas ocorrem provavelmente a partir das formas crônicas
e não fatais da doença.
Etiologia – Nas fazendas onde o microrganismo é endêmico, os suínos ficam
expostos naturalmente à E. rhusiopathiae quando jovens; os seus anticorpos
maternos proporcionam um grau de imunidade ativa sem a doença constatável. O
microrganismo é excretado pelos animais infectados e sobrevive por curtos perío-
dos na maioria dos solos. Os animais recuperados e os cronicamente infectados
podem se tornar portadores do microrganismo, possivelmente por toda a vida.
Acreditava-se que a Erysipelothrix rhusiopathiae causasse uma reação alérgica nas
articulações dos suínos sensibilizados, o que resultaria em lesões crônicas e
estéreis semelhantes às observadas na artrite reumatóide no homem; hoje, porém,
questiona-se essa crença.
Achados clínicos – A septicemia aguda, a forma cutânea (subaguda), a artrite
crônica e a endocardite vegetativa podem ocorrer em seqüência ou separadamente.
Os suínos com septicemia aguda podem morrer subitamente sem sinais prévios.
Isso ocorre mais freqüentemente nos suínos em terminação (45 a 90kg). Os animais
agudamente infectados ficam febris (40 a 42°C), andam rigidamente sobre seus
dedos e deitam sobre seus esternos mais separadamente do que se amontoando
em grupos. Eles guincham melancolicamente quando manipulados e podem
transferir seu peso de pé para pé quando ficam de pé. A descoloração da pele pode
variar de um eritema muito disseminado e de uma descoloração arroxeada das
orelhas, focinho e abdome, até lesões cutâneas em forma de diamante em quase
qualquer parte do corpo, mas particularmente nas partes laterais e dorsais. As
lesões podem ocorrer como áreas rosadas ou arroxeadas claras de tamanhos
variáveis, que se tornam elevadas e firmes ao toque com 2 a 3 dias de enfermidade.
Erisipela 406

Elas podem desaparecer ou progredir para um tipo mais crônico de lesão, tal como
a doença da pele de diamante. Se não forem tratadas, podem ocorrer necrose e
separação de grandes áreas de pele, mas mais comumente, as pontas das orelhas
e a cauda podem se tornar necróticas e desprendidas.
A doença clínica geralmente é esporádica, e afeta indivíduos ou pequenos
grupos, mas algumas vezes ocorrem grandes surtos. A mortalidade é de 0 a 100%
e pode ocorrer morte em até 6 dias após os primeiros sinais da enfermidade. As
porcas prenhes agudamente afetadas podem abortar, provavelmente devido à
febre, e as porcas em aleitamento podem demonstrar agalactia. Os animais não-
tratados podem desenvolver artrite crônica ou endocardite valvular vegetativa; tais
lesões também podem ocorrer nos suínos sem nenhum sinal prévio de septicemia.
A endocardite valvular é mais comum nos suínos adultos ou jovens e se manifesta
freqüentemente por morte súbita, geralmente por embolismo. A artrite crônica, a
forma mais comum da infecção crônica, produz claudicação suave a severa; as
articulações afetadas podem ser difíceis de detectar, mas tendem a se tornar
visivelmente aumentadas e firmes. A mortalidade nos casos crônicos é baixa, mas
a velocidade de crescimento fica retardada.
Lesões – Na infecção aguda, além das lesões cutâneas, os linfonodos ficam
geralmente aumentados e congestos, o baço incha e os pulmões ficam edematosos
e congestos. Podem-se encontrar petéquias nos rins, coração e ocasionalmente em
qualquer lugar.
Nos casos de endocardite valvular, podem ocorrer embolismos e infartos. A
artrite pode envolver articulações de uma ou mais pernas, ou as articulações
intervertebrais; o aumento das articulações é proliferativo, mas não supurativo,
e formam-se pontas de tecido de granulação na cavidade articular. Nos casos
crônicos, pode haver erosão da cartilagem articular, e pode resultar uma anqui-
lose.
Diagnóstico – A erisipela aguda é difícil de diagnosticar nos suínos que
apresentarem apenas febre, pouco apetite e apatia; no entanto, como a erisipela
responde extremamente bem à penicilina, uma melhora acentuada dentro de 24h
confirma o diagnóstico. As típicas lesões cutâneas em forma de diamante são
diagnósticas. A artrite e a endocardite são difíceis de se diagnosticar no animal vivo,
uma vez que outros agentes podem causar síndromes semelhantes (ver CLAUDICA-
ÇÃO EM SUÍNOS, pág. 642). À necropsia, a demonstração do microrganismo em
esfregaços corados ou em culturas confirma o diagnóstico, embora nos casos de
artrite crônica, possa-se não cultivar os microrganismos. Pode-se isolar o microrga-
nismo facilmente em placas de ágar sangue a partir do baço, rins e ossos longos de
suínos agudamente doentes (e a partir de amígdalas e de outros linfonodos de
muitos indivíduos aparentemente normais). A sorologia pode se provar duvidosa,
embora um título em elevação em um teste de aglutinação (com controles) seja útil,
assim como um teste de fixação de complemento.
Profilaxia e tratamento – Utilizam-se bacterinas mortas ou, em alguns países,
cepas imunizantes de culturas vivas de baixa virulência para suínos. A bacterina
absorvida em hidróxido de alumínio e morta em formalina confere uma imunidade
que, na maioria dos casos, protege o suíno em crescimento da doença aguda até
que ele atinja a idade de mercado. Também se utiliza uma vacina oral de baixa
virulência. Deve-se vacinar o rebanho reprodutivo jovem, inclusive os cachaços,
duas vezes no intervalo recomendado, e depois revaciná-lo a cada 6 meses ou após
cada leitegada. Não se aconselha a vacinação de animais exageradamente pre-
nhes.
A vacinação aumenta o nível de imunidade, mas não proporciona uma proteção
completa. Podem ocorrer casos agudos após o estresse, e pode-se não proporcio-
nar proteção contra as formas artrítica ou cardíaca da doença. Ocorre variação
Erisipela 407

antigênica entre as cepas bacterianas, tanto que a vacina pode não ser igualmente
efetiva contra todas as cepas violentas.
Se ocorrerem casos agudos repentinamente em um rebanho não vacinado,
pode-se administrar um anti-soro (se estiver disponível) para os suínos em contato,
ou pode-se administrar a eles penicilina ou tetraciclinas. A penicilina é a droga de es-
colha nos suínos agudamente afetados, e tem sido utilizada intercorrentemente com
o anti-soro. O tratamento da infecção crônica é inefetivo, e devem-se descartar
tais animais.
A eliminação dos portadores, uma boa higiene e um programa de vacinação
regular devem ser efetivos, mesmo nos rebanhos que tiverem apresentado proble-
mas sérios e recidivantes.

POLIARTRITE NÃO SUPURATIVA NOS CORDEIROS


É uma artrite aguda ou, mais comumente, crônica de uma ou várias articulações,
geralmente dos membros. Às vezes, ela também afeta os bezerros e os cabritos.
Etiologia – O agente infectante, a Erysipelothrix rhusiopathiae, geralmente entra
no organismo por meio de ferimentos nos cordeiros jovens, algumas vezes pelo
umbigo, mas mais comumente após o corte da cauda e a castração. Após uma
septicemia transitória, o microrganismo se localiza nas articulações, sem deixar
evidência de infecção no local de entrada. As más condições dos cordeiros no
momento da cirurgia, ou um clima adverso mais tarde, podem predispor a uma alta
taxa de infecção.
Achados clínicos – Na forma aguda, a lesão característica consiste em uma
artrite não supurativa manifesta por calor e dor, mas apenas um inchaço suave nos
tecidos articulares. As articulações mais comumente envolvidas são jarretes, patela,
cotovelo e joelho. Os cordeiros afetados ficam relutantes em se mover, e freqüen-
temente deprime-se severamente o crescimento, mas pode ocorrer recuperação
completa em 2 a 3 semanas. Em , 10 a 15% dos casos, no entanto, a infecção
persiste e desenvolve-se uma artrite crônica com um aumento de volume permanen-
te da articulação. A mortalidade geralmente é baixa, mas alguns cordeiros morrem
de septicemia aguda ou complicações emergentes do decúbito.
Nos surtos que ocorrem após o corte de cauda e a castração, o período de
incubação é acentuadamente constante; os primeiros casos aparecem 9 a 19 dias
após a operação, e praticamente todos os casos subseqüentes se desenvolvem
dentro de 5 dias. A incidência pode atingir 50%, mas na maioria dos surtos ela é < 10%.
Na forma crônica, geralmente não se observam sinais até que os cordeiros
tenham 2 a 6 meses de idade. Tipicamente, afetam-se várias articulações e isso faz
com que os cordeiros apresentem uma andadura rígida.
Diagnóstico – Nos surtos que ocorrem após o corte de cauda e a castração,
pode-se realizar um diagnóstico presuntivo a partir da história e dos sinais clínicos.
Nos casos esporádicos, devem-se tentar o isolamento e a identificação dos
microrganismos a partir das articulações afetadas. Deve-se distinguir a doença da
poliartrite devida a outras bactérias (por exemplo, a artropatia estreptocócica), da
doença dos músculos brancos e das outras causas de claudicação.
Profilaxia e tratamento – Recomendam-se a adoção de técnicas anti-sépticas
rigorosas e a manutenção de condições higiênicas para o corte de cauda e a
castração, mas não se pode confiar unicamente nelas para a prevenção. Os
chamados métodos “incruentos” de realizar ambas as operações podem reduzir as
chances de contaminação do ferimento, mas sabe-se que os surtos se seguem a
todos os métodos comuns. Deve-se considerar a vacinação onde a doença for um
problema recidivante. A melhor terapia consiste na penicilina administrada precoce-
mente na doença aguda, mas esse procedimento não tem valor na forma crônica.
Erisipela 408

CLAUDICAÇÃO PÓS-BANHO DE IMERSÃO NOS O VINOS


É uma celulite e uma laminite emergentes de uma extensão de uma infecção
cutânea focal, causada pela penetração da Erysipelothrix rhusiopathiae através de
pequenas abrasões cutâneas na região do casco. Tem-se descrito essa afecção,
que ocorre normalmente nos surtos, na maioria dos países grandes criadores de
ovinos.
Etiologia – Com o tempo e o uso repetido, as soluções de banho de imersão ou
as suspensões de agentes inseticidas, que possuem pouca ou nenhuma atividade
bacteriostática, se tornam pesadamente carregadas com várias espécies de bacté-
rias. A Erysipelothrix rhusiopathiae é um contaminante comum, e sua presença no
tanque, algumas vezes em número enorme, leva à infecção dos ferimentos
cutâneos durante o banho de imersão. As pequenas abrasões cutâneas na região
do casco e da articulação da quartela correspondem às portas comuns de entrada.
As lesões que se estendem desses ferimentos na perna para as lâminas do casco
causam a claudicação pós-banho de imersão aguda. Também podem ocorrer surtos
quando os ovinos devem andar por meio de áreas lamacentas pesadamente
contaminadas com o microrganismo.
Achados clínicos – Dois a 4 dias após o banho de imersão, um número
variável (até 90%) dos ovinos em um rebanho pode ficar aleijado em uma ou mais
pernas. As pernas afetadas parecem normais, exceto quanto às regiões do casco
e da quartela, que ficam quentes e dolorosas. Mais tarde, ocorre um grau variável
de queda de pêlos, algumas vezes se estendendo até o carpo e tarso. A maioria
dos ovinos se recupera espontaneamente em 2 a 4 semanas sem nada mais sério
que uma suave perda de peso corporal. Em alguns surtos, no entanto, a
mortalidade pode atingir 5% e, particularmente nos ovinos jovens, pode-se perder
muito da condição corporal. As artrites crônica e aguda constituem-se seqüelas
raras.
Profilaxia e tratamento – A adição de sulfato de cobre ao banho de imersão
(0,04%) deve proporcionar um controle efetivo, embora seja melhor se descartar os
banhos de imersão pesadamente contaminados com matéria orgânica. A penicilina
é o antibiótico de escolha, e o tratamento precoce deve acelerar a recuperação.

FEBRE AFTOSA
É uma infecção viral aguda e altamente contagiosa dos animais de cascos
fendidos domésticos e silvestres. A morbidade e a mortalidade são maiores nos
jovens. Inicialmente, se caracteriza por lesões vesiculares; subseqüentemente, por
erosões do epitélio da boca, narinas, focinho, pés, tetas, úbere e pilares ruminais.
Os hospedeiros naturais são bovinos, suínos, ovinos, caprinos, bufalinos, bisões,
veados, antílopes, javalis, renas, lhamas, camuras, alpacas, vicunhas, girafas,
elefantes, cervos-nobres, camelos, capivaras, toupeiras, ratos-silvestres-aquáti-
cos, ratos e ouriços. Experimentalmente, pode-se transmitir o vírus da febre aftosa
(FA) (VFA) para camundongos, cobaias, coelhos, hamsters, ovos de galinha
embrionados, galinhas, chinchilas, ratões-do-banhado, ursos-cinzentos, tatus e
caititus. Os eqüinos são resistentes. O vírus se replica quando inoculado em
macacos, tartarugas, sapos e cobras, mas essas espécies normalmente não
desenvolvem lesões.
A FA é endêmica na Ásia, África, em partes da Europa e na maior parte da
América do Sul. Américas do Norte e Central, Caribe, Austrália, Nova Zelândia e
Febre Aftosa 409

muitas das ilhas da Oceania se encontram livres da FA. A Grã-Bretanha e muitos


outros países da Europa Ocidental, tais como Dinamarca, Noruega e Suécia, se
encontram livres a maior parte do tempo. A Irlanda se encontra livre desde 1941, e
a FA não tem ocorrido no Japão há décadas.
Etiologia – A FA é causada por um enterovírus da família Picornaviridae.
Identificaram-se pelo menos 7 tipos imunologicamente distintos de VFA por meio da
fixação de complemento assim como o A; o O; o C; os Territórios Sul-Africanos (TSA)
1, 2 e 3; e a Ásia 1. Dentro dos 7 tipos, identificaram-se > 60 subtipos antes que o
“World Reference Laboratory” (em Pirbright, Inglaterra) parasse de classificá-los em
uma base seqüencial. Desde , 1980, têm-se identificado novos subtipos em uma
base geográfica. Muitos dos subtipos são suficientemente diferentes antigenicamente
para assegurar a preparação de vacinas subtípicas. O vírus é inativado rapidamente
por meio de um pH baixo ou alto, da luz solar (embora ele possa sobreviver por
longos períodos em fragmentos teciduais) e de altas temperaturas. O vírus não tem
o envelope lipídico, e portanto é resistente ao éter e ao clorofórmio. Os desinfetantes
mais comumente utilizados são hidróxido de sódio, carbonato de sódio e ácido
acético.
Transmissão e epidemiologia – A maior parte da transmissão se dá por meio
de aerossóis, geralmente quando os animais estão em proximidade íntima, embora
haja evidência crescente de que, sob certas condições, o vírus possa se espalhar
pelo vento por até 50km. Demonstrou-se que quando o homem inala os aerossóis
respiratórios dos animais infectados com a FA, o vírus pode persistir no trato
respiratório por até 24h. Durante esse período, torna-se possível a transmissão do
vírus para outras pessoas e animais através da via respiratória. (Existem casos de
FA no homem com registros; no entanto, isso não corresponde a um problema de
saúde pública.)
Os fluidos esofágicos provenientes de animais infectados com a FA podem
conter o vírus antes que apareçam os sinais e as lesões – e também após as lesões
desaparecerem. Os bovinos podem reter o vírus nas células das amígdalas por até
3 anos após a recuperação. Existem evidências circunstanciais de que tais animais
carreadores possam transmitir a infecção quando introduzidos em um rebanho livre
de FA, mas nunca se demonstrou isso experimentalmente.
Pode-se encontrar o VFA em grandes quantidades no leite dos animais infecta-
dos. As temperaturas de pasteurização não destroem o vírus em tais amostras
porque o vírus recebe proteção a partir de restos celulares, gordura e outros
componentes do leite. O vírus vestigial também sobrevive ao processamento de
caseína, caseinato e alguns queijos, mas no caso da caseína e do queijo, ocorre uma
deterioração do vírus após períodos relativamente curtos de armazenamento.
Pode-se transmitir experimentalmente o VFA por meio da inseminação artificial.
Restos de carne e ossos de animais infectados constituem-se freqüentemente na
fonte de infecção dos suínos, que podem então transmitir facilmente a infecção para
bovinos e outros animais. Vários surtos nos EUA se deveram a suínos que foram
alimentados com restos alimentares não cozidos de navios que se abasteceram em
países onde existia FA. Os surtos também se deveram ao uso de produtos biológicos
contaminados, tais como vacinas de cólera suína e de varíola bovina e extrato
hipofisário. Como o vírus se encontra presente em grande parte da pele, a salga, o
secamento e a desinfecção das superfícies dos couros dos animais infectados não
impedem a sobrevivência do vírus. Fora do corpo do animal, as condições variáveis
afetam a sua viabilidade.
Os suínos tendem a excretar mais vírus que os bovinos ou os ovinos. As
manifestações clínicas variam com as cepas do vírus. A doença pode ser difícil de
detectar nos ovinos, mas eles podem transmitir facilmente o vírus para outras
espécies.
Febre Aftosa 410

Patogenia – O local de infecção primário e de replicação inicial comum corres-


ponde às células da membrana mucosa da garganta. A partir daí, o vírus se espalha
para as células adjacentes, entra no sistema circulatório, e depois infecta as outras
células e órgãos suscetíveis por todo o animal. Após 24 a 48h, o animal desenvolve
febre e aparecem vesículas na cavidade bucal, entre as garras e por todos os
lugares. As vesículas se rompem dentro de outras 48h, freqüentemente deixando
uma área desnuda e esfolada. No final da viremia, a febre abaixa e começa a
cicatrização com o desaparecimento gradual das lesões e do vírus, exceto nos
tecidos da garganta, onde o vírus pode persistir por até 3 anos em bovinos, ovinos,
caprinos e outros ruminantes.
Achados clínicos – Inicialmente, os animais podem apresentar embotamento,
inapetência, febre e tremores, seguidos por estalo dos lábios, salivação e agitação
ou coices. Os sinais característicos da FA são salivação, e vesículas nas narinas,
cavidade bucal e entre as garras; no entanto, podem-se observar esses mesmos
sinais em outras doenças vesiculares. Após a formação das vesículas, ocorre uma
acentuação da salivação e da claudicação. Os animais prenhes podem abortar e os
animais jovens podem morrer, especialmente os leitões que estiverem mamando
em uma porca infectada. As lesões em ovinos e caprinos são as mesmas dos
bovinos, mas são menos acentuadas. As lesões secundárias, especialmente nos
pés, podem ser causadas por bactérias.
Podem se desenvolver lesões secundárias crônicas das lesões orais, nasais e
podais. A deformação do casco pode resultar em claudicação permanente. O
envolvimento da glândula mamária pode resultar em mastite e deterioração perma-
nente da produção láctea. São comuns a emaciação prolongada e a falha no ganho
de peso.
Lesões – Podem-se encontrar vesículas ou pústulas na língua, coxim dental,
gengiva, bochecha, palatos mole e duro, lábios, narinas, focinho, coroas dos cascos,
tetas e úbere, bem como no focinho dos suínos, na derme dos dedos rudimentares
e nos espaços interdigitais. Podem-se encontrar lesões em todos os pés, mas
algumas vezes envolve-se apenas 1 ou 2. Nos ovinos, o coxim dental é o local mais
comum para as lesões. À necropsia, podem-se observar lesões nos pilares
ruminais, miocárdio e músculos esqueléticos. O vírus do Tipo C parece ter uma
predileção pelo músculo cardíaco.
Diagnóstico – Em bovinos, ovinos, caprinos e suínos, os sinais clínicos da FA
são indistingüíveis dos da estomatite vesicular (ver pág. 450). O mesmo vale para
o exantema vesicular (ver pág. 469) e a doença vesicular (ver pág. 466) nos
suínos, e para a calicivirose dos mamíferos marinhos (ver pág. 1264). Torna-se
essencial o diagnóstico diferencial por meio de um dos vários métodos laborato-
riais, incluindo fixação de complemento, neutralização viral, precipitação em
ágar-gel e o ELISA. Utiliza-se crescentemente a mensuração das propriedades
físicas e químicas e da “impressão digital” da ribonuclease T-1 para rastrear o
movimento das cepas virais. Desenvolveram-se recentemente sondas de DNA,
marcadas com avidina-biotina, que podem ser úteis para a detecção do vírus nos
produtos dos animais infectados.
Tratamento e controle – Não há cura conhecida, e embora o tratamento possa
aliviar os sinais, ele não impede o alastramento da infecção. A medida preventiva
mais efetiva consiste na proibição da introdução de animais ou de produtos animais
nos países livres de FA a partir de países que possuem a doença, exceto quando
se sabe que o processamento do produto destruiu o vírus.
Individualmente, os países possuem políticas diferentes para o controle da FA.
Devido à capacidade do vírus de se espalhar, obtém-se o melhor controle a partir
de uma base regional, nacional e continental. Nas áreas livres de FA, torna-se
essencial o diagnóstico rápido, seguido por uma quarentena das propriedades
Infecções Fúngicas 411

(incluindo o movimento de pessoas e veículos), seguido pelo abate e pela remoção


das carcaças por meio de incineração ou de enterramento, e pela descontaminação
das propriedades. Após 30 dias, repovoam-se as propriedades com animais-
sentinela suscetíveis que são cuidadosamente monitorados por 30 dias antes que
se permita o repovoamento ao proprietário.
Nos países onde a doença é endêmica, o abate dos animais infectados nem
sempre é possível devido a razões econômicas ou sociais. Nesses casos,
administram-se vacinas. Em alguns países, vacinam-se os bovinos de 1 a 3
vezes/ano. Em muitos países europeus ocidentais, tem-se aplicado vigorosa-
mente a vacinação anual dos bovinos por > 30 anos e, quando ocorrem surtos,
utilizam-se os mesmos processos de erradicação dos países livres de FA.
Sempre que ocorre um surto em um país onde se utilizam vacinas, deve-se isolar
o vírus do surto e tipificá-lo para se determinar se a vacina que está sendo
utilizada contém um antígeno homólogo ao do vírus do campo. Nos outros países
onde não se aplicam vacinas tão rotineiramente, por exemplo, na América do Sul,
geralmente quarentenam-se os animais até que tenham se recuperado e que
todo o rebanho tenha sido revacinado.
Na Europa, os surtos se devem a vacinas inapropriadamente preparadas ou a
uma fuga do vírus do local de produção da vacina. Se for possível o desenvolvimento
de vacinas subunitárias, estas serão mais seguras; têm-se desenvolvido tais
produtos experimentalmente contra vários tipos e subtipos do vírus.

INFECÇÕES FÚNGICAS
(Micoses)

A maioria dos agentes das micoses sistêmicas existe como saprófitas no solo, na
vegetação em decomposição e no estrume e nos tecidos animais ceratinizados. O
reservatório do solo corresponde à fonte primária da maioria das infecções, que
podem ser adquiridas por inalação, ingestão ou introdução traumática dos elemen-
tos fúngicos (ver também DERMATOFITOSE, pág. 954).
Os fungos patogênicos estabelecem a infecção em hospedeiros aparentemente
normais, e consideram-se tais doenças, como histoplasmose, coccidioidomicose e
blastomicose como micoses sistêmicas primárias. Os fungos oportunistas geral-
mente exigem um hospedeiro que esteja debilitado (por exemplo, estresses tais
como cativeiro, acidose metabólica, má nutrição ou uma neoplasia) para estabele-
cer uma infecção. A exposição prolongada a antimicrobianos ou substâncias
imunossupressoras parece aumentar a probabilidade de infecção por parte dos
fungos oportunistas que causam doenças tais como aspergilose, mucormicose,
criptococose e candidíase, que podem ser focais ou sistêmicas. Tem-se descrito a
criptococose em animais aparentemente normais; nesses casos, é possível que se
tenha desprezado algum defeito sutil do hospedeiro (possivelmente na imunidade
mediada por células).
Os achados clínicos e as lesões macroscópicas não são definitivamente diagnós-
ticos de micoses sistêmicas; exigem-se estudos microscópicos ou culturais ou
ambos. A identificação do fungo e da reação tecidual por meio de um exame
microscópico dos exsudatos e do material de biópsia é adequada para o diagnóstico
de histoplasmose, criptococose, blastomicose, coccidioidomicose e rinosporidiose.
Outras doenças, tais a candidíase, aspergilose e mucormicose, exigem tanto o
isolamento cultural como a avaliação microscópica para um diagnóstico definitivo.
Infecções Fúngicas 412

Esses fungos também são contaminantes comuns de cultura; conseqüentemente,


devem-se demonstrar a invasão e a reação teciduais para tornar significativo o
isolamento cultural. A sorologia e os testes cutâneos com antígenos específicos
podem ser úteis para o diagnóstico (e o prognóstico) de algumas doenças micóticas,
tais como histoplasmose e coccidioidomicose.
Nenhum agente quimioterápico disponível dá resultados consistentemente
satisfatórios contra as micoses sistêmicas. Utiliza-se mais freqüentemente a
anfotericina B, mas ela é nefrotóxica; os gatos são menos tolerantes que os
cães. Também se utilizam miconazol, cetoconazol e flucitosina (fluorocitosina 5).
Utiliza-se a última droga raramente como um agente único, mas acredita-se que
ela possa ser sinergística em combinação com a anfotericina B contra algumas
infecções fúngicas.

ASPERGILOSE
É uma doença induzida por vários Aspergillus spp, especialmente a A.
fumigatus. É encontrada mundialmente em quase todos os animais domésticos
e aves assim como em muitas espécies silvestres. É primariamente uma
infecção respiratória que pode se tornar generalizada; no entanto, a predileção
tecidual varia entre as espécies animais. As formas mais comuns são infecções
pulmonares em aves domésticas e outras aves, aborto micótico em bovinos,
micose da bolsa gutural em eqüinos e infecções nos tecidos nasais e paranasais
de cães. Têm-se descrito formas pulmonares e intestinais nos gatos domésticos,
com a maioria dos casos intestinais sendo associada com a enterite infecciosa
felina.
Achados clínicos e lesões – Nas aves, a aspergilose (ver pág. 1956) é
primariamente broncopulmonar, com dispnéia, respiração ofegante e polipnéia
acompanhadas por sonolência, anorexia e emaciação. Observam-se torcicolos e
distúrbios de equilíbrio quando a infecção se dissemina para o cérebro. Ocorrem
nódulos amarelos de tamanho e consistência variáveis ou lesões em placa nas vias
respiratórias, pulmões, sacos aéreos ou membranas das cavidades corporais.
Podem-se encontrar fungos de crescimento semelhante a pêlos nas paredes
espessadas dos sacos aéreos. As outras espécies com aspergilose broncopulmo-
nar podem apresentar lesões nodulares nos pulmões, ou uma pneumonia aguda
acompanhada por um fluido serossanguinolento na cavidade pleural e por uma
pleurite fibrinosa.
Nos ruminantes, a aspergilose pode ser assintomática, ocorrer em uma forma
broncopulmonar ou causar placentite e aborto. A pneumonia micótica pode ser
rapidamente fatal. Os sinais incluem pirexia; respiração estertorosa, superficial e
rápida; descargas nasais e uma tosse úmida. Os pulmões ficam firmes, pesados e
mosqueados, e não sofrem colapso. Na pneumonia micótica aguda a crônica, os
pulmões contêm múltiplos granulomas discretos e a doença lembra macroscopica-
mente uma tuberculose.
Na ausência de pneumonia, as vacas infectadas geralmente não apresentam
nenhum sinal exceto o aborto; aborta-se um feto morto entre o sexto e o nono meses,
e retêm-se as membranas fetais. Encontram-se lesões no útero, nas membranas
fetais e freqüentemente na pele fetal. No útero, as áreas intercarunculares ficam
macroscopicamente espessadas, coriáceas e vermelho-escuras a castanhas, e
contêm focos elevados ou erodidos, cobertos por uma pseudomembrana aderente
cinza-amarelada. As carúnculas maternas ficam vermelho-escuras a castanhas, e
os cotilédones fetais aderentes ficam acentuadamente espessados. As lesões
cutâneas nos fetos abortados consistem em focos discretos, macios, elevados e
avermelhados a cinzentos, que lembram uma tinha.
Infecções Fúngicas 413

Nos eqüinos, a epistaxe e a disfagia correspondem a complicações comuns


da micose das bolsas guturais (ver também pág. 896). Ela se caracteriza por uma
inflamação necrosante da bolsa gutural, que fica espessada, hemorrágica e
recoberta por uma pseudomembrana friável. Podem ocorrer distúrbios locomotores
e visuais, incluindo cegueira, quando a infecção se espalha para o cérebro e o
nervo óptico.
Nos cães, a aspergilose é geralmente causada pela A. fumigatus; ela afeta as
câmaras nasais e os seios paranasais, mas podem ocorrer lesões em vários órgãos,
incluindo o olho. Ela ocorre principalmente nas raças dolicocefálicas, e começa na
região posterior do maxiloturbinado ventral com sinais de letargia, espirros, descar-
ga nasal sero a mucopurulenta uni ou bilateral, e freqüentemente epistaxe. Os cães
com aspergilose ocular apresentam achados fundoscópicos compatíveis com
endoftalmite. As lesões macroscópicas variam consideravelmente com o local da
infecção, mas a mucosa dos seios nasais e paranasais pode se recobrir por uma
camada de material necrótico negro-acinzentado e pelo crescimento fúngico. A
mucosa e o osso subjacente podem ficar necróticos com a perda da definição óssea
nas radiografias.
Descreve-se crescentemente a doença disseminada nos cães, sem o envol-
vimento aparente do trato respiratório. A maioria dos casos tem ocorrido nos
pastores alemães e envolve aspergilos incomuns (por exemplo, a A. terreus e
a A. deflectus).
Diagnóstico – Como os aspergilos são muito comuns e são freqüentemente
isolados a partir de lesões não aspergílicas, torna-se difícil o diagnóstico por cultura;
devem-se confirmar os resultados positivos por meio da demonstração de hifas
estreitas, hialinas, septadas e ramificadas no interior das lesões. O teste de difusão
dupla no ágar gel para os anticorpos séricos consiste em uma técnica confiável para
o diagnóstico; a potencialização da sensibilidade pode se tornar possível com
técnicas tais como o ELISA. Podem-se utilizar procedimentos imunofluorescentes
para identificar as hifas nas secções teciduais.
Tratamento – Têm-se utilizado várias técnicas cirúrgicas e regimes de drogas
com sucesso variável. Têm-se utilizado a exposição cirúrgica e a curetagem na
aspergilose nasal canina e na guturomicose eqüina. As drogas utilizadas incluem
tiabendazol, flucitosina e anfotericina B.

CANDIDÍASE
É uma doença mucocutânea localizada, distribuída mundialmente em vários
animais, e causada por espécies de fungo semelhante a uma levedura, Candida
spp, mais comumente a C. albicans. O fungo é um habitante comum da mucosa oral
e é parte da flora do trato gastrointestinal. O microrganismo infecta mais freqüente-
mente as aves (ver pág. 1893), nas quais envolve mucosa oral, esôfago e papo. As
infecções são raras em cães, gatos e eqüinos. No entanto, considera-se o Candida
spp uma causa da mastite e do aborto bovinos, e descrevem-se infecções vaginais,
cutâneas, gastrointestinais e orais na maioria dos animais domésticos e nos
primatas não humanos. Pode ocorrer a disseminação para os outros órgãos. As
infecções são mais comuns nos animais jovens, e freqüentemente se seguem a
alguma causa predisponente ou fator debilitante, tal como a má nutrição ou uma
terapia antibacteriana ou imunossupressora extensa.
Achados clínicos e lesões – Os sinais são variáveis e inespecíficos e podem
estar associados mais com as situações primárias ou predisponentes do que com
a própria candidíase. Os bezerros com candidíase pré-estomacal apresentam
diarréia aquosa, anorexia e desidratação, com progressão gradual para prostração
e morte. Os pintos afetados ficam apáticos e apresentam uma redução do consumo
Infecções Fúngicas 414

alimentar e da velocidade de crescimento. A candidíase suína afeta as mucosas


oral, esofágica e gástrica, com diarréia e emaciação sendo os sinais mais consis-
tentes.
As lesões macroscópicas da pele e das mucosas são geralmente massas
brancas recobertas com crostas, únicas ou múltiplas, elevadas e circulares. O
microrganismo pode penetrar no epitélio ceratinizado e causar um espessamento
ceratinoso acentuado das mucosas da língua, esôfago e rúmen. Nas aves, as lesões
esofágicas e do papo correspondem a úlceras circulares e brancas com crostas
superficiais elevadas que produzem o espessamento da mucosa; torna-se comum
uma pseudomembrana facilmente removida.
Diagnóstico – Os microrganismos fúngicos são numerosos no tecido epitelial
em proliferação, e pode-se obter um diagnóstico por meio do exame dos raspados
ou dos espécimes de biópsia das lesões mucocutâneas. A Candida albicans é uma
célula de levedura (2 a 4µm de diâmetro), ovóide, com brotos e com paredes finas,
ou ocorre em cadeias que produzem pseudo-hifas quando os blastosporos perma-
necem presos após a divisão por brotamento. Hifas verdadeiras, regulares e
filamentosas também podem se tornar visíveis. As células fúngicas ficam geralmen-
te limitadas ao tecido epitelial e raramente se estendem profundamente.
Tratamento – A pomada de nistatina ou a aplicação tópica de anfotericina B ou
de solução de iodo a 1% podem ser úteis no tratamento da candidíase oral ou
cutânea. Alguns imidazóis (por exemplo, o miconazol e o cetoconazol) podem ser
superiores à nistatina.

CROMOMICOSE
É uma infecção cutânea ou subcutânea crônica causada por um entre vários
gêneros e espécies de fungos negros ou castanhos da família Dematiaceae.
Podem-se agrupar as infecções em síndromes clinicopatológicas: cromomicose
superficial, cromoblastomicose e cromo-hifomicose (feo-hifomicose). Não se des-
creveu a cromomicose superficial, infecção do estrato córneo por fungos pigmenta-
dos, nos animais domésticos. A cromoblastomicose se caracteriza pela presença de
formas septadas esféricas do fungo (células muriformes) na derme. Na cromo-
hifomicose, as formas fúngicas pigmentadas são hifas sem células muriformes
óbvias. Também se têm associado os fungos dematiáceos com os micetomas (ver
pág. 421).
Os fungos da cromomicose são microrganismos saprofíticos, largamente distri-
buídos e encontrados no solo, água e matéria vegetal em decomposição. Pode
resultar infecção da implantação fúngica no tecido no local do ferimento. A lista de
patógenos descritos aumenta rapidamente; os aspectos taxonômicos dos fungos
causadores estão em constante modificação.
Achados clínicos e lesões – Tem-se descrito a cromo-hifomicose em vacas,
gatos, eqüinos e cães, nos quais se isolaram fungos tais como Bipolaris spicifera
(Drechslera spiciferum ), Exophiala jeanselmi e Phialophora verrucosa . Encon-
tram-se massas subcutâneas com aumento de tamanho lento na cabeça, mucosa
nasal, membros e peito. Os nódulos podem ulcerar e apresentar tratos fistulosos
drenantes. Esses piogranulomas contêm hifas septadas e pigmentadas com
aumentos irregulares e formas semelhantes a leveduras, com brotos e paredes
finas, e com alguns fungos clamidosporos. Tem-se isolado a Xylophypha bantiana
(Cladosporium trichoides ) a partir de lesões mais profundas (SNC e rins) em
gatos e cães.
Também se tem descrito a cromomicose que envolve tanto tecidos cutâneos
como mais profundos em sapos, jabutis, lagostas e várias espécies de peixes – os
fungos causadores mais comuns são Cladosporium spp, Exophiala spp (por
Infecções Fúngicas 415

exemplo, E. pisciphila e E. salmonis), Phoma herbarum e Scolecobasidium humicola


(possivelmente Dactylaria spp). Tem-se atribuído à Dactylaria constricta (gallopava)
a doença no SNC em várias espécies aviárias.
Diagnóstico – As características clínicas da cromomicose são tais que o
diagnóstico diferencial deve incluir neoplasias, outros granulomas e cistos
epidermóides. Nos cortes histológicos, tem-se confundido essa doença com os
micetomas eumicóticos causados pelos fungos dematiáceos. Na cromo-
blastomicose, observam-se grupos de células muriformes tanto no interior de
células gigantes como extracelularmente. Pode-se diagnosticar a cromo-
hifomicose a partir do exame microscópico do exsudato e das amostras de
biópsia, o que revela hifas filamentosas hialinas ou pigmentadas (2 a 6µm de
diâmetro), com vesículas terminais e intercaladas (clamidoconídios 6 a 12µm) e
esporos. Não se podem identificar os vários fungos causadores a partir de suas
características histológicas nos tecidos; exige-se um isolamento cultural. Podem-
se identificar os microrganismos em cortes histológicos corados com imunoglo-
bulinas conjugadas com isotiocianato de fluoresceína específicas para o agente
fúngico em particular.
Tratamento – Na maioria dos casos, confina-se a infecção à pele e aos tecidos
subcutâneos. Quando em uma localização favorável, pode-se efetuar a cura por
meio de uma larga excisão da lesão. Pode-se considerar para o tratamento uma
quimioterapia de combinação com a administração local de anfotericina B e o uso
sistêmico de fluorocitosina. No laboratório, muitos agentes da cromomicose pare-
cem resistentes à anfotericina B; o cetoconazol, que tem sido utilizado com
benefícios no homem, pode ser de valor em tais casos.

COCCIDIOIDOMICOSE
É uma infecção não contagiosa e originária da poeira, causada pelo fungo
dimórfico Coccidioides immitis. As infecções se limitam às regiões áridas do
sudoeste dos EUA e às áreas semelhantes do México e das Américas Central e
do Sul. Embora muitas espécies de animais (inclusive o homem) sejam suscetí-
veis, apenas os cães são afetados significativamente. Ruminantes e suínos
podem apresentar infecções subclínicas com lesões restritas aos focos nos
pulmões e nos linfonodos do tórax. A inalação dos esporos fúngicos corresponde
ao único modo de infecção estabelecido, e podem-se transmitir os esporos por
partículas de pó. A maioria das infecções bovinas são contraídas nos rebanhos
de engorda poeirentos.
Achados clínicos e lesões – A doença varia de inaparente ou benigna (bovinos,
ovinos, suínos, cães e gatos) a progressiva, disseminada e fatal (cães, primatas não
humanos e raramente gatos e o homem). A coccidioidomicose primariamente é uma
doença respiratória crônica, mas as infecções caninas se disseminam a vários
tecidos, incluindo os olhos e os ossos. Conseqüentemente, os sinais clínicos podem
variar enormemente, dependendo do envolvimento dos órgãos e da severidade da
infecção. Os cães com doença disseminada podem apresentar tosse crônica,
anorexia, caquexia, claudicação, aumento das articulações, febre e diarréia intermi-
tente. Pode ocorrer disseminação para a pele com ulceração drenante, mas a
infecção primária por meio da pele é rara.
As lesões macroscópicas podem se limitar aos pulmões, mediastino e linfonodos
do tórax, ou se disseminar para vários órgãos. As lesões são nódulos discretos e de
tamanho variável, com uma superfície de corte, branco-acinzentada e firme e que
lembra a da tuberculose. Os nódulos são piogranulomas compostos de células
gigantes e epitelióides, e o centro de alguns focos pode conter exsudato purulento
e microrganismos fúngicos. Algumas lesões podem apresentar focos mineralizados.
Infecções Fúngicas 416

Diagnóstico – Nas áreas endêmicas, deve-se considerar a coccidioidomico-


se nos cães com doença broncopulmonar crônica, e quando se encontram
nódulos pulmonares e linfonodos aumentados nas radiografias torácicas. As
lesões são piogranulomas que contêm a C. immitis livre no exsudato e nas
células gigantes multinucleadas e epitelióides. Os microrganismos variam em
tamanho e aparecem como esférulas relativamente grandes (20 a 80µm, até
200µm) com uma parede de contorno duplo. As esférulas maduras (esporângios)
contêm endosporos (esporangiósporos) de 2 a 5µm de diâmetro. Estabelece-se
o diagnóstico por meio da demonstração de esférulas nos tecidos. Um teste
cutâneo de coccidioidina positivo (inchaço com edema ou endurecimento pre-
sentes no local de teste 48h após a injeção) indica exposição. Para se realizar
o teste, injeta-se intradermicamente 0,1mL de coccidioidina não diluída na borda
inferior da pele do flanco. Devem-se restringir as tentativas de cultura do fungo
aos laboratórios equipados para manipular culturas tão perigosamente infec-
tantes.
Tratamento – A anfotericina B é a droga de escolha. Tem-se utilizado o
cetoconazol no homem e essa droga pode ser de valor em outras espécies.

CRIPTOCOCOSE
É uma doença fúngica sistêmica que pode afetar pulmões, SNC e pele,
particularmente na face e pescoço de gatos e cães. O fungo causal, a
Cryptococcus neoformans (teleomorfo: a Filobasidiella neoformans ), existe no
ambiente e nos tecidos em forma de levedura. Embora a infecção ocorra
mundialmente, não há áreas endêmicas conhecidas, veterinárias ou humanas.
O fungo é encontrado no solo e estrume dos galináceos, em especialmente em
dejetos de pombos. A transmissão se dá por inalação dos esporos ou por
contaminação dos ferimentos. Nos dejetos aviários, pode ocorrer uma forma
não encapsulada tão pequena quanto 1µm, que pode ser inalada nas porções
mais profundas dos pulmões. A criptococose é mais comum em cães e gatos,
mas também ocorre em bovinos, eqüinos, ovinos, caprinos, aves e animais
silvestres. No homem, muitos casos se encontram associados com uma
resposta imunomediada por células defeituosa; provavelmente, o mesmo vale
para os animais inferiores.
Achados clínicos e lesões – A infecção se torna freqüentemente dissemina-
da, e os sinais inespecíficos e variáveis dependem do envolvimento dos órgãos.
As lesões são comuns nos pulmões, SNC e regiões faciais, especialmente nas
mucosas oral e nasal, mas também podem ocorrer na mucosa faríngea e nos
seios craniais. Essas lesões se acompanham por tosse, espirros, descargas
oculares e nasais e pela presença de massas em expansão. Com a infecção do
SNC, os sinais incluem ataxia, alterações no comportamento, andadura em
círculos, disfunção locomotora e cegueira, as últimas devidas a lesões no cérebro
ou nos globos oculares ou em ambos. As lesões cutâneas são nodulares,
geralmente ulceradas e acompanhadas pelo inchaço dos tecidos moles. Tem-se
encontrado a criptococose bovina apenas nos casos de mastite, e muitas vacas
em um rebanho podem estar infectadas. As vacas infectadas apresentam
anorexia, diminuição do fluxo de leite, inchaço e firmeza dos quartos afetados e
aumento dos linfonodos supramamários. O leite pode se tornar viscoso, mucóide
e branco-acinzentado, ou pode ficar aquoso com flocos. A doença nos eqüinos
consiste quase invariavelmente é uma enfermidade respiratória com crescimen-
tos obstrutivos nas cavidades nasais.
As lesões na pele, pulmões e SNC são em geral grosseiramente viscosas, líticas
e císticas e observam-se microscopicamente vários blastosporos criptocócicos. As
Infecções Fúngicas 417

meninges severamente afetadas parecem espessadas. Freqüentemente, ocorre


pouca resposta tecidual com um número pequeno a moderado de leucócitos
mononucleares, mas algumas lesões são granulomas. No tecido, especialmente no
cérebro e meninges, o fungo se multiplica para formar cistos ocupados por células
fúngicas e suas cápsulas mucóides.
Diagnóstico – Deve-se considerar a criptococose em cães e gatos com doença
respiratória e no SNC, especialmente quando se encontram presentes ulcerações
cutâneas e inchaços nodulares. A natureza lítica, mucóide e viscosa das lesões é
altamente sugestiva; pode-se confirmar o diagnóstico por meio do exame microscó-
pico dos tecidos, fluidos corporais e líquido cerebrospinhal. Os microrganismos são
pálidos, redondos a ovais, de 5 a 20µm de diâmetro, com brotos, uma parede fina
e uma larga cápsula rica em mucina que não é corada por cortes de H/E. Os
microrganismos também podem se fazer presentes nos tecidos como pseudo-hifas
alongadas. Nas preparações de tinta da Índia, as largas cápsulas mucinosas
aparecem como esferas claras e não coradas em um fundo negro. Pode-se
identificar a levedura encapsulada por meio de um reagente específico FI para a
C. neoformans.
Tratamento – O tratamento é de pouco valor em infecções disseminadas,
especialmente as que apresentarem envolvimento cerebral, meníngeo e bronco-
pulmonar. Podem-se remover cirurgicamente as lesões cutâneas focais sem
disseminação. Podem-se utilizar a anfotericina B e a fluorocitosina-5 em combi-
nação em cães e gatos. Tem obtido sucesso o tratamento da criptococose felina
confinada às vias nasais e pele com flucitosina oral ou com altas doses prolon-
gadas de cetoconazol.

ENTOMOFTOROMICOSE
(Basidiobolomicose, Conidiobolomicose)
É primariamente uma infecção da mucosa nasal e tecido subcutâneo dos eqüinos
e raramente dos outros animais, causada por Conidiobolus coronatus (Entomophthora
coronata) ou Basidiobolus ranarum (haptosporus). Esses fungos comuns se encon-
tram presentes no solo e na vegetação em decomposição e, no caso dos basidiobolos,
nos tratos gastrointestinais de anfíbios, répteis e macródeos. A Conidiobolus
coronatus é um importante patógeno dos insetos. Descreveu-se uma infecção na
qual as lesões granulomatosas ulcerativas continham núcleos de tecido necrótico
(cancros).
Achados clínicos e lesões – Os granulomas ulcerativos da membrana mucosa
das narinas ou da boca, ou os crescimentos nodulares da mucosa nasal e dos lábios
causados pela C. coronatus podem causar bloqueio mecânico, resultando em
dispnéia e descarga nasal. As lesões causadas por B. ranarum são nódulos
grandes, geralmente únicos, circulares, ulcerativos e pruriginosos da região supe-
rior do corpo. Os tratos fistulosos drenam um fluido serossanguinolento a partir das
lesões, que se encontram freqüentemente traumatizadas. A extensão aos linfono-
dos regionais resulta em inchaço dos nódulos e desenvolvimento de focos necróticos
amarelados. As lesões podem conter um núcleo central, amarelado e cremoso de
tecido necrótico. A basidiobolomicose disseminada é rara, mas foi descrita em cães
e em um mandril.
Nos tecidos excisados ou nas amostras de necropsia, uma derme fibrótica
espessada apresenta áreas branco-cremosas ou avermelhadas disseminadas. As
lesões, que contêm formas hifais, um infiltrado abundante de eosinófilos e áreas
sequestradas de necrose, apresentam características histológicas de granulomas
infecciosos.
Infecções Fúngicas 418

Diagnóstico – Clinicamente, pode-se confundir a entomoftoromicose com a


habronemíase cutânea (ver pág. 976) e a oomicose (ver pág. 422), mas pode-se
diferenciá-la por meio do exame microscópico dos tecidos. Nos cortes corados com
H/E, o fungo aparece como buracos e canais alongados, e muitas hifas apresentam
uma bainha eosinofílica; nos cortes corados para o fungo, o microrganismo consiste
de grandes hifas ramificadas, e algumas vezes septadas, com 4 a 8µm. Exige-se o
exame cultural para a identificação do fungo causador. Distingue-se a entomofto-
romicose da oomicose por meio das diferenças na distribuição anatômica, e por
meio do lento crescimento da lesão, da penetração mais rasa e do menor número
e tamanho dos focos necróticos da entomoftoromicose.
Tratamento – A excisão cirúrgica, a imunoterapia, ou ambas, têm obtido
sucesso. A imunoterapia consiste em injeções intradérmicas de 0,02 a 0,1mL de
material fúngico micronizado. Tem-se tratado a doença micótica localizada com a
anfotericina B administrada sistêmica ou localmente ou ainda por ambas as formas.
Teoricamente, o tratamento inclui uma remoção cirúrgica inicial da lesão, seguida
pela administração de anfotericina B. O cetoconazol tem sido ativo in vitro contra o
fungo causador.

LINFANGITE EPIZOÓTICA
É uma doença granulomatosa e crônica da pele, vasos linfáticos e linfonodos dos
membros e do pescoço dos Equidae, causada pelo fungo dimórfico Histoplasma
farciminosum. A doença ocorre nas áreas do Oriente e do Mediterrâneo, mas é
desconhecida nos EUA. O fungo forma micélios na natureza e leveduras nos tecidos,
e possui uma fase saprófita no solo. A infecção é adquirida provavelmente pela
infecção de um ferimento ou pela transmissão por insetos sugadores de sangue.
Achados clínicos e lesões – Clinicamente, a doença se caracteriza por nódulos
cutâneos livremente móveis. Esses nódulos se originam dos vasos e nódulos
linfáticos superficiais infectados, e tendem a ulcerar e passar por períodos alterna-
dos de drenagem e fechamento. Os linfonodos afetados aumentam de volume e
endurecem. A pele que recobre os nódulos pode se espessar, endurecer e se fundir
com os tecidos subjacentes. As lesões também podem se fazer presentes nos
pulmões, conjuntiva, córnea, mucosa nasal e outros órgãos. Os nódulos são
piogranulomas que apresentam uma cápsula fibrosa grossa e contêm pus cremoso
e espesso e os microrganismos causadores.
Diagnóstico – As características clínicas são altamente sugestivas, e pode-se
confirmar o diagnóstico por meio do exame microscópico dos exsudatos e dos
espécimes de biópsia. As formas de levedura do microrganismo distendem o
citoplasma dos macrófagos e aparecem nos cortes em H/E como corpúsculos ovais
ou globosos de 3 a 4µm, com um corpúsculo basofílico central circundado por uma
zona não corada. O microrganismo lembra muito a H. capsulatum.
Tratamento – Não se conhece nenhum tratamento completamente satisfatório.
Pode-se utilizar a excisão cirúrgica das lesões combinada com drogas antifúngicas
(anfotericina B).

GEOTRICOSE
É uma micose rara devida a uma infecção por Geotrichum candidum, um
saprófita comum do solo e da matéria orgânica em decomposição. O microrganismo
causa uma doença sistêmica em cães, aborto e mastite bovinos, nódulos caseosos
nos linfonodos de suínos, e tem sido isolado a partir de fezes de animais com
enterite, de lesões cutâneas em vários animais e aves e do sistema respiratório de
eqüinos, pingüins, galinhas e do homem.
Infecções Fúngicas 419

Achados clínicos e lesões – Os sinais clínicos variam com o envolvimento


dos órgãos e podem ser inespecíficos. Um cão com geotricose disseminada tem
febre, tosse não produtiva, distúrbio respiratório, anorexia e vômito. Os achados
radiográficos incluem as densidades nodulares com confluência em algumas
regiões dos pulmões. Na geotricose disseminada, as lesões se encontram em
vários órgãos e consistem de nódulos carnudos, firmes, múltiplos e amarelo-
acinzentados, que correspondem microscopicamente a granulomas bem defi-
nidos.
Diagnóstico – O diagnóstico definitivo se baseia em características culturais e
microscópicas. Os elementos fúngicos podem ser abundantes, tanto livres como no
interior dos macrófagos e das células gigantes multinucleadas, na forma de células
ovóides, semelhantes a leveduras (3 a 7µm de diâmetro) e como cadeias curtas e
unidas de células de leveduras redondas formando as pseudo-hifas. Nos cortes
histológicos dos tecidos corados com H/E, a G. candidum lembra a Candida
albicans e a Histoplasma capsulatum.
Tratamento – A nistatina administrada como suspensão oral foi efetiva no
tratamento de gorilas com diarréia aquosa associada ao isolamento da G. candidum
a partir de amostras fecais úmidas.

HISTOPLASMOSE
É uma doença granulomatosa, disseminada, não contagiosa e crônica do
homem e dos outros animais, causada pelo fungo dimórfico Histoplasma capsulatum.
O fungo habita o solo, onde se reproduz assexuadamente; encontra-se comumente
no solo que contém estrume de morcegos e aves. Produz crescimento miceliano no
solo e em culturas a temperatura ambiente; cresce em forma de levedura nos tecidos
e nas culturas, a 37°C.
Encontra-se a histoplasmose por todo o mundo. As áreas endêmicas nos EUA
incluem os vales dos rios Mississipi e Ohio e a cadeia dos montes Apalaches.
Descreveu-se a infecção em muitas espécies animais, mas a doença é incomum a
rara em todos os animais, menos em cães e gatos. A infecção ocorre comumente
por meio da contaminação por aerossol do trato respiratório (raramente oral), e
pulmões e linfonodos do peito são os locais da infecção primária. Os microrganis-
mos entram na circulação sangüínea a partir de um foco primário e se disseminam
por todo o organismo; podem se localizar no olho e produzir coriorretinite ou
endoftalmite.
Achados clínicos e lesões – Os sinais variam e são inespecíficos, refletindo o
envolvimento dos vários órgãos. Muitos cães apresentam um curso prolongado de
perda de peso a emaciação, tosse crônica, diarréia persistente, febre, anemia,
hepatomegalia, esplenomegalia, linfadenopatia e ulceração gastrointestinal e
nasofaríngea. Também se tem descrito nos cães uma dificuldade respiratória
obstrutiva devida a uma linfadenopatia traqueobrônquica. A disseminação pode
envolver a pele, na qual se desenvolvem lesões nodulares exsudativas e ulceradas.
A histoplasmose aguda pode ser fatal após 2 a 5 semanas.
As lesões macroscópicas incluem aumento do fígado, baço e linfonodos
mesentéricos; ascite; nódulos amarelo-esbranquiçados de tamanhos variados nos
pulmões; e aumento dos linfonodos brônquicos. O fígado aumentado pode apresen-
tar focos de inflamação granulomatosa dispersos, múltiplos, amarelo-pálidos e de
forma irregular. Os focos pálidos podem se fazer presentes no miocárdio, e o
intestino delgado pode apresentar paredes acinzentadas e espessadas e ulceração
da mucosa.
Diagnóstico – Devem-se considerar a histoplasmose e outras infecções fúngi-
cas quando os sinais clínicos incluem distúrbios respiratórios, diarréia, aumento dos
Infecções Fúngicas 420

linfonodos brônquicos e nódulos pulmonares. Pode-se obter informação diagnósti-


ca adicional por meio da injeção de 0,1mL de histoplasmina na pele da face inferior
do flanco. Considera-se uma área de edema ou de endurecimento (≥ 5µm) no local
de teste a 48h da aplicação como uma resposta positiva. Pode-se confirmar o
diagnóstico por meio do exame microscópico de fluidos ou de exsudatos a partir de
lesões cutâneas ou de amostras de biópsia. As formas de levedura nos macrófagos
e nas células gigantes são estruturas redondas a ovóides (1 a 4µm) com uma parede
celular fina e rosada (H/E) e uma zona clara e delgada entre a parede e o citoplasma
celulares. Podem-se visualizar facilmente os microrganismos com corantes para
glicogênio.
Tratamento – O tratamento pode ser sintomático ou mais específico, utilizando an-
fotericina B ou cetoconazol. A histoplasmose aguda e disseminada geralmente é
fatal.

MUCORMICOSE
É uma categoria de infecções por fungos da ordem Mucorales, gêneros Mucor,
Absidia, Rhizopus e Mortierella. O termotolerante mais patogênico Mucor spp hoje
é classificado em um “novo” gênero, o Rhizomucor . Esses fungos monomórficos
comuns são habitantes normais do solo, estrume e vegetação apodrecida. As
infecções são freqüentemente oportunistas e secundárias a distúrbios tais como a
acidose metabólica e a imunossupressão. Os fungos causam lesões granulomato-
sas nos vários órgãos das várias espécies, incluindo bovinos, suínos, ovinos,
eqüinos, cães, gatos, vários animais silvestres (incluindo primatas não-humanos,
roedores e aves) e homem. As lesões podem ser focais, envolvendo superfície
corporal, linfonodos e porções do trato gastrointestinal; ou a doença pode se
disseminar com lesões em vários órgãos. A mucormicose é particularmente impor-
tante como causa de placentite e aborto nos Bovidae.
Achados clínicos e lesões – Os sinais são geralmente inespecíficos e refletem
o envolvimento dos órgãos. Alguns animais com lesões focais ou disseminadas
podem ser assintomáticos. Outros, com pneumonia, podem apresentar respiração
estertorosa, superficial e rápida; descarga nasal; efusão pleural e pleurite. A
mucormicose sistêmica pode causar anorexia, pirexia e diarréia persistente; têm-se
seguido distúrbios neurológicos após o envolvimento cerebral.
As lesões nodulares nos linfonodos, fígado, pulmões e rins (suínos e bovinos)
são brancas a amareladas e sólidas a cavitárias. Nos bovinos mais velhos os
linfonodos afetados parecem tuberculosos: os nódulos são amarelados, grosseira-
mente aumentados, caseocalcificados e fibróticos. Em outra forma da doença,
encontram-se úlceras circulares a ovais nos pré-estômagos e abomaso dos bovinos
e no trato gastrointestinal dos suínos.
Diagnóstico – O diagnóstico ante mortem é incomum; muitos casos são
assintomáticos ou os sinais são inespecíficos. Pode-se diagnosticar a mucormicose
microscopicamente por meio da demonstração de hifas irregulares, não septadas,
ramificadas e largas (10 a 20µm de largura) e da reação tecidual esperada, com
invasão arterial, trombose e necrose. Podem-se identificar os fungos em cortes
teciduais por meio de técnicas de imunofluorescência, que utilizam antiglobulinas
fluoresceínicas específicas para cada gênero dos Mucorales. Exigem-se estudos
culturais para a identificação da espécie de fungo infectante, e deve-se isolar o
mesmo fungo a partir de várias amostras da carcaça. A sorologia é útil no diagnóstico
do aborto bovino causado por Mortierella wolfii.
Tratamento – Pode-se combinar a excisão cirúrgica das lesões superficiais
focais com a administração local de anfotericina B. No entanto, não se conhece
nenhum tratamento completamente satisfatório.
Infecções Fúngicas 421

M ICETOMAS
Dois tipos diferentes de micróbios – actinomicetos e fungos – causam
tumores granulomatosos no tecido subcutâneo, que podem se espalhar
localmente para envolver o osso. Os agentes causadores dos micetomas
eumicóticos (fúngicos) incluem vários fungos geofílicos saprofíticos, incluindo
Acremonium spp, Curvularia geniculata, Madurella grisea e Scedosporium
( Monosporium ) apiospermum (o estado assexual da Pseudallescheria
[ Petriellidium, Allescheria ] boydii ).
Nas lesões, os micélios fúngicos proliferam e se organizam em agregados
conhecidos como grânulos ou grãos. Nesses grânulos, o micélio fica compacto
e freqüentemente bizarro e distorcido em sua forma. Os clamidosporos são
freqüentes, especialmente na periferia, e o micélio pode ou não se incrustar
em uma substância amorfa semelhante a cimento. Histologicamente, os
grânulos ficam freqüentemente circundados por depósitos eosinofílicos. Os
grânulos podem ter várias cores e tamanhos, dependendo da espécie de
fungo envolvida.
Os casos confirmados de micetomas em não humanos são raros. O cão é a
vítima principal do dematiáceo C. geniculata, o principal agente etiológico. A
Scedosporium apiospermum pode ser um agente causal subestimado. O
tratamento primariamente é limitado à cirurgia; a quimioterapia com drogas não
tem sido efetiva.

BLASTOMICOSE NORTE-AMERICANA
É uma doença causada pelo fungo dimórfico Blastomyces dermatitidis, caracte-
rizada por lesões piogranulomatosas em vários tecidos. É mais comum no homem
e nos cães, mas também é descrita em gatos e eqüinos e em espécies tão
largamente divergentes quanto o leão africano, o golfinho-de-nariz-de-garrafa e o
leão-marinho. Parece não ser uma doença de bovinos, ovinos ou suínos. A
blastomicose geralmente se limita à América do Norte, e a maioria dos casos ocorreu
no sistema do rio Mississipi e ao redor dos Grandes Lagos. A sua patogenia não está
claramente definida, mas a porta de entrada primária é o trato respiratório por meio
da inalação de esporos a partir de um local de crescimento fúngico saprofítico. As
lesões cutâneas podem resultar de uma entrada primária através da pele, ou, mais
comumente, por disseminação de um foco pulmonar.
Achados clínicos e lesões – Os sinais variam com o envolvimento dos órgãos
e são inespecíficos. A emaciação pode ser acompanhada por tosse, anorexia,
dispnéia, febre e exsudato nasal. Podem ocorrer pequenas pústulas cutâneas
recobertas com escaras amareladas ou nódulos subcutâneos. Os piogranulomas
subcutâneos, freqüentemente múltiplos, se ulceram através da pele e descarregam
um exsudato purulento. Comumente, os linfonodos brônquicos ficam enormemente
aumentados e aparecem nas radiografias como massas densas. Na blastomicose
torácica, os padrões radiográficos predominantes são os de densidades intersticiais
nodulares e de um padrão pulmonar misto. Podem ocorrer hematúria, noctúria e
disúria com tenesmo, com blastomicose urogenital. Nos cães, os sinais óbvios
podem ser oftálmicos.
As lesões macroscópicas consistem de algumas a numerosas áreas de conso-
lidação pulmonar cinzentas a amareladas, firmes, irregulares e de tamanho variável
e de nódulos nos pulmões e nos linfonodos do tórax. A disseminação pode resultar
em lesões nodulares em vários órgãos, mas especialmente na pele, olho e osso. As
lesões cutâneas correspondem a pápulas únicas ou múltiplas, ou a piogranulomas
nodulares drenantes crônicos.
Infecções Fúngicas 422

Diagnóstico – Deve-se considerar a blastomicose nos cães com nódulos


cutâneos drenantes e sinais de doença respiratória. Os achados radiográficos nos
pulmões incluem nódulos não calcificados ou consolidação, e aumento dos linfono-
dos brônquicos e mediastinais. Pode-se fazer um diagnóstico a partir de um tecido
de biópsia ou de amostras aspiradas das lesões cutâneas, e na necropsia, a partir
da presença da forma de levedura do fungo. Esses blastosporos rosa-pálidos (H/E)
e redondos a ovóides medem de 8 a 25µm e possuem uma parede de contorno duplo
e refrátil. Podem estar vazios ou conter material nuclear basofílico e apresentar
brotos únicos de base larga. Geralmente ocorre uma resposta de anticorpos
detectada por um teste de imunodifusão em gel. Pode-se também identificar o
microrganismo por meio de técnicas de imunofluorescência.
Tratamento – A dermatopatia primária rara pode persistir por meses; devem-
se remover essas lesões cirurgicamente já que a blastomicose responde
fracamente à terapia. Considera-se a anfotericina B como a droga de escolha,
mas o tratamento possui pouco valor uma vez que a doença tenha se disseminado.
Sugeriu-se que a combinação da anfotericina B e do cetoconazol reduza a taxa
de reincidência.

OOMICOSE
É uma doença causada por fungos da classe Oomycetes. Os microrganismos de
importância veterinária incluem várias espécies de Saprolegnia e de Achyla (por
exemplo, S. diclina ), que são os agentes comuns das micoses cutâneas nos peixes,
e a Pythium insidiosum (Hyphomyces destruens), a causa da dermatomicose dos
eqüinos (“bursatti”, câncer do pântano e sanguessugas). Também se tem isolado o
Pythium spp, que alguns consideram que não seja um fungo, a partir de casos de
micose cutânea, oral ou gastrointestinal em cães, e lesões pulmonares em um
eqüino. Também se tem descrito a doença natural nos bovinos (cutânea) e no
homem, e provavelmente em gatos e ovinos. A pitiose, como se tem chamado a
doença, é uma doença comum dos animais domésticos em alguns países tropicais
e subtropicais do mundo.
Achados clínicos e lesões – Nos eqüinos, as lesões correspondem a nódulos
grandes, grosseiramente circulares, granulomatosos, ulcerados e fistulados, ou a
inchaços subcutâneos com massas ou núcleos necróticos amarelo-acinzentados.
As lesões são pruriginosas, drenam um exsudato mucossanguinolento, ficam
freqüentemente autotraumatizadas e contêm “coágulos” amarelados e irregular-
mente ramificados, tanto livres no interior de seios como firmemente presos ao
tecido circundante. O trato sinusal contém material sanguinolento espesso a
mucopurulento. As lesões são mais comuns nas pernas (especialmente na parte
mais inferior dos membros), abdome, peito e genitália. A distribuição das lesões é
atribuível à natureza aquática do microrganismo.
As amostras removidas na cirurgia ou na necropsia consistem de tecido fibroso
com áreas de necrose focais, firmes e irregularmente espaçadas que variam em
tamanho e cor. Microscopicamente, as alterações variam de focos de inflamação
exsudativa aguda com eosinófilos numerosos a uma reação granulomatosa com
áreas seqüestradas de necrose e com uma estrutura de hifas com paredes
espessas, ramificações e ligeiramente irregulares quanto à largura.
Diagnóstico – As lesões da oomicose eqüina são semelhantes às da
entomoftoromicose (ver pág. 417) e podem ser confundidas com a habronemíase
cutânea (ver pág. 976). Na oomicose, os núcleos necróticos são distintos do tecido
circundante e destaca-se uma descarga soropurulenta a partir dos tratos sinusais.
As lesões contêm hifas irregulares, ramificadas, algumas vezes septadas e de 4 a
8µm de diâmetro.
Infecções Fúngicas 423

Tratamento – A excisão cirúrgica, a imunoterapia ou a combinação de ambas


têm sido efetivas. A imunoterapia consiste de uma injeção intradérmica de 0,02 a
0,1mL de material micronizado do fungo causador. Uma osteíte ou uma laminite de
origem profunda podem se constituir em uma complicação importante de tal terapia.
A remoção cirúrgica mais a administração sistêmica ou local de anfotericina B
constituem um tratamento satisfatório se a doença for localizada.

PECILOMICOSE
É uma micose sistêmica (principalmente pulmonar), causada pelo Paecilomyces
spp e descrita no homem e em vários animais inferiores, especialmente os com
temperaturas corporais mais baixas. A infecção nos répteis e anfíbios cativos é
provável e razoavelmente comum e os outros hospedeiros incluem – cães, eqüinos,
gatos (granuloma nasal) e caprinos (mastite). Os fungos causadores mais importan-
tes são P. lilacinus e P. variotii. Os fungos, geralmente considerados não patogêni-
cos, se encontram largamente distribuídos no solo e na matéria orgânica em
decomposição. A infecção geralmente é secundária a debilitação, imunossupres-
são e/ou alteração da flora microbiana normal por meio da administração prolonga-
da de antibióticos.
Achados clínicos e lesões – Os sinais variam e são inespecíficos, mas podem
refletir o envolvimento tecidual ou visceral. Os órgãos envolvidos ficam aumentados
e contêm nódulos branco-acinzentados elevados. Nos casos disseminados, encon-
tram-se lesões granulomatosas (focos múltiplos e pálidos) que contêm pseudo-hifas
septadas (2 a 3µm de diâmetro), conídios ovais e esporos de paredes finas,
esféricos a ovais (3 a 6µm), em muitos tecidos (por exemplo, pulmões), as quais
estão intimamente associadas com arteríolas de tamanho pequeno a médio.
Diagnóstico – Podem-se confundir as lesões macroscópicas com as das outras
micoses sistêmicas. No entanto, hifas septadas, conídios e esporos desse fungo
diferem dos fungos patogênicos comuns, tais como o Aspergillus sp e os fungos da
mucormicose. Pode-se obter o diagnóstico a partir do isolamento do fungo em
cultura de amostras de lesões múltiplas. No caso da maioria das espécies, o
crescimento pode se encontrar ausente ou restrito a 37°C, mas pode ser bom a 5
a 30°C.
Tratamento – Não se descreveu nenhum regime de tratamento. O Paecilomyces
spp varia enormemente quanto à sensibilidade aos agentes antifúngicos – a
P. lilacinus parece ser altamente resistente à anfotericina B e à flucitosina, mas
sensível ao cetoconazol, enquanto a P. variotii é sensível às primeiras 2 drogas.

PENICILIOSE
As infecções com Penicillium spp são raras nos animais domésticos, mas já se
isolou o agente a partir de um caso de dermatose felina, de uma celulite orbital e de
uma sinusite com pneumonia em outro gato, de uma patologia destrutiva invasiva
dos tecidos nasais em cães e de uma doença sistêmica nos ratos-de-bambu (nesses
casos, o fungo era a P. marneffei) no sudoeste da Ásia. O Penicillium spp se encontra
largamente distribuído na natureza e se encontra nos solos, grãos e vários alimentos
e rações.
Achados clínicos e lesões – Os cães com peniciliose nasal apresentam
espirros crônicos e uma descarga nasal aguda a crônica, que varia de hemorrágica
intermitente a mucopurulenta ou mucóide intermitente ou contínua. Os achados
radiográficos incluem áreas de destruição dos turbinados com aumento da
radiotransparência. Macroscopicamente, a mucosa nasal apresenta focos de ne-
crose e de ulceração; microscopicamente, as hifas fúngicas podem formar um
revestimento fosco e espesso sobre uma mucosa intacta adjacente a esses focos.
Infecções Fúngicas 424

Diagnóstico – O diagnóstico se baseia na cultura fúngica, na caracterização das


lesões e na presença das hifas fúngicas e em um teste positivo de difusão dupla em
ágar-gel. O isolamento do Penicillium sp em cultura deve ser acompanhado pela
demonstração da invasão tecidual por parte do fungo para confirmação. Nos
tecidos, a P. marneffei lembra muito a fase de levedura da Histoplasma capsulatum.
Tratamento – Tem-se combinado a turbinectomia cirúrgica com curetagem com
a lavagem sob pressão da cavidade nasal com tintura de iodo a 1% ou iodo-povidona
(10:1) e tiabendazol oral. Tem-se sugerido o tratamento com tiabendazol combinado
com flucitosina.

RINOSPORIDIOSE
É uma infecção piogranulomatosa, não fatal, crônica, primariamente da mucosa
nasal e ocasionalmente da pele dos Equidae, bovinos, cães e aves aquáticas,
causada pelo fungo Rhinosporidium seeberi. Incomum na América do Norte, é
observada mais freqüentemente na Índia, África e América do Sul. Não se tem
cultivado o microrganismo e desconhece-se o seu hábitat natural. Um traumatismo
pode predispor à infecção, que não é considerada transmissível.
Achados clínicos e lesões – A infecção da mucosa nasal se caracteriza por
crescimentos polipóides que podem ser macios, rosados, friáveis, lobulados com
superfícies ásperas e grandes o suficiente para ocluírem as passagens nasais. As
lesões cutâneas podem ser únicas ou múltiplas, sésseis ou pedunculadas. Os
pólipos nasais e as lesões cutâneas possuem um componente inflamatório
fibromixóide granulomatoso e contêm o microrganismo fúngico.
Diagnóstico – Pode-se confundir a rinosporidiose com outras lesões granuloma-
tosas da mucosa nasal e da pele, incluindo aspergilose, entomoftoromicose,
“granuloma nasal” e criptococose. A demonstração microscópica das esférulas
(esporângios) de R. seeberi nas amostras de biópsia confirma o diagnóstico. Essas
esférulas podem ser numerosas, variar em tamanho (até 300µm), apresentar
paredes espessas e ácido-periódicas positivas ao teste de Schiff e conter endosporos
de 4 a 19µm de diâmetro. Os estágios de desenvolvimento de tamanho variável e
sem esporos se distribuem por toda a lesão.
Tratamento – Considera-se padrão a excisão cirúrgica das lesões, mas a
recidiva não é incomum.

ESPOROTRICOSE
É uma doença granulomatosa crônica incomum e esporádica do homem e de
vários animais domésticos e de laboratório, causada pela Sporothrix (Sporotrichum)
schenckii. Esse fungo dimórfico se distribui mundialmente e é um saprófita encon-
trado em matéria vegetal (por exemplo, palha e musgo esfagno), excrementos
animais e solo. A infecção ocorre quando os esporos conseguem entrar por meio de
ferimentos cutâneos.
Achados clínicos e lesões – Cabeça, tórax, orelhas, nariz e membros dos
animais afetados apresentam nódulos cutâneos firmes, elevados e algumas vezes
crostosos e alopécicos, que se disseminam ao longo dos vasos e dos nódulos
linfáticos. As lesões superficiais ulceram e descarregam um exsudato vermelho-
amarronzado. A infecção pode, em raras ocasiões, se tornar generalizada, com
lesões nas vísceras torácicas e abdominais e no cérebro e nos olhos. Pode-se obter
um exsudato inodoro e amarelo-cremoso a partir da incisão dos nódulos. Têm-se
descrito vários casos nos eqüinos, que lembram a linfangite epizoótica (ver pág.
418). Microscopicamente, os nódulos são lesões piogranulomatosas compostas de
macrófagos, células gigantes e vários outros tipos de células, incluindo neutrófilos.
Leptospirose 425

Diagnóstico – Pode-se obter o diagnóstico a partir do exame cultural (amostras


obtidas a partir de lesões fechadas) ou microscópico do exsudato ou das amostras
de biópsia. O microrganismo se encontra presente como algumas a numerosas
células únicas e em forma de charuto no interior dos macrófagos nos tecidos e no
exsudato. As células fúngicas são pleomórficas e pequenas (2 a 10 × 1 a 3µm); os
brotos podem se fazer presentes e dão a aparência de uma raquete de pingue-
pongue. Tem-se utilizado uma técnica de imunofluorescência para a identificação
das células semelhantes a leveduras nos tecidos. Nas culturas, produz-se um
micélio verdadeiro, com hifas septadas, ramificadas e finas, que sustentam conídios
piriformes em conidióforos delgados.
Tratamento – Têm-se utilizado os iodetos (de potássio ou de sódio) com certo
sucesso; continua-se a terapia até que os sinais de iodismo se desenvolvam e várias
semanas após a aparente recuperação para se prevenir uma recidiva. A anfotericina
B e a griseofulvina também podem ter valor, especialmente quando combinadas
com a flucitosina. Não se recomendam incisão, excisão e cauterização cirúrgicas
das lesões cutâneas. Esses procedimentos são freqüentemente seguidos por um
aumento na severidade das lesões.

LEPTOSPIROSE
É uma doença contagiosa dos animais, inclusive o homem, causada pela
infecção por vários sorotipos leptospiróticos imunologicamente distintos, a
maioria dos quais considerados como subgrupos da Leptospira interrogans. As
infecções podem ser assintomáticas ou resultar em várias situações patológi-
cas, incluindo febre, icterícia, hemoglobinúria, infertilidade, aborto e morte.
Após a infecção aguda, as leptospiras se localizam freqüentemente nos rins ou
nos órgãos reprodutivos e são eliminadas na urina, algumas vezes em
grande quantidade por meses ou anos. A doença se origina freqüentemente na
água, já que os microrganismos sobrevivem na água de superfície por períodos
extensos.
A infecção é freqüentemente adquirida por meio do contato da pele ou da
membrana mucosa com urina, e em menor parte, por meio do consumo de alimento
ou da água contaminados por urina. As infecções podem se estabelecer facilmente
por meio da conjuntiva, da mucosa vaginal ou das abrasões cutâneas. Caso se
introduza um animal eliminador em um rebanho anteriormente livre da doença, as
leptospiras se disseminam rapidamente e podem ocorrer abortos e natimortos, a
maior parte desses freqüentemente durante a metade ou o último trimestre da
gestação. Os sinais clínicos podem ser severos, suaves ou inaparentes. Geralmente,
a recuperação dos sinais agudos se encontra associada com o surgimento dos
anticorpos circulantes e o desaparecimento das leptospiras do sangue. Os abortos
leptospiróticos podem ser seguidos por retenção das membranas fetais, e pode-
se prejudicar a fertilidade. Os surtos patológicos nos rebanhos pequenos são
geralmente autolimitantes. No entanto, o controle das infecções endêmicas nos
grandes rebanhos geralmente exige imunização, quimioterapia, proteção do
rebanho contra águas de superfície e limitação do contato com roedores e outros
portadores silvestres.
De > 175 sorotipos leptospiróticos patogênicos antigenicamente distintos, isola-
ram-se apenas 7 a partir dos animais domésticos nos EUA, embora se tenham
isolado outros a partir dos animais silvestres. A imunidade cruzada entre os
sorotipos é apenas moderada, e têm-se descrito infecções duplas e até triplas. Os
Leptospirose 426

anticorpos aglutinantes geralmente aparecem de 6 a 12 dias após a infecção; os


títulos se elevam rapidamente, e depois geralmente caem por vários meses a níveis
moderados, que podem persistir de semanas a anos. Um único teste soropositivo
possui pouca importância diagnóstica, já que pode resultar de uma vacinação
recente, da imunidade passiva em bezerros ou de uma infecção passada ou atual.
Pode-se confirmar o diagnóstico por meio da elevação do título em amostras séricas
pareadas, caso se coletem a primeira amostra durante o estágio agudo e a segunda
após 7 a 10 dias. A vacinação com bacterinas pode estimular as concentrações
significativas de aglutininas mas, sem exposição prévia, os títulos de aglutinação
microscópica diminuem entre 2 a 3 meses. Alguns animais portadores ou eliminadores
nos quais se tenha localizado a infecção, não apresentam títulos diagnósticos. Os
métodos sorológicos comumente utilizados incluem o teste de aglutinação micros-
cópica, o teste de aglutinação de microtítulos e ocasionalmente os testes ELISA e
de fixação de complemento.
Obtêm-se isolamentos primários durante o estado agudo da infecção por
meio da inoculação de 0,5mL de sangue, coletado assepticamente, em animais
de laboratório ou meios laboratoriais adequados. Deve-se fazer uma série de
diluições do inoculado para reduzir a probabilidade de contaminação. Seme-
lhantemente, pode-se examinar a urina em um microscópio de campo escuro ou
cultivá-la 2 a 4 semanas ou mais após uma infecção aguda. Os resultados
negativos não excluem a infecção, já que as leptospiras quase sempre são
eliminadas intermitentemente na urina.
Também se pode confirmar o diagnóstico clínico por meio da demonstração do
microrganismo em cortes do rim e do fígado, corados pelo método de impregnação
de prata de Levaditi ou pela técnica de Warthin-Starry. As leptospiras não se coram
com os corantes comuns de anilina. Também se podem examinar os esfregaços de
tecido fresco do fígado ou do rim ou o depósito centrifugado da urina recentemente
coletada, com conjugados fluorescentes específicos ou em microscopia de campo
escuro, mas tais procedimentos requerem experiência considerável. Deve-se
observar a motilidade característica sob microscopia de campo escuro para se
providenciar uma identificação positiva.
O homem é suscetível a todos os sorotipos patogênicos encontrados nos animais
domésticos, e geralmente ocorre a transmissão a partir dos animais silvestres ao se
ter contato com tecidos de animais infectados ou águas de superfície contaminadas
pela urina dos animais infectados. Em virtude dessas origens, a doença no homem
está freqüentemente relacionada ocupacionalmente. Como nos outros animais, a
doença varia de inaparente a severa e pode ser fatal quando ocorre insuficiência
renal. Os sinais mais comuns incluem febre, dores de cabeça, erupções cutâneas,
mialgia e indisposição; as técnicas laboratoriais se tornam necessárias para um
diagnóstico definitivo. Devem-se informar os proprietários dos animais sobre o risco
zoonótico em potencial da leptospirose.

LEPTOSPIROSE NOS BOVINOS


(Água-vermelha dos bezerros)
Nos EUA, a doença se deve primariamente aos sorotipos hardjo, pomona e
grippotyphosa . No entanto, também se isolaram os sorotipos canicola e
icterohaemorrhagiae.
Achados clínicos – Ocorrem icterícia hemolítica e hemoglobinúria em ≥ 50%
dos bezerros jovens infectados com o sorotipo pomona. A mortalidade é de 5 a 15%.
A síndrome clínica aguda ocorre em < 10% dos adultos e as mortes são raras. A
morbidade pode ser de > 75% nos rebanhos mais velhos, e geralmente atinge 100%
nos bezerros.
Leptospirose 427

Os bezerros geralmente apresentam febre, prostração, anorexia e dispnéia, e


nas infecções por pomona, icterícia, hemoglobinúria e anemia. A temperatura
corporal pode se elevar subitamente para 40,5 a 41°C. A hemoglobinúria raramente
dura mais que 48 a 72h. A icterícia diminui rapidamente e é seguida por anemia. A
contagem de hemácias começa a aumentar em número em 4 a 5 dias e retorna ao
normal 7 a 10 dias mais tarde. Os bovinos mais afetados exibem leucocitose. Certo
grau de albuminúria é comum durante o pico febril. No entanto, as infecções por
hardjo raramente causam icterícia, hemoglobinúria e anemia, o que torna o
diagnóstico mais difícil.
Nos bovinos mais idosos, os sinais variam enormemente e o diagnóstico fica
mais difícil. As infecções endêmicas por hardjo, que geralmente causam produção
anormal de leite, tornam-se mais óbvias nos bovinos leiteiros do que nos de corte.
Os sinais geralmente ficam restritos a uma redução na produção de leite e de
bezerros; não se observa uma crise hemolítica. O leite fica espesso, amarelado e
tingido de sangue, embora haja poucas evidências de inflamação mamária. A
produção de leite retorna ao normal dentro de 10 dias, mesmo na ausência de
tratamento. Geralmente ocorrem abortos e natimortos, que são comuns com
pomona e esporádicos com hardjo, 3 a 10 semanas após a infecção inicial. Os
abortos são mais comuns durante o terceiro trimestre. Um tumulto por aborto em um
rebanho reprodutivo torna-se freqüente na primeira indicação de que a leptospirose
exista, já que os sinais iniciais suaves freqüentemente passam despercebidos. Nos
rebanhos endemicamente afetados, os abortos ocorrem principalmente nos ani-
mais mais jovens e são esporádicos, não se manifestam em tumultos. Os bezerros
criados por vacas anteriormente infectadas ficam protegidos pelos anticorpos
colostrais por até 6 meses. Os bezerros geralmente apresentam títulos de anticor-
pos semelhantes aos de suas mães.
Lesões – A anemia e a icterícia são características proeminentes das infecções
por pomona. A urina apresenta uma cor vermelho-clara ou de vinho do Porto. Os rins
apresentam as lesões mais importantes na forma de infartos vermelhos ou brancos
que causam o mosqueamento do córtex, freqüentemente acentuado o bastante
para ser visível através da cápsula. O fígado pode ficar inchado, com pequenas
áreas de necrose focal. Nos casos fulminantes, observam-se petéquias no epicárdio
e nos linfonodos; no entanto, nas infecções mais prevalentes por hardjo , as lesões
ficam restritas primariamente aos rins.
Diagnóstico – Sorologia com amostras pareadas de soro, cultura direta em
meios especiais ou técnicas de inoculação animal tornam-se geralmente necessá-
rias para confirmar os achados clínicos e post mortem. Na avaliação do rebanho,
devem-se obter soros de várias faixas etárias. O isolamento do agente causador se
constitui na ferramenta diagnóstica mais confiável. As alterações físicas macroscó-
picas no leite na ausência de uma inflamação mamária são sugestivas de leptospirose.
Semelhantemente, a eliminação de brucelose, campilobacteriose e tricomoníase
como causas de um surto de abortamento aponta para a leptospirose. Os títulos de
aglutinação freqüentemente atingem o seu máximo antes do aborto, já que a
infecção aguda ocorreu várias semanas antes. O aborto devido ao sorotipo hardjo
ocorre freqüentemente na ausência de títulos sorológicos.
Tratamento – Têm-se descrito a estreptomicina, a clortetraciclina e a oxitetraciclina
como obtendo sucesso, se administradas precocemente. Recomenda-se a diidroes-
treptomicina para o tratamento do estado de portador ou de eliminador, embora
trabalhos recentes indiquem que os portadores não sejam eliminados pela antibio-
ticoterapia. Nos casos dos animais valiosos, a transfusão EV de um lavado de
hemácias pode se mostrar benéfica se a anemia atingir um nível crítico. O
tratamento possui pouco efeito no curso da doença, uma vez que tenha se
desenvolvido uma crise renal. O manejo de rebanhos infectados merece conside-
Leptospirose 428

ração especial. Quando a leptospirose é diagnosticada nas vacas de corte prenhes


durante o início da fase epidêmica, podem-se evitar abortos adicionais por meio da
vacinação imediata de todo o rebanho e do tratamento simultâneo de todos os
animais com antibióticos apropriados. O antibiótico reduz o número de leptospiras
nos rins e nos outros tecidos, pelo menos durante o tratamento, e proporciona um
meio de proteção até que se induza a imunidade por meio da vacinação. Nos
rebanhos leiteiros, devem-se tratar geralmente apenas os animais doentes com
antibióticos, já que se deve considerar a perda de leite de mercado após o
tratamento.
Profilaxia – Os proprietários de bovinos confiam nas vacinações anuais, na
criação em confinamento e na quimioprofilaxia para controle. As bacterinas geral-
mente conferem proteção contra abortos e morte, e reduzem significativamente as
infecções renais, embora ainda ocorram algumas infecções. Os métodos de manejo
para reduzir a transmissão incluem controle de ratos, proteção dos bovinos de
ribeirões e de lagoas potencialmente contaminados, separação dos bovinos dos
suínos e dos animais silvestres, seleção do lote de reposição dos rebanhos
soronegativos quanto à leptospirose e quimioprofilaxia e vacinação do lote de
reposição.

LEPTOSPIROSE NOS CÃES


(Tifo canino, Doença de Stuttgart, Icterícia infecciosa)
A infecção geralmente se deve ao sorotipos canicola ou copenhageni, um
membro do sorogrupo icterohaemorrhagiae, embora também se tenham isolado
pomona, grippotyphosa e ballum em cães nos EUA. As infecções com canicola ou
copenhageni são prevalentes em algumas populações de cães. O sorotipo
copenhageni freqüentemente é a causa do chamado tipo hemorrágico e ictérico de
leptospirose. Os ratos castanhos são o reservatório primário do sorotipo copenhageni
nos EUA, enquanto os cães são o reservatório de canicola.
Achados clínicos – Podem-se afetar cães de todas as idades, e a incidência
muito maior nos machos. O período de incubação é de 5 a 15 dias. Nos casos
severos, o início é súbito e ela se caracteriza por uma ligeira fraqueza, anorexia,
vômito, uma febre de 39,5 a 40,5°C e freqüentemente há uma conjuntivite suave.
Nesse estágio, o diagnóstico clínico se torna difícil. Dentro de vários dias, a
temperatura cai acentuadamente, a depressão fica mais pronunciada, a respiração
fica trabalhosa e a sede se acentua. Em alguns cães, a icterícia de intensidade
variável pode ser a primeira manifestação da enfermidade. O cão pode ficar
relutante em se levantar de uma posição sentada, e pode exibir sinais de dor ao se
palpar a região lombar ou o abdome dorsal anterior. A mucosa oral pode exibir
inicialmente manchas hemorrágicas irregulares que lembram abrasões ou queima-
duras, as quais mais tarde se tornam secas e necróticas e se desprendem em
secções. Uma secreção salivar persistente ao redor da gengiva pode se tingir de
sangue. A deglutição fica difícil. Os animais com doença mais avançada apresentam
depressão profunda e tremores musculares, com a temperatura caindo gradual-
mente para até 36°C. Podem-se observar vômito e fezes sanguinolentas, o que
indica uma gastroenterite hemorrágica. A micção freqüente com albumina e cálculos
na urina indica uma nefrite aguda. Os olhos se afundam nas órbitas e os vasos da
conjuntiva ficam congestos. O pulso se torna fraco e, nos casos severos, desenvol-
ve-se uremia. A mortalidade raramente é > 10%; as mortes, quase sempre causadas
por insuficiência renal, ocorrem geralmente 5 a 10 dias após o início. Uma nefrite
progressiva e crônica freqüentemente se segue a infecções agudas por canicola.
Em tais casos, pode não ocorrer morte até muito após a enfermidade inicial ter se
reduzido.
Leptospirose 429

A contagem de leucócitos pode se elevar a 35.000; o BUN também pode se


elevar. Os outros achados laboratoriais são variáveis, dependendo da severidade
e do estágio da doença.
Lesões – A gastroenterite hemorrágica freqüentemente é a lesão predomi-
nante. Em tais casos, os tecidos podem se corar uniformemente com bile, o
fígado pode ficar ingurgitado e os linfonodos hemorrágicos. O miocárdio pode
ficar difusamente hemorrágico. Os órgãos podem apresentar um odor urêmico.
Os rins aumentam de volume na fase aguda e apresentam focos avermelhados.
À medida que a doença se desenvolve, a nefrite intersticial subaguda resulta em
focos acinzentados ou no mosqueamento da junção corticomedular. No animal
urêmico, podem ocorrer úlceras orais e escaras na língua. Os casos crônicos
apresentam graus variáveis de nefrite intersticial. O diagnóstico se baseia nos
achados clínicos e de necropsia; na demonstração histológica de leptospiras
nos rins, fígado ou urina; e na sorologia.
Tratamento – Recomendam-se a tetraciclina, a doxicilina e a estreptomicina
para as infecções agudas; sugere-se a diidroestreptomicina em doses pesadas por
1 semana para a redução do estado de portador/eliminador. Deve-se utilizar mais
a doxiciclina que a tetraciclina quando uma nefrite aguda se fizer presente. Podem-
se tratar a desidratação e a acidose por meio da administração de uma solução de
lactato 0,17M, sozinha ou com uma solução salina de dextrose, e com altas doses
de vitaminas do complexo B. Na fase anúrica da doença, não se deve administrar
um volume excessivo de fluido; deve-se ajustar o volume de fluido para que um cão
de 18kg perca , 90g por dia. A diálise peritoneal pode salvar a vida nos casos
urêmicos.
Profilaxia – Para reduzir as chances de exposição, aconselha-se que os
proprietários se empenhem no controle de roedores e mantenham os seus cães
acorrentados. Durante as epidemias, deve-se recomendar o confinamento na
propriedade do proprietário. Encontram-se disponíveis bacterinas bivalentes e
devem-se administrá-las a cada 6 a 8 meses para manter um título protetor para
os cães em alto risco, por exemplo, os cães de caça, reprodução e exposição.
Caso se diagnostique a leptospirose em um canil, devem-se considerar o
tratamento e a vacinação de todos os cães no canil. Os cães em contato com
animais silvestres devem receber bacterinas que contenham os antígenos
grippotyphosa e pomona .

LEPTOSPIROSE NOS EQÜINOS


Durante investigações acerca da etiologia da uveíte eqüina (ver pág. 363), a
sorologia revelou que muitos eqüinos afetados apresentavam altos títulos para o
sorotipo pomona, e isolou-se o microrganismo a partir dos olhos dos eqüinos.
Induziu-se experimentalmente uma uveíte crônica com infecções leptospiróticas. A
leptospirose aguda nos eqüinos se caracteriza por febre de 39,5 a 40,5°C por 2 a 3
dias, depressão ou embotamento, anorexia, icterícia e neutrofilia. Podem ocorrer
um aborto várias semanas após a febre, e uma uveíte crônica meses mais tarde. Na
Europa, isolaram-se os sorotipos pomona, hardjo, icterohaemorrhagiae e bratislava
a partir de fetos eqüinos abortados. Desconhece-se a incidência de leptospirose nos
eqüinos; no entanto, as evidências sorológicas indicam uma incidência mais alta
que a clinicamente aparente.
Muitos casos de leptospirose ocorrem indubitavelmente sem serem reconheci-
dos devido ao curso transitório e suave, que deixa apenas as lesões oculares
aparentes e tardias como evidências visíveis. As medidas de controle e de
tratamento são semelhantes às dos bovinos e dos suínos, mas ainda não se
desenvolveram bacterinas específicas para os eqüinos.
Leptospirose 430

LEPTOSPIROSE NOS SUÍNOS


Embora pomona fosse o sorotipo mais comumente encontrado nos suínos,
as pesquisas sorológicas recentes indicaram que o sorotipo bratislava é o mais
difundido. A infecção geralmente provém do contato com a urina de outros
suínos ou de animais silvestres. Os suínos também podem se infectar com os
sorotipos grippotyphosa, canicola e icterohaemorrhagiae. Os suínos podem
aparentemente excretar um grande número de microrganismos em sua urina
até 1 ano após a recuperação de uma infecção aguda. Eles transmitem
freqüentemente a doença para o homem, e na Europa, isso se conhece por
“doença do rebanho suíno”. A leptospirose aguda, que ocorre nos suínos jovens
devido aos sorotipos pomona ou grippotyphosa , se caracteriza por febre,
icterícia, hemorragias e morte. As infecções com bratislava se associam
primariamente com uma redução da eficiência reprodutiva.
A leptospirose suína aguda não é freqüentemente uma entidade claramente
definida. Em alguns suínos, a infecção pode ser inaparente; outros apresentam
apenas febre e anorexia por 3 a 4 dias. Os sinais clínicos mais severos incluem um
pouco ganho de peso, anorexia, distúrbios gastrointestinais e ocasionalmente,
meningite com rigidez, espasmos e andadura em círculos. Têm-se isolado freqüen-
temente as leptospiras a partir de fetos suínos abortados. Abortos no final da
prenhez, natimortos ou neonatos fracos representam os sinais mais reconhecíveis
de leptospirose em um rebanho. No início de um surto, podem-se reduzir os abortos
por meio de tratamento e vacinação de todos os animais reprodutores no rebanho.
O controle de roedores torna-se importante na redução da transmissão de alguns
sorotipos.

LEPTOSPIROSE NOS OVINOS


A prevalência nos ovinos é mais baixa que nos bovinos, possivelmente devido
aos métodos de criação menos intensivos e à sua tendência a evitar o contato com
a água de superfície. Nos EUA, pomona e hardjo são os sorotipos mais comuns
isolados a partir dos ovinos. As características clínicas, o diagnóstico e o manejo da
doença são essencialmente os mesmos descritos anteriormente para bezerros e
bovinos adultos.

LISTERIOSE
(Listerelose, Doença da andadura em círculos)

É uma infecção bacteriana esporádica, com distribuição mundial, que ocorre


mais nos climas temperados e mais frios. Afeta uma larga variedade de animais
e aves, incluindo o homem. Há uma alta incidência de portadores intestinais, e
a doença ocorre mais comumente do que é diagnosticada. A encefalite ou a
meningoencefalite nos ruminantes adultos é a forma mais freqüentemente
reconhecida.
Etiologia e epidemiologia – A Listeria monocytogenes é um cocobacilo difterói-
de, extremamente resistente, não formador de esporos, Gram-positivo, móvel e
pequeno, que cresce sob uma larga variação de temperatura (4 a 44°C). A sua
capacidade de crescer a 4°C constitui um importante auxílio diagnóstico (no método
de “enriquecimento frio”) para o isolamento do microrganismo a partir do tecido
cerebral (mas não dos tecidos fetais ou placentários). Sob condições microaerofílicas,
Listeriose 431

potencializa-se o isolamento primário. O Listeria é um saprófita comum que vive no


ambiente de solo com plantas e que tem sido isolado a partir de ≥ 42 espécies de
mamíferos domésticos e silvestres e 22 espécies de aves, bem como de peixes,
crustáceos, insetos, restos de esgoto, água, silagem e outros ingredientes alimen-
tares, leite, queijo, mecônio, fezes e terra.
Os reservatórios naturais da L. monocytogenes parecem ser o solo e os tratos
gastrointestinais dos mamíferos, ambos os quais contaminam a vegetação. Os
animais em pastejo ingerem o microrganismo e contaminam posteriormente a
vegetação e o solo. Ocorre transmissão de animal para animal, por meio da rota
fecal-oral.
A listeriose é primariamente uma doença de inverno – primavera dos ruminantes
em engorda ou confinados. O pH alcalino da silagem estragada potencializa a
multiplicação da L. monocytogenes. Podem ocorrer surtos ≥ 10 dias após a
alimentação com uma silagem de má-qualidade. Tem-se implicado a silagem de
milho mais comumente nos ovinos do que nos bovinos. A remoção ou a alteração
da silagem na ração detém freqüentemente o alastramento da listeriose; a alimen-
tação com a mesma silagem meses mais tarde pode produzir novos casos.
Patogenia – O Listeria que for ingerido ou inalado tende a causar septicemia,
aborto e infecção latente. Aqueles que entram nos tecidos têm uma predileção por
se localizar na parede intestinal, na medula oblonga e na placenta; ou por causar
uma encefalite por meio de pequenos ferimentos na mucosa bucal, ou por meio de
inalação ou pela conjuntiva.
Ocorrem várias manifestações de infecção em todas as espécies suscetíveis e
estas se associam com as síndromes clínicas características: encefalite ou menin-
goencefalite nos ruminantes adultos, aborto e mortalidade perinatal em todas as
espécies, septicemia nos animais monogástricos e nos ruminantes neonatos e
septicemia com necrose no miocárdio e/ou hepática nas aves domésticas (ver pág.
1913). A maioria das infecções é subclínica ou latente, mas pode ocorrer listeriose
clínica quando o animal se estressar.
A encefalite listérica afeta ovinos, bovinos, caprinos e ocasionalmente suínos.
Corresponde essencialmente a uma infecção localizada no tronco cerebral, que
ocorre quando a L. monocytogenes sobe aos nervos craniais. Os sinais clínicos
variam de acordo com a função dos neurônios afetados, mas são freqüentemente
unilaterais e incluem paralisia facial e andadura em círculos.
A listeriose septicêmica ou visceral é mais comum nos monogástricos, incluindo
suínos, cães, gatos, coelhos silvestres e domésticos e muitos outros pequenos
mamíferos. Esses animais podem exercer um papel na transmissão da L.
monocytogenes. Encontra-se essa forma também nos ruminantes jovens, antes
que o rúmen se torne funcional. Embora seja rara, descreveu-se uma septicemia nos
ruminantes domésticos mais idosos e nos veados. A forma septicêmica afeta outros
órgãos além do cérebro, com a principal lesão se constituindo em uma necrose
hepática focal.
O útero de todos os animais domésticos, especialmente dos ruminantes, é
suscetível à L. monocytogenes em todos os estágios da prenhez, o que pode
resultar em placentite, metrite, infecção fetal e morte, abortamento, natimortalidade,
mortes neonatais e possivelmente, portadores viáveis. A metrite tem pouco ou
nenhum efeito na reprodução subseqüente; no entanto, pode-se eliminar o Listeria
por ≥ 1 mês, por meio da vagina e do leite.
As infecções orais tendem a se localizar na parede intestinal e resultar em
infecção inaparente e excreção fecal prolongada. Postula-se que a silagem conta-
minada por Listeria resulte em numerosas infecções latentes, atingindo freqüente-
mente 100% do rebanho ou do lote exposto, mas resultando em listeriose clínica em
apenas alguns animais.
Listeriose 432

Achados clínicos – A encefalite é a forma mais facilmente reconhecida de


listeriose nos ruminantes. Ela afeta todas as idades e ambos os sexos, algumas
vezes como uma epidemia no rebanho de engorda bovino ou ovino. O curso em
ovinos e caprinos é rápido; pode ocorrer morte 4 a 48h após o início dos sinais, e a
recuperação é rara. A doença é menos aguda nos bovinos, com a maior parte deles
sobrevivendo por 4 a 14 dias. Pode ocorrer recuperação espontânea, mas os
sobreviventes freqüentemente apresentam uma lesão permanente do SNC. As
lesões se localizam no tronco cerebral, e os sinais indicam a disfunção do terceiro
ao sétimo pares de nervos craniais.
Inicialmente, os animais afetados ficam deprimidos, febris, desorientados e
indiferentes à sua circunvizinhança, e geralmente se isolam. Tendem a se amontoar
nos cantos ou a inclinar a sua cabeça e empurrá-la contra objetos estacionários. Se
andarem, tropeçam e se movem em círculos, sempre na mesma direção. São
comuns uma descarga nasal acentuada, anorexia, estrabismo e conjuntivite, e os
animais parecem ficar cegos. Freqüentemente se desenvolve paralisia facial com
queda da orelha, dilatação da narina e abaixamento da pálpebra no lado afetado,
embora isso ocorra mais comumente nos bovinos. Pode haver contrações intermi-
tentes e paralisia dos músculos faciais, da garganta e da língua, o que interfere na
deglutição e resulta em salivação profusa. Os animais terminalmente afetados
caem, ficam incapazes de se levantar e deitam no mesmo lado; tornam-se comuns
movimentos de “corrida” involuntários.
A encefalite listérica pode recair nas mesmas propriedades em anos sucessivos.
O número de animais clinicamente envolvidos em um surto geralmente é pequeno,
mas pode alcançar 30% em um rebanho de ovinos ou caprinos e 10% em um
rebanho de bovinos; a mortalidade é alta. As mortes cessam subitamente quando
os ovinos saem para o pasto.
A listeriose é relativamente incomum em suínos, com a septicemia ocorrendo nos
suínos < 1 mês de idade e a encefalite em suínos mais idosos; a doença tem um
curso rápido e fatal de 3 a 4 dias.
O abortamento listérico geralmente ocorre no último trimestre da gestação e sem
sinais premonitórios. Os fetos geralmente morrem no interior do útero, mas também
ocorrem natimortos e mortes neonatais. A taxa de abortamento varia e tem sido de
até 20% nos rebanhos de ovinos. É rara a septicemia fatal da mãe secundária à
metrite. A encefalite e o abortamento geralmente não ocorrem simultaneamente no
mesmo rebanho ou lote. No entanto, tem-se alterado o padrão clínico em ovinos na
Inglaterra: estão aumentando os abortamentos, encefalites e diarréias, e ocorrem
surtos de abortamento e de encefalite juntos no mesmo rebanho.
Lesões – Na encefalite listérica, ocorrem poucas lesões macroscópicas além de
uma certa congestão das meninges. As lesões microscópicas se confinam prima-
riamente à ponte, medula oblonga e medula espinhal anterior.
Na listeriose septicêmica, podem-se encontrar pequenos focos necróticos em
qualquer órgão, especialmente no fígado. Nos bezerros que morrem < 3 semanas
de idade, além da necrose hepática focal, ocorrem freqüentemente gastrite e
enterite hemorrágicas acentuadas.
Nos fetos abortados, há autólise ligeira a acentuada, fluido claro a tingido de
sangue nas cavidades serosas e focos necróticos pequenos e numerosos (0,5 a
2µm) no fígado, especialmente em sua metade direita. Podem-se encontrar focos
necróticos em outras vísceras, tais como pulmão e baço. Na mucosa abomasal
podem-se encontrar erosões rasas, de 1 a 3mm. As alterações autolíticas podem
mascarar essas lesões. Os esfregaços corados por Gram do conteúdo abomasal
revelam numerosos cocobacilos pleomórficos e Gram-positivos.
Diagnóstico – Não há um teste diagnóstico ante mortem satisfatório. Só se pode
confirmar a listeriose por meio do isolamento e da identificação da L. monocytogenes.
Listeriose 433

As amostras de escolha correspondem ao cérebro dos animais com envolvimento


do SNC e à placenta e ao feto abortados. Se as tentativas de isolamento primário
falharem, deve-se manter o tecido cerebral triturado a 4°C por várias semanas e
recultivá-lo semanalmente. Ocasionalmente, tem-se isolado a L. monocytogenes a
partir do fluido espinhal, descarga nasal, urina, fezes e leite de ruminantes clinica-
mente doentes. Não se utiliza rotineiramente a sorologia para diagnóstico devido a
muitos animais saudáveis apresentarem altos títulos de listeriose. A imunofluores-
cência efetiva na identificação rápida da L. monocytogenes em esfregaços oriundos
de animais mortos ou abortados por listeriose e oriundos de leite, carne e outras
fontes.
Pode se tornar difícil a distinção entre a listeriose e a toxemia da prenhez em
ovelhas (ver pág. 550) ou a cetose no gado (ver pág. 538), mas na toxemia da
prenhez ou na cetose, as paralisias facial e auricular são menos prováveis e a
cetonúria é comum. Em bovinos, os sinais localizados da listeriose, se estiverem
presentes, ajudam a diferenciá-la da encefalite tromboembólica (ver pág. 728), da
polioencefalomalacia (ver pág. 743), da encefalomielite bovina esporádica (ver pág.
756) e da intoxicação por chumbo (ver pág. 2029). Deve-se sempre considerar a
raiva (ver pág. 749) no diagnóstico diferencial da listeriose. As outras causas de
abscessos cerebrais, embora raras, e cenurose (ver pág. 730) podem ser clinica-
mente indistingüíveis da listeriose.
Tratamento e controle – A Listeria monocytogenes é suscetível a penicilina,
eritromicina, cloranfenicol e tetraciclinas; a droga de escolha é a penicilina. Exigem-
se altas doses devido à dificuldade de manutenção de níveis terapêuticos no
cérebro. A recuperação depende do tratamento precoce. Se os sinais de encefalite
forem severos, geralmente ocorre morte apesar do tratamento.
Deve-se administrar a penicilina G a 44.000u/kg de peso corporal,
intramuscularmente, diariamente por 1 a 2 semanas, com a primeira injeção sendo
acompanhada pela mesma dose EV.
Descreveu-se que a clortetraciclina, a 10mg/kg de peso corporal, EV diariamente
por 5 dias, é efetiva na meningoencefalite nos bovinos, mas menos efetiva nos
ovinos. Exige-se uma terapia de suporte, incluindo fluidos e eletrólitos, para os
animais que apresentam dificuldade em comer e tomar água.
Os resultados com vacinas têm sido inconclusivos. Em um surto, devem-se
segregar os animais afetados. Caso se forneça silagem, deve-se interromper o uso
da mesma, em particular, em uma base de experimentação. Deve-se evitar
rotineiramente a silagem estragada. É provável que o milho ensilado antes de se
tornar suficientemente maduro tenha um pH mais ácido, que desencoraja a
multiplicação da L. monocytogenes.
Risco zoonótico – Pode-se questionar o conceito de que os animais servem
como reservatórios da infecção para o homem, já que se tem isolado o Listeria
a partir das fezes de um número significativo de pessoas aparentemente
normais, assim como animais. No entanto, apesar disso e do caráter invasivo
aparentemente baixo da L. monocytogenes , deve-se manipular com cuidado
todo material suspeito. Os fetos abortados e a necropsia dos animais septicêmicos
representam um grande perigo. As pessoas têm desenvolvido meningite fatal,
septicemia e erupção cutânea papular nos braços após a manipulação de
material abortado. Nos casos com encefalite, a L. monocytogenes geralmente
se confina ao cérebro e representa um risco menor de transmissão, a menos que
se remova o cérebro. Devem-se proteger os animais prenhes (inclusive as
mulheres) da infecção, devido ao perigo para o feto.
Pode-se isolar a Listeria monocytogenes a partir do leite de vacas mastíticas,
abortantes ou aparentemente normais. A excreção no leite geralmente é intermiten-
te, mas pode persistir por muitos meses. O leite infectado é um risco, pois o Listeria
Listeriose 434

pode sobreviver a determinadas formas de pasteurização. Também se tem isolado


o Listeria a partir do leite de ovinos, caprinos e mulheres.

DOENÇA DE LYME
(Borreliose)

É uma doença inflamatória imunomediada e proveniente de carrapatos de


cães, gatos, eqüinos, vacas, animais silvestres e homem. Nos EUA é endêmica
ao longo da costa nordeste, e em Minnesota e Wisconsin; já foi descrita em 44
estados, inclusive no sudeste, oeste e centro-oeste. Também foi descrita no
Canadá, Europa e Austrália. Possui um impacto zoonótico significativo, e os
casos humanos ocorrem geograficamente em paralelo com os casos animais.
Os veterinários devem estar cientes da transmissão em potencial ao homem,
representada pela manipulação de carrapatos, sangue, urina e fluido sinovial
infectados.
Etiologia e transmissão – O agente causador é o espiroqueta Borrelia burgdorferi.
Ele é transmitido principalmente pelos carrapatos Ixodes dammini, I. pacificus, I.
ricinus e I. scapularis. Outros carrapatos duros, tais como a Dermacentor variabilis
e a Amblyomma americanum, servem provavelmente como vetores de importância
secundária. A infecção geralmente ocorre durante o verão e o outono, quando a
atividade dos carrapatos está em seu máximo. As ninfas e os adultos podem
transmitir o microrganismo ao hospedeiro, mas como as ninfas têm apenas 1 a 2mm
de comprimento, não podem ser observadas. O hospedeiro primário dos estágios
larvais e ninfais é o camundongo-de-patas-brancas, e do estágio adulto, o veado-
de-cauda-branca. A transmissão não vetorial pode ocorrer transplacentariamente,
ou por meio da urina infectada.
Achados clínicos e diagnóstico – Claudicação e febre constituem os sinais
clínicos predominantes, mas anorexia, fadiga e linfadenopatia são comuns. A
claudicação é causada pela artrite, que pode envolver uma ou várias articulações.
A artrite é freqüentemente episódica, mas pode se tornar crônica. As articulações
dos membros anteriores parecem ser afetadas mais freqüentemente, e ficam quase
sempre dolorosas, quentes e inchadas. No entanto, as radiografias e os hemogramas
de rotina ficam geralmente normais. Também se têm observado sinais neurológicos,
cardíacos, renais e reprodutivos.
O isolamento ou a demonstração da B. burgdorferi a partir do sangue, urina ou
fluido sinovial são diagnósticos, mas tão tecnicamente difíceis que possuem pouco
valor clínico. O diagnóstico se faz geralmente por meio da sorologia, utilizando-se
os testes de ELISA ou de imunofluorescência indireta. Os resultados podem ser
obscurecidos pelo uso inicial de antibióticos, e pode ainda ocorrer uma doença
crônica. Os altos níveis de anticorpos podem persistir por muitos meses, mesmo
após o tratamento. O fluido sinovial e/ou cerebroespinhal dos animais que apresen-
tarem artrite ou sinais neurológicos também podem apresentar títulos de anticorpos
mais altos.
Tratamento e controle – Tetraciclina, penicilina, eritromicina e ceftriaxona têm
todas provado serem benéficas no tratamento dos casos humanos, e mesmo a
doença crônica respondeu a uma terapia EV e a altas doses de penicilina. Embora
ainda não se tenham avaliado completamente os regimes terapêuticos espécie-
específicos nos animais domésticos, é provável que as mesmas classes de drogas
possuam valor. Os cães respondem à tetraciclina, amoxicilina ou ampicilina em
dosagens padrão, administradas por 21 a 28 dias. Devem-se tratar os animais
Melioidose 435

assintomáticos soropositivos provavelmente porque a reatividade pode se constituir


em uma antecipação da doença.
Como os carrapatos não transmitem o espiroqueta imediatamente após o
atracamento, o preventivo mais eficiente consiste em exame diário ou mais
freqüente dos animais, e remoção imediata dos carrapatos. O tratamento freqüente
dos animais com banhos de imersão acaricidas e repelentes de carrapatos (tais
como os produtos piretrínicos) é útil. Medidas de controle ambiental, tais como é
eliminação das moitas e aspersão de acaricidas no curral também constituem
partes úteis de um programa de controle completo. Encontra-se disponível uma
vacina morta para uso em cães ≥ 12 semanas de idade. Devem-se administrar
2 doses IM de 1mL da vacina, com intervalos de 3 semanas, seguidas pela
revacinação anual.

MELIOIDOSE
É uma infecção bacteriana caracterizada por lesões supurativas ou caseosas nos
linfonodos e vísceras. Macroscopicamente, as lesões não têm características espe-
cíficas; microscopicamente, ocorre uma resposta granulomatosa e purulenta mista.
Etiologia e epidemiologia – É causada pela Pseudomonas pseudomallei
(Bacillus whitmori, Loefflerella pseudomallei, Malleomyces pseudomallei), um baci-
lo Gram-negativo, oval e móvel, com uma coloração bipolar. Os microrganismos se
encontram nas lesões e descargas, por exemplo, o muco nasal quando se infecta
o trato respiratório, e a urina quando se envolvem os rins. Acredita-se que
originalmente se restrinja à água e aos solos úmidos nas áreas tropical e subtropical.
Tem-se isolado a P. pseudomallei de regiões temperadas (sudoeste da Austrália e
França). A infecção se transmite aparentemente mais a partir do ambiente do que
de animal para animal. Os surtos que originam infecções provenientes do solo
ocorrem primariamente durante ou após chuvas pesadas ou inundações em regiões
com alta umidade ou temperatura. O microrganismo é um patógeno oportunista,
especialmente em hospedeiros imunologicamente deprimidos. Pode-se matá-lo
facilmente por calor, mas ele pode sobreviver por muitos meses no solo e na água.
Têm-se descrito infecções em ovinos, caprinos, suínos, bovinos, eqüinos, cães,
aves, golfinhos, peixes tropicais, vários animais silvestres e no homem. Em laborató-
rio, os hamsters, as cobaias e os coelhos são altamente suscetíveis. Como se reconhece
freqüentemente a melioidose em primatas importados para pesquisa, é provável que
a doença também possa ocorrer em primatas vendidos como animais de estimação.
Achados clínicos – Os sinais variam com o local das lesões; devido a isso, tem-
se denominado a melioidose como uma doença “mímica”. Os diagnósticos diferen-
ciais incluem pneumonia, tuberculose, cólera, malária e várias artrítides. Em
animais domésticos, é geralmente crônica e progressiva. Em ovinos e caprinos,
abscessos pulmonares são comuns e a pneumonia torna-se evidente. Ocorre
descarga nasal caso se ulcere o septo nasal. Algumas vezes, afetam-se as
articulações e o animal fica aleijado. Os sinais de encefalite podem estar associados
com microabscessos no SNC. Pode ocorrer mastite nos caprinos, e pode-se isolar
a P. pseudomallei a partir do leite.
Tem-se descrito a melioidose nos eqüinos como distúrbios nervosos e respira-
tórios ou cólicas e diarréia. Em suínos, abscessos no baço são comumente
encontrados no abate. Tem-se encontrado freqüentemente um ou mais abscessos
infectados em ovinos, caprinos e suínos clinicamente normais. Ocorre morte
quando os abscessos são extensos ou quando se envolve um órgão vital.
Melioidose 436

Diagnóstico – O diagnóstico se faz por isolamento e identificação do microrga-


nismo e deve incluir a aglutinação com um anti-soro. O agente cresce facilmente nos
meios diagnósticos de rotina e apresenta uma forma de colônia e um odor
característicos, especialmente no ágar baseado em glicerol. Alguns dos microrga-
nismos com muitas das características bacteriológicas da P. pseudomallei não são
aglutinados por anti-soros específicos e não são patogênicos para as cobaias. Os
testes de fixação de complemento e de hemaglutinação indireta no soro são auxílios
diagnósticos úteis na maioria das espécies, incluindo o homem. Os imunoensaios
enzimáticos e os testes imunofluorescentes estão se tornando mais largamente
utilizados.
Tratamento e controle – O tratamento é caro e geralmente insatisfatório, pois
os animais podem sofrer recaídas ao se interromper o tratamento. O microrganismo
é sensível a canamicina, novobiocina, tetraciclina, sulfonamidas e trimetoprima-
sulfametoxazol. Algumas cepas não são sensíveis ao cloranfenicol. Os β-lactâmicos
imipenem e ceftazidima se provaram recentemente ativos in vitro contra a P.
pseudomallei. Pode-se controlar a doença por meio de uma criação intensiva dos
animais sem contato com o solo e pelo fornecimento da bebida com água limpa
(filtrada e/ou clorada). Quando ocorrer diarréia, os estábulos precisam ser
desinfetados e carcaças, camas e estrume removidos com segurança. O controle
na criação extensiva se limita supervisão e vacinação cuidadosas. Entretanto, as
vacinas não são efetivas contra um desafio forte.

NEOSPOROSE
É uma infecção por protozoário recentemente reconhecida de cães, e experi-
mentalmente, de roedores e gatos.
Etiologia – A espécie Neospora caninum é um parasita intracelular obrigatório
que era anteriormente confundido com a Toxoplasma gondii. Conhece-se apenas
os estágios assexuais, e eles lembram a T. gondii. Desconhece-se o ciclo vital
completo da N. caninum, mas ela pode ser transmitida transplacentariamente nos
cães, e pode afetar as ninhadas subseqüentes. Os taquizoítos possuem 5 a 7 × 1
a 5µm, dependendo do estágio da divisão. Dividem-se por endodiogenia. Encon-
tram-se taquizoítos em miócitos, neurônios, células dérmicas, macrófagos e em
outras células. Localizam-se com freqüência diretamente no citoplasma da célula
hospedeira sem um vacúolo. Cistos teciduais de até 100µm de diâmetro são
encontrados nos neurônios; a parede do cisto é amorfa e tem até 4µm de espessura.
Os cistos não têm septos e contêm bradizoítos delgados, de 7 × 1,5µm.
Achados clínicos – Afetam-se tanto cãezinhos como cães mais idosos. Nem
todos os filhotes de uma ninhada são afetados. A maioria das infecções severas
ocorre nos filhotes jovens, e torna-se tipicamente evidente como uma paralisia
ascendente dos membros, particularmente dos membros posteriores. A paralisia é
freqüentemente progressiva e resulta em uma contratura rígida dos músculos dos
membros afetados. Em alguns cães, observam-se apenas os sinais nervosos. A
síndrome da polirradiculoneuromiosite parece típica da neosporose. Também
podem ocorrer dermatite ulcerativa, hepatite, pneumonia e encefalite.
Lesões – Encefalomielite não supurativa, polirradiculoneurite, miosite necrosante
aguda, flebite, necrose hepática multifocal/coagulativa e atrofia dos músculos são
os achados predominantes.
Diagnóstico – Elevam-se os níveis de CPK, AST(SGOT) e ALT(SGPT). Ocasio-
nalmente, observam-se parasitas nas amostras de biópsia. Um teste de imuno-
Nocardiose 437

peroxidase que utilize anticorpos específicos pode identificar a N. caninum em


cortes teciduais ou em esfregaços de biópsia; pode-se utilizar um teste de imuno-
fluorescência indireta para a detecção dos anticorpos.
Tratamento – Não se conhece o tratamento, mas pode-se tentar o tratamento
com drogas da toxoplasmose (sulfadiazina, daraprima e clindamicina).

NOCARDIOSE
É uma infecção crônica resultante de microrganismos originários do solo do
gênero Nocardia, e caracterizada por lesões nodulares granulomatosas, purulentas
e generalizadas. Os agentes etiológicos são N. asteroides, N. brasiliensis e
N. otitidis-caviarum (caviae). Essa infecção parece afetar mais freqüentemente
bovinos, embora também se observe a doença em cães, eqüinos, gatos, ovinos,
caprinos e aves, bem como em peixes e vários animais silvestres e cativos, incluindo
mamíferos marinhos. O quadro histológico de supuração e granulação é acentua-
damente semelhante em diferentes espécies animais, nos diferentes locais anatô-
micos e com as várias nocárdias patogênicas. O debate ainda cerca a classificação
taxonômica da N. farcinica, aparentemente uma quimera de micobactérias e
nocárdias verdadeiras. A Nocardia asteroides é hoje a espécie-tipo do gênero.
Achados clínicos – Cães – Os sinais incluem febre, dor, claudicação,
dispnéia, empiema, aumento do abdome, linfadenite e abscessos flutuantes
nas glândulas salivares ou no tecido subcutâneo. Observam-se freqüentemente
nas extremidades inchaços granulomatosos que lembram lesões actinomicóticas.
Os abscessos superficiais se rompem e drenam pus que contém flocos de tecido
necrótico. Os pulmões e os linfonodos brônquicos quase sempre contêm lesões
supurativas e granulomatosas. Observam-se microcolônias bem definidas nos
exsudatos pleurais.
Bovinos – A mastite é a infecção nocardiana predominante entre as descritas
nos bovinos. A enfermidade sistêmica – febre prolongada, anorexia, emaciação,
aumento do lacrimejamento e da salivação – pode ou não se tornar evidente. As
glândulas mamárias afetadas podem ficar aumentadas de volume e firmes. O
exsudato viscoso e esbranquiçado contém coágulos sangüíneos discretos e peque-
nos (1µm) grumos (microcolônias) esbranquiçados de bactérias. Nunca se encon-
tram presentes grânulos sulfurosos. Freqüentemente, formam-se pequenos seios
de drenagem; casos severos, a glândula pode romper. Pode ocorrer metástase nos
pulmões e nos linfonodos supramamários. Também se têm descrito mormo bovino
(uma linfadenite e uma linfangite purulentas), abortamento e infecções pulmonares
e generalizadas. Mas tanto as nocárdias verdadeiras como as micobactérias (por
exemplo, a Mycobacterium farcinogenes) parecem capazes de induzir o mormo
bovino.
Diagnóstico – Deve-se suspeitar de nocardiose nos cães com doença pulmonar
inexplicada, com nódulos subcutâneos e nas glândulas salivares ou com absces-
sos. As radiografias torácicas revelam nódulos macios, não calcificados e difusos
em vários lobos dos pulmões.
Para propósitos diagnósticos, coletam-se pus, esputo ou uma amostra de biópsia
a partir da lesão, e preparam-se, secam-se, coram-se por Gram e examinam-se os
esfregaços sob imersão em óleo. Os microrganismos aparecem como formas
bacilares e filamentosas ramificadas, finas (≤ 1µm), Gram-positivas e em forma de
contas. Possuem um determinado grau de ácido-resistência, mas são difíceis de
serem demonstrados em material fixo por formalina. Os Nocardia spp são facilmente
Nocardiose 438

cultivados em placas de ágar de infusão de cérebro-coração ou de sangue,


incubadas a 37°C por ≥ 3 dias.
O diagnóstico específico de mastite em bovinos depende da cultura dos grumos
em leite não refrigerado e fresco, proveniente do quarto afetado. Têm-se demons-
trado anticorpos fixadores de complemento e precipitinas em soros de bovinos
infectados. As reações de hipersensibilidade cutânea provaram ter valor diagnós-
tico.
Tratamento – A nocardiose freqüentemente é fatal apesar de uma quimioterapia
vigorosa. A capacidade das nocárdias converter-se, ou existir, em uma forma
deficiente de parede celular parece constituir um fator na patogenia de algumas
infecções. O uso prolongado (6 a 12 semanas) do cotrimoxazol parece ser o melhor
tratamento para os cães. As práticas colaboradoras incluem a excisão dos nódulos
ou abscessos subcutâneos.
Tem-se tratado com sucesso a mastite nocardiana bovina com uma infusão no
úbere de 500mg de novobiocina combinados com 25 a 40mL de nitrofurazona a
0,2%, duas vezes ao dia, por 3 a 5 dias. Porém, como nos cães, o tratamento de
escolha é o cotrimoxazol. As práticas de higiene e de boa ordenha são possivelmen-
te mais importantes que a quimioterapia no controle da nocardiose em um rebanho.
Ainda não se conhece o papel veterinário dos antibióticos (por exemplo, imipenem
e amicacina) efetivos na nocardiose humana.

PESTE BUBÔNICA
É uma doença que afeta principalmente o sistema linfático e os pulmões,
causada pela Yersinia ( Pasteurella) pestis . Embora a peste bubônica seja um
flagelo histórico do homem, roedores silvestres e coelhos, casos associados
com gatos e cachorros são hoje reconhecidos como riscos para o homem. Uma
infecção experimental em 5 gatos resultou em uma enfermidade aguda dentro
de 24 a 48h em todos eles. A febre chegou a 41°C, e 3 dos 5 morreram (no
quarto, no sexto e no vigésimo dias). A temperatura dos 2 sobreviventes
retornou ao normal no sexto dia. Os 10 cães infectados experimentalmente
apresentaram sinais transitórios de enfermidade, com uma febre que chegou a
40,5°C, persistindo por 72h; mas todos se recuperaram e ficaram clinicamente
normais no sétimo dia após a exposição.
Existem focos endêmicos de peste bubônica silvestre no oeste dos EUA e em
várias outras áreas do mundo. As pulgas são os vetores que constituem os meios
primários de alastramento da Y. pestis a partir desses reservatórios, embora o
contato com as carcaças de coelho infectadas seja uma fonte de infecção importante
para o homem durante o inverno.
Nas áreas endêmicas, deve-se suspeitar da peste bubônica nos gatos, bem
como nos Felidae silvestres (por exemplo, os linces-vermelhos) que exibirem
febre, pneumonia e linfadenite. Pode-se confirmar o diagnóstico por cultura
sangüínea ou por teste de imunofluorescência do aspirado do linfonodo. Como
a peste bubônica nos gatos pode ser com freqüência rapidamente letal, deve-
se iniciar a terapia imediatamente. Estreptomicina e tetraciclina em combinação
são efetivas e, com base nos casos humanos, devem ser continuadas por ≥ 5
dias após a temperatura retornar ao normal para se evitar recidivas. A prevenção
envolve a eliminação do contato com os roedores ou coelhos silvestres infectados
e com suas pulgas.
Febre Q 439

FEBRE Q
É uma infecção rickettsial, geralmente inaparente, mas capaz de causar
abortos em ovinos, caprinos e bovinos, e uma doença semelhante à influenza
no homem, que pode resultar em endocardite crônica. O risco de infecção é
enormemente aumentado em pessoas (veterinários, criadores de gado, traba-
lhadores de matadouro e pessoal de laboratório) em ocupações que os colocam
em contato direto ou indireto com ovinos, caprinos ou bovinos parturientes e
infectados, ou com produtos (lã ou couro) de animais infectados. Têm ocorrido
vários episódios de febre Q no pessoal e nos pacientes humanos em instituições
médicas em que se utilizaram ovinos latentemente infectados para pesquisa. A
infecção humana foi aparentemente adquirida por meio da inalação de agentes
infecciosos presentes no ar.
Etiologia e epidemiologia – O microrganismo causador, a Coxiella burnetii, se
distribui mundialmente e tem sido encontrado em vários mamíferos domésticos e
silvestres, artrópodes e aves. Bovinos domésticos, ovinos, caprinos, cães e gatos
são suscetíveis à infecção, e encontra-se a doença na maioria das áreas onde se
mantêm bovinos, ovinos e caprinos. Os carrapatos ixodídeos e argasídeos podem
ser reservatórios do microrganismo.
A epidemiologia é complexa porque existem 2 padrões principais de trans-
missão; em um deles, o microrganismo circula entre animais silvestres e seus
ectoparasitas, principalmente os carrapatos; o outro ocorre nos ruminantes
domésticos, independentemente do ciclo dos animais silvestres. O microrganis-
mo se dissemina por meio do leite, placentas e descargas pós-parto infectados,
o que proporciona fontes de infecção em potencial para o homem e outros
animais.
A Coxiella burnetii pode sobreviver semanas a anos no ambiente, e pode se
espalhar por meio da aerossolização das partículas infectantes, por contato
direto ou por ingestão das descargas reprodutivas ou do leite. Com base em
evidências epidemiológicas, pode ocorrer transmissão por carrapatos entre os
ruminantes domésticos. O modo de transmissão mais importante dos ruminantes
domésticos para o homem é a transmissão aérea das partículas de pó a partir
de fluidos reprodutivos dessecados; no entanto, também estão envolvidos os
procedimentos obstétricos e o leite cru. A pasteurização a altas temperaturas
mata efetivamente o microrganismo. Os carrapatos podem transmitir ocasional-
mente a doença ao homem.
Achados clínicos e diagnóstico – A infecção é geralmente subclínica, mas
pode causar anorexia e abortos em ovinos e caprinos. Estudos recentes
implicam a C. burnetii como causa de infertilidade e abortamento esporádico em
bovinos. Uma vez que um ruminante doméstico se infecte, o microrganismo
pode se localizar nas glândulas mamárias, linfonodos supramamários, placenta
e útero, a partir dos quais pode eliminá-lo nos partos e lactações subseqüentes.
As lesões macroscópicas são inespecíficas nos ruminantes domésticos. realiza-
se mais comumente o teste de fixação de complemento, mas os testes de
aglutinação e de imunofluorescência e a microscopia de tecidos corados também
podem ser diagnósticos. A recuperação do microrganismo representa uma ameaça
para o pessoal de laboratório. Nos ruminantes domésticos, um diagnóstico
diferencial deve incluir agentes infecciosos e não infecciosos que causam abortos.
Tratamento e controle – Uma vacina para os animais, embora ainda não
disponível atualmente nos EUA, evitou a infecção quando administrada em ovinos
e bovinos não infectados. A tetraciclina é a droga de escolha para o tratamento, mas
não é tão efetiva como no tratamento das outras rickettsioses. A segregação dos
Febre Q 440

animais prenhes e a incineração ou o enterramento dos restos reprodutivos podem


reduzir enormemente o alastramento do microrganismo. A Coxiella burnetii é
altamente resistente aos agentes físicos e químicos.

ENFERMIDADE DA TRANSPIRAÇÃO
É uma toxicose aguda, febril, e proveniente de carrapatos, caracterizada princi-
palmente por um eczema úmido e profuso e uma hiperemia da pele e das
membranas mucosas visíveis. É essencialmente uma doença de bezerros jovens,
embora adultos também sejam suscetíveis. Infectaram-se experimentalmente ovi-
nos, suínos, caprinos e um cão. Essa doença ocorre nas porções oriental, central
e meridional da África e provavelmente no Sri Lanka e no sul da Índia.
Etiologia – A causa é uma toxina epiteliotrófica produzida por fêmeas de
determinadas linhagens da Hyalomma truncatum. A toxina se desenvolve no
carrapato, e não no hospedeiro vertebrado. O potencial de produção de toxina fica
retido nos carrapatos por 20 gerações, e possivelmente mais. As tentativas de
transmissão experimental entre animais afetados e normais, por contato ou por
inoculações de sangue, não obtiveram sucesso.
Os períodos graduais de infestação de um hospedeiro suscetível por carrapatos
“infectados” possuem efeitos diferentes no hospedeiro. Um período muito curto não
tem nenhum efeito; o animal permanece suscetível. Um período longo o suficiente
para produzir uma reação pode conferir imunidade, mas se a exposição for > 5 dias,
podem resultar sinais clínicos severos e morte. A recuperação confere uma
imunidade durável, que pode durar ≥ 4 anos. Descreveram-se também outras
formas intimamente relacionadas de toxicoses por H. truncatum.
Achados clínicos, lesões e diagnóstico – Após um período de incubação de
4 a 11 dias, os sinais aparecem subitamente e incluem hipertermia, anorexia, apatia,
corrimentos ocular e nasal, hiperemia das membranas mucosas visíveis, salivação,
necrose da mucosa oral e hiperestesia. Mais tarde, as pálpebras se mantêm unidas.
Sente-se a pele quente, e logo se desenvolve uma dermatite úmida, começando na
base das orelhas, axilas, virilha e períneo, e se estendendo pelo corpo inteiro. O pêlo
fica emaranhado, e podem-se observar gotas de umidade nele. A pele se torna
extremamente sensível e emite um odor azedo. Mais tarde, podem-se arrancar
facilmente os pêlos e a epiderme, expondo ferimentos úmidos e avermelhados. As
pontas das orelhas e da cauda podem necrosar e cair. Finalmente, a pele se torna
dura e rachada, e predisposta a infecções secundárias ou a uma infestação por
bicheira. O animal fica sensível à manipulação, exibe dor quando se movimenta e
procura a sombra.
O curso freqüentemente é rápido e pode ocorrer morte dentro de poucos dias.
Nos casos menos agudos, o curso fica mais prolongado e pode ocorrer recuperação.
A mortalidade nos bezerros afetados é de 30 a 70% sob condições naturais. A
morbidade nas áreas endêmicas é de , 10%. A severidade da infecção é
influenciada pelo número de carrapatos, bem como pelo período de tempo em que
permanecem no hospedeiro.
Além das lesões cutâneas descritas anteriormente, encontram-se emaciação,
desidratação, estomatite difteróide, faringite, laringite, esofagite, vaginite ou
postite, edema e hiperemia dos pulmões, atrofia do baço e congestão do fígado,
rins e meninges.
Para o diagnóstico, torna-se essencial a determinação da presença do vetor.
Ocorre tipicamente uma hiperemia generalizada com conseqüente descamação
Toxoplasmose 441

das camadas superficiais das membranas mucosas dos tratos respiratório superior,
gastrointestinal e genital externo, e uma dermatite úmida profusa, seguida por uma
descamação superficial da pele.
Profilaxia e tratamento – O controle da infestação de carrapatos constitui a
única medida profilática efetiva. Indicam-se a remoção dos carrapatos, o tratamento
sintomático e bons cuidados. Os antibióticos não nefrotóxicos e os agentes
antiinflamatórios são úteis para combater a infecção secundária. Pode-se utilizar
soro imune para um bom efeito como um tratamento específico.

TOXOPLASMOSE
A Toxoplasma gondii é um protozoário que infecta a maioria das espécies de
animais de sangue quente, incluindo as aves e o homem, na maior parte do
mundo.
Etiologia – O ciclo vital inteiro se completa no epitélio do intestino delgado dos
membros da família dos gatos; os estágios assexuais e sexuais se desenvolvem
endogenamente, e os oocistos são eliminados nas fezes. Três formas ou estágios
de T. gondii podem iniciar a infecção em gatos e outros vertebrados: 1. o trofozoíto
ou taquizoíto é a forma ativamente proliferativa observada nas infecções dissemi-
nadas agudas, e pode estar presente no sangue, urina, lágrima, saliva, sêmen, fezes
ou fluidos corporais, e em uma larga variedade de tecidos. Possui uma forma de lua
crescente, 4 a 8 × 2,4µm, e se cora bem com Giemsa. Sobrevive no ambiente ou nos
tecidos de um animal morto por apenas agumas horas; 2. o cistozoíto ou bradizoíto
é a forma dormente do Toxoplasma e está presente nas infecções congênitas e
adquiridas, crônicas ou assintomáticas. Encontra-se em cistos, principalmente no
cérebro, olho, fígado e musculatura cardíaca e esquelética. Os cistos individuais
possuem 50 a 150µm de diâmetro, e cada um tem uma parede cística elástica e
argirofílica que contém muitas centenas de zoítos ácido-periódicos-Schiff-positivos
bastante comprimidos. Essa forma pode sobreviver nos tecidos por vários dias após
a morte, mas é facilmente destruída pelo cozimento ≥ 66°C; 3. o oocisto é expelido
nas fezes de gatos suscetíveis após a ingestão de qualquer das 3 formas infectantes
(taquizoítos, bradizoítos e oocistos). Após a ingestão dos bradizoítos encistados do
Toxoplasma, os oocistos (10 × 12µm) aparecem nas fezes após 4 a 5 dias e
continuam a ser excretados, freqüentemente em números enormes, por 3 a 20 dias.
Esses oocistos esporulam em 2 a 4 dias e tornam-se então infectivos para
virtualmente todos os vertebrados. Os oocistos são resistentes e podem sobreviver
> 1 ano sob condições favoráveis. São destruídos por calor seco a 70°C, água
fervente, iodo forte e soluções de amônia fortes.
Achados clínicos – A maioria das infecções por Toxoplasma é latente ou
assintomática. Os altos títulos de IgG sérica são comuns em ovinos, suínos e gatos;
são menos comuns em cães e eqüinos; e até menos comuns em bovinos. A infecção
clínica é relativamente incomum na maioria das espécies, mas observam-se casos
esporádicos e epidemias ocasionais, particularmente em animais jovens e
estressados, e têm-se descrito surtos de infecção congênita. Geralmente, a infec-
ção clínica passa por um curso semelhante na maioria das espécies. Nos jovens, a
infecção geralmente é aguda e generalizada; nos adultos, se associa freqüentemen-
te apenas com o envolvimento crônico do SNC. Nos animais jovens, particularmente
em cãezinhos, gatinhos e leitões, os sinais incluem febre, anorexia, tosse, dispnéia,
diarréia, icterícia e disfunção do SNC. As lesões incluem pneumonite, linfadenite,
hepatite, miocardite e encefalomielite.
Toxoplasmose 442

A toxoplasmose é uma causa importante de abortos e natimortos, particularmen-


te em ovinos, e algumas vezes suínos e caprinos. Em ovinos e caprinos, as lesões
nas cotilédones fetais consistem de focos de necrose esbranquiçados e múltiplos de
até 2mm de diâmetro; no feto, pode haver áreas extensas de leucoencefalomalacia
e de nódulos gliais, alguns dos quais podem apresentar necrose central e
mineralização.
Diagnóstico – Deve-se confirmar a demonstração das lesões características e
dos microrganismos semelhantes a Toxoplasma nos cortes teciduais por meio do
isolamento do microrganismo e de testes sorológicos. O isolamento consiste de uma
injeção IP de material suspeito em camundongos livres da infecção natural por
Toxoplasma. Algumas cepas de Toxoplasma são letais aos camundongos em 5 a
12 dias e os esfregaços corados por Giemsa do exsudato peritoneal apresentam
muitas formas intracelulares e livres dos trofozoítos de Toxoplasma. A maioria das
cepas de Toxoplasma não é letal para os camundongos, mas produz uma infecção
crônica com cistos teciduais. Podem-se sangrar os camundongos após 4 a 6
semanas e medir o título de anticorpos de Toxoplasma em seu soro. Também se
podem fazer preparações de “macerados” úmidos do cérebro e examiná-los quanto
a cistos de Toxoplasma.
Encontram-se disponíveis vários testes sorológicos confiáveis para a detecção
dos anticorpos de Toxoplasma, embora os anticorpos de Hammondia dos hospedei-
ros intermediários também reajam com o antígeno de Toxoplasma, devendo-se
excluí-los em tais testes. O teste da tintura de Sabin-Feldman e os testes de fixação
de complemento, imunofluorescência indireta (IFI), hemaglutinação indireta (HAI),
ELISA e aglutinação (AG) são alguns dos testes sorológicos utilizados para o
diagnóstico. Encontram-se comercialmente disponíveis kits que contêm todos os
reagentes necessários para IFI, HAI, ELISA e AG. Os testes de IFI e HAI são menos
sensíveis que o teste da tintura.
Exige-se um aumento de 4 vezes nos títulos de anticorpos IgG nas amostras
coletadas em intervalos de 2 a 3 semanas para se confirmar uma infecção ativa. Os
altos títulos de IgG refletem uma infecção anterior e a presença contínua de
Toxoplasma encistados; nos gatos, eles indicam uma imunidade à eliminação de
oocistos. Os altos títulos de IgM nos gatos indicam uma infecção ativa e se
correlacionam bem com eliminações recentes de oocistos ou com a doença (o que
significa que tais gatos [com altos títulos de IgM] são riscos de saúde pública em
potencial).
Alguns dos casos descritos de toxoplasmose nos bovinos diagnosticados por
métodos histológicos se deveram provavelmente a outros parasitas protozoários,
por exemplo, o estágio de esquizonte do Sarcocystis. Semelhantemente, podem-se
ter confundido infecções em bezerros, cãezinhos e gatinhos com infecções causa-
das pela Neospora caninum (ver pág. 436) ou por protozoários intimamente
relacionados.
Tratamento – No caso dos outros animais além do homem, raramente se justifica
o tratamento. A sulfadiazina (73mg/kg de peso corporal) age sinergisticamente com
a pirimetamina (0,44mg/kg) no tratamento da toxoplasmose severa aguda nos
animais de laboratório e no homem. Como essas drogas parecem afetar apenas os
microrganismos livres (e não os cistos), deve-se instituir o tratamento tão cedo
quanto possível. Essa terapia pode produzir uma depressão tóxica reversível da
medula óssea, que pode ser evitada pelas vitaminas do complexo B e pelo ácido
folínico. A clindamicina é a droga de escolha para o tratamento das infecções por
Toxoplasma em cães e gatos. As dosagens totais (oral e parenteral) são de 10 a 40
e de 25 a 50mg/kg, respectivamente, para cães e gatos. Continua-se o tratamento
por ≥ 2 semanas. Aliviam-se os efeitos colaterais de anorexia, vômito e diarréia por
meio da redução ou da divisão da dosagem diária.
Tuberculose 443

Transmissão e profilaxia – Um animal prenhe não exposto anteriormente


pode desenvolver uma parasitemia com o alastramento da infecção para o
útero; pode resultar uma infecção congênita latente ou clara. Nas várias
espécies de roedores de laboratório, têm-se transmitido verticalmente infecções
congênitas assintomáticas para várias gerações.
Provavelmente, a maioria das infecções por Toxoplasma são adquiridas após o
nascimento. Nos carnívoros rigorosos, acredita-se que a infecção se siga à ingestão
de carne ou de carcaças infectadas (e não cozidas) e frescas de uma larga variedade
de hospedeiros intermediários. Nos herbívoros, acredita-se que a maioria das
infecções resulte da ingestão de pastos contaminados com oocistos de Toxoplasma
provenientes de fezes de gatos. Nos omnívoros, inclusive o homem, a infecção
parece resultar tanto da ingestão de carne não cozida como da ingestão acidental
de oocistos.
Em qualquer espécie de hospedeiro, uma toxoplasmose latente pode se tornar
ativa e causar uma infecção generalizada clara. Isso resulta de infecções intercor-
rentes (por exemplo, por vírus e protozoários), neoplasias, estresses ambientais ou
imunossupressão.
Em qualquer período, , 1% de todos os gatos dos EUA eliminam oocistos de
Toxoplasma em suas fezes. A reeliminação de oocistos raramente se segue à
reinfecção por cistos de Toxoplasma, e raramente (se muito) ocorre se o gato
desenvolver enterite, se infectar com outros coccídios ou ficar imunossuprimido.
Para se minimizar a transmissão de oocistos, não se deve alimentar os gatos com
carne crua e nem permitir que matem aves ou roedores; deve-se limpar diariamente
as camas (antes da esporulação dos oocistos), preferivelmente queimando-as. As
mulheres grávidas devem evitar o contato com gatos e com suas camas. O pessoal
de laboratório que trabalhar com gatos ou que manipular fezes de gatos deve evitar
a contaminação dos instrumentos e da bancada do laboratório, e deve usar luvas e
roupas protetoras.
Ainda não se encontra disponível uma vacina.

TUBERCULOSE
É uma doença infecciosa causada por bacilos ácido-resistentes do gênero
Mycobacterium. Embora seja comumente definida como uma doença crônica e
debilitante, a TB ocasionalmente assume um curso agudo e rapidamente progres-
sivo. A doença afeta praticamente todas as espécies de vertebrados, e antes de se
adotar medidas de controle, era uma doença importante do homem e dos animais
domésticos. Os sinais e lesões são geralmente semelhantes nas várias espécies.
Etiologia – Reconhecem-se 3 tipos principais de bacilos tuberculosos: o huma-
no, o bovino e o aviário; respectivamente, M. tuberculosis, M. bovis e complexo da
M. avium (M. avium-intracellulare-scrofulaceum). Os 3 tipos diferem em caracterís-
ticas culturais e patogenicidade. Os 2 tipos mamíferos são mais intimamente
relacionados entre si do que o tipo aviário. Reconhecem-se mais de 30 sorotipos do
complexo da M. avium; no entanto, apenas os sorotipos 1 e 2 são patogênicos para
as aves (ver também pág. 1941).
Todos os 3 tipos podem produzir infecção em espécies hospedeiras além das
suas próprias. A Mycobacterium tuberculosis é mais específica; raramente produz
uma doença progressiva nos animais inferiores além dos primatas não humanos, e
ocasionalmente em cães e papagaios. O complexo da Mycobacterium avium
(sorotipos 1 e 2) constitui a única espécie de conseqüência nas aves, mas também
Tuberculose 444

é patogênico para suínos, bovinos, ovinos, visons, cães, gatos e alguns animais de
sangue frio. A Mycobacterium bovis pode causar uma doença progressiva na
maioria dos vertebrados de sangue quente, inclusive no homem. As outras
micobactérias além dos bacilos tuberculosos (ver pág. 447) são raramente isoladas
de animais domésticos e exóticos.
Patogenia – A doença começa com a formação de um foco primário, que no
homem e nos bovinos, se localiza geralmente em um pulmão, e nas aves, quase
sempre no trato intestinal. Nos mamíferos, a drenagem linfática a partir do foco
primário leva à formação de lesões caseosas em linfonodos adjacentes; essas
lesões, junto com o foco primário, são conhecidas como “complexo primário”. Esse
complexo primário raramente se cura nos animais, mas pode progredir lenta ou
rapidamente.
Quando a lesão se localiza, resulta em uma massa granulomatosa e semelhante
a um tumor, chamada de tubérculo. O crescimento contínuo dos microrganismos
causa o aumento de volume do granuloma com subseqüente necrose central,
caseamento e uma tendência à mineralização. Nos mamíferos, os tubérculos
podem ficar envolvidos por um tecido conjuntivo denso e fibroso, e assim se
interrompe a doença. O alastramento linfatogênico e hematogênico dos bacilos a
partir dos focos primários resulta em tubérculos em outros órgãos e tecidos, cujo
número e extensão se relacionam com o número de bacilos circulantes. Essas
lesões generalizadas podem se encapsular e permanecer pequenas por longos
períodos, geralmente não causando nenhum sinal clínico detectável; no entanto,
uma forma aguda de generalização, conhecida como TB miliar, com freqüência é
rapidamente fatal.
Achados clínicos – Os sinais dependem da extensão e da localização das
lesões. Os linfonodos superficiais aumentados fornecem um sinal diagnóstico útil;
no entanto, as lesões nos linfonodos profundos possuem pouco ou nenhum valor no
estabelecimento de um diagnóstico clínico. Os sinais gerais são fraqueza, anorexia,
dispnéia, emaciação e um baixo grau de febre flutuante. Nas infecções por M. bovis
em mamíferos, envolvem-se geralmente os órgãos torácicos. Ao se envolver
extensivamente os pulmões, torna-se comum uma tosse curta, repetida e intermi-
tente. O sinal principal de TB consiste comumente em uma emaciação ou
definhamento crônico, que ocorrem apesar da boa nutrição e dos cuidados. Nos
suínos, as lesões devidas à M. avium são mais freqüentemente observadas nos
linfonodos associados com o trato gastrointestinal; porém, ocorre uma doença
generalizada.
Diagnóstico – O diagnóstico clínico torna-se geralmente possível somente após
a doença se encontrar avançada. A maioria dos animais infectados se torna
eliminadora dos bacilos tuberculosos nesse momento e se constituem em uma
ameaça aos outros animais. Utiliza-se a radiografia nos primatas não humanos e
nos pequenos animais domésticos. Nos grandes animais domésticos, o método
mais confiável e prático de obtenção de um diagnóstico por tentativa consiste em um
teste cutâneo de tuberculina. Os animais infectados com micobactérias desenvol-
vem uma reação de hipersensibilidade retardada, caracterizada por inflamação e
inchaço, onde se injetou intradermicamente a tuberculina.
Os animais infectados tanto com a M. bovis como com a M. tuberculosis reagem
quase que igualmente a uma tuberculina preparada a partir de uma cultura de um
desses microrganismos. Como aves e mamíferos com TB aviária reagem menos ou
não reagem à tuberculina mamífera, deve-se utilizar a tuberculina aviária nesses
casos.
A dose utilizada em um teste intradérmico de tuberculina é de 0,1mL (0,1mg de
proteína) nos mamíferos e 0,05mL nas galinhas. Nos mamíferos maiores nos EUA,
geralmente injeta-se a tuberculina em uma dobra de pele próxima à base da cauda
Tuberculose 445

ou na pele da região cervical. Nos suínos, a injeção se faz na pele da superfície


dorsal de uma orelha ou na vulva; nas galinhas, na pele de uma barbela. Observam-
se e palpam-se os locais de injeção quanto ao inchaço característico 48h após a
injeção em suínos e galinhas, e 72h em bovinos e na maioria dos animais exóticos
e silvestres, exceto em primatas (ver também pág. 1247).
Quase todos os países utilizam atualmente uma cepa da M. bovis para a
preparação da tuberculina mamífera para uso veterinário. Em alguns países, ainda
se utiliza a tuberculina de meio sintético concentrada pelo calor (tuberculina velha
[TV]), mas a maioria (incluindo os EUA) utiliza hoje uma tuberculina derivativa
proteica purificada (DPP) em uma concentração proteica de 1mg/mL. As tuberculi-
nas DPP são preferíveis por serem mais fáceis de padronizar e mais específicas que
a TV. As tuberculinas DPP também são particularmente úteis no teste de tuberculina
cervical-comparativo (c-c), utilizado para diferenciar as respostas causadas pelos
bacilos tuberculosos mamíferos e pelas outras micobactérias. O teste c-c é realizado
nos bovinos por meio da injeção intradérmica de tuberculinas DPP de M. avium e
M. bovis em locais separados no pescoço. A diferença no tamanho das 2 respostas
geralmente indica se a sensibilidade à tuberculina é causada mais pela infecção pela
M. bovis do que pela infecção pelo complexo da M. avium, pela M. paratuberculosis
ou por uma sensibilização transitória de micobactérias saprofíticas (por exemplo,
M. terrae e M. nonchromogenicum) no ambiente. Esses microrganismos são
responsáveis por algumas das reações de tuberculina falsos-positivas que são o
principal problema em áreas onde já se tenha quase eliminado a TB. Pode-se reduzir
bastante a incidência de reativos sem nenhuma lesão macroscópica por meio do uso
do teste c-c aplicado por pessoal experiente; entretanto, não se deve utilizar o teste
c-c em rebanhos nos quais se tenha diagnosticado a M. bovis. Para se confirmar o
diagnóstico de TB, deve-se isolar e identificar o agente etiológico. Os resultados de
cultura geralmente exigem 4 a 8 semanas.
Controle – Os principais reservatórios da infecção são o homem e os bovinos;
no entanto, também se encontraram texugos, bisões, gambás, kudu, veados,
lhamas, cervos-nobres e suínos domésticos e selvagens infectados com M. bovis .
A prevalência da doença em tais reservatórios influencia a incidência da doença nas
outras espécies.
Os 3 principais métodos de controle da TB são teste e abate, teste e segregação,
e quimioterapia. No método de teste e abate, abatem-se os reagentes positivos ao
teste de tuberculina. Tem-se utilizado largamente esse método no Reino Unido,
EUA, Canadá, Nova Zelândia e Austrália. Na maioria dos países europeus, onde o
teste e abate não seriam práticos, têm-se utilizado formas variantes do teste e
segregação, empregando-se teste e abate apenas nos estágios finais da erradicação.
Pode-se utilizar a isoniazida (INH) na quimioterapia, mas as desvantagens são tão
grandes (até 25% de casos refratários, aparecimento de cepas resistentes à droga,
presença de INH no leite e risco de recidiva ao se retirar a droga) que não se permite
o tratamento da TB bovina nos EUA ou na maioria dos outros países.
Embora a vacina BCG (bacilo de Calmette-Guérin) seja um agente imunizante
utilizado no homem em algumas áreas de alto risco, ela não previne completamente
a infecção em bovinos ou animais exóticos cativos. Além do mais, os animais
vacinados reagem ao teste cutâneo de tuberculina. Os países que tentaram usar a
vacinação como base de um programa de controle para a TB bovina acabaram por
abandonar o procedimento em favor do método de teste e abate.

Tuberculose nos animais ungulados, exóticos e cativos


Numerosas espécies, incluindo bisões, elefantes, rinocerontes, kudu, camelos,
lhamas, girafas e órix são suscetíveis à M. bovis. As lesões geralmente envolvem
Tuberculose 446

pulmões e linfonodos torácicos. Pode-se geralmente realizar um diagnóstico por


tentativa através da condução de testes cutâneos de tuberculina. Tem-se utilizado
a terapia com isoniazida. Devido à importância de saúde pública, devem-se manter
os animais infectados em isolamento.

Tuberculose nos gatos


Os gatos, ao contrário dos cães, são resistentes à infecção com M. tuberculosis.
A maioria das infecções naturais com M. bovis surge da ingestão de leite contami-
nado, e encontram-se lesões primárias no trato gastrointestinal. Porém, ocorre
infecção respiratória. Os ferimentos infectados algumas vezes dão origem a seios
tuberculosos. Antigamente, até 12% dos gatos necropsiados em partes da Europa
eram tuberculosos, mas a eliminação dos bacilos tuberculosos a partir do suprimen-
to de leite tornou a doença rara.
As lesões nos gatos geralmente lembram as dos cães. Têm-se registrado uns
poucos focos primários isolados, e parece que a infecção se segue a uma rápida
disseminação. Lesões e descargas geralmente contêm grandes números de
bacilos.
Considera-se o teste cutâneo de tuberculina não confiável nos gatos, e o
diagnóstico radiográfico freqüentemente é difícil. O isolamento de bacilos ácido-
resistentes fornece evidências de infecção, mas os resultados negativos de uma
cultura possuem valor questionável. Devido à importância de saúde pública, devem-
se sacrificar os animais afetados, assim como remover os outros gatos da proprie-
dade devido à TB bovina.

Tuberculose nos bovinos


Uma vez difundidos, particularmente no gado leiteiro, os programas de controle
reduziram tanto a incidência que vários países a eliminaram virtualmente. Continua-
se a identificar alguns rebanhos infectados em diversas áreas dos EUA. A fonte de
infecção geralmente são outros bovinos infectados, embora em alguns países, a TB
pulmonar ou geniturinária no homem, ou a TB bovina nos animais silvestres
constituam fontes de infecção.
Os animais tuberculosos com lesões pulmonares não encapsuladas expelem
gotículas infectadas no ar por meio da tosse, e contaminam o pasto por meio das
fezes. Os animais adultos se infectam pela inalação de partículas de pó aéreas, bem
como por meio da ingestão de alimento ou água contaminados. Os bezerros podem
se infectar ao beberem leite contaminado.
As lesões agudas geralmente se encontram no tórax e algumas vezes nos
linfonodos da cabeça ou intestinos. As lesões podem se encontrar em muitos órgãos
em estágios avançados da doença e nos tecidos que raramente são afetados
primariamente; conseqüentemente, ocorre infecção no úbere, útero, em vários
linfonodos, rins e meninges com freqüência variável. Raramente se afetam os
músculos esqueléticos, mesmo nos casos avançados. A TB no úbere assume uma
importância especial devido à contaminação do leite com bacilos tuberculosos
viáveis.

Tuberculose nos cães


Os cães podem se infectar com M. tuberculosis , M. bovis e raramente com o
complexo da M. avium ou M. fortuitum. Os cães podem se infectar a partir de uma
fonte humana e podem por sua vez infectar o homem, especialmente as crianças.
As raças braquicefálicas parecem ser mais suscetíveis, e os machos são afetados
mais comumente que as fêmeas.
Tuberculose 447

As lesões tuberculosas nos cães lembram freqüentemente neoplasias, e a


calcificação é rara. As lesões são geralmente branco-acinzentadas e circunscritas.
As lesões hepáticas são grandes e amareladas, com centros deprimidos e bordas
hemorrágicas. Algumas dessas lesões apresentam centros purulentos e macios;
outras parecem cavidades sanguinolentas gastas ou podem assumir a forma de
pequenos nódulos cinzentos múltiplos, espalhados pelo fígado.
As lesões pulmonares geralmente consistem de áreas broncopneumônicas
vermelho-acinzentadas; algumas se disseminam para formar cavidades. Podem se
abrir na cavidade pleural ou se comunicar com um brônquio. As lesões pulmonares
e pleurais são invariavelmente exsudativas, e uma grande quantidade de um líquido
cor-de-palha pode se localizar no tórax. Algumas lesões podem causar colapso das
porções inferiores do pulmão.
Os testes de tuberculina falsos-negativos são comuns nos cães; as radiografias
e a história da exposição se tornam úteis no diagnóstico. Devido à importância de
saúde pública, devem-se sacrificar os cães afetados, assim como se devem
remover os cães de propriedades em que haja bovinos infectados com TB bovina.

Tuberculose em primatas não humanos


Os macacos e os grandes antropóides são suscetíveis a M. bovis, M. tuberculosis
e M. avium. Têm-se descrito epidemias em várias colônias de primatas. O controle
e a erradicação são difíceis de se obter, já que comumente ocorre doença pulmonar.
Os macacos do Novo Mundo parecem ser mais resistentes à infecção que os
macacos do Velho Mundo. Tem-se utilizado a isoniazida no tratamento de animais
infectados com M. tuberculosis ou M. bovis ; no entanto, os macacos podem
continuar a eliminar bacilos na urina. Têm-se utilizado largamente os testes
cutâneos de tuberculina na detecção dos animais infectados. Nos testes em
macacos, devem-se utilizar tuberculinas preparadas para uso veterinário. As
tuberculinas DPP preparadas para o uso no homem não são suficientemente
potentes para omitir as respostas de hipersensibilidade do tipo retardado nessas
espécies (ver também pág. 1247).

Tuberculose nos suínos


Os suínos são suscetíveis à infecção com todos os 3 tipos de bacilos
tuberculosos. A infecção é mais freqüentemente contraída por meio da ingestão
de materiais infectados; por isso, as lesões primárias se situam no trato
gastrointestinal e nos linfonodos associados, particularmente nos mesentéricos,
cervicais ou submaxilares.
A disseminação freqüentemente é severa e rápida no caso da M. bovis, mas a
infecção com M. avium ou com M. tuberculosis geralmente se limita aos linfonodos
da cabeça e do trato gastrointestinal e aos linfonodos associados. As lesões
causadas por M. avium ou M. tuberculosis geralmente não são invasivas, enquanto
a M. bovis geralmente causa uma doença rapidamente progressiva com caseamento
e liquefação das lesões. Deve-se confirmar a diferenciação do tipo de infecção por
meio de isolamento e identificação do microrganismo.

Tuberculose nos ovinos e caprinos


A TB é rara nos ovinos e nos caprinos, mas quando ocorre, a M. bovis causa
uma afecção semelhante à dos bovinos; o bacilo aviário pode causar lesões
disseminadas. Pode-se realizar um diagnóstico por tentativa através da injeção
de tuberculina DPP de M. bovis e de M. avium em locais separados na região
cervical.
Tuberculose 448

Outras infecções micobacterianas além da tuberculose


Têm-se isolado micobactérias encontradas no solo e na água a partir dos tecidos
dos animais. Tem-se associado a Mycobacterium fortuitum (um microrganismo de
crescimento rápido que é altamente resistente a penicilina G, estreptomicina,
ampicilina, sulfametoxazol e cloranfenicol) a mastite nas vacas, infecções pulmona-
res nos cães, lesões em linfonodos nos suínos e em determinados animais exóticos
e lesões cutâneas nos gatos e nos cães. Os testes de suscetibilidade à droga
indicam que o microrganismo é inibido pela capreomicina e pela etionamida. Tem-
se isolado a Mycobacterium chelonei (uma outra micobactéria de crescimento
rápido, semelhante à M. fortuitum nas reações bioquímicas) a partir de ferimentos
contaminados e de abscessos por injeção. Devem-se distinguir esses microrganis-
mos de M. parafortuitum, M. phlei, M. smegmatis e M. vaccae, que raramente ou
nunca são patogênicos.
Os peixes e outros animais de sangue frio podem se infectar com um microrga-
nismo ácido-resistente fotocromogênico, a M. marinum, que tem sido reconhecida
como um patógeno humano. Tem-se isolado um outro microrganismo fotocromogê-
nico, a M. kansasii, a partir de suínos, bovinos e primatas não humanos. Podem-se
diferenciar esses microrganismos com testes bioquímicos e de soroaglutinação.
Tem-se isolado a Mycobacterium scrofulaceum, um escotocromógeno, a partir
de lesões nos linfonodos em suínos, bovinos e determinados primatas não huma-
nos. Tem-se isolado a Mycobacterium xenopi, um escotocromógeno de crescimento
lento, a partir de suínos, aves aquáticas e anfíbios. Devem-se diferenciar esses
microrganismos da M. gordonae e M. flavescens e de outras micobactérias
escotocromogênicas de crescimento lento que são contaminantes comuns da água.
Podem-se isolar a partir da água e do solo numerosas micobactérias não
fotocromogênicas e não patogênicas que lembram estritamente patógenos em
potencial; podem-se diferenciar a M. nonchromogenicum, M.gastri, M. triviale e
M. terrae (que lembram estritamente cepas do complexo da M. avium) por meio de
exames laboratoriais in vitro.
Embora as micobactérias oportunistas geralmente falhem em produzir uma
doença progressiva, elas podem ser importantes na indução de uma sensibilidade
cutânea transitória à tuberculina nos animais. A aplicação dos testes cutâneos c-c,
utilizando tuberculinas DPP biologicamente balanceadas preparadas a partir de
filtrados de culturas de M. bovis e M. avium, proporciona informações úteis acerca
da possível causa da sensibilidade cutânea à tuberculina. Devem-se utilizar as
tuberculinas preparadas para uso veterinário, que contêm , 5.000 unidades de
tuberculina por dose de teste nos testes cutâneos em animais domésticos, silvestres
e exóticos.
A Mycobacterium lepraemurium, um bacilo ácido-resistente, de crescimento
lento e não fotocromogênico, causa uma doença em gatos e ratos semelhante em
alguns aspectos à lepra no homem. O microrganismo pode crescer em meios que
contenham o citocromo C e o α-cetoglutarato. A causa da lepra no homem, a
M. leprae, tem sido encontrada em doenças espontaneamente ocorrentes nos
tatus. Esse microrganismo não cresce em meio de cultura artificial.

TULAREMIA
É uma septicemia bacteriana que afeta > 100 espécies de mamíferos silvestres
e domésticos, aves, répteis e peixes, bem como o homem. O animal doméstico
Tularemia 449

hospedeiro primário é o ovino, mas já se descreveu infecção clínica em cães, gatos,


suínos e eqüinos. Os bovinos parecem ser resistentes. Pouco se sabe acerca da
incidência verdadeira e do espectro de doença clínica nos animais domésticos. Os
animais silvestres hospedeiros importantes incluem lebres-da-Califórnia e lebres-
de-cauda-de-algodão, castor, rato almiscarado, ratos-silvestres-aquáticos-de-cau-
da-curta, ovinos na América do Norte e outros ratos-silvestres-aquáticos, ratos-do-
mato e lemingues na Europa e na Ásia.
Existem focos de infecção naturais na América do Norte e Eurásia, onde o
microrganismo circula entre vetores artrópodes e vários mamíferos, aves, répteis e
peixes.
Etiologia – O microrganismo causador, a Francisella tularensis , é um bastonete
Gram-negativo não esporulante, que se relaciona antigenicamente com as brucelas.
É morto rapidamente por calor e desinfecção apropriada, mas sobrevive por semanas
ou meses em um ambiente úmido. É fastidioso no crescimento, mas pode ser cultivado
facilmente; o pessoal de laboratório está em alto risco de infecção. Os microrganismos
ocorrem em 2 tipos, com base em sua bioquímica e virulência. Na América do Norte
encontra-se apenas o Tipo A, que é o mais virulento; no homem, a taxa de
mortalidade pode ser de 5 a 7%, se não for tratado. O Tipo B é menos virulento
sendo mais comumente isolado a partir de animais aquáticos e infecções associadas
com a água. Têm-se isolado ambos os tipos a partir de vetores artrópodes.
Transmissão e epidemiologia – A tularemia é uma zoonose clássica, capaz de
ser transmitida por aerossol, contato direto, ingestão ou artrópodes. A inalação de
aerossóis infecciosos (ou microrganismos, como no laboratório) pode produzir uma
forma pneumônica. O contato direto com (ou a ingestão de) carcaças infectadas de
animais silvestres (por exemplo, da lebre-de-cauda-algodão) pode produzir uma
forma ulceroglandular, oculoglandular ou orofaríngea (lesão local com linfadenite
regional) ou uma forma tifóide. A imersão em ou a ingestão de água contaminada
pode produzir a infecção nos animais aquáticos. Os carrapatos podem manter a
infecção transestadialmente e transovarianamente, o que os torna reservatórios
eficientes, bem como vetores. Os vetores reconhecidos nos EUA incluem a
Dermacentor andersoni, o “carrapato-do-mato”; a Amblyomma americanum, o
“carrapato-estrela-solitária”; a Dermacentor variabilis, o “carrapato-dos-cães”; e a
Chrysops discalis, a “mosca-dos-veados”.
A fonte de infecção mais comum para o homem e os herbívoros é a picada de um
carrapato infectado, mas as pessoas que depenam, preparam ou ingerem carne de
caça inadequadamente cozida também estão em risco aumentado. Cães, gatos e
outros carnívoros podem adquirir a infecção a partir da ingestão de uma carcaça
infectada.
Achados clínicos e lesões – A tularemia tem um período de incubação de 1 a
10 dias. Nos ovinos e na maioria dos mamíferos, se caracteriza por um início súbito
de febre alta, letargia, anorexia, rigidez, redução da mobilidade ou outros sinais
associados com uma doença septicêmica. Aceleram-se o pulso e a freqüência
respiratória; podem-se desenvolver tosse, diarréia e polaciúria. Podem ocorrer
prostração e morte em poucas horas ou dias. Em qualquer espécie, os casos
esporádicos são melhor reconhecidos por meio dos sinais de septicemia. A
mortalidade pode ser de até 15% nos surtos em cordeiros não tratados. Os casos
subclínicos podem ser comuns.
As lesões mais consistentes são focos de necrose esbranquiçados e miliares no
fígado, e algumas vezes no baço e linfonodos. Torna-se comum o aumento de
volume do fígado, baço e linfonodos. Podem-se isolar facilmente os microrganismos
a partir de espécimes de necropsia com o uso de meios especiais. O risco de
infecção durante a necropsia ou para o pessoal de laboratório é significativo; tornam-
se essenciais instalações e procedimentos especiais.
Tularemia 450

Diagnóstico – Deve-se diferenciar a tularemia de outras doenças septicêmicas


(especialmente da peste bubônica) ou da pneumonia aguda. Quando grandes
números de ovinos exibem os sinais típicos durante os períodos de infestação
pesada por carrapatos, deve-se suspeitar de tularemia ou paralisia por carrapatos
(ver pág. 755).
O diagnóstico da infecção aguda se confirma pela cultura e identificação da
bactéria, pelo teste de imunofluorescência indireta ou por um aumento de 4 vezes
o título de anticorpos entre as amostras séricas agudas e convalescentes. Um único
título de ≥ 1:80, obtido pelo teste de aglutinação em tubo, torna-se uma evidência
presuntiva de uma infecção anterior.
Tratamento e controle – Estreptomicina, tetraciclinas, gentamicina e doxiciclina
são efetivas nos níveis de dosagem recomendados. O tratamento inicial deve
impedir a perda por morte. O controle é difícil e se limita à redução da infestação de
carrapatos e a um diagnóstico e tratamento rápidos. Pode se tornar necessário um
tratamento persistente, já que muitos microrganismos são intracelulares. Vacinas
encontram-se disponíveis para o pessoal de alto risco; a recuperação confere uma
imunidade de longa duração.

ESTOMATITE VESICULAR
É uma doença viral caracterizada por febre e vesículas nas membranas mucosas
da boca, epitélio da língua, tetas, solas dos pés, coroa do casco e ocasionalmente
de outras partes do corpo. Bovinos, eqüinos e suínos são naturalmente suscetíveis;
ovinos e caprinos se infectam ocasionalmente. Os agentes apresentam uma larga
variação de hospedeiros, incluindo, veados, linces-vermelhos, guaxinins e maca-
cos; muitos roedores e animais de sangue frio têm sido infectados experimentalmen-
te. Tem ocorrido uma doença semelhante à gripe nas pessoas que trabalham com
animais infectados ou com o vírus. Confirmou-se a estomatite vesicular apenas nas
Américas do Norte e do Sul.
Etiologia e epidemiologia – Os vírus em forma de bastão pertencem ao grupo
dos rabdovírus, cujos membros parasitam não só mamíferos, como também peixes,
insetos e plantas – uma diversidade de hospedeiros desconhecida para qualquer
outro grupo de vírus.
Há 2 sorotipos distintos: o Nova Jérsei e o Indiana, com 3 subtipos do último. Não
há imunidade cruzada entre os 2 sorotipos ou entre os vírus da estomatite vesicular,
febre aftosa, exantema vesicular e enfermidade vesicular suína. Ela não é tão
contagiosa quanto a febre aftosa. Em um rebanho, até 90% dos animais apresentam
sinais clínicos, e quase todos desenvolvem anticorpos. O vírus se encontra em
abundância no fluido vesicular claro e nos invólucros vesiculares; torna-se mais
infectivo quando as vesículas se rompem ou logo depois disso. No entanto, as
lesões podem ficar inócuas 5 ou 6 dias mais tarde.
A estomatite vesicular geralmente ocorre epidemicamente nas regiões tempera-
das e endemicamente nas regiões mais quentes. Os vetores insetos e o movimento
dos animais são provavelmente responsáveis por seu alastramento. O sorotipo
Indiana é transmitido pelos flebotomíneos mosquitos-pólvora. A doença pode se
espalhar rapidamente, afetando freqüentemente muitos animais em 1 semana. Nas
regiões endêmicas, ela ocorre durante a estação quente, freqüentemente durante ou
no final da estação chuvosa. Também se torna provável uma fase persistente do vírus.
Desconhece-se a rota primária de infecção, mas ela pode ser através da pele ou
do trato respiratório. Ocorrem lesões generalizadas, mas a viremia é incomum.
Enfermidade Eqüina Africana 451

Achados clínicos – O período de incubação é de 2 a 8 dias, ou possivelmente


mais. Freqüentemente, o excesso de salivação corresponde ao primeiro sinal. O
exame da boca pode revelar vesículas elevadas e descoradas. As lesões variam em
tamanho; algumas não são maiores do que uma ervilha, enquanto outras podem
envolver a superfície inteira da língua. Nos eqüinos, as lesões se confinam
principalmente à superfície superior da língua, mas podem também envolver a
superfície inferior dos lábios, os ângulos da boca e a gengiva. Nos bovinos, as lesões
também podem ocorrer no palato duro, lábios e gengiva, e algumas vezes se
estendem ao focinho e ao redor das narinas. Não são excepcionais as lesões
secundárias, que envolvem os pés de eqüinos e bovinos. Nos rebanhos leiteiros são
encontradas lesões nas tetas. Nas infecções naturais dos suínos, são freqüentes as
lesões podais, e a claudicação corresponde freqüentemente ao primeiro sinal
observado. A temperatura corporal pode se elevar imediatamente antes do, ou
simultaneamente com o aparecimento das vesículas. Geralmente, não há compli-
cações e a doença é autolimitante, com a recuperação ocorrendo em , 2 semanas.
Nos rebanhos leiteiros, a queda de produção pode ser séria e a mastite pode se
constituir em uma seqüela. Os anticorpos séricos persistem por toda a vida, mas
pode ocorrer a recrudescência da doença ou uma reinfecção.
Diagnóstico – A estomatite vesicular, embora economicamente importante,
possui uma importância particular devido à sua semelhança com a febre aftosa, o
exantema vesicular e a enfermidade vesicular suína. Por causa disso, devem-se
diagnosticar precisamente os surtos. Quando a estomatite vesicular afeta eqüinos
sob condições naturais, não ocorre um problema diagnóstico sério, pois os eqüinos
não são suscetíveis à febre aftosa. O diagnóstico se baseia na distribuição e nas
características das lesões, e pode-se diferenciar a doença da varíola eqüina através
da ausência de pápulas e pústulas. Em bovinos e suínos, o diagnóstico se faz pela
fixação de complemento ou pelo ELISA, utilizando-se uma suspensão da lesão
epitelial como antígeno. Se esses testes forem negativos, passa-se o material em
camundongos, ovos embrionados ou culturas teciduais, e depois se realizam de
novo os testes de fixação de complemento, ELISA e de neutralização viral. Com
esses testes, também se podem detectar anticorpos nos soros dos animais
recuperados. Pode-se realizar a microscopia eletrônica a partir da amostra original
ou do material cultivado.
Tratamento e controle – Devem-se enviar os casos suspeitos imediatamente à
atenção do estado ou das autoridades federais. Não há tratamento específico.
Devem-se tratar sintomaticamente a infecção secundária do tecido desgastado e as
outras seqüelas. Em alguns países da América Latina, encontram-se disponíveis
vacinas. Deve-se restringir a movimentação dos animais, e desinfectar os cami-
nhões e os fomitos.

ENFERMIDADE EQÜINA AFRICANA


A enfermidade eqüina africana (EEA) uma doença viral dos Equidae, aguda ou
subaguda, originária de insetos, endêmica no continente africano e caracterizada
por sinais clínicos e lesões associados à deterioração respiratória e circulatória.
Etiologia e epidemiologia – A EEA é causada por um orbivírus, de 55 a 70nm
de diâmetro, da família Reoviridae. Existem 9 tipos imunologicamente distintos. Os
extratos de cérebro de camundongo infectado com o vírus da EEA hemaglutinam as
hemácias dos eqüinos. O vírus fica inativado a um pH de < 6 ou de ≥ 12, ou por
formalina, β-propiolactona, derivados acetiletileneimínicos ou radiação.
Enfermidade Eqüina Africana 452

O aparecimento da EEA é precedido pelas estações de chuvas fortes, que se


alternam com condições climáticas quentes e secas. Os surtos na África Central e
Oriental se estenderam ao Egito, Oriente Médio e sul da Arábia. De 1950 a 1960,
uma epidemia importante se estendeu da Índia aos países do Oriente Próximo;
estimou-se que 300.000 Equidae foram destruídos. Em 1966, ocorreu um segundo
surto no norte da África e sul da Espanha. Em 1987, a doença entrou na Espanha
por meio de uma zebra importada da Namíbia. Ambos esses surtos na Espanha
foram controlados, mas um outro ocorreu em 1988, e ocorreram casos esporádicos
no início de 1989. Em uma pesquisa no Egito, detectaram-se anticorpos para o vírus
da EEA em ovinos, caprinos, camelos, bufalinos e cães.
Transmissão – Os Culicoides spp são os principais vetores de transmissão. A
EEA ocorre durante as estações quentes e chuvosas, que favorecem a propagação
dos vetores e desaparece após o frio. Isolou-se o vírus a partir do sangue de cães
vadios clinicamente saudáveis, do carrapato dos cães Rhipicephalus sanguineus
sanguineus, e do carrapato dos camelos Hyalomma dromedarii durante o inverno
na região de Assuã, no sul do Egito, onde a doença é endêmica. Transmitiu-se
experimentalmente a doença por meio de mosquitos. Os estudos limitados utilizan-
do cães que se recuperaram de uma infecção experimental no Egito revelaram que
3 ataques diários sucessivos por grupos de Culex pipiens ativaram os vírus de EEA
latentes e iniciaram uma viremia e febre. Sugeriu-se que o vírus possa “hibernar” nos
cães com infecção persistente. No entanto, desconhece-se o papel completo dos
artrópodes na transmissão da doença.
Achados clínicos e lesões – A mortalidade depende da virulência do isolado e
da suscetibilidade do hospedeiro, e pode atingir 90% em epidemias. A forma
respiratória aguda se caracteriza por um período de incubação de 3 a 5 dias, por um
edema interlobular e por um hidropericárdio; ocorre morte em , 1 semana. Uma
febre de 40 a 40,5°C por 1 a 2 dias é seguida de dispnéia, tosse espasmódica, e
dilatação das narinas; o animal fica em pé com suas pernas afastadas e a cabeça
estendida. A conjuntiva fica congesta e a fossa supra-orbital pode inchar. A
recuperação é rara e o animal morre de anoxia. À necropsia, há um edema
pulmonar, que se torna especialmente visível nos espaços intralobulares. Os
pulmões se distendem e ficam congestos, e pode-se encontrar um fluido espumoso
na traquéia, brônquios e bronquíolos. Pode haver uma efusão pleural. Os linfonodos
torácicos podem ficar edematosos e o fundo gástrico pode ficar congesto. São
encontradas petéquias hemorrágicas no pericárdio, e ocorre um aumento no fluido
pericárdico. As lesões cardíacas geralmente não são importantes. As vísceras
abdominais podem ficar congestas. Pode escorrer um exsudato espumoso a partir
das narinas. A forma pulmonar é a forma comum nos cães.
A forma cardíaca é subaguda, e o período de incubação é de 1 a 2 semanas. A
reação febril de < 1 semana se segue de inchaço da fossa supra-orbital, que é
patognomônico. O inchaço geralmente se estende a pálpebras, tecidos faciais,
pescoço, tórax, carne do peito e ombros. Geralmente ocorre morte dentro de 1
semana e esta pode ser precedida por cólica. A taxa de mortalidade é de , 50%.
As petéquias e equimoses no epicárdio e no endocárdio tornam-se proeminentes.
Os pulmões ficam geralmente flácidos ou ligeiramente edematosos. Ocorrem
infiltrações amareladas e gelatinosas dos tecidos subcutâneos e intramusculares,
especialmente ao longo das veias jugulares e dos ligamentos da nuca. As outras
lesões incluem hidrocárdio, miocardite, gastrite hemorrágica e petéquias na super-
fície ventral da língua e peritônio. Nos surtos, geralmente se encontra uma forma
cardíaca e pulmonar mista, com sinais e lesões do tipo único predominante.
Diagnóstico – Nas áreas endêmicas, os sinais clínicos e lesões podem levar a
um diagnóstico provisório. Entretanto, a confirmação laboratorial torna-se essencial
para um diagnóstico definitivo e para a determinação do sorotipo; o último item se
Ehrlichiose Eqüina 453

torna importante para as medidas de controle. Amostras de sangue devem ser


obtidas no pico de febre, preservadas em uma solução de OCG (50% de glicerol,
0,5% de oxalato de potássio e 0,5% de fenol), e transportadas (a 4°C) para o
laboratório. As amostras de baço coletadas de animais recentemente mortos devem
ser preservadas em glicerina tamponada a 10%. Utilizam-se camundongos jovens
ou culturas celulares para o isolamento do vírus. Os camundongos infectados
podem desenvolver sinais nervosos ou paralíticos e devem-se observá-los por 3
semanas. Para se obter um alto título de antígenos, a partir dos cérebros dos
camundongos para o teste de fixação de complemento (CF), podem ser neces-
sárias 2 ou 3 subpassagens. Coletam-se os cérebros dos camundongos
paralisados apenas para a preparação de antígenos. O teste de CF torna-se útil
para o diagnóstico da doença; utilizam-se os testes de neutralização viral e/ou
hemaglutinação – inibição para a sorotipagem.
Prevenção e controle – Os Equidae sobreviventes desenvolvem uma imunida-
de sólida a um sorotipo em particular, mas permanecem suscetíveis aos outros
sorotipos. Existem vacinas para todos os 9 sorotipos. Existem vacinas tanto
adaptadas de culturas celulares, como atenuadas de cérebros de camundongos, as
quais proporcionam uma proteção de longa duração. Vacinas inativadas encon-
tram-se disponíveis; exigem-se 2 doses para proporcionar uma imunidade
adequada. Essas vacinas induzem uma reação local na área da inoculação e um
curto período de proteção.
Quando a doença aparece pela primeira vez em uma área, devem-se eliminar
imediatamente os eqüinos afetados, e vacinar os Equidae não infectados com uma
vacina polivalente e repousá-los por 2 semanas. Ao se tipificar o vírus isolado, os
animais que tenham recebido a vacina polivalente devem ser revacinados com uma
vacina homóloga. Também se inicia o controle de vetores com a utilização de
inseticidas e repelentes. Os eqüinos vacinados devem ser mantidos em baias à
prova de insetos, já que pode ocorrer uma falha vacinal. As aeronaves que voarem
de áreas endêmicas para países livres da doença devem ser pulverizadas com
spray de inseticidas em sua chegada. Nos EUA, os eqüídeos provenientes de países
africanos ficam quarentenados por 2 meses e são depois testados quanto ao vírus.
A presença de anticorpos não interfere na importação de Equidae para os países
livres da doença.

EHRLICHIOSE EQÜINA
É uma doença sazonal, não contagiosa e infecciosa, observada principalmente no
norte da Califórnia, mas também reconhecida no Colorado, Illinois, Flórida, Arkansas,
Washington e Pensilvânia (ver também FEBRE EQÜINA DE POTOMAC, pág. 223).
Etiologia – O agente rickettsial causador, a Ehrlichia equi, lembra os agentes
etiológicos da febre originária dos carrapatos e da febre petequial bovina. A Ehrlichia
equi está presente nos vacúolos citoplasmáticos dos neutrófilos e, ocasionalmente,
dos eosinófilos durante o estado agudo. Os esfregaços sangüíneos, corados por
Giemsa ou por Wright-Leishman, revelam um ou mais agregados vagos (mórulas ou
corpúsculos de inclusão, com 1,5 a 5µm de diâmetro) de microrganismos
cocobacilares, cocóides cinza-azulados a azul-escuros ou pleomórficos, no interior
do citoplasma dos neutrófilos. Vetor, reservatório, período de incubação e modo de
transmissão da E. equi são desconhecidos, embora se suspeite da transmissão por
carrapatos. Pode-se transmitir experimentalmente a infecção a eqüinos suscetíveis
através do sangue completo; a incubação é de 1 a 2 semanas.
Ehrlichiose Eqüina 454

Achados clínicos e lesões – A severidade dos sinais varia com a idade do


animal e a duração da enfermidade. Os sinais podem ser suaves. Os eqüinos com
< 1 ano de idade podem ter apenas febre. Os eqüinos com 1 a 3 anos de idade
desenvolvem febre, depressão, edema suave dos membros e ataxia. Os adultos
apresentam os sinais característicos de febre, anorexia parcial, depressão, edema
dos membros, petequiação, icterícia e relutância em se mover. A febre fica mais alta
durante os primeiros 1 a 3 dias de infecção, flutuando entre 39,5 a 40°C. A febre de
39 a 40°C persiste por 6 a 12 dias. Os sinais se tornam mais severos por vários dias.
A vasculite do miocárdio pode causar raramente arritmias ventriculares transitórias.
Pode ocorrer a exacerbação de qualquer infecção intercorrente, tal como um
ferimento na perna ou uma infecção respiratória. Os corpúsculos de inclusão
citoplasmáticos são poucos durante as primeiras 48h e aumentam para 30 a 40%
dos neutrófilos circulantes do terceiro ao quinto dia de infecção. A doença é sazonal
na Califórnia, ocorrendo no fim do outono, inverno e primavera.
Ocorrem petequiações grosseiras, equimoses e edema no tecido subcutâneo e
nas fáscias. A vasculite é regional,afetando-se predominantemente o tecido subcu-
tâneo e as fáscias das pernas.
Diagnóstico – A demonstração dos corpúsculos de inclusão citoplasmáticos
característicos em um esfregaço sangüíneo padrão é diagnóstica. Tem-se descrito
um teste de imunofluorescência indireta. Os diagnósticos diferenciais incluem
encefalite viral, hepatopatia primária, anemia infecciosa eqüina, púrpura hemorrá-
gica e arterite viral.
Tratamento – A oxitetraciclina é extremamente efetiva contra a E. equi . Penici-
lina, cloranfenicol e estreptomicina não possuem efeito inibitório. A tetraciclina EV,
a 7mg/kg, diariamente, por 8 dias, elimina a infecção. Os eqüinos com ataxia severa
e edema, podem se beneficiar de um tratamento com corticosteróides a curto prazo
(20mg de dexametasona, diariamente). Os eqüinos recuperados ficam solidamente
imunes por pelo menos 2 anos, e não são portadores.

ARTERITE VIRAL EQÜINA


(Tifo eqüino, Celulite epizoótica, Conjuntivite)

É uma doença viral, contagiosa e aguda, caracterizada por febre, descargas


nasais e oculares, edema e abortamento.
Etiologia e epidemiologia – Classificou-se o agente etiológico como um
arterivírus da família Togaviridae. Embora, com base nos testes sorológicos, o vírus
pareça ser largamente distribuído por todo o mundo, a doença não é comumente
diagnosticada. Ela ocorre em surtos esporádicos, freqüentemente associados com
o movimento dos eqüinos. A transmissão ocorre primariamente pelas rotas respira-
tória e venérea durante a fase aguda da infecção; nos garanhões portadores a longo
ou a curto prazo, ela se espalha apenas venereamente. Os sinais clínicos são mais
severos em jovens, idosos e animais debilitados. As éguas podem abortar em vários
estágios da prenhez. Podem ocorrer epidemias onde se reúnem eqüinos, por
exemplo, em vendas, exposições e fazendas reprodutivas. A exposição ao vírus
pode resultar em uma infecção inaparente ou clínica, dependendo da cepa do
vírus. A mortalidade é rara na infecção natural e tem sido observada somente nos
neonatos; as recuperações são completas. Um número significativo de garanhões
recuperados se transforma em portadores, os quais exercem um papel impor-
tante na disseminação e perpetuação do vírus. Não se têm detectado éguas
portadoras.
Arterite Viral Eqüina 455

Achados clínicos – Após um período de incubação de 1 a 8 dias, a febre e a


leucopenia podem ser acompanhadas por lacrimejamento, conjuntivite, congestão
e descargas nasais, fraqueza, depressão, anorexia e edema dos membros
(especialmente dos membros posteriores). Os achados menos consistentes
incluem edema periorbital/supra-orbital; edema do revestimento corporal ventral,
incluindo escroto, prepúcio e mamas; fotofobia; exantema cutâneo mais comu-
mente no pescoço, mas algumas vezes generalizado; cólica; dispnéia; mialgia e
artralgia; diarréia; icterícia e ataxia. O abortamento ocorre no fim da fase febril ou
no início da fase convalescente da doença. Mais comumente, muitos animais com
infecção aguda ficam assintomáticos ou desenvolvem apenas sinais suaves de
febre, edema variável dos membros, conjuntivite e rinite. A severidade dos sinais
clínicos varia muito.
Lesões – O vírus afeta as células endoteliais e musculares, primariamente das
pequenas artérias por todo o corpo; pode resultar em uma panvasculite. As lesões
incluem inchaço e degeneração endoteliais, formação de trombos e degeneração
e necrose características dos meios das artérias e vênulas, especialmente das
menores. As lesões macroscópicas observadas nos casos fatais de infecção
experimental com a cepa Bucyrus não atenuada do vírus incluem: edema; petéquias,
especialmente no tecido subcutâneo dos membros e do abdome; excesso de fluidos
pleural e peritoneal; e edema e hemorragia dos linfonodos intra-abdominais, bem
como dos intestinos delgado e grosso, especialmente do ceco e do cólon. Obser-
vam-se enterite, hemorragias e infartos no baço, edema e enfisema pulmonares e
pneumonia intersticial nos potros neonatos naturalmente infectados, alguns dos
quais acabam morrendo. Os fetos abortados ficam quase sempre parcialmente
autolisados. O edema e as petéquias tornam-se muito difundidos, e encontra-se um
excesso de fluido nas cavidades corporais. Não há lesões patognomônicas nos
fetos infectados.
Diagnóstico – Embora a arterite viral eqüina possa ser provisoriamente diferen-
ciada do herpesvírus eqüino do Tipo 1 (HVE-1, ver pág. 889) e da influenza eqüina
(ver pág. 893) com base nos sinais clínicos, não se pode confirmar o diagnóstico sem
o isolamento do vírus e/ou sorologia ou histopatologia. Pode-se confundir a síndrome
clínica com a observada na virose Getahá ou na enfermidade eqüina africana, nos
países em que essas infecções ocorrem. Devem-se diferenciar os casos esporádicos
da anemia infecciosa eqüina (ver pág. 32) e da púrpura hemorrágica (ver pág. 521).
O abortamento durante ou imediatamente após uma enfermidade constitui uma
característica diagnóstica valiosa, mas não invariável: o aborto raramente acompa-
nha a gripe e a égua geralmente não apresenta nenhum sinal clínico, antes do
abortamento pelo HVE-1. Os fetos abortados devido ao HVE-1 apresentam freqüen-
temente lesões características, enquanto os abortados devido ao vírus da arterite
eqüina não têm nem lesões específicas nem corpúsculos de inclusão.
As amostras apropriadas para o isolamento do vírus incluem “swabs” conjunti-
vais e nasofaríngeos, amostras sangüíneas citratadas e sêmen. Devem-se coletar
as amostras tão logo quanto possível, após o início da enfermidade. Nos casos
supostos de abortamento pelo vírus da arterite eqüina, os fluidos fetal e placentário
e uma larga variedade de tecidos placentários, linforreticulares e outros podem se
constituir em fontes produtivas do vírus. Já que poucos laboratórios trabalham com
esse vírus, torna-se aconselhável a procura de informações a partir de um labora-
tório qualificado antes de se coletar as amostras para sorologia ou virologia.
Profilaxia e tratamento – Não há tratamento específico; indicam-se as drogas
antibacterianas e uma terapia sintomática, e são desejáveis um bom atendimento
e um repouso absoluto, com um retorno gradual à atividade. Pode-se evitar a arterite
viral eqüina e controlá-la através de práticas de manejo corretas e do uso seletivo
(onde for autorizado) de uma vacina de vírus vivo modificado comercial.
Mormo 456

MORMO
(Farcino)

É uma doença aguda ou crônica, contagiosa, e geralmente fatal dos Equidae,


causada pela Pseudomonas mallei e caracterizada pelo desenvolvimento seqüen-
cial de nódulos ulcerantes, que ocorrem mais comumente no trato respiratório
superior, pulmões e pele. O homem, os Felidae e outras espécies são suscetíveis
e as infecções são geralmente fatais. O mormo é uma das doenças conhecidas mais
antigas e já foi prevalecente por todo o mundo. Encontra-se hoje erradicada ou
efetivamente controlada em muitos países, inclusive nos EUA.
Etiologia – A Pseudomonas mallei se encontra presente nos exsudatos do nariz
e da pele ulcerativa dos animais infectados, e a doença é comumente contraída por
meio da ingestão de alimento ou água contaminados através da descarga nasal dos
animais portadores. O microrganismo é suscetível ao calor, luz e desinfetantes, e é
improvável que sobreviva em uma área contaminada por > 6 semanas.
Achados clínicos – Após um período de incubação de , 2 semanas, os
animais afetados geralmente exibem septicemia e febre alta (até 41°C) e,
subseqüentemente, uma descarga nasal mucopurulenta espessa e sinais respi-
ratórios. Ocorre morte dentro de alguns dias. A doença crônica é comum nos
eqüinos e ocorre como uma afecção debilitante com lesões nasais e cutâneas
ulcerativas ou nodulares. Os animais podem viver por anos, enquanto dissemi-
nam o microrganismo. O prognóstico é desfavorável. Os animais recuperados
podem não desenvolver imunidade.
Reconhecem-se as formas nasal, pulmonar e cutânea do mormo, e um animal
pode se afetar por mais de uma forma ao mesmo tempo. Na forma nasal,
desenvolvem-se nódulos na mucosa do septo nasal e nas partes inferiores dos
ossos turbinados. Os nódulos se degeneram em úlceras profundas com bordas
irregulares elevadas. As cicatrizes em forma de estrela características permanecem
após as úlceras cicatrizarem. No estágio inicial, os linfonodos submaxilares ficam
aumentados e edematosos, e mais tarde aderem à pele ou aos tecidos mais
profundos.
Na forma pulmonar, encontram-se nos pulmões, pequenos nódulos semelhan-
tes a tubérculos, que possuem centros caseosos ou calcificados circundados por
zonas inflamatórias. Se o processo patológico for extenso, podem se fazer presen-
tes a consolidação do tecido pulmonar e uma pneumonia. Os nódulos tendem a abrir
e podem drenar o seu conteúdo para os bronquíolos, resultando na extensão da
infecção pelo trato respiratório superior.
Na forma cutânea (“farcino”), os nódulos aparecem ao longo do trajeto dos
vasos linfáticos, particularmente os das extremidades. Esses nódulos passam por
degeneração e formam úlceras que drenam um pus altamente infeccioso e pegajo-
so. O fígado e o pulmão também podem exibir lesões nodulares típicas.
Diagnóstico – Nódulos típicos, úlceras, formação de escaras e situação debili-
tada podem fornecer evidências suficientes para um diagnóstico clínico. No entanto,
como esses sinais geralmente não se desenvolvem até que a doença esteja bem
avançada, devem-se aplicar testes diagnósticos específicos tão logo quanto possí-
vel. Além do teste de maleína, que é o procedimento de escolha, a fixação do
complemento é o mais preciso dos vários testes sorológicos que podem ser
utilizados, embora o último ocasionalmente revele falsos-positivos. A cultura do
exsudato das lesões revela a presença do microrganismo causador.
Profilaxia e tratamento – Não há vacina. A profilaxia e o controle dependem
da detecção precoce e da eliminação dos animais afetados, bem como de uma
quarentena completa e de uma desinfecção rigorosa da área envolvida. Admi-
Septicemia nos Potros 457

nistra-se o tratamento somente nas áreas endêmicas. Os antibióticos não são


muito efetivos. A sulfadiazina administrada diariamente por 20 dias tem obtido
sucesso.

SEPTICEMIA NOS POTROS


A septicemia pode ocorrer in utero, porém é mais freqüentemente adquirida a
partir de fontes ambientais após o nascimento. A falha na ingestão ou na absorção
de colostro adequado aumenta a suscetibilidade à infecção bacteriana, cujas causas
mais comuns são os microrganismos Gram-negativos, por exemplo, Escherichia
coli, Klebsiella sp e Actinobacillus sp. Os sinais clínicos sutis de septicemia, letargia,
fraqueza, perda do reflexo de mamar e incapacidade de ficar em pé sem assistência,
podem se fazer presentes no nascimento ou podem se desenvolver durante os
primeiros dias de vida. Os potros podem estar hipo ou hipertérmicos. Com o choque
e a acidose metabólica, desenvolvem-se taquicardia e taquipnéia.
A septicemia neonatal fulminante em eqüinos é uma doença multissistêmica. Os
sinais mais óbvios da septicemia variam com o sistema de órgãos envolvido e com
o grau de insuficiência presente. O alastramento hematogênico das bactérias
resulta comumente em pneumonia e poliartrite-poliosteomielite, embora a localiza-
ção bacteriana possa ocorrer em quase todo lugar. Se as bactérias se localizarem
no trato gastrointestinal, a enterite/colite resulta então em distensão abdominal e
diarréia. Quando a meningite se fizer presente, o potro pode ficar comatoso ou ter
convulsões.
A avaliação laboratorial também é variável, mas os achados mais comuns
incluem um nível de IgG de < 800mg/dL, um leucograma anormal e uma elevação
do fibrinogênio sérico. Neutropenia ou neutrofilia podem estar presentes dependen-
do do estágio da doença. Observa-se um aumento no número de neutrófilos
imaturos, e tornam-se comuns as evidências de alterações tóxicas nos neutrófilos.
Os potros afetados ficam freqüentemente hipoglicêmicos. Uma acidose metabólica
ou metabólica e respiratória mista pode se fazer presente.
O diagnóstico definitivo se baseia em cultura de sangue positiva. Os diagnósticos
diferenciais incluem síndrome do mal-ajustamento neonatal (ver pág. 738), anemia
hemolítica isoimune (ver pág. 26), doença do músculo branco (ver pág. 661),
uroperitônio (ver pág. 1083), cólicas em potros (ver pág. 207) e herpesvirose eqüina
do Tipo 1 (ver pág. 889). O prognóstico é ruim se não se fizer o diagnóstico
precocemente. Indicam-se cuidados neonatais intensivos e os sobreviventes po-
dem se tornar atletas de sucesso.
A terapia inclui os antibacterianos parenterais de largo espectro, tais como uma
combinação de penicilina/ampicilina com gentamicina/amicacina. Transfusões de
plasma e fluidos EV devem ser administrados para combater a deficiência de
imunoglobulinas, o choque séptico e a acidose metabólica. Deve-se administrar
dextrose, caso se suspeite de hipoglicemia. Ataques podem ser controlados com
fenobarbital ou diazepam. Devem-se providenciar aquecimento e nutrição adequa-
dos.
As medidas preventivas incluem a higiene no parto e no ambiente do parto.O
aspecto mais importante consiste em assegurar a absorção adequada da imunoglo-
bulina colostral. Deve-se testar uma amostra sérica coletada de um potro com 24h
de idade quanto à concentração de imunoglobulinas. Se os níveis de IgG forem
< 800mg/dL, indica-se uma transfusão de plasma profilática.
Febre Suína Africana 458

FEBRE SUÍNA AFRICANA


A febre suína africana (FSA) uma doença viral altamente contagiosa com sinais
e lesões que lembram os da cólera suína (ver pág. 461). Antes de 1957, ela se
restringia à África e aparecia como uma infecção altamente virulenta dos suínos
domésticos em contato com suínos silvestres endogênicos. O javali africano, o
potamóquero e o hilóquero são portadores inaparentes e freqüentemente infectados
do vírus. A primeira extensão da FSA para fora da África ocorreu em Portugal em
1957 e na Espanha em 1960. Houve numerosos surtos na França e na Itália nos 20
anos seguintes; ela se espalhou para o Caribe e América do Sul nos anos 70, e para
a Bélgica e Holanda nos anos 80. Ao contrário das manifestações clínicas severas
dos isolados africanos, surgiram formas menos virulentas durante as epidemias na
Península Ibérica, o que tornou o diagnóstico clínico muito mais difícil. Foi erradicada
do Hemisfério Ocidental, mas continua a existir nos suínos domésticos em Portugal
e na Espanha, e nos suínos silvestres da Sardenha e de vários países da África.
Etiologia e epidemiologia – Embora se classifique o vírus da FSA como um
iridovírus, ele possui algumas propriedades dos poxvírus. Esse DNA-vírus se
replica primariamente nas células do sistema macrofagomonocitário e se encon-
tra em quase todos os fluidos e tecidos dos suínos agudamente infectados. Pode-
se isolar o vírus a partir dos tecidos dos animais portadores por até 3 anos, após
a infecção. É um vírus excepcionalmente resistente e retém a sua infectividade
por ≥ 18 meses à temperatura ambiente, por ≥ 1h a 56°C e por 6 meses nos
presuntos comercialmente processados. Os esfregaços sangüíneos permanece-
ram infecciosos após 24h de exposição ao hidróxido de sódio a 1%, mas não ao
mesmo composto a 2%. O vírus é relativamente resistente à tripsina e aos ácidos,
mas sensível ao éter. Ele tem sido transmitido para coelhos, cabritos, ovos
embrionados e culturas teciduais. Nem os produtos de cepas virais atenuadas,
nem os de vírus mortos proporcionaram proteção significativa a partir do desafio
com vírus heterólogos virulentos, embora se tenha descrito uma certa proteção
a partir do desafio com isolados intimamente relacionados. A ausência de uma
vacina confiável consiste em um fator crítico nos esforços de controle. Um
aspecto incomum da resposta imune ao vírus da FSA é a ausência do anticorpo
neutralizante facilmente demonstrável. Anticorpos são produzidos e a sua trans-
ferência passiva oferece alguma proteção, como se demonstra pelo retardamen-
to do início, pela redução na quantidade de vírus circulantes e pela modificação
da severidade dos sinais clínicos.
Apenas os Suidae parecem ser naturalmente suscetíveis à FSA, que pode ser
transmitida por contato direto ou indireto. No Hemisfério Ocidental, os surtos iniciais
parecem ter sido causados pela alimentação com sobras de produtos suínos
infectados, provenientes de aviões internacionais.
Os carrapatos Ornithodoros sp podem agir como vetores por até 8 anos após a
exposição ao vírus. Em alguns carrapatos, o vírus da FSA pode sobreviver um ciclo
completo de carrapato por meio de uma passagem transovariana, tornando-os
assim vetores extremamente efetivos. Demonstrou-se recentemente que ≥ 6
espécies de Ornithodoros são capazes de transmitir a FSA, inclusive 2 (O. coriaceus
e O. turicata) dos EUA.
A infecção geralmente ocorre por exposição oronasal. O vírus se replica
inicialmente nos macrófagos das amígdalas e dos linfonodos regionais. Isto é
seguido rigorosamente por uma viremia, que se torna detectável 2 a 4 dias após a
exposição e dura 2 a 4 semanas.
Achados clínicos – O primeiro sinal é febre; ocorrem temperaturas de 40,5 a
42°C 5 a 15 dias após a infecção natural. Ocorrem uma leucopenia e uma
Encefalomiocardite Viral 459

trombocitopenia precoces. No caso dos isolados virulentos, depois de , 4 dias de


febre ou , 24 a 48h antes da morte, os animais geralmente param de comer e se
tornam apáticos, incoordenados e cianóticos. Aumenta a freqüência do pulso e da
respiração. Vômito, diarréia e descargas oculares são algumas vezes observados.
Ocorre morte freqüentemente 4 a 7 dias após o início da febre. As porcas prenhes
podem abortar. No caso das cepas virulentas do vírus, a mortalidade nos suínos
domésticos atinge freqüentemente os 100%. Os sobreviventes tornam-se geral-
mente portadores por toda a vida, embora o vírus não esteja continuamente
presente nas excreções.
Lesões – As lesões macroscópicas no estágio agudo da infecção com isolados
virulentos, incluem hemorragias acentuadas nos linfonodos, hemorragias petequiais
no córtex renal e esplenomegalia congestiva. As regiões sem pêlos exibem
freqüentemente áreas edematosas de cianose. Ocorrem equimoses cutâneas nas
pernas e no abdome. Os fluidos pleural, pericardíaco e peritoneal se encontram em
excesso. Ocorrem petéquias nas membranas mucosas da laringe e da bexiga, no
córtex renal e nas superfícies viscerais dos órgãos. O edema se torna quase sempre
proeminente nas estruturas mesentéricas do cólon e adjacentes à vesícula biliar. Na
forma crônica, necrose caseosa focal e mineralização dos pulmões podem ser
observadas.
Diagnóstico – Deve-se informar imediatamente qualquer doença semelhante à
cólera suína às autoridades estaduais e federais. As lesões macroscópicas da
cólera suína e da FSA são muito semelhantes para permitirem um diagnóstico
diferencial determinado; no entanto, ocorrem diferenças menores que podem ser
um pouco úteis. Os infartos no baço e as “úlceras em botão” da cólera suína
raramente ocorrem na FSA aguda. Edema severo dos pulmões e das paredes da
vesícula biliar, e fluidos peritoneal, pleural e pericardíaco em excesso são comuns
na FSA, mas raros na cólera suína.
Amostras de sangue, do baço e dos linfonodos gastro-hepáticos devem ser
coletadas para o diagnóstico laboratorial. O vírus suspeito pode se replicar na
medula óssea suína ou nas culturas do couro. As hemácias suínas adsorvem os
leucócitos infectados com o vírus virulento da FSA, o que causa uma reação de
hemadsorção, e mais tarde, o vírus causa a lise dos leucócitos. Não ocorre
hemadsorção com o vírus da cólera suína. Podem-se identificar os anticorpos
séricos contra o vírus da FSA nos animais cronicamente infectados através dos
testes de imunoeletroosmoforese, imunofluorescência indireta, imunoperoxidase
indireta ou ELISA. Os suínos imunizados contra o vírus da cólera suína se infectam
se forem desafiados com o vírus da FSA. As células infectadas em um tecido podem
ser dectadas por meio dos processos de imunofluorescência direta e indireta, de
imunoperoxidase ou de hibridização por sonda do ácido nucléico.
Controle – O alastramento da FSA para Europa, Caribe e Brasil e a ausência de
uma vacina intensificam o risco internacional. Tornam-se necessários esforços
internacionais cooperativos para proibir a movimentação dos animais, produtos e
vetores infectados. Todos os veterinários devem ficar alerta para reconhecer a FSA,
e devem utilizar os serviços diagnósticos estaduais e federais. Um diagnóstico
positivo de FSA deve ser seguido por quarentena rígida e abate.

ENCEFALOMIOCARDITE VIRAL
É uma infecção do homem e de outros animais, principalmente suínos e primatas
não humanos, causada pelo grupo EMC dos picornavírus. Embora a infecção
Encefalomiocardite Viral 460

subclínica seja comum em muitas espécies, nos suínos têm ocorrido mais freqüen-
temente morte esporádica ou epidemias. Os vírus da EMC causam um enfermidade
pequena nos humanos; os casos humanos individuais esporádicos, particularmente
nos adolescentes, se manifestam como uma meningite asséptica, uma doença
semelhante à poliomielite ou a síndrome de Guillain-Barré.
Epidemiologia – Os estudos sorológicos indicam que os vírus da EMC ocorrem
mundialmente. As descrições da doença nos suínos provêm das Américas, Australásia
e África do Sul. Os roedores, principalmente os ratos, são os principais reservatórios
assintomáticos. Os surtos da doença se associam geralmente a um aumento do
contato com roedores ou seus excrementos. Nos EUA, tem-se demonstrado a
suscetibilidade de vários animais de zoológico, incluindo orangotangos, chimpan-
zés, babuínos, macacos-de-rabo-de-porco, lêmures, lhamas, preguiças, determi-
nadas espécies de antílopes, rinocerontes-negros e elefantes-africanos através da
recuperação do vírus a partir de animais que morrem com achados histológicos e
macroscópicos compatíveis. Tem-se isolado o vírus da EMC a partir de fetos e de
leitões natimortos, o que indica que pode ocorrer infecção transplacentária.
Achados clínicos, lesões e diagnóstico – A maioria dos animais afetados é
encontrada morta ou morre subitamente quando excitada por manipulação ou por
outros meios. Um breve período de depressão, inapetência, ataxia, vômito ou
dispnéia pode preceder a morte. Os achados clínicos são compatíveis com uma
insuficiência cardíaca aguda.
Podem estar presentes lesões de insuficiência cardíaca aguda, incluindo aumen-
to do fígado, edema pulmonar, edema mesentérico e ascite. O coração geralmente
se dilata, principalmente no lado direito. O miocárdio ventricular apresenta freqüen-
temente, áreas esbranquiçadas múltiplas e discretas ou zonas pálidas mal-defini-
das. Histologicamente, a necrose do miocárdio com uma infiltração por parte dos
linfócitos e dos macrófagos, se encontra tipicamente presente. Não se encontram
vasculite e endocardite.
Devem-se diferenciar as lesões macroscópicas das lesões da deficiência de
selênio/vitamina E, dos infartos cardíacos devidos a êmbolos sépticos, da forma
cardíaca da febre aftosa e do edema intestinal. Nos casos agudos, pode-se
recuperar o vírus a partir de muitos órgãos, mas especialmente do coração e baço.
Os anticorpos são detectáveis 5 a 7 dias após a infecção.
Controle – Não se encontram vacinas comercialmente disponíveis, mas está se
utilizando uma vacina aditivada, morta e experimental para a proteção dos animais
de zoológico nos EUA. Indica-se o controle de roedores. O vírus é relativamente
estável no ambiente, e são úteis os desinfetantes à base de cloro, iodo ou aldeído.

DOENÇA DE GLÄSSER
(Polisserosite suína, Poliartrite infecciosa)

É uma polisserosite, poliartrite e meningite fibrinosas, ocasionalmente fatais, dos


suínos. Considera-se hoje que essa síndrome se deva à Haemophilus parasuis
(suis ), mas a H. parainfluenzae também causa possivelmente uma doença
semelhante. Fatores estressantes, tais como desmame ou transporte, predispõem
à doença, e têm-se descrito afecções semelhantes, devidas ao Mycoplasma spp,
notavelmente a M. hyorhinis nos leitões jovens (ver CLAUDICAÇÃO NOS SUÍNOS , pág.
642). A Mycoplasma hyosynoviae causa comumente uma artrite, mas não uma
polisserosite nos adultos jovens. A doença de Glässer ocorre provavelmente em todo
o mundo, embora a maioria das descrições proceda da Europa.
Cólera Suína 461

Achados clínicos – A doença geralmente é suave com baixa morbidade, mas


pode se tornar severa com alta morbidade e mortalidade quando a infecção entra
em um rebanho suscetível. O período de incubação é de 1 a 5 dias, com a doença
ocorrendo 2 a 7 dias após a precipitação do estresse. Os suínos jovens (desmame
aos 4 meses) geralmente são afetados. Desenvolve-se uma temperatura de 41 a
42°C, e ocorrem anorexia, depressão, e algumas vezes rinite suave e dispnéia com
tosse. Alguns suínos ficam aleijados, com articulações dolorosas, quentes, incha-
das e flutuantes. Podem-se desenvolver uma artrite crônica, e ocasionalmente uma
meningite e convulsões. Os leitões podem morrer durante o estágio agudo, ou pode
ocorrer recuperação completa ou parcial.
Lesões – As lesões clássicas incluem pleurite serofibrinosa ou fibrinopurulenta,
pericardite e peritonite com ou sem broncopneumonia e meningoencefalite
fibrinopurulenta. O fluido articular fica turvo com depósitos esverdeados de fibrina,
e inflamam-se os tecidos periarticulares.
Diagnóstico – O diagnóstico provisório, com base na história, sinais clínicos e
necropsia, se confirma através da cultura do microrganismo a partir dos fluidos
articulares, sangue cardíaco ou líquido cerebroespinhal. A sorologia, baseada nos
testes de precipitação ou de fixação de complemento em títulos de > 1:80, pode
ajudar a diferenciar essa afecção das outras causas de polisserosite e artrite.
Tratamento e controle – A resposta às injeções de penicilina, estreptomicina,
tetraciclinas, trimetoprima ou sulfametazina geralmente é boa. As medidas de
controle devem objetivar a remoção dos estresses, e a medicação dos suínos em
risco, por meio do alimento ou da água pode ter valor. Em alguns países, utiliza-se
uma bacterina morta em formalina, com aparente sucesso. As infecções micoplasmais
respondem melhor a drogas, tais como tilosina, lincomicina ou eritromicina; isso
pode ajudar na diferenciação.

CÓLERA SUÍNA
(Febre suína, Febre suína clássica)

É uma doença viral altamente contagiosa dos suínos. A doença, devida a cepas
virais virulentas, apresenta um início súbito, e afeta suínos de todas as idades com
altas morbidade e mortalidade, embora adultos sejam menos afetados. As cepas
menos virulentas causam uma doença crônica ou suave, insuficiência reprodutiva
e perdas neonatais. Também pode ocorrer uma infecção inaparente.
A cólera suína é endêmica em muitos países sul-americanos, africanos e
asiáticos. Encontra-se ausente no Canadá, Austrália e Nova Zelândia, e foi erradicada
nos EUA e em vários países europeus.
Etiologia e patogenia – A causa é um pestivírus da família Togaviridae. Ele
possui alguns antígenos em comum com o vírus da diarréia viral bovina (VDVB),
mas os testes de neutralização os distinguem como espécies separadas. As
cepas do vírus da cólera suína são hospedeiras específicas sob condições
naturais; geralmente, formam um grupo antigênico mais compacto que as cepas
do VDVB, mas as variantes sorológicas, de virulência e antigenicidade baixas,
podem causar dificuldades diagnósticas. O vírus se replica em culturas celulares
de origem suína, e a maioria das cepas não produz efeito citopático. Nas pocilgas,
os excrementos e a cama podem permanecer contaminados por dias a semanas,
dependendo principalmente das temperaturas prevalecentes. O vírus sobrevive
na carne suína por ≥ 4 anos, e em carnes congeladas ou carcaças preservadas
por 3 a 6 meses ou mais.
Cólera Suína 462

O contato direto é o modo de transmissão mais comum. Os suínos infectados


eliminam vírus em todas as excreções e secreções corporais em quantidades
relativas à virulência da cepa viral. Os suínos persistentemente virêmicos após uma
infecção transplacentária ou pós-natal podem infectar o rebanho saudável. A
alimentação com restos alimentares não processados ou inadequadamente proces-
sados que contenham carne infectada também pode se constituir em um importante
meio de alastramento. Os tecidos provenientes de suínos infectados são potencial-
mente contagiosos mesmo após o início de uma doença detectável ou, na recupe-
ração, após o desenvolvimento de anticorpos neutralizantes séricos. As outras rotas
de alastramento, embora muito menos importantes, incluem numerosos vetores
mecânicos, mas o espalhamento aéreo parece ser improvável.
A rota de entrada viral mais comum é a ingestão, e a amígdala é o local primário
de replicação. Seguem-se alastramento linfático e viremia 24h após a infecção. A
replicação secundária do vírus nos leucócitos circulantes, células endoteliais dos
vasos sangüíneos e linfáticos, tecidos linfóides viscerais, baço e medula óssea,
contribui posteriormente para a viremia por 5 a 6 dias. O alastramento para as
estruturas epiteliais após 3 a 4 dias resulta na eliminação do vírus em excreções e
secreções. Os suínos que sobrevivem à infecção por 6 semanas apresentam um
esgotamento generalizado do tecido linfóide e são suscetíveis a infecções intercor-
rentes.
Achados clínicos – A doença pode ser aguda, crônica, suave ou clinicamente
inaparente com relação à virulência do vírus e à resposta do hospedeiro. Após um
período de incubação de 5 a 10 dias (varia de 2 a 20), os suínos agudamente
afetados ficam letárgicos, anoréticos e apresentam febre, que persiste comumente
a 41°C. Seguem-se hiperemia multifocal da pele, conjuntivite, constipação transitó-
ria e depois diarréia, ocasionalmente com vômito. É comum a dispnéia. Os sinais
nervosos incluem ataxia, paresia e convulsões. Os suínos se amontoam ou se
agrupam. A mortalidade nos suínos jovens pode atingir 100%. Nos casos agudos,
os sinais persistem até que o suíno comatoso morra 5 a 15 dias após o início da
enfermidade. Pode-se observar uma cianose pré-terminal, sobretudo ventralmente,
na base das orelhas e no focinho.
Nos casos crônicos, os sinais de embotamento, apetite caprichoso e algumas
vezes depravado, pirexia e diarréia persistem por > 1 mês. Ocorre uma fase de
recuperação aparente, com uma eventual recidiva e morte. Na doença suave, que
resultar de uma infecção com cepas virais de baixa virulência, os sinais podem se
resumir a pirexia e inapetência transitórias, ou podem ocorrer perdas reprodutivas
devidas a uma infecção transplacentária. Tais perdas incluem morte fetal, reabsor-
ção, abortamento, mumificação ou natimortalidade, ou nascimento de leitões fracos
e com tremores. O vírus da cólera suína é uma causa infecciosa reconhecida da
síndrome do tremor congênito suíno (ver pág. 704). Os leitões congenitamente
infectados, se sobreviverem (algumas vezes aparentemente saudáveis), ficam
geralmente virêmicos por vários meses antes do “início tardio” da doença clínica.
Lesões – Nos casos agudos, a maioria das lesões resulta de danos virais ao
endotélio dos vasos sangüíneos, mas também ocorre uma depressão da medula
óssea, que resulta em leucopenia e trombocitopenia profunda. Esta última pode
estar associada com a diátese hemorrágica. As petéquias e equimoses ficam muito
disseminadas e freqüentemente proeminentes na pele, laringe, bexiga, junção
ileocecal, cérebro e pelve e córtex renais. Neste último, elas produzem a chamada
aparência de “ovo de peru”. A infartação multifocal da margem do baço é caracte-
rística, mas inconstante. No intestino grosso, um dano semelhante nos vasos
sangüíneos e a conseqüente necrose produzem “úlceras em botão” circulares e
elevadas. São comuns os linfonodos hemorrágicos aumentados. A histologia do
cérebro apresenta uma encefalite não supurativa com uma vasculite severa em
Infecções Estreptocócicas dos Suínos 463

grande porcentagem dos casos fatais agudos. Nos casos crônicos, as lesões
inflamatórias hemorrágicas quase sempre se encontram ausentes, mas ocorre
geralmente um esgotamento generalizado do tecido linfóide. A infecção transpla-
centária pode produzir desmielinogênese central, hipoplasia cerebelar, microencefalia
e hipoplasia pulmonar.
Diagnóstico – A história, sinais clínicos e lesões macroscópicas sustentam um
diagnóstico por tentativa nos surtos agudos. Petequiação muito disseminada,
envolvendo laringe, bexiga e rins; infartação esplênica; “úlceras em botão”; eritema
cutâneo e pneumonia são fortemente indicativos. Leucopenia e trombocitopenia
são achados freqüentes, mas deve-se determinar a contagem de leucócitos em ≥ 6
suínos.
O diagnóstico diferencial inclui febre suína africana, salmonelose septicêmica,
pasteurelose, estreptococose, leptospirose, erisipela, púrpura, envenenamento
cumarínico e doença do coração de amora. Os sinais nervosos da cólera suína não
podem ser diferenciados dos devidos às outras encefalites, ou dos de alguns
distúrbios nervosos não infecciosos. A confirmação do diagnóstico em qualquer de
suas formas clínicas exige métodos laboratoriais.
O diagnóstico laboratorial se baseia atualmente no exame direto por meio da
imunofluorescência (para o antígeno viral) dos tecidos frescos (preferivelmente
enviados em gelo) e das culturas celulares. Os tecidos preferidos são amígdalas,
linfonodos faríngeos, baço, rins e íleo distal. Também se pode utilizar a
imunoperoxidase para a classificação do antígeno. Podem-se utilizar anticorpos
monoclonais para distinguir a cólera suína dos outros isolados de pestivírus. A
detecção sorológica do anticorpo para a cólera suína e a sua diferenciação do
anticorpo para o VDVB se baseiam nos testes de neutralização ou no ELISA. O
exame histológico do cérebro tem sido um adjuvante diagnóstico útil. As contagens
de leucócitos e trombócitos podem ser úteis, e podem-se tentar o isolamento viral
ou experimentos de transmissão animal. Nos países onde há uma política legal para
o controle da cólera suína, devem-se notificar os casos suspeitos imediatamente às
autoridades reguladoras.
Tratamento e controle – O soro hiperimune é o único tratamento disponível e
pode ser efetivo nos estágios iniciais da doença ou para a proteção dos animais em
contato. O controle se faz essencialmente por meio de erradicação ou vacinação.
A erradicação por meio do abate de todos os suínos em contato e da eliminação das
carcaças tem obtido sucesso. Desinfectam-se as instalações infectadas, e estas
não são repovoadas por um certo período. Controla-se rigidamente a movimentação
de suínos nas áreas infectadas. Nos países com uma política de erradicação,
regula-se rigidamente a alimentação com restos alimentares. Nos países onde a
doença é endêmica, empregam-se principalmente vacinas de vírus atenuados.
Embora a vacinação possa reduzir a prevalência da doença endêmica, deve-se
interrompê-la ao se introduzir a erradicação por meio do abate, e proibi-la nas áreas
“oficialmente” livres da doença.

INFECÇÕES ESTREPTOCÓCICAS
DOS SUÍNOS
INFECÇÕES POR STREPTOCOCCUS SUIS
A Streptococcus suis (Grupo D de Lancefield) é uma causa comum de meningite
e artrite nas grandes fazendas intensivas de suínos; em alguns países, inclusive nos
Infecções Estreptocócicas dos Suínos 464

EUA e no Canadá, também se associa com pneumonia, endocardite, miocardite e


doenças do trato genital da porca. No homem, a S. suis do Tipo 2 pode causar artrite,
febre, meningite e surdez permanente. Embora se tenham descrito mundialmente
menos que 100 casos humanos, recomenda-se tomar precauções, particularmente
ao se realizar necropsias.
Etiologia e epidemiologia – A Streptococcus suis geralmente aparece nas
lesões como cadeias curtas ou como diplococos ovais. É um aeróbio facultativo
e Gram-positivo, que forma pequenas colônias durante a noite no ágar sangue.
As colônias são circundadas por uma zona estreita de hemólise clara no ágar
sangue eqüino e uma hemólise parcial (esverdeada) no ágar sangue ovino ou de
bezerro. A Streptococcus suis se subdivide em pelo menos 9 sorotipos com base
nos antígenos capsulares polissacarídeos específicos. A tipificação apenas por
meio de testes bioquímicos pode enganar, pois outros estreptococos possuem
espectros de atividade semelhantes. A doença clínica geralmente se associa com
os Tipo 1 e 2. Má ventilação, altos níveis de gases dos excrementos, superlotação
e outros estresses predispõem aos surtos de meningite causados pelo Tipo 2. Têm-
se descrito isolados de alta e baixa virulências. Existe pouca informação acerca do
relacionamento causal dos outros sorotipos com a doença. Nos EUA, o Sorotipo 7
parece ter sido mais freqüentemente isolado de lesões do que os outros
sorotipos.
O Tipo 1 é endêmico na maioria dos rebanhos, mas afeta apenas esporadica-
mente os suínos com até , 8 semanas de idade. As cepas virulentas do Tipo 2 são
menos difundidas e tendem a ocorrer mais nos grandes rebanhos intensivos. O Tipo
2 afeta os suínos com até o peso de mercado. Ambos os Tipos 1 e 2 são carreados
subclinicamente nas criptas amigdalinas por longos períodos e podem-se detectá-
los algumas vezes no nariz.
O Tipo 2 se espalha entre os rebanhos principalmente por meio da movimentação
dos suínos portadores subclínicos, mas também parece se espalhar por outras
formas. Um método possível é por meio das moscas, que viajam facilmente 1,6 a
3,2km entre as fazendas. As moscas podem transportar a infecção por até 5 dias.
Dentro dos rebanhos, o método de alastramento principal ocorre entre os suínos
desmamados, particularmente quando confinados intensivamente. Os portadores
subclínicos transmitem facilmente a doença aos outros suínos em contato íntimo; a
taxa de portadores pode ser alta (60 a 100%). O microrganismo parece ser menos
facilmente transmitido das porcas portadoras para seus leitões, pelo menos durante
o período neonatal. O ambiente também exerce provavelmente um papel no
alastramento, já que o microrganismo sobrevive por longos períodos em fezes, e
carcaças. Felizmente, o vírus é morto facilmente por detergentes e desinfetantes
comuns.
Achados clínicos – A Streptococcus suis do Tipo 1 provoca casos esporádicos
de poliartrite e algumas vezes de meningite nos leitões lactentes, mas esses casos
têm menos importância.
A Streptococcus suis do Tipo 2 causa meningite aguda, e freqüentemente fatal,
nos suínos em desmame e em crescimento. A incidência nos rebanhos endêmicos
pode flutuar entre 2 e 15%, e permanece um problema constante. A meningite, que
pode ocorrer quando um suíno se infecta primeiro ou surgir quando os portadores
se estressam, se manifesta como depressão, febre, tremores, incoordenação,
opistótono, convulsões, cegueira e surdez.
Em alguns países, a S. suis do Tipo 2 se associa mais freqüentemente com
broncopneumonia do que com meningite, embora não haja evidências de que seja
primária. Em alguns países, descreve-se que esporadicamente ocorrem morte
súbita devida a endocardite e/ou miocardite, e doenças do trato genital das porcas,
incluindo o abortamento. Também são comuns a poliartrite e a claudicação.
Infecções Estreptocócicas dos Suínos 465

Lesões – A pele pode apresentar manchas vermelhas. Os linfonodos ficam


freqüentemente aumentados e congestos, sendo comum a polisserosite fibrinosa.
As cápsulas articulares podem se espessar, e as articulações podem conter
excesso de fluido turvo ou claro. As meninges e o cérebro freqüentemente parecem
normais, mas pode haver congestão, edema e excesso de fluido cerebroespinhal
claro ou turvo. Histologicamente, as alterações são típicas de meningite bacteriana
aguda. Os pulmões afetados podem apresentar graus variáveis de consolidação e
de broncopneumonia fibrinopurulenta.
Diagnóstico – A história e os sinais clínicos podem sugerir uma infecção por S.
suis, e a histologia e os testes de imunofluorescência podem fornecer evidências
adicionais, embora os testes de imunofluorescência não sejam específicos. O
diagnóstico definitivo depende do isolamento e da identificação do microrganismo
causador, senão pode-se confundir a doença com outras infecções estreptocócicas;
outras infecções bacterianas tais como erisipela, salmonelose ou doença de
Glässer aguda; privação de água; ou possivelmente a pseudo-raiva.
Tratamento e controle – O controle da meningite pela S. suis do Tipo 2 é a
principal preocupação. As tentativas de impedir a introdução de suínos portadores
provenientes de rebanhos endêmicos não são completamente confiáveis, já que o
microrganismo pode ser subclínico, e não existem testes confiáveis para monitorar
a sua presença. Além do mais, pode-se introduzi-lo por outras formas (por exemplo,
por meio das moscas). Uma outra possibilidade quando ocorrem novos surtos é de
que as cepas suaves já endêmicas tenham sofrido mutação tornando-se mais
virulentas. Uma vez em um rebanho, a doença tende a permanecer endêmica; nem
a vacinação nem a terapia coletiva a eliminarão. Embora se utilizem vacinas mortas,
não se provou a sua eficácia. A boa criação reduz o estresse ambiental e diminui a
doença clínica. Utiliza-se comumente uma medicação profilática/estratégica, geral-
mente no alimento ou na água, mas algumas vezes por meio da injeção de
antibióticos de longa ação. O microrganismo tende a se tornar resistente a tetraci-
clinas e sulfonamidas. A maioria dos isolados é sensível à penicilina, mas se inativa
rapidamente no alimento e portanto, pode falhar no controle da doença.

INFECÇÕES ESTREPTOCÓCICAS DOS GRUPOS C E L


E O UTROS G RUPOS
Septicemia, artrite, endocardite e outras afecções esporádicas dos suínos se
associam algumas vezes com a Streptococcus equisimilis (Grupo C de Lancefield),
ou menos comumente com os estreptococos do Grupo L ou outros estreptococos
não agrupáveis.
Etiologia e epidemiologia – A Streptococcus equisimilis e os estreptococos do
Grupo L aparecem nas lesões como cocos alongados e Gram-positivos em pares
ou em cadeias curtas. Eles produzem pequenas colônias durante a noite no ágar
sangue, circundadas por zonas distintas de hemólise completa. A identificação se
baseia no agrupamento de Lancefield e nas reações do açúcar.
Os estreptococos dos Grupos C e L se encontram comumente presentes em
muitas localizações corporais, incluindo excreções e secreções de suínos normais
na maioria dos rebanhos. A contaminação também é possível a partir de fontes não
suínas. Os microrganismos são oportunistas e geralmente entram no corpo do suíno
jovem por meio de lesões, incluindo dentes-de-agulha e caudas cortados ou
abrasões do piso. Eles causam uma bacteremia ou septicemia geralmente seguidas
por artrite ou endocardite.
Achados clínicos – Nos suínos lactentes, observa-se freqüentemente uma artrite
com articulações inchadas e quentes, acompanhada por febre, depressão, anorexia
e outras indicações de septicemia. Também podem ocorrer achados clínicos seme-
Infecções Estreptocócicas dos Suínos 466

lhantes em suínos no período pós-desmame. A endocardite não é incomum nos


suínos mais idosos, mas geralmente é diagnosticada apenas na necropsia.
Os estreptococos também se associam ocasionalmente com abscessos cutâ-
neos, mastite e pneumonia, e parecem estar envolvidos com outros fatores
causativos na necrose das orelhas (ver pág. 308). Esses microrganismos são
freqüentemente isolados a partir dos tratos reprodutivos femininos, incluindo des-
cargas vaginais, mas provavelmente se superestimam esses microrganismos como
a causa de uma insuficiência reprodutiva.
Lesões – As lesões mais comuns estão associadas com a artrite nos suínos jovens
e incluem o aumento da quantidade de fluido sinovial turvo freqüentemente acompa-
nhado por um inchaço periarticular. Os estreptococos causam freqüentemente uma
endocardite nos suínos mais idosos, e podem-se observá-los microscopicamente
como microrganismos cocóides nas lesões vegetativas das válvulas cardíacas.
Diagnóstico – Os sinais clínicos são freqüentemente sugestivos de infecções
com os estreptococos dos Grupos C ou L, mas a identificação definitiva deve se
basear no isolamento e na identificação bacterianos.
Tratamento e controle – É quase certo que se encontrem estreptococos dos
Grupos C ou L nos suínos jovens, mas pode-se reduzir a incidência das infecções
clinicamente importantes por meio de uma boa higiene com relação ao alojamento
e durante os procedimentos cirúrgicos menores. Modificações no alojamento para
reduzir abrasões cutâneas e traumatismos também são muito úteis. A terapia
específica geralmente envolve penicilina e antibióticos relacionados.

INFECÇÕES ESTREPTOCÓCICAS DO G RUPO E


Os estreptococos do Grupo E costumavam ser uma causa comum dos absces-
sos da barbela (linfadenite ou garrotilho suíno) nos suínos em engorda nos EUA, e
resultavam no aparamento da carcaça e na condenação ao abate. Isto é menos
comum hoje. O microrganismo ocorre em cadeias de 3 a , 15 cocos Gram-positivos
e encapsulados que produzem pequenas colônias circundadas por zonas de
hemólise completa. O microrganismo fermenta açúcares, mas a identificação
definitiva se faz pelo agrupamento de Lancefield. Existem pelo menos 6 sorotipos,
mas o sorotipo EV é o principal causador dos abscessos da barbela. O microrganis-
mo é transportado nas criptas amigdalinas e se espalha pelas secreções orais e
nasais. A doença ocorre repetidamente em algumas fazendas.
Os sinais incluem um inchaço acentuado dos linfonodos cervicais, algumas vezes
acompanhado por pirexia e anorexia. Os linfonodos cervicais abscedados, com áreas
aumentadas de liquefação se encapsulam após , 1 semana; podem ocorrer abscessos
secundários nos outros órgãos. O diagnóstico se baseia na síndrome clinicopatológica
típica, e se confirma por cultura e identificação do microrganismo causador.
Podem-se lancetar os abscessos grandes. Nos casos avançados, os antibióticos
são geralmente ineficazes. Têm-se produzido vacinas atenuadas vivas, mas são de
pouco uso. O uso muito disseminado de alimentos medicados e as alterações nos
sistemas de criação foram provavelmente responsáveis pela redução da incidência.

DOENÇA VESICULAR SUÍNA


A doença vesicular suína (DVS) é tipicamente uma doença transitória dos suínos,
na qual as lesões vesiculares aparecem na boca e nos pés. As lesões são
semelhantes às da febre aftosa (FA, ver pág. 408), às do exantema vesicular dos
Triquinelose 467

suínos (EVS, ver pág. 469) e às da estomatite vesicular (ver pág. 450), mas os suínos
não emagrecem, e as lesões se curam rapidamente. Têm-se descrito sinais
nervosos, mas estes são raramente observados no campo. A doença não causa
perdas severas de produção, mas possui uma grande importância econômica
porque deve ser diferenciada da FA, a erradicação é cara e freqüentemente se
impõem embargos à carne suína proveniente de nações não livres da DVS.
Embora já tenha ocorrido a infecção em trabalhadores de laboratório, e o vírus
possa estar presente em ovinos e bovinos, supõe-se que os suínos sejam os únicos
hospedeiros naturais. A doença foi identificada primeiro na Itália em 1966 e subse-
qüentemente em Hong Kong, no Japão e em vários países da Europa Ocidental. Ela
foi erradicada em alguns países (por exemplo, Grã-Bretanha e Suíça).
Etiologia – O agente causador é um enterovírus da família Picornaviridae. É
transmitido por contato direto ou indireto ou pela alimentação com carne suína ou
seus subprodutos infectados. A infecção dá origem a uma viremia e a vesículas
generalizadas que contêm grande quantidade do vírus.
Achados clínicos e diagnóstico – Os sinais primários são lesões vesiculares
na boca, lábios ou focinho, e nos pés, especialmente na coroa do casco. As lesões
podem ser suaves ou inaparentes, especialmente quando os suínos forem mantidos
sobre camas macias.
O diagnóstico se baseia em testes laboratoriais nas amostras epiteliais ou no soro.
A fixação de complemento e o ELISA são os testes de escolha, mas também se exige
freqüentemente a passagem em uma cultura de tecido suíno. Também se utilizam a
soroneutralização e a difusão em ágar gel. A diferenciação das outras doenças
vesiculares depende da fixação de complemento, do ELISA, da suscetibilidade das
culturas teciduais, da variação da suscetibilidade ao pH e da microscopia eletrônica.
Controle – Os países livres da doença podem permanecer assim por meio da
proibição da importação de suínos e de subprodutos de carne suína, ou por meio da
garantia de que os subprodutos de carne suína estejam tratados (por calor ou por
outro meio) para matar o vírus. Deve-se relatar qualquer surto suspeito às autorida-
des apropriadas. Se a doença aparecer, as medidas de controle importantes são o
cozimento completo (de acordo com as regras) de todos os restos alimentares, e o
controle da movimentação dos suínos. O vírus permanece infectivo por longos
períodos; conseqüentemente, a desinfecção das propriedades, dos caminhões e do
equipamento deve ser completa. Os desinfetantes mais efetivos são as bases
fortes, embora se possam utilizar os hipocloritos ou os iodóforos que contenham ácido
quando não se encontrar presente material orgânico.

TRIQUINELOSE
É uma doença parasitária de importância para a saúde pública. As infecções
humanas se estabelecem por meio do consumo de carne infectada insuficientemen-
te cozida, geralmente de suíno ou de urso, embora também se tenham implicado
outras espécies. Ocorrem infecções naturais nos carnívoros silvestres; ela também
tem sido encontrada em eqüinos, ratos, castores, gambás, morsas, baleias e aves
consumidoras de carne. A maioria dos mamíferos é suscetível.
Etiologia e epidemiologia – Reconhecem-se hoje várias espécies ou subespécies
do nematóideo causador. Como eles possuem poucas diferenças morfológicas,
utilizam-se na diferenciação outras características, tais como o isolamento reprodutivo,
a infectividade a determinados hospedeiros e a resistência a baixas temperaturas.
Atualmente utiliza-se uma nomenclatura trinomial para diferenciá-los: Trichinella
Triquinelose 468

spiralis spiralis ( domestica) – alta infectividade para ratos, camundongos e suínos,


e baixa resistência ao congelamento; T. spiralis nativa – encontrada nos carnívoros
árticos, baixa infectividade para ratos e suínos, e resistência ao congelamento; T.
spiralis nelsoni – encontrada na África e Europa até , o paralelo 50° ou 60°, baixa
infectividade para camundongos, ratos e suínos, e baixa virulência; T. spiralis
pseudospiralis – ausência de cisto no estágio muscular, tamanho pequeno, prima-
riamente um parasita das aves.
A infecção ocorre por meio da ingestão de larvas encistadas no músculo. A parede
cística é digerida no estômago, e as larvas liberadas penetram nas mucosas
duodenal e jejunal. Dentro de , 4 dias, as larvas se desenvolvem em adultos
sexualmente maduros. As fêmeas (3 a 4µm) penetram profundamente na mucosa e
descarregam larvas vivas no quinto ao sexto dia; um adulto geralmente produz 500
a 1.000 larvas por 2 a 6 semanas. Após a reprodução, os vermes adultos morrem e
são geralmente digeridos. As pequeninas larvas (0,1µm) migram para os músculos,
e seguem os sistemas linfático e portal para a circulação periférica; as que atingem
a musculatura estriada entram nas células musculares individuais. Crescem rapida-
mente (para 1µm) e começam a se enrolar no interior da célula, geralmente uma por
célula. Inicia-se a formação da cápsula , 15 dias após a infecção, e ela se completa
em 4 a 5 semanas. Ocorre calcificação em proporções diferentes nos vários
hospedeiros, mesmo entre indivíduos dentro de uma mesma espécie. As larvas
podem permanecer viáveis nos cistos por anos e continuar o seu desenvolvimento
se forem ingeridas por outro hospedeiro adequado. Diafragma, língua, masseter e
músculos intercostais estão entre os músculos mais fortemente envolvidos.
Se passarem pelo intestino e forem eliminadas nas fezes antes da maturação, as
larvas se tornam infectivas para os outros animais.
Achados clínicos e diagnóstico – A maioria das infecções nos animais
domésticos e silvestres prossegue não diagnosticada. No homem, as infecções
pesadas produzem uma enfermidade séria com 3 fases clínicas (intestinal, invasão
muscular e convalescente) e mortes ocasionais.
Embora o diagnóstico ante mortem nos animais além do homem seja raro, pode-
se suspeitar da triquinelose se houver uma história de ingestão de roedores ou de
carne crua infectada. O exame microscópico de uma amostra de biópsia muscular
confirmará, mas não excluirá necessariamente a triquinelose. O ELISA é um teste
confiável para a detecção de anticorpos anti-Trichinella, embora possa não ocorrer
uma soroconversão até , 18 dias após a infecção.
Controle – O tratamento geralmente não é prático nos animais. O objetivo
consiste no impedimento da ingestão por qualquer animal, inclusive o homem, de
cistos de Trichinella viáveis na musculatura. Nos suínos, pode-se conseguir isso com
um bom manejo, incluindo o controle de roedores e o cozimento dos restos
alimentares (fornecidos aos suínos) por 30min a 100°C, e pelo impedimento do
acesso a carcaças de animais silvestres.
A inspeção da carne quanto a triquinas viáveis no momento do abate (por meio de
métodos de digestão ou triquinoscópicos) é efetiva na prevenção da infecção humana
em muitos países. Na América do Norte, admite-se que a carne suína possa estar
infectada, tanto que os produtos que aparecem como “prontos para comer” devem ser
processados por aquecimento, congelamento ou cura adequados para matar as
triquinas antes da comercialização. Devem-se cozinhar os outros produtos de carne
suína para se assegurar que todo o tecido tenha sido aquecido a uma temperatura de
≥ 58°C. O congelamento da carne suína a uma temperatura apropriada por um período
apropriado também é efetivo (-15°C por 20 dias, -23°C por 10 dias ou -30°C por 6 dias).
Supõe-se que as infecções nos suínos se devam à T. spiralis spiralis. O congelamento
não mata confiavelmente as triquinas em outra carne além da suína.
Doença do Vômito e da Emaciação 469

EXANTEMA VESICULAR DOS SUÍNOS


(Virose do leão-marinho de San Miguel [VLSM])

É uma doença altamente infecciosa e aguda, caracterizada por febre e formação


de vesículas no focinho, mucosa oral, solas dos pés, entre os dedos e na coroa do
casco. Têm-se demonstrado muitos tipos imunologicamente distintos do calicivírus
causador (13 tipos de VEVS a partir de populações de suínos e ≥ 20 de vírus da
VLSM a partir de fontes marinhas). Mamíferos marinhos, peixes, cobras, bovinos,
visons, eqüinos, primatas e o homem são suscetíveis a um ou mais sorotipos do
vírus.
Nos suínos, a doença clínica é indistinguível da febre aftosa (ver pág. 408), da
estomatite vesicular (ver pág. 450) ou da doença vesicular suína (ver pág. 466).
Originalmente confinada à Califórnia, a doença se tornou muito difundida nos EUA
durante os anos 50, mas uma campanha vigorosa de erradicação da doença obteve
sucesso. Em 1959, o país foi declarado livre do EVS, e a doença foi classificada
como uma Doença de Animais Estrangeiros; ela nunca foi descrita como infecção
natural dos suínos em nenhuma outra parte do mundo.
Desde 1972, tem-se isolado um vírus indistinguível do vírus do exantema
vesicular dos suínos (VEVS), designado como vírus da virose do leão-marinho de
San Miguel (VLSM), a partir de “swabs” retais e da garganta de filhotes de leão-
marinho da Califórnia prematuros e de 4 meses de idade, de filhotes de otárias-
do-norte desmamados e mortos, e de filhotes de elefantes-marinhos-do-norte em
aleitamento; e a partir de lesões vesiculares nos mamíferos marinhos, da carne
de foca comercial produzida no Alasca e de peixes perciformes coletados na orla
marítima no sul da costa da Califórnia. Os isolados do vírus da VLSM tanto
provenientes de peixes como do mamíferos marinhos são capazes de produzir o
EVS nos suínos. Além disso, os isolados de calicivírus provenientes de “swabs”
retais e da garganta de bezerros leiteiros causam um exantema vesicular clínico
nos suínos expostos. Recuperou-se um vírus do tipo calicivírus a partir de lesões
vesiculares nas palmas e solas de um pesquisador que trabalhava com o vírus.
Nos suínos, o diagnóstico presuntivo se baseia na febre e na presença de
vesículas típicas, que se rompem dentro de 24 a 48h para formar erosões. Pode-se
confirmar o diagnóstico nos testes de fixação de complemento e na microscopia
eletrônica no tecido epitelial, ou após a passagem nas culturas teciduais suínas.
Também se utilizam testes de soroneutralização e microscopia imunoeletrônica.
Devem-se relatar os casos suspeitos de exantema vesicular imediatamente às
autoridades reguladoras. Devem-se cozinhar os restos alimentares e os peixes
antes de oferecê-los aos suínos.

DOENÇA DO VÔMITO E DA EMACIAÇÃO


(DVE, Encefalomielite hemaglutinante, Encefalomielite coronaviral)

É uma doença viral dos suínos jovens, caracterizada por vômito, constipação e
anorexia que resulta tanto em morte rápida como em emaciação crônica (doença do
vômito e da emaciação). Durante alguns surtos, também se podem observar
distúrbios motores devidos a uma encefalomielite aguda (encefalomielite
hemaglutinante).
Etiologia e epidemiologia – O coronavírus causador, o vírus da encefalomielite
hemaglutinante (VEH), é de um tipo antigênico único, e cresce em vários tipos de
Doença do Vômito e da Emaciação 470

culturas de células suínas, nas quais causa a formação de sincícios. Esse vírus
aglutina as hemácias de várias espécies animais. Os suínos são os únicos
hospedeiros naturais. O vírus se espalha por meio de aerossol.
A infecção parece ser muito difundida na América do Norte, Europa Ocidental e
Austrália. Ela geralmente permanece subclínica. O vírus é endêmico na maioria dos
rebanhos reprodutivos, e existe uma imunidade de rebanho. As porcas imunes
transferem os anticorpos maternos para as suas ninhadas, que ficam protegidas até
que desenvolvam resistência com a idade; conseqüentemente, os surtos clínicos
tornam-se raros. No entanto, se o vírus entrar em um rebanho suscetível com leitões
neonatais, a morbidade e a mortalidade podem ser altas.
Patogenia – A replicação acontece primeiro na mucosa nasal, amígdalas,
pulmões e em uma quantidade muito limitada, no intestino delgado. A partir desses
locais de entrada, o vírus invade núcleos definidos da medula oblonga, através do
sistema nervoso periférico e se espalha subseqüentemente para todo o tronco
cerebral, e possivelmente para o cérebro e o cerebelo. Acredita-se que o vômito seja
causado pela replicação viral no gânglio sensorial vagal. A emaciação se deve ao
vômito e ao esvaziamento retardado do estômago, que resulta das lesões
induzidas pelo vírus no plexo intramural. A infecção dos neurônios cerebrais e
cerebelares pode causar distúrbios motores que são, entretanto, raramente
observados durante um surto.
Achados clínicos e lesões – Ambas as síndromes clínicas, as formas de DVE
e encefalítica, se confinam quase que exclusivamente aos suínos com < 4 semanas
de idade. A forma de DVE possui um período de incubação de 4 a 7 dias. Observam-
se esforços de vômito e vômitos repetidos. Os suínos começam a mamar mas logo
param, afastam-se da porca e vomitam o leite que ingeriram. Eles mergulham suas
bocas nas tigelas de água mas bebem pouco, o que possivelmente um indicativo de
paralisia faríngea. O vômito persistente resulta em um rápido declínio da condição
do animal. Os suínos neonatos ficam desidratados, cianóticos e comatosos, e
morrem. Os suínos mais velhos, porém, continuam a vomitar, embora menos
freqüentemente do que no estágio inicial da doença. Eles perdem o apetite e ficam
emaciados. Pode-se desenvolver uma grande distensão do abdome cranial. Esse
estado de “emaciação” pode persistir 1 a 6 semanas até que os suínos morram de
inanição. A mortalidade aproxima-se de 100% dentro da ninhada, e os sobreviven-
tes tornam-se permanentemente subdesenvolvidos.
A forma de encefalomielite também se inicia com vômito, geralmente 4 a 7 dias
após o nascimento. O vômito continua intermitentemente por 1 a 2 dias, mas
raramente é severo e não resulta em desidratação. Depois de 1 a 3 dias, observam-
se tremores musculares generalizados e hiperestesia. Os suínos tendem a andar
para três, terminando freqüentemente em uma posição de “cão-sentado”. Eles se
enfraquecem logo, tornam-se incapazes de crescer e “remam” com seus membros.
Também ocorrem cegueira, opistótono e nistagmo. Após alguns dias ficam dispnéi-
cos e comatosos, e morrem.
Do início ao desaparecimento, um surto em uma fazenda dura 2 a 3 semanas.
O desaparecimento da doença coincide com o desenvolvimento da imunidade em
porcas adiantadamente prenhes, o que protege conseqüentemente os suínos por
meio dos anticorpos maternos.
Nos suínos cronicamente afetados, observam-se caquexia e distensão abdomi-
nal. Os seus estômagos ficam dilatados e cheios de gases. Microscopicamente,
encontram-se embainhamento perivascular, gliose e degeneração neuronal na
medula em 70 a 100% dos suínos com sinais nervosos, e em 20 a 60% dos suínos
que apresentam a síndrome da DVE. Observa-se regularmente uma neurite dos
gânglios sensoriais periféricos, particularmente dos gânglios trigeminais. Encon-
tram-se uma degeneração dos gânglios da parede estomacal e um embainhamento
Língua Azul 471

perivascular em 15 a 85% dos suínos com DVE. As lesões tornam-se mais


pronunciadas na área glandular pilórica.
Diagnóstico – Pode-se fazer um diagnóstico laboratorial rotineiramente por
meio do isolamento do vírus a partir do tronco cerebral, caso se sacrifiquem os
suínos dentro de 2 dias após o aparecimento dos sinais clínicos. O isolamento do
vírus a partir de suínos que tenham se afetado por > 2 dias é difícil.
Pode-se demonstrar uma elevação significativa no título de anticorpos em
amostras séricas pareadas. Deve-se coletar a amostra sérica aguda imediatamente
após o início da doença, pois os suínos podem já ter estabelecido um baixo título de
anticorpos quando os primeiros sinais aparecerem.
O diagnóstico diferencial inclui a doença de Teschen-Talfan (ver pág. 746) e a
pseudo-raiva (ver pág. 747). Os sinais respiratórios nos suínos mais velhos e os
abortamentos nas porcas fazem parte de um surto de pseudo-raiva. No caso da
doença de Teschen-Talfan, geralmente envolvem-se os suínos mais velhos.
Controle – Não há tratamento. Uma vez que os sinais estejam evidentes, a
doença segue seu curso. São raras as recuperações espontâneas. Podem-se
proteger os leitões nascidos de porcas não imunes durante um surto por meio da
injeção, no nascimento, tanto de soro hiperimune como de soro proveniente de
porcas aleatoriamente escolhidas no abate. No entanto, o lapso de tempo entre o
diagnóstico e a cessação da doença geralmente é muito curto para se obter muito
lucro com esse procedimento. A manutenção do vírus na fazenda e conseqüente-
mente a manutenção da imunidade naturalmente induzida nas porcas evitam os
surtos nos leitões.

LÍNGUA-AZUL
É uma doença viral, transmitida por insetos e não contagiosa de ovinos, bovinos,
caprinos e ruminantes silvestres. A doença ocorre largamente no continente
africano e em menor extensão na América do Norte, Ásia e Europa. Isolou-se o vírus
a partir de insetos picadores (Culicoides spp) e de bovinos na Austrália; no entanto,
não há evidências clínicas de que a língua-azul exista nos ruminantes desse
continente. Existem evidências sorológicas de uma infecção muito disseminada nos
ruminantes do Caribe e de alguns países das Américas Central e do Sul, mas não
se confirmou a doença clínica.
Etiologia e transmissão – O vírus da língua-azul é um orbivírus da família
Reoviridae; identificaram-se 24 sorotipos antigênicos no mundo, 5 deles nos
EUA. Sob condições naturais, o vírus é transmitido biologicamente pelo Culicoides
spp. Os bovinos são um importante reservatório para ovinos e outros ruminantes
suscetíveis; algumas espécies de ruminantes silvestres também podem ser
reservatórios.
Achados clínicos – O período normal de incubação nos ovinos é de 5 a 10 dias.
Os sinais clínicos, em seqüência de surgimento, incluem: dispnéia com ofegação;
hiperemia do focinho, lábios e orelhas; pirexia (até 42°C); depressão; e inflamação,
ulceração, erosão e necrose da mucosa da boca, especialmente do coxim dental.
Os sinais que podem aparecer, dependendo da severidade da doença incluem o
inchaço e, menos freqüentemente, a cianose da língua, uma claudicação devida a
uma coronite, torcicolo, vômito, pneumonia, conjuntivite e ocasionalmente, alopecia.
A língua-azul nos ovinos dos EUA é muito mais suave do que nos da África, com
mortalidades de 0 a 30%. Os bovinos se encontram com freqüência inaparentemente
infectados, mas alguns podem desenvolver sinais clínicos semelhantes aos dos
Língua Azul 472

ovinos infectados. Se os bovinos se infectarem durante a gestação, podem abortar


ou parir bezerros anormais (artrogripose, hidranencefalia e ataxia). Também se tem
encontrado o vírus no sêmen de touros infectados, mas as quantidades são
geralmente baixas e ocorrem apenas durante o estágio virêmico da infecção. No
veado-de-cauda-branca e na antilocapra, o vírus causa freqüentemente uma
doença hemorrágica fatal superaguda.
Diagnóstico – Pode-se confirmar o diagnóstico clínico por meio do isolamento
direto do vírus em embriões de galinha inoculados intravascularmente, em determi-
nadas culturas de células ou em ovinos suscetíveis. O vírus também pode crescer
(menos facilmente) em camundongos e em hamsters lactentes inoculados
intracerebralmente. Podem-se então identificar os vírus isolados por meio de testes
de imunofluorescência ou de soroneutralização. Pode-se obter um diagnóstico
presuntivo indireto com a elevação do título de anticorpos em soros pareados a partir
de animais recuperados. Os testes sorológicos incluem fixação de complemento,
difusão em ágar gel, ELISA e soroneutralização.
A viremia se associa primariamente a hemácias e o vírus pode coexistir em
animais infectados com altas concentrações de seus anticorpos neutralizantes
específicos. Logo, o lavado de hemácias torna-se freqüentemente necessário para
o isolamento do vírus.
A língua-azul é freqüentemente maldiagnosticada (dependendo da espécie
envolvida) como fotossensibilização, estomatite “micótica”, diarréia viral bovina e a
sua forma mucosa, rinotraqueíte bovina infecciosa, febre catarral maligna, estomatite
vesicular, doença hemorrágica epizoótica dos veados, éctima contagioso, berne na
cabeça e febre aftosa.
Prevenção e controle – Encontra-se disponível nos EUA uma vacina viva
modificada e monovalente (Sorotipo 10) de origem em cultura de células apenas
para uso nos ovinos. Estão se desenvolvendo vacinas vivas modificadas com os
outros sorotipos encontrados nos EUA e vacinas mortas. Não se deve utilizar a
vacina viva em áreas não endêmicas durante a estação dos vetores, pois ela é
infecciosa para o vetor inseto, e a passagem do vírus vacinal pelo inseto aumenta
a sua patogenicidade para os ovinos. Não se devem vacinar as ovelhas prenhes no
início da gestação, pois isso resulta freqüentemente em hidranencefalia e outras
deformidades nos cordeiros. A imunidade passiva nos cordeiros dura , 6 meses,
e durante esse período, ela pode interferir no desenvolvimento da imunidade ativa
a partir da vacinação. Em um surto, a decisão da vacinação depende das circuns-
tâncias existentes. As medidas para reduzir as picadas de insetos nos ruminantes
suscetíveis por meio da redução das populações de insetos na área devem ajudar
a minimizar a extensão da doença.

LEUCOSE BOVINA
(Linfossarcoma, Linfoma maligno, Leucemia)

O termo leucose indica uma proliferação maligna do tecido formador de leucóci-


tos. Como os tumores linfóides predominam nos bovinos, linfossarcoma e linfoma
maligno tornam-se sinônimos. Alguma vezes, chama-se a doença de leucemia, mas
a presença de células malignas no sangue não é um achado consistente.
Reconhecem-se 4 síndromes clinicopatológicas: dos bezerros, tímica, cutânea
e dos adultos. As 3 primeiras formas são chamadas de leucose esporádica pois não
há evidências de que sejam contagiosas. A síndrome dos adultos, também conhe-
cida como leucose enzoótica, é causada pelo vírus da leucose bovina (VLB). A
Leucose Bovina 473

leucose esporádica ocorre mundialmente, enquanto a distribuição geográfica da


leucose enzoótica se relaciona diretamente com a prevalência do VLB.
Podem-se infectar experimentalmente ovinos e caprinos com o VLB, e os ovinos
mais infectados desenvolvem linfossarcoma. Tem havido alguns relatos de reba-
nhos naturalmente infectados, mas desconhecem-se a fonte e o mecanismo de
infecção desses casos. Todas as evidências indicam que o VLB não se espalha de
ovinos para bovinos ou de bovinos para ovinos por contato normal. Os estudos
epidemiológicos e sorológicos têm falhado em demonstrar qualquer evidência de
infecção ou doença humanas associadas com a exposição ao VLB.
Transmissão, epidemiologia e patogenia – A transmissão do VLB ocorre
primariamente por meio da transferência de linfócitos sangüíneos entre os animais.
O vírus se encontra raramente presente na secreção nasal, saliva, urina ou sêmen,
exceto quando esses fluidos se contaminam com exsudato celular ou sangue. Os
insetos podem agir como vetores mecânicos do sangue, mas trauma, uso de
agulhas de sangria comuns e procedimentos cirúrgicos são provavelmente os
mecanismos de transmissão mais comuns.
Pode-se transmitir o VLB para os fetos in utero, mas geralmente < 10% dos
bezerros originários de fêmeas infectadas portam o vírus ao nascer. Ao se transferir
os embriões de vacas infectadas com o VLB para vacas VLB-negativas, os bezerros
produzidos ficam rotineiramente livres da infecção. A transmissão do VLB para os
bezerros por meio do colostro ou do leite é rara devido à proteção conferida pelos
anticorpos colostrais.
A maioria das infecções por VLB é assintomática, e pode-se reconhecê-la
apenas por meio de um teste sorológico que detecte o anticorpo específico viral. O
animal se torna soropositivo 4 a 12 semanas após a exposição viral. Dos bovinos
infectados, , 30% desenvolvem uma linfocitose persistente, mas a resposta à
infecção não está associada a um sinal clínico da doença.
O desenvolvimento da leucose é uma rara manifestação de infecção pelo VLB.
A incidência de casos de tumor varia consideravelmente de rebanho a rebanho. A
taxa média anual de bovinos infectados é estimada em 0,3%.
Achados clínicos – Na forma dos bezerros da leucose, que afeta animais < 6
meses de idade, uma linfadenopatia generalizada e uma metástase tumoral muito
disseminada envolvem a maioria dos sistemas de órgãos e a medula óssea.
Os casos tímicos ocorrem tipicamente em animais com 6 a 8 meses de idade.
O tumor geralmente se confina ao timo e resulta em um inchaço difuso do pescoço
ventral. O tecido neoplásico também pode se estender para o tórax, e não é incomum
a metástase nos linfonodos locais. São incomuns as lesões posteriores ao diafragma.
Nos adultos jovens, observa-se a leucose cutânea, o único tumor linfóide não
fatal dos bovinos. Os tumores cutâneos superficiais se encontram presentes apenas
por algumas semanas, e após as lesões regredirem, a recidiva é rara.
A leucose enzoótica é uma doença de bovinos adultos, e a maioria dos casos
ocorre em animais que tenham 4 a 8 anos de idade. A distribuição do tumor é
imprevisível, mas os tecidos mais comumente afetados incluem linfonodos, abomaso,
coração, baço, rins, útero, meninges espinhais e tecido linfático retrobulbar.
Diagnóstico – Pode-se realizar um diagnóstico presuntivo da leucose se houver
evidências clínicas de linfadenopatia ou tumor em um tecido comumente afetado.
Algumas vezes, pode-se demonstrar a leucemia na forma dos bezerros, mas os
casos tímicos e cutâneos são geralmente aleucêmicos. O exame de sangue
raramente é útil no diagnóstico da leucose enzoótica porque muitos bovinos infecta-
dos com o VLB e clinicamente normais apresentam linfocitose persistente. Um
teste soronegativo quanto à infecção com o VLB é informativo quando se suspeita de uma
leucose enzoótica; nesse caso, pode-se excluir a doença. No entanto, um resultado
positivo indica apenas uma infecção com o VLB e não significa muito para o
Leucose Bovina 474

diagnóstico diferencial. O teste sorológico não é apropriado para a leucose dos


bezerros, tímica e cutânea, pois as formas esporádicas não são causadas pelo VLB.
Um diagnóstico definitivo de leucose requer exame histológico dos tecidos
afetados já que a aparência macroscópica de um tumor linfóide pode ser semelhante
à de outros tipos de neoplasia ou outras doenças proliferativas.
Controle – Não há tratamento para a leucose ou para a infecção com o VLB nos
animais individuais. Pode-se eliminar o vírus de um rebanho testando-se
sorologicamente todos os bovinos a intervalos de 2 a 3 meses e removendo-se
imediatamente os animais positivos. A extensão de tempo exigida para se obter um
rebanho livre do VLB varia, dependendo da prevalência inicial da infecção, mas na
maioria dos rebanhos, pode-se erradicar o vírus dentro de 1 ano. Se a prevalência
da infecção for muito alta para permitir a remoção de todos os reagentes ao VLB,
pode-se reduzir o alastramento do vírus por meio da segregação desses animais
para evitar o contato direto com os bovinos VLB negativos. Devem-se isolar os
bezerros originários de fêmeas infectadas até que tenham ≥ 6 meses de idade,
quando poderão ser testados sorologicamente sem a interferência dos anticorpos
colostrais. Embora o procedimento de segregação possa ser útil para a redução da
prevalência do VLB em um rebanho, o objetivo final da fiscalização sorológica
consiste na eliminação total do vírus.

FEBRE PETEQUIAL BOVINA


(Doença de ondiri)

É uma doença infecciosa dos bovinos, caracterizada por hemorragia e edema.


Foi confirmada apenas no Quênia, em altitudes de > 1.500m, embora também possa
ocorrer nos países vizinhos de topografia semelhante. O microrganismo pode se
multiplicar após a infecção experimental em bovinos, ovinos, antílopes-pongo,
impalas, gazelas-de-Thomson e gnus, portanto, provavelmente na maioria dos
ruminantes domésticos e silvestres.
Etiologia e epidemiologia – O agente causador é um mi crorganismo semelhan-
te a uma rickéttsia, a Ehrlichia (Cytoecetes) ondiri. Pode-se observá-la nos granu-
lócitos e monócitos em circulação enquanto os bovinos estão doentes, e no baço à
necropsia. Acreditava-se que se multiplicasse inicialmente no baço, com um
alastramento subseqüente para os outros órgãos. Em alguns animais, ocorrem
infecções latentes após a recuperação. A imunidade dura vários anos.
A doença se restringe às áreas de cerrado ou de margens de floresta, que tenham
sombra forte, uma camada espessa de palha e uma umidade relativa alta. Ocorre
esporadicamente por todo o ano em raças importadas de bovinos. Suspeita-se de
um vetor artrópode, mas falharam as extensas tentativas de se incriminar carrapa-
tos, insetos picadores e os ácaros. Os antílopes-pongo (Tragelaphus scriptus ) são
os reservatórios da E. ondiri nas áreas endêmicas, e os outros ruminantes silvestres
podem se tornar reservatórios em potencial.
Achados clínicos – A doença varia de inaparente a fatal, e se caracteriza por
febre, apatia e petequiação das membranas mucosas. Após um período de
incubação de 4 a 14 dias, os animais desenvolvem uma febre alta; 2 a 3 dias mais
tarde, a maioria dos animais parece entorpecida, e aparecem petéquias nas
membranas mucosas, particularmente na superfície inferior da língua e na mucosa
vaginal. Essas hemorragias aumentam em vários dias, e depois regridem. O edema
e a hemorragia conjuntivais acentuados (“olho de ovo escaldado”) tornam-se
característicos em alguns casos severos. Tipicamente, ocorrem eosinopenia total e
Artrite e Encefalite Caprinas 475

linfopenia acentuada, seguidas por uma neutropenia igualmente acentuada. À


necropsia, uma hiperplasia linfóide acompanha a hemorragia e o edema muito
disseminados. Não se descreveu nenhuma anormalidade histológica característica.
Na microscopia eletrônica, tem-se observado o microrganismo nos vacúolos cito-
plasmáticos do endotélio capilar, um dano que pode ser responsável pelas hemor-
ragias e pelo edema característicos.
Diagnóstico – Nas áreas onde a doença é endêmica, uma história de movimen-
tação através de áreas de pastejo acidentadas, acompanhada de sinais clínicos e
post mortem, permite um diagnóstico presuntivo. Nas outras áreas, torna-se
necessária a demonstração do microrganismo causador, tanto em esfregaços de
baço ou de sangue corados por Giemsa, como por inoculação de suspensões
teciduais em bovinos ou ovinos suscetíveis. Devem-se coletar diariamente esfrega-
ços sangüíneos do animal receptor durante 10 dias e examiná-los quanto à E. ondiri.
A Ehrlichia ondiri se cora de azul com o Giemsa, e pode ser observada nas infecções
experimentais e naturais como pequenos corpúsculos (0,4µm), corpúsculos maio-
res (1 a 2µm), grupos de corpúsculos pequenos e grandes e grupos de mórulas de
corpúsculos pequenos. Esses corpúsculos ocorrem nos vacúolos citoplasmáticos e
são mais comumente observados nos neutrófilos.
Tratamento e controle – Tem-se utilizado com sucesso a ditiossemicarbazona
no tratamento dos casos experimentais iniciais. Nas áreas endêmicas, pratica-se a
evitação das áreas associadas com casos anteriores, sempre que possível.

ARTRITE E ENCEFALITE CAPRINAS


A artrite e encefalite caprinas (AEC) é uma síndrome patológica que se manifesta
mais freqüentemente em caprinos leiteiros adultos como uma artrite e uma mastite
não responsivas crônicas, e em caprinos jovens como uma encefalite (leucoen-
cefalomielite). A sorologia sugere que o vírus se distribui largamente entre os
caprinos leiteiros nos países mais industrializados, mas é raro entre os caprinos
autóctones dos países em desenvolvimento. A doença foi descrita na América do
Norte, Europa, Austrália e Nova Zelândia. Já se infectaram ovinos experimental-
mente. Atualmente, não há evidências de que o vírus da AEC (VAEC) infecte o
homem; no entanto, recomenda-se a pasteurização do leite caprino para o consumo
humano, já que ele contém um alto nível do vírus e se constitui em uma fonte
potencial de microrganismos de interesse zoonótico, tais como a Coxiella burnetti
e o Salmonella spp.
Etiologia e patogenia – O VAEC é um retrovírus não oncogênico da subfamília
Lentivirinae e se relaciona antigenicamente com o vírus da pneumonia progressiva
ovina e o da maedi-visna. Os anticorpos monoclonais podem distinguir os vírus da
AEC e da pneumonia progressiva ovina; no entanto, ainda não se encontra
disponível um teste comercial para fazê-lo. O vírus geralmente não infecta o feto, e
a maior parte da transmissão ocorre por meio do leite e do colostro. Pode ocorrer
certa transmissão durante o processo do nascimento. A transmissão horizontal
entre caprinos não lactentes parece ser limitada, exigindo meses ou anos de contato
na maioria dos casos. No entanto, consideram-se as cabras infectadas lactantes
como uma fonte relativamente potente de infecção horizontal.
As pesquisas sorológicas indicam uma taxa de infecção de > 60% entre os
caprinos leiteiros nos países industrializados; porém, a prevalência da doença
clínica é de 9 a 38%. A sorologia indica que quanto mais velha for a população de
caprinos, maior será a taxa de infecção.
Artrite e Encefalite Caprinas 476

A maioria dos caprinos se infecta enquanto jovem, porta o vírus por toda a vida
e desenvolve a doença meses ou anos mais tarde devido a fatores ainda
indefinidos.
Achados clínicos – Geralmente se observa a leucoencefalomielite nos cabritos
com 2 a 4 meses de idade; ela pode se desenvolver nos adultos, se bem que mais
insidiosamente. A doença geralmente começa com a incapacidade do cabrito aduzir
uma ou ambas as patas traseiras, progride freqüentemente para uma paralisia
ascendente e termina com ataques e morte. Antes dos ataques, o cabrito se
encontra afebril, alerta e capaz de comer e beber. Nem sempre ocorre morte, mas
a regressão da paralisia é rara.
A artrite geralmente apresenta um longo curso clínico, mas são comuns
exacerbações agudas de dor, claudicação e inchaço das articulações. Ela afeta
mais freqüentemente os adultos, mas também pode ser vista aos 4 meses de idade.
A má condição física é típica nos casos crônicos. Embora possa-se afetar qualquer
articulação, envolvem-se mais comumente carpos, jarretes, patelas, cotovelos,
ombros e bolsas. As células do fluido sinovial tornam-se predominantemente
mononucleares durante todos os estágios (menos os mais agudos) da doença. A
radiografia dos casos crônicos revela a mineralização dos tecidos moles ao redor
das articulações e das bolsas.
Lesões – Os cabritos com a forma encefalítica podem apresentar áreas castanho-
claras macroscopicamente visíveis no interior da substância branca do cérebro e da
medula espinhal, mas a histologia se torna necessária para se demonstrar adequa-
damente as bainhas perivasculares características, a desmielinização e a malacia.
À necropsia de um caprino com a forma artrítica, a carcaça se encontra freqüentemente
em más condições devido à inapetência ou à incapacidade de comer nos estágios
finais da doença. As articulações e as bolsas se encontram aumentadas devido ao
excesso de produção de fluido sinovial, à proliferação de tecido conjuntivo fibroso,
aos infiltrados celulares inflamatórios e aos restos necróticos. As articulações
abertas revelam membranas sinoviais castanhas e espessadas; necrose do tecido
conjuntivo; e um material cor de giz que se constitui em fosfato de cálcio. A mastite
se caracteriza por um úbere firme e difusamente inchado. A firmeza se deve a
infiltrações difusas a peridutais densas de linfócitos, células plasmáticas e histiócitos.
Tem-se associado a pneumonia intersticial que afeta os lobos cranioventrais com a
infecção pelo VAEC.
Diagnóstico – O diagnóstico da forma encefalítica da AEC se baseia nos achados
clínicos e post mortem. A histologia se torna freqüentemente necessária para um
diagnóstico definitivo. A precipitação do anticorpo contra o vírus indica provavelmen-
te uma infecção persistente, mas não patognomônica, de qualquer forma da doença,
pois encefalite, artrite, mastite ou pneumonia podem ter outras causas nos animais
soropositivos. O diagnóstico diferencial inclui várias encefalites bacterianas e para-
sitárias, ataxia enzoótica (curvatura da espinha), toxicoses e traumatismo.
O diagnóstico da AEC se baseia numa história de artrite crônica que resiste a
qualquer forma de tratamento, e nos achados de necropsia. Os achados soropositivos
são úteis, mas deve-se considerá-los apenas como adjuvantes do diagnóstico. O
diagnóstico diferencial inclui enfermidade articular dos caprinos jovens, traumatis-
mos, desequilíbrios minerais, poliartrite clamidiana, artrite micoplasmal e erisipela.
O diagnóstico da mastite e da pneumonia da AEC se baseia nos achados clínicos
e post mortem. Os diagnósticos diferenciais incluem causas bacterianas (na
mastite) e causas virais ou bacterianas (na pneumonia).
Tratamento e controle – O curso da forma encefalítica não pode ser alterado por
qualquer terapia conhecida. As medidas paliativas podem ser úteis em todas as
formas da doença, e tem-se recomendado a fenilbutazona para reduzir a dor e a
inflamação na forma artrítica.
Febre Efêmera 477

Pode-se reduzir a taxa de infecção dos caprinos recém-nascidos em > 90% por
meio da remoção dos cabritos das cabras infectadas à medida que passam pelo
canal de nascimento, oferecendo-se a eles um colostro aquecido a 56°C por 1h,
pasteurizando-se o leite e criando-os isolados dos caprinos infectados. Podem-se
utilizar testes sorológicos, tais como a imunodifusão em ágar gel, para monitorar a
infecção.

FEBRE HEMORRÁGICA DA CRIMÉIA-CONGO


(FHCC, Doença do vírus do Congo)

É uma doença viral severa e freqüentemente fatal do homem, transmitida por


carrapatos; as infecções nos animais domésticos e nos mamíferos silvestres adultos
podem produzir uma enfermidade febril fracamente definida que pode durar alguns
dias. Embora as aves sejam resistentes, elas podem disseminar carrapatos in-
fectantes em largas áreas. O agente, o vírus da FHCC (um nairovírus, Bunyaviridae)
se encontra no sul da China e antiga URSS, sudeste da Europa, Índia, Oriente
Próximo e por toda a África. O vírus da FHCC se encontra associado a ≥ 30 espécies
de carrapatos de 8 gêneros, principalmente os ixodídeos (carrapatos duros). É
provável que o vírus se encontre muito disseminado em todos os países da África
e Eurásia que estão dentro dos limites da distribuição mundial dos carrapatos
Hyalomma. Ocorrem epidemias quando a densidade populacional de Hyalomma
explode devido aos ciclos climáticos naturais ou às alterações ambientais; nas
outras épocas, os casos humanos são esporádicos. O vírus se mantém na
população de carrapatos do estágio larval até os estágios ninfal e adulto, e é
transmitido transovarianamente. É transmitido ao homem e aos outros animais na
saliva dos carrapatos picadores, por meio do contato com carcaças infectadas ou
descargas sanguinolentas infectadas, e também por acidentes de laboratório. Pode-
se diagnosticar a FHCC por meio do isolamento do vírus em camundongos lactentes
e na cultura tecidual ou por meio do ELISA. Não se encontram disponíveis nem
vacina e nem tratamento.

FEBRE EFÊMERA
(Enfermidade de 3 dias)

É uma doença de bovinos e bufalinos transmitida por artrópodes, que ocorre na


África, Austrália e Ásia, exceto na antiga URSS. Ocorrem infecções inaparentes no
búfalo-do-Cabo, alclafo, cobo, gnu e veado.
Etiologia e epidemiologia – O vírus da febre efêmera é classificado como um
rabdovírus (de RNA de fita única). Foi melhor isolado a partir de bovinos infectados
por meio da inoculação de sangue desfibrinado em culturas teciduais de mosquito
(Aedes albopictus) e de sua transferência para culturas de células de rim de filhote
de hamster (BHK 21) ou de rim de macaco (Vero) após 15 dias. Podem-se utilizar
ambas as linhagens celulares BHK 21 e Vero para o crescimento do vírus e a
condução de testes sorológicos. Também se podem utilizar camundongos lactentes
para o isolamento primário por meio de uma inoculação intracerebral.
Febre Efêmera 478

A doença só pode ser transmitida dos bovinos infectados para os suscetíveis por
meio de uma inoculação EV; apenas os 0,005mL de sangue coletados durante o
estágio febril tornam-se infectivos. Embora se recupere o vírus de algumas espécies
de Culicoides e de mosquito (anofelinos e culicinos) coletados no campo, não se
provaram os vetores durante as epidemias principais. Não ocorre transmissão por
contato ou por fomitos, e o vírus não parece persistir nos bovinos recuperados. A
maioria dos bovinos recuperados apresenta uma imunidade por toda a vida.
A prevalência, extensão e severidade da doença variam de ano para ano, e
ocorrem epidemias periodicamente. Durante as epidemias, o início é rápido,
afetando-se muitos animais dentro de dias ou em 2 a 3 semanas. A doença é mais
prevalecente na estação úmida nos trópicos e no verão e no início do outono nos
subtrópicos ou nas regiões temperadas (quando as condições favorecem a multipli-
cação dos artrópodes picadores), e desaparece abruptamente no inverno. A
morbidade pode ser tão alta quanto 50 a 80%, mas a mortalidade global geralmente
é de 1 a 2%, embora ela seja maior nos bovinos bem condicionados.
Sinais clínicos, lesões e diagnóstico – Os sinais, que ocorrem subitamente e
variam em severidade, incluem uma febre bifásica ou polifásica, tremores, inapetência,
lacrimejamento, descarga nasal serosa, salivação, dispnéia, atelectasia, atonia dos
pré-estômagos, depressão, rigidez e claudicação, e uma diminuição súbita na
produção de leite. Os bovinos afetados podem ficar em decúbito e paralisados por
8h a ≥ 1 semana. As lesões incluem uma polisserosite que afeta as superfícies
articular, pleural e peritoneal; um pouco de edema pulmonar; e atelectasia. Após a
recuperação, a produção de leite freqüentemente falha em retornar aos níveis
normais até a próxima lactação. Ocorre abortamento, com perda total da lactação
da estação, em , 5% das vacas prenhes de 8 a 9 meses. Touros, outros bovinos
pesados e vacas leiteiras de produção pesada são os mais severamente afetados,
mas mesmo assim, ocorre geralmente uma recuperação espontânea dentro de
alguns dias.
Em uma epidemia, o diagnóstico se baseia quase que inteiramente nos sinais
clínicos. A confirmação se faz por sorologia, e raramente por isolamento viral. Todos
os casos clínicos apresentam neutrofilia com formas de associação.
Tratamento e controle – O repouso completo é o tratamento mais efetivo. As
drogas antiinflamatórias administradas no início e em doses repetidas por 2 a 3 dias
são efetivas. Deve-se evitar a administração oral a menos que o reflexo de
deglutição esteja funcional. Tratam-se os sinais de hipocalcemia como na febre do
leite. As vacinas de vírus atenuados parecem ser efetivas, mas só devem ser usadas
nas áreas endêmicas. As vacinas de vírus inativados não produziram uma proteção
a longo prazo contra o desafio experimental com o vírus virulento, e não podem
garantir uma imunidade permanente.

ÁGUA NO CORAÇÃO
(Caudriose)

É uma doença rickettsial não contagiosa e infecciosa dos ruminantes em áreas


infestadas pelos carrapatos do gênero Amblyomma, o que inclui as regiões da África
ao sul do Saara e as ilhas de Madagáscar, Reunião e Maurício e o Caribe. Muitos
ruminantes, incluindo os antílopes, são suscetíveis; outros, tais como o damalisco
e o gnu se tornam subclinicamente infectados e podem agir como reservatórios. As
raças autóctones de bovinos Bos indicus parecem mais resistentes que as raças
importadas.
Água no Coração 479

Etiologia e transmissão – O microrganismo causador, a Cowdria ruminantium


(um parasita intracelular obrigatório) transmitido sob condições naturais pelos
carrapatos “pintados” pertencentes ao gênero Amblyomma. Esses carrapatos de 3
hospedeiros se infectam durante os estágios tanto larvais como ninfais e transmitem
a infecção durante um dos estágios subseqüentes. A progênie de um carrapato
fêmea infectado não é infectiva.
Pode-se propagar experimentalmente o agente da “água no coração” por meio
da passagem sucessiva tanto por inoculação de sangue infectante nos animais
suscetíveis como pelo fornecimento de estágios larvais e ninfais infectados do
carrapato para os mesmos animais. Em temperatura ambiente, o sangue perde a
sua infectividade dentro de poucas horas, mas podem-se preservar os microrganis-
mos em nitrogênio líquido. Também se pode propagar a Cowdria ruminantium em
uma cultura tecidual de células endoteliais.
Não há, ou há apenas parcialmente, uma proteção cruzada entre as diferentes
cepas da C. ruminantium. A maioria delas é infectante para os camundongos, mas
não pode passar progressivamente por eles; porém, algumas cepas são patogênicas
para os camundongos infectados por rota EV. Uma delas, a cepa de Kümm, é
altamente patogênica para os camundongos e pode passar por eles, mesmo que
tenham sido infectados intraperitonealmente. Os macrófagos peritoneais dos ca-
mundongos infectados com essa cepa servem como antígeno no teste de imuno-
fluorescência indireta.
Achados clínicos e patogenia – Os sinais são drásticos nas formas superaguda
e aguda. Nos casos superagudos, os animais desenvolvem febre, que se segue
rapidamente por hiperestesia, lacrimejamento e convulsões. Na forma aguda, os
animais apresentam anorexia e sinais nervosos, tais como depressão, andadura
rígida de passos altos, piscamento exagerado dos olhos e movimentos de mastiga-
ção, que terminam em convulsões e prostração. Ocasionalmente observa-se
diarréia. Nos casos subagudos, os sinais ficam menos acentuados e o envolvimento
do SNC torna-se inconsistente.
O microrganismo causador se reproduz inicialmente nas células reticuloendote-
liais, particularmente nos macrófagos, e depois invade e se multiplica no endotélio
vascular. Durante os estágios febris, e por um curto espaço de tempo depois, o
sangue se torna infectivo para os animais suscetíveis. Os sinais e lesões se
encontram associados à lesão do endotélio vascular, o que resulta em um aumento
na permeabilidade vascular e em extensas hemorragias teciduais. Essas situações
precipitam uma queda na pressão arterial e uma falha circulatória geral. As lesões
nos casos agudos e superagudos incluem hidrotórax, hidropericárdio, edema e
congestão dos pulmões, esplenomegalia, petéquias e equimoses nas superfícies
mucosas e serosas, e ocasionalmente, hemorragia no trato gastrointestinal.
Diagnóstico – Nas formas agudas, pode-se basear o diagnóstico nos sinais
clínicos. Para o diagnóstico definitivo, torna-se necessária a demonstração das
colônias do microrganismo no citoplasma das células endoteliais capilares. Isso se
obtém com esfregaços “macerados” e corados por Giemsa da substância cinzenta
cerebral. Utiliza-se um teste de imunofluorescência indireta para a detecção dos
anticorpos no soro dos animais que se recuperaram de uma infecção clínica ou
subclínica natural ou artificial. Em ovinos e caprinos, esses anticorpos persistem por
vários anos, e a sua presença se correlaciona bem com a resistência aos desafios
natural ou artificial. Os bovinos soropositivos são resistentes ao desafio, embora os
anticorpos não sejam detectáveis 9 a 12 meses após a infecção. A imunidade na
“água no coração” parece ser principalmente, se não exclusivamente, mediada por
células.
Tratamento e controle – O controle da infestação de carrapatos consiste em
uma medida profilática útil em alguns casos, mas pode ser difícil e cara para se
Água no Coração 480

manter em outros casos. A redução excessiva do número de carrapatos, no entanto,


interfere na manutenção de uma imunidade adequada por meio do desafio regular
e pode resultar em perdas pesadas. Utiliza-se o sangue ovino infectado como vacina
em combinação com um tratamento antibiótico no momento da reação. Bezerros
jovens (< 6 semanas) e cordeiros e cabritos jovens (< 1 semana) são razoavelmente
resistentes e podem se recuperar espontaneamente de infecções naturais e
experimentais. As tetraciclinas a 10mg/kg de peso corporal geralmente efetuam a
cura, se forem administradas no início. Em ovinos, caprinos e nas raças suscetíveis
de bovinos, pode-se exigir um nível mais alto de tratamento (10 a 20mg/kg),
particularmente no final da reação febril ou quando aparecem os sinais clínicos.
Pode se tornar necessário um segundo ou terceiro tratamento.

FEBRE CATARRAL MALIGNA


(FCM, Catarro maligno da cabeça, Febre catarral, Coriza gangrenosa)

É uma doença infecciosa, esporádica e aguda dos bovinos e de outros Bovidae


e Cervidae, caracterizada por baixa morbidade e mortalidade extremamente alta,
embora em alguns casos, a morbidade possa ser alta, particularmente nas espécies
suscetíveis, tais como o cervo-do-padre-David e o gado-de-Bali. A FCM se tornou
uma doença importante nas fazendas de veados.
Etiologia – Embora a FCM seja uma entidade clinicopatológica única, existem
pelo menos 2 agentes distintos, mas relacionados, que podem causar naturalmente
a doença. Um deles, o hespesvírus alcelafino do Tipo 1 (HVA-1), que é carreado
inaparentemente pelos gnus (Connochaetes taurinus), é prevalecente na África e
nos parques zoológicos, sendo responsável pela FCM “originária dos gnus” (FCM-G).
A outra causa principal é o agente da FCM “associado a ovinos” (AO). Embora não
se tenha isolado o agente da FCM-AO, as evidências moleculares e sorológicas
indicam que ele seja semelhante ao HVA-1. Esse agente ocorre mundialmente e
acredita-se que infecte a maioria dos ovinos domésticos, geralmente sem causar a
doença. Podem-se transmitir ambos os agentes da FCM experimentalmente para
bovinos, veados, coelhos e hamsters, por intermédio de células sangüíneas ou de
linfonodos originárias de animais infectados. Também se pode transmitir a FCM-G
para cobaias e ratos, por intermédio de células de linfonodos infectadas. Além disso,
vírus semelhantes ao HVA-1 isolados em 2 outras espécies de antílopes alcelafinos,
o topi e o congoni, causaram a FCM após uma inoculação experimental em bovinos.
Os herpesvírus isolados dessas 2 espécies são distintos do HVA-1 e foram
denominados HVA-2.
Transmissão e epidemiologia – O HVA-1 é transmitido vertical e horizontal-
mente nas populações de gnus. Alguns filhotes de gnu, infectados in utero,
espalham mais tarde os vírus para outros nas secreções nasais e oculares e nas
fezes, com a maioria se infectando aos 6 meses de idade. Acredita-se que os
fomitos, particularmente os contaminados durante o parto, sejam capazes de
carrear a infecção para os ruminantes suscetíveis. Parece provável que ocorra
um cenário semelhante no caso do agente AO no momento do parto, mas as
evidências que sustentam essa hipótese são circunstanciais. Sob condições de
fazenda, a FCM geralmente ocorre nos adultos. Nos zoológicos, podem-se
também afetar os juvenis. As fazendas de veados podem experimentar uma
mortalidade anual de 1%. A suscetibilidade à FCM varia entre os veados: o veado-
nobre e o cervo-vermelho são muito mais suscetíveis que os bovinos; o cervo-do-
padre-David e aparentemente o sika e o veado-de-cauda-branca são altamente
Febre Catarral Maligna 481

suscetíveis. Não se descreveu a doença nos gamos, o que sugere que sejam
resistentes. Os ruminantes suscetíveis são os “hospedeiros finais”, que desen-
volvem a FCM clínica após um período de incubação de 3 semanas a 6 meses.
Em tais animais, o vírus se encontra associado às células, e a transmissão lateral
torna-se rara.
Patogenia – A hipótese atual mais plausível consiste em que o desenvolvimento
da doença depende da infecção de grandes linfócitos granulares e imunorreguladores,
com uma atividade de “matador natural” (MN). A reação normal à FCM possui as
características de uma hiperplasia dos linfócitos T, com uma resposta policlonal que
resulta da desregulação dos linfócitos T. Sugeriu-se que o processo necrosante da
fase terminal da doença seja um fenômeno auto-imune que se manifesta por meio
da expressão de uma atividade semelhante à de MN de determinadas células do
sistema imune.
Achados clínicos – A FCM pode assumir formas agudas (especialmente nos
veados), subagudas (“cabeça e olhos”) ou crônicas. Podem-se observar os casos
agudos como mortes súbitas, mas geralmente, a morte é precedida por febre,
depressão, aumento dos linfonodos, descargas oculares e nasais serosas, erosões
das papilas bucais, oftalmia e diarréia (algumas vezes hemorrágica). Os veados
podem apresentar hemorragia intestinal proeminente e evidências de coagulação
intravascular disseminada (ver pág. 28). Também pode se encontrar presente uma
dispnéia. A morte ocorre em 1 a 3 dias. A síndrome “cabeça e olhos” é a forma mais
comum nos bovinos. Os sinais adicionais incluem lesões inflamatórias e erosivas na
mucosa do trato respiratório superior, que levam a uma descarga nasal mucopuru-
lenta profusa com incrustação do focinho, ulceração da mucosa oral, salivação e
conjuntivite mucopurulenta com opacidade da córnea, que começa na junção
corneoscleral e progride centripetamente. Pode-se encontrar presente um hipópio.
Podem ocorrer um exantema irregular com embaraçamento dos pêlos, e ulceração
do períneo, vulva, coroa do casco, pele interdigital e tetas. Alguns animais apresen-
tam sinais no SNC, tais como excitabilidade, hiperestesia e tremores musculares.
Ocasionalmente, estes sinais podem progredir para convulsões ou para uma
agressividade sugestiva de raiva. O curso da forma de “cabeça e olhos” pode durar
até 2 semanas. Na FCM crônica, desenvolve-se inanição. A recuperação é rara. O
hemograma pode mostrar linfocitose, seguida por linfopenia. Pode ocorrer neutro-
filia se os danos teciduais forem extensos.
Lesões – As lesões são muito disseminadas e afetam geralmente todos os
órgãos, mas a sua severidade e natureza variam consideravelmente. As principais
alterações que caracterizam a FCM são necrose epitelial (gastrointestinal, respira-
tória ou urinária) associada com uma inflamação linfóide mucosa e/ou dérmica,
linfoproliferação, infiltração intersticial de tecidos não linfóides e vasculite. Nos
veados, a hemorragia no lúmen do íleo, ceco e cólon pode se tornar proeminente,
junto com equimoses na serosa colônica. A maioria dos linfonodos fica hiperplásica,
com o desenvolvimento proeminente do paracórtex, mas podem ocorrer terminal-
mente hemorragia e necrose. Uma característica proeminente é a infiltração
intersticial dos órgãos por parte dos linfócitos, especialmente do coração, fígado,
glândulas adrenais, meninges, espaços perivasculares do SNC, e rins. Nos rins,
pode-se detectar macroscopicamente essa infiltração como focos esbranquiçados
e elevados embaixo da cápsula. Podem ocorrer lesões vasculares na maioria dos
sistemas do corpo e estas podem variar em intensidade desde uma infiltração suave
da adventícia por parte dos linfócitos até lesões transmurais que compreendem
necrose fibrinóide, infiltração linfóide e ocasionalmente, trombose. Nos casos
crônicos, as alterações proliferativas nas paredes dos vasos afetados podem levar
aos seu aumento e proeminência. A rede admirável é o tecido de escolha para a
demonstração das lesões vasculares.
Febre Catarral Maligna 482

Diagnóstico – A FCM é uma entidade clinicopatológica e, embora seja suspei-


tada clinicamente, a confirmação reside no exame histológico, especialmente na
demonstração das lesões epiteliais degenerativas, da infiltração linfóide multissis-
têmica e da vasculite. Quando o HVA-1 for a causa, o isolamento do vírus a partir
do couro ante mortem e das amostras sangüíneas post mortem (coletadas na
necropsia) pode confirmar o diagnóstico. Pode-se detectar o anticorpo que reage
com o vírus por meio da imunofluorescência indireta no soro originário de gnus,
ovinos e alguns animais clinicamente afetados. Os testes de neutralização do vírus
e ELISA também podem fornecer evidências da infecção. Os anticorpos da FCM
podem reagir cruzadamente com os outros herpesvírus bovinos nos testes de
imunofluorescência ou ELISA, mas não no teste de neutralização do vírus. O
diagnóstico diferencial inclui peste bovina, língua-azul, doenças vesiculares, febre
bovina da Costa Leste (Theileria parva), rinotraqueíte infecciosa em bovinos,
mucosopatia diarréica viral bovina e febre do transporte e, quando houver sinais
nervosos, raiva e encefalites originárias dos carrapatos. Quando se afetar os
veados-vermelhos de fazenda, deve-se excluir a iersiniose.
Tratamento e controle – A sobrevivência é rara, mas antibióticos ou sulfonami-
das para controlar a infecção bacteriana secundária e terapia de suporte (fluidos)
podem ter valor nos animais valiosos. Para a prevenção da doença, torna-se
essencial a separação dos animais suscetíveis da fonte de infecção, ou seja, gnus
e ovinos.

DOENÇA OVINA DE NAIRÓBI


É uma doença viral e originária dos carrapatos de ovinos e caprinos, caracteri-
zada por febre e gastroenterite. Ela ocorre no Quênia, Uganda, Tanzânia, Somália,
Etiópia e Zaire. Embora o homem seja suscetível, as infecções humanas são raras.
Etiologia e transmissão – O nairovírus causador, da família Bunyaviridae, é
possivelmente o vírus conhecido mais patogênico para ovinos e caprinos. Está
intimamente relacionado com o vírus da Ganjam, uma infecção originária dos
carrapatos de ovinos, caprinos e do homem na Índia; com o vírus da Dugbe, uma
outra infecção originária dos carrapatos; e com o vírus da febre hemorrágica da
Criméia-Congo (ver pág. 477). O vírus é transmitido transovariana e transestadial-
mente pelo carrapato de orelha castanho, Rhipicephalus appendiculatus, no qual
pode sobreviver por , 2,5 anos. Os outros carrapatos Rhipicephalus e Amblyomma
também podem transmitir a doença. O vírus é eliminado na urina e nas fezes, mas
a doença não se espalha por contato.
Achados clínicos – Uma febre prodrômica que dura de 1 a 3 dias se segue a um
período de incubação de 4 a 15 dias. Algumas vezes, a febre é bifásica. A
enfermidade se manifesta por depressão; anorexia; descarga nasal mucopurulenta
e tingida de sangue; e uma disenteria fétida que causa um esforço doloroso. Os
animais prenhes abortam freqüentemente. Pode ocorrer morte no início da fase
virêmica febril ou , 2 dias após a remissão da febre. A mortalidade nos ovinos é de
30 a 90%. Os ovinos nativos são mais suscetíveis que os Merinos. A doença nos
caprinos geralmente é menos severa, embora já se tenha descrito uma mortalidade
de 80%.
Lesões – As principais lesões são hiperplasia dos tecidos linfóides e hemorra-
gias dos tratos gastrointestinal (particularmente o abomaso) e respiratório, vesícula
biliar, baço e coração. Entretanto, essas hemorragias não são invariavelmente
observadas, particularmente quando ocorre morte no início do estágio virêmico. O
Paratuberculose 483

feto apresenta hemorragias dérmicas. As lesões histológicas adicionais incluem


glomerulonefrite e necrose do miocárdio.
Diagnóstico – A ocorrência de uma doença em ovinos ou caprinos, com alta
mortalidade e acompanhada por uma infestação de carrapatos é sugestiva, espe-
cialmente quando seguida de movimentação para áreas endêmicas ou de altera-
ções na população de carrapatos que tenham sido induzidas por chuva pesada e
prolongada. A confirmação dos sinais e lesões sugestivos exige isolamento e
identificação sorológica do vírus. As amostras preferidas são sangue, linfonodos
mesentéricos e baço.
Controle – Nas áreas endêmicas, não se observam sinais clínicos a menos que
se introduzam animais suscetíveis. Devem-se vacinar tais animais, assim como os
animais expostos quando a distribuição do vetor carrapato aumenta. O controle de
carrapatos não é prático.

PARATUBERCULOSE
(Doença de Johne)

É uma enterite contagiosa e crônica, caracterizada por diarréia persistente e


progressiva, perda de peso, debilitação e finalmente morte. Ela afeta bovinos,
ovinos, caprinos, lhamas, camelos, cervos de fazenda e outros ruminantes domés-
ticos e silvestres. A distribuição é mundial. Considera-se mínimo o risco zoonótico,
mas o isolamento de microrganismos semelhantes a partir de algumas pessoas com
enterite de Crohn o torna menos certo.
Etiologia e patogenia – O cultivo da Mycobacterium paratuberculosis (johnei),
o microrganismo causador, requer a incorporação da micobactina (um fator de
crescimento derivado de micobactérias) ao meio. O microrganismo é muito resisten-
te e pode sobreviver nas fezes e no solo por > 1 ano. É eliminado em grande número
nas fezes dos animais infectados, e adquire-se a infecção por meio da ingestão de
alimento e água contaminados. A introdução da doença em um rebanho limpo se faz
geralmente por portadores subclinicamente infectados.
Adquire-se a infecção no início da vida, mas raramente se desenvolvem sinais
clínicos nos bovinos com < 2 anos de idade. A resistência aumenta com a idade
e é improvável que os bovinos expostos pela primeira vez quando adultos se
infectem. A maioria dos bezerros se infecta logo após o nascimento, ao mamar
em úberes contaminados com fezes de animais infectados, ou quando alojada em
cercados contaminados. O microrganismo também pode se encontrar presente
no colostro e no leite de vacas infectadas. Após a ingestão, a bactéria se localiza
na mucosa do intestino delgado inferior e nos linfonodos associados. Se não for
eliminado, o microrganismo se multiplica e inicia o desenvolvimento das lesões
intestinais que resultam nos sinais clínicos claros. Porém, a eliminação fecal
começa antes que os sinais clínicos se tornem aparentes. Pode-se isolar a
Mycobacterium paratuberculosis a partir das fezes, linfonodos mesentéricos e
ileocecais, parede intestinal espessada, e menos freqüentemente, do úbere e dos
tratos reprodutivos de ambos os sexos.
Achados clínicos – A doença se caracteriza por perda de peso e diarréia, mas
os sinais iniciais são variáveis e freqüentemente vagos. A diarréia fica mais severa
em semanas ou meses, quando ocorre uma perda de peso adicional, a coloração do
pelame pode desbotar e pode-se desenvolver edema ventral e intermandibular. Nos
bovinos leiteiros, a produção de leite pode cair ou falhar em atingir os níveis
esperados. Os animais ficam alertas e a temperatura e o apetite ficam geralmente
Paratuberculose 484

normais, embora possa aumentar a sede. A doença é progressiva e termina


finalmente em emaciação e morte. A maioria dos casos ocorre em bovinos de 2 a 6
anos de idade. A doença em ovinos e caprinos é semelhante, mas nestes animais a
diarréia é menos acentuada do que nos bovinos. Nos veados, o curso da doença
pode ser mais rápido.
Lesões – Ocorre uma resposta granulomatosa caracterizada pelo acúmulo
progressivo de células epitelióides na mucosa e na submucosa no intestino delgado
posterior. Isso resulta em uma hipertrofia difusa do jejuno posterior, íleo e válvula
ileocecal e ceco adjacente, com a formação de pregas transversas grossas. As
lesões se caracterizam pela ausência de inflamação ou ulceração. Torna-se comum
a linfangite com envolvimento variável dos linfonodos adjacentes. Freqüentemente,
não há correlação entre os sinais clínicos e a severidade das lesões. Ovinos e
caprinos podem desenvolver focos de caseamento, com calcificação da parede
intestinal e linfonodos, e o espessamento intestinal geralmente é menos acentuado
do que nos bovinos.
Diagnóstico – A cultura fecal é o método mais confiável de detecção dos animais
que eliminam a M. paratuberculosis, mas requer 12 a 16 semanas de incubação
antes que os resultados se encontrem disponíveis. Os testes positivos são signifi-
cativos, mas como a eliminação pode ser intermitente, os resultados negativos
significam pouco, e exige-se o teste de amostras adicionais. A cultura fecal detecta
, 20 a 50% dos animais infectados nos testes de rebanho iniciais. Também se pode
detectar o microrganismo nas amostras fecais por meio de sondas genéticas que
identificam as seqüências de ácido nucléico da M. paratuberculosis. Os procedi-
mentos que amplificam as seqüências de ácido nucléico desejadas tornam possível
detectar a infecção mesmo quando se encontra presente um baixo número de
microrganismos. Na necropsia, pode-se detectar o microrganismo no epitélio
intestinal e nos linfonodos adjacentes, tanto histologicamente como por cultura.
Os testes sorológicos fornecem resultados mais rápidos do que a cultura fecal,
mas apresentam algumas deficiências. O teste de fixação de complemento é lento
e relativamente insensível, sendo raramente utilizado. O teste de imunodifusão em
ágar gel, embora fácil de se realizar, apresenta uma baixa sensibilidade e é utilizado
primariamente para confirmar a infecção nos animais com sinais clínicos. O ELISA
possui boa sensibilidade com uma especificidade um pouco mais baixa, e é mais útil
quando aplicado em um rebanho do que em animais individuais.
Os testes de imunidade mediada por células (por exemplo, teste de Johnin,
transformação de linfócitos e testes de inibição da migração de leucócitos) possuem
pouco valor diagnóstico prático.
Controle – Não se conhece nenhum tratamento satisfatório. O controle exige boa
higiene e bom manejo. Devem-se testar os rebanhos com casos confirmados para
determinar a extensão da infecção, e mandar os animais positivos para o abate.
Deve-se continuar retestando a intervalos de 6 meses a 1 ano, até que se obtenham
≥ 3 testes negativos. Devem-se remover os bezerros das vacas imediatamente após
o nascimento, alimentá-los com mamadeiras de colostro que tenha sido pasteuriza-
do ou obtido de vacas negativas, e depois criá-los completamente segregados dos
adultos até > 1 ano de idade. Como pode ocorrer uma infecção intra-uterina, devem-
se separar os bezerros de mães que tenham ou desenvolvam sinais da doença.
Mesmo se os animais de reposição provierem de rebanhos tidos como livres da
doença, devem-se testá-los antes e após a compra.
Em muitos países, o uso de vacina está sujeito à aprovação por parte das
agências reguladoras, e se encontra restrito aos rebanhos infectados. A vacinação
dos bezerros (< 1 mês de idade) pode ser efetiva na redução da incidência da
doença, mas não elimina a infecção. Os bovinos inoculados com uma vacina
inativada de células inteiras em óleo mineral desenvolvem granulomas, de 2,5 a
Pasteurelose de Ovinos 485

vários centímetros, no local da inoculação (carne do peito) e podem reagir positiva-


mente em testes de tuberculina subseqüentes. A auto-inoculação acidental pode
resultar em reações agudas severas com desprendimento da pele e sinovite e
tendinite crônicas. A vacinação não elimina a necessidade de um bom manejo e de
uma boa higiene.

PASTEURELOSE DE OVINOS
Existem 2 síndromes distintas, dependendo do biótipo da Pasteurella haemolytica
envolvido (a P. multocida raramente causa uma doença endêmica, pelo menos nos
climas temperados). As cepas do biótipo A (12 sorotipos) causam pneumonia em
rebanhos e esporadicamente em indivíduos, bem como infecções septicêmicas nos
cordeiros jovens. As cepas do biótipo T (4 sorotipos) causam doença superaguda
com uma patogenia diferente. Isolam-se cepas não tipificáveis em , 10% dos casos.
Tem-se descrito uma pasteurelose pneumônica na maioria dos principais países
criadores de ovinos. A distribuição do biótipo T não é clara, mas ocorre no Reino
Unido, EUA e Hungria.

PASTEURELOSE PNEUMÔNICA (PNEUMONIA ENZOÓTICA)


Uma quantidade variável de ovinos saudáveis porta as cepas do biótipo A no trato
respiratório superior. Compreendem-se pouco os fatores que predispõem os ovinos
às infecções pulmonares ativas. Estresse ambiental e agentes infecciosos, por
exemplo, o vírus da parainfluenza do Tipo 3 e o adenovírus, estão entre os fatores
que têm sido incriminados. Um surto de rebanho geralmente começa subitamente
com os ovinos morrendo ou com doença respiratória aguda. Os outros ovinos no
rebanho apresentam sinais menos severos, tais como tosse e descargas oculonasais
suaves. A mortalidade raramente é > 10%. Nos cordeiros < 2 meses de idade, a
doença é mais freqüentemente septicêmica que pneumônica.
Na doença aguda, ocorrem efusão pericárdica fibrinosa e um exsudato pleural
claro com coágulos de fibrina. Os pulmões ficam aumentados, edematosos e
vermelho-arroxeados brilhantes, geralmente com uma consolidação distinta nas
áreas ântero-ventrais. Nos ovinos que sobreviverem por mais tempo, as lesões
ficam mais nitidamente demarcadas e vermelhas mais escuras, e ocorrem adesões
entre as pleuras. O diagnóstico depende da recuperação de um grande número de
P. haemolytica do biótipo A a partir das lesões. Sob essas circunstâncias, isolam-
se raramente as cepas do biótipo T.
Nos casos agudos, devem-se considerar no diagnóstico diferencial as doenças
clostridianas apropriadas à faixa etária afetada.
A oxitetraciclina (20mg/kg da preparação de longa ação) a cada 3 a 4 dias é
apropriada para terapia e profilaxia dos ovinos em contato. As vacinas multivalentes,
incluindo uma série de sorotipos mais comuns, geralmente concedem proteção
quando utilizadas de acordo com as instruções do fabricante. Têm-se demonstrado
títulos de anticorpos no colostro de ovelhas e no soro de cordeiros que mamam em
ovelhas vacinadas com antígenos do biótipo A.

PASTEURELOSE SISTÊMICA
A forma sistêmica da pasteurelose é causada pelas cepas do biótipo T, que são
carreadas nas amígdalas, se espalham para e se multiplicam nos pulmões, e se
espalham posteriormente para outros órgãos. Conhece-se pouco a epidemiologia.
Pasteurelose de Ovinos 486

A doença freqüentemente se manifesta alguns dias após ter-se aumentado o plano


de nutrição ou após o estresse do transporte; isso vale especialmente para os ovinos
com , 6 meses de idade. Freqüentemente ocorre morte de ovinos em boas
condições, e a doença prossegue por alguns dias com uma mortalidade de , 5%.
Os ovinos afetados são geralmente encontrados mortos. Os que são vistos vivos
ficam entorpecidos, relutantes em se movimentar e apresentam dispnéia, descarga
espumosa a partir da boca, e febre (menos nos estágios terminais). Na necropsia,
há evidências de uma infecção sistêmica. Tornam-se proeminentes uma inflamação
exsudativa e hemorrágica da mucosa abomasal e petéquias no peritônio visceral,
pescoço e por baixo da pleura parietal. Os rins podem exibir um amolecimento
cortical como na doença do rim polposo. Podem-se recuperar culturas puras da P.
haemolytica do biótipo T a partir dos órgãos e do sangue cardíaco. Os diagnósticos
diferenciais incluem toxicoses agudas, os distúrbios metabólicos e septicemias
causadas por outros microrganismos além das pasteurelas. A antibioticoterapia
freqüentemente não é possível devido ao início súbito da doença. Deve-se praticar
a introdução gradual de um alimento de maior valor nutritivo, e deve-se considerar
a vacinação profilática.
A Pasteurella haemolytica também provoca casos esporádicos de mastite em
meio à lactação, meningite e artrite.

PESTE DOS PEQUENOS RUMINANTES


A peste dos pequenos ruminantes (PPR) também conhecida como pseudopeste
bovina dos pequenos ruminantes, é peste de ovinos e caprinos, Kata, síndrome da
pneumoenterite – estomatite, estomatite pustular contagiosa e complexo pneu-
moenterítico. É uma doença viral aguda ou subaguda de caprinos e ovinos,
caracterizada por febre, estomatite necrótica, gastroenterite e pneumonia. Foi
descrita pela primeira vez como uma entidade clínica na Costa do Marfim em 1942,
e subseqüentemente no Senegal, Gana, Togo, Benin e Nigéria. Ovinos são menos
suscetíveis que caprinos; bovinos se infectam apenas subclinicamente. O homem
não corre risco.
Etiologia e epidemiologia – O vírus causador, um morbilivírus da família
Paramyxoviridae (ver também PESTE BOVINA [PB], pág. 489), apresenta uma afinida-
de particular pelos tecidos linfóides e pelo tecido epitelial do trato gastrointestinal,
no qual produz lesões características.
A PPR é prevalecente na África Ocidental e Central e no Oriente Médio.
Freqüentemente não se descrevem os surtos que afetam apenas uns poucos
animais; as epidemias ocorrem quando a população dos animais suscetíveis
aumenta. Tal epidemia pode eliminar os caprinos e os ovinos de uma área. A
transmissão se faz por contato íntimo, e o confinamento parece favorecer os
surtos. As fontes de infecção são as secreções e excreções dos animais doentes.
Como na PB, geralmente aceita-se que não existe o estado de portador; no
entanto, os casos subclínicos podem espalhar a infecção durante sua fase de
incubação. O veado-de-cauda-branca é completamente suscetível; esse veado
e outros ruminantes silvestres podem exercer um papel na epidemiologia da
doença. Embora se possam induzir experimentalmente infecções subclínicas nos
suínos, eles não transmitem a doença aos suínos ou caprinos suscetíveis; logo,
os suínos podem não ter nenhum papel na epidemiologia da PPR. Embora os
bovinos sejam suscetíveis à infecção, eles geralmente não exibem sinais clínicos
ou transmitem a doença.
Peste dos Pequenos Ruminantes 487

Achados clínicos – A forma aguda da PPR é acompanhada por uma elevação


súbita na temperatura corporal para 40 a 41,3°C. Os animais afetados aparecem
doentes e inquietos e podem apresentar pelame opaco, focinho seco, membranas
mucosas congestas e depressão do apetite. No início, a descarga nasal é serosa;
mais tarde, ela se torna mucopurulenta e dá um odor pútrido à respiração. O período
de incubação geralmente é de 4 a 5 dias. Podem-se observar pequenas áreas de
necrose na membrana mucosa do piso da cavidade nasal. A conjuntiva se conges-
tiona freqüentemente, e o canto medial pode exibir um pequeno grau de incrustação.
Alguns animais afetados desenvolvem uma conjuntivite catarral profusa com a
adesão das pálpebras. A estomatite necrótica afeta o lábio inferior e a gengiva e ao
redor das inserções dos dentes incisivos; nos casos mais severos, podem-se
envolver o coxim dental, palato, bochechas e suas papilas e língua. A diarréia pode
ser profusa e se acompanhar de desidratação e emaciação; seguem-se hipotermia
e morte, geralmente após 5 a 10 dias. Mais tarde, pode-se desenvolver uma
broncopneumonia caracterizada por tosse. Os animais prenhes podem abortar. Nos
animais jovens, as taxas de morbidade e mortalidade são mais altas que nos adultos.
Podem-se ativar infecções latentes e complicar o quadro clínico.
Lesões – Observam-se emaciação, conjuntivite e estomatite; as lesões necró-
ticas se encontram na face interna do lábio inferior e na gengiva adjacente, nas
bochechas perto da comissura, e na superfície ventral da língua. Nos casos severos,
as lesões podem se estender ao palato duro e à faringe. As erosões são rasas, com
uma base esfolada avermelhada e que mais tarde se torna branco-rosada; limitam-
se com o epitélio normal, o que proporciona uma margem nitidamente demarcada.
Raramente se envolvem rúmen, retículo e omaso. O abomaso exibe erosões
regularmente delineadas que possuem uma base esfolada avermelhada e drenam
sangue.
As lesões severas são menos comuns no intestino delgado do que na boca,
abomaso ou intestino grosso. Na primeira porção do duodeno e no íleo terminal,
podem se encontrar presentes estrias hemorrágicas, e menos freqüentemente
erosões. Afetam-se severamente as placas de Peyer; podem-se desprender placas
inteiras de tecido linfóide. Geralmente, se afeta mais severamente o intestino
grosso, com as lesões ocorrendo ao redor da válvula ileocecal e na junção
cecocólica e no reto. Esse último exibe estrias de congestão ao longo das pregas
da mucosa, que resultam em uma aparência de “estrias de zebra”.
Podem aparecer petéquias nos turbinados, laringe e traquéia. Podem se encon-
trar presentes placas de broncopneumonia.
Diagnóstico – O diagnóstico presuntivo se baseia nos achados clínicos, pato-
lógicos e epidemiológicos, e pode-se confirmá-lo por meio do isolamento e da
identificação do vírus. As amostras exigidas são sangue não coagulado, linfonodos,
amígdalas, baço e pulmão inteiro. A detecção dos antígenos virais por meio dos
testes de fixação de complemento ou de precipitina em ágar gel não diferencia a
doença da PB. A detecção de anticorpos neutralizantes de vírus com um título
elevado nos animais sobreviventes é diagnóstica. Deve-se diferenciar a PPR das
outras infecções gastrointestinais agudas (por exemplo, a PB), das infecções
respiratórias (por exemplo, a pleuropneumonia caprina contagiosa) e de outras
doenças, tais como o éctima contagioso, a “água no coração”, a coccidiose e o
envenenamento mineral.
Controle – Quando se suspeitar da PPR, devem-se notificar as autoridades
estaduais e federais. Recomenda-se a erradicação quando a doença aparecer em
países anteriormente livres da PPR; os métodos de erradicação da PB são úteis.
Não há tratamento específico, entretanto o tratamento das complicações bacteria-
nas e parasitárias diminui a mortalidade nos rebanhos afetados. Tem-se preparado
uma vacina atenuada em cultura de células renais caprinas embrionárias; isso
Peste dos Pequenos Ruminantes 488

confere uma proteção contra a doença natural por , 1 ano. Também se tem utilizado
com sucesso uma vacina de cultura celular de PB para a imunização contra a PPR.

FEBRE DO VALE DO RIFT


(Hepatite enzoótica infecciosa de ovinos e bovinos)

É uma doença viral dos animais (inclusive o homem), originária dos mosquitos,
caracterizada por um período de incubação curto, febre, hepatite, abortamento e
morte nos animais jovens. Afeta-se a maioria dos animais domésticos, exceto
suínos, cobaias, coelhos e galinhas. Cordeiros jovens, cabritos, bezerros e cãezinhos
são altamente suscetíveis. Os ovinos e o homem são mais suscetíveis que bovinos
e cães. Ocorrem morbidade e mortalidade significativas em ovinos, bovinos e no
homem. Tem-se diagnosticado a doença em muitos países africanos; ocorreram
surtos recentes no Egito, Senegal e Mauritânia.
Etiologia e epidemiologia – O agente causador é um flebovírus da família
Bunyaviridae; esse vírus fica rapidamente inativado em um pH de < 6,2. Têm
ocorrido epidemias explosivas em intervalos de 5 a 15 anos, e elas se associam
normalmente com períodos de chuvas fortes em áreas geralmente secas. Nos
períodos interepidêmicos, acredita-se que o vírus se encontre em ovos dormentes
do mosquito Aedes lineatopennis no solo seco das depressões do pasto (dambos).
Com as chuvas adequadas, os mosquitos infectados se desenvolvem e infectam os
ruminantes, o que dissemina o vírus. Muitas espécies de mosquitos espalham o
vírus. O homem também pode se infectar facilmente por meio de aerossóis
provenientes dos animais infectados e seus tecidos, de fetos abortados e dos
procedimentos de laboratório, e tem o potencial de transmitir a doença (por meio dos
mosquitos) para outros animais em áreas não infectadas.
Achados clínicos – O período de incubação em ovinos e bovinos é de 12 a 96h.
Em cordeiros jovens, cabritos, bezerros e cãezinhos, o início é rápido, com uma
febre de 40 a 41,5°C, apatia, anorexia, fraqueza e morte. Nos cordeiros < 1 semana
de idade, a mortalidade pode ser > 90% em 36h; em cordeiros e bezerros > 1 semana
de idade, ela é de , 20%. Em ovinos adultos, pode haver febre, apatia, anorexia,
andadura insegura, vômito, descarga nasal mucopurulenta, diarréia e abortamento,
ou o aborto pode ser o único sinal; a mortalidade raramente é > 30%. Em bovinos
adultos, pode haver febre, anorexia, salivação, queda na produção de leite,
abortamento e diarréia, ou o aborto pode ser o único sinal; a mortalidade geralmente
< 10%.
Lesões – A lesão primária em todas as espécies é uma necrose hepática focal,
que pode ou não ser macroscopicamente visível. Os cordeiros que morrem da
doença apresentam fígados aumentados, macios, friáveis, marrom-amarelados a
vermelho-escuros com focos necróticos acinzentados e petéquias. Ocorrem hemor-
ragias serosas, viscerais e cutâneas muito disseminadas. Ovinos e bovinos adultos
podem apresentar focos necróticos pálidos e difusos no fígado; hemorragias
viscerais e serosas; e enterite hemorrágica. Nos cordeiros, ocorre uma necrose de
coagulação difusa nos hepatócitos. Têm-se observado corpúsculos de inclusão
intranucleares. Em ovinos e bovinos adultos, as áreas focais de necrose hepática
são menores e em menor número que nos cordeiros.
Diagnóstico – Deve-se suspeitar da febre do Vale do Rift quando o padrão
epidemiológico incluir: período de incubação curto, alta mortalidade nos animais < 1
semana de idade (particularmente cordeiros, bezerros, cabritos e cãezinhos), mal-
estar e abortos em ovinos e bovinos, lesões hepáticas, doença hemorrágica ou
Peste Bovina 489

semelhante à gripe no homem e a presença de um vetor artrópode. O diagnóstico


diferencial inclui língua-azul, enterotoxemia, doença de Wesselsbron e febre efêmera.
A confirmação de um diagnóstico suspeito exige isolamento e identificação sorológica
do vírus utilizando-se camundongos e/ou culturas celulares. As pesquisas soroló-
gicas são complicadas pelas reações cruzadas entre o vírus da febre do Vale do Rift
e os outros flebovírus.
Controle – Recomenda-se a remoção do rebanho das regiões baixas e infesta-
das de mosquitos para regiões mais altas, ou estabulá-lo e aplicar-lhe um spray. A
vacina inativada requer 2 injeções e deve-se repeti-la anualmente. Uma vacina
neurotrófica atenuada produzida nos camundongos estimula uma imunidade rápida
e de longa duração, mas é abortogênica e teratogênica. Uma vacina mutagenizada
recentemente desenvolvida e testada produz uma proteção rápida, não tem efeitos
adversos nos cordeiros recém-nascidos, é segura para os animais prenhes e produz
uma viremia baixa que não se constitui em uma fonte de vírus para os mosquitos.

PESTE BOVINA
(Praga bovina)

É uma doença dos animais de casco fendido, caracterizada por febre, estomatite
necrótica, gastroenterite, necrose linfóide e alta mortalidade. Na forma epidêmica,
constitui-se na peste mais letal conhecida entre os bovinos. A suscetibilidade varia
entre as espécies: é alta em búfalos africanos, girafas, Suidae silvestres,
Tragelaphinae e nas raças de bovinos, tais como a Ankole, a das Ilhas do Canal e
a preta japonesa; moderada em gnus e zebus da África Oriental; e suave nas
gazelas e nos pequenos ruminantes domésticos. A peste bovina é subclínica nos
suínos europeus e nos hipopótamos. É endêmica na Índia e na África. A falta de
controle nos países fronteiriços levou recentemente a epidemias no oeste, leste e
norte da África; no Oriente Próximo; e em partes da Ásia.
Etiologia, epidemiologia e patogenia – O agente infeccioso é um morbilivírus,
intimamente relacionado aos vírus da peste dos pequenos ruminantes (ver pág.
486), da cinomose (ver pág. 494) e do sarampo. As cepas do vírus variam
acentuadamente no tipo de hospedeiro e na virulência. O soro proveniente de
bovinos recuperados ou vacinados reage cruzadamente com todas as cepas nos
testes de neutralização, mas têm-se demonstrado diferenças antigênicas menores.
O vírus se encontra presente em pequenas quantidades nas secreções nasais
1 a 2 dias antes da febre; os níveis estão altos nas secreções e excreções durante
a primeira semana da doença clínica e diminuem rapidamente à medida que o
animal desenvolve anticorpos e começa a se recuperar. A transmissão requer um
contato direto ou indireto próximo; a infecção ocorre através da nasofaringe. O vírus
é frágil e rapidamente inativado pelo calor e pela luz, mas permanece viável por
longos períodos nos tecidos resfriados ou congelados. Não existe estado de
portador; o vírus se mantém por meio de transmissão contínua entre os animais
suscetíveis. Nas áreas endêmicas, os bovinos jovens se infectam após a imunidade
maternal desaparecer e antes de a imunidade vacinal começar, com possíveis ciclos
auxiliares ovinos, caprinos e ungulados silvestres. Nas áreas epidêmicas, o vírus
infecta a maioria dos animais suscetíveis e tende a se limitar, a menos que a
população fique grande o suficiente para sustentar uma endemicidade.
Após o crescimento primário nos linfonodos associados com a nasofaringe, o
vírus se prolifera por todo o tecido linfóide e se espalha por meio do sangue para as
mucosas dos tratos gastrointestinal e respiratório superior. A citopatologia viral causa
Peste Bovina 490

danos teciduais. Os antígenos virais induzem uma resposta imune potente que
controla a infecção e permite a recuperação se o dano tecidual não for muito severo.
Achados clínicos – Febre, anorexia e depressão se seguem a um período de
incubação de 3 a 15 dias; uma descarga oculonasal se desenvolve 1 a 2 dias mais
tarde. Dentro de 2 a 3 dias, aparecem lesões necróticas puntiformes (que aumentam
rapidamente para formar placas caseosas) na gengiva, mucosa bucal e língua.
Freqüentemente afetam-se os palatos duro e mole. A descarga oculonasal se torna
mucopurulenta, e o focinho se resseca e racha. A diarréia, que é o sinal clínico final,
pode ser aquosa e conter sangue, muco e uma membrana mucosa. Os animais
apresentam dor abdominal severa, sede e dispnéia, e podem morrer de desidrata-
ção. A convalescença é prolongada e pode ser complicada por infecções intercor-
rentes devidas a imunossupressão. Nas áreas endêmicas, a morbidade é baixa e
os sinais clínicos são freqüentemente suaves, enquanto nas epidêmicas, a morbi-
dade é freqüentemente de 100% e a mortalidade de até 90%.
Lesões – As alterações patológicas macroscópicas se tornam evidentes por todo
o trato gastrointestinal e respiratório superior, tanto as áreas de necrose e erosão
como as de congestão e hemorragia, as últimas causando as clássicas “estrias de
zebra” no reto. Os linfonodos podem ficar aumentados e edematosos, com focos
necróticos esbranquiçados nas placas de Peyer. O exame histológico revela
necrose linfóide e epitelial com sincícios virais e inclusões intracitoplasmáticas.
Diagnóstico – Os achados clínicos e patológicos podem ser suficientes para o
diagnóstico nas áreas endêmicas e após a confirmação laboratorial inicial de uma
epidemia. Nas áreas onde a doença for incomum ou ausente, devem-se utilizar
testes laboratoriais para diferenciá-la da diarréia viral bovina em particular, e da
febre da costa leste, febre aftosa, rinotraqueíte infecciosa em bovinos e febre
catarral maligna. O isolamento do vírus e a detecção de antígenos virais específicos
nos tecidos afetados constituem os testes padrão, e é útil a demonstração da
elevação dos títulos de anticorpos. Os testes rápidos e simples para a detecção de
antígenos (imunodifusão ou imunoeletroforese contrária) são valiosos no campo.
Devem-se coletar as amostras para laboratório a partir dos animais durante os
estágios iniciais da doença clínica, preferivelmente antes do início da diarréia.
Devem-se coletar assepticamente sangue completo, tecido linfóide, baço e lesões
intestinais e transportá-los rapidamente a 4°C ou em gelo.
Controle – Geralmente não se tenta o tratamento, mas os cuidados médicos com
fluidoterapia de suporte e antibioticoterapia podem ajudar na recuperação dos
animais valiosos. A imunidade ativa dura geralmente por toda a vida; a imunidade
maternal dura por 6 a 11 meses. O controle nas áreas endêmicas se faz por
imunização de todos os bovinos e bufalinos domésticos > 1 ano de idade com uma
vacina de cultura celular atenuada. Nessas áreas, controlam-se os surtos por meio
de quarentena e “vacinação em grupo” e algumas vezes, por meio do abate. Nas
áreas epidêmicas, controla-se melhor a doença por meio do abate e da quarentena.
O controle da movimentação dos animais torna-se imprescindível, já que a maioria
dos surtos se deve à introdução de bovinos infectados. Os países livres da doença
e os que fazem fronteira com as áreas endêmicas devem ficar extremamente
vigilantes ou vacinar os animais como precaução.

FEBRE ORIUNDA DOS CARRAPATOS


A febre oriunda dos carrapatos (FOC) é uma doença dos ruminantes, transmitida
pela Ixodes ricinus na Europa e pela Rhipicephalus haemaphysaloides supino na
Febre Oriunda dos Carrapatos 491

Índia. Foi identificada em ovinos e bovinos no Reino Unido, Irlanda, Noruega,


Finlândia e Índia. Também foi descrita em caprinos e veados.
Etiologia – Geralmente se aceita que o agente causador seja um membro da
ordem Rickettsiales, embora sua classificação final ainda permaneça não resolvida.
Antigamente denominada Rickettsia phagocytophila , é hoje comumemente referida
como Ehrlichia phagocytophila ou Cytoecetes phagocytophila. O agente parasita
primariamente os neutrófilos e torna-se visível como corpúsculos azul-acinzentados
no citoplasma sob microscopia luminosa em esfregaços sangüíneos corados por
Romanowsky.
Têm-se descrito várias formas morfológicas do agente; elas variam de pequenos
corpúsculos em forma de bastão ou arredondados de 0,5µm de diâmetro a
corpúsculos arredondados maiores, com até 3µm de diâmetro. Também se descre-
veram grupos de corpúsculos (chamados mórulas), com 2 a 4µm de diâmetro.
Demonstrou-se a transmissão transestadial na I. ricinus, embora não se tenha
descrito a transmissão transovariana. Cordeiros e bezerros em pastos infestados
por carrapatos contraem uma carga parasitária logo após o nascimento, e tornam-
se infectados dentro das primeiras 2 a 3 semanas de vida. Embora nem todos os
carrapatos portem o agente da FOC, grande parte dos carrapatos adultos e das
ninfas parece se encontrar infectada, já que mesmo uma infestação ligeira do pasto
é suficiente para transmitir e manter a doença.
Também pode ocorrer transmissão por meio de agulhas contaminadas.
Achados clínicos – Após um período de incubação de 2 a 6 dias, os sinais
clínicos mais comuns (e freqüentemente os únicos) incluem pirexia, embotamento
e anorexia, que duram por , 5 a 8 dias. Depois disso, os animais se recuperam e,
embora bastante imunes à infecção subseqüente, podem permanecer como porta-
dores e agir como reservatórios na infecção das novas gerações de carrapatos.
Têm-se notado vários efeitos mais severos. Esses efeitos incluem restrição do
crescimento ou perda de peso nos cordeiros, e queda acentuada, mas temporária,
na produção de leite nas vacas. Tem-se descrito abortamento em ovelhas e vacas,
e carneiros e os touros podem exibir uma grande redução da qualidade do sêmen.
As variações na severidade dos efeitos clínicos podem estar relacionadas às
diferenças entre as cepas da FOC ou à suscetibilidade do hospedeiro.
Talvez o efeito mais significativo da infecção pela FOC seja a sua deterioração
séria dos mecanismos de defesa celulares e humorais, o que predispõe o hospedei-
ro a infecções secundárias, por exemplo, piemia por carrapatos, pasteurelose
pneumônica e infecção da enfermidade da andadura em círculos.
Lesões – Uma série de alterações hematológicas distintas, embora transitórias,
se segue à infecção com a FOC. Dois a 4 dias após a infecção, desenvolve-se uma
neutrofilia modesta, seguida por uma neutropenia acentuada por 4 a 8 dias. O
número de eosinófilos e linfócitos pode cair paralelamente com a queda nos
neutrófilos. Em ovinos e bovinos, os neutrófilos são os principais leucócitos
parasitados, e no pico da reação, ≥ 90% dos neutrófilos em circulação podem conter
corpúsculos rickettsiais.
A neutropenia severa e o forte parasitismo dos neutrófilos remanescentes
prejudicam enormemente a capacidade funcional dessas células. Intercorrentemente,
desenvolve-se uma linfocitopenia e reduz-se a capacidade do animal produzir
anticorpos e montar uma resposta mediada por células. Essas alterações podem
durar 2 a 3 semanas; depois, o animal apresenta uma suscetibilidade bastante
aumentada às infecções secundárias.
Na necropsia dos casos não complicados, as anormalidades macroscópicas se
restringem a um aumento de volume do baço.
Diagnóstico – A história clínica e a presença do vetor carrapato são auxílios
úteis. A doença clínica geralmente ocorre apenas em animais jovens nascidos em
Febre Oriunda dos Carrapatos 492

áreas infestadas por carrapatos ou em animais mais idosos recém-introduzidos em


tais áreas. Deve-se confirmar o diagnóstico por meio do exame microscópico dos
esfregaços sangüíneos corados (comumente de Leishman ou de Giemsa) quanto
à presença de microrganismos da FOC no citoplasma dos leucócitos circulantes,
principalmente dos neutrófilos.
Controle – Existem 3 aspectos do controle: o controle de vetores, a imunidade e
a quimioterapia. Pode-se conseguir um controle efetivo por meio da eliminação ou da
redução acentuada do contato com o vetor carrapato, através do pastejo dos bovinos
e dos ovinos em pastos livres de carrapatos nas áreas de baixada ou através do uso
de acaricidas. Na criação ovina, isso comumente envolve a manutenção da ovelha
e do cordeiro em um pasto cercado e relativamente livre de carrapatos, até que o
cordeiro tenha , 6 semanas de idade. O cordeiro também se beneficia de uma
melhora na nutrição da ovelha. Não se pratica comumente o banho de imersão dos
cordeiros dentro de 1 a 2 semanas de nascimento por causa das dificuldades de
reunião dos cordeiros em fazendas de colinas largamente dispersas, dos riscos de um
não reconhecimento por parte da mãe e da duração relativamente curta da proteção
proporcionada pelo acaricida, possivelmente devido ao velo curto e à rápida velocidade
de crescimento do cordeiro. No entanto, o banho de imersão por duas vezes com um
intervalo de 2 a 3 semanas realmente reduz a incidência da infecção. Os estudos
também demonstraram o benefício dos acaricidas “pour-on” nos cordeiros.
Vários aspectos da imunidade permanecem controversos, mas geralmente se
aceita que ovinos e bovinos sejam imunes a um desafio após a recuperação de 1
ou 2 reações clínicas à FOC. A imunidade pode durar até 1 ano, embora pareça
diminuir mais rapidamente se os animais forem removidos de um pasto infestado por
carrapatos. Pode persistir uma certa imunidade residual mesmo quando os animais
se reinfectam, já que as reações secundárias são comumente mais suaves que as
iniciais. Existem diferentes cepas de FOC, geralmente com um grau significativo de
imunidade cruzada entre elas. Os ruminantes com imunidade adquirida tornam-se
geralmente portadores, ou seja, um pequeno número de microrganismos persiste
em seus corpos, e a maioria dos ruminantes que pasta em pastos infestados por
carrapatos atua como fonte contínua de infecção por carrapatos.
Têm-se utilizado várias drogas para suprimir ou evitar a FOC. A oxitetraciclina
utilizada em surtos nos bovinos leiteiros reduz a pirexia e restaura a produção de
leite. O tratamento é particularmente efetivo se for administrado dentro de poucos
dias da infecção, embora possam ocorrer recidivas. A sulfametazina também se
mostra útil, e os seus efeitos são semelhantes aos da oxitetraciclina. A administra-
ção de uma tetraciclina de longa ação aos cordeiros nas primeiras 2 a 3 semanas
de vida resulta em uma proteção que dura , 2 semanas; ela também reduz
efetivamente a incidência de infecções secundárias, tais como a piemia por
carrapatos, e leva a uma potencialização da velocidade de crescimento.

PIEMIA POR CARRAPATOS


É uma doença estafilocócica endêmica dos cordeiros entre as 2 semanas e 3
meses de idade, associada com infestações da Ixodes ricinus. Ela se caracteriza por
abscessos piêmicos encontrados comumente nas articulações, embora também
possam se encontrar presentes virtualmente em qualquer órgão. A doença é uma
causa importante de perdas econômicas por meio da debilitação e da morte dos
cordeiros. Foi descrita em todas as áreas infestadas por carrapatos do Reino Unido
e Irlanda.
Piemia por Carrapatos 493

Etiologia – A Staphylococcus aureus é isolada consistentemente a partir dos


abscessos piêmicos. Existem evidências de que os estafilococos sejam inoculados
pelo carrapato durante a sua alimentação, desviando-se conseqüentemente das
defesas cutâneas. No entanto, também parece provável que a bactéria entre a partir
de qualquer ferimento ou de um umbigo infectado, e produza uma piemia devido à
leucopenia severa associada à febre oriunda dos carrapatos (FOC, ver anterior-
mente).
A incidência da piemia por carrapatos varia de ano para ano, embora não se
conheça a causa dessa imprevisibilidade; em alguns anos, até 25% dos cordeiros
em pastos infectados por carrapatos podem se tornar piêmicos, mas a incidência
raramente é > 10%.
Achados clínicos – A piemia por carrapatos é mais comumente reconhecida
como aleijamento de cordeiros. Podem-se encontrar várias lesões nos cordeiros
afetados; os estafilococos se localizam nas articulações e causam abscessos e
claudicação. Outros cordeiros podem ficar paraplégicos ou apresentar outros sinais
nervosos como resultado de lesões no SNC, embora a formação de abscessos nos
órgãos internos se associe comumente às más condições e a emaciação por
doença. Além dessa síndrome crônica ou piêmica, descreveu-se uma forma aguda
ou septicêmica da infecção estafilocócica.
Lesões – Na necropsia, os abscessos são mais comuns no fígado, articulações,
pulmões e rins. Também se encontram nas meninges do cérebro ou da medula
espinhal, e no pericárdio e miocárdio; menos comumente no diafragma, timo e nas
glândulas adrenais.
Os carrapatos são geralmente encontrados na virilha dos cordeiros infectados,
e os locais de atracamento se encontram freqüentemente inflamados.
Diagnóstico – A história e os sinais clínicos são indicadores valiosos, e a
restrição geográfica rígida da doença e sua relação com a infestação por carrapatos
constituem características diagnósticas. A piemia por carrapatos pode lembrar
outras infecções supurativas do recém-nascido, incluindo a infecção causada pelos
estreptococos, mas as lesões são mais extensas e pode-se isolar a S. aureus.
Controle – O controle da infestação por carrapatos é a medida mais efetiva e,
como no controle da FOC, pode-se consegui-lo por meio da restrição dos cordeiros
e ovelhas a pastos livres de carrapatos em baixadas pelas primeiras poucas semanas
de vida, ou por meio da administração de acaricidas nos cordeiros, como banhos de
imersão ou esfregaços. O uso da cipermetrina como “pour-on” tem indicado que este
pode ser o melhor método de controle de carrapatos nos cordeiros jovens.
O uso da tetraciclina de longa ação pode ajudar a evitar tanto a FOC como a
piemia por carrapatos, quando administrada nas primeiras semanas de vida.
Embora são seja um substituto para o uso dos acaricidas e dos outros métodos de
controle de carrapatos, ela é melhor considerada como um adjunto útil no controle
da morbidade e da mortalidade nos cordeiros. Uma única injeção do dobro da dose
padrão às 3 semanas de idade pode reduzir significativamente a mortalidade e a
morbidade nos cordeiros jovens de colinas em um pasto infestado por carrapatos,
e melhorar os ganhos de peso e a condição dos remanescentes. O antibiótico pode
impedir o desenvolvimento da FOC, possivelmente por 3 semanas, livrando o animal
da pirexia e da imunossupressão, de modo que se reduz a incidência da piemia por
carrapatos e de outras infecções, tais como pasteurelose e colibacilose. Quando os
cordeiros finalmente desenvolvem a FOC, eles estão várias semanas mais velhos
e aparentemente menos suscetíveis à infecção secundária.
O tratamento dos casos clínicos com penicilina ou oxitetraciclina pode ser efetivo,
contanto que as lesões não se encontrem muito avançadas.
Doença de Wesselsbron 494

DOENÇA DE WESSELSBRON
É uma infecção viral e originária dos carrapatos artrópodes, de ovinos, bovinos,
caprinos, eqüinos e suínos. Também já se isolou o vírus a partir do homem. Os
ovinos são os mais severamente afetados; os sinais incluem febre, depressão,
anorexia, abortamento e morte. A mortalidade é alta em cordeiros recém-nascidos
e ovelhas prenhes. Os achados post mortem incluem hepatite, hepatomegalia,
icterícia, congestão hepática e edema subcutâneo. As lesões histológicas incluem
necrose dos hepatócitos, proliferação das células de Kupffer e infiltração de
leucócitos nas tríades portais.
A epidemiologia é semelhante à da febre do Vale do Rift (FVR, ver pág. 488), mas
os 2 vírus não são relacionados e não existe proteção cruzada. O vírus de
Wesselsbron, um flavivírus, se distribui largamente nas partes mais quentes e
úmidas da África. A infecção é comum, mas a doença é rara. Os surtos da doença
se limitam aos países no sul da África. A transmissão se faz por várias espécies de
mosquitos Aedes. Também pode ocorrer transmissão mecânica por meio de
moscas picadoras.
Pode-se isolar o vírus por meio da inoculação intracerebral de camundongos
recém-nascidos. Os camundongos desmamados não são suscetíveis ao vírus de
Wesselsbron (como são ao vírus da FVR). Para o diagnóstico, utilizam-se comu-
mente inibição da hemaglutinação, fixação de complemento e a neutralização viral.
O controle envolve o uso de uma vacina de vírus atenuados, mas devido a
possíveis efeitos teratogênicos, não se recomenda a vacinação das ovelhas
prenhes. Freqüentemente, combina-se essa vacina com a vacina contra a FVR.
Também se pode tentar o controle por meio do controle dos vetores mosquitos.

CINOMOSE CANINA
(Doença dos coxins ásperos)

É uma doença viral sistêmica e altamente contagiosa dos cães que é observada
mundialmente; caracteriza-se por febre difásica, leucopenia, catarro respiratório e
gastrointestinal, e freqüentemente, complicações pneumônicas e neurológicas. A
doença ocorre nos Canidae (cães, raposas e lobos), Mustelidae (por exemplo, furão,
vison e cangambá), a maioria dos Procyonidae (por exemplo, o aguaxinim e o quati)
e alguns Viveridae (por exemplo, o binturongue). Embora já se tenha especulado
que o vírus da cinomose canina cause uma esclerose múltipla no homem, não há
evidências de suporte. Tem-se manifestado uma preocupação injustificada com o
contato humano com os cães vacinados com a vacina contra o sarampo. Utiliza-se
o vírus do sarampo atenuado para proteger os cães contra a cinomose, mas eles não
eliminam o vírus após a vacinação.
Etiologia e patogenia – A cinomose canina é causada por um paramixovírus
intimamente relacionado com os vírus do sarampo e da peste bovina. O vírus é
sensível aos solventes lipídicos e à maioria dos desinfetantes, e é instável fora do
hospedeiro. A principal rota de infecção consiste na secreção de gotículas por meio
de aerossol a partir dos animais infectados. Alguns cães infectados podem eliminar
o vírus por vários meses.
A replicação do vírus ocorre inicialmente no tecido linfático do trato respiratório.
Uma viremia associada a células resulta na infecção de todos os órgãos linfáticos,
seguida de uma infecção dos epitélios respiratório, gastrointestinal e urogenital,
bem como do SNC. A doença ocorre após a replicação do vírus nesses órgãos.
Cinomose Canina 495

Achados clínicos – Geralmente ocorre uma febre 3 a 6 dias após a infecção.


Também pode haver uma leucopenia (especialmente uma linfopenia) no mesmo
momento. Esses sinais podem passar despercebidos. A febre baixa por vários dias
antes que uma segunda febre ocorra, a qual dura ≥ 1 semana. Esta febre pode ser
acompanhada por descarga nasal serosa, descarga ocular mucopurulenta e anore-
xia. Podem se seguir sinais respiratórios e gastrointestinais, que geralmente se
complicam por infecções bacterianas secundárias. Os sinais no SNC podem acom-
panhar ou seguir a doença sistêmica, ou ocorrer após uma infecção subclínica. Pode-
se observar uma hiperceratose dos coxins podais (doença dos “coxins ásperos”) e
do epitélio do plano nasal. Nos cães com hiperceratose, observam-se freqüentemen-
te sinais neurológicos. Os sinais no SNC incluem: 1. tremor localizado de um músculo
ou de um grupo de músculos (coréia, espasmos flexores e hipercinese), tais como
os músculos da perna ou faciais; 2. paresia ou paralisia, freqüentemente começando
a se tornar evidente como uma ataxia nos membros posteriores, seguida por paresia
e paralisia ascendentes; e 3. convulsões caracterizadas por salivação e movimentos
de mastigação da mandíbula (pequeno mal, “ataques de mascar chiclete”). Os
ataques se tornam mais freqüentes e severos, e o cão pode cair em decúbito lateral
e “pedalar” com suas pernas; ocorrem freqüentemente micção e defecação
involuntárias (ataque de grande mal, convulsão epileptiforme). Um cão pode exibir
qualquer, ou todas as 3, dessas manifestações nervosas no curso da doença. As
conseqüências da infecção variam de uma infecção inaparente e suave a uma
doença severa manifestada pela maioria dos sinais anteriores. O curso da doença
pode ser de apenas 10 dias, mas pode se prolongar por várias semanas ou meses.
Nos casos excepcionais, pode haver períodos de abatimento intermediários, segui-
dos por uma recidiva. Freqüentemente, quando a recuperação parece iminente,
surgem seqüelas neurológicas permanentes, como as descritas anteriormente.
A encefalite do cão idoso (ECI), uma afecção rara marcada por ataxia,
movimentos compulsivos, tais como tremores da cabeça ou um “pedalar” contínuo,
e uma hipermetria descoordenada, pode ocorrer no cão adulto sem uma história
anterior de sinais clínicos relacionados com o vírus da cinomose canina (VCC). Não
parece ocorrer convulsões e tremores neuromusculares (coréia) na ECI. Embora já
se tenha detectado o antígeno da VCC no cérebro dos cães com ECI por meio da
coloração para imunofluorescência, os cães com ECI não são infecciosos e não se
têm isolado vírus compatíveis com a replicação. Não se conhece a fisiopatologia da
ECI.
Lesões – A atrofia do timo é um achado post mortem consistente. Pode-se
encontrar presente uma hiperceratose do nariz e coxins podais. Dependendo do
grau da infecção bacteriana secundária, também podem se encontrar presentes
broncopneumonia, enterite e pústulas cutâneas. Histologicamente, o VCC produz
necrose dos tecidos linfáticos, corpúsculos de inclusão intranucleares e citoplasmá-
ticos nos epitélios respiratório, gastrointestinal e urinário e uma pneumonia inters-
ticial. As lesões encontradas no cérebro dos cães com complicações neurológicas
incluem degeneração neuronal, gliose, desmielinização, embainhamento peri-
vascular, leptomeningite não supurativa e corpúsculos de inclusão intranucleares
predominantemente no interior das células gliais.
Diagnóstico – Deve-se considerar a cinomose no diagnóstico de qualquer
afecção febril nos cãezinhos. Embora o caso clínico típico não seja difícil de
diagnosticar, algumas vezes os sinais característicos não aparecem até o final da
doença. Pode-se modificar o quadro clínico por meio da sobreposição de toxoplas-
mose, coccidiose, ascaríase e de numerosas infecções virais e bacterianas.
Algumas vezes se confunde a cinomose com leptospirose, hepatite infecciosa
canina ou envenenamento com chumbo. Uma enfermidade catarral febril com
seqüelas neurológicas justifica um diagnóstico de cinomose. Na necropsia, confir-
Cinomose Canina 496

ma-se melhor o diagnóstico clínico por meio das lesões histológicas e/ou por meio
do ensaio de imunofluorescência do antígeno viral nos tecidos. Nos animais vivos,
podem-se examinar com esses procedimentos os epitélios conjuntival, traqueal,
vaginal ou outros ou o sobrenadante do sangue. Essas amostras ficam geralmente
negativas quando os anticorpos circulantes se encontram presentes no cão doente.
Pode-se então fazer o diagnóstico por meio da demonstração da IgM específica do
vírus.
Tratamento – Os tratamentos se direcionam à limitação da invasão bacteriana
secundária, suporte do equilíbrio hídrico e bem-estar global do cão, e controle das
manifestações nervosas. Esse tratamento inclui antibióticos, soluções eletrolíticas,
hidrolisados proteicos, suplementos dietéticos, antipiréticos, preparações nasais,
analgésicos e anticonvulsivantes. Nenhum tratamento é específico ou bem-sucedi-
do uniformemente. Tornam-se essenciais os bons cuidados médicos, e apesar do
cuidado intensivo, alguns cães falham em ter alguma recuperação satisfatória.
Embora os tratamentos para a coréia e as outras manifestações neurológicas da
cinomose geralmente não obtenham sucesso, os antiespasmódicos e os sedativos
podem reduzir a severidade dos sinais.
Profilaxia – A imunização bem-sucedida dos cãezinhos com as vacinas de vírus
vivos modificados da cinomose canina depende da ausência de um anticorpo
materno interferente. Pode-se prever, a partir de uma nomografia, a idade em que
os cãezinhos podem ser imunizados, caso se conheça o título de anticorpos séricos
da mãe; esse serviço se encontra disponível em muitos laboratórios diagnósticos.
Alternativamente, podem-se vacinar os cãezinhos com a vacina do vírus vivo
modificado com 6 semanas de idade e a intervalos de 2 a 4 semanas até as 16
semanas de idade. Encontram-se disponíveis uma vacina de vírus vivo modificado
contra o sarampo e uma combinação da vacina de vírus vivo modificado do sarampo
e da vacina de vírus vivo modificado da cinomose canina. Devem-se administrar
intramuscularmente essas vacinas. Deve-se administrar a vacina contra o sarampo
ou a combinação aos cãezinhos com 6 a 7 semanas de idade. O vírus do sarampo
induz a imunidade ao VCC na presença do anticorpo materno contra a cinomose.
O cãozinho vacinado dessa forma deve receber uma vacina de vírus vivo modificado
contra a cinomose quando tiver 12 a 16 semanas de idade. Encontram-se disponí-
veis muitas variedades da vacina atenuada contra a cinomose e devem-se utilizá-
las de acordo com as instruções do fabricante. Sugere-se a revacinação anual.

HERPESVIROSE CANINA
É uma infecção viral, fatal e mundial dos cãezinhos. O vírus também pode estar
associado com uma vaginite vesicular nas cadelas adultas. Sabe-se que apenas os
membros dos Canidae (cães, lobos e coiotes) são suscetíveis.
Etiologia – A doença é causada por um DNA-herpesvírus canino envelopado
(HVC), que é sensível aos solventes lipídicos e à maioria dos desinfetantes. É
relativamente instável fora do hospedeiro.
A transmissão ocorre geralmente por contato entre os cãezinhos suscetíveis e as
secreções vaginais ou oronasais infectadas da sua mãe ou as secreções oronasais
dos cães que se permitir que entrem em contato com os cãezinhos durante as
primeiras 3 semanas de vida. Pode ocorrer uma transmissão in utero.
A infecção dos cãezinhos recém-nascidos suscetíveis resulta na replicação do
HVC nas células de superfície da mucosa nasal, faringe e amígdalas, seguida pela
viremia e pela invasão viral dos órgãos viscerais.
Doenças Rickettsiais Caninas 497

Achados clínicos – A morte devida à infecção pelo HVC geralmente ocorre com
1 a 3 semanas de idade, mas ocasionalmente também ocorre nos cãezinhos com
até 1 mês de idade; a morte torna-se rara nos cãezinhos com 6 meses. Tipicamente,
o início é súbito e a morte ocorre após uma enfermidade de ≤ 24h. Os cães mais
idosos expostos a ou experimentalmente inoculados com o HVC podem desenvol-
ver uma rinite suave ou uma vaginite vesicular. Alguns investigadores ligaram o HVC
a abortamentos, natimortos e infertilidade. Existem poucas evidências da associa-
ção do HVC com a traqueobronquite infecciosa.
Lesões – As lesões características consistem de uma necrose focal dissemi-
nada e de hemorragias. As lesões mais acentuadas são observadas nos pul-
mões, porção cortical dos rins, glândulas adrenais, fígado e trato gastrointestinal.
Todos os linfonodos ficam aumentados e hiperêmicos, e o baço incha. Também
podem ocorrer lesões no SNC. A lesão histológica básica é a necrose com
hemorragia no parênquima adjacente. Mais freqüentemente não há reação
inflamatória. Corpúsculos de inclusão intranucleares, basofílicos, pequenos e
únicos são mais comuns em áreas de necrose nos pulmões, fígado e rins.
Ocasionalmente, eles ocorrem como corpúsculos tenuemente acidofílicos, loca-
lizados no interior do espaço nuclear.
Diagnóstico – Pode-se confundir a infecção com o HVC com a hepatite
infecciosa canina (ver pág. 505), mas ela não se acompanha por uma vesícula biliar
espessada e edematosa, freqüentemente associada com a última doença. Áreas
focais de necrose e hemorragia, especialmente as que ocorrem nos rins, a
distinguem da hepatite e da toxoplasmose. O HVC causa uma doença séria apenas
nos cãezinhos muito jovens. A morte rápida e as lesões características a distinguem
da cinomose canina (ver anteriormente). Pode-se isolar o vírus a partir dos pulmões
frescos, fígado, rins e baço por meio de técnicas de cultura de células. Devem-se
enviar ao laboratório os tecidos refrigerados, mas não congelados.
Controle – Não se encontra disponível nenhuma vacina. As cadelas infectadas
desenvolvem anticorpos, e as ninhadas subseqüentes à primeira ninhada infectada
recebem anticorpos maternos no colostro. Os cãezinhos que recebem os anticorpos
maternos podem se infectar com os vírus, mas esses não resultam em doença.
A remoção dos cãezinhos das cadelas afetadas por meio de uma cirurgia
cesariana e a sua criação em isolamento evitam mortes sob condições experimen-
tais. No entanto, observam-se infecções mesmo em cãezinhos nascidos em
cesariana. Podem-se reduzir as mortes ao se criar os cãezinhos infectados em
incubadoras a temperaturas elevadas (35°C, 50% de umidade relativa). Devem-se
administrar uma terapia de suporte e uma fluidoterapia adequadas aos cãezinhos
criados dessa forma. O prognóstico dos cãezinhos que sobreviverem às infecções
neonatais pelo HVC é reservado, pois os danos aos órgãos linfóides, rins e fígado
podem ser irreparáveis.

DOENÇAS RICKETTSIAIS CANINAS


EHRLICHIOSE CANINA
É uma doença de aguda a crônica causada pela Ehrlichia canis. É endêmica em
muitas partes dos EUA, e ocorre mundialmente. Até hoje, descreveram-se 46 casos
de infecção humana com E. canis, embora não haja evidências de transmissão
direta dos cães para o homem. A enfermidade humana mimetiza a febre maculosa
das montanhas rochosas.
Doenças Rickettsiais Caninas 498

Etiologia – O agente causador é visto raramente como colônias de corpúsculos


cocóides no citoplasma dos leucócitos. Afetam-se os monócitos mais freqüente-
mente, embora algumas cepas possam afetar apenas neutrófilos ou eosinófilos, ou
ambos. O carrapato castanho dos cães (Rhipicephalus sanguineus) é o vetor
primário e reservatório, e pode transmitir a doença por até 5 meses após o
ingurgitamento. Transfusões sangüíneas, ou outros meios pelos quais se transfe-
rem leucócitos infectados, também transmitem a doença. Em algumas áreas, , 50%
dos animais infectados também possuem títulos para a E. platys, o agente da
trombocitopenia cíclica infecciosa (ver adiante), mas desconhece-se a relação
clínica entre os 2 microrganismos.
Achados clínicos – Os sinais surgem do envolvimento dos sistemas hêmico e
linforreticular, e progridem comumente de agudos para crônicos, dependendo da
cepa do microrganismo e do estado imune do hospedeiro. Nos casos agudos,
ocorrem hiperplasia reticuloendotelial, febre, linfadenopatia generalizada, espleno-
megalia e trombocitopenia. Podem ocorrer sinais variáveis de anorexia, depressão,
perda de resistência, rigidez e relutância a andar, edema dos membros ou escroto,
e tosse ou dispnéia. A maioria dos casos agudos ocorre na primavera, verão e início
do outono, coincidindo com a maior atividade do vetor carrapato.
O hemograma geralmente está normal, mas pode refletir anemia normocrômica,
normocítica suave, leucopenia ou leucocitose suave. A trombocitopenia é comum,
mas as petéquias podem não ficar evidentes e as plaquetas podem não ser
obviamente reduzidas em um esfregaço sangüíneo. A trombocitopatia raramente
contribui para uma hemorragia. A citologia por aspiração revela linfonodos reativos
e, geralmente, uma plasmocitose acentuada.
A mortalidade é rara no estágio agudo: pode ocorrer uma recuperação espontâ-
nea, o cão pode permanecer assintomático ou pode se seguir uma doença crônica.
Nos casos crônicos, a medula óssea se torna hipoplásica, e os linfócitos e os
plasmócitos inflitram os vários órgãos. Dependendo de quais órgãos foram afeta-
dos, e em que grau, os sinais são variáveis e aparecem sem relação com a estação.
Os achados clínicos podem incluir esplenomegalia acentuada, glomerulonefrite,
insuficiência renal, pneumonite intersticial, uveíte anterior, ataxia cerebelar, depres-
são, paresia e hiperestesia. Perda de peso severa consiste em um achado
importante.
O hemograma fica em geral acentuadamente anormal no estado crônico. Uma
trombocitopenia severa pode causar freqüentemente uma diátese hemorrágica.
Nas raças dolicocefálicas, torna-se comum a epistaxe; hematúria, melena e petéquias
e equimoses na pele e nas membranas mucosas ocorrem em todas as raças. Pode
ocorrer uma pancitopenia variavelmente severa (leucopenia madura, anemia não
regenerativa, trombocitopenia ou qualquer combinação disso). Freqüentemente,
ocorre uma hipergamaglobulinemia policlonal ou, ocasionalmente, monoclonal.
Lesões – Durante o estágio agudo, as lesões são geralmente inespecíficas, mas
são comuns a esplenomegalia e pulmões descoloridos e volumosos. Histologica-
mente, ocorrem hiperplasia linforreticular e embainhamento perivascular linfocítico
e plasmocítico. Nos casos crônicos, essas lesões podem se acompanhar de uma
hemorragia muito difundida e de um aumento da infiltração celular mononuclear dos
órgãos.
Diagnóstico – O diagnóstico clínico se confirma pela demonstração do mi-
crorganismo no interior dos leucócitos, ou por uma combinação de sinais clínicos,
títulos positivos de imunofluorescência indireta e da resposta ao tratamento. Os
baixos números de microrganismos tornam difícil a demonstração, exceto na fase
aguda antes do tratamento. Pode-se retardar a resposta dos anticorpos em até 28
dias; conseqüentemente, um título de anticorpos não pode se constituir em uma
ferramenta diagnóstica confiável no início do curso da doença. Como a trombocito-
Doenças Rickettsiais Caninas 499

penia é um achado relativamente consistente, a contagem de plaqueta se torna um


teste de triagem importante.
O diagnóstico diferencial durante o estágio agudo inclui outras causas de febre
e de linfadenopatia (por exemplo, febre maculosa das Montanhas Rochosas,
brucelose, blastomicose e endocardite); doenças imunomediadas, especialmente
trombocitopenia e lúpus eritematoso sistêmico; e linfossarcoma. O diagnóstico
diferencial durante o estágio crônico inclui intoxicação por estrogênio, mieloftise,
pancitopenia imunomediada e outras doenças associadas com uma disfunção
específica de um órgão (por exemplo, a glomerulonefrite).
Tratamento – A droga de escolha para todas as formas de ehrlichiose é a
tetraciclina (22mg/kg, VO, três vezes ao dia) por um mínimo de 2 semanas nos casos
agudos, 1 a 2 meses nos casos crônicos. A doxiciclina (5 a 10mg/kg, VO ou EV,
diariamente por 10 a 14 dias) é efetiva em alguns casos nos quais a tetraciclina falha.
Duas doses de dipropionato de imidocarb (5 a 7mg/kg, IM), com um intervalo de 2
semanas, são variavelmente efetivas tanto contra a ehrlichiose como contra a
babesiose; no entanto, a droga não é aprovada para uso nos EUA. Em todas as
formas da doença, a temperatura retorna ao normal dentro de 24 a 48h após o
tratamento, e o cão se torna mais ativo e começa a comer. Nos casos crônicos, as
anormalidades hematológicas podem persistir por 3 a 6 meses. Pode se tornar
necessária uma terapia de suporte para combater a emaciação e a disfunção
específica de um órgão; podem-se exigir transfusões de plaquetas ou de sangue
completo se a hemorragia for extensa. Deve-se medir novamente o título de
anticorpos contra a E. canis dentro de 6 meses de enfermidade para confirmar um
estado soronegativo indicativo de uma terapia de sucesso.
Profilaxia – A prevenção é potencializada pelo controle dos carrapatos e pela
utilização de doadores sangüíneos negativos para a imunofluorescência indireta. A
tetraciclina (6,6mg/kg, VO, diariamente) é um preventivo efetivo nos canis onde a
ehrlichiose é endêmica.

TROMBOCITOPENIA INFECCIOSA CÍCLICA CANINA


O agente etiológico é a Ehrlichia platys. Ela é morfologicamente semelhante à E.
canis, mas afeta apenas as plaquetas. A distribuição do microrganismo é semelhan-
te à da E. canis (ver anteriormente).
Os cães geralmente não apresentam nenhum sinal da infecção pela E. platys,
apesar da presença do microrganismo nas plaquetas. O achado primário é uma
trombocitopenia cíclica, recidivando a intervalos de 10 dias. Geralmente, a natureza
cíclica diminui e a trombocitopenia se torna suave e se resolve lentamente.
Podem-se demonstrar as mórulas nas plaquetas com qualquer corante de
Romanowski. No entanto, a parasitemia é rara ou ausente quando o número de
plaquetas é baixo, e a porção afetada diminui a cada ciclo sucessivo; portanto, a
demonstração direta pode ser difícil. Ocorre uma soroconversão 13 a 19 dias após
a inoculação, e ela é detectada confiavelmente por um teste de imunofluorescência
indireta. Os títulos positivos confirmam uma exposição anterior, mas deve-se
correlacionar a sua importância com os achados clínicos. Freqüentemente, os cães
positivos para a E. canis também são positivos para a E. platys.
O tratamento é o mesmo da E. canis.

FEBRE DA FASCÍOLA DE ELOKOMIN


É uma doença transmitida por fascíolas de canídeos, ursos, guaxinins e furões.
É observada sozinha ou como agente complicador da doença do envenenamento
por salmão (DES, ver a seguir). Ela utiliza a Nanophyetus salmincola da mesma
forma que a descrita para a DES. O agente da febre da fascíola de elokomin
Doenças Rickettsiais Caninas 500

(Neorickettsia elokominica) lembra a N. helminthoeca , mas difere antigenicamente


e possui uma extensão mais larga de hospedeiros.
O período de incubação (9 a 12 dias) é mais longo que o da DES. Ao contrário
da DES, a febre geralmente atinge um platô e persiste por 4 a 7 dias. A diarréia
sanguinolenta está ausente, assim como a desidratação severa observada na DES.
A linfadenopatia generalizada é notável e geralmente maior que a causada pela
N. helminthoeca. Embora a mortalidade nos casos não tratados seja geralmente
< 10%, muitos cães exibem uma linfadenopatia persistente e severa e uma perda
de peso por semanas após a recuperação dos outros sinais. Ocasionalmente,
observam-se ataxia e meningoencefalite. Observam-se ovos de fascíola no exame
fecal. As lesões da febre da fascíola de elokomin não complicadas lembram as da
DES, mas as lesões gastrointestinais severas se encontram ausentes. Diagnóstico,
tratamento e profilaxia são os mesmos da DES.

FEBRE MACULOSA DAS MONTANHAS ROCHOSAS


(FMMR, Febre do carrapato)
É uma doença do homem, dos cães e de outros pequenos mamíferos, causada
pela Rickettsia rickettsii. Como a Dermacentor andersoni e a D. variabilis transmitem
a doença, > 80% dos casos ocorrem nos cães que freqüentam o campo. Devido à
sua suscetibilidade, os cães constituem uma sentinela excelente da R. rickettsii. A
soroprevalência varia de 4,3 a 63,4%, mas esses valores não refletem precisamente
as taxas de infecção por causa da detecção de anticorpos reagentes cruzados com
outras rickéttsias do grupo da febre maculosa. Já que a rickettsemia pode ocorrer
durante os estágios agudos, devem-se manipular com cuidado as amostras de
sangue e de tecidos.
Embora não ocorra transmissão direta dos cães para o homem, há um risco
quando as rickéttsias na hemolinfa ou nas excreções do carrapato entram em
contato com a pele arranhada ou a conjuntiva durante a remoção dos carrapatos
ingurgitados dos animais de estimação.
Achados clínicos – Os primeiros sinais podem incluir qualquer combinação de
febre (até 40,5°C), anorexia, linfadenopatia, poliartrite, tosse ou dispnéia, dor
abdominal e edema da face ou das extremidades. A petequiação ocorre mais tarde,
se houver, e geralmente se confina às membranas mucosas. As manifestações
neurológicas são comuns e podem incluir alteração dos estados mentais, disfunção
vestibular e rigidez da nuca. Uma hemorragia retinal focal constitui um achado
consistente durante o curso inicial da doença.
A trombocitopenia é comum, mas geralmente suave o suficiente para não ser
vista em um esfregaço de sangue periférico. Ocorre leucopenia durante os estágios
iniciais da infecção, seguida por uma leucocitose progressiva. Geralmente, as
anormalidades bioquímicas séricas são suaves, mas podem incluir hipoproteine-
mia, hipoalbuminemia, azotemia, hiponatremia, hipocalcemia e aumento dos níveis
das enzimas hepáticas.
Lesões – O dano endotelial vascular se deve aos efeitos citopáticos diretos das
rickéttsias. A severidade da vasculite necrosante pode se correlacionar diretamente
com a dose infectiva. O dano endotelial vascular e a trombocitopenia contribuem
para o desenvolvimento de petéquias e equimoses.
Diagnóstico – O teste mais sensível é o título por imunofluorescência indireta.
Porém, devido à alta incidência de anticorpos reagentes cruzados, deve-se docu-
mentar a demonstração de um aumento de 4 vezes nos títulos em conjunção com
uma síndrome clínica compatível. O diagnóstico diferencial inclui outras causas de
febre de origem desconhecida. A resposta terapêutica geralmente é drástica, como
ocorre nas outras doenças rickettsiais caninas. Após a infecção natural, a imunidade
Doenças Rickettsiais Caninas 501

parece ser para a vida inteira; portanto, não se devem atribuir episódios recidivantes
de febre do carrapato à FMMR.
Tratamento – As tetraciclinas a 22mg/kg, VO, três vezes ao dia por 2 semanas
são efetivas. Pode se tornar necessária a terapia de suporte para a desidratação e
a diátese hemorrágica. Devido às alterações na integridade vascular, aconselham-
se taxas conservativas de administração de fluidos. Não há tratamento profilático.

DOENÇA DO ENVENENAMENTO POR SALMÃO


A doença do envenenamento por salmão (DES) é uma doença infecciosa aguda
dos canídeos, na qual o agente infectivo é transmitido por meio dos vários estágios
de uma fascíola em ciclo de vida caramujo-peixe-cão. O nome da doença é errôneo,
já que não se envolve nenhuma toxina.
Etiologia – A DES é causada pela Neorickettsia helminthoeca . A doença
algumas vezes é complicada por um segundo agente (ver FEBRE DA FASCÍOLA DE
ELOKOMIN, anteriormente). O vetor é uma pequena fascíola, a Nanophyetus salmincola.
O cão se infecta pela ingestão de trutas, salmões ou salamandras-gigantes-do-
Pacífico, que contêm as metacercárias encistadas das fascíolas infectadas por
rickéttsias. No intestino do cão, as fascíolas larvais se desencistam, se incrustam na
mucosa duodenal e introduzem as rickéttsias. A infecção da fascíola em si produz
pouca ou nenhuma doença clínica.
O ciclo de vida se mantém pela passagem dos ovos de fascíola infectados nas
fezes do hospedeiro. Desenvolvem-se miracídios a partir desses ovos, e estes
infectam o caramujo Oxytrema plicifer para formar rédias. As rédias se desenvolvem
em cercárias que são liberadas do caramujo, penetram no salmão ou na truta e se
desenvolvem em metacercárias encistadas e infectivas. O ciclo se completa quando
o cão come o peixe e se infecta com as rickéttsias. A transmissão por meio do contato
de gaiola com gaiola, de termômetros retais ou de aerossóis é rara.
Parece que idade, sexo e raça não influenciam a patogenia da doença, que
pode aparecer a qualquer momento, mas a incidência torna-se mais alta quando
a disponibilidade do peixe é maior. Encontram-se peixes infectados no Oceano
Pacífico, de San Francisco à costa do Alasca, mas a DES é mais prevalecente do
norte da Califórnia ao estreito de Puget. Também é observada no continente, ao
longo dos rios de migração dos peixes. Aparentemente, o caramujo é o fator
geograficamente limitante.
Achados clínicos – Os sinais aparecem subitamente, em geral 5 a 7 dias após
a ingestão de peixes infectados, mas podem se retardar até 33 dias, e persistem por
7 a 10 dias antes de culminarem na morte de até 90% dos animais não tratados; a
temperatura corporal atinge 40 a 42°C 1 a 2 dias mais tarde, e depois declina
gradualmente por 4 a 8 dias e retorna ao normal. Os animais ficam freqüentemente
hipotérmicos antes da morte. A febre é acompanhada por depressão e anorexia
completa em virtualmente todos os casos. Geralmente ocorre um vômito persistente
por volta do quarto ou do quinto dia. Desenvolve-se uma diarréia por volta do quinto
ao sétimo dia; ela freqüentemente contém sangue e pode ser severa. Ocorrem
desidratação e uma perda de peso extrema. Quando severos, os sinais gastrointes-
tinais são clinicamente indistinguíveis dos da parvovirose canina (ver pág. 299).
Ocorre uma linfadenopatia generalizada em , 60% dos casos. Um exsudato nasal
ou conjuntival pode se encontrar presente e mimetizar a cinomose. A neutrofilia é
comum, mas pode ocorrer uma leucopenia absoluta e acentuada com um desvio
degenerativo à esquerda. Descreveu-se trombocitopenia em 94% dos casos. Os
valores da bioquímica sérica ficam normais.
Lesões – A DES parece afetar principalmente os tecidos linfóides e o intestino.
Ocorre um aumento de volume dos folículos linfóides gastrointestinais, linfonodos,
Doenças Rickettsiais Caninas 502

amígdalas, timo, e em um certo grau, do baço, com necrose microscópica,


hemorragia e hiperplasia. Observa-se por todo o intestino uma enterite hemorrágica
variável, mas freqüentemente severa, que parece surgir dos folículos linfóides
danificados. Também aparecem focos microscópicos de necrose ao lado dos folículos.
As fascíolas incrustadas no duodeno são responsáveis por poucos danos teciduais.
Em alguns cães, identificou-se uma meningite ou meningoencefalite não supurativa.
Diagnóstico – Encontram-se ovos de fascíola no exame fecal em , 92% dos
casos, o que ajuda a sustentar o diagnóstico. Os ovos são ovais, castanho-
amarelados, de superfície áspera e de , 87 a 97 × 35 a 55µm, com um opérculo
indistinto e um pequeno ponto cego na extremidade oposta. Durante o primeiro
ou o segundo dia, alguns ovos podem ser evacuados nas fezes. Têm-se
demonstrado os microrganismos intracelulares por meio de aspiração dos linfo-
nodos em , 70% dos casos. O diagnóstico diferencial inclui outras causas de
febre de origem desconhecida, linfadenopatia generalizada, vômito e diarréia.
Deve-se considerar a cinomose, quando ocorrerem diarréia e conjuntivite exsu-
dativa.
Profilaxia e tratamento – Atualmente, o único meio de profilaxia é a prevenção
da ingestão de salmão, truta, truta-cabeça-de-ferro e peixes de água doce seme-
lhantes não cozidos. Nos casos de recuperação, persiste uma resposta imune
humoral profunda, mas não há resistência cruzada entre a N. helminthoeca e a N.
elokominica. Várias sulfonamidas administradas oral ou parenteralmente são efe-
tivas, assim como a clortetraciclina, a oxitetraciclina e o cloranfenicol. Os animais
geralmente sucumbem devido à desidratação, aos desequilíbrios eletrolíticos e
ácido-básicos e à anemia. Portanto, torna-se freqüentemente essencial uma terapia
de suporte geral para a hidratação e o equilíbrio ácido-básico, enquanto se
preenchem as exigências nutricionais e se controla a diarréia. O uso criterioso de
transfusões de sangue completo pode ser útil.

PLEURITE E PERITONITE INFECCIOSA


FELINA
(PIF, Infecção coronaviral felina)

É uma infecção viral contagiosa e mundial dos Felidae domésticos e silvestres;


afeta ambos os sexos e todas as idades, ocorrendo mais comumente nos felinos
entre 6 meses e 2 anos de idade. A incidência da infecção diminui nos gatos com
5 a 13 anos de idade, seguindo-se um aumento da incidência nos felinos com 14
a 15 anos de idade. A PIF se caracteriza por um início insidioso e pelo
desenvolvimento de uma forma úmida (efusiva) ou seca (não efusiva). A morta-
lidade atinge 100%.
Etiologia e epidemiologia – A PIF é causada por um ou mais coronavírus, que
se relacionam antigenicamente com o vírus da gastroenterite transmissível suína,
com o coronavírus canino, com o vírus 229E da bronquite humana e com o
coronavírus entérico felino (CVEF). Ainda não se elucidou completamente o
relacionamento exato entre as múltiplas cepas do VPIF e do CVEF. Elimina-se o
VPIF tanto na saliva como nas fezes após uma inoculação oral do vírus crescido em
cultura tecidual, o que sugere que a rota natural de infecção seja primariamente oral
após a exposição à saliva ou às fezes contaminadas. Quarenta a 50% dos casos de
campo de PIF ocorrem em gatos também infectados com o vírus da leucemia felina
(VLF). Esse relacionamento pode ter uma base imunológica.
Pleurite e Peritonite Infecciosa Felina 503

Achados clínicos – A infecção aguda pode ser assintomática, mas podem


ocorrer febre de origem desconhecida, conjuntivite transitória, sinais de infecção do
trato respiratório ou diarréia. Esse período prodrômico pode durar dias ou semanas
antes que ocorram sinais clínicos de PIF úmida ou seca.
A PIF úmida é a forma mais comum da doença e se caracteriza pelo desenvol-
vimento de ascite e/ou de efusão pleural. Também se tem descrito efusão pericár-
dica. Na PIF seca, ocorrem lesões granulomatosas sem o desenvolvimento de
fluido, e estas podem ser encontradas em qualquer órgão, incluindo SNC e olhos.
A larga variedade de sinais clínicos observados depende de qual órgão esteja
predominantemente afetado, o que torna a PIF seca mais difícil de se diagnosticar
do que a forma efusiva.
Nos estágios finais de ambas as formas, o gato fica moribundo, e acredita-se que
uma coagulação intravascular disseminada favoreça a multiplicação do vírus e a sua
disseminação através das paredes celulares, o que resulta em uma rápida insufi-
ciência do órgão e morte.
Lesões – A lesão primária é uma necrose perivascular imunomediada e aguda,
que progride para uma lesão piogranulomatosa crônica. As lesões podem aparecer
em vários tecidos, mas o omento, serosa peritoneal, fígado, rins, pleuras, parênquima
pulmonar, pericárdio, meninges, cérebro e úveas são os locais comuns.
Diagnóstico – O diagnóstico presuntivo se baseia na história de uma febre
persistente resistente a antibióticos, anorexia, perda de peso, letargia progressiva,
diarréia crônica e debilitação, bem como de outros sinais associados com o
envolvimento do órgão específico. Os exsudatos fluidos característicos nas cavida-
des corporais são altamente sugestivos. Uma densidade fluida de “vidro moído”
homogênea pode obscurecer os detalhes nas radiografias torácicas ou abdominais.
São comuns anemia não regenerativa progressiva, neutrofilia adulta relativa e
linfopenia suave. Na maioria dos casos, encontra-se um desvio na proporção
albumina/globulina, causado pela hiperglobulinemia. A eletroforese das proteínas
séricas demonstrou que a hiperglobulinemia resulta de um aumento da quantidade
de ambas as globulinas α 2 e γ, e reflete os estágios inflamatórios ativo (α2) e crônico
(γ) da doença. A efusão ascítica e/ou pleural também contém quantidades aumen-
tadas de globulinas α 2 e γ, possui uma densidade específica alta, contém relativa-
mente poucos elementos celulares, porém mais material granular ordinário, e pode
coagular quando estacionária.
Os testes ELISA ou de imunofluorescência geralmente indicam títulos de
anticorpos coronavirais moderados a altos nos gatos infectados. Porém, alguns
gatos com PIF exibiram títulos baixos ou nenhum título, e alguns gatos saudáveis
sem nenhum sinal clínico da doença apresentaram títulos altos (com o tempo, os
títulos do último grupo podem diminuir). A biópsia dos órgãos afetados não apenas
confirma o diagnóstico, como também revela a extensão e o estágio da doença.
Tratamento e controle – O tratamento geralmente é inefetivo. Os relatos dos
possíveis benefícios dos vários imunomoduladores precisam ser avaliados poste-
riormente. Como os casos confirmados de PIF geralmente se associam com altos
títulos de anticorpos de CVEF, os imunoestimuladores inespecíficos não parecem
ser indicados. As combinações de antiinflamatórios e imunossupressores em
conjunto com uma terapia de suporte podem tornar o gato mais confortável,
aumentando assim o tempo de sobrevivência em vários meses.
A presença de anticorpos circulantes contra o VPIF, e provavelmente de
anticorpos anti-CVEF, sensibiliza um gato, tanto que a exposição subseqüente ao
VPIF virulento pode produzir uma resposta de anticorpos anamnésica, resultando
em um rápido início da doença aguda e fulminante. Conseqüentemente, ainda não
se desenvolveu uma vacina. Devem-se impedir os gatos saudáveis de entrar em
contato com gatos com diagnóstico confirmado de PIF.
Pleurite e Peritonite Infecciosa Felina 504

Ao contrário dos testes de VLF, que identificam os antígenos grupo-específicos


do VLF no sangue ou nos fluidos corporais dos gatos infectados, não existe nenhum
teste disponível para triar grandes números de gatos para o antígeno viral da PIF.
Não se garante um programa de controle baseado na presença dos anticorpos
séricos dos coronavírus. Não se deve sacrificar nenhum animal saudável com base
no teste de anticorpos.

PANLEUCOPENIA FELINA
(Enterite infecciosa felina, Cinomose felina, Agranulocitose felina)

É uma doença viral altamente contagiosa dos gatos, caracterizada por início
súbito, pirexia, anorexia, depressão, desidratação, vômito e diarréia, leucopenia
profunda, hipotermia no final da doença e alta mortalidade.
Etiologia e epidemiologia – O parvovírus causador ataca todos os membros da
família dos gatos (Felidae) e o guaxinim, o quati e o jupará da família dos guaxinins
(Procyonidae) e a civeta-das-palmeiras da família das civetas (Viverridae). O vírus
é íntima e antigenicamente relacionado com o parvovírus canino do Tipo 2 e
antigenicamente idêntico ao vírus da enterite do visom. A maioria dos gatos errantes
fica exposta ao vírus durante o seu primeiro ano de vida. O vírus pode ser eliminado
na urina e nas fezes por até 6 semanas após a recuperação, e está presente em todas
as secreções e excreções dos animais afetados. A infecção se espalha por contato
direto ou fomitos. O vírus pode sobreviver por anos em um ambiente contaminado,
mas pode ser destruído por uma diluição de alvejante caseiro (hipoclorito de sódio).
O vírus exige células em divisão ativa para uma replicação efetiva. Os tecidos que
sofrem uma atividade mitótica mais rápida são danificados mais severamente.
Achados clínicos, lesões e diagnóstico – O período de incubação é de 2 a 10
dias. Com o início da pirexia, o animal se torna anorético, deprimido e fraco. Podem
ocorrer diarréia e vômito 1 a 2 dias após a elevação inicial da temperatura. Ocorre
uma desidratação extrema rapidamente, embora os gatos afetados pareçam
sedentos. Desenvolve-se uma leucopenia imediatamente antes do início da pirexia.
Nos casos mais agudos, a leucopenia se deve a uma neutropenia absoluta. Os gatos
severamente afetados podem apresentar uma linfopenia absoluta. A contagem de
leucócitos total de < 2.000 células/µL indica um prognóstico ruim. Pode ocorrer uma
leucocitose gradual, caracterizada por um desvio acentuado à esquerda e muitos
neutrófilos imaturos bizarros. O curso da doença raramente é > 5 a 7 dias. Os
gatinhos com panleucopenia superaguda podem morrer dentro de 12h do início dos
sinais clínicos. A mortalidade é alta, especialmente nos gatos jovens; descrevem-
se perdas de 60 a 90%. A infecção dos gatinhos in utero ou durante o período
neonatal destrói a camada granular externa do cerebelo, que se manifesta por
incoordenação, que se nota primeiro quando os gatinhos começam a andar (ataxia
cerebelar felina). As infecções suaves ou subclínicas são comuns em alguns surtos,
especialmente nos gatos adultos não vacinados.
A desidratação e a emaciação são severas exceto nos casos superagudos em
que as alterações macroscópicas podem ser insignificantes. As primeiras altera-
ções são hiperplasia, edema e necrose dos linfonodos mesentéricos e do timo. A
medula óssea pode aparecer semifluida e gordurosa. A parede intestinal fica
geralmente espessada e túrgida; existe gás em algumas alas intestinais. A super-
fície serosa das áreas severamente afetadas pode ficar hiperêmica, com hemorra-
gias equimóticas ou petequiais. As criptas intestinais ficam geralmente dilatadas e
contêm restos que consistem de células epiteliais necróticas desprendidas. Podem
Hepatite Infecciosa Canina 505

se encontrar presentes o espessamento e a fusão dos vilos. Fígado, rins e baço


podem parecer ligeiramente inchados. Observa-se degeneração das células hepá-
ticas e das células epiteliais tubulares renais. Os corpúsculos de inclusão intranu-
cleares eosinofílicos podem se desenvolver transitoriamente nos tecidos em que
ocorre a replicação viral.
O diagnóstico confirmatório requer o uso de um ou mais testes de soroneu-
tralização, hemaglutinação, inibição da hemaglutinação ou ELISA, e mesmo esses
testes não são sempre confiáveis.
Profilaxia e tratamento – Encontram-se disponíveis vacinas vivas modificadas
e inativadas. Não se devem administrar vacinas atenuadas a gatas prenhes,
imunossuprimidas ou doentes, ou gatinhos < 4 semanas de idade. Devem-se
vacinar os gatinhos primeiro com 8 a 10 semanas de idade, novamente com 12 a 14
semanas, e anualmente depois disso. Nas áreas de alto risco, pode-se recomendar
uma terceira vacinação com 16 a 18 semanas. Nunca se deve terminar a série inicial
de vacinação antes das 12 semanas de idade. A imunização deve estar completa
2 semanas antes de uma possível exposição.
O anti-soro homólogo proporciona uma imunidade passiva rápida por 7 a 10 dias,
mas pode interferir na vacinação por 2 a 3 semanas. Pode-se utilizar o anti-soro (2
a 4mL/kg de peso corporal, s.c.) nos gatos suscetíveis que tenham sido expostos ao
parvovírus felino ou nos gatinhos privados de colostro.
A terapia depende de um manejo de suporte e de cuidados médicos até que as
defesas naturais retornem. Os gatos que sobreviverem por 5 a 7 dias provavelmente
se recuperarão. Devem-se suspender o alimento e a água até que não se necessite
de antieméticos. Preferem-se os antieméticos derivados da fenotiazina. Deve-se
administrar uma solução eletrolítica balanceada, tal como o lactato de Ringer,
através de um cateter EV interno. Para os gatos que estejam moribundos ou
severamente anêmicos ou hipoproteinêmicos, indica-se o tratamento inicial com
plasma ou sangue inteiro proveniente de doadores imunes saudáveis.
Deve-se administrar um antimicrobiano parenteral, por exemplo, a gentamicina,
ao gato hidratado por 5 dias para impedir septicemia e endotoxemia bacterianas
Gram-negativas. Os agentes antieméticos-antidiarréicos anticolinérgicos são con-
tra-indicados, já que podem causar íleo confirmado. Para a hipotermia, deve-se
utilizar uma compressa de água quente ou uma almofada térmica (com cuidado,
para evitar queimaduras). Após se reduzir o vômito, podem-se oferecer pequenas
e freqüentes quantidades de alimentos facilmente digeríveis e suaves. O retorno a
uma dieta e a um esquema de alimentação normais deve ser gradual para evitar a
indução de uma gastroenterite. Devem-se isolar os gatos afetados dos gatos
suscetíveis por 6 semanas após a recuperação.

HEPATITE INFECCIOSA CANINA


A hepatite infecciosa canina (HIC) é uma doença contagiosa e mundial dos cães
com sinais que variam de uma febre ligeira e congestão das membranas mucosas
a depressão severa, leucopenia acentuada e tempo de sangramento prolongado.
Ela também ocorre em raposas, lobos, coiotes, cangambás e ursos; outros carnívo-
ros podem se infectar sem desenvolver a doença.
Etiologia e patogenia – A HIC é causada por um DNA-vírus não envelopado, o
adenovírus canino do Tipo 1 (AVC-1), que se relaciona antigenicamente apenas
com o AVC-2 (uma das causas da traqueobronquite infecciosa dos cães (ver pág.
931). O AVC-1 é resistente aos solventes lipídicos e sobrevive fora do hospedeiro
Hepatite Infecciosa Canina 506

por semanas ou meses, mas uma solução de hipoclorito de sódio (alvejante) a 1 a


3% constitui um desinfetante efetivo.
A ingestão de urina, fezes ou saliva provenientes de animais infectados constitui
a rota principal da infecção. Os cães recuperados eliminam o vírus na urina por ≥ 6
meses. A infecção inicial ocorre nas criptas das amígdalas e nas placas de Peyer,
seguindo-se viremia e infecção das células endoteliais em muitos tecidos, o que
inicia a infecção dos órgãos viscerais. Fígado, rins, baço e pulmões são os principais
órgãos-alvo. As lesões renais crônicas e o enevoamento corneal (“olho azulado”)
resultam das reações de complexos imunes que se seguem após a recuperação da
doença aguda.
Achados clínicos – A doença varia de uma febre ligeira a uma enfermidade fatal.
A taxa de mortalidade é mais alta nos cães muito jovens. O período de incubação
é de 4 a 9 dias. O primeiro sinal é uma febre de > 40°C, que dura 1 a 6 dias e
geralmente é bifásica. Pode-se observar uma taquicardia fora de proporção com a
febre. No dia seguinte à elevação inicial de temperatura, desenvolve-se uma
leucopenia que persiste por todo o período febril. O grau de leucopenia varia e
parece se correlacionar com a severidade da enfermidade. Se a febre tiver uma
duração curta, a leucopenia pode ser o único sinal, mas se persistir por > 1 dia,
desenvolve-se uma enfermidade aguda.
Os sinais incluem apatia, anorexia, sede, conjuntivite, descarga serosa a partir
dos olhos e do nariz, e ocasionalmente, dor abdominal. Pode-se observar uma
hiperemia ou petéquias intensas na mucosa oral, bem como um aumento de volume
das amígdalas. Também pode-se observar vômito. Pode haver um edema subcu-
tâneo da cabeça, pescoço e tronco.
O tempo de coagulação se correlaciona diretamente com a severidade da
enfermidade, e pode tornar difícil o controle da hemorragia, que se manifesta pelo
sangramento ao redor dos dentes decíduos e por hematomas espontâneos. No
entanto, torna-se comum uma coagulação intravascular disseminada, e ela pode ser
importante na patogenia da doença. Geralmente não se observam sinais respirató-
rios nos cães com HIC; porém, tem-se recuperado o AVC-1 a partir de cães com
sinais de traqueobronquite infecciosa e a partir de cães com sinais respiratórios
induzidos pela exposição a um isolado obscuro. As raposas podem apresentar
convulsões intermitentes durante o curso da doença, e uma paralisia terminal pode
envolver um ou mais membros ou o corpo inteiro. Embora o envolvimento do SNC
seja incomum, o cão severamente infectado pode apresentar uma convulsão
terminal, e são comuns as hemorragias do tronco cerebral.
Na recuperação, os cães comem bem mas reobtêm peso lentamente. Sete a 10
dias após os sinais agudos desaparecerem, , 25% dos cães recuperados desen-
volvem uma opacidade corneal bilateral, que geralmente desaparece espontanea-
mente. Nos casos suaves de HIC, a opacidade corneal transitória pode ser o único
sinal da doença.
Pode-se desenvolver uma hepatite crônica nos cães que apresentarem baixos
níveis de anticorpos passivos quando expostos. Algumas vezes, observa-se uma
infecção simultânea com o AVC-1 e o vírus da cinomose.
Lesões – Os danos endoteliais resultam em hemorragias em “pincel de tinta” na
serosa gástrica, linfonodos, timo, pâncreas e tecidos subcutâneos. A necrose das
células hepáticas produz alterações de coloração variável no fígado, que pode ficar
normal em tamanho ou inchado. A parede da vesícula biliar pode ficar edematosa
e espessada; pode-se encontrar um edema do timo. Podem-se observar focos
branco-acinzentados no córtex renal.
Diagnóstico – Geralmente, o início abrupto e o tempo de sangramento prolon-
gado sugerem uma HIC. A evidência clínica nem sempre é suficiente para diferen-
ciar a HIC da cinomose (ver pág. 494). O diagnóstico se confirma por meio do
Leishmaniose Visceral 507

isolamento do vírus, da imunofluorescência ou dos corpúsculos de inclusão intranu-


cleares característicos no fígado.
Tratamento – As transfusões sangüíneas podem se tornar necessárias nos
cães severamente doentes. Além disso, deve-se administrar dextrose a 5% em
solução salina isotônica, de preferência endovenosamente. Nos cães com tempo
de coagulação prolongado, a administração subcutânea de fluidos pode ser
perigosa. Deve-se administrar um antibiótico de largo espectro. Como o uso de
tetraciclinas durante o desenvolvimento dos dentes (final do período pré-natal,
período neonatal e início do período pós-natal) pode descolori-los, não se devem
utilizar essas drogas nos cãezinhos antes que os seus dentes permanentes
irrompam. Embora a opacidade corneal transitória (que pode ocorrer durante o
curso da HIC ou estar associada com a vacinação com vacinas de AVC-1
atenuadas) geralmente não requeira nenhum tratamento, uma pomada oftálmica
de atropina pode aliviar o doloroso espasmo ciliar que pode estar associado a ela.
Deve-se proteger o cão contra a luz brilhante quando ocorrer o problema.
Geralmente os corticosteróides são contra-indicados para o tratamento da
opacidade corneal associada com a HIC.
Profilaxia – Encontram-se disponíveis vacinas de vírus vivos modificados.
Essas vacinas se encontram freqüentemente combinadas com outras vacinas.
Recomenda-se a imunização contra a HIC na época das imunizações contra a
cinomose canina. As vacinas de AVC-1 atenuadas produzem opacidades bilaterais
ou unilaterais transitórias da córnea e podem ser eliminadas na urina. Encontra-se
hoje disponível uma vacina de AVC-2 vivo atenuado que protege os cães contra as
infecções por AVC-1 e AVC-2. Essa vacina não produz opacidades corneais ou
uveíte, e o vírus não é eliminado na urina. Ela se encontra disponível nas mesmas
combinações que a vacina de AVC-1. Recomenda-se a revacinação anual contra a
HIC.
Os anticorpos maternos das cadelas imunes interferem na imunizacão ativa até
que os cãezinhos tenham 9 a 12 semanas de idade.

LEISHMANIOSE VISCERAL
É uma doença por protozoário, crônica e finalmente fatal, do homem, dos cães
e de determinados roedores, caracterizada por febre intermitente, hepatomegalia,
esplenomegalia, linfadenopatia, anemia e hiperproteinemia.
A infecção nos cães é prevalecente no Brasil, China e região do Mediterrâneo,
e descreveu-se um foco em Oklahoma, EUA. Os gatos se infectam raramente e não
apresentam sinais de doença visceral, embora ocasionalmente apresentem úlceras
cutâneas devidas à infecção com o Leishmania spp dermotrópico.
Etiologia e transmissão – A Leishmania donovani é o agente causador no
Hemisfério Oriental, e a L. chagasi no Hemisfério Ocidental. Os parasitas são
transmitidos como promastigotos pela picada de várias espécies de mosquitos
flebotomíneos (mosquitos-pólvora). Nos hospedeiros mamíferos, os promastigotos
são engolidos pelos macrófagos, no interior dos quais se transformam e se dividem
como amastigotos.
Achados clínicos e diagnóstico – Podem-se encontrar os amastigotos nos
macrófagos em quase qualquer tecido do corpo, mas os órgãos mais severamente
afetados são medula óssea, baço, fígado e linfonodos. Os 3 últimos aumentam
devido à hiperplasia linfóide. Nos cães, o período de incubação pode ser de meses
ou anos. Os sinais incluem caquexia, alopecia, onicogrifose, linfadenopatia, hepa-
Leishmaniose Visceral 508

tomegalia e esplenomegalia. A febre pode se encontrar presente. Os achados


laboratoriais incluem freqüentemente anemia, linfopenia e hipergamaglobulinemia.
Pode-se encontrar presente uma proteinúria.
Os achados ocasionais incluem lesões oculares anteriores, lesões cutâneas,
pneumonite intersticial e amiloidose. O diagnóstico diferencial inclui linfossarco-
ma, mieloma, ehrlichiose e infecções fúngicas sistêmicas. O diagnóstico defini-
tivo requer a demonstração dos microrganismos em decalques corados por
Giemsa e fixados em metanol, aspirados dos tecidos linfóides afetados, culturas
de amostras teciduais ou aspirados em meios especiais, ou subinoculação do
material infectado em hamsters dourados. O sangue pode conter um baixo
número de parasitas, e o exame dos tecidos linfóides é mais confiável. Não se
encontra rotineiramente disponível o teste de anticorpos séricos. Os amastigotos
aparecem como inclusões esféricas de 5µm nos macrófagos, geralmente nos
focos de inflamação granulomatosa. Eles lembram a Histoplasma capsulatum ,
mas os amastigotos do Leishmania spp contêm tanto um núcleo como um
cinetoplasto.
Tratamento – No homem, utilizam-se os compostos antimoniais pentavalentes
(o estibogliconato de sódio e o antimoniato de meglumina), mas eles não são
oficialmente aprovados para o uso nos cães. Podem ser necessárias várias
semanas de tratamento (30 a 50mg/kg de peso corporal/dia, EV ou IM) com essas
drogas nos cães, embora sejam prováveis os efeitos tóxicos e sejam comuns as
recidivas após o tratamento. Provavelmente não se recomenda a tentativa de
tratamento dos cães importados para áreas não endêmicas, devido a considera-
ções de saúde pública.
SISTEMA IMUNE
MECANISMOS IMUNOPATOLÓGICOS ....................................................... 510
Reações do Tipo I (Anafilaxia) ................................................................. 510
Reações do Tipo II (Citotoxicidade Mediada por Anticorpo) .................... 511
Reações do Tipo III (Doenças Imunocomplexas) .................................... 512
Reações do Tipo IV (Reações Imunes Mediadas por Células) ............... 513
ENTIDADES DOENTIAS ESPECÍFICAS DE NATUREZA
IMUNOPATOLÓGICA ................................................................................... 513
Doenças Envolvendo Reações Anafiláticas ............................................ 513
Anafilaxia Sistêmica ........................................................................... 514
Choque Anafilático ....................................................................... 514
Reações Urticariformes ............................................................... 514
Alergia a Leite .............................................................................. 514
Reações Anafiláticas Localizadas ..................................................... 514
Rinite Alérgica .............................................................................. 514
Bronquite Alérgica ........................................................................ 515
Bronquiolite Alérgica .................................................................... 515
Infiltração Pulmonar com Eosinofilia (Síndrome IPE) .................. 515
Asma Alérgica .............................................................................. 515
Alergias Intestinais (Alergias Alimentares) .................................. 515
Dermatite Atópica ........................................................................ 516
Doenças Envolvendo Anticorpos Citotóxicos .......................................... 517
Anemia Hemolítica Auto-imune e Trombocitopenia ........................... 517
Anemia Hemolítica Auto-imune Hiperaguda ................................ 517
Anemia Hemolítica Auto-imune Aguda ........................................ 517
Anemia Hemolítica Auto-imune Crônica ...................................... 517
Aplasia Simples dos Glóbulos Vermelhos ................................... 517
Trombocitopenia Auto-imune ....................................................... 518
Doença (Hemolítica) Aglutinina Fria ............................................ 518
Desordens Cutâneas Auto-imunes .................................................... 519
Pênfigo Vulgar ............................................................................. 519
Pênfigo Foliáceo .......................................................................... 519
Penfigóide Bolhoso ...................................................................... 519
Miastenia Grave ................................................................................. 519
Doenças Envolvendo Imunocomplexos ................................................... 520
Glomerulonefrite ................................................................................ 520
Pneumonite de Hipersensibilidade .................................................... 520
Lúpus Eritematoso Sistêmico ............................................................ 520
Vasculite ............................................................................................. 521
Púrpura Hemorrágica ......................................................................... 521
Uveíte Anterior ................................................................................... 521
Artrite Reumatóide Canina ................................................................. 521
Sinovite Plasmacítica Linfocítica ........................................................ 522
Poliartrite Idiopática ........................................................................... 522
Periarterite Nodosa ............................................................................ 522
Meningite Imunomediada ................................................................... 522
Doenças Envolvendo a Imunidade Mediada por Células ........................ 523
Reações Granulomatosas ................................................................. 523
Coriomeningite Linfocítica .................................................................. 523
Sistema Imune 510

Hipersensibilidade de Contato ........................................................... 523


Tireoidite Auto-imune ......................................................................... 523
Adrenalite Auto-imune ....................................................................... 524
Ceratite Seca ..................................................................................... 524
Imunodeficiências .................................................................................... 524
Deficiências de Fagocitose ................................................................ 524
Deficiência de Adesão Leucocitária em Setter Irlandês .................... 525
Deficiências em Imunoglobulinas ...................................................... 525
Hipogamaglobulinemia Congênita ............................................... 525
Hipogamaglobulinemia Transitória .............................................. 526
Deficiências na Imunidade Mediada por Células ............................... 526
Doença de Imunodeficiência Combinada .......................................... 526
Deficiências de Complemento ........................................................... 526
Imunodeficiências Seletivas ............................................................... 526
Imunodeficiências Induzidas por Vírus .............................................. 527
Vírus da Imunodeficiência em Símios .......................................... 528
Vírus da Imunodeficiência Felina ................................................. 528
Vírus Semelhante ao da Imunodeficiência Bovina ...................... 528
Tumores do Sistema Imune ..................................................................... 528
Gamopatias .............................................................................................. 529
Policlonais .......................................................................................... 529
Monoclonais ....................................................................................... 529

MECANISMOS IMUNOPATOLÓGICOS
As respostas imunes normais são vitais na proteção do hospedeiro contra a
invasão de microrganismos, tecidos e substâncias estranhas. Entretanto, sob
certas circunstâncias, estas respostas normalmente protetoras, podem ter
efeito deletério sobre o hospedeiro; todas estas respostas adversas são
chamadas alérgicas ou de hipersensibilidade. As doenças auto-imunes ocorrem
como resultado da lesão tecidual causada pela reação imune específica do
hospedeiro a seus próprios tecidos. Há quatro situações em que o sistema
imune do hospedeiro danifica seus próprios tecidos: 1. Tipo I ou anafilática; 2.
Tipo II ou citotóxica; 3. Tipo III ou imunomediada e 4. Tipo IV ou mediada por
células. Além das quatro categorias clássicas de hipersensibilidade, podem
ocorrer outras desórdens do sistema imune, incluindo imunodeficiências, tumo-
res e gamopatias (ver págs. 523 a 529).

REAÇÕES DO TIPO I
(Anafilaxia)
São causadas por mediadores químicos farmacologicamente ativos liberados
de basófilos ou mastócitos. Os mediadores incluem histamina, leucotrienos, pros-
taglandinas, bradicininas e fatores quimiotácticos de eosinófilos. A liberação de
mediadores químicos pelos mastócitos acontece quando o antígeno (alérgeno) une-
se às molélulas específicas de anticorpos (reaginas) que estão presentes sobre a
membrana dos mastócitos.
Os anticorpos que medeiam as reações do Tipo I normalmente são da classe de
imunoglobulinas (Ig) E e menos comumente IgG. Estes anticorpos são produzidos
principalmente pelo tecido linfóide associado à mucosa. Os anticorpos IgE também
Mecanismos Imunopatológicos 511

são chamados reagínicos ou homocitotróficos devido à propensão a se ligar aos


mastócitos e aos basófilos. Muitos tipos de antígenos são capazes de induzir os
anticorpos reagínicos (por exemplo, soros, hormônios, enzimas, venenos, pólens,
polissacarídios complexos, média de contrastes de raios-X iodados, antibióticos e
outras drogas). Os anticorpos reagínicos, enquanto freqüentemente nocivos, prova-
velmente evoluíram como um mecanismo de defesa especializado contra infecções
parasitárias. Infelizmente, certos indivíduos super-reagem a antígenos não parasi-
tários pela produção de altos níveis de anticorpos reagínicos. A predisposição
genética para produzir altos níveis de tais anticorpos é conhecida como atopia.
A natureza do distúrbio clínico que ocorre após a interação de alérgenos e células
ligadoras de IgE varia de acordo com a dose de alérgenos, a rota pela qual o
alérgeno entra no corpo e a localização do revestimento de IgE dos mastócitos. A
reação alérgica pode afetar o sistema respiratório (rinite, espasmos bronquiais e
edema de laringe), o trato gastrointestinal (náusea, cólicas espasmódicas, vômito,
diarréia), sistema cardiovascular (vasodilatação intestinal e hepática) ou pele
(erupções cutâneas e urticária).

REAÇÕES DO TIPO II
(Citotoxicidade mediada por anticorpo)
As reações citotóxicas ocorrem como resultado da ligação de anticorpos IgG, IgM
ou IgA a antígenos na superfície das células do organismo ou associadas a
estruturas (receptores mioneurais, substância cimentante intracelular, etc.). O
complemento também pode participar da reação. Muitos tipos de células podem ser
danificados, mas as células sangüíneas parecem ser, particularmente suscetíveis
a lise imunomediada e fagocitose.
Está ainda obscuro por que um animal produz “auto-anticorpos” que reagem
contra seus próprios tecidos. Cogita-se que células clones produtoras de auto-
anticorpos são normalmente produzidas durante o tempo de vida de um animal,
mas estas são suprimidas pelos linfócitos. Em alguns distúrbios “auto-imunes”
parece haver uma deficiência de linfócitos supressores. Os linfócitos supressores
são importantes na regulação da resposta imune normal e uma de suas funções
é suprimir a produção de auto-anticorpos. Há fortes evidências de que muitas
desordens auto-imunes tenham uma predisposição genética. Fatores externos
(por exemplo, infecções virais) podem iniciar a produção de auto-anticorpos,
mas estes fatores são importantes apenas no caso de indivíduos geneticamente
predispostos.
Infecções virais agudas podem induzir alterações transitórias na imunorregulação
talvez pela destruição dos linfócitos T supressores, ou pela alteração do equilíbrio
relativo das diversas subpopulações de linfócitos reguladores, permitindo assim a
formação de auto-anticorpos. A anemia hemolítica auto-imune pós-viral e a trombo-
citopenia são observadas em pessoas e, ocasionalmente, em cães. Infecções virais
crônicas, tais como as infecções com o vírus da leucemia felina (VLF) e vírus da
imunodeficiência felina, também podem ser associadas a uma incidência mais
elevada do que o esperado de fenômenos auto-imunes. Da mesma forma, doenças
do sistema linfóide, em particular neoplasias linforreticulares, podem alterar a
imunorregulação normal. Fenômenos auto-imunes em tais casos freqüentemente
precedem outros sinais de tumor.
Alguns antígenos teciduais são profundamente escondidos na membrana celular
ou em outras áreas inacessíveis às células linfóides do hospedeiro. Devido à
natureza afastada destes antígenos, o sistema imune do hospedeiro pode não
reconhecê-los como “próprios” durante o desenvolvimento embrionário. Se estes
antígenos são desmascarados ou liberados após a vida embrionária, o hospedeiro
Mecanismos Imunopatológicos 512

pode reconhecê-los como estranhos e formar anticorpos contra eles. Com o


envelhecimento das hemácias, um “novo” antigeno superficial é exposto e elas são
destruídas por auto-anticorpos. Isto pode explicar o aparecimento transitório de
auto-anticorpos para constituintes celulares após infartos do miocárdio ou doença
hepática no homem.
Anticorpos de reação cruzada também podem danificar os tecidos hospedei-
ros. Certas proteínas e drogas microbianas são antigenicamente similares aos
antígenos do hospedeiro ou podem reagir com antígenos do hospedeiro e alterar,
antigenicamente, estas proteínas, por exemplo, antígenos estreptocócicos M que
estimulam a produção de anticorpos que reagem cruzadamente com as membra-
nas glomerular ou vascular normais basais. As neoplasias podem elaborar
antígenos embrionários ou neoantígenos que podem estimular anticorpos com
reação cruzada. As células hospedeiras também podem ser danificadas como
resultado de reações imunológicas ocorridas em outros locais: o primeiro compo-
nente do complemento liga-se ao complexo antígeno-anticorpo, mas por razões
inexplicáveis, o restante dos componentes do complemento pode se ligar a
tecidos normais do hospedeiro, que são destruídos por lise ou fagocitose
complemento-mediada.
Agentes microbianos podem infectar certos tecidos e conseqüentemente foca-
lizar a resposta imune do hospedeiro naquele tecido. Babesia e Haemobartonella
spp podem parasitar eritrócitos e a destruição das células e a anemia podem resultar
de ataque imune do hospedeiro às células parasitadas.

REAÇÕES DO TIPO III


(Doenças imunocomplexas)
Estas reações ocorrem como resultado da localização de complexos antíge-
no-anticorpo em tecidos, normalmente nas paredes de vasos. Os pré-requisitos de
tais doenças são uma fonte contínua de antígeno circulante e uma produção
contínua de anticorpos. Quando os níveis de antígenos circulantes e anticorpos
atingem concentrações críticas, são produzidos complexos antígeno-anticorpo de
tamanho intermediário. Os complexos menores são solúveis e passam através das
paredes vasculares, enquanto os complexos maiores são removidos pelo sistema
reticuloendotelial. Os complexos de tamanho intermediário têm uma tendência a
passar através dos espaços celulares endoteliais, mas ficam aprisionados próximos
à membrana basal. O complemento que está ligado aos complexos atrai
quimiotaxicamente as células polimorfonucleares ou macrófagos para a área; os
complexos são ingeridos por estas células e, como resultado, mediadores inflama-
tórios são liberados e danificam os tecidos adjacentes.
Um número de condições pode levar a doenças imunocomplexas: 1. infecções
– crônicas, persistentes, baixo grau, virais, bacterianas, fúngicas, protozoárias, ou
parasitárias; 2. malignidade – neoplasias, principalmente neoplasias linforreticulares;
3. desordens “auto-imunes” – por exemplo, doenças imunocomplexas são parte
importante no lúpus eritematoso sistêmico (LES); 4. doença do soro – o resultado
do uso terapêutico de soro heterólogo; 5. reação a drogas – várias drogas,por
exemplo, lincomicina, eritromicina, sulfonamidas, trimetoprim-sulfonamida e alguns
hormônios parecem induzir a formação de imunocomplexos em uma pequena
porção dos animais tratados. Ao que parece, drogas ou seus metabólitos fazem isto
por agirem como antígenos ou haptenos (pequenas moléculas antigênicas que são
capazes de induzir uma resposta de anticorpo quando combinadas com proteínas
maiores do hospedeiro). Os haptenos podem combinar-se com substâncias do
hospedeiro para produzir novos antígenos; os anticorpos produzidos não reagem
apenas com o complexo hapteno, mas também com a substância corporal associa-
Entidades Doentias Específicas de Natureza Imunopatológica 513

da. Drogas, como o propiltiouracil, podem, algumas vezes, alterar a imunorregulação


normal e induzir uma doença semelhante ao lúpus eritematoso sistêmico; e 6.
idiopática – em muitos casos, a origem do antígeno e, portanto a causa da doença,
não é identificável.
As manifestações clínicas da doença imunocomplexa são extremamente
variáveis. A reação de Arthus resulta de formação local de imunocomplexos; se
os complexos são depositados principalmente nos glomérulos, a glomerulone-
frite é a apresentação clínica primária. A sinovite é um resultado da deposição
sinovial. A pneumonite ocorre se os complexos forem depositados nos alvéolos.
Erupções dérmicas resultam da deposição nos vasos da derme. A vasculite
resulta da deposição nas paredes de pequenas artérias. Meningite, miopatia,
mielopatia, neuropatia ou hemorragias localizadas podem ser seqüelas adicio-
nais da doença imunocomplexa. Em qualquer indivíduo, a doença imunocomplexa
pode envolver qualquer um ou uma combinação dos importantes órgãos
anteriormente citados.

REAÇÕES DO TIPO IV
(Reações imunes mediadas por células, Hipersensibilidade tardia)
O exemplo mais familiar é a reação induzida pela tuberculina na pele de
indivíduos sensibilizados, pela injeção intradérmica de uma proteína derivada da
micobactéria. A reação cutânea ocorre como resultado da interação de linfócitos
derivados do timo, com o antígeno sensibilizante. A reação tecidual é um resultado
de linfocinas elaboradas pelos linfócitos sensibilizados. As linfocinas podem ser
citotóxicas às células-alvo específicas, ativam macrófagos tornando-os citotóxicos,
inibem a movimentação dos macrófagos para fora da área e causam a transforma-
ção de pequenos linfócitos em grandes células blásticas basofílicas. Este tipo de
reação focaliza a atividade macrofágica no local de invasão do antígeno e, portanto,
é extremamente efetiva no combate a várias infecções microbianas. Também é
importante na destruição de alguns tumores e tecidos estranhos enxertados. Uma
reação Tipo IV persistente e descontrolada, geralmente a patógenos intracelulares
ou material estranho, pode causar granulomas extensos.

ENTIDADES DOENTIAS ESPECÍFICAS DE


NATUREZA IMUNOPATOLÓGICA
As entidades doentias específicas com uma base imune têm sido mais bem
caracterizadas em espécies animais de companhia e de laboratório. Exceto pela
relativa freqüência destes vários distúrbios entre as espécies, as manifestações
clínicas e o tratamento normalmente são similares, não importando a espécie.

DOENÇAS ENVOLVENDO REAÇÕES ANAFILÁTICAS


(Reações do Tipo I, Atopia)
As reações do Tipo I são sistêmicas ou locais. A injeção de antígenos sensibili-
zantes (alérgenos) diretamente na corrente sangüínea pode resultar em choque
anafilático ou reações mais focais (urticária, erupções cutâneas, edema facial
conjuntival). Se o alérgeno sensibilizante penetrar nas membranas mucosas ou na
pele, ocorrem normalmente reações mais localizadas.
Entidades Doentias Específicas de Natureza Imunopatológica 514

Anafilaxia sistêmica
(Reações anafiláticas generalizadas)
O choque anafilático ocorre em animais sensibilizados após a injeção parente-
ral de vacinas ou drogas, ingestão de alimentos ou após picadas de insetos. Os
sinais clínicos ocorrem alguns segundos após a entrada do alérgeno na circulação.
Este período latente é o tempo requerido para o alérgeno ligar-se aos mastócitos
sensibilizados e para que os mediadores vasoativos sejam liberados. No homem e
na maioria dos animais domésticos, os pulmões são o órgão-alvo primário e a
vascularização mesentérica portal é secundária; o inverso ocorre em cães. A
degranulação de mastócitos na vasculatura pulmonar causa constrição das vias
aéreas bronquiais ou das veias pulmonares e acúmulo de sangue no leito vascular
pulmonar, o que resulta em dispnéia severa. A degranulação de mastócitos na
vasculatura portossistêmica causa dilatação venosa e acúmulo de sangue no
intestino e no fígado, o que resulta em choque, agitação, cólica, náusea, hipersalivação,
dispnéia, cianose, e nos casos severos, morte.
O choque anafilático é tratado com uma injeção EV de adrenalina para neutralizar
a constrição bronquial e vasodilatação mesentérica portal. Pode ser necessário
suporte auxiliar de pressão sangüínea e respiração. Devido ao início hiperagudo dos
sinais, os anti-histamínicos são de pequeno benefício terapêutico. Os anti-
histamínicos são mais efetivos no tratamento de infecções urticariformes e edema
facial conjuntival, mas mesmo nestes casos eles são mais eficazes se usados para
prevenir ataques em animais que tenham predisposição alérgica conhecida.
Reações urticariformes (urticária ou placas angiodematosas) da pele, tecido
subcutâneo, edema agudo dos lábios, conjuntiva e pele da face (edema angioneurótico
facial conjuntival) são manifestações menos severas de uma reação alérgica
sistêmica. Urticária é a última reação severa e raramente está associada com outras
anormalidades clínicas. O edema facial conjuntival é mais severo e pode estar
associado com anafilaxia sistêmica leve a moderadamente severa. Estas reações
em geral se seguem à administração de vacinas ou drogas, ingestão de certos
ingredientes alimentares ou a picada de insetos (ver SARNA EM CAVALOS, pág. 974;
DERMATITE pág. 951 e URTICÁRIA pág. 1051). Reações urticariformes e edema facial
conjuntival ocorrem na maioria das espécies e em geral resolvem-se espontanea-
mente dentro de 24h.
A alergia a leite ocorre ocasionalmente em vacas e menos freqüentemente em
éguas, quando atraso da ordenha ou rápido desmame aumenta a pressão
intramamária a ponto dos componentes do leite, notadamente a caseína, terem
acesso à circulação; estas proteínas “estranhas” induzem uma hipersensibilidade
do Tipo I que pode ser localizada ou sistêmica. A recuperação é imediata desde que
a glândula seja esvaziada.

Reações anafiláticas localizadas


A rinite alérgica, manifestada por descarga nasal serosa e espirros, é menos
comum em outros animais que no homem. Freqüentemente é sazonal, correlacio-
nada com a exposição ao pólen. A rinite não sazonal pode ser relacionada à
exposição a alérgenos ubíquos, tais como escaras do couro cabeludo, mofo da
cama e ingredientes alimentares. A doença pulmonar obstrutiva crônica em cavalos
(ver pág. 888) pode ser uma seqüela de alergias respiratórias de baixo grau.
“Summer snuffles” é uma rinite alérgica sazonal que ocorre comumente em bovinos
guernsey ou jersey que se encontram em certos tipos de pastos floridos no final do
verão e início do outono. Uma tentativa para se diagnosticar a rinite alérgica pode
ser feita pela identificação de eosinófilos no exsudato nasal, uma resposta favorável
aos anti-histamínicos, desaparecimento dos sinais quando o alérgeno ofensivo é
Entidades Doentias Específicas de Natureza Imunopatológica 515

removido ou ocasionalmente, pela sua natureza sazonal. Diferente do que acontece


no homem, o teste cutâneo não é um método preciso para diagnosticar as alergias
nasais nos animais.
A bronquite alérgica crônica tem sido melhor caracterizada nos cães. Observa-
se uma tosse seca, áspera, picada, que é facilmente precipitada pelo esforço ou
pressão sobre a traquéia. A doença pode ser sazonal ou ocorrer ao longo de todo
o ano. Normalmente não está associada a outros sinais de doença. O exsudato
bronquial é rico em eosinófilos e livre de bactérias. Radiografias do tórax são
normais e pode ou não haver um baixo grau de eosinofilia periférica. A condição é
tratada com preparações que contêm dilatadores e expectorantes bronquiais
(aminofilina e iodeto de potássio ou guaifenesina), que ajudam na remoção do muco
espesso e tenaz. Os glicocorticóides são dramaticamente efetivos, em especial
quando seu uso pode ser limitado a certas estações ou a baixas doses em terapia
em dias alternados. A prevenção do(s) alérgeno(s) ofensivo(s) normalmente não é
possível, porque só raramente ele é identificável.
A bronquiolite alérgica é mais comum em gatos. Manifesta-se por uma tosse
discreta, respiração difícil, dispnéia, aumento da densidade peribronquiolar à
radiografia, podendo ser confundida com outras patologias (asma alérgica ou
dirofilariose). Responde bem a doses moderadas a elevadas de corticosteróides,
mas a cura é rara. O alérgeno causador geralmente não é identificado.
A infiltração pulmonar com eosinofilia (síndrome IPE) ocorre mais freqüen-
temente no cão, mas tem sido reconhecida em todas as espécies. Está associada a
infiltrados inflamatórios difusos nos pulmões e uma pronunciada eosinofilia peri-
férica; freqüentemente as globulinas séricas estão elevadas. Diferente da bronquite
alérgica, os animais afetados estão freqüentemente dispnéicos ou facilmente
cansados com exercício. O exsudato bronquial difuso contém numerosos eosinó-
filos. O alérgeno ofensor específico normalmente não é descoberto. Os glicocor-
ticóides são o tratamento de escolha. Uma síndrome semelhante à IPE é também
associada a infecções parasitárias dos pulmões, residentes ou migratórias.
A asma alérgica é menos comum entre os outros animais além do homem.
Entre os animais é mais freqüente em gatos, nos quais a sintomatologia é similar
àquela dos homens. Ocorre mais freqüentemente no verão e após o exercício;
ataques individuais podem ser transitórios e suaves ou prolongados e severos
(estado asmático). Ataques suaves podem se manifestar como respiração difícil e
tosse, enquanto em ataques severos pode haver dispnéia expiratória, hiperinflação
dos pulmões, aerofagia, cianose e tentativas frenéticas de obter ar.
As alergias intestinais (alergias alimentares) são relativamente comuns em
cães e gatos, principalmente filhotes. Gastrite alérgica manifesta-se por vômitos,
que ocorre 1 a > 12 vezes por semana, 1 a 2h após a alimentação. O vômito pode
ser bilioso. Os cães também podem evacuar intermitentemente; em gatos, o
vômito pode ser o único sinal. Gatos e cães com gastrite alérgica geralmente são
normais, exceto pelo vômito, embora em casos severos possa haver perda de peso
e da condição da pelagem. Enterite alérgica está associada com uma inflamação
leve do intestino delgado, mas com discreta eosinofilia ou não. As fezes geralmente
são normais em volume e freqüência, mas a consistência varia de pastosa a aquosa.
As fezes podem ser extremamente fétidas, principalmente em gatos. Animais
afetados podem ser excessivamente magros, apesar do bom apetite. Lesões
cutâneas e pelame rarefeito estão normalmente associados com alergias alimenta-
res em gatos, mas menos comumente em cães. A alergia geralmente segue uma
enterite viral, bacteriana ou protozoária (um fenômeno conhecido como “descobri-
dor da alergia”). Alergia alimentar pode ser uma causa de diarréia em leitões recém-
desmamados, embora esta evidência não seja clara; a diarréia geralmente é tratada
como uma infecção e não como uma alergia. A enterite eosinofílica é a mais severa
Entidades Doentias Específicas de Natureza Imunopatológica 516

das doenças intestinais alérgicas. Manifesta-se por inflamação moderada a severa


do intestino e uma eosinofilia marcante. Diarréia, perda de peso e pelame pobre,
geralmente são evidentes. Colite alérgica é rara em cães, mas comum em gatos; em
cães está freqüentemente associada com evacuação freqüente e mole, fezes
mucosas e às vezes sanguinolentas; em gatos, manifesta-se mais freqüentemente
por fezes normais, revestidas ou manchadas com sangue fresco.
Tanto o diagnóstico como o tratamento de alergias intestinais são feitos por meio
de uma dieta estritamente controlada. No cão isto significa alimentos pobres em
proteínas e que contenham o mínimo possível de ingredientes. Uma dieta básica de
arroz, ricota (ou tofu) e carne de carneiro, suplementados com vitaminas e minerais
é uma boa dieta inicial. Quando os sinais (normalmente a diarréia) tiverem desapa-
recido, podem ser introduzidos alimentos adicionais na dieta, um de cada vez.
Felizmente, também estão disponíveis prescrições dietéticas comerciais. Doses
baixas de glicocorticóides administradas diariamente ou dia sim, dia não, também
podem prover excelente alívio para os cães que não podem ser ajudados pelas
alterações dietéticas. A enterite alérgica no gato é tratada por uma alimentação
exclusivamente de proteínas da carne. Carne moída de peru e de cordeiro cozidas
são bons alimentos hipoalergênicos. Se os gatos não forem também alérgicos a
estes alimentos, pode ocorrer melhora dramática nas fezes, peso, qualidade do
pelame e lesões cutâneas em 1 a 2 semanas. Uma vez que ocorra uma resposta,
novos alimentos são introduzidos, um de cada vez, em intervalos de 2 semanas ou
mais. Filhotes com alergias alimentares freqüentemente se recuperam, enquanto
animais mais velhos podem necessitar de dietas hipoalérgenas por toda vida.
A dermatite atópica é um distúrbio cutâneo pruriginoso crônico que ocorre em
várias espécies, mas tem sido mais extensamente estudada no cão. Os animais com
dermatite atópica têm uma predisposição genética que leva à produção excessiva de
anticorpos reagínicos (IgE). Estima-se que , 10% de todos os cães sofram de atopia,
mas a incidência é mais alta em dálmatas e terriers. A dermatite atópica dos cães com
freqüência é decorrente da inalação de alérgenos, por exemplo, pólens, mofos, escaras
do couro cabeludo. Diferente do homem (no qual as membranas mucosas, respira-
tória e conjuntival são os tecidos-alvo usuais) nos cães, a pele é o tecido-alvo. Em
gatos, os alérgenos alimentares são provavelmente a causa mais comuns de lesões
cutâneas que alérgenos inalados. Sarna doce (ver pág. 974) é uma dermatite alérgica
sazonal de cavalos, associada com picadas de certos insetos, principalmente Culicoides
que se alimentam à noite. Lesões intensamente pruriginosas aparecem ao longo do
dorso das orelhas até a cauda e área perianal. Reações cutâneas alérgicas, similares
à picada de insetos, podem ser observadas nas orelhas e face de cães e gatos.
Cães atópicos freqüentemente coçarão muito suas patas e axilas. Transpiração
excessiva é especialmente notável nas áreas menos recobertas por pêlos. As
lesões da pele são muito aumentadas em severidade pela lambedura, coçadura e
infecções bacterianas secundárias. Lesões cutâneas atópicas em gatos são miliares
(pequenas escaras) e muito espraiadas ou maiores e mais localizadas. As lesões
localizadas são freqüentemente pruriginosas.
O tratamento consiste na identificação do alérgeno ofensor pelo teste cutâneo
intradérmico e sua eliminação (ou prevenção) sempre que possível. O teste cutâneo
(pág. 941) é muito menos seguro para se detectar o alérgeno ofensor em gatos do
que em cães. A reação “pustular e flamejante” vista quando o alérgeno ofensor é
injetado na derme é uma manifestação focal do estado alérgico. A hipossensibiliza-
ção é efetiva em , 60% dos cães com dermatite atópica; esta consiste da injeção
IM de uma quantidade apropriada de alérgenos ofensores em intervalos mensais,
até que seja notada a melhora. Se a hipossensibilização falhar ou não for utilizada,
a terapia em dias alternados com glicocorticóides será benéfica. Os anti-histamínicos
são de efetividade mínima.
Entidades Doentias Específicas de Natureza Imunopatológica 517

DOENÇAS ENVOLVENDO ANTICORPOS CITOTÓXICOS


(Reações do Tipo II)
A anemia hemolítica auto-imune ( AHAI,ver pág. 24), e a trombocitopenia
(ver pág. 67) são as duas reações do Tipo II mais comuns.Podem estar asso-
ciadas ao lúpus eritematoso sistêmico (LES [mais comum em cães]) ou às
malignidades linforreticulares (mais comuns em cavalos e gatos). Drogas,
vacinas ou infecções também podem precipitar ataques de anemia hemolítica
ou trombocitopenia na maioria das espécies. Freqüentemente, entretanto, a
causa é desconhecida. A condição tem 4 formas básicas: hiperaguda, aguda ou
subaguda, crônica e aplasia simples de hemácias. A maioria das formas é
tratável e recidivas são raras.
A anemia hemolítica auto-imune hiperaguda é observada principalmente em
cães de meia-idade e de raças grandes. Os cães afetados ficam muito deprimidos
e dentro de 24 a 48h há uma grande diminuição de hematócrito com bilirrubinemia,
icterícia variável e às vezes hemoglobinúria. Inicialmente a anemia não é responsi-
va, mas torna-se responsiva dentro de 3 a 5 dias. Trombocitopenia e fenômenos
trombóticos podem acompanhar esta condição. O teste de Coombs freqüentemente
é negativo, esferócitos podem ou não estar presentes e ocorre marcante aglutinação
de eritrócitos. A auto-aglutinação não é dispersada pela solução salina, daí o termo
anemia hemolítica com aglutininas salinas. O soro geralmente contém auto-
anticorpos que causam aglutinação da maioria das hemácias do doador (inclusive
heteroespécies). O prognóstico da anemia hemolítica auto-imune hiperaguda é
ruim, mesmo com uma terapia rápida e vigorosa. A terapia mais efetiva é iniciar
imediatamente com altas doses de glicocorticóides associados à ciclofosfamida.
Transfusões com sangue incompatível devem ser evitadas, se possível. Se o
sangue incompatível for usado, o animal deve primeiro ser heparinizado e mantido
com heparina nos primeiros 10 dias. Mesmo sem a transfusão, a heparinização pode
ser benéfica nas primeiras 2 semanas ou mais.
A anemia hemolítica auto-imune aguda é a forma mais comum da doença, com
uma predileção racial por cocker spaniels. Os sinais iniciais são normalmente
palidez de fadiga e, menos comumente, icterícia. É proeminente a hepatospleno-
megalia e a anemia é com freqüência bastante responsiva no início. A contagem de
leucócitos freqüentemente estará elevada devido à hiperplasia da medula óssea. A
auto-aglutinação de eritrócitos é incomum e o teste de Coombs é geralmente
positivo. Estes animais geralmente respondem bem à terapia com glicocorticóides.
Se uma resposta favorável não for observada dentro de 7 a 10 dias, devem-se
adicionar drogas citotóxicas (ciclofosfamida ou azatioprina) ao regime.
A anemia hemolítica auto-imune crônica difere da forma aguda porque o
hematócrito cai para um nível constante e aí permanece por semanas ou meses. Em
geral, a anemia é responsiva no início da doença, passando a minimamente
responsiva ou totalmente não responsiva até que se torna grave. A medula óssea
é normal ou hiper-responsiva e o teste de Coombs freqüentemente é negativo. A
anemia hemolítica auto-imune crônica é relativamente mais comum em gatos que
em cães. Os animais são tratados inicialmente com glicocorticóides; se não houver
resposta dentro de 2 semanas, devem-se adicionar drogas citotóxicas ao regime.
A aplasia simples dos glóbulos vermelhos é uma variação das desordens
anteriores e é mais comum em cães. Ocorre em 2 formas, uma em filhotes
desmamados a adolescentes e a outra em adultos. Diferente do que ocorre na
anemia hemolítica auto-imune aguda, a medula óssea mostra uma depressão
seletiva dos elementos eritróides; granulócitos e plaquetas não são afetados.
Portanto, a anemia periférica não é responsiva. O ataque imune aparentemente é
direcionado aos precursores dos glóbulos vermelhos e o teste de Coombs geral-
Entidades Doentias Específicas de Natureza Imunopatológica 518

mente é negativo. Entretanto, freqüentemente há alguma dificuldade em se identi-


ficar doadores compatíveis. O tratamento normalmente é semelhante ao da anemia
hemolítica auto-imune crônica.
A trombocitopenia auto-imune é comum, especialmente em cães.É mais
comum em fêmeas do que em machos. Os sinais clínicos mais freqüentes são
hemorragias da pele e membranas mucosas. Melena, epistaxe e hematúria podem
acompanhar o quadro e causar anemia profunda. A anemia hemolítica e a tromboci-
topenia ocorrem, algumas vezes, juntas. A trombocitopenia auto-imune normalmente
é diagnosticada com base na baixa contagem de plaquetas periféricas em face de
uma megacariocitose pronunciada na medula. Ocasionalmente, entretanto, os
megacariócitos podem estar seletivamente ausentes da medula. Esta condição é
análoga à aplasia simples das hemácias. Os testes para anticorpos antiplaquetários
são difíceis de conduzir e podem ser positivos em apenas 70% dos casos ou menos.
O diagnóstico geralmente é feito com base nos sintomas clínicos e na resposta à
terapia e não nos testes de anticorpo antiplaquetário.
Animais com trombocitopenia auto-imune, que apresentam apenas hemorragias
petequiais e ecmóticas, sem uma significante perda de sangue e megacariócitos na
medula, geralmente são tratados no início apenas com glicocorticóides. Os sinais
clínicos devem desaparecer e a contagem plaquetária começa a subir em 5 a 7 dias.
Se a contagem plaquetária não aumentar significantemente em 7 a 10 dias, então
podem-se adicionar ciclofosfamida, azatioprina ou vincristina aos glicocorticóides.
Nos animais com megacariócitos na medula e severa perda sangüínea, deseja-se
uma resposta mais rápida à terapia.Tais animais são tratados com uma única
injeção de vincristina, associada com glicocorticóides diários; uma resposta favorá-
vel geralmente ocorre depois de 3 a 5 dias. Se a perda sangüínea puser em risco
a vida, deve-se administrar sangue total rico em plaquetas. Se a contagem
plaquetária tiver aumentado até o sétimo dia, não se deve administrar uma segunda
dose de vincristina e a remissão deve ser mantida apenas com glicocorticóides. Se
não houver resposta dentro de 7 dias, deve-se administrar uma segunda dose de
vincristina. Se a contagem plaquetária, ainda estiver baixa dentro de 2 semanas,
a vincristina é descontinuada e adiciona-se ciclofosfamida ou azatioprina. Animais
com trombocitopenia e sem megacariócitos respondem muito mais lentamente aos
glicocorticóides ou aos glicocorticóides e à vincristina. O tratamento de escolha para
estes animais é com prednisolona e ciclofosfamida, e não se deve esperar uma
resposta muito antes de 1 a 2 semanas após iniciada a terapia. A terapia pode ser
descontinuada na maioria dos animais com trombocitopenia auto-imune, 1 a 3
meses depois que a contagem plaquetária retornar ao normal. Alguns animais têm
trombocitopenia mais ou menos persistente em face da terapia com drogas ou
podem ser mantidos em remissão apenas com tratamento crônico em altas doses.
Nestes casos, deve-se permitir que o animal sobreviva com a trombocitopenia, se
os sinais forem mínimos ou utilizar uma combinação terapêutica de longa duração
com glicocorticóides e vincristina, azatioprina ou ciclofosfamida. A esplenectomia
pode ser útil; raramente é curativa por si só, mas pode permitir o uso de doses
menores e mais seguras de drogas imunossupressoras.
A doença (hemolítica) aglutinina fria é um tipo de anemia hemolítica auto-imune
que tem sido reconhecida mais freqüentemente em cães e cavalos. A desordem é
freqüentemente idiopática, mas pode ocorrer secundariamente a uma infecção
crônica, outras doenças auto-imunes ou um processo neoplásico. Os auto-anticor-
pos IgM podem ser aglutinantes ou não aglutinantes. A aglutinação completa não é
vista à temperatura corporal, mas preferivelmente, a baixas temperaturas. A doença
é mais freqüente em climas frios e durante períodos frios do ano. Os sinais iniciais
podem ser de uma doença hemolítica; ou no tipo aglutinante, também pode haver
estase microcapilar com subseqüente acrocianose e necrose do nariz, pontas das
Entidades Doentias Específicas de Natureza Imunopatológica 519

orelhas e cauda, dígitos, escroto e prepúcio. O diagnóstico é baseado na auto-


aglutinação reversível que ocorre apenas em temperaturas baixas. A reação direta
de Coombs é normalmente negativa para IgG, freqüentemente positiva para C3 e
normalmente positiva para IgM, se a reação for efetuada no frio. A mortalidade
associada é alta. Na ausência de distúrbios precipitantes (por exemplo, infecção
ou neoplasia), a doença é melhor controlada com altas doses de glicocorticóides
usadas em combinação com a ciclofosfamida. A ciclofosfamida é retirada quando
a anemia desaparece e as aglutininas “frias” não são mais detectadas.
Desordens cutâneas auto-imunes – pênfigo vulgar e a condição variante, o
pênfigo foliáceo, são doenças cutâneas imunológicas que envolvem anticorpos
dirigidos contra as substâncias cimentadas intracelulares na camada celular basal,
o que resulta em separação das células epidérmicas (acantólise). O pênfigo vulgar é
relativamente incomum, mas tem sido descrito em cães. Caracteriza-se por lesões
bolhosas ao longo das junções mucocutâneas da boca, ânus, prepúcio, vulva e na
cavidade oral. Outras áreas da pele são apenas levemente envolvidas. Devido à
epiderme dos animais ser relativamente fina (quando comparada com a pele huma-
na), as bolhas rompem-se rapidamente e formam erosões; conseqüentemente, as
bolhas características são raramente vistas. As bolhas ocorrem como resultado da
acantólise suprabasilar. A infecção bacteriana secundária freqüentemente complica
as lesões, e se deixada sem tratamento, o distúrbio é freqüentemente fatal. O pênfigo
vulgar é tratado com altas doses de glicocorticóides isolados ou em associação com
outras drogas, tais como ciclofosfamida, azatioprina ou sais de ouro. A doença é difícil
de se manter em remissão e o prognóstico a longo prazo é claramente ruim.
O pênfigo foliáceo é mais comum em cães do que em gatos e cavalos.
Caracteriza-se clinicamente por erosões, ulcerações e incrustações espessas da
pele e junções mucocutâneas. A ausência de lesões na boca e a natureza áspera,
geralmente grossa das lesões da pele tendem a diferenciá-lo do pênfigo vulgar.
Como no pênfigo vulgar, os auto-anticorpos estão presentes na pele e reagem com
a substância cimentante intracelular. Estes auto-anticorpos separam as camadas
celulares cornificadas das não cornificadas. Altas doses de glicocorticóides são
usadas inicialmente, mas baixas doses, em terapias em dias alternados, são usadas
desde que a doença esteja sob controle. Drogas imunossupressoras mais potentes,
tais como ciclofosfamida ou a azatioprina são usadas com os glicocorticóides em
casos que não respondam a esteróides. Sais de ouro juntamente com baixas doses
de glicocorticóides auxiliam, algumas vezes, na manutenção da remissão em
animais, quando apenas os esteróides não são eficazes. Animais que respondem
mal à terapia inicial, ou requerem altas dosagens de drogas para controlar lesões,
têm um prognóstico ruim a longo prazo.
O penfigóide bolhoso tem sido reconhecido em cães, mais freqüentemente em
collies e doberman pinschers. As lesões são com freqüência bastante espraiadas,
mas tendem a se concentrar na virilha. A pele envolvida assemelha-se a uma
escaldadura grave. As bolhas também podem ser vistas; são subepidérmicas e
podem estar repletas de eosinófilos. Os auto-anticorpos para as proteínas da lâmina
basal são vistos em secções em lâmina por anticorpos fluorescentes. O tratamento de
escolha é prednisolona e a azatioprina usadas em associação. A remissão é freqüen-
te, mas a terapia contínua com drogas em dosagens relativamente altas pode ser
necessária para manter a doença sob controle. O prognóstico a longo prazo é ruim.
A miastenia grave (forma adquirida) ocorre em cães, e menos comumente em
caprinos e gatos. Os animais afetados produzem auto-anticorpos para os recepto-
res de acetilcolina, que se unem ao receptor e provocam a redução da acetilcolina;
as manifestações clínicas mimetizam aquelas produzidas pelo curare. Extrema
fraqueza muscular generalizada, acentuada pelo exercício leve, é comum na
miastenia grave. Megaesôfago é uma enfermidade primária ou acompanhando
Entidades Doentias Específicas de Natureza Imunopatológica 520

doenças nos cães. Timomas estão freqüentemente associados com a miastenia


grave no homem, mas são raros em outros animais. A administração de
anticolinesterase de curta duração (cloreto de edrofônio) produz um dramático
aumento da força muscular. O tratamento é com anticolinesterase de longa duração.
Terapia com drogas imunossupressivas crônicas para esta doença é lógica e deve
ser investigada. Auto-anticorpos para receptores da acetilcolina podem ser detec-
tados no soro dos animais afetados, utilizando-se procedimento indireto de anticor-
pos fluorescentes com o músculo normal como substrato.

DOENÇAS ENVOLVENDO IMUNOCOMPLEXOS


(Reações do Tipo III)
Os distúrbios imunocomplexos estão entre as doenças imunológicas mais
comuns. Podem ser idiopáticos ou de origem secundária. O local de deposição dos
complexos imunes determina a natureza da doença.
A glomerulonefrite (ver pág. 1066) é causada pela deposição de complexos
antígeno-anticorpo na superfície subendotelial ou subepitelial da membrana basal
do glomérulo. A glomerulonefrite secundária ocorre como um efeito colateral de um
distúrbio imunológico neoplásico ou infeccioso crônico. Animais com glomerulone-
frite idiopática (> 50% dos casos) geralmente têm sinais de doença renal, enquanto
a glomerulonefrite secundária com freqüência representa uma parte relativamente
menor de uma doença mais séria.
A pneumonite de hipersensibilidade é causada pela deposição de imunocom-
plexos nos alvéolos; é mais comum em grandes animais expostos a partículas
antigênicas. Os antígenos mais potentes deste tipo são aqueles contidos nos
esporos de actinomicetos termofílicos de feno mofado. A inalação destes esporos
causa a doença do pulmão do fazendeiro em homens e uma pneumonia atípica em
bovinos (ver pág. 879). Caracteriza-se pelo início de deficiência respiratória 4 a 6h
após a exposição ao feno mofado. O tratamento mais eficaz é a remoção da fonte
do antígeno. Por outro lado, a esteroidoterapia pode ser eficaz.
O lúpus eritematoso sistêmico (LES) ocorre em cães, menos comumente em
gatos e raramente em grandes animais. Possui 2 formas imunológicas; imunocom-
plexos e uma sensibilidade a anticorpos aumentada, com uma tendência a produzir
auto-anticorpos. Portanto, é uma combinação das doenças do Tipo II e III. Os
anticorpos para ácido nucleico são a marca registrada do LES, mas em alguns
indivíduos, anticorpos para eritrócitos, plaquetas, linfócitos, fatores de coagulação,
imunoglobulinas (fatores reumatóides) e tireoglobulina também podem estar pre-
sentes. Estes auto-anticorpos, em particular aqueles para ácido-nucleico, não são
sempre patogênicos por si só. Apesar disso, eles devem ser considerados marca-
dores da doença. Embora combinações de auto-anticorpos e antígenos próprios
possam contribuir para a quantidade total de imunocomplexos, eles não são a única
fonte de imunocomplexos. Normalmente, tanto os imunocomplexos como os
aspectos de auto-anticorpos da doença predominam num dado animal. Deposição
de imunocomplexos ao redor de pequenos vasos sangüíneos leva a sinovite,
reações dérmicas, erosões e úlceras orais, miosite, neurite, meningite, arterite,
mielopatia, glomerulonefrite e pleurite. A glomerulonefrite é uma das maiores
complicações com risco de vida do LES no homem e em gatos, mas não em cães.
Psicose, um sinal importante do LES no homem, é observado principalmente em
gatos. Anemia hemolítica auto-imune e/ou trombocitopenia são as manifestações
de auto-anticorpo mais comuns do LES em animais.
O LES é caracterizado pela presença de anticorpos antinucleares (ANA) e testes
para estes ou para células LE associadas, podem ajudar no diagnóstico. Entretanto,
alguns animais saudáveis podem ter ANA, e nem todos animais com LES apresen-
Entidades Doentias Específicas de Natureza Imunopatológica 521

tam ANA detectáveis. O diagnóstico do LES deve ser baseado na síndrome clínica
inteira e não apenas na presença ou ausência de ANA.
O LES normalmente pode ser tratado com glicocorticóides. Inicialmente, eles são
usados em elevadas doses diárias e, quando ocorre a remissão, é usada a terapia
em baixas doses em dias alternados. O tratamento com drogas deve ser continuado
por pelo menos 2 a 3 meses após todos os sinais clínicos terem desaparecido. A
ciclofosfamida ou a azatioprina ou ambas são usadas em combinação com glicocor-
ticóides em animais com LES que sejam difíceis de controlar somente com
glicocorticóides.
A vasculite mediada por imunocomplexos é comum em animais, principalmente
cães e eqüinos. As lesões são mais prevalecentes na derme das porções distais dos
membros e membranas mucosas da boca, principalmente o palato e a língua (cães)
e o lábio (eqüinos). O envolvimento do nariz, orelhas, pálpebras, córnea e ânus é
menos comum. As lesões iniciais são áreas avermelhadas que crescem rapidamen-
te das erosões superficiais. Uma crosta forma-se rapidamente sobre as erosões
dérmicas. Edema dos membros é comum em eqüinos e um sinal igualmente
resplandecente porém menos freqüente em cães. A vasculite é um sinal do LES em
alguns animais, mas mais freqüentemente é idiopática. Vasculite induzida por
drogas tem sido bem reconhecida em cães. A vasculite é detectada pelo exame
histopatológico e imuno-histopatológico de biópsias superficiais e profundas, obti-
das das margens das lesões.
A vasculite é tratada pela retirada das drogas ofensivas (se estas forem implicadas na
causa) ou pela terapia com drogas imunossupressoras. Os glicocorticóides usados
isoladamente ou associados com outros agentes, tais como azatioprina ou ciclofos-
famida, são normalmente usados para tratar casos não induzidos por drogas (ver
também PERIARTERITE NODOSA, adiante).
A púrpura hemorrágica de eqüinos é uma forma de púrpura não trombocitopê-
nica (ver pág. 70), que freqüentemente é uma seqüela de infecção respiratória
precoce por Streptococcus equi; é mediada por complexos imunes de IgA e antígeno
estreptocócico M nas membranas basais vasculares.
A uveíte anterior (ver pág. 356) freqüentemente envolve reações mediadas por
imunocomplexos. Uma uveíte com freqüência ocorre no estágio de recuperação da
hepatite infecciosa canina (ver pág. 505). Esta é decorrente da reação dos
anticorpos séricos com as células endoteliais da úvea que contêm o adenovírus
canino I. Similarmente, a uveíte eqüina (ver pág. 363) ou uveíte anterior de eqüinos
pode estar associada a reações imunológicas aoLeptospira ou Onchocerca spp.
A uveíte causada pelas infecções de Toxoplasma e vírus da PIF também tem base
imunológica.
A artrite reumatóide canina (ver também ARTRITE E PROBLEMAS RELACIONADOS,
Pq An, pág. 568) se manifesta inicialmente como uma claudicação alterada com
aumento de volume dos tecidos moles ao redor da articulação envolvida. Dentro de
semanas ou meses a doença localiza-se nas articulações individuais e desenvol-
vem-se alterações radiográficas características. As alterações radiográficas preco-
ces consistem de aumento de volume de tecidos moles e uma perda de densidade
trabecular óssea na área da articulação. Áreas radiotransparentes semelhantes a
cistos são com freqüência observadas no osso subcondral. A lesão proeminente é
uma erosão progressiva da cartilagem e osso subcondral na área da junção sinovial,
que resulta em perda da cartilagem articular e colapso do espaço articular.
Freqüentemente ocorrem deformidades angulares e a luxação da articulação é uma
seqüela freqüente. As deformidades ocorrem mais freqüentemente nas articulações
cárpicas, társicas e falângeas e, menos freqüentemente, nas articulações do
cotovelo e joelho. As alterações do líquido sinovial indicam uma sinovite inflamatória
estéril com elevada contagem de células totais e uma alta proporção de neutrófilos
Entidades Doentias Específicas de Natureza Imunopatológica 522

na população celular do líquido sinovial. Acredita-se que isto seja decorrente da


deposição de imunocomplexos na sinóvia.
Uma artrite reumatóide também tem sido reconhecida em gatos. Tende a ocorrer
em gatos idosos e freqüentemente está associada a infecções com VLF. A doença
em gatos é muito mais insidiosa em seu desenvolvimento do que em cães.
A sinovite plasmacítica linfocítica, uma possível variante da artrite reumatóide,
é comum em cães de raças médias e grandes. Embora sejam freqüentemente
envolvidas múltiplas articulações, a doença tem uma predisposição para a articula-
ção do joelho. A queixa mais comum apresentada é uma claudicação do membro
posterior e um movimento anterior de gaveta das articulações do joelho. Linfócitos
e neutrófilos polimorfonucleares predominam no líquido sinovial, embora em alguns
casos o líquido esteja essencialmente normal. A inspeção grosseira da articulação
apresenta uma proliferação amarelada da membrana sinovial e distensão ou ruptura
dos ligamentos cruzados.
A artrite reumatóide canina e a sinovite plasmacítica linfocítica respondem mal
aos glicocorticóides sistêmicos isolados. Ciclofosfamida e azatioprina são freqüen-
temente usadas com glicocorticóides para tratar estes distúrbios; drogas antiinfla-
matórias não esteróides, por exemplo, a aspirina, podem ajudar a reduzir o
desconforto do animal.
Na poliartrite idiopática, uma desordem comum em cães, não há evidência de
um processo infeccioso crônico primário ou de lúpus eritematoso sistêmico; doença ar-
ticular freqüentemente é a única manifestação. É mais comum em cães grandes,
principalmente pastores alemães, doberman pinchers, retrievers, spaniels e pointers.
Em raças toy ocorre mais freqüentemente em poodles toy, yorkshire terries e
chihuahuas ou mestiços destas raças. O diagnóstico é feito com base na anamnese
de febre cíclica não responsiva a antibióticos, indisposição e anorexia, seguida de
enrijecimento e claudicação. Alterações ósseas não são vistas em radiografias até
a doença estar bem estabelecida. Mesmo depois, alterações radiográficas são
brandas e podem mimetizar a doença articular degenerativa. O líquido sinovial é de
natureza inflamatória, mas estéril. A doença pode ser controlada com altas doses
diárias de glicocorticóides, seguidas por baixas doses em terapia por dias alterna-
dos. O tratamento normalmente pode ser interrompido após 3 a 5 meses. Cães que
não respondem bem a tal terapia (> 50%) são tratados com drogas imunossupres-
soras mais potentes, tais como azatioprina ou ciclofosfamida em associação a
glicocorticóides. Sais de ouro podem ajudar no aumento da terapia com glicocorti-
cóides em alguns animais.
A periarterite nodosa (poliarterite nodosa, poliarterite necrotizante) é
uma doença idiopática rara de animais domésticos, que ocorre geralmente como
uma manifestação imunológica secundária causada pela deposição de imunocomplexos
e inflamação nas paredes de artérias de tamanho pequeno e médio. Entre os
animais de fazenda, é mais comum em suínos, geralmente associada à erisipela
e a infecções estreptocócicas, e é atribuída a uma reação arterial hipertensiva a
essas bactérias ou a suas vacinas. Tem sido relatada em gatos, embora freqüentemente
tenha sido confundida com a forma não efusiva da peritonite infecciosa felina.
Acredita-se que a meningite imunomediada ocorra em cães. A condição
também tem sido chamada de periarterite nodosa, embora sua relação com a
síndrome humana seja incerta. Uma meningite responsiva a esteróides é particular-
mente comum em adolescentes ou adultos jovens de beagles, boxers, pointers,
akitas e menos comum em outras raças puras e em muitas mestiças. Os sinais
clínicos em beagles, boxers e pointers consistem de picos cíclicos de febre, severa
dor e rigidez cervicais, relutância ao exercício e depressão. Cada crise dura de 5 a
10 dias com intervalos de normalidade completa ou parcial durando ≥ 1 semana.
Durante as crises, a quantidade de proteína e neutrófilos no líquido cerebroespinhal
Entidades Doentias Específicas de Natureza Imunopatológica 523

está elevada. A lesão é uma arterite, primariamente dos vasos meníngeos, mas
ocasionalmente de outros órgãos. A doença freqüentemente é autolimpante após
vários meses; as crises tornam-se mais brandas e menos freqüentes. A terapia com
glicocorticóides reduz a severidade das crises. Em alguns animais, a doença torna-
se crônica e parcialmente amenizável com a terapia.
Uma forma mais severa deste tipo de meningite foi relatada em uma ninhada de
bernese mountain. A doença nessa ninhada foi um tanto cíclica, mas a resolução
nos períodos intermediários foi menor que no caso de beagles, pointers e boxers.
Anormalidades no líquido cerebroespinhal assemelham-se às da doença em outras
raças. A condição foi menos autolimitante e requereu terapia com altas doses de
glicocorticóides para manter os animais de uma forma confortável.
Uma síndrome de meningite, freqüentemente associada com poliartrite, é vista
em akitas com 12 semanas de idade. Os animais mostram picos febris severos (mas
um tanto cíclicos), depressão, rigidez e dor cervicais bem como rigidez generaliza-
da. Animais afetados apresentam uma taxa de crescimento menor e freqüentemen-
te parecem baldados. A doença responde pobremente a glicocorticóides e à
combinação de uma terapia imunossupressiva; a maioria dos animais são sacrifica-
dos quando adultos jovens. Em akitas idosos, é observada uma forma mais branda
e mais responsiva a drogas, a qual pode estar associada ao pênfigo foliáceo, uveíte
e tireoidite linfocítica plasmacítica.

DOENÇAS ENVOLVENDO A I MUNIDADE MEDIADA POR CÉLULAS


(Reações do Tipo IV)
As reações granulomatosas a microrganismos, tais como a micobactéria,
Coccidioides, Blastomyces e Histoplasma spp e, possivelmente vírus da PIF,
podem ocorrer como resultado de reações crônicas imunomediadas por células.
Embora a imunidade mediada por células controle efetivamente estes tipos de
infecção em muitos indivíduos, por razões não compreendidas, estes mecanismos
são apenas parcialmente eficazes em outros e ocorre uma reação granulomatosa.
Na coriomeningite linfocítica, infecção viral de camundongos (ver pág. 1238),
os danos do SNC ocorrem como resultado da destruição de células infectadas por
vírus por linfócitos derivados do timo. Encefalite do cão idoso (ver pág.495)
também pode resultar de mecanismos de imunidade mediada por células dirigidas
contra células persistentemente infectadas pelo vírus da cinomose canina. A
infecção inicial pelo vírus da cinomose canina é em geral clinicamente inaparente
e pode preceder a encefalite por anos.
Na hipersensibilidade de contato, agentes químicos reagem com proteínas da
derme e são produzidas novas proteínas antigênicas. A resposta imunomediada
por células do hospedeiro, contra estas proteínas dérmicas alteradas quimicamen-
te, danifica a pele, por exemplo, reações a arbustos e trepadeiras venenosos para
o homem. Tem sido descrita em cães e cavalos, e ocorre normalmente como
resultado do contato do animal com componentes sensibilizantes incorporados em
pratos plásticos para a alimentação, coleiras plásticas e componentes de drogas
colocadas sobre a pele.
A tireoidite auto-imune tem sido reconhecida no cão e caracteriza-se pela
destruição da glândula tireóide por um processo auto-imune, que tem componentes
humorais (Tipo II) e mediados por células (Tipo IV). A doença é particularmente
prevalecente em cães doberman pinschers, beagle, golden retriever e akita. O
hipotireoidismo (ver pág. 338) pode ser a única manifestação da doença ou ser um
componente clínico ou subclínico de uma desordem auto-imune mais ampla, como
o lúpus eritematoso sistêmico, poliartrite idiopática, meningite imunomediada (pe-
riarterite nodosa), panendocrinopatia e artrite reumatóide.
Entidades Doentias Específicas de Natureza Imunopatológica 524

A adrenalite auto-imune tem sido relatada em cães. As glândulas adrenais


são lentamente destruídas por um infiltrado linfocítico plasmacítico. Quando
uma quantidade suficiente de tecido glandular é destruída, os animais
desenvolvem a síndrome de Addison (insuficiência adrenocortical). A doença
está às vezes associada com um ataque imune semelhante contra outras
glândulas endócrinas, em particular a tireóide.
A ceratite seca ocorre em cães com uma predisposição genética como em
cocker spaniels. Pode ocorrer em uma forma primária ou secundária ao uso crônico
de sulfonamidas. A desordem está associada com uma destruição imunomediada
das glândulas lacrimais. É análoga à síndrome de Sjögren do homem, que é
causada por uma doença das glândulas salivares e perda de saliva. Dos cães
afetados, ≥ 50% respondem favoravelmente a colírios contendo ciclosporina. A
ciclosporina inibe seletivamente os distúrbios mediados por linfócitos T.

IMUNODEFICIÊNCIAS
Deficiências de fagocitose – A fagocitose é uma característica essencial do
sistema imune do hospedeiro. Os fagócitos são encontrados ao redor das membra-
nas mucosas e pele bem como na corrente sangüínea, baço, linfonodos, meninges,
membranas sinoviais, medula óssea e ao redor dos vasos sangüíneos ao longo do
corpo. Os fagócitos estão nos tecidos (histiócitos, macrófagos sinoviais, células de
Kupffer , etc.) ou no sangue (leucócitos polimorfonucleares, monócitos). A fagocito-
se envolve o reconhecimento pelo fagócito de materiais estranhos, nocivos ou
danosos, quimiotaxia de fagócitos para o material, aderência do material à membra-
na plasmática do fagócito, incorporação do material a uma vesícula pinocitótica,
formação de um fagossomo e ativação da cadeia respiratória e enzimas lisossomais
no fagossomo. Deficiências na fagocitose podem envolver defeitos congênitos ou
adquiridos em quaisquer destas fases ou no número disponível de fagócitos. Os
fagócitos têm receptores de imunoglobulinas e de complemento em suas superfí-
cies que auxiliam no “engolimento” (opsonização) do material estranho coberto com
anticorpos específicos (opsoninas) ou complemento, ou ambos.
Deficiências no processo fagocitário manifestam-se freqüentemente pelo au-
mento de suscetibilidade a infecções bacterianas da pele, sistema respiratório e
trato gastrointestinal, que respondem pobremente a antibióticos. As deficiências
fagocitárias adquiridas incluem desordens que levam a depressões leucocitárias
profundas e crônicas. Infecções com vírus da leucemia felina, infecção com o vírus
da panleucopenia felina, infecção com o vírus da imunodeficiência felina, pancito-
penia canina tropical, granulocitopenias idiopáticas, granulocitopenias induzidas
por drogas (drogas anticancerígenas, estrogênios, anticonvulsivantes, sulfonami-
das, etc.) e distúrbios mieloproliferativos são algumas condições que podem
desenvolver infecções secundárias como complicação com risco de vida.
Um decréscimo cíclico de todos os elementos celulares, mais notadamente
neutrófilos, ocorre no sangue periférico, baixando a resistência a infecções de collies
cinza e mestiços de collie (ver HEMATOPOIESE CÍCLICA EM CÃES C OLLIE C INZA, pág. 76).
Anormalidades congênitas que levam à fagocitose prejudicada são bem docu-
mentadas nos homens. Deficiências de opsoninas, de fatores de complemento,
habilidades quimiotáticas, mieloperoxidase e ativação em enzimas lisossômicas
têm sido reconhecidas, mas não em outros animais além do homem. Doenças
granulomatosas crônicas têm sido reconhecidas como um defeito ligado ao cromos-
somo X em alguns cães setter irlandeses (síndrome granulocitopática canina).
Algumas famílias de weimaraners sofrem de septicemias bacterianas (geralmente
manifestadas por infecções ósseas e articulares) em filhotes. A causa de base para
este fenômeno é desconhecida; alguns dos animais afetados têm níveis abaixo do
Entidades Doentias Específicas de Natureza Imunopatológica 525

normal de IgM e IgG, e pesquisas preliminares indicam que os leucócitos apresen-


tam um defeito bactericida.
Deficiência de adesão leucocitária em setter irlandês (síndrome da
granulocitopatia canina) – Uma imunodeficiência primária, causada por um
gene autossômico recessivo, tem sido descrita no homem e em setters
irlandeses, com uma expressão deficiente de glicoproteínas na superfície dos
leucócitos. Clinicamente é caracterizada por infecções bacterianas severas,
recidivantes, com formação diminuída de pus e diminuição na cicatrização de
feridas. Animais infectados geralmente apresentam pirexia severa, anorexia,
perda de peso e respondem pobremente à antibioticoterapia. Pode ocorrer
leucocitose persistente e extrema ( > 100.000 leucócitos/µL), consistindo
predominantemente de uma neutrofilia madura.
Deficiências em imunoglobulinas – Estas podem ser adquiridas ou congêni-
tas. As deficiências adquiridas ocorrem em neonatos que não recebem anticorpos
maternos adequados (falha na transferência passiva) ou em animais idosos devido
a condições que diminuem a síntese de imunoglobulinas ativas. A insuficiência da
transferência passiva de imunoglobulinas ocorre ocasionalmente em todas as
espécies que tenham o colostro como a principal fonte de anticorpos maternos. É
comumente associada a problemas clínicos em bezerros, cordeiros e potros. A falha
na transferência passiva pode ocorrer quando o jovem animal não recebe a
amamentação apropriada durante os primeiros dias de vida ou quando o colostro da
mãe contém baixos níveis de anticorpos específicos. Teoricamente, também podem
ocorrer problemas com a absorção intestinal de imunoglobulinas do leite. Os níveis
de imunoglobulinas < 400mg/dL na amostra de soro, após a amamentação, indicam
uma insuficiência de transferência passiva nos potros. A separação dos bezerros de
suas mães muito precocemente é um problema que ocorre com freqüéncia em
rebanhos leiteiros. Animais recém-nascidos que falham na obtenção adequada de
anticorpos maternos, freqüentemente sucubem a infecções bacterianas ou virais
fatais dos tratos gastrointestinal e respiratório.
A hipogamaglobulinemia idiopática (essencial) não tem sido descrita em animais,
mas ocorre indubitavelmente. Em homens está associada à atividade excessiva das
células supressoras que deprimem a síntese de imunoglobulinas estimuladas por
antígeno pelo linfócito B.
A hipogamaglobulinemia de significado clínico pode ser associada a qualquer
distúrbio que interfira na síntese de imunoglobulinas. Tumores, tais como mielomas
de plasmócitos ou linfossarcomas que ocasionalmente secretam grandes quantida-
des de anticorpos monoclonais, podem estar associados a deficiências profundas
dos anticorpos benéficos normais. Isto pode ser devido à competição das células
tumorais pelo substrato necessário com as células produzindo imunoglobulinas
normais, ou devido à presença de linfócitos supressores derivados do timo no
sangue que não conseguem selecionar a inibição para a produção anormal de
imunoglobulinas. Animais com tumores produtores de anticorpos monoclonais
podem ter infecções secundárias severas. Algumas infecções virais, por exemplo,
a cinomose e a parvovirose caninas podem danificar o sistema linforreticular a tal
ponto que a produção normal de anticorpos é virtualmente interrompida.
A hipogamaglobulinemia congênita tem sido reconhecida por si só ou em
combinação com as deficiências na imunidade mediada por células (imunodeficiên-
cia combinada,ver adiante). Deficiências na síntese de subclasse IgG têm sido
observadas em algumas raças de bovinos; deficiência de IgM tem sido descrita em
eqüinos; deficiências de IgA têm sido descritas em beagles, pastores alemães e
shar-peis. Bovinos com deficiência de subclasses de IgG geralmente são assinto-
máticos, enquanto potros mais velhos com deficiências de IgM sofrem de infecções
respiratórias. Cães com deficiência de IgA, assim como o homem, sofrem principal-
Entidades Doentias Específicas de Natureza Imunopatológica 526

mente de eczema, infecções respiratórias crônicas e possivelmente alergias. A


deficiência de IgA em beagles parece ser devida a um defeito na secreção de IgA,
pois células IgA positivas estão presentes em número normal. Alguns pastores
alemães parecem ter níveis de IgA mais baixos que outras raças e uma incidência
maior de alergias GI. A deficiência de IgA em shar-peis é extremamente variável;
alguns apresentam níveis secretórios e séricos ínfimos, e alguns têm níveis séricos
normais e níveis secretórios ínfimos ou baixos. Assim como os pastores alemães,
os shar-peis afetados têm mais problemas alérgicos que o normal.
A hipogamaglobulinemia transitória tem sido reconhecida mais freqüentemen-
te em potros e filhotes de cães. É mais comum em filhotes do tipo spitz, que em outras
raças. É congênita e manifesta-se por um atraso no desenvolvimento da imunidade
ativa. Potros com este problema desenvolvem freqüentemente sinais clínicos de
hipogamaglobulinemia (em geral infecções respiratórias) , 6 meses de idade, quan-
do seus anticorpos maternos atingem um nível muito baixo. Após cerca de 3 a 5 meses
eles começam a produzir imunoglobulinas. Cãezinhos com esta condição
também desenvolvem infecções respiratórias recorrentes entre 1 a 6 meses de idade,
mas recuperam-se e apresentam-se essencialmente normais aos 8 meses de idade.
Deficiências na imunidade mediada por células – Deficiências puras na
imunidade mediada por células são relativamente raras no homem e não têm ainda
sido descritas em outros animais. Em geral, deficiências nas respostas imunome-
diadas por células estão associadas à aplasia tímica (ausência ou redução muito
grande no tamanho do timo). É observada em algumas linhagens consangüíneas de
cães e bovinos. Eles são deficientes na função imunomediada por células, tais como
blastogênese de linfócitos, além de ter disfunção da pituitária.
Doença de imunodeficiência combinada – Identificou-se um caráter autossômi-
co recessivo desta doença em potros árabes e basset hounds. Casos esporádicos de
imunodeficiência combinada, provavelmente hereditária, têm sido vistos em poodle
toy, rottweiler e cães sem raça definida. Os animais afetados são freqüentemente
assintomáticos durante os primeiros meses de vida, mas tornam-se progressivamen-
te mais suscetíveis a infecções microbianas quando os anticorpos maternos dimi-
nuem. Os potros árabes com este distúrbio freqüentemente sucumbem à pneumonia
por adenovírus ou outras infecções , 2 meses de idade. Os potros são persistente-
mente linfopênicos. Não se detectaram anticorpos IgM em amostras pré-colostrais de
soro. Os níveis de imunoglobulinas serão normais após a amamentação, mas diminui-
rão progressivamente com o tempo comparados com potros normais. À necropsia, a
glândula tímica é difícil de ser identificada e sua arquitetura está anormal. Há uma
depleção pronunciada de elementos linfóides nos linfonodos, placas de Peyer e baço.
Os cãezinhos com imunodeficiência combinada geralmente são normais até 6 a 12
semanas de idade. A causa mais comum de morte por esta condição é a cinomose
resultante da imunização de rotina com a vacina do vírus vivo modificado.
Deficiências de complemento – Uma deficiência congênita do terceiro compo-
nente do complemento foi descrita em uma linhagem consangüínea das raças
britânicas de cães. Estes animais sofriam de infecções bacterianas recorrentes,
especialmente doenças cutâneas e pneumonias. Embora o complemento seja
necessário para a opsonização e a quimiotaxia dos neutrófilos, muitas pessoas ou
animais de laboratório com esta deficiência nem sempre sofrem de infecções
bacterianas. Isto é principalmente devido à existência de 2 vias que promovem um
caminho de ativação do sistema, mesmo se o outro é bloqueado.
A deficiência congênita de C1 tem sido reconhecida no homem e menos
comumente em cães. Os animais afetados sofrem de quadros recidivantes de
edema facial.
Imunodeficiências seletivas – Filhotes de rottweiler apresentam uma predis-
posição racial para infecções por parvovírus severas e freqüentemente fatais. Sua
Entidades Doentias Específicas de Natureza Imunopatológica 527

resistência para outras doenças é essencialmente normal, e a base para esta


imunodeficiência seletiva é desconhecida.
Gatos persas apresentam uma predisposição para desenvolver dermatofitose
severa e algumas vezes prolongada. Em alguns gatos persas, as infecções fúngicas
invadem a derme e causam uma doença granulomatosa (micetomas).
Martas que apresentam pelagem mutante aleutiana são suscetíveis à infecção
crônica por parvovírus e desenvolvem uma doença chamada doença da Marta
aleutiana (ver pág. 1274). Martas de outras cores são suscetíveis à infecção por este
vírus, mas não desenvolvem doença clínica.
Aspergilose focal e sistêmica (e micoses devidas a fungos relacionados) afeta
certas raças de cães. Raças de focinho longo, como o pastor alemão e seus
cruzamentos, são predispostas a desenvolver aspergilose focal nas passagens
nasais. Aspergilose sistêmica é vista quase que exclusivamente em pastores
alemães e mais comumente no oeste australiano. Caracteriza-se por pielonefrite
fúngica, osteomielite e discoespondilite. O microrganismo pode ser facilmente
isolado do sangue e da urina.
Imunodeficiências induzidas por vírus – Estas têm sido causadas por alguns
agentes, em animais. O vírus da cinomose causa uma imunodeficiência combinada
profunda em filhotes afetados. A infecção está associada com um progressivo
declínio nos níveis de globulina de anticorpo e aumento da suscetibilidade a agentes
normalmente contidos pela imunidade celular, por exemplo, toxoplasmose,
nocardiose.
A infecção por parvovírus em cães e gatos causa uma depressão profunda e
transitória no número de neutrófilos e linfócitos responsivos. Isto tem levado a um
aumento da incidência de infecções fúngicas (aspergilose, mucormicose, candidía-
se) no período de recuperação imediato. Uma síndrome severa de imunodeficiência
induzida pelo parvovírus também tem sido observada em camundongos.
A imunodeficiência induzida pelo retrovírus tem recebido um maior exame desde
o aparecimento da síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS) no homem. A
infecção pelo vírus da leucemia felina (VLF) está associada com uma imunodeficiên-
cia adquirida e um aumento da incidência de infecções secundárias e oportunistas.
A imunodeficiência adquirida na infecção pelo VLF é multifatorial e de natureza
ampla. Gatos infectados podem apresentar deficiências de neutrófilos, diminuição
da síntese de anticorpos (principalmente a antígenos bacterianos), diminuição da
imunidade celular e níveis variáveis de complemento. A resposta imune à infecção
pelo VLF também parece inibir a progressão da imunidade específica ao vírus da
peritonite infecciosa felina (PIF), o que leva à reativação da PIF quiescente.
A infecção de macacos pelo retrovírus símio do Tipo D (Tipos de I a V e vírus do
macaco mason-pfizer) tem uma patogenia semelhante à infecção pelo VLF em
gatos, porém induz uma imunodeficiência mais severa. Cada sorotipo tende a ser
encontrado em espécies específicas de macacos na selva e dentro de áreas
geográficas definidas. A infecção pelo retrovírus Tipo D em macacos pode causar
uma doença severa em animais adolescentes de zoológicos e em centros primatas
com amplos grupos raciais. Embora a taxa de infecção nos animais selvagens seja
alta, estas viroses causam nas populações selvagens uma síndrome menos severa
que nas de cativeiro. Os macacos afetados morrem dentro de vários meses com
febre, linfadenopatia, e infecções oportunistas do SNC, trato respiratório e intesti-
nos; tornam-se portadores assintomáticos vitalícios; ou recuperam-se totalmente.
Alguns sorotipos causam uma fibrose retroperitoneal progressiva. Macacos saudá-
veis podem ser anticorpo positivo e ter o vírus no sangue e saliva (portadores
assintomáticos) ou anticorpo positivo sem apresentar o vírus isolado (imune).
Animais com sinais clínicos estão sempre virêmicos, mas podem ou não ter
anticorpos séricos, dependendo da severidade da doença.
Entidades Doentias Específicas de Natureza Imunopatológica 528

Vírus da imunodeficiência em símios (VIS) é um lentivírus com considerável


homologia genética com o vírus da imunodeficiência humana (HIV), a causa da AIDS
no homem. Existem muitas cepas de VIS na natureza. Os hospedeiros comuns são
primatas africanos como os macacos verdes africanos, sooty mangabeys, mandrills,
baboons. A transmissão entre macacos infectados e não infectados ocorre através
de mordidas e pela exposição in utero. Não está presente em populações nativas de
primatas asiáticos. Raramente causa a doença nas espécies hospedeiras africanas.
Se os animais estiverem sob forte estresse, como em cativeiro, alguns animais
infectados podem desenvolver uma doença semelhante a AIDS. VIS principalmente
de origem em sooty mangabey, causa doença severa em macacos (rhesus, stump
tail, pig tail, bonnet, etc.). A maioria dos macacos afetados vieram de zoológicos e
centros primatas, onde é permitido o contato entre espécies africanas e asiáticas, e
tecidos e líquidos orgânicos são freqüentemente trocados entre os animais, com fins
de pesquisa. A imunossupressão associada com o VIS pode durar meses ou anos.
Encefalites (geralmente assintomáticas exceto pelo enfraquecimento) e linfomas
são seqüelas freqüentes da infecção pelo VIS em macacos. Os animais infectados,
tanto sadios quanto doentes, carregam a infecção pelo resto da vida. Macacos
infectados com o VIS geralmente possuem anticorpos séricos detectáveis por uma
série de procedimentos. Já que a infecção dura por toda a vida do animal, a presença
de anticorpos séricos indica a presença do vírus no corpo.
O vírus da imunodeficiência felina (VIF, originalmente lentivírus linfotrófico T
felino) é um lentivírus que foi recentemente descoberto em gatos domésticos. A
infecção é endêmica em gatos de todo o mundo. É eliminado principalmente pela sa-
liva e a principal forma de transmissão é através de mordidas. Gatos idosos, machos
e de vida livre (selvagens e domésticos) são os que possuem um maior risco de se
infectar. A infecção pelo VIF é rara em gatos domiciliados. Após a infecção há um
período transitório de febre, linfadenopatia e neutropenia. A maioria dos gatos recupe-
ram-se desse estágio e parecem normais por meses ou anos até que ocorra a
imunodeficiência. Desconhece-se a porcentagem de gatos infectados que entram na fase
terminal da doença. Gatos com imunodeficiência adquirida induzida pelo VIF sofrem de
infecções oportunistas e secundárias crônicas dos tratos respiratório, GI (incluindo a boca),
urinário e da pele. Gatos infectados pelo VIF apresentam uma incidência mais alta de
linfomas negativos causados pelo VLF, geralmente do Tipo celular B e desordens mie-
loproliferativas (neoplasias e displasias). Dos gatos afetados , 5% apresentam sinais
neurológicos condizentes com doença do córtex cerebral (anormalidades comporta-
mentais, distúrbios psicomotores, demência, convulsões). Os gatos permanecem
infectados pelo resto da vida; a presença de anticorpos séricos está diretamente
relacionada com a habilidade de isolar o vírus das células sangüíneas e da saliva.
Um lentivírus foi recentemente isolado de bovinos, e tem sido chamado de vírus
semelhante ao da imunodeficiência bovina (VIB). O vírus foi originalmente
isolado de bovinos negativos para o vírus da leucemia bovina (BLV), que apresen-
tavam linfocitose e hemolinfadenopatia persistentes. Também tem sido isolado de
bovinos com linfossarcomas, negativos para o BLV. A incidência total em bovinos
parece ser de , 1%, embora em alguns rebanhos possa ser ≥ 15%. Evidências
preliminares indicam que o vírus não é a principal causa de imunodeficiência em
bovinos. Podem-se detectar alguns bovinos infectados por meio de testes soroló-
gicos para anticorpos virais. O isolamento do vírus da corrente sangüínea parece ser
o método mais preciso para se detectar os animais infectados.

TUMORES DO SISTEMA I MUNE


As respostas imunes normais requerem uma rápida proliferação de linfócitos.
Entretanto, esta proliferação pode ser descontrolada e resultar em neoplasias
linfóides. Linfomas podem se originar de células T ou B.
Entidades Doentias Específicas de Natureza Imunopatológica 529

A maioria dos casos de linfossarcoma canino, doença de Marek, leucose de


bezerros e leucemia felina, tem origem nas células T como os timomas. Timomas,
que são relativamente raros nos animais domésticos, em geral causam perda de
peso e dificuldade respiratória. São comumente confirmados por radiografia. No
homem, os timomas podem estar associados com sinais de miastenia grave.
Embora esta associação tenha sido relatada em cães, ela é rara. Muitos linfomas
de células T estão associados com uma imunossupressão simultânea, como
mostrado pela predisição a infecções recidivantes.
Leucose em bovinos e ovinos adultos, leucemia felina alimentar e leucose aviária
geralmente originam-se das células B. Sob algumas circunstâncias, células B
neoplásicas podem se desenvolver em plasmócitos. Tumores de plasmócitos são
conhecidos como mielomas. Em virtude dos plasmócitos neoplásicos secretarem
produtos de imunoglobulinas, eles aumentam as gamopatias.

GAMOPATIAS
São patologias em que os níveis de imunoglobulinas séricas estão grandemente
aumentados. Podem ser classificadas em policlonais, que envolvem um aumento
em todas as principais classes de imunoglobulinas ou monoclonais, se envolverem
apenas uma única imunoglobulina homogênea.
Gamopatias policlonais em animais são observadas em piodermites crônicas;
infecções fúngicas, bacterianas, virais crônicas; doenças granulomatosas;
abcedação; parasitoses crônicas, riquetisioses crônicas, como a pancitopenia
canina tropical (PCT); doenças imunológicas crônicas, como o lúpus eritematoso
sistêmico, artrite reumatóide e miosite; ou em neoplasia. Elas também podem ser
idiopáticas. Em alguns animais, a gamopatia pode parecer inicialmente ser mono-
clonal, devido à predominância de uma classe de imunoglobulina (geralmente IgG).
Exemplos desse fenômeno têm sido observados em gatos com peritonite infecciosa
felina não efusiva e cães com PCT crônica.
Gamopatias monoclonais são caracterizadas pela presença no soro de uma
proteína de imunoglobulina homogênea. As classes de imunoglobulinas não envol-
vidas, normalmente estão diminuídas. Gamopatias monoclonais são benignas (isto
é, associadas com uma doença de base) ou podem estar associadas com tumores
secretores de imunoglobulina. No homem, gamopatias benignas podem se tornar
malignas com o decorrer do tempo; em outros animais, são raras e não estão
associadas com um tumor demonstrável ou doença clínica.
Tumores que secretam anticorpos monoclonais originam-se de plasmócitos
(mieloma) ou linfoblastos (linfossarcoma). Mielomas de plasmócitos podem secre-
tar proteínas intactas de qualquer classe de imunoglobulina ou subunidades de
imunoglobulinas (cadeia leve ou pesada). Proteínas de mielomas em cães em geral
são do Tipo IgG ou IgA e menos comumente do Tipo IgM. Mielomas do Tipo IgA são
particularmente comuns em doberman pinschers. Imunoglobulinas monoclonais
produzidas pelo linfossarcoma são freqüentemente da classe IgM, independente-
mente da espécie. Proteínas de mielomas em gatos e eqüinos em geral são IgG e
menos comumente IgM, IgG (T) (eqüinos) ou IgA.
Os sinais clínicos dependem da localização e da severidade da neoplasia
primária e da quantidade e do tipo da imunoglobulina secretada. Mielomas de
plasmócitos freqüentemente se desenvolvem nas cavidades medulares dos ossos
chatos do crânio, costela, pelve e vértebras. Fraturas patológicas dos ossos lesados
podem levar a distúrbios do SNC ou espinhais, ou dor e claudicação. Os linfossarcomas
envolvem, freqüentemente, os órgãos parenquimatosos;portanto, os sinais clínicos
são mais diversos.
Clinicamente, a doença mais evidente pode resultar da presença da própria
proteína monoclonal. A amiloidose (ver pág. 385) pode ocorrer como resultado do
Entidades Doentias Específicas de Natureza Imunopatológica 530

aumento do catabolismo de imunoglobulinas. A síndrome da hiperviscosidade,


especialmente com proteínas IgM ou IgA monoclonais, pode ocorrer se os níveis de
proteína no sangue forem altos. Nesta síndrome, a viscosidade plasmática pode ser,
muitas vezes, normal, o que leva a profundos distúrbios vasculares, trombose e
diátese sanguinolenta. Depressão, cegueira e manifestações neurológicas podem
ocorrer como resultado de hemorragia dentro do sistema nervoso e retina. Algumas
proteínas IgM monoclonais atuam como crioglobulinas e agregam-se in vitro e
in vivo quando o plasma é resfriado. Animais com crioglobulinemia freqüentemente
desenvolverão gangrena nas pontas das orelhas, pálpebras, dedos e ponta da
cauda, especialmente durante o clima frio (ver também DOENÇA HEMOLÍTICA FRIA,
pág. 518). Mielomas que produzem auto-anticorpos para vários tecidos têm sido
identificados no homem, mas não em animais. Finalmente, animais com gamopatias
monoclonais podem ter níveis muito deprimidos de imunoglobulinas normais e
podem, portanto, sofrer de sérias infecções secundárias .
Os tumores que secretam imunoglobulinas normalmente são tratados com
glicocorticóides e drogas alquilantes. O prognóstico para remissão após a terapia é
muito melhor em cães do que em gatos. Mesmo em cães, entretanto, o prognóstico
para o futuro é pobre e a recidiva é comum após 6 a 12 meses. A plasmaferese pode
ser necessária para baixar a viscosidade sérica em animais com sinais clínicos da
síndrome de hiperviscosidade. Injeções de antibióticos e globulinas podem ser
necessárias para ajudar a prevenir infecções secundárias.
DISTÚRBIOS METABÓLICOS
DISTÚRBIOS METABÓLICOS, Introdução ................................................. 531
Doenças Metabólicas Hereditárias .......................................................... 531
Doenças Relacionadas à Produção ......................................................... 532
TEMPERATURA CORPORAL ...................................................................... 533
PORFIRIA ERITROPOIÉTICA CONGÊNITA ................................................ 535
SÍNDROME DA VACA OBESA ..................................................................... 536
HIPOGLICEMIA NEONATAL (ver MCN) ...................................................... 1322
TETANIA DEVIDO À HIPOMAGNESEMIA EM BOVINOS E OVINOS ........ 536
Tetania devido à Hipomagnesemia em Bezerros .................................... 538
CETOSE NO GADO ...................................................................................... 538
TETANIA DA LACTAÇÃO EM ÉGUAS ........................................................ 540
HIPERTERMIA MALIGNA ............................................................................. 541
OBESIDADE .................................................................................................. 543
PARESIA DA PARTURIENTE EM VACAS .................................................. 544
PARESIA DA PARTURIENTE EM OVELHAS .............................................. 545
EXAUSTÃO FÍSICA ...................................................................................... 546
HEMOGLOBINÚRIA PÓS-PARTO ............................................................... 549
TOXEMIA DA PRENHEZ EM VACAS .......................................................... 549
TOXEMIA DA PRENHEZ EM OVELHAS ...................................................... 550
TETANIA PUERPERAL ................................................................................ 551
TETANIA DO TRANSPORTE EM RUMINANTES ........................................ 553

DISTÚRBIOS METABÓLICOS, INTRODUÇÃO


As doenças metabólicas podem ser hereditárias ou adquiridas, sendo as últimas
mais importantes. As doenças metabólicas têm importância clínica, pois afetam a
produção de energia ou lesam tecidos críticos para a sobrevivência.

DOENÇAS METABÓLICAS HEREDITÁRIAS


Erros inatos do metabolismo são desordens genéticas raras que acometem
muitos animais, mais comumente cães e gatos. A doença resulta de uma ausência
parcial ou total de uma enzima crítica no metabolismo intermediário. A maioria das
desordens primariamente documentadas afeta o SNC, as chamadas “doenças
armazenadas.” A doença ocorre porque quantidades anormais de substratos de
enzimas são “armazenadas” dentro dos lisossomos dos neurônios, que prejudicam
sua função. Geralmente, os animais são normais ao nascimento, mas manifestam
Distúrbios Metabólicos, Introdução 532

sinais clínicos dentro das primeiras semanas ou meses de vida. Estas doenças são
progressivas e geralmente fatais, e não há tratamento específico atualmente para
qualquer uma delas. As gangliosidoses, GM1 e GM2, ocorrem em gatas siamesas,
korat e naquelas sem raça definida; em cães beagle, pointer alemão de pêlo curto
e spaniel japonês. A esfingomielinose ocorre em gatos siameses e naqueles sem
raça definida. A lipofuscinose ceróide ocorre em setters ingleses, cocker spaniels,
dachshunds, chihuahuas, salukis e em gatos domésticos. A manosidose ocorre em
gatos persas em sem raça definida. A glicogenose do Tipo II ocorre em cães lapland
e a do Tipo III em pastores alemães. A leucodistrofia de células globóides (de
Krabbe) ocorre em cairn terriers, west highland white terriers, bluetick hounds,
beagles, poodles, lulus da Pomerânia e basset hounds. A mucopolissacaridose do
Tipo VI, uma doença primariamente associada a laminite, ocorre em gatos siame-
ses; o Tipo I ocorre em cães e gatos. Doenças associadas a leucopenia e anemia
incluem deficiência de piruvatocinase em basenjis e beagles; deficiência de
fosfofrutocinase em springer spaniels ingleses. Os eqüinos não possuem doenças
metabólicas documentadas, exceto a metemoglobinemia possivelmente congênita
e tremores episódicos.
Em animais de grande porte, a quantidade deste tipo de doença é pequena, e a
daquelas que ocorrem possui baixa incidência. A mais comum provavelmente é a
manosidose em bovinos angus, galloway e murray grey; e de caprinos. Outras
doenças identificadas que se manifestam por sinais neurológicos e que provavel-
mente são hereditárias são as gangliosidoses GM1 e GM2 em bovinos e suínos,
respectivamente; a lipofuscinose ceróide em ovinos; as glicogenoses generalizadas
em bovinos e ovinos; a citrulinemia e a uropatia em xarope de bordo em bovinos; e
a leucodistrofia de células globóides em ovinos.
Outras doenças hereditárias nas quais ocorrem erros metabólicos básicos de
tecidos específicos são: bócio em ovinos e caprinos, paraceratose hereditária
(edema) em bovinos, osteogênese imperfeita em ovinos e caprinos, e possivelmen-
te miocardiopatia de bovinos, as hipotricoses, bezerros alopécicos, fotossensibiliza-
ção de ovinos, dermatose vegetante, síndrome do estresse em suínos,
dermatosparaxia e síndrome de Ehlers-Danlos em bovinos. Muitos outros defeitos
hereditários, principalmente aqueles relacionados ao crescimento anormal de
colágeno, cartilagem e osso, provavelmente também se devem a erros metabólicos
básicos de tecidos estruturais.

DOENÇAS RELACIONADAS À PRODUÇÃO


(Doenças metabólicas adquiridas)
“A verdadeira doença metabólica” geralmente resulta de uma deficiência ou
excesso herdado de catalisador(es) ou enzima(s). Entretanto, a maioria das
doenças discutidas nesta seção está primariamente relacionada à produção ou ao
manejo, embora o metabolismo seja um fator crítico na patogenia de cada doença.
Sua causa em muitos casos não é uma falha no metabolismo, mas sim um
incremento de demanda para um nutriente particular, sendo seu suprimento
adequado sob condições selecionadas. Estas doenças, como hipocalcemia, hipomag-
nesemia e hipoglicemia, são favorecidas pelas práticas de manejo que visam a um
aumento da produção. Portanto, elas são mais adequadamente intituladas de
doenças da produção. Por outro lado, sustenta-se que elas sejam doenças metabó-
licas porque o manejo do animal demanda uma produção que, no seu pico, está
acima da capacidade das reservas metabólicas do animal para sustentar certos
nutrientes nas concentrações fisiológicas . Portanto, a paresia das vacas parturien-
tes ocorre quando a secreção mamária de cálcio é superior ao que a dieta pode
fornecer ou maior que o fornecimento de emergência que o sistema ósseo pode
Temperatura Corporal 533

reunir em pouco tempo. Há situações paralelas com glicose e magnésio, e com


fósforo em relação à hemoglobinúria pós-parto.
Nem todas as “doenças metabólicas” induzidas pela produção são devidas a um
simples balanço negativo de determinado nutriente. Em algumas situações, a
ingestão da dieta de determinado nutriente é subitamente reduzida em face de uma
alta e constante necessidade metabólica, por exemplo, toxemia da prenhez de
ovelhas e vacas de corte, síndrome da vaca obesa em gado leiteiro e, provavelmen-
te, hiperlipemia em éguas-pônei. Ainda são classificadas como doenças induzidas
pela produção, porque um manejo ditado financeiramente decide não suplementar
uma rápida queda no plano nutricional do animal que precipita a doença.
A mioglobinúria paralítica dos cavalos é um outro tipo de doença metabólica
induzida pela produção. Neste caso, a produção (atividade física de trabalho ou corrida)
é mantida por um determinado nível de aporte nutritivo. Uma decisão de não trabalhar
ou fazer correr o animal sem uma concomitante diminuição da ingestão de alimentos
pode resultar em acúmulo de glicogênio num nível perigoso. A doença é produzida
quando se resume o trabalho e a produção de ácido láctico excede seu metabolismo.
A diferença entre as doenças metabólicas relacionadas à produção e à deficiên-
cia nutricional é freqüentemente sutil. Em termos gerais, as deficiências nutricionais
são de larga duração, de estado crônico e corrigidas apenas pela suplementação da
dieta. As doenças metabólicas são de estados agudos que respondem efetivamente
à administração sistêmica do metabólito necessário, embora o animal possa
requerer suplementação dietética para evitar o retorno da doença.
O aspecto mais importante das doenças de produção metabólica induzidas pela
produção é o diagnóstico rápido e acurado. Se possível, os mesmos testes devem
ser utilizados para predizer a provável ocorrência da doença, antes de seu início
clínico a fim de evitar as perdas financeiras que elas causam. Um sistema particular
de diagnóstico que faz este trabalho é o Teste de Perfil Metabólico de Compton. O
teste é baseado no exame de diversas amostras de grupos e na comparação dos
estados bioquímicos dos animais dentro de um determinado rebanho e que estejam
ou não num estado de estresse metabólico. Um desvio do grupo estressado em
relação ao grupo normal é tomado como índice de potencial de ocorrência da
doença. O sistema tem a desvantagem de ser caro. Uma extensão do sistema para
predizer o desenvolvimento da doença em indivíduos não é recomendada favora-
velmente pela mesma razão.

TEMPERATURA CORPORAL
Nos animais homeotérmicos, a função celular normal depende de uma tempera-
tura corporal relativamente constante. Esta temperatura corresponde à soma entre
o calor produzido e o calor perdido ou conservado, e é regulada por um mecanismo
central do hipotálamo que ativa as atividades fisiológicas e comportamentais. A
produção de calor é aumentada por tremor, termogênese não tremular, exercício,
ingestão de alimento, taxa metabólica e secreção de certos hormônios. Em
herbívoros, a fermentação bacteriana no trato GI representa uma fonte adicional de
calor. A conservação do calor resulta da vasoconstrição periférica e de respostas
comportamentais que reduzam a área superficial a partir da qual o calor possa ser
perdido. Animais expostos ao calor excessivo procuram um ambiente mais frio, onde
a perda de calor possa ser acelerada.
O calor é perdido por radiação, condução e vaporização da água pelas vias
respiratórias e pela pele; pequenas quantidades são perdidas nas fezes e na urina.
Temperatura Corporal 534

As perdas são aceleradas pela área superficial maior, pelo ambiente mais frio, pela
vasodilatação periférica, pelo arfar e pelo suor. O pêlo reduz a capacidade de perder
calor, então animais muito peludos e aqueles com pelame escuro são vulneráveis
a altas temperaturas. Os ruminantes possuem um mecanismo de sudorese limitado;
portanto, a perda de calor por evaporação é ineficiente.
Em animais de sangue quente ou homeotérmicos, a temperatura corporal real
varia de espécie para espécie e às vezes entre indivíduos da mesma espécie (ver
TABELAS 3 e 4, págs. 1169 e 1170); a temperatura normal pode variar de 35° a 43°C.
Partes periféricas do corpo possuem temperaturas diferentes, em grande parte
devido à temperatura ambiente e à quantidade de insulação. A temperatura retal é
representativa da temperatura corporal, a qual varia menos. A temperatura basal
pode ser obtida pela manhã, após um período de descanso, sem excitar o animal.
Variação normal – A temperatura corporal de animais sadios está sujeita a
variações diurnas leves. A temperatura eleva-se durante o dia e cai durante a noite.
Grandes animais, como eqüinos, bovinos e elefantes, apresentam pequenas varia-
ções diurnas (, 0,5°C). Certos animais, por exemplo, os camelos, que são adapta-
dos a grandes variações na temperatura ambiente e a uma disponibilidade restrita de
água, apresentam flutuações diurnas na temperatura corporal, chegando até 5°C.
A hipertermia em vários graus pode resultar de esforço, excitação ou exposição
prolongada a ambientes quentes ou úmidos. A hipertermia devida à reduzida perda
de calor pode afetar seriamente as funções normais, por exemplo, vacas sujeitas a
temperaturas ambientais excessivamente altas reduzem a ingestão de alimento e
perdem peso, e a produção láctea cai. A perda de calor está associada à perda de
água. Têm sido demonstrados efeitos teratogênicos em embriões cujas mães foram
sujeitas à hipertermia durante a gestação. Quando não há água disponível, a
desidratação leva à inibição da sudorese; isto pode levar à hipertermia, que pode ser
tratada prontamente pela administração de água (ver HIPERTERMIA MALIGNA , pág. 541).
Variações sazonais na temperatura corporal estão relacionadas ao estresse ambi-
ental e ao ciclo reprodutivo. No inverno, a temperatura retal pode estar 1°C abaixo dos
níveis no verão. Antes da ovulação, a temperatura basal pode estar , 0,5°C abaixo do
nível dos dias anteriores. Durante o estro, o nível é um tanto mais alto. Está um pouco
acima do normal durante a primeira metade da gestação. Animais jovens possuem
temperaturas mais instáveis que os idosos, com flutuações diurnas um tanto maiores.
A febre é produzida por pirógeno químico, viral ou bacteriano. É o resultado de
um “reajuste” dos mecanismos de termorregulação para funcionar acima dos níveis
normais. Em muitos animais, as prostaglandinas são responsáveis por este reajus-
te; isto explica a efetividade da aspirina na redução da febre. Imediatamente após
o nascimento, os neonatos não apresentam febre durante uma infecção, mas dentro
de poucos dias, animais jovens respondem à infecção com uma febre muito maior
do que a dos animais maduros. Em animais idosos, mesmo infecções severas
produzem pouca ou nenhuma alteração na temperatura corporal. Na febre diurna,
que pode indicar infecção crônica, a temperatura pode elevar-se por vários graus
durante o dia e retornar ao normal à noite. Muitas infecções causam febre por
indução de produção de pirógenos endógenos (interleucina-1) a partir dos leucóci-
tos polimorfonucleares, que constituem um mecanismo de defesa. Estes pirógenos
atravessam a barreira hematoencefálica para ajustar os centros de termorregulação
no cérebro. Nas infecções agudas, a temperatura pode permanecer vários graus
acima do normal por alguns dias, às vezes com uma flutuação diurna sobreposta.
A febre reincidente de algumas infecções crônicas (por exemplo, brucelose)
caracteriza-se por vários dias de temperatura corporal elevada, seguidos por vários
dias de temperatura normal.
Um calafrio geralmente é o mensageiro de um episódio febril e representa um
período de produção e conservação de calor. O episódio começa com extrema
Porfiria Eritropoiética Congênita 535

irritabilidade, tremor, procura por um ambiente quente e redução da área superficial


do corpo (“envolvendo-se”) a partir da qual o calor pode ser perdido. No momento
do calafrio, a temperatura corporal já está elevada; os mecanismos já mencionados
produzem mais calor e fazem a temperatura elevar-se ainda mais.
Ocorrem distúrbios metabólicos como resultado da febre. O mais notável destes
é devido à excessiva perda de água. Desidratação severa pode produzir um aumento
na temperatura corporal, que é resolvido pela administração de fluidos. Febre
persistente pode levar a perda de cloreto de sódio e lesão cerebral. Durante o verão
e depois da febre, eqüinos e bovinos devem ter sal disponível para repor as perdas.
Os desequilíbrios ácido-básico e eletrolítico, associados a febre prolongada ou
hipertermia, podem levar à acidose. Se a febre persistir, podem ocorrer convulsões,
excessiva produção de calor, lesão cerebral e possivelmente morte. A febre pode
ser tratada resfriando-se o animal por meio de banhos de imersão frios, ou no caso
de pequenos animais, com banhos com esponja embebida em álcool. As convul-
sões podem ser controladas por sedação ou doses anestésicas de barbitúricos. A
temperatura corporal máxima compatível com a vida é de 5°C acima do nível normal
do animal.
Hipotermia (ver também pág. 759) – Quando a pele ou o sangue são resfriados
o suficiente para diminuir a temperatura corporal de animais que não estão hibernan-
do, os processos metabólico e fisiológico diminuem. As taxas cardíacas e respirató-
rias tornam-se lentas, a pressão sangüínea é baixa e a consciência é perdida. Com
uma temperatura retal de < 28°C, a habilidade para recuperar a temperatura normal
é perdida, mas o animal continuará a sobreviver e, se for aplicado calor externo, a
temperatura retornará ao normal. Estes achados têm sido adaptados e usados
extensivamente em cirurgias cardíacas e cerebrais no homem. No estado de
hipotermia, o oxigênio necessário para as células, principalmente para os neurônios,
é muito reduzido, e a circulação pode parar relativamente por longos períodos.
Uma temperatura corporal diminuída é observada em estágios terminais. É um
sinal prognóstico ruim no caso de doenças infecciosas. No caso de hipotermia
acidental, o animal deve ser colocado em um ambiente aquecido e lentamente deve
retornar à temperatura normal.

PORFIRIA ERITROPOIÉTICA CONGÊNITA


(Porfirinúria, Dente rosado)

É uma doença hereditária rara, típica de bovinos, suínos e homens, na qual a


formação defeituosa de hemoglobina resulta na produção de quantidade excessiva
de porfirinas do Tipo I nos núcleos dos normoblastos em desenvolvimento.
O defeito no gado é herdado como um fator recessivo simples, e geralmente é
restrito aos rebanhos nos quais o endocruzamento ou cruzamento entre animais
próximos é praticado. A doença tem sido reconhecida nos EUA, Canadá, Dinamar-
ca, Jamaica, Inglaterra, África do Sul, Austrália e Argentina. O animal heterozigoto
parece ser normal, mas o homozigoto recessivo é afetado ao nascimento e possui
uma descoloração marrom-avermelhada dos dentes, ossos e urina. A urina contém
quantidades excessivas de coproporfirina I e uroporfirina I, mas a descoloração dos
dentes e ossos é devida primariamente à uroporfirina I. Os ossos, a urina e os dentes
(especialmente os decíduos) exibem uma marcante fluorescência rósea quando
irradiados com luz ultravioleta. A exposição prolongada à luz solar causa lesões
típicas de fotossensibilidade com necrose superficial das porções não pigmentadas
da pele. Uma anemia hemolítica se desenvolve, sendo caracterizada por normocromia
Porfiria Eritropoiética Congênita 536

com macrócitos e micrócitos e marcante pontilhado basofílico. A esplenomegalia


eventualmente se desenvolve e os ossos mostram um aumento de fragilidade
devido a um córtex diminuído. O animal se torna progressivamente apático e pode
morrer, a menos que seja protegido da luz solar. Uma doença semelhante (ver pág.
949) causa fotossensibilidade somente no gado limusine e no homem.
O defeito nos porcos e gatos é extremamente raro e difere da doença em algumas
circunstâncias encontrada nos bovinos. A fotossensibilização não é característica
e a doença é transmitida de maneira autossômica dominante. A doença nos suínos
tem sido relatada somente na Dinamarca e Nova Zelândia; nos gatos, ela tem sido
reconhecida somente nos EUA.
O diagnóstico deve ser baseado na excreção de uroporfirinas anormais e na
descoloração marrom dos dentes, os quais exibem fluorescência vermelho-alaran-
jada quando irradiados com luz ultravioleta. Animais afetados e seus parentes
heterozigotos devem ser excluídos do programa reprodutivo, pois não há teste
laboratorial definitivo para detecção de heterozigotos clinicamente normais.

SÍNDROME DA VACA OBESA


(Doença do fígado gordo dos bovinos)

Esta doença de vacas obesas que pariram recentemente tem muito em comum
com a toxemia da prenhez (ver pág. 549), estando geralmente associada a ela;
entretanto, suas epidemiologias são diferentes. A doença do fígado gordo aparece
preferencialmente após a parição e normalmente em vacas alimentadas de forma
inadequada, isto é, seu aporte é planejado para ser maior do que a sua demanda
nutricional para lactação. Devido às vacas estarem realmente num balanço energé-
tico negativo durante a súbita demanda de energia após a parição, há alta
mobilização de gordura dos depósitos corporais, resultando em deposição hepática.
Apenas vacas obesas desenvolvem a doença. Clinicamente, há cetonúria severa,
anorexia, fraqueza, decúbito e, finalmente, taquicardia e coma. A morte em 7 a 10
dias é o desfecho usual. Nenhum tratamento específico pode ser recomendado. As
medidas gerais de suporte são geralmente adotadas: forragens de alta qualidade e
palatáveis; injeção de anabolizantes esteróides; infusão EV de soluções eletrolíticas
combinadas ou glicose, ou ambas; insulinas; e transferência de bolo alimentar ou
infusão intra-ruminal de grandes volumes de suco de rúmen de outros animais. Os
resultados são pobres. Devido ao fato desta ser uma doença de vacas de alta
produção em rebanhos intensivamente manejados, a prevenção é uma prioridade.
Deve-se evitar a obesidade e tratar assiduamente a periparturiente.

TETANIA DEVIDO À HIPOMAGNESEMIA EM


BOVINOS E OVINOS
(Tetania das pastagens)

É um distúrbio metabólico caracterizado pela hipomagnesemia que ocorre


principalmente em vacas e ovelhas adultas, sobretudo naquelas em lactações
intensas ou em pastagens suculentas. Ocorre também em gado de qualquer idade
ou condição, particularmente gado de corte, que pasta no trigo ou outros cereais, ou
Tetania devido à Hipomagnesemia em Bovinos e Ovinos 537

naqueles que estejam subnutridos e expostos ao tempo frio e a mudanças bruscas.


Manifesta-se por irritabilidade, tetania e convulsões, possuindo altas taxas de
mortalidade.
Etiologia – A taxa de ocorrência de hipomagnesemia depende do grau de
deficiência; é rápida em vacas lactantes com acesso a pastos viçosos depois de terem
sido estabuladas no inverno, e lenta em vacas de corte subnutridas. Os baixos níveis
de magnésio e os altos níveis de potássio e nitrogênio na grama e pastagem de trigo
combinam-se para limitar a absorção de magnésio. Excitação, ordenha, transporte
e clima adverso são possíveis mecanismos desencadeantes. A hipocalcemia é um
freqüente achado concomitante, possivelmente secundário à hipomagnesemia.
Os níveis séricos de magnésio < 1,5mg/dL devem ser considerados suspeitos e
níveis < 1mg/dL são diagnósticos; porém podem voltar praticamente ao normal (1,7
a 3,0mg/dL) durante o estágio convulsivo. Os níveis séricos de cálcio estão em geral
moderadamente deprimidos (5,0 a 8,0mg/dL). Os níveis de magnésio no líquido
cefalorraquidiano são baixos, e isto é considerado a causa dos episódios convulsi-
vos característicos.
Achados clínicos – Na forma mais aguda da doença, os animais afetados, que
podem estar pastando de maneira aparentemente normal, repentinamente levan-
tam as cabeças, urram, galopam de maneira cega e frenética, caem e sofrem
severas convulsões de pedalagem. Estes episódios convulsivos podem ser repeti-
dos em breves intervalos, e a morte geralmente ocorre em algumas horas. Em
muitos casos, animais no pasto são achados mortos sem observação de doença.
Em casos menos severos, a vaca está obviamente doente, porém tranqüila,
apresenta andar rígido e hipersensibilidade ao toque e som, urina freqüentemente
e pode progredir ao estágio agudo e convulsivo depois de um período de 2 a 3 dias.
Devido à hipocalcemia concomitante com hipomagnesemia, pode ser difícil deter-
minar qual o problema primário; a tetania das pastagens pode acompanhar a paresia
da parturiente e os sinais clássicos desta última podem ser obscurecidos por
convulsões tetânicas. Em todos os casos de tetania das pastagens, a diminuição
dos ruídos cardíacos e da taquicardia são sinais característicos.
A doença na ovelha ocorre essencialmente sob as mesmas condições e
apresenta os mesmos sinais clínicos do gado.
Tratamento – Animais afetados requerem tratamento urgente. Usualmente, o
tratamento inclui administração de compostos de cálcio e magnésio e, algumas vezes,
sedativos se as convulsões e a tetania forem severas. Uma injeção endovenosa
contendo cálcio e magnésio pode ser usada, contudo deve-se administrá-la vagaro-
samente e monitorar o coração cuidadosamente. Uma alternativa de menor risco é
administrar cálcio por via EV (ver PARESIA DA PARTURIENTE, pág. 544) e sulfato de
magnésio por via s.c. (200mL/vaca de uma solução a 50%). A menos que o animal seja
removido do pasto que produz a tetania, e com alimentação concentrada, é provável
que o nível sangüíneo de magnésio caia outra vez em níveis perigosamente baixos,
24 a 36h após a terapia. Para prevenir isto, o tratamento diário com 60g de óxido de
magnésio, VO, por ≥ 1 semana, deve ser iniciado e retirado gradualmente.
Profilaxia – A prevenção é largamente feita por uma combinação de aumento da
ingestão de magnésio nos períodos perigosos e de manejo. A suplementação oral
diária de magnésio ou óxido de magnésio (60g para bovinos e 10g para ovinos) pode
ser incorporada no concentrado alimentar ou em lambeduras contendo melaço; o
sabor efetivamente desagradável impede o consumo de livre escolha. “Bolos” de
liga de magnésio foram desenvolvidos para o gado e ovelhas a fim de promover uma
liberação lenta de magnésio no rúmen. A fertilização com pedra calcária ou óxido de
magnésio para aumentar o magnésio herbáceo é bem-sucedida apenas em certos
tipos de solo. A aspersão da pastagem com óxido de magnésio em pó (125kg/ha)
ou a pulverização com solução de sulfato de magnésio a 2% em intervalos de 2
Tetania devido à Hipomagnesemia em Bovinos e Ovinos 538

semanas dá boa prevenção a curto prazo contra tetania das pastagens sob
condições climáticas adequadas.
Animais que acabaram de sair da estação fria devem ser protegidos do frio e do
vento e providos de suplementação alimentar. A fertilização com nitrogênio e potás-
sio reduz o conteúdo e o aproveitamento do magnésio das pastagens e deve ser
evitada na primavera antes do primeiro acesso dos animais à pastagem. Os bovinos
e ovinos devem ter acesso ao feno ou à pastagem seca. Modificar a data de parição
das vacas que não estiverem no início da lactação, quando o inverno for rigoroso,
é uma medida efetiva de prevenção, mas pode ser economicamente impraticável.

TETANIA DEVIDO À HIPOMAGNESEMIA EM BEZERROS


A tetania em bezerros caracterizada por hipomagnesemia e comumente hipocal-
cemia, é clinicamente idêntica à tetania das pastagens no gado adulto. Por causa
de sua ocorrência em bezerros de 2 a 4 meses sendo alimentados apenas com leite,
ou em bezerros jovens alimentados com sucedâneos lácteos ou processos crôni-
cos, a doença é considerada como decorrência da absorção inadequada de
magnésio intestinal. A inadequação pode ser devida a uma deficiência primária de
magnésio na dieta ou à rápida passagem da ingestão através dos intestinos. No
último caso, é necessário cessar a diarréia crônica. Os bezerros afetados requerem
tratamento imediato com solução de sulfato de magnésio a 10% (100mL s.c.),
seguida pela administração oral de 10 a 15g de óxido de magnésio, diariamente.
Este nível de dosagem oral com óxido de magnésio também é um profilático efetivo.
Também é recomendado suplementar a dieta com feno ou pastagem.

CETOSE NO GADO
(Acetonemia, Cetonemia)

Trata-se de uma doença metabólica de vacas lactantes que ocorre desde alguns
dias a algumas semanas após a parição. É caracterizada por hipoglicemia, cetonemia,
cetonúria, inapetência, letargia ou excitabilidade, perda de peso, diminuição da
produção leiteira e, ocasionalmente, incoordenação. Na maioria das áreas, a inci-
dência é maior nas vacas de alta produção que estão sendo alimentadas no estábulo.
Etiologia – Qualquer fator que cause redução no aporte ou absorção dos
precursores de carboidratos da dieta pode causar cetose primária. Embora, teorica-
mente, os fatores que afetam o metabolismo dos carboidratos absorvidos possam
similarmente causar hipoglicemia e cetose primária, nenhum deles foi identificado.
A teoria de que a causa primária de cetose é a disfunção do córtex adrenal não foi
substanciada. A cetose é comumente secundária à depressão do apetite resultante
de doenças primárias como metrite, mastite e deslocamento do abomaso.
A hipótese de deficiência de carboidratos é baseada na observação de que, das
várias formas de carboidratos ingeridas pelos ruminantes, poucas são absorvidas
como glicose. As principais fontes de energia do animal são os ácidos acético,
propiônico e butírico produzidos pela fermentação microbiana no rúmen; destes, o
ácido propiônico é geralmente aceito como o maior precursor de carboidratos e o
único a ter propriedades anticetogênicas. Se isto ocorrer, a vaca lactante recebe
pouco ou nenhum excesso de carboidrato além daquele requisitado para a síntese
de lactose secretada no leite. Um aporte calórico inadequado pode ocorrer quando
a comida é insuficiente ou desagradável, ou quando o balanço de substâncias
cetogênicas e anticetogênicas na dieta é perturbado, por exemplo, pela administra-
Cetose no Gado 539

ção de determinadas silagens com elevado conteúdo de ácido butírico. A composi-


ção da dieta pode similarmente modificar a população microbiana do rúmen, e isso
influencia a proporção relativa dos ácidos graxos voláteis produzidos pela fermen-
tação. Se a propensão for para a produção de ácidos graxos voláteis cetogênicos,
a cetose é esperada como seqüela.
Em rebanhos leiteiros, boa parte do componente etiológico para cetose deriva da
demanda de glicose requerida para produção de lactações profusas. Se a demanda
para um suprimento direto de glicose para os tecidos não for obtida dos estoques
hepáticos de glicogênio, os tecidos são invadidos por gordura, cujo metabolismo
promove cetogênese.
Achados clínicos – Os sinais incluem inapetência, constipação, fezes cobertas
de muco, depressão, olhar fixo, queda na produção leiteira, algumas vezes uma
postura corcunda sugestiva de dor abdominal suave e, em pouco tempo, em casos
não tratados, uma óbvia perda de peso. A maior parte dos casos é definhante, do
tipo letárgico, mas com alguns sinais de frenesi e agressão. Os sinais clínicos
incluem o andar em círculos, cambaleios, pancadas, mastigação, urros, hiperestesia,
andar compulsivo e pressão da cabeça contra objetos. Isto ocorre em episódios que
duram , 1h e recorrem a intervalos. A respiração possui odor acetônico. A
hipoglicemia, cetonúria e cetonemia estão sempre presentes. A doença é autolimitante
porque a redução de aporte alimentar eventualmente causa uma cessação do fluxo
de leite e esgotamento de glicose. A cetose subclínica ocorre em vacas que
apresentam cetonúria após a parição mas estão clinicamente normais. Estas vacas
têm uma pequena redução na produção láctea, mas um nível significante na
ineficiência reprodutiva associado à endometrite.
Diagnóstico – Enquanto um teste negativo de urina ou leite (Rothera ou
“Acetest”) descarta a cetose, a simples presença de hipoglicemia, cetonemia e
cetonúria não é suficiente para confirmar o diagnóstico de uma cetose primária.
Qualquer anormalidade que leve uma vaca em início de lactação a apresentar
anorexia, por exemplo, metrite, pneumonia, ou mastite, causa um certo grau de
cetose secundária ou cetose rápida . Tais condições, naturalmente, podem acom-
panhar a síndrome cetótica pura. Uma das causas mais comuns da cetose
secundária é o deslocamento do abomaso para a esquerda (ver pág. 183). A
hipomagnesemia persistente subclínica (ver pág. 536) também foi identificada como
precursora da acetonemia e liga-se à deficiência de cobalto (ver pág. 1452) como
um fator predisponente identificável no gado em pastagens. Na cetose secundária,
a reação positiva aos comprimidos de “Acetest” pela urina não é freqüentemente tão
rápida e tampouco é pronunciada, como na doença primária. Algumas vezes, é
aconselhável cautela no diagnóstico até que a resposta ao tratamento tenha sido
observada. A falha em se conseguir uma resposta contínua e definitiva pela glicose
ou hormonioterapia é causa para reconsideração dos sinais e possíveis complicações.
Tratamento – Em vacas magras que obviamente têm sido subnutridas, a
reposição dos carboidratos é recomendada. Em vacas obesas, nas quais o
desequilíbrio nutricional é a causa mais provável, os glicocorticóides são eficazes.
A injeção EV de glicose não é suficientemente eficaz, mesmo quando repetida
diariamente por 3 a 4 dias, para ser recomendada como única forma de tratamento.
Entretanto, é comumente usada como suplemento para glicocorticóides parenterais
ou propilenoglicol oral. Uma injeção de glicose resulta em pronto incremento na
glicose sangüínea, que é seguido por um decréscimo nas próximas horas para
valores geralmente abaixo dos normais, mas ainda maiores que o nível pré-
tratamento; a glicose sangüínea pode não voltar ao normal por vários dias, mesmo
em vacas que mostrem boa resposta.
Em seguida a uma injeção intramuscular de glicocorticóides, a glicose sangüínea
geralmente retorna ao normal em 8 a 10h e pode chegar a um valor consideravel-
Cetose no Gado 540

mente acima do normal em 24h, especialmente quando a causa é ingestão calórica


inadequada. Nestes casos, uma melhora marcante do apetite e do comportamento
geral normalmente ocorre em 24h, e os níveis de cetose sangüínea retornam ao
normal em 3 a 5 dias. A produção de leite pode diminuir durante a terapia com
esteróides, mas aumenta no segundo a terceiro dia após o tratamento. Esteróides
anabólicos estão sendo usados atualmente como tratamento, mas não foram
oficialmente aprovados em todos os países.
Propilenoglicol (225g, 2 vezes ao dia por 2 dias, depois 110g diariamente por 2
dias) ou lactato de amônio (200g diariamente por 5 dias) administrado por VO
possuem um bom efeito em muitos casos. Comparada com outros tratamentos,
entretanto, a resposta é lenta e a terapia deve ser estendida por um longo período.
Estas substâncias parecem ser de grande valor quando usadas como tratamento de
suporte seguindo-se aos usos de glicocorticóides ou glicose. Acetato de sódio
administrado oralmente é menos eficaz. Hidrato de cloral, algumas vezes, é usado
conjuntamente com outros tratamentos, sendo especialmente eficaz quando a
hiperexcitabilidade está presente. Quando o apetite é recuperado, seguindo-se a
qualquer dos tratamentos anteriores, a boa alimentação é necessária para restaurar
o animal para saúde e produção totais.
Sendo freqüentemente difícil a distinção entre cetose primária e secundária
quando o animal exibe sinais de outras condições de enfermidade, é aconselhável
tratar a cetose e a condição complicada.
Profilaxia – Os animais suscetíveis à cetose devem ser mantidos em um regime
de ingestão de energia relativamente alta antes da parição, e o nível deve ser
incrementado substancialmente após a mesma. Um bom guia para a alimentação
satisfatória é a condição corporal da vaca, que deve ser mantida para se evitar
engorda ou emagrecimento exagerados. O conteúdo proteico da ração deve ser
moderado (,16%), e o concentrado administrado para vacas estabuladas deve ser
de , 1kg/3kg de leite produzido.
O aporte diário de feno para a manutenção da condição corporal deve ser de
,3kg/100kg de peso corporal. A forragem deve ser de boa qualidade, palatável,
digestível e nutritiva. Silagens úmidas e finas, emboloradas e empoeiradas são
precursores comuns de acetonemia em vacas de alta produção. As rações que
induzem uma alta produção de ácidos propiônicos no rúmen podem contribuir
materialmente para a prevenção da cetose, quando administradas por algumas
semanas antes e após a parição; por exemplo, uma ração de feno de alfafa
finalmente moída e peletizada, com um cereal cozido em vapor (milho em flocos,
cevada etc.), na qual a relação feno-cereal cozido possa ser de até 8:1, promove
uma alta produção de ácido propiônico. Para esta ração ser efetiva, o animal não
deve ter acesso a fenos compridos, molhados, raspas ou outras forragens não
moídas. Quando grandes quantidades de silagens estão sendo administradas, a
sua substituição por feno pode ser vantajosa. A adição de propionato de sódio ao
alimento reduz a incidência da doença.

TETANIA DA LACTAÇÃO EM ÉGUAS


(Tetania do transporte, Eclâmpsia)

É uma condição associada à hipocalcemia e, algumas vezes, a alterações nos


níveis de magnésio sangüíneo. Ocorre mais freqüentemente em éguas que pariram
, 10 dias ou 1 a 2 dias pós-desmame, ou em éguas amamentando em pastagens
viçosas. Ocasionalmente, é vista em cavalos não lactantes, em geral, após algum
Hipertermia Maligna 541

estresse, por exemplo, transporte prolongado. De ocorrência incomum desde o


“final” dos cavalos de tração, é caracterizada por incoordenação, tetania, suor,
tremores musculares, respiração rápida e violenta e um som surdo vindo do peito,
considerado por muitos como uma contração espasmódica do diafragma. O
manuseio pode exacerbar os sinais, mas cavalos afetados não são hipersensíveis
ao som e não há prolapso da terceira pálpebra como no tétano. Entretanto, o andar
tenso e duro e a cauda em bandeira são aparentes. A temperatura corporal está
próxima ao normal e o apetite parece não estar prejudicado, mas durante um ataque,
o animal é incapaz de comer, urinar ou defecar. Animais levemente afetados podem
se recuperar espontaneamente; animais afetados de forma severa decaem em
,24h, desenvolvem convulsões tetânicas e usualmente morrem no dia seguinte.
A resposta às injeções EV de soluções de cálcio administradas vagarosamente
é, em geral, boa. Se a tetania for associada ao transporte, é aconselhável a
incorporação de magnésio à solução. A sedação é freqüentemente indicada para
éguas excitáveis.

HIPERTERMIA MALIGNA
(Síndrome do estresse porcino [SEP], Carne de porco pálida, mole e
exsudativa [PME], Necrose do músculo dorsal, Miopatia do transporte)

É uma miopatia hipermetabólica, semelhante ao choque, causada em animais


geneticamente suscetíveis por estresse e inalação de anestésicos ou por relaxantes
musculares despolarizantes. Os suínos são os principais animais envolvidos, mas
casos foram relatados em cavalos, cães, gatos, veados, galinhas, coelhos, bovinos
(síndrome da musculatura dupla, ver pág. 574) e no homem. A miopatia da captura
dos animais selvagens (ver pág. 667) é similar em muitos aspectos. Nos suínos,
aqueles de carne magra, bem musculados, de raças de crescimento rápido, como
pietrain, landrace, poland china e aqueles obtidos de cruzamentos destas raças, são
mais suscetíveis.
Etiologia – Embora se pensasse que a hipertermia maligna (HM) fosse transmi-
tida por um único gene autossômico dominante com expressão incompleta ou
variável, evidências mais recentes sugerem que seja transmitida por um gene
autossômico recessivo. Vários fenótipos têm sido identificados, o que sugere que a
herança possa variar de raça para raça, ou ainda, de rebanho para rebanho.
O defeito primário é uma anormalidade da cinética do cálcio no músculo
esquelético. Ocorre aumento da concentração de cálcio mioplasmático e mitocon-
drial na hipertermia maligna. Níveis elevados de cálcio mioplasmático estimulam a
excitação-contração muscular e aumentam a glicogenólise muscular e a produção
cardíaca. Sob condições naturais, a hipertermia maligna é iniciada por estresse, por
exemplo, no manuseio, manejo, transporte, acasalamento, excitação e exercício.
Experimentalmente, a síndrome pode ser induzida por inalação de agentes anesté-
sicos, por exemplo, halotano, metoxiflurano, clorofórmio, enflurano e fluroxeno.
Relaxantes musculares despolarizantes, como a succinilcolina e agonistas α-
adrenérgicos também podem iniciar ou potencializar a síndrome.
Achados clínicos – Os sinais iniciais são leves e finos tremores musculares
rápidos da cauda, dorso e pernas. Os tremores progridem até a rigidez muscular, e
o animal torna-se incapaz de se movimentar. Perda da cor e eritemas, seguidos por
cianose, são evidentes em porcos brancos devido à vasoconstrição periférica.
Taquicardia (, 200bpm), arritmias cardíacas, respiração de boca aberta, hiperven-
tilação, aumento da temperatura corporal e hipercapnia são seguidos por narcose
Hipertermia Maligna 542

pelo CO2, apnéia e morte. A temperatura corporal pode aumentar em até 1°C (a cada
5 a 7min) e pode alcançar até 45°C antes da morte.
Após a morte, o rigor mortis se desenvolve em poucos minutos. A temperatura
muscular está elevada e o alto nível de ácido láctico causa um baixo pH muscular
(≤ 5); entretanto, o pH muscular aumenta rapidamente, conforme o corpo esfria. Os
músculos do dorso, coxas, quadril e ombros são os mais freqüentemente afetados.
Músculos com alta porção de fibras do Tipo 2, como o semitendinoso e o psoas, são
extensivamente mais afetados e devem ser examinados macroscópica e histologi-
camente à necropsia. Os músculos afetados de um animal que morre com quadro
agudo, são pálidos, úmidos, e liberam fluidos à necropsia. Episódios repetidos
podem produzir focos secos e escuros nos músculos afetados. As alterações
histológicas nos músculos não são específicas e podem incluir uma variação no
diâmetro das fibras musculares seccionadas transversalmente e degeneração hialina.
Diagnóstico – Um histórico de estresse ou exposição a drogas estressantes e
suscetibilidade genética são importantes considerações, juntamente com sinais
clínicos semelhantes a choque agudo, tremor muscular, aumento rápido na tempe-
ratura, taquipnéia e rigidez. O pH sangüíneo está diminuído (< 6) e os níveis de lactato
e piruvato sangüíneos estão aumentados. Os níveis de ácido láctico sangüíneo
podem atingir 425mg/dL. A pressão parcial de CO2 está elevada no sangue arterial
e o consumo de oxigênio está aumentado. A concentração de catecolaminas
plasmáticas está aumentada e é responsável pela hiperglicemia concorrente. As
principais mudanças eletrolíticas plasmáticas são os aumentos de potássio e fosfato.
Diagnósticos diferenciais incluem: 1. insolação, que é devida a confinamento ou
exercício forçado em ambientes quentes; 2. tetania hipocalcêmica (puerperal) com
contrações musculares e aumento de temperatura corporal; 3. miopatia de captura
em animais selvagens (quando esta é um diagnóstico diferencial); e 4. azotúria ou
síndrome paralítica, caracterizada pela mioglobinúria, que se desenvolve em
seguida a exercícios em cavalos, bovinos de tração, ovelhas e galgos de corrida.
A SEP, HM e PME são consideradas por alguns como uma única síndrome e por
outros como 3 síndromes. Evidências experimentais demonstraram que estas
síndromes são clinicamente similares e todas são geneticamente determinadas.
Entretanto, genes diferentes parecem controlar a suscetibilidade a estressantes
específicos; por exemplo, todos os porcos que desenvolvem PME não parecem
suscetíveis ao estresse da anestesia por halotano. A suscetibilidade aos diferentes
estressantes pode ser o fator principal na diferenciação das 3 síndromes.
Tratamento – Uma vez que a hipertermia maligna é determinada geneticamente,
uma seleção de criações, em função da suscetibilidade, é essencial; entretanto,
características desejáveis geneticamente controladas, como desenvolvimento mus-
cular e taxas de crescimento, devem ser mantidas. Vários testes de seleção têm sido
utilizados. No teste de desafio ao halotano, os suínos são expostos à anestesia por
halotano (3 a 6% v/v) durante , 5min e os níveis séricos de creatinina fosfoquinase
(CPK) pré e pós-anestésicos são medidos; um aumento de 20 a 100 vezes é
encontrado em porcos suscetíveis. Evidências recentes indicam uma combinação
de halotano e succinilcolina produzindo maior sensibilidade à detectação de
hipertermia maligna. Outro teste utilizado é o do exercício, no qual um aumento de
creatinina fosfoquinase após exercício indica suscetibilidade à hipertermia maligna.
A resistência (e suscetibilidade) à hipertermia maligna também tem sido associada
a certos grupos sangüíneos e à fragilidade osmótica das hemácias.
O tratamento da HM consiste na remoção do animal dos possíveis estresses ou
anestésico inalatório, administração EV de tranqüilizantes, fluidoterapia com bicar-
bonato para corrigir a acidose láctica, resfriamento superficial e hiperventilação com
oxigênio. Um relaxante muscular intracelular experimental, o dantroleno (um deri-
vado de fenitoína) tem demostrado experimentalmente inibir e controlar episódios
Obesidade 543

de HM em suínos. As doses relatadas foram de 3 a 5mg/kg de peso corporal, EV.


A taquiarritmia pode ser tratada com procainamida.

OBESIDADE
O acúmulo de gordura ocorre quando há um desequilíbrio entre as calorias
ingeridas e as perdidas. A obesidade ocorre quando o peso corporal é ≥ 15% acima
do considerado ótimo (ver a seção MCN, pág. 1317, sobre requerimentos nutricionais
de várias espécies; ver também APETITE, pág. 1323, e COMPORTAMENTO, pág. 1085).
Etiologia – A principal causa é o excesso de alimentação combinado com o
exercício inadequado. É o distúrbio nutricional mais comum em cães, sendo que a
incidência aumenta com a idade (acima de 50%), provavelmente devido à redução
da taxa metabólica basal e da atividade física. É mais comum em fêmeas que em
machos, e em cães castrados que em não castrados de ambos os sexos. Algumas
raças de cães tendem a ser mais obesas, incluindo labradores, dachshunds e
beagles. Cães alimentados com comida caseira, restos de comida e petiscos
apresentam uma tendência maior à obesidade quando comparados aos animais
que se alimentam exclusivamente de rações comerciais. Ao contrário dos cães, os
gatos conseguem regular melhor a ingestão de alimentos de acordo com a
necessidade calórica, e a obesidade é menos comum. Entretanto, o número de
gatos obesos parece estar aumentando em freqüência, provavelmente devido ao
aumento do sabor das rações comerciais para gatos. Condições patológicas que
podem estar associadas à obesidade incluem hipotireoidismo, hiperadrenocorticismo,
diabetes melito e insulinoma.
O ponto no qual o acúmulo de gordura em comidas de animais se torna excessivo
é um tanto subjetivo. É, invariavelmente, o resultado de padrões alimentares
anormais impostos aos animais.
Achados clínicos – A espessura da camada de gordura que cobre a caixa
torácica é o melhor indicador da obesidade quando não se sabe qual é o peso
corporal ótimo do animal. Normalmente, as costelas podem ser sentidas com
facilidade, mas não vistas, enquanto as costelas não podem ser facilmente palpadas
nos animais obesos. Abdome pendular, andar bamboleante e inatividade são outros
sintomas de alguns animais obesos. A obesidade pode predispor a muitos problemas
incluindo distúrbios locomotores ou articulares, dispnéia e fadiga, lipidose hepática,
eficiência reprodutiva diminuída, distocia e aumento do risco anestésico e cirúrgico.
Tratamento – O consumo calórico deve ser reduzido e um programa de
exercícios regulares deve ser desenvolvido para gastar energia e possivelmente
reduzir o apetite. A ingestão calórica diária deveria ser reduzida para , 60 a 70%
daquela requerida para manutenção. Isto pode ser realizado mais efetivamente com
uma nutrição completa, mas com baixa caloria e alta concentração de fibra. Dietas
caseiras ou comerciais são preferíveis à alimentação em quantidades menores da
dieta normal. Pequenas refeições podem ser ministradas freqüentemente durante
o dia; petiscos e restos de comida devem ser eliminados. A taxa de perda de peso
deve ser de , 3% por semana durante as primeiras 6 semanas e menor posterior-
mente. O progresso deve ser monitorado por pesagem semanal e devem-se fazer
modificações dietéticas se necessário. A monitoração freqüente também entusias-
ma o proprietário a continuar com o programa.
Uma redução dramática do peso pode ser realizada em cães quando a ingestão
de alimento é quase que completamente restrita. Isto não deve ser realizado em
gatos obesos. Idealmente, o animal deve ser hospitalizado durante este período e
Obesidade 544

examinado diariamente; devem ser administrados suplementos vitamínicos-mine-


rais e a água deve ser dada ad lib. A acidose metabólica e a cetose geralmente não
representam problemas clínicos em cães quando a gordura é mobilizada. Entretan-
to, quando ocorrem alterações no equilíbrio de fluidos, a perda do tecido adiposo
ocorre proporcionalmente à redução do peso e à inanição. Drogas como as
anfetaminas são comprovadamente ineficazes em cães, e procedimentos cirúrgicos
como desvio jejunoileal não são necessários ou recomendados.

PARESIA DA PARTURIENTE EM VACAS


(Febre do leite)

É uma doença afebril de vacas leiteiras idosas que ocorre mais comumente
durante ou logo após a parição e manifesta-se por colapso circulatório, paresia
generalizada e depressão.
Etiologia – A doença geralmente está associada com o súbito início da lactação
profusa; é uma hipocalcemia aguda, na qual os níveis séricos de cálcio estão abaixo
do normal (, 10mg/dL), podendo chegar até 3 a 7mg/dL (média 5mg/dL). A
concentração sérica de magnésio pode estar dimuída e resultar em tetania, ou
elevada e resultar em paralisia flácida e sonolência. A doença pode ocorrer em
vacas de qualquer idade, porém é mais comum em vacas leiteiras de 5 a 9 anos de
idade. Há uma incidência maior na raça jersey.
Achados clínicos e diagnóstico – A paresia parturiente geralmente ocorre em
72h após a parição, mas ocasionalmente antes, durante, ou mesmo alguns meses
após. A doença é algumas vezes a causa de distocia que se origina de esforços
expulsivos inadequados, e o prolapso do útero pode ser uma complicação.
No início da doença, a vaca pode exibir alguma instabilidade ao andar. Mais
freqüentemente, ela é incapaz de se levantar, sendo encontrada deitada sobre
o esterno; a cabeça pode estar deslocada para um lado ou virada para o flanco.
Os olhos são embaçados e fixos e as pupilas dilatadas. A anorexia é completa,
o focinho tende a ser seco e as extremidades são frias. A freqüência do pulso
geralmente é elevada e a temperatura é normal ou subnormal. O trato gastroin-
testinal se torna atônico com defecação suprimida e ânus relaxado. Se o
tratamento é adiado por muitas horas, a apatia dá origem ao coma, que se torna
progressivamente mais profundo, levando à morte. Com o coma próximo, o
animal assume decúbito lateral, o qual predispõe a timpanismo, regurgitação e
pneumonia por aspiração. O tratamento nos estágios iniciais é melhor sucedido
e poucas recaídas ocorrem. Animais afetados no momento ou algumas horas
após a parição parecem desenvolver sinais graves mais rapidamente do que
aqueles que são acometidos em outros períodos. Diagnósticos diferenciais
incluem metrite, mastite coliforme, tetania das pastagens, indigestão aguda,
gastrite traumática, luxações coxofemorais, paralisia do nervo obturador, linfos-
sarcoma, compressão espinhal e fratura da pelve. Algumas destas doenças, em
adição à pneumonia por aspiração e à miopatia degenerativa, podem também
ocorrer concomitantemente com a paresia da parturiente ou como complicações
(ver também V ACA C AÍDA, pág. 669).
Tratamento – Os esforços são dirigidos no sentido de restaurar o nível sérico de
cálcio ao seu patamar normal, o que deve ser feito o mais cedo possível para evitar
danos nervosos e musculares e decúbito. Isto é facilitado pela supervisão intensa
das vacas que pariram nas 72h precedentes. Borogliconato de cálcio é mais
comumente usado (250 a 500mL, 25% de solução), preferivelmente por injeção EV,
Paresia da Parturiente em Ovelhas 545

porém as vias subcutânea e intraperitoneal também são usadas. A administração


s.c. permite lenta absorção do íon de cálcio e pode diminuir o risco de parada
cardíaca. A assepsia cuidadosa e a limitação de volume injetado em cada local a
, 50mL reduzem as chances de reações locais.
Os animais que apresentam recidiva ou que não se levantam depois de 8 a 12h
devem ser tratados novamente, embora no momento de cada tratamento, o
diagnóstico deve ser reconfirmado e as complicações estabelecidas. Na ausência
de uma análise sangüínea, é freqüentemente impossível se saber qual elemento
está abaixo de seu nível de normalidade: além do cálcio, outros íons, como o fósforo,
o potássio ou mais provavelmente o magnésio, podem estar indicados para casos
não responsivos. Nos casos complicados por cetose (ver pág. 538), devem-se
administrar 250 a 500mL de dextrose a 50%, EV.
Nos poucos casos nos quais há falhas na resposta a qualquer outro tratamento,
o úbere pode ser inflado. Cada quarto é inflado através de um tubo estéril via teta
até ficar firme, se necessário, as tetas são gentilmente amarradas com gaze para
prevenir o escape do ar. A gaze é removida depois de 2 a 3h e o úbere é parcialmente
ordenhado. Se necessário, a insuflação pode ser repetida 6 a 8h mais tarde.
Profilaxia – A alimentação com dietas contendo níveis de fósforo normais a
elevados e com baixo nível de cálcio durante a fase final da prenhez ajuda a prevenir
a paresia da parturiente, porém estas rações são difíceis de preparar de forma
prática e, se administradas por longos períodos em vacas de alta lactação, podem
resultar em perigosa depleção das reservas minerais esqueléticas. Ordenha retar-
dada ou incompleta após a parição, pela manutenção de certa pressão no úbere, é
de valor duvidoso na redução do número de ocorrências e pode agravar uma
infecção latente para mastite aguda. Doses maciças de vitamina D (20 a 30 milhões
de unidades diárias), administradas na alimentação por 5 a 7 dias antes da parição,
reduzem a incidência, porém se a administração for interrompida por mais de 4 dias
antes da parição, a vaca se torna mais suscetível. Esta eventualidade pode ser
evitada pela injeção simultânea de um corticosteróide para induzir a parição. A
dosagem por períodos mais longos que aqueles recomendados deve ser evitada
devido ao perigo de toxicidade. Uma única injeção EV ou s.c. de 10 milhões de
unidades de vitamina D cristalina, administrada 8 dias antes da parição, é um
preventivo eficaz. A dose é repetida se a vaca não parir na data devida. Novos
compostos usados (onde aprovados e disponíveis) no lugar de vitamina D e menos
prováveis de causar hipervitaminose D são 25-hidroxicolecalciferol, 1,25-diidro-
xicolecalciferol e 1α-hidroxicolecalciferol. Depois da parição, uma dieta rica em cálcio
é requerida. Atualmente, é uma prática comum administrar largas doses de cálcio em
forma de gel (VO) após a parição para assegurar uma alta ingestão do elemento.
Doses de 150g de cálcio são administradas 1 dia antes e 1 dia após a parição.

PARESIA DA PARTURIENTE EM OVELHAS


É um distúrbio de metabolismo em ovelhas prenhes e lactantes caracterizado por
hipocalcemia aguda e rápido desenvolvimento de hiperexcitabilidade, ataxia,
paresia, coma e morte.
Etiologia – A causa exata é desconhecida, mas as condições sob as quais os
surtos de campo ocorrem são consideravelmente bem definidas. A deficiência de
cálcio e/ou magnésio pode contribuir para o processo. A doença ocorre a qualquer
momento, desde 6 semanas antes da parição até 10 semanas após, principalmente
em ovelhas velhas muito limitadas ao pasto. O princípio é súbito e quase invariavel-
Paresia da Parturiente em Ovelhas 546

mente segue, dentro de 24h, mudança abrupta na alimentação, súbita mudança no


tempo ou curtos períodos de jejum impostos por circunstâncias tais como tosquia,
enforquilhamento ou transporte (ver também TETANIA DO TRANSPORTE EM RUMINAN-
TES, pág. 553).
Achados clínicos e diagnóstico – Caracteristicamente, a doença ocorre em
surtos. A incidência é em geral < 5%, mas em surtos graves, 30% do rebanho pode
estar afetado ao mesmo tempo. Os sinais precoces são ligeira hiperexcitabilidade,
tremores musculares e distúrbios locomotores. Isto é logo seguido por embotamen-
to, decúbito esternal (freqüentemente com os membros posteriores estendidos para
trás), discreto timpanismo ruminal, regurgitação de comida através das narinas,
olhar fixo, respiração superficial, coma e morte em 6 a 36h.
O diagnóstico é baseado no histórico e sinais clínicos. Em surtos de ocorrência
anterior ao parto, a toxemia da prenhez é o principal diagnóstico diferencial. Um
diagnóstico experimental de hipocalcemia aguda pode ser confirmado de imediato
por uma dramática e geralmente duradoura resposta à calcioterapia.
Profilaxia e tratamento – O tratamento consiste em injeção de cálcio, EV ou s.c.
(por exemplo, 100mL de borogliconato de cálcio a 25% w/v), preferencialmente com
magnésio adicionado. As ovelhas afetadas devem ser manejadas com cuidado a fim
de que mortes súbitas não ocorram por falha cardíaca. A prevenção reside,
sobretudo, na prevenção das causas predisponentes.

EXAUSTÃO FÍSICA
Ocorre por uma série complexa de eventos metabólicos que acometem um
indivíduo quando o mesmo ultrapassa o seu limite de resistência. (É diferente da
fadiga, a qual pode ser considerada como um cansaço extremo dentro do limite
normal do indivíduo.) Ocorre mais freqüentemente em animais forçados a exercícios
físicos prolongados, na maioria das vezes sob condições ambientais severas.
Eqüinos utilizados em enduros e maratonas são os mais comumente afetados.
Fisiopatologia – No início do exercício, o corpo responde ao aumento da
demanda metabólica, aumentando o suprimento de oxigênio para os músculos
locomotores, os quais sintetizam ATP para a produção de energia. Se a intensidade
dos exercícios for mantida em níveis aeróbicos, esta pode ser mantida durante
períodos consideráveis. Quando a intensidade dos exercícios aumenta acima do limi-
te aeróbico suportável, a energia é produzida anaerobicamente e a fadiga se instala
com rapidez. O calor é sempre produzido, não importando se a energia é produzida
por via aeróbica ou anaeróbica. No cavalo normal, este calor é dissipado pela
evaporação do suor. Se os elementos perdidos pelo suor durante o exercício
prolongado não forem substituídos, principalmente sob alta temperatura e umidade
ambientais, ocorrerão distúrbios metabólicos associados à exaustão.
É difícil medir-se a perda de fluidos; entretanto, alterações no peso corporal
fornecem um bom indicador quantitativo sob circunstâncias prevalentes. Os sinais
clínicos de desidratação tornam-se aparentes quando 4 a 5% do peso corporal é
perdido e os sinais são severos quando há perda de , 10%. As concentrações de
potássio e de cloreto são maiores no suor que no plasma; portanto perdem-se mais
rapidamente que o sódio. O cloreto é mais importante e sua perda resulta em
alcalose conforme o organismo conserva os íons de bicarbonato para compensar
o ânion perdido.
As alterações na composição plasmática que ocorrem durante os enduros
variam com a duração da corrida, temperatura e umidade ambientais, vigor da
Exaustão Física 547

corrida e acesso à água (com ou sem a adição de eletrólitos) durante o decorrer da


competição. A tendência geral para os eletrólitos é ocorrer uma pequena alteração
durante as corridas de 100km, contanto que não esteja tão quente. Quando a
temperatura é morna ou quente e a sudorese é profusa, as concentrações eletrolí-
ticas plasmáticas podem declinar significantemente. Entretanto, as concentrações
de cálcio e de magnésio diminuem e a de fósforo pode aumentar significantemente.
Além disso, as concentrações de proteína plasmática e de albumina aumentam,
como reflexo da desidratação. Este mesmo efeito também ocorre nos eritrócitos e
leucócitos, durante e após a corrida. O aumento das concentrações plasmáticas de
creatinina, uréia e bilirrubina também reflete os efeitos da desidratação, enquanto
o aumento de CPK e AST(SGOT) indica a perda aumentada a partir das fibras
musculares. Em cavalos normais, estes valores retornam ao normal após a corrida;
se isto não ocorrer, é sinal de exaustão. Elevações persistentes de CPK ou AST
indicam lesão muscular, como ocorre na rabdomiólise (ver pág. 667), o que pode
fazer parte do processo de exaustão.
Acompanhando estas alterações, o aumento do pH sangüíneo, bicarbonato e do
excesso de bases, principalmente durante o meio da corrida, indicam o desenvol-
vimento de alcalose metabólica. Queda marcante na glicemia e aumento na
concentração de ácidos graxos livres e de glicerol, principalmente no final de
corridas longas, refletem o aumento da contribuição do metabolismo lipídico para a
produção de energia, conforme declinam gradualmente as fontes de carboidratos no
fígado.
Dentro das fibras dos músculos locomotores, a produção de energia depende
de mecanismos aeróbicos ou anaeróbicos. Sob níveis submáximos de trabalho em
condições aeróbicas, a duração do trabalho é limitada por fatores que governam
o suprimento de glicose (de glicogênio hepático e IM) e/ou de ácidos graxos não
esterificados (dos lipídios corporais armazenados). Quando a capacidade de produ-
zir energia por via aeróbica é excedida, devido a um suprimento insuficiente de
oxigênio ou por um trabalho que exceda a capacidade aeróbica do animal, a diferença
nas necessidades energéticas é encontrada pelas vias anaeróbicas. Como resulta-
do, o ácido láctico é produzido, iniciando-se o processo de fadiga. Este processo
possui dois estágios: 1. a dificuldade de liberação do cálcio do retículo sarcoplasmá-
tico e sua ligação pela troponina; e 2. o turnover da actina-miosina através das pontes.
Ambos os estágios requerem energia das reações de ATPase e são inibidos
quando a quantidade de ATP é pequena, quando inibidores da ação da ATPase
atingem níveis suficientes para inibi-la, ou quando o pH muscular diminui a níveis
inibitórios. O pH baixo também diminui a liberação do cálcio e sua afinidade pela
troponina. Durante um exercício prolongado, sob condições aeróbicas sem acúmulo
de ácido láctico, a fadiga ocorre quando o estoque de glicogênio é esgotado.
Entretanto, a fadiga também ocorre quando as reservas de substratos energé-
ticos são adequadas, não há acúmulo de ácido láctico e o pH encontra-se baixo. O
acúmulo de íons de potássio ou a depleção de sódio no espaço extracelular ou no
sistema sarcotubular pode resultar em fadiga, afetando ou prevenindo a propaga-
ção dos potenciais de ação. Uma disseminação irregular da excitação tubular e,
portanto, uma ativação miofibrilar podem ocorrer.
Além disso, o papel do acúmulo de fósforo inorgânico durante o exercício, e sua
ação no processo de fadiga, principalmente na ausência de alta concentração do íon
de hidrogênio, necessita de mais estudos.
Achados clínicos – Tipicamente, um cavalo exausto encontra-se letárgico e
mostra-se pouco interessado no ambiente. As córneas estão vitrificadas, as orelhas
sem expressão e a face parece ansiosa, refletindo a presença de cólicas ou de
espasmos musculares. Os animais geralmente estão anoréticos e com freqüência,
apesar de desidratados, não bebem água. A hipertermia geralmente está presente,
Exaustão Física 548

apesar da temperatura retal poder ser enganosa se o reto estiver dilatado por ar
devido a uma diminuição do tono do esfíncter anal. O reflexo do esfíncter anal pode
estar ausente.
Taquicardia e taquipnéia persistentes são evidentes. Uma respiração superficial
e mais rápida que a taxa cardíaca pode causar uma troca gasosa ineficiente. Ritmo
diafragmático agitado, arritmias, murmúrios e pulso jugular evidente podem ser
sinais adcionais de insuficiência dos sistemas cardiovascular e pulmonar na
tentativa de restabelecer a função normal.
O achado clínico mais evidente é a desidratação, que se reflete pela perda da
elasticidade cutânea, enoftalmia e membranas mucosas secas. Estas alterações
indicam uma perda de 7 a 10% do peso corporal, podendo chegar a até 30 a 40L de
água. Esta perda é complicada pelo desequilíbrio eletrolítico severo que se segue.
Fadiga, fraqueza, tremores, cansaço, rigidez, dor e possivelmente paralisia são os
sinais musculares habituais.
Se não for administrada uma terapia de suporte apropriada com fluidos e
eletrólitos, pode ocorrer insuficiência renal por exaustão, disfunção hepática,
rabdomiólise e mesmo laminite. O desenvolvimento desses problemas é detectado
por altas concentrações plasmáticas de creatinina, uréia, CPK e AST(SGOT) por
vários dias após a corrida. A redução do fluxo e a concentração urinária ocorrem
durante o curso da corrida, retornando ao normal com a restauração da hidratação.
Virtualmente, não há nenhuma alteração na composição da urina entre cavalos
normais e exaustos,exceto quando há sangue na urina em animais com mioglobinúria.
“Flutter” diafragmático sincronizado (“soluços”) – Freqüentemente rela-
cionado ao estresse atlético e não raro visto em corridas de enduro, isto também ocorre
em outras condições, incluindo pressão traumática no nervo frênico, êmese persis-
tente, desequilíbrio eletrolítico e estados de hipocalcemia, como na paresia da
parturiente. As 3 alterações fisiopatológicas comuns são alcalose (geralmente
metabólica), hipocalcemia e desequilíbrio eletrolítico. Os cavalos podem ser retira-
dos durante o enduro devido a este problema, quando eles estão provavelmente
alcalóticos, normocalcêmicos e em graus variáveis de desidratação. Eles encontram-
se quase com certeza cansados, mas não necessariamente exaustos. Qualquer que
seja a causa específica, o mecanismo que leva ao “flutter” diafragmático sincroni-
zado é provavelmente uma estimulação do nervo frênico pela descarga elétrica
cardíaca. O diafragma se contrai simultaneamente com o batimento cardíaco.
Tratamento e prevenção – Os cavalos se manterão hidratados, dentro de limites
razoáveis, se um suprimento hídrico adequado for fornecido a intervalos freqüentes
durante a corrida. Beber pequenas quantidades de água a intervalos regulares é
melhor do que beber grandes quantidades ocasionalmente. Suplementar a água com
sal ou eletrólitos também é vantajoso. Se ocorrerem a desidratação e a exaustão,
deve-se imediatamente restabelecer o volume hídrico corporal e o equilíbrio eletro-
lítico. Os cavalos que estão prontos para beber podem ser tratados com uma solução
eletrolítica balanceada por via oral e depois devem ter acesso à água à vontade.
Como resultado da perda de eletrólitos e das concentrações plasmáticas (por
exemplo, baixo nível de sódio), o animal poderá não ter sede, devendo ser tratado
por gavagem até que a mesma retorne. Nos cavalos afetados severamente, pode ser
necessário um tratamento inicial EV para restaurar a hidratação rapidamente; a
terapia de manutenção é depois mantida por via oral. Quando complicada pelo
“flutter” diafragmático sincronizado e se a hipocalcemia fizer parte do desequilíbrio
metabólico, a administração de borogliconato de cálcio é importante para bloquear
os “soluços”. Geralmente, a simples correção da alcalose interrompe os “soluços”. Se
houver evidência de mioglobinúria, deve-se administrar uma fluidoterapia rigorosa
para aumentar a diurese substancial a fim de reduzir o grau da lesão tubular renal
provocada pela mioglobina filtrada. Se houver sinais clínicos de dor, podem-se
Toxemia da Prenhez em Vacas 549

administrar analgésicos. Em termos gerais, um cavalo que termina uma corrida de


80 a 160km e está moderadamente desidratado necessita de fluidos por via oral
(20 a 50L), contendo de 13 a 30g de cloreto de sódio e 8 a 20g de cloreto de potássio
por litro, para restaurar a hidratação. Se estiver severamente desidratado, também
deve-se administrar uma solução eletrolítica balanceada, EV (por exemplo, solução
de lactato de Ringer) em 10 a 20L. Treinamento e condicionamento adequados do
cavalo, acompanhamento cuidadoso dos eventos durante a corrida e fornecimento
de água durante a mesma, principalmente nas superiores a 50km, contribuem
substancialmente para a prevenção da exaustão e de suas complicações.

HEMOGLOBINÚRIA PÓS-PARTO
Trata-se primariamente de uma doença de vacas de alta produção leiteira que
ocorre 2 a 4 semanas após o parto. É caracterizada por hemólise intravascular,
hemoglobinúria e anemia.
A causa é desconhecida. A doença é rara em animais de corte ou em animais
< 3 anos; é incomum num período > 4 semanas após o parto. A incidência é geralmen-
te baixa, porém até 50% dos animais afetados podem morrer. Dietas com alta
quantidade de plantas crucíferas (colza ou couve) ou polpa de beterraba, e alimenta-
ção prolongada com dietas deficientes em fósforo são fatores predisponentes. Na
América do Norte, a doença pode ocorrer após longa estabulação. Acredita-se que a
hemoglobinúria seja associada à hipofosfatemia devido aos níveis séricos de fósforo
sempre subnormais (0,8 a 1,4mg/dL) em vacas agudamente doentes. Na Nova
Zelândia, a deficiência nutricional de cobre é a causa mais comum, embora a deficiên-
cia de selênio também possa ser responsável. A explicação mais plausível para estas
observações de campo é que os agentes hemolíticos ocorrem na pastagem, bem
como na colza, nabo e outras plantas crucíferas, e que o estado de hipofosfatemia ou
hipocuprose confere às hemácias maior suscetibilidade a estas hemolisinas.
A hemólise EV rápida leva a hemoglobinúria, palidez acentuada e pulso rápido.
Desidratação, fraqueza e marcante queda na produção do leite são sinais proemi-
nentes. A temperatura pode ser elevada a 39,5°C. Uma certa angústia respiratória
pode ser observada. A hemólise intravascular continua por 3 a 5 dias, e em vacas
que se recuperam, o retorno ao normal é vagaroso. A icterícia pode ocorrer em
estágios tardios. Sem tratamento, a morte é freqüente.
A transfusão de largas quantidades de sangue total pode ser o único tratamento
efetivo de animais severamente afetados. Nos casos menos graves, 60g de fosfato
de ácido sódico em 300mL de água destilada podem ser administrados endoveno-
samente, seguidos por injeções subcutâneas a cada 12h ou por doses orais diárias
da mesma quantidade de fosfato. Se injetado subcutaneamente, o fosfato de ácido
sódico deve ser bem distribuído para evitar necrose tecidual. Farinha de osso deve
ser adicionada à ração. É importante evitar a deficiência de cobre ou fósforo na dieta
e prevenir o acesso das vacas a plantas que obviamente contêm hemolisinas.

TOXEMIA DA PRENHEZ EM VACAS


É uma doença esporádica que ocorre mais comumente em vacas que se
tornaram obesas devido à alimentação intensa no início da prenhez, mas que sofrem
Toxemia da Prenhez em Vacas 550

um estresse nutricional grave durante os 2 meses que antecedem a parição (ver


também SÍNDROME DA VACA OBESA, pág. 536). A morbidade é baixa, tornando-se
maior quando o gado alimentado no pasto fica sem alimentação natural e não é
suplementado. Quando a doença torna-se clinicamente aparente, está usualmente
muito avançada e o tratamento neste estágio não é compensador; a mortalidade é
virtualmente de 100%.
Nos últimos estágios da prenhez, as vacas afetadas estão invariavelmente
obesas, completamente anoréticas e em geral carregando gêmeos. Há um período
transitório de inquietação e incoordenação, o pulso é fraco e rápido, e as fezes são
pequenas e firmes. Segue-se decúbito esternal. Há um volume de descarga nasal
clara maior que o normal, a pele do focinho apresenta-se seca, com rachaduras
existe a possibilidade de sua perda ; os movimentos respiratórios são rápidos e com
grunhidos. A condição do animal permanece imutável por 7 a 10 dias. Terminalmente,
as fezes se tornam moles e malcheirosas, tendem a ser alaranjadas e permanecem
pequenas no tocante ao volume; a vaca torna-se comatosa e morre silenciosamente.
Os achados laboratoriais são cetonemia e cetonúria marcantes, hipoglicemia e
proteinúria. Os níveis de enzimas hepáticas no soro são elevados e, na fase
terminal, o nível de glicose sangüínea está freqüentemente muito elevado. À
necropsia, há um aumento do volume do fígado, o qual tem aspecto gorduroso. A
ostertagíase é com freqüência uma doença concomitante significativa e a mucosa
do abomaso pode estar obviamente anormal.
O tratamento é em geral ineficaz, sobretudo se a vaca já está em decúbito. Os
esteróides anabólicos têm a melhor reputação, e a terapia de suporte com glicose,
fluidos e eletrólitos (EV ou VO) e propilenoglicol (VO) é recomendada. Embora seja
provável a perda do bezerro, a vida da vaca pode ser protegida por indução do parto
com corticosteróides ou por secção cesariana.
Esta patologia pode ser prevenida com uma suplementação adequada de
concentrados na alimentação, durante o último trimestre da gestação.

TOXEMIA DA PRENHEZ EM OVELHAS


(Cetose ovina)

É uma doença de ovelhas parturientes, caracterizada primariamente por sinto-


mas neurológicos.
Etiologia – A causa primária predisponente é a subnutrição no final da prenhez.
Ovelhas superalimentadas, carregando gêmeos ou trigêmeos, são mais suscetíveis
que ovelhas em condições ruins e aquelas que carregam um único cordeiro.
Qualquer elemento que interrompa o aporte alimentar (por exemplo, tempestades,
transporte, outras condições da doença) pode induzir a patologia. A lesão primária
é uma encefalopatia hipoglicêmica, que resulta da inabilidade da ovelha para suprir
glicose suficiente (provinda dos produtos da digestão ou de tecidos catabolizados)
para cobrir a demanda de carboidratos dos fetos múltiplos e grandes e de si mesma.
O defeito parece estar na manutenção do nível de glicose sangüínea, uma vez que
a utilização da glicose disponível não está impedida. Com o progresso da doença,
cetose grave e acidose podem se desenvolver, juntamente com distúrbios hepáti-
cos, renais e, possivelmente, endócrinos. A glicose sangüínea pode se elevar sem
aliviar os sinais de encefalopatia. Neste estágio, a ovelha é refratária ao tratamento.
Achados clínicos e diagnóstico – Sinais clínicos precoces podem ser erráticos
e difíceis de detectar. O curso usual, que dura 2 a 5 dias, inclui indiferença,
inapetência, andar sem direção, “estacamento” contra qualquer tipo de obstrução,
Tetania Puerperal 551

contrações musculares (das orelhas, ao redor dos olhos e talvez de outras partes),
posturas incomuns, ranger dos dentes, perda progressiva de reflexos, cegueira,
ataxia e, finalmente, decúbito esternal, coma e morte.
Os testes laboratoriais geralmente revelam hipoglicemia nos estágios iniciais,
com normoglicemia ou hiperglicemia na fase final, e hipercetonemia. A acidose e
elevação do nitrogênio não proteico sangüíneo são achados concomitantes variá-
veis. Achados de necropsia incluem fígados de aspecto gorduroso, indistingüíveis
daqueles achados algumas vezes em ovelhas aparentemente sadias, subalimentadas
e perto da parição. As glândulas adrenais podem estar aumentadas, hiperêmicas ou
acinzentadas. Alterações pulmonares estão associadas ao decúbito.
A hipocalcemia aguda antes da parição é o principal diagnóstico diferencial.
Nesta, a duração é curta (a morte ocorre em 24h), e usualmente há uma resposta
acentuada, imediata e persistente à terapia com cálcio EV.
Tratamento – Uma vez que sinais avançados se desenvolvem, nenhum trata-
mento é altamente eficaz. A mortalidade dos casos não tratados é de , 80%. Com
o diagnóstico precoce, que pode ser obtido por movimentação cuidadosa do
rebanho, particularmente quando a doença foi induzida por um jejum relativamente
súbito, o glicerol ou o propilenoglicol (120mL em 2 vezes ao dia por VO) reduzem
a mortalidade. Os melhores resultados são obtidos com a combinação de um desses
medicamentos com um esteróide anabólico e fluidoterapia para controlar a acidose,
mas mesmo assim a mortalidade pode ser de aproximadamente 50%. A cesariana
ou a indução do aborto no início do curso da doença geralmente leva à recuperação
e, se próximo ao parto, a cria pode ser salva. Deve-se providenciar alimentação
palatável, água e proteção contra os extremos climáticos. Duas vezes ao dia,
alimentação forçada com pastagem seca, finamente moída, administrada pelo tubo
gástrico, pode ser uma prática válida, especialmente com animais valiosos; o
tratamento deve ser continuado até que o apetite retorne.
Profilaxia – No início da prenhez, a obesidade deve ser evitada, e um suplemen-
to bom e adequado deve ser administrado nas últimas 6 semanas. A suplementação
alimentar depende da condição da pastagem e do peso das ovelhas. Quando as
pastagens se tornam ruins, uma suplementação em quantidade maior pode ser
necessária. Se uma alimentação adequada não estiver disponível para todo o
rebanho ao final da prenhez, casos prematuros podem ser identificados por um
manejo cuidadoso. Estes indivíduos podem ser separados do rebanho e receber
cuidados especiais e boa alimentação, porém qualquer interrupção do aporte
alimentar deve ser evitada.
Quando a doença ocorre em ovelhas obesas em boas pastagens, talvez
associada a problemas nos membros, uma caminhada leve por 30min pode prevenir
o desenvolvimento de casos incipientes a partir da elevação da glicose sangüínea
por um período. Quando a suplementação alimentar pode ser provida como
profilaxia, é importante prevenir a hiperalimentação, a qual pode causar acidose
láctica e laminite. Ambas as doenças são possíveis se os grãos estiverem
disponíveisad lib.

TETANIA PUERPERAL
(Eclâmpsia)

É uma doença encontrada mais freqüentemente em pequenas e excitáveis raças


de cães como chihuahuas, poodles toy e pequenos terriers, particularmente de 1 a 3
semanas após o parto. Também ocorre esporadicamente em cães maiores e gatos.
Tetania Puerperal 552

Etiologia e patogenia – Consideravelmente pouco é conhecido sobre a patoge-


nia das síndromes pós-parturientes hipocalcêmicas em cães e gatos em compara-
ção à doença que ocorre no gado (ver pág. 544). Existe pouca evidência para sugerir
que a tetania puerperal em cadelas lactantes é o resultado de uma interferência na
secreção do hormônio paratireóideo (PTH); de fato, os níveis de PTH parecem ser
aumentados em resposta à hipocalcemia. A hipocalcemia e hipofosfatemia severas,
que se desenvolvem junto ao pico de lactação (1 a 3 semanas pós-parto),
provavelmente são o resultado de um desequilíbrio entre as taxas de entrada e saída
do “pool” de cálcio extracelular.
Os distúrbios funcionais associados à hipocalcemia na cadela são, primariamen-
te, o resultado da tetania neuromuscular aumentada, em contraste àqueles obser-
vados na vaca, na qual os sinais clínicos são dominados por paresia muscular. A
ocorrência de tetania ou paresia, em resposta à hipocalcemia, parece ser o
resultado de diferenças fisiológicas básicas entre a cadela e a vaca na função da
junção neuromuscular. Em vacas, a liberação de acetilcolina e a transmissão dos
impulsos nervosos através das junções neuromusculares são bloqueadas pela
hipocalcemia grave, que leva à paresia muscular. O cão parece ter uma margem de
segurança maior na transmissão neuromuscular, na qual o grau, cujo potencial final
de placa excede o limiar de disparo, é maior que na vaca. Na cadela com
hipocalcemia, a ligação excitação-secreção é mantida na junção neuromuscular. A
tetania ocorre como resultado de disparos repetitivos espontâneos das fibras
motoras nervosas. Como resultado da perda de cálcio estabilizador ligado às
membranas, as membranas nervosas se tornam mais permeáveis aos íons e
requerem um estímulo de menor magnitude para se despolarizarem.
Achados clínicos e diagnóstico – O curso clínico na hipocalcemia da partu-
riente canina é rápido, com apenas 8 a 12h de intervalo entre o aparecimento dos
sinais clínicos iniciais e o desenvolvimento da tetania. Os sinais premonitórios
incluem intranqüilidade, arquejo excessivo e comportamento excitável. Em poucas
horas, os sinais podem progredir para ataxia, tremores, tetania muscular e convul-
sões. A hipertermia está freqüentemente associada ao aumento da atividade
muscular; elevações da temperatura para 42°C não são incomuns.
Na maioria dos casos, o diagnóstico é baseado na história, sinais clínicos de
excitabilidade neuromuscular aumentada e resposta à terapia. Se os recursos
laboratoriais estiverem prontamente disponíveis, a demonstração de hipocalcemia
com níveis séricos de cálcio < 7mg/dL é confirmatória. O fósforo sérico está
freqüentemente diminuído a um grau comparável. A glicose sangüínea está no
parâmetro normal-baixo ou diminuído como resultado da intensa atividade muscular
associada à tetania.
Tratamento – A administração EV lenta de uma solução de cálcio orgânico,
como o gliconato de cálcio, deve resultar numa rápida melhora clínica e cessação
dos espasmos tetânicos em 15min. Na maioria das cadelas pesando de 5 a 10kg,
5 a 10mL de gliconato de cálcio a 10% proverão cálcio suficiente. A administração
deve ser procedida vagarosamente para evitar a indução de fibrilação ventricular e
parada cardíaca.
Os cãezinhos devem ser removidos das cadelas por 24h para reduzir o dreno
lactacional de cálcio. Durante este período, eles devem ser alimentados com
sucedâneo lácteo ou outra dieta apropriada; se eles forem suficientemente madu-
ros, é aconselhável desmamá-los. Dietas suplementares de cálcio e vitamina D
provaram ser úteis na prevenção de recidivas em certas cadelas.
Embora alguns clínicos preconizem o uso de corticosteróides além do cálcio e da
vitamina D para prevenir recidivas após a terapia original, o seu valor é questionável;
eles podem interferir no transporte intestinal de cálcio e aumentar a perda urinária
do mesmo.
Tetania do Transporte em Ruminantes 553

Prevenção – Durante a gestação, uma dieta balanceada de boa qualidade, com


relação cálcio–fósforo de ≤ 1:1 que provê a quantidade requerida de cálcio (porém
não excessiva), pode suprir um mecanismo homeostático de Ca mais responsivo ao
incremento marcante na demanda lactacional. Experiências clínicas em vacas
sugerem que o maior controle da homeostasia do cálcio pela secreção de PTH, em
animais alimentados com dietas balanceadas ou relativamente baixas em cálcio
durante a gestação, ocorre com a aproximação do parto e o início da drenagem
lactacional.

TETANIA DO TRANSPORTE EM
RUMINANTES
(Doença da estrada de ferro, Mal-estar da estrada de ferro, Cambaleios)

É uma condição que afeta vacas e ovelhas bem alimentadas em estágios


avançados de prenhez, durante ou imediatamente após longo transporte e estresse.
É também relatada em carneiros durante o transporte para confinamento. A causa
específica é desconhecida, mas acredita-se ser uma forma aguda de hipocalcemia
trazida por condições adversas durante o embarque. Outros acreditam que a
hipomagnesemia seja a causa precipitante. Vagões ou caminhões superpopulosos,
quentes, pobremente ventilados e sem provisão alimentar ou água parecem ser
fatores contribuintes.
A evidência da condição é mais comumente observada na chegada, mas pode
se desenvolver enquanto em trânsito. Sinais precoces de inquietação e movimentos
incoordenados são seguidos por uma paralisia parcial dos membros anteriores e
andar cambaleante. Mais tarde, o animal é incapaz de se levantar e assume uma
atitude similar àquela observada na paresia da parturiente em vacas. A freqüência
do pulso de 100 a 120 pode ser notada enquanto a respiração é rápida e laboriosa.
A temperatura pode estar levemente elevada e a congestão das membranas
mucosas ocorre comumente. Sede extrema pode se desenvolver, enquanto a
anorexia é regularmente observada; pode haver redução ou completa cessação das
atividades peristáltica e ruminal. O aborto pode ocorrer como complicação. A
paralisia progressiva, a perda gradual de consciência e a morte resultam em poucos
dias, a menos que o tratamento adequado seja empreendido logo após o início.
Animais em prenhez avançada devem receber apenas comida seca que contenha
magnésio e cálcio adequados por 1 a 2 dias antes do embarque. O carregamento
deve ser realizado com o mínimo de excitação; veículos superpopulosos e pobre-
mente ventilados devem ser evitados. Se o tempo de trânsito for muito longo, arranjos
deverão ser feitos para se ter os animais alimentados, hidratados e descansados.
Cloridrato de promazina ou outros atarácticos adequados (a menos que o transporte
seja para abate), administrados intramuscularmente 30min antes do carregamen-
to, são eficazes para avaliar o estresse do transporte e podem ajudar a prevenir a
doença. Para o tratamento, injeções EV de borogliconato de cálcio (solução a 25%,
400 a 800mL/vaca, , 100mL/ovelha) ou borogliconato de cálcio com sulfato de
magnésio (solução a 5%, mesmos volumes), administradas vagarosamente, de
preferência com 250 a 500mL de solução de dextrose a 50%, são recomendadas,
mas os resultados são ruins. Em vacas afetadas, injeções de soluções de eletrólito
EV repetidas devem ser administradas e a vaca removida para um leito macio com
a pata segura por baixo. A indução da parição é um tratamento lógico, mas ineficaz
na maioria dos casos. A sedação é indicada se os animais estão hiperexcitados.
SISTEMA MUSCULOESQUELÉTICO
SISTEMA MUSCULOESQUELÉTICO, Introdução ...................................... 559
ARTRITE E PROBLEMAS CORRELATOS, GR AN .................................... 562
Tipos Específicos de Artrite ..................................................................... 562
Bursite ..................................................................................................... 564
Higroma do Codilho e Jarrete ............................................................ 564
Mal da Cernelha – Mal da Nuca ........................................................ 565
Poliartrite – Serosite por Clamídia ........................................................... 565
Tendinite .................................................................................................. 567
Tenossinovite ........................................................................................... 568
ARTRITE E PROBLEMAS RELACIONADOS, PQ AN ................................. 568
Bursite ..................................................................................................... 568
Displasia Coxofemoral ............................................................................. 569
Artropatias Imunomediadas ..................................................................... 570
Osteoartrite .............................................................................................. 570
Espondilose Deformante .......................................................................... 571
Artrite Supurativa ..................................................................................... 572
ANOMALIAS CONGÊNITAS E HEREDITÁRIAS DO SISTEMA
MUSCULOESQUELÉTICO ........................................................................... 572
Deformidades Angulares nos Membros dos Potros ................................ 572
Aracnomelia e Artrogripose ..................................................................... 573
Miopatias Congênitas .............................................................................. 573
Síndrome do Quarto Traseiro Assimétrico em Suínos ...................... 573
Atrofia Parda ...................................................................................... 573
Músculo Duplo em Bovinos ............................................................... 574
Esteatose Muscular ........................................................................... 574
Miopatia Associada à Rigidez Articular Congênita ............................ 574
Miopatia Associada à Hidrocefalia Congênita ................................... 574
Leitões Cambaios .............................................................................. 574
Encurtamento do Tendão Flexor ............................................................. 575
Defeitos na Espinha dos Potros ............................................................... 576
Discondroplasia ....................................................................................... 576
Paralisia do Nervo Femoral ..................................................................... 577
Perna Flácida ........................................................................................... 577
Osteogênese Imperfeita ........................................................................... 577
Osteopetrose ........................................................................................... 577
Polidactilia ................................................................................................ 578
Sindactilia ................................................................................................. 578
HÉRNIA DIAFRAGMÁTICA (ver RES) ......................................................... 862
DISTROFIAS ASSOCIADAS AO CÁLCIO, FÓSFORO E VITAMINA D ...... 578
Hiperparatireoidismo Primário ................................................................. 579
Hiperparatireoidismo Secundário ............................................................. 581
Hiperparatireoidismo Nutricional ........................................................ 581
Hiperparatireoidismo Secundário Renal ............................................ 583
Hipoparatireoidismo ................................................................................. 585
Raquitismo ............................................................................................... 586
Calcinose Enzoótica ................................................................................ 587
OSTEOPATIA HIPERTRÓFICA .................................................................... 589
Sistema Musculoesquelético 556

CLAUDICAÇÃO, Princípios Gerais ............................................................. 589


Etiologia e Fatores Predisponentes ................................................... 590
Diagnóstico ........................................................................................ 590
CLAUDICAÇÃO EM BOVINOS .................................................................... 595
Paralisia do Parto ..................................................................................... 596
Dermatite Vegetativa Interdigital .............................................................. 597
Artropatia Degenerativa ........................................................................... 597
Dermatite Verrucosa ................................................................................ 598
Luxações .................................................................................................. 598
Ergotismo ................................................................................................. 599
Claudicação por Ingestão de Festuca ..................................................... 599
Penetração da Sola por Corpos Estranhos ............................................. 599
Fraturas .................................................................................................... 600
Queimaduras pelo Frio ............................................................................ 600
Fissuras da Parede do Casco .................................................................. 601
Fissuras Verticais ............................................................................... 601
Fissuras Horizontais ........................................................................... 601
Laminite .................................................................................................... 602
Paralisia do Nervo Peroneal .................................................................... 603
Pododermatites ........................................................................................ 603
Podridão dos Cascos ......................................................................... 603
Podridão Crônica dos Cascos ........................................................... 604
Ulceração da Sola .............................................................................. 604
Ruptura do Músculo Gastrocnêmio ......................................................... 605
Paresia Espástica .................................................................................... 605
Síndrome Espástica ................................................................................. 606
CLAUDICAÇÃO EM CAPRINOS .................................................................. 606
Epifisite ..................................................................................................... 607
Artrite e Encefalite Caprinas (ver GEN) ................................................... 475
Tendões Contraídos em Cabritos ............................................................ 608
Deficiência de Cobre ................................................................................ 608
Dermatofilose (ver PEL) ........................................................................... 952
Febre Aftosa (ver GEN) ........................................................................... 408
Podridão dos Cascos/Dermatite Interdigital ............................................. 608
Mal das Juntas ......................................................................................... 608
Laminite .................................................................................................... 609
Micoplasmose .......................................................................................... 610
Luxação Patelar (ver adiante) .................................................................. 675
Trauma/Dor .............................................................................................. 610
Doença dos Músculos Brancos ............................................................... 610
CLAUDICAÇÃO EM EQÜINOS .................................................................... 611
Problemas da Pata .................................................................................. 611
Cisto Ósseo na Terceira Falange ...................................................... 611
Contusões na Sola ............................................................................. 611
Cancro na Ranilha ............................................................................. 612
Talões Contraídos .............................................................................. 612
Fratura do Osso Navicular ................................................................. 613
Fratura da Terceira Falange .............................................................. 613
Ceratoma ........................................................................................... 614
Laminite .............................................................................................. 614
Doença Navicular ............................................................................... 617
Sistema Musculoesquelético 557

Osteíte Podal ..................................................................................... 618


Ferimentos Perfurantes na Pata ........................................................ 618
Doença Piramidal ............................................................................... 619
Inflamação da Coroa do Casco ......................................................... 619
Fendas na Parede do Casco ............................................................. 620
Inflamação Eczematosa dos Cascos ................................................. 620
Separação da Parede do Casco de sua Matriz ................................. 621
Talões Cortados ................................................................................. 621
Ossificação da Cartilagem Alar .......................................................... 621
Podridão da Ranilha .......................................................................... 622
Condições do Boleto e da Quartela ......................................................... 622
Fraturas da Primeira e Segunda Falanges e Sesamóides
Proximais ..................................................................................... 622
Exostose do Boleto ............................................................................ 623
Exostose Interfalângea ...................................................................... 624
Sesamoidite ....................................................................................... 624
Sinovite Vilonodular ........................................................................... 625
Distensão da Bolsa dos Boletos (Ovas) ............................................ 625
Condições do Carpo ................................................................................ 625
Canela Dolorida ................................................................................. 625
Higroma Cárpico ................................................................................ 626
Carpite ................................................................................................ 626
Fraturas dos Ossos Cárpicos ............................................................ 627
Fraturas dos Ossos Metacárpico e Metatársico Acessórios .............. 627
Fratura do Terceiro Osso Metacárpico .............................................. 628
Exostose ............................................................................................ 628
Condições da Escápula e do Codilho ...................................................... 628
Artrite da Articulação da Escápula ..................................................... 628
Bursite Bicipital ................................................................................... 629
Fraturas do Codilho ........................................................................... 629
Fraturas da Escápula ......................................................................... 630
Atrofia da Escápula ............................................................................ 630
Condições do Tarso ................................................................................. 630
Hidrartrose Társica ............................................................................. 631
Esparavão Ósseo .............................................................................. 631
Alifate ................................................................................................. 632
Deslocamento do Tendão Flexor Superficial da Ponta do Jarrete .... 632
Fratura do Tarso ................................................................................ 632
Rupturas do Tendão do Membro Posterior ........................................ 633
Rupturas do Terceiro Músculo Peroneal ........................................... 633
Mal das Ancas ................................................................................... 633
Distensão da Bainha Társica ............................................................. 634
Condições da Soldra ................................................................................ 634
Fraturas da Soldra ............................................................................. 634
Gonite ................................................................................................. 634
Luxação Patelar ................................................................................. 635
Cisto Ósseo Subcondral .................................................................... 635
Condições Coxofemorais ......................................................................... 636
Coxite ................................................................................................. 636
Deslocamento das Ancas .................................................................. 636
Fratura da Pelve ................................................................................ 637
Bursite Trocantérica ........................................................................... 637
Condições do Dorso ................................................................................ 637
Sistema Musculoesquelético 558

Fraturas .............................................................................................. 637


Distensões de Músculos e Ligamentos ............................................. 638
Espondilose Ossificante ..................................................................... 638
Encavalamento dos Processos Espinhosos Dorsais ......................... 638
Distensão Sacroilíaca ........................................................................ 639
Condições Diversas ................................................................................. 639
Síndrome do Cambaleio (ver NER) ......................................................... 717
Deformidades de Flexão .................................................................... 639
Miopatia Calcificante .......................................................................... 640
Osteocondrose ................................................................................... 640
Fisite ................................................................................................... 641
CLAUDICAÇÃO EM SUÍNOS ....................................................................... 642
Doenças das Patas .................................................................................. 643
Lesões e Podridão das Patas ............................................................ 643
Laminite .............................................................................................. 645
Perda dos Dígitos Acessórios ............................................................ 645
Supercrescimento dos Cascos .......................................................... 645
Artrítides Infecciosas ................................................................................ 646
Erisipelas (ver GEN) .......................................................................... 405
Polisserosite por Haemophilus (ver GEN, Doença de Glässer) ........ 460
Artrite por Micoplasma ....................................................................... 646
Polisserosite por Micoplasma ............................................................ 646
Poliartrite Séptica Neonatal (Doença Articular) ................................. 647
Osteomielite e Artrite Supurativa em Animais Idosos ........................ 648
Anormalidades Esqueléticas Não Infecciosas ......................................... 649
Apofisiólise da Tuberosidade Isquiática ............................................. 649
Osteoartrite e Osteocondrose ............................................................ 649
Fraturas .............................................................................................. 651
Anormalidades Esqueléticas Induzidas pela Nutrição ....................... 651
Epifisiólise Femoral Proximal ............................................................. 651
CLAUDICAÇÃO EM OVINOS ....................................................................... 652
Abscesso Podal ....................................................................................... 652
Podridão dos Cascos ............................................................................... 653
Podridão dos Cascos Benigna ........................................................... 653
Podridão dos Cascos Virulenta .......................................................... 653
Glândula Sebácea Impactada ou Infectada ............................................. 656
Fibroma Interdigital .................................................................................. 656
Dermatite Interdigital Ovina ..................................................................... 656
Laminite Séptica ...................................................................................... 657
CLAUDICAÇÃO EM PEQUENOS ANIMAIS ................................................ 657
Causas Específicas de Claudicação em Animais Jovens ................. 659
Causas Específicas de Claudicação em Adultos ............................... 659
MIOPATIAS ................................................................................................... 659
Miopatias do Tipo Distrofia ...................................................................... 660
Miopatias Nutricionais .............................................................................. 660
Miopatia Nutricional de Cordeiros e Bezerros
(Doença do Músculo Branco) ...................................................... 661
Miopatias Nutricionais, Esqueléticas e Cardíacas em Suínos ........... 663
Miopatia Nutricional dos Equidae ...................................................... 664
Doença da “Gordura Amarela” ........................................................... 664
Polimiopatia Hipocalêmica em Gatos ................................................ 665
Sistema Musculoesquelético, Introdução 559

Miopatias Tóxicas .................................................................................... 665


Toxicidade Ionófora ........................................................................... 665
Intoxicação por Plantas ...................................................................... 666
Miopatias de Esforço ............................................................................... 666
Azotúria e Síndrome da Paralisia ou “Cording-up” dos Cavalos ....... 666
Rabdomiólise de Esforço em Cães .................................................... 667
Síndrome do Estresse Porcino, Carne de Porco Pálida,
Mole e Exsudativa (ver MET) ....................................................... 541
Miopatia da Captura dos Animais Selvagens .................................... 667
Miopatias Diversas ................................................................................... 667
Miopatia Isquêmica ............................................................................ 667
Miopatia Pós-anestésica em Eqüinos ................................................ 668
Miopatia Fibrótica e Ossificante dos Cavalos Quarto de Milha ......... 668
Miosite de Etiologia Indeterminada .......................................................... 668
Miosite Eosinofílica em Cães ............................................................. 668
Miosite Eosinofílica em Bovinos e Ovinos ......................................... 669
Polimiosite em Cães .......................................................................... 669
PARESIA NEUROMUSCULAR OU ESQUELÉTICA EM VACAS APÓS
DECÚBITO PROLONGADO (Vaca Caída) .................................................. 669
OSTEÍTE ........................................................................................................ 671
Panosteíse Canina ................................................................................... 672
OSTEOCONDROSE ...................................................................................... 673
Osteocondrite Dissecante ........................................................................ 673
Displasia do Codilho ................................................................................ 674
PARALISIA DO MEMBRO ANTERIOR (ver NER) ....................................... 742
LUXAÇÃO PATELAR ................................................................................... 675
RUPTURA DO TENDÃO DE AQUILES ........................................................ 676
RUPTURA DOS LIGAMENTOS CRUZADOS .............................................. 677
SARCOCISTOSE .......................................................................................... 678

SISTEMA MUSCULOESQUELÉTICO,
INTRODUÇÃO
O sistema musculoesquelético é composto pelos ossos e músculos estria-
dos do corpo, além das articulações, tendões e ligamentos que unem os
componentes deste aparelho. Suas funções primárias são sustentar a estru-
tura do corpo, efetuar seus movimentos e, em algumas situações, oferecer
proteção a certas estruturas vitais, como por exemplo, cérebro, olhos e vísceras.
Ele também fornece o sistema de armazenamento principal para cálcio e fósforo,
e contém uma importante porção de tecido hematopoiético. Distúrbios de sis-
temas inter-relacionados, por exemplo, sistemas nervoso, circulatório, enzimáti-
co e integumentar, podem afetar o funcionamento do sistema musculoesque-
lético.
Sistema Musculoesquelético, Introdução 560

As doenças do sistema musculoesquelético são na maioria das vezes manifes-


tadas por debilidade de movimentos ou de função; o grau de debilidade depende da
causa específica e da gravidade das alterações. A maioria delas é decorrente de
transtornos esqueléticos e alterações articulares, embora alguns casos sejam
originados de doenças musculares, distúrbios neurológicos, toxinas, desequilíbrios
endócrinos, distúrbios metabólicos, doenças infecciosas, circulatórias, deficiências
ou desequilíbrios nutricionais e, ocasionalmente, defeitos congênitos.
Doenças do sistema músculo esquelético também podem afetar outros
sistemas do corpo e, nesses casos, freqüentemente a queixa primária será de
disfunção. O movimento e o controle oculares, respiração, função urinária, retração
do pênis, mastigação e deglutição são todos, em parte, uma função do sistema em
questão. Uma disfunção muscular primária, induzida por fatores tóxicos, infecciosos
ou congênitos, pode levar à paralisia completa ou parcial, embora, na maioria dos
casos, a sede do problema seja o sistema nervoso e a disfunção muscular seja
secundária (por exemplo, tétano, rinopneumonite, cinomose canina, hidrocefalia).
A unidade funcional e estrutural do músculo esquelético é a unidade motora.
Esta consiste em: 1. neurônio motor ventral com seu corpo celular no corno central
da medula espinhal e seu axônio periférico; 2. junção neuromuscular; e 3. fibras
musculares invervadas pelo neurônio. Cada um desses componentes deve estar
intacto para que o músculo exerça sua função normal. O neurônio motor ventral é
a via motora comum final que conduz impulsos neurais do sistema nervoso central
para o músculo.
O primeiro passo no processo de transmissão é a propagação do potencial de
ação nervosa no axônio terminal. Isto resulta na despolarização da membrana do
axônio terminal devido ao aumento da permeabilidade da membrana aos íons
de sódio. Os íons de cálcio, que entram no axônio terminal como resultado da
despolarização, são necessários para a liberação da acetilcolina neurotransmis-
sora, das vesículas sinápticas do axônio terminal para a fenda sináptica da junção
neuromuscular. Se houver ausência dos íons de cálcio ou se eles forem inibidos por
íons de magnésio, não ocorrerá liberação da acetilcolina.
Quando a acetilcolina se une aos seus receptores, há um aumento na permea-
bilidade da membrana muscular aos íons de sódio e potássio, resultando numa
alteração do potencial de membrana muscular. A passagem do potencial de ação
ao longo da membrana inicia o mecanismo de contração/acoplação das fibras
musculares. A hidrólise da acetilcolina em colina e acetato, pela enzima colineste-
rase, conclui o processo de transmissão.
O músculo normal e suas unidades motoras associadas podem ser considera-
dos como um órgão dinâmico multifacetado e muitas doenças podem alterar sua
estrutura e função. Os distúrbios da junção neuromuscular resultam em fadiga
muscular, fraqueza e paralisia. As condições que interferem na função da junção
neuromuscular incluem a miastenia grave, drogas (por exemplo, curare, succinilcolina
e certos antibióticos), toxinas (por exemplo, botulismo, tétano, picada de cobra e
paralisia do carrapato), hipocalcemia e hipermagnesemia.
As doenças específicas do tecido muscular são chamadas de miopatias; essas
incluem distúrbios na membrana ou no conteúdo da fibra muscular. As miopatias,
que envolvem primariamente a membrana da fibra muscular, podem ser hereditá-
rias (por exemplo miotonia congênita dos caprinos) ou adquiridas (por exemplo
deficiências de selênio e vitamina E, hipotireoidismo, hipocalemia). As miopatias que
envolvem o conteúdo das fibras musculares incluem distrofia muscular, polimiosite,
miosite eosinofílica, hipertermia maligna, doenças de armazenamento de glicogê-
nio e do lipídio, deficiências de vitamina E e selênio (doença do músculo branco,
azotúria) e rabdomiólise de esforço. O diagnóstico diferencial destas doenças é
grandemente facilitado pela ajuda de exames laboratoriais, tais como biópsia
Sistema Musculoesquelético, Introdução 561

muscular, níveis séricos de enzimas, eletromiografia, termografia e estudos da


velocidade de condução nervosa.
A maioria das patologias ósseas é congênita, nutricional ou traumática.
Problemas de natureza congênita incluem tanto distorções de ossos in utero
quanto defeitos genéticos. Exemplos destes últimos incluem alguns casos de
ataxia eqüina (“bambeira”) e displasia coxofemoral em certas raças de cães e
a formação ou crescimento anormal dos ossos tal como a que decorre da
hipoplasia da paratireóide.
As causas nutricionais são primariamente decorrentes de desequilíbrios ou de
deficiências de minerais, particularmente cálcio e fósforo, ainda que outros mi-
croelementos possam estar envolvidos. Outras causas nutricionais incluem o ele-
vado teor de proteína na ração dos animais em crescimento. Tanto deficiência
quanto excesso de certas vitaminas, particularmente A e D, podem influir no cres-
cimento ou na integridade dos ossos. A osteomalacia é um exemplo clássico de
desequilíbrio ou deficiência de cálcio e fósforo. A epifisite pode ser decorrente
de desequilíbrios ou deficiências de minerais ou de proteínas na ração.
Causas traumáticas incluem fraturas completas ou incompletas; periostite,
seqüestros ósseos; e exostoses decorrentes de trauma agudo ou crônico, parti-
cularmente na inserção de tendões ou ligamentos. Limitação de movimentos, dor,
aumento de temperatura local e aumento de volume, normalmente acompanham
qualquer destas patologias.
As articulações são classificadas, basicamente, em 2 tipos: 1. sinartroses, nas
quais os segmentos são unidos por tecido fibroso ou cartilagem e são essencial-
mente imóveis; e 2. diartroses, que são articulações móveis, caracterizadas pela
presença de uma cavidade articular com uma membrana sinovial. As sinartroses
raramente são envolvidas em problemas do sistema musculoesquelético, senão em
traumas, tais como fraturas. As diartroses freqüentemente são envolvidas e vários
elementos da articulação podem ser afetados, como a cápsula fibrosa, os ligamen-
tos articulares e a cavidade propriamente dita (incluindo os meniscos), a membrana
sinovial, o líquido sinovial, o osso subcondral e as cartilagens articulares.
As doenças que afetam as diartroses podem ser decorrentes de trauma agudo,
processo inflamatório crônico, distúrbios do desenvolvimento, ou até infecções
bacterianas ou fúngicas. O trauma agudo pode resultar em luxações, subluxações
ou fraturas das articulações. O trauma direto também pode levar à ruptura parcial
ou completa dos ligamentos articulares ou da cápsula fibrosa.
Distúrbios de desenvolvimento incluem osteocondrite dissecante, ataxia eqüina,
síndrome do disco lombar (encontrada em certas raças de cães devido à conforma-
ção defeituosa resultante de cruzamentos seletivos), expansão da epifisite para o
interior da articulação e lesões decorrentes da angulação anormal da articulação.
Infecções intra-articulares por bactérias e fungos ou envolvendo os ligamentos,
cápsula fibrosa ou tendões de inserção próximos às articulações também são,
geralmente, bastante evidentes.
A inflamação crônica das articulações e estruturas adjacentes é mais comum
nas articulações envolvidas na locomoção, embora outros locais, como a articula-
ção temporomandibular, possam ser afetados. O líquido sinovial atua como
lubrificante para as superfícies articulares e nutre a cartilagem articular. Em
qualquer lesão articular, o líquido sinovial apresenta-se alterado em volume e em
composição; há efusão do fluido, aumento no conteúdo proteico e decréscimo na
reabsorção. Pode ocorrer produção de enzimas que freqüentemente são destrutivas
para a cartilagem articular, resultando em ulceração focal da cartilagem articular
e proliferação da membrana sinovial e dos ossos ao longo da margem articular. Em
alguns casos, o processo continua até que o osso subjacente à cartilagem seja
erodido, levando a uma degeneração articular irreparável.
Sistema Musculoesquelético, Introdução 562

Muitas doenças do sistema musculoesquelético são relativamente simples de


diagnosticar, embora a inter-relação com outros sistemas corporais, particularmen-
te o sistema nervoso, possa complicar o diagnóstico. Os procedimentos diagnósti-
cos para determinar a causa exata ou localizar a articulação específica podem incluir
exames visual e manual, radiografias, anestesia local ou regional, artroscopia,
cintigrafia, termografia, ultra-sonografia, e outros exames laboratoriais da membra-
na sinovial e do líquido sinovial.

ARTRITE E PROBLEMAS CORRELATOS,


GR AN
(Osteoartrite, Osteocondrose, Artrite séptica, Artrite traumática)

A inflamação articular é um problema inespecífico que representa um


espectro de várias doenças com várias patogenias. Apesar de comum a todos
os grandes animais, a artrite é melhor conhecida nos eqüinos devido à importância
significativa da locomoção nessa espécie (ver também CLAUDICAÇÃO EM BOVINOS,
pág. 595; EM CAPRINOS, pág. 606; EM EQÜINOS, pág. 611; EM SUÍNOS , pág. 642 e
EM O VINOS , pág. 652).

TIPOS ESPECÍFICOS DE ARTRITE


Sinovite e capsulite traumáticas, pequenas fraturas intra-articulares, distensões
e rupturas de ligamentos intra-articulares e outras lesões da cartilagem articular
induzidas por trauma são formas de artrite traumática. Em todas estas doenças, a
cápsula articular (membrana sinovial e cápsula fibrosa) está inflamada, o que resulta
em hiperemia, edema e níveis variáveis de dor e claudicação. A extensão do dano
à cartilagem articular depende da intensidade do trauma.
A osteoartrite (doença degenerativa articular) é um conjunto de distúrbios
caracterizados por um estágio final comum: a deterioração progressiva da cartila-
gem articular acompanhada por alterações nos ossos e tecidos moles da articula-
ção. A exostose interfalângea e o esparavão ósseo são exemplos. A doença pode
ser provocada por trauma repetido ou desgaste, com o esforço exagerado e a má
conformação agindo como fatores contribuintes ou, alternativamente, qualquer
outra entidade artrítica pode levar a este estágio permanente de degeneração da
cartilagem articular. O grau de perda da cartilagem articular, assim como o grau de
osteofitose e entesopatia, varia. No gado, o problema geralmente se desenvolve
secundariamente a danos nos ligamentos cruzados, meniscos ou cápsula articular.
A artrite infecciosa ou séptica (algumas vezes chamada de artrite purulenta)
resulta do seqüestro de uma infecção bacteriana no interior de uma articulação. A
articulação infectada ocorre em 3 situações principais: 1. infecção hematogênica
(mal do umbigo), comum em potros, bezerros e cordeiros; 2. lesão traumática com
introdução local da infecção; e 3. infecção iatrogênica associada a aspiração
articular, infecção ou cirurgia (geralmente em cavalos). A artrite séptica é caracte-
rizada por dor e distensão extremas da articulação por um líquido sinovial turvo e
enevoado que contém muitos neutrófilos. A cartilagem articular, osso subcondral
e membrana sinovial sofrem danos permanentes se um tratamento eficaz não for
rapidamente instituído. A velocidade dos danos depende do microrganismo causal.
Nos potros, a osteomielite primária também é causada por uma infecção por
Salmonella sp, comumente como uma poliartrite em uma síndrome hematogênica.
Artrite e Problemas Correlatos, Gr An 563

Nos cordeiros jovens, a Actinobacillus seminis causa poliartrite, assim como a


Chlamydia psittaci e a Erysipelothrix insidiosa. A última após o corte da cauda,
castração ou infecção umbilical. Os vírus e micoplasmas podem também ser
agentes etiológicos nos animais de corte. Nos caprinos adultos, o vírus da artrite e
encefalite caprinas (ver pág. 475) é uma causa importante de artrite. Nos caprinos
jovens, a Chlamydia psittaci e a Mycoplasma mycoides são causas freqüentes.
A artrite infecciosa suína é uma denominação comum para um grupo de
inflamações articulares por bactérias (incluindo por micoplasma) em leitões mais
jovens. Em leitões recém-nascidos, a artrite séptica é comumente devida à infecção
intra-uterina ou umbilical por Escherichia coli ou Corynebacterium, Streptococcus
ou Staphylococcus spp; o tratamento é melhor direcionado através da redução da
possibilidade de infecção pelo meio ambiente. Suínos mais velhos podem, muitas
vezes, desenvolver artrite como uma seqüela de infecções com Haemophilus,
Erysipelothrix ou Mycoplasma spp ; embora o diagnóstico nos estágios precoces da
condição não seja difícil, os estágios mais crônicos podem ser confundidos com
lesões articulares produzidas por hipervitaminose A de origem dietética.
A osteocondrite dissecante é uma entidade artrítica importante nos cavalos. É
devida a uma condição mais generalizada de osteocondrose (ver pág. 673). A
osteocondrose é também uma importante doença em suínos, sendo também
observada no gado bovino. A osteocondrite dissecante é provavelmente a doença
ortopédica mais importante dos cavalos jovens, afetando freqüentemente soldra,
jarrete, boleto e paleta.
Achados clínicos – A artrite provoca dor e alteração na função da articulação.
Se o processo está ativo ou agudo, a cápsula articular geralmente está distendida
e os tecidos em torno estão inchados e quentes. A manipulação da articulação
provoca dor nos casos mais graves. Nos casos mais sutis, testes de flexão são
necessários para evidenciar a claudicação nos cavalos. Nos casos mais crônicos,
a amplitude da movimentação está diminuída, havendo menor flexão e um espes-
samento fibroso na área da articulação. A avaliação radiográfica é necessária para
uma confirmação positiva de várias entidades patológicas. A artroscopia é utilizada
para avaliar com precisão a extensão do dano à cartilagem articular e para
estabelecer um prognóstico.
Tratamento – O tratamento da sinovite e capsulite traumáticas agudas inclui
repouso e fisioterapia, como água fria, gelo, flexão passiva, e natação. As drogas
antiinflamatórias não esteróides são normalmente usadas. A lavagem articular é
utilizada para remoção de produtos inflamatórios produzidos pela membrana
sinovial, assim como debris de cartilagem articular que exacerbam a sinovite. A
drenagem articular tem sido recomendada para aliviar a distensão capsular, mas é
de benefício mínimo quando isolada. Várias medicações intra-articulares têm sido
utilizadas. Os corticosteróides são os agentes antiinflamatórios mais potentes e
são eficazes na sinovite traumática aguda. No entanto, eles possuem alguns efeitos
deletérios no metabolismo da cartilagem e devem ser utilizados com cuidado. O
hialuronato de sódio é eficaz na sinovite e capsulite mas possui efeito mínimo
quando há dano à cartilagem articular ou fraturas intra-articulares. Os gli-
cosaminoglicanos polissulfatados possuem propriedades condroprotetoras, sendo
indicadas para evitar degeneração da cartilagem articular. Os danos traumáticos
diretos à cartilagem articular ou pequenas fraturas intra-articulares são melhor
tratados com cirurgia artroscópica para minimizar o desenvolvimento de osteoartri-
tes. As lesões de osteocondrite dissecante também são tratadas desta forma.
As artrites sépticas exigem tratamento imediato para evitar danos irreparáveis.
Os antibióticos sistêmicos de largo espectro são indicados; a escolha inicial se
baseia no patógeno mais provável, mas está sujeita a mudanças baseadas na
Artrite e Problemas Correlatos, Gr An 564

cultura e testes de sensibilidade. O tratamento antibiótico sistêmico é combinado à


terapia local, que variadamente consiste de lavagem articular e artrotomia para
permitir drenagem. A artrotomia ou artroscopia são necessárias para remover
depósitos de fibrina. Também é utilizado tratamento antiinflamatório concomitante
(por exemplo, fenilbutazona).
Nas osteoartrites, o tratamento é principalmente paliativo. A permanência da
doença articular degenerativa enfatiza a necessidade do diagnóstico imediato e
manejo correto da sinovite e capsulite traumáticas, fraturas intra-articulares ou da-
nos à cartilagem articular, osteocondrite dissecante ou artrite séptica. Quando a
doença articular degenerativa está avançada, a fusão cirúrgica pode ser realizada
em articulações selecionadas. Embora o tratamento geralmente não tenha sucesso
nos casos crônicos, por exemplo, osteoartrite crônica de touros e vacas, restrição
do exercício e boa alimentação podem prolongar a vida e ser economicamente
interessante em reprodutores valiosos. Em touros que são incapazes de cavalgar,
o sêmen para inseminação artificial pode ser coletado por eletroejaculação, mas os
aspectos humanos deste tratamento devem também ser considerados.

BURSITE
Trata-se de uma reação inflamatória no interior de uma bolsa que pode variar de
inflamação leve à sépsis. É mais comum e importante nos eqüinos. Pode também ser
classificada como verdadeira ou adquirida. A bursite verdadeira é uma inflamação em
uma bolsa congênita ou natural (abaixo da fáscia profunda), por exemplo, bursite
trocantérica e bursite supra-espinhosa (fístula na cernelha). A bursite adquirida é o
desenvolvimento de uma bolsa subcutânea onde previamente não havia uma e/ou
inflamação desta bolsa, por exemplo, cordilheira sobre o processo do olecrânio
(higroma do codilho), e bursite sobre a tuberosidade calcânea (higroma do jarrete).
A sinovite pode se manifestar como uma inflamação aguda ou crônica. Os
exemplos de bursite aguda incluem a bursite bicipital e trocantérica nos estágios
iniciais. É geralmente caracterizada por inchaço, calor e dor locais. As bursites
crônicas geralmente se desenvolvem em associação a traumas repetidos, fibrose
e outras alterações crônicas, por exemplo, higroma do codilho, higroma do jarrete e
higroma carpal. O líquido bursal excessivo se acumula e a parede da bolsa é
espessada por tecido fibroso. Podem se formar faixas fibrosas ou um septo no interior
da cavidade bursal, geralmente desenvolvendo-se um espessamento subcutâneo
generalizado. Estes aumentos de volume bursais desenvolvem-se como inchaços
frios e indolores e, se não forem muito grandes, não interferem severamente na
função. A bursite séptica é mais grave, estando associada à dor e claudicação. A
infecção de uma bolsa pode ser hematogênica ou decorrente de penetração direta.
A dor na bursite aguda pode ser aliviada pela aplicação de bolsas frias, aspiração
do conteúdo e medicação intrabursal. As injeções repetidas podem resultar em
infecção. O tratamento da bursite crônica é cirúrgico. Os casos de bursite infectada
exigem tratamento com antibióticos sistêmicos, assim como drenagem local.

Higroma do codilho e jarrete


É um aumento de volume de origem inflamatória da bolsa localizada no tecido
subcutâneo, acima do processo do olecrânio e túber calcâneo respectivamente nos
eqüinos. São causas freqüentes traumas provocados por decúbito sobre chão duro
e pouco recoberto por cama, coices, quedas, pancadas dadas na parte traseira de
reboques, ferraduras que se projetam para além dos talões e longos períodos de
decúbito.
Ocorre edema circunscrito sobre e ao redor da bolsa afetada. A claudicação é rara
em qualquer caso. A bolsa afetada pode estar inicialmente flutuante e macia, mas em
Artrite e Problemas Correlatos, Gr An 565

pouco tempo, forma-se uma cápsula fibrosa firme, especialmente se houver


recidiva de um ferimento antigo. Inicialmente, o aumento de volume bursal pode
ser pouco perceptível ou atingir até proporções consideráveis. Casos crônicos
podem progredir para a abscedação.
Os casos agudos recentes podem responder bem à aplicação de água fria,
seguida em poucos dias, por uma aspiração asséptica e uma injeção de corticosterói-
de. A bolsa também pode ser reduzida em tamanho pela aplicação de contra-irri-
tantes, ultra-som ou radioterapia. As bolsas encapsuladas há algum tempo são mais
refratárias ao tratamento. A remoção cirúrgica (normalmente drenagem e curetagem)
é recomendada somente para casos crônicos avançados ou àqueles que tornam-
se infectados. Uma proteção contra a ação da ferradura no codilho deve ser usada
para prevenir recidivas de um higroma naqueles animais onde a condição foi
causada pelo talão ou pela ferradura.

Mal da cernelha – Mal da nuca


São 2 distúrbios inflamatórios de cavalos que diferem basicamente em sua
localização, respectivamente a bolsa supra-espinhal e a bolsa supra-atlantal. A
explicação a seguir trata do mal da cernelha, mas, exceto por detalhes anatômi-
cos, as suas características gerais são aplicáveis ao mal da nuca. No estágio
inicial da doença não há presença de fístula. Somente quando há ruptura da bolsa
ou quando ela é aberta cirurgicamente para a drenagem e instala-se uma infecção
secundária por bactérias piogênicas, é que ela assume um caráter fistuloso
verdadeiro. Atualmente sua incidência é bastante rara.
Etiologia – As evidências sugerem que a condição é primariamente de origem
infecciosa e os títulos de aglutinação sustentam esta teoria. A Brucella abortus e,
ocasionalmente, a B. suis podem ser isoladas do líquido aspirado da bolsa ainda
fechada e pode ocorrer um surto de brucelose em bovinos após o contato com
cavalos com bursite fistulada. O título para Brucella deve sempre ser avaliado nestes
casos e, se significativo, os proprietários devem ser informados do significado para
a saúde pública.
Achados clínicos – A inflamação leva a um considerável espessamento da
parede da bolsa. Os sacos da bolsa estão distendidos e a ruptura pode ocorrer
quando há pouco tecido recobrindo a bolsa. Em casos adiantados e mais crônicos,
o ligamento e a coluna vertebral dorsal são afetados e, ocasionalmente, nota-se
necrose destas estruturas.
No estágio inicial há uma distensão da bolsa supra-espinhal, com um exsudato
claro, amarelado e viscoso. O aumento de volume pode ser dorsal, uni ou bilateral,
dependendo do arranjo dos sacos da bolsa entre as camadas de tecido. A bursite é
um processo exsudativo de início, mas nenhuma supuração verdadeira ou infecção
secundária ocorre até a ruptura da bolsa ou sua punção.
Tratamento e prevenção – A instituição precoce do tratamento favorece o
prognóstico. O tratamento de melhor efeito é a dissecção completa e a remoção da
bolsa infectada. O custo do tratamento, que se torna prolongado em casos antigos,
freqüentemente excede o valor do animal. A vacina de Brucella não tem auxiliado
na terapia, o mesmo ocorrendo com o iodeto de sódio. Ela é razoável para manter
eqüinos separados de bovinos infectados por Brucella e eqüinos com cernelha
fistulosa descarregante de bovinos.

POLIARTRITE – SEROSITE POR CLAMÍDIA


(Serosite infecciosa)

É uma doença infecciosa que afeta ovinos, bezerros, caprinos e suínos. A


poliartrite por clamídia em ovinos foi descrita pela primeira vez em Wisconsin, e tem
Artrite e Problemas Correlatos, Gr An 566

sido reconhecida desde então, no oeste dos EUA, Austrália e Nova Zelândia. A
doença foi identificada em bezerros dos EUA, Austrália e Áustria; e em porcos da
Áustria, Bulgária e EUA.
Etiologia e epidemiologia – As cepas do agente etiológico, Chlamydia psittaci,
isoladas das articulações afetadas de ovinos e carneiros são idênticas, mas os
antígenos específicos das cepas em sua parede celular são distinguidos daqueles
que causam abortos em ovinos e bovinos (ver pág. 788).
O trato GI é muito importante na patogenia da poliartrite por clamídia. A doença
foi reproduzida experimentalmente por inoculação oral. Como as clamídias podem
ser obtidas normalmente em fezes de bezerros e cordeiros clinicamente normais, é
mais provável que o parasita e o trato GI do hospedeiro freqüentemente mante-
nham-se em equilíbrio. Quando há um desvio em favor das clamídias, ocorrem uma
infecção sistêmica e uma clamidemia; o local final de replicação é a membrana
sinovial. O trato GI também foi infectado após inoculações intra-articulares experi-
mentais. As clamídias são excretadas nas fezes e urina, sendo transmitidas via
ingestão ou, em alguns casos, inalação.
Achados clínicos – A poliartrite por clamídia é observada em cordeiros em
regime de pasto e em criações intensivas de engorda. A morbidade pode girar em
torno de 5 a 75%. A temperatura retal afetada varia de 39 a 41,5°C. Podem ocorrer
graus variáveis de rigidez, claudicação, anorexia e conjuntivite concomitante (ver
pág. 354). Os ovinos afetados encontram-se deprimidos, relutam a mover-se e,
freqüentemente, hesitam em ficar em pé ou apoiar-se sobre um ou mais membros,
mas eles podem disfarçar a rigidez após um exercício forçado. A elevada incidência
da doença em ovinos em regime de pasto ocorre entre o final do verão e início do
inverno.
A doença pode afetar bovinos de todas as idades, mas os bezerros de 4 a 30 dias
de idade são atingidos com maior gravidade. Estes bezerros podem apresentar
febre, atividade reduzida e, em geral, é necessário carregá-los até a mãe e sustentá-
los enquanto mamam. Eles invariavelmente têm diarréia, que pode ser grave, e
assumem uma posição encurvada quando de pé. As articulações dos membros
geralmente estão edemaciadas e sensíveis à palpação. O envolvimento do umbigo
e sinais neurológicos não são observados.
A poliartrite por clamídia pode ser detectada tanto em porcos mais velhos
quanto em leitões novos. Os leitões acometidos tornam-se febris e anoréticos
e podem desenvolver catarro nasal, dificuldades respiratórias e conjuntivite.
Esta condição não é claramente diferenciada de outras infecções que levam os
suínos à polisserosite e à artrite.
Lesões – As alterações teciduais mais notáveis estão nas articulações. Em
cordeiros o aumento nas articulações não é freqüentemente notado, mas em casos
crônicos avançados, pode ser notado um ligeiro alargamento de soldra, jarrete e
codilho. Nos bezerros afetados, um edema periarticular subcutâneo ao longo das
bainhas dos tendões e sacos sinoviais flutuantes, preenchidos por fluido contribuem
para o aumento das articulações. A maioria das articulações afetadas de cordeiros
ou bezerros contém bastante fluido sinovial túrbido e de coloração amarelo-
acinzentada. Flocos e placas de fibrina no espaço articular afetado podem aderir
firmemente às membranas sinoviais. As cápsulas articulares estão espessadas. A
cartilagem articular está lisa e não estão presentes erosões ou evidências de
alterações compensatórias em suas margens. As bainhas tendíneas de cordeiros
e bezerros gravemente afetados podem estar distendidas e conter um exsudato
cremoso amarelo-acinzentado. Os músculos vizinhos estão hiperêmicos e edema-
ciados, com petéquias em seus planos fasciais associados.
Diagnóstico – A história e o exame cuidadoso das alterações patológicas nas
articulações e em outros órgãos podem ser de grande valor diagnóstico. O exame
Artrite e Problemas Correlatos, Gr An 567

citológico do líquido sinovial ou tecidos pode revelar corpúsculos elementares de


clamídias ou inclusões citoplasmáticas em suas células. O isolamento e a identi-
ficação do agente causal, proveniente das articulações atingidas, confirmam o
diagnóstico. As culturas bacteriológicas das articulações afetadas são normalmente
negativas, mas Escherichia coli ou estreptococos podem ser isolados ocasio-
nalmente. Devemos suspeitar da poliartrite por clamídia em bezerros jovens que
apresentam artrite e não têm sinais de lesões umbilicais.
Características clínicas e patológicas distinguem a poliartrite por clamídia de
muitas outras condições que causam enrijecimento e claudicação em cordeiros.
Estes, com deficiência mineral ou osteomalacia, geralmente não têm febre. A
osteogênese anormal nestas 2 condições e as lesões distintas da doença do
músculo branco são virtualmente patognomônicas. Na artrite causada por
Erysipelothrix rhusiopathiae há formação de depósito e depressão da superfície
articular, fibrose periarticular e formação de osteófitos. A laminite decorrente da
infecção pelo vírus da língua azul pode ser diferenciada clínica e etiologicamente.
São necessárias investigações microbiológicas detalhadas para diferenciar a artrite
por clamídia da artrite por micoplasma.
Tratamento e prevenção – Se iniciada precocemente, a terapia com penicilina
de longa ação, tetraciclinas ou tilosina, pode dar bons resultados. As lesões mais
avançadas não respondem satisfatoriamente. O uso diário na alimentação de 150
a 200mg de clortetraciclina para cordeiros afetados, em criações intensivas, reduz
a incidência da poliartrite por clamídia. Não há vacinas aprovadas disponíveis.

TENDINITE
(Tendão arqueado)
É a inflamação aguda ou crônica do tendão, com graus variáveis de ruptura das
fibras tendíneas. Esta doença é vista mais comumente em cavalos usados em
trabalho intenso, particularmente cavalos de corrida. Os tendões flexores são
freqüentemente mais envolvidos que os extensores, e aqueles das patas dianteiras
mais do que das traseiras. Destes, o tendão flexor superficial é mais envolvido na
“tendinite” comum dos cavalos de corrida. A lesão primária é uma ruptura das fibras
tendíneas associada a hemorragia e ao edema.
Etiologia – A tendinite geralmente surge após exercício pesado. As causas mais
comuns incluem superextensão do tendão sem um treinamento apropriado, conti-
nuidade dos trabalhos após o início dos primeiros sinais de sensibilidade, fadiga e
trabalho árduo em pistas de superfície irregular. Ferragem inadequada também
pode causar tendinite. Uma conformação e treinamento insatisfatórios também
podem resultar em colapso tendíneo.
Achados clínicos – Durante o estágio agudo, o cavalo tem grave claudicação
e as estruturas envolvidas estão quentes, doloridas e edemaciadas. Nos casos
crônicos, há fibrose com espessamento e aderências na área peritendínea. O
cavalo com tendinite crônica pode apresentar-se normal enquanto caminha ou trota,
mas sofre recidiva sob trabalho pesado. A ultra-sonografia melhorou bastante a
definição do problema, revelando muitos defeitos e lesões que não são detectáveis,
ou que pelo menos são difíceis de detectar, pela palpação.
Tratamento – A tendinite é melhor tratada no estágio inicial e agudo. O cavalo
deve ser confinado à cocheira e o inchaço e inflamação tratados agressivamente
com compressas frias e agentes antiinflamatórios sistêmicos. Deve ser utilizado
algum suporte ou imobilização, dependendo do grau de dano sofrido pelo tendão.
As injeções intratendíneas de corticosteróides são contra-indicadas. O cavalo deve
retornar gradualmente ao regime de exercícios para tentar reduzir o grau de
formação de adesões. A desmotomia do ligamento acessório (“check”) superior tem
Artrite e Problemas Correlatos, Gr An 568

sido utilizada mais recentemente como um tratamento coadjuvante para mini-


mizar a recidiva quando o cavalo volta ao treinamento.
Outros tratamentos para a tendinite crônica incluem a ponta-de-fogo
(termocauterização) superficial (os benefícios são questionáveis), “splitting” per-
cutâneo do tendão e implante de fibra de carbono. A abertura localizada do tendão,
baseada na identificação ultra-sonográfica de uma área hipoecóica, também tem
sido utilizada com a intenção de diminuir a pressão intratendínea causada por soro
ou hemorragia. O prognóstico para um cavalo voltar a correr após uma tendinite é
reservado, qualquer que seja o tratamento. A desmotomia do ligamento anular
também é utilizada quando a tendinite envolve essa área.

TENOSSINOVITE
Trata-se da inflamação da membrana sinovial e, geralmente, da camada
fibrosa da bainha tendínea. O problema é caracterizado pela distensão da bainha
tendínea devido à efusão sinovial, possuindo diferentes causas e manifestações
clínicas. Os vários tipos de tenossinovites incluem a idiopática, aguda, crônica e
séptica (infecciosa).
A sinovite idiopática é a distensão sinovial da bainha tendínea em animais jovens,
cuja causa é incerta. A tenossinovite aguda e crônica ocorre devido a trauma. A
tenossinovite séptica pode estar associada a ferimentos penetrantes, extensão
local de infecção ou infecção hematogênica.
Há vários graus de distensão sinovial da bainha tendínea e de claudicação,
dependendo da gravidade. Os cavalos estão acentuadamente mancos na
tenossinovite séptica. A tenossinovite crônica é comum nos cavalos na bainha
társica do jarrete e na bainha digital. Estas 2 entidades devem ser diferenciadas do
esparavão mole e da efusão sinovial do boleto.
Os casos agudos podem ser tratados sintomaticamente com compressas frias,
drogas antiinflamatórias não esteróides e repouso. A aplicação de contra-irritantes
e ligas tem sido utilizada nos casos mais crônicos. A radioterapia é útil. A tenossinovite
séptica requer antibióticos sistêmicos e drenagem. Se desenvolverem-se adesões
entre a bainha tendínea e o tendão, normalmente há claudicação e efusão persis-
tentes.

ARTRITE E PROBLEMAS RELACIONADOS,


PQ AN
Ver também DOENÇA DE LYME, página 434, e CLAUDICAÇÃO EM PEQUENOS ANIMAIS,
página 657.

BURSITE
As bolsas sobre as articulações podem inflamar-se, especialmente nas raças de
cães de grande porte. As cavidades das bolsas são sacos de tecido conjuntivo
alinhados com a membrana sinovial localizada entre os tendões e osso. A inflama-
ção freqüentemente desaparece com repouso, aplicação de compressas de gelo
triturado ou aspiração do fluido. O local deve ser protegido de traumatismos maiores.
É necessário certificar-se da esterilidade do líquido da bolsa inflamada, antes da
administração de corticosteróides. Se a bursite é séptica, podem-se injetar antibió-
ticos diretamente dentro da bolsa.
Artrite e Problemas Relacionados, Pq An 569

DISPLASIA COXOFEMORAL
A displasia coxofemoral (DCF) é uma doença do desenvolvimento dos cães,
na qual a instabilidade articular devido à desconformidade da cabeça do fêmur
e do acetábulo permite movimentação excessiva da cabeça do fêmur.
Etiologia – A causa é desconhecida. A displasia coxofemoral é comum em raças
grandes, porém também ocorre nas menores. Machos e fêmeas são afetados com
igual freqüência. O padrão de herança sugere que é poligênica. A DCF é uma doença
complexa, também influenciada por estresses ambientais, que resultam em
modelagem articular anormal, cujo estágio final é uma osteoartrite (OA) secundá-
ria. O desenvolvimento da doença não depende do grau de inclinação da cabeça
do fêmur em relação à diáfise do fêmur, ou do grau de rotação da cabeça do fêmur
em torno do mesmo. No entanto, as anormalidades nestes ângulos muitas vezes
coexistem com a DCF, podendo ter um papel importante na progressão dos
sintomas clínicos. Pais com articulações “normais” podem ter filhotes displásicos.
No entanto, é mais provável que nasçam cães saudáveis de pais com articulações
normais. A seleção de cães por características desejáveis, por exemplo, bom
temperamento ou maior tamanho, pode resultar na seleção de animais suscetíveis
à DCF. Muitos filhotes de cães com DCF também tornam-se displásicos.
Achados clínicos – A diminuição da atividade e evidências de dor articular
muitas vezes são observadas entre 4 meses e 1 ano de idade. Cães jovens apresen-
tam um andar balouçante e inseguro; os membros posteriores são movidos para
frente com os jarretes deslocados lateralmente, colocando mais peso nos membros
anteriores e tentando forçar a cabeça do fêmur para o interior do acetábulo. Os cães
muitas vezes correm com ambos os membros posteriores movendo-se juntos
(galope de coelho) e têm dificuldade de levantar-se quando sentados ou deitados.
As escadas são difíceis de subir e o cão pode ganir ou morder quando a articulação
afetada é manipulada. A doença é progressiva e freqüentemente paralisante, mas
alguns cães sentem pouco desconforto, apesar das alterações anormais nas suas
articulações. A atividade intensa pode agravar o problema e revelar sintomas de
doença em animais anteriormente considerados não afetados.
A articulação coxofemoral fica danificada, inflamada e enfraquecida, o que
finalmente resulta em grave OA secundária. A quantidade de fluido sinovial aumenta
e o ligamento redondo fica inchado, esticado, rompendo-se eventualmente. A
cartilagem articular que recobre as extremidades ósseas opostas, normalmente lisa,
fica desgastada e a cápsula articular torna-se cronicamente inflamada e espessada.
Os músculos da articulação coxofemoral (garupa) ficam fracos e atrofiam-se.
Diagnóstico – O diagnóstico pode ser estabelecido por radiografia sob anes-
tesia geral ou sedação profunda. O animal é colocado em decúbito dorsal, com
ambos os membros posteriores completamente estendidos e as soldras rotacionadas
medialmente. Na articulação “normal”, a cabeça do fêmur se adapta ao acetábulo; na
articulação displásica, há mais espaço evidente entre os ossos. O deslocamento da
cabeça do fêmur é o marco da doença. Na maioria dos cães, se a radiografia revelar
que a região dorsal do acetábulo sombreia < 50% da cabeça do fêmur, a articulação
estará subluxada. Se o centro da cabeça do fêmur estiver diretamente abaixo da
borda acetabular, a intensidade da DCF será “moderada”; se estiver mais deslocada,
é “grave”. O deslocamento da cabeça do fêmur (por exemplo, lassidão articular) pode
também ser revelado ao tirar-se uma radiografia pélvica com um objeto sólido entre
os fêmures e pressionando-se as soldras medialmente; os fêmures devem estar
perpendiculares à mesa. Muitas vezes, o acetábulo parece raso e os osteófitos são
evidentes. As alterações características podem não ser detectadas até que os
animais estejam com 2 anos de idade.
Tratamento e prevenção – Caminhadas, natação, ou corridas moderadas são
benéficas, porém saltos e corridas prolongadas devem ser evitados. A aspirina
Artrite e Problemas Relacionados, Pq An 570

tamponada pode aliviar a dor, mas a aspirina e outras medicações não impedem as
alterações destrutivas na articulação. Os suplementos nutricionais não se mostra-
ram benéficos. Foram desenvolvidos procedimentos cirúrgicos para tratamento de
cães com dor e claudicação, porém a função normal da articulação não foi comple-
tamente restituída.
A ocorrência de DCF pode ser reduzida pela seleção (radiográfica) de modo a
cruzar apenas os animais livres da doença. Um método melhor é selecionar os cães
para acasalamento com base no desempenho da família e testes de progênie.
O desenvolvimento da doença é retardado e sua severidade diminuída quando
a taxa de crescimento dos filhotes é restringida. O oposto também é verdadeiro,
isto é, a displasia pode ser acelerada pelo aumento da taxa de crescimento nos
primeiros 4 meses de idade. Os cães que carregam os genes indesejáveis podem
ser identificados por esse procedimento. A estratégia consiste em “forçar” a
expressão da DCF em cães considerados como reprodutores através de dieta e,
possivelmente, outras práticas de manejo. O procedimento também pode revelar
o potencial para doença em pais aparentemente saudáveis. Excluindo-se os
animais displásicos e potencialmente displásicos da reprodução, a freqüência dos
filhotes livres de displasia deve aumentar.

ARTROPATIAS IMUNOMEDIADAS
Nos cães, existem 2 tipos de artropatias sistêmicas imunomediadas, ambas
inflamatórias, purulentas e não infecciosas. Nas artrites reumatóides (AR) – tipo
erosivo – há destruição da cartilagem articular e, nos casos graves, até do osso
subcondral. No lúpus eritematoso sistêmico (LES) – tipo não erosivo – a destrui-
ção da cartilagem articular não é uma característica principal. A causa inicial é
desconhecida em ambos os tipos. O LES afeta principalmente as raças médias
e grandes, enquanto a AR é mais comum nas raças pequenas e “toy”. A
comparação de testes de patologia clínica e achados radiológicos ajuda a
diferenciar os 2 problemas. Não existe cura conhecida; o melhor que pode ser
feito nestas doenças é mantê-las em remissão com uma combinação de
terapias, exercícios, dieta e controle do peso durante toda a vida.

OSTEOARTRITE
(OA, Doença articular degenerativa)
A osteoartrite (OA) é uma doença articular comum, que, dependendo da
etiologia, pode afetar animais de todas as idades. Pode ser classificada como
primária, sendo também chamada de artrite de desgaste dos animais idosos; ou
secundária, significando que é causada por um agente infeccioso (artrite séptica),
uma partícula óssea intra-articular móvel, um processo ancôneo desunido, uma
fratura mal-alinhada ou uma doença de desenvolvimento, como a displasia
coxofemoral. A OA é diferente da artrite reumatóide (AR), a qual é uma doença
inflamatória, crônica e sistêmica, que resulta em destruição progressiva das
articulações sinoviais. Na OA, a cartilagem articular é afetada inicialmente. A
cartilagem hialina normalmente lisa, brilhante e flexível começa a rachar e fibrilar.
As lesões são geralmente de condromalacia devido à necrose condrocítica e à
liberação de enzimas degradativas das células, que resultam em destruição
matricial. Os produtos liberados estimulam a membrana sinovial, resultando em
uma sinovite que ajuda a aumentar a degradação da cartilagem articular, provocan-
do uma dor articular constante. Devido à dor, a articulação é poupada, os músculos
em torno atrofiam-se, a cápsula articular se espessa, podendo ocorrer efusão inicial.
Com a perda da cartilagem articular, os componentes ósseos da articulação
articulam-se uns contra os outros (eburnação), resultando em formação de apoios
Artrite e Problemas Relacionados, Pq An 571

ósseos periféricos (osteófitos) causados pelo padrão locomotor anormal da articu-


lação. A OA pode afetar uma ou várias articulações; em quadrúpedes, as articula-
ções que suportam peso (por exemplo, coxofemoral, femorotibial, escapuloumeral
e umerorradioulnar) são comprometidas com maior freqüência.
Achados clínicos e diagnóstico – Os animais afetados relutam em efetuar
ações corriqueiras, tais como pular, fazer truques, andar, correr ou caçar; sustentam
menos peso no membro afetado. Eles podem claudicar, apresentar rigidez e ter
dificuldade de se levantar de uma posição sentada ou deitada. E podem gemer ou
morder quando a articulação afetada é manipulada. A dor piora pelo frio ou numa
mudança brusca no tempo e é exacerbada por exercício intenso.
As evidências clínicas incluem a cápsula articular espessada, depósitos de
minerais nos tecidos moles adjacentes às articulações, osteófitos na margem
articular, estreitamento do espaço articular (devido à perda da cartilagem articular)
e alterações na espessura e na densidade dos ossos. Pode ser usado o exame do
líquido articular. As articulações saudáveis contêm somente uma pequena quan-
tidade de fluido sinovial claro e viscoso. A descoloração do fluido, ou o
aumento de células teciduais ou leucócitos sugerem a doença. A confirmação deve
incluir o exame radiográfico da articulação afetada.
Tratamento – Andar e nadar torna a musculatura ágil e promove a lubrificação
e a nutrição da articulação. O repouso e a perda de peso (se obeso) são importantes.
O uso excessivo da articulação afetada agrava a dor e causa danos ainda maiores.
Drogas antiinflamatórias (por exemplo, aspirina tamponada) aliviam a dor. Os
corticosteróides podem ser usados moderadamente em casos avançados e somen-
te após um diagnóstico definitivo. Entretanto, quando a dor é aliviada, o processo
pode se agravar, pois o animal torna-se mais ativo. A medicação traz mais conforto
a cães com artrite, mas não detém o processo degenerativo. Vitaminas e suplemen-
tação dietética não detêm o processo e nem restituem a função articular. Os cães
afetados devem ser mantidos aquecidos e secos. A dor de uma lesão recente pode
ser diminuída pela aplicação de gelo triturado em um saco plástico sobre a
articulação afetada. Procedimentos cirúrgicos têm sido efetivos no tratamento da
osteocondrite dissecante das articulações da região da escápula e do jarrete,
deslocamento patelar e displasias do cotovelo. Entretanto, a cirurgia somente ajuda
a retardar o progresso da doença. Quando a dor não pode ser controlada pela
medicação, o último recurso é a implantação cirúrgica de uma endoprótese.

ESPONDILOSE DEFORMANTE
É uma osteoartrite degenerativa da coluna, particularmente da área lombar,
caracterizada pelo desenvolvimento de osteófitos nas extremidades e próximo às
bordas ventrais da vértebra. Uma condição semelhante afeta a região lombossacra.
Artropatia degenerativa dos processos articulares acompanha as lesões patológi-
cas da coluna anterior. A doença geralmente ocorre como uma doença crônica e
progressiva de cães idosos, particularmente encontrada em raças grandes. A
alteração degenerativa do anel fibroso é uma das causas conhecidas; o núcleo
pulposo representa um papel menos importante na patogenia. A maioria dos cães
com espondilose deformante não revela nenhum sinal clínico, a menos que os
osteófitos exerçam pressão sobre as raízes dos nervos. A dor torna-se evidente e
os cães afetados são relutantes a se mover com a liberdade característica.
Radiograficamente, os osteófitos apresentam superfícies ventral ou lateral oblíqua
e lisa , que se confundem com o córtex do corpo vertebral. Os espaços dos discos
podem estar com a largura normal. Um ou vários pares de vértebras podem estar
envolvidos. O tratamento é indicado somente na presença de dor. A aspirina, isola-
damente ou em conjunto com esteróides, pode ser benéfica (ver também págs. 707 e
1698).
Artrite e Problemas Relacionados, Pq An 572

ARTRITE SUPURATIVA
(Artrite séptica)
Esta condição é geralmente causada pela introdução de infecções em uma
articulação por traumatismo. A articulação fica edemaciada, quente, dolorida e
a temperatura corporal é elevada. Ocorre claudicação acentuada. O exame
clínico pode revelar um ferimento que leva ao interior da articulação ou a uma
descarga mucóide da articulação composta de pus e líquido sinovial. O pus na
cavidade articular pode ter um efeito lítico sobre a cartilagem
articular e pode ocorrer destruição óssea subcondral.
Se a aspiração do líquido sinovial não tiver sucesso, pode ser necessária a
drenagem cirúrgica da articulação. Devem ser feitos cultura e antibiograma do
fluido. Os antibióticos apropriados devem ser usados tanto de forma local quanto
sistêmica por várias semanas. A injeção intra-sinovial de antibióticos freqüentemen-
te ajuda no encurtamento da fase inflamatória aguda.

ANOMALIAS CONGÊNITAS E HEREDITÁRIAS


DO SISTEMA MUSCULOESQUELÉTICO
A inabilidade de um animal para andar normalmente, com freqüência, é
evidenciável ao nascer. Algumas destas anormalidades são hereditárias, outras
resultam da ingestão de plantas ou outros agentes tóxicos pela mãe durante a
fase inicial da prenhez ou decorrem de infecções virais que atingem o feto. Ver
também L UXAÇÃO PATELAR, página 675. Condições que afetam o sistema nervoso
também podem prejudicar a marcha (por exemplo, ver DEFEITOS CEREBELARES DO
TRONCO CEREBRAL, pág. 698).

DEFORMIDADES ANGULARES NOS MEMBROS DOS POTROS


(Valgo cárpico ou társico, Joelho valgo)
São defeitos esqueléticos congênitos ou adquiridos que dão à porção distal
de um membro um desvio lateral (ou medial), precocemente na vida neonatal.
Têm sido implicados na condição malposicionamento in utero, hipotireoidismo,
trauma, má-conformação, frouxidão articular excessiva e ossificação endocon-
dral defeituosa do cárpico ou do társico e ossos longos. Tanto os membros
dianteiros como traseiros podem ser atingidos, quase sempre simultaneamente.
Achados clínicos – O carpo é mais freqüentemente afetado, mas o tarso e os
boletos são envolvidos ocasionalmente. O desvio é óbvio, contudo varia na sua
gravidade. Um desvio lateral (valgo) de até 4° da porção distal de um membro pode
ser considerado normal, ainda que possa ser a base para uma queixa do proprie-
tário. Muitos potros são assintomáticos, entretanto a claudicação e o aumento de
volume dos tecidos moles podem acompanhar o desvio grave. A rotação para fora
dos boletos invariavelmente acompanha o valgo cárpico. Potros que apresentam
ossificação defeituosa dos ossos cubóides cárpicos ou frouxidão excessiva da
articulação, freqüentemente mancam dolorosamente e suas patas tornam-se pro-
gressivamente desviadas. Os membros afetados devem ser palpados com cuidado
a fim de se detectar a frouxidão dos ligamentos e áreas específicas passíveis de dor.
O diagnóstico deve incluir uma determinação precisa do local (nível) e a causa
do desvio. A metáfise, físis ou epífise distais do rádio ou os ossos cubóides podem
ser locais do desvio. A radiografia é indispensável. As imagens devem incluir o
Anomalias Congênitas e Hereditárias do Sistema Musculoesquelético 573

comprimento do rádio e do metacarpo (ou tíbia e metatarso) para aumentar os


traçados e as medidas do ângulo de desvio. Linhas retas, traçadas sobre o eixo
longitudinal do rádio e da canela, devem interseccionar-se sobre o local do
desvio, auxiliando o diagnóstico e a escolha do tratamento. A cartilagem em
forma de cúpula, a epífise em cunha e deformações dos ossos cárpicos são
sinais adicionais freqüentes do desvio. Casos discretos com freqüência melhoram
espontaneamente, sem tratamento. Exames e radiografias seqüenciais, diários
ou semanais, são necessários para se acompanhar a melhora espontânea ou
para se estabelecer uma necessidade cirúrgica.
Na ausência do tratamento, o prognóstico para o valgo cárpico é ruim. A
conformação anormal levará a uma doença articular degenerativa precoce. Da
mesma maneira, a deformidade dos ossos cubóides cárpicos contribui para um
prognóstico também ruim. Por outro lado, a maioria dos casos responde favoravel-
mente se houver a detecção precoce, avaliação cuidadosa e o tratamento adequado.
Tratamento – A cirurgia é o tratamento primário. A frouxidão articular excessiva,
com ou sem envolvimento dos ossos cubóides cárpicos, requer uma “canaleta” de
gesso ou uma calha de madeira acolchoada e a monitoração cuidadosa do
exercício. O boleto e a região das falanges não devem ser imobilizados pelo gesso
para ajudar o desenvolvimento do tendão e o tono dos ligamentos. O gesso protege
a junta frouxa de traumas, enquanto o exercício melhora o tono tecidual. Tais
suportes devem ser mantidos por até 6 semanas.
Os defeitos da físis e epífise também são passíveis de correção cirúrgica. O
sucesso destas cirurgias depende da continuação do crescimento e desenvol-
vimento dos ossos, e elas devem ser realizadas antes que as cartilagens de
crescimento se “fechem”, preferivelmente logo entre os 2 a 4 meses de idade.

ARACNOMELIA E A RTROGRIPOSE
A síndrome da aracnomelia e astrogripose (SAA), que ocorre em bezerros
pardos suíços, apresenta as principais lesões no sistema musculoesquelético. A
maioria dos bezerros com SAA estão mortos ao nascer ou morrem em horas. Os
membros são longos, delgados e curvos. Os músculos estão atrofiados. As
articulações cárpica, do jarrete e do boleto geralmente apresentam contraturas.
As malformações adicionais são braquignatia, crânio curto, cifoscoliose e aneuris-
mas de vasos. O defeito é hereditário como um simples autossômico recessivo.

MIOPATIAS CONGÊNITAS
Síndrome do quarto traseiro assimétrico em suínos
É um distúrbio, que se descrito em vários países europeus torna aparente
quando os suínos atingem , 30kg de peso corporal e se manifesta pela atrofia dos
músculos da coxa do membro posterior direito ou esquerdo. Algumas evidências
sugerem um complexo hereditário para a doença.

Atrofia parda
(Xantose, Lipofuscinose)
Os músculos esqueléticos e o miocárdio do gado leiteiro com esta condição
apresentam uma coloração de pardo-amarelada a bronze. Os masseteres e o
diafragma são mais freqüentemente afetados. Não é produzida nenhuma
doença clínica. Microscopicamente, notam-se grânulos de pigmento pardo
acumulados sobre o sarcolema ou no centro das fibras musculares. Há presunção
de uma causa genética, visto que certas raças (por exemplo, ayrshire) são mais
predispostas a esta condição que outras.
Anomalias Congênitas e Hereditárias do Sistema Musculoesquelético 574

Músculo duplo em bovinos


(Hiperplasia miofibrilar, Hipertrofia muscular)
Esse distúrbio tem sido descrito em muitas raças bovinas e também pode afetar
cordeiros. Em bovinos, está envolvido um modo de herança autossômica recessiva.
Os bezerros afetados apresentam os músculos abaulados e pequena quantidade de
gordura subcutânea. Microscopicamente, nota-se um aumento no número de fibras
musculares pequenas com extremidades cônicas e fibras do Tipo II hipertrofiadas.
Bezerros afetados podem causar distocia. Tentativas de explorar esta condição na
produção de carcaças maiores geralmente não têm sido bem-sucedidas devido a
qualidade da carne, eficiência reprodutiva e estrutura esquelética inferiores.

Esteatose muscular
Esta condição, em que as fibras musculares são substituídas por gordura, é
observada ocasionalmente em bovinos e suínos no momento do abate, não produz
nenhuma doença clínica e a causa é desconhecida. As lesões macroscópicas são
áreas pálidas simétricas nos músculos afetados, especialmente do dorso, pescoço
e membros superiores. Microscopicamente muitas fibras musculares são substitu-
ídas por tecido adiposo.

Miopatia associada à rigidez articular congênita


(RAC, Artrogripose)

Esta síndrome é um dos defeitos congênitos mais comuns entre os bezerros. É


caracterizada pelo enrijecimento dos membros em postura anormal e, freqüente-
mente, provoca distocia. Os animais afetados podem apresentar outras anormali-
dades, incluindo hidrocefalia, palatosquise e disrafia espinhal. A condição pode ser
letal, mas alguns animais pouco afetados recuperam-se completamente. As lesões
musculares podem ser primárias em alguns tipos da doença, mas geralmente as
lesões neurais são primárias e a alteração muscular representa uma atrofia por
perda de inervação. A RAC ocorre em bovinos, ovinos, eqüinos e suínos. Numero-
sos fatores etiológicos têm sido cogitados, incluindo teratogênios virais (vírus de
Akabane [ver pág. 402]), vegetais (Lupinus sp [ver pág. 2046]) e uma característica
recessiva hereditária dos bovinos (ver a seguir). Em ovinos, podem causar RAC,
teratogênios vegetais (astrágalo) virais (Akabane, Wesselsbron [ver pág. 494] e da
febre do Vale do Rift [ver pág. 488]), exposição ao parbendazol e miopatias primárias
hereditárias autossômicas recessivas dos cordeiros merino e welsh mountain. Em
suínos, a RAC pode ser uma característica hereditária autossômica recessiva, ou
resultado da deficiência de vitamina A ou de manganês, ou exposição da porca
prenhe a toxinas vegetais (tabaco, estramônio, cicuta e cereja silvestre).

Miopatia associada à hidrocefalia congênita


Esta condição é hereditária em gado hereford como uma característica autossô-
mica recessiva. Os bezerros afetados podem ficar cegos e são incapazes de ficar
em pé. Os músculos esqueléticos são pálidos e amolecidos, tendo diversas altera-
ções microscópicas. Embora os detalhes sejam obscuros, as lesões musculares
são provavelmente secundárias às lesões neurológicas de base.

Leitões cambaios
(Pernas encurvadas, Hipoplasia miofibrilar)
É uma condição de neonatos em que as patas traseiras são “espalhadas” para
os lados ou estendidas para frente. Suínos tratados apropriadamente, em geral, se
Anomalias Congênitas e Hereditárias do Sistema Musculoesquelético 575

recuperam em poucos dias, embora poucos se recuperem caso as patas dianteiras,


também estejam afetadas. A causa imediata do “espalhamento” das patas é o
enfraquecimento dos músculos adutores em relação aos abdutores. Os suínos
afetados são suscetíveis a pisoteamentos, inanição e resfriamento decorrente da
pouca mobilidade.
Etiologia – A influência genética foi demonstrada. Há diferenças significativas na
incidência entre ninhadas de cachaços diferentes e de diferentes raças. Ocorre com
maior freqüência em machos do que em fêmeas e em suínos com pouco peso ao
nascer. A incidência pode ser aumentada se forem administrados glicocorticóides
durante a prenhez, e parece possível que a sensibilidade ao estresse do(s) pai(s)
muito musculoso(s) pode ser um fator contribuinte. No entanto, qualquer causa de
alongamento dos músculos adutores aumenta a incidência. O alongamento pode
ser causado por pisos escorregadios, debater-se quando a pata fica presa em
fendas no solo e como resultado de danos às vias nervosas devido a infecções virais
intra-uterinas. As micotoxinas têm sido envolvidas em alguns casos. A nutrição geral
da porca (níveis de colina, metionina e vitamina E) pode influenciar na incidência.
Diagnóstico – Os sinais clínicos são característicos. Infecções in utero com o
vírus da encefalite hemaglutinante, enterovírus, outros vírus e infecções pós-parto
das meninges por bactérias, além de trauma devem ser considerados. Os músculos
afetados estão geralmente hipoplásicos e as pequenas fibras musculares contêm
poucas miofibrilas, como seria de se esperar em músculos de fetos normais
próximos ao parto.
Profilaxia e tratamento – Pisos secos e antiderrapantes devem ser providen-
ciados. Estes pisos não devem apresentar fendas onde os animais possam se
prender, especialmente nos primeiros 2 dias. Os leitões devem ser protegidos de
lesões provocadas pela porca e deve-se assegurar-lhes amamentação adequada.
Em leitões afetados, as patas traseiras devem ser fixadas juntas, acima do jarrete
com uma ligadura frouxa em “forma de 8”, feita com fita adesiva, por 2 a 4 dias.
Devem ser corrigidas as deficiências nutricionais da ração da porca. Os glicocorti-
cóides não devem ser administrados na fase final da gestação e linhagens de
animais com elevada suscetibilidade devem ser eliminadas.

ENCURTAMENTO DO TENDÃO FLEXOR


Esta é, provavelmente, a anormalidade mais prevalente do sistema locomotor
dos bezerros recém-nascidos de quase todas as raças. É causada por um gene
autossômico recessivo e a posição in utero pode afetar o grau de incapacidade.
Potros recém-nascidos também podem ser afetados (ver pág. 639).
Ao nascer, as quartelas dianteiras, os boletos e algumas vezes, as articulações
cárpicas, estão flexionados em graus variáveis, devido ao encurtamento dos
tendões flexores digitais superficiais e profundos e dos músculos associados. Uma
fenda no palato pode acompanhar esta condição em algumas raças. Animais
levemente afetados sustentam o peso nas solas dos cascos e andam sobre suas
pinças. Os animais afetados de forma mais severa andam sobre a superfície dorsal
da quartela e articulação do boleto; se não forem tratados, a superfície dorsal destas
articulações torna-se prejudicada e desenvolve-se uma artrite supurativa.
Os sinais são muito sugestivos, mas esta condição deve ser diferenciada da
artrogripose (ver pág. 574).
Casos brandos recuperam-se sem tratamento. Casos intermediários recuperam-
se com a aplicação de uma canaleta instalada de tal modo que o animal seja forçado
a sustentar o peso sobre suas pinças; entretanto, a pressão aplicada não deve
comprometer a circulação para que a pata não sofra uma necrose isquêmica. A
freqüente extensão manual das articulações, tentando-se estender os ligamentos,
Anomalias Congênitas e Hereditárias do Sistema Musculoesquelético 576

tendões e músculos, ajuda no tratamento destes casos intermediários. Casos


graves requerem tenotomia de um ou ambos os tendões flexores. Um molde de
gesso pode também ser indicado em alguns casos. Casos extremos podem não
responder a tratamento algum.

DEFEITOS NA ESPINHA DOS POTROS


(Dorso selado, Dorso cortante)
Os defeitos da coluna vertebral são incomuns nos potros, mas entre eles, a
escoliose congênita é encontrada com maior freqüência e está presente no
nascimento. É freqüentemente difícil avaliar sua gravidade no exame clínico, sendo
que uma melhor apreciação pode ser obtida pelo exame radiográfico. Em casos a
recuperação é espontânea e pode ser completa. Mesmo nos casos mais graves,
raramente há alguma anormalidade óbvia no modo de andar ou maneabilidade.
Entretanto, estes potros com freqüência não são criados, em decorrência de sua
incapacidade para trabalhar ou serem montados.
Outra deformidade congênita ocasional é a sinostose (fusão das vértebras) a
qual pode ser associada a uma escoliose secundária. É necessária a radiografia
para confirmação.
A condição da lordose congênita (dorso selado) é associada à hipoplasia dos
processos articulares intervertebrais. Em cavalos adultos, graus de lordose e
cifose adquiridas (dorso cortante) são ocasionalmente vistos e estes normalmente
predispõem ao enfraquecimento do dorso. O diagnóstico se baseia na aparência
clínica e pode ser confirmado por radiografias, as quais revelam uma curvatura
indevida da coluna vertebral, comumente na porção cranial da região torácica (T5-10)
na lordose e na porção cranial da região lombar (L1-3) na cifose.

DISCONDROPLASIA
Bovinos – A discondroplasia de origem genética ocorre na maioria das raças de
bovinos. As formas variam da chamada forma letal “Bulldog” Dexter, a qual é
invariavelmente natimorta, até aqueles animais que são tão pouco afetados que o
diagnóstico somente por inspeção visual não é confiável.
Os anões braquicefálicos, muito comuns entre bovinos hereford na década de
50, foram amplamente eliminados através da seleção genética. Eles são caracteri-
zados por perfil curto, chanfro abaulado, prognatismo, abdome distendido e pernas
curtas. Têm aproximadamente metade do tamanho normal. Os anões
dolicocefálicos são muito encontrados nos bovinos da raça angus e apresentam
a mesma conformação corporal geral que os anões braquicefálicos, mas esses têm
cabeça longa e não têm nem chanfro abaulado nem prognatismo. Os bezerros de
perfil curto são freqüentemente denominados anões “resfolegantes”, devido à sua
respiração laboriosa e audível. Ambos os tipos são de baixa viabilidade e suscetíveis
à timpanite. Suas carcaças são indesejáveis e eles são raramente mantidos na
criação, salvo por razões experimentais.
Vários experimentos de acasalamento indicam que anões braquicefálicos e
dolicocefálicos e vários tipos de animais “compactos” são parte de um mesmo
complexo genético que também pode incluir a forma letal de Dexter. Tipos
análogos de anões também ocorrem em outras raças. Atualmente, poucos
animais deste tipo são usados em reprodução. No início acreditava-se que um
simples gene autossômico recessivo, com penetrância completa, era responsá-
vel pelo nanismo braquicefálico e isto ainda parece ser o caso quando os
cruzamentos são confinados em compactos. Entretanto, quando os cruzamentos
são confinados entre não portadores da moléstia, a proporção entre anões e não
anões é de , 15:1, de tal modo que implicam-se os genes recessivos a dois loci.
Anomalias Congênitas e Hereditárias do Sistema Musculoesquelético 577

Atualmente, entretanto, não há uma única hipótese genética que sirva para
todos os tipos de discondroplasia.
Cães – Em cães, ocorrem discondroplasias dos esqueletos apendicular e axial.
A primeira é relatada em poodles e scottish terriers e a segunda em malamutes do
Alaska, basset hounds, dachshunds, poodles e scottish terriers. Em algumas raças
(bassets, dachshunds, pequinês) os caracteres discondroplásicos apendiculares
são uma importante característica do tipo racial. Em malamutes, a condição é
acompanhada por anemia.

PARALISIA DO NERVO FEMORAL


Trata-se de claudicação unilateral do membro posterior que se segue a um
nascimento difícil. A condição, identificada em muitas raças de bovinos, é mais
freqüentemente encontrada nos bezerros de novilhas de primeira cria. A causa é
o sobreestiramento do nervo femoral com contusão e ruptura total ou parcial.
Bezerros afetados são grandes ou precisam passar por uma pelve estreita em
apresentação anterior com distocias do tipo “posteriores sobre o corpo” ou “poste-
riores dobrados”. Ocasionalmente, os bezerros afetados nascem sem assistência,
mas normalmente é requerida muita tração para liberá-los.
O membro afetado é incapaz de suportar o peso do corpo e são evidentes luxação
patelar espontânea ou induzida, flexão do jarrete e da soldra durante a marcha,
diminuição do tono e atrofia do quadríceps femoral e hipometria. Outros sinais
compatíveis com a distocia grave e tração forçada, tais como ossos fraturados e
contusões também podem estar presentes. Um antecedente de tração forçada, um
bezerro grande, um membro posterior parcial ou completamente paralisado e atrofia
muscular após vários dias são normalmente suficientes para fazer um diagnóstico.
Não há tratamento satisfatório para bezerros gravemente afetados, mas aqueles
apenas levemente afetados, freqüentemente, recuperam-se após algumas sema-
nas ou meses.

PERNA FLÁCIDA
É uma condição hereditária dos bovinos da raça jersey, aparentemente contro-
lada por um simples gene recessivo. Alguns bezerros afetados nascem mortos. Os
que sobrevivem parecem normais ao nascimento, mas são incapazes de manter-se
de pé; eles podem esforçar-se para isto, mas não conseguem devido à formação
incompleta de músculos, ligamentos, tendões e articulações. As articulações da
região escapular e pélvica podem estar “giradas” para alguma direção sem que os
animais apresentem desconforto aparente. O diagnóstico é feito com base nos
sinais, achados de necropsia e identificação dos animais portadores.
Não há tratamento, mas o pai e a mãe de cada um dos animais afetados devem
ser relatados à associação de criadores e à central de inseminação para que os
animais portadores possam ser identificados.

OSTEOGÊNESE I MPERFEITA
É um defeito ósseo generalizado, hereditário de bovinos, cães e gatos, caracte-
rizado por extrema fragilidade dos ossos e lassidão articular. Os ossos longos são
delgados e possuem córtices pouco espessos. Calos e fraturas recentes podem
estar presentes. A esclera dos olhos pode ser azulada.

O STEOPETROSE
É uma doença rara que parece ser herdada de forma simples, autossômica e
recessiva em bovinos angus e hereford. Também é observada em cães, potros e
Anomalias Congênitas e Hereditárias do Sistema Musculoesquelético 578

bezerros simmental. Em média, os bezerros angus afetados são abortados com 263
dias de gestação. Os bezerros afetados possuem uma mandíbula inferior curta e
quase imóvel. Os dentes molares estão impactados. Os ossos longos são frágeis.
Não há diferença de densidade entre as áreas do córtex e da medula dos ossos
longos. O diagnóstico é confirmado pela bissecção longitudinal dos ossos longos.
Não se encontram cavidades medulares; as diáfises dos ossos longos estão
preenchidas com um tampão ósseo. Deste modo, a osteopetrose é caracterizada
por um osso sólido que não é reabsorvido ou remodelado.

POLIDACTILIA
Trata-se de um defeito genético de bovinos, ovinos, suínos e, ocasionalmente,
de eqüinos. Na sua forma genética e mais comum, afeta ambos os membros
anteriores, simetricamente. O segundo dígito está desenvolvido, mas os dígitos
rudimentares mediais estão ausentes. Os dígitos dos posteriores podem estar
fundidos, causando polissindactilia. Algumas vezes apenas um membro está
afetado; ainda mais incomum é a ocorrência de polidactilia em todos os 4. A
polidactilia dos bovinos parece ser poligênica, com um gene dominante em um locus
e um homozigoto recessivo em outro.

SINDACTILIA
(Casco de mula)
É a fusão parcial ou completa de um ou mais dígitos da pata. Relatado em
numerosas raças de bovinos, ela é mais prevalente em holsteins. É uma herança
autossômica recessiva simples. As patas dianteiras são afetadas com mais
freqüência, mas uma ou todas as 4 patas podem estar completa ou parcialmente
sindáctilas. Os animais afetados andam de forma lenta, apresentam marcha
altamente interrompida e dificultosa se as 4 patas forem atingidas. A sindactilia
pode estar associada à suscetibilidade a hipertermia.
Não há tratamento. O pai e a mãe de cada um dos animais afetados devem ser
relatados à associação de criadores e à central de inseminação para que os animais
portadores possam ser identificados.

DISTROFIAS ASSOCIADAS AO CÁLCIO,


FÓSFORO E VITAMINA D
As principais causas de osteodistrofias são deficiências ou desequilíbrios de
cálcio (Ca), fósforo (P) e vitamina D na dieta. Suas inter-relações não são facilmente
definidas e a deficiência absoluta de algum dos três pode ser absoluta ou relativa.
As deficiências devem ser avaliadas em relação à disponibilidade e à taxa de
crescimento.
Em todas as espécies, uma deficiência absoluta ou relativa de cálcio causa
hiperparatireoidismo (ver pág. 342) e o desenvolvimento de osteoporose ou osteo-
distrofia fibrosa, ou ambos. A deficiência de cálcio não causa raquitismo ou
osteomalacia em mamíferos. A deficiência absoluta é menos comum do que a
relativa deficiência condicionada por excesso de fósforo.
A deficiência de fósforo causa raquitismo ou osteoporose em animais em
crescimento e osteomalacia ou osteoporose em adultos. Isto ocorre principalmente
em ruminantes em pastejo e raramente em animais que consomem grãos ou carne.
Distrofias Associadas ao Cálcio, Fósforo e Vitamina D 579

Ocorrem apetite e taxa de crescimento baixos, pica e anormalidades na movimen-


tação. Nas vacas, observam-se decréscimo na produção leiteira, infertilidade e,
ocasionalmente, anemia (ver HEMOGLOBINÚRIA POS-PARTO, pág. 549).
A deficiência de vitamina D é a causa clássica do raquitismo (animais em
crescimento) e osteomalacia (em adultos). Ela geralmente resulta da exposição
insuficiente dos animais ou seus alimentos ao sol. É influenciada pela deficiência ou
desequilíbrio de cálcio e fósforo; altos níveis de caroteno em alimentos verdes
também produzem sinais de deficiência de vitamina D.
A hipervitaminose D pode ser iatrogênica ou resultado da suplementação
dietética acidental ou ingestão de veneno de rato. Por si só, a superdosagem maciça
causa gastrite hemorrágica e pneumonia intersticial. Superdosagem moderada
persistente produz hipercalcemia, atrofia e mineralização dos tecidos moles, espe-
cialmente dos rins, estômago, pulmão e vasos sangüíneos. Histologicamente, o
acúmulo de osteóide basofílico nas superfícies ósseas é característico. Pseudo-
hiperparatireoidismo ocorre em alguns cães com neoplasias não paratireóideas,
particularmente adenocarcinomas das glândulas do saco anal e linfossarcomas que
também resultam em grave hipercalcemia (ver também HIPERCALCEMIA HUMORAL
MALIGNA, pág. 343). Nestes casos, ocorre a mineralização renal e, com menor
freqüência, a gástrica e a endocárdica. Animais que estejam em pastejo de plantas
com atividade de vitamina D também podem apresentar sinais de hipercalcemia e
mineralização de tecidos moles (ver CALCINOSE ENZOÓTICA, pág. 587).
Pode coincidir em um animal ou grupo de animais, mais de uma doença
decorrente de deficiência ou desequilíbrio de cálcio, fósforo e vitamina D e a
descrição de tais casos como uma deficiência simples tem confundido a interpreta-
ção das osteodistrofias de ocorrência natural. Atualmente, o diagnóstico destas
osteodistrofias é baseado em critérios histológicos. Análise da cinza dos ossos
geralmente permite a separação destas várias doenças. Freqüentemente, a defi-
ciência de fósforo é acompanhada por hipofosfatemia; deficiência de vitamina D por
hipocalcemia; e deficiência de cálcio por normocalcemia (ver também ARTROPATIA
DEGENERATIVA DE BOVINOS, pág. 597).

HIPERPARATIREOIDISMO PRIMÁRIO
O hormônio da paratireóide (PTH) é produzido em excesso por uma lesão
funcional autônoma na glândula paratireóide. Esta doença é encontrada com
pouca freqüência em cães idosos e não parece ser uma seqüela de
hiperparatireoidismo secundário crônico (ver adiante). O mecanismo de controle
normal para a secreção de PTH pela concentração do cálcio sangüíneo é perdido
no hiperparatireoidismo primário e a paratireóide produz hormônio em excesso a
despeito do cálcio sangüíneo elevado.
O hormônio da paratireóide atua nas células dos túbulos renais, inicialmente para
promover a excreção de fósforo e retenção de cálcio. Um aumento prolongado da
secreção de PTH resulta na reabsorção óssea osteocítica e osteoclástica acelera-
da. O mineral é removido do esqueleto e substituído por tecido conjuntivo fibroso
imaturo. A osteodistrofia fibrosa é generalizada por todo o esqueleto, mas é
acentuada em certas áreas, tais como o osso esponjoso do crânio. Os níveis
elevados de PTH também inibem a reabsorção tubular renal de fósforo.
A lesão na glândula paratireóide em cães é em geral um adenoma ou, ocasional-
mente, um carcinoma, composto na sua maior parte por células principais ativas. Os
adenomas são usualmente únicos, levemente vermelho-acastanhados e localiza-
dos na região cervical próxima, mas num ponto delimitado, da glândula tireóide.
Raramente, eles podem estar presentes no mediastino anterior, próximo à base do
coração.
Distrofias Associadas ao Cálcio, Fósforo e Vitamina D 580

Achados clínicos – Claudicações seguem a reabsorção óssea osteoclástica


grave, e fraturas de ossos longos ocorrem após o menor trauma físico. Fraturas por
compressão dos corpos vertebrais enfraquecidos podem pressionar a medula
espinhal e os nervos, resultando em disfunção motora e sensorial.
A hiperostose facial, com obliteração parcial da cavidade nasal por tecido ósseo
fracamente mineralizado e tecido conjuntivo fibroso altamente vascularizado e a
perda ou amolecimento dos dentes, são sinais que têm sido observados em cães.
Isto pode resultar na impossibilidade de fechar adequadamente a boca e no
desenvolvimento de úlceras gengivais. O maxilar e os ramos da mandíbula freqüen-
temente estão espessados de forma grosseira pelo tecido ósseo excessivo. Os
ossos do crânio estão marcantemente delgados pela grande reabsorção e têm uma
aparência radiográfica, como que “roída por traça”, característica.
Lesões – A demonstração histológica de uma borda de tecido normal e cápsula
fibrosa parcial a completa de uma paratireóide aumentada sugere mais o diagnós-
tico de um adenoma do que de uma hiperplasia focal. Os carcinomas de células
principais tendem a ser maiores que os adenomas e são fixos aos tecidos
subjacentes devido à infiltração local de células neoplásicas.
Diagnóstico – Embora outros achados laboratoriais possam ser variáveis, a
hipercalcemia é consistente e resulta da liberação acelerada do cálcio dos ossos.
O cálcio sangüíneo em cães normais é , 10± 1mg/dL dependendo da idade e da
dieta (método de análise). Valores de cálcio sérico consistentemente > 12mg/dL
devem ser considerados hipercalcêmicos. Cães com hiperparatireoidismo primário
geralmente apresentam cálcio sérico de ≥ 12 a 20mg/dL. O fósforo sangüíneo está
abaixo ou em níveis abaixo do normal (≤ 4mg/dL). A excreção urinária de fósforo e,
freqüentemente, de cálcio é aumentada e pode resultar em nefrocalcinose e
urolitíase. O metabolismo acelerado da matriz óssea é refletido pelo aumento da
excreção urinária de hidroxiprolina. A atividade sérica de fosfatase alcalina pode
estar elevada em pacientes com doença óssea patente. A demonstração de níveis
elevados de PTH na circulação, pelo radioimunoensaio espécie-específico num cão
adulto a senil com hipercalcemia, hipofosfatemia e evidências de distúrbios ósseos
generalizados, proporciona evidências conclusivas para o diagnóstico de hiperpa-
ratireoidismo primário. O PTH pode ser medido por radioimunoensaios sensíveis ou
por ensaios imunorradiométricos.
O ensaio do PTH por N-terminal intacto pode ser realizado com soro (preferivel-
mente) ou plasma que foi separado e congelado (–70°C em tubos plásticos ou de
vidro) tão logo quanto possível após a coleta. Utilizando-se este método, os níveis
circulantes de PTH na maior parte dos animais estão próximos de 20pg/mL (por
exemplo, cão 20 ± 5pg/mL; gato 17 ± 2pg/mL), com os níveis dos primatas não-
humanos um pouco mais baixos. O ensaio de PTH que utiliza anticorpos gerados
contra o terminal carboxila da molécula humana geralmente fornece resultados
menos consistentes em outros animais que não o homem.
Outras causas de hipercalcemia, que devem ser consideradas no diagnóstico
diferencial do hiperparatireoidismo primário, são intoxicações por vitamina D
(superdosagem) ou calcinose enzoótica (ver pág. 587), neoplasmas malignos
com metástases ósseas e hipercalcemia humoral maligna (ver pág. 343). A
hipercalcemia da hipervitaminose D pode ser tão alta quanto a do hiperparati-
reoidismo primário, mas é acompanhada por graus variados de hiperfosfatemia
e atividade de fosfatase alcalina sérica normal. Doenças esqueléticas geralmente
estão ausentes, visto que o aumento das concentrações sangüíneas de cálcio
e fósforo é mais decorrente do aumento da taxa de absorção intestinal do que
da reabsorção óssea.
Neoplasias malignas com metástases ósseas podem causar hipercalcemia e
hipercalciúria moderadas, mas a atividade de fosfatase alcalina e os níveis de
fósforo sérico usualmente estão normais ou só levemente alterados. Estas altera-
Distrofias Associadas ao Cálcio, Fósforo e Vitamina D 581

ções são tidas como decorrentes da liberação de cálcio e fósforo para o sangue, a
partir de áreas de destruição óssea com índices acima da capacidade de filtração
dos rins e intestinos. O envolvimento ósseo é mais restritamente localizado na área
da metástase. A osteólise associada à metástase tumoral resulta não somente da
ruptura física do osso pela proliferação de células neoplásicas, mas também
da produção local de substâncias humorais que estimulam a reabsorção óssea, tais
como prostaglandinas e interleucina-1.
A hiperplasia primária da paratireóide foi descrita em filhotes de pastor alemão
associada a hipercalcemia, hipofosfatemia, aumento da imunorreatividade ao PTH
e aumento do “clearance” fracional de fósforo inorgânico na urina. Os sintomas
clínicos incluem crescimento retardado, fraqueza, poliúria, polidipsia e uma redução
difusa na densidade óssea. A infusão EV de cálcio não suprime a secreção
autônoma de PTH pela hiperplasia difusa de células principais em todas as
paratireóides. As lesões incluem hiperplasia nodular de células C da tireóide e uma
mineralização difusa dos pulmões, rins e mucosa gástrica. A doença é herdada
como um autossômico recessivo.
A hipercalcemia também pode ser associada a lesões osteolíticas multifocais
associadas a êmbolos sépticos, imobilização completa, osteossarcoma, hipoadre-
nocorticismo (doença de Addison), hipocalcitoninismo devido a uma lesão destru-
tiva da tireóide, doença renal crônica, hemoconcentração ou hiperproteinemia. A
hipercalcemia é ocasionalmente detectada em animais desidratados, mas em geral
é suave. Ela é atribuída à contração do volume de líquido que resulta em
hiperproteinemia e elevação da concentração de cálcio ionizado e não ionizado. A
hipercalcemia desaparece rapidamente após a fluidoterapia.
Tratamento – O objetivo do tratamento é eliminar a fonte de produção excessiva
de PTH. Deve-se tentar a identificação de todas as 4 paratireóides antes de excisar
algum tecido. Adenomas simples ou múltiplos devem ser removidos totalmente. Se
todas as paratireóides identificáveis na região cervical parecerem normais ou forem
de tamanho pequeno, e o diagnóstico tiver sido estabelecido com razoável certeza,
a exploração cirúrgica do tórax, próximo à base do coração, pode ser necessária
para se localizar a neoplasia paratireóidea.
A remoção cirúrgica da lesão funcional da paratireóide resulta numa rápida
diminuição dos níveis de PTH circulante, devido à meia-vida do PTH no plasma ser
< 15min. Visto que os níveis plasmáticos de cálcio em pacientes com a doença
óssea patente podem diminuir rapidamente e tornar-se subnormais 12 a 24h após
a cirurgia, eles devem ser monitorados com grande freqüência. A hipocalcemia pós-
operatória (≤ 5mg/dL) pode ser resultante de: 1. depressão da atividade secretória
das células principais, devido à supressão pela hipercalcemia crônica ou lesão ao
tecido paratireóideo restante durante a cirurgia; 2. decréscimo abrupto na reabsor-
ção óssea devido à redução nos níveis de PTH; e 3. mineralização acelerada da
matriz osteóide formada pelos osteoblastos hiperplásicos, anteriormente impedida
de se mineralizar pelos níveis elevados de PTH. A infusão do gliconato de cálcio para
manter o cálcio sérico entre 7,5 e 9mg/dL, associada a uma alimentação rica em
cálcio e suplementação de vitamina D, corrigirá estas sérias complicações pós-
operatórias. Se a hipercalcemia persistir por ≥ 1 semana após a cirurgia ou retornar
após uma melhora inicial, deve-se suspeitar da presença de um segundo adenoma
ou metástase de um carcinoma.

HIPERPARATIREOIDISMO SECUNDÁRIO
Hiperparatireoidismo nutricional
(Osteodistrofia fibrosa)
É um aumento da secreção de PTH como um mecanismo compensatório
induzido por desequilíbrio nutricional. Em geral, os animais em crescimento são
Distrofias Associadas ao Cálcio, Fósforo e Vitamina D 582

mais gravemente afetados, porque sua necessidade de cálcio é mais elevada. Uma
grande porção de distrofias esqueléticas diagnosticadas, como raquitismo e osteo-
gênese imperfeita, em filhotes de cães e gatos é uma manifestação do hiperpara-
tireoidismo nutricional.
Etiologia e patogenia – Desequilíbrios minerais dietéticos de importância
etiológica são: 1. baixo teor de cálcio (a maioria dos grãos) ou cálcio indisponível
(plantas ricas em oxalatos, tais como Setaria sphacelata, Cenchrus ciliaris e
Panicum maximum); 2. fósforo em excesso, com cálcio normal ou baixo (carne ou
vísceras); e 3. quantidades inadequadas de colecalciferol (vitamina D3) em primatas
do Novo Mundo. O resultado final significante é a hipocalcemia, que resulta na
estimulação da paratireóide.
Uma dieta pobre em cálcio falha no suprimento diário requerido, desenvolven-
do a hipocalcemia, mesmo que grandes porções do cálcio ingerido sejam absor-
vidas. A ingestão excessiva de fósforo resulta no aumento da absorção e elevação
do fósforo sangüíneo. A hiperfosfatemia não estimula diretamente a glândula
paratireóide, mas o faz indiretamente pela sua habilidade em baixar o cálcio
sangüíneo.
A doença desenvolve-se quase sempre em cãezinhos e gatinhos que se
alimentam predominantemente com carne bovina (ver também NUTRIÇÃO: CÃES e
GATOS, págs. 1458 e 1409).
Achados clínicos – Gatinhos alimentados exclusivamente com coração bovino
desenvolvem distúrbios locomotores com 4 semanas de idade, embora o conteúdo
de proteína digestiva seja alto (> 50% da base de peso) e a gordura promova o
crescimento rápido, os animais pareçam bem nutridos e seu pêlo brilhante. Os sinais
clínicos predominantes são relutância para se movimentar, claudicação posterior e
ataxia. Os gatinhos freqüentemente ficam de pé com um desvio característico da
pata. A doença esquelética torna-se progressivamente mais grave após 5 a 14
semanas. Os gatinhos tornam-se quietos e relutantes em brincar e assumem uma
posição sentada ou em decúbito esternal com os membros posteriores em abdução.
As atividades normais podem resultar no aparecimento súbito de claudicação grave
devido a fraturas incompletas ou por dobramento de um ou mais ossos.
A claudicação é o distúrbio funcional inicial em cães em crescimento e pode variar
de uma leve coxeadura até a incapacidade de andar. Os ossos ficam dolorosos à
palpação e as fraturas por dobramento de ossos longos e vértebras são comuns. Em
cães adultos, os sinais clínicos geralmente são relatados como a reabsorção dos
ossos da mandíbula. A reabsorção, estimulada pelo PTH, do osso alveolar resulta
em afrouxamento e subseqüente perda dos dentes, com recuo da gengiva e
exposição parcial da raiz em casos avançados.
Em cavalos, o hiperparatireoidismo nutricional é conhecido como doença do
rolão, doença de Miller e macrocrania. A dieta de cavalos “bem alimentados” é
freqüentemente muito alta em grãos e baixa em forragem, o que leva a uma ingestão
elevada de fósforo e baixa de cálcio. Várias das claudicações obscuras de cavalos
têm sido atribuídas ao hiperparatireoidismo nutricional. As alterações patológicas
são similares àquelas em outras espécies, mas os ossos da cabeça são particular-
mente afetados nos casos graves e as fraturas macroscópicas e microscópicas do
osso subcondral, com conseqüente degeneração da cartilagem articular e dilacera-
ção dos ligamentos de inserção periosteal, são uma influência dominante nos sinais
clínicos.
O hiperparatireoidismo nutricional é raro em bovinos e ovinos, mas é visto
ocasionalmente em rebanhos de engorda intensiva. Nestas espécies, a fibroplasia
medular não é uma característica da condição. A osteoporose é a lesão dominante,
mas a “cara inchada” pode ocorrer em caprinos. As deformidades ósseas em
animais recuperados podem causar constipação ou distocia.
Distrofias Associadas ao Cálcio, Fósforo e Vitamina D 583

Diagnóstico – Para se estabelecer um diagnóstico definitivo, a dieta deve ser


avaliada em relação ao cálcio, fósforo e vitamina D nela contidos. Há evidências
radiográficas de desmineralização esquelética generalizada, perda da “lâmina dura
dentes”, reabsorção óssea subperiosteal do córtex, deformidades curvas e múltiplas
fraturas por dobramento dos ossos longos, decorrentes da intensa proliferação
localizada de osteoclastos. Os parâmetros laboratoriais usados para avaliar a
função renal devem estar dentro dos limites normais em pacientes com hiperpara-
tireoidismo nutricional.
Uma única dosagem de Ca, P, e fosfatase alcalina séricos pode ser de pouco valor
diagnóstico. Desde que o mecanismo homeostático esteja funcionando, e a função
renal esteja normal, os níveis séricos de cálcio e fósforo geralmente estão no nível
baixo – normal. A atividade da fosfatase alcalina está freqüentemente elevada em
animais com doença óssea patente. O aumento da secreção do PTH atua nos rins
normais para aumentar a excreção de fósforo e diminuir a de cálcio pela urina.
Tratamento – A intenção é diminuir a secreção de PTH pela correção da
deficiência ou desequilíbrio mineral da dieta. Filhotes de cães e gatos com a doença
devem ser alimentados com uma dieta que preencha suas necessidades diárias de
proteína, cálcio e fósforo. Gliconato de cálcio, lactato ou carbonato de cálcio devem
ser usados como suplementos dietéticos, para obter-se uma proporção de cálcio e
fósforo de 2:1, durante o período de convalescença em animais jovens com doença
óssea grave. A vitamina D adicional geralmente não é necessária; entretanto, ela
pode ser indicada em primatas com deficiência de vitamina D3. O gliconato de cálcio
deve ser dado parenteralmente se houver depressão do apetite. O excesso de
cálcio dietético deve ser avaliado, porque pode retardar o crescimento e alterar a
remodelação óssea em animais jovens. Mesmo casos avançados respondem fa-
voravelmente à suplementação dietética. Boa enfermagem é essencial para preve-
nir complicações, tais como úlceras de decúbito, constipação e fraturas adicionais.
Após o início da suplementação dietética, os animais afetados devem ser
confinados por várias semanas. A resposta à terapia é rápida, e dentro de 1 semana
o animal torna-se mais ativo e suas atitudes melhoram. Saltos e subidas devem ser
evitados, porque o esqueleto ainda está suscetível a fraturas. A restrição pode
ser menos rígida após 3 semanas, mas o confinamento com limitação de movimen-
tos é indicado até que o esqueleto retorne ao normal (a resposta ao tratamento deve
ser monitorada radiograficamente). Em animais jovens, a recuperação, em geral,
completa-se por volta de 8 a 9 semanas.

Hiperparatireoidismo secundário renal


É uma complicação da deficiência renal crônica caracterizada por uma taxa de
secreção excessiva, mas não autônoma, de PTH. Ocorre freqüentemente em cães
e ocasionalmente, em gatos e outros animais. A secreção de hormônios pelas
glândulas paratireóides hiperplásicas, em geral, permanece responsiva à flutuação
do cálcio sangüíneo.
Etiologia e patogenia – O mecanismo etiológico primário é uma doença renal
crônica, progressiva com a deterioração da função do órgão. A insuficiência renal
crônica, em cães idosos é o resultado de nefrite intersticial, glomerulonefrite,
nefrosclerose ou amiloidose. Condições tais como displasia renal, doença renal
ligada a uma linhagem familiar, rins policísticos e hidronefrose congênita bilateral
podem ser responsáveis pela doença em cães jovens.
Quando a doença renal reduz significantemente a taxa de filtração glomerular, o
fósforo é retido e desenvolve-se uma hiperfosfatemia progressiva. Embora a
concentração sangüínea de fósforo não tenha influência reguladora direta na
síntese e secreção de PTH, ela pode fazê-lo indiretamente pelo baixo cálcio
sangüíneo, o qual estimula a paratireóide. Na deficiência renal crônica, a hipocalce-
Distrofias Associadas ao Cálcio, Fósforo e Vitamina D 584

mia também resulta de um distúrbio adquirido no metabolismo de vitamina D, no qual


os rins doentes são incapazes de converter as formas precursoras inativas na forma
ativa de vitamina D (1,25 diidroxicolecalciferol).
Achados clínicos – Os sinais predominantes de vômito, desidratação, polidip-
sia, poliúria, depressão e odor amoniacal na respiração estão relacionados a
insuficiência renal progressiva e uremia. Uma variedade de lesões esqueléticas do
hiperparatireoidismo secundário pode estar presente, abrangendo desde pequenas
alterações, como doença renal inicial (ou suave) até uma grave osteodistrofia
fibrosa da deficiência renal avançada. O volume dos ossos afetados, em geral, é
normal (isostótico), particularmente em cães idosos, devido à lenta instalação da
deficiência renal e ao baixo índice de atividade metabólica dos ossos. Lesões
ósseas hiperostóticas, tais como o aumento de volume facial, podem ser vistas em
cães jovens, nos quais a deposição de osteóide desmineralizado por osteoblastos
hiperplásicos e a produção de tecido conjuntivo fibroso excedem a taxa de
reabsorção óssea.
Embora o envolvimento esquelético seja generalizado, ele não afeta todas as
partes de modo uniforme. As lesões aparentes surgem cedo e atingem um estágio
mais avançado em certas áreas, tais como os ossos esponjosos do crânio. A
reabsorção do osso alveolar pode ocorrer precocemente e resulta em afrouxa-
mento dos dentes, os quais podem ser destacados com facilidade interferindo
na mastigação. Como resultado da reabsorção acelerada do osso esponjoso da
mandíbula e maxila, os ossos tornam-se amolecidos e flexíveis (“doença da man-
díbula de borracha”) e as mandíbulas não se fecham apropriadamente. Isto, com
freqüência, resulta em sialorréia e protrusão da língua. A mandíbula gravemente
desmineralizada é predisposta a fraturas e deslocamento dos dentes de seus
respectivos alvéolos. Os ossos longos são menos drasticamente afetados. Claudi-
cação, marcha rígida e fraturas após o menor trauma podem resultar do aumento
da reabsorção óssea.
Lesões – Todas as glândulas paratireóides estão aumentadas, inicialmente
pela hipertrofia das células principais e, subseqüentemente, pela hiperplasia
compensatória. Embora as paratireóides não sejam autônomas, a concentração
de PTH no sangue periférico com freqüência excede a do hiperparatireoidismo
primário.
Diagnóstico – O soro deve ser analisado para cálcio, fósforo e fosfatase alcalina.
Determinações múltiplas são mais confiáveis, devido à grande variação existente,
dependendo do estágio da doença e dos mecanismos compensatórios do organis-
mo. O cálcio sangüíneo normalmente está em níveis normais mais baixos, devido
à mobilização das reservas do esqueleto. A concentração de fósforo sangüíneo é
aumentada devido a progressivas disfunções tubular e glomerular, com perda das
células-alvo que interfere na resposta na concentração de fosfato na urina, pelo
aumento de PTH. O fósforo é retido e a concentração sangüínea continua a elevar-
se a despeito do hiperparatireoidismo secundário.
A atividade de fosfatase alcalina pode estar elevada em animais com doenças
ósseas evidentes. Aproximadamente 10% dos cães com insuficiência renal crônica
têm elevação moderada de cálcio sérico (≥12mg/dL).
Tratamento – O tratamento é em geral dirigido para a redução da carga
excretória e provisão de substâncias (tais como sódio [como cloreto ou bicarbonato]
e água) que o rim deficiente é incapaz de conservar. Uma prescrição dietética com
cálcio suplementar (gliconato ou lactato) e vitamina D pode diminuir a gravidade do
hiperparatireoidismo e das lesões ósseas que o acompanham. Pequenas doses
(0,003µg/kg de peso corporal/dia) de 1,25-diidroxicolecalciferol parecem reduzir o
grau de hiperparatireoidismo.
Distrofias Associadas ao Cálcio, Fósforo e Vitamina D 585

HIPOPARATIREOIDISMO
É um distúrbio metabólico em que quantidades subnormais de PTH (hormônio da
paratireóide) são secretadas ou no qual o hormônio secretado é incapaz de interagir
normalmente com as células-alvo. Tem sido reconhecido primariamente em cães,
em particular em raças pequenas, tais como schnauzers miniatura, mas outras
raças podem ser afetadas.
Etiologia e patogenia – Uma variedade de mecanismos patogênicos pode
resultar em secreção inadequada de PTH. A glândula paratireóide pode ser lesada
ou inadvertidamente removida durante cirurgia de tireóide. Após a lesão à glândula
paratireóide ou ao seu suprimento vascular, há freqüentemente regeneração
adequada do parênquima funcional e subseqüente desaparecimento dos sinais
clínicos.
O hipoparatireoidismo idiopático em cães adultos geralmente é o resultado de
uma paratireoidite linfocítica difusa, que provoca extensa degeneração das células
principais e substituição por tecido conjuntivo fibroso. Outras causas possíveis de
hipoparatireoidismo incluem destruição da paratireóide por uma neoplasia primária
ou metastática, na área cervical anterior, e a atrofia da paratireóide associada a uma
hipercalcemia duradoura. A presença de numerosas partículas de vírus da cinomose
nas células principais da glândula paratireóide pode contribuir para o baixo nível de
cálcio sangüíneo em certos cães com esta doença. A agenesia da paratireóide é
uma causa rara de hipoparatireoidismo congênito em cãezinhos. Certos casos de
hipoparatireoidismo idiopático com as paratireóides histologicamente normais em
animais (incluindo o homem) podem ser decorrentes da ausência de enzimas
específicas nas células principais, que convertem a molécula de pró-PTH em PTH
biologicamente ativo, secretado pela glândula. Outros casos podem se desenvolver
por meio de um mecanismo imunomediado, já que a destruição similar de parênqui-
ma secretório e a infiltração linfocítica foram produzidas experimentalmente em
cães, por injeções repetidas de emulsões de tecidos paratireóideos.
Pseudo-hipoparatireoidismo é uma variante que ocorre em homens, mas é
incerta a sua ocorrência em outros animais. As células-alvo no rim e ossos são
incapazes de responder a quantidades normais ou elevadas de PTH e uma grave
hipocalcemia desenvolve-se, mesmo que as glândulas paratireóides estejam
hiperplásicas.
Achados clínicos e lesões – Os distúrbios funcionais e as manifestações
clínicas do hipoparatireoidismo, primariamente, são o resultado do aumento da
excitabilidade neuromuscular e tetania. A reabsorção óssea é diminuída por causa
da ausência de PTH e da diminuição progressiva dos níveis de cálcio sangüíneo (4
a 6mg/dL). Os cães afetados ficam inquietos, nervosos e atáxicos, com enfraque-
cimento e tremores intermitentes de grupos individuais de músculos que progridem
para tetania generalizada e ataques convulsivos. Os níveis sangüíneos de fósforo
estão substancialmente elevados, devido ao aumento da reabsorção tubulorrenal.
Nos estágios iniciais da paratireoidite linfocítica imunomediada em cães, há
infiltração da glândula com linfócitos e plasmócitos, e hiperplasia nodular regenera-
tiva das células principais restantes. Mais tarde, a glândula paratireóide é substi-
tuída por linfócitos, fibroblastos e capilares com células principais viáveis apenas
ocasionalmente.
Diagnóstico – É baseado nos sinais clínicos de elevação da excitabilidade
neuromuscular, hipocalcemia grave e quase sempre hiperfosfatemia num animal
não parturiente, e na resposta à terapia. Alguns dos sinais (por exemplo, tetania) e
dados laboratoriais (por exemplo, hipocalcemia) são similares àqueles da tetania
puerperal (ver pág. 551). Entretanto, a tetania puerperal usualmente é acompanha-
da por hipofosfatemia e por uma concentração de glicose em níveis abaixo do
normal ou na faixa normal – baixa como resultado da intensa atividade muscular
associada à tetania.
Distrofias Associadas ao Cálcio, Fósforo e Vitamina D 586

Tratamento – A tetania neuromuscular deve ser bloqueada pelo retorno do


nível de cálcio sangüíneo para próximo do normal através da administração EV
de soluções orgânicas de cálcio. A manutenção prolongada do nível sangüíneo de
cálcio, na ausência da secreção normal de PTH, deve ser fornecida por dietas ricas
em cálcio e pobres em fósforo, que são ainda suplementadas com cálcio (gliconato
ou lactato) e vitamina D3.
Grandes doses de vitamina D3 (≥ 25.000 a 50.000u/dia, dependendo do tamanho
do cão) podem ser requeridas inicialmente para elevar os níveis sangüíneos de
cálcio em pacientes com hipoparatireoidismo, desde que a falta de PTH diminua a
taxa de formação do metabólito biologicamente ativo de vitamina D nos rins. Para
prevenir o desenvolvimento de hipercalcemia e extensa mineralização de tecidos
moles, a dosagem de vitamina D deve ser cuidadosamente ajustada pela determi-
nação freqüente dos níveis séricos de cálcio. Após ajustar a dose de vitamina D, um
intervalo de 4 a 5 dias deve preceder a próxima determinação de cálcio sangüíneo.
Uma vez que o cálcio sangüíneo tenha retornado aos níveis normais, doses
substancialmente mais baixas de vitamina D são indicadas para a manutenção
prolongada. Em alguns cães, somente o cálcio da suplementação dietética é
necessário para a estabilização prolongada de cálcio sangüíneo.

RAQUITISMO
É uma doença de animais em crescimento, caracterizada pela interferência na
mineralização, com conseqüente reabsorção normal da cartilagem dos discos de
crescimento e interferência na mineralização da matriz óssea. São afetados de forma
mais severa os discos de crescimento dos ossos, que crescem mais rapidamente.
Etiologia – A ingestão ou absorção deficiente, ou ambas, de vitamina D ou
fósforo, ou de ambos, são as causas mais freqüentes. Em animais mantidos dentro
de casa, a deficiência de vitamina D é um fator importante; animais de pastoreio são
mais suscetíveis à deficiência de fósforo. O metabolismo anormal da vitamina D (que
ocorre, por exemplo, na uremia ou deficiências bioquímicas hereditárias) deve ser
considerado em animais raquíticos com dietas aparentemente normais e dietas de
composição imprópria. A falha na absorção de vitamina D pode ser causada por
esteatorréia. A vitamina D endogênica é produzida na epiderme pela ação da luz
ultravioleta sobre um precursor. A vitamina D exógena é absorvida da dieta ou por
uma injeção local.
Achados clínicos e diagnóstico – Em casos graves, há claudicação associada
ao alargamento das extremidades dos ossos de crescimento rápido, e deformidades
nos ossos longos de sustentação. A claudicação e o aumento de volume das
articulações são decorrentes, na maioria dos casos, da poliartrite crônica e, em cães
jovens de grande porte, da osteodistrofia hipertrófica. A radiografia dos ossos
raquíticos apresenta discos de crescimento largos e desmineralização óssea. A
desmineralização no hiperparatireoidismo nutricional é acompanhada pelo cresci-
mento normal dos discos.
O alargamento dos discos de crescimento, devido à falha na reabsorção carti-
laginosa, não é patognomônico do raquitismo. Ele ocorre em certas condrodispla-
sias hereditárias e qualquer fator que interfira na vascularização metafisária
normal ou na invasão sinusoidal da cartilagem, ou em ambos os casos pode causar o
alargamento dos discos. Este ponto deve ser considerado quando as radiografias de
uma única articulação são interpretadas. No animal raquítico, o cálcio sangüíneo
multiplicado pelo fósforo sangüíneo (em mg/dL) é geralmente < 30. Esta é uma
técnica auxiliar de diagnóstico se o soro for coletado antes da terapia ou correção
dietética. A confirmação do diagnóstico em casos brandos requer o exame histoló-
gico dos discos de crescimento ativos. Já que o animal raquítico pode ser hipocalcêmi-
co, as mudanças histológicas do hiperparatireoidismo podem estar presentes.
Distrofias Associadas ao Cálcio, Fósforo e Vitamina D 587

Tratamento – É imperativo um diagnóstico preciso, já que a vitamina D sem


cálcio exacerba aquelas condições associadas ao hiperparatireoidismo nutricional.
O raquitismo, causado por deficiências simples de vitamina D ou fósforo, deve ser
tratado de acordo com o padrão de recomendações nutricionais após considera-
ções detalhadas e, se possível, análise da dieta existente. Deficiências secundárias
requerem correções da causa de base.

CALCINOSE ENZOÓTICA
(Enteque seco, Enteque ossificante, Espichamento, Espichação, Doença de
perda de Manchester, Doença de Naalehu, “Weidektankheit”)
É uma doença complexa de ruminantes e cavalos, causada por envenenamento
com plantas tóxicas ou desequilíbrio mineral e caracterizada pela extensa calcifi-
cação dos tecidos moles. A prevalência da doença em bovinos varia largamente, de
10% a índices tão elevados quanto 50% em áreas da Argentina, Brasil, Papua-Nova
Guiné, Jamaica, Havaí e Baviera. Ela é considerada a causa de até 60% da
mortalidade e atinge 17% dos ovinos do sul do Brasil e Mattewara (Índia), respecti-
vamente. A incidência em qualquer outra parte (Austrália, Israel, África do Sul e sul
dos EUA) é menos documentada e em muitas áreas é rara ou inexistente.
Etiologia e patogenia – As causas conhecidas caem em 2 categorias: envene-
namento por plantas e desequilíbrios minerais no solo. A primeira é provavelmente
a mais importante. Cestrum diurnum (jasmim selvagem, jasmim “day-blooming”, rei-
do-dia), Trisetum flavescens (golden oats or yellow oat grass), Nierembergia
veitehii, Solanum esuriale, S. torvum e S. malacoxylon (glaucophyllum) contêm 1α,
25-diidroxicolecalciferol (calcitriol) glicosídio ou uma substância que mimetiza sua
ação calcinogênica. Recentes estudos revelaram que a S. malacoxylon tem o
sistema enzimático necessário para a síntese de calcitriol da vitamina D3. Não
existem evidências concretas incriminando outras plantas.
O desequilíbrio de minerais em certos solos da Índia, Havaí, Áustria e, possivel-
mente, em qualquer outra parte é considerado o principal fator etiológico; o
desequilíbrio dietético mineral pode contribuir para a calcificação, associada,
sobretudo, a plantas tóxicas. Excesso de cálcio ou fósforo, deficiência absoluta ou
condicionada de magnésio e deficiência do potássio e nitrogênio têm sido incrimi-
nados ou suspeitados.
A osteodistrofia em touros, após a ingestão excessiva e prolongada de cálcio, é
condição similar à anterior. A calcificação do sistema cardiovascular, associada ao
envelhecimento e a doenças caquéticas como a tuberculose, não possui esta
semelhança. A vitamina D3 em excesso e a ingestão normal ou excessiva de cálcio
induzem à calcificação aórtica e à aterosclerose em ruminantes.
Normalmente, a conversão de 25-hidroxicolecalciferol (calcifediol) para calcitriol
no rim é controlada por um mecanismo de “feedback”. O fator semelhante ao
calcitriol nas folhas das plantas desvia este “feedback” e mais cálcio do que pode ser
fisiologicamente acumulado é absorvido. Hipercalcemia promove a produção de
calcitonina, calcinose e osteoporose.
Alterações no cálcio, fósforo e magnésio plasmáticos são diferentes em diferen-
tes espécies. Cavalos desenvolvem hiperfosfatemia; o cálcio plasmático mantém-
se normal, mas sobe com doses excessivas de calcitriol. Freqüentemente, tanto o
cálcio sérico como o fósforo inorgânico estão elevados em bovinos. A hipomagne-
semia também pode estar presente.
Achados clínicos – A doença é progressiva e crônica estendendo-se por
semanas ou meses. Os primeiros sinais são um andar rígido e doloroso, mais
pronunciado quando o animal movimenta-se após repouso prolongado. Os mem-
bros dianteiros são os mais afetados e alguns animais até mesmo andam ou pastam
Distrofias Associadas ao Cálcio, Fósforo e Vitamina D 588

sobre seus joelhos. Quando de pé, os membros dianteiros curvam-se para frente,
já que a articulação não pode estender-se completamente. O animal desloca o peso
para a parte dianteira dos cascos ou alternadamente para cada membro
dianteiro, o que diminui o estresse sobre o carpo, que está espessada e dolorida.
As articulações distais tornam-se anormalmente retas. Quando os animais afetados
são forçados a andar, sua marcha é desajeitada, rígida e lenta, os passos são curtos
e, após uma pequena distância, a respiração torna-se superficial e diafragmática. As
narinas ficam dilatadas e a cabeça e o pescoço ficam distendidos. Vários graus de
murmúrio cardíaco são detectáveis, geralmente, como uma segunda bulha desdo-
brada ou indefinida; estes são exagerados após o exercício. O ritmo do pulso é
aumentado após um exercício corriqueiro. O pulso jugular é proeminente em alguns
casos.
Com o progresso da doença, o animal perde peso e torna-se fraco e apático. O
pelame torna-se eriçado, opaco e desbotado, particularmente em bovinos. Há perda
de musculatura, proeminência do esqueleto, abdome dobrado, cifose e base da
cauda em relevo. A função ovariana está deteriorada. O apetite usualmente não é
atingido, mas, algumas vezes, torna-se depravado. A calcificação dos vasos é
palpável ao exame retal.
A osteodistrofia é observada na calcinose decorrente da intoxicação por Trisetum
flavescens e Cestrum diurnum em bovinos bávaros e eqüinos da Flórida, respecti-
vamente. Cavalos gravemente afetados param com os membros anteriores um
tanto abduzidos e luxados caudalmente nas articulações da escápula. Os tendões
flexores, particularmente os ligamentos suspensores, estão doloridos. As articula-
ções do boleto estão hiperestendidas em graus variáveis.
Lesões – Ocorrem degeneração e calcificação dos tecidos moles, com emacia-
ção e quantidades variáveis, mas excessivas, de fluido nas cavidades torácica e
abdominal e no saco pericárdico. O sistema cardiovascular é o primeiro a ser
envolvido, seguido pelos pulmões, rins e tendões. O coração e a aorta apresentam
efeitos mais marcantes. O coração esquerdo é mais afetado que o direito. Em casos
extremos, os focos de calcificação são vistos nas válvulas e na corda tendínea.
Placas brancas elevadas, de tamanho e forma irregulares, são vistas na superfície
luminal; em casos avançados, isto ocorre ao longo do comprimento da aorta e de
seus ramos principais. Depósitos minerais ocorrem na pleura; na superfície e na
borda dos lobos pulmonares diafragmáticos e apicais, na artéria e pelve renais e nos
ligamentos e tendões, particularmente os dos membros anteriores. Ocorrem
engrossamento capsular e erosão irregular da superfície articular da cartilagem e
articulações, especialmente dos joelhos e jarrete.
As evidências histológicas básicas são necrose e calcificação do tecido conjun-
tivo, seguidas pela proliferação celular na área afetada.
Diagnóstico – É geralmente baseado no histórico, sinais e lesões, mas pode ser
difícil em estágios precoces. O raio-X e a eletrocardiografia podem ajudar no
diagnóstico.
Controle – A remoção do(s) fator(es) causal(is) é essencial, mas quando a
doença está associada ao conteúdo mineral do solo, o controle pode ser difícil.
Mudanças de pastagem, forragem e ambiente podem trazer a melhora clínica e
ainda diminuir o depósito mineral dos tecidos moles. Experimentalmente, a adminis-
tração oral diária de 15g de hidróxido de alumínio previne o desenvolvimento de
calcinose em ovinos que consumiram Trisetum flavescens.
Claudicação, Princípios Gerais 589

OSTEOPATIA HIPERTRÓFICA
(Doença de Marie)

É uma condição em que alterações ósseas dos membros estão associadas a


lesões intratorácicas. Ocorre em associação a tuberculose, broncopneumonia e
abscessos pulmonares. Mais comumente é associada a neoplasias pulmonares
primárias ou metastáticas. Tem ocorrido juntamente com processos granuloma-
tosos da cavidade torácica. A doença é mais comum em cães, mas tem sido relatada
em eqüinos, bovinos, ovinos e outros animais.
A causa é desconhecida. Há um rápido aumento inicial no fluxo sangüíneo
periférico para a porção baixa dos membros, provavelmente devido a um estímulo
vagal. Esse é seguido pela proliferação de tecido conjuntivo na região falângea das
patas, que progride em direção proximal. A próxima alteração é uma proliferação
óssea envolvendo as falanges e os ossos longos.
Achados clínicos – Os cães usualmente são afetados em fase tardia de vida
enquanto outras espécies podem ser afetadas em qualquer idade. Os animais
afetados normalmente apresentam-se com a história de engrossamento progressi-
vo das patas no decorrer de poucos meses, que, em geral, causa claudicação.
Algumas vezes há história de tosse crônica com alguma dispnéia, especialmente
após o exercício suave. O apetite e a função intestinal normalmente estão normais.
Em casos avançados, pode ocorrer uma andadura rígida ou ainda a impossibilidade
em ficar de pé. A movimentação ou a palpação dos ossos afetados causam dor e
os membros engrossados são quentes.
Lesões – Os ossos longos dos membros são envolvidos com maior freqüência.
Os ossos afetados estão parcial ou completamente cobertos com depósitos ósseos
neoformados irregulares e desiguais sobre o córtex. As superfícies articulares não
são envolvidas, mas pode haver um aumento de volume dos tecidos moles
adjacentes às articulações e um engrossamento das cápsulas articulares.
Diagnóstico – É baseado no exame físico e sinais radiográficos característicos.
A radiografia revela extensa proliferação de osso neoformado, quase sempre
bilateral, ao longo do comprimento dos ossos longos e falanges. Esta distribuição
bilateral da neoformação óssea, juntamente com a ausência de erosão cortical,
ajuda a distinguir a condição de uma neoplasia óssea. A radiografia do tórax
freqüentemente revela uma neoplasia primária ou metastática nos pulmões.
Tratamento – Não há tratamento específico para a condição, embora o trata-
mento da lesão intratorácica, por cirurgia ou quimioterapia, possa levar a uma
regressão temporária das alterações ósseas. A neurectomia vagal tem sido relatada
também como terapia valiosa.

CLAUDICAÇÃO, PRINCÍPIOS GERAIS


Caracteriza-se por um desvio da postura ou marcha normal, resultante de algum
distúrbio estrutural ou funcional de um ou mais membros ou do tronco. Na maioria
dos casos, a claudicação é acompanhada por dor, que ocasionalmente pode estar
ausente, produzindo um tipo mecânico de claudicação. A claudicação não é doença,
mas uma indicação de dor, enfraquecimento, deformidade ou outros impedimentos
no sistema musculoesquelético. Ver também o índice da seção SISTEMA MUSCULOES-
QUELÉTICO, páginas 555 a 559, para os seguintes tópicos: A VALIAÇÃO DA M ARCHA,
página 691 e D OENÇAS DA COLUNA E MEDULA ESPINHAIS , página 705.
Claudicação, Princípios Gerais 590

A claudicação pode ser ainda classificada em distúrbios na sustentação de peso


(pata de sustentação) e não sustentação do peso (pata de impulso). Uma claudica-
ção de sustentação é vista quando o cavalo reduz a extensão e duração da
sustentação do corpo pela tomada de um passo encurtado e a elevação do corpo
durante a fase de suporte da movimentação; ela ocorre com lesões no casco, ossos,
tendões, ligamentos e nervos motores. Uma claudicação do tipo pata de impulso é
vista durante a fase de impulso do ciclo do passo, quando o membro é conduzido
para a frente. Pode ocorrer uma claudicação mista de suporte e impulso. Além disso,
freqüentemente uma lesão em um membro ela pode ser causa das lesões ou
claudicações secundárias em outras áreas no mesmo membro ou em qualquer dos
outros 3 membros, devido ao esforço para proteger a lesão original. A laminite
biomecânica no casco oposto é uma complicação comum de problemas ortopédicos
graves em cavalos. Cavalos de corrida desenvolvem lesões secundárias ou ainda
tendinite e/ou desmite suspensora nos membros dianteiros, seguida de claudi-
cação dos membros posteriores e vice-versa. Esta situação é denominada claudi-
cação complementar.

Etiologia e fatores predisponentes


As causas da claudicação podem ser classificadas como: 1. predisposição,
envolvendo imaturidade ou condição precária, má conformação, doença sistêmica,
ferração imprópria e carência de atenção com os cascos, ou nos cavalos, mau
calçamento; ou 2. excitação devida a trauma direto ou indireto, incoordenação de
ação muscular, como pode ocorrer em animais exaustos e infecções bacterianas,
especialmente dos cascos, bainhas tendíneas e articulações.
Termos como claudicação de paleta, de anca e de jarrete são freqüentemente
usados para descrever as chamadas claudicações regionais. Deve-se notar,
entretanto, que estes termos não indicam especialmente a estrutura envolvida.
Claudicação de paleta, por exemplo, não indica se a lesão causal está na articulação
escapuloumeral, no tendão de origem do bíceps, na bolsa bicipital ou em qualquer
dos músculos daquela região. “A claudicação de paleta” pode ser secundária a
distúrbios nos cascos. Um exame do cavalo em movimento não denota a região
precisa envolvida, embora possa dar uma indicação e pista do local aproximado do
problema.
Nos grandes animais, exceto nas raças padrão de cavalos, a maioria das
claudicações afeta os membros dianteiros, normalmente do carpo para baixo. A
idade do cavalo é freqüentemente um fator predisponente. A intensidade das
competições de corrida em cavalos greyhounds jovens e imaturos (isto é, 2 anos de
idade) significa uma alta incidência de dores de canela, fraturas por estresse, talho
no osso metacárpico do cavalo e lesões do tendão. O tipo de superfície sobre a qual
o animal trabalha pode ser importante para agravar alguma anormalidade de
conformação. Treinamento fatigante ou impróprio é outro importante fator predispo-
nente à claudicação, particularmente em relação a lesões ao tendão e aos ligamen-
tos. Nos pequenos animais, o trauma é provavelmente o principal fator causador de
claudicação, embora conformação, crescimento, ambiente e mesmo neoplasia
também devam ser considerados. Nos animais de fazenda, a nutrição e o ambiente
(isto é, clima, instalações, tamanho do rebanho, higiene) são igualmente importantes.
A raça pode ser um fator predisponente significativo, por exemplo, osteocondrose do
cotovelo em rottweilers, laminite em pôneis e paresia espástica em bezerros frísios.

Diagnóstico
O diagnóstico da claudicação requer uma investigação cuidadosa e sistemática
para se definir precisamente a localização e a causa do problema. A claudicação pode
ser evidente durante o repouso, durante a progressão ou através de exame manual
Claudicação, Princípios Gerais 591

que incluem movimento passivo (isto é, testes com pinças de casco ou martelo em
eqüinos). Há vários meios auxiliares sofisticados para o diagnóstico, mas não há
substituto para a perspicácia clínica, experiência, palpação e um bom conhecimento
prático de anatomia. Mesmo com tudo isto, claudicações obscuras (por exemplo,
lesões musculoligamentosas e problemas relacionados ao dorso) poderão desafiar
um diagnóstico definitivo.
Queixa inicial e histórico – Um histórico completo e objetivo devem ser obtido
antes de se iniciar o exame físico. O tipo e a idade do animal e a quantidade de
exercício que ele vem efetuando fornecem pistas diagnósticas importantes. Por
exemplo, puros-sangues jovens alimentados com ração rica em grãos são propen-
sos a uma miopatia de esforço ou rabdomiólise de baixo grau (paralisia). Cavalos
de salto idosos são mais predispostos a doença do navicular e exostoses
interfalângeas. A laminite é muito comum em pôneis obesos que pastejam sobre
forragens tenras. Nos bovinos, uma dieta rica está ligada não apenas à alta
produção, mas também a laminite e outros problemas digitais. Historicamente, a
maioria dos casos de claudicação nos membros dianteiros envolve o casco,
enquanto o jarrete é a região freqüentemente afetada dos membros posteriores,
mas, em vista da predominância atual de cavalos leves, a maioria dos casos de
claudicações anteriores surge do boleto para baixo. Entretanto, nos puros-sangues
de corrida e raças padrão em treinamento, o carpo é freqüentemente envolvido.
Doenças ortopédicas do desenvolvimento, tais como osteocondrite dissecante,
podem ser generalizadas, afetando qualquer articulação ou osso do corpo; elas são
comuns tanto em animais de companhia como em animais de fazenda.
Perguntas a respeito do início e duração da claudicação, da existência de uma
causa incitante (por exemplo, perfuração do casco, coice ou queda), de quando o
animal foi ferrado pela última vez (por exemplo, perfuração por um cravo), se algum
tratamento prévio foi efetuado e que efeito ele pode ter tido, podem ser úteis na
definição do problema particular da claudicação em questão. O tipo de repouso (isto é,
cocheiras ou pasto) assim como qualquer alteração na claudicação quando o animal
é exercitado (isto é, ao se aquecer a claudicação desaparece) devem ser determi-
nados. Nos eqüinos, os tropeços podem ser uma característica de uma claudica-
ção específica (por exemplo, doença do navicular) ou causados por um problema
neurológico.
Exame em repouso – O exame físico deve sempre se iniciar com uma
inspeção visual do cavalo. Defeitos de conformação (por exemplo, joelhos de
bezerro, jarretes de foice) devem ser observados e registrados como possíveis
predisposições. As falhas na conformação devem ser consideradas, mas com
muito aumento de volume crônico (por exemplo, sobreossos), elas podem não ser
associadas com a causa primária da claudicação. Similarmente, ferimentos antigos,
cicatrizes ou aumento de volume podem ou não ser relevantes. O comportamento
geral pode indicar se o animal sente alguma dor (por exemplo, transpiração,
escavação do solo, apoio de uma das patas em pinça ou proteção de um dos
membros). A posição anormal pode sugerir um problema particular (por exemplo,
a postura típica de laminite, luxação da patela ou paralisia do radial). Mobilidade
ou posição anormais de parte de um membro pode indicar um tendão rompido
ou um osso fraturado. A adução ou abdução de um membro pode também ser
notada em claudicações da anca ou da soldra respectivamente.
Exame ao exercício – Após uma inspeção visual do animal em repouso, ele deve
ser observado em movimento. A maioria das claudicações é mais evidente durante
um trote lento sobre piso duro e plano. O animal deve ser trotado em linha reta, indo
e vindo em direção ao clínico. É importante que o redeador mantenha o cavalo com
a rédea frouxa para não restringir os movimentos da cabeça. Inicialmente, o
examinador deve olhar as orelhas e a anca, pela ordem, para detectar um balançar
da cabeça ou elevação da anca. Atenção também deve ser dirigida para o eixo do
Claudicação, Princípios Gerais 592

corpo, a fim de determinar se este eixo está na mesma linha e direção do movimento.
Subseqüentemente, deve-se verificar se as patas são levadas em linha reta ou se
são aduzidas, abduzidas ou movidas de forma semicircular, enquanto se movimen-
tam. Finalmente, a ação também deve ser observada pelo lado, para identificar
variações no comprimento do passo e restrição na flexão articular.
Claudicação do membro dianteiro – A cabeça é elevada quando o membro
manco apóia-se no solo e a baixa quando este está suspenso. Em eqüinos, som
produzido por cada casco, quando bate no solo, também pode dar uma
indicação quanto ao membro claudicante. Se há claudicação bilateral de igual
gravidade, um balançar da cabeça pode não ser aparente, mas a ação de frente
será afetada com uma redução no comprimento do passo. Se, entretanto, a
claudicação for de gravidade desigual, um balançar da cabeça estará presente
como na claudicação unilateral. Em tais casos, o membro menos afetado é
possivelmente mal observado. Além disso, se o membro com claudicação
evidente for submetido ao bloqueio anestésico para desensibilizar a área
dolorida, a aparente cura daquele membro e o movimento persistente da cabeça
indicarão que o outro membro também claudicará.
Claudicação do membro traseiro – Em geral, a garupa do lado afetado fica
elevada quando o membro manco está em sustentação. O grau de elevação da
garupa varia conforme a fonte e gravidade da claudicação. Quando ambos os
membros posteriores estão claudicantes, há enrijecimento e restrição da marcha,
como acontece nos problemas de dorso. Quando a pata afetada for claramente
identificada, devem-se avaliar os seguintes pontos: grau de flexão das articulações,
comprimento do passo, presença de adução ou abdução do membro, colocação do
casco e apoio do pé e altura a que os jarretes são elevados.
O cavalo deve, então, ser virado num círculo apertado em ambas as direções.
Dificuldade em se virar sobre uma pata claudicante ou dolorida pode, freqüentemen-
te, demonstrar enrijecimento tanto no pescoço, quanto no dorso ou quartos
traseiros. Fazendo-se o animal dar alguns passos para trás podem-se também
realçar alguns tipos de claudicação (por exemplo, danos vertebrais e harpejamento).
Em eqüinos, claudicações suaves (por exemplo, esparavão) freqüentemente
podem ser demonstradas pelo troteamento do animal num círculo de cerca de 4 a 5m
com uma rédea longa. Nestas circunstâncias, a claudicação é agravada quando o
membro afetado está do lado de dentro do círculo. O efeito que a flexão forçada ou,
em alguns casos, a extensão tem sobre o grau de claudicação (por exemplo, teste do
esparavão)deve ser sistematicamente avaliado, tentando-se manter as articulações
individuais ou regiões dos membros dobradas ao máximo, por , 60s e, então, forçar
o animal a trotar para a avaliação da claudicação. Os testes de flexão são particular-
mente favoráveis em cavalos com claudicação leve. É importante comparar o efeito
sobre o membro oposto de todos os testes de flexão.
Se o grau ou local da claudicação ainda não estiver claro, o animal deve ser
puxado, montado ou dirigido (atrelado) por , 20min. O peso adicional do cavaleiro,
algumas vezes, acentua a claudicação. Alguns casos ainda devem ser examinados
correndo ou no ritmo máximo, para serem diagnosticados efetivamente. Após este
tipo de exercício, o cavalo deve descansar por , 30min e ser reexaminado.
O exame físico do membro claudicante deve ser iniciado pela pata, e anormali-
dades do casco (por exemplo, anéis de laminite, fissuras, talões contraídos) e o
estado das ferraduras notados. O calor detectado no casco ou faixa coronária pode
ser avaliado por comparação com o membro oposto. Todas as estruturas identificá-
veis devem ser gentil, mas meticulosamente, palpadas, tanto com a pata apoiada
sobre o solo como elevada. A ferradura deve ser removida e o casco totalmente
limpo e inspecionado quanto a fissuras, desgaste irregular ou secreções. Freqüen-
temente é necessário aparar o casco para auxiliar o exame. O casco pode ter a
Claudicação, Princípios Gerais 593

sensibilidade testada inicialmente pela percussão da parede e sola usando-se um


martelo leve e, posteriormente, pela compressão, usando-se a pinça de casco.
Deve ser feita a palpação sistemática de todos os pontos de referência
anatômicos, da quartela à escápula. Isto precisa ser feito com a pata sustentando
o peso, embora os tendões flexores e o ligamento suspensor devam ser palpados
individualmente com os membros semiflexionados. Qualquer elevação da
temperatura, dor, distensão articular ou outros sinais suspeitos num membro,
devem ser notados e comparados com o membro oposto. O alcance da flexão e a
extensão da articulação da quartela, boleto, carpo, codilho e paleta devem ser
examinados e anotada qualquer restrição ou dor implícita.
Os mesmos princípios de exame devem ser efetuados nos membros posteriores,
com particular atenção para o jarrete quanto a sinais palpáveis de distensão da
articulação tibiotársica ou esparavão. Em grandes animais, caso haja suspeita de
uma condição na porção superior dos membros traseiros ou baixo dorso, deve-se
empreender um exame retal.
Um exame detalhado do dorso é melhor efetuado com o cavalo preso a um
tronco. A linha mediodorsal do lombo é examinada para ver se ela está reta e não
apresenta curvaturas sugestivas de espasmo muscular unilateral (isto é, escoliose
espástica). O exame para qualquer assimetria da pelve ou perda muscular sobre os
quartos deve ser executado, particularmente se o histórico sugerir danos sacroilíacos.
É difícil palpar mais do que as pontas do processo espinhoso dorsal, embora, em
muitos cavalos normais, seja possível identificar os espaços intra-espinhosos. Deve
ser possível detectar espasmo dos músculos longos dorsais ou qualquer protrusão
dos ápices dos processos espinhosos dorsais. Cavalos com a pele fina ou hipersen-
sível podem reagir quando a linha mediodorsal é palpada profundamente, mas, a
menos que haja uma resposta realmente dramática (por exemplo, coices, empina-
das e grunhidos), isto não deve ser levado em consideração. A palpação dos
processos espinhosos sacrais (S2 - 5) deve ser efetuada, particularmente em cavalos
usados para corridas de trote, já que a dor pode ser detectada sobre a inserção
tendínea do músculo longo dorsal nos processos S2 e S3.
Pelo pinçamento alternado da linha média das regiões torácica caudal e sacral,
é possível fazer o animal fletir (isto é, ventroflexão ou arco) e estender (isto é,
dorsoflexão ou depressão) sua espinha respectivamente. A relutância em efetuar
esta manobra sugere alguma dor de base decorrente de lesão a tecido mole ou
óssea da espinha toracolombar. O desconforto significante, produzido por este
teste, é geralmente acompanhado pelo espasmo dos músculos longos dorsais. A
sensibilidade da pele sobre o dorso e lombo não é um teste confiável, porque ela é
muito variável entre indivíduos. Entretanto, o golpe firme dos músculos longos
dorsais com uma caneta para produzir contração muscular e flexão lateral da coluna
toracolombar é uma técnica útil. Normalmente, não deve haver nenhum ressenti-
mento marcante para este teste, a menos que haja alguma dor muscular envolvida.
Se algum problema ósseo ou muscular crônico estiver presente no meio do dorso,
então será freqüentemente visível uma relutância ou dificuldade na flexão lateral em
uma ou ambas as direções.
Métodos auxiliares de diagnóstico – Um conhecimento total da anatomia e
fisiologia musculoesqueléticas é essencial para o diagnóstico de claudicação, mas
freqüentemente é insuficiente por si só. Técnicas adicionais podem ser requeridas;
algumas requerem equipamento caro e pessoal experiente e são viáveis somente
em clínicas grandes ou institucionais.
Anestesia local – Bloqueios nervosos seletivos e anestesia intra-articular são
de assistência primária na confirmação do local ou região que causa a claudi-
cação em grandes animais. Experiência e um conhecimento preciso de anatomia
topográfica é essencial, e a desinfecção cirúrgica rigorosa do local deve ser
executada. O procedimento deve ser efetuado de maneira sistemática, inician-
Claudicação, Princípios Gerais 594

do-se com os nervos digitais palmares, para dessensibilizar a porção caudal


do pé e da sola e, então, gradativamente trabalhando-se na direção proximal do
membro.
Radiologia – Em pequenos animais, a radiografia é geralmente realizada após
um exame clínico cuidadoso. Nos eqüinos, assim que o local da claudicação tenha
sido confirmado pela anestesia local, deve-se fazer uma radiografia da região. Para
se obter uma avaliação acurada deve-se proceder a observações repetidas. A
extensão de qualquer alteração presente pode ajudar muito no prognóstico (ver
também, pág. 1156).
Ultra-sonografia – Este meio de formação de imagem é bem difundido pelo
acesso aos tecidos moles e pela complementação da radiografia. A interpretação
correta requer um conhecimento completo de anatomia e experiência. Este
método tornou-se particularmente valioso em cavalos para diagnóstico e prognóstico
de tendinites (tendões arqueados) e desmites (estiramento do ligamento suspensor)
(ver também pág. 1160).
Cintigrafia óssea – A técnica de cintilografia óssea é um meio para detectar a
renovação óssea e a formação de novo osso que envolve a administração EV de
material radioativo. Áreas de elevada radioatividade indicam desenvolvimento
ósseo, dano ósseo ativo ou cura de fratura. A técnica tem grande potencial como
diagnóstico de claudicações obscuras, e na monitorização do progresso da
claudicação.
Artroscopia – A endoscopia das articulações viabiliza a avaliação precisa da
membrana sinovial, cartilagem articular, ligamentos intra-articulares e meniscos.
Ela se tornou uma ferramenta valiosa para o diagnóstico e tratamento de condições
ortopédicas em eqüinos. Esta técnica vem sendo cada vez mais utilizada em
pequenos animais.
Análise do líquido sinovial – A coleta e análise da sinóvia para citologia em
relação a viscosidade, proteínas, ácido hialurônico, produtos de degradação carti-
laginosa e certas enzimas podem prover informações úteis sobre efusão articular,
sinovite e artrite séptica. É a maneira mais confiável de se distinguir processos
traumáticos e/ou sépticos em uma articulação.
Patologia clínica – Medição de enzimas derivadas da musculatura (CPK
[também chamada de creatina cinase], desidrogenase láctica e AST [SGOT]) pode
auxiliar o diagnóstico de claudicação ou de outros problemas musculoesqueléticos
causados por doença muscular ou trauma.
Faradismo – Corrente farádica, oscilando ritmicamente para induzir contrações
de grupos musculares específicos, tem sido usada no diagnóstico e tratamento de
danos musculares. Entretanto, o valor do método parece variar diretamente com a
habilidade do operador.
Eletromiografia (EMG) – Esta técnica facilita bastante a investigação dos
nervos periféricos, suas inserções nos músculos e dos músculos propriamente
ditos. São introduzidos eletrodos em agulha na musculatura, que são utilizados para
localizar uma lesão ou auxiliar na identificação de uma doença muscular primária.
Alterações no eletromiógrafo são provocadas por denervação ou miopatias. Através
da estimulação nervosa, podem ser avaliados a gravidade e o prognóstico de uma
neuropatia.
Biópsia de músculo – Nos eqüinos, as amostras de biópsia muscular podem ser
coletadas por uma técnica simples percutânea. O exame histológico está sendo
utilizado para diagnóstico, assim como para a avaliação do estado físico e potencial
de desempenho. São utilizadas técnicas histoquímicas especiais para determinar o
tipo das fibras assim como a concentração de glicogênio e de várias enzimas, que
são alteradas pelo treinamento e exercício.
Termografia – Esta é a formação de imagem gráfica das variações de temperatu-
ra da pele. O valor da técnica está na detecção precoce de alterações patológicas,
Claudicação em Bovinos 595

freqüentemente antes de os sinais clínicos tornarem-se aparentes. O termograma de


ambos os membros deve ser obtido para comparação.
Análise da andadura – A cinematografia de alta velocidade pode ser usada
para registrar e estudar os movimentos de cavalos em diferentes velocidades e andadu-
ras (cinesiologia). O advento da análise computadorizada dos filmes agora permite
uma avaliação muito mais completa e rápida do andar e do desempenho. Técnicas
associadas para analisar o andar incluem: 1. eletrogoniometria, que fornece o
registro contínuo do movimento da articulação para determinar o padrão de movi-
mento articular, velocidade angular, amplitude de movimento e aceleração, além do
suporte do impulso e o tempo do passo total; e 2. dinamografia, que envolve o uso
de placas de força para medir diretamente a força locomotiva exercida pela pata
sobre o piso ou sobre ferraduras especiais. A esteira rolante de alta velocidade está
aumentando a aplicação clínica da tecnologia de análise do andar, podendo se tornar
um método padronizado de análise e diagnóstico de anormalidades da andadura
e claudicações em cavalos de corrida e animais de esporte de todos os tipos.

CLAUDICAÇÃO EM BOVINOS
A claudicação é uma causa significante de redução do desempenho em bovinos
de corte e leiteiro. A redução é apresentada como diminuição da eficácia alimentar
e da ingestão de alimentos, perda de peso corporal, diminuição leiteira, redução da
atividade sexual, fertilidade e, em alguns casos, longevidade.
Recentes progressos na criação, alimentação e manejo têm contribuído para um
aumento da incidência de claudicação. A seleção baseada em características
conformacionais pode ser contraprodutiva para a eficiência funcional. Destacam-se
entre estas características a ausência de angulação nos membros; os tendões,
ligamentos e músculos auxiliem na absorção de traumas e estresses nos membros.
Acredita-se que a alimentação com alto teor de energia e deficiente em fibras de
boa qualidade causa a formação de um extrato córneo mais mole que o normal nos
cascos, que se erodem, desintegram e são mais facilmente traumatizados que aos
cascos normais. Crescimento rápido em animais < 18 meses de idade, exercício
inadequado e estresse psicossomático podem exacerbar os fatores predisponentes
de claudicação. Certos tipos de piso, ardósia ou concreto, e o desenho dos bretes
e currais podem contribuir para estresses de manejo. A aparação regular dos cascos
e o pedilúvio são aspectos positivos do manejo. As claudicações dos bovinos devem
ser estudadas através de uma perspectiva epidemiológica; um histórico completo do
rebanho deve ser considerado.
Como a maioria das doenças, o tratamento bem-sucedido, a prevenção e o
controle dependem de um diagnóstico preciso. A observação à distância com o
animal parado e movimentando-se revela informações importantes. Postura e andar
anormais não devem ser confundidos com defeitos conformacionais. O clínico deve
estar familiarizado com as mudanças físicas adquiridas no sistema musculoes-
quelético, por exemplo, inchaços dos membros, reações inflamatórias em torno da
região digital e distorções ou defeitos dos cascos. A palpação e auscultação de uma
articulação podem ser úteis. A palpação retal é apropriada se há suspeita de
anormalidade pélvica (ver também DOENÇAS DA C OLUNA E M EDULA E SPINHAIS,
pág. 705).
Visto que , 90% das lesões que causam claudicações estão localizadas nas
patas, deve ser dada especial atenção a esta área mesmo que a causa pareça se
Claudicação em Bovinos 596

localizar em outro lugar no membro. O espaço interdigital, a coroa do casco e a sola


devem ser examinados em qualquer caso. Cada ponto descolorido ou quebrado na
sola e parede deve ser intensamente investigado. Isto é facilitado com o uso de uma
mesa de contenção, mas os cascos podem ser examinados com uma contenção
apropriada para bovinos em pé. O cloridrato de xilazina é muito usado para sedar
animais que são controlados com dificuldade, embora ele não seja oficialmente
aprovado para o uso em bovinos. Radiografias, artrocenteses e bloqueios nervosos
regionais podem ser necessários para confirmar um diagnóstico. (Ver também no
índice da seção [SISTEMA MUSCULOESQUELÉTICO], págs. 460 a 465 os tópicos relacio-
nados, por exemplo, M IOPATIAS; ARTRITES E PROBLEMAS C ORRELATOS, G R AN; ANOMA-
LIAS CONGÊNITAS; e RUPTURA DO T ENDÃO DE AQÜILES).
A claudicação pode ser secundária ou acompanhar numerosas doenças, como
a diarréia viral bovina; febre aftosa; mastite; avitaminoses A, E ou D; cetoses;
deficiências de cálcio, fósforo ou cobre; fotossensibilização; intoxicação por festucas,
flúor, ou ergot; estomatite micótica; febre catarral maligna; e linfocitoma. Após o
tratamento bem-sucedido da doença primária, o animal se recupera (ver também
VACA CAÍDA, pág. 669).

PARALISIA DO PARTO
(“Paralisia do obturador”)
A paresia ou paralisia dos músculos adutor e caudal da coxa, nos membros
posteriores, é provocada por danos intrapélvicos primários sobre o ramo ventral do
nervo espinhal L6, o principal contribuidor dos nervos ciáticos e obturador. Pode
também ocorrer o dano direto do nervo obturador. Estas lesões são freqüentemente
associadas à distocia.
Os sinais são paralisia, paresia ou ataxia dos membros posteriores (um ou
ambos). A condição é mais comum na vaca, mas outras espécies também podem
ser afetadas. A lesão do nervo ocorre quando o feto insinua-se no canal pélvico por
um período extenso ou quando um feto grande é forçado através deste canal. Há
quase sempre algum grau de paresia dos membros posteriores, ataxia ou paralisia
nas vacas quanto o bezerro fica preso ao canal pélvico por >1h; o nível de gravidade
varia, desde pequena dificuldade em levantar-se, durante alguns dias, até a
paralisia permanente.
A paresia ou paralisia dos músculos dos membros posteriores resulta em ataxia
ou incapacidade em se manter em pé. A flexão do boleto pode ser notada junto à
ataxia. O animal pode deitar-se sobre o esterno com os membros posteriores em
abdução exagerada ou colocados paralelos ao corpo. Geralmente, após alguns
dias, a vaca é capaz de “engatinhar” e, depois, de levantar-se e andar com passos
curtos e irregulares, mas caindo freqüentemente com as articulações dos boletos
flexionadas e os membros abduzidos. Os animais paralisados têm vivacidade e
estão alertas, ao contrário dos animais com outras doenças pós-parto, tais como
febre do leite, mastite aguda ou metrite. A condição deve ser diferenciada de
fraturas, trauma muscular, tumores e abscessos que envolvam os nervos
pélvicos e a medula espinhal posterior. Os animais paralisados podem desenvolver
dentro de 6h miopatias isquêmicas por compressão, comuns nas “vacas caídas”,
sobre os músculos da coxa. O perigo de miopatia isquêmica pode ser reduzido
virando-se a vaca de um lado para o outro a cada 2h e utilizando-se uma cama
macia.
A história e os sinais permitem o diagnóstico na maior parte dos casos. Se a vaca
não estiver alerta o bastante, a cuidadosa administração de gliconato de cálcio pode
descartar a febre do leite (ver pág. 544). Ver também VACA CAÍDA, página 669, para
outras possibilidades de diagnóstico e tratamento.
Claudicação em Bovinos 597

A paralisia do parto pode ser prevenida pelo uso precoce de cesariana ou


fetotomia, antes da passagem demorada ou brutal do feto através do canal pélvico.

DERMATITE VEGETATIVA INTERDIGITAL


(Hiperplasia interdigital)
É um crescimento de tecido interdigital que ocorre tanto em bovinos de corte
quanto em bovinos leiteiros, mas com incidência mais elevada entre os primeiros.
A predisposição hereditária e o superajustamento das unhas parecem ser as causas
básicas. Ocorre um estiramento do ligamento distal interfalângeo (cruzado) com
formação de exostose na superfície axial da falange intermediária.
A condição inicia-se com um extravasamento ventral da gordura interdigital,
seguido pelo engrossamento da pele. À medida que a massa se projeta para baixo,
é comprimida entre as unhas e irritada pelo contato com o solo e objetos estranhos.
Esta irritação contínua estimula um aumento de volume ainda maior, e o andar do
animal torna-se extremamente doloroso com o aumento de tamanho da massa.
Eventualmente, ele pode tomar um quarto do tamanho de uma unha. Normalmente,
≥ 2 patas são afetadas.
Geralmente, a massa de tecido conjuntivo que se projeta para baixo, entre as
unhas, não é difícil de diagnosticar, mas deve ser diferenciada de um ferimento
primário infectado e da dermatite verrucosa (ver adiante).
A excisão cirúrgica associada à imobilização dos dígitos é um tratamento
geralmente bem-sucedido. A criocirurgia também tem sido eficaz.

ARTROPATIA DEGENERATIVA
(Doença articular degenerativa, Osteoartrite)
É uma condição não específica que afeta sobretudo as articulações coxofemoral
e femorotibial. É caracterizada por degeneração da cartilagem articular e eburnação
do osso subcondral, efusão articular, fibrose com calcificação da cápsula articular
e osteófitos.
É provável que várias causas e fatores predisponentes influenciem o desen-
volvimento, idade do início e gravidade da condição. Há uma disposição
hereditária para artropatia degenerativa. Certas conformações, por exemplo,
jarrete reto em touros de corte, são incriminadas. A instabilidade articular após
traumas é uma causa comum. Os fatores nutricionais envolvidos em alguns
casos são as rações ricas em fósforo e pobres em cálcio, as quais, provavel-
mente, influenciam na resistência do osso subcondral. Deficiência de cobre ou
intoxicação por fluoreto também pode atuar por caminhos similares. A tração
forçada no parto de um bezerro que se apresenta de garupa pode comprometer
o suprimento sangüíneo para a articulação coxofemoral, podendo resultar em
artrite. O papel da infecção é obscuro. A artrite infecciosa em bezerros, usual-
mente produz mudanças graves no jarrete, mas a artropatia degenerativa
raramente envolve essa articulação.
Touros alimentados com uma dieta rica em grãos podem se tornar mancos tão
precocemente como em 6 a 12 meses, mas a maioria dos casos é constatada
inicialmente entre 1 e 2 anos. A claudicação é de instalação gradual e usualmente
afeta as articulações coxofemorais de ambos os lados. O envolvimento da soldra é
raro. Os sinais progridem concomitantemente com a degeneração da cartilagem e
desenvolvimento de osteófitos. A claudicação que chega à incapacitação, com
crepitação da articulação degenerada, pode se desenvolver em poucos meses;
entretanto, a correlação entre alterações patológicas e sinais clínicos é pobre. As
alterações iniciais ocorrem no acetábulo e sobre a superfície dorsomedial da cabeça
do fêmur.
Claudicação em Bovinos 598

Em vacas, a soldra é afetada com maior freqüência e o côndilo medial do fêmur


apresenta mudanças bem mais cedo. O aparecimento dos sinais é mais tardio do
que em touros, normalmente ocorrendo em adultos. Já que a artropatia degenerativa
pode ser resultado de algum dos vários fatores iniciantes, um diagnóstico específico
pode ser difícil de se estabelecer. A avaliação radiográfica, citológica e microbioló-
gica do líquido sinovial pode ser de grande ajuda. A avaliação artroscópica das
superfícies articulares e ligamentos também pode ser útil para se alcançar um
diagnóstico definitivo e um prognóstico.
A maioria dos animais apresenta alterações irreversíveis nas articulações
quando se estabelece o diagnóstico. O tratamento paliativo em reprodutores
valiosos deve ser assegurado com o conhecimento de que a condição ou fatores
predisponentes podem ser hereditários. A dieta deve ser cuidadosamente inspe-
cionada, analisada e, se necessário, corrigida. Isto é especialmente importante em
animais de crescimento rápido nos quais o exercício adequado é indicado e o
excesso de peso deve ser evitado.

DERMATITE VERRUCOSA
(Verrucosa granulosa)
É uma lesão proliferativa que envolve a pele anterior e posterior do espaço
interdigital, quase sempre na pata traseira. Em geral, só um animal é afetado,
mas, em raras ocasiões, ela pode tornar-se um problema de rebanho, normalmente
se o lote é maltratado. Numerosas bactérias têm sido isoladas das lesões; quando
elas se tornam um problema de rebanho, um vírus pode ser considerado o agente
causal.
Inicialmente, há uma irritação crônica da pele, devido às condições precárias do
lote, seguida pela proliferação das células epidérmicas e subposição de tecido
conjuntivo fibroso. As lesões histológicas incluem dermatite, hiperceratose e
papilomas. Uma massa com aspecto de couve-flor surge e, eventualmente, pode
invadir o espaço interdigital. A massa, gradativamente, aumenta de tamanho e
torna-se enrugada na superfície, com projeções digitiformes ou ciliares. Lesões
similares podem também aparecer abaixo dos dígitos acessórios. A claudicação é
somente leve até após vários meses, quando a lesão torna-se maior e desgastada.
A localização e a superfície rugosa e com aspecto ciliar ajudam a diferenciar esta
condição da dermatite vegetativa interdigital (ver anteriormente).
A remoção cirúrgica e a cauterização do tecido subjacente com tricloreto de
antimônio ou sulfato de cobre são o tratamento preferencial. A criocirurgia da lesão
também é efetiva. Quando muitos animais são afetados em um rebanho, o uso de
uma vacina comercial ou autógena pode ser indicado.

LUXAÇÕES
Luxação coxofemoral e lesões da soldra são freqüentemente resultado de
manutenção de vacas em estro com o rebanho, sobre uma superfície escorregadia.
Os touros que servem vacas neste ambiente e vacas que montam outras vacas
podem causar danos nestas articulações. A correção de uma luxação proximal da
articulação coxofemoral é possível, desde que a cabeça do fêmur e a borda do
acetábulo não tenham sido fraturadas. A correção de lesões da soldra tem
encontrado sucesso limitado em vacas e touros.
A luxação do boleto ocorre freqüentemente em bovinos jovens que tentam cruzar
o “mata-burro” (grelha de metal que é colocada sobre um fosso e que substitui a
porteira). O uso de um tranqüilizante ou anestesia leve, facilita a recolocação das
estruturas deslocadas. A imobilização com fibra de vidro acolchoada, posta no local
por 3 semanas, normalmente promove uma recuperação satisfatória.
Claudicação em Bovinos 599

A luxação traumática da articulação tibiotársica pode ocorrer e traz um bom


prognóstico se não houver nenhuma fratura ou prolapso dos pequenos ossos
társicos. A anestesia geral é necessária para promover relaxamento muscular
suficiente para permitir a redução manual (ver também LUXAÇÃO P ATELAR, pág. 675).

ERGOTISMO
É uma doença de bovinos e outros animais de produção resultante da ingestão
contínua de esclerócitos do fungo parasita Claviceps purpurea. A claudicação é o
primeiro sintoma (ver também pág. 2040).

CLAUDICAÇÃO POR I NGESTÃO DE FESTUCA


(Pé de festuca)
É uma gangrena seca das extremidades, causada pelo consumo da festuca
crescida tóxica, Festuca arundinacea (ver também INTOXICAÇÃO POR FESTUCA, pág.
2044). Trabalhos confiáveis sobre a claudicação por festuca têm chegado de
muitos estados dos EUA, bem como da Nova Zelândia, Austrália e Itália.
Os primeiros sinais desenvolvem-se em bovinos que tenham pastado por 10 a
14 dias em pastos de festuca crescida. Há aumento da temperatura, edema, dor
acentuada e claudicação de uma ou mais patas. Normalmente um membro posterior
é afetado primeiro. Com a ingestão continuada de festuca, surge uma linha divisória
em algum ponto, normalmente entre o jarrete e as unhas. A gangrena seca afeta a
porção distal que, eventualmente, pode desprender-se. Cogita-se que a baixa
temperatura ambiente contribua para a severidade das lesões. Os animais afetados
geralmente apresentam febre, procuram a sombra quando está calor e ficam com
as patas na água, se possível. Na necropsia, há poucas lesões além daquelas
associadas ao edema ou à gangrena seca, apesar de já ter sido relatada a necrose
da gordura abdominal.
Claudicação, condição precária, gangrena seca das extremidades distais das
orelhas, cauda e patas e um histórico de pastejo sobre festuca crescida, levam ao
diagnóstico.
Não há tratamento satisfatório, mas a suplementação da forragem por grãos é
favorável. Deve ser evitada a aplicação de fertilizantes ricos em nitrogênio para
estabilizar a implantação da festuca. O fornecimento de outros alimentos pode
resultar na recuperação se as lesões não tiverem progredido para a gangrena seca
e os animais forem mantidos aquecidos. O risco da claudicação por festuca é
reduzido pela manutenção de leguminosas em consorciamento com a gramínea, já
que a festuca alta, não é consumida em larga escala quando outras forragens são
fornecidas. Sementes livres de endófitos devem ser utilizadas, quando se estabe-
lecer uma nova pastagem. Variedades de festuca crescida com reduzida infestação
de fungos endofíticos têm sido desenvolvidas.

PENETRAÇÃO DA SOLA POR CORPOS ESTRANHOS


Esta é a lesão mais comum do casco de bovinos e ocorre quando um objeto
pontiagudo, tal como um cravo, arame ou vidro penetra a sola. A claudicação ocorre
imediatamente se o corpo estranho permanece no local e continua a pressionar as
terminações nervosas do cório do casco. Se ocorrer uma infecção do cório antes de
o corpo estranho ser deslocado, forma-se um abscesso no ponto de penetração. Se
o abscesso estiver localizado na região anterior da sola, o início da claudicação será
rápido e a dor será intensa. Se a infecção for na parte posterior da sola, o início será
mais demorado e menos intenso. Pode ocorrer a drenagem natural do pus pela coroa
do casco.
Claudicação em Bovinos 600

O abscesso pode ser detectado exercendo-se pressão na sola com a pinça de


casco. Na maioria das vezes, a sola precisa ser aparada para revelar o corpo
estranho ou o caminho para o abscesso. Com tratamento, o corpo estranho deve ser
removido e o trato explorado para determinar sua extensão. A exploração deve
continuar até que seja estabelecida drenagem adequada, mas a destruição de
tecido saudável deve ser mínima. O ferimento deve ser limpo e realizado curativo
com antibiótico, preferivelmente em forma de pó. O dígito afetado pode ser envolvido
por uma pequena sacola plástica, mantida no local e protegida por uma forte
bandagem adesiva. Se a abertura da sola estiver localizada até 2cm de distância da
parede abaxial, uma parte da parede poderá ser removida para permitir drenagem
lateral; isto cria uma superfície autodrenante. A administração parenteral de
penicilina é apropriada por 2 a 3 dias, na dose de 22.000u/kg de peso corporal.

FRATURAS
Apesar de as fraturas ósseas ocorrerem em bovinos de todas as idades, elas são
mais comuns em animais < 1 ano de idade. Os procedimentos apropriados podem
ser economicamente justificados nesta faixa etária, desde que não existam articu-
lações envolvidas. As técnicas de fixação externa e/ou a tala de Thomas podem ser
utilizadas com sucesso. Em casos selecionados, a transfixação percutânea ou
fixação interna podem ser tentadas.
As fraturas dos ossos longos principais dos bovinos adultos normalmente não
são tratadas. As fraturas das tuberosidades coxais podem ocorrer quando o gado
é tocado rapidamente por passagens estreitas. Nesses casos, espículas ósseas
podem perfurar a pele ou podem ocorrer distorções feias do flanco. As fraturas das
falanges proximal e intermediária podem ser consideradas para tratamento em
bovinos adultos jovens e mansos.
A fratura da falange distal é relativamente comum em bovinos adultos. O início
da claudicação é rápido e a dor geralmente é intensa. Se o dígito medial for
envolvido, o animal pode buscar alívio da dor cruzando suas patas. A recuperação
natural é prolongada e, devido ao fato de a maioria destas fraturas ocorrer na
articulação interfalângea distal, pode se iniciar uma artrite debilitante no local da
fratura. Se esta lesão for tratada, o dígito saudável deve ser elevado por um bloco
de madeira e o dígito afetado, preso em flexão de encontro ao bloco utilizando-se
adesivo de metil metacrilato.
O risco de fraturas é minimizado se as causas mais comuns forem evitadas.
Superfícies escorregadias são perigosas, especialmente para animais no cio. As
passagens estreitas não devem ser utilizadas por vários animais ao mesmo tempo.

QUEIMADURAS PELO FRIO


(Hipotermia)
Estes são os riscos de um bezerro que tenha nascido num ambiente onde o fator
de resfriamento atinja valores < –18°C. Um bezerro fraco, nascido de uma vaca
exausta após longo trabalho de parto, num ambiente frio e com vento (por exemplo,
temperatura de –7°C e vento de 50km/h, fazendo um fator de resfriamento de –
29°C) pode sofrer queimaduras pelo frio nos pés e em outras extremidades.
Após alguns dias, o bezerro pode tornar-se relutante em seguir sua mãe e em
manter-se em pé, mas seu apetite é normal. A inspeção de um bezerro
gravemente afetado pode revelar crostas no focinho, as pontas das orelhas e a
extremidade de cauda desvitalizadas associadas às patas traseiras frias. As
patas traseiras são geralmente afetadas por serem colocadas longe do corpo
quando o bezerro se deita, enquanto as dianteiras são colocadas sob o corpo
e protegidas do frio pelo calor deste. Após vários dias ou semanas, os tecidos
Claudicação em Bovinos 601

desvitalizados, incluindo os cascos, começam a soltar-se e o animal recusa-se


a ficar em pé (ver também pág. 759).
O maior problema do diagnóstico é diferenciar a queimadura pelo frio da
intoxicação pela festuca (ver pág. 2044). A idade do animal e a verificação da
temperatura e da curva de resfriamento do dia do seu nascimento podem auxiliar no
diagnóstico da queimadura pelo frio. Uma vez que os sinais se tornam aparentes,
não há tratamento.

FISSURAS DA PAREDE DO CASCO


Fissuras verticais e horizontais (fraturas, quebras) da parede do casco ocorrem
com freqüência elevada. Há quase sempre alguma predisposição, ainda que nem
sempre identificável, de enfraquecimento da parede do casco, tal como uma
conformação defeituosa, talvez devida a uma alimentação imperfeita; a única
exceção é uma laceração causada por um objeto cortante. Quando uma fissura está
localizada em uma unha, deve-se examinar a unha correspondente do membro
oposto.

Fissuras verticais
(Fissura ungular longitudinal, Fendas na parede do casco)
Estas fissuras ocorrem na superfície dorsal e dorsoabaxial da parede do casco.
O ressecamento do casco que precede o aparecimento deste problema é causado
por perda de água pelo tecido córneo do casco, que ocorre na ausência do perioplo.
O perioplo é o extrato externo a prova d’água do casco, que diminui com a idade e
é perdido por abrasão mecânica em solos arenosos. Alguns acreditam que a
nutrição inadequada (deficiência de zinco) está implicada na etiologia.
Podem ocorrer grandes fissuras em todos os 8 dígitos sem nenhum sintoma de
claudicação. Fissuras muito pequenas que envolvem apenas a faixa coronária
podem ser um problema muito maior. O tecido córneo da faixa coronária é mole e
flexível. Conforme o animal se move, as pressões criadas podem abrir a fissura o
suficiente para permitir que a infecção atinja as estruturas subjacentes. A seqüela
mais grave é uma infecção na articulação interfalângea distal. Como uma pequena
fissura pode ser facilmente camuflada, especialmente por barro, a palpação da faixa
coronária deve ser um procedimento de rotina.
As fissuras grandes raramente requerem atenção, mas o cuidado cosmético
ocasional é necessário. Nestes casos, o tecido córneo quebrado deve ser removido
e a fissura preenchida com metil metacrilato. Os grampos também são úteis. A
extremidade proximal da fissura pode ser fechada com um ferro quente. A perda de
água do extrato córneo do casco pode ser diminuída aplicando-se uma camada
espessa de óleo ou verniz na parede do casco.
Em uma pequena fissura séptica na faixa coronária, uma pequena porção do
tecido córneo sobre o abscesso deve ser removida e um pó antibiótico aplicado
sobre o ferimento subjacente. Um pequeno curativo de gaze deve ser colocado
sobre a ferida, preso firmemente por uma bandagem adesiva de 2,5cm em torno
da faixa coronária.

Fissuras horizontais
(Fissura ungular horizontal)
Estas fissuras ocorrem primariamente em gado leiteiro adulto após um episódio
de laminite. A continuidade da parede do casco é perdida num plano paralelo à
coroa do casco. Em geral, todas as 8 unhas são atingidas. A condição
freqüentemente ocorre após uma grave doença sistêmica que é acompanhada por
Claudicação em Bovinos 602

uma elevação marcante na temperatura corporal. Distúrbios nutricionais e


metabólicos também podem ser causas básicas. Durante a doença ativa, um casco
de baixa qualidade desenvolve-se na banda coronária.
Inicialmente, pode haver alguma inflamação na banda coronária e uma discreta
claudicação ou rigidez. A despeito de uma recuperação aparente, uma depressão
envolvendo a parede do casco exceto na região do talão, logo torna-se evidente.
Após alguns meses a , 1 ano, quando a área sulcada cresceu diversos centímetros
em direção à sola, o casco distal à ranhura separa-se devido ao peso sustentado e
à força de alavanca sobre a pinça. A porção separada apresenta-se como um dedal
colocado no casco e o movimento desta porção causa o desenvolvimento de uma
fissura horizontal e a penetração do tecido sensitivo subjacente. Os sinais são
patognomônicos.
O tratamento consiste na remoção, da maior parte possível, da porção distal do
casco, sem a penetração no tecido sensível. Após várias semanas ou meses, o
casco novo deverá estender-se e ocorrerá a recuperação.

LAMINITE
(Aguamento, Pododermatite asséptica difusa [PAD])
Muitas lesões dos cascos estão associadas à laminite, que compromete a
qualidade do extrato córneo do casco e o deixa suscetível a danos e erosão. A forma
crônica da laminite é chamada de casco achinelado. A causa principal da laminite
é a ingestão massiva de alimento rico em energia (aguda) ou ingestão continuada
de altos níveis de carboidratos (subaguda ou subclínica) (ver também SOBRECARGA
DE GRÃOS, pág. 210).
As vacas leiteiras geralmente mostram os primeiros sintomas de laminite subclí-
nica imediatamente após o parto. A deterioração da qualidade do casco predispõe
a lesões tais como doença da linha branca, úlceras de sola e erosões nos talões. A
sola também se desgasta mais rapidamente, o que a torna mais suscetível a traumas.
Garrotes em engorda podem também ser afetados por laminite aguda ou
subclínica. Esta última é de pouca importância econômica.
Touros de corte em teste de engorda e novilhas leiteiras de reposição são
altamente suscetíveis à laminite subclínica. Este problema não é clinicamente
evidente de imediato, porém causa alterações patológicas nos cascos que são
altamente contraprodutivas. Considera-se que o problema seja resultante de
acidose láctica, que faz com que as endotoxinas vasoativas sejam liberadas por
microrganismos Gram-negativos. As alterações patológicas na microcirculação do
cório causam danos irreversíveis. Estão sendo investigadas etiologias alternativas,
por exemplo, o papel do fator de crescimento epidérmico. Está claro que a laminite
subclínica tem uma etiologia mais complexa do que se acreditava originalmente. Os
estresses de manejo, assim como o exercício limitado, foram implicados.
Na laminite aguda, geralmente há um histórico de ingestão exagerada de grãos.
Os animais relutam em se mover e apresentam diarréia. A postura pode ser
característica, com todos os 4 membros sob o corpo, ou com os anteriores e
posteriores estendidos para a frente. O animal pode tentar andar sobre os joelhos.
O cruzar das patas ou pisar em linha são indicativos de que apenas as unhas mediais
estão afetadas. Na laminite crônica, os cascos são longos e virados para cima nas
pinças; há presença de sulcos profundos. Na laminite subaguda não há alterações
do andar ou postura. O extrato córneo do casco é mole, manchado de sangüe, e
possui uma aparência amarelo-fosca. A alta incidência de claudicação no meio da
lactação e a presença de lesões na linha branca e úlceras de sola confirmam o
diagnóstico no rebanho.
Para o tratamento dos casos agudos, ver SOBRECARGA DE G RÃOS, página 210. A
aparação do casco longo dos casos crônicos é, na melhor das hipóteses, paliativa
Claudicação em Bovinos 603

(ver APARAÇÃO DOS C ASCOS, pág. 1346). A laminite subclínica é extremamente


comum em rebanhos leiteiros de alta produção. Estes casos exigem investigações
especiais que visam à identificação da importância relativa dos fatores epidemioló-
gicos envolvidos.
Acredita-se que o casco em saca-rolhas e os cascos achinelados são 2
deformidades hereditárias. A resolução destas deformidades não é possível.

PARALISIA DO NERVO PERONEAL


Esta condição, em geral, surge logo após o parto, embora possa não estar
relacionada a ele, nem restrita a vacas adultas. A causa é um trauma ou compressão
sobre o nervo peroneal. Lesões causadas por parto, abscessos, tumores e
exostoses vertebrais têm sido consideradas causas.
Esta condição é marcada pela flexão do boleto e articulações da quartela e pode
afetar um ou ambos os membros posteriores. A flexão pode ser tão grave que o
animal passa a se apoiar sobre a superfície dorsal destas articulações. Após vários
dias, podem surgir erosões na superfície dorsal da articulação, resultando em artrite
supurativa. Uma claudicação com os boletos e quartelas flexionados usualmente é
evidência suficiente para que se faça este diagnóstico.
Um leve molde de gesso para manter as articulações do boleto e da quartela
estendidas é uma medida efetiva na maioria dos casos, particularmente se a causa
for uma lesão durante o parto. A tensão para manter estas articulações em extensão
pode ser aplicada pelo ancoramento das pinças, por uma correia de tecido ou couro,
que são colocadas ao redor do membro, próximo ao jarrete.

PODODERMATITES
Podridão dos cascos
(Pododermatite infecciosa, Necrobacilose interdigital)
Apresenta-se como maior causa de claudicações em bovinos de corte e leite de
toda as idades.
Etiologia – A Fusobacterium necrophorum tem sido considerada a bactéria
responsável por esta doença, embora seja difícil produzir evidências conclusivas.
Mais recentemente a Bacteroides nodosus e a B. melaninogenicus também foram
incriminadas. A doença ocorre durante o ano todo, mas tende a ser mais prevalente
durante as estações úmidas. Entretanto, ela tem sido observada durante o tempo
seco, quando o terreno está firme e o bovino entra em contato com áreas lamacentas
ou quando é forçado a atravessar terreno arado recentemente. Provavelmente, o
terreno duro e seco predispõe o tecido interdigital e os talões a ferimentos. Desde
que ocorra uma solução de continuidade na pele, os microrganismos infectam
prontamente a ferida. Uma ou mais patas podem ser afetadas num determinado
instante.
Achados clínicos e diagnóstico – Edema e eritema simétricos da região
interdigital, sem evidência de corpos estranhos, indicam esta condição. A claudi-
cação é severa, a temperatura do corpo é elevada e a lactação pode cessar.
Eventualmente, ocorre necrose e surgem fissuras longitudinais, revelando uma
descarga purulenta, de odor pútrido e uma massa central de tecido necrótico.
Quando a massa central de tecido necrótico é removida ou desprende-se, a cura,
normalmente, progride com rapidez. Em alguns casos, a infecção invade estruturas
profundas e desenvolve-se uma artrite supurativa.
Tratamento – O tratamento sistêmico ou local com antibióticos e sulfonamidas
parece encurtar o curso da doença. Outros procedimentos que podem acelerar a
recuperação são limpeza dos cascos, aplicação de curativos protetores, amarração
das unhas unidas e remoção da massa necrótica interdigital. Para o tratamento e
Claudicação em Bovinos 604

prevenção, tem sido recomendada a metionina de zinco. A incidência de podridão


diminui se os animais forem passados por um pedilúvio de formalina ou sulfato de
cobre (a 3 e 5% respectivamente). Também pode ser feito o polvilhamento dos
cascos com uma mistura de sulfato de cobre e cal 2 vezes por dia. Tem sido benéfico
o uso de iodetos orais e compostos de zinco como preventivo em alguns casos.
A artrite ou tenossinovite supurativa é uma seqüela ocasional da podridão dos
cascos. A remoção cirúrgica de uma unha afetada provoca alívio rápido, mas > 80%
dos bovinos que tiveram um dígito removido são sacrificados em até 1 ano. A
drenagem cirúrgica e artrodese da articulação interfalângea distal é compensadora
em reprodutores valiosos, se os métodos conservativos não forem bem-sucedidos.

Podridão crônica dos cascos


(Pododermatite necrótica crônica, Dermatite interdigital)
Este problema é mais comum em condições pouco higiênicas, sendo causado
pela Bacteroides nodosus. Inicia-se como uma dermatite interdigital úmida. As
secreções saem pelas comissuras dorsais da fenda interdigital, onde secam e
formam uma crosta. Neste ponto a claudicação não está presente; não há inchaço
digital, mas o animal balança de um lado para o outro. Até 60% do rebanho pode
estar afetado. Em poucos casos, a infecção progride causando erosão dos talões.
Inicialmente observada como uma úlcera entre os bulbos dos talões, o problema
pode progredir até que todo o bulbo seja perdido. Neste estágio o animal claudica,
podendo resultar complicações.
Passar o rebanho por um pedilúvio com solução de formalina (3%) diariamente
por 1 semana reduz a incidência. A melhoria na higiene é extremamente importante.
O problema geralmente resolve-se espontaneamente, quando os animais são
soltos no pasto. Os casos individuais que progredirem para o estágio de claudicação
aparente devem ser isolados em cama limpa e a região afetada tratada topicamente
com uma mistura de 50% de sulfato de cobre anidro e sulfametazina.

Ulceração da sola
(Pododermatite circunscrita)
A úlcera da sola, uma das causas mais comuns de claudicação no gado, é
causada por pressão mecânica no centro da sola, na junção da sola com o talão.
Neste ponto, o processo proximal da falange distal está próximo da face interna da
sola. Portanto, qualquer processo que permita à sola curvar-se sob pressão leva a
uma necrose de pressão nesta área. Quando danificado, o cório pára de produzir
tecido córneo, ocorrendo a formação de tecido de granulação; o desgaste excessivo
da sola e/ou a laminite subclínica diminuem a resistência da sola. A aparação dos
cascos que remova muita parede abaxial leva à transferência do apoio do peso da
parede para o centro da sola. Se os talões estiverem completamente erodidos, o
apoio do peso é transferido para a frente, podendo resultar em úlcera. Um acúmulo
excessivo de tecido córneo no centro da sola, ou permitir que o animal ande em
superfície pedregosa, leva a traumas na área.
A ulceração é observada na união dos terços médio e posterior da sola,,1,25cm
da borda axial. A maioria das lesões é encontrada nas unhas laterais dos membros
posteriores, e a lesão tende a ser bilateral. O animal freqüentemente fica com as
patas afetadas estendidas para trás. As unhas mediais dos anteriores são algumas
vezes afetadas. Em alguns casos, a úlcera pode não ser encontrada até que a sola
que a recobre seja retirada. A lesão de granulação típica tem normalmente 1,25cm
de diâmetro.
A aparação corretiva do casco é um primeiro passo apropriado; o tecido
degenerado deve ser cuidadosamente removido a partir da circunferência da lesão,
Claudicação em Bovinos 605

sem destruir nenhuma sola normal. Um bloco de madeira ou bota de borracha deve
ser colocado no dígito sadio. O tecido de granulação não precisa ser removido nem
é necessária a colocação de curativo; uma faixa é contra-indicada.

RUPTURA DO MÚSCULO GASTROCNÊMIO


A ruptura deste músculo é relativamente rara, mas ocorre com freqüência
suficiente para ser significativa. Está provavelmente associada à hipocalcemia
e deficiência de fósforo e vitamina D. O decúbito prolongado, que resulta em
miosite e o ato de debater-se para se levantar ocasionalmente levam à ruptura
de um ou ambos os músculos gastrocnêmios. Por vezes, casos de ruptura do
gastrocnêmio têm sido associados com pielonefrite que, presumivelmente, leva
a uma miosite, enfraquecendo o músculo o bastante para permitir a ruptura.
Injeções de medicamentos irritantes no músculo gastrocnêmio podem causar
necrose e ruptura.
O animal é incapaz de estender o jarrete, mantendo-o em flexão. Quando
completamente rompido, o animal, de pé, descansa o jarrete e a porção distal do
membro sobre o solo, o que é diagnóstico, embora a ruptura do tendão de Aquiles
(ver pág. 676) possa produzir postura idêntica.
O sucesso do tratamento é extremamente improvável em animais adultos e
pesados. Uma bandagem de gesso ou uma tala que mantenha o jarrete em
extensão, o suprimento adequado de vitaminas e minerais e o acompanhamento
apropriado podem levar ao sucesso, mas é necessário um longo período de
recuperação.

PARESIA ESPÁSTICA
(“Elso heel”)
Esta condição espástica hereditária é vista em muitas raças, mas parece ser
mais comum nas raças holandesa e angus. Ela surge primeiro em uma ou ambas
as patas traseiras num período entre 3 meses e 2 anos. Eventualmente, ambos os
membros traseiros podem tornar-se afetados, mesmo que, inicialmente, apenas um
apresente sinais. A causa não é conhecida. Evidências recentes demonstram que
a doença não é transmitida como uma característica recessiva simples. O líquido
cerebroespinhal contém uma quantidade reduzida de fósforo, cálcio e ácido
homovanílico, o mais importante metabólito da dopamina neurotransmissora. AST
(SGOT) é baixa e a fosfatase alcalina é elevada.
É caracterizada pelo esticamento dos músculos gastrocnêmio e flexor superfi-
cial. As articulações do jarrete e da soldra são mantidas em extensão completa e o
calcâneo é puxado em aposição à porção distal da tíbia. Esta relação anatômica
resulta em um membro excessivamente reto distalmente e em um jarrete pequeno
e de aparência fraca. Tremulações musculares são evidentes no membro afetado
quando o animal é forçado a se mover. O membro afetado parece ser mais curto e
não pode tocar o solo, mas balança como um pêndulo quando o animal anda ou
corre. São freqüentemente notados o dorso arqueado e a base da cauda elevada.
O diagnóstico diferencial se faz pela idade em que surgem os primeiros sinais, pelo
envolvimento unilateral do início das manifestações e pelo deslocamento dorsal da
tuberosidade calcânea, identificando patologias como síndrome espástica, gonite,
luxação dorsal da patela e paralisia posterior progressiva.
Relaxantes musculares podem oferecer alívio temporário. A tenotomia do tendão
do músculo gastrocnêmio e a tenotomia parcial ou completa do tendão flexor
superficial, 8 a 12cm dorsalmente à tuberosidade calcânea, têm tido bons resultados
em alguns casos. A neurectomia tibial produz melhores resultados, mas não há
Claudicação em Bovinos 606

justificativas reais para o tratamento de alguns animais de reprodução, já que esta


condição é aparentemente hereditária. O tratamento de animais não reprodutores
pode ser justificado por razões humanitárias, embora os animais estejam liquidados
para o mercado.

SÍNDROME ESPÁSTICA
(Cãibra)
São os espasmos tônicos, intermitentes e bilaterais de grupos de músculos
esqueléticos em animais idosos em pé, que afetam primariamente bovinos leiteiros
(ver também, pág. 715). Embora com freqüência a causa seja considerada uma
característica autossômica recessiva simples com penetrância incompleta, ela é
mais provavelmente herdada através de um mecanismo genético múltiplo. O início
da síndrome parece ser dependente e modificado por fatores tais como dor,
posição em pé, medo e excitação.
Os primeiros sinais surgem quando os animais atingem ≥ 3 anos. Inicialmente
muito suaves, os sinais tornam-se progressivamente mais graves durante um
período de anos. Iniciam-se como um leve espasmo muscular, que surge após o
animal efetuar um movimento brusco, andar sobre superfície escorregadia ou
tornar-se excitado. Os sinais são ausentes em animais em repouso. O espasmo de
um ou ambos os membros posteriores dura vários minutos. Animais muito afetados
levantam a cabeça e a viram para o lado, o que parece aliviar o ataque agudo. Eles
podem elevar um membro dianteiro e estender as patas traseiras posteriormente.
As patas traseiras ocasionalmente podem ser flexionadas uma de cada vez.
Eventualmente, a contração espástica dos músculos se estende para todo o corpo.
Estes ataques graves podem vir de modo intermitente em intervalos semanais ou
mensais. Como os ataques severos tornam-se mais freqüentes e persistentes por
longos períodos, faz-se necessário o abate ou a eutanásia.
É mais freqüentemente confundida com tétano (ver pág. 398) e paresia espástica
(ver anteriormente). A ausência de sinais enquanto o animal está em repouso
diferencia a doença do tétano. A história de um início gradual em animais com , 3
anos ou mais, além dos sinais, é suficiente para diferenciar esta síndrome da paresia
espástica.
Não há tratamento definitivo. Relaxantes musculares e depressores do SNC
trazem somente recuperação mínima e temporária.

CLAUDICAÇÃO EM CAPRINOS
A anormalidade do andar é um sintoma comum a muitas doenças e problemas.
O histórico completo é importante para o diagnóstico, o qual deve incluir incidência
e duração no rebanho, nutrição, alterações na alimentação, método de criação e
introdução recente de animais no rebanho (ver também INTERAÇÃO MANEJO-DOENÇA:
CAPRINOS, pág. 1350).
O casco da(s) pata(s) afetada(s) deve ser examinado, e o excesso de material
córneo removido para deixar uma superfície plana de apoio do peso. Se o casco não
foi aparado por um longo período ou os caprinos permaneceram em piso macio ou
cama, o material córneo comumente cresce excessivamente a partir das paredes,
pinças e talões, dobrando-se sobre a sola. Com descuido grave, cascos semelhan-
tes a “tamancos holandeses” (pinças alongadas) podem fazer com que o animal
ande sobre os talões. Durante a aparação dos cascos, devem-se notar qualquer
Claudicação em Caprinos 607

porção de casco que esteja anormalmente espessada, galeria nos talões ou sola,
desgaste anormal de uma unha ou odor anormal ou necrótico.
Após a aparação, a pata deve ser lavada com escova e inspecionada em busca
de ferimentos perfurantes, corpos estranhos (por exemplo, pedras ou espinhos na
região interdigital), ou pus proveniente da drenagem de um abscesso – especial-
mente na coroa.
O resto do membro deve ser cuidadosamente palpado, incluindo ossos, tendões e
músculos. Qualquer atrofia muscular ou restrição de movimento deve ser notada. As
articulações devem também ser examinadas quanto a calor, aumento de volume ou dor.
Se o exame clínico não for suficiente para o diagnóstico definitivo, pode ser
necessária a coleta asséptica de líquido articular da articulação afetada (geralmen-
te o carpo) para coloração por Gram, cultura e antibiograma.
Se o líquido articular contiver apenas pus, ou bactérias Gram-positivas, isto indica
mal das juntas (infecção articular inespecífica); apenas fibrina sugere mal das juntas
ou Chlamydia sp; fibrina e pus combinados sugerem Mycoplasma spp; um líquido
claro ou turvo com muitas células mononucleares sugere o vírus da AEC (ver
pág. 475) ou Erysipelothrix sp. Uma amostra de sangue também pode ser útil. No mal
das juntas ou erisipela, a contagem de leucócitos é alta, com neutrofilia. Na laminite,
o número de eosinófilos pode ser normal ou elevado. Os níveis sangüíneos de cálcio,
fósforo e vitamina D podem auxiliar no diagnóstico de epifisite, embora estes muitas
vezes retornem ao normal antes de o animal afetado ser examinado. Se houver
suspeita de AEC, podem ser realizadas titulações; no entanto, podem ocorrer falsos-
negativos durante estresse intenso, e títulos positivos podem ser coincidentes com
claudicação por outra causa, se a incidência sorológica for alta no rebanho de origem.
As radiografias podem ser úteis. Na epifisite, os discos de crescimento devem ser
observados; há também desvios laterais do rádio e, ocasionalmente, adelgaçamento
do osso. Na infecção pelo vírus da AEC, o aumento de volume inicial dos tecidos
moles em torno da articulação afetada é seguido por depósitos de cálcio no tecido
periarticular inchado, cápsula articular, ligamentos, tendões, bainhas tendíneas e,
finalmente, ventres musculares. As últimas alterações consistem de leve produção
de osteófitos periarticulares, esquírolas articulares e extensões grosseiras do osso
periarticular proximal e distalmente.
Alguns dos problemas mais importantes que causam claudicação em caprinos
serão discutidos adiante. Ver também ÍNDICE, página 555.

Epifisite
(Membros curvos)
Trata-se de um desequilíbrio cálcio: fósforo em cordeiros jovens de crescimento
rápido, mais freqüente em machos que em fêmeas; e em cabras novas no estágio final
da sua primeira prenhez ou no estágio inicial da sua primeira lactação. Estas cabritas
são jovens (por exemplo, 12 meses), ou muito leiteiras, ou estão prenhes de gêmeos
ou trigêmeos. A epifisite algumas vezes é complicada pelo raquitismo (ver pág. 586).
Achados clínicos e diagnóstico – A epifisite inicia-se com a deformação
lateral ou medial de um ou ambos os rádios. As alterações posteriores podem
consistir do desvio lateral dos dígitos anteriores ou posteriores; claudicação e
relutância em andar; dorso curvado; e aumento de volume macio e doloroso nas
articulações cárpica, metacarpofalângea, társica, e metatarsofalângea. O diagnóstico
pode ser confirmado por radiografias.
Os problemas que têm sido incriminados como causa incluem: excesso de cálcio
na dieta com a razão cálcio:fósforo > 1,4:1 (geralmente > 1,8:1), ingestão de proteína
em excesso (tem causado epifisite em outras espécies), excesso de ferro na dieta
(reduziu os níveis séricos de fósforo em ovelhas através da diminuição da formação
dos metabólitos da vitamina D), carência de vitamina D causada por ausência de sol
Claudicação em Caprinos 608

por longos períodos e baixo nível de vitamina D na dieta. Alimentação verde


enriquecida, sementes e produtos derivados de semente têm baixos níveis de
vitamina D. O caroteno possui um efeito antivitamina D. A vitamina D possui pouca
estabilidade nos alimentos preparados, especialmente quando misturada com
minerais. A alfafa é rica em cálcio (1,4% de cálcio para 0,2% de fósforo) e proteína.
Os proprietários muitas vezes criam os cabritos com leite da mãe por longos
períodos, pois muitas vezes não comercializam o leite.
Tratamento e controle – Uma vez identificadas a(s) causa(s) provável(is), a
dieta deve ser corrigida e o suplemento adequado deve ser administrado. Isto
normalmente significa vitamina D e fósforo injetáveis e/ou suplemento oral balan-
ceado de cálcio/fósforo.
Os fatores predisponentes também devem ser corrigidos. A dieta dos cabritos em
crescimento deve ser alterada para diminuir o seu ritmo de crescimento. O
acasalamento de cabras muito jovens deve ser desencorajado. Os cabritos machos
devem ser separados das fêmeas aos 3 a 4 meses de idade. As cabritas jovens em
lactação com deformidades nos membros devem ser manejadas de forma que não
atinjam lactação plena, por exemplo, não as ordenhando completamente e secan-
do-as logo que possível.
O tratamento impede que as deformidades do membro piorem e deve melhorá-
las bastante; no entanto, o retorno à normalidade completa do membro é muito raro.

Tendões contraídos em cabritos


É um problema congênito normalmente bilateral, que é um defeito genético em
angorás na Australásia. O problema é causado por alelos autossômicos recessivos
que precisam atingir um certo nível antes de o animal mostrar-se afetado; o tempo
entre a compra de um bode carreador e o aparecimento de cabritos afetados pode
ocorrer em 5 a 6 gerações. Os membros anteriores ou os posteriores podem ser
afetados. Em casos raros, apenas um membro anterior fica contraído. Em casos
graves, o cabrito é incapaz de ficar em pé, ou pisa com os boletos. Em casos menos
graves ele pode se mover com relativa facilidade com os boletos permanentemente
em flexão parcial. Em casos suaves, podem ser colocadas talas gradualmente mais
retas nos membros, até que o cabrito possa apoiar o peso nos seus cascos.
Em anglo-nubianos nos EUA, Canadá, Austrália e Nova Zelândia, há um
problema genético semelhante chamado de β-manosidose. No nascimento, estes
cabritos apresentam graus variáveis de flexão fixa nos membros anteriores e
extensão fixa nos posteriores. Eles podem ver, berrar e mamar, se levados à teta.
Os reflexos de defesa são normais ou deprimidos e há uma intenção de tremor,
especialmente da cabeça. Pode haver nistagmo, surdez e anormalidades faciais.
Não existem grandes anormalidades à necropsia embora o corte dos tendões
permita o movimento livre dos membros. A histologia revela uma típica doença
de armazenamento. Os cabritos afetados não possuem níveis plasmáticos de
β-manosidase, e os pais possuem metade do nível normal.

Deficiência de cobre
Isto pode causar problemas semelhantes aos dos bovinos (ver págs. 1453 e 720).
Podridão dos cascos/dermatite interdigital
Os dois problemas são graves em caprinos e outras espécies (ver págs. 603 e 653).

Mal das juntas


Trata-se de uma infecção bacteriana inespecífica de várias articulações dos
cabritos. As bactérias que foram incriminadas são, na sua maioria, Gram-positivas,
Claudicação em Caprinos 609

incluindo estafilococos, estreptococos, Corynebacterium spp e coliformes. A


Erysipelothrix rhusiopathiae também causa mal das juntas, apesar de ser incomum
em caprinos e, quando ocorre, afeta principalmente cabritos de 3 a 4 meses de
idade.
As bactérias ambientais penetram na circulação do neonato, normalmente pelo
cordão umbilical. Outros métodos de entrada incluem contaminação de feridas na
pele ou via tratos GI ou respiratório. Os fatores predisponentes incluem a falta da
rotina de desinfecção do cordão umbilical, higiene precária nas baias de parição, ou
parição em ambiente superpopulado ou sujo. A Erysipelothrix rhusiopathiae é uma
bactéria que vive no solo, podendo persistir em fazendas ou instalações utilizadas
por ovinos ou suínos. A infecção por micoplasma é também um diagnóstico
diferencial.
Achados clínicos – Mais de uma articulação fica quente, inchada e dolorida.
Muitas vezes o(s) membro(s) afetado(s) não suportará(ão) peso. Os cabritos com
> 1 membro afetado podem ser incapazes de ficar em pé. As articulações mais
comumente afetadas são carpo, paleta, jarrete, e soldra. Geralmente há febre,
porém sem redução no apetite. Algumas vezes a região umbilical está inflamada,
porém com freqüência não há nenhuma anormalidade visível. Pode se formar um
abscesso umbilical muito tempo depois de o cabrito ter se recuperado. Há um
aumento de leucócitos com desvio à esquerda.
Se o problema se torna crônico, os membros ficam enrijecidos, algumas
articulações podem estar anquilosadas e o crescimento geral é ruim. Neste estágio
a temperatura é normal.
Tratamento – Para ser bem-sucedido, o tratamento deve ser iniciado o mais
cedo possível. Injeções freqüentes de altas doses de antibióticos, administradas
por ,1 semana geralmente conseguem a cura, se combinadas a um manejo
cuidadoso. A penicilina e seus derivados são as drogas de escolha para a erisipela.
As complicações podem ser evitadas providenciando-se cama macia, virando-se
freqüentemente os cabritos incapazes de se levantar e massageando-se as arti-
culações afetadas. Se a anquilose começar a se desenvolver, o cabrito deve ser
apoiado em uma tipóia, por pequenos períodos, tão freqüentemente quanto pos-
sível.
Nos grandes rebanhos comerciais, o tratamento de cabritos gravemente afeta-
dos pode não ser economicamente justificável; muitos dos que se recuperam
permanecem com mau aspecto para o resto de suas vidas.
Controle – A higiene no parto é essencial. Uma cama profunda de serragem
limpa, maravalha ou feno deve ser providenciada; muitas vezes é melhor permitir
que a cabra dê à luz em um pasto fresco se o clima estiver quente.
O cordão umbilical dos cabritos neonatos deve ser imerso várias vezes em um
anti-séptico forte, por exemplo, solução de Lugol ou iodofor. O umbigo deve ser
imerso na solução cada vez que o cabrito for manejado nas primeiras 24 a 48h. As
cabras geralmente lambem e mordem o cordão umbilical por várias horas após o
parto. As pessoas devem limpar seus calçados antes de entrar nas baias de parição
(maternidades).

Laminite
(Aguamento)
Trata-se de um problema cosmopolita. A incidência em caprinos é menor do que
em gado de leite e cavalos. As causas predisponentes incluem superalimentação ou
acesso súbito a concentrados, dietas ricas em grãos e pobres em forragem, e/ou
dietas de alta proteína. A laminite pode também ocorrer como complicação de
infecções agudas como mastite, metrite ou pneumonia, especialmente após o parto.
Claudicação em Caprinos 610

Quando grave, o animal afetado claudica, reluta em se mover, tem febre e todas
as 4 patas estão quentes ao toque. Ao se tocar a coroa do casco o animal revela dor
intensa e reage. Nos casos um pouco menos graves, apenas os membros anteriores
são afetados. A laminite pode tornar-se crônica se a fase inicial não for diagnosticada
e tratada com sucesso. O início é insidioso, mas eventualmente o cabrito é
observado andando sobre os joelhos, com deformidade tipo “treno” nos cascos
(cascos achinelados, com as pinças apontando para cima).
Na laminite aguda, o problema primário, quando houver, deve ser tratado
prontamente. A laminite é tratada com anti-histamínicos, EV, 3 vezes/dia. Após as
primeiras 12h os corticosteróides são úteis; no entanto, seu uso é contra-indicado
em cabras prenhes. Analgésicos (por exemplo, fenilbutazona 2 a 4mg/kg, flunixina
meglumina 1,1mg/kg ou aspirina 30 a 100mg/kg ) diários e duchas ou imersão das
patas afetadas são úteis. A laminite crônica com cascos deformados é tratada pela
aparação vigorosa rotineira dos cascos.

Micoplasmose
Ver também páginas 796 e 913. Cabritos infectados com Mycoplasma mycoides
subsp mycoides (variante de colônias grandes [CG]) podem demonstrar claudica-
ção grave com várias articulações inchadas e quentes, perda de peso, pirexia e
pelagem ruim. Alguns apresentam diarréia e outros têm aumento dos ruídos
pulmonares e freqüência respiratória. Os cabritos afetados geralmente têm 2 a 4
semanas de idade. Foram relatadas taxas de morbidade e mortalidade de 90 e 30%,
respectivamente.

Trauma/dor
Os caprinos, em geral, são criaturas muito ágeis, porém se assustados, podem
tentar saltos impossíveis, com fraturas ou outros traumas conseqüentes. Os
piquetes destinados a caprinos manejados infreqüentemente devem ter barreiras
visuais além de físicas. Felizmente, a maior parte das fraturas distais dos membros
cura-se rapidamente com imobilização externa normal. A tosquia de caprinos
angorás é uma fonte de problemas potenciais, por exemplo, quando a máquina de
tosquia corta o tendão de Aqüiles. Os procedimentos ortopédicos indicados para
cães grandes podem ser utilizados.
Algumas injeções IM podem causar problemas; por exemplo, vacinas clostrídicas
mistas podem causar grave inchaço de tecidos moles e claudicação por ≥ 48h, e as
drogas irritantes podem danificar nervos em torno causando claudicação. Em
alguns casos de mastite grave, especialmente a gangrenosa, há uma claudicação
do membro posterior no lado afetado. A cabra muda seu andar devido à dor e
inchaço do úbere afetado. Aspirina, fenilbutazona e flunixina meglumina são os
analgésicos sugeridos.

Doença dos músculos brancos


Ver também página 661. A maioria dos cabritos afetados apresenta boas
condições e tem 2 a 3 meses de idade (varia de 1 semana a 4 meses).
Comumente, a morte súbita é associada a dano na musculatura cardíaca.
Outros cabritos são deprimidos, relutam em se mover e parecem enrijecidos
com uma postura de “cavalete”. Os músculos, especialmente dos membros
posteriores, são firmes e doloridos ao toque.
Claudicação em Eqüinos 611

CLAUDICAÇÃO EM EQÜINOS
Ver também CLAUDICAÇÃO, PRINCÍPIOS GERAIS, página 589.

PROBLEMAS DA PATA
Cisto ósseo na terceira falange
A presença de um cisto ósseo grande na terceira falange produz uma claudica-
ção crônica grave que não responde à medicação antiinflamatória. Esta condição
incomum pode ser vista em qualquer casco, mas está mais freqüente nos membros
posteriores. Aparentemente não há nenhuma predisposição etária, racial ou sexual.
Presume-se ser de origem traumática e não parte da síndrome de osteocondrose.
Uma desmineralização cística pode acompanhar os abscessos subsolares prolon-
gados. O cisto pode comunicar-se com a articulação falângea distal. Cistos múltiplos
estão algumas vezes presentes e podem progredir em tamanho e, eventualmente,
preencher grande parte da terceira falange. O diagnóstico é confirmado pelo
bloqueio do nervo volar e radiografia. O diagnóstico diferencial inclui ceratoma,
doença navicular, osteíte pedal e abscessos da terceira falange. O tratamento
cirúrgico nem sempre tem sucesso devido ao local e tamanho da lesão. A fratura
secundária da falange distal pode ocorrer devido ao enfraquecimento progressivo
do osso. Alguns cavalos retornam ao seu desempenho antigo anterior e outros são
destinados a usos alternativos, como reprodução.

Contusões na sola
Contusões na superfície volar da pata normalmente ocorrem pelas lesões diretas
causadas por pedras, pisos irregulares ou outros traumas. A ferração deficiente,
especialmente em animais com quartela baixa ou laminite, predispõe à contusão
normalmente ao longo da periferia da sola. A contusão pode ou não ser associada
à claudicação, mas se ela tornar-se crônica, a área afetada pode se tornar infectada.
Contusões persistentes de sola, não responsivas, podem levantar a suspeita de
osteíte pedal.
Há um tipo específico de “contusão” que ocorre na sola, no ângulo entre a parede
e a barra da ranilha. É mais comum nas patas dianteiras, no quarto interior e
normalmente está associada com uma ferração deficiente na qual a parte posterior
de uma ferradura foi impropriamente colocada ou deixada por muito tempo, causan-
do pressão na sola. Ferraduras que tenham sido ajustadas muito fechadas nos
quartos também podem causar este tipo de contusão. Também pode ser predisposta
pela conformação imperfeita da pata, tal como paredes retas que tendem a virar
em direção aos quartos ou patas encasteladas. Outras causas incluem o corte
excessivo da sola (que expõe os tecidos sensíveis à contusão) ou negligência
quanto ao comprimento dos cascos, permitindo que se tornem longos e irregulares.
As contusões são descritas como “secas”, quando existem somente pequenas
alterações inflamatórias; como “úmidas”, quando há excesso de exsudato inflama-
tório; e como “supurativas”, quando tornam-se infectadas secundariamente.
Quando a pata for elevada e a superfície da sola estiver livre de sujeira e material
córneo solto, nota-se uma descoloração vermelha ou amarelo-avermelhada. Uma
claudicação do tipo sustentação é o sinal mais precoce, mas a claudicação não está
sempre presente. Batendo-se de forma leve com um pequeno martelo sobre a área
ou aplicando-se pressão com uma pinça de casco, normalmente provoca-se
desconforto. Se houver contaminação, a dor será pronunciada quando for aplicada
a pressão; e se não for prontamente tratada, um canal purulento poderá estender-
se através da coroa do casco e produzir uma cavidade supurada.
Claudicação em Eqüinos 612

O prognóstico é favorável. Em contusões secas, sem complicações, o alívio da


pressão sobre a área afetada é a primeira ação a ser considerada. Isto pode ser
conseguido pelo encurtamento da pinça, se esta for muito longa, e pela aplicação
de uma ferradura com barra para promover pressão sobre a ranilha. Uma ferradura
três quartos com barra pode também ter valor no alívio da pressão.
Se a lesão supurar, ela deve ser drenada imediatamente pela abertura cirúrgica
direta através da sola. Após a drenagem, o pé deve ser cuidado para que se
mantenha a mesma. Banhos quentes do casco e cataplasmas podem ser úteis. O
animal deve ser mantido num boxe seco e limpo. Após o controle da infecção nas
contusões supuradas, a cavidade deve ser preenchida com gaze estéril e uma
pomada antibiótica local, uma sola de metal, borracha ou couro colocada entre a
ferradura e a pata. Terapia antibacteriana parenteral deve ser indicada somente em
cascos sépticos graves.

Cancro na ranilha
É uma hipertrofia crônica e supuração aparente dos tecidos produtores córneos
do casco, que envolve a ranilha e a sola. A causa é desconhecida. Esta condição
é primariamente uma doença dos cavalos pesados de tração, raramente vista hoje
em dia, embora em certos estábulos de cavalos leves no sul dos EUA haja
ocorrências freqüentes. A doença é mais freqüentemente encontrada nos membros
posteriores e quando é detectada está em estágio avançado. A ranilha pode parecer
intacta, mas tem uma aparência gasta e oleosa. O tecido córneo da ranilha
desprende-se facilmente, revelando o cório intumescido e fétido, coberto por um
exsudato caseoso. A superfície do cório é irregular com um crescimento vegetativo
característico. A doença pode estender-se para a sola e até para a parede, não
apresentando tendência à cura.
O prognóstico é reservado. O tratamento deve ser radical e intensivo. Todo o
tecido córneo solto e o tecido afetado devem ser removidos, e deve ser feito um
curativo com anti-séptico ou antibiótico diariamente. É necessário que se mantenha
um ambiente limpo e seco para que ocorra a cura, o que pode levar semanas ou
meses. Os materiais à prova d’água e botas plásticas são utilizados para este
propósito. Se o cavalo não claudicar, poderá voltar ao trabalho durante o período de
cicatrização, utilizando uma ferradura especial, com uma placa removível na sola
para proteger o curativo.

Talões contraídos
É uma condição vista principalmente em patas dianteiras de cavalos leves. Pode
ser causada por ferração incorreta que traciona os quartos, impedindo a expansão
do casco e a pressão adequada da ranilha. É predisposta por cascos ressecados,
pelo uso excessivo da grosa e pelo corte das barras. Pode seguir o uso de uma
ferradura que imobiliza o casco, como as usadas para a fratura da terceira falange.
A ranilha é estreita e encolhida, as barras podem estar curvadas ou quase
paralelas uma em relação à outra e os quartos e talões são marcantemente
contraídos e fechados. O casco córneo é seco e pesado. A claudicação é evidente
quando o cavalo é trabalhado em velocidade. O comprimento do passo é encurtado
e pode ser notado calor ao redor dos talões e dos quartos.
O prognóstico é reservado; a recuperação nos casos avançados leva 6 a 12
meses. Os fatores mais importantes no tratamento são umidificar os cascos e
promover expansão. Isso pode ser conseguido imergindo-se as patas em água
diariamente por 10 a 14 dias e realizando-se, a seguir, uma ferração corretiva. Os
produtos para cascos ressecados que contêm óleos ou ceras devem ser utilizados
com cautela, pois podem impedir a entrada de água no casco. As ferraduras tipo
Claudicação em Eqüinos 613

“slipper” com não mais de 3 cravos de cada lado promovem a expansão do casco.
Os clipes (barbetas) nos quartos ou o quarto cravo devem ser evitados.
O adelgaçamento com a grosa da parede do casco na região dos quartos logo
abaixo da faixa coronária, ou sulcos paralelos à coroa, feitos 2cm abaixo da coroa
desde os talões até metade do caminho para a pinça, auxiliam na expansão dos
talões. O segundo e o terceiro sulcos devem ser feitos com 1,2cm de distância e
paralelos ao primeiro. Conforme o casco cresce, o procedimento pode ter de ser
repetido até que os talões se expandam para a conformação normal.

Fratura do osso navicular


A fratura do osso navicular pode ocorrer como um resultado de trauma ou
concussão da pata, ou ser uma seqüela da doença navicular (ver pág. 617). É muito
menos comum do que a fratura da terceira falange, mas pode ocorrer nas patas
anteriores e posteriores. Embora a dor seja variável, a pinça de casco pode
normalmente indicar o local geral de dor. A claudicação é persistente e pode ser
eliminada pelo bloqueio do nervo digital palmar. A radiografia confirmará o
diagnóstico. Entretanto, a presença de ossos naviculares bipartidos congênitos,
não deve ser confundida com fraturas.
O tratamento é feito pelo repouso prolongado e corte corretivo para aliviar a
adesão do tendão, mas uma união óssea satisfatória no local da fratura raramente
ocorre. Foi descrito o reparo cirúrgico com parafuso “lag” (fixação com compressão).
O prognóstico é reservado a ruim. Embora este seja o tipo de fratura mal consolidada
que pode responder muito à terapia com campo magnético de baixa intensidade,
faltam dados substanciais neste sentido.

Fratura da terceira falange


(Fratura da falange distal)
A fratura da terceira falange não é uma lesão traumática incomum. Ocorre como
efeito de uma concussão durante exercício ou corrida, produzindo um ataque súbito
de claudicação. A maioria das fraturas ocorre ao longo da asa lateral e freqüente-
mente se estende para dentro da articulação falângea distal.
Ocorre uma claudicação de sustentação aguda e normalmente há dor à com-
pressão da pata com a pinça de casco. Percutindo-se levemente o casco com um
martelo também pode-se provocar a dor. A claudicação é exacerbada quando se
vira o cavalo ou se faz pivô sobre a perna afetada. Se a fratura não se estende para
dentro da articulação, pode ocorrer considerável melhora da claudicação após
somente 48h de repouso no estábulo.
Os sinais clínicos podem sugerir a condição, mas o diagnóstico é confirmado pelo
bloqueio do nervo distal palmar e radiografias. Freqüentemente, > 2 posições são
requeridas antes de evidenciar-se a linha de fratura. Imediatamente após a lesão,
a confirmação radiográfica pode ser difícil, porque a fratura é somente uma linha fina
nesta fase. A repetição dos raios-X 48 a 72h mais tarde, incluindo as radiografias
oblíquas, pode ser necessária para confirmar a presença e o local exato da fratura.
Isto é importante para estabelecer se a fratura se estende para dentro da articulação
falângea distal.
O tratamento conservador de 6 a 9 meses de repouso é normalmente tudo o que
é necessário para as fraturas que não envolvam a articulação. A fratura geralmente
se cura por uma união fibrosa, de modo que mesmo que o animal pare de claudicar,
a evidência radiográfica da fratura permanece. É normal ajustar uma ferradura de
barra plana com um bom encaixe atrás de cada quarto para limitar a expansão e
contração dos talões. Em cavalos jovens (< 3 anos), fraturas para dentro da
articulação podem curar-se satisfatoriamente, provendo-se 12 meses de repouso.
Claudicação em Eqüinos 614

Cavalos mais velhos (> 3 anos) têm muito menos prognósticos favoráveis, e a
inserção de um parafuso osseocortical através do local da fratura é indicada,
usando-se a técnica da compressão interfragmentária. Entretanto, a infecção é um
freqüente fator de complicação da cirurgia. Muitas fraturas cicatrizam na presença
de infecção, mas o parafuso deve ser removido numa segunda cirurgia para a
completa restituição do cavalo ao trabalho. A neurectomia digital palmar de cavalos
de corrida com fraturas alares tem sido utilizada para permitir que eles retornem à
competição sem a demora exigida para a cura completa.

Ceratoma
(Cerafilocele)
É a hipertrofia córnea na face interna da parede, normalmente na região da pinça.
Acredita-se que isso acompanhe um processo inflamatório crônico da matriz
laminar, causado por “cravos mal colocados”, lesão mecânica à parede ou à coroa
do casco ou após grosamento do último. Freqüentemente, a doença não é
evidenciável até que o crescimento esteja bem avançado. O exame da superfície
palmar mostra que o crescimento, comumente em formato cilíndrico, expandiu-se
empurrando a linha branca para o centro da sola. A atrofia pela pressão sobre a
terceira falange normalmente segue os casos graves. A remoção cirúrgica da massa
é indicada. Em casos leves, a ferração corretiva pode trazer algum alívio temporário.
O prognóstico deve ser reservado.

Laminite
(Aguamento, Febre nas patas)
Tradicionalmente definida como uma inflamação ou edema da lâmina sensitiva
da pata, a laminite agora está sendo considerada como uma isquemia transitória
associada a uma coagulopatia que leva à interrupção e degeneração da união entre
as lâminas córneas e sensitivas. Em casos refratários, a rotação da falange distal
torna-se uma seqüela comum, que pode progredir para a perfuração da sola. A
doença é a manifestação local de um distúrbio metabólico generalizado e os
problemas do casco podem ser classificados de modo geral como agudos, subagu-
dos ou crônicos. Pode ocorrer nas patas dianteiras, em todas as 4 patas ou,
ocasionalmente, só nas traseiras. A laminite biomecânica pode ocorrer numa única
pata, normalmente como complicação de uma claudicação grave ou doença
ortopédica no membro contralateral.
Etiologia – As causas mais comuns de laminite são a ingestão excessiva de
carboidratos (“superdosagem de grãos”); pastagem de forragens tenras, especial-
mente por parte de pôneis; e exercício excessivo e concussões num cavalo não
adaptado a esta prática. Também pode ser secundária a metrite pós-parição,
endotoxemia, cólica e enterite, ou administração de dose excessiva de corticoste-
róides ou algum outro medicamento. O risco é elevado em pôneis e em cavalos
despreparados que se encontram com o peso acima do adequado. Há uma alta
incidência das formas aguda e subaguda durante a época de crescimento da
forragem.
A alteração inicial na laminite aguda é a isquemia das vênulas e arteríolas
lamelares. O sangue arterial é então “desviado” para as vias de retorno venoso de
muitos vasos sangüíneos anastomóticos da pata (especialmente na banda coro-
nária) e desvia a circulação do cório causando estagnação do sangue, congestão
funcional e tromboembolismo dos leitos capilares. A necrose laminar contribui para
a rotação.
Estes distúrbios na circulação da pata, que inicialmente são reversíveis, prova-
velmente causam dor evidente. Se, por outro lado, a condição torna-se prolongada
Claudicação em Eqüinos 615

e há hipoxia crônica e deficiência de aminoácidos sulfurados essenciais no cório,


pode ocorrer retardamento ou parada da ceratinização entre o estrato germinativo
e a zona ceratogênica. O resultado final é a produção dos “anéis de laminite”, em
casos leves, e rotação da terceira falange ou completa separação do estojo córneo
dos tecidos subjacentes, em casos graves. A separação entre o estojo córneo e as
lâminas sensitivas é decorrência da isquemia, ceratinização deficiente e constante
tração do tendão flexor profundo sobre a terceira falange, associados à reação do
solo sobre a pinça do casco quando o cavalo está de pé. Há algum suporte sobre
o dorso da terceira falange, oferecido pelo tendão flexor digital profundo e pelo coxim
digital; entretanto, estas estruturas de suporte podem servir como um apoio
resultando na rotação do osso da terceira falange. Se esta separação ocorrer
rapidamente, uma “pressão” da terceira falange sobre o casco pode acontecer. Em
casos crônicos, a coroa da terceira falange pode penetrar a sola imediatamente em
frente à ranilha. O prognóstico em casos graves é ruim, porque as alterações
tornam-se irreversíveis e é comum a instalação de infecções secundárias. Em casos
subagudos e crônicos, a rotação da terceira falange ocorre de forma relativamente
mais lenta. A sola tende a espessar-se tornando-se convexa e espessa, e o casco
altera sua forma para acomodar a nova posição.
Achados clínicos – Na laminite aguda, o animal fica deprimido, anorético e
apresenta grande relutância em ficar de pé. Há sempre resistência marcante contra
qualquer forma de exercício e a postura normal é alterada em busca do alívio do
peso que é exercido sobre as patas afetadas. Se forçado a andar, o animal
apresenta um caminhar lento, curvado e de passos curtos. Cada pata, uma vez
erguida, é reapoiada o mais rapidamente possível.
Em geral, a temperatura é sensível em todo o casco, especialmente próximo à
banda coronária. Um pulso exagerado e palpitante pode ser palpado e visível nas
artérias digitais. A dor pode causar tremor muscular no animal, e uma sensibilidade
uniforme pode ser detectada pela pressão sobre as patas. A rotação da terceira
falange pode se instalar durante ou após o estágio agudo se não for instaurado um
tratamento eficaz rapidamente. Evidências radiográficas de rotação podem ser
observadas já no terceiro dia. As mucosas visíveis estão comumente injetadas, com
elevada temperatura corporal (40 a 41°C), freqüência do pulso (80 a 120/min) e
freqüência respiratória (80 a 100/min). Os casos excepcionalmente graves, que
levam a um prognóstico desfavorável, podem apresentar um exsudato sanguinolen-
to vertendo pelas bandas coronárias.
Os casos subagudos podem exibir alguns ou todos os sinais clínicos vistos
anteriormente, mas num grau menos grave. Freqüentemente, haverá só uma leve
alteração da postura, associada à relutância em caminhar e a algum aumento na
sensibilidade a concussões sobre as solas das patas afetadas. Pode haver aumento
não detectável da temperatura na banda coronária ou elevação do pulso digital. As
formas agudas e subagudas da laminite tendem a recidivar a intervalos variáveis e
podem se desenvolver para a forma crônica.
A laminite crônica é caracterizada pelas alterações na forma do casco e é
usualmente seguida por um ou mais ataques da forma aguda. Bandas de crescimen-
to córneo irregular (anéis de laminite) podem ser vistas nos cascos, próximas à
região da pinça e divergindo nos talões. O próprio casco torna-se estreito e
alongado, com a parede quase vertical na região do talão e horizontal na pinça.
Com o progresso da condição, a sola torna-se engrossada e com o contorno liso
ou pouco convexo. A forma de andar é similar àquela já descrita, e quando de pé o
animal lança o peso do corpo continuamente de uma pata para a outra. O exame
radiográfico revela rotação e alguma osteoporose da terceira falange. A coroa do
osso é forçada para baixo e pressiona a sola calejada. Nos casos graves, ela pode
penetrar a sola num ponto logo à frente da ranilha.
Claudicação em Eqüinos 616

Diagnóstico – O diagnóstico na laminite aguda e grave é feito pela história do


caso (por exemplo, sobrecarga de grãos) e pela postura do animal, pelo aumento
de temperatura dos cascos, pela presença de pulso firme nas artérias digitais e pela
relutância na movimentação. Casos discretos sem nenhuma deformidade visível do
casco podem ser descobertos ao exame radiográfico das patas afetadas que
apresentam uma falta de paralelismo na vista lateral entre a parede do casco e a
superfície cranial da terceira falange. Uma divergência de ≥ 11° indica um prognós-
tico de reservado a desfavorável para o retorno ao desempenho anterior.
Tratamento – A laminite aguda constitui uma emergência médica devido à
possibilidade de ocorrência rápida da rotação da falange distal. A despeito da pronta
terapia, o prognóstico é reservado até a recuperação completa e a exclusão de
alterações na estrutura do casco. Na laminite aguda, especialmente em casos
de superalimentação com grãos, é indicado o óleo mineral. A administração oral
de 4L de óleo mineral pode atuar como laxante e tende a prevenir a absorção de
material tóxico do trato GI. A purgação não deve ser empregada na fase aguda
porque muitos cavalos tendem a estar desidratados.
Compressas frias ou geladas, aplicadas sobre as patas afetadas, são indicadas
por alguns, mas evidências recentes sugerem que as compressas quentes, usadas
precocemente no curso da doença, possam ser mais benéficas. Os anti-histamíni-
cos têm valor discutível durante a claudicação aguda, mas o uso de pastas de
cloridrato de isoxsuprina, um agente vasodilatador periférico, pode ser valioso. Alguns
estão utilizando heparina (40u/kg, três vezes ao dia por 3 dias) devido à suspeita de
coagulopatia e tromboembolismo associados; no entanto, a terapia com heparina
em eqüinos foi associada à formação de grupos de hemácias que, em um animal
desidratado, pode agravar a dinâmica do fluxo sangüíneo local nas patas.
Flunixina meglumina e fenilbutazona são os agentes antiinflamatórios preferidos,
e o ácido meclofenâmico também tem sido útil; entretanto, todos os 3 podem ser
tóxicos. Esses agentes são antiinflamatórios não esteróides; cada um deve ser
usado de acordo com as instruções do rótulo e, se usados em combinação, a
dosagem de cada um deve ser reduzida de acordo.
O cloridrato de fenoxibenzamina (0,66mg/kg, EV em 500mL de solução salina),
que é um bloqueador α-adrenérgico que causa vasodilatação por até 24h, tem sido
utilizado nos casos graves e agudos de laminite. No entanto, pode causar depressão
e deve ser evitado nos animais em choque.
As ferraduras em coração têm sido utilizadas nos casos agudos para tentar difundir
a pressão pela sola e evitar a rotação da terceira falange. Como uma ferradura em
coração mal colocada pode agravar a dor, a colocação correta é essencial.
A administração de corticosteróides para cavalos com laminite é contra-indicada,
porque há sério catabolismo celular e inibição da resposta imune, freqüentemente
resultando em dano muscular e piora da laminite. As endotoxinas Gram-negativas,
devido à superdosagem de carboidratos, têm sido implicadas na patogenia da
laminite, sendo especialmente importante manter-se a resposta imune normal
durante o tratamento.
Experimentalmente, uma vacina combinada (recentemente desenvolvida), que
consiste de uma bacterina mutante de Salmonella morta, um endotoxóide e um
adjuvante de hidróxido de alumínio, tem apresentado eficácia na redução das
complicações da laminite relacionadas a endotoxinas.
O bloqueio do nervo digital em estágios precoces da doença permite ao paciente
caminhar. Esse artifício tem como resultado o aumento do fluxo sangüíneo arterial
através do arco terminal. O bloqueio nervoso e as caminhadas, entretanto, são
contra-indicados se a rotação da terceira falange já tiver se iniciado. Devido ao seu
valor na ceratinização do casco, a metionina é usada em doses diárias de 22mg/kg
por 1 semana, seguida de 11mg/kg na segunda semana e 5,5mg/kg na terceira.
Claudicação em Eqüinos 617

O tratamento da laminite crônica tem consistido de tentativas para restaurar o


alinhamento normal da falange distal com rotação e estimulando a pressão da
ranilha, pelo abaixamento dos talões, remoção do excesso de pinça e proteção
da sola afundada. Isto requer protetores de couro na sola, ferraduras em forma de
coração, adicionados ao corte do casco. Podem ser usados compostos acrílicos, em
associação ao corte apropriado do casco, para desenvolver a pinça e proteger a
sola. O casco deve ser cortado e a ferradura ajustada a intervalos de 4 a 6 semanas.
Esta abordagem pode ser bem-sucedida em casos selecionados, porém é cara,
trabalhosa e prolongada.
A ressecção da parede do casco separada também pode ser indicada, tendo sido
utilizada em casos agudos e crônicos, especialmente aqueles com pinças podres
e/ou infecção. Este procedimento cirúrgico envolve riscos, devendo ser precedido
por conversas entre o veterinário e o ferrador.

Doença navicular
(Podotroclose, Podotroclite)
Essencialmente, é uma condição degenerativa crônica da bolsa e do osso
naviculares que envolve danos na superfície flexora do osso e no tendão flexor
digital profundo adjacente, com formação de osteófitos sobre as bordas proximal e
lateral do osso. Conseqüentemente, esta é uma síndrome de patogenia complexa,
ao invés de uma entidade patológica específica. É primariamente uma doença das
patas dianteiras e essencialmente desconhecida em pôneis e jumentos.
Etiologia – A causa exata é desconhecida; todavia, sugere-se que a trombose
arterial e necrose isquêmica dentro do osso navicular estejam envolvidas. Consi-
dera-se que seja uma doença do cavalo de sela maduro, mas foram observadas
evidências radiográficas em cavalos de 3 anos de idade. Pode ser parcialmente
hereditária; certamente está associada com conformação vertical da pata dianteira.
A conformação da pata, nos casos crônicos, torna-se anormal; fica encastelada e
contraída, com uma ranilha pequena. A ferração inadequada que inibe a ação da
ranilha e dos quartos pode ser um fator contribuinte. A concussão entre o tendão
flexor e o osso navicular pode causar uma bursite local que leva a hiperemia e
rarefação óssea com alteração resultante na superfície flexora do osso.
Achados clínicos e diagnóstico – Normalmente, a doença possui um início
insidioso. A(s) pata(s) afetada(s) chama(m) atenção, inicialmente, pela atitude
do animal quando em repouso. O cavalo alivia a pressão do tendão flexor
profundo na área dolorida, apoiando o casco em pinça, ou avançando a pata
afetada e tirando os talões do solo. Se ambas as patas dianteiras estiverem
afetadas, eles são colocados “em pinça” alternadamente. Uma claudicação
intermitente se manifesta precocemente no curso da doença. O passo é
encurtado, e pode haver uma tendência a tropeços. O teste de flexão, que
envolve a porção distal dos membros anteriores, normalmente provoca uma
exacerbação transitória da claudicação. Pode haver sensibilidade nos músculos
braquiocefálicos secundária às alterações da postura e passo, causando a
queixa freqüente de “manqueira de paleta”.
O diagnóstico clínico é óbvio se for empreendido um histórico completo e um
exame físico cuidadoso. Isto é conseguido pela observação do apoio em pinça. A
claudicação pode ser eliminada pelo bloqueio nervoso digital palmar. Radiografias
revelam lesões degenerativas no osso com uma alteração no formato dos chama-
dos canais vasculares do formato triangular fino normal para um formato de cantil
invertido ou triangular. Estas lesões podem resultar da doença navicular ou do
envelhecimento natural, e devem ser interpretadas sob a luz do histórico e dos sinais
clínicos.
Claudicação em Eqüinos 618

Tratamento – Como o problema é crônico e degenerativo, pode ser tratado em


alguns cavalos, mas não curado. Quando há claudicação intensa, recomenda-se o
repouso. Os cuidados com a pata são dirigidos para uma aparação e ferração que
restaurem o alinhamento e equilíbrio falângeos normais. O adelgaçamento dos
quartos com a grosa e umidificação apropriada do casco podem aliviar a contratura
dos cascos. A ferradura com ramos inclinados e um calço em cunha (taloneira)
auxiliam a expansão do casco, porém a angulação normal deve ser mantida e
devem-se utilizar apenas 3 cravos em cada ramo da ferradura; um quarto cravo nos
talões anularia o efeito da inclinação. As pinças devem ser arredondadas para
facilitar o início do passo. As drogas antiinflamatórias não esteróides como a
fenilbutazona, juntamente com o manejo adequado da pata, prolongam a vida útil
de alguns cavalos. As injeções de corticosteróides dentro da bolsa são também mais
paliativas que curativas. Outra terapia é o hidroclorato de isoxsuprina (0,6mg/kg,
VO, 2 vezes/dia, por 6 a 14 semanas) em forma de pasta, que age como
vasodilatador periférico, mas após a interrupção da terapia há recorrências.
A neurectomia digital palmar pode levar ao alívio da dor e prolongar a utilidade
do animal, mas nenhuma neurectomia deve ser considerada curativa. A neurecto-
mia digital pode ser acompanhada de complicações graves, como formação de
neuroma doloroso. A neurectomia volar e mais alta nunca deve ser feita.
Recentemente foi descrita uma técnica de desmotomia do ligamento sesamói-
deo colateral. Cortando-se este ligamento, acredita-se que as forças concussivas
entre o osso navicular e o tendão flexor digital profundo sejam reduzidas. Os
resultados são preliminares e não comprovados.
Apesar de o prognóstico ser de reservado a ruim, um regime terapêutico
cuidadosamente elaborado pode prolongar a vida útil na maioria dos casos, e o
estado competitivo em muitos. Após meses ou anos, todos os cavalos afetados
atingem um estágio não responsivo ao tratamento.

Osteíte podal
Trata-se de uma inflamação das estruturas sensíveis da face volar das patas
dianteiras, associada a osteíte e desmineralização da terceira falange. Concussões
repetidas, laminite, calos persistentes, contusões crônicas da sola são fatores que
têm sido implicados como causa. É comum em cavalos de performance e, normal-
mente, está associada ao trabalho em pista dura. As claudicações podem não ser
óbvias, porque normalmente os dois dianteiros estão afetados. Pode haver um
movimento enrijecido ou arrastado dos membros anteriores com sintomas de
desconforto na região dos cascos. A percussão e a pressão da pinça no casco
normalmente revelam sensibilidade sobre toda a sola. A radiografia é auxiliar no
diagnóstico e na diferenciação de uma possível doença navicular.
O tratamento envolve repouso prolongado, medicação antiinflamatória e ferra-
ção cuidadosa para aliviar a pressão da sola. O prognóstico é reservado, mas a vida
útil de muitos cavalos pode ser estendida pelo manejo apropriado.

Ferimentos perfurantes na pata


(Ferimentos produzidos por cravos, Cravo apertado, Abscesso subsolar)
Os ferimentos perfurantes geralmente ocorrem como resultado de técnica de
ferração deficiente, mas pode ocorrer quando o cavalo pisa em um corpo estranho
penetrante. A expressão “cravo apertado” implica um cravo que foi introduzido
próximo às estruturas sensíveis da pata, causando dor aguda. Já a perfuração por
cravo significa que o cório foi penetrado.
Outro tipo de perfuração da sola é o causado pela penetração por corpo estranho
e usualmente está associado à introdução de microrganismos patogênicos. A
Claudicação em Eqüinos 619

claudicação é em geral grave, especialmente quanto à sustentação do peso; o grau


de claudicação pode ser similar a uma fratura. O cavalo descansa o membro afetado
em pinça. Há elevação da temperatura e dor na pata, que progridem para a banda
coronária quando se formam abscessos. Subseqüentemente, há aumento de
volume edematoso nas áreas da quartela e boleto. Casos mal cuidados passam a
drenar na banda coronária após 2 a 3 semanas. O diagnóstico é feito ao se confirmar
o local da dor retirando-se a ferradura, utilizando-se a pinça de casco, e aparando-
se a região suspeita para encontrar o corpo estranho ou o seu trajeto.
O pronto tratamento com desinfetantes e cataplasmas é importante para perfu-
rações por cravos. Assegurar a adequada drenagem do local ajuda a prevenir a
formação de abscessos. Em cavalos com ferimentos por corpo estranho, o prognós-
tico é bom, provendo-se um diagnóstico precoce e instituindo-se rapidamente uma
terapia. Se houver transcorrido tempo suficiente para o desenvolvimento de absces-
sos subsolares crônicos, o tratamento deverá ser prolongado e a perspectiva será
muito menos favorável. Se a infecção estender-se para a articulação interfalângea
distal, o prognóstico será desfavorável.
Se um corpo estranho estiver presente, ele deverá ser encontrado e removido e
a área infectada deverá ser aparada com uma faca de casco para se estabelecer
uma drenagem adequada. A pata deve, então, ser colocada em uma “bota” de
borracha ou plástico por 3 a 5 dias com uma almofada de algodão embebida numa
solução de sulfato de magnésio saturado ou qualquer outro cataplasma adequado.
Deve ser feita a imunização contra o tétano em todos os casos de ferimentos
perfurantes nos cascos. Quando a dor é intensa, um bloqueio do nervo palmar provê
alívio temporário. As antibioticoterapias sistêmica e local não serão necessárias se
a infecção for localizada e for obtida boa drenagem. As perfurações profundas da
pata, que envolvem tendão flexor digital profundo, bolsa navicular, osso navicular ou
terceira falange são consideradas emergências cirúrgicas.

Doença piramidal
(Doença do processo extensor, Pé de contra forte)
Esta condição costuma ser classificada como um tipo de exostose interfalângea
(ver pág. 623). Ela surge a partir de uma periostite induzida traumaticamente ou a
partir de uma fratura por avulsão do processo extensor da terceira falange,
decorrente da tensão excessiva na inserção do tendão. A íntima associação do
processo extensor com a articulação falângea distal significa que a artrite secundá-
ria é uma complicação provável. Casos precoces podem manifestar calor e dor à
pressão. Em geral, está presente um aumento de volume na região da pinça
exatamente acima da banda coronária que resulta em aparência de “pé de contra
forte”. A medicação antiinflamatória sistêmica pode ser benéfica no tratamento. A
cirurgia tem sido usada com sucesso para fraturas por avulsão.

Inflamação da coroa do casco


(Seio coronário)
É uma inflamação purulenta crônica da cartilagem alar da terceira falange,
caracterizada pela necrose da cartilagem e um ou mais tratos cavitários estenden-
do-se da cartilagem doente, através da pele, até a região coronária. É raramente
encontrada na atualidade, mas costumava ser comum em cavalos de tração. Esta
inflamação se segue a lesões na banda coronária ou na quartela sobre a região da
cartilagem alar, por onde a infecção é introduzida nos tecidos profundos , evoluindo
para um abscesso subcoronário. Também pode se seguir a um ferimento perfurante
da sola. O primeiro sinal é um aumento de volume inflamatório sobre a região da
Claudicação em Eqüinos 620

cartilagem alar. Esse é seguido por abscedação e formação de cavidades. Durante


o estágio agudo, ocorre a claudicação.
A cirurgia para remoção do tecido doente e cartilagem normalmente é bem-
sucedida. A terapia local e/ou parenteral sem cirurgia provavelmente falhará.
Na ausência de terapia, má drenagem, necrose da cartilagem e abscedação
recorrente levam à claudicação crônica e extensão às estruturas profundas. Se
o dano é extenso e a articulação interfalângea distal foi invadida, o prognóstico
é desfavorável.

Fendas na parede do casco


(Fenda na frente do casco, Fendas na lateral do casco)
São rachaduras na parede do casco que se iniciam na coroa e correm
paralelamente aos túbulos córneos. As fissuras na região dos quartos são mais
comuns nos cavalos de corrida. Enquanto o ressecamento excessivo do casco
pode predispor à condição, os traumas e os fatores conformacionais são citados
como causas mais prováveis. Lesões extensas sobre a coroa do casco podem
levar a uma fissura na parede, caracterizada pelo desenvolvimento e sobrepo-
sição da parede do casco no local da lesão. Essa última condição é referida
como falso quarto.
Uma fenda no tecido córneo formada pela coroa é o sinal mais óbvio. A
claudicação normalmente não é um problema. Se for estabelecida uma infecção,
pode ocorrer uma descarga purulenta ou sanguinolenta, acompanhada pelos sinais
de inflamação e claudicação. A terapia envolve a cirurgia e a ferração corretiva para
alterar a distribuição do peso no casco. O crescimento de tecido córneo novo pode
ser encorajado pela aplicação de um agente contra-irritante (por exemplo, tintura de
iodo) sobre a coroa na região da fenda (esta medida deve ser utilizada com cuidado
em cavalos de pelame levemente colorido ou branco). Se a fenda tornar-se
infectada, um curativo anti-séptico pode ser indicado. Técnicas de reparação que
usam acrílico ou fibra de vidro podem ter sucesso se aplicadas adequada e
cuidadosamente. A ressecção completa da parede do casco (caudal à fenda),
tomando-se cuidado para não danificar a coroa, é o tratamento freqüentemente
escolhido nos casos precoces e graves de fissura na região dos quartos ou quando
o esporão é formado. O casco é então ligado por uma bandagem até que a nova
formação córnea seja evidente. O animal é ferrado com uma ferradura de três
quartos ou de três quartos com barra para aliviar qualquer pressão sobre a porção
despida da parede.

Inflamação eczematosa dos cascos


(Calcanhar de graxa, Dermatite verrucosa)
É uma dermatite seborréica crônica caracterizada por hipertrofia e exsudação na
superfície caudal da quartela e boleto. Freqüentemente está associada com a
higiene precária do estábulo, mas nenhuma causa específica é conhecida. Os
cavalos pesados são particularmente suscetíveis e os membros posteriores são
mais comumente afetados. Os cavalos de raças padrão são freqüentemente
afetados na primavera quando as pistas estão úmidas. O uso comum de pedra
calcária nas pistas de corrida tem sido associado à condição.
A doença pode evoluir sem sinais por algum tempo, porque é mascarada pela
“penugem” da porção da quartela. A pele é pruriginosa, sensível e edematosa
durante o estágio agudo; mais tarde, ela torna-se espessada e a maior parte do pêlo
é perdida. Restam somente os pêlos mais curtos, e estes posicionam-se eretos. A
superfície da pele é macia e há um exsudato acinzentado de odor fétido. A condição
tende a tornar-se crônica e surge um crescimento vegetativo de granulomas. A
Claudicação em Eqüinos 621

claudicação pode ou não estar presente; ela pode ser grave e associada à celulite
generalizada do membro. Como a condição é progressiva, há espessamento e
endurecimento da pele na região afetada, com rápida hipertrofia do tecido fibroso
subcutâneo.
O tratamento persistente e agressivo normalmente é bem-sucedido. Ele consiste
em remoção do pêlo, lavagem regular e limpeza com água aquecida e sabão para
remoção do exsudato, secagem e aplicação de um curativo adstringente. Se
surgirem lesões granulomatosas, elas deverão ser cauterizadas. A celulite requer
antibioticoterapia sistêmica e profilaxia contra o tétano.

Separação da parede do casco de sua matriz


(Depressão da parede, Distrofia ungular)
É uma condição que afeta a parede do casco na região da pinça, caracterizada
pela perda de substância e alteração nas características do tecido córneo. Ela é a
seqüela mais freqüente para os casos crônicos leves de laminite. A superfície
externa da parede parece saudável, mas junto à superfície palmar do casco, a
superfície interna da parede é vista como “farinhenta”, e de fato pode haver uma
cavidade devido à perda de substância córnea. Percutindo-se o lado de fora da
parede na região da pinça, evidencia-se um som oco sobre a porção afetada. A
doença pode envolver somente uma pequena área ou quase toda a largura da
parede na região da pinça. A claudicação é infreqüente, mas acompanha a infecção
ocasional e a abscedação.
O prognóstico normalmente é bom. A porção afetada deve ser limpa e enfaixada
temporariamente com alcatrão e estopa. Na ausência de claudicação, a ferração e
o trabalho podem continuar. Se a condição for extensa, pode ser necessário
remover a parede externa sobre a área afetada.

Talões cortados
É um grave desequilíbrio adquirido da pata com assimetria dos talões. O
desequilíbrio resulta no contato de um lado dos talões com o solo antes do que seu
par, originando uma força cortante nos bulbos do talão, crescimento assimétrico da
pinça e grave contração dos talões. Há sensibilidade crônica dos talões, indistinguí-
vel daquela que surge na doença navicular. A pata assimétrica deve ser observada
cuidadosamente de todos os ângulos, e a marcha observada em passadas lentas
para detectar o apoio do peso anormal e o estresse cortante na região do sulco
central. Fendas do casco, fissuras profundas entre os bulbos do talão e podridão da
ranilha freqüentemente acompanham o problema. Pode haver um diagnóstico
concomitante de doença navicular.
São requeridos o corte e a ferração corretivos para restaurar o alinhamento
apropriado dos talões e o equilíbrio da pata. É usada uma ferradura com barra, com
uma barra diagonal de reforço para suportar o quarto e o talão afetados. São
necessários vários ajustes da ferradura antes de a melhora ser evidente. O
prognóstico é bom em casos sem complicações, se as medidas corretivas forem
aplicadas consistentemente até que ocorra novo crescimento do casco.

Ossificação da cartilagem alar


É uma ossificação das cartilagens alares da terceira falange. A doença é comum
nas patas dianteiras de cavalos pesados que trabalham em superfícies duras.
Também é freqüente em animais de caça e de salto, mas é rara nos puros-sangues
de corrida. Concussões repetidas nos quartos dos cascos são provavelmente a
causa essencial, mas pode haver uma predisposição hereditária. A condição
Claudicação em Eqüinos 622

também é promovida pela ferração imperfeita que inibe o movimento fisiológico


normal dos quartos. Alguns casos surgem a partir de trauma direto.
Perda de flexibilidade à palpação digital de uma ou ambas as cartilagens alares
é um sinal indicativo de ossificação. Já que a rigidez da cartilagem é acompanhada
pela ossificação, as cartilagens podem, em alguns casos, projetar-se proeminente-
mente acima da coroa. A claudicação pode ser um sinal do problema, dependendo
do estágio de ossificação, quantidade de concussões sustentadas pelas patas e das
características do terreno. A claudicação é mais provável quando a ossificação está
associada a uma pata estreita ou contraída ou quando é acompanhada por outra
condição, como a doença navicular. A andadura pode apresentar um passo encur-
tado e conduzindo-se o animal através de um plano inclinado pode-se exacerbar a
sensibilidade. As mulas têm, freqüentemente, grandes ossificações, todavia rara-
mente apresentam claudicação.
A calcificação das cartilagens alares pode ser suspeitada após observação e
palpação, porém o exame radiográfico é essencial para a confirmação do diagnós-
tico. (A ossificação das cartilagens alares comumente ocorre sem sintomas de
claudicação.) Quando a claudicação está presente, é útil se fazer a ferração
corretiva para promover a expansão dos quartos e para proteger a pata de
concussões. Entalhar os cascos, juntamente com o uso de um contra-irritante (por
exemplo, tintura de iodo) na região coronária para promover o crescimento do casco,
também promove a expansão da parede.

Podridão da ranilha
É uma degeneração da ranilha com infecção bacteriana secundária que
começa nos sulcos colateral e central. A condição é resultado de manejo e
higiene inadequados, que permitem aos cavalos ficarem em condições úmidas
por períodos prolongados, e falhas na limpeza regular dos cascos. É mais
comum nas patas posteriores. O sulco afetado fica úmido e contém uma descarga
negra e espessa que exala um odor fétido característico. Estes sinais isolados
são suficientes para se fazer o diagnóstico.
O tratamento deve iniciar pelo fornecimento de um local seco e limpo. Deve-se
fazer a limpeza do casco com a remoção de todo o tecido macerado. Loções
adstringentes, utilizadas na limpeza diária do casco, podem ajudar na recuperação
após a remoção do tecido afetado. O uso de uma ferradura com barra, após o
processo da doença ter sido bloqueado, pode ajudar na regeneração da ranilha. O
prognóstico é normalmente favorável, mas se o cório da ranilha tiver sido danificado,
todo o tecido afetado da ranilha deve ser removido.

CONDIÇÕES DO BOLETO E DA QUARTELA


Fraturas da primeira e segunda falanges e sesamóides proximais
As fraturas da primeira falange não são incomuns em cavalos de corrida.
Podem ser pequenas fraturas em “lasca” ao longo da margem dorsal da superfície
articular proximal, fraturas longitudinais (quartela fendida) ou cominutivas. Outra
categoria (vista exclusivamente em cavalos de raças padrão) envolve fraturas do
tipo “lasca” ou de avulsão da face palmar ou plantar proximal da primeira falange
(fraturas de Birkeland).
Os sinais de fratura longitudinal envolvem claudicação de apoio aguda, logo após
o trabalho ou uma corrida. Inicialmente, pode haver pequeno ou nenhum aumento
de volume, mas há dor intensa à palpação ou flexão do boleto. A claudicação pode
ser menos pronunciada com uma fratura em lasca ou por avulsão, contudo a flexão
da articulação exacerba o problema.
Claudicação em Eqüinos 623

O diagnóstico é confirmado pela radiografia, embora muitas vistas oblíquas


possam ser necessárias para assegurar a visibilidade da linha de fratura, vista
inicialmente como uma fissura fina que pode estender-se do boleto ao córtex
distal.
As fraturas em lasca e de avulsão podem ser removidas pela artroscopia. As
fraturas longitudinais podem ser reparadas pela fixação interna usando-se ≥ 2
parafusos ósseos corticais pela técnica de compressão interfragmentária. O trata-
mento conservador de fraturas cominutivas graves envolve a imobilização com
molde de gesso/fibra de vidro por até 12 semanas. Problemas que podem surgir,
entretanto, são o alinhamento ruim no local da fratura e a artrite secundária.
As fraturas da segunda falange são similares àquelas da primeira falange, mas
não são tão comuns. O tratamento e prognóstico são similares.
As fraturas dos ossos sesamóides proximais são relativamente comuns. São
causadas pela superextensão e, freqüentemente, estão associadas a danos no
ligamento suspensor, como ocorre no membro anterior dos puros-sangues. O
sesamóide proximal lateral do membro posterior dos cavalos raças padrão pode ser
fraturado como um resultado de forças de torção induzidas pela ferração com uma
ferradura do tipo “trailer”. As fraturas podem ser apicais, mediais, basais ou múltiplas
e podem envolver um ou ambos os sesamóides. Os sinais clínicos incluem o
aumento da temperatura, dor e claudicação aguda, que é agravada pela flexão do
boleto. Há hemartrose e efusão sinovial da articulação do boleto. O diagnóstico é
confirmado radiograficamente. A pronta remoção cirúrgica de pequenos fragmentos
leva a um bom prognóstico. Os raças padrão respondem melhor que os puros-
sangues devido ao seu andar de duplo apoio. A perspectiva em grandes fraturas
basilares é desfavorável, qualquer que seja a via de abordagem cirúrgica empreen-
dida. A ruptura completa do aparelho suspensor, que inclui fraturas de ambos os
ossos sesamóides, é uma lesão catastrófica acompanhada pelo comprometimento
vascular da pata, embora alguns destes cavalos possam ser salvos para a
reprodução pela artrodese cirúrgica da articulação do boleto.

Exostose do boleto
(Ossículos, Periostite e artrite serosa da articulação do boleto)
É uma inflamação, normalmente bilateral, do periósteo na superfície dorsal da
epífise distal metacárpica principal e na cápsula associada à articulação do boleto.
A extremidade proximal da primeira falange pode também estar envolvida. Por isso,
esta condição constitui uma forma de periostite e artrite serosa que pode progredir
para uma doença articular degenerativa. A causa determinante é o esforço violento
e o trauma repetido do treinamento duro em animais jovens. Tem sido reconhecida
como um risco ocupacional dos puros-sangues jovens.
O animal afetado move-se com uma andadura curta e picada. A palpação e a
flexão da articulação do boleto produzem dor e o exame revela um aumento de
volume mole, quente e sensível na frente e, algumas vezes, na lateral da articulação
do boleto. A radiografia nos estágios iniciais pode não apresentar nenhuma
evidência da neoformação óssea, sendo estes casos chamados de “exostoses
verdes”. Mais tarde, a entesopatia na área de ligamento da cápsula articular do
boleto ao metacarpo principal e à primeira falange podem ser vistas. Isto é sucedido
pela progressiva neo-ossificação ou formação de esporão, o qual pode quebrar e
surgir como “esquírola articular”.
O repouso é muito importante e pode ser curativo para casos iniciais. A inflamação
pode ser aliviada pela aplicação de compressas frias por vários dias. Agentes
antiinflamatórios sistêmicos, tais como fenilbutazona, também podem ser usados.
Alguns preferem a injeção intra-articular de corticosteróide; entretanto, esta e outras
Claudicação em Eqüinos 624

formas de medicação antiinflamatória, se usadas juntamente aos contínuos treina-


mentos ou corridas, levam inevitavelmente à destruição das superfícies articulares.
O hialuronato de sódio intra-articular é um meio de tratamento útil que visa restabele-
cer a viscosidade sinovial normal. Isto também pode ser feito pela transferência de
líquido sinovial através da remoção de , 5mL de sinóvia de uma articulação normal
(por exemplo, tibiotársica) e sua injeção no boleto afetado.

Exostose interfalângea
É uma periostite ou osteoartrite que leva a exostoses, envolvendo a primeira ou
segunda falange. A condição pode resultar de deficiências de conformação, ferração
imprópria e concussões repetidas devido ao trabalho em solos duros. Pode se seguir
a trauma e infecção, especialmente em ferimentos provocados por arame de cerca.
Em cavalos leves, a tração violenta dos ligamentos e a inserção tendínea na região
da quartela são os mais freqüentes fatores causais. Ela pode ser uma parte da
síndrome de osteocondrose (ver pág. 673) em cavalos jovens de desenvolvimento
rápido.
Há uma aparência característica em forma de sino na região da quartela. A
claudicação decorrente da periostite é vista inicialmente. Uma vez que tenha
ocorrido proliferação óssea, a claudicação pode desaparecer, particularmente
se a superfície articular não estiver envolvida. Por outro lado, a claudicação
normalmente persiste se a superfície articular for envolvida e pode progredir para
anquilose.
O diagnóstico clínico desta exostose é baseado na visualização e palpação de
tecidos moles espessados e neoproliferação óssea na região da quartela. Em geral,
o grau de movimento articular está restrito e há dor na flexão forçada das superfícies
articulares envolvidas. O bloqueio nervoso regional identifica a quartela como o sítio
da dor. A radiografia confirma o diagnóstico.
O repouso completo é o mais importante requisito. O tratamento com aplicações
frias e adstringentes e a radioterapia em estágios iniciais podem ser benéficos. A
medicação antiinflamatória pode aliviar os sinais clínicos de claudicação. A artrode-
se cirúrgica da articulação da quartela é curativa e é usada com sucesso para
restituir o rendimento dos cavalos jovens com osteocondrose.

Sesamoidite
Os ossos sesamóides são mantidos em posição pelo ligamento suspensor
proximal e por uma série de ligamentos sesamóides distais. Devido ao grande
estresse sofrido pelo boleto durante o exercício rápido, pode ocorrer o rompimento
na inserção de alguns destes ligamentos, o que resulta na sesamoidite.
Embora os sinais clínicos sejam similares, são menos graves que aqueles
decorrentes da fratura dos sesamóides. Dependendo da extensão dos danos, pode
haver vários graus de claudicação e aumento de volume. A redução da velocidade
pode ser a única manifestação de claudicação. A dor e o calor podem ser evidentes
à palpação e à flexão da articulação do boleto. Evidências radiográficas da
sesamoidite incluem a neoproliferação óssea periosteal, e/ou lesões osteolíticas,
particularmente na superfície abaxial do sesamóide afetado e linhas radiolucentes
(similares às linhas de fratura, exceto por não haver separação de fragmento)
correndo obliquamente através do osso. Essas linhas são proeminentes canais
vasculares. Posicionamentos radiográficos oblíquos são essenciais para diagnós-
tico e avaliação acurados.
A despeito de uma variedade de regimes de tratamento, o prognóstico para
cavalos com sesamoidite reservado a ruim. Mesmo após 9 a 12 meses de repouso,
Claudicação em Eqüinos 625

uma alta proporção de cavalos pode claudicar novamente após 6 a 8 semanas do


recomeço dos treinamentos. O tratamento recomendado é a administração por 2 a
3 semanas de fenilbutazona. Pelo menos 6 meses de repouso são requeridos para
uma sesamoidite suave, e 9 a 12 meses para os casos graves.

Sinovite vilonodular
É uma inflamação da membrana sinovial da face dorsoproximal da articulação do
boleto dos membros anteriores. A causa é desconhecida. A idade dos animais
afetados é de 2 a 18 anos, com incidência um pouco maior em machos. Tem-se
registrado envolvimento bilateral. Os nódulos intra-articulares são normalmente
ligados por uma haste ampla à porção dorsal da bolsa dorsoproximal da articulação
do boleto. Os nódulos são firmes e branco-acinzentados e podem ser circunscritos
ou lobulados. Lesões ósseas erosivas estão tipicamente associadas com a massa e,
em alguns casos, podem estender-se para a erosão da superfície articular. Micros-
copicamente, as lesões consistem de um estroma denso e bem colagenizado,
circunscrito pelas células sinoviais. A vascularização é proeminente e são ocasional-
mente vistas alterações hialinas no estroma e metaplasia óssea.
O diagnóstico pode ser suspeitado à palpação e confirmado radiograficamente
e o tratamento é feito pela excisão cirúrgica da lesão. Massas menores são
amenizáveis à artroscopia. A radioterapia parece ajudar a prevenir recidivas após
a excisão cirúrgica.

Distensão da bolsa dos boletos


(Ovas)
Edemas, aumentos de volume cheios de líquidos ao redor das articulações dos
boletos (dos membros anteriores e/ou posteriores) que geralmente não são acom-
panhados por calor, dor ou claudicação, são denominados distensão da bolsa. São
tidos como associados a traumas e exercício pesado, mas a patogenia exata é
incerta. Embora normalmente benigna, a distensão deve ser observada com
suspeita na presença de claudicação. Alguns cavalos, particularmente animais
pesados, parecem ser mais propensos a este problema. O tratamento é difícil e na
ausência de claudicação desnecessário. O processo pode desaparecer espontane-
amente ou responder a períodos de repouso, bandagens e exercícios. A recidiva é
comum.

CONDIÇÕES DO CARPO
Canela dolorida
(Fratura em forma de pires)
É uma periostite na superfície cranial do osso metacárpico ou metatársico
principal. A condição é vista com maior freqüência nos membros anteriores de
puros-sangues jovens (2 anos) em treinamento e em campanha. É muito menos
freqüente em cavalos de raças padrão.
Esta condição é genericamente induzida por concussões em cavalos jovens,
cujos ossos não estão completamente condicionados. Acredita-se que as
microfraturas (isto é, fraturas de estresse) estejam envolvidas. Em alguns casos, ela
progride para uma fratura em forma de pires cortical ou mesmo fratura longitudinal
incompleta. Em casos pouco graves, a condição está associada somente à
formação de hematoma subperiostal e espessamento da face superficial do córtex.
Há edema doloroso e quente na superfície cranial do osso afetado. O cavalo fica
normalmente manco no início, seu passo é curto e a gravidade desta claudicação
aumenta com o exercício.
Claudicação em Eqüinos 626

O repouso do treinamento é importante até que toda sensibilidade e inflamação


tenham desaparecido. A inflamação aguda pode ser aliviada pela aplicação de
compressas frias. Se a condição estiver associada à fratura por estresse, contra-
irritantes e injeções locais de corticosteróides são contra-indicados. Em casos
selecionados, pode ser indicada a fixação por parafuso da fissura da fratura.

Higroma cárpico
É um aumento de volume proeminente, cheio de líquido na face dorsal do carpo
quando um trauma repetido causa uma bursite local (ver HIGROMA DO CODILHO E
JARRETE, pág. 564). Em alguns casos, desenvolve-se uma tenossinovite do exten-
sor carporradial ou extensor digital comum ou, ocasionalmente, uma sinovite da
articulação carporradial ou intercarpal, que são visualizadas indistintamente. O
animal geralmente não claudica, mas em casos graves, pode haver alguma restrição
na amplitude da flexão articular. O tratamento conservador de simples retirada de
fluido e injeção de corticosteróide é raramente eficaz; o aumento de volume retorna
rapidamente. É necessário abrir a lesão cirurgicamente, inserir um dreno por até 3
semanas e colocar uma bandagem compressiva no membro. Em algumas circuns-
tâncias, é necessário dissecar o revestimento bursal para prevenir recidivas
contínuas.

Carpite
(Dor na soldra)
É uma inflamação aguda ou crônica das cápsulas articulares e estruturas
associadas do carpo. Em casos crônicos, podem desenvolver-se exostoses
(entesopatia). A forma aguda é comum em puros-sangues em treinamento. A
condição é normalmente atribuída à concussão de treinamentos pesados, sobretu-
do em cavalos imaturos ou despreparados. A lesão da face dorsal do carpo é uma
causa comum, especialmente em animais de caça e saltadores. Alguns casos são
o resultado de fraturas em lasca não detectadas ou osteíte/esclerose de um dos
ossos cárpicos. Se a conformação for ruim, a condição pode surgir sem qualquer
história evidente de trauma ou lesão.
A claudicação inicial e aumento de volume do carpo podem consistir da distensão
da cápsula articular e de estruturas sinoviais relacionadas, ou ser um aumento de
volume verdadeiro de tecidos moles. Os casos crônicos podem desenvolver exosto-
ses extensas na porção distal do rádio ou nas superfícies dorsais de algum dos ossos
cárpicos, normalmente os ossos radiais ou o terceiro cárpico. O diagnóstico é normal-
mente simples; entretanto, é necessário ter em mente a possibilidade de uma fratura
cárpica de base. A radiografia, em todas as posições, deve ser um método de rotina
na avaliação destes casos. A vista tangencial (“sunrise”) é importante na detecção da
osteíte/esclerose, particularmente no terceiro osso cárpico. A artroscopia é utilizada
na avaliação da cartilagem articular quando há ausência de alterações ósseas.
O repouso é o melhor tratamento e o prognóstico para casos agudos é bom, se
for providenciada a exclusão do trabalho por parte do animal. A dor pode ser aliviada
pela aspiração do excesso de fluido da articulação e a injeção intra-articular de um
corticosteróide, mas o repouso adequado é essencial. Se necessário, este proce-
dimento pode ser repetido após 4 ou 5 dias. O ácido hialurônico intra-articular ou os
glicosaminoglicanos polissulfatados têm recebido ampla aceitação neste problema.
A presença de fraturas em lasca ou alterações ósseas degenerativas é uma
indicação para a avaliação artroscópica e cirurgia. O tratamento antiinflamatório,
combinado com o treinamento contínuo e corridas, acelera o processo degenerativo
na articulação. O prognóstico é baseado na eficácia do tratamento e no grau das
alterações ósseas.
Claudicação em Eqüinos 627

Fraturas dos ossos cárpicos


Muitas das fraturas dos ossos cárpicos são causadas pelos esforços do “tipo
transverso”; estes estão normalmente presentes nos finais das corridas, quando é
grande a possibilidade de uma superextensão máxima da articulação. Muitas fraturas
ocorrem na face dorsal da articulação cárpica e envolvem, particularmente, os ossos
radiais e terceiro cárpico. As fraturas em lasca ou em “placa” ocorrem, embora as
fraturas em lasca sejam predominantes na porção distal do rádio e no osso
carporradial, e as fraturas em placa são normalmente vistas no terceiro cárpico. Outra
fratura cárpica é a longitudinal do osso acessório cárpico.
As fraturas em lasca podem não produzir sinais óbvios até que o animal esfrie
após o trabalho ou a corrida, quando o aumento de volume do carpo, acompanha-
do de claudicação, pode ser perceptível. Fraturas em placa ou por compressão
dos ossos cárpicos normalmente resultam em aumento imediato de volume e
grave claudicação de apoio. Se a fratura for incompleta ou se o fragmento for
pequeno, o animal poderá caminhar relativamente sem problemas em 7 a 10 dias
após medidas antiinflamatórias simples, tais como o repouso e compressas frias
na região. Injeções intra-articulares de esteróides e administração de fenilbuta-
zona também podem aliviar os sinais inflamatórios. Entretanto, a claudicação
voltará após qualquer trabalho extenuante.
Um diagnóstico convencional requer exposições em 6 chapas para garantir a
observação da linha de fratura. As chapas dorsopalmar, látero-medial, oblíquas das
faces lateral e medial e látero-medial em flexão são vistas necessárias. Uma projeção
do tipo “skyline” é valiosa para delinear a extensão de uma fratura em placa.
A combinação do tratamento antiinflamatório intra-articular ou sistêmico e o
trabalho contínuo pode ser usada por razões econômicas, mas em geral, leva a
alterações degenerativas na articulação; portanto, a cirurgia artroscópica é o
tratamento de escolha. As fraturas em placa requerem o uso de parafusos de
fixação, com a técnica de compressão interfragmentária.
As fraturas do osso acessório do carpo devem ser tratadas conservadoramen-
te pela manutenção do repouso em estábulo por um longo período (8 a 12 meses)
para permitir uma união fibrosa no local da fratura. Por outro lado, o retorno à
atividade atlética plena é improvável. O prognóstico para fraturas do carpo está
diretamente relacionado à gravidade da lesão, à eficácia da cirurgia ou outro(s)
tratamento(s).

Fraturas dos ossos metacárpico e metatársico acessórios


Fraturas do segundo e quarto ossos metacárpico e metatársico não são inco-
muns. A causa pode ser decorrente de trauma direto, tal como interferência pelo
membro contralateral, mas as fraturas transversais seguem com maior freqüência
uma desmite suspensora e o tecido fibroso resultante que se desenvolve e encap-
sula a extremidade distal e livre do osso. O local usual destas fraturas é próximo à
extremidade distal, , 5cm da ponta. Imediatamente após a fratura ocorrer, os sinais
clínicos de inflamação aguda estão presentes, geralmente envolvendo o ligamento
suspensor. É perceptível uma claudicação de apoio, a qual pode retroceder após
alguns dias de repouso e retornar somente após o trabalho.
Fraturas antigas e crônicas causam uma claudicação de suporte à velocidade.
Ocorre o espessamento do ligamento suspensor sobre e acima do local da fratura.
A fratura normalmente apresenta uma considerável formação de calosidade sobre
o local, mas há pequena tendência à cicatrização.
O diagnóstico é confirmado por meio de radiografias oblíquas. A remoção cirúrgica
da ponta fraturada e da calosidade é o tratamento de escolha. O prognóstico é
baseado na gravidade da desmite suspensora associada que tem maior suporte no
prognóstico para o futuro desempenho que a própria fratura.
Claudicação em Eqüinos 628

Fratura do terceiro osso metacárpico


É uma fratura transversal no terço médio metacárpico que pode ocorrer por
trauma direto, normalmente por um coice. O estresse da corrida sobre uma
superfície dura resulta em fraturas oblíquas (isto é, condilares) longitudinais que
progridem do boleto, pelo eixo metacárpico, e algumas vezes também envolvem os
sesamóides proximais. Pequenos fragmentos ou fraturas incompletas do córtex
dorsal da região média metacárpica podem ocorrer como fraturas por estresse. O
diagnóstico é confirmado pela radiografia; pode ser difícil demonstrar a linha de
fratura, sendo necessária uma série de radiografias oblíquas.
Fraturas no terço médio metacárpico podem cicatrizar com um molde apropriado,
embora a imobilização prolongada possa ser necessária já que uniões tardias
ocorrem freqüentemente. A união incompleta e a formação de calosidade podem
prejudicar os tendões e ligamentos adjacentes. A fixação interna com placas de
compressão e parafusos é o tratamento de escolha. As fraturas condilares podem
ser tratadas conservadoramente pelo gesso, mas tais lesões articulares são melhor
manejadas pela fixação por parafuso, usando-se a compressão interfragmentária
se a osteoartrite for minimizada ou evitada. Fissuras de fraturas também podem
apresentar união tardia a menos que o parafuso cortical seja aplicado (ver também
CANELA DOLORIDA, pág. 625).

Exostose
(Desmite interóssea)
Esta condição envolve primariamente o ligamento interósseo entre o terceiro
e o segundo ossos metacárpicos (com menor freqüência os metatársicos). A
reação é uma periostite com a produção de novo osso (exostose) ao longo do
osso envolvido. Trauma, decorrente de concussão ou lesão, esforço decorrente de
treinamento excessivo (especialmente nos cavalos imaturos), falha na conforma-
ção ou ferração imprópria podem contribuir para o desenvolvimento de exosto-
ses.
A exostose envolve mais freqüentemente os ossos metacárpicos rudimentares
médios. É observada a claudicação somente quando as exostoses estão se
formando e é mais freqüentemente vista em cavalos jovens. A claudicação é mais
pronunciada após o animal ter sido trabalhado. Nos estágios iniciais não há edema
visível, mas a palpação profunda pode revelar um doloroso aumento de volume
subperiosteal local. Nos estágios finais surge um crescimento calcificado. Após a
calcificação, desaparece a claudicação, exceto em casos raros nos quais o
crescimento atinge o ligamento suspensor ou a articulação carpometacárpica.
Radiograficamente, é necessário diferenciar a exostose da fratura do metacarpo ou
metatarso acessórios.
É indicado o repouso completo. O uso local de esteróides atrasa o processo
de consolidação e está contra-indicado. Na clínica de puros-sangues, tem certa
tradição o uso de ponta de fogo no esparavão, com o intuito de acelerar a
ossificação do ligamento interósseo. Entretanto, na maioria dos casos, os
tratamentos irritativos são contra-indicados. Se a invasão da exostose vai de
encontro ao ligamento suspensor, então a remoção cirúrgica é algumas vezes
necessária.

CONDIÇÕES DA ESCÁPULA E DO CODILHO


Artrite da articulação da escápula
Inflamações das estruturas da articulação escapular são incomuns. A condição é
secundária a alterações na cápsula articular ou, mais freqüentemente, a alterações
Claudicação em Eqüinos 629

ósseas superficiais na articulação do úmero ou escápula, tais como a causadas pela


osteocondrite dissecante. Ocasionalmente, estão presentes fraturas que envolvem
as superfícies articulares. O trauma sobre a ponta da escápula é uma causa
freqüente. Em potros, as infecções da articulação de origem bacteriana devidas a
ferimentos perfurantes ou de origem hematogênica (piossepticemia) resultam numa
artrite purulenta.
Uma claudicação de impulso e apoio está presente em casos graves. Em casos
discretos, somente claudicação de impulso pode ser notada. A fase avançada está
encurtada, a pinça pode ser arrastada e a perna freqüentemente descreve um
movimento semicircular para evitar a flexão desta articulação. A extensão forçada
do membro, que puxa a escápula para a frente, freqüentemente causa dor.
Radiografias da articulação da escápula, preferivelmente feitas com o animal em
decúbito lateral, podem demonstrar as alterações artríticas.
O tratamento é freqüentemente ineficiente devido às graves alterações artríticas.
Injeções intra-articulares de um esteróide podem ser pouco benéficas. Esteróides
ou fenilbutazona sistêmicos podem aliviar os sinais de dor em alguns animais. O
ácido hialurônico pode ser digno de consideração, devido ao seu aparente benefício
em casos de doenças degenerativas em outras articulações.

Bursite bicipital
É uma inflamação da bolsa localizada entre o tendão do bíceps e o sulco bicipital
do úmero. A causa usual é o trauma direto da extremidade da escápula.
Essencialmente, a condição produz uma claudicação de impulso com o en-
curtamento da fase anterior. O animal pode tropeçar porque a pinça não está
suficientemente elevada para livrar-se do solo. Em casos graves, uma claudicação
de apoio pode também estar presente; o animal repousa o membro numa posição
semifletida característica. A extensão forçada do membro normalmente causa uma
reação de dor. A pressão digital profunda sobre a bolsa e o tendão do bíceps pode
causar uma resposta de dor. A ultra-sonografia pode demonstrar o excesso de
líquido e lesões associadas ao tendão do bíceps. As radiografias podem ser úteis
em casos crônicos nos quais a calcificação da bolsa é uma seqüela comum.
O repouso prolongado é indicado (> 6 meses), particularmente em casos agudos.
Injeções de ácido hialurônico ou esteróides dentro da da bolsa podem ter sucesso.
A fenilbutazona e a administração oral de esteróides também podem ser úteis. O
prognóstico é reservado.

Fraturas do codilho
As fraturas do codilho não são lesões ortopédicas incomuns em cavalos, sendo
mais freqüente a fratura da ulna. Elas ocorrem em qualquer idade como resultado
de coice ou queda. Em potros (< 12 meses), elas envolvem o disco fisário do
olecrânio. O surgimento da claudicação é súbito e há dor e aumento de volume no
codilho. A fratura é normalmente transversa, estendendo-se através da incisura
semilunar e é freqüentemente articular. O olecrânio está deslocado pela tração do
tendão de inserção do tríceps; o codilho está baixado e não pode ser estendido,
produzindo sinais similares àqueles da paralisia do nervo radial. O carpo e o boleto
estão flexionados com o apoio da pinça no solo. O diagnóstico deve ser confirmado
radiograficamente.
O tratamento pode ser conservador ou cirúrgico. Em fraturas não articulares e
não deslocadas, o entalamento da perna inteira e o repouso em estábulo têm
apresentado sucesso. Em outros tipos, a redução por abertura e fixação interna por
placa ou banda de tensão é o método de escolha. O prognóstico é favorável com o
tratamento apropriado.
Claudicação em Eqüinos 630

Fraturas da escápula
Fraturas da escápula distal (tuberosidade escapular) e úmero proximal (tubero-
sidade lateral) são as fraturas mais comuns. Elas normalmente resultam de quedas
ou coices. A claudicação é grave e de aparecimento súbito. Há, com freqüência,
muito aumento de volume local de tecidos moles e formação de hematomas. O
diagnóstico é confirmado radiograficamente. O tratamento conservador pelo repou-
so prolongado em estábulo freqüentemente resultará em melhora. O tratamento
cirúrgico pode ter sucesso em casos selecionados. Exceto nos casos tratados
cirurgicamente, ambos os tipos de fratura curam-se por união fibrosa. O envolvimen-
to articular leva a um prognóstico desfavorável.

Atrofia da escápula
(Deslocamento da escápula, Pescoço achatado)
É a atrofia dos músculos supra e infra-espinhoso nos cavalos. Esta atrofia é de
2 tipos: por desuso e neurogênica. A atrofia por desuso, que algumas vezes envolve
também o tríceps, segue qualquer lesão da perna ou pata que leve à diminuição
prolongada do uso do membro. A atrofia neurogênica é decorrente de dano ao nervo
supra-escapular, que inerva os músculos supra e infra-espinhoso. Pôneis de pólo
são ocasionalmente afetados devido às colisões durante competições.
Achados clínicos e diagnóstico – Se o trauma não é evidente, pode haver
ausência de dor e dificuldade em se detectar a claudicação até que ocorra a atrofia.
Se a lesão é evidente, há usualmente alguma dificuldade em estender-se a
escápula. Com a ocorrência de atrofia, há a formação de uma depressão de cada
lado da espinha da escápula, especialmente na área infra-espinhosa, resultando em
proeminência da espinha. Já que os tendões de inserção dos 2 músculos
afetados atuam como ligamentos colaterais laterais para a articulação umeros-
capular, a atrofia destes músculos leva a um afrouxamento desta articulação.
Segue-se a abdução da escápula que, em casos graves, é diagnosticada erronea-
mente como uma luxação. O membro afetado, quando avançado, descreve um
curso semicircular e, quando o peso é apoiado sobre a perna, a articulação da
escápula move-se lateralmente. Em repouso, junto com a abdução da escápula, há
aparentemente abdução das porções inferiores do membro.
Tratamento e prognóstico – O tratamento da atrofia por desuso consiste na
remoção da causa da deficiência de uso do membro. Para a atrofia neurogênica a
massagem com linimentos estimulantes ou com um vibrador elétrico pode ser
benéfica. Contrações musculares rítmicas pelo faradismo têm “mantido vivo o
músculo afetado”, até que ocorra a regeneração do nervo. Baseando-se no sucesso
em um limitado número de casos, a liberação cirúrgica do nervo supra-escapular da
compressão por tecido cicatricial, através de retirada de um fragmento da superfície
rostral da escápula, tem sido recomendada. Para obtenção de melhores resultados,
a cirurgia deve ser realizada antes que a instabilidade e mobilidade lateral da
articulação da paleta estejam avançadas.
O prognóstico da atrofia por desuso depende da remoção da causa primária. Na
atrofia neurogênica, o prognóstico é reservado. Em casos brandos, deve-se esperar
que o paciente se recupere em 6 a 8 semanas, mas quando o dano ao nervo for
grave, a recuperação espontânea pode levar muitos meses, se esta ocorrer
totalmente. Estes casos são candidatos à liberação cirúrgica do nervo. Se a lesão
ao nervo tiver sido muito grave, a recuperação é improvável.

CONDIÇÕES DO TARSO
Ver também FRATURAS DOS OSSOS METACÁRPICO E METATÁRSICO ACESSÓRIOS,
página 627.
Claudicação em Eqüinos 631

Hidrartrose társica
(Inflamação flutuante do jarrete)
Trata-se de uma sinovite crônica da articulação tibiotársica caracterizada pela
distensão da cápsula articular. Falhas na conformação podem levar ao en-
fraquecimento da articulação do jarrete e ao aumento da produção de sinóvia.
Nesses casos, ambos os membros são afetados. Os casos unilaterais parecem ser
mais uma seqüela de alguma entorse ou algum problema intra-articular de base,
como uma osteocondrose.
O cavalo normalmente não claudica, a menos que a condição seja complicada
por envolvimento ósseo. A distensão primária da cápsula articular está na superfície
dorsomedial do jarrete, enquanto um pequeno aumento de volume ocorre em cada
lado do aspecto caudal proximal. A hidrartrose társica sem complicações raramente
interfere na utilidade do animal, mas constitui uma marca feia e torna necessário o
exame radiográfico da articulação. O aparecimento e o desaparecimento espontâ-
neos da distensão podem ocorrer em animais desmamados e de 1 ano.
O excesso de líquido dentro da cápsula articular pode ser aspirado. Corticoste-
róides intra-articulares fornecem alívio variável e transitório. Se necessário, o
procedimento pode ser repetido 3 semanas mais tarde. A artroscopia deve ser feita
quando se suspeitar do envolvimento ostecondral. A condição tende a recidivar,
especialmente se uma das causas contribuintes for a deficiência de conformação.

Esparavão ósseo
É a osteoartrite ou osteíte que envolve a articulação do jarrete, normalmente nas
articulações intertársica distal e tarsometatársica e, ocasionalmente, na articulação
intertársica proximal. As lesões envolvem doença articular degenerativa, particular-
mente na face craniomedial do jarrete, com neoproliferação óssea periarticular,
levando eventualmente à anquilose. Embora a condição normalmente cause
claudicação, esta pode ser obscurecida se as lesões forem bilaterais. Entre as
teorias avançadas para explicar esta condição, pode-se citar falha na conformação
do jarrete, concussão excessiva e desequilíbrio mineral. Todas as raças podem ser
afetadas, mas ela é mais prevalente em animais de raças padrão e quarto de milha.
O cavalo claudicante tende a arrastar a pinça. O movimento anterior do casco é
encurtado e a ação do jarrete é diminuída. A claudicação às vezes é contínua desde
que as lesões ósseas envolvam as superfícies articulares. O talão torna-se alonga-
do. Os cavalos de raças padrão desenvolvem sensibilidade na musculatura glútea
(a chamada bursite trocantérica) secundária ao esparavão. Em casos avançados,
a proliferação óssea é freqüentemente visível na face craniomedial distal do jarrete
(isto é, sede do esparavão). Quando em pé, o cavalo pode repousar a pinça sobre
o solo com o talão levemente erguido. A claudicação intensa em geral desaparece
com o exercício e retorna após o cavalo ter repousado. O teste do esparavão
(movimentando-se o animal a trote após a flexão forçada da articulação afetada por
1 a 2min) pode ser uma ajuda importante para o diagnóstico, mas não é específico
para esta condição ou mesmo para esta articulação. No chamado esparavão oculto,
não há exostose visível ou radiográfica. A anestesia local das articulações társicas
individualmente é necessária para localizar o sítio exato da dor responsável pela
claudicação.
A doença é autolimitante, terminando com a anquilose espontânea da(s)
articulação(ões) afetada(s) e um retorno ao estado sadio. Nos estágios iniciais, a
injeção intra-articular de corticosteróides e/ou hialuronato de sódio pode ser
benéfica. A administração de drogas antiinflamatórias não esteróides (por exemplo,
fenilbutazona) pode eliminar ou reduzir os sinais clínicos. O trabalho do cavalo após
este tratamento visa promover a anquilose e a resolução da claudicação. A
Claudicação em Eqüinos 632

artrodese cirúrgica é outro meio de acelerar a anquilose da articulação afetada. A


tenotomia cuneana é comumente utilizada, mas possui valor questionável por si só.
O uso de pontas de fogo profundas é defendido por apressar o processo de
anquilose, mas é duvidoso que tenha algum efeito benéfico além de encorajar o
repouso. A ferração corretiva pelo levantamento dos talões e arredondamento da
pinça pode ser útil, mas não elimina a claudicação em si.

Alifate
Caracteriza-se por um espessamento ou encurvamento do ligamento társico
plantar devido a um esforço violento. Inflamação e espessamento deste ligamento
podem ocorrer após queda, escorregão, salto ou arrancada. É mais usual em cavalos
de raças padrão nos quais a conformação ruim do jarrete é um fator predisponente.
Há um espessamento sobre a superfície caudal do osso tarsofibular, , 10cm
abaixo da ponta do jarrete. Essa condição é facilmente verificada quando o animal
é observado de lado. Um alifate recentemente formado é associado com inflamação
aguda e claudicação. O cavalo em pé protege a perna com a elevação do talão. Em
casos crônicos, não há normalmente nenhuma claudicação ou dor.
Se a condição é decorrente de inflamação aguda, indicam-se compressas frias
e repouso. Pouco pode ser feito para sanar o problema quando esse é secundário
à deficiência de conformação. Felizmente, o problema parece ser autolimitante, sem
efeitos permanentes no desempenho do animal.

Deslocamento do tendão flexor superficial da ponta do jarrete


O dano à inserção medial do tendão flexor superficial, à medida que ele passa
sobre a tuberosidade calcânea, pode causar uma luxação lateral do tendão. A lesão
ocorre devido à flexão súbita do jarrete, e o tendão pode ocasionalmente deslizar
para a face medial do jarrete. No início, há claudicação do membro com aumento de
volume e aquecimento local. O tratamento envolve repouso ≥ 3 meses, possivel-
mente com a aplicação de um molde de gesso. A claudicação melhora, mas o animal
pode permanecer com um deslocamento permanente do tendão flexor e uma ação
espasmódica do jarrete. Geralmente não há dificuldade de movimentação durante
o exercício rápido ou o salto, mas o alinhamento dos movimentos pode estar
afetado. O tratamento cirúrgico tem sido relatado num número limitado de casos. O
resultado não tem tido muito sucesso, particularmente em animais grandes.

Fratura do tarso
As fraturas do jarrete ocorrem como resultado de traumatismos, ou como uma
complicação secundária de doença articular degenerativa. O jarrete é uma arti-
culação complexa que abrange 8 ossos. Como no carpo, uma vasta gama de locais
e tipos de fratura pode ocorrer. O diagnóstico específico pode depender de um
exame radiográfico cuidadoso.
Algumas das fraturas mais comuns envolvem lascas do osso tibiotársico e do
maléolo medial ou lateral da tíbia. Fraturas em placa (“slab”) do osso central társico
e terceiro osso társico também são encontradas, particularmente em cavalos de
raças padrão. Já que estas freqüentemente são muito pequenas e podem causar
claudicação, é importante o uso de anestesia local para identificar-se positivamente
o local da claudicação. Em muitas circunstâncias, um período de repouso (3 a 6
meses) é tudo o que é necessário para a recuperação completa, embora com
grandes fragmentos, possa ser mais indicada a remoção cirúrgica. A articulação
tibiotársica é tratável pelo exame e cirurgia artroscópicos, sendo as áreas acessíveis
mais envolvidas. As fraturas em placa são passíveis de fixação por parafusos “lag”
(compressão interfragmentária).
Claudicação em Eqüinos 633

Rupturas do tendão do membro posterior


A ruptura do tendão de Aquiles inteiro (ver também pág. 676) que envolve os
tendões gastrocnêmio e flexor superficial é rara. O jarrete pode baixar em direção
ao solo e tornar-se completamente incapaz de sustentar qualquer peso sobre o
membro. O prognóstico é grave.
É mais comum se observar a ruptura do músculo gastrocnêmio, que pode resultar
do estresse excessivo sobre o jarrete (por exemplo, paradas súbitas). Pode ser
bilateral e o peso pode ser apoiado, mas há flexão excessiva do jarrete, provocando
dificuldades no caminhar. Não há tratamento satisfatório. O entalamento do membro
e o tipoiamento do animal têm sido tentados, mas são normalmente ineficazes.
As lesões aos tendões extensores, o extensor digital longo e o lateral freqüente-
mente acompanham as lacerações dos membros posteriores. Se apenas um tendão
está envolvido, o prognóstico geralmente é bom. Se ambos os tendões extensores
forem seccionados, o cavalo pode ficar com uma deficiência no seu andar e
desempenho, mas pode ser utilizado em velocidade baixa ou para reprodução. O
tratamento conservativo leva à cicatrização da ferida, porém a reparação cirúrgica
e imobilização devem ser consideradas se ambos os tendões forem lesados e/ou
deseja-se bom desempenho.
A ruptura dos tendões flexores superficial e profundo algumas vezes ocorre como
lesão de corridas ou acompanha lacerações. Estas são lesões graves com claudi-
cação marcante e grau variável de superextensão do boleto e quartela. O tratamento
implica em reparo cirúrgico com talas ou gesso no membro, mas o prognóstico é ruim
quanto ao desempenho futuro.

Rupturas do terceiro músculo peroneal


As lesões ao terceiro músculo peroneal afetam o aparato do membro posterior
que mantém o animal em pé e interrompem a ação recíproca das articulações da
soldra e jarrete. O sinal diagnóstico mais característico é a habilidade para estender
o jarrete e flexionar a soldra simultaneamente. O cavalo claudica, mas normalmente
é capaz de sustentar o peso sobre o membro. O membro posterior afetado
freqüentemente apresenta-se trêmulo quando é forçado para a frente. O tratamento
conservador é indicado e envolve um período prolongado de repouso (normalmente
4 meses); o prognóstico é favorável.
Mal das ancas
É uma doença mioclônica, de um ou ambos os membros posteriores, caracteri-
zada por superflexão espasmódica da articulação. A etiologia é desconhecida,
contudo têm sido identificadas lesões de uma neuropatia periférica nos nervos
ciático, peroneal e tibial. Formas graves da condição têm sido atribuídas ao latirismo
(envenenamento por ervilha doce) nos EUA e, possivelmente, à intoxicação por
“dente-de-leão” na Austrália. Cavalos de qualquer raça podem ser afetados, mas a
doença é rara em potros.
São observados todos os graus de hiperflexão, da suave elevação e apoio
espasmódico do pé, até o caso extremo em que o pé é elevado abruptamente até
tocar o abdome e, então, é lançado violentamente contra o solo. Em casos graves,
há atrofia dos músculos laterais da coxa. No mal das ancas australiano e no
latirismo, a condição pode ser progressiva e a anormalidade da andadura tão grave
que torna a eutanásia necessária.
Mal das ancas leve pode ser intermitente. Os sinais são mais evidentes quando
o cavalo é virado de forma abrupta ou forçado a andar para trás. Em alguns casos,
a condição é vista somente nos primeiros passos após o cavalo ter saído do
estábulo. Freqüentemente os sinais são menos intensos ou até mesmo ausentes
Claudicação em Eqüinos 634

durante o tempo quente. Embora o mal das ancas seja visto como uma situação não
saudável, ele não atrapalha materialmente a capacidade do cavalo para o trabalho,
exceto nos casos graves, nos quais as concussões constantes levam a complica-
ções secundárias. A condição pode também tornar o animal incapaz para os esportes
eqüestres (por exemplo, adestramento).
O diagnóstico é baseado nos sinais clínicos, mas pode ser confirmado pela
eletromiografia. Se houver dúvida, o animal deve ser observado enquanto caminha
para trás no estábulo, após exercício pesado de 1 ou 2 dias. O harpejamento falso
surge, algumas vezes, como resultado de alguma irritação temporária nas partes
inferiores da área da quartela ou mesmo de uma lesão dolorosa na pata. Os casos
ocasionais de fixação ascendente momentânea da patela podem exibir uma
andadura semelhante à do mal das ancas.
Quando se suspeita de intoxicação, a remoção do animal para outra área pode ser
todo o tratamento necessário. Muitos desses casos podem aparentemente se resta-
belecer de forma espontânea. Em casos crônicos, os melhores resultados têm sido
obtidos pela tenectomia do tendão extensor digital lateral, incluindo a remoção de
uma porção do músculo. A melhora pode ainda não ser evidente por volta de 2 a 3
semanas após a cirurgia. O prognóstico após a cirurgia deve ser reservado, porque
nem todos os casos respondem. Isto não é surpresa, uma vez que se trata de um
axonopatia distal. Outros métodos de tratamento incluem altas doses de tiamina e
fenitoína.

Distensão da bainha társica


É uma distensão da bainha társica do tendão flexor digital profundo, pouco acima
do jarrete. É caracterizada por um aumento plantar visível de volume líquido nas
regiões proximais lateral e medial da articulação tibiotársica, que a distingue de um
esparavão. É normalmente unilateral e varia de tamanho. A lesão é referida como
uma tenossinovite de origem traumática, mas pode ser associada a qualquer
resposta inflamatória, dor ou claudicação detectáveis. Ela constitui, essencialmen-
te, uma marca e sua importância clínica é fundamental em cavalos de exposição. O
tratamento é feito pela retirada do líquido e injeção de um corticosteróide de longa
ação ou ácido hialurônico. Este pode precisar ser repetido em algumas ocasiões até
que o aumento de volume não reapareça. A radioterapia também ajuda na redução
da propriedade secretória da bainha tendínea.

CONDIÇÕES DA SOLDRA
Fraturas da soldra
As fraturas graves da articulação da soldra, que envolvem o fêmur distal ou a tíbia
proximal, são incomuns. Os danos associados à articulação femorotibial, ligamen-
tos e meniscos e o marcante aumento de volume dos tecidos moles fazem com que
o tratamento em cavalos adultos seja difícil ou impossível.
As fraturas da patela normalmente causam claudicação e aumento de volume
muito menos graves. A radiografia é necessária para se confirmar o diagnóstico. As
fraturas da patela podem responder ao tratamento conservador ou, se envolver um
grande fragmento ósseo, pode requerer reparo cirúrgico. Fraturas da crista da tíbia
também podem ocorrer ocasionalmente e requerem reparo cirúrgico.

Gonite
É uma inflamação da soldra que leva à doença degenerativa articular. Esta
articulação é complexa e a condição pode ser precipitada por causas múltiplas:
osteocondrose, fixação ascendente persistente da patela, lesões aos ligamentos
Claudicação em Eqüinos 635

colaterais lateral ou medial da articulação, lesões aos ligamentos cruzados ou ao


menisco, erosão da cartilagem articular ou infecção bacteriana da articulação por
um ferimento perfurante ou de origem hematogênica (por exemplo, piossepticemia).
A gravidade dos sinais é variável, dependendo da causa e da extensão das
alterações patológicas. A cápsula femoropatelar distendida é vista logo abaixo da
patela.
É perceptível uma claudicação de impulso como um encurtamento da fase
anterior do passo. Em repouso, o boleto é flexionado e apenas a pinça toca o solo.
Em casos moderadamente graves, são notadas claudicações de apoio e de impulso.
Em casos graves, a perna pode ser transportada em posição flexionada. Pode-se
notar uma crepitação se houver a ruptura de meniscos, ligamentos cruzados e
ligamentos colaterais. Radiografias da articulação são importantes para a confirma-
ção do diagnóstico de envolvimento osteocondral, enquanto a ultra-sonografia é
valiosa para avaliação dos ligamentos, meniscos e tecidos moles.
Um período prolongado de repouso é indicado. Podem ser usadas repetidas
injeções intra-articulares de esteróides ou ácido hialurônico. Em casos menos
graves, a fenilbutazona e esteróides sistêmicos podem ser usados para aliviar a
claudicação. Aqueles casos decorrentes da ruptura dos ligamentos ou danos aos
meniscos raramente respondem satisfatoriamente, progredindo quase sempre para
uma artrite secundária. O prognóstico é desfavorável se a condição é crônica ou se
lesões graves à superfície articular, ligamentos ou meniscos tiverem ocorrido.

Luxação patelar
O deslocamento verdadeiro da patela é incomum nos cavalos (ver também pág.
675). Quando ele ocorre é normalmente uma lesão séria, e a luxação patelar é logo
aparente. Em algumas raças, ocorre uma forma congênita de luxação lateral similar
àquela vista em pequenos cães. O problema mais freqüente que envolve a patela
é a fixação ascendente ou aprisionamento do ligamento patelar medial sobre a
porção proximal da crista troclear medial do fêmur. Em algumas raças de pôneis,
pode haver uma predisposição hereditária para a condição, mas ela também é vista
em animais imaturos com fraco desenvolvimento muscular, principalmente da coxa.
Pode ser uni ou bilateral. Os sinais clássicos são os de um “travamento” intermitente
do membro em extensão, seguido por um súbito movimento abrupto ou hiperflexão
quando o ligamento patelar se liberta da crista troclear medial. Os sinais são mais
freqüentemente vistos após um período de imobilidade (por exemplo, passada uma
noite no estábulo ou após uma viagem em reboque). Entretanto, os sinais clínicos
são freqüentemente muito menos dramáticos, o que torna o diagnóstico difícil. Pode
simplesmente haver uma falha de impulsão do membro posterior, associada a uma
ação patelar abrupta.
Em muitos casos pode haver cura, apenas com uma melhora geral do estado
e aumento do tono muscular do quarto traseiro. Em casos mais graves e persistentes,
é indicada a desmotomia do ligamento patelar medial. A desmotomia foi comumente
empregada no passado, porém atualmente está em descrédito. Acredita-se que após
a cirurgia ocorra uma fragmentação da extremidade distal da patela e osteocondrose,
particularmente quando o exercício pós-operatório é iniciado precocemente. Quando
a cirurgia é realizada, o repouso deve ser suficiente (por exemplo, 4 a 6 semanas) para
permitir cicatrização completa antes de se recomeçar o treinamento.

Cisto ósseo subcondral


(Lesão semelhante ao cisto ósseo)
Esta condição envolve grandes estruturas semelhantes a cistos radiolucentes
que podem ocorrer em vários locais do corpo, mas particularmente na soldra. Sua
Claudicação em Eqüinos 636

patogenia não está completamente compreendida, mas pode surgir após trauma-
tismo na cartilagem articular ou como resultado de uma lesão de osteocondrite.
Parece surgir no ponto de sustentação de peso; os locais mais comuns são o côndilo
medial do fêmur, a terceira falange, a escápula, o boleto e o carpo.
Na soldra, os cistos são freqüentemente vistos em puros-sangues jovens (1 a 2
anos); em geral, os sinais de claudicação são inicialmente notados no começo da
doma ou do treinamento. Embora a distensão articular femoropatelar seja caracte-
rística, estas lesões císticas podem causar claudicações muito graves sem disten-
são articular ou sinais palpáveis de dor, que são facilmente diagnosticadas por meio
de radiografias. Alguns cavalos respondem a um período de repouso de 4 a 6 meses
e melhoram quando medicados com fenilbutazona. Quando este tratamento conser-
vador falha, particularmente em animais mais velhos, é indicada a cirurgia. Esta
envolve a abertura e curetagem do revestimento dos cistos e tamponamento do
espaço com um enxerto ósseo autógeno. Devido aos resultados favoráveis, alguns
recomendam a cirurgia antes do tratamento mais conservador. Tanto a artrotomia
quanto a artroscopia são utilizadas.

CONDIÇÕES COXOFEMORAIS
Coxite
(Osteoartrite coxofemoral)
É a inflamação da articulação coxofemoral que leva à osteoartrite. Muitos casos
são de origem traumática, ocorrendo secundariamente a quedas ou estando em
recumbência no estábulo; entretanto a ruptura da borda do acetábulo ou fraturas
através deste, e a localização de uma infecção sistêmica, particularmente a pios-
septicemia em animais jovens, têm ocorrido.
São notadas claudicações de apoio e de impulso. Em casos graves, a perna pode
ser arrastada. Em casos menos graves, a marcha é ondulante, isto é, o quarto
afetado é elevado quando o peso é deslocado sobre a perna. O membro é avançado
de modo semicircular, com a fase anterior do passo encurtada. A pinça pode estar
gasta por causa do arrastamento. O animal freqüentemente pára com a perna
parcialmente flexionada, a soldra volta-se para fora e a ponta do jarrete volta-se para
dentro. Em casos crônicos, ocorre a atrofia dos músculos do quarto. A palpação retal
pode revelar um aumento de volume sobre o acetábulo, particularmente se tiver
ocorrido uma fratura através dele. A radiografia da articulação pode confirmar o
diagnóstico.
O prognóstico é pobre, indica-se repouso e, em casos leves, esteróides intra-
articulares podem aliviar a claudicação temporariamente. A fenilbutazona é útil,
porém muitos casos são excessivamente dolorosos para que a droga possa ter ação
benéfica.

Deslocamento das ancas


O deslocamento desta articulação pode ocorrer em associação à ruptura do
ligamento redondo, ligamento acessório e cápsula articular. Este tipo de lesão
ocorre secundariamente ao traumatismo, mas é um tanto incomum. Fraturas da
borda acetabular dorsal freqüentemente acompanham o deslocamento. O desloca-
mento, com separação dorsal da cabeça do fêmur, é acompanhado pela fixação
proximal da patela.
Na ruptura do ligamento redondo da articulação coxofemoral, há um aparência
típica dos membros posteriores, em que a soldra e a pinça se viram para fora e o
jarrete para dentro. O deslocamento completo da articulação coxofemoral não
ocorre sempre, porém, quando ocorre, há um efeito marcante sobre o andar, com
Claudicação em Eqüinos 637

relutância para suportar peso. O fêmur está virado para fora e o trocanter maior está
mais proeminente do que de costume.
A recolocação da articulação coxofemoral pode ser tentada sob anestesia geral,
mas os resultados a longo prazo são usualmente ruins.

Fratura da pelve
A fratura da pelve pode ocorrer em qualquer idade, mas é mais prevalente nos
cavalos de 6 meses a 2 anos de idade. Quase todas as partes da cintura pélvica
podem ser envolvidas. O local e a extensão dos tecidos moles danificados podem
afetar o último prognóstico. Há aparecimento súbito de claudicação do membro
posterior com dor considerável. Inicialmente, pode ser difícil observar a crepita-
ção. Geralmente é possível confirmar-se uma fratura pélvica pelo exame retal,
especialmente se os fragmentos são deslocados. Se a claudicação não for muito
grave, mas houver suspeita de uma fratura, é melhor repousar o animal por 4 a
6 semanas antes de administrar um anestésico geral para se efetuar o exame
radiográfico.
Em casos mais crônicos, a claudicação pode estar associada à atrofia dos
músculos glúteos. As radiografias podem demonstrar o local e auxiliar no prognóstico.
Fraturas da tuberosidade da coxa, asa do ílio, tuberosidade isquiática e diáfise do
ísquio trazem um prognóstico esperançoso, particularmente em animais jovens.
Repouso de 9 a 12 meses é, em geral, o único tratamento necessário. Fraturas do
acetábulo, diáfise do ílio e púbis têm um prognóstico muito mais reservado.

Bursite trocantérica
É uma inflamação do tendão do músculo glúteo médio da bolsa, entre este tendão
e o trocanter maior, ou da cartilagem do trocanter maior. Na maioria das vezes, esta
condição é encontrada em cavalos de raças padrão, nos quais a bursite e a miosite
glútea são secundárias a problema no jarrete.
O peso é apoiado sobre a parede medial da pata, de tal forma que está é mais
gasta do que a parede lateral. O passo do membro afetado está encurtado e a perna
está virada para dentro. O cavalo tende a deslocar o peso dos quartos traseiros para
o lado sadio. Em casos crônicos, os músculos entre os ângulos interno e externo do
ílio estão atrofiados, dando à anca uma aparência plana. A dor é evidente quando
se faz pressão sobre o trocanter maior.
Se a inflamação é aguda, o animal deve permanecer em repouso e receber
compressas quentes sobre a área afetada. Injeções de corticosteróides dentro da
bolsa podem aliviar a inflamação temporariamente. Em casos crônicos, a injeção de
1mL de solução de Lugol a 5%, diluída em partes iguais de água destilada dentro
ou ao redor da bolsa, traz bons resultados como um contra-irritante.

CONDIÇÕES DO DORSO
Fraturas
Fraturas múltiplas dos ápices dos processos espinhosos dorsais de T4-10 são,
algumas vezes, observadas em cavalos jovens que tenham escorregado ou caído
de costas. As pontas dos ápices e os centros de ossificação são fraturados e
deslocados lateralmente. Após a dor inicial e a reação local terem diminuído, estes
animais têm uma recuperação satisfatória. Em geral, não há efeito permanente no
desempenho do animal, mas um aumento persistente de volume sobre a cernelha
pode requerer uma sela especial. Ocasionalmente, outras fraturas de processos
espinhosos individuais ocorrem e sua presença pode ser confirmada pela radiogra-
fia. Nestes casos, os sinais clínicos são variáveis.
Claudicação em Eqüinos 638

Fraturas dos corpos vertebrais são mais sérias. Há, freqüentemente, uma
história de queda feia que se assemelha a um salto mortal e resulta numa
paraplegia completa ou parcial, decorrente de danos à medula espinhal. O
prognóstico é grave.

Distensões de músculos e ligamentos


Ver também MIOPATIAS, página 659.
Danos aos tecidos moles são, indubitavelmente, as causas mais comuns das
lesões dorsais no cavalo. Estes, na maioria das vezes, envolvem o complexo de
músculos longos dorsais cuja ação é estender (dorsiflexão) e flexionar lateral-
mente a espinha. A distensão de todos ou parte dos músculos longos, em geral,
ocorre durante o exercício de montaria e os sinais clínicos estão associados à
alteração do desempenho e dor lombar de aparecimento agudo. Os principais
locais de danos são as regiões dorsocaudal e lombocranial (isto é, em frente e
atrás da área da sela). A maioria destas lesões responde a um período de repouso
e fisioterapia, embora possam ser necessárias várias semanas para uma recupe-
ração completa.
Outro local extremamente comum de danos aos tecidos moles é o chamado
ligamento supra-espinhoso, que ocorre abaixo da linha média do dorso e está
aderido aos ápices dos processos espinhosos torácicos e lombares. É consti-
tuído de múltiplas inserções tendíneas de várias partes do complexo longo-
dorsal e está, portanto, sujeito às mesmas distensões que os músculos. Os
sinais clínicos normalmente persistem e, neste caso, as chances de recuperação
completa, em geral, não são tão boas quanto as das distensões musculares sem
complicação.
Há considerável controvérsia sobre o diagnóstico e tratamento dos problemas do
dorso dos cavalos. Muito crédito é dado ao valor da fisioterapia, particularmente a
manipulação quiroprática e osteopática, mas não há relatos substanciais de sua
eficácia.

Espondilose ossificante
São lesões espondilíticas, que afetam os corpos vertebrais, do meio para trás do
tórax, pouco comuns em animais em serviço. Entretanto, quando elas ocorrem,
provocam sérios efeitos clínicos e pouco pode ser feito no que diz respeito a um
tratamento permanente para manter o animal em trabalho.
Lesões osteoartríticas dos processos transversos e articulares das vértebras
lombares são mais comuns, especialmente em cavalos idosos. Por outro lado, elas
parecem causar poucos inconvenientes para o animal, porque esta parte da espinha
é mantida particularmente rígida, mesmo quando o animal está saltando.

Encavalamento dos processos espinhosos dorsais


(“Síndrome kissing spines”)
Choques sobre os ápices da espinha dorsal, sob a área da sela, parecem
predispor alguns cavalos à dor lombar. Nestes casos, há pontos de pressão entre
as espinhas adjacentes encavaladas, demonstrados por uma reação periosteal
local, pequenos cistos ósseos e formação de pseudo-articulações. Lesões radiográ-
ficas deste tipo são vistas algumas vezes em animais que não sofrem de problemas
dorsais, embora haja uma baixa incidência e as lesões sejam menos graves. Um
diagnóstico auxiliar, usado nestas condições, é a injeção de um anestésico local
dentro do espaço interespinhoso afetado. Muitos casos respondem a um período de
repouso e fisioterapia, mas o tratamento em casos persistentes é a ressecção de um
ou mais ápices para aliviar a compressão da espinha.
Claudicação em Eqüinos 639

Distensão sacroilíaca
(Subluxação sacroilíaca, Distensão sacroilíaca, Artrose sacroilíaca, Saliência de
caçador)
A distensão aguda e grave dos ligamentos sacroilíacos está associada a uma
história de lesão e dor intensa na região pélvica ou sacroilíaca, freqüentemente com
claudicação marcante dos membros posteriores. A distensão sacroilíaca subaguda
ou crônica é uma lesão de baixo grau que causa uma sensibilidade dorsal típica. Ela
representa a cura incompleta ou recidiva de uma distensão aguda. Pode haver um
histórico de mau desempenho com uma claudicação intermitente e, freqüentemen-
te, falseante dos membros posteriores. Esta claudicação pode estar associada a
alguma restrição na ação dos membros posteriores e ao arrastamento da pinça de
um ou de ambos os cascos. Há, em geral, proeminência ou assimetria da tuberosi-
dade sacral. A palpação retal ajuda na identificação da crepitação ou alteração da
região sacroilíaca.
Esta síndrome é usual em cavalos de raças padrão e de salto e caça, e tem sido
confundida com problemas crônicos da soldra. Em geral há uma fraca musculação
da massa glútea e, quando esta é observada por trás, pode-se detectar certa
assimetria dos quartos. Isto pode ser causado pela inclinação ou rotação da pelve,
perda muscular em um dos quartos, ou ambos. A cauda pode ser mantida levemente
deslocada para o lado. Nos estágios iniciais a dor pode ser evidenciada quando é
aplicada pressão na linha média, em frente à tuberosidade coxal, normalmente
havendo relutância em ventrofletir o dorso. Se estes casos são diagnosticados
precocemente e o animal repousa tempo suficiente para a completa cicatrização dos
ligamentos danificados, ele normalmente pode recuperar-se dentro de 6 a 9 meses.
Entretanto, de raças padrão geralmente não competem bem. Casos crônicos
continuam a apresentar baixo desempenho a despeito do repouso e da medicação
antiinflamatória.

CONDIÇÕES DIVERSAS
Deformidades de flexão
(Tendões contraídos, Pata de mula, Emboletamento)
É uma síndrome de distúrbios do tendão flexor, associada a alterações posturais
e podais, claudicação e debilidade. Há causas congênitas e adquiridas. O
malposicionamento no útero, lesões teratogênicas (ver ARTROGRIPOSE, pág. 574) e
defeitos genéticos têm sido implicados ou comprovados como causadores de
contração dos membros em potros recém-nascidos. A dor crônica é a causa mais
comum da contratura adquirida dos tendões. A dor pode surgir de fisites, osteocon-
drose, osteoartrite ou ferimento dos tecidos moles e infecções e pode induzir a
retirada reflexa do membro, com o encurtamento das unidades musculotendíneas.
Os flexores são mais robustos que os extensores, então, o paciente anda sobre suas
pinças ou apóia-se sobre os boletos. Erros nutricionais referentes a problemas
associados ao crescimento ósseo (isto é, osteocondrose e fisite, ver anteriormente)
estão intimamente relacionados à síndrome e devem ser cuidados como uma parte
do tratamento (ver também, pág. 575).
Achados clínicos – Potros recém-nascidos exibem um vasto espectro de
envolvimento. Alguns não podem ficar em pé; outros tentam andar sobre o dorso
de seus boletos. Outros podem ficar em pé, mas apóiam-se sobre os boletos ou
carpos. Um potro pode melhorar espontaneamente, embora outro, aparentemente
normal ao nascimento, possa tornar-se progressivamente pior. Lactentes e desma-
mados de 3 a 12 meses de idade podem exibir um rápido ataque e passar a andar
sobre suas pinças com os talões desencostados do solo. Um ataque lento é carac-
Claudicação em Eqüinos 640

terizado por um casco “encastelado” pelo alongamento dos talões e concavamento


das pinças. Fisites são freqüentemente evidentes nestes animais. O envolvimento
de ambos os membros anteriores é regra, mas há tendência de maior comprome-
timento de um dos dois. Abscessos da pinça são uma complicação freqüente do
casco e alterações na locomoção são adicionadas à dor e à deformidade.
Os animais mais velhos (1 a 2 anos) comumente apóiam-se sobre as articula-
ções metacarpofalângeas, que estão aumentadas de volume e espessadas. Estes
animais têm os membros anteriores e posteriores verticalizados e retificados com
o envolvimento do tendão flexor e ligamento suspensor. Potros de 1 ano apresen-
tam-se em geral mais severamente afetados e com maior resistência ao tratamento
do que animais mais jovens. O diagnóstico específico do envolvimento do tendão
não é difícil se um exame completo e um julgamento cuidadoso forem efetuados. A
doença óssea, associada ou de base, ou a doença articular e o mau manejo
nutricional devem ser identificados e corrigidos.
Tratamento – Vários tipos de talas e moldes de gesso são usados em potros com
contratura tendínea. A extensão forçada do membro induz o reflexo miotático
inverso com relaxamento dos músculos flexores. Casos precoces em potros
lactentes e desmamados podem ser manejados de maneira conservadora com
correções nutricionais, aparamento apropriado do casco e analgesia. O tratamento
cirúrgico pode ser simples ou complexo, dependendo do grau de envolvimento. A
desmotomia do ligamento acessório do tendão flexor digital profundo (desmotomia
“check” inferior) é o procedimento mais usado e bem-sucedido e não interfere no
potencial futuro do animal, portanto, outros tipos de cirurgia, incluindo tenotomia e
alongamento do tendão, tendem a ter menor sucesso. Contratura da cápsula
articular, malformações de ligamento colateral e envolvimento ósseo são complica-
ções que ocorrem em casos avançados e que impedem um resultado de sucesso.
Mesmo quando a cirurgia é indicada, as correções nutricionais, o corte apropriado
do casco e a analgesia são procedimentos integrantes da recuperação. O prognós-
tico é razoável a bom para aqueles casos que são detectados precocemente e
manejados de forma apropriada.

Miopatia calcificante
(Miopatia fibrótica)
É uma condição incomum que ocorre principalmente em quartos de milha em
trabalho, como resultado de traumatismo aos músculos semimembranoso, semi-
tendíneo e bíceps femoral. Normalmente é unilateral e envolve fibrose progressiva
com aderências locais do músculo afetado que, eventualmente, se calcificam. A
forma de andar é característica; a fase anterior do passo é convulsiva e o pé é
lançado para trás a uma curta distância até ser recolocado sobre o solo. A ação
é apreciavelmente diferente daquelas do mal das ancas e da fixação da patela. O
endurecimento dos músculos também pode ser palpado em alguns casos. A
radiografia e a ultra-sonografia ajudam a estabelecer o grau de envolvimento. O
tratamento envolve uma cirurgia para incisar o ligamento medial do músculo
semitendíneo na região da soldra. Os resultados obtidos em um número limitado de
casos são encorajadores. De outra forma, o prognóstico é desfavorável.

Osteocondrose
(Osteocondrite dissecante [OCD], Discondroplasia)
É uma doença metabólica de maturação da cartilagem e de ossificação endo-
condral defeituosa, que resulta numa síndrome de defeitos ósseos e articulares (ver
também pág. 673). As causas incluem o crescimento acelerado, traumatismo à
cartilagem, desnutrição e desequilíbrios minerais, incluindo sinais de deficiências
Claudicação em Eqüinos 641

minerais e intoxicação por metais pesados em circunstâncias isoladas. Não é


comprovado o fator genético, mas parece haver uma tendência familiar entre
linhagens de crescimento rápido. Trauma à cartilagem de crescimento danifica os
capilares que estão brotando, o que impede a ossificação endocondral e leva à
deformidade física da cartilagem. Se a cartilagem metafisária-fisária estiver afetada,
o contorno ósseo e o crescimento longitudinal serão alterados (ver FISITE, adiante).
O envolvimento da cartilagem articular nas superfícies periféricas da articulação
leva a alterações regressivas nas margens das articulações, lesões dissecantes e
formação de retalhos (osteocondrite dissecante). Lesões centrais da articulação,
devidas ao efeito da sustentação do peso, envolvem a retenção focal da cartilagem
dentro do osso subcondral (ver CISTO Ó SSEO SUBCONDRAL, pág. 635). O envol-
vimento do esqueleto axial inclui as facetas articulares vertebrais, instabilidade
espinhal, danos à medula espinhal e, finalmente ataxia e déficits na propriocepção.
Achados clínicos – A síndrome varia dependendo da(s) estrutura(s)
cartilaginosa(s) envolvida(s). Muitos cavalos apresentam lesões múltiplas. Cavalos
jovens em crescimento são afetados, mas os cistos subcondrais ocasionais podem
não ser evidentes até 2 a 3 anos de idade. Os sinais iniciais são dor e deformidade.
Membros angulados ou deformidades de flexão sugerem a inclusão de osteocon-
drose em seus diagnósticos diferenciais. Da mesma maneira, a efusão sinovial das
articulações associada com graus variáveis de claudicação é indicativa de
defeitos da cartilagem articular. Qualquer osso ou articulação pode ser afetado,
mas as articulações tibiotársicas, femoropatelar, femorotibial, do codilho e da
escápula são pontos de predileção; as articulações metacarpofalângea e interfalân-
gea proximal também são freqüentemente afetadas. O envolvimento da articulação
da quartela resulta na exostose interfalângea (ver pág. 624) em pacientes mais
jovens do que seria esperado. As radiografias são essenciais. Devido às lesões
serem freqüentemente bilaterais, o membro contralateral deve ser radiografado
para comparação. As lesões da cartilagem articular não são comumente observa-
das em radiografias, portanto, a artroscopia está sendo cada vez mais importante
no diagnóstico e avaliação desta doença.
Tratamento – O tratamento é primariamente cirúrgico. Deformidades de flexão
e angulares do membro são passíveis de cirurgia com previsão de resultados
favoráveis nos casos propriamente selecionados. A osteocondrite dissecante tem
sido operada com sucesso nas articulações tibiotársicas, metacarpofalângea,
femoropatelar e na escápula dos cavalos. As técnicas artroscópicas freqüentemen-
te são usadas. Os cistos subcondrais da articulação femorotibial têm sido maneja-
dos com sucesso pela curetagem, usando-se ou não enxertos de osso esponjoso.
A doença na quartela pode ser manejada pela artrodese cirúrgica.
Em adição às considerações cirúrgicas, qualquer distúrbio nutricional deve ser
corrigido e qualquer elemento tóxico deve ser eliminado. A superalimentação com
alimentos ricos em energia é um erro comum. O exercício deve ser regulado de
acordo com o(s) local(is) e gravidade do envolvimento. O prognóstico é reservado
mas depende da idade do animal, natureza e localização da(s) lesão(ões), da
detecção e correção dos fatores predisponentes e da resposta do animal ao
tratamento.

Fisite
(Epifisite, Displasia da cartilagem fisária, Displasia do disco de crescimento)
A fisite envolve um aumento de volume ao redor do disco de crescimento de
certos ossos longos em animais jovens. Pode ser um componente da osteocondro-
se. As causas sugeridas incluem desnutrição, defeitos conformacionais, falhas no
crescimento do casco, compressão do disco de crescimento e toxicose. A hipótese
mais aceitável até agora parece ser a teoria da compressão. Por outro lado, as
Claudicação em Eqüinos 642

alterações observadas na fisite também ocorrem em animais clinicamente normais.


A condição é vista freqüentemente nos potros bem crescidos, rapidamente cresci-
dos e mais pesados durante os meses de verão, quando o solo está seco e duro, e
nas fazendas de criação onde a proporção cálcio:fósforo na dieta apresenta
desequilíbrio.
Esta condição ocorre em cavalos jovens e, envolve mais comumente as extre-
midades distais do rádio, tíbia, terceiro osso metatársico/metacárpico e face
proximal da primeira falange. A condição é caracterizada pelo aumento de volume
no nível do disco de crescimento, dando às articulações afetadas uma típica
aparência “cúbica”. As radiografias ajudam o clínico na sua avaliação. Microscopi-
camente, a cartilagem fisária aparece espremida e afinada e há neoformação óssea.
O tratamento consiste na redução da ingestão de alimento, para que o peso
corporal seja reduzido ou, pelo menos, o ritmo de crescimento; no exercício
confinado num cercado ou num pavilhão largo e ventilado, com uma superfície
macia (musgo de turfa, muitas camadas de palha, maravalhas ou areia); na
certificação de que as patas sejam cuidadosa e freqüentemente aparadas; e se
necessário, na correção da dieta. A proporção cálcio:fósforo deve ser ajustada para
1,6:1,0 e o conteúdo de proteína limitado a < 10% da matéria seca. Em termos
gerais, não devem ser fornecidos farelos. Por outro lado, fosfato dicálcico ou farinha
de osso (10 a 30g diários) devem ser adicionados à dieta. É indicada a suplemen-
tação de vitamina D via oral ou parenteral mas a dosagem deve ser monitorada
rigorosamente para prevenir a hipervitaminose D.
Como medida preventiva, os potros acima de 1 ano de idade, com excesso de
gordura ou muito pesados, devem ser observados cuidadosamente quanto a sinais
clínicos, especialmente quando o terreno está duro e seco. Quando estas condições
prevalecem, é sensato cortar parte da ração alimentar e restringir o exercício.

CLAUDICAÇÃO EM SUÍNOS
Os distúrbios locomotores estão se tornando comuns em suínos, provavelmente
devido à tendência a aumentar a produção confinando-os intensivamente, principal-
mente quando são utilizados pisos com frestas ou perfurados. A claudicação pode
resultar na falha em alcançar peso de mercado, rendimento reduzido e condenações
parciais ou totais da carcaça ao abate. Também podem ocorrer sérias perdas na
criação de reprodutores e a relação de seleção varrão/marrãs pode ser comprome-
tida. Distúrbios locomotores em porcas podem ser a grande causa de refugos.
Perdas adicionais surgem de: 1. custo de reposição; 2. aumento no número de
porcas necessárias para manter a produção; 3. aumento da mortalidade antes do
desmame, resultante da menor agilidade das porcas; e 4. fraco desempenho
reprodutivo devido à redução da média de parição das porcas do rebanho. Em
machos, já que os animais claudicantes são inábeis para a reprodução, as perdas
incluem: 1. custo adicional de reposição (de outro modo os varrões de boa saúde
seriam usados em excesso); 2. redução do tamanho da leitegada e taxa de
concepção; e 3. mais varrões têm de ser mantidos.
O sistema locomotor envolve músculos, ossos, articulações, tendões, ligamen-
tos e unhas, todos coordenados pelos sistemas nervosos central e periférico. A
disfunção de qualquer área pode resultar em claudicação. Somente as anormalida-
des comuns que afetam o sistema esquelético e patas serão detalhadas aqui, e
estas precisam ser diferenciadas das claudicações resultantes de anormalidades
neuromusculares.
Claudicação em Suínos 643

Sempre que um problema for encontrado, a história completa, incluindo morbi-


dade, faixa etária afetada, tipo de surgimento e progressão da claudicação e outros
sinais clínicos deve ser obtida. O fluxo dos animais, práticas de manejo e programas
de vacinação, também devem ser avaliados.

DOENÇAS DAS PATAS


Lesões e podridão das patas
O termo “podridão das patas” descreve fissuras na parede do casco (fissuras dos
quartos) que levam à laminite séptica. Estas lesões são vistas primariamente na
unha lateral dos membros anteriores e posteriores, particularmente nos últimos. As
fissuras originam-se na face volar da parede do casco e geralmente ocorrem nos
dois terços distais do casco. A podridão das patas pode também ocorrer em porcos
de todas as idades como resultado de infecção após a penetração da sola ou do
talão. Aproximadamente 15 a 20% dos suínos podem ser afetados durante 1 ano nas
fazendas “médias” e acima de 50% em criações-problema. Em porcos de peso de
mercado, até 85% podem ter evidências de lesões do casco, embora muitas não
sejam sérias. Erosões do talão, separações ao longo da linha branca, erosões da
sola e fissuras na parede do casco são as lesões mais comuns.
Animais de reprodução também podem ter elevada incidência de lesões podais.
“Falsas fissuras na parede do casco” (originadas na superfície volar), “bush foot”
(deformidades da pata resultantes de laminite séptica), ferimentos da sola ou talão
e hiperceratinização do talão, parecem ser as lesões mais freqüentemente asso-
ciadas a claudicação.
Patogenia – Populações mistas de cocos Gram-negativos, espiroquetas e
microrganismos filamentosos Gram-negativos têm sido encontradas; algumas
culturas têm produzido Fusobacterium necrophorum e Corynebacterium pyogenes.
O desenvolvimento de cavidades necróticas no cório e a invasão microbiana nas
estruturas subjacentes podem resultar em tenossinovite, osteomielite ou artrite
supurativa. Estes espaços podem migrar dorsalmente para dentro do cório e
comumente desenvolvem uma celulite com fístulas acima da banda coronária. As
unhas gravemente afetadas tornam-se alongadas e deformadas devido a uma
proliferação de tecido conjuntivo fibroso. Por outro lado, muitas infecções são
confinadas ao casco ou à área da articulação do boleto. Ocasionalmente, quando
a osteomielite da terceira falange está presente, as lesões da pata são a rota de
entrada para infecções sistêmicas e resultam em infecções localizadas nas outras
regiões do corpo. Os porcos alimentados no solo podem desenvolver a laminite
séptica causada por milho quebrado (quirera) que penetra na sola e migra dorsal-
mente. A laminite traumática pode surgir após trauma à parede do casco com ou sem
alterações superficiais deste. Nem todas as lesões do casco resultam em laminite
traumática ou séptica, então, deve-se tomar cuidado para determinar até que ponto
a lesão do casco é a causa de uma claudicação. Os fatores que seguem são
conhecidos por influenciar o desenvolvimento das lesões da pata.
Tamanho do casco e consistência do tecido córneo – Em neonatos, as unhas
mediais, particularmente do membro posterior, são mais comumente afetadas
devido ao afastamento lateral do membro durante a amamentação. Em grupos de
outras idades, as unhas laterais, particularmente as posteriores, são as mais
afetadas por várias razões: o dígito medial também é encurtado nos membros
posteriores e anteriores; a superfície volar do dígito medial também é mais
encurtada e estreita que a lateral; e a área da superfície volar do casco, junto ao
comprimento e ângulo da pinça, pode ser influenciada pela superfície do piso em que
o animal esteja estabulado. A composição do tecido córneo do casco pode
influenciar na incidência das lesões podais: mais cálcio é encontrado em tecido
Claudicação em Suínos 644

córneo danificado e o tecido córneo produzido pelo cório inflamado é mais poroso
e pouco resistente aos danos. Tecido córneo pigmentado parece conter mais
componentes minerais que o tecido córneo não pigmentado e a incidência das
lesões nas patas é mais alta no último, possivelmente porque ele é mais mole.
Superfície do piso – Animais estabulados sobre pisos artificiais desenvolvem
mais lesões podais. O piso ideal deve prover tração adequada, não ser abrasivo e
ser confortável para o animal se deitar, ser autolimpante ou de fácil limpeza, durável
e barato. Muitos pisos, embora satisfaçam alguns destes critérios, têm uma
deficiência importante; é difícil produzir uma superfície não abrasiva que não seja
escorregadia. O concreto tem sido usado em grande quantidade em todas as fases
de produção, na forma de pisos sólidos, parcialmente laminados, ou completamente
formados por lâminas de concreto. Infelizmente, as superfícies de concreto variam
tremendamente, primeiro devido às diferenças de composição, condições de
disposição e acabamento; segundo devido a fatores que precipitam o desgaste
excessivo do piso e dos cascos.
O concreto recentemente derramado ou “verde” pode produzir maior incidência
de lesões que superfícies amadurecidas. Acabamentos rugosos e pisos de concreto
sólido gasto, com agregados cortantes expostos, aumentam o risco de lesões na
pata e membro. O concreto laminado com bordas cortantes ou lascadas é mais
traumático para cascos e membros, quando comparado com as lâminas de bordas
arredondadas. Pisos parcialmente laminados causam menos lesões no casco do
que os completamente laminados. A largura das lâminas também influencia na
incidência de lesões nos suínos em crescimento e terminação: lâminas de concreto
de 20cm produzem menos lesões podais do que aquelas com 13cm.
Experimentos para se determinar o melhor traçado, modelo e composição das
lâminas para o piso da pocilga têm tido resultados equívocos. Pisos de madeira
podem produzir uma menor incidência de lesões podais do que os de concreto, mas
eles são menos duráveis. Ripas de plástico ou alumínio parecem predispor a lesões
mais graves de talão e sola, enquanto pisos de concreto ou laminares de aço
favorecem as fissuras na parede da pata. Painéis metálicos revestidos de plástico
são menos abrasivos, especialmente para os joelhos dos neonatos. Muitas das
críticas vistas anteriormente aplicam-se a várias formas de pisos de metal perfurado
ou trançado. Devem-se tomar muito cuidado com o acabamento, tamanho dos vãos
e o assentamento de tais pisos. Devem-se também levar em consideração a limpeza
e desinfecção destes pisos.
Nutrição – A nutrição é responsável por uma parte da incidência de podridão das
patas. Os suínos alimentados com soro de leite ou leite desnatado podem ter uma
alta incidência à podridão dos cascos, enquanto os alimentados com restos ou
lavagem são, provavelmente, menos suscetíveis. A suplementação com biotina,
200µg/kg em dietas não baseadas em milho, pode produzir uma redução na inci-
dência de lesões podais em porcas ou ajudar a prevenir seu desenvolvimento. Dietas
que contêm milho (amarelo) como base são consideradas possuidoras de índices
adequados de biotina, mas a suplementação ainda poderia provar ser benéfica.
Achados clínicos e diagnóstico – Uma claudicação que não suporta peso,
unilateral, que pode resultar de uma lesão de casco com subseqüente laminite ou de
uma laminite traumática sem nenhuma evidência de lesão do casco. O casco deve
ser limpo e palpado. A pressão digital pode ajudar na localização da área de dor.
Tratamento e controle – A terapia normalmente envolve o tratamento das
infecções secundárias. Agentes quimioterápicos tópicos, tais como pomada antibió-
tica, solução de formalina e sulfato de cobre, têm sido usados em surtos de podridão
das patas. Grandes doses intramusculares de penicilina procaína (6 milhões de UI)
são cogitados como efetivas. Pode ser benéfico colocar-se os animais num cercado
forrado, com cama ou livre de sujeira. As lesões da pata podem melhorar se os
Claudicação em Suínos 645

animais forem presos em gaiolas individuais. A amputação das unhas afetadas


cronicamente pode ser empreendida, mas o tratamento conservador com
adstringentes é tão ou mais efetivo que isso.
A medida de controle mais importante é a provisão de uma superfície de piso
limpa, seca e não abrasiva. A cama deve ser mantida limpa e seca e sua
profundidade deve ser adequada. Pisos de concreto rugoso devem ser recobertos;
uma variedade de tintas de resinas baseadas em betume e epóxi tem sido usada,
mas o primeiro não parece ser suficientemente durável e o último pode tornar as
superfícies muitas lisas. O fato de ser escorregadia pode ser parcialmente superado
pela incorporação de areia ou serragem nas resinas, contudo o piso pode, então,
tornar-se muito abrasivo. Se as margens das lâminas de concreto forem cortantes
ou lascadas, elas podem ter que ser substituídas.
Pedilúvio de formalina ou sulfato de cobre pode ajudar na prevenção. Os animais
com dígitos do mesmo tamanho devem ser selecionados para a criação no rebanho
e a sua dieta deve ser suplementada com biotina.

Laminite
A inflamação do cório da pata, infecciosa ou não infecciosa, pode resultar em
claudicação. Doenças sistêmicas, tais como febre pós-parto e intoxicação por
mercúrio, podem resultar em laminite. A superalimentação também tem sido implica-
da. Já que a laminite não é o principal sinal clínico de uma doença sistêmica, a
freqüência com que as 2 são associadas é desconhecida. Talvez a forma mais
comum de laminite seja a observada em porcas com febre pós-parto ou mastite. A
claudicação é normalmente observada nos membros anteriores, embora todos os 4
membros possam ser afetados. Calor e dor podem ser evidentes nos cascos e pode
ser detectado um pulso digital se o boleto for palpado. Ao exame do corte histológico,
hiperemia, hemorragia e dilatação dos linfáticos são observadas no extrato vas-
cular. Na base das lâminas são vistas trombose e inflamações supurativas. O
tratamento é normalmente dirigido à doença sistêmica primária, mas corticoste-
róides ou anti-histamínicos podem ser usados para diminuir a inflamação do cório.
A laminite com ou sem infecção é um problema comum em animais criados em
pisos artificiais. O traumatismo do casco, que produz hemorragia e inflamação no
cório, é uma causa não infecciosa comum; a hemorragia é particularmente óbvia em
animais com tecido córneo não pigmentado.

Perda dos dígitos acessórios


Tem-se relacionado a perda ou dano ao dígito acessório medial do membro
posterior em leitões neonatos ou porcas em gaiolas de parição com certos tipos de
piso de metal perfurado ou distendido. O dígito pode ser infectado durante o período
de amamentação e cair após o desmame.

Supercrescimento dos cascos


Alterações na estrutura do casco não indicam necessariamente um problema da
pata. Os cascos supercrescidos são comuns em animais estabulados em pisos de
superfície não abrasiva ou aos quais se permite somente o exercício limitado, por
exemplo, varrões e marrãs em estábulos com piso de lama. Alterações na forma do
casco podem ocorrer quando alguma causa altera o modo de andar, alterando
conseqüentemente, a forma de desgaste das unhas. As pinças alongadas podem
resultar de exostoses e fraturas da extremidade distal da terceira falange. Lesões
dolorosas no talão ou uma lesão na face anterior da superfície articular do úmero
distal, que façam com que o animal apóie o peso, principalmente na sola e pinça do
casco, podem causar o encurtamento da pinça e proliferação do talão. O tratamento
Claudicação em Suínos 646

do supercrescimento, sem complicação, do talão ou pinça, geralmente envolve o


corte do excesso de tecido córneo. O tipo de raça também pode ser um fator
predisponente para algumas alterações conformacionais da pata.

ARTRÍTIDES INFECCIOSAS
Artrite por micoplasma
A Mycoplasma hyosynoviae é um habitante primitivo comum da nasofaringe e
pode produzir sinovite aguda e subseqüente claudicação em porcos de 10 a 30
semanas de idade, mas é mais comum em animais acima desta faixa etária.
Achados clínicos – Os sinais clínicos podem ser precedidos por alterações do
manejo, tais como transporte, mistura de ninhadas e marcação. O fato de os leitões
caminharem em lotes sujos após chuva pesada também pode precipitar um surto.
A sinovite decorrente de M. hyosynoviae pode ser secundária à osteoartrite. Os
indivíduos afetados estão normalmente afebris e relutam em se levantar. As
articulações mais comumente afetadas incluem a soldra, codilho, carpo e tarso, mas
as claudicações dos membros posteriores são mais comuns. Quando os membros
anteriores são afetados, os animais deslocam o seu peso para os membros
posteriores, flexionam o carpo e estendem o codilho. O envolvimento do membro
posterior é caracterizado por uma tentativa de deslocar o peso para os membros
anteriores. O animal tem dificuldade em ficar em pé, com uma postura de pernas
rígidas, alternando o peso do corpo de um membro posterior para o outro repetida-
mente, e flexiona freqüentemente o membro afetado. Imediatamente após o animal
ficar em pé, ele pode caminhar de forma rígida, mas em geral caminha normalmente
após exercício forçado. Pode ser observada a cifose. A distensão articular pode ser
visível e palpável quando o carpo e o tarso estão envolvidos, mas é difícil detectar
a distensão de outras articulações. Uma diminuição da claudicação normalmente
ocorre , 1 semana após o início e os sinais clínicos continuam diminuindo até que
a recuperação esteja completa. A morbidade é variável (1 a 50%) e a mortalidade
é baixa.
A Mycoplasma hyosynoviae foi isolada recentemente das lesões de bursite
adventícia dos jarretes, mas não está claro se ele está envolvido com o desenvol-
vimento destas bolsas.
Diagnóstico e lesões – As membranas sinoviais são hiperplásicas, edematosas
e hiperêmicas. Há líquido articular serossanguinolento em excesso, mas as super-
fícies periarticulares e articulares não estão afetadas. O diagnóstico é baseado no
histórico, sinais e lesões; uma sinovite aguda, não febril e não supurativa num porco
de 12 a 24 semanas de idade é altamente sugestiva. O diagnóstico é confirmado
pelo isolamento do microrganismo e pela sorologia.
Tratamento e controle – A M. hyosynoviae é sensível a tilosina, lincomicina e
tiamulina parenterais. Uma injeção de corticosteróides aos primeiros sinais da
doença reduz a gravidade da claudicação. A identificação e correção de fatores
predisponentes são os melhores meios de prevenção: experimentalmente, a
vacinação tem se mostrado efetiva.

Polisserosite por micoplasma


A Mycoplasma hyorhinis é um comensal comum das secreções nasais dos
animais em crescimento. Se o animal está estressado, pode resultar em uma
septicemia, com subseqüente colonização das membranas serosas e sinoviais.
Embora a M. hyorhinis seja comumente isolada de lesões pneumônicas, não se
sabe se ela é um contaminante ou um patógeno secundário (ver também pág.
906).
Claudicação em Suínos 647

A claudicação é geralmente aguda e acompanhada por outros sinais de infecção


sistêmica: febre moderada (40 a 41°C), anorexia e depressão. Os leitões apresen-
tam respiração laboriosa e ficam de pé com o dorso arqueado. O aumento de volume
das articulações do tarso e carpo pode ser observado. As articulações da soldra,
escápula e atlantooccipital podem estar envolvidas. Duas semanas mais tarde, o
sinal predominante pode ser a claudicação com distensão articular que, ocasional-
mente, persiste por até 6 meses. Geralmente, ocorre poliartrite em animais de 3 a
10 semanas de idade e pode haver uma história de pneumonia ou enterite
concomitantes. A mortalidade é normalmente baixa, embora a morbidade ocasio-
nalmente atinja 25%.
Cultura e histopatologia podem diferenciar as lesões macroscópicas de
polisserosite e artrite da M. hyorhinis daquelas decorrentes da Haemophilus
parasuis. As chances de isolamento de microrganismos são melhores quando os
animais estão em estágios agudos da doença. A sorologia também pode auxiliar no
diagnóstico.
A M. hyorhinis é sensível à tilosina ou lincomicina, mas em geral o tratamento não
é muito efetivo a não ser que seja administrado logo aos primeiros sintomas da
doença. Evitando-se as doenças concomitantes e os estresses, tais como flutuações
extensas de temperatura, mistura, movimento e superlotação, ajuda-se a prevenir o
processo.

Poliartrite séptica neonatal


(Doença articular)
A poliartrite séptica é uma importante causa de mortalidade pré-desmame: até
30% ou mais das leitegadas são afetadas e a média de incidência no rebanho é
> 17%. A média da morbidade foi estabelecida em , 3,3% e a mortalidade em 1,5%,
porém > 50% dos neonatos sobrevivem após desenvolver a artrite séptica e con-
tribuem para os problemas de claudicação observados nas fases de crescimento e
terminação.
Cogita-se que as principais rotas de entrada da bactéria nos leitões sejam as
amígdalas e intestino delgado, mas o umbigo também pode contribuir. De fato,
qualquer abertura cirúrgica no integumento (por exemplo, corte da cauda, marcação
na orelha, recorte dos dentes) pode se constituir numa porta de entrada para a
infecção que se localiza na(s) articulação(ões). Também podem ser porta de entrada
as lesões das patas, infecções cutâneas generalizadas e abrasões dos joelhos
resultantes de pisos com superfície rugosa.
A imunidade colostral é importante na prevenção das artrites sépticas. A
incidência é mais alta na progênie de marrãs e porcas jovens, e em rebanho que
tenha sido repopulado recentemente ou que compra um grande número de marrãs
de reposição.
Achados clínicos – A claudicação pode ser observada tão precocemente
quanto 3 a 4 dias (geralmente , 10) e a distensão articular por 7 a 15 dias após a
parição, mas os picos de mortalidade estão entre a segunda e a quinta semanas de
vida. Qualquer articulação pode ser afetada, mas há certa predisposição para as
articulações do carpo, codilho, coxofemoral e do tarso.
Diagnóstico e lesões – A maioria dos casos é de natureza supurativa. Os
agentes isolados mais comuns são os estreptococos (, 55%), particularmente os
dos grupos sorológicos C, L e D; estafilococos (, 6%); Escherichia coli (, 4%) e
Corynebacterium pyogenes (, 3%). Pasteurella e Moraxella spp, Erysipelothrix
rhusiopathiae (não supurativa), Actinobacillus (Haemophilus ) pleuropneumoniae e
H. parasuis são ocasionalmente envolvidos.
Os estreptococos do Grupo C, E. coli e estafilococos são mais comumente isolados
em casos subagudos. Cápsulas articulares apresentam-se infiltradas por material
Claudicação em Suínos 648

necrótico, fibrina ou flocos de material purulento e as membranas sinoviais encon-


tram-se hiperêmicas e apresentam um certo grau de proliferação, mas raramente há
erosão da cartilagem. Os estreptococos do Grupo L geralmente causam infecções
crônicas com grande quantidade de material purulento na cápsula articular.
A C. pyogenes é mais comumente isolada de articulações com lesões crônicas,
grave fibrose periarticular, necrose e fibrose dos músculos adjacentes. Na cápsula
articular, está presente copioso material purulento, verde-pálido e pode ocorrer
extensa ulceração das superfícies articulares.
A demonstração do agente infeccioso em esfregaços corados e culturas das
articulações, baço ou cérebro, confirmará o diagnóstico.
Tratamento e controle – Se administrado assim que aparecem os sinais de
claudicação, o tratamento é mais efetivo do que quando a distensão articular já está
visível. A escolha do antibiótico deve ser baseada no agente infeccioso envolvido. A
penicilina é normalmente efetiva contra o estreptococo, quando dada em dosagem
adequada.
A poliartrite pode ser prevenida por: 1. garantia da ingestão adequada de colostro
durante as primeiras horas de vida; 2. execução de corte da cauda, recorte dos
dentes, marcação das orelhas, castrações, etc., de forma higiênica; e 3. fornecimen-
to de pisos não abrasivos. Já que o problema é mais grave em leitegadas de marrãs,
a média de idade das fêmeas em reprodução deve ser elevada e as marrãs devem
ser adquiridas de uma só fonte.
A vacinação das fêmeas para prevenir a poliartrite nos neonatos não tem sido bem
avaliada, embora possa ser efetiva se estreptococos dos Grupos C e L estiverem
envolvidos. A proteção passiva dos neonatos pode ser obtida pela vacinação contra
erisipelas em porcas, mas não há vacinas efetivas contra C. pyogenes ou estafilo-
cocos. Vacinas para E. coli, A. pleuropneumoniae, H. parasuis e Pasteurella spp são
utilizáveis, mas suas eficácias em prevenir a poliartrite neonatal são desconhecidas.
Uma medida preventiva praticada normalmente é o ato de se mergulhar os
umbigos dos animais nascidos em iodo, mas, para que seja efetiva, ela deve ser feita
exatamente após o nascimento. A ligadura destes umbigos consome tempo,
contudo os benefícios são compensadores. Uma injeção de antibiótico nos leitões,
logo após o nascimento é útil em alguns casos. O uso de antibióticos na alimentação
das porcas não é eficaz.

Osteomielite e artrite supurativa em animais idosos


A artrite supurativa também ocorre em animais idosos, embora alguns destes casos
tenham se originado durante a amamentação. Os agentes etiológicos envolvidos são
um pouco diferentes daqueles que causam artrite em neonatos: Corynebacterium
pyogenes é mais comum e também ocorrem estreptococos e estafilococos; ocasional-
mente a artrite supurativa pode ser causada pela Brucella suis.
Os estreptococos invadem a amígdala palatina, mas danos a superfícies muco-
sas e pele também podem promover uma porta de entrada para estreptococos,
estafilococos e C. pyogenes. As rotas comuns de entrada em animais idosos
incluem locais de injeção, ferimentos por mordedura na cauda e vulva, lesões nas
patas, distocias, laceração da mama e procedimentos cirúrgicos não sanitários.
Os sinais dependem da região do corpo envolvida, mas o problema é geralmente
crônico e progressivo. Quando a piemia é intra-articular, a distensão da articulação
é marcante. Áreas periarticulares podem também apresentar abscessos. A espondilite
e a osteomielite das vértebras lombares, além de abscessos epidurais podem
resultar em hipersensibilidade sobre a espinha e podem provocar cifose ou paraple-
gia. Fraturas traumáticas ou patológicas, osteoartrite e outras anormalidades do
sistema esquelético são freqüentemente complicadas pela piemia. Tais animais
devem ser eliminados.
Claudicação em Suínos 649

A artrocentese pode revelar uma grande quantidade de material purulento e


cremoso nos casos de estreptococos ou estafilococos ou material verde-amarelado
se a causa for a C. pyogenes. Os casos devidos à C. pyogenes tendem a ser mais
crônicos e associado a extenso dano articular com fibrose periarticular.
O tratamento com um antibiótico apropriado é efetivo somente em estágios
iniciais. O mesmo é verdadeiro para a osteomielite e abscessos epidurais. A
lavagem articular e a instilação de antibióticos podem ser efetivas, mas consomem
tempo e dinheiro.
A prevenção deve promover a eliminação da porta de entrada do microrganismo.
Não há vacina contra estafilococos ou a C. pyogenes, mas alguns relatos indicam
que vacinas estreptocócicas podem ser usadas na prevenção da artrite por este
agente em neonatos. Se a artrite supurativa em animais desmamados for conside-
rada um problema residual de baia de parição, devem ser instituídas medidas
preventivas neste local.

ANORMALIDADES ESQUELÉTICAS NÃO INFECCIOSAS


Apofisiólise da tuberosidade isquiática
Uma apófise é um disco de crescimento que está associado à projeção de um
osso tal como a tuberosidade isquiática. A separação bilateral desta tuberosidade
normalmente é observada em porcas jovens, sobretudo naquelas pesadamente
prenhes ou que estejam próximas à parição. Uma postura de “cão sentado” é
freqüentemente adotada; o animal pode ficar em pé com assistência, mas em geral,
só por um breve período. A palpação sobre a tuberosidade isquiática deve demons-
trar crepitação e aumento de volume. A causa desta condição é desconhecida, mas,
como a epifisiólise (ver adiante), cogita-se que a separação seja posterior a uma
ossificação endocondral anormal que resulta num espessamento e enfraquecimen-
to da físis. O espessamento da físis, associado à tuberosidade isquiática, tem sido
visto na osteocondrose. A separação unilateral com evidências de reparação também
tem sido observada, sugerindo que os animais que sofrem de uma apofisiólise
unilateral suave podem não necessitar ser submetidos ao abate de emergência.

Osteoartrite e osteocondrose
A osteoartrite também denominada artropatia, artrose, poliartrose, doença
articular degenerativa e osteoartrose, é uma causa de claudicação em suínos
adultos jovens e animais idosos.
Patogenia – O exame microbiológico tem falhado na revelação de agentes
infecciosos. As alterações histológicas na cartilagem articular, osso subcondral e
membrana sinovial, confirmaram o que se suspeitava.
A osteoartrite em suínos é geralmente secundária à osteocondrose (ver também
pág. 673). A osteocondrose em suínos, geralmente refere-se a uma falha focal na
ossificação endocondral e nas cartilagens epifisária e fisária. Esta é provavelmente
uma designação errônea, já que a osteocondrose implica degeneração e necrose
do osso e cartilagem de um centro de ossificação. A osteonecrose não é observada
em lesões precoces, mas esclerose e fibrose da medula óssea podem ser observa-
das em estágios tardios. A condronecrose é mais comumente observada no
complexo articular epifisário e só ocasionalmente observada na cartilagem fisária.
A incidência e gravidade da osteocondrose não podem ser relacionadas a anorma-
lidades do aparelho locomotor em suínos abaixo do peso de mercado. As claudica-
ções desenvolvem-se quando uma área do complexo cartilaginoso articular epifisá-
rio, enfraquecida pela osteocondrose, separa-se do osso subcondral associado.
A osteoartrite e a osteocondrose têm sido relatadas em muitas articulações
sinoviais dos membros do esqueleto axial. Há uma predileção por certas articula-
Claudicação em Suínos 650

ções e regiões da superfície articular destas articulações. As superfícies mais


comumente afetadas são a face axial do côndilo medial do fêmur, a anterior da
tróclea do úmero, as articulações intervertebrais lombares sinoviais e a face lateral
da cabeça do úmero. A osteocondrose é também observada em várias áreas da
cartilagem fisária. As cartilagens fisárias mais comumente envolvidas são aquelas
da ulna distal e fêmures proximal e distal. Também têm sido observadas nos
discos fisários que não sustentam o peso, tais como a físis troclear da ulna proximal
e a apófise da tuberosidade isquiática. A osteocondrose tem sido observada na área
de ossificação endocondral das costelas. Há alguma dúvida se a osteocondrose de
certas áreas fisárias leva à claudicação pela produção de anormalidades na
angulação de ossos longos ou se estas anormalidades são a razão do desenvolvi-
mento da osteocondrose. Sem um estudo periódico do progresso da doença é
impossível dizer o que é a causa e o que é o efeito.
A causa da osteocondrose e da osteoartrite não foi determinada. Suínos em
crescimento desenvolvem lesões mais sérias à medida que o seu peso aumenta,
mas não se sabe se as lesões são relacionadas à taxa de ganho de peso ou se ao
peso do corpo em si. Diferenças de ninhada e raça são também consideradas, mas
há ainda algumas questões sobre se a osteocondrose pode ser eliminada através
da seleção sem sacrificar as características desejáveis de produção, especialmente
quando a prevalência de osteocondrose da ulna, úmero e fêmur em animais com
peso de abate aproxima-se de 100%.
Achados clínicos, lesões e diagnóstico – A osteoartrite é uma claudicação
bilateral crônica e progressiva e os sinais podem ser observados tão cedo quanto 4
meses de idade, embora > 6 meses seja mais típica. As articulações mais comu-
mente envolvidas são as do codilho, soldra e as intervertebrais lombares. Inicial-
mente, animais com envolvimento dos codilhos exibem leve flexão das articulações
do carpo, metacarpo e interdigitais, com extensão das articulações do codilho
durante a fase de apoio do peso durante o passo e quando de pé. O comprimento do
passo deve estar levemente encurtado. A claudicação pode progredir desta apa-
rência de “perna reta” para uma de caminhar sobre as pinças com visível flexão do
carpo. Animais gravemente afetados podem caminhar sobre o carpo.
Quando as articulações da soldra são afetadas, o animal deve apoiar o peso com
a soldra e tarso estendidos. Com o progresso da claudicação, o passo pode ser
encurtado e o animal pode apoiar o peso somente sobre a pinça. Quando observa-
se o modo de andar por trás, pode-se perceber uma notável oscilação lateral dos
quartos traseiros. É possível observar cifose com claudicação quadrilateral devido
ao envolvimento das articulações do codilho e soldra. A cifose é também observada
com a espondilose secundária à osteocondrose nas áreas de crescimento do centro
das vértebras lombares.
A necropsia geralmente revela lesões bilaterais de gravidade similar ou diferente,
nas articulações mais freqüentemente envolvidas. Na soldra, as lesões são localiza-
das principalmente na face axial do côndilo medial do fêmur. Lesões no codilho
podem ser observadas no côndilo medial ou capitulum humeri. O envolvimento das
superfícies articulares do rádio e ulna ocorre somente nos estágios tardios da doença.
As lesões articulares surgem principalmente como corrugações da cartilagem
sem nenhum envolvimento da cartilagem articular superficial. A progressão da lesão
pode resultar na formação de “retalhos” de cartilagem (osteocondrite dissecante),
com ulceração da cartilagem articular e exposição do osso subcondral em casos
graves. Lesões crônicas terão evidências de reparo fibrocartilaginoso. O líquido
sinovial pode estar levemente aumentado e com aparência serossanguinolenta. A
anquilose e formação de osteófitos podem ocorrer em articulações crônica e
gravemente afetadas. A radiografia de reprodutores valiosos pode ajudar no
diagnóstico, mas somente são detectadas lesões que envolvem o osso subcondral.
Claudicação em Suínos 651

Tratamento e controle – O prognóstico é ruim. A intervenção cirúrgica precoce


para remover a cartilagem e curetar a área afetada é raramente econômica. Devido
à incerteza da etiologia, as recomendações para prevenção tendem a ser gerais e
vagas. Nutrição adequada, ingestão limitada de energia nos animais selecionados
para reprodução para que cresçam lentamente, seleção baseada em certas
conformações ou na gravidade das lesões em testes de progênie, exercício
aumentado e superfície de piso apropriada são medidas que têm sido sugeridas.

Fraturas
A fratura óssea pode ocorrer em suínos de qualquer idade. Estas fraturas em
neonatos são causadas principalmente pelas porcas. As fraturas nos animais adul-
tos podem ser associadas a traumatismos severos, diretos na criação ou no transpor-
te. Como resultado da osteomalacia, as porcas e marrãs não raramente desenvol-
vem fraturas proximais do fêmur ou vertebrais após o desmame de grandes ninha-
das. Estas fraturas são mais comuns em porcas que amamentaram em boxes
individuais e foram misturadas com outras porcas no desmame. Suínos afetados
devem ser abatidos.

Anormalidades esqueléticas induzidas pela nutrição


Deficiências ou excessos de diversos nutrientes têm sido associados com anorma-
lidades esqueléticas em suínos (ver DISTROFIAS ASSOCIADAS AO CÁLCIO, FÓSFORO E
VITAMINA D, págs. 578 e 1521). Alterações no crescimento e remodelação óssea são
vistas como problemas nutricionais em jovens animais durante o crescimento. Podem
resultar em deformação óssea. Em animais idosos, o desequilíbrio nutricional afeta
predominantemente o processo da remodelação, geralmente resultando em altera-
ções da resistência do osso cortical e trabecular. A osteomalacia é mais comum em
porcas adultas que estão amamentando ninhadas grandes por ≥ 4 semanas.
Lesões esqueléticas têm sido relatadas em porcos com hiper ou hipovitaminose
A; deficiências de manganês, magnésio e cobre; e intoxicação por zinco e fluoreto.
A maioria dos estudos sobre desequilíbrios nutricionais que afetam o sistema
esquelético entretanto, diz respeito aos níveis de cálcio, fósforo e vitamina D.

Epifisiólise femoral proximal


A epifisiólise é a fratura através da físis ou disco de crescimento proximal do
fêmur, que resulta na separação da cabeça do fêmur de seu colo. Isto é normalmente
observado em suínos entre 5 meses e 3 anos de idade. O fechamento da físis
femoral proximal nos suínos ocorre de 3 a 3,5 anos de idade. A patogenia é incerta,
mas é consenso que a condição resulta de um enfraquecimento na região fisária,
com alteração na ossificação endocondral do animal em crescimento. A osteocon-
drose tem sido incriminada como uma alteração na ossificação endocondral que
pode enfraquecer o disco de crescimento fisário.
A condição pode ser unilateral ou bilateral. É geralmente de aparecimento agudo
e extremamente dolorosa; ocasionalmente, a claudicação é mais insidiosa e torna-
se abruptamente grave em 5 a 10 dias após o aparecimento. Se bilateral, o animal
fica, em geral, incapaz de se levantar, mas pode aceitar alimento e água; com a
claudicação unilateral, o peso não pode ser apoiado sobre o membro afetado. A
manipulação do membro afetado é ressentida, e a crepitação pode ser ouvida ou
sentida na região coxofemoral se a mão for colocada sobre a coxa.
A epifisiólise unilateral deve ser diferenciada da fratura unilateral do fêmur,
associada a traumatismo ou osteomalacia. A epifisiólise bilateral deve ser diferen-
ciada de fraturas bilaterais e da paraplegia decorrente de fraturas lombossacrais,
espondilose ou abscedações espinhais. O tratamento não é praticável.
Claudicação em Ovinos 652

CLAUDICAÇÃO EM OVINOS
Uma série de doenças sistêmicas pode causar claudicações em ovinos. As
condições mais comuns, listadas por grupos etários, geralmente afetados, são:
cordeiros – mal das juntas, tétano, doença do músculo branco, ataxia enzoótica
(deficiência de cobre), poliartrite (por Chlamydia), raquitismo, intoxicação por
plantas tóxicas (por exemplo “sneezeweed”), éctima contagioso (estomatite ulcerosa);
adultos – mastite, epididimite, desequilíbrios de minerais e microelementos; qual-
quer idade – erisipela (uma das mais importantes, ver pág. 405), laminite, língua
azul, dermatose ulcerativa, febre aftosa e dermatofilose. Informações adicionais no
diagnóstico diferencial, tratamento e prevenção podem ser encontradas nos tópicos
específicos (ver também ARTRITE E PROBLEMAS CORRELATOS, GR AN, pág. 562;
DOENÇAS DA COLUNA e MEDULA ESPINHAIS, pág. 705; ANOMALIAS CONGÊNITAS e
HEREDITÁRIAS DO SISTEMA MUSCULOESQUELÉTICO, pág. 572 e MIOPATIAS, pág. 659).
Muitas claudicações são decorrentes de lesões. Os princípios gerais de trata-
mento e prevenção destas lesões para ovinos são os mesmos utilizados para outras
espécies.
Além das doenças que afetam também outras partes do corpo, há um grupo de
infecções específicas das patas. São decorrentes de infecções mistas com combi-
nação de bactérias, incluindo Fusobacterium necrophorum . A pele entre as unhas
é local primário de invasão, mas isto normalmente não ocorre quando o extrato
córneo está seco e intacto. As causas predisponentes são os danos causados pela
água, macerações, queimaduras pelo frio ou traumatismo mecânico. A penetração
epidérmica por F. necrophorum e Corynebacterium pyogenes induz uma condição
transitória, a dermatite interdigital ovina (DIO); quando há invasão concorrente pela
Bacteroides (Fusiformis) nodosus, surge a podridão dos cascos. Esta pode ser
benigna ou virulenta, dependendo da linhagem de B. nodosus envolvida. Quando a
invasão dérmica e subdérmica pela F. necrophorum e C. pyogenes envolve a
articulação interfalângea distal, a doença que se desenvolve é o abscesso podal. A
infecção da matriz do casco com estes microrganismos resulta em laminite séptica.
A partir de agora, segue-se a descrição destas 5 condições distintas, mas relacionadas.

ABSCESSO PODAL
(Necrose bulbar infecciosa, Abscesso do talão)
O abscesso podal é uma infecção necrosante ou purulenta que envolve a
articulação interfalângea distal. A incidência é normalmente esporádica, porém até
15% dos carneiros ou ovelhas em gestação adiantada podem ser afetados.
Os 2 microrganismos mais consistentemente encontrados nos casos de absces-
so podal são Fusobacterium necrophorum e Corynebacterium pyogenes. De forma
geral, os abscessos podais desenvolvem-se como uma complicação da DIO (ver
pág. 656) pela extensão do processo necrótico para dentro do tecido subcutâneo e
dali para a articulação interfalângea distal. Esta articulação é vulnerável a infecções
na face interdigital, onde a cápsula articular projeta-se acima da borda coronária,
pelas bolsas dorsal e volar. Nestes 2 locais, a cápsula articular é protegida somente
pela pele interdigital e por uma quantidade mínima de tecido subcutâneo.
Casos esporádicos podem também originar-se após a penetração de objetos
cortantes ou desbastes pouco cuidadosos dos cascos.
Abscessos desenvolvem-se mais freqüentemente quando o solo e as pastagens
estão úmidos. Os carneiros, particularmente em seu primeiro inverno e as ovelhas no
final da gestação são mais comumente afetados. A doença causa uma claudicação
aguda, normalmente restrita a uma só pata. Em estágios precoces, pode ser possível
extrair-se o material necrosado através do canal aberto na pele interdigital, responsá-
Claudicação em Ovinos 653

vel pela invasão bacteriana. Mais tarde, a cavidade do abscesso pode estender-se e
estourar em um ou mais pontos acima da coroa. Em , 50% dos casos, há movimento
exagerado do dígito afetado, o que evidencia o rompimento dos ligamentos sobre a
articulação interfalângea distal. Em tais casos, parece que pode haver deslocamento
do dígito durante a locomoção e deformidades permanentes.
Claudicação aguda, aumento de volume de um dos dígitos e descarga cavitária,
distinguem o abscesso podal da podridão dos cascos. A radiografia é usada para
ajudar a determinar a extensão do dano articular.
Uma vez que se estabeleceu a infecção na articulação, o tratamento tem valor
limitado. A terapia deve ser dirigida para a manutenção da integridade dos ligamen-
tos articulares, pela drenagem dos abscessos, bandagens para reduzir o estresse
sobre os ligamentos e pelo ataque à infecção bacteriana com antibióticos e
sulfonamidas.
Embora o prognóstico para a completa recuperação do abscesso podal seja ruim,
em muitos casos a cicatrização suficiente da pata, para permitir a locomoção
adequada após um período de , 2 meses, pode ocorrer.
O controle depende da prevenção das condições que causam a DIO e também
do tratamento da condição tão breve quanto ela apareça. Embora as vacinas de
Fusobacterium necrophorum sejam usadas, elas não têm tido resultados inteira-
mente satisfatórios.

PODRIDÃO DOS CASCOS


Podridão dos cascos benigna
A podridão dos cascos benigna (PCB) é uma forma de podridão dos cascos em
que a infecção é confinada principalmente à pele interdigital, atingindo o mínimo de
tecido córneo adjacente. Clinicamente, ela é similar à DIO (ver pág. 656), mas a
Bacteroides nodosus está envolvida. A claudicação é comum, mas menos grave do
que na podridão dos cascos virulenta (PCV ver adiante). A etiologia e a patogenia
são as mesmas da podridão dos cascos virulenta, mas a linhagem causadora de B.
nodosus é menos virulenta. B. nodosus isoladas de bovinos normalmente causam
somente a forma benigna de podridão dos cascos em ovinos. Os efeitos econômicos
da podridão dos cascos benigna são muito menores do que os da PCV. O pedilúvio
com solução a 5% de formaldeído é normalmente adequado para controle.

Podridão dos cascos virulenta


(PCV, Podridão dos cascos maligna, Podridão dos cascos contagiosa)
A podridão dos cascos virulenta (PCV) é uma doença específica, crônica e
necrosante, que afeta a epiderme interdigital e a matriz do casco. Ela começa como
uma dermatite interdigital e estende-se até envolver grandes áreas da matriz do
casco. Devido à destruição do tecido infectado, o casco perde seu ancoramento e
torna-se destacável. A podridão dos cascos é contagiosa e, sob condições adequa-
das, a morbidade pode aproximar-se de 100%. A infecção é também encontrada em
caprinos e cervídeos, mas raramente em bovinos.
Etiologia – A podridão dos cascos é decorrente de uma infecção mista, na qual
o sinergismo entre 2 bactérias anaeróbias Gram-negativas é essencial. A
Fusobacterium necrophorum é um residente normal do ambiente dos ovinos, mas
a infecção depende da presença da Bacteroides nodosus, um parasita estrito que
não sobrevive mais que alguns dias no solo ou nas pastagens; sua viabilidade
depende da presença de animais infectados. Desta maneira, a B. nodosus é
considerada o agente causal transmissível e específico da podridão dos cascos,
embora sua contribuição para o processo não seja necessariamente maior que a da
F. necrophorum.
Claudicação em Ovinos 654

A transmissão da podridão dos cascos para animais sadios requer um ambiente


quente e úmido. Sob estas condições, o extrato córneo interdigital torna-se mace-
rado; filamentos de F. necrophorum invadem a epiderme superficial e induzem a DIO
(ver pág. 656). Se a B. nodosus fizer contato com a pele neste estágio, o processo
resulta em podridão dos cascos. Lesões nas patas favorecem a sua transmissão;
embora ela normalmente não ocorra quando a temperatura do solo é < 4,5°C.
Achados clínicos – O sinal mais evidente é a claudicação, que pode ser grave.
Alguns animais permanecem em decúbito ou sobre seu esterno e joelho, os quais
tendem a tornar-se depilados e ulcerados. Os animais afetados perdem as condi-
ções corporais. Carneiros com o processo nas patas posteriores podem ser
incapazes de servir e, da mesma forma, ovelhas com lesões nestes membros
podem ser incapazes de suportar o peso de um macho durante o serviço. A
produção de lã é reduzida. Em casos iniciais, o exame das patas pode revelar nada
mais do que uma dermatite similar à DIO. Em casos levemente mais avançados, nos
quais a infecção tenha começado a se estender para dentro da matriz do casco, há
leve deslocamento de áreas do casco. Com o progresso da doença, a necrose
epidérmica e a separação de porções do estojo córneo se propagam ao talão e à sola
e, finalmente, à parede externa do casco. Isto ocorre de tal forma que o casco pode,
eventualmente, estar ancorado somente pela coroa. O tecido necrosado tem um
odor característico. A miíase é uma seqüela comum que pode estender-se para os
flancos do ovino e situar-se onde as patas infectadas entram em contato com o
flanco quando o animal se deita. Em alguns ovinos, a doença persiste por anos. Em
outros, a infecção pode ser escondida em pequenos bolsões dentro das patas, onde
é detectável somente através de um desbaste extenso; ovinos assim afetados
atuam como portadores subclínicos. Estes pequenos bolsões tornam-se ativos
dentro do casco ou podem se abrir e contaminar o solo quando o ambiente externo
está úmido. A recuperação da podridão dos cascos ocorre, mas não é seguida de
imunidade apreciável.
Diagnóstico – Casos precoces confinados ao espaço interdigital podem ser
confundidos com DIO ou podridão dos cascos benigna. Os casos avançados podem
ser confundidos com abscesso podal (ver anteriormente). Em rebanhos afetados
com PCV, são características a infecção e a separação do estojo córneo do casco,
usualmente em mais de uma pata. Em abscessos podais, há uma invasão mais
profunda dos tecidos e uma descarga de material necrótico e purulento, geralmente
em uma só pata. A B. nodosus pode ser identificada em esfregaços corados de
material necrótico da podridão dos cascos, embora outras bactérias predominem.
Tratamento – O tratamento utilizado pode ser direcionado ao controle tempo-
rário da doença ou à sua erradicação do rebanho. Em certas ocasiões, por exemplo,
durante uma estação úmida, o controle temporário pode ser a única meta realista.
O tratamento pode ser tópico ou parenteral. O tratamento tópico requer
desbaste cuidadoso do casco para que todo o tecido córneo afetado seja
removido e para que o tecido necrosado seja exposto. Soluções bactericidas
são, então, aplicadas por aerossol ou pedilúvio ou embebimento das patas. As
soluções de pedilúvio mais comumente usadas são formaldeído a 5%, sulfato de
cobre a 10% ou sulfato de zinco a 10%. As soluções usadas como sprays
aerossóis incluem aquelas usadas para o pedilúvio além da cetrimida a 20% e
da oxitetraciclina em água/álcool a 1,3%.
Para o embebimento das patas, os ovinos devem ser mantidos por 1h em pé em
uma solução de 10% de sulfato de zinco e 0,2% v/v de detergente de lavanderia que
contenha surfactantes não iônicos ou o surfactante lauril sulfato de sódio. Em
condições úmidas, não é necessário aparar previamente as patas, mas se as patas
estiverem secas e duras, a aparação melhora a taxa de recuperação. Geralmente
o embebimento da pata deve ser repetido em 5 a 10 dias.
Claudicação em Ovinos 655

O tratamento parenteral consiste em injeções de penicilina e diidroestreptomi-


cina de 50.000 a 70.000u/kg e 50 a 70mg/kg, respectivamente (esta dose excede
em 2 a 3 vezes a dose aprovada na maioria dos países); oxitetraciclina ou penicilina
G benzatina (não tem o uso aprovado em todos os países).
O índice de sucesso para qualquer um dos métodos de tratamento é substan-
cialmente melhorado se o ovino tratado for mantido em um ambiente seco após o
tratamento (mesmo por 24h). As patas do ovino tratado devem ser examinadas a
cada 1 a 2 semanas para identificar aqueles que não responderam ao tratamento
ou aqueles que necessitam de um melhor desbaste.
Relatos de diversos países indicam uma melhor resposta com a utilização de
sulfato de zinco oral combinado à vitamina A. As dosagens e tempo de tratamento
têm variado amplamente, porém parece que um período extenso de tratamento (1
tablete contendo 210mg de sulfato de zinco e 50.000 UI de vitamina A, administrado
a cada 10 dias, por 7 vezes) é benéfico. A terapia laser tem sido utilizada experimen-
talmente com sucesso.
A combinação dos métodos tópico e parenteral de tratamento, simultaneamente,
não resultará na erradicação imediata da podridão dos cascos. É necessário tempo
para identificar os casos subclínicos ou reincidentes.
Prevenção e controle – Rebanhos livres de podridão dos cascos podem manter-
se assim pela prevenção da introdução de B. nodosus. Qualquer ovino adicionado
ao rebanho deve ser examinado, isolado por 1 mês e, então reexaminado. Qualquer
veículo ou utensílio, no qual ovinos desconhecidos ou infectados tenham sido
mantidos deve ser limpo e desinfetado antes de ser posto em contato com ovinos
sadios.
Durante os períodos do ano que favorecem a transmissão de podridão dos
cascos, algum controle deve ser mantido pelo pedilúvio do rebanho afetado e
tratamento (tópico ou parenteral) individual dos ovinos gravemente afetados.
As vacinas de B. nodosus aceleram a cicatrização em animais afetados e ajudam
a proteger os não afetados. Vacinas absorvidas em alumínio requerem 2 doses com
intervalo de 4 a 6 semanas para se estabelecer uma imunidade efetiva, a qual
persiste por , 2 meses. As lesões se curam em 4 a 6 semanas se a imunidade se
estabelecer. As vacinas oleosas induzem a imunidade em 3 semanas após a dose
inicial e esta pode persistir por 3 a 4 meses. A revacinação é recomendada a
intervalos de 3 a 6 meses em áreas endêmicas. Apenas a vacinação, normalmente,
não promove o controle ou erradicação completa.
Erradicação – A erradicação somente pode ser conseguida pela eliminação de
todos os casos de infecção virulenta por B. nodosus e pela prevenção de sua
reintrodução. Isto pode ser feito pela repovoação do rebanho afetado com ovinos
livres da doença ou eliminação dos animais afetados, que não respondem pronta-
mente ao tratamento rigoroso de toda nova infecção. Os animais afetados são
identificados pelo exame clínico; nenhum outro teste diagnóstico é praticável sob
tais circunstâncias. Casos subclínicos constituem o maior problema, já que eles
podem reincidir durante os 2 a 3 meses seguintes e em conseqüência, transmitir a
infecção. Outros ruminantes (caprinos, cervídeos e bovinos) são fontes de infecção
em potencial da B. nodosus e devem ser considerados nos programas de erradicação.
A erradicação deve ser tentada somente quando o ambiente estiver seco. Em
outras épocas, o tratamento deve ser direcionado ao controle interno do rebanho.
Um programa de erradicação de sucesso requer planejamento, dedicação e
investimento de tempo e dinheiro; entretanto, ele normalmente recompensa bem o
esforço e as despesas, quando comparado a tentativas de controlar um rebanho
permanentemente infectado.
Antes de a erradicação ser tentada, a prevalência deve ser reduzida para < 15%
através da quimioterapia e/ou vacinação. Uma vez que isto seja obtido, ou se a
Claudicação em Ovinos 656

prevalência já for baixa, as patas de todos os ovinos do rebanho devem ser


examinadas, e o rebanho deve ser dividido em 2 grupos: afetados e não afetados.
Aqueles ovinos com lesões de PCV não perceptíveis devem ser isolados, subme-
tidos ao pedilúvio e postos sobre um piso limpo e seco. Este grupo deve ser
passado pelo pedilúvio 1 vez por semana durante os próximos 2 a 3 meses e
qualquer animal afetado por claudicação deve ser removido imediatamente.
Ovinos com lesões de PCV são eliminados ou medicados topicamente (e
parenteralmente, caso se deseje), após desbaste cuidadoso e extensivo, da pata e
então separados do grupo não afetado. O grupo afetado deve passar pelo pedilúvio
ou ser medicado topicamente a cada 3 a 4 dias com reexame e redesbastamento
a cada 1 a 2 semanas. Eventualmente, um grupo “potencialmente limpo” deve ser
separado daqueles que aparentemente responderam ao tratamento no grupo
afetado. Este grupo “potencialmente limpo” deve ser monitorado por 1 a 3 meses ou
por um período que favorece a expansão da podridão dos cascos para detectar e
novamente isolar quaisquer casos subclínicos que tenham passado despercebidos.
Eventualmente, este grupo pode ser adicionado ao rebanho limpo.
A maioria dos ovinos afetados recupera-se da podridão dos cascos com
tratamento adequado e tempo. Colocando-se um caso ativo ou subclínico no
rebanho limpo, por outro lado, pode-se levar o programa de erradicação ao fra-
casso.

GLÂNDULA SEBÁCEA I MPACTADA OU INFECTADA


Os ovinos possuem uma glândula sebácea na pele do dígito. Uma secreção
glandular oleosa é armazenada em uma pequena bolsa entre as falanges. Um canal
na pele permite a descarga da secreção para a superfície da pele. Ocasionalmente,
o canal pode estar obstruído, causando impactação e distensão da bolsa de óleo.
Isto pode causar claudicação, assim como distorção no aspecto dos tecidos
interdigitais. A bolsa de óleo pode também tornar-se infectada, resultando em uma
celulite ou abscesso local. A retirada do conteúdo por pressão manual alivia a
impactação. As glândulas infectadas também podem ser espremidas e tratadas com
antibióticos locais ou sistêmicos, ou ambos, dependendo da extensão e gravidade
do processo infeccioso.

FIBROMA INTERDIGITAL
Trata-se de uma massa de tecido fibroso entre as pinças; pode assemelhar-se
a um papiloma, e se não for removido, cresce para cima entre as primeiras falanges,
podendo causar claudicação intensa. Se detectado precocemente, a remoção
cirúrgica (criocirurgia e eletrocautério) é bem-sucedida.

DERMATITE INTERDIGITAL OVINA


(DIO, Pé escaldado)
É uma condição necrosante da pele interdigital, devida à infecção mista com
Fusobacterium necrophorum e Corynebacterium pyogenes. O tempo frio e pasta-
gens úmidas são considerados causas predisponentes. Uma condição semelhante
tem sido atribuída a danos mecânicos impostos por restolhos curtos e duros. Lesões
similares ao epitélio interdigital, freqüentemente, resultam de “pelotas de argila”,
uma condição na qual bolas de argila são moldadas dentro do vão do espaço
interdigital, endurecendo e tornando-se difíceis de desalojar. Estas “pelotas de
argila” causam constante irritação e intensificam a invasão bacteriana.
A claudicação pode ser vista em 90% dos ovinos e, em algumas instâncias, todas
as 4 patas podem estar afetadas. Em casos brandos, a pele interdigital está
Claudicação em Pequenos Animais 657

vermelha e edemaciada e coberta por uma película úmida de material necrótico


esbranquiçado. Entretanto, em casos gravemente afetados, a pele interdigital está
necrosada e erodida e os tecidos subcutâneos estão expostos. Podem desenvolver-
se supuração e aumento de volume dos tecidos interdigitais mais profundos. A
parede do casco não se separa dos tecidos subjacentes e o odor característico
associado à infecção por Bacteroides nodosus não está presente. Sob condições
secas, a doença freqüentemente é transitória, mas pode persistir ou retornar cada
vez que a pastagem tornar-se úmida.
A aparência clínica é característica, mas condições similares que envolvem
outros microrganismos devem ser excluídas. No caso de podridão dos cascos (ver
anteriormente) o exame microscópico de material corado revelará a presença de B.
nodosus. A dermatofilose (morangueiro podre, ver pág. 952) afeta a pele com pêlos
da coroa e quartela. Doenças virais, tais como dermatite ulcerativa, éctima conta-
gioso e febre aftosa, podem ser excluídas pelo histórico do rebanho, sinais clínicos
e sorologia. A F. necrophorum pode também infectar as lesões causadas por estas
doenças infecciosas.
Tratamento e controle – A maioria das lesões cicatriza rapidamente sob
condições secas ou com remoção do animal para pastagens mais secas. Quando
a doença está associada com restolho, a melhora normalmente segue a remoção
para pastagens comuns. A cicatrização pode ser auxiliada pela aplicação externa
de desinfetantes, tais como formaldeído a 5% ou sulfato de zinco a 10% e, em casos
graves, o estabulamento do animal em condições secas.

LAMINITE SÉPTICA
(Supuração lamelar, Abscesso da pinça)
É uma infecção bacteriana aguda da matriz laminar do casco, normalmente
restrita à pinça e parede abaxial. A doença é esporádica e a etiologia variável, mas
casos decorrentes da Fusobacterium necrophorum e Corynebacterium pyogenes,
normalmente são mais graves e extensos que aqueles que envolvem estreptococos
ou outros microrganismos. A infecção provavelmente penetra através de fissuras
entre a parede e a sola e através de fraturas verticais e horizontais do tecido córneo.
Algumas vezes, é favorecida pela retenção de lama e fezes, por supercrescimento
do casco ou pela separação da parede após laminite.
A parte da frente da pata é mais comumente afetada. A claudicação é grave e o
dígito afetado está quente e sensível. Pode haver uma cavidade acima da lesão na
região da coroa. Os ovinos afetados normalmente se recuperam rapidamente após
o desbaste do tecido córneo para promover a drenagem.

CLAUDICAÇÃO EM PEQUENOS ANIMAIS


É uma alteração da locomoção normal devida a lesão ou defeito no membro,
especialmente na pata ou perna. As patologias espinhais podem estar envolvidas
(ver DOENÇAS DA COLUNA E MEDULA ESPINHAIS, pág. 705). A claudicação pode ser
adquirida ou hereditária. A origem da claudicação pode ser esquelética, na articu-
lação ou em torno dos tecidos moles, ou em uma falha na inervação. Para se avaliar
o curso de uma claudicação, o grau de claudicação deve ser anotado. Um método
consiste em graduar as claudicações em escala de 1 a 10, 1 significando normal e
10 significando não suportar peso.
Antes do exame físico, o cão deve ser observado ao passo e a trote em uma
superfície não escorregadia. A correia deve estar frouxa, para evitar que ela altere
Claudicação em Pequenos Animais 658

o padrão de locomoção. O examinador deve observar o cão andando em sua


direção, passando por si e afastando-se (para permitir visão lateral e por trás), e
então novamente em sua direção e passando pelo outro lado. O procedimento é
repetido com o cachorro trotando; claudicações leves não evidentes ao passo
podem tornar-se aparentes em um trote lento. O trote não deve ser acelerado e não
se deve permitir que o cão galope. É normal que alguns cães marchem ao invés de
trotar. Uma técnica útil é a de desenvolver a habilidade de imaginar um “replay”, em
câmera lenta, do que foi observado no exame. O exame deve ser repetido até que
o membro afetado e, se possível, o local da claudicação, sejam determinados (ver
também CLAUDICAÇÃO, PRINCÍPIOS GERAIS, pág. 589).
Durante a excitação da visita à clínica, uma claudicação pode “desaparecer”;
pode ser necessário que o cão fique internado por 1 a 2 dias para observar se a
claudicação retorna.
Deve ser observado o seguinte: extensão da fase de suspensão do passo,
duração da fase de apoio, posição no momento de contato e de elevação, e se o
membro é levado para frente e para trás normalmente ou se é abduzido ou aduzido.
Quaisquer alterações nos ângulos articulares normais durante o passo devem ser
notadas. Uma redução no movimento de uma articulação indica dor na região; a área
da pata que primeiro faz contato com o solo deve ser particularmente notada. A
cabeça do cão se abaixa quando a pata faz contato com o solo e levanta quando a
pata manca faz contato com a superfície. A cabeça geralmente se mantém mais
baixa que o normal nas claudicações de membros posteriores e, algumas vezes,
mais alta que o normal nas dos membros anteriores.
A maioria dos gatos não apóia um membro dolorido, porém, se for permitido que
fiquem soltos dentro de casa, algumas vezes o local da claudicação pode ser
determinado utilizando-se as mesmas técnicas que para os cães.
Claudicação nos membros anteriores – Um animal manco em um membro
anterior apresenta um passo encurtado, avança com o membro são e apressa o
arco do passo quando utiliza o membro manco, levantando a cabeça ao
mesmo tempo. Nas claudicações intensas, a coluna pode se arquear excessiva-
mente.
Claudicação no ombro (paleta) – Ocorre o “congelamento” (perda do movimen-
to) da articulação do ombro, e o movimento ocorre entre a escápula e o tórax. Nos
passos mais lentos observa-se um andar curto e entrecortado.
Claudicação no cotovelo – A parte posterior da fase de apoio do passo está
diminuída; o membro alivia o peso abruptamente no momento de apoio máximo.
Quando parado, o cotovelo tende a ficar aduzido.
Claudicação no carpo e na pata – Há bom movimento na fase de suspensão,
porém há uma limitação marcante de suporte de peso na fase de apoio.
Claudicação nos membros posteriores – O peso é transferido para os quartos
anteriores, o pescoço é estendido e a cabeça é mantida mais baixa. Os membros
anteriores tendem a estar posicionados mais para trás.
Claudicação coxofemoral – Os membros posteriores estão anormalmente
separados para utilizar o apoio lateral da coluna lombar; a fase de suspensão está
reduzida e a cabeça pode ser jogada para cima no lado manco. Os filhotes
displásicos tendem a demonstrar um andar fraco e sinuoso, normalmente galopan-
do com ambos os posteriores juntos, como um “coelho”. As articulações coxofemo-
rais subluxadas normalmente podem ser palpadas (sinal de Ortolani positivo) ou
podem ser audíveis.
Claudicação na soldra – O movimento na articulação é diminuído, a pata sã
desce abruptamente na fase de apoio, a fase de suspensão é feita por movimento
coxofemoral, e o movimento társico é mínimo. Este último fenômeno ocorre devido
ao fato de a soldra e o jarrete moverem-se concomitantemente.
Miopatias 659

Claudicação no jarrete (tarso) e pata – O ângulo articular pode estar fixo. Na


osteocondrite dissecante társica, os cães freqüentemente ficam com seus jarretes
hiperestendidos.

CAUSAS ESPECÍFICAS DE CLAUDICAÇÃO EM ANIMAIS JOVENS


Membros anteriores – 1. Desequilíbrio nutricional (fraturas patológicas); 2.
ombro – luxação congênita, osteocondrite dissecante, fratura fisária; 3. cotovelo –
processo coronóide fragmentado, processo ancôneo desunido, subluxação do
cotovelo, fratura fisária, Osteocondrite dissecante (côndilo umeral distal-medial); 4.
carpo – deformidade angular do membro (secundária à lesão fisária), retenção da
matriz cartilaginosa, hiperextensão com lesão ligamentosa; 5. claudicação origina-
da de ossos longos – fraturas, panosteíte, cistos ósseos, osteomielite, osteodistro-
fia hipertrófica, neoplasia.
Membros posteriores – 1. Desequilíbrio nutricional (fraturas patológicas); 2.
pelve – displasia coxofemoral, necrose avascular, lesão no disco de crescimento,
fratura fisária na cabeça do fêmur; 3. soldra – osteocondrite dissecante, luxação
medial da patela, fraturas fisárias femoral distal e tibial proximal; 4. tarso –
osteocondrite dissecante; 5. claudicação originária de ossos longos – fraturas,
panosteíte, osteodistrofia hipertrófica, osteomielite, neoplasia.

CAUSAS ESPECÍFICAS DE CLAUDICAÇÃO EM ADULTOS


Membros anteriores – 1. Doença degenerativa articular geral – artrite, artrite
infecciosa, artrite imunomediada, osteocondrite dissecante, doença da coluna
cervical; 2. ombro – bursite bicipital, luxação traumática, fratura escapular, fratura
umeral, osteomielite, neoplasia, patologia neuromuscular, doença degenerativa
articular crônica secundária a anormalidades de desenvolvimento; 3. cotovelo –
fratura distal no úmero, ruptura do tendão de inserção do tríceps, avulsão do tendão
do bíceps, doença degenerativa articular crônica secundária a anormalidades de
desenvolvimento, luxação aguda ou crônica, subluxação secundária a crescimento
assincrônico; 4. antebraço – fratura, fratura de Monteggia, osteomielite, neoplasia;
5. carpo – luxação, subluxação, osteomielite, avulsão dos tendões flexores, fratura
metacárpica, fratura de sesamóide, infecção na base da unha, neoplasia.
Membros posteriores – 1. Pelve – doença do disco intervertebral (Tipos I ou II),
discoespondilite, subluxação sacroilíaca, músculos estirados ou rompidos, hérnia
inguinal, síndrome lombossacral, tromboembolismo, luxação coxofemoral traumá-
tica, fratura, displasia coxofemoral , neoplasia; 2. diáfise femoral – Fratura, osteo-
mielite, neoplasia; 3. soldra – fratura local (fêmur, patela ou tíbia), ruptura do
ligamento cruzado cranial ou caudal, ruptura dos ligamentos colaterais, lesão dos
meniscos, avulsão do extensor digital longo, osteocondrite dissecante crônica,
luxação patelar; 4. diáfise tibial – fratura, osteomielite, neoplasia; 5. tarso e
metatarso – fraturas (em todos os ossos), luxação, subluxação, doença articular
degenerativa, hiperextensão, ruptura do ligamento plantar, luxação do tendão flexor
digital superficial.

MIOPATIAS
As miopatias são doenças que produzem dano primário, às fibras musculoesque-
léticas, excluindo aquelas de origem inflamatória e aquelas secundárias a lesões
neurais. Muitos exemplos de miopatia ocorrem em animais e alguns, tais como as
Miopatias 660

miopatias nutricionais, têm grande importância econômica. Outras miopatias em


animais são modelos importantes de várias doenças humanas (ver também MIO-
PATIAS CONGÊNITAS, pág. 573).

MIOPATIAS DO TIPO DISTROFIA


Muitos exemplos de miopatias progressivas têm sido descritos em animais.
Muitas são hereditárias, outras se assemelham a vários tipos de distrofia muscular
vistas no homem. Os músculos afetados têm uma variedade de alterações atróficas
e degenerativas. Em bovinos meuse-rhine-yssel da Holanda, tem sido descrita uma
miopatia progressiva fatal do diafragma e músculos intercostais. Outra distrofia em
gado bovino é a síndrome “weaver” no pardo suíço. A hiperplasia, comumente
chamada músculo duplo (ver pág. 574) é uma miopatia congênita encontrada em
algumas raças européias de gado. Miopatias progressivas têm sido relatadas em
ovinos da raça merino (uma característica hereditária autossômica recessiva), em
suínos “pietrain” (síndrome do rastejamento dos “pietrain”), e em cães, gatos,
galinhas, perus e visons. Extensos estudos têm sido feitos sobre distrofia muscular
hereditária em camundongos e hamsters. O hâmster tem graves lesões miocárdicas
e serve como modelo para estudos de miocardiopatias.

MIOPATIAS NUTRICIONAIS
As miopatias mais comuns e mais importantes economicamente nos animais
domésticos são aquelas que têm sua origem na deficiência de selênio ou vitamina
E ou de ambos. Caracteristicamente, estas são doenças agudas que, com maior,
mas não com exclusividade, afetam animais jovens em idade de amamentação. Os
sinais clínicos variam enormemente, dependendo da distribuição e gravidade do
dano muscular. Freqüentemente, estes incluem rigidez ou incapacidade para ficar
em pé como resultado de danos simétricos ao cinturão muscular ou aos grandes
músculos dos membros. Complicações, tais como inabilidade em mamar ou
broncopneumonia, podem levar a prostração e morte dentro de poucos dias a , 1
semana após o início dos sintomas. Falha cardíaca aguda é freqüentemente a causa
determinante da morte, especialmente em bezerros.
As lesões no coração ou no músculo esquelético variam de áreas levemente
descoloridas difusas até estrias ou manchas brancas bem definidas e são quase
sempre simétricas e bilaterais. Muitos músculos podem ser envolvidos, mas as
lesões macroscópicas são mais comuns no coração ou nos grandes músculos do
cinturão escapular, dorso e coxas; os músculos do diafragma e língua também
podem ser afetados. Exemplos têm sido descritos na maioria dos animais domés-
ticos e de laboratório, sob uma variedade de nomes, incluindo distrofia muscular,
doença do músculo branco (DMB), distrofia muscular nutricional (DMN), doença do
cordeiro rígido, mieloencefalopatia degenerativa em eqüinos, paralisia da última
lactação, carne branca, carne de peixe, degeneração cerácea, mioglobinúria
paralítica e miopatia sensível a selênio.
Alterações patológicas em outros tecidos ocorrem freqüentemente em associa-
ção a algumas miopatias. Estas incluem necrose do fígado, edema subcutâneo e
pulmonar com exsudação para dentro das cavidades corporais, esteatite, ulceração
gástrica, necrose pancreática, miopatia da moela, anemia lipofuscinose intestinal,
degeneração testicular, morte e reabsorção embrionária, encefalomalacia, e outras
lesões no sistema nervoso. Em alguns casos, as lesões em outros tecidos predo-
minam ou parecem constituir a patologia única: por exemplo, diátese exsudativa (ver
págs. 1543 e 1545) e encefalomalacia em pintos (ver pág. 1545); necroses cardíaca,
hepática, muscular e renal em camundongos; necrose hepática dietética em ratos;
e talvez necrose hepática maciça em ovinos. Alguns relatos atribuem um papel
Miopatias 661

causador à deficiência de selênio e vitamina E na ocorrência destas miopatias e das


mastites, metrites, retenção de placenta, cistos ovarianos e desempenho reprodutivo
prejudicado em gado leiteiro, além da imunossupressão em bezerros.
Além das alterações estruturais nas várias miopatias, alterações bioquímicas
podem ser detectadas no tecido muscular, sangue e urina. Baixas concentrações de
creatina muscular são geralmente observadas, associadas ao aumento de cálcio e
sódio e diminuição de potássio. Os níveis séricos de selênio em animais miopáticos
diminuem bem como a atividade de peroxidase glutationa, embora as atividades de
desidrogenase láctica, AST (SGOT) e creatinina fosfoquinase sérica (CPK) aumen-
tem. A urina freqüentemente tem uma elevada proporção creatina:creatinina como
resultado do aumento de excreção de creatina e pode conter mioglobina.

Miopatia nutricional de cordeiros e bezerros


(Doença do músculo branco [DMB], Doença do cordeiro rígido, Distrofia muscular
enzoótica)
É uma miodegeneração que, freqüentemente, ocorre em bezerros e cordeiros
cujas mães tenham recebido alimentação deficiente de selênio durante ou antes da
gestação. Leguminosas, que crescem em certas áreas onde o selênio é deficiente
ou inaproveitável no solo, parecem estar particularmente envolvidas, aparentando
serem menos eficientes que as gramíneas na retirada de selênio do solo. Quando
a dieta é restrita a estas leguminosas, como na criação extensiva de bovinos ou
ovinos, vacas e ovelhas podem receber selênio insuficiente. Esta condição tem sido
relatada em muitos países e tem sido reproduzida experimentalmente em várias
espécies de animais pela restrição da ingestão de selênio e vitamina E. Uma
miopatia similar ocorre naturalmente em bovinos de 1 ano ou adultos jovens,
caprinos (ver pág. 610), cervos, potros, cavalos adultos, cães, coelhos, aves, peixes
e vários animais de laboratório e selvagens.
Etiologia – Algumas miopatias (sobretudo em herbívoros) e algumas condições
citadas anteriormente têm sido atribuídas a uma deficiência de vitamina E, que pode
ser causada por grandes quantidades de ácidos graxos insaturados e outras
substâncias formadoras de peróxidos na dieta, por exemplo, a suplementação
contínua com óleo de fígado de bacalhau tem induzido casos de deficiência de
vitamina E. A DMB em bovinos em pastagem após a primavera tem sido atribuída
à absorção da porção de ácidos graxos poliinsaturados presentes nos brotos do
capim que escapam à hidrogenação ruminal. Em muitos casos de miopatia nutricio-
nal, está presente a deficiência de selênio. Esta pode ser uma simples deficiência
causada em animais que ingerem forragens cultivadas em solos deficientes de
selênio ou este selênio pode existir, mas ser precipitado pelo efeito antagonista
de vários metais (prata, cobre, cobalto, cádmio, mercúrio, estanho). Uma alta
ingestão de fósforo na dieta aumentou a gravidade da DMB e resultou em diminuição
do teor de selênio hepático em ovinos. A aplicação de enxofre nas pastagens, como
enxofre elementar ou gipsita (gesso), pode interferir na absorção de selênio pelas
forragens e precipitar a doença nos ruminantes.
Algumas miopatias e condições relacionadas respondem somente ao selênio,
algumas somente à vitamina E e outras aos dois. Embora a vitamina E não possa
satisfazer completamente as necessidades de selênio, ela pode reduzir as quanti-
dades requeridas para proteção contra a diátese exsudativa. O inverso também é
verdadeiro. Uma deficiência de vitamina E em pintos (ver pág. 1545) aparentemente
leva ao desenvolvimento de encefalomalacia e distrofia muscular, mesmo na
presença de selênio suficiente para proteger contra a diátese exsudativa (uma dieta
pobre em metionina e cistina). Semelhantemente, o selênio não pode repor a
vitamina E para prevenir a esterilidade e a miopatia em alguns animais experimen-
tais (coelhos) ou encefalomalacia em pintos, produzida por dietas deficientes em
Miopatias 662

vitamina E. Inversamente, uma infertilidade ocorrida naturalmente em ovelhas,


aparentemente, relacionada a mortes fetais e, algumas vezes, associada à alta
incidência de DMB em cordeiros que recebem níveis adequados de vitamina E,
responde notavelmente à pequena suplementação de selênio, o que também ocorre
na alopecia em ratos e primatas. A necrose hepática observada em ratos e suínos
parece responder a qualquer um dos dois nutrientes.
Achados clínicos – O tipo congênito de miopatia pode resultar em morte súbita
dentro de 2 a 3 dias após o nascimento, geralmente com o envolvimento do
miocárdio. O tipo tardio de DMB está associado ao envolvimento do músculo
cardíaco e/ou esquelético e pode ser precipitado por exercício vigoroso. Os animais
afetados movem-se rigidamente com um arqueamento do dorso e, freqüentemente,
ficam em decúbito. Se a condição é grave o suficiente para impedir a amamentação,
por disfunção dos músculos da perna ou da língua, ocorrerá morte por inanição.
Algumas vezes há diarréia profusa. Em casos crônicos, pode haver relaxamento da
cintura escapular e espaçamento das pinças. A falha cardíaca progressiva resulta
em dispnéia. Sinais variam com o estado dietético de selênio e, em algumas áreas,
o mau aspecto geral pode ser o único sinal associado à deficiência de selênio.
Lesões – As lesões musculoesqueléticas são geralmente bilaterais e simétricas
e podem afetar um ou mais grupos musculares. Macroscopicamente, o músculo
afetado é pálido e seco e pode apresentar estriações longitudinais distintas ou uma
pronunciada brancura com aspecto de giz devido à deposição anormal de cálcio
mas algumas vezes o envolvimento pode ser difuso. Ocorrem lesões cardíacas
como placas subendocárdicas bem definidas que, freqüentemente, são mais
pronunciadas no ventrículo direito em cordeiros. Em bezerros, o ventrículo esquerdo
é geralmente afetado. Microscopicamente, foram estabelecidas evidências das
alterações seqüenciais na musculatura danificada, progredindo do edema mitocon-
drial e lise miofibrilar para necrose hialina ou granular. Quando o coração está
envolvido, as fibras de Purkinje podem estar danificadas; as efusões pleural,
pericárdica e peritoneal com congestão e edema pulmonares não são incomuns.
Diagnóstico – Em cordeiros, a artrite infecciosa não supurativa produz uma
síndrome clínica similar à da DMB e a morte súbita por falha cardíaca pode ser
confundida com enterotoxemia. A história e os achados de necropsia, entretanto,
são geralmente característicos. Em casos moderados e em cordeiros muito jovens,
exames laboratoriais, tais como exame histopatológico, avaliação dos níveis de
peroxidase glutationa, AST (SGOT) e CPK podem ser necessários.
Em bezerros, a síndrome típica e as lesões são razoavelmente definidas. Em
casos moderados – e particularmente em animais idosos – o diagnóstico pode ser
difícil e os exames laboratoriais (como com cordeiros) tornam-se necessários.
Prevenção – Para se prevenir a ocorrência de DMB durante as 4 semanas após
o nascimento, deve-se dar oralmente ou por via s.c. 5mg de selênio (Se) para
ovelhas e 15mg de Se para as vacas, geralmente como selenito de sódio 4 semanas
antes do parto. Para se prevenir DMB tardia, cordeiros devem receber 0,5mg e
bezerros 5mg de selênio com 2 a 4 semanas de idade; repetindo-se a dose mais 2
vezes a intervalos mensais. Uma mistura de selênio e vitamina E é indicada para
algumas áreas. Outros procedimentos para a suplementação com selênio incluem
a administração de pílulas de selênio intra-ruminais, utilização de sal enriquecido
com selênio ou misturas minerais, implante subcutâneo de pílulas de selênio, ou
aplicação de selênio no solo na dosagem de 4g/acre (10g÷hectare) no fertilizante.
A adição de selênio na alimentação para animais de reprodução ou seus
produtos é usada em áreas de conhecida deficiência ou indisponibilidade desse
elemento. O nível da suplementação recomendada é de 0,3ppm de selênio,
calculado com base na matéria seca total ingerida. Ele é adicionado como selenito
de sódio, que contém 45,65% de selênio e, devido à pequena quantidade envolvida
Miopatias 663

e à toxicidade da ingestão excessiva, são necessárias a pré-mistura e subseqüente


mistura. Em alguns países, incluindo os EUA, a adição de selênio na alimentação
é controlada por lei e autoridades apropriadas devem ser consultadas; em todas as
áreas, recomenda-se cuidado em seu uso.
Tratamento – Cordeiros e bezerros devem receber selenito de sódio e vitamina
E em emulsão estéril, por vias s.c. ou IM, na proporção de 1mg de selênio e 50mg
(68UI) de vitamina E por 18kg de peso corporal. Este pode ser repetido após 2
semanas, mas não exceder 4 doses. Grandes doses são aconselhadas às vezes,
mas é necessário cuidado quando elas se aproximam dos níveis tóxicos. Na
prática, vários produtos são de valor para o uso nas espécies animais para as quais
estes foram destinados. Quando uma simples deficiência de vitamina E for aparente,
a suplementação dietética com α-tocoferol ou substâncias ricas nesta vitamina deve
ser instituída. As doses mínimas não foram estabelecidas; entretanto, têm sido
relatadas curas após doses diárias de 5mg de α-tocoferol para coelhos; 500mg
inicialmente, seguidos por 100mg em dias alternados para cordeiros e 600mg
inicialmente seguidos por doses diárias de 200mg para bezerros. Quando a dieta
fornecida contiver substâncias antagonistas da vitamina E, tal como gordura
poliinsaturada desprotegida, estas devem ser removidas ou estabilizadas pela
adição do antioxidante adequado. Concentrados secos de vitaminas A e D devem
ser substituídos por óleo de fígado de bacalhau removendo-se, assim, uma fonte
potencial de dano oxidativo.

Miopatias nutricionais, esqueléticas e cardíacas em suínos


(Hepatose dietética, Doença do coração de amora)
Há várias doenças específicas de suínos em que as degenerações musculares
podem ser muito extensas, tais como a doença do coração de amora (DCA) e outras
nas quais a degeneração é freqüentemente conspícua, tais como a hepatose
dietética (HD).
Etiologia – A DCA e a HD estão associadas com dietas pobres em selênio ou
vitamina E. A administração de ferro dextrano a leitões que tenham baixa taxa de
vitamina E pode precipitar uma miopatia grave (ver pág. 2028), com lesões idênticas
à deficiência de selênio e vitamina E. Outros fatores que podem aumentar as
necessidades de selênio incluem dietas pobres em proteína, especialmente as que
contêm concentrações de aminoácidos sulfurados, alimentação com excesso de
compostos antagonistas do selênio, e possíveis influências genéticas no metabolis-
mo do selênio. A vitamina E pode estar menos disponível em dietas com alta
concentração de ácidos graxos poliinsaturados, vitamina A, ou micotoxinas. Há
evidência de que a DCA nem sempre é causada pela deficiência de vitamina E/
selênio. Parece estar relacionada ao crescimento rápido de leitões muito jovens.
Achados clínicos – Estas condições têm certas características em comum. As
perdas tendem a ocorrer esporadicamente, afetando porcos de crescimento rápido
entre 2 e 16 semanas de idade. A morte, quase invariavelmente, ocorre de forma
súbita e é com freqüência precipitada pelo exercício.
Lesões – Na DCA, a lesão característica é a presença de um saco pericárdico
macroscopicamente distendido que contém um líquido cor de palha e filamentos de
fibrina, além de extensa hemorragia por todo o miocárdio e epicárdio. Microscopi-
camente, o coração apresenta tanto lesão vascular como miocítica; em adição à
hemorragia intersticial, há normalmente extensa necrose do miocárdio associada a
trombos de fibrina dentro dos capilares. Se os animais sobreviverem por alguns dias,
os sinais nervosos podem ser vistos, resultando de encefalomalacia focal.
Na HD, há freqüentemente edema subcutâneo associado a quantidades va-
riáveis de transudato nas cavidades serosas. Filamentos de fibrina aderem-se ao
Miopatias 664

fígado, que tem uma aparência de noz-moscada característica, causada pelos focos
irregulares de necrose do parênquima e hemorragia. Lesões focais de necrose do
miocárdio e, menos freqüentemente, mionecrose esquelética podem ser aparentes.
As lesões agudas podem apresentar-se sob a forma de lóbulos difusos avermelhados
e inchados, e edema da parede da vesícula biliar.
Muitos suínos que morrem por deficiência de selênio/vitamina E apresentam
ulceração esofagogástrica ou alterações pré-ulcerativas.
Diagnóstico – A história e os achados macroscópicos da necropsia são
normalmente distinguíveis, mas histologia para demonstrar lesões cardíacas e
musculoesqueléticas específicas pode ser necessária. Os diagnósticos diferenciais
para DCA incluem doenças septicêmicas agudas (por exemplo, salmonelose,
erisipela, e estreptococose), pericardite, polisserosite e doença do edema. Para a
HD, envenenamento por betume e toxicose por gossipol devem também ser
consideradas e, em porcos com lesões acentuadas na musculatura esquelética, a
síndrome do estresse porcino deve ser considerada. Como em outras espécies com
deficiência de vitamina E/selênio, casos subclínicos podem ser identificados pela
diminuição dos níveis de selênio, vitamina E de glutationa peroxidase no soro e nos
tecidos e pelo aumento dos níveis de CPK e AST (SGOT) no soro.
Prevenção e tratamento – As rações podem ser suplementadas com selênio ou
vitamina E ou com ambos, como se faz com os ruminantes. Os suínos afetados e
seus companheiros de rebanho devem ser tratados com injeções de selênio e
vitamina E para elevar rapidamente os níveis teciduais. A injeção em porcas no final
da gestação aumenta os níveis teciduais em leitões recém-nascidos.

Miopatia nutricional dos Equidae


A miodegeneração associada à deficiência de selênio/vitamina E pode ocorrer
em cavalos adultos, jumentos e mulas. A doença em eqüídeos adultos pode
manifestar-se na forma aguda, com morte súbita e inesperada, ou na forma
subaguda, por um andar incoordenado, mioglobinúria, disfagia com inchaço dos
músculos masseteres e linguais, dispnéia e taquicardia. As lesões incluem mús-
culos esqueléticos e o miocárdio. O diagnóstico e tratamento são semelhantes ao
dos ruminantes e suínos (ver anteriormente). Em potros, uma miopatia que parece
semelhante aos distúrbios responsivos a selênio/vitamina E de outras espécies
pode ocorrer no nascimento ou logo após, sendo acompanhada por esteatite ou
“doença de gordura amarela” (ver adiante). O enrijecimento e dor à palpação das
massas adiposas subcutâneas são notáveis, e os potros gravemente afetados
podem ficar incapazes de mamar. Os níveis de selênio e de glutationa peroxidase
nos potros afetados podem não ser inferiores aos normais. O tratamento com
vitamina E parece ser mais eficaz do que com selênio.

Doença da “gordura amarela”


(Esteatite nutricional, Paniculite nutricional)
É uma doença caracterizada por uma marcante inflamação do tecido adiposo e
por deposição de pigmento “ceróide” nas células adiposas. A doença pode ocorrer
isoladamente em gatos ou acompanhada por miopatia em ratos, visons, potros e
suínos afetados.
Acredita-se que uma superabundância de ácidos graxos insaturados na ração,
juntamente com uma deficiência de vitamina E ou outros antioxidantes, resulte na
peroxidação e deposição de pigmento “ceróide” sobre o tecido adiposo. A maioria
dos casos ocorridos naturalmente e dos casos reproduzidos experimentalmente
tem ocorrido em animais que tinham tido peixe ou produtos à base de peixe na dieta.
Cogita-se que a causa específica esteja relacionada à alta insaturação dos ácidos
Miopatias 665

graxos do óleo de peixe e à carência de proteção pela vitamina E e outros elementos


antioxidantes.
Os gatos afetados estão freqüentemente obesos, geralmente são jovens e
podem ser de ambos os sexos. Apresentam perda da agilidade e indisposição para
se mover. Há sensibilidade à palpação do dorso ou abdome. Em casos avançados,
mesmo com um leve toque, pode-se causar dor. A febre é um achado constante e
a anorexia pode estar presente.
Em visons, os filhotes podem ser afetados pela esteatite pouco tempo após o
desmame e se não forem tratados, as perdas podem prolongar o tempo para esfola.
Os sinais surgem subitamente, os filhotes podem rejeitar a comida durante a noite
e estar mortos pela manhã. Os animais afetados podem recusar sua alimentação e
apresentar um “movimento saltitante incoordenado” peculiar, que leva à completa
incapacidade de locomoção e coma. No momento da esfola, os sobreviventes
apresentam depósitos de gordura amarela e hemoglobinúria.
O achado laboratorial típico é uma contagem de leucócitos elevada com
neutrofilia e, algumas vezes, eosinofilia. A biópsia da gordura subcutânea apre-
senta-a marrom-amarelada e firme. O exame microscópico revela graves alterações
inflamatórias e presença de pigmento ceróide associado.
Uma síndrome de certa forma similar, causada por infecção por fungos ou
bactérias (por exemplo, Mycobacterium), ocorre nos mesmos animais e em outros,
incluindo o cão.
O alimento causador deve ser removido da dieta. É necessária a administração
de vitamina E em forma de α-tocoferol, pelo menos 30mg diários para gatos ou 15mg
diários para o visom. Os antibióticos são de valor duvidoso, a despeito da febre e da
leucocitose. O uso de fluidos parenterais não é aconselhável, a menos que exista
desidratação. Em virtude da dor associada, os pacientes devem ser manuseados o
menos possível.

Polimiopatia hipocalêmica em gatos


Os gatos afetados apresentam fraqueza muscular generalizada de início súbito,
ventroflexão persistente do pescoço, dor muscular aparente à palpação, andar
enrijecido e entrecortado, e relutância em andar. A administração de potássio VO ou
parenteralmente reverte a síndrome. Os gatos afetados apresentam atividade
sérica elevada da CPK e baixas concentrações séricas de potássio. As biópsias
musculares não revelam alterações ou, ocasionalmente, revelam leve mionecrose.
Os gatos afetados exigem suplementação dietética com potássio por longo prazo
para prevenir recaídas.

MIOPATIAS TÓXICAS
Ver também INTOXICAÇÃO POR FERRO EM LEITÕES RECÉM-NASCIDOS, página 2028.

Toxicidade ionófora
Monensina, lasalocida, salinomicina e narasina podem causar miopatias. Ca-
valos são altamente suscetíveis e relatos de intoxicação também existem para
bovinos, ovinos, suínos, cães, galinhas, perus e galinhas-d’angola. A intoxicação é
geralmente resultado da exposição a premix não diluídos ou de erros de mistura. A
toxicidade pode ser potencializada por vários antibióticos e sulfonamidas acres-
centadas à ração em combinação aos ionóforos. Os cavalos e bovinos afetados
podem desenvolver anorexia, falhas cardíacas com taquicardia, dispnéia, diarréia,
enrijecimento, enfraquecimento muscular e mioglobinúria. À necropsia, estão
presentes áreas pálidas de necrose miocárdica e congestão pulmonar, geralmente
Miopatias 666

proeminentes em eqüinos e bovinos. Suínos e ovinos tendem a ter principalmente


lesões musculoesqueléticas que parecem muito similares àquelas da miopatia
nutricional, tanto macroscópica quanto histologicamente. O diagnóstico requer a
história de exposição com desenvolvimento de alterações clínicas e patológicas
características.

Intoxicação por plantas


Ocorrem degenerações dos músculos cardíaco e esquelético quando bovinos e
outros animais (principalmente caprinos) consomem frutas ou grãos de certas
plantas. A Karwinskia humboldtiana (coyotillo) e o Cassia spp (sena) têm sido
incriminados, mas outras espécies também podem causar danos. Animais afetados
mostram debilidade e anormalidades no modo de andar. Há palidez nos músculos
gravemente degenerados. As lesões microscópicas consistem em necrose hialina
e degeneração granular. Algumas enzimas sangüíneas estão elevadas e pode
ocorrer mioglobinúria. O tratamento consiste na remoção do animal da área de
pastagem contaminada e na alimentação suplementar.

MIOPATIAS DE ESFORÇO
Azotúria e síndrome da paralisia ou “cording-up” dos cavalos
(Mioglobinúria paralítica, Rabdomiólise de esforço)
A síndrome da paralisia ou “cording-up” é considerada uma forma suave de
azotúria e, portanto, tem uma etiologia similar. Os termos são usados principalmente
para cavalos leves e para raças mais pesadas, respectivamente; ambos estão
associados com miopatia esquelética (ver também EXAUSTÃO FÍSICA, pág. 546).
Etiologia – A causa destas entidades é desconhecida. São, em geral, direta-
mente relacionadas ao exercício forçado após um período de repouso durante o qual
a alimentação não tenha sido restrita, porém a doença já foi observada em cavalos
no pasto. A causa parece estar relacionada mais ao excesso do consumo total de
alimentos energéticos do que especificamente ao conteúdo de carboidratos da
dieta, como já foi suspeitado.
Achados clínicos – Na síndrome da paralisia e na azotúria, os primeiros
sinais são sudorese profusa, estremecimento e pulso rápido, seguidos de
fraqueza dos membros traseiros, que resulta em enrijecimento da andadura e
relutância em mover-se e, em casos graves, mioglobinúria. Na azotúria, a doença
rapidamente progride para o decúbito, freqüentemente com sinais nervosos.
Atividades séricas elevadas de AST (SGOT) e creatinina fosfoquinase (CPK) são
indicadores úteis para verificar a extensão do dano muscular. O prognóstico
depende da extensão do dano muscular e é bom para aqueles animais que
permanecem em pé. Ele também é razoavelmente bom para aqueles animais que
deitam devido à perda de função de seus quartos traseiros, desde que eles fiquem
sossegados e bem acomodados e que o pulso retorne ao normal em 24h.
Entretanto, os sobreviventes, algumas vezes, sofrem de claudicação e atrofia
muscular prolongada ou, ocasionalmente, permanente.
O prognóstico é ruim para animais nervosos, inquietos e que, em decúbito,
continuam a se debater e não são acalmados por sedativos ou tranqüilizantes. É
igualmente ruim para aqueles que são forçados a continuar movimentando-se após
os sinais tornarem-se aparentes. É também um mau sinal após 24h, o paciente
apresentar progressiva incapacidade em apoiar-se sobre seu esterno e manter-se
naquela posição. Um pulso fraco ou irregular é um sinal ainda mais desfavorável.
Lesões – Estão presentes extensas áreas pálidas de mionecrose, especialmen-
te nos músculos da coxa, pelve e lombo. Os músculos geralmente estão úmidos e
Miopatias 667

escuros, mas áreas pálidas de necrose miocárdica e aumento de volume dos rins,
com córtex marrom e faixas marrom-avermelhadas na medula também podem ser
observados. A urina marrom reflete a mioglobinúria. Estudos microscópicos revelam
degeneração hialina, mionecrose e nefrose mioglobinúrica. Calcificações normal-
mente não aparecem.
Tratamento – O bom manejo é importante. O paciente deve ser mantido o mais
quieto possível, e devem ser feitas tentativas para manter-se o animal em pé.
Atenção especial deve ser dada para o conforto do cavalo e precauções devem ser
tomadas contra o desenvolvimento das úlceras de decúbito. Os indivíduos nervo-
sos, inquietos ou aqueles que apresentam evidências de dor, devem receber
sedativos, tais como hidrato de cloral ou tranqüilizantes. Se as condições indicarem
um período de decúbito, deve ser indicado um laxante oleoso. Purgantes de ação
rápida, tais como arecolina e fisostigmina, não devem ser usados.
Quando os sinais são leves, sem nenhum histórico prévio de ocorrência e com
as atividades enzimáticas séricas sem elevação significante, pode ser suficiente
somente a tranqüilização moderada. Cavalos mais severamente afetados não
devem ser movimentados, mas devem ser mantidos num lugar protegido. Eles
devem ser friccionados a seco e cobertos de acordo com o tempo. Injeções de
selênio e vitamina E parecem ter resultados favoráveis em muitos casos, no entanto,
não foi encontrada nenhuma evidência de deficiência de base de selênio/vitamina
E nos cavalos afetados.

Rabdomiólise de esforço em cães


Ocasionalmente, uma síndrome semelhante à azotúria ocorre em cães após
exercício intenso. A condição normalmente é reportada em greyhounds de corrida
ou cães de caça, mas pode seguir lutas em cães agressivos de qualquer raça. Os
sinais típicos incluem a rigidez lombar muscular, poliúria, polidipsia e mioglobinúria.
As enzimas séricas estão elevadas e, em casos graves, há completa falha renal. O
diagnóstico presuntivo é baseado nos sinais clínicos e na história e confirmado pela
biópsia renal. Casos suaves podem ser beneficiados pelos fluidos EV, para
combater o choque e ajudar na excreção renal da mioglobina, e pela injeção EV de
uma solução de bicarbonato a 4,2% (20mL/kg) inicialmente e continuada (a 1,4%)
por mais 2 a 3 dias. A mortalidade relatada é de , 25%.

Miopatia da captura dos animais selvagens


Esta síndrome, freqüentemente ocorre após a contenção de animais selvagens.
Os animais afetados podem morrer com quadro agudo de acidose láctica ou
podem sobreviver vários dias e apresentar enrijecimento muscular ou até mesmo
decúbito. Lesões musculoesqueléticas graves, associadas à necrose miocárdica e
nefrose mioglobinúrica podem estar presentes. São usados no tratamento, o
manuseio cuidadoso e a redução do estresse. Os fluidos EV e o bicarbonato de sódio
podem ajudar. Se os animais são originários de áreas consideradas deficientes em
selênio, o problema pode ser uma miopatia induzida por exercício que responde a
administração de selênio/vitamina E (ver também HIPERTERMIA MALIGNA, pág. 541).

MIOPATIAS DIVERSAS
Miopatia isquêmica
A trombose da artéria ilíaca em cavalos resulta em necrose isquêmica extensa
da musculatura do membro posterior. Em bovinos, a necrose maciça da musculatura
da coxa pode estar presente na “vaca caída” (ver pág. 669) e é, provavelmente,
decorrente do efeito de isquemia e trauma físico associado ao decúbito prolongado
e ao esforço fracassado para se levantar.
Miopatias 668

Miopatia pós-anestésica em eqüinos


As complicações da anestesia geral em eqüinos podem causar lesões mus-
culares devidas à isquemia regional por hipotensão arterial induzida pela anestesia.
Esta síndrome pode ocorrer como uma forma localizada em grupos musculares em
contato com a mesa cirúrgica, ou de forma generalizada com características
semelhantes à azotúria.

Miopatia fibrótica e ossificante dos cavalos quarto de milha


A ruptura física de músculos, especialmente no posterior da coxa, durante o
exercício intenso, resulta em cicatrização com fibrose extensa e ossificação. As
lesões também têm sido associadas às injeções IM (ver também pág. 640).

M IOSITE DE ETIOLOGIA INDETERMINADA


Miosite eosinofílica em cães
(Miosite atrófica)
É uma inflamação aguda e recidivante dos músculos. A doença é comum em
cães pastores alemães e afeta mais freqüentemente, os músculos da mastigação.
A causa é desconhecida, mas evidências recentes corroboram bastante o papel de
uma lesão imunomediada seletiva dirigida contra proteínas específicas das fibras
musculares mastigatórias do Tipo 2M.
O início é normalmente abrupto. Durante um ataque, a mandíbula torna-se
fixada, os músculos da mastigação incham simetricamente e interferem na
drenagem dos tecidos retrobulbares, produzindo edema na conjuntiva, prolapso
da membrana nictitante e exoftalmia. A boca é mantida parcialmente aberta e o
animal sofre dor considerável, comendo com dificuldade. Os ataques duram de
1 a 3 semanas e em miosite eosinofílica são acompanhados por uma eosinofilia
marcante. Na miosite atrófica, que ocorre em outras raças de focinho comprido,
a eosinofilia é leve ou ausente. O período entre os ataques varia de 3 semanas
a 6 meses. Após cada ataque, os músculos afetados tornam-se mais atrofiados.
Com cada ataque sucessivo, a gravidade diminui e o intervalo entre eles tende
a encurtar. Em estágios tardios, o envolvimento do esôfago torna a deglutição
dificultosa.
Durante o ataque agudo, os músculos afetados são aumentados de volume e
tomam uma consistência flácida, estão escurecidos, hemorrágicos e apresentam
focos pálidos. Os linfonodos regionais estão aumentados e firmes. Nos primeiros
ataques, as lesões estão confinadas aos músculos da mastigação; com os ataques
contínuos, músculos adicionais podem ser envolvidos. A lesão histológica é uma
miosite eosinofílica aguda. Embora a infiltração eosinofílica seja normalmente muito
difusa, o envolvimento muscular real é desigual. Freqüentemente, as fibras muscu-
lares necrosadas parecem ser focos de reação. Em lesões tardias, atrofia extensa
e fibrose, além de infiltração de células plasmáticas e linfócitos, estão presentes nos
músculos mastigatórios afetados.
A natureza periódica da doença e sua seletividade incomum para localização e
raça, normalmente, fazem o diagnóstico óbvio. A eosinofilia é geralmente de suporte
e, se restar qualquer dúvida, o exame histológico pode ser usado, através de uma
biópsia, para confirmar o diagnóstico.
A doença é progressiva e nenhuma terapia tem, até agora, sido eficaz para alterar
sua natureza e curso recorrentes; entretanto, o uso de corticosteróides e ACTH
minimiza marcantemente o desconforto e o aumento de volume muscular durante
o ataque.
Paresia Neuromuscular ou Esquelética em Vacas após Decúbito Prolongado 669

Miosite eosinofílica em bovinos e ovinos


É uma mionecrose focal associada a grande número de granulócitos eosino-
fílicos. Mortes súbitas podem envolver miocardites em bovinos e ovinos. A causa é
desconhecida na maioria das circunstâncias, mas a presença de Sarcocystis spp
(ver pág. 562) degenerados no centro de algumas lesões necróticas sugere que
eles podem ser implicados. Alternativamente, a causa pode ser uma reação
alérgica concentrada no músculo. Ao abate, esta condição é vista como uma
descoloração focal cinza-esverdeada na musculatura esquelética e ocasional-
mente cardíaca que desaparece quando exposta ao ar.

Polimiosite em cães
Os cães afetados podem apresentar músculos rijos e doloridos e atrofia mus-
cular, ser intolerantes ao exercício, e apresentar disfagia devido ao comprometi-
mento dos músculos esofágicos e laríngeos. A doença, que ocorre em cães adultos
de raças grandes, pode se desenvolver de forma aguda ou apresentar um curso
lento e progressivo; suspeita-se que seja imunomediada. O diagnóstico é confirma-
do por biópsias musculares que mostram infiltrações focais de linfócitos e células
plasmáticas com necrose concomitante de fibras musculares. A maioria dos casos
responde à terapia com corticosteróides.

PARESIA NEUROMUSCULAR OU
ESQUELÉTICA EM VACAS APÓS
DECÚBITO PROLONGADO
(Vaca caída)

Vacas em decúbito que não tenham respondido ao tratamento da doença


primária, ou inicialmente diagnosticada, podem ser referidas como “vacas caídas’’.
Estas vacas estão geralmente alertas, sem problemas nos membros anteriores, mas
têm paresia ou paralisia dos posteriores. Esta síndrome desenvolve-se mais comu-
mente após a paresia parturiente (ver pág. 544), mas pode ser uma seqüela de
qualquer doença que cause decúbito por poucas horas, por exemplo, metrite,
mastite, paralisia do parto (ver pág. 596), cetose, artrite, exaustão, tetania das
pastagens, intoxicação, anestesia e traumatismo (ver também PROTEÍNA, NUTRIÇÃO:
BOVINOS, pág. 1441).
Evidências experimentais têm demonstrado que, por < 6h, a pressão sobre o
nervo ciático e músculos caudais da coxa de uma “vaca caída” pode causar paresia
ou paralisia dos membros posteriores. A pressão causa grave mionecrose isquêmi-
ca e neuropatia (a síndrome “compartimental” ou de “esmagamento”). Vacas
paréticas em decúbito sobre pisos de concreto estão especialmente em risco
sobretudo quando a vaca não for capaz de virar-se sozinha de um lado para o outro.
Assim, esta síndrome tem uma via comum final de patogenia, mas muitos fatores
iniciantes são possíveis. As causas destes fatores devem ser diagnosticadas de
modo que medidas preventivas, prognósticos e terapêuticas específicas sejam
instituídas.
Achados clínicos – As vacas afetadas são normalmente observadas de 6 a 24h
após o tratamento para a paresia parturiente, quando são ainda incapazes de se
levantar, embora em geral tenham respondido bem à terapia com cálcio em todos
os outros aspectos. Os sinais vitais estão dentro dos índices normais; elas estão
Paresia Neuromuscular ou Esquelética em Vacas após Decúbito Prolongado 670

vivas, alertas e podem comer e ruminar, embora seu apetite esteja normalmente
diminuído. Não há outras anormalidades clínicas, mas, quando forçadas a se
levantar, elas nem o tentam ou fazem tentativas fracassadas. Em alguns casos, esta
tentativa frustrada é associada à incapacidade do animal de estender os boletos e
flexionar os jarretes. Esta é uma indicação de provável dano ao nervo ciático ou a
seu ramo peroneal, sofrido enquanto a vaca esteve em decúbito pela paresia
puerperal. O exame clínico não revela grave necrose nervosa ou muscular na coxa.
A velocidade de condução nervosa entre o sulco ciático (ísquio) e a face lateral da
soldra pode ser medida para confirmar a lesão. A velocidade normal de condução
do nervo fibulociático é de 80 a 110m/s. Um nervo ciático danificado apresenta
condução mais lenta (< 50m/s).
Os níveis séricos de cálcio, magnésio e fósforo inorgânico estão normalmente
abaixo do normal após o tratamento adequado para a hipocalcemia inicial. As
enzimas séricas ( AST [SGOT], CPK) estão marcantemente elevadas dentro de 12
a 36h devido à necrose isquêmica muscular.
Tratamento – Há pouco suporte experimental para qualquer dos tratamentos
que têm sido sugeridos. Estes incluem a administração de fósforo, potássio, ACTH,
corticosteróides e anti-histamínicos. Cálcio adicional deve ser dado somente com
muito cuidado, para vacas em decúbito, se elas não apresentarem outros sinais de
hipocalcemia. A boa enfermagem é o melhor tratamento; a vaca em decúbito deve
ser removida rapidamente (e com cuidado) para uma área com cama profunda e
macia e com um bom apoio para as patas (ou no exterior ou sobre pacotes de
estrume seco). Muitas vacas podem, então, mover-se de um lado para o outro;
aquelas que não o conseguem devem ser viradas a cada 2 a 4h. Seus membros
posteriores devem ser flexionados, estendidos e massageados. Enfermagem
adequada e alimentação cuidadosa são essenciais para a boa recuperação. A
maioria das vacas afetadas tenta levantar-se em 1 semana; aquelas que se mantêm
em decúbito por 2 semanas, sem melhora, são incapazes de se levantar para
sempre, mas, se tratados com suficiente atenção, alguns destes casos aparente-
mente perdidos podem se recuperar. Em vacas paréticas (fracas) ou atáxicas, pode
ser notado um apoio temporário sobre o boleto, decorrente de lesões do ciático na
coxa ou dano do nervo peroneal lateral à soldra.
Deve-se tomar muito cuidado se for usada aparelhagem para suspender vacas
grandes; ela pode ser mais danosa do que benéfica pela adição de lesões
musculares. Tipóias são menos propensas a causar lesões adicionais, embora
sejam mais difíceis de usar. Tipóias (ou outras “aparelhagens”) podem ser de grande
ajuda se usadas com cuidado, 1 vez por dia. Se estas não forem usadas, a vaca deve
ser estimulada a levantar-se diariamente – algumas aparentemente não percebem
que se recuperaram. Deve ser mantido bom apoio para a pata a fim de se minimizar
os escorregões. Se uma superfície escorregadia for inevitável, podem ser úteis
sacos de estopa atados sobre as patas ou atá-las juntas com uma corda ou correia
com 1m de comprimento.
Se o ambiente e os cuidados forem inadequados, deve ser considerado o
sacrifício, por razões humanitárias.
Controle – A prevenção e o pronto tratamento da paresia parturiente são os
melhores meios para evitar esta condição. Os tratadores devem aprender a
reconhecer precocemente os sinais clínicos da febre do leite para que as vacas
possam ser tratadas antes do decúbito. As vacas que são propensas à paresia
parturiente devem parir ao ar livre ou em um estábulo com areia e palha ou numa
boa cama de pacotes de estrume. Elas devem ficar em uma destas áreas pelo
menos 4 dias antes e 4 dias após a parição.
Osteíte 671

OSTEÍTE
É a inflamação da medula óssea (osteomielite), osso cortical e periósteo
(periostite), em geral causada por bactérias, ocasionalmente por fungos e raramen-
te por corpos estranhos migratórios ou reação eletrolítica a implantes metálicos.
Etiologia e patogenia – Para produzir a osteíte infecciosa são necessárias
necrose tecidual e presença de um agente infeccioso. Muitos casos são secundários
a trauma, com ou sem fratura, e a cirurgias ortopédicas. Estafilococos, estreptoco-
cos e coliformes usualmente são os responsáveis. Os microrganismos podem
chegar via hematogênica ou pela extensão direta. A osteíte hematogênica é rara,
especialmente em adultos e pequenos animais. Há envolvimento das metáfises
epífises após a bacteremia em potros (Salmonella spp, Escherichia coli) e bezerros
(Corynebacterium [Actinomyces] pyogenes). A localização metafisária e epifisária
é favorecida pela circulação sinusoidal da porção esponjosa. Lesões vertebrais
ocorrem em suínos (Brucella suis) e bezerros (C. pyogenes). A localização vertebral
é permitida pela conexão entre os seios venosos medulares vertebrais e as grandes
veias do abdome e tórax. O Nocardia spp causa, ocasionalmente, osteíte vertebral
toracolombar em cães com infecções intratorácicas.
Em áreas endêmicas, as micoses sistêmicas, coccidioidomicoses (Américas do
Sul e Central, Arizona, Califórnia, Texas) e blastomicoses (África, estados atlânticos
centrais, bacias do Mississipi-Ohio, margem norte de Ontário e Manitoba) freqüen-
temente causam osteíte hematogênica em cães.
Osteíte por extensão direta do microrganismo pode seguir ferimentos de morde-
dura em cães e gatos (Pasteurella spp, anaeróbios orais); corpos estranhos perfu-
rantes, artrite crônica e úlceras de decúbito em grandes animais; e doenças dentárias
em todas as espécies (ver também ACTINOMICOSE, pág. 383). O último exemplo é
decorrente da drenagem linfática periodontal para dentro do osso adjacente.
Achados clínicos e diagnóstico – Dor, aumento de volume de tecidos moles,
elevação da temperatura corporal e, freqüentemente, depressão e anorexia carac-
terizam a osteomielite precoce. Pode se notar leucocitose com desvio à esquerda
e um aumento da taxa de sedimentação. O animal pode estar relutante em usar o
membro.
Se a infecção espalhar-se para uma articulação, ela pode se tornar edemaciada
e dolorosa. Na osteíte crônica, podem-se desenvolver aumento de volume flutuante
ou fístulas que, posteriormente, vêm a drenar. Amostras devem ser coletadas para
cultura e teste de sensibilidade, microscopia dos exsudatos e exames histológicos.
Estas devem ser obtidas profundamente de dentro da lesão, usando-se a exposição
cirúrgica se necessário. Amostras de biópsia devem ser extraídas para evitar as
reações periosteais não específicas.
A radiografia é essencial para se definir a extensão da doença e a resposta ao
tratamento. Em osteomielite precoce pode haver ausência de alterações radiográ-
ficas. Lesões ósseas podem ser visíveis primeiro em , 2 semanas, pelo surgimento
do aumento da densidade medular e espessamento irregular da superfície perios-
teal. Mais tarde, uma extensa neo-ossificação periosteal pode desenvolver-se em
reação à ruptura circulatória e exsudação inflamatória na medula. Raramente,
grandes volumes de ossos desvitalizados (seqüestros) são visíveis quando tornam-
se isolados em pus pelo invólucro vivo.
Em cães, a osteomielite aguda deve ser distinguida radiograficamente de outras
causas de dor óssea, tal como osteopatia hipertrófica e panosteíte. A osteomielite
crônica com reação periosteal deve ser confirmada por biópsia. O carcinoma de
célula escamosa digital é freqüentemente complicado pela osteíte em pequenos
animais e em todas as espécies, a proliferação periosteal é uma resposta não
específica para muitos insultos, incluindo neoplasias e traumatismos.
Osteíte 672

Tratamento – O tratamento efetivo de osteomielite aguda ou precoce depende


da identificação do microrganismo e seu antibiograma. Antibióticos sistêmicos,
preferivelmente bactericidas, são recomendados. Estes incluem ampicilina,
cefaloridina, cloranfenicol, gentamicina e canamicina. O tratamento é aconselhado
por 1 a 2 meses. A drenagem de locais infectados pode ser necessária.
O sucesso com osteomielite crônica depende da terapia prolongada, freqüente-
mente, incluindo a intervenção cirúrgica. Um antibiótico apropriado deve ser iniciado
antes da cirurgia. Todo seqüestro deve ser removido e os tecidos fibrosados e
necróticos, debridados. As fístulas devem ser exploradas e o osso curetado até que
haja sangramento. A fixação interna deve ser deixada se estiver provendo um suporte
rígido. Se não estiver, ela deve ser removida e recolocada de uma forma que o faça.
A ferida cirúrgica deve ser deixada aberta para drenar e cicatrizar por granulação ou
fechada meticulosamente para eliminar todos os espaços mortos, providenciando-
se que drenos sejam instalados. Tubos fenestrados podem ser implantados para
permitir a lavagem com grandes volumes de soluções salinas estéreis, antibacteria-
nas e enzimáticas. O tiloxapol pode ser jorrado para dentro do local, a fim de ajudar
a retirada de material mucóide e manter a drenagem desobstruída.
Em intervalos de 2 a 3 semanas, durante o tratamento, devem ser feitos culturas
e testes de sensibilidade e o progresso do animal seguido clínica e radiografica-
mente. Grandes defeitos cirúrgicos podem ser reparados com enxertos ósseos,
uma vez que a infecção esteja superada. A terapia antibacteriana inadequada da
osteíte aguda pode eliminar os sinais clínicos, mas deixa a infecção persistir, o que
pode levar à osteíte crônica meses ou anos mais tarde. A amputação pode ser o
melhor tratamento inicial na osteíte digital e, em outros casos, ela deve ser
considerada se a terapia intensiva e prolongada falhar.

PANOSTEÍTE CANINA
(Osteomielite juvenil, Panosteíte eosinofílica, Panostose, Enostose)
Trata-se de uma doença caracterizada por uma claudicação intermitente e que
muda de membro, com remissão espontânea, que afeta principalmente cães
machos e jovens (5 a 12 meses) de raças grandes e gigantes, porém cães menores
ou mais velhos também podem ser afetados.
A etiologia é desconhecida. As causas sugeridas incluem alérgenos, hiperestro-
genismo, estresse e agentes infecciosos. Aproximadamente 75% dos casos envol-
vem cães pastores alemães, e , 66% são machos; portanto, fatores genéticos e
hormonais podem ser predisponentes.
A doença se desenvolve como uma área localizada de degeneração granular da
medula óssea adiposa, seguida de edema e proliferação fibrovascular medular,
normalmente próxima da artéria nutriente de um osso longo. Posteriormente, o
tecido fibrovascular se ossifica. O tecido proliferativo pode ocupar a maior parte da
cavidade medular diafisária e, se envolver o endósteo, ocorre uma proliferação
periosteal secundária. Com a remissão, o osso medular e periosteal é reabsorvido,
porém, nos casos crônicos, os ossos longos afetados tornam-se cúbicos, devido à
remodelação repetida.
Uma claudicação que varia de leve a intensa, com dor óssea que tende a ser
intermitente e mudar de membro, é típica. A palpação firme dos ossos longos no
membro afetado pode evidenciar dor. Alguns cães podem estar febris e anoréticos
nos estágios iniciais. Raramente, pode estar presente uma amigdalite. Os ossos
longos, especialmente dos membros anteriores, são afetados com maior freqüên-
cia. O envolvimento ósseo múltiplo ocorre em , 50% dos cães. A remissão espon-
tânea e a exacerbação dos sintomas ocorrem, mas normalmente a doença de um
osso se resolve em 3 meses. Em cães mais velhos, a doença torna-se mais lenta.
Osteocondrose 673

Os achados radiográficos são diagnósticos, porém as lesões podem não ser


visíveis até 10 a 14 dias após o início dos sintomas e, mesmo então, podem ser tão
sutis que escapam da detecção. Podem ser observadas áreas pouco nítidas na
medula ou áreas de densidade de tecido mole na cavidade medular, especialmente
na região da artéria nutriente. Algumas vezes, apenas um enrugamento endosteal
é aparente. Posteriormente, as áreas de radiodensidade podem coalescer e
expandir-se, preenchendo a maior parte do espaço medular. Pode ser observada
uma leve reação periosteal, e a ossificação dos tecidos moles tornará as lesões mais
evidentes.
Não há tratamento específico. Normalmente, o tratamento sintomático com
analgésicos e repouso ou restrição ao exercício, conforme necessário, é o suficien-
te. A panosteíte tende a ter um curso de remissão e exacerbação durante vários
meses. As lesões ósseas regridem gradualmente após os sintomas clínicos desa-
parecerem.

OSTEOCONDROSE
Trata-se de um distúrbio na calcificação endocondral algumas vezes classificado
de condrodisplasia. Pode implicar na separação da cartilagem articular imatura do
osso epifisário subjacente (algumas vezes dissecando-se completamente livre e
flutuando na cavidade sinovial – osteocondrite dissecante), ou pode resultar na
retenção dos núcleos piramidais da cartilagem fisária, projetando-se na metáfise
(por exemplo, osteocondrite em suínos). Muitas vezes estas 2 lesões ocorrem
simultaneamente no mesmo osso. A doença ocorre durante o crescimento máximo,
quando os estresses biomecânicos são maiores no esqueleto imaturo (4 a 8 meses
em cães, 36 a 54kg em suínos). É mais comum nas raças grandes e gigantes de
cães, porcos de crescimento rápido, cavalos, perus e frangos.

OSTEOCONDRITE DISSECANTE
Uma área focal de cartilagem articular imatura torna-se espessada e contém um
número diminuído de condrócitos, que estão desorganizados. A matriz na área basal
desta região torna-se condromalácica e acelular. Há uma separação da cartilagem
articular imatura do osso trabecular subjacente. A fratura condral estende-se
horizontal e verticalmente formando um retalho. O líquido sinovial penetra no espaço
medular subjacente, podendo formar cistos subcondrais (normalmente apenas em
grandes animais). O retalho de cartilagem imatura pode soltar-se completamente
(esquírola articular), ou pode se prender novamente, por ossificação endocondral,
ao osso subjacente, especialmente em suínos, resultando em uma superfície
articular enrugada. Isto ocorre apenas se a articulação é repousada ou protegida,
o que permite o restabelecimento da circulação necessária para a ossificação
endocondral. Se o retalho for arrancado pela movimentação articular, pode ser
moído em fragmentos menores durante a locomoção e desaparecer, enquanto
placas maiores podem prender-se à membrana sinovial, tornar-se vascularizadas
e ossificar. O defeito articular resultante, com o tempo, é preenchido por fibrocar-
tilagem.
Etiologia – A causa exata é desconhecida. O trauma causado por estresses
biomecânicos excessivos em áreas focais tem sido incriminado. Em suínos, lesões
complementares na cartilagem articular imatura e na cartilagem fisária adjacente
não são incomuns. A hereditariedade das características predisponentes (taxa de
Osteocondrose 674

crescimento, excitabilidade, tamanho do esqueleto, massa muscular, etc.) não é


conhecida. A articulação mais freqüentemente afetada varia entre as espécies, por
exemplo, escapular em cães, codilho em suínos. A soldra (côndilo medial ou lateral)
e o jarrete (face caudal da tróclea medial do talo) podem também ser afetados.
Achados clínicos – A osteocondrite dissecante causa uma claudicação insi-
diosa e normalmente persistente, iniciando-se em cães, entre 4 a 8 meses de idade.
A claudicação é freqüentemente unilateral, mesmo suspeitando-se que as lesões
sejam bilaterais. Ocasionalmente, várias articulações são afetadas. Após o repou-
so, o animal se apresenta enrijecido e, após o exercício, agrava-se a claudicação.
A dor pode ser evidenciada por hiperextensão ou hiperflexão da articulação,
dependendo de qual articulação seja afetada. As articulações da escápula, quando
afetadas, são mais dolorosas na hiperextensão. Sem tratamento, a claudicação
persistirá e se tornará permanente devido à osteoartrite secundária. A articulação
se apresenta crepitante e é observada atrofia muscular nas condições crônicas.
Quando a cartilagem não se fissura, a condição pode ficar indetectável; entretanto,
as lesões assintomáticas devem ser demonstradas radiograficamente.
Diagnóstico – A história, idade, raça, sexo e sinais clínicos fornecem informa-
ções importantes; contudo, as radiografias são requeridas para sustentar o diag-
nóstico. À radiografia lateral, as lesões na escápula são observadas como um
achatamento irregular na porção central da metade caudal da superfície articular do
úmero. A OCD dos côndilos femorais no cão é melhor observada numa radiografia
lateral em que os côndilos não estejam superpostos. A radiografia ântero-posterior
do jarrete em extensão completa revela a depressão característica da superfície
afetada. As lesões específicas no codilho e jarrete podem não ser visíveis em
radiografias após o desenvolvimento da osteoartrose proliferativa.
Tratamento – Um pequeno número de animais com OCD recupera-se esponta-
neamente em 4 a 6 semanas de repouso e exercício muito limitado. Drogas
antiinflamatórias não são indicadas, já que promovem a atividade física e, desta
forma, agravam a condição. Se a intervenção cirúrgica das articulações afetadas da
região da escápula for realizada logo após o diagnóstico, o prognóstico é bom. Os
corpos articulares devem ser removidos e a lesão no osso subcondral curetada. As
lesões que envolvem a soldra, codilho e jarrete também devem ser tratadas
cirurgicamente; todavia, o prognóstico para estas articulações é reservado.

DISPLASIA DO CODILHO
Há 3 condições, que afetam a articulação do codilho canino, que podem ser
consideradas como displasia: a não união do processo ancôneo, a fragmentação do
processo coronóide medial e a não união do epicôndilo medial do úmero; todas
resultam em osteoartrite secundária (OA, ver pág. 570).
Não união do processo ancôneo (NUPA) – A NUPA, que ocorre nas mesmas
raças da OCD (ver anteriormente), é a separação do centro de ossificação do
processo ancôneo da metáfise proximal da ulna. A fusão deve se completar por volta
dos 5 a 6 meses de idade. Postula-se que a fratura resulte de um desequilíbrio
biomecânico da força e movimento no codilho em crescimento rápido. Inicialmente,
o processo ancôneo está conectado à ulna por uma ponte de tecido fibroso, que se
fragmenta formando uma pseudo-artrose, e o codilho torna-se instável. A lassidão
articular provoca danos à cartilagem articular, resultando em uma OA secundária.
A base hereditária tem sido acusada, mas não foi provada.
Desenvolve-se um ataque insidioso de claudicação entre 4 e 8 meses de idade;
entretanto alguns casos bilaterais podem não ser detectados até que os cães tenham
> 1 ano de idade. Os codilhos afetados podem desviar-se lateralmente e a amplitude
de movimentação da articulação é restrita. Casos avançados têm sinais de osteoar-
Luxação Patelar 675

trite, efusão articular e crepitação. Os sinais clínicos são sugestivos, mas o diagnós-
tico é confirmado pelo exame radiográfico. Uma radiografia lateral da articulação do
codilho, na posição flexionada, deve permitir a visualização do processo não unido.
Ambos os codilhos devem ser examinados porque a condição pode ser bilateral.
A remoção cirúrgica na NUPA logo após o diagnóstico ter sido estabelecido é o
tratamento de escolha. A osteoartrite pode ocorrer, mas em menor grau. A atividade
do animal é marcantemente melhorada com a cirurgia.
Fragmentação do processo coronóide medial – A FPCM é um problema do
compartimento medial do codilho canino, no qual o processo coronóide não se une,
parcial ou totalmente, à diáfise ulnar, não se tornando, portanto, parte da superfície
articular do sulco troclear. Isto resulta em instabilidade articular, irritação e, final-
mente, OA. Este problema e a osteocondrose do côndilo medial do úmero são
considerados as 2 causas mais comuns de OA no codilho canino. O exame
radiográfico da articulação antes da osteoartrite pode revelar os fragmentos se-
parados. O diagnóstico é confirmado por artrotomia e remoção dos fragmentos as
quais podem diminuir a gravidade dos sinais clínicos. Por outro lado, a osteoartrite
resultante pode continuar a ser uma causa de claudicação intermitente.
Não união do epicôndilo medial do úmero – A NUEMU resulta de um distúrbio
na fusão endocondral da epífise do epicôndilo medial do úmero com a extremidade
distal do osso. A causa exata é desconhecida, mas como os flexores digitais e
carpais originam-se no aspecto ventral desta estrutura, isto pode representar uma
avulsão epifisária. Isto ocorre em cães jovens (6 a 8 meses) de raças grandes,
resultando em dor à flexão do codilho ou à palpação digital profunda, sendo
acompanhada por aumento de volume dos tecidos moles. Radiograficamente, são
observadas estruturas radiodensas caudal e distalmente à área do epicôndilo
medial. O tratamento relatado tem sido a excisão cirúrgica; no entanto, se for uma
avulsão epifisária, a refixação pareceria mais apropriada. A OA é o acompanha-
mento habitual; a gravidade e o momento de início deste problema dependem da
rapidez de diagnóstico e do grau de dano tecidual no momento da cirurgia.

LUXAÇÃO PATELAR
Em grandes animais, a luxação patelar ocorre como 3 síndromes clínicas: 1. uma
hipoplasia ou malformação congênita da crista troclear, vista em bezerros, cordeiros
e potros neonatos. Não tem sido provada uma base hereditária para esta condição,
apesar de o problema ter sido observado em éguas e em seus potros; 2. uma
destruição progressiva da crista troclear lateral, resultante da osteocondrite dis-
secante, vista em animais jovens de crescimento rápido; 3. luxação em qualquer
idade devida a traumatismo e ruptura dos ligamentos patelares.
Em pequenos animais, a luxação patelar é observada tipicamente em raças de
cães “toy” e miniatura, nos quais ela deve ser considerada uma doença hereditária.
Geralmente é considerada congênita, já que as condições que a predispõem estão
presentes ao nascimento. É caracterizada pela epifisiólise e por uma diminuição da
anteversão do colo do fêmur. Os sinais estão presentes intermitentemente. Em
animais idosos, a condição pode surgir agudamente como resultado de um trauma-
tismo pequeno, devido à piora da dor na doença articular degenerativa, ou como
resultado de um esgotamento dos tecidos moles. A luxação em raças grandes e
gigantes, também chamada de geno valgo, é vista nas mesmas raças que são
afetadas pela displasia coxofemoral. Nestes casos, ela é geralmente bilateral e
surge dos 5 aos 6 meses de idade.
Luxação Patelar 676

Achados clínicos – Grandes animais (ver também pág. 635) – Neonatos


afetados bilateralmente têm uma história de dificuldade em se levantar desde o
nascimento. A soldra e o jarrete estão marcadamente flexionados e o(s) membro(s)
afetado(s) não pode(m) suportar o peso. A patela é palpada como uma dura massa
lateral à soldra e pode ser recolocada dentro do sulco troclear se o membro for
estendido. A luxação lateral unilateral produz sinais similares, embora o animal
possa conseguir se levantar e mover-se com o peso parcialmente apoiado sobre o
membro afetado. Um importante problema a ser descartado em bezerros neonatos
é a paralisia do nervo femoral subseqüente à distocia. Animais jovens com
osteocondrite podem apresentar-se com claudicação uni ou bilateral e efusão
femoropatelar moderada à profusa. Um corpo osteocondral em forma de meia lua,
calcificado, representando o remanescente da crista da tróclea lateral é, com
freqüência, palpado lateralmente dentro do espaço articular (ver também OSTEO-
CONDROSE, pág. 673). A luxação patelar traumática normalmente é unilateral e
acompanhada por profundo aumento de volume periarticular e efusão articular. Por
outro lado, os sinais clínicos são similares àqueles da forma congênita.
Pequenos animais – Nas raças pequenas, as luxações são mediais em 75 a
80% dos casos e quase todos os casos traumáticos são mediais. As luxações
laterais são vistas em raças pequenas, mas usualmente em épocas mais tardias da
vida (5 a 8 anos); a condição em raças grandes, descrita anteriormente, em geral,
resulta em luxação lateral.
Em todos os casos, a forma de andar está afetada; as luxações mediais
geralmente causam uma aparência de perna arqueada e as laterais causam uma
postura de jarrete de vaca. A soldra está flexionada em graus variáveis e o grau de
sustentação do peso também varia. Especialmente em pequenas raças afetadas
pela forma congênita, a luxação não pode ser intermitente; mesmo quando luxado,
o efeito sobre a forma de andar pode ser aparente em todos os passos. Em cães de
meia-idade ou idosos com luxação crônica, o ligamento cruzado cranial está
rompido em 15 a 20% dos casos.
Diagnóstico – Os sinais clínicos são extremamente sugestivos e a palpação ou
a visualização radiográfica da patela deslocada é diagnóstica. Esta condição pode
assemelhar-se à paralisia do nervo femoral, à ruptura do ligamento cruzado cranial
ou à gonite de qualquer forma. Radiografia e artroscopia são meios que ajudam na
avaliação das lesões de osteocondrite e deformidades da fenda ou crista troclear,
especialmente quando o tratamento cirúrgico é considerado.
Tratamento – Animais com profundas deformidades congênitas da crista troclear
têm um prognóstico ruim, especialmente se a patela não ficar na fenda troclear por
algum tempo após a recolocação manual. A cirurgia para aprofundar o sulco troclear
e reconstruir os ligamentos periarticulares da cápsula articular pode ter sucesso em
casos selecionados.

RUPTURA DO TENDÃO DE AQUILES


É uma ruptura parcial ou completa da continuidade dos tendões do gastrocnêmio
e flexor superficial. Pode ser resultante de traumatismo por acidente automobilístico,
laceração por máquina de cortar grama ou arame, estresse extremo durante uma
corrida ou caçada ou, ocasionalmente, de uma grave infecção local. A laceração
pode ocorrer em qualquer parte ao longo do curso do tendão; entretanto, as rupturas
ocorrem geralmente no ponto de inserção no calcâneo, em conjunto com uma fratura
por arrancamento da tuberosidade calcânea, ou na junção entre músculo e tendão.
Ruptura dos Ligamentos Cruzados 677

A ruptura do músculo gastrocnêmio (ver pág. 605) produz um modo de andar


idêntico àquele da ruptura do tendão de Aquiles. O exame radiográfico cuidadoso
e por palpação deve ser efetuado para determinar a natureza exata da lesão e a
possibilidade de envolvimento ósseo. A ultra-sonografia é útil para identificar falhas
tendíneas ou na junção musculotendínea quando o membro apresenta inchaço
difuso e a palpação não é reveladora.
Há uma alteração característica de postura e do modo de andar. O animal não
é capaz de ficar em pé por muito tempo ou andar sobre um dos dedos do membro
afetado. O grau de flexão do jarrete está aumentado e sem a concomitante flexão
da soldra. A superfície plantar do metatarso pode tocar o solo. À palpação, o tendão
está flácido e, algumas vezes, edemaciado. A dor não é um sinal importante.
O tratamento é cirúrgico e as rupturas musculotendíneas requerem atenção ime-
diata. As rupturas com divisão cortante do tendão são mais fáceis de reparar do que
lacerações indistintas. Após o reparo cirúrgico, a perna deve ser imobilizada numa
posição levemente flexionada por 5 a 6 semanas. A fixação da tuberosidade calcânea
à tíbia, com um parafuso ósseo, tem sido recomendada como método de imobilização.

RUPTURA DOS LIGAMENTOS CRUZADOS


Os ligamentos cruzados cranial e caudal são responsáveis pela manutenção da
estabilidade craniocaudal da soldra durante a flexão e extensão; a ruptura de
qualquer deles resulta em instabilidade articular acentuada, que pode predispor à
osteoartrite.
A lesão aos ligamentos cruzados pode ser diretamente relacionada a sua fun-
ção como limitadores da movimentação articular. Forças excessivas durante ex-
tremos desta limitação podem resultar na lesão a estes ligamentos. Em virtude de
sua posição na articulação e por ser o principal limitador da instabilidade cranial,
rotação interna e hiperextensão da soldra, o ligamento cruzado cranial é lesado com
maior freqüência.
A lesão ao ligamento cruzado cranial está normalmente associada com uma
rotação súbita ou hiperextensão da soldra; a lesão ao ligamento cruzado caudal
normalmente é resultado de uma força direta na tíbia, forçando-a caudalmente. A
lesão aguda ao ligamento cruzado pode ser isolada ou associada a outras patolo-
gias da soldra. Dependendo do mecanismo da lesão, os ligamento colaterais,
meniscos e/ou outros ligamentos cruzados podem estar envolvidos. Devido à
instabilidade articular associada, a lesão crônica normalmente resulta em altera-
ções articulares degenerativas que incluem formação de osteófitos periarticulares,
espessamento capsular e degeneração medial dos meniscos.
A ruptura de um ou de ambos os ligamentos geralmente causa uma claudicação
aguda no membro posterior, sendo diagnosticada pela demonstração da excursão
cranial ou caudal anormal da tíbia no fêmur, o chamado sintoma de “gaveta”. Os
ligamentos cruzados são melhor avaliados quanto à integridade com o membro na
posição funcional. Um pequeno animal é colocado em decúbito lateral, e o exami-
nador segura a porção distal do fêmur com uma mão e a porção proximal da tíbia
com a outra. Com o membro na posição funcional, são feitas tentativas de subluxar-
se a tíbia cranial ou caudalmente; um movimento anormal em qualquer direção
indica insuficiência dos ligamentos cruzados. Os grandes animais são examinados
em pé. A palma das mãos é utilizada para rápida e forçosamente empurrar e puxar
a parte proximal da tíbia, num esforço para demonstrar um movimento cranial ou
caudal anormal.
Ruptura dos Ligamentos Cruzados 678

Devido à instabilidade articular e progressão subseqüente das alterações arti-


culares degenerativas, a estabilização cirúrgica da soldra está indicada. O prog-
nóstico baseia-se na quantidade de estabilização cirúrgica e na extensão das
alterações degenerativas já presentes.

SARCOCISTOSE
(Sarcosporidiose)

É uma invasão do endotélio e músculos por protozoários do gênero Sarcocystis.


Como o nome indica, as Sarcocystis spp formam cistos na musculatura de vários
hospedeiros intermediários – homens, cavalos, bovinos, ovinos, caprinos, suínos,
pássaros, roedores e répteis – que variam em tamanho de poucos micrômetros a
vários centímetros, dependendo do hospedeiro e da espécie.
Etiologia – As Sarcocystis spp desenvolvem-se num ciclo de 2 hospedeiros,
que consiste de um hospedeiro intermediário (presa) e outro definitivo (predador).
O ciclo de vida presa – predador tem sido demonstrado por bovino – cão (S. cruzi ),
bovino – gato (S. hirsuta ), bovino – homem ( S. hominis ), ovino – cão ( S. tenella
S. arieticanis ), ovino – gato (S. gigantea, S. medusiformis ), caprino – cão (S.
capracanis, S. hircicanis), caprino – gato ( S. moulei ), suíno – cão (S. meischeriana),
suíno – homem (S. suihominis), suíno – gato ( S. porcifelis), e outros. Em torno de
1 semana após a ingestão de musculatura contendo cistos de Sarcocystis
(sarcocistos), o hospedeiro definitivo começa a eliminar esporocistos infectantes
em suas fezes; a eliminação continua por vários meses. Após a ingestão de
esporocistos por um hospedeiro intermediário adequado são liberados os
esporozoítas que iniciam o desenvolvimento de esquizontes no endolélio vascu-
lar. Merozoítas são liberados dos esquizontes maduros e produzem uma segun-
da geração de esquizontes endoteliais. Os merozoítas desta segunda geração
invadem, subseqüentemente, as fibras musculares, onde desenvolvem sarcocistos
típicos. Inicialmente, os sarcocistos contêm somente alguns metrócitos –
parasitas não infecciosos, redondos, que originam zoítas infecciosas em forma
de banana e que se encontram nos cistos maduros por cerca de 2 a 3 meses após
a infecção. Os sarcocistos de algumas espécies crescem tanto que são facilmen-
te visíveis a olho nu. A presença de tais sarcocistos pode resultar na condenação
da carcaça durante a inspeção da carne. Os sarcocistos de outras espécies
permanecem microscópicos, embora grande número de cistos possa estar
presente no músculo.
Patogenia – Até recentemente as Sarcocystis spp eram consideradas de
patogenia duvidosa, mas infecções induzidas artificialmente com esporocistos de S.
cruzi de fezes caninas produziram doença aguda em bezerros e abortamentos,
natimortalidade e morte em vacas prenhes. Sinais similares têm sido demonstrados
para S. tenella em cordeiros e ovelhas. Os sinais clínicos foram similares àqueles
relatados em surtos naturais de sarcocistos em bovinos na Austrália, Canadá,
Inglaterra, Irlanda, Noruega e EUA. O homem também serve como hospedeiro
intermediário e sofre miosite e vasculite, mas a fonte de tais infecções humanas
nunca foi determinada e apenas , 40 desses casos são conhecidos mundialmente.
O homem fica doente após a ingestão de sarcocistos de S. suihominis em carne de
porco mal cozida e S. hominis em carnes bovinas nessas condições; os sinais
clínicos de náusea, dor abdominal e diarréia podem permanecer por mais de 48h.
A extensão da doença humana pela ingestão de carne infectada não tem sido
documentada.
Sarcocistose 679

Achados clínicos – Em muitos animais, a doença não é evidente, e o parasita


é descoberto somente no abate. Em bovinos gravemente afetados por S. cruzi, os
sinais incluem febre, anorexia, caquexia, diminuição de leite, diarréia, espasmos
musculares, anemia, hiperexcitabilidade, enfraquecimento, prostração e morte. As
vacas infectadas, no último trimestre de gestação, podem abortar. Após a recupe-
ração da doença aguda, alguns bezerros podem crescer pouco e, eventualmente,
morrer em estado caquético. Ovinos, caprinos e suínos têm sinais clínicos similares.
Após a recuperação da doença aguda, alguns ovinos podem perder sua lã. À
necropsia, os animais agudamente afetados têm hemorragia das membranas
serosas das vísceras e do miocárdio.
Controle – O principal fator de difusão da sarcocistose é a eliminação dos
esporocistos nas fezes de carnívoros. Devido a muitos bovinos e ovinos adultos e
vários suínos serem infectados, os cães e outros carnívoros não devem ser
alimentados com carne crua e restos destes animais mortos. Os suprimentos de
grãos e alimentos devem ser mantidos cobertos; cães e gatos não devem ser
admitidos em instalações usadas para qualquer alimento ou abrigo de animais. Tem
sido relatado o uso de amprólio na alimentação (100mg/kg de peso corporal,
diariamente, por 30 dias) profilaticamente, para reduzir a doença em bovinos com
S. cruzi. Profilaticamente, a administração de amprólio ou salinomicina também
protege, experimentalmente, os ovinos infectados. O tratamento terapêutico de
bovinos e ovinos tem sido ineficiente. Vacinas ainda não estão disponíveis.
SISTEMA NERVOSO
SISTEMA NERVOSO, Introdução ................................................................ 682
Organização ................................................................................. 682
Função ......................................................................................... 683
Interação com Outros Órgãos ...................................................... 684
Respostas Clínicas à Doença ...................................................... 685
Princípios de Diagnóstico .................................................................. 685
Exame Clínico .......................................................................................... 687
Anamnese .......................................................................................... 687
Exames Neurológico e Físico ............................................................ 688
Avaliação da Cabeça ................................................................... 688
Avaliação da Marcha ................................................................... 691
Avaliação do Pescoço e dos Membros Anteriores ............................ 691
Avaliação do Tronco, Membros Posteriores, Ânus e Cauda ............. 692
Líquido Cerebroespinhal .................................................................... 693
Patologia Clínica ................................................................................ 694
Radiografia ......................................................................................... 694
Outras Avaliações Diagnósticas ........................................................ 694
Princípios de Terapia ............................................................................... 694
ENCEFALOPATIA ESPONGIFORME BOVINA ........................................... 696
DOENÇAS CONGÊNITAS E HEREDITÁRIAS DO SNC .............................. 697
Defeitos Cerebelares do Tronco Cerebral ............................................... 698
Defeitos Cerebrais ................................................................................... 699
Doenças Paralíticas e Espásticas ............................................................ 700
Atrofia Muscular Espinhal ........................................................................ 701
Mieloencefalopatia Degenerativa Progressiva Bovina ............................. 701
Distúrbios dos Cães ................................................................................. 702
Síndrome do Tremor Congênito Suíno .................................................... 704
DOENÇAS DA COLUNA E DA MEDULA ESPINHAIS ................................ 705
Cães e Gatos ........................................................................................... 706
Bovinos .................................................................................................... 715
Eqüinos .................................................................................................... 717
Suínos ...................................................................................................... 719
Ovinos e Caprinos ................................................................................... 720
DISAUTONOMIA ........................................................................................... 721
Disautonomia Canina ............................................................................... 721
Enfermidade do Capim dos Eqüinos ....................................................... 721
Disautonomia Felina ................................................................................ 722
DOENÇA DO EDEMA ................................................................................... 723
ENCEFALOMIELITE EQÜINA ...................................................................... 724
PARALISIA FACIAL ...................................................................................... 726
HEMOFILOSE ............................................................................................... 728
HELMINTOS E LARVAS DE INSETOS ........................................................ 729
Cestóideos ............................................................................................... 730
Larvas de Insetos ..................................................................................... 731
Sistema Nervoso 682

Nematóideos ............................................................................................ 731


Trematódeos ............................................................................................ 733
TETANIA DEVIDO À HIPOMAGNESEMIA (ver MET) .................................. 536
“LOUPING ILL” ............................................................................................. 733
MENINGITE E ENCEFALITE ........................................................................ 735
SÍNDROME DO MAL-AJUSTAMENTO NEONATAL ................................... 738
NEOPLASIA .................................................................................................. 738
PARALISIA DO MEMBRO ANTERIOR ........................................................ 742
POLIOENCEFALOMALACIA ........................................................................ 743
ENCEFALOMIELITE ENTEROVIRAL SUÍNA .............................................. 746
PSEUDO-RAIVA ............................................................................................ 747
TETANIA PUERPERAL (ver MET) ............................................................... 551
RAIVA ............................................................................................................ 749
“SCRAPIE” .................................................................................................... 753
ENCEFALOMIELITE BOVINA ESPORÁDICA ............................................. 755
TÉTANO (ver GEN) ....................................................................................... 398
PARALISIA POR CARRAPATO ................................................................... 756
TETANIA DO TRANSPORTE (ver MET) ...................................................... 553

SISTEMA NERVOSO, INTRODUÇÃO


Através da geração, propagação e da integração da atividade elétrica, o
sistema nervoso detecta mudanças no meio ambiente externo ou interno do
organismo, interpreta a informação sensorial, dirige respostas musculares coor-
denadas e libera hormônios.

Organização
O sistema evoluiu a partir de reflexos simples, envolvendo 2 ou 3 neurônios como
mecanismo básico, por exemplo, o reflexo patelar e os demais reflexos de retração.
Esses reflexos são modificados com o aumento dos níveis de variação e integração
das informações sensoriais (aferentes) que passam a partir dos membros, olhos,
língua, nariz, orelhas ou sistema vestibular, através da medula espinhal e/ou do
tronco encefálico primitivo, cerebelo, tálamo e hemisférios cerebrais. As conexões
entre as áreas do sistema nervoso são chamadas tratos.
Os comandos motores (eferentes) são modificados em uma hierarquia
semelhante: hemisférios cerebrais, núcleos basais, tronco encefálico e medula
espinhal. Quanto mais evoluída a espécie, maior a habilidade para diversificar
e aprender suas respostas a um estímulo. Em animais, esta capacidade é
normalmente considerada como inteligência. Características humanas de inte-
ligência (solução de problemas abstratos e avaliação do futuro) são sustentadas
Sistema Nervoso, Introdução 683

pela “associação” de áreas dos hemisférios cerebrais, que entre as espécies não
humanas são bem desenvolvidos somente nos macacos mais evoluídos. O
estado de alerta e o sono consistem em interações do tronco encefálico com o
cérebro. A consciência (o que nós sabemos nós sentimos) é de origem cerebral,
principalmente em áreas “associadas”. Felizmente, a maioria dos dados senso-
riais e de controle motor não necessita nem envolve consciência, por exemplo,
movimentos intestinais, controle dos esfíncteres e regulação da freqüência
cardíaca.
O cerebelo é o centro principal da coordenação do sistema nervoso, e o
hipotálamo é o responsável pelo mais alto controle do sistema nervoso visceral
(simpático e parassimpático) e hormônios. Uma combinação de estruturas
cerebrais está envolvida com as emoções e o comportamento, incluindo as partes
do cérebro e hipotálamo mais primitivas.
Desta maneira, as atividades sensorial, motora, de coordenação, visceral,
intelectual, emocional e comportamental são consideravelmente independentes
umas das outras. Uma doença pode danificar severamente uma função, embora
tenha pequeno efeito sobre as outras.

Função
O sistema nervoso central (SNC) compreende o cérebro e a medula; o
sistema nervoso periférico (SNP) os nervos cranianos e espinhais. Nervos
espinhais e cranianos contêm axônios de neurônios motores inferiores (NMI) de
vários tamanhos que conduzem às musculaturas esquelética e lisa. A perda de
NMI leva a paralisia flácida, perda dos reflexos e rápida atrofia dos músculos
esqueléticos. Todos os outros neurônios motores no SNC são chamados
neurônios motores superiores (NMS), e podem afetar os músculos somente via
NMI, a via final comum para os músculos. A perda de NMS leva a paralisia
espástica (tônica), reflexos exagerados e a uma lenta atrofia por desuso dos
músculos esqueléticos enervados pelo NMI afetado. As perdas parcial e
completa da função motora voluntária são denominadas paresia e paralisia,
respectivamente.
Fibras sensoriais nos nervos espinhais medeiam o sentido de posição cons-
ciente (propriocepção consciente [PC]) e do tato, via cérebro; e propriocepção
subconsciente, via cerebelo; assim como as sensações de dor, calor e frio. Assim,
pode haver analgesia (perda de dor) sem que haja perda completa de todas as
sensações (anestesia), perda de PC sem perda do impulso cerebelar e vice-
versa. Os nervos cranianos medeiam as funções sensoriais especializadas,
como o olfato, paladar, visão, audição e equilíbrio, assim como várias atividades
motoras, viscerais e de tato.
Os tratos espinhais ascendente e descendente associados com as funções
motoras e sensoriais têm sido denominados tradicionalmente como tratos longos.
A lesão nesses tratos causa tipicamente uma paralisia de NMS e uma perda da PC
ou da sensação de dor nos membros e no tronco caudal à lesão. Ao contrário, a lesão
de fibras semelhantes nos nervos periféricos produz sinais sensoriais segmentares
(perda focal da sensação de dor ou da função reflexa) e paralisia de NMI em apenas
alguns músculos de um membro.
As unidades do sistema nervoso geralmente funcionam pela modificação da
atividade elétrica existente ou inerente de outros tratos; por exemplo, os NMI têm
uma velocidade de disparo elétrico natural em resposta a um estímulo em seu
músculo, a qual é suprimida por muitos NMS (por exemplo, cerebrais), mas
aumentada por outros NMS (por exemplo, vestibulares).
O tempo de chegada e o seqüenciamento de dados sensoriais são importantes,
especialmente na coordenação de movimentos. O cerebelo é informado da maioria
Sistema Nervoso, Introdução 684

dos comandos dos NMS dirigidos aos NMI e adquire coordenação através da
comparação do comando original com os dados proprioceptivos, que resultam nos
movimentos musculares. Qualquer lesão, inflamatória ou compressiva, pode atra-
sar a chegada de informações no cerebelo. A ataxia resultante, a hipermetria, ou o
tremor podem ser tão severos como se ocorresse destruição física do cerebelo ou
de seus tratos. O equilíbrio é coordenado adicionalmente pelo sistema vestibular,
com informações inicialmente captadas por receptores localizados no labirinto do
ouvido interno (periférico) e então direcionadas aos núcleos vestibulares no tronco
cerebral (central). Lesões periféricas e centrais podem ser distinguidas, pois outras
alterações cerebrais evidentes (depressão, deficiências em nervos cranianos,
perda da PC fraqueza) acompanham as últimas.
Os neurotransmissores são substâncias químicas que retransmitem os
impulsos elétricos (dados) através de uma fenda sináptica para o próximo
neurônio. As sinopses químicas proporcionam várias vantagens evolutivas em
relação às sinapses elétricas simples quanto ao processamento dos dados e à
complexidade das respostas possíveis. Os neurotransmissores são excitatórios
(por exemplo, os glutamatos) ou inibitórios (por exemplo, o ácido δ-aminobutírico
[GABA]) e podem envolver os hormônios circulantes (por exemplo, a noradrena-
lina) ou também ser utilizados em outras funções corporais (por exemplo, a
serotonina na inflamação local). As substâncias químicas, as toxinas, os anticor-
pos ou as enzimas que destroem, mimetizam, potencializam ou bloqueiam os
efeitos desses neurotransmissores podem produzir alterações disseminadas ou
locais no sistema nervoso (por exemplo, a atropina, os organofosfatos, a estric-
nina e a toxina tetânica).
Deste modo, processos patológicos podem afetar a duração, excitação, inibição
e transmissão dos dados elétricos no sistema nervoso, assim como causar danos
físicos ao organismo. Alterações fisiológicas podem não ser detectadas pela
microscopia óptica ou mesmo pela microscopia eletrônica.

Interação com outros órgãos


O sistema nervoso necessita que eletrólitos sangüíneos, glicose, oxigênio,
temperatura, pH, osmolaridade, pressão e vários outros parâmetros, devam ser
mantidos dentro de limites estreitos. Somente oxigênio, dióxido de carbono e glicose
atravessam facilmente a barreira hematocerebral. O metabolismo oxidativo da
glicose fornece a maior parte das necessidades energéticas do cérebro. O supri-
mento de oxigênio e glicose para o cérebro é dependente do fluxo sangüíneo
cerebral (FSC). O FSC normal depende da pressão de perfusão no cérebro, a qual
é equivalente à diferença entre a pressão arterial média e a pressão intracraniana.
Assim, se houver redução da pressão arterial média ou elevação da pressão
intracraniana, o FSC poderá ser reduzido. Entretanto, felizmente, o FSC é mantido
em um nível relativamente constante em pressões arteriais médias de 50 a
160mmHg, devido à dilatação ou constrição apropriada dos vasos sangüíneos
cerebrais (auto-regulação da pressão), e também quando a pressão intracraniana
é alta pelo aumento na pressão arterial média (resposta de Cushing). Os vasos
sangüíneos do cérebro também são sensíveis às substâncias químicas contidas no
sangue; a hipoxia sistêmica e hipercapnia, causam dilatação vascular para prevenir
hipoxia e acidose cerebrais, respectivamente (regulação química). Apesar destes
mecanismos de defesa, os neurônios podem tornar-se desprovidos de oxigênio
(hipoxia hipóxica), e ocorre uma lesão característica de alteração celular neuronal
isquêmica. Outras causas potenciais para a hipoxia cerebral incluem a anemia
(hipoxia anêmica), debilidade seletiva do FSC (hipoxia isquêmica) e redução do
rendimento cardíaco (hipoxia estagnante). A alteração celular neuronal isquêmica
também ocorre devido à hipoglicemia, como no caso de tumores produtores de
Sistema Nervoso, Introdução 685

insulina do pâncreas e outras determinadas lesões metabólicas, por exemplo,


deficiência de tiamina dos ruminantes e intoxicação salina em suínos. Muitas outras
doenças de órgãos e sistemas podem assim afetar o sistema nervoso, usualmente
produzindo ataques, depressão ou coma.
Inversamente, as alterações no sistema nervoso podem produzir mudanças
inesperadas na fisiologia de outros órgãos; por exemplo, o aumento do tono vagal,
causado por inflamação do tronco cerebral ou por elevação na pressão do FSC, pode
produzir bradicardia severa, bloqueio cardíaco e bloqueio sinoatrial. Choque emo-
cional ou dano cerebral podem causar choque neurogênico. O estresse emocional
afeta o esvaziamento pilórico e também pode levar a colites. O desmaio é um
fenômeno vasovagal. Traumatismo cerebral pode causar edema pulmonar neurogê-
nico fatal.

Respostas clínicas à doença


Apesar dos inúmeros mecanismos pelos quais doenças ou lesões podem afetar
o sistema nervoso, somente 4 tipos básicos de respostas clínicas são verificados:
deficiência, choque, liberação e descarga.
A deficiência é a resposta mais provável de ser observada, por exemplo, quando
um nervo é perfurado acidentalmente, uma vértebra fraturada danifica os tratos
medulares, uma infecção danifica um reflexo e um tumor causa pressão sobre os
nervos ópticos causando cegueira, ou otite interna causa perda da função vestibular.
O choque no SNC é, na maior parte das vezes, limitado à concussão; o choque
medular ocorre apenas transitoriamente, seguindo uma lesão medular nos animais.
A concussão é um “abalo” temporário dos neurônios, não havendo ferimento ou
hemorragia, como ocorre na contusão.
O fenômeno de liberação inclui hiper-reflexia após a ocorrência de perda de
impulso dos NMS para os NMI, e talvez alguns casos de perda do autocontrole
adquirido, conduzindo a tiques nervosos.
A descarga refere-se a explosões elétricas no cérebro, vistas como ataques
(convulsões), irritação sensorial dos nervos (dor) e irritação dos NMI (fasciculações
musculares).
Assim, os sinais clínicos refletem não somente processos patológicos, mas a
porção do sistema nervoso afetada.
O sistema nervoso responde à doença em um número limitado de formas. As
principais formas de edema cerebral são a vasogênica (o fluido passa no interior de
espaços extracelulares devido à lesão vascular), a citotóxica (o fluido se acumula
intracelularmente devido a uma falha na bomba de sódio) e a intersticial (o fluido
passa dos ventrículos para o interstício devido a uma hidrocefalia). A maioria das
cerebropatiais causa um certo grau de necrose, que pode se concentrar tanto na
substância cinzenta (polioencefalomacia) como na substância branca
(leucoencefalomacia). A desmielinização é freqüente e pode ocorrer independente-
mente da lesão corporal celular neuronal ou axonal (desmielinização primária) ou
devido a ela (desmielinização secundária). A degeneração do axônio e da sua
bainha mielínica distalmente ao ponto da lesão axonal ou neuronal é chamada
degeneração walleriana. Essa degeneração é típica das patologias compressivas
e crônicas da medula espinhal. Ao contrário, as lesões agudas da medula espinhal
causam freqüentemente uma necrose hemorrágica central.

PRINCÍPIOS DE DIAGNÓSTICO
Os passos clássicos no diagnóstico incluem a localização da lesão e a determi-
nação do seu caráter (irritativo ou destrutivo) e da sua causa. Isso se encaixa bem
com o sistema de registros médicos orientado por problema, mas enfatiza a
Sistema Nervoso, Introdução 686

localização neurológica. Não se necessita de um conhecimento detalhado de


neuroanatomia para se fazer um diagnóstico e selecionar um tratamento, mas torna-
se necessária a explicação de todos os sinais.
A eficiência no diagnóstico neurológico em geral depende da coleta e da
interpretação da história e de exames físicos e neurológicos. São fatores importantes
no diagnóstico diferencial: espécie, raça, idade, velocidade do início dos sintomas,
melhoras, deterioração, sintomas clínicos ou episódicos, evidência de dor focal,
possibilidade de trauma, vacinação recente e acesso a tóxicos ou animais infectados.
Exame neurológico – O exame tem 3 objetivos: caracterizar o sintoma
apresentante, encontrar qualquer outra alteração no sistema nervoso e localizar a(s)
lesão(ões), sempre que possível. Mesmo em casos obscuros, a lesão geralmente
pode se localizar na espinha, no cérebro, ou no sistema nervoso periférico. Dentro
do cérebro, as lesões em geral podem se localizar em 1 das 4 áreas principais
baseadas nos sintomas: o tálamo (mudanças de atitude, andar compulsivo e em
círculos e ataques) o cerebelo (ataxia, dismetria, tremores), tronco cerebral (depres-
são, paresia e déficits de nervos cranianos) ou sistema vestibular (ataxia, inclinação
da cabeça e nistagmo). As lesões da medula espinhal devem se localizar em C1-5
(paralisia dos NMS em todos os 4 membros, os membros posteriores talvez piores),
em C6-T2 (paralisia dos NMI nos membros anteriores, paralisia dos NMS nos
membros posteriores, membros anteriores piores), em T 3-L 3 (membros anteriores
normais, paralisia dos NMS nos membros posteriores) ou L4-S3 (membros anteriores
normais, paralisia dos NMI nos membros posteriores). As lesões podem ser locali-
zadas em nervos periféricos e cranianos específicos, baseando-se em alterações na
função reflexa e no padrão de perda de sensibilidade e da massa muscular. A
severidade e a simetria esquerda-direita também podem ser estimadas (lembrando-
se das funções cruzadas do cérebro). As funções do membro esquerdo são
mediadas pelo mesencéfalo e hemisfério direitos do cérebro. Portanto, lesões rostrais
ou ao mesencéfalo causam alterações clínicas contralaterais, e lesões caudais ao
mesencéfalo normalmente causam deficiências no mesmo lado. Os reflexos dos
nervos cranianos esquerdos são mediados pelo hemisfério esquerdo do cérebro,
mas a visão consciente esquerda, pelo hemisfério cerebral contralateral. As funções
do trato são usadas geralmente para estimar a severidade; os reflexos são utilizados
mais para a localização (ver EXAME C LÍNICO DO S ISTEMA NERVOSO, adiante).
A localização neurológica auxilia o diagnóstico de vários modos. Por exemplo,
lesões multifocais sugerem doença infecciosa, enquanto lesões focais são mais
sugestivas de neoplasia ou infarto. Outros testes são usualmente necessários para
identificação específica da patologia (radiologia, hematologia, bioquímica sangüí-
nea, sorologia, punção do líquido cerebroespinhal [LCE]). O conhecimento da
severidade da lesão ajuda na seleção e na urgência do tratamento, prognóstico e
educação do proprietário. As lesões da medula espinhal que causam paralisia de
NMI ou perda da sensação de dor, em geral, têm mau prognóstico.
O diagnóstico diferencial é facilitado pela existência de uma lista de patologias,
preferivelmente subdividida por espécies, que podem causar o sintoma presente.
Uma perspectiva da combinação e da taxa de desenvolvimento dos sinais clínicos
possíveis em cada doença também é necessária. Afecções traumáticas e vasculares
normalmente levam a sintomas agudos, não progressivos; enfermidades infecciosas,
metabólicas, neoplásicas e degenerativas causam sintomas crônicos e progressivos.
Testes laboratoriais – Hoje se pratica o teste elétrico dos sistemas neuromus-
culares na maioria das espécies. A eletroencefalografia (EEG) possui alguma
utilidade no diagnóstico dos ataques e pode providenciar uma evidência indireta de
outras doenças. A eletromiografia (EMG) identifica a atividade muscular espontânea
(potenciais de fibrilação, ondas pronunciadas positivas) associada com lesões nos
nervos e também pode ajudar na identificação dos distúrbios miogênicos (potenciais
Sistema Nervoso, Introdução 687

musculares bizarros). As velocidades de condução dos nervos (VCN) sensoriais e


motores são mais úteis em doenças como a paralisia “coonhound”, na qual a VCN
se encontra reduzida. Utiliza-se a estimulação repetitiva do nervo para o diagnóstico
da miastenia grave, na qual ocorre um decréscimo característico no potencial
muscular solicitado. Os potenciais de solicitação cerebral e espinhal dão informa-
ções acerca da integridade das vias cerebrais (visão, audição) e espinhais (dor,
propriocepção).
A mensuração da pressão, a contagem de células, a cultura e a análise química do
LCE são todas possíveis. Em geral, as doenças bacterianas fazem com que os leu-
cócitos aumentem drasticamente (> 1.000/µL) no LCE com a maior parte se constitu-
indo de neutrófilos, e as doenças virais causam aumentos suaves ou moderados
(< 100/µL) com a maior parte se constituindo de linfócitos ou macrófagos. As outras
doenças inflamatórias ou neoplásicas causam alterações variáveis, freqüentemente
intermediárias entre as observadas nos casos das doenças bacterianas e virais.
As biópsias musculares podem refletir alterações típicas tanto de patologias
musculares (variação no tamanho da fibra, aumento de volume dos núcleos
internos, fibras hialinas) ou nervosas (fibras angulares, pequena atrofia de grupo)
primárias. As biópsias dos ramos nervosos sensoriais ou as biópsias parciais dos
nervos motores podem identificar uma desmielinização ou uma inflamação típicas
de determinadas patologias. Encontram-se disponíveis testes sorológicos e uriná-
rios para muitos metabólitos do sistema nervoso.
As técnicas de obtenção de imagens diagnósticas assumem freqüentemente um
papel importante (ver pág. 1155). As radiografias planas e de contraste ajudam na
identificação das lesões espinhais. Mais recentemente, o uso das varreduras por
tomografia computadorizada e por ressonância magnética permitiu uma identifica-
ção mais clara das neoplasias intracranianas. Em uma situação de rebanho, deve-
se considerar a necropsia de um indivíduo afetado.

EXAME CLÍNICO DO SISTEMA NERVOSO


Uma anamnese detalhada e exames físico e neurológico são necessários para
avaliar um problema envolvendo o sistema nervoso. Conhecimentos de neuroana-
tomia, conceitos de neurofisiologia e processos neuropatológicos são requisitos
para a interpretação exata dos sinais clínicos. A partir dos aspectos clínicos iniciais,
o problema pode ser classificado como difuso, multifocal ou focal; simétrico ou
assimétrico; suave, moderado ou severo; e a localização anatômica pode ser
determinada. A consideração dos mecanismos potenciais da doença como congê-
nitos e familiais, inflamatórios, metabólicos, tóxicos, nutricionais, traumáticos,
vasculares, degenerativos neoplásicos ou idiopáticos é necessária para formular
uma lista precisa de diagnósticos diferenciais. Testes clinicopatológicos adicionais
podem ser necessários para se obter um diagnóstico final, incluindo a análise do
LCE, radiografias simples e contrastadas e outros testes diagnósticos especiais.

ANAMNESE
Doenças neurológicas tendem a ter predileção por espécies, idade, raça e, ocasio-
nalmente, sexo. As queixas primárias de problemas neurológicos incluem freqüente-
mente alterações comportamentais, ataques convulsivos, tremores, deficiências de
nervos cranianos, ataxia e paresia ou paralisia de um ou mais membros. Informações
sobre o início, curso e duração da queixa principal podem ser utilizadas para determi-
nar os mecanismos patológicos mais prováveis. Distúrbios congênitos e familiais são
mais comumente vistos ao nascimento ou dentro de 1ano e meio de idade e podem ser
Sistema Nervoso, Introdução 688

estáticos ou progressivos. Distúrbios inflamatórios, metabólicos, tóxicos e nutricio-


nais tendem a ter um início agudo ou subagudo e geralmente são progressivos.
Distúrbios vasculares e traumáticos têm um início agudo e raramente são progressi-
vos. Distúrbios degenerativos e neoplásicos tendem a ocorrer com mais freqüência
em animais mais velhos, tendo um início crônico e um curso progressivo. Muitas
desordens idiopáticas iniciam-se com caráter agudo e melhoram num curto período
de tempo. Informações sobre problemas semelhantes na família, doenças sistêmi-
cas concorrentes ou recentes, estado de vacinação, outros animais afetados, dieta,
possível exposição a toxinas ou trauma, e alterações neoplásicas passadas podem
ter muita utilidade no estabelecimento de certos mecanismos da doença.

EXAMES NEUROLÓGICO E FÍSICO


A evidência de doenças em outros sistemas corporais pode ser associada a
distúrbios inflamatório, metabólico, tóxico ou neoplásico metastático do sistema
nervoso. Sinais externos de exposição traumática ou tóxica podem sustentar estes
mecanismos da doença.
O exame neurológico pode ser dividido em 4 partes: avaliação da cabeça; da
marcha; do pescoço e membros anteriores; e do tronco, membros posteriores, ânus
e cauda. Inicialmente, deve ser feita uma tentativa para relatar os déficits para uma
lesão anatômica focal.
Caso se encontrem anormalidades na avaliação da cabeça, deve-se então
realizar uma tentativa inicial para se explicarem as anormalidades nos membros
anteriores devidas a uma lesão acima do forame magno. Se não se encontrar
nenhuma anormalidade na cabeça, mas se estiverem presentes anormalidades nos
membros anteriores, deve-se então realizar uma tentativa de se explicar as
anormalidades nos membros posteriores devidas a uma lesão cervical. A paralisia
ou a paresia de todos os 4 membros com perda de todos os reflexos espinhais (com
ou sem deficiências nos nervos craniais) se associa freqüentemente com patologias
difusas na junção neuromuscular ou nos nervos periféricos.
O conhecimento de patologias específicas dentro de um certo mecanismo para
uma dada espécie, idade, raça e sexo de animal permite um diagnóstico diferencial
preciso e um plano diagnóstico para ser formulado após se completarem a história
e os exames físicos e neurológicos. Os mecanismos tóxicos, metabólicos e
nutricionais raramente produzem deficiências neurológicas assimétricas. Os outros
mecanismos podem ser simétricos ou assimétricos.

Avaliação da cabeça
A consciência, postura da cabeça, coordenação e função dos nervos cranianos
são observadas durante a avaliação da cabeça. Sinais anormais são resultantes de
lesões acima do nível do forame magno no cérebro, no tronco cerebral (diencefálo,
mesencéfalo, ponte ou medula oblonga) ou no cerebelo. Demência, andadura com-
pulsiva ou outras anormalidades comportamentais são freqüentemente devidas a
lesões no cérebro ou diencéfalo. A depressão, o semicoma ou o coma podem se dever
a lesões no cérebro, no diencéfalo ou mesencéfalo. Ataques são devidos ao envolvi-
mento do cérebro ou diencéfalo. Uma rotação da cabeça ou um movimento circular
compulsivo, sem inclinação, são também associados a lesão cerebral ou diencefálica,
no lado correspondente àquele para o qual o animal se volta. Uma inclinação verda-
deira da cabeça é conseqüente à patologia no sistema vestibular. Coordenação
anormal da cabeça, meneios e tremores resultam de disfunção cerebelar.
Os nervos cranianos estão localizados em sítios específicos ao longo do tronco
cerebral e é simples testá-los. Sinais anormais são produzidos por lesões dos
nervos cranianos, periféricos ou do tronco encefálico. Se uma lesão do tronco
Sistema Nervoso, Introdução 689

encefálico está presente, anormalidades são observadas no modo de andar, nos


membros anteriores ou posteriores. Se somente um nervo craniano periférico é
afetado, as outras 3 partes do exame ficam normais.
I. Olfatórios – O nervo olfatório é usado para cheirar.
Testes – Observar a capacidade do animal encontrar comida ou a reação a
substâncias químicas tais como dentes-de-alho, benzeno e xilol (não utilizar
substâncias que irritem a mucosa nasal e as terminações do nervo trigêmeo, tais
como a cânfora ou o fenol).
Sinais de disfunção – Uma resposta anormal corresponde a uma incapacidade
para encontrar alimento ou responder a produtos químicos não irritantes, e é
encontrada no caso de uma patologia na placa crivada, nos bulbos olfatórios e no
diencéfalo.
II. Ópticos – Os nervos ópticos são necessários para a visão e também conduzem
as fibras aferentes do centro do reflexo luminoso pupilar para o mesencéfalo.
Testes visuais – O teste de ameaça é realizado por meio de um gesto ameaçador
em direção a cada olho, evitando-se corrente de ar excessiva ou o toque dos pêlos.
O teste de obstáculo pode ser necessário quando a acuidade visual é duvidosa. É
comum vendar-se um olho de cada vez para detectar cegueira assimétrica.
Reflexo pupilar à luz – Um foco brilhante de luz é incidido em cada pupila em
direção à retina temporal e a pupila é observada quanto à constrição imediata. A
pupila oposta deve mostrar constrição simultaneamente.
Exame oftalmoscópico – Este detecta patologias ópticas locais. Coriorretinite
ou papiledema podem estar associados com doenças do SNC ou do SNP.
Sinais de disfunção – A disfunção do nervo óptico resulta em redução ou perda
da visão e dos reflexos luminosos pupilares no lado afetado. Ainda deve ocorrer uma
constrição pupilar simultânea ao se estimular o olho oposto. As lesões do trato
óptico, das radiações ópticas, do córtex talâmico (núcleo geniculado lateral) ou do
córtex occipital geralmente produzem uma cegueira contralateral com reflexos
luminosos pupilares normais, por exemplo, uma lesão do hemisfério cerebral
esquerdo causa uma cegueira no lado direito com reações pupilares normais.
III. Oculomotor – Este nervo porta fibras eferentes parassimpáticas a partir do
centro do reflexo pupilar luminoso ao glânglio ciliar, cujas fibras inervam o músculo
constritor da pupila. É também eferente ao músculo elevador palpebral; aos
músculos retos dorsal, medial e ventral; e ao músculo ventral do olho.
Testes – 1. realizar o teste de reflexo pupilar à luz igualmente ao do nervo óptico;
2. observar a presença ou ausência de ptose da pálpebra superior e estrabismo
ventrolateral.
Sinais de disfunção – As lesões do mesencéfalo ou do nervo oculomotor
resultam em uma pupila dilatada não responsiva à luz, mas o olho permanece com
visão. O animal pode ou não apresentar estrabismo ventrolateral e ptose. No caso
das lesões unilaterais não ocorre constrição pupilar (direta) no mesmo lado, mas
ocorre constrição (simultânea) contralateral.
IV. Troclear – Este é o nervo motor para o músculo oblíquo dorsal do olho.
Teste – Observar o globo ocular quanto a um estrabismo dorsomedial (mais fácil
de se observar em gatos devido à pupila vertical).
Sinais de disfunção – As lesões do mesencéfalo ou do nervo troclear podem
resultar em estrabismo dorsomedial.
V. Trigêmeo – Este nervo possui 3 ramos principais. O ramo mandibular é
o nervo motor para os músculos mastigadores e é sensorial no assoalho da
cavidade oral, na arcada ventral e na pele da cabeça ventrolateral. Os ramos
oftálmico e maxilar são sensoriais à pele da cabeça, dorsolateral às membranas
mucosas do teto da cavidade oral, arcada dorsal e cavidade nasal e ao globo
ocular, incluindo a córnea (dor).
Sistema Nervoso, Introdução 690

Testes – 1. Avaliar o tono da mandíbula e os movimentos mastigatórios e palpar os


músculos masseter e temporal para avaliar o componente motor do nervo trigêmeo; 2.
pode-se avaliar a função sensorial através do estímulo dos cantos medial e lateral dos
olhos, que dispara o reflexo palpebral (fechamento das pálpebras), e do estímulo da
córnea, que resulta na retração do globo. Nos cães resistentes, pode-se tornar neces-
sária uma alfinetada na mucosa nasal, e se observará uma resposta de prevenção.
Sinais de disfunção – Uma lesão no nervo trigêmeo ou na ponte produz uma
atrofia dos músculos masseter e temporal e/ou a perda de sensação na face, na
córnea e na mucosa nasal. Uma lesão do nervo motor trigêmeo bilateral produz uma
“queda” da mandíbula.
VI. Abducente – Este é o nervo motor para os músculos retolateral e retrator
bulbar do olho.
Testes – 1. observar o globo ocular quanto a um estrabismo medial; 2. disparar
o reflexo corneal com as pálpebras mantidas abertas, e observar quanto a uma
retração do globo ocular e um prolapso da terceira pálpebra.
Sinais de disfunção – As lesões na medula oblonga rostral ou no nervo
abducente resultam em estrabismo medial e ausência de retração do globo.
VII. Facial – Este é o nervo motor para os músculos de expressão facial (orelha,
pálpebras, nariz e boca).
Testes – 1. disparar os reflexos papebral, de ameaça e corneal para a função do
músculo orbicular ocular; 2. observar o nariz quanto a desvios (com lesões unilaterais);
3. beliscar o lábio para ver se ele se retrai; coçar as orelhas para ver se elas se movem.
Sinais de disfunção – Uma lesão no nervo facial (ouvido interno ou médio ou
medula oblonga rostral) resulta em uma incapacidade para piscar as pálpebras ou
para mover os lábios ou o nariz, e geralmente produz uma face abatida, salivação
e acúmulo de alimento na bochecha afetada.
VIII. Vestibulococlear – Existem 2 divisões principais desse nervo; a primeira, o
nervo coclear, funciona para prover o sentido de audição. O segundo ramo, o nervo
vestibular, permite a manutenção da postura normal, do tono muscular e do
equilíbrio.
Testes – A surdez total (ver pág. 369) é facilmente detectada ao se criarem ruídos
altos próximos ao animal que estiver dormindo. Observar quanto à inclinação da
cabeça, ao desequilíbrio e à tendência a cair, rolar ou andar em círculos com lesões
unilaterais ou assimétricas. Checar quanto à presença de um nistagmo anormal com
a cabeça em posição normal (nistagmo espontâneo de repouso) e com a cabeça
mantida em uma posição desviada (nistagmo posicional).
Sinais de disfunção – As lesões na medula oblonga rostral ou no nervo
vestibulococlear unilateral (ouvido interno) produzem um desequilíbrio com inclina-
ção da cabeça em direção ao lado da lesão. Freqüentemente se encontra presente
um nistagmo giratório e horizontal posicional ou espontâneo. As lesões bilaterais
resultam em desequilíbrio em ambos os lados, movimentos largos de desvio da
cabeça e surdez. Uma lesão cerebelar unilateral pode resultar em uma inclinação
da cabeça a partir do lado da lesão.
IX. Glossofaríngeo e X. vago – Esses nervos providenciam o controle sensorial
e motor da faringe, da laringe e das vísceras.
Testes – 1. beliscar os ossos hilóides para disparar um reflexo de regurgitação;
2. observar quanto à fonação e aos sons respiratórios normais.
Sinais de disfunção – As lesões nos nervos glossofaríngeo e vago ou na medula
oblonga caudal resultam em disfagia, megaesôfago, paresia ou paralisia laríngeas
e uma alteração na fonação.
XI. Acessório espinhal – Inerva os músculos trapézio, esternocefálico e
braquiocefálico.
Testes – Palpar os músculos inervados.
Sistema Nervoso, Introdução 691

Sinais de disfunção – As lesões na medula espinhal cervical cranial ou na


medula oblonga caudal podem resultar na atrofia do músculo esternocefálico.
XII. Hipoglosso – Esse é o nervo motor dos músculos da língua e genioióideo.
Teste – Observar quanto ao controle muscular da língua durante a lambedura e
a bebida de água.
Sinais de disfunção – As lesões no nervo hipoglosso ou na medula oblonga
caudal podem resultar no desvio ou na atrofia da língua.

Avaliação da marcha
A marcha é observada enquanto o animal anda, trota, galopa, anda em círculos,
anda de lado e recua. Em grandes animais, a deambulação para cima e para baixo
em uma rampa, enquanto vendados, pode acentuar muito discretamente defeitos à
marcha. A avaliação da marcha é especialmente importante em animais de grande
porte, uma vez que as reações posturais são difíceis de serem obtidas devido ao
tamanho, e os reflexos espinhais normalmente não são testados, a não ser que os
animais estejam deitados. Em pequenos animais, podem ser detectadas alterações
discretas através do teste da reação postural nos membros (nas próximas 2 partes
do exame, ver a seguir). Nos pequenos animais, também se observa a andadura ou
o ficar em pé sobre um lado. Animais com lesões no córtex cerebral e diencéfalo em
geral têm um andar relativamente normal, mas podem andar em círculos compul-
sivamente. Animais com lesões no mesencéfalo, ponte e medula oblonga têm
paresia ou paralisia dos membros com deficiências freqüentemente mais severas
no lado da lesão. Lesões cerebelares produzem ataxia e dismetria. A disfunção
vestibular causa uma queda, um rolamento ou uma andadura em círculos no mesmo
lado. Se nenhuma anormalidade é encontrada no exame da cabeça, mas a marcha
apresenta-se anormal, é mais provável que a lesão esteja na medula espinhal, nos
nervos periféricos ou nos músculos.

Avaliação do pescoço e dos membros anteriores


O pescoço é examinado quanto à presença de dor e, em animais de grande porte,
quanto à atrofia e à insensibilidade ao espetar-se a pele, indicando lesão da medula
espinhal cervical.
Carrinho de mão – Levantam-se do chão os membros posteriores dos pequenos
animais, e avalia-se o animal enquanto este estiver andando apenas sobre os
membros anteriores. Utiliza-se esse teste para se detectarem deficiências sutis nos
membros anteriores. Os animais normais não devem tropeçar ou apoiar-se sobre os
nós dos dedos à medida que andam.
Olhos e pescoço tônicos – Com o animal (cão ou gato) em pé, eleva-se o seu
nariz e observam-se os olhos para ver se eles se ajustam coordenadamente ao
centro das fissuras palpebrais. Simultaneamente, os membros anteriores devem
se estender sem nenhuma tendência para se apoiarem nos nós dos dedos ou se
enfraquecerem. Se estiver presente uma dor no pescoço, deve-se considerar
uma lesão nessa área.
Posicionamento proprioceptivo – Cada pata é deslocada através de uma
rotação sobre seu próprio eixo ou através da ampla adução ou abdução do membro.
O animal deve colocar imediatamente a perna na posição normal. A consciência
proprioceptiva é, freqüentemente, a primeira a ser afetada com lesões discretas do
sistema nervoso.
Colocação – Pequenos animais podem ser carregados à superfície de uma
mesa; vendo esta, o animal normalmente se antecipará colocando suas patas
dianteiras sobre a superfície. Se estiver vendado, deve colocar as patas dianteiras
sobre a mesa somente quando houver contato dos membros com a borda da
Sistema Nervoso, Introdução 692

mesma. Uma perda da resposta de colocação pode se encontrar presente em uma


disfunção sutil quando a andadura estiver normal.
Saltitamento – Este pode ser testado somente em pequenos animais. Enquanto
seguram-se 3 membros suspensos do chão, força-se o animal a mover-se ou saltitar
sobre o quarto membro; podem ser detectadas por meio deste procedimento as
debilidades motora e proprioceptiva, a incoordenação cerebelar e a deficiência
cerebrocortical. Esse procedimento também é útil na detecção de uma disfunção sutil.
Endireitamento – Observa-se se o animal pode se endireitar a partir de um
decúbito lateral. Um pequeno animal suspenso de cabeça para baixo através de
suas ancas tenta manter a sua cabeça para cima ao rotacionar o tronco de lado a
lado e estende seus membros anteriores para sustentar o peso quando abaixado ao
chão. No caso de uma disfunção vestibular, o animal se contorce para o lado da
lesão ou joga sua cabeça para baixo.
Reflexos espinhais – São testados com o animal em decúbito lateral com os
membros relaxados. Ao se beliscarem os dedos ou a pele do membro distal, o animal
deve retirar este último e o membro oposto geralmente não se move. Esse é o reflexo
flexor ou de retirada; ele se encontra presente se os segmentos C 6-T2 da medula
espinhal e os nervos do plexo braquial estiverem intactos. As lesões intramedulares
da medula espinhal em C6-T2 geralmente deprimem ou abolem o reflexo, mas as
lesões extramedulares leves podem não produzir nenhuma alteração. No caso das
lesões craniais a C 6, pode ocorrer uma extensão simultânea do membro oposto (o
reflexo extensor cruzado) quando o membro testado se flexiona.
Pode-se bater de leve com um martelo de percussão em outros tendões (bíceps
e tríceps) e no músculo (extensor radial do carpo) e avaliar a resposta ao se testar
C6-7 ou o nervo musculocutâneo, e C7-T2 ou o nervo radial, respectivamente. Esses
reflexos podem ser difíceis de se obter nos animais normais, tanto que se devem
interpretar as alterações com cuidado. Todos os reflexos podem estar anormais ou
exagerados com as lesões acima de C6.
Atrofia muscular – A atrofia muscular localizada severa, dos membros ou pescoço,
indica dano a um nervo em particular (corpo celular, raiz ou porção periférica) que
inerva aquele músculo e pode ser útil na localização de uma lesão naquele local.
Sensibilidade – Testa-se a percepção consciente da dor, superficial (pele) ou
profunda (osso) pela aplicação de pinça na pele ou osso e observação da resposta
comportamental. Tal resposta indica que o nervo sensitivo periférico e a medula
espinhal, assim como as vias do tronco encefálico para o córtex, estão intactos.
Se o animal apresentar achados anormais na avaliação da cabeça, devem-se
relacionar inicialmente quaisquer anormalidades no membro anterior relacionadas
à lesão acima do forame magno. Caso não se possam explicar as anormalidades
do membro anterior por meio da lesão na cabeça, então deve estar presente um
processo patológico difuso ou multifocal tal como um distúrbio inflamatório, tóxico,
metabólico, nutricional ou neoplásico metastático.
Se não houver anormalidades na avaliação da cabeça e os membros anteriores
estiverem anormais, então uma lesão na medula espinhal cervical e no plexo
braquial se encontra presente. Nas lesões da medula espinhal cervical, os membros
anteriores estão anormais e os reflexos espinhais dos membros posteriores estão
normais ou exagerados.
Se nenhuma alteração é encontrada na avaliação da cabeça ou membros anterio-
res, então a lesão, se existe, deve estar abaixo dos segmentos T2 da medula espinhal.

Avaliação do tronco, membros posteriores, ânus e cauda


O tronco do animal é observado quanto à postura anormal ou desvios da coluna ver-
tebral, dor, insensibilidade ou hiperestesia a uma leve alfinetada e atrofia muscular
focal.
Sistema Nervoso, Introdução 693

Reflexo do panículo e do troncocutâneo – As alfinetadas aplicadas na pele do


tórax ou do abdome resultam na contração do músculo troncocutâneo. Esse arco
reflexo utiliza os ramos cutâneos dos nervos espinhais lombares e torácicos como
vias aferentes e o nervo torácico lateral do plexo branquial como via eferente. Utiliza-
se esse reflexo para a localização de lesões na medula espinhal entre o local do
estímulo aferente e os níveis do plexo braquial caudal.
Reações posturais e atitudinais – Nos membros posteriores, avaliam-se o
carrinho de mão, o posicionamento proprioceptivo, a colocação e o pulo em um pé
só em uma maneira semelhante àquela utilizada para os membros anteriores. Como
no caso dos membros anteriores, esses testes requerem integridade completa do
cérebro, da medula espinhal e dos nervos periféricos; logo, eles não são úteis na
localização das lesões, mas o são na detecção de deficiências sutis que sustentam
a presença de uma lesão neurológica.
Reflexos espinhais – Os reflexos espinhais dos membros posteriores são
mais confiáveis para a localização das lesões toracolombares que os reflexos dos
membros anteriores. Os reflexos espinhais podem estar anormais ou exagerados
no caso das lesões acima do nível do arco reflexo, ou deprimidas ou abolidas no
caso das lesões no local do reflexo. A percussão do tendão patelar deve produzir
a extensão da soldra se os segmentos L4-5 da medula espinhal e o nervo femoral
estiverem intactos. A percussão dos músculos gastrocnêmio e tibial cranial causa
a extensão ou a flexão do jarrete, respectivamente, e testa os nervos tibial e
peroneal, os segmentos espinhais L6-S 2 e o plexo lombossacral. Um reflexo
extensor cruzado pode estar associado com lesões acima de L 6. Ao se beliscar
ou alfinetar o ânus, o esfíncter se retesa e a cauda se abaixa se os nervos e os
segmentos S 1-3 (ânus) e caudal (cauda) estiverem intactos. Nos casos das lesões
que afetam S1-Cd 5 ou a cauda eqüina, observa-se uma atonia (flacidez) da
bexiga, do ânus e da cauda.
Atrofia muscular – A atrofia muscular focal do tronco ou do membro posterior
localiza a lesão ao nervo que inerva tal músculo.
Sensação – Em lesões moderadas a severas da medula espinhal, a sensação
superficial pode estar ausente caudalmente a partir do lado cranial da lesão. Em
lesões severas da medula espinhal, a sensação profunda está ausente a partir dos
ossos de todos os membros e da cauda.
Fenômeno de Schiff-Sherrington – Em alguns animais com lesões espi-
nhais severas e agudas, entre T 2-L 3, a paralisia do membro posterior é
acompanha por uma rigidez extensora dos membros anteriores quando o animal
se encontra em decúbito lateral. Embora uma lesão severa produza essa
síndrome, o prognóstico provavelmente não se torna muito animador se puder
disparar uma dor profunda.

LÍQUIDO CEREBROESPINHAL
A pressão e a composição do líquido cerebroespinhal (LCE) podem ajudar
adicionalmente na determinação do mecanismo dos distúrbios do SNC. A técnica
de coleta é simples e segura com a prática. A análise do LCE requer um equipamento
especial mínimo, mas devem-se realizar a contagem de células e a identificação
dentro de 30min após a coleta. A análise do LCE geralmente se torna necessária
para detectar as infecções no SNC. Pode-se realizar a coleta através da punção da
cisterna cerebelomedular nos pequenos animais, ou do espaço subaracnóideo da
junção lombossacral nos grandes animais. As elevações da pressão para mais de
170mm H2O nos pequenos animais indica uma lesão que ocupa o espaço ou um
defeito na drenagem do LCE no interior do sistema venoso. A elevação das
proteínas se associa freqüentemente com a encefalite, a meningite, a neoplasia ou
a compressão da medula espinhal. A elevação do teor celular sugere uma inflama-
Sistema Nervoso, Introdução 694

ção do SNC. Os neutrófilos são indicativos de infecções bacterianas, hemorragia


subaracnóidea (as hemácias também se encontram presentes), abscesso cerebral
ou meningoencefalite supurativa responsiva a esteróides, ou um alguns casos,
necrose no interior de um tumor. O aumento do número de linfócitos, monócitos e
neutrófilos é mais comum na meningoencefalite granulomatosa, nas infecções
fúngicas ou na toxoplasmose. As culturas do LCE podem demonstrar o agente
causador nas infecções bacterianas e fúngicas. A sorologia pode identificar os
anticorpos contra outros agentes, particularmente os vírus.

PATOLOGIA CLÍNICA
As causas metabólicas das anormalidades comportamentais e ataques
convulsivos incluem hipoglicemia, encefalopatia hepática, encefalopatia urêmica,
hipocalcemia, hipomagnesemia e síndromes hiperosmolar e hiposmolar. Glicose
sérica, enzimas hepáticas, uréia sangüínea, ácidos biliares, amônia sérica e
eletrólitos devem ser avaliados para detectar a maioria das disfunções metabólicas.
As determinações da colinesterase e chumbo séricos são inestimáveis para o
diagnóstico de intoxicação aguda por organofosfatos e chumbo, respectivamente.

RADIOGRAFIA
Radiografias simples do crânio e da coluna vertebral são úteis na detecção de
fratura, subluxação, infecção ou neoplasia das estruturas ósseas. Na maioria dos
casos, as infecções ou neoplasias do cérebro e da medula espinhal apresentam
radiografias simples normais. Utiliza-se a mielografia para a detecção de lesões
espinhais compressivas, incluindo os discos intervertebrais protraídos ou herniados
e os tumores na medula espinhal. A angiografia cerebral, a pneumoventriculografia,
a tomografia computadorizada e a obtenção de imagens por ressonância magnética
são outras técnicas diagnósticas utilizadas para avaliar animais com neuropatias.

OUTRAS AVALIAÇÕES DIAGNÓSTICAS


Encontram-se disponíveis a eletroencefalografia, a eletromiografia e outros
procedimentos eletrodiagnósticos especiais na maioria das práticas de referência
em neurologia.

PRINCÍPIOS DE TERAPIA
Ver também SISTEMA NERVOSO, FAR página 1693.
O objetivo da terapia cirúrgica consiste na redução da compressão dos nervos,
do cérebro ou da medula espinhal. Isso se realiza melhor tão logo quanto possível
após a lesão, já que uma compressão prolongada pode causar um dano irreversível.
O inchaço cerebral devido a edema é medicamente descomprimido com combi-
nações de diuréticos metabólicos (por exemplo, furosemida, 1mg/kg, duas vezes ao
dia), diuréticos osmóticos (por exemplo, manitol, 0,25 a 1g/kg, três vezes ao dia),
grandes doses “estabilizadoras de membrana” de glicocorticóides (por exemplo,
prednisolona, 30 a 50mg/kg, ou a dexametasona, 2 a 4mg/kg quatro vezes ao dia),
dimetilsulfóxido (DMSO) e oxigenação adequada. A anestesia profunda e a oxige-
nação hiperbárica não têm sido efetivas experimentalmente, mas várias antipros-
taglandinas específicas podem se tornar disponíveis para bloquear o vasoespasmo
arterial no cérebro.
Podem-se utilizar os glicocorticóides, a fenilbutazona, o DMSO e vários outros
antiinflamatórios quando houver uma inflamação não infecciosa (por exemplo, uma
Sistema Nervoso, Introdução 695

desmielinização, um edema e uma hipoxia periinfartante). Pode-se utilizar o confina-


mento em gaiolas ou baias caso se suspeite de um trauma ou de uma lesão no disco
intervertebral. Deve-se realizar a redução da dor com um confinamento estrito (por
exemplo, com os glicocorticóides) em um animal com uma lesão espinhal, a fim de
que a liberação da dor não permita que o animal se mova excessivamente e piore a
lesão. Os animais com disfunção neurológica severa e dor crônica podem exigir uma
cirurgia. A desmielinização ou a inflamação imunomediadas podem precisar de
uma terapia com glicocorticóides em dias alternados por 3 a 12 meses.
O cuidado na seleção da droga é necessário caso se suspeite de infecção ativa.
É preferível usar jaula de confinamento e talvez aspirina em vez de glicocorticóides,
que podem suprimir a função imunológica. Pode-se usar a sedação para o
relaxamento, O diazepam não é somente um tranqüilizante, mas um relaxante
muscular específico. Relaxantes (por exemplo, metocarbamol) ajudam a aliviar o
espasmo muscular associado à dor medular ou mesmo ao tétano. Derivados da
morfina devem ser evitados em animais com lesões do SNC, uma vez que podem
aumentar o edema.
Infecções – Encontram-se disponíveis poucos agentes antivirais, e os antifúngicos
são de uso limitado no SNC. A maioria dos agentes antibacterianos não atravessa
a barreira hematocerebral ou hematocerebroespinhal intactas (não inflamadas), e
muitos não atravessam adequadamente mesmo quando a inflamação se encontra
presente. Cloranfenicol, trimetoprim e sulfas atravessam a barreira hematocerebroes-
pinhal intacta; a ampicilina e a penicilina a atravessam-na adequadamente quando
ela está inflamada. Os antibióticos aminoglicosídios (gentamicina, neomicina, etc.)
não atravessam bem a barreira hematocerebroespinhal, mesmo quando ela se
encontra inflamada. Se for necessária uma instilação intratecal (no interior do
espaço subaracnóideo ou do sistema ventricular), deve-se administrar o agente no
interior de um ventrículo lateral. Uma injeção no interior da cisterna cerebelomedular
se torna aceitável para as lesões espinhais. O LCE drena a partir dos ventrículos
para a superfície do cérebro e para a medula espinhal.
Quando o animal se encontra em decúbito, exige-se uma atenção especial para
se impedir ou tratar úlceras de decúbito. Tipóias, almofadas, palha e serragem
podem ajudar a distribuir o peso do animal. As camas de água também podem ser
úteis, mas devem ser fabricadas em material resistente para evitar a sua punção. A
prevenção da queimadura por via urinária, a manutenção do animal seco e a virada
do animal a cada 2h são úteis. O tratamento efetivo de uma úlcera de decúbito se
torna difícil até que o animal comece a reobter a função motora.
A cistite pode ser uma seqüela de paralisia ou de incontinência; uma vez que se
detecte uma infecção, podem ser necessários acidificantes, anti-sépticos e antibió-
ticos. A compressão manual da bexiga três vezes por dia ajuda a prevenir e a tratar
a cistite. Deve-se evitar a cateterização se possível.
Doenças metabólicas e tóxicas – O cérebro é especialmente sensível a
alterações eletrolíticas ou a reduções da glicose e vitaminas no sangue necessárias
para seu metabolismo (por exemplo, tiamina). Elevações na amônia e em outros
compostos no sangue, devido a insuficiência hepática ou renal, podem acarretar
efeitos dramáticos no cérebro. Compostos tóxicos usualmente causam coma ou
ataques, alteração nas taxas de eletrólitos, bloqueio das vias metabólicas, ou afetam
os neurotransmissores ou o fígado. O tratamento específico depende da doença ou
da identificação do agente e de um conhecimento da via metabólica afetada.
Fisioterapia e reabilitação – A extensão e a flexão manual dos membros
paralisados (por exemplo, por 15min, três vezes ao dia) ajudam a manter o volume
muscular e limitam a contração fibrótica dos músculos, mas apenas por alguns
meses. O estímulo elétrico percutâneo é mais efetivo. Podem-se utilizar a natação
e o suporte em tipóias uma vez que uma certa função motora retorne. Uma ultra-
Sistema Nervoso, Introdução 696

sonoterapia pode ajudar os músculos a manter e a melhorar a função, mas isso não
é terapêutico no caso das lesões do SNC.
Os dispositivos que permitem movimentos, tais como andadores, são efetivos
para cães e gatos com paresia posterior mas não resolvem o problema da
incontinência. Outras poucas reabilitações têm sido tentadas em animais.
A terapia específica para ataques depende da causa, por exemplo, antibióticos
para meningite infecciosa; cálcio EDTA para intoxicação por chumbo; gliconato de
cálcio para hipocalcemia; glicose para hipoglicemia. Podem-se usar anticonvulsi-
vantes para auxiliar no tratamento de tais patologias, mas seu uso primário é no
controle da epilepsia. Fenobarbital, primidona, diazepam, valproato, parametadiona,
fenitoína, e compostos do tipo progesterona podem aumentar o limiar das células
cerebrais aos ataques e retardar a disseminação de atividade elétrica anormal entre
as células. Destas drogas, o fenobarbital aparece como sendo o mais efetivo para
controle, a longo prazo, de ataques em cães e gatos. O diazepam é o mais útil no
estado epiléptico. O estrogênio baixa o limiar ao ataque provocado por qualquer
excitação, estresse ou irritação; conseqüentemente, a neutralização da epilepsia é
aconselhável. As doses de anticonvulsivantes variam tremendamente entre as
espécies e podem ser metabolizadas diferentemente (em especial a fenitoína). Por
isso, a medida dos níveis séricos é aconselhável.
Terapia comportamental – O treinamento e a educação do proprietário são os
tratamentos mais necessários para muitos animais-problema, mas os hormônios, a
castração, os anticonvulsivantes e os tranqüilizantes podem ajudar. As drogas
específicas direcionadas ao metabolismo dos neurotransmissores podem se tornar
melhor compreendidas e novas drogas podem se tornar disponíveis. Os tratamen-
tos cirúrgicos, por exemplo, a lobotomia pré-frontal e o lesionamento focal do
cérebro, são raramente efetivos. A dose oral de colina parece ter um efeito
temporário (semanas) nos animais mais “senis”.
Fraqueza episódica – Muitas doenças sistêmicas e neurológicas podem causar
fraqueza ou intolerância ao exercício. Uma destas patologias, a miastenia grave,
pode ser tratada especificamente com potencializadores da acetilcolina ou
parassimpatomiméticos, tais como edrofônio (EV, curta duração), fisostigmina e
neostigmina (IM ou VO). Estes agentes ajudam na manutenção da transmissão
sináptica neuromuscular (efeitos nicotínicos), mas alguns também estimulam sinapses
muscarínicas (excesso de salivação). A atropina, um bloqueador da acetilcolina,
previne efeitos muscarínicos indesejáveis mas não afeta as sinapses nicotínicas.

ENCEFALOPATIA ESPONGIFORME BOVINA


É uma neuropatia fatal e progressiva dos bovinos domésticos adultos, que
lembra muito a “scrapie” dos bovinos e dos caprinos (ver pág. 753); foi diagnosticada
pela primeira vez na Grã-Bretanha em 1986.
Etiologia, epidemiologia e patogenia – Ainda não se identificou o agente
causador, mas as similaridades entre a encefalopatia espongiforme bovina (EEB)
e a “scrapie” sugerem que ela pertença a um grupo de microrganismos incomple-
tamente caracterizados denominados vírus não convencionais ou príons. Esses
agentes, além da “scrapie”, causam a encefalopatia transmissível do vison (ver pág
1276), a emancipação crônica do veado-orelhudo, a “kuru” e a doença de Creutzfeldt-
Jakob no homem. A infectividade de tais agentes é detectada apenas por um ensaio
biológico nas espécies hospedeiras experimentais, notavelmente nos camundon-
gos e nos hamsters. Estabeleceu-se a transmissibilidade da EEB nos camundongos
Doenças Congênitas e Hereditárias do SNC 697

e nos bovinos. Não há evidências de que as encefalopatias espongiformes transmis-


síveis do homem sejam adquiridas dos animais.
Os estudos iniciais na Grã-Bretanha demonstraram uma extensa epidemia de
fonte comum, consistindo somente dos casos índice e sem nenhuma evidência de
transmissão entre os bovinos. A incidência dos rebanhos afetados aumentou com
o tamanho do rebanho. No entanto, a incidência nacional e dentro de um rebanho
foi geralmente baixa. A incidência máxima foi em um bovino de 4 anos de idade. Não
houve predisposição racial ou sexual. As evidências disponíveis sustentam uma
exposição no alimento a um agente semelhante ao da “scrapie” através da
contaminação das rações concentradas.
Os mecanismos patogenéticos ainda são desconhecidos, mas os dados indicam
uma rota oral de infecção e um período de incubação mínimo de 22 meses.
Achados clínicos e lesões – Os sinais clínicos são principalmente neurológicos,
insidiosos no início, progridem variavelmente em semanas a meses e terminam com
a morte. O início clínico independe da estação ou do estágio da lactação; os sinais
incluem um comportamento apreensivo que pode progredir para agressão e frenesi,
hiperestesia com coices durante a ordenha, ataxia na andadura e redução da produ-
ção de leite ou perda do peso vivo. A incoordenação, a hipermetria, a epilepsia e a pa-
resia generalizada são intercorrentes com as alterações comportamentais e se tornam
mais tarde os sinais dominantes. Também ocorrem tremores e fasciculações muscu-
lares. O prurido intenso, como observado na “scrapie”, não é uma característica, mas
alguns bovinos afetados se esfregam e se coçam. As considerações de sanidade, de
comportamento não manejável, o decúbito ou a emaciação obrigam ao abate.
Os achados de necropsia significativos se restringem às alterações histológicas no
SNC. Elas compreendem uma vacuolização bilateral do neurófilo da substância
cinzenta (espongiose) e dos neurônios, semelhante às lesões observadas na “scrapie”.
Diagnóstico – Os sinais clínicos iniciais podem ser sutis ou lembrar os da hipo-
magnesemia ou da cetose nervosa. Podem-se descartar os distúrbios metabólicos na
bioquímica sérica e na falha ao responder à terapia. Deve-se basear a avaliação
clínica na repetição dos exames em intervalos suficientes para detectar o progresso
dos sinais. O exame histológico subseqüente do cérebro se torna essencial para a
confirmação do diagnóstico. As alterações comportamentais da EEB poderiam ser
confundidas com as da forma furiosa da raiva (ver pág. 750), mas o curso clínico
geralmente prolongado da EEB contrasta com o da raiva. O diagnóstico diferencial
também inclui a listeriose encefálica (ver pág. 430), a intoxicação por chumbo (ver
pág. 2029) e a síndrome da vaca caída (ver pág. 669).
Controle – O tratamento é ineficaz. Têm-se iniciado medidas de controle legais
provisórias na Grã-Bretanha, que presumem que a exposição dos bovinos a um
tecido contaminado por “scrapie” na farinha de carne de osso seja a fonte do
problema. Essas medidas compreendem a notificação dos casos clínicos suspeitos
às autoridades reguladoras, o abate compulsório, a histopatologia do cérebro, a
destruição da carcaça e o pagamento de uma compensação. O uso de proteínas
derivadas de ruminantes nas rações para ruminantes foi proibido em julho de 1988.

DOENÇAS CONGÊNITAS E HEREDITÁRIAS


DO SNC
Os defeitos congênitos do SNC são comuns, pode-se reconhecer a maioria
através da alteração estrutural, que pode envolver tanto o SNC como as estruturas
Doenças Congênitas e Hereditárias do SNC 698

esqueléticas, ou somente o primeiro. Sabe-se que alguns defeitos congênitos são


hereditários, outros são causados por fatores ambientais (plantas tóxicas, deficiên-
cias nutricionais e infecções virais); em muitos casos, ainda se desconhece a causa.
Nos animais nascidos com um sistema nervoso bem desenvolvido (potros, bezerros,
cordeiros e suínos), podem-se reconhecer os distúrbios neurológicos hereditários ao
nascimento. Nos gatinhos e nos cãezinhos, que nascem bem menos desenvolvidos,
os distúrbios neurológicos podem não ser notáveis até que eles comecem a andar
normalmente (ver também DOENÇAS DA COLUNA E DA MEDULA ESPINHAIS, pág. 705).

Defeitos cerebelares do tronco cerebral


A malformação de Arnold-Chiari consiste em uma herniação dos processos
lingüiformes do tecido cerebelar através do forame magno no interior do canal
espinhal cervical anterior e um deslocamento caudal e um alongamento da medula
oblonga, da ponte e do quarto ventrículo. Ela se associa freqüentemente com a
espinha bífida, a hidrocefalia e a meningomielocele. É rara nos animais domésticos,
e desconhece-se a causa.
Têm se descrito aplasia cerebelar, hipoplasia e degeneração em muitas
espécies. Devem-se reavaliar sua patogenia e as causas, já que uma infecção pré-
natal e neonatal (panleucopenia viral felina e diarréia viral bovina) pode ser
causadora. Os sinais principais são uma ataxia ao nascimento ou imediatamente
após, movimentos musculares violentos, tremores comuns e opistótono. As caracte-
rísticas patológicas incluem uma atrofia de todas ou de partes das camadas do
córtex cerebelar, mas particularmente, a perda da camada das células de Purkinje.
A hipoplasia cerebelar nos cãezinhos e nos gatinhos freqüentemente é acompanha-
da por uma hipoplasia da ponte, dos corpos oliváceos inferiores e algumas vezes
dos tratos ópticos. Os sinais clínicos consistem de trombos, andadura em círculos
e ataxia, e freqüentemente um tremor na cabeça. Tem-se observado um outro tipo
de distúrbio cerebelar, no qual se afeta predominantemente a substância branca
cerebelar, em bezerros jérsei e de outras raças na América do Norte. As lesões
também ocorrem em outras partes do cérebro, sendo a mais notável uma ausência
de formação de mielina. Na Grã-Bretanha, tem-se descrito uma afecção um pouco
semelhante (a hipomielinogênese congênita) nos cordeiros paralíticos recém-
nascidos. Desenvolvem-se cilindros axiais por todo o seu sistema nervoso, mas a
mielinização é deficiente. A mioclonia congênita nos suínos (ver pág. 704) pode
representar uma variação da hipomielinogênese congênita.
Tem-se descrito a atrofia cortical cerebelar nos bezerros holstein com caracte-
rísticas clínicas e morfológicas comparáveis àquelas do defeito nos cordeiros
(cordeiros dementes) e nos cães. Tem-se descrito uma afecção semelhante nos
bezerros angus como convulsões e ataxia familiais; descreveram-se alterações
patológicas quase idênticas em bezerros holstein e em um charolês. Os sinais
clínicos geralmente aparecem durante as primeiras poucas horas de vida e se
caracterizam por ataques tetaniformes súbitos, únicos ou múltiplos, durando 3 a 12h
ou mais. A hereditariedade pareceu ser dominante com uma penetração incompleta
(20 a 30%).
O edema neuroaxial hereditário e o edema cerebral congênito foram descri-
tos primeiro em herefords mochos neonatos. Os bezerros eram incapazes de se
levantar e ficavam deitados quietamente sem se debater. Houve incoordenação e
contração tônica muscular grosseira. O toque súbito ou o bater de palmas levaram
a uma extensão vigorosa das pernas e do pescoço. Os cérebros estavam macros-
copicamente normais, mas o exame microscópico revelou uma aparência vacuolar
esponjosa do tecido do SNC junto ao eixo longo das fibras mielinizadas nas
substâncias branca e cinzenta.
Doenças Congênitas e Hereditárias do SNC 699

A ataxia progressiva é uma entidade clínica e patológica, mais provavelmente


de etiologia genética, nos bovinos charoleses. Os sinais clínicos foram notados pela
primeira vez em bovinos de 8 a 24 meses de idade, e progrediram em 1 a 2 anos de
uma ligeira ataxia envolvendo todos os 4 membros, para decúbito. As lesões
histológicas consistiam de placas eosinofílicas na substância branca da cápsula
interna, na substância cerebelar branca e na medula espinhal. Houve uma decom-
posição da mielina, mas nenhuma resposta fagocitária.

Defeitos cerebrais
A agenesia do corpo caloso ausência de todo ou de parte do corpo caloso,
têm sido descrita raramente nos animais domésticos, e desconhece-se sua
causa.
A anencefalia, o não fechamento da porção cranial do tubo neural e conseqüen-
temente falha no desenvolvimento cranial, tem sido descrita em bovinos. Sua causa
é desconhecida. A hipófise pode estar ausente, e sua ausência é provavelmente
responsável pelo prolongamento da gestação de alguns bezerros com anencefalia.
Defeitos associados incluem fissura do palato, ausência da cauda, atresia do ânus
e fontanela aberta.
A arrinencefalia (ausência do rinencéfalo) é uma deformidade rara nos bovinos,
caracterizada pela ausência uni ou bilateral dos bulbos, do trato ou dos nervos
olfatórios. Uma prenhez prolongada pode acompanhar a afecção. As raças envol-
vidas são a simmental, a gurnsey e a angus. Desconhece-se a causa da deformi-
dade, embora já se tenha presumido que fosse uma mutação letal dominante.
A craniosquise (fissura no esqueleto cranial) geralmente se associa com a
herniação das meninges e partes do cérebro.
A ciclopia e a cebocefalia são defeitos severos que envolvem o crânio bem
como o esqueleto facial. Nos cordeiros, a causa consiste na ingestão da planta de
pasto Veractrum californicum (ver pág. 2067).
A exencefalia é a exposição ou a protrusão completa do cérebro a partir de um
grande crânio defeituoso (acrania). O defeito é raro e desconhece-se a causa.
A hidranencefalia é uma ausência completa ou quase completa dos hemisférios
cerebrais em um crânio de conformação normal. O espaço é preenchido com LCE
envolvido por um tecido cerebral delgado membranoso e meninges. A síndrome
congênita de hidranencefalia, com ou sem artrogripose, ocorre esporadicamente ou
como uma epidemia nos bezerros. Os sinais clínicos principais são cegueira,
incoordenação e artropatia. As outras alterações patológicas observadas são a
hipoplasia cerebelar, a atrofia muscular, a fissura do palato, a escoliose e a espinha
bífida. Podem ocorrer aborto, natimortalidade ou nascimentos prematuros. Têm-se
identificado várias causas, incluindo a hipertemia e os vírus da febre efêmera, da
encefalite japonesa, da língua azul e da doença de Akabane.
A hidrocefalia (um acúmulo excessivo de fluido no interior do sistema ventricular)
é comum nos bovinos e em outros animais domésticos. Os bezerros com hidrocefalia
interna (ver também pág. 574) podem nascer mortos ou morrer em poucos dias. Em
muitas raças de bovinos, esse defeito parece ser hereditário como uma doença
recessiva autossômica simples. Nos bezerros hereford e shorthorn, a hidrocefalia é
acompanhada por uma estenose do aqueduto, uma hipoplasia cerebelar, uma
miopatia, anomalias oculares múltiplas, descolamento e displasia da retina, catarata,
microftalmia e persistência das membranas pupilares. A hidrocefalia varia conside-
ravelmente; podem-se envolver um ou ambos ventrículos laterais, pode-se dilatar o
terceiro ventrículo e a porção anterior do aqueduto e o quarto ventrículo pode-se
manter normal. Nos bezerros hereford, podem ocorrer um retorcimento dorsal e uma
compressão lateral do mesencéfalo com uma estenose da parte média do aqueduto
Doenças Congênitas e Hereditárias do SNC 700

mesencefálico. O abaulamento do crânio não é compatível nos animais domésticos.


Os bezerros discondroplásicos (ver também pág. 576) geralmente são afetados por
uma hidrocefalia interna.
A meningocele e a meningoencefalocele se caracterizam pela protrusão das
meninges e do tecido cerebral através de uma fissura craniana (craniosquise). A
porção herdada algumas vezes forma um grande saco preenchido por líquido. A
meningoencefalocele geralmente ocorre na região frontal (proencefalia) mas tam-
bém pode ser mesofrontal, parietal ou occipital. Na maioria dos animais domésticos,
não se sabe se o defeito é hereditário; nos leitões, é uma doença recessiva
autossômica simples. (As meningoceles também ocorrem na coluna espinhal, como
um tipo de espinha bífida.)
A microencefalia é rara e tem sido descrita com uma cavidade cranial de
tamanho normal apenas parcialmente preenchida pelo cérebro. Nos casos descri-
tos, houve um decréscimo no número de giros, e o corpo caloso e o fórnix se
encontravam ausentes; todos eram natimortos ou morriam logo após o nascimento.
Os defeitos associados incluíam micrognatia, defeitos múltiplos oculares e auditi-
vos, hemisfério cerebral vesicular e ausência do septo pelúcido.

Doenças paralíticas e espásticas


É um grupo de doenças, algumas das quais hereditárias, com evidências clínicas
de envolvimento do SNC; porém, ainda não se definiu bem a patogenia e as lesões
neurológicas.
A citrulinemia (um defeito metabólico hereditário nos bezerros holstein-frísios)
foi descrita primeiro na Austrália. Ela se deve a uma elevação da citrulina no plasma
causada por uma deficiência de uma enzima do ciclo da uréia, a arginossuccinatos-
sintetase. Os bezerros afetados parecem normais no nascimento mas morrem de
neuropatia fatal aguda em 1 a 4 dias, Os sinais são repentinos no início e consistem
de depressão, andadura desnorteada, cegueira, ataques, opistótono e decúbito.
Não há lesões macroscópicas no cérebro; a mucosa gastrointestinal pode revelar
congestão e edema, e o fígado se encontra pálido e amarelado. Há um edema
cerebrocortical difuso, uma congestão, uma certa degeneração neuronal e um
inchaço astroglial. Encontram-se alterações semelhantes no mesencéfalo, no
cerebelo e no tronco cerebral, mas elas são menos severas.
A epilepsia é uma doença funcional do cérebro caracterizada por convulsões
tonicoclônicas periódicas recorrentes, geralmente de curta duração, e aparentemen-
te semelhantes à epilepsia no homem. Tem-se descrito uma epilepsia “idiopática” em
muitas espécies, mas provavelmente ela seja mais freqüentemente observada nos
cães (ver adiante); ela foi descrita nos bovinos vermelhos suecos como uma doença
autossômica recessiva, e nos bovinos suíços castanhos como uma doença autossô-
mica dominante (ver também ATAQUES C ONVULSIVOS [CÃES], adiante).
A história típica é de ataques recorrentes, com pouco ou nenhum outro sinal
físico. As convulsões podem-se iniciar no primeiro ano de vida, porém mais
freqüentemente começam no segundo ano. O ataque típico dura 1 a 2min e consiste
de uma expressão de olhar fixo, uma queda para o lado e um disparo de movimentos
nas extremidades. A evacuação da bexiga e do intestino é comum durante os
ataques. Após a convulsão, o animal pode reobter rapidamente o seu estado normal
ou agir atordoada e desordenadamente por alguns minutos.
A glangliosidose GM 1 ocorre nos bezerros frísios endogâmicos na Irlanda e
envolve uma redução (70 a 80%) na atividade da β-galactosidase. Os sinais clínicos
se tornam evidentes durante as primeiras poucas semanas de vida, e incluem uma
inclinação dos quartos posteriores, uma relutância ao se mover e uma rigidez. As
lesões microscópicas incluem primariamente a vacuolização dos neurônios.
Doenças Congênitas e Hereditárias do SNC 701

O espasmo letal (espasticidade neonatal letal) tem sido descrito nos bovinos
jérsei e hereford como uma doença autossômica recessiva simples.
A manosidade (originalmente descrita como pseudolipidose) no angus, no
cinzento de Murray, no galloway, possivelmente em algumas outras raças, se deve
a uma deficiência da enzima manosidase e é uma doença autossômica recessiva
simples. Clinicamente, ocorrem ataxia, tremor na cabeça, agressão e falha no
crescimento. Também podem ocorrer abortos e mortes neonatais. A maioria dos
bezerros afetados morre dentro do primeiro ano, algumas vezes imediatamente
após o nascimento. A vacuolização dos neurônios, dos macrófagos, das células
reticuloendoteliais dos linfonodos e das células pancreáticas exócrinas é típica. Os
bezerros afetados (homozigóticos) apresentam uma deficiência absoluta de α-
manosidase, e os heterozigotos são parcialmente deficientes. Conseqüentemente,
pode-se controlar a manosidose através da identificação e da eliminação dos
heterozigotos com base em testes bioquímicos.
A doença da urina em xarope de bordo é uma aminoacidúria nos bezerros
hereford mochos e possivelmente também naqueles com chifres. Os bezerros
afetados apresentam uma neuropatia severa na primeira semana de vida. Eles
ficam entorpecidos, assumem o decúbito em 2 a 4 dias e finalmente apresentam
opistótono. As lesões histológicas severas consistem de um estado esponjoso.
A paresia espástica ocorre em muitas raças de bovinos e se caracteriza por uma
contratura espástica dos músculos e por uma extensão da soldra e do tarso de uma
ou de ambas as pernas traseiras. Ela tem sido chamada de “contração do tendão
de Aquiles”, “jarrete reto” e “calcanhar de Elso” (ver também CLAUDICAÇÃO EM
BOVINOS, pág. 595). A espasticidade afeta os músculos gastrocnêmio e flexor
superficial e os tendões e, em alguns casos, os músculos bíceps femoral,
semitendinoso, semimembranoso, quadríceps e abdutor. É uma doença progressi-
va e varia quanto à severidade e ao período de início; é geralmente observada
primeiro nos bezerros de 3 a 6 meses de idade.
As radiografias dos jarretes afetados se caracterizam por um aumento no ângulo
da articulação, uma osteoporose, uma exostose da linha epifisária da tíbia, uma
curvatura e uma exostose do perfil dorsal do calcâneo e um alargamento da linha
epifisária deste. A(s) influência(s) genética(s), bem como os fatores ambientais,
interage(m) para exprimir a paresia espástica. Não se devem utilizar os touros
afetados para o acasalamento.
Em bovinos > 3 anos de idade, observa-se uma síndrome espástica (síndrome
espática periódica ou remitente, espasticidade neuromuscular com cãibra, paralisia
posterior progressiva, estiramento ou cãibra de estábulo), caracterizada por contra-
ções musculares espásticas e súbitas de uma ou de ambas as pernas traseiras (ver
também págs. 605 e 606).

Atrofia muscular espinhal


É uma doença dos bezerros suíços castanhos, que se suspeita ser hereditária.
O primeiro sinal clínico corresponde a uma fraqueza nas pernas traseiras com 3 a
4 semanas de idade; os bezerros apresentam dificuldades para se levantar e
assumem o decúbito. Os estágios terminais se caracterizam por uma atrofia
muscular severa. O exame histopatológico revela uma degeneração e uma perda
de neurônios motores nos cornos ventrais da medula espinhal. A atrofia neurogênica
dos músculos é uma lesão compatível.

Mieloencefalopatia degenerativa progressiva bovina do bovino suíço castanho


A mieloencefalopatia degenerativa progressiva bovina (MEDPB) pode ser um
defeito metabólico congênito do transporte axonal que é familial e parece ser
Doenças Congênitas e Hereditárias do SNC 702

hereditário. Exigem-se quatro critérios básicos para o estabelecimento do diagnós-


tico clínico: 1. início da fraqueza bilateral das pernas traseiras e da ataxia entre 5 e
8 meses de idade; 2. deficiência dos reflexos proprioceptivos, sem nenhuma outra
anormalidade neurológica clinicamente detectável; 3. ausência de anormalidade
musculoesquelética clinicamente importante; e 4. ligação com o relacionamento
familiar. Inicialmente descrita como “tecelão” por causa da peculiar andadura em voltas,
a doença se associa freqüentemente com uma lesão no dorso ou uma artropatia.
Os sinais clínicos da MEDPB refletem os 4 critérios diagnósticos. Os animais
afetados finalmente assumem o decúbito e morrem, ou devem ser abatidos devido
ao timpanismo ruminal. Não há lesões macroscópicas típicas. As lesões microscó-
picas primárias se confinam ao SNC. As lesões na medula espinhal consistem de
uma degeneração axonal, incluindo a formação de esferóides; a perda de axônios e
mielina; e a vacuolização da substância branca devido a grandes espaços intercelulares
vazios. As lesões são qualitativamente semelhantes em todos os níveis da medula
espinhal, mas não o são quantitativamente nos diferentes níveis nos mesmos
funículos. Envolvem-se as fibras ascendentes e descendentes, e o envolvimento é
mais severo na área torácica. A microscopia eletrônica demonstra alterações axonais
e mielínicas e alterações reativas nas células gliais. Na medula espinhal, observa-se
pouca ou nenhuma resposta glial, nenhuma resposta inflamatória e nenhum envol-
vimento da substância cinzenta. As lesões cerebelares se limitam à degeneração
seletiva e à perda das células de Purkinje e ao inchaço ocasional dos axônios dessas
mesmas células na camada granular do córtex cerebelar.

Distúrbios dos cães


Os ataques convulsivos parecem ser hereditários em determinadas raças de
cães. Os ataques espásticos nos retrievers do labrador lembram uma epilepsia (nas
leituras de EEG). Os “ataques” nos tervurens belgas possuem provavelmente uma
base genética.
A epilepsia (ver pág. 700) nos beagles possui uma base genética. A taxa mais
alta nos machos do que nas fêmeas sugere uma hipótese genética envolvendo 2
loci, um recessivo autossômico, e o outro, um gene supressor ligado ao sexo. A
epilepsia nos pastores alemães também parece ser herdada, como uma doença
recessiva autossômica. Tem-se observado uma alta incidência de epilepsia nos
cocker spaniels. Podem-se utilizar os eletroencefalogramas para a detecção, em
uma idade precoce, de distúrbios neurológicos que são prováveis de se manifestar
como convulsões quando o cão estiver mais velho.
Nos cães, têm-se associado convulsões com deficiências das vitaminas A e B,
hipocalcemia, parasitismo intestinal, obstruções intestinais e hipertermia; eles
podem preceder uma paralisia por carrapato. Como se desconhece a causa, deve-
se direcionar o tratamento para o alívio dos sinais clínicos. As drogas comumente
utilizadas para controlar os ataques epiléticos nos cães incluem o fenobarbital, a
primidona e a fenitoína, administrados separadamente ou em combinação.
A idiotia amaurótica familial, possivelmente herdada como uma doença
recessiva autossômica simples, ocorreu em pointers alemães de pêlo curto; os
sinais clínicos aos 6 meses de idade incluíram nervosismo e redução da capacidade
para treinamento. Mais tarde desenvolveram-se ataxia progressiva e deterioração
da visão. Histologicamente, observam-se neurônios com grânulos solúveis e
insolúveis e uma elevação dos glangliosídios GM2 no córtex cerebral.
A leucodistrofia das células globóides (doença de Krabbe), descrita em cairn
terriers, west highland white terriers e poodles miniatura, é herdada como uma
doença recessiva autossômica simples que causa a deficiência de uma β-
galactosidase. Clinicamente, observam-se duas síndromes importantes: em alguns
cães, observa-se uma pequena rigidez pélvica, aos 3 a 6 meses; em outros, um
Doenças Congênitas e Hereditárias do SNC 703

distúrbio cerebelar é o principal sinal clínico. Ocorre morte 2 a 3 meses após o início
dos sinais. O teor de proteína total de 80mg/dL no LCE equivale ao normal de
27,5mg. Grandes células globóides se distribuem por toda a substância branca da
medula espinhal e do cérebro.
O comportamento alucinatório no spaniel king Charles se caracteriza por uma
“captura de moscas” persistente na ausência de estímulos (insetos voadores).
A ataxia hereditária (uma doença recessiva autossômica simples) aparece em
fox terriers de 2 a 4 meses de idade. A progressão é rápida, depois se retarda, mas
a ataxia geral progride até que o cão fique incapaz de andar. As lesões histológicas
incluem a desmielinização bilateral das colunas dorsolateral e ventromedial da
medula espinhal. A ataxia nos Jack Russel terriers é clinicamente semelhante.
A hipoplasia e a degeneração cerebelares hereditárias, descritas em airedales
de 12 semanas de idade, se manifestam por sinais de ataxia e hipermetria.
Ocorreram ausência e degeneração das células de Purkinje, bem como uma
cromatólise dos neurônios nos núcleos cerebelares centrais.
A idiotia amaurótica juvenil em um setter inglês, mais provavelmente herdada
como uma doença recessiva, se caracterizou pela redução da visão e por embota-
mento, manifestados quando o cão tinha 12 a 15 meses de idade. Por volta dos 18
meses, apareceram espasmos musculares e, finalmente, os ataques progrediram
para espasmos tonicoclônicos severos. Os achados patológicos macroscópicos
incluíram o aumento de volume dos linfonodos e uma atrofia do cérebro. Histologi-
camente, observaram-se grânulos lipídicos nos neurônios, no coração, nos pul-
mões, no fígado e no trato gastrointestinal.
A abiotrofia neuronal nos lapões suecos, herdada como uma doença recessiva
autossômica simples, se caracteriza por um início súbito de fraqueza tanto nos
membros anteriores como nos posteriores, quando os cães atingem de 5 a 7 semanas
de idade. Ela progride para tetraplegia, atrofia dos membros e flexão articular. Histo-
logicamente, observam-se uma cromatólise periférica central, um encolhimento do
corpo celular, uma neurofagia e uma degeneração axonal e mielínica.
Uma osteopatia neurotrópica em pointers de 3 a 9 meses de idade, considerada
hereditária, se caracterizou por uma roedura das unhas, uma automutilação e uma
baixa sensibilidade nas partes distais dos membros. Os cortes da medula espinhal
revelaram uma desmielinização e uma degeneração vacuolar da substância branca.
A paralisia dos membros posteriores dos cruzamentos de são bernado ×
dogue alemão e de dogue alemão × bloodhound se desenvolveu quando os cães
tinham 3 meses de idade. Acreditava-se que a morte dos neurônios simpáticos
motores e pré-ganglionares na medula espinhal fosse hereditária.
A tetania recorrente nos terriers escoceses, também denominada cãibra
escocesa e geralmente observada primeiro com , 1 ano de idade, se caracteriza
inicialmente pelo arqueamento do dorso seguido por uma andadura com pernas
rígidas devido à superflexão dos membros posteriores e à abdução dos membros
anteriores. Observam-se os sinais, que podem resultar de um metabolismo anormal
da serotonina, quando os cães se excitam ou se exercitam arduamente e reduzem
o ritmo com o descanso. É uma doença recessiva autossômica simples.
O disrafismo espinhal nos cães weimaraners é um distúrbio hereditário,
embora a forma de hereditariedade ainda não seja clara. Os sinais clínicos principais
incluem uma andadura em pequenos pulos, uma postura encurvada, uma abdução
de um membro e uma propriocepção anormal nas pernas posteriores quando os
cães atingem 4 a 6 semanas de idade. A doença não é progressiva. As medulas
espinhais apresentam duplicação, ausência e malformação do canal central;
afinamento e ausência da substância cinzenta central; e áreas de substância
cinzenta ectópicas no sulco mediano ventral. Nos cães mais velhos, pode-se
desenvolver uma siringomielia (cavitação da medula espinhal).
Doenças Congênitas e Hereditárias do SNC 704

Nos airedale terriers, ocorre uma afecção de tremores permanente nos quartos
traseiros e na cauda, geralmente após os cães atingirem no mínimo 6 meses de idade.

Síndrome do tremor congênito suíno


(Mieloclonia congênita, Suínos sacudidores, Suínos dançarinos, Tremores congênitos)
É uma síndrome neurológica característica dos leitões recém-nascidos, caracteriza-
da clinicamente por tremores. O tremor congênito é indicativo de um distúrbio difuso do
SNC, e geralmente se encontra associado com anormalidades da formação da mielina
central. Algumas vezes também envolve uma hipoplasia cerebelar. Os estudos patoló-
gicos e neuroquímicos estabeleceram 5 entidades etiológicas dentro da síndrome.
Etiologia e epidemiologia – As infecções virais transplacentárias dos fetos
durante a primeira metade da gestação causam a maioria dos incidentes da
síndrome. O vírus da cólera suína (ver pág. 461) corresponde à única etiologia
infecciosa identificada. Um outro agente transmissível, presumivelmente viral, é
provavelmente responsável pela maioria dos surtos de tremor congênito nos países
livres da cólera suína. Também se têm conhecido (mas raramente descrito) causas
hereditárias nos cachaços landrace e landrace-cruzado como uma doença reces-
siva ligada ao sexo e nos suínos saddleback britânicos e chester white como uma
doença recessiva autossômica. O organofosfato de triclorfona produz uma síndro-
me nos leitões quando utilizado em porcas no meio da gestação. Existem provavel-
mente outras entidades etiológicas.
As causas infecciosas dão origem a epidemias que geralmente afetam muitas
ninhadas e até 100% dos suínos dentro das mesmas. Na forma infecciosa mais
comum, a mortalidade é geralmente baixa, especialmente sob condições de bom
manejo; mas em surtos resultantes de uma infecção pelo vírus da cólera suína, a
mortalidade pode ser alta. Os surtos persistem por 2 a 3 meses. É provável que as
ninhadas subseqüentes de pais de uma ninhada afetada sejam normais. A infecção
subclínica é espalhada pelos adultos com a forma infecciosa comum. A triclorfona,
quando utilizada terapeuticamente como um acaricida, pode produzir incidentes nos
quais nascem muitas ninhadas afetadas com altas morbidade e mortalidade dentro
de um curto período. A epidemiologia do tremor congênito geneticamente determi-
nado está de acordo com a hereditariedade mendeliana simples; afetam-se , 25%
dos leitões de cada ninhada, e a mortalidade é alta. As predisposições raciais e
sexuais ajudam a identificar essas formas incomuns.
Achados clínicos – A principal manifestação consiste de um tremor rítmico
difuso ou de uma mioclonia repetitiva presentes ao ou desenvolvendo-se algumas
horas após o nascimento. Quando os leitões repousam, os tremores diminuem ou
cessam, apenas para recomeçar após um estímulo externo. Durante a atividade
motora voluntária, eles permanecem constantes. Quando os tremores ficam tão
severos que impedem o aleitamento, os leitões logo morrem de inanição. Na maioria
dos sobreviventes, o tremor desaparece dentro de 3 semanas, mas ocasionalmente
persiste por meses, e até mesmo atinge a maturidade. Uma ataxia suave e algumas
vezes uma dismetria podem acompanhar os tremores, especialmente quando estes
são severos. Ocasionalmente, em um surto de tremor congênito infeccioso, alguns
dos leitões afetados deslocam suas pernas (ver também pág. 574). No entanto, não
há nenhuma associação patogenética conhecida entre as 2 síndromes.
Lesões – As alterações patológicas se limitam ao SNC e se caracterizam
morfológica e neuroquimicamente pelas entidades definidas. Ocorre uma hipo ou
uma desmielinogênese espinhal em todas as entidades descritas do tremor congê-
nito, mas isso é variável em natureza e extensão entre as diferentes formas
etiológicas e variável em severidade entre os casos de uma única forma. As
alterações nos oligodendrócritos provavelmente sustentam as deficiências de mielina.
Doenças da Coluna e da Medula Espinhais 705

A medula espinhal geralmente se reduz em tamanho em todas as formas, exceto na


forma infecciosa que mais comumente ocorre. Nessa forma, as alterações morfoló-
gicas são mínimas, e as deficiências de mielina se confinam virtualmente à medula
espinhal. Em algumas outras entidades etiológicas, também se afeta a mielina
cerebral. A correlação entre o grau de anormalidade da mielina e a severidade dos
sinais clínicos nem sempre é íntima. Embora se considere que o tremor se origine
na medula espinhal, desconhece-se o mecanismo. A hipoplasia e a displasia
cerebelares se encontram presentes nas formas que resultam de uma infecção
transplacentária pelo vírus da cólera suína ou de uma exposição fetal à triclorfona.
Diagnóstico – O sinal clínico característico nos leitões afetados vivos permite
facilmente o diagnóstico da síndrome. O diagnóstico etiológico requer o conheci-
mento dos achados epidemiológicos e patológicos. Os tipos hereditários envolvem
geralmente as raças específicas e apresentam uma baixa incidência, mesmo nos
rebanhos afetados. Os tipos infecciosos tendem a ocorrer em surtos com uma alta
morbidade inicial e, se devidos à cólera suína, podem dar origem a outras formas
de perda reprodutiva. A demonstração dos anticorpos contra a cólera suína no soro
das porcas com ninhadas afetadas confirma a exposição da porca ao vírus.
A demonstração das deficiências de mielina espinhal requer uma comparação cuida-
dosa dos cortes histológicos corados da medula espinhal provindos dos leitões afetados
e dos leitões normais da mesma idade. Embora os métodos neuroquímicos sejam mais
exatos, as técnicas laboratoriais não se encontram rotineiramente disponíveis. A avalia-
ção objetiva da hipoplasia cerebelar depende do peso do cerebelo com relação ao peso
do cérebro inteiro, e em comparação com dados de controle apropriados. Caso se
encontre uma hipoplasia cerebelar nos leitões afetados, deve-se suspeitar inicialmen-
te de cólera suína, especialmente nos países onde a doença permanece endêmica.
Tratamento e controle – Ainda não se desenvolveram tratamentos ou
biológicos profiláticos específicos. No entanto, como a morte é causada pela incapa-
cidade de mamar, podem-se salvar os suínos individualmente, ajudando-os a mamar
ou fornecendo-lhes alimentação até que, com a idade, a intensidade dos tremores
diminua. Se sobreviverem aos primeiros 5 dias, suas chances de sobreviver sem
ajuda tornam-se boas.
As medidas de controle do rebanho dependem do diagnóstico etiológico. As
causas infecciosas (freqüentemente a cólera suína) produzem uma doença mais
economicamente importante que as causas hereditárias. Pode-se controlar uma
infecção transplacentária por um vírus não identificado, o que é mais comum,
através da exposição deliberada de porcas não acasaladas a leitões afetados; isso
deve resultar na proteção dos leitões nas prenhezes subseqüentes. Nos rebanhos
não afetados, o uso de cachaços provenientes de rebanhos infectados pode
introduzir a doença.
Podem-se eliminar as causas hereditárias através do descarte dos portadores
identificados por meio de uma análise estatística dos dados de acasalamento. Não
se devem reter para o acasalamento os leitões que sobrevivem ao tremor congênito,
qualquer que seja a causa.

DOENÇAS DA COLUNA E DA MEDULA


ESPINHAIS
As doenças da coluna e da medula espinhais dos cães e dos gatos incluem as
doenças congênitas, as doenças degenerativas, as doenças inflamatórias e infec-
Doenças da Coluna e da Medula Espinhais 706

ciosas, as neoplasias, as doenças nutricionais, os traumatismos e as doenças de


depósito. Várias dessas doenças também afetam outros animais. A seguir são
apresentadas as discussões gerais, com ênfase nas doenças em pequenos
animais; as discussões acerca das doenças mais específicas nos bovinos, nos
eqüinos, nos suínos e nos bovinos e caprinos apresentadas separadamente na
página 715.

CÃES E GATOS
Distúrbios congênitos
A subluxação atlantoaxial é uma instabilidade da articulação atlantoaxial que
resulta da separação, ausência ou malformação do processo odontóide (dente). Ela
pode produzir deficiências neurológicas agudas e severas devido à flexão excessiva
da articulação. É mais comum nos cães < 1 ano de idade, mas pode ocorrer em
animais mais velhos como resultado de um traumatismo. Também tem sido descrita
nos gatos. Os sinais clínicos variam de uma rigidez e uma dor cervicais, através de
uma tetraparesia espástica, até uma tetraplegia. Os sinais podem ocorrer aguda-
mente ou se desenvolver lentamente por vários meses. O diagnóstico se baseia nos
achados radiográficos. O prognóstico é reservado. Torna-se obrigatória a descom-
pressão cirúrgica com a estabilização da luxação.
A malformação - má articulação cervical (síndrome do cambaleio) representa
uma malformação das vértebras cervicais inferiores, que resulta em graus variáveis
de compressão da medula espinhal. A doença se caracteriza radiograficamente pelo
deslocamento da face craniodorsal da vértebra para o interior do canal vertebral, pela
estenose do orifício cranial do forame vertebral e, algumas vezes, pela malformação
das faces craniodorsal ou cranioventral do corpo vertebral. Ocorre nos eqüinos (ver
SÍNDROME DO CAMBALEIO EQÜINO, pág. 717) e em várias raças de cães, porém mais
comumente nos dogues alemães mais jovens (<1 ano) e nos dobermans pinschers
mais velhos (> 5 anos). Existem relatos isolados em outras raças, incluindo o borzói,
o ridgeback rodesiano, o old english sheepdog, o setter irlandês, o fox terrier, o boxer,
o chow-chow, o weimaraner, o retriever dourado e o cão montanhês dos Pireneus.
Desconhece-se a causa, embora possam-se implicar as rápidas velocidades de
crescimento e nutrição, os fatores mecânicos e a genética. Os sinais tendem a ser
progressivos e variar de uma paraparesia suave a uma tetraplegia. Os quartos
posteriores se incluem desajeitadamente enquanto andam. Precisa-se diferenciar
esse distúrbio das esqueletopatias, tais como a displasia coxofemoral, a osteocondro-
se dissecante e a osteodistrofia hipertrófica, e da aproximação excessiva dos joelhos,
das neoplasias da medula espinhal cervical e das protrusões dos discos intervertebrais
nos cães mais idosos. As alterações da medula espinhal consistem em graus
variáveis de necrose e desmielinização no nível da lesão. O diagnóstico se baseia nos
sinais clínicos, na raça e na radiografia. Os estudos de contraste espinhal tornam-se
essenciais para o estabelecimento de um diagnóstico preciso. O prognóstico depen-
de da severidade do defeito e da idade do cão. Os cães jovens ocasionalmente se
recusam espontaneamente. Nos outros, uma terapia com corticosteróides pode
ajudar. Nos casos severos, o prognóstico é ruim, mesmo com uma cirurgia
descompressiva e estabilizadora. Nos basset hounds < 6 meses de idade ocorre uma
malformação possivelmente hereditária das vértebras C2-3; nesses animais pode-se
aliviar com sucesso a compressão da medula espinhal através de uma cirurgia.
Os seios dermóides são defeitos do tubo neural que resultam de uma separação
incompleta da pele e do tubo neural durante o desenvolvimento embrionário. A
afecção é mais comum nos cães ridgeback rodesianos, mas podem-se afetar outras
raças. Os sinais clínicos podem ocorrer quando o seio se comunica com a dura-
Doenças da Coluna e da Medula Espinhais 707

máter e se infecta. Os sinais clínicos refletem a localização da lesão e podem variar


de fraqueza a paralisia de um ou mais membros. A excisão cirúrgica é o tratamento
de escolha.
A hemivértebra é uma malformação congênita caracterizada pela presença de
um ou mais corpos vertebrais em forma de cunha, que resulta em um desvio dorsal
(cifose) da coluna vertebral torácica (geralmente entre T7 e T9). É mais comum nos
buldogues ingleses, nos buldogues franceses e nos boston terriers, geralmente <1
ano de idade. Os sinais de paraparesia ou paraplegia e de incontinência urinária
resultam da cifose progressiva que produz uma compressão da medula espinhal, ou
podem seguir uma luxação ou fratura vertebrais no local da hemivértebra secundária
ou um salto, uma queda ou um traumatismo súbitos. O diagnóstico se faz através
de uma radiografia e/ou uma mielografia. O prognóstico é reservado para os animais
clinicamente afetados. A compressão da medula espinhal requer uma descompres-
são e uma estabilização cirúrgicas. A vértebra quadrada e a vértebra-borboleta
são malformações vertebrais que raramente se tornam clinicamente importantes.
A atrofia muscular espinhal hereditária canina é uma doença hereditária
dominante dos spaniels bretões, que se caracteriza pela degeneração de neurônios
selecionados do tronco cerebral e do corno ventral da medula espinhal. Definiu-se
clinicamente a doença como: 1. início súbito – tetraparesia progressiva a partir de
1 a 4 meses de idade; 2. início intermediário – os sinais de paresia começam aos 4
a 6 meses de idade, e a tetraparesia progressiva ocorre nos 2 anos seguintes; e 3.
início tardio – uma doença lentamente progressiva, com os animais sobrevivendo
bem na idade adulta. Os animais andam de uma forma gingada, e a atrofia muscular
se torna proeminente nos músculos proximais dos membros posteriores e nos
músculos paraspinhais. Os animais severamente afetados permanecem em de-
cúbito lateral e tornam-se incapazes de levantar a cabeça. O diagnóstico se baseia
nos sinais clínicos e na raça. Não há tratamento.
A mielopatia hereditária dos hounds afegãos é uma doença recessiva
autossômica, que se caracteriza por cavitação e necrose da medula espinhal a partir
dos segmentos cervicais inferiores até os lombares médios. Os sinais clínicos
ocorrem entre 3 e 8 meses de idade. A paresia dos membros posteriores progride por
várias semanas para uma paraplegia e uma paresia dos membros anteriores. Os
reflexos espinhais podem ficar deprimidos e a respiração pode se tornar abdominal.
A morte resulta freqüentemente de uma falha respiratória. Os membros posteriores
podem ficar analgésicos. A radiografia fica normal. O diagnóstico se baseia na idade,
na raça e nos sinais clínicos. Não existe tratamento e o prognóstico é ruim.
A estenose lombossacral pode ser congênita ou adquirida nos cães. Os
sinônimos incluem “síndrome da cauda eqüina” e “espondilolistese”. Caracteriza-se
pelo encurtamento dos pedículos, pelo espessamento e pela justaposição escleró-
tica da lâmina e dos processos articulares, pelo envolvimento e pela hipertrofia do
ligamento amarelo e pela esclerose das faces articulares que se abaulam em
direção ao canal vertebral. A forma congênita é comum nas raças pequenas,
enquanto a forma adquirida é mais comum nas raças grandes, particularmente nos
pastores alemães. Em ambas as formas, geralmente se notam os sinais nos cães
adultos até os de meia-idade. Os sinais clínicos incluem dor à palpação da área
lombossacral, dificuldade em se levantar, paresia, incontinências fecal e urinária e
hipotonia do esfíncter anal. O diagnóstico se faz por radiografia. O prognóstico é
geralmente favorável com a descompressão cirúrgica.
A exostose cartilaginosa múltipla é uma doença proliferativa benigna da
cartilagem e dos ossos que pode envolver as vértebras. Ela ocorre raramente nos
cães e nos gatos. Não há predisposição sexual ou racial, embora seja provável uma
tendência familial. A afecção se relaciona com uma diferenciação anormal das
células cartilaginosas, que dá origem às exostoses. Os sinais neurológicos se
Doenças da Coluna e da Medula Espinhais 708

relacionam com uma compressão da medula espinhal secundária às exostoses


vertebrais, que são mais comuns nas regiões torácica e lombar. Os sinais que
aparecem antes de 1 ano de idade progridem desde uma paresia até uma paralisia
dos membros posteriores. O diagnóstico se baseia na radiografia e na mielografia.
A excisão cirúrgica se torna necessária se houver evidência de uma compressão da
medula espinhal. O prognóstico é reservado.
A displasia occipital se refere a um forame magno anormalmente grande,
resultando de um defeito de desenvolvimento do osso occipital. É comum em raças
pequenas ou toy de cães, e é geralmente observada como um achado incidental nas
radiografias do crânio. Não se acredita que cause sinais clínicos.
A disgenesia sacrococcígea (disgenesia caudal) é uma malformação heredi-
tária da espinha e da medula espinhal inferiores nos gatos sem cauda da ilha de
Manx, nos quais as vértebras sacrais e coccígeas podem se encontrar ausentes.
Algumas vezes, ela se encontra associada com a espinha bífida, a meningomielocele,
a siringomielia, a displasia da medula espinhal e a ausência da cauda eqüina. Os
gatos afetados apresentam uma postura plantígrada, uma andadura em pequenos
pulos, uma paraplegia dos membros posteriores, uma incontinência fecal e urinária
e uma analgesia perineal. O diagnóstico se baseia na idade, na raça e nos achados
radiográficos. O prognóstico é reservado. Os animais podem se deteriorar seria-
mente após o nascimento, ou uma invalidez parcial pode não progredir. Os gatos
levemente afetados podem alcançar longevidade, caso se maneje a incontinência
urinária e fecal. Não há tratamento.
A espinha bífida é uma malformação congênita que resulta da falha da fusão das
metades dos processos espinhosos dorsais, com ou sem a protrusão da medula
espinhal (mielocele) ou das suas membranas (meningocele) ou de ambas (mielo-
meningocele). Tem-se descrito comumente a afecção nos cães e nos gatos. A
incidência é alta nos buldogues ingleses jovens. Ela ocorre mais comumente na
região lombar. Os sinais clínicos, que podem ser observados assim que o animal
começa a andar, incluem fraqueza dos membros posteriores, incontinência fecal e
urinária, analgesia perineal e flacidez do esfíncter anal. O local do defeito ósseo
pode ficar marcado pelo encrespamento da pele revestidora, pela ondulação do
pelame ou por uma cavitação palpável no processo espinhoso dorsal. Confirma-se
o diagnóstico por radiografia ou mielografia. O prognóstico é reservado a ruim, e
geralmente não se tenta o tratamento.
A displasia espinhal é um distúrbio hereditário da medula espinhal dos cães,
que se caracteriza freqüentemente por hidromielia, duplicação do canal central,
siringomielia e ectopia da substância cinzenta. É mais comum nos weimaraners,
nos quais é hereditária. Os sinais clínicos aparecem geralmente por volta de 4 a 6
semanas de idade e incluem uma andadura de “salto-de-coelho” simétrica nos
membros posteriores, uma postura de base larga e uma superextensão dos
membros posteriores, e uma depressão da propriocepção. Os sinais menos
constantes incluem escoliose, ondulações de pelame anormais na região dorsal do
pescoço e coilosternia. Os sinais clínicos nem progridem, nem regridem. Os animais
podem levar uma vida normal. Não há tratamento.

Doenças degenerativas
Os cistos aracnóides foram descritos esporadicamente em cães de 1 a 10 anos
de idade. Esses cistos se caracterizam por lesões cavitárias na linha média dorsal
que resultam em uma compressão da medula espinhal. Recentemente, têm-se
observado síndromes clínicas cervicais e toracolombares. O diagnóstico se faz pela
mielografia. A excisão cirúrgica se torna o tratamento de escolha.
A mielopatia degenerativa é uma doença que ocorre mais freqüentemente nos
pastores alemães, e ocasionalmente nas outras raças grandes de cães, geralmente
Doenças da Coluna e da Medula Espinhais 709

> 5 anos de idade. Suspeita-se de uma base hereditária. Também ocorre uma doença
semelhante nos gatos. Desconhecem-se a causa e a patogenia, mas ela não está
relacionada a discopatia, espondilose deformante ou ossificação dural. Patologica-
mente, encontram-se as alterações mais severas na medula espinhal torácica, e
estas caracterizam-se pela degeneração da substância branca. O início da doença
é insidioso. Os sinais clínicos incluem uma fraqueza e um apoio progressivos nos
nós dos dedos das patas dos membros posteriores, e uma ataxia no tronco. Alguns
cães apresentam uma depressão do reflexo patelar. O diagnóstico se baseia na
idade, na raça e na síndrome clínica. Os testes auxiliares, inclusive a radiografia e a
mielografia, ficam normais. O prognósticos é ruim. Não há tratamento.
A ossificação dural é um distúrbio degenerativo dos cães que se caracteriza
pela formação de placas ósseas na superfície interior da dura-máter. Essas
placas ocorrem em > 60% dos cães > 2 anos de idade e são mais comuns nas
áreas cervical e lombar. Geralmente, constitui uma afecção radiograficamente
detectada como um achado incidental. Caracteriza-se por sombras lineares
radiopacas e delgadas no interior do canal vertebral, especialmente no local dos
forames intervertebrais.
Os êmbolos fibrocartilaginosos, que se acredita surgirem dos discos
intervertebrais, resultam em uma necrose isquêmica da medula espinhal. Esse
distúrbio ocorre em cães imaturos e adultos, especialmente nas raças maiores,
e nos gatos. O infartamento no nível da medula espinhal lombossacral e
cervicotorácica resulta na necrose das células do corno ventral. O início dos
sinais clínicos é tipicamente superagudo (em segundos), com a paralisia de um
ou mais membros, dependendo do nível do infartamento da medula espinhal. Os
locais mais comuns são os segmentos medulares lombares e cervicais. Tipica-
mente, os animais afetados não manifestam dor. O diagnóstico se baseia na
rapidez do início e nos achados radiográficos/mielográficos normais. O LCE pode
apresentar um aumento das proteínas e uma elevação da contagem de neutró-
filos dentro de poucas horas após o início clínico. O prognóstico é reservado.
Qualquer melhora deve-se tornar aparente em 1 a 2 semanas. Os corticosterói-
des (1mg/kg duas vezes ao dia) podem ser benéficos para a redução do edema
da medula durante as primeiras 24h. Nos grandes animais, têm-se descrito
êmbolos fibrocartilaginosos nos segmentos cervicais baixos dos eqüinos e nos
segmentos lombares baixos de uma porca.
A discopatia intervertebral constitui um dos distúrbios neurológicos mais
comuns; ela resulta de uma protrusão do material discal para o interior do canal
vertebral com subseqüente compressão da medula espinhal ou das raízes dos
nervos espinhais, ou de ambas. Ocorre em todas as raças de cães, mas é comum
nos dachshunds, nos beagles, nos pequineses, nos poodles, nos cocker spaniels,
nos shih tzus e nos corgis galeses, de 3 a 7 anos de idade. Acredita-se que o risco
de ocorrência nos dachshunds seja 10 a 12 vezes maior que o de todas as outras
raças combinadas. A doença é rara nos gatos. Os locais mais comuns são as regiões
toracolombar (85%) e cervical (15%). Os sinais clínicos da discopatia cervical se
caracterizam por dor e espasmos cervicais e tetraparesia. A tetraplegia é incomum.
Os cães podem assumir uma postura com o nariz mantido próximo ao chão e o dorso
arqueado. No caso da doença toracolombar, os cães podem apresentar paresia ou
paraplegia. A função dos membros anteriores permanece normal. A pressão digital
na espinha, no nível da protrusão do disco, geralmente dispara a dor. Os animais
ficam geralmente incontinentes, Como resultado de uma protrusão violenta e aguda
do material de um disco toracolombar, pode-se desenvolver uma mielomacia difusa
progressiva em uma pequena porcentagem dos cães, e causar paralisia ascendente
e descendente. À medida que a afecção progride, os membros anteriores e
posteriores podem-se tornar flácidos. Os animais afetados morrem de paralisia
Doenças da Coluna e da Medula Espinhais 710

respiratória à medida que a afecção se alastra para envolver a medula cervical. O


diagnóstico definitivo da discopatia se baseia nos estudos radiográficos e, às vezes,
mielográficos. O prognóstico depende da agudeza da protrusão do disco, do grau
de lesão medular e da duração da compressão da medula. Em geral: 1. os animais
que sofrem paresia ou paralisia, mas ainda mantêm o controle da bexiga e
apresentam uma sensação normal de dor, têm um prognóstico favorável após um
tratamento médico ou circúrgico; 2. os animais que ficam paralisados e incontinen-
tes, e apresentam uma redução da sensação de dor, possuem um prognóstico
reservado após a descompressão cirúrgica; 3. os animais que ficam paralisados,
incortinentes e apresentam uma perda da sensação de dor possuem um prognóstico
extremamente ruim, apesar do tratamento.
O tratamento pode ser conservativo (repouso em gaiola, restrição da atividade,
analgésicos e corticosteróides [por exemplo, a prednisolona, 0,5mg/kg, duas vezes
ao dia por 72h e depois interrompida] para a dor severa) para os animais que
manifestarem seus primeiros episódios de dor ou dor com fraqueza suave. Após o
manejo conservativo, > 50% dos cães apresentam recidivas. Indica-se o tratamento
cirúrgico nos casos de sinais clínicos recorrentes ou progressivos, sinais não
responsivos ao manejo médico, paresia ou paralisia com dor profunda e paralisia e
ausência de dor profunda de uma duração < 24h. Em tais animais, exigem-se a
descompressão cirúrgica imediata e a remoção do material protraído. A reabilitação
inclui o manejo da bexiga (esvaziamento manual, cateterização), a prevenção das
úlceras de decúbito, os exercícios de natação e os exercícios de ficar em pé/andar.
As complicações potenciais da terapia com glicocorticóides a longo prazo e/ou alta
dosagem incluem a hemorragia e a ulceração gastrointestinais, a perfuração
colônica e a pancreatite. Podem-se evitar essas complicações através da minimiza-
ção do uso de esteróides e através do uso profilático de protetores gastrointestinais,
antiácidos e antagonistas de H2.
A espondilose deformante é um distúrbio degenerativo da coluna espinhal
caracterizado por osteófilos vertebrais nos espaços intervertebrais, que resulta na
formação de esporões ou pontes ósseas completas; nos cães, isso ocorre mais
freqüentemente nos locais T9-10 e L7-S1. Os retrievers de pêlo liso, os setters
irlandeses, os bloodhounds e os ridgebacks rodesianos podem apresentar um alto
risco de espondilose deformante. A incidência nos cães e nos gatos aumenta com
a idade. É geralmente um distúrbio subclínico; no entanto, pode ocorrer uma dor
localizada em associação com a fratura dos esporões ou pontes ósseas. As
projeções osteofíticas no interior do canal espinhal com a compressão da medula
espinhal são raras. O diagnóstico se baseia nos achados radiográficos. O tratamen-
to é sintomático e o prognóstico é bom.

Doenças inflamatórias e infecciosas


A cinomose (ver pág. 494) permanece como um dos distúrbios do SNC mais
comuns nos cães. Os sinais na medula espinhal variam de fraqueza a paralisia em um
ou mais membros. Os espasmos flexores rítmicos se encontram freqüentemente pre-
sentes nos músculos flexores dos membros, nos músculos abdominais e na muscula-
tura cervical. Essas contrações não se encontram necessariamente associadas à
paresia ou à paralisia do membro e geralmente persistem durante o sono. Ocorre uma
encefalomielite multifocal nos cães adultos (4 a 8 anos de idade) e esta se caracteriza
por um curso crônico (por exemplo, 6 a 12 meses). A incidência dessa doença é baixa
e não é precedida por, nem coincidente com os sinais sistêmicos que são observados
nos cães mais jovens. Os sinais iniciais incluem fraqueza dos membros posteriores,
incoordenação generalizada e prostração ocasional, que freqüentemente progride para
uma tetraplegia. Os ataques generalizados ou as alterações de personalidade não são
Doenças da Coluna e da Medula Espinhais 711

características dessa doença. Alguns animais apresentam paralisia facial, inclinação


da cabeça e nistagmo, e podem-se observar tremores na cabeça.
A raiva (ver pág. 749) é causada por um rabdovírus que atinge o SNC através
dos nervos periféricos. O vírus apresenta um alto tropismo para neurônios, e podem-
se observar os corpúsculos de Negri nos neurônios grandes, tais como as células
piramidais do hipocampo. O vírus produz uma polioencefalomielite multifocal com
infiltrados perivasculares monocleares. Há uma predileção pela localização no
tronco cerebral e na medula espinhal. Os sinais na medula espinhal podem-se
caracterizar por uma paresia espinhal ascendente ou uma paralisia flácida. Os
reflexos espinhais ficam freqüentemente deprimidos. O diagnóstico diferencial da
paralisia flácida inclui a paralisia por carrapato, o botulismo e a paralisia do
conhound. Pode ocorrer uma síndrome paralítica (semelhante àquela observada na
própria raiva) nos cães e nos gatos após a vacinação com uma vacina viva
modificada, mas pode ocorrer uma recuperação clínica dentro de 1 a 2 meses.
Entre os animais de fazenda, os bovinos são os mais comumente afetados. Os
sinais da medula espinhal incluem o apoio nos boletos traseiros, o arqueamento e
a inclinação dos quartos traseiros durante a marcha, a diminuição da sensação
(mais evidente nos quartos traseiros), a flacidez da cauda, a paralisia do ânus, o
tenesmo, o decúbito, e a morte geralmente dentro de 48h. Nos ovinos, observam-
se sinais semelhantes, Os eqüinos e os suínos geralmente apresentam excitação
e mania. Seguem-se paralisia terminal e morte, como nos bovinos.
A meningite bacteriana é incomum nos cães e nos gatos. A invasão bacteriana
do SNC geralmente resulta tanto em encefalomielite como em meningite (ver
MENINGITE E ENCEFALITE, pág. 735).
A abscedação espidural pode resultar em um êmbolo séptico de origem
sangüínea. Os sinais clínicos geralmente refletem uma lesão que ocupa o espaço
focal. Um abscesso epidural raramente invade a dura e penetra na medula espinhal.
Dessa forma, o LCE geralmente se mantém normal. O diagnóstico pode exigir uma
radiografia de contraste. O prognóstico é ruim, especialmente se a massa for grande
e encapsulada, o que a torna refratária a uma antibioticoterapia.
A peritonite infecciosa felina (PIF, ver pág. 502) é uma doença imunopatológica
causada por coronavírus. Caracteriza-se por lesões granulomatosas, principalmente
nas superfícies ependimais, nos plexos coróides e nas leptomeninges, embora as
lesões na medula espinhal não sejam raras. As excentricidades neurológicas e clínicas
da PIF incluem paresia dos membros posteriores, ataxia generalizada, hiperestesia
toracolombar dorsal, nistagmo, anisocoria, ataques, tetraparesia e tremores intencio-
nais. O prognóstico para os gatos, afetados é ruim clinicamente pois a maioria dos
animais morre dentro de poucas semanas ou meses. Não há tratamento satisfatório.
A polioencefalomielite felina é uma doença crônica e lentamente progressiva.
Os achados patológicos consistem de um embainhamento perivascular e de uma
degeneração e perda neuronais severas, especialmente na medula espinhal
torácica, juntos com uma degeneração difusa (desmielinização e necrose axonal)
da substância branca da medula espinhal. Desconhece-se a causa, embora as
alterações patológicas sugiram uma infecção viral. Pode-se encontrar associada
com os vírus da panleucopenia ou da leucemia felina. Os sinais clínicos incluem
paraparesia, ataxia e, algumas vezes, hipermetria. Pode-se observar um tremor
intencional na cabeça. Os gatos afetados se mantêm, em geral, mentalmente
alertas. A função do nervo cranial se mantém normal, exceto quando à depressão
dos reflexos pupilares consensual e direto em alguns animais. As reações posturais
e os reflexos espinhais segmentares podem ficar deprimidos nos membros afeta-
dos. Ocasionalmente, torna-se evidente uma área localizada de hiperestesia
aparente. Alguns gatos apresentam leucopenia, hiperplasia mielóide e anemia não
regenerativa. O prognóstico é reservado a ruim. Não há tratamento definitivo.
Doenças da Coluna e da Medula Espinhais 712

A meningoencefalomielite granulomatosa (MEG) é uma doença inflamatória,


não supurativa, esporádica e mundialmente disseminada dos cães, mais comumen-
te das raças pequenas jovens e de meia-idade, especialmente os poodles. As lesões
podem ser disseminadas ou focais. A forma disseminada foi anteriormente descrita
como “reticulose inflamatória”, e a forma focal como “reticulose neoplásica”. As
lesões se confinam ao SNC e se caracterizam por densas agregações de células
mesenquimais dispostas em um padrão espiral perivascular. As bainhas
perivasculares se compõem geralmente de elementos histiocitários e infiltrados de
células linfoplasmáticas.
Algumas vezes, encontram-se presentes neutrófilos e células gigantes multi-
nucleadas em pequeno número. Na forma disseminada, as lesões se distribuem
largamente por todo o SNC, especialmente na substância branca do cérebro,
tronco cerebral inferior, cerebelo e medula espinhal cervical. A coalescência das
lesões granulomatosas de muitos vasos sangüíneos adjacentes pode produzir
uma massa verdadeira, que representa a forma focal da MEG. Em alguns cães,
ocorre uma forma ocular na qual as bainhas granulomatosas inicialmente envol-
vem os nervos ópticos, o disco óptico ou a retina. Desconhece-se a causa; no
entanto, é possível que a MEG represente uma resposta alterada do hospedeiro
a um agente infeccioso.
As formas disseminadas e focais da MEG são mais comuns que a forma ocular.
O início da MEG disseminada é geralmente agudo com um curso progressivo por
1 a 8 semanas. Em , 25% dos cães afetados, a deterioração é rápida e leva à morte
em 1 semana. Em > 50% dos casos, o curso clínico é de 2 a 6 semanas. A forma
focal da MEG apresenta um início mais insidioso e pode progredir lentamente por
3 a 6 meses. A forma ocular tende a apresentar um início súbito e pode permanecer
estática ou ser progressiva.
Os sinais clínicos são variáveis e refletem a localização da lesão. Os sinais da
MEG focal geralmente sugerem uma única lesão ocupa espaço, por exemplo,
síndromes cerebrais, pontomedulares, vestibulares, etc. Os sinais da MEG disse-
minada geralmente refletem uma síndrome multifocal. Os sinais comuns incluem
incoordenação, ataxia e prostração, dor cervical, inclinação da cabeça, nistagmo,
paralisia facial/trigeminal, andadura em círculos, ataques e depressão. Ocasional-
mente, uma febre acompanha os sinais clínicos. Precisam-se diferenciar os sinais
da medula cervical (dor e rigidez cervicais) dos da discopatia cervical e da meningite.
O LCE fica anormal, com um aumento dos níveis de proteína (100 a 1.000 + mg/dL)
e uma pleocitose mononuclear (50 a 800 leucócitos/mL).
Embora possa-se seguir uma remissão temporária após uma terapia com
corticosteróides, o prognóstico é ruim. A cessação da terapia com corticosteróides
é seguida por uma deterioração rápida e dramática.
As doenças micóticas produzem esporadicamente uma meningoencefalomielite
granulomatosa nos cães e nos gatos. Os agentes infecciosos micóticos, incluindo
Cryptococcus neoformans, Blastomyces dermatitidis, Histoplasma capsulatum e
Coccidioides immitis, podem alcançar o SNC hematogenicamente (por exemplo, a
partir de uma infecção primária no trato respiratório) ou por alastramento direto a
partir de uma infecção adjacente por exemplo, a partir das fossas nasais, dos alvéolos
e dos seios dentários, do ouvido externo, da trompa de Eustáquio, do ouvido médio
ou interno, do osso temporal pétreo ou do osso basilar. Enquanto a incidência do
envolvimento do SNC nas doenças micóticas é baixa, a C. neoformans pode ser mais
provável de ser incriminada que os outros microrganismos, e especialmente nos
animais imunossuprimidos. Os gatos contraem a doença mais freqüentemente que
os cães. Uma característica notável das lesões micóticas, particularmente no SNC,
é a relativa ausência de resposta tecidual por parte do hospedeiro. Os sinais
neurológicos variam de acordo com a localização e a severidade da lesão, e podem
Doenças da Coluna e da Medula Espinhais 713

refletir tanto um processo patológico de massa focal como um multifocal difuso; eles
podem incluir ataques, depressão, desorientação, andadura em círculos, ataxia,
prostração, paresia dos membros posteriores, paraplegia, anisocoria, dilatação
pupilar e cegueira. Podem-se demonstrar os microrganismos no LCE, que é
pleocítico (células mononucleares e polimorfonucleares) e apresenta um aumento no
nível de proteínas. No caso da criptococose, podem-se encontrar presentes
eosinófilos. O prognóstico para os animais com envolvimento do SNC é ruim, mesmo
quando tratados com anfotericina B.
Têm-se descrito outros agentes micóticos que produzem esporadicamente
infecções no SNC. Esses agentes incluem Cladosporium trichoides, Paecilomyces
sp, Flavobacterium meningosepticum, Geotrichum candidum e Aspergillus sp (ver
também INFECÇÕES FÚNGICAS, pág. 411).
A osteomielite-discoespondilite é um distúrbio inflamatório dos corpos verte-
brais e discos intervertebrais associados. É comum nos cães jovens a adultos de
meia-idade, geralmente das raças maiores. Os cães machos afetados superam as
cadelas afetadas em , 2:1. Também tem sido descrita nos gatos. A afecção pode
ocorrer após um traumatismo iatrogênico da coluna vertebral (por exemplo, a
curetagem de um disco), uma migração de um corpo estranho, ou mais comumente,
êmbolos sépticos de origem sangüínea. Na maioria dos casos, não se estabeleceu
a origem da infecção. Os locais possíveis incluem o trato urinário, a pele, a gengiva
e as válvulas cardíacas. Os microrganismos identificados incluem Staphylococcus
aureus, Brucella canis, Nocardia sp, Streptococcus canis e Corynebacterium
diphtheroides. Os sinais clínicos, que refletem o grau de proliferação óssea e
compressão da medula espinhal, variam de uma hiperestesia espinhal sutil a uma
paresia/paralisia severa. Os animais afetados podem ficar deprimidos, anoréticos e
febris. O diagnóstico se baseia nos achados radiográficos que podem incluir lise
óssea (especialmente nas áreas vertebrais adjacentes ao disco), proliferação,
esclerose vertebral, encurtamento dos corpos vertebrais e estreitamento dos
espaços dos discos intervertebrais. Os locais comuns de discoespondilite incluem
as vértebras torácicas e lombares e a articulação lombossacral. O prognóstico é
geralmente favorável com uma antibioticoterapia a longo prazo. As cefalosporinas
são efetivas na maioria dos casos em pequenos animais. A curetagem vertebral
pode acelerar a resolução clínica. Em animais com compressão da medula espinhal,
exigem-se uma descompressão e uma imobilização da vértebra.
A polirradiculoneurite (paralisia do coonhound) é uma neuropatia comum dos
cães, que ocorre especialmente nas raças caçadoras de guaxinins. Porém, pode
ocorrer uma afecção semelhante nos cães sem nenhuma exposição possível a
guaxinins. A patogenia não é clara. Uma mordedura de guaxinim tem sido um
antecedente compatível e suspeita-se de uma base imunológica.
Os sinais clínicos aparecem freqüentemente em 7 a 11 dias após um encontro
com um guaxinim. O início se caracteriza por fraqueza e hiporreflexia dos membros
posteriores. A paralisia progride rapidamente, e resulta em uma tetraplegia simétrica
flácida. Nos animais severamente afetados pode ocorrer fraqueza facial e dispnéia.
A paralisia dura de várias semanas até 2 a 3 meses. O prognóstico é geralmente
favorável com um tratamento sintomático e uma terapia de suporte; no entanto, a
proteção contra futuros ataques tem vida curta ou é inexistente. Pode ocorrer morte
a partir de uma paralisia respiratória.
O tétano (ver pág. 398) é causado pela toxina da Clostridium tetani. A suscetibilida-
de varia acentuadamente entre as espécies. Os sinais clínicos são geralmente
observados em 5 a 10 dias de infecção. Esses sinais incluem rigidez da andadura com
uma espasticidade extensora em todos os membros, dispnéia, espasmos dos mús-
culos mastigatórios e faríngeos (que resultam em trismo e disfagia), elevação da
cauda e contração dos músculos faciais (o que concede uma expressão zombeteira).
Doenças da Coluna e da Medula Espinhais 714

Os animais ficam hipersensíveis aos estímulos externos. Na doença severa, o animal


pode assumir decúbito e desenvolver um opistótono, e a morte pode resultar, prove-
niente de uma falha respiratória. O diagnóstico geralmente se baseia nos sinais
clínicos característicos. O prognóstico é geralmente favorável com o tratamento.
A toxoplasmose (ver pág. 441) pode causar embainhamento perivascular no SNC;
infiltração de linfócitos, células plasmáticas e histiócitos na meninge; necrose; e dege-
neração neuronal. Os sinais nos cães e nos gatos podem incluir hiperexcitabilidade,
depressão, tremores, paresia, paralisia e ataques. Nos cães < 3 a 4 meses de idade,
podem-se encontrar presentes uma hiperextensão rígida e uma atrofia macroscópica
dos músculos dos membros posteriores. Recentemente, descreveu-se uma
polimiosite/polineuropatia por Toxoplasma em cães adultos, com uma tetraplegia rapi-
damente progressiva. O LCE é geralmente anormal (proteína elevada e uma pleocitose
monocitária-polimorfonuclear mista). O diagnóstico se confirma por sorologia e histopa-
tologia. O prognóstico é ruim nos animais com envolvimento do SNC; no entanto, alguns
cães podem responder favoravelmente à clindamicina.
A osteomielite vertebral, a discoespondilite ou a abscedação epidural
também ocorrem comumente nos grandes animais após uma migração de corpo
estranho ou, mais comumente, a partir de êmbolos sépticos hematógenos secun-
dários a uma onfaloplastia nos potros e nos bezerros; uma metrite, uma mastite e
uma peritonite traumática nos bovinos; um corte de cauda nos cordeiros; e uma
mordedura de cauda nos suínos. Os sinais clínicos se referem ao local da lesão. As
bactérias freqüentemente envolvidas incluem a Corynebacterium pyogenes e a
Fusobacterium necrophorum nos bovinos; a C. pseudotuberculosis nos ovinos e nos
caprinos; as Salmonella spp, a Actinobacillus equuli ou a Rodococcus equi nos
potros; a Mycobacterium tuberculosis ou a Brucella abortus nos eqüinos adultos; e
a B. suis nos cachaços.

Neoplasia
A neoplasia da medula espinhal nos cães e nos gatos ocorre menos freqüente-
mente que a neoplasias do sistema nervoso (ver pág. 738).

Distúrbios nutricionais
Os distúrbios nutricionais que afetam a coluna ou a medula espinhal são
incomuns nos cães e nos gatos, exceto quanto à hipervitaminose A e à ataxia dos
hounds. A hipervitaminose A ocorre nos gatos alimentados predominantemente
com uma dieta de fígado. A vitamina A em excesso resulta em hipertrofia óssea e
em espondilose anquilosante das vértebras cervicais. Os sinais clínicos incluem um
“sentar como canguru”, incapacidade para mover a cabeça ou o pescoço, dor e
claudicação do membro anterior. O diagnóstico e faz por radiografia. O prognóstico
é reservado a ruim. As alterações na dieta podem deter uma progressão adicional,
mas não reduzem significativamente a espondilose que já se encontra presente.
Tem-se observado a ataxia dos hounds nos foxhounds, nos harriers e nos beagles
na Grã-Bretanha. Os animais afetados geralmente têm de 2 a 6 anos de idade.
Ocorre uma degeneração walleriana severa na medula espinhal. Os sinais clínicos
incluem fraqueza nos membros posteriores, ataxia e hipermetria. O curso clínico
pode ser de 6 a 18 meses. A função do membro anterior permanece normal. Tem-
se implicado um fator dietético, pois o distúrbio está associado à alimentação com
o bucho (o pré-estômago dos bovinos e dos ovinos).

Traumatismo espinhal
Essa afecção é comum nos cães e nos gatos, e é mais freqüentemente causada
por automóveis, quedas, lutas ou ferimentos a bala. As fraturas e luxações espinhais
Doenças da Coluna e da Medula Espinhais 715

podem ocorrer em qualquer nível mas são mais freqüentes na junção toracolombar,
uma área que compreende segmentos espinhais móveis e estáveis. As lesões da
medula espinhal resultantes se caracterizam patologicamente por graus variáveis
de isquemia, edema, necrose hemorrágica, degeneração neuronal, desmieliniza-
ção e malacia focal. O edema localizado pode resultar em um inchaço acentuado da
medula. Os sinais clínicos geralmente ocorrem imediatamente, e não são geralmen-
te progressivos. A lesão da medula espinhal toracolombar severa nos cães resulta
em paraplegia e hiperextensão dos membros anteriores (síndrome de Schiff-
Sherrington). A radiografia geralmente mostra fraturas e luxações óbvias da coluna
vertebral. Indica-se uma descompressão cirúrgica, uma redução e uma estabiliza-
ção imediatas da vértebra, frequentemente combinadas com uma terapia com
corticosteróides (dexametasona 2 a 4mg/kg. EV, repetida a intervalos de 6 a 8h). O
prognóstico é reservado. Os animais que apresentam uma perda da sensação de
dor apresentam um prognóstico ruim.
Os eqüinos são propensos a fraturas sacrais após quedas enquanto trabalham
como transporte de carga, e a traumatismos cervicais associados com trancos
violentos pelo cabresto. Os bovinos são suscetíveis a fraturas lombossacrais por
acidentes de acasalamento. As vértebras dos bezerros, dos potros ou dos suínos
com deficiência de cálcio podem ficar mais suscetíveis a fraturas.

Doenças de armazenamento
Ver também DOENÇAS CONGÊNITAS E HEREDITÁRIAS DO SNC, página 697.
São doenças raras que resultam de defeitos enzimáticos geneticamente determi-
nados, com os subseqüentes acúmulo e armazenamento de substratos no interior do
sistema nervoso. Pode-se observar uma paraparesia progressiva nos animais com 3
a 4 meses de idade. Os sinais de doença cerebral também são freqüentes. As doenças
de armazenamento que produzem sinais na medula espinhal nos cães e nos gatos
incluem a gangliosidose, a esfingomielinose, a leucodistrofia das células globóides e
a mucopolissacaridose. Essas doenças são geralmente fatais. Não há tratamento.

BOVINOS
A osteomielite vertebral, a raiva, a degeneração axonal no gado suíço castanho
e o traumatismo espinhal encontram-se mencionados na discussão centrada nos
cães e nos gatos (ver anteriormente). A seguir, discutem-se as doenças adicionais
da medula e da coluna espinhais nos bovinos.
A subluxação atlantoaxial bovina e a compressão da medula cervical secundá-
ria ocorrem nos bovinos holstein e nos cruzados entre o nascimento e 1 ano de idade.
O dente é pequeno ou se encontra ausente, e o eixo se desloca ventralmente ao atlas.
O atlas e os ossos occipitais podem-se fundir. Os sinais clínicos variam de paresia a
tetraplegia.
A poliomielomalacia simétrica focal foi descrita em um rebanho puro-sangue
de bovinos ayrshire. Os animais afetados são normais ao nascerem, mas se tornam
fracos nos quartos posteriores e paraplégicos em 10 dias; também podem-se
envolver os membros anteriores. Ocorre uma atrofia muscular, e os reflexos
espinhais se encontram reduzidos ou ausentes. As lesões parecem se restringir à
medula espinhal e se caracterizam por necrose (malacia) dos cornos ventrais com
acúmulo de fagócitos de lipídios. As áreas da medula que parecem ser suscetíveis
são os alargamentos cervicais e lombares. Desconhece-se a causa da afecção, mas
os fatores genéticos podem exercer um papel. Não há tratamento.
A meningoencefalomielite rinotraqueíte infecciosa bovina é causada por um
herpesvírus que raramente causa doença no SNC nos bovinos. Os sinais incluem
depressão, ataxia, cegueira, ataques e morte (ver também pág. 884).
Doenças da Coluna e da Medula Espinhais 716

Algumas vezes apenas a ataxia e a paralisia dos membros posteriores podem ser
vistas. Não há tratamento.
O distúrbio mielínico do gado charolês é um distúrbio neurológico progres-
sivo, caracterizado por placas múltiplas de mielina anormal por toda a substância
branca do SNC. Ele foi descrito na Grã-Bretanha, na França e no Canadá.
Acredita-se que seja familial, e o processo patológico sugere um desarranjo
básico dos oligodendrócitos – as células formadoras de mielina. Os sinais clínicos
são reconhecidos pela primeira vez aos 8 a 24 meses de idade, e progridem de
uma ligeira ataxia nos membros posteriores a um decúbito em 1 a 2 anos.
A mielodisplasia é uma malformação congênita devida ao desenvolvimento
defeituoso de qualquer parte da medula espinhal antes de uma diferenciação
completa das substâncias branca e cinzenta. Pode ocorrer esporadicamente em
bezerros nascidos com uma ataxia moderada a severa dos membros posteriores e
uma paresia espástica não progressiva. Alguns animais manifestam uma andadura
dos membros posteriores na forma de “saltitar-de-coelho”. Uma malformação da
coluna vertebral pode acompanhar a anomalia da medula espinhal.
A neoplasia da medula e da coluna espinhais nos bovinos geralmente se restringe
ao espaço epidural. O linfossarcoma (ver pág. 391) pode-se desenvolver freqüente-
mente no espaço epidural em qualquer nível espinhal e produzir sinais clínicos
referentes à área comprimida da medula espinhal. Uma elevação do título de anticor-
pos contra o vírus da leucemia bovina pode sugerir essa doença, que pode envolver
outros sistemas corporais. O neurofibroma dos nervos espinhais pode-se estender
ocasionalmente para o interior do canal vertebral e comprimir a medula espinhal.
A intoxicação por organofosfato nos bovinos pode causar uma paraparesia (ver
INTOXICAÇÃO POR HALOXONA NOS OVINOS, a seguir, e a discussão na seção TOX, página 2058).
Migração parasitária (ver também pág. 729) – As larvas da Hypoderma bovis
(a mosca da hipodermose bovina [ver pág. 944] migram através do espaço epidural
dos bovinos, geralmente durante o período de julho a outubro; elas têm sido
implicadas no desenvolvimento de paraparesia e ataxia dos membros posteriores
nos bovinos tratados de hipodermose. Os outros distúrbios parasitários que podem
causar sinais clínicos semelhantes nos bovinos incluem a Coenurus cerebralis e a
Parelaphostrongylus tenuis.
A mieloencefalopatia degenerativa progressiva (síndrome do tecelão, pág.
701) é hereditária nos bovinos suíços castanhos.
A paresia espástica (paralisia espástica bovina, calcanhar de Elso) é comum nos
bezerros leiteiros e de corte jovens (1 a 9 meses de idade), especialmente entre os
que ainda estão mamando (ver também pág. 605). A causa não é clara; no entanto,
suspeita-se de um desequilíbrio de neurotransmissores. Os sinais se caracterizam
por espasmos trêmulos e progressivos do gastrocnêmio e dos músculos flexores
digitais. Os sinais são geralmente assimétricos, inicialmente com o membro afetado
balançando como um pêndulo quando o animal se move. A tenotomia do tendão
gastrocnêmio e a neurectomia tibial têm-se mostrado benéficas em alguns casos.
A síndrome espástica (ver pág. 606), também conhecida como espasticidade
periódica, cãibra ou estiramento, é mais comum nos bovinos holstein e guernsey,
geralmente de 3 a 7 anos de idade. Acredita-se que a síndrome seja hereditária. Os
sinais se caracterizam por episódios de extensão dos membros posteriores que
duram de alguns segundos a vários minutos; eles geralmente ocorrem quando o
animal está se levantando para ficar em pé, ou em um movimento súbito após um
período de relaxamento. Ocorrem espasmos musculares extensores das costas e
dos quartos posteriores com uma extensão caudal dos membros posteriores e uma
dificuldade para se mover. Os sinais são geralmente permanentes e podem
progredir até o ponto em que o animal não pode ficar em pé. As lesões são
inconsistentes e não há tratamento. O prognóstico é reservado.
Doenças da Coluna e da Medula Espinhais 717

Os tremores podem ocorrer nos bovinos que se alimentarem de vários capins,


incluindo paspalo, alpiste e centeio. Os animais manifestam freqüentemente uma
andadura espástica dos membros posteriores, acompanhada por quedas e tremo-
res. Nos casos de cambaleio por paspalo (ver pág. 2046), identificou-se uma
micotoxina produzida pelo fungo Claviceps paspali como o agente tremorgênico.

EQÜINOS
O traumatismo espinhal, o tétano, a ostemielite vertebral e os êmbolos
fibrocartilaginosos encontram-se mencionados nas discussões centradas nos cães
e nos gatos (ver anteriormente). A seguir discutem-se as doenças adicionais da
coluna e da medula espinhais nos eqüinos.
A hematomielia aguda tem sido descrita em alguns eqüinos após uma anestesia
em decúbito dorsal. Ocorre uma hemorragia muito disseminada na substância
cinzenta da medula espinhal. Os animais afetados permanecem paralisados.
Acredita-se que a malformação atlantooccipital seja um distúrbio reces-
sivamente hereditário nos potros árabes de ambos os sexos. Geralmente, o atlas se
encontra fundido com o osso occipital e o eixo se desloca ventralmente. O forame
do atlas pode-se reduzir acentuadamente. Os sinais de compressão da medula
cervical cranial podem-se encontrar presentes no nascimento e causar paresia e
ataxia severas ou tetraparesia e incapacidade de ficar de pé. Ao se mover a cabeça,
pode ocorrer um estalo audível no local da malformação. O diagnóstico se confirma
por radiografia. O prognóstico é de reservado a ruim. Tem-se descrito um distúrbio
semelhante nos bovinos holstein.
A malformação - má articulação cervical ou a mielopatia estenótica cervi-
cal (também conhecida como síndrome do cambaleio e ataxia sensorial
eqüina) é um distúrbio vertebral que afeta os eqüinos, geralmente nos primeiros
1 a 2 anos de vida. A incidência é mais alta nos puros-sangues; os sinais são
freqüentemente notados nos potros desmamados ou naqueles de 1 ano de idade.
A estenose do canal vertebral, que envolve mais freqüentemente C5-7, resulta em
uma mielopatia compressiva focal. A desmielinização é a principal alteração
patológica. Manifestam-se uma ataxia e uma paresia acentuadas dos membros
posteriores. Os membros anteriores podem ficar espásticos. O diagnóstico se faz
por radiografia e/ou mielografia. O prognóstico é reservado. A artrodese cirúrgica
pode obter sucesso.
A encefalopatia degenerativa é um distúrbio neurológico lentamente progres-
sivo dos eqüinos e das zebras jovens (do nascimento aos 3 anos de idade).
Desconhece-se a causa; no entanto, é possível que tanto a predisposição genética
quanto os fatores nutricionais (por exemplo, a vitamina E) contribuam para a doença.
As lesões consistem de áreas bilateralmente simétricas de degeneração mielínica
difusa, estendendo-se dos segmentos medulares cervicais aos lombares, especial-
mente nos funículos laterais e ventrais. Na medula espinhal também se podem
observar uma distrofia neuroaxonal, uma perda das células nervosas e um acúmulo
de pigmento. Os sinais clínicos geralmente começam nos membros posteriores e
progridem para envolver os membros anteriores. Os sinais se caracterizam por
ataxia, espasticidade e paresia simétricas. Clinicamente, pode não ser possível se
diferenciar essa doença da mielopatia estenótica cervical. Todos os testes auxiliares
ficam normais. Descreveu-se uma síndrome semelhante em eqüinos morgan e em
cavalos de Przewalski cativos selvagens da Mongólia.
A mieloencefalopatia pelo herpesvírus eqüino do Tipo 1 é uma doença dos
eqüinos (adultos e potros) que ocasionalmente acompanha surtos de abortamento
e doenças respiratórias (ver também pág. 889). A síndrome neurológica pode ocorrer
como a única enfermidade na fazenda. Podem-se afetar todas as idades de animais,
Doenças da Coluna e da Medula Espinhais 718

mas as éguas prenhes de 3 a 9 meses são particularmente suscetíveis. As lesões na


medula espinhal se caracterizam por focos necróticos múltiplos em ambas as substân-
cias, branca e cinzenta, que resultam de uma vasculite acompanhada por uma
trombose. A vasculite pode ter uma base imunológica. Os sinais neurológicos
apresentam um início súbito, são geralmente simétricos e variam em severidade de
uma ataxia suave para uma paralisia. A paresia pode progredir para uma tetraplegia,
mas geralmente ocorre uma pequena alteração nos sinais após 2 a 3 dias.
A anemia infecciosa eqüina (ver pág. 32) ocasionalmente produz uma neuro-
patia nos eqüinos. As alterações neuropatológicas incluem uma ependimite granu-
lomatosa não supurativa, uma plexite coróide, uma meningite e uma encefalomie-
lite. Os sinais clínicos incluem uma ataxia dos membros posteriores. Os sinais
podem começar aguda ou insidiosamente. O diagnóstico se faz por meio de um teste
de imunodifusão positiva em ágar gel. Devem-se sacrificar os animais afetados, pois
a doença é contagiosa.
Latirismo é um distúrbio neurológico progressivo e crônico que ocorre nos eqüi-
nos que ingerem sorgo ou pastagem do Sudão (ver também pág. 2102). Acredita-se
que a doença esteja associada com o ácido hidrociânico encontrado nessas plantas.
Ocorrem alterações degenerativas nas raizes nervosas dos segmentos lombares,
sacrais e coccígeos. Os sinais clínicos incluem o gotejamento de urina, as queimadu-
ras por urina nas ancas e nas coxas, a flacidez do esfíncter anal e a paraparesia. A
cistite e a hematúria se desenvolvem secundariamente à retenção urinária neurogê-
nica. Não se deve permitir que os eqüinos pastem em pastos de sorgo enquanto as
plantas estão em crescimento rápido ou quando estão subdesenvolvidas devido a
seca. Não há tratamento definitivo. O prognóstico é de reservado a ruim.
Nos eqüinos as neoplasias da medula e da coluna espinhais são raras.
A neurite da cauda eqüina é uma polirradiculoneurite idiopática e lentamente
progressiva que afeta os eqüinos adultos de ambos os sexos e de qualquer raça. Os
achados patológicos incluem uma inflamação granulomatosa e uma degeneração
axonal dos nervos da cauda eqüina. Ainda não se determinou a causa; no entanto,
acredita-se que os fatores alérgenos e imunomediados exerçam um papel. Os sinais
clínicos se caracterizam por incontinência fecal e urinária, flacidez do esfíncter anal,
incapacidade para retração do pênis, analgesia perineal, paralisia da cauda e atrofia
dos músculos glúteos. Podem-se observar uma ataxia e uma paresia suaves.
Alguns animais apresentam sinais de envolvimento do nervo craniano (por exemplo,
uma paralisia facial e uma vestibulopatia). O LCE fica anormal, com um aumento dos
níveis proteicos (100 a 300mg/dL) e uma pleocitose mononuclear/ polimorfonuclear
(> 100 células/mL). O diagnóstico diferencial inclui o traumatismo sacral, a
mieloencefalopatia pelo herpesvírus do Tipo I, a raiva, o latirismo, a mielite por
protozoário e a nematodíase espinhal. O prognóstico é ruim. Não há tratamento.
A migração parasitária através da medula espinhal dos eqüinos (ver pág. 729)
pode ocorrer com vários microrganismos, incluindo Micronema deletrix, Strongylus
vulgaris, Setaria sp e Hipoderma lineatum. Os sinais clínicos são geralmente súbitos
no início, e dependem da localização da lesão. O exame do LCE pode revelar um
aumento nos números de eosinófilos e de hemácias. O prognóstico é reservado.
Não há terapia definitiva.
A mielite por protozoário é uma doença esporádica comum dos adultos jovens
(não foi observada em potros) que produz uma encefalomielite necrosante e não
supurativa. Já se acreditou que a doença se restringisse aos eqüinos que vivem a
leste das montanhas rochosas nos EUA; entretanto, existem descrições no Canadá
e na Califórnia. Em alguns eqüinos, os protozoários são abundantes, principalmente
os contidos no interior dos macrófagos. Ainda não se determinaram a identidade e
o ciclo vital do parasita (este lembra intimamente a Sarcocystis sp). A doença afeta
mais freqüentemente os eqüinos puros-sangues. Não parece ser contagiosa. Os
Doenças da Coluna e da Medula Espinhais 719

sinais clínicos são variáveis e dependem da localização da lesão; variam de uma


paraparesia a uma tertraparesia. Os sinais neurológicos são freqüentemente
assimétricos. O envolvimento da intumescência cervical ou lombar resulta em
atrofia muscular, hipotonia e hiporreflexia. O curso clínico pode ser moderadamente
progressivo. O LCE pode-se encontrar anormal, com uma elevação dos níveis de
proteínas e uma pleocitose. O prognóstico é de reservado a ruim, mesmo com
drogas de antiácido fólico (trimetoprim-sulfadiazina a 15mg/kg, VO duas vezes ao
dia, e pirimetamina a 0,25mg/kg, VO uma vez ao dia, por até 2 meses). O diagnóstico
se baseia na idade e nos dados históricos e clínicos. É incomum que se afete apenas
um único animal em uma fazenda.
Os cistos sinoviais associados com as facetas articulares das vértebras
cervicais inferiores podem causar uma compressão da medula espinhal nos eqüinos
de 1 a 6 anos de idade. Desconhece-se a causa. O diagnóstico se faz por radiografia
e mielografia.

SUÍNOS
A osteomielite vertebral, a raiva e os êmbolos fibrocartilaginosos encontram-se
mencionados nas discussões centradas nos cães e nos gatos (ver anteriormente). A
seguir discutem-se as doenças adicionais da coluna e da medula espinhais nos
suínos.
O envenenamento por ácido arsanílico (ver pág. 1988) se deve a uma
superdosagem de rações alimentares com promotores de crescimento arsenicais
orgânicos. Os sinais clínicos podem progredir de uma ataxia dos membros poste-
riores e uma paresia até uma tetraparesia. Os animais afetados podem assumir uma
posição de “sentar como cão”. A retirada precoce do arsenical pode resultar em uma
recuperação espontânea completa. As lesões no sistema nervoso se caracterizam
por uma degeneração mielínica e axonal nos nervos periféricos, em ambos os
nervos ópticos e nos tratos ópticos.
A mielopatia nutricional é um distúrbio da medula espinhal rapidamente
progressivo dos suínos jovens com 3 e meio a 6 meses de idade. Os sinais clínicos
progridem de uma paresia dos membros posteriores para uma paraplegia. A lesão
na medula espinhal consiste de uma desmielinização bilateral simétrica. A causa é
uma deficiência de cobre. Podem ocorrer sinais clínicos semelhantes em suínos de
3 meses de idade alimentados somente com leite, como resultado de uma deficiên-
cia de vitamina A (ver também págs. 22 e 1522).
A migração parasitária através da medula espinhal por parte do verme renal dos
suínos ,Stephanurus dentalus (ver pág. 1059), pode produzir uma ataxia e uma paresia
dos membros posteriores. O início dos sinais clínicos é agudo. Geralmente, afetam-se
os suínos individualmente. A afecção ocorre especialmente no sudeste dos EUA.
Não se conhece nenhum tratamento efetivo. A Ascaris suum pode causar sinais
semelhantes.
A poliomielomalacia, que ocorre nos suínos de 5 semanas a 5 meses de idade,
pode ocorrer como um surto em vários suínos. Os sinais clínicos ocorrem subita-
mente e incluem ataxia, paresia e perda dos reflexos dos 4 membros, e incapacidade
para ficar em pé. Encontram-se presentes lesões degenerativas na substância
cinzenta da medula espinhal, especialmente nos segmentos cervicais e lombar. A
doença pode estar relacionada com a deficiência de nicotinamida.
A encefalomielite enteroviral suína (ver pág. 746), também chamada de
doença de Teschen, doença de Talfan, poliomielite suína e paresia enzoótica
benigna, é mais comum em suínos lactentes, desmamados ou no início do
crescimento. Esse enterovírus tem uma predileção pela substância cinzenta da
medula espinhal, na qual causa degeneração neuronal, proliferação das células
Doenças da Coluna e da Medula Espinhais 720

gliais e embainhamento e congestão vasculares. Os sinais clínicos incluem uma


fraqueza e uma ataxia progressivas e ascendentes dos membros posteriores, com
tremores musculares generalizados. Nos casos severos, podem-se observar
nistagmo, convulsões, opistótono e coma. Não há tratamento, mas alguns animais
podem sobreviver, freqüentemente com deficiências neurológicas permanentes.
A encefalomielite hemaglutinante suína (ver pág. 469) é causada por um
coronavírus neurotrópico que afeta esporadicamente os suínos jovens. Os sinais
clínicos podem incluir tremores musculares, ataxia, hiperestesia e coma. A morbi-
dade e a mortalidade podem atingir 100%.

OVINOS E CAPRINOS
A raiva e a osteomielite vertebral encontram-se mencionadas nas discussões
centradas nos cães e nos gatos (ver anteriormente). A seguir discutem-se as
doenças adicionais da coluna e da medula espinhais nos ovinos e nos caprinos.
Recentemente se descreveu uma mielopatia necrosante aguda nos cordeiros
de 8 a 12 semanas de idade. Os sinais clínicos variaram de uma ataxia dos membros
posteriores a uma paralisia. As alterações na medula incluíram uma necrose focal
na substância branca e um inchaço axonal. Acreditava-se que a causa da lesão
fosse os êmbolos fibrocartilaginosos.
A intoxicação por haloxona pode ocorrer após uma exposição ao anti-
helmíntico organofosforado de haloxona. Os sinais clínicos ocorrem geralmente em
3 a 5 semanas após a exposição, e se caracterizam por uma paraparesia e uma
ataxia espásticas simétricas. Os membros posteriores ficam parcialmente flexionados,
freqüentemente com a superfície dorsal do casco no chão. Os sinais geralmente
permanecem estáticos. Podem-se encontrar presentes axônios inchados na medu-
la espinhal lombar e no nervo ciático. O prognóstico é reservado (ver também
INTOXICAÇÃO POR ORGANOFOSFORADOS, pág. 2022).
A migração parasitária através da medula espinhal dos ovinos está freqüente-
mente associada com o verme meníngeo do veado-da-Virgínia (Parelaphostrongylus
tenuis [ver pág. 732]). Os sinais são abruptos em seu início e podem variar de uma
paresia e uma ataxia dos membros posteriores a uma tetraparesia. Os animais
afetados apresentam uma história de pastejo em pastos que tenham sido expostos
ao veado-da-Virgínia. O curso clínico é variável, freqüentemente relacionado com
a rota migratória do parasita. Os sinais podem progredir, permanecer estáticos ou
melhorar. O LCE se encontra freqüentemente anormal, com elevação dos níveis de
proteína e uma pleocitose mononuclear e eosinofílica. Recomenda-se o tratamento
com a dietilcarbamazina, o levamisol ou o tiabendazol. O prognóstico é reservado.
As larvas da Setaria digitata e da Coenurus cerebralis (larvas da cenurose) que se
localizam na medula espinhal podem causar sinais semelhantes.
O encurvamento da coluna, também conhecido como ataxia enzoótica (ver
pág. 1453), é uma neuropatia nos ovinos e nos caprinos, que está associada com
a deficiência de cobre da mãe e dos filhotes. As lesões na medula espinhal e no
tronco cerebral se caracterizam por uma deficiência de mielina e uma degeneração
neuronal. Os sinais iniciais observados do nascimento aos 3 a 4 meses de idade
incluem ataxia e paresia dos membros posteriores que geralmente progridem para
uma tetraparesia. O tratamento com sulfato de cobre pode resultar em uma melhora
acentuada.
A leucoencefalomielite viral dos caprinos é uma doença altamente infecciosa,
causada por um retrovírus não oncogênico do grupo dos lentivírus. As lesões se
caracterizam por uma desmielinização difusa e alterações granulomatosas inflama-
tórias disseminadas que envolvem freqüentemente a substância cinzenta. Esse
vírus também pode produzir uma pneumotite intersticial e uma artrite (ver pág. 475).
Disautonomia 721

Ele é eliminado no colostro e no leite das cabras infectadas. Os sinais são


geralmente observados nos cabritos < 5 meses de idade. A incidência de infecção
subclínica é alta. Os sinais variam de uma paraparesia a uma tetraparesia e
progridem rapidamente em um período de 2 semanas. O LCE fica anormal com uma
elevação nos níveis de proteína e geralmente uma pleocitose mononuclear. O
prognóstico é ruim; não há tratamento.

DISAUTONOMIA
DISAUTONOMIA CANINA
Documentaram-se cinco casos na Grã-Bretanha e na Noruega. Além disso,
ocorreram três casos em cães de origem norte-americana. Observaram-se disúria
e perda do reflexo anal em cada cão, junto com outros sinais típicos da disautonomia
felina. As características histopatológicas eram semelhantes àquelas observadas
nos distúrbios eqüino e felino (ver a seguir).

ENFERMIDADE DO CAPIM DOS EQÜINOS


É uma disautomia fatal, de etiologia desconhecida, que causa uma redução
acentuada da motilidade gastrointestinal devida a uma degeneração muito dissemi-
nada no sistema nervoso autônomo. É observada em toda a Grã-Bretanha e norte da
Europa, e já foi descrita uma vez na Austrália. Discutem-se surtos da doença na
Colômbia. A literatura japonesa contém descrições de afecções possivelmente rela-
cionadas.
A enfermidade do capim ocorre em qualquer idade após o desmame e em
qualquer época do ano, mas a incidência máxima se situa na primavera em eqüinos
de 2 a 7 anos de idade. Todos os Equidae parecem suscetíveis. Embora esteja
associada com eqüinos recentemente adquiridos e mantidos unicamente com capim,
tem-se observado a afecção em rebanhos estabulados. Reconhecem-se as formas
superaguda, aguda, subaguda e crônica. A morte ocorre dentro de 24h, 4 dias e 21
dias, respectivamente para as primeiras 3 formas. Os eqüinos com a forma crônica
podem viver por semanas ou meses; alguns sobrevivem. As evidências experimen-
tais sugerem a presença de um fator neurotóxico no plasma dos eqüinos afetados.
Achados clínicos – A afecção é afebril e se caracteriza por depressão profunda,
inquietação, elevação da freqüência de pulso, íleo e cólica. Ocorrem uma sudorese
irregular e fasciculações musculares finas nos ombros e nos flancos. Ao contrário da
disautonomia felina, os reflexos luminosos pupilares e a produção de lágrimas se
mantêm normais, e as catecolaminas plasmáticas se encontram elevadas. Os
eqüinos afetados podem apresentar disfagia e disfunção esofágica. Isso causa uma
salivação, um refluxo nasal do conteúdo estomacal e uma dificuldade na passagem
de uma sonda gástrica. Na palpação retal, a mucosa se encontra seca e pegajosa,
e as fezes escassas e endurecidas. A distensão das alças do intestino delgado e a
impactação do cólon maior são características dos casos agudos. Nos casos mais
crônicos, ocorre caquexia, e pode-se observar um prolapso peniano nos machos
castrados. Uma impactação ileal secundária e um deslocamento do cólon maior
podem-se constituir em características confundíveis.
Lesões – Nos casos agudos, acentua-se a distensão fluida do estômago e do
intestino delgado e impacta-se o intestino grosso. Pode ocorrer uma ruptura
gástrica. O trato gastrointestinal fica geralmente vazio nos casos crônicos. Todas as
formas podem apresentar esplenomegalia, ulceração linear do esôfago e o surgi-
Disautonomia 722

mento de bolas fecais escuras, secas e duras. A lesão patognomônica é uma


degeneração neuronal do tipo cromatolítico através de todo o sistema nervoso
autônomo, e, em menor grau, em determinados neurônios não autônomos.
Diagnóstico – Não se encontra disponível nenhum teste diagnóstico in vivo
confiável, mas a demonstração da disfunção esofágica ou da elevação dos níveis
das catecolaminas plasmáticas pode ser útil. A confirmação do diagnóstico depende
do exame histopatológico dos gânglios autônomos. Deve-se descartar a obstrução
do intestino delgado nas formas mais agudas. Nas formas crônicas devem-se
considerar outras causas possíveis de emaciação.
Tratamento – Uma fluidoterapia sintomática com uma descompressão gástrica
podem providenciar um alívio temporário, mas o prognóstico é desanimador. Por
motivos humanitários, torna-se desejável a eutanásia precoce. Recomenda-se a
estabulação do rebanho em risco por parte do dia.

DISAUTONOMIA FELINA
(Síndrome de Key-Gaskell)
É uma afecção recentemente reconhecida dos gatos domésticos, caracterizada
pela disfunção do sistema nervoso autônomo. Todas as raças e idades parecem ser
suscetíveis. Os primeiros casos forma descritos no início de 1982 na Grã-Bretanha.
A afecção se tornou muito disseminada, porém mais tarde declinou em incidência
e severidade. Também registraram-se casos em outros países europeus, na Nova
Zelândia, nos Emirados Árabes Unidos e na Venezuela. Nos últimos anos, descre-
veram-se cinco casos nos EUA, e dois não se originaram na Grã-Bretanha. O
distúrbio parece afetar a biossíntese proteica neuronal, mas desconhece-se a
etiologia. A enfermidade do capim dos eqüinos e a disautonomia canina (ver
anteriormente) parecem ser semelhantes à síndrome felina.
Achados clínicos e lesões – Os gatos afetados exibem inicialmente depressão
e anorexia, freqüentemente com sinais de infecção do trato respiratório superior ou
de diarréia transitória. As características mais explícitas aparecem em vários dias,
embora em alguns gatos o início possa ser superagudo, enquanto outros podem
apresentar um mal-estar vago por algumas semanas. Os sinais mais comuns
incluem pupilas dilatadas não responsivas, focinho seco, redução da secreção
lacrimal, disfunção esofágica com regurgitação e constipação. As outras caracterís-
ticas incluem mucosa oral seca, prolapso da membrana nictante, bradicardia,
anisocoria e incontinência urinária ou fecal. Esses sinais refletem uma disfunção
tanto simpática como parassimpática. Os sinais não autônomos incluem deficiência
proprioceptiva da perna traseira e arreflexia anal ocasionais. Quando medidos, as
catecolaminas plasmáticas ou seus metabólitos urinários se encontram reduzidos.
A necropsia pode exibir megaesôfago, membranas mucosas secas, bexiga atôni-
ca e acúmulo de fezes no reto. Nos gatos recentemente doentes, observa-se uma
degeneração do tipo cromatolítica nos neurônios por todo o sistema nervoso autôno-
mo, e em menor grau em determinados neurônios não autônomos. Os casos crônicos
exibem um esgotamento acentuado dos neurônios nos gânglios autônomos.
Diagnóstico – O diagnóstico definitivo depende do exame histopatológico dos
gânglios autônomos. A confirmação clínica pode ser auxiliada por uma radiografia
de contraste do esôfago e uma demonstração de redução da secreção lacrimal
(< 5mm/min, quando medida pelo teste de lágrima de Schirmer). A pilocarpina
(0,1%) aplicada na córnea de um gato afetado causa uma miose profunda dentro de
10 a 15min, mas não tem efeito num gato normal. Uma infecção pelo vírus da
leucemia felina (VLF) (ver pág. 46) pode causar tanto anisocoria como incontinência
urinária, mas os gatos com disautonomia felina geralmente apresentam outros
sinais clínicos distintos e são negativos quanto ao VLF.
Doença do Edema 723

Tratamento – O objetivo da terapia consiste na estabilização do gato e na


manutenção de um equilíbrio hídrico adequado. A nutrição parenteral total pode ser
útil nos estágios iniciais, mas deve ser seguida por uma alimentação com sonda
nasogástrica ou com gastrostomia. Quando a regurgitação se resolve, a manuten-
ção da posição vertical após a ingestão oral se torna útil. As preparações
multivitamínicas, o aquecimento, a evacuação manual da bexiga e a atenção à
limpeza e à higiene são benéficos. As lágrimas artificiais e uma nebulização de vapor
intermitente podem ajudar a aliviar o ressecamento dos olhos e das membranas
mucosas. A parafina líquida é útil no caso da constipação, mas pode aumentar o
risco da aspiração. O dantron (5 a 15mg, VO, diariamente) constitui uma alternativa
segura. Os parassimpatomiméticos tais como o betanecol (2,5mg duas ou três
vezes ao dia) podem ter uso; no entanto, seu efeito é grosseiro, e a superdosagem
pode exigir um tratamento com atropina. Tem-se utilizado a metoclopramida
(0,1mg/kg, EV, ou 0,3mg/kg, três vezes ao dia, s.c.) para melhorar o esvaziamento
gástrico. Uma pequena parte dos gatos se recupera, enquanto outros podem-se
tornar capazes de suportar deficiências autônomas residuais. Porém, tais melhoras
exigem freqüentemente até 1 ano, e o prognóstico permanece ruim.

DOENÇA DO EDEMA
(Enterotoxemia por E. coli)

É um distúrbio neurológico agudo e altamente fatal dos suínos que geralmente


ocorre 5 dias a 2 semanas (comumente 10 dias) após o desmame. É encontrado
mundialmente. O desmame precoce parece reduzir a freqüência mas pode encurtar
o período de incubação.
Etiologia e patogenia – A doença depende da colonização do intestino delgado
por cepas toxigênicas da E. coli que produzem o princípio da doença do edema
(PDE). As cepas produtoras de PDE da E. coli são poucas, com as mais importantes
sendo 0138:k81, 0139:k82 e 0141:k85. A maioria, se não todas, produz hemolisina.
O PDE absorvido causa uma degeneração arterial e um aumento da permeabilidade
vascular, o que resulta na formação de edema em várias localizações de uma
malacia focal no tronco cerebral.
Achados clínicos e lesões – A morte súbita de suínos em crescimento rápido e
bem encorpados pode-se constituir no primeiro sinal. Os sinais neurológicos carac-
terísticos incluem cegueira aparente, ataxia e andadura em círculos, que progride
para decúbito lateral com opistótono e movimentos de pedalagem. O edema das
pálpebras ou da testa pode-se tornar evidente, e o edema da laringe pode causar uma
voz esganiçada característica. A morte geralmente se segue em várias horas a 2 dias.
Alguns suínos que se recuperam apresentam sinais neurológicos persistentes de
severidade variável. A morbidade em um grupo afetado pode ser , 15%. Nem a
diarréia nem a constipação correspondem a achados consistentes.
Embora alguns suínos não apresentem nenhuma lesão macroscópica, outros
(particularmente os recentemente mortos) apresentam um edema subcutâneo,
notavelmente na região da cabeça. A submucosa da curvatura maior do estômago
e o mesentério do cólon espiral podem apresentar um edema gelatinoso. As
cavidades serosas podem conter um fluido âmbar-claro em excesso.
Diagnóstico – As carcaças se encontram geralmente em boas condições, e os
sinais clínicos e os achados de necropsia nos animais recentemente mortos são
característicos. O isolamento de culturas quase puras de sorotipos hemolíticos
específicos da E. coli a partir do intestino delgado dos casos agudos é útil. A
Doença do Edema 724

confirmação se baseia na demonstração histológica da malacia focal no tronco


cerebral, ou das lesões vasculares degenerativas típicas em várias localizações. O
diagnóstico diferencial inclui a meningite por Streptococcus suis, a pseudo-raiva, a
septicemia por Salmonella e o envenenamento por arsênico salino e orgânico.
Tratamento e controle – Os suínos afetados raramente se recuperam. As
medidas preventivas devem-se direcionar para a redução da formação de popula-
ções abundantes de E. coli no intestino. A minimização da alteração dietética no
desmame e o aumento da quantidade de fibra da dieta podem-se tornar úteis. A
alimentação profilática com antibióticos ou medicação na água para beber visando
a inibição da multiplicação da E. coli durante o período de risco é benéfica em alguns
casos. Alguns promotores de crescimento (ver pág. 1856) também podem ser úteis.
O estímulo da imunidade intestinal local aos fatores colonizadores da E. coli antes do
desmame pode reduzir a severidade do surto. Como há evidência de uma predispo-
sição hereditária, a seleção genética pode-se tornar um meio de prevenção futura.

ENCEFALOMIELITE EQÜINA
(Encefalite eqüina)

As encefalites eqüinas são síndromes clinicamente semelhantes caracterizadas


por sinais de disfunção do SNC e por uma mortalidade moderada a alta. Classica-
mente, consideram-se vários arbovírus como os agentes causadores, mas também
têm-se incriminado agentes protozoários semelhantes ao toxoplasma (ver também
págs. 441 e 718). Os arbovírus causadores são transmitidos por mosquitos ou
carrapatos e infectam vários outros hospedeiros vertebrados, incluindo o homem,
nos quais eles ocasionalmente causam infecções séricas. Em geral, esses arbovírus
utilizam um ciclo mosquito-roedor ou mosquito-ave.
Etiologia e epidemiologia – Os eqüinos podem-se infectar com α-vírus (família
Togaviridae) ou flavivírus (família Flaviviridae). Os α-vírus mais intimamente associa-
dos com a encefalite eqüina incluem os vírus das encefalomielites eqüinas venezuelana
(EEV), ocidental (EEOc) e oriental (EEOr). Os outros α-vírus associados virológica
ou sorologicamente com a encefalite clínica nos Equidae são os vírus Aura, Rio Ross,
Floresta Semliki e Una, mas esses agentes parecem se associar apenas rara ou
incidentalmente com a doença e não ocorrem na América do Norte. As evidências
recentes sugerem que o vírus da lebre-da-neve do grupo antigênico da Califórnia, da
família Bunyaviridae, também é capaz de causar uma doença clínica. O vírus da
EEOr ocorre no leste dos EUA e Canadá, onde a doença nos eqüinos e no homem
encontra-se associada com surtos nas aves domésticas, especialmente nos estados
costeiros do Atlântico e do Golfo. Também ocorre atividade viral no México, no
Panamá, nas Américas Central e do Sul e nas ilhas do Caribe. Embora a distribuição
geográfica do vírus da EEOc pareça abranger virtualmente todas as Américas, só se
descreve a EEOc clínica no oeste dos EUA e Canadá, no México e na América do
Sul. Variantes não patogênicas do vírus EEV ocorrem em ciclos silvestres nos
pantanais da Flórida, oeste dos EUA, México, Panamá, Américas Central e do Sul,
e em algumas ilhas do Caribe. Os surtos periódicos de EEV ocorrem naturalmente
nos eqüinos e no homem no norte da América do Sul há 60 anos ou mais. Só se isolou
o vírus da EEV patogênica para os eqüinos durante as epidemias eqüinas, e a sua
origem não apresenta nenhuma associação com o vírus selvagem da EEV.
A EEOr e a EEOc têm-se associado com neuropatias naturalmente ocorrentes
e experimentalmente induzidas nos bezerros. A EEOr também tem-se associado
com doenças experimentais e clínicas nos suínos.
Encefalomielite Eqüina 725

Em termos de saúde pública, o vírus da encefalite japonesa é o flavivírus mais


importante que causa a encefalite eqüina; ele é reconhecido por todo o Extremo
Oriente. A mortalidade nos eqüinos é baixa (< 5%), e ela causa abortos nos suínos
sem outros sinais clínicos. Além disso, os outros flavivírus isolados de Equidae
encefalíticos são aqueles da enfermidade do cambaleio (“louping ill”) e os das
encefalites do vale do Murray e do Nilo ocidental. Os outros flavivírus (por exemplo,
o que causa a encefalite de St. Louis) podem produzir evidências sorológicas da
infecção nos eqüinos, sem uma doença clínica clara.
Tem-se isolado o vírus maindrain, um buniavírus transmitido por Culicoides e
encontrado no oeste do EUA, a partir de eqüinos encefalíticos. A doença de Borna,
uma meningoencefalite dos eqüinos, não apresenta etiologia arboviral e nem se sabe
que se é zoonose. É causada por um RNA-vírus não classificado que é isolado na
Europa durante a primavera e o início do verão. Clinicamente, a doença lembra as
encefalites por α-vírus.
Os vírus da EEOr, da EEOc e da EEV selvagens são transmitidos aos hospedei-
ros mamíferos através de insetos mordedores, principalmente mosquitos dos
gêneros Aedes, Anopheles, Culex (incluindo o subgênero Melanoconion) e Culiseta.
Pode-se isolar o vírus da EEV selvagem do oeste dos EUA a partir dos besouros-
andorinha (Oeciacus vicarius). Tem-se isolado o vírus da EEV virulenta em eqüinos
a partir de muitos gêneros de mosquitos e de outros insetos hematófagos, mas
somente durante as epidemias. Os mosquitos são vetores biológicos, ou seja, os
vírus se replicam no corpo e persistem nas glândulas salivares. A transmissão por
parte de artrópodos que não os mosquitos provavelmente não é importante. As aves
silvestres servem como os reservatórios principais dos vírus da EEOr e da EEOc.
Os roedores da floresta e as aves silvestres são os reservatórios mais prováveis do
vírus da EEV selvagem; não se conhece o reservatório ou a origem do vírus da EEV
epidêmica. Os hospedeiros-reservatórios tendem a desenvolver uma viremia com
títulos sangüíneos adequados para infectar mosquitos, e contribuem ativamente
para o ciclo de sobrevivência viral. Os eqüinos são considerados os hospedeiros
definitivos para os vírus da EEOc e da EEV selvagem; os eqüinos com infecções por
EEOr podem desenvolver uma viremia adequada para infectar os vetores, mas
provavelmente não contribuem significativamente para a transmissão ou para a
persistência virais. Os eqüinos são os mais importantes disseminadores do vírus da
EEV epidêmica e produzem uma viremia adequada para infectar os mosquitos. Ao
contrário dos vírus da EEOc e da EEOr, o vírus da EEV epidêmica pode, às vezes,
também se espalhar entre os eqüinos e ao homem por meio de contato ou de
aerossol. Essas doenças ocorrem mais freqüentemente nos eqüinos no pasto que
nos estabulados, e se concentram nas áreas que apresentam a combinação
apropriada de hospedeiros-reservatórios suscetíveis e mosquitos. As epidemias de
EEOr e de EEOc tendem a ocorrer da metade ao final do verão.
Achados clínicos e lesões – A clínica seqüencial e os eventos sorológicos após a
infecção com os vírus da EEOr, da EEOc ou da EEV são semelhantes. Os sinais clínicos
de uma encefalomielite ocorrem , 5 dias após a infecção, e a maioria das mortes ocorre
2 a 3 dias mais tarde. Os sinais incluem febre, deterioração da visão, andadura irregular,
andar desnorteado, redução dos reflexos, andadura em círculos, incoordenações,
bocejos, ranger de dentes, sonolência, lábio inferior pendular, incapacidade para engo-
lir, fotofobia, peso na cabeça, incapacidade para se levantar, paralisia, convulsões
ocasionais e morte. Os animais ligeiramente afetados podem-se recuperar lentamente
em algumas semanas, mas podem apresentar danos cerebrais residuais (embotamen-
to e demência) e ser denominados de “idiotas”. A mortalidade nos eqüinos é de 20 a 50%
para a EEOc, 50 a 90% para EEOr e de 50 a 75% para EEV.
Não se observa nenhuma lesão macroscópica característica. Microscopicamente,
ocorrem hemorragia e degeneração dos neurônios no córtex cerebral, no tálamo, no
Encefalomielite Eqüina 726

hipotálamo e em outras partes do SNC. Podem-se encontrar presentes uma gliose, um


embainhamento perivascular com células polimorfonucleares (especialmente na EEOr e
na EEV) e mononucleares (especialmente na EEOc), proliferação microglial e meningite.
Os corpúsculos de inclusão se encontram presentes apenas na doença de Borna.
Diagnóstico – Um diagnóstico presuntivo pode-se basear nos sinais clínicos, na
história e na ocorrência sazonal e é auxiliado pelo conhecimento das áreas endêmi-
cas ou da atividade epidêmica de um tipo viral. A demonstração das lesões
histopatológicas típicas de uma encefalite viral reforça o diagnóstico. A especificida-
de diagnóstica resulta da neutralização viral da inibição da hemaglutinação ou dos
testes de fixação de complemento durante as fases aguda e convalescente. Devido
à alta mortalidade e à morte rápida dos eqüinos afetados, torna-se difícil a obtenção
de soros pareados. Os anticorpos de neutralização se tornam detectáveis aproxima-
damente no mesmo momento em que os sinais da disfunção do SNC ocorrem, e a
viremia termina em 4 a 5 dias após a infecção. Considera-se positiva uma elevação
de 4 vezes no título entre os soros convalescente e agudo ou um título muito alto
(particularmente de IgM) em um animal não vacinado. O diagnóstico se confirma pelo
isolamento e identificação do vírus a partir do cérebro ou do sangue. No caso dos
vírus da EEV e da EEOr, o isolamento se torna difícil após se observarem os sinais
do SNC; deve-se coletar sangue para o isolamento do vírus a partir de eqüinos febris
normais clinicamente no mesmo pasto ou em pastos adjacentes.
O diagnóstico diferencial inclui a hepatoencefalopatia, a raiva, a mieloencefalite
por protozoário, a encefalite verminótica e a leucoencefalomalacia.
Profilaxia e tratamento – Não se encontra disponível nenhum agente antiviral
específico. O tratamento de suporte (drogas antiinflamatórias, controle de ataques)
e cuidados intensivos ajudam na recuperação dos casos leves. Como as encefalites
se espalham primariamente por meio de mosquitos, devem-se direcionar as
medidas de controle contra eles; essas incluem a drenagem e o tratamento com
inseticidas nas áreas criadoras de mosquitos, e a aplicação de repelentes de insetos
nos eqüinos. A remoção de eqüinos do pasto e sua estabulação se tornam
aconselháveis durante os surtos.
Hoje, utilizam-se quase que exclusivamente vacinas inativadoras de origem em
cultura celular ou em embriões de galinha, e essas são geralmente consideradas
efetivas. Encontram-se disponíveis vacinas monovalentes, bivalentes (EEOr e
EEOc) e trivalentes (EEOr, EEOc e EEV). A vacina monovalente da EEV correspon-
de a um vírus atenuado de origem em culturas celular e não se deve utilizá-la em
éguas prenhes ou potros jovens. A vacina atenuada da EEV tem sido grandemente
substituída por um produto formalinizado, incorporado a uma vacina trivalente com
antígenos para a EEOr e a EEOc. Deve-se administrar a vacina , 1 mês antes da
estação dos mosquitos e, onde essa estação é longa, deve-se repeti-la dentro de 1
ano. Nas áreas onde a atividade dos mosquitos corresponde a aproximadamente o
ano inteiro, devem-se vacinar os potros com 3, 4 e 6 meses de idade, e anualmente
depois disso.

PARALISIA FACIAL
A paralisia facial é comum nos cães, especialmente nos cocker spaniels. O nervo
facial é particularmente vulnerável a danos em seu curso através do ouvido médio e
onde seus ramos se dividem mais superficialmente nos nervos auriculopalpebral e
bacias dorsal e ventral, que inervam os músculos da expressão facial (orelhas,
pálpebras, bochechas, lábios e nariz). A maioria das paralisias faciais nos cães
Paralisia Facial 727

ocorre como uma síndrome idiopática que pode ser transitória ou permanente. A
segunda causa mais comum é a deterioração inflamatória a partir de uma otite
média/interna crônica. O nervo também é suscetível a um traumatismo cirúrgico
durante uma ablação do canal auditivo externo e uma osteotomia da bula timpânica.
Os neoplasmas e os processos inflamatórios no ângulo cerebelomedular ou no
interior da medula rostral (onde se localiza o núcleo facial) podem causar uma
paralisia facial. Os gatos são predispostos a carcinomas das células escamosas e
adenocarcinomas do canal auditivo, que se espalham freqüentemente para afetar o
nervo facial. A paralisia facial nos cães se associa ocasionalmente com o hipotireoi-
dismo, os tumores hipofisários, a miastenia grave e a polineurite devida a paralisia
do coonhound ou síndromes idiopáticas. Os eqüinos comumente sofrem paralisia
facial a partir de um traumatismo de pressão nos ramos superficiais do nervo facial,
à medida que eles atravessam a mandíbula. A encefalomielite por protozoário e a
neurite da cauda eqüina são neuropatias centrais e periféricas, respectivamente, nas
quais pode-se observar uma paralisia facial uni ou bilateral (ver [ambas] pág. 718).
O traumatismo agudo da cabeça (que causa fraturas e hemorragias no osso temporal
pétreo), a otite/ interna, as infecções da bolsa gutural e as lesões osteoproliferativas na
articulação do osso estiloióide com o osso temporal constituem outras causas da
paralisia facial nos eqüinos. Nos ruminantes, a listeriose é uma causa clássica
de paralisia facial. Os abscessos cerebrais, a meningite fibrinosa basilar e a otite
supurativa/média também são causas comuns nos suínos, nos bovinos e nos caprinos.
Achados clínicos – A paralisia facial unilateral total se caracteriza pela ausência
do reflexo palpebral, pela imobilidade e pela flacidez dos músculos de expressão
facial com o subseqüente desvio do nariz em direção ao lado normal. Nos cães e nos
gatos, a fissura palpebral se abre largamente e, em resposta ao teste de ameaça,
o animal pode retrair o globo e mover rapidamente a terceira pálpebra ao invés de
piscar. Os sinais de ceratite de exposição podem ocorrer em conjunto com a
paralisia facial devido à incapacidade para piscar ou mover rapidamente a terceira
pálpebra para lubrificar a córnea. A ceratite seca também pode ocorrer se houver
uma perda da produção de lágrimas devido a um dano nas fibras parassimpáticas
no nervo facial. Nos bovinos e nos eqüinos, a pálpebra superior pode pender
ligeiramente devido à atonia do músculo frontal. A lesão do ramo auriculopalpebral,
à medida que ele atravessa o arco zigomático, causa a paralisia de apenas uma
orelha e uma pálpebra.
Dependendo do local e do grau da lesão do nervo, a paralisia facial pode ser total
ou parcial. Nos eqüinos, por exemplo, o dano nos ramos bucais pode resultar apenas
em um ligeiro desvio do nariz e na flacidez dos lábios, mas tornam-se comuns a
salivação de líquidos e a impactação do alimento na área inervada pelo ramo bucal
da boca no lado afetado. A narina também pode falhar em dilatar ativamente na
inspiração. Pode-se localizar freqüentemente o local do dano nervoso subjacente no
ouvido interno através do distúrbio vestibular intercorrente, manifestado por inclina-
ção da cabeça, nistagmo e incoordenação nos estágios agudos. As lesões do tronco
cerebral próximas ao núcleo facial podem causar sinais bilaterais. Além disso, a
fraqueza dos membros e outras deficiências nos nervos cranianos podem ajudar a
diferenciar uma doença central de lesões periféricas.
Tratamento – Dependendo da severidade da lesão, a neurite traumática e
idiopática do nervo facial freqüentemente se resolve espontaneamente em algumas
semanas. Os corticosteróides são úteis para o controle do edema e da inflamação
agudos, particularmente se utilizados dentro de 24h após a lesão. Devem-se tratar
vigorosamente as infecções com a droga apropriada. As pomadas oftálmicas
protetoras ou o fechamento cirúrgico se tornam necessários para impedir a ceratite
quando se paralisam as pálpebras. Com a deterioração dos lábios preênseis dos
eqüinos, tornam-se necessárias rações úmidas volumosas e recipientes fundos de
Paralisia Facial 728

água para o tratamento de suporte. Nos eqüinos de desempenho, têm-se utilizado


cirurgia e próteses para impedir o colapso total da narina durante um exercício
vigoroso.

HEMOFILOSE
(Meningoencefalite tromboembólica, METE)

É uma doença septicêmica aguda, primariamente do SNC e dos olhos, caracte-


rizada por febre, depressão severa, fraqueza, ataxia, cegueira, coma e morte dentro
de 1h a vários dias. É mais comum nos bovinos em engorda mas também ocorre nos
bezerros, nos bovinos leiteiros e nos animais no pasto. Embora seja encontrada
mundialmente, a maioria das descrições vem da América do Norte.
Etiologia – O microrganismo causador (Haemophilus somnus ) é um cocobacilo
pleomórfico, não formador de esporos, imóvel, Gram-negativo e pequeno que
cresce melhor em uma atmosfera que contenha dióxido de carbono e em um meio
que contenha sangue de bezerro e extrato de levedura (pirofosfato de tiamina). Ele
parece ser idêntico a Histophilus ovis, um agente etiológico da septicemia ovina, da
mastite e da epididimite. Reconhecem-se cepas diferentes, e parece existir relaci-
onamento entre a cepa e a doença.
Transmissão, epidemiologia e patogenia – Desconhecem-se os mecanismos
pelos quais a H. somnus se espalha. O microrganismo é freqüentemente encontrado
no trato respiratório, o que sugere uma rota por aerossol. Também é excretado com
a urina e em descargas originárias da vagina e do prepúcio dos animais infectados.
Pode sobreviver por > 70 dias no muco sangüíneo ou nasal, mas apenas por breves
períodos na urina. Tem-se sugerido uma infecção a partir do pasto contaminado. A
taxa de infecção nos bovinos sadios é alta, mas a morbidade nos grupos infectados
é de geralmente 2 a 5%, ocasionalmente alcançando 30%. A mortalidade nos
animais clinicamente afetados e não tratados é freqüentemente de 100%. Além do
SNC, podem-se afetar também os sistemas gastrointestinal, auditivo, musculoes-
quelético, ocular, renal, reprodutivo e respiratório. A Haemophilus somnus também
causa pneumonia (que lembra a da febre do transporte), vaginite, mastite e
raramente aborto.
A patogenia é fracamente compreendida, embora o microrganismo circule na
corrente sangüínea e cause coagulação intravascular disseminada, vasculite seve-
ra, hemorragia, trombose e infartamento em muitos órgãos.
Achados clínicos – Uma temperatura de até 42°C constitui freqüentemente o
primeiro sinal da doença, mas cai rapidamente ao normal ou ao subnormal. Os
outros sinais característicos incluem rigidez, apoio nos boletos depressão severa,
ataxia, paralisia e opistótono, seguidos por coma e morte dentro de 1 a 48h. Os
animais afetados podem ficar cegos e, algumas vezes, observam-se hemorragias
retinianas, com focos acinzentados de necrose retiniana. Outros sinais, tais como
hipersensibilidade, convulsões, excitação, nistagmo e andadura em círculos, ocor-
rem inconsistentemente. Ocasionalmente, encontram-se animais mortos sem si-
nais de enfermidade.
Também têm-se descrito outras manifestações da infecção pela H. somnus:
vaginite, endometrite, infertilidade, abortamento, possível repetição de acasala-
mento, laringite, traqueíte, pneumonia supurativa, miocardite, otite, mastite e artrite.
É comum uma alteração acentuada nas contagens de leucócitos diferencial e
total; ocorrem leucopenia e neutropenia nos casos severos e neutrofilia nos casos
menos severos. No LCE, a contagem total de células se eleva acentuadamente e
Patologias do SNC Causadas por Helmintos e Larvas de Insetos 729

predominam os neutrófilos. Nos estágio agudos da doença, pode-se cultivar o


microrganismo a partir do sangue, do fluido sinovial, do LCE e do cérebro.
Lesões – Focos avermelhados a castanhos de necrose com hemorragia se
encontram freqüentemente presentes na superfície e nas secções de corte do
cérebro e da medula espinhal. Em alguns animais pode-se estender uma meningite
fibrinosa pelo cérebro e pela medula espinhal, e o LCE pode se tornar turvo. Uma
necrose e uma ulceração se encontram freqüentemente presentes na laringe e na
traquéia. Uma pneumonia intersticial pode acompanhar a forma septicêmica, ou
pode ocorrer separadamente uma broncopneumonia fibrinosa aguda. A poliartrite
serofibrinosa é comum. Pode-se observar uma necrose hemorrágica no miocárdio,
nos músculos esqueléticos, nas serosas do esôfago e do intestino, na bexiga e no
córtex renal. Algumas vezes, observam-se uma pericardite fibrinosa e uma perito-
nite. A hemorragia e a trombose retinais são comuns na forma septicêmica. Uma
opacidade córnea pode estar presente ocasionalmente, mas provavelmente se
encontra associada a um traumatismo.
Diagnóstico – O diagnóstico presuntivo se baseia nos sinais clínicos, no exame
do LCE e nos achados macroscópicos de necropsia, e se confirma por histopatolo-
gia e isolamento da bactéria. O diagnóstico diferencial inclui a polioencefalomacia,
a hipovitaminose A, o envenenamento por chumbo, a raiva, a pseudo-raiva e a
meningoencefalite listeriana.
Tratamento e controle – Devem-se separar e tratar imediatamente com
penicilina e estreptomicina, ou oxitetraciclina, os animais clinicamente afetados. O
tratamento é mais efetivo nos estágios iniciais da doença. Uma vez que o animal
assume o decúbito, o prognóstico se torna ruim. Devem-se checar a cada hora os
lotes bovinos de engorda, nos quais se tenha confirmado a doença; recomendam-
se supervisão constante e o tratamento imediato dos novos casos. As tetraciclinas
(por exemplo, a oxitetraciclina ou a clortetraciclina) no alimento ou na água podem
reduzir a incidência dos novos casos. A maioria dos surtos segue seu curso em 2
a 3 semanas. O microrganismo é geralmente resistente à lincomicina, à neomicina
e às sulfonamidas. Pode-se controlar a mortalidade pelo manejo de práticas que
enfatizem mais o crescimento do que a terminação.
As bacterinas podem reduzir a morbidade e a mortalidade e reduzir o número de
animais que requeiram tratamento. A suscetibilidade ao desenvolvimento da doen-
ça clínica parece não estar relacionada com os títulos de anticorpos séricos.

PATOLOGIAS DO SNC CAUSADAS POR


HELMINTOS E LARVAS DE INSETOS
Vários parasitas se associam com o SNC dos vertebrados e podem ser classi-
ficados como se segue:
1. Estágios imaturos dos parasitas e animais carnívoros – Esses parasitas
podem induzir alterações comportamentais no hospedeiro intermediário, que se
tornam prováveis de potencializar a transmissão para o hospedeiro definitivo
através da predação por exemplo, a Taenia multiceps.
2. Espécies neurotrópicas – Essas espécies requerem condições providencia-
das pelo SNC para seu crescimento e seu desenvolvimento, por exemplo, a
Parelaphostrongylus (Pneumostrongylus) tenuis. No hospedeiro normal, esses
parasitas geralmente não causam sinais neurológicos; nos outros podem-se tornar
altamente patogênicos.
Patologias do SNC Causadas por Helmintos e Larvas de Insetos 730

3. Parasitas anômalos ou acidentais – Vários parasitas que migram nos


tecidos do hospedeiro podem alcançar o SNC, embora isso não constitua uma
exigência para seu desenvolvimento e sua transmissão; em alguns casos, o
significado biológico da associação com o SNC é obscuro, por exemplo, em
determinados nematóideos ascaridóideos.
Pode-se atribuir a patogenicidade no SNC geralmente ao traumatismo causado
pelas atividades dos parasitas; desconhece-se o papel dos produtos excretórios e
secretórios. Os parasitas também podem transportar microrganismos patogênicos
ao SNC. Os sinais clínicos se relacionam com a localização do parasita e com as
lesões produzidas por ele. Os sinais incluem fraqueza motora, ataxia, desvio da
cabeça, andadura em círculos, depressão, cegueira, pendência da orelha ou da
pálpebra, perda do medo ou do instinto de arrebanhamento, paresia e paralisia.
Tem-se descrito um tratamento quimioterapêutico de sucesso para a nematodíase
cerebroespinhal com dietilcarbamazina a 100mg/kg. A ivermectina e os orga-
nofosfatos matam os bernes e pelo menos alguns nematóideos, mas a morte de
parasitas no SNC pode provocar um dano tecidual adicional. A cirurgia pode ser útil
como no caso da cenurose (ver a seguir).

CESTÓIDEOS
Cenurose – A Taenia (Multiceps) multiceps é um parasita intestinal dos canídeos
(especialmente dos cães, das raposas e dos chacais) e do homem. Os hospedeiros
intermediários são os ovinos, os caprinos, os veados, os antílopes, as camurças, os
coelhos, as lebres, os eqüinos e, menos comumente, os bovinos, que adquirem os
ovos enquanto pastam. Algumas oncosferas alcançam o cérebro e se desenvolvem
em centros (antes conhecido como Coenurus cerebralis ) através da germinação
endógena dos escólices. A invasão e o desenvolvimento iniciais das oncosferas
podem ser responsáveis pela meningoencefalite supurativa aguda. O cenuro
completamente desenvolvido pode ter 5 a 6cm de diâmetro e causar um aumento
da pressão intracranial que resulta em ataxia, hipermetria, cegueira, desvio da
cabeça, cambaleios e paralisia. A afecção clínica é comumente conhecida como
modorra, cambaleio ou resistência. Nos ovinos, a palpação do crânio caudalmen-
te aos botões dos cornos pode revelar uma rarefação; a cirurgia para a remoção do
cisto, incluindo sua parede, possui uma chance razoável de sucesso e se justifica
nos animais de valor. Não se devem alimentar os cães associados à vida doméstica
com as cabeças dos animais afetados e devem se vermifugá-los regularmente
(especialmente se estiverem associados com ovinos).
Cisticercose – A Taenia solium é um parasita intestinal do homem. Os cisticercos
(antes considerados como um parasita separado, a Cysticercus cellulosae) ocorrem
na carne dos suínos, mas também podem-se desenvolver no homem e nos cães que
ingerirem os ovos. Eles se localizam comumente nas meninges e no interior do
neurópilo, e podem causar convulsões e distúrbios locomotores.
Hidatidose – A Echinococcus granulosus é um parasita dos cães e dos lobos. Os
ovos são ingeridos por herbívoros domésticos e silvestres, por exemplo, os ovinos, os
bovinos e os alces. Após eclodirem, as oncosferas invadem o sistema circulatório e se
alojam em várias partes do corpo (especialmente no fígado e nos pulmões). Elas se
desenvolvem em grandes cistos (os cistos hidáticos) que germinam escólices endoge-
namente. Raramente se descrevem cistos hidáticos no SNC dos animais, inclusive do
homem, no qual produzem sinais e sintomas semelhantes aos dos tumores cerebrais.
Uma espécie relacionada, um parasita das raposas (a E. multilocularis), utiliza o
rato silvestre aquático como hospedeiro intermediário. Raramente se encontra
esse parasita no cérebro do homem, no qual o cisto hidático não produz escólices.
Como mencionado anteriormente (no caso da cenurose), a cirurgia pode ser útil.
Patologias do SNC Causadas por Helmintos e Larvas de Insetos 731

LARVAS DE I NSETOS
A miíase que envolve o SNC é muito incomum, exceto no casos da Hypoderma
bovis, cujas larvas se desenvolvem normalmente em buracos entre o periósteo e a
dura-máter antes de migrarem para o tecido subcutâneo do dorso. Os sinais
neurológicos (que variam de uma andadura insegura, rígida e transitória a uma
paralisia) podem ocorrer em bovinos que tenham recebido inseticidas sistêmicos,
quando as larvas se encontram presentes no canal espinhal (ver pág. 944).
Raramente se descreve a penetração das larvas da Oestrus ovis (a berne nasal
dos ovinos [ver pág. 917]) no osso etmoidal e o alcance destas ao cérebro anterior.
Entretanto, é possível que outros fatores facilitem a entrada das larvas no cérebro.
Os bernes podem se mover rapidamente após a morte do hospedeiro e migrar
para tecido distantes do local de origem.

NEMATÓIDEOS
Ascaridoidea
Ascaridose – As larvas de alguns vermes cilíndricos ascarídeos (incluindo
Baylisascaris spp dos mustelídeos e Toxocara canis dos cães e dos gatos) podem
invadir o SNC, bem como outros tecidos dos cães-da-pradaria, dos coelhos, dos
camundongos, dos castores, dos cães e do homem. Essas larvas são aparentemen-
te transportadas para vários tecidos através do sistema arterial. As larvas se tornam
ativas no interior do neurópilo, e as larvas de algumas espécies, por exemplo, de B.
columnaris, crescem acentuadamente e podem causar um traumatismo tecidual
considerável; tais infecções geralmente resultam em distúrbios neurológicos que
podem levar à morte do hospedeiro.

Filarioidea
Eleoforose – A Elaeophora schneideri (um filarióideo das artérias carótidas e dos
seus ramos) é comum no veado-orelhudo, principalmente no oeste da América do
Norte. As microfilárias se acumulam na pele da região cefálica; os vetores são espécies
de Tabanidae. As larvas se desenvolvem nas artérias das leptomeninges antes de
migrarem para as carótidas. A infecção é geralmente silenciosa no hospedeiro normal.
Nos veados-nobres, nos alces, nos veados-da-Virgínia, nos ovinos e nos
caprinos, os vermes no interior das artérias causam degeneração e perda do
endotélio e acúmulo de proteínas plasmáticas e plaquetas sobre e no interior da
túnica íntima. A trombose, a infiltração da túnica íntima e a proliferação fibroblástica
podem resultar finalmente na oclusão e na necrose isquêmica dos tecidos associa-
dos. As lesões necróticas associadas oclusão das artérias leptomeníngeas são
comumente encontradas no cérebro. Os sinais neurológicos incluem cegueira,
desvio da cabeça, andadura em círculos, ataxia e paralisia (ver também pág. 977).
Setariose – A Setaria digitata é um parasita comum da cavidade peritoneal dos
bovinos na Ásia. As microfilárias ocorrem no sangue; os mosquitos são os vetores.
A infecção parece ser silenciosa nos bovinos. Desconhecem-se os detalhes do
desenvolvimento no hospedeiro normal. Nos eqüinos, nos caprinos e nos ovinos, os
vermes em desenvolvimento invadem o SNC e causam fraqueza motora, ataxia,
claudicação, pendência das orelhas ou das pálpebras e paralisia lombar. As lesões
incluem malacia focal e degeneração dos cilindros axiais e da bainhas de mielina em
todas as regiões do SNC.
Tem-se descrito a Setaria cervi (Elaphostrongylus altaica ) nas leptomeninges
dos veados na Europa e na Rússia, freqüentemente em associação com E. cervi .
Também tem-se encontrado Setaria sp no SNC dos eqüinos. O significado desses
achados é obscuro.
Patologias do SNC Causadas por Helmintos e Larvas de Insetos 732

Metastrongiloidea
Angiostrongilose – Angiostrongylus cantonensis é um parasita comum das
artérias pulmonares dos ratos no sudeste da Ásia e no sul do Pacífico. Os
gastrópodes terrestres são os hospedeiros intermediários. As larvas invadem o
cérebro e se desenvolvem no parênquima neural por , 2 semanas, quando entram
no espaço subaracnóideo e migram, , 1 mês após a infecção, para as artérias
pulmonares através do sistema venoso. Os sinais neurológicos são raros nos ratos
com infecções leves a moderadas, mas nas infecções agudas, podem ocorrer
andadura em círculos, canibalismo e paraplegia. Nas regiões endêmicas, as
pessoas adquirem freqüentemente a infecção.
Elafostrongilose – A Elaphostrongylus cervi (rangiferi) é um parasita comum da
musculatura esquelética do Rangifer e das Cervus spp (rena e veado-nobre) na
região holártica, especialmente na Eurásia. É transmitido por gastrópodes terrestres
e se desenvolve aparentemente por um período no SNC, antes de migrar para os
músculos. A infecção está associada com fraqueza lombar, paresia e paralisia nos
cervídeos na Suécia e na Rússia.
Parelafostrongilose – A Parelaphostrongylus (Pneumostrongylus) tenuis
ocorre normalmente no espaço subdural e nos seios venosos do crânio do veado-
da-Virgínia no leste da América do Norte. Os ovos alcançam os pulmões através
do sangue venoso e se desenvolvem em larvas, que deixam a árvore brônquica
e saem com as fezes. As larvas infectantes, adquiridas de caramujos e lesmas
terrestres à medida que o veado se alimenta, invadem a medula espinhal e se
desenvolvem por várias semanas nos cornos dorsais da substância cinzenta;
depois, elas invadem e amadurecem no espaço subdural. A infecção é geralmen-
te silenciosa no veado-da-Virgínia.
A Parelaphostrongylus tenuis invade o SNC de vários cervídeos silvestres (alce,
rena e veado-nobre), antílopes, ovinos e caprinos. Nesses hospedeiros, o parasita
produz um traumatismo considerável no SNC. ALém disso, os ovos depositados no
tecido neural provocam reações inflamatórias acentuadas. Os sinais clínicos
consistem de fraqueza lombar, ataxia, claudicação, rigidez, andadura em círculos,
posições anormais da cabeça e paralisia. Os sinais variam quanto ao início e ao tipo
nos animais individuais. As remissões temporárias são típicas.
Escriabingilose – A Skrjabingylus nasicola e a S. chitwoodorum são encontra-
das nos seios frontais dos mustelídeos, especialmente dos visons, das doninhas e
dos cangambás. As larvas adquiridas dos gastrópodes terrestres se desenvolvem
por um tempo na parede intestinal, e depois migram para a medula espinhal. Elas
se movem pelas leptomeninges até o cérebro e ao longo dos tratos olfatórios para
a placa cribiforme, na qual elas penetram para alcançar os seios frontais. A presença
delas nas leptomeninges provoca hemorragias e leptomeningite. Nas infecções
agudas, alguns vermes subadultos invadem o cérebro e causam sinais neurológi-
cos, incluindo paralisia.

Rhabditoidea
Micronemose – Micronema deletrix é um nematóideo cefalobídeo de vida livre
que foi descrito no SNC dos eqüinos e do homem. Ele pode atingir o SNC através
de ferimentos contaminados pelo solo que contém os vermes, ou através de
abscessos nas cavidades oral e nasal. O nematóideo se multiplica no SNC e é
altamente destruidor de tecidos neurais, o que causa a morte do hospedeiro.

Nematóideos variados
Têm-se descrito larvas migratórias de estrôngilos (talvez a Strongylus vulgaris)
no SNC dos eqüinos; o fenômeno parece ser raro. As larvas da Stephanurus
Louping Ill 733

dentatus raramente invadem o SNC dos suínos; têm-se encontrado larvas da


Trichinella spiralis no cérebro em casos humanos fatais de triquinose e em
camundongos experimentalmente infectados. As larvas da Baylisascaris procyonis,
um verme cilíndrico do intestino delgado dos guaxinins, infectam muitos hospedei-
ros intermediários (incluindo o homem), e não raramente migram através do SNC,
com conseqüências sérias. As larvas da Strongyloides stercoralis podem invadir o
cérebro de animais experimentalmente infectados. A Splendidofilaria quiscali é
encontrada nos hemisférios cerebrais dos pássaros-pretos (Quiscalus quiscula) e
de outras aves na América do Norte. A Paronchocerca helicina ocorre nas
leptomeninges craniais da biguatinga ( Anhinga anhinga) nos EUA. A Gnathostoma
spinigerum tem sido encontrada raramente no SNC do homem. A Eustrongylides
ignotus, implantada subcutaneamente em ratos e galinhas, migrou para o SNC e
causou a morte do hospedeiro (ver também pág. 243).

TREMATÓDEOS
Paragonimíase – Têm-se descrito raramente os adultos e os ovos de Paragonimus
westermani no SNC do homem, dos cães, dos gatos e dos ratos (os últimos 3 foram
induzidos experimentalmente).
Esquistossomose – Os esquistossomos depositam normalmente seus ovos nos
pequenos vasos do intestino e da bexiga, a partir dos quais são eliminados nas fezes ou
na urina. Alguns ovos, porém, entram na circulação geral e podem alcançar o SNC, onde
encapsulam. Tem-se observado essa afecção no homem e em alguns outros animais.
Tronglotremíase – A Troglotrema acutum habita os seios frontais e etmoidais
das raposas e dos mustelídeos na Europa, Uma osteíte rarefativa pode resultar
disso e permitir que os microrganismos alcancem a cavidade cranial, levando a uma
meningite purulenta fatal.

“LOUPING ILL”
(Encefalomielite ovina)

É uma doença viral aguda e transmitida por carrapatos que atinge o SNC,
variando de inaparente a fatal. Ela afeta primariamente os ovinos, mas os
bovinos, os caprinos, os eqüinos, os cães, os suínos, os veados-nobres, as
corças, os tetrazes-vermelhos e o homem também podem-se infectar; o homem
pode-se infectar através das mordeduras de carrapatos ou da exposição a tecidos
ou instrumentos infectados. A doença ocorre por todos os pastos de colina
acidentados das Ilhas Britânicas onde quer que o carrapato-vetor ( Ixodes ricinus)
seja prevalente. Na Noruega, na Espanha, na Turquia e na Bulgária ocorreram
recentemente doenças de ovinos indistinguíveis da “louping ill” e causadas por
vírus que não foram diferenciados do vírus dessa última, o que sugere que a
afecção possa não se restringir às Ilhas Britânicas.
Etiologia e transmissão – O vírus pertence à família Flaviviridae e é parte de um
complexo de vírus antigênico e intimamente relacionado e distribuído por todas as
regiões temperadas do norte (conhecido como encefalite originária dos carrapatos)
e que se encontra primariamente associado com a doença no homem. A infecção
é transmitida transestadialmente pelo carrapato-hospedeiro; parece que não ocorre
transmissão transovariana. Nos ovinos, a mortalidade varia de 60% no rebanho
recém-introduzido a 5 a 10% nos animais previamente expostos. Nas fazendas
onde a doença é endêmica, as perdas se confinam principalmente aos animais < 2
Louping Ill 734

anos de idade; os adultos tendem a ficar imunes como resultado de uma infecção
anterior, e os cordeiros ficam protegidos, em sua primeira temporada, pelos
anticorpos colostrais. No entanto, quando a doença aparece pela primeira vez, ou
após um intervalo de vários anos, ovinos de todas as idades se tornam suscetíveis.
A mortalidade é variável nas outras espécies, mas tende a ser alta no tetraz-
vermelho. Apenas os ovinos e os tetrazes parecem ser capazes de passar a infecção
para o carrapato-vetor. A infecção também pode espalhar-se através do contato
com instrumentos ou tecidos contaminados. Os caprinos lactantes infectados
podem excretar altos títulos do vírus em seus leites, o que pode causar uma infecção
fatal em seus cabritos e se tornar um risco de saúde potencial ao homem.
Patogenia, achados clínicos e lesões – O curso da infecção é semelhante em
todas as espécies, e varia apenas na intensidade da viremia e na freqüência com que
se desenvolvem os sinais clínicos. Após a inoculação por um carrapato infectado, o
vírus se replica inicialmente nos tecidos linfóides, o que dá origem a uma viremia que
dura 1 a 5 dias. Só os indivíduos que desenvolvem altos títulos podem transferir o
vírus aos carrapatos. Durante a viremia, pode ocorrer uma reação febril, mas os
sinais clínicos explícitos se encontram geralmente ausentes até que o vírus entre no
SNC e comece a replicação, mesmo que a resposta imune tenha eliminado o vírus
dos tecidos extraneuronais. A extensão do dano neuronal conseqüente à replicação
viral determina a severidade dos sinais, a partir da ausência aparente de disfunção
neurológica. As lesões histológicas podem-se encontrar presentes caso se desen-
volvam ou não os sinais. Os sinais incluem tremores musculares finos, mordiscação
nervosa, ataxia (particularmente dos membros posteriores), fraqueza e colapso;
pode ocorrer morte 1 a 3 dias após o início dos sinais. Também podem ocorrer mortes
superagudas. Em alguns animais recuperados, pode persistir uma paresia residual
ou um torcicolo. Todos os animais individuais ficam solidamente imunes.
A severidade da doença clínica nos animais recentemente infectados com a
Cytoecetes phagocytophila (a causa da febre oriunda dos carrapatos [ver pág. 490])
aumenta acentuadamente, presumivelmente devido ao efeito imunossupressor
desse microrganismo. A patologia acompanhante pode ser complexa, e ser respon-
sável pela alta mortalidade experimentada ao se introduzir rebanhos não contami-
nados em um pasto infestado por carrapatos.
Não se encontra presente nenhuma lesão macroscópica específica, embora
possa se desenvolver uma pneumonia secundária. O exame histológico do SNC
geralmente exibe uma polioencefalomielite não supurativa, com lesões predominan-
tes no tronco cerebral.
Diagnóstico – A doença ocorre normalmente apenas nos animais que tenham
tido acesso a um pasto infectado por carrapatos; porém, o quadro clínico variável
necessita da diferenciação de outras afecções que causem uma disfunção locomo-
tora ou neurológica. A confirmação se faz pelo exame histológico do cérebro, pelo
isolamento do vírus a partir do tecido do SNC e por sorologia. Devem-se fixar o
cérebro e o tronco cerebral em solução de formaldeído (10% em solução salina)
tanto quanto possível, e examinar os cortes quanto às lesões características, que
podem ser úteis na obtenção de um diagnóstico presuntivo; o diagnóstico definitivo
requer o isolamento do vírus. Deve-se coletar assepticamente o tronco cerebral
(1cm3) em uma solução salina de glicerol a 50% para o isolamento do vírus através
da inoculação em camundongos ou em cultura tecidual, e para a subseqüente
identificação através de testes de imunofluorescência ou de neutralização com
anticorpos específicos. A mensuração dos anticorpos soroneutralizantes e dos
inibidores da hemaglutinação (IH) também pode ser útil para a obtenção de um
diagnóstico e para estudos. A presença do anticorpo IgM nos bovinos e nos ovinos,
diagnosticada pelo teste de IH, fornece uma boa evidência de que a infecção tenha
ocorrido nos 10 dias anteriores.
Meningite e Encefalite 735

Tratamento e controle – Não se encontra disponível nenhum tratamento


específico, mas os cuidados apropriados, a alimentação manual e a sedação podem
ser úteis. Encontra-se disponível uma vacina inativa e propagada em cultura
tecidual, que protege com sucesso ovinos, bovinos e caprinos. Uma única injeção
provoca uma resposta dos anticorpos que persiste por ≥ 2 anos. O colostro da ovelha
vacinada previne a infecção dos cordeiros em seus primeiros meses. Geralmente,
vacinam-se todos os animais mantidos para acasalamento aos 6 meses de idade.
O uso de banhos de imersão em inseticidas para proteger contra a exposição aos
carrapatos geralmente se torna inadequado, embora as preparações “pour-on”
recentemente desenvolvidas possam reduzir a exposição.

MENINGITE E ENCEFALITE
Na maioria das espécies, a meningite tende a ocorrer em associação com ou
secundariamente a uma encefalite. No entanto, os sinais de meningismo podem
preceder a fase encefalítica em determinadas infecções. Nos cães, reconhecem-
se várias síndromes, nas quais os sinais meníngeos predominam por todo o curso
da doença. As causas da meningite e da encefalite (além das bactérias) incluem os
vírus, os fungos, os protozoários, a migração parasitária, os agentes químicos e as
doenças imunomediadas.
Etiologia e patogenia – A meningoencefalite bacteriana afeta freqüentemente
os animais de fazenda neonatos como uma seqüela de uma septicemia causada
pela Escherichia coli ou por estreptococos; a infecção por Actinobacilus equuli é uma
causa importante nos potros. A falha na transferência passiva das imunoglobulinas
é o único fator mais importante predispondo neonatos a uma onfaloflebite e/ou uma
enterite com o alastramento hematogênico subseqüente da infecção para o SNC.
Nos animais mais velhos ou adultos, entidades patológicas bem-reconhecidas, tais
como a meningoencefalite tromboembólica (METE [Haemophilus somnus]) dos
bovinos, a doença de Glässer dos suínos (H. parasuis) e a septicemia por H. agni
nos cordeiros em engorda também causam a meningoencefalite pela rota hemato-
gênica. A listeriose (Listeria monocytogenes), que é comum nos bovinos, nos ovinos
e nos caprinos, é um exemplo de uma meningoencefalite multifocal no tronco
cerebral que sobe para o SNC através dos nervos cranianos. A Pasteurella
haemolytica e a P. multocida, que geralmente causa uma pneumonia fibrinosa e
uma septicemia hemorrágica nos ruminantes, produzem ocasionalmente uma
leptomeningite fibrinopurulenta localizada. Também se descreveu uma meningoen-
cefalite devida à P. haemolytica nos eqüinos, nos asininos e nas mulas. As
Actinomyces, as Cryptococus e as Streptococcus spp são causas esporádicas de
meningite nos eqüinos adultos.
Em qualquer espécie, pode ocorrer uma extensão direta das infecções bacteria-
nas ou micóticas para o SNC a partir de sinusite, otite média ou interna, osteomielite
vertebral, discoespondilite, ou mordedura ou ferimentos traumáticos profundos
adjacentes à cabeça ou à espinha. As infecções iatrogênicas se tornam possíveis
a partir de instrumentos cirúrgicos ou agulhas espinhais contaminados. Também
podem surgir abscessos cerebrais a partir de uma infecção direta ou por um
embolismo séptico dos vasos cerebrais. Acredita-se que os abscessos hipofisários
nos ruminantes se originem de uma invasão bacteriana no plexo sangüíneo ao redor
da hipófise. Nos abscessos cerebrais crônicos, pode-se desenvolver uma
leptomeningite fibrinosa adjacente ou ocasionalmente difusa. Embora menos
comumente que nos animais de fazenda, os cães podem desenvolver uma menin-
Meningite e Encefalite 736

gite ou uma meningoencefalite bacterianas espontâneas, a partir das quais têm-se


isolado várias bactérias (P. multocida, Staphylococcus aureus, S. epidermidis, S.
albus, Actinomyces spp e Nocardia spp). A endocardite bacteriana também é uma
fonte importante de infecção do SNC nos cães.
As alterações patológicas características da meningoencefalite bacteriana in-
cluem uma infiltração difusa tanto de neutrófilos como de células mononucleares
nas leptomeninges. Freqüentemente, todo o espaço subaracnóideo do cérebro e da
medula espinhal inflama-se. A vasculite é freqüentemente acentuada. As bactérias
também podem invadir o parênquima do SNC, o que resulta em uma infiltração mono
e polimorfonuclear e em grandes áreas de embainhamento perivascular. Pode-se
observar uma necrose das substâncias branca e cinzenta, com infiltrações de
macrófagos, neutrófilos e células plasmáticas. A listeriose causa unicamente
microabscessos que consistem de acúmulos de neutrófilos e de reação celular
microglial com uma necrose de liquefação central.
Os outros agentes que podem causar meningoencefalite, especialmente nos
cães e ocasionalmente nos gatos e em outras espécies, incluem o Toxoplasma e os
protozoários semelhantes a este, a Neospora caninum , a Acanthamoeba castellani,
a Cryptococcus neoformans , a Blastomyces dermatitidis, a Histoplasma capsulatum,
Aspergillus sp, Coccidioides immitis e Rickettsia spp (febre maculosa das Monta-
nhas Rochosas, intoxicação por salmão e ehrlichiose). Raramente outros fungos
tais como a Cladosporium trichoides, a Paecilomyces variotii, a Flavobacterium
meningosepticum e a Geotrichum candidum causam meningoencefalomielite. As
encefalites supurativas assépticas associadas com migrações aberrantes de para-
sitas para o SNC ocorrem com várias espécies (ver págs. 729 a 733). Os vírus, tais
como os da cinomose e o da parvovirose caninas, o da peritonite infecciosa felina,
o da febre catarral maligna nos ruminantes e o da encefalomielite bovina esporádica,
também produzem meningite além da encefalite. A meningoencefalite eosinofílica
é uma resposta inflamatória incomum ao envenenamento por sal nos suínos. As
plantas unicelulares (Prototheca wickerhamii e P. zopfii ) também podem produzir
uma meningoencefalomielite eosinofílica nos cães.
Reconhecem-se várias meningoencefalites idiopáticas nos cães. Nos cães
pointer adultos ocorre uma meningoencefalomielite piogranulomatosa. Essa
doença tem sido descrita como um distúrbio agudo e rapidamente progressivo. As
lesões consistem de uma infiltração extensa de células mononucleares e neutrófilos
nas leptomeninges e no parênquima, especialmente na medula espinhal cervical e
no tronco cerebral. Ainda não se identificou um agente etiológico. A meningoence-
falite granulomatosa (MEG, ver pág. 712) ou reticulose inflamatória é uma
neuropatia mais comum que afeta cães de 5 anos em média (variando de 8 meses
a 10 anos). Recentemente, identificaram-se uma meningite supurativa responsiva
a esteróides, que afeta principalmente os cães grandes < 2 anos de idade, e uma
síndrome de vasculite necrosante severa nos beagles, nos cães-montanheses de
Berna e nos pointers alemães de pêlo curto, como possíveis distúrbios imunológicos
com uma predisposição hereditária.
Achados clínicos – Os sinais comuns da meningite bacteriana são pirexia,
hiperestesia, rigidez do pescoço e espasmos musculares paraspinhais dolorosos. Os
cães e ocasionalmente os eqüinos exibem agudamente essa síndrome e, algumas
vezes, cronicamente sem sinais clínicos de envolvimento cerebral ou da medula
espinhal. No entanto, no caso da meningoencefalite difusa devida a qualquer agente,
podem-se desenvolver depressão cegueira, paresia progressiva, ataxia cerebelar
e/ou vestibular, opistótono, deficiências nos nervos craniais, ataques, delírio e coma
terminal, dependendo da severidade e da localização das lesões. Nas infecções
neonatais, onfaloflebite, poliartrite e oftalmite com um hipópio podem acompanhar a
inflamação do SNC. Devido a sua patogenia incomum, a Listeria monocytogenes
Meningite e Encefalite 737

causa freqüentemente um desequilíbrio vestibular unilateral e uma paralisia facial e


faríngea. Na METE dos bovinos, os sinais nervosos tendem a ser superagudos com
o animal entrando subitamente em colapso e em semicoma. A febre e a rigidez dos
membros podem ser os únicos sinais detectáveis nos estágios prodrômicos. Os
sinais clínicos da meningoencefalomielite piogranulomatosa incluem rigidez cervical,
cifose, manutenção do nariz próximo ao chão, relutância a se mover e andadura
hipermétrica incoordenada. Algumas vezes, observam-se braquicardia, vômito e
atrofia dos músculos cervicais. Os sinais nos nervos craniais podem incluir a
síndrome de Horner e os sinais da paralisia dos nervos trigêmeo e facial. Os sinais
de meningoencefalomielite nos cães variam com a distribuição das lesões. Podem-
se observar dor no pescoço, depressão, distúrbios comportamentais, ataxia, paresia
e deficiências nos nervos craniais. A forma disseminada da MEG apresenta um curso
mais curto e fulminante de 1 a 8 semanas em comparação com a forma focal, que
apresenta freqüentemente uma progressão insidiosa por muitos meses.
Diagnóstico – Além da história, as condições ambientais, predisposições de
espécies ou raças a determinadas doenças, os sinais clínicos e o exame do LCE
constituem os meios mais acurados de identificação de um processo inflamatório do
SNC. A menos que uma palpação espinhal descarte a meningite, o animal que exibir
dor sem nenhuma deficiência neurológica pode ser maldiagnosticado como tendo
discopatia, pleurite, pancreatite, poliartrite ou mal-estar e desconforto provenientes
de uma septicemia. Os cães com meningite e encefalite bacterianas, meningite
supurativa responsiva a esteróides e vasculite apresentam tipicamente altos núme-
ros de neutrófilos (100 a 1.000µL) no LCE. O teor de proteína no LCE também fica
em geral significativamente elevado (100 a 5.000mg/dL). Ocasionalmente, obser-
vam-se bactérias no exame citológico do LCE e identificam-se as mesmas com a
coloração de Gram. A cultura das bactérias originárias do LCE torna-se mais provável
nos grandes animais que nos cães. Em alguns casos, as culturas sangüíneas
seriadas obtêm mais sucesso no isolamento do microrganismo causador. As
infecções virais e a listeriose produzem tipicamente uma pleocitose mononuclear no
LCE; a contagem total de células e os níveis de proteína se elevam de suave a
moderadamente. As inflamações granulomatosas geralmente induzem números
moderados a altos de células e uma elevação da proteína no LCE. A população
celular é predominantemente mononuclear, e pode-se tornar difícil a distinção entre
as infecções e as causas idiopáticas da MEG. Entretanto, no caso da
meningoencefalomielite piogranulomatosa, a análise do LCE geralmente revela uma
pleocitose neutrofílica (500 a 1.000 leucócitos/mL). Têm-se identificado criptococos
e, ocasionalmente, protozoários no LCE, mas geralmente torna-se necessária a
sorologia para confirmar as infecções micóticas e por protozoários in vivo.
Tratamento – O prognóstico é reservado no caso da meningoencefalomielite
bacteriana. O uso apropriado de antibióticos, de acordo com resultados de cultura,
se torna básico para uma terapia de sucesso. As recidivas são freqüentes, e a terapia
prolongada se torna freqüentemente necessária. A correção da imunodeficiência é
obrigatória nos grandes animais neonatos. Utilizam-se os antibacterianos de largo
espectro, tais como ampicilina, cloranfenicol, tetraciclinas, trimetoprim-sulfas e
cefalosporinas de terceira geração, mas podem-se necessitar de dosagens mais
altas que as normais para que se consigam concentrações adequadas no SNC.
Têm-se tratado as infecções micóticas do SNC no homem com sucesso com a
anfotericina B; a toxoplasmose pode responder a uma combinação de
sulfa/pirametamina ou a uma terapia com clindamicina. Geralmente contra-indicam-
se os glicocorticóides no caso das infecções bacterianas, micóticas ou por protozoários;
porém, uma alta dose de curso curto de dexametasona ou de metilprednisolona pode
controlar as complicações que ameacem a vida, tais como o edema cerebral agudo
e a herniações cerebrais iminentes. Recomendam-se doses imunossupressoras de
Meningite e Encefalite 738

corticosteróides no caso das inflamações idiopáticas nos cães. A terapia de suporte


consiste de analgésicos, anticonvulsivos, fluidos, uma dieta de alta qualidade e
fisioterapia.

SÍNDROME DO MAL-AJUSTAMENTO
NEONATAL
(SMN, Potros convulsivos, Idiotas, Errantes, Ladradores)

É uma afecção não infecciosa dos potros, caracterizada por distúrbios com-
portamentais graves. Os potros afetados podem parecer normais ao nascimento
e o parto não é complicado. Os primeiros sinais, que geralmente aparecem em
24h, incluem perda de afinidades pela égua e perda do reflexo de mamar. À
medida que a afecção progride, aparecem hiperexcitabilidade, bruxismo, ceguei-
ra aparente, vagar sem direção e clono. Os potros emitem freqüentemente ruídos
de “latidos” durante o estágio errante, e aqueles suavemente afetados podem
exibir somente os sinais relacionados com o estágio errante. Opistótono e rigidez
extensora, perda do reflexo de endireitamento, decúbito e, finalmente, estado
comatoso se seguem nessa ordem. Hipoxia e acidose acompanham as altera-
ções comportamentais.
Desconhece-se a causa exata da SMN; as possibilidades incluem distúrbio
vascular cerebral que pode resultar em edema e hemorragia, traumatismo cranial
ou torácico ou hipoxia e aumento da pressão intracranial durante o parto. O
diagnóstico diferencial inclui prematuridade, dismaturidade, traumatismo cranial
agudo, hidrocefalia congênita e meningite séptica.
O tratamento é de suporte e sintomático. Torna-se essencial a manutenção da
temperatura corporal normal, do equilíbrio ácido-básico, dos níveis ideais de fluido
corporal e da nutrição adequada e o auxílio à ventilação e o impedimento de uma
infecção secundária. O controle químico das convulsões se torna freqüentemente
necessário (barbituratos, fenitoína, diazepam ou primidona).
O prognóstico é bom, se não for complicado por uma septicemia. A sobrevivência
é > 50% com o tratamento apropriado. Se o potro se recuperar, as funções
neurológicas retornam na ordem reversa em que foram perdidas.

NEOPLASIAS DO SISTEMA NERVOSO


Os tumores primários do sistema nervoso se originam das células neu-
roectodérmicas ou mesodérmicas no ou associadas ao cérebro, medula espinhal
ou nervos periféricos. Os tumores secundários podem-se originar dos tecidos
circundantes ou de uma metástase hematogênica. Os tumores primários do
sistema nervoso raramente se metastatizam fora do crânio e do canal vertebral,
e nos cães e gatos, eles são mais comuns no cérebro do que na medula espinhal
ou nos nervos periféricos. A idade e a raça (mas não o sexo) constituem fatores
predisponentes. Na medicina veterinária, classificaram-se os tumores do sistema
nervosos de acordo com os critérios utilizados para a classificação dos tumores
no homem, mas 15 a 20% dos tumores neuroectodérmicos ainda permanecem
não classificados.
Neoplasias do Sistema Nervoso 739

Como os efeitos secundários podem mascarar a localização dos tumores


intracraniais, as correlações clinicopatológicas precisas se tornam difíceis. Além da
infiltração real do tecido cerebral, um tumor no interior do crânio pode levar a uma
necrose local, a um edema e a uma herniação cerebral ou cerebelar. A herniação
pode causar um aumento na pressão intracranial com subseqüente desenvolvimen-
to de hidrocefalia. O tecido herniado também pode resultar na compressão do tronco
cerebral.
Os tumores primários em geral crescem lentamente; os secundários, os altamen-
te malignos, os metastáticos e os ósseos com freqüência crescem rapidamente. A
topografia, os padrões de crescimento e alterações resultantes dentro e ao redor do
tumor tendem a ser característicos para o neoplasma específico. Os tumores
primários, por exemplo, os astrocitomas e os oligodendrogliomas, tendem a se
localizar profundamente e a se infiltrar no parênquima circundante. A
meningoencefalomielite granulomatosa neoplásica (reticulose primária) também
tende a se infiltrar no SNC. Todos eles apresentam uma predileção pelos hemisfé-
rios cerebrais.
Os meningiomas nos cães e nos gatos são geralmente tumores benignos que
tendem a crescer lentamente sob a dura-máter e a se expandir em direção ao
cérebro ou à medula espinhal; eles mais produzem uma atrofia por pressão do que
se infiltram. Podem-se aderir à dura-máter ou permanecer no interior do tecido
leptomeníngeo. Os meningiomas espinhais tendem a ocupar uma posição intradural-
extramedular. Os meningiomas intracraniais podem produzir uma erosão óssea.
Tem-se descrito uma hiperostose (espessamento do osso adjacente aos
meningiomas) nos cães e nos gatos. Nos cães com meningiomas espinhais, a
radiografia pode retratar alterações laminares nas vértebras afetadas, de aparência
recortada, e indicativas de alterações semelhantes à atrofia por pressão associadas
com o crescimento tumoral lento.
Os ependimomas surgem das células ependimais que revestem o sistema
ventricular. Eles tendem a penetrar no parênquima cerebral, mas podem-se projetar
no lúmen do ventrículo. Pode ocorrer uma metástase através do LCE. Os
ependimomas do quarto ventrículo podem-se estender para fora dos forames e
cercar o tronco cerebral. Os papilomas do plexo coróide se expandem localmente
no ventrículo, e raramente apresentam um crescimento destrutivo invasivo ou uma
metástase. Devido a sua localização, particularmente quando surgem no quarto
ventrículo, os ependimomas e os papilomas do plexo coróide tendem a interferir
diretamente no fluxo do LCE no sistema ventricular.
Incidência – A maioria dos dados acerca da freqüência das neoplasias do
sistema nervoso nos animais domésticos se relaciona com os cães, nos quais os
tumores intracraniais constituem 1 a 3% de todos os tumores. Nos grandes animais,
os tumores do sistema nervoso são raros, exceto quanto aos linfossarcomas e aos
neurofibromas nos bovinos.
Tumores cerebrais – Nos cães, os tumores cerebrais mais comuns são os
meningiomas, os gliomas (astrocitomas e oligodendrogliomas) e os sarcomas não
diferenciados. A reticulose primária, os adenomas hipofisários e os papilomas do
plexo coróide também são comuns. Entre os animais domésticos, os boxers, os
buldogues ingleses e os boston terriers > 5 anos de idade apresentam a incidência
mais alta de tumores cerebrais, geralmente gliomas. Os adenomas hipofisários
também são freqüentes nas raças braquicefálicas.
A maioria dos meningiomas ocorre nos cães > 7 anos de idade. Eles são
intracraniais, e ocorrem freqüentemente nas foices meníngeas no cérebro, nas
convexidades do hemisférios cerebrais e na superfície ventral do cérebro, especial-
mente na fossa cranial média. Alguns se encontram no espaço retrobulbar que surge
da bainha do nervo óptico.
Neoplasias do Sistema Nervoso 740

Nos cães, a maioria dos ependimomas parece se situar nos ventrículos laterais
e no terceiro ventrículo. Cerca de 50 a 60% dos papilomas do plexo coróide ocorrem
no quarto ventrículo, e o restante com igual incidência nos ventrículos laterais e no
terceiro ventrículo.
Nos gatos, os meningiomas (freqüentemente múltiplos) são os tumores cerebrais
primários mais comumente descritos; , 70 a 75% ocorre nos gatos com mais de 9
anos de idade.
Tumores na medula espinhal – Os tumores mais comuns da medula espinhal
nos cães são os tumores ósseos malignos, primários e extradurais, e os tumores
metástaticos nos ossos e nos tecidos moles. A metástase na medula espinhal é
incomum nos animais, embora se tenha descrito uma incidência de 16% nos cães.
Os blastomas da medula espinhal são tumores extramedulares com uma predileção
pelo segmentos medulares T10-L3. São observados nos cães jovens, e mais
freqüentemente nos pastores alemães. A maioria dos meningiomas espinhais nos
cães se situa na região cervical, enquanto os astrocitomas tendem a se localizar nos
segmentos cervicais inferiores e nos torácicos superiores. Os linfossarcomas
epidurais são os tumores espinhais mais comuns nos gatos, nos suínos e nos
bovinos.
Tumores dos nervos periféricos – Os tumores do sistema nervoso periférico
(SNP) são mais freqüentes que os tumores do SNC nos eqüinos e nos bovinos. O
neurofibroma é o tumor do SNP mais freqüentemente observado nos bovinos.
Incomuns nos cães, os tumores da bainhas nervosas envolvem principalmente as
raízes do plexo braquial e do V nervo craniano. Os linfossarcomas podem ocorrer
nas raízes nervosas ou nos nervos dos cães, dos gatos, dos eqüinos e dos bovinos.
Achados clínicos – Os sinais associados com as várias síndromes cerebrais,
da medula espinhal e dos nervos periféricos se encontram exibidos na TABELA 1. Os
sinais clínicos podem ser agudos ou insidiosos no início, e progredir rápida ou
lentamente. Os cães com tumores intramedulares geralmente não parecem ter uma
longa história de dor obscura como os cães com outros tipos de tumores na medula
espinhal/nervos periféricos. Talvez isso se deva a uma falta de compressão da raiz
nervosa e/ou a uma ausência de destruição óssea. Os sinais, incluindo o início da
paresia/paralisia, tendem a se desenvolver rapidamente nos tumores espinhais
intramedulares. Os sinais neurológicos que forem inicialmente assimétricos podem-
se tornar, de forma rápida, bilateralmente simétricos.
Pode ocorrer uma síndrome paraneoplásica (redução ou ausência de reflexos
espinhais, atrofia muscular, redução do tono) nos animais com neoplasmas malig-
nos que podem ou não se metastatizar no SNC.
Diagnóstico – O diagnóstico se baseia na idade, na raça, nos sinais clínicos, na
análise do LCE e na radiografia. Nos tumores profundamente localizados, a análise
do LCE fica freqüentemente normal. Ocasionalmente, a concentração da proteína
pode-se elevar suave a moderadamente. Quando se envolvem as meninges, o LCE
apresenta tipicamente uma pleocitose neutrofílica com uma elevação da concentra-
ção proteica. Raramente se observam células tumorais na neoplasia primária do
SNC.
Os estudos radiológicos comuns incluem a radiografia em filme de pesquisa e a
mielografia. No caso dos tumores cerebrais, a ventriculografia, a venografia do seio
cerebral e a angiografia cerebral estão sendo substituídas por técnicas de obtenção
de imagens mais precisas e mais seguras, tais como a cintilografia, a tomografia
computadorizada (TC) e a obtenção de imagens por ressonância magnética. A
radiografia em filme de pesquisa pode detectar a proliferação, a lise ou a luminosidade
do osso secundário aos neoplasmas. Devido à calcificação no tumor, os meningiomas
intracraniais podem ficar radiopacos; pode-se observar um aumento ou uma
redução na densidade do crânio no local do tumor nos gatos.
Neoplasias do Sistema Nervoso 741

TABELA 1 – Sinais Clínicos Associados com Várias Síndromes Nervosas Periféricas,


Cerebrais e da Medula Espinhal
Síndrome Sinais
Cerebral/ 1. Alteração do estado mental/compor-
diencefálica tamento (apatia, desorientação, hi-
perexcitabilidade e agressão)
2. Postura/movimento anormais (anda-
dura em círculos, andadura medida,
pendência da cabeça e pleurotótono)
3. Deterioração visual +/-, ataques, papi-
ledema, síndrome hipotalâmico-hipo-
fisária (pituitária)
Cerebelar 1. Dismetria (geralmente hipermetria)
2. Tremor intencional (cabeça e corpo)
3. Postura com base larga
4. Ataxia do tronco
5. Deficiência +/- do reflexo de ameaça,
tremores oculares
Vestibular 1. Inclinação da cabeça
2. Andadura em círculos/prostração/rola-
mento
3. Nistagmo
4. Estrabismo vestibular
Cervical (C1-5) 1. Hemiplegia – tetraplegia
2. Sinais* no neurônio motor superior
(NMS) nos membros anteriores e pos-
teriores
3. Dor cervical, rigidez cervical +/-
Cervicotorácica (C6-T 2) 1. Hemiparesia – tetraplegia
2. Sinais ** no neurônio motor inferior
(NMI) nos membros anteriores
3. Sinais no neurônio motor superior
(NMS) nos membros posteriores
4. Reflexo do panículo ausente (C8-T1)
5. Síndrome de Horner (T1-3) ± (miose
ptose, enoftalmia e prolapso da tercei-
ra pálpebra)
Toracolombar (T3-L3) 1. Sinais do neurônio motor superior
(NMS) nos membros posteriores
2. Hipalgesia – analgesia caudal ao local
da lesão
Lombossacral(L4-S3...Cd) 1. Sinais no neurônio motor inferior (NMI)
nos membros posteriores
2. Dilatação do esfíncter anal, retenção
urinária
Neuropática 1. Sinais no neurônio motor inferior (NMI)
em todos os membros posteriores
2. Atrofia significativa dos músculos es-
queléticos (atrofia neurogênica)
3. Hipalgesia +/ -
* Paresia/paralisia espástica, hiper-reflexia, hipertonia.
** Paresia/paralisia flácida, hiporreflexia, hipotonia.
Adaptado de Braund, K.G., Neoplasia, In: Veterinary Neurology, Oliver, J. E., Hoerlein, B.F., Mayhew,
I.G. (ed.), W.B. Saunders Co., Philadelphia, 1987.
Neoplasias do Sistema Nervoso 742

A perda de densidade óssea do canal vertebral (que aparece como um alargamento do


canal) pode ser causada por tumores no canal, e os neurofibromas da raiz nervosa podem
causar o alargamento dos forames intervertebrais. A mielografia destaca os tumores
espinhais e ajuda a identificar a sua localização. A TC pode localizar precisamente os
tumores cerebrais, e pode também fornecer informações pertinentes à malignidade do
tumor. Os meningiomas, os tumores do plexo coróide e os tumores hipofisários são
facilmente distinguidos através de uma potencialização por um agente de contraste.
Ocasionalmente utiliza-se a eletrofisiologia ao se suspeitar de neoplasias cere-
brais. A eletroencefalografia pode identificar uma área de atividade elétrica anormal
associada com uma lesão que ocupe um espaço. A eletromiografia, realizada
freqüentemente em distúrbios do sistema nervoso periférico, é útil na diferenciação
da raiz dos tumores espinhais ou dos nervos periféricos.
A histopatologia do tecido obtido através de uma biópsia cirúrgica ou da remoção
do tumor constitui o passo final em direção a um diagnóstico definitivo.
Prognóstico e tratamento – O prognóstico é de reservado a ruim. Embora a
localização precisa precoce de uma massa tumoral raramente seja possível, a
remoção dos tumores intracraniais está se tornando mais freqüente. Os tumores da
medula espinhal podem ser melhor localizados, mas as massas intramedulares não
são cirurgicamente dissecáveis, e os tumores extradurais são freqüentemente
tumores ósseos primários ou metastáticos.
Embora alguns autores considerem que os tumores intradurais-extramedulares
sejam cirurgicamente corrigíveis, outros descreveram que a maioria não é comple-
tamente dissecável e que a recidiva é alta.
Se eles não invadirem a medula espinhal, podem-se dissecar os tumores nas
raizes ou nos nervos periféricos, mas também se deve remover a raiz ou o nervo
afetado. Quando se envolve mais de uma raiz ou nervo (como pode ocorrer no caso
de um tumor do plexo braquial), pode-se tornar necessária a amputação do membro.
O uso da radioterapia e da quimioterapia para os tumores do sistema nervoso não
tem sido freqüente na medicina veterinária. Os corticosteróides podem reduzir o
edema ao redor dos tumores; no caso dos tumores linfóides e retículo-histiocitários,
podem induzir uma regressão temporária.

PARALISIA DO MEMBRO ANTERIOR


A inervação da perna dianteira se danifica comumente por meio de um traumatismo
direto, de uma isquemia por uma contenção ou anestesia prolongada de eqüinos ou
bovinos pesados em decúbito lateral e, ocasionalmente, por tumores que envolvam os
nervos e as radículas do plexo braquial. Uma tração no membro anterior severa o
suficiente para causar uma abdução excessiva do ombro pode destacar ou esticar
severamente o plexo inteiro. Os sinais clínicos resultantes refletem graus variáveis de
danos às raízes nervosas intradurais ventral e dorsal. O nervo radial é o mais vulnerável
a lesões no nível da primeira costela e do úmero, onde repousa no sulco muscoloespiral.
Caracteristicamente, qualquer animal com uma paralisia completa do plexo
braquial fica com o cotovelo pendente, e o carpo e a articulação metacárpica em
flexão parcial. O membro é arrastado e a sustentação do corpo causa um colapso no
cotovelo e no carpo. Dos cinco nervos principais do plexo (musculocutâneo, axilar,
radial, ulnar e mediano), a lesão no nervo radial proximal ao cotovelo produz a maior
incapacidade motora porque, o cotovelo, o carpo e os dígitos não podem ser
estendidos para sustentar o peso. Uma lesão do nervo distal ao cotovelo resulta
somente na articulação dos dígitos e do carpo. No caso das lesões severas do nervo
Polioencefalomalacia 743

radial, ocorre primariamente uma dessensibilização sobre o dorso do membro


anterior e dos dígitos. No caso das paralisias do nervo ulnar e do mediano, ocorre uma
deterioração da flexão dos dígitos e do carpo. Os danos nos nervos musculocutâneos
e axilar afetam o movimento do ombro e a flexão do cotovelo, respectivamente.
Quando um processo inflamatório, traumático ou neoplásico afeta os segmentos da
medula espinhal a partir dos quais o plexo braquial surge (C6-T2), pode ocorrer uma
paresia bilateral dos membros anteriores e posteriores. Os neurofibromas que se
originam em um nervo do plexo braquial progridem freqüentemente para a medula
espinhal e causam uma hemiplegia discreta. O envolvimento da primeira raiz torácica
produz freqüentemente a síndrome de Horner no mesmo lado que a paralisia do
membro. Dentro de 1 a 2 semanas, desenvolve-se uma atrofia muscular neurogênica
severa nos grupos musculares denervados.
Nos cães, descreveu-se uma forma de neurite do plexo braquial, que se caracte-
riza por uma claudicação alternante do membro anterior. Ocorrem anormalidades
eletromiográficas difusas típicas de denervação; o LCE e a mielografia espinhal ficam
normais. Esses cães melhoram com uma terapia com glicocorticóides. Têm-se
incriminado produtos bovinos e/ou eqüinos na dieta no caso desse distúrbio.
Uma história precisa e um exame neurológico cuidadoso do membro anterior
tornam-se essenciais e geralmente adequados para um diagnóstico. As evidências
radiográficas de fraturas podem sugerir o local da lesão. O prognóstico é reservado
quando a perda sensorial é completa e podem ser necessários 2 a 4 meses de
convalescença para a regeneração do nervo. A análise eletromiográfica dos vários
grupos musculares pode determinar a extensão da lesão. Através de estudos
seqüenciais da condução nervosa, podem-se detectar mais cedo sinais de regene-
ração nervosa e se administrar um prognóstico mais definido.
Nos casos de uma contusão aguda dos nervos, devem-se aliviar o edema e a
pressão. Quando se suspeitar de que um nervo (ou nervos) foi lesionado, indicam-se
uma cirurgia exploratória e um reparo cirúrgico. Se o pé estiver sendo arrastado e houver
propensão para laceração, pode-se protegê-lo com uma bota de couro. Durante um
período de convalescença prolongado, a fisioterapia (consistindo de massagem mus-
cular) e a flexão e extensão de todas as articulações do membro afetado podem ajudar
a evitar a fixação da articulação devido a uma contratatura muscular. O prognóstico para
os animais com destacamento do plexo braquial é de reservado a ruim. A amputação
do membro nos pequenos animais pode se tornar necessária nos casos irreversíveis.

POLIOENCEFALOMALACIA
(PEM, Necrose cerebroespinhal)

É uma neuropatia não infecciosa dos ruminantes, caracterizada por amaurose e


estrabismo, seguidos por decúbito, opistótono e convulsões. A tiamina tecidual e a
atividade enzimática relacionada encontram-se deprimidas e levam a necrose e
autofluorescência do tecido cerebral afetado; o último se torna útil no diagnóstico.
Os bovinos e os ovinos jovens intensivamente criados se encontram em maior risco,
mas a doença também ocorre nos caprinos, nos antílopes, nos veados e nos bovinos
e ovinos no pasto sob circunstâncias especiais. Ocorre no mundo inteiro, notavel-
mente nas Américas do Norte e do Sul, na Europa, no Oriente Médio e na Austrália.
Etiologia e epidemiologia – Em todos os casos, a tiamina tecidual se encontra
deficiente; no entanto, a causa dessa deficiência varia e ainda não está completa-
mente clara. Quando se altera abruptamente a dieta para concentrados e silagem
de milho, a quantidade de tiamina no rúmen cai rapidamente e a microflora
Polioencefalomalacia 744

gastrointestinal se altera notavelmente; os bacilos Gram-positivos com atividades de


tiaminase do Tipo I, os cocos Gram-negativos e os cocobacilos se tornam dominan-
tes. A tiaminase do Tipo I leva automaticamente à produção de análogos da tiamina,
alguns dos quais já demonstrados no tecido cerebral dos animais afetados; no
entanto, o seu papel etiológico ainda é incerto. Finalmente, os baixos níveis teciduais
das enzimas dependentes de tiamina prejudicam o metabolismo energético, particu-
larmente no cérebro e no coração, tecidos que dependem do catabolismo da glicose.
Isso resulta em alterações compatíveis com a parada metabólica aguda nas células
gliais e nos neurônios nas áreas cerebrais de alta vulnerabilidade e na menos
comumente reconhecida necrose focal do miocárdio. Também ocorre no caso do
envenenamento por samambaia (Pteridium aquilinum), por valeriana (Marsilea
drummondii) e por samambaia-das-rochas ( Cheilanthes sieberi), pois essas plantas
contêm tiaminase do Tipo I (ver também pág. 1989). O alimento embolorado também
pode se associar à PEM pois alguns bolores produzem tiaminase do Tipo I, ou eles
ou seus metabólitos podem agir por interferirem no equilíbrio da microflora gastroin-
testinal e na síntese endógena de tiamina. A ingestão de quantidades excessivas de
sulfato fornecido para limitar o consumo de concentrado ou como contaminante da
água também se encontra associada com surtos de PEM. Ainda não se compreen-
deu o mecanismo. A intoxicação por melaço nos países caribenhos produz sinais e
lesões semelhantes, mas seu relacionamento com a PEM ainda é incerto.
Virtualmente todos os casos se relacionam com distúrbios do rúmen e do
ecossistema intestinal por meio de práticas de criação intensivas e pelo fornecimen-
to de grandes quantidades de carboidratos. Nos ovinos, tem-se associado com a
doença uma taxa de alterações > 280g de carboidrato hidrossolúvel por cabeça por
alimento. Os casos que ocorrem no pasto na Nova Zelândia e na Europa se
relacionam com o capim suculento e rico em proteínas. Na Austrália, os pastos
anteriormente alagados e repovoados com samambaia-valeriana induzem PEM,
enquanto na América do Sul, observa-se a PEM em bovinos no pasto em inanição
que ingeriram (por canibalismo) carcaças apodrecidas.
Patogenia – O pirofosfato de tiamina é uma coenzima exigida no ciclo do ácido
tricarboxílico e no desligamento da pentose, ambos vitais para a produção de energia
pela célula cerebral. A ausência de energia causa uma necrose neuronal e um
inchaço dos astrócitos. Devido à distribuição dos ramos terminais das artérias
cerebrais, às exigências metabólicas neuronais variáveis e às diferenças bioquími-
cas neuronais intrínsecas, as lesões cerebrais na PEM são piores no córtex (frontal,
parietal e occipital), no tálamo, nos corpos geniculados laterais e nos núcleos
coliculares posteriores. As lesões isquêmicas secundárias devidas ao inchaço
cerebral incluem herniação oposta de partes do córtex e a herniação do cerebelo em
direção ao interior do forame magno. A necrose focal do miocárdio ocorre principal-
mente nos átrios. Mais recentemente têm-se observado distúrbios da atividade da
medula óssea na inadequação da tiamina, e estes podem ser responsáveis por
hemorragias subserosas raras nas vísceras dos bezerros e na natureza hemorrágica
das lesões corticais algumas vezes observadas nos cordeiros.
Achados clínicos e lesões – Os sinais prodrômicos incluem isolamento e
anorexia. Depressão súbita, hipoatividade ruminal, estrabismo dorsomedial (“olhar
fixo nas estrelas”), opistótono moderado, perturbação da andadura, cegueira
cortical e preservação do reflexo luminoso pupilar constituem os sinais mais
comuns. Nos casos não tratados, seguem-se hiperestesia, decúbito, opistótono
severo e convulsões tonicoclônicas. Podem-se notar uma elevação da pressão do
LCE, uma pleocitose de monócitos e macrófagos e um edema papilar dentro de 24
a 48h. A menos que se sigam convulsões, a temperatura permanece normal.
Ocasionalmente, ocorrem braquicardia e arritmias, e pode-se notar uma expiração
ruidosa e uma diarréia transitória. No bovino em decúbito não tratado, a mortalidade
Polioencefalomalacia 745

atinge 100% em 3 a 4 dias. A morbidade nos bovinos engorda é geralmente < 5%,
mas nos bezerros de 3 a 5 meses de idade, ela pode ser de até 50%. Nos ovinos,
o curso clínico tende a ser mais rápido.
Nos animais afetados em < 24h as lesões macroscópicas são sutis. O amarelamento
cortical simétrico característico dos lobos frontal, occipital e parietal é melhor observado
nos animais que sobrevivem por 2 a 3 dias. A herniação occipital subtentorial e a
conização do cerebelo em direção ao interior do forame magno criam necrose focal e
lesões hemorrágicas. O cérebro perde o turgor normal. Após 24h de doença clínica, sob
luz ultravioleta, a 365nm na escuridão, as zonas de necrose no córtex e nas estruturas
cerebrais profundas fluorescem em amarelo-azulado. As lesões histológicas incluem
uma necrose cortical laminar com neurônios encolhidos, eosinofílicos e com “parada
metabólica”; uma vacuolização esponjosa fina do neurópilo; e ocasionalmente, peque-
nas hemorragias perivasculares. A severidade de hipertrofia capilar e da atividade dos
macrófagos nos tecidos necróticos depende progressivamente do tempo.
Diagnóstico – Nos animais vivos, um ensaio de transcetolase das hemácias e
tiaminase fecal ou ruminal e a resposta à terapia com tiamina constituem procedi-
mentos diagnósticos úteis. A tiaminase fecal nos animais neurologicamente normais
que apresentam níveis sangüíneos de tiamina < 50nmol/L pode indicar uma
inadequação subclínica à tiamina, associada com um ganho deficiente de peso. A
elevação do piruvato e do lactato sangüíneos é sugestiva, mas propende a uma
elevação errônea devido a um esforço muscular. Nos animais mortos, a fluorescên-
cia cortical macroscópica e as lesões cerebrais histológicas características são
confirmatórias. Os níveis de tiamina no cérebro, no fígado e no coração ficam baixos.
O envenenamento subagudo por chumbo, sal e a intoxicação com água também são
capazes de causar áreas de degeneração cortical com um padrão histológico que
pode ser difícil de distinguir daquele da PEM.
O diagnóstico diferencial nos bovinos e nos ovinos inclui o envenenamento agudo
por chumbo, a intoxicação com nitrofurano, a hipomagnesemia, a deficiência de
vitamina A, a intoxicação com organoclorato, a meningoencefalite tromboembólica
(METE) infecciosa, o abscesso cerebral e a enterotoxemia clostrídica do Tipo D.
Tratamento – A PEM é uma condição de emergência; uma vez que os neurônios
estão morrendo aos milhões, deve-se iniciar uma terapia imediatamente após o
aparecimento dos sinais. O cloridrato de tiamina, a 10 a 15mg/kg EV ou IM, assegura
uma rápida reativação dos complexos enzimáticos deficientes. A tiamina parenteral
em excesso é rapidamente perdida na urina. A continuação do antagonismo e a
destruição da tiamina derivada do trato gastrointestinal podem necessitar tratamen-
tos repetidos em taxas de dosagem mais baixas (2 a 10mg/kg, duas ou quatro vezes
ao dia por 3 dias). Nos animais de valor, a dexametasona (1 a 2mg/50kg, IM por 3
dias) e o gotejamento EV de manitol podem minimizar o inchaço cerebral e facilitar
a recuperação. A rapidez da recuperação se relaciona diretamente com a velocida-
de do diagnóstico e da terapia. Freqüentemente se conseguem a recuperação da
visão e a restauração da função normal, mas isso pode exigir 2 a 3 semanas de
convalescença. Como outros animais no rebanho ou no lote se encontram em risco
devem-se reduzir o concentrado e a silagem de milho na dieta e fornecer uma
forragem adicional de qualidade por 5 dias antes do retorno gradual às rações mais
ricas em energia. A tiamina parenteral e a alteração dietética constituem a profilaxia
preferida. Contra-indica-se a tiamina dietética suplementar, pois pode estimular
posteriormente os microrganismos tiaminolíticos no intestino. No entanto, pode-se
conseguir uma profilaxia oral ou uma terapia de suporte através da administração
do dissulfeto propilítico de tiamina ou do dissulfeto tetrafurfurílico de tiamina, que são
menos solúveis. Essas substâncias não são destruídas pela tiaminase do Tipo I e
são facilmente absorvidas a partir do trato gastrointestinal.
Encefalomielite Enteroviral Suína 746

ENCEFALOMIELITE ENTEROVIRAL SUÍNA


(Doença de Teschen, Polioencefalomielite suína, Doença de Talfan,
Paresia enzoótica benigna)

É uma doença infecciosa dos suínos, análoga à poliomielite humana. A doença


severa é hoje rara; ela ocorre na Rússia e na África, mas foi descrita pela última vez
na Europa (Áustria) em 1980. Nos outros países, descreve-se uma doença leve
esporádica, ou não se reconhece a mesma.
Etiologia, epidemiologia e patogenia – Os enterovírus (Picornaviridae) são
comuns nas populações suínas por todo o mundo. Muitas cepas não são patogêni-
cas. Utilizando-se o teste de neutralização viral, definiram-se 11 sorogrupos de
enterovírus suínos. As cepas mais neurotrópicas pertencem a um dos 3 primeiros
sorogrupos, e o sorogrupo 1 contém não apenas as mais altamente virulentas, como
também muitas das neutrópicas menos virulentas. Embora se reconheçam subtipos
antigênicos, eles não se distinguem entre cepas mais ou menos virulentas do vírus.
Os enterovírus podem sobreviver no ambiente por meses.
A transmissão se dá por contato direto ou indireto como suínos infectados. A cepa
virulenta do sorogrupo 1 da doença de Teschen clássica produz altas morbidade e
mortalidade em suínos de todas as idades, mas aparentemente permanece confi-
nada a determinadas áreas geográficas. A doença esporádica e leve ocorre em
qualquer lugar. Os rebanhos convencionais ficam em geral endemicamente infec-
tados, e a exclusão dos enterovírus nos rebanhos SPF se torna difícil de manter. A
infecção é principalmente inaparente e ocorre geralmente no desmame com o
declínio da imunidade materna passiva e a mistura dos suínos. Os casos clínicos
esporádicos da doença nervosa ocorrem principalmente por volta dessa época,
embora a doença seja mais comum nos leitões desmamados após a introdução de
um sorotipo para o qual o rebanho não tenha sido exposto.
O vírus ingerido se replica no trato gastrointestinal e se encontra associado com
o tecido linfóide. Não ocorre destruição do epitélio intestinal, mas o vírus é eliminado
dos locais de multiplicação nas fezes por várias semanas. Em alguns suínos,
especialmente nos infectados com cepas virulentas, segue-se uma viremia que
resulta no alastramento da infecção para o SNC (ver também pág. 719).
Achados clínicos e lesões – Na infecção virulenta aguda, os sinais clínicos
aparecem 1 a 4 semanas após a exposição nos suínos de todas as idades. A
ataxia é freqüentemente o primeiro sinal observado, seguido por febre, prostra-
ção e anorexia. Podem ocorrer ataques, nistagmo, opistótono e coma. A paralisia,
inicialmente evidente como paraplegia mas progredindo para quadriplegia, é
freqüente nos casos severos. A morte é comum dentro de 3 a 4 dias do início dos
sinais.
Os sinais de doença leve correspondem essencialmente à ataxia e à paresia, a
última mais raramente progredindo para paralisia. Somente os suínos jovens
(desmamados ou não) são suscetíveis , e a recuperação é freqüente.
Não há lesões macroscópicas. As alterações microscópicas são mais proemi-
nentes na substância cinzenta do tronco cerebral, do cerebelo e da medula espinhal.
A encefalite não supurativa se caracteriza por necrose neuronal, neuronofagia,
focos gliais e um embainhamento linfocítico perivascular. A meningite se encontra
freqüentemente presente sobre o cerebelo.
Diagnóstico – Os sinais clínicos (especialmente os do distúrbio locomotor), a
epidemiologia e a ausência de achados de necropsia macroscópicos específicos
proporcionam um diagnóstico presuntivo. A natureza e a distribuição das lesões
histológicas proporcionam evidências de suporte. As amostras séricas agudas e
convalescentes, coletadas com um intervalo ≥ 2 semanas, podem demonstrar uma
Pseudo-raiva 747

elevação nos anticorpos de neutralização ou de fixação de complemento. Para se


confirmar o diagnóstico, exige-se o isolamento viral a partir do SNC. Pode-se basear
a diferenciação das formas severa e mais suave da doença apenas nas evidências
sorológicas, clínicas e epidemiológicas.
O diagnóstico diferencial inclui as muitas outras encefalites virais dos suínos,
particularmente a cólera suína, a febre suína africana, a pseudo-raiva, a raiva e
encefalopatias da doença do edema e da privação de água/intoxicação com sal. Os
sintomas locomotores proeminentes na encefalomielite enteroviral podem ser
confundidos também com várias neuropatias tóxicas e nutricionais.
Tratamento e controle – Não há tratamento. Utiliza-se uma vacina viva
atenuada para o controle nas áreas onde há doença endêmica severa. No passado,
as medidas de erradicação na Europa central incluíam vacinação em grupo e abate,
e restrição à importação de suínos ou de produtos de origem suína. Em muitos
países, deve-se relatar às autoridades reguladoras a suspeita da doença de
Teschen clássica. Nos rebanhos com doença clínica leve endêmica, a introdução de
um lote reprodutivo ≥ 1 mês antes do acasalamento deve potencializar a imunidade
passiva nos filhotes.

PSEUDO-RAIVA
(Doença de Aujeszky, Sarna raivosa)

É uma infecção viral, primariamente dos suínos, que afeta o SNC. A variação
de hospedeiros é ampla, embora a infecção seja fatal virtualmente em todos os
animais que se infectam, exceto nos suínos. O homem, os macacos, os chimpan-
zés, os pecilotermos e os insetos são resistentes à infecção. O vírus pode
sobreviver na superfície corporal das moscas domésticas, que podem servir
como fontes de vírus. Descreveu-se a pseudo-raiva nos EUA, nas Américas,
Central e do Sul, na Europa, na Índia, no sudeste da Ásia, em Taiwan, no Japão,
nos países do norte da África e na Nova Zelândia. Não foi detectada no Canadá
ou na Austrália.
Etiologia, epidemiologia e patogenia – O herpesvírus causador tem uma fita
dupla de DNA e um envelope lipoproteico. Existem pelo menos 5 glicoproteínas que
se projetam do envelope. O vírus persiste em um estado latente nos neurônios
ganglionares em uma alta porcentagem dos suínos infectados. Existem muitas
cepas de vírus e estas variam de aparentemente virulentas nos suínos a altamente
virulentas.
O suíno é o hospedeiro primário e o único reservatório conhecido. Os suínos
excretam grandes quantidades de vírus na saliva e nas secreções nasais por até 2
semanas após a infecção primária, e excretam pequenas quantidades apenas
raramente na urina ou nas fezes. Os suínos podem-se manter infectados latente-
mente pela vida inteira e podem eliminar o vírus por até 1 semana se estiverem
suficientemente estressados. Embora a sobrevivência no ambiente dependa da
temperatura, da umidade e do meio, o vírus geralmente não sobrevive > 2 semanas
fora do suíno vivo. A maioria dos animais se infecta por contato direto com os suínos
que estão eliminando o vírus. A infecção por ingestão de tecido contaminado ou por
inalação de aerossol contaminado é menos comum, embora a transmissão por
aerossol a distâncias significativas pareça ocorrer realmente.
A patogenia e a manifestação da doença são semelhantes em todas as espécies
suscetíveis. O vírus chega às vias oronasais e inicia a infecção nas células epiteliais;
ele viaja para o cérebro no axoplasma dos nervos craniais e, simultaneamente,
Pseudo-raiva 748

infecta o trato respiratório superior e pode progredir para os alvéolos. A viremia é


intermitente e de baixos títulos, mas dá ao vírus acesso a todas as partes do corpo.
Achados clínicos – Nos suínos, o período de incubação é de 30 a 48h. Os
primeiros sinais são espirros e tosse, seguidos rapidamente por pirexia, anorexia e
prostração. O envolvimento neurológico pode-se seguir e ser manifestado por
tremores, incoordenação, convulsões e coma. Em alguns suínos jovens ocorrem
vômito e diarréia. Pode ocorrer morte 3 a 6 dias após a infecção. A mortalidade pode
atingir 100% nos suínos lactentes, mas diminui com o aumento da idade; poucos
adultos morrem, se tanto. A incidência de abortamento, mumificação e/ou natimor-
talidade em leitões pode aumentar dependendo do estágio da gestação na infecção.
Após o surto inicial em um rebanho, a imunidade passiva protege os suínos até 6 a
12 semanas de idade, e podem-se observar sinais somente nos suínos em fim de
crescimento. Embora os surtos possam causar perdas severas, não é incomum que
um rebanho afetado não apresente efeito clínico óbvio.
A doença nos bovinos, nos ovinos e nos caprinos segue mais freqüentemente um
curso clínico curto de 36 a 48h. Ocorre uma breve fase de excitação, na qual os
bovinos ficam ocasionalmente agressivos; ocorrem tremores e uma aparente
ansiedade à medida que a freqüência respiratória e a salivação aumentam, e estas
são acompanhadas pela lambedura das narinas. À medida que o envolvimento
neurológico progride, pode-se desenvolver um prurido, com fortes esforços para
aliviar a coceira, e culminar em incoordenação, decúbito, convulsão, exaustão,
coma e morte.
A doença nos cães e nos gatos segue um curso semelhante àquele nos
ruminantes, com certas exceções. Não se encontraram cães agressivos, e a
extensão da síndrome é mais variável. Nos gatos, a fase de excitação é precedida
por um período de apatia; no início da salivação, o miado se torna persistente e o
gato resiste a ser pego. Nos cães e nos gatos o prurido pode ou não estar presente.
Lesões – A congestão dos vasos das meninges fica, com freqüência, macros-
copicamente evidente. Observam-se menos freqüentemente petequiação das
papilas e do córtex renais, amigdalite necrótica e focos necróticos difusos no fígado
e no baço. Algumas vezes se encontram presentes vesículas na pele das narinas
e na mucosa bucal. Os outros sinais de envolvimento do SNC incluem as lesões
microscópicas da meningoencefalomielite não supurativa, da encefalomielite, da
meningite e da ganglioneurite. Ocasionalmente, podem-se encontrar inclusões
intranucleares eosinofílicas nas células gliais ou nos neurônios. Há focos necróticos
de células parenquimais nas amígdalas, no fígado, no baço e nos pulmões.
Diagnóstico – O diagnóstico por tentativa pode-se basear na história, na
prevalência da pseudo-raiva na área, nos sinais clínicos e nas lesões post mortem.
Quando os sinais clínicos são suaves, o diagnóstico diferencial inclui: no caso dos
suínos lactentes – a Escherichia coli, a Streptococcus suis, a gastroenterite
transmissível e o vírus da encefalomielite hemaglutinante; no caso dos suínos em
fim de crescimento – a intoxicação por arsênico ou por organoclorato, a S. suis e a
privação de água; no caso dos adultos – o parvovírus, o vírus da encefalomiocardite,
a leptospirose ou o vírus da gripe. Pode-se utilizar o isolamento viral ou a técnica de
imunofluorescência para detectar o vírus nos tecidos. As amígdalas e o cérebro são
os melhores, mas o fígado, o baço e os pulmões também podem ser positivos. Os
fetos anormais também podem eliminar o vírus. Utilizam-se comumente os testes
sorológicos (inclusive a soroneutralização, o ELISA e a aglutinação em látex) para
a detecção dos suínos que tenham sido expostos ≥ 2 semanas antes.
Nas outras espécies, os sinais clínicos geralmente drásticos combinados com
uma história de exposição a suínos são muito sugestivos.
Controle – Não há tratamento. As vacinas atenuadas e inativadas são efetivas
na prevenção da doença, mas não impedem a infecção pelo vírus de campo. Os
Raiva 749

suínos vacinados também eliminam o vírus após uma infecção por cepas de campo,
embora em concentrações menores e por períodos mais curtos do que os suínos
infectados não vacinados. Encontram-se disponíveis vacinas geneticamente altera-
das; o acompanhamento com testes sorológicos permite que os suínos vacinados
sejam diferenciados dos suínos infectados com o vírus da cepa de campo. Cada um
desses testes é projetado para ser utilizado em conjunto com uma vacina específica.
Para se manter um rebanho livre do vírus da pseudo-raiva deve-se: 1. acrescen-
tar apenas suínos soronegativos ao rebanho; 2. evitar a visita a instalações
infectadas e proibir o acesso público à instalação dos suínos; 3. manter os animais
silvestres, particularmente os suínos selvagens e os animais desgarrados, longe do
rebanho; e 4. evitar a utilização de equipamento de outras propriedades. No caso
de um surto, o isolamento dos suínos não infectados pode eliminar o alastramento
dentro do rebanho.

RAIVA
É uma encefalomielite viral aguda que afeta todos os animais de sangue quente.
A taxa de mortalidade é próxima a 100%. Embora a raiva ocorra por todo o mundo,
alguns países se encontram livres da doença devido a programas bem-sucedidos
de erradicação, ou em virtude de sua condição insular ou do emprego de regulamen-
tos rigorosos de quarentena.
Etiologia e epidemiologia – Dos 4 sorotipos de lissavírus atualmente reconhe-
cidos, o sorotipo 1 é responsável pela raiva clássica dos animais terrestres. Os
sorotipos 2, 3 e 4 são vírus relacionados à raiva, que possuem diferenças antigênicas
e epidemiológicas com relação à própria. Os vírus da raiva, recentemente identifi-
cados nos morcegos europeus, são atualmente classificados com o sorotipo 4.
A espécie animal predominante na qual a raiva se mantém varia nas diferentes
partes do mundo. A raiva canina predomina na África, na Ásia, na América Latina
e no Oriente Médio. Na América do Norte e na Europa, onde a raiva canina foi
efetivamente controlada, a doença se mantém nas espécies silvestres. Na América
do Norte, as raivas no cangambá, no gaxinim e na raposa são (cada uma)
encontradas em regiões geográficas razoavelmente distintas, embora ocorra uma
certa sobreposição na distribuição. Também podem-se detectar essas diferenças
na distribuição como diferenças nas cepas virais por tipificação com anticorpos
monoclonais, com uma cepa “associada ao cangambá” ou “associada ao guaxinim”
predominando em uma determinada região. A raiva nos morcegos se distribui por
todos os EUA, e a tipificação com anticorpos monoclonais pode diferenciar os vírus
da raiva de origem nos morcegos daqueles de origem nos animais silvestres
terrestres. Na Europa, predomina a raiva nas raposas. Em determinadas partes do
norte da Europa, a raiva no cão-guaxinim assume uma preocupação crescente, e
parece que hoje a raiva nos morcegos serôdios pode-se encontrar largamente
distribuída na Europa. O morcego-vampiro é um reservatório importante no México,
nas Américas Central e do Sul e em partes do Caribe, e constitui a origem dos surtos
nos bovinos. Outras espécies silvestres podem exercer um papel importante na
manutenção da raiva em determinadas áreas, incluindo os mangustos no Caribe e
no sul da África, os chacais em determinadas partes da África e os lobos em partes
do norte da Europa.
Transmissão e patogenia – A transmissão se dá geralmente através da
mordedura de um animal raivoso, por meio da saliva rica em vírus. Menos
comumente, pode-se introduzir o vírus em cortes ou ferimentos existentes na pele,
Raiva 750

ou através de uma membrana mucosa intacta ou desgastada. O vírus pode-se


encontrar presente na saliva e ser transmitido por um animal infectado alguns dias
antes do início dos sinais clínicos. Tem-se descrito raramente a transmissão por
rotas não salivares. Essas rotas incluem a transmissão por aerossol ao homem no
laboratório e em cavernas infestadas de morcegos.
O período de incubação é prolongado e variável. A maioria dos casos nos cães
ocorre dentro de 21 a 80 dias após a exposição, mas o período de incubação pode
ser mais curto ou consideravelmente mais longo.
A maioria das infecções ocorre por deposição de saliva infectada no músculo
ou nas membranas mucosas. Após a replicação no local, o vírus viaja através dos
nervos periféricos para a medula espinhal e sobe em direção ao cérebro. O
intervalo considerável durante o qual o vírus permanece no local de inoculação
justifica a infiltração local do soro hiperimune como um dos métodos de tratamen-
to defendidos para uso no homem. Ao alcançar o cérebro, o vírus geralmente sai
do SNC e atinge as glândulas salivares através de seu suprimento nervoso. É raro
encontrar o vírus na glândula salivar e não no cérebro. Pode ocorrer um
alastramento hematogênico, mas é raro. Embora a doença seja geralmente fatal,
uma vez que os sinais clínicos aparecem, tem-se descrito recuperação em vários
animais, inclusive no homem.
Achados clínicos – Os animais raivosos de todas as espécies exibem sinais
típicos de distúrbio do SNC, com variações menores peculiares aos carnívoros, aos
ruminantes, aos morcegos e ao homem (ver também pág. 710). Pode-se dividir o
curso clínico (particularmente nos cães) em 3 fases: a prodrômica, a excitativa e a
paralítica. O termo “raiva furiosa” se refere aos animais nos quais a fase excitativa é
predominante, e “raiva muda ou paralítica” aos animais nos quais a fase excitativa é
extremamente curta ou ausente e a doença progride rapidamente para a fase
paralítica. Em qualquer animal, o primeiro sinal é uma alteração no comportamento,
que pode ser indistinguível de um distúrbio gastrointestinal, uma lesão, um corpo
estranho na boca, um envenenamento ou uma doença infecciosa em seu início. A
alteração de temperatura não é significativa, e pode-se ou não notar salivação. Os
animais geralmente param de comer e de beber e podem procurar o isolamento.
Freqüentemente o trato urogenital se encontra irritado ou estimulado, como eviden-
ciado pela micção freqüente, pela ereção no macho e pelo desejo sexual. Após o
período prodrômico de 1 a 3 dias, os animais apresentam sinais de paralisia ou ficam
indóceis. Os carnívoros, os suínos e, ocasionalmente, os eqüinos e as mulas mordem
outros animais ou as pessoas à provocação mais ligeira. Os bovinos chifram qualquer
objeto que se mova. A doença progride rapidamente após o início da paralisia, e a
morte é virtualmente certa dentro de 10 dias dos primeiros sinais.
Forma paralítica – Essa forma se caracteriza pela paralisia inicial dos músculos
da garganta e masseteres, geralmente com uma salivação abundante e uma
incapacidade para engolir. A pendência da mandíbula inferior é comum nos cães.
Os proprietários examinam freqüentemente a boca dos cães e dos bovinos,
procurando por um corpo estranho, ou administram uma medicação com as mãos
nuas, expondo-se portanto à raiva. Esses animais não ficam indóceis e raramente
tentam morder. A paralisia progride rapidamente para todas as partes do corpo, e
seguem-se coma e morte em algumas horas.
Forma furiosa – Essa é a clássica “síndrome do cachorro louco”, na qual o
animal se torna irracional e agressivo. A expressão facial é de alerta e de ansiedade,
com as pupilas dilatadas; um ruído leva ao ataque. Tais animais perdem toda a
cautela e o medo dos inimigos naturais. Não há evidências de paralisia durante o
estágio excitatório. Os cães raramente vivem > 10 dias após o início dos sinais. Os
cães com essa forma de raiva perambulam freqüentemente por ruas e estradas,
mordendo outros animais, pessoas e qualquer objeto que se mova. Eles engolem
Raiva 751

comumente objetos estranhos, por exemplo fezes, palha, gravetos e pedras. Os


cães raivosos mastigam o arame e a estrutura de suas gaiolas, quebram seus
dentes e seguem a mão que se movimenta em frente da gaiola, tentando mordê-la.
Os filhotes de cães aparentemente procuram a companhia humana e ficam
excessivamente brincalhões, mas mordem mesmo quando acariciados, geralmente
se tornando indóceis em algumas horas. À medida que a doença progride, tornam-
se comuns a incoordenação muscular e os ataques. A morte é o resultado de uma
paralisia progressiva.
Os gatos domésticos e os linces-vermelhos raivosos atacam repentinamente,
mordendo e arranhando de maneira indócil. As raposas raivosas invadem freqüen-
temente jardins ou mesmo casas, atacando cães e pessoas. A irracionalidade do
comportamento que pode ocorrer é demonstrada na raposa que ataca um porco-
espinho; achar uma raposa com espinhos de porco-espinho pode, na maioria dos
casos, sustentar um diagnóstico de raiva. As raposas e os gambás raivosos são
responsáveis por muitas perdas de bovinos no pasto, e também os atacam nos
estábulos.
O guaxinim raivoso se caracteriza por sua perda do medo do homem, sua
agressão freqüentemente, sua incoordenação e sua atividade durante o dia, sendo
um animal predominantemente noturno. Nas áreas urbanas, eles atacam freqüen-
temente os cães domésticos.
A raiva nos bovinos segue o mesmo padrão geral, e aqueles com a forma furiosa
ficam perigosos, atacando e perseguindo o homem e outros animais. Nos bovinos
leiteiros, a lactação cessa abruptamente. Ao contrário da expressão plácida normal,
ocorre uma expressão de alerta, Os olhos e as orelhas seguem os sons e os
movimentos. Um bramido característico é o sinal clínico mais típico nos bovinos. Esse
bramido pode continuar intermitentemente até um pouco antes da morte.
Os eqüinos e as mulas podem exibir uma agitação extrema evidenciada por um
rolamento, como no caso de uma cólica. Como nas outras espécies, eles podem
morder ou atacar indocilmente e, devido ao tamanho e à força, se tornar incontroláveis
em algumas horas. Tais animais sofrem freqüentemente ferimentos auto-infligidos.
Em geral, deve-se suspeitar de raiva nos animais silvestres terrestres que
estejam agindo anormalmente. O mesmo vale para os morcegos que são observa-
dos voando à luz do dia, descansando no chão, atacando pessoas e animais ou
lutando. Os morcegos insetívoros, embora pequenos, podem infligir um ferimento
com seus dentes e nunca se deve pegá-los ou manipulá-los com as mãos nuas.
Diagnóstico – O diagnóstico clínico é geralmente possível, mas pode ser
difícil; no estágio prodrômico, pode-se confundir facilmente a raiva com outras
doenças. Em todas as espécies de animais, a incapacidade para engolir a saliva
é sugestiva de uma obstrução na garganta, de um corpo estranho alojado entre
os dentes ou de ingestão de substâncias irritantes. Além do mais, muitos animais
normais lutam quando feridos, provocados ou pela posse de alimento ou de um
companheiro; os gatos, particularmente os machos, podem atacar subitamente
e sem provocação outros animais ou o homem. Todos esses padrões de
comportamento podem-se encontrar presentes no caso da raiva, mas também
podem não ter relação.
A técnica de coloração imunofluorescente no tecido cerebral fresco combina a
velocidade das técnicas histológicas com a maior sensibilidade do exame biológico.
O teste se baseia na observação visual direta de uma reação antígeno-anticorpo
específica. Os tecidos cerebrais examinados devem incluir o hipocampo, a medula
oblonga e o cerebelo (e devem-se preservá-los por meio de refrigeração com gelo
úmido ou bolsas de gelo). Quando apropriadamente utilizado, esse teste pode
estabelecer um diagnóstico altamente específico dentro de algumas horas, e tem-
se tornado o teste de escolha na maioria dos laboratórios. Embora utilizados por
Raiva 752

muitos laboratórios como um procedimento de auxílio, os resultados do teste de


inoculação em camundongos raramente discordam do teste de imunofluorescência.
Controle – Com base na redução ou na eliminação dos casos em carnívoros
domésticos e nos reservatórios silvestres apropriados, os programas de controle
funcionam melhor em uma base nacional ou regional. Os parâmetros abrangentes
para o controle nos cães foram preparados pela Organização Mundial da Saúde e
incluem: 1. a notificação dos casos suspeitos e a destruição dos cães com sinais
clínicos e dos cães mordidos por um animal suspeito de ser raivoso; 2. a redução
das taxas de contato entre cães suscetíveis através de leis de acorrentamento de
animais, controle de movimento de cães e quarentena; 3. a imunização em massa
dos cães através de campanhas e da continuação da vacinação dos cães jovens;
4. o controle dos cães vadios e a destruição dos cães não vacinados com baixos
níveis de dependência do, ou restrição pelo homem; e 5. o registro dos cães.
Muitas vacinas efetivas se encontram disponíveis por todo o mundo; nos EUA,
existem atualmente 19 vacinas aprovadas parta o uso nos cães pela “National
Association of State Public Health Veterinarians” (NASPHV), das quais 18 são
inativas. As vacinas de vírus vivo modificado (VVM) ainda se encontram em uso
disseminado para cães em muitas outras partes do mundo. A freqüência de
vacinação recomendada é de 1 a 3 anos (devem-se seguir as recomendações do
fabricante). Também se encontram disponíveis várias vacinas aprovadas pela
NASPHV para o uso nos gatos, e algumas para o uso nos eqüinos e nos animais
domésticos. Não se encontra disponível nenhuma vacina aprovada pela NASPHV
para o uso nos animais silvestres mantidos como animais de estimação e não se
demonstrou uma imunidade protetora nessas espécies a partir das vacinas comer-
cialmente disponíveis.
Até recentemente, o controle da raiva nas populações silvestres confiava na
destruição dos animas silvestres em uma tentativa de reduzir a taxa de contato entre
os animais suscetíveis. No entanto, isso se mostrou ineficaz e levou ao uso muito
disseminado (e efetivo) de vacinas de VVM orais distribuídas em iscas para controlar
a raiva das raposas na Europa. A doença se encontra hoje erradicada na Suíça.
Têm-se realizado pesquisas adicionais em uma tentativa de se aplicar esse método
para o controle da raiva nos animais silvestres na América do Norte, e para ajudar
no controle da raiva nos países em desenvolvimento.
Manejo de casos suspeitos de raiva (exposição dos animais de estimação) –
Torna-se importante averiguar se ocorreu a exposição à raiva. Deve-se presumir que
um animal doméstico tenha sido exposto se saliva ou a tecido nervoso de um animal
raivoso ou potencialmente raivoso puder ter tido contato direto com as membranas
mucosas ou com um rompimento na pele, mesmo que não se tenha testemunhado
uma mordedura verdadeira ou que o animal potencialmente infectante não se
encontre disponível para o teste. Quando se sabe que existe raiva nos morcegos ou
nos animais silvestres terrestres, deve-se considerar exposto a um animal raivoso
qualquer animal doméstico que seja mordido ou arranhado por um carnívoro ou
morcego silvestre que não se encontre disponível para o teste. A NASPHV recomen-
da que se destrua imediatamente qualquer cão ou gato não vacinado exposto à raiva.
Se o proprietário não estiver disposto a fazer isso, deve-se colocar o animal em um
isolamento rígido por 6 meses e vaciná-lo contra a raiva 1 mês antes da liberação.
Se a vacinação de um animal exposto estiver em dia, deve-se revaciná-lo imediata-
mente e confiná-lo para uma observação de 90 dias.
Exposição do homem – Quando uma pessoa se expõe a um animal suspeito
de ter raiva, devem-se avaliar cuidadosamente as circunstâncias. Isso deve incluir
a consideração da espécie de animal envolvida, do risco de raiva na área, se ocorreu
uma exposição suficiente para transmitir a raiva, e a situação atual do animal e sua
disponibilidade para um teste diagnóstico. Os carnívoros silvestres e os morcegos
Scrapie 753

apresentam um risco considerável onde a doença ocorre, e pode-se não encontrar


um comportamento anormal quando os animais estão raivosos. Se possível deve-
se testar qualquer carnívoro silvestre ou morcego suspeito de exposição de uma
pessoa à raiva. Em alguns países, considera-se raivosa qualquer espécie silvestre
na qual se saiba que ocorre raiva e que tenha sido exposta ao homem ou a um animal
doméstico até que se prove o contrário. Deve-se considerar da mesma forma a
exposição de pessoas à raiva a partir de seus próprios animais silvestres “de
estimação”. Deve-se confinar por 10 dias qualquer cão ou gato saudável, vacinado
contra a raiva ou não, que se expuser a uma pessoa; se o animal desenvolver
qualquer sinal de raiva durante esse período, deve-se sacrificá-lo humanitariamente
e enviar seu cérebro imediatamente para o diagnóstico de raiva. Se o cão ou gato
responsáveis pela exposição forem vadios ou abandonados, devem ser sacrificados
imediatamente e enviados para o diagnóstico de raiva.
Imunização humana – Recomenda -se enfaticamente que todas as pessoas em
grupos de alto risco da população, tais como os médicos veterinários, os oficiais de
controle de animais, os trabalhadores de laboratórios diagnósticos e de raiva e as
pessoas que estejam viajando para países nos quais a raiva canina seja endêmica,
recebam imunização pré-exposição. No entanto, não se pode confiar na profilaxia
pré-exposição no caso de uma exposição subseqüente à raiva, e deve-se suplementá-
la com um regime de imunização pós-exposição limitado.

“SCRAPIE”
(“Tremblante du mouton”, “Rida”)

É uma neuropatia degenerativa dos ovinos, constituindo o protótipo das infecções


de “vírus lentos”, que produzem encefalopatias espongiformes subagudas nos
animais e no homem. A encefalopatia transmissível ao visom (ETV), a doença da
emaciação crônica do veado-orelhudo e do veado-nobre cativos, a kuru, a doença de
Creutzfeldt-Jakob e a encefalopatia espongiforme bovina (EEB, ver pág. 696) se
definem pelas características clinicopatológicas nos seus hospedeiros naturais;
todas são transmissíveis a outras espécies, nas quais são virtualmente indistinguíveis.
Etiologia, transmissão e patogenia – Os neuropatógenos causadores têm
propriedades tão incomuns que são denominados “vírus não convencionais”.
Embora sejam virais ou subvirais quanto ao tamanho, a falta de identificação de
quaisquer ácidos nucléicos ou proteínas agente-específicos limita severamente o
progresso na sua caracterização e leva a especulações de que possam representar
novas formas de entidades “infecciosas” capazes de produzir morte celular e
degeneração tecidual.
A “scrapie” é transmitida naturalmente aos ovinos suscetíveis através do contato
com animais ou pastos infectados. Não há evidências claras de que seja transmitida
verticalmente no genoma ou por transferência de embriões, apesar da ocorrência
familial comum. Durante o primeiro ano após a exposição natural, presumivelmente
por via oral, o agente replica lentamente nos tecidos linforreticulares antes de se
alastrar para o SNC, ou pela semeadura hematogênica intermitente da barreira
hematocerebral ou pela passagem centrípeta ao longo das vias nervosas. Uma vez
no SNC, o agente da “scrapie” se replica. A degeneração dos neurônios-alvo após
os 2 anos de idade resulta no início dos sinais clínicos.
A suscetibilidade à infecção por exposição natural é controlada geneticamente.
Nos EUA, ela é quase exclusivamente uma doença dos ovinos de raça pura,
notavelmente os suffolks.
Scrapie 754

Achados clínicos – O início é insidioso. Os ovinos afetados ficam excitados e


podem-se observar tremores finos na cabeça e no pescoço. A característica mais
típica é o prurido intenso, que começa freqüentemente sobre a anca. Em alguns
casos, o prurido faz com que se torne difícil para o animal se alimentar e descansar
normalmente. Podem-se disparar os sinais nervosos por um ruído ou movimento
súbito a partir de um ovino quieto, porém afetado. A lã fica seca, separável e quebra-
diça, o que resulta na perda do velo em grandes áreas. Podem-se esfolar por
esfregadura outras áreas. Ocasionalmente, ocorrem convulsões. Ao se colocar o
ovino para trotar, ocorre freqüentemente uma hipermetria peculiar das pernas diantei-
ras, algumas vezes com movimentos de galope nas pernas traseiras. Após 2 a 6
meses de uma deterioração neurológica progressiva (caracterizada por emaciação,
fraqueza e ataxia), os ovinos afetados ficam totalmente debilitados e morrem logo.
Lesões – As lesões são microscópicas e se confinam ao SNC; elas incluem a
microvacuolização da substância cinzenta, a degeneração neuronal e a hipertrofia
astrocitária. Não ocorrem infiltrados celulares inflamatórios e não se demonstrou
nenhuma reação imune agente-específica. Os exames do material cerebral infecta-
do à procura de partículas semelhantes a vírus não têm obtido sucesso, mas têm-se
identificado fibrilas semelhantes a amilóides e acredita-se que sejam específicas.
Essas estruturas, denominadas fibrilas associadas a “scrapie” (FAS), são compos-
tas de uma sialoglicoproteína única (proteína priônica) que é codificada para e por um
gene do hospedeiro. Acredita-se que a regulação desse gene seja importante na
determinação da duração do período de incubação em camundongos experimental-
mente infectados, e que possa também ser importante na suscetibilidade dos ovinos.
Diagnóstico – O diagnóstico se baseia nos sinais clínicos, na história do rebanho
e no exame microscópico do SNC. Encontram-se em progresso estudos para
determinar se se pode utilizar o isolamento das FAS e a detecção da proteína
priônica através do método de análise da mácula ocidental para suplementar os
achados clinicopatológicos.
Epidemiologia e controle – Não há tratamento. Os ovinos, os caprinos, os
visons, as mulas, veados-orelhudos, os veados-nobres e os bovinos encontram-se
presentemente afetados, mas não se sabe quais são os hospedeiros incidentais e
quais são as fontes potenciais da infecção natural nas outras espécies. Os caprinos
parecem ser hospedeiros incidentais; as suas raras infecções se encontram
associadas com o contato com ovinos infectados com “scrapie” ou com a exposição
a pastos contaminados. Os veados-orelhudos e os veados-nobres cativos podem-
se infectar apenas após terem sido alojados em instalações anteriormente utilizadas
para ovinos. Os visons são os hospedeiros finais, os quais acreditava-se original-
mente que ficassem expostos somente quando tecidos de ovinos infectados com
“scrapie” eram a alimentação para os visons criados em fazenda. Entretanto,
estudos epidemiológicos recentes de EMV sugerem que os bovinos também
possam ser uma fonte de infecção. Outros estudos sobre a EEB no Reino Unido
indicam que um novo surto explosivo pode ter resultado do fornecimento de
suplementos proteicos ao gado leiteiro.
Uma das principais preocupações das infecções que afetam tanto o homem
como outros animais consiste no fato de serem ou não zoonoses; por exemplo, não
há evidências de que a ocorrência da doença de Creutzfeldt-Jakob seja influenciada
pelo contato com qualquer espécie animal.
Após a primeira aparição nos EUA (em 1947), estabeleceu-se o Programa de
Erradicação da “Scrapie”. Isso envolveu a identificação dos animais afetados e a
destruição de todos os ovinos no rebanho, bem como em outros rebanhos expostos.
Esse procedimento foi modificado em 1983 para destituir principalmente os animais
de laços familiares, devido à forte ocorrência familial da doença.
Encefalomielite Bovina Esporádica 755

ENCEFALOMIELITE BOVINA ESPORÁDICA


(Encefalomielite clamidiana)

Têm ocorrido surtos de EBE em várias partes do mundo. As descrições indicam


que as clamídias também podem causar infecções no cérebro do homem, dos
gambás, dos cães e de várias espécies aviárias.
Etiologia e epidemiologia – A EBE é causada pelas cepas do imunotipo 2 da
Chlamydia psittaci. Os isolados de C. psittaci a partir dos bovinos e dos ovinos
recaem em 5 imunotipos. Também se têm isolado as cepas do imunotipo 2 a partir
de cordeiros e bezerros com poliartrite (ver pág. 565), conjuntivite (ver pág. 354) e
infecções intestinais por clamídias (ver pág. 164).
As infecções intestinais subclínicas nos bovinos, bem como nos outros animais,
são provavelmente muito mais comuns do que o descrito, e podem ser a fonte de
infecção no caso da encefalomielite clamidiana. Nos casos esporádicos, não se
sabe por que as clamídias deixam uma relação parasita-hospedeiro equilibrada no
intestino, penetram na barreira intestinal, estabelecem uma fase infecciosa no
sangue e infectam o cérebro como o órgão-alvo.
A doença é mais freqüentemente observada em bovinos de 3 meses a 3 anos de
idade. As taxas de morbidade são geralmente baixas, mas podem alcançar 50%;
muitos dos bezerros geralmente morrem se não forem tratados em um estágio
precoce.
Achados clínicos e lesões – O período de incubação nos bezerros experimen-
talmente infectados é de 6 a 30 dias. O primeiro sinal nos casos naturais e
experimentais é febre (40 a 42°C). A temperatura permanece elevada até imedia-
tamente antes da morte ou da recuperação. O apetite permanece bom pelos
primeiros 2 a 3 dias apesar da febre. Posteriormente, ocorrem depressão, salivação
em excesso, diarréia, anorexia e perda de peso. Os bezerros ficam incoordenados
e cambaleiam ou caem sobre objetos. Não se observam pendência da cabeça e
cegueira. No estágio terminal, os bezerros assumem freqüentemente o decúbito e
podem desenvolver opistótono. O curso da doença geralmente é de 10 a 14 dias.
As lesões não se limitam ao cérebro; pode-se observar dano vascular em muitos
órgãos diferentes. A peritonite serofibrinosa, a pleurite e a pericardite tornam-se
comuns, e são especialmente acentuadas nos casos mais crônicos. As lesões
microscópicas no cérebro consistem de bainhas perivascularers e focos inflamató-
rios no parênquima, compostos primariamente de células mononucleares.
Diagnóstico – Pode-se basear um diagnóstico por tentativa nos sinais clínicos
e particularmente na presença de uma peritonite serofibrinosa na ausência de
causas de peritonite, tais como vólvulo intestinal, intussuscepções, perfurações
traumáticas do retículo, úlceras abomasais perfuradas ou deslocamento de órgãos.
O diagnóstico diferencial também inclui a raiva, a rinotraqueíte/encefalite bovina
infecciosa, a listeriose, a encefalomacia tromboembólica, a polioencefalomielite, a
pseudo-raiva e a febre catarral maligna. O diagnóstico da EEB se confirma por
isolamento do microrganismo a partir do tecido cerebral ou em embriões de galinha
em desenvolvimento ou em culturas de células alterações histológicas nos cortes
cerebrais ou por avaliação das lâminas de impressão tecidual coradas com Giemsa
ou com material imunofluorescente.
Tratamento – Os antibióticos de escolha são as tetraciclinas, as oxitetraciclinas
e a tilosina. Para o tratamento ser efetivo, devem-se administrá-las tão cedo quanto
possível no início da doença, em altas doses (por exemplo, as oxitetraciclinas a 20
a 50mg/kg por dia) e por ≥ 1 semana. Se o tratamento for efetivo, a febre deve cair
significativamente dentro de 24h. Não se encontram vacinas disponíveis.
Paralisia por Carrapato 756

PARALISIA POR CARRAPATO


É uma tetraplegia flácida, simétrica, ascendente, afebril e induzida por toxinas,
com o impedimento funcional dos reflexos dos tendões superficiais e profundos dos
membros e do abdome. Essa síndrome difere tanto clínica quanto etiologicamente
de todas as encefalites virais e de outras doenças originárias dos carrapatos. A
variação de hospedeiros depende principalmente da preferência de vertebrado da
espécie de carrapato envolvida. Dessa forma, podem-se afetar o homem (especial-
mente as crianças) e uma larga variedade de mamíferos, bem como aves e
marsupiais. Os cães são afetados mais comumente, mas podem ocorrer perdas nos
gatos, nos cordeiros, nos bezerros, nos caprinos e nos potros. O rápido transporte
moderno pode ser responsável pelo alastramento da paralisia por carrapato para
outras regiões não necessariamente limitadas à localização da espécie de carrapato
em particular.
Embora a doença tenha uma distribuição quase mundial, algumas espécies de
carrapato responsáveis possuem um destaque particular em determinadas regiões.
No caso da medicina humana, essas espécies incluem, na Austrália, a Ixodes
holocyclus, e na América do Norte, a Dermacentor andersoni e a D. variabilis . As
mesmas espécies também são de interesse particular na medicina veterinária, bem
como I. rubicundus (paralisia por carrapato do Karoo) na África do Sul, a Rhipicephalus
evertsi evertsi e a Argas (Persicargas) walkerae na África subsaariana e, provavel-
mente, a A. (Persicargas) radiatus na América do Norte.
Etiologia, epidemiologia e patogenia – Demonstrou-se, descreveu-se ou
suspeitou-se do potencial de indução da paralisia em 54 espécies de carrapatos
pertencentes a 7 gêneros ixodídeos e 3 gêneros argasídeos. Geralmente se
pressupõe que a substância responsável pela paralisia pelo carrapato seja uma
neurotoxina. Várias hipóteses quanto à natureza da toxina descreverem-na ou como
um produto do próprio carrapato ou como um metabólito tóxico resultante da
interação da saliva do carrapato com o tecido do hospedeiro, ou ainda como um
produto de um microrganismo microbiano ou simbionte.
A intoxicação se associa principalmente com carrapatos ixodídeos fêmeas e se
limita, pelo menos no caso da R. evertsi evertsi a uma breve fase de sucção de umas
poucas horas entre o quarto e quinto dias de infestação. A intoxicação pelos
carrapatos fêmeas se inicia, ou pelo menos se ativa parcialmente, através da cópula
e da transferência de sucesso dos espermatóforos. Na maioria dos carrapatos
argasídeos, no entanto, as larvas são o estágio causador.
Os parâmetros do hospedeiro que influenciam a epidemiologia incluem a
sensibilidade à toxina, a idade, a imunidade, o comportamento, a reatividade e a
densidade populacional. Pode-se reforçar a imunidade antitóxica, que começa pelo
menos 2 semanas após a exposição primária ao carrapato e dura algumas
semanas, através de infestações posteriores. Os fatores do carrapato incluem a
dinâmica e a virulência da capacidade de indução de paralisia, a atividade sexual,
a taxa de infestação e a fase de sucção. A incidência máxima de paralisia por
carrapato se associa sempre com a atividade sazonal dos carrapatos fêmea, e
ocorre principalmente na primavera e no início do verão.
A paralisia por carrapato é uma polineuropatia motora, e o envolvimento das vias
aferentes é limitado, embora os estudos recentes sugiram que também se afetem
as vias sensoriais e autônomas. A neurotoxina circula no animal hospedeiro e
interfere na liberação de acetilcolina na junção neuromuscular. A deterioração
funcional durante a paralisia também afeta as fibras nervosas eferentes que servem
os músculos respiratórios; como resultado, os níveis de dióxido de carbono se
elevam e a pressão parcial de oxigênio e o pH sangüíneo caem. A acidose
respiratória prejudica os órgãos que influenciam as funções hemodinâmicas.
Paralisia por Carrapato 757

Achados clínicos – O período de incubação, que depende da duração da


alimentação do carrapato, é geralmente de 5 a 7 dias. A paralisia do membro
posterior se caracteriza inicialmente por uma incoordenação ligeira a acentuada e
fraqueza. Esses sinais se intensificam e se estendem dentro de algumas horas; o
animal fica incapaz de mover as pernas dianteiras ou traseiras, ou de ficar em pé ou
sentar. Geralmente se preserva a sensação. Também ocorre nistagmo e dificulda-
des na respiração, na mastigação e na deglutição. Pode ocorrer morte em várias
horas por paralisia respiratória. A temperatura fica normal; os valores sangüíneos
e humorais ficam inalterados. Têm-se documentado uma insuficiência ventilatória
aguda, uma congestão pulmonar, uma hipoxemia moderada e uma acidose não
respiratória suave nos últimos estágios da paralisia por carrapato. Também se têm
descrito níveis séricos elevados de CPK na paralisia por carrapato canina, causada
pela D. andersoni e pela I. holocyclus. Os níveis de fosfato se elevam confirmada-
mente nos últimos estágios da paralisia causada pela I. holocyclus. Não ocorrem
lesões morfologicamente manifestadas. Os estudos eletrofisiológicos revelam uma
diminuição das velocidades máximas de condução nervosa motora; uma diminuição
nos potenciais de ação composta nervosa, bem como nos potenciais compostos dos
músculos correspondentes; e uma deterioração da propagação de impulsos das
fibras aferentes e a potencialização simultaneamente exigida dos potenciais corren-
tes estimulatórios necessários para disparar uma resposta. O encefalograma fica
normal. A paralisia atinge o máximo dentro de algumas horas; a recuperação é
rápida 1 a 3 dias), e completa caso se removam os carrapatos em tempo.
Destacaram-se vários estágios da doença nos cães com paralisia por carrapato
causada pela I. holocyclus : 1. fraqueza; 2. incapacidade de andar; 3. incapacidade
para se endireitar; 4. incapacidade para se endireitar e perda dos reflexos de
retirada; e 5. estado moribundo, com morte ocorrendo dentro de 2h.
Diagnóstico – O diagnóstico se baseia na presença dos carrapatos, no apare-
cimento súbito de paralisia, no curso rápido e na rápida recuperação clínica após a
remoção do carrapato. Como regra, e ao contrário das outras doenças do sistema
nervoso periférico originárias dos carrapatos, a temperatura fica normal e os valores
sangüíneos e de fluido não se alteram. Não se encontram disponíveis técnicas
diagnósticas laboratoriais específicas.
O diagnóstico diferencial inclui o botulismo e a polirradiculoneurite (nos cães, ver
pág. 713).
Tratamento e controle – O tratamento da paralisia por carrapato se limita à
remoção em tempo de carrapatos presos à pele, tanto manualmente como utilizan-
do-se um banho de imersão ou um banho com produto acaricida adequado.
Encontra-se disponível um soro imune terapeuticamente efetivo apenas para a
paralisia pela I. holocyclus. O prognóstico para essa forma de paralisia por carrapato
é duvidoso mesmo com a remoção do carrapato, com o tratamento acaricida e com
o soro hiperimune. O tratamento é de suporte.
O controle profilático biológico ou químico (ou ambos) dos carrapatos e a adesão
a determinadas práticas de criação podem reduzir enormemente o risco de paralisia.
Pode-se também considerar a imunização ativa através da injeção de extratos
brutos ou purificados das glândulas salivares da I. holocyclus.
INFLUÊNCIAS FÍSICAS
FRIO ............................................................................................................... 759
Hipotermia ................................................................................................ 759
Ulceração pelo Frio .................................................................................. 760
CHOQUE ELÉTRICO .................................................................................... 760
Atingimento por Raio e Eletrocussão ....................................................... 760
Voltagem Livre no Abrigo Animal ............................................................. 761
CALOR .......................................................................................................... 763
Queimaduras ........................................................................................... 763
Hipertermia ............................................................................................... 764
DOENÇA DAS ALTAS MONTANHAS .......................................................... 765
ENFERMIDADE DO TRANSPORTE ............................................................. 767
TRAUMATISMO, PQ AN ............................................................................... 767
Afogamento .............................................................................................. 768
Choque Elétrico ....................................................................................... 769
Traumatismo Torácico ............................................................................. 769
Ferimentos ............................................................................................... 771

FRIO
HIPOTERMIA
É uma grande queda na temperatura corporal que resulta de uma exposição a um
frio extremo, a um efeito de drogas ou a uma falha dos mecanismos de regulação
da temperatura interna. Nos endotérmicos, a hipotermia pode ser classificada como
leve, moderada ou intensa quando a temperatura corporal for de 30 a 32°C, 22 a
25°C ou 0 a 8°C, respectivamente. O prognóstico varia de acordo com o caso.
A hipotermia nos neonatos (especialmente nos leitões e nos cordeiros) é uma
causa importante de morte. A suscetibilidade é maior durante as suas primeiras 48h.
As correntes de ar e lâmpadas infravermelhas falhas ou malposicionadas são as
causas principais nos leitões; um tempo inclemente e o pelame úmido do nascimen-
to são as causas principais nos cordeiros. Os leitões com frio podem se aglomerar
próximos à porca, o que aumenta o risco de morte por esmagamento. O tremor, a
redução da capacidade e do instinto de mamar, e a queima de calorias para a
manutenção do calor em vez do crescimento e da energia levam à morte por meio
da síndrome de hipotermia/inanição.
O reaquecimento e a manutenção da temperatura corporal normal podem ser
obtidos externa ou internamente. No aquecimento externo ou superficial, aquece-
se a superfície corporal por meio de uma imersão em água morna, cobertores, um
quarto quente, bolsas de água quente, etc. Pode-se evitar o choque durante o
reaquecimento através de um aquecimento lento, se possível. Nos casos mais
críticos, quando o reaquecimento rápido é importante, uma diálise peritoneal com
o dialisado pré-aquecido em 50 a 55°C proporciona um método excelente de aque-
cimento interno ou central. Os neonatos exigem não somente um aquecimento
como também uma atenção cuidadosa às necessidades nutricionais.
Frio 760

ULCERAÇÃO PELO FRIO


É a destruição dos tecidos superficias como resultado de uma exposição ao frio
com distúrbios estruturais e funcionais secundários dos vasos sangüíneos superfi-
ciais menores. A ulceração pelo frio não é incomum nos animais jovens, especial-
mente nos bezerros e potros fracamente nutridos expostos a tempestades e a um
frio extremo (ver também pág. 600). Os suínos paridos no frio extremo podem sofrer
ulcerações pelo frio nas partes expostas, especialmente nas orelhas e na cauda.
Algumas vezes, afetam-se as cristas das galinhas (ver também HIPOTERMIA, ante-
riormente.)
O congelamento ligeiro faz com que a pele fique pálida e sem sangue. Isto é logo
acompanhado por uma vermelhidão intensa, calor, dor e inchaço. Em tais casos, os
pêlos podem cair e a epiderme pode se descascar. Geralmente, a inflamação se
suaviza, o inchaço desaparece e somente permanece um aumento da sensibilidade
ao frio; a irritação e a coceira podem continuar por algum tempo.
Se o congelamento for mais severo, a parte afetada fica inchada e dolorida,
permanece fria e mais tarde começa a enrugar. Nos casos severos, pedaços de pele
se desvitalizam e forma-se uma linha de demarcação entre as partes afetadas e
normais. Finalmente, a porção destruída se destaca e deixa uma superfície
esfolada.
As lesões pequenas e simples podem ser tratadas com anti-sépticos suaves e
uma cobertura completa com uma pomada cicatrizante. A ulceração pelo frio
simples é tratada por meio de um aquecimento rápido da parte afetada com um
banho ou uma compressa mornos (40,5 a 42°C) por 15 a 20min, e por meio da
aplicação de um curativo anti-séptico. À medida que a sensibilidade retornar, deve-
se evitar o autotraumatismo. O congelamento severo pode ser tratado conserva-
tivamente até que apareça uma linha de demarcação. Deve-se então remover
cirurgicamente a porção necrótica do tecido severamente afetado e tratar o defeito
como um ferimento aberto.

CHOQUE ELÉTRICO
ATINGIMENTO POR RAIO E ELETROCUSSÃO
A lesão ou a morte de um animal devidas a correntes elétricas de alta voltagem
podem resultar de um raio, de fios de transmissão caídos, de circuitos elétricos
falhos ou da mastigação de um fio elétrico (ver também CHOQUE E LÉTRICO, PQ AN,
pág. 769). O atingimento por raio é sazonal e tende a ser geograficamente restrito.
Determinados tipos de árvores, especialmente as altas e com sistemas de raízes
que se espalham bem por debaixo da superfície do solo, tendem a ser mais fre-
qüentemente atingidos por um raio que outros. A eletrificação de tais raízes carrega
uma área superficial larga, particularmente quando o solo já se encontra úmido; a
passagem de raízes carregadas por baixo de uma poça de água rasa faz com que
ela se eletrifique. Uma tubulação de cerâmica pode espalhar uma carga elétrica
sobre um campo inteiro. Os fios de transmissão caídos também podem eletrificar
uma poça de água. Existem diferenças na condutividade do solo; a argila, a areia,
o barro, o mármore e o giz (em ordem decrescente) são bons condutores, enquanto
que o solo rochoso não o é.
A eletrocussão acidental dos animais de fazenda geralmente ocorre como
resultado de uma fiação falha. A eletrificação de uma tubulação de água ou de leite,
ou de uma guarnição metálica ou de uma grade de proteção pode resultar em uma
Choque Elétrico 761

distribuição disseminada de uma corrente elétrica por todo o estábulo (ver também
VOLTAGEM LIVRE NO ABRIGO ANIMAL, adiante).
A morte por choque elétrico geralmente resulta de uma parada cardíaca ou
respiratória; a passagem de uma corrente através do coração geralmente produz
uma fibrilação ventricular; o envolvimento do SNC pode afetar os centros respirató-
rios ou outros centros vitais.
Achados clínicos – Podem ocorrer vários graus de choque elétrico. Na maioria
dos casos de atingimento por raio, a morte é instantânea e o animal cai sem esforço.
Ocasionalmente, o animal fica inconsciente, mas pode se recuperar em alguns
minutos a várias horas; os sinais nervosos residuais, por exemplo, a depressão, a
paraplegia e a hiperestesia cutânea podem persistir por dias ou semanas, ou ficar
permanentes. Ocorrem marcas de chamuscamento na carcaça, danos no ambiente
imediato, ou ambos, em , 90% dos casos de atingimento por raio, mas são menos
prováveis de serem encontrados se o animal for eletrocutado por fica em pé sobre
o solo eletrificado. As marcas de chamuscamento tendem a ser lineares e são mais
comumente encontradas nos lados mediais das pernas, embora raramente possa-
se afetar uma boa parte do corpo. Por baixo das marcas de chamuscamento, é
comum uma congestão capilar; o padrão ramificado característico do atingimento por
raio pode ser visualizado melhor no lado dérmico da pele através de extravasamentos
subcutâneos de sangue. As marcas de chamuscamento são difíceis de se encontrar
nos animais recuperados. Os animais menores, tais como os suínos, que entram em
contato com tigelas de água ou guarnições eletrificadas podem ser mortos instanta-
neamente ou ser atirados contra o cercado com a força do choque.
Diagnóstico – A história de uma tempestade recente pode confundir; o achado
de um animal morto ou lesado sob uma árvore ou próximo a uma cerca só é
significativo se se encontrarem evidências de uma queimadura de tronco recente,
de uma divisão de postes da cerca, de uma solda do arame, etc. O rigor mortis se
desenvolve e passa rapidamente. A distensão post mortem do rúmen ocorre
rapidamente e deve ser diferenciada de um timpanismo em ruminantes ante mortem
(ver pág. 195); em ambas as situações, o sangue tende a se coagular lentamente
ou a não se coagular em absoluto. As mucosas do trato respiratório superior
(incluindo os turbinados e os seios) ficam congestas e hemorrágicas; as hemorra-
gias traqueais lineares são comuns, mas os pulmões não ficam comprimidos como
no caso do timpanismo. Todas as outras vísceras ficam congestas e podem-se
encontrar petéquias e equimoses em muitos órgãos. Devido à distensão ruminal
post mortem, o sangue fracamente coagulado se move passivamente para a
periferia do corpo, resultando em um extravasamento post mortem de sangue nos
músculos e nos linfonodos superficiais da cabeça, do pescoço e dos membros
torácicos e, em uma menor extensão, nos quartos traseiros. Provavelmente, a
melhor indicação da morte instantânea é a presença de feno ou de outro alimento
na boca do animal; as evidências de suporte incluem a presença de uma ingesta
normal (especialmente no rúmen), uma falta de ingesta espumosa (timpanismo
espumoso), uma ausência de uma distensão da vesícula biliar e uma presença de
fezes normais no trato inferior e ocasionalmente no solo por trás do animal.
Ocasionalmente ocorrem fraturas ósseas.
Tratamento – Os animais que sobreviverem podem exigir uma terapia de
suporte e sintomática.

VOLTAGEM LIVRE NO ABRIGO ANIMAL


O termo “voltagem livre” se refere a pequenas correntes elétricas que fluem
através de um estábulo; quando possuem uma voltagem suficiente, podem
passar através do corpo de um animal e afetar adversamente o seu comportamento.
Choque Elétrico 762

A resistência elétrica da vaca é geralmente menor do que a do homem; conseqüen-


temente, ela pode ser afetada por voltagens demasiadamente baixas para serem
percebidas pelo proprietário. O trajeto da boca para os cascos é o mais sensível.
Geralmente acredita-se que o limiar de modificação comportamental para as vacas
seja de 0,5 a 1V de corrente alternada (CA); os níveis maiores produzem alterações
correspondentemente maiores. No caso de uma CA de 2V, pode-se esperar que
90% das vacas respondam. A exposição intermitente parece ser mais perturbadora
que a exposição contínua. Mesmo quando se excede o limiar, nem todos os animais
respondem todo o tempo, nem com os mesmos sinais, mas à medida que a voltagem
aumenta, os sinais no rebanho ficam mais disseminados e uniformes.
Uma quantidade crescente de evidências sugere que não exista nenhum
relacionamento entre as respostas comportamentais à voltagem livre e as respostas
fisiológicas ou hormonais. Não existe nenhum relacionamento aparente entre as
modificações comportamentais e a produção leiteira.
Os problemas de voltagem livre também podem afetar os bovinos de corte, os
suínos e as aves domésticas, embora menos freqüentemente, devido à demanda
elétrica nessas operações ser menor.
Achados clínicos – Nenhum sinal é patognomônico: uma larga variedade de
sinais foi descrita nas vacas expostas a níveis diferentes de voltagem livre. Os sinais
documentados incluem alterações comportamentais, uma redução do consumo de
água diário e uma redução do tempo por bebida. Não se afeta a quantidade de água
consumida. Períodos intermitentes de mau desempenho, má descida do leite ou
ejeção de leite incompleta ou desigual, comportamento anormal durante a ordenha,
aumento do tempo de ordenha, recusa de alimento ou água, elevação da contagem
de células somáticas no leite e aumento de uma mastite constituem sinais freqüen-
temente atribuídos à voltagem livre que também podem ser causados por outros
fatores, tais como uma manipulação abusiva da vaca, uma máquina de ordenha
falha, más técnicas de ordenha e higiene, e deficiências nutricionais. Portanto, deve-
se empreender uma investigação completa antes de se culpar a voltagem livre como
única causa.
Os sinais nos suínos são semelhantes, embora os suínos sejam 2,5 vezes mais
resistentes à voltagem livre que as vacas leiteiras. As porcas apresentam um
comportamento agressivo, uma redução do apetite, uma redução do consumo de
água e uma ordenha desigual (aumento de morte por inanição em leitegadas). Uma
anorexia pós-parto com um pouco de constipação constitui uma queixa importante.
O problema nas aves domésticas não se encontra bem definido, mas descreveu-
se uma taxa de mortalidade significativa nos peruzinhos.
Diagnóstico – Para confirmação, deve-se medir um potencial de ≥ 1V de CA
entre 2 pontos com os quais uma vaca pode ter contato, e algumas vacas devem
exibir sinais de exposição. Os níveis de voltagem podem precisar ser monitorados
em momentos diferentes do dia e em dias diferentes, já que se pode exceder
intermitentemente o nível do limiar. Quando se suspeitar de uma exposição durante
a ordenha, devem-se fazer medições com todo o equipamento elétrico ligado (tanto
110 como 220V). Embora se acredite que os níveis de exposição entre 0,5 e 1V de
CA não sejam prejudiciais, devem-se monitorar as fazendas nas quais se detecta-
ram esses níveis para assegurar que não ocorram níveis superiores intermitente-
mente. Como a utilização elétrica à noite é maior do que pela manhã, a voltagem livre
pode se constituir em mais um problema durante as ordenhas noturnas.
Pode-se medir a voltagem livre ponto a ponto ou ponto a terra. O ponto a ponto
se refere a medições feitas entre 2 pontos de contato nos quais a vaca pode tocar
simultaneamente. As medições de ponto a terra utilizam como ponto de medição um
bastão revestido de cobre (1,3m) enterrado no solo a ≥ 8,5m a partir de quaisquer
aterramentos ou equipamentos elétricos, e uma vaca no outro ponto de contato.
Calor 763

Ambos os métodos são utilizados satisfatoriamente. Longos fios condutores medi-


dores isolados (2 a 3m) facilitam a coleta de medições na fazenda. O voltímetro deve
possuir uma escala de leitura completa de 2 a 5V em aumentos de 0,1V. É
aconselhável que um eletricista qualificado avalie a situação e desenvolva uma ação
corretiva. Se se detectar ≥ 1V, deve-se determinar a fonte: um eletricista pode fazer
isso medindo a voltagem entre um bastão de aterramento isolado que representa a
terra verdadeira e um fio de aço na terra na entrada de serviço do estábulo sob
cargas diferentes.
Como um problema de fazenda, ela necessita de uma correção imediata para a
segurança das pessoas e dos animais de criação. Se a voltagem variar > 0,5V na
ausência de qualquer carga da fazenda ou atingir 1V com as cargas típicas da
fazenda incluídas, o problema é externo à fazenda, e se deve contatar o fornecedor
de energia local quanto às possíveis soluções.
Prevenção e controle – A maioria das fontes de voltagem livre na fazenda se
deve a sistemas de fiação que não preenchem os padrões normais. As deficiências
podem incluir falhas de aterramento reais (curtos-circuitos), fiação de tamanho
inferior, conexões frouxas ou corroídas, ou fiação danificada por animais, acidentes
ou umidade. Um eletricista deve examinar o sistema e reparar quaisquer defeitos.
A eliminação das fontes na fazenda e fora dela criadas por um serviço de 240V não
falho geralmente é de responsabilidade da companhia fornecedora.
A resposta das vacas varia quando se elimina a voltagem livre, dependendo da
duração, da magnitude e da consistência da exposição. Quando a exposição for
baixa (< 2,5V), a recuperação do comportamento anormal pode ser quase imediata;
quando a exposição for a voltagens mais altas, o comportamento pode não se alterar
até que as vacas deixem o rebanho de ordenha e entrem em um período seco.
Quando a exposição se dá através da alimentação ou da bebida, a resposta é
geralmente imediata, mas a resposta refletida pela produção e os novos casos de
mastite são variáveis. O reservatório de mastite persistirá até que seja controlado
por meio de um programa de saúde do úbere.
Os sistemas elétricos devem seguir os padrões codificados em todos os
momentos. Sempre que não se puder atribuir sinais sugestivos a outras causas,
devem-se realizar medições para determinar se existe um potencial de voltagem, e
os resultados devem ser registrados para comparações futuras. Encontram-se
disponíveis monitores para uma supervisão contínua na fazenda.

CALOR
QUEIMADURAS
É a destruição do epitélio ou dos tecidos mais profundos por meio de calor direto,
de calor radiante, de chamas, de uma fricção, de eletricidade ou de produtos
químicos corrosivos.
Etiologia – As queimaduras térmicas resultam de uma escaldadura com líquidos
quentes, de um contato com objetos quentes ou de uma exposição a chamas ou
calor radiante. Os suínos, os cães (especialmente as raças “sem pêlos”) e os ovinos
tosquiados rentemente podem sofrer queimaduras de calor radiante (queimaduras
de sol). As queimaduras resultantes de uma fricção são mais freqüentemente
causadas por um esfregamento de cordas ásperas contra a pele durante a conten-
ção de grandes animais, ou por um arrastamento ou um esfregamento da pele ao
longo do calçamento nos pequenos animais atropelados por veículos a motor. Nos
Calor 764

grandes animais, as queimaduras elétricas são mais comumente causadas por um


atingimento por raio (ver pág. 760) em pastos abertos e menos freqüentemente
através do contato com fios elétricos soltos (tal como nos pequenos animais, ver
pág. 769). Nos pequenos animais, as queimaduras elétricas resultam mais freqüen-
temente de uma mastigação de um fio elétrico ou do uso de um secador de cabelos
defeituoso. Os produtos químicos corrosivos incluem os ácidos, os fenóis e as bases
fortes (ver também FOTOSSENSIBILIZAÇÃO, pág. 993).
Achados clínicos – As queimaduras nos animais não são estritamente compa-
ráveis com as que acontecem no homem. Podem ocorrer queimaduras de primeiro
grau com um avermelhamento da pele, mas a formação de vesículas e bolhas é
incomum, exceto nos suínos. A lesão normal de uma queimadura moderadamente
severa nos animais é um edema difuso da pele e dos tecidos subcutâneos, com ou
sem uma formação de pequenas vesículas e descolamentos. O chamuscamento de
um tecido ocorre nas queimaduras severas, e a pele pode ficar completamente
desvitalizada, com a lesão se estendendo até as estruturas mais profundas. Pode-
se seguir um descolamento da pele, deixando grandes áreas desnudas a partir das
quais uma exsudação ou um derrame constantes de soro podem levar a uma perda
considerável de proteínas e fluidos. As queimaduras de pequenas áreas do corpo
só causam desconforto; os animais com queimaduras mais severas ficam relutantes
a se mover, ressentem-se da manipulação e podem ficar indiferentes a estímulos
normais. As queimaduras extensas com uma perda considerável de plasma podem
resultar em um choque. As complicações posteriores incluem uma infecção, um
prejuízo das funções cardíaca e hepática, e uma pneumonite. O prognóstico
depende da área total da queimadura, da profundidade de penetração (espessura
parcial ou completa), da localização, da idade e da situação do animal.
Tratamento – Devem-se tratar o choque, a insuficiência renal, a anemia e os
distúrbios respiratórios conforme o necessário. Se as queimaduras forem severas
e envolverem mais de 50% do corpo, deve-se considerar uma eutanásia. As
queimaduras menos severas ou as que envolvem áreas menores podem ser
geralmente tratadas com sucesso. Inicialmente, a aplicação de compressas frias
pode reduzir a dor e o edema. Deve-se depilar a área queimada, já que a extensão
dos danos não pode ser facilmente visível através do pêlo, e o descolamento de
tecido necrótico pode não ocorrer por vários dias. A limpeza do ferimento é
imperativa para a remoção do tecido e dos restos em descolamento, e pode-se
realizá-la por meio de uma hidroterapia ou de uma lavagem local com solução salina
ou de iodo. A aplicação local de cremes antibacterianos (tais como a sulfadiazina
argêntea) deve se seguir ao procedimento de limpeza. Os curativos oclusivos e as
pomadas são contra-indicados, embora possam ser necessárias ataduras leves.
Raramente se exigem antibióticos sistêmicos.
Podem-se utilizar cremes de filtro solar para proteger os cães sem pêlos.

HIPERTERMIA
(Exaustão pelo calor, Cãibra pelo calor, Ataque de calor, Insolação)
É uma elevação na temperatura corporal até ou além do ponto de regulação
fisiológica, geralmente secundária a uma alta temperatura ambiental, uma alta
umidade e uma ventilação inadequada. A exposição aos raios diretos do sol pode
contribuir.
Todos os animais domésticos são suscetíveis à insolação. Os cães confinados
a alojamentos fechados em tempo quente, e os bovinos, eqüinos ou outros animais
de criação que estiverem sendo conduzidos em grande número ou transportados
em tempo quente são mais comumente afetados. Os fatores predisponentes
incluem o esforço físico, a obesidade e a estagnação do ar.
Doença das Altas Montanhas 765

A exaustão pelo calor ocorre em eqüinos de tração, bovinos e suínos. É incomum


nos cães. A exposição prolongada a altas temperaturas ambientais faz com que os
vasos sangüíneos periféricos se dilatem. Quando a dilatação ocorre sem uma ele-
vação compensatória no volume sangüíneo, pode-se seguir um colapso circulatório.
As cãibras pelo calor são mais comuns nos animais que realizam um trabalho
duro em calor intenso. Os animais com a capacidade de suar são mais comumente
afetados, por exemplo, os eqüinos de tração. As cãibras pelo calor são raras nos
cães, exceto nos que trabalham ou correm em um ambiente quente. A causa é um
desarranjo no equilíbrio eletrolítico (perda aguda de sais).
Os sinais importantes da exaustão pelo calor são a fraqueza, os tremores
musculares e o colapso. Também podem existir uma hiperpnéia e um pulso rápido.
A temperatura corporal não fica necessariamente elevada, e o início dos sinais não
é tão súbito quanto no caso da insolação. As cãibras pelo calor se caracterizam por
um espasmo muscular severo, com uma interrupção na sudorese nos eqüinos e nos
animais de trabalho, exceto nos cães.
Os sinais clínicos da insolação incluem uma hiperpnéia e um colapso. Não são
incomuns uma expressão de olhar fixo, o vômito e a diarréia. A mucosa oral pode
ficar vermelho-brilhante e a temperatura retal se eleva enormemente (até 43°C).
Podem ocorrer uma coagulação intravascular disseminada (ver pág. 28) e um
edema cerebral como fatores complicantes nos cães.
No caso da exaustão pelo calor, deve-se aplicar água fria no corpo e movimentar
o animal para uma área fresca e sombreada. Pode-se administrar EV uma solução
salina isotônica aos animais que sofrerem de cãibras pelo calor (ver também
VENTILAÇÃO, pág. 1339).
A insolação requer uma terapia imediata. Os animais respondem melhor a uma
imersão em água fria. Os enemas de água fria também são úteis. Deve-se conferir
a temperatura retal a cada 10min e interromper o tratamento à medida que a
temperatura voltar ao normal. Se se utilizar enemas de água fria, a temperatura retal
pode não se constituir em um indicador preciso.

DOENÇA DAS ALTAS MONTANHAS


(Doença da carne de peito, Cardiopatia hipertensiva pulmonar)

É uma doença não infecciosa dos bovinos caracterizada pelos sinais clínicos e
lesões da insuficiência cardíaca congestiva (CHF). Ela afeta as áreas de montanhas
altas do oeste dos EUA e da América do Sul (geralmente acima de 2.200m) e foi
relatada em determinadas outras áreas montanhosas do mundo. A síndrome
também pode ocorrer nos ovinos e veados sob estresse extremo. Uma doença
semelhante possui importância clínica nas galinhas nos Andes. A incidência nos
bovinos em risco é de 0,5 a 5%, mas geralmente é < 2%. A ocorrência depende da
altitude, mas não exclusivamente. Os bovinos recém-introduzidos tendem a ser
mais suscetíveis que os bovinos nativos. Nas áreas na América do Norte onde os
bovinos passam o verão e o outono pastando em altas altitudes e retornam a
elevações mais baixas no final do outono, a doença geralmente se manifesta após
estar em uma alta altitude por ≥ 2 meses. Nas áreas onde os bovinos vivem o ano
inteiro em altas altitudes, a incidência da doença é maior no inverno ou no início da
primavera, presumivelmente devido ao estresse do clima invernal. Ela afeta ambos
os sexos, todas as idades e provavelmente a maioria das raças – mas não
necessariamente de forma equivalente. É mais comum, por exemplo, nos bovinos
< 1 ano de idade e nos garrotes.
Doença das Altas Montanhas 766

Etiologia – A doença se relaciona com a hipoxia crônica de um ambiente de alta


altitude, que causa uma vasoconstrição pulmonar, e daí, uma hipertensão pulmonar
e finalmente, uma CHF. A necessidade de alguns outros fatores incitantes ou
causadores é com freqüência indicada circunstancialmente. Documentou-se a au-
sência da doença em pastos do tipo rente em determinadas áreas geográficas em
altitudes de até 3.400m, assim como a alta incidência em pastos vizinhos do tipo não
rente que possuem linhagens bovinas e procedimentos de manejo semelhantes.
Implicou-se uma alteração da atividade quimiorreceptora e do metabolismo miocár-
dico como possível fator contribuinte. Os estudos recentes sugerem que a alteração
fenotípica das células musculares lisas que acompanha as lesões hipóxicas ou
induzidas pela pressão induz uma deposição extracelular de elastina e colágeno na
vasculatura pulmonar, um fator contribuinte no desenvolvimento de uma insuficiência
cardíaca direita. Ocorre uma variação acentuada na suscetibilidade individual (osten-
sivamente herdável, pelo menos em parte). O trajeto varia através do qual a hiperten-
são pulmonar progride para uma CHF. Nos casos não complicados, ela parece se
relacionar com a suscetibilidade individual e os danos vasculares pulmonares perma-
nentes. Outros tipos de estresse, tais como pneumonia, envenenamento vegetal,
infecção com vermes pulmonares, clima abaixo de zero, lesões pulmonares crônicas
ou ruptura do diafragma se sobrepõem freqüentemente na circulação pulmonar já
parcialmente comprometida e podem obscurecer a etiologia.
O astrágalo (determinadas espécies dos gêneros Oxytropis e Astragalus),
quando consumido pelos bovinos (especialmente pelos bezerros) em elevações
altas, aumenta acentuadamente a prevalência e a severidade da CHF. A afecção se
desenvolve dentro de 1 a 2 semanas, e a incidência pode ser de até 100%, se se
permitir que os bovinos pastem o astrágalo por mais do que períodos curtos. A toxina
no astrágalo (o alcalóide indolizidínico swainsonina) é excretada no leite, conse-
qüentemente alimentando os bezerros, que desenvolvem uma CHF. Esses animais
apresentam os sinais e as lesões da doença das altas montanhas e as lesões do
envenenamento com o astrágalo. Essas observações sugerem que outros fatores
possam potencializar a incidência da doença das altas montanhas.
Achados clínicos – A doença em geral se desenvolve lentamente. Os períodos
de frio severo ou outro estresse ambiental parecem precipitar o início dos sinais.
Primeiro nota-se que os animais afetados ficam deprimidos. À medida que a
síndrome progride, pode-se desenvolver um edema subcutâneo na região do peito
e este se estender cranialmente até o espaço intermandibular e caudalmente até a
parede abdominal ventral. Ocasionalmente, o desequilíbrio hídrico e o edema
acentuados não se tornam evidentes; em vez disso, o animal emacia-se. Geralmen-
te se encontram presentes uma ascite bem como uma distensão e uma pulsação
acentuadas da veia jugular, e pode-se desenvolver uma diarréia fluida profusa. A
respiração fica forte, e os animais podem parecer cianóticos. Eles ficam relutantes
a se mover, podem ficar em decúbito e, no caso de um exercício forçado, podem
colapsar e morrer.
Lesões – Em geral se encontra presente um edema generalizado, particular-
mente no tecido subcutâneo ventral, na musculatura esquelética, nos tecidos
perirrenais, no mesentério e na parede do trato gastrointestinal. Encontram-se
presentes uma ascite, um hidrotórax e um hidropericárdio. As lesões hepáticas
(devidas a uma congestão passiva crônica) variam de uma aparência de “noz-
moscada” inicial até uma fibrose lobular severa. Os pulmões podem apresentar
graus variáveis de atelectasia, enfisema intersticial, edema e, em alguns casos,
pneumonia. Encontram-se presentes uma hipertrofia ventricular direita e uma
dilatação cardíaca acentuadas. O deslocamento do vértice cardíaco para a esquer-
da confere ao coração um contorno aumentado e arredondado. Ocasionalmente, as
artérias pulmonares contêm trombos. Microscopicamente, a hipertrofia da túnica
Traumatismo, Pq An 767

média das pequenas artérias e arteríolas no pulmão constitui um achado consisten-


te. Deve-se diferenciar essa doença de outras doenças que causam a CHF nos
bovinos, tais como a pericardite traumática, a pneumonia crônica, as anomalias
congênitas e as lesões miocárdicas primárias.
Tratamento e controle – Devem-se remover os animais afetados com um mínimo
de contenção, estresse e excitação para uma altitude mais baixa, onde alguns deles
se recuperarão espontaneamente. Deve-se administrar uma terapia de suporte geral,
incluindo antibióticos para combater a pneumonia. Podem-se remover grandes
quantidades de derrame por meio de uma paracentese. A terapia com digitálicos e
diuréticos tem sido benéfica. Nas altas altitudes, pode-se considerar o uso de oxigênio
para reduzir a pressão arterial pulmonar no caso de animais valiosos. Como essa
doença pode recidivar, não se devem retornar os animais recuperados às altas
altitudes, e como é provável uma suscetibilidade herdada, não se devem manter os
bovinos afetados para acasalamento. Os estudos a longo prazo sugerem fortemente
que a medição da pressão arterial pulmonar dos pais novos poderia constituir uma
ferramenta de manejo importante para reduzir a incidência dessa doença.

ENFERMIDADE DO TRANSPORTE
É uma afecção caracterizada por náuseas, manifestadas como uma salivação
excessiva e vômito, e outros sinais geralmente referíveis a uma estimulação do
sistema nervoso autônomo. É geralmente observada durante uma viagem por terra,
mar ou ar. Podem-se afetar o homem e muitos animais domésticos. O principal
mecanismo causador envolve a estimulação do aparelho vestibular no ouvido
interno, que possui conexões com o centro emético no tronco cerebral. O medo do
veículo pode constituir um fator contributivo nos cães e nos gatos (os sinais típicos
podem ser observados em um veículo estacionado).
Os sinais importantes são a salivação e o vômito. Os animais podem bocejar,
gemer e apresentar sinais de desconforto ou apreensão; os indivíduos severamente
afetados também podem ter diarréia. Os sinais geralmente desaparecem quando o
movimento veicular cessa.
A enfermidade do transporte às vezes pode ser superada através do condiciona-
mento do animal para viajar. Se não, têm-se utilizado algumas drogas ataráticas e
antináuseas nos cães, com bons resultados. Os anti-histamínicos (tais como o
cloridrato de difenidramina, o dimenidrinato e o cloridrato de prometazina) impedem
a enfermidade do transporte, proporcionam uma sedação e inibem o enjôo. Os
derivados fenotiazínicos de ação central (tais como a trietilperazina, a clorpromazina,
a proclorperazina e o maleato de acepromazina) possuem efeitos antieméticos, bem
como sedativos. Também se tem utilizado o fenobarbital para produzir um efeito
sedativo geral. A administração oral de uma dessas drogas várias horas antes da
partida deve reduzir ou eliminar os sinais da enfermidade do transporte (ver também
DROGAS QUE AFETAM AS FUNÇÕES GÁSTRICAS, pág. 1668).

TRAUMATISMO, PQ AN
Os automóveis, outros animais, objetos afiados, tiros, impactos abruptos ou
quedas podem causar traumatismos nos pequenos animais. As lesões induzidas
Traumatismo, Pq An 768

por trauma freqüentemente ameaçam a vida e exigem uma avaliação rápida.


Determina-se imediatamente os sinais vitais: freqüência cardíaca, pulso, cor da
membrana mucosa, tempo de repreenchimento capilar, freqüência e esforço
respiratórios, movimento dos membros e função nervosa motora e craniana (ver
EXAME CLÍNICO DO SISTEMA NERVOSO, pág. 687). Palpa-se o abdome quanto a
evidências de uma onda fluida e de uma bexiga urinária intacta. Os dados
laboratoriais iniciais devem incluir hematócrito, proteína total, ECG, faixas de teste
sangüíneo para uréia e glicose, e finalmente, radiografias das áreas afetadas.
Deve-se tratar primeiro o problema que mais ameaçar a vida. Deve-se interrom-
per uma hemorragia ativa com ataduras de pressão e cobrir imediatamente os
ferimentos torácicos abertos com ataduras estéreis e uma aspiração do ar pleural.
Devem-se tratar a dispnéia e o choque (ver pág. 1659) com oxigênio, fluidos e
esteróides, conforme o indicado. Freqüentemente, retardam-se os procedimentos
diagnósticos e terapêuticos tais como as radiografias e o tratamento de ferimentos
até que o animal se estabilize. Devem-se iniciar os procedimentos de monitoração
apropriados para uma detecção de complicações ou uma descompensação iniciais.
Avaliam-se comumente o hematócrito, a proteína total, a produção urinária, a
freqüência e o esforço respiratórios, a freqüência cardíaca, a pressão sangüínea, as
temperaturas central e periférica, a pressão venosa central, o ECG, a intensidade
do pulso e os exames neurológicos repetidos para este propósito.
As fraturas ocorrem comumente nos acidentes automobilísticos. O tratamento
óbvio é o cirúrgico; no entanto, indicam-se a limpeza dos ferimentos abertos e a
imobilização temporária, devendo-se retardar a redução e a fixação até que o animal
esteja estável.

AFOGAMENTO
As fatalidades resultam de eventos fisiopatológicos complexos que diferem de
acordo com a composição do líquido. A hipoxia é o achado mais consistente, sendo
mais severa quando se inala a água marinha. A terapia inicial envolve uniformemen-
te uma limpeza e uma sucção das vias aéreas, uma reposição criteriosa de fluido e
eletrólitos e um suporte do sistema cardiovascular.
A avaliação e o prognóstico se baseiam no exame físico, na análise gasosa
sangüínea arterial, radiografias e na resposta à terapia. As radiografias iniciais podem
se encontrar normais, e alterações só ser detectadas na análise gasosa sangüínea
arterial. As alterações radiográficas típicas incluem padrões alveolares ventrocaudais
com componentes intersticiais e brônquicos que progridem com o tempo.
O suporte mecânico de ventilação é freqüentemente necessário no “quase
afogamento” em águas frescas e marinhas. A pressão de ventilação positiva e/ou
a pressão expiratória final positiva intermitentes são com freqüência as modalidades
de escolha. A resposta à ventilação mecânica é determinada pelos gases sangüí-
neos. O uso profilático de antibióticos é controverso; alguns defendem seu uso
apenas quando infecção secundária tiver sido documentada.
O quase afogamento em água fresca resulta em grandes quantidades de líquido
hipotônico entrando nos pulmões e sendo rapidamente absorvidas na corrente
sangüínea. Ocorrem uma hipervolemia e uma hemodiluição que são associadas à
hemólise das hemácias. A fibrilação ventricular pode resultar da diluição dos
eletrólitos e da Hb, e de uma anoxia associada. O tratamento se orienta em direção
à ventilação e à oxigenação de suporte, estabilizando o sistema cardiovascular,
promovendo uma perfusão renal e uma eliminação dos fluidos excessivos, estabe-
lecendo um equilíbrio eletrolítico normal e impedindo uma pneumonia. As transfu-
sões de troca proporcionam um meio possível de restabelecimento do volume
sangüíneo normal e do equilíbrio eletrolítico. Pode-se realizar uma diálise peritoneal
para remover a água excessiva.
Traumatismo, Pq An 769

A água marinha é hipertônica. Ocorre uma difusão rápida de sais no sangue e a


água se move para o interior dos alvéolos pulmonares. Resultam uma hemo-
concentração acentuada, uma hipernatremia e um edema pulmonar. Exigem-se
oxigênio, fluido, ventilação e suporte cardiovascular. Pode-se exigir uma infusão de
colóide (por exemplo, plasma, dextranos e heptamido) para restabelecer o volume
circulante e aumentar a pressão oncótica plasmática.

CHOQUE ELÉTRICO
Ver também página 760. Nos cãezinhos e gatinhos, isso geralmente resulta da
mastigação de fios elétricos. A severidade do problema varia com a voltagem e o
trajeto da corrente através do corpo. Os sinais mais comuns são os danos teciduais
(queimaduras, necrose), as disritmias cardíacas e o edema pulmonar agudo. À
medida que a eletricidade atravessa a pele e a mucosa, a energia se converte em
calor; ocorre uma necrose de coagulação nos locais de entrada e saída, e dentro do
músculo estriado através do qual a eletricidade passa. Os ferimentos do palato, dos
lábios e da língua são freqüentes, e podem exigir um debridamento, uma antibiotico-
terapia e uma alimentação com sonda nasogástrica temporária para se desviar da
cavidade oral.
As disritmias cardíacas são secundárias a alterações eletrofisiológicas dentro do
coração, produzidas pela corrente elétrica. Pode ocorrer qualquer arritmia, porém
as mais comuns são a taquicardia ventricular, a fibrilação ventricular e os distúrbios
de condução atrioventriculares. O tratamento é sintomático, utilizando-se drogas
antiarrítmicas ou uma desfibrilação conforme o indicado. Indica-se uma administra-
ção de fluido cuidadosa para se evitar um colapso cardíaco.
O edema pulmonar, com a dispnéia e a cianose resultantes, constitui uma
seqüela comum nos pequenos animais. Geralmente, é severo, e o início se dá dentro
de 12h da lesão. O vazamento de fluido a partir dos capilares pulmonares destruí-
dos, a insuficiência cardíaca ou os mecanismos neurogênicos podem contribuir para
o edema. As anormalidades radiográficas envolvem caracteristicamente os campos
pulmonares dorsocaudais, que mostram um padrão intersticial e alveolar misto.
Exigem-se uma oxigenioterapia e uma administração de fluido criteriosa. A furose-
mida, os broncodilatadores e os corticosteróides podem ser benéficos no início do
curso do tratamento. Se o animal descompensar, pode se tornar necessária uma
ventilação mecânica. Se for necessário, podem-se utilizar baixas doses de oximorfona
(0,025 a 0,05mg/kg) ou de morfina para reduzir a ansiedade.
Apatia, coma, choque hipovolêmico, convulsões ou morte constituem complica-
ções possíveis. Pode ocorrer uma necrose focal nos nervos, no cordão espinhal e
no cérebro. A necrose tubular renal é possível no caso de uma insuficiência renal
aguda.

TRAUMATISMO TORÁCICO
O traumatismo no tórax pode levar a uma interferência que ameace a vida com
a oxigenação. Deve-se fazer o diagnóstico rapidamente e se instituir um tratamento
apropriado. Os diferenciais primários a se considerar são as lesões da parede
torácica (por exemplo, o tórax móvel), o pneumotórax, o hemotórax, as contusões
pulmonares e a hérnia diafragmática. O diagnóstico do traumatismo torácico se
baseia na história e no exame físico, incluindo uma auscultação, uma percussão e
uma palpação. Faz-se uma radiografia após a estabilização inicial.
O tratamento médico inclui oxigênio por meio de uma máscara facial ou de um
cateter nasal, fluidos e outras medicações apropriadas para o suporte e a estabili-
zação cardiopulmonares.
Traumatismo, Pq An 770

Limpam-se rapidamente e recobrem-se com uma atadura estéril os ferimentos


torácicos penetrantes. Evacua-se o ar pleural tão rapidamente quanto possível.
Diagnosticam-se as costelas fraturadas ou o tórax móvel por meio de uma observa-
ção e uma palpação. No caso do tórax móvel, observa-se um movimento paradoxal
da parede torácica em cada respiração; a parede torácica pode ser estabilizada
temporariamente através da colocação do animal em decúbito lateral com o lado
afetado para baixo. Exige-se uma fixação externa ou interna para um reparo
permanente.
O pneumotórax (uma seqüela comum de uma lesão da parede torácica, do
parênquima pulmonar ou das vias aéreas) pode ser aberto ou fechado com relação
ao ambiente. Um pneumotórax é classificado como simples quando a pressão
intrapleural for menor ou igual à pressão atmosférica. Quando um pedaço de tecido
ou um objeto estranho age como uma válvula de um sentido e permite o fluxo aéreo
no interior do espaço pleural na inspiração, mas impede o escape do ar na expiração,
ocorre um pneumotórax com tensão: a pressão intrapleural fica maior que a
atmosférica, o que causa um prejuízo do retorno venoso e uma hipoxia. Constitui
uma situação de ameaça à vida.
O pneumotórax é diagnosticado através da história, da observação, da palpação,
da auscultação e da percussão. A severidade dos sinais se relaciona diretamente
com a rapidez do início, a severidade dos danos e o tipo de pneumotórax.
Geralmente se encontram uma taquipnéia e uma ansiedade. Podem se encontrar
presentes membranas mucosas pálidas (com ou sem cianose) e uma respiração de
boca aberta. Um tórax em forma de barril com um movimento fraco da parede
torácica indica um pneumotórax com tensão. Na auscultação, os ruídos pulmonares
vesiculares se reduzem ou se encontram ausentes dorsalmente. Os ruídos pulmo-
nares ventrais se mantêm normais, e os ruídos cardíacos podem se manter normais
ou ficar abafados. A percussão de um pneumotórax revela uma hiper-ressonância,
e o tórax fica timpânico se se encontrar presente um pneumotórax com tensão.
O tratamento depende da severidade e do tipo de pneumotórax. Deve-se recobrir
todos os ferimentos penetrantes com uma atadura estéril. Se o pneumotórax for
suave e possuir sinais clínicos associados mínimos, um repouso em gaiola é
freqüentemente tudo o que é necessário. Se o pneumotórax for moderado a severo,
evacua-se o espaço pleural por meio de uma toracocentese ou de uma sonda
torácica. Um pneumotórax com tensão exige uma drenagem imediata e uma
equilibração das pressões intrapleural e atmosférica. Pode-se aliviar rapidamente
uma pressão intrapleural alta colocando-se uma agulha ou um cateter de grande
calibre (14 a 18) no espaço pleural. Exige-se a colocação de uma sonda torácica se
o pneumotórax for severo, se o ar se acumular rapidamente após uma toracocentese
ou se se encontrar presente um pneumotórax com tensão.
No caso do hemotórax , os ruídos pulmonares dorsais mantêm-se normais e os
ruídos pulmonares ventrais se reduzem ou ficam ausentes. Os ruídos cardíacos são
geralmente abafados. Na percussão, o tórax fica surdo ventralmente. O tratamento
se baseia na severidade dos sinais. Um hemotórax suave a moderado pode exigir
somente um repouso em gaiola; um hemotórax severo ou contínuo pode exigir uma
toracocentese, transfusões sangüíneas ou a colocação de uma sonda torácica.
Quando o sangramento for contínuo, exige-se uma exploração cirúrgica e uma
autotransfusão.
As contusões pulmonares (sozinhas ou junto com outras lesões torácicas)
geralmente ocorrem logo após a lesão traumática, mas podem aumentar em
severidade durante as primeiras 72h. O diagnóstico se dá através da anamnese, do
exame físico, da auscultação e da radiografia. A respiração é trabalhosa e pode ficar
rápida e rasa. Os ruídos ou estalos broncovesiculares podem ser aumentados sobre
as áreas contundidas. Se a lesão for severa, os ruídos pulmonares podem ficar
Traumatismo, Pq An 771

ausentes na área afetada. As radiografias mostram um padrão intersticial e alveolar


aumentado.
O tratamento para as contusões pulmonares depende da severidade do insulto
e dos sinais clínicos. A ventilação alveolar e a troca gasosa se reduzem devido a um
acúmulo de sangue e de fluido no parênquima pulmonar. Os animais levemente
afetados respondem ao repouso em gaiola com ou sem uma suplementação com
oxigênio. O animal pode se encontrar em choque e inquieto. Administram-se fluidos
para melhorar a perfusão, mas deve-se evitar a super-hidratação, já que ela pode
piorar o edema e a hemorragia pulmonares. O uso criterioso de diuréticos e de
broncodilatadores pode ser útil. A morfina em pequenas doses (0,1 a 0,5mg/kg)
pode aliviar a ansiedade e, portanto, melhorar a ventilação alveolar. Os corticoste-
róides podem ser benéficos quando administrados cedo, embora o seu uso, bem
como o de antibióticos, seja controverso. Os animais com contusões pulmonares
severas se encontram em um risco elevado de insuficiência respiratória.
Se as radiografias revelarem uma hérnia diafragmática (ver pág. 862), exige-se
um reparo cirúrgico quando o animal estiver estabilizado. Indica-se uma cirurgia de
emergência se o espaço ventilatório estiver significativamente comprometido atra-
vés de vísceras no tórax, se o estômago se encontrar no tórax, se o suprimento
sangüíneo visceral se encontrar comprometido ou se não se puder estabilizar o
choque.

FERIMENTOS
Os ferimentos podem resultar em uma perda de continuidade e de função, em dor
e em uma hemorragia. O tratamento de ferimento básico incorpora os procedimen-
tos para se evitar uma contaminação posterior, remover resíduos, debridar tecidos,
proporcionar uma drenagem, promover uma vascularização e permitir um eventual
fechamento do ferimento.
As ataduras de compressão constituem uma medida de primeiros socorros para
controlar o sangramento. Uma vez que as ataduras estejam embebidas com
sangue, colocam-se curativos adicionais sobre elas em vez de removê-las e
substituí-las. Só se devem utilizar garrotes quando as ataduras de pressão forem
ineficazes. Posteriormente, ligam-se ou coagulam-se os vasos sangrantes.
Uma vez controlado o sangramento, cobre-se o ferimento com um lubrificante
hidrossolúvel estéril, enquanto se depila e se limpa com um sabão germicida a pele
ao redor. Aplica-se então um curativo estéril com uma pomada antibiótica, uma
solução de povidona-iodo a 0,5% ou de clorexidina a 0,5 a 1%, até que se estabilize
o animal. Podem-se infiltrar o ferimentos limpos pequenos com anestésicos locais
para um debridamento.
Pode-se exigir uma sedação narcótica ou uma anestesia geral no caso do
tratamento de um ferimento mais comprometido. Devem-se lavar completamente os
restos com uma solução salina estéril morna. Devem-se excisar o tecido inviável e
os materiais estranhos que permanecerem após a lavagem. Se o ferimento for
extenso ou profundo, pode-se fazer o debridamento em estágios. As lesões de
arrancamento requerem trocas de atadura úmida para seca pelo menos diariamente
até que se faça presente um leito de granulação saudável. Podem-se deixar abertos
os ferimentos contaminados sob curativos estéreis, e colocam-se drenos se não se
puder fechar o espaço morto. Os ferimentos abdominais abertos requerem uma
passagem de atadura cuidadosa. Devem-se trocar as ataduras abdominais úmidas
imediatamente para evitar uma contaminação.
O fechamento final dos ferimentos se dá por meio de um fechamento primário,
um fechamento primário retardado, um fechamento secundário ou uma cicatrização
por segunda intenção. O fechamento primário é apropriado para um ferimento limpo
Traumatismo, Pq An 772

com < 6h. Se o ferimento estiver contaminado, retarda-se o fechamento primário.


Limpa-se, debrida-se, lava-se e deixa-se aberto o ferimento com uma atadura feita
de gaze úmida estéril, algodão absorvente e esparadrapo elástico. Colocam-se
suturas no quarto ou quinto dia se o tecido parecer vitalizado e não infeccionado.
Deixam-se abertos os ferimentos infectados sob ataduras por 5 a 10 dias após a
limpeza e o debridamento. Pode-se então proceder o fechamento secundário por
meio de uma aproximação de sutura direta de 2 superfícies granulares ou por meio
de uma excisão do tecido de granulação e do ferimento primário. No caso de
ferimentos antigos ou grandes defeitos cutâneos infectados, recomenda-se a
cicatrização por segunda intenção através de uma epitelialização e de uma
contração. Deixam-se abertos esses ferimentos sob ataduras apropriadas após o
debridamento e a lavagem. Os retalhos cutâneos ou as técnicas de enxertamento
proporcionam uma opção para uma cicatrização mais rápida ou mais cosmética.
Podem-se obter culturas bacterianas antes da lavagem do ferimento, e se iniciar
e manter uma antibioticoterapia sistêmica por no mínimo 7 a 10 dias. As complica-
ções da cicatrização dos ferimentos geralmente se associam com o ressecamento
dos tecidos, as infecções bacterianas ou fúngicas, a má nutrição, a automutilação,
a imunossupressão ou uma técnica cirúrgica inapropriada.
Os ferimentos por mordedura geralmente se parecem com pequenos ferimentos
de perfuração da pele, mas podem se encontrar presentes uma contaminação e
uma maceração maciças dos tecidos subcutâneo e muscular sob a superfície; a
formação de abscessos em ferimentos por mordedura é especialmente comum nos
gatos. Tais ferimentos exigem uma exploração. Se o ferimento parecer penetrar no
tórax ou na cavidade abdominal, os sinais de febre, dor, derrame, contagem de
leucócitos elevada ou depressão podem indicar uma necessidade de exploração da
cavidade apropriada. Uma lavagem diagnóstica peritoneal ou pleural com uma
análise do fluido auxilia na detecção de uma contaminação subaguda ou aguda (por
exemplo, bacteriana no caso de leucócitos) antes dos sinais sistêmicos.
SISTEMA REPRODUTIVO
SISTEMA REPRODUTIVO, Introdução ....................................................... 775
Fenômenos Reprodutivos (Tabelas) ........................................................ 776
Períodos de Gestação ....................................................................... 776
Períodos de Incubação ...................................................................... 776
Características do Ciclo Reprodutivo ................................................. 777
Gônadas .................................................................................................. 775
Trato Genital Tubular Feminino ............................................................... 781
Trato Genital Tubular Masculino .............................................................. 782
Infertilidade e suas Manifestações ........................................................... 782
Método Diagnóstico para os Problemas de Infertilidade ................... 782
Princípios de Terapia ............................................................................... 783
ABORTO, GR AN .......................................................................................... 785
Indução do Aborto e do Parto ............................................................ 786
Aborto nos Suínos ................................................................................... 786
Abortamento Clamidiano ......................................................................... 788
Bovinos .............................................................................................. 788
Abortamento Enzoótico nos Ovinos e Caprinos ................................ 789
Aborto Bovino Epizoótico ......................................................................... 791
Campilobacteriose Genital Ovina ............................................................ 792
ABORTO, PQ AN (ver MCN) ......................................................................... 1408
SÍNDROME DE AGALACTIA ........................................................................ 794
Porcas ...................................................................................................... 794
Insuficiência Lactacional nas Porcas Periparturientes ....................... 794
Agalactia Contagiosa e Outras Mastites Micoplasmais
dos Pequenos Ruminantes ................................................................ 796
CAMPILOBACTERIOSE GENITAL BOVINA ............................................... 798
TRICOMONÍASE BOVINA ............................................................................ 801
UBEROPATIAS BOVINAS ............................................................................ 803
Mamilite Ulcerativa Bovina ....................................................................... 803
Doenças Congênitas e Fisiológicas ......................................................... 803
Mastite (ver adiante) ................................................................................ 831
Pseudovaríola Bovina (ver PEL) .............................................................. 997
Doenças Traumáticas .............................................................................. 805
Acne do Úbere ......................................................................................... 807
BRUCELOSE ................................................................................................. 807
Brucelose nos Bovinos ............................................................................ 807
Brucelose nos Cães ................................................................................. 810
Brucelose nos Caprinos ........................................................................... 810
Brucelose nos Eqüinos ............................................................................ 811
Brucelose nos Suínos .............................................................................. 811
Brucelose nos Ovinos .............................................................................. 812
ANOMALIAS CONGÊNITAS E HEREDITÁRIAS ......................................... 814
OVARIOPATIA CÍSTICA ............................................................................... 816
Ovariopatia Cística Folicular .................................................................... 816
Sistema Reprodutivo 774

Ovariopatia Cística como um Problema no Rebanho ........................ 818


Ovariopatia Cística Lútea ......................................................................... 819
DOENÇAS DO SISTEMA REPRODUTIVO, PQ AN ..................................... 820
Distúrbios da Fêmea ................................................................................ 820
Metrite Aguda ..................................................................................... 820
Distocia .............................................................................................. 820
Pseudoprenhez nas Cadelas ............................................................. 821
Cistos Foliculares: Ninfomania .......................................................... 821
Mastite ................................................................................................ 822
Piometria ............................................................................................ 822
Hiperplasia Vaginal ............................................................................ 824
Vaginite .............................................................................................. 825
Distúrbios do Macho ................................................................................ 825
Orquite Aguda/Epididimite ................................................................. 825
Orquite Crônica/Epididimite ............................................................... 826
Balanopostite ..................................................................................... 827
Parafimose ......................................................................................... 827
Fimose ............................................................................................... 827
Tumor Venéreo Canino Transmissível .................................................... 828
EXANTEMA COITAL EQÜINO ..................................................................... 828
TUMORES MAMÁRIOS ................................................................................ 829
MASTITE, GR AN .......................................................................................... 831
Teste de Mastite da Califórnia ........................................................... 832
Mastite nas Vacas .................................................................................... 833
Controle da Mastite Bovina ................................................................ 836
Mastite nas Cabras .................................................................................. 837
Mastite nas Éguas ................................................................................... 838
Mastite nas Ovelhas ................................................................................ 838
Mastite nas Porcas .................................................................................. 838
METRITE, GR AN .......................................................................................... 839
Metrite Contagiosa Eqüina ....................................................................... 840
GESTAÇÃO PROLONGADA NOS BOVINOS E NOS OVINOS ................. 841
PROSTATOPATIAS ...................................................................................... 842
Hiperplasia Prostática Benigna ................................................................ 843
Cálculos ................................................................................................... 844
Neoplasias ............................................................................................... 844
Cistos Prostáticos e Paraprostáticos ....................................................... 844
Prostatite .................................................................................................. 845
RETENÇÃO DA PLACENTA, GR AN ........................................................... 846
Vacas ....................................................................................................... 846
Éguas ....................................................................................................... 846
Outras Espécies ....................................................................................... 847
POSTITE E VULVITE ULCERATIVAS .......................................................... 847
PROLAPSO E EVERSÃO UTERINOS ......................................................... 848
PROLAPSOS VAGINAL E CERVICAL ......................................................... 849
VAGINITE E VULVITE, GR AN ..................................................................... 851
Sistema Reprodutivo, Introdução 775

SISTEMA REPRODUTIVO, INTRODUÇÃO


Devem-se considerar todas as funções do sistema reprodutivo ao se resolver
problemas de reprodução. As diferenças do sistema reprodutivo entre os sexos e as
espécies são complexas. Em ambos os sexos, existem órgãos sexuais primários e
centros reguladores primários. Também em ambos os sexos, as gônadas e os
órgãos genitais tubulares adaptados à função constituem os órgãos sexuais
primários. A hipófise e o hipotálamo são os centros reguladores primários principais;
conseqüentemente, a função reguladora é, em parte, neurendócrina em natureza.
Nas fêmeas prenhes, a unidade fetoplacentária tem um papel significativo na
manutenção e na terminação da prenhez.

FENÔMENOS REPRODUTIVOS
As características cronológicas e fisiológicas do ciclo reprodutivo nas várias
espécies se encontram resumidas nas tabelas seguintes.

GÔNADAS
Ambos os sexos possuem um par de gônadas, cujas funções principais são
a gametogênese e a esteroidogênese. Ambas as funções são reguladas prima-
riamente pelas gonadotrofinas liberadas pela hipófise anterior, sob a influência
do hipotálamo. Este último é mediado por um peptídeo, o hormônio liberador
de gonadotrofina (GnRH); a secreção e a liberação do GnRH são governadas
por estímulos do SNC e um mecanismo de “feedback”, por hormônios produzi-
dos por outros órgãos endócrinos como as gônadas, a hipófise, a tireóide e as
adrenais.
Ovários – As gônadas femininas intra-abdominais variam em tamanho e
localização dependendo da espécie. Apenas as da vaca e as da égua podem
ser examinadas diretamente por palpação retal. Uma vez que se atinja a
puberdade (ver T ABELA 3) e um animal comece a ciclar, alteram-se o tamanho
e a forma dos ovários por meio de estruturas funcionais cíclicas, isto é, os
corpos lúteos (CL) e os folículos. De acordo com um conceito simplificado, o
hormônio folículo-estimulante (FSH), é responsável pelo desenvolvimento
do(s) folículo(s) e pela síntese de estrogênios por parte das células tecais. Uma
vez que se atinja um determinado nível de estrogênio, libera-se o hormônio
luteinizante (LH) nas espécies de ovulação espontânea. Esse pico de LH
precede a ovulação, que é seguida pelo desenvolvimento do CL. O aumento do
número de células lúteas ocorre paralelo a uma elevação na progesterona
sérica. Nas fêmeas poliéstricas sazonais e poliéstricas não prenhes (ver T ABELA
3), a vida funcional e morfológica do CL é terminada pela prostaglandina
endogenosa (PG)F 2α proveniente do útero. À medida que o CL regride, desen-
volve(m)-se novo(s) folículo(s) ovulatório(s), que completa(m) o ciclo estral.
Podem-se monitorar as alterações hormonais durante o ciclo estral por radioi-
munoensaio e ELISA dos hormônios no sangue, no leite ou nos outros fluidos
corporais. A ciclagem estral continua após a puberdade, a menos que seja inter-
rompida pela prenhez, e em algumas espécies, pela estação ou pela lactação
durante o período pós-parto imediato. A ciclagem também é bloqueada pelas
afecções patológicas dos ovários (por exemplo, atrofia nutricional e estressante
e cistos ovarianos) e pelas doenças uterinas (por exemplo, piometria e endometrite
severa), que podem resultar em um CL persistente. Os estrogênios e a
progesterona, os principais hormônios gonadais, atuam localmente, afetam os
órgãos-alvo tais como o trato genital tubular, e regulam a liberação de gonado-
Sistema Reprodutivo, Introdução 776

TABELA 1 – Períodos de Gestação*


Animais domésticos Dias Animais silvestres DiasM a -
Gato 58 – 65 caco de Gibraltar 210
Bovinos, angus 281 Urso preto 210
ayrshire 279 Bisão 270
brahman 292 Camelo , 410
suíço castanho 290 Coiote 60 – 64
charolês 289 Veado da Virgínia 197 – 220
guernsey 283 Elefante 600 – 660
hereford 285 Cervo nobre (uapiti) 240 – 250
holstein 279 Girafa 420 – 450
jersey 279 Lebre 38
limousin 289 Hipopótamo 225 – 250
shorthorn 282 Canguru vermelho 38**
simmental 289 Leopardo 92 – 95
Cão 58 – 70 Leão 108
Asno 365 Sagüi 140 – 150
Caprino 145 – 155 Macaco, mico 150 – 180
Eqüino pesado 330 – 340 Alce 240 – 250
leve 340 – 342 Boi almiscarado 270
Lhama 330 Gambá 12 – 13
Suíno 112 – 115 Pantera 90 – 93
Ovino, raças de carne 144 – 147 Porco-espinho 112
raças de lã 148 – 151 Antilocabra 230 – 240
Animais de pele Dias Guaxinim 63
Rena 210 – 240
Chinchila 110 – 120 Rinoceronte africano 530 – 550
Furão 42 Foca 330
Raposa 49 – 55 Musaranho 20
Marta européia 236 – 274 Cangambá 62 – 65
Visom 40 – 75 Esquilo cinzento 30 – 40
Ondatra 28 – 30 Anta 390 – 400
Ratão-do-banhado (coypu) 120 – 134 Tigre 105 – 113
Lontra 270 – 300 Morsa 330 – 360
Coelho 30 – 35 Cachalote 480 – 500
Lobo 60 – 38
Marmota 31 – 32
* Ver também ALGUNS DADOS FISIOLÓGICOS DOS ANIMAIS DE L ABORATÓRIO, página 1248.
** O atraso do desenvolvimento demora tanto quanto um “canguruzinho” fica na bolsa.

TABELA 2 – Períodos de Incubação


Aves domésticas Dias Aves de caça e gaiola Dias
Galinha 20 – 22 Periquito australiano 17 – 18
Pato 26 – 28 Tentilhão 11 – 14
Pato selvagem 35 Papagaio 17 – 31
Ganso 25 – 28 Faisão 24
Galinha-d’angola 28 Pombo 10 – 18
Peru 28 Codorniz 21 – 23
Cisne 33 – 36
Sistema Reprodutivo, Introdução 777

TABELA 3 – Características do Ciclo Reprodutivo


Idade na Duração do Duração do Melhor época de Primeiro estro após
Espécie puberdade Tipo do ciclo ciclo estro acasalamento o parto Observações
Bovina 4 – 18 (12) Poliéstrico, o ano 21 dias (18 – 18h (10 – 24) Inseminação da meta- Varia*, melhor acasalar Ovulação 10 – 12h após o fim
meses. Ge- todo 24) de do estro até 6h em 60 – 90 dias do estro. Sangramento ute-
ralmente pri- após o final rino , 24h depois da ovu-
meiro acasa- lação na maioria, mas pode
lamento , 15 exigir um exame vaginal
meses para detecção

Eqüina 10 – 24 (18) me- Poliéstrico sazonal Muito variável, 6 dias (2 – 10) Dura poucos dias; 4 – 14 dias (9) Ocorre ovulação dupla em ,
ses no início da prima- , 21 dias (19 deve-se acasalar a 20% dos períodos estrais,
vera – 26) intervalos de 2 dias mas os gêmeos raramente
progridem até o termo

Ovina 7 – 12 (9) me- Poliéstrico sazonal, 16 1⁄2 dias (14 – 24 – 48h 18 – 20h após o início Próximo outono Ovulação perto do final do
ses início do outono 20) do estro estro
até inverno. Esta-
ções prolonga-
das nos dorsets e
nos merinos

Suína 4 – 9 (7) meses Poliéstrico, o ano 21 dias (16 – 2 – 3 dias , 24h após o início do 4 – 10 dias após o des- Ovulação usualmente , 40h
todo 24) estro mame após o começo do estro

Caprina 4 – 8 (5) meses Poliéstrico sazonal, 18 – 21 dias 2 – 3 dias Diariamente durante o Próximo outono Muitos intersexos nascem em
do início do outo- (19) estro linhagens mochas
no até o fim do
inverno

(Continua)
Sistema Reprodutivo, Introdução 778

TABELA 3 (Cont.) – Características do Ciclo Reprodutivo


Idade na Duração do Duração do Melhor época de Primeiro estro
Espécie puberdade Tipo do ciclo ciclo estro acasalamento após o parto Observações
Cão 5 – 24 meses. Monoéstrico não sa- 31⁄2 – 13 meses 2 – 21 dias A partir do segundo dia Poucos meses (um pe- Sangramento do proestro por
Mais cedo zonal (média de 6 de estro e em dias ríodo de metestro de 7 – 10 dias. Ovulação ge-
nas raças pe- – 12) alternados, daí para 2 – 31 ⁄ 2 meses se- ralmente 1 – 3 dias após a
quenas. Mais o final do estro guido de um período primeira aceitação. Óvulos
tarde nas ra- de anestro altamente eliminados antes de se ex-
ças maiores variável) pulsar o 1º corpúsculo po-
lar. A pseudoprenhez ge-
ralmente termina entre 60
e 70 dias
Gato 4 – 12 meses Ovulação provoca- 14 – 21 dias 6 – 7 dias Diariamente, a partir do 4 – 6 semanas Ovulação 24 – 48h após coi-
(10 meses); da, poliestro sazo- segundo dia do estro to. Pseudoprenhez dura 36
12 – 18 me- nal na primavera dias. Cruzamentos inférteis
ses nos per- e início do outono prolongam o aparecimento
sas) do próximo ciclo , 45 dias

Raposa 10 meses Monestro de de- 2 – 4 dias Próximo inverno Ovulação usualmente no pri-
zembro a março, meiro ou segundo dia de
mas sobretudo do receptividade. Óvulo solto
fim de janeiro a fe- antes da expulsão do pri-
vereiro meiro corpo polar. Nenhum
sangramento do proestro

Visom 10 meses Ovulação provoca- Ondas de folí- 2 dias Ovulação induzida Próxima primavera A ovulação começa 36 – 48h
da. Poliestro sa- culos em in- após o coito, que deve du-
zonal da metade tervalos de 7 rar ≥ 30min
de fevereiro ao iní- – 10 dias
cio de abril
Sistema Reprodutivo, Introdução 779

Chinchila 400 – 600g (6 Poliestro intenso de 30 – 50 dias Vagina perfura- Acasala na segunda 2 – 48h. Ovulação na
– 81⁄ 2 meses) novembro a maio (41) da 1⁄ 2 – 6 dias noite, raramente na segunda noite
durante o es- terceira
tro; acasala-
mento à noite
Ratão-do-ba- 5 a 8 meses Poliéstrico 24 – 29 dias 2 a 4 dias 48h
nhado
Coelho 5 a 9 meses. Va- Ovulação provoca- Ciclos estrais ir- Até 1 mês Quando a vulva fica au- Imediatamente, mas os Nos EUA, não acasala bem
ria de 4 a 12 da. Acasala mais regulares mentada de volume blastocistos morrem no verão. Ovulação 101⁄2 h
meses na ou menos o ano e hiperêmica se a coelha amamen- após o coito. A pseudopre-
maioria das ra- todo; pode apre- tar uma grande ninha- nhez dura 14 – 16 dias
ças sentar anestro sa- da
zonal
Macaco 3 anos Poliéstrico o ano 27 – 28 dias , 3 dias Perto da ovulação 10 Após o desmame dos A menstruação dura 4 – 6
rhesus todo; tendência (23 – 33) – 13 dias do ciclo filhotes anteriores dias; a ovulação, geralmen-
(Macaca para ciclos anovu- te , 13 dias após o início
mulatta) latórios no verão
norte-americano

Rato 37 a 67 dias, Poliéstrico o ano 4 – 5 dias , 14h (12 – 18) Perto da ovulação Dentro de 24h Ovulação logo após a meia-
varia confor- todo geralmente, noite. A estimulação cervi-
me a linha- inicia-se em cal causa pseudoprenhez
gem; com- , 7h da noite que dura por 12 – 14 dias
primento do
corpo na pu-
berdade de
148 – 150mm
Camundongo 35 dias (28 a Poliéstrico o ano Geralmente 4 Algumas horas Fêmea mais receptiva Dentro de 24h Ovulação logo após a meia-
49) todo ou 5 dias a partir das durante as primeiras noite. A estimulação da cér-
10h da noite 3h vix causa pseudoprenhez
que dura 10 – 12 dias

(Continua)
Sistema Reprodutivo, Introdução 780

TABELA 3 (Cont.) – Características do Ciclo Reprodutivo


Idade na Duração do Duração do Melhor época de Primeiro estro após
Espécie puberdade Tipo do ciclo ciclo estro acasalamento o parto Observações
Cobaia 55 – 70 dias Poliéstrico o ano 16 1⁄2 dias 6 – 11h. Come- A partir do meio do Em geral imediatamen- Ovulação , 10h após o início
todo. ça geralmen- estro te do estro
te à noite

Hâmster 4 – 6 semanas Poliéstrico o 4 – 5 dias 12h, uma noite Meio do estro Após o desmame Ovulação 8 – 12h após o início
ano todo. Poucas do estro. A pseudoprenhez
prenhezes no in- dura 7 – 13 dias
verno
Gerbilo da 9 a 12 semanas Poliéstrico 4 a 6 dias 12 – 15h Meio do estro 1 a 3 dias Ovulação espontânea 6 a 10h
Mongólia após o cruzamento

* Muitas vacas normais ovulam logo em 8 a 12 dias após o parto, com ou sem sinais detectáveis de estro.
Sistema Reprodutivo, Introdução 781

trofinas por meio de um mecanismo de “feedback” tanto no hipotálamo como na


hipófise anterior. Além desses locais de ação, os hormônios sexuais femininos
também são responsáveis pelas características sexuais, pelo comportamento
e pela lactação.
Testículos – Como os ovários, os testículos possuem uma função dupla:
espermatogênese e secreção de hormônios esteróides. Em termos simples, a esper-
matogênese é estimulada pelo FSH e aumentada pelos androgênios, primariamen-
te a testosterona. As células de Leydig, sob a influência do LH, produzem a testos-
terona e, em algumas espécies (por exemplo, a eqüina), também produzem estro-
gênios. Exige-se a testosterona para o desenvolvimento e a função das glândulas
acessórias, dos órgãos copulatórios, das características sexuais masculinas e do
comportamento. Para uma espermatogênese ideal, os testículos dos mamíferos
devem descer para a cavidade escrotal; no entanto, ocorre esteroidogênese
testicular intra-abdominal, e não se prejudica a libido dos garanhões, cachaços e
cães criptorquídicos. O fotoperíodo afeta tanto a formação de células espermáticas
como a esteroidogênese nos machos das espécies com um padrão reprodutivo
sazonal. Reduzem-se a qualidade do sêmen, a libido e a capacidade de acasalamen-
to durante o período anestral das fêmeas. Encontram-se disponíveis métodos de
avaliação de amostras representativas de sêmen e ensaios hormonais para a
avaliação da função testicular. A palpação e a mensuração dos testículos podem
revelar afecções patológicas.

TRATO GENITAL TUBULAR FEMININO


Exceto quanto ao vestíbulo, que se desenvolve a partir do seio urogenital, o trato
genital feminino deriva dos dutos paramesonéfricos (müllerianos) embrionários.
Cada um dos segmentos se adapta para preencher a sua função. Assim, o oviduto
(por meio de sua motilidade) adquire o(s) óvulo(s) e propele o zigoto(s) para o útero,
enquanto a sua secreção proporciona um ambiente apropriado para a sobrevivên-
cia dos gametas, a fertilização e os primeiros dias críticos da vida embrionária. A
interferência na motilidade ou na secreção leva à infertilidade. A variação entre as
espécies do útero bicórneo e em forma de “Y” envolve o tamanho do corpo e o
comprimento dos cornos, que se adaptam para acomodar um número e uma forma
de feto(s) espécie-específico(s). A cérvix proporciona uma barreira protetora,
relativamente efetiva, contra as infecções ascendentes, exceto nas espécies em
que o sêmen se deposita intra-uterinamente, por exemplo, na espécie eqüina.
Exige-se uma integridade morfológica e funcional do útero e da cérvix para o
estabelecimento e a manutenção da prenhez e para o parto. As infecções contraídas
no acasalamento e durante o parto e puerpério e as suas seqüelas são causas
comuns da infertilidade das fêmeas. Elas interferem na função uterina normal,
incluindo a liberação da PGF2α. A aplicabilidade dos métodos diagnósticos para a
detecção das anormalidades uterinas e cervicais depende da espécie, do tamanho
do animal e da anatomia da cérvix. Clinicamente, diagnosticam-se os casos por
meio de palpação retal e abdominal, vaginoscopia e histeroscopia por fibra óptica,
radiografia e ultra-sonografia transretal. Os auxílios diagnósticos laboratoriais
incluem o exame microbiológico e citológico dos exsudatos ou das secreções, o
exame histológico das biópsias, a citologia endometrial e os ensaios hormonais.
O trato posterior (que consiste de vagina, vestíbulo e vulva) serve como o órgão
copulatório e como o último segmento do canal de nascimento. Também proporcio-
na um caminho para as infecções ascendentes, particularmente quando se perde
ou se reduz a efetividade do esfíncter da vulva devido a um traumatismo ou a um
relaxamento. As infecções puerperais envolvem comumente o trato tubular inteiro.
Além disso, a infecção vestibulovaginal perpetuada pela urovagina e pela
pneumovagina sustenta uma infecção crônica no útero bovino e no eqüino. No
Sistema Reprodutivo, Introdução 782

entanto, o vestíbulo e a vagina podem-se inflamar, mesmo quando o útero estiver


normal, ou mesmo prenhe. Ao contrário, nas piometrias de cérvix fechada nas vacas
e nas cadelas, a vagina e o vestíbulo podem estar essencialmente normais.

TRATO GENITAL TUBULAR MASCULINO


Nos machos, o trato tubular proporciona um caminho para as células espermáti-
cas e o sêmen. Ele começa como os dútulos eferentes dos testículos, incluindo a
cabeça, o corpo e a cauda do epidídimo, e continua como duto deferente. O duto
deferente sobe para a cavidade abdominal através do anel inguinal e passa pela face
dorsal da bexiga para entrar na uretra pélvica. As uretras peniana e pélvica são
divididas como saídas para o sêmen e a urina. Ao longo desse caminho, determina-
dos segmentos do trato evoluíram morfológica e funcionalmente para realizarem
funções específicas adicionais. Os epidídimos se envolvem na maturação e no
armazenamento das células espermáticas e na absorção seletiva dos espermatozói-
des anormais. As ampolas e as glândulas sexuais acessórias (ou seja, as vesículas
seminais, a próstata e as glândulas bulbouretrais) contribuem para a formação do
plasma seminal. O tamanho e a forma das glândulas sexuais acessórias variam entre
as espécies. As vesículas seminais e as glândulas bulbouretrais (ou de Cowper) se
encontram ausentes nos cães. Nos touros, os epidídimos e as vesículas seminais
são locais comuns de infecção. A epididimite também é comum nos carneiros. A
hipertrofia e a neoplasia prostáticas se encontram primariamente nos cães, e podem
ser detectadas por palpação retal. Na maioria dos animais, podem-se diagnosticar
as afecções patológicas dos epidídimos (por exemplo, as várias formas de inflama-
ção, dilatação cística [espermiostasia] e aplasia segmentar) por meio de palpação
escrotal. As outras doenças ou distúrbios funcionais podem exigir a avaliação de uma
ou várias amostras de sêmen. Podem-se avaliar clinicamente as vesículas seminais
apenas nos animais que sejam grandes o suficiente para uma palpação retal.

INFERTILIDADE E SUAS MANIFESTAÇÕES


A interação do SNC, do hipotálamo, da hipófise, das gônadas e dos seus órgãos-
alvo resulta em cadeias muito bem coordenadas de eventos fisiológicos que levam
ao estro e à ovulação na fêmea, e à ejaculação do sêmen fértil pelo macho. Para
resultados ideais, a ovulação e a deposição do sêmen no trato genital feminino
devem estar intimamente sincronizadas. A falha de qualquer evento funcional único
em ambos os sexos leva à infertilidade ou à esterilidade.
A manifestação definitiva de infertilidade é a falha na produção de filhotes. Nos
animais poliéstricos, um número subnormal de filhotes também constitui infertilida-
de. Nas fêmeas, a infertilidade pode se dever a uma falha no ciclo, a aberrações no
ciclo e período estrais (com base na disfunção dos ovários ou do eixo hipotalâmico-
hipofisário), a uma falha na concepção ou à morte pré e perinatal. Os problemas de
infertilidade principais dos machos são os distúrbios da produção, do transporte ou
do armazenamento de espermatozóides; a aberração da libido; e a incapacidade
parcial ou total para acasalar.
A maioria, se não a totalidade, dos principais problemas de infertilidade possui
uma etiologia complexa; vários fatores, sozinhos ou em combinação, podem causar
falhas reprodutivas. A patogenia pode ser igualmente complexa.

Método diagnóstico para os problemas de infertilidade


Já que a fêmea dá à luz os filhotes, ela reflete ou o sucesso ou a falha da
reprodução. No entanto, especialmente nos animais naturalmente acasalados mas
também na IA, o primeiro passo diagnóstico (independentemente da queixa)
consiste no estabelecimento do papel etiológico da fêmea e do macho.
Sistema Reprodutivo, Introdução 783

Nos anos recentes, o homem tem assumido mais e mais responsabilidade para
determinados aspectos da reprodução, tais como a observação do estro, a preser-
vação do sêmen e a inseminação; cada ponto de interferência é uma fonte potencial
de erro. Conseqüentemente, devem-se considerar os erros humanos, que são
detectados ou descartados pela avaliação do desempenho com a ênfase principal
nas técnicas e nos procedimentos, e sua adequação e qualidade.
Têm-se desenvolvido métodos diagnósticos para testar a sanidade anatômica e
funcional de ambos os sexos. Esses métodos variam do exame clínico sustentado
por auxílios diagnósticos tais como a endoscopia e a ultra-sonografia, até testes
laboratoriais incluindo ensaios hormonais, microbiologia, citologia, sorologia, exa-
me citogenético, avaliação do sêmen, etc.
A escolha dos métodos de exame é determinada pela espécie e pelo tamanho
do animal. As decisões com relação ao tipo e à extensão dos testes de laboratório
se baseiam na história e na informação obtidas durante o curso do exame. O plano
diagnóstico deve fornecer evidências para o estabelecimento do papel da fêmea, do
macho e do criador em cada caso de falha reprodutiva. Os problemas reprodutivos
raramente são acompanhados por sinais alarmantes de doença. Além disso, existe
um intervalo entre a ocorrência da falha e a sua manifestação aparente. Os
exemplos incluem os intervalos entre um serviço sem sucesso e o retorno ao estro
ou uma falha em parir. Este período de atraso pode permitir uma recuperação do
animal e assim o exame pode produzir resultados negativos. A interpretação dos
resultados também deve levar em conta as diferenças entre as espécies, e naquelas
com um padrão reprodutivo sazonal, a infertilidade pode ser fisiológica durante
determinados períodos do ano.

PRINCÍPIOS DE TERAPIA
(Ver também MANEJO DA REPRODUÇÃO, pág. 1367.) As demandas crescentes pela
eficiência de produção, junto com as alterações ambientais (por exemplo, o
alojamento e os sistemas de manejo) e, em muitos casos, com a erradicação de
sucesso de infecções específicas (por exemplo, a brucelose, a tuberculose e a
campilobacteriose), causaram uma modificação nas estratégias terapêuticas nas
várias espécies domésticas. Especialmente nos animais de consumo alimentar, e
em até certo grau nos eqüinos, o método terapêutico de escolha consiste fre-
qüentemente de uma combinação de agentes farmacológicos e da correção dos
problemas de manejo. Os tratamentos com base no rebanho também se tornaram
mais importantes, especialmente à luz da necessidade de uma efetividade de custo
(por exemplo, o aumento do uso de agentes farmacológicos no manejo reprodutivo
tal como a sincronização do estro, a superovulação, a indução do parto e o tratamento
do anestro e do subestro). As outras tendências terapêuticas nos animais de con-
sumo alimentar são o resultado de um aumento no conhecimento dos possíveis
riscos dos resíduos antimicrobianos e hormonais nos tecidos e no leite; as alterna-
tivas a uma antibioticoterapia justificam uma atenção aumentada.
Nos animais pequenos, a alteração da estratégia terapêutica não é tão evidente
quanto nos animais grandes. O animal individual ainda permanece em foco, e o
ambiente dessas espécies não passa pelas mesmas alterações como no caso dos
animais grandes. Porém, as técnicas diagnósticas e os tratamentos se tornaram
mais sofisticados. Uma terapia mais eficiente pode propagar uma predisposição
hereditária para uma redução da fertilidade por cura de doenças que antes eram
autolimitantes; deve-se considerar isso sempre que se lidar com problemas de
fertilidade.
Controle farmacológico da reprodução – O controle do ciclo estral – mais
comumente a sincronização do estro – geralmente se baseia em agentes que agem
diretamente nos ovários (por exemplo, o FSH, o LH ou as preparações com efeitos
Sistema Reprodutivo, Introdução 784

semelhantes, tais como a gonadotrofina sérica da égua prenhe [PMSG] ou a


gonadotrofina coriônica humana [HCG] e as prostaglandinas) ou em agentes que
agem principalmente no nível hipofisário-hipotalâmico (GnRH, progesterona, pro-
gestinas). A superovulação, que se tornou uma parte essencial da transferência de
embriões, geralmente é obtida por meio de um tratamento hormonal durante um
determinado estágio do ciclo com o FSH ou com agentes com o efeito deste (por
exemplo, a PMSG) combinados com uma droga com o efeito do LH (por exemplo,
a HCG). Nos ruminantes, utiliza-se a PGF2α ou os seus análogos para lise do CL e
indução do estro após a estimulação do desenvolvimento folicular múltiplo pelo FSH.
As afecções patológicas dos ovários (ovários císticos, retardamento da ovulação)
são tratadas freqüentemente com preparações com o efeito do LH (por exemplo, a
HCG) ou com o GnRH. No caso do CL persistente, as prostaglandinas se tornaram o
tratamento de escolha. Tem-se tratado experimentalmente a inatividade ovariana pós-
parto (anestro pós-parto) com pulsos de FSH ou de GnRH repetidos com o tempo. No
entanto, os sistemas práticos de entrega desses produtos não se encontram disponíveis
atualmente, e as afecções tais como o anestro da lactação permanecem difíceis de
tratar. Em algumas espécies (por exemplo, os suínos), o retardamento da puberdade
responde freqüentemente ao tratamento com uma droga com um efeito folículo-
estimulante (FSH, PMSG ou uma combinação de PMSG e HCG).
As outras áreas nas quais os hormônios exógenos podem exercer um papel no
controle da reprodução são a prenhez e o parto. Utilizam-se os estrogênios como
abortivos em algumas espécies (por exemplo, os bovinos), mas as prostaglandinas
geralmente são mais eficazes. Também se utilizam estrogênios no impedimento de
uma prenhez após um acasalamento indesejado (por exemplo, nos cães). Pode-se
utilizar a progesterona ou os vários progestogênios na supressão do estro para
impedir o acasalamento em todas as espécies. Na indução do parto, que se tornou
uma ferramenta importante de manejo em algumas espécies (por exemplo, os
suínos e os bovinos), utiliza-se o tratamento com corticosteróides ou PGF2α ou uma
combinação disso. As fêmeas com um feto morto geralmente não respondem bem
aos corticosteróides. Nos suínos, parece que tanto a PGF2α como uma combinação
desta e da ocitocina são melhores. Nas éguas, a ocitocina é mais eficaz. Em todas
as espécies, torna-se importante que o animal seja preparado para o parto. Quanto
menos preparado estiver o trato reprodutivo (por exemplo, a cérvix, a unidade
fetoplacentária e a glândula mamária), maior será o risco de complicações.
No caso das afecções tais como o prolongamento da gestação, utilizam-se os
mesmos agentes que no caso da indução do parto nos animais normais. Nos
distúrbios uterinos (piometria, retenção da placenta e endometrite), os melhores
agentes não antibióticos são os que podem causar contrações do miométrio,
aumentar o fluxo de sangue uterino e mobilizar os mecanismos de defesa para o
útero. Pode-se conseguir isso com os estrogênios e a ocitocina. As prostaglandinas
possuem um estímulo forte nas contrações do miométrio nos cães e nas vacas em
ciclagem, mas não nas vacas em pós-parto. A piometria nas vacas é melhor tratada
com a PGF2α, já que a afecção se define como incluindo a presença de um CL.
Tratamento antimicrobiano – Utilizam-se os agentes antimicrobianos, mais
comumente os antibióticos, no tratamento das infecções do trato reprodutivo em
todas as espécies. A seleção da droga deve-se basear na identificação microbioló-
gica e nos testes de sensibilidade. A dose, a via de administração e o intervalo de
dosagem variam entre as espécies e com o estado microbiológico, a distribuição
tecidual e sangüínea, etc. A maioria dos antibióticos administrados sistemicamente
penetra melhor nos tecidos do trato reprodutivo que aqueles administrados local-
mente, em especial quando se encontrar presente uma endometrite ou uma metrite
severa. Uma tendência recente consiste no uso de doses mais altas ou de um
intervalo de dosagem mais curto para se obterem níveis sangüíneos, distribuição
Aborto, Gr An 785

tecidual e uma concentração inibitória mínima efetivos da droga. Em geral, isso


significa que se devem utilizar doses mais altas que as oficialmente aprovadas.
Alternativas não antibióticas – Os resultados insatisfatórios com os antibióti-
cos e o aumento do interesse acerca da resistência bacteriana e dos resíduos
teciduais, pelo menos no caso dos animais de consumo alimentar, enfatizam a
necessidade de alternativas não antibióticas para o tratamento das infecções
reprodutivas. Em geral, existem 2 efeitos de não antibióticos no trato reprodutivo que
são desejáveis: o efeito contrátil que causa a evacuação do trato tubular e o efeito
positivo na defesa local humoral e celular. As drogas de interesse primário para a
evacuação do útero são a ocitocina, a ergonovina, os estrogênios, e em algumas
espécies (por exemplo, nos cães), a PGF2α. Dessas drogas, os estrogênios e a
PGF2α podem ter um efeito benéfico duplo, estimulando as contrações do útero (por
exemplo, nos casos de retenção da placenta ou dos lóquios, ou de metrite pós-parto)
e estimulando a defesa celular local. Além do seu efeito contrátil no miométrio, a
PGF2α causa a regressão do CL em várias espécies. Isso induz estro, o que reforça
o efeito no miométrio e produz um estrogênio endogenoso. Na piometria, esses
efeitos podem trabalhar sinergisticamente. As drogas com efeito contrátil no trato
tubular, ou com efeito estimulatório na defesa local, são utilizadas em combinação
com antibióticos ou como o único tratamento em casos de retenção da placenta,
metrite, retardamento da involução uterina, retenção dos lóquios, metrorragia,
prolapso uterino, piometria, etc. Utiliza-se comumente a ocitocina para estimular a
ejeção do leite na mastite em algumas espécies (bovinos, eqüinos, cães e suínos).
No passado, o uso de duchas desinfetantes (por exemplo, com solução de lugol,
clorexidina, peróxido de hidrogênio, vários iodóforos, etc.) era muito mais comum
para determinadas infecções. Elas ainda são utilizadas para esse propósito,
especialmente nos grandes animais; no entanto, algumas dessas substâncias são
irritantes, e há indicações de que o uso local de desinfetantes possa perturbar a
defesa imune local (por exemplo, a capacidade fagocítica dos leucócitos). Como não
se confirmaram os efeitos benéficos, recomenda-se hoje menos freqüentemente
esse tipo de tratamento. Para determinados propósitos, por exemplo, a indução do
estro prematuro nas vacas durante um estágio determinado do ciclo, isso ainda
poderia ter um lugar entre os tratamentos possíveis. No entanto, o efeito benéfico
em tais casos se encontra associado mais com a indução da produção de PGF2α e
de estrogênios endogenosos que com o efeito antimicrobiano da droga.

ABORTO, GR AN
Muitos abortos nos bovinos e nos ovinos resultam de uma infecção que alcança
o feto através da circulação materna. O primeiro passo consiste na identificação da
causa do aborto para que se possam tomar as medidas preventivas. Porém, o
diagnóstico da causa é difícil e só se faz um diagnóstico positivo em , 25% dos casos.
Discutem-se as infecções importantes que podem levar ao aborto em seus
respectivos tópicos (ver M ANEJO DA R EPRODUÇÃO: BOVINOS – CAUSAS DO A BORTO, pág.
1374, e DOS EQÜINOS – A BORTO, pág. 1386).
Nos ovinos nos EUA, a causa mais comum de aborto é a campilobacteriose. Os
outros agentes associados com o aborto nos ovinos incluem: a Toxoplasma gondii,
o vírus da língua azul, a Brucella ovis, as clamídias, as leptospiras, a Listeria
monocytogenes e as Salmonella spp. Semelhantemente, as doenças infecciosas
importantes que causam aborto nos suínos (ver adiante) incluem brucelose, a
leptospirose, a pseudo-raiva e a parvovirose.
Aborto, Gr An 786

Têm-se incriminado o trauma, a fadiga, o choque cirúrgico, os venenos e deter-


minadas drogas e produtos químicos como causas de aborto, mas geralmente faltam
provas específicas. Podem ser envolvidos determinados genes (recessivos ou
letais). Tem-se mencionado freqüentemente o envenenamento por nitrato como uma
causa de aborto; entretanto, todos os experimentos controlados e as observações
relativas aos efeitos do nitrato no feto não conseguiram ligar esse produto químico a
uma doença fetal ou um aborto. Os fatores listados anteriormente podem afetar a
prenhez por meio do estresse ou do efeito direto no feto. Em todo caso, a maioria dos
produtos químicos exerce o seu efeito atravessando a placenta e afetando o feto ou
a mesma, ou ambos. Tais produtos químicos podem causar morte fetal e/ou anoma-
lias com severidade variável. Seu efeito no feto depende da dosagem e do momento
específico da gestação (diminui com a idade do feto), por exemplo, a Veratrum
californicum produz uma aplasia adeno-hipofisária e malformações esqueléticas nos
cordeiros fetais quando ingerida pela ovelha no 14º dia de gestação (ver pág. 699).
A maioria das prenhezes gemelares em eqüinos termina em aborto. A introdução
de bactérias contaminantes no útero, por uma pipeta de IA ou por outros meios, pode
causar morte fetal e aborto.

INDUÇÃO DO ABORTO E DO PARTO


Podem-se abortar os bovinos por meio de uma injeção IM de uma dose
luteolítica de prostaglandina (PG)F2α ou de seus análogos. Isso é quase 100%
efetivo na altura do quarto mês, mas tende a ser menos efetivo à medida que a
prenhez progride. Pode-se induzir o aborto (95%) durante o quinto a oitavo meses
pela injeção de uma combinação de uma dose luteolítica de PG e de 25mg de
dexametasona. Ambas as drogas induzem o parto; porém, quando se administram
ambas, os bezerros tendem a nascer em um momento mais previsível após o
tratamento (39 ± 1,5h). Induz-se o parto em 85 a 100% das vacas quando as drogas
são injetadas 0 a 14 dias antes do termo, mas até 75% das induções de sucesso
retêm as placentas; não se afeta significativamente a produção de colostro e de leite.
Os bezerros que nascem em até 14 dias antes do termo apresentam viabilidade
normal e níveis sangüíneos normais de γ-globulinas.
Podem-se abortar as éguas com PG. Após o quarto mês, torna-se necessária
uma dose dupla ou uma repetição do tratamento a intervalos de 48h (ou ambos). No
final da prenhez, a PG irá induzir o parto mas não de um potro vivo. A lavagem do
útero com um anti-séptico diluído, uma solução salina ou soluções antibióticas
resulta no aborto da égua em qualquer estágio da prenhez. Dependendo do estágio
da prenhez, 200 a 500mL de fluido são suficientes.
Nas éguas, quando a cérvix começa a relaxar e o colostro está no úbere, pode-
se induzir o parto pela administração de 40u de ocitocina EV. O parto ocorre em
, 30min. Ele é acompanhado por uma liberação prematura do alantocório, e deve-
se encontrar disponível uma assistência para auxiliar no nascimento e na remoção
das membranas do potro. Uma variação desse tratamento é a administração de 3
doses de 5u de ocitocina a intervalos de 15min, e depois o aumento da dosagem
para 10u a intervalos de 15min até que ocorra o parto.

ABORTO NOS SUÍNOS


Os abortos freqüentemente são dramáticos, mas geralmente apenas como
eventos individuais. A reabsorção fetal precoce sem um aborto óbvio pode ser mais
importante economicamente. A maioria dos abortos resulta de causas não infec-
ciosas. Apesar de uma história e de uma avaliação laboratorial completas, freqüen-
temente torna-se impossível a determinação da causa específica. A falha reprodu-
Aborto, Gr An 787

tiva se deve apenas raramente a uma doença única. Evita-se a maioria dos
problemas por meio de um bom manejo e uma boa criação, e uma boa manutenção
de registros. Torna-se crítica uma coleta cuidadosa de uma informação retrospec-
tiva (ver MANEJO DA REPRODUÇÃO: SUÍNOS, pág. 1387).
A seguir, listam-se algumas causas específicas de aborto ou de outras falhas
reprodutivas. Podem-se localizar as discussões gerais das doenças específicas por
meio do ÍNDICE.
Parvovírus – O vírus está presente na maioria das populações de suínos. A
imunidade materna persiste nas marrãs até a maturidade sexual, e pode impedi-
las de se tornarem naturalmente imunes. Elas podem ficar expostas perto do
período de acasalamento e experimentar uma falha reprodutiva. A reabsorção fetal
precoce e o retorno irregular ao estro são mais comuns. Podem-se observar redu-
ção no tamanho da ninhada, abortamento e aumento no número de múmias. O
diagnóstico se baseia melhor nos registros e no envio dos fetos mumificados ao
laboratório diagnóstico.
Pseudo-raiva – Os problemas reprodutivos podem incluir abortos, natimortos,
múmias e suínos fracos. Em um rebanho infectado recentemente, os outros sinais
podem incluir febre e sinais nervosos e respiratórios. Podem-se utilizar vários testes
laboratoriais diferentes para a confirmação, dependendo do tipo de amostras
disponível. As evidências de uma falha reprodutiva podem ser sutis em um rebanho
cronicamente infectado.
Outros vírus – Outros vírus (por exemplo, o enterovírus e o vírus da gripe) podem
contribuir para a falha reprodutiva. Para a sua identificação exige-se uma investi-
gação diagnóstica completa.
Brucelose – Uma doença incomum e rigidamente monitorada, é transmissível
ao homem e é o objetivo dos regulamentos que governam a movimentação do lote
reprodutor. A brucelose é a única doença venérea dos suínos. Todos os criadores
de lote reprodutor devem manter um atestado de testes regulares e de isenção da
doença. Ela pode causar abortos ou outras falhas, e é diagnosticada por testes
laboratoriais, primariamente a sorologia das porcas.
Leptospirose – A epidemiologia da doença é complexa, sendo uma das causas
mais comuns da falha reprodutiva. Existem várias fontes potenciais dos sorotipos
infecciosos, e estes podem resultar em um número qualquer de manifestações
clínicas, incluindo os abortamentos. A avaliação completa pode incluir a sorologia,
mas torna-se difícil o diagnóstico específico sem uma investigação completa.
Outras infecções bacterianas – Vários patógenos bacterianos podem induzir
a infertilidade e o abortamento: qualquer microrganismo que produzir uma resposta
febril pode resultar em abortamento. As perdas resultantes são geralmente esporá-
dicas e o diagnóstico pode ser difícil.
Micotoxinas – Os bolores podem produzir toxinas (geralmente nos grãos
alimentares) que podem induzir abortos. O início súbito de uma recusa ao alimento,
de diarréia ou de abortos pode justificar a consideração das micotoxinas. Geralmen-
te, existe uma causa insidiosa da redução da eficiência reprodutiva. Deve-se
conduzir um estudo epidemiológico completo tão logo quanto possível. O suporte
laboratorial pode ser útil, mas o alimento afetado não se encontra freqüentemente
disponível para avaliação. Essa é uma razão do valor de um programa regular para
a amostragem e a retenção do alimento.
Monóxido de carbono – Várias influências ambientais, tais como as tempera-
turas ambientes severas, podem ter efeitos sutis na reprodução. Nas instalações
com má ventilação e certos tipos de aquecedores geradores de monóxido de
carbono, os acúmulos deste último podem causar abortos múltiplos e risco aos
tratadores. A amostragem do ar e a avaliação diagnóstica dos suínos abortados
podem resultar em um diagnóstico relativamente imediato.
Aborto, Gr An 788

Acidentes fisiológicos – Nos suínos, muitos abortos resultam de vários


incidentes fisiológicos nas porcas individuais. Esses abortos são freqüentemente
hormonais e podem não ter qualquer relacionamento óbvio com a doença. As
tentativas de diagnóstico são quase sempre retroativas e infrutíferas. Caso se
reconheçam os abortamentos de outono e as ineficiências reprodutivas relativas à
redução da luz solar, deve-se considerar uma iluminação artificial e um aumento no
consumo de energia no final do verão e no início do outono.

ABORTAMENTO CLAMIDIANO
BOVINOS
Têm-se identificado as clamídias como causas do aborto nos bovinos na América
do Norte, na Europa, na África e na Ásia. Nos EUA, têm-se diagnosticado aborta-
mentos clamidianos no Colorado, no Arizona, na Califórnia, em Utah, no Wisconsin,
no Wyoming, em Montana e no Texas.
Etiologia e epidemiologia – Os abortos são causados pelas cepas do Imunotipo
1 da Chlamydia psittaci (ver também ABORTAMENTO ENZOÓTICO NOS OVINOS E NOS
CAPRINOS, adiante). As cepas do Imunotipo 1 representam o único imunotipo
recuperado a partir das placentas e dos fetos abortados das vacas, e elas também
são isoladas freqüentemente a partir de vacas com infecções intestinais subclínicas.
Uma entidade separada conhecida como abortamento bovino epizoótico ou
abortamento do contraforte (ver adiante), que já se pensou ser causada por uma
infecção clamidiana, encontra-se hoje associada com um agente borreliano trans-
mitido pelo carrapato de casca mole Ornithodoros coriaceus. Têm-se isolado os
agentes clamidianos a partir de abortamentos bovinos nos contrafortes californianos,
onde se sabe que o carrapato ocorre, bem como em áreas onde ele não ocorre. A
transmissão do agente do abortamento induzido por clamídias depende não de
vetores, mas da via fecal–oral. As infecções intestinais subclínicas (ver pág. 137)
são comuns nos bovinos, e têm-se induzido experimentalmente abortamentos com
tais isolados intestinais. As infecções clamidianas genitais dos touros causam uma
síndrome de vesiculite seminal, na qual o sêmen contém clamídias. As novilhas
inseminadas com tal sêmen não concebem porque uma endometrite induzida pela
clamídia impede a nidação do embrião e resulta em esterilidade. A infertilidade
torna-se um problema nos rebanhos com touros afetados, mas não se têm descrito
abortamentos em tais rebanhos.
Achados clínicos e lesões – Os abortamentos ocorrem geralmente sem sinais
anteriores. Eles são freqüentemente esporádicos na natureza, mas até 20% das
vacas têm abortado em um dado rebanho. As vacas de todas as idades são
suscetíveis; podem ocorrer abortos logo no quinto mês, embora a maioria ocorra
durante o último trimestre. Também podem nascer natimortos e bezerros fracos.
Podem-se reter as placentas e uma endometrite pode resultar em dificuldades de
reacasalamento.
Uma lesão consistente e significativa é a placentite severa, que pode ser
localizada. O epitélio trofoblástico torna-se necrótico, especialmente nas áreas inter
e periplacentomais. Pode-se encontrar presente um exsudato fibrinopurulento entre
o endométrio e o córion. O córion intercotiledonário pode ter uma consistência
gelatinosa (edematosa) ou coriácea.
As lesões no feto variam consideravelmente dependendo do estágio da infecção.
Essas lesões podem ser mínimas se a infecção permanecer localizada na placenta
e o aborto for simplesmente um resultado de hipoxia fetal que ocorre antes da
clamidemia fetal. Se o feto se infectar com as clamídias, podem-se observar então
lesões tais como necrose focal, vasculite e outras reações inflamatórias em vários
Aborto, Gr An 789

órgãos, inclusive o cérebro. Ocorrem petéquias no tecido subcutâneo, no timo e em


várias superfícies mucosas/serosas. O fígado fica inchado e com uma superfície
mosqueada, e ocorrem ascite e aumento de volume dos linfonodos.
Diagnóstico – As lesões fetais ou placentárias não são suficientemente
características para um diagnóstico específico sem uma confirmação laborato-
rial. A citologia esfoliativa revela inclusões clamidianas intracitoplasmáticas ou
corpúsculos elementares abundantes nas células epiteliais placentárias coriô-
nicas das partes placentárias afetadas. Também se podem isolar as clamídias
em embriões de galinha ou culturas teciduais da placenta ou de vários tecidos fe-
tais, mas a infectividade dessas amostras pode ser baixa no momento do aborta-
mento.
As respostas dos anticorpos das vacas prenhes com infecções e abortamentos
clamidianos fetais e placentários são detectáveis com o ELISA ou o teste de
imunofluorescência por inclusão indireta. As respostas são diagnosticamente
indicativas. Observa-se uma elevação inicial suave dos anticorpos. Os títulos
descem até níveis baixos antes do aborto ou do parto, contanto que esses eventos
ocorram em até mais de 4 semanas após a inoculação ou a exposição. O nascimento
de fetos vivos ou mortos infectados por clamídias com placentas infectadas estimula
uma rápida elevação no título de anticorpos que atinge níveis máximos 2 a 3
semanas após a terminação da prenhez. Da mesma forma, as amostras séricas
pareadas (coletadas no momento do aborto e 2 a 3 semanas mais tarde) exibem
uma elevação significativa no título de anticorpos se o aborto resulta de uma
infecção clamidiana. Os principais antígenos clamidianos reativos nesses testes
são os antígenos proteináceos específicos da espécie, do tipo e da cepa. O teste
padrão de fixação de complemento (CF) empregado anteriormente era específico
do gênero e relativamente insensível. Os fetos podem ter níveis elevados de
imunoglobulinas que não são reativas no teste de CF, mas eles reagem aos
antígenos clamidianos no teste de imunodifusão dupla ou no ELISA.
Tratamento e prevenção – Como as vacas não exibem nenhum sinal antes do
abortamento, torna-se difícil a prevenção de abortos por meio de uma antibioti-
coterapia. A clortetraciclina, 2 a 5g/vaca/dia, incorporada em péletes de alfafa ou em
blocos de melaço com proteína, reduziu a taxa de abortamento em uma experiência
de campo. Porém, isso constitui um regime profilático caro e não prático, exceto em
circunstâncias especiais nas quais existam problemas de abortamento clamidiano
severos e confirmados em um dado rebanho. Não se encontram disponíveis vacinas
clamidianas eficazes para uso nos bovinos.

ABORTAMENTO ENZOÓTICO NOS OVINOS E CAPRINOS


É uma doença infecciosa e mundial que se manifesta por abortamento e, em
menor grau, por parto de natimortos ou prematuros. Têm-se descrito infecções
oculares em trabalhadores de laboratório e abortos em mulheres que tiveram
contato com ovinos em abortamento.
Etiologia e epidemiologia – O agente causador compreende as cepas do
Imunotipo 1 da Chlamydia psittaci, idênticas àquelas associadas ao abortamento
clamidiano bovino (ver anteriormente). As cepas recuperadas a partir de fetos
abortados de ovinos ou bovinos causam abortos em ambas as espécies. Os
microrganismos originários dos tecidos ovinos podem-se propagar no saco vitelino
de embriões de galinha, nas células de cultura, nos camundongos (por instilação
nasal) e nas cobaias (por inoculação IP).
O modo natural de infecção consiste na exposição orofaríngea, na ingestão ou
na inalação. As portas de entrada e de penetração se encontram na nasofaringe,
possivelmente nas criptas amigdalinas e nos locais intestinais. Pode-se produzir
Aborto, Gr An 790

experimentalmente a doença tanto por inoculação oral como por parenteral. Não
há evidências de transmissão mediada por artrópodes. Os carneiros podem ter
infecções nos órgãos genitais e eliminar clamídias no sêmen que contém leucócitos
abundantes. Reduz-se a taxa de concepção das ovelhas acasaladas com tais
carneiros. As ovelhas receptivas se infectam e a infecção persiste. Após a concep-
ção e o desenvolvimento placentário e fetal com respostas imunes associadas,
ocorrem as fases clamidêmicas; o agente invade a placenta e o feto e segue-se o
aborto. Ocasionalmente, será infectado apenas um cordeiro entre um par de
gêmeos. Até 30% das ovelhas prenhes podem abortar quando a infecção for recém-
introduzida em um rebanho, embora ocorram perdas menores ano após ano entre
as ovelhas de 1 ano e as mais jovens nos rebanhos endemicamente infectados.
Achados clínicos – Tornam-se característicos o abortamento, a natimortalidade
ou o parto prematuro no último mês de gestação. Retém-se a placenta em uma peque-
na porção dos abortos. Os fetos mortos podem-se manter no interior do útero, e algu-
mas vezes se mumificam antes de serem expulsos. Tais ovelhas emaciam-se rapi-
damente e podem morrer. Afora esses casos, a doença possui pouco efeito na mãe.
Lesões – Os fetos abortados se encontram bem preservados e podem estar
recobertos por um material floculento e com cor-de-barro. Podem-se detectar as
petéquias no tecido subcutâneo durante a esfola, e os linfonodos se encontram
aumentados e edematosos. A placentite é o achado mais consistente, com uma
porção variável de cotilédones necróticas e um espessamento granular e viscoso do
córion intercotiledonário. As margens das lesões ficam hiperêmicas. As outras
partes da placenta podem parecer normais.
Diagnóstico – A assistência laboratorial torna-se essencial na diferenciação do
abortamento clamidiano dos abortos devidos a outras causas infecciosas. Os
corpúsculos elementares clamidianos aparecem como pintas avermelhadas, pe-
quenas e únicas ou agregadas em decalques corados por Gimenez. As criossecções
das cotilédones afetadas ou dos tecidos intercotiledonários contêm corpúsculos
elementares avermelhados em inclusões citoplasmáticas. A imunofluorescência
revela (com uma especificidade imunológica) os antígenos clamidianos nas amos-
tras placentárias. O isolamento e a identificação das clamídias causadoras consti-
tuem um diagnóstico conclusivo, mas consomem muito tempo e possuem pouco
valor em um surto. Eleva-se significativamente o nível de anticorpos contra antíge-
nos clamidianos após o aborto. Podem-se detectar os anticorpos no soro fetal. Os
testes de escolha são o ELISA ou o teste de imunofluorescência por inclusão
indireta, que detecta principalmente os anticorpos contra os antígenos clamidianos
proteicos. O teste de fixação de complemento utilizado anteriormente detecta
apenas os anticorpos contra os antígenos específicos do gênero.
Pode-se diferenciar o aborto devido à Campylobacter sp por meio do exame dos
decalques e da cultura bacteriana. A Brucella ovis e a Coxiella burnetii causam
síndromes semelhantes e podem ser diferenciadas por citologia esfoliativa ou
cultura.
Tratamento e controle – Reduziram-se significativamente os abortos nas
ovelhas suscetíveis por meio de 2 injeções (com intervalo de 2 semanas) de uma
preparação de longa ação de oxitetraciclina no meio da gestação. Recomenda-se
uma terapia de tetraciclina nos neonatos infectados e nas fêmeas que abortaram.
Porém, ainda não se estabeleceram doses eficazes.
Uma vacina de vírus mortos forneceu uma boa proteção quando administrada
antes do acasalamento ou no início da gestação; deve-se repeti-la a intervalos de
3 anos ou menos. Entretanto, ela não é completamente efetiva e pode ainda ocorrer
a eliminação do microrganismo em um rebanho vacinado. O isolamento das ovelhas
abortantes por 2 a 3 semanas, a remoção de todas as placentas e a higienização das
áreas reduzem o risco para o resto do rebanho.
Aborto, Gr An 791

ABORTO BOVINO EPIZOÓTICO


(ABE, Abortamento do contraforte dos bovinos)

É uma doença infecciosa dos bovinos que se manifesta por abortamento ou


nascimento de bezerros fracos. É endêmica nos contrafortes da Califórnia, em
Nevada e no sul do Oregon.
Etiologia e transmissão – A distribuição do ABE se encontra intimamente
associada com a do vetor, o carrapato “pajaroello” de casca mole (Ornithodoros
coriaceus). Esse carrapato geralmente se encontra na palha do chão das áreas de
repouso dos veados; sob o chaparral, o cerrado com carvalhos e as parreiras-
ursinas dos contrafortes; bem como nas elevações das florestas mais altas nas
cadeias de Sierra Nevada, das Cascatas e Costeira. A alimentação de combinações
de carrapatos adultos e ninfas em vacas prenhes suscetíveis produz aborto no
terceiro trimestre da prenhez, após um período de incubação de 90 a 150 dias. Como
o carrapato se encontra ativo durante os meses quentes e secos do ano e
relativamente dormente durante os meses úmidos mais frios, a infecção se torna
mais comum entre maio e outubro.
Isolaram-se o Chlamydia e a Borrelia spp e 3 vírus a partir dos carrapatos “pajaroello”.
Cultivaram-se os microrganismos borrelianos a partir de tecidos maternos e fetais,
mas eles não induziram um ABE quando inoculados em vacas prenhes. Os agentes
virais provenientes dos carrapatos não induziram abortamentos em vacas prenhes,
mas a inoculação clamidiana causou com certeza um aborto. Porém, o abortamento
clamidiano (ver pág. 788) parece ser uma entidade separada do ABE. Ainda não se
estabeleceu definitivamente a causa infecciosa do ABE.
Os animais em risco são primariamente os que estão no segundo trimestre de
prenhez, quando levados a uma área endêmica pela primeira vez. As novilhas
jovens não parecem desenvolver imunidade nas áreas endêmicas do carrapato e
permanecem suscetíveis ao aborto como novilhas prenhes de 1 ano. A incidência
do abortamento e do nascimento de bezerros fracos a partir de vacas potencialmen-
te expostas é de 10 a 90%, dependendo do grau de exposição ao carrapato, do
estágio da gestação e da suscetibilidade dos animais no rebanho.
Achados clínicos, lesões e diagnóstico – As vacas infectadas não exibem
normalmente nenhum sinal da doença; aquelas que abortam em geral se recuperam
rapidamente com poucas seqüelas e concebem nos acasalamentos subseqüentes.
As vacas que se estressarem adicionalmente ou que ficarem subnutridas são as
mais prováveis de apresentarem uma retenção da placenta. Os bezerros infectados
que nascem vivos podem ser prematuros ou menores que o normal. O aumento de
volume palpável dos linfonodos ajuda na identificação dos bezerros afetados. A
sobrevivência pode depender do clima e da disponibilidade de proteção e de
alimento.
As lesões diagnósticas não se desenvolvem no feto até > 100 dias após a
infecção. A lesão mais característica corresponde ao aumento de volume e à
nodulação do fígado, que resulta de uma congestão crônica. O tecido linfóide se
encontra aumentado por todo o feto; os linfonodos podem ter 3 vezes o tamanho
normal. As outras lesões nos fetos abortados incluem o edema do tecido subcutâneo
e a ascite; pode-se encontrar presente um eritema sobre a pele do flanco e do
abdome. As hemorragias petequiais se disseminam freqüentemente pelo tecido
subcutâneo, pela superfície ventral da língua, pelas mucosas da traquéia e da
cavidade oral e pelas conjuntivas.
Histologicamente, as lesões necrosantes agudas se sobrepõem às lesões
proliferativas crônicas. As lesões proliferativas envolvem as células do sistema
monócito–macrófago que se infiltram em vários órgãos, mais obviamente os
linfonodos, o baço e o fígado. Os focos necrosantes agudos freqüentemente formam
Aborto, Gr An 792

piogranulomas em vários órgãos, particularmente nos linfonodos e no baço. Pode


estar presente uma vasculite aguda em qualquer órgão. As únicas alterações que
ocorrem no timo incluem a atrofia do revestimento cortical dos timócitos e a
infiltração pelos macrófagos. As lesões agudas parecem semelhantes às alterações
imunomediadas que resultam da deposição dos complexos tóxicos no tecido.
Pode-se obter um diagnóstico por tentativa a partir da história e das lesões
macroscópicas, e confirmá-lo por meio das alterações histológicas típicas. Embora
a sorologia não seja confiável sob o ponto de vista de uma causa incerta, os testes
específicos tornam-se úteis na diferenciação das outras causas infecciosas de
aborto.
Profilaxia e tratamento – Os agentes imunizantes e os antibióticos não se
mostraram úteis na prevenção ou no tratamento do ABE. O manejo minimiza com
sucesso o impacto do ABE em áreas endêmicas conhecidas. A manutenção de
novilhas e vacas prenhes suscetíveis conhecidas fora das áreas endêmicas durante
os meses de atividade do carrapato “pajaroello” ou até que atinjam 6 meses de
prenhez se mostrou benéfica. A manipulação dos bovinos na mesma fazenda entre
pastos conhecidos de exposição e de não exposição ao carrapato, com base na
suscetibilidade gestacional e na atividade sazonal dos carrapatos, tem ajudado a
reduzir a incidência do ABE. Os bovinos expostos parecem não abortar uma segunda
vez, embora se desconheça a extensão da proteção proveniente de uma exposição
natural. A alteração da estação de partos (por exemplo, da primavera para o outono
ou do outono para o final do verão) tem melhorado a produção de bezerros.

CAMPILOBACTERIOSE GENITAL OVINA


É uma doença infecciosa caracterizada por abortamento e causada pela
Campylobacter fetus subespécie fetus ou pela C. jejuni. Ela causa sérias perdas
econômicas nos ovinos nos EUA e nos outros países. Ambas as espécies de
Campylobacter causam aborto esporádico nos bovinos, e diarréia, bacteremia,
abortamento e sepse perinatal no homem. Também tem-se associado a
Campylobacter jejuni com a diarréia em vários outros animais (ver pág. 121).
Etiologia e transmissão – Ambos os microrganismos causam epidemias de
aborto ovino. A ingestão com o alimento ou a água é seguida por uma bacteremia
transitória e uma infecção da placenta e do feto. Os esforços experimentais falharam
na transmissão venérea da doença. Os ovinos portadores provavelmente são a
principal fonte de infecção – por microrganismos eliminados nas fezes e oriundos de
infecções gastrointestinais ou da vesícula biliar, ou nas descargas uterinas, ou ainda
nos fetos e membranas abortados. A Campylobacter jejuni é muito disseminada na
natureza e foi isolada a partir das fezes de ovinos, caprinos, bovinos, galinhas,
perus, patos, muitas outras aves, gatos, cães e animais de zoológico. Na maioria dos
casos os portadores eram assintomáticos. Isolou-se a Campylobacter fetus subes-
pécie fetus a partir do sangue, das fezes, dos fetos abortados e da bile dos bovinos,
dos ovinos e do homem.
O período de incubação é de 7 a 53 dias após a ingestão do microrganismo.
Seguem-se alguns surtos após algumas semanas de um aborto primário único. Um
surto produz imunidade no rebanho, possivelmente pela vida inteira, mas não ocorre
proteção cruzada entre as 2 espécies e ambas podem estar envolvidas. Não são
incomuns os surtos nas ovelhas de reposição suscetíveis.
Achados clínicos – Um aborto durante as últimas 8 semanas de prenhez ou, em
alguns casos, o nascimento de cordeiros fracos a termo constitui a síndrome típica.
A morte fetal geralmente ocorre 1 a 2 dias após o aborto. Geralmente, não há
indicação do aborto iminente, mas algumas ovelhas apresentam uma descarga
vaginal anterior. Geralmente, a recuperação imediata e a fertilidade nas estações de
Aborto, Gr An 793

acasalamento subseqüentes são boas. Ocasionalmente, o aborto se complica por


uma metrite e pela morte subseqüente da ovelha. A mortalidade das ovelhas é de
0 a 5%. Nos rebanhos recentemente afetados, pode-se confinar o aborto principal-
mente às ovelhas de reposição não vacinadas. Geralmente, a incidência de aborto
não é > 10 a 20%, mas pode chegar a 70%.
Lesões – Em alguns fetos abortados, mais freqüentemente os que estão próxi-
mos ao termo, o fígado mostra focos necróticos acinzentados típicos de 1 a 3cm de
diâmetro. Geralmente, o feto se encontra edematoso e as suas cavidades corporais
contêm um fluido avermelhado. As membranas fetais ficam edematosas e as
cotilédones ficam pálidas e necróticas, mas as lesões são variáveis e não são
específicas.
Diagnóstico – Deve-se diferenciar a campilobacteriose do abortamento
clamidiano (ver pág. 788), já que o último produz achados clínicos quase idênticos
e pode ocorrer concomitantemente. Torna-se necessário um diagnóstico precoce
para um tratamento também precoce e proteção do resto do rebanho. Pode-se
basear um diagnóstico de tentativa em uma história de abortamento nas últimas 8
semanas de prenhez, ou de nascimento de cordeiros vivos mas fracos, e na
observação de bactérias curvas e delgadas em colorações de impressões
cotiledonares, de descargas vaginais ou do fluido abomasal fetal. Os microrganis-
mos são Gram-negativos, mas podem-se corar com os corantes mais simples para
revelar a sua morfologia característica. Os focos necróticos no fígado são patogno-
mônicos, mas ocorrem em < 40% dos fetos.
O diagnóstico é confirmado pelo isolamento e pela identificação do microrga-
nismo, que podem ser facilmente realizados a partir de amostras satisfatórias. O
fluido abomasal e o fígado fetais são as fontes mais apropriadas para o isolamento.
Se os órgãos abdominais forem removidos por animais necrófagos, pode-se realizar
o isolamento algumas vezes a partir do coração, dos pulmões ou do cérebro.
Tratamento e controle – Devem-se isolar as ovelhas abortantes e adotar
práticas higiênicas estritas; essas incluem a remoção dos fetos abortados e das
descargas associadas. Se possível, devem-se transferir as ovelhas não afetadas
para uma área limpa e providenciar alimento e água não contaminados.
A vacinação em um surto experimental se mostrou efetiva na redução dos
abortos, e deve-se considerá-la quando os abortos ocorrerem sensivelmente antes
da data de parição.
O tratamento com penicilina-estreptomicina IM em 2 dias consecutivos reduziu
experimentalmente o aborto, mas muitas cepas de ambas as espécies são resisten-
tes a esses antibióticos. Como ocorrem cepas resistentes, deve-se realizar um teste
de sensibilidade. Os outros antibióticos, geralmente eficazes, que poderiam ser
considerados são a eritromicina, a tilosina, a gentamicina, a neomicina e algumas
tetraciclinas.
Utiliza-se com algum sucesso a alimentação diária com clortetraciclina da
época do diagnóstico até o parto, mas esse tratamento possui as desvantagens do
ônus, do tempo perdido na preparação de uma mistura uniforme e da palatabilidade.
A higienização, o tratamento com antibióticos parenterais e possivelmente a
vacinação devem controlar a maioria dos surtos.
A vacinação com uma vacina bivalente é efetiva para prevenção do aborto devido
à C. fetus subespécie fetus, mas os abortos devidos à C. jejuni ocorrem algumas
vezes nas ovelhas vacinadas. Devem-se vacinar as ovelhas imediatamente antes
ou após o acasalamento e administrar uma vacinação de reforço imediatamente
após o segundo mês de gestação. Devem-se administrar vacinações de reforço
anuais nessa época.
Síndrome de Agalactia 794

SÍNDROME DE AGALACTIA
PORCAS
A agalactia constitui uma falha total na produção ou na descida do leite. É
incomum nas porcas; no entanto, não é hipogalactia ou insuficiência lactacional (ver
adiante) e ocorre em porcas individuais ou em surtos de rebanho. Várias afecções
das glândulas mamárias são tão devastadoras para os leitões (devido à agalactia
ou à hipogalactia [ver pág. 1322]) que se tornam essenciais um diagnóstico e uma
terapia imediatos ou uma adoção cruzada com outra porca.
Como a porca pode apresentar agalactia ou hipogalactia em uma ou mais
glândulas, os leitões individuais que escolherem e se “fixarem” em uma única
glândula às 24h de idade poderão sofrer enquanto seus irmãos de ninhada se
manterão normais. Isso ocorre comumente como resultado de uma mastite bacte-
riana em uma única glândula sem nenhum sinal clínico óbvio na porca, mas com
conseqüências severas para o leitão “fixado” à glândula.
Numa outra infecção, as tetas individuais podem estar obstruídas ou não existir;
em qualquer caso, a causa mais comum é a necrose da teta, que é uma conseqüên-
cia de trauma nas tetas em pisos ásperos (geralmente de concreto) dentro dos
primeiros dias de vida. Pode-se afetar um número variável de glândulas em porções
variáveis das leitoas. O trauma e a inflamação levam à ablação da teta ou à oclusão
do duto, que podem causar “tetas cegas” na vida posterior. Pode-se evitar isso por
meio da alteração da superfície dos pisos dos engradados de parto do concreto para
um dos materiais plásticos disponíveis.
Uma afecção freqüentemente referida pelos fazendeiros como “úbere áspero” é
extremamente comum. As evidências circunstanciais sugerem que ela esteja
associada geralmente com o aumento da produção de leite e, por várias razões, com
uma falha dos leitões para consumir todo o leite disponível, por exemplo, quando os
leitões se debilitam por diarréia ou friagem. A afecção é autolimitante: a porca
responde ao produzir menos leite, com a perda potencial do crescimento subse-
qüente nos leitões. Não se deve confundir o “úbere áspero” com uma insuficiência
lactacional. Afora a relutância a dar de mamar, as porcas com “úbere áspero” não
apresentam nenhum dos outros sinais clínicos de hipogalactia. Semelhantemente,
não se deve confundir a hipogalactia com a mastite bacteriana na qual, nos casos
severos que envolvem muitas glândulas e infecções por estafilococos ou por
Klebsiella, as porcas podem morrer.
O diagnóstico é feito em grande parte por um exame clínico cuidadoso.

INSUFICIÊNCIA LACTACIONAL NAS PORCAS PERIPARTURIENTES


(Complexo mastite–metrite–agalactia [MMA], Hipogalactia da periparturiente)
É uma síndrome de etiologia complexa; o nome mais freqüentemente usado,
MMA, é errôneo. Embora as glândulas mamárias fiquem inchadas, sensíveis e
freqüentemente mais quentes que o normal, encontra-se uma mastite grosseira-
mente detectável em apenas um pouco > 50% das porcas afetadas. Da mesma
forma, a metrite é apenas um achado ocasional e não um aspecto clinicamente
importante desse problema. Finalmente, apenas raramente ocorre uma agalactia
completa; a maioria das porcas continua a produzir leite, mas a uma taxa grande-
mente reduzida. A conseqüência é a morte dos leitões por inanição aguda, fraqueza
induzida pela hipoglicemia e aumento na incidência do esmagamento pela porca, e
aumento na suscetibilidade à diarréia e aos outros problemas.
Etiologia e patogenia – A etiologia é multifatorial. As evidências sugerem que
as endotoxinas lipopolissacarídicas (LPS), uma porção da parede celular de todas
Síndrome de Agalactia 795

as bactérias Gram-negativas, exerçam um papel em alguns casos. Supõe-se, e


demonstrou-se parcialmente, que tais toxinas sejam facilmente absorvidas a partir
das glândulas mamárias. Além do isolamento dos numerosos estreptococos e
estafilococos, as pesquisas de campo da mastite nos suínos descreveram uma alta
incidência de Escherichia coli e Klebsiella spp, que sustenta adicionalmente o papel
proposto das bactérias Gram-negativas. Também se demonstrou que as endotoxi-
nas podem ser absorvidas a partir do útero, mas não a partir da vagina da porca no
pós-parto.
Além de produzirem uma grande variedade de alterações cardiovasculares e
imunológicas, as endotoxinas LPS também suprimem a produção de prolactina pela
hipófise anterior, diminuem a circulação dos hormônios tireóideos e aumentam as
concentrações do cortisol. Essas alterações afetam adversamente a produção de
leite. A administração sistêmica de endotoxinas de E. coli purificadas produz
alterações clínicas, endócrinas e hematológicas indistinguíveis daquelas observa-
das nos casos de campo de falha na lactação. As evidências circunstanciais de que
as endotoxinas LPS possam exercer um papel na falha da lactação são fortes, mas
ainda não se determinou a extensão do seu envolvimento.
As observações clínicas sugerem que a constipação e/ou o fornecimento de um
alimento finamente triturado para as porcas possa resultar no supercrescimento
bacteriano e na absorção subseqüente das endotoxinas a partir dos intestinos, mas
tem-se contestado grandemente essa teoria.
As outras causas de hipogalactia que devem ser consideradas incluem as
anormalidades do úbere e das tetas, o edema do úbere, a hipocalcemia, a mastite
bacteriana, a infecção viral ativa (por exemplo, a pseudo-raiva e a gastroenterite
transmissível) e o ergotismo crônico. Os derivados do ergot suprimem a liberação
de prolactina nas outras espécies, o que corresponde a um mecanismo de ação
presumivelmente aplicável nas porcas. A incidência da insuficiência lactacional é
, 3 vezes mais alta nos animais multíparos que nos nulíparos, e não segue um
padrão sazonal perceptível. A incidência da produção inadequada de leite varia de
apenas uma porca ocasional a > 50% das porcas de um rebanho.
Achados clínicos e lesões – Observa-se o problema quase que exclusivamente
dentro dos primeiros 3 dias pós-parto; > 50% das porcas afetadas apresentam sinais
de redução da produção de leite dentro das primeiras 24h. O exame clínico é melhor
realizado enquanto os leitões estão mamando. A ejeção do leite nas porcas afetadas
se encontra ou ausente ou com uma breve duração, o que faz com que os leitões
continuem a mamar ativamente por um período extenso. Como resultado dos
esforços de amamentação vigorosos, podem-se traumatizar as tetas. As glândulas
mamárias variam de macroscopicamente normais a inchadas, firmes e quentes ao
toque, com uma pele arroxeada e pustulosa. A temperatura retal das porcas varia
de normal a acentuadamente elevada (> 41°C). Também podem-se manifestar
anorexia, constipação e depressão. É normal uma certa descarga vaginal durante
os primeiros poucos dias pós-parto, e raramente está presente uma metrite.
Durante os estágios iniciais, os leitões tentam mamar repetidamente a inter-
valos freqüentes e não “se acalmam” após o aleitamento. A mordedura da face se
torna freqüente à medida que os leitões se empurram para obterem posição e mais
leite. À medida que se esgotam as reservas de energia dos leitões, diminuem as
tentativas de aleitamento e eles migram freqüentemente para as porções mais
quentes do engradado de parto. É comum o esmagamento por parte da porca.
Não há lesões macroscópicas consistentes. Algumas porcas podem apresentar
alguns focos de inflamação nas glândulas mamárias. Uma ou mais glândulas podem
apresentar uma mastite necrosante severa.
Diagnóstico – O diagnóstico se baseia geralmente nos sinais clínicos. Leitões
emaciados e fracos, um número significativo de leitões esmagados e uma falha da
Síndrome de Agalactia 796

ninhada ao se aquietar após o aleitamento são sinais de uma produção de leite


inadequada. Nas porcas, pirexia leve a moderada, constipação, diarréia, redução do
apetite e sensibilidade, inchaço e deterioração das tetas são compatíveis com um
diagnóstico de insuficiência lactacional. Podem-se isolar culturas bacterianas puras
a partir das amostras de leite.
Tratamento e controle – Vários meios terapêuticos ou outros meios estão
disponíveis para o tratamento; a adoção cruzada dos leitões de porcas afetadas por
porcas normais é de longe o meio mais efetivo. Uma porca que tiver parido dentro
de 24h ou uma porca que tiver desmamado sua ninhada em 2 a 3 semanas de idade
são as mães adotivas adequadas. Não se devem introduzir os leitões às últimas até
, 3h após se ter removido a sua própria ninhada. A ocitocina (5 a 10u/porca)
ocasionalmente é efetiva no restabelecimento da lactação se for utilizada 2 a 3 vezes
a intervalos de 3 a 4h. Nos rebanhos nos quais se afeta uma porcentagem
substancial das porcas e das marrãs, o parto induzido pela prostaglandina F2α reduz
a incidência de insuficiência lactacional. Embora o mecanismo não seja claro,
supõe-se que com uma indução rápida do trabalho de parto, as tetas se dilatem por
um período mais curto, e se reduza o potencial para uma mastite coliforme. Os
antibióticos de amplo espectro se tornam apropriados se a porca apresentar sinais
de mastite. Alguns relatos sugerem que os glicocorticóides sejam efetivos no
tratamento do edema do úbere. Tem-se descrito um certo sucesso com o uso da
flunixina meglumina para contra-atacar alguns dos efeitos das endotoxinas. Não há
evidências claras de que as vacinas ofereçam um efeito profilático benéfico. A boa
higienização tende a reduzir a incidência da mastite na porca e a diarréia nos leitões.
Não é provável que se afetem as ninhadas subseqüentes.

AGALACTIA CONTAGIOSA E OUTRAS MASTITES


MICOPLASMAIS DOS PEQUENOS RUMINANTES
Embora a agalactia contagiosa (AC) seja geralmente causada pela Mycoplasma
agalactiae, pelo menos 3 outros micoplasmas (a saber, a M. mycoides mycoides
[tipo colônia grande, Mmm CG], a M. capricolum e a M. putrefaciens) podem causar
uma mastite transmissível em pequenos ruminantes, particularmente nos caprinos.
Embora se possam isolar ocasionalmente várias outras espécies de micoplasmas
a partir do úbere dos ovinos e dos caprinos, elas provavelmente não causam doença
nesse local.
A Mycoplasma agalactiae e a M. putrefaciens se localizam mais freqüentemente
no úbere e a M. capricolum nas articulações, enquanto a Mmm CG se associa
geralmente com uma síndrome complexa de sinais. No entanto, a distinção clínica
entre esses microrganismos pode ser difícil, e nos países onde ocorrem comumente
2 ou mais deles (por exemplo, na Espanha, em Portugal e na França), aplica-se o
termo AC a uma síndrome de agalactia e poliartrite, com ou sem outros sinais e
independentemente da causa.
Etiologia e achados clínicos – A Mycoplasma agalactiae causa uma doença
subaguda ou crônica em caprinos e ovinos. Ela foi descrita em muitos países do
mundo, mais freqüentemente na bacia do Mediterrâneo.
A doença aparece no parto ou imediatamente após o mesmo. O úbere se torna
quente e inchado; a pirexia e a inapetência são seguidas por uma redução da
produção de leite. O leite pode se tornar espesso e amarelado, e se separa em
repouso. Pode-se afetar uma ou ambas as glândulas do úbere; podem-se desenvol-
ver nódulos endurecidos e, posteriormente, uma atrofia. A produção de leite pode
cessar completamente. A poliartrite é freqüente; a ceratoconjuntivite é menos
comum. Nos surtos sérios, pode-se afetar a maioria dos animais, e a mortalidade
pode ser de 10 a 20%.
Síndrome de Agalactia 797

A Mmm CG é sorologicamente indistinguível do agente causador da


pleuropneumonia contagiosa bovina, mas difere dele em várias características
biológicas, mais notavelmente na produção de grandes colônias em meios de ágar.
Ocorre quase que totalmente nos caprinos e raramente nos ovinos. É a principal
causa de doença nos caprinos nos EUA, na França e em Israel, mas também ocorre
em muitos outros países. A Mmm CG geralmente causa uma doença aguda ou
subaguda, mais severa que a produzida pela M. agalactiae. A mortalidade pode
atingir 25% nas cabras e ser > 90% nos cabritos. Pode-se observar qualquer um ou
todos os sinais de mastite, poliartrite, pleuropneumonia, ceratoconjuntivite e morte
aguda ou superaguda, algumas vezes com sinais no SNC. Os sinais e a severidade
podem variar acentuadamente entre os surtos e os rebanhos e, com o tempo, até
dentro do mesmo rebanho. Em situações endêmicas, a doença pode ser esporádica
e de baixa prevalência, com a redução da produção de leite sendo a conseqüência
mais aparente. Nos surtos agudos, o úbere é geralmente firme e afetado bilateral-
mente e o leite é aguado e esverdeado, com um depósito floculento. Nas fazendas
endemicamente infectadas, freqüentemente afeta-se uma única glândula, e o leite,
embora reduzido em volume, com freqüência parece normal apesar de conter um
grande número de micoplasmas. Em ambas as situações, a afecção pode-se
resolver ou progredir para uma atrofia da glândula. Em um surto nos ovinos, a
pleuropneumonia e a poliartrite causaram uma mortalidade de 60%.
A Mycoplasma capricolum causa uma doença aguda e esporádica nos caprinos,
raramente nos ovinos. Mais comumente descrito na França, nos EUA e na Espanha
(embora também ocorra em muitos outros países), esse microrganismo é um
representante do “grupo da M. mycoides” e se relaciona em particular intimamente
com o agente da pleuropneumonia contagiosa caprina. Pode causar uma agalactia,
uma poliartrite e, ocasionalmente, abscessos nas cabras após um estágio septicêmico.
Nos cabritos, observam-se pneumonia e artrite; nos ovinos, associou-se o microrga-
nismo com a artrite e com uma vulvovaginite ulcerativa.
A Mycoplasma putrefaciens causa uma doença subaguda ou crônica apenas
nos caprinos. Foi descrita mais freqüentemente nos EUA e ocasionalmente na
França e na Austrália. É a menos patogênica das 4 espécies, e os sinais se limitam
normalmente ao úbere, embora a agalactia possa ser seguida por uma poliartrite
severa. A produção de leite cai abruptamente, com ou sem alterações macroscópicas
no leite. Um odor putrefato pode-se tornar detectável no tanque de leite volumoso.
Transmissão e epidemiologia – O leite é uma fonte importante de infecção,
tanto diretamente no filhote lactente, como por meio do equipamento de ordenha ou
das mãos do ordenhador contaminados, ou ainda por meio de camas ou de cochos
de água contaminados. A infecção parece ocorrer principalmente pela via oral em
animais jovens, embora a via respiratória também esteja implicada na infecção pela
Mmm CG. A infecção ascendente do canal da teta também é importante no adulto
lactante, especialmente no caso da M. agalactiae e da M. putrefaciens .
Os portadores são a principal fonte de infecção. Os animais podem excretar
micoplasmas, especialmente a M. agalactiae, por uma lactação e na(s) lactação(ões)
subseqüente(s). Todos os 4 micoplasmas mastitogênicos podem-se instalar no
canal auditivo externo dos caprinos e nos ácaros que ocorrem nesse local. Ainda não
se conhece a importância disso na epidemiologia das micoplasmoses dos pequenos
ruminantes. Embora se considerem os micoplasmas como frágeis e de vida curta
fora do hospedeiro, existem relatos de uma sobrevivência a longo prazo no solo, no
estrume ou em secreções, especialmente em baixas temperaturas.
Diagnóstico – Devem-se investigar os novos surtos por meio de cultura do(s)
agente(s) envolvido(s). A Mycoplasma agalactiae e a M. putrefaciens são identifica-
das com relativa facilidade, embora a identificação da M . capricolum e da Mmm CG
possa exigir um laboratório especializado. A sorologia (geralmente os testes de
Síndrome de Agalactia 798

fixação de complemento e de hemaglutinação indireta) é menos freqüentemente


aplicada e útil apenas na base de um rebanho, preferivelmente após uma demons-
tração por cultura de que o micoplasma específico examinado ocorra no rebanho ou
no local.
O diagnóstico diferencial inclui a infecção pela Pasteurella haemolytica, que pode
causar pneumonia, mastite, e ocasionalmente artrite; a mastite por estafilococos,
estreptococos ou outras bactérias; e a artrite causada pelo vírus da encefalite
artrítica caprina ou pela Erysipelothrix rhusiopathiae.
Tratamento e controle – Os antibióticos mais eficazes são as tetraciclinas, os
macrolídeos (tilosina, eritromicina e josamicina) e o fumarato de tiamulina. Se eles
são administrados imediatamente e por uma duração suficiente (no mínimo 3 a 5
dias), os sinais geralmente melhoram, embora as articulações afetadas ainda
possam ficar recalcitrantes. Além do mais, a antibioticoterapia é onerosa e raramen-
te elimina a infecção pelo micoplasma.
A melhora na higiene e no manejo pode reduzir acentuadamente a prevalência
e a severidade da micoplasmose. Devem-se isolar os animais infectados e manter
os adultos lactantes separados dos animais mais jovens. Se possível, devem-se
separar os animais recém-nascidos das suas mães ao nascimento e alimentá-los
com colostro e depois leite, ambos tratados por aquecimento a 56°C por 30min.
Devem-se desinfetar regularmente o alojamento e os utensílios de ordenha e
observar rigidamente princípios higiênicos durante a ordenha.
Encontram-se disponíveis vacinas comerciais apenas contra a M. agalactiae.
Ambas as formas mortas e atenuadas reduzem a doença; porém, as vacinas de
vírus mortos são onerosas e possuem uma baixa eficácia, e as vacinas de vírus
vivos, embora mais eficazes, podem causar a doença e o leite pode secretar os
microrganismos vivos. Além do mais, as vacinas de vírus vivos utilizadas por muito
tempo não preveniram a infecção por, e a excreção de, cepas virulentas.

CAMPILOBACTERIOSE GENITAL BOVINA


É uma doença venérea dos bovinos, caracterizada por infertilidade e morte
embrionária precoce. Ocorre aborto em uma pequena porcentagem das vacas
infectadas. A distribuição é mundial.
Etiologia e transmissão – A Campylobacter fetus da subespécie venerealis,
que é a causa comum da doença, é um bastonete Gram-negativo, encurvado ou em
forma de espiral, que é móvel por meio de um flagelo polar. Não se sabe se essa
subespécie infecta o homem. A exposição ao calor, ao ressecamento ou aos níveis
atmosféricos de oxigênio destrói rapidamente o microrganismo. Os 2 biótipos
conhecidos não diferem quanto à patogenicidade.
A C. fetus subespécie fetus ou a C. jejuni podem causar abortos esporádicos
nos bovinos, sem evidências de infertilidade, após a sua ingestão. Essas espécies
causam o aborto enzoótico nos ovinos e nos caprinos (ver pág. 792), uma enterite
em vários animais (ver pág. 121) e bacteremia e enterite no homem.
Sob condições naturais, a Campylobacter fetus é transmitida pelo coito, e pode-
se espalhar por meio de instrumentos contaminados ou de sêmen não tratado na
inseminação artificial. A infecção pode-se espalhar entre os touros por contato com
equipamento de coleta de sêmen contaminado ou pelo repouso em uma cama
contaminada. Alguns touros são refratários à infecção, mas outros se tornam
portadores permanentes. A duração do estado de portador nas vacas é muito
variável; em um experimento, 37% delas permaneceram infectadas 5 a 10 meses
Campilobacteriose Genital Bovina 799

após a exposição. O desenvolvimento de uma imunidade local geralmente resulta


na limpeza das trompas de Falópio e do útero dentro de 3 meses, mas a infecção
vaginal pode persistir após se estabelecer uma prenhez.
Achados clínicos – O efeito primário é uma infertilidade temporária; o abortamento
possui uma importância secundária. A irregularidade do ciclo estral é um sinal proe-
minente: ocorre concepção e esta é interrompida pela infecção, reabsorve-se o
embrião e inicia-se um novo ciclo. Se o embrião é expulso, ele freqüentemente é tão
pequeno que não se reconhece o aborto. Também se pode ignorar um grau variável
de endometrite e uma vaginite e uma cervicite ligeiras produzidas algumas vezes.
Sob condições de acasalamento natural, a primeira evidência da doença pode
ser um aumento no número de vacas que retornam ao estro no final do período de
acasalamento e uma perda maior que a normal na carne dos touros reprodutores
devida a uma sobrecarga de trabalho. Nos rebanhos que não estiverem sob
observação estrita, pode-se não suspeitar da doença até que se detectem muitas
vacas receptivas e diferenças maiores que as normais nos estágios da prenhez.
Nos rebanhos recentemente infectados, ocorrem taxas de concepção de 40 a
50% ou menores. Onde a doença é endêmica, as taxas de concepção podem ficar
apenas moderadamente abaixo do normal, com uma infertilidade severa restrita às
novilhas de reposição ou às vacas suscetíveis acasaladas com o rebanho. Geral-
mente não são abortados mais que 5% de um rebanho; os abortos podem ocorrer
em qualquer momento durante a gestação, mas são mais comuns entre o quarto e
o sexto mês. Nos abortos tardios, pode-se reter a placenta. As lesões placentárias
e fetais não são características o suficiente para serem diagnósticas.
Diagnóstico – A campilobacteriose genital e a tricomoníase bovinas (ver pág.
801) são clinicamente semelhantes e difíceis ou impossíveis de se diferenciar sem
os procedimentos laboratoriais. De vez em quando, as 2 doenças são encontradas
correntemente em um rebanho. A campilobacteriose pode ser diagnosticada por
tentativa por intermédio da história clínica e da observação de bactérias delgadas
e encurvadas em colorações de impressões cotiledonares ou do fluido abomasal
fetal. Os microrganismos são Gram-negativos, mas se corarão com os corantes
mais simples, que revelam a sua morfologia característica. Podem-se observá-los
freqüentemente em preparações úmidas do fluido abomasal examinadas por
microscopia de campo escuro ou de contraste de fase. O exame microscópico do
fluido prepucial ou do muco cervicovaginal não é útil devido à ocorrência freqüente
de comensais como a C. sputorum nos animais saudáveis. Pode-se confirmar uma
suspeita de campilobacteriose por:
1. Isolamento da C. fetus subespécie venerealis. O procedimento mais eficiente
e específico é o isolamento dos microrganismos causadores a partir dos touros do
rebanho, que são os principais portadores, ou a partir de vacas não prenhes e inférteis
escolhidas. Podem-se realizar isolamentos a partir dos fetos abortados, geralmente
sem o uso de meios seletivos, se os tecidos são enviados em boas condições ao
laboratório. Devem-se manter os tecidos sob refrigeração ligeira durante o transpor-
te. O fluido abomasal e o fígado são as melhores fontes para o isolamento, mas
algumas vezes pode-se realizar a recuperação a partir de outros órgãos, incluindo o
cérebro. Exige-se uma atmosfera pobre em oxigênio para a incubação das culturas.
Pode-se coletar o fluido prepucial ou o muco cervicovaginal para a cultura. A
lavagem da cavidade prepucial ou da vagina com um fluido pode resultar na redução
dos isolamentos devida ao supercrescimento de culturas por parte de microrganis-
mos contaminantes e por isso não é recomendada. Devido à sensibilidade dos
microrganismos aos níveis atmosféricos de oxigênio, devem-se ou cultivar as
amostras em meios seletivos logo após a coleta ou colocá-las em recipientes de
meio de enriquecimento de transporte para a transferência para o laboratório.
Podem-se transportar as amostras de muco cervicovaginal em pipetas sobre gelo
Campilobacteriose Genital Bovina 800

seco, mas ocorre uma certa redução no número de microrganismos viáveis, o que
pode resultar em resultados falsos-negativos.
Algumas vezes examinam-se os touros e as vacas quanto à campilobacteriose
antes de exportá-los ou vendê-los; exige-se um mínimo de 3 culturas negativas,
provenientes de amostras coletadas em intervalos ≥ 5 dias, para uma certeza
razoável de isenção da infecção.
2. Colorações imunofluorescentes. O exame imunofluorescente dos mucos
prepucial e cervicovaginal complementa a cultura, e o uso de ambos os procedimen-
tos identifica um número ligeiramente mais alto de animais infectados que um dos
procedimentos sozinho. Também se utiliza a imunofluorescência após uma incuba-
ção do meio de enriquecimento de transporte. Uma desvantagem da imunofluores-
cência é a incapacidade de distinção entre a C. venerealis e a C. fetus.
3. Sorologia. Tem-se utilizado o teste de aglutinação do muco vaginal como um
teste de rebanho, mas ele possui um valor limitado na detecção da infecção em
animais individuais. Podem não aparecer anticorpos até que o animal se encontre
infectado por vários meses, e alguns animais se tornam rapidamente negativos. Não
se tem utilizado extensivamente o teste ELISA, mas os resultados preliminares
indicam que ele seja mais sensível e que detecte os anticorpos mais cedo que o teste
de aglutinação.
Os testes de fixação de complemento e aglutinação do soro sangüíneo possuem
um valor limitado porque a maioria das vacas desenvolve apenas títulos baixos e
algumas novilhas virgens e livres da doença desenvolvem títulos, presumivelmen-
te devido ao contato com microrganismos que dividem antígenos com as Campylo-
bacter spp.
Tratamento e controle – As medidas de controle se baseiam na suposição de
que a transmissão ocorra somente no coito e de que os portadores se encontrem
presentes no rebanho. A infecção se restringe aos tratos genitais de ambos os
sexos, e as respostas imunes sistêmicas não se desenvolvem naturalmente. Após
a infecção, a maioria das vacas desenvolve uma imunidade local que limpa as
bactérias das trompas de Falópio e do útero dentro de 3 meses. Pode então ocorrer
uma prenhez, embora a vagina possa permanecer infectada por vários meses ou por
uma ou mais prenhezes bem-sucedidas. Acredita-se que a persistência da infecção
se deva à capacidade das bactérias para alterar os antígenos de superfície expostos
às defesas imunes do hospedeiro durante o curso da infecção. As vacas convales-
centes podem desenvolver uma infecção vaginal novamente quando em exposição
a touros infectados, mas desenvolvem uma resposta anamnésica que impede a
infecção do útero e permite a concepção. Ainda não se identificou uma imunidade
natural nos touros; alguns touros permanecem infectados por toda a vida a menos
que sejam tratados ou vacinados.
Geralmente se realizam as medidas de controle na preparação para a próxima
estação de acasalamento. O descarte das vacas receptivas não eliminará a infecção
no rebanho devido às portadoras prenhes, e deve-se considerar a sua manutenção,
pois o desenvolvimento da imunidade resultará em uma fertilidade razoavelmente
boa. Devem-se vacinar todos os animais tão logo quanto possível após o diagnós-
tico, e novamente em 6 a 8 semanas; deve-se administrar uma vacinação de reforço
, 1 mês antes do início do acasalamento. O intervalo entre as vacinações não deve
ser < 4 semanas.
A vacinação das vacas infectadas acelera a eliminação da infecção em certo
grau, mas o efeito pode ser mínimo em uma infecção bem estabelecida. No entanto,
a vacinação melhora dramaticamente a fertilidade das vacas infectadas, embora
permaneçam algumas portadoras vaginais. A vacinação dos touros pode curar a
infecção e prevenir a infecção permanente, mas em um experimento, necessitou-
se de 3 vacinações para a eliminação da infecção de todos os touros. Os touros
Tricomoníase Bovina 801

vacinados podem transmitir infecções por poucas horas após acasalarem com uma
vaca infectada. Existe uma certa indicação de que a duplicação da dosagem da
vacina utilizada para as vacas possa ser melhor para os touros.
A inseminação artificial pode impedir o alastramento da infecção. Obtém-se o
sêmen preferivelmente a partir de touros não infectados, e dilui-se o mesmo em 1:25;
adicionam-se 500u de penicilina e 0,5mg de diidrostreptomicina por mL de sêmen
diluído. Deve-se manter o sêmen tratado em 4,4°C por ≥ 6h antes do uso. Devem-
se incluir procedimentos de detecção por calor e inseminação para eliminar qual-
quer possibilidade de transmissão entre as vacas.
Embora o tratamento antibiótico das vacas infectadas tenha dado resultados
variáveis e seja praticado raramente, o tratamento dos touros geralmente é efetivo, e em
algumas circunstâncias pode até ser apropriado. Pode-se utilizar um tratamento local
ou sistêmico, ou ambos. No touro, administram-se uma injeção s.c. (25mg/kg) e uma
infusão prepucial (10mL) de 50% de diidrostreptomicina aquosa; mantém-se fechado
o orifício prepucial e massageia-se o exterior da bainha por 1min antes de se liberar o
orifício. Aconselham-se 2 ou 3 tratamentos em intervalos de 48h. Tem-se observado a
ulceração da mucosa peniana, de importância não identificada, em alguns touros após
o tratamento local.
Deve-se praticar a vacinação nos rebanhos limpos em risco devido ao potencial
de mistura dos bovinos durante o acasalamento, ou quando animais não virgens
forem adicionados ao rebanho. Embora as recomendações dos fabricantes de va-
cinas variem, o seguinte programa de vacinação se baseia em resultados de pes-
quisa. Devem-se vacinar as vacas e os touros não vacinados anteriormente por 2
vezes em um intervalo ≥ 4 semanas, com a última vacinação sendo administrada em
≤ 1 mês antes do início do acasalamento. Exigem-se vacinações de reforço anuais
(porque a maioria dos animais vacinados não desenvolve uma resposta anamnésica
durante a exposição à infecção) e devem-se administrá-las antes do acasalamento.
As vacinações de reforço administradas em um período considerável antes do
acasalamento (por exemplo, na época do exame da prenhez) possuem um certo
valor, mas não são efetivas como se fossem administradas imediatamente antes do
acasalamento.

TRICOMONÍASE BOVINA
É uma doença venérea dos bovinos, causada por um protozoário e caracteriza-
da por morte fetal precoce e infertilidade associada com intervalos entre partos
enormemente estendidos. A distribuição é mundial.
Etiologia e epidemiologia – O protozoário piriforme causador (a Tritrichomonas
[Trichomonas] foetus) tem comumente 10 a 15 × 5 a 10µm, mas há um pleomorfismo
considerável, e os microrganismos cultivados em meios artificiais tendem a se tornar
esféricos. Na extremidade anterior do microrganismo, existem 3 flagelos com aproxima-
damente o mesmo tamanho do parasita. Uma membrana ondulante se estende pelo
comprimento do tricomônada e é margeada por um filamento marginal que continua além
da membrana como um flagelo posterior. Alguns microrganismos podem sobreviver aos
procedimentos de refrigeração utilizados para o armazenamento do sêmen, mas eles
não sobrevivem ao ressecamento ou às altas temperaturas.
Encontra-se o microrganismo apenas no trato genital da vaca e do touro. Mais de
90% das vacas podem ser infectadas quando cobertas por um touro doente. Pode
ocorrer transmissão por meio da inseminação artificial (IA); logo, deve-se utilizar
apenas o sêmen proveniente de touros sabidamente não infectados. Pode-se
presumir que a transmissão ocorra somente durante o coito e que a maioria dos
Tricomoníase Bovina 802

touros permaneça permanentemente infectada a menos que seja tratada de modo


apropriado. O touro geralmente corresponde à fonte de infecção inicial e contínua
em um rebanho. As vacas infectadas geralmente se recuperam espontaneamente
após as durações médias de 20 semanas (exposição primária) e de 10 semanas
(exposição secundária).
As vacas podem permanecer infectadas por toda a prenhez e eliminar
tricomônadas a partir do trato genital após o parto. No entanto, a maioria das vacas
anteriormente infectadas que passarem por 3 meses de repouso sexual após um
parto com involução uterina normal ficam livres da infecção.
Achados clínicos – O sinal mais comum é uma infertilidade causada pela morte
do feto, geralmente 2 a 4 meses após a concepção, e caracterizada pelo acasala-
mento repetido e pelo parto enormemente retardado. Pode ocorrer aborto, se a
prenhez continuar pelo terceiro e pelo quarto meses. As vacas que prosseguem com
seus bezerros além do quarto mês parem geralmente um bezerro vivo. Uma medida
prática da infertilidade nas vacas infectadas pela primeira vez consiste em um
aumento no intervalo médio entre partos em 90 a 100 dias.
A tricomoníase é uma causa da piometria pós-coital, que resulta na morte e na
maceração do feto em desenvolvimento. Nos rebanhos infectados, essa complica-
ção geralmente ocorre em < 5% das vacas. O corpo lúteo e, em alguns casos, o
tampão cervical persistem tanto que não ocorre descarga de pus. Mais freqüente-
mente, porém, a cérvix se abre e ocorre uma ligeira descarga inodora. Como em
todas as piometrias, não ocorre estro e a afecção pode persistir por meses.
Diagnóstico – Pode-se basear um diagnóstico por tentativa na história e nos
sinais clínicos, mas a confirmação depende do encontro do microrganismo em pelo
menos um animal em um rebanho. Podem-se encontrar os microrganismos no fluido
placentário, no conteúdo estomacal de um feto abortado, no útero vários dias após
um aborto e no pus exsudado. Também se podem encontrá-los em grande número
na vagina em 12 a 19 dias após a infecção. Subseqüentemente, os números
aumentam e diminuem regularmente de acordo com a fase do ciclo estral, e o maior
número se encontra em 3 a 7 dias antes de cada estro.
Nos touros, os microrganismos se localizam no prepúcio, freqüentemente em
pequenos números. O exame microscópico do esmegma prepucial quanto aos
tricomônadas é o método mais comum para confirmar um diagnóstico de rebanho.
Embora se possam encontrar os tricomônadas em todas as partes da bainha e no
pênis, ocorre em número maior no fórnix e na glande peniana. Pode-se utilizar uma
pipeta plástica de IA para coletar o fluido prepucial. Introduz-se a pipeta no fórnix do
prepúcio e coleta-se o esmegma com uma combinação de raspagem e aspiração
por meio de um bulbo de borracha ou de uma seringa acoplados. Aspiram-se as
amostras de muco vaginal a partir da vagina anterior com uma pipeta de vidro ou
plástico e um tubo comprido de borracha. Simplifica-se o diagnóstico e melhora-se
a eficiência por meio de amostras de cultura por 4 a 7 dias a 37°C, antes do exame
microscópico (alta potência).
Pode-se examinar um volume maior de fluido se não for usada uma lamínula. O
microrganismo pode não ser numeroso e torna-se freqüentemente necessário um
exame sistemático cuidadoso. Pode-se realizar a identificação em baixa potência e
esta é baseada no tamanho e na forma dos microrganismos, bem como na
movimentação abrupta e desnorteada característica. Apenas os microrganismos
vivos são úteis para os propósitos diagnósticos.
Tratamento e controle – As medidas de controle se baseiam na suposição de
que a transmissão ocorra somente durante o coito. Devem-se descartar os animais
com piometria ou outras anormalidades genitais. A maioria das vacas remanescen-
tes pode se recuperar se for utilizada uma IA com sêmen livre de T. foetus. Se a IA
não for possível, o rebanho poderá ser dividido nos grupos exposto e não exposto.
Uberopatias Bovinas 803

No grupo não exposto, prossegue-se a cobertura utilizando-se touros não infecta-


dos. Trata-se o grupo exposto quanto a uma uteropatia reconhecível e permite-se
um repouso sexual de 3 meses. Para o acasalamento, deve-se dividir o rebanho
exposto em tantos grupos quanto possível, com um touro jovem para cada grupo.
Devem-se examinar os touros e as vacas quanto à reinfecção. Também se pode
obter controle nos grandes rebanhos através da eliminação de todos os touros > 3
anos de idade e da utilização apenas dos touros mais jovens para o cruzamento. Isso
se baseia na relativa ausência de suscetibilidade dos touros jovens à infecção por
tricomônadas.
Geralmente se recomenda mais o abate que o tratamento dos touros. Tem-se
descrito um tratamento de sucesso com o dimetridazol, o ipronidazol ou o metronidazol.
No entanto, tal uso ainda não tem aprovação oficial.

UBEROPATIAS BOVINAS
Ver também MASTITE, página 831 e PSEUDOVARÍOLA BOVINA, página 997.

M AMILITE ULCERATIVA BOVINA


É uma afecção ulcerativa severa das tetas das vacas leiteiras que pode ocorrer
em surtos e resultar em uma perda acentuada da produção de leite e uma alta
incidência de mastite secundária. Inicialmente descrita na Grã-Bretanha, ela tam-
bém ocorre nos EUA e em outros países. É causada por um herpesvírus bovino do
Tipo 2, que é o mesmo da cepa Allerton do Grupo II dos vírus da dermatopatia
granulomatosa (ver pág. 997).
As lesões começam como uma ou mais placas espessadas de tamanho variável
na pele de uma ou mais tetas. A vesiculação dessas placas ocorre rapidamente e
a superfície se desprende, deixando uma área ulcerada esfolada que se recobre
com uma escara marrom-enegrecida. As escaras tendem a rachar e sangrar,
especialmente se for tentada a ordenha. Pode-se envolver a maior parte da parede
da teta, e a lesão inclui freqüentemente o orifício desta, o que predispõe a uma
mastite e à obstrução do canal estriado. Nos estágios iniciais, antes que se acentue
a vesiculação, podem-se detectar as inclusões intranucleares nas células da
epiderme. A doença se torna mais severa nas vacas que pariram recentemente,
especialmente aquelas com edema do úbere. As lesões severas podem levar várias
semanas para cicatrizar.
O diagnóstico se baseia nos sinais e se confirma por histopatologia ou isolamento
do vírus a partir das lesões iniciais. Os títulos de neutralização do vírus se elevam
rapidamente e deve-se coletar a primeira amostra sérica no início do curso da
doença.
Devem-se isolar as vacas afetadas e separar os utensílios de ordenha utilizados.
Podem ser necessárias cânulas para remover o leite. As pomadas anti-sépticas
emolientes utilizadas após a ordenha podem reduzir o trauma, a hemorragia e as
infecções bacterianas secundárias adicionais. Devem-se considerar as infusões
profiláticas para mastite se for envolvido o orifício da teta. As soluções de iodóforos
(1:320 v/v) podem ser úteis como desinfetantes da teta e do úbere para auxiliar no
controle nos rebanhos infectados.

DOENÇAS CONGÊNITAS E FISIOLÓGICAS


As aberrações congênitas incluem muitos defeitos estruturais, por exemplo, a
fusão das tetas traseiras e dianteiras, as tetas de base larga ou em forma de funil,
Uberopatias Bovinas 804

as tetas pequenas e curtas, as tetas inapropriadamente localizadas, os úberes


“destacados”, a predisposição a úberes pendulares ou suspensos, a hipoplasia dos
quartos anteriores ou posteriores e as tetas supranumerárias. Exceto quanto à
última afecção, não há tratamento. Devem-se eliminar esses defeitos por meio de
um acasalamento seletivo.
Nas novilhas, observa-se ocasionalmente a agalactia e esta provavelmente se
constitui em uma afecção hereditária associada com um desequilíbrio dos hormô-
nios que controlam o crescimento e o desenvolvimento do úbere ou a lactação. A
resposta ao tratamento é duvidosa. Ocasionalmente, essa afecção se deve a uma
doença sistêmica severa no animal recentemente amadurecido, ou pode estar
associada a uma mastite crônica avançada com uma extensa fibrose da glândula
mamária. Os animais afetados pela última afecção nunca produzem um suprimento
normal de leite.
Nos bovinos leiteiros jovens, observa-se ocasionalmente a falha na descida do
leite após o parto. Pode-se causar isso por meio da dor e do desconforto de um
úbere grande e edematoso, ou por medo e estresse durante o procedimento de
ordenha inicial. Se os métodos comuns de massagem, o uso de compressas
quentes, a amamentação e a ordenha freqüente não conseguirem uma descida
apropriada do leite, a administração de um extrato de hipófise posterior ou de
ocitocina pode ter sucesso. Este tratamento pode ter de ser repetido a cada ordenha
por vários dias. Uma ordenha exata e uma rotina de alimentação tornam-se
importantes no treinamento das novilhas para desenvolverem um hábito de descida
apropriada do leite.
A inversão do orifício da teta é congênita e pode ser hereditária. Embora se
associe com a facilidade da ordenha, ela é indesejável porque as tetas freqüente-
mente borrifam leite. Esse tipo de orifício de teta favorece a infecção do úbere.
Observa-se uma dermatite necrótica (algumas vezes chamada de seborréia do
úbere) nas vacas e nas novilhas de primeiro parto com grandes úberes edematosos
várias semanas após o parto. Nas novilhas, as áreas geralmente envolvidas são a
face lateral do úbere e a face medial da coxa; o úbere fica fortemente pressionado
contra a perna e causa uma esfoladura, uma dermatite e finalmente uma necrose.
Nas vacas, ela é geralmente observada na porção anterior do úbere entre os 2
quartos anteriores. Possivelmente, a má-circulação ou a isquemia devidas ao
extenso edema causem a necrose nesse local. Nas novilhas, o tratamento consiste
na redução da congestão do úbere tão rapidamente quanto possível com diuréticos
ou diuréticos e corticosteróides, limitação da movimentação, limpeza diária com
uma solução anti-séptica e aplicação de adstringentes suaves. Nas vacas, deve-se
lavar diariamente a área necrótica inchada para se controlar o odor, e devem-se
aplicar pós adstringentes e secantes junto com repelentes de moscas durante o
verão. Não existe tratamento específico para acelerar o desprendimento e o reparo
do tecido normal.
O edema e a congestão fisiológicos do úbere são comuns nos bovinos
leiteiros de alta produção antes e após o parto. Não se pode controlar satisfatoria-
mente esse problema, mas várias práticas podem ajudar. Alguns autores aconse-
lham a ordenha das vacas antes do parto como um meio de redução da congestão
e do edema, mas isso pode predispor as vacas mais idosas a uma paresia
parturiente. As ordenhas freqüentes podem ser úteis. A massagem e as compressas
quentes estimulam a circulação e promovem a redução do edema. Deve-se repetir
a massagem tão freqüentemente quanto possível. Quando a descida do leite falha,
o edema e a congestão do úbere parecem aumentar. Nas vacas severamente
afetadas, o úbere freqüentemente “se esgota” e fica pendular. Os diuréticos (por
exemplo, a clorotiazida ou preparações semelhantes) se mostraram altamente
benéficos na redução do edema do úbere, especialmente nos bovinos jovens.
Uberopatias Bovinas 805

A ruptura dos ligamentos suspensores do úbere (principalmente dos liga-


mentos mediais) ocorre gradualmente em algumas vacas mais idosas após várias
lactações, leva a um rebaixamento do úbere e faz com que as tetas se direcionem
um pouco lateralmente. Ocasionalmente, pode ocorrer uma ruptura aguda no parto
ou imediatamente após este; isso se caracteriza por um rebaixamento súbito do
úbere, uma rigidez e um inchaço e por um edema acentuado com uma exsudação
serosa na base do úbere, em especial anteriormente. Não existe tratamento de
sucesso; as tipóias de suporte geralmente não são satisfatórias.
As tetas supernumerárias podem-se localizar no úbere atrás das tetas poste-
riores, entre as tetas anteriores e posteriores ou acopladas às tetas dianteiras ou
traseiras. Elas são facilmente removidas cirurgicamente quando o animal tem de 1
semana a 1 ano de idade; é melhor que essa cirurgia seja feita aos 3 a 8 meses de
idade. A remoção imediatamente antes ou durante a lactação é indesejável pois
freqüentemente se forma na teta uma fístula que é difícil de corrigir. A remoção das
tetas supernumerárias das novilhas leiteiras se torna desejável para melhorar a
aparência do úbere, eliminar a possibilidade de uma mastite na glândula acima das
tetas extras e facilitar a ordenha.
Observa-se urticária ou inchaço alérgico do úbere e das tetas em associação
com uma urticária generalizada (ver pág. 1051) e ocasionalmente pode-se localizá-
la quando as vacas repousam em camas de palha de trigo sarraceno ou de outras
plantas alergênicas.

DOENÇAS TRAUMÁTICAS
Podem-se limpar os ferimentos superficiais do úbere e das tetas com
soluções anti-sépticas adequadas e tratá-los como ferimentos abertos com a,
aplicação freqüente de pós ou sprays anti-sépticos. Se as tetas estão envolvidas
uma fita adesiva pode acelerar a cicatrização. Devem-se tratar os ferimentos que
envolverem o orifício da teta com cremes anti-sépticos e enfaixá-los duas vezes ao
dia para prevenir infecções do úbere. Pode resultar uma hemorragia severa que
exija uma compressão e um ligamento imediatos a partir dos ferimentos que
romperem uma grande veia láctica.
Devem-se limpar e suturar sob anestesia local (com contenção física ou química)
e imediatamente (dentro de 6h) os ferimentos mais profundos do úbere e das
tetas para promover uma cicatrização de primeira intenção. Quando o ferimento
envolver a cisterna da teta, pode-se tornar necessária a inserção de uma cânula de
auto-retenção da teta com uma tampa removível na mesma pelas primeiras 24h
para impedir o vazamento de leite através do ferimento (o que retardaria ou impediria
a cicatrização) e para auxiliar na ordenha. Os cuidados posteriores incluem a infusão
do quarto afetado com preparações antibióticas e a manutenção de altos níveis
sangüíneos de antibióticos por terapia parenteral.
Os abscessos do úbere podem ser secundários a ferimentos, a uma mastite
avançada, a hematomas infectados ou contusões severas. Devem-se incisá-los e
drená-los quando estiverem crônicos e próximos à superfície do úbere. Deve-se
enfaixar o ferimento por 2 dias com uma gaze que contenha um contra-irritante (por
exemplo, uma solução alcoólica de iodo a 2,5%) e lavá-lo diariamente após isso com
uma solução anti-séptica.
A “mancha negra”, a “escara negra” ou o “tripé” da teta podem causar
necrose, formação de escaras e um espessamento fibroso do orifício e do esfíncter
da teta, e podem levar a uma estenose desta (ver adiante). Eles respondem
freqüentemente a aplicações regulares de uma pomada de corticosteróide-antibió-
tico nos estágios iniciais. Os surtos podem-se dever a uma função defeituosa da
máquina desta ordenha, especialmente a uma pulsação defeituosa, a um revesti-
mento muito fino ou a um nível excessivamente alto de vácuo e superordenha. Tais
Uberopatias Bovinas 806

defeitos podem causar inicialmente aversões e crescimentos vegetativos no orifício


da teta, e o leite residual nessas lesões pode favorecer o crescimento bacteriano e
o desenvolvimento de uma infecção local, que pode levar a uma “mancha negra” e
a uma mastite secundária.
Os quartos “cegos” ou não funcionais geralmente são o resultado de uma
infecção severa, que pode ocorrer na vaca lactante ou seca ou na novilha devido à
amamentação por outras novilhas ou bezerros. Se for tratada, pode-se superá-la e
os quartos produzirão leite satisfatoriamente razoável durante a próxima lactação se
a fibrose não for extensa. Pode-se secar permanentemente um quarto cego que
ainda contenha uma pequena quantidade de pus por meio de uma infusão de
solução de nitrato de prata a 3% (30 a 50mL). Os quartos cegos ou não funcionais
raramente podem ser congênitos.
Após o parto, observa-se freqüentemente um leite sanguinolento quando o
úbere fica em geral severamente congestionado e edematoso, bem como após um
trauma no úbere. Essa afecção é mais comum do primeiro ao terceiro parto. Ela
geralmente se resolve sem tratamento em 4 a 14 dias, contanto que se ordenhe
regularmente a glândula.
Podem ocorrer fendas e rachaduras quando as tetas ficam expostas a lavagem
e secagem freqüentes, soluções irritantes ou ventos úmidos e frios. Em alguns
países, podem ocorrer simultaneamente fendas nas tetas e uma pseudovaríola
bovina (ver pág. 997) e estas podem levar a lesões severas. Podem-se tratar ambas
as afecções com pomadas anti-sépticas de úbere, tais como aquelas que contêm
clorexidina ou iodóforos. Os banhos de imersão da teta com os últimos produtos
mais glicerina a 5 a 10%, aplicados após a ordenha, podem ajudar a evitar as fendas
e a controlar a mastite.
A obstrução completa da teta é causada pelos mesmos fatores que causam a
estenose, ou por uma obstrução membranosa congênita. O tratamento é semelhante
ao da estenose, mas o prognóstico geralmente é mais reservado. Ocasionalmente,
se a lesão for suficientemente severa, deve-se interromper a ordenha do quarto pelo
resto do período de lactação ou permanentemente. Podem estar presentes corpús-
culos amiláceos, coágulos sangüíneos firmes, pequenos tumores pedunculados do
revestimento da teta ou corpos estranhos (por exemplo, dilatadores de teta) na
cisterna da mesma e todos esses obstruem intermitentemente o orifício interno da
teta. Podem-se removê-los por meio de uma massagem, ou por dilatação ou incisão
do orifício da teta e captura e remoção do objeto com um par de fórceps finos.
As contusões e os hematomas do úbere e das tetas produzem inchaços
dolorosos e resultam freqüentemente em um leite sanguinolento. Também pode
ocorrer uma estenose temporária do canal ou do orifício da teta. As aplicações frias
feitas regularmente a intervalos de vários dias, e depois as aplicações quentes ou
as compressas quentes e uma massagem suave podem acelerar a resolução do
inchaço. Nessas condições, deve-se substituir a ordenha por máquina por uma
ordenha manual suave até que se complete a recuperação. Os grandes hematomas
raramente podem interferir na circulação do sangue na pele do úbere, e podem
ocorrer necrose e infecção. Não se devem incisar ou drenar os hematomas a menos
que eles fiquem infectados.
As “vazadoras” são as vacas com tetas que gotejam leite continuamente ou
após o estímulo que causa a descida do mesmo. Essas vacas geralmente mantêm
uma lesão severa na teta ou possuem um canal estriado grande. Em geral, pouco
se pode fazer para corrigir satisfatoriamente essa afecção. Têm-se tentado, com
sucesso limitado, a injeção de pequenas quantidades de solução de lugol ao redor
do esfíncter da teta com uma seringa intradérmica, a cauterização do orifício externo
ou da extremidade da teta e a correção cirúrgica.
As fístulas permanentes no interior da teta ou as cisternas das glândulas são
melhor reparadas cirurgicamente quando a vaca se encontra seca.
Brucelose 807

A estenose da teta é caracterizada por um estreitamento acentuado do orifício da


mesma ou do canal estriado (ou de ambos), o que torna a ordenha difícil. Ocasional-
mente uma afecção congênita que afeta todas as tetas, ela resulta mais freqüente-
mente de uma contusão ou de um ferimento que produz um inchaço ou formação de
um coágulo sangüíneo ou escara. Nos casos agudos, indica-se um tratamento
conservador conforme o salientado para os ferimentos e as contusões. Deve-se
interromper temporariamente a ordenha por máquina em favor de uma ordenha
manual da(s) teta(s) afetada(s). Em casos raros, pode-se utilizar uma cânula de teta
presa no lugar, com as precauções assépticas apropriadas, para a retirada do leite.
Muitos casos agudos de estenose progridem para uma forma mais crônica, caracte-
rizada por um espessamento fibroso do revestimento do canal e dos tecidos do
esfíncter, especialmente se estiver presente um ferimento no orifício da teta ou ao
redor dele. Nos casos crônicos, a cirurgia algumas vezes pode corrigir a estenose.
Devem-se manipular cuidadosamente todas as lesões ou procedimentos cirúrgicos
na teta para se evitar uma infecção. Ao se envolver a teta ou o orifício desta, são
indicadas infusões antibióticas profiláticas no quarto.

ACNE DO ÚBERE
É uma doença das vacas leiteiras caracterizada por pústulas na pele do úbere e das
tetas, freqüentemente próximas à base da mesma. Ela tende a se espalhar em alguns
rebanhos. Geralmente podem-se isolar estafilococos a partir das pústulas. Um fator
predisponente pode consistir no excesso de “formigamento” da teteira na ordenha
associado com um prolongamento do intervalo entre a cessação do fluxo de leite e a
remoção da teteira. Devem-se cortar os pêlos da área afetada, lavar a pele completa-
mente com clorexidina (5.000ppm) ou um iodóforo (10.000ppm), e aplicar uma
pomada antibacteriana (tal como a clorexidina ou o sulfatiazol) duas vezes ao dia após
a ordenha. O uso de soluções de clorexidina ou de iodóforos para lavar o úbere e os
banhos de imersão da teta pós-ordenha ajudam a impedir o alastramento da doença.

BRUCELOSE
É uma doença contagiosa que afeta primariamente os bovinos, os suínos, os
ovinos, os caprinos e os cães, causada pelas bactérias do gênero Brucella e
caracterizada por abortamento e, em menor grau, orquite e infecção das glândulas
sexuais acessórias nos machos. A doença é prevalente na maior parte do mundo. A
brucelose afeta ocasionalmente os eqüinos. A doença no homem, freqüentemente
referida como febre ondulante, é um sério problema de saúde pública.

BRUCELOSE NOS BOVINOS


(Aborto contagioso, Doença de Bang)
Etiologia e epidemiologia – Nos bovinos, a doença é causada quase exclusi-
vamente pela Brucella abortus ; no entanto, ocasionalmente implica-se a B. suis ou
a B. melitensis. A infecção se alastra rapidamente e causa muitos abortos nos
rebanhos não vacinados. Tipicamente, em um rebanho no qual a doença é
endêmica, uma vaca infectada só aborta uma vez após a exposição; as gestações
e as lactações subseqüentes parecem normais. Após a exposição, muitos bovinos
se tornam bacterêmicos por um curto período e desenvolvem aglutininas e outros
anticorpos; a maioria dos restantes resiste à infecção, e uma pequena porcentagem
das vacas infectadas se recupera. Um teste de aglutinação sérica positivo geralmen-
Brucelose 808

te precede o aborto, mas pode ser retardado em alguns animais. Os microrganismos


são eliminados no leite e nas descargas uterinas, e a vaca pode ficar temporaria-
mente estéril. Podem-se encontrar bactérias no útero durante a prenhez, a involução
uterina, e infreqüentemente, por um período prolongado no útero não grávido.
Algumas vacas infectadas que abortaram anteriormente eliminam brucelas a partir
do útero nos partos normais subseqüentes. As infecções secundárias contribuem
para a infertilidade e podem prolongar a involução e a presença de B. abortus no
útero e nas suas descargas. Os microrganismos são eliminados no leite por uma
extensão variável de tempo – em alguns animais por toda a vida.
A transmissão natural pode ocorrer por meio da ingestão dos microrganismos,
que podem estar presentes em grande número nos fetos abortados, nas membra-
nas fetais e nas descargas uterinas. Os bovinos podem ingerir água e alimento
contaminados ou lamber os genitais contaminados dos outros animais. A transmis-
são venérea por touros infectados a vacas suscetíveis pode ocorrer mas é rara. A
transmissão pode ocorrer por meio da inseminação artificial ao se depositar no útero
um sêmen contaminado por Brucella, mas ela não ocorre (segundo alguns autores)
ao se depositar esse sêmen no meio da cérvix. As brucelas podem entrar no corpo
pelas membranas mucosas, conjuntivas, ferimentos ou mesmo pela pele intacta.
Os vetores mecânicos (por exemplo, outros animais, incluindo o homem) podem
espalhar a infecção. Têm-se recuperado brucelas a partir de fetos e a partir do
estrume que tenha permanecido em um ambiente fresco por > 2 meses. A exposição
à luz solar direta mata o microrganismo em poucas horas.
Achados clínicos – O aborto é a manifestação mais óbvia. As infecções também
podem causar bezerros natimortos, placentas retidas e redução da produção de
leite. Habitualmente, os abortos não complicados não prejudicam a saúde geral.
Nos touros, podem-se infectar as vesículas seminais, as ampolas, os testículos
e os epidídimos; portanto, os microrganismos se encontram no sêmen. Podem-se
demonstrar aglutininas no plasma seminal dos touros infectados. Podem ocorrer
abscessos testiculares. Tem-se isolado o microrganismo a partir das articulações
artríticas.
Diagnóstico – O diagnóstico se baseia na bacteriologia ou na sorologia. Pode-
se recuperar a Brucella abortus a partir da placenta, porém mais convenientemente
em uma cultura pura do estômago e dos pulmões de um feto abortado. A maioria das
vacas pára de eliminar microrganismos a partir do trato genital quando se completa
a involução uterina. Os focos da infecção permanecem no sistema reticuloendotelial
e no úbere, e isola-se a Brucella abortus freqüentemente a partir do leite e das
secreções do úbere não lactante.
Os testes de aglutinação sérica correspondem ao método de diagnóstico padrão.
Os testes de aglutinação também podem detectar os anticorpos no leite, no soro do
leite e no plasma. Mais recentemente, desenvolveu-se um ELISA para detectar os
anticorpos no leite e no soro e os antígenos de Brucella nas descargas vaginais. Um
teste que utilize o muco vaginal para detectar as aglutininas de Brucella também pode
ter valor diagnóstico. Ao se utilizar uma lâmina padrão ou um teste de aglutinação
sérica em tubo, consideram-se positivas uma aglutinação completa em diluições de
1:100 ou mais para os animais não vacinados e de 1:200 para os animais vacinados
entre os 3 e os 9 meses de idade, e classificam-se esses animais como reagentes.
Procedimentos de teste de avaliação – 1. Teste do anel no leite com Brucella
(TAB) – No controle oficial e na erradicação com base em uma área, o TAB é eficiente
e preciso para localizar os rebanhos leiteiros infectados. Pode-se monitorar o estado
de brucelose dos rebanhos leiteiros em qualquer área por meio da implementação do
TAB a intervalos de 3 a 4 meses. Na fazenda, na unidade de processamento do leite
ou no laticínio, coletam-se e testam-se amostras de leite misturadas provenientes de
rebanhos individuais. Os rebanhos com um TAB positivo são testados individualmente
Brucelose 809

quanto ao sangue e os reagentes são abatidos. O custo de um programa de TAB em


uma área é de , 10% do teste sorológico. As eficácias dos 2 programas de teste na
redução das taxas de infecção são comparáveis.
2. Teste do bovino de mercado (TBM) – Também se podem avaliar os rebanhos
não leiteiros de uma área quanto à brucelose por meio do teste de soros coletados
a partir de bovinos destinados para o abate por mercados intermediários e terminais
ou nos abatedouros. Os reagentes são rastreados até o rebanho de origem, e
testam-se rebanhos inteiros. O custo da identificação dos reagentes por esse
método é mínimo quando comparado com o custo do teste de todos os bovinos em
todos os rebanhos. Podem-se utilizar testes de avaliação adicionais, incluindo o
teste do cartão e o teste da lâmina, para a identificação dos animais presumivelmen-
te infectados, reduzindo conseqüentemente o número de testes diagnósticos mais
onerosos.
Podem-se conseguir e manter áreas livres de brucelose, eficaz e economica-
mente, pela utilização do TAB nos rebanhos leiteiros e do TBM nos rebanhos não
leiteiros.
Podem-se utilizar testes suplementares nos rebanhos nos quais não se erradicou
a brucelose apesar da aplicação contínua dos testes padrão. A utilização de uma
bateria desses testes melhora a probabilidade de detecção dos animais infectados
que permaneceram nesses rebanhos como reservatórios da infecção. Eles também
são utilizados para esclarecer os resultados dos testes do cartão e da lâmina,
especialmente entre os soros dos bovinos vacinados. Esses testes, que incluem a
fixação de complemento e a precipitação em rivanol, são projetados para detectar
primariamente os anticorpos especificamente associados com uma infecção por
Brucella. Um outro procedimento diagnóstico suplementar consiste no teste de
amostras de leite oriundas de quartos individuais do úbere por meio de um TAB de
diluição seriada; esse teste freqüentemente é um método excelente para a detecção
de uma infecção crônica nos úberes das vacas que possam apresentar reações
séricas confusas.
Controle – Como não se conhece nenhum tratamento prático, os esforços se
direcionam para a detecção e a prevenção. A erradicação final depende do teste e
da eliminação dos reagentes. Com esse método, erradicou-se a doença de muitos
rebanhos individuais e áreas. Devem-se testar os rebanhos a intervalos regulares
até que 2 a 3 testes sucessivos sejam negativos.
Devem-se proteger os rebanhos não infectados. O maior perigo corresponde aos
animais de reposição. As adições devem ser bezerros ou novilhas não prenhes
vacinados. Se vacas prenhes ou novas tiverem de ser adicionadas, elas deverão
provir de áreas ou rebanhos livres de brucelose e ser soronegativas. Devem-se
isolar as reposições por ≥ 30 dias e retestá-las antes de adicioná-las ao rebanho.
A vacinação dos bezerros com a cepa 19 da B. abortus aumenta a resistência à
infecção. A resistência pode não ser completa e alguns bezerros podem-se infectar,
dependendo da severidade da exposição. Uma pequena porcentagem dos animais
vacinados desenvolve anticorpos que podem persistir por anos, e que conseqüen-
temente podem confundir os resultados do teste diagnóstico. Para minimizar esse
problema, os bezerros nos EUA são vacinados com uma vacina que contém 3 a 10
bilhões de microrganismos viáveis da cepa 19 da B. abortus por dose de 2mL.
Em determinadas áreas de alta incidência nos EUA, tem-se praticado a vacina-
ção do rebanho completo de bovinos adultos utilizando-se de 300 milhões a 1 bilhão
de microrganismos viáveis da cepa 19 por dose de 2mL; no entanto, não se
recomenda essa prática nas áreas onde a doença tiver sido eliminada.
A bacterina 45/20 de Brucella abortus como adjuvante é uma outra vacina que tem
sido utilizada em outros países. A maioria dos estudos indica que a vacina 45/20,
quando utilizada como recomendado, pode induzir uma imunidade comparável àquela
Brucelose 810

da cepa 19. As recomendações atuais são de 2 injeções iniciais em intervalos


específicos e de um reforço anual. Uma das vantagens é a de que raramente ocorre
um teste de aglutinação sérica positivo. As desvantagens incluem as injeções múltiplas
em intervalos específicos, o custo das vacinas e do trabalho adicionais e as reações
locais nos pontos de injeção.
A vacinação tem sido eficaz como único meio de controle da doença. A redução
no número de reagentes em um rebanho se relaciona diretamente com a porcen-
tagem de animais vacinados. No entanto, quando provier de um controle de um
programa de erradicação, torna-se necessário um programa de teste e abate.

BRUCELOSE NOS CÃES


Embora os cães se infectem ocasionalmente com a Brucella abortus, a B. suis
ou a B. melitensis, essas ocorrências esporádicas em geral se associam intima-
mente com os animais domésticos infectados. Uma causa de aborto em cães
alojados em canis é a B. canis. Os cães parecem ser os hospedeiros definitivos
desse microrganismo. A infecção causa uma redução de 75% no número de
cãezinhos desmamados em alguns canis reprodutores. A doença se dissemina
rapidamente entre os cães alojados em canis muito próximos, especialmente na
época do acasalamento ou quando ocorrem abortos. A transmissão é congênita,
venérea ou por ingestão de materiais contaminados. Todas as idades e ambos os
sexos parecem ser igualmente suscetíveis. Tem-se descrito a transmissão da
brucelose dos cães para o homem e ocasionalmente para outros animais.
Os sinais primários incluem o aborto sem sinais premonitórios durante o último
trimestre da prenhez, natimortos e falhas de concepção. Após o aborto, geralmente
se segue uma descarga vaginal prolongada. Os abortos podem ocorrer durante as
prenhezes subseqüentes. Os cães infectados desenvolvem uma linfadenite gene-
ralizada e freqüentemente uma epididimite, uma periorquite e uma prostatite. A
bacteremia é freqüente e persiste por , 18 meses após a exposição. A pirexia não
é característica.
O diagnóstico se baseia no isolamento e na identificação do agente causador ou
na sorologia. Geralmente, pode-se isolar facilmente o microrganismo a partir do
exsudato vaginal, dos cãezinhos abortados, do sangue, do leite ou do sêmen dos
cães infectados. O teste sorológico mais amplamente utilizado é o teste de aglu-
tinação. Ocorrem reações de aglutinação inespecíficas em alguns cães a partir dos
quais não se tenha isolado Brucella; para eliminar os anticorpos inespecíficos, trata-
se o soro com 2-mercaptoetanol e retestam-se os animais (ver pág. 1154).
As tentativas de imunização ou tratamento não obtêm sucesso uniformemente.
O controle se baseia na eliminação ou no isolamento dos cães infectados identifi-
cados por testes sorológicos ou culturas positivas. A incidência da infecção é muito
mais baixa nos canis onde os cães são alojados individualmente. A terapia a longo
prazo (por exemplo, com uma combinação de estreptomicina e tetraciclina) obtém
sucesso na maioria dos casos.

BRUCELOSE NOS CAPRINOS


Os sinais da brucelose nos caprinos são semelhantes aos dos bovinos. A doença
é prevalente na maioria dos países onde os caprinos são uma parte importante da
indústria animal. Ela é rara nos EUA. O agente causador é geralmente a Brucella
melitensis , mas também se implica a B. abortus. As infecções ocorrem primariamen-
te por ingestão do microrganismo, mas as inoculações conjuntivais, vaginais e subcu-
tâneas também produzirão a doença. A doença causa abortos mais ou menos no
quarto mês de prenhez. Raramente ocorrem artrite e orquite e a infecção com a B.
melitensis pode causar uma ceratite e uma bronquite crônica. O diagnóstico é feito
Brucelose 811

pelo exame bacteriológico do leite ou de um feto abortado, ou por testes de


aglutinação sérica. Se qualquer caprino em um rebanho apresentar um título ≥ 1:100,
devem-se considerar positivos todos os caprinos com títulos de 1:50 ou 1:25. Nos
EUA, controla-se a doença por meio do abate dos reagentes; nos outros países,
utiliza-se a vacinação.

BRUCELOSE NOS EQÜINOS


Os eqüinos podem-se infectar com a Brucella abortus ou a B. suis. A bursite
supurativa, mais comumente reconhecida como “mal da cernelha” ou “mal-da-nuca”
(ver pág. 565), é o incômodo mais freqüente associado com a brucelose nos
eqüinos. Ocasionalmente, descrevem-se abortos.

BRUCELOSE NOS SUÍNOS


As manifestações clínicas da brucelose nos suínos variam consideravelmente,
mas são semelhantes em muitos aspectos àquelas observadas nos bovinos e nos
caprinos. Embora a doença seja freqüentemente autolimitante, ela permanece em
alguns rebanhos por anos. A brucelose causada pela B. suis também ocorre nos
outros animais domésticos e no homem. Descrevem-se epidemias de brucelose
humana entre os trabalhadores de frigoríficos, e a fonte comum são os suínos
infectados.
Etiologia e transmissão – A Brucella suis se espalha principalmente pelo
contato animal íntimo, geralmente por ingestão de tecidos ou de restos infectados.
Os cachaços infectados podem transmitir a doença durante a cobertura; pode-se
recuperar o microrganismo a partir do sêmen.
Os suínos criados para propósitos de acasalamento constituem uma fonte
importante de infecção. Embora infreqüente, tem-se descrito a transmissão natural
entre suínos desmamados infectados. Os suínos lactentes se infectam a partir das
porcas, mas a maioria atinge a idade de desmame sem se infectar. A doença
geralmente é mais severa nos suínos reprodutores que nos suínos jovens, mas
ambos os grupos etários são suscetíveis.
Achados clínicos – Após a exposição à B. suis , os suínos desenvolvem uma
bacteremia que pode persistir por até 90 dias. Durante e após a bacteremia, a
localização pode ocorrer em vários tecidos. Os sinais dependem consideravelmente
do(s) sítio(s) de localização. As manifestações comuns incluem aborto, esterilidade
temporária ou permanente, orquite, claudicação, paralisia posterior, espondilite, e
ocasionalmente, metrite e formação de abscessos nas extremidades ou em outras
áreas do corpo.
A incidência de aborto pode ser de 0 a 80%. Os abortos também podem ocorrer
no início da gestação e não ser observados. Geralmente, as porcas ou as marrãs
que abortam no início da gestação retornam ao estro logo depois e são reacasaladas.
A esterilidade é comum nas porcas, nas marrãs e nos cachaços e pode ser a
única manifestação. Antes de se tentar o tratamento, torna-se lógico o teste quanto
à brucelose nos rebanhos nos quais a esterilidade é um problema. A esterilidade
pode ser permanente nas porcas, porém é mais freqüentemente temporária. Nos
cachaços, pode ocorrer uma orquite, geralmente unilateral; a fertilidade parece ser
reduzida mas não se alcança uma esterilidade completa.
Diagnóstico – O meio principal de diagnóstico nos suínos é o teste do cartão de
brucelose. Têm-se utilizado vários outros testes de aglutinação sérica ou de fixação
de complemento. Acredita-se geralmente que esses testes sejam efetivos na
determinação da presença da brucelose em um rebanho, mas possuam limitações
na sua detecção em animais individuais. Conseqüentemente, em qualquer progra-
Brucelose 812

ma de controle, devem-se testar mais os rebanhos inteiros ou unidades de rebanhos


que os animais individuais. Ocorrem baixos títulos de aglutinina em quase todo
rebanho grande, infectado ou não, e alguns suínos infectados podem não apresen-
tar títulos detectáveis. O teste do cartão geralmente é mais preciso que os testes de
aglutinação convencionais. Nos suínos, também se podem utilizar os testes suple-
mentares utilizados para os bovinos.
Profilaxia e controle – Deve-se ter cuidado após a compra de suínos individuais
que apresentem um baixo título de aglutinina, a menos que se conheça o estado de
todo o rebanho de origem. Devem-se isolar os suínos na volta de feiras e
exposições, antes da entrada no rebanho. Devem-se adquirir as reposições de
rebanhos conhecidos por serem livres de brucelose, ou devem-se testá-las e isolá-
las por 3 meses e retestá-las antes de serem adicionadas ao rebanho. A vacinação
não é confiável, e não se pode fazer nenhuma recomendação prática para o
tratamento. O controle se baseia no teste e na segregação, e no abate do lote
reprodutivo infectado. Podem-se utilizar os seguintes planos para eliminar a
brucelose de um rebanho.
1. Venda do rebanho inteiro para o abate – Esse plano geralmente é o
mais rápido, confiável e econômico. As reposições devem vir de rebanhos livres
de infecção e ser feitas após a limpeza e a desinfecção do equipamento e das
instalações. Deve-se colocar o rebanho de reposição em um piso que esteja livre de
suínos há ≥ 60 dias.
2. Teste, segregação e retardamento do abate do rebanho infectado – Recomen-
da-se esse plano apenas para uso em rebanhos de sangue puro, quando se desejar
reter linhagens valiosas. Devem-se isolar os suínos desmamados com ≤ 6 semanas
de idade (em um piso não contaminado); deve-se comercializar o restante do
rebanho tão logo quanto possível. Os suínos devem ser testados , 30 dias antes
do acasalamento, e devem-se salvar apenas as marrãs que apresentarem um teste
negativo. O acasalamento deve acontecer apenas com cachaços conhecidos como
sendo negativos. Devem-se retestar as marrãs após o parto. Se for encontrada uma
infecção, deve-se repetir o plano inteiro, ou abandoná-lo em favor do plano 1.
3. Abate somente dos reagentes – Geralmente não se recomenda esse plano,
exceto em rebanhos nos quais são encontrados bem poucos reagentes, não é
observado nenhum sinal clínico ou há dúvida de que os títulos do reagente tenham
sido causados por Brucella. Recomenda-se um reteste do rebanho em intervalos de
30 dias, com a remoção dos reagentes até que o resultado seja negativo.
Devem-se encorajar os criadores de suínos nos EUA a atestarem seus rebanhos
como livres de brucelose. Encontram-se disponíveis os detalhes dos procedimentos
de atestamento a partir dos veterinários reguladores estaduais.

BRUCELOSE NOS OVINOS


Nos ovinos, a infecção pela Brucella melitensis causa uma doença clínica
semelhante àquela dos caprinos (ver anteriormente). No entanto, a B. ovis produz
uma doença exclusiva dos ovinos: a epididimite e a orquite deterioram a fertilidade,
que consiste no principal efeito econômico. Ocasionalmente, observam-se placentite
e abortamento e pode haver mortalidade perinatal. A doença foi descrita primeiro na
Nova Zelândia e na Austrália, e desde então foi descrita na maioria das áreas
criadoras de ovinos do mundo.
Infectaram-se experimentalmente carneiros de até 8 semanas por várias vias
não venéreas. A doença pode ser transmitida entre os carneiros por meio do contato
direto. A infecção ativa nas ovelhas é incomum, mas se desenvolve após o
cruzamento com carneiros naturalmente infectados. Os pastos contaminados não
parecem importantes no alastramento da doença. A infecção persiste freqüente-
Brucelose 813

mente nos carneiros, e uma alta porcentagem deles elimina intermitentemente a B.


ovis por ≥ 4 anos.
As manifestações primárias incluem as lesões do epidídimo, da túnica e dos
testículos nos carneiros; a placentite e o abortamento nas ovelhas; e ocasionalmen-
te, a morte perinatal nos cordeiros. As lesões podem-se desenvolver rapidamente:
nos carneiros, a primeira anormalidade detectável pode ser uma deterioração
acentuada na qualidade do sêmen associada com a presença de células inflama-
tórias e microrganismos. Raramente se observa uma fase sistêmica aguda nas
infecções naturalmente ocorrentes. Após a regressão da fase aguda – que pode ser
tão suave a ponto de não ser observada –, podem-se apalpar as lesões no epidídimo
e nas túnicas escrotais. O aumento de volume do epidídimo pode ser uni ou bilateral.
A cauda do epidídimo é envolvida mais freqüentemente que a cabeça ou o corpo,
e a lesão mais proeminente consiste em espermatoceles de tamanho variável que
contêm um fluido espermático parcialmente espessado. As túnicas ficam freqüen-
temente espessadas e fibrosas, e desenvolvem-se aderências extensas entre elas.
Os testículos podem apresentar uma atrofia fibrosa; essas lesões geralmente são
permanentes. Em alguns casos, as lesões palpáveis são transitórias, enquanto em
outros, os microrganismos podem estar presentes no sêmen por longos períodos
sem lesões clinicamente detectáveis.
Como nem todos os carneiros infectados apresentam anormalidades palpáveis
dos tecidos escrotais (nem todos os casos de epididimite se devem à brucelose),
devem-se examinar posteriormente os carneiros remanescentes. Os carneiros que
eliminam os microrganismos, mas não apresentam lesões, devem ser identificados
por meio da cultura do sêmen. Podem ser necessários exames repetidos para
identificar os eliminadores intermitentes. O exame microscópico dos esfregaços
corados de sêmen também pode ser útil; o exame de imunofluorescência é um
auxílio diagnóstico altamente específico. Os testes sorológicos utilizados para a
erradicação da doença e o atestamento de animais incluem o ELISA, a fixação de
complemento, a inibição da hemaglutinação, a aglutinação indireta e a difusão em
gel. Também têm sido utilizados os testes cutâneos de sensibilidade retardada,
particularmente na Romênia, antiga Rússia e América do Sul.
Podem-se reduzir a incidência e o alastramento da doença por meio do exame
regular dos carneiros antes da estação de acasalamento, e do descarte daqueles
que apresentarem anormalidades genitais óbvias. Como a suscetibilidade nos
carneiros aumenta acentuadamente com a idade, tornam-se vantajosos a manuten-
ção de um rebanho de carneiros jovens e o isolamento dos carneiros não infectados
dos carneiros mais velhos e possivelmente infectados.
Na Nova Zelândia, pratica-se extensivamente a imunização dos carneiros
utilizando-se 2 doses de células mortas de B. ovis como um adjuvante. Na África do
Sul, recomenda-se a imunização dos carneiros desmamados com B. melitensis
atenuada. Como a infecção nas ovelhas aparentemente se origina quase que
exclusivamente da cobertura por carneiros infectados, podem-se controlar econo-
micamente as perdas de cordeiros devidas à infecção das ovelhas por meio da
restrição da vacinação aos carneiros.
A clortetraciclina e a estreptomicina utilizadas concomitantemente têm efetuado
curas bacteriológicas. No entanto, o tratamento não é econômico, exceto em
carneiros especialmente valiosos; e mesmo se a infecção for eliminada, a fertilidade
pode continuar prejudicada.
Anomalias Congênitas e Hereditárias do Sistema Reprodutivo 814

ANOMALIAS CONGÊNITAS E HEREDITÁRIAS


DO SISTEMA REPRODUTIVO
O criptorquidismo é uma falha de um ou de ambos os testículos para descer ao
escroto. É mais comum nos suínos e nos eqüinos, e hereditário nessas espécies.
Suspeita-se que seja hereditário nos cães e gatos. A retenção bilateral resulta em
esterilidade por supressão térmica da espermatogênese. A temperatura normal do
escroto necessária para a espermatogênese dos mamíferos é de 0,5 a 4,5°C abaixo
da temperatura corporal normal. Os criptorquídicos unilaterais apresentam uma
espermatogênese normal no testículo escrotal, são férteis e podem passar a
característica para os seus descendentes. Os testículos abdominais produzem
hormônios masculinos, e os criptorquídicos apresentam características sexuais
secundárias e comportamento de cruzamento normais. Como os testículos criptor-
quídicos podem-se tornar neoplásicos, devem-se castrar os animais afetados. Os
hormônios gonadotróficos administrados nos animais pré-púberes algumas vezes
podem fazer com que os testículos desçam.
Também ocorrem o monorquidismo, o anorquidismo e a hipoplasia gona-
dal. A hipoplasia gonadal hereditária dos bovinos das Terras Altas suecas foi
enormemente eliminada por um programa de acasalamento controlado. Não se
tem observado uma hipoplasia gonadal semelhante nos EUA. A hipoplasia
idiopática é comum. As outras anomalias dos testículos e do epidídimo são raras.
A agenesia ovariana ou os ovários supernumerários são extremamente raros, e
a hipoplasia não é freqüente.
O prolapso do prepúcio nos touros ocorre como uma característica de acasa-
lamento ou pode resultar de um edema após um traumatismo. O prolapso predispõe
a uma lesão adicional e se não for tratado resulta em abscedação, cicatrizes,
aderências e fimose. Pode-se corrigir o prolapso do prepúcio por meio da remoção
cirúrgica do tecido supérfluo. A infecção secundária após a cirurgia pode resultar em
aderências e estenose.
Os desvios do pênis nos touros podem resultar de lesões, mas na maioria dos
casos a etiologia é obscura; sugeriu-se um fator herdável. Os desvios são laterais,
descendentes e ascendentes, e, se forem graves, impedem a cópula. Tem-se
realizado a correção cirúrgica por meio da remoção de 1 a 2 pedaços da túnica
albugínea na face convexa. Tais operações são difíceis devido à chance de infecção
e à dificuldade na remoção exata da quantidade certa do tecido, e não se devem
realizá-las se a hereditariedade parecer envolvida.
O pênis espiralado é o resultado de uma ereção extrema, na qual a túnica
albugínea dorsal e lateral do pênis se estica mais do que a túnica mais espessa e
mais forte ao redor do sulco uretral. A maioria dos touros afetados finalmente supera
essa dificuldade sem tratamento. Eles aprendem a inserir o pênis antes que a
espiralação ocorra, ou a libido pode diminuir tanto a ponto de ocorrer uma ereção
menos vigorosa. Algumas vezes observa-se o pênis espiralado ao se utilizarem
altas voltagens para uma eletroejaculação.
A uretra peniana pode-se abrir na superfície ventral do pênis (hipospadia) ou na
sua superfície dorsal (epispadia) e interferir na inseminação natural.
Pode-se cortar com uma tesoura o frênulo persistente nos touros jovens. Pode
ocorrer o pênis congenitamente curto nos touros. O dífalo é raro nos touros.
O hermafroditismo ou intersexualidade pode ocorrer em todas as espécies de
animais domésticos. O hermafrodita verdadeiro possui tanto um tecido ovariano
quanto um testicular. Tal afecção geralmente é bilateral e pode resultar em ano-
malias da genitália externa. O hermafrodita mais comum é na verdade um pseudo-
hermafrodita no qual estão presentes ou ovários ou testículos e ocorre uma anomalia
Anomalias Congênitas e Hereditárias do Sistema Reprodutivo 815

da genitália externa, que lembra, em algum grau, a genitália do sexo oposto. O


pseudo-hermafroditismo é mais comum nos caprinos (ver pág. 343) e nos suínos.
O distúrbio congênito mais freqüente do útero é a aplasia segmentar uterina,
que ocorre nos bovinos gerados por endogamia. Embora seja freqüentemente
referida como doença da novilha branca, esse nome é errôneo pois não existe
conexão com a cor do pelame. A porção do útero sem abertura externa pode-se
preencher com fluido, o que resulta em uma estrutura distendida e semelhante a um
cisto. Pode ocorrer aplasia em vários níveis, incluindo a cérvix, de modo que a
descrição da afecção se torna muito variável entre os animais. Pode-se envolver
a vagina e preenchê-la com muco. Esses animais são estéreis. Não há tratamento.
Os bovinos apresentam freqüentemente uma cérvix dupla. Geralmente, não é
uma cérvix dupla completa, porém mais uma abertura externa dupla com 2 canais
cervicais que se encontram antes de atingir a abertura interna. Essa afecção é
herdada. Ela não tem efeito na fertilidade, e na maioria dos casos é encontrada
apenas incidentalmente durante um exame genital. Os dutos de Gartner císticos
no assoalho da vagina não possuem importância clínica. As vacas podem apresen-
tar raramente um hímen imperfurado, que causa o acúmulo de fluido na vagina.
Uma das anomalias congênitas mais freqüentes dos bovinos é a vaca maninha
(frimartinismo), uma fêmea nascida como gêmeo de um macho normal. Mais de 90%
de tais fêmeas apresentam uma hipoplasia tão extrema do trato genital que só se
podem observar o útero e os ovários histologicamente. A porção anterior da vagina
fica hipoplásica, enquanto a vulva e a porção posterior ficam geralmente normais.
Pode-se determinar um diagnóstico de frimartinismo baseado em hipoplasia vaginal
geralmente por meio de um exame vaginal do bezerro com um dedo ou um espéculo
adequadamente pequeno. A fusão da circulação placentária dos gêmeos permite o
intercâmbio de células embrionárias e possivelmente também de hormônios. O
intercâmbio de células resulta em um padrão genético duplo nos gêmeos, que pode
ser detectado por meio de uma combinação de 2 tipos diferentes de sangue em um
único animal. Esse teste de tipagem sangüínea específico se encontra disponível
nas associações dos bovinos de raça pura e em outros lugares.
A constrição retovaginal do gado jérsei é um defeito congênito que resulta da
homozigose de um único gene autossômico recessivo. Nas fêmeas, o defeito é
caracterizado por constrições inelásticas na junção do ânus, do reto, do vestíbulo e
da vulva. O macho apresenta uma estenose anal. As vacas afetadas desenvolvem
uma distocia severa. Os exames retais são difíceis de serem realizados nos bovinos
afetados. Além disso, as vacas afetadas ficam propensas a desenvolver um edema
de úbere no parto, que se segue freqüentemente por uma mastite severa. O fluxo
sangüíneo mamário fica significativamente mais baixo no parto. No entanto, ocorre
uma elevação significativa da pressão sangüínea, na veia epigástrica superficial
cranial no parto.
As éguas podem ficar estéreis como resultado de anormalidades cromossômi-
cas; tais éguas são geralmente menores que a média da raça. Não há padrão cíclico
de comportamento estral, e embora possa haver uma reação a uma investida, elas
geralmente são passivas aos avanços do garanhão. A genitália externa fica
ligeiramente menor que o normal. As anormalidades notáveis são confinadas à
genitália interna. Os ovários são muito pequenos, lisos, firmes e não apresentam
folículos ou corpos lúteos. O exame histológico revela que esses ovários consistem
de um estroma não diferenciado. O útero é pequeno e flácido e a cérvix é flácida com
a abertura permanecendo aberta. A anormalidade cromossômica comum nessas
éguas é a ausência de um dos cromossomos sexuais denominados XO. Os
autossomos parecem ser normais. Algumas vezes ocorre um mosaico envolvendo
uma mistura de XO e XX ou XY. Não há tratamento.
Ovariopatia Cística 816

OVARIOPATIA CÍSTICA
Entre os animais domésticos, a ovariopatia cística é mais comum nos bovinos,
particularmente nas raças leiteiras, mas também ocorre esporadicamente nos cães
(ver pág. 821), nos gatos e nos suínos. Ocasionalmente, encontram-se grandes
folículos múltiplos em um ou em ambos os ovários da égua, primariamente durante as
fases de transição do outono ou primavera do ciclo reprodutivo. A sua aparência, no
entanto, não é acompanhada do quadro clínico e das aberrações comportamentais
típicas da doença nos bovinos. Os cistos ovarianos nos bovinos podem ser de 3 tipos:
folicular, lúteo ou corpo lúteo (CL) cístico. Ao contrário dos outros, o CL cístico surge
após a ovulação. Considera-se um CL cístico como um estágio normal ou uma
variação do desenvolvimento do CL, já que é encontrado na ciclagem normal e em
vacas prenhes sem sinais concorrentes de infertilidade. O CL cístico possui uma área
central mais macia e mais polposa (devido à presença de um fluido ou de um coágulo
sangüíneo em degeneração) do que o CL típico, e é mais freqüentemente detectado
, 1 semana após o estro, quando a estrutura se encontra próxima do final da fase do
corpo hemorrágico, ou seja, da fase de desenvolvimento. O CL cístico, assim como o
típico, pode ou não apresentar uma coroa ou papila de ovulação no ápice da
estrutura. Não se deve considerar a sua ausência como diagnóstica da afecção
cística, pois 10 a 20% do CL normal e funcional não desenvolve essa característica.
A discussão a seguir se limita às 2 formas patológicas de ovariopatia cística bovina, os
cistos foliculares e os cistos lúteos. Embora etiológica e patogeneticamente relaciona-
das, as suas diferenças clínicas justificam a descrição em separado.

OVARIOPATIA CÍSTICA FOLICULAR


(Cistos foliculares, Folículos císticos, Ninfomania)
As manifestações comportamentais e conformacionais da doença variam consi-
deravelmente, assim como o quadro clínico global. No entanto, todos os sinais se
relacionam com as lesões focais primárias, a saber, os cistos de parede fina no
ovário.
A ovariopatia cística afeta primariamente os bovinos leiteiros, embora também
seja descrita ocasionalmente nos bovinos de corte. Essa diferença se deve ao
manejo e aos métodos de tratamento mais intensivos, utilizados nas vacas leiteiras
individualmente. A doença é mais comum entre determinadas linhagens familiares
dentro das raças, o que implica em fatores hereditários na etiologia.
Acredita-se que a síndrome ovariana cística seja causada pela alta produção.
Porém, essa observação é tendenciosa, pois as vacas de produção mais alta são
as mais prováveis de serem examinadas, de serem tratadas se apresentarem uma
ovariopatia cística e de serem permitidas a permanecer no rebanho, apesar de
alguma redução no desempenho reprodutivo. As evidências indicam que a ovariopatia
cística mais faz com que as vacas produzam mais leite do que a alta produção faz
com que as mesmas desenvolvam a doença. A incidência aumenta com a idade.
Dentro das faixas etárias, a maioria dos casos ocorre dentro de 3 a 8 semanas de
lactação na primeira ovulação pós-parto a ser tentada, coincidindo com a produção
leiteira diária máxima. A incidência descrita no rebanho é de 5 a 25%, ou mais alta
em alguns rebanhos-problema, e pode-se influenciá-la por programas de saúde em
nível de rebanho, nos quais se enfatizam o exame e a detecção.
Etiologia e patogenia – Tem-se implicado uma predisposição hereditária nos
bovinos leiteiros, por exemplo, as novilhas anteriormente císticas apresentaram
uma incidência mais alta de ovariopatia cística do que as novilhas não afetadas. O
estresse pré-parturiente serve aparentemente como gatilho. Acredita-se que o
mecanismo pelo qual o estresse desencadeia os defeitos hipotalâmicos e hipofisá-
Ovariopatia Cística 817

rios nos animais geneticamente predispostos seja mais comumente uma deficiência
relativa na liberação do hormônio luteinizante (LH) no estro. Isso pode ser um reflexo
da falha da liberação hipotalâmica do hormônio liberador de gonadotrofina (GnRH).
Sabe-se que um outro mecanismo que existe em algumas vacas com cistos
corresponde a uma deficiência de receptores de LH e de hormônio folículo-
estimulante (FSH) nos folículos em desenvolvimento.
Durante o proestro normal, a regressão do CL coincide com o desenvolvimento
de um folículo selecionado, enquanto se inibe o crescimento de quaisquer folículos
adicionais. Nos animais que estejam desenvolvendo uma ovariopatia cística, a
ovulação não ocorre. Além do mais, na ausência de um efeito inibidor de um LH
adequado, vários folículos (incluindo os que não ovulam) podem crescer e formar
cistos múltiplos tanto bi como unilateralmente. Macroscopicamente, os cistos
lembram folículos aumentados, variando em tamanho do normal a 5 a 6cm de
diâmetro. O tamanho e a forma de um ovário afetado dependem do número e do
tamanho dos cistos presentes. O ovário cístico é pelo menos inicialmente capaz de
uma esteroidogênese, e os seus produtos variam de estrogênios a progesterona e
a androgênios. A ação dos vários hormônios produzidos é responsável pelas
alterações observadas no trato genital bem como pela conformação do corpo e
comportamento geral.
Achados clínicos – As aberrações comportamentais variam do estro freqüente
e intermitente com um impulso monossexual exagerado a um comportamento
semelhante ao de um touro, incluindo a monta, o arranhamento do chão com as
patas e o bramido. Esse comportamento é acompanhado freqüentemente pela
masculinização da cabeça e do pescoço. Nos casos crônicos, torna-se comum o
relaxamento da vulva, do períneo e dos ligamentos pélvicos grandes, o que faz com
que a extremidade da cabeça se eleve. A maioria dos animais afetados apresenta
esses sinais, mas outros podem ficar sexualmente quiescentes. Essa variação se
deve à duração da doença e à natureza do hormônio secretado pelo ovário doente.
Os ovários afetados ficam geralmente aumentados de volume e arredondados, mas
o seu tamanho varia, dependendo do número e do tamanho dos cistos. A sua
superfície fica lisa, elevada e com estruturas semelhantes a vesículas, particular-
mente quando os cistos excedem os 2,5 a 3cm de diâmetro. Freqüentemente, os
cistos são multiplicados e podem exceder 2,5cm de diâmetro. Sob a influência dos
hormônios produzidos pelo ovário cístico e/ou da falta dos hormônios normalmente
presentes durante os ciclos estrais, o útero passa por alterações palpáveis, que por
sua vez variam com a duração da afecção cística. Conseqüentemente, durante a
primeira semana, a parede uterina fica espessada e edematosa como uma extensão
do edema pós-estral normal. No final da semana, a parede uterina assume uma
textura semelhante à de uma esponja. Nos casos crônicos, são comuns a atrofia e
a atonia da parede uterina. Menos comumente, os cornos uterinos são encurtados
acentuadamente, mas por outro lado parecem normais. É comum um certo grau de
descarga vaginal mucóide a mucopurulenta. A hidrometria (o útero de parede
extremamente fina e preenchido por fluido) ocorre raramente.
Diagnóstico – Os cistos múltiplos e maiores são facilmente identificados por
palpação retal. A história, a conformação e as alterações uterinas (quando presen-
tes) fornecem evidências diagnósticas suplementares. As características da palpa-
ção do útero são úteis para a diferenciação entre um cisto folicular único e um folículo
de Graaf maduro. Somente a vaca no estro apresenta um útero espiralado e
extremamente túrgido.
Prognóstico – De um ponto de vista, a doença responde facilmente ao
tratamento, seja ele mecânico (ruptura manual) ou hormonal. A taxa de sucesso da
ruptura manual, quando medida em termos de concepções dentro de 24 dias, é
, 50%; a hormonioterapia (ver anteriormente) parece obter ligeiramente mais
Ovariopatia Cística 818

sucesso. O comportamento aberrante cessa dentro de 3 a 4 dias após uma terapia


de sucesso. Isso se segue por uma conformação normal do ovário; pode-se esperar
um estro fértil e normal 4 a 7 dias após a ruptura manual e 10 a 30 dias após a
hormonioterapia. No caso do GnRH, 25% dos casos exigiram um segundo tratamen-
to e 5% exigiram um terceiro. Um terço dos casos tratados pela terceira vez não
respondeu. A auto-recuperação é possível e comum nos casos que ocorrerem
dentro dos primeiros 50 dias após o parto. Isto e a observação de que a auto-
recuperação envolve a mesma seqüência de eventos que uma recuperação em
resposta à hormonioterapia sugerem cuidado na avaliação da eficiência terapêutica.
Os proprietários devem estar cientes de que cada vaca tratada com sucesso torna-
se mais provável de exigir um tratamento após o próximo parto do que as vacas
anteriormente não afetadas. Da mesma forma, um tratamento de sucesso encoraja
a perpetuação da doença no rebanho caso se utilizem os descendentes no
acasalamento. Embora a afecção ovariana cística nos bovinos apresente claramen-
te um componente genético, é improvável que uma única fazenda que utilize a IA
possua uma influência significativa em sua incidência. A Suécia tem obtido progres-
so na redução da afecção por meio de procedimentos de descarte e de seleção dos
touros utilizados na IA, mas ainda se tratam as vacas afetadas.
Tratamento – O tratamento mais antigo é a ruptura manual – segura-se o ovário
e aplica-se uma pressão moderada com as polpas dos dedos (e não com suas
pontas) contra a palma até que o(s) cisto(s) se rompa(m). Após uma ruptura de
sucesso, pode-se comprimir brevemente o ovário para minimizar a hemorragia; no
entanto, a hemorragia raramente é uma seqüela da ruptura de cistos foliculares
corretamente diagnosticados. Essa complicação ocorre provavelmente com mais
freqüência, quando se faz um diagnóstico errôneo e se tenta a ruptura de um CL ou
de um corpo hemorrágico. Não se deve desprezar o risco potencial de traumatiza-
ção do ovário e de provocação de uma hemorragia com uma peritonite local
subseqüente. Deve-se ponderar esse risco contra o custo de uma hormonioterapia.
Das várias preparações hormonais recomendadas e usadas no passado, a
gonadotrofina coriônica humana (HCG) permanece como a única ainda disponível
e utilizada. Ela é mais eficaz em unidades IM de 10.000 USP, embora alguns autores
descrevam sucesso com doses menores administradas intramuscular ou endove-
nosamente. A hormonioterapia mais recente inclui um subproduto do GnRH,
conhecido como LH-RH, que é eficaz a 100µg IM. Ele é igualmente efetivo, mas
menos antigênico que a HCG. Pode-se alternar o uso dos 2 produtos, particularmen-
te nos casos refratários. Para acelerar o início do primeiro estro após o tratamento,
podem-se administrar prostaglandinas 9 a 10 dias após a HCG ou o GnRH. Ainda
não se confirmou a alegação de que o acasalamento no primeiro estro seja propenso
à produção de gêmeos. Na verdade, o acasalamento no primeiro estro parece
reduzir o risco de recidiva.
Tem-se administrado parenteral e oralmente a progesterona (ou os seus análo-
gos) às vacas que não respondem a uma terapia com a HCG ou o GnRH. Tem-se
continuado o tratamento com a progesterona por no mínimo 10 a 12 dias, se não 20,
na expectativa de um estro normal com a sua retirada; no entanto, os resultados têm
sido menos que encorajadores.

Ovariopatia cística como um problema no rebanho


Ocasionalmente, os rebanhos individuais experimentam taxas excepcional-
mente altas (, 50%) de ovariopatia cística por um período de meses. A determina-
ção da causa desses episódios não é fácil, mas devem-se apontar as seguintes
questões: 1. O diagnóstico é preciso, ou seja, as estruturas que estão sendo
diagnosticadas como cistos são realmente cistos? Pode-se confirmar isso por meio
de diagnósticos de segunda opinião, da determinação da progesterona no leite ou
Ovariopatia Cística 819

no plasma e/ou da otimização das habilidades diagnósticas por uma educação


contínua. 2. Alterou-se o programa de palpação para o rebanho? O início de uma
rotina de exames pós-parto para todas as vacas e o aumento da freqüência das
visitas ao rebanho podem resultar em um aumento aparente da incidência. 3.
Aumentou a incidência de complicações periparturientes e estresse no rebanho? As
vacas que apresentam problemas na época do parto são muito mais prováveis de
desenvolverem cistos. Tentativas de redução dessas complicações são indicadas.
4. Avaliou-se o programa nutricional do rebanho? Freqüentemente são implicadas
as aberrações nutricionais como causadoras do desenvolvimento de cistos nas
vacas, mas raramente se confirma essa preocupação em experimentos controla-
dos. Têm-se implicado mais freqüentemente as inadequações ou os desequilíbrios
que envolvem o cálcio e o fósforo, a vitamina E e o selênio e a energia. Também se
suspeita freqüentemente dos alimentos ou forragens mofados que contêm altas
concentrações de substâncias estrogênicas, mas necessita-se de melhores méto-
dos de teste.

OVARIOPATIA CÍSTICA LÚTEA


(Cistos lúteos)
Este tipo de ovariopatia cística se caracteriza por ovários aumentados com um
ou mais cistos – cujas paredes são mais espessas que as dos cistos foliculares,
devido ao revestimento de tecido lúteo. As proporções de incidência de cistos lúteos
versus cistos foliculares variam enormemente entre os veterinários, dependendo de
suas tendências diagnósticas individuais. O padrão de incidência é semelhante ao
dos cistos foliculares.
Etiologia e patogenia – As causas básicas dos cistos lúteos são as mesmas dos
cistos foliculares. A principal é a liberação de LH suficiente para iniciar a luteinização
dos folículos, mas inadequada para causar a ovulação. Os cistos lúteos são uma
extensão dos cistos foliculares, tanto que o folículo não ovulatório fica parcialmente
luteinizado, espontaneamente ou em resposta a uma hormonioterapia.
Achados clínicos – Os cistos lúteos são acompanhados por uma conformação
normal e um comportamento anestral. A palpação retal revela um útero quiescente
característico da fase lútea do ciclo estral. Os cistos lúteos são reconhecidos como
cúpulas lisas e flutuantes que protraem por cima da superfície do ovário. Esses cistos
são geralmente únicos, mas podem ser múltiplos ou aparecer intercorrentemente
com cistos foliculares uni ou bilateralmente. Os cistos lúteos são diferenciados dos
cistos foliculares com base nas características palpáveis da estrutura e do útero, e
em certo grau, da conformação do corpo e do comportamento. O ensaio de pro-
gesterona e a ultra-sonografia podem ajudar a diferenciar os cistos foliculares dos
lúteos. Nas tentativas de ruptura manual das estruturas císticas, os cistos foliculares
explodem sob uma pressão mínima, enquanto os cistos lúteos não podem-se romper
sem a aplicação de uma pressão considerável, freqüentemente em excesso daquela
considerada segura. Ambos os tipos de cistos respondem à terapia com LH ou com
GnRH, mas a prostaglandina F2α irá lisar alguns cistos lúteos e, quando aplicável,
esse tratamento se torna preferível devido ao seu período muito mais curto entre a
administração e o estro e ao seu custo mais baixo que o da HCG ou do GnRH.
Tratamento e controle – O tratamento de escolha corresponde às doses
luteolíticas de PGF2α. Os cistos lúteos também respondem à terapia com a HCG e
com o GnRH, que é efetiva no tratamento dos cistos foliculares. Não se recomenda
a ruptura manual dos cistos lúteos.
As medidas preventivas são comuns a ambos os tipos de cistos (ver anterior-
mente).
Doenças do Sistema Reprodutivo, Pq An 820

DOENÇAS DO SISTEMA REPRODUTIVO,


PQ AN
Ver também MANEJO DA REPRODUÇÃO: PQ AN, página 1401.

DISTÚRBIOS DA FÊMEA
Metrite aguda
A infecção aguda do útero é geralmente um distúrbio pós-parto que pode ser
associado a um aborto, uma infecção fetal, uma retenção de placenta, uma manipu-
lação obstétrica ou com uma infecção ascendente após um parto aparentemente
normal. A metrite ocorre incomumente após o acasalamento. A Escherichia coli é a
bactéria mais comum isolada a partir do útero infectado; os estreptococos, os
estafilococos e outras bactérias são isolados menos freqüentemente.
Os animais com metrite ficam geralmente muito doentes, com febre, letargia e
inapetência. Geralmente, encontra-se uma descarga vaginal purulenta e fétida. A
fêmea pode rejeitar o seu filhote. Deve-se considerar a metrite aguda em qualquer
animal no pós-parto com sinais de enfermidade sistêmica ou de uma descarga
vaginal anormal. Um útero flácido e grande pode-se tornar palpável. Devem-se tirar
radiografias para se determinar se houve retenção de fetos. O hemograma pode
apresentar uma leucocitose com um desvio à esquerda.
A terapia inclui o tratamento de suporte, os fluidos EV e os antibióticos bacteri-
cidas de amplo espectro, preferivelmente aqueles efetivos contra a E. coli. A
prostaglandina F2α (0,1 a 0,25mg/kg de peso corporal, s.c., por 2 a 3 dias) ou a
ocitocina (5 a 20u nas cadelas, 2 a 5u nas gatas, IM) podem ajudar a evacuar o
conteúdo uterino. Indica-se uma ovário-histerectomia após a estabilização inicial se
o animal estiver extremamente doente ou se uma futura reprodução não for
importante. Senão, deve-se considerá-la um procedimento facultativo para ser
realizado ao se cessar a lactação.

Distocia
Um nascimento difícil pode resultar de defeitos no miométrio, anormalidades
metabólicas tais como hipocalcemia, diâmetro pélvico inadequado, dilatação insu-
ficiente do canal de nascimento, deficiência hormonal fetal (deficiência corticoste-
róide fetal), tamanho demasiadamente grande do feto, morte fetal ou apresentação
fetal anormal.
Deve-se considerar a distocia em qualquer uma das seguintes situações: um
animal com uma história anterior de uma distocia ou de uma obstrução do trato
reprodutivo; nenhum parto dentro de 24h após a queda da temperatura retal (para
< 37,7°C); 1 a 2h de contrações abdominais fortes sem a passagem de um cãozinho
ou de um gatinho; 1 a 2h de trabalho de parto ativo sem o nascimento dos cãezinhos/
gatinhos subseqüentes; o período de repouso durante um trabalho de parto ativo
excede 4 a 6h; a cadela ou a gata está em dor óbvia (gritos e lambedura ou
mordedura da vulva); há uma descarga vaginal negra, purulenta ou hemorrágica; há
sinais de enfermidade sistêmica; ou a gestação se prolonga.
Para se permitir uma terapia racional, devem-se determinar a causa da distocia
(obstrutiva versus não obstrutiva) e as condições do animal avaliado. Torna-se
desejável uma história completa quanto aos partos anteriores, aos traumatismos
pélvicos e às datas de acasalamento. Deve-se examinar o animal quanto a sinais
de uma enfermidade sistêmica que, se estiver presente, pode exigir uma cirurgia
cesariana imediata. A descarga vaginal normal no parto possui uma cor verde-
Doenças do Sistema Reprodutivo, Pq An 821

escura; uma cor anormal característica exige uma atenção imediata. Deve-se
realizar um exame vaginal estéril para se avaliar o grau de dilatação cervical, a
desobstrução do canal de nascimento e a posição e a apresentação do(s) feto(s).
Pode-se utilizar a radiografia ou a ultra-sonografia para determinar a presença dos
fetos, seu tamanho, número, posição e viabilidade.
Pode-se considerar o manejo médico quando as condições da fêmea e dos fetos
estiverem estáveis, quando houver uma posição e uma apresentação fetais apro-
priadas e quando não houver obstrução. Pode-se administrar a ocitocina IM (3 a 20u
nas cadelas, 2 a 5u nas gatas) em até 3 vezes a intervalos de 30min, com ou sem
gliconato de cálcio a 10% (3 a 5mL, EV lentamente, 1 vez) na tentativa de promover
as contrações uterinas. Se não se seguir nenhuma resposta, deve-se realizar uma
cirurgia cesariana.
Pode-se utilizar (cuidadosamente) o fórceps para remover os fetos mortos ou
facilitar o nascimento dos fetos mal-apresentados ou parcialmente nascidos.
Devem-se realizar uma manipulação gentil e uma lubrificação adequada para se
evitar danos ou morte dos fetos vivos. A episiotomia pode ser útil.
Indica-se a cirurgia no caso de uma distocia obstrutiva (se essa distocia for
acompanhada por um choque ou uma enfermidade sistêmica), no caso de uma
inércia uterina primária (caso se prolongue o trabalho ativo de parto) e/ou o manejo
médico falhe.

Pseudoprenhez nas cadelas


(Pseudociese)
A pseudoprenhez é comum nas cadelas e incomum nas gatas. Ocorre no final do
diestro e se caracteriza pela hiperplasia das glândulas mamárias, pela lactação e
pelas alterações comportamentais. Algumas cadelas se comportam como se o parto
tivesse ocorrido, cuidando “maternalmente” de objetos inanimados colocados
embaixo de si e recusando-se a comer. A história, a palpação abdominal e as
radiografias/ultra-sonografia abdominais excluem a possibilidade de uma prenhez
verdadeira.
Acredita-se que a queda da progesterona e o aumento da concentração de
prolactina, associados com um diestro tardio, sejam responsáveis pelos sinais
clínicos. Não se recomenda nenhum tratamento, pois a afecção se resolve espon-
taneamente em 1 a 3 semanas. Tranqüilizantes podem ser considerados para as
cadelas com alterações comportamentais significativas, embora algumas dessas
drogas possam aumentar a liberação de prolactina. Não se devem utilizar estrogê-
nios devido ao seu potencial de supressão da medula óssea. As progestinas
geralmente param a lactação, mas se forem interrompidas, a prolactina aumenta
novamente e a lactação pode recorrer. Os androgênios podem ser considerados
para parar a lactação. Se os proprietários se incomodarem com acessos repetidos
de pseudoprenhez, deve-se ou acasalar a cadela ou submetê-la a uma ovário-
histerectomia. A ovário-histerectomia impede a recidiva.

Cistos foliculares: ninfomania


Os cistos foliculares são raros e resultam em uma secreção prolongada de
estrogênios, em sinais contínuos de proestro ou de estro e na atratividade aos
machos. Pode não ocorrer ovulação durante esse ciclo estral anormal. Deve-se
suspeitar de cistos foliculares em qualquer cadela que apresente manifestações
clínicas de estro por > 21 dias ou quando o proestro e o estro durarem por > 40 dias.
Os folículos císticos podem ser difíceis de diferenciar dos ciclos freqüentes e
normais nas gatas. Um tumor ovariano secretor de estrogênios corresponde a uma
outra consideração diagnóstica.
Doenças do Sistema Reprodutivo, Pq An 822

A ovário-histerectomia é curativa. Caso se pretenda acasalar o animal, pode-se


induzir a ovulação pelo uso do hormônio liberador de gonadotrofina (GnRH, 25µg
totais nas cadelas ≤ 11kg, e 2,2µg/kg nas cadelas > 11kg; 25µg totais, IM, nas gatas
por 2 dias). O acasalamento deve continuar provavelmente por todo o estro
prolongado, pois se desconhece o momento de ovulação. O GnRH não é um
tratamento efetivo para os tumores ovarianos.

Mastite
É um processo inflamatório séptico ou não séptico que envolve uma ou mais
glândulas mamárias e que geralmente ocorre durante a lactação. Pode ocorrer uma
mastite séptica por infecção ascendente a partir dos mamilos, por ferimentos
penetrantes ou por alastramento hematogênico. Os estafilococos e os estreptoco-
cos são as bactérias mais comuns isoladas do leite. Geralmente não se encontra a
fonte de infecção. As glândulas mamárias afetadas ficam geralmente inchadas,
quentes e doloridas. O leite das glândulas afetadas pode ficar hemorrágico ou
purulento, pode apresentar um pH alcalino e ser freqüentemente mais viscoso que
o leite normal. A cadela/gata pode ou não apresentar sinais de enfermidade tais
como febre, apatia, inapetência e rejeição do filhote.
O diagnóstico se faz facilmente a partir da história e do exame físico. Deve-se
avaliar o leite de cada glândula em qualquer cadela ou gata no pós-parto com sinais
de enfermidade sistêmica. Antes de se iniciar a terapia, deve-se coletar uma
amostra do leite para uma cultura bacteriana e um exame de sensibilidade. O fluido
pode ser obtido também para cultura por meio da aspiração com uma agulha fina.
Devem-se escolher os antibióticos bactericidas de amplo espectro com base nos
testes de sensibilidade, e com o conhecimento de que eles passarão no leite para
o filhote. Durante a lactação, devem-se evitar antibióticos tais como a tetraciclina,
o cloranfenicol ou os aminoglicosídios, a menos que os neonatos estejam desma-
mados. As compressas quentes nas glândulas afetadas encorajam a drenagem e
parecem aliviar o desconforto. Deve-se lancetar, drenar, lavar e tratar uma glândula
mamária abscedada como um ferimento aberto.
As mastites não sépticas ocorrem mais comumente no desmame. A(s) glândula(s)
afetada(s) fica(m) quente(s), inchada(s) e dolorida(s) ao toque, mas o animal fica
alerta e saudável. Devem-se aplicar localmente compressas quentes 4 a 6 vezes
diariamente na fêmea lactante com uma mastite não séptica, e devem-se encorajar
os filhotes a mamarem nessas glândulas. Quando ocorre uma galactostasia no
desmame, pode-se diminuir a lactação por meio da redução do consumo de
alimento e de água da fêmea. Não se devem estimular as glândulas mamárias
durante essa época. Devem-se fornecer água e alimento apropriados para os
filhotes.

Piometria
É um distúrbio diestral que se caracteriza por um endométrio uterino anormal com
uma infecção bacteriana secundária. Na cadela normal, os corpos lúteos produzem
progesterona por 9 a 12 semanas após a ovulação em cada ciclo estral. Se não
ocorrer uma prenhez após a indução da ovulação em uma gata, a expectativa de
vida dos corpos lúteos é de , 45 dias.
Etiologia – A progesterona promove o crescimento endometrial enquanto reduz
a atividade do miométrio. Finalmente, desenvolve-se uma hiperplasia endometrial
cística e um acúmulo de secreções uterinas. A progesterona também pode inibir a
resposta leucocitária à infecção bacteriana. As bactérias da flora vaginal normal são
a fonte mais provável de contaminação uterina. A Escherichia coli é a bactéria mais
comum isolada nos casos de piometria, embora também se tenham isolado o
Doenças do Sistema Reprodutivo, Pq An 823

Staphylococcus, o Streptococcus, o Pseudomonas e as Proteus spp e outras bac-


térias. Como as gatas requerem um estímulo copulatório para ovular, formar os corpos
lúteos e produzir progesterona, a piometria é menos comum nas gatas que nas
cadelas. Tem-se associado a administração de medroxiprogesterona com o desen-
volvimento da piometria nas cadelas e nas gatas. A piometria pode-se desenvolver
no tecido uterino deixado após uma ovário-histerectomia (piometria de coto).
O estrogênio, sozinho, não contribui para o desenvolvimento da hiperplasia
endometrial cística ou da piometria. No entanto, ele aumenta os efeitos estimulató-
rios da progesterona no útero. A administração de estrogênios exógenos (por
exemplo, as “doses de anticoncepcional”) durante o diestro aumenta enormemente
o risco de desenvolvimento de uma piometria; devem-se desencorajar as injeções
de estrogênios para evitar a prenhez.
Achados clínicos e laboratoriais – Observam-se os sinais clínicos durante o
diestro, geralmente 4 a 8 semanas após o estro ou após a administração de
progestinas exógenas. Os sinais são variáveis e incluem letargia, anorexia, poliúria,
polidipsia e vômito. Quando a cérvix fica aberta, encontra-se presente uma descarga
vulvar purulenta, que freqüentemente contém sangue. Quando a cérvix fica fecha-
da, não ocorre descarga e o útero grande pode causar distensão abdominal. Os
sinais podem progredir rapidamente para choque e morte.
O exame físico revela letargia, desidratação, aumento do volume uterino e, se a
cérvix ficar desobstruída, uma descarga vaginal sangüínea a mucopurulenta.
Encontra-se febre em apenas 20% dos animais afetados. O choque pode-se
encontrar presente.
O leucograma dos animais com piometria é variável e pode ser normal. É comum
leucocitose caracterizada por neutrofilia com um desvio à esquerda. Pode-se
encontrar uma leucopenia nos animais com sepse. Também pode-se desenvolver
uma anemia não regenerativa normocrômica normocítica suave (hematócrito de 28
a 35%). Pode-se encontrar uma hiperproteinemia devida a uma hiperglobulinemia.
Os resultados de urinálise são variáveis. No caso de uma infecção uterina por E. coli,
pode-se desenvolver uma isostenúria devida a uma deterioração da função tubular
renal induzida por endotoxinas e/ou a uma insensibilidade ao hormônio antidiuréti-
co. Uma glomerulonefropatia causada pela deposição de complexos imunes pode
resultar em uma proteinúria. Essas lesões renais são potencialmente reversíveis
uma vez que se resolve a piometria.
Diagnóstico – Deve-se suspeitar da piometria em qualquer cadela ou gata
diestral doente, especialmente se estiverem presentes polidipsia, poliúria ou vômito.
Pode-se estabelecer o diagnóstico a partir da história e do exame físico e de uma
radiografia/ultra-sonografia abdominais. A citologia vaginal é freqüentemente útil na
determinação da natureza da descarga vulvar. A contagem sangüínea completa, o
perfil bioquímico e a urinálise ajudam a excluir as outras causas de polidipsia/poliúria
e de vômito, e a avaliar a função renal, o estado ácido-básico e a septicemia. Deve-
se realizar uma cultura e um teste de sensibilidade no exsudato uterino. O
diagnóstico diferencial inclui a prenhez e as outras causas de descarga vulvar, de
poliúria e polidipsia e de vômito.
Tratamento – A ovário-histerectomia é o tratamento de escolha, mas pode-se
considerar o tratamento médico caso se deseje a preservação do potencial reprodutivo
da cadela ou da gata. Devem-se administrar fluidos EV e antibióticos bactericidas
de amplo espectro. Devem-se corrigir os desequilíbrios hídrico, eletrolítico e ácido-
básico tão rápido quanto possível, antes de se realizar uma ovário-histerectomia. A
infecção bacteriana é responsável pela enfermidade e pode não se resolver até que
se remova o exsudato uterino. Devem-se continuar os antibióticos orais (com base
nos resultados de uma cultura e de um teste de sensibilidade) por 7 a 10 dias após
a cirurgia.
Doenças do Sistema Reprodutivo, Pq An 824

Pode-se utilizar uma terapia médica com a prostaglandina (PG) F 2α nos animais
que se pretender acasalar no futuro, embora a PG não seja aprovada nos EUA para
uso nos gatos ou nos cães. A PG causa a contração do miométrio, o relaxamento
da cérvix e a expulsão do exsudato uterino e em doses terapêuticas não causa
luteólise nos cães ou nos gatos. Provavelmente, não se deve utilizar a PG nos
animais > 8 anos de idade ou naqueles que não são pretendidos para acasalamento.
A demora antes de uma melhora clínica e os muitos efeitos colaterais da PGF2α
impedem o seu uso em um animal severamente enfermo. Também se deve utilizá-
la com cuidado em uma cadela ou gata com uma piometria de cérvix fechada, devido
ao aumento do risco de uma ruptura uterina. Deve-se excluir a prenhez, pois a PG
pode induzir um aborto.
Na cadela e na gata, deve-se utilizar apenas a PGF2α de ocorrência natural
(0,25mg/kg de peso corporal, s.c., uma vez por dia, durante 5 dias). Os análogos
sintéticos (por exemplo, o cloprostenol, o fluprostenol e o prostaleno) são muito mais
potentes que a PGF2α natural, mas ainda não foram avaliados para uso nos cães ou
nos gatos. Devem ser administrados, por ≥ 2 semanas, antibióticos bactericidas e
de amplo espectro, escolhidos com base na cultura e nos testes de sensibilidade.
Os outros efeitos da PGF2α incluem inquietação, ofegação, hipersalivação, andadu-
ra de um lado para o outro, dor abdominal, taquicardia, vômito e defecação. Nos
gatos, também se podem observar vocalização e comportamento de limpeza
intenso. Essas reações desaparecem dentro de 2h da injeção. A DL50 da PGF2α nos
cães é de 5,13mg/kg de peso corporal. Uma ataxia severa, um distúrbio respiratório
e tremores musculares podem ser observados nas gatas que recebem 5mg/kg. Se
ocorrerem efeitos colaterais severos, fluidos EV em taxas apropriadas são indicados
para o tratamento de choque. A evacuação uterina após uma injeção é variável.
Deve-se reexaminar o animal 2 semanas após o fim da terapia médica. Se ainda
se encontrar presente uma descarga vulvar mucopurulenta ou sanguinolenta ou um
aumento de volume uterino, pode-se repetir a terapia com PGF2α, utilizando-se o
mesmo procedimento; no entanto, o prognóstico para a recuperação é muito pior.
Prognóstico – Geralmente, o prognóstico é bom para um animal que passe por
uma ovário-histerectomia. Após a terapia médica, o prognóstico para uma resolução
inicial da piometria é bom se a cérvix estiver aberta, mas reservado a ruim se ela
estiver fechada. Dos animais que respondem, até 90% das cadelas e 70% das gatas
com uma piometria de cérvix aberta podem ser férteis. Descreveu-se que somente
50% das cadelas com uma piometria de cérvix fechada podem retornar à fertilidade.
A recidiva é provável: das cadelas tratadas medicamente quanto à piometria, 70%
apresentaram recorrência dentro de 2 anos. Recomenda-se que o animal se acasale
no próximo e em cada ciclo subseqüente, até que se consiga o número desejado de
cãezinhos ou gatinhos, e depois seja castrado.

Hiperplasia vaginal
É uma proliferação da mucosa vaginal, que geralmente se origina do assoalho
da vagina anterior ao orifício uretral. Ocorre durante o proestro e o estro, como
resultado de um estímulo estrogênico. O sinal mais comum corresponde a uma
massa que protrai da vulva, inicialmente lisa e brilhante; com uma exposição
prolongada, a superfície se torna seca e desenvolvem-se fissuras, de modo que a
massa assume uma aparência semelhante à da língua. Pode-se encontrar presente
uma ligeira descarga vaginal. Embora o tecido hiperplásico se origine próximo ao
orifício uretral, a disúria é incomum. A hiperplasia vaginal interfere na cópula. A
relutância ao acasalamento pode-se constituir no único sinal clínico, se o tecido
hiperplásico estiver contido na cripta vaginal. A hiperplasia vaginal se resolve
espontaneamente à medida que diminuem os níveis de estrogênio. O diagnóstico
é feito por meio da história (estágio do ciclo estral) e do exame da vagina. Se a
Doenças do Sistema Reprodutivo, Pq An 825

história for questionável, pode-se confirmar o estímulo estrogênico pela citologia


vaginal. Os 2 diagnósticos diferenciais são o prolapso vaginal e a neoplasia. Pode-
se excluir o primeiro deles por meio da história e dos achados físicos, e o segundo
por uma biópsia.
Se a massa não causar problemas, a terapia não é indicada. No entanto, se o
tecido hiperplásico protrair da vulva, deve-se mantê-lo limpo e úmido e aplicar uma
pomada antibiótica. Pode-se tornar necessário um colar elizabetano para impedir o
autotraumatismo. Podem-se acasalar esses animais por meio de uma inseminação
artificial. A hiperplasia regride tão logo passe a fase folicular do ciclo estral.
Raramente há uma recidiva no parto, presumivelmente associada a uma explosão
de estrogênios. Pode-se tornar necessária uma ressecção da submucosa se a
massa for extremamente grande ou o dano à mucosa for extenso. É comum uma
recidiva após a ressecção cirúrgica. A hiperplasia vaginal é resolvida dias após a
remoção do estrogênio. A ovário-histerectomia acelera a resolução, impede a
recidiva e corresponde ao tratamento de escolha.

Vaginite
A inflamação da vagina pode ocorrer nas cadelas pré-púberes ou adultas,
intactas ou castradas. É rara nas gatas. A vaginite geralmente se deve a uma
infecção bacteriana, que pode ser secundária a anormalidades conformacionais,
tais como as estenoses vestibulovaginais. As infecções virais (herpes), os corpos
estranhos vaginais, as neoplasias, a hiperplasia da vagina, os esteróides androgê-
nicos (por exemplo, a mibolerona) ou as condições intersexuais também podem
causar uma vaginite.
O sinal clínico mais comum corresponde a uma descarga vulvar. Também se
podem observar a lambedura da vulva, a atração dos machos e uma micção
freqüente. Não se encontram presentes sinais de enfermidade sistêmica, nem
existem anormalidades no hemograma ou no perfil bioquímico. A ausência dessas
alterações ajuda a diferenciar a vaginite da piometria de cérvix aberta, o diagnóstico
diferencial mais importante. A avaliação diagnóstica deve incluir um exame digital
da vagina, uma vaginoscopia, uma citologia e uma cultura do exsudato e, se
necessário, radiografias ou uma ultra-sonografia abdominais para a avaliação do
útero. Pode-se obter uma cultura vaginal anterior utilizando-se um “swab” de cultura
protegido. A vagina contém uma flora bacteriana normal; portanto, devem-se
interpretar cuidadosamente os resultados da cultura. Um crescimento forte, espe-
cialmente de um único microrganismo, provavelmente é mais significativo do que um
crescimento ligeiro de vários microrganismos.
Devem-se corrigir os fatores predisponentes, tais como o material estranho ou as
anormalidades anatômicas. A infecção bacteriana pode responder a um tratamento
local (duchas vaginais). Nas infecções persistentes, antibióticos bactericidas sistê-
micos e de amplo espectro podem ser necessários. Os animais pré-púberes
freqüentemente não exigem tratamento porque a vaginite quase sempre se resolve
com o primeiro estro. Por esta razão, pode ser sábio o retardamento da ovário-
histerectomia facultativa nos animais afetados até o seu primeiro ciclo estral.

DISTÚRBIOS DO MACHO
Para uma discussão das prostatopatias, ver página 842.

Orquite aguda/epididimite
A inflamação ou infecção aguda dos testículos e/ou do epidídimo pode ser
causada por um trauma, uma infecção (fúngica, bacteriana ou viral) ou uma torção
Doenças do Sistema Reprodutivo, Pq An 826

testicular. Os sinais clínicos incluem dor e inchaço dos testículos, epidídimos e/ou
escroto. Pode haver ferimentos ou tratos de drenagem na pele escrotal.
Deve-se palpar cuidadosamente o conteúdo escrotal (incluindo o duto deferente
e o plexo pampiniforme) para evidências de torções, material estranho ou lesões
focais dos testículos ou do epidídimo. Deve-se coletar o sêmen para a citologia em
um animal com uma orquiepididimite aguda. Um aspirado com uma agulha fina dos
testículos ou dos epidídimos envolvidos fornece o material para a citologia e a
cultura. Deve-se realizar um teste de aglutinação rápida em lâmina para Brucella
canis.
Se a manutenção da fertilidade do cão não for importante, a castração e
antibióticos bactericidas de amplo espectro por 7 a 10 dias consistem no tratamento
de escolha. As lesões da pele escrotal são tratadas apropriadamente. Se a fer-
tilidade é importante, a terapia para a orquite bacteriana consiste em antibióticos
bactericidas de amplo espectro. Os agentes antifúngicos são indicados para as
infecções fúngicas. Além disso, os agentes antiinflamatórios (por exemplo, a pred-
nisona [0,5mg/kg, diariamente] ou a aspirina [10mg/kg, duas vezes ao dia]) e a
hipotermia local (por exemplo, compressas de água fria) podem reduzir o dano
testicular causado pelo inchaço e pela hipertermia locais.
O prognóstico para a manutenção da fertilidade é reservado apesar da terapia
agressiva, devido ao potencial para um dano irreversível no epitélio germinativo,
uma degeneração tubular, um desenvolvimento de orquite imunomediada ou um
bloqueio do sistema de dutos com restos necróticos e tecido fibroso. Estas seqüelas
podem levar meses para ocorrer. Não há tratamento de sucesso para a infecção por
B. canis. Todos os agentes antifúngicos interferem na espermatogênese, direta ou
indiretamente. O dano isquêmico causado pela torção testicular se torna irreversível
dentro de horas.

Orquite crônica/epididimite
A orquiepididimite crônica pode-se desenvolver como uma seqüela da síndrome
aguda, ou pode surgir sem nenhuma história anterior de inflamação testicular. As
causas possíveis incluem as da orquiepididimite aguda, da orquite/epididimite
imunomediada, da neoplasia e da formação de uma espermatocele ou de um
granuloma. A apresentação clínica comum é a infertilidade; a maioria dos animais
é, por outro lado, assintomática. O exame físico pode revelar uma atrofia e uma
fibrose testiculares. A palpação do epidídimo pode revelar um endurecimento ou um
aumento de volume. Os tumores podem ser palpáveis.
Os testes diagnósticos devem incluir o exame citológico do sêmen com uma
cultura bacteriana e micoplasmal e um teste de aglutinação rápida em lâmina para
Brucella canis. Uma aspiração com agulha fina, especialmente das lesões focais,
freqüentemente é útil. Podem-se realizar uma biópsia testicular para histopatologia
e uma cultura bacteriana quando se tiverem esgotado os testes diagnósticos menos
invasivos.
O tratamento é difícil porque freqüentemente não se conhece a causa básica.
Se as culturas bacterianas forem positivas, devem ser administrados antibióticos
sistêmicos apropriados por ≥ 3 semanas. Se a histopatologia for sugestiva de um
processo imunomediado (uma infiltração plasmocítica, linfocítica), pode-se indi-
car o tratamento com drogas imunossupressoras (por exemplo, a prednisona, a
1mg/kg de peso corporal, duas vezes ao dia). No entanto, como um resultado dos
efeitos inibitórios no eixo hipotalâmico–hipofisário–gonadal, os glicocorticóides
podem causar uma atrofia testicular e uma infertilidade. O prognóstico para o
retorno da fertilidade é grave. O tratamento para a neoplasia testicular é a cas-
tração.
Doenças do Sistema Reprodutivo, Pq An 827

Balanopostite
A inflamação da cavidade prepucial é comum nos cães. A balanopostite suave,
que resulta em uma descarga prepucial mucopurulenta ligeira, se encontra presente
em muitos cães adultos e possui pouca importância clínica. Traumatismo, lacera-
ções, neoplasia, corpos estranhos ou fimose podem resultar no desenvolvimento de
uma balanopostite severa. A balanopostite é rara nos gatos.
Os sinais incluem uma descarga prepucial mucopurulenta, o inchaço do prepúcio
e possivelmente dor. Devem-se examinar o pênis e o prepúcio completamente
quanto aos fatores predisponentes básicos. As culturas bacterianas da cavidade
prepucial, embora algumas vezes difíceis de interpretar devido à flora normal, são
úteis na identificação de microrganismos incomuns ou de sensibilidades antibióticas
nos casos refratários.
O tratamento inclui a correção de quaisquer fatores predisponentes, a limpeza e
a lavagem completa da cavidade prepucial com um anti-séptico suave (por exemplo,
uma ducha de povidona-iodo) ou com uma solução salina estéril e a infusão de uma
pomada antibiótica na cavidade prepucial por 7 a 10 dias. Deve-se combinar isso
com 7 a 10 dias de antibióticos sistêmicos de amplo espectro, caso se encontre
presente uma enfermidade sistêmica. A recidiva da balanopostite suave é comum,
apesar da terapia. A castração pode ser útil.

Parafimose
A incapacidade de retrair completamente o pênis na cavidade prepucial ocorre
geralmente após a ereção e o desenvolvimento de uma fimose funcional. É
observada mais freqüentemente após uma coleta de sêmen ou coito. A pele no
orifício prepucial torna-se invertida e prejudica a drenagem venosa do pênis. As
outras causas incluem uma fimose suave, objetos estranhos ao redor do pênis, um
traumatismo ou uma balanopostite crônica. Deve-se diferenciar a parafimose do
priapismo, do prepúcio congenitamente encurtado, da deformidade congênita da
abertura do pênis ou da paralisia dos músculos refratores deste.
A parafimose é uma emergência médica. O pênis exposto se torna edematoso,
ressecado e dolorido. Se não for tratada, pode-se desenvolver uma ulceração, uma
necrose isquêmica e/ou uma gangrena. Se for reconhecida precocemente, antes de
se desenvolver o edema severo e a dor, a parafimose é tratada facilmente. Desliza-
se gentilmente o prepúcio em uma direção posterior e expõe-se posteriormente o
pênis – isto everte a pele no orifício prepucial; depois o prepúcio geralmente desliza
facilmente pelo pênis. No caso da parafimose devida a outras causas ou de duração
mais longa, exige-se uma sedação ou uma anestesia geral. Pode ser necessária a
excisão da pele prepucial para se examinar completamente a cavidade do prepúcio,
remover o material restritivo e aliviar a obstrução venosa. Após o restabelecimento
da circulação, o banho do pênis exposto em soluções frias ou hipertônicas pode
ajudar também na redução do inchaço. Recoloca-se então o pênis na cavidade
prepucial e fecha-se a incisão. Se a uretra estiver danificada, pode-se necessitar de
um cateter urinário interno para impedir a formação de uma estenose. Se a necrose
ou a gangrena for severa, podem ser necessárias a amputação do pênis e do
prepúcio e a castração.

Fimose
É uma incapacidade congênita ou adquirida de protrair o pênis através de um
orifício prepucial anormalmente pequeno. Pode-se desenvolver devido a uma infla-
mação, uma neoplasia, um edema ou uma fibrose após um traumatismo, uma
irritação ou uma infecção. Os sinais clínicos são variáveis. Geralmente, não se nota
o problema até que o cão tente cruzar e seja incapaz de copular. O diagnóstico se
Doenças do Sistema Reprodutivo, Pq An 828

estabelece por meio do exame físico do prepúcio e do pênis. O tratamento depende


da severidade da estenose e do uso pretendido do cão. Caso não se utilize o cão
para acasalamento, provavelmente não será necessária uma terapia, embora se
deva considerar a castração para evitar uma excitação inesperada. Indica-se a
ampliação cirúrgica do orifício prepucial caso se pretenda utilizar o animal para
acasalamento, se a fimose contribuir para uma balanopostite ou em uma situação
improvável em que a fimose interfira na micção normal.

TUMOR VENÉREO CANINO TRANSMISSÍVEL


É um tumor multilobulado, papilar, nodular, pedunculado ou em forma de couve-
flor, que varia de um nódulo pequeno (5µm) a uma massa grande (> 10cm), e que
é firme, embora friável. A superfície fica freqüentemente ulcerada e inflamada, e
pode ficar hemorrágica e infectada. O tumor pode ser solitário ou múltiplo e quase
sempre se localiza na genitália externa, embora também possa ocorrer na pele
adjacente e nas mucosas orais, nasais e conjuntivais.
A incidência varia de relativamente alta em algumas áreas a rara em outras. O
tumor pode surgir profundamente no prepúcio ou na vagina e ser difícil de ver. Isso
pode levar a um diagnóstico errôneo caso se admita incorretamente que o sangra-
mento seja uma hematúria. O tumor se espalha de local para local e de cão para cão
por meio de implantação. No início, ele cresce rapidamente. A metástase é incomum
(5%); quando ocorre, corresponde geralmente aos linfonodos regionais. Também
se observam metástases nos rins, no baço, nos olhos, no cérebro, na hipófise, na
pele e no tecido subcutâneo, nos linfonodos mesentéricos e no peritônio. O tumor
geralmente é fácil de se diagnosticar por meio da citologia de aspirados com agulha
fina da massa. Ao contrário da aparência citológica, a aparência histológica do tumor
venéreo transmissível pode ser difícil de se distinguir dos outros tumores de células
arredondadas, tais como o histiocitoma, o linfossarcoma e os mastocitomas. Isso
vale especialmente quando os tumores ocorrem em localizações extragenitais.
Como os tumores venéreos transmissíveis podem não regredir espontaneamen-
te, devem ser considerados progressivos e tratados de acordo. Embora se tenham
utilizado a excisão cirúrgica, a radioterapia e a imunoterapia, considera-se a
quimioterapia como o tratamento de escolha. Descreve-se o sulfato de vincristina
(0,5mg/m2, EV, uma vez por semana por 3 a 6 semanas) como efetivo, exceto
quando o tumor se localiza nos olhos ou no cérebro. Geralmente, pode-se esperar
uma remissão total por volta do sexto tratamento. A adriamicina (30mg/m2, EV, a
cada 3 semanas) também é efetiva; porém, devido à maior incidência de reações
adversas, deve-se reservá-la para os animais que não responderem à vincristina.
O prognóstico para a remissão total é bom, a menos que se encontre presente um
envolvimento metastático do SNC ou dos olhos.

EXANTEMA COITAL EQÜINO


É uma doença venérea benigna dos eqüinos.
Etiologia e epidemiologia – A doença ocorre mundialmente. Afeta ambos os
sexos e se espalha primariamente no coito; embora rara nos eqüinos não acasalados,
a transmissão por meio de manipulações ginecológicas é possível. Ainda não se
confirmou o aborto sob condições naturais. A imunidade possui curta duração. O
herpesvírus eqüino causador do Tipo 3 (HVE-3) possui um único tipo antigênico,
mas pode-se isolar uma população mista de variantes de placas grandes e
pequenas a partir de amostras clínicas.
Tumores Mamários 829

Achados clínicos – Nas éguas, desenvolvem-se nódulos avermelhados, circu-


lares e múltiplos de até 2mm de diâmetro nas mucosas vaginal e vulvar e na pele
(especialmente no períneo), 4 a 8 dias após o acasalamento; a mucosa vaginal
parece inflamada. As lesões progridem para vesículas e pústulas que se rompem
e formam úlceras rasas e coalescentes. A cicatrização, que geralmente ocorre
dentro de 3 semanas, deixa áreas não pigmentadas (crostas brancas) que permitem
a identificação dos portadores em potencial. As lesões do clitóris e da vagina se
cicatrizam mais lentamente. Não ocorre nenhum distúrbio sistêmico acompanhante
a menos que as lesões se compliquem por uma infecção bacteriana. Ocorrem
lesões semelhantes no pênis e no prepúcio dos garanhões; aqueles que forem
afetados agudamente podem-se recusar a montar. A recidiva se torna comum
quando os acasalamentos são freqüentes. A fertilidade de nenhum dos sexos é
afetada. As lesões extragenitais nas tetas, nos lábios e na mucosa nasal são raras.
Diagnóstico – A aparência típica e a distribuição das lesões permitem um
reconhecimento fácil da doença, mas elas passam freqüentemente despercebidas.
Podem-se observar os herpesvírus nas preparações microscópicas eletrônicas das
células epiteliais a partir da margem das úlceras, e se necessário, pode-se isolar e
identificar o vírus. Utilizam-se os testes sorológicos para os anticorpos neutralizantes
séricos apenas para estudos epidemiológicos. As infecções por HVE-1 e por HVE-4
(ver pág. 889) podem produzir lesões semelhantes nas mucosas genitais.
Profilaxia e tratamento – O tratamento dos garanhões por 3 dias com antibió-
ticos tópicos para combater a infecção secundária e o repouso sexual proporcionam
o controle suficiente para permissão do acasalamento em 1 a 2 semanas. Podem-
se tratar as éguas com clorexidina e cremes de antibiótico e cortisona.

TUMORES MAMÁRIOS
A freqüência da neoplasia mamária nas diferentes espécies varia em um grau
surpreendente. O cão é de longe a espécie doméstica mais freqüentemente afetada.
A prevalência nos cães é de , 3 vezes a das mulheres; , 50% de todos os tumores
na cadela são tumores mamários. No gatos, a prevalência dos tumores linfóides e
cutâneos é mais alta. Os tumores mamários são raros nas vacas, nas éguas, nas
cabras, nas ovelhas e nas porcas. Existem diferenças tanto no comportamento
biológico como na histologia dos tumores mamários nos gatos e nos cães. Embora
ambos sejam animais de estimação domésticos e possuam uma dieta, um ambiente
e uma expectativa de vida semelhantes, a prevalência é mais alta nos cães; no
entanto, somente , 45% desses tumores são malignos nos cães, enquanto , 90%
deles são malignos nos gatos. Os cães apresentam um número muito mais alto de
tumores mistos e complexos que os gatos.
Etiologia – Desconhece-se a causa dos tumores mamários em qualquer espécie
exceto nos camundongos, nos quais um oncornavírus é o causador em determina-
das linhas isogênicas. Os hormônios exercem um papel importante na hiperplasia e
na neoplasia do tecido mamário, mas desconhece-se o mecanismo exato. Os
trabalhos recentes nos animais demonstraram receptores de estrogênios e/ou de
progesterona nas células tumorais mamárias, o que pode influenciar a patogenia de
uma neoplasia mamária induzida por hormônios, bem como a resposta a uma
hormonioterapia.
Têm-se identificado efeitos genéticos e nutricionais na neoplasia mamária nos
camundongos e em algumas pessoas, mas não nos cães e nos gatos. De um ponto
de vista prático, todos os tumores mamários devem ser considerados potencialmen-
Tumores Mamários 830

te malignos, independentemente do tamanho e do número de glândulas envolvidas.


Em ambos, os cães e os gatos, o alastramento dos carcinomas mamários se dá
primariamente em direção aos linfonodos regionais e aos pulmões. Nos cães, 5 a
10% dos carcinomas mamários podem produzir metástases esqueléticas, primaria-
mente no esqueleto axial, mas também nos ossos longos.
Tumores mamários caninos – Esses tumores ocorrem mais freqüentemente
nas cadelas virgens; eles são extremamente raros nos cães. A ovariectomia antes
do primeiro estro reduz o risco de neoplasia mamária para 0,5% do risco nas cadelas
virgens; a ovariectomia após um estro reduz o risco para 8% nas cadelas virgens.
As cadelas castradas após a maturidade apresentam o mesmo risco das cadelas
virgens. As 2 glândulas mamárias caudais são mais freqüentemente envolvidas que
as 3 glândulas anteriores. Macroscopicamente, os tumores aparecem como nódu-
los únicos ou múltiplos em uma ou mais glândulas, variando em tamanho de 1 a
25cm. A superfície de corte é geralmente lobulada, castanho-acinzentada e firme,
apresentando freqüentemente cistos preenchidos com fluidos. Os tumores mamá-
rios mistos podem conter um osso ou uma cartilagem macroscopicamente reconhe-
cíveis na superfície de corte.
Mais de 50% dos tumores mamários caninos são tumores mistos benignos; uma
porção menor corresponde a tumores mistos malignos. Nos últimos, os componen-
tes epiteliais ou mesenquimais (tanto sozinhos como em combinação) podem
produzir metástases. A Organização Mundial da Saúde (OMS) classificou histolo-
gicamente os tumores das glândulas mamárias caninas como carcinomas (com 6
tipos e subtipos adicionais), sarcomas (com 4 tipos), carcinossarcomas (tumores
mamários mistos) ou adenomas benignos. Esse esquema de classificação se
baseia na extensão do tumor, no envolvimento dos linfonodos e na presença de
lesões metastáticas (sistema TNM), e inclui tumores não classificados e displasias
aparentemente benignas.
Tumores mamários felinos – Ocorrem principalmente nas gatas virgens mais
velhas (média de 11 anos). A castração em uma idade precoce, especialmente antes
do primeiro estro, possui um efeito poupador e reduz o risco, mas o grau de proteção
se encontra menos precisamente documentado que nos cães. As 2 mamas anterio-
res ou torácicas são mais freqüentemente envolvidas que as glândulas posteriores.
Histologicamente, a maioria dos tumores mamários felinos é de adenocarcino-
mas, com tipos papilares ou tubulares mais comuns que os tipos mucóides ou
sólidos. Os tumores mamários mistos e os sarcomas são menos comumente
diagnosticados que os carcinomas. Os tumores benignos da glândula mamária
felina são relativamente infreqüentes e respondem por apenas , 10% desses
tumores. O sistema de classificação clínica TNM da OMS (ver anteriormente)
também se aplica aos tumores mamários felinos.
Observou-se nos gatos uma entidade distinta denominada hiperplasia
fibroadenomatosa. Os outros nomes para essa entidade são hipertrofia mamária
felina, hipertrofia mamária benigna e hipertrofia mamária fibroglandular. Ela afeta
primariamente os gatos jovens, em ciclagem ativa ou prenhez. Também tem sido
observada em gatos castrados, incluindo os machos mais idosos que receberam
drogas progestacionais exógenas (acetato de megestrol). O distúrbio se acentua
clinicamente pelo crescimento rápido de uma ou mais glândulas mamárias.
Métodos diagnósticos (cães e gatos) – Geralmente se suspeita de um tumor
mamário com a detecção de uma massa ao exame físico. A duração é obscura, mas
o crescimento pode ser útil na determinação do prognóstico. A palpação dos
linfonodos regionais ajuda a determinar a extensão do alastramento. Devem-se tirar
radiografias torácicas para se detectarem metástases pulmonares. Os aspirados
com agulha fina podem diferenciar lesões inflamatórias e neoplásicas, mas podem
levar a conclusões errôneas e ao retardamento da cirurgia.
Mastite, Gr An 831

Tratamento e prognóstico – Os tumores mamários são melhor tratados por


meio de uma cirurgia, embora não haja consenso de que este seja o melhor
procedimento. A remoção do tumor único (lumpectomia), a mastectomia simples
(remoção de uma única glândula afetada), a mastectomia radical modificada
(remoção da glândula afetada e das que dividem a sua drenagem linfática e os
linfonodos associados) e a mastectomia radical (remoção da cadeia mamária inteira
e dos linfonodos associados) têm todos os seus defensores. Os processos mais
complicados não demonstraram prolongar a sobrevivência quando comparados
aos outros, e as vantagens dos procedimentos mais simples são óbvias. Nos gatos,
a mastectomia radical aumenta o intervalo de isenção da doença, mas não o período
de sobrevivência.
A quimioterapia não é um tratamento efetivo nos tumores mamários caninos;
tem-se utilizado uma combinação de doxorrubicina e ciclofosfamida com uma
eficácia limitada nos tumores mamários felinos. A radioterapia não é efetiva.
O prognóstico se baseia em fatores múltiplos. A maioria dos tumores das
glândulas mamárias caninas causa morte dentro de 1 ano. Os sarcomas se
associam com períodos de sobrevivência mais curtos que os dos carcinomas.
Outros fatores, incluindo o tamanho, o envolvimento de linfonodos e a diferenciação
nuclear, também afetam o prognóstico. Nos gatos, o volume do tumor é importante;
os gatos com tumores grandes (> 3cm de diâmetro) possuem um período de
sobrevivência médio de 6 meses, mas aqueles com tumores < 2cm de diâmetro
apresentam uma sobrevivência média > 4 anos.

MASTITE, GR AN
É a inflamação da glândula mamária, que quase sempre se deve aos efeitos de
uma infecção por patógenos bacterianos ou micóticos. Embora possua maior
importância econômica nas vacas leiteiras, ela pode afetar outras espécies e é
tratada em grande parte da mesma maneira em cada uma delas. A seguir,
apresentam-se separadamente notas breves acerca da mastite nas ovelhas, nas
cabras, nas porcas e nas éguas (ver também as discussões em INTERAÇÕES MANEJO–
DOENÇA na seção MCN.)
Os fatores que predispõem à infecção no interior da glândula são a higiene
precária na ordenha, as falhas na ordenhadeira, o manejo deficiente da ordenha, as
lesões nas tetas, os ferimentos nas tetas e as populações ambientais de patógenos.
A infecção é diagnosticada por meio da cultura e da identificação do patógeno a
partir de uma amostra de leite coletada assepticamente. A mastite é detectada por
sinais clínicos ou resultados de testes projetados para detectarem aumentos no
número de leucócitos no leite (nos casos subclínicos). Nos casos clínicos, um
diagnóstico provisório geralmente se baseia nos sinais e no conhecimento dos
patógenos predominantes no rebanho, mas deve-se confirmá-lo por meio de uma
cultura. Utilizam-se os testes de sensibilidade nos isolados para determinar ou
confirmar a adequação dos antibióticos utilizados na terapia.
Os 4 tipos clínicos da mastite são: 1. superaguda – o inchaço, o calor, a dor e a
secreção anormal na glândula são acompanhados de febre e outros sinais de um
distúrbio sistêmico, tais como uma depressão acentuada, um pulso rápido e fraco,
um afundamento dos olhos, fraqueza e anorexia completa; 2. aguda – as alterações
na glândula são semelhantes às anteriores, mas a febre, a anorexia e a depressão
são leves a moderadas; 3. subaguda – não há alterações sistêmicas e as alterações
na glândula e na sua secreção são menos acentuadas; e 4. subclínica – a reação
Mastite, Gr An 832

inflamatória só é detectável por meio de testes, tais como o Teste de Mastite da


Califórnia (ver a seguir), o Teste de Mastite do Wisconsin, o teste de Nagase ou
outros testes e a contagem eletrônica de células, que são utilizados em intervalos
para detectar um teor persistentemente alto de leucócitos no leite.
As alterações na secreção podem variar de uma aquosidade ligeira com alguns
flocos (por exemplo, a mastite estafilocócica subaguda), passando por aquosa ou
serosa com grandes coágulos amarelados (por exemplo, as mastites estafilocóci-
ca, estreptocócica ou micoplasmal agudas e superagudas) até aquosa e amar-
ronzada com flocos farináceos finos (por exemplo, a mastite coliforme ou
micoplasmal). No caso da mastite crônica severa, a glândula afetada perde
gradualmente a sua capacidade produtiva e pode desenvolver uma atrofia ou
lentamente abscessos nodulares firmes ou massas semelhantes a granulomas no
interior do parênquima.
Os patógenos bacterianos mais comuns (em ordem aproximada de freqüência
decrescente) são a Staphylococcus aureus, a Streptococcus uberis, a Str. agalactiae,
a Str. dysgalactiae, outros estreptococos e coliformes. A mastite pode-se associar
com infecções com muitos outros microrganismos, incluindo a Corynebacterium
pyogenes, a Pseudomonas aeruginosa, a Nocardia asteroides, a Clostridium
perfringens, as Mycobacterium spp, as Mycoplasma spp, as Pasteurella spp, as
leveduras e as Prototheca spp.
Tratamento da mastite – Quase sempre se recomenda o tratamento quando
ocorre uma mastite clínica. A penicilina é a droga de escolha para a mastite
estreptocócica e os estafilococos não resistentes. No entanto, a maioria dos
isolados estafilocócicos em alguns rebanhos são resistentes, tanto que as penicili-
nas semi-sintéticas (tais como a cloxacilina), que não são afetadas pela penicilinase
estafilocócica, são mais efetivas. Embora o tratamento geralmente acelere o retorno
da produção, uma alta porcentagem de infecções estafilocócicas pode não ser
eliminada durante a lactação. A terapia da vaca seca resulta em uma taxa de cura
um pouco melhor. Os coliformes variam largamente quanto à sua sensibilidade
antibiótica.
Determinados antibióticos, tais como o hidroiodeto de penetamato e a eritro-
micina, alcançam níveis muito mais altos no leite do que no plasma após uma
administração sistêmica, e podem ser úteis nos casos agudos e superagudos
devidos a microrganismos suscetíveis.
Devem-se coletar amostras de leite antes do tratamento, o qual se inicia
imediatamente. A cultura e o teste de sensibilidade antibiótica permitem o acúmulo
de dados sobre os agentes infecciosos comuns em cada rebanho, o que serve como
guia para futuras recomendações de tratamento e controle.
Dependendo do antibiótico e da base infundidos no úbere e da forma de
repositório injetada, não se deve utilizar para consumo humano o leite coletado por
várias ordenhas após o tratamento. Devem-se observar os períodos de repouso
recomendados. Em caso de dúvida, deve-se testar o leite antes de comercializá-lo.

Teste de mastite da Califórnia


Encontra-se disponível comercialmente um “kit” que consiste de uma pá plástica
e todos os reagentes necessários. Misturam-se quantidades iguais (2mL) dos
reagentes e do leite nas depressões da pá plástica por meio de um movimento
giratório. As amostras negativas não formam gel e as amostras positivas apresen-
tam vários graus de formação deste, o que é um reflexo do grau de inflamação do
úbere. Existe um alto grau de correlação entre o teste de mastite da Califórnia (TMC)
e a contagem de células somáticas. Pode-se utilizar o TMC para estimar a contagem
de células somáticas do volume de leite do rebanho, do leite de um balde ou do leite
de um quarto do úbere.
Mastite, Gr An 833

MASTITE NAS VACAS


Mastite estreptocócica – Na natureza, a Streptococcus agalactiae exige a
glândula mamária para a sua perpetuação. Todos os outros estreptococos, sejam
saprófitas sejam patógenos potenciais, entram na glândula mamária por oportunis-
mo e não dependem dela para a sua sobrevivência. Logo, a mastite por S. agalactiae
é uma doença infecciosa específica que pode ser erradicada dos rebanhos leiteiros.
O microrganismo entra na glândula através da abertura da teta e se localiza no leite
e na superfície dos canais lácticos. Ele não penetra no tecido. Inicialmente, ele se
multiplica rapidamente e causa um derrame de neutrófilos nos dutos e danifica os
epitélios dutal e acinar, o que leva a uma obstrução dutal com células e restos
celulares. A fibrose do tecido interalveolar e a involução dos acinos nos lóbulos
afetados se seguem rapidamente e levam a uma perda da função secretória.
Como a Streptococcus agalactiae se espalha de vaca para vaca durante a
ordenha, devem-se ordenhar as vacas eliminadoras por último. Alguns autores
acreditam que os bezerros alimentados com um leite que contenha o patógeno
possam transmiti-lo para as glândulas imaturas dos companheiros de cercado, caso
se permita que mamem uns nos outros. Por essa razão, alojam-se separadamente
os bezerros alimentados com leite.
Os outros estreptococos que podem causar a mastite são a S. dysgalactiae, a S.
uberis, a S. zooepidemicus e os estreptococos dos grupos D, G, L e N de Lancefield.
Tanto a S. dysgalactiae quanto S. uberis são comuns no ambiente das fazendas
leiteiras; é muito provável que a S. agalactiae contribua substancialmente para
contagens bacterianas inaceitáveis no leite e possa ser totalmente responsável por
isso.
A mastite causada pela S. agalactiae responde bem à penicilina, mas alguns dos
outros estreptococos parecem ser mais resistentes; infunde-se o antibiótico na
glândula infectada através do canal da teta após uma desinfecção completa do
orifício da mesma. Também se podem utilizar a clortetraciclina, a oxitetraciclina, a
cefalosporina ou a cloxacilina sódica. Têm-se descrito resultados variáveis com o
uso da neomicina. No tratamento da vaca seca, podem-se utilizar preparações de
cloxacilina benzatina, de penicilina-novobiocina, de cefalosporina ou de penicilina
de longa ação.
Mastite estafilocócica – A Staphylococcus aureus é hoje a causa mais impor-
tante de mastite na maioria das áreas leiteiras por causar mastite tanto crônica
quanto aguda, as infecções respondem fracamente ao tratamento e são facilmente
transmitidas no momento da ordenha. Mas, ao contrário da opinião anterior, este
microrganismo não coloniza a pele, e só se encontra nela no caso de uma infecção
do úbere.
Nos rebanhos em que a mastite estafilocócica é um problema, ≥ 50% das
vacas podem apresentar infecções subclínicas crônicas. A Staphylococcus
aureus pode causar uma mastite superaguda; uma mastite gangrenosa superaguda
(na qual a pele do quarto e da teta se torna fria e azulada e finalmente se
desprende); bem como os tipos subclínicos agudo, subagudo e crônico. As
infecções que durarem mais que alguns meses são freqüentemente refratárias ao
tratamento devido ao desenvolvimento de uma barreira tecidual entre o antibió-
tico e o microrganismo.
O tratamento das vacas com infecções subclínicas durante a lactação não obtém
tanto sucesso como o tratamento da vaca seca; por isso, estas devem ser tratadas
no período seco com uma infusão de longa ação apropriada, por exemplo, as
preparações de penicilina-estreptomicina, de cefalosporina, de novobiocina ou de
cloxacilina benzatina. Prefere-se a última droga se os testes de sensibilidade não
tiverem sido realizados.
Mastite, Gr An 834

Pode-se tratar sistemicamente a mastite estafilocócica aguda e superaguda com


um antibiótico apropriado, por exemplo, a eritromicina, a estreptomicina, a
oxitetraciclina ou a clortetraciclina. No caso da terapia intramamária, recomenda-se
a cloxacilina, mas os testes de sensibilidade podem revelar que outras infusões, tais
como a eritromicina, a lincomicina, a penicilina-estreptomicina, a clortetraciclina ou
a neomicina podem ser mais efetivas em alguns casos. Têm-se recomendado
vacinas estafilocócicas, mas o seu valor no controle da doença parece ser limitado.
Mastite coliforme – Os coliformes mais freqüentemente encontrados são a
Escherichia coli, a Enterobacter aerogenes e as Klebsiella spp. Nos quartos com
uma baixa contagem de células, os coliformes se multiplicam rapidamente. A reação
inflamatória que se segue destrói a população coliforme, liberando assim a sua
endotoxina. A toxemia resultante produz os sinais locais e sistêmicos de uma
mastite aguda ou superaguda (incluindo gangrena em casos ocasionais), e pode
também ocorrer morte. A temperatura na mastite aguda ou superaguda é de 39 a
42°C, a secreção de leite cessa mesmo que geralmente se infecte apenas uma única
glândula, e tornam-se proeminentes a anorexia, a depressão, a desidratação e a
rápida perda de peso. A secreção do(s) quarto(s) clinicamente afetado(s) é geral-
mente amarronzada e aquosa. Também pode ocorrer diarréia. Uma característica
singular é que, na recuperação, o tecido do úbere geralmente retorna ao normal de
forma que, em uma lactação subseqüente, não se encontra nenhuma fibrose e a
glândula é capaz de produzir em sua capacidade. As vacas que produzirem leite com
baixas contagens de leucócitos (< 100.000 células/mL) são mais sujeitas a episó-
dios de mastite coliforme aguda, e as vacas mais idosas podem ser até mais, devido
ao aumento da desobstrução do canal estriado.
No caso da mastite coliforme superaguda, indica-se um tratamento sistêmico
com sulfametazina ou com antibióticos, tais como as combinações de penicilina-
estreptomicina, a oxitetraciclina ou a ampicilina, em conjunto com uma infusão de
mastite do mesmo antibiótico no quarto afetado a cada 24h por 3 a 4 tratamentos.
Infunde-se o quarto afetado após a ordenha da noite e este é lavado repetidamente
durante o dia para remover as bactérias e as toxinas. Pode-se usar a ocitocina para
remover a secreção antes do tratamento. As injeções únicas ou repetidas de
flunixina meglumina, anti-histamínicos ou a administração EV de um corticosteróide
com soluções eletrolíticas balanceadas e isotônicas podem ter utilidade como
terapia de suporte nos casos severos. Se os níveis estiverem baixos, pode-se
necessitar de soluções de borogliconato de cálcio ou de bicarbonato isotônico.
Na mastite aguda, as infusões antibióticas intramamárias com ou sem antibióti-
cos sistêmicos são de início (dependendo da severidade) geralmente suficientes se
o microrganismo for sensível ao antibiótico em uso. Têm-se utilizado, com resulta-
dos variáveis, o sulfato de diidrostreptomicina, a ampicilina, a clortetraciclina, a
oxitetraciclina e a neomicina. Também se recomenda a lavagem freqüente da teta.
Felizmente, a maioria das infecções coliformes do úbere é eliminada pela vaca,
freqüentemente antes de se instituir o tratamento; portanto, as culturas dos casos
clínicos podem ser freqüentemente negativas.
Mastite por Pseudomonas aeruginosa – Geralmente, ocorre uma infecção
persistente, que pode ser caracterizada por irritações agudas ou subagudas
intermitentes. Encontra-se o microrganismo nos ambientes de solo–água comuns
nas fazendas leiteiras. Tem-se descrito que as infecções em nível de rebanho se
seguem a uma exposição extensa à água de lavagem e às teteiras contaminadas
ou aos tratamentos intramamários administrados pelos ordenhadores. A falha em
se empregar técnicas assépticas para a terapia do úbere ou o uso de um equipamen-
to de ordenha contaminado pode levar ao estabelecimento de infecções por P.
aeruginosa dentro das glândulas mamárias. Uma mastite superaguda severa com
toxemia e alta mortalidade pode-se seguir imediatamente em alguns casos, enquan-
Mastite, Gr An 835

to em outros podem ocorrer infecções subclínicas. O patógeno persiste em uma


glândula por até 5 lactações, mas pode ocorrer uma recuperação espontânea.
O patógeno freqüentemente é sensível à estreptomicina, à neomicina e à
carbenicilina in vitro, mas os resultados têm sido variáveis quando se infundem
essas drogas no úbere. A carbenicilina parece ser a droga de escolha, mas ainda
não se desenvolveu um tratamento satisfatório para a mastite por P. aeruginosa .
Mastite por Corynebacterium pyogenes – Esse patógeno é comum nos
processos supurativos dos bovinos e dos suínos, e produz uma mastite caracterís-
tica nas novilhas e nas vacas secas; ocasionalmente, é observado em uma mastite
em um úbere lactente, e pode ser um invasor secundário. A inflamação se
caracteriza pela formação de exsudato purulento, profuso e de odor fétido. O odor
fétido não é causado pela C. pyogenes, mas pelo micrococo anaeróbico, Peptococcus
indolicus, que se encontra comumente em associação com o primeiro; nos raros
casos de mastite por C. pyogenes nos quais a P. indolicus não se encontra presente,
o exsudato fica inodoro.
A mastite devida a C. pyogenes ocorre em uma forma epidêmica entre as vacas
secas, as novilhas e os bezerros que pastam durante os meses de verão nos países
do norte da Europa, quando o vetor Hydrotaea irritans se encontra presente. Nos
outros países, onde a mosca se encontra ausente, os casos são esporádicos.
Podem-se controlar as epidemias por meio do controle de moscas ou da remoção
dos animais das áreas infestadas pelas mesmas. Nas áreas endêmicas, o tratamen-
to profilático das novilhas e das vacas secas com preparações de penicilina de longa
ação tem sido efetivo na redução das infecções. Tratam-se as vacas na secagem
e de novo em 4 a 6 semanas. A terapia raramente obtém sucesso, e o quarto afetado
geralmente se perde para a produção. Os animais infectados podem ficar sistemi-
camente doentes, os animais com abscessos geralmente devem ser abatidos.
Formas incomuns de mastite – As Mycoplasma spp podem causar uma forma
severa de mastite que pode ser espalhada rapidamente através de um rebanho com
sérias conseqüências. A Mycoplasma bovis é a causa mais comum. As outras
espécies significativas incluem a M. californicum, a M. canadense e a M.
bovigenitalium. O início tipicamente é rápido. Envolvem-se alguns ou todos os
quartos. A perda de produção é freqüentemente dramática, e logo se substitui a
secreção por um exsudato seroso ou purulento. Inicialmente, pode-se observar um
sedimento floculento ou granular fino característico no material removido das
glândulas infectadas. Apesar dos efeitos locais severos no tecido do úbere, as vacas
geralmente não manifestam sinais de envolvimento sistêmico. A infecção pode
persistir durante o período seco. Como não existe tratamento satisfatório, devem-
se segregar as vacas afetadas pelo menos para a lactação ou por toda a sua vida,
ou abatê-las e administrar medidas estritamente sanitárias, especialmente na
ordenha ou durante o tratamento.
A Nocardia asteroides causa uma mastite destrutiva caracterizada por um início
agudo, uma alta temperatura, anorexia, uma rápida emaciação e um inchaço
acentuado do úbere. A resposta no úbere é típica de uma inflamação granulomatosa
e leva a uma extensa fibrose e à formação de nódulos palpáveis. As histórias do
rebanho sugerem que a infecção do úbere possa-se associar com a falha em
assegurar a assepsia no tratamento intramamário das formas comuns de mastite.
Recomenda-se o abate para os casos clínicos óbvios, mas as infusões intramamá-
rias de uma preparação de furaltadona-penicilina podem remover com sucesso as
infecções latentes e subclínicas.
Tem aparecido uma mastite devida a várias leveduras nos rebanhos leiteiros,
especialmente após o uso da penicilina na tentativa de se erradicar a S. agalactiae,
ou em associação com o uso repetitivo e prolongado das infusões antibióticas nas
vacas individuais. As leveduras crescem bem na presença de penicilina e de alguns
Mastite, Gr An 836

outros antibióticos, e se forem acidentalmente introduzidas durante as infusões de


antibióticos no úbere, podem ser capazes de se multiplicar e causar uma mastite.
Os sinais podem ser severos com uma alta temperatura, seguidos por uma
recuperação espontânea em , 2 semanas ou por uma mastite destrutiva crônica.
Outras infecções por levedura causam uma inflamação mínima e autolimitante.
Caso se suspeite de uma mastite devida a uma levedura, deve-se parar imediata-
mente a antibioticoterapia.
Tem-se descrito uma mastite enrijecedora crônica, semelhante àquela causada
pelo bacilo da tuberculose, como sendo causada por bacilos ácido-resistentes
originários do solo, tais como a Mycobacterium fortuitum, a M. smegmatis, a M.
vaccae e a M. phlei, quando se introduzem tais microrganismos na glândula junto
com antibióticos (especialmente a penicilina) em veículos oleosos ou cremosos. O
óleo aparentemente potencializa a invasividade desses microrganismos, e portanto
a terapia é contra-indicada.
De outra forma, esses microrganismos tendem a ser saprófitas e desaparecer
dos quartos infectados, pelo menos na próxima lactação. Nesse meio tempo, a
mastite é geralmente moderada. Ocorrem surtos distintos e têm-se descrito vários
deles, especialmente com a M. fortuitum e a M. smegmatis.

Controle da mastite bovina


Conseguem-se o controle e a erradicação das formas contagiosas de mastite
devida à Str. agalactiae e à S. aureus por meio da adesão aos 8 pontos listados a
seguir, mais um programa específico para cada patógeno.
Já que se podem curar 90 a 95% das infecções por Str. agalactiae por meio de
uma terapia com penicilina durante a lactação, devem-se identificar as vacas
lactantes e secas infectadas por meio de uma cultura e tratá-las simultaneamente.
Pode-se adiar o tratamento das vacas no final da lactação até a secagem. A terapia
da vaca seca deve curar a maioria das vacas infectadas remanescentes. Deve-se
monitorar o rebanho para detectar a reintrodução da infecção.
Uma porcentagem muito menor das vacas infectadas com S. aureus é curada
tanto pela terapia da lactação como pela da vaca seca. Portanto, devem-se manter
todas as vacas infectadas em um grupo segregado até descartá-las do rebanho.
Sempre se ordenha esse grupo por último (a menos que também haja um grupo
infectado com Mycoplasma) para deter a transferência da infecção na ordenha.
Administra-se a terapia da vaca seca a esse grupo e tratam-se os casos clínicos,
mas nunca se devem considerá-los curados, mesmo que uma cultura negativa
tenha sido obtida. Deve-se transferir quaisquer outras vacas com novas infecções
por S. aureus para esse grupo. Deve-se monitorar o rebanho por meio de uma
cultura da mastite clínica e das amostras do volume de leite do tanque para detectar
a reintrodução da infecção.
Existem 8 pontos relacionados a considerar: 1. Checar (e corrigir quando
necessário) a função da ordenhadeira e os procedimentos de ordenha. Têm-se
associado os seguintes fatores com as incidências mais altas de mastite: a) A
flutuação excessiva e irregular do vácuo na teteira e no tubo de vácuo ou de leite.
Isso ocorre algumas vezes devido a uma reserva inadequada de vácuo ou a uma
manipulação errônea das teteiras (o “deslizamento do tubo” no fim da ordenha,
deixando um excesso de ar no interior do sistema é particularmente perigoso). b) Os
níveis de vácuo ≥ 5cm de mercúrio acima ou abaixo dos 33cm recomendados na
teteira. c) O bloqueio dos orifícios de admissão de ar nas peças em garra. d) Os tubos
de leite com calibre estreito (prefere-se um diâmetro interno < 2,5cm em relação a
tubos de calibre largo). e) As anormalidades macroscópicas na velocidade (normal
de 40 a 60/min) e na proporção (40 a 50 de repouso: 50 a 60 de vácuo) de pulsação.
f) O comprimento muito curto de um tubo efetivo (recomenda-se um mínimo de
Mastite, Gr An 837

14cm, da extremidade do tubo até o ponto mais baixo da queda). Os tubos curtos
impedem a massagem adequada e permitem a congestão da extremidade da teta.
g) A remoção inadequada do conjunto. Deve-se liberar primeiro o vácuo e remover
as teteiras logo após a vaca ter completado a ordenha, para se evitar a superordenha.
h) O estímulo inadequado antes da aplicação do conjunto de teteiras.
2. Observar e corrigir a higiene da ordenha. Um sistema de higiene recomendado
consiste em: a) Ordenhar completa e inicialmente 1 a 2 jatos de leite. b) Lavar as
tetas em água corrente limpa ou higienizada e secá-las com toalhas de papel
descartáveis. c) Banhar as tetas em imersão no final da ordenha em uma solução
de hipocloreto (4% de cloro disponível), uma solução de clorexidina (a 0,5%), uma
solução de iodóforo (5.000 a 10.000ppm de iodo) ou um outro banho de imersão
efetivo. d) Os ordenhadores devem usar luvas de borracha e desinfetar suas mãos
quando passarem de vaca para vaca, especialmente em situações de surto. e) Para
controlar a mastite coliforme, banhar as tetas em imersão antes da ordenha em
2.500 a 5.000ppm de iodóforo e secá-las com uma toalha. Banhar as tetas em
imersão continuamente após a ordenha, mas utilizar um banho de imersão com
hipocloreto para evitar níveis volumosos de iodo no leite que excedam os limites
aceitáveis.
3. Detectar as vacas infectadas por meio de TMC (ver pág. 832) repetidos ou de
culturas e contagens de células. Cultivar todos os casos clínicos. Isolar as vacas
infectadas e ordenhá-las por último. Ordenhar primeiro as novilhas limpas, depois
as vacas recentemente tratadas e finalmente as vacas infectadas.
4. Tratar as infecções clínicas à medida que elas ocorrem e as infecções
subclínicas na secagem (especialmente as infecções por Str. aureus e estrep-
tocócicas). Podem-se tratar as vacas portadoras de infecções por Str. agalactiae
durante a lactação com um grau razoável de sucesso. Tratar todos os quartos na
secagem com uma infusão antibiótica de longa ação apropriada.
5. Descartar todas as vacas que apresentarem 3 a 5 ou mais ataques clínicos
de mastite durante a lactação, que tenham falhado em responder a uma terapia
repetida (incluindo a terapia da vaca seca) ou apresentarem contagens de células
somáticas persistentemente altas.
6. Examinar todas as introduções ao rebanho por meio da palpação do úbere, da
cultura e do TMC da secreção de todos os quartos.
7. Controlar as rachaduras e as fissuras das tetas e a pseudovaríola bovina por
meio de medidas apropriadas, já que elas podem predispor a uma alta incidência de
mastite.
8. Manter o interesse e a consciência do proprietário quanto ao problema da
mastite por meio de discussões regulares dos resultados da cultura e da contagem
de células (ou do TMC) de amostras mensais do tanque de volume, de amostras pré-
tratamento preservadas de todos os casos clínicos e de análises mensais das
contagens de células somáticas dos registros do rebanho e dos animais em trata-
mento.

MASTITE NAS CABRAS


Os microrganismos que infectam o úbere dos caprinos são semelhantes aos das
vacas. Os estafilococos coagulase-negativos apresentam uma alta prevalência e
parecem causar infecções persistentes que resultam em contagens elevadas de
células e em uma mastite de baixo grau, com alguns episódios clínicos recidivantes.
O nível de infecção e de incidência da mastite devida à Staphylococcus aureus e à
Streptococcus agalactiae e a outros estreptococos tende a ser baixo, mas podem
ocorrer diferenças importantes entre os rebanhos.
As infecções micoplasmais, primariamente por Mycoplasma mycoides mycoides
(do tipo colônia grande) e por M. putrefaciens, causam algumas vezes sérios surtos
Mastite, Gr An 838

de mastite nos caprinos (ver também pág. 796). O último agente também causa
septicemia, poliartrite, pneumonia e encefalite, junto com uma doença séria e
mortalidade nos cabritos lactentes. Também se tem descrito a Mycoplasma capricolum
como causadora de uma mastite severa nos caprinos e de uma infecção nos
cabritos. As cabras geralmente se recuperam em , 4 semanas.
Como nas vacas, os microrganismos Gram-negativos causam infecções intermi-
tentes que podem ser severas, mas que são geralmente autolimitantes. A
Corynebacterium pyogenes produz algumas vezes abscessos nodulares múltiplos.
Os programas para diagnóstico, controle e tratamento da mastite bacteriana nos
caprinos são semelhantes aos das vacas. A higiene da ordenha e do ambiente
precisa ser boa para reduzir a prevalência e o alastramento da infecção. Os caprinos
cronicamente infectados devem ser descartados assim como os caprinos com
infecções por M. mycoides mycoides e os que não se recuperarem de infecções por
M. putrefaciens ou M. capricolum.

MASTITE NAS ÉGUAS


A mastite aguda ocorre ocasionalmente nas éguas lactantes, mais comumente
no período de secagem, em uma ou ambas as glândulas. A Strepotococcus
zooepidemicus é o patógeno mais freqüente. Também são encontradas a
Streptococcus equi, a S. equisimilis, a S. agalactiae e a S. viridans. Também se tem
descrito uma variedade de bactérias Gram-negativas. Ocorre um inchaço doloroso
e acentuado da glândula afetada e dos tecidos adjacentes, e a secreção fica
freqüentemente sorofloculenta. Podem-se encontrar presentes febre e depressão.
A égua pode andar rigidamente ou ficar em pé com as pernas traseiras afastadas
devido ao desconforto.
O tratamento é semelhante ao das vacas, mas quando infusões intramamárias
são utilizadas, devem-se inseri-las separadamente em ambos os orifícios da teta.
A cultura e o teste de sensibilidade antibacteriana ajudam na seleção de uma terapia
antimicrobiana local e sistêmica apropriada. Sem o tratamento imediato, pode
ocorrer a abscedação ou o endurecimento da glândula. Pouco se sabe acerca da
freqüência e da persistência das infecções intramamárias subclínicas nas éguas.

MASTITE NAS OVELHAS


Essa pode ser uma doença muito importante, com uma incidência ≥ 2%. Afora
as mortes provenientes das infecções superagudas, a doença pode ser uma causa
da mortalidade de cordeiros por inanição, ou da redução do peso dos cordeiros ao
desmame. Ocorrem tipos superagudos, gangrenosos (provavelmente devidos à
Staphylococcus aureus), agudos, subagudos e provavelmente subclínicos. Os
microrganismos mais comumente envolvidos são a S. aureus, os estafilococos
coagulase-negativos, os estreptococos, a Escherichia coli, a Pasteurella haemolytica
e a Corynebacterium pyogenes.
Os princípios de diagnóstico e tratamento utilizados na mastite bovina podem ser
aplicados nas ovelhas. Pouco se sabe acerca do controle da mastite ovina, mas
deve ser benéfica a inspeção cuidadosa das glândulas mamárias das ovelhas antes
do acasalamento para que sejam detectadas e eliminadas as ovelhas com mastite
aguda, subaguda e crônica.

MASTITE NAS PORCAS


A mastite pode ser importante nas unidades de criação de suínos. A mastite
superaguda pode afetar as porcas e as marrãs e se associa comumente com
infecções coliformes (por Escherichia coli, Enterobacter aerogenes e Klebsiella). Ela
Metrite, Gr An 839

é mais comum no parto ou imediatamente após o mesmo, e as porcas afetadas


apresentam uma toxemia moderada a severa. A temperatura da porca pode-se
elevar a 42°C ou ficar subnormal. As glândulas afetadas ficam inchadas e arroxeadas
e apresentam uma secreção aquosa. A mortalidade das porcas é alta, e a ninhada
morre a menos que seja adotada ou alimentada artificialmente. As porcas recupe-
radas podem apresentar uma deterioração da produção de leite na próxima
lactação. O tratamento da mastite coliforme superaguda nas porcas é semelhante
ao das vacas (ver anteriormente). A ampicilina, a diidrostreptomicina ou a
oxitetraciclina, administradas sistemicamente têm sido utilizadas.
A mastite subaguda pode ocorrer nas porcas mais idosas e levar ao enrijecimento
de uma ou mais glândulas e prejudicar a capacidade da porca de amamentar uma
ninhada grande. Essa forma de mastite se associa mais provavelmente com uma
infecção por estreptococos ou estafilococos. As lesões granulomatosas nas mamas
das porcas têm sido associadas com as infecções pela Actinobacillus lignieresii,
pela Actinomyces bovis e pela Staphylococcus aureus. A Fusobacterium necrophorum
e a Corynebacterium pyogenes também têm sido incriminadas na mastite da porca.
Um exame completo e uma cultura das glândulas mamárias da porca se tornam
importantes para o diagnóstico de qualquer um dos tipos superagudos e subagudos
de mastite (ver SÍNDROME DE AGALACTIA, pág. 794).
Ainda não se investigou extensivamente o controle da mastite suína, mas o
isolamento das porcas em cercados adequadamente desinfetados antes, durante
e por um período adequado após o parto deve ajudar a evitar as severas perdas
associadas com a mastite coliforme.

METRITE, GR AN
É a inflamação das camadas muscular e endometrial do útero. Quase sempre
ocorre uma metrite aguda após um parto anormal ou uma contaminação uterina
grosseira. O retardamento da involução uterina é um fator predisponente importan-
te. Ela é acompanhada freqüentemente pela retenção da placenta (ver pág. 346).
Os contaminantes entram no útero durante o parto e estabelecem a infecção,
especialmente em associação com o estresse causado por uma distocia, um
abortamento, uma doença sistêmica intercorrente ou má nutrição. Comumente,
ocorre uma descarga fétida a partir do útero. Nos animais severamente afetados, o
útero fica atônico e nas vacas e nas éguas podem-se acumular vários litros de fluido.
Os sinais sistêmicos incluem febre, anorexia, depressão e, nas éguas, toxemia e
laminite. O útero pode ficar inchado e tão frágil que se deve ter cuidado ao examiná-
lo. A manipulação do útero por meio da palpação retal pode causar uma perimetrite.
O tratamento deve ser tanto sistêmico quanto local com antimicrobianos de
amplo espectro. Os tratamentos sistêmicos (indicados quando se encontram
presentes sinais sistêmicos) incluem trimetoprim com sulfadoxina, tetraciclinas,
ampicilina (especialmente quando também se encontrar presente uma infecção do
trato urinário) e penicilina. A evacuação do conteúdo uterino é essencial antes do
tratamento local. A ocitocina é geralmente efetiva dentro de 48h de parto. Deve-se
utilizar um sifão se houver uma resposta fraca.
No caso do tratamento local do útero pós-parto das vacas, alguns medicamentos
em concentrações prováveis de serem atingidas no útero são inefetivos contra as
bactérias comuns (por exemplo, a Corynebacterium pyogenes ). Algumas drogas ou
seus veículos omitem respostas inflamatórias severas no endométrio. O ambiente
anaeróbico do útero pós-parto pode ser insatisfatório para algumas drogas (por
Metrite, Gr An 840

exemplo, os aminoglicosídios). O conteúdo uterino também pode conter substân-


cias tais como a penicilinase, que inibem drogas em particular. Tem-se sugerido
como regime de tratamento a oxitetraciclina em uma base de povidona infundida no
útero a cada 2 dias, com uma terapia sistêmica com penicilina quando a febre estiver
presente. A seleção dos antibióticos para tratamento das vacas leiteiras deve
considerar os períodos de repouso do leite.
O antibiótico selecionado para o tratamento local das éguas com metrite deve ser
conhecido por não ser irritante ao endométrio, por exemplo, as tetraciclinas. A
lavagem uterina, em conjunto com antibióticos locais, é útil na remoção dos fluidos
e dos subprodutos tóxicos da inflamação; nas éguas com metrite séptica severa, a
remoção física do conteúdo uterino pode ser crítica para a sobrevivência. As
lavagens de grande volume (10 a 12L) repetidas com água ou solução salina mornas
podem causar uma contração uterina bem como potencializar a remoção do material
ofensivo.
Quando a vaca não estiver sistemicamente doente, é comum a recuperação
espontânea da metrite. Se a doença ficar crônica, o útero pode ficar fibrótico e com
a parede espessada. As vacas cronicamente afetadas podem emagrecer e pode-
se prejudicar a fertilidade potencial. Os casos crônicos podem ser tratados com
infusões antibióticas ou com desinfetantes, tais como a solução de lugol. O último
agente causa uma necrose do endométrio superficial, que se regenera subseqüen-
temente e pode apresentar uma melhora do potencial.
Se as éguas sobrevivem à fase aguda da metrite, geralmente não ocorre nenhum
efeito posterior negativo. A inspeção cuidadosa quanto aos danos para o endométrio
e cérvix causados pelo parto, metrite ou tratamentos deve fornecer dados que se
correlacionem bem com a fertilidade futura.
Ver também METRITE CONTAGIOSA EQÜINA, adiante, e MMA, página 794.

M ETRITE CONTAGIOSA EQÜINA


É uma doença venérea altamente contagiosa dos eqüinos e, experimentalmente,
dos asininos. Na maioria das áreas, deve-se relatar a doença às autoridades
regulatórias.
Etiologia, epidemiologia e achados clínicos – O agente causador é um
cocobacilo Gram-negativo, já classificado discutivelmente no gênero Haemophilus,
e hoje designado Taylorella equigenitalis. Esse agente é sofisticado e melhor
cultivado no ágar Eugon-chocolate a 37°C em uma atmosfera microaerofílica.
Nos garanhões infectados, a T. equigenitalis se localiza no esmegma do prepúcio
e na superfície do pênis, especialmente na fossa uretral, sem a produção de doença
clínica. A infecção é transmitida pelo coito, mas a transferência potencial entre as
éguas e entre os garanhões e por parte dos tratadores e dos instrumentos consiste
em um sério risco. As éguas severamente afetadas desenvolvem uma endometrite
manifestada por uma descarga vulvar mucopurulenta, pegajosa e profusa 2 a 6 dias
após a cobertura; os sinais são menos severos ou insignificantes nos outros. A taxa
de concepção fica baixa, presumivelmente devido à salpingite, mas após a redução
da infecção, a fertilidade é reobtida. Pode-se encurtar o diestro. O aborto é incomum,
mas os potros podem-se expor no nascimento e reter a infecção até a idade de
acasalamento.
Diagnóstico – Nas éguas, isso se baseia na recuperação da T. equigenitalis a
partir do endométrio, da cérvix, da fossa e dos seios clitoridianos nos vários estágios
após a exposição e o subseqüente desenvolvimento de anticorpos específicos para
a fixação de complemento (CF) e a hemaglutinação (HA), 1 a 2 semanas após o
aparecimento dos sinais clínicos (8 a 14 dias após o cruzamento). A imunofluores-
cência indireta também pode ter valor. As amostras para bacteriologia devem ser
Gestação Prolongada nos Bovinos e nos Ovinos 841

coletadas com cuidado para se evitar o alastramento lateral da infecção. Nas


infecções agudas, pode-se isolar melhor a T. equigenitalis a partir de “swabs”
endometriais protegidos; nas infecções crônicas, a partir de um “swab” combinado
da fossa e dos seios clitoridianos. No caso dos garanhões, “swabs” do prepúcio, do
pênis e da fossa uretral são exigidos. O uso de meios de transporte mantidos a 4°C
(prefere-se o meio de Amies, mas o meio de Stuart é satisfatório quando o intervalo
entre a coleta e o processamento dos “swabs” for curto) potencializa a sobrevivência
da T. equigenitalis. O supercrescimento por parte dos micróbios saprófitas pode
interferir no isolamento. A adição de trimetoprim, de clindamicina e de agentes
antifúngicos (anfotericina) ao ágar Eugon-chocolate suplementado com 5% de
sangue eqüino coagulado ajuda no isolamento de ambas as cepas resistentes e
sensíveis à estreptomicina, mas devem-se utilizá-los em paralelo com um meio não
seletivo. A imunofluorescência possui um valor limitado na identificação do agente
causador no material clínico, embora seja útil na identificação das colônias suspei-
tas. Pode-se utilizar a sorologia para a monitoração das éguas cruzadas com
garanhões de estado patológico incerto, e para a avaliação das éguas que tenham
contraído recentemente a infecção mas que os resultados bacteriológicos sejam
inconclusivos. Os títulos de CF persistem por 4 a 6 semanas, os títulos de HA por
mais tempo. Os testes sorológicos não são úteis nos garanhões infectados.
Tratamento e controle – Deve-se excitar o garanhão e lavar completamente o
pênis e a bainha protraídos com clorexidina (deve-se remover o esmegma da fossa
uretral); após 2min, enxágua-se o anti-séptico; seca-se o pênis, a fossa e a bainha
e lambuza-se à vontade essas estruturas com um creme de nitrofurazona. Repete-
se isso diariamente por 5 dias. Após ≥ 1 semana, torna-se aconselhável um
cruzamento-teste do garanhão antes de prosseguir-se o acasalamento. Não se
recomenda o uso profilático prolongado da clorexidina nos garanhões antes e após
a cobertura para minimizar a possibilidade de adquirirem a T. equigenitalis; essa
substância pode inibir a flora normal e permitir que se desenvolva Pseudomonas na
pele do pênis, que pode se transferir às éguas. Na maioria das éguas, a infecção com
uma metrite contagiosa eqüina (MCE) aguda se resolve sem tratamento em 3
semanas, mas muitas delas retêm a infecção na fossa e nos seios clitoridianos. A
limpeza do esmegma da fossa e a aplicação local de clorexidina e de cremes
antibióticos na fossa e nos seios (variáveis em número e localização) freqüentemen-
te sobrepujam a infecção residual; em outros casos, torna-se necessária a ablação
dos seios clitoridianos.

GESTAÇÃO PROLONGADA NOS BOVINOS E


NOS OVINOS
A gestação se prolonga quando uma lesão no eixo hipofisário-adrenocortical do
feto interfere na liberação do cortisol necessário para o início do parto. As duas
formas de gestação prolongada observadas nos bovinos são herdadas por meio de
um gene homozigótico autossômico recessivo. Uma das formas, observada nos
bovinos holstein e ayrshire, se deve a uma hipoplasia das adrenais fetais e à
ausência de uma enzima adrenal necessária para a síntese dos glicocorticóides.
Esses fetos continuam a crescer 20 a 90 dias além do termo e podem exceder 90kg.
No final da prenhez normal, as vacas afetadas apresentam uma certa hipertrofia
mamária sem nenhum outro sinal de parto. O início espontâneo do parto, que ocorre
somente após a morte do feto, resulta em uma distocia e indica-se uma cirurgia
Gestação Prolongada nos Bovinos e nos Ovinos 842

cesariana. Os bezerros vivos nascidos por meio de uma cirurgia cesariana são
hipoglicêmicos e apresentam uma síndrome semelhante a um hipoadrenocorticismo.
Uma terapia contínua de suporte e com corticosteróides pode manter esses
bezerros vivos, mas não é prática.
Uma segunda forma de gestação prolongada, que ocorre nos bovinos guernsey
e vermelho e branco suecos, se deve a uma aplasia da hipófise e a uma ausência de
hormônio adrenocorticotrófico (ACTH) suficiente para estimular a liberação de
glicocorticóides. As características desses fetos incluem uma suspensão do cresci-
mento com , 7 meses de gestação, deformação dos membros, alopecia e hidrocefalia,
anencefalia ou ciclopia. As adrenais também podem ficar hipoplásicas ou se
encontrar ausentes. Esses fetos podem viver in utero por longos períodos, e têm-se
descrito gestações de até 18 meses. O parto ocorre após a morte do feto.
Tem-se associado uma outra forma de gestação prolongada nos bovinos
holstein com a herniação cerebral (marca de Catlin) no feto. Tal feto continua a
crescer in utero e pode-se iniciar o parto 20 a 60 dias mais tarde, resultando em
uma distocia devida a um feto maior que o normal. As características desses fetos
incluem uma herniação cerebral, uma inclinação da testa e uma redução da
cavidade cranial. A hipoplasia das adrenais ou a aplasia da hipófise também tem
sido descrita.
A ingestão da Veratrum californicum por parte da ovelha entre o 14º e o 30º dias
de gestação interfere no desenvolvimento do SNC (ver pág. 699) e resulta em
deformidades severas da cabeça e da face, ciclopia, hipoplasia ou aplasia da
hipófise e gestação prolongada . Esses fetos continuam a crescer in utero até os 230
dias e podem resultar na morte da ovelha se não forem removidos por meio de uma
cirurgia cesariana. A Veratrum album, encontrada na Europa, pode causar uma
afecção semelhante no feto quando ingerida pelos bovinos.
Tem-se descrito uma gestação prolongada associada a fetos gigantes nos
ovinos karakul. Acredita-se que esses ovinos consumam um arbusto (Salsola
tuberculata) que inibe os fatores liberadores hipotalâmicos fetais. As ovelhas
afetadas não desenvolvem um aumento de volume do úbere pré-parturiente normal.
Os fetos apresentam hipófises pequenas e adrenais hipoplásicas.
Nos casos de gestação prolongada, pode-se induzir o parto por meio de uma
injeção IM de glicocorticóides. Análogos das prostaglandinas ou combinações
destas e glicocorticóides também podem ser utilizados (ver também FALHA DA
FUNÇÃO ENDÓCRINA FETAL, pág. 313).

PROSTATOPATIAS
Incomuns a raras nas outras espécies, as prostatopatias são comuns nos
cães. Elas incluem a hiperplasia prostática benigna, a prostatite bacteriana, os
abscessos prostáticos, os cistos prostáticos e paraprostáticos e a neoplasia
prostática; todos apresentam sinais clínicos semelhantes porque todos causam
o aumento de volume ou a inflamação prostática. Os sinais mais comuns
incluem o tenesmo, o gotejamento de sangue do pênis, a hematúria e as
infecções recidivantes do trato urinário. Os sinais inespecíficos adicionais (tais
como a febre, a indisposição e a dor abdominal caudal) se encontram freqüen-
temente presentes com as infecções bacterianas e as neoplasias. O adenocar-
cinoma prostático com metástases vertebrais pélvicas e lombares pode causar
anormalidades na andadura. O aumento de volume prostático pode interferir
mecanicamente como nos outros órgãos abdominais. As prostatopatias podem
Prostatopatias 843

causar menos comumente infertilidade, incontinência urinária ou obstrução


uretral.
A próstata é examinada fisicamente por meio de palpação retal e abdominal. A
próstata aumentada raramente se localiza completamente dentro do canal pélvico.
Avaliam-se por palpação o tamanho, a forma, a simetria, a consistência, a mobilida-
de e a presença ou a ausência de desconforto. Os sinais clínicos e os achados físicos
são geralmente suficientes para localizar o processo patológico na glândula pros-
tática, mas não para diferenciar as várias afecções.
As radiografias abdominais podem definir adicionalmente o tamanho, a forma e
a posição da próstata. Devem-se avaliar radiograficamente os linfonodos
sublombares, as vértebras lombares e os ossos da pelve quanto a evidências de
metástases. Pode-se realizar um cistouretrograma de contraste positivo quando
uma próstata anormal se torna difícil de diferenciar da bexiga. A ultra-sonografia
fornece informações adicionais sobre a homogeneidade do parênquima prostático,
o diâmetro uretral e a natureza difusa ou focal da doença. A invasão ou a destruição
uretral, identificadas por uma radiologia de contraste ou uma ultra-sonografia, são
altamente sugestivas de uma neoplasia prostática. Os outros achados radiográfi-
cos/ultra-sonográficos não diferenciam cistos e abscessos, ou hiperplasia, neopla-
sia difusa e prostatite.
Pode-se obter material para exame citológico e microbiológico por meio da
massagem prostática seguida por uma aspiração por meio de um cateter urinário,
por uma coleta da fração prostática do ejaculado, por uma aspiração com agulha fina
e/ou por uma biópsia. A massagem prostática é facilmente realizada; no entanto, as
amostras ficam sempre contaminadas pelo material da bexiga. Como o fluido
prostático normalmente reflui para a bexiga, geralmente se encontra presente uma
infecção do trato urinário no caso de uma prostatite bacteriana. Quando se encontra
presente uma infecção do trato urinário, o exame microbiológico da porção prostá-
tica (terceira fração) do ejaculado se torna mais preciso que o exame das amostras
da massagem prostática. Freqüentemente as células neoplásicas não são recupe-
radas nas amostras obtidas por ejaculação ou por massagem prostáticas. Pode-se
realizar uma aspiração transretal ou percutânea com agulha fina, com ou sem uma
orientação ultra-sonográfica; embora geralmente segura e simples, ela não ocorre
sem nenhum risco de penetração das estruturas circundantes. A biópsia é o
procedimento diagnóstico mais definitivo, mas também o mais invasivo, para a
diferenciação das prostatopatias. A biópsia prostática provavelmente é melhor
realizada por meio de uma celiotomia.

HIPERPLASIA PROSTÁTICA BENIGNA


É o distúrbio prostático mais comum encontrado na maioria dos cães machos
virgens > 6 anos de idade. É o resultado de um estímulo androgênico, mas não se
sabe por que alguns machos são afetados e outros não. Pode não haver nenhum
sinal clínico, ou podem ocorrer tenesmo, hematúria e sangramento. Os achados
físicos e históricos sugerem o diagnóstico. A radiologia pode confirmar a
prostatomegalia. A ultra-sonografia deve exibir um envolvimento difuso e relativa-
mente simétrico. As estruturas císticas, difusas e múltiplas são razoavelmente
comuns. O exame citológico das amostras de massagem ou de ejaculado revela
uma hemorragia com uma inflamação suave sem evidências de sepse ou neoplasia.
A castração é o tratamento de escolha; a involução prostática fica geralmente
evidente dentro de poucas semanas e se completa freqüentemente em vários
meses.
Pode ser possível uma outra terapia para os machos pretendidos para o uso no
acasalamento. No entanto, o tratamento com antiandrogênios é muito menos efe-
tivo que a castração. As drogas que ou inibem a síntese de androgênios ou “contra-
Prostatopatias 844

atacam” os efeitos destes têm o potencial de inibir a espermatogênese, e o seu uso


a longo prazo pode não ter conseqüências mais desejáveis que a castração. Não se
pode recomendar o uso dos estrogênios para reduzir a hiperplasia prostática.
Pode ocorrer uma metaplasia escamosa da próstata sempre que um estímulo
estrogênico se encontrar presente (administração exógena ou produção endógena
por parte de um tumor das células de Sertoli). A metaplasia escamosa pode causar
um aumento de volume prostático e piorar os sinais clínicos. Também pode po-
tencializar o risco de alterações císticas e de infecção no interior da próstata. Os
estrogênios podem causar um “feedback” negativo ao hipotálamo e à hipófise,
diminuindo assim a espermatogênese. Os estrogênios também são potencialmente
tóxicos à medula óssea.
Atualmente faltam estudos a longo prazo com outros antiandrogênios, tais como
o cetoconazol, a flutamida ou o acetato de megestrol. Tem-se recomendado o
acetato de megestrol (0,55mg/kg, VO, diariamente por 10 dias) para o tratamento
da hiperplasia benigna nos reprodutores de valor. Uma experiência limitada sugere
que qualquer efeito benéfico possa ser temporário. A castração permanece como
o tratamento de escolha.

CÁLCULOS
Quando ocorrem (raramente) cálculos prostáticos, também existem geralmente
outras prostatopatias. Os cálculos prostáticos radiopacos raramente são achados
incidentais nas radiografias abdominais.

NEOPLASIAS
O adenocarcinoma é a neoplasia mais comum da próstata. O carcinoma das
células de transição que surge na bexiga ocasionalmente invade a próstata. A
castração não é protetora contra o futuro desenvolvimento de uma neoplasia
prostática nos cães.
Os sinais clínicos da neoplasia prostática são semelhantes aos das outras
prostatopatias. Podem-se encontrar presentes dor e febre. Se a neoplasia se infiltrar
na uretra, uma disúria ou uma obstrução uretral torna-se provável. O adenocarcino-
ma prostático se metastatiza nos linfonodos regionais, nas vértebras lombares e nos
ossos da pelve. O alastramento para locais distantes (tais como os pulmões) é
incomum até o final do curso da doença. As metástases ocorrem freqüentemente
antes que se realize o diagnóstico. Sempre que uma prostatopatia causar uma
obstrução uretral nos cães, a neoplasia deve receber a mais alta consideração. Da
mesma forma, uma prostatomegalia em um cão anteriormente castrado é altamente
sugestiva de uma neoplasia. O diagnóstico se faz por meio de uma biópsia.
Não há tratamento efetivo. Recomenda-se uma consulta com um oncologista
veterinário.

CISTOS PROSTÁTICOS E PARAPROSTÁTICOS


Ocasionalmente, cistos grandes são encontrados dentro da ou associados com
a glândula prostática. Os sinais são semelhantes aos encontrados nos outros tipos
de aumento de volume prostático, e geralmente só se tornam aparentes quando
alcançam um tamanho suficiente para causar pressão nos órgãos adjacentes. Os
cistos grandes podem resultar em uma distensão abdominal e deve-se diferenciá-
los da bexiga e dos abscessos prostáticos.
O tratamento médico é inefetivo e a terapia com estrogênios é contra-indicada.
É improvável que a castração sozinha possua benefícios, mas pode-se indicá-la
após a remoção do cisto. A excisão total do cisto consiste no único tratamento
Prostatopatias 845

satisfatório. A excisão cirúrgica é preferível à marsupialização, pois o manejo


crônico da fístula freqüentemente é problemático.

PROSTATITE
A inflamação da glândula prostática é geralmente supurativa e pode resultar em
abscessos. Ela pode se associar com uma hiperplasia prostática (ver anteriormen-
te). Vários microrganismos têm sido incriminados. A infecção pode ser hematogênica
ou ascendente a partir da uretra. Como o fluido prostático normalmente reflui para
o interior da bexiga, a infecção do trato urinário freqüentemente acompanha a
infecção prostática.
Os sinais lembram os da hiperplasia prostática. Além disso, são comuns
indisposição, dor e febre. Podem ocorrer desidratação, septicemia e choque nos
casos severos de prostatite bacteriana aguda ou de abscessos prostáticos.
Os achados históricos, físicos e radiográficos sugerem uma prostatite bacteriana
aguda e abscessos. Uma neutrofilia com um desvio à esquerda, uma monocitose e/ou
leucócitos tóxicos podem ser observados. A ultra-sonografia apresenta áreas hipoecóicas
compatíveis com bolsas de fluido. Obtém-se idealmente o material prostático por meio
da ejaculação, de uma massagem prostática ou de uma aspiração com agulha fina para
exame citológico e para cultura e testes de sensibilidade. A massagem de uma próstata
agudamente infectada pode liberar microrganismos no sangue e causar uma bactere-
mia/septicemia. Por essa razão, outros métodos são preferidos. A aspiração com
agulha fina pode liberar microrganismos na cavidade peritoneal. Os cães com prostatite
bacteriana aguda ou abscessos podem ficar relutantes à ejaculação. A urinálise exibe
uma hematúria, uma piúria e uma bacteriúria. Deve-se enviar a urina para cultura e teste
de sensibilidade. Freqüentemente, a urina e o material prostático produzem os mesmos
microrganismos.
A prostatite bacteriana crônica pode não causar nenhum sinal clínico, exceto uma
infecção recidivante do trato urinário. As anormalidades físicas podem-se limitar ao
trato urinário. O tamanho e a forma prostáticos podem ficar normais. Os cães com
prostatite bacteriana crônica ficam geralmente propensos à ejaculação. O fluido
prostático e a urina devem ser enviados para exames citológico e microbiológico.
Também se pode utilizar a massagem prostática ou a aspiração com agulha fina
para a obtenção de amostras.
No caso de desidratação ou choque indica-se a fluidoterapia. Os antibióticos
devem ser selecionados com base no teste de sensibilidade e administrados por 1
a 2 semanas. Os abscessos prostáticos grandes são melhor tratados por meio de
uma drenagem cirúrgica. Pode-se considerar a castração após o controle da
infecção. Devem-se cultivar novamente a urina e/ou o fluido prostático após a
antibioticoterapia e 2 a 4 semanas mais tarde, para se certificar de que a infecção
foi resolvida.
A prostatite bacteriana crônica pode ser difícil de se resolver. A antibioticoterapia
deve continuar por ≥ 4 semanas. As culturas devem ser repetidas durante, e por
vários meses após a antibioticoterapia, para se verificar se a resistência ou uma
infecção persistente se desenvolve. Os benefícios da castração para o tratamento
da prostatite bacteriana crônica são incertos; no entanto, parece razoável que a
involução prostática após a castração ajudaria pelo menos a impedir a recidiva da
infecção.
Retenção da Placenta, Gr An 846

RETENÇÃO DA PLACENTA, GR AN
VACAS
As membranas fetais são normalmente expulsas dentro de 12h do parto;
considera-se retardada a expulsão que ocorrer 12 a 24h após o parto, e consideram-
se retidas as membranas que não forem expulsas dentro de 24h. A incidência da
retenção de placenta após um parto normal é de 3 a 12%. Após nascimentos
anormais, ou quando o trato reprodutivo se encontra infectado, 20 a 50% das vacas
podem ser afetadas.
Na expulsão placentária normal, os placentomas começam a se soltar durante
o final da prenhez. A colagenização dos tecidos conjuntivos maternos e fetais no
placentoma constitui a principal alteração. Durante o parto, as alterações na pressão
uterina, a alteração no fluxo sangüíneo e o achatamento do placentoma contribuem
para a expulsão imediata. A retenção pode-se relacionar com os placentomas
imaturos, como no nascimento prematuro ou no aborto; com a placentite ou a
inflamação cotiledonária, como nas infecções bacterianas ou micóticas; com o
edema dos vilos coriônicos devido a qualquer causa; e com a atonia uterina ou o
retardamento da involução. As doenças específicas associadas com o aborto (por
exemplo, a brucelose) são causas importantes da retenção da placenta. Também
se reconhecem várias etiologias metabólicas e nutricionais.
Geralmente, observam-se membranas descoloridas e em degeneração pendu-
radas a partir da vulva após 24h. Ocasionalmente, elas podem persistir dentro do
trato e causar uma descarga de odor fétido. Freqüentemente, não há enfermidade
sistêmica, mas a produção de leite e o apetite podem ser reduzidos. Pode ocorrer
um envolvimento sistêmico quando o útero fica atônico ou traumatizado. O fecha-
mento da cérvix antes da expulsão das membranas pode precipitar uma metrite
severa com sinais sistêmicos.
Tem-se substituído a remoção manual tradicional da placenta retida por um
método mais conservativo, que é menos traumático e geralmente menos complica-
do. Nas vacas que não apresentarem sinais de doença sistêmica, uma tração gentil
diária nas membranas será geralmente suficiente para causar a expulsão em
poucos dias. Deve-se remover o tecido em excesso para evitar-se uma contamina-
ção grosseira posterior do trato. Os exames e os tratamentos locais devem ser
realizados com uma higiene exemplar.
Quando se notam sinais de enfermidade sistêmica, indica-se uma terapia intra-
uterina. As tetraciclinas são a melhor escolha devido à produção de penicilinase ser
característica da flora típica associada com a metrite nas vacas (o que torna a
penicilina ineficiente), ao envolvimento das bactérias anaeróbicas limitar a efetividade
dos aminoglicosídios e aos restos teciduais no útero das vacas afetadas inativarem
as sulfonamidas. Não se provou que a terapia anti-séptica seja benéfica. Os
antibióticos sistêmicos devem ser administrados, quando houver febre ou trauma ou
necrose do trato.
Aconselha-se um exame de acompanhamento em 10 a 20 dias para se determi-
nar se está presente uma metrite residual numa tentativa de redução do intervalo de
partos.

ÉGUAS
A placenta normalmente é expulsa dentro de 3h do parto, mas pode-se retardá-
la em até 8 a 12h sem seqüelas inconvenientes. A retenção além disso é incomum
e tende a se associar com uma infecção, uma distocia ou uma atonia uterina. Os
casos não complicados podem ser tratados por meio da administração de ocitocina,
Postite e Vulvite Ulcerativas 847

tanto em pequenas doses IM repetidas (20 a 30u) como por gotejamento EV lento
de 50 a 100u por 1 a 2h. Pode-se notar um desconforto associado com a contração
uterina.
Como as bactérias se multiplicam logaritmicamente após 8h, torna-se prudente
o início de uma antibioticoterapia local e sistêmica quando a retenção excede o seu
tempo. Sempre que se medicar ou explorar manualmente o útero, são imperativas
a higiene e a suavidade. Pode-se combinar a exploração com a administração local
de um medicamento para se reduzir o número de vezes de invasão uterina. A
manipulação cuidadosa das membranas pode resultar em sua separação, mas em
nenhum caso se justifica a extração vigorosa.
As complicações mais sérias da retenção da placenta nas éguas são a metrite,
a septicemia e a laminite. Para minimizá-las, torna-se útil a lavagem uterina com
grandes volumes de água ou de solução salina mornas.

OUTRAS ESPÉCIES
Nas ovelhas e nas cabras, geralmente são utilizados tratamentos local e
sistêmico para prevenção de infecções e uma tração gentil das membranas. A
placenta retida é geralmente expulsa dentro de 2 a 10 dias.
Nas porcas, os sinais de enfermidade sistêmica e uma descarga purulenta que
contém pequenos pedaços de membrana indicam um caso incomum de retenção
de placenta. Se observada precocemente, uma ocitocina pode ajudar. Indica-se um
tratamento intensivo para combater a infecção.

POSTITE E VULVITE ULCERATIVAS


(Bainha podre, Vergalho podre, Balanopostite enzoótica, Vulvovaginite
herpesviral caprina)

A postite (ou vulvite) ulcerativa, uma doença moderadamente contagiosa dos


ovinos e dos caprinos e ocasionalmente dos bovinos, se caracteriza por lesões
ulcerativas com formação de crostas no prepúcio, e menos freqüentemente nos
lábios da vulva. É prevalente nos ovinos e nos caprinos machos castrados e no
carneiros, e menos freqüente nas ovelhas; não se conhece a incidência nas cabras.
A maior incidência ocorre nos carneiros castrados angorás e merinos. Também se
tem observado postite nos garrotes e algumas vezes nos touros.
Etiologia e epidemiologia – Para se estabelecerem as ulcerações, torna-se
necessária uma combinação de altos níveis de uréia urinária e do microrganismo
causador, a Corynebacterium renale. Os animais com dietas ricas em proteínas (16
a 18%) produzem uma urina alcalina, que também é rica em uréia (até 4%), e a C.
renale (que é um habitante normal da pele) pode hidrolisar a uréia em amônia.
Isolou-se um herpesvírus caprino a partir de caprinos com vulvovaginite.
A incidência mais alta nos carneiros castrados merinos e angorás se correlaciona
com a lã e o pêlo angorá longos e pesados que circundam o prepúcio, o que faz com
que a área se contamine com urina. A severidade sazonal flutua com a disponibili-
dade das forragens ricas em proteínas, com a época da tosquia e possivelmente
com outras influências não relacionadas com o consumo proteico. Nos EUA, a
afecção geralmente se limita aos carneiros angorás castrados e não castrados
mantidos para acasalamento, já que não se mantêm geralmente os ovinos castra-
dos além do estágio de cordeiro de mercado. Pode-se transmitir a afecção aos
carneiros castrados, aos não castrados e às ovelhas por meio do material infectante
Postite e Vulvite Ulcerativas 848

oriundo de uma úlcera vulvar ou prepucial externa. Os cordeiros machos não


castrados (2 a 3 semanas) são geralmente resistentes. Os cordeiros fêmeas (1 mês)
podem apresentar lesões semelhantes às vesículas por baixo da cauda.
Achados clínicos – As úlceras se desenvolvem ao redor do orifício prepucial
(postite ulcerativa externa) e surge uma crosta amarronzada sobre a lesão. A
remoção dessa crosta raramente produz hemorragia. Se não for tratada, a afecção
pode progredir e obstruir parcial ou totalmente o orifício prepucial. A progressão
posterior para a mucosa prepucial externa causa uma afecção séria e debilitante, a
postite ulcerativa interna.
A vulvite ulcerativa começa com uma inflamação vulvar e uma incrustação
amarelada dos lábios. A afecção pode-se resolver ou progredir para um inchaço,
uma ulceração e uma formação de crostas na comissura ventral, no clitóris e na
vagina posterior.
Nos casos avançados de postite ulcerativa interna, ocorrem lesões externas
típicas, mais o aumento de volume e o alongamento do prepúcio devidos à obstrução
parcial ou completa do orifício prepucial. Esses casos são acompanhados por um
espessamento da parede prepucial e por um acúmulo de uma mistura de odor fétido
de urina e de exsudato necrótico.
Diagnóstico – As lesões ulcerativas do prepúcio ou da vagina, recobertas com
crostas ásperas e amarronzadas que na remoção produzem uma hemorragia
mínima, são características da postite ulcerativa. Deve-se considerar a dermatose
ulcerativa (DU, pág. 1051), que é uma doença viral, e pode-se diferenciá-la com
base em que a DU forma uma crosta rígida e firmemente presa que na remoção
revela uma superfície hemorrágica e granular. A DU também pode envolver a glande
do pênis e causar fimose ou parafimose. As lesões ulcerativas em outras localiza-
ções, tais como na face ou nas pernas, sugerem um diagnóstico de DU.
O aumento de volume e o alongamento do prepúcio devidos à postite ulcerativa
devem ser diferenciados da urolítiase (ver pág. 1072).
Tratamento e controle – Os tratamentos efetivos são difíceis e freqüentemente
não obtêm sucesso nos ovinos e nos caprinos castrados mantidos para a produção
de velo em criações extensivas em pasto. A redução do consumo de proteínas, a
remoção da lã ou do pêlo da área prepucial e o implante de 100mg de testosterona
a cada 3 meses (onde for disponível) reduzem a incidência e a severidade. O zeranol
na ração tem obtido um sucesso limitado.
O tratamento consiste no debridamento do tecido afetado e nas aplicações
semanais de uma pomada que contenha penicilina, bacitracina ou sulfato de cobre
a 5 a 10%. Os animais devem ser isolados até a remissão dos sinais clínicos. O
tratamento precoce (e o isolamento) torna-se necessário para evitar uma postite
ulcerativa interna debilitante e mais séria, que pode exigir uma cirurgia.

PROLAPSO E EVERSÃO UTERINOS


O prolapso do útero pode ocorrer em qualquer espécie; porém, ele é mais comum
nas vacas leiteiras e nas porcas, menos freqüente nas ovelhas e raro nas éguas, nas
cadelas e nas gatas. A etiologia é obscura e a ocorrência é esporádica. O decúbito
com os quartos posteriores mais baixos que os quartos anteriores, a invaginação do
útero, o excesso de tração para aliviar uma distocia e a hipocalcemia têm sido todos
incriminados como causas contribuintes. O prolapso do útero geralmente ocorre
dentro de poucas horas após o parto, quando a cérvix está aberta e o útero perdeu
o tono. O prolapso geralmente é completo e a massa do útero geralmente pende por
Prolapsos Vaginal e Cervical 849

baixo dos jarretes do animal afetado. Nas porcas, ocorre uma exceção, na qual
pode-se reverter um corno enquanto os leitões não nascidos no outro corno
impedem um prolapso posterior.
Nas vacas, o tratamento envolve a remoção da placenta (se ainda estiver presa)
e a limpeza completa da superfície endometrial. Retorna-se então o útero para a sua
posição normal por um de vários métodos. Primeiro, deve-se administrar uma
anestesia epidural. Se a vaca ficar de pé, deve-se limpar o útero, elevá-lo ao nível
da vulva sobre uma bandeja (ou por meio de uma maca segura por 2 assistentes)
e então recolocá-lo por meio da aplicação de uma pressão anterior firme, começan-
do na porção cervical e progredindo gradualmente para o ápice. Uma vez recolo-
cado o útero, deve-se inserir a mão na extremidade de ambos os cornos uterinos
para se certificar de que não haja uma invaginação remanescente. Se a vaca ficar
em decúbito, deve-se posicioná-la com os quartos posteriores elevados para
movimentá-la para uma área inclinada ou para colocá-la em decúbito esternal com
as patas traseiras estendidas para trás.
Um método alternativo envolve a elevação dos quartos posteriores com algum
tipo de elevador preso às patas anteriores, colocando assim a vaca em decúbito
dorsal. Recoloca-se o útero como indicado anteriormente. Nas porcas e nos
pequenos animais, pode-se conseguir a reposição por meio da manipulação simul-
tânea do útero, a partir do exterior com uma mão e por uma incisão abdominal com
a outra. Indica-se a ressecção do útero prolapsado nos casos de longa posição em
pé em que ocorreu necrose tecidual. Uma vez que o útero esteja em sua posição
normal, antibióticos são colocados no mesmo, administra-se ocitocina e faz-se uma
sutura de Caslick na vulva. As infusões de solução salina estéril e morna podem
ajudar a evitar a recidiva.
O prognóstico depende do grau de lesão e de contaminação do útero. A
reposição imediata de um útero limpo e minimamente traumatizado permite um
prognóstico favorável. Não há tendência da afecção para recidivar nos partos
subseqüentes. As complicações tendem a se desenvolver quando ocorrem lacera-
ção, necrose e infecção, ou quando se retarda o tratamento. O choque, a hemorragia
e o tromboembolismo são seqüelas comuns de um prolapso prolongado e requerem
uma terapia de suporte agressiva. Em alguns casos, a bexiga e os intestinos podem-
se prolapsar no útero evertido. Isso requer uma recolocação cuidadosa antes da
recolocação do útero. Pode-se drenar a bexiga com um cateter ou uma agulha
através da parede uterina. A elevação dos quartos posteriores e a pressão no útero,
ajudam na reposição da bexiga e dos intestinos. Pode-se tornar necessária a incisão
do útero para se recolocarem esses órgãos.
Na vaca, a amputação do útero severamente traumatizado ou necrótico pode ser
o único meio de salvação do animal. O tratamento de suporte e a antibioticoterapia
são indicados.

PROLAPSOS VAGINAL E CERVICAL


A eversão e o prolapso da vagina, com ou sem o prolapso da cérvix, ocorrem em
todas as espécies, mas são mais freqüentes nos bovinos e nos ovinos. Nos ovinos,
são atribuídos à rejeição dos carneiros castrados. Ocasionalmente, a bexiga pode
estar contida na vagina prolapsada.
A afecção geralmente ocorre nas fêmeas adultas no final da prenhez. Os fatores
predisponentes incluem o relaxamento e o aumento da mobilidade das estruturas de
tecido mole no canal pélvico e no períneo à medida que o parto se aproxima e ao
Prolapsos Vaginal e Cervical 850

aumento da pressão intra-abdominal devido ao aumento do tamanho fetal, à gordura


intra-abdominal ou à distensão do rúmen. A afecção também pode ter um componen-
te genético, já que freqüentemente é descrita como ocorrendo em algumas famílias
e pode ocorrer em animais não prenhes jovens. No entanto, a maioria dos prolapsos
ocorre nas vacas multíparas, o que sugere que os partos múltiplos predisponham à
eversão. O relaxamento da vulva, da vagina e do tecido mole que a circunda no final
da prenhez permite um aumento da mobilidade do trato reprodutivo caudal. Quando
o animal se deita, a gravidade e o aumento da pressão intra-abdominal evertem
temporariamente a vagina através da vulva. Uma irritação e um inchaço da mucosa
exposta se seguem a uma eversão repetida; isto resulta em uma distensão e ocorre
um prolapso.
Nos ovinos, os fatores predisponentes incluem a genética, o aumento da pressão
intra-abdominal devido a cordeiros múltiplos ou à distensão do rúmen, os estrogê-
nios no alimento e o pastejo em áreas que possuam plantas estrogênicas (Trifolium
subterraneum). O uso do estilbestrol ou do estradiol para engordar cordeiros pode
predispor a um prolapso vaginal.
O assoalho da vagina se prolapsa primeiro e as eversões repetidas podem
resultar em um divertículo de um ou ambos os lados da vagina. A cérvix se prolapsa
ocasionalmente através da vulva. A abertura cervical externa pode ficar aumentada
e eritematosa; no entanto, geralmente não se interrompe a prenhez. Pode-se
obstruir a uretra e impedir a micção, o que pode levar à ruptura da bexiga. Se não
for tratada, resulta em uremia, estase vascular, necrose e infecção da vagina, e
finalmente, morte.
Não se devem acasalar as famílias predispostas à afecção e os animais que já
tenham sido afetados anteriormente. As práticas de alimentação devem ser avalia-
das para se assegurar que os animais estejam ganhando peso no último trimestre
mas não estejam sendo superalimentados, e que se tenham eliminado as fontes
estrogênicas. Os animais devem ser mantidos no nível do chão, durante o final da
prenhez. Os métodos para impedir um prolapso intermitente no final da prenhez
incluem várias técnicas de sutura ou o uso de um dispositivo de retenção (retentor
de prolapso de Johnson). No caso dos ovinos que pastaram sobre alimento
estrogênico e ficaram cronicamente afetados, pode ser útil um dispositivo de
retenção vaginal (um retentor de parto) disponível comercialmente. A ressecção de
uma parte da mucosa da parede vaginal, a fixação da parede cervical ou vaginal e
a anestesia epidural com a utilização de álcool para impedir a distensão constituem
outras soluções a longo prazo para o prolapso recidivante. Após a administração do
anestésico epidural, lava-se o órgão com sabão e água e enxágua-se completamen-
te; se necessário, esvazia-se a bexiga; a congestão e o edema são reduzidos por
meio da aplicação de uma pressão gentil; recoloca-se a vagina e aplica-se um
antibiótico tópico. Deve-se então reter a vagina na posição. Somente o último
procedimento apresenta uma dificuldade séria. A irritação da mucosa vaginal resulta
em um tenesmo extremo, e os dispositivos de retenção devem ser fortes para
impedir a recidiva. Consegue-se a retenção temporária ou permanente por meio de
vários métodos de sutura da vulva. Grampos metálicos de prolapso com botões
pesados ou dispositivos semelhantes também têm sido utilizados. Esses dispositi-
vos são removidos durante o primeiro estágio do parto.
Vaginite e Vulvite, Gr An 851

VAGINITE E VULVITE, GR AN
A contusão ou a laceração da vagina e da vulva resulta freqüentemente de um
parto. Infreqüentemente, uma vaginite traumática pode resultar de uma lesão
maliciosa, de uma cobertura por parte de um touro grande e vigoroso ou de um
prolapso da vagina (ver anteriormente). A vagina inflamada fica dolorosa e edema-
tosa, e há freqüentemente um exsudato fétido, que indica uma infecção bacteriana.
As lacerações vaginais se limitam geralmente à área retroperitoneal e são comuns
uma celulite com um edema acompanhante, uma necrose e uma descarga fétida,
freqüentemente com uma metrite aguda acompanhante. Podem ocorrer tenesmo e
um inchaço da vulva. O grau de depressão, anorexia e febre depende da severidade
da infecção. Ocasionalmente se estabelece um edema maligno (ver pág. 395) no
tecido lesado.
O exame e o tratamento devem ser realizados com uma mão enluvada, bem
lubrificada e limpa para se minimizar a dor e a distensão. Se as membranas fetais
forem retidas, elas devem ser removidas, caso isto possa ser feito rápida e
facilmente. Como a metrite (ver pág. 839) geralmente se encontra presente, deve-
se tratá-la. Os antibióticos colocados no útero escapam através da vagina e ajudam
no tratamento da infecção lá presente. Preparações antibióticas oleosas podem ser
colocadas na vagina com um cateter. Os animais com vaginite severa devem ser
tratados por meio de sulfonamidas ou antibióticos parenterais. O tenesmo na
vaginite traumática geralmente é transitório ou causado pelo exame; deve-se
controlá-lo por meio de uma anestesia epidural. As alterações inflamatórias geral-
mente impedem o prolapso nesses casos.
A vaginite granular é caracterizada por nódulos esféricos, a , 1mm de diâmetro
na mucosa vulvar dos bovinos. Pode ocorrer uma hiperplasia semelhante nos
folículos linfáticos do pênis do touro. Ela consiste em uma resposta hiperplásica
inespecífica do tecido linfático dessas áreas a um irritante ou a um antígeno. A
vulvovaginite infecciosa pustular (VIP, ver pág. 884) é uma doença na qual pode
ocorrer uma hiperplasia após a recuperação de uma infecção aguda. Nos outros
casos, desconhece-se freqüentemente o estímulo da hiperplasia. Não se indica o
tratamento das fêmeas, e a afecção regride espontaneamente em várias semanas
a vários meses. Afetam-se mais freqüentemente os animais jovens, pois estes
experimentam uma maior exposição a novos antígenos. Nas fêmeas, a afecção não
se relaciona com a fertilidade, embora o agente predisponente possa influenciar
esta última.
A vaginite mucopurulenta (algumas vezes com uma cervicite, uma endometrite
e uma balanopostite associada nos touros) é difícil de se definir etiologicamente. Às
vezes, envolvem-se claramente os vírus, incluindo o herpesvírus da VIP e o vírus da
“Epivag” na África do Sul. As bactérias, tais como os estreptococos, os coliformes,
as corinebactérias e os micoplasmas, se encontram freqüentemente presentes. Em
alguns rebanhos ocorrem surtos após a cobertura; freqüentemente, não existem
infecções mais profundas associadas e não se prejudica a fertilidade. Postula-se
uma etiologia viral. A Haemophilus somnus (ver pág. 728) pode exercer um papel,
já que tem sido freqüentemente isolada a partir de rebanhos afetados. A recupera-
ção espontânea é comum. Quando há infertilidade, o tratamento com antibióticos
freqüentemente não compensa. Indica-se a suspensão da cobertura natural e o uso
de inseminação artificial.
SISTEMA RESPIRATÓRIO
SISTEMA RESPIRATÓRIO, Introdução ...................................................... 854
Princípios Terapêuticos ........................................................................... 859
PNEUMONIA POR ASPIRAÇÃO .................................................................. 860
PNEUMONIA POR CLAMÍDIA ...................................................................... 861
HÉRNIA DIAFRAGMÁTICA .......................................................................... 862
DOENÇAS DA LARINGE .............................................................................. 863
Paralisia da Laringe ................................................................................. 864
PNEUMONIA HIPOSTÁTICA ........................................................................ 865
INFECÇÃO VERMINÓTICA PULMONAR .................................................... 865
PNEUMONIA MICÓTICA .............................................................................. 870
NECROBACILOSE ........................................................................................ 871
Difteria dos Bezerros ............................................................................... 871
FARINGITE .................................................................................................... 872
ENFISEMA PULMONAR ............................................................................... 874
DOENÇAS RESPIRATÓRIAS DOS BOVINOS ............................................ 874
Complexo de Doenças Respiratórias dos Bovinos .................................. 874
Introdução .......................................................................................... 874
Pneumonia Bovina Induzida por Vírus ............................................... 875
Vírus Parainfluenza-3 .................................................................. 875
Vírus Respiratório Bovino Sincicial .............................................. 875
Pasteurelose Pneumônica ................................................................. 876
Enfisema Pulmonar Bovino Agudo e Edema ........................................... 878
Pneumonia Intersticial Atípica (Doença do Pulmão do Fazendeiro) ........ 879
Pleuropneumonia Contagiosa Bovina ...................................................... 880
Pneumonia Enzoótica em Bezerros ......................................................... 882
Septicemia Hemorrágica .......................................................................... 883
Rinotraqueíte Infecciosa em Bovinos, Vulvovaginite Infecciosa
Pustular e Síndromes Associadas ..................................................... 884
Síndrome do Edema Traqueal do Gado de Engorda .............................. 886
DOENÇAS RESPIRATÓRIAS DOS EQÜINOS ............................................ 887
Introdução ................................................................................................ 887
Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (Asma) ......................................... 888
Infecção pelo Herpesvírus Eqüino Tipo 1 ................................................ 889
Infecção por Outros Herpesvírus ....................................................... 892
Influenza Eqüina ...................................................................................... 893
Hemorragia Pulmonar Induzida pelo Exercício ........................................ 894
Doenças das Bolsas Guturais .................................................................. 895
Empiema ............................................................................................ 895
Micose das Bolsas Guturais .............................................................. 895
Timpanismo das Bolsas Guturais ...................................................... 896
Hemiplegia Laríngea (Ronco) .................................................................. 896
Pleurite ..................................................................................................... 898
Abscedação Pulmonar em Potros por Rhodococcus equi ....................... 899
Garrotilho ................................................................................................. 901
Sistema Respiratório 854

DOENÇAS RESPIRATÓRIAS DOS SUÍNOS ............................................... 903


Introdução ................................................................................................ 903
Rinite Atrófica ........................................................................................... 904
Rinite por Corpo de Inclusão ................................................................... 905
Pneumonia por Micoplasma .................................................................... 906
Rinite Necrótica ........................................................................................ 907
Pasteurelose ............................................................................................ 908
Pleuropneumonia ..................................................................................... 909
Influenza Suína ........................................................................................ 910
DOENÇAS RESPIRATÓRIAS DOS OVINOS E CAPRINOS ....................... 911
Introdução ................................................................................................ 911
Pleuropneumonia Contagiosa Caprina .................................................... 913
Pneumonia Não Progressiva (Atípica) ..................................................... 913
Pneumonia Progressiva ........................................................................... 915
Adenomatose Pulmonar .......................................................................... 916
Berne Nasal de Ovinos ............................................................................ 917
DOENÇAS RESPIRATÓRIAS DOS PEQUENOS ANIMAIS ........................ 918
Introdução ................................................................................................ 918
Pneumonite Alérgica ................................................................................ 918
Complexo de Doenças Respiratórias dos Felinos ................................... 919
Trematódeos Pulmonares ........................................................................ 922
Nematóideos Pulmonares ........................................................................ 923
Aelurostrongylus abstrusus ................................................................ 923
Capillaria aerophila ............................................................................ 923
Filaroides spp ..................................................................................... 923
Neoplasia ................................................................................................. 924
Pneumonia ............................................................................................... 926
Rinite e Sinusite ....................................................................................... 928
Amigdalite ................................................................................................ 929
Traqueobronquite ..................................................................................... 930
Traqueobronquite Infecciosa dos Cães (Tosse dos Canis) ............... 931

SISTEMA RESPIRATÓRIO, INTRODUÇÃO


Natureza e função do trato respiratório – O sistema respiratório desempenha
várias funções. A mais importante é liberar oxigênio para o sistema cardiovascular,
para ser distribuído para o restante do organismo e remover o dióxido de carbono.
A transferência gasosa ocorre nos alvéolos pulmonares, onde a barreira ar – sangue
é representada por uma tênue membrana permeável. Uma insuficiência ou deficiên-
cia importante da transferência gasosa, devida a uma doença que comprometa esta
membrana ou o seu suprimento de ar ou sangue, pode acarretar efeitos sérios. Além
da troca gasosa, o sistema respiratório desempenha numerosas funções, manten-
do o equilíbrio ácido-básico, agindo como um reservatório de sangue, filtrando e
provavelmente destruindo êmbolos, metabolizando algumas substâncias bioati-
vas (como serotonina, prostaglandinas, corticosteróides e leucotrienos) e ativando
algumas substâncias (como angiotensinas). O sistema também protege suas
delicadas vias aéreas, aquecendo e umidificando o ar inalado e filtrando partículas
materiais. As vias aéreas superiores também proporcionam a olfação e desempe-
nham um papel na regulação da temperatura em animais ofegantes.
Sistema Respiratório, Introdução 855

Grandes partículas aéreas geralmente são depositadas no revestimento mucoso


das passagens nasais, laringe, traquéia e brônquios, sendo posteriormente carreadas
pelo “tapete” mucociliar para a faringe, para serem engolidas ou expectoradas.
Pequenas partículas podem ser depositadas no alvéolo, onde são fagocitadas por
macrófagos. A defesa contra a invasão de microrganismos e de outras partículas
estranhas é feita por estruturas anatômicas e por mecanismos inespecíficos e
imunológicos (celular e humoral). Estes são os fatores que determinam a suscetibi-
lidade individual e entre as espécies para a doença, a qual pode ser manipulada
através do uso comedido de vacinas, antimicrobianos e novos produtos
biotecnológicos, como interferon e linfocinas. Outros fatores incluem a tortuosidade
das passagens nasais; presença de pêlos, cílios e muco; o reflexo de tosse e a
broncoconstrição. As defesas celulares incluem o macrófago, que fagocita invasores
e os apresenta (ou pelo menos seus antígenos mais importantes) aos linfócitos para
estimular a resposta imune; e o neutrófilo, que morre na luta contra invasores e deve
ser removido juntamente com suas enzimas potencialmente lesivas. Defesas secre-
toras incluem o interferon para defesas antivirais, complemento para lise de invaso-
res, revestimento surfactante do alvéolo para prevenir seu colapso e facilitar a função
macrofágica, fibronectina para bloquear a fixação bacteriana, anticorpos e muco.
O sistema respiratório deve desempenhar muitas funções, preferencialmente
gastando o mínimo de energia. O esforço requerido é aumentado pelos processos
que se opõem à expansão dos pulmões (por exemplo, fibrose, ou hidro, quilo,
pneumo ou hemotórax), impedem o fluxo de ar (por exemplo, tumores nasais,
bronquiolite, broncoconstrição ou edema pulmonar) ou aumentam a espessura da
interface ar-sangue (por exemplo, pneumonia intersticial devida a vírus ou toxinas,
edema pulmonar).
A anatomia do trato respiratório difere muito entre as espécies em: forma do
trato respiratório superior e inferior; extensão, forma e padrão dos ossos turbina-
dos; padrão dos ramos dos brônquios; anatomia dos bronquíolos terminais,
incluindo a ventilação colateral; lobação e lobulação; espessura da pleura;
integridade do mediastino; relação entre as artérias pulmonares, as artérias
brônquicas e os bronquíolos; presença de “shunts” vasculares; distribuição dos
mastócitos; suprimento sangüíneo para a pleura. Cada variação na estrutura
anatômica implica em variação na função, cada qual podendo influenciar na
patogenia da doença respiratória em uma determinada espécie. Os 3 principais
grupos de espécies que possuem tratos respiratórios semelhantes anatomica-
mente são: 1. bovinos, ovinos e suínos; 2. cães, gatos, macacos, ratos, coelhos
e porcos-da-índia; e 3. cavalos e homem.
Variações fisiológicas marcantes existem ainda entre as diferentes espécies. Por
exemplo, os bovinos são predispostos a movimentos retrógrados de drenagem da
faringe, são sujeitos à hipertensão pulmonar e ventilação reduzida quando o
ambiente está frio, possuem pulmões relativamente pequenos com baixo volume de
fluxo e de capacidade residual funcional e são mais sensíveis que a maioria das
outras espécies às mudanças ambientais de temperatura. Estas diferenças anatô-
micas e fisiológicas determinam o porquê de alguns patógenos afetarem somente
algumas espécies (por exemplo, Pasteurella haemolytica afeta bovinos, mas não
suínos) e o porquê de a pneumonia ser muito importante em algumas espécies (bovi-
nos, suínos) e menos em outras (cães, gatos).
Hipoxia (menor oxigenação, freqüentemente denominada anoxia) causa sinais
clínicos de doença respiratória. Pode ser o resultado de: 1. capacidade reduzida do
sangue no transporte de oxigênio (anoxia anêmica, como na intoxicação por monó-
xido ou nitrito de carbono ou anemia verdadeira devida a diversas causas); 2. fluxo
sangüíneo reduzido (anoxia estagnante, como na insuficiência cardíaca congestiva
ou no choque); 3. ventilação alveolar insuficiente ou difusão prejudicada (anoxia
Sistema Respiratório, Introdução 856

anóxica, como na pneumonia, edema pulmonar, congestão crônica, pneumotórax


ou paralisias dos músculos respiratórios); ou 4. incapacidade dos tecidos para
utilizar o oxigênio disponível (anoxia histotóxica como na intoxicação por cianeto).
Os mecanismos compensatórios para hipoxia incluem aumento na profundidade
e freqüência respiratória que é mediado por quimiorreceptores localizados na
carótida e corpos aórticos; contração do baço, que lança mais hemácias na
circulação; e aumento da força e da freqüência dos batimentos cardíacos. Se a
hipoxia cerebral se desenvolver, a função respiratória pode ser reduzida mais ainda
devido à depressão da atividade neuronal. A estimulação da eritropoiese também
ocorre na hipoxia, contudo o grau de policitemia é espécie-dependente. Além do
mais, as funções miocárdicas, renais e hepáticas podem estar reduzidas, assim
como a motilidade e as secreções intestinais. Se os mecanismos compensatórios
são inadequados, pode-se iniciar um ciclo vicioso, no qual a função de todos os
tecidos corporais torna-se menos eficiente.
Achados clínicos de insuficiência respiratória – A descarga nasal pode ser
serosa, catarral, purulenta ou hemorrágica, dependendo do grau de lesão da
mucosa. Ela indica o aumento da produção de secreções normais, às vezes
suplementada por neutrófilos (purulenta) ou sangue (hemorrágica). Provavelmente
também indica diminuição da limpeza da narina com a língua, quando os animais
estão doentes. Epistaxe, a presença de sangue nas vias aéreas superiores ou nariz,
é freqüentemente causada por ruptura vascular, como na infecção micótica da bolsa
gutural ou hemorragias pulmonares em eqüinos induzidas pelo exercício. Hemopti-
se, expectoração com sangue, ocorre após a ruptura de aneurismas pulmonares em
bovinos com abscessos pulmonares crônicos. Sangramentos também podem ser o
resultado da presença de pólipos, neoplasias, granulomas, traumas, trombocito-
penia e intoxicação por samambaias ou trevo doce.
Hiperpnéia, um aumento na taxa e na profundidade da ventilação pulmonar, torna-
se dispnéia quando a respiração parece laboriosa e parece estar causando descon-
forto. Processos infecciosos que causam toxemia comprometem posteriormente o
hospedeiro, por exemplo, pneumonia bovina devida à Pasteurella haemolytica. A
dispnéia pode ser causada por doença no próprio trato respiratório, por exemplo,
obstrução das vias aéreas, pneumonia, hidrotórax, ou por outros problemas, como
insuficiência cardíaca, desequilíbrios ácido-básicos, capacidade anormal do sangue
em carrear oxigênio ou ainda distúrbios da função nervosa. A inalação dificultosa,
como a observada com a obstrução por tumores ou exsudatos, é denominada dispnéia
inspiratória, enquanto a expiração dificultosa, como no enfisema, é denominada
dispnéia expiratória. Outras respostas incluem expectoração de exsudatos claros e
respiração superficial com “grunhidos”, freqüentemente associada com dor de pleurite.
Causas de insuficiência – Anomalias do trato respiratório são raras, mas
ocorrem. Exemplos incluem a presença de cistos nos seios e turbinados, hipoplasia
traqueal e pulmões acessórios. A causa mais comum de má função do trato res-
piratório superior é a rinite, que resulta em exsudação de neutrófilos, macrófagos e
fluidos, ou erosão e ulceração, ou ambas, da mucosa nasal. Pode ser causada por
agentes virais, bacterianos, fúngicos ou parasíticos, e também por reações de
hipersensibilidade, como alergias locais e anafilaxia (ver SISTEMA IMUNE, pág. 509).
A atrofia dos turbinados, por exemplo, na rinite atrófica de suínos, impede a função
principal de filtração e expõe os pulmões a uma carga mais pesada de poeira e
microrganismos. A obstrução da cavidade nasal pode ser causada por tumores,
granulomas, abscessos ou corpos estranhos. Sinusite pode ser uma complicação
de infecções do trato respiratório superior ou descornificação.
Laringite, traqueíte e bronquite resultam em tosse, dispnéias inspiratória e
expiratória e inspiração prolongada. A tosse pode ser seca se a irritação for causada
por erosão na mucosa, ou úmida se for causada por exsudação copiosa nas vias
Sistema Respiratório, Introdução 857

aéreas principais. O edema pulmonar severo causa extrema insuficiência respira-


tória, assim como o enfisema.
A doença respiratória mais comum é a pneumonia, a qual é definida como uma
inflamação dos pulmões. Existem vários sistemas para se classificar os vários tipos
de pneumonia. Um método útil é classificá-la de acordo com a distribuição das
lesões nos pulmões: a pneumonia focal apresenta um ou mais focos discretos,
distribuídos ao acaso, por exemplo, abscedação devida a êmbolos de outros sítios,
tuberculose ou actinomicose; a pneumonia lobular acentua o padrão anatômico
dos lóbulos, como na broncopneumonia causada por Pasteurella multocida ; a
pneumonia lobar cobre grandes áreas dos lobos e freqüentemente é severa, como
na pasteurelose pneumônica fibrinosa dos bovinos; a pneumonia intersticial ou
difusa freqüentemente envolve o pulmão inteiro, como em “maedi” de ovinos, ou
nas reações de hipersensibilidade. A aparência ou etiologia de uma determinada
pneumonia pode ser descrita como gangrenosa, parasítica (verminótica), por
aspiração, etc. Acredita-se que o problema inicial em muitas pneumonias seja
devido a uma alteração súbita na flora bacteriana nasal normal, resultando no
aumento exagerado e súbito de uma ou mais espécies de bactérias. Estas bactérias
entram nos pulmões em grande número e podem vencer os mecanismos normais
de defesa, se instalar, multiplicar e iniciar a inflamação. Além disso, freqüentemente
como precursora, uma infecção respiratória viral ocorre particularmente em grupos
de animais que tenham sido recentemente congregados e estressados por viagens,
manejo e superlotação de ambientes. Algumas infecções respiratórias virais podem
acarretar disfunção temporária dos mecanismos de fagocitose dos macrófagos
alveolares. Isso com freqüência ocorre vários dias após a exposição viral. Bactérias
inaladas proliferam e a pneumonia prossegue normalmente com uma infecção
agressiva e exsudação maciça no interior dos alvéolos.
A pneumonia também pode ser causada por infecções virais, bacterianas e
fúngicas diretas, assim como por toxinas que chegam pela via hematogênica ou por
inalação.
Por meio de processos naturais, possivelmente auxiliados por terapia apro-
priada, o exsudato pode ser removido dos pulmões e as lesões das mucosas das
passagens aéreas podem-se curar. Entretanto, seqüelas graves podem persistir.
Bronquiectasia é uma lesão crônica dos brônquios e parênquima, caracterizada
por dilatação cilíndrica ou sacular irreversível, infecção secundária e atelectasia. A
ulceração dos bronquíolos causada por agentes virais pode levar à organização de
tampões de tecido conjuntivo em bronquíolos pequenos, uma lesão chamada
“bronquiolite obliterante”, que pode causar obstrução permanente, atelectasia e
insuficiência respiratória severa. A constrição dos bronquíolos em bronquite alérgica
crônica e em bronquiolite resulta em sinais clínicos semelhantes. Algumas pneumo-
nias crônicas, por exemplo a “maedi” que acomete ovinos, são caracterizadas por
lesões difusas e sólidas, devidas a hiperplasia dos folículos linfóides, hiperplasia do
músculo liso ao redor dos bronquíolos, fibrose e infiltração linfocítica difusas.
Pneumonia por aspiração muitas vezes leva à gangrena com toxemia severa
acompanhando a reação inflamatória aguda.
A maioria das pneumonias infecciosas ocorre nas porções ântero-ventrais do
pulmão. Entretanto, agentes infecciosos, assim como neoplasias, podem invadir
o pulmão via circulação sangüínea, o que pode resultar em um extenso prejuízo
da função pulmonar, como o edema pulmonar causado por insuficiência cardíaca
crônica. Pleurite, empiema, hidrotórax, quilotórax, atelectasia, hérnia diafragmá-
tica ou pneumotórax também podem causar sérios prejuízos à função respirató-
ria. Trombose pulmonar pode levar a edema pulmonar. Infarto pulmonar pode
reduzir a função respiratória, mas é raro devido ao suprimento sangüíneo duplo
do órgão. Lesão tóxica, como a toxicidade do 3-metilindol em bovinos, causa
Sistema Respiratório, Introdução 858

edema, enfisema e necrose do epitélio alveolar seguida de hiperplasia compen-


satória destas células; os efeitos da troca gasosa resultam em hipoxia severa e
dispnéia.
Embora a pneumonia seja a causa mais importante, várias outras patologias que
ocorrem no tórax podem causar insuficiência respiratória. Edema pulmonar, o
acúmulo anormal de líquido no tecido intersticial, vias aéreas ou alvéolos pulmona-
res, pode ocorrer conjuntamente com desordens circulatórias, em particular colap-
so do ventrículo esquerdo ou aumento da permeabilidade capilar, ocasionalmente
em reações anafiláticas e alérgicas e em algumas doenças infecciosas. Traumatis-
mo craniano pode causar edema pulmonar em cães. Dispnéia e respiração com
boca aberta podem ocorrer. Os animais preferem a posição de pé à deitada ou ficam
apenas em decúbito esternal, ou poderão assumir posição sentada. A auscultação
do tórax pode revelar respiração ofegante e ruidosa e ruído de líquidos.
A pleurite ou pleurisia pode ser causada por qualquer patógeno que entre na
cavidade pleural, mas freqüentemente é uma extensão da pneumonia. Respiração
superficial e rápida, temperatura elevada e dor torácica são sugestivas de pleurite.
A auscultação do tórax pode revelar estertores.
Empiema, pus na cavidade pleural, é causado por bactérias piogênicas ou
fungos, que atingem a cavidade torácica pelo sangue, ou extensão de uma
pneumonia, por reticulite traumática ou por ferimento penetrante no tórax. Tosse,
febre, dor e dispnéia podem estar presentes.
Hemotórax , acúmulo de sangue na cavidade pleural, comumente é causado por
traumatismo torácico. Hidrotórax, o acúmulo de transudato na cavidade pleural,
usualmente é causado por interferência no fluxo sangüíneo ou na drenagem
linfática. Quilotórax, o acúmulo do quilo na cavidade pleural, é uma condição
relativamente rara e é visto mais freqüentemente em gatos. Pode ser causado pela
ruptura do duto torácico, mas freqüentemente é idiopático. As manifestações das 3
condições incluem embaraço respiratório e fraqueza.
Pneumotórax é o acúmulo de ar na cavidade pleural, podendo ser de origem
traumática ou espontânea. O ar pode penetrar nessa cavidade através de ferimen-
tos penetrantes na parede torácica ou pela extensão de um enfisema pulmonar. O
pulmão se colapsa se um grande volume de ar entrar na cavidade pleural.
Pneumotórax bilateral pode-se desenvolver se o mediastino estiver frágil ou
incompleto. A dispnéia é evidente.
Controle de doença respiratória – Alterações dietéticas repentinas, desmame,
frio, correntes de ar, umidade, poeira, altos níveis de amônia, ventilação pobre em
geral e a reunião em larga escala de grupos de idades diferentes são as influências
principais nas doenças respiratórias nos grupos de animais. É importante evitar ou
minimizar o estresse e a reunião de animais de origens diversas. Falhas no
estabelecimento de identidade individual do animal, no diagnóstico clínico post
mortem acurado, e falta de um sistema de diagnóstico com arquivamento e
tratamento são causas importantes na falha do controle de surtos de pneumonia.
A imunização pode ajudar a controlar a infecção respiratória. Entretanto, este
controle pode ser comprometido pela sincronização imprópria, uso de vacinas
inefetivas ou inadequadas e práticas de manejo inadequadas. Na maioria dos casos,
danos severos às defesas naturais não podem ser revertidos posteriormente por
agentes terapêuticos e biológicos.
A superfície da mucosa do trato respiratório contém folículos linfóides que per-
mutam células com outras partes do organismo. Entretanto, a maioria dos linfócitos
do revestimento respiratório produz apenas imunoglobulina A (IgA), enquanto as
células nos linfonodos do trato respiratório produzem ambas as imunoglobulinas
M e G (IgM e IgG). Dependendo do agente envolvido, várias respostas imunes
mediadas por anticorpos e por células ocorrem no trato respiratório, e incluem:
Sistema Respiratório, Introdução 859

opsonização, aglutinação, imobilização, neutralização de toxinas e vírus, bloqueio


por aderência a células, lise e quimiotaxia. Variação no tipo de resposta imune
ocorre de acordo com a idade, a espécie e os meios de resposta a mecanismos
específicos de virulência dos patógenos envolvidos. As espécies variam no tipo de
resposta imune presente em diferentes locais do trato respiratório. Grandes gotí-
culas de antígeno podem imunizar o trato respiratório superior com IgA, mas
pequenas partículas replicantes podem ser necessárias para imunizar o trato
respiratório inferior. Para desenvolver níveis adequados de anticorpos para a
proteção do pulmão, é freqüentemente necessário usar doses repetidas de antíge-
no mais adjuvante, ou um antígeno replicante. Esses resultados são raramente
alcançados sob as condições de campo. Por exemplo, experimentos no campo
utilizando vacinas respiratórias em bovinos não demonstraram significante eficácia
sob o ponto de vista estatístico.

PRINCÍPIOS TERAPÊUTICOS
(Ver também pág. 1698.) A doença respiratória freqüentemente é caracterizada
por produção anormal de secreções e exsudatos e por uma reduzida capacidade de
removê-los. O objetivo primário é reduzir o volume e a viscosidade das secreções
e facilitar a sua remoção. Isso pode ser efetuado pelo controle da infecção,
modificando as secreções e, quando possível, melhorando a drenagem postural e
removendo o material mecanicamente. Métodos terapêuticos incluem alteração do
ar inspirado, administração de expectorantes, antitussivos, broncodilatadores, anti-
microbianos, diuréticos e outras drogas.
A hidratação deve ser mantida. A inalação de ar umidificado pode facilitar a
remoção das secreções das vias aéreas. Os expectorantes às vezes são usados na
tentativa de liquefazer estas secreções. Entretanto eles devem ser administrados
em associação a uma terapia respiratória auxiliar, como melhora da drenagem
postural, exercícios leves, e percussão torácica, que (em associação com a tosse)
aumenta a expectoração e a remoção das secreções. O valor dos expectorantes nas
dosagens tradicionais é questionável. A remoção mecânica, por aspiração, das
secreções viscosas e pegajosas, pode ser necessária nos casos severos de
obstrução das vias aéreas.
Agentes antitussivos são indicados para aliviar o desconforto associado à tosse
não produtiva, mas são contra-indicados nos casos de secreção mucosa excessiva
das vias aéreas. Produtos que contêm atropina também são contra-indicados, pelo
menos em teoria, porque este agente aumenta a viscosidade das secreções das
vias aéreas.
A maior resistência oferecida pelas vias aéreas, causada pela contração dos
músculos lisos dos brônquios, pode ser aliviada com o uso de broncodilatadores, os
quais são indicados em animais portadores de doenças asmáticas e de doença
respiratória crônica. Metilxantinas, como a teofilina e a aminofilina, são broncodila-
tadores efetivos em todas as espécies, com exceção dos bovinos. Isoproterenol,
clenbuterol e adrenalina em geral também são efetivos; o cromoglicato de sódio é
usado em eqüinos para o tratamento de doenças das pequenas vias aéreas (por
exemplo, asma). O uso de corticosteróides é justificado nos casos alérgicos. As anti-
histaminas podem ser usadas para aliviar a broncoconstrição causada pela libera-
ção de histamina. O broncospasmo também pode ser significantemente reduzido
pela remoção dos fatores irritantes, utilizando-se sedativos leves ou reduzindo-se
os períodos de excitação.
Em casos de infecções bacterianas, a terapia antimicrobiana deve ser instituída.
O objetivo básico é selecionar o agente mais efetivo contra um microrganismo
específico, ou o agente menos tóxico das várias alternativas. Cultura e teste de
Sistema Respiratório, Introdução 860

sensibilidade de secreções das vias aéreas, embora não infalíveis, são os melhores
métodos para determinação da antibioticoterapia apropriada. O conhecimento de
penetração tecidual e das características farmacocinéticas dos agentes antimicro-
bianos também é importante. Os seguintes agentes provaram ser eficientes nas
espécies relacionadas: bovinos – oxitetraciclina, eritromicina, penicilinas e sulfona-
midas; ovinos e caprinos – oxitetraciclina, penicilinas e sulfonamidas; suínos –
lincomicina, espectinomicina, penicilinas e sulfonamidas; cães e gatos – cefalospo-
rina, cloranfenicol, eritromicina, lincomicina, clindamicina, penicilinas, sulfonamidas
e tetraciclinas; eqüinos – penicilinas, sulfonamidas e tetraciclinas, sendo estas
últimas utilizadas com cautela devido ao ocasional efeito colateral de diarréia
severa. Aminoglicosídios são úteis, mas podem ser nefrotóxicos. Trimetoprim
geralmente associado à sulfonamida é útil na terapia respiratória na maioria das
espécies, mas nos EUA não está licenciado para uso em animais de produção.
Novas drogas como a enrofloxacina (aprovada em pequenos mas não em grandes
animais nos EUA) e o ceftiofur podem ser eficazes. Antibióticos de amplo espectro
devem ser usados se a bactéria específica não foi identificada e, uma vez iniciado,
o curso completo da terapia deve ser terminado. Agentes antimicrobianos múltiplos
devem ser usados apenas com o total conhecimento do potencial de interação das
drogas. Devido ao acúmulo de resíduos na carne dos animais de produção, os
veterinários devem utilizar estes produtos adequadamente e avisar os produtores.
A hipoxemia causada pela maioria dos distúrbios pulmonares geralmente pode ser
corrigida pela administração de oxigênio. Entretanto, a administração contínua de
altas concentrações aumenta a tendência à atelectasia de reabsorção regional; isto
agrava a hipoxemia e pode causar pneumonite. A hipoxemia freqüentemente é acom-
panhada por graus variáveis de hipercapnia e acidemia. Intubação endotraqueal e
ventilação mecânica podem ser necessárias em animais com insuficiência respirató-
ria aguda ou em animais comatosos ou apnéicos. As determinações de gases
sangüíneos arteriais e do pH, quando viáveis, são extremamente válidas no tratamento.
Em casos de edema pulmonar, o uso de diuréticos pode ser indicado. Os
diuréticos osmóticos têm uma ação mínima na diurese. Um efeito diurético profundo
pode ser produzido com inibidores da anidrase carbônica (por exemplo, acetazola-
mida) e com diúréticos de curva ativa (por exemplo, furosemida).

PNEUMONIA POR ASPIRAÇÃO


(Pneumonia por corpo estranho, Pneumonia por inalação,
Pneumonia gangrenosa)

É uma forma de pneumonia caracterizada por necrose pulmonar e causada pela


entrada de material estranho nos pulmões.
Etiologia – A administração errônea de medicamentos é a causa mais comum de
pneumonia por aspiração. Líquidos administrados por garrafadas ou por seringa não
devem ser dados mais rápido do que o animal possa deglutir, e a administração de
remédio líquido por garrafada é particularmente perigosa quando a língua do animal
é puxada para fora, a cabeça é voltada para cima, ou quando o animal está tossindo
ou urrando. A administração de líquidos por intubação nasal não está isenta de riscos
e uma técnica cuidadosa é especialmente necessária em animais debilitados. Os
animais (sobretudo os gatos) são particularmente suscetíveis à pneumonia causada
por aspiração de produtos sem gosto, como o óleo mineral. A inalação de alimentos
muitas vezes ocorre em bezerros e suínos. Tentativas de administrar alimentos ou
líquidos a animais parcialmente em choque ou a aspiração de vômito podem resultar
Pneumonia por Clamídia 861

em pneumonia por aspiração. Distúrbios da deglutição, como em animais anestesia-


dos ou em comatose (por exemplo, gado adulto sob anestesia geral e vacas em
decúbito lateral com febre do leite) ou naqueles que sofrem de paralisia vagal,
faringite aguda, abscessos ou tumores da região faríngea, divertículo esofágico,
fenda palatina e encefalites, são causas predisponentes freqüentes. Em ovelhas,
banho de imersão mal-aplicado pode causar aspiração de líquidos. A inalação de
gases irritantes ou fumaça é uma causa pouco freqüente.
Alguns anestésicos, por exemplo, tiobarbitúricos, estimulam a salivação. O
sulfato de atropina ajuda a controlá-la enquanto o uso de um cateter endotraqueal
com um manguito inflável previne a aspiração de fluidos durante a cirurgia.
Achados clínicos – Uma história que revela um evento que ocorre 1 a 3 dias
antes, quando a aspiração do corpo estranho poderia ter ocorrido, é de grande valor
diagnóstico. No cavalo, a temperatura usualmente sobe de 40 a 40,5°C durante os
primeiros dias e depois se torna remitente. Pirexia é também observada em cães,
gatos e bovinos, mas, algumas vezes, o bovino desenvolve pouca ou nenhuma
febre. O pulso encontra-se acelerado e a respiração é rápida e laboriosa. Uma
respiração fétida, adocicada e característica de gangrena pode ser detectada; a sua
intensidade aumenta à medida que a doença progride. Isso está, muitas vezes,
associado com uma descarga nasal purulenta que, por vezes, é castanho-averme-
lhada ou verde. Ocasionalmente, a evidência do material aspirado pode ser
observada na descarga nasal ou no material expectorado, por exemplo, gotículas
de óleo. À auscultação, sonoridades líquidas em um ou ambos os lados do tórax são
audíveis no início da condição, seguidas por sons ofegantes, atrito pleural e,
algumas vezes, sons crepitantes de enfisema subcutâneo. A toxemia geralmente é
fatal dentro de um curso de 1 a 2 dias em vacas que aspiram conteúdo ruminal.
Bovinos e suínos recuperam-se mais freqüentemente que eqüinos, mas em todas
as espécies a mortalidade é alta. Animais que se recuperam freqüentemente
desenvolvem abscessos pulmonares. Em surtos que se seguem a banhos de
imersão em ovelhas, as perdas aumentam do segundo ao sétimo dia em média e
depois diminuem gradualmente.
Lesões – A pneumonia ocorre usualmente nas partes ventrais anteriores dos
pulmões e pode ser uni ou bilateral. Nos estágios iniciais, os pulmões estão acen-
tuadamente congestionados, com áreas de edema interlobular. Os brônquios estão
hiperêmicos e cheios de espuma. As áreas pneumônicas tendem a ter formato de
cone com a base voltada para a pleura. Supuração e necrose se seguem, os focos
tornam-se leves e liquefeitos, castanho-avermelhados e têm odor pútrido. Há
usualmente uma pleurite fibrinosa aguda, muitas vezes com exsudato pleural.
Tratamento – O animal deve ser mantido em repouso. Uma tosse produtiva
não deve ser suprimida. Antibióticos de amplo espectro devem ser usados em
animais que sabidamente inalaram uma substância estranha, quer seja um
líquido, quer seja um vapor irritante, sem esperar que os sinais de pneumonia
apareçam. O tratamento de suporte e a precaução são os mesmos utilizados na
pneumonia infecciosa. Em pequenos animais, a oxigenioterapia pode ser bené-
fica. Não obstante a terapia, o prognóstico é ruim e todos os esforços devem ser
feitos para prevenir essa condição.

PNEUMONIA POR CLAMÍDIA


A clamídia tem sido identificada em várias partes do mundo como uma das causas
de pneumonia enzoótica em bezerros (ver pág. 882). Estes microrganismos também
causam pneumonia em camundongos, ovinos e caprinos. Em gatos, ela ocorre como
Pneumonia por Clamídia 862

uma seqüela rara das muito mais comuns conjuntivite e rinite por clamídia. A clamídia
também tem sido isolada em raras ocasiões de amostras de leitões e potros
pneumônicos. O principal sinal clínico da clamidiose zoonótica no homem é a pneu-
monia, geralmente transmitida por pássaros (ver também pág. 1900).
Etiologia e epidemiologia – O agente causal é a Chlamydia psittaci. Alguns
isolados respiratórios de bezerros têm característica de Imunotipos 1 e 6, e são
semelhantes às cepas coletadas de infecções intestinais ou produtos de aborto de
bovinos e ovinos. O Imunotipo 6 foi coletado de pulmões pneumônicos de bezerros
e suínos. Assim, o trato GI deve ser considerado como um sítio importante na
patogenia das infecções intestinais por clamídias (ver também pág. 164) e como um
reservatório natural e fonte de microrganismos. A pneumonia por clamídia afeta
bezerros tanto sob condições de pastagem como em fazendas de leite. A doença
em ovinos é mais freqüentemente observada em cordeiros de carne de diferentes
locais reunidos em pastos de alimentação ou irrigados. Cordeiros estressados sob
condições de lavoura freqüentemente são sujeitos a várias infecções bacterianas
secundárias, que podem resultar em taxas de mortalidade e morbidade mais altas
que as observadas em casos de clamidiose respiratória não complicada.
Achados clínicos e lesões – Bezerros com pneumonia por clamídia freqüente-
mente estão febris, letárgicos, com uma descarga nasal serosa e posteriormente
mucopurulenta, tosse seca entrecortada e dispnéia. Bezerros recém-desmamados
são afetados mais freqüentemente, mas bovinos mais velhos podem apresentar
sinais. Cordeiros e cabritos apresentam sinais semelhantes.
A lesão pulmonar aguda caracteriza-se por uma pneumonia intersticial lobular.
As porções ântero-ventrais dos pulmões estão consolidadas, mas nos casos
severos, lobos inteiros podem estar envolvidos. A tosse seca ocorre devido à
traqueíte. Alterações pulmonares microscópicas são típicas de broncopneumonia
exsudativa com uma bronquiolite proliferativa e exsudativa.
Diagnóstico – Nem os sinais clínicos, nem as lesões permitem que seja feito um
diagnóstico presuntivo de pneumonia por clamídia; eles não são suficientemente
diferentes dos observados no complexo da doença respiratória bovina/ovina com
suas etiologias múltiplas. O diagnóstico requer isolamento da clamídia dos tecidos
afetados em uma cultura de tecidos ou embrião de galinha. Um aumento nos títulos
de anticorpos, utilizando ELISA, no soro coletado durante os estágios agudo e
convalescente da doença, pode ser um auxílio diagnóstico. Anticorpos IgG2 predo-
minantes são induzidos por infecções por clamídia em bovinos. Clamidiose subclí-
nica não é incomum.
Profilaxia e tratamento – Vacinas não estão disponíveis. Vários agentes
antimicrobianos como penicilina, eritromicina, tilosina e tetraciclinas podem interfe-
rir na multiplicação do agente, mas a tetraciclina geralmente é a droga de escolha.
O tratamento deve ser iniciado o mais rápido possível. Injeções de oxitetraciclina na
dose de 25 a 50mg/kg, diariamente durante 5 a 7 dias, são recomendadas.

HÉRNIA DIAFRAGMÁTICA
É uma quebra na continuidade do diafragma, com protrusão de vísceras
abdominais no tórax.
Etiologia – A causa geralmente é traumática, embora defeitos congênitos do
diafragma possam resultar em herniação, como observado na hérnia peritonioperi-
cárdica. Em pequenos animais, o atropelamento é uma causa comum, enquanto em
grandes animais, devem-se considerar queda e parto. A prevalência em búfalos
Doenças da Laringe 863

sugere uma base hereditária nesta espécie. Em bovinos, aderências ao diafragma


adjacente ao retículo devem ser diferenciadas das resultantes de reticuloperitonite
traumática com subseqüente herniação diafragmática.
Achados clínicos – Os sinais variam dependendo das espécies afetadas. Os
cães caracteristicamente apresentam dispnéia e freqüentemente assumem uma
posição sentada para que ocorra diminuição da pressão das vísceras abdominais
nos pulmões. O encarceramento do estômago ou intestino pode mimetizar ou
realmente resultar em obstrução e os sinais obstrutivos podem ocorrer, principal-
mente nos casos crônicos. Hérnia peritoniopericárdica congênita mais freqüente-
mente é um achado acidental, o qual pode estar relacionado aos sistemas respira-
tórios ou GI, ou ser devido ao comprometimento do retorno venoso para o coração.
Eqüinos podem apresentar uma história de cólicas recidivantes. A obstrução aguda
subseqüente pode necessitar de cirurgia e a hérnia é diagnosticada na exploração
do diafragma. Bovinos e búfalos ingerem corpos estranhos e sofrem de distúrbios
GI relacionados à reticuloperitonite traumática. A fraqueza do diafragma e a
subseqüente herniação podem ser difíceis ou impossíveis de se diferenciar de
defeitos diafragmáticos congênitos.
Um considerável número de vísceras abdominais pode gradualmente atravessar
orifícios relativamente pequenos, devido à pressão negativa na cavidade torácica.
Radiografias geralmente mostram as vísceras herniadas e a irregularidade ou
ruptura da linha diafragmática.
Diagnóstico e tratamento – Evidência de traumatismo anterior e sinais clínicos
de dispnéia ou distúrbio GI são sugestivos. Radiografias (contrastadas, se necessá-
rio) podem confirmar a anormalidade diafragmática. Em grandes animais, celiotomia
exploratória pode ser necessária para substanciar achados clínicos sugestivos de
herniação diafragmática . O diagnóstico diferencial em pequenos animais deve incluir
outras causas de dispnéia, e em grandes animais outras causas de problemas GI.
A correção cirúrgica é o único tratamento.

DOENÇAS DA LARINGE
Laringite é a inflamação da mucosa ou das cartilagens da laringe, podendo ser
secundária a uma infecção do trato respiratório superior. Pode-se desenvolver pela
irritação direta provocada pela inalação de poeira, fumaça ou gases irritantes;
corpos estranhos; ou pelo trauma da intubação ou pelo excesso de vocalização. A
laringite pode acompanhar traqueobronquites infecciosas e cinomose em cães;
rinotraqueíte infecciosa e calicivirose em gatos; rinotraqueíte infecciosa e difteria de
bezerros em bovinos; garrotilho; infecção por herpesvírus do Tipo 1; arterite viral;
bronquite infecciosa em eqüinos; infecções por Fusobacterium necrophorum ou
Corynebacterium pyogenes em ovinos e influenza em suínos.
Edema da mucosa e da submucosa geralmente faz parte da laringite; e se for
severo, a glote pode ser significativamente obstruída. Entretanto, o edema também
pode resultar de alergia, inalação de irritantes ou cirurgia na área. A intubação para
a anestesia pode provocar edema de laringe, principalmente quando realizada com
uma indução inadequada ou com técnicas precárias. Cães braquicefálicos e obe-
sos e aqueles com paralisia da laringe (ver adiante) desenvolvem edema da laringe
e laringite, devido ao severo arfar ou ao esforço respiratório durante a excitação ou
hipertermia. Em bovinos, o edema da laringe tem sido observado na febre carbun-
cular, urticária e em enfermidades séricas. Em suínos, pode ocorrer como parte da
doença do edema. Em eqüinos, bovinos e ovinos, o edema da laringe pode levar à
condropatia aritenóidea.
Doenças da Laringe 864

Condropatia laríngea é uma condição supurativa da matriz da cartilagem que


pode afetar eqüinos, ovinos e bovinos, principalmente machos jovens. Há uma
distinta predisposição racial em eqüinos puros-sangues, ovinos texel e southdown
e bovinos belgian blue.
Achados clínicos – A tosse é o principal sinal de laringite, quando o edema é leve
e os tecidos mais profundos da laringe não estão envolvidos. Inicialmente ela é
áspera, seca e curta, mas torna-se suave e úmida posteriormente, podendo ser
muito dolorosa. Pode ser induzida por pressão na laringe, exposição ao ar frio e
poluído, deglutição de alimentação grosseira ou água fria e tentativas de administrar
medicamentos. Alterações vocais podem ser evidentes em pequenos animais. O
estridor pode resultar do edema e da motilidade reduzida das cartilagens aritenóides
na condropatia laríngea. Halitose e respiração ruidosa e difícil podem ser evidentes
e o animal pode ficar com sua cabeça abaixada e a boca aberta. A deglutição é difícil
e dolorosa. Os sinais sistêmicos são geralmente atribuídos à doença primária, como
na difteria dos bezerros, em que a temperatura pode atingir 40,5oC. A morte devida
à asfixia pode ocorrer, principalmente se o animal for excitado.
O edema da laringe pode-se desenvolver dentro de horas. É caracterizado pelo
aumento do esforço inspiratório e estridor que se desenvolve a partir da laringe. A
taxa respiratória pode cair, à medida que o esforço respiratório se torna exagerado.
As membranas mucosas visíveis estão cianóticas, o pulso e a temperatura aumen-
tados e os eqüinos podem suar profusamente. Cães com obstrução das vias aéreas
condutoras podem mostrar extremos distúrbios de termorregulação durante o
verão; hipertermia marcante é comum.
Diagnóstico – Um diagnóstico presuntivo é baseado nos sinais clínicos. O
diagnóstico definitivo requer laringoscopia. Em eqüinos e bovinos conscientes, ele
pode ser realizado com um endoscópio flexível introduzido por via nasal; em cães
e gatos geralmente devem-se administrar anestésicos ou analgésicos. A história e
os sinais clínicos geralmente permitem uma identificação rápida da doença primária
e do envolvimento laríngeo.
Tratamento – No caso de obstrução da laringe, deve-se colocar imediatamente um
tubo de traqueotomia. Corticosteróides devem ser administrados para reduzir o efeito
obstrutivo do edema inflamatório – hidrocortisona EV é adequada inicialmente.
Terapia antibiótica sistêmica concomitante também é necessária. São essenciais a
identificação e o tratamento da doença primária. Medidas paliativas para acelerar a
recuperação e dar conforto para o animal incluem inalação de ar umidificado,
confinamento em ambientes limpos e aquecidos, alimentação macia ou líquida e
evitar poeira. A tosse pode ser suprimida com preparações antitussivas e as infecções
bacterianas controladas com antibióticos ou sulfonamidas. O controle da dor com o
uso judicioso de analgésicos, principalmente em gatos, permite que o animal se
alimente, acelerando conseqüentemente a recuperação . Aritenoidectomia parcial é
uma terapia efetiva para a condropatia laríngea em eqüinos, ovinos e bovinos, embora
o retorno à capacidade atlética máxima em eqüinos de competição seja incerto.
Paralisia da laringe
É uma doença das vias aéreas superiores, comum em cães e rara em gatos. Os
sintomas incluem tosse seca, alterações na voz, respiração ruidosa que progride
para uma dispnéia marcante com estresse e exercício, estridor e colapso. Regurgi-
tação e vômito podem ocorrer. É um problema adquirido, comum em raças grandes
e gigantes de cães de meia-idade a idosos, como por exemplo, labrador retriever,
setter irlandês e dinamarquês. É observada menos freqüentemente como uma
doença hereditária congênita em bouviers de flandres, leonbergers, huskies
siberianos e raças que puxam trenós.
O diagnóstico é baseado nos sinais clínicos. É necessária a laringoscopia sob
anestesia leve para confirmar o diagnóstico. Os movimentos laríngeos estão
Infecção Verminótica Pulmonar 865

ausentes ou paradoxais com a respiração. A eletromiografia mostra ondas finas


positivas, potenciais de denervação e às vezes miotonia. As radiografias não são
diagnósticas. A atrofia da denervação é observada nos cortes histológicos dos
músculos da laringe.
O diagnóstico diferencial inclui miosite, tumor recorrente no nervo vagal ou
laríngeo, inflamação, miastenia grave, hipotireoidismo severo, trauma e degenera-
ção neurológica generalizada. A terapia é direcionada para aliviar os sinais de
obstrução das vias aéreas. Tranqüilização e corticosteróides são efetivos tempora-
riamente nos casos leves. A obstrução severa pode requerer traqueotomia. A
terapia definitiva é cirúrgica e direcionada ao aumento da abertura glótica.

PNEUMONIA HIPOSTÁTICA
É uma condição decorrente da falha do sangue ao passar prontamente através
das estruturas vasculares dos pulmões, o que pode levar à transferência do fluido
do espaço vascular para o pulmonar. Essa condição é devida à congestão passiva
dos pulmões e é vista mais comumente em animais velhos ou debilitados. Ela é
comumente secundária a alguma outra doença, por exemplo, insuficiência cardíaca
congestiva. Animais com paralisia ou que estejam se recuperando de anestesia,
algumas vezes, desenvolvem pneumonia hipostática no caso de não terem se
movimentado regularmente.
Qualquer doença primária deve ser diagnosticada e tratada. A tosse nem sempre
é um sinal proeminente, mas com o desenrolar do processo, dispnéia e cianose se
tornam aparentes. Infecção bacteriana secundária é comum. Radiografias revelam
densidade aumentada do pulmão e o espaço mediastinal pode estar deslocado no
lado que sofreu atelectasia.
A posição na qual o paciente se deita deve ser mudada de hora em hora. O
exercício deve ser encorajado se for compatível com a condição do paciente. Se
for possível determinar a causa primária, terapia específica, por exemplo, digitá-
licos para insuficiência cardíaca congestiva ou clorotiazida para edema, poderá
ser instituída.
Narcóticos e sedativos devem ser utilizados ao mínimo para encorajar movimen-
tos e evitar que o reflexo de tosse seja deprimido. A manutenção de hidratação
adequada é importante, mas não deve ser exagerada: a super-hidratação pode
aumentar a congestão.

INFECÇÃO VERMINÓTICA PULMONAR


(Bronquite verminótica, Pneumonia verminótica)

É uma infecção do trato respiratório inferior que resulta em bronquite ou


pneumonia, ou ambas, por qualquer um dos inúmeros nematóideos parasíticos,
incluindo Dictyocaulus viviparus em bovinos e cervos, D. arnfieldi em jumentos e
cavalos, D. filaria , Protostrongylus rufescens e Muellerius capillaris em ovelhas
e cabras, Metastrongylus apri em porcos, Filaroides (Oslerus) osleri em cães, e
Aelurostrongylus abstrusus em gatos. Outras infecções verminóticas pulmonares
ocorrem, mas são menos comuns. Vermes pulmonares são encontrados em muitos
países, principalmente nos de clima temperado.
Infecção Verminótica Pulmonar 866

Os 3 primeiros vermes pulmonares mencionados pertencem à superfamília


Trichostrongyloidea e possuem ciclo biológico direto; os outros pertencem à
Metastrongyloidea e, com exceção da F. osleri, possuem ciclos de vida indireta.
Alguns nematóideos que habitam o ventrículo direito e a circulação pulmonar,
como Angiostrongylus vasorum (ver pág. 90) e Dirofilaria immitis (ver pág. 87),
encontrados em cães em certas regiões do mundo, podem estar associados com
doenças pulmonares. Podem ocorrer sinais clínicos de síndrome cardíaca ou
pulmonar, ou uma combinação de ambas.
O verme pulmonar do bovino, D. viviparus, é comum no noroeste da Europa, onde
causa “husk” ou “hoose”, uma doença economicamente importante nas Ilhas
Britânicas. O verme pulmonar das ovelhas e cabras, D. filaria, é reconhecido como
patógeno na Austrália, Europa e América do Norte, mas é considerado mais
importante nos países mediterrâneos, Oriente Médio e Índia. Muellerius capillaris
prevalece no mundo inteiro, mas comumente não é considerado causador de sinais
clínicos visíveis em ovelhas infectadas. Outras infecções de eqüinos, suínos, cães
e gatos por outros vermes pulmonares são reconhecidas em muitos países e,
esporadicamente, podem causar enfermidades clínicas sérias.
Epidemiologia – Fêmeas adultas nos brônquios depositam ovos larvados que
podem eclodir nos mesmos (por exemplo, D. viviparus) ou nas fezes do hospe-
deiro (por exemplo, D. arnfieldi ) após terem sido eliminados pela tosse e
ingeridos. O primeiro estágio de larvas nas fezes se desenvolve até o terceiro
estágio de larvas infectantes num mínimo de 1 semana, mas pode demorar mais
dependendo da temperatura ambiente e da umidade. A viabilidade das larvas
infectantes é exacerbada por temperaturas moderadas e umidade elevada. As
larvas podem-se disseminar no pasto através das fezes líquidas, das rodas dos
veículos e, nos casos de D. viviparus, ao serem levadas do estrume pelos
esporângios dos fungos Pilobulus.
Após a ingestão, larvas infectantes sofrem mais duas mudas enquanto migram
dos intestinos aos pulmões, via sistema linfático e suprimento sangüíneo arterial
pulmonar. As larvas emergem nos alvéolos e migram para os bronquíolos e
brônquios quando estão maduras. O período pré-patente é de , 4 semanas para
D. viviparus, 5 semanas para D. filaria, e 8 a 16 semanas para D. arnfieldi. No caso
do último, a infecção patente ocorre só nos jumentos ou potros, e não em eqüinos
mais velhos.
As pastagens no início do ano tornam-se uma fonte de infecção como resultado
da sobrevivência das larvas na vegetação ou no solo durante o inverno anterior, no
qual elas podem sobreviver até mesmo em baixas temperaturas; ou sendo pastadas
por animais aparentemente normais que carreiam infecções leves do ano anterior.
No caso de D. arnfieldi, os jumentos são considerados a primeira fonte de infecção
para cavalos através das pastagens.
A maioria dos metastrongilóideos pulmonares tem ciclos de vida indiretos. Os
adultos de M. apri são encontrados em brônquios pequenos nos lobos caudais do
pulmão de suínos e depois de os ovos larvados terem passado nas fezes eles são
ingeridos por minhocas nas quais ocorre o desenvolvimento do terceiro estágio de
larvas infectantes em 3 semanas; uma minhoca pode conter ≥ 1.000 larvas
infectantes. Os porcos tornam-se infectados pela ingestão de minhocas e a infecção
torna-se patente em 4 semanas.
Muellerius capillaris, P. rufescens, e A. abstrusus requerem lesmas ou caracóis
como hospedeiros intermediários; ovelhas e cabras são infectadas comendo os
hospedeiros, mas provavelmente gatos tornam-se infectados com A. abstrusus
comendo um hospedeiro paratênico, como um pássaro ou um roedor que tenham
comido previamente as lesmas ou caracóis. No mínimo, 4 a 6 semanas são
necessárias para que essas infecções tornem-se patentes; no caso de M. capillaris,
10 semanas podem ser o tempo necessário.
Infecção Verminótica Pulmonar 867

Filaroides osleri libera ovos larvados que eclodem na traquéia do cão. Os


cãezinhos tornam-se infectados através da ingestão da larva em seu primeiro
estágio tanto pelas fezes como pela saliva de um cão infectado, provavelmente no
último caso enquanto estão sendo lambidos por suas mães. A larva, em seu primeiro
estágio, sofre muda no duodeno e, eventualmente, os adultos são encontrados
dentro de nódulos que se desenvolvem na membrana mucosa da traquéia e nas
origens do brônquio lobar; 10 a 18 semanas são requeridas para que a infecção se
torne patente (ver também DOENÇAS RESPIRATÓRIAS DOS PEQUENOS ANIMAIS, pág. 918).
Em geral, a epidemiologia das infecções por vermes pulmonares é refletida em
problemas causados em bovinos por D. viviparus . A doença clínica é comumente
observada em animais jovens quando eles são expostos à larva infectante pela
primeira vez; no caso de bezerros, isso se dá durante a sua primeira temporada nas
pastagens. Animais adultos são geralmente imunes, entretanto eles podem apre-
sentar infecção subclínica leve e servir como fonte de larvas para contaminação de
pastagens ou outros ambientes. Bronquites parasitárias patentes podem ocorrer
quando indivíduos ou grupos são primeiramente expostos, como adultos que não
tiveram imunidade adquirida com a idade (por exemplo, após uma mudança para
uma área nova), ou reinfecções podem ocorrer quando animais adultos com imu-
nidade reduzida encontram um desafio esmagador de larvas infectantes.
Embora o gado jovem seja exposto às pastagens logo na primavera, a doença
clínica severa geralmente não ocorre até o outono. As razões para isto são
imperfeitamente compreendidas, mas podem incluir o comportamento das larvas
infectantes no solo e a reciclagem da infecção na população de risco. A epidemio-
logia de muitas infecções por vermes pulmonares não é conhecida em detalhes.
Patogenia – Os efeitos patogênicos dos vermes pulmonares dependem da sua
localização dentro do trato respiratório, do número de larvas infectantes ingeridas e
do estado imune do animal. Durante a fase pré-patente da infecção por D. viviparus,
a lesão principal é o bloqueio dos bronquíolos por um infiltrado de eosinófilos em
resposta ao desenvolvimento das larvas; isto acarreta uma obstrução das vias
aéreas e colapso dos alvéolos distais ao bloqueio. Os sinais clínicos são moderados,
a menos que esteja presente uma grande quantidade de larvas, caso em que o animal
pode morrer na fase pré-patente com severo enfisema intersticial. Na fase patente,
os adultos nos brônquios lobar e segmentar causam uma bronquite com eosinófilos,
células plasmáticas e linfócitos na parede bronquial, e exsudato celular, muco
espumoso e nematóideos adultos são encontrados no lúmen. A irritação bronquial
causa tosse marcante e a reação completa leva a um aumento da resistência das vias
aéreas. Um componente importante dos estágios patentes é o desenvolvimento de
uma pneumonia crônica, não supurativa, eosinofílica e granulomatosa em resposta
aos ovos e às larvas de primeiro estágio que são aspiradas no interior de alvéolos e
bronquíolos. Isso é comum nos lobos caudais dos pulmões, e quando se generaliza,
leva a sinais clínicos severos; em combinação com a bronquite, pode resultar em
morte. Enfisema intersticial, edema pulmonar e infecção secundária são complica-
ções que aumentam as probabilidades de um resultado fatal. Sobreviventes podem
sofrer perda de peso considerável. Se o animal sobreviver até o fim da patência (, 2
a 3 meses para D. viviparus), a maioria ou até todos os vermes adultos são expelidos,
e o exsudato celular se resolve dentro das 4 semanas seguintes. O animal irá se
recuperar a menos que a infecção secundária se desenvolva nos pulmões lesados
durante o período pós-patente. Numa pequena proporção de animais, há uma
exacerbação dos sinais clínicos no período pós-patente. Isso se deve ao desenvol-
vimento de uma alveolite proliferativa difusa caracterizada por hiperplasia das células
epiteliais alveolares do Tipo II; a causa é desconhecida.
Dictyocaulus filaria é semelhante a D. viviparus , mas o enfisema intersticial não
é uma complicação freqüente. As lesões bronquiais predominam nas infecções por
Infecção Verminótica Pulmonar 868

D. arnfieldi , e quando uma reação alveolar ocorre, como em jumentos e potros, há


áreas lobulares excessivamente arejadas devido à obstrução intermitente dos
brônquios pequenos.
Os efeitos patogênicos de outros vermes pulmonares têm uma base semelhante,
mas freqüentemente não produzem sinais clínicos sérios, talvez devido a uma
localização mais restrita nos pulmões. O período patente e as lesões associadas
duram ≥ 4 meses para alguns vermes pulmonares (M. apri e A. abstrusus), mas
podem ser > 2 anos (M. capillaris). As lesões em suínos por M. apri são uma
combinação de bronquite e bronquiolite localizadas, com excesso de arejamento
dos alvéolos relacionados, usualmente nas bordas dos lobos caudais. Nos suínos,
a hipertrofia e a hiperplasia dos músculos lisos dos dutos bronquiolar e alveolar, com
marcante hiperplasia de células mucosas, são fatos marcantes. Nódulos linfóides
cinzentos (2 a 4mm) são vistos próximos ao fim da patência no momento em que os
vermes adultos são mortos. Fragmentos de vermes mortos podem ser encontrados
microscopicamente nesses nódulos.
Em infecções por M. capillaris e P. rufescens , parece predominar uma pneumo-
nia crônica, eosinofílica e granulomatosa; a reação ocorre nos bronquíolos e
alvéolos que contêm os parasitas, seus ovos e larvas. Eles são rodeados por
macrófagos, células gigantes, eosinófilos e outras células imunoinflamatórias, que
produzem placas subpleurais cinzas ou beges (1 a 2cm) na borda dorsal dos lobos
pulmonares caudais. Podem ocorrer lesões pequenas (1 a 2mm), esverdeadas e
nodulares. O efeito dessas lesões é menor em ovinos, talvez devido à localização
predominantemente subpleural. Esta infecção representa um espectro patogênico
mais baixo para vermes pulmonares.
Em gatos, A. abstrusus produz áreas nodulares de pneumonia granulomatosa
nos lobos caudais, que se suficientemente generalizadas podem ser clinicamente
significantes e ocasionalmente fatais; características notáveis são a hipertrofia e
hiperplasia dos músculos lisos na camada média das artérias e arteríolas pulmona-
res. Os nódulos de F. osleri, encontrados na membrana mucosa da traquéia e dos
grandes brônquios, podem produzir extrema irritação das vias aéreas e tosse per-
sistente.
Em animais adultos, não expostos previamente à infecção, as lesões e patogenia
são as mesmas que em animais jovens. Entretanto, em animais adultos com algum
grau de imunização, a reexposição ao parasita (por exemplo, reinfecção por “husk”
no gado adulto) pode produzir lesões diferentes. Desde que a imunidade do animal
seja incompleta, muitas larvas são capazes de atingir os pulmões antes de serem
mortas nos alvéolos e bronquíolos terminais. Os nódulos subpleurais verde-acin-
zentados de 2 a 4mm que se organizam ao redor do parasita morto são compostos
de linfócitos e células plasmáticas os quais envolvem uma zona central de eosinó-
filos. Eventualmente o parasita e os eosinófilos desaparecem e deixam um nódulo
linfóide residual que também irá regredir com o tempo. As larvas que não são mortas
nos bronquíolos terminais podem atingir os brônquios e causar uma bronquite
caracterizada por infiltrado eosinofílico marcante nas paredes dos brônquios e
exsudato amarelo-esverdeado no lúmen constituído de eosinófilos, outras células
inflamatórias e detritos de parasitas. A reação associada a esse processo pode
acarretar sinais clínicos severos se os nódulos forem numerosos e a bronquite
eosinofílica extensa; isso é responsável pelo fenômeno de reinfecção.
Achados clínicos – Os sinais clínicos de infecção por vermes pulmonares
variam de tosse moderada com aumento também moderado das taxas respiratórias
a tosse severa e persistente, angústia e insuficiência respiratória; ganho de peso
reduzido, produção reduzida de leite e perda de peso acompanhada de diferentes
infecções nos bovinos, ovinos e caprinos. Infecções subclínicas patentes podem
ocorrer em todas as espécies.
Infecção Verminótica Pulmonar 869

Os mais consistentes sinais no bovino são taquipnéia e tosse. Inicialmente há


uma respiração rápida e superficial, acompanhada de tosse que é exacerbada pelo
exercício. Dificuldades respiratórias podem suceder, e animais infectados maci-
çamente permanecem com suas cabeças estendidas para frente, com a boca aberta
e com salivação. Os animais tornam-se anoréticos e rapidamente perdem a condi-
ção. Ruídos pulmonares são particularmente proeminentes no nível da bifurcação
bronquial. No gado leiteiro adulto, esses sinais são acompanhados por uma queda
severa na produção leiteira e por ruídos pulmonares anormais acima dos lobos
caudais do pulmão. O fenômeno de reinfecção no gado leiteiro adulto usualmente é
visto no outono; embora menos severos que nas infecções iniciais, os sinais são a
tosse generalizada e taquipnéia com uma queda marcante na produção de leite.
Os sinais em ovinos e caprinos infectados com D. filaria são semelhantes àqueles
observados nos bovinos. Nessas 2 espécies, os sinais pulmonares usualmente não
estão associados com M. capillaris ou P. rufescens. D. arnfieldi está associada a
tosse, taquipnéia e debilidade em eqüinos mais velhos, porém a poucos ou talvez
a nenhum sinal clínico em potros ou jumentos.
O principal sinal clínico de M. apri em suínos é uma tosse persistente que pode
se tornar paroxística. Tosse e dispnéia ocorrem em gatos e cães com infecções por
A. abstrusus e F. osleri, respectivamente. Mortes são relativamente incomuns por
esses vermes pulmonares, entretanto elas ocorrem em filhotes de gatos.
Diagnóstico – Basicamente é feito pela avaliação dos sinais clínicos, epidemio-
logia, presença da larva de primeiro estágio nas fezes e necropsia dos animais do
mesmo grupo ou do mesmo rebanho. Broncoscopia e radiografia podem ser úteis
em alguns casos. As larvas não são encontradas nas fezes de animais nos períodos
pré ou pós-patente e, usualmente, também não o são no fenômeno de reinfecção.
Nos estágios iniciais de um surto, as larvas podem estar presentes em pequeno
número. Larvas de primeiro estágio ou ovos larvados podem ser detectados
usando-se a maioria das técnicas de flotação fecal com as soluções salinas
apropriadas. Um método conveniente para detectar larvas é a modificação do
método de Baermann, no qual 25g de amostra fecal são envoltos em papel tecidual
ou gaze de algodão e suspensos ou colocados em água contida num béquer. A água
no fundo do béquer é examinada quanto à presença de larvas após 4h; em infecções
maciças, as larvas podem estar presentes dentro de 30min.
A necropsia deve incluir o exame da traquéia, principalmente na sua bifurcação,
no caso de F. osleri e as lesões por ela produzidas. Os adultos de Dictyocaulus spp
e M. apri são prontamente visíveis nos brônquios durante os períodos patentes de
infecção. Entretanto, o exame do esfregaço do muco bronquial ou secções histoló-
gicas das lesões podem ser necessários para confirmar um diagnóstico durante
outros estágios da infecção por vermes pulmonares, e também para alguns dos
outros vermes pulmonares.
A broncoscopia pode ser usada para detectar nódulos de F. osleri ou para coletar
lavados traqueais (cães e cavalos), e para examinar ovos, larvas e eosinófilos.
Tratamento – Diversas drogas são úteis. Já o levamisol, os benzimidazóis
(fenbendazol, oxifendazol e albendazol), assim como a ivermectina são mais fre-
qüentemente usados em bovinos, e são efetivos contra todos os estágios de
D. viviparus. Estas drogas são também efetivas contra vermes pulmonares em
ovinos, eqüinos e suínos. O fenbendazol tem sido usado com sucesso em gatos
para A. abstrusus. Em cães, Filaroides osleri apresenta problemas, mas há
evidência de que o fenbendazol e o albendazol sejam efetivos se o tratamento for
prolongado.
Animais no pasto devem ser confinados para o tratamento, e a terapia de
suporte pode ser necessária para complicações que podem aparecer em todas
as espécies.
Infecção Verminótica Pulmonar 870

Controle – O controle das infecções por vermes pulmonares, apenas pelo


manejo de pastagens, não é seguro. O risco que os animais podem sofrer pode ser
minimizado quando não se permite que bezerros pastem com outros animais e se
impede seu acesso a pastos com história de infecção recente por vermes pulmona-
res. Evitar colocar jumentos no piquete de eqüinos pode ser útil para controlar o
parasita pulmonar no eqüino. A combinação de uma prática regular de pastoreio
com anti-helmínticos estratégicos também não foi comprovadamente eficaz. Con-
tudo, a disponibilidade atual de anti-helmínticos com período de atividade prolonga-
do (por exemplo, ivermectina que é efetiva por mais de 2 semanas contra D. viviparus)
ou a liberação lenta através de bolo (por exemplo, tartarato de morantel) fazem desta
uma abordagem mais segura. Em bovinos na primeira estação de pastagem, 2
tratamentos com ivermectina, 3 e 8 semanas depois, fornecem um controle efetivo
da bronquite parasitária a menos que o pasto de desafio esteja muito infestado e a
estação de pastagem prolongada; neste caso, pode ser necessário um tratamento
adicional na 13ª semana. Para evitar contaminação ambiental, devem-se medicar
os animais possíveis carreadores como precaução. Os parasitas pulmonares que
requerem um hospedeiro intermediário podem ser controlados pela eliminação do
contato com este hospedeiro, por exemplo, mantendo os suínos estabulados.
A vacinação contra os parasitas pulmonares que infestam os bovinos é praticada
em larga escala no noroeste da Europa e é efetiva no controle de “husk”. A vacina
é constituída de larvas infectantes atenuadas, irradiadas pelos raios-X, administra-
das por via oral em 2 doses com intervalo de 4 semanas. Os animais devem ser
mantidos estabulados durante o período de vacinação e por até 2 semanas após a
segunda dose, para dar tempo de desenvolver uma resistência adequada antes da
liberação dos animais aos pastos. Uma vacina similar é usada contra a D. filaria no
sudeste europeu.

PNEUMONIA MICÓTICA
É uma inflamação crônica dos pulmões causada por fungos ou leveduras (tem
sido costumeiro incluir aqui as infecções pulmonares causadas por Actinomyces e
Actinobacillus spp).
Etiologia – Cryptococcus, Histoplasma, Coccidioides, Blastomyces e Aspergillus
spp, juntamente com outros fungos e leveduras, têm sido incriminados como
agentes causadores dessa condição em animais domésticos (ver INFECçõES FúN-
GICAS, pág. 411). Os tecidos e secreções das passagens respiratórias são um
excelente ambiente para esses microrganismos. Infecções fúngicas são freqüen-
temente concomitantes com infecções bacterianas. Acredita-se que a fonte da
maioria das infecções seja o solo e não a transferência horizontal de outros ani-
mais. Considerando-se a alta taxa de exposição a estes patógenos em certas
circunstâncias, existem questões não resolvidas com relação à epidemiologia dessa
condição, incluindo suscetibilidade individual, toxigenicidade dos microrganismos,
papel da imunidade e doença concomitante.
Achados clínicos e lesões – Uma tosse curta e úmida é característica, porém a
condição é mais de debilidade geral. Como em outros tipos de pneumonia, uma
descarga nasal fina e mucóide pode estar presente. À medida que a doença progride,
dispnéia, emaciação e uma fraqueza generalizada se tornam progressivamente
evidentes. A respiração torna-se abdominal, semelhante àquela observada em
hérnias diafragmáticas. À auscultação, sons respiratórios ásperos são ouvidos. Em
casos avançados, os sons respiratórios normais estão diminuídos ou quase inaudíveis.
Necrobacilose 871

Leucocitose e febre periódica ocorrem, provavelmente concomitantes a infecções


bacterianas. Freqüentemente ocorre disseminação com a blastomicose. Alterações
nos olhos, como úlceras de córnea, cegueira e descarga purulenta são comuns, e as
lesões podem ser evidentes na pele, linfonodos, ossos e articulações.
Lesões focais de inflamação crônica estão presentes nos pulmões. Formações
de abscessos e cavitação podem ser vistas em conjunto com áreas de necrose de
coloração amarela ou cinza. Alguns animais demonstram numerosos nódulos
miliares que podem ser vistos em radiografias.
Diagnóstico – Uma tentativa de diagnóstico de pneumonia micótica pode ser
feita se um animal com pneumonia crônica exibir os sinais descritos e não responder
à antibioticoterapia. Entretanto, um diagnóstico definitivo irá requerer assistência
laboratorial, e a radiografia pode ser útil. Alguns antígenos, por exemplo, histoplasmina
e blastomicina, têm sido desenvolvidos e são um auxílio no diagnóstico. A cultura
do esputo que é expelido em espasmos de tosse pode revelar o microrganismo
infectante. À necropsia, o diagnóstico clínico pode ser confirmado pela cultura
apropriada e técnicas histopatológicas.
Tratamento – Não há um método inteiramente satisfatório de tratamento
sistêmico das infecções micóticas; a anfotericina pode ser útil, contudo é indeseja-
velmente tóxica. O cetoconazol tem mostrado uma atividade contra inúmeros
fungos patogênicos em humanos; ele pode ser efetivo em cães e outros animais.

NECROBACILOSE
O termo necrobacilose é usado para descrever qualquer doença ou lesão com
a qual Fusobacterium necrophorum (Sphaerophorus necrophorus) esteja associa-
da. Estão incluídos difteria dos bezerros (ver adiante), rinite necrótica dos suínos
(ver pág. 907), podridão dos cascos nos bovinos (ver pág. 603), abscesso podal dos
ovinos (ver pág. 652), necrose pós-parto da vagina e útero, necrose focal do fígado
de bovinos e ovinos, inflamação da coroa dos cascos de eqüinos (ver pág. 619) e
outras numerosas lesões necróticas em ruminantes e, menos comumente, suínos,
eqüinos, aves e coelhos. O microrganismo é provavelmente um invasor secundário
mais do que propriamente uma causa primária, sendo usualmente parte de infecção
mista. Contudo, sua exotoxina necrosante indubitavelmente tem um papel na
produção das lesões características. F. necrophorum faz parte da flora normal da
boca, intestino, e trato genital de muitos herbívoros e onívoros, e está disseminada
no meio ambiente. Admite-se que ela tenha acesso ao corpo através de ferimentos
da pele ou das membranas mucosas.

DIFTERIA DOS BEZERROS


É uma doença infecciosa dos bezerros que afeta a laringe (laringite necrótica),
cavidade oral (estomatite necrótica) ou faringe, caracterizada por febre, ulcerações,
e intumescência das estruturas afetadas.
Etiologia – Fusobacterium necrophorum tem sido por longo período considera-
da a causa dessa doença. Contudo, as lesões traumáticas às membranas mucosas
da cavidade oral, pela ingestão de forragens grosseiras ou alimentos que contêm
uma quantidade excessiva de talos duros, são fatores predisponentes. Similarmen-
te, a erupção de dentes ou outras infecções, por exemplo, doença das mucosas,
podem causar danos preliminares às membranas mucosas. Fatores contribuintes
incluem celeiros e alimentos sujos.
Necrobacilose 872

Achados clínicos e lesões – A difteria dos bezerros usualmente ocorre na forma


de estomatite necrótica em animais < 3 meses de idade e na forma de laringite
necrótica naqueles mais velhos. O bezerro com estomatite necrótica tem dificuldade
em mamar, encontra-se deprimido e anorético, e tem uma temperatura de até 40°C.
As faces podem estar inchadas, a saliva pode escorrer da boca e a respiração tem
um odor repulsivo. Em bezerros com laringite necrótica, o sinal mais proeminente
em casos severos é a respiração ofegante e ruidosa. Os sinais iniciais podem incluir
uma febre de 41°C, taquipnéia e salivação. Posteriormente, podem ser notadas
protrusão da língua e uma descarga nasal. Bezerros podem desenvolver estomatite
e laringite necróticas conjuntamente; como seqüela, pode haver uma pneumonia
necrosante aguda devida à aspiração de fragmentos de tecidos infectados. Bezer-
ros sem tratamento podem sucumbir à toxemia e à pneumonia dentro de 2 a 7 dias.
As lesões principais são úlceras necróticas de variada profundidade nas mem-
branas mucosas orais, faríngeas ou laríngeas. As partes envolvidas com mais
freqüência são a língua, particularmente suas bordas, superfície interna das
bochechas e revestimento da faringe. Nos casos severos, as lesões estendem-se
para o interior da cavidade nasal, laringe, traquéia, e até para os pulmões.
Diagnóstico – Os sinais são usualmente suficientes para estabelecer um
diagnóstico. Dificuldades podem ser encontradas quando, em certos surtos, um
bezerro mais velho é o primeiro a ficar doente ou, em rebanhos, quando a doença
afeta só 1 ou 2 bezerros. Uma bactéria filamentosa, perolada e Gram-negativa pode
ser demonstrada em esfregaços das partes mais profundas das lesões ou pela
cultura em ágar sangüíneo sob condições anaeróbicas; as colônias são β-hemolíticas.
Tratamento e controle – Animais afetados devem ficar isolados dos sadios. A
limpeza e a desinfecção das áreas de arraçoamento e fornecimento de água e dos
abrigos são importantes passos na prevenção da disseminação da doença. O
exame físico diário de todos os bezerros jovens é recomendado para o reconheci-
mento precoce de novos casos. As sulfonamidas de escolha são a sulfamerazina e
a sulfametazina. Penicilina ou tetraciclinas provaram ser benéficas, e também o
cloranfenicol onde seu uso é permitido. Alimentação suplementar com leite, ovos e
mingau nutritivo é recomendável.

FARINGITE
É a inflamação das paredes da nasofaringe ou da orofaringe.
Etiologia – A faringite pode acompanhar infecções do trato respiratório superior;
resultar de lesão física, química ou traumática; ou se desenvolver a partir da extensão
de doenças inflamatórias das estruturas adjacentes. A submucosa da faringe de todas
as espécies contém generosos depósitos de tecidos linfóides, os quais nos animais
imaturos tendem a se tornar hiperplásicos. Nos jovens cavalos de corrida, a hiperpla-
sia linfóide faríngea (HLF) é um achado comum na endoscopia, mas tende a se
agravar devido a infecções virais ou partículas de poeira, principalmente quando o
cavalo estiver em pleno treinamento. HLF é considerada por alguns autores como a
causa de obstrução das vias aéreas superiores, mas evidências recentes sugerem
que ela possui pequeno impacto no desempenho do animal. Freqüentemente torna-
se crônica, caracterizando-se por nódulos nas paredes da faringe e nas suas
reentrâncias que contêm massas de linfócitos. Ela melhora com o descanso, mas
freqüentemente recidiva quando o treinamento recomeça. HLF geralmente desapa-
rece espontaneamente aos 3 anos. Trauma na faringe pode resultar de corpos
estranhos ou de uso de instrumentos não especializados, por exemplo “balling guns”.
Faringite 873

Corpos estranhos na orofaringe são comuns em cães e menos comuns em gatos.


Eles correspondem a 2 grupos, aqueles em forma de cunha que ficam firmemente
alojados, não sendo deslocados pelo animal, e aqueles que penetram na mucosa.
Corpos estranhos penetrantes variam de alfinetes e agulhas a bastões, que podem
penetrar na parede da faringe ao serem engolidos, causando severa celulite local e
ruptura esofágica ou, se quebrados, agem como foco de supuração. Inalação ou
ingestão de drogas e químicos podem causar intensa irritação. Independentemente
da etiologia, a disfagia de qualquer tipo provavelmente é acompanhada de faringite.
Eqüinos com paralisia de faringe proveniente de micose das bolsas guturais com
disautonomia (ver pág. 895) e garrotilho (ver pág. 901) apresentam faringite secun-
dária. Similarmente, cães com defeitos palatinos, megaesôfago ou esofagite desen-
volvem inflamação das amígdalas e da faringe. Irritação térmica da faringe ocorre em
cães como resultado da ingestão de alimentos ou líquidos quentes. Alongamento do
palato mole ou eversão dos ventrículos laterais da laringe em cães braquicefálicos
podem causar dificuldade respiratória e disfagia, resultando em faringite e amigdalite.
Achados clínicos e diagnóstico – Em geral, animais com faringite possuem
apetite normal, porém não se alimentam devido à dor provocada pela ingestão e
deglutição. A palpação da faringe revela sensibilidade aumentada. Pode haver
aumento de volume dos linfonodos submaxilar, retrofaríngeo e faríngeo e as amígda-
las, muitas vezes, estão aumentadas e inflamadas. Se há uma laringite concomitan-
te, uma tosse sufocante pode surgir quando se exerce uma pressão sobre a faringe.
Se a dor causar resistência à abertura de boca, o exame pode ser facilitado com
anestesia geral. A impossibilidade de deglutir pode causar salivação; ânsia de vômito
e tosse são comuns, e a possibilidade de pneumonia por aspiração deve ser consi-
derada.
Paralisia faríngea (ver pág. 177) pode ser um sinal da raiva (ver pág. 749). HLF
severa provoca um aumento na turbulência do fluxo de ar através da faringe e pode
causar ruído respiratório durante o exercício. Também acredita-se que isto seja o
iniciador do deslocamento dorsal do palato mole. À endoscopia, HLF é visível nas
paredes e reentrâncias da faringe, mucosa das bolsas guturais e nas superfícies
dorsais do palato mole e epiglote.
As causas da faringite são variáveis e não existe um prognóstico único. O
resultado depende da natureza dos fatores precipitantes.
Tratamento – Os objetivos primários são identificar e controlar os fatores
predisponentes. Se a condição foi provocada por corpos estranhos, a remoção do
objeto ofensor e a aplicação local de uma solução anti-séptica-expectorante (por
exemplo, solução de Mandl [0,6g de iodo, 1,2g de iodeto de potássio, 0,25g de óleo
de hortelã-pimenta, glicerina q.s.p. 30mL]) geralmente são efetivas. O animal afetado
deve receber alimentos moles ou líquidos, que podem ser engolidos facilmente.
Suplementação dietética EV pode ser necessária durante o estágio agudo.
Devem-se administrar sulfonamidas ou antibióticos por via parenteral aos
grandes animais. Em eqüinos, HLF é uma doença de adolescentes e tende a se
resolver espontaneamente com a maturidade do animal. Quando a hiperplasia for
severa, o cavalo deve ficar em repouso em um ambiente limpo e ser tratado com
sprays faríngeos tópicos e antibioticoterapia sistêmica. Em cavalos com faringite
infecciosa (isto é, garrotilho), na qual o edema e exsudatos podem causar dispnéia
angustiante, vapores com cresol são úteis e podem evitar a traqueotomia; linfonodos
abscedados são comuns e devem ser drenados e lancetados se necessário. A tosse
pode ser aliviada pela administração de xaropes expectorantes na língua. É
insensato forçar medicação por via oral, devido ao risco de causar asfixia fatal.
Similarmente, o manejo da faringite em pequenos animais objetiva controlar ou
eliminar as causas. Calicivirose em gatos pode causar marcante ulceração da mucosa
orofaríngea. O tratamento é essencialmente de suporte, para controlar infecções
Faringite 874

bacterianas secundárias, manter a hidratação normal e a adequada nutrição. Isto


pode incluir fluidoterapia EV e/ou uma sonda de faringostomia ou gastrostomia.
Alongamento do palato mole, reentrância glossoepiglótica e eversão dos ventrí-
culos laríngeos devem ser tratados cirurgicamente em cães.

ENFISEMA PULMONAR
As 2 principais formas de enfisema ocorrem nos pulmões. Enfisema alveolar
(em eqüinos, chamado “asma eqüina” ou doença pulmonar obstrutiva crônica, ver
pág. 888) é o aumento permanente dos espaços alveolares, acompanhado de
ruptura do septo alveolar. Enfisema intersticial é a presença de ar dentro das áreas
interlobulares, subpleurais e intersticiais do pulmão. O enfisema deve ser distingui-
do da hiperinflação simples do alvéolo, a qual é um achado post mortem comum, que
ocorre temporariamente, secundário à obstrução da saída do ar.
O enfisema é uma doença importante no homem; em outros animais, ele quase
sempre é secundário a outro processo patológico pulmonar. A patogenia não é
totalmente conhecida, mas sugerem-se pelo menos 2 possibilidades: 1. pode
ocorrer devido à degradação e ao enfraquecimento do interstício pelas enzimas
proteolíticas, principalmente a elastase, liberadas pelas células inflamatórias; 2.
mais comumente, a doença se desenvolve secundariamente a uma bronquite ou
bronquiolite crônica que levam a uma obstrução das vias aéreas na expiração, mas
ainda permitem que o ar entre no alvéolo na inspiração, ou através dos poros
comunicantes nas paredes alveolares.
O enfisema intersticial é mais comum em bovinos e suínos, devido ao septo inter-
lobular bem desenvolvido dos seus pulmões. Em bovinos, enfisema intersticial
severo pode ser acompanhado por enfisema subcutâneo sobre o dorso, quando o
ar passa ao longo dos planos fasciais, dos pulmões através do mediastino e abertura
torácica para a subcútis do dorso. Enfisema intersticial freqüentemente acompanha
dispnéia severa em bovinos, principalmente na pneumonia intersticial aguda (atípi-
ca) (ver EPBA, pág. 878). Graus mais leves de enfisema podem preceder a morte,
se houver um esforço prolongado e uma respiração exagerada. Estas alterações
agônicas devem ser diferenciadas de lesões ante mortem.

DOENÇAS RESPIRATÓRIAS DOS BOVINOS


COMPLEXO DE DOENÇAS RESPIRATÓRIAS
DOS BOVINOS
INTRODUÇÃO
A doença respiratória bovina (DRB) pode ser causada por uma variedade de
fatores interagindo para permitir a colonização microbiana do pulmão, o que resulta
em angústia respiratória severa e possivelmente morte. O sistema imune do hospe-
deiro, assim como vários vírus e bactérias, incluindo clamídias e micoplasmas, e até
helmintos e fungos têm um papel na determinação da severidade da doença. O
manejo, determinando alteração do ambiente no qual o animal se encontra, afeta
Doenças Respiratórias dos Bovinos 875

todos esses fatores e, conseqüentemente, influencia diretamente as possíveis perdas


econômicas. Portanto, se os animais estão estressados como resultado de uma série
de fatores, tais como desmame, transporte, alteração ou privação de dieta, etc., que
podem afetar adversamente os mecanismos de defesa do animal, e depois são
reunidos com animais que estão abrigando vários patógenos, a doença provavelmen-
te vai aparecer. Se os animais estão aglomerados e se a ventilação é inadequada, a
transmissão é mais fácil. Em muitos casos, os patógenos por si só causam
imunomodulação; deste modo, a infecção por vírus não só induz alterações anatômi-
cas do trato respiratório, que propiciam condições para o desenvolvimento de
bactérias, mas também altera os mecanismos de depuração do hospedeiro. Esse si-
nergismo é visto freqüentemente entre vírus e bactérias na doença respiratória bovina.

PNEUMONIA BOVINA INDUZIDA POR VÍRUS


Vírus parainfluenza-3
Historicamente, o vírus parainfluenza (PI-3) tem sido associado com a doença
respiratória bovina (DRB), embora as opiniões sejam variadas, assim como o papel
que ele desempenha na doença. Ele pode infectar muitas espécies, incluindo o
homem, bovinos, cães, eqüinos, macacos e ovinos. É encontrado em todo o mundo.
O vírus PI-3 é capaz de causar doença por si só, mas está provavelmente
muito mais freqüentemente envolvido como uma infecção primária, seguida pela
Pasteurella haemolytica como um invasor secundário. Os sinais clínicos incluem
febre, anorexia, descarga nasal serosa, lacrimejamento e tosse.
A pneumonia viral fatal não complicada pelo PI-3, embora provavelmente rara,
pode ser observada como uma consolidação severa dos lobos ântero-ventrais dos
pulmões. Lesões histológicas incluem bronquiolite e alveolite com marcante con-
gestão e hemorragia. O quadro patológico geralmente é visto como uma pneumonia
fibrinopurulenta induzida por Pasteurella.
A infecção pelo vírus PI-3, com ou sem infecção bacteriana secundária, é difícil
de ser separada de outras pneumonias virais em bovinos. Adenovírus, enterovírus,
rinovírus, reovírus, calicivírus, coronavírus e possivelmente outros vírus, provavel-
mente desempenham um papel importante em alguns surtos de DRB, e a doença
causada por eles não é diferenciada da induzida pelo vírus PI-3. Ver também
INFECÇÃO PELO VÍRUS RESPIRATÓRIO BOVINO SINCICIAL, adiante.
O tratamento inclui antibioticoterapia contra invasores bacterianos. Boas práti-
cas de manejo, como alimentação apropriada, pronto acesso a água fresca e abrigo,
ajudam a reduzir as perdas.
Várias vacinas para o PI-3 estão disponíveis, as quais fornecem proteção se
usadas como uma parte racional da prevenção da doença e do programa de manejo.

Vírus respiratório bovino sincicial


A infecção pelo vírus respiratório bovino sincicial (VRBS) ocorre em todo o mundo,
com alguma variação antigênica entre os vírus isolados. Os hospedeiros incluem
todas as espécies bovinas, ovinos, caprinos e outros animais, inclusive o homem. É
um pneumovírus da família Paramyxoviridae, aparentemente inerente nas popula-
ções bovinas, nas quais causa uma infecção cíclica inaparente e resulta em títulos
substanciais de anticorpos séricos na maioria dos bovinos. Estes anticorpos podem
proteger o animal do desenvolvimento da doença clínica, mas não previnem a
infecção. Como outros vírus respiratórios, ele se dissemina por gotículas de aerossóis.
Há evidências de que este vírus seja o principal agente envolvido na iniciação da
doença respiratória bovina, e que bactérias e fatores estressantes contribuam para
precipitar a doença clínica (ver também INFECÇÃO POR PI-3 anteriormente).
Doenças Respiratórias dos Bovinos 876

Achados clínicos – Este vírus é capaz de produzir pneumonia viral aguda e é


implicado em alguns casos de enfisema alimentar. Entretanto, mais freqüentemen-
te ele é o prelúdio de uma pasteurelose pneumônica. Febre ( > 42oC) pode ser
encontrada nos estágios iniciais da infecção e picos em 5 a 7 dias, posteriormente
caindo para 40 a 41oC, acompanhada por infecção bacteriana secundária e
pneumonia. Inicialmente estes animais podem parecer alertas e se alimentar
normalmente, depois tornam-se anoréticos e deprimidos e freqüentemente apre-
sentam descarga nasal mucopurulenta, tosse e dispnéia.
Lesões – Não é comum uma pneumonia por VRBS simples. Entretanto, o vírus
pode causar uma broncopneumonia severa difusa, geralmente com algum grau de
enfisema e edema. A presença de espuma nos brônquios e traquéia é comum. A
pneumonia como resultado de infecção por VRBS geralmente é um reflexo de
infecção secundária por Pasteurella haemolytica (ver adiante). Esta pneumonia é
fibrinopurulenta e há consolidação severa dos lobos cranioventrais. Edema e
enfisema dos lobos pulmonares diafragmáticos podem variar em severidade.
Ao exame histopatológico, bronquiolite necrosante com sincícia (células multinu-
cleadas) pode estar presente no revestimento epitelial e nas paredes alveolares.
Edema e enfisema intersticiais com epitelialização alveolar e formação de membra-
na hialina também têm sido notados.
Diagnóstico – Não existem sinais cardinais para se fazer um diagnóstico de
doença respiratória induzida por VRBS facilmente. Em alguns estudos, > 50% das
doenças respiratórias alimentares envolvem o vírus respiratório bovino sincicial
(VRBS). Além disso, o vírus é comumente encontrado em rebanhos leiteiros e de
corte e está envolvido em muitos, ou na maioria, dos problemas respiratórios.
Geralmente as infecções virais estão complicadas por bactérias secundárias. Alguns
também acham que a DVB (ver pág. 199) pode desempenhar um papel importante
com o VRBS para produzir a doença.
O isolamento viral de “swabs” nasais geralmente é inútil, assim como a recupe-
ração do vírus de espécimes necrosados. O vírus é frágil, sendo logo “capturado”
pelos anticorpos.
A sorologia parece ser um método diagnóstico definitivo; entretanto é sempre
retrospectivo. Amostras sorológicas pareadas são essenciais. Entretanto, o título de
anticorpos dos animais com a doença clínica bem desenvolvida pode ser mais alto
na amostra coletada na fase aguda que na amostra coletada 2 a 3 semanas depois.
Isto ocorre porque a resposta dos anticorpos freqüentemente se desenvolve
rapidamente e os sinais clínicos seguem a infecção viral por mais de 10 a 12 dias.
Amostras sorológicas únicas mostrando altos títulos de anticorpos de alguns
animais podem ser úteis para se fazer um diagnóstico associado aos sinais clínicos.
Tratamento e profilaxia – O tratamento é dirigido à invasão bacteriana secundá-
ria. O uso de antibióticos com a terapia de suporte geralmente reduz as perdas. Na
doença severa induzida por vírus com enfisema, o tratamento deve ser rápido e
vigoroso. Podem ocorrer muitas mortes. Anti-histaminas e corticosteróides parecem
ser benéficos.
Experiências de campo indicam que vacinas, inativadas e vivas modificadas,
reduzem as perdas devidas à doença respiratória induzida pelo VRBS.

PASTEURELOSE PNEUMÔNICA
(Febre da viagem, Febre do transporte)
Todas as idades são suscetíveis, porém a doença respiratória grave associada
com Pasteurella spp geralmente ocorre em animais jovens após viagens; conse-
qüentemente, é chamada com freqüência de febre do transporte (ver também
SEPTICEMIA HEMORRÁGICA, adiante). Entretanto, outras formas de estresse combina-
Doenças Respiratórias dos Bovinos 877

das com a exposição simultânea a um ou mais dos inúmeros vírus e bactérias podem
também resultar em pneumonia.
Etiologia – Pasteurella haemolytica é o agente mais freqüentemente isolado dos
pulmões de animais infectados. Entretanto, P. multocida, assim como uma varieda-
de de outras bactérias, também pode causar pneumonia. Na maioria dos casos,
estas Pasteurella spp citadas são habitantes do trato respiratório superior de
animais sadios; em condições normais, elas permanecem confinadas ao trato
respiratório superior, especialmente nas criptas das amígdalas. Após estresse ou
infecção viral (ver anteriormente), há um rápido aumento na taxa de replicação das
bactérias, que resulta em colonização bacteriana do pulmão. A taxa aumentada de
crescimento bacteriano e colonização do pulmão pode ser decorrente de alterações
anatômicas e ambientais do trato respiratório, bem como de uma supressão do
mecanismo de defesa do hospedeiro. A doença é mais comum em gado confinado
dentro das primeiras semanas de entrada no confinamento. Em alguns casos, até
50% dos animais podem requerer tratamento, e 1 a 10% de mortalidade é comum.
Achados clínicos – O gado afetado encontra-se deprimido, anorético, tem febre
(40 a 41°C) e uma descarga nasal serosa a mucopurulenta com respiração rápida
e de pouca profundidade e, muitas vezes, tosse quando se movimenta. Em casos
graves, há pleurite; a respiração é irregular e os animais podem grunhir na expiração
e, eventualmente, se recusar a levantar. A auscultação pulmonar pode revelar
estertores úmidos, atrito pleural e crepitação. Quando a consolidação pulmonar
progride, os sons pulmonares podem estar diminuídos. O curso da doença pode ser
encurtado se o tratamento for iniciado precocemente, mas pode-se tornar crônico
se atrasado; os animais podem-se tornar debilitados e morrer dentro de poucas
semanas ou meses depois.
Lesões – À necropsia, as porções ântero-ventrais do pulmão estão vermelho-
escuras, distendidas, duras e, muitas vezes, cobertas por fibrina. Aderências entre
as superfícies adjacentes são comuns. Além disso, um exsudato pleural serofibrinoso
está presente. Na superfície de corte, a fibrina está evidente entre os lóbulos, e áreas
de necrose estão dispersas por todo o lobo. À medida que a doença progride, essas
áreas necróticas tornam-se demarcadas por um contorno branco. Culturas puras de
P. haemolytica podem ser isoladas da maioria dos casos; estas estão associadas
à pleuropneumonia fibrinosa com trombose extensiva dos linfáticos intersticiais,
envolvimento marcante dos macrófagos e focos de necrose pulmonar, mas com
poucos sinais de inflamação das vias aéreas. Em contraste, infecções por P.
multocida estão associadas com bronquite supurativa e broncopneumonia, exsu-
dação mínima com fibrina, e menos trombose dos linfáticos. Esses achados podem
ser úteis na diferenciação das infecções. Embora acredite-se que os vírus predis-
ponham os animais à superinfecção bacteriana, o vírus e suas lesões geralmente
desaparecem antes que as mortes possam ocorrer.
Tratamento – Para obter melhores resultados, o gado afetado deve ser tratado
logo. Os animais devem ser identificados, isolados e tratados com antibacterianos
de amplo espectro. A menos que drogas de longa duração sejam usadas, o
tratamento deve ser repetido por no mínimo 3 a 4 dias. Falha no tratamento pode
ocorrer se ele for iniciado tardiamente, ou se os microrganismos forem resistentes
ao antibiótico escolhido. Medicação em massa no alimento ou na água geralmente
é de valor limitado na medida em que animais doentes não comem nem bebem o
suficiente para produzir níveis inibitórios de antibiótico no sangue.
Controle – O manejo é a chave para o controle da doença respiratória bovina.
Os bezerros devem ser imunizados contra os principais patógenos virais antes do
desmame e do transporte (ver PNEUMONIA ENZOÓTICA EM BEZERROS, adiante). O valor
das bacterinas de Pasteurella ainda não foi determinado; alguns relatos indicam que
elas podem até exacerbar a doença. Entretanto, testes de campo de vacinas mais
Doenças Respiratórias dos Bovinos 878

novas, subnidades (leucotoxina, etc.), cultura de células e cultura modificada têm


mostrado uma eficácia considerável, quando usados como parte de um programa
de controle e prevenção da doença. A vacinação deve ser feita ≥ 3 semanas antes
do embarque e da remoção para o confinamento. As imunizações podem ser
repetidas na entrada para o confinamento. O manuseio deve ser, tanto quanto
possível, reduzido e espaçado a fim de reduzir o estresse. Os animais podem
receber suplementação alimentar adequada antes do desmame para que haja
tempo para uma adaptação às alterações da dieta. A ventilação (ver pág. 1339) é
um instrumento de manejo importante; a renovação freqüente do ar remove as
gotículas infectadas do ambiente, diminuindo a lesão ao sistema respiratório do
animal (ver também INTERAÇÃO MANEJO-DOENÇA: BOVINOS, pág. 1343).

ENFISEMA PULMONAR BOVINO AGUDO E EDEMA


(EPBA, Febre de neblina, Pneumonia intersticial atípica bovina)

É uma das causas mais comuns de distúrbios respiratórios agudos no gado,


particularmente bovino adulto de corte, caracterizada por súbito aparecimento,
tosse mínima, e um curso que termina fatalmente ou evolui para uma melhora
dramática dentro de poucos dias. É uma doença de grupos; a morbidade situa-se
> 50%, entretanto comumente só uma pequena minoria desenvolve angústia
respiratória grave. Tipicamente, ocorre no outono, 5 a 10 dias após uma mudança
para uma pastagem melhor, muitas vezes viçosa. O termo febre de neblina deriva
da sua associação com os pastos com neblina, ou seja, com nevoeiro, ou suas
conseqüências.
Etiologia – É provável que os metabólitos do aminoácido natural L-triptofano
sejam responsáveis por muitos surtos. No rúmen, o L-triptofano é degradado em
ácido indolacético, que pode ser convertido em 3-metilindol (3-MI) por alguns
microrganismos ruminais. O 3-MI é absorvido pela corrente sangüínea e é a fonte
da pneumotoxicidade após ser metabolizado pelo sistema oxidase de função mista,
que é muito ativo nos pulmões. Aparentemente, o nível de L-triptofano de culturas
está mais alto nas pastagens suculentas que crescem mais rápido, em particular,
mas não apenas no outono. Síndromes clinicopatológicas indistinguíveis ocorrem
em pastagens de nabo silvestre e após a ingestão de batatas-doces mofadas
infectadas com Fusarium solani ou de hortelã silvestre, por Perilla frutescens. A
hortelã silvestre contém cetona perila, que é pneumotóxica; batatas-doces infesta-
das com F. solani contêm várias substâncias pneumotóxicas, especialmente
4-ipomeanal.
Achados clínicos – O enfisema pulmonar bovino agudo (EPBA) é mais comum
em vacas de corte pesadas, mas pode ocorrer em qualquer sexo e em gado de leite
ou corte, dentro das mesmas condições de manejo. Surtos usualmente desenvol-
vem-se dentro de 5 a 10 dias após uma mudança para um pasto melhor, e raramente
ocorrem em animais que já estejam no campo por > 3 semanas. A morbidade varia
até 50% ou mesmo até 100%, mas em geral só poucos são afetados de forma grave.
Os casos brandos podem passar despercebidos: os bovinos estão deprimidos,
mas ainda alertas; há taquipnéia e hiperpnéia, mas a auscultação não é usualmente
significativa. Tais bovinos normalmente apresentam recuperação espontânea den-
tro de dias. O bovino seriamente afetado mostra angústia respiratória extensa com
respiração bucal, projeção da língua e salivação intensa. Um grunhido expiratório
ruidoso é comum, mas a tosse é rara. Nos estágios iniciais, a auscultação revela
sons respiratórios surpreendentemente suaves; estertores são raros. Se a morte
não ocorrer (até 1 em 3 morre), há uma melhora dramática e no terceiro dia os
animais recomeçam a comer. Nesse estágio, a auscultação revela ruídos respi-
Doenças Respiratórias dos Bovinos 879

ratórios ásperos e, em alguns animais, crepitação dorsal (enfisematosa). Alguns


bovinos têm enfisema subcutâneo que se estende ao longo do dorso desde a
cernelha. A recuperação clínica completa pode levar 3 semanas.
Lesões – Lesões significantes estão limitadas ao trato respiratório. Em bovinos
afetados que tenham morrido ou sido abatidos in extremis, os pulmões estão
pesados e não entram em colapso normal. Eles estão amplamente afetados com
diferentes graus de firmeza comparável à da borracha; há edema e enfisema
extensos, muitas vezes com formação de grandes bolhas preenchidas por ar nas
regiões interlobular e subpleural. Hemorragias na submucosa estão muitas vezes
presentes na laringe, traquéia e brônquios maiores. Histologicamente, a lesão é
caracterizada por congestão, edema alveolar, formação de membrana hialina, e
áreas de hiperplasia epitelial alveolar prematura dos pneumonócitos do Tipo II;
ocasionalmente, áreas de necrose bronquiolar podem ser encontradas. O enfisema
é muitas vezes dramático e é limitado à fascia intersticial onde é acompanhado de
edema.
Em animais abatidos após 3 dias de doença, os pulmões estão ainda pesados
e normalmente não apresentam colapso; eles estão rosa-acinzentados e de
consistência aumentada; edema e enfisema são imperceptíveis ou ausentes.
Histologicamente, esses animais mostram hiperplasia epitelial alveolar generali-
zada, característica de uma alveolite difusa, aguda e proliferativa.
Diagnóstico – O diagnóstico é baseado em histórico, sinais e lesões. Uma vez
que a síndrome não é específica com relação à causa, indícios devem ser obtidos
de fatores do manejo, como mudança na pastagem, ou exposição a hortelã perila
ou batata-doce mofada.
Tratamento e profilaxia – Animais afetados severamente têm reservas tão
pequenas que qualquer transporte ou manuseio deve ser feito com cautela para
prevenir mortes imediatas. Nenhuma droga foi comprovadamente efetiva em
experimentos controlados, mas adrenalina, aminofilina e corticosteróides são
amplamente usados. Mesmo animais severamente afetados podem-se recuperar
se retirados de pastagens injuriantes e manejados com tranqüilidade. Após 1
semana, os bovinos podem ser gradualmente reintroduzidos às pastagens.

PNEUMONIA INTERSTICIAL ATÍPICA


(Doença do pulmão do fazendeiro)
É uma condição que parece ser semelhante à doença do pulmão do fazendeiro
em humanos e ocorre em ambas as formas, aguda e crônica, no bovino adulto. As
formas humana e bovina da doença podem coexistir em fazendas devido à
exposição comum ao pó proveniente de feno mofado.
Etiologia – A doença ocorre quando indivíduos sensibilizados inalam antígenos
de actinomicetos termofílicos, comumente os esporos da Micropolyspora faeni. Os
actinomicetos proliferam em grande número no feno, grãos, ou outra matéria vegetal
que tenha sido aquecida a , 65°C após estocagem num estágio úmido (contendo
30 a 40% de umidade). A poeira contém grande número de esporos que são
liberados quando esse feno mofado é agitado. O pequeno tamanho dos esporos
(1µm) permite que eles atinjam as vias aéreas menores e alvéolos e provoquem uma
reação que tem sido denominada como “pneumonite da hipersensibilidade”, a qual
é considerada predominantemente uma reação de hipersensibilidade do Tipo III
(Arthus), embora um componente de hipersensibilidade do Tipo IV seja suspeito (ver
DOENÇAS IMUNOPATOLÓGICAS, pág. 523).
Rebanhos afetados pertencem a áreas onde, normalmente, fortes chuvas
ocorrem por volta da estação de fenação, sugerindo que o problema clínico só possa
surgir após repetidas sensibilizações e agressões pelos esporos. A doença clínica
Doenças Respiratórias dos Bovinos 880

tende a aparecer durante a última metade do período de arraçoamento no inverno


e, usualmente, só quando o feno mofado é dado em estábulos. Em tais circunstân-
cias, os anticorpos séricos (normalmente detectados por imunodifusão) para M.
faeni são espalhados entre o gado adulto, no fim de cada período de alimentação
no inverno, e muitos bovinos aparentemente normais são soropositivos. Ao contrá-
rio, poucos bovinos adultos são soropositivos em outras fazendas onde feno “bom”
é o padrão ou onde silagem de gramíneas é fornecida.
Achados clínicos – Indivíduos podem sucumbir à forma aguda da doença em
um período de semanas. Usualmente, só casos agudos graves são percebidos: há
angústia respiratória, anorexia e agalactia em animais ≥ 5 anos de idade; tosse e
pirexia também ocorrem e ruídos adventícios são, ocasionalmente, ouvidos à
auscultação; a morte é rara.
A doença crônica comumente tem uma morbidade mais alta; em muitos casos
os sinais apresentados são perda de peso, produção baixa e tosse persistente.
Indivíduos afetados mostram-se relativamente alertas e comem razoavelmente
bem, porém taquipnéia, hiperpnéia e tosse estão disseminadas no grupo. A
auscultação pode revelar crepitações ântero-ventrais e, algumas vezes, nos casos
mais graves, estertores disseminados. Intolerância ao exercício pode ser um sinal
presente, e insuficiência cardíaca congestiva pode-se desenvolver se a fibrose
pulmonar se estender por vastas áreas.
Lesões – As lesões macroscópicas são muitas vezes irrelevantes; na maioria
dos casos, há um leve arejamento lobular periférico, com pequenas manchas
subpleurais acinzentadas e difusas. Embora haja indícios de que o edema pulmonar
transitório possa ser uma característica de casos agudos graves, as lesões
histológicas que são consistentemente encontradas são infiltração celular interal-
veolar, granuloma epitelióide e bronquiolite obliterante. Em alguns casos crônicos,
pequenos focos de hiperplasia epitelial alveolar e metaplasia com fibrose intersticial
podem ser encontrados. Essas áreas podem-se estender e incluir boa parte (se não
toda) da substância pulmonar, determinando casos clinicamente indistinguíveis da
alveolite fibrosante difusa (AFD). Evidências circunstanciais sugerem que alguns
casos de AFD são característicos do estágio final da doença pulmonar crônica do
fazendeiro.
Tratamento e controle – Como freqüentemente é impossível proteger comple-
tamente o gado de novas agressões, a maioria dos animais se recupera apenas
parcialmente, após o tratamento com dexametasona (1mg/5 a 10kg de peso
corporal). Entretanto, há comumente uma melhora marcante quando eles retornam
para o pasto na primavera. A prevenção é difícil em áreas onde o feno fica úmido
durante o processo de cura e não é possível alterar o regime de alimentação.

PLEUROPNEUMONIA CONTAGIOSA BOVINA


É uma pneumonia altamente contagiosa, em geral acompanhada de pleurite.
Está presente na África, Península Ibérica e partes da Índia e China; surtos menores
ocorrem no Oriente Médio. Os EUA ficaram livres da doença desde 1892, o Reino
Unido desde 1898 e Austrália desde 1973.
Etiologia – O microrganismo causal é Mycoplasma mycoides mycoides (ver
também PLEUROPNEUMONIA CONTAGIOSA CAPRINA, pág. 913). O bovino suscetível
torna-se infectado por inalação de gotículas expelidas na tosse por animais
infectados. Cabras e ovelhas não são importantes na epidemiologia. A septicemia
produz lesões nos rins e na placenta, que podem ser fontes de infecção. Pode
ocorrer infecção transplacentária. A viabilidade do microrganismo no ambiente é
fugaz. O período de incubação da doença varia, mas a maioria dos casos ocorre 3
a 8 semanas após a exposição. Em algumas localidades, rebanhos suscetíveis
Doenças Respiratórias dos Bovinos 881

mostram até 100% de morbidade, mas taxas menores de infecção (, 10%)


associadas com sinais clínicos são mais comuns. A mortalidade está provavelmente
em , 50%. Os 25% de animais recuperados podem-se tornar portadores com
lesões pulmonares crônicas sob a forma de seqüestros de tamanhos variados. Uma
vez que os portadores não podem ser detectados clínica ou sorologicamente, eles
constituem um sério problema em programas de controle. Suscetibilidade racial,
sistemas de manejo e saúde geral do animal são fatores importantes que influen-
ciam a infecção.
Achados clínicos – Em casos agudos,os sinais incluem temperaturas altas (até
41,5°C), anorexia e respiração dolorosa e difícil. Em climas quentes, o animal muitas
vezes fica isolado na sombra, com a cabeça abaixada e estendida, com o dorso
levemente arqueado e com os cotovelos virados para fora. A percussão do tórax é
dolorosa; a respiração é rápida, pouco profunda e abdominal. Se o animal é forçado
a se movimentar rapidamente, a respiração se torna mais dificultosa e uma tosse
leve e úmida pode aparecer. A doença progride rapidamente, os animais perdem a
condição e a respiração se torna muito laboriosa, com um grunhido na expiração.
O animal deita-se e a morte ocorre após 1 a 3 semanas. O gado afetado cronicamen-
te exibe sinais de intensidade variada por 3 a 4 semanas, após as quais as lesões
gradualmente desaparecem e o animal parece se recuperar. Casos subclínicos
ocorrem e podem ser importantes como portadores.
Lesões – A cavidade torácica pode conter até 10L de um fluido amarelo-claro ou
turvo, misturado com flocos de fibrina, e os órgãos no tórax estão muitas vezes
cobertos por espessos depósitos dessa última. Segmentos variáveis de um ou
ambos os pulmões podem estar envolvidos, a porção afetada se encontra aumentada
e sólida. Ao corte, o aspecto marmóreo típico de pleuropneumonia é evidente
devido ao septo interlobular e ao tecido subpleural ampliados, circunscrevendo
lóbulos pulmonares solidificados de coloração cinza, amarela ou vermelha. Micros-
copicamente, esta é uma pneumonia fibrinosa severa e aguda com pleurite fibrinosa,
trombose dos vasos sangüíneos pulmonares e áreas de necrose do tecido pulmonar;
o tecido intersticial é acentuadamente espessado por líquido de edema que contém
muita fibrina. Nos casos crônicos, a lesão possui um centro necrótico seqüestrado em
uma cápsula fibrosa e espessa e pode haver aderências pleurais fibrosas. Os
microrganismos podem sobreviver neste seqüestro e os animais tornam-se portadores.
Diagnóstico – É baseado nos sinais clínicos, teste de fixação do complemento
e necropsia. A confirmação é obtida pelo exame histopatológico, pela detecção do
microrganismo no fluido pleural usando microscópio de campo escuro, isolamento
do microrganismo do pulmão ou fluido pleural e demonstração de antígenos
específicos no tecido pulmonar usando soro antigalactante hiperimune, imunodifusão
e imunofluorescência. A doença subclínica é detectada pelo uso do teste de fixação
do complemento. Tão rápido quanto se suponha um surto, o abate e a necropsia de
um animal suspeito são recomendáveis.
Controle – A doença é “notificável” por lei em muitos países onde foi erradicada
pelo abate de todos os animais infectados e expostos. Em países onde o gado pode
ter movimentação restringida prontamente, a doença pode ser erradicada por
quarentena, teste sangüíneo e imunização com vacina atenuada (por exemplo,
cepa T1/ 44). Onde o gado não pode ser confinado, a disseminação da infecção
pode ser limitada por vacinação. Rastreando a origem do gado infectado detectada
nos abatedouros, os testes sangüíneos e a imposição de medidas restritivas para
a movimentação do gado também podem contribuir para o controle da doença em
tais áreas.
O tratamento é recomendado apenas nas áreas endêmicas, pois os micror-
ganismos podem não ser eliminados e podem surgir animais portadores. Tilosina
(10mg/kg, IM, duas vezes ao dia, em 6 aplicações) é considerada efetiva.
Doenças Respiratórias dos Bovinos 882

PNEUMONIA ENZOÓTICA EM BEZERROS


É um nome comumente usado para as doenças infecciosas respiratórias de
bezerros mantidos em grupos confinados em abrigos comunitários, em ambientes
fechados ou currais. É primariamente um problema em bezerros < 6 meses, mas
pode ocorrer em bezerros com até 1 ano de idade, e é mais comum em gado leiteiro
do que de corte. A taxa de morbidade pode-se aproximar de 100%; a taxa de
mortalidade é extremamente variável, mas freqüentemente é > 20%.
Etiologia – As causas são as mesmas das doenças respiratórias bovinas em
geral (ver anteriormente): estresse associado à infecção respiratória viral primária,
seguido pela superinfecção bacteriana. O estresse é o resultado de um manejo
deficiente, por exemplo, insuficiência na transferência de imunidade passiva, ven-
tilação inadequada, aumento constante do número de bezerros no grupo, substitutos
lácteos de má qualidade ou espaço inadequado. Qualquer um dos inúmeros vírus
pode estar envolvido. Da mesma forma, uma grande variedade de bactérias pode ser
isolada de bezerros cronicamente afetados. Devem-se fazer testes de suscetibilida-
de antimicrobiana dos isolados para se determinar o tratamento mais efetivo. O
isolamento do vírus através de “swabs” nasais ou lavados transtraqueais é difícil,
assim como a infecção viral aguda pode preceder os sintomas clínicos. As entidades
virais podem ser identificadas sorologicamente com amostras séricas pareadas, a
primeira coletada quando um bezerro entra em um grupo infectado e a segunda após
a doença respiratória clínica. Entretanto, isto pode ser de valor limitado, pois os
bezerros freqüentemente soroconvertem para múltiplos vírus nestas condições.
Achados clínicos – Durante os surtos agudos, a temperatura corporal chega a
39,5 a 41,5oC. Inicialmente, a respiração é rápida e superficial com tosse leve
acompanhada por uma descarga nasal serosa. A doença pode-se resolver lenta-
mente ou tornar-se mais severa, caracterizando-se por tosse áspera, dispnéia
marcante, descarga nasal persistente, anorexia, desidratação e fraqueza. A doença
pode ter início insidioso com sinais clínicos vagos. Os bezerros desenvolvem uma
doença respiratória crônica, tosse esporádica, pelame áspero e ganho insuficiente
de peso, sendo freqüentemente separados como “agentes estéreis” após um ou
mais regimes de tratamento.
Lesões – São bilaterais e confinadas às porções anterior e apical dos lobos
cardíacos dos pulmões. Uma broncopneumonia fibrinopurulenta com aderências
pleurais apresenta lesões típicas, quando a morte ocorre devido à pneumonia por
Pasteurella. As áreas consolidadas são vermelhas e cinzas. A fibrina está presente
na superfície dos pulmões. Numerosos abscessos podem ser encontrados, como
resultado da infecção por Actinobacillus (Corynebacterium) pyogenes.
Tratamento – Embora os antimicrobianos devam ser escolhidos com base em
testes de suscetibilidade, freqüentemente é necessário iniciar o tratamento antes
que os resultados laboratoriais estejam disponíveis. Nestes casos, o medicamento
de escolha é um antibiótico de amplo espectro, que tenha sido efetivo no tratamento
de casos semelhantes na mesma propriedade ou na área. O tratamento deve ser
continuado por ≥ 48h após uma acentuada melhora dos sinais clínicos, com a
temperatura corporal < 39,5oC.
Controle e prevenção – Quando os bezerros são colocados em abrigos comu-
nitários, que contêm animais de várias idades, o controle da pneumonia enzoótica é
extremamente difícil. A severidade da pneumonia pode ser modificada pela melhora
no manejo, abrigos apropriados, ventilação adequada e cuidados com os lactentes.
A prevenção começa com a vacinação das vacas contra vírus respiratórios especí-
ficos e bactérias, 3 a 4 semanas antes do parto para aumentar a qualidade dos
anticorpos colostrais. Os bezerros devem receber 8 a 10% do peso corporal em
colostro, nas primeiras 12h após o nascimento. Bezerros leiteiros recém-nascidos
Doenças Respiratórias dos Bovinos 883

devem ser abrigados individualmente em cocheiras ou estábulos e alimentados com


leite completo ou substitutos lácteos de alta qualidade que contenham < 0,5% de
fibra, até 8 a 12 semanas de idade. Os bezerros devem ser vacinados contra vírus
respiratórios, 3 a 4 semanas antes do primeiro agrupamento. Quando instalados em
grupos, os bezerros devem ter idade semelhante e o número de animais deve ser
≤ 10. À medida que os bezerros crescem, os grupos podem-se tornar maiores
conforme o tamanho do rebanho, facilidades e comando de trabalho disponível. Um
sistema “all-in/all-out” deve ser praticado ao se estabelecer e delimitar um grupo.
Bezerros de corte recém-nascidos e suas mães devem ser removidos das áreas de
parto, assim que eles estiverem se alimentando bem e fortes o suficiente para viajar.

SEPTICEMIA HEMORRÁGICA
É uma pasteurelose aguda que acomete principalmente bovinos e búfalos e
freqüentemente atinge proporções epidêmicas. O único surto verdadeiro nas Amé-
ricas do Norte ocorreu em um bisão no Yellowstone National Park. Não foi confirmada
a ocorrência nas Américas Central e do Sul. A septicemia hemorrágica (SH) é a
principal doença de bovinos e búfalos no sul e leste da Ásia, África e de alguns países
do sul da Europa e do Oriente Médio. Embora possa ocorrer em qualquer época do
ano, as piores epidemias ocorrem durante a estação chuvosa. É mais comum em
búfalos utilizados no cultivo de arroz nos vales e deltas dos rios do sudeste da Ásia.
Acredita-se que os búfalos sejam mais suscetíveis que os bovinos. Existem
relatos de SH em eqüinos, suínos, veados, bisões, camelos, elefantes e iaques. É
provável que bovinos e búfalos selvagens sejam suscetíveis. A administração de
20.000 bactérias por via subcutânea pode levar a óbito um búfalo suscetível. Coelhos
e camundongos de laboratório são altamente suscetíveis à infecção experimental.
Etiologia – SH é causada por 1 dos 2 sorotipos de Pasteurella multocida,
designados B:2 e E:2. O sorotipo E:2 foi isolado apenas na África; o B:2 provoca a
doença em qualquer lugar e tem sido isolado no Egito e Sudão.Pasteurella multocida
é um parasita extracelular e a imunidade é primariamente humoral. SH é essenci-
almente uma endotoxemia.
Aproximadamente 5% dos bovinos ou búfalos podem carrear o sorotipo poten-
cialmente patogênico na nasofaringe. Existe a hipótese de que, sob estresse, os
portadores podem-se tornar doentes e disseminar microrganismos virulentos (via
saliva e descarga nasal), pelo contato direto e indireto, aos animais suscetíveis. Os
surtos podem causar enormes perdas em algumas regiões. As maiores perdas
ocorrem durante as chuvas no sudeste da Ásia, e acredita-se que os microrganis-
mos, que podem sobreviver durante horas e provavelmente dias no solo úmido e na
água, são amplamente transmitidos nesse período.
Achados clínicos – A maioria dos casos são agudos ou hiperagudos, resultando
em morte dentro de 8 a 24h após o início. Devido ao curso clínico curto, os sinais
clínicos podem não ser observados. Os primeiros sinais são apatia, relutância a se
mover, febre, salivação e descarga nasal serosa. O edema freqüentemente é
observado, iniciando-se na garganta e disseminando-se para a região parotídea,
pescoço e peito. As membranas mucosas tornam-se congestas; há dificuldade
respiratória e geralmente o animal vem a óbito dentro de horas. Ocasionalmente isso
demora dias para acontecer. A recuperação é rara. Parece não haver a forma crônica.
Lesões – As alterações mais evidentes nos animais afetados são edema,
hemorragias disseminadas e hiperemia geral. Na maioria dos casos ocorre edema
na cabeça, pescoço e região peitoral. A incisão das áreas edematosas revela um
fluido seroso claro ou cor de palha. O edema também é encontrado na musculatura,
e as hemorragias petequiais na subserosa, as quais são encontradas por todo o
animal, são particularmente características. Um fluido tingido de sangue freqüente-
Doenças Respiratórias dos Bovinos 884

mente é encontrado no saco pericárdico e nas cavidades torácica e abdominal.


Hemorragias petequiais são particularmente evidentes nos linfonodos faríngeo e
cervical. A gastroenterite é observada apenas ocasionalmente e, ao contrário da
pasteurelose pneumônica, a pneumonia geralmente não é extensiva.
Diagnóstico – Os surtos podem ser rapidamente identificados, principalmente
se há história de surto recente e a vacinação estiver inadequada. Casos esporádicos
são mais difíceis de serem diagnosticados clinicamente. A estação do ano, o curso
rápido e a alta incidência no rebanho, com febre e edema, indicam SH típica. À
necropsia, lesões características suportam o diagnóstico clínico. Embora surtos
típicos não sejam difíceis de se reconhecer clinicamente, devem-se considerar
como diagnóstico diferencial: salmonelose aguda, carbúnculo, pasteurelose
pneumônica (outros sorotipos) e peste bovina.
Um diagnóstico presuntivo é baseado no isolamento de P. multocida do sangue
e dos órgãos vitais de um animal com sinais típicos; o diagnóstico definitivo depende
da identificação do sorotipo B:2 ou E:2. Outros sorotipos causam várias infecções
no bovino e no búfalo, mas não a SH típica. O teste de proteção passiva em ratos,
que emprega soro imune de coelho para B:2 e E:2 específicos, é usado na Ásia e
na África para identificar estes sorotipos. Testes mais precisos como hemaglutina-
ção indireta, coaglutinação, contra-imunoeletroforese e imunodifusão estão dispo-
níveis em alguns laboratórios.
Se houver decomposição post mortem , o agente causal pode ser coberto e
obscurecido por bactérias estranhas. Em tais casos , a inoculação subcutânea de
ratos ou coelhos com pequenas quantidades de sangue e de suspensões teciduais
facilita o isolamento das pasteurelas em cultura pura ou quase pura.
A sorologia não possui valor diagnóstico. Entretanto, a hemaglutinação indireta
e o teste de proteção passiva em ratos são de valor na determinação do estado
imune do animal.
Tratamento e controle – Sulfonamidas, tetraciclinas, penicilina e cloranfenicol
(onde seu uso é permitido) são efetivos, se administrados no início. Devido ao curso
rápido da doença e à freqüente dificuldade de acesso aos animais, a terapia anti-
microbiana freqüentemente é impraticável. Embora exista resistência antibiótica
múltipla para algumas cepas de P. multocida, isto não tem sido descrito para os
sorotipos de SH. O principal meio de controle é a vacinação. Três tipos de vacinas
são amplamente usadas: bacterina comum, bacterina precipitada em alumínio e
bacterina com adjuvante oleoso. A bacterina mais efetiva é a com adjuvante oleo-
oso – uma dose fornece proteção por 9 a 12 meses; ela deve ser administrada
anualmente para todos os animais. A bacterina precipitada em alumínio é adminis-
trada a cada 6 meses. Anticorpos maternos interferem na eficácia da vacina em
bezerros. A vacina com adjuvante oleoso não é popular devido à dificuldade de
aspirá-la na seringa e às ocasionais reações teciduais adversas.

RINOTRAQUEÍTE INFECCIOSA EM BOVINOS,


VULVOVAGINITE INFECCIOSA PUSTULAR
E SÍNDROMES ASSOCIADAS
O herpesvírus 1 bovino (HVB-1) pode causar síndromes moderadas a severas em
bovinos de todas as idades e raças. Além disso, pode afetar um número de diferentes
sistemas do corpo e, em razão disto, manifesta-se por si mesmo de diferentes formas,
incluindo doenças respiratórias, abortos, encefalite, doença sistêmica, conjuntivite e
infecções genitais. Em gado confinado, a forma respiratória é a mais comum; em
reprodutores, as maiores perdas podem ocorrer como resultado de abortos ou
infecções genitais. Após a infecção, apesar de o animal se recuperar, o vírus co-
Doenças Respiratórias dos Bovinos 885

mumente se mantém num estado latente que pode ser reativado periodicamente
após transporte, doença concorrente, estresse ou tratamento com corticosteróides.
Animais com infecções latentes geralmente não apresentam sinais clínicos como
resultado da reativação viral, mas eles servem como uma fonte de infecção para
outros animais suscetíveis e, assim, perpetuam a doença no rebanho.
Etiologia e epidemiologia – Apesar de existirem diferenças de cepas dentro
do Grupo HVB-1, há pouca associação com síndromes particulares; todas as formas
da doença podem ser causadas pelo mesmo isolado, sob condições apropriadas. O
vírus pode ser isolado das secreções nasal, ocular e vaginal, e do sêmen e de lavados
prepuciais.
A forma respiratória é mais prevalente em condições de confinamento, nas
quais muitos animais são aglomerados ou transportados. Isso permite rápida
disseminação do vírus, de alguns animais portadores para animais suscetíveis.
Freqüentemente, a infecção viral pura não é ameaçadora à vida do animal, mas a
infecção concorrente por bactérias (mais comumente Pasteurella spp) aumenta a
severidade da doença respiratória com o subseqüente desenvolvimento de pneu-
monia e possivelmente a morte.
As infecções genitais ocorrem em touros (balanopostite infecciosa pustular
[BIP]) e vacas (vulvovaginite infecciosa pustular [VIP]) dentro de 1 a 3 dias após o
acasalamento ou contato íntimo com um animal infectado. A transmissão pode
ocorrer na ausência de lesões visíveis; touros infectados subclinicamente podem
também transmitir a infecção através da inseminação artificial.
Achados clínicos – O período de incubação para as formas respiratória e genital
geralmente é de 2 a 6 dias. Na forma respiratória, o animal pode estar deprimido,
anorético, apresentar febre de 40 a 42oC, uma descarga nasal e narinas altamente
inflamadas (“nariz vermelho”). O exame cuidadoso demonstra inúmeras úlceras ou
pápulas na mucosa nasal. Nesse período, o animal pode exibir dispnéia, respiração
bucal e salivação excessiva. Muitos animais também exibem conjuntivite e, em
casos leves, esta pode ser a única evidência da infecção por HVB-1. Se a infecção
bacteriana concorrente não ocorrer, os animais geralmente se recuperam sem
tratamento 4 a 5 dias após ocorrer o pico da temperatura e sinais respiratórios.
Abortos ocorrem independentemente da severidade ou forma da doença. Eles
podem ocorrer em até 90 dias após a infecção; conseqüentemente, pode ser difícil
relacioná-los com infecção por HVB-1, principalmente se a doença for leve ou
subclínica. Abortos geralmente ocorrem na segunda metade da gestação. Mortali-
dade embrionária precoce e retorno ao cio também podem ocorrer.
Nas infecções genitais de vacas, os primeiros sinais são micção freqüente,
elevação da cauda e uma leve descarga vaginal. A vulva encontra-se edemaciada,
e pequenas pápulas e posteriormente erosões e úlceras estarão presentes na
superfície mucosa. Se infecções bacterianas secundárias não ocorrerem, o animal
recupera-se em 10 a 14 dias. Se ocorrer infecção bacteriana, pode haver inflamação
do útero e infertilidade transitória com descarga vaginal purulenta por várias
semanas. Em touros, ocorrem lesões similares no pênis e prepúcio.
A infecção pelo HVB-1 pode ser severa em bezerros jovens. Pirexia, descargas
ocular e nasal, dispnéia, diarréia, incoordenação e eventualmente convulsões e
morte podem ocorrer num curto período após a infecção viral generalizada. Foi
isolada uma cepa de HVB-1, que pode causar encefalite em adultos e jovens.
Lesões – A extensão das lesões depende do tempo em que o animal é examinado
após a infecção primária e da extensão das complicações bacterianas secundárias.
Nas infecções por rinotraqueíte infecciosa em bovinos (RIB) não complicadas, a
maioria das lesões é restrita ao trato respiratório superior e à traquéia. Hemorragias
petequiais a ecmóticas podem ser encontradas nas membranas mucosas da
cavidade nasal e dos seios paranasais. Áreas focais de necrose se desenvolvem no
nariz, faringe, laringe e traquéia. As lesões podem coalescer e formar placas.
Doenças Respiratórias dos Bovinos 886

Os seios freqüentemente estão preenchidos por um exsudato seroso ou


serofibrinoso. Com o progresso da doença, a faringe torna-se coberta por um
exsudato serofibrinoso e um fluido tingido de sangue pode ser encontrado na
traquéia. Os linfonodos faríngeo e pulmonar podem estar agudamente edemacia-
dos e hemorrágicos. A traqueíte pode-se estender até os brônquios e bronquíolos
e terminar em broncopneumonia. Quando isto ocorre, há necrose do epitélio das
vias aéreas. As lesões virais freqüentemente são camufladas por infecções bacte-
rianas secundárias (ver COMPLEXO DE DOENÇAS R ESPIRATÓRIAS DOS BOVINOS, anterior-
mente). Em animais jovens com infecção generalizada pelo HVB-1, erosões e
úlceras cobertas com debris podem ser encontradas no nariz, esôfago e estômago
anterior; focos brancos podem ser encontrados no fígado, rins, baço e linfonodos.
Em bezerros jovens com encefalite, as meninges estão apenas hiperêmicas. Fetos
abortados podem ter lesões necróticas pálidas, focais em todos os tecidos. Elas são
visíveis principalmente no fígado.
Diagnóstico – O diagnóstico de infecções por HVB-1 sem complicação pode ser
feito através dos sinais característicos e lesões. Entretanto, como a severidade da
doença pode variar, é melhor diferenciar o HVB-1 de outras infecções virais pelo
isolamento do vírus. Amostras devem ser retiradas logo ao início da doença e um
diagnóstico pode ser possível em 2 a 3 dias. Um aumento no título de anticorpos
pode também ser usado para confirmar um diagnóstico, embora uma única amostra,
mesmo se houver um título alto de anticorpos, seja de pequeno valor na confirmação
da doença. Não é possível detectar progressão no título de anticorpos em abortos,
já que a infecção ocorre em um tempo considerável antes do aborto e os títulos de
anticorpos já estão nos níveis máximos. O aborto causado pelo HVB-1 pode ser
diagnosticado pela identificação de lesões características e pela demonstração do
vírus nos tecidos fetais pela IFI e cultura. Lesões macroscópicas e microscópicas de
animais mortos recentemente podem ajudar no diagnóstico.
Tratamento e controle – Imunização com vacinas de vírus modificados vivos ou
mortos geralmente dá proteção adequada, reduzindo a severidade da doença. O
uso de vacinas vivas não é isento de riscos devido à persistência do vírus e ao seu
potencial de reativação. Vacinas vivas modificadas IM e intranasais são disponíveis,
mas o tipo IM pode causar aborto. As vacinas intranasais são mais perfeitamente
atenuadas sendo, portanto, recomendadas para uso nos animais destinados à
reprodução, incluindo vacas gestantes. As vacinas IM são mais fáceis de usar e
muitas vezes são as vacinas de escolha em confinamento. Novilhas em reprodução
e de reposição e touros devem estar imunizados aos 6 a 8 meses de idade, antes
do cruzamento e a cada 1 a 2 anos depois. Alguns recomendam não vacinar touros
jovens pois eles podem ser discriminados quando vendidos para a reprodução se
tiverem títulos séricos. O gado a ser confinado deve ser imunizado 2 a 3 semanas
antes de entrar no confinamento. Antibióticos não têm valor contra a infecção viral,
mas podem reduzir infecções bacterianas secundárias. A erradicação do vírus é
possível através do teste sorológico e separação dos reagentes ou através de um
estrito sistema de rebanho duplo.

SÍNDROME DO EDEMA TRAQUEAL DO GADO


DE ENGORDA
(Síndrome de Honker)

Esta síndrome provoca extenso edema da mucosa-submucosa na membrana


dorsal da traquéia inferior, com diarréia contínua e freqüentemente asfixia obstru-
tiva. A síndrome acomete bovinos confinados nas planícies dos EUA, durante os
últimos dois terços do período de engorda.
Doenças Respiratórias dos Eqüinos 887

A causa é desconhecida. Até esta data nenhum agente infeccioso foi incriminado.
Embora ela ocorra durante o ano todo, é mais comum no verão. Pode haver uma
relação entre poeira do ar, taxa/profundidade da respiração e incidência, mas
raramente mais que 1 ou 2 animais são envolvidos em um determinado dia ou em
um curral. Parece ser um estado subclínico que pode se iniciar devido ao movimento
e ao exercício.
Geralmente, o primeiro sinal é um ruído inspiratório gutural alto, mesmo antes de
qualquer sinal de dispnéia. Com o tempo, e principalmente se o animal se
movimenta, a dificuldade respiratória piora e o animal pode-se tornar agitado ou
hostil. Se as lesões forem profundas na árvore traqueal, um pequeno som é
produzido e os sintomas são facilmente observados. O animal torna-se cianótico e
tipicamente entra em colapso e morre em < 24h.
Mais freqüentemente, as lesões se estendem da região mesocervical para a
entrada torácica, podendo atingir a bifurcação da traquéia. Lesões leves a modera-
das têm sido observadas no momento do abate, em animais aparentemente
normais. Nos casos fatais, a lesão é completamente obstrutiva e freqüentemente
acompanhada por hemorragia.
O diagnóstico diferencial inclui abscessos traqueais, laringite necrótica e outras
causas de espessamento da membrana dorsal da traquéia – as quais geralmente
são menos obstrutivas.
Corticosteróides, se administrados cedo – antes de a temperatura corporal atingir
40oC – e com uma manipulação mínima para não estressar o animal, podem ser
curativos. É importante manter o animal quieto e tranqüilo. Penicilina (22.000u/kg
por peso corporal) tem sido efetiva quando administrada a tempo, mas não deve ser
usada se o abate for realizado dentro de 1 mês. As respostas aos diuréticos têm sido
mínimas, e as antiprostaglandinas ainda não foram bem avaliadas.

DOENÇAS RESPIRATÓRIAS DOS EQÜINOS


INTRODUÇÃO
Vários vírus afetam o trato respiratório dos eqüinos, principalmente os da
influenza, herpes, rino e arterite. A pneumonia por adenovírus tem sido relatada em
associação com imunodeficiência combinada em potros árabes. O significado da
parainfluenza e da reovirose é obscuro. Herpesvírus eqüino doTipo 1 (rinopneumonite)
e influenza estão comumente envolvidos em infecções clínicas; entretanto, a
vacinação freqüente (a cada 2 a 3 meses) de muitos eqüinos contra estes vírus tem
reduzido dramaticamente sua incidência.
Infecções respiratórias virais geralmente produzem pirexia, descarga nasal e
freqüentemente tosse. Infecções bacterianas secundárias, que produzem uma
descarga nasal mucopurulenta e exacerbam a tosse, são comuns. Os eqüinos
afetados normalmente parecem doentes e não se alimentam. Outros sintomas
incluem linfadenite e às vezes há alterações bioquímicas hematológicas ou sangüí-
neas. Embora seja possível a cultura de vírus respiratórios a partir de “swabs”
nasofaríngeos ou do sangue dos cavalos agudamente virêmicos, as infecções virais
geralmente são confirmadas pela sorologia.
Infecções respiratórias virais podem afetar todas as porções das vias aéreas,
incluindo os seios paranasais e as bolsas guturais. Ocasionalmente, podem-se
desenvolver abscedação pulmonar, pneumonia ou pleurite; estas complicações ge-
ralmente estão associadas com o estresse, por exemplo, viagem ou exercício intenso.
Doenças Respiratórias dos Eqüinos 888

Muitas bactérias e fungos podem ser isolados do trato respiratório de eqüinos


normais. Entretanto, eles podem-se tornar patógenos oportunistas em certas situa-
ções, por exemplo, após uma infecção viral. Streptococcus zooepidemicus provavel-
mente é o mais comum, embora Actinobacillus equuli, Bordetella bronchiseptica,
Escherichia coli, Pasteurella spp e Pseudomonas aeruginosa também tenham sido
isolados. O isolamento de S. equi indica infecção por garrotilho(ver adiante). Recen-
temente, a S. pneumoniae foi identificada em cavalos de corrida com bronquiolite.
Streptococcus spp são provavelmente os microrganismos mais comuns isolados
de potros com pneumonia ou abscessos pulmonares. Entretanto, a infecção por
Rhodococcus (Corynebacterium) equi (ver adiante) produz uma pneumonia severa
e pode ser endêmica em alguns haras. Micoplasmas são de significância incerta,
mas foram incriminados em um surto de pleurite.
Os patógenos bacterianos podem ser identificados pela cultura de um “swab”
nasal, mas principalmente de um “swab” nasofaríngeo ou lavado traqueobronquial.
A causa de uma infecção respiratória geralmente é determinada pela associação da
história e de exames clínicos, endoscópicos, radiológicos e, em alguns casos, ultra-
sonográficos. Investigações bioquímicas, hematológicas e sangüíneas também são
úteis na maioria das infecções respiratórias.
As infecções respiratórias podem predispor à bronquiolite irritante/alérgica, se os
eqüinos afetados são expostos à poluição por poeira de estábulo (por exemplo,
esporos fúngicos – ver DPOC [ASMA] adiante).
Vacinas de eficácia variável estão disponíveis para influenza eqüina, rinopneu-
monite viral e garrotilho. Recomendações gerais são impossíveis devido às diferen-
tes normas das diversas agências reguladoras nacionais e ao rápido desenvolvi-
mento de novas vacinas. O custo e o risco de cada vacina devem ser levados em
consideração com as probabilidades de exposição e perdas em valores econômicos
e sentimentais. A força dos argumentos que encorajam a vacinação aumenta com
a probabilidade de exposição.
Na doença respiratória viral aguda, os eqüinos afetados devem repousar em
estábulos livres de poeira. Antibacterianos de amplo espectro (por exemplo,
sulfonamidas potencializadas) podem prevenir infecções bacterianas secundárias.
Se os eqüinos afetados forem exercitados, complicações mais sérias podem se
desenvolver, como por exemplo, pleurite. Medicações antipiréticas podem ser
usadas se a pirexia for severa.
Se os sinais clínicos persistirem, antibacterianos (por exemplo, penicilina,sul-
fonamida potencializada), talvez associados a broncodilatadores, podem ser admi-
nistrados. Devem-se coletar lavados traqueais para realizar a cultura e o teste de
sensibilidade, nos casos não responsivos ou em alguns indivíduos selecionados,
depois de ter ocorrido um surto respiratório no haras. Lavados transtraqueais não
devem ser realizados em animais sob tratamento. A análise bioquímica do sangue
pode indicar um problema inflamatório severo, como uma broncopneumonia,
abscedação pulmonar ou pleurite. Radiografias do tórax podem ajudar a confirmar
o diagnóstico e monitorar o progresso do tratamento seguido. A ultra-sonografia tam-
bém pode ser útil. Em eqüinos com efusão pleural, devem-se realizar a toracocentese
e a drenagem pleural de ambos os lados do tórax. É de grande importância que os
animais com doenças severas do trato respiratório inferior, como pneumonia,
abscedação pulmonar ou pleurite, repousem em um estábulo livre de poeira.

DOENÇA PULMONAR O BSTRUTIVA CRÔNICA


(DPOC, Asma, Enfisema alveolar crônico)
É uma doença respiratória crônica, não infecciosa, que acomete Equidae e
caracteriza-se por dispnéia, tosse crônica, descarga nasal e perda de resistência.
Doenças Respiratórias dos Eqüinos 889

Etiologia – Embora existam discussões a respeito da causa primária, a causa


mais comumente reconhecida é a exposição a poeira, mofos ou outros poluentes
aéreos. Entretanto, fatores desencadeantes podem incluir infecções do trato respi-
ratório ou predisposição hereditária. A doença é rara em eqüinos < 6 anos de idade.
Achados clínicos e lesões – A doença geralmente é insidiosa no início e tem
natureza progressiva. Muitos eqüinos podem ser levemente afetados ou afetados
apenas durante certas estações do ano. Entretanto, episódios “asmáticos” agudos
não são raros. Na maioria dos casos, ocorre dispnéia quando o cavalo é estabulado,
principalmente quando é exposto a ambientes empoeirados. Os sintomas podem ser
agravados com exercício e alimentação com certas forragens, principalmente feno
empoeirado ou mofado. A expiração é laboriosa. A contração da musculatura
abdominal por um longo período pode resultar em hipertrofia muscular e formação
de um sulco (“linha da asma eqüina”) ao longo do arco costal. Nos casos avançados,
as narinas estão brilhantes e o ânus pode estar protraído se a dispnéia for severa.
Geralmente há tosse persistente e ocasionalmente paroxística. Esta tosse pode ser
produtiva e freqüentemente ocorre durante alimentação ou exercício. Uma descarga
nasal é comum. Ruídos ao final da expiração são ouvidos na auscultação torácica nos
casos severos; estes sons são ouvidos apenas após o uso de um saco de respiração.
Eqüinos estabulados com camas de palha e alimentados com feno empoeirado
freqüentemente têm bronquiolite subclínica. Nesses casos, a endoscopia traqueal
revela um exsudato mucopurulento. Entretanto, muitos eqüinos com tosse crônica e
descarga nasal não apresentam ruídos pulmonares adventícios à auscultação
torácica.
A lesão mais evidente é uma bronquiolite generalizada, mas nos casos severos
crônicos pode haver enfisema com alterações estruturais permanentes nas paredes
alveolares e tecidos intersticiais.
Diagnóstico – A diferenciação de outras causas de tosse crônica ou descarga
nasal (por exemplo, bronquiolite parasitária) é baseada na história e em outros
procedimentos diagnósticos como endoscopia, avaliação do exsudato traqueobron-
quial e radiografias torácicas. Na forma mais sutil, o único sinal clínico pode ser uma
hiperpnéia ao descanso.
Tratamento – A maioria dos eqüinos melhora dramaticamente se o ambiente
respiratório for melhorado, por exemplo, se o animal for mantido em local aberto ou
toda a palha e o feno forem removidos do estábulo. O estábulo livre de poeira
envolve o uso de papel ou ripas de madeira para a cama e cubos de alimentação
completos, grama embalada a vácuo ou até feno completamente úmido. Ocasional-
mente, os eqüinos afetados podem apresentar sinais clínicos, provavelmente
devido à exposição a pólens de gramíneas ou árvores.
A percepção do proprietário para descobrir o fator desencadeante é essencial
para o sucesso do manejo. O uso adequado de drogas mucolíticas e broncodilata-
doras pode acelerar a recuperação. Corticosteróides também podem ser úteis nos
casos pouco responsivos. No pequeno percentual de animais que só melhoram
lentamente, alterações pulmonares crônicas são provavelmente irreversíveis. Os
eqüinos afetados devem ser mantidos em ambientes livres de poeira pelo resto de
suas vidas.

INFECÇÃO PELO HERPESVÍRUS EQÜINO TIPO 1


(Rinopneumonite viral eqüina, Vírus do aborto eqüino)
Etiologia e epidemiologia – O herpesvírus eqüino do Tipo 1 (HVE-1)
compreende 2 grupos de vírus distintos genética e antigenicamente, agora
comumente referidos como Subtipos 1 e 2 de HVE-1 mas até recentemente
considerados herpesvírus diferentes, designados por HVE-1 e HVE-4. O HVE-1
Doenças Respiratórias dos Eqüinos 890

está presente em populações eqüinas por todo o mundo. Ambos os subtipos


produzem primariamente doença respiratória febril aguda, caracterizada por
rinofaringite e traqueobronquite. Surtos de doença respiratória ocorrem anual-
mente em potros nas áreas com concentrada população eqüina; fora isso, os
episódios são esporádicos. A maioria desses surtos em recém-desmamados é
causada pelas cepas do Subtipo 2. A idade, estação do ano e distribuição
geográfica variam, sendo provavelmente determinadas pelo estado imunólogico
e pela concentração de animais. Nos indivíduos, o efeito da exposição é
determinado pela cepa viral envolvida, estado imunológico estado de prenhez e
possivelmente a idade. A infecção de éguas prenhes com as cepas do Subtipo 2
raramente resulta em aborto.
As éguas podem abortar várias semanas a meses após a doença clínica ou, na
maioria dos casos, depois da infecção subclínica com cepas do Subtipo 1 do HVE-1.
Uma seqüela clínica rara da infecção pelo HVE-1, a qual é causada apenas por
determinadas cepas do Subtipo 1, é o desenvolvimento de doença neurológica. O
reservatório natural do HVE-1 é o cavalo; existem evidências progressivas de
portadores latentes de ambos os subtipos do vírus . A transmissão ocorre pelo
contato direto ou indireto com descargas nasais infectadas, fetos abortados,
placentas e fluidos placentários. A análise de restrição enzimática do HVE-1 tem
confirmado a presença de múltiplas cepas geneticamente distintas dentro de ambos
os subtipos do vírus; estas cepas ou eletroferótipos co-circulam e podem ser a causa
de surtos de doenças respiratórias, abortos e, em alguns casos, doenças neuroló-
gicas associadas.
Achados clínicos – Após um período de incubação de 2 a 10 dias, os eqüinos
suscetíveis podem desenvolver qualquer um dos seguintes sintomas: febre de 39
a 42oC que persiste por 1 a 7 dias, neutropenia e linfopenia com descarga serosa
e congestão da mucosa nasal e conjuntiva, indisposição, faringite, tosse, inapetência
e às vezes edema dos linfonodos mandibular e/ou retrofaríngeos, ou constipação
seguida por diarréia. Eqüinos infectados com cepas do Subtipo 1 freqüentemente
desenvolvem uma febre bifásica com a viremia coincidindo com o segundo pico de
temperatura. Infecções bacterianas secundárias são comuns, com conseqüentes
exsudação nasal mucopurulenta e tosse. A infecção é leve ou inaparente em
eqüinos previamente expostos e imunologicamente sensibilizados ao vírus.
Éguas que abortam após a infecção pelo HVE-1 raramente exibem qualquer sinal
premonitório. Os abortos ocorrem 2 a 12 semanas após a infecção, geralmente entre
o sétimo e 11º meses de gestação. Os fetos abortados apresentam-se normais ou
minimamente autolisados e a placenta é expelida pouco tempo depois do aborto.
Não há evidências de danos ao trato reprodutivo da égua e a concepção subseqüen-
te não é prejudicada.
Éguas expostas ao vírus no final da gestação podem não abortar, mas os potros
nascem com uma pneumonite viral fulminante; estes animais são muito suscetíveis
a infecções bacterianas secundárias e geralmente morrem dentro de horas ou dias.
Infreqüentemente, o HVE-1 tem sido associado ao desenvolvimento de lesões
herpéticas na genitália externa de éguas.
Alguns animais em certos surtos de infecção pelo HVE-1 desenvolvem doenças
neurológicas com severidade clínica variada (ver também pág. 717). Dependendo
da localização e da extensão das lesões, os sinais variam de uma incoordenação
leve e paresia posterior a paralisia posterior severa com decúbito, perda da função
da cauda e da bexiga, perda da sensibilidade da pele no períneo e áreas inguinais
e ainda dos membros pélvicos. Em casos excepcionais, a paralisia pode ser
progressiva e culminar em tetraplegia e morte. O prognóstico depende da severida-
de dos sintomas e do período de decúbito. Embora a doença neurológica associada
ao HVE-1 seja vista mais freqüentemente em éguas logo após o aborto, ela também
Doenças Respiratórias dos Eqüinos 891

pode ocorrer em éguas estéreis, garanhões, cavalos castrados e em potros, após


um surto de infecção respiratória pelo HVE-1. Mieloencefalite com recuperação do
vírus tem sido relatada em certos casos. Não está estabelecido se a neurite da cauda
eqüina é uma seqüela da infecção pelo HVE-1.
Lesões – Há diferenças significantes nos mecanismos patogenéticos entre os 2
subtipos de HVE-1: as infecções pelo Subtipo 2 são restritas ao epitélio do trato
respiratório e linfonodos associados; cepas do Subtipo 1 também possuem uma
predileção pelo endotélio vascular, principalmente na mucosa nasal, pulmões,
adrenal, tireóide e SNC. De significado adicional é a viremia associada a leucócitos
que ocorre em infecções pelo Subtipo 1, a qual pode resultar em aborto ou em
doença neurológica.
As lesões macroscópicas de uma rinopneumonite viral incluem hiperemia e
ulceração ou necrose do epitélio respiratório e múltiplos focos pequenos e com cor
de ameixa nos pulmões. Histologicamente, há evidências de inflamação, necrose e
inclusões intranucleares no epitélio do trato respiratório e nos centros germinais dos
linfonodos associados. Lesões pulmonares caracterizam-se por infiltração neutrofílica
dos bronquíolos terminais, infiltração por células mononucleares perivasculares e
peribronquiolares e exsudato serofibrinoso nos alvéolos.
Lesões típicas nos fetos abortados incluem edema pulmonar interlobular com
fluido em abundância na cavidade torácica; áreas multifocais de necrose do fígado;
petéquias no miocárdio, adrenal e sob a cápsula esplênica; hiperplasia linfóide do
baço; e necrose tímica. Inclusões intranucleares são encontradas no pulmão,
fígado, adrenal e tecidos linforreticulares.
Eqüinos com HVE-1 associado com doença neurológica podem não apresentar
lesões macroscópicas ou ter apenas mínima evidência de hemorragia nas menin-
ges, cérebro e parênquima da medula espinhal. Histologicamente as lesões são
discretas e compreendem vasculite com lesão celular endotelial e “cuff” perivascular,
formação de trombos e hemorragias, e, nos casos avançados, áreas de malacia. As
lesões podem aparecer em qualquer nível do cérebro ou medula espinhal.
Diagnóstico – A rinopneumonite viral eqüina não pode ser diferenciada da
influenza eqüina (ver adiante), arterite viral eqüina (ver pág. 454) ou outras infecções
respiratórias eqüinas somente com base nos sinais clínicos.Ela pode ser confirmada
pelo isolamento do vírus, preferencialmente por meio de “swabs” nasofaríngeos e
amostras sangüíneas citratadas colhidas logo no início do curso da infecção e por
testes sorológicos das fases aguda e convalescente.
Nos casos de suspeita de aborto por HVE-1, o diagnóstico é baseado nas lesões
características macro e microscópicas nos fetos abortados, isolamento viral
e demonstração de antígenos virais nos tecidos fetais. Pulmão, fígado, adrenal e
tecidos linforreticulares são fontes produtoras de vírus. Testes sorológicos de éguas
que abortaram têm pouco valor diagnóstico (ver também aborto em eqüinos,
pág. 1386).
Apesar de cepas do vírus do Subtipo 1 terem sido isoladas de certos casos de
HVE-1 associado a doenças neurológicas e anticorpos neutralizantes homólogos na
ocasião terem sido encontrados no LCE dos animais afetados, isto é raro e o
diagnóstico depende da demonstração das lesões vasculares características nas
secções de tecidos do SNC.
Tratamento – Não há tratamento específico. É indicado o repouso durante a fase
febril aguda e vários dias após a doença respiratória causada por HVE-1, para
minimizar as complicações bacterianas secundárias. Antipiréticos são recomenda-
dos para eqüinos com uma febre ≥ 40,5oC. A antibioticoterapia deve ser instituída
ao primeiro sinal de descarga nasal purulenta ou envolvimento pulmonar. A maioria
dos potros infectados pré-natalmente com o HVE-1 morre pouco tempo após o
nascimento, apesar dos cuidados intensivos e da medicação antimicrobiana. Se
Doenças Respiratórias dos Eqüinos 892

animais com HVE-1 associado a doenças neurológicas não estão em decúbito ou


estão por apenas 2 a 3 dias, o prognóstico geralmente é favorável. Cuidados
intensivos são necessários para evitar congestão pulmonar, pneumonia, ruptura da
bexiga ou atonia intestinal. A recuperação pode ser completa, mas uma pequena
porcentagem de animais mantém seqüelas neurológicas.
Controle – A imunidade após a infecção natural com qualquer dos dois subtipos
do HVE-1 parece envolver uma combinação dos fatores imunológicos celular e
humoral. Embora ocorra uma pequena imunidade cruzada entre os 2 subtipos
depois de uma infecção primária do trato respiratório de potros imunologicamente
ingênuos, uma significante proteção cruzada se desenvolve em cavalos após
repetidas infecções com um subtipo de vírus particular. A imunidade à reinfecção do
trato respiratório pode persistir por até 3 meses, mas múltiplas infecções resultam
em um nível de imunidade que previne os sinais clínicos de doenças respiratórias.
A imunidade à infecção que causa o aborto parece estar relacionada com o nível de
resistência do anel linfático faríngeo. Uma diminuição na resistência pode levar ao
desenvolvimento de viremia associada a leucócitos, a qual pode resultar em
infecção transplacentária do feto.
Práticas de manejo recomendadas para a prevenção e controle das doenças
relacionadas ao HVE-1 são: 1. evitar introduzir o vírus em um grupo de eqüinos
suscetíveis, através de uma fonte exógena. Eqüinos que chegam na fazenda,
oriundos de outras fazendas ou leilões ou que retornam de corridas, devem ser
isolados por 3 a 4 semanas antes de serem misturados com os eqüinos residentes,
principalmente com as éguas prenhes; 2. reduzir os manejos que resultem em
estresse dos animais, devido à possibilidade de o estresse induzir a reativação de
HVE-1 latente em animais portadores; 3. separar os eqüinos em pequenos grupos
por raça ou estilo de corrida. Isto é especialmente importante com relação às éguas
prenhes, as quais, se possível, devem ser mantidas em um grupo afastado dos
animais desmamados, animais com um ano de idade e animais fora de treinamento.
Num surto de doença respiratória ou aborto os animais afetados devem ser isolados,
devem ser tomadas as medidas sanitárias apropriadas e nenhum cavalo deve deixar
a propriedade antes de 3 semanas após a recuperação do último caso clínico. Em
pequenas fazendas onde o contato íntimo entre os animais já tenha ocorrido, o
isolamento dos animais afetados pode ser considerado sem propósito.
A administração parenteral de vacinas com vírus vivo modificado é licenciada em
alguns países e banida em outros. Uma vacina inativada é o único produto
atualmente recomendado pelo fabricante como um auxílio na prevenção do aborto
pelo HVE-1. Ela deve ser administrada durante o quinto, sétimo e nono meses de
gestação. A imunidade produzida pelas vacinas disponíveis persiste por apenas 2
a 4 meses. Para maximizar esta efetividade contra a doença respiratória, a
vacinação deve-se iniciar em potros com 3 a 4 meses de idade e, dependendo da
vacina utilizada, deve-se dar uma segunda dose 4 a 8 semanas mais tarde.
Vacinações de reforço podem ser administradas a cada 2 a 3 meses até a
maturidade. Programas de vacinação contra o HVE-1 não devem ser limitados às
éguas prenhes, mas devem incluir todos os cavalos da propriedade. Estes progra-
mas não devem gerar uma falsa sensação de segurança; a vacinação contra esta
infecção não substitui as práticas de manejo adequadas.

Infecção por outros herpesvírus


O herpesvírus eqüino do Tipo 2 (HVE-2) é onipresente na mucosa respiratória,
conjuntivas e nos leucócitos de eqüinos normais, assim como aqueles afetados por
várias doenças. Está presente em eqüinos de todas as idades. Seu significado
patogênico permanece obscuro. Tem sido sugerido que o HVE-2 seja a causa da
ceratoconjuntivite herpética. O herpesvírus eqüino do Tipo 3 (HVE-3) é a causa do
Doenças Respiratórias dos Eqüinos 893

exantema coital eqüino (ver pág. 828), uma doença benigna e exantematosa
progenital.

INFLUENZA EQÜINA
Trata-se de uma doença respiratória aguda, altamente contagiosa e febril.
Etiologia e epidemiologia – Dois vírus de influenza imunologicamente diferen-
tes têm sido encontrados em populações eqüinas de todo o mundo exceto na
Austrália e Nova Zelândia. O ortomixovírus A/Equi-1, embora provavelmente
presente por décadas, não tem sido isolado desde 1980; o ortomixovírus A/Equi-2
foi reconhecido primeiro em 1963 como causa de epidemias disseminadas, depois
disso, o vírus se tornou endêmico em muitos países. A endemicidade é mantida por
casos clínicos esporádicos e por uma infecção leve ou inaparente nos eqüinos
suscetíveis que são constantemente introduzidos na população ao nascimento, pela
diminuição da imunidade ou pelo movimento de outras áreas ou países. Não se sabe
se existe um estado de portador. A conseqüência clínica após uma exposição viral
depende muito da condição imunológica; em animais suscetíveis ela pode variar de
uma infecção leve e inaparente a uma doença severa que raramente é fatal, exceto
em cavalos jovens, velhos ou de outro modo debilitados e em burros. A transmissão
ocorre pela via respiratória através do contato com secreções respiratórias infectan-
tes. A epidemia se instala quando um ou mais eqüinos agudamente infectados são
introduzidos em um grupo suscetível reunidos para show, leilão, treinamento ou
corrida. O resultado epidemiológico depende das características antigênicas do
vírus circulante e do estado imune de uma determinada população eqüina no
momento da exposição ao vírus e possivelmente da infecção por este. Exposições
naturais freqüentes ou vacinações regulares podem ter contribuído para o grau de
flutuação antigênica que tem ocorrido com certas cepas de A/Equi-2 em algumas
partes do mundo. Novos mutantes do vírus devem-se desenvolver com antigenicidade
que difere significantemente das cepas em circulação, então podem-se esperar
surtos de disseminação da doença.
Achados clínicos e lesões – O período de incubação geralmente é de 1 a 3 dias,
mas pode ser de 18h a 5 dias ou, raramente, 7 dias. O início é abrupto com febre de
42oC, geralmente durando < 3 dias nas infecções não complicadas. A tosse
geralmente seca, áspera e improdutiva é um achado significante; é observada no
início do curso da doença e pode persistir por várias semanas, principalmente se
sobrevier infecção bacteriana. A descarga nasal, embora inicialmente serosa e em
pequena quantidade, torna-se geralmente profusa e mucopurulenta posteriormente
na presença de uma infecção estreptocócica sobreposta. Depressão, anorexia e
fraqueza são freqüentes. Descarga lacrimal, aumento de volume dos linfonodos da
cabeça, edema dos membros, rigidez, laminite, dispnéia expiratória e pneumonia às
vezes estão presentes. Eqüinos medianamente afetados recuperam-se inevitavel-
mente em 2 a 3 semanas; os animais severamente afetados podem convalescer por
até 6 meses. A recuperação da tosse e das seqüelas incapacitantes da doença é
acelerada pela completa restrição de atividades físicas árduas.
O risco de complicações causadas por infecções bacterianas secundárias, como
por exemplo, pneumonia, pleurite, bronquite crônica, doença pulmonar obstrutiva
crônica (asma), é minimizado pela restrição ao exercício, controle de poeira, boa
ventilação e boas condições de higiene.
Geralmente não são observadas lesões, mas pneumonia intersticial, pleurite,
bronquite, peribronquite, perivasculite e miocardite intersticial podem ser observa-
das nos casos fatais.
Diagnóstico – A assistência laboratorial geralmente é necessária para diferen-
ciar influenza de rinopneumonite eqüina viral, arterite eqüina viral e outras infecções
Doenças Respiratórias dos Eqüinos 894

respiratórias. Entretanto, a ocorrência de uma infecção respiratória de rápida


disseminação em um grupo de eqüinos (caracterizada por aparecimento súbito,
febre alta, depressão, fraqueza e tosse disseminada) geralmente é suficiente para
fazer um diagnóstico presuntivo de influenza eqüina. A confirmação é baseada no
isolamento viral e/ou sorologia das fases aguda e convalescente. “Swabs”
nasofaríngeos são o material de escolha para tentar isolar o vírus; eles devem ser
feitos o mais rápido possível após o início da doença.
Tratamento e controle – Eqüinos que não apresentam complicações requerem
apenas o descanso e cuidados adequados. Antipiréticos são recomendados para
eqüinos com uma febre ≥ 40,5oC. Antibióticos são indicados quando a febre persistir
por mais de 3 a 4 dias, ou quando houver descarga nasal purulenta ou envolvimento
pulmonar. O repouso deve ser total e por um tempo suficiente após o fim dos sinais
clínicos, para evitar lesões miocárdicas e pulmonares a longo prazo.
Para controlar a doença, devem-se realizar boas práticas de manejo e adminis-
trar uma vacina com adjuvante inativado que contenha os vírus A/Equi-1 e A/Equi-
2. A probabilidade de exposição à infecção pode ser reduzida pelo isolamento de
qualquer eqüino recentemente introduzido no estábulo ou em outros grupos de
eqüinos e minimizando o contato com outros cavalos. As autoridades em corrida e
outras autoridades em eqüinos requerem que os cavalos recebam 2 vacinações,
com intervalo não < 3 semanas ou > 3 meses, seguidas de um reforço inicial 6 meses
depois e em seguida anualmente. Em vista da duração limitada da proteção
fornecida pelas vacinas comuns, devem-se administrar injeções de reforços mais
freqüentemente, por exemplo, a cada 3 a 6 meses. As vacinas disponíveis devem
ser monitoradas continuamente com relação à cepa viral, com a finalidade de refletir
o mais próximo possível a antigenicidade da cepa viral do campo.

HEMORRAGIA PULMONAR I NDUZIDA PELO EXERCÍCIO


(HPIE, Epistaxe, “Sangrador”)
É a presença de sangue nas vias aéreas traqueobronquiais durante ou após o
exercício. Acredita-se que a hemorragia ocorra a partir da circulação arterial
bronquial. Os pulmões apresentam extensa bronquiolite na região dorsal do lobo
caudal com concomitante neovascularização arterial bronquial, fibrose intersticial e
seqüestro de macrófagos que contêm hemossiderina (hemossiderófagos).
Etiologia – Embora vários mecanismos tenham sido propostos, a causa defini-
tiva ainda não é conhecida. Uma teoria é que uma pequena doença das vias aéreas,
provavelmente como conseqüência de material particulado inalado e de doenças
respiratórias prévias, predispõe as regiões pulmonares a mecanismos anormais de
estresse, principalmente durante trabalho severo. Acredita-se que este estresse
anormal ocorra devido ao pulmão eqüino possuir pouca ventilação colateral e em
virtude de os segmentos pulmonares lesados não inflarem uniformemente. Estres-
ses de tosa na superfície de contato entre os segmentos pulmonares lentos e
normalmente expandidos resultam na ruptura do tecido pulmonar com hemorragia
subseqüente. Neovascularização arteriobronquial dos segmentos lesados ocorre
como parte de uma resposta de reparação, e acredita-se que o sangramento
subseqüente provavelmente ocorra a partir desses vasos. É provável que este
processo ocorra quando o cavalo é exercitado arduamente.
Não há diferenças geográficas aparentes na prevalência da HPIE e , 30% das
raças padrão e > 75% dos puros-sangues de corrida, quartos-de-milha e appaloosas
apresentam evidências de HPIE após exercício árduo. Também tem sido relatada
em cavalos utilizados para salto, corrida com barreiras e pólo, mas não ocorre
freqüentemente em cavalos utilizados em corrida de enduro. Embora a HPIE tenha
sido reconhecida após o trote, ela está associada mais comumente com corridas
Doenças Respiratórias dos Eqüinos 895

>14m/s ou com curtos períodos de exercício árduo. A ausência de HPIE em cavalos


sob exercício leve prolongado e a sua ocorrência em cavalos sob exercício vigoroso
sustentam a teoria de que a hemorragia é uma conseqüência de uma pressão maior
aplicada à circulação vascular pulmonar.
Diagnóstico – A observação, por meio de endoscopia, da presença de sangue
nas vias aéreas após o exercício fornece evidências definitivas de HPIE. Outras
fontes de hemorragia do trato respiratório superior, principalmente micose das
bolsas guturais (ver adiante) e hematoma etmoidal, devem ser excluídas durante a
endoscopia, a qual geralmente é recomendada 60 a 90min após o exercício. Caso
se suspeite de HPIE e o cavalo não puder ser examinado após o exercício, o exame
citológico do aspirado traqueobronquial para a observação de hemossiderófagos é
considerado diagnóstico. A utilização de corantes contendo ferro ressaltado facilita
o reconhecimento dessas células. Não têm sido observadas anormalidades no
hemograma ou na hemostasia.
Tratamento e controle – O tratamento de eqüinos com hemorragia pulmonar
severa geralmente é inefetivo, embora os animais com hemorragia leve possam não
necessitar de tratamento. Os esforços devem ser direcionados para o tratamento
sintomático de qualquer doença respiratória reconhecida, para um aumento na
ventilação do estábulo, treinamento apropriado e uma convalescença adequada
após infecção respiratória bacteriana ou viral. A droga mais utilizada na tentativa de
controle é a furosemida. Outras medicações utilizadas na prevenção incluem
estrôgenios conjugados e vitaminas K e C. Medicações orais que têm sido utilizadas
(também com resultados variáveis) incluem o produto bioflavinóide hesperidan,
assim como as vitaminas orais C e K.

DOENÇAS DAS BOLSAS GUTURAIS


Empiema
É um acúmulo de pus que pode se desenvolver secundariamente às infecções
do trato respiratório superior nos eqüinos, especialmente aquelas causadas por
estreptococos, ou como uma complicação de outras doenças das bolsas guturais.
A infecção bacteriana em uma ou ambas as bolsas produz uma descarga nasal
intermitente, tumefação dolorosa da região parotídea e, em casos graves, cabeça
rígida e respiração estertorosa. A temperatura corporal é elevada; depressão e
anorexia ocorrem em muitos casos. O diagnóstico pode ser feito através da
endoscopia da faringe e bolsa gutural afetada, e radiografias podem demonstrar
obliteração parcial da bolsa gutural normal contornada por líquido acumulado.
O tratamento apenas com antibióticos freqüentemente não tem êxito, entretanto,
um período de terapia com penicilina associada a lavagens diárias das bolsas
guturais com uma solução não irritante é eficaz na maioria dos casos. Casos
refratários requerem drenagem cirúrgica, e a cirurgia é o tratamento de escolha nos
raros casos em que o material purulento se torna espessado e forma “condróides”.
O timpanismo congênito das bolsas guturais pode desenvolver empiema. A cirurgia
é o único tratamento.

Micose das bolsas guturais


É uma invasão fúngica localizada ou difusa no teto da bolsa gutural, usualmente
por Aspergillus spp (ver também pág. 412). Outros microrganismos fúngicos e
bactérias podem também ser isolados; entretanto, a verdadeira etiologia dessa
condição e o papel dos fungos permanecem desconhecidos. Uma variedade de
sinais clínicos surge em decorrência de danos aos nervos craniais e às artérias
contidas no revestimento mucoso da bolsa gutural. O sinal mais comum é a epistaxe,
Doenças Respiratórias dos Eqüinos 896

causada pela erosão fúngica tanto nas paredes da artéria carótida interna como nos
ramos da artéria carótida externa. A hemorragia é usualmente espontânea e grave,
e repetidos ataques podem preceder um episódio fatal. Disfagia, síndrome de
Horner, hemiplegia laríngea e deslocamento dorsal do palato mole podem-se
desenvolver em resposta ao dano causado pelo fungo aos nervos craniais e
simpáticos da bolsa gutural afetada. O prognóstico para recuperação de eqüinos
que tenham desenvolvido disfagia decorrente dessa doença é ruim. O diagnóstico
pode ser feito por endoscopia . Soluções contendo um agente antifúngico devem ser
aplicadas diretamente nos tecidos afetados por infusão através do tubo de biópsia
de um endoscópio. A remoção cirúrgica da lesão é eficaz, mas não é recomendada
a menos que as artérias atingidas estejam obstruídas. A hemorragia pode ser
prevenida pela obliteração das artérias afetadas ao longo do seu curso através da
bolsa gutural, por meio de cateteres com ponta de balão. A administração de
agentes antifúngicos por VO e pelas rotas sistêmicas geralmente não é recomen-
dada devido aos gastos e aos potenciais efeitos tóxicos dessas drogas.

Timpanismo das bolsas guturais


O timpanismo desenvolve-se mais em potrancas do que em potros logo após o
nascimento, mas também pode ser evidente em cavalos com até 1 ano de idade. A
bolsa afetada torna-se distendida com ar e forma uma tumefação característica não
dolorosa e elástica na região da parótida. A respiração pode tornar-se estertorosa
em casos graves; no entanto, a maioria dos potros afetados tem aparência normal
. A causa é desconhecida, embora um defeito no orifício faríngeo da trompa de
Eustáquio possa permitir a entrada de ar na bolsa gutural afetada, mas prejudicar
seu retorno para a faringe. O diagnóstico é comumente baseado nos sinais clínicos
e na idade do animal afetado. Casos graves podem desenvolver um empiema
secundário, o que pode complicar as manifestações clínicas. A condição é usual-
mente unilateral, mas casos bilaterais têm sido relatados. O tratamento de escolha
é a fenestração da membrana que separa a bolsa gutural afetada da normal. Esse
procedimento promove uma via para que o ar da bolsa gutural anormal passe para
o lado normal e seja expelido na faringe. O prognóstico após a correção cirúrgica é
bom.

HEMIPLEGIA LARÍNGEA
(Ronco, Neuropatia laríngea recidivante)
É uma paresia ou paralisia permanente da cartilagem aritenóide esquerda e da
prega vocal, que se manifesta clinicamente por intolerância ao exercício e ruído
respiratório anormal, primariamente um estridor inspiratório (assovio ou ronco)
durante o exercício. Envolvimento do lado direito e bilateral (paraplegia laríngea) é
raro.
Etiologia e patogenia – É uma axonopatia distal, geralmente congênita (e
provavelmente hereditária), que afeta os nervos laríngeos recorrentes e possivel-
mente os nervos peroneais e fibras longas do SNC. A causa da degeneração axonal
é desconhecida. A perda progressiva das grandes fibras mielinizadas na porção
distal dos nervos laríngeos recorrentes resulta em atrofia neurogênica dos múscu-
los laríngeos intrínsecos, exceto o músculo cricotireóideo, que é inervado pelo nervo
laríngeo cranial. Inicialmente, os músculos adutores, principalmente o músculo
cricoaritenóide lateral, são afetados e os sinais clínicos tornam-se evidentes com o
envolvimento do adutor principal, o músculo cricoaritenóide dorsal. O nervo recor-
rente esquerdo parece ser envolvido mais comumente devido ao seu comprimento
maior, e ao envolvimento inicial do músculo cricoaritenóide lateral devido à distribui-
ção das fibras maiores deste músculo. Causas menos comuns incluem trauma
Doenças Respiratórias dos Eqüinos 897

direto no vago ou no nervo laríngeo recorrente, injeção perivascular acidental de


substâncias irritantes e intoxicações por plantas (Cicer arietinum [broto de ervilha]
e Lathyrus spp) e química (chumbo, organofosfatos).
Embora todas as raças possam ser afetadas, parece haver uma maior prevalên-
cia em raças maiores, e em eqüinos machos e maiores dentro da mesma raça. A
estimativa de prevalência em puros-sangues é de 2 a 95%, dependendo do critério
diagnóstico.
A perda do controle neuromuscular do músculo abdutor resulta em colapso da
cartilagem aritenóide associada e da prega vocal, que reduz a área de cruzamento
da glote. A impedância aumentada para fluir necessita de um esforço maior por parte
dos músculos acessórios da respiração para manter o fluxo de ar necessário para
as trocas gasosas. Devido à natureza flexível da glote, as exageradas forças de
colapso resultam no futuro colapso da cartilagem aritenóide e aumento da impedân-
cia para o fluxo aéreo. Durante um exercício árduo, o lado afetado colapsa
completamente a ponto de a cartilagem aritenóide esquerda ser puxada para a linha
média até que ela toque efetivamente a cartilagem aritenóide normal abduzida,
ocluindo efetivamente a via aérea (colapso dinâmico). O assovio respiratório
característico resulta da ressonância dentro do ventrículo aberto no lado afetado. O
estridor mais áspero ou ronco é produzido pelo turbilhão oriundo da extremidade da
cartilagem aritenóide e da prega vocal.
Achados clínicos e diagnóstico – Os eqüinos afetados geralmente são
assintomáticos em repouso. Ruído respiratório anormal durante o exercício e
intolerância a exercícios são os principais sinais clínicos. O diagnóstico é confirmado
pela observação endoscópica de movimentação anormal da cartilagem aritenóide
e da prega vocal. Com a hemiplegia laríngea, a cartilagem aritenóide e a prega vocal
estão localizadas na posição mediana dentro do lúmen da laringe e estão imóveis.
Abdução incompleta ou adução inicial após abdução completa são consideradas
diagnósticas de hemiparesia laríngea. Movimentos assincrônicos das cartilagens
laríngeas ocorrem comumente; sua relação com a neuropatia laríngea recorrente
permanece controversa. Animais com assincronia laríngea, intolerância ao exercí-
cio e ruído respiratório anormal durante o exercício devem ser examinados com
relação à função laríngea imediatamente após o exercício árduo ou preferivelmente
durante o exercício de rotina, num esforço para confirmar a disfunção laríngea.
Outros testes físicos, como palpação da laringe, teste de depressão aritenóide,
reflexo adutório laríngeo (teste do tapa), e observação do movimento aritenóide
durante a deglutição e a oclusão nasal são úteis, mas não fornecem evidências
definitivas de hemiplegia laríngea.
O diagnóstico diferencial inclui outras causas de obstrução das vias aéreas
superiores e intolerância ao exercício. A condropatia aritenóide (condrite) é a única
desordem das cartilagens aritenóides que pode ser confundida com hemiplegia
laríngea à endoscopia. Erros de diagnóstico podem ser evitados pela observação
cuidadosa do formato e do tamanho das cartilagens aritenóides – na condropatia
aritenóide, há um espessamento transversal e elas perdem o seu formato caracte-
rístico de feijão. A abdução e adução geralmente são limitadas e freqüentemente a
margem do arco palatofaríngeo é evidente no lado afetado. Com a progressão, a
superfície axial (medial) da cartilagem aritenóide pode ser distorcida, com um tecido
de granulação que se projeta através da mucosa; uma lesão de contato pode estar
presente na cartilagem aritenóide contralateral. A diferenciação entre estas patolo-
gias geralmente só é difícil quando o espessamento da cartilagem aritenóide é
mínimo ou se ambas as cartilagens aritenóides estão afetadas similarmente. A
condropatia aritenóide deve sempre ser considerada se a motilidade da aritenóide
direita for reduzida. As radiografias geralmente mostram pequenos focos de
mineralização dentro da aritenóide nos casos de condropatia.
Doenças Respiratórias dos Eqüinos 898

Tratamento – A neuropatia laríngea recorrente é incurável; os “tratamentos”


comuns objetivam estabilizar o lado afetado da laringe durante a inspiração e
conseqüentemente prevenir o colapso dinâmico das vias aéreas durante o exercí-
cio. A ventriculectomia laríngea é útil nos eqüinos afetados normalmente não
utilizados em exercícios árduos. Laringoplastia prostética é comumente utilizada em
cavalos de corrida e é a única técnica que reduz satisfatoriamente a impedância do
fluxo inspiratório. Apesar de complicações, como tosse ou refluxo nasal da ingesta,
ocorrerem ocasionalmente, os riscos da laringoplastia prostética são justificados em
cavalos que de outra maneira não poderiam ser bons atletas. Aritenoidectomia
parcial é de valor limitado.

PLEURITE
(Pleurisia, Pleuropneumonia)
É uma inflamação aguda ou crônica das membranas pleurais, caracterizada por
sinais relacionados a dor e efusão pleurais.
Etiologia e patogenia – A efusão pleural pode ser idiopática, mas geralmente
está associada com pneumonia, abscesso pulmonar, ferimentos torácicos penetran-
tes, ruptura esofágica, neoplasia ou peritonite. Na América do Norte, a pleuropneu-
monia é a causa mais comum de efusão pleural, principalmente em cavalos de
corrida. O estresse associado com transporte, exercício, cirurgia, anestesia e
infecção respiratória viral recente é considerado um importante fator predisponente.
Microrganismos podem ser isolados em , 2 de 3 cavalos com efusão pleural
parapneumônica. Microrganismos típicos incluem Streptococcus zooepidemicus,
Escherichia coli, Pasteurella spp, Klebsiella spp, Rhodococcus (Corynebacterium)
equi e anaeróbios como Bacteroides e Clostridium spp. Mycoplasma felis e outras
Mycoplasma spp também têm sido isoladas. Em certas regiões secas e poluídas,
infecções pulmonares com Coccidioides immitis e Nocardia spp têm sido associa-
das com efusão pleural.
Achados clínicos e diagnóstico – Os primeiros sinais incluem febre, inapetência,
depressão, posição dobrada dos cotovelos, relutância a se mover e edema subcu-
tâneo do tórax ventral e membros. Um recuo em resposta à percussão torácica
indica dor pleural. Freqüentemente os cavalos com pleurite parecem ter cólicas. Nos
casos crônicos freqüentemente há anorexia, perda de peso, febre intermitente,
esforço respiratório anormal; e nos cavalos com efusão estéril ou neoplásica,
tolerância reduzida ao exercício.
O diagnóstico definitivo requer a detecção da efusão pleural e a coleta de amostras
do fluido pleural para avaliação macroscópica e citológica, coloração de Gram e
cultura. O exame citológico permite a diferenciação de causas infecciosas de neoplá-
sicas e de outras causas não infecciosas de efusão pleural. Se o fluido estiver
presente em ambas as cavidades pleurais, devem-se avaliar amostras de ambos os
lados do pulmão, pois as características do fluido e dos microrganismos podem ser
diferentes. Já que quase um terço dos cavalos com pleuropneumonia possui efusão
pleural estéril, recomendam-se citologia e cultura para microrganismos anaeróbicos
(incluindo Mycoplasma spp) e aeróbicos, a partir do aspirado transtraqueal. Um odor
fétido da respiração ou do fluido pleural é fortemente sugestivo de infecção por
anaeróbicos.
A ultra-sonografia é útil para estimar a quantidade de fluido pleural e para
verificar o grau de loculação. Bolhas de gás dentro do fluido são indicativas de
infecção anaeróbica. A radiografia é de valor limitado até que a cavidade pleural
seja drenada. As radiografias freqüentemente confirmam patologias pulmonares
coexistentes e são úteis para monitorar a resolução de lesões pneumônicas
depois de a efusão ser resolvida.
Doenças Respiratórias dos Eqüinos 899

Achados hematológicos são relativamente não específicos e geralmente indicam


inflamação ou infecção. As alterações antecipadas incluem hiperfibrinogenemia,
anemia leve, leucocitose neutrofílica, hiperproteinemia, hipoalbuminemia e hiper-
globulinemia.
A auscultação e a percussão do tórax são úteis para monitorar a resolução da
efusão e alterações na aeração pulmonar. Com a consolidação pulmonar e efusão
pleural, os sons cardíacos geralmente podem ser detectados em uma região maior
do tórax, sobretudo dorsal e caudalmente. Sons pulmonares anormais incluem
completa ausência de movimento aéreo, dispnéia inspiratória e crepitações, ruídos
de fricção e sons musicais. A auscultação cuidadosa com e sem o auxílio de um saco
respiratório, com regiões delineadas de sons anormais e níveis de fluido na parede
torácica, é importante para monitorar a progressão da doença.
Tratamento – A drenagem das cavidades pleurais associada com antibióti-
cos, antiinflamatórios, analgésicos e tratamento de suporte é importante. Antibió-
ticos de amplo espectro (penicilina e gentamicina) devem ser utilizados inicial-
mente e trocados posteriormente após o resultado da cultura, se necessário. A
tetraciclina é indicada no caso de infecção por Mycoplasma spp e o metronidazol
pode ser necessário em algumas infecções anaeróbicas. O espaço pleural pode
ser drenado por várias toracocenteses, pois há reacúmulo de fluidos, ou por
drenagem contínua com um tubo de toracostomia e uma válvula de dreno torácico
de Heimlich descartável ou selo subaquático. Recomenda-se fazer uma abertura
no tórax, quando o fluido é muito viscoso para ser drenado através de um tubo ou
se ele estiver contido numa cavidade de abscesso bem definida. Um acompa-
nhamento ultra-sonográfico pode ser necessário para a drenagem de regiões
multiloculadas.
A efusão pleural secundária à peritonite requer identificação e tratamento
apropriado da causa da última. Efusões pleurais malignas freqüentemente são
refratárias ao tratamento, pois o processo neoplásico geralmente está avançado no
momento em que os sinais se tornam evidentes. A efusão secundária à perfuração
e ruptura esofágicas requer o conhecimento e reparação do local do defeito
esofágico. Contaminação extensa do espaço mediastinal com material alimentar
freqüentemente impede o sucesso da reparação. Ferimentos torácicos penetrantes
devem ser debridados vigorosamente e reparados. Lavagem do hemitórax afetado,
aspiração do pneumotórax e terapia antimicrobiana de amplo espectro são impor-
tantes para minimizar o empiema.
Com o reconhecimento precoce e o tratamento adequado, a recuperação pode
ser esperada em ≥ 50% dos cavalos com efusão pleural parapneumônica; o retorno
aos níveis normais de atividade ocorre em , 50% dos sobreviventes. O prognóstico
é de reservado a ruim para os animais com efusão pleural secundária a neoplasia
ou ruptura esofágica.

ABSCEDAÇÃO PULMONAR EM POTROS POR RHODOCOCCUS EQUI


(Pneumonia granulomatosa)
É uma doença infecciosa de potros, cosmopolita, adquirida pela inalação de
poeira do solo contaminado com o agente causal e caracteriza-se por broncopneu-
monia e abscedação pulmonar.
Etiologia e patogenia – A bactéria causal Rhodococcus (Corynebacterium) equi
é um bastonete Gram-positivo, pleomórfico, aeróbico, não esporulado e encapsu-
lado. Afeta primariamente potros de 2 a 6 meses de idade; cavalos > 6 meses são
resistentes, a menos que sejam imunocomprometidos. A doença tem sido associa-
da com diarréia e aborto em eqüinos e com várias lesões supurativas em vários
outros hospedeiros, incluindo bovinos, ovinos, caprinos, gatos e homem.
Doenças Respiratórias dos Eqüinos 900

A bactéria é um saprófita do solo; seu crescimento é consideravelmente aumen-


tado pelos constituintes do esterco dos herbívoros, como o ácido acético, e altas
temperaturas. Sob condições ideais, por exemplo, altas temperaturas, ela pode-se
multiplicar milhares de vezes no solo. Além disso, o microrganismo cresce em
grandes números no intestino de potros < 12 semanas de idade, mas a sua presença
nas fezes de eqüinos mais velhos representa aquisição de pasto. Ele resiste à luz
solar e à dessecação e é relativamente resistente à maioria dos desinfetantes. Com
o passar dos anos, conseqüentemente, a infecção pode aumentar progressivamen-
te em fazendas de criação que possuem muitos potros ou permitem o acúmulo de
esterco no ambiente imediato.
A inalação da poeira contaminada resulta na distribuição cranioventral de
abscessos pulmonares, os quais podem ser mais extensos no pulmão direito que no
esquerdo. Enterite granulomatosa e linfadenite podem ocorrer após a ingestão de
esputo infectado. Em casos raros, pode ocorrer enterite sem alterações pneumônicas.
A Rhodococcus equi é um patógeno oportunista; afeta potros quando os níveis
de anticorpos maternos declinam e o seu sistema auto-imune é imaturo. Animais
com o sistema imune comprometido (isto é, doença de imunodeficiência combinada,
ver pág. 526) possuem alto risco de se infectar. Pode haver também uma predispo-
sição genética para a doença, principalmente em cavalos árabes. O mecanismo de
patogenicidade é desconhecido, mas existem relatos da habilidade do microrganis-
mo para sobreviver e eventualmente destruir macrófagos alveolares de potros
jovens. A severidade da doença parece estar relacionada com o número de
microrganismos inalados nos pulmões. A maioria dos potros parece resistir e
enfrentar com sucesso uma pequena quantidade de R. equi precocemente.
Achados clínicos – A doença começa com aumento dos ruídos bronquiais
difusos, freqüentemente acompanhados por tosse. Isto se desenvolve com estertores,
os quais podem estar localizados em uma pequena área dos pulmões (mais
freqüentemente a área ântero-ventral), em alguns casos unilateralmente. Pirexia
(> 39oC) ocorre em poucos dias com aumento da freqüência respiratória (> 40/min)
e inspiração abdominal “pregueada”. Os ruídos broncovesiculares estão aumenta-
dos nas grandes vias aéreas; chiados ocorrem nas pequenas vias aéreas. Os potros
não tratados desenvolvem progressivos estertores, que podem ser ouvidos por todo
o campo pulmonar freqüentemente acompanhados por estridores. A tosse torna-se
mais severa e intensa. Os potros normalmente permanecem espertos, alertas e
fortes, apesar do severo envolvimento pulmonar freqüentemente até os estágios
finais da doença. Leucocitose por neutrofilia, monocitose e marcante fibrinogenemia
ocorrem. Descarga nasal mucopurulenta é comum, mas não ocorre linfadenopatia
na região da garganta. Eventualmente, um potro não tratado pode-se tornar
cianótico e entrar em colapso. Pode haver severa obstrução respiratória e febre de
até 41oC, quando os pulmões estiverem extensamente abscedados e consolidados.
Em fazendas onde a infecção é endêmica, a morbidade pode ser de 90%, assim
como a mortalidade nos animais não tratados. Onde a doença não é endêmica, os
potros provavelmente apresentam uma pneumonia subclínica, talvez com o desen-
volvimento de um pequeno abscesso solitário nos pulmões como a única manifes-
tação da doença. Em alguns casos, R. equi causa diarréia severa, devida à colite
granulomatosa e à linfadenite mesentérica proveniente da ingestão de esputo
infectado. Por fim, os potros podem se tornar bacterêmicos e desenvolver osteomie-
lite ou hipópio.
Lesões – Lesões macroscópicas típicas incluem broncopneumonia com dis-
tribuição irregular e generalizada de abscessos que possuem 0,3 a 6cm de diâmetro
e podem ser caseosos. O parênquima pulmonar freqüentemente está consolidado
e há exsudato mucopurulento em algumas vias aéreas. A abscedação dos linfono-
dos regionais é comum. Histologicamente, as lesões são piogranulomatosas e
Doenças Respiratórias dos Eqüinos 901

contêm um material caseoso espesso e um núcleo de detritos necróticos rodeado


por numerosos macrófagos e neutrófilos que contêm bactérias intactas.
Diagnóstico – O método ideal é a cultura de aspirados transtraqueais e
broncoalveolares, mas podem ocorrer resultados falsos-negativos. A auscultação
torácica pode ser de valor limitado no início da doença, pois o envolvimento das vias
aéreas pode não ser totalmente evidente. Lesões radiográficas de um padrão
alveolar evidente caracterizado por consolidação regional maldefinida, são típicas;
estas lesões consolidadas são freqüentemente nodulares ou cavitárias. Linfadeno-
patia mediastinal é evidente radiograficamente nos casos avançados. Nos casos
suspeitos, o início da terapia deve ser baseado na evidência radiográfica de uma
doença pulmonar granulomatosa e dos sinais clínicos. Os testes sorológicos
diagnósticos têm sido descritos, mas não estão prontamente disponíveis. Pode ser
útil a cultura fecal quantitativa, demonstrando > 106 R. equi/g de fezes, utilizando-
se um meio seletivo.
Tratamento e controle – A terapia antimicrobiana sistêmica deve ser instituída
imediatamente e mantida por 4 a 10 semanas. A combinação antibiótica de escolha
é o etilsuccinato ou estolato de eritromicina, na dose de 25mg/kg de peso corporal,
VO, três vezes ao dia, com rifampina na dose de 10mg/kg, VO, uma vez ao dia. Esta
combinação sinérgica tem tido excelentes resultados clínicos, provavelmente
porque estas drogas são lipossolúveis e penetram bem nos fagócitos. A maioria dos
potros se recupera com o início do tratamento. Drogas alternativas incluem o
trimetoprim (6,6mg/kg, VO, três vezes ao dia) em permanente combinação com
sulfametoxazol e ampicilina sódica (11 a 15mg/kg, IM, quatro vezes ao dia) em
combinação com a gentamicina (2,2mg/kg, IM, três vezes ao dia). A última droga não
deve ser usada por > 7 dias sem uma monitoração para nefrotoxicose. A resposta
ao tratamento é avaliada pela evidência radiográfica de resolução e pelo retorno da
concentração plasmática de fibrinogênio aos níveis normais.
Deve-se administrar uma solução poliiônica balanceada EV (por exemplo, lactato
de Ringer) aos animais desidratados. A febre pode ser controlada com dipirona,
22mg/kg; fenilbutazona, 0,5 a 1mg/kg ou flunixin meglumina, 0,5 a 1mg/kg. Deve-
se fornecer ventilação ideal e restringir os exercícios.
Para prevenir o desenvolvimento de R. equi no ambiente de potros jovens,
deve-se remover o esterco. As áreas destinadas aos potros jovens e suas mães
devem ser gramadas e alternadas. Deve-se evitar a presença de poeira nos
estábulos, por exemplo, concretando as vias de acesso e umedecendo-as. Os
potros devem ser removidos dos ambientes infectados o mais rápido possível; em
fazendas endemicamente afetadas, eles devem ser examinados (temperatura,
freqüência respiratória, auscultação dos campos pulmonares) a cada 2 a 3 dias
durante os primeiros 4 meses, e todos os animais suspeitos devem ser tratados.
Desta maneira, a mortalidade pode ser prevenida, mas apenas o bom manejo
reduzirá o nível de infecção.
Não existem vacinas comerciais disponíveis. Os anticorpos parecem proteger os
animais e, nos casos severos, a administração de soro (500mL a 1L) obtido da égua
pode ser benéfica. Devem ser instituídas a vacinação contra os agentes virais
debilitantes (por exemplo, herpesvírus eqüino do Tipo 1 e vírus da influenza eqüina)
e a rotina de programas de controle de parasitas.

GARROTILHO
(Cinomose)
É uma doença infecciosa transmissível e cosmopolita dos Equidae, caracteriza-
da por inflamação do trato respiratório superior e, mais freqüentemente, por
abscedação dos linfonodos adjacentes.
Doenças Respiratórias dos Eqüinos 902

Etiologia e patogenia – O agente causal, Streptococcus equi, é um coco Gram-


positivo, capsulado e β-hemolítico, que pertence ao Grupo C de Lancefield e forma
cadeias. Um único tipo antigênico tem sido reconhecido, mas pode existir mais de
uma cepa. É transmitido através de descargas purulentas dos animais infectados.
É suscetível a dessecação, luz solar e desinfetantes. Os animais afetados são
infectantes por ≥ 4 semanas após o início da doença. Uma forma atípica e endêmica,
porém mais moderada, da doença clássica é causada por uma variante não
capsulada da bactéria. Existe o estado de portador crônico convalescente. Embora
seja uma doença primariamente de jovens, animais de qualquer idade, sem infecção
prévia ou imunização, podem ser afetados.
A infecção ocorre por inalação ou ingestão, seguida pela invasão da mucosa
faríngea e do trato respiratório superior, no qual enzimas e toxinas liberadas pelo
organismo induzem inflamação. O microrganismo se dissemina para os linfonodos
locais, causando linfadenite e abscedação. A bacteremia pode ocorrer, disseminando
o microrganismo para os tecidos linfóides de todo o corpo. A disseminação local pode
causar inflamação da bolsa gutural e sinusite. A produção de anticorpos específicos
(IgA secretória e IgG) pela mucosa nasofaríngea e a maturação e drenagem dos
abscessos levam à recuperação. A imunidade após a recuperação não é longa.
Achados clínicos – O período de incubação é de 3 a 6 dias. Inapetência e reação
febril são os primeiros sinais; a temperatura pode alcançar 41°C. Inflamação da
mucosa respiratória superior e do tecido linfóide da faringe ocorre dentro de 1 a 2
dias, o que causa deglutição dolorosa. Uma descarga nasal, e às vezes ocular,
serosa ou mucopurulenta bilateral se segue. Linfadenopatia é o principal achado
clínico. A infecção dissemina-se para os linfonodos intermandibular e parafaríngeo
e muitas vezes, para os nódulos cervicais anteriores. Abscedação dos nódulos
ocorre depois. O hemograma dos cavalos infectados não é específico e apresenta
neutrofilia com ou sem desvio à esquerda e hiperfibrinogenemia. O curso normal da
doença é de 10 a 14 dias quando o abscesso amadurece e drena.
A morbidade pode-se aproximar de 100% em uma população não exposta
previamente, embora a mortalidade seja < 2%. A morte pode resultar de infecção do
SNC, pneumonia, abscedação de vísceras ou asfixia devida à compressão da
faringe ou laringe. Miocardite e pericardite podem ocorrer. Púrpura eqüina (ver
pág. 70) pode acompanhar ou seguir a doença. Empiema das bolsas guturais
(ver anteriormente) ocorre em alguns animais, devido à diverticulite primária ou à
drenagem de linfonodos locais abscedados na bolsa.
“Falso garrotilho” é caracterizado pela abscedação em outras áreas do corpo,
principalmente dos linfonodos no abdome e menos freqüentemente no tórax. A
ruptura de abscessos mesentéricos ou mediastinais causa peritonite purulenta e
pleurite. Isto ocorre em animais que aparentemente falham no desenvolvimento de
uma resposta imune ou naqueles que estão sendo tratados com doses inadequadas
de penicilina durante o curso da doença, modificando dessa forma os antígenos da
parede celular da bactéria.
Diagnóstico – Quando o garrotilho ocorre na forma epidêmica, seus aspectos
clínicos – febre alta e a formação de abscessos nos linfonodos da cabeça e região
faríngea – são quase patognomônicos. A infecção da mucosa respiratória superior
e dos linfonodos por S. zooepidemicus secundária à doença viral pode mimetizar o
garrotilho, mas a febre e o desenvolvimento rápido característico do abscesso
servem para diferenciar a doença clinicamente. O diagnóstico definitivo depende da
identificação da S. equi, de preferência no pus obtido pela drenagem cirúrgica de
abscessos maduros. Abscessos que drenam naturalmente são rapidamente inva-
didos por S. zooepidemicus , o que pode confundir o diagnóstico bacteriológico. A
identificação da S. equi de um cavalo (com ou sem sinais típicos de garrotilho) é uma
segura advertência da iminência dessa doença no rebanho.
Doenças Respiratórias dos Suínos 903

Tratamento – Repouso completo e cuidados assistenciais devem ser forneci-


dos. Compressas quentes sobre os abscessos podem acelerar sua maturação;
quando maduros, eles podem ser incisados e drenados. Animais disfágicos devem
ser alimentados com alimentos moles, úmidos e palatáveis. Os cavalos que
apresentam dispnéia marcante e/ou disfagia podem necessitar de uma traqueosto-
mia, alimentação com sonda gástrica e fluidoterapia EV. O uso de antimicrobianos
é controverso, apesar de a S. equi ser sensível a penicilina, sulfamerazina,
sulfametazina e sulfadiazina-trimetoprim. A penicilina ou as sulfonamidas são
indicadas nos casos agudos severos, em potros recém-nascidos e em animais que
requerem traqueostomia. Se a antibioticoterapia for usada, recomendam-se altas
doses de penicilina (25.000 a 100.000UI/kg, EV, quatro vezes ao dia) por 7 a 10 dias.
Profilaxia – Antes de se agrupar animais, eles devem ser isolados por várias
semanas. Deve-se fazer cultura de qualquer descarga nasal, para se determinar se
a S. equi é o agente causal. Se o resultado for positivo, esses animais devem
ser isolados até ficarem livres da infecção. Baias, bebedouros e utensílios devem
ser desinfetados e não utilizados por ≥ 4 semanas.
Nos EUA existem 3 vacinas disponíveis, embora a vacinação seja benéfica
apenas em rebanhos em que a doença é endêmica. A vacinação geralmente causa
abscedação no local da aplicação e não previne a infecção, mas resulta em uma
doença mais branda nos animais infectados.
Devido aos resultados geralmente insatisfatórios após a vacinação com bacté-
rias mortas ou seus produtos, o ideal seria o desenvolvimento de uma cepa não
virulenta e estável de S. equi, que quando administrada por via intranasal estimularia
uma imunidade na mucosa local.

DOENÇAS RESPIRATÓRIAS DOS SUÍNOS


INTRODUÇÃO
As doenças respiratórias dos suínos podem ser classificadas em 2 amplas
categorias com base na extensão e na duração da doença: uma que afeta muitos
animais e pode ser séria, mas com duração limitada; e outra que persiste em um
grande número de animais por períodos indefinidos. A Categoria 1 pode ser mais
dispendiosa, mas as perdas são limitadas. Ela inclui a influenza suína (ver adiante),
cólera suína (ver pág. 461) e formas pneumônicas de pseudo-raiva (ver pág. 747).
Os vírus causais podem persistir num rebanho, mas surtos da doença tendem a ser
autolimitantes. As síndromes mais importantes na Categoria 2 são rinite atrófica,
pneumonia por micoplasma e pleuropneumonia (para todas as 3, ver adiante).
Níveis moderados de rinite atrófica, em que o focinho ainda não está torto, não são
tão lesivos. A pneumonia enzoótica, quando causada apenas pelo micoplasma, é
de pequena conseqüência, mas quando associada com infecções secundárias, por
exemplo, Pasteurella multocida, as condições resultantes podem ser severas.
Actinobacillus pleuropneumoniae pode estar associada com perdas consideráveis
em alguns rebanhos. A migração de larvas de vermes ou as infecções listadas no
Grupo 1 freqüentemente levam a problemas severos quando ocorrem com as
infecções do Grupo 2.
A severidade e a importância econômica das doenças da Categoria 2 também
estão relacionadas com a densidade populacional, o tipo e tamanho do rebanho.
Elas podem ser de pequena importância nos rebanhos produtores de desmamados
para venda, mas tornam-se de maior importância em uma alta densidade de leitões
Doenças Respiratórias dos Suínos 904

de corte. Geralmente, mas não sempre, a mortalidade em conseqüência dessas


doenças é baixa. Perdas econômicas resultam da taxa de crescimento desigual, de
efeito adverso na eficiência alimentar, e um custo adicional com medicamentos,
particularmente os alimentares. Embora esses custos sejam variáveis, eles são
sérios porque são contínuos. Entretanto, quando o estresse puder ser evitado pelo
manejo adequado, estas doenças poderão estar presentes, mas causarão apenas
perdas mínimas.
É possível conseguir rebanhos livres das doenças da Categoria 2 com técnicas
como repopulação com animais SPF ou medicar os animais no início do desmame ou
adquirir animais de rebanhos livres de pneumonia. O último método é o menos caro, mas
como a etiologia das doenças da Categoria 2 é complexa, todos os leitões devem ser
comprados de uma única fonte (isto também é válido para compra de desmamados).
É difícil manter rebanhos livres de doenças respiratórias, já que a maioria é
transmitida por aerossóis; eles podem ser transportados pelo vento por ≥ 2 milhas,
dependendo do clima, terreno e densidade de leitões no local.
Rebanhos fechados, isto é, onde é usada a inseminação artificial ou a transferên-
cia de embriões para trazer um novo material genético, ajudam a estabelecer a
imunidade contra os microrganismos presentes e evitam a introdução de novas
infecções, cepas ou sorotipos. O manejo “all-in/all-out”, no qual o estábulo inteiro e
o espaço aéreo são esvaziados antes de serem repreenchidos, é uma ferramenta
poderosa para minimizar o efeito potencial da pneumonia crônica.
A doença respiratória é endêmica na maioria dos rebanhos. Os principais fatores
para controle são estresse do manejo, densidade do rebanho, ventilação, controle
da temperatura e espaço para se movimentar. Estes fatores associados com
práticas de manejo “all-in/all-out” em rebanhos fechados evitam ou diminuem
bastante a necessidade de medicação profilática e terapêutica.

RINITE ATRÓFICA
É uma doença de suínos caracterizada por espirros, seguidos por atrofia dos
ossos turbinados que pode ser acompanhada por distorção do septo nasal e
encurtamento ou deformação do maxilar superior.
Etiologia – A etiologia é complexa e envolve no mínimo 2 microrganismos.
Várias infecções, como rinite por corpo de inclusão, pseudo-raiva e agentes não
infecciosos podem causar espirros e lacrimejamento, geralmente sem causar rinite
atrófica. A Bordetella bronchiseptica tem sido implicada como a causa principal. Esta
bactéria não é hospedeiro-específica, embora cepas que causam rinite atrófica
geralmente sejam isoladas apenas de suínos. Cães, gatos, roedores e outras
espécies podem albergar a B. bronchiseptica por longos períodos, mas o seu papel
na disseminação da rinite atrófica em suínos é incerto. Certas cepas toxigênicas de
Pasteurella multocida freqüentemente agem com a B. bronchiseptica, causando
atrofia permanente dos turbinados e distorção nasal. Devido ao fato de que ambos
os microrganismos podem causar rinite atrófica, a doença foi dividida em 2 formas:
rinite atrófica regressiva, devida à B. bronchiseptica, é leve, transitória e provavel-
mente não afeta o crescimento e o desenvolvimento do animal; rinite atrófica pro-
gressiva, causada pela P. multocida toxigênica, é severa, permanente e geralmen-
te resulta em taxa de crescimento baixa.
Surtos da doença geralmente ocorrem após a introdução de suínos ou mistura
de suínos de fontes diferentes. Os leitões podem ser afetados em qualquer idade,
principalmente com a P. multocida, que pode infectar animais maduros. Super-
população, ventilação inadequada, mistura e movimentação de animais e outras
doenças concomitantes são fatores importantes que contribuem para a intensifica-
ção da doença.
Doenças Respiratórias dos Suínos 905

Achados clínicos – Sinais agudos usualmente aparecem entre 3 e 8 semanas


de idade e, em casos severos, hemorragia nasal pode ocorrer. Os dutos lacrimais
podem se tornar ocluídos e então lágrimas aparecem sob o canto medial dos olhos.
Com o progresso da doença, alguns suínos afetados podem desenvolver desvio
lateral ou encurtamento do maxilar superior; outros podem sofrer algum grau de
atrofia dos turbinados sem distorção externa aparente. O grau de distorção pode ser
julgado pela relação entre os incisivos superiores e inferiores se as variações de raça
forem levadas em conta.
A severidade da rinite atrófica em um rebanho depende muito da presença de
cepas toxigênicas de P. multocida, do nível de manejo e do estado imune do
rebanho. Este último está relacionado à vacinação e à distribuição pareada das
porcas, já que as porcas mais jovens tendem a ser mais infectadas e possuem uma
imunidade lactogênica menor que as mais velhas.
Lesões – O grau de atrofia e distorção é melhor avaliado pelo exame de uma
secção transversa no nível do segundo dente pré-molar (o primeiro dente de
bochecha até 7 a 9 meses de idade); secções paralelas adicionais são recomenda-
das por alguns. Nos estágios ativos de inflamação, a mucosa terá uma aparência
esbranquiçada e pode estar presente material purulento na superfície. Nos estágios
finais, as cavidades nasais podem estar claras, mas pode haver graus variáveis de
amolecimento, atrofia, ou rachadura dos turbinados, desvio do septo nasal e
distorção assimétrica das estruturas ósseas adjacentes.
Diagnóstico – Os sinais e lesões são comumente a base para o diagnóstico.
Entretanto, as bactérias devem ser identificadas por cultura. Monitoração de rotina
é feita em alguns rebanhos de criação: o grau de atrofia em suínos abatidos é medido
e o rebanho recebe uma graduação. Rinite atrófica deve ser diferenciada de rinite
necrótica (ver adiante).
Controle – Raramente é possível conservar rebanhos inteiramente livres de
surtos leves de espirros, e um nível baixo de ossos turbinados e nasais aberrantes
à necropsia é comum, mesmo em rebanhos que não evidenciam sinais clínicos de
rinite. Quando a rinite atrófica atinge nível não aceitável no rebanho, as medidas
de controle adotadas são usualmente estratégicas: quimioprofilaxia, vacinação,
encerramento temporário do rebanho à introdução de novos suínos, e melhora nas
condições de criação (como melhor ventilação e higiene e menos poeira nas
rações). Em geral, quimioprofilaxia inclui a administração de drogas antibacterianas
a todas as porcas, particularmente antes do parto, assim como a leitões recém-
nascidos e, algumas vezes, a suínos recentemente desmamados. Medicação nas
rações de desmamados e de animais em crescimento e, algumas vezes, nas rações
de matrizes, é útil com freqüência. As drogas comumente usadas são sulfonamidas,
trimetoprim, tilosina e tetraciclinas.
Têm sido desenvolvidas bacterinas contra P. multocida toxigênica, B.
bronchiseptica ou ambas. Vacinas com toxóide e misturas de bacterinas com
toxóide estão disponíveis contra P. multocida ; embora ambas apresentem resulta-
dos satisfatórios na maioria dos rebanhos, a infecção pode ser melhor prevenida
com misturas de bacterinas com toxóides. As porcas são vacinadas 4 e 2 semanas
antes do parto, e os leitões com 1 e 4 semanas de idade. Um nível alto de imunidade
colostral se desenvolve em leitões oriundos de porcas vacinadas.

RINITE POR CORPO DE INCLUSÃO


A rinite por corpo de inclusão (RCI) é causada por um citomegalovírus, que
produz corpos de inclusão na mucosa nasal. A infecção em porcas prenhes
raramente leva à mumificação fetal, natimortos e morte neonatal; os corpos de
inclusão são demonstráveis em vísceras de fetos. A infecção em leitões jovens (< 2
Doenças Respiratórias dos Suínos 906

semanas) pode ser fatal na ausência de uma imunidade lactogênica; se houver


anticorpos circulantes, a infecção resultará em rinite e conjuntivite moderadamente
severas, freqüentemente com uma descarga copiosa a partir da qual a recuperação
é rotineira. A infecção em suínos mais velhos normalmente não causa sinais
clínicos, embora estejam presentes grandes inclusões basofílicas na mucosa nasal.
Sugere-se, mas não se prova, que a RCI predisponha a infecções bacterianas que
levam à rinite atrófica (ver anteriormente). O vírus é cosmopolita; exames sorológi-
cos sugerem que ele seja ubíquo na América do Norte, embora os sinais clínicos não
sejam comuns.

PNEUMONIA POR MICOPLASMA


(Pneumonia enzoótica, PE)
É uma pneumonia crônica, clinicamente leve e infecciosa que acomete suínos;
caracterizada por sua habilidade para se tornar endêmica num rebanho e por
produzir uma tosse seca persistente, taxa de crescimento retardada, aparecimento
esporádico de dificuldades respiratórias e uma alta incidência de lesões pulmonares
em porcos abatidos. Ela ocorre mundialmente.
Surtos clínicos de pneumonia por micoplasma podem diminuir a taxa de cresci-
mento e a conversão alimentar. Este efeito é maior quando muitos suínos são
confinados em construções mal ventiladas, sob condições de manejo inadequadas.
Os efeitos da doença são irregulares e imprevisíveis e o local limita a eficiência e a
flexibilidade de grandes unidades de produção. Entretanto, em criações modernas
com um bom controle de doenças, a pneumonia por micoplasma permanece
subclínica e é de pouca importância econômica.
Etiologia e epidemiologia – Os termos “pneumonia viral” (PV) e “pneumonia
enzoótica” são freqüentemente usados para descrever uma síndrome característica,
agora conhecida, causada primariamente por Mycoplasma hyopneumoniae. Esse
microrganismo pleomórfico é fastidioso, menor que a maioria das bactérias e difícil
de ser claramente visto sob microscópios ópticos comuns. Pode ser cultivado em
meio especialmente preparado, mas seu isolamento de casos de campo é difícil. Ele
é rapidamente inativado no ambiente e por desinfetantes, mas pode sobreviver por
períodos maiores em tempo frio. Parece ser hospedeiro-específico. Investigações no
campo sugerem que cepas diferentes de M. hyopneumoniae variam em patogenici-
dade.
Além disso a pneumonia por micoplasma é freqüentemente complicada por
outros micoplasmas, bactérias e vírus, que também comprometem a gravidade da
doença. Certas cepas de M. hyorhinis e talvez alguns vírus podem por si só atuar
como agentes primários na produção de uma síndrome semelhante à pneumonia
causada por M. hyopneumoniae.
Na maioria dos países onde métodos modernos de criação de suínos são
adotados, os pulmões de 30 a 80% dos suínos abatidos mostram lesões pneumônicas
do tipo associado com infecção por micoplasma. Porcos de todas as idades são
suscetíveis, mas dentro de uma criação, os porcos tornam-se infectados nas
primeiras semanas de vida ou por suas mães ou por outros suínos jovens após a
incorporação. A incidência de lesões pulmonares é mais alta nos animais de 2 a 4
meses de idade. A imunidade se desenvolve lentamente, as lesões pulmonares
regridem, e suínos mais velhos em fase de crescimento e suínos adultos podem-se
recuperar completamente.
Achados clínicos e lesões – Em rebanhos nos quais a doença é endêmica, a
morbidade é alta, mas os sinais clínicos podem ser mínimos e a mortalidade baixa.
Tosse é o sinal mais comum e é mais evidente quando os suínos são estimulados.
Pneumonia severa tende a aparecer esporadicamente em indivíduos ou grupos de
Doenças Respiratórias dos Suínos 907

porcos. Um fator predisponente comum é uma mudança no tempo, porém outros


fatores estressantes, tais como infecções virais transitórias e incorporação de
suínos, podem causar reativações. A doença é usualmente mais grave quando ela
entra pela primeira vez num rebanho.
As lesões nos pulmões são cinzentas ou rosadas, e são mais comuns nos lobos
apical e cardíaco. Lesões antigas se tornam claramente delimitadas. Os linfonodos
associados podem estar aumentados. Histologicamente, as células inflamatórias
estão presentes nos bronquíolos; há manguitos perivasculares e peribronquiolares
e hiperplasia linfóide extensa.
Diagnóstico – Achados clínicos, patológicos e epidemiológicos são geralmente
adequados para diagnóstico. A M. hyopneumoniae pode ser demonstrada em
esfregaços de impressão da superfície de corte do pulmão afetado, identificada por
técnica de IFI e, algumas vezes, isolada e identificada em cultura. Testes sorológi-
cos, principalmente o teste de fixação de complemento, são usados algumas vezes
num rebanho padrão, mas eles produzem tanto resultados falsos-positivos como
falsos-negativos que são difíceis de interpretar.
A pneumonia por micoplasma deve ser diferenciada da influenza suína,
pasteurelose, pneumonia por Bordetella, ascaríase severa, vermes pulmonares e
outras pneumonias.
Controle – Quando a doença entra pela primeira vez em um rebanho, o
tratamento em massa com antibióticos, por exemplo, tilosina, espiramicina, tiamulin
ou tetraciclina, ajuda a controlar a severidade dos sinais. Quando ela surge em
rebanhos nos quais é endêmica, o tratamento individual dos suínos com antibióticos
geralmente resulta em remissão, controlando as bactérias secundárias.
Culturas inativadas de micoplasma têm sido desenvolvidas na forma de vacinas,
mas têm valor duvidoso. Os efeitos econômicos da doença podem ser reduzidos, e
algumas vezes eliminados, através de melhoramentos nas instalações e no manejo,
dando atenção especial à ventilação e à superpopulação.
Em grandes unidades intensivas, é aconselhável começar com linhagens de
apoio oriundas de rebanhos que sejam livres de pneumonia por micoplasma e
adotar precauções rigorosas contra contato direto e indireto com outros rebanhos.
Infelizmente, muitos rebanhos que são manejados dessa maneira não permane-
cem livres de micoplasmas por longos períodos, particularmente em áreas de forte
densidade populacional. Observações de campo sugerem que no tempo frio e
úmido, a infecção pode ser transportada pelo vento por no mínimo uma milha entre
grandes rebanhos.
Nos EUA e partes da Europa, a maioria dos rebanhos livres de pneumonia por
micoplasma era estabelecida pelas técnicas de repopulação suína. Mais recente-
mente, alguns têm sido estabelecidos através da medicação no início do desmame.
As maiores dificuldades com estes programas de rebanhos são as taxas de
esgotamento e a dificuldade de monitoração dos rebanhos que pretendem se livrar
da pneumonia por micoplasma. A detecção precoce de esgotamento do rebanho
também pode ser extremamente difícil.

RINITE NECRÓTICA
(Nariz de touro)
É uma doença incomum e esporádica de suínos jovens, caracterizada por
supuração e necrose do focinho, aparecendo a partir de ferimentos das mucosas
oral ou nasal. Existe confusão na literatura devido ao uso da designação incorreta
“nariz de touro” para também descrever rinite atrófica (ver anteriormente).
Etiologia – Fusobacterium necrophorum é comumente isolada das lesões e,
indubitavelmente, contribui para a doença, mas muitos outros tipos de microrganis-
Doenças Respiratórias dos Suínos 908

mos estão freqüentemente presentes. Eles ganham acesso através do dano no céu
da boca, muitas vezes como resultado do corte muito curto de dentes caninos ou o
uso de tosquiadeiras muito afiadas.
Achados clínicos e lesões – Os sinais incluem aumento de deformidade da
face, ocasionalmente hemorragia, obstrução nasal, espirro, descarga nasal de
cheiro pútrido, algumas vezes envolvimento dos olhos com lacrimejamento e
descarga purulenta, perda de apetite, e emaciação. Geralmente, só 1ou 2 suínos
são afetados no rebanho.
Usualmente o aumento de volume facial é duro, mas a incisão revela uma massa
de tecido necrótico rosa-acinzentada, de cheiro pútrido ou restos teciduais verde-
acinzentados, dependendo da duração da lesão. Os ossos nasais e faciais se
envolvem no processo e, como conseqüência, a deformidade facial pode ser
marcante.
Diagnóstico – A rinite necrótica é prontamente diferenciada da rinite atrófica pelo
aspecto protuberante de distorção facial observada na primeira. A rinite atrófica não
causa outro aumento que não aquele devido ao desvio do focinho para cima ou para
o lado. O caráter do exsudato e a sua localização dentro do tecido do focinho ou face
são característicos do “nariz de touro”.
Profilaxia e tratamento – A prevenção é direcionada no sentido de evitar lesões
à boca e ao focinho, bem como melhorar o saneamento. Quando a doença ocorre
repetidamente, o dente canino deve ser seccionado cuidadosamente.
Se a condição for avançada, é duvidosa a recomendação do tratamento. A
intervenção cirúrgica prematura e o uso de compressas na cavidade com sulfona-
mida ou tintura de iodo podem ser úteis. Em suínos jovens, sulfametazina adminis-
trada oralmente é de valia.

PASTEURELOSE
A pasteurelose é mais comumente observada em suínos como uma complicação
da pneumonia por micoplasma (ver anteriormente), embora a influenza suína,
doença de Aujeszky, Bordetella bronchiseptica ou Actinobacillus (Haemophilus)
pleuropneumoniae também possam causar alterações nos pulmões, causando a
doença provocada por Pasteurella spp. O agente causal geralmente é a Pasteurella
multocida. Ela produz uma broncopneumonia exsudativa, às vezes com pericardite
e pleurite. Uma pneumonia primária, esporádica e fibrinosa devida a pasteurelas
sem conexão epidemiológica com pneumonia por micoplasma ou por outros
agentes também pode ocorrer em suínos. Nas formas primária e secundária, lesões
torácicas crônicas e poliartrites tendem a se desenvolver. O diagnóstico é baseado
nos achados de necropsia e isolamento de Pasteurella das lesões. Cepas não
toxigênicas do Tipo A capsular são os isolados predominantes nos casos de
pneumonia. Cepas toxigênicas de P. multocida na presença de Bordetella
bronchiseptica estão associadas com a rinite atrófica (ver anteriormente).
Pasteurelose septicêmica e meningite ocasionalmente ocorrem em leitões. P.
haemolytica tem sido isolada de fetos abortados. A septicemia também ocorre em
suínos adultos. Não existem lesões características e a patogenia é obscura. Cepas
suínas de P. haemolytica são freqüentemente atípicas e não pertencem aos
sorotipos ovinos e bovinos comuns. Entretanto, alguns surtos no Reino Unido têm
sido associados com íntimo contato com ovinos.
O controle da forma pneumônica secundária da doença geralmente é baseado
na prevenção ou controle da pneumonia por micoplasma. Uma terapia precoce e
vigorosa com antibióticos ou antibióticos associados com sulfonamidas é indicada
para todas as formas da doença, no intuito de prevenir seqüelas crônicas. Um
aumento na resistência a alguns antibióticos tem sido notado entre as pasteurelas.
Doenças Respiratórias dos Suínos 909

PLEUROPNEUMONIA
É uma doença respiratória severa e contagiosa, primariamente de suínos jovens
(com até 6 meses), embora em um surto inicial os adultos possam ser afetados. Tem
um início súbito, curso curto, morbidade e mortalidade altas. Ocorre em todo o
mundo e parece estar aumentando em incidência, embora alguns relatos sugiram
que a severidade esteja declinando em países onde ela já se estabeleceu há muito
tempo.
Etiologia – O microrganismo causal é a Actinobacillus (Haemophilus)
pleuropneumoniae. A transmissão se dá por aerossol e muitos suínos recuperados
são carreadores. Os sinais clínicos se desenvolvem dentro de 4 a 12h em infecções
experimentais.
Achados clínicos – O aparecimento é súbito e, em rebanhos que não tenham
sido anteriormente infectados, a disseminação é rápida. Alguns suínos podem ser
encontrados mortos sem terem exibido sinais clínicos. A dificuldade respiratória é
grave; há “soluços” e, às vezes, uma descarga nasal e oral espumosa e sanguino-
lenta. Temperaturas de até 41,5°C, anorexia, e relutância à movimentação são
sinais típicos.
Apesar de ser primariamente uma doença de suínos em crescimento, adultos
podem sofrer abortos ou infecções fatais. O curso é tipicamente de 1 a 2 dias. A
morbidade pode alcançar 50% e, em casos não tratados, a mortalidade é alta. Os
sobreviventes geralmente têm taxas de crescimento reduzidas e tosse persistente.
Uma vez estabelecida no rebanho, a doença pode ser evidente apenas como
uma diminuição na taxa de crescimento e pleurite no abatedouro, embora possam
ocorrer formas agudas. Entretanto, lesões severas podem não estar acompanhadas
de sinais clínicos igualmente severos e mortes no transporte ou condenação da
carcaça podem ocorrer. São comuns infecções concomitantes com micoplasma,
pasteurela ou com vírus da influenza suína.
Lesões – Pleurite fibrinosa e pericardite podem ser severas. Nos casos agudos,
os pulmões estão escuros e edemaciados, com sangue e fluido vertendo da
superfície de corte. Coágulos hemorrágicos, ou mesmo necróticos, de todos os
tamanhos podem estar presentes. A traquéia pode conter muita espuma tingida com
sangue. Nos casos crônicos, as lesões são mais organizadas e localizadas. Lesões
extratorácicas são raras, embora haja relatos de osteomielite relacionada.
Diagnóstico – O surto explosivo é sugestivo e, combinado com sinais clínicos
e lesões macroscópicas, justifica freqüentemente a tentativa de diagnóstico. Infec-
ções simultâneas, por exemplo, por pasteurela, podem complicar o diagnóstico. Em
rebanhos que tenham sido expostos e que tenham desenvolvido no mínimo um grau
de imunidade, o padrão pode ser menos distinto. Muitos testes sorológicos têm sido
usados para ajudar a confirmar o diagnóstico ou detectar os portadores, mas os
resultados nem sempre são claros. Um diagnóstico definitivo depende do isolamen-
to e identificação de A. pleuropneumoniae.
Tratamento e controle – A rapidez do aparecimento e a persistência da infecção
nos rebanhos tornam o tratamento difícil. Canamicina, espiramicina, tetraciclinas,
trimetoprim, penicilinas sintéticas, tilosinas e sulfonamidas têm sido usados. O
primeiro tratamento deve ser parenteral, seguido de medicação na alimentação ou
na água,o que pode proteger os suínos em contato.
Devido ao fato de os sobreviventes freqüentemente se tornarem portadores, o
controle é difícil, embora bons resultados estejam sendo conseguidos por algumas
vacinas. O manejo “all-in”/“all-out”, redução dos estoques quando possível e boa
ventilação são recomendados. Se possível, reposições devem ser feitas de reba-
nhos livres do microrganismo. Se a doença se mostrar difícil de controlar, a repopulação
do rebanho deve ser considerada.
Doenças Respiratórias dos Suínos 910

INFLUENZA SUÍNA
(Gripe suína, “Hog flu”)
Experimentalmente, é uma doença respiratória aguda, altamente contagiosa, que
pode resultar da infecção por um vírus da influenza do Tipo A. Entretanto, no campo
existem cepas de virulências variáveis e a manifestação clínica pode ser determinada
por microrganismos secundários. Os suínos são os principais hospedeiros do vírus
da influenza suína (SIV) clássica. (Infecções no homem têm sido relatadas, mas
cepas suínas de influenza A parecem não se disseminar em populações humanas).
A doença ocorre comumente no meio-oeste dos EUA, ocasionalmente em outros
estados; no México, Canadá e América do Sul; na Europa, do Reino Unido até a
antiga União Soviética, e da Suécia à Itália; no Quênia; e no Japão, Taiwan, e outras
partes do leste asiático. Parece estar ausente na Austrália.
Etiologia – O vírus da influenza suína é um ortomixovírus RNA da influenza do
Grupo A com antígeno hemaglutinante H1 e antígeno neuraminidase N1 (por
exemplo, H1N1) e também H3N2 e seus recombinantes. Vírus da influenza B e C
têm sido isolados de suínos, mas não podem causar a doença clássica. A infecção
clássica do Tipo A com isolados de virulência branda pode favorecer a reprodução
do vírus da pseudo-raiva (ver pág. 747), de Haemophilus parasuis e Actinobacillus
(H. pleuropneumoniae) (ver anteriormente) ou Mycoplasma hyopneumoniae (ver
anteriormente), alguns dos quais podem complicar os surtos. A mistura de suínos
portadores e não imunes é um fator predisponente importante. O vírus provavelmen-
te não sobrevive fora de células vivas por > 2 semanas, exceto em condições frias.
Ele é prontamente inativado por desinfetantes.
Dentro de uma área infectada, surtos ocorrem mais comumente no outono ou
inverno, muitas vezes no início de tempo particularmente frio na América do Norte.
Nas áreas mais quentes do mundo, a infecção pode ocorrer em qualquer época.
Usualmente, um surto é precedido por 1 ou 2 casos individuais e depois se
dissemina rapidamente dentro de um rebanho, sobretudo por infecção aérea e
transmissão de suíno para suíno. O vírus sobrevive em suínos portadores por até
3 meses e pode ser demonstrado em animais não afetados entre os surtos. Em um
rebanho com anticorpos positivos para a doença, os surtos da infecção recorrem
quando a imunidade diminui. Até 40% dos rebanhos podem conter suínos com
anticorpos positivos. Suínos portadores geralmente são responsáveis pela introdu-
ção da influenza suína em rebanhos e países não infectados anteriormente.
Patogenia – Há um espectro de virulência de leve a agudo, mas na forma aguda
clássica, o vírus multiplica-se no epitélio bronquial dentro de 16h da infecção e causa
necrose focal do mesmo, atelectasia focal e hiperemia extensa do pulmão. Exsudato
bronquial e atelectasia disseminada, vista macroscopicamente como lesões da cor
de ameixa, que afetam lóbulos individuais dos lobos apical e intermediário, ocorrem
após 24h. As lesões continuam a se desenvolver até 72h depois da infecção, após
o que torna-se mais difícil demonstrar o vírus. Hiperplasia epiteliobronquial, neutró-
filos no exsudato e necrose coagulativa de alguns alvéolos ocorrem e são acompa-
nhados por lesões nos lobos diafragmáticos. Pneumonia intersticial, células mono-
nucleares no exsudato e hiperplasia bronquial ocorrem na lesão restabelecida e
a maioria dos vírus desaparece no nono dia. Perdas na reprodução associadas com
surtos primários parecem ser secundárias na medida em que vírus não têm sido
isolados.
Achados clínicos – Um surto agudo clássico é caracterizado pelo aparecimento
súbito e rápida disseminação através do rebanho inteiro, freqüentemente dentro de
1 a 3 dias. Os sinais principais são depressão, febre (42,2°C), anorexia, tosse,
dispnéia, fraqueza, prostração, e uma descarga mucosa dos olhos e nariz. A
mortalidade é geralmente de , 1 a 4%. O curso patente da doença usualmente varia
Doenças Respiratórias dos Ovinos e Caprinos 911

de 3 a 7 dias em infecções não complicadas, com recuperação clínica do rebanho


quase tão súbita quanto o surgimento. Entretanto, o vírus pode continuar a se
reproduzir, sendo os sinais clínicos suprimidos por respostas imunes; alguns suínos
podem-se tornar cronicamente afetados. Em rebanhos que estão em boas condi-
ções, a principal perda econômica é decorrente do retardo no crescimento e demora
em alcançar o peso de mercado. Algum aumento na mortalidade dos leitões tem sido
relatado e efeitos na fertilidade do rebanho, incluindo abortos no final da gestação,
podem decorrer de surtos em rebanhos não imunes.
Lesões – Nas infecções não complicadas, as lesões usualmente estão restritas
à cavidade torácica. As áreas pneumônicas estão claramente demarcadas,
colapsadas e rosa-avermelhadas. Elas podem estar distribuídas por todo o pulmão,
mas tendem a ser mais extensas e confluentes ventralmente. Áreas não pneumônicas
são pálidas e enfisematosas. As vias aéreas contêm um exsudato mucopurulento
copioso e os linfonodos bronquiais e mediastinais estão edematosos, mas raramen-
te congestos. Pode haver edema pulmonar grave, especialmente do septo interlobular,
ou uma pleurite serosa ou serofibrinosa. Histologicamente, as lesões são primaria-
mente aquelas de uma bronquiolite exsudativa, com uma pneumonia intersticial,
quando completamente desenvolvida.
Diagnóstico – Em surtos típicos, um diagnóstico presuntivo pode ser feito a partir
dos achados clínicos e patológicos, mas a confirmação depende do isolamento do
vírus ou da demonstração de anticorpos específicos. O vírus pode ser isolado das
secreções nasais, na fase febril, ou de tecidos pulmonares afetados, no estágio
inicial agudo, pela inoculação de ovos embrionados de garças coletados do líquido
amniótico, após 72 a 96h, e pelo exame da atividade hemaglutinante específica.
Pode ser necessária a passagem do material no mínimo 2 vezes, antes de ser
considerado negativo. Um diagnóstico retrospectivo pode ser feito através da
demonstração do aumento nos anticorpos específicos nas amostras de soro,
durante os estágios agudos e de convalescença, usando-se o teste da inibição da
hemaglutinação. Os antígenos dos subtipos H3 e H1 devem ser incluídos. Esse
teste é também usado para levantamentos no rebanho. Para diagnosticar infecção
por influenza sem complicação, condições como pasteurelose, pseudo-raiva, e
infecções por clamídia (Haemophilus e Actinobacillus) devem ser eliminadas.
Tratamento e controle – Não existe tratamento efetivo, embora os antimicrobia-
nos possam reduzir as infecções bacterianas secundárias. Vacinação e controle na
importação são as únicas medidas preventivas específicas; as cepas H1N1 e H3N2
estão freqüentemente incluídas em adjuvantes oleosos ou de alumínio. Boas
condições de manejo e ausência de estresse, principalmente aquele devido a
superpopulação e poeira, ajudam a reduzir as perdas.

DOENÇAS RESPIRATÓRIAS DOS OVINOS


E CAPRINOS
INTRODUÇÃO
Algumas, mas não todas, as discussões neste capítulo são sobre doenças co-
muns a ovelhas e cabras. Ênfase na introdução é dada para doenças de ovelhas, mas,
em termos gerais, se aplica a ambas as espécies. A importância das doenças
respiratórias depende de sua prevalência (que tende a flutuar sazonalmente), de seus
efeitos na produtividade e, em algumas doenças, de sua disseminação pelo mundo.
Doenças Respiratórias dos Ovinos e Caprinos 912

Doenças do trato respiratório superior de ovinos e caprinos incluem sinusite


causada por larvas de Oestrus ovis (ver adiante), pólipos nasais em ovinos idosos
e adenocarcinomas nasais endêmicos em várias raças de ovinos. Partículas
semelhantes a retrovírus têm sido demonstradas em cortes histológicos de adeno-
carcinomas nasais endêmicos.
Muitos vírus e bactérias, incluindo micoplasmas e clamídias, têm sido isolados
do trato respiratório de ovinos e caprinos, mas nem todos têm mostrado ser a causa
da doença. A importância de algumas bactérias como a Pasteurella haemolytica tem
sido estabelecida em pneumonia de ovinos, mas nenhum papel etiológico evidente
foi identificado para certos micoplasmas (por exemplo, Mycoplasma arginini),
alguns vírus (por exemplo, reovírus) e clamídias. Muitos ovinos portam a Pasteurella
haemolytica no seu trato respiratório superior e amígdalas. A infecção pelo vírus da
parainfluenza 3 (PI-3) é comum, ao passo que infecções por adenovírus (do qual no
mínimo 6 sorotipos são conhecidos em ovinos) e vírus sincicial respiratório geral-
mente são menos freqüentes.
As síndromes de doença respiratória podem ser divididas amplamente em
pneumonia exsudativa de curta duração (aguda) e doença proliferativa prolongada
(crônica). Nem todos os fatores predisponentes de doenças respiratórias agudas
são conhecidos, mas infecções virais agudas em uma população suscetível de
ovinos podem alterar os mecanismos protetores do trato respiratório, de tal maneira
que certas bactérias comensais podem invadir, se multiplicar, e causar sérias
doenças. Um sinergismo confirmado é uma infecção inicial pelo vírus PI -3 seguida
por invasões de P. haemolytica Biótipo A. O resultado é, muitas vezes, uma
pneumonia severa em uma ou várias ovelhas num rebanho. A introdução de novos
animais, alta densidade populacional ou ventilação reduzida podem atuar como
fatores predisponentes associados. Em tais surtos, lobos pulmonares anteriores
consolidados e de coloração vermelha são comuns à necropsia.
Usualmente, alterações pulmonares crônicas, progressivas e proliferativas são
associadas às chamadas infecções virais lentas. A prevalência de tais infecções,
das quais 2 entidades específicas têm sido descritas em ovinos, varia pelo mundo,
mas pode ser alta em algumas regiões. Na pneumonia progressiva (“maedi” – ver
pág. 915), o pulmão inteiro pode-se alterar em um processo de proliferação celular
gradual (pneumócitos e linfócitos do Tipo I) que, com o tempo, resulta em dispnéia
e debilitação marcante. A outra doença viral lenta é a adenomatose pulmonar (ver
adiante), na qual pneumócitos do Tipo II e células bronquiolares relacionadas
proliferam tanto que se formam massas tumorais no tecido pulmonar.
Bronquite e pneumonia crônicas que afetam principalmente os lobos diafragmá-
ticos podem também resultar de infestação verminótica (Dictyocaulus filaria , Muellerius
capillaris ou Protostrongylus rufescens). Uma pneumonia crônica posterior, mas não
progressiva, que pode regredir após alguns meses, é chamada “pneumonia atípica”
(ver adiante). Esta pneumonia exsudativa e proliferativa, que afeta primariamente os
lobos anteriores dos pulmões, está associada com Mycoplasma ovipneumoniae e P.
haemolytica (sorotipos do Tipo A). O vírus da parainfluenza 3 também pode estar
envolvido nos surtos dessa doença. Linfadenite caseosa (ver pág. 77), causada por
Corynebacterium pseudotuberculosis, pode causar abscedação dos pulmões e dos
linfonodos associados, e debilitação progressiva em ovinos e caprinos. Demonstrou-
se experimentalmente que um herpesvírus encontrado nos pulmões de ovinos com
adenomatose pulmonar causa uma pneumonia intersticial crônica leve.
Para o controle da doença respiratória, as condições de manejo predisponentes
devem ser evitadas. A vacinação com bacterinas que contém P. haemolytica tem
dado resultados equívocos ou desapontadores. A vacinação por via intranasal ou
outras vacinas com PI-3 podem ser úteis. O controle das doenças virais lentas, da
pneumonia atípica e da linfadenite caseosa é considerado adiante.
Doenças Respiratórias dos Ovinos e Caprinos 913

Em todos os surtos de doença respiratória, a assistência laboratorial, com


necropsia, sorologia ou microbiologia, pode auxiliar o diagnóstico e resultar num
controle mais efetivo.

PLEUROPNEUMONIA CONTAGIOSA CAPRINA


É uma pneumonia contagiosa com pleurite, que ocorre em cabras em muitas
partes do Oriente Médio, África e Ásia, menos comumente nos países mediterrâ-
neos e Américas Central e do Norte.
Etiologia – Pneumonias agudas em cabras são causadas pela cepa F38 de
Mycoplasma, M. mycoides mycoides (colônia grande, Mmm CG) e M. mycoides
capri (ver também PLEUROPNEUMONIA CONTAGIOSA BOVINA, pág. 880). A cepa F38
causa uma doença letal altamente contagiosa muito semelhante às descrições
iniciais da pleuropneumonia clássica contagiosa caprina, e parece ser transmitida
por aerossol infectado. A morbidade pode ser de 100% e a mortalidade de 60 a
100%. A aglomeração ou o confinamento de animais facilita a disseminação da
doença.
A doença causada pelos outros micoplasmas não é particularmente contagiosa.
Tanto a M. mycoides mycoides (colônia grande) como a M. mycoides capri têm sido
isoladas na Austrália; a primeira na América do Norte.
Achados clínicos e lesões – Fraqueza, perda do apetite, tosse, hiperpnéia, e
descarga nasal acompanhadas de febre (41°C) são freqüentemente encontradas.
Intolerância ao exercício e, eventualmente, dificuldade respiratória ocorrem. Uma
forma septicêmica da doença sem envolvimento específico do trato respiratório tem
sido descrita.
Tipicamente, o tórax contém um excesso de fluido amarelo-claro e há uma
pneumonia fibrinosa aguda com pleurite fibrinosa de base. A consolidação é algumas
vezes restrita a um pulmão. O grau de distensão do septo interlobular por líquido
serofibrinoso varia e quando a infecção é causada pela cepa F38 é considerada
menos notável que quando causada por outros micoplasmas. A tendência a formar
seqüestro necrótico é menor que na pleuropneumonia contagiosa bovina e lesões
podem regredir lentamente em animais sobreviventes. Pericardite fibrinosa, artrite
fibrinopurulenta e meningite também ocorrem em algumas infecções.
Diagnóstico – Os sinais clínicos, a epidemiologia e os achados post mortem são
usados para estabelecer um diagnóstico. O microrganismo causal deve ser isolado
e identificado, mas o isolamento pode ser difícil em alguns casos. Pasteurella spp
são freqüentemente associadas com pneumonia em caprinos e podem dificultar a
identificação dos principais agentes etiológicos. Em casos agudos, as formas
filamentosas do micoplasma podem, muitas vezes, ser detectadas em exames
microscópicos de campo escuro do líquido pleural. Não há testes sorológicos de uso
de rotina, mas testes de fixação de complemento podem ser úteis.
Controle – A quarentena de rebanhos afetados é desejável. Vacinas, mortas e
vivas, têm sido usadas, mas sua eficiência não está estabelecida. O tratamento com
tilosina diariamente à base de 10mg/kg, IM por 3 dias tem sido efetivo.

PNEUMONIA NÃO PROGRESSIVA (ATÍPICA)


É uma doença crônica infecciosa raramente fatal que geralmente afeta ovinos
com até 1 ano de idade e ocasionalmente adultos.
Etiologia – Mycoplasma ovipneumoniae, Pasteurella haemolytica Biótipo A e
talvez o vírus da parainfluenza 3 (PI-3) estejam implicados. A Pasteurella multocida
pode constituir-se no componente bacteriano da doença em alguns países e casos,
mas Mycoplasma arginini e Chlamydia psittaci, que são isoladas de alguns
casos, parecem não ter um papel na etiologia da doença.
Doenças Respiratórias dos Ovinos e Caprinos 914

É provável que a transmissão seja exclusivamente por via respiratória e que a


ovelha seja a fonte principal de infecção para cordeiros. A colonização do trato
respiratório superior por microrganismos pode ocorrer logo ao primeiro ou segundo
dia após o nascimento. A forma endêmica ocorre quando aumenta o número de
agentes respiratórios, conforme o período de parição progride e aumenta o número
de animais infectados que excretam os microrganismos. O declínio de anticorpos
colostrais permite o desenvolvimento de uma pneumonia crônica não progressiva
em 2 a 3 semanas, porém mais usualmente dos 2 aos 3 meses de idade. Muitos
fatores, primariamente a densidade de animais e o manejo antes e após a parição,
influenciam a incidência e severidade num rebanho. Em rebanhos confinados,
≥ 40% dos cordeiros podem estar afetados. Surtos podem ocorrer em cordeiros
mais velhos e até em ovelhas após uma mudança estressante, como a movimen-
tação ou mistura de animais de origens diferentes.
Patogenia – Mycoplasma ovipneumoniae produz apenas alterações leves nos
pulmões, mas estas permitem a invasão secundária pela P. haemolytica, com
concomitante exacerbação das lesões e dos sinais clínicos. O micoplasma pode
persistir nos pulmões por ≥ 7 meses após a infecção inicial, mas pasteurelas
geralmente são eliminadas dentro de 3 meses e as lesões começam a se resolver
após esse período. Apesar de a pneumonia não progressiva ser reproduzida
experimentalmente apenas com estes 2 microrganismos, a infecção pelo vírus PI-3
pode ser um precursor necessário da doença de campo.
Achados clínicos – A doença é muitas vezes leve o suficiente para passar
despercebida. Os sinais incluem tosse, descarga nasal mucopurulenta, depressão,
hiperpnéia e, ocasionalmente, dispnéia; eles são particularmente evidentes após
exercício. Mortes esporádicas podem ocorrer. Pirexia pode ser observada nos
estágios iniciais. Inapetência e crescimento lento são vistos em cordeiros estabulados.
Lesões – As lesões pulmonares claramente demarcadas, que variam de verme-
lho-acastanhado (nos estágios iniciais) a cinza, são geralmente encontradas nas
porções apical, cardíaca e anteriores dos lobos diafragmáticos. Pleurite pode estar
presente. Alterações histológicas incluem hiperplasia linfóide nodular, muitas vezes
com manguitos linfóides, perivasculares e peribronquiolares, hiperplasia epitelial
bronquiolar, e cicatrizes com aspecto hialino dentro ou próximo às paredes bron-
quiolares. O exsudato celular no lúmen alveolar consiste principalmente de macrófa-
gos e, nos estágios iniciais, quando as pasteurelas estão presentes, de neutrófilos.
Diagnóstico – Sinais de doença respiratória simultaneamente em vários ovinos
< 1 ano de idade são sugestivos, mas a confirmação depende dos exames macro
e microscópico das lesões pulmonares. Exames microbiológicos e sorológicos
auxiliam na identificação da doença, mas não representam um diagnóstico defini-
tivo, uma vez que os 2 microrganismos ocorrem amplamente em populações de
ovelhas normais (e cabras, no caso de micoplasma) e invadem rapidamente o tecido
pulmonar “enfermo” por outras causas.
Diagnósticos diferenciais incluem adenomatose pulmonar, “maedi”, pasteurelose
e infecção verminótica pulmonar. A diferenciação absoluta se baseia no exame
patológico dos pulmões. A adenomatose pulmonar e a “maedi” geralmente afetam
animais > 1 ano de idade e envolvem indivíduos, enquanto a pasteurelose causa
sinais mais agudos e mortes, afetando animais de todas as idades.
Tratamento e controle – Vacinas contra Pasteurella têm sido inefetivas expe-
rimentalmente; vacinas contra micoplasma não têm sido testadas. O tratamento
deve incluir o tiamulin injetável (o qual demonstrou experimentalmente prevenir o
desenvolvimento da lesão) ou a tilosina; ambos devem ser administrados na
dosagem de 10mg/kg, preferencialmente durante 3 dias consecutivos. A oxitetraciclina
é menos efetiva. Tiamulin ou tilosina em uma base profilática parecem ser as drogas
mais promissoras no combate à pneumonia atípica endêmica.
Doenças Respiratórias dos Ovinos e Caprinos 915

O controle requer um bom manejo para maximizar a capacidade de resistência


à infecção e minimizar a transmissão de microrganismos respiratórios. A concentra-
ção dos animais estabulados, os sistemas de confinamentos e a boa ventilação são
importantes. Cordeiros devem ser expostos o mínimo possível a animais mais
velhos. Animais recém-adquiridos devem ser isolados até que estejam recuperados
do estresse do transporte.

PNEUMONIA PROGRESSIVA
(“Maedi-Visna”, “Zwoegersiekte”)
É uma doença viral progressiva e crônica de caprinos e ovinos. Em ovinos, o vírus
afeta principalmente pulmões e úbere, mas o SNC e as articulações também podem
ser afetados. A doença tem sido relatada nas Américas do Norte e do Sul, Europa,
África e Ásia. A doença em ovinos nunca foi encontrada na Austrália e na Nova
Zelândia, embora seja prevalente em caprinos nesses países.
Etiologia – O vírus RNA causal (um lentivírus), que persiste nos leucócitos de
ovinos infectados, na presença de resposta imune humoral e mediada por células,
é detectável por vários testes sorológicos. Anticorpos neutralizantes aparecem mais
lentamente que outros anticorpos e, em geral, vários meses após a infecção.
Ovelhas sorologicamente positivas devem ser consideradas infectadas e capazes
de transmitir o vírus. Estima-se que a transmissão ocorra habitualmente através da
ingestão de colostro ou leite que contenham o vírus, ou pela inalação de gotículas
de aerossóis. Acredita-se que ocorra infecção intra-uterina com pouca freqüência.
Todas as raças de ovinos parecem ser suscetíveis, embora ovinos border leicester
pareçam mais suscetíveis. As práticas de manejo podem influenciar as taxas de
morbidade.
Uma síndrome que acomete caprinos, conhecida como artrite e encefalite
caprinas (ver pág. 475), é causada por um retrovírus proximamente relacionado.
Achados clínicos – Os sinais raramente ocorrem em ovelhas < 2 anos e são
mais comuns naquelas > 4 anos de idade. A doença progride lentamente, com
aumento dos problemas respiratórios ( “maedi” ou “zwoegersiekte”) como o principal
sinal. Tosse e exsudato bronquial são raramente evidentes. Ovinos afetados podem
morrer de pneumonia secundária causada por Pasteurella. Uma mastite não
inflamatória endurecida é comum. Outras, porém mais raras, formas da doença
produzidas por esse vírus são encefalite e artrite. Todas são infecções de progres-
são lenta. Na forma encefalítica (conhecida como visna), ataxia, tremores muscu-
lares, ou movimentos circulares progridem para paresia e, eventualmente, para
paralisia completa.
Uma doença neurológica aguda é de ocorrência freqüente em cabritos de 1 a 6
meses de idade em fazendas onde há uma alta incidência de artrite em lactentes.
Diferente da doença artrítica progressiva lenta em adultos, os cabritos infectados
apresentam sinais de ataxia no primeiro mês de idade, que podem progredir para
paralisia dentro de 2 meses.
Lesões – As lesões macroscópicas de pneumonia progressiva são restritas aos
pulmões e linfonodos associados. Os pulmões não colapsam quando o tórax é
aberto e são anormalmente firmes e pesados (2 a 4 vezes o peso normal). As
primeiras alterações no pulmão podem ser difíceis de se detectar, mas no final da
doença, os pulmões estão mosqueados por áreas consolidadas de coloração cinza
e marrom. Os linfonodos mediastinais e traqueobronquiais estão aumentados e
edematosos. Pneumonia intersticial, hiperplasia linfóide perivascular e peribron-
quial, e hipertrofia do músculo liso são observadas por todo o pulmão. Lesões no
SNC, quando ocorrem, são de meningoleucoencefalite com desmielinização secun-
dária. Todas as lesões são progressivas e resultam da resposta imunocelular do
hospedeiro e não diretamente do dano causado pelo vírus.
Doenças Respiratórias dos Ovinos e Caprinos 916

Diagnóstico – O diagnóstico clínico de pneumonia progressiva não pode ser


feito com exatidão. A adenomatose pulmonar, pneumonia verminótica e linfadenite
caseosa pulmonar são outras condições que requerem diferenciação. A necropsia
irá excluir as duas últimas e, na maioria dos casos, a adenomatose pulmonar
também. Listeriose, “scrapie”, doença “louping”, raiva e lesões que ocupam espaço
devem ser consideradas quando sinais neurológicos são observados. Em rebanhos
que são acometidos por pneumonia progressiva pela primeira vez, deve-se confir-
mar o diagnóstico através de histopatologia, sorologia ou isolamento do vírus.
Controle – Não há um tratamento efetivo. Métodos de controle incluem o
sacrifício de todas as ovelhas soropositivas (algumas vezes incluindo seus cordei-
ros) e repetição de testes em intervalos de , 6 meses, até que ≥ 3 testes negativos
sejam obtidos. Como alternativa, os cordeiros podem ser isolados ao nascimento,
não tendo acesso ao colostro e leite de ovelhas positivas, e sendo submetidos ao
aleitamento artificial.

ADENOMATOSE PULMONAR
(“Jaagsiekte”)
É uma neoplasia viral contagiosa dos pulmões dos ovinos e mais raramente dos
caprinos. A doença tem sido relatada na Europa, Ásia, África, e Américas do Sul e
do Norte.
Etiologia – Os exsudatos respiratórios dos ovinos afetados são infectantes. O
agente causal não foi estabelecido, embora um retrovírus tenha sido identificado no
tumor e nos fluidos. Um herpesvírus também foi isolado do tumor, mas parece não
ter um papel na etiologia da doença. A transmissão natural parece ocorrer geralmen-
te pela via respiratória. O contato íntimo, por exemplo, pelo cocho de ração, pode
favorecer a disseminação do vírus.
Achados clínicos – O período de incubação após infecção natural se estende por
meses, de modo que os sinais clínicos da doença geralmente se tornam eviden-
tes quando os ovinos têm de 3 a 4 anos de idade. Os tumores produzem sinais clínicos
quando se tornam suficientemente grandes ou numerosos a ponto de interferirem na
respiração. Ovinos afetados perdem peso e mostram aumento na dificuldade respi-
ratória. Estertores úmidos podem ser ouvidos mesmo sem o uso de um estetoscópio.
A tosse não é proeminente. O abaixamento forçado da cabeça muitas vezes faz com
que muco espumoso escorra das narinas. A doença clínica termina fatalmente após
dias ou semanas, algumas vezes devido à pasteurelose secundária.
Lesões – Os tumores estão restritos aos pulmões e raramente aos linfonodos
associados. Variam de nódulos pequenos a áreas consolidadas extensas envolven-
do as partes ventrais de ≥ 1 lobo. Esses são firmes, acinzentados, lisos e nitidamente
demarcados. Quantidades copiosas de um líquido branco e espumoso estão
presentes nas vias aéreas. Alterações histológicas são causadas por proliferação
descontrolada de pneumócitos do Tipo II em disposição colunar e células semelhan-
tes nos bronquíolos.
Diagnóstico – Não existem testes sorológicos ou bioquímicos disponíveis
capazes de identificar com segurança os ovinos afetados antes que sinais clínicos
se desenvolvam. Embora vários carneiros num rebanho possam estar afetados,
usualmente uma única ovelha é notada num determinado momento. A idade da
ovelha, os estertores úmidos, e a evidência de volumes anormais de fluido respira-
tório num ovino sem febre auxiliam o diagnóstico. Entretanto, tais casos podem ser
complicados por uma pneumonia terminal causada por Pasteurella, e o exame
histológico é muitas vezes essencial para confirmar a presença de tecido tumoral.
Controle – O tratamento não é prático e o controle em rebanhos nos quais a
doença sabidamente ocorre deve ser baseado na redução de aglomerações e na
Doenças Respiratórias dos Ovinos e Caprinos 917

eliminação prematura de qualquer ovino que esteja emagrecido, perdendo peso, ou


mostrando distúrbios respiratórios.

BERNE NASAL DE OVINOS


A mosca do berne do nariz de ovinos, Oestrus ovis, é um parasita cosmopolita
que, nos seus estágios larvais, habita as vias nasais e seios de ovinos e caprinos.
Ela também tem sido vista em ovinos de chifre grande (Ovis canadensis), no cabrito
montês europeu (Capra ibex), e em hospedeiros não característicos, como homem
e cães. Embora a sua incidência em alguns países do norte da Europa tenha
diminuído nos últimos anos, ela continua a ser um dos parasitas de ovinos
mais amplamente distribuídos na África do Sul, Brasil e países na Bacia do
Mediterrâneo.
A mosca adulta é marrom-acinzentada e possui , 12mm de comprimento. A
fêmea deposita as larvas ao redor e no interior das narinas de ovinos sem pousar
nesses locais. Essas pequenas larvas branco-claras (inicialmente < 2mm de
comprimento) migram para o interior da cavidade nasal e muitas delas passam no
mínimo algum tempo nos seios paranasais. À medida que as larvas (bernes)
amadurecem, elas se tornam de coloração creme, depois escuras e, finalmente,
mostram uma faixa escura ou negra na superfície dorsal de cada segmento. Diz-se
que o período larval, que é usualmente mais curto em animais jovens, varia de 1 a
10 meses. Quando maduras, as larvas deixam as vias nasais, caem no solo, se
enterram algumas polegadas e transformam-se em pupa. O período pupal dura de
3 a 9 semanas, dependendo das condições ambientais. No final desse período, a
mosca emerge do envoltório pupal e segue seu caminho para a superfície. O
acasalamento ocorre logo e a fêmea começa a depositar larvas.
Achados clínicos – Uma vez que as larvas comecem a se mover nas vias nasais,
uma profusa descarga ocorre, no início clara e mucóide, mas posteriormente muco-
purulenta e freqüentemente tingida por finas estrias de sangue advindas de hemor-
ragias minúsculas produzidas pelos ganchos e espinhos das larvas. A atividade
contínua das larvas, particularmente se elas são numerosas, causa um espessa-
mento da mucosa nasal que, juntamente com a descarga mucopurulenta, leva a
distúrbios respiratórios. Paroxismos de espirros acompanham a migração das larvas
maiores. Larvas presentes nos seios são algumas vezes incapazes de escapar; elas
morrem e podem gradualmente se calcificar ou levar a uma sinusite séptica. A
inflamação purulenta, produzida nos seios ocasionalmente, pode-se disseminar
para o cérebro com resultados fatais. Entretanto, os efeitos principais do berne nasal
são irritação, com uma conseqüente redução no tempo de pastagem, e perda da
condição. As infestações podem consistir de ≥ 80 larvas, mas usualmente só 4 a 15
são encontradas.
Para evitar a tentativa da mosca de depositar as larvas, a ovelha pode correr de
um lugar para outro, conservando suas narinas próximas ao solo, e pode espirrar e
bater suas patas com força ou sacudir sua cabeça. Comumente, sobretudo durante
as horas mais quentes do dia quando as moscas estão mais ativas, pequenos
grupos de ovelhas agrupam-se com as faces voltadas para o centro de um círculo,
com as cabeças abaixadas e bem próximas.
Tratamento – Ruelene administrado à força por VO, na dose de 110mg/kg, deve
proporcionar bom controle. Rafoxanide, administrado à força por VO em bolo ou
garrafada na dose de 7,5mg/kg, triclorfon VO ou IM administrado à força, na dose
de 75mg/kg, e nitroxinil s.c. na dose de 20mg/kg têm sido considerados eficazes.
Ivermectina VO ou s.c. na dose de 200µg/kg também foi considerada eficaz.
Doenças Respiratórias dos Pequenos Animais 918

DOENÇAS RESPIRATÓRIAS
DOS PEQUENOS ANIMAIS
INTRODUÇÃO
Doenças respiratórias ocorrem freqüentemente em cães e gatos. Apesar de
sinais clínicos, como tosse e dispnéia, usualmente serem atribuídos a problemas
primários no trato respiratório, eles podem advir de desordens de outros sistemas,
por exemplo, insuficiência cardíaca congestiva.
Tanto animais jovens como idosos correm um grande risco de desenvolver
doença respiratória. Ao nascimento, os sistemas respiratório e imune são incomple-
tamente desenvolvidos; isto facilita a introdução e a disseminação de patógenos
dentro dos pulmões, podendo ocorrer edema alveolar. Em animais idosos, alte-
rações degenerativas crônicas que destroem a depuração mucociliar normal e a
barreira imunológica podem tornar os pulmões mais vulneráveis aos patógenos
aéreos e às partículas tóxicas.
Uma flora variável de microrganismos comensais indígenas ( Pasteurella
multocida, Bordetella bronchiseptica, estreptococos e bactérias coliformes) normal-
mente reside nas passagens nasais de cães e gatos, nasofaringe, traquéia superior
e intermitentemente nos pulmões, sem causar sinais clínicos. Infecções oportunis-
tas podem ocorrer por estas bactérias, quando os mecanismos respiratórios de
defesa são comprometidos por: 1. infecção por um patógeno primário, como o vírus
da cinomose, da parainfluenza, adenovírus canino do Tipo 2 em cães e vírus da
rinotraqueíte ou da calicivirose em gatos; 2. outros insultos como inalação de fumaça
ou gases nocivos; ou 3. doenças como insuficiência cardíaca congestiva e neoplasia
pulmonar. Infecções bacterianas secundárias complicam o manejo das infecções
respiratórias virais de cães e gatos. Os patógenos podem continuar a residir no trato
respiratório de animais convalescentes. Quando estressados, estes animais podem
ter recidivas; eles também podem agir como fonte de infecção para outros. Práticas
de manejo inadequadas, como superpopulação, estão freqüentemente associadas
com condições higiênicas e ambientais impróprias, o que resulta em estresse e
aumento da incidência e severidade das infecções. Condições que favorecem a
disseminação da infecção freqüentemente ocorrem em gatis, canis, “pet shops”,
pensões, etc.
Anormalidades congênitas, como narinas estenóticas, alongamento do palato
mole e estenose traqueal, podem causar disfunção respiratória. Massas neoplási-
cas e alterações degenerativas das vias aéreas, como paralisia da laringe (ver
pág. 864) e colapso traqueal, podem resultar em dispnéia ou em outras manifesta-
ções clínicas de doença respiratória.
Colapso traqueal é mais comum em raças miniaturas e toys, e raro em gatos.
A etiologia é desconhecida. Os animais afetados apresentam uma tosse crônica e
dispnéia inspiratória ou expiratória. Freqüentemente eles são obesos e apresentam
doença pulmonar ou cardiovascular concomitante. Perda de peso (se o animal for
obeso) é uma parte importante do manejo. Outras medidas incluem restrição ao
exercício, redução da excitação e do estresse e terapia médica com antitussivos,
antibióticos e broncodilatadores.

PNEUMONITE ALÉRGICA
É uma reação de hipersensibilidade aguda ou crônica dos pulmões e das
pequenas vias aéreas.
Etiologia – Uma etiologia de base raramente é determinada nas reações de
hipersensibilidade pulmonar em cães e gatos. Hipersensibilidade do Tipo I ou
Doenças Respiratórias dos Pequenos Animais 919

imediata provavelmente é o mecanismo mais comum, embora mecanismos dos


Tipos III e IV também possam estar envolvidos (ver também pág. 512). O infiltrado
celular é tipicamente eosinofílico; entretanto, infiltrados inflamatórios mistos que
consistem de células mononucleares, eosinófilos, neutrófilos ou infiltrados predomi-
nantemente linfocíticos podem ser observados. A infiltração pulmonar com eosino-
filia (IPE, ver pág. 515) é um grupo de doenças associadas com eosinofilia periférica
e pulmonar associada. Entretanto, nem todos os tipos de pneumonites alérgicas
estão associados com IPE. Causas de IPE incluem migração de parasitas, reação
a microfilárias de vermes cardíacos, vermes pulmonares, infecções fúngicas ou
bacterianas crônicas (histoplasmose, aspergilose), vírus, antígenos externos e
fatores precipitantes desconhecidos. Dirofilariose canina (ver pág. 87) ocorre
quando os cães se tornam sensibilizados a microfilárias. Uma reação semelhante
pode ser observada em gatos com vermes cardíacos. A migração de parasitas
intestinais e parasitas pulmonares primários pode induzir sinais subclínicos ou
sinais leves de pneumonite alérgica. A hipersensibilidade pulmonar também pode
ser causada por drogas e reações a alérgenos inalados; entretanto, isto é pouco
documentado em pequenos animais.
Achados clínicos – Tosse crônica é o sinal mais comum. Ela pode ser leve ou
severa, produtiva ou não, progressiva ou não. Perda de peso, taquipnéia, dispnéia,
respiração ruidosa, intolerância ao exercício e, ocasionalmente, hemoptise podem
ser observadas. Animais severamente afetados podem apresentar dispnéia mode-
rada a severa e cianose em repouso. À auscultação os sons respiratórios estão
normais ou aumentados, com estertores ou ruídos. A febre normalmente está
ausente. O grau de dispnéia e tosse está relacionado com a severidade da
inflamação dentro das vias aéreas e alvéolos.
Diagnóstico – É baseado na história e nos achados radiográficos e clinicopato-
lógicos. Radiografias torácicas freqüentemente mostram infiltrado alveolar
irregular e aumento da demarcação bronquial e intersticial. Evidências radiográficas
de verme cardíaco ou doenças pulmonares parasitárias podem sugerir uma
etiologia de base. Alterações hematológicas típicas são leucocitose leve, eosino-
filia periférica variável (4 a 50%) e ocasionalmente basofilia. Exames de fezes,
teste de Knotts ou teste para verme cardíaco oculto são indicados quando se
suspeita de parasitismo pulmonar ou dirofilariose. Um lavado traqueal para
análise citológica, cultura e detecção de formas larvais freqüentemente é útil. Na
pneumonite alérgica, a citologia do lavado traqueal geralmente revela uma
predominância de eosinófilos. Culturas bacterianas de lavados traqueais coleta-
dos assepticamente geralmente são negativas.
Tratamento – Quando uma causa de base for encontrada, a eliminação do
agente ofensor e uma terapia curta com glicocorticóides resolvem o problema.
Prednisolona começando na dose de 1 a 2mg/kg por peso corporal, VO, por 10 a 14
dias, freqüentemente é suficiente. Quando a IPE é secundária à dirofilariose ou a
parasitas pulmonares, o tratamento com prednisolona antes ou durante o tratamen-
to para parasita controla os sinais pulmonares. Quando uma etiologia de base não
puder ser determinada, a terapia prolongada com prednisolona por 3 semanas a 3
meses freqüentemente é necessária. Quando se suspeita de broncoconstrição
severa, broncodilatadores podem ser úteis. Animais severamente dispnéicos po-
dem requerer oxigenioterapia de curto prazo.

COMPLEXO DE DOENÇAS RESPIRATÓRIAS DOS FELINOS


O complexo de doenças respiratórias dos felinos inclui doenças caracterizadas por
rinite, conjuntivite, lacrimejamento, salivação e ulcerações orais. As doenças princi-
pais, rinotraqueíte viral felina (RVF) e infecção por calicivírus felino (CVF), afetam
Doenças Respiratórias dos Pequenos Animais 920

espécies exóticas assim como as domésticas. Pneumonite felina (Chlamydia psittaci)


e infecções por micoplasma parecem ser de menor importância. Pleurite e peritonite
infecciosa felina (ver pág. 502) tipicamente causam uma condição mais generalizada,
mas podem causar sinais de infecção leve no trato respiratório superior.
A RVF e os calicivírus são hospedeiros específicos e não apresentam risco
conhecido para humanos. Conjuntivites humanas, causadas pelo agente clamidial
felino, têm sido relatadas.
Etiologia – Provavelmente 40 a 45% das infecções respiratórias superiores em
felinos são causadas pelo vírus da RVF, um herpesvírus. O calicivírus felino tem
uma incidência semelhante. Infecções duplas por esses vírus ocorrem comumente.
Outros microrganismos como Chlamydia psittaci , Mycoplasma spp e reovírus são
considerados importantes na maioria das infecções restantes.
A transmissão natural desses agentes ocorre via gotículas de aerossol e fomitos,
que podem ser carreados para um gato suscetível por pessoas. Animais convalescen-
tes podem continuar a abrigar o vírus por muitos meses. O calicivírus é eliminado
continuamente, enquanto o vírus da RVF é liberado intermitentemente. O estresse
pode precipitar um curso secundário da doença. O período de incubação varia de
2 a 6 dias para RVF e CVF, e de 5 a 10 dias para pneumonite.
Achados clínicos – O aparecimento de RVF é marcado por febre, espirros
freqüentes, conjuntivite, rinite e, muitas vezes, salivação. Excitação ou movimenta-
ção podem induzir o espirro. A febre pode alcançar 40,5°C, mas cede e tende a flutuar
do normal até 39°C. Inicialmente, descargas serosas nasal e ocular ocorrem;
rapidamente se tornam mucopurulentas e copiosas, ocasião em que depressão e
anorexia estão evidentes. Gatos severamente debilitados podem desenvolver
estomatite ulcerativa, ocorrendo ceratite ulcerativa em alguns. Os sinais podem
persistir por 5 a 10 dias em casos mais leves, e por até 6 semanas em casos graves.
Geralmente, a mortalidade é baixa e o prognóstico é bom, exceto para gatos jovens
e idosos. A doença muitas vezes é prolongada e uma perda de peso marcante pode
ocorrer. A RVF freqüentemente é complicada por infecções bacterianas secundá-
rias; abortos e infecções generalizadas têm sido associados com ela.
Há muitas cepas de calicivírus felino relacionadas sorologicamente. Elas pa-
recem ter predileção pelo epitélio da cavidade oral e pelos tecidos profundos do
pulmão. Alguns calicivírus não são patogênicos. Alguns induzem pouco mais que
salivação e ulceração da língua, palato ou narinas duros; outros produzem edema
pulmonar e pneumonia intersticial. Duas cepas podem produzir uma “síndrome de
languidez” sem sinais de ulceração oral ou pneumonia. Estas 2 últimas cepas
produzem uma febre transitória, claudicação alternante nos membros e dor à
palpação das articulações afetadas. Estes sinais ocorrem mais freqüentemente em
filhotes de 8 a 12 semanas e geralmente se resolvem sem tratamento. A síndrome
pode ocorrer em filhotes vacinados contra o CVF, pois nenhuma vacina protege
contra ambas as cepas de calicivírus que produzem a “síndrome da languidez”.
O calicivírus também tem sido encontrado em gatos com gengivite linfocítica
plasmocítica e estomatite. As lesões superficiais cicatrizam-se rapidamente e os
gatos afetados recuperam o apetite 2 a 3 dias após o início da doença. O curso
clínico geralmente é de 7 a 10 dias. Febre aguda, inapetência e depressão são sinais
comuns. Rinite serosa e conjuntivite também podem ocorrer.
Infecções por C. psittaci produzem caracteristicamente conjuntivite; gatos infec-
tados espirram ocasionalmente. A febre pode ocorrer à medida que a doença
progride, além de uma descarga lacrimal serosa a uma conjuntivite mucopurulenta,
infiltração linfóide e hiperplasia epitelial. Animais convalescentes podem sofrer
recaídas.
O micoplasma pode infectar os olhos e trato respiratório superior, caracteristica-
mente produzindo edema severo da conjuntiva e uma rinite menos severa.
Doenças Respiratórias dos Pequenos Animais 921

A ocorrência de doença viral severa do trato respiratório superior é rara em gatos


adultos adequadamente vacinados. Estes gatos devem ser avaliados com relação
a doenças imunodeficientes concomitantes, incluindo a leucemia e a imunodeficiên-
cia felinas.
Lesões – As lesões geralmente estão confinadas ao trato respiratório, conjun-
tivas e cavidade oral. Na rinotraqueíte viral felina, as membranas mucosas nasais
e conjuntivas encontram-se avermelhadas, tumefeitas e cobertas por um exsudato
seroso a purulento. Em casos severos, necrose focal dessas membranas pode
ocorrer. A laringe e traquéia podem estar levemente inflamadas. Os pulmões podem
estar congestos, com pequenas áreas de consolidação; entretanto, alterações
pulmonares raramente são significativas na RVF, exceto, possivelmente, nos gatos
jovens estressados. A lesão histológica característica da RVF é o corpo de inclusão
intranuclear acidofílico. Durante os estágios iniciais da doença, inclusões podem
estar presentes em pontos de necrose epitelial na língua, membranas nasais,
amígdalas, epiglote, traquéia e membrana nictitante. Corpos de inclusão são
transitórios. Inclusões não ocorrem em infecções por calicivírus.
A lesão característica causada pelo calicivírus felino (CVF) é a ulceração da
mucosa oral. Lesões na língua ou palato duro de início podem aparecer como
vesículas que, subseqüentemente, se rompem. Por vezes, ulcerações ocorrem no
epitélio que recobre o septo nasal médio. Os calicivírus mais virulentos destroem as
células epiteliais dos bronquíolos e alvéolos, o que causa edema pulmonar agudo
que progride diretamente para uma hiperplasia bronquiolar seropurulenta e pneu-
monia intersticial.
No início do curso clínico da pneumonite felina, o microrganismo causal pode ser
identificado pela coloração de Giemsa nos esfregaços ou impressões conjuntivais.
Os corpos elementares são intracitoplasmáticos. Micoplasmas ocorrem na forma de
corpos cocóides extracelulares freqüentemente observados na superfície das
células epiteliais das conjuntivas.
Diagnóstico – O diagnóstico presuntivo é baseado em sinais típicos como
espirros, conjuntivite, rinite, lacrimejamento, salivação, úlceras orais e dispnéia. A
rinotraqueíte viral felina (RVF) tende a afetar as vias conjuntivais e nasais; os
calicivírus, a mucosa oral e o trato respiratório inferior. Infecções por clamídia
resultam em conjuntivite crônica e de baixo grau. Essas características podem ser
obscurecidas em infecções mistas. Exame citológico de raspados conjuntivais
corados com Giemsa é de valia para a identificação de clamídias e micoplasmas. Um
diagnóstico definitivo é baseado no isolamento e identificação do agente. A mucosa
da orofaringe, narinas externas e bolsas conjuntivais são os locais preferidos de
amostragem.
Tratamento – O tratamento é em grande parte sintomático e de suporte, mas
antibióticos de amplo espectro são úteis contra invasores secundários, assim como
diretamente contra C. psittaci. As tetraciclinas são as drogas mais efetivas contra C.
psittaci. Descargas nasais e oculares devem ser freqüentemente removidas para o
conforto do animal. A nebulização pode auxiliar na remoção de secreções pegajosas.
Gotas nasais contendo vasoconstritor (por exemplo, 2 gotas de sulfato de efedrina,
solução a 0,25%, em cada narina duas vezes ao dia ) e antibióticos podem ser úteis
na redução da quantidade de exsudato nasal. Um ungüento oftálmico suave
contendo antibióticos (tetraciclinas em infecções por C. psittaci ) é indicado 5 a 6
vezes ao dia para prevenir a irritação da córnea produzida pelo exsudato ressecado.
Se ocorrerem úlceras de córnea em infecções pelo vírus da rinotraqueíte felina
(ceratite herpética), é indicada a administração de preparações oftálmicas contendo
idoxuridina ou aciclovir, além de outras preparações oftálmicas com antibiótico. Se
a dispnéia for severa, o gato pode ser colocado em uma tenda de oxigênio. Fluidos
podem ser indicados para corrigir a desidratação e a alimentação forçada pode ser
Doenças Respiratórias dos Pequenos Animais 922

necessária. A esofagostomia pode ser necessária para a alimentação de gatos


severamente debilitados. Anti-histaminas (por exemplo, maleato de clorfeniramina,
VO, duas vezes ao dia [8mg para adultos, 4mg para filhotes]) podem ser benéficas
no curso inicial da doença.
Profilaxia – Estão disponíveis 2 tipos de vacinas com vírus vivo modificado
contra RVF-CVF. O primeiro tipo é administrado por via parenteral; gatos > 9
semanas devem ser vacinados 2 vezes, com um intervalo de 3 semanas. Os filhotes
devem ser vacinados a intervalos de 3 a 4 semanas até que tenham ≥ 12 semanas
de idade. É indicada a revacinação anual com uma única dose.
O segundo tipo de vacina é administrado a gatos saudáveis por instilação nos
sacos conjuntivais e nas passagens nasais (os proprietários devem ser avisados
que gatos inoculados pela via oronasal podem espirrar 4 a 7 dias após a vacinação).
Filhotes vacinados < 12 semanas de idade devem ser revacinados quando atingirem
esta idade. A revacinação anual com uma única dose é recomendada.
Vacinas contra RVF-CVF com vírus vivo modificado administradas por via pa-
renteral estão disponíveis em associação com vacinas contra o vírus da panleuco-
penia felina, vivo modificado ou quimicamente inativado. Uma vacina parenteral
composta inteiramente de vírus inativados também está disponível.
Vacinas contra C. psittaci que contêm embrião de galinha ou célula original são
administradas por via parenteral. Uma única dose é recomendada para gatos > 12
semanas de idade; filhotes mais jovens devem ser revacinados com 16 semanas;
todos devem ser revacinados anualmente. Estas vacinas são indicadas em gatis ou
em propriedades onde a infecção pela C. psittaci for confirmada. As vacinas contra
a clamidiose estão disponíveis em associação com as vacinas contra panleucopenia,
RVF e CVF. A vacinação sistemática e o controle dos fatores ambientais (exposição
a gatos doentes, superpopulação e estresse) fornecem uma excelente proteção
contra doenças do trato respiratório superior.

TREMATÓDEOS PULMONARES
(Paragonimus kellicotti, P. westermani)
Estes parasitas geralmente são encontrados em cistos, primariamente nos
pulmões de cães, gatos e de vários outros animais domésticos e silvestres. Eles
também têm sido encontrados raramente em outras vísceras ou no cérebro. A
infecção é mais comum na China, sudeste da Ásia e América do Norte. Paragonimus
westermani é um parasita do homem e de outros animais na China e em outros
países no Extremo Oriente.
Os adultos são volumosos, vermelho-acastanhados, ovais e medem , 14 × 7mm.
Os ovos são pardo-dourados, ovais e distintamente operculados, medindo , 100 ×
60µm. Os ovos atravessam a parede do cisto, são expectorados, ingeridos e pas-
sam com as fezes. O ciclo de vida inclui vários caramujos como primeiro hospe-
deiro intermediário e lagostas ou caranguejos como segundo hospedeiro intermediá-
rio. Cães e gatos tornam-se infectados ao comer lagosta ou caranguejos crus conten-
do a cercária encistada. Após penetrar na parede intestinal e vaguear na cavidade peri-
toneal, o parasita jovem passa através do diafragma aos pulmões, onde se estabelece.
Animais infectados podem ter uma tosse crônica, profunda e intermitente;
eventualmente se tornam fracos e letárgicos, embora muitas infecções passem
despercebidas. O diagnóstico é realizado através do achado de ovos característicos
nas fezes ou esputo. A localização nos pulmões é assegurada através de radiogra-
fia. Infecções aberrantes podem ser determinadas através de testes sorológicos.
A administração diária de bitional por 1 semana ou em dias alternados por 1 mês
é um tratamento eficaz. Fenbendazol ou albendazol dados diariamente por 2 e 3
semanas, respectivamente, também são tratamentos úteis para reduzir o número de
ovos depositados e, eventualmente, para matar os parasitas.
Doenças Respiratórias dos Pequenos Animais 923

NEMATÓIDEOS PULMONARES
Ver também INFECÇÃO VERMINÓTICA PULMONAR , página 865.

Aelurostrongylus abstrusus
Este nematóideo, o verme pulmonar mais comum em gatos, é encontrado em
muitas partes do mundo, incluindo os EUA, Europa e Austrália. Eles são parasitas
pequenos (machos 7mm, fêmeas 10mm), profundamente alojados nos tecidos
pulmonares. Os ovos são forçados a entrar nos dutos alveolares e alvéolos
adjacentes, onde formam pequenos nódulos. Eles encontram-se dentro desses
nódulos. Uma vez que a larva escapa, ela é tossida, deglutida e passa nas fezes.
As larvas observadas nas fezes de animais infectados são enroladas, têm uma
cauda ondulada com uma espinha e têm < 400µm de comprimento. O ciclo de vida
inclui caramujos ou lesmas como primeiros hospedeiros intermediários e rãs,
lagartos, pássaros ou roedores como vetores das larvas encistadas. Quando um
desses hospedeiros de transporte é ingerido, a larva migra do estômago para os
pulmões via cavidades peritoneal e torácica. Ela atinge os pulmões dentro de 24h
e as larvas são observadas nas fezes em , 1 mês.
Embora a prevalência dessa infecção possa ser alta, os sinais diagnósticos e
clínicos estão muitas vezes ausentes. Debilidade crônica, tosse, dispnéia e estertores
pulmonares podem ser observados. Os pulmões usualmente possuem nódulos
sólidos de coloração cinza e em relevo, com 1 a 10mm de diâmetro; doença alveolar
generalizada tem sido observada em condições crônicas. O tratamento é difícil e
muitas vezes não é necessário, mas o levamisol e outros anti-helmínticos mais
modernos podem ser eficazes.

Capillaria aerophila
Mesmo sendo um parasita usual dos seios frontais, traquéia, brônquios e
raramente das cavidades nasais de raposas, a C. aerophila é encontrada em cães
e em outros carnívoros. Elas têm de 25 a 35mm de comprimento. As fêmeas
produzem ovos com tampões bipolares semelhantes àqueles de Trichuris, entretan-
to suas cascas são de coloração pálida a esverdeada e corroídas. Os ovos são
depositados nos pulmões, tossidos e engolidos, passando nas fezes. Eles podem
ser identificados nos lavados traqueais ou flotação fecal. O ciclo de vida é direto; os
cães tornam-se infectados através do consumo de alimentos ou água contaminados
com ovos larvados. Após a eclosão nos intestinos, as larvas chegam aos pulmões
e brônquios via sistema circulatório. Elas amadurecem , 40 dias após a infecção.
Os sinais clínicos incluem tosse, espirros e descarga nasal. O tratamento pode ser
tentado com a administração contínua de levamisol ou fenbendazol.

Filaroides spp
Esses vermes traqueais que parasitam cães são usualmente encontrados em
nódulos de paredes finas ao redor da bifurcação bronquial. Eles têm sido encontra-
dos nos EUA, África do Sul, Nova Zelândia, Índia, Grã-Bretanha, França e Austrália.
Os machos têm , 5mm de comprimento e as fêmeas de 10 a 15mm de comprimento.
O ciclo de vida é direto e a cadela infectada pode transmitir as larvas na sua saliva
para os filhotes ao lambê-los e limpá-los. Após a ingestão, as larvas passam para
a corrente sangüínea e são carreadas para os pulmões e brônquios.
Uma tosse persistente e seca é o sinal clínico mais comum. A tosse pode,
posteriormente, se tornar severa com dificuldade respiratória. O diagnóstico pode
ser concluído através do achado de larvas nas fezes, mas como essas larvas são
letárgicas e em número pequeno, a broncoscopia é o melhor método. A excisão
Doenças Respiratórias dos Pequenos Animais 924

cirúrgica dos nódulos, associada à administração de fenbendazol, levamisol ou


tiabendazol, tem sido efetiva no tratamento de animais infectados. A quimioterapia
sozinha pode ser bem-sucedida, mas nem sempre permite uma cura completa.
A Filaroides hirthi é semelhante à F. osleri, mas é encontrada no parênquima
pulmonar. As fêmeas são ovíparas. Os adultos encontram-se em “ninhos” no
parênquima pulmonar, onde ocorre reação granulomatosa focal. O diagnóstico
pode ser difícil em infecções leves. A flotação com sulfato de zinco geralmente é
mais útil que o aparato de Baermann. O tratamento com tiabendazol ou levamisol
tem sido efetivo.

NEOPLASIA DO SISTEMA RESPIRATÓRIO


Tumores do nariz e dos seios paranasais
Eles totalizam 1 a 2% de todos os tumores caninos ou felinos. A incidência em
cães é 2 vezes maior que em gatos; machos de ambas as espécies têm uma
incidência mais alta que as fêmeas. A idade média em que é feito o diagnóstico é
de 10 anos e meio para cães e 12 anos para gatos. Em cães, 80% desses tumores
são malignos e 60 a 70% são adenocarcinomas e carcinomas de células escamo-
sas. Nos cães, os etmoturbinados tendem a ser os locais preferidos. Raças
dolicocefálicas e mesocefálicas parecem ter um risco maior que as raças
braquicefálicas. Dos tumores nasais em gatos, 90% são malignos, sendo carcino-
mas e linfomas os mais comuns. Tumores do nariz e dos seios paranasais em geral
são localmente muito invasivos e metastatizam raramente; metástases ocorrem
mais em carcinomas e num estágio avançado da doença. Os locais comuns de
metástases são os linfonodos regionais, pulmões e cérebro. A invasão nos seios
paranasais tende a ser maior em cães que em gatos. Em geral, se não tratado, a
sobrevivência é de 3 a 5 meses após o diagnóstico.
Descarga nasal crônica é o sinal clínico mais comum, podendo ser mucóide,
mucopurulenta ou serossanguinolenta. Inicialmente a descarga é unilateral, mas
freqüentemente torna-se bilateral. Espirros periódicos, epistaxe e estertores respi-
ratórios podem ocorrer. Deformações faciais e orais resultam da destruição do osso
ou das estruturas sinonasais do tecido mole. A extensão retrobulbar desses tumores
resulta em ceratite exoftálmica e exposta. Epífora secundária pode ocorrer se o duto
nasolacrimal estiver obstruído. Em fases avançadas da doença, sinais do SNC, por
exemplo, desorientação, cegueira, convulsões, estupor e coma, podem ocorrer se
o tumor se estender na abóbada craniana.
O diagnóstico é feito a partir da história, dos sinais clínicos e pela eliminação de
outras causas de descarga nasal, espirros ou deformação facial. Radiografias
cranianas tipicamente mostram aumento da densidade da cavidade nasal e seios
frontais, além de evidência de destruição óssea. O diagnóstico definitivo é baseado
na biópsia do tecido tumoral.
O tratamento é paliativo em sua maior parte, já que a cura permanente é rara.
Excisão cirúrgica agressiva, quimioterapia, radioterapia ou combinações dessas
terapias proporcionam um prognóstico mais favorável, quando o diagnóstico for
precoce.

Tumores da laringe e traquéia


São raros em cães e gatos. Os tumores da laringe mais freqüentemente relatados
em cães são oncocitomas, carcinomas de células escamosas, mastocitomas,
melanomas e osteossarcomas; e em gatos, carcinomas de células escamosas,
linfossarcomas e adenocarcinomas. Pólipos inflamatórios benignos da laringe
também ocorrem em cães e gatos. Tumores da traquéia são particularmente raros.
Doenças Respiratórias dos Pequenos Animais 925

Displasia osteocondral da traquéia (osteocondroma) é um tumor benigno, obser-


vado primariamente em cães < 1 ano de idade. Outros tumores mesenquimais
benignos, carcinomas e sarcomas são ocasionalmente observados.
Os sinais mais comuns dos tumores da laringe incluem dispnéia inspiratória,
estridor, alteração vocal (latido rouco ou perda da voz), tosse e dispnéia ao exercício.
Os sinais mais comuns associados aos tumores da traquéia são tosse, dispnéia,
estridor e raramente hemoptise. Tumores laríngeos e traqueais podem estar
associados com sinais de obstrução fixa das vias aéreas superiores (dispnéias
inspiratória e expiratória). O grau de dispnéia freqüentemente está relacionado com
o grau de obstrução luminal.
O diagnóstico é feito a partir da história, dos sinais clínicos e pela eliminação de
outras causas de obstrução das vias aéreas superiores ou tosse. A laringoscopia ou
traqueoscopia proporcionam a visualização da massa tumoral. O diagnóstico
definitivo é feito pela biópsia.
A excisão cirúrgica e a ressecção são o tratamento de escolha. A radioterapia
pode ser paliativa para os tumores radiossensíveis, como carcinomas de células
escamosas, mastocitomas e linfomas. A ressecção cirúrgica da displasia osteocondral
traqueal em cães é curativa.

Tumores pulmonares primários


São raros em cães e gatos; entretanto, os relatos da incidência de carcinomas
pulmonares aumentaram no mínimo 100% durante os últimos 20 anos. Isto é
atribuído a um aumento na média de vida e a uma melhor detecção e conhecimento
do tumor. A maioria dos tumores pulmonares primários ocorre em cães com idade
média de 10 anos, e em gatos com idade média de 12 anos. Não há predileção racial
ou sexual constante. Tumores pulmonares primários geralmente se originam dos
bronquíolos e alvéolos terminais; ocasionalmente eles ocorrem como um tumor
secundário concomitante, o que pode tornar difícil a diferenciação entre doença
primária e metastática. Dos tumores pulmonares primários em cães e gatos, ≥ 80%
são malignos. Adenocarcinoma e carcinoma anaplásico são os tipos mais comuns
em cães e gatos. O carcinoma de células escamosas é observado mais freqüente-
mente em gatos que em cães. Sarcomas pulmonares primários e adenomas são
raros em ambas as espécies. A disseminação metastática dos tumores pulmonares
primários geralmente ocorre para outras áreas dos pulmões, linfonodos traqueo-
bronquiais, ossos e cérebro. A disseminação intrapulmonar pelas vias aéreas ocor-
re em , 50% dos cães com adenocarcinoma. A disseminação metastática para as
pleuras, pericárdio, coração e diafragma pode ocorrer; sítios extratorácicos hete-
rogêneos incluem fígado, baço e rins. Os cães com adenocarcinomas têm um
prognóstico melhor que os com carcinoma de células escamosas (tempo médio de
sobrevivência: 19 meses e 8 meses, respectivamente). A recidiva e as metástases
tendem a ocorrer mais cedo e com maior freqüência em cães com carcinoma de
células escamosas pulmonar primário.
Achados clínicos – Tumores pulmonares primários possuem manifestações
variáveis, que dependem da localização do tumor, rapidez de crescimento, presen-
ça de doença pulmonar prévia ou concomitante e conhecimento por parte do
proprietário. Os sinais comuns incluem tosse, inapetência, perda de peso, tolerância
ao exercício reduzida, letargia, taquipnéia, dispnéia, respiração ruidosa, vômito ou
regurgitação, pirexia e claudicação. O sinal clínico mais comum em cães é uma
tosse crônica improdutiva. A tosse é rara em gatos e sinais não específicos como
inapetência, perda de peso, taquipnéia e dispnéia são mais comuns. Em ambas as
espécies, taquipnéia ou dispnéia indicam a presença de uma massa tumoral ou
efusão pleural. Efusão pleural é particularmente comum em gatos com tumores
pulmonares primários. A claudicação pode ser devida à osteopatia hipertrófica (rara
Doenças Respiratórias dos Pequenos Animais 926

em gatos [ver pág. 589]) ou a metástases ósseas ou musculoesqueléticas. A


auscultação torácica pode estar normal, pode refletir um aumento dos sons
respiratórios compatível com congestão pulmonar, ou os mesmos podem estar
abafados devido a consolidação pulmonar ou efusão pleural.
Diagnóstico – Um terço ou mais dos tumores pulmonares primários são reconhe-
cidos acidentalmente, durante radiografias para outros problemas ou à necropsia.
Radiografias torácicas são essenciais para um diagnóstico por tentativa, nos animais
que exibem sinais clínicos compatíveis. Tumores pulmonares primários em cães
podem ocorrer como lesões de uma massa única ou múltipla circunscrita, como um
padrão pulmonar difuso ou como uma consolidação lobar. Em gatos, lesões de
massas únicas circunscritas são menos comuns, enquanto um padrão pulmonar
difuso e consolidação lobar são mais freqüentes. Acúmulo de fluido pleural é comum
em gatos e menos freqüente em cães. Em ambas as espécies, podem ocorrer
envolvimento da parede torácica e linfadenopatia hilar. O diagnóstico presuntivo
pode ser feito pela listagem de outras causas de doença pulmonar com padrões
pulmonares radiográficos semelhantes. O diagnóstico definitivo requer biópsia.
Tratamento – A ressecção cirúrgica do tumor por lobectomia dos lobos pulmona-
res afetados é o tratamento de escolha. Lesões inoperáveis ou doença metastática
podem ser controladas com quimioterapia. O tempo médio de sobrevivência para os
tumores pulmonares primários operáveis em cães é de 10 a 13 meses; se os
linfonodos estiverem envolvidos no momento do diagnóstico, o tempo de sobrevivên-
cia é menor. Recidiva ou metástase do tumor é uma causa comum de morte.

Tumores metastáticos, pulmões


Um tumor localizado pode-se estender para os pulmões por disseminação pelas
vias hematogênica ou linfática ou pela extensão direta das células tumorais. Certos
tumores primários, como adenocarcinomas mamários, osteossarcomas e melano-
mas orais, mais comumente metastatizam-se para os pulmões. Os pulmões podem
ser o único sítio de metástase ou pode haver metástases concomitantes em outros
órgãos; no primeiro caso, a abordagem diagnóstica é identificar um tumor primário
oculto ou rever cuidadosamente o histórico médico para descobrir uma anterior
remoção de tumores. Devido ao fato de que as metástases pulmonares ocorrem no
curso clínico tardio da doença tumoral maligna, o prognóstico é ruim.
Os sintomas da doença pulmonar metastática são semelhantes aos dos tumores
pulmonares primários, mas a tosse é menos comum. A severidade dos sintomas
depende da localização anatômica do tumor e se as lesões forem solitárias ou
múltiplas.
O diagnóstico é semelhante ao dos tumores pulmonares primários. Devido à
limitação na resolução radiográfica de pequenas lesões (≤ 3mm de diâmetro), ≥ 40%
dos casos de metástases pulmonares podem não ser visualizados.
Radiografias torácicas devem preceder a remoção de tumores, devido à alta
incidência de disseminação metastática para os pulmões. O objetivo maior do
tratamento do câncer é, mais do que sua erradicação, a prevenção de metástases.
Lesões metastáticas de crescimento lento ou solitárias são melhor tratadas pela
excisão cirúrgica. Quimio ou radioterapia podem ser úteis em certos tipos de
tumores não tratáveis pela ressecção cirúrgica. As metástases pulmonares totais
têm um prognóstico ruim.

PNEUMONIA
É uma inflamação aguda ou crônica dos pulmões e brônquios, caracterizada por
distúrbio na respiração e hipoxemia, e complicada pelos efeitos sistêmicos de toxinas
associadas. A causa usual é uma infecção viral primária do trato respiratório inferior.
Doenças Respiratórias dos Pequenos Animais 927

O vírus da cinomose canina, os adenovírus Tipos 1 e 2, o vírus da parainfluenza


e o calicivírus felino causam lesões nas vias aéreas distais e predispõem à
invasão bacteriana secundária do pulmão. A invasão parasitária dos brônquios,
por Filaroides, Aelurostrongylus ou Paragonimus spp, pode resultar em pneumo-
nia. Envolvimento por protozoários, por exemplo, Toxoplasma gondii (ver pág.
441), é raramente encontrado. Pneumonia tuberculosa, apesar de incomum, é
vista mais freqüentemente em cães que em gatos. Pneumonias granulomatosas
micóticas (ver I NFECÇÕES FÚNGICAS, pág. 411) também têm uma maior incidência
em cães. Pneumonia criptocócica tem sido descrita em gatos. Lesão à mucosa
bronquial e inalação ou aspiração de irritantes podem causar pneumonia direta-
mente, predispondo à invasão bacteriana secundária. Pneumonia por aspiração
pode resultar de vômito persistente, motilidade esofágica anormal, medicações
administradas de modo inadequado, por exemplo, óleo ou alimentos (alimenta-
ção forçada), ou pode-se seguir à sucção de leite materno num neonato que tenha
fenda palatina.
Achados clínicos – Os sinais iniciais geralmente são aqueles da doença
primária. Letargia e anorexia são comuns. Uma tosse profunda de baixa amplitude
é notada. Dispnéia progressiva, “tremor” dos lábios e cianose podem ser evidentes,
especialmente ao exercício. A temperatura corporal é moderadamente aumentada
e pode haver leucocitose. A auscultação geralmente revela consolidação, a qual
pode ser irregular, porém mais comumente é difusa. Nos estágios mais avançados
da pneumonia, a densidade pulmonar aumentada e a consolidação peribronquial
causada pelo processo inflamatório podem ser visualizadas radiograficamente.
Complicações como pleurite, mediastinite ou invasão por microrganismos oportu-
nistas podem ocorrer.
Diagnóstico – A análise do fluido traqueal é válida para o diagnóstico de
infecções bacterianas. O exame citológico indicará a resposta imune do animal e a
localização intra ou extracelular da bactéria. Teste de sensibilidade e cultura
bacteriana são necessários e podem incluir cultura para micoplasma e anaeróbios,
especialmente nos animais refratários. Uma etiologia viral geralmente resulta em
temperatura corporal inicial de 40 a 41oC. A leucopenia, freqüentemente esperada,
pode não ocorrer em muitas infecções respiratórias virais (por exemplo, traqueo-
bronquite infecciosa canina, pneumonia pelo calicivírus felino, pneumonia por
peritonite infecciosa felina). Uma história de anestesia recente ou vômitos severos
indica a possibilidade de pneumonia por aspiração. Animais agudamente afetados
podem morrer dentro de 24 a 48h do início. Pneumonias micóticas geralmente são
de natureza crônica. Nódulos miliares observados à necropsia podem sugerir
pneumonia por protozoários.
Tratamento – O animal deve ser colocado em um ambiente morno e seco. Se
houver anemia, esta deve ser tratada. A oxigenioterapia pode ser utilizada se a
cianose for severa, sendo melhor aplicada por uma cadeia de oxigênio, com uma
concentração de 30 a 50%. A quimioterapia antimicrobiana empírica deve ser
iniciada e alterada com base nos resultados da análise dos lavados dos fluidos
transtraqueais. A terapia de apoio deve ser instituída conforme o necessário,
podendo ser incluídos suplementação de oxigênio, fisioterapia pulmonar (nebu-
lização e copagem) e broncodilatadores. Uma resposta negativa 48 a 72h após
a terapia justifica a reavaliação do plano de tratamento. A quimioterapia antimi-
crobiana deve ser continuada 1 semana após a resolução dos sinais clínicos e
radiográficos.
Os animais devem ser freqüentemente reexaminados. Radiografias torácicas
devem ser repetidas a intervalos regulares para monitorar a recorrência ou observar
um processo de doença primária de base e para detectar complicações como
consolidação pulmonar, atelectasia ou abscedação.
Doenças Respiratórias dos Pequenos Animais 928

RINITE E SINUSITE
É uma inflamação aguda ou crônica das membranas mucosas do nariz e seios
nasais.
Etiologia – Uma infecção viral é a causa mais comum de rinite/sinusite aguda em
cães e gatos. Rinotraqueíte viral felina (RVF), calicivírus felino (CVF), cinomose
canina, adenovírus canino Tipos 1 e 2 e parainfluenza canina são mais freqüente-
mente incriminados. Estados crônicos ocorrem em RVF e CVF, com secreção
intermitente associada ao estresse. Rinite/sinusite bacteriana freqüentemente é
uma complicação secundária. A rinite bacteriana primária em cães pode ocorrer
devido a infecção por Bordetella bronchiseptica ou Pasteurella multocida.
Rinite/sinusite alérgica é uma atopia pouco definida que ocorre sazonalmente em
associação com a produção de pólen; e de forma perene, provavelmente
em associação a poeira doméstica e mofo. Aspiração de fumaça, inalação de gases
irritantes ou a presença de corpos estranhos nas passagens nasais também podem
causar rinite aguda.
A rinite crônica ocorre mais comumente devido à infecção bacteriana, seguida de
inflamação ou trauma, corpos estranhos, neoplasias ou infecção micótica. Em
gatos, rinossinusite crônica é uma seqüela freqüente de infecções virais agudas da
mucosa nasal e seios, que resulta em alterações epitelial e glandular hiperplásicas.
Rinite e/ou sinusite podem ocorrer quando um abscesso da raiz dentária apical se
estende para o recesso maxilar. A rinossinusite micótica pode ser causada por
Cryptococcus neoformans, Aspergillus spp e Penicillium spp. Os gatos são mais
freqüentemente afetados por Cryptococcus sp que os cães, entretanto a aspergilose
é freqüente em cães e rara em gatos.
Achados clínicos e diagnóstico – A rinite aguda é caracterizada por uma ou
mais descargas nasais, espirros, prurido nasal, estertor respiratório, respiração com
a boca aberta ou dispnéia inspiratória. Lacrimejamento e conjuntivite freqüentemen-
te acompanham inflamação das passagens respiratórias superiores. Os tecidos
afetados geralmente estão hiperêmicos e edemaciados. A descarga nasal é serosa,
mas torna-se mucóide como resultado de uma infecção bacteriana secundária. Se
células inflamatórias se infiltrarem na mucosa, a descarga pode-se tornar mucopu-
rulenta. O espirro, numa tentativa de limpar as vias aéreas superiores de secreções
ou exsudatos, é observado mais freqüentemente em rinites agudas e tende a ser
intermitente na rinite crônica. Também pode ser observado o reflexo de aspiração
(“espirro reverso”), um curto episódio paroxístico de esforço inspiratório, na tentativa
de limpar a nasofaringe de material obstrutivo. Estertores respiratórios, respiração
com a boca aberta e dispnéia inspiratória ocorrem quando as passagens nasais são
estreitadas devido a mucosa inflamada, elementos glandulares e secreções. Uma
descarga nasal unilateral aguda, possivelmente acompanhada de prurido nasal,
sugere a presença de corpo estranho. Suspeita-se de doença neoplásica ou
micótica quando existir uma descarga nasal crônica inicialmente unilateral, mas que
se torna bilateral, ou por alterações no caráter da secreção nasal de mucopurulenta
a serossanguinolenta ou hemorrágica.
O diagnóstico é baseado na história, exame físico, achados radiográficos e
eliminação de outras causas de descarga nasal e espirros.
Tratamento – Nos casos moderados ou agudos, o tratamento de suporte pode
ser efetivo. Casos severos de rinossinusite em gatos adultos e filhotes podem
necessitar de fluidos parenterais, para prevenir a desidratação, e de um suporte
nutricional via tubo nasogástrico, para manter o peso. A rinossinusite bacteriana
secundária crônica pode ser tratada com quimioterapia antimicrobiana durante 3
a 6 semanas, com base na sensibilidade do(s) microrganismo(s) predominante(s)
identificado(s). O uso intermitente de descongestionantes nasais vasoconstrito-
Doenças Respiratórias dos Pequenos Animais 929

res em geral fornece alívio apenas temporário da congestão da mucosa nasal. A


rinossinusite micótica requer terapia antifúngica baseada na identificação do
agente fúngico etiológico (ver também AGENTES ANTIFÚNGICOS, pág. 1773). Casos
não responsivos à terapia médica podem necessitar de cirurgia, que consiste de
sinusotomia e/ou rinotomia, lavagem e quimioterapia antimicrobiana. Radiotera-
pia seguida de turbinectomia é o tratamento mais viável para a neoplasia
intranasal.

AMIGDALITE
Etiologia – A amigdalite é comum em cães e rara em gatos. Em cães, pode
ocorrer como uma doença primária, freqüentemente em raças pequenas. Também
pode ser secundária a distúrbios nasais, orais ou faríngeos (por exemplo, fenda
palatina); êmese crônica ou regurgitação (por exemplo, devido a megaesôfago);
tosse crônica (por exemplo, bronquite). A amigdalite crônica pode ocorrer em cães
braquicefálicos, em associação com faringite, que acompanha alongamento do
palato mole e mucosa faríngea excessiva. Acredita-se que a amigdalite crônica
em animais jovens represente a maturação dos mecanismos de defesa farín-
geos.
Escherichia coli, Staphylococcus aureus e estreptococos hemolíticos são as
bactérias patogênicas mais freqüentemente isoladas das amígdalas afetadas.
Fibras vegetais ou outros corpos estranhos que se alojam na fossa da amígdala
podem produzir uma inflamação unilateral localizada ou um abscesso periamig-
dalino. Outros agentes físicos e químicos podem causar irritação da orofaringe e em
uma ou ambas as amígdalas. A amigdalite também pode acompanhar massas
amigdalinas neoplásicas, devidas a trauma físico ou infecção bacteriana secun-
dária.
Achados clínicos e diagnóstico – A amigdalite nem sempre é acompanhada
de sinais clínicos óbvios. Febre e indisposição são raras, a menos que haja uma
infecção sistêmica. Ânsia, seguida de tosse curta e leve, pode resultar na expulsão
de pequenas quantidades de muco. Inapetência, apatia, salivação e disfagia são
observadas na amigdalite severa.
O aumento das amígdalas pode variar da protrusão das criptas para uma massa
de tamanho suficiente para causar disfagia ou ruído inspiratório. Um exsudato
séptico supurativo pode rodear a amígdala, a qual pode estar avermelhada, com
pequenos focos ou placas necróticos. A amigdalite pode ser um sinal de doença
inflamatória regional ou generalizada; dessa forma, a amigdalite primária deve ser
diagnosticada após a exclusão das doenças de base. Carcinomas de células
escamosas, melanona maligno e linfossarcoma comumente ocorrem nas amígda-
las dos cães e devem ser distinguidos de amigdalite. Linfossarcoma amigdalino
geralmente resulta em aumento bilateral simétrico, enquanto neoplasias não
linfóides são normalmente unilaterais.
Tratamento – A administração sistêmica imediata de antibióticos é indicada no
caso de amigdalite bacteriana. As penicilinas freqüentemente são efetivas, mas nos
casos refratários, cultura e teste de sensibilidade podem ser necessários. Analgé-
sicos moderados são apropriados; no caso de irritação faríngea severa, uma dieta
pastosa palatável é recomendada por alguns dias, até que a disfagia seja resolvida.
A administração parenteral de fluidos é necessária nos animais que são incapazes
de se alimentar pela boca.
A amigdalectomia raramente é necessária no caso de amigdalite primária
crônica, mas fornece alívio permanente. Outras indicações para a amigdalectomia
incluem aumento das amígdalas, que interfira no fluxo de ar (por exemplo, em raças
braquicefálicas) e neoplasias amigdalinas.
Doenças Respiratórias dos Pequenos Animais 930

TRAQUEOBRONQUITE
É uma inflamação aguda ou crônica da traquéia e das vias aéreas brônquicas.
A bronquite pode-se estender dos bronquíolos para o parênquima pulmonar. A tra-
queobronquite pode ser primária ou secundária, dependendo do agente etiológico.
Etiologia – Traqueobronquite infecciosa canina (tosse dos canis, ver adiante) é
freqüentemente um resultado de infecções virais do sistema respiratório. Outras
causas de traqueobronquite incluem parasitas, como por exemplo, Aelurostrongylus
abstrusus (gatos e cães), Capillaria aerophila (cães), Crenosoma vulpis (cães) e
Filaroides osleri (cães).
A traqueíte pode ser secundária a doenças da orofaringe ou à tosse crônica
relacionada a doença cardíaca ou a doença pulmonar não cardíaca. Outras causas
incluem aspiração de fumaça e exposição a gases químicos nocivos. A exacerbação
da bronquite crônica que afeta cães de meia-idade e idosos pode ser conseqüência
de alterações súbitas no tempo ou de outros fatores ambientais estressantes. Asma
brônquica foi diagnosticada em gatos, mas é rara. Corpos estranhos nas vias aéreas
e anormalidades de desenvolvimento, como deformidades laríngeas, podem pre-
dispor à bronquite. A bronquiectasia pode ocorrer como último estágio de bron-
quite crônica em cães. O reconhecimento da traqueobronquite como uma sín-
drome secundária freqüente subjaz à importância do diagnóstico e ao controle de
uma doença primária associada.
Achados clínicos – Espasmos de tosse são os sinais proeminentes. Estes são
mais graves após repouso ou uma mudança do meio ambiente, ou no início do
exercício. À auscultação, os sons respiratórios podem estar essencialmente nor-
mais. Em casos avançados, estertores sonoros são audíveis. A temperatura está
levemente elevada. O estágio agudo da bronquite passa em 2 a 3 dias; a tosse,
entretanto, pode persistir por 2 a 3 semanas. É difícil diferenciar bronquite grave de
pneumonia; a primeira freqüentemente se estende para o parênquima pulmonar,
resultando em pneumonia. Asma brônquica em felinos pode resultar em cianose e
dispnéia, e é acompanhada de eosinofilia.
Lesões – Durante os estágios inflamatórios agudo e subagudo, as vias aéreas
estão repletas de um exsudato espumoso, seroso ou mucopurulento. Em bronquites
crônicas, elas contêm excessiva quantidade de muco viscoso. Nessas condições, o
revestimento epitelial está espessado e opaco, um resultado de fibrose difusa,
edema e infiltração de células mononucleares. Há ainda hipertrofia e hiperplasia das
glândulas mucosas e células caliciformes da região da traquéia e brônquio. O ato de
tossir indica uma tentativa de remover o acúmulo de muco e exsudato das vias
respiratórias.
Diagnóstico – O diagnóstico é feito com base na anamnese e sinais clínicos, e
pela eliminação de outras causas de tosse. Em bronquites crônicas, radiografias do
tórax podem mostrar um aumento nos locais de demarcação linear e peribronquial.
A broncoscopia revela epitélio inflamado e com muco, e muitas vezes secreção
mucopurulenta nos brônquios. Além disso, o procedimento permite coleção de
biópsia e amostra de “swab” para pesquisa in vitro. O lavado bronquial é um auxílio
diagnóstico adicional que pode demonstrar os agentes causais ou respostas
celulares significantes, por exemplo, eosinófilos.
Tratamento – Nos casos moderados ou agudos, a terapia de suporte pode ser
efetiva; entretanto é indicado o tratamento de doenças concomitantes. Repouso,
ambiente aquecido e higiene apropriada são importantes. Quimioterapia anti-
microbiana de amplo espectro é indicada para o tratamento da tosse. Tosse
produtiva e persistente é melhor controlada por expectorantes que contenham
codeína ou antitussivos similares. Animais refratários à terapia médica conservativa
devem ser radiografados, tanto no tórax quanto na traquéia cervical; e devem-se
Doenças Respiratórias dos Pequenos Animais 931

realizar alguns exames de laboratório para avaliar outros diagnósticos diferenciais.


Citologia do lavado transtraqueal, cultura e antibiograma podem ser indicados para
identificar um agente etiológico e determinar a quimioterapia antimicrobiana apro-
priada. Fisioterapia pulmonar consistindo de nebulização com cloreto de sódio pode
soltar as secreções e estimular a expectoração. O vapor de um banho quente pode
ser um substituto para a nebulização.

Traqueobronquite infecciosa dos cães


(Tosse dos canis)
Geralmente é uma doença moderada e autolimitante que afeta cães de todas as
idades e resulta da inflamação das vias aéreas superiores. Pode progredir para
broncopneumonia fatal em filhotes ou para uma bronquite crônica em adultos
debilitados ou cães idosos. A doença dissemina-se rapidamente entre os animais
suscetíveis em um ambiente fechado, por exemplo, hospitais veterinários ou canis.
Etiologia – O vírus da parainfluenza canina, o adenovírus canino 2 (AVC-2) ou
o vírus da cinomose canina podem ser os patógenos primários ou únicos envolvidos.
Reovírus canino (Tipos 1, 2 e 3), herpesvírus canino e adenovírus 1 canino (AVC-1)
são de importância questionável nesta síndrome. Bordetella bronchiseptica pode
agir como um patógeno primário, principalmente em cães < 6 meses de idade;
entretanto, esta e outras bactérias (geralmente microrganismos Gram-negativos
como Pseudomonas sp, Escherichia coli e Klebsiella pneumoniae) podem causar
infecções secundárias, após uma injúria viral ao trato respiratório. Infecções
concomitantes com vários desses agentes são comuns. O papel de Mycoplasma sp
não foi claramente estabelecido. Estresse, extremos de ventilação, temperatura e
umidade aparentemente aumentam a suscetibilidade e a severidade da doença.
Achados clínicos e diagnóstico – Os sinais clínicos proeminentes são paroxis-
mos de uma tosse seca e áspera, que pode ser seguida por ânsia ou vômito. A tosse
é facilmente induzida por uma leve palpação da laringe ou traquéia. Os animais
afetados apresentam poucos sinais clínicos adicionais, exceto uma anorexia
parcial. A temperatura corporal e a contagem de leucócitos geralmente permane-
cem normais. O desenvolvimento de sinais mais severos, incluindo febre, descarga
nasal purulenta, depressão, anorexia e tosse produtiva, principalmente em filhotes,
indica uma infecção sistêmica complicada, como cinomose ou broncopneumonia.
Estresse, principalmente devido a condições ambientais adversas e nutrição
inadequada, pode contribuir para uma recaída durante a convalescença.
Deve-se suspeitar de traqueobronquite se uma tosse característica se desenvol-
ver subitamente 5 a 10 dias após o contato com outros cães suscetíveis ou afetados.
Geralmente a severidade diminui durante os primeiros 5 dias, mas a doença persiste
por 10 a 20 dias. Traumatismo na traquéia devido à intubação pode produzir uma
síndrome semelhante, mas geralmente menos severa.
Tratamento – De preferência, os animais afetados não devem ser hospitaliza-
dos, pois a doença é quase sempre altamente contagiosa e também é autolimitante.
Práticas de manejo apropriadas, incluindo boa nutrição, higiene e cuidados, assim
como correção dos fatores ambientais predisponentes, aceleram a recuperação.
Supressores da tosse que contenham derivados da codeína, como o hidrocodone
(0,25mg/kg de peso corporal, a cada 6 a 12h, VO) ou butorfanol (0,05 a 0,1mg/kg,
a cada 6 a 12h, VO ou s.c.), devem ser usados apenas o suficiente para controlar
a tosse não produtiva persistente. Os antibióticos geralmente não são necessários,
exceto nos casos crônicos severos; cefalosporinas, cloranfenicol e tetraciclinas são
mais indicados, pois atingem concentrações efetivas na mucosa traqueobrônquica.
Quando necessário, os antibióticos devem ser selecionados por cultura e antibiogra-
ma das amostras coletadas por aspiração transtraqueal ou broncoscopia. Antibió-
ticos administrados por VO ou IM podem não reduzir significantemente o número de
Doenças Respiratórias dos Pequenos Animais 932

B. bronchiseptica na traquéia distal ou brônquio principal. Dessa forma, nos casos


severos não responsivos à antibioticoterapia parenteral, sulfato de canamicina
(250mg) ou de gentamicina (50mg) diluídos em 3mL de solução salina podem ser
administrados por aerossolização duas vezes ao dia durante 3 dias. Para receber
este tratamento, os cães devem receber broncodilatadores anteriormente. Injeção
endotraqueal de antibióticos (por exemplo, gentamicina) é uma alternativa viável
para a aerossolização. Os corticosteróides podem ajudar a aliviar os sinais clínicos,
mas devem ser usados concomitantemente com um agente antibacteriano; eles são
contra-indicados em cães com tosse severamente doentes.
Profilaxia – Os cães devem ser imunizados com vacinas de vírus vivo modificado
contra cinomose, parainfluenza e AVC-2, que também fornecem proteção contra
AVC-1. Os produtos comerciais freqüentemente combinam estes agentes e fre-
qüentemente incluem vacinas de parvovírus vivo modificado e antígenos de
leptospira. Uma vacinação inicial deve ser realizada quando o animal tiver 6 a 8
semanas de idade e repetida 2 vezes a intervalos de 3 a 4 semanas até que o animal
tenha 14 a 16 semanas de idade. A revacinação deve ser feita anualmente. Quando
o risco de uma infecção por B. bronchiseptica é considerado significante, a
administração de uma vacina intranasal viva avirulenta é preferível a produtos
parenterais que contenham bactérias inativadas ou extratos bacterianos. Uma
associação de B. bronchiseptica avirulenta e parainfluenza viva modificada está
disponível em uma vacina para uso intranasal. Uma inoculação é realizada (intra-
nasalmente) em cães > 3 semanas de idade.
PELE
PELE, Introdução ........................................................................................ 935
Princípios Terapêuticos ........................................................................... 940
ACANTOSE NIGRICANTE ........................................................................... 941
TESTES ALÉRGICOS .................................................................................. 941
ALOPECIA .................................................................................................... 942
HIPODERMOSE – BERNE ........................................................................... 944
Dermatobia hominis ................................................................................. 944
Hypoderma spp ........................................................................................ 944
DERMATOPATIAS CONGÊNITAS E HEREDITÁRIAS .............................. 947
ÉCTIMA CONTAGIOSO ............................................................................... 949
CUTEREBROSE, PQ AN ............................................................................. 950
DERMATITE ................................................................................................. 951
DERMATOFILOSE ....................................................................................... 952
DERMATOFITOSE (Tinha) .......................................................................... 954
Bovinos .................................................................................................... 955
Cães e Gatos ........................................................................................... 956
Eqüinos .................................................................................................... 957
Outras Espécies ....................................................................................... 957
OUTRAS DERMATOSES ............................................................................. 958
ECZEMA NASAL DOS CÃES ...................................................................... 959
COMPLEXO DO GRANULOMA EOSINOFÍLICO ........................................ 959
PÚRPURA NÃO TROMBOCITOPÊNICA EQÜINA (ver SLC) ..................... 70
EPIDERMITE EXSUDATIVA ........................................................................ 961
PULGAS ....................................................................................................... 962
MOSCAS E MOSQUITOS ............................................................................ 965
Moscas ..................................................................................................... 965
Borrachudos e Piuns .......................................................................... 965
Varejeira ............................................................................................. 966
Moscas de Búfalo .............................................................................. 967
Moscas da Face ................................................................................. 968
Moscas da Cabeça ............................................................................ 968
Moscas do Chifre ............................................................................... 969
Mutucas e Moscas de Veado ............................................................. 970
Moscas Domésticas e Outras Moscas que Procriam em Lixo ........... 971
Moscas de Estábulo ........................................................................... 972
Carrapato dos Carneiros .......................................................................... 973
Sarna Doce em Cavalos .......................................................................... 974
Mosquitos ........................................................................................... 975
Pele 934

HELMINTOS DA PELE ................................................................................ 976


Habronemíase Cutânea ........................................................................... 976
Infecções por Dracunculus ...................................................................... 976
Eleoforose ................................................................................................ 977
Oncocercíase ........................................................................................... 978
Parafilariose ............................................................................................. 979
Parafilaria bovicola ............................................................................. 979
Parafilaria multipapillosa .................................................................... 980
Dermatite por Pelodera ............................................................................ 981
Estefanofilariose ...................................................................................... 981
HIGROMA ..................................................................................................... 982
“CISTOS” INTERDIGITAIS .......................................................................... 982
SARNA ......................................................................................................... 983
Sarna em Bovinos .................................................................................... 983
Sarna em Cães e Gatos .......................................................................... 985
Sarna em Cavalos ................................................................................... 987
Sarna e Escabiose em Ovinos e Caprinos .............................................. 988
Sarna em Suínos ..................................................................................... 990
PARACERATOSE ........................................................................................ 990
PEDICULOSE ............................................................................................... 990
FOTOSSENSIBILIZAÇÃO ........................................................................... 993
Fotossensibilização Congênita em Ovinos .............................................. 995
PITIRÍASE RÓSEA DOS SUÍNOS ............................................................... 995
VARÍOLAS .................................................................................................... 996
Varíola Bovina .......................................................................................... 996
Pseudovaríola Bovina .............................................................................. 997
Dermatopatia Granulomatosa .................................................................. 997
Infecção por Poxvírus em Gatos .............................................................. 999
Varíolas Ovina e Caprina ......................................................................... 1001
Varíola Suína ........................................................................................... 1001
PRURIDO ...................................................................................................... 1002
PIODERMIA .................................................................................................. 1003
LESÕES DORSAIS ...................................................................................... 1004
BICHEIRA ..................................................................................................... 1005
INFESTAÇÃO POR CARRAPATOS ............................................................ 1007
Parasitismo Argasídeo ....................................................................... 1008
Parasitismo Ixodídeo ......................................................................... 1009
Ixodidae Importantes ............................................................................... 1010
Amblyomma spp ................................................................................ 1010
Boophilus spp .................................................................................... 1012
Dermacentor spp ................................................................................ 1013
Haemaphysalis spp ............................................................................ 1014
Hyalomma spp ................................................................................... 1015
Ixodes spp .......................................................................................... 1017
Margaropus spp ................................................................................. 1019
Pele, Introdução 935

Nosomma sp ...................................................................................... 1019


Rhipicephalus spp .............................................................................. 1019
Argasidae Importantes ............................................................................. 1022
Argas spp ........................................................................................... 1022
Ornithodoros spp ............................................................................... 1022
Otobius spp ........................................................................................ 1023
Controle de Carrapatos ............................................................................ 1024
TUMORES DA PELE E DE TECIDOS MOLES ........................................... 1026
Introdução .................................................................................... 1026
Tumores de Folículo Piloso e Epidérmicos .............................................. 1027
Lesões Papilomatosas Benignas, Não Associadas a Vírus .............. 1027
Tumores de Células Basais ............................................................... 1028
Epiteliomas Cornicantes Intracutâneos ............................................. 1028
Carcinomas de Células Escamosas .................................................. 1029
Cistos Cutâneos Ceratinizados .......................................................... 1030
Tumores do Folículo Piloso ............................................................... 1031
Tumores Cutâneos de Glândulas Apócrinas ..................................... 1032
Tumores de Glândulas Apócrinas dos Sacos Anais .......................... 1033
Tumores de Glândulas Ceruminosas ................................................ 1033
Tumores de Glândulas Écrinas .......................................................... 1033
Tumores de Glândulas Sebáceas ...................................................... 1034
Tumores de Glândulas Hepatóides (Tumores de Glândulas
Perianais) ..................................................................................... 1034
Tumores Neuroendócrinos Cutâneos Primários ................................ 1035
Papilomatose (Verrugas) ......................................................................... 1035
Tumores de Tecido Conjuntivo ................................................................ 1037
Tumores Fibroblásticos Benignos ...................................................... 1037
Tumores Fibroblásticos Malignos ...................................................... 1038
Tumores Fibro-histiocíticos ................................................................ 1040
Tumores da Bainha de Nervos Periféricos ........................................ 1041
Tumores de Tecido Adiposo .............................................................. 1041
Tumores Vasculares .......................................................................... 1042
Tumores Cutâneos de Músculos Lisos .............................................. 1043
Sarcomas Anaplásicos e Indiferenciados ................................................ 1044
Neoplasias Cutâneas Linfocíticas, Histiocíticas e Relacionadas ............. 1044
Neoplasias Linfóides da Pele ............................................................. 1044
Tumores de Mastócitos Cutâneos ..................................................... 1046
Tumores com Diferenciação Histiocítica ............................................ 1047
Tumores Venéreos Transmissíveis ................................................... 1048
Neoplasias de Origem Melanocítica ........................................................ 1048
Tumores Metastáticos .............................................................................. 1050
DERMATOSE ULCERATIVA DOS OVINOS ............................................... 1051
URTICÁRIA .................................................................................................. 1051

PELE, INTRODUÇÃO
A pele representa o limite anatômico, e o principal órgão de comunicação entre
o animal e seu ambiente. É o órgão mais extenso do corpo, constituindo 12 a 24%
do peso do animal, dependendo da idade. É um órgão extremamente heterogêneo,
Pele, Introdução 936

constituído por uma variedade de componentes teciduais e celulares: uma epider-


me, um sistema apendicular, derme, músculo eretor do pêlo, panículo carnoso
(contração muscular) e panículo adiposo (uma camada subcutânea gordurosa).
A principal atividade da epiderme é produzir ceratina e melanina. O primeiro é
um produto dos ceratinócitos, o último dos melanócitos. O outro tipo celular de
importância na epiderme são as células de Langerhans, uma célula dendrítica, mas
não do tipo nervosa, que é ativa nos processos imunológicos e possivelmente na
regulação da formação da ceratina.
A taxa de mitose na epiderme e o processo normal de ceratinização estão sob
um controle químico complexo. Drogas, como por exemplo, a adrenalina, podem
interagir com fatores de crescimento e resultar em diminuição da atividade mitótica
e da ceratinização. Outros fatores que afetam a mitose epidérmica e a ceratinização
incluem esteróides, vitamina A, calônios, e possivelmente o ciclo estral e condições
ambientais de luminosidade. A epiderme está intimamente relacionada e subordi-
nada à derme subjacente; há evidências de que a derme contenha fatores que
afetam a atividade da epiderme.
A parte mais importante da epiderme é sua camada superficial, o estrato córneo,
uma vez que boa parte da atividade funcional da pele reside nesta camada (ver
adiante). A integridade desta membrana depende do adequado arranjo estrutural da
ceratina que ela contém e, provavelmente, do seu conteúdo lipídico. Este último tem
um efeito na adesão dos ceratinócitos, impermeabilizando a pele, influenciando a
absorção ou a penetração de agentes no organismo. O estrato córneo está
continuamente desprendido ou descamado. No homem, ,2g de estrato córneo
desprende-se diariamente. Pouco se sabe sobre o processo de descamação, e seus
mecanismos de controle.
O sistema apendicular é um produto da epiderme, com a qual é contíguo, e
consiste de folículos pilosos, glândulas apócrinas e sebáceas. Os folículos pilosos
em cães, gatos, ovinos e caprinos são compostos, freqüentemente consistindo de
um folículo primário (pelagem longa e grosseira) circundado por um número variável
(3 a 12) de folículos secundários (pêlos curtos e finos), todos geralmente emergindo
de um único poro. Em bovinos e eqüinos, os folículos são simples com apenas um
único pêlo emergindo de cada poro. O folículo piloso não é um órgão estático, mas
ao contrário, passa por períodos de crescimento (anagenia) e inatividade (telogênio).
Há normalmente também, um estágio intermediário de involução (catágeno) entre
estes 2 períodos. A troca de pelagem é um evento sazonal e em geral representa
a perda de um pêlo telogênico, e o crescimento de um novo pêlo anagênico. Isto
ocorre durante o início da primavera e outono, e está relacionado primariamente
com a fotoperiodicidade, ou seja, mudanças na duração e intensidade luminosa.
Segue 1 dos 3 padrões: sincrônico, em onda ou em mosaico.
Fatores controladores hormonais, neurais e vasculares podem influenciar o
crescimento piloso. Os mecanismos de controle endócrino são os mais importantes;
eles são complexos, e provavelmente dependem do equilíbrio de vários hormônios.
Em geral, o crescimento piloso é aumentado por tireoxina, adrenalectomia e
gonadectomia. Os glicocorticóides e estrogênios tendem a retardar o crescimento
piloso. Fatores nutricionais, particularmente proteínas, gorduras e vitaminas (e em
menor grau, o consumo calórico) também podem afetar o crescimento piloso. O
tamanho, a forma, e a espessura do pêlo nos animais são controlados geneticamen-
te, embora possam ser influenciados por fatores ambientais.
O restante do sistema apendicular consiste de glândulas sebáceas e glândulas
sudoríparas apócrinas e écrinas. As glândulas sebáceas são alveolares simples,
glândulas holócrinas que secretam o sebo nos folículos e conseqüentemente para
a superfície epidérmica. O sebo é um material lipídico complexo que contém
colesterol, ésteres de colesterol, triglicerídios, ceras diésteres e ácidos graxos. As
Pele, Introdução 937

glândulas sebáceas tornam-se completamente funcionais na puberdade e estão


sob a influência primária dos hormônios androgênicos. A dieta também tem um
efeito na produção sebácea; diminuições no consumo de gordura podem levar a
uma redução inicial na produção sebácea seguida de um aumento compensatório.
As glândulas sudoríparas apócrinas estão presentes onde quer que existam
folículos pilosos (ver também TUMORES CUTÂNEOS DE GLÂNDULAS APÓCRINAS, pág.
1032). Seus dutos penetram o folículo logo acima da entrada do duto sebáceo. O
produto da glândula sudorípara é um material lipídico, proteináceo e branco. As
glândulas não se tornam funcionais até a puberdade e estão sob controle tanto
humoral como nervoso.
As glândulas sudoríparas écrinas estão presentes em áreas limitadas (usual-
mente nos coxins e focinho) em muitos animais. Elas eliminam o seu produto
diretamente na superfície da pele. Nos primatas, estes são os principais órgãos
responsáveis pela sudorese.
A derme é uma estrutura mesenquimal que suporta, nutre e, em certo grau,
regula a epiderme e os apêndices. Consiste de fibras (colágenas, reticulares e
elásticas), substância fundamental (um gel mucopolissacarídio), células (fibroblas-
tos, mastócitos e histiócitos), e vastos plexos nervoso e vascular. Tanto nervos
mielinizados quanto não mielinizados estão presentes na derme. Os nervos motores
são predominantemente adrenérgicos em tipo, e inervam os vasos sangüíneos e os
músculos eretores do pêlo. Exceto nos eqüinos, as glândulas apócrinas parecem
não ser inervadas. Os nervos sensitivos estão distribuídos em 3 redes: dérmica,
folicular e órgãos de fim especializado. Tato, pressão, dor, prurido, calor e frio são
sensações cutâneas percebidas pelo cérebro.
A principal função da pele é a proteção. A pelagem fornece uma proteção
mecânica, e também funciona como um importante sistema de filtragem e isolante.
Ela pode servir também para esconder ou camuflar o animal. O estrato córneo, uma
membrana flexível, durável, forte e altamente desenvolvida, serve como uma estrutura
química e impermeabilizante; se for removido, a pele funcionará como uma
membrana mucosa e será livremente permeável a quase todos os agentes. A
temperatura cutânea, hiperemia, hidratação do estrato córneo, lesão química ou
mecânica à membrana, afetam e alteram a sua função protetora. Aumento da
temperatura cutânea e da hidratação da epiderme, hiperemia e lesão mecânica ou
química à superfície aumentam a penetração dérmica a materiais nocivos. A
pelagem também tem a função de proteção contra a penetração de agentes tóxicos
ou alergênicos através da superfície da pele, por filtração mecânica e adsorção de
moléculas positivamente carregadas, à ceratina negativamente carregada do pêlo.
O terceiro tipo de proteção proporcionada pela pele é contra a irradiação actínica.
A luz ultravioleta é filtrada pela camada pilosa e absorvida pelos grânulos de
melanina na epiderme e no pêlo.
A pele é importante para a regulação térmica no homem e em alguns animais
domésticos. Isto é particularmente verdadeiro para o cavalo e em menor grau para
suínos, ovinos e caprinos. Naqueles animais que possuem glândulas sudoríparas
apócrinas, sua função normalmente não é de termorregulação; outros mecanismos
adaptativos, como o resfolegar no cão e a salivação e a limpeza da pelagem com
saliva em gatos e camundongos são usados para dissipar o calor. A conservação
do calor é feita por meio de vasoconstrição, tremor e isolamento proporcionado pela
gordura subcutânea e pela ereção dos pêlos. É a pelagem secundária, em vez da
primária, que isola o animal através de espaços aéreos mortos contidos na camada
pilosa, particularmente quando ereta. Para esta função propriamente dita, a pelagem
deve estar seca e impermeável.
A epiderme também serve como um mensageiro imunológico. Por exemplo,
material antigênico e alergênico pode ser processado pelas células de Langerhans
Pele, Introdução 938

e transportado para células T nodais e locais, induzindo reações de hipersensibili-


dade. A proteína epidérmica pode ser conjugada com haptenos exógenos, tornan-
do-os antigênicos.
Além disso, 7-desidrocolesterol, o precursor da vitamina D, é formado na
epiderme.
As funções das glândulas sudoríparas e sebáceas da pele e seus produtos não
estão bem conhecidos ou entendidos. Animais mutantes desprovidos de pêlo, sem
glândulas apócrinas ou sebáceas vivem normalmente sem elas. Embora em
eqüinos, ovinos e caprinos as glândulas sudoríparas apócrinas façam parte da
termorregulação, é inteiramente incerta qual é a função delas nos outros animais
domésticos. O suor pode interferir na hidratação do estrato córneo e na viscosidade
da camada lipídica. As glândulas sebáceas fornecem à superfície epidérmica uma
camada lipídica que demonstrou ter certa atividade antibacteriana e antifúngica;
elas podem ainda interferir na hidratação epidérmica e, possivelmente, na descama-
ção. Os lipídios sebáceos são importantes, proporcionando brilho ou lustro à
camada pilosa do animal.
Padrões de reação – Embora a pele seja um órgão complexo e heterogêneo,
com relação à sua estrutura, ela reage de maneira limitada. Estas reações básicas
são expressadas clinicamente, como lesões primárias e secundárias. As lesões
primárias incluem: 1. máculas (≤10mm) e manchas (>10mm) – áreas não elevadas
e despigmentadas da pele; 2. pápulas, nódulos e tumores – lesões sólidas e
elevadas (em ordem crescente de tamanho); 3. vergões – superfície superior plana,
saliências úmidas, elevações sólidas da pele resultantes da liberação de histamina
pelos mastócitos; 4. vesículas (≤10mm) e bolhas (>10mm) – lesões elevadas
“cheias de líquido”; e 5. pústulas – lesões elevadas que contêm pus. As lesões
secundárias incluem: 1. escamas – descamação do estrato córneo; 2. crostas –
resíduos ressecados de lesões exsudativas; 3. liquenificação – pele usualmente
pigmentada, semelhante a cortiça, na qual os sulcos normais da pele são exagera-
dos; e 4. alterações na pigmentação resultantes de processos inflamatórios ou
neoplásicos.
Muitos agentes podem produzir reações ou lesões idênticas na pele. Por
exemplo, uma pústula pode ser uma reação a um irritante, uma infecção, uma
ruptura de cisto apócrino ou associada com uma doença auto-imune (por exemplo,
pênfigo). De modo contrário, qualquer agente pode produzir várias reações. Uma
infecção por dermatófito pode ser assintomática, ou produzir alopecia com ou sem
inflamação, ou uma pápula, pústula ou nódulo granulomatoso (quérion). A irradia-
ção actínica pode resultar em eritema e alterações inflamatórias ou provocar uma
neoplasia. Portanto, é freqüentemente difícil (e às vezes impossível) estabelecer um
diagnóstico etiológico com base apenas na erupção primária. Uma história comple-
ta, definição da distribuição topográfica, culturas, esfregaços, raspados e histopa-
tologia são essenciais para um diagnóstico definitivo. Além disso, como as lesões
primárias podem ser destruídas pelo autotraumatismo e/ou por infecções bacteria-
nas secundárias, a história e distribuição topográfica das lesões freqüentemente se
tornam importantes para o diagnóstico.
Quando é lesada, a pele reage de uma maneira limitada (determinada genetica-
mente) para eliminar ou neutralizar a lesão, por meio de vários eventos inflamatórios
ou proliferativos: 1. influxo de células inflamatórias, edema, fatores quimiotácticos,
etc. na derme – usualmente produzindo lesões elevadas sólidas na pele, como
pápulas ou nódulos; 2. fluxo de células inflamatórias através da epiderme –
produzindo vesículas, pústulas ou exsudação; 3. aceleração do tempo de renova-
ção da epiderme – produzindo escamas; 4. aumento da atividade mitótica – levando
ao espessamento da epiderme; ou 5. aumento da atividade melanocítica – produ-
zindo pigmentação. Alguns desses eventos podem realmente ser prejudiciais ao
Pele, Introdução 939

processo de cura, por exemplo, a presença de crostas na pele tende a camuflar e


manter uma infecção. A resposta ao prurido (se coçar, lamber, morder) pode
intensificar a inflamação. A ruptura da epiderme pode predispor a infecções
secundárias ou à entrada de substâncias prejudiciais e a superfície de exsudação
pode favorecer a proliferação bacteriana. Dessa forma, no tratamento de qualquer
afecção, devem ser considerados o equilíbrio correto de agentes antiinflamatórios
e o processo da doença.
História – A informação deve ser obtida e interpretada da seguinte maneira:
1. Quando e onde a doença começou, e como ela progrediu?
2. Se houver prurido, o proprietário deverá ser questionado com relação ao seu
grau e intensidade em uma escala de 1 a 10 (entretanto, a percepção das pessoas
com relação à intensidade do prurido é extremamente variável – por exemplo, o
animal não tem escoriações e mesmo assim o proprietário relata prurido de grau 10).
a) Leve a moderado – ocorre na maioria das doenças e não é diagnosticado.
b) Severo – o animal se coça na sala de atendimento, por exemplo, na escabiose,
dermatite alérgica a pulga, hipersensibilidade alimentar. c) Contínuo – nódulo
pruriginoso acral e “hot spot”. d) Mínimo – sarna demodética localizada, tinha, a
maioria das alopecias endócrinas, seborréia e impetigo nos animais jovens.
3. Receptividade a um tratamento prévio? a) Esteróides – muitas dermatoses são
controladas com esteróides. Exceções incluem doenças auto-imunes tratadas com
doses antiinflamatórias, resposta variável ao tratamento da hipersensibilidade
alimentar, aberrações hormonais sexuais, escabiose e granulomas por lambedura.
b) Antibióticos – uma boa resposta é esperada no tratamento de piodermias, mas
não em doenças vesiculopustulares, crostosas que se assemelham a infecções
bacterianas, como tinha, dermatite de contato, doenças auto-imunes, seborréia.
4. Envolvimento de membros da família? – A maioria das infecções bacterianas
não é contagiosa. Quando outros animais ou pessoas da casa são envolvidos,
devem-se considerar ectoparasitas, mudança na dieta ou alterações das condições
ambientais.
5. Idade do animal? – Muitas dermatoses possuem um padrão etário distinto, por
exemplo, no primeiro ano de vida – piodermia juvenil, sarna demodética, dermatose
responsiva ao zinco, dermatoses congênitas, tinha; entre 1 e 3 anos – atopia
(dermatite inalante); de meia-idade para mais velho – dermatoses endócrinas,
tumores.
6. Predisposição racial – por exemplo, boxers: doença de Cushing, atopia, sarna
demodética, “hot spots”, granulomas por lambedura, dermatite solar nasal, lúpus;
setter irlandês: seborréia, atopia, autotraumatismo neurótico; cocker e springer
spaniel: seborréia; pastor alemão: piodermia, hipersensibilidade alimentar ou
idiossincrasias, sarna demodética, fístulas perianais.
7. As lesões precederam ou seguiram algum autotraumatismo? – Lesões
primárias devem preceder autotraumatismo.
8. A doença tem alguma relação com o ciclo estral? – Certas dermatoses pioram
ou melhoram durante o estro, ou começam 4 a 6 semanas após o estro (síndrome
“blown coat”). Machos castrados apresentam muitos problemas dermatológicos,
freqüentemente observados 2 a 4 anos após a castração, sendo responsivos à
terapia de substituição com testosterona.
9. Houve alguma alteração no ambiente ou na dieta do animal quando do início
da doença?
10. A doença possui um padrão sazonal? Ela é constante durante todo o ano ou
aumenta e diminui? Atopia, aberrações hormonais sexuais, dermatite alérgica a
pulga, seborréia e piodermia podem apresentar um padrão sazonal definido.
Algumas doenças dermatológicas têm um padrão topográfico distinto. 1. atopia
(alergia inalante) – face (incluindo orelhas), axilas e membros; 2. hipersensibilidade
Pele, Introdução 940

alimentar – como anteriormente mencionado, e/ou região posterior do corpo e


períneo; 3. desordens endócrinas (em geral) – tronco, poupando a cabeça e as
extremidades; 4. dermatoses relacionadas a hormônios sexuais – região posterior
do corpo, períneo, virilha, dobras dos flancos, axilas, região interdigital e face; 5.
seborréia – pinas, região periocular, perilabial, porção média do tronco, cauda,
perianal, virilha, umbilical, mamilos, interdigital; 6. dermatite de contato – membros,
região escrotal, virilha, axilas, pinas e lábios.
Por outro lado, áreas específicas do corpo são mais comumente afetadas por
certas condições. 1. face – doenças auto-imunes, piodermia, sarna demodética,
dermatite de contato, tinha, escabiose, seborréia; 2. membros – dermatites neuró-
ticas, piodermias, sarna demodética, atopia, ancilostomíase, vasculite; 3. região do
carpo e tarso – granulomas por lambedura; 4. lateral dos cotovelos – escabiose,
calos, piodermia por ponto de pressão; 5. tronco – piodermia, seborréia, sarna
demodética, Cheyletiella, desordens endócrinas; 6. pinas – escabiose, seborréia,
doenças auto-imunes, lesões por picadas de insetos, piodermia, vasculite; 7. região
posterior do corpo – dermatite alérgica a pulgas, hipersensibilidade alimentar,
infecção dos sacos anais, síndrome de hiperestesia (gatos); 8. virilha – piodermia,
doenças auto-imunes, dermatite de contato, atopia, seborréia.

PRINCÍPIOS TERAPÊUTICOS
Existem dificuldades particulares para a prática e o entendimento da derma-
toterapia. O modo de ação de muitas drogas usadas em dermatologia é desconhe-
cido (por exemplo, o alcatrão e o enxofre são extremamente usados com muito
sucesso, mas sem o conhecimento dos mecanismos moleculares envolvidos);
existem poucos estudos mais aprofundados.
A influência de outros sistemas no tegumento freqüentemente exige que o
tratamento seja interno, bem como tópico, por exemplo, é irracional tratar uma
dermatose devida ao hipotireoidismo pela aplicação externa de medicamentos, em
vez de administrar hormônio tireóideo. Medidas tópicas adequadamente seleciona-
das podem ser a melhor forma de tratamento se a causa for desconhecida ou incerta.
A escolha do medicamento tópico a ser usado é determinada pelas características
morfológicas, pelo estágio e local da erupção. Uma dermatose deve ser classificada
como aguda ou crônica, seca ou exsudativa, infectada ou não infectada, superficial
ou profunda, e deve ser tratada adequadamente.
Medicamentos tópicos são escolhidos para produzir efeitos específicos de
acordo com o caráter das lesões. É melhor usar poucos remédios bem conhecidos
em vez de ser confundido pelo oceano de drogas dermatológicas disponíveis. Um
remédio pode prejudicar em vez de ajudar; no caso de dúvida, comece com o agente
mais brando e indiferenciado; quando usar um novo medicamento, observe o efeito
em uma pequena área antes de aplicá-lo em uma área maior; não mude para um
novo remédio à medida que a dermatose melhore satisfatoriamente com o uso de
algum composto mais antigo. Quando um remédio for prejudicial a um paciente, pare
de usá-lo e tente encontrar a causa da indisposição. A ação dos remédios tópicos
dependerá freqüentemente do modo de aplicação e de remoção. Devem ser dadas
instruções adequadas ao cliente e freqüentemente uma demonstração da maneira
correta do uso, incluindo aplicação e remoção de cada preparação. A certeza do
diagnóstico é necessária para um tratamento apropriado. Dependendo dessa
certeza, a terapia tópica em muitas dermatoses é muito importante no manejo
terapêutico do paciente.
A terapia tópica é valiosa ou mais aplicável nas seguintes situações: 1. quando
o diagnóstico definitivo não pode ser feito, ou ainda não foi feito; 2. quando um
adjuvante ao tratamento sistêmico irá acelerar a recuperação; 3. quando a experiên-
Testes Alérgicos 941

cia indica que a terapia tópica será tão bem-sucedida quanto o tratamento sistêmico
(ver também ANTI-SÉPTICOS E DESINFETANTES, pág. 1850).

ACANTOSE NIGRICANTE
É um termo descritivo de uma síndrome clínica com múltiplas etiologias de base
potenciais. Ela ocorre em cães, particularmente dachshunds. As causas potenciais
são muitas, e mais que uma pode ser encontrada em um mesmo animal. As
principais causas incluem traumatismo mecânico por fricção (principalmente em
animais obesos), alergia inalatória, alergia alimentar, alergia de contato, piodermia,
hipotireoidismo, hiperadrenocorticismo, e dermatoses relacionadas ao hormônio
sexual. Alguns casos são idiopáticos e podem ser hereditários.
As lesões consistem em graus variáveis de eritema axilar simétrico, alopecia,
hiperpigmentação, espessamento e liquenificação da pele. Os sinais podem progre-
dir até envolver a face medial dos membros anteriores, região ventral do pescoço,
tórax e abdome. A superfície da pele afetada freqüentemente apresenta uma textura
cerosa ou untuosa. Pode haver prurido.
Fatores que provocam ou contribuem para o aparecimento da doença devem ser
identificados. Uma avaliação completa inclui: biópsia de pele, testes alérgicos, dieta
hipoalergênica, avaliação tireóidea e adrenal, e outros testes apropriados para o
animal em questão. O diagnóstico de acantose nigricante idiopática é firmado pela
exclusão de todas as causas conhecidas.
Muitas terapias têm sido preconizadas e o sucesso variável obtido com cada uma
delas reflete provavelmente as multietiologias de base da doença. O tratamento
deve ser específico quando possível. Melatonina (1u/cão, s.c., uma vez ao dia
durante 3 dias, e depois quando necessário) tem sido preconizada para casos
idiopáticos, mas raramente é efetiva e a sua obtenção é difícil. Vitamina E (dL-α-
acetato de tocoferol) na dose de 200UI, via oral, duas vezes por dia, por 1 a 2 meses
é benéfica em alguns casos idiopáticos. A terapia tópica com xampus anti-
seborréicos e a redução do peso de animais obesos são úteis.

TESTES ALÉRGICOS
Testes para o diagnóstico de dermatites alérgicas em animais incluem o teste
cutâneo intradérmico e testes sorológicos in vitro, como o teste radioalergossorvente
ou ELISA. Eles são usados principalmente para a detecção da alergia a substâncias
inaladas; seu uso em alergia alimentar é controvertido.
Teste cutâneo intradérmico – O teste cutâneo intradérmico (TCID) é o teste
mais comumente usado e o melhor caracterizado. É usado em cães e gatos para o
diagnóstico da dermatite alérgica a inalantes (atopia ou dermatite atópica) e
dermatite alérgica a pulgas; em eqüinos é usado para o diagnóstico da urticária
relacionada com agentes inalantes, e da hipersensibilidade a insetos. O TCID
baseia-se na presença de mastócitos sensibilizados na pele. Quando um alérgeno
ofensor é injetado intradermicamente, estas células se degranulam e liberam
mediadores químicos da inflamação. O resultado é um vergão e eritema no local da
aplicação se o animal for alérgico. O TCID requer experiência e o investimento em
materiais, sendo realizado freqüentemente por especialistas.
Testes Alérgicos 942

As reações ao TCID podem variar em cada estação; o melhor momento para


realizar o teste na maioria dos animais é imediatamente após uma piora do
quadro alérgico. Desta forma, a época ideal para o teste no Hemisfério Norte é
setembro a novembro. Corticosteróides (orais, injetáveis e tópicos) afetam o
TCID, e devem ser suspensos no mínimo 2 a 4 semanas antes do teste. Anti-
histaminas e tranqüilizantes podem ser administrados até uma semana antes do
teste. Durante a suspensão da droga, problemas concorrentes como seborréia
ou piodermia devem ser tratados.
Os alérgenos específicos usados para o teste variam de acordo com a região.
Preferem-se extratos individuais específicos (por exemplo, pólen de vidoeiro) a
extratos mistos (por exemplo, pólens de várias árvores). Extratos alergênicos
são adquiridos na forma concentrada, sem preservativo de glicerina, e devem ser
diluídos antes do uso. Dependendo do fabricante, a concentração de alérgenos
é expressa em unidades de nitrogênio proteico/mL (PNU/mL) ou peso: volume
(p:v). As diluições normais para teste são 250 a 1.000 PNU/mL ou 1:5.000 a
1:1.000 p:v. A potência dessas diluições se deteriora com o tempo; novas
diluições devem ser feitas a cada 6 semanas. Um controle positivo (1:100.000
fosfato de histamina) e um controle negativo (solução diluente alergênica) são
sempre usados.
Pode ser necessário sedar o animal para realizar o teste. As drogas que não
afetam o TCID incluem o cloridrato de xilazina para cães ou eqüinos e o cloridrato
de cetamina para gatos. Os pequenos animais são contidos em decúbito lateral e
a região torácica lateral tricotomizada; aproximadamente 0,05mL de cada alérgeno
é injetado intradermicamente nos locais delimitados adequadamente, além dos 2
controles. Em eqüinos, utiliza-se a região cervical lateral e injeta-se 0,1mL.
Reações imediatas são observadas 15 a 30min após a injeção. Devem ser
notados um grosso vergão, graus variáveis de endurecimento e eritema. O controle
negativo não deve produzir nenhuma reação. O controle positivo deve produzir um
vergão grande (>12mm), eritematoso e endurecido; a dificuldade na observação de
uma reação forte do controle positivo indica problema com o teste, geralmente
interferência de drogas. As reações em geral são mensuradas como 0,1+, 2+, 3+ ou
4+, com o controle negativo recebendo o escore 0 e o positivo 4+. As reações
positivas são muito mais sutis em gatos, o que torna a interpretação difícil.
Um prurido transitório no local da injeção pode ocorrer em ,10% dos animais.
Reações adversas severas como anafilaxia podem ocorrer, mas são raras.
Teste in vitro: estes testes, realizados em laboratórios comerciais, detectam a
presença de anticorpo reagínico alergênico específico (IgE) no soro. Eles estão
disponíveis apenas para cães. Sua utilidade no diagnóstico e controle da alergia
canina não está totalmente documentada. As vantagens incluem a facilidade do uso,
não requerendo reagentes especiais e requer a suspensão de drogas como os
corticosteróides. As condições da amostra, escore, e interpretação variam conforme
o laboratório onde o teste foi realizado.

ALOPECIA
(Atriquia, Calvície)

É a perda localizada ou generalizada de pêlo, pelagem ou lã. A alopecia pode ser


primária ou secundária a muitos processos inflamatórios da pele.
Etiologia – A alopecia congênita tem sido descrita em vacas, cavalos, cães,
gatos e suínos. Linhagens de camundongos e ratos desprovidas de pêlo têm sido
Alopecia 943

selecionadas e estão disponíveis comercialmente. A ausência de pelagem invaria-


velmente acompanha o bócio congênito em suínos nascidos de fêmeas deficientes
em iodo. A alopecia adquirida ocorre devido a várias doenças e intoxicações, por
exemplo, deficiências dietéticas; doenças infecciosas, particularmente aquelas que
causam reações febris ou destruição epitelial; e envenenamento, como por mercú-
rio, tálio, iodo ou formaldeído. Doenças endócrinas (hipotireoidismo, hiperadreno-
corticismo, alopecias relacionadas ao hormônio de crescimento, e desequilíbrio de
hormônios sexuais) são as causas mais comuns de alopecia não inflamatória,
principalmente em cães. Pode ocorrer uma alopecia temporária em eqüinos, ovinos
e cães durante a gestação, lactação ou várias semanas após uma doença severa
ou febre. A queda localizada de pêlos pode resultar do atrito local persistente, da
aplicação contínua de produtos químicos, irritantes ou radiação; ectoparasitas; e
infecções bacterianas ou por dermatófitos.
Achados clínicos e diagnóstico – A alopecia é um sinal freqüente de uma
dermatopatia específica, por exemplo, dermatofitose ou anormalidades endócrinas.
A perda de pêlos na alopecia adquirida, normalmente inicia-se como áreas de
atriquia localizada, que depois podem aumentar em tamanho e coalescer com
lesões adjacentes, ou permanecer inalteradas. O prurido é variável, dependendo da
causa primária. Na alopecia endócrina, as lesões se desenvolvem de forma
simétrica e não há prurido, a menos que exista uma infecção bacteriana secundária.
O curso da alopecia é crônico e o prognóstico desfavorável, a menos que a causa
primária seja identificada e tratada.
Devem-se realizar raspados cutâneos para pesquisa de ectoparasitas (espe-
cialmente em cães, para Demodex). Culturas bacterianas e fúngicas também
podem ser realizadas, especialmente se o padrão da alopecia for disseminado e
multifocal. O melhor método diagnóstico é biópsia cutânea de lesões represen-
tativas. Concentrações sorológicas de hormônios tireóideos, hormônio de cres-
cimento, cortisol, estrogênio e androgênio devem ser determinadas se a alopecia
for bilateral e simétrica. Doenças inflamatórias severas podem causar cicatrizes
permanentes e alopecia não responsiva a tratamentos.
Tratamento – O sucesso da terapia depende do estabelecimento da causa de
base. O grau de recuperação depende da duração da doença e da quantidade
de folículos pilosos lesados. Infecções bacterianas devem ser tratadas por um
período ≥ 3 semanas com uma droga apropriada (por exemplo, em cães,
lincomicina 20mg/kg, duas vezes ao dia; eritromicina 20mg/kg, três vezes ao dia;
cefalosporina 20mg/kg, três vezes ao dia, sulfatrimetoprim 15mg/kg, duas vezes
ao dia). Dermatofitoses devem ser tratadas como recomendado (ver DERMATOFI -
TOSE pág. 954). Em cães, se o desequilíbrio de hormônios gonadais for a causa
da alopecia, é indicada a castração. No hipotireoidismo (ver pág. 338) a terapia
com L-tireoxina (0,5mg/m 2, duas vezes ao dia) geralmente é efetiva (para calcular
a superfície corporal para fórmula, ver pág. 57). A terapia de reposição com
hormônios gonadais pode ser efetuada, quando indicado por exames e sorologia;
entretanto, a terapia com estrogênios (e possivelmente androgênios) pode
causar sérios efeitos colaterais.
Para cães machos, pode-se administrar metiltestosterona na dose de 1mg/kg (no
máximo 30mg) em dias alternados. Para cadelas, pode-se administrar 0,1mg de
dietilstilbestrol diariamente durante 3 semanas e, em seguida parar por 1 semana;
este ciclo é repetido por 3 meses. Deve-se evitar que ocorra depressão da medula
óssea. Se for bem-sucedida, a hormonioterapia deve ser diminuída para a menor
dosagem efetiva possível.
Hipodermose – Berne 944

HIPODERMOSE – BERNE
(Dermatobia hominis e Hipoderma spp)

A hipodermose dos bovinos no Hemisfério Norte é causada pelos estágios larvais


(larva do gado ou berne do boi) das moscas do gênero Hypoderma (ordem Diptera,
família Oestridae). Hypoderma (Oedemagena ) tarandi são parasitas naturais dos
Cervidae e renas nas regiões árticas. Na América Central e na América do Sul,
larvas (berne tropical) da Dermatobia hominis (Diptera, Cuterebridae) são importan-
tes parasitas do gado.

DERMATOBIA HOMINIS
A mosca do berne tropical ou “torsalo” é um dos parasitas mais importantes de
bovinos na América Latina e está distribuída entre o sul do México e o norte da
Argentina. Os estágios larvais são encontrados em muitos hospedeiros: bovinos,
ovinos, caprinos, suínos, bufalinos, cães, gatos, coelhos e no homem. Bovinos e
cães são as espécies mais comumente infectadas.
Ciclo de vida – A mosca adulta mede 12 a 15mm de comprimento; sua vida é
curta, com cerca de 4 dias em média. A mosca adulta fixa seus ovos nos diferentes
tipos de insetos (quarenta e nove espécies de insetos [mosquitos e moscas em sua
maioria] são descritos como vetores de D. hominis na América Latina) que os
transmitem para os hospedeiros mamíferos, nos quais virão a eclodir à medida que
os insetos se alimentam. As larvas migram sob a pele do animal alguns minutos após
a eclosão e permanecem no tecido subcutâneo por 39 a 50 dias. Durante este
período, as larvas crescem e produzem cistos com um orifício através do qual
respiram. Quando madura, a larva deixa o hospedeiro e cai ao chão, entoca-se, e
torna-se pupa. O período de pupa dura de 32 a 43 dias, ao final deste período as
moscas emergem como adultas. O ciclo de vida completo requer de 78 a 117 dias.
A penetração da pele pelas larvas é acompanhada por dor severa, inflamação
local e formação gradual de pus. O couro é condenado ao abate, e a produção do
leite e da carne é reduzida.
Tratamento e controle – Diferentes inseticidas sistêmicos em várias formula-
ções são viáveis para o tratamento. Inseticidas organofosforados, como diclorvos e
fention são usados na América Latina, como spray ou produtos tópicos; triclorfon é
viável como produto injetável, spray ou oral, a ivermectina pode ser administrada por
via subcutânea ou “pour-on”.

HYPODERMA SPP
Duas espécies de Hypoderma, H. bovis e H. lineatum, são parasitas importantes
de bovinos. Elas são encontradas entre 25 e 60° de latitude no Hemisfério Norte e
ocorrem em mais de 50 países da América do Norte, Europa, África e Ásia. Na
América do Norte, H. lineatum, uma larva de gado comum, é encontrada no Canadá,
EUA e norte do México; H. bovis, uma larva de bovinos do norte, é geralmente
encontrada ao norte do paralelo 35°. A ocorrência no gado bovino e no bisão
americano é comum. Há também relatos de larvas de Hypoderma spp em cavalos,
ovinos, caprinos e no homem.
Ciclo de vida – Os Hypoderma (moscas de calcanhar) adultos são moscas
pilosas com ,15mm de comprimento. Durante o final da primavera ou início do
verão, elas depositam seus ovos na pelagem do gado, particularmente na região
mais baixa das pernas. Em 3 a 7 dias, os ovos eclodem e o primeiro estágio larval
emerge; movem-se através do pêlo, penetram na pele. Aparentemente, estas larvas
locomovem-se quase que exclusivamente através do tecido conjuntivo. Elas secre-
Hipodermose – Berne 945

tam enzimas proteolíticas que dissolvem os tecidos e facilitam sua movimentação.


Durante o outono e o inverno, as larvas migram em direção a 2 regiões específicas,
que variam de acordo com as espécies: Hypoderma lineatum migra em direção ao
tecido conjuntivo da parede esofágica, onde permanece por um período de 2 a 4
meses. As larvas de Hypoderma bovis migram para a região do canal espinhal;
algumas são encontradas na gordura epidural do canal, onde permanecem por um
período similar.
No começo do inverno, as larvas iniciam sua migração final novamente através
do tecido conjuntivo e atingem o tecido subdérmico da linha costal do hospedeiro,
onde produzem um poro de respiração através da pele. Os cistos são formados ao
redor das larvas e passam por 2 mudas (segundo e terceiro estágios). Este período
dura 4 a 6 semanas. Finalmente, o terceiro estágio larval emerge pelos orifícios, cai
no chão e torna-se pupa. As moscas evoluem das pupas em 1 a 3 meses,
dependendo das condições do meio externo. As moscas adultas não se alimentam
e vivem < 1 semana. O ciclo de vida completo das Hypoderma spp é de 1 ano.
Estes eventos sazonais são semelhantes para as 2 espécies, contudo, para a
H. lineatum, ocorrem , 6 a 8 semanas antes do que o observado com a H. bovis.
Estes eventos variam de ano para ano, mas são relativamente bem relacionados às
condições climáticas locais e regionais. No sul dos EUA, normalmente as larvas
aparecem primeiro nas costas do animal em meados de setembro; ao passo que ao
norte do país, este evento é atrasado, ocorre no final de janeiro, ou mais tarde. No
Texas, a primeira queda da larva do dorso do animal ocorre durante a última
quinzena de novembro; em Montana, ocorre durante a primeira quinzena de março.
Quando ambas as espécies estão presentes, as larvas podem emergir no dorso do
animal em , 5 a 6 meses; quando somente a H. lineatum está presente, ocorre em
, 3 a 4 meses. No sul dos EUA, a atividade de oviposição das moscas fêmeas ocorre
de janeiro a março; nos estados do norte, de maio a julho.
Achados clínicos e patogenia – Durante os períodos mais quentes do dia, o
gado corre livremente sem orientação, com a cauda elevada, quando atacados,
particularmente por fêmeas de H. bovis. Entretanto, nem sempre este tipo de
conduta resulta do ataque das moscas, sendo ocasionalmente observado em
estações ou regiões conhecidas por serem livres das mesmas.
Ao contrário do gado sadio, a presença de larvas de H. bovis e suas secreções
na gordura epidural do canal espinhal está associada à dissolução do tecido
conjuntivo, necrose do tecido adiposo e inflamação. Às vezes, a inflamação
estende-se para o periósteo e ossos, produzindo uma área localizada de periostite
e osteomielite. Ocasionalmente, o epineuro e o perineuro podem estar envolvidos.
Raramente, em casos severos, paralisia ou outros distúrbios nervosos podem
ocorrer. Similarmente, a presença de H. lineatum na submucosa do esôfago pode
causar inflamação e edema nos tecidos adjacentes, suficientemente severos para
dificultar a deglutição ou eructação. No entanto, não é comum sinais clínicos de
parasitismo serem evidentes durante a fase migratória.
As larvas recém-produzidas penetram na pele e promovem uma erupção
hipodérmica. Os pontos de penetração são dolorosos, inflamados e geralmente há
um exsudato seroso amarelado. As larvas podem ocorrer em todo dorso do animal,
da cauda até a cernelha, e do topo do dorso até aproximadamente um terço das
laterais. Os cistos são de consistência firme e geralmente elevam-se consideravel-
mente acima do contorno normal da pele; em cada elevação há um orifício de
respiração, que varia em tamanho, de um pequeno orifício para pequenas larvas até
um buraco circular, de 3 a 4mm de diâmetro, para larvas crescidas. A infecção
secundária dos cistos pode resultar em grandes abscessos supurativos. A saída da
larva, sua expulsão forçada ou sua morte dentro do cisto, geralmente resultam em
cicatrização da lesão sem maiores complicações. As carcaças e o couro do gato
Hipodermose – Berne 946

acometido por hipodermose apresentam marcas evidentes da infestação e são de


valor reduzido no seu processamento.
O número de larvas em um animal infestado varia de 1 a ≥ 300; rebanhos
infestados podem ter animais não acometidos. Os animais mais jovens são mais
abundantemente infestados.
À medida que as larvas de Hypoderma migram através do tecido conjuntivo em
direção aos seus locais prediletos, se elas morrerem em outro local, principalmente
próximo à medula espinhal, podem causar reações severas e às vezes fatais; estas
reações parecem estar relacionadas à abundância de larvas, mas raramente ocorrem.
A morte do primeiro estágio larval de H. bovis no canal espinhal após o tratamento
sistêmico com inseticida tem produzido rigidez, ataxia, fraqueza muscular e paralisia
dos membros posteriores. A recuperação é geralmente rápida e completa, mas
ocasionalmente a paralisia pode ser permanente.
A morte do primeiro estágio larval de H. lineatum causa inflamação da parede
esofágica, disfagia, salivação e timpanismo. Novamente, a recuperação é em geral
rápida e completa (48 a 72h após tratamento), mas em casos severos, o timpanismo
pode ser fatal. A ruptura do esôfago pode ser causada pela tentativa da passagem
de uma sonda estomacal.
Diagnóstico – O terceiro estágio larval pode ser facilmente diferenciado, pois a
H. bovis é geralmente maior, não possui espículas no décimo segmento e o
espiráculo tem o formato de funil; a H. lineatum é menor, tem espículas no décimo
segmento e o espiráculo é geralmente liso. Nos casos de timpanismo ou paralisia,
a presença de larvas em desintegração, bem como de hemorragia e danos
teciduais, distingue os animais parasitados dos não parasitados.
Tratamento e controle – São viáveis para tratamento 6 inseticidas sistêmicos
diferentes, em várias formulações. Tratamentos com coumafos, famphur, fention,
fosmet, triclorfon ou ivermectina através de “pour-on” devem ser aplicados uniforme-
mente ao longo da linha mediana do dorso do animal. Por sua vez, o fention a 20%
deve ser aplicado em um único ponto no dorso do animal.
Sprays que contenham coumafos ou fosmet também controlam a hipoder-
mose; para uma absorção máxima são necessários volume e pressão suficien-
tes para umedecer toda a superfície da pele. O coumafos e fosmet podem ser
também usados na forma de banho parasiticida. A ivermectina é sistematicamente
ativa contra o parasita quando administrada por via subcutânea, VO ou “pour-on”.
Não deve ser usado nenhum agente sistêmico organofosforado em associação
com outro, já que suas ações são sinérgicas. O gado estressado pela castração,
insolação, vacinação ou transporte não deve ser tratado. O uso destes organo-
fosforados e da ivermectina é proibido em animais leiteiros lactantes. Em função da
presença de resíduos no gado por algum tempo após o tratamento, deve ser
estritamente observado o período da suspensão do tratamento.
O gado bovino, especialmente bezerros, em áreas onde o número de larvas por
animal é reconhecidamente alto, deve ser tratado tão logo quanto possível após o
final da estação das moscas. Eles não devem ser tratados por mais de 8 a 12
semanas antes do surgimento da primeira larva no dorso, uma vez que reações
adversas podem ocorrer quando larvas migratórias são mortas.
Quando inseticidas sistêmicos não podem ser usados e a rotenona é aprovada,
a hipodermose pode ser controlada pela aplicação deste composto nas lesões e
larvas no dorso. Como novas larvas continuam a aparecer no dorso, e posto que a
rotenona mata somente aquelas com as quais entra em contato através dos orifícios
de respiro, é necessário repetir o tratamento a cada 30 a 45 dias durante a estação
da larva. Uma lavagem ou polvilhamento com rotenona bruta deve ser aplicada no
dorso do animal e inserida através dos orifícios das larvas. Este tratamento, se
aplicado corretamente, mata > 90% das larvas no dorso.
Dermatopatias Congênitas e Hereditárias 947

Em grupos pequenos de animais tratáveis, a extração instrumental ou expulsão


manual (espremedura) das larvas individualmente é efetiva. Raramente, quando
este procedimento é feito sem os devidos cuidados, a larva é esmagada em seu cisto
e pode resultar em reação anafilática.

DERMATOPATIAS CONGÊNITAS E
HEREDITÁRIAS
Defeitos congênitos envolvendo a pele e seus anexos não são raros, e a maioria
possui uma causa genética.
O albinismo é classificado como parcial, incompleto ou completo. O albinismo
parcial é caracterizado por uma íris que é azul e branca centralmente e marrom
perifericamente, e por uma cor de pelagem que é, geralmente, característica da raça
ou mais diluída. Animais com albinismo incompleto, que é herdado como um
autossomo dominante, podem ter defeitos congênitos oculares da túnica coróide e
hipoplasia dos tecidos fibrosos e celulares de coróide.
A síndrome de Chédiak-Higashi (ver pág. 76), caracterizada por albinismo
parcial, é uma herança recessiva e os animais afetados apresentam anormalidade
de membranas de organelas em vários tipos celulares e a suscetibilidade às
infecções é maior. Os albinos completos possuem pelagem toda branca, a íris é
branca a rósea mas a túnica coróide é normal. O albinismo completo é uma herança
autossômica simples e recessiva.
Uma deficiência de coloração albinótica em gado angus, a hipopigmentação
oculocutânea, é herdada como uma característica autossômica simples e recessiva.
A pelagem marrom é observada sobre toda a superfície corporal e focinho, cascos
e bolsa escrotal também são de coloração marrom. A superfície da pele é marrom
a cinza e isto é particularmente notório na pele lisa ao redor das pálpebras, orelhas,
focinho, ânus e vulva. A característica mais aparente envolve a cor da íris: a cor preta
da íris é substituída por uma íris luminosa, geralmente de 2 cores, dando uma
aparência duplamente anelada. As pupilas sempre aparecem constritas à luz do dia
e, à distância, os olhos parecem brancos. O fundo ocular é despigmentado.
A fragilidade da pele, semelhante à síndrome de Ehlers-Danlos no homem, é
caracterizada por extrema fragilidade da pele, afrouxamento das articulações,
fragilidade cutânea e retardo na cicatrização de ferimentos cutâneos. O tecido
colágeno do corpo revela fragmentação e desorganização das fibras e maturação
deficiente. A pele dos bezerros afetados contém 12% a menos de proteína e 36%
a menos de glicina do que a pele normal. O defeito tem sido identificado nas raças
middle e high belgas, hereford, simmental, charolês e black pied alemão.
A epiteliogênese imperfeita é herdada como uma característica autossômica
simples recessiva e ocorre em bezerros das raças holstein, ayrshire, jersey,
shorthorn e angus. Bezerros holstein apresentam extensos defeitos epiteliais e
distais às articulações cárpica e társica, e uma ou mais patas defeituosas. Além
disso, focinho, narinas, língua, palato duro e bochechas apresentam defeitos
epiteliais. As orelhas são deformadas por margens enroladas e adesões nas
superfícies de contato. Bezerros ayrshire apresentam lesões similares, mas em
menor extensão e sem defeitos nas patas ou chifres. Bezerros da raça jersey
apresentam extensos defeitos epiteliais na cavidade bucal e sobre o corpo e pernas.
Eles também apresentam graves defeitos, como braquignatia inferior e atresia anal.
Bezerros das raças shorthorn e angus apresentam grandes defeitos epiteliais distais
Dermatopatias Congênitas e Hereditárias 948

às articulações cárpica e társica e uma ou mais patas e cascos defeituosos. Há


também defeitos epiteliais na cavidade bucal e no esôfago. Os bezerros afetados
com epiteliogênese imperfeita ou nascem prematuros ou morrem logo após o
nascimento por septicemia.
A ceratogênese imperfeita (paraceratose hereditária, “adema disease” é uma
herança autossômica recessiva simples em gado black pied e friesians ingleses. A
doença possivelmente está presente em holsteins nos EUA. Os bezerros afetados
parecem normais ao nascimento mas após 1 mês desenvolvem exantema nas pernas
com alopecia simétrica. Alguns bezerros apresentam diarréia; outros, sinais do SNC,
conjuntivite, rinite e broncopneumonia. Os bezerros apresentam a pele descamável,
espessada e enrugada na região do pescoço e paletas; eles ainda apresentam
alopecia e os chifres demoram para desenvolver-se. Lesões de dermatite exsudativa
desenvolvem-se nas pernas, e observam-se erosões na mucosa da cavidade oral,
esôfago e antro cardíaco. As lesões na pele são seguidas por deterioração das
condições corporais. A patogenia da ceratogênese imperfeita envolve deficiência no
consumo de zinco no intestino (defeitos cromossômicos são comuns nestes bezerros,
mas são considerados seqüelas em vez de causas deste defeito).
A ictiose congênita, devida à homozigosidade de um gene autossômico reces-
sivo simples, foi descrita em bezerros das raças pinzgauer, holsteins canadense e
chianina. O defeito é caracterizado pela ausência de pelagem e toda a superfície
corporal é coberta por placas córneas que medem até 2,54cm de diâmetro. As placas
córneas são separadas por fissuras profundas das quais crescem pêlos. O defeito é
letal. Defeitos associados incluem microtia, catarata e displasia tireóidea.
Seis tipos diferentes de hipotricose podem ser distinguidos nos bovinos, todos
sensíveis à influência do meio externo. Todos os 6 tipos são herdados e a severidade
varia; alguns são letais. Alopecia letal, alopecia parcial e hipotricose viável são
caracteres autossômicos recessivos simples; hipotricose com anodontia é conside-
rada uma característica recessiva ligada ao sexo; hipotricose com perda dos dentes
incisivos é possivelmente uma característica dominante, enquanto a alopecia
estriada relaciona-se a um gene dominante ligado ao sexo. Uma alopecia caracte-
rística com anodontia é observada em cães crested chineses.
Uma hipotricose comum característica é observada em bezerros hereford
(mocho ou com chifre). O defeito varia de moderado a severo. As células de Huxley
dos folículos pilosos contêm microgotículas esferóides de material pleomórfico
semitranslúcido, abundante na região de diferenciação e transformação das células
papilares nas porções interna e externa das bainhas pilosas. Estas microgóticulas
são grânulos trico-hialinos eletrodensos e não têm os micros e macrofilamentos
usualmente vistos em bovinos normais.
A dermatose vegetante é uma afecção hereditária relativamente rara de suínos,
causada por um fator autossômico recessivo, semiletal que pode ter se originado na
raça danish landrace. Placas eritematosas, que progridem para lesões verrugosas
nas patas, abdome e na região interna da coxa podem ser vistas ao nascimento ou
desenvolvem-se durante as primeiras 3 semanas de vida. O crescimento é retarda-
do e a morte ocorre geralmente em decorrência de uma pneumonite por células
gigantes associadas dentro de 6 meses, embora alguns animais pareçam recupe-
rar-se completamente.
A protoporfiria eritropoiética congênita é uma patologia hereditária rara
fotossensibilizante observada somente no gado limousin e no homem. A diminuição
na atividade da enzima mitocondrial ferroquelatase em todo o corpo permite o
acúmulo de protoporfirina livre nas hemácias em desenvolvimento, as quais, por
difusão, penetram no plasma e nos fluidos intercelulares e, finalmente, nas fezes.
A protoporfirina no plasma e no fluido extracelular está associada à fotossensibili-
dade cutânea.
Éctima Contagioso 949

Os animais afetados são fotossensíveis nas áreas de pele expostas à luz


ultravioleta próxima. Os bezerros também podem apresentar convulsões. Os
animais afetados, protegidos da luz solar, se desenvolvem normalmente. O defeito
é uma herança autossômica recessiva simples, e tem sido identificado nos EUA e
Canadá. O diagnóstico é baseado nos sinais clínicos e na análise dos níveis de
porfirina nas hemácias e nas fezes. Não deve haver protoporfirina na urina. Animais
heterozigotos clinicamente normais apresentam uma elevação distinta, mas mode-
rada da concentração de protoporfirina livre nas hemácias. Uma doença semelhan-
te, a porfiria eritropoiética congênita (ver pág. 535), ocorre em bovinos e outras
espécies, e é caracterizada por outros problemas e sinais (ver também FOTOSSEN-
SIBILIZAÇÃO, pág. 993).

ÉCTIMA CONTAGIOSO
(Dermatite pustular contagiosa, Úlcera da boca)

É uma dermatite infecciosa de ovinos e caprinos, que afeta inicialmente os lábios


dos animais jovens. Encontrada no mundo todo, mais comumente no final do verão,
no outono e no inverno no pasto, e no inverno em confinamentos. Esta afecção pode
ocorrer em cordeiros jovens no início da primavera e, ocasionalmente, em ovinos
adultos que não adquiriram imunidade por exposição natural. O homem pode
ocasionalmente infectar-se e há relatos da doença em cães que ingeriram carcaças
infectadas.
O poxvírus causal (um parapoxvírus) está relacionado aos vírus da pseudovaríola
e estomatite papular dos bovinos. A infecção ocorre por contato. O vírus é altamente
resistente à dessecação, tendo sido isolado de crostas ressecadas após 12 anos.
Também é resistente ao glicerol e ao éter.
Achados clínicos e diagnóstico – A lesão primária desenvolve-se na pele dos
lábios, estendendo-se freqüentemente para a mucosa bucal. Ocasionalmente, as
lesões são encontradas nas patas, geralmente na região interdigital e ao redor da
coroa do casco. Ovelhas que amamentam cordeiros infectados podem desenvolver
lesões no úbere. Em cordeiros muito novos, a lesão inicial pode desenvolver-se na
gengiva abaixo dos dentes incisivos. As lesões surgem como pápulas e progridem
para os estágios vesicular e pustular antes de incrustarem-se. A coalescência de
numerosas lesões discretas leva freqüentemente à formação de grandes escaras,
e a proliferação dos tecidos dérmicos produz uma massa verrugosa sob elas.
Quando a lesão se estende à mucosa oral, freqüentemente desenvolve-se uma
necrobacilose secundária (ver pág. 871).
Durante o curso da doença (1 a 4 semanas), as escaras desprendem-se e o
tecido fecha sem cicatrizes. Durante os estágios ativos da infecção, os cordeiros
mais seriamente afetados geralmente deixam de se alimentar e definham. Lesões
extensas nas patas promovem claudicação. As ovelhas com lesões no úbere podem
desenvolver mastite.
A lesão é característica. A doença deve ser diferenciada da dermatose ulcerativa
(ver pág. 1051), cujo vírus produz um tipo diferente de reação promovendo
destruição tecidual e formação de úlceras crateriformes. O éctima geralmente afeta
animais mais jovens do que a dermatose ulcerativa, embora este critério seja usado
somente presuntivamente. Uma diferenciação positiva pode ser obtida pela inocu-
lação em ovinos suscetíveis e previamente imunizados contra o éctima.
Tratamento e controle – O uso de antibactericidas pode ajudar a combater
infecções secundárias. Em áreas endêmicas, repelentes e larvicidas apropriados
Éctima Contagioso 950

devem ser aplicados nas lesões. O vírus é transmissível ao homem, e as lesões,


geralmente localizadas nas mãos e no rosto, são mais proliferativas e ocasional-
mente muito dolorosas. Veterinários e pastores devem executar medidas razoáveis
de precaução. O diagnóstico no homem é estabelecido pela transmissão do vírus
ao carneiro; pode ser de valor também um teste de fixação de complemento.
Os ovinos que se recuperam de uma infecção natural são altamente resistentes
à reinfecção. Apesar da multiplicidade imunogênica das cepas virais, com uma
exceção ocasional, vacinas comerciais de cepa única, utilizadas atualmente, têm
produzido imunidade razoável em todo o território dos EUA. A “ineficiência” vacinal
parece ser devida à virulência da cepa infectante e não às diferenças na antigeni-
cidade da vacina. Ovinos imunizados contra éctima contagioso permanecem
suscetíveis a dermatose ulcerativa.
As vacinas devem ser usadas cautelosamente para evitar a contaminação das
propriedades não infectadas, e os animais vacinados devem ser separados do lote
não protegido até que as lesões cicatrizem. Uma pequena quantidade de vacina é
aplicada sobre as escarificações leves da pele, geralmente na parte interna da coxa.
Os cordeiros devem ser vacinados com , 1 mês de idade. Para melhores
resultados, uma segunda vacinação é sugerida , 2 a 3 meses mais tarde. Os
cordeiros não imunizados devem ser vacinados antes de serem introduzidos em
plantéis confinados infectados. Trabalhos experimentais sugerem que a administra-
ção parenteral de vacina virulenta induz melhor imunidade do que o procedimento
usual.

CUTEREBROSE, PQ AN
É a presença da larva da mosca Cuterebra spp (ordem Diptera, família
Cuterebridae), na subcútis de um coelho ou roedor. Os Cuterebra adultos não são
parasitas e são observados raramente. As fêmeas depositam ovos dentro ou
próximo aos ninhos, ou ao longo do hábitat dos hospedeiros normais. A larva
infectante, que se desenvolve dentro dos ovos, eclode em resposta ao calor de um
hospedeiro nas proximidades. Embora, em geral, a larva penetre no hospedeiro por
via bucal e nasal, outras aberturas corporais podem ser utilizadas, como as
lacerações cutâneas. Após a penetração na pele, elas migram a vários locais no
tecido subcutâneo nos diferentes hospedeiros. A rota da migração é variável. A larva
pode alcançar 25mm de comprimento e 10mm de diâmetro. As espículas cuticulares
pretas dão à larva completamente desenvolvida uma coloração escura. O desenvol-
vimento larval perdura , 1 mês, após o qual a larva sai para pupar no solo. A duração
do estágio de pupa varia consideravelmente, dependendo dos fatores ambientais e
latência no inverno. As moscas adultas que depositam 5 a 15 ovos por local, podem
depositar > 2.000 ovos.
Um abscesso subcutâneo de parede espessa e tamanho variável forma-se ao
redor da larva em desenvolvimento. Pode haver secreção de pus do orifício de
respiração feita na pele pelo parasita. É possível ocorrer migração larval anormal,
incluindo invasão do cérebro com distúrbios nervosos fatais.
Cuterebra são parasitas acidentais daqueles hospedeiros incomuns que fazem
contato com os ovos. Cães e gatos podem se tornar infestados, provavelmente por
explorarem tocas de roedores ou outros ninhos de ovos. As lesões são encontradas
mais freqüentemente sob a pele do pescoço e do peito durante o final do verão e
início do outono. A lambedura constante da área peitoral é freqüentemente o sinal
clínico mais evidente nos gatos.
Dermatite 951

Em raras ocasiões, cães e gatos podem se infestar com Hypoderma spp ou, mais
comumente, com Dermatobia hominis, nas áreas onde ela está presente.
A lesão não deve ser comprimida, posto que a ruptura do parasita pode resultar
em anafilaxia. O orifício de respiração feito através da pele pelo parasita deve ser
aumentado cirurgicamente para permitir a remoção cuidadosa da larva. A lesão é
então tratada como qualquer abscesso com a lavagem e instilação de preparações
antibióticas.

DERMATITE
A dermatite pode ser produzida por uma série de agentes, incluindo irritantes
externos, queimaduras, alérgenos, trauma e infecções bacterianas, virais, parasitá-
rias ou fúngicas. A dermatite pode estar associada a uma doença intercorrente
interna ou sistêmica e fatores hereditários também podem estar envolvidos. As
alergias (ver pág. 513) formam um importante grupo de fatores etiológicos, especial-
mente em pequenos animais.
O sinal mais comum é o prurido, seguido por lesões na pele que progridem de
edema e eritema para pápulas, vesículas, exsudação e descamação ou escaras.
Pode ocorrer infecção secundária. À medida que a doença se torna crônica, o
eritema diminui e as pápulas também, mas as lesões ficam mais secas e a pele pode
desenvolver fissuras. Os sintomas podem variar consideravelmente, de acordo com
a espécie afetada e com o agente causal.
É vital determinar a causa de base da dermatite, pois as medidas paliativas
raramente efetuam uma cura. Deve ser feita uma anamnese completa, anotando a
progressão da doença (pruriginosa? sazonal?), o meio ambiente, alimento, exposi-
ção e envolvimento com outros animais ou pessoas, e qualquer tratamento feito
anteriormente. O exame físico deve definir as áreas afetadas; por exemplo,
generalizado, tronco, face, membranas mucosas, etc. Testes diagnósticos, como
raspado de pele para detecção de ectoparasitas, cultura de pele para detecção de
bactérias e fungos, biópsia de pele, avaliação endócrina, dieta hipoalergênica ou
teste cutâneo intradérmico devem ser empregados, quando indicado.
Até ser diagnosticada a causa da dermatite, ou naqueles casos de dermatite idiopá-
tica, podem ser usadas ambas as terapias paliativas tópica e sistêmica. A pelagem
das áreas afetadas e circundantes deve ser aparada. A dermatite úmida aguda pode
ser tratada com solução adstringente (por exemplo, solução de Burow) ou uma loção
ou creme corticosteróide oclusiva mínima. A dermatite seca crônica geralmente será
auxiliada pela aplicação de uma pomada corticosteróide. Para remover escaras ou
crostas, pode ser usado um xampu com alcatrão e enxofre, ou enxofre e ácido
salicílico. Produtos à base de alcatrão são contra-indicados para gatos.
Infelizmente, a terapia tópica é freqüentemente lambida ou retirada pelo animal;
a terapia sistêmica com doses antiinflamatórias de corticosteróides é geralmente a
melhor alternativa. Para uma ação rápida, deve-se usar droga via oral (prednisona,
prednisolona). A dose inicial é 1mg/kg, VO, uma vez ao dia; esta deve ser diminuída
para a dose mais baixa possível em dias alternados, para a supressão dos sintomas.
Antes de usar corticosteróides tópicos ou sistêmicos, qualquer etiologia infecciosa
deve ser eliminada.
Aparelhos restritivos (grilhões, colares elisabetanos) e sedativos devem ser
usados somente como último recurso na terapia de prurido. Eles contribuem pouco
para o conforto do animal ou para o diagnóstico da doença.
Dermatofilose 952

DERMATOFILOSE
(Infecção por Dermatophilus, Estreptotricose cutânea, Lã encaroçada)

Trata-se de uma infecção epidérmica, de distribuição cosmopolita, porém mais


prevalecente nos trópicos, também chamada erroneamente de dermatite micótica.
As lesões são caracterizadas por uma dermatite exsudativa com formação de
escaras. A Dermatophilus congolensis tem uma grande variedade de hospedeiros.
Nos animais domésticos, freqüentemente afeta bovinos, ovinos e caprinos. Ocasio-
nalmente, afeta cavalos, mas é rara em suínos, cães e gatos. A patologia é mais
conhecida como estreptotricose cutânea em bovinos, caprinos e eqüinos; em ovinos
quando as áreas lanosas do corpo são afetadas, a doença é denominada “lã
encaroçada” (“lumpy wool”) e de apodrecimento dos cascos quando as porções
distais dos membros são afetadas. Os poucos casos relatados no homem geralmen-
te associam-se com os tratadores dos animais doentes.
O hábitat natural da D. congolensis é desconhecido. Embora ela seja provavel-
mente um saprófita do solo, as tentativas de isolá-la do solo têm sido sem sucesso;
tem-se isolado somente do tegumento de várias espécies animais e está restrita às
camadas vivas da epiderme. Animais infectados, cronicamente assintomáticos, são
considerados reservatórios primários.
Etiologia, transmissão e epidemiologia – Dermatophilus congolensis, a única
espécie do gênero, é um actinomiceto anaeróbio facultativo, Gram-positivo, não
ácido-resistente. Tem 2 morfologias características: hifas filamentosas e zoosporos
móveis. As hifas são caracterizadas por filamentos ramificados de 1 a 5µm de
diâmetro. Os últimos filamentos são septados transversal e longitudinalmente
formando um maço de células cocóides. As células cocóides maturam dentro de um
zoosporo ovóide flagelado, que mede de 0,6 a 1µm de diâmetro.
Fatores, como exposição prolongada à chuva, alta umidade, alta temperatura e
vários ectoparasitas que reduzem ou modificam a permeabilidade das barreiras
naturais do tegumento, influenciam o desenvolvimento, prevalência, incidência
sazonal e transmissão da dermatofilose. O microrganismo pode permanecer em
latência nas lesões epidérmicas até que ocorram condições climáticas que favore-
çam sua infectividade. As epidemias geralmente ocorrem na época das chuvas. A
umidade facilita a liberação dos zoosporos das lesões preexistentes e sua penetra-
ção subseqüente na epiderme, estabelecendo novos focos de infecção. A alta
umidade também contribui indiretamente para difundir as lesões pelo aumento no
número de insetos sugadores, particularmente pulgas e carrapatos, que atuam
como vetores mecânicos. A difusão da infecção pode ocorrer após tosquia, banho
ou introdução de um animal infectado no rebanho.
A dermatofilose é contagiosa somente àqueles animais com qualquer diminuição
na resistência local ou sistêmica da pele que favoreça o estabelecimento da infecção
e subseqüente doença.
Patogenia – Para estabelecer a infecção, o zoosporo infectivo deve alcançar
uma área epidérmica, onde as barreiras naturais de proteção estiverem reduzidas
ou deficientes. O efluxo respiratório da pele com baixa concentração de dióxido de
carbono atrai os zoosporos móveis às áreas suscetíveis da superfície cutânea. Os
zoosporos germinam para produzir hifas, que penetram na epiderme viva e
subseqüentemente espalham-se em todas as direções a partir do foco inicial. A
penetração das hifas causa uma reação inflamatória aguda. A resistência natural à
infecção aguda consiste na fagocitose dos zoosporos infectantes, mas uma vez
estabelecida a infecção, há pouca ou nenhuma imunidade. Na maioria das infecções
agudas, a invasão da epiderme pelos filamentos termina em 2 a 3 semanas e as
lesões cicatrizam-se espontaneamente. Nas infecções crônicas, os folículos pilosos
Dermatofilose 953

afetados e as crostas são áreas nas quais ocorrem invasões intermitentes de


folículos e pele ainda não afetados. O epitélio invadido forma uma camada córnea
e separa-se na forma de crostas. Nas lesões úmidas, a umidade facilita a prolifera-
ção e liberação dos zoosporos das hifas. A alta concentração de dióxido de carbono
produzida pela densa população de zoosporos acelera sua saída para a superfície
da pele, completando então o ciclo de vida único.
Achados clínicos – A dermatofilose ocorre em todas as idades, mas é mais
prevalecente em animais jovens. As lesões não estão no mesmo estágio de pro-
gressão e a dermatite pode variar individualmente em cada animal, de aguda a
crônica. Variações individuais também podem ocorrer pela idade, sexo e raça.
Poucos animais apresentam prurido e a maioria se recupera espontaneamente em
3 semanas após o início da infecção ou durante períodos de seca. A cicatrização das
lesões cutâneas não complicadas ocorre sem formação de cicatriz. Estas infecções
geralmente exercem pouca influência no estado geral de saúde do animal. Os
animais com infecções severas generalizadas sempre ficam debilitados e apresen-
tam dificuldade em se movimentar e apreender alimentos se as patas, lábios e
focinho estiverem severamente afetados. Estes animais, considerados incuráveis,
são com freqüência enviados ao abate. Ocasionalmente ocorre morte, particular-
mente em bezerros e cordeiros, pela generalização da doença com ou sem infecção
bacteriana secundária e infestação secundária por moscas ou larvas da bicheira ou
vermes. As conseqüências econômicas primárias são o couro danificado no gado
e perda de lã nos ovinos.
Lesões – A distribuição das lesões macroscópicas em bovinos e ovinos geral-
mente está relacionada a fatores predisponentes que reduzem ou atravessam
barreiras naturais do tegumento. No bovino, as lesões podem ser observadas em
3 estágios: 1. pêlos aglutinados como um pincel nas lesões; 2. formação de crostas
ou escaras em função da coalescência das lesões iniciais; e 3. acúmulo de material
cutâneo ceratinizado formando lesões verrugóides, que medem 0,5 a 2cm de
diâmetro. As lesões típicas são escaras circulares em forma de cúpula, que medem
2 a 8mm de diâmetro. A maioria das lesões associadas com umidade prolongada
da pele está distribuída sobre a cabeça, superfície dorsal do pescoço e do corpo e
superfícies laterais superiores do pescoço e tórax. O bovino que permanece por
longos períodos dentro da água ou na lama desenvolve lesões em áreas como as
pregas da pele das superfícies flexoras das articulações. As lesões iniciadas por
moscas sugadoras (vetores mecânicos) são encontradas primariamente no dorso,
enquanto lesões induzidas por carrapatos localizam-se na cabeça, pavilhões
auriculares, axilas, regiões inguinal e escrotal.
As infecções crônicas de lã encaroçada, por sua vez, são caracterizadas por
massas de material crostoso em forma piramidal, limitado às fibras de lã. As crostas
localizam-se principalmente nas áreas dorsais do corpo e impedem a tosa do ovino.
As lesões nos lábios, membros posteriores e patas são predispostas ao agravamen-
to por plantas com espinhos. A dermatofilose é uma dermatite proliferativa que afeta
a pele desde a coroa acima do casco até o carpo ou jarrete.
O exame histopatológico das lesões revela as ramificações de hifas caracterís-
ticas com septações multidimensionais, células cocóides e zoosporos na epiderme.
Os microrganismos geralmente são abundantes em lesões ativas, mas podem ser
esparsos ou ausentes em lesões crônicas.
Diagnóstico – O diagnóstico presuntivo depende muito da aparência das lesões
nos animais afetados clinicamente e da presença de D. congolensis em esfregaços
corados ou cortes histológicos das lesões. Um diagnóstico definitivo pode ser
estabelecido por isolamento e identificação de bactérias em cultura. O diagnóstico
diferencial inclui dermatomicoses, na maioria das espécies; no bovino, verrugas e
dermatopatia granulomatosa; nos ovinos, éctima contagioso e dermatose ulcerativa.
Dermatofilose 954

Tratamento e controle – Os animais com infecção aguda apresentam cicatriza-


ção rápida e espontânea, logo o tratamento não é indicado, exceto por razões
estéticas. Geralmente, as infecções crônicas são curadas rápida e efetivamente
com a aplicação de uma dose única de penicilina procaína (22.000UI/kg) e
estreptomicina (22mg/kg) via IM. Quando uma única dose não tem resultado, a
combinação penicilina-estreptomicina pode ser administrada por 5 dias, ou pode
substituir-se por uma dose única de oxitetraciclina (20mg/kg) de longa ação.
O isolamento dos animais afetados clinicamente do resto do rebanho, ou o
descarte destes animais e o controle dos ectoparasitas são os métodos utilizados
no controle do ciclo infectivo. O tratamento externo com soluções desinfetantes que
contêm cresóis ou sais de cobre pode diminuir a difusão da infecção, se aplicado no
momento correto do ciclo de transmissão ou quando a mesma é provável. Os
inseticidas aplicados externamente são usados freqüentemente para controlar os
insetos sugadores.

DERMATOFITOSE
(Tinha)

Trata-se de infecção do tecido ceratinizado (pele, pêlos e unhas), causada por


um dos vários gêneros de fungos denominados conjuntamente de dermatófitos (ver
também INFECÇÕES FÚNGICAS, pág. 411). Todos os animais domésticos são susce-
tíveis. Os fungos patogênicos são de distribuição cosmopolita. Alguns dermatófitos
(por exemplo, Microsporum gypseum) normalmente habitam o solo (geofílicos), mas
podem causar doenças nos animais, inclusive no homem. Outros dermatófitos (por
exemplo, M. audouinii) estão adaptados ao homem e raramente infectam os animais
(antropofílicos); há ainda outros que são primariamente patogênicos aos animais
(por exemplo, M. canis, Trichophyton equinum e T. verrucosum) mas podem causar
doença no homem (zoofílicos). A transmissão ocorre primariamente pelo contato
com indivíduos infectados, com fomitos contaminados (como os aparelhos e
ferramentas de cavalariça), ou com solo que contenha espécies geofílicas. Ocasio-
nalmente, a transmissão dos conídios (artrosporo) pelo ar pode ocorrer. A transmis-
são zoonótica às vezes ocorre, e é comum especialmente com M. canis. O contato
com um dermatófito nem sempre resulta em infecção. O estabelecimento da
infecção depende da espécie do fungo e de uma variedade de fatores relacionados
aos hospedeiros, como idade, imunocompetência, atividade fungistática das secre-
ções epidérmicas, doenças concomitantes e estado nutricional e hormonal do
mesmo. Os hospedeiros mais suscetíveis parecem ser os indivíduos jovens,
debilitados ou imunodeprimidos. A cura da infecção é acompanhada pelo desenvol-
vimento de uma imunidade mediada por células contra antígenos dos dermatófitos,
o que geralmente protege o animal contra uma futura infecção.
Na maioria das vezes, os dermatófitos crescem somente em tecido ceratinizado
morto, e a infecção detém seu avanço ao alcançar células vivas ou tecido inflamado.
Como são hospedeiros específicos, raramente os fungos zoofílicos causam reações
inflamatórias severas nos animais; no homem, eles freqüentemente causam rea-
ções inflamatórias agudas, limitando assim o progresso da infecção. A infecção
inicia-se em um folículo piloso em crescimento ou no estrato córneo, onde os
conídios originam as hifas. As hifas penetram e invadem a haste do pêlo, tornando-
o frágil, e avançam em direção ao folículo enquanto o pêlo cresce. Os fungos não
penetram a região mitótica viva do pêlo e quando o crescimento piloso termina, o
crescimento fúngico também termina. As espécies importantes de dermatófitos
Dermatofitose 955

produzem grupamentos de artrosporos ao longo da superfície externa do fio (tipo


ectotrix) e não no interior da haste do fio (tipo endotrix).
As dermatofitoses são extremamente variáveis em sua aparência clínica. O
diagnóstico é concluído por cultura, exame com uma lâmpada ultravioleta (lâmpada
de Wood), com 366nm de comprimento de onda ou exame microscópico direto de
pêlos e fragmentos de tecidos.
A cultura de fungos é o meio diagnóstico mais efetivo e específico. Freqüente-
mente denota infecções não diagnosticadas por outros procedimentos, e também
permite identificação das espécies de fungos. Pode ser usado o “Dermatophyte Test
Medium” (DTM). Após a limpeza suave da área afetada com água ou álcool a 70%
para reduzir a contaminação saprofítica, pêlos e escaras são removidos e colocados
na placa de ágar, que é coberta ou fechada para reduzir a evaporação. A incubação
à temperatura ambiente é suficiente. O crescimento do dermatófito geralmente é
notável em 3 a 7 dias, mas pode demorar até 3 semanas. Os dermatófitos cultivados
em DTM produzirão uma mudança na cor do meio, de amarelo para vermelho, no
momento em que a colônia torna-se visível; as próprias colônias são brancas e
ligeiramente amareladas. As colônias de fungos saprofíticas são brancas ou
pigmentadas, mas quase nunca produzem mudança de cor inicial. Os saprófitas
tornarão o DTM vermelho quando incubados por tempo prolongado. Portanto, é
crucial que se examinem as culturas diariamente para notar alguma mudança de
cor. O diagnóstico definitivo e a identificação específica requerem remoção das hifas
e macronídios da superfície da colônia com fita de acetato e o exame microscópico
com algodão embebido em lactofenol azul-corante.
A lâmpada de Wood é útil no diagnóstico de infecções por M. Canis em animais
(e infecções por M. audouinii no homem). Os pêlos infectados fluorescem adquirindo
uma cor amarelo-esverdeada; as lesões ou crostas infectadas não são fluorescen-
tes. Este método tem aplicação limitada, pois , 50% das infecções por M. canis
mostrarão fluorescência, e as outras espécies de dermatófitos animais não são
fluorescentes. Pode ocorrer fluorescência falso-positiva, especialmente com a
descamação que é vista nas seborréias caninas. Além disso, certos medicamentos
tópicos (sabão, petrolatos, tetraciclinas) e a ceratina podem ser fluorescentes. Iodo
ou outros medicamentos que contêm halogênios podem mascarar a fluorescência
nos pêlos infectados. Os pêlos fluorescentes devem ser cultivados para confirmar
a presença do dermatófito.
O exame microscópico direto de pêlos ou raspados cutâneos, às vezes permite
um diagnóstico definitivo, pela demonstração de hifas características e/ou artrosporos.
Os pêlos ou raspados oriundos da periferia de uma área suspeita são examinados
quanto a elementos fúngicos em uma preparação úmida (hidróxido de potássio
[KOH] a 20% em água), ligeiramente aquecida e comprimida.
A adição de um corante específico para corar a parede celular fúngica (clorazol
negro E, 100mg/100mL de solução de KOH) facilitará a identificação das hifas e
artrosporos.

DERMATOFITOSE EM BOVINOS
A Trichophyton verrucosum é geralmente o agente causal da dermatofitose em
bovinos, mas outras Trichophyton spp podem ser, ocasionalmente, isoladas. A
patologia é mais comum em bezerros. Após uma incubação de 2 a 4 semanas, os
pêlos da área infectada caem ou quebram-se, e em 2 a 3 meses, observam-se
placas crostosas, redondas, ligeiramente circunscritas, espessas, branco-acin-
zentadas e elevadas na superfície da pele. As lesões expandem-se em direção à
periferia e podem alcançar 5 a 10cm de diâmetro. Os locais prediletos incluem a
cabeça, pescoço e períneo. Se não tratadas, as lesões podem se generalizar
Dermatofitose 956

sobretudo nos filhotes. O prurido geralmente não está presente, e uma piodermia
secundária é rara. A dermatofitose é mais comum durante o inverno em animais
estabulados, mas pode ocorrer em qualquer época do ano. Um diagnóstico
presuntivo pode ser baseado nos sinais clínicos típicos, e confirmado então por
cultura.
Para o tratamento, muitas medicações tópicas são aparentemente efetivas.
Como a recuperação espontânea é comum, a principal vantagem da terapia tópica
é prevenir a progressão das lesões existentes e limitar a difusão do material infectivo
para outros animais. As crostas espessas devem ser removidas delicadamente com
uma escova e sabão suave e o material contaminado queimado. Uma terapia tópica
efetiva inclui banhos ou pulverizações com cal sufurada a 0,5%, hipocloreto de sódio
a 0,5% (1:10 cloro alvejante), solução de clorexidina a 0,5%, povidona-iodo a 1% ou
Captan 1:300. Estas medicações são aplicadas em toda a superfície corporal dos
animais afetados diariamente durante 5 dias, depois semanalmente até que a
infecção seja controlada. Lesões individuais também podem ser tratadas regular-
mente com uma suspensão a 5% de tiabendazol em dimetilsulfóxido. Na Europa
utiliza-se uma vacina fúngica atenuada, a qual garante uma profilaxia efetiva; ela
não está disponível nos EUA e no Canadá.

DERMATOFITOSE EM CÃES E GATOS


Aproximadamente 70% dos casos de dermatofitose canina são causados por
Microsporum canis, 20% por M. gypseum e 10% por Trichophyton mentagrophytes.
Nos gatos, , 98% são causados por M. canis, com M. gypseum e T. mentagrophytes
responsáveis pelos demais casos. Em virtude da alta prevalência das infecções por
M. canis, a lâmpada de Wood é um meio utilizado quando examinam-se estas
espécies. No entanto, M. gypseum, T. mentagrophytes e metade das cepas de
M. canis não fluorescem. Conseqüentemente, um exame negativo sob lâmpada de
Wood não descarta a dermatofitose. O diagnóstico deve ser confirmado por cultura.
A detecção de infecção em animais portadores assintomáticos é facilitada pela
escovação da pelagem com uma escova de dentes nova ou um massageador de
couro cabeludo de náilon, depois semeando-se o material obtido em uma placa por
meio de pressão sobre os pêlos do meio de cultivo apropriado.
A aparência clínica de dermatofitose felina é bastante variável. Os filhotes são
comumente os mais afetados. As lesões, que consistem freqüentemente de
alopecia focal, descamação e formação de crostas, são moderadamente eritema-
tosas e ocorrem freqüentemente ao redor das orelhas, face e extremidades. Pode
não haver lesões clinicamente aparentes, ou então poucos pêlos, quebrados ao
redor da face e orelhas. Estes animais servem como portadores e originam um
problema particular em gatis ou locais onde são criados muitos animais. Até 90% dos
gatos “infectados” podem parecer normais. Ocasionalmente, a dermatofitose ocorre
como uma “dermatite miliar” nos felinos. O prurido pode ou não estar presente.
As lesões nos cães geralmente se caracterizam por alopecia, áreas circulares e
descamativas com pêlos quebrados. Formas atípicas de dermatofitose canina
podem ser vistas. Em uma delas, as lesões consistem de pápulas e pústulas sem
áreas de alopecia ou descamação. Placas de alopecia ou nódulos nitida-
mente demarcados, eritematosos e elevados são denominados dermatofitose
quérion e podem estar associados a uma reação de hipersensibilidade local. A
T. mentagrophytes pode causar infecções localizadas um tanto simétricas no septo
nasal, as quais são facilmente confundidas com outras patologias. A dermatofitose
generalizada é rara em cães, a menos que apresente um estado de imunodeficiên-
cia (incluindo aqueles devido ao uso de corticosteróides ou outras terapias imunos-
supressoras e hiperadrenocorticismo) ou uma doença metabólica, como o diabetes
Dermatofitose 957

melito. O diagnóstico diferencial em cães inclui sarna demodética, foliculite bacte-


riana e lesões seborréicas circulares.
A dermatofitose em pequenos animais geralmente é autolimitante. O objetivo
primário da terapia é prevenir a transmissão da infecção para outros animais e
proprietários. A terapia tópica quase sempre é suficiente. É mais indicado o
tratamento de toda a superfície corporal do animal, em vez do tratamento tópico das
lesões, pois desta última forma podem-se deixar áreas inaparentes de infecção sem
tratamento. Cal sufurada (0,5%), clorexidina (0,5%) ou solução de Captan 1:300
podem ser usados como rinsagem duas vezes por semana. Para casos crônicos ou
severos, a terapia sistêmica com griseofulvina é garantida. A dose para cães é de
40 a 120mg/kg de peso corporal da forma microcristalina, administrada uma vez ao
dia ou em doses divididas, junto com uma refeição rica em gordura. Os gatos não
devem receber > 20 a 50mg/kg dia, devido à potencial toxicidade da droga sobre a
medula óssea. Cepas resistentes à griseofulvina são encontradas ocasionalmente
no homem, mas não têm sido relatadas em animais. Dermatófitos podem ser
sensíveis ao cetoconazol (10 a 30mg/kg, diariamente), embora esta droga não seja
aprovada para uso em animais. Todos os tratamentos para dermafitose devem ser
continuados por 2 a 4 semanas após a cura clínica ou a cultura fúngica negativa. O
tratamento por 1 a 3 meses geralmente é necessário.

DERMATOFITOSE EM EQÜINOS
A Trichophyton equinum é a causa primária de dermatofitose em eqüinos,
embora a Microsporum equinum (freqüentemente confundida com M. canis) seja
importante em alguns locais; T. mentagrophytes, M. canis, e M. gypseum são
encontradas ocasionalmente. Os sinais clínicos consistem de uma ou mais áreas de
alopecia. Eritema, descamação e formação de crostas freqüentemente estão
presentes, mas variam de intensidade. As lesões iniciais podem se assemelhar à
urticária, depois progridem para alopecia e formação de crostas em poucos dias. O
diagnóstico é confirmado por cultura. O diagnóstico diferencial inclui dermatofilose
e foliculite bacteriana. A transmissão por fomitos contaminados, como selas e
arreios é especialmente comum.
O tratamento bem-sucedido requer medicação do animal e descontaminação do
ambiente. O ideal é isolar os animais afetados. O tratamento tópico consiste na
aplicação pelo corpo inteiro de um rinse com um agente antifúngico (ver anterior-
mente [BOVINOS] para recomendações) diariamente por 5 a 7 dias, depois sema-
nalmente até a cura. O rinse pode ser precedido por um xampu com povidona-iodo,
se desejado. As ferramentas e utensílios de cavalariça devem ser desinfetados
freqüentemente e não devem ser utilizados em animais hígidos após a utilização nos
animais infectados.

DERMATOFITOSE EM OUTRAS ESPÉCIES


A dermatofitose em suínos geralmente é causada por Microsporum nanum. As
lesões caracterizam-se por anéis de inflamação que se disseminam de forma
centrífuga, com uma área central de alopecia e crostas castanho-avermelhadas. As
lesões apresentam tipicamente 4 a 6cm de diâmetro. Os suínos afetados devem ser
isolados até as lesões cicatrizarem. As baias e outras instalações devem ser limpas
e desinfetadas. Para tratamento, ver DERMATOFITOSE BOVINA, anteriormente.
A dermatofitose é rara em ovinos e caprinos. A espécie infectante primária é a
Trichophyton verrucosum. As lesões são mais encontradas na cabeça, pescoço e
cernelha. O tratamento é o mesmo que em bovinos.
Outras Dermatoses 958

OUTRAS DERMATOSES
Vários distúrbios sistêmicos produzem lesões variadas na pele. Normalmente, as
lesões não são inflamatórias, e a alopecia é comum. Em alguns casos, as alterações
cutâneas são características de uma doença em particular. No entanto, a dermato-
se, não está, com freqüência, notadamente associada com a doença de base e deve
ser cuidadosamente diferenciada dos distúrbios cutâneos primários. Algumas
destas dermatoses secundárias serão mencionadas brevemente adiante, e tam-
bém estão descritas nos capítulos específicos sobre os distúrbios.
A dermatose pode estar associada a deficiências nutricionais, especialmente de
proteínas, gorduras, minerais, algumas vitaminas e microelementos. Entretanto, é
raro observarmos dermatose em cães e gatos que são alimentados com dietas
balanceadas, devido à boa nutrição proporcionada pelas rações. Os huskies
siberianos, e ocasionalmente outras raças, podem desenvolver uma doença seme-
lhante à paraceratose suína e requerem quantidades adicionais de zinco em suas
dietas (220mg de sulfato de zinco; a cada 12 a 24h). A dermatose responsiva ao
zinco também tem sido relatada em bovinos, ovinos e caprinos e está associada com
uma necessidade individual mais alta, não com uma deficiência dietética.
A dermatite é observada algumas vezes, no curso de distúrbios crônicos de
órgãos internos, como nefrite, hepatite ou piometria, e distúrbios dos sacos anais.
O envenenamento por sulfato de tálio (veneno de rato), esporão do centeio,
mercúrio e iodetos pode causar várias alterações cutâneas. Hiperceratose em
bovinos pode ser causada pela toxicidade a naftalenos clorados.
Nos cães, a dermatose pode aparecer como resultado de uma disfunção
endócrina. Nos machos, com tumor das células de Sertoli, podem ser observados
alopecia bilateral e prurido ocasional com erupções papulares. As cadelas intactas
com desequilíbrio hormonal geralmente apresentam ginecomastia, prurido, eviden-
ciam erupção papular e ciclo estral freqüente. As lesões de pele de ambos os
distúrbios podem se iniciar na região inguinal e do flanco e progredir cranialmente.
A dermatose decorrente de castração é rara em cães e gatos; quando isso ocorre,
é geralmente não pruriginosa, com alopecia discreta nas regiões perineal ou
inguinal. Entretanto, a alopecia endócrina felina é observada principalmente em
gatos machos castrados. É caracterizada por um adelgaçamento do pêlo, bilateral,
simétrico e difuso, que se inicia nas regiões perineal e genital. A etiologia é
desconhecida, mas geralmente responde à hormonioterapia.
As dermatoses também têm sido observadas na hipofunção da tireóide. As
lesões de pele são caracterizadas pela diminuição do crescimento piloso e alopecia
simétrica bilateral. A pele do paciente com hipotireoidismo é seca, escamosa,
espessada e pregueada. Acantose e distúrbios seborréicos também podem ocorrer.
Em raros casos, desenvolve-se mixedema cutâneo.
A produção deficiente de hormônios hipofisários raramente causa dermatoses.
O hipofisarismo é caracterizado pela queda de pêlos, especialmente nas regiões
axilar e do tórax lateral e abdome. O hiperadrenocorticismo também se manifesta
por meio de alterações cutâneas, tais como hiperpigmentação, alopecia, seborréia,
calcinose cutânea e piodermia secundária. No diabetes melito podem ocorrer
prurido e infecção secundária.
O tratamento de todas estas afecções depende de um diagnóstico etiológico
específico. Uma vez este estabelecido e controlado, as lesões de pele, geralmente,
necessitam apenas de tratamento sintomático (por exemplo, controle do prurido) até
que estes desapareçam com a resolução da doença primária (ver também SISTEMA
ENDÓCRINO, pág. 307).
Complexo do Granuloma Eosinofílico 959

ECZEMA NASAL DOS CÃES


(Dermatite nasal solar, Nariz de collie)

A dermatite nasal dos cães deve ser considerada como um sinal clínico de muitas
doenças. As lesões podem afetar o septo nasal, o plano nasal ou ambos. Na
piodermia, na dermatofitose e na demodicose, as regiões com pêlo do focinho são
afetadas. No lúpus ou pênfigo, o focinho inteiro freqüentemente apresenta crostas,
com ocasional exsudação serosa ou ulceração. No lúpus sistêmico e discóide, e
ocasionalmente no pênfigo e no linfoma cutâneo, o plano nasal apresenta-se
despigmentado, eritematoso e eventualmente pode ulcerar. O eczema nasal devido
à radiação solar é uma doença rara, quase sempre diagnosticada erroneamente
como uma variante do lúpus. Na dermatite solar nasal, as áreas não pigmentadas
do plano nasal são afetadas primeiramente, e ocasionalmente o septo nasal pode
tornar-se inflamado e às vezes ulcerado. As lesões são piores no verão, embora o
lúpus e o pênfigo possam também apresentar esta variação sazonal. Algumas das
doenças citadas podem afetar a região periocular (ver também LÚPUS ERITEMATOSO
SISTÊMICO, pág. 520 e PÊNFIGO, pág. 519).
O tratamento depende da etiologia. O diagnóstico deve incluir raspado de pele,
culturas bacteriana e fúngica e biópsias, tanto para exame histopatológico quanto
para testes imunológicos. Uma vez que o diagnóstico de dermatite solar nasal seja
confirmado, a utilização de uma loção corticosteróide tópica (valerato de betametasona
a 0,1%) é útil na redução da inflamação. Deve-se restringir severamente a exposição
do cão à luz solar. Protetores solares tópicos podem ser efetivos, mas precisam ser
aplicados no mínimo duas vezes ao dia.

COMPLEXO DO GRANULOMA EOSINOFÍLICO


É um grupo de doenças que afeta gatos, cães e eqüinos. A etiologia é desconhe-
cida, embora em gatos uma reação de base de hipersensibilidade possa estar
presente.
Achados clínicos – Em gatos, 3 entidades têm sido agrupadas no complexo.
Úlcera eosinofílica – É uma lesão bem delimitada, eritematosa, e ulcerativa,
geralmente não dolorosa nem pruriginosa, encontrada no lábio superior (ver também
pág. 151). Estas lesões ocasionalmente progridem para carcinoma de células
escamosas, o qual representa o principal diagnóstico diferencial. A histologia revela
uma dermatite ulcerativa, com um infiltrado celular de neutrófilos, plasmócitos e
células mononucleares predominantemente. A eosinofilia tecidual ou periférica é rara.
Placa eosinofílica – É uma lesão bem delimitada, eritematosa e elevada, que
ocorre mais comumente na região medial da coxa e é extremamente pruriginosa. A
histologia revela uma dermatite eosinofílica difusa com evidente edema inter e
intracelular e vesículas que contêm eosinófilos na epiderme. Os mastócitos estão
freqüentemente presentes em grande número, e esta afecção deve ser distinguida
de tumor destas células. A eosinofilia periférica é comum.
Granuloma linear – É geralmente elevado, bem delimitado, amarelado a rosado,
com uma configuração linear distinta, embora este padrão seja menos evidente
quando as lesões ocorrem na boca. Geralmente estas lesões aparecem na face
caudal dos membros posteriores. Histologicamente, uma resposta inflamatória
granulomatosa circunda o colágeno degenerativo. Eosinofilia tecidual e periférica é
evidente quando as lesões são na boca, mas variam quando as lesões são na pele.
Complexo do Granuloma Eosinofílico 960

Em cães, as lesões relatadas como granuloma eosinofílico histologicamente


assemelham-se ao granuloma linear dos gatos, com evidente degeneração de colá-
geno circundada por um infiltrado eosinofílico e granulomatoso. Estas lesões podem
ocorrer como massas vegetativas ou ulceradas na cavidade oral, ou menos
comumente, como placas, nódulos ou pápulas nos lábios e em outras áreas do
corpo. Qualquer raça pode ser afetada, mas os huskies siberianos apresentam um
risco maior.
Em eqüinos, a doença tem sido denominada de granuloma eosinofílico eqüino
com degeneração do colágeno. Outros nomes são necrobiose nodular do colágeno,
granuloma colagenolítico e necrose nodular axilar. As lesões são nodulares, não
ulcerativas e não pruriginosas, freqüentemente ocorrem na área em que é colocada
a sela, e podem apresentar uma área central cinza-esbranquiçada. Lesões mais
antigas podem se tornar mineralizadas. Picadas de insetos e traumatismos têm sido
sugeridos como etiologia, embora o início ocasional durante o inverno em climas
frios e o não contato com selas, sugiram causas multifatoriais. A histologia revela
áreas multifocais de degeneração de colágeno circundadas por um processo
inflamatório granulomatoso que contém eosinófilos. Desta forma, histologicamente
esta lesão é semelhante ao granuloma linear dos gatos e ao granuloma eosinofílico
dos cães.
Uma rara doença dos eqüinos, caracterizada macroscopicamente por uma
dermatite esfoliativa progressiva e histologicamente por um infiltrado perivascular
rico em eosinófilos, com espongiose ocasional e pústulas eosinofílicas, tem
sido denominada de dermatite eosinofílica esfoliativa eqüina e estomatite. Gra-
nulomas eosinofílicos em órgãos internos e na cavidade oral têm sido observados
em casos severos. Uma síndrome hipereosinofílica tem sido identificada em
gatos.
Tratamento – Em gatos, devem-se investigar distúrbios de hipersensibilidade
(alergia a pulgas, alimentos ou inalantes). Se a causa de base não puder ser
determinada e a afecção estiver causando desconforto, podem-se administrar
corticosteróides como o acetato de metilprednisolona (4mg/kg) IM a cada 2
semanas, num total de 2 a 3 injeções; ou comprimidos de triancinolona (4mg/5kg
de peso corporal) a cada 1 a 3 dias. Em casos de recidiva, uma injeção de acetato
de metilprednisolona a cada 6 semanas, freqüentemente é efetiva. Em cães, as
lesões parecem ser muito mais responsivas aos corticosteróides, sendo a terapia
à base de prednisona oral ou prednisolona (0,5 a 2mg/kg/dia inicialmente,
diminuindo a dosagem durante 20 a 30 dias). As lesões recidivam em alguns cães,
sendo indicada nestes casos uma terapia com baixa dosagem de corticosteróides
em dias alternados. Eqüinos que apresentam lesões solitárias de granuloma
eosinofílico eqüino com degeneração de colágeno, podem ser tratados pela
excisão cirúrgica ou por injeções sublesionais de corticosteróides. Lesões
mineralizadas requerem a excisão. O triancinolona acetonida (3 a 5mg/lesão) ou
o acetato de metilprednisolona (5 a 10mg/lesão) são efetivos. Não se deve
administrar mais que 20mg de triancinolona acetonida sublesionalmente, devido
ao seu potencial para induzir laminites. Eqüinos com lesões múltiplas podem ser
tratados com prednisona oral ou prednisolona a 1,1mg/kg a cada 24h durante 2
a 3 semanas. Na dermatite eosinofílica esfoliativa eqüina e estomatite e na
síndrome hipereosinofílica felina, os corticosteróides mesmo em doses altas, têm
se mostrado inefetivos. O prognóstico para esta doença é grave, e os animais
afetados são geralmente sacrificados.
Epidermite Exsudativa 961

EPIDERMITE EXSUDATIVA
(“Doença do porco seboso”)

É uma dermatite generalizada e aguda que ocorre em leitões de 5 a 60 dias de


idade e caracteriza-se por aparecimento súbito, com morbidade de 10 a 90% e
mortalidade de 5 a 90%. A epidermite exsudativa tem sido relatada na maioria das
áreas de suinocultura do mundo e é de grande incidência nas regiões produtoras de
milho dos EUA.
As lesões de epidermite exsudativa são causadas por Staphylococcus hyicus
(hyos), mas os agentes bacterianos parecem ser incapazes de penetrar no epitélio
íntegro. As lesões abrasivas nos cascos e patas ou lacerações no corpo freqüente-
mente precedem a infecção. Um vírus do tipo vesicular pode ser o fator predispo-
nente.
Os leitões desenvolvem resistência com a idade, mas o microrganismo pode ser
isolado da pele de suínos mais velhos, da vagina de porcas e do divertículo prepucial
de porcos. Os leitões lactentes são geralmente infectados pelas mães, mas a
infecção cruzada ocorre após a mistura na desmama.
Achados clínicos e lesões – Os primeiros sinais são apatia e vermelhidão da
pele e em um ou mais leitões da ninhada. Os suínos afetados tornam-se rapidamen-
te deprimidos e recusam-se a comer. A temperatura corporal pode estar elevada no
início, mas depois permanece próxima ao normal. A pele torna-se espessada,
aparecem pontos marrom-avermelhados dos quais exsuda soro e há evidência de
dor em suínos afetados na forma aguda. Freqüentemente, há inflamação supurativa
do ouvido externo e inflamação catarral dos olhos.
Vesículas, possivelmente causadas por um vírus, desenvolvem-se na pele,
rompem-se e tornam-se infectadas. O corpo rapidamente é coberto por um exsudato
úmido e gorduroso, de soro e gordura, que se torna crostoso. Vesículas e úlceras
também se formam na língua e no focinho. As patas quase sempre apresentam
erosão da zona coronária e do casco, e os cascos podem ser perdidos em raros
casos. Em casos agudos, a morte ocorre em 3 a 5 dias. Por outro lado, particular-
mente nos animais mais velhos, a doença é mais branda e as lesões circunscritas
desenvolvem-se vagarosamente e não coalescem. A mortalidade é baixa, exceto
nos animais afetados quando muito jovens, mas a recuperação pode ser lenta e o
crescimento retardado.
A necropsia dos suínos severamente afetados revela intensa desidratação,
congestão dos pulmões e inflamação dos linfonodos periféricos. Nas formas aguda
e hiperaguda da doença nota-se geralmente distensão renal e dos ureteres com
presença de muco, descamação celular e detritos celulares.
Tratamento – O agente etiológico é inibido pela maioria dos antibióticos, e a
penicilina em altas dosagens pode ser efetiva, se for administrada no início da
doença. O tratamento pode ser menos efetivo em leitões jovens em casos avança-
dos. As ninhadas infectadas devem ser isoladas, e um antibiótico de amplo espectro
deve ser administrado. Em surtos severos, os leitões sadios que estiverem em
contato com os doentes podem também receber antibióticos por vários dias. A
lavagem completa dos animais severamente afetados com sabão e solução
desinfetante suave e morna pode ajudar na recuperação. As matrizes, suas
ninhadas e as áreas de criação devem ser desinfetadas completamente para
interromper o surto. Outras medidas de controle incluem o aumento dos níveis de
zinco e biotina da dieta, e a vacinação. Recentemente, demonstrou-se interferência
bacteriana por cepas não patogênicas de S. hyicus.
Pulgas 962

PULGAS
As pulgas são ectoparasitas comuns sugadores de sangue, principalmente de
cães e gatos, que podem causar prurido e conseqüentemente problemas derma-
tológicos severos. As 2 espécies mais comumente encontradas que infestam proprie-
dades domésticas, a Ctenocephalides felis e a menos prevalecente, C. canis,
alimentam-se em cães, gatos e no homem. Pulex irritans, considerada a “pulga do
homem”, também se alimenta em cães e gatos. As pulgas requerem calor e umidade
para completarem seu ciclo de vida; em regiões de clima temperado, elas podem ser
apenas um problema sazonal de verão, mas em zonas mais tropicais ou áreas
aquecidas da casa, infestações perenes sérias são freqüentes. As pulgas também
agem como hospedeiros intermediários de uma tênia comum, a Dipylidium caninum,
e podem transmitir o parasita filarial, Dipetalonema reconditum. A transmissão de
outras doenças pela pulga comum de cães e gatos não é reconhecida correntemente.
As pulgas de cães e gatos não são conhecidas como transmissoras de doenças
ao homem, mas a sua capacidade de se alimentar de sangue humano indica que
elas são indesejáveis do ponto de vista da saúde humana. Adicionalmente, cães e
gatos podem servir de portadores temporários de outras espécies de pulgas, que
podem transmitir outras doenças (ver PESTE BUBÔNICA, pág. 438). A urticária papular
e lesões de pele pruriginosas múltiplas, causadas por picadas de pulga, são muito
comuns, tanto em crianças quanto em adultos, e podem ser os primeiros sintomas
noticiáveis de infestação por pulgas nos animais de estimação da família.
Etiologia e epidemiologia – As pulgas adultas podem saltar longas distâncias
e fixam-se facilmente aos animais nos ambientes infestados. Uma irritação pequena
pode ser causada por seu movimento na superfície da pele e pela perfuração da
epiderme. O maior problema é a freqüente indução de hipersensibilidade alérgica
por secreções salivares das pulgas.
Em um ambiente úmido, as pulgas podem sobreviver fora do hospedeiro por até
7 meses, sem um repasto sangüíneo. Quando presas a um hospedeiro, elas se
alimentam vorazmente, porém digerindo apenas uma pequena porcentagem do
sangue ingerido, sendo o restante excretado como pequenos grumos de fezes
negras. A alimentação estimula a postura de ovos enquanto no hospedeiro, e as
pulgas fêmeas adultas produzirão várias centenas de ovos durante seu tempo de
vida. Os pequenos ovos brancos não aderem à pele ou ao pêlo, mas caem
livremente do hospedeiro para contaminar a cama, chão, tapetes e o ambiente
externo. As larvas ápodes que emergem dos ovos são virtualmente invisíveis a olho
nu. Elas se alimentam ativamente de restos proteicos locais, particularmente fezes
de sangue seco de pulgas adultas. As larvas pupam e as pulgas adultas emergirão
mais tarde dos pequeninos casulos. O ciclo de vida inteiro da pulga é completado
em , 3 semanas sob condições ambientais favoráveis.
As pulgas podem se reproduzir rapidamente em populações epidêmicas durante
poucos meses quentes. As famílias proprietárias de animais de estimação que
experimentam infestações severas são quase sempre abaladas pelo maciço
número de pulgas adultas, que facilmente picam a pele humana e podem tornar as
propriedades quase inabitáveis.
Patogenia – As pulgas alimentam-se rapidamente picando a epiderme e
sugando o sangue de capilares cutâneos danificados. Várias picadas para alimen-
tação podem ser feitas num mesmo lugar e dentro de poucos minutos. Várias
pulgas podem causar centenas de penetrações de pele individuais e num breve
período. Os hospedeiros que não se tornam hipersensíveis aos antígenos salivares
de pulga podem experimentar pequena ou nenhuma reação cutânea às picadas;
entretanto, muitos indivíduos desenvolvem, eventualmente, hipersensibilidade alér-
Pulgas 963

gica às pulgas (dermatite alérgica à pulga [DAP]) e podem exibir tanto urticária
pustular imediata quanto lesões inflamatórias retardadas, que são intensamente
pruriginosas. Muitos dos danos resultantes na pele são então causados por prurido
que provoca mordidas e outros ferimentos auto-infligidos. A severidade dos sinais
clínicos está mais relacionada com o grau de hipersensibilidade do que com o
número de pulgas existentes. No caso de alta sensibilidade individual, poucas
pulgas podem causar doença severa, e a duração dos sinais clínicos pode persistir
por muitos dias. Existe uma variação individual com relação à sensibilidade aos
alérgenos da pulga; em cães isto depende em parte de uma exposição prévia a
picadas de pulgas – a exposição intermitente leva a uma hipersensibilidade maior
que a provocada por uma exposição contínua. As reações cutâneas decorrentes de
alergia a picada de pulga são menos documentadas em gatos.
Achados clínicos – O prurido é geralmente o primeiro sinal de infestação por
pulgas em cães e gatos, quase sempre na ausência de quaisquer lesões dermato-
lógicas evidentes. As lesões são mais comuns na região lombossacra, dorso da
cauda, regiões medial e caudal dos membros posteriores, regiões abdominal e
inguinal. O esfregar constante pode não causar muitos danos significativos à pele,
mas freqüentemente incomoda os proprietários de animais de estimação. Ocasio-
nalmente, um gato (ou um cão) pode estar infestado mas assintomático. Devido ao
fato de que números massivos de pulgas podem retirar quantidades significativas
de sangue de pequenos animais, é comum a anemia em infestações pesadas.
Lesões – Uma grande variedade de lesões de pele pode se desenvolver em
animais hipersensíveis. A evidência clássica de hipersensibilidade a pulgas é a
presença de alopecia dorsal com dermatite exsudativa inflamatória, particularmente
próximo à base da cauda. Os cães cronicamente afetados podem desenvolver
acentuada perda de pêlo e hiperceratose ou “pele de elefante”. Manchas de
dermatite úmida aguda ou “pintas quentes” podem aparecer em cães quando a pele
estiver danificada por prurido ou mordeduras auto-infligidas, embora as pulgas nem
sempre provoquem esta reação. Gatos com infestação crônica podem não apresen-
tar lesões ou prurido, ou podem desenvolver dermatite miliar (“doença do gato
sarnento”), com pápulas e crostas múltiplas, pequenas e salientes, principalmente
no dorso. Entretanto, estas lesões nem sempre estão relacionadas às pulgas, e o
grau de prurido pode variar. Além disso, as pulgas podem ser responsáveis por um
excesso de higiene (lambedura) e têm sido implicadas no complexo granuloma
eosinofílico.
Diagnóstico – Embora não sejam achadas no animal, as pulgas adultas são
visíveis, particularmente se uma lente de aumento iluminada for usada. Um auxílio
diagnóstico é o “teste do papel molhado”: uma folha de papel branca e plana é
completamente umedecida e mantida embaixo do animal, enquanto a pelagem
dorsal é rapidamente penteada com os dedos. Qualquer “resíduo fecal de pulga” que
for deslocado produzirá uma mancha de sangue castanho-avermelhada visível no
papel. Nem sempre é fácil provar que o prurido ou a dermatite exsudativa estão
sendo causados por pulgas; entretanto, elas são a causa mais comum destes sinais
e é razoável começar-se o tratamento inseticida.
A severidade de uma infestação por pulgas em uma família não pode ser
totalmente avaliada pelo exame dos animais residentes; os proprietários também
têm que ser questionados para se saber se a pele humana está sendo picada e quais
áreas ou cômodos são os mais utilizados pelos animais e, por isso, os que devem
estar mais infestados.
O diagnóstico diferencial da dermatite alérgica a pulga inclui atopia, alergia
alimentar, desordens seborréicas, piodermia, dermatofitose, e escabiose canina.
Um teste intradérmico positivo com antígenos de pulga comerciais confirma o
diagnóstico e auxilia na educação do proprietário, mas nem todos os cães com DAP
Pulgas 964

apresentam um teste intradérmico positivo. Qualquer dermatite pruriginosa com


uma distribuição primariamente caudodorsal, com presença de pulgas ou suas
fezes, ou com medidas inadequadas para o controle de pulgas em uma região
geográfica favorável ao seu desenvolvimento, deve ser tratada inicialmente como
DAP. Se o animal apresentar uma resposta deficiente às medidas vigorosas de
controle às pulgas, dentro de 4 semanas, doença coexistente ou outros diagnósticos
diferenciais devem ser considerados.
O diagnóstico em gatos é baseado na história, sinais clínicos e resposta à
terapia. O diagnóstico diferencial inclui hipersensibilidade alimentar, queiletielose,
trombiculidíase, dermatofitoses, atopia, foliculite bacteriana, e dermatite miliar
idiopática.
Tratamento e controle – Não existe controle de pulgas efetivo que seja “fácil”;
a infestação tem que ser persistentemente controlada em várias frentes. Os
elementos de um programa bem-sucedido são: 1. todos os animais em uma casa
devem receber tratamento inseticida regular apropriado para as necessidades
sazonais. Uma aplicação direta na pele é exigida na forma de um spray, aerosol,
banho, rinse, pó ou aplicação de espuma. Uma coleira antipulga pode ser usada
para proteção adicional, mas não deve ser considerada como o único meio de
controle. A dose oral de citioato ou administração tópica de fention em cães pode ser
tentada, mas sua eficiência é variável e a intoxicação deve ser evitada; 2. os locais
de dormir do animal devem ser os alvos primários para aplicação de inseticida,
devido ao fato de que é aí que fezes, ovos, larvas e pupas de pulgas se acumulam.
A cama deve também ser regularmente lavada e a área inteira deve ser mantida
limpa por aspiração de pó e limpeza geral rigorosas, sempre que necessário; 3. os
cômodos freqüentados pelos animais podem beneficiar-se do uso ocasional de
nebulização de controle ou sprays de mão. O uso freqüente de aspirador de pó
reduzirá a acumulação de ovos e restos de pulga; 4. as áreas externas onde os
animais brincam, descansam ou dormem devem ser tratadas com spray de
inseticida, sobretudo durante os climas mais quentes; 5. para evitar introdução
de pulgas em uma casa controlada, todos os animais estranhos devem ser tratados
na chegada, a menos que o seu status livre de pulgas seja confiável. Os animais que
estejam voltando de canis-pensão devem ser tratados imediatamente; e 6. um
controle de pulgas ideal deve incluir tratamento profilático precoce na época anterior
à observação de algumas pulgas. O aparecimento de pulgas adultas em animais
geralmente indica que a infestação da propriedade inteira já aconteceu e que a
população de parasitas está crescendo rapidamente.
A escolha de inseticidas químicos eficientes é crítica para o sucesso de um
programa de controle. Piretrinas sinérgicas, piretróides sintéticos, carbamatos e
organofosforados, todos têm o seu lugar, e a tecnologia das novas formulações
prometem estender os efeitos residuais. O metopreno é um novo produto controlador
do crescimento de insetos, aprovado para o controle de pulgas; ele inibe a
maturação de larvas em adultos. Ele se encontra disponível também na forma de
spray na qual apresenta efeitos ovicidas. O seu uso em combinação com inseticidas
parece oferecer melhor controle de propriedades (ver também P ARASITICIDAS EXTER-
NOS, pág. 1811).
A intoxicação por organofosforados (ver pág. 2022) pode ocorrer em animais se
eles forem expostos ao uso múltiplo e simultâneo desta classe de compostos em
coleiras antipulgas, sprays, rinses, citioato oral, fention e tratamento anti-helmíntico
com diclorvos. Os gatos são particularmente suscetíveis e se um organofosforado
for usado, deve-se tomar cuidado. Recomendações semelhantes podem ser
aplicadas aos greyhounds. Preparações concentradas de organofosforados devem
ser manipuladas com cuidado, pois o seu derramamento na pele desprotegida pode
causar intoxicação sistêmica séria no homem.
Moscas e Mosquitos 965

A resistência das pulgas a certos produtos químicos tem sido descrita, mas
geralmente é usada como uma desculpa para um controle epidemiológico inade-
quado.
O tratamento efetivo da DAP depende da erradicação das pulgas juntamente
com outras medidas apropriadas para o controle da piodermia secundária, seborréia
ou dermatite piotraumática. Como medida temporária para providenciar alívio para
o prurido, enquanto o controle de pulgas estiver no início, podem-se usar drogas
corticosteróides de curta duração (por exemplo, prednisolona na dose de 0,5 a
1mg/kg, uma vez por dia durante 4 a 7 dias, depois em manhãs alternadas [em cães
– em gatos, em tardes alternadas] por mais 10 dias). Não há justificativas para o uso
repetido de corticosteróides injetáveis de longa duração para controlar a DAP em
cães, já que isso pode levar ao hiperadrenocorticismo iatrogênico. Tentativas de
hipossensibilizar animais com preparações de antígenos de pulga comerciais
raramente são bem-sucedidas.

MOSCAS E MOSQUITOS
MOSCAS
Borrachudos e Piuns
Os borrachudos, também conhecidos como piuns, são membros da família
Simuliidae, ordem Diptera. Eles são caracterizados por tórax fortemente arqueado,
um aumento acentuado nas veias alares anteriores, e a ausência de olhos simples.
Algumas espécies são > 5mm de comprimento. Eles variam em cor de cinza, oliva
e negro. Apenas as fêmeas alimentam-se de sangue e suas peças bucais incluem
estiletes perfuradores parecidos com espadas. As antenas consistem de 9 a 12
segmentos. Os olhos da fêmea são distintamente separados; os do macho, com
raras exceções, são contíguos acima das antenas. Os palpos têm 5 segmentos.
Embora existam > de 1.000 espécies de Simuliidae, apenas algumas são conside-
radas importantes como pragas. Os borrachudos alimentam-se de todos os animais
economicamente exploráveis, animais selvagens, pássaros e o homem.
Os Simuliidae estão distribuídos por todo o mundo em áreas onde as condições
permitam o desenvolvimento das formas imaturas. Os borrachudos freqüentemente
aparecem em enxames onde correntes de água velozes e fortes proporcionem água
bem aerada para o desenvolvimento das larvas. As larvas quase sempre são
encontradas em água corrente; as torrentes rasas de montanhas são os lugares
favoritos para procriação. Algumas espécies, incluindo algumas notáveis pragas,
procriam em rios maiores; outras vivem em correntes temporárias ou semiperma-
nentes. Os borrachudos são particularmente abundantes nas zonas temperadas e
subárticas do norte, mas muitas espécies ocorrem nos trópicos e subtrópicos onde
outros fatores que não temperaturas sazonais afetam os seus padrões de desenvol-
vimento e abundância.
As larvas prendem-se às rochas ou a outros objetos sólidos (por exemplo, os
lados e estruturas de concreto caídas em canais de irrigação, represas de concreto)
em rios, algumas vezes aderindo à vegetação aquática ou emergente.
Os borrachudos possuem 1 a 6 gerações por ano, dependendo da espécie e das
condições climáticas. A atividade das fêmeas adultas pode durar de 2 a 3 semanas
até 3 meses. O néctar das flores providencia os carboidratos para a energia de vôo,
tanto das fêmeas quanto dos machos, porém as fêmeas geralmente exigem sangue
para o desenvolvimento ovariano.
Moscas e Mosquitos 966

Os adultos podem voar 12 a 18km a partir de seus lugares de procriação, mas


enxames migratórios, levados pelo vento, podem ir muito mais longe. A Simulium
arcticum pode viajar ≥ 150km no oeste do Canadá, e outras espécies são descritas
como viajando ≥ 250km. A Simulium colombaschense pode viajar 200 a 450km com
as correntes de vento no vale do Danúbio.
Outro grupo de borrachudos pertence à família Ceratopogonidae. Estas peque-
nas moscas sugadoras de sangue quase sempre estão relacionadas a maruins,
mosquitos-pólvora, mosquitos-isca ou “no-see-ums”. As Culicoides spp são as mais
comuns. Eles estão associados a hábitats úmidos ou semi-aquáticos, tais como
solos úmidos ou lodosos ao redor de correntes, riachos, lagos e pântanos. Eles são
picadores constantes e podem causar irritação tanto em pessoas quanto em animais
de produção (ver também SARNA DOCE em CAVALOS, pág. 974).
Além de reações locais (vermelhidão, pústulas de coceira) no local da picada,
pode haver condições gerais que variam em intensidade conforme a sensibilidade
do indivíduo e o número de picadas. Ataques por grande número de borrachudos
podem causar danos pesados e alta mortalidade nos animais de produção, e o
homem pode constantemente ser atacado.
A morte por um ataque de borrachudos resulta, aparentemente, de uma toxina
na saliva que aumenta a permeabilidade dos capilares e permite que o fluido do
sistema circulatório exsude e caia nas cavidades do corpo e espaços teciduais. O
animal rapidamente sucumbe a um ataque em massa, mas pode se recuperar
rapidamente se protegido de novas investidas. Quedas na produção de carne, leite
e ovos podem resultar de ataques menos extensos. Certas espécies de borrachudos
algumas vezes causam perdas nas aves domésticas tanto por ataque direto quanto
por transmissão de Leucocytozoon spp. Na África, membros dos complexos
agrupados ao redor de S. damnosum e S. neavei são importantes como vetores de
Onchocerca spp. Na América Central, S. ochraceum, S. metallicum, S. callidum e
S. exiguum são vetores importantes de Onchocerca. A S. ochraceum e a S. metallicum
também podem ser picadores constantes. A espécie africana, S. neavei, um
importante vetor de Onchocerca volvulus, e várias outras espécies têm uma relação
obrigatória com caranguejos de rio do gênero Potamonautes.
As Culicoides spp também são picadores constantes e podem causar irritação
intensa e aborrecimento. Quando em grande número, podem fazer com que os
animais de produção fiquem muito nervosos e interrompam o seu padrão de
alimentação. Os maruins do gênero Culicoides também são capazes de transmitir
doenças inclusive oncocercíase nos eqüinos e língua azul em bovinos e ovinos.
Tratamento e controle – Já que um controle de área ampla de borrachudos é difícil
e caro, os criadores de animais de produção freqüentemente recorrem ao uso diário
de repelentes para proteção de seus animais. Antes de empreender-se medidas de
controle, os produtores devem consultar o seu pessoal de conhecimento entomológico
para as últimas recomendações aprovadas. Se fundos públicos e pessoal de super-
visão treinado estiverem disponíveis, o controle em larga escala dos borrachudos é
possível por meio do tratamento de correntes de procriação com um larvicida
aprovado. Os tratamentos com pesticidas, que envolvem superfícies de água ou
grandes áreas de terra estão sujeitos a regulamento governamental e têm que ser
conduzidos com a devida precaução acerca de possíveis efeitos deletérios ambientais
e resíduos em produtos alimentares (ver também PARASITICIDAS EXTERNOS, pág. 1811).

Varejeira (Miíase cutânea, Larva do velo, Ataque de moscas, Larvas da lã)


Várias espécies de varejeira causam miíase em ovinos. Moscas primárias nos
EUA e Canadá são os borrachudos Phormia regina e Protophormia terraenovae e
a mosca verde Lucilia sericata. Lucilia illustris, Cochliomyia (Callitroga) macellaria
(larva da bicheira secundária) e algumas outras são geralmente invasores secun-
Moscas e Mosquitos 967

dários. Lucilia cuprina é a mosca primária mais importante na Austrália e África do


Sul; L. sericata na Grã-Bretanha; e L. cuprina, L. sericata e Calliphora stygia na Nova
Zelândia.
Os ovos, normalmente postos abaixo da extremidade do velo, eclodem dentro de
24h, se o ambiente for úmido. Umidade e nutrientes do soro, fezes, etc. são
necessários para a sobrevivência da larva de primeiro estágio. A larva de segundo
estágio pode erodir a pele com seus ganchos bucais para obter alimento. Uma vez
estabelecidas, as moscas podem se propagar rapidamente e atrair mais varejeiras
secundárias, assim como as primárias. As picadas fortes podem ser fatais, mas
mesmo as brandas podem causar uma rápida debilitação. A presença da mosca
deve ser precocemente diagnosticada; o comportamento dos ovinos é um bom
indicador de miíase. Deve-se suspeitar da ocorrência de bicheira (ver pág. 1005),
se as larvas estiverem associadas com ferimentos.
A porção do corpo preferida pela mosca varejeira é a região posterior, onde
moscas são atraídas pela lã molhada com urina ou contaminada com fezes. O corpo
do ovino pode também estar ferido, o que normalmente associado com a chuva
causa o apodrecimento do velo, freqüentemente caracterizado por descoloração
devida à Pseudomonas sp ou devida à dermatofilose (ver pág. 952). Outro local é
a cabeça de carneiros chifrudos ou a lã ao redor do prepúcio, lados onde as patas
com podridão dos cascos entram em contato com o velo e feridas.
A infestação da região posterior pelas varejeiras pode ser efetivamente contro-
lada por , 6 a 8 semanas, tosando-se entre as pernas e ao redor da cauda. A tosa
total controla surtos que envolvam outras partes do corpo. A remoção da lã ao redor
da cabeça e prepúcio pode prevenir picadas nessas áreas. A coloração da urina na
entreperna de ovelhas merino pode ser virtualmente eliminada pela remoção da
prega posterior (operação mulas australianas) e a contaminação fecal pode ser
grandemente reduzida cortando-se a cauda corretamente na terceira articulação. A
diarréia deve ser controlada. O odor associado com a umidade atrai moscas e
estimula a oviposição, particularmente durante a estação quente e úmida.
A quimioprofilaxia consiste em umedecer as áreas suscetíveis até a saturação
completa com preparações larvicidas e inseticidas apropriadas, como organofos-
forados ou criomazina, um larvicida específico utilizado na forma de banhos de
imersão ou sprays. O procedimento mais eficiente é introduzir o inseticida entre o
velo (geralmente na região posterior, ao longo das costas, cabeça) sob alta pressão.
A proteção pode durar 6 a 8 semanas, mas em regiões onde a mosca é resistente,
como a L. cuprina na Austrália, ela pode durar apenas 2 a 3 semanas. A aplicação
semanal de agentes como o ronel a 2,5% sob pressão, em feridas até a completa
cicatrização pode ser altamente benéfica, particularmente para a larva da bicheira.
O tratamento individual deve começar com a remoção de toda a lã da área afetada
e ao redor dela, antes da aplicação de agentes adequados. Queimar ou enterrar as
carcaças pode ser uma medida genérica de higiene, mas pode ter pouco efeito em
ataques primários. A principal fonte de moscas primárias é o ovino ferido.

Moscas de búfalo
A Haematobia irritans exigua é semelhante à mosca dos chifres, H. irritans, no
tamanho e aparência, e nos hábitos de procriação e alimentação. A mosca do búfalo
é uma praga primária de bovinos e bufalinos, mas ocasionalmente pode se alimentar
em cavalos, ovinos ou animais silvestres. Distribui-se por todo o norte da Austrália
e Nova Guiné, e é encontrada em partes do sul, sudeste e leste da Ásia e Oceania,
mas não se estende à Nova Zelândia. O seu desenvolvimento é semelhante ao da
mosca dos chifres; a adulta deixa o animal hospedeiro apenas enquanto põe ovos
em estrume fresco, onde se dá o desenvolvimento. O ciclo de vida pode levar 7 a
10 dias, dependendo da temperatura.
Moscas e Mosquitos 968

No caso das moscas do búfalo é de interesse primário a irritação e o aborrecimen-


to que causam aos animais. As picadas geralmente ocorrem nos ombros e cernelha,
e podem facilitar o aparecimento de bicheiras. Durante o clima quente, as moscas
movem-se para partes sombreadas do corpo. Os animais acometidos sofrem perda
de sangue e são irritados pelas moscas; a eficiência alimentar e a produção podem
ser adversamente afetadas.
Estas moscas são facilmente controladas porque são muito suscetíveis a
inseticidas. Em áreas onde a resistência não é problema, o brinco com piretróide
pode ser usado; entretanto, tem se desenvolvido resistência a piretróides em partes
da Austrália (ver também PARASITICIDAS EXTERNOS, pág. 1811).

Moscas da face
A Musca autumnalis é semelhante em aparência à mosca doméstica comum e
ocorre em bovinos em pastoreio por todo o sul do Canadá e maioria dos EUA. As
peças bucais consistem em labelos de absorção e existem 4 faixas longitudinais no
abdome. Pode ser diferenciada da mosca doméstica pela proximidade e ângulos
das margens interiores dos olhos e pela coloração distinta da face e do abdome.
Os bovinos são os hospedeiros principais da mosca da face nos EUA, mas ela
também se alimenta em eqüinos e, possivelmente, ovinos e caprinos. É uma praga
para os bovinos em pasto, e procria apenas em fezes bovinas frescas em situações
de pastoreio. Não se desenvolve em situações de engorda e, assim, não é uma
praga em bovinos confinados. Os ovos são postos em estrume fresco e eclodem em
, 1 dia. A larva amarelada exige 2 a 4 dias para se desenvolver e quando madura
deixa o estrume para pupar no solo ao redor. O ciclo de vida completo do ovo ao
adulto requer 12 a 20 dias, dependendo das condições climáticas. Durante o
inverno, o adulto inativo se refugia em construções e outros lugares protetores.
As moscas da face quase sempre ocorrem em grande número ao redor dos olhos
e do focinho dos animais de produção. As fêmeas alimentam-se de secreções
faciais, como fluidos lacrimais, muco nasal e saliva para obter proteína para o
desenvolvimento do ovo. Também se alimentam em outras fontes, como sangue de
feridas e leite na face de bezerros. As moscas da face possuem espinhos ásperos
e pequenos (dentes prestômicos) nas suas peças bucais absorvedoras. Conse-
qüentemente, apenas algumas moscas são suficientes para causar irritação e
danos mecânicos ao tecido ocular do seu hospedeiro. A atividade alimentar das
moscas da face intensifica a transmissão da Moraxella bovis, o principal agente
etiológico da ceratoconjuntivite infecciosa bovina. As moscas da face também
servem de vetores para os vermes oculares nematóideos das Thelazia spp, e são
vetores naturais do nematóideo dos bovinos, Parafilaria bovicola.
O controle das moscas da face é difícil. Muitos esforços têm sido feitos usando-
se vários inseticidas e técnicas de aplicação, como sacos de pó, sprays
de nebulização, formulações para esfregar e inseticidas, além de reguladores de
crescimento de insetos, como aditivos alimentares. Em sua maioria, estes esforços
proporcionaram um controle pouco satisfatório. A introdução de brincos impregna-
dos de inseticidas providencia um controle um pouco melhor. Entretanto, com a
maioria destes dispositivos, reduções sazonais de moscas da face de apenas 70
a 80% têm sido alcançadas, até com 2 brincos instalados por animal, um em cada
orelha.

Moscas da cabeça (Moscas de plantação)


A Hydrotaea irritans é um muscídeo não picador encontrado em grande número
nos países do norte europeu, especialmente Dinamarca e Grã-Bretanha, onde é
uma praga de bovinos, ovinos e outros animais de produção. É um aborrecimento
Moscas e Mosquitos 969

para os animais domésticos e o homem porque é atraída para a boca, nariz, orelhas,
olhos e feridas para se alimentar de secreções. Ao contrário de outras Hydrotaea
spp, a H. irritans produz uma geração a cada ano com 3 estágios larvais metamór-
ficos. Os ovos depositados no fim do verão eclodem no segundo estágio larval
metamórfico dentro de poucos dias. Este estágio saprófago dura um curto
período antes de desenvolver o terceiro estágio principal, o qual é predatório para
outras larvas de insetos. Durante o inverno ocorre um estágio larval tardio. As
moscas adultas são mais ativas do início de junho até o fim de setembro e são
comuns na vizinhança de moitas e bosques nos quais se abrigam entre períodos
de alimentação.
Na Grã-Bretanha, os ovinos são principalmente afetados. Grandes enxames,
atraídos pelo movimento de animais, congregam-se para alimentar-se de
secreções dos olhos e nariz, e de restos celulares na base do chifre em crescimento.
Para aliviar a irritação persistente, os ovinos esfregam e arranham suas cabeças,
o que resulta na formação de feridas em carne viva ou “cabeças quebradas”,
especialmente no topo da cabeça. As moscas, atraídas pelo sangue, pousam nestas
lesões auto-infligidas e aumentam as bordas por sua atividade de alimentação.
Ovinos de todas as idades ficam envolvidos, mas as raças com chifres e sem lã na
cabeça são mais severamente afetadas.
As moscas da cabeça também atacam o homem, veados, cavalos, bovinos e
coelhos. Embora nenhuma lesão correspondente à “cabeça quebrada” se desenvol-
va nos bovinos, a associação entre a ocorrência de mastite de verão (devida à
Corynebacterium pyogenes) e a atividade sazonal de moscas da cabeça é muito
próxima, especialmente na Dinamarca. As moscas da cabeça podem também estar
envolvidas na disseminação da mixomatose em coelhos.
O desenvolvimento, emergência e congregação da praga, a qual ocorre fora de
áreas de fazenda, impossibilitam os métodos tradicionais de controle com spray
inseticida em lugares de procriação e hábitats de descanso generalizados. O
controle no ponto de contato entre os insetos adultos que se alimentam e os
hospedeiros mamíferos é também de limitado valor. Com ovinos, a retenção de
compostos organofosforados ou derivados de piretrina nas áreas suscetíveis da
cabeça é de curta duração e, portanto, necessita de reaplicações impraticáveis em
animais de vida livre. O uso de brincos com inseticidas nos bovinos diminui a
incidência de mastite de verão, presumivelmente por redução de transmissão por
mosca da cabeça.
A remoção de animais de produção de lugares infestados durante a estação de
moscas é o único meio completamente eficiente para se evitar danos. O abrigo
de ovinos, uma vez que tenham aparecido “cabeças quebradas”, é o único método de
sucesso em impedir futuros danos por estas moscas.

Moscas do chifre
A Haematobia irritans é uma importante praga em bovinos, encontrada na maioria
das regiões produtoras de carne do mundo. Populações deste parasita são comuns
na Europa, África do Norte, Ásia Menor e Américas. Na América do Norte, a mosca
do chifre é encontrada onde quer que ocorram bovinos. Entretanto, ela ocorre em
números muito maiores e por períodos mais longos no sul e sudoeste dos EUA.
As moscas do chifre têm a cor e a aparência gerais das moscas de estábulo, mas
têm apenas quase metade do tamanho e são mais delgadas. O seu aparelho bucal
perfurador/sugador, tipo baioneta, é também semelhante na aparência e posição.
As moscas do chifre são quase exclusivamente pragas de bovinos e se reproduzem
apenas em fezes bovinas, mas se alimentam em cavalos, ovinos, caprinos e animais
silvestres.
Moscas e Mosquitos 970

As moscas do chifre adultas gastam sua vida inteira em seu hospedeiro e as


fêmeas deixam-no apenas para pôr ovos em fezes frescas, onde ocorre o desenvol-
vimento das larvas. No sul dos EUA, o ciclo de vida dura 1 semana, mas em climas
mais frios e na primavera ou outono, o desenvolvimento pode levar 2 a 3 semanas.
Em algumas áreas mais quentes (sul da Flórida e maior parte do sul do Texas), as
moscas do chifre continuam a se reproduzir ativamente durante todo o ano.
Moscas recém-emergidas procurando seu hospedeiro podem viajar 11 a 15km,
mas geralmente o encontram em distâncias bem menores, e a migração raramente
ocorre em grandes distâncias. No sul dos EUA, populações de mosca em indivíduos
podem alcançar milhares, especialmente nos touros que não tenham recebido
tratamento químico; no norte, elas podem não exceder 100, embora o dano infligido
seja semelhante.
Achados clínicos – Tanto moscas do chifre fêmeas como macho adultas
perfuram a pele para sugar sangue, o que causa dor, incômodo e perda de sangue
no bovino. Já que elas se alimentam até 20 vezes por dia, quantidades consideráveis
de sangue têm de ser repostas. A irritação também faz com que os animais irritados
percam peso devido ao seu menor aproveitamento de alimento. Infecções pesadas
causam lesões ao longo da linha média ventral do animal. As moscas do chifre causam
grandes perdas econômicas anualmente nos EUA; 14% das reduções de ganho de
peso em gado bovino de pasto e perdas de 5 a 6kg/cabeça em bezerros desmama-
dos são comuns. Na gado leiteiro, a produção de leite pode ser reduzida em 10 a
20%. Além disso, a mosca do chifre serve como hospedeiro intermediário do
nematóideo de bovinos, Stephanophilaria stilesi (ver pág. 981).
Tratamento e controle – As moscas do chifre são relativamente fáceis de
controlar com os sprays químicos para o animal inteiro e com meios de autotratamento,
como sacos de pó ou esfregadores dorsais em um situação de uso forçado. Certos
inseticidas também são disponíveis como aditivos alimentares aplicados no animal
para matar larvas de moscas do chifre que se reproduzem nas fezes. Um outro
método de controle é o uso de brincos impregnados com inseticidas (piretróides ou
organofosforados). Infelizmente, a resistência das moscas do chifre a piretróides,
principalmente em brincos, tem se desenvolvido ao longo do sul da Flórida ao Texas;
no norte até Kentucky e Nebraska; e oeste, para Califórnia e Havaí. Conseqüente-
mente, certas diretrizes precisam ser seguidas no controle de moscas do chifre
nestas e em outras áreas onde a resistência a piretróides possa ocorrer. Os brincos
nos animais devem ser aplicados de acordo com as instruções do rótulo. Devem-se
também, aplicar os brincos nos animais próximo ou no próprio início da estação de
moscas, removendo-os no, ou perto do fim da mesma, e métodos de tratamento
alternados com inseticidas não piretróides devem ser usados próximo do fim da
estação de moscas. Se a resistência for suspeita, o retratamento não deve ser feito
com outros tipos de brincos de piretróide, já que a resistência cruzada é muito
provável; o uso de métodos de controle alternativos com não piretróides é indicado.

Mutucas e moscas de veado


As moscas desta família (Tabanidae) variam em tamanho de 6 a 10mm até 25mm
de comprimento. Dentro desta família, as pragas mais importantes na América do
Norte compreendem os gêneros Chrysops (moscas de veado), Hybomitra e Tabanus
(mutucas). Os 2 últimos, geralmente, são maiores do que o primeiro e são as pragas
mais sérias. A gama de hospedeiros inclui todos os animais economicamente
exploráveis, animais selvagens, domésticos e o homem. Nos EUA, os problemas
mais sérios estão no sudeste, onde as condições são mais úmidas e mais favo-
ráveis. Entretanto, até em áreas secas ou altas, durante certas épocas do ano,
podem ocorrer grandes surtos.
Moscas e Mosquitos 971

As larvas de mutucas são primariamente aquáticas ou semi-aquáticas, mas


podem ser encontradas em áreas altas onde pouca umidade está associada ao solo.
O ciclo de vida de muitas espécies é desconhecido e pode durar 1 a 2 anos,
dependendo da espécie e do local onde são encontradas. A maioria das mutucas
estudadas tem uma única geração por ano e passam o inverno em estágio larval.
As fêmeas adultas requerem um repasto sangüíneo para pôr ovos enquanto os
machos se alimentam em flores ou sucos vegetais.
As mutucas podem transmitir o agente causador do carbúnculo, anaplasmose,
tularemia e anemia infecciosa eqüina. Nas Filipinas e na África, os tabanídeos
podem transmitir vários tripanossomos patogênicos aos animais de produção. A
transmissão geralmente é mecânica, mas as mutucas também podem servir como
hospedeiro intermediário para alguns agentes, por exemplo, Trypanosoma theileri,
Haemoproteus metchnikovi, e pelo menos 4 nematóideos.
As peças bucais laminares da fêmea provocam uma ferida dolorosa e um fluxo
considerável de sangue, o qual é então sorvido. Alguns indivíduos das espécies
maiores podem impedir os bovinos de se alimentarem normalmente somando-se
este fator à perda por superatividade que eles estimulam. A perda de sangue torna-
se um fator significativo quando dúzias de moscas se alimentam em um animal
várias horas por dia durante o verão. Uma vez que a alimentação tenha terminado,
o sangue pode continuar a fluir do local atraindo outras moscas. Destas, a bicheira
Cochliomyia hominivorax é de grande interesse no sul do México e América Central.
Tratamento e controle – As mutucas são as mais difíceis de controlar entre
todas as moscas sugadoras de sangue. Muitos dos compostos usados para controle
de outras moscas matam os tabanídeos, entretanto elas podem não ficar expostas
o suficiente para serem afetadas, já que se alimentam intermitentemente, ficando no
hospedeiro apenas por um curto período, o que requer doses maiores de compos-
tos. Os repelentes comerciais são protetores apenas por curtos períodos e precisam
ser aplicados repetidamente para manter a sua eficácia. Agentes específicos devem
ser usados apenas após inspeção por especialistas do regulamento local.

Moscas domésticas e outras moscas que procriam em lixo


A mosca doméstica, Musca domestica, é comumente encontrada nos arredores
de criações de animais e aves domésticos, onde facilmente procria em fontes de
estrume acumulado. É de cor acinzentada, com 4 faixas torácicas escuras, e é
equipada com peças bucais absorvedoras e não picadoras. Sob condições climá-
ticas favoráveis, o ciclo completo de vida da mosca doméstica pode ocorrer em
apenas 10 a 14 dias.
Embora não se alimentem de sangue, as moscas domésticas perturbam os
animais devido à sua intensa movimentação. Isto pode levar à redução da produção.
Além disso, as moscas domésticas têm sido implicadas na transmissão de diversos
agentes patogênicos de importância médica e veterinária. Isto porque as grandes
populações de moscas domésticas freqüentemente ocorrem perto das criações mal
cuidadas, principalmente de aves, tornando-se um incômodo público.
Várias outras espécies de moscas de procriação em lixo podem ocorrer nas
imediações de criações. Entre estas podem ser incluídas pequenas moscas
domésticas (Fannia spp), moscas de lixo (Ophyra sp), falsas moscas de estábulo
(Muscina spp), mosca soldado-negro (Hermetia illucens), várias moscas varejeiras
(família Calliphoridae) e moscas-traça (família Psychodidae).
Um programa de saneamento completo é necessário para controlar as populações
de mosca dentro e fora das criações. Todo o acúmulo de estrume deve ser removido
pelo menos 2 vezes por semana ou manejado apropriadamente, se estocado nas
propriedades, diminuindo, conseqüentemente, a procriação de moscas. Se as
Moscas e Mosquitos 972

práticas de manejo de estrume seco forem adotadas, devem ser feitos esforços extras
para reduzir ao mínimo a umidade do estrume. Se uma cova de estrume líquido for
utilizada, não se deve permitir que o mesmo se acumule acima da linha da água, seja
flutuando, seja aderindo nas paredes, já que é um local ideal para a produção de
moscas. Os inseticidas devem ser considerados como complementares às medidas
de saneamento e manejo destinadas à prevenção de procriação de moscas. Os
sprays residuais fornecem um controle de até 2 a 4 semanas com apenas um
tratamento, podendo ser aplicados em superfícies de descanso das moscas. Sprays,
nebulizações ou defumações com efeito rápido, mas sem ação residual, podem ser
usados para redução imediata de altas quantidades de moscas adultas. Outras
medidas de controle de moscas adultas, como o uso de faixas de resina inseticida ou
o uso de várias iscas de moscas, podem ser adotadas. Estas medidas são mais úteis
como complementos a outras práticas de controle de moscas. Os larvicidas também
podem ser aplicados diretamente às fontes de procriação de moscas; entretanto, isto
deve ser considerado apenas para os focos de reprodução não eliminados por
práticas normais de saneamento anteriormente adotadas.

Moscas de estábulo
A Stomoxys calcitrans tem aproximadamente o mesmo tamanho e aparência
geral de uma mosca doméstica. Sua cor é cinza-acastanhada, a mais externa das
4 faixas torácicas é interrompida, e o abdome tem uma aparência em forma de
xadrez. Ela possui uma probóscide em forma de agulha que é retraída para repouso
abaixo da parte anterior da sua face. As asas, quando em repouso, são largas nas
pontas. Acredita-se que esta seja a espécie mais cosmopolita do mundo.
A mosca de estábulo alimenta-se na maioria dos animais de sangue quente.
Geralmente é encontrada nas vizinhanças de estábulos ou áreas de pastoreio;
entretanto, pode também ser encontrada alimentando-se em animais em outras
situações de confinamento. As formas imaturas se desenvolvem na matéria orgâ-
nica em decomposição, incluindo recortes de grama e algas ao longo de praias. No
meio-oeste dos EUA, as larvas podem ser encontradas em áreas úmidas, próximas
a margens de montes de feno e covas de silagem. Em lugares onde os bovinos
alimentam-se de feno, a procriação pode ocorrer no limite da área de alimentação
onde o feno se mistura com urina e fezes. O ciclo de vida no campo pode ser
completado em 2 a 3 semanas e os adultos podem viver 3 a 4 semanas ou mais.
As moscas de estábulo podem ser um problema em muitas áreas dos EUA, mas
são predominantes em áreas de engorda por confinamento do meio-oeste. O dano
infligido ao bovino é causado pela picada dolorosa e também pela perda de sangue,
e a irritação leva os animais a se tornarem menos eficientes na conversão de
alimento em carne ou leite. A mosca de estábulo pode também ser um vetor
mecânico do carbúnculo ou do mal das cadeiras, e é um hospedeiro intermediário
de Habronema microstoma, um nematóideo parasita de cavalos.
As moscas de estábulo são difíceis de controlar por meio de tratamento de animais,
já que elas geralmente alimentam-se apenas uma ou duas vezes por dia, por curtos
períodos. Vários inseticidas aprovados podem ser administrados em spray, onde as
moscas possam estar repousando, por exemplo, em celeiros ou fileiras de cercas. A
consideração principal no controle de moscas de estábulo é o saneamento, o qual
pode ser responsável por até 90% do controle. Áreas ao longo de fileiras de cercas,
sob montes de alimentos, ou onde quer que estrume, fezes ou matéria em decompo-
sição possam se acumular, devem ser mantidas limpas, já que proporcionam o meio
para o desenvolvimento das moscas. Se procedimentos de bom saneamento forem
praticados, o controle químico, provavelmente será menos necessário; sem sanea-
mento, as medidas de controle químico provavelmente falharão.
Moscas e Mosquitos 973

CARRAPATO DOS CARNEIROS


A Melophagus ovinus é um dos mais largamente distribuídos e importantes
parasitas externos dos carneiros. É um inseto verdadeiro, uma mosca sem asas, e
não um ácaro. O adulto mede , 7mm de comprimento, com uma cor castanha ou
avermelhada, e é coberto por pêlos curtos eriçados. A fêmea produz uma única
larva, completamente desenvolvida, a qual adere-se à lã e pupa dentro de 12h. Um
jovem carrapato emerge depois de , 22 dias e pode viver 100 a 120 dias se for fêmea
e , 80 dias se for macho. Durante este tempo, , 10 larvas são produzidas por cada
fêmea. A vida inteira do parasita é gasta no hospedeiro. Os carrapatos que caem do
hospedeiro, geralmente sobrevivem < 1 semana e representam pouco risco de
infestação ao rebanho. O número de carrapatos aumenta durante o inverno e no
começo da primavera, quando se espalham rapidamente por um rebanho, particu-
larmente quando os ovinos estão reunidos em recintos fechados para alimentação
ou abrigo.
Para se alimentar, estes parasitas perfuram a pele com suas peças bucais e
sugam o sangue. Eles geralmente se alimentam no pescoço, peito, ombros, flancos
e anca, mas não no dorso, onde o pó e outros detritos se depositam na lã, causando
um defeito no couro chamado berbigão. As lesões que produzem são em forma de
mancha e afetam o grau e o valor da pele dos animais.
A irritação da pele leva o ovino a se esfregar e morder, e o velo torna-se fino,
surrado e sujo. O excremento dos carrapatos causa descoloração permanente, a
qual reduz o valor da lã. Os ovinos infestados, particularmente cordeiros e ovelhas
prenhes, podem perder a vitalidade e tornarem-se antieconômicos. Os carrapatos
também transmitem Trypanosoma melophagium , a qual é considerada como não
patogênica para ovinos.
Controle – A tosquia remove muitas pupas e adultos. Assim, a tosa antes da
parição e o tratamento subseqüente das ovelhas com inseticidas para controlar os
carrapatos remanescentes podem reduzir grandemente a possibilidade de os
cordeiros se tornarem severamente infestados. Os ovinos são, geralmente, tratados
após a tosquia e melhores resultados são obtidos se for usado um inseticida, cujo
resíduo permaneça pelo menos por 3 a 4 semanas. Com isso, os carrapatos que
emergirem das pupas também serão mortos. O tratamento moderno para controlar
piolhos também erradica carrapatos.
Quando tanques para banho de imersão de ovinos forem disponíveis, o banho
é considerado um método eficiente de tratamento. A submersão completa do animal
assegura a destruição de todos os carrapatos presentes, mas na maioria dos casos
não mata as larvas pupadas; é necessário um inseticida de longa ação para matar
os parasitas recém-emergidos. Grandes rebanhos de ovinos no posto devem ser
tratados em um tanque de banho de imersão construído permanentemente. Reba-
nhos menores e de fazenda podem ser tratados com sucesso em tanques de banho
de imersão portáteis, de ferro galvanizado ou em tanques menores, banheiras, etc.
A aspersão com spray pode ser tão eficiente quanto o método de banho de
imersão, e é mais conveniente em algumas áreas. Pressões de 7 a 14kg/cm2 para
lã curta e 21 a 28kg/cm2 para lã comprida são comumente usadas.
O banho de imersão em ducha é também, algumas vezes, usado. Neste
procedimento, os ovinos são mantidos em um cercado especial e submetidos à
ducha de alto a baixo até o velo ficar saturado. O escoamento é retornado para
recirculação e a concentração do inseticida usado é a mesma do banho de imersão.
A concentração do inseticida pode cair rapidamente e tornar-se ineficiente se as
instruções de reabastecimento não forem seguidas explicitamente.
Jato de inseticida envolve a aplicação forçada do inseticida por meio de um pente
de jato múltiplo manual. Embora uma pequena ducha seja menos eficiente do que
Moscas e Mosquitos 974

banhos ou sprays, este método pode ser vantajoso para rebanhos menores, já que
é econômico e não requer uma instalação permanente.
Formulações tópicas ou “pour-on” de piretróides mais novos são de fácil apli-
cação e muito efetivas.
A pulverização forçada é um método que se ajusta bem às práticas de manejo
na época da tosquia. É rápida e econômica, e evita que os animais fiquem molhados.
Vários tipos de equipamento para pulverização são disponíveis comercialmente (ver
também PARASITICIDAS EXTERNOS, pág. 1811).

SARNA DOCE EM CAVALOS


Trata-se de uma dermatose pruriginosa, sazonal e, anualmente recorrente do
cavalo, que afeta as regiões da crina, cauda e abdome, causada por uma reação
alérgica as Culicoides spp, família Ceratopogonidae. Ocorre largamente e é
conhecida como “hipersensibilidade ao Culicoides” no Canadá, “sarna do Queensland”
na Austrália e “kasen” no Japão. As Culicoides spp, freqüentemente chamadas
maruins, mosquitos-pólvora, mosquitos-isca ou “no-see-ums” (ver também pág. 966),
são insetos sugadores de sangue, muito pequenos. Eles voam apenas nos meses
mais quentes do ano e são mais ativos antes e durante o entardecer, alimentando-
se quase sempre na crina, cauda e no abdome. A doença resulta de uma reação de
hipersensibilidade do Tipo I. Geralmente, apenas uma pequena porcentagem de
cavalos em um grupo é afetada, sendo que o número depende da exposição aos
parasitas. Além disso, os cavalos imaturos são raramente afetados e os sinais
clínicos quase sempre pioram com a idade do animal. Os pôneis podem ser mais
freqüentemente afetados. Uma predisposição familiar tem sido observada.
Prurido severo, alopecia, efusão serosa e formação de crostas por escoriação e
inflamação são comumente observados. Em casos crônicos severos, a liquenificação
também está presente. As áreas do topo da cabeça, crina e cauda são comumente
afetadas, enquanto o abdome está raramente envolvido.
Um prurido intenso, alopecia crostosa das regiões da crina e cauda, associados
à exposição a maruins são muito sugestivos para o diagnóstico. Os sinais clínicos
são evidentes apenas durante os meses mais quentes na maioria dos casos,
mas são observados durante todo o ano em casos severos. O diagnóstico diferen-
cial inclui oncocercíase (ver pág. 978) e reação a Haematobia irritans (mosca de
chifre) e Stomoxys calcitrans (mosca de estábulo). A oncocercíase é uma dermatose
não sazonal, semelhante à sarna doce, mas geralmente é menos pruriginosa e afeta
a cabeça, pescoço e abdome. A oncocercíase e a hipersensibilidade ao Culicoides
não são mutuamente exclusivas e os sinais clínicos podem ser similares. Freqüen-
temente um diagnóstico definitivo só é alcançado quando uma resposta positiva ao
tratamento é observada. A mosca do chifre e a do estábulo causam uma dermatose
pruriginosa sazonal; a mosca de estábulo nas costas, peito, pescoço e pernas; a
mosca de chifre na linha média ventral.
Tratamento e controle – Prednisolona oral, 400mg, duas vezes ao dia, ou
dexametasona oral, 10mg, duas vezes ao dia, em casos severos, são eficazes para
resolver os sintomas clínicos. A dose deve ser diminuída gradualmente depois de
5 dias, para o menor volume capaz de evitar o prurido. A terapia de dias alternados
é aconselhada se os corticosteróides forem administrados por um período prolon-
gado. Cortisona e antibióticos tópicos são eficientes apenas como terapia auxiliar;
a base de creme é útil para prevenir a exposição da pele aos maruins. As anti-
histaminas são ineficazes no tratamento da maioria das doenças de hipersensibili-
dade cutânea no cavalo.
As medidas preventivas para reduzir a exposição a maruins são preferíveis à
terapia com corticosteróides de longo prazo. Estabular os cavalos afetados antes e
Moscas e Mosquitos 975

durante o anoitecer é geralmente eficiente, já que os maruins raramente entram em


estábulos. O uso de um ventilador no estábulo para criar movimento aéreo ao redor
do cavalo é benéfico, já que Culicoides geralmente são menos voadores. Se isto não
for possível, repelentes de mosca usados antes do anoitecer são ocasionalmente
eficientes. Brincos com repelentes de mosca presos à crina e à cauda dos cavalos
(não aprovados nos EUA); piretro, com ação conjunta com butóxido de piperonil,
aplicado semanalmente; butoxipolipropileno glicol 800, aplicado diariamente; co-
bertor de estábulo; e finas telas nas portas e janelas do estábulo têm sido usados
com sucesso variado.

M OSQUITOS
Aproximadamente 3.000 espécies de mosquitos foram descritas ao redor do
mundo, com , 150 delas na América do Norte de clima temperado. Os mosquitos
são os mais proeminentes dos numerosos tipos de artrópodes sugadores de
sangue. São encontrados desde os pântanos salgados das planícies costeiras até
as piscinas de neve a 4.300m de altitude até 1.100m abaixo do nível do mar, nas
minas de ouro da Índia. Todos os animais de produção, cães, animais silvestres e
o homem estão sujeitos ao ataque.
Os gêneros importantes incluem Aedes, Anopheles, Culex , Culiseta e Psorophora.
Os mosquitos põem seus ovos tanto diretamente na superfície de água parada
quanto no caso da maioria das Aedes e Psorophora spp, em um substrato com solo
úmido, onde eles eclodem após um aguaceiro de uma irrigação, chuva, derretimento
de neve, etc. As larvas e pupas são também conhecidas como “wigglers” e
“tumblers”, respectivamente, são aquáticas, e ocorrem em uma grande variedade
de hábitats, desde lagos e pântanos permanentes até pastos irrigados, buracos de
árvore e até grupos de contêineres artificiais que contenham água. Algumas
espécies apresentam várias gerações por ano, e a alternância de períodos secos e
úmidos devido à chuva ou à irrigação revela-as em enormes quantidades. Os
hábitos de vôo dos adultos variam com a espécie; algumas Aedes spp são tidas
como migrando vários quilômetros a partir de seu hábitat larval aquático. As Aedes
e Psorophora spp geralmente passam o inverno no estágio de ovo, enquanto as
Anopheles, Culex e Culiseta spp, geralmente, passam o inverno no estágio adulto.
A Psorophora columbiae é uma grave praga, tanto de animais de produção quanto
de pessoas em áreas de plantação de arroz do Arkansas e Luisiana. A Culex tarsalis,
um vetor importante da encefalite eqüina ocidental, é encontrada nos estados do
oeste, centro e sul dos EUA. Aedes vexans é uma importante espécie nociva
encontrada nos estados do meio-oeste, e certas espécies do gênero Mansonia são
graves pragas de animais de produção da Flórida. A Aedes albopictus é uma espécie
asiática recente, que poderá se tornar um importante vetor de doença.
Os prejuízos que os mosquitos infligem aos animais de produção consistem
principalmente em grave incômodo, perda de sangue e transmissão de várias
doenças. Além disso, as toxinas injetadas no momento da picada podem causar
efeitos sistêmicos. Várias doenças, incluindo a encefalomielite eqüina e dirofilariose
canina, são transmitidas. Na América Central e na América do Sul, o adulto da
mosca do berne, Dermatobia hominis (ver pág. 944) fixa seus ovos em espécies de
mosquitos do gênero Psorophora, os quais os transmitem aos hospedeiros mamí-
feros quando se alimentam. Casos de transmissão aparente da bouba aviária por
mosquitos também têm sido relatados.
Tratamento e controle – O pecuarista deve tentar eliminar ou reduzir áreas em
suas terras que abriguem larvas de mosquitos. O controle de áreas de mosquito
geralmente envolve a cooperação de muitos indivíduos e pode ser realizado com
sucesso apenas com pessoal especializado com equipamento apropriado. Além da
Moscas e Mosquitos 976

eliminação de locais de procriação aquáticos, os programas de área geralmente


incluem o uso extensivo de larvicidas. No caso de grandes surtos de mosquitos
adultos, particularmente quando a transmissão de doenças for uma preocupação,
a aplicação de um inseticida ativo contra os adultos pode ser necessária.
Deve-se tomar cuidado com áreas de programas de tratamento, pois muitos
organismos “não alvo”, como peixes, camarões, abelhas podem se expor aos
inseticidas. Um entomologista da extensão local deve ser consultado a respeito de
materiais apropriados para uso em animais ou propriedades. Estes programas em
larga escala geralmente são conduzidos por divisões de controle de mosquito ou
outros órgãos governamentais.
É difícil para o pecuarista proteger seus animais; os sprays residuais nos animais
não previnem os ataques, e os repelentes normalmente disponíveis não conferem
proteção adequada durante surtos pesados. A proteção contra os mosquitos adultos
pode ser realizada por aplicações no solo e, em alguns casos, também aéreas, de
um inseticida em um momento de infestação máxima. Dependendo das condições
locais, está proteção pode ser de curta duração. Animais de valor devem ser
mantidos em instalações fechadas ou teladas e os mosquitos no interior mortos com
nebulização ou uma formulação de aerossol de um inseticida aprovado. Um alívio
temporário pode ser produzido por sprays ou materiais de esfregar (“wipe-on”)
disponíveis comercialmente.

HELMINTOS DA PELE
HABRONEMÍASE CUTÂNEA
(Feridas de verão)
É uma doença da pele de eqüinos em parte por larvas de vermes estomacais (ver
pág. 242). Quando as larvas emergem de moscas, que se alimentam em feridas
preexistentes ou em áreas úmidas da genitália e olhos, elas migram para o interior
e irritam o tecido, causando uma reação granulomatosa. A lesão torna-se crônica e
a cura é retardada. O diagnóstico é baseado no achado de granulomas na pele,
marrom-avermelhados e oleosos, que não curam e que contêm material calcificado,
amarelo, do tamanho de grão de arroz. As larvas, reconhecidas por protuberâncias
espinhosas em suas caudas, podem algumas vezes, ser demonstradas em raspa-
dos das lesões. Muitos tratamentos diferentes têm sido utilizados, a maioria dos
quais com maus resultados. O tratamento sintomático, que inclui o uso de repelentes
de insetos, pode ser de utilidade, e os organofosforados, aplicados topicamente na
superfície raspada da lesão podem matar larvas. A remoção cirúrgica ou cauteriza-
ção do tecido de granulação excessivo podem ser necessárias. O tratamento com
ivermectina (200µg/kg) tem sido eficiente, e embora possa haver exacerbação
temporária das lesões (presumivelmente em reação à morte das larvas), a cura
espontânea pode ser aguardada. O controle de moscas-hospedeiro e a coleta e
manejo regular do estrume, aliados à terapia anti-helmíntica regular, podem ajudar
a reduzir a incidência de habronemíase cutânea.

INFECÇÕES POR DRACUNCULUS


A Dracunculus insignis ocorre principalmente no tecido conjuntivo subcutâneo
das pernas de guaxinins, visons e outros animais, inclusive cães na América do
Norte e possivelmente outras partes do mundo. As fêmeas (com ≥ 30mm de
Helmintos da Pele 977

comprimento) são muito mais longas que os machos (, 20mm). Produzem


úlceras na pele de seu hospedeiro através das quais a sua extremidade anterior
é projetada em contato com água. Elas põem larvas características, compridas
e de caudas finas. As pulgas d’água (Cyclops sp) são os hospedeiros interme-
diários nos quais as larvas infectantes se desenvolvem. Os cães tornam-se
infestados por meio da ingestão de água contaminada ou de um hospedeiro
paratênico (rã).
Tratos inflamatórios serpentiformes e subcutâneos, e úlceras de pele crateriformes,
edematosas que não se curam são observadas nestas infestações. Embora seja um
parasita raro, as infecções são ocasionalmente encontradas em locais ao redor de
pequenos lagos e poças rasas de água estagnada. O tratamento é feito por meio da
extração lenta e cuidadosa do parasita. A administração de compostos de
benzimidazol ou miridazol pode ser útil.
A Dracunculus medinensis, o “verme da Guiné” de partes da África, Ásia e Oriente
Médio, embora primariamente um parasita do homem, também ocorre em cães e
outros animais.

ELEOFOROSE
(Dermatose filarial, Cegueira de olhos claros, Cabeça ferida)
Elaeophora schneideri é um parasita do veado orelhudo e do veado de cauda
negra, encontrada nas montanhas do oeste e sudoeste dos EUA; ela também tem
sido encontrada em veados de rabo branco nas regiões sul e sudeste. Os parasitas
adultos têm 60 a 120mm de comprimento e normalmente são encontrados na
carótida comum ou nas artérias maxilares internas. As microfilárias de , 275µm de
comprimento e 15 a 17µm de espessura, normalmente encontram-se em capilares
cutâneos na fronte e na face. O desenvolvimento nos hospedeiros intermediários,
mutucas dos gêneros Tabanus e Hybomitra, requer , 2 semanas. Larvas infectivas
invadem o hospedeiro à medida que as mutucas se alimentam, migram para as
artérias leptomeníngeas e transformam-se em adultas imaturas em , 3 semanas.
Estes adultos jovens migram contra a corrente sangüínea e se estabelecem nas
artérias carotídeas comuns, onde continuam o seu crescimento. Os parasitas
atingem a maturidade sexual em , 6 meses e começam a produzir microfilárias. O
tempo de vida dos adultos é de 3 a 4 anos.
Achados clínicos – A doença clínica não tem sido relatada no veado orelhudo
e no veado de cauda negra; portanto, eles são considerados hospedeiros definitivos
normais. Quando as mutucas transmitem as larvas infecciosas ao alce europeu, alce
americano, ovino doméstico, caprino doméstico, veado-sika e possivelmente ao
veado de cauda branca, desenvolvem-se nas artérias leptomeníngeas e causam
necrose isquêmica do tecido cerebral, resultando em cegueira, dano cerebral e
morte súbita. A cegueira nestes animais é caracterizada pela ausência de opacidade
no meio refratário do olho, daí o nome popular de cegueira de “olhos claros”.
Os ovinos e caprinos domésticos, sobretudo cordeiros, cabritos e filhotes com um
ano de idade, podem morrer repentinamente 3 a 5 semanas após a infestação. A
morte é geralmente precedida pela falta de coordenação e pelo andar em círculos
e, freqüentemente, por convulsões e opistótono. Numerosos trombos ocorrem nas
artérias cerebral e leptomeníngea. Um ou mais adultos jovens de E. schneideri
acompanham cada trombo. Se o ovino ou caprino sobreviver a uma infestação
precoce, 6 a 10 meses mais tarde desenvolverá uma dermatite sanguinolenta no
topo da cabeça, testa ou face, daí o nome popular de “cabeça ferida”. As lesões
ocasionalmente ocorrem nas pernas, abdome e patas. Estas lesões são conse-
qüentes à dermatite alérgica em resposta às microfilárias alojadas nos capilares. As
lesões persistem, com períodos de cura incompleta ou intermitente, por , 3 anos,
Helmintos da Pele 978

seguidos por recuperação espontânea. A hiperplasia e a hiperceratose ocorrem na


epiderme da área parasitada.
Diagnóstico – O diagnóstico diferencial envolve cenurose (Taenia, ver pág. 730),
necrose cerebroespinhal (ver pág. 743) e enterotoxemia (ver pág. 392). A eleoforose
não deve ser considerada, a menos que os ovinos estejam em áreas endêmicas
durante o verão. O diagnóstico em cordeiros, cabritos ou animais de um ano de idade
e em filhotes de alce europeu geralmente é feito na necropsia. Numerosos trombos e
parasitas poderão ser encontrados nas artérias carotídeas comuns, maxilares inter-
nas, cerebrais e leptomeníngeas. O diagnóstico presuntivo em ovinos adultos é
baseado na anamnese e localização e tipo de lesão. A lesão de pele tem que ser
diferenciada de dermatose ulcerativa (ver pág. 1051). A confirmação é pela recuperação
de microfilárias da lesão ou recuperação post mortem de parasitas adultos. A biópsia
da lesão da pele é macerada em solução salina isotônica, e mantida em temperatura
ambiental ≥ 6h. A pele é então examinada à procura de microfilárias típicas.
Profilaxia e tratamento – Sais de piperazina são eficientes a 220mg/kg de peso
corporal, VO. A recuperação completa ocorrerá em 18 a 20 dias. Nenhum tratamen-
to é disponível para a forma cerebral da doença.

ONCOCERCÍASE
O status taxonômico das 3 espécies de Onchocerca atualmente reconhecidas e
de outras espécies reconhecidas anteriormente está sob discussão. A Onchocerca
cervicalis ocorre no ligamento da nuca e possivelmente em outros locais do
organismo dos eqüinos. Nos bovinos, a O. gutturosa localiza-se no ligamento da
nuca e a O. lienalis no ligamento gastroesplênico. Os adultos estão associados ao
tecido conjuntivo, são muito finos e variam em comprimento de 3 a 60cm. As
microfilárias são encontradas na derme e em raras ocasiões circulando no sangue
periférico. As microfilárias não apresentam bainha e possuem 200 a 250µm de
comprimento, com uma cauda curta e pontiaguda. Os hospedeiros intermediários
da O. cervicalis são as Culicoides spp. As Simulium spp servem como hospedeiro
intermediário para O. gutturosa e O. lienalis.
Achados clínicos – A Onchocerca cervicalis tem sido associada ao mal de
cernelha, mal da nuca, dermatite e uveíte em cavalos (ver também VERMES
OCULARES DE GRANDES E PEQUENOS ANIMAIS, pág. 365). Entretanto, devido à presença
comum de grande número destes parasitas em cavalos sem estas manifestações,
existe alguma discussão sobre o seu papel na patogenia destas afecções.
Os adultos, no ligamento da nuca, induzem reações inflamatórias que variam de
necrose edematosa aguda a alterações granulomatosas crônicas, resultando em
fibrose e mineralização acentuadas. Os nódulos mineralizados são mais comuns
em cavalos mais velhos. Embora as lesões ocorram nestas áreas, presumivelmente
associadas a parasitas mortos, atualmente aceita-se que o mal da cernelha e o mal
da nuca não estejam associados a infestações por O. cervicalis.
As microfilárias concentram-se na pele da linha média ventral. Um grande
número pode ser encontrado em cavalos sem dermatite, assim como em cavalos
com dermatite da face, pescoço, peito, cernelha, pernas anteriores e abdome. Estas
lesões quase sempre incluem áreas de escamas, crostas, ulceração, alopecia e
despigmentação, e podem ser pruriginosas. A dermatite pode estar associada a
uma reação imunológica à morte de microfilárias. Embora a patogenia destas lesões
não esteja suficientemente clara, o tratamento com drogas microfilaricidas melhora
dramaticamente estas condições. Reações alérgicas a picadas de pequenas
moscas podem produzir lesões semelhantes ou exacerbar dermatites associadas
a microfilárias. Conseqüentemente, o diagnóstico da dermatite associada ao
Onchocerca pode se basear na sensibilidade ao tratamento microfilaricida.
Helmintos da Pele 979

As microfilárias também se acumulam nos olhos dos cavalos, embora nem todos
concordem que haja uma associação clara entre a uveíte eqüina (ver pág. 363), ou
outras lesões oculares em cavalos, com as microfilárias.
Diagnóstico – O método mais eficiente é a biópsia de pele. A biópsia de pele
inteira com ≥ 6mm é preferível. O tecido é macerado em solução salina isotônica e
deixado por várias horas. As microfilárias concentram-se e coram-se com o novo
azul de metileno após a remoção dos pedaços de pele. As microfilárias podem ser
diferenciadas microscopicamente das Setaria spp, as quais ocorrem no sangue de
bovinos e eqüinos pela presença de uma bainha ao redor dos Setaria (ver também
SARNA DOCE EM CAVALOS, pág. 974).
Tratamento – Nenhum tratamento é eficaz contra os parasitas adultos. A
ivermectina (200µg/kg) é altamente eficaz (> 99%) contra os microfilárias e produz
acentuada melhora clínica nos cavalos com dermatite oncocercótica. Uma pequena
porção de cavalos infestados com O. cervicalis reage ao tratamento com um
marcado edema da linha média ventral 1 a 3 dias após o tratamento. Lesões
oculares também têm sido relatadas. Estas reações normalmente resolvem-se
espontaneamente, porém um tratamento sintomático pode ser necessário.

PARAFILARIOSE
Parafilaria bovicola
Trata-se de um parasita filarial de bovinos, que causa lesões subcutâneas que
lembram equimoses. Também tem sido relatado no búfalo indiano (Bubalus bubalis).
O verme é esbranquiçado; as fêmeas adultas têm 50 a 65mm de comprimento, e os
machos 30 a 35mm. Ocorrem na Ásia (Filipinas, Japão, antiga Rússia, Paquistão,
Índia), Europa (Bulgária, Romênia, França, Suécia) e África (Marrocos, Tunísia,
Ruanda, Burundi, África do Sul, Namíbia, Botsuana, Zimbábue). Um espécime foi
descoberto no Canadá em um touro importado da França, mas parece não ter se
estabelecido no continente americano, e não foi relatado na Austrália.
A parafilariose tem sido responsável por uma considerável perda econômica
para as indústrias de carne bovina da África do Sul e Suécia, apesar das suas
diferenças climáticas. A doença ocorre primariamente em bovinos nas savanas do
sul da África, porém na Suécia está emergindo como um problema em bovinos na
primavera após a volta ao pasto depois do confinamento do inverno.
Os únicos sintomas externos da infestação nos bovinos são hemorragias cutâneas
focais (“pontos de sangramento”), que podem exsudar algumas horas antes de
coagular e secar na pelagem emaranhada. Os pontos de sangramento são induzidos
pelo verme fêmea, o qual causa a formação de um pequeno nódulo, perfura a pele e
ovipõe no sangue gotejante de uma ferida central. Os pequeninos ovos contêm o
primeiro estágio larval (microfilárias) do parasita. Tanto no Hemisfério Norte quanto no
Sul, os pontos de sangramento são acentuadamente sazonais, sendo muito comuns
na primavera e nos primeiros meses de verão. A maioria dos pontos de sangramento
ocorre ao longo do dorso do animal, particularmente nos quartos anteriores.
Os hospedeiros invertebrados são as moscas da face do gênero Musca (subgênero
Eumusca), as quais ingerem os ovos quando se alimentam nos pontos de sangra-
mento. A Musca autumnalis foi identificada como hospedeiro na Suécia, a M. lusoria
e a M. xanthomelas na África do Sul, e a M. vitripennis na Ásia. O desenvolvimento
até o terceiro estágio de larva infectante requer 10 a 12 dias no corpo da mosca. A
transmissão ao gado provavelmente ocorre quando as moscas alimentam-se nas
feridas, nos pontos de sangramento de Parafilaria, ou nas secreções oculares.
Devido ao sangramento sazonal e à presença de nódulos cutâneos, infestações
severas por P. bovicola foram relatadas como reduzindo a produtividade de bois de
trabalho na Índia; entretanto, a maior importância do Parafilaria é nos países
Helmintos da Pele 980

produtores de carne e centraliza-se na patologia do tecido subcutâneo. As carcaças


de animais infestados evidenciam lesões irregulares, edematosas e amarelo-
esverdeadas, que lembram equimoses. São geralmente superficiais, mas ocasio-
nalmente existe envolvimento extenso dos músculos subjacentes. As lesões são
mais severas durante a primavera e o verão.
A remoção de lesões de carcaças afetadas conduz a uma considerável perda de
carne vendável. As carcaças manejadas ficam quase sempre seriamente desfigura-
das sendo, conseqüentemente, desvalorizadas. Em casos severos, a carcaça pode
ser totalmente condenada. As lesões são mais comuns e severas em touros do que
em novilhos, os quais por sua vez são menos severamente afetados que as fêmeas.
Os pontos de sangramento sazonais são, algumas vezes, confundidos com
feridas por espinhos, arame farpado, carrapatos ou insetos picadores. Para diferen-
ciação, tanto o sangue fresco como seco devem ser misturados em água em um
tubo-teste e centrifugados. Os ovos característicos são encontrados no exame
microscópico do sedimento.
As lesões da carcaça podem ser diferenciadas de equimoses pela presença de
numerosos eosinófilos em esfregaço corado por Giemsa, feito a partir das lesões.
Além disso, o tecido afetado tem um cheiro metálico característico e desagradável.
Geralmente, apenas uma pequena quantidade de vermes está presente nas
carcaças afetadas e devido à sua cor e à reação inflamatória que os acompanha,
eles são quase sempre difíceis de serem achados. Os tecidos afetados podem ser
incubados em solução salina morna para facilitar a recuperação de parasitas. Um
teste de ELISA para a detecção de anticorpos contra P. bovicola foi recentemente
desenvolvido.
A ivermectina (200µg/kg) ou nitroxinil (20mg/kg) dados por injeção subcutânea
são eficientes em reduzir o número e a área de superfície de lesões causadas por
Parafilaria. Para providenciar tempo suficiente para resolução das lesões, os
animais devem ser tratados por pelo menos 70 a 90 dias antes do abate. O intervalo
do tratamento para o abate não deve ser >120 dias, pois as formas larvais não
afetadas do parasita podem provocar lesões frescas quando maturarem.
Testes na Suécia mostraram que o uso de brincos impregnados com piretróide
resultou em um bom controle de moscas e reduziu as lesões parafilariais ao abate
em 75%. O emprego de brincos em todos os bovinos em uma área resultou no
controle total do parasita. O uso de banhos com piretróide sintético residualmente
ativo também se mostrou eficiente na redução da transmissão.
Pode ser possível analisar os animais importados com o teste de ELISA para
evitar a disseminação da doença em países atualmente não afetados, ou usar este
teste conjuntamente com inseticidas residuais e anti-helmínticos eficientes para
erradicar novos focos de infestação.
Parafilaria multipapillosa
A Parafilaria multipapillosa ocorre no tecido subcutâneo de cavalos em várias
partes do mundo; é especialmente comum nas estepes russas e leste da Europa.
É semelhante em tamanho, aparência, ciclo de vida e desenvolvimento à P. bovicola.
Acredita-se que o hematófago Haematobia spp seja o hospedeiro invertebrado.
Na primavera e no verão, o parasita forma nódulos na pele, sobretudo na cabeça
e quartos ântero-superiores. Estes nódulos sangram transitoriamente, porém quase
sempre profusamente (“sangramento de verão”) e então se curam; outros nódulos
hemorrágicos desenvolvem-se quando o parasita se move para um local diferente.
Ocasionalmente, os nódulos supuram. Os nódulos e o sangramento são repugnan-
tes e interferem no uso de arreios de cavalos de trabalho, porém geralmente levam
a poucas conseqüências. Os sinais clínicos são patognomônicos.
Nenhum tratamento satisfatório é disponível, mas o controle de moscas pode
ajudar a reduzir a incidência.
Helmintos da Pele 981

DERMATITE POR PELODERA


(Dermatite rabdítica)
É uma dermatose aguda, não sazonal e rara, que resulta da invasão da pele por
larvas do nematóideo saprofítico de vida livre, Pelodera (Rhabditis) strongyloides.
As larvas são comuns em matéria orgânica em decomposição e/ou perto da
superfície de solo úmido, porém são parasitários apenas ocasionalmente. A
exposição à larva ocorre por meio de contato direto com material infestado, por
exemplo, uma cama úmida e suja. As larvas podem não ser capazes de invadir uma
pele saudável, portanto uma dermatose preexistente ou condições ambientais que
favoreçam a maceração da pele, tais como exposição constante a camas úmidas ou
lodosas, podem facilitar a invasão. A dermatite por Pelodera foi relatada em cães,
vacas, cavalos, carneiros, cobaias e humanos.
Tipicamente, as lesões estão confinadas a áreas do corpo em contato com o
material infestado, tais como extremidades, abdome ventral, tórax e períneo. A pele
afetada é eritematosa e parcial a completamente alopécica, com pápulas, pústulas,
crostas, erosões ou ulcerações. O prurido geralmente é intenso, mas pode também
ser moderado ou mesmo ausente. Os diagnósticos diferenciais incluem demodicose,
sarna sarcóptica canina, dermatofitose, piodermia e outras raras infestações
cutâneas larvais, como dermatite parasitária, dirofilariose, dipetalonemíase e
estrongiloidíase.
O diagnóstico é confirmado facilmente por demonstração de larvas de P.
strongyloides vivas e móveis em raspados de pele de áreas afetadas. As larvas são
cilíndricas e têm , 600µm × 38µm. Um exame histológico de biópsia de pele revela
larvas nos folículos pilosos e derme superficial e, geralmente um infiltrado inflama-
tório dérmico. As larvas são facilmente cultivadas em placas de ágar sangue a 25°C.
O tratamento eficiente consiste primariamente na remoção e destruição de
camas infestadas e úmidas, e remoção do animal para um ambiente seco e limpo.
Geralmente, segue-se uma cura espontânea. Pode ser desejável dar um banho ou
administrar spray com uma preparação inseticida nos animais afetados pelo menos
duas vezes a intervalos semanais. O uso a curto prazo de corticosteróides pode ser
indicado se o prurido for severo.

ESTEFANOFILARIOSE
(Dermatite filarial dos bovinos)
A Stephanophilaria stilesi é um pequeno parasita filarial responsável por uma
dermatite circunscrita ao longo da linha média ventral de bovinos. O parasita foi
descrito por todo o território dos EUA, mas é mais comum nas regiões oeste e
sudoeste. Os vermes adultos têm 3 a 6mm de comprimento e geralmente são
encontrados na derme, justamente abaixo da camada epidérmica. As microfilárias
têm 50µm de comprimento e estão encerradas em uma membrana vitelina semi-
rígida e esférica. O hospedeiro intermediário da S. stilesi é a fêmea da mosca do
chifre Haematobia irritans (ver pág. 969). As moscas do chifre alimentam-se na
lesão ingerindo microfilárias que se desenvolvem até o terceiro estágio de larva
infectante em 2 a 3 semanas. As larvas infectantes são introduzidas na pele quando
as moscas do chifre se alimentam.
A dermatite desenvolve-se ao longo da linha média ventral, geralmente entre
o peito e o umbigo. Com a exposição repetida, a lesão espalha-se e quase sempre
envolve a pele posterior ao umbigo. Lesões ativas são cobertas com exsudato
seroso ou sanguinolento, enquanto lesões crônicas são lisas, secas e desprovi-
das de pêlos. Hiperceratose e paraceratose ocorrem na epiderme da área
parasitada.
Helmintos da Pele 982

Os raspados profundos de pele são macerados em solução salina isotônica e


examinados microscopicamente à procura de adultos ou microfilárias. As microfilá-
rias têm que ser diferenciadas das microfilárias de Onchocerca lienalis, O. gutturosa
e Setaria spp, as quais são muito maiores (200 a 250µm), e da Pelodera strongyloides
(ver anteriormente), um pequeno nematóideo de vida livre, que é ocasionalmente
responsável por uma dermatite úmida e superficial. O esôfago rabditiforme da
P. strongyloides não ocorre em nematóideos filariais.
Nenhum tratamento aprovado é disponível para S. stilesi, mas os organofosforados
aplicados topicamente (triclorfon 6 a 10%, diariamente ou alternadamente por 7
dias) provaram ser eficientes contra outras espécies de Stephanofilaria.

HIGROMA
É uma falsa bolsa que aparece sobre proeminências ósseas e pontos de pressão,
principalmente em cães de raças grandes. O trauma repetido devido ao cão deitar
em superfícies duras produz uma resposta inflamatória, que resulta em uma
cavidade de parede densa, preenchida por líquido. Um aumento de volume de
consistência flutuante, macio e indolor desenvolve-se sobre pontos de pressão,
principalmente o olecrânio. Se permanecer por muito tempo, uma inflamação severa
pode se desenvolver, e ulceração, infecção e fístulas podem estar presentes. A
bolsa contém um líquido claro, amarelo a vermelho.
Se diagnosticado precocemente e se ainda estiver pequeno, o higroma pode ser
controlado clinicamente, por meio de uma aspiração asséptica com agulha e
prevenção de traumas. Camas macias ou acolchoados sobre pontos de pressão são
fundamentais para impedir traumas futuros. Se o processo for crônico, indicam-se
a drenagem cirúrgica, nivelamento e colocação de drenos de Penrose. Em áreas
com ulceração severa podem ser necessárias a excisão completa e a cirurgia
reconstrutiva. O uso de corticosteróides dentro do higroma é altamente controverso.

“CISTOS” INTERDIGITAIS
Nódulos (não cistos verdadeiros) multiformes e inflamados envolvem o tecido
interdigital de cães. Histologicamente, eles representam áreas de furunculose. As
opiniões diferem quanto à sua etiologia. As causas mais prováveis são corpos
estranhos, por exemplo, pêlos encravados, barbas de espiga e grãos de areia
(reações granulomatosas); e infecções bacterianas, principalmente estafilocócicas
(reações supurativas). A hipersensibilidade ao contato ou alérgenos bacterianos
também pode ter um papel. Os ácaros Demodex quase sempre podem ser obtidos
na área interdigital e podem ser um fator etiológico. Os cistos são comuns em cães
confinados a áreas de chão batido. Parece que a irritação e o trauma constantes,
isolados ou em combinação com os agentes anteriores, são fatores significativos.
Em seu estágio inicial, a lesão interdigital se parece com uma pequena pápula,
porém mais tarde progride para um nódulo. O último geralmente tem 1 a 2cm de
diâmetro, é roxo-avermelhado, brilhante, flutuante e pode se romper quando
palpado e exsudar um material sanguinolento. Pode haver nódulos únicos ou
múltiplos em uma ou mais patas. Os nódulos causados por corpos estranhos são
geralmente solitários e quase sempre ocorrem em uma pata dianteira. Uma recaída
Sarna 983

não é comum nestes casos. Se causados por infecção bacteriana, pode haver vários
nódulos com novas lesões se desenvolvendo enquanto outras se curam. A dor pode
ou não ser aparente, mas é mais comum nos nódulos que estejam quase se
rompendo e que contenham corpos estranhos.
Os granulomas por corpo estranho podem responder à aplicação de calor úmido
por 15 a 20min, 3 a 4 vezes por dia, e remoção do objeto estranho. Uma a duas
semanas são exigidas para que a lesão se cure. Se os banhos quentes das patas
não forem eficazes, a excisão cirúrgica é a abordagem mais prática.
As lesões bacterianas são tratadas sistematicamente com antibióticos selecio-
nados de acordo com os resultados de cultura e sensibilidade. Altas doses e
tratamento prolongado por até 6 a 8 semanas podem ser exigidos. Pode ser
necessário que as lesões sejam incisadas cirurgicamente e debridadas. Curativos
com antibióticos podem então ser aplicados por vários dias, seguidos por embebeção
ou lavagem com soluções anti-sépticas, por exemplo, clorexidina. A terapia com
bacterinas estafilocócicas também foi utilizada com sucesso.
As lesões que ocorrem em cães confinados geralmente são recorrentes, a menos
que o cão seja removido do ambiente predisponente.

SARNA
É uma doença cutânea contagiosa, causada por uma das várias espécies de
ácaros, que podem ser transmitidas quando larvas, ninfas ou fêmeas fertilizadas
são transferidas para animais suscetíveis diretamente pelo contato com animais
doentes, ou indiretamente por fomito ou ambiente contaminado. Os animais infesta-
dos sofrem alopecia e prurido com intensa irritação e hipersensibilidade, o que pode
levar à debilitação e possivelmente à morte. O período de incubação é de 2 a 6
semanas, dependendo do número de ácaros transferidos, do local de transferência
e da suscetibilidade do hospedeiro. Os estágios de desenvolvimento incluem ovo,
larva (3 pares de patas), ninfa (1 ou 2 pares), e adulto (4 pares). Ninfas e adultos são
sexualmente dimórficos. Duas a 3 semanas podem ser exigidas para completar o
ciclo de vida, que ocorre inteiramente no hospedeiro. Embora sejam hospedei-
ros específicos, alguns ácaros de sarna são considerados raças biológicas e
não espécies distintas, e infestação – ao menos temporária – pode ocorrer em outras
espécies de hospedeiros, incluindo o homem em contato com hospedeiros infestados.

SARNA EM BOVINOS
(Sarna de cocheira)
A identificação do tipo de sarna presente e sua diferenciação das outras
dermatoses é obtida pela recuperação de ácaros em raspados de pele. Às vezes,
a sarna e as dermatofitoses ocorrem ao mesmo tempo em rebanhos ou indivíduos.
As lesões escabióticas (Sarcoptes scabiei var. bovis) aparecem primeiro na
cabeça e no pescoço e então se espalham para outras partes. Algumas vezes, as
lesões aparecem na região perineal e entre as coxas. A irritação e erupções de pele
são semelhantes às dos cavalos (ver adiante). São caracterizadas por uma
aparência crostosa e escamosa; a pele engrossa e forma grandes pregas. As lesões
podem se curar espontaneamente durante o verão, sobretudo quando os animais
são mantidos no pasto.
A escabiose comum ou a sarna psoróptica dos bovinos (Psoroptes ovis), é uma
doença notificável e quarentenável, e, quando suspeita, deve ser relatada imediata-
Sarna 984

mente aos escritórios oficiais. Os proprietários não devem tentar tratar o gado
infestado; isto deve ser feito pelos escritórios oficiais. A doença está presente no gado
de corte de pasto ou engorda dos estados centrais e ocidentais dos EUA, com o maior
número de surtos descrito no Texas, Novo México, Oklahoma, Kansas, Colorado e
Nebraska. Aparece primeiro na cernelha e logo difunde-se ao longo do pescoço e
dorso, cobre os ombros e o peito até o abdome e flancos. Grandes quantidades de
ácaros desenvolvem-se quando o próprio tratador está limitado, bem como em
bovinos presos em postes. Em casos severos, as lesões podem recobrir quase o
corpo inteiro. Mortes em bezerros e animais de um ano não tratados são comuns. O
curso é geralmente crônico, mas pode ser agudo em animais mais jovens, sobretudo
durante os meses de inverno; o prognóstico é favorável se o tratamento for aplicado.
Os bovinos infestados devem ser imersos, e não tratados com spray.
Quatro banhos de imersão são aprovados nos EUA: toxafeno, 0,5 a 0,6% (com
período de pausa exigido de 28 dias antes do abate); coumafos 0,3% (sem exigência
de período de pausa); fosmet 0,20 a 0,25% (com um período de pausa exigido de
21 dias antes do abate); e cal sufurada quente (2% de polissulfetos de cálcio
aquecidos a 35 a 40,5°C) sem exigência de período de pausa. Dependendo do
produto utilizado (as instruções do fabricante devem ser verificadas), o regulamento
prevê 2 banhos de imersão em animais infestados em intervalos de 7 a 14 dias.
Apenas a cal sufurada quente é registrada para o uso em vacas leiteiras em lactação
(um banho de imersão, sem período de pausa).
A ivermectina aplicada subcutaneamente, na dose de 200µg/kg de peso corpo-
ral, é aprovada para o controle de sarnas psoróptica e sarcóptica (exceto em gado
leiteiro em lactação). Embora um tratamento seja eficiente, o bovino tratado deve ser
isolado por 2 semanas dos bovinos desprotegidos.
A sarna corióptica (Chorioptes bovis ) é o tipo mais comum de sarna em bovinos
nos EUA. As áreas da quartela das pernas são os locais prediletos deste ácaro. Uma
grande parte do gado pode estar infestada sem exibir os sintomas clínicos. As lesões
começam normalmente nas pernas, por isso a doença é chamada de “sarna de
perna”. A base da cauda freqüentemente é afetada e, se não tratada, a afecção pode
se espalhar para outras partes do corpo. Os bovinos podem ser tratados com
crotoxifos aplicados como um spray a 0,25% em altas pressões até umedecer
completamente o animal, incluindo as pernas e as ancas. Banhos de imersão e
sprays que contenham 0,06% de lindane também são eficazes, onde o uso desta
droga for permitido. Os banhos de imersão permitidos para escabiose psoróptica
bovina são eficazes contra o Chorioptes. Os banhos com cal sufurada são eficientes
se o curso completo de 6 tratamentos for dado a intervalos de 7 a 10 dias. A
ivermectina aplicada topicamente na dose de 500µg/kg de peso corporal é efetiva
contra a sarna corióptica (não deve ser usada em vacas em lactação).
A sarna demodética (Demodex bovis) é transferida da vaca ao bezerro durante
o aleitamento e pode causar consideráveis danos ao couro. As lesões podem ser
aparentes no pescoço, peito, ombros e face de bovinos leiteiros jovens, mas são
raramente visíveis ou palpáveis no gado de corte. Em casos raros, as lesões podem
aparecer por toda a superfície do corpo. Aproximadamente 90% do couro que tenha
sido desprovido de pêlos antes de ser curtido contém manchas devidas a ácaros
demodéticos. Primeiro, pápulas e nódulos pequenos se desenvolvem; algumas
vezes, possuem uma cor avermelhada e um material branco e grosso, de consistên-
cia cerosa pode ser extraído deles. Este material contém numerosos ácaros. Em
casos raros, os nódulos são preenchidos com pus e podem coalescer, formando
abscessos cobertos com pequenas escamas. Em alguns casos, as lesões cutâneas
consistem de crostas grossas e a pele engrossa e forma pregas pesadas. O curso
de sarna demodética bovina geralmente é suave, mas pode se estender por muitos
meses. A recuperação é geralmente espontânea. Não há tratamento satisfatório.
Sarna 985

As infestações por ácaro de sarna (Psorergates bos ) têm sido relatadas nos
EUA e Canadá. Alopecia e descamação podem ocorrer, mas as lesões não são
crostosas. Os ácaros são minúsculos e difíceis de serem coletados. O acaricida de
escolha é a cal sufurada na forma de spray ou banhos de imersão aplicados duas
vezes, com 2 semanas de intervalo.

SARNA EM CÃES E GATOS


Acaríase cutânea – É uma doença de pele causada por ácaros parasitários; a
sarna sarcóptica é altamente contagiosa, a sarna demodética é muito menos.
A sarna sarcóptica canina (Sarcoptes scabiei var. canis) é encontrada em todo
o mundo. Os ovos são ovais, e o corpo do ácaro é praticamente circular com pernas
curtas. As ninfas e os adultos possuem 4 pares de patas, e as larvas possuem 3. No
adulto, o terceiro e o quarto pares não se estendem além da margem do corpo. A
vida inteira do parasita é gasta no hospedeiro e o ciclo exige 17 a 21 dias para se
completar. Os ovos são postos em túneis formados pela fêmea escavando a pele.
O ácaro da sarna sarcóptica felina, Notoedres cati , é menor e mais circular que
o ácaro que ataca os cães.
A sarna demodética canina (Demodex canis ) tipicamente infesta os folículos
pilosos e, algumas vezes, as glândulas sudoríparas apócrinas e sebáceas; cães
saudáveis podem albergar o ácaro. Os estágios de desenvolvimento são ovo, larva,
protoninfa, ninfa e adulto. O ciclo de vida exige 20 a 35 dias para se completar. Os
ovos são fusiformes e os ácaros vermiformes. O abdome alongado é marcado com
estriações transversais. A Demodex cati é ocasionalmente encontrada em gatos
nos quais pode causar lesões semelhantes às dos cães.
A sarna sarcóptica é facilmente transmitida por contato direto. Lesões visíveis
podem aparecer em 2 a 8 semanas, dependendo do número de ácaros transmitidos,
local de infestação e suscetibilidade do hospedeiro.
A sarna demodética é transmitida quando os ácaros que vagam na pele são
transferidos de um hospedeiro infestado para um suscetível. A exposição inicial
geralmente ocorre durante os primeiros dias de vida, quando os filhotes mamam em
um cadela infestada. Jovens cães suscetíveis podem também contrair sarna por
contato íntimo com outros cães severamente infestados. Os ácaros demodéticos
perdem sua capacidade de invadir folículos pilosos quando fora do hospedeiro
apenas por um breve período.
O ácaro sarcóptico causa intenso prurido e o animal responde com vigoroso
coçar, morder e esfregar, o qual leva à inflamação e a infecção secundárias. As
regiões preferidas pelos ácaros são a cabeça (ao redor dos olhos, orelhas e focinho),
tórax ventral e raiz da cauda. A pele torna-se seca, espessada e enrugada. As
crostas são formadas nas áreas envolvidas. Nos animais não tratados, emaciação,
debilidade e mesmo morte podem ocorrer. Outros animais podem albergar ácaros
por longos períodos com apenas envolvimento localizado. Nos gatos, a sarna
geralmente começa nas extremidades das orelhas, espalha-se pela face e depois
pela cabeça inteira. Também pode se estender até envolver o resto do corpo e
pernas.
O animal com sarna demodética pode ter uma variedade de lesões, de pequenas
manchas de alopecia ao redor dos olhos ou pelo corpo até extensas lesões
purulentas ou sanguinolentas, que cobrem completamente o corpo. Na forma
localizada, as lesões ocorrem como pequenas áreas isoladas de alopecia na face
ou patas dianteiras ou ambas. A afecção localizada é suave, normalmente não
desenvolve piodermia secundária e não é considerada uma desordem séria. No tipo
pustular (generalizado), a pele torna-se extremamente avermelhada, com exsuda-
ção de sangue e soro das áreas afetadas, junto com material purulento resultante
Sarna 986

de invasão bacteriana (geralmente Staphylococcus aureus, e ocasionalmente,


Pseudomonas spp).
A patogenicidade da sarna sarcóptica depende das interações de parasita e
hospedeiro, complicadas por infecções secundárias. A escavação pelos ácaros na
epiderme causa danos mecânicos e irritação, produzida por secreções salivares. Os
hospedeiros afetados desenvolvem, tipicamente, hipersensibilidade a alérgenos
associados com os ácaros e suas excreções e secreções, e há um prurido intenso
concomitante.
Os ácaros demodéticos alimentam-se primariamente nas células do folículo
piloso, células ao redor e, em menor quantidade, na secreção sebácea. Na sarna
demodética localizada, o dano é restrito a isolado, as áreas não pruriginosas são
acompanhadas por eritema e escamas e não há componente imune. As condições
que favorecem a proliferação de ácaros e o desenvolvimento de sarna generalizada
não são completamente conhecidas. Nos cães com demodecose generalizada, a
blastogênese de linfócitos é severamente deprimida por um fator supressivo no soro,
mas a supressão ocorre apenas em casos complicados por infecção bacteriana.
Raspados de pele de vários locais diferentes podem ser necessários para se
encontrar ácaros e confirmar o diagnóstico de sarna sarcóptica. As regiões com
pápulas eritematosas e crostas devem ser raspadas vigorosamente para se retirar
os ácaros sarcópticos de suas galerias. Os ácaros demodéticos podem ser extraí-
dos ao se espremer os folículos pilosos e coletados ao raspar-se com uma lâmina
de escalpelo as áreas imediatamente adjacentes aos locais com alopecia, eritema,
crostas ou foliculite. O leve revestimento de lâmina de escalpelo com óleo mineral
facilita a coleta de restos de pele e ácaros sobre a lâmina. Os ácaros são transferidos
da lâmina para uma gota de óleo mineral em uma lâmina de microscópio para exame
sob baixa potência (40×). O exame é facilitado pela clarificação da amostra com
NaOH ou KOH a 10%. Mesmo se os ácaros não forem demonstráveis em raspados
de pele, quando sinais típicos estiverem presentes, deve-se considerar a terapia de
escolha com um acaricida aprovado.
O animal afetado deve ser preparado com corte de pêlos e lavagem da pele com
um xampu ceratolítico e anti-seborréico, antes do tratamento com um acaricida
aprovado. Dois ou mais tratamentos durante várias semanas podem ser necessá-
rios para uma cura completa (ver PARASITICIDAS EXTERNOS, PQ AN, pág. 1816).
Vários acaricidas são tóxicos para gatos. Banhos com cal ou enxofre, ou
compostos de rotenona podem ser usados com sucesso; bons resultados podem
ser obtidos com a aplicação de uma pomada de enxofre nas áreas afetadas.
A sarna demodética canina, particularmente a forma generalizada, pode ser
persistente e, freqüentemente, responde mal ao tratamento. A forma escamosa ou
localizada quase sempre se cura espontaneamente em 4 a 8 semanas, mas , 10%
dos casos de sarna localizada desenvolvem-se de forma generalizada. O ronel em
uma mistura de propilenoglicol e amitraz são os 2 acaricidas mais eficientes para o
tratamento de sarna demodética. A solução de ronel deve ser aplicada diariamente,
em uma base rotatória, em não mais que um terço do corpo. Recomenda-se a
aplicação tópica de amitraz a cada 2 semanas, conduzida por completo umedecimento
do paciente, e deve-se continuar até que ácaros vivos não sejam mais recuperados
após 2 aplicações seguidas. Em casos de infecção secundária, devem-se adminis-
trar antibióticos, já que podem ocorrer mortes devidas à septicemia e a abscessos.
Acaríase nasal (ácaros nasais) – Trata-se de uma infestação da cavidade
nasal e seios paranasais de cães pelo ácaro Pneumonyssus (Pneumonyssoides)
caninum, geralmente sem ou com sintomas apenas moderados. O ácaro adulto
tem um corpo amarelo-pálido. A fêmea grávida contém um embrião totalmente
desenvolvido, que preenche quase todo o abdome. O método de transmissão do
parasita é desconhecido.
Sarna 987

Exceto pelo acúmulo de muco e hiperemia suave das membranas mucosas,


nenhum sinal clínico ou lesão é atribuído à infestação. Uma rinite severa pode,
ocasionalmente, ocorrer. A maioria das infestações são encontradas na necropsia.
Foram relatados alguns casos nos quais o ácaro foi encontrado no nariz de cães que
dormiam. O tratamento não tem sido tentado.
Otoacaríase (sarna otodéctica, sarna de orelha, otite externa parasitária) –
Trata-se de uma infestação das orelhas com ácaros parasitários (ver OTITE EXTERNA,
pág. 372).
Infestações por Cheyletiella – Infestações por ácaros de Cheyletiella blakei em
gatos, e C. yasguri em cães têm sido descritas estendendo-se a pessoas que estão
intimamente relacionadas com animais infestados. Uma das espécies relatadas, C.
parasitivorax (ácaro da pele), ocorre em coelhos e talvez em outros animais. A
maioria das infestações humanas ocorre quando se permite que gatos infestados
durmam nas camas. A doença é altamente contagiosa. As Cheyletiella spp habitam
a pelagem e a superfície da pele de animais, mas também podem viver livres na
natureza. Elas são grandes (388 × 266µm) e facilmente identificadas ao microscópio
pelas grandes garras palpais, numerosas cerdas emplumadas e cones nos tarsos.
Duas formas clínicas, esfoliativa e crostosa, têm sido reconhecidas no cão. Na
primeira, um processo de descamação (mimetizando caspa) ocorre primariamente
no dorso do tronco e é mais evidente na pele, com poucas escamas na pelagem.
Alopecia e alterações inflamatórias estão geralmente presentes apenas como
conseqüência do ato de se coçar. O grau de prurido varia de moderado a intenso.
Na forma crostosa, crostas alopécicas, circulares, discretas e múltiplas (2 a 5cm de
diâmetro) são observadas no dorso e laterais do tronco. As lesões podem-se
expandir ou aumentar e parecer semelhantes à tinha; entretanto, nenhum limite
inflamatório é evidente na pele e nenhum dermatófito pode ser demonstrado. A
lesão também lembra a forma crostosa da seborréia que ocorre tão comumente em
cocker spaniels. A forma crostosa da doença é mais comum nos gatos. As lesões
lembram fortemente uma tinha, mas a maioria ocorre no pescoço e no tronco.
O diagnóstico depende da identificação dos ácaros em raspados de pele.
Raspados profundos não são necessários. O material removido para exame deve
ser colocado em hidróxido de potássio a 10% e observado sob aumento de 25 ×.
Devido ao hábito dos gatos de se limparem regularmente, a infestação pode ser
diagnosticada freqüentemente pelo isolamento de ácaros ou ovos em exames de
fezes rotineiros. (Este hábito de higiene dos gatos deve ser levado em conta na
escolha do ectoparasiticida para gatos.)
O tratamento de sucesso (ver também pág. 1816) pode ser alcançado com lavados
ou pó de derris (planta que possui retenona), ou aplicação tópica de uma variedade
de inseticidas incluindo lindane a 0,02%, compostos organofosforados, solução de
benzoato de benzila-lindane, ou xampu de tetrationato de potássio com lindane. As
aplicações tópicas devem ser repetidas até que a cura clínica seja alcançada e nem
o ácaro nem seus ovos possam ser demonstrados por exame microscópico.

SARNA EM CAVALOS
A sarna sarcóptica (Sarcoptes scabiei var. equi) é o tipo mais severo de sarna.
As lesões iniciais aparecem na cabeça, pescoço e ombros. As regiões protegidas
por pêlos longos e as partes mais baixas das extremidades geralmente não são
envolvidas. O primeiro sinal é um intenso prurido. Pequenas pápulas e vesículas
desenvolvem-se em uma dermatite aguda; a escamação aumenta rapidamente,
seguida pela formação de crostas. As manchas sem pêlos e com crostas aumentam
e a pele engrossa, formando pregas, principalmente na região do pescoço. Em
casos avançados, as lesões podem-se estender por todo o corpo, levando a
Sarna 988

emaciação, fraqueza geral e anorexia. O curso é sempre crônico e o prognóstico é


o mais desfavorável entre todos os tipos de sarna em cavalos, particularmente
quando as infestações são severas e os animais estão em más condições.
Para tratamento, as preparações acaricidas são aplicadas por spray, esfrega-
mentos ou banhos de imersão. Para grupos de animais, o banho de imersão é o
método mais conveniente e eficiente. A cal sufurada pode ser usada se o banho for
aquecido e os animais forem imersos 4 a 6 vezes em intervalos de 10 a 12 dias. O
banho de toxafeno a 0,5% geralmente fornece controle com uma única aplicação. O
lindane na concentração de 0,06% pode ser usado como um spray ou banho, onde
o seu uso for permitido.
A sarna psoróptica (causada pela Psoroptes ovis [equi]) é uma doença notificável
e quarentenável nos países onde é encontrada. Produz lesões em partes abrigadas
do corpo, tais como abaixo do topete e da crina, na base da cauda, abaixo do queixo,
entre as pernas traseiras e nas axilas. Os ácaros, algumas vezes, são encontrados
nas orelhas e podem ser a causa da inquietação. As lesões são semelhantes ao tipo
sarcóptico, porém as crostas são maiores e mais grossas, a pele é menos pregueada
e o prurido é menos severo. O curso é crônico e o prognóstico favorável. O tratamento
corresponde ao adotado para o tipo sarcóptico (ver anteriormente) ou aos banhos
de imersão utilizados na sarna psoróptica de bovinos (ver anteriormente).
A sarna corióptica (Chorioptes bovis) também é conhecida como “sarna das
pernas”. As lesões cutâneas são encontradas principalmente nas partes inferiores
das pernas traseiras. Em casos severos, as lesões de pele podem-se espalhar aos
flancos, ombros e pescoço. A doença é caracterizada por prurido intenso, escamas,
crostas, engrossamento da pele e, em casos negligenciados, uma dermatite úmida
na região do boleto. Os sintomas diminuem no verão, mas ocorre uma recaída com
o retorno do clima frio. O curso geralmente é crônico e o prognóstico favorável. Os
tratamentos recomendados para outros ácaros de sarna também são eficazes
contra a sarna corióptica.
A sarna demodética (Demodex equi) é raramente diagnosticada nos cavalos.
Os ácaros vivem nos folículos pilosos e nas glândulas sebáceas e produzem
pápulas e úlceras, sobretudo ao redor dos olhos e na testa. A seguir, as lesões se
difundem aos ombros e, finalmente, pelo corpo inteiro. A pele afetada fica recoberta
de escamas. Não há prurido. Também não há tratamento satisfatório.

SARNA E ESCABIOSE EM O VINOS E CAPRINOS


Nos ovinos, estas doenças são causadas por Sarcoptes scabiei var. ovis, Chorioptes
bovis, Psoroptes ovis, P. cuniculi, Demodex sp, e Psorergates (Psorobia) ovis.
A sarna sarcóptica no ovino ocorre somente em pele sem lã, começando, via
de regra, na cabeça e na face; é rara. A sarna corióptica é o tipo mais freqüente
no ovino. É muito mais freqüentemente encontrada nas pernas traseiras e entre os
dedos da pata ou no escroto de carneiros. É comumente chamada de “sarna das
pernas” ou “das patas”. A escabiose psoróptica (escabiose dos ovinos) é uma
doença notificável e os rebanhos afetados estão sujeitos a quarentena e banhos de
imersão. Nenhuma escabiose psoróptica de ovinos foi descrita nos EUA deste 1970.
Os países onde a escabiose dos ovinos é ainda um problema incluem Reino Unido,
Eire, França, Alemanha, Líbano, Israel, Egito, África do Sul, Quênia, Argentina,
Brasil e México. Ocorre quase que exclusivamente nas partes lanosas do corpo,
onde produz lesões grandes, escamosas e crostosas. Mordeduras e o ato de coçar
com as patas, causados por intenso prurido, são geralmente os primeiros sinais.
Quando grandes áreas da pele estão envolvidas, os animais tornam-se gradual-
mente emaciados e sofrem de anemia e hidremia caquética. Os ácaros psorópticos
são algumas vezes encontrados nas orelhas dos ovinos.
Sarna 989

Ivermectina injetável é eficaz contra sarna psoróptica em ovinos, embora sejam


necessárias 2 aplicações com um intervalo de 7 dias para eliminar os ácaros; uma
aplicação é efetiva contra Sarcoptes e Psorergates. Um único banho de imersão
com toxafeno 0,5 a 0,6% elimina todos os ácaros que acometem os ovinos, exceto
a Psorergates ovis. Outros banhos de imersão aprovados para uso contra a
Psoroptes, a saber, coumafos (0,3%) e fosmet (0,2 a 0,25%), controlam os ácaros
coriópticos, mas sua eficácia contra Sarcoptes não foi testada. No Reino Unido, um
único banho de imersão aprovado corretamente durante 1min com diazinon,
propetanfos ou flumetrina é totalmente efetivo; diazinon e fenvalerato também são
usados na África do Sul.
A sarna psoróptica (P. cuniculi) de caprinos geralmente infesta as orelhas, mas
algumas vezes espalha-se para a cabeça, pescoço e corpo, e causa grave irritação.
Ela ocorre particularmente nos caprinos angorás nos quais a lã fica consideravel-
mente danificada. É uma doença notificável de caprinos angorás no Texas. O curso
é crônico, porém o prognóstico é bom. Qualquer um dos acaricidas aprovados para
uso como banhos de imersão em ovinos elimina a sarna auricular dos caprinos. Os
caprinos leiteiros em lactação devem ser tratados apenas com solução de cal
sufurada. A Psoroptes cuniculi também infesta as orelhas e algumas vezes o corpo
de coelhos domésticos.
A sarna demodética foi descrita em ovinos e caprinos, nos quais causa lesões
de pele semelhantes às dos outros grandes animais. Nos caprinos, é semelhante ao
que foi descrito para bovinos leiteiros. As lesões são encontradas na pele do
pescoço, ombros, tórax e flancos. Os nódulos, que variam em tamanho de uma
cabeça de alfinete a uma avelã, contêm um material acinzentado, grosso, de
consistência cerosa, que pode ser facilmente extraído. Numerosos ácaros
demodéticos são encontrados neste material. Os nódulos da sarna demodética nos
caprinos se assemelham a cistos, com uma inflamação discreta no tecido circundan-
te. Em alguns países, esta infestação nos caprinos pode ser uma condição
persistente, causando grande dano ao couro. Não há tratamento satisfatório. Em
caprinos de valor, a incisão dos nódulos e tratamento com tintura de iodo fornecem
os melhores resultados terapêuticos.
Infestação por “ácaro de coceira” – Trata-se de uma infestação de ovinos
causada pela Psorergates ovis, na qual o prurido induzido pelo ácaro faz com que
o hospedeiro se morda e esfregue as áreas afetadas, danificando o velo. A doença
tem sido descrita na Austrália, Nova Zelândia, África do Sul, EUA, Argentina e Chile,
porém não é considerada de importância econômica fundamental. O ciclo de vida
(ovo, larva, 3 estágios de ninfas, e adultos) é completado em 4 a 5 semanas. O
desenvolvimento de todos os estágios ocorre na epiderme, onde acredita-se que os
ácaros se alimentem de fluidos celulares.
Os primeiros sinais quase sempre ocorrem , 2 a 3 anos depois que os banhos
de imersão com arsenicais são abandonados em favor de inseticidas mais novos.
A incidência aumenta lentamente no rebanho até que, depois de 3 ou 4 anos, 10%
dos ovinos mais velhos podem estar ativamente se mordendo ou se esfregando. Um
velo danificado, alopecia, crostas, ou uma dermatite crônica que resulta principal-
mente de trauma auto-infligido (na ausência de Psoroptes, piolhos, “carrapatos” de
ovinos, dermatofilose, podridão de velo ou sementes de grama) são sinais suges-
tivos de infestação por ácaro de coceira. A cernelha e as laterais do tronco são locais
comuns de envolvimento. A demonstração dos ácaros em raspados de pele (vários
raspados de pele podem ser necessários) é exigida para confirmação.
O banho de imersão em cal sufurada a 1% ou arsênico a 0,2% é considerado um
tratamento satisfatório. Isto não precisa ser feito anualmente, mas apenas quando
a incidência no rebanho o justificar. Em alguns países, a ivermectina é aprovada
para controle desta infestação em ovinos.
Sarna 990

SARNA EM SUÍNOS
A sarna sarcóptica (Sarcoptes scabiei var. suis) é a única forma de alguma
importância nos suínos. As lesões geralmente começam na cabeça, especialmente
nas orelhas e então difundem-se pelo corpo, cauda e pernas. O prurido é geralmente
intenso e associado ao desenvolvimento de uma reação de hipersensibilidade aos
ácaros. Quando a hipersensibilidade diminui, geralmente após vários meses, a pele
seca, áspera e espessada está coberta por crostas acinzentadas formando grandes
dobras. Raspados de pele profundos devem ser examinados já que os suínos
também são acometidos por outros tipos de doença de pele, incluindo dermatofitose.
O prurido é freqüentemente melhor indicador de infestação que o isolamento do
ácaro, principalmente em porcas e leitões lactentes. A administração de spray com
lindane na concentração de 0,05 a 0,1% ou malation a 0,05% é eficiente; solução de
clordane a 0,25% também tem sido usada. (O uso de alguns ou todos estes produtos
em animais de produção para consumo é proibido em alguns países.) A ivermectina,
na dose de 300µg/kg de peso corporal, s.c., também é eficiente.
A sarna demodética também ocorre nos suínos, causando lesões de pele
semelhantes às observadas em outros grandes animais. Não há tratamento confiável.

PARACERATOSE
É uma deficiência nutricional que acomete leitões de 6 a 16 semanas de idade,
e caracteriza-se por lesões das camadas superficiais da epiderme. É um distúrbio
metabólico resultante de uma deficiência relativa de zinco (ver também pág. 1521)
e de um excesso de cálcio na dieta.
Os sintomas estão restritos à pele, embora nos casos severos se possam observar
letargia e anorexia brandas e uma diminuição na taxa de crescimento. Se houver
prurido, este é discreto. As lesões externas estão distribuídas simetricamente em
áreas com ceratinização excessiva e anormal da epiderme com a formação de crostas
córneas e fissuras. Pontos ou pápulas marrons são vistos primeiramente nas áreas
ventrolaterais do abdome, parte interna das coxas e na quartela, boleto, jarrete e
cauda, unindo-se para envolver áreas maiores até o corpo inteiro estar recoberto. A
lesão é córnea e seca e em geral é facilmente removida. Ocasionalmente, ocorre
infecção secundária das lesões e as fissuras tornam-se repletas com um exsudato
escuro e mucoso e detritos, que podem lembrar uma epidermite exsudativa (ver pág.
961); no entanto, está última ocorre em leitões mais jovens.
Resultados altamente satisfatórios podem ser obtidos pelo ajuste na ingestão de
cálcio e zinco. O nível de cálcio na dieta dos suínos em crescimento deve ser mantido
entre 0,65 e 0,75% e uma suplementação de 50ppm de zinco (equivalente à adição
de 200mg/kg de sulfato ou carbonato de zinco por tonelada). A correção da
deficiência leva a uma rápida recuperação.

PEDICULOSE
(Infestação por piolhos)

Varias espécies de piolho picadores (ordem Mallophaga) e piolhos sugadores


(ordem Anoplura [Siphunculata]) infestam os animais domésticos. Os piolhos
Pediculose 991

sugadores ocorrem apenas nos mamíferos, mas os piolhos picadores são encon-
trados tanto nos mamíferos quanto nas aves (ver ECTOPARASITISMO NAS AVES
DOMÉSTICAS, pág. 1621).
Etiologia – Os piolhos dos animais domésticos demonstram um alto grau de
especificidade de hospedeiro. Os bovinos são comumente infestados pelo piolho
picador bovino, Damalinia (Bovicola) bovis, e por 3 espécies de Anoplura; o piolho
bovino de nariz curto, Haematopinus eurysternus ; o piolho bovino de nariz longo,
Linognathus vituli; e o piolho bovino azul pequeno, Solenopotes capillatus. Nos
trópicos, o piolho da ponta da cauda, H. quadripertusus, não é incomum (Flórida e
Costa do Golfo nos EUA). O pilho do búfalo indiano doméstico, H. tuberculatus, pode
infestar temporariamente os bovinos.
Os cavalos podem albergar 2 espécies de piolho, o piolho picador eqüino,
Damalinia (Bovicola) equi e o piolho sugador eqüino, Haematopinus asini. Os
suínos são comumente infestados com o piolho suíno, Haematopinus suis, o qual
é muito grande (, 5 a 6mm).
Os ovinos podem-se tornar infestados com o piolho picador ovino, Damalinia
(Bovicola) ovis, e 3 espécies de piolho sugador: o piolho das patas dos ovinos,
Linognathus pedalis; o piolho do corpo, L. ovillus; e o piolho ovino africano, L.
africanus. Os caprinos albergam várias espécies de piolhos, sendo os mais comuns
o piolho picador caprino, Damalinia (Bovicola) caprae e o piolho sugador caprino,
Linognathus stenopsis. Dois outros Mallophaga, D. limbata e D. crassipes, também
são freqüentemente encontrados.
Cães podem ser infestados com Linognathus setosus (Anoplura), Trichodectes
canis e ocasionalmente Heterodoxus spiniger . A Felicola subrostrata (Mallophaga)
parasita gatos.
Os piolhos são insetos achatados, ápteros, com geralmente 1 a 2mm de
comprimento. Suas pernas são adaptadas para agarrar-se em cabelos e penas. Os
Anoplura são sugadores de sangue. Os estiletes bucais são retraídos dentro da
cabeça quando não estão em uso. Os Mallophaga têm mandíbulas ventrais
mastigadoras e vivem em produtos epidérmicos; algumas espécies alimentam-se
de sangue e exsudatos, quando disponíveis.
Os ovos dos piolhos ficam colados aos pêlos, e são pálidos, translúcidos e
subovais. As ninfas dos piolhos (3 estágios) são menores que os adultos, mas por
outro lado assemelham-se com eles em hábitos e aparência. Aproximadamente 3
a 4 semanas são necessárias para completar uma geração, mas isso varia com a
espécie.
Achados clínicos e diagnóstico – A pediculose é manifestada por prurido e
irritação dérmica com os conseqüentes coçar, esfregar e mordiscar das áreas
infestadas. Uma aparência descuidada generalizada, pelame áspero e produção
diminuída em animais de fazenda são comuns. Em infestações severas, pode haver
perda de pêlo e escarificação local. A infestação extrema por piolhos sugadores
pode causar anemia. Nos ovinos e caprinos, o esfregar e o coçar quase sempre
resultam em fibras quebradas, as quais dão ao velo uma aparência “esgarçada”.
Nos cães, o pelame torna-se áspero e seco e, se os piolhos forem numerosos, o pêlo
pode ficar emaranhado. Os piolhos sugadores causam pequenos ferimentos que
podem-se tornar infectados. O constante vagar na superfície da pele e tanto a
perfuração quanto a mordedura da mesma causam nervosismo nos hospedeiros.
O diagnóstico deve ser baseado na presença de piolhos. O pêlo deve ser
separado e devem-se examinar a pele e a porção proximal do pelame sob luz forte.
O pêlo de grandes animais deve ser separado na face, pescoço, orelhas, linha
dorsal, barbela, ancas, base e ponta da cauda. Cabeça, pernas, pés e escroto não
devem ser esquecidos, particularmente nos ovinos. Em pequenos animais, os ovos
(lêndeas) presos são facilmente vistos. Ocasionalmente, quando o pêlo está
Pediculose 992

emaranhado, os piolhos podem ser vistos quando o volume for separado. Os piolhos
picadores são ativos e podem ser vistos movendo-se entre os pêlos, enquanto os
piolhos sugadores geralmente se movem muito lentamente e são quase sempre
encontrados com as peças bucais imersas na pele.
A pediculose nos animais de produção é mais prevalente durante o inverno; a
severidade é acentuadamente reduzida com a aproximação do verão. Infestações,
principalmente de piolhos sugadores, podem-se tornar severas. Em rebanhos
leiteiros, novilhas, vacas secas e touros podem escapar de um diagnóstico precoce
e sofrer mais severamente. Bezerros jovens podem morrer. O tratamento efetivo
resulta em rápida melhora.
A transmissão geralmente ocorre por contato com o hospedeiro. Os piolhos
caídos ou arrancados do hospedeiro morrem em poucos dias, mas os ovos livres
podem continuar a eclodir por um período de 2 a 3 semanas em clima quente.
Portanto, as propriedades recentemente desocupadas por animais infestados
devem ser desinfetadas antes de serem usadas por um plantel novo.
Tratamento – O controle de piolhos geralmente exige a aplicação de inseticidas
eficientes (ver também PARASITICIDAS EXTERNOS, pág. 1811), mas os produtos
disponíveis são grandemente influenciados pela legislação local. Em muitas partes
do mundo, inseticidas organoclorados não estão disponíveis para o uso em
rebanhos, e nos EUA alguns inseticidas são aprovados apenas em certos estados.
Quando os animais de produção são banhados ou tratados com spray é impor-
tante seguir com cuidado as instruções do fabricante, particularmente em ovinos,
cujo velo age peneirando e retendo gotículas de emulsões e partículas da suspensão.
Estas práticas estão sendo atualmente substituídas por preparações “pour-on” e
spray de baixo volume para a aplicação de inseticidas piretróides.
As tolerâncias nulas ou muito baixas aos pesticidas no leite limitam o número de
inseticidas que podem ser usados em vacas e cabras leiteiras. Compostos efetivos
incluem o crotoxifos mais diclorvos, e permetrina. Adicionalmente, o gado leiteiro
pode ser tratado com coumafos, fenvalerato e estirofos. Cabras que não estejam em
lactação podem ser tratadas também com coumafos, dioxation ou fenvalerato.
Bovinos, ovinos e suínos de corte podem ser tratados com coumafos a 0,06%,
dioxation a 0,15%, malation a 0,5%, metoxiclor, fenvalerato, permetrina, crotoxifos,
crotoxifos mais diclorvos ou ivermectina (para piolhos sugadores). Fosmet, estirofos,
estirofos mais diclorvos, lindane e amitraz podem ser usados em bovinos de corte;
spray de diazinon a 0,03% é efetivo contra piolhos em ovinos. Embora a rotenona
não deva ser usada em suínos, é segura para uso em outros animais quando as
normas correntes permitem.
O banho de imersão ou o tratamento completo com spray proporcionam uma
excelente cobertura, e geralmente 2 tratamentos com 2 semanas de intervalo
controlam efetivamente os piolhos. Um tratamento eficiente com spray requer
embebição do pêlo à pele; 12L podem ser necessários para tratar animais de grande
porte e de pêlo longo. O banho de imersão promove consistentemente a maior
cobertura, mas o número de formulações que podem ser aplicadas por este método
é limitado.
Outros métodos além do banho de imersão ou spray, por exemplo, o “pour-on”,
podem ser desejáveis do ponto de vista da redução do estresse do animal ou
também dos indivíduos que fazem a aplicação. Vários inseticidas sistêmicos
aprovados para o controle de bernes bovinos promovem um bom controle de
piolhos; entretanto devem-se tomar precauções para evitar reações hospedeiro-
parasita (ver HIPODERMOSE–BERNE, pág. 944). As formulações “pour-on” de fention
controlam as infestações de piolho em gado leiteiro não lactante, gado de corte e
suínos. O clorpirifos aplicado em um único ponto nas costas do animal provê um
controle de piolhos de longa duração em gado de corte, gado leiteiro não lactante
Fotossensibilização 993

e ovinos. A permetrina a 1% “pour-on” se encontra atualmente disponível para o


controle de piolhos no gado de corte e leiteiro. Os bovinos que podem ser contidos,
por exemplo, gado leiteiro em troncos, podem ser tratados com um volume baixo de
nebulização de crotoxifos a 1% mais diclorvos a 0,25%.
Os piolhos em gado de corte podem ser controlados pelo uso no inverno da
manobra de se esfregar as costas dos animais com inseticidas ou “sacos de pó”
(coumafos, crotoxifos, dioxation, malation, fosmet e estirofos) semelhantes aos
usados contra moscas no verão. A eficiência depende do uso freqüente em todos
os bovinos do rebanho. O crotoxifos, diclorvos, coumafos ou estirofos a 3% podem
ser usados em gado leiteiro. As populações de piolhos podem também ser reduzidas
por pulverização manual com malation a 5%, metoxiclor a 10% ou fosmet a 1% no
gado de corte; ou rotenona a 1%, estirofos a 3%, ou coumafos a 1% em gado leiteiro
ou de corte.
A ivermectina injetável é altamente eficiente contra piolhos sugadores (um pouco
menos contra piolhos picadores) em bovinos, ovinos e suínos, mas não deve ser
usada em vacas em lactação quando o leite for usado para consumo humano. Doses
suficientemente altas para serem eficazes contra piolhos não são recomendadas
em cães.
Os cães podem ser tratados com banhos de imersão, lavados, sprays ou pós.
Compostos efetivos incluem permetrina, piretrinas, dioxation, rotenona, metoxiclor,
lindane, diazinon, malation ou coumafos. Em gatos, somente carbaril, rotenona ou
piretrinas devem ser usados.
Piolhos em suínos podem ser controlados com banhos de imersão e sprays de
amitraz, lindane a 0,03%, dioxation a 0,15%, metoxiclor a 0,5% e sprays de malation
a 0,5%, coumafos a 0,06%, crotoxifos mais diclorvos, crotoxifos, ronel e estirofos a
0,5%. Formulações em pó de estirofos a 3%, coumafos a 1% ou fosmet a 1%
também são efetivas. Formulações em pó de estirofos a 3% e coumafos a 1% podem
ser usadas para tratar instalações. Ivermectina injetável a 300µg/kg é eficaz.
Em muitos países, órgãos reguladores especificam os limites de resíduos
teciduais de inseticidas e cuidadosamente regulam o seu uso nos animais de
produção. Todos esses regulamentos são sujeitos a mudanças; leis e requerimen-
tos locais pertinentes devem ser determinados. O tratamento de animais de corte e
de leite deve ser restrito ao uso especificado nos rótulos e todas as suas precauções
cuidadosamente observadas.

FOTOSSENSIBILIZAÇÃO
É uma condição na qual a pele levemente pigmentada é hiper-reativa à luz solar,
devido a um agente fotodinâmico na pele. Moléculas de agentes fotossensibilizan-
tes são energizadas pela luz. Quando a molécula retorna ao estado menos
energizado, a energia liberada é transferida para moléculas receptoras que rapida-
mente iniciam reações químicas nos componentes da pele. A lesão tecidual
provavelmente resulta da produção de oxigênio reativo intermediário ou de altera-
ções da permeabilidade da membrana celular. A fotossensibilização difere da
queimadura solar, na qual a pele levemente pigmentada lentamente torna-se
inflamada após a exposição aos raios ultravioleta.
A fotossensibilização ocorre em todo o mundo e pode afetar algumas espécies,
porém é mais comum em bovinos e ovinos.
Etiologia – A fotossensibilização pode ser classificada como primária, secundá-
ria (hepatogênica) ou como formação aberrante ou imperfeita de pigmento. Ver
Fotossensibilização 994

também PORFIRIA ERITROPOIÉTICA CONGÊNITA, pág. 535 e PROTOPORFIRIA ERITROPOIÉ-


TICA CONGÊNITA, pág. 948. Uma grande quantidade de substâncias químicas pode
ser de agentes fotossensibilizantes, embora a maioria seja oriunda de plantas.
Fotossensibilização primária – O agente fotodinâmico é absorvido através
da pele ou pelo trato GI inalterado e atinge a primeira na sua forma “inata”.
Exemplos são a hipericina (do Hypericum [erva de St. John]) e fagopirina (da
Fagopyrum esculentum [trigo sarraceno]). Plantas da família Umbelliferae e
Rutaceae contêm furocumarinas fotoativas (psoralenos), as quais causam fotos-
sensibilização em gado de criação e aves domésticas. Ammi majus e Cymopterus
watsonii (salsa de primavera) têm produzido fotossensibilização em bovinos e
ovinos respectivamente. A ingestão de sementes de A. majus e A. visnaga tem
produzido severa fotossensibilização em aves domésticas. Espécies de Trifolium,
Medicago (trevo e alfafa), Erodium e Brassica têm sido incriminadas, por exem-
plo, na “dermatite por trevo” e na “queimadura por colza”. Muitas outras plantas
têm sido suspeitas, mas as fototoxinas não têm sido identificadas. Adicionalmen-
te, alguns derivados do alcatrão, fenotiazina, sulfonamidas e tetraciclinas têm
induzido fotossensibilização primária.
Fotossensibilização secundária (hepatogênica) – Este é decididamente o
tipo mais freqüente em rebanhos. O agente fotossensibilizante, a filoeritrina (uma
porfirina), acumula-se no plasma devido à excreção hepatobiliar diminuída. A
filoeritrina é derivada da decomposição química anaeróbica da clorofila pelos
microrganismos no antro cardíaco de ruminantes. A filoeritrina, mas não a clorofila,
é normalmente absorvida na circulação e efetivamente excretada pelo fígado na
bile. Deficiências na excreção de filoeritrina devidas à disfunção hepática ou às
lesões no duto biliar aumentam a sua quantidade na circulação. Conseqüentemen-
te, ela atinge a pele onde absorve e libera energia luminosa, a qual inicia uma reação
fototóxica.
A filoeritrina tem sido incriminada como o agente fototóxico nas seguintes
condições: oclusão do duto biliar comum; eczema facial (ver pág. 2043); lupinose
(ver pág. 2046); fotossensibilidade congênita dos ovinos corriedale e southdown
(ver adiante); e intoxicação por Tribulis terrestris (trepadeira), Lippia rehmanni,
Lantana camara, várias Panicum spp (sorgo), Myoporum laetum e Narthecium
ossifragum.
A fotossensibilização também tem sido relatada associada com danos hepáticos
e várias intoxicações: erva de Santiago, Senecio spp; alga azul-esverdeada; Nolina
texana; Agave lecheguilla (lechuguilla); Holocalyx glaziovii, Kochia scoparia ou
Tetradymia (arranhões de cavalos ou coelhos); Brachiaria brizantha ; fósforo e
tetracloreto de carbono. É provável que a filoeritrina seja o agente fototóxico em
muitos destes casos.
Metabolismo aberrante de pigmento – Agentes porfirínicos fotossensibilizantes
são pigmentos endógenos que estão normalmente ausentes ou presentes na
circulação apenas em pequenas quantidades.
Achados clínicos e lesões – A síndrome apresenta sinais clínicos similares,
independentemente da causa. Animais fotossensitivos são fotofóbicos imediata-
mente após a exposição solar. Eles se contorcem em aparente desconforto e
raspam ou esfregam as áreas expostas da pele levemente pigmentadas, como por
exemplo, orelhas, pálpebras e focinho. Filoeritrinemia severa e luz solar brilhante
podem induzir lesões cutâneas típicas, mesmo em bovinos e ovinos pretos. O
eritema desenvolve-se rapidamente e é logo seguido por edema. Se a exposição à
luz cessar neste estágio, as lesões logo se resolvem; caso se prolongue, ocorrerá
exsudação serosa marcante, formação de crostas e necrose cutânea. Em bovinos
e principalmente veados, a exposição da língua na lambedura pode resultar em
glossite com ulceração e necrose profunda.
Pitiríase Rósea dos Suínos 995

Dependendo da causa inicial do acúmulo do agente fotossensibilizante, outros


sinais clínicos podem ser observados, por exemplo, se a fotossensibilidade for
hepatogênica, a icterícia pode estar presente.
Diagnóstico – A fotossensibilidade marcante apresenta sinais clínicos bem
reconhecidos, mas casos iniciais ou brandos são semelhantes aos efeitos da
queimadura solar actínica primária. Referências a doenças específicas nas quais a
fotossensibilização é um sinal objetivo podem auxiliar no diagnóstico de doenças de
base. Análises sorológicas e biópsia hepática (se houver indício de doença hepá-
tica) e exames de sangue, fezes e urina para porfirinas devem ser considerados.
Tratamento e controle – Enquanto a fotossensibilidade continuar, os animais
devem ser mantidos completamente à sombra ou preferencialmente fechados e
soltos para pastar apenas durante a noite. O estresse severo da fotossensibilização
e a extensiva necrose cutânea podem revelar-se altamente debilitantes e aumentar
a mortalidade. Corticosteróides administrados parenteralmente nos estágios iniciais
podem ser úteis. Infecções cutâneas secundárias e supurações devem ser tratadas
e o assédio de moscas prevenido. As lesões cutâneas cicatrizam-se bem, mesmo
após extensiva necrose. O prognóstico e a eventual produtividade do animal
dependem do local, da severidade da lesão primária e do grau de resolução.

FOTOSSENSIBILIZAÇÃO CONGÊNITA EM OVINOS


Ovinos southdown e corriedale podem herdar uma incompetência hepatobiliar
que resulta em fotossensibilização. Em ovinos southdown mutantes, o defeito
herdado está no aumento dos níveis de bilirrubina não conjugada e de ânions
orgânicos no fígado. Níveis de bilirrubina não conjugada no plasma são consisten-
temente elevados e, na medida em que a excreção parcial de bilirrubina é mantida,
não ocorre icterícia. A filoeritrina é menos efetivamente excretada, e cordeiros
afetados tornam-se fotossensíveis quando começam a pastar. A menos que a
clorofila seja excluída da dieta ou a exposição solar seja prevenida, as lesões e o
estresse da fotossensibilização resultarão em morte dentro de semanas. Ovinos
mutantes assim protegidos desenvolvem lesões renais progressivas nas quais
bandas radiais fibrosas são formadas na medula, com aumento do número de
túbulos císticos. Estas alterações resultam em insuficiência renal e morte. O fígado
é pequeno, com depósitos pericanaliculares de lipofuscina.
Esta característica semiletal parece ser herdada como um gene recessivo
simples. A eliminação dos portadores é o único controle viável.
No ovino corriedale mutante, a insuficiência hepatocelular ocorre na excreção de
bilirrubina conjugada e de outros metabólitos conjugados. A icterícia não é evidente,
mas a excreção de filoeritrina está suficientemente reduzida para produzir fotossen-
sibilização. A pigmentação hepática é óbvia macroscopicamente. Pigmento mar-
rom-enegrecido semelhante à melanina está presente nas células parenquimais
centrolobulares. A característica é transmitida por um gene autossômico recessivo.
O controle é feito por meio de detecção e remoção dos portadores.

PITIRÍASE RÓSEA DOS SUÍNOS


É uma patologia esporádica de etiologia desconhecida da pele de suínos
geralmente com 8 a 12 semanas de idade, mas ocasionalmente acomete leitões com
2 semanas, e muito raramente leitões com até 10 meses. Um ou mais leitões podem
ser afetados. A doença geralmente é branda, mas anorexia e diarréia discretas têm
Pitiríase Rósea dos Suínos 996

sido relatadas. As lesões são caracterizadas por nódulos eritematosos e aneliformes


com bordas distintas elevadas e avermelhadas. As lesões são maiores na sua
periferia, e as lesões adjacentes podem coalescer. O centro da lesão é plano e
coberto com uma crosta em forma de farelo, que geralmente seca deixando a pele
normal. As lesões ocorrem predominantemente na região abdominal e podem ser
vistas sobre o dorso, pescoço e membros posteriores. Geralmente não há prurido.
A recuperação espontânea em geral ocorre dentro de 6 a 8 semanas e o tratamento
é desnecessário. O diagnóstico é simples na maioria dos casos, mas podem-se usar
testes laboratoriais.
A doença é considerada parcialmente hereditária, sendo que leitões da raça
landrace são comumente afetados, mas o tipo de herança genética é desconhecido.
Etiologia viral é uma possibilidade, pois é semelhante a uma doença humana que
se acredita ser ocasionada por vírus.

VARÍOLAS
São viroses agudas que acometem o homem, pássaros e animais, com exceção
dos cães. Tipicamente, ocorrem lesões difusas na pele e mucosas que progridem de
máculas para pápulas, vesículas e pústulas antes de formar crostas e cicatrizar. A
maioria das lesões contém múltiplas inclusões intracitoplasmáticas que representam
o local de replicação viral nas células infectadas. Em algumas poxviroses a formação
de vesículas não é clinicamente evidente, mas ao exame histológico podem-se
observar microvesículas e, às vezes, as lesões proliferativas são características.
A infecção é adquirida por via aerógena ou através da pele (por exemplo, varíola
ovina). Em alguns casos (por exemplo, varíola das aves, varíola suína), o vírus é
transmitido mecanicamente por artrópodes picadores. A infecção pode ser seguida
por lesões generalizadas (por exemplo, varíola ovina) ou permanecer localizada
(pseudovaríola bovina). A imunização contra poxviroses é praticada utilizando-se
cepas do vírus de baixa virulência, sendo um exemplo clássico a erradicação total
da varíola no homem pela imunização com cepas de vírus de vacínia vivo. A origem
deste vírus é obscura.
Os poxvírus podem ser classificados de acordo com suas propriedades
fisicoquímicas e biológicas. Imunologicamente, os vírus da varíola humana, varíola
bovina, símia, etc. estão intimamente relacionados ao vírus da vacínia. Os poxvírus
aviários, os vírus mixoma e alguns outros poxvírus (por exemplo, varíola suína) são
espécie-específicos. Os vírus do éctima contagioso, da pseudovaríola bovina e da
estomatite papular bovina são parapoxvírus.
Na Europa, infecções de pele localizadas, exceto em alguns casos de doenças
generalizadas fatais, têm sido relatadas em felinos (guepardos, leões e gatos
domésticos – ver adiante).

VARÍOLA BOVINA
É uma doença branda e eruptiva de vacas leiteiras, nas quais as lesões ocorrem
no úbere e nas tetas. Já foi considerada comum, é agora extremamente rara e
relatada somente na Europa Ocidental (ver também INFECÇÃO POR POXVÍRUS EM
GATOS, adiante).
O vírus da varíola bovina está relacionado íntima e antigenicamente ao vírus da
varíola humana e ao da vacínia. Na verdade, os 2 primeiros podem ser diferenciados
somente por técnicas laboratoriais sofisticadas. Antes de a vacinação contra varíola
Varíolas 997

humana ser abandonada, algumas erupções em vacas eram devidas à infecção por
vacínia de pessoas recentemente vacinadas.
A doença transmite-se por contato durante a ordenha. Depois de um período
incubação de 3 a 7 dias, durante o qual as vacas podem estar discretamente febris,
aparecem pápulas nas tetas e úbere. As vesículas podem não ser evidentes ou
podem romper-se rapidamente, deixando áreas com lesões ulceradas, em carne
viva, que formam crostas. As lesões cicatrizam em 1 mês. A maioria das vacas em
um rebanho leiteiro pode ser afetada e as lesões, acompanhadas por febre, podem
ocorrer nas mãos, braços ou no rosto dos ordenhadores se estes não estiverem
vacinados contra varíola.
A varíola bovina ou infecção por vacínia pode ser confundida com mamilite por
herpes bovino; devido à semelhança na aparência das lesões, é necessária a
confirmação laboratorial. A pseudovaríola bovina é uma doença mais branda.
As medidas de prevenção na transmissão dentro de um rebanho devem estar
baseadas no isolamento e higiene.

PSEUDOVARÍOLA BOVINA
(Nódulos dos ordenhadores, Paravacínia)
É uma infecção branda e comum do úbere e tetas de vacas, causada por um
parapoxvírus, que é de distribuição cosmopolita. O vírus da pseudovaríola bovina está
relacionado ao éctima contagioso (ver pág. 949) e à estomatite papular bovina (ver
pág. 149). Estes parapoxvírus diferem morfologicamente do vírus da vacínia e de
outros poxvírus. Eles possuem uma variedade limitada de hospedeiros e não se
propagam em ovos férteis. Crescem em alguns tipos de cultura celular, embora
relativamente pouco.
As lesões iniciam-se como pequenas pápulas vermelhas nas tetas ou úbere.
Estas podem ser seguidas rapidamente por lesões crostosas, ou podem-se desen-
volver pequenas vesículas ou pústulas antes da formação de crosta. As crostas
podem ser abundantes, mas podem ser removidas sem causar dor. Ocorre
granulação abaixo das crostas, resultando em uma lesão elevada que cicatriza no
centro, deixando pequenas crostas com característica de ferradura ou um anel
circular. Este estágio é alcançado em , 7 a 12 dias. Algumas lesões persistem por
vários meses, dando às tetas afetadas um aspecto áspero, podendo se formar
escaras adicionais. A infecção transmite-se lentamente no rebanho leiteiro e uma
porcentagem variável de vacas apresenta lesões em qualquer época. O gado pode
apresentar recidivas nas lactações subseqüentes.
As lesões crostosas podem ser confundidas com papilomas ou lesões traumá-
ticas das tetas e úbere. Estas escaras examinadas ao microscópio eletrônico
freqüentemente denotam partículas virais características.
O controle da infecção dentro do rebanho é difícil, mas depende essencialmente
de medidas higiênicas, como a limpeza da teta com anti-sépticos, para destruir o
vírus e prevenir a transmissão. Parece desenvolver-se uma pequena imunidade.
O homem pode infectar-se; as lesões não são dolorosas, mas são pruriginosas,
com nódulos vermelho-púrpura que estão presentes, geralmente, nos dedos ou
mãos. Estas lesões causam pouco transtorno e desaparecem após várias semanas.

DERMATOPATIA GRANULOMATOSA
É uma doença infecciosa, eruptiva e ocasionalmente fatal dos bovinos caracte-
rizada por nódulos na pele e outras partes do corpo. A infecção secundária
freqüentemente agrava a condição. Tradicionalmente, ocorre no sul e no leste da
África, mas recentemente estendeu-se ao nordeste do continente até a região oeste
africana (subsaariana).
Varíolas 998

Etiologia e epidemiologia – O agente etiológico viral está relacionado ao vírus da


varíola ovina. A cepa principal é conhecida como poxvírus “Neethling”. A dermatopatia
granulomatosa aparece epidêmica ou esporadicamente. Freqüentemente, novos
focos de infecção aparecem em áreas distantes da erupção inicial. Sua incidência é
mais alta com a umidade do verão, mas pode eventualmente ocorrer no inverno. É
mais prevalente em regiões ao longo dos cursos de água e nas terras baixas. Depois
que as restrições de quarentenas designadas para limitar a transmissão da infecção
falharam, suspeitou-se que os insetos sugadores atuem como vetores, mas as lesões
têm ocorrido sob condições nas quais os insetos praticamente poderiam ser excluí-
dos. A doença pode ser transmitida por meio de saliva infectada, por isso a infecção
por contato deve ser aceita como um meio de transmissão. Os búfalos africanos são
suspeitos de servirem como possíveis portadores no Quênia.
A infecção artificial pode ser produzida por inoculação de suspensão de nódulos
cutâneos ou sangue colhido durante os primeiros estágios febris, por alimento ou
água contaminados com saliva de animais infectados.
Achados clínicos – Uma injeção subcutânea de material infectado produz
inicialmente um aumento de volume doloroso seguido por febre, lacrimejamento,
corrimento nasal e hipersalivação, aparecendo depois erupções características na
pele e outras partes do corpo em , 50% do gado suscetível. O período de incubação
varia de 4 a 14 dias.
Os nódulos são bem circunscritos, arredondados, suavemente elevados, firmes
e dolorosos, e envolvem a cútis inteira e a mucosa dos tratos gastrointestinal,
respiratório e genital. Os nódulos podem ocorrer no focinho e nas membranas
mucosas nasal e bucal. Os nódulos da pele contêm uma massa de tecido firme,
cremosa, cinza ou amarela. Os linfonodos regionais estão aumentados de volume
e desenvolve-se edema no úbere, região torácica e membros posteriores. Às vezes
ocorre infecção secundária, causando supuração extensa e necrose. Como resul-
tado final, o animal torna-se extremamente emaciado e a eutanásia pode ser
considerada. Os nódulos regridem com o tempo ou a necrose da pele resulta em
áreas firmes e elevadas (“sit-fasts”), claramente separadas da pele ao redor. Estas
áreas de necrose deixam úlceras, que cicatrizam deixando marcas.
A morbidade varia de 5 a 50%; a mortalidade geralmente é baixa. A maior perda
é representada pela diminuição na produção leiteira, perda de peso e rejeição ou
redução no valor do couro.
Diagnóstico – A doença pode ser confundida com a pseudodermatopatia
granulomatosa, causada por um herpesvírus (herpesvírus bovino Tipo 2). Estas
doenças podem ser semelhantes clinicamente, embora em algumas partes do
mundo, as lesões por herpesvírus observadas estejam restritas às tetas e ao úbere
das vacas e a doença seja chamada mamilite ulcerativa bovina (ver pág. 803).
A “pseudodermatopatia granulomatosa” é considerada mais branda que a
verdadeira dermatopatia granulomatosa, mas a diferenciação depende essencial-
mente do isolamento e identificação do vírus. O exame histológico e ultra-estrutural
dos nódulos pode ser útil. Corpos de inclusão intracitoplasmáticos semelhantes aos
poxvírus ou inclusões eosinofílicas intranucleares herpesvirais podem ser observa-
dos nos nódulos, dependendo da causa.
A Dermatophilus congolensis também causa nódulos na pele do gado (ver
DERMATOFILOSE, pág. 952).
Profilaxia e tratamento – Não são usadas as restrições de quarentena. A
vacinação profilática por meio de vírus atenuado oferece o método de controle mais
promissor. Também têm sido usados vírus das varíolas caprina e ovina passados
em cultura de tecido.
A administração de sulfonamidas para controlar a infecção secundária e cuida-
dos intensivos são recomendados.
Varíolas 999

INFECÇÃO POR POXVÍRUS EM GATOS


É uma doença esporádica em gatos domésticos, reconhecida apenas no Reino
Unido e possivelmente Europa Ocidental. Os gatos afetados geralmente apresen-
tam lesões múltiplas na pele, embora sinais respiratórios e outros possam ser vistos.
Etiologia e epidemiologia – Atualmente, todos os vírus isolados dos gatos
domésticos examinados são indistinguíveis do vírus da varíola bovina. A varíola
bovina ou a infecção com outros vírus intimamente relacionados também tem sido
relatada em Felidae capturados e em outras espécies, por exemplo, elefantes,
rinocerontes e tamanduás, em vários zoológicos europeus. No entanto, a relação de
alguns destes vírus com espécies estabelecidas dentro do gênero (ver anteriormen-
te) não está clara. Aparentemente, a varíola bovina não ocorre nos EUA, embora
outros ortopoxvírus tenham sido isolados de quatis. É possível que este vírus possa
também infectar outros hospedeiros. O vírus da varíola bovina também é infeccioso
para o homem e a transmissão gato-homem tem sido relatada. Os proprietários
devem ser adequadamente advertidos.
Embora tradicionalmente descrita como uma doença de bovinos, o vírus da
varíola bovina, na verdade, é raro, e a hipótese aceita é que seus hospedeiros-
reservatório sejam pequenos mamíferos silvestres. Os gatos, que agora são os
hospedeiros mais comumente reconhecidos do vírus da varíola bovina, provavel-
mente se infectam quando caçam; a maioria dos gatos afetados vem de ambientes
rurais, e é caçadora de roedores; a lesão inicial é freqüentemente descrita como
oriunda de uma pequena ferida semelhante a uma mordida. A transmissão de gato
para gato também pode ocorrer, mas geralmente resulta apenas em infecção
subclínica. Presumivelmente, raros casos bovinos, resultam do contato direto ou
indireto com o hospedeiro-reservatório, como acontece em alguns casos humanos.
Contudo, as transmissões gato-homem e bovino-homem também são possíveis. A
infecção em gatos tem uma incidência marcadamente sazonal, com a maioria dos
casos ocorrendo entre setembro e novembro.
A importância da doença e seu reconhecimento relativamente recente nos gatos
são desconhecidos. Ela pode ter estado sempre presente na população felina, mas
não era identificada. Alternativamente, a doença pode aumentar em importância,
também, como um resultado de uma mudança na epidemiologia da doença no
hospedeiro reservatório, ou (talvez menos provável) na natureza do biótipo domi-
nante do próprio vírus.
Patogenia – A porta de entrada mais comum parece ser através da pele, mas a
infecção oronasal também é possível. Após a replicação local e desenvolvimento da
lesão cutânea primária, o vírus propaga-se para os linfonodos locais e uma viremia
associada com leucócitos pode-se desenvolver. A fase virêmica pode estar associa-
da com pirexia e depressão, e durante este período, o vírus pode ser isolado de
diferentes tecidos, incluindo a pele, turbinados (e algumas vezes pulmões) e órgãos
linfóides. Lesões cutâneas secundárias generalizadas aparecem poucos dias após
o início da viremia, e lesões recentes continuam a aparecer por 2 a 3 dias, ocasião
em que a viremia cessa.
Achados clínicos – A maioria dos gatos afetados tem história de uma lesão
cutânea primária única, geralmente na cabeça, pescoço ou em um membro anterior.
A lesão primária pode variar em caráter de uma pequena ferida crostosa a um
grande abscesso. Aproximadamente 7 a 10 dias após o aparecimento da lesão
primária, lesões cutâneas secundárias generalizadas começam a aparecer. Após 2
a 4 dias, estas se tornam pápulas discretas, circulares e ulceradas com , 0,5 a 1cm
de diâmetro. As úlceras logo tornam-se cobertas por crostas e a cura geralmente é
completa em , 6 semanas. Muitos gatos apresentam apenas lesões cutâneas, mas
, 20% podem desenvolver coriza e/ou conjuntivite. Alguns gatos podem apresentar
Varíolas 1000

pirexia, depressão e inapetência durante a fase de viremia, antes e durante o


desenvolvimento inicial de lesões secundárias. Infecções bacterianas concomitan-
tes, particularmente das lesões primárias, podem agravar os sintomas sistêmicos.
A maioria dos gatos domésticos, entretanto, recupera-se sem problemas. A doença
pulmonar mais severa não é comum em gatos domésticos, mas ocorre freqüente-
mente em leopardos, e é fatal em ambas as espécies. Doenças mais severas em
gatos domésticos estão freqüentemente associadas com imunossupressão ou após
tratamento com corticosteróides ou associada com infecção pelo vírus da leucemia
felina ou vírus da imunodeficiência felina.
Lesões – Uma vez que a maioria dos gatos sobrevive, o único tecido disponível
para o exame patológico é a biópsia das lesões cutâneas. Histologicamente, as
lesões consistem de áreas de hiperplasia e hipertrofia epidérmicas com vesiculação
da camada celular espinhosa. Muitas das células epidérmicas da borda das
vesículas contêm características inclusões citoplasmáticas eosinofílicas. Posterior-
mente, há ulceração e necrose da epiderme e substituição por um coágulo
eosinofílico de células necróticas e fibrina. Um denso exsudato celular inflamatório
misto está presente na derme ao redor da lesão. Com a cura, uma fina camada de
epiderme cobre a pele sob as crostas, e nas áreas do novo tecido cicatricial está
presente um infiltrado celular, principalmente mononuclear.
Em casos mais raros, nos quais a doença generalizou-se, estão presentes lesões
no fígado, pulmões, traquéia, brônquios, mucosa bucal e intestino delgado.
Diagnóstico – Se múltiplas lesões circunscritas estiverem presentes, e especial-
mente se houver histórico de caçada ou acesso a um ambiente rural, um diagnóstico
presuntivo pode se basear nos sinais clínicos. Também se deve suspeitar de
infecção por poxvírus quando lesões cutâneas não respondem a antibióticos. O
diagnóstico diferencial inclui dermatite miliar, herpesvírus felino ou calicivirose,
granuloma eosinofílico, ferimentos por mordidas, dermatofitose e outras condições
bacterianas ou fúngicas.
Um diagnóstico presuntivo e rápido pode ser feito na maioria dos casos pela
observação das lesões, do exsudato, ou exame do material de biópsia com relação
às características retangulares dos vírions do ortopox vistos por microscopia eletrô-
nica. Um método mais preciso e sensível de diagnóstico é o isolamento do vírus em
cultura celular ou em membrana corioalantóide dos ovos embrionados. O soro para
determinação do anticorpo e o material da biópsia para exame histológico fixado
também devem ser enviados ao laboratório, no caso de o vírus não ser isolado.
Tratamento e controle – Tanto nos gatos domésticos quanto nos guepardos, é
importante que o vírus da varíola bovina seja prontamente diagnosticado, pois o
tratamento com esteróides, que é freqüentemente usado na terapia de outras
patologias da pele nos gatos, é contra-indicado. Embora nos guepardos a doença
seja quase sempre severa, nos gatos domésticos, se a condição for reconhecida,
o tratamento de suporte (antibióticos de amplo espectro, fluidoterapia) é geralmente
bem-sucedido e a mortalidade é baixa.
Atualmente, parece que a infecção nos gatos domésticos é principalmente
esporádica e adquirida pelo contato com um reservatório selvagem infectado, por
isso, as medidas de controle provavelmente não são indicadas. Nos parques ou
reservas silvestres onde felinos correm o risco de ter contato com pequenos
roedores selvagens e especialmente onde a doença já tenha ocorrido, a vacinação
pode ser de grande ajuda. O vírus da vacínia parece ser de baixa patogenicidade
em gatos domésticos e os guepardos parecem ser refratários; não têm sido feitas
tentativas com outras vacinas de ortopoxvírus. Assim, atualmente, o manejo dos
surtos entre grandes felinos depende do pronto diagnóstico e do isolamento dos
animais afetados para reduzir a possibilidade de transmissão direta (animal para
animal). Tanto quanto é sabido, as gamaglobulinas têm pouco ou nenhum valor,
Varíolas 1001

mas podem ser utilizadas, se disponíveis. A desinfecção das propriedades pode ser
realizada com alvejantes de hipocloreto ou detergentes. À temperatura ambiente, os
poxvírus podem ser relativamente resistentes, e nas crostas secas podem perma-
necer infectantes por meses.

VARÍOLAS OVINA E CAPRINA


São doenças sérias, freqüentemente fatais, caracterizadas por erupções dissemi-
nadas pela pele. Ambas as doenças estão confinadas ao sudeste da Europa, África
e Ásia. Os poxvírus de ovinos e caprinos (capripoxvírus) estão intimamente relacio-
nados, antigenicamente e em suas características fisicoquímicas. Eles também estão
relacionados ao vírus da dermatopatia granulomatosa (ver anteriormente). Os relatos
de suscetibilidade natural dos ovinos ao poxvírus caprino e vice-versa são conflitantes;
pelo menos algumas cepas parecem capazes de infectar ambas as espécies.
O período de incubação da varíola ovina é de 4 a 8 dias, e o da varíola caprina
de 5 a 14 dias. As doenças nos ovinos e caprinos apresentam um quadro clínico
semelhante, sendo geralmente menos severas nos caprinos. Ocorrem febre e
distúrbios sistêmicos em grau variável. As pálpebras tornam-se edemaciadas e há
uma descarga nasal mucopurulenta. As lesões epidérmicas disseminadas desen-
volvidas são vistas mais rapidamente no focinho, orelhas e áreas livres de lã ou pêlos
longos. A palpação detecta lesões não observáveis prontamente. As lesões iniciam-
se como áreas eritematosas na pele, e progridem rapidamente para placas elevadas
e circulares com bordas congestas causadas por inflamação local, edema e
hiperplasia epitelial. Embora as microvesículas estejam presentes histologicamen-
te, as vesículas e pústulas não são evidenciadas clinicamente. O vírus está presente
em abundância nas lesões da pele neste estágio. À medida que as lesões regridem,
ocorre necrose da derme, resultando na formação de crostas duras e escuras,
nitidamente separadas da pele ao redor. A regeneração do epitélio abaixo das
crostas leva várias semanas. Quando estas crostas são removidas, permanece uma
cicatriz em forma de estrela, livre de pêlos ou lã. Nos casos mais severos, podem
ocorrer lesões pulmonares. Em alguns ovinos e em certa raças, a doença pode ser
branda ou a infecção pode ser inaparente.
Tem-se sugerido que a transmissão seja aerógena, ou ocorra pelo contato direto
com as lesões, ou mecanicamente por picadas de insetos.
A doença em ambas as espécies deve ser diferenciada da infecção mais branda,
éctima contagioso (ver pág. 949), que causa principalmente lesões proliferativas
crostosas ao redor da boca.
A infecção resulta em imunidade sólida e duradoura. As vacinas de vírus vivos
atenuados dão imunidade mais duradoura do que as vacinas de vírus inativados. O
vírus vivo, atenuado, da dermatopatia granulomatosa também pode ser usado como
vacina contra as varíolas ovina e caprina.

VARÍOLA SUÍNA
É uma infecção aguda, freqüentemente branda, caracterizada por erupções na
pele e que afeta somente os suínos. A doença está presente nos EUA, particular-
mente no centro-oeste, e tem sido relatada em todos os continentes, embora a
incidência seja geralmente baixa.
Historicamente, em algumas erupções o vírus da vacínia estava envolvido, mas
atualmente, o vírus da varíola suína parece ser a única causa. A doença descrita
aqui é causada por este último. O vírus da varíola suína distingue-se dos outros
poxvírus e não protege contra infecção pelo vírus da vacínia. Cresce em cultura de
células de suínos, mas não cresce em ovos embrionados. É relativamente estável
ao calor e sobrevive por , 10 dias a 37°C.
Varíolas 1002

A doença é mais freqüentemente observada em leitões de 3 a 6 semanas de


idade, mas todas as idades podem ser afetadas. Após um período de incubação
de , 1 semana, observam-se pequenas áreas avermelhadas freqüentemente na
face, orelhas, lado interno das pernas e abdome; estas desenvolvem-se em pápulas
e em poucos dias tornam-se pústulas ou às vezes pequenas vesículas. O centro das
pústulas torna-se seco e crostoso, e está rodeado por uma área inflamada e elevada,
de modo que as lesões parecem umbilicadas. Mais tarde, formam-se crostas
escuras (1 a 2cm de diâmetro), dando aos leitões afetados uma aparência sarapin-
tada. Estes pontos eventualmente caem ou são retirados sem deixar marcas. Surtos
sucessivos de lesões podem ocorrer, de modo que nem todas estão no mesmo
estágio. O estágio primário da doença pode ser acompanhado por uma febre branda,
inapetência e apatia. Poucos animais morrem de varíola suína não complicada.
O vírus é encontrado em abundância nas lesões e pode ser transmitido de animal
para animal por um piolho picador (Haematopinus suis ). A doença também pode ser
transmitida, possivelmente entre fazendas, por outros insetos que atuam como
portadores mecânicos.
Os animais curados são imunes. Não há tratamento específico. A erradicação
dos piolhos é importante.

PRURIDO
(Coceira)

É uma sensação desagradável que provoca o desejo de se arranhar ou,


alternativamente, uma sensação de irritação incômoda dentro da pele. Muitos
acreditam que possa ocorrer apenas na epiderme e conjuntiva palpebral. Não
existem receptores especializados de prurido. A sensação de coceira é transmitida
pelo nervo terminal da medula espinhal, e ascende para o trato espinotalâmico
ventrolateral via tálamo para o córtex.
A natureza dos mediadores do prurido é controversa. Acredita-se hoje que inclua
histaminas (liberadas da degranulação de mastócitos) e enzimas proteolíticas
(proteases). As proteases são liberadas por fungos, bactérias, degranulação de
mastócitos e durante reações antígeno-anticorpo. Leucotrienos, prostaglandinas, e
tromboxano A2 são pró-inflamatórios, quebrados pelo ácido araquidônico. Ácidos
graxos essenciais, particularmente o ácido γ-linolênico, têm sido usados para conter
a inflamação mediada por leucotrienos e tromboxano A2.
Sendo um sintoma e não uma doença, o prurido ocorre comumente em animais
domésticos devido a doenças alérgicas, ectoparasitas, infecções bacterianas, e
condições idiopáticas (por exemplo, seborréia). Entretanto, certas condições po-
dem ser designadas genericamente como pruriginosas e não pruriginosas, já que
as doenças variam entre e dentro das espécies, assim como a sua habilidade em
provocar prurido; por exemplo, enquanto as endocrinopatias geralmente são
dermatoses não pruriginosas, uma seborréia secundária concomitante ou piodermia
podem provocar prurido e causar diagnóstico errôneo podendo o desequilíbrio
hormonal ser negligenciado.
Uma história dermatológica completa deve ser feita, e o tipo da lesão e sua
localização anotadas. Técnicas diagnósticas incluem raspados cutâneos, observa-
ção em lâmpada de Wood, cultura para fungos, investigações alérgicas (testes
dietéticos, “patch testing” e testes intradérmicos) e biópsia. Se ocorrer piodermia,
deve-se determinar se esta é a única causa do prurido ou se é secundária a uma
alergia de base. Isto é melhor determinado tratando-se o animal com um antibiótico
Piodermia 1003

efetivo contra estafilococos (os patógenos bacterianos mais comuns em piodermias


de pequenos e possivelmente também de grandes animais), reavaliando-se depois
o prurido em 7 a 10 dias. Uma resolução completa ou quase completa do prurido
indica que a piodermia é a causa primária; uma redução parcial do prurido indica
uma etiologia alérgica ou ectoparasitária concomitante.
Infelizmente, alguns animais apresentam um prurido que deve ser classificado
como idiopático, depois que todos os testes diagnósticos forem utilizados. Neste
caso, a terapia com drogas não esteróides antipruríticas (anti-histaminas, aspirina
ou ácidos graxos essenciais) ou com corticosteróides deve ser tentada. Embora os
corticosteróides sejam em geral mais efetivos em todas as espécies, deve-se tentar
uma terapia teste durante um mês com várias drogas antipruriginosas não esterói-
des, nos animais que necessitarem do uso de corticosteróides por toda a vida. Se
estas drogas forem efetivas, os potenciais efeitos colaterais da terapia com
corticosteróides a longo prazo podem ser evitados.

PIODERMIA
(Dermatite piogênica, Acne, Piodermia secundária)

É uma infecção piogênica da pele, que pode ser primária ou secundária,


superficial ou profunda. Os microrganismos comumente isolados das piodermias
incluem Staphylococcus aureus, S. epidermidis, estreptococos (tanto hemolíticos
quanto não hemolíticos), Corynebacterium spp, Pseudomonas spp, e Proteus
vulgaris. A maioria das espécies de estafilococos causadoras da infecção é
identificada como S. intermedius. Os distúrbios metabólicos, as imunodeficiências,
o descontrole endócrino, ou vários processos alérgicos podem predispor ao desen-
volvimento de piodermia.
Achados clínicos – O cão é a espécie mais freqüentemente afetada. As
piodermias superficiais são caracterizadas por pústulas, pápulas foliculares ou
colaretes epidérmicos. Estes últimos são lesões circulares com margens esca-
rificadas, freqüentemente confundidos com dermatofitoses. Embora presentes em
outras dermatopatias, os colaretes epidérmicos são mais comuns nas piodermias
superficiais. As piodermias profundas podem estar localizadas na face, membros ou
áreas interdigitais (ver “CISTOS ” INTERDIGITAIS, pág. 982), ou podem estar generaliza-
das. As lesões são exsudativas e purulentas. Os cães da raça pastor alemão
parecem ser mais suscetíveis.
A celulite juvenil (piodermia juvenil, garrotilho em cachorrinho) geralmente ocorre
em cães com ≤ 12 semanas de idade; as raças mais comumente afetadas são:
labrador e golden retrievers, dachshunds, brittanys e os springer spaniels. É
caracterizada pelo aumento de volume dos linfonodos; edema das regiões periaural,
perioral e periocular; pústulas e alopecia. Os cães afetados geralmente apresentam
febre, anorexia e letargia. Nos cães com qualquer tipo de piodermia, o primeiro
diagnóstico diferencial a ser feito deve ser sempre de demodecose. Os gatos
raramente apresentam piodermia, mas quando a têm, os sinais clínicos asseme-
lham-se àqueles dos cães. Os gatos podem apresentar infecções microbacterianas,
como a lepra felina.
Em eqüinos, a foliculite freqüentemente se desenvolve no dorso e região
lombar (ver também LESÕES LOMBARES, adiante), particularmente no verão.
Estafilococos, Dermatophilus spp, ou Corynebacterium pseudotuberculosis são
mais comumente isolados. Inicialmente, a área afetada pode estar edemaciada
e sensível. Isto é seguido pela formação de pápulas foliculares e pústulas, que
Piodermia 1004

podem se tornar confluentes ou se romper, formando placas e crostas. A foliculite


profunda seguida de ulceração pode se desenvolver sobre extensas áreas do
corpo, especialmente no pescoço, áreas laterais torácicas, superfície interna das
coxas ou no prepúcio. Piodermias profundas em eqüinos são geralmente causa-
das por C. pseudotuberculosis.
Nos bovinos, a foliculite, que pode progredir para necrose, desenvolve-se em sua
maior parte no abdome, região inguinal e superfícies mediais das coxas. As outras
piodermias primárias freqüentemente ocorrem nas áreas de atrito ou onde a pele é
mais sensível. Os animais que apresentam piodermia profunda e extensa podem ter
febre, anemia, leucocitose e aumento de volume dos linfonodos regionais.
Tratamento e prognóstico – Deve-se evitar a irritação das áreas afetadas. No
estágio inicial, são feitos banhos mornos com soluções anti-sépticas, como
hexaclorofeno ou povidona-iodo. A terapia das piodermias superficiais ou das
pregas de pele é quase sempre auxiliada pelo emprego de xampus com o peróxido
de benzoil (2,5%). Em geral, tanto as piodermias superficiais quanto as profundas
são melhor tratadas com antibióticos baseados na cultura e sensibilidade. Quando
é usada uma antibioticoterapia empírica (antes de receber os resultados do
antibiograma), é necessário lembrar que a maioria dos estafilococos que causa
piodermia é produtora de penicilinase. Nos casos de as piodermias persistirem ou
recidivarem, podem ser usados imunoestimulantes como as bacterinas.
A terapia de piodermia juvenil (que não é uma infecção realmente bacteriana)
deve incluir altas doses (1mg/kg, duas vezes ao dia) de corticosteróides (prednisona
ou prednisolona) com diminuição gradativa desta dosagem por um período de 1
mês. Antibióticos podem ser usados concomitantemente.
O prognóstico das piodermias superficiais é mais favorável para os eqüinos do
que para os outros animais. O prognóstico para piodermia superficial em outras
espécies, particularmente os cães, e para piodermia profunda em quaisquer espé-
cies pode ser desfavorável, a menos que os fatores predisponentes possam ser
determinados e corrigidos ou sejam usados antibióticos por um longo período e até
mesmo por toda a vida do animal.

LESÕES DORSAIS
(“Collar galls”)

A área situada abaixo da sela nos cavalos de montaria (ou a área da cernelha
naqueles montados com arreios) é, com freqüência, um local de lesões da pele e
mais profundamente dos tecidos moles e ósseo. Os sinais clínicos variam de acordo
com a profundidade da lesão e das complicações causadas por infecção secundá-
ria. Os ferimentos que afetam somente a pele caracterizam-se por alterações
inflamatórias que variam de eritemas, até pápulas, vesículas, pústulas e finalmente
necrose. Freqüentemente, a condição inicia-se como uma inflamação aguda dos
folículos pilosos e progride para uma foliculite purulenta. As áreas afetadas apresen-
tam alopecia, e estão edemaciadas, inchadas, quentes e doloridas. O exsudato
seroso ou purulento seca e forma crostas. As lesões avançadas são denominadas
“galls”. Nos casos em que há maiores danos na pele e nos tecidos subjacentes,
podem se desenvolver abscessos. Eles caracterizam-se por serem inchaços
quentes, flutuantes, sensíveis à palpação e dos quais pode ser aspirado um
exsudato purulento ou serossanguinolento. Os danos severos à pele e ao tecido
subcutâneo ou aos mais profundos resultam em necrose seca ou úmida. As lesões
lombares crônicas são caracterizadas por uma foliculite profunda (nódulos de
Bicheira 1005

consistência firme) ou uma dermatite localizada endurecida e proliferativa. As


lesões normalmente são causadas pela má colocação dos arreios.
As escoriações e inflamações da pele das regiões abaixo da sela e arreios são
tratadas como quaisquer outras dermatoses. É necessário repouso absoluto das
partes afetadas. Durante os estágios agudos ou iniciais, são indicadas soluções
adstringentes (solução de Burow ou acetato de chumbo a 2%). As lesões crônicas
e aquelas infectadas superficialmente podem ser tratadas com aplicações mornas e
massagem com pomadas estimulantes (iodo) ou antibióticos sistêmicos. Os hema-
tomas devem ser puncionados ou incisados. O tecido necrosado deve ser removido
cirurgicamente. Um adstringente ou anti-séptico de pele que consista de 500mL de
sublimado alcoólico a 0,1%, mais 30g de ácido tânico e 1g de violeta de genciana
pode ser útil. Em foliculites/furunculoses severas, é indicado o uso de antibióticos.
A identificação e eliminação da “tachinha” da sela que está machucando o animal
é mais importante que qualquer outro tratamento.

BICHEIRA
A bicheira é o nome dado à infestação por larvas de uma mosca, a Cochliomyia
(Callitroga) hominivorax (ordem Diptera, família Calliphoridae), que é um parasita
obrigatório causador de miíase. A fêmea da mosca da bicheira deposita seus ovos
em ferimentos, cortes, mordeduras, umbigo de recém-nascidos e outros locais na
pele de todos os animas de sangue quente. A C. hominivorax está distribuída por
toda a região neo-ártica e neotropical no Hemisfério Ocidental. Como resultado de
programas de erradicação maciça internacionais, federais e estaduais, populações
sobreviventes de C. hominivarox não são mais encontradas nos EUA e no México;
relatos isolados de infestações são freqüentemente registrados para importação de
animais infectados de locais onde a bicheira ainda prevalece. Populações sobrevi-
ventes são encontradas nas Américas Central e do Sul e certas ilhas do Caribe.
Outra espécie de mosca da bicheira, a mosca da bicheira do “velho mundo”,
Chrysomyia bezziana, é encontrada na África e sul da Ásia, incluindo a Papua-Nova
Guiné.
Etiologia, epidemiologia e patogenia – A mosca da bicheira, semelhante em
aparência a outras moscas varejeiras, deposita 200 a 400 ovos em fileiras, que se
sobrepõem como telhas em uma massa na borda do ferimento. Depois de 12 a 21h,
as larvas saem dos ovos, se insinuam para dentro do ferimento e escavam o tecido.
As larvas alimentam-se dos fluidos dos ferimentos e tecidos vivos e completam o seu
crescimento em 5 a 7 dias. As larvas crescidas que saem da ferida caem no chão
e escavam o solo para pupar. O período pupar varia de 7 dias a 2 meses,
dependendo da temperatura. Temperaturas de congelamento ou mínimas (8°C)
matam as pupas. Os adultos acasalam-se com 3 a 4 dias de idade e as fêmeas
grávidas estão prontas para ovipôr , ao 6 dias de idade. No tempo quente, o ciclo
de vida pode ser completado em 21 dias. Apenas moscas fêmeas alimentam-se e
ovipõem em feridas; machos e fêmeas virgens mais jovens agrupam-se para
acasalar na vegetação, principalmente em vegetação florida.
A miíase da bicheira é difundida pelo movimento de animais infestados e por
migração da mosca. As larvas possuem ganchos bucais pontiagudos e afiados, que
dilaceram o tecido vivo.
Achados clínicos e diagnóstico – Os ferimentos recém-infestados contêm
larvas da bicheira de uma única idade; os ferimentos mais velhos e maiores
podem conter larvas de várias idades e freqüentemente de espécies diferentes de
Bicheira 1006

moscas. O fluido fétido marrom-avermelhado produzido no ferimento geralmente


escoa para fora do mesmo e pode tingir o pêlo ou a lã ao redor ou abaixo do
ferimento. À medida que o incômodo aumenta, o animal infestado procura
proteção e retira-se para a sombra mais intensa disponível. Mesmo um ferimento
pequeno e relativamente insignificante, infestado com larvas da bicheira atrai não
apenas moscas da bicheira mas também moscas domésticas e varejeiras; mais
tarde, o tecido necrótico atrai mais moscas. Os ferimentos podem aumentar
acentuadamente devido à infestação múltipla e, a menos que sejam tratados,
geralmente resultam na morte do animal.
As moscas da bicheira são azuladas a verde-azuladas, levemente maiores que
a mosca doméstica e dificultam a distinção de outras moscas varejeiras da família
Calliphoridae. As larvas são raramente vistas, exceto as fêmeas ao redor dos
ferimentos. As larvas são afiladas com ganchos bucais na extremidade estreita e
espiráculos respiratórios na extremidade larga. Os segmentos corporais são anela-
dos com espinhos. Devido a sua forma e aparência lembrarem parafusos de
madeira, dá-se o nome em inglês de “verme-parafuso”. As larvas da bicheira podem
ser distinguidas das larvas de outras espécies intimamente relacionadas, sobretudo
a Cochliomyia (Callitroga) macellaria, responsável pela bicheira secundária, através
dos troncos traqueais, os quais nas verdadeiras larvas da bicheira possuem um
pigmento escuro e podem ser vistos através da cutícula larval.
Controle – As larvas da mosca da bicheira em ferimentos podem ser mortas pela
aplicação de um produto curativo, diretamente no ferimento infestado. Tais curati-
vos, que contêm lindane ou ronel, podem ser difíceis de achar nos EUA, devido ao
programa de erradicação. Estes curativos são melhor aplicados com um pincel de
pintura de 2,5cm. A aplicação cuidadosa é necessária para assegurar que o curativo
alcance todas as cavidades formadas pelas larvas escavadoras em ferimentos
profundos. Uma fina camada deve também ser aplicada na pele circundante ao
ferimento para protegê-la de reinfestação. Os ferimentos podem também ser
tratados com formulações de aerossol, pó ou espuma, que contenham coumafos,
lindane ou ronel. Como medida profilática para proteger os animais da infestação e
também para matar larvas em pequenas feridas difíceis de serem detectadas, os
animais podem ser completamente tratados com spray de ronel, ou tratados com
spray ou imersos em banhos de coumafos. Em bovinos, injeções subcutâneas de
ivermectina demonstraram limpar feridas das larvas de C. bezziana dentro de 3 dias
e prevenir reinfestação por 14 dias após a injeção.
Programa de erradicação – Em 1958, o Departamento de Agricultura dos EUA
iniciou um programa nos estados do sudeste para eliminar a bicheira, baseado na
técnica de esterilizar insetos. Criadas artificialmente e expostas à radiação gama
pouco tempo antes de emergirem das pupas, as moscas macho ficam estéreis, mas
capazes de acasalar. As fêmeas se acasalam apenas uma vez, e quando acasaladas
com um macho estéril, põem ovos que não eclodem. A liberação de números
suficientes de machos estéreis em uma área por um período levou à eliminação. Em
1959, a bicheira tinha sido eliminada na Flórida. O programa custou , $ 11 milhões,
ao passo que a mosca (e seu tratamento) foi estimada como custando $ 20 milhões
anualmente.
O programa se expandiu para cobrir o resto da área envolvida nos EUA e então,
por meio de contrato conjunto México-EUA, para incluir a maioria do México. Isto,
mais o uso de um atrativo de larvas e um sistema de inseticidas que atraía e matava
adultos, levou à erradicação da bicheira no México. Há interesse na expansão da
área por toda a América Central e Caribe. Entretanto, até que isso seja alcançado,
vigilância constante por todos que lidam com animais no sul dos EUA e México é
necessária para detectar uma infestação rapidamente e erradicá-la antes que as
moscas se reproduzam e se espalhem. Se um ferimento for encontrado infestado
Infestação por Carrapatos 1007

com larvas, amostras apropriadas devem ser coletadas e mandadas para os


escritórios de erradicação (P.O. Box 969, Mission, TX 78572 USA).

INFESTAÇÃO POR CARRAPATOS


Os carrapatos são ectoparasitas sugadores de sangue obrigatórios da maioria
dos vertebrados terrestres, virtualmente onde quer que estes animais existam. Os
carrapatos transmitem um grande número e variedade de agentes infecciosos, por
exemplo, ver FEBRE O RIUNDA DOS CARRAPATOS, página 490 e PIEMIA POR CARRAPATOS,
página 492, alguns dos quais são apenas levemente patogênicos aos animais de
produção mas podem causar doenças no homem (ver ZOONOSES, pág. 2109). Outros
agentes patogênicos causam doenças nos animais de produção e são de enorme
importância econômica. Além disso, a atividade alimentar do carrapato produz
reações do hospedeiro, tais como toxicose (por exemplo, enfermidade da transpiração,
ver pág. 440; paralisia por carrapato, ver pág. 756) causada por fluidos salivares e
toxinas, ferimentos de pele suscetíveis a infecções bacterianas secundárias e
bicheiras, anemia e morte. O efeito total (produção e desempenho reduzidos) é
incalculável, embora tenham sido feitas pesquisas para quantificar os vários efeitos.
As nações economicamente desenvolvidas gastam enormes somas de dinheiro
para prevenir e reduzir as perdas por doenças veiculadas por carrapato. Nas nações
menos desenvolvidas com bem menos recursos para prevenção e controle e uma
necessidade relativamente grande de proteína animal para sustentar a sua popula-
ção humana, por sua vez pobremente nutrida, as perdas por doenças veiculadas por
carrapatos são especialmente intensas. O transporte internacional de animais
infectados pelos agentes transmitidos por carrapatos (Theileria , Babesia, Anaplasma
e Cowdria spp) é largamente restringido.
Os fatores primários nas extensas distribuição e prevalência de muitas espécies
de carrapatos e agentes de doenças veiculadas por carrapatos são o transporte de
animais de produção infestados por eles a grandes distâncias e a introdução
nos animais de produção de espécies de carrapato e agentes de doenças veicula-
das por eles, que não tenham sido previamente observadas e contra as quais os
animais não tenham imunidade ou resistência inata. Uma grande quantidade de
espécies de carrapato introduzidas floresceu em vastos ambientes de pasto e
pastagem durante os últimos séculos, como resultado das explosões de população
humana e de animais de produção.
Duas das 3 famílias de carrapatos parasitam os animais de produção: os
Argasidae (argasídeos, “carrapatos macios” ou “de couro”) e os Ixodidae (ixodídeos,
“carrapatos duros”). Embora dividam certas propriedades básicas, argasídeos e
ixodídeos diferem em muitos padrões estruturais, comportamentais, fisiológicos,
alimentares e reprodutivos. As espécies tropicais e subtropicais podem sofrer 1, 2
ou raramente 3 ciclos de vida completos por ano. Nas zonas temperadas, há quase
sempre um ciclo anual; nas regiões mais ao norte, 2 a 4 anos são exigidos pela
maioria das espécies. Existem 4 estágios de desenvolvimento: ovo, larva, ninfa
e adulto. Todas as larvas têm 3 pares de pernas; todas as ninfas e adultos, 4. Os
adultos possuem áreas genital e anal distintas na superfície ventral do corpo.
Os tarsos das pernas dianteiras de todos os carrapatos transportam um peculiar
aparelho sensorial – o órgão de Haller – para sentir estímulos químicos (odor),
temperatura, umidade, etc. As feromonas estimulam a reunião de grupos, reconhe-
cimento de espécies, acasalamento e seleção de hospedeiro em carrapatos.
Infestação por Carrapatos 1008

Certas espécies de carrapatos que parasitam animais de produção podem


sobreviver vários meses, ocasionalmente alguns anos sem alimento, se as condi-
ções ambientais o permitirem. As preferências de hospedeiro dos carrapatos são
geralmente limitadas a um certo gênero, família ou ordem de vertebrados. Entretan-
to, certos carrapatos são excepcionalmente adaptáveis a uma variedade maior de
hospedeiros vertebrados, logo, cada espécie tem de ser avaliada separadamente.
As larvas e ninfas da maioria dos ixodídeos parasitários de animais de produção
alimentam-se em pequenos animais silvestres (tais como pássaros, roedores,
pequenos carnívoros, ou mesmo lagartos).
Nos Argasidae, a superfície coriácea dorsal não tem uma placa dura (escudo).
Os argasídeos macho e fêmea parecem ser muito semelhantes, exceto pelo
tamanho maior da fêmea e diferenças na genitália externa. O capítulo argasídeo
(peças bucais) nas larvas surge da extremidade anterior do corpo, porém nas ninfas
e nos adultos surge da superfície ventral do corpo.
Nos Ixodidae, a superfície dorsal do macho é coberta por um escudo. O escudo
da fêmea, ninfa e larva ixodídeas cobre apenas a metade anterior da superfície
dorsal. O capítulo ixodídeo surge da extremidade anterior do corpo em todos os
estágios de desenvolvimento.
Parasitismo argasídeo – Os Argasidae são altamente especializados em se
abrigar em nichos ou frestas protegidos em madeira ou rochas ou em ninhos ou
lugares de descanso dos vertebrados situados no nível do solo ou subterrâneos. A
maioria destes parasitas coriáceos habita ambientes tropicais ou temperados
quentes, com longas estações secas. Os hospedeiros são tanto os que descansam
em grande número perto do micro-hábitat argasídeo, quanto os que retornam de
tempos em tempos para descansar lá ou sazonalmente para se reproduzir.
A maioria das 55 espécies de Argas spp parasita pássaros que se reproduzem
em colônias em árvores ou saliências rochosas, e outras parasitam morcegos que
habitam cavernas. Poucas se alimentam em répteis ou mamíferos silvestres e
nenhuma em animais de produção. Várias espécies tornaram-se importantes
pragas para os galináceos domésticos e pombos, entre elas os vetores da Borrelia
anserina (espiroquetose aviária) e Aegyptianella pullorum (egiptianelose). As Argas
spp também causam paralisia por carrapato e muitas são vetores de vários
arbovírus, alguns dos quais infectam o homem.
As quase 100 espécies de Ornithodoros abrigam-se em cavernas, buracos ou
tocas, debaixo da sombra de árvores; no substrato ou sob pedras ou restos no chão
de colônias reprodutivas de pássaros; em ninhos de pássaros em buracos de árvore;
ou debaixo de grandes pedras junto com lagartos ou tanreques (espécie de
mamíferos insetívoros). Diferentes grupos de espécies parasitam répteis, pássaros
ou mamíferos. Algumas espécies adaptaram-se aos diferentes ambientes onde os
animais de produção são confinados, e também são pragas para o homem. Certas
espécies são vetores de espiroquetas da febre recorrente (Borrelia spp) e dos vírus
que causam a peste suína africana e podem causar toxicose. Numerosas toxinas
salivares ou arbovírus transmitidos pelos Ornithodoros causam irritação ou doenças
febris no homem.
Uma população de argasídeos normalmente parasita apenas um único tipo de
vertebrados e habita sua área de abrigo, possuindo vários hospedeiros, ou seja, as
larvas alimentam-se em um hospedeiro, caem ao substrato e sofrem metamorfose;
os vários estágios de ninfas alimentam-se cada um em um hospedeiro, caem e
sofrem metamorfose; os adultos alimentam-se várias vezes (mas não sofrem
metamorfose). As ninfas e adultos dos argasídeos alimentam-se de forma rápida
(usualmente 30 a 60min). As larvas de alguns argasídeos também. Outras exigem
vários dias para se ingurgitar totalmente. Os adultos argasídeos acasalam-se fora
do hospedeiro e várias vezes; posteriormente, as fêmeas depositam algumas
Infestação por Carrapatos 1009

centenas de ovos em vários lotes (um lote por vez) e alimentam-se entre as
oviposições.
O peculiar gênero argasídeo Otobius será discutido na página 1023.
Parasitismo ixodídeo – Os Ixodidae totalizam mais de 650 espécies (contra
aproximadamente 155 espécies de argasídeos), ocupam muito mais hábitats e
nichos que os argasídeos e parasitam um número maior de vertebrados em uma
maior variedade de ambientes. Mais que 600 espécies de ixodídeos têm um ciclo de
vida de 3 hospedeiros; outros têm um ciclo de 2 hospedeiros e alguns têm um ciclo
de 1 hospedeiro. Cada estágio de desenvolvimento pós-embrionário ixodídeo
(larva, ninfa, adulto) alimenta-se apenas uma vez, se não for por um período de
vários dias. Machos e fêmeas da maioria das espécies que parasitam animais de
produção acasalam-se enquanto no hospedeiro, embora alguns se acasalem fora
do hospedeiro, no chão ou em buracos. Os machos consomem menos alimento que
as fêmeas, mas permanecem por mais tempo no hospedeiro e podem se acasalar
com várias fêmeas. Durante as épocas de inatividade, poucas ou nenhuma das
fêmeas são encontradas alimentando-se, mesmo que os machos ainda estejam
presos aos hospedeiros. A atividade da população larval ou ninfal geralmente
alcança o pico durante as estações de “descanso” dos adultos, embora em algumas
espécies haja mais ou menos uma sobreposição na dinâmica sazonal de imaturos
e adultos.
O macho ixodídeo torna-se sexualmente maduro apenas após começar a se
alimentar, acasalando-se depois disso com uma fêmea que esteja se alimentando.
Apenas o pós-acasalamento faz com que a fêmea se torne repleta e completamente
madura sexualmente. Ela então se destaca, cai, e por um período de alguns dias,
deposita um único lote de numerosos ovos no ou perto do solo, geralmente em
frestas ou debaixo de pedras ou restos. Dependendo da espécie e da quantidade
de alimentação de uma fêmea, o lote geralmente totaliza 1.000 a 4.000, porém pode
ser > 12.000 ovos. A fêmea morre após a oviposição. Notavelmente, os ixodídeos
(exceto as espécies de 1 hospedeiro) gastam ≥ 90% de seu tempo de vida fora do
hospedeiro, um fato de extrema importância no planejamento de medidas de controle.
O processo de alimentação de vários dias progride lentamente; a forma de balão
característica das larvas, ninfas e fêmeas ingurgitadas desenvolve-se apenas
durante a metade final do dia de alimentação e é seguida pelo destacamento. O
momento de queda em certas horas do dia ou da noite é governado por um ritmo
circadiano intimamente associado ao ciclo de atividade do hospedeiro principal.
Também é vital saber se os imaturos de uma espécie de ixodídeo alimentam-se
na mesma espécie de hospedeiro que os adultos parasitam, ou em vertebrados
menores. Onde os hospedeiros menores aceitáveis são escassos, os imaturos de
algumas espécies de ixodídeos podem alimentar-se nos mesmos animais de
produção hospedeiros que os adultos; os imaturos de outras espécies raramente ou
nunca o fazem.
A proximidade de hospedeiros aceitáveis, gradientes de temperatura do ar e
umidade atmosférica durante os períodos de “descanso” e “procura de hospedeiro”
estão entre os numerosos fatores que regulam o desenvolvimento de cada estágio
e, no caso das fêmeas, oviposição.
Ixodídeos de 3 hospedeiros – A maioria das espécies de ixodídeos tem um ciclo
de 3 hospedeiros. As larvas recém-eclodidas procuram um hospedeiro apropriado,
geralmente através da vegetação, alimentam-se por vários dias, caem e mudam
para ninfas, as quais repetem estas atividades e mudam para adultos. Das espécies
de 3 hospedeiros que parasitam animais de produção, algumas apresentam
imaturos e adultos que parasitam o mesmo tipo de hospedeiro; estes, quase sempre
desenvolvem enormes densidades populacionais. O sucesso das espécies de
ixodídeos que requerem hospedeiros de tamanho menor para os imaturos depende
Infestação por Carrapatos 1010

da disponibilidade destes hospedeiros nos animais de produção que pastam e


pastejam no solo. Os numerosos riscos naturais inerentes ao ciclo de 3 hospedeiros
são compensados pelos inúmeros benefícios proporcionados pelas espécies de
carrapatos adaptáveis às práticas de manejo animal. Apenas certos ixodídeos
específicos para herbívoros adaptaram-se à coexistência com animais de produção,
e aí está a resposta para os numerosos problemas com carrapatos em animais de
produção na África, onde os hospedeiros para adultos e imaturos são abundantes.
Ixodídeos de 2 hospedeiros – Alguns ixodídeos, especialmente os que parasitam
mamíferos errantes (e também pássaros em certos casos) em ambientes hostis do
Velho Mundo, desenvolveram um ciclo de 2 hospedeiros no qual larvas e ninfas
alimentam-se em um hospedeiro, e os adultos em outro. Como nas espécies de 3
hospedeiros, ambos os hospedeiros podem ser diferentes ou da mesma espécie.
Os parasitas de 2 hospedeiros dos animais de produção prosperam tanto nos
ambientes hostis quanto nos não hostis e são difíceis de controlar. Isto é verdadeiro
sobretudo nas espécies de 2 hospedeiros que se alimentam nas orelhas e área anal
dos animais de produção.
Ixodídeos de 1 hospedeiro – Entre os mais prejudiciais de todos os carrapatos,
estão várias espécies de 1 hospedeiro. Estes parasitas se expandiram conjunta-
mente com os herbívoros distribuídos em enormes extensões nos trópicos ( Boophilus
spp, Dermacentor nitens, etc.) ou em zonas temperadas (D. albipictus, Hyalomma
scupense). Larvas, ninfas e adultos alimentam-se em um único animal até que a
fêmea acasalada e repleta caia no chão e oviponha.
Locais de alimentação – Cada espécie tem um ou mais locais de alimentação
preferidos no hospedeiro, embora em infestações pesadas, outras áreas do corpo do
hospedeiro possam ser utilizadas. Algumas alimentam-se principalmente na cabeça,
pescoço, ombros e ancas; outras nas orelhas; outras ao redor do ânus e abaixo da
cauda. Outros locais de alimentação freqüentemente explorados são as axilas, úbere,
genitália masculina e pincel da cauda. Os imaturos e adultos quase sempre têm locais
de alimentação preferidos diferentes. A fixação do grande e irritante Amblyomma spp
é regulada pela produção de uma feromona de agregação e ligação pelo macho, a
qual assegura que os carrapatos se fixem em locais menos vulneráveis.

IXODIDAE I MPORTANTES
Amblyomma spp
Os carrapatos do gênero Amblyomma são grandes parasitas de 3 hospedeiros.
Têm olhos e peças bucais fortes e alongadas e são mais ou menos brilhantemente
ornamentados, e estão confinados geralmente aos trópicos e subtrópicos. Os
adultos e imaturos de 37 das 102 espécies conhecidas neste gênero parasitam
répteis, os quais junto às aves que se alimentam no solo, são freqüentemente
hospedeiros de carrapatos imaturos de gênero Amblyomma que se adaptaram, no
estágio adulto, para parasitar mamíferos. Suas longas peças bucais fazem com que
os carrapatos do gênero Amblyomma sejam especialmente difíceis de serem
removidos manualmente e, com freqüência, causam sérios ferimentos que podem
se tornar secundariamente infectados por bactérias ou larvas da bicheira.
A maioria, se não todos, dos carrapatos do gênero Amblyomma que parasitam
animais de produção são reservatórios e vetores da Cowdria ruminantium, o agente
rickettsial responsável pela “água no coração” (ver pág. 478). Certos carrapatos do
gênero Amblyomma americano que parasitam animais de produção são vetores
provados ou potenciais deste agente.
A Amblyomma americanum , o carrapato estrela solitária, é abundante no sul dos
EUA, do Texas e Missouri até a Costa Atlântica e se distribui para o norte até New
Jersey. Também é uma praga famosa no México e Américas Central e do Sul.
Infestação por Carrapatos 1011

O escudo é característico, devido a uma pálida ornamentação no macho e uma


considerável mancha prateada (“estrela”) próxima da margem posterior da fêmea.
Larvas, ninfas e adultos são indiscriminados na escolha do hospedeiro e parasitam
vários animais de produção e silvestres, assim como o homem. A atividade nos EUA
continua do início da primavera até o fim do outono. Os locais de alimentação nos
mamíferos domésticos e silvestres são geralmente áreas com pêlo ralo; os ferimen-
tos nestes locais predispõem os animais de produção ao ataque pela mosca da
bicheira, Cochliomyia hominivorax. O carrapato estrela solitária transmite os agentes
que causam a tularemia, a febre maculosa das Montanhas Rochosas, a febre Q e
a doença de Lyme, e pode causar paralisia por carrapatos no homem e cães. O vírus
da estrela solitária (Bunyaviridae) foi isolado em uma A. americanum no Kentucky.
A Amblyomma cajennense, o carrapato de Caiena, distribui-se da América do Sul
até o sul do Texas. Como com a A. americanum, cada estágio ativo é indiscriminado
na escolha do hospedeiro: animais de produção e uma grande variedade de animais
silvestres (aves e mamíferos) servem como hospedeiros. As pessoas são severa-
mente irritadas por grupos de larvas de A. cajennense (micuins ou “carrapatos-
semente”) em áreas florestadas ou de grama alta. A maioria dos adultos se prende
na superfície inferior do corpo, especialmente entre as pernas, e alguns se
alimentam em qualquer lugar do corpo. A atividade continua por todo o ano. A
Amblyomma cajennense é aparentemente um vetor do agente rickettsial da febre
maculosa das Montanhas Rochosas. O vírus de Wad Medani (Reoviridae, um
orbivírus), um vírus africano transportado para as ilhas do Caribe por bovinos
infestados com A. variegatum vindos do Senegal, tem sido isolado da A. cajenense,
na Jamaica.
A Amblyomma maculatum, o carrapato da costa do Golfo, é uma praga importan-
te de animais de produção, sobretudo bovinos, da América do Sul ao sul dos EUA.
Os hábitats mais favoráveis são áreas quentes com grande precipitação chuvosa,
próximas à orla marítima. Os imaturos geralmente parasitam pássaros e pequenos
mamíferos; os adultos parasitam veados, bovinos, eqüinos, ovinos, suínos e cães.
A atividade de alimentação dos adultos ocorre principalmente no fim do verão e
começo do outono, mas pode começar mais tarde após um verão seco. A maioria
dos adultos infesta as orelhas, onde os ferimentos de alimentação tornam-se os
locais iniciais de bicheiras. Grupos de adultos se alimentando também causam
muita irritação nas partes superiores do pescoço dos bovinos e no “cupim” dos
bovinos da raça brahman.
A Amblyomma imitator parasita os animais de produção da América Central ao
sul do Texas. Pragas ocasionais nos animais de produção na América tropical são
A. neumanni (Argentina), A. ovale e A. parvum (Argentina ao México), A. tigrinum
(maior parte da América do Sul) e A. tapirellum (Colômbia ao México).
A Amblyomma testudinarium habita os ambientes florestados tropicais asiáticos
do Sri Lanka e Índia à Malásia e Vietnã, Indonésia, Bornéu, Filipinas, Taiwan e sul do
Japão. Os adultos são particularmente abundantes nos porcos silvestres e domés-
ticos e também infestam veados, bovinos e outros animais de produção e o homem.
Os imaturos parasitam pássaros e mamíferos de menor tamanho, assim como o
homem. Na Índia e Sri Lanka, as A. integrum e A. mudlairi adultas também parasitam
animais de produção, ungulados silvestres e o homem.
A Amblyomma hebraeum, o carrapato malhado do sul da África, habita savanas
quentes, moderadamente úmidas da República da África do Sul, Namíbia, Botsuana,
Zimbábue, Malavi, Moçambique e Angola. Os imaturos alimentam-se em vários
mamíferos de pequeno porte, pássaros que se alimentam no solo e répteis. Os
adultos infestam animais de produção, antílopes e outros animais silvestres. Os
adultos, fixados, principalmente às áreas do corpo com pêlo relativamente curto,
causam sérios ferimentos que se tornam secundariamente infectados por bactérias
Infestação por Carrapatos 1012

e infestados por moscas da bicheira (Chrysomyia bezziana). Como outros carrapa-


tos do gênero Amblyomma africano (carrapatos malhados) que parasitam animais
de produção, a A. hebraeum é um importante vetor da Cowdria ruminantium, e a
larva transmite a Rickettsia conori (tifo por carrapato) ao homem.
A Amblyomma variegatum , o carrapato malhado da África tropical, é um parasita
brilhantemente colorido e facilmente visível, encontrado em todas as savanas
subsaarianas, indo para o sul até a distribuição da A. hebraeum, e também no sul
da Arábia, em várias ilhas nos Oceanos Atlântico e Índico e no Caribe. As
preferências de hospedeiro são semelhantes às da A. hebraeum, mas também
incluem camelos. Os adultos alimentam-se principalmente durante as estações
chuvosas, e os imaturos, durante as estações secas. A maioria dos adultos prende-
se no lado inferior do corpo do hospedeiro, na genitália e abaixo da cauda. A
Amblyomma variegatum lesa o hospedeiro e transporta a C. ruminantium semelhan-
temente à A. hebraeum. Este carrapato não é considerado um vetor eficiente da
doença dos ovinos de Nairóbi, mas é um vetor secundário da febre hemorrágica da
Criméia-Congo (FHCC). O vírus de Dugbe foi isolado da A. variegatum em 6 nações
ao norte do Equador; os vírus de Thogoto e Bhanja também estão associados a este
carrapato em várias áreas ao norte do Equador. Notavelmente, o vírus da febre
amarela foi isolado da A. variegatum em bovinos na República Centro-Africana e
demonstrou-se que ele é transmitido transovarianamente à progênie de fêmeas
infectadas. O vírus de Jos infecta a A. variegatum da Etiópia ao Senegal e foi
transportado neste carrapato para a Jamaica.
A Amblyomma lepidum, o carrapato malhado do leste da África, habita as
savanas áridas do norte da Tanzânia ao Sudão central. A Amblyomma gemma, o
carrapato malhado jóia, ocorre em ambientes semelhantes da Tanzânia, Somália,
Quênia e Etiópia. Uma pequena variedade de carrapato malhado do búfalo, A.
cohaerens, é abundante nos bovinos nas terras altas da Etiópia; mas do Zaire à
Tanzânia, a variedade maior de A. cohaerens parasita principalmente o búfalo cape.
Outros carrapatos Amblyomma africanos do búfalo cape e diferentes grandes
mamíferos e animais de produção são a A. pomposum , das florestas úmidas das
terras altas da Angola, Zaire, Uganda, sul do Sudão, Quênia e Zimbábue; e a A.
astrion, da África Ocidental e Zaire.
Boophilus spp
Cada uma das 5 espécies de Boophilus spp tem um ciclo de vida de 1 hospedeiro,
que pode ser completado em 3 a 4 semanas e resulta numa pesada carga de
carrapatos. Sob estas condições, a resistência aos acaricidas torna-se um importan-
te problema nos esforços de controle. O gado zebu, o qual tem servido por séculos
como hospedeiro de B. microplus na região indiana, desenvolveu resistência por ser
parasitado por grande número de Boophilus e é usado, puro de origem ou mestiço
com outras raças, em programas de controle integrados. A Boophilus microplus,
considerada o mais importante carrapato parasita de animais de produção do
mundo, foi introduzida a partir de florestas habitadas por bovídeos ou cervídeos da
região indiana a muitas áreas da Ásia tropical e subtropical, nordeste da Austrália,
Madagáscar, terras baixas costeiras do sudeste da África à linha do Equador, e
maior parte das Américas do Sul e Central, México e Caribe. A Boophilus microplus
e B. annulatus foram erradicadas dos EUA após um longo e dispendioso programa
de controle. A vigilância constante é mantida para prevenir a sua reintrodução. A
Boophilus annulatus do sul da antiga URSS, Oriente Próximo e Médio e da área
mediterrânea foi introduzida por animais de produção dos primeiros colonos
espanhóis no nordeste do México, porém não se espalhou para a América Central.
Na África, ao sul do Saara e norte da linha do Equador, os movimentos de bovinos
provavelmente são importantes para as muitas populações de B. annulatus. A
Infestação por Carrapatos 1013

Boophilus decoloratus, que se distribui do sul da África até o Saara está sendo
substituída na parte sudeste desta área pela B. microplus. Nas zonas mais úmidas
da África Ocidental, a B. annulatus mistura-se ou é totalmente substituída pela B.
geigyi. Populações dispersas da B. geigyi ocorrem no extremo leste e no sul e centro
do Sudão. No Sri Lanka, uma espécie não denominada infesta bovinos e búfalos
domésticos e também veados selvagens. O único Boophilus restrito a ovinos e
caprinos (e ocasionalmente eqüinos) é a B. kohlsi da Síria, Iraque, Israel, Jordânia,
oeste da Arábia Saudita e Iêmen. Boophilus microplus e B. annulatus são importan-
tes vetores da Babesia bigemina, B. bovis e Anaplasma marginale. A Boophilus
decoloratus é um vetor eficiente da Babesia bigemina e A. marginale não transmite
a B. bovis.

Dermacentor spp
Dezenove das 30 espécies de Dermacentor spp habitam zonas temperadas. Das
11 espécies tropicais, apenas a D. nitens é de maior importância em medicina
veterinária; as outras podem transmitir infecções zoonóticas e os adultos podem ser
comuns na natureza em suínos, veados e antílopes. Os imaturos infestam principal-
mente roedores e também lagomorfos. Os Dermacentor spp que estão em áreas
frias (e a D. nitens na América tropical) possuem ciclos de vida especializados e
dinâmica de atividade sazonal, cada um dos quais tendo que ser considerado
separadamente. Por outro lado, o ciclo de vida do Dermacentor é do padrão típico
de 3 hospedeiros.
A Dermacentor (Anocentor) nitens, um carrapato eqüino tropical de 1 hospedeiro,
originalmente parasitava veados (Mazama) nas florestas do norte da América do
Sul. Com a introdução dos Equidae e outros animais de produção neste hábitat,
adaptaram-se a estes animais. Passando toda a sua vida parasitária no interior das
orelhas do hospedeiro, este parasita facilmente se espalhou por atividades huma-
nas para outras áreas das Américas, incluindo Flórida e Texas. Além das cavidades
auditivas, cada estágio ativo pode infestar as vias nasais e a crina, o abdome ventral
e a área perianal. A Dermacentor nitens transmite a Babesia caballi transovariana-
mente a sucessivas gerações, e é importante à indústria de corrida de cavalos.
Outra espécie americana de 1 hospedeiro, a D. albipictus, o carrapato de inverno
ou do alce, distribui-se do Canadá e norte dos EUA até o oeste dos EUA e México.
Uma “forma” amarronzada, algumas vezes chamada D. nigrolineatus , distribui-se
do Novo México a sul e leste dos EUA e provavelmente é uma verdadeira
subespécie, se não for uma espécie por si só. O período de alimentação larva-ninfa-
adulto em um único hospedeiro (alce, veado, uapiti, ou bovinos ou cavalos
domésticos) estende-se do outono à primavera. Os hospedeiros severamente
infestados podem morrer. A Dermacentor albipictus causa a quase sempre fatal
“doença do alce fantasma” no Canadá e é um vetor secundário do vírus da febre por
carrapato do Colorado.
As outras 6 espécies de Dermacentor spp americanos têm ciclos de vida de 3
hospedeiros. O carrapato do mato das Montanhas Rochosas, D. andersoni, ocorre
do lado oeste de Nebraska até as montanhas ocidentais (Cascatas e Serras
Nevadas), no norte do Novo México e Arizona e no oeste do Canadá. O carrapato
canino americano, D. variabilis, ocorre no oeste das Cascatas e Serras Nevadas, no
México, de Nebraska ao Atlântico e no leste do Canadá. Ambas as espécies
produzem a paralisia por carrapato nos animais de produção, animais silvestres e
no homem. São os principais vetores da Rickettsia rickettsii, o agente da febre
maculosa das Montanhas Rochosas. A Dermacentor andersoni é também o vetor
principal do vírus da febre por carrapato do Colorado e transmite o vírus de
Powassan, a Anaplasma marginale e os agentes da tularemia e febre Q. A
D. variabilis transmite o vírus de Sawgrass e a A. marginale. Os adultos de ambas
Infestação por Carrapatos 1014

as espécies parasitam animais de produção e silvestres, como o veado, o bisão e


o uapiti, mas os da D. variabilis preferem cangambás, guaxinins, pumas, etc. e cães
domésticos. Os imaturos alimentam-se em roedores e outros pequenos mamíferos
silvestres. Uma espécie relacionada, biologicamente semelhante, a D. occidentalis,
está restrita às terras baixas do Pacífico, do Oregon à baixa Califórnia.
No oeste dos EUA e México, D. parumapterus, D. hunteri e D. halli parasitam
várias lebres e coelhos, carneiros selvagens, e catetos, respectivamente. Estes
carrapatos raramente têm contato com animais de produção. No México e Guatemala,
a D. dissimilis parasita vários hospedeiros; na Costa Rica e Panamá, a D. latus
infesta antas.
Nas estepes, florestas e montanhas eurasianas, D. marginatus, D. reticulatus e
D. silvarum, coletivamente, são vetores de vários vírus e da Babesia bovis, B. caballi,
B. equi, B. canis, Theileria ovis, Anaplasma ovis e dos agentes da tularemia e
febre Q. A Dermacentor marginatus é encontrada em florestas, pântanos,
semidesertos e zonas alpinas da França ao sudoeste da Sibéria, Casaquistão,
Sin-kiang, regiões autônomas da China, Irã e norte do Afeganistão. A Dermacentor
reticulatus distribui-se das ilhas da Irlanda e Bretanha ao noroeste da Sibéria e
Sin-kiang, China, nas planícies aluviais e florestas decíduas e de coníferas. A
Dermacentor silvarum distribui-se da Sibéria central e nordeste da China ao Japão
em pântanos, planícies, florestas secundárias e de arbustos, e fazendas em áreas
florestadas da taiga. Alguns machos nas populações de cada uma destas 3 espécies
permanecem presos ao hospedeiro durante o inverno. Os adultos e imaturos podem
passar o inverno no chão. A maior atividade adulta ocorre do início da primavera ao
verão, com um pico menor no outono. Larvas e ninfas são ativas da primavera ao
outono. O ciclo de vida pode ser completado em 1 ano ou estendido por uma ou mais
diapausas de inverno ou verão, ou ambas, para 2 a 4 anos.
Aproximadamente outros 12 Dermacentor spp habitam certas terras baixas,
estepes montanhosas e áreas semidesertas da Ásia temperada. Os seus adultos
são comumente observados em camelos, bovinos, eqüinos, ovinos e caprinos. As
várias espécies do subgênero de Dermacentor, o Indocentor, na Ásia tropical, são
parasitas de porcos silvestres; também infestam animais silvestres maiores, mas
raramente ou nunca se alimentam em animais de produção.

Haemaphysalis spp
Poucas das 155 espécies de Haemaphysalis parasitam animais de produção,
mas as que o fazem são economicamente importantes na Eurásia, África, Austrália
e Nova Zelândia. Alguns parasitas hemafisalinos de veados silvestres, antílopes e
bovinos adaptaram-se aos bovinos domésticos e um pouco menos a ovinos e
caprinos. Outros, originalmente específicos para vários carneiros e cabras selva-
gens, adaptaram-se principalmente às raças domésticas destes animais. Algumas
espécies africanas que se adaptaram a carnívoros, agora parasitam cães domés-
ticos. Os imaturos das espécies que parasitam animais de produção geralmente se
alimentam em vertebrados de menor tamanho, porém existem algumas exceções
dignas de nota. Todos os Haemaphysalis spp têm um ciclo de vida de 3 hospedeiros
e são pequenos (os adultos não alimentados têm < 4,5mm de comprimento),
amarronzados ou avermelhados e sem olhos. A maioria tem peças bucais muito
curtas. Diferentes espécies produzem paralisia por carrapatos e são vetores dos
agentes causadores da febre Q, tularemia, brucelose e Theileria orientalis, T. ovis,
Babesia major, B. motasi, B. canis, Anaplasma masaeterum, etc.
A Haemaphysalis punctata é largamente distribuída onde ovinos, caprinos e
bovinos se alimentam em certas florestas abertas e pastos com arbustos do
sudoeste da Ásia (Irã e antiga URSS), à maior parte da Europa, incluindo o sul da
Escandinávia e Bretanha. Os imaturos infestam pássaros, ouriços, roedores e
Infestação por Carrapatos 1015

répteis. Além da transmissão de Anaplasma e Babesia spp, diferentes populações


de H. punctata estão infectadas pelo vírus da encefalite por carrapato, vírus de
Tribec, vírus de Bhanja e o vírus da febre hemorrágica da Criméia-Congo.
As Haemaphysalis sulcata adultas parasitam animais de produção (principal-
mente ovinos e caprinos) do noroeste da Índia e sul da antiga URSS à Arábia, Sinai
e sul da Europa. As H. parva (otophila) adultas parasitam os mesmos hospedeiros
da espécie anterior, do sudoeste da antiga URSS até a área mediterrânea do Oriente
Próximo (exceto Egito). As H. sulcata imaturas são especialmente comuns em
lagartos, mas a variedade de hospedeiros de larvas e ninfas de ambas as espécies
é semelhante à da H. punctata.
A Haemaphysalis longicornis é um parasita de veados e animais de produção no
Japão e nordeste da Ásia; há uma forma (raça) bissexual nas áreas do sul, e uma
raça partenogenética nas áreas do norte. A última foi introduzida na Austrália, Nova
Zelândia e ilhas do Pacífico, onde preserva a sua estranha capacidade reprodutiva.
Os imaturos geralmente parasitam pequenos mamíferos e pássaros, mas também
podem se alimentar em animais de produção; pesadas densidades populacionais
podem se tornar uma série praga em veados e em animais de produção. Este
carrapato é o vetor principal da Theileria orientalis, e também transmite a Babesia
ovata, B. gibsoni, e os agentes da febre Q, encefalite de Powassan e a encefalite
russa de primavera–verão. As larvas, ao se alimentar, provocam dermatite aguda
no homem.
Outros hemafisalinos eurasianos que parasitam animais de produção são a H.
inermis (terras baixas do norte do Irã e sudoeste da antiga URSS até a Europa
central e sudeste, em direção à Itália), H. pospelovashtromae (montanhas do sul da
antiga URSS e Mongólia), H. kopetdaghicus (Área do Mar Cáspio, montanhas
da antiga URSS e Irã), e H. tibetensis, H. xinjiangensis e H. moschisuga (China).
Três das várias espécies hemafisalinas de parasitas de animais de produção que
ocorrem principalmente na Índia são especialmente dignas de nota: a H. bispinosa
distribui-se no Paquistão, Bangladesh, Nepal, Butão, Sri Lanka e Malásia, e
transmite o Babesia spp a bovinos, ovinos e cães; a H. spinigera é o principal vetor
do vírus da doença da floresta de Kyasanur em humanos do Estado de Karnataka
(na Índia); e a H. anomala se distribui das terras baixas do Nepal ao Sri Lanka e
montanhas do noroeste da Tailândia.
Na Ásia temperada, 18 outros hemafisalinos parasitam animais de produção: 9
deles no Himalaia e montanhas afastadas e os outros no nordeste da antiga URSS,
Coréia e Japão. O iaque e o híbrido iaque-bovino doméstico estão entre os animais
de produção que servem de hospedeiros para hemafisalinos do Himalaia. Várias
espécies do Himalaia parecem preferir caprinos e ovinos.
Na África subsaariana, 4 hemafisalinos infestam animais de produção em
florestas de terras altas ou florestas secundárias úmidas ou ribeirinhas de terras
baixas. São a H. parmata (Etiópia e Quênia, África Central e Ocidental, até Angola),
H. aciculifer (Etiópia até Camarões e Zimbábue, até a África do Sul), H. rugosa (sul
do Sudão e Uganda até Gana e Senegal), e H. silacea (Zululândia e leste da
África do Sul).

Hyalomma spp
Os carrapatos do gênero Hyalomma são quase sempre os mais abundantes
carrapatos parasitas de animais de produção, incluindo camelos, em terras baixas
e biótopos de altitude média quentes, áridos e semi-áridos, geralmente agrestes, os
com longas estações secas, da Ásia central e do sudoeste até o sul da Europa e sul
da África. Pelo menos 15 das 30 espécies conhecidas de Hyalomma spp são
importantes vetores de agentes infecciosos aos animais de produção e homem. O
ciclo de vida de 3 hospedeiros predomina neste gênero, mas algumas espécies têm
Infestação por Carrapatos 1016

ciclo de 1 ou de 2 hospedeiros. Algumas espécies de 3 hospedeiros podem


desenvolver ciclos em 1 ou 2 hospedeiros, uma capacidade peculiar deste gênero
ixodídeo. Os hialominos são quase todos carrapatos moderadamente grandes a
grandes, com longas peças bucais.
No subgênero Hyalommasta, os imaturos da única espécie, H. aegyptium,
parasitam jabutis e animais silvestres e de produção de menor porte do Paquistão
a ambos os lados da bacia mediterrânea. Os adultos são específicos de jabutis.
O subgênero de Hyalommina concentra-se no subcontinente indiano e distribui-
se até a Somália. Cada uma das 6 espécies tem um ciclo de 3 hospedeiros. Os
imaturos parasitam mamíferos de pequeno porte, sobretudo roedores. A preferência
de hospedeiros por parte dos estágios adultos inclui ovinos, caprinos, bovinos e
gazelas silvestres. Duas espécies hoje parasitam principalmente bovinos e búfalos
domésticos: H. brevipunctata (Índia e Paquistão) e H. kumari (Índia, Paquistão,
Afeganistão, noroeste do Irã e Tajiquistão). Geralmente, 3 parasitam ovinos e
caprinos: H. hussaini (Índia, Paquistão, Burma), H. rhipicephaloides (áreas do Mar
Morto e Mar Vermelho), e H. arabica (Iêmen e Arábia Saudita). H. punt (Somália e
Etiópia) se alimenta em antílopes, camelos, bovinos, ovinos e caprinos.
O subgênero Hyalomma contém 15 espécies de importância para saúde pública
e veterinária. Três das 15 espécies têm 2, 3 e 4 subespécies, respectivamente. A
principal entre estas é um carrapato de 2 hospedeiros, a H. anatolicum anatolicum,
a qual é um dos mais prejudiciais carrapatos do mundo e está difusamente
distribuída entre camelos, bovinos e eqüinos nos ambientes de estepe e semideserto
da Ásia Central a Bangladesh, Oriente Médio e Oriente Próximo, Arábia, sudeste da
Europa e África do norte da linha do Equador. Imaturos e adultos geralmente
infestam os mesmos tipos de hospedeiros. Ninfas e adultos não alimentados
passam a seca e estação de inverno em frestas em paredes de pedra, estábulos e
terrenos sem cultivo e com ervas daninhas. Quando os imaturos infestam mamíferos
menores, pássaros ou répteis, o tipo de ciclo de vida é o de 3 hospedeiros.
Hyalomma anatolicum anatolicum transmite Theileria annulata, Babesia equi,
Babesia caballi, Anaplasma marginale, Trypanosoma theileri, e pelo menos 5
arbovírus; é um importante vetor do vírus da febre hemorrágica da Criméia-Congo
para o homem. Os numerosos imaturos e adultos da H. a. anatolicum quase sempre
parasitam animais de produção, causando grandes perdas econômicas. Os imatu-
ros da subespécie H. a. excavatum (um parasita de 3 hospedeiros) infestam
principalmente roedores escavadores em biótopos um tanto diferentes em um
mesmo ambiente que a H. a. anatolicum. Adultos de ambas as subespécies podem
infestar o mesmo animal. A distribuição da H. a. excavatum é um tanto mais limitada
que a da H. a. anatolicum, mas a sua densidade populacional no inverno é quase
sempre maior que a da última. Uma espécie intimamente relacionada, a H.
lusitanicum, substitui a H. a. anatolicum da Itália central a Portugal, Marrocos e Ilhas
Canárias e está associada às babesioses eqüina e bovina. Além dos animais de
produção, veados e coelhos servem como hospedeiros.
O complexo da Hyalomma marginatum consiste de 4 subespécies, todas
invariavelmente de 2 hospedeiros. Os adultos parasitam animais de produção e
herbívoros silvestres; os hospedeiros primários dos imaturos são pássaros; lebres
e ouriços são hospedeiros secundários, e os roedores são raramente, ou nunca,
parasitados. As subespécies são: H. m. marginatum (área do Mar Cáspio do Irã e
antiga URSS a Portugal e noroeste da África); H. m. rufipes (sul do Saara até a África
do Sul, também vale do Nilo e sul da Arábia), H. m. turanicum (Paquistão, Irã, sul da
antiga URSS, Arábia, partes do nordeste da África – introduzida com ovinos do Irã
até o Karoo); e H. m. isaaci (do Sri Lanka até o sul do Nepal, Paquistão e norte do
Afeganistão). As subespécies de Hyalomma marginatum são importantes vetores
do vírus da febre hemorrágica da Criméia-Congo e também transmitem agentes de
Infestação por Carrapatos 1017

doenças de animais de produção e outros vírus que infestam animais silvestres,


de produção e o homem.
O complexo da Hyalomma asiaticum consiste de 3 subespécies com ciclos de
vida de 3 hospedeiros, que habitam desertos, semidesertos e estepes do sudoeste
da China, Mongólia e sul da antiga URSS em direção ao Oriente Médio até o Iraque.
Os roedores são os principais hospedeiros dos imaturos; as lebres podem também
ser infestadas. Os adultos parasitam animais de produção, sobretudo camelos. As
subespécies do leste para o oeste, H. a. kozlovi, H. a. asiaticum e H. a. caucasicum,
são de considerável importância veterinária e médica.
Três espécies adicionais de Hyalomma spp de 3 hospedeiros que parasitam
camelos (e outros animais de produção) são a H. dromedarii (da Índia à África ao
norte da linha do Equador), H. schulzei (do leste do Irã à Arábia e norte do Egito) e
H. franchinii (da Síria à Tunísia). Os imaturos parasitam roedores e outros pequenos
mamíferos, pássaros e répteis; os imaturos da H. dromedarii também infestam
animais de produção. A Hyalomma dromedarii é de considerável importância
veterinária e médica. As outras 2 espécies foram pouco investigadas neste aspecto.
A Hyalomma detritum , um importante vetor da Theileria annulata, é uma espécie
de 3 hospedeiros, cujos adultos e imaturos parasitam animais de produção. Os seus
biótopos são áreas úmidas em estepes, desertos e semidesertos do sul da China,
Mongólia, e terras baixas do Nepal ao sul da Europa e norte da África. A Hyalomma
impeltatum distribui-se do Irã e Arábia ao norte da Tanzânia e Chade. Os adultos
parasitam animais de produção; os imaturos alimentam-se em roedores e outros
mamíferos pequenos, pássaros e répteis.
A Hyalomma scupense, um parasita de 1 hospedeiro, de bovinos e eqüinos do
sudoeste da antiga URSS e sudeste da Europa, é incomum devido ao fato de passar
o inverno no hospedeiro, o qual quase sempre sofre bastante ao longo do período
de alimentação de numerosas larvas (fim do outono), ninfas (inverno) e adultos
(primavera). A H. scupense é um vetor da Theileria annulata e da Babesia equi .
Além das várias espécies já mencionadas, as savanas africanas abrigam outras
5 espécies de Hyalomma spp que parasitam animais silvestres e de produção: H.
truncatum (sudeste do Egito ao sul da África), H. albiparmatum (sul do Quênia, norte
da Tanzânia), H. erythraeum (leste da Somália e Etiópia e Iêmen), H. impressum
(oeste do Sudão e África Ocidental) e H. nitidum (República Centro-Africana e África
Ocidental). Os imaturos destas espécies de 3 hospedeiros geralmente infestam
pequenos mamíferos e, menos freqüentemente, pássaros e répteis. Cada espécie
é economicamente importante. Por exemplo, a H. truncatum, que causa a doença
do suadouro e a claudicação bovinas e também a paralisia por carrapato em
humanos e ovinos, é um vetor do vírus da febre hemorrágica da Criméia-Congo, da
Coxiella burnetti (febre Q) e da Rickettsia conori (tifo por carrapato).

Ixodes spp
O gênero Ixodes, o maior gênero da família Ixodidae, contém , 220 espécies e
é altamente especializado, tanto estrutural quanto biologicamente. Tanto quanto se
sabe, todas as espécies de Ixodes spp têm um ciclo de vida de 3 hospedeiros. Quase
todas as espécies habitam zonas de florestas tropicais ou temperadas ou pastagens
florestais ou com arbustos; poucos são adaptados a áreas úmidas em semidesertos
ou a colônias de nidificação de aves marinhas em regiões árticas ou subantárticas.
Os hospedeiros são uma grande variedade de aves e mamíferos e alguns répteis.
A maioria das espécies parasita hospedeiros escavadores ou animais que retornam
regularmente a cavernas, covas, ou colônias de nidificação arbóreas ou terrestres.
As poucas Ixodes spp que parasitam artiodáctilos ou perissodáctilos errantes são
excepcionalmente adaptáveis; também parasitam animais de produção e são
Infestação por Carrapatos 1018

importantes pragas ou vetores de agentes que infectam animais de produção e o


homem.
O grupo da Ixodes ricinus da Eurásia, noroeste da África e Américas do Norte e do
Sul é especialmente importante. A Ixodes ricinus, conhecida como carrapato de ovino,
é o protótipo deste grupo, habitando pastos, jardins, arvoredos, planícies aluviais e
florestas, todos relativamente úmidos, frescos, com arbustos e florestados, na maior
parte da Europa, alcançando o Mar Cáspio e o norte do Irã, e também o noroeste da
África. O seu ciclo de vida é de 2 a 4 anos, dependendo da temperatura ambiente (nos
biótopos do Mediterrâneo oriental, mais secos e quentes, a I. ricinus é substituída pela
I. gibbosus, a qual completa seu ciclo de vida em 1 ano). As larvas da I. ricinus
alimentam-se em pequenos répteis, aves e mamíferos; as ninfas, em vertebrados de
pequeno e médio portes; e os adultos alimentam-se principalmente em herbívoros e
animais de produção. Todos os estágios, sobretudo ninfas e adultos, parasitam o
homem. A I. ricinus macho consome pouco ou nenhum alimento, mas se acasala no
hospedeiro, enquanto a fêmea se alimenta. Os adultos são mais ativos na primavera;
em algumas populações, há um pico mais baixo de atividade adulta no outono. As
principais entre as numerosas doenças arbovirais transmitidas pela I. ricinus são
“louping ill”, encefalite por carrapato e febre hemorrágica da Criméia-Congo. Outros
agentes transmitidos aos animais de produção são Coxiella burnetti, Anaplasma
marginale, Babesia divergens e Ehrlichia phagocytophila.
A Ixodes persulcatus, o carrapato da taiga, está intimamente relacionada à
I. ricinus e tem preferências de hospedeiros semelhantes; distribui-se do centro e
leste das montanhas da Europa, através das florestas de terras baixas do Mar
Báltico e lado leste da Carélia pela taiga siberiana até os mares do Japão e do
Okhotsk e as ilhas do norte do Japão. O ciclo de vida é completado em 2 a 4 anos.
É o principal vetor do vírus da encefalite russa da primavera-verão e transmite o
Babesia spp e os agentes da anaplasmose ovina, peste bubônica e tularemia.
Outras representantes asiáticas do grupo da I. ricinus são I. sinensis da China,
I. kashmiricus do norte montanhoso da Índia, Paquistão e Quirguízia; I. pavlovskyi
do sul da antiga Rússia, e I. kazakstani da taiga montanhosa e floresta decídua do
Casaquistão, Quirguízia e Turcomenistão.
Ixodes dammini (também um membro do grupo I. ricinus) é um vetor da Borrelia
burgdorferi, o agente da doença de Lyme no noroeste e centro norte dos EUA e sul
do Canadá; também é um vetor da Babesia microti, o agente da babesiose humana
nas áreas costeiras de Nova Iorque ao Massachusetts. Os principais hospedeiros
das I. dammini adultas são os veados; os animais de produção raramente pastam
em zonas florestadas habitadas por este carrapato. Os adultos da intimamente
relacionada I. scapularis algumas vezes parasitam os animais de produção no sul
dos EUA; os da I. pacificus também o fazem da baixa Califórnia à Colúmbia Britânica
e em bolsões interiores no Idaho, Nevada e Oregon. A Ixodes pacificus transmite os
agentes da doença de Lyme, tularemia e uma rickéttsia do grupo da febre maculosa
das Montanhas Rochosas; sua picada causa úlceras de cura lenta. Uma espécie
relacionada, a I. affinis, distribui-se da Carolina do Sul e Flórida à Argentina. É
encontrada principalmente nos animais silvestres e não foi investigada a sua
capacidade vetorial.
Na África apenas 4 Ixodes spp adaptaram-se aos animais de produção. O
principal destes é o carrapato de paralisia sul-africano, I. rubicundus, da vegetação
das colinas e montanhas úmidas da região do Karoo, na África do Sul. Suas toxinas
salivares causam uma tetraplegia flácida nos animais de produção, homem, cães e
chacais. Os imaturos parasitam a lebre das rochas, outras lebres e os musaranhos-
elefante. Outros parasitas de animais de produção nas terras altas africanas são
I. drakenbergensis (Natal), I. lewisi (Quênia) e I. cavipalpus (do sul do Sudão a
Zimbábue e Angola).
Infestação por Carrapatos 1019

Margaropus spp
Intimamente relacionadas aos Boophilus, as 3 espécies de Margaropus spp,
altamente especializadas, com pernas que lembram contas de rosário, e com 1
hospedeiro, estão restritas a áreas limitadas da África. Margaropus reidi e M. wileyi
são encontradas em girafas no Sudão, e no Quênia e Tanzânia, respectivamente.
Margaropus wileyi é também um parasita de zebras e gnus e a M. winthemi, que se
alimenta no inverno, também parasita zebras, cavalos e, menos freqüentemente,
outros animais de produção, além de antílopes, estando confinada às montanhas da
África do Sul e podendo contribuir para a perda de condições durante o inverno.

Nosomma sp
Os adultos da única espécie deste gênero, a N. monstrosum, parasitam particu-
larmente búfalos domésticos e selvagens, e também o homem, animais de produção
e silvestres, na maior parte da Índia, terras baixas do Nepal, Bangladesh, Tailândia e
Laos. Os imaturos parasitam principalmente roedores murídeos.

Rhipicephalus spp
As espécies de Rhipicephalus ocorrem na Eurásia e norte da África (15 espécies)
e na África subsaariana (, 55 espécies). Os adultos da maioria das espécies
parasitam artiodáctilos, perissodáctilos ou carnívoros silvestres e domésticos. Os
imaturos alimentam-se principalmente em mamíferos menores; entretanto, algu-
mas das espécies que parasitam roedores e hiraxes, e algumas das espécies que
parasitam artiodáctilos, alimentam-se no mesmo hospedeiro que os adultos. O ciclo
de vida deste carrapato é tipicamente de 3 hospedeiros, mas na zona climática do
Mediterrâneo (verão longo e quente com baixa pluviosidade), a R. bursa tem um
ciclo de 2 hospedeiros. Na África subsaariana, com longas estações secas, R.
evertsi e R. glabroscutatum também têm ciclos de 2 hospedeiros.
Várias espécies africanas de Rhipicephalus spp abundantes e economicamente
importantes têm sido por muito tempo difíceis de se identificar ou incorretamente
identificadas. A taxonomia destes grupos está atualmente sendo revisada. Quando
esta revisão for completada, numerosos conceitos de espécies familiares serão
mudados. As “áreas-problema” estão indicadas adiante.
A Ásia tropical é o lar de 5 Rhipicephalus spp; os adultos de 2 espécies parasitam
animais domésticos. A Rhipicephalus haemaphysaloides infesta todos os tipos de
animais de produção, antílopes, veados, carnívoros e lebres silvestres no sudeste
continental da Ásia (também Taiwan e Filipinas), indo para o oeste em direção à
Índia, Sri Lanka, Nepal, Paquistão e oeste do Afeganistão. A Rhipicephalus pilans
infesta animais de produção e silvestres na Indonésia e Bornéu. Os imaturos de
ambas as espécies alimentam-se principalmente em roedores e também em
musaranhos, lebres e pequenos carnívoros.
Da Europa central ao Casaquistão, R. rossicus, R. schulzei e R. pumilio possuem
importância veterinária e médica. No sudoeste da Europa, a R. pusillus infesta cães,
assim como o coelho europeu, a raposa e o porco silvestre. A Rhipicephalus
turanicus, como é atualmente conhecida, distribui-se da China, sul da antiga URSS,
Índia, sul da Europa e África até a África do Sul. Um membro do taxonomicamente
difícil grupo da R. sanguineus, a “ R. turanicus” e suas várias populações, as quais
podem representar várias espécies, requer estudos adicionais sobre sua capacida-
de vetorial.
Uma espécie de 2 hospedeiros facilmente reconhecida, a R. bursa, distribui-se
do oeste do Mediterrâneo europeu ao Irã e Casaquistão. Os adultos e imaturos
parasitam animais de produção, lebres, veados, ovinos e caprinos selvagens, além
Infestação por Carrapatos 1020

do homem. Causam paralisia ovina e transmitem a febre hemorrágica da Criméia-


Congo e outros vírus ao homem, e Babesia, Theileria e Anaplasma spp aos animais
de produção.
O ripicéfalo africano mais conhecido, R. sanguineus, o carrapato de canil ou
carrapato dos cães castanhos, espalhou-se pelo mundo inteiro por meio dos cães
domésticos. Está agora estabelecido em regiões que vão do Canadá e Escandinávia
até a Austrália. Na África, Oriente Próximo, e partes do sul da Europa, os adultos
parasitam carnívoros domésticos e silvestres, ovinos, caprinos, camelos, outros
animais de produção, e vários mamíferos silvestres, sobretudo lebres e ouriços. Os
imaturos na natureza nesta área alimentam-se em mamíferos de pequeno porte.
Entretanto, em situações urbanas em qualquer lugar, os cães são virtualmente os
únicos hospedeiros de imaturos e adultos. O homem raramente é atacado. Cepas
de adultos de R. sanguineus que se alimentam em bovinos são encontradas em
partes do México e no Taiti. Este carrapato é ativo durante todo o ano nos trópicos
e subtrópicos, mas apenas da primavera ao outono em zonas temperadas. As ninfas
e adultos recém-ativos, ao subirem em paredes a partir de fendas ao nível do solo,
são freqüentemente observados. A Rhipicephalus sanguineus é um vetor de
Babesia canis, Ehrlichia canis, Rickettsia rhipicephali, R. conori, febre hemorrágica
da Criméia-Congo e vírus de Thogoto. No centro-sul dos EUA, a R. sanguineus está
associada com focos dispersos da Leishmania mexicana. As implicações deste
carrapato como um vetor de outros agentes infecciosos requerem confirmação.
Certas populações americanas tornaram-se resistentes a inseticidas. O himenóptero
(calcídeo) parasita de carrapatos, Hunterellus hookeri, freqüentemente infesta
ninfas de R. sanguineus na África oriental.
A Rhipicephalus appendiculatus , o “carrapato das orelhas castanho”, é uma
importante praga nas savanas frescas, sombreadas, florestadas e com arbustos
com ≥ 600mm de chuva anuais, do nível do mar até 2.300m de altitude, do sul do
Sudão e leste do Zaire ao Quênia e África do Sul. Os adultos e imaturos alimentam-
se nas orelhas de bovinos, outros animais de produção e antílopes, mas também em
outras áreas quando a infestação é grande. Os imaturos podem infestar pequenos
antílopes e carnívoros, e ocasionalmente roedores. A atividade sazonal está
intimamente associada à temperatura e a períodos de chuva. A Rhipicephalus
appendiculatus é o principal vetor de um grupo de doenças da Theileria parva (febre
da costa leste, doença de Corridor, teileriose maligna de Zimbábue) e o vírus da
doença dos ovinos de Nairóbi, e é também um vetor da T. taurotragi, Ehrlichia bovis,
Rickettsia conori e do vírus de Thogoto. As infestações pesadas causam algumas
vezes uma toxemia fatal e perda de resistência a várias infecções, assim como
severos danos às orelhas dos hospedeiros.
A intimamente relacionada R. zambeziensis, com preferências de hospedeiros
semelhantes, ocorre nas mais secas savanas de terras baixas na Tanzânia,
Zimbábue, Zâmbia, Botsuana, e Transvaal; também é um vetor da febre da costa
leste. Outras espécies intimamente relacionadas à R. appendiculatus incluem R.
nitens na Província do Cabo da África do Sul e R. duttoni na Angola e Zaire.
A R. pulchellus, um parasita de zebras, “ornamentado com marfim”, também
infesta animais de produção e de caça ao leste do Vale do Rift do sul da Etiópia à
Somália e noroeste da Tanzânia. O seu hábitat são as savanas com grama, arbustos
e árvores dispersas entre 300 e 1.300m de altitude onde a pluviosidade anual é de
250 a 600mm. Os adultos e imaturos geralmente infestam o mesmo hospedeiro;
entretanto, os imaturos também se alimentam em lebres e as larvas (“carrapatos-
semente” ou micuins) são importantes pragas de incômodo no homem. A
Rhipicephalus pulchellus alimenta-se nas orelhas dos hospedeiros e no baixo
abdome, principalmente durante as estações úmidas. Este carrapato é um vetor da
Babesia equi (entre as zebras), Theileria spp, Trypanosoma theileri, Rickettsia
Infestação por Carrapatos 1021

conori, vários Bunyaviridae (febre hemorrágica da Criméia-Congo, doença dos


ovinos de Nairóbi e os vírus de Kajiado, Kismayo e Dugbe) além do vírus de Barur.
Os ripicefálides africanos de 2 hospedeiros são as subespécies da R. evertsi e a
R. glabroscutatum. A Rhipicephalus evertsi evertsi, um carrapato grande, de “olhos
de rosário” e pernas vermelhas, um parasita da zebra da África oriental, parasita todos
os tipos de herbívoros silvestres e animais de produção (porém raramente suínos).
Os imaturos e adultos infestam os mesmos hospedeiros; os imaturos também são
observados em lebres. A R. e. evertsi distribui-se da África do Sul até o leste da África
ao leste do Nilo ao sul do Sudão e se estabeleceu também nas montanhas do Iêmen.
Focos dispersos, introduzidos pelos animais domésticos, ocorrem a oeste do Nilo. Os
imaturos alimentam-se no canal auricular, os adultos, principalmente ao redor do ânus
e sob a cauda, também nas axilas e na virilha, e sobre o esterno. Grandes quantidades
em um único hospedeiro são comuns em Equidae e difíceis de controlar devido à sua
concentração em locais de difícil acesso. O ciclo de vida continua por todo o ano, mas
diminui nas estações mais frias. A R. e. evertsi transmite Babesia equi, Theileria parva
(vetor secundário), Borrelia theileri, Rickettsia conori e os vírus de Kerai, Wad Medani
e Thogoto. A subespécie ocidental de pernas estriadas (semelhante ao Hyalomma),
R. e. mimeticus, encontrada do oeste da Botsuana à Namíbia, Angola e Zaire, possui
preferências de hospedeiro, locais de alimentação e ciclo de vida semelhantes aos da
subespécie principal.
A pequenina R. glabroscutatum tornou-se recentemente uma praga comum de
ovinos, caprinos e outros animais de produção na savana árida, de pequenos
arbustos do sudeste da província do Cabo (África do Sul). O cudu e outros antílopes
menores também são infestados. Os poucos registros de imaturos foram encontra-
dos em roedores.
O grupo da R. pravus, atualmente sob estudo taxonômico, consiste de ≥ 4
espécies, cujos adultos alimentam-se em animais de produção e herbívoros
silvestres (incluindo lebres), e os imaturos alimentam-se em musaranhos-elefante
(insetívoros), lebres e outros pequenos mamíferos. A Rhipicephalus pravus, um
carrapato marrom, de olhos convexos, ocorre em savanas florestadas e com
arbustos na África oriental. É infectada pelo vírus de Kadam. A intimamente
relacionada R. occulatus , um parasita de lebres, e um parasita relacionado ainda
não nominado que afeta animais de produção, ocorrem no sul da África.
O grupo difícil de classificar da R. punctatus , de parasitas dos animais de
produção e artiodáctilos silvestres consiste de R. punctatus (Angola, Moçambique,
Tanzânia), R. kochi (neavi) (da Botsuana ao Quênia e Zaire), e uma espécie não
nominada de Zimbábue e África do Sul.
O grupo da R. capensis também está sob estudo. Originalmente parasitas do
búfalo cape, estas espécies agora parasitam animais de produção e silvestres na
Namíbia e África do Sul ( R. capensis, incluindo a possivelmente sinônima
R. gertrudae), África oriental (R. compositus e R. longus) e da África ocidental até
o sudeste do Sudão (R. cliffordi).
Acima de 1.800m de altitude nas zonas de floresta e arbustos no leste africano,
R. hurti e R. jeanelli infestam animais de produção, búfalos cape e outros grandes
animais de caça. A Rhipicephalus hurti também habita as montanhas do Zaire.
Ambas as espécies se alimentam principalmente nas orelhas dos hospedeiros; a
R. Jeanelli também se alimenta na ponta da cauda.
A Rhipicephalus simus, o protótipo do grupo da R. simus, e há muito tempo
considerada uma espécie bem estabelecida, hoje está dividida em várias espécies.
Na nova classificação, R. simus sensu stricto ocorre no sul e centro da África
aproximadamente ao sul da latitude 8°S. No leste e norte da África, R. simus é
substituída por uma espécie menos pontilhada, a R. praetextatus, a qual estende-
se da Tanzânia central ao Egito. Os adultos de ambas as espécies parasitam
Infestação por Carrapatos 1022

animais de produção, cães, carnívoros silvestres, animais de caça de grande e


médio portes e o homem. A ocorrência e densidade nos animais de produção são
inexplicavelmente erráticas. Os estágios imaturos alimentam-se em roedores
escavadores comuns nas savanas. Ambas as espécies causam paralisia por
carrapatos no homem e transmitem Rickettsia conori e Coxiella burnetti. No Quênia,
a R. praetextatus é um vetor do vírus de Thogoto e pode ser um vetor secundário
do vírus da doença dos ovinos de Nairóbi. A oeste do Nilo, esta espécie foi
substituída por R. senegalensis e R. muhsamae.
Boa parte da literatura a respeito da R. tricuspis (da Tanzânia à África do Sul) e
da R. lunulatus (África ocidental até a Etiópia e Tanzânia) está incorreta. O principal
local de alimentação de ambas nos animais de produção e silvestres é a ponta da
cauda, mas outras partes do hospedeiro são também locais de alimentação.
Rhipicephalus sanguineus e R. turanicus, do grupo da R. sanguineus, foram
mencionadas anteriormente. Espécies relacionadas são R. camicasi e R. bergeoni
do nordeste da África, R. guilhoni e R. moucheti da África ocidental e 2 “formas”
largamente distribuídas da R. sulcatus, as quais ainda estão em estudos.
Duas espécies muito distintas quase sempre confundidas com a R. appendiculatus
são a R. supertritus (de Natal ao sul do Sudão) e R. muhlensi (do Quênia e sul do
Sudão à África central). Os adultos de ambas as espécies parasitam bovinos,
búfalos cape, antílopes e grandes animais de caça; a R. supertritus também é
encontrada em carnívoros.

ARGASIDAE IMPORTANTES
Argas spp
A maioria das 56 espécies de Argas spp conhecidas são específicas de pássaros
ou morcegos; algumas parasitam mamíferos silvestres terrestres ou a tartaruga
gigante das Galápagos. As espécies de importância na transmissão de Aegyptianella
pullorum e Borrelia anserina às aves domésticas são A. persicus (muitas áreas
tropicais e subtropicais do mundo), A. arboreus (maior parte da África, incluindo o
Egito), A. africolumbae (África tropical), A. walkerae (sul da África) e A. miniatus
(Américas Central e do Sul). Outras espécies que infestam aves domésticas
parecem transmitir tanto a A. pullorum quanto a B. anserina. A paralisia por
carrapatos é causada por alimentação por A. persicus, A. arboreus, A. walkerae, A.
miniatus, A. radiatus e A. sanchezi (EUA). Estes e outros Argas spp podem causar
grande irritação quando se alimentam no homem.

Ornithodoros spp
Poucas das , 100 espécies de Ornithodoros spp têm contato com animais de
produção. A maioria habita nichos protegidos em buracos, cavernas, covas,
rochedos e colônias de pássaros. Entre as que parasitam animais de produção,
O. savignyi e O. coriaceus são excepcionais por terem olhos e por descansarem
logo abaixo ou acima do nível do solo debaixo da sombra de árvores, onde os
animais de produção e de caça descansam e dormem. A Ornithodoros savignyi, o
“tampan” de areia, vive em áreas semi-áridas da Namíbia à Índia e Sri Lanka e é
quase sempre muito abundante. O homem e os animais de produção parasitados
sofrem severa irritação e toxicose por mordidas e “tampan” da areia e paralisia e
morte de animais são registradas. A Ornithodoros coriaceus, o “pajaroello” dos
hábitats de cerrados de carvalhos em encostas do norte da Califórnia até Chiapias
(no México), ocupa camas de veado debaixo de árvores e é famosa pela irritação
que provoca em veados, bovinos e no homem. O aborto bovino epizoótico parece
ser transmitido apenas pela O. coriaceus. A Ornithodoros guerneyi abriga-se no solo
Infestação por Carrapatos 1023

sombreado por árvores em zonas áridas da Austrália, onde cangurus e homens


descansam; os animais de produção são raros ou ausentes nestes hábitats.
Entre os numerosos Ornithodoros que habitam buracos, várias espécies são
naturalmente infectadas com o vírus da febre suína africana na África, ou têm a
capacidade já confirmada de albergar e transmitir o agente na Europa e Américas.
O reservatório e vetor natural do vírus da febre suína africana é a O. porcinus
porcinus (O. moubata porcinus), a qual é abundante em buracos de porcos tropicais
africanos e também de porcos-da-terra e porcos-espinhos. As populações de
porcos domésticos nas vizinhanças de porcos silvestres infectados têm quase
sempre sido dizimadas por febre suína africana. Os porcos domésticos e silvestres
não estão envolvidos na epidemiologia da Borrelia duttoni, o agente da febre
recorrente africana humana, a qual é transmitida pela O. moubata. O vírus da
febre suína africana foi transportado em carne infectada para a Espanha, onde a
O. marocanus (erraticus), um habitante de buracos de roedores e estábulos de
porcos, é um vetor eficiente. A Ornithodoros marocanus é também um reservatório
e vetor da Borrelia hispanica, o agente da febre recorrente africana humana no
noroeste da Espanha. A febre suína africana foi da mesma maneira introduzida no
Brasil, Haiti, República Dominicana e Cuba. As americanas O. puertoricensis, O.
turicata, O. talaje, O dugesi e O. coriaceus são vetores potenciais do vírus da febre
suína africana.
A Ornithodoros tholozani (papillipes, também crossi) infesta buracos, cavernas,
estábulos, rochas e cercas de argila e habitações humanas em vilas e cidades
antigas ou recém-construídas em ambientes de semideserto, estepe ou estações de
seca longas da China, sul da antiga URSS, noroeste da Índia e do Afeganistão à
Grécia, noroeste da Líbia e ilhas do Mediterrâneo oriental. Vários roedores, ouriços,
porcos-espinhos e animais domésticos suportam populações de O. tholozani. O
homem sofre de febre recorrente persa severa, algumas vezes fatal, quando picado
por O. tholozani infectadas por Borrelia persicus.
A Ornithodoros lahorensis , originalmente um parasita de carneiros selvagens
que descansam em abrigos de rochedos, é uma importante praga de animais de
produção estabulados em terras baixas e montanhas do Tibete, Kashmir e sul
da antiga URSS à Árabia Saudita e Turquia, Grécia, Bulgária e Iugoslávia. O ciclo
de vida de 2 hospedeiros e o longo período de atracamento durante o inverno da
O. lahorensis são biologicamente notáveis. É deletério para animais de produção
mantidos por muito tempo no inverno em estábulos severamente infestados; pode
causar paralisia, anemia e toxicose e transmitir os agentes da piroplasmose,
brucelose, febre Q e tularemia. No Irã e Turcomenistão, a raramente estudada
O. canestrini também parasita animais de produção em cavernas e estábulos.
A Ornithodoros turicata parasita roedores, corujas, cobras e jabutis, que procriam
em buracos, frestas e cavernas, e também porcos domésticos e outros animais de
produção no sul dos EUA e México. Ao contrário da maioria dos padrões de
alimentação dos Ornithodoros, as O. turicata imaturas ingurgitam-se em ≤ 30min,
porém os adultos podem se prender por até 2 dias. A Ornithodoros turicata foi
associada a doenças de suínos e a sérias reações tóxicas e infecções secundárias
que podem resultar quando o homem for picado.
A Ornithodoros furucosus parasita o homem e animais de produção em casas e
estábulos no noroeste da América do Sul. Outras pragas de animais de produção
e do homem na América do Sul, provavelmente parasitas originários dos catetos,
são O. braziliensis e O. rostratus.

Otobius spp
A Otobius megnini é extremamente especializada biológica e estruturalmente, e
infesta os canais auriculares de antilocabras, ovinos das montanhas, veados
Infestação por Carrapatos 1024

orelhudos e da Virgínia em biótopos de baixa pluviosidade do oeste dos EUA e


México e oeste do Canadá. Bovinos, eqüinos, caprinos, ovinos, cães e o homem são
semelhantemente infestados. Este bem escondido parasita foi transportado com
animais de produção para o oeste da América do Sul, Galápagos, Cuba, Havaí,
Índia, Madagáscar e sudeste da África. Notavelmente, os adultos possuem peças
bucais não funcionais e permanecem sem se alimentar no solo, porém com
capacidade de sobreviver por quase 2 anos. As fêmeas depositam até 1.500 ovos
em um período de 2 semanas. As larvas e as ninfas de 2 estágios alimentam-se por
2 a 4 meses, principalmente no inverno e na primavera. Pode haver ≥ 2 gerações
por ano. O homem e outros animais podem sofrer severa irritação por infestação no
canal auditivo e os animais de produção severamente infestados perdem as
condições durante o inverno. Paralisia por carrapato dos hospedeiros e infecções
secundárias por bicheira são relatadas. A Otobius megnini é infectada pelos agentes
da febre Q, tularemia, febre por carrapato do Colorado e febre maculosa das
Montanhas Rochosas. O segundo Otobius sp, a O. lagophilus, alimenta-se na
cabeça das lebres do deserto e coelhos no oeste dos EUA.

CONTROLE DE C ARRAPATOS
O controle de carrapatos é praticado em várias circunstâncias, envolvendo
diferentes espécies de carrapato e de hospedeiros. As principais razões para se fazer
este controle são proteger os hospedeiros da irritação e evitar perdas na produção,
formação de lesões que possam se tornar secundariamente infectadas, danos ao
couro e úbere, toxicose, paralisia, e sobretudo, a infecção por vários agentes
patológicos. O controle também previne a disseminação das espécies dos carrapatos
e das doenças por elas transmitidas para áreas, regiões ou continentes não afetados.
Controle cultural e biológico – Estas medidas podem ser direcionadas tanto
contra os estágios de carrapatos não parasitários fora do hospedeiro, quanto contra
os estágios parasitários no hospedeiro. Os estágios não parasitários da maioria das
espécies de carrapatos, ixodídeos ou argasídeos, possuem requerimentos especí-
ficos em termos de microclima e estão restritos a micro-hábitats particulares dentro
de ecossistemas não habitados por seus hospedeiros. A destruição desses micro-
hábitats reduz o número de carrapatos. Alterações no ambiente pela remoção de
certos tipos de vegetação têm sido realizadas para o controle da Amblyomma
americanum em áreas de lazer no sudeste dos EUA e no controle da Ixodes
rubicundus na África do Sul. O controle de carrapatos argasídeos, como Argas
persicus e A. walkerae em aves, pode ser conseguido pela eliminação de fendas
existentes em paredes e poleiros, as quais servem de abrigo para os estágios não
parasitários.
A população de carrapatos pode também ser reduzida pela remoção de “hospe-
deiros alternativos” ou hospedeiros de um estágio particular do ciclo de vida. Esta
medida tem sido sugerida para o controle de ixodídeos de 3 hospedeiros, como
Rhipicephalus appendiculatus, Amblyomma hebraeum e Ixodes rubicundus na
África, e Hyalomma spp no sudeste da Europa e Ásia.
A rotação de pastagem ou o revezamento de pastos tem sido usada no controle
do carrapato ixodídeo de 1 hospedeiro, a Boophilus microplus na Austrália. Este
método pode também ser aplicado para outros carrapatos de 1 hospedeiro, nos
quais a duração do período de revezamento é determinada pelo tempo de vida
relativamente curto da larva não parasitária. Entretanto, possui pouca aplicação
para carrapatos ixodídeos de vários hospedeiros ou argasídeos, devido ao longo
período de sobrevivência em jejum de ninfas e adultos.
Predadores, incluindo aves, roedores, musaranhos, formigas e aranhas, em
algumas áreas desempenham um papel importante na redução do número de
Infestação por Carrapatos 1025

carrapatos não parasitários. No Novo Mundo, as formigas de fogo (Pheidole


megacephala) são predadoras de carrapato dignas de nota. Carrapatos ingurgitados
podem também ser parasitados pelas larvas de algumas vespas (Hymenoptera),
mas isto não representa uma redução significativa na população de carrapatos.
Sabe-se que os gados zebu (Bos indicus ) e sanga (cruzamento de Bos taurus
com B. indicus), raças indígenas da Ásia e África, geralmente tornam-se mais
resistentes aos carrapatos ixodídeos após uma exposição inicial. Raças européias,
ao contrário (B. taurus), em geral permanecem relativamente mais suscetíveis. A
resistência a carrapatos do gado zebu e de seus cruzamentos está sendo progres-
sivamente explorada como uma medida de controle dos estágios parasitários. A
introdução do gado zebu na Austrália tem revolucionado o controle da B. microplus
no continente. O uso de bovinos resistentes como método de controle de carrapatos
também está se tornando importante na África e Américas. Na África, infestações
de carrapatos ixodídeos em rebanhos de produção e em ungulados silvestres
também podem ser reduzidas pelos Buphagus spp, que são pássaros que se
alimentam de carrapatos ligados ao hospedeiro.
Controle químico – (Ver também PARASITICIDAS EXTERNOS, pág. 1811). O controle
de carrapatos com acaricidas pode ser direcionado contra os estágios não parasitários
encontrados no ambiente ou contra estágios parasitários no hospedeiro. O controle de
carrapatos ixodídeos pelo tratamento acaricida da vegetação tem sido feito em locais
específicos (por exemplo, ao longo de trilhos) em áreas de lazer nos EUA e em outros
locais, para reduzir o risco de ataque de carrapatos às pessoas. Este método não tem
sido recomendado para um uso mais amplo, devido à poluição ambiental e ao custo
do tratamento de áreas grandes. Canis, celeiros e residências podem requerer
tratamento periódico com acaricidas, para controlar os estágios não parasitários de
carrapatos ixodídeos, como o carrapato dos canis, Rhipicephalus sanguineus.
Os estágios não parasitários de carrapatos argasídeos, que infestam focos
específicos como galinheiros, pombais, chiqueiros e residências são mais freqüente
e efetivamente tratados com acaricidas.
O tratamento dos hospedeiros com acaricidas para matar larvas, ninfas e adultos
de carrapatos ixodídeos e larvas de carrapatos argasídeos tem sido o método de
controle mais amplamente usado. Na primeira metade do século, o principal
acaricida era o trióxido de arsênio. Subseqüentemente, organoclorados, organo-
fosforados, carbamatos , amidinas e piretróides têm sido usados em diferentes
partes do mundo. A introdução de novos compostos tem sido necessária devido ao
desenvolvimento de resistência em populações de carrapatos.
Os acaricidas são mais comumente aplicados em rebanhos na forma de sprays
ou banhos de imersão, os quais são considerados mais efetivos. Recentemente,
várias outras maneiras de aplicação de acaricidas têm sido desenvolvidas, incluindo
implantes sistêmicos e bolos de liberação lenta, brincos impregnados com acarici-
das convencionais de liberação lenta, “pour-ons”, os quais são aplicados no dorso
do animal e difundem-se rapidamente por toda a superfície corporal, e “spot-ons”,
os quais são semelhantes ao “pour-on”, mas possuem menor capacidade de
difusão. Em aves, os acaricidas são aplicados normalmente na forma de pós; em
gatos na forma de pós ou banhos; em cães na forma de pós, banhos simples ou
banhos de imersão.
Vacinas – Um recente avanço de grande importância potencial, utilizando a
biotecnologia, foi a produção de uma vacina efetiva contra B. microplus. O agente
imunizante é um antígeno do carrapato “oculto” não encontrado normalmente no
hospedeiro. O mecanismo imune que é estimulado é diferente do estimulado pela
exposição a carrapatos (isto é, a alimentação do carrapato). O antígeno é derivado
do extrato bruto de fêmeas adultas parcialmente ingurgitadas. Ele estimula a
produção de um anticorpo que lesa as células intestinais e mata os carrapatos ou
Infestação por Carrapatos 1026

reduz drasticamente seu potencial reprodutivo. É provável que vacinas similares


sejam desenvolvidas no futuro, contra outros carrapatos ixodídeos de fundamental
importância econômica. Estas poderão tornar a maioria das outras formas de
controle de carrapato obsoletas e alterar nossas tentativas de controle dos carrapa-
tos e das doenças por eles transmitidas.
Estratégias de controle – Inicialmente os principais usos dos acaricidas foram
para erradicação de carrapatos, prevenção de sua difusão e das doenças por eles
transmitidas (quarentena), e erradicação e controle das mesmas. Os programas de
erradicação foram bem-sucedidos em algumas áreas subtropicais ecologicamente
marginais, como o sul dos EUA e a Argentina central, onde o Boophilus spp e a
babesiose foram erradicados, e sul da África onde a febre da costa leste (causada
por Theileria parva parva) foi erradicada. O programa foi menos eficiente em áreas
tropicais ecologicamente mais favoráveis do noroeste da Austrália, América Central,
ilhas do Caribe e África oriental.
Nas áreas em que a erradicação não foi realizada, os custos de manutenção de
programas de controle de carrapatos intensivo têm se tornado muito altos. Por esta
razão, estratégias de controle químico e biológico integradas têm sido adotadas.
Estas estratégias de custo mais efetivo têm sido facilitadas pelo aumento do
conhecimento da ecologia, da relação carrapato–hospedeiro, dos efeitos dos
carrapatos per si na produtividade do rebanho, da epidemiologia das doenças
transmitidas por carrapatos e do controle dessas doenças por métodos imunológi-
cos. Modelos de populações de carrapatos e da epidemiologia de doenças por eles
transmitidas estão sendo usados para simular as estratégias de controle, como um
meio de identificar as melhores estratégias a serem usadas em situações ecológicas
e socioeconômicas diferentes.
Medidas de quarentena rigorosa para prevenir reintroduções são exigidas em
países em que os carrapatos e as doenças por eles transmitidas foram erradicados.
Modelos climáticos, sistemas de informação geográfica e sistemas práticos (mode-
los baseados no conhecimento técnico e na inteligência artificial) estão sendo
usados para identificar áreas não afetadas, nas quais podem se instalar pragas se
os carrapatos forem introduzidos.

TUMORES DA PELE E DE TECIDOS MOLES


Introdução
Tumores cutâneos são os distúrbios neoplásicos mais freqüentemente diagnos-
ticados em animais domésticos, em parte porque eles podem ser facilmente
identificados, e em parte devido à constante exposição da pele ao ambiente externo.
Drogas carcinogênicas, radiações ionizantes e vírus têm sido implicados, mas
fatores hormonais e genéticos podem ter um papel importante no desenvolvimento
de neoplasias cutâneas.
A pele é uma estrutura complexa composta de vários tecidos epiteliais (epiderme,
porções acessórias), mesenquimais (tecidos conjuntivos fibrosos, vasos sangüí-
neos, tecido adiposo), tecidos neurais e neuroectodérmicos (nervo periférico,
células Merkel, melanócitos), todos com potencial para desenvolver tumores
distintos. Devido à diversidade dos tumores cutâneos, sua classificação é difícil, e,
para muitas, há controvérsias quanto à origem das células. Também existem
controvérsias com relação aos critérios que devem ser usados para se estabelecer
se uma lesão que se desenvolve na pele ou em tecidos moles é ou não uma
Tumores da Pele e de Tecidos Moles 1027

neoplasia, e se for, se é benigna ou maligna. Para evitar confusão, os seguintes


termos serão usados na discussão: 1. um nevo (hamartoma) é um defeito de
desenvolvimento localizado na pele, que pode ou não estar aparente no nascimento.
Nevos podem se desenvolver de uma ou mais estruturas cutâneas, por exemplo, um
nevo sebáceo refere-se a um defeito de desenvolvimento localizado na pele, que
envolve glândulas sebáceas. O termo nevo não se aplica a lesões melanocíticas
benignas em medicina veterinária, no entanto é usado para definir o mesmo tipo de
lesão no homem; 2. uma neoplasia benigna é localizada, não infiltrativa e facilmen-
te extirpável; 3. uma neoplasia de malignidade intermediária é localmente
infiltrativa e freqüentemente requer cirurgia radical. Estas recidivam freqüentemente
mas raras vezes (ou nunca) metastatizam. (Tal categoria é essencial porque muitas
neoplasias não são evidentemente benignas nem malignas); 4. uma neoplasia
maligna é infiltrativa e tem considerável potencial metastático.
Embora as neoplasias cutâneas sejam caracteristicamente nodulares ou
papulares, elas também podem ocorrer como placas alopécicas localizadas ou
generalizadas, placas e manchas eritematosas e pigmentadas, vergões, ou úlceras
incuráveis. Por isso, é difícil distinguir doenças inflamatórias de uma neoplasia, com
base somente nos sinais clínicos; distinguir um tumor benigno de um maligno é ainda
mais subjetivo, pois os malignos (principalmente no início do desenvolvimento)
podem ser palpados como massas encapsuladas, discretas.
Para se estabelecer um diagnóstico definitivo, geralmente utiliza-se a histopatolo-
gia. A avaliação citológica também pode ser útil, e para alguns tipos (por exemplo,
mastocitomas) pode rivalizar ou mesmo superar o valor do exame histopatológico.
A terapia depende muito do tipo de tumor, da sua localização, tamanho, e das
características do animal. Para neoplasias benignas, não associadas com ulcera-
ção ou disfunção clínica, a ausência de terapia pode ser a opção mais prudente,
principalmente em se tratando de cães idosos. Para doenças neoplásicas mais
agressivas ou para tumores benignos esteticamente desagradáveis ou que inibam
a função normal, existem várias opções terapêuticas. Para a maioria, a cirurgia
oferece a maior possibilidade de cura com menor custo, e freqüentemente com
menos efeitos colaterais. A excisão completa é melhor. Embora a lumpectomia seja
adequada para lesões benignas, se a suspeita for de uma lesão maligna, a mesma
deve ser removida com ampla margem cirúrgica. Para tumores que não podem ser
completamente excisados, pode-se fazer a remoção parcial ou o “debulking”. O
“debulking” pode prolongar o tempo de vida do animal, assim como aumentar a
efetividade da radiação ou quimioterapia. A criocirurgia também é uma opção;
embora seja mais efetiva para lesões benignas superficiais, as neoplasias cutâneas
malignas também podem ser tratadas. A radioterapia é de maior valor para
neoplasias infiltrativas não extirpáveis cirurgicamente, ou quando a intervenção
cirúrgica causaria danos físicos inaceitáveis. A quimioterapia pode ser usada como
um método primário para neoplasias malignas ou como terapia adjunta para a
cirurgia ou radioterapia. Na pele, é mais comumente usada para tratar alguns tipos
de tumores (linfossarcomas, mastocitomas, tumores venéreos transmissíveis, etc.)
ou tumores sólidos que não podem ser extirpados completamente. Embora seja
geralmente paliativa, podem-se às vezes obter remissões por muito tempo. Outras
formas de terapia incluem hipertermia, laser e fototerapia.

TUMORES DE FOLÍCULO PILOSO E EPIDÉRMICOS


Lesões papilomatosas benignas, não associadas a vírus
Para verrugas virais, as lesões mais comuns da pele, ver PAPILOMATOSE, página
1035. Entretanto, lesões benignas, proliferativas, não associadas com infecção por
papilomavírus podem apresentar a mesma morfologia.
Tumores da Pele e de Tecidos Moles 1028

Nevos epidérmicos são raras proliferações que têm sido identificadas apenas em
cães, mais freqüentemente nos jovens. Macroscopicamente, eles geralmente apare-
cem como manchas, placas ou pápulas pigmentadas, hiperceratóticas, quase sem-
pre com um padrão linear indefinido. Embora sejam benignos, sua aparência é
desagradável, e a hiperceratose extensa favorece uma infecção bacteriana secundá-
ria. Lesões localizadas podem ser excisadas; as lesões maiores podem ser inoperáveis
e controláveis apenas com o uso de xampus ceratolíticos tópicos e emolientes.
Papilomas congênitos de potros são raros, e provavelmente são um defeito de
desenvolvimento e não um resultado de infecção por papilomavírus. Eles ocorrem
em qualquer porção do corpo, mas são mais comuns na cabeça. Animais puros-
sangues podem ser predispostos. Presentes na ocasião do nascimento, as lesões
(freqüentemente com vários centímetros de diâmetro) são alopécicas, pedunculadas
e exofíticas, com uma superfície papilada, assemelhando-se a uma couve-flor. Eles
são benignos e a excisão é curativa.
Disceratomas verrucosos são neoplasias benignas e raras, que acometem
cães; seu aspecto sugere origem de folículo piloso. Macroscopicamente, são
pápulas verrucosas com um centro umbilicado ceratótico. A excisão é curativa.

Tumores de células basais


(Epiteliomas de células basais, Basaliomas, Carcinomas de células basais)
Geralmente são tumores cutâneos benignos, comuns em cães e gatos, e com
menos freqüência, em eqüinos. Não se sabe se eles originam-se da epiderme, da
região matriz do pêlo, ou de ambas. Em cães e gatos, alguns tumores basais são
contínuos com a epiderme; entretanto, a maioria é destituída de ligações epidérmi-
cas. Em cães, eles assemelham-se ao tricoblastoma (um tumor humano de matriz
pilosa). Não está provado que a lesão solar seja uma causa do surgimento de
tumores de células basais nos animais domésticos. Entretanto, lesões actínicas na
pele de cães podem produzir zonas focais de proliferação de células basais a partir
da epiderme.
Tumores de células basais são mais comuns em animais de meia-idade ou mais
velhos. Em cães, eles são mais comuns na cabeça, pescoço e porções anteriores
do corpo. Cocker spaniels e poodles parecem ser predispostos. Em gatos, não
existe um local de predileção, e as raças de maior risco parecem ser as de pêlo
longo, angorá, siamês e himalaia. Os tumores geralmente são nódulos firmes,
solitários, encapsulados, freqüentemente sem pêlos e ulcerados, que podem ser
pedunculados e variam de tamanho de < 1cm a > 10cm de diâmetro. Em gatos, eles
são freqüentemente císticos e podem ser multicêntricos. Em cães e gatos, estas
lesões freqüentemente são pigmentadas. Eles podem apresentar evidências defi-
nidas de diferenciação em glândulas sebáceas e apócrinas ou de folículos pilosos.
Eles são neoplasias benignas, lentamente expansivas, e podem estar associados
com ulceração extensa e inflamação secundária. A excisão completa é curativa.
Tumores de células basais multicêntricos em gatos, ocasionalmente recidivam.

Epiteliomas cornificantes intracutâneos


(Ceratoacantoma ou incorretamente, Papiloma escamoso)
Neoplasias benignas de cães e possivelmente de gatos. Como os ceratoacantomas
humanos, estas lesões provavelmente crescem a partir de folículos pilosos e não da
epiderme interfolicular. Eles são mais comuns no dorso, pescoço, tórax e porção
anterior do corpo em cães de meia-idade a mais velhos; mais freqüentemente em
machos que em fêmeas. Os cães noruegueses elkhound e keeshond são mais
predispostos; entretanto, pastores alemães, old english sheepdogs e collies apre-
sentam um risco de desenvolver uma forma generalizada da doença. As lesões
Tumores da Pele e de Tecidos Moles 1029

podem ser solitárias ou múltiplas, algumas vezes em grande número. Comumente


eles são nódulos ou pápulas endofíticos, exofíticos e umbilicados, com margens
ligeiramente papiladas, rodeando um plug central de ceratina, e também podem
envolver a derme mais profunda sem envolvimento epidérmico palpável. Esta última
forma é clinicamente indistingüível de um cisto ceratinizado. Como eles são
benignos, o tratamento é opcional, desde que um diagnóstico definitivo seja
estabelecido, e não ocorrem autotraumatismo, ulceração ou infecção secundária. A
excisão é curativa; entretanto, podem-se desenvolver outros tumores posteriormen-
te. Não há evidência de que a quimioterapia ou a imunoterapia sejam de valor no
tratamento de lesões totalmente desenvolvidas ou na prevenção da sua recidiva.

Carcinomas de células escamosas


(Carcinomas epidermóides)
São oriundos da epiderme ou do epitélio da bainha da raiz externa do folículo
piloso, sendo reconhecidos em todos os animais domésticos, mas são incomuns em
suínos. Têm sido associados com a exposição prolongada à luz solar. Embora
amplamente reconhecidos no homem, o papel dos papilomavírus na indução de
carcinomas de células escamosas em animais domésticos permanece pouco
conhecido. Apenas os carcinomas de células escamosas das membranas não
mucosas estão listados adiante.
Em cães, estes são os carcinomas mais freqüentes da cútis, usualmente
encontrados nas extremidades distais, cabeça, pescoço, regiões anteriores ou
abdome ventral. Eles são mais comuns em scottish terriers, pequineses, bóxers,
poodles e elkhounds noruegueses. Além disso, algumas raças de pelagem preta,
como labrador retrievers, poodles padrão e schnauzers podem infreqüentemente
desenvolver carcinomas de células escamosas subungueais em várias extremida-
des. A incidência tende a aumentar com a idade. Em cães, a etiologia da maioria
destes tipos de tumores permanece indefinida; aqueles que se desenvolvem nas
regiões abdominal ventral, prepucial, escrotal e inguinal de algumas raças de pêlo
curto e pelagem branca como dálmatas, pit bull terriers e beagles são induzidos por
prolongada lesão solar. Eles se desenvolvem na região ventral porque: 1. a pele
pouco pelosa oferece uma proteção mínima contra a radiação ultravioleta; 2. muitos
animais deitam-se ao sol de costas; e talvez 3. a radiação solar pode se refletir do
chão para cima. Antes de o carcinoma se desenvolver, os animais adquirem zonas
focais de liquenificação, hiperceratose e eritema conhecidas como ceratose solar
(dermatose solar, ceratose actínica, ceratose senil).
Em gatos, carcinomas cutâneos de células escamosas desenvolvem-se mais
comumente em associação com lesão solar crônica, geralmente nas pinas e/ou
pálpebras, áreas em que o pêlo e a pele são brancos. Como nos cães, uma ceratose
solar freqüentemente precede o desenvolvimento de tumores malignos. Os tumores
não causados pela exposição solar desenvolvem-se mais comumente nos dígitos.
Em eqüinos, a maioria destes tumores ocorre nas regiões genital e ocular; eles
são raros na pele não adjacente às membranas mucosas. Estes carcinomas genitais
de células escamosas são mais comuns em machos que em fêmeas. Os que se
desenvolvem nas pálpebras são mais comuns em eqüinos com região periocular
branca e supõe-se que sejam induzidos por lesão solar.
Em bovinos, eles são mais comuns em raças com pelagem branca e pele pouco
pigmentada, ao redor das membranas mucosas, geralmente nas junções mucocu-
tâneas, particularmente nas regiões periocular e vulvar. Na Índia, carcinomas de
células escamosas do centro do chifre são freqüentemente encontrados em touros
castrados mais velhos. A causa mais comum é a lesão actínica. A ceratose solar
freqüentemente precede o desenvolvimento de um tumor invasivo; fatores genéti-
cos, imunodeficiência e vírus parecem ter algum papel.
Tumores da Pele e de Tecidos Moles 1030

Em ovinos, carcinomas de células escamosas são de significativa importância


em algumas partes do mundo; em um estudo na Austrália, eles foram responsáveis
por mais de um terço de todas as condenações antes do abate. A raça merino é de
maior risco, e as fêmeas são mais predispostas que os machos. Os locais mais
comuns de aparecimento são a pele pouco pelosa das orelhas, lábios, focinho e
lábios vulvares depois que eles foram exteriorizados pela operação de Mule para
evitar o ataque de moscas. Os tumores nestes locais ocorrem em associação com
lesão solar, acentuando-se quando os animais ingerem plantas fotossensibilizantes.
Tumores nas orelhas também ocorrem mais freqüentemente após um procedimento
como a colocação de brincos. Carcinomas de células escamosas podem se
desenvolver a partir de cistos foliculares em locais não comumente expostos à luz
solar.
Em caprinos, eles ocorrem com maior freqüência nas fêmeas, nas quais tumores
desenvolvem-se nas regiões perineal e vulvar, assim como na pele de tetas e úbere;
machos e fêmeas podem desenvolver tumores induzidos pela luz solar nas orelhas.
Embora a raça angorá seja a de maior risco, caprinos saanan ocasionalmente
desenvolvem carcinomas de células escamosas no úbere em associação com
papilomas. O papel do papilomavírus na progressão do tumor é indefinido.
A maioria dos carcinomas de células escamosas são lesões solitárias; entretan-
to, múltiplos tumores podem se desenvolver em associação com lesão solar. Eles
aparecem como lesões endofíticas ou exoendofíticas, sendo as primeiras massas
dérmicas, irregulares e elevadas, com uma superfície ulcerada; e as últimas
massas dérmicas irregulares e elevadas, cobertas por uma epiderme papilada. Em
bovinos com envolvimento dos chifres, o primeiro sinal é o crescimento distorcido
dos mesmos.
Em geral, eles são altamente infiltrativos nos tecidos moles e ósseos adjacentes
mas tendem a metastatizarem-se lentamente. Infreqüentemente, em bovinos, eles
regridem espontaneamente. A terapia mais comum é a excisão completa ou
criocirurgia. Em gatos, tem sido relatado que a radiação promove um controle
durante 2 anos em 87% dos casos. Algum sucesso tem sido obtido com o uso da
imunoterapia para o tratamento de carcinomas de células escamosas na região
ocular e no centro do chifre de bovinos, com vacina autógena feita de tecido tumoral
em suspensão com adjuvante de Freund, ou por imunomodulação inespecífica,
usando Corynebacterium parvum. Se os tumores forem grandes, o “debulking” é
recomendado antes de se instituir uma imunoterapia. Em cães com múltiplas
ceratoses actínicas ventrais ou com carcinomas de células escamosas não operáveis,
sugere-se como tratamento a aplicação tópica do dinitroclorobenzeno ou do 5-
fluorouracil (5%).

Cistos cutâneos ceratinizados


A maioria destes cistos representam malformações do folículo piloso. Eles são
comuns em cães; ocasionalmente identificados em gatos, eqüinos, caprinos e
ovinos; e raros em bovinos e suínos. A excisão é o tratamento de escolha. A
compressão violenta das lesões é contra-indicada, pois geralmente estimula uma
severa resposta inflamatória de corpo estranho.
Cistos de inclusão epidérmicos (cistos epidermóides, cistos foliculares, tipo
infundibular, com freqüência chamados erroneamente de cistos sebáceos) na
verdade representam uma dilatação cística do infundíbulo do folículo piloso (da
região superior do folículo piloso que é indistingüível da epiderme). Eles variam de
2mm a > 5cm (as lesões < 5mm de diâmetro são freqüentemente chamadas “milia”).
Apesar do seu nome, há pouca evidência de que estes cistos realmente originem-
se de uma invaginação da epiderme. O único animal doméstico identificado como
de risco é o ovino merino, no qual estes cistos são freqüentemente múltiplos e
Tumores da Pele e de Tecidos Moles 1031

podem progredir para carcinomas de células escamosas. Assim como todos os


cistos foliculares, eles são geralmente lesões solitárias, papulares a nodulares e
podem ser manipulados livremente. Em geral são parcialmente compressíveis à
palpação e ocasionalmente têm uma pequena abertura através da epiderme, de
onde o conteúdo cístico é drenado. Eles são preenchidos por um material caseoso,
granular, cinza, marrom ou amarelado.
O termo tricolemal ou cisto pilar é aplicado aos cistos foliculares que demons-
tram um padrão de ceratinização da porção mais baixa da bainha externa da raiz
pilosa. Eles têm sido definitivamente identificados apenas em cães e gatos.
Cistos matriz são cistos foliculares nos quais a parede assemelha-se ao epitélio
do bulbo do pêlo (a porção matriz do folículo piloso) e à bainha interna da raiz, que
ocorrem predominantemente em cães e gatos. Muitos progridem para pilomatricomas
(ver adiante).
Cistos híbridos são cistos foliculares que apresentam uma combinação das
características dos cistos de inclusão epidérmico, tricolemal e cistos matriz, e
ocorrem predominantemente em cães e gatos. Eles podem progredir para
tricoepiteliomas (ver adiante).
Cistos dermóides são malformações congênitas encontradas mais comumente
na linha média dorsal da cabeça ou ao longo da coluna vertebral e são mais
comumente identificados em cães bóxers, kerry blue terriers, rhodesian ridgeback,
cavalos puros-sangues e possivelmente em ovinos suffolk. Tipicamente múltiplos,
eles diferem dos outros cistos foliculares, pois na superfície de corte eles apresen-
tam eixos pilosos totalmente formados.
Ceratomas são lesões císticas na parede do casco da pinça ou, menos
freqüentemente, nas ancas ou calcanhares em animais com o casco fendido e são
freqüentemente secundários a lesões traumáticas; dessa forma, eles podem
realmente representar cistos de inclusão epidérmica verdadeiros. Claudicação e
deformidades da parede ou da sola do casco são observadas. Estas lesões
raramente possuem > 5cm de diâmetro e contêm ceratina laminada de coloração
branca a marrom, freqüentemente com um centro necrótico. Os ceratomas freqüen-
temente se tornam secundariamente inflamados.

Tumores do folículo piloso


O folículo piloso é uma estrutura complexa, composta de 8 camadas epiteliais
diferentes. Estes tumores são complexos, e muito trabalho precisa ser feito para
caracterizá-los (ver também EPITELIOMAS CORNIFICANTES I NTRACUTÂNEOS, CARCINO-
MAS DE CÉLULAS ESCAMOSAS e CISTOS CUTÂNEOS C ERATINIZADOS, anteriormente). Eles
são mais comuns em cães, menos freqüentes em gatos e raros em outros animais
domésticos.
Tricolemomas são neoplasias raras e benignas de folículos pilosos de cães,
derivadas da bainha externa da raiz; ligeiramente semelhantes a um tumor de
mesmo nome no homem. Eles são mais comuns em cães idosos, sendo mais
freqüentemente identificados na cabeça. Os poodles podem ser predispostos. Os
tricolemomas são massas ovóides e firmes, de 1 a 7cm de diâmetro, encapsulados
mas expansivos posteriormente. A excisão é curativa.
Poros dilatados de Winer são neoplasias raras de folículos pilosos, que têm
sido reconhecidas apenas em gatos idosos, mais freqüentemente em machos. São
lesões benignas e solitárias, com a aparência de um comedão gigante. A excisão
é curativa.
Tricoepiteliomas são neoplasias benignas de folículos pilosos, nas quais todos
os elementos dos folículos pilosos (infundíbulo, istmo e porções inferiores do
folículo) estão representados, com o predomínio das regiões infundibular e ístmica;
Tumores da Pele e de Tecidos Moles 1032

em cães são mais comuns no tronco e nos gatos costumam ocorrer na cabeça,
geralmente em animais > 5 anos de idade. Eles aparecem como nódulos encapsu-
lados (1 a 5cm de diâmetro), palpáveis na derme e na gordura subcutânea. Eles
tendem a se ulcerar e freqüentemente drenam um material caseoso, granular,
amarelo e denso. Consistem de múltiplas estruturas císticas preenchidas por
ceratina. A excisão é curativa. Animais que desenvolvem um tumor podem desen-
volver outros posteriormente.
Pilomatricomas (tumores de matriz pilosa, epiteliomas calcificantes [de Malherbe])
são neoplasias benignas de folículos pilosos compostas de todos os elementos do
folículo piloso; entretanto, ao contrário do tricoepitelioma, predomina o componente
da matriz. Eles são mais comuns no tronco de cães adultos, geralmente de kerry blue
terriers, poodles, bedlington terriers e schnauzers, e são raros em gatos. Macrosco-
picamente, eles são indistingüíveis dos tricoepiteliomas, porém, seu conteúdo
cístico quase sempre é granuloso devido à mineralização. A cirurgia é o tratamento
de escolha. Assim como com os tricoepiteliomas, os cães que desenvolvem uma
lesão, quase sempre desenvolvem outras posteriormente.
Pilomatricomas malignos (neoplasias epiteliais malignas com diferenciação do
folículo piloso) são raros e têm sido identificados quase que exclusivamente em
cães, geralmente nos idosos. Macroscopicamente, eles se caracterizam como
tumores multinodulares ou solitários, que têm a aparência de pilomatricomas e
recorrem após a tentativa de excisão completa. Eles freqüentemente metastatizam
para drenar os linfonodos e órgãos internos, especialmente os pulmões. Cirurgia
radical é recomendada. Não se sabe se eles são responsivos a radiação ou
quimioterapia.

Tumores cutâneos de glândulas apócrinas


Existem 2 tipos de glândulas sudoríparas: apócrina e écrina. As apócrinas são
glândulas tubulares com uma porção secretória em espiral e um duto reto longo que
descarrega em um infundíbulo folicular. Nos animais domésticos, todos os folículos
pilosos possuem glândulas apócrinas. Em cães e gatos, as glândulas apócrinas
também estão presentes junto com os sacos anais, e as glândulas apócrinas mo-
dificadas, conhecidas como glândulas ceruminosas, estão presentes no meato
auditivo externo. Na maioria dos animais estas glândulas produzem um composto
oleoso, odorífero, que é um atrativo sexual, marcador territorial e um sinal de
advertência. Em eqüinos e bovinos, estas glândulas desempenham papel na
termorregulação, produzindo suor.
Os tumores de glândulas apócrinas são mais comuns em cães e gatos, geral-
mente nos animais de meia-idade ou mais velhos, e são raros em outros animais
domésticos. Três doenças da pele pelosa podem ser caracterizadas sob esta
classificação.
Dilatação de glândula apócrina cística (cisto de glândula apócrina, hiperplasia
de glândula apócrina cística) é melhor caracterizada como um nevo. É comum no
cão, sendo encontrada mais freqüentemente na cabeça e pescoço. É caracterizada
por uma região focal de glândulas apócrinas dilatadas na pele não traumatizada e
geralmente não são aparentes macroscopicamente, até que uma ou mais glândulas
dilatem-se e possam ser palpadas. Elas aparecem como pápulas ou nódulos
flutuantes, preenchidos com um fluido claro a acastanhado. A excisão completa é
curativa.
Adenomas de glândulas apócrinas são raros em todos os animais domésticos,
mas têm sido identificados com maior freqüência em cães, gatos e eqüinos. Em cães
e gatos, eles são mais comuns na cabeça e pescoço; em eqüinos, nas pinas e vulva.
Macroscopicamente, eles aparecem como massas nodulares, discretas, firmes a
Tumores da Pele e de Tecidos Moles 1033

flutuantes, raramente > 4cm de diâmetro. A ulceração é incomum. Eles são


benignos, e a excisão completa é curativa.
Adenocarcinomas de glândulas apócrinas de pele pelosa são raros em todos
os animais domésticos, mas têm sido identificados mais freqüentemente em cães
e gatos. Em cães, eles se desenvolvem principalmente na região axilar e devem ser
diferenciados de adenocarcinomas de glândulas mamárias. Freqüentemente eles
são ulcerados, maiores que os adenomas de glândulas apócrinas e possuem
margens irregulares. Ocasionalmente, variantes têm sido identificadas com gran-
des vacuolizações citoplasmáticas extensas (hidradenocarcinomas de células
claras). Todos são localmente infiltrativos mas, em geral metastatizam posterior-
mente. A excisão completa é o tratamento de escolha.

Tumores de glândulas apócrinas dos sacos anais


Eles têm sido identificados apenas em cães, mais freqüentemente em fêmeas
idosas (intactas ou ovário-histerectomizadas). A maioria é maligna (ver também
pág. 343). Eles normalmente aparecem como massas nodulares, firmes e profun-
das na área dos sacos anais. Muitos são associados com uma síndrome
paraneoplásica, a qual caracteriza-se por hipercalcemia e resulta em anorexia,
perda de peso, poliúria e polidipsia. Eles tendem a ser altamente infiltrativos no canal
pélvico. Freqüentemente metastatizam para os linfonodos sublombares (90%) e
para órgãos internos distantes (40%). Uma ampla excisão cirúrgica, que inclua os
linfonodos envolvidos, é o tratamento de escolha. Mesmo que o tumor não possa ser
totalmente retirado, a cirurgia pode ser um paliativo, pois a hipercalcemia parece
estar relacionada com a massa tumoral total. A quimioterapia adjunta também pode
ser benéfica, mas todos têm um prognóstico ruim; poucos cães sobrevivem > 1 ano
depois que o tumor foi diagnosticado.

Tumores de glândulas ceruminosas


São neoplasias raras que se desenvolvem a partir de glândulas apócrinas
modificadas do meato auditivo externo; eles são mais comuns em gatos, mas
também ocorrem em cães, normalmente em animais de meia-idade ou mais velhos.
Eles aparecem como nódulos firmes, freqüentemente pedunculados, podendo
obstruir totalmente o canal auditivo externo, e estão geralmente associados com
uma otite externa secundária. Em gatos, eles devem ser distinguidos de pólipos
inflamatórios que crescem no interior da orelha. Em cães eles podem ser confundi-
dos com hiperplasia anexial severa devida a uma otite externa primária. Eles são
absolutamente benignos e a excisão é curativa.
Adenocarcinomas de glândulas ceruminosas são raros, porém mais freqüen-
tes em gatos e podem ser vistos em cães. Tumores de animais de meia-idade ou
mais velhos, são normalmente nodulares ou semelhantes a placas com as bordas
mal definidas. Eles tendem a permanecer confinados ao canal auditivo até que mais
tarde no curso da doença eles se estendem ao redor dos tecidos mole e ósseo e
drenam linfonodos; metástases sistêmicas distantes têm sido identificadas. Ampla
incisão cirúrgica, que requer ablação da orelha, é o tratamento de escolha. O
prognóstico é bom, se o tumor estiver confinado ao canal auditivo. Para tumores
invasivos, a radiação externa tem sido recomendada; entretanto, não se sabe se
esta terapia prolonga a sobrevida do animal significativamente.

Tumores de glândulas écrinas


Glândulas écrinas, sudoríparas, espirais e tubulares estão presentes nos coxins
dos carnívoros, na ranilha de ungulados, no carpo de suínos e na região nasolabial
de ruminantes. Existem apenas relatos não científicos desses tumores. Em cães e
Tumores da Pele e de Tecidos Moles 1034

gatos, eles se desenvolvem exclusivamente nos coxins. A maioria é maligna. Muito


poucos têm sido identificados para caracterizar os aspectos macroscópicos, micros-
cópicos e de comportamento.

Tumores de glândulas sebáceas


Tumores ou formações semelhantes a tumores de glândulas sebáceas são
comuns em cães, infreqüentes em gatos e raros em outros animais domésticos.
Embora 5 categorias diferentes tenham sido descritas, todas podem ser variações
do mesmo processo patológico.
Nevos de glândulas sebáceas são lesões solitárias que têm sido relatadas
apenas em cães. A única característica macroscópica que os distingue da hiperpla-
sia de glândulas sebáceas e dos adenomas é que eles tendem a ser lineares ou
circunscritos e possuem vários centímetros de comprimento ou diâmetro.
Hiperplasias de glândulas sebáceas representam uma alteração senil, mais
comum em cães e gatos. Aparecem nas pálpebras, cabeça e tronco, como massas
papiladas múltiplas, geralmente < 1cm de diâmetro, com uma superfície brilhante,
ceratótica.
Adenomas de glândulas sebáceas podem ocorrer em todos os animais domés-
ticos, mas principalmente em cães adultos, mais comumente em fox terriers, cocker
spaniels, poodles, beagles e dachshunds, embora kerry blue terriers, boston terriers,
elkhounds noruegueses e basset hounds também possam ser predispostos. Freqüen-
temente múltiplos, eles desenvolvem-se mais comumente no abdome e tórax, e
podem ser macroscopicamente indistingüíveis da hiperplasia de glândulas sebáceas.
Epiteliomas de glândulas sebáceas (sebaceomas) são tumores benignos de
cães, raramente reconhecidos e mal definidos, quase nunca encontrados em gatos,
que aparecem como massas cutâneas quase sempre ulceradas, nodulares, que
podem ter vários centímetros de diâmetro. Uma superfície epidérmica papilada e
pigmentação são achados variáveis.
Adenocarcinomas de glândulas sebáceas são raros em animais domésticos,
reconhecidos quase que exclusivamente em cães e gatos, geralmente em animais
de meia-idade ou mais velhos e raramente > 2cm de diâmetro. Eles são freqüente-
mente ulcerados e podem parecer indistingüíveis dos epiteliomas sebáceos. Ten-
dem a ser localmente infiltrativos e podem se metastatizar para os linfonodos
regionais em uma fase posterior da doença.
O tratamento é opcional para os tumores benignos de glândulas sebáceas, a
menos que eles estejam secundariamente inflamados e infectados. A excisão é o
tratamento de escolha para os adenocarcinomas de glândulas sebáceas, mas pode
ser difícil devido à sua natureza infiltrativa e a radioterapia adjunta pode ser
requerida. Mesmo crescimentos de glândulas sebáceas benignos recidivam, se
forem deixadas sobras no local cirúrgico; isto é comum em adenomas de pálpebras.
Além disso, hiperplasia de glândulas sebáceas e adenoma de glândulas sebáceas
freqüentemente recidivam para outros locais da pele até mesmo após a excisão
completa. Não existe um protocolo de quimioterapia estabelecido para nenhuma
destas lesões, embora tenha sido relatado que retinóides orais sejam efetivos no
controle de hiperplasias recorrentes e adenomas no homem.

Tumores de glândulas hepatóides


(Tumores de glândulas perianais, Tumores de glândulas circum-anais)
Neoplasias caninas comuns que se desenvolvem a partir de glândulas sebáceas
modificadas. Estas glândulas são mais comuns no tecido cutâneo ao redor do ânus,
mas também podem estar presentes ao longo da linha média ventral do períneo até
a base do crânio, nas regiões dorsal e ventral da cauda, e na pele das regiões lombar
Tumores da Pele e de Tecidos Moles 1035

e sacral. Androgênios estimulam o desenvolvimento das glândulas hepatóides,


resultando em alterações patológicas benignas, geralmente em cães machos,
intactos e mais velhos.
Tumores benignos de glândulas hepatóides são divididos em hiperplasia de
glândulas hepatóides e adenomas de glândulas perianais; entretanto não existem
critérios estabelecidos para distingui-los, e eles devem ser considerados uma única
entidade. Adenomas de glândulas hepatóides são mais comuns em cães machos
e idosos e são incomuns em fêmeas. Cocker spaniels, pastores alemães, dachshunds,
beagles, buldogues ingleses e samoiedas são mais comumente afetados. Os
tumores podem se desenvolver em qualquer sítio onde as glândulas hepatóides
estiverem presentes, mas 90% ocorrem na região perianal. Macroscopicamente,
eles aparecem como nódulos únicos ou (mais comumente) múltiplos intradérmicos,
com 0,5 a 10cm de diâmetro. Eles comumente são ulcerados e hemorrágicos, e o
material ceratináceo pode ser freqüentemente retirado com pressão local. Tumores
grandes podem comprimir o canal anal tornando a defecação difícil. Até 95% dos
cães machos respondem totalmente à castração; os que não respondem devem ser
avaliados com relação à função adrenocortical, e se nenhuma anormalidade for
detectada, o cão deve ser reavaliado para a presença de adenocarcinoma de
glândula hepatóide de baixo grau. A excisão pode ser feita simultaneamente para
remover tumores ulcerados ou extremamente grandes que se tornaram secundaria-
mente infectados. A cirurgia é o tratamento de escolha para fêmeas com tumores
de glândulas hepatóides, mas pode necessitar de repetição, pois a recidiva é
comum. A radioterapia também é uma opção e tem resultado em cura durante 2 anos
em 69% dos tumores benignos. Dietilstilbestrol pode servir de alternativa à castra-
ção, mas devido aos seus efeitos colaterais, que incluem anemia aplásica e
hiperplasia prostática cística, seu uso deve ser severamente restrito.
Adenocarcinomas de glândulas hepatóides são neoplasias caninas inco-
muns, das quais < 1% são malignas. Eles não parecem ser influenciados por
hormônios, e ocorrem em cães idosos com igual freqüência em machos e fêmeas.
Eles geralmente são ulcerados, com evidência palpável de invasão em tecidos
perianais profundos. Têm um acentuado potencial metastático e freqüentemente se
difundem para os linfonodos regionais. O tratamento consiste de ampla excisão
cirúrgica, incluindo os linfonodos envolvidos, e possivelmente radiação subseqüen-
te. Estes tumores geralmente não respondem à castração ou à terapia com
estrogênio, e não se sabe se a quimioterapia é benéfica para doenças metastáticas.
O prognóstico é reservado.

Tumores neuroendócrinos cutâneos primários


(Tumores de células Merkel, Histiocitomas atípicos, Carcinomas trabeculares,
Plasmocitomas extramedulares)
Em medicina veterinária, existem controvérsias se os tumores se desenvolvem
a partir das células Merkel (derivação incerta de células neurossecretórias tácteis,
presentes na camada celular basal da epiderme). Existem descrições de neoplasias
na pele e na cavidade oral de cães com grânulos intracitoplasmáticos, limitados por
membrana, característicos de tumores neuroendócrinos. Entretanto, estes são
freqüentemente indistingüíveis de plasmocitomas extramedulares cutâneos; prova-
velmente, eles são o mesmo tumor.

PAPILOMATOSE
(Verrugas)
Papilomas múltiplos da pele ou de superfícies mucosas geralmente são vistos em
animais mais jovens, e são causados por vírus; papilomas únicos são mais
Tumores da Pele e de Tecidos Moles 1036

freqüentes em animais mais velhos, mas sua causa é desconhecida. O termo


papilomatose é às vezes usado para descrever a forma multicêntrica, que ocorre
mais freqüentemente na pele, trato gastrointestinal superior, genital e mucosa da
bexiga em uma variedade de mamíferos, incluindo o homem. Verrugas também têm
sido relatadas em algumas espécies de peixes e de pássaros. Verrugas não
induzidas por vírus têm sido reconhecidas em Felidae. As verrugas induzidas por
papilomavírus são espécie específicas sob condições naturais, e freqüentemente
locais específicas. A papilomatose é mais comum em eqüinos, cães e bovinos.
Os vírus que induzem verrugas são pequenos (55nm em média), com dupla fita
de DNA e pertencem à família Papovaviridae. Alguns mamíferos possuem vários
vírus de papilomas distintos, por exemplo, o homem possui > 20; bovinos, 5; cães,
2; e coelhos, 2. O vírus é transmitido por contato direto, fomitos e possivelmente
insetos.
Achados clínicos – Bovinos – As verrugas ocorrem comumente na cabeça,
pescoço e porções anteriores do corpo, e ocasionalmente no dorso e abdome. A
extensão e duração das lesões dependem do tipo de vírus, da área afetada e do grau
de suscetibilidade. As verrugas aparecem , 2 meses após a exposição e podem
durar ≥ 1 ano. A papilomatose se torna um problema do rebanho quando a infecção
ocorre em um grande grupo de bovinos jovens suscetíveis. A imunidade para uma
reexposição geralmente se desenvolve 3 a 4 semanas após a infecção inicial, mas
ocasionalmente ocorrem recidivas, provavelmente devidas à perda de imunidade.
A verruga de bovinos contém um elemento fibromatoso, que é mais proeminente
na forma venérea da doença, na qual os fibropapilomas podem ser um sério
problema no pênis de jovens touros, podendo causar distocia quando a mucosa
vaginal de novilhas é afetada.
Uma forma de papilomatose cutânea persistente com pequenas verrugas pode
ocorrer em rebanhos de bovinos mais velhos. O papilomavírus bovino tem sido
demonstrado em tumores de bexiga associados com a ingestão de samambaia (ver
pág. 1989) em várias partes do mundo, e em papilomas do trato gastrointestinal
superior de bovinos na Escócia. Acredita-se que o papilomavírus age como um co-
carcinógeno. Quando o papilomavírus bovino é injetado na pele de eqüinos, um
tumor semelhante a um fibrossarcoma similar a um sarcóide desenvolve-se.
Eqüinos – Verrugas pequenas e dispersas ocorrem no nariz e nos lábios,
presumivelmente nos locais de abrasão quando os potros se focinham. São comuns
quando potros são mantidos juntos, mas regridem em alguns meses devido à
imunidade completa. As chamadas placas aurais também parecem ser uma forma
de papiloma. Ocorrem na superfície interna das pinas, e ocasionalmente ao redor
do ânus, glândulas mamárias e vulva.
Papilomas eqüinos devem ser diferenciados de sarcóides, aos quais são
semelhantes em aparência. O sarcóide eqüino (ver pág. 1039) é um tumor mais
comum de cavalos que pode se assemelhar a verrugas ulceradas.
Cães – Duas formas de papilomas caninos ocorrem, ambas primariamente em
cães jovens. Os papilomas orais são múltiplos crescimentos piliformes, semelhan-
tes à couve-flor, cinza ou brancos que em casos extremos podem cobrir uma grande
porção do palato, língua e esôfago e interferir na mastigação. Podem ocorrer
necrose e infecção secundária, causando um odor pútrido. Inclusões virais estão
presentes na camada granular. A forma cutânea aparece como sua contraparte nos
bovinos com múltiplas verrugas na face, pescoço e membros. O papilomavírus oral
não causa papiloma cutâneo quando injetado na pele.
Outras espécies – Verrugas que afetam várias áreas da pele têm sido descritas
em caprinos; algumas, presentes nas tetas e úbere, tornam-se carcinomas. Raras
em ovinos, elas podem ser transmitidas de ovino para ovino, mas não para outras
espécies. Papilomas são raros em suínos, e suspeita-se de uma etiologia viral, mas
Tumores da Pele e de Tecidos Moles 1037

isso não está provado. As lesões podem ser solitárias ou múltiplas, podendo ocorrer
na face ou genitália. Para papilomas em coelhos, ver página 1291. Papilomatoses
cutâneas, transmissíveis têm sido relatadas em macacos, mas a especificidade não
foi estabelecida.
Um fibroma cutâneo ocorre em veados orelhudos de cauda branca e de cauda
preta, e em antílopes, alces e caribus. É causado por um papilomavírus encontrado
apenas no epitélio que recobre o tumor e assemelha-se ao papilomavírus bovino.
Tratamento e controle – A papilomatose infecciosa é uma doença autolimitante,
embora a duração das verrugas varie consideravelmente. Muitos tratamentos têm
sido defendidos sem se provar a sua eficácia. A remoção cirúrgica é recomendada
se as verrugas forem muito desagradáveis. Entretanto, se a cirurgia for feita no
estágio inicial de desenvolvimento das verrugas, pode haver recidiva e estímulo do
crescimento; dessa forma, elas devem ser removidas quando próximas ao seu
tamanho máximo ou quando estiverem em regressão. Os animais afetados podem
ser isolados dos suscetíveis, porém com o período de incubação longo, muitos
animais são expostos antes que o problema seja diagnosticado.
A maioria das vacinas tem apresentado sucesso limitado como um preventivo
para bovinos, mas não para tratamento. Como as verrugas virais são em sua maioria
espécie específicas, não há nenhum mérito no uso de uma vacina derivada de
uma espécie em outra.
Quando a doença for um problema de rebanho, ela pode ser controlada pela
vacinação com uma suspensão do tecido na área das verrugas, em que o vírus foi
morto com formalina. Vacinas autógenas podem ser mais efetivas que as disponí-
veis comercialmente. Pode ser necessário que se inicie a vacinação prematuramen-
te em bezerros com 4 a 6 semanas de idade, com uma dose de , 0,4mL,
intradermicamente em 2 locais. A vacinação é repetida em 4 a 6 semanas e com 1
ano de idade. A imunidade se desenvolve em algumas semanas, mas não está
relacionada com nenhum mecanismo envolvido na regressão espontânea. Se a
exposição ao vírus ocorrer antes da vacinação, a imunidade pode se desenvolver
muito tarde para prevenir o aparecimento das verrugas. Um programa de vacinação
deve ter efeito durante , 3 a 6 meses antes de seu valor preventivo estar evidente.
A vacinação deve ser continuada por ≥ 1 ano após a última verruga ter desaparecido,
pois as instalações podem ainda estar contaminadas. Baias, balaústres e outros
materiais inertes podem ser desinfetados pela fumigação com formaldeído.

TUMORES DE TECIDO CONJUNTIVO


Tumores fibroblásticos benignos
Nevos colagenosos são defeitos de desenvolvimento benignos, focais, asso-
ciados com o aumento da deposição de colágeno dérmico. São relativamente
comuns em cães, incomuns em gatos e raros em grandes animais. Eles geralmente
ocorrem em animais de meia-idade ou mais velhos, e mais freqüentemente nas
extremidades proximais e distais, cabeça e pescoço. Eles são nódulos dérmicos
sésseis a elevados, freqüentemente com uma superfície papilada, às vezes com
pêlos grossos saindo deles. Infreqüentemente, eles podem aparecer na gordura
subcutânea. A excisão é curativa.
Dermatofibrose nodular generalizada diagnosticada em pastores alemães, é
uma síndrome na qual múltiplos nevos colagenosos estão associados com
cistadenocarcinomas renais, e em fêmeas, a múltiplos leiomiomas uterinos. Acre-
dita-se ser herdada por um gene autossômico dominante, e é primeiro reconhecida
quando o animal tem 3 a 5 anos de idade. Caracteriza-se pelo desenvolvimento de
múltiplos nevos colagenosos que variam de pouco palpáveis a grandes e nodulares,
geralmente nos membros, patas, cabeça e tronco e podem apresentar uma
Tumores da Pele e de Tecidos Moles 1038

distribuição simétrica. A doença renal desenvolve-se em , 3 a 5 anos após as lesões


cutâneas terem sido reconhecidas. Não existe terapia conhecida para prevenir o
desenvolvimento de neoplasias renais e uterinas.
Fibromas são proliferações geralmente celulares discretas, de fibroblastos
dérmicos, raros em todas as espécies domésticas, mas mais comuns em cães e
gatos idosos. São pápulas ou nódulos solitários, firmes a flutuantes, freqüentemente
sem pêlos. Como estas lesões são benignas, o tratamento é opcional; entretanto,
a excisão completa é recomendada para se obter uma confirmação histopatológica.
Acrocórdones (“tags” cutâneos, fibromas moles, papilomas fibrovasculares)
são lesões cutâneas distintas e benignas de cães mais velhos. Estas lesões são
comuns, podem ser únicas ou múltiplas e podem ocorrer em qualquer raça, mas os
animais de raças grandes podem ter um risco acentuado. Mais comumente, eles
aparecem como crescimentos exofíticos pedunculados, freqüentemente cobertos
por uma superfície epidérmica verrucosa. O tratamento é opcional, mas recomenda-
se a biópsia para confirmar o diagnóstico. Eles são passíveis de excisão, eletroci-
rurgia e criocirurgia, mas cães que desenvolvem um acrocórdone são propensos a
desenvolver outros posteriormente.

Tumores fibroblásticos malignos


Um componente do grupo das neoplasias malignas, conhecido como sarcoma de
células “fuso”, que inclui sarcóides eqüinos, fibromatoses, fibrossarcomas,
histiocitomas fibrosos malignos, neurofibrossarcomas, leiomiossarcomas, rabdo-
miossarcomas e variações de lipossarcomas, angiossarcomas, sarcomas de célu-
las sinoviais, mesoteliomas e meningiomas. Como um grupo, este é talvez o mais
amplamente reconhecido, mesmo sendo neoplasias menos definidas. A confusão
advém em parte do fato de que todos os sarcomas de células “fuso” têm uma célula
de origem comum: uma célula mesenquimal primitiva. Portanto, a caracterização
destes sarcomas não é baseada nas células de origem, mas na linha celular em
direção a qual houve a diferenciação. Devido ao fato de esta célula mesenquimal
primitiva ter aparentemente maior capacidade de não diferenciação e de diferencia-
ção que a célula basal (a célula de origem da maioria dos tumores epiteliais),
geralmente há uma sobreposição morfológica consideravelmente maior em sarco-
mas que em carcinomas. Isto torna difícil definir os critérios histopatológicos
necessários para se fazer um diagnóstico inequívoco de um sarcoma específico de
célula “fuso”.
Uma segunda causa de confusão advém da dificuldade de determinar se eles são
benignos ou malignos. A maioria dos sarcomas de células “fuso” dos animais
domésticos são localmente infiltrativos, difíceis de serem excisados, mas raramente
metastatizam. Logicamente, estes tumores devem ser considerados benignos
porque, pela definição, apenas tumores malignos possuem potencial metastático;
entretanto, uma lógica semelhante impõe que estes tumores devem ser considera-
dos malignos porque, pela definição, neoplasias benignas não são infiltrativas. Em
patologia humana, tumores de células “fuso” mesenquimais que não metastatizam,
mas são infiltrativos, têm sido definidos como “sarcomas de malignidade intermedi-
ária”, um conceito utilizado adiante.
Devido ao fato de esses sarcomas serem considerados como um grupo, alguns
comentários gerais devem ser feitos. Clinicamente, existem 4 princípios gerais
relacionados aos sarcomas de células “fuso” e aos sarcomas de tecido mole: 1.
quanto mais superficial for a localização, é mais provável que o tumor seja benigno
(tumores profundos tendem a ser malignos); 2. quanto maior o tumor, maior é a
probabilidade de ele ser maligno; 3. um tumor que se desenvolve rapidamente tem
mais chance de ser maligno que um que se desenvolva lentamente; 4. tumores
Tumores da Pele e de Tecidos Moles 1039

benignos são relativamente avasculares, enquanto que a maioria dos malignos são
hipervasculares.
A excisão é o tratamento de escolha; a excisão ampla ou amputação deve ser
feita quando anatomicamente viável, pois estes sarcomas freqüentemente se
infiltram ao longo dos planos fasciais, tornando difícil se determinar pelo exame
macroscópico, as margens periféricas do tumor. A melhor, se não a única, oportu-
nidade para se remover totalmente o sarcoma de célula “fuso” é durante a primeira
tentativa cirúrgica; os tumores que recidivam possuem um potencial maior para se
metastatizar, e o tempo entre a recidiva tende a ser mais curto a cada tentativa
subseqüente de excisão. Além disso, muitos tumores de tecido mole possuem
uma “pseudocápsula”, a qual em um exame macroscópico dá a impressão de uma
completa encapsulação; estes tumores não devem ser desencapsulados, pois as
células neoplásicas estão quase sempre presentes no tecido conjuntivo pericapsular.
Exceto para os sarcóides eqüinos, normalmente a criocirurgia não é usada para
estes tumores, já que a maioria, principalmente os fibrossarcomas, possui membra-
nas celulares espessas, tornando-os resistentes ao congelamento. Os sarcomas
geralmente não respondem bem às doses convencionais de radiação, embora
tenha-se relatado que doses mais altas tenham controlado , 50% dos casos
durante 1 ano. “Debulking” cirúrgico seguido pela radiação também é uma opção
para um controle local. Embora a quimioterapia tenha sido efetiva no tratamento de
tumores semelhantes no homem, não se conhece nenhum protocolo quimiotera-
pêutico de valor para o tratamento desses tumores em outros animais.
Sarcóides eqüinos são as neoplasias mais freqüentemente reconhecidas em
eqüinos. Sua etiologia é indefinida, mas provavelmente eles são causados por um
papilomavírus diferente do encontrado em bovinos. Há evidência de predisposição
familiar, e eles podem ser transmitidos por contato direto, via vetores artrópodes ou
via fomitos, por exemplo, escovas e agulhas contaminadas. Eles se desenvolvem
em eqüinos, burros ou mulas, mais comumente nos animais < 4 anos de idade. Os
sarcóides podem aparecer em qualquer região do corpo, e até 84% dos animais
afetados apresentam múltiplas lesões. Os locais mais comuns variam com a área
geográfica: no Reino Unido, o pênis parece ser o local mais comum, enquanto no
noroeste dos EUA, os membros são afetados mais freqüentemente. Sarcóides são
altamente variáveis em aparência, e 4 aspectos são reconhecidos: 1. verrucosos,
que podem ser confundidos com papilomas escamosos ou carcinomas de células
escamosas; 2. fibroblásticos, que podem ser confundidos com tecido de granulação
ou fibromas; 3. sésseis ou planos, que podem ser confundidos com verrugas planas;
e 4. verrucosos e fibroblásticos mistos, que podem ser confundidos com fibropa-
pilomas. Eles devem ser considerados sarcomas de malignidade intermediária; eles
não metastatizam, mas comumente recidivam. A criocirurgia (após “debulking”
cirúrgico das lesões maiores) é o tratamento de escolha. Tem sido relatada taxa de
1 ano de remissão em , 90% dos casos. Além disso, lesões não tratadas também
podem regredir espontaneamente, embora ≥ 50% dos sarcóides eqüinos recidivem
após a cirurgia apenas. A radioterapia usando irídio pode ser de valor quando as
lesões estiverem presentes em locais em que não seja possível a criocirurgia ou a
excisão. A imunoterapia com inoculações de Bacillus Calmette-Guerin (BCG)
permanece controversa; têm sido relatados bons resultados e anafilaxia fatal.
Recomenda-se a administração de meglumina flunixina e prednisolona 30min antes
da inoculação de BCG. Sarcóides inoculados com BCG podem levar vários meses
para regredir totalmente. Finalmente, esta forma de terapia não deve ser usada
quando os animais tratados puderem ter contato com bovinos, pois a BCG pode
induzir uma reação de tuberculina positiva nos bovinos.
Fibromatose (fibromatose agressiva, desmóides extra-abdominais, tumores
desmóides, fibrossarcomas de baixo grau, fasciítes nodulares) é uma proliferação
Tumores da Pele e de Tecidos Moles 1040

esclerótica e infiltrativa de fibroblastos bem diferenciados, derivados de aponeuro-


ses e bainhas de tendões. Pode ocorrer em outras localizações, mas é geralmente
observada na cabeça de cães, onde é comumente diagnosticada como fasciíte
nodular. (Em medicina veterinária, o termo fasciíte nodular é aplicado a 2 doenças
diferentes: uma que se comporta como uma fibromatose e uma que comumente
afeta os tecidos perioculares [conhecida como histiocitoma fibroso canino – ver
adiante]). Fibromatoses são infreqüentes em gatos e eqüinos. Macroscopicamente,
fibromatoses são quase sempre indistingüíveis de fibrossarcomas infiltrativos;
entretanto, eles podem ser diferenciados ao exame histológico. Nódulos linfóides
focais estão dispersos por todos os tecidos. Fibromatoses são localmente infiltrativas
sem potencial metastático. Se possível, a excisão é o tratamento de escolha. A
recidiva é comum e a radioterapia pode ser de valor para um controle local.
Fibrossarcomas são tumores mesenquimais agressivos, nos quais os fibroblas-
tos são os tipos celulares predominantes; são mais comuns em gatos, nos quais são
o tumor de tecidos moles mais comum. Eles também são comuns em cães, mas são
raros em outros animais domésticos. Existem 2 formas reconhecidas em gatos: uma
forma multicêntrica nos jovens (geralmente < 4 anos de idade), causada pelo vírus
do sarcoma felino (VSF) e uma forma solitária nos jovens e nos mais velhos, na qual
o vírus do sarcoma felino não tem sido implicado. Em todas as outras espécies, os
fibrossarcomas tendem a ser solitários. Em cães, estes tumores são mais comuns
no tronco e nas extremidades, e fêmeas e cocker spaniels podem estar predispos-
tos. Os fibrossarcomas variam muito em tamanho. Eles aparecem como lesões
carnosas, firmes, que envolvem a derme e a gordura subcutânea, e podem invadir
a musculatura subjacente ao longo dos planos faciais. Quando os tumores são
múltiplos, eles normalmente estão localizados dentro da mesma região anatômica.
Os fibrossarcomas com abundante proteoglicanos intersticiais (mucinas de tecido
conjuntivo) são chamados de mixossarcomas ou mixofibrossarcomas. Os
mixossarcomas permanecem pouco definidos em medicina veterinária, e muitos
deles podem ser melhor caracterizados como variações de lipossarcomas ou de
histiocitomas fibrosos malignos. Os fibrossarcomas devem ser considerados tumo-
res invasivos; aproximadamente 10% metastatizam. O sucesso da excisão cirúrgica
dos fibrossarcomas depende do grau de atipia celular (como definido pelo índice
mitótico), da natureza infiltrativa do tumor, do tamanho e da localização anatômica.
Gatos com tumores na pina ou flanco possuem um maior tempo de sobrevivência
após a cirurgia; se na cabeça, dorso ou membros, 70% recidivam < 1 ano após a
cirurgia inicial.

Tumores fibro-histiocíticos
Tumores mesenquimais e pleomórficos, compostos por células histiocíticas e
fibroblastos (freqüentemente presentes como células gigantes multinucleadas);
estas lesões benignas permanecem pouco definidas em medicina veterinária. Uma
lesão chamada histiocitoma fibroso canino (episcleroceratite granulomatosa
nodular, fasciíte nodular, ceratoconjuntivite proliferativa, granuloma conjuntival,
granuloma do collie) é reconhecida na junção episcleral e na córnea de collies jovens
e de meia-idade (2 a 4 anos de idade), mas as características histológicas são mais
sugestivas de uma resposta inflamatória granulomatosa que de uma neoplasia.
Como é de se esperar em um processo inflamatório não infeccioso, este geralmente
é responsivo a injeções sublesionais de 10 a 40mg de metilprednisolona.
Histiocitomas fibrosos malignos (tumores de células gigantes extra-esquelé-
ticos, tumores de células gigantes de partes moles, dermatofibrossarcomas) são
incomuns na pele e tecidos moles de gatos, eqüinos e mulas. Eles têm sido descritos
em cães, mas permanecem pouco definidos nesta espécie. Em gatos, histiocitomas
fibrosos malignos são mais comuns nas extremidades distais ou regiões ventral e
Tumores da Pele e de Tecidos Moles 1041

cervical de animais idosos. Em eqüinos e mulas, eles têm sido descritos como
tumores de células gigantes de partes moles. Eles aparecem em eqüinos de 3 a 12
anos de idade. São inchaços firmes, nodulares a difusos, de coloração branca na
superfície de corte, com hemorragia variável. Histiocitomas fibrosos malignos são
sarcomas de malignidade intermediária. Eles são localmente invasivos e tendem a
recidivar após tentativas de excisão completa, mas raramente metastatizam. A
excisão radical é recomendada.

Tumores da bainha de nervos periféricos


Neuromas por amputação (neuromas traumáticos) não são neoplasias; são
proliferações desorganizadas do parênquima nervoso periférico e do estroma, como
resposta à amputação ou à injúria traumática. Eles são mais comumente identifica-
dos em associação com amputação da cauda de cães ou neurectomia em extremi-
dades distais de eqüinos. Em cães, neuromas por amputação são geralmente
reconhecidos em animais jovens, e estão associados com autotraumatismo extre-
mo da ponta da cauda. Em eqüinos, a lesão apresenta-se como um inchaço firme,
freqüentemente dolorido, no local da cirurgia. A excisão é curativa.
Neurofibromas e neurofibrossarcomas (perineuromas, neurilemomas, tumo-
res da bainha de nervos, hemangiopericitomas, neurotecomas, schwannomas) são
tumores de células “fuso” que se desenvolvem a partir de componentes do nervo
periférico de tecidos conjuntivos. Acredita-se que eles se desenvolvem a partir das
células de Schwann, mas eles podem também se desenvolver de células mesenqui-
mais, que produzem o tecido conjuntivo não mielinizado, o qual circunda a fibra
nervosa mielinizada. Em cães, algumas vezes este tumor pode ser indistingüível de
hemangiopericitomas e pode ser o mesmo tumor.
Em cães e gatos, tumores da bainha de nervos periféricos da pele ocorrem em
animais idosos. Em bovinos, suspeita-se de uma base genética, podem ser
múltiplos, ocorrendo tanto em animais jovens como velhos, e são comumente um
achado acidental no matadouro, aparecendo como um ou mais inchaços nodosos
de nervos profundos da parede torácica e vísceras. O envolvimento cutâneo é raro.
Eles aparecem como lesões nodulares, firmes e brancas, que podem ser identifica-
das em associação com os nervos periféricos. Eles podem ser benignos ou podem
apresentar um grau intermediário de malignidade. Os benignos são mais comuns
em bovinos, nos quais, devido à sua natureza indolente, o tratamento se torna
opcional; além disso, tumores adicionais tendem a se desenvolver espontaneamen-
te em outros locais posteriormente. Em cães, gatos e eqüinos, a maioria desses
tumores é localmente infiltrativa, mas não metastatiza. A excisão completa é o
tratamento de escolha.

Tumores de tecido adiposo


Lipomas são tumores benignos de tecido adiposo, talvez mais exatamente
caracterizados como nevos. Eles são comuns em cães, ocorrem ocasionalmente
em gatos e eqüinos e são raros em outras espécies domésticas. Em cães, eles
geralmente ocorrem em fêmeas obesas e mais velhas, mais comumente no tronco
e nos membros proximais. As raças de maior risco são cocker spaniels, dachshunds,
weimeraners, labrador retrievers, e pequenos terriers. Os gatos mais afetados são
os castrados e os com 6 a 12 anos de idade. A obesidade não parece ser um fator
predisponente. Os eqüinos afetados geralmente têm < 2 anos de idade. Os lipomas
normalmente são massas nodulares discretas, moles, ocasionalmente pedunculadas,
e a maioria é facilmente deslocável. Em cães e gatos, eles são freqüentemente
múltiplos. Uma variação rara desse tumor, a lipomatose difusa, tem sido identificada
em dachshunds, nos quais virtualmente a pele inteira é afetada, resultando em
Tumores da Pele e de Tecidos Moles 1042

dobras proeminentes no pescoço e pele truncada. Muitos lipomas unem-se imper-


ceptivelmente ao tecido adiposo adjacente não neoplásico, tornando difícil se
determinar quando a lesão inteira é excisada. Lipomas com um estroma de tecido
conjuntivo abundante (fibrolipomas) ou um componente vascular proeminente
(angiolipomas) também são reconhecidos. Apesar de sua natureza benigna, os
lipomas não devem ser ignorados, devido à sua tendência a crescer com o decorrer
do tempo, e à sua aparência macroscópica, que pode torná-los indistingüíveis dos
lipomas infiltrativos ou lipossarcomas (ver adiante). A excisão é curativa. Em cães,
uma restrição dietética várias semanas antes da cirurgia pode permitir uma melhor
definição das margens cirúrgicas do tumor. Aproximadamente 1/3 dos cães e gatos
que desenvolvem um desses tumores pode desenvolver outros posteriormente.
Lipomas infiltrativos (lipomas intramusculares e intermusculares) são raros em
cães, gatos e eqüinos. Em cães, eles são mais comuns em fêmeas de meia-idade,
normalmente no pescoço e nos membros. Eles são inchaços pouco confinados,
moles, nodulares a difusos, que tipicamente envolvem a gordura subcutânea, a
musculatura subjacente do tecido e o estroma do tecido conjuntivo. Lipomas
infiltrativos, que atravessam os planos fasciais e os feixes musculoesqueléticos, são
considerados sarcomas de malignidade intermediária. Raramente eles metastatizam.
A excisão radical é recomendada e a amputação pode ser necessária.
Lipossarcomas são incomuns em todos os animais domésticos. Em gatos, a
infecção pelo vírus da leucemia felina raramente tem sido associada com o seu
desenvolvimento; não se sabe se isto é apenas uma coincidência ou se estas
infecções desempenham um papel importante no desenvolvimento da doença.
Estes tumores geralmente aparecem em animais mais velhos. Eles são nodulares,
moles a firmes e podem exsudar um fluido mixóide quando seccionado. Muitos
apresentam áreas palpáveis, parcialmente encapsuladas, mas estas zonas não
devem ser consideradas uma evidência de tumor benigno. Lipossarcomas são
neoplasias malignas que possuem baixo potencial metastático, mas são extrema-
mente infiltrativos. A excisão ampla é recomendada mesmo para aqueles que
parecem ser parcialmente encapsulados. A recidiva é comum, principalmente para
variantes anaplásicas.

Tumores vasculares
Hemangiomas da pele e tecidos moles são proliferações benignas que asseme-
lham-se intimamente a vasos sangüíneos. Permanece indefinido se eles realmente
são neoplasias, nevos ou malformações vasculares, e não existe critério para a sua
separação. Eles são mais comumente identificados em cães, ocasionalmente em
gatos e eqüinos, raramente em bovinos e suínos e excepcionalmente em outros
animais. Tem-se sugerido que as raças caninas de maior risco são os bóxers,
scottish terriers, airedales e kerry blue terriers. Em eqüinos, eles são mais comuns
nas extremidades distais de animais < 1 ano de idade. Em bovinos, eles ocorrem em
animais mais velhos ou como lesões congênitas. O gado leiteiro é predisposto a
hemangiomas disseminados (angiomatose) na pele e em órgãos internos. Em
suínos, estas lesões geralmente ocorrem na pele escrotal ou perineal de yorkshire,
berkshire e, menos comumente, em javalis chester white. Nas 2 primeiras raças,
acredita-se que a doença seja transmitida geneticamente. Hemangiomas são
nódulos únicos a múltiplos, circunscritos, freqüentemente compressivos, com
coloração vermelha a preta. A epiderme de revestimento pode não estar afetada, ou
pode estar ulcerada ou papilada, principalmente em eqüinos e bovinos.
Quando as hemácias são esparsas ou ausentes, aplica-se o termo linfangioma.
Hemangiomas presentes apenas na derme superficial e que induzem hiperplasia
epidérmica são conhecidos como angioceratomas.
Tumores da Pele e de Tecidos Moles 1043

Hemangiomas são neoplasias benignas, mas possuem uma tendência a se


ulcerar, portanto é importante a confirmação do diagnóstico para se fazer um
prognóstico; desta forma indica-se a sua remoção cirúrgica. A excisão é o tratamen-
to de escolha; entretanto, isto pode ser difícil em grandes animais nos quais as
lesões podem ocorrer nas extremidades distais. Nesses casos, a criocirurgia ou a
radioterapia podem ser necessárias. Exceto em bovinos leiteiros com angiomatose,
o desenvolvimento de tumores adicionais em novos locais após a excisão completa
é incomum.
Hemangiopericitomas (sarcoma canino de células “fuso”, histiocitoma fibroso
maligno canino, neurofibrossarcoma canino, perineuroma canino) são comuns em
cães e raros (ou ausentes) em gatos. Eles são mais comuns nas extremidades
distais de cães idosos. As fêmeas parecem ser mais predispostas e as raças de
maior risco são bóxer, pastor alemão, cocker e springer spaniels, fox terrier,
airedales e doberman pinschers. Eles são lesões solitárias, firmes, multilobuladas,
com bordas irregulares, aparecendo mais comumente na gordura subcutânea e
algumas vezes na derme. Os hemangiopericitomas são de malignidade intermediá-
ria e têm potencial metastático limitado. A excisão completa é o tratamento de
escolha, mas, devido à sua natureza infiltrativa, , 30% dos tumores recidivam.
Angiossarcomas são neoplasias malignas cujas células apresentam muitas
características funcionais e morfológicas de endotélio normal. Embora estes tumo-
res sejam freqüentemente divididos em hemangiossarcomas (origem em vasos
sangüíneos) e linfangiossarcoma (origem em vasos linfáticos), esta distinção é
arbitrária. O termo angioendotelioma também é usado. Sua causa é desconhecida,
mas em cães de pelagem branca curta, como o pit bull terrier, a lesão solar crônica
tem induzido uma mudança no plexo vascular superficial, que inicialmente aparece
como um hemangioma, mas depois progride para um tumor vascular maligno.
Angiossarcomas da pele e de tecidos moles ocorrem em todos os animais
domésticos, mas são mais comuns em cães, geralmente em animais adultos ou
idosos. Em cães, eles se desenvolvem mais freqüentemente no tronco, ancas,
coxas e extremidades distais. Os machos são mais freqüentemente afetados que as
fêmeas e os animais das raças pastor alemão, bóxer e bernese mountain apresen-
tam um risco maior. Normalmente, eles são nódulos eritematosos, solitários, pouco
confinados, presentes em qualquer lugar da pele ou tecidos moles subjacentes.
Menos freqüentemente eles aparecem como uma equimose pouco definida. Todos
crescem rapidamente e quase sempre estão associados com grandes áreas de
necrose e trombose, sendo geralmente vermelhos a pretos na superfície de corte.
Caracteristicamente, eles criam seu próprio espaço vascular, atravessando os
tecidos moles. Em cães, os angiossarcomas são mais agressivos que todos os
sarcomas de tecido mole. Metástases distantes, principalmente no pulmão e fígado,
são comuns. Em outros animais domésticos, estes tumores não parecem ser tão
agressivos, e a recidiva pós-excisional é mais comum que a metástase. Para todas
as espécies, a excisão ampla é o tratamento de escolha. Recentemente, a quimio-
terapia adjuvante à base de vincristina, doxorubicina e ciclofosfamida tem sido
relatada na redução de angiossarcomas; entretanto, os efeitos dessa terapia com
relação ao tempo de sobrevida do animal, permanecem indefinidos.

Tumores cutâneos de músculos lisos


Porque eles são pouco reconhecidos ou porque eles ocorrem com pouca regula-
ridade nos animais domésticos, os tumores cutâneos de músculos lisos (leiomiomas
ou leiomiossarcomas) são raramente diagnosticados. Os relatados geralmente são
malignos e limitados a cães e gatos. Normalmente são massas cutâneas firmes.
Leiomiomas são menores e tendem a se limitar à derme, enquanto leiomiossarcomas
Tumores da Pele e de Tecidos Moles 1044

são maiores e a maioria surge (ou estende-se) da gordura subcutânea. O comporta-


mento dos tumores malignos de músculos lisos permanece pouco definido. A excisão
completa é o tratamento de escolha para leiomiomas e leiomiossarcomas.

SARCOMAS ANAPLÁSICOS E INDIFERENCIADOS


São tumores mesenquimais malignos, difíceis de serem caracterizados micros-
copicamente. Sarcomas indiferenciados não possuem características distintas
(padrões de arquitetura, características citoplasmáticas e nucleares, produtos
celulares). Sarcomas anaplásicos possuem a maioria das seguintes características:
variações no tamanho e na forma do nucléolo, hipercromasia nuclear, notável
irregularidade da cromatina, figuras mitóticas anormais e grande número de figuras
mitóticas. Dessa forma, sarcomas anaplásicos são geralmente indiferenciados,
mas sarcomas indiferenciados não são necessariamente anaplásicos. Ambos
devem ser tratados pela excisão ampla; entretanto, o prognóstico para os sarcomas
anaplásicos é geralmente pior que para os sarcomas indiferenciados.

NEOPLASIAS CUTÂNEAS LINFOCÍTICAS, HISTIOCÍTICAS


E RELACIONADAS
Neoplasias linfóides da pele
Plasmocitomas extramedulares caninos (histiocitomas atípicos, tumores
neuroendócrinos cutâneos primários [ver pág. 1035]) foram reconhecidos recente-
mente, mas como são tumores cutâneos relativamente comuns, acredita-se que são
oriundos de células plasmáticas. A maioria desses tumores são previamente
diagnosticados como sarcomas de células reticulares.
Esta neoplasia é mais comum nos dígitos, lábios, pina externa aural e na
cavidade oral de cães adultos a idosos. Eles raramente são > 5cm de diâmetro.
Cocker spaniels, e possivelmente golden retrievers, são as raças de maior risco.
Estes tumores são vermelhos, ocasionalmente pedunculados e freqüentemente
ulcerados. Embora sejam geralmente solitárias, as lesões podem ser múltiplas em
, 10% dos animais. Plasmocitomas extracutâneos podem ser localmente invasivos,
principalmente quando presentes na cavidade oral; a excisão completa, mas
conservativa, é geralmente curativa. O tratamento para tumores múltiplos ou
recidivantes permanece pouco definido. A radioterapia parece ser a segunda melhor
opção de tratamento. Para tumores radiorresistentes, agentes quimioterápicos,
como melfalan, ciclofosfamida e glicocorticóides têm sido recomendados.
Linfossarcomas cutâneos podem ocorrer primariamente na pele ou secunda-
riamente à uma doença interna, sistêmica (ver também LINFOSSARCOMA, págs. 38, 46
e 472). O linfossarcoma cutâneo é incomum, mas tem sido identificado em todas as
espécies domésticas. Em geral, 2 formas distintas são reconhecidas: uma forma
epiteliotrófica (presumivelmente de origem em linfócitos T), na qual há infiltração por
linfócitos malignos na epiderme, e uma forma nodular, não epiteliotrófica (presumi-
velmente de origem em linfócitos B).
Linfossarcomas epiteliotróficos (micoses fungóides) são a forma mais comum
de linfossarcoma cutâneo em cães, incomum em gatos e rara em outros animais. Em
cães e gatos, ocorrem em animais de meia-idade ou mais velhos. Possuem
numerosas manifestações macroscópicas e inicialmente podem ser difíceis de
serem identificados com base nos sinais clínicos. Inicialmente podem apresentar
manchas eritematosas irregulares, descamação excessiva, alopecia primária, uma
gengivite ulcerativa e erosiva, placas e nódulos ou uma combinação de uma ou mais
das características citadas. Com o evoluir do processo, placas e nódulos tornam-se
uma característica importante. Em medicina veterinária, o termo reticulose “pagetoid”
Tumores da Pele e de Tecidos Moles 1045

é usado quando o linfossarcoma epiteliotrófico não possui envolvimento dérmico


significativo. Uma doença progressiva e incurável com envolvimento de linfonodos,
geralmente ocorre com a progressão da doença. Na maioria dos casos, a pele torna-
se severamente envolvida, sendo necessária a eutanásia. Nos raros casos em que
há evidência da presença de células malignas no sangue periférico, o termo
síndrome de Sezary é aplicado. Não se estabeleceu nenhuma terapia efetiva para
esta neoplasia.
Linfossarcomas cutâneos não epiteliotróficos (LCNE) são a forma de linfos-
sarcoma cutâneo mais comumente reconhecida em todos os animais domésticos,
exceto o cão, porém são raros a incomuns em todas as espécies. Em cães, eles são
mais comuns em animais de meia-idade ou idosos. As lesões são nódulos ou placas,
principalmente no tronco, as quais podem ser únicas ou múltiplas e ulceram
freqüentemente. Em muitos casos, os linfossarcomas cutâneos não epiteliotróficos
podem ser macroscopicamente indistingüíveis do linfossarcoma epiteliotrófico, e a
avaliação histológica pode ser necessária para distingui-los. O linfossarcoma
cutâneo não epiteliotrófico canino é agressivo e um envolvimento sistêmico secun-
dário é freqüente. Vários tipos de terapia têm sido utilizados, incluindo excisão,
quimioterapia e, menos freqüentemente, a radioterapia, isoladamente ou em
combinação. A excisão é o tratamento de escolha quando a doença for limitada a
um tumor solitário e ocasionalmente a cura completa tem sido obtida. A excisão ou
criocirurgia nas formas mais difusas raramente acarreta em remissão por um longo
tempo. Protocolos quimioterápicos ou quimioimunológicos utilizados para outras
formas de linfossarcoma canino devem ser considerados paliativos. O tempo médio
de remissão é de , 8 meses.
Em eqüinos, linfossarcoma cutâneo não epiteliotrófico (linfossarcoma nodular,
linfossarcoma subcutâneo, linfossarcoma linfo-histiocítico) pode ser reconhecido
em qualquer idade, mas é mais comum em animais de meia-idade. Nódulos firmes,
não ulcerados são mais comuns na gordura subcutânea da superfície corporal
ventral. Microscopicamente, são reconhecidos 2 tipos de linfossarcoma nodular
eqüino: o mais comum consiste de uma mistura de histiócitos e de linfócitos
pequenos, bem diferenciados, ocasionalmente com características plasmocitóides;
o segundo consiste de uma população monomórfica de linfócitos atípicos grandes,
com células histiocíticas apenas ocasionais. A diferenciação nesses tipos é impor-
tante na maioria dos casos de linfossarcoma cutâneo eqüino, que possui um padrão
celular monomórfico, tem envolvimento interno e progride rapidamente. Ao contrá-
rio, a forma linfo-histiocítica raramente está associada a um envolvimento interno e
os eqüinos afetados podem sobreviver por meses ou anos. À medida que a forma
linfo-histiocítica progride, os nódulos tendem a se tornar mais freqüentes nas
regiões cervical e ventral. Em muitos casos, a eutanásia pode ser justificada quando
o envolvimento faríngeo induz dispnéia. Não se conhece terapia para estas formas.
Em bovinos, o linfossarcoma cutâneo é uma doença de animais jovens (geral-
mente < 4 anos de idade). Não está associado à infecção pelo vírus da leucemia
bovina. As lesões são tipicamente nodulares, envolvem a derme e/ou a gordura
subcutânea, e freqüentemente são ulceradas. Não se conhece terapia.
Em gatos, o linfossarcoma cutâneo não epiteliotrófico é uma doença de animais
de meia-idade ou mais velhos. O papel do vírus da leucemia felina permanece
indefinido. As lesões são placas ou nódulos, que podem ser únicos ou múltiplos,
alopécicos ou com pêlos, ulcerados ou revestidos por uma epiderme intacta. O
linfossarcoma cutâneo não epiteliotrófico felino é agressivo; mesmo quando se tenta
a excisão completa de um nódulo solitário, a recidiva é comum. Até o momento, não
se conhece nenhuma terapia; não se sabe se protocolos quimioterápicos utilizados
no tratamento de outras formas de linfossarcomas felinos são de valor para o
linfossarcoma cutâneo não epiteliotrófico.
Tumores da Pele e de Tecidos Moles 1046

Tumores de mastócitos cutâneos


Estes tumores (também chamados mastocitomas, sarcomas de mastócitos) são
as neoplasias malignas ou potencialmente malignas mais freqüentemente reconhe-
cidas em cães. Podem ocorrer também nas formas leucêmica e visceral. A
existência de uma etiologia viral tem sido especulada, mas há controvérsias. Eles
podem ocorrer em cães de qualquer idade (média entre 8 a 10 anos). Eles podem
ocorrer em qualquer lugar na superfície corporal, bem como nos órgãos internos,
mas os locais mais comuns são as regiões posterior e superior dos membros e
regiões perineal e prepucial. Aproximadamente 10% deles são multicêntricos. Eles
variam acentuadamente em tamanho e apenas a aparência clínica não é suficiente
para se estabelecer um diagnóstico. Normalmente eles aparecem como massas
nodulares, moles a sólidas, elevadas. Embora freqüentemente pareçam ser
encapsulados, eles não são; eles são um denso agregado de mastócitos, rodeados
perifericamente por um “halo” de mastócitos em menor número, que à palpação
parece uma pele normal. Cães podem desenvolver sinais clínicos associados com
a liberação de produtos vasoativos dos mastócitos malignos. O sinal mais comum
é a ulceração gastroduodenal que pode estar presente em até 25% dos casos. A
avaliação citológica de Wright, aspirados com agulha fina ou esfregaços de
impressão podem ser usados para estabelecer o diagnóstico dos tumores
de mastócitos caninos. Entretanto, a citologia não substitui a histopatologia, na
medida em que apenas esta última está correlacionada com o prognóstico. Existem
2 sistemas de gravação histopatológica e, para evitar confusão, é essencial saber
qual dos 2 sistemas está sendo usado.
Embora acredite-se que haja uma variante benigna do tumor de mastócitos
canino, não há meios clínicos ou microscópicos para identificá-la. Além disso,
tumores de mastócitos pequenos podem permanecer quiescentes por longos
períodos antes de se tornarem agressivos. Logo, todos devem ser tratados como
malignos. O tratamento depende do estágio clínico da doença.
O tratamento de escolha para tumores no Estágio I é a excisão completa com
uma margem liberal: um mínimo de 3cm de tecido sadio rodeando todas as bordas
palpáveis deve ser removido na tentativa de se retirar o nódulo e o “halo” de células
neoplásicas ao seu redor. Se a avaliação histológica sugerir que o tumor se estende
além das margens cirúrgicas, deve-se fazer uma nova cirurgia ou, alternativamente,
iniciar uma radioterapia.
Até o momento, não existe um consenso quanto ao tipo de terapia para os
mastocitomas nos Estágios II a IV. Para tumores no Estágio II, várias opções estão
disponíveis, incluindo a excisão (abrangendo o nódulo regional afetado, se possí-
vel), prednisolona e radioterapia usada isoladamente ou em combinação. O trata-
mento de tumores nos Estágios III e IV é geralmente paliativo. Uma terapia
recomendada é a prednisolona (2mg/kg de peso corporal, VO, nos primeiros 5 dias,
seguida por uma dose de manutenção de 0,5mg/kg, diariamente) ou injeções
intralesionais de triamcinolona (1mg/cm de diâmetro do tumor a cada 2 semanas).
Cimetidina (4mg/kg, VO, quatro vezes ao dia) deve ser administrada concomitante-
mente para inibir a formação de úlceras gastroduodenais. Além disso, a cimetidina
pode ter alguma atividade antitumoral.
Mastocitomas cutâneos felinos são comuns. Têm sido reconhecidos tumores
cutâneos, sistêmicos, leucêmicos e formas gastrointestinais. Duas variantes distin-
tas têm sido reconhecidas: 1. um tipo de mastócito análogo, mas não idêntico, aos
mastocitomas cutâneos nos cães; e 2. um tipo histiocítico único em gatos.
A primeira variante é mais comum. Ocorre principalmente em gatos > 4 anos de
idade e pode se desenvolver em qualquer parte do corpo, mas mais comumente na
cabeça e pescoço. Eles são nódulos únicos, alopécicos, geralmente com 2 a 3cm
Tumores da Pele e de Tecidos Moles 1047

de diâmetro, e ocasionalmente com extensão na gordura subcutânea. Nódulos


linfóides são comuns, e eosinófilos são raros. Como nos mastocitomas cutâneos
caninos, há uma correlação com atipia celular e comportamento clínico; entretanto,
nenhum sistema de graduação histopatológica tem sido estabelecido. A excisão
completa é o tratamento de escolha; menos de 20% dos tumores recidivam após a
cirurgia e desses poucos metastatizam.
O tipo histiocítico de mastocitoma cutâneo felino ocorre em gatos siameses e é
reconhecido primariamente < 4 anos de idade. As lesões podem se desenvolver em
qualquer lugar do corpo e aparecem como papulonódulos subcutâneos, firmes,
pequenos (geralmente com 0,5 a 1cm de diâmetro) e múltiplos. Em geral, quanto
mais velho o gato, menos numerosas as lesões. Esta variante pode ser difícil de ser
distinguida morfologicamente de uma resposta inflamatória granulomatosa. Como
os tumores tendem a se resolver espontaneamente, não é necessário tratamento.
Mastocitomas eqüinos são tumores benignos incomuns. Existem dúvidas se
eles são realmente um processo neoplásico ou uma resposta inflamatória incomum.
As lesões podem se desenvolver em qualquer lugar do corpo, mas são mais comuns
na cabeça e nos membros. Normalmente, há uma massa solitária na derme e/ou na
gordura subcutânea, que pode se expandir e envolver a musculatura subjacente.
Alopecia e ulceração são características variáveis. A excisão é o tratamento de
escolha. Estas lesões não metastatizam. Uma variante do mastocitoma eqüino
cutâneo ocorre em potros recém-nascidos, nos quais as lesões podem se tornar
generalizadas, mas regredir posteriormente, sugerindo uma semelhança com a
urticária pigmentosa no homem.
Mastocitomas em suínos e bovinos são raros. Em suínos, a maioria aparece
como nódulos cutâneos solitários e discretos. A maioria é benigna, mas podem existir
variantes leucêmicas e disseminadas. Em bovinos, a maioria é maligna e caracteriza-
se por múltiplos nódulos cutâneos, freqüentemente acompanhados por envolvimen-
to sistêmico; formas puramente cutâneas têm sido reconhecidas ocasionalmente.

Tumores com diferenciação histiocítica


Estes compreendem um grupo de doenças cutâneas pouco definidas, todas
caracterizadas por uma proliferação de histiócitos (macrófagos teciduais) na ausên-
cia de qualquer estímulo conhecido.
Histiocitomas cutâneos são comuns em cães e raros em gatos, caprinos e
bovinos. As lesões podem se desenvolver a partir de macrófagos cutâneos modifi-
cados conhecidos como células de Langerhan; entretanto, a célula exata de origem
é desconhecida. Há evidências de uma etiologia viral para o histiocitoma canino,
mas o agente causal não foi identificado. Em cães, eles ocorrem principalmente na
cabeça, pinas e membros, onde eles aparecem como nódulos solitários, elevados,
geralmente ulcerados e facilmente deslocados. Apesar de basicamente vistos em
cães < 2 anos de idade, eles ocorrem em qualquer idade. Bóxers, dachshunds,
cocker spaniels, great danes e shetland sheepdogs são as raças de maior risco.
Embora sejam uma neoplasia comum, os histiocitomas não são sempre fáceis de
se diagnosticar histologicamente, e podem ser confundidos com inflamação granu-
lomatosa, mastocitomas, plasmocitomas e linfossarcomas cutâneos. Os histiocitomas
caninos devem ser considerados benignos, e a maioria se resolve espontaneamen-
te sem tratamento dentro de 2 a 3 meses. Entretanto, a excisão completa, mas
conservativa, é o tratamento padrão; a criocirurgia ou eletrocirurgia podem ser
igualmente efetivas.
Tumores semelhantes têm sido relatados em gatos jovens. Ainda permanece
indefinido se eles realmente representam uma variante felina da doença canina, ou
se eles são uma variante da forma histiocítica do mastocitoma felino.
Tumores da Pele e de Tecidos Moles 1048

Em caprinos e bovinos, os histiocitomas são extremamente raros e comportam-


se similarmente aos tumores caninos.
Histiocitoses cutâneas são raras em cães, e estão associadas com o desen-
volvimento de numerosas placas e nódulos que envolvem a derme e/ou a gordura
subcutânea. Elas ocorrem em animais de qualquer idade, mas são mais comuns em
adultos jovens. Pastores alemães parecem ser mais predispostos. Os nódulos e
placas tendem a aumentar e diminuir, com múltiplas lesões freqüentemente ocor-
rendo ao mesmo tempo. A face, pescoço, dorso e tronco são envolvidos mais
comumente. A maioria das lesões não é pruriginosa, mas pode ulcerar. A histioci-
tose cutânea não compromete os órgãos internos, mas a sua natureza difusa e a
desagradável aparência das lesões, quase sempre forçam o proprietário a conside-
rar a eutanásia. Várias terapias têm sido tentadas, incluindo glicocorticóides
sistêmicos, e a combinação de glicocorticóides e quimioterapia. Em alguns casos,
parece que os glicocorticóides induzem a remissão.
Histiocitoses de cães bernese mountain são desordens familiares, sistêmicas
de etiologia desconhecida, com 2 manifestações: uma forma cutânea e geralmente
mais indolente, conhecida como histiocitose sistêmica; e uma forma mais agressiva,
na qual as lesões cutâneas são extremamente raras, conhecida como histiocitose
maligna. A histiocitose maligna tem sido infreqüentemente identificada em outras
raças caninas. Na histiocitose sistêmica, os machos (principalmente os com
aproximadamente 4 anos) são mais freqüentemente afetados que as fêmeas. Há
múltiplos nódulos cutâneos, pápulas e placas envolvendo a pele (especialmente do
escroto), a mucosa nasal e as pálpebras. As lesões são pouco circunscritas,
variavelmente alopécicas e podem se ulcerar. As lesões se desenvolvem em ondas
e lentamente regridem, recidivando apenas muitos meses depois. A doença clínica
tende a se tornar mais severa a cada nova onda de erupções. Embora a pele seja
o órgão-alvo primário, as lesões podem também se desenvolver em outros órgãos,
incluindo linfonodos, baço e medula óssea. A doença pode ser episódica em sua
apresentação clínica, mas é progressiva e eventualmente fatal.
A histiocitose maligna ocorre em machos bernese mountain (principalmente os
com aproximadamente 7 anos) e, com menos freqüência, em outras raças caninas.
Os pulmões, linfonodos e fígado são os órgãos mais comumente afetados e a
doença tende a poupar a pele. Macroscopicamente, as lesões são massas firmes,
solitárias, grandes, que podem ocupar grandes porções de órgãos internos afeta-
dos. É rapidamente progressiva e não aumenta e diminui como a histiocitose
sistêmica. Poucos cães sobrevivem > 6 meses.
Vários protocolos quimioterapêuticos têm sido usados para tratar ambas as
formas: fração 5 de timosina bovina tem sido benéfica na indução de remissões,
principalmente na forma sistêmica; entretanto, ambas as formas da doença são
essencialmente fatais.

Tumores venéreos transmissíveis


Ver TUMOR VENÉREO CANINO TRANSMISSÍVEL, página 828. Estes também podem se
desenvolver inicialmente na pele com pêlos, pela inoculação em lesões cutâneas.

NEOPLASIAS DE ORIGEM MELANOCÍTICA


Neoplasias melanocíticas são mais comuns em cães, eqüinos cinza e suínos
miniaturas, incomuns em caprinos e bovinos e raros em gatos e ovinos. Devido à
importância das lesões melanocíticas em dermatologia humana, 2 pontos precisam
ser destacados: 1. a terminologia usada para descrever lesões melanocíticas em
animais é acentuadamente diferente da usada em dermatologia humana. Em animais,
os termos “melanoma benigno” e “melanoma maligno” são utilizados para distinguir
Tumores da Pele e de Tecidos Moles 1049

neoplasias inócuas e agressivas, respectivamente. No homem, o termo “nevo” é


aplicado a todas as lesões melanocíticas benignas e o termo “melanoma” refere-se
a todas as neoplasias melanocíticas malignas; 2. embora a lesão solar seja uma
causa comum dos tumores melanocíticos no homem, não há evidências que
sugiram que lesões actínicas possam estimular o desenvolvimento dessas lesões
nos animais domésticos.
Em cães, melanomas benignos da pele (consideravelmente mais comuns
que melanomas malignos) mais comumente se desenvolvem na cabeça e
membros anteriores de cães de meia-idade ou mais velhos; scottish terriers,
schnauzers, dobermans pinschers e setters irlandeses são as raças de maior
risco. Eles podem aparecer como máculas ou manchas, pápulas ou placas, ou
como massas elevadas, ocasionalmente pedunculadas. A maioria possui uma
superfície pigmentada. Embora sejam geralmente solitárias, lesões múltiplas
podem estar presentes nas raças de risco. Estes tumores são benignos e a
excisão completa é curativa.
Melanomas malignos caninos mais comumente se desenvolvem nas junções
mucocutâneas dos lábios, na cavidade oral (ver também pág. 156) e nos leitos
ungueais. Melanomas malignos da pele pelosa são raros, e a maioria se desenvolve
nas regiões abdominal, ventral e escrotal. Scottish terriers e golden retrievers são
as raças de maior risco para os melanomas malignos que não se desenvolvem na
cavidade oral. Machos são mais comumente afetados que fêmeas. A maioria dos
melanomas malignos aparece como nódulos elevados, geralmente ulcerados, que
são variavelmente pigmentados. Quando presentes nas regiões mucocutâneas dos
lábios, alguns tumores podem ser pedunculados, com uma superfície papilada;
quando presentes no leito ungueal, eles aparecem como inchaços do dígito,
freqüentemente com perda da unha e destruição do tecido ósseo subjacente.
Melanomas malignos caninos são agressivos e possuem um considerável potencial
metastático. O tratamento geralmente consiste na excisão completa; entretanto, a
natureza infiltrativa do tumor pode tornar isso difícil. Melanomas em geral são
considerados resistentes à radioterapia, e não está estabelecido um protocolo
quimioterápico.
Neoplasias melanocíticas cutâneas felinas são mais comumente identifica-
das na cabeça e extremidades distais, geralmente em gatos de meia-idade ou mais
velhos. A maioria é benigna. A excisão é o tratamento de escolha.
A maioria das lesões melanocíticas em eqüinos ocorre em animais pretos, que
se tornam cinza (ou brancos) com a idade. Elas são mais comuns em lippizaners,
árabes e percherons. Geralmente são diagnosticadas em animais idosos, mas
normalmente iniciam o seu desenvolvimento quando os animais têm 3 a 4 anos de
idade. Desenvolvem-se mais comumente no períneo e na base da cauda, mas
podem ocorrer em qualquer local, inclusive na área da parótida. Os tumores
freqüentemente são múltiplos e podem aparecer como nódulos coalescentes
freqüentemente pedunculados, podendo se estender num avanço linear na base da
cauda. Eles normalmente possuem a superfície de corte preta.
Melanomas de eqüinos cinza aumentam em tamanho e em número com o
decorrer do tempo e a maioria é lentamente infiltrativa. Alguns são mais agressivos,
com ampla disseminação cutânea. Muitos eqüinos cinza possuem evidências de
envolvimento dos linfonodos; entretanto, não se sabe se isto representa metástase
ou se os melanócitos intranodulares e melanófagos representam um estímulo dos
melanócitos extracutâneos, que estão normalmente presentes no linfonodo. O
tratamento consiste na remoção cirúrgica ou criocirurgia; entretanto, animais que
desenvolvem um tumor estão predispostos a desenvolver outros posteriormente.
Melanomas em eqüinos de outra cor são raros, inicialmente solitários e
acometem eqüinos idosos. Em geral, eles são altamente infiltrativos e possuem
Tumores da Pele e de Tecidos Moles 1050

verdadeiro potencial metastático. A excisão ou criocirurgia é o tratamento de


escolha. O prognóstico a longo prazo é reservado.
Melanomas em suínos são raros, exceto as lesões congênitas em suínos
sinclair (hormel), miniaturas e duroc. A seleção genética nessas raças tem aumen-
tado a prevalência dos tumores. Estes tumores se desenvolvem antes e após o
nascimento e ocorrem em qualquer lugar do corpo. Geralmente são múltiplos e
podem aparecer como máculas ou manchas pigmentadas com as bordas lisas;
como lesões freqüentemente ulceradas, pigmentadas e elevadas; ou como massas
azuladas, mais profundas e levemente elevadas. Melanomas profundamente inva-
sivos estão freqüentemente associados com metástase. Os linfonodos e os pul-
mões são os sítios mais comuns de metástases. Nem todos se tornam invasivos;
muitos sofrem regressão espontânea associada com um intenso infiltrado linfocítico.
Lesões melanocíticas em suínos não são tratadas; devido à natureza hereditária da
doença, a prevenção pela seleção genética é recomendada se for freqüentemente
reconhecida no rebanho.
Melanomas em bovinos desenvolvem-se infreqüentemente em qualquer local
do corpo. Eles podem ocorrer em qualquer idade, mas são mais comumente
reconhecidos em animais jovens; formas congênitas têm sido reconhecidas. Bovi-
nos angus parecem ser predispostos. Comumente, eles são massas nodulares
grandes, com a superfície de corte densamente pigmentada. A excisão é curativa
na maioria dos casos; entretanto, variantes malignas raras têm sido reconhecidas
com metástases distantes.
Melanomas em ovinos ocorrem mais freqüentemente em animais de meia-
idade ou idosos, mas têm sido reconhecidos em neonatos. Eles são mais comuns
em suffolks e angorás. A maioria ocorre como massas dérmicas e/ou subcutâneas,
múltiplas e densamente pigmentadas. Eles devem ser considerados malignos;
metástases são comuns.
Tumores melanocíticos em caprinos são raros. Eles são mais comuns em
animais de meia-idade ou idosos, e possivelmente em angorás. Pode haver uma
predileção pela banda coronária e úbere. As lesões são massas múltiplas ou
solitárias com pigmentação variável na superfície de corte. A maioria tende a crescer
rapidamente e metástases são comuns.

TUMORES METASTÁTICOS CUTÂNEOS


A disseminação de uma neoplasia primária para a pele é incomum nos animais
domésticos. É ocasionalmente identificada em cães, menos comumente em gatos
e raramente em eqüinos, bovinos, ovinos, caprinos e suínos. Embora todas as
neoplasias malignas sejam capazes de um envolvimento cutâneo secundário, os
adenocarcinomas de glândulas mamárias, carcinomas de células escamosas,
carcinomas de células transicionais, tumores venéreos transmissíveis e heman-
giossarcomas são os que possuem maior potencial metastático. Embora a aparên-
cia seja variável, as lesões geralmente são papulonodulares, ulceradas e múltiplas.
Inicialmente, as metástases cutâneas caracterizam-se por agregados de células
neoplásicas dentro de vasos dérmicos superficiais e profundos. Estas lesões
evoluem e estendem-se na derme, eliminando as estruturas anexas. Geralmente,
é difícil distinguir a neoplasia primária de uma metástase com base nas caracterís-
ticas morfológicas. Isto ocorre devido ao fato de que apenas uma pequena
população de células do tumor primário possui um potencial para desenvolver
metástases, e estas células podem ter características microscópicas diferentes.
Metástases cutâneas possuem um prognóstico reservado.
Urticária 1051

DERMATOSE ULCERATIVA DOS OVINOS


(Úlcera dos lábios e membros, Balanopostite venérea e vulvite)

É uma doença infecciosa, viral, ulcerativa dos ovinos, que se manifesta de 2


formas um tanto distintas, uma caracterizada pela formação de úlceras ao redor da
boca e nariz ou nos membros (ulceração dos lábios e membros), e a outra pela
presença de ulcerações de transmissão venérea do prepúcio e pênis ou vulva.
Achados clínicos – A lesão, independentemente da localização, é uma úlcera em
carne viva, com uma ferida que sangra facilmente e varia em profundidade e extensão,
contendo uma secreção purulenta inodora e coberta desde o início com uma crosta.
As lesões na face ocorrem no lábio superior, entre a borda do lábio e o orifício
nasal, no queixo e na mufla. O processo ulcerativo pode, em casos mais graves,
perfurar o lábio. As lesões nas patas ocorrem em qualquer lugar entre a zona
coronária e o carpo ou tarso.
As lesões venéreas circundam parcial ou totalmente o orifício prepucial e podem
se tornar tão severas a ponto de promover fimose. Em casos raros, o processo
ulcerativo pode estender-se até a glande do pênis, tornando o animal incapaz de
exercer a cobertura natural. Nas fêmeas, edema, ulceração e escoriações dos lábios
vulvares promovem conseqüências menos sérias.
Não há reações sistêmicas notáveis precocemente. Com freqüência, a doença
permanece não diagnosticável até que as lesões tenham alcançado um estágio tão
avançado que os sinais de claudicação ou distúrbios urinários tornem-se aparentes.
Diagnóstico – Depende inteiramente do reconhecimento das lesões ulcerativas
características. A diferenciação entre esta lesão e aquelas do éctima (ver pág. 949),
que são essencialmente de caráter proliferativo, é essencial. A questão da seme-
lhança dos agentes da dermatose ulcerativa e do éctima contagioso não está
definida claramente, mas a inoculação de ovinos previamente imunizados contra
éctima auxiliará na definição de um diagnóstico. Também é difícil, e algumas vezes
impossível, diferenciar postite e vulvite ulcerativas (ver pág. 847) e dermatose
ulcerativa, sem recorrer à inoculação de ovinos.
Profilaxia e tratamento – Os animais infectados devem ser isolados e aqueles
com lesões genitais devem ser afastados da reprodução. O tempo de recuperação
varia de 2 a 8 semanas e não é muito influenciado pelo tratamento. Assim, o
tratamento em geral, não é empregado, a menos que os animais estejam prontos
para reprodução; as lesões labiais interferem na alimentação, as lesões podais
levam os animais à claudicação e eles perdem peso, ou as infecções bacterianas
secundárias se agravam.
O tratamento consiste na remoção das crostas e de todo tecido necrótico das
úlceras e aplicação de um dos seguintes preparados: nitrato de prata (bastão
adstringente), tintura forte de iodo, solução de sulfato de cobre a 30%, solução de
formaldeído a 4%, cresol a 5% (banho de imersão dos ovinos), ou pó de sulfauréia.
As lesões podais e mais baixas nos membros podem ser tratadas com pedilúvios
com sulfato de cobre ou soluções de formaldeído.

URTICÁRIA
(Erupções cutâneas por urtigas)

É uma dermatopatia caracterizada por múltiplas erupções em placas, que são


formadas pelo edema localizado na derme e freqüentemente surgem e desapare-
cem repentinamente.
Urticária 1052

A doença ocorre em todos os animais domésticos, mas com maior freqüência nos
eqüinos (ver também “SARNA DOCE”, pág. 974). A urticária alérgica pode ser exógena
ou endógena. A urticária exógena pode ser produzida por produtos tóxicos irritantes
do pêlo de urtiga, da picada de insetos, ou medicações e pode ocorrer com maior
freqüência no verão. Alguns produtos químicos, como o ácido carbólico, terebentina,
dissulfato de carbono, ou óleo bruto, também podem causar a patologia. Fatores não
imunológicos, como pressão, luz solar, calor, exercício, estresse físico, e anorma-
lidades genéticas podem precipitar ou intensificar a urticária.
Os animais sensíveis, particularmente os cães de pêlo curto e os cavalos de raça
pura, também podem exibir um fenômeno denominado dermografismo, no qual a
fricção ou chicotada (o atrito) produz lesões urticariformes na pele. Não tem
significância clínica.
A urticária endógena ou “sintomática” pode-se desenvolver após a inalação ou
absorção de alérgenos e tem sido mais observada em eqüinos e cães (ver DERMATITE
ATÓPICA, pág. 516). Nos eqüinos, tem sido observada no curso das alterações
gastrointestinais, particularmente na constipação severa ou na inflamação da mucosa
intestinal. Uma única forma de urticária tem sido descrita, principalmente em bovinos
jersey e guernsey, que se tornam sensibilizados pela caseína do seu leite (ver também
pág. 514). Ocorre em casos de retenção ou ingurgitamento do leite no úbere. A
urticária tem sido observada em cadelas durante o estro. Em eqüinos jovens, cães e
suínos, a urticária tem sido associada com parasitas intestinais. O edema
angioneurótico é uma variante da urticária com risco de vida, no qual há edema
subcutâneo difuso, freqüentemente localizado na cabeça, membros ou períneo.
Achados clínicos – O vinco na pele ou as placas aparecem em alguns minutos
ou horas após exposição ao agente causativo. Nos casos graves, as erupções
cutâneas são precedidas de febre, perda de apetite ou apatia. Os cavalos tornam-
se excitados e inquietos. As lesões na pele são circulares, achatadas e elevadas,
com 1 a 20cm de diâmetro, e podem ser suavemente deprimidas no centro. Elas
podem se desenvolver em qualquer parte do corpo, mas ocorrem principalmente no
dorso, flanco, pescoço, pálpebras e membros posteriores. Em casos avançados,
podem ser encontradas nas membranas mucosas da boca, nariz, conjuntiva, reto
e vagina. Comumente, as lesões desaparecem tão rapidamente quanto surgem,
geralmente em algumas horas.
Nos ovinos, as lesões geralmente são observadas somente no úbere e nas áreas
do abdome onde não há pêlos. Em suínos, as erupções têm sido observadas ao redor
dos olhos, no focinho, abdome e entre os membros posteriores, tanto quanto no dorso.
Em geral, o prognóstico da urticária nos animais é favorável. Um resultado fatal
é raro, e ocorre devido a uma reação anafilática ou associado a um angioedema
envolvendo as vias respiratórias.
A urticária crônica é um desafio diagnóstico. Todos os alérgenos em um meio
devem ser considerados causas potenciais, e deve-se instituir, se possível, a
eliminação da exposição dos animais a estes agentes.
Tratamento – A urticária aguda em geral desaparece espontaneamente. Os
adrenocorticosteróides de ação rápida, como succinato sódico de hidrocortisona,
succinato sódico de prednisolona ou o hemissuccinato são úteis. Dexametasona
(0,1mg/kg) tem sido útil em cães, gatos e eqüinos. Anti-histaminas são de valor
questionável, e podem induzir urticária se administradas endovenosamente. Adre-
nalina pode ser dada em situações em que o animal corra perigo de vida. As lesões
desaparecem de imediato, mas retornarão rapidamente se o alérgeno não for
eliminado. Normalmente, não é necessário o tratamento local das lesões. Em casos
especialmente severos, podem-se aplicar compressas frias de água, vinagre ou
álcool (70%).
SISTEMA URINÁRIO
SISTEMA URINÁRIO, Introdução ................................................................ 1053
Princípios da Terapia ............................................................................... 1054
ANOMALIAS CONGÊNITAS E HEREDITÁRIAS
DO SISTEMA URINÁRIO ........................................................................ 1056
DOENÇAS INFECCIOSAS DO SISTEMA URINÁRIO, PQ AN .................... 1057
Cistite ..................................................................................................... 1057
Pielonefrite ............................................................................................... 1058
Nefrite Intersticial ..................................................................................... 1059
Infecção por Capillaria plica ..................................................................... 1059
Infecção por Verme Renal Gigante no Visom e no Cão .......................... 1059
DOENÇAS INFECCIOSAS DO SISTEMA URINÁRIO, GR AN .................... 1060
Cistite e Pielonefrite Bovinas ................................................................... 1060
Cistite Suína ............................................................................................. 1061
Estefanurose ............................................................................................ 1062
DOENÇAS NÃO INFECCIOSAS DO SISTEMA URINÁRIO, PQ AN ........... 1063
Insuficiência Renal ................................................................................... 1063
Insuficiência Renal Crônica ............................................................... 1063
Insuficiência Renal Aguda ................................................................. 1064
Uropatia Obstrutiva .................................................................................. 1065
Glomerulopatia ......................................................................................... 1066
Defeitos Tubulares Renais ....................................................................... 1067
Doenças Neoplásicas .............................................................................. 1068
Tumores Renais ................................................................................. 1068
Tumores do Trato Urinário Inferior ..................................................... 1069
Distúrbios da Micção ................................................................................ 1070
Urolitíase .................................................................................................. 1072
Urolitíase Canina ............................................................................... 1074
Urolitíase e Síndrome Urológica Felinas ........................................... 1077
DOENÇAS NÃO INFECCIOSAS DO SISTEMA URINÁRIO, GR AN ........... 1079
Urolitíase .................................................................................................. 1079
Urolitíase em Ruminantes .................................................................. 1079
Urolitíase em Eqüinos ........................................................................ 1082
Uroperitônio em Potros ............................................................................ 1083

SISTEMA URINÁRIO, INTRODUÇÃO


O sistema urinário realiza funções metabólicas, humorais e excretoras. A maioria
das anormalidades do sistema urinário pode ser diagnosticada pelo exame físico,
urinálise e pela interpretação bioquímica sérica. O diagnóstico de algumas con-
dições pode requerer testes específicos e adicionais e conhecimento da fisiopato-
logia renal.
O exame físico e a história do animal freqüentemente fornecem a maioria dos
indícios necessários para diagnosticar uma desordem do trato urinário. A história
deve incluir a freqüência de micção, o volume de urina produzido e a sua aparência
Sistema Urinário, Introdução 1054

e odor. A polaciúria deve ser diferenciada da poliúria; a presença de polidpsia


sugere poliúria.
O exame físico deve incluir a palpação da bexiga, o exame da genitália externa
e um exame retal para avaliação da uretra distal em ambos os sexos e da próstata
em cães machos. Um exame neurológico completo deve ser feito em animais com
incontinência urinária.
Urinálise – Este é o teste diagnóstico mais importante na avaliação da doença
do trato urinário. Embora as amostras de urina sejam mais comumente usadas para
a urinálise de rotina, a urina coletada por cistocentese ou cateterização fornece
resultados mais acurados nas culturas quantitativas. Os dois últimos métodos
minimizam a contaminação uretral e genital da amostra urinária.
Uma urinálise deve incluir avaliação da cor, turbidez, densidade específica e pH.
A presença de proteína, sangue oculto, glicose, cetonas, bilirrubina e urobilinogênio
pode ser determinada pelo método “dipstick”. Este método não diferencia hemoglo-
binúria, mioglobinúria ou hematúria; entretanto, o exame do sedimento urinário pode
confirmar a hematúria. A presença de proteína na urina deve ser avaliada com
relação à gravidade específica da urina; uma urina muito concentrada pode ter uma
concentração proteica aumentada sem um significado patológico.
O exame do sedimento urinário permite a detecção de eritrócitos, leucócitos,
células epiteliais, cilindros renais, cristais, ovos de parasitas e bactérias. Células
neoplásicas descamadas podem ser observadas no sedimento urinário dos animais
portadores de neoplasias renais ou do trato urinário inferior. Um sedimento ativo
com piúria, hematúria e/ou cristalúria é altamente sugestivo de infecção bacteriana
do trato urinário.
Culturas urinárias quantitativas são úteis para confirmar infecções bacterianas do
trato urinário e determinar a antibioticoterapia apropriada. Amostras urinárias com
concentrações bacterianas superiores a 100.000 colônias por unidade (CFU)/mL, são
indicativas de infecções bacterianas; as superiores a 10.000CFU/mL em uma amos-
tra urinária obtida por cateterização ou superiores a 1.000CFU/mL em uma
amostra obtida por cistocentese são evidências de infecção bacteriana.
A retenção de urina por um período específico fornece informação acerca
da excreção fracionada de eletrólitos, da taxa de filtração glomerular (TFG) e da
excreção de proteína. A excreção de proteína também pode ser avaliada pela
relação da proteína urinária e da creatinina em uma amostra urinária colhida ao
acaso. O método se correlaciona bem com resultados obtidos pelo uso de amostras
de urina de 24h durante o tempo em que o sedimento urinário está inativo. A relação
proteína:creatinina é normalmente < 2 em cães. Uma relação > 2 é indicativa de uma
nefropatia que leva a perda de proteína e valores >10 estão freqüentemente
associados com amiloidose renal.
Outros métodos diagnósticos – A avaliação sérica incluindo a determinação
de uréia, creatinina, cálcio e fósforo e dos eletrólitos séricos é necessária para
confirmar a disfunção renal. Radiografias abdominais, estudos contrastados do trato
urinário superior e inferior, ultra-som dos rins e da bexiga, exame cistoscópico da
bexiga ou biópsia renal podem ser necessários para identificar uma desordem
particular do trato urinário. Biópsias renais podem ser obtidas via laparotomia,
laparoscopia ou por métodos percutâneos. Embora o rim possua uma capacidade
limitada para responder a doenças, a histopatologia renal fornece informações
diagnósticas e prognósticas.

PRINCÍPIOS DA TERAPIA
Ver também página 1706.
As doenças do sistema urinário podem ocorrer secundariamente a uma varie-
dade de processos patológicos que podem ocorrer em qualquer lugar do sistema.
Sistema Urinário, Introdução 1055

A terapia apropriada depende da localização, da severidade e da etiologia do


problema. A terapia deve ser instituída somente depois que uma anamnese
acurada, um exame físico completo e um mínimo de dados básicos laboratoriais
(contagem sangüínea completa, análise bioquímica sérica, urinálise e cultura de
urina) sejam avaliados. O aspecto mais desejável da terapia é a remoção do agente
causal específico. Freqüentemente, isso não é possível, e uma terapia inespecífica
ou de suporte deve ser instituída.
A obstrução urinária aguda é comumente uma emergência. O esvaziamento da
bexiga é normalmente realizado pela manipulação mecânica ou pela remoção
cirúrgica da causa. A terapia médica é comumente necessária para diminuir a
azotemia por meio da reposição dos déficits de fluidos e da correção da acidose e
da hipercalemia. Uma melhora clínica é observada em 24 a 48h, desde que a
obstrução urinária não tenha resultado em lesão permanente do parênquima renal.
O tratamento da obstrução crônica é mais complicado, já que requer uma pesquisa
minuciosa do local e da causa da obstrução; a cirurgia é comumente necessária para
eliminar a causa.
O tratamento da insuficiência renal aguda requer de vários dias a 2 semanas de
controle médico antes que se possa determinar se a regeneração renal será
adequada para manter o animal. O tratamento comumente inclui a administração
parenteral de fluidos para controlar o balanço dos mesmos e corrigir a acidose, a
hipercalcemia, a hiperfosfatemia e possivelmente a hipertensão. No caso de anúria,
o uso de vasodilatadores como a dopamina ou diuréticos osmóticos pode ser útil. Se
estas medidas conservativas forem inadequadas, pode-se instituir a diálise perito-
neal ou a hemodiálise para manter a homeostasia por 1 a 2 semanas enquanto os
rins estiverem se regenerando.
A terapia da insuficiência renal crônica é complexa e se altera continuamente
com a progressão da doença. Um auxílio nutricional especial a longo prazo pode ser
necessário para controlar a hiperfosfatemia, o limite proteico, manter o equilíbrio de
cálcio e a ingestão de vitaminas, e suprir a necessidade calórica de um animal com
anorexia e êmese intermitente. Outras considerações incluem controle da hiperten-
são, tratamento da acidose e o uso de esteróides anabólicos ou de eritropoietina
para promover a hematopoiese.
A glomerulopatia (ver pág. 1066) é um dilema terapêutico, particularmente se o
animal também tem insuficiência renal. Se não houver insuficiência renal, o
tratamento pode se concentrar na remoção do processo imunológico ou da imu-
nossupressão para reduzir a perda de proteína pela urina. Um tratamento efetivo é
raro nos animais portadores de glomerulonefrite. Muitos animais com glomerulone-
frite mantêm um equilíbrio proteico, o que reduz a necessidade do tratamento.
Transfusões de plasma podem ser feitas em animais com hipoalbuminemia severa
para prevenir as complicações da hipoproteinemia, mas o valor dos suplementos
proteicos não foram documentados. Em animais com nefropatia que acarrete a
perda de proteínas, a necessidade de restrição proteica representa um paradoxo
que torna o tratamento difícil e conflitante. Quando a causa da perda proteica é uma
amiloidose, a progressão é rápida e o tratamento normalmente não tem sucesso.
Infecções simples do trato urinário são tratadas inicialmente com um antibiótico
de amplo espectro. Se a infecção persistir, a escolha do antibiótico deve ser baseada
no resultado da cultura e no teste de sensibilidade. A duração do tratamento pode
variar de 3 semanas a vários meses, dependendo da resistência do organismo e do
local da infecção. A maioria das infecções do trato urinário pode ser efetivamente
resolvida dentro de 3 semanas. Infecções crônicas recorrentes normalmente estão
associadas com pielonefrites, prostatites, urolitíases ou atonia de bexiga.
A terapia médica para a urolitíase consiste de uma substância que dissolva o
cálculo ou previna a sua recidiva ou ambos. Esta é acompanhada pela produção de
Sistema Urinário, Introdução 1056

uma urina pouco saturada, dependendo do tipo de urólito, pelo uso de dieta ou
de medicação específica. Uma dieta pobre em minerais tem sido efetiva no
controle de cálculos de estruvita. Outros tipos de urólitos, os chamados cálculos
metabólicos, incluindo cistina, urato e oxalato de cálcio, requerem tratamento
médico específico.
Defeitos tubulares renais podem ser tratados especificamente, dependendo da
perda ou da retenção de um determinado soluto, por exemplo, o defeito no ácido
úrico resultando em cálculos de urato responde ao tratamento com alopurinol.
Algumas formas de defeitos tubulares, por exemplo, glicosúria renal, podem não
requerer tratamento. A acidose tubular renal pode requerer uma terapia com
bicarbonato, dependendo da forma de acidose.

ANOMALIAS CONGÊNITAS E HEREDITÁRIAS


DO SISTEMA URINÁRIO
As anomalias do sistema urinário são raras. As alterações nos rins incluem cis-
tos, rim em ferradura, rim em anel, hipoplasia e aplasia. Em cães e gatos, estas
anomalias podem resultar em azotemia progressiva ou podem ser assintomáticas.
O diagnóstico normalmente é feito por radiografia contrastada, ultra-sonografia ou
por laparotomia exploradora.
Displasia e hipoplasia renais – Estes defeitos são mais comuns em cães
(elkhound norueguês, lhasa apso, shih isu, samoieda, cocker spaniel, doberman
pinscher e poodle standard). A displasia pode ser uni ou bilateral e os rins
normalmente são pequenos, firmes e pálidos; alguns rins têm o córtex renal
uniformemente diminuído. Ao exame histológico, os rins apresentam túbulos e
estruturas glomerulares bizarros e primitivos, além de tecido fibroso em excesso.
Os animais afetados apresentam, freqüentemente, polidipsia e poliúria, os quais
precedem sinais de uremia. A hipoplasia ocorrerá se o início da insuficiência renal
ocorrer dentro dos primeiros meses de vida. As alterações na urinálise, no hemo-
grama e na bioquímica sangüínea são as mesmas encontradas em nefropatias
progressivas crônicas. A uremia está freqüentemente presente dos 6 meses aos 2
anos de idade. O diagnóstico, de início, pode ser suspeitado com base na raça e na
idade. Uma biópsia renal pode ser útil na confirmação do diagnóstico. O tratamento
é o mesmo de qualquer outra insuficiência renal crônica.
Ureter ectópico – Este defeito tem sido mais comumente reportado em cães
(freqüentemente fêmeas) e é em geral observado dos 3 aos 6 meses de idade. A
incontinência urinária é um sinal clássico, embora o esvaziamento normal possa
ocorrer em cães com ureter ectópico unilateral. Um baixo grau de vaginite ou de
vulvite pode estar presente devido ao processo irritativo produzido pela presença da
urina. O ureter(es) envolvido(s) pode(m) abrir-se no interior da uretra, próstata ou
vagina. O diagnóstico pode ser confirmado por uma pielografia EV, que trace o curso
do ureter. O tratamento mais efetivo consiste no transplante dos ureteres afetados
no interior da bexiga. Os animais com ureteres ectópicos que terminam na uretra
sempre mantêm um grau reduzido de incontinência após a cirurgia, embora a uso
de agentes adrenérgicos como a fenilpropanolamina possa minimizar a inconti-
nência.
Agenesia renal unilateral – Esta é relativamente comum em gatos e muito rara
em cães. Um rim e seu respectivo ureter estão freqüentemente ausentes. Em geral,
é um achado causal em gatos e a função renal é normal.
Doenças Infecciosas do Sistema Urinário, Pq An 1057

Rins policísticos ou cistos únicos – Também conhecidos como rins císticos


congênitos, o termo rim policístico aplica-se quando o parênquima renal está em
grande parte tomado por formações císticas múltiplas. Isso é relativamente raro
tanto em cães quanto em gatos. Em geral, tais rins encontram-se grosseiramente
aumentados à palpação. Os rins policísticos podem não causar sinais clínicos ou
podem levar à insuficiência renal progressiva. Habitualmente o diagnóstico é feito
com base em achados físicos e radiográficos, exame ultra-sônico ou pela laparo-
tomia exploradora. A pielonefrite é um achado freqüente em tais rins e pode
precipitar a insuficiência renal.
Anomalias mistas – Artérias renais duplas ou múltiplas são encontradas em
aproximadamente 5% dos cães. Outros defeitos congênitos, incluindo fusão renal,
persistência do úraco, bexiga dupla, hidronefrose e hidroureter são relativamente
raros, tanto no cão quanto no gato. Nefroblastoma, um tumor embrionário, é raro nos
animais domésticos, exceto nos suínos; ele pode não causar problemas, mas pode
ser muito grande e causar distensão abdominal. Embora incomum, a uretra peniana
pode-se abrir na superfície ventral do pênis (hipospadias) ou na superfície dorsal
(epispadias).

DOENÇAS INFECCIOSAS DO SISTEMA


URINÁRIO, PQ AN
Infecções bacterianas do trato urinário são comuns em cães e incomuns em
gatos. A cistite é mais comum em fêmeas que em machos. Escherichia coli,
Staphylococcus aureus, Proteus, Klebsiella spp e estreptococos entéricos são os
patógenos mais comumente isolados. Na cistite e na pielonefrite, as infecções são
geralmente ascendentes. Fatores predisponentes incluem estase urinária, distúr-
bios da micção, defeitos congênitos ou adquiridos da parede da bexiga, urolitíases,
cateterização e imunossupressão. A diferenciação de infecção do trato superior
versus do trato inferior é importante com relação ao prognóstico e ao tratamento.
Embora infecções fúngicas do trato urinário sejam raras, a candidíase pode ocorrer
em animais imunossuprimidos ou que tenham recebido uma terapia antibiótica
prolongada. Infecções micóticas sistêmicas, por exemplo, blastomicoses, podem
envolver o trato urinário.

CISTITE
Os sinais são polaciúria, hematúria e disúria, alguns animais podem interromper
o treinamento caseiro. A hematúria pode ser mais evidente no final da micção. A
parede da bexiga pode estar espessada ou dolorida. As infecções podem ser
assintomáticas e detectadas acidentalmente durante uma urinálise de rotina.
Diagnóstico – A anamnese e os achados físicos podem ser sugestivos, mas não
são suficientes para se estabelecer um diagnóstico. Devem-se realizar a urinálise
e a cultura da urina obtida por meio de uma técnica de coleta estéril. Prefere-se a
cistocentese à cateterização, devido à obtenção de uma amostra estéril. A urinálise
em uma infecção típica do trato urinário revela uma quantidade elevada de
hemoglobina e de proteína e números aumentados de hemácias, leucócitos e
bactérias; o pH pode estar alcalino, principalmente se a infecção for causada por
bactérias urease-positivas como Staphylococcus ou Proteus spp. As infecções
fúngicas são geralmente diagnosticadas pela observação de elementos fúngicos no
sedimento urinário; a confirmação é feita pela cultura fúngica.
Doenças Infecciosas do Sistema Urinário, Pq An 1058

Fatores predisponentes devem ser considerados na cistite bacteriana crônica ou


recidivante. A persistência dos sinais clínicos, apesar da terapia antimicrobiana,
sugere uma doença adicional no trato urinário inferior, por exemplo, urolitíase ou
neoplasia. A cistouretrografia contrastada ou ultra-sonografia são usadas para
diagnosticar cálculos, neoplasias e defeitos anatômicos. Pielonefrites (ver adiante)
devem ser excluídas. Prostatites crônicas (ver pág. 845) em cães podem ser
diagnosticadas por citologia e cultura do fluido prostático obtida por ejaculação ou
por massagem prostática. Um hemograma completo e o perfil bioquímico devem ser
feitos para detectar a possibilidade de doenças sistêmicas, por exemplo, diabetes
melito ou hiperadrenocorticismo.
Tratamento – O primeiro episódio de cistite deve ser tratado durante 2 a 3
semanas com um antibiótico, preferivelmente com base na cultura e no antibio-
grama; sem a realização da cultura, devem-se utilizar antibióticos de amplo espectro
que atinjam altas concentrações na urina. Ampicilina ou uma combinação de
sulfonamida-trimetropim podem ser administradas desde que a maioria dos patóge-
nos urinários sejam sensíveis a estes agentes. O medicamento deve ser adminis-
trado após a micção para prolongar o tempo em que a urina medicada permanece
na bexiga. Para aumentar a taxa de absorção, o animal não deve ser alimentado por
um período > 30min após a administração da droga. Uma urinálise deve ser
realizada 3 a 5 dias após o término da terapia; deve-se fazer a cultura da urina, se
um sedimento urinário ativo for observado. Não é indicado um tratamento posterior
se o sedimento for inativo; se a cultura urinária for positiva, um segundo curso de
antibióticos deve ser administrado por no mínimo 3 semanas.
Se a cultura urinária subseqüente permanecer positiva, o animal deve ser
avaliado radiográfica e ultra-sonograficamente para a detecção dos fatores pre-
disponentes. Se nenhum fator for encontrado, a terapia antibiótica deve ser
reinstituída por 4 a 6 semanas. Uma nova cultura deve ser realizada após o término
da antibioticoterapia. Se a cultura permanecer positiva, a supressão da antibioti-
coterapia pode ser indicada: um antibiótico de amplo espectro pode ser adminis-
trado ao entardecer, na dose de um quarto a um terço da dose diária normal durante
4 a 6 meses, após o que se repete a urocultura. Pode-se requerer uma terapia a
longo prazo. Uma terapia de suporte para ajudar no mecanismo de eliminação da
bactéria da bexiga pode ser útil. Deve-se permitir que o animal urine freqüente-
mente, e devem-se manter as caixas higiênicas limpas e disponíveis para os
gatos.

PIELONEFRITE
Uma pielonefrite aguda pode causar sinais sistêmicos como febre, anorexia,
depressão, vômito e dor à palpação renal. Uma pielonefrite crônica pode ser
subclínica, causar febre intermitente, anorexia e depressão, ou resultar em uremia
se houver grande destruição de tecido renal. A diminuição da capacidade para
concentrar urina pode levar a polidipsia e poliúria. Uma cistite concomitante pode
causar sinais de doença do trato urinário inferior.
Diagnóstico – A história e os sinais físicos podem ser sugestivos de uma
pielonefrite aguda, mas normalmente não são úteis em infecções crônicas. Concen-
trações elevadas de uréia e creatinina podem estar presentes, assim como outras
anormalidades laboratoriais associadas com insuficiência renal. A urinálise, na
maioria dos casos, é condizente com uma infecção bacteriana (ver CISTITE, anterior-
mente) e produz uma cultura bacteriana positiva. Bactérias ou leucócitos na urina
são fortemente sugestivos de pielonefrite. A urinálise é normal e a cultura urinária
é negativa nos poucos animais nos quais a infecção é localizada no parênquima
renal.
Doenças Infecciosas do Sistema Urinário, Pq An 1059

A confirmação da pielonefrite pode ser difícil. Radiografias e ultra-sonografias


podem demonstrar rins aumentados na pielonefrite aguda, e pequenos e irregulares
na pielonefrite crônica. A avaliação de uma urografia EV pode revelar evidências de
pielonefrite (cálices cegos e dilatados) ou ureterite (ureteres tortuosos, dilatados).
Biópsia renal e cultura ocasionalmente são necessárias para definitivamente
diagnosticar uma pielonefrite e identificar o patógeno.
Tratamento – É necessária uma antibioticoterapia por no mínimo 4 a 6 semanas,
baseada nos resultados da cultura da biópsia renal ou urinária e do antibiograma.
A cultura urinária deve ser repetida 7 a 10 dias após o término da antibioticoterapia,
e subseqüentemente a cada 30 dias, até que se obtenham 3 culturas negativas
consecutivas. Animais com infecções crônicas ou recorrentes devem ser avaliados
com relação aos fatores predisponentes, os quais devem ser corrigidos se possível.
Infecções crônicas às vezes podem ser controladas com terapia de supressão
antibiótica (ver CISTITE, anteriormente).
Devem-se administrar fluidoterapia apropriada e medicamentos aos animais
com insuficiência renal secundária à pielonefrite (ver INSUFICIÊNCIA RENAL, pág. 1063).

NEFRITE INTERSTICIAL
A nefrite intersticial aguda em cães pode ser causada pela leptospirose (ver
pág. 428). Outras causas específicas de nefrite intersticial aguda ou crônica são
raramente identificadas. Polaquiúria, hematúria, emagrecimento e dor podem ser
causados por verminose renal (ver a seguir).

INFECÇÃO POR CAPILLARIA PLICA


Este delgado e pequeno parasita (fêmeas com 60mm de comprimento), que se
estabelece ocasionalmente na pelve renal, ureter ou bexiga urinária de cães, gatos
e de outros animais, tem sido relatado na América do Norte, Europa e na antiga
URSS. Geralmente não produz sinais clínicos. A minhoca é o hospedeiro interme-
diário. Estes vermes produzem ovos semelhantes àqueles do verme chicote (mas
incolores), que são eliminados pela urina. Embora nem fenbendazol (50mg/kg/dia
durante 3 dias) nem ivermectina (20µg/kg) sejam aprovados, eles são usados
efetivamente no tratamento de cistites em cães, nos raros casos em que a C. plica
está envolvida. (Nota – Alguns cães sensíveis reagem severamente a esta dose de
ivermectina, ver pág. 1807.)
O levamisol parece ser efetivo no tratamento de infecções com C. felis cati, um
parasita similar da bexiga em gatos.

INFECÇÃO POR VERME RENAL G IGANTE NO VISOM E NO CÃO


O Dioctophyma renale ocorre mais comumente e ocasionalmente em cães e
muitas outras espécies, inclusive no homem. As fêmeas são os maiores nematóides
conhecidos, de 75 a 100cm de comprimento e com 1cm ou mais de diâmetro; os
machos são menores, até 35cm de comprimento. Os adultos são vermelhos e vivem
no tecido renal, quase invariavelmente no rim direito. O parênquima renal é
gradualmente destruído com o crescimento da fêmea do parasita.
Os ovos são eliminados na urina e possuem casca espessa e com reentrâncias
e apresentam dois pólos; se ingeridos por oligoquetas, as larvas infectantes
eclodem e desenvolvem-se. A infecção se dá pela ingestão de anelídeo ou de um
hospedeiro paratênico (por exemplo, variedades de peixe de cabeça grande e lúcio)
que tenha ingerido um anelídeo infectado. A larva migra do estômago ou duodeno
para a cavidade peritoneal e, ocasionalmente, fígado, antes da evolução para
adultos maduros nos rins. Os ovos são eliminados na urina 4 a 6 meses após a
Doenças Infecciosas do Sistema Urinário, Pq An 1060

infecção. Os casos relatados em cães são relativamente raros; a incidência em


visons selvagens varia de 2 a 48%.
Achados clínicos e diagnóstico – Os sinais não se desenvolvem até que o
parasita se aproxime ou alcance a maturidade. A seqüência envolve uma perda de
peso marcante, hematúria, micção freqüente, inquietação e evidência de dor
abdominal ou lombar severa. A anemia pode ocorrer secundariamente à perda
sangüínea. A doença é diagnosticada pelos sintomas e pela presença dos ovos do
parasita na urina. O verme adulto pode ser esporadicamente detectado pelo exame
radiológico ou ultra-sonográfico.
Profilaxia e tratamento – A prevenção da ingestão de peixe cru ou outros
organismos aquáticos é recomendada, especialmente em áreas onde a ocorrência
do parasita em animais silvestres é conhecida. A nefrectomia nos estágios precoces
da infecção leva à rápida recuperação.

DOENÇAS INFECCIOSAS DO SISTEMA


URINÁRIO, GR AN
CISTITE E PIELONEFRITE BOVINAS
(Pielonefrite contagiosa bovina)
Trata-se de uma doença inflamatória esporádica do trato urinário de bovinos e às
vezes de ovinos causada geralmente por Corybacterium renale; entretanto, Esche-
richia coli, C. pyogenes, estreptococos, estafilococos e bacilos difteróides não
identificados também produzem infecções no trato urinário, isoladamente ou em
associação à infecção pelo C. renale.
Epidemiologia – Infecções aberrantes por C. renale têm sido relatadas em
eqüinos e cães. A doença é de importância econômica no bovino e ocasionalmen-
te no ovino. As vacas são mais comumente acometidas que os touros. O C. renale
foi isolado a partir da vulva, vagina e prepúcio de bovinos aparentemente nor-
mais. Atualmente ele é reconhecido como a causa de prostite e vulvite ulcerativas
em ovinos (ver pág. 847) e uma doença similar é observada em suínos (ver a
seguir). Experimentalmente, a bactéria isolada produz pielonefrite em camun-
dongos. A incidência de vacas portadoras é significantemente elevada em
rebanhos com casos clínicos quando comparada a rebanhos sem sintomas
clínicos de pielonefrite antes do aparecimento de um caso esporádico. A trans-
missão é possivelmente favorecida pelo trato dos animais com escovas contami-
nadas, contato vulvar com cama contendo urina, balançar contínuo da cauda e
o uso de instrumentos obstétricos impropriamente esterilizados, particularmente
cateteres urinários. A transmissão venérea parece ser um meio provável de
contágio em animais criados em sistema de monta natural.
A suscetibilidade à doença apresenta-se aumentada por fatores desencadean-
tes de estresse, como excesso alimentar, produção elevada, gestação avançada ou
clima frio.
Achados clínicos – Uma perda gradual das condições físicas ocorre durante um
período de semanas ou meses. Os animais em estágios avançados de infecção são
emaciados e desidratados; ocorre anorexia. Geralmente, o pulso e os movimentos
respiratórios encontram-se normais; a temperatura pode variar. A maioria dos casos
é progressiva, mas remissões temporárias podem ocorrer.
Inquietação, golpeamento do abdome, balançar contínuo da cauda, polaciúria e
tenesmo são sintomas comuns. A freqüente eliminação de urina com sangue,
Doenças Infecciosas do Sistema Urinário, Gr An 1061

contendo coágulos, é considerada patognomônica. Pela palpação retal cuidadosa


é possível detectar sensibilidade e aumento do rim, do ureter e espessamento da
parede da bexiga nos casos avançados. A palpação em casos que evidenciem
sinais severos, porém em estágios iniciais, pode não revelar alterações. A palpação
dos ureteres pela vagina, em vacas adultas, revela um ureter semelhante a um
cordão sempre com crepitação e contendo coágulos sangüíneos. Os ureteres são
mais facilmente localizados na proximidade de sua entrada no colo da bexiga. A
postura do animal pode ser semelhante àquela associada aos quadros de pericar-
dite traumática, gastrite ou indigestão.
Lesões – A uretra encontra-se inflamada, edemaciada e estriada com equi-
moses na submucosa. A bexiga contém restos celulares consideráveis, sangue livre
e coagulado, e um depósito de “areia” característico. A parede da bexiga é franca-
mente espessada e edemaciada; sua mucosa encontra-se hemorrágica e pode
estar ulcerada, edemas sob a forma de grandes vesículas usualmente estão pre-
sentes na maior parte da superfície epitelial. Geralmente os ureteres estão extrema-
mente dilatados e, muitas vezes, seu diâmetro normal atinge 2,5cm; as paredes
encontram-se espessadas, edemaciadas e hemorrágicas. O lúmen está sempre
preenchido por coágulo sangüíneos, pus e tecido renal necrosado.
Embora a infecção possa ser unilateral, ambos os rins estão geralmente
envolvidos e podem estar 2 a 3 vezes maiores que seu tamanho normal. As
lobulações corticais externas estão geralmente indefinidas e a superfície pode estar
quase lisa. A cápsula pode estar aderida. Os cálices mostram-se preenchidos com
um exsudato viscoso cinzento, fragmentos de tecido necrosado, coágulos sangüí-
neos e urina. Cálculos e um precipitado semelhante à areia estão presentes,
enquanto um odor forte de amônia é emitido. Abscessos numerosos e hemorragias
ocorrem através das zonas medular e cortical. Uma atrofia do parênquima e uma
fibrose considerável ocorrem em casos avançados. Em geral, a infecção é caracte-
rizada por um processo inflamatório necrosante ativo, extenso e difuso.
Diagnóstico – Os sinais são razoavelmente característicos. Em geral, existem
somente 1 ou 2 animais afetados no rebanho, concomitantemente. Uma anamnese
do rebanho deve indicar que infecções esporádicas ocorreram no passado. A
pielonefrite deve ser diferenciada de outras doenças, tais como a leptospirose e a
hemoglobinúria bacilar ou das pós-parturientes, nas quais uma hemoglobinúria ou
uma hematúria são achados freqüentes. Um esfregaço corado do sedimento de uma
amostra urinária centrifugada, provinda de um animal com pielonefrite por C. renale,
contém arranjos agrupados e paralelos de bacilos pleomórficos Gram-positivos.
Quando houver suspeita, deve ser feita uma urocultura para C. renale.
Tratamento – Se a terapia é iniciada antes que a dilatação dos ureteres e rins
possa ser palpada, os animais infectados por C. renale em geral respondem
sensivelmente à terapia com penicilina, não ocorrendo o mesmo com os infectados
por E. coli. Em todos os casos, a eficácia da terapia deverá ser comprovada por
exame bacteriológico do sedimento urinário. A recidiva é comum, especialmente em
casos avançados. Para evitar isso, o curso do tratamento deve ser de pelo menos
7 dias e o de 8 a 15 dias é recomendado. O tratamento deve ser repetido se o
microrganismo ainda estiver presente no sedimento urinário 1 mês após a suspen-
são da terapia. Outros antibióticos podem ser efetivos, mas estudos críticos de sua
eficácia não têm sido relatados. Em geral, as sulfonamidas não se mostraram tão
úteis como as penicilinas no tratamento da pielonefrite.

CISTITE SUÍNA
Embora menos caracterizada que a pielonefrite bovina (ver, anteriormente), esta
condição é ocasionalmente um sério problema, em particular se o estresse é
Doenças Infecciosas do Sistema Urinário, Gr An 1062

significante em pocilgas grandes. O agente etiológico é o Eubacterium (Cory-


nebacterium) suis. Ainda que cachaços possam ser infectados, e em pequenas
unidades um único cachaço represente a fonte de infecção para todas as fêmeas
afetadas, está é primariamente uma doença de fêmeas adultas. As fêmeas podem
morrer sem que sinais tenham sido observados. Depressão, anorexia e hematúria
são sinais característicos; disúria pode ser observada. Cistite e, às vezes, ureterite
e pielonefrite compõem as lesões macroscópicas. A penicilina pode ser efetiva se
administrada precocemente.

ESTEFANUROSE
Etiologia – Os adultos do verme renal suíno, Stephanurus dentatus (20 a 45mm
de comprimento e , 2mm de diâmetro), são encontrados nos rins, paredes dos
ureteres e na gordura perirrenal. Este verme é largamente distribuído, em particular
em áreas tropicais e subtropicais, e é primariamente um parasita de animais criados
em áreas externas. As larvas eclodem com rapidez após a eliminação dos ovos na
urina; elas atingem o estágio infectante em mais ou menos 3 a 5 dias e são
suscetíveis ao frio, à dissecação e à luz solar. Em geral são ingeridas, mas podem
penetrar pela pele, e a minhoca pode servir como um hospedeiro paratênico.
Infecções transdérmicas têm sido relatadas. As larvas dirigem-se para o fígado e,
após migração extensa através do tecido hepático por 3 meses ou mais, perfuram
a cápsula e penetram na cavidade abdominal. A larva instala-se no rim ou próxima
deste órgão e, ocasionalmente, em outros tecidos ou órgãos. Infecções manifesta-
das em animais com menos de 5 meses de idade foram adquiridas por transmissão
pré-natal.
Achados clínicos e diagnóstico – Infecções experimentais maciças por ver-
mes renais mostraram ter um efeito adverso no desenvolvimento. Pleurite e
peritonite são comuns. A principal perda econômica consiste na condenação de
tecidos e órgãos afetados vermes migratórios. As lesões mais severas geralmente
são as do fígado, o qual apresenta cirrose, formação cicatricial, trombose extensa
dos vasos portais e um grau variável de necrose. Danos pulmonares e renais
também são comuns.
Quando os vermes estão no rim ou no ureter, ou estão próximos a eles sob a
forma de cistos que se abrem no interior do último, os ovos podem ser detectados
na urina. Infecções pré-patentes são difícies de diagnosticar e um diagnóstico
definitivo depende da demonstração dos vermes ou lesões à necropsia.
Controle – Práticas de controle eficientes são indicadas em áreas onde a
ocorrência do verme é conhecida. Devido ao longo período pré-patente, o controle
pode ser atingido com um programa de criação “apenas de marrãs”: as leitoas
mais velhas são colocadas com leitoas jovens de rebanhos limpos e somente as
marrãs são criadas e, então, vendidas após o desmame, desta maneira não se
permite desenvolvimento de infecção persistente. A erradicação dentro de 2 anos
tem sido relatada. A higiene rigorosa das instalações internas ou externas, inclusive
provisão de uma proteção de concreto abaixo dos comedouros, também reduzirá o
problema significantemente.
Ivermectrina (300µg/kg) e fenbendazol (3mg/kg/dia por 3 dias) são efetivos
contra Stephanurus sp. Experimentalmente, o levamisol (8mg/kg) foi eficiente na
interrupção da produção de ovos em 4 dias, e a urina permaneceu livre de ovos pelas
6 semanas seguintes.
Doenças Não Infecciosas do Sistema Urinário, Pq An 1063

DOENÇAS NÃO INFECCIOSAS DO SISTEMA


URINÁRIO, PQ AN
I NSUFICIÊNCIA RENAL
A incapacidade dos rins para realizar suas funções normais pode ser classificada
como tendo origem renal, pré ou pós-renal. A azotemia pré-renal é o resultado do
fluxo sangüíneo renal reduzido devido a causas como desidratação, insuficiência
cardíaca congestiva ou choque. A azotemia pré-renal pode ser completamente
resolvida com tratamento apropriado ou pode progredir para doença e insuficiência
renais. A azotemia renal (doença primária do parênquima renal) pode ocorrer
secundariamente a insuficiência renal aguda ou crônica. Causas de azotemia pós-
renal incluem rupturas no trato urinário (geralmente de origem traumática) bem
como obstrução do fluxo urinário por cálculo, neoplasia ou coágulos sangüíneos.

Insuficiência renal crônica


Trata-se de uma condição resultante de perda prolongada, significante e em
geral progressiva de tecido renal funcional. Nenhuma predileção por sexo tem sido
relatada. A insuficiência renal crônica geralmente ocorre em animais mais velhos,
embora nefropatias congênitas possam causar insuficiência renal em animais < 1
ano de idade. Esta condição tem sido descrita como nefrite intersticial crônica, mas
uma vez que o termo descreve essencialmente a aparência morfológica dos rins
com doença renal irreversível, progressiva e crônica, ele não contribui para o
entendimento da causa de base. As causas identificáveis incluem pielonefrite,
amiloidose, uropatia obstrutiva crônica, lesões congênitas, glomerulonefrite e
neoplasia.
Achados clínicos – Polidipsia, poliúria e vômitos esporádicos são os primeiros
sinais. Como a insuficiência renal progride por um período superior a semanas ou
meses, anorexia, perda de peso, desidratação, ulceração oral, vômitos e diarréia
são observados. Nos estágios terminais, desidratação severa, vômito, convulsões
e coma levam à morte. As membranas mucosas se tornarão pálidas se a anemia
estiver presente. Perdas dentárias, deformação da maxila e da mandíbula ou
fraturas patológicas podem ser vistas em animais com osteodistrofia renal se-
cundária. A palpação cuidadosa pode revelar rins pequenos e irregulares em
animais com nefropatia terminal ou rins volumosos em animais com tumores ou
hidronefrose.
Diagnóstico – Os níveis de nitrogênio uréico sangüíneo (BUN – “blood urea
nitrogen”), creatina sérica e fósforo inorgânico apresentam-se elevados. Uma
anemia não regenerativa moderada a severa, acidose metabólica e hipertensão
desenvolvem-se com a diminuição da função renal. Osteoporose pode ser observa-
da radiograficamente. A densidade específica urinária em cães normais em geral
varia de 1,008 a 1,029; em cães com disfunção renal, a densidade específica pode
ser fixada em 1,008 a 1,012. Contudo, cães com glomerulopatia primária podem
tornar-se azotêmicos, embora mantenham alguma capacidade de concentração
urinária. Os gatos com insuficiência renal crônica geralmente produzem urina com
uma densidade específica de 1,008 a 1,034, provavelmente devido à sua capacida-
de normal de produzir uma urina muito concentrada.
A polidipsia e a poliúria da insuficiência renal crônica devem ser diferenciadas
daquelas associadas a diabetes (insípido ou melito), piometria, pielonefrite sem
insuficiência renal e hiperadrenocorticismo. A insuficiência adrenal pode ser confun-
dida com insuficiência renal primária, visto que a azotemia pré-renal pode ser
causada por vômito, diarréia e polidipsia.
Doenças Não Infecciosas do Sistema Urinário, Pq An 1064

Radiografia contrastada, ultra-sonografia abdominal, provas de função renal


específicas, urocultura e biópsia renal podem ser feitas para determinar a etiologia
e a severidade da nefropatia. Na maioria dos casos, contudo, os estágios avançados
da insuficiência renal impedem a identificação da etiologia principal. A condição é
então descrita como nefropatia terminal. A insuficiência renal crônica deve ser
diferenciada da insuficiência renal aguda, a qual é potencialmente reversível.
Geralmente o diagnóstico é feito por meio de uma anamnese cuidadosa, exame
físico e achados laboratoriais listados anteriormente, no entanto um biópsia renal
pode ser necessária.
Tratamento – A perda severa de tecido renal é uma condição de incapacidade
permanente. Contudo, os animais podem sobreviver por longos períodos com
apenas uma pequena fração de tecido renal normal. O tratamento recomendado
varia com a severidade dos sinais. Animais com alterações clínicas mínimas (tais
como vômitos ocasionais) podem ser controlados clinicamente em casa. Água
fresca deverá estar sempre disponível. Dieta com restrição proteica pode minimizar
alguns dos sinais e, além disso, pode auxiliar no retardo da progressão da
insuficiência renal, a qual é inevitável. Alimentos com alto valor proteico, assim como
ovo ou fígado, deverão ser fornecidos dentro de um nível de 2,0g/kg de peso
corporal/dia para cães e 3,5kg de peso corporal/dia para gatos. Formulações
comerciais de dietas para gatos e cães com insuficiência renal crônica estão
disponíveis. Uma dieta hipoproteica e restrita em minerais também contribuirá para
a redução da concentração de fósforo sérico, a qual pode ser útil no retardo da
progressão da patologia. Se a restrição dietética de proteína for malsucedida na
manutenção de um nível sérico normal de fósforo, agentes ligantes de fosfato sob
apresentação de gel, contendo hidróxido de alumínio, deverão ser administrados
por via oral. A administração de um antagonista de receptor H 2, como a cimetidina
(5mg/kg, VO, 3 a 4 vezes/dia), diminui a acidez gástrica e os vômitos e pode reduzir
os níveis de hormônios paratireóideos, o que leva à diminuição da concentração de
fósforo sérico. Bicarbonato de sódio, administrado VO, pode ser indicado se o
animal está em acidose. Vitaminas do complexo B devem ser administradas (VO)
para compensar as perdas urinárias de vitaminas solúveis em água. Esteróides
anabólicos ou eritropoietina recombinante, tais como a oximetalona ou nandrolona,
são administrados com o intuito de estimular a eritropoiese em animais anêmicos,
transfusões sangüíneas podem ser necessárias para manter um volume total de
células (VTC). A hipertensão associada à insuficiência renal crônica pode, pelo
menos parcialmente, ser diminuída por meio do fornecimento de uma dieta hi-
possódica. A mudança de uma dieta normossódica para uma hipossódica deve ser
feita gradualmente para impedir uma depleção do volume. Fluidoterapia EV (ver
pág. 1642) é necessária em animais com sinais severos de uremia. A eutanásia
pode ser indicada se a fluidoterapia não melhorar a função renal e nem minimizar
os sinais de uremia.

Insuficiência renal aguda


A insuficiência renal aguda ocorre quando uma lesão renal importante resulta
na incapacidade do órgão para regular o equilíbrio hídrico e de solutos; isso pode
ocorrer com fluxo urinário reduzido, normal ou aumentado. As etiologias incluem:
toxinas, tais como metais pesados, etilenoglicol, antibióticos aminoglicosídios,
metoxiflurano e fenacetina: vasculites, incluindo glomerulonefrite aguda e lúpus
eritematoso; isquemia prolongada; infarto devido a fluxos embólicos de endocar-
dites bacterianas ou coagulação intravascular disseminada; infecção, incluindo
pielonefrite aguda ou leptospirose; hemoglobinúria ou mioglobinúria; e hipercalce-
mia, a qual nos cães é geralmente uma síndrome paraneoplásica associada a
linfossarcoma (ver HIPERCALCEMIA HUMORAL MALIGNA, pág. 343).
Doenças Não Infecciosas do Sistema Urinário, Pq An 1065

Achados clínicos – Os sinais de insuficiência renal aguda incluem anorexia,


depressão, desidratação, ulceração oral, vômitos, diarréia e hipotermia. Geralmen-
te os sinais físicos não são notáveis, contudo a sensibilidade renal pode ser
observada pela palpação.
Diagnóstico – Os animais afetados terão uréico nitrogênio sangüíneo, creatinina
sérica e concentrações de fósforo sérico elevados; acidose metabólica; e hiper-
calemia, se oligúria ou anúria estiverem presentes. Uma avaliação cuidadosa da
anamnese e de todos os achados clínicos e laboratoriais deverá ser feita para
diferenciar a insuficiência renal aguda da crônica. Animais com azotemia pré-renal
têm urina concentrada, ao passo que os cães com insuficiência renal aguda têm
uma urina densidade específica de 1,008 a 1,029 e os gatos de 1,008 a 1,034. Uma
biópsia renal pode ser necessária para determinar a severidade, extensão, causa
e o potencial de reversibilidade da doença.
Tratamento – Se a causa da insuficiência renal aguda for conhecida, uma terapia
específica deverá ser instituída, por exemplo, o 4-metilpirazol ou etanol, no caso de
intoxicação por etilenoglicol (ver pág.1998). A fluidoterapia (ver pág.1642) é indica-
da para todos os animais com insuficiência renal aguda. Um fluido poliiônico, como
solução de lactato de Ringer, é satisfatório, a menos que a hipercalemia esteja
presente, neste caso a solução salina normal é recomendada. O bicarbonato de
sódio pode ser adicionado ao fluido para corrigir a acidose. A produção de urina e/ou
pressão venosa central deve ser monitorada atentamente para evitar super-
hidratação em casos de oligúria ou anúria. A terapia diurética deverá ser instituída
se a produção de urina for <20mL/kg/dia. Esta pode compreender furosemida
(2mg/kg, EV; esta dose pode ser duplicada e depois triplicada a intervalos fre-
qüentes de hora em hora, se a produção urinária não aumentar), diurese osmótica
(dextrose ou manitol a 20%, 0,5g/kg, EV, lentamente, alternada com administração
de solução de lactato de Ringer, 30 a 60mL/kg, EV), e/ou vasodilatadores renais
(dopamina diluída em dextrose a 5% em administração EV, fornecendo 1 a
5µg/kg/min). A diálise peritoneal ou a hemodiálise serão necessárias se nenhuma
das medidas anteriores forem efetivas no restabelecimento da produção urinária. A
fluidoterapia é mantida até que a função renal se restabeleça e a condição clínica
do animal se estabilize.

UROPATIA OBSTRUTIVA
Mesmo que os rins sejam capazes de funcionar normalmente, uma obstrução do
fluxo urinário em qualquer ponto abaixo do nível dos rins conduz ao acúmulo de
restos metabólicos e insuficiência renal aguda. A obstrução da uretra por urólitos em
cães e por plugs cristalinos e mucoproteínas em gatos é a causa mais comum,
embora tumores ou coágulos sangüíneos presentes na uretra ou ureteres também
possam ser responsáveis.
A hidronefrose é caracterizada pela dilatação da pelve renal como resultado de
obstrução parcial ou completa do fluxo urinário de um ou ambos os rins. Quando
a obstrução é aguda, completa e bilateral, ocorrem alterações menos extensas nos
rins por causa de seu período de sobrevivência pequeno. Na obstrução unilateral ou
parcial, o animal sobrevive o bastante para ter atrofia severa por pressão do
parênquima renal e dilatação cística do órgão afetado. Hidroureter é um acompa-
nhamento freqüente e observado quando a obstrução ocorre num ponto mais baixo
do trato. A pressão hidrostática aumentada resulta em atrofia do parênquima renal
funcional. As papilas da medula desaparecem primeiro; a seguir, o córtex pode
igualmente atrofiar. O rim afetado torna-se eventualmente uma bolsa disfuncional,
grosseiramente dilatada, preenchida por urina ou fluido seroso.
Achados clínicos – Os animais com obstrução uretral terão estrangúria e,
freqüentemente, hematúria; podem ter sensibilidade abdominal evidente, especial-
Doenças Não Infecciosas do Sistema Urinário, Pq An 1066

mente se a obstrução for bilateral. Sinais de insuficiência renal desenvolvem-se


rapidamente e compreendem vômito, desidratação, hipotermia e depressão severa.
A bexiga é distendida e sensível à palpação, e o cateter não pode ser introduzido.
Bradicardia ou arritmias cardíacas devidas a acidose e hipercalemia podem estar
presentes. Comumente, a obstrução ureteral unilateral não é diagnosticada em
virtude da hipertrofia compensatória do rim não afetado resultar em um estado não
azotêmico, a menos que o rim dilatado seja palpado.
Diagnóstico – Geralmente a anamnese, os sinais clínicos e o exame físico
fornecem um diagnóstico correto em animais com obstrução uretral. Uma pielografia
EV ou ultra-sonografia abdominal são necessárias em casos de obstrução ureteral.
A determinação imediata dos níveis de potássio sérico deverá ser feita em animais
com arritmias cardíacas. Um ECG pode fornecer evidência presuntiva de hiperca-
lemia se os resultados laboratoriais forem demorados (bradicardia; ondas T altas e
pontiagudas; intervalo P-R aumentado; complexo QRS alargado; bloqueio atrial).
Tratamento – A obstrução uretral deverá ser reparada (ver UROLITÍASE, pág.
1072). Os fluidos são administrados por via EV para melhorar a função renal e
corrigir os desequilíbrios eletrolíticos. O fluido de escolha é o salino normal; o
bicarbonato de sódio é acrescentado para corrigir a acidose e a hipercalemia. Em
animais com hipercalemia severa e arritmias cardíacas, soluções de dextrose ou
insulina regular e infusões de dextrose podem ser administradas para direcionar o
potássio intracelularmente. Quantidades grandes de fluidos podem ser requeridasà
medida que o animal suporta uma diurese pós-obstrutiva por 1 a 5 dias. Eletrólitos
séricos, peso corporal, VTC produção de urina e hematócrito deverão ser monitorados
diariamente, e os ajustes apropriados no tipo e na quantidade de fluido administrado
deverão ser feitos.
A intervenção cirúrgica é necessária em animais com obstrução ureteral. Quando
possível, a obstrução deverá ser removida para restabelecer o fluxo urinário;
entretanto, a nefrectomia unilateral é sempre requerida.

GLOMERULOPATIA
Animais com glomerulopatia primária podem ter alterações clínicas e laborato-
riais um pouco diferentes que aqueles com doença intersticial. A lesão na membrana
basal glomerular resulta em albuminúria, a qual pode levar à hipoalbuminemia. Os
animais podem exibir sinais mais relacionados à hipoalbuminemia que à uremia.
Glomerulopatias são menos comuns em gatos que em cães, embora incomuns em
ambas as espécies. Nenhuma predisposição por idade, sexo ou raça tem sido
relatada.
Glomerulonefrite é uma doença imunomediada caracterizada pela deposição
ou formação in situ de imunocomplexos na parede capilar glomerular, a qual incita,
então, alterações inflamatórias (ver também pág. 520). Em gatos, está freqüente-
mente associada com a infecção pelo vírus da leucemia felina; em alguns cães, está
associada com adenovírus, piometria, neoplasia, lúpus eritematoso sistêmico (LES)
e dirofilariose. A glomerulonefrite membranoproliferativa tem sido relatada em um
grupo de doberman pinschers jovens, sugerindo uma doença familial, e em uma
família de samoiedas com uma doença glomerular hereditária dominante associada
ao cromossomo X.
Amiloidose é o nome dado a qualquer uma das várias glicoproteínas fibrilares
quimicamente neutras que podem estar depositadas em tecidos e interferir na
função normal do órgão (ver também AMILOIDOSE, pág. 385). Todas estas proteínas
são depositadas numa conformação de folha β-pregueada, a qual resulta num
aspecto único e propriedades químicas do amilóide. Em cães, o amilóide é
geralmente depositado nos glomérulos; em gatos, é encontrado com maior freqüên-
cia no interstício medular.
Doenças Não Infecciosas do Sistema Urinário, Pq An 1067

Achados clínicos – Muitos animais com amiloidose renal desenvolvem a


chamada síndrome nefrótica (proteinúria maciça, concentração de albumina redu-
zida e hipercolesterolemia). Embora seja uma característica da síndrome nefrótica
humana, o edema pode ou não estar presente em outros animais. Azotemia não é
um achado consistente nos estágios iniciais, mas muitos animais com síndrome
nefrótica progridem para uma insuficiência renal crônica em um período variável de
tempo. Proteinúria (primariamente albumina) pode levar a perda de peso e diminui-
ção da atividade. A hipoproteinemia pode levar a ascite, dispnéia (devido a efusão
pleural ou edema pulmonar), ou ocasionalmente, edema periférico. A doença
glomerular crônica ou severa eventualmente causa insuficiência renal e uremia. Os
achados físicos são geralmente inespecíficos, exceto no caso de ascite ou edema
periférico. Nefropatias que causam perda de proteína levam à perda de antitrombina
III, o que leva a um estado de hipercoagulação. Dispnéia severa secundária ao
tromboembolismo pulmonar pode ser vista em cães com glomerulonefrite ou
amiloidose.
Diagnóstico – O nitrogênio uréico sangüíneo, a creatinina sérica e as concen-
trações de fósforo são elevados, de modo variável, na dependência da severidade
da doença e do tempo de diagnóstico. A densidade urinária específica pode estar
alta ou baixa. A proteinúria está presente em todas as formas de glomerupatia, mas
deve ser quantificada para determinar se a perda é significante. A perda urinária
proteica durante 24h equivalente de 10 a 20mg/kg é considerada normal em cães
e gatos. Alternativamente, a relação proteína: creatinina pode ser determinada
numa amostra urinária aleatória; um valor > 2 indica uma proteinúria significante, e
valores > 10 são freqüentemente associados com amiloidose.
Radiografias torácicas e abdominais devem ser obtidas para descartar a possi-
bilidade de neoplasia e dirofilariose. Uma biópsia renal é necessária para se
determinar o tipo de glomerulopatia. O grau de proteinúria não está sempre
correlacionado à severidade das lesões histológicas. Testes para LES (título de
anticorpo antinuclear e preparado LE) deverão ser feitos em cães com glomerulo-
nefrite. Ocorre hipertensão em muitos casos, e deve-se determinar a pressão
sangüínea em todos os animais com evidência de doença glomerular.
Tratamento – Nenhuma terapia específica demonstrou ser benéfica em cães
tanto com glomerulonefrite quanto com amiloidose. Os corticosteróides aumentam
a deposição de amilóide e deverão ser evitados nestes animais. As medidas de
suporte incluem uma dieta proteica de alta qualidade e baixa em sódio para controlar
a hipertensão e diuréticos para controlar o edema. Modificações nos níveis de sódio
da dieta deverão ser feitas gradualmente. As transfusões de plasma podem ser
necessárias em animais com edema ou ascite refratários. Animais em insuficiência
renal devem receber terapia apropriada (ver pág. 1063).

DEFEITOS TUBULARES RENAIS


Síndrome de Fanconi
É um conjunto de distúrbios tubulares renais que levam a uma perda excessiva
de inúmeros solutos na urina, resultando em distúrbios metabólicos e, em alguns
casos, em insuficiência renal. Tem sido relatado em cães basenji (adultos de ambos
os sexos) como uma doença hereditária. Estudos da função renal indicam perdas
urinárias excessivas de glicose, sódio, potássio, fósforo, ácido úrico, bicarbonato e
aminoácidos. Os níveis de glicose no sangue apresentam-se normais. Os eletrólitos
séricos são normais no início da patologia, mas a hipofosfatemia, a hipocalemia e
a acidose metabólica são observadas em estágios avançados.
Os sinais clínicos compreendem polidipsia, poliúria e perda de peso. Sinais de
uremia podem estar presentes se o animal tiver uma insuficiência renal. O diagnós-
Doenças Não Infecciosas do Sistema Urinário, Pq An 1068

tico é baseado na determinação da excreção fracionada renal aumentada de


glicose, sódio, potássio, fósforo e bicarbonato. O diagnóstico diferencial inclui
glicosúria renal simples e doenças renais por outras causas. Não se observam
alterações microscópicas. Alguns cães possuem rins normais e outros podem
apresentar alterações inespecíficas. Ainda não foi descrito um tratamento dietético
para reverter o defeito tubular.
Suplementação oral de cloreto de sódio, potássio, fosfato e bicarbonato é
indicada se a concentração sorológica correspondente estiver baixa. Cães com
insuficiência renal (ver pág. 1063) devem receber uma terapia sintomática apropria-
da. A doença é lentamente progressiva, apesar da terapia, e eventualmente leva
à morte por insuficiência renal.

Glicosúria renal
Geralmente é um defeito congênito na porção do túbulo contornado proximal que
absorve a glicose, resultando em glicosúria, apesar de a glicemia estar normal. Os
animais afetados podem ser assintomáticos, ter polidipsia/poliúria, ou apresentar
infecções do trato urinário recidivantes, devido à utilização da glicose pelas
bactérias. O diagnóstico é feito pela demonstração de uma glicosúria persistente,
com uma glicemia normal e pela não identificação de nenhuma outra anormalidade
renal. Apesar de não existir nenhum tratamento disponível, a doença não é
progressiva.

Acidose tubular renal


É um raro defeito tubular renal que resulta em acidose metabólica hiperclorêmica
em cães. Dois tipos têm sido descritos: o Tipo I é caracterizado por um defeito na
capacidade tubular distal para secretar íons de hidrogênio; o Tipo II é o resultado de
uma redução no limiar de reabsorção do bicarbonato no túbulo proximal. O Tipo I é
mais severo e pode estar associado com desmineralização do esqueleto (devido ao
tamponamento excessivo de íons de hidrogênio) e com nefrolitíases (devido à
hipercalciúria da reabsorção óssea). O diagnóstico é baseado na presença de
acidose metabólica hiperclorêmica sem outra causa. O Tipo I pode ser
presuntivamente diagnosticado quando o pH urinário for inapropriadamente alto
com relação ao grau de acidose sistêmica. A incapacidade para obter uma urina
ácida após a administração oral de cloreto de amônia é diagnóstica; entretanto, este
teste é contra-indicado em um animal que já esteja severamente acidótico. O Tipo
II é diagnosticado pela demonstração do aumento da excreção fracionária urinária
de bicarbonato quando os níveis plasmáticos de bicarbonato forem normais ou
diminuídos. A terapia consiste na administração de bicarbonato de sódio por via oral,
o suficiente para manter o pH sangüíneo na sua faixa de normalidade.

DOENÇAS NEOPLÁSICAS
Tumores renais
Tumores renais são incomuns; em cães representam 0,6 a 1,7% de todos os
tumores. Os tumores benignos são raros, em geral são achados incidentais nas
necropsias e não possuem significância clínica. Adenomas, lipomas, fibromas e
papilomas têm sido relatados.
Os tumores renais malignos primários (exceto os nefroblastomas) são mais
comuns em animais de idade média a avançada; nenhuma predileção racial foi
encontrada. O tumor renal maligno primário mais comum é o adenocarcinoma, que
se origina do epitélio tubular renal. Geralmente, é unilateral, localizado em um pólo
renal, bem delimitado, com coloração amarelada, branca ou acinzentada. O
Doenças Não Infecciosas do Sistema Urinário, Pq An 1069

tamanho varia de microscópico a muitas vezes o do rim normal. Os adenocarcino-


mas renais metastizam-se precocemente em vários órgãos; rim oposto, pulmões,
fígado e adrenais estão mais comumente envolvidos.
Os nefroblastomas (nefroma embrionário, tumor de Wilms) surgem de tecido
embrionário vestigial. Eles ocorrem em animais jovens e são mais comumente
diagnosticados em cães < 1 ano de idade. Não existe nenhuma predileção racial, mas
a incidência em machos afetados é o dobro da comumente ocorrida em fêmeas.
Geralmente são unilaterais, porém, ocasionalmente, são bilaterais e podem atingir
proporções imensas: não é raro, virtualmente, o abdome inteiro ser ocupado pelo
tumor. As metástases ocorrem nos linfonodos regionais, fígado e pulmões.
Os carcinomas de células de transição surgem do epitélio de transição da pelve
renal, ureter, bexiga ou uretra. Eles estão discutidos sob o título TUMORES NO TRATO
URINÁRIO INFERIOR, a seguir. Outros tumores renais malignos primários incluem
hemangiossarcomas, fibrossarcomas, leiomiossarcomas e carcinomas de células
escamosas; todos são raros.
Os rins são um sítio comum de tumores metastáticos ou multicêntricos. As lesões
metastáticas podem ser uni ou bilaterais. O linfossarcoma é o tumor multicêntrico
mais comum que compromete os rins. Até 50% dos cães e gatos com linfossarcoma
apresentam lesões renais e, em alguns casos, somente os rins são afetados. O
comprometimento renal é em geral difuso, intersticial e bilateral, resultando em rins
aumentados e irregulares. O linfossarcoma em gatos está geralmente associado à
infecção pelo vírus da leucemia felina.
Achados clínicos – Geralmente os sinais são inespecíficos e podem incluir
perda de peso, anorexia, depressão e febre. Tumores bilaterais podem destruir
tecido renal suficiente para causar insuficiência renal e sinais de uremia. Os
proprietários atenciosos podem relatar “protuberâncias” no abdome do animal ou
aumento abdominal. Hematúria persistente, geralmente microscópica, pode ocor-
rer. Com raridade, os tumores renais podem produzir quantidades excessivas de
eritropoietina resultando em policitemia (ver pág. 99).
Diagnóstico – A anamnese e os sinais clínicos podem indicar a presença de uma
massa na área renal ou renomegalia. A localização e o tamanho da massa podem
ser confirmados por ultra-sonografia ou radiografia, embora uma urografia excretora
ou uma arteriografia renal possam ser necessárias. As radiografias torácicas podem
revelar doença metastática. Ocasionalmente, células neoplásicas podem ser en-
contradas no sedimento urinário. O exame histológico de tecido obtido por biópsia
por aspiração* ou por biópsia cirúrgica em cunha é necessário para determinar o tipo
de tumor. A biópsia percutânea por aspiração e o exame citológico podem ser
suficientes para o diagnóstico de linfossarcoma em cães e gatos.
Tratamento – O tratamento de todos os tumores renais, exceto o linfossarcoma,
exige a remoção cirúrgica do tumor; geralmente a nefrectomia unilateral é neces-
sária. O linfossarcoma é melhor controlado pela associação com quimioterapia
(ver pág. 39). A quimioterapia não tem mostrado eficiência contra outros tumores
renais que não o linfossarcoma.

Tumores do trato urinário inferior


Os tumores dos ureteres, bexiga e uretra são incomuns em cães e raros em
gatos. Considera-se que a menor incidência em gatos seja devida a uma diferença
no metabolismo do triptofano que resulta em concentrações urinárias baixas de

* N. do T. – A amostra é removida por intermédio de aspiração com agulha hipodérmica ou


trocarte.
Doenças Não Infecciosas do Sistema Urinário, Pq An 1070

metabólitos de triptofano carcinogênicos. Os animais idosos são mais comumente


afetados; a idade média de ocorrência em cães e os gatos é de 9 anos.
Os tumores benignos do trato urinário inferior são raros. Papilomas e leiomiomas
são os mais comumente diagnosticados, mas fibromas, neurofibromas, hemangio-
mas, rabdomiomas e mixomas também ocorrem.
Os tumores malignos primários são as neoplasias do trato urinário inferior mais
comuns, dos quais os carcinomas de célula de transição são diagnosticados com
maior freqüência. Os carcinomas de célula escamosa, adenocarcinomas,
fibrossarcomas, leiomiossarcomas, rabdomiossarcomas, hemangiossarcomas e
osteossarcomas também podem ocorrer. Os carcinomas de célula de transição
podem ocorrer como projeções da mucosa semelhantes a papilas, únicas ou
múltiplas, ou como uma infiltração difusa no ureter, bexiga ou uretra. Eles são
altamente invasivos e metastatizam-se freqüentemente, em especial nos linfonodos
regionais e pulmões. Os tumores de ureter e bexiga podem causar obstrução
crônica do fluxo urinário com hidronefrose secundária. Tumores uretrais causam
provavelmente uropatia obstrutiva aguda. Infecções bacterianas secundárias no
trato urinário são comuns em associação a tumores de bexiga e uretra.
Achados clínicos – A hematúria é o sinal mais comum. Animais com obstrução
ureteral e hidronefrose unilateral podem mostrar evidências de dor abdominal e
apresentam um aumento renal palpável. Os sinais de uremia podem ser evidentes
em animais com obstrução ureteral bilateral e hidronefrose ou naqueles com
obstrução uretral. Tumores da bexiga ou da uretra também podem causar disúria,
estrangúria e polaciúria. A parede da bexiga pode estar espessada e um cordão
semelhante à uretra pode ser palpável por via retal.
Diagnóstico – A anamnese e os sinais clínicos são altamente sugestivos de
patologia no trato urinário inferior em animais com tumores da bexiga ou uretra. A
urinálise revela, freqüentemente, hematúria e evidência de infecção. Infecções
crônicas e descomplicadas do trato urinário devem ser diferenciadas daquelas
associadas a tumores. As células neoplásicas podem ser encontradas no sedimen-
to, particularmente em carcinomas da célula de transição. Uma cistouretrografia ou
ultra-sonografia é necessária para determinar a localização e a extensão do tumor.
A biópsia do tumor é exigida para um diagnóstico definitivo.
Tratamento – A excisão do tumor é a terapia mais benéfica. Carcinomas de
células transitórias estão com freqüência localizadas no trígono da bexiga ou na
uretra, e podem necessitar de uma cirurgia radical reconstrutiva do trato urinário
inferior. O prognóstico é pobre para estes animais, mesmo com a intervenção
cirúrgica, pois recidivas e metástases ocorrerem rapidamente. Estudos recentes
sugerem que a quimioterapia com cisplatina possa prolongar a vida dos animais
afetados.

DISTÚRBIOS DA MICÇÃO
Os distúrbios da micção podem resultar de disfunção de qualquer um dos
componentes que controlam a micção. Incontinência urinária é a falha do controle
voluntário do esfíncter uretral, com constante ou intermitente passagem inconscien-
te de urina; isto pode ser uma falha do armazenamento da urina ou uma desordem
no esvaziamento da mesma, e pode ter uma origem neurológica ou não. A principal
incontinência de origem não neurológica é atribuída à deficiência de hormônios
sexuais em animais castrados, principalmente fêmeas, e pode ocorrer como uma
seqüela da ovário-histerectomia.
Animais com incontinência podem deixar uma poça de urina onde se deitam ou
gotejar urina enquanto caminham. Os pêlos ao redor da vulva ou do prepúcio podem
ficar molhados, e pode ocorrer dermatite perivulvar ou periprepucial como resultado
da ação irritante da urina.
Doenças Não Infecciosas do Sistema Urinário, Pq An 1071

A incontinência voluntária é observada com irritabilidade do detrusor, em geral


associada à cistite. A destruição da musculatura lisa da uretra por infecção ou
neoplasia pode causar incontinência. Animais com ureteres ectópicos congênitos
unilaterais podem urinar normalmente e “gotejar” urina intermitentemente, en-
quanto é menos provável que animais com ureteres ectópicos bilaterais urinem
normalmente.
A incontinência urinária paradoxal ocorre quando há uma obstrução parcial do
trato urinário. A incapacidade para urinar resulta em freqüentes tentativas de
micção, estrangúria e passagem apenas de uma pequena quantidade de urina.
Ocasionalmente a incontinência pode ser vista com obstrução parcial da uretra.
Animais com obstrução total rapidamente se tornam urêmicos. A incapacidade de
micção pode ser devida à obstrução mecânica da uretra por cálculos, tumores ou
estenoses.
As formas neurológicas de incontinência urinária são melhor categorizadas como
lesões no neurônio motor superior (NMS) ou inferior (NMI) na medula espinhal.
Lesões na medula espinhal sacral, traumatismo no nervo pélvico e atonia do
detrusor levam a sinais de NMI, que se caracterizam por uma bexiga distendida e
facilmente esvaziável. Lesões na medula espinhal toracolombar, no cérebro,
cerebelo ou tronco cerebral levam a sinais de NMS, que se caracterizam por uma
bexiga distendida que é difícil de ser esvaziada se o animal estiver apresentando
paresia ou paralisia. A forma final de incontinência urinária neurológica é a obstrução
funcional (dissinergia reflexa), que ocorre quando há incoordenação do reflexo
normal de micção; acredita-se que isso seja o resultado de uma descarga maior de
impulsos do nervo simpático no esfíncter uretral.
A excitação pode causar incontinência urinária em alguns animais. Incontinência
urinária idiopática em gatos pode estar associada com o vírus da leucemia felina.
Pode-se induzir uma incontinência urinária iatrogênica, pela administração de
corticosteróides ou diuréticos.
Diagnóstico – Os sinais clínicos geralmente são sugestivos de um distúrbio da
micção. Um exame físico e neurológico completo é indicado em qualquer animal
com incontinência urinária. A história deve incluir a idade que o animal tinha quando
começou a apresentar o problema, o seu estado sexual, a idade de castração, a
medicação que está sendo usada, e história de uma infecção prévia do trato urinário.
O ato de esvaziar a bexiga deve ser observado, e a mesma deve ser palpada após
o seu esvaziamento para estimar-se o volume residual.
A bexiga é pequena a moderadamente distendida na maioria dos tipos de
incontinência e pode ser esvaziada manualmente. Animais com incontinência NMI
ou com bexiga atônica apresentam a bexiga muito distendida, que pode ser
esvaziada com uma pressão mínima. Animais com obstrução funcional ou mecâ-
nica, ou lesões no NMS também apresentam a bexiga muito distendida, mas que
não pode ser esvaziada. Deve-se tomar cuidado quando se tenta esvaziar a bexiga
desses animais, para que não ocorra ruptura da mesma. Uma sonda pode ser
facilmente introduzida na bexiga de animais com obstrução funcional, mas não
poderá ser introduzida em animais com obstrução mecânica. Radiografias simples
e contrastadas são necessárias para se determinar o tipo e a localização da
obstrução mecânica.
Tratamento – Os animais com incontinência hormonal são tratados com o
hormônio sexual apropriado – dietilestilbestrol em fêmeas e testosterona em
machos. A dose deverá ser ajustada ao mínimo exigido para manter a continência.
Alternativamente, uma droga agonista α-adrenérgica (por exemplo, a fenilpropa-
nolamina, 2 a 4mg/kg/dia em doses divididas) pode ser administrada. Esta droga
também pode ser benéfica em animais com incompetência do esfíncter uretral. A
incontinência voluntária é tratada com drogas anticolinérgicas, tais como a
Doenças Não Infecciosas do Sistema Urinário, Pq An 1072

propantelina (cães – <20kg, 7,5mg/dia; > 20kg, 15mg/dia; gatos – 7,5mg a cada
72h). Drogas colinérgicas, tais como o betanecol, são empregadas em animais com
atonia do detrusor. A obstrução funcional é tratada com drogas simpatolíticas (por
exemplo, a fenoxibenzamina, 2,5 a 10mg, 1 a 3 vezes/dia); pode ser também
necessário o uso de drogas colinérgicas.
As obstruções mecânicas devem ser resolvidas por cateterização e retropulsão
do material que está causando a obstrução na bexiga, ou por meio de cirurgia. Os
animais com atonia do detrusor por superdistensão, mas sem lesões neurológicas,
terão benefícios com a descompressão vesical por meio da fixação de uma sonda
urinária colocada na bexiga por 3 a 7 dias. Aqueles com atonia neurogênica
geralmente não respondem ao tratamento medicamentoso e exigem um esvazia-
mento manual da bexiga ou cateterização várias vezes por dia.

UROLITÍASE
É uma condição associada com a presença de cálculos ou com quantidades
excessivas de cristais no trato urinário. A subseqüente irritação da mucosa resulta
na eliminação freqüente de urina com sangue, na obstrução do trato urinário ou em
ambos. A doença possui muitos nomes, incluindo cálculos urinários, pedras na
bexiga, pedras nos rins, doença do trato urinário inferior, e em gatos, síndrome
urológica felina (SUF). A urolitíase é comum em cães e gatos; a incidência é de 2,8%
de todos os cães e 10% dos gatos hospitalizados. Urólitos grandes são comuns em
cães, enquanto nos gatos, os urólitos em geral são partículas semelhantes a areia
ou cristais microscópicos. A incidência é aproximadamente igual em ambos os
sexos de ambas as espécies, mas os sinais clínicos diferem devido às diferenças
anatômicas.
Em todas as espécies animais, os cálculos são constituídos de cerca de 20
substâncias cristalinas, representando diferentes formas de minerais de fosfato,
oxalato, urato, cistina, carbonato e sílica. Os elementos e radicais constituintes
podem ser identificados por análise química e combinação precisa dos cristais por
cristalografia óptica e cristalografia por raio-X. Contudo, em muitos casos, uma
análise do cálculo é desnecessária, visto que o tipo mais provavelmente presente
pode ser determinado a partir da espécie, idade, sexo, raça, dieta ou outros dados
clinicamente disponíveis. Em casos recidivantes, uma análise quantitativa e não
qualitativa do cálculo deverá ser conduzida.
Os mecanismos envolvidos na formação efetiva do cálculo não estão bem
entendidos. Existem 3 teorias principais: a hipótese matriz, na qual a matriz inor-
gânica proteica é enfatizada como iniciadora da formação do urólito; a hipótese
cristalização-inibidor, na qual a importância de inibidores orgânicos e inorgânicos
da cristalização é enfatizada; e a hipótese precipitação-cristalização, na qual a
importância da supersaturação de um sal é enfatizada. Independentemente destes
ou de outros mecanismos, os cálculos não podem ser produzidos sem: 1. uma
concentração suficientemente alta de constituintes formadores do cálculo na urina;
2. tempo adequado no trato urinário; e 3. para estruvita (magnésio-amônio-fosfato),
cistina ou cálculos de urato, um pH favorável para a cristalização. Qualquer aspecto
que acentue um destes fatores predispõe à formação do urólito. Estes fatores são
influenciados por infecção do trato urinário, dieta, absorção intestinal, volume
urinário, freqüência de micção e genética. A importância de cada um destes na
causa ou predisposição à urolitíase, ou de modo oposto, na prevenção desta, varia
nas diferentes espécies e com os diferentes tipos de urólito. Os fatores envolvidos
na urolitíase de determinadas espécies por certos tipos de cálculos estão bem
documentados: cálculos de cistina e urato dos cães possuem origem metabólica; os
cálculos de estruvita de cães estão freqüentemente associados a infecções do trato
urinário por bactérias produtoras de urease.
Doenças Não Infecciosas do Sistema Urinário, Pq An 1073

A prevenção é baseada na composição química dos cálculos. Uma vez que a


substância química agressora é conhecida, sua concentração urinária pode ser
reduzida pela diminuição do aporte alimentar, aumento do volume urinário, elimina-
ção da infecção, modificações no pH urinário, ou alteração da produção ou excreção
por meio de drogas.
Achados clínicos – Os sinais são causados pela presença e efeitos dos cristais
ou cálculos no trato urinário. Os cálculos podem não promover sinais notáveis;
podem irritar a mucosa do trato urinário, causando cistite ou uretrite; ou podem-se
instalar na uretra ou, raramente, nos ureteres, causando obstrução. Cálculos na
pelve renal são menos comuns e geralmente não causam sinais observáveis, a
menos que exista uma infecção do trato urinário superior ou lesão suficiente para
produzir insuficiência renal. Ocasionalmente, podem estar associados à pielonefrite,
resultando em hematúria e febre. A obstrução de um ureter pode resultar
em hidronefrose e perda da função do rim ipsilateral. Visto que os sinais clínicos de
disfunção renal não se tornam aparentes até que dois terços do parênquima renal
funcional estejam perdidos, os sinais não serão observados, a menos que ambos
os ureteres estejam obstruídos.
O gotejamento da urina ou da micção em locais incomuns por um animal
habituado a viver dentro de casa indica a possibilidade de cálculos vesicais ou
uretrais. A urina pode ser sanguinolenta e ter um odor forte semelhante à amônia.
Estes sinais podem ser episódicos, iniciando-se abruptamente e diminuindo dentro
de poucos dias sem tratamento, mas recidivam. Geralmente, são os únicos sinais
ocorridos em fêmeas e podem ser os únicos sinais em muitos machos. Contudo, a
obstrução uretral ocorre comumente em machos pode ser súbita ou desenvolver-se
por dias ou semanas. Inicialmente, pode haver tentativas freqüentes de urinar
somente por meio de gotas, um fluxo delicado ou nenhuma eliminação. Os gatos
acometidos podem acocorar-se, fazer esforço grande e lamber o pênis excessiva-
mente.
A obstrução substancial causa uremia, anorexia, desidratação, letargia, depres-
são, e, ocasionalmente, vômito e diarréia. Se a obstrução é completa, coma e morte
seguem-se dentro de 72h. O tratamento deve ser instituído logo após a ocorrência
da obstrução; se houver demora até o animal tornar-se comatoso, as chances de
sobrevivência serão francamente reduzidas. A bexiga distendida pode romper,
embora isso seja mais comum em ruminantes que em cães ou gatos. Por um
pequeno período seguinte à ruptura, o animal pode parecer melhor devido ao alívio
da dor causada pela distensão vesical; contudo, a peritonite e a absorção de restos
metabólicos ocorrem rapidamente, resultando em depressão, distensão abdominal
e morte. O cão ou o gato urêmico raramente sobrevive à restauração cirúrgica de
uma bexiga rompida.
Diagnóstico – Cálculos com um diâmetro > 3mm são geralmente visíveis em
radiografias, e alguns são palpáveis. Os achados clínicos e laboratoriais podem ser
negativos, ou os únicos sinais clínicos podem ser aqueles associados a cistite e
uretrite. Na obstrução uretral, a bexiga é distendida ou rompida; se rompida, não
pode ser palpada, e a urina pode ser prontamente obtida da cavidade abdominal por
meio de paracentese. Se a bexiga não estiver rompida, estará rígida, distendida,
dolorosa e não poderá ser comprimida.
A palpação abdominal é útil na detecção da presença de cistite, ou de cálculos
císticos ou uretrais. A parede vesical pode estar espessada e proporciona uma
sensação de “aspereza” quando palpada. Embora um urólito suficientemente
grande possa ser palpado ou cálculos múltiplos possam ser reconhecidos pela
sua crepitação, não se pode depender da palpação para revelar todos os casos
de cálculos císticos. A detecção e a localização de cálculos uretrais podem ser
realizadas pela passagem de um cateter.
Doenças Não Infecciosas do Sistema Urinário, Pq An 1074

O diagnóstico pode não ser difícil, mas desde que cálculos múltiplos estejam
freqüentemente presentes por todo o trato urinário, um exame radiográfico completo
do trato é indicado. Urinálise, urocultura e antibiograma são muito úteis na determi-
nação do tipo de urólito presente.

Urolitíase canina
As raças predispostas são o schnauzer miniatura, dachshund, dálmata, pug,
bulldog, welsh corgi, basset hound, beagle e terriers. Cães com 2 a 10 anos de idade
são os mais acometidos. A maioria dos urólitos ocorre na uretra; os cálculos renais
respondem por apenas 2 a 8% dos casos, e os cálculos ureterais são raros.
Estimativas de recidiva após o tratamento têm variado de 12 a 75%, mas variam
consideravelmente com a raça, o tipo de urólito e o tratamento. Os urólitos de cães
são constituídos de uma substância química predominante, que em geral identifica
o cálculo nos tipos de 1 a 4: 1. estruvita, (fosfato-magnésio-amônio), com ou sem
fosfato de cálcio (às vezes chamado de fosfato duplo ou triplo, dependendo do
número de cátions presentes); 2. urato, composto de urato-amônio; 3. cistina,
consistindo do aminoácido de cistina; ou 4. oxalato, consistindo de oxalato de cálcio,
magnésio ou amônio. Na maioria dos casos, o tipo de urólito pode ser determinado
como descrito na FIGURA 1. Outros tipos raros consistem de dióxido de silício, fosfato
de cálcio, ou carbonato e xantina. Os urólitos de silicato ocorrem mais comumente
em cães pastores alemães e outras raças de maior porte. Geralmente possuem
espículos que dão a eles o aspecto de pedrinhas usadas em jogos infantis
(“children's jacks”) e são às vezes referidos como “jack stones”.
Uma concomitante infecção do trato urinário (ITU) varia com o tipo de urólito: 50
a 97% de urólitos de estruvita, 3 a 80% de urólitos de urato, e 0 a 50% de urólitos
de cistina; e pode estar presente em cães com urólitos de carbonato ou silicato, mas
raramente naqueles com urólitos de oxalato. Contudo, com todos os urólitos que não
são de fosfato, uma infecção do trato urinário ocorre geralmente como um resultado
dos urólitos e não desempenha um papel na causa ou predisposição de sua
formação; ao contrário, na maioria dos cães com urólitos de estruvita, uma infecção
do trato urinário é importante na indução ou predisposição de sua formação. As
bactérias mais comumente envolvidas são Staphylococcus ou Proteus spp urease-
positivos. A enzima urease aumenta a hidrólise da uréia, a qual eleva o pH urinário
e a quantidade de íons livres de amônio e fosfato para a formação de estruvita.
Os cálculos de urato ocorrem primariamente em dálmatas, mas podem ser
encontrados em outras raças, particularmente se a função hepática está comprome-
tida. A função hepática diminuída prejudica a conversão de amônia em uréia e ácido
úrico em alantoína, resultando em um aumento na excreção urinária de ambos.
Assim, a formação de urólitos de urato de amônio é aumentada. Os dálmatas são
particularmente suscetíveis à formação de urólitos de urato porque, ao contrário dos
outros cães, apresentam pouca quantidade de enzima hepática (uricase) que
converte ácido úrico em alantoína. Todavia, quase 25% dos urólitos ocorridos em
dálmatas são de estruvita.
Os urólitos de cistina ocorrem devido a uma deficiência hereditária na reabsorção
tubular renal de cistina e lisina. A única conseqüência conhecida do aumento dos
níveis urinários destes aminoácidos é a formação de urólitos de cistina. Embora esta
deficiência ocorra tanto no homem como na mulher, em cães ela é ligada ao sexo
e ocorre somente em machos; os animais afetados devem ser afastados da re-
produção. A concentração urinária de cistina ou lisina relativa a creatinina pode
ser mensurada para identificar cães com esta deficiência. Uma concentração de
cistina urinária > 75mg/g de creatinina ou uma concentração de lisina > 25mg/g
de creatinina em cães que não estejam em jejum é indicativa de suscetibilidade à
Doenças Não Infecciosas do Sistema Urinário, Pq An 1075

Cão

Fêmea Macho

80 a 97% são
ESTRUVITAS
< 1 ano > 1 anos Previamente
Dálmatas Não
de idade de idade ocorrido


Desvio portossistêmico Sim Não

Sim Não Dálmatas


Radiodensidade

URATO Não Sim Alta Baixa URATO


ocasionalmente
ESTRUVITA
97% são 23% são Em rins ou ureteres
ESTRUVITAS ESTRUVITAS

77% são Não Sim


URATOS
Cristais urinários presentes Infecção do trato urinário
Não

Infecção do trato
urinário devida a Sim Não Sim
Staphylococcus
ou Proteus spp
Alimentar com a mesma OXALATO ESTRUVITA
dieta geralmente ▼
Sim Não consumida
Não Alimentar com
ESTRUVITA Se previamente Sim esta dieta
ocorrido, se não o
mesmo anterior
Cristais de Cristais de Cristais de Cristais de
estruvita oxalato urato cistina

ESTRUVITA OXALATO URATO CISTINA

Basset, bulldog
chiuaua, terrier
irlandês ou yorkshire
Sim Não pH urinário
após >12h
Incidência em machos adultos fixo

ESTRUVITA ______ 25% __ 50 a 75% ____ Geralmente alcalina


OXALATO ______ 10% __ 10 a 20% ____ Geralmente ácido
URATO _______ 5% ___ 8 a 12% ____ Variável
CISTINA ______ 55% ____ 4 a 6% ____ Ácida
SILICATO ____ 5 a 7% ____ 5 a 7% ____ Geralmente ácido

Se incerto, deve-se obter uma análise quantitativa de urólito ou sedimento pela


centrifugação de 25 a 100mL de urina em um tubo com extremidade coniforme.

F IGURA 1 – Determinação dos tipos de urólitos caninos.


Doenças Não Infecciosas do Sistema Urinário, Pq An 1076

urolitíase por cistina. A excreção de cistina e lisina é a mesma em cães em jejum


afetados e normais.
Qualquer fator que eleve a excreção urinária de cálcio ou oxalato predispõe à
formação de urólitos de oxalato de cálcio. A excreção da cálcio é aumentada por
hipercalciúria primária crônica ou pseudo-absortiva, hiperparatireoidismo, aporte
excessivo de vitamina D, neoplasias osteolíticas, hipercalcitoninismo e lesão tubular
renal proximal.
Tratamento – Em casos de obstrução urinária, se o cão estiver visivelmente
desidratado, letárgico ou comatoso, uma terapia constituída de fluidos e eletrólitos
deve ser instituída imediatamente para estabilizar o animal. A obstrução e a
distensão vesical devem ser aliviadas. A fluidoterapia deve ser continuada até que
o cão esteja se alimentando e bebendo bem.
Uma obstrução do orifício uretral externo pode ser ocasionalmente removida
por massagem cuidadosa. (Se for necessária a anestesia, o animal deverá ser
primeiro bem hidratado. Geralmente, anestésicos inalantes são preferidos. Às
vezes, os cálculos uretrais podem ser deslocados para o exterior por dilatação de
uma porção de uretra com fluido sob pressão e, então, bruscamente eliminados. O
urólito quase sempre pode ser deslocado de volta para o interior da bexiga pelo uso
do maior cateter que possa facilmente transpor o cálculo e introduzido-se uma
mistura estéril de partes iguais de uma solução salina isotônica e um lubrificante
aquoso, enquanto a porção distal do lúmen uretral ao redor do cateter é ocluída. Às
vezes, é útil reduzir a distensão vesical por cistocentese antes da hidropropulsão
dos cálculos uretrais. O cão deve ser acompanhado atentamente por pelo menos 5
a 7 dias, a fim de que uma possível reobstrução possa ser controlada; quando o
animal for enviado para casa, o proprietário deve monitorar a micção e observar
sinais de disúria por muitas semanas.
Remoção do urólito – Em todos os cães com urólitos que não sejam de fosfato
ou em cães com urólitos que não sejam de urato durante a gestação e a lactação,
a remoção cirúrgica dos cálculos e a lavagem da bexiga e uretra com solução salina
isotônica estéril são necessárias. Em cães não gestantes ou não lactantes, os
urólitos de amônio e estruvita podem ser removidos cirurgicamente ou dissolvidos
por alimentação com uma dieta calculolítica (disponível comercialmente*). A disso-
lução assegura que todos os urólitos sejam removidos; minimiza o risco, duração e
pós-operatório envolvidos com a cirurgia; e também é preferida pela maioria dos
clientes. O período para dissolver os urólitos caninos é de 2 a 20 semanas (8
semanas em média); contudo, os sinais clínicos geralmente são minimizados dentro
de 1 semana. A dieta calculolítica é fornecida aos cães jovens somente até que o
cálculo não seja tão visível radiograficamente; os cães adultos devem receber a
dieta por mais 4 semanas. Se o tamanho ou a densidade radiográficos do urólito não
diminuírem no espaço de 60 dias em absolutamente nada, mas a dieta calculolítica
e a água são ingeridas, os urólitos provavelmente não são de estruvita ou urato de
amônio e, portanto, devem ser removidos cirurgicamente e analisados.
Em machos adultos, o tipo provável do urólito presente (FIGURA 1, pág. 1075)
pode ser determinado e o tratamento pode ser selecionado para removê-lo e
prevenir a recidiva. A determinação do tipo de urólito em machos < 1 ano de idade
(com exceção dos dálmatas) e em todas as fêmeas, é necessária somente em casos
recidivantes, pois 97% dos casos nestas duas categorias possuem urólitos de
estruvita, enquanto somente 23 a 60% dos machos adultos afetados apresentam
este tipo de urólito.

* N. do T. – Estas rações não estão disponíveis no mercado brasileiro.


Doenças Não Infecciosas do Sistema Urinário, Pq An 1077

Prevenção – Em outros casos que não os causados por urólitos de cistina,


apenas 20 a 30% dos casos de urolitíase recorrem e o tratamento médico e dietético
para prevenção não é garantido. Após a dissolução dietética ou remoção cirúrgica
de urólitos recidivantes, uma dieta com restrição mineral e proteica é indicada;
durante a gestação ou a lactação, uma dieta com menos restrições bastará (ambas
as dietas estão disponíveis comercialmente*). Se houver recidiva quando apenas
uma dieta restritiva e água estiverem sendo ingeridas, os seguintes procedimentos
deverão instituídos: 1. para urólitos de estruvita, manter uma dieta exclusivamente
calculolítica; 2. para urólitos de urato ou cistina, administrar, VO, 1g (1⁄4 de colher de
chá)/5kg de peso corporal de bicarbonato de sódio a cada 6 a 8h, e adicionar 2g) 1⁄2
colher de chá)/10kg de peso corporal/dia de sal na comida. Se eles recidivarem com
a dieta restritiva (com a administração de sal e bicarbonato de sódio), alopurinol é
dado 10mg/kg 3 vezes/dia por um mês, diariamente, desde então; se os urólitos de
cistina recorrerem, devem-se administrar 10 a 30mg/kg/dia de D-penicilamina,
dividida em pelo menos 2 doses e adicionada aos alimentos para prevenir os
vômitos.

Urolitíase e síndrome urológica felinas


É uma patologia comum que ocorre com igual freqüência em ambos os sexos.
As manifestações clínicas podem divergir: a obstrução uretral é comum no macho
e a cistite e a uretrite, na fêmea. A maioria dos casos ocorre em gatos domésticos,
com o primeiro episódio manifestando-se de 1 a 6 anos de idade.
Acima de 90% de todos os urólitos em gatos são exclusiva ou primariamente de
estruvita (amônio-magnésio-fosfato), ocasionalmente com quantidades menores
de fosfato de cálcio (apatita), oxalato de cálcio ou urato de amônio, e 0 a 5% de matriz
orgânica. Estes cálculos podem-se assemelhar à areia. Os cálculos císticos e renais
discretos são menos comuns. De 0,5 a 3% dos urólitos são de urato e oxalato, 3 a
5% são tampões gelatinosos. Estes tampões diferem dos urólitos, de modo que
abrangem uma maior quantidade de matriz orgânica, o que lhes confere um
aspecto de pasta de dente de consistência compressível; eles localizam-se na
uretra, geralmente perto do orifício uretral. O mineral presente em 99% destes
tampões é 80% a 100% estruvita. O 1% restante inclui fosfato de cálcio primariamen-
te ou oxalato de cálcio. Urólitos de carbonato de cálcio são raros, e urólitos de silicato
e cistina não têm sido relatados.
Etiologia – A infecção, embora presente em , 5% dos casos, geralmente é um
resultado da patologia e não uma causa. Uma redução na atividade física, a qual
freqüentemente diminui o consumo de água e a freqüência de micção, predispõe à
urolitíase. Fatores redutores da atividade física incluem castração, confinamento,
condições climáticas adversas, enfermidades e obesidade.
Estudos indicam que a urolitíase felina pode ser produzida pelo fornecimento
de dietas ricas em magnésio, presumivelmente porque induzem a formação de
cálculos de estruvita. Embora o papel do magnésio dietético em excesso na
“ocorrência natural” da doença permaneça discutível e outros fatores possam estar
bem envolvidos, é prudente restringir o consumo de magnésio pelos gatos.
Embora relate-se que a ocorrência de urolitíase é mais provável quando é fornecida
ração seca em vez de enlatada, isso não é devido às diferenças no conteúdo aquoso
e não é válido para todas as rações secas. Comparada à ração comercial enlatada
normal para gatos, a ração seca normal é inferior em gordura, digestibilidade e calorias,
sendo superior em fibras que aumentam o volume fecal e conseqüentemente a

* N. do T. – Estas rações não estão disponíveis no mercado brasileiro.


Doenças Não Infecciosas do Sistema Urinário, Pq An 1078

excreção fecal de água, a qual diminui a produção urinária. A densidade calórica inferior
da ração e o consumo maior pelo gato favorecem o aumento do aporte de magnésio e
reduzem o volume urinário e, conseqüentemente, concentram o magnésio urinário.
Algumas rações secas para o gato são mais altas em digestibilidade e conteúdo calórico
e mais baixas em fibra e magnésio que a maioria das rações enlatadas e portanto são
menos prováveis na indução da urolitíase. Miligramas de magnésio por 100kcal são o
melhor caminho para avaliar as diferentes comidas felinas.
Tratamento – A terapia à base de fluidos e eletrólitos deve ser instituída e a
obstrução removida, como descrito para o cão (ver adiante). Os sinais clínicos na
maioria dos casos, se devidos a obstrução uretral ou cistite, que resultam comu-
mente em polaciúria e hematúria, são conseqüentes a cálculos e cristais no trato
urinário. Para minimizar estes sinais, o cálculo deve ser removido; uma dieta cal-
culolítica é o melhor método, sendo também o preferido pela maioria dos proprie-
tários. Desde que uma dieta contenha ≤ 15mg de magnésio/100kcal e na ausência
de infecção do trato urinário mantenha o pH urinário ≤ 6,0, isso leva à dissolução de
todos os urólitos. Embora na maioria dos casos mesmo os cálculos maiores não
sejam tão visíveis radiograficamente depois de 1 mês nesta dieta, é recomendado
que ela seja mantida por 2 a 3 meses. A administração de acidificantes urinários é
contra-indicada, assim como a administração suplementar de sal, pois isso aumen-
ta a ingestão de água e o volume urinário. O consumo de suplementos vitamínico-
minerais ou de qualquer outra ração reduzirá ou não promoverá a dissolução dos
cálculos. A infecção do trato urinário geralmente não ocorre, mas, se presente,
deverá ser tratada como descrito para o cão (ver pág. 1056).
Prevenção – A urolitíase afeta 1 a 10% de todos os gatos e recidiva em 50 a 70%
daqueles previamente afetados e alimentados regularmente com rações comerciais.
Contudo, tanto a ocorrência como a recidiva podem ser prevenidas na maioria dos
animais, fornecendo-se somente dietas que contenham < 20mg de magnésio/100kcal
e que não aumentem o pH urinário para > 6,4. Estas podem ser compradas comercial-
mente ou podem ser preparadas a partir de rações caseiras (ver TABELA 1, adiante).
Uretrostomia perineal, aumento no consumo de sal para elevar a produção
urinária ou fornecimento de um acidificante urinário não evitarão recidiva em muitos
casos se o regime dietético não for instituído e serão desnecessários quando uma
dieta hipomagnésica e não alcalinizante for consumida. O fornecimento contínuo de
uma dieta calculolítica é necessário em casos raros que recidivam mesmo com
dietas preventivas.

TABELA 1 – Dieta Caseira para Controle e Prevenção da Síndrome Urológica Felina


450g de carne bovina moída (não incluindo a carne de cernelha),
levemente cozida e sem retirar a gordura
110g de fígado, cru ou levemente cozido
1 xícara (230g) de arroz cozido
1 colher de chá (5mL) de óleo de cozinha
1 colher de chá (5g) de rocha calcária (carbonato de cálcio), casca de ovo moída ou 8
comprimidos antiácidos para o estômago
60 a 90mL de água, que pode ser adicionada durante o preparo se o gato
preferir comida suculenta
Misture todos os ingredientes
Rendimento: 800g
Fornecer 110 a 230g/gato/dia
Adaptado de Veterinary Medicine/Small Animal Clinician, 79:334, 1984.
Doenças Não Infecciosas do Sistema Urinário, Gr An 1079

DOENÇAS NÃO INFECCIOSAS DO SISTEMA


URINÁRIO, GR AN
UROLITÍASE
Ver páginas 1072 a 1074, uma introdução à urolitíase em grandes e pequenos
animais.

Urolitíase em ruminantes
A formação de cálculos no trato urinário de bovinos, ovinos e caprinos é
primariamente uma doença metabólica. Esta patologia é comum em ruminantes,
incomum em eqüinos e rara em suínos. A oclusão da uretra por cálculos causa
retenção urinária, dor abdominal, distensão e ruptura da uretra ou bexiga, com morte
por uremia ou septicemia secundária. A urolitíase é uma importante patologia de
animais destinados à engorda, contudo um número significante de casos também
ocorre em animais adultos de reprodução. A urolitíase clínica é vista mais freqüen-
temente durante os meses de inverno em novilhos e carneiros castrados criados
com ração abundante, ou em pasto de inverno onde as condições climáticas severas
ocorrem com consumo limitado de água, especialmente de água que possa ter um
conteúdo mineral elevado.
A urolitíase não tem uma distribuição geográfica específica e os diferentes tipos
de cálculos refletem a distribuição mineral da alimentação. Os cálculos desenvol-
vem-se em machos e fêmeas similarmente, mas a urolitíase ocorre principalmente
em machos devido às diferenças anatômicas e hormonais. A urolitíase pode ocorrer
numa variedade de condições ambientais e em animais de todas as idades.
Etiologia e patogenia – A incidência nos EUA é maior em bezerros, cordeiros
ou cabritos que foram submetidos à castração em uma idade precoce e são
alimentados com uma dieta rica em grãos com uma proporção mais ou menos de
1:1 de cálcio para fósforo ou uma dieta rica em magnésio. A urolitíase em ruminantes
geralmente possui uma origem nutricional, os cálculos de estruvita estão associa-
dos com dietas ricas em grãos de cereais, e os cálculos de sílica com o pastejo em
solos ricos nessa substância.
Em condições de pasto seco, onde a pastagem ou cereais fenados constituem
a dieta básica, cálculos de silicato são comumente formados. As dietas ricas em
cálcio, por exemplo, o trevo subterrâneo, produzem cálculos de calcita. Plantas, tais
como o Halogeton ou as extremidades da beterraba doce comum, ricas em oxalato,
podem contribuir na formação de cálculos de calcita ou “weddelite”. A análise
do núcleo dos cálculos anteriormente mencionados sugere que a precipitação do
mineral específico envolvido inicie a formação de cálculo. O cálculo mais comum em
animais destinados à engorda que recebem rações ricas em concentrado com
composição mineral precariamente balanceada (alta em fósforo e baixa em cálcio)
é o tipo estruvita, contendo fosfatos de cálcio, de magnésio e de amônio. Nestes
casos, mucoproteína, cilindros celulares ou células epiteliais podem estar envolvidos
na formação de cálculo. A formação de cristais a partir de compostos na urina
normalmente ocorre como conseqüência de fatores fisicoquímicos, como alterações
na concentração e pH da urina. Muitos componentes da urina são mantidos em
suspensão coloidal; a ruptura deste equilíbrio resulta em precipitação destes compo-
nentes. As mucoproteínas e os mucopolissacarídios contribuem para a formação de
urólitos de carbonato de cálcio, sílica, fosfato de amônio e magnésio e fosfato de
magnésio, e podem ser o principal responsável pela formação de urólitos.
A composição mineral da água, em conjunto com o desequilíbrio de mineral da
dieta, provavelmente contribui mais para o início da formação do cálculo do que para
Doenças Não Infecciosas do Sistema Urinário, Gr An 1080

a redução no consumo da própria água; o consumo de água limitado não provou ser
calculogênico.
A castração de machos jovens retira a influência hormonal necessária para o
desenvolvimento completo do pênis e da uretra. Os cálculos variam em tamanho e
forma, de um material pequeno, liso e granular às pedras grandes e multinucleadas.
Quando eliminados, estes cálculos não causam problema na fêmea, mas podem
irritar a mucosa delicada da uretra de machos jovens. A flexura sigmóide em bois,
e além desta estrutura o processo uretral em carneiros e bodes são os sítios mais
comuns para o cálculo se localizar. A irritação neste sítio de localização causa
inflamação e restrição, e oclui a uretra. Com o passar do tempo, pode aumentar a
constrição da uretra que já é pouco desenvolvida.
Achados clínicos – O primeiro sinal clínico tanto da oclusão parcial quanto da
completa é a disúria, manifestada por desconforto abdominal. Os animais tornam-
se inquietos, contorcem-se, golpeiam o abdome e fazem tentativas freqüentes de
micção. Em carneiros e bodes, as tentativas de micção são acompanhadas por
movimentos rápidos da cauda. Em novilhos, a cauda apresenta-se elevada e a
pulsação apenas da uretra ventral ao reto é freqüentemente observada. Em
novilhos, o prolapso retal pode ser uma seqüela do esforço.
Antes da oclusão completa, a urina pode gotejar pela uretra, secando nos pêlos
prepuciais e levando a depósitos minerais. Se a condição não for corrigida, o animal
se isolará, recusará beber ou comer, se tornará urêmico e morrerá. O curso da
patologia pode levar de 5 a 7 dias.
Lesões – Em casos de ruptura uretral, os tecidos circundantes estarão hemor-
rágicos e necróticos e a urina infiltrar-se-á no tecido subcutâneo. A abertura da uretra
poderá exibir ≥ 1 cálculo; pode ser necessária a dissecação da uretra para localizar
a oclusão. Em casos de ruptura da bexiga, a cavidade abdominal estará preenchida
pela urina.
Diagnóstico – No princípio, os sinais clínicos promovem um diagnóstico,
embora possam ser confundidos com cólica aguda devido a outro tipo de dor
abdominal ou a infecções do trato urinário, devendo ser excluídos por um exame
físico cuidadoso. A indigestão, o consumo de grandes quantidades de água gelada,
estase ou obstrução do trato GI, enterites primárias, úlceras abomasais, conccidiose
e outras desordens abdominais podem causar sensibilidade abdominal. A hipersen-
sibilidade na região da flexura sigmóide pode ser evidente, e a palpação profunda
pode localizar a dilatação resultante da obstrução. Um exame do processo uretral
em carneiros ou bodes pode identificar o cálculo oclusor. Se os sinais clínicos iniciais
não ocorrerem, o animal poderá mostrar apenas depressão e anorexia com edema
subcutâneo ao longo do pênis com preenchimento do abdome por urina. A distensão
abdominal devida à presença de urina deve ser diferenciada de timpanismo ruminal,
peritonite difusa, tumores da cavidade peritoneal e obstruções do trato GI. O
balotamento permite detecção do fluido, e observando-se o animal por trás, o
abdome mostra-se periforme. A confirmação é obtida pelo exame do fluido abdomi-
nal coletado por paracentese. O edema subcutâneo ao longo do prepúcio e abdome
ventral devido à ruptura da uretra deve ser diferenciado de lesão traumática,
abscessos subcutâneos e hérnias umbilicais ou ventrais. Em animais reprodutores,
lacerações do prepúcio, com conseqüente prolapso e infecção deste, e hematoma
do pênis devem também ser diferenciados. Nestes casos, os níveis elevados de
creatinina sérica ou um aumento do uréico nitrogênio sangüíneo auxiliarão no
diagnóstico diferencial.
Tratamento e controle – A intervenção cirúrgica no caso de urolitíase em
novilhos é economicamente possível; contudo, o valor de um carneiro castrado pode
limitar o procedimento cirúrgico que simplesmente extirpa o processo uretral com
tesoura. O procedimento cirúrgico para cálculos localizados na região da flexura
Doenças Não Infecciosas do Sistema Urinário, Gr An 1081

sigmóide é o mesmo para bovinos, ovinos e caprinos. A contenção apropriada, a


tranqüilização e um anestésico regional são necessários antes da cirurgia. A técnica
cirúrgica pode variar, mas exige a exteriorização do pênis na porção proximal da
flexura sigmóide. Em casos iniciais, os cálculos podem ser palpados e removidos
por simples incisão na uretra. Se a uretra estiver visível, ela pode ser suturada e
retorna à posição normal com um simples fechamento da pele. Em casos mais
complicados, pode ser necessário amputar o pênis proximal à flexura sigmóide ou
na região perineal.
Em casos de ruptura uretral, a urina subcutânea deve ser escoada; isto é
feito lancetando-se e pele sobre a área de acúmulo de urina. Anti-sépticos tópicos
e repelentes de mosca podem ser aplicados nestas lacerações ventrais. Os anti-
bióticos parenterais são recomendados para evitar infecção em todos os casos
cirúrgicos. As soluções de eletrólitos ou de dextrose são administradas para cor-
rigir a desidratação e promover o fluxo urinário, se necessário. O tratamento para
ruptura de bexiga exige estabelecimento da capacidade de urinar, proporcionan-
do cicatrização da bexiga e corrigindo a uremia. O uso de um trocarte para escoar
a urina da cavidade peritoneal auxilia na redução da uremia. Uma uretrostomia de-
verá ser executada para fornecer passagem livre de urina. As tentativas de
reparar a bexiga rompida são em geral malsucedidas. A cicatrização espontânea
da bexiga ocorre freqüentemente após uretrostomia e remoção do fluido abdomi-
nal, embora estes animais mostrem-se melhor recuperados dentro de 3 a 4 meses
para evitar complicações adicionais. Em alguns casos de ruptura de bexiga
tratados por paracentese e uretrostomia, não ocorreu eliminação da urina dentro
de 48h após a cirurgia; a urina reacumula na cavidade peritoneal devido à falha
na cicatrização da bexiga. Tais animais podem ser tratados pela execução de
uma cistotomia, suturando-se um dreno plástico dentro da bexiga e depois ex-
teriorizando-se a outra extremidade do tubo através da parede abdominal ventral
posterior. Antibióticos e fluidoterapia devem ser empregados após este procedi-
mento para evitar infecção e choque. Estes animais deverão estar recuperados
dentro de poucos meses. Ocasionalmente, animais não tratados são examina-
dos, apresentando ruptura de bexiga e uremia severa. O tratamento pode ser
tentado, mas o prognóstico é ruim.
A quimioterapia tem respondido com sucesso limitado e deve ser feita antes
da obstrução completa. Em casos iniciais, relaxantes de musculatura lisa asso-
ciados a agentes antiinflamatórios podem ser úteis. Cristais de estruvita associa-
dos às rações ricas em grãos são solúveis em um pH <6,8. O jejum alimentar por
24h em associação com dosagem oral de cloreto de amônio (7 a 10g/cabeça/dia
para um cordeiro ou cabrito de 30kg, ou 56 a 80g para um novilho de 240kg) pode
acidificar a urina. A acidificação da urina deverá ser mantida por ≥ 1 semana após
o tratamento cirúrgico devido à provável presença de cálculos múltiplos na
bexiga.
O conhecimento da composição e da etiologia do urólito envolvido é necessário
para o estabelecimento de um programa preventivo apropriado. Os cálculos mais
comuns em novilhos, carneiros castrados, cordeiros e cabritos nos EUA estão
associados a rações ricas em grãos com fósforo dietético elevado. Desde que uma
ração contenha uma proporção de cálcio para fósforo de 2:1, ocorrerá uma grande
redução da incidência de urolitíase em animais destinados à engorda. A adição de
1 a 4% de sal na ração mostrou-se eficaz. Rações com 9% de sal podem
ser fornecidas antes do consumo alimentar ou se o ganho de peso for afetado;
alternativamente, o cloreto de amônio a 2% pode ser adicionado. Uma dieta bem
balanceada, que inclua quantidades adequadas de vitamina A junto com um
suprimento grande de água, é sugerida.
Doenças Não Infecciosas do Sistema Urinário, Gr An 1082

Urolitíase em eqüinos
Trata-se de uma condição metabólica incomum em eqüinos que determina si-
nais de disúria e cólica e é caracterizada pela formação de cálculo, que envolvem
primariamente a bexiga. Embora seja diagnosticada onde quer que os cavalos
sejam criados, as variações na distribuição de minerais e seus desequilíbrio
(refletidos nas forragens, concentrados e água) podem influenciar a incidência
de urolitíase e o tipo de cálculo formado. Aproximadamente 99% dos casos de
urolitíase em eqüinos são devidos a cálculos císticos, mais comumente diagnosti-
cados em machos adultos; na maioria dos casos ocorre em animais castrados. As
diferenças anatômicas entre os sexos provavelmente justificam a variação na
incidência. A uretra do macho é comprida e sinuosa e há constrição do arco isquiá-
tico. As obstruções podem ocorrer em qualquer lugar, mas são mais freqüentes no
ponto da entrada pélvica.
Etiologia – A etiologia específica dos cálculos urinários é desconhecida. Dois
tipos quimicamente semelhantes (carbonato de cálcio) ocorrem: um cálculo áspero,
espiculado e com projeções de firmeza moderada e, em menor freqüência, um
cálculo mais firme e liso.
A urina eqüina normal contém quantidades significantes de cristais e mucopro-
teínas que podem funcionar como uma substância ligadora dos cristais de
carbonato de cálcio. Caracteristicamente, a urina eqüina tem um pH alcalino, o
qual, junto com o conteúdo mineral elevado, pode favorecer a cristalização e a
precipitação mineral. O núcleo para a formação do cálculo pode ser células
epiteliais descamadas ou grumos de mucos. As influências alimentares, tais
como rações concentradas ricas em fósforo e pobres em cálcio, que predispo-
nham à formação de cálculo em ruminantes, não foram estabelecidas em
eqüinos.
Achados clínicos – Os sinais clínicos da urolitíase dependem da localização do
cálculo. A maioria dos cálculos está localizada na bexiga e causa sinais de disúria,
hematúria, estrangúria e polaciúria. A hematúria ocorre mais freqüentemente após
exercício ou no final da micção; outro sinal físico inclui uma posição de esforço
durante a micção. Esta posição pode ser mantida por algum tempo após a micção
e pode ser acompanhada por esforços e gemidos audíveis. A fêmea pode gotejar
urina, a qual irritará o períneo; animais castrados e garanhões podem protrair o
pênis com gotejamento intermitente de urina. A oclusão uretral geralmente é
acompanhada por inquietação, vários graus de cólica e tentativas freqüentes de
urinar. A bexiga encontra-se distendida às palpação retal. Na maioria dos casos
fatais, um único urólito grande, ocasionalmente com urólitos menores, é encon-
trado na bexiga; menos freqüentemente, o urólito pode ser encontrado localizado
no colo da bexiga ou arco isquiático. Raramente são encontrados cálculos na pelve
renal.
Diagnóstico – A anamnese e os sinais clínicos permitem uma tentativa de
diagnóstico. A confirmação pode ser feita por uma combinação de palpação retal,
cistoscopia e cateterização. A localização de uma massa ovóide firme no e
próxima ao colo da bexiga pela palpação retal pode ser o único procedimento
necessário. Se a bexiga estiver distendida, uma cateterização facilitará a palpa-
ção; isso também poderá eliminar as estenoses uretrais e a impactação de
esmegma do seio uretral ou localizará o urólito. A cistoscopia utilizando unidade
de fibra óptica flexível contribuirá muito no diagnóstico e avaliação do prognós-
tico.
Tratamento – Na maioria dos casos, os cálculos vesicais devem ser removidos
cirurgicamente e um bom pós-operatório cuidadoso é necessário. Antibióticos,
diuréticos e acidificantes urinários podem contribuir na recuperação.
Doenças Não Infecciosas do Sistema Urinário, Gr An 1083

UROPERITÔNIO EM POTROS
(Ruptura da bexiga)
O uroperitônio ocorre em potros neonatos como um resultado da saída de urina
através das rupturas na parede dorsal ou ventral da bexiga ou através do úraco. A
ruptura pode resultar desde um trauma do parto a uma distensão na bexiga, mas
geralmente não há história de nascimento difícil ou anormal; algumas anomalias
podem ser congênitas. A condição é muito mais prevalente em machos.
Geralmente, os sinais clínicos manifestam-se no segundo ou terceiro dia de vida
e aumentam com severidade durante vários dias. Há prostração associada a uma
progressiva redução das mamadas. O potro assume posição de urinar freqüente-
mente, mas há eliminação de apenas pequenas quantidades de urina. Entretanto,
o uroperitônio pode estar presente em potros que parecem urinar normalmente.
Podem ser observadas taquicardia e taquipnéia. Com a evolução, ocorre aumento
na distensão abdominal. Uma onda de fluido algumas vezes pode ser detectada por
rechaço. Alguns potros observam periodicamente o flanco. A paracentese abdomi-
nal fornece um fluido amarelo-pálido transparente com baixa densidade específica
e contagem celular.
As maiores alterações na bioquímica sangüínea são hipercalemia, hiponatre-
mia e hipocloremia. A uréia e a creatinina sérica podem estar normais ou elevadas.
Um diagnóstico positivo pode ser feito comparando-se os níveis de creatinina: no
uroperitônio, a creatinina do líquido peritoneal é no mínimo 2 vezes o valor da
creatinina sérica. Outro teste diagnóstico simples é a injeção 10mL de uma solução
de azul de metileno no interior da bexiga, via cateter urinário, e a observação do
corante no líquido peritoneal coletado por paracentese abdominal 15min depois. O
diagnóstico diferencial inclui retenção de mecônio, septicemia e síndrome do mal-
ajustamento neonatal (ver pág. 738).
O tratamento é feito por cirurgia corretiva. Devido à hipercalemia e à hiponatre-
mia, arritmias cardíacas são comuns quando potros com uroperitôneo são aneste-
siados. Desequilíbrios de fluidos e eletrólitos devem ser corrigidos antes da
anestesia. Alta concentração de potássio sérico pode ser corrigida pela administra-
ção EV de salina normal, bicarbonato de sódio e dextrose a 5%. Nos casos severos
de hipercalemia pode ser necessária também a administração de insulina ou a
diálise peritoneal.
PARTE II

COMPORTAMENTO
MANUTENÇÃO ............................................................................................. 1086
Geral .................................................................................................. 1086
Reação ............................................................................................... 1087
Variedades de Comportamento Reativo .................................................. 1089
Comportamento Reflexo .................................................................... 1089
Comunicação e Vocalização .............................................................. 1089
Reatividade Submissa e Preventiva .................................................. 1089
Reatividade Agonística ...................................................................... 1090
Ingestão ............................................................................................. 1091
Cuidado Corporal ............................................................................... 1092
Movimento .......................................................................................... 1093
Comportamento Exploratório ............................................................. 1093
Comportamento Territorial ................................................................. 1094
Descanso e Sono ............................................................................... 1095
Associação ......................................................................................... 1095
Aspectos de Sanidade da Manutenção ............................................. 1096
COMPORTAMENTO SOCIAL E AFILIAÇÃO ............................................... 1097
RELAÇÕES SOCIAIS ENTRE O HOMEM E OS ANIMAIS .......................... 1098
COMPORTAMENTO SOCIAL DAS ESPÉCIES ........................................... 1099
Comportamento Social dos Cães ............................................................ 1099
Comportamento do Filhote ................................................................ 1100
Comportamento Social dos Gatos ........................................................... 1101
Comportamento Social dos Grandes Animais ......................................... 1102
Comportamento Social das Galinhas ...................................................... 1102
Comportamento Social dos Perus Domésticos ....................................... 1103
Comportamento Social dos Patos ........................................................... 1104
COMPORTAMENTO REPRODUTIVO .......................................................... 1104
Fêmea ..................................................................................................... 1104
Macho ..................................................................................................... 1105
Comportamento Coital ............................................................................. 1106
Características do Comportamento Reprodutivo em Aves Domésticas .. 1108
ESTRESSE COMPORTAMENTAL ............................................................... 1108
Controle de Síndromes Comportamentais ............................................... 1114
Síndromes .......................................................................................... 1115
SANIDADE ANIMAL ..................................................................................... 1126
Introdução ................................................................................................ 1126
Características ......................................................................................... 1127
Objetivos .................................................................................................. 1129
Comportamento 1086

COMPORTAMENTO
MANUTENÇÃO
Muito organizado, o comportamento “padrão” é reconhecido em animais domés-
ticos e de laboratório como parte importante de sua programação genética relacio-
nada à manutenção. Ações cinéticas, ingestivas e reativas inerentes representam
atividade comportamental importante; estas incluem reação, ingestão, cuidado
corporal, movimento, exploração, territorialismo, descanso e associação. Podem
ser expressas regularmente, ou de acordo com a necessidade das circunstâncias,
ou ainda, podem-se sobrepor a fim de serem expressas simultaneamente, ou de
serem substituídas de acordo com as exigências de bem-estar. Esta interação
de várias modalidades etiológicas como método principal de integração entre o
animal e o ambiente pode ser descrita como um ecossistema.
O comportamento de manutenção, muito do qual é geneticamente determinado,
é motivo de trabalho, um fator biológico de suma importância como meio de tática
de existência. A homeostasia comportamental, assim como a física, determina a
aptidão biológica do animal no ambiente ao qual ele tem de se adaptar. Assim, o
comportamento típico de uma espécie contribui para a aptidão biológica de forma
que tais aptidões e produtividade estejam em considerável associação.
A maior parte da produção animal é baseada em manutenção. Por exemplo, a
produtividade depende do comportamento ingestivo e de autopreservação eficien-
tes: a seleção para o crescimento pode ser baseada grandememente na seleção de
comportamento ingestivo. O comportamento de produção, entretanto, não é isolado;
o comportamento é uma seqüência de componentes. Os comportamentos espacial
e social inatos representam outras atividades comportamentais importantes, que
podem ser vistas como necessidades etológicas adicionais no interesse da integri-
dade funcional do animal e sua harmonia com as circunstâncias da domesticação.

Geral
Várias formas de comportamento de manutenção servem a vários propósitos. As
reações são usadas pelos animais como precauções de segurança, formas de
expressão e manifestação de sua presença, estado e intenção hipotética. São
formas importantes de comunicação entre animais, a base de um estado equilibrado
de entendimento. Grande parte do comportamento de consumação, logicamente,
relaciona-se à manutenção. O movimento é um componente importante do estímulo
equilibrado que um animal exige. A liberdade substancial de movimento, o uso do
ambiente e a associação com os outros são claramente exigidos para produzir uma
variedade de atividades comportamentais incluídas nos comportamentos de manu-
tenção.
Os comportamentos de manutenção devem ser restritos a um certo grau em
sistemas protetores de criação, por exemplo, o comportamento ingestivo é inibido
em ungulados, os quais são geneticamente codificados para pastar e procurar
alimento, ao passo que o confinamento proíbe tal comportamento. A criação
restritiva também reduz a atividade afiliativa e, como resultado, os animais confina-
dos não podem sempre expressar harmoniosamente um comportamento social
organizado. Uma vez que alimento e abrigo são providenciados, os animais não
requerem o uso de todos os comportamentos de manutenção que não são, ou
podem não ser, exibidos nestas circunstâncias; entretanto, estes ainda devem ser
reconhecidos em produção animal desde que surja a questão se tais comportamen-
tos normais podem ser “inibidos” quando a sua manifestação é bloqueada, e então
ser expressos em momentos inapropriados.
Comportamento 1087

A homeostasia etológica tipicamente envolve multissistemas ligados ao compor-


tamento, resulta da motivação variada e providencia manutenção com sucesso (ver
TABELA 1). Atividades autodeterminantes são quase sempre complexas e envolvem
comportamento intencional, por exemplo, a procura associa, seleção de comida,
escolha de locais para descanso e excreção, e desenvolvimento arranjos sociais.
Estas atividades contribuem para a função composta do animal, da qual o propósito
é a integração do animal com seu ambiente. As manifestações refletem necessida-
des comportamentais com variabilidade de animal para animal e de momento para
momento.
Os animais buscam homeostasia não apenas para comer, beber e socializar,
mas também para recompensar um ambiente “enfadonho” por um menos monóto-
no, ganhar acesso a companhias sociais quando mantidos em confinamento
solitário e evitar a dor e extremos ambientais. Enquanto um estímulo exagerado
pode agir como agente estressante, os animais também podem-se esforçar para
evitar um estímulo muito leve. Assim sendo, em alguns tipos de criação, a
subestimulação é tão estressante quanto a superestimulação.

Reação
O comportamento reativo é uma classe primária de atividades utilizadas pelos
animais para mantê-los em harmonia com o seu ambiente e ajustá-los a mudanças
ambientais súbitas que são efetiva ou potencialmente prejudiciais. Estão incluídos
o comportamento reflexo, a comunicação, as reações preventiva e submissa e o
comportamento agonístico. Todos se relacionam às muitas circunstâncias rotineiras
como parte do manejo normal de animais de fazenda.
As formas de comportamento que são um resultado de animais associados a
outros são variadas, e mostram o substrato das atividades sociais na vida em
rebanho. Devido ao fato do confinamento reduzir a oportunidade para atividades
sociais, os de animais confinados não podem ser capazes de expressar seu
altamente organizado comportamento social normal; daí, tal oportunidade ser um
componente importante da saúde animal.
A sensação de movimento é uma exigência importante de animais para a
manutenção de um relacionamento funcional com o seu ambiente. O esforço
muscular que acompanha o movimento voluntário é hoje considerado como uma
exigência sensorial de função animal. O sistema sensorial cinético responde ao
estresse mecânico devido à gravidade agindo no corpo de acordo com mudanças
no movimento e posição. Este é um componente do arsenal de estímulos para que
o animal crie uma mistura de sensações.
O fenômeno total de reatividade é um comportamento estímulo-dependente e
portanto funciona como uma chave importante através da operação dos sentidos.
Os órgãos dos sentidos detectam estímulos específicos e gerais e os transferem,
aos receptores internos no sistema nervoso; quando devidamente sensibilizado,
direcionado e acionado, o comportamento reativo aparece como resposta motora.
O movimento resultante abrange várias formas, da atividade reflexa no nível da
medula espinhal, até toda uma série de ações conativas com informação sensorial
processada no nível cortical. As ações conscientes estão envolvidas em muitas
reações ambientais, tais como a escolha de comida e abrigo.
Muito da reatividade é influenciado pelo sistema nervoso autônomo. Os efeitos
comportamentais principais de estimulação simpática relacionam-se aos estados
de medo ou raiva, e preparam o animal para “lutar ou fugir”. Alterações fisiológicas
específicas resultantes da estimulação simpática incluem pressão sangüínea e
batimentos cardíacos aumentados, expansão dos tubos brônquicos e supressão da
atividade gastrointestinal, tudo isso assegurando boa oxigenação da musculatura
Comportamento 1088

TABELA 1 – Características de Homeostasia Comportamental Relacionadas à Manutenção


Categoria
Características primárias Características secundárias Papel na manutenção
comportamental
Cuidado corporal Limpeza, procura de conforto Evacuação, modos de comporta- Três funções homeostáticas de higiene superfi-
mento excretório cial, excreção e estado confortável são bási-
cas para a saúde
Movimento Alterações de posição e postura, Brincadeira e espreguiçamento Certos processos de movimento exigem expres-
movimentos de exercício são regular para manter a aptidão
Exploração Esforços investigativos e atencio- Atividades empíricas em geral Estímulo, com quantidade e variabilidade, neces-
sidade sário para satisfação sensorial e aprendizagem
Territorialismo Utilização de espaço individual para Comportamento possessivo no cui- Necessidades espaciais são tanto quantitativas
funções básicas dado do abrigo e alimentação como qualitativas para várias exigências de
automanutenção, por exemplo, nutrição, abri-
go, defesa, reprodução
Repouso Sonolência, repouso e sono em Inatividade em várias posições Autoconservação física, restauração fisiológica
decúbito em fases diurnas
Associação Ligações; atos sociais positivos, por Socialização, afinidade de grupo Associação a grupo social e estabilidade de
exemplo, afiliação interação
Comportamento 1089

para ação instantânea. O sistema nervoso autônomo também age como integrador
comportamental; todo o seu papel se resume na modulação e elaboração da
intensidade das respostas comportamentais, em geral, e comportamento emocional
em particular.

VARIEDADES DE COMPORTAMENTO REATIVO


Algumas reações são autodeterminantes, outras são genéricas; a maior parte
delas são respostas corporais, outras são vocais; algumas são positivas, algumas
são negativas. Entre as várias formas, várias classes importantes de reatividade
podem ser reconhecidas, incluindo: 1. ação reflexa; 2. comunicação e vocalização;
3. resposta a fatores ambientais específicos (inclusive sazonais); 4. reação preven-
tiva; 5. reação reprodutiva; 6. reação agonística. Algumas reações envolvem
combinações destas categorias.

Comportamento reflexo
Muitas formas de comportamento reativo ocorrem como simples reflexos, por
exemplo, extensão ou retração de um membro em resposta à dor local. A reação
à dor, junto com a sensação (de alguma forma), pode estabelecer a base do
sofrimento. Os reflexos dos membros têm funções protetoras ou posturais. A
evacuação reflexa (envolvendo defecação ou micção súbitas) é comum, por
exemplo, em bovinos e ovinos seguindo-se a uma invasão de seu espaço
individual. Os esforços reflexos de fuga são prontamente vistos em animais postos
subitamente em contenção fechada. A vocalização reativa ocorre imediatamente
após a separação de pares formados e em outras formas de rompimento de grupo.
Os reflexos de orientação podem ser negativos, como quando os bovinos direcionam
seus quartos traseiros em direção à chuva em curso. O papel homeostático da
reatividade coletivamente compreende uma grande variedade de comportamen-
tos que ocorrem como respostas reativas.

Comunicação e vocalização
Sons vocais, individual e coletivamente, podem ser de considerável uso nos
ajustes dos animais às suas circunstâncias. A comunicação, que usa linguagem
corporal e fonação em vários graus, é uma característica importante de reatividade.
A vocalização, particularmente em reatividade social, é uma característica de
comunicação; por exemplo, sinais vocais ocorrem como trocas entre mãe e neonato,
entre macho e fêmea reprodutores, e por indivíduos ligados quando separados. À
medida que a reatividade aumenta, as vocalizações tendem a aumentar em volume,
quantidade e complexidade. Sons vocais graves freqüentemente acompanham
exibições de ameaça de machos adultos. Muitas vocalizações são incorporadas em
respostas relacionadas com alarme e ameaça.
Como característica principal de suas associações grupais, cães, ovinos, bovi-
nos e eqüinos mantêm contato visual. Os suínos usam mais comunicação auditiva
com congêneres, enquanto gatos usam tanto contato visual como auditivo.

Reatividade submissa e preventiva


Durante a reunião de grupos ao natural ou em situações de alta densidade, os
indivíduos podem ser forçados a violar o espaço individual de outros. A reatividade
em condições tão próximas depende das posições hierárquicas dos animais. A
ordem hierárquica, quando estável, requer de cada animal: 1. reconhecimento de
indivíduos; 2. um encontro inicial quando a posição social é primeiramente estabe-
lecida; 3. uma memória duradoura que permita a cada animal reagir ao outro de
acordo com o seu status social estabelecido.
Comportamento 1090

A reação preventiva mais notável é a fuga, que pode ser socialmente controlada
ou descontrolada. Quando a fuga do rebanho é controlada, os animais fogem em sua
ordem normal de viagem, na qual uma fêmea da alta posição hierárquica é
geralmente a líder. Quando ocorre pânico, há uma fuga descontrolada e desorga-
nizada. A prontidão de fuga em eqüinos evoluiu como uma tática de sobrevivência
vital.
As reações preventivas entre indivíduos podem ser passivas ou ativas em
resposta à aproximação ameaçadora. A prevenção de uma relação de agressão na
forma de submissão social tem posturas características em cada espécie. Podem
variar da forma mais comum, um leve abaixamento de cabeça com desvio contrário
ao estímulo, até a exibição grosseira de submissão hipotônica na qual o animal
assume posição de repouso e nega-se a se levantar. Este último comportamento é
uma condição confundível quando uma doença intercorrente leva à prostração. O
reconhecimento de reações submissas é essencial no manejo de qualquer rebanho
doente ou “abaixador”, para assegurar que sua saúde receba consideração apro-
priada. A inércia geral, ou submissão, é uma característica comum, constituída por
um nível anormalmente baixo de reatividade a estímulos que geralmente levam a
alguma alteração de posição ou postura.

Reatividade agonística
O comportamento agressivo é quase sempre observado quando grupos de
animais são formados pela primeira vez. A produção de leite, o ganho de peso e
outras respostas fisiológicas podem ser afetados por vários dias durante as
interações sociais agressivas resultantes. Embora os ovinos raramente exibam
dominação social explícita, os machos competem no início de cada estação de
reprodução e podem exibir cabeçadas agressivas se as condições de criação
intensiva aumentarem a competição por comida, espaço ou área de descanso. As
cabeçadas em bovinos e ovinos, mordeduras de pescoço ou chutes em eqüinos,
olhares fixos e rosnados em cães, golpes em gatos, e empurrões e mordeduras em
suínos são atividades agonísticas comuns. A retaliação, prevenção, fuga e submis-
são são reatividades dependentes.
Luta – A reatividade típica de uma espécie é notável na forma de luta. Muitos
cães, gatos e eqüinos- problema são considerados imprevisíveis, sobretudo quando
agressivos, por exemplo, “mordedores de medrosos”. Sua resposta a um alarme ou
ameaça pode ser fuga (ou tentativa de fuga) ou ataque, dependendo grandemente
de seu temperamento, condicionamento e da situação específica. Todo o rebanho
reage a ameaças a distâncias estabelecidas, que variam com a reação potencial, o
indivíduo e as distâncias “críticas”, quando as áreas invisivelmente cercadas são
ameaçadoramente invadidas. Cada uma destas distâncias é o ponto no qual a dada
distância entre o animal e o sujeito que avança esteja tão reduzida que o animal
atingido possa reagir. Em distância de fuga, o animal fugirá do intruso se possível.
Se, entretanto, o intruso que se aproxima alcançar a distância crítica, o animal mais
provavelmente atacará. A distância individual circunda imediatamente o animal e é
reservada para conhecidos especiais. Estas distâncias variam de acordo com o
temperamento, experiência, treinamento domesticado, competição, alojamento,
alimentação, etc., inerentes ao animal.
A luta é mais intensa quando os adultos são colocados juntos pela primeira vez.
Se uma porca estranha for introduzida em um grupo estabelecido, o comportamento
agressivo coletivo do grupo direcionado ao estranho provavelmente irá resultar em
grave lesão física. Demonstrações de luta entre vacas não duram normalmente mais
do que alguns minutos, mas podem-se prolongar se os animais forem igualmente
correspondidos. Neste caso, o animal ao ser atacado por um lado vira-se paralela-
mente ao outro e empurra sua cabeça (e chifres) à região do flanco inferior do outro.
Comportamento 1091

Esta aproximação de flanco quase sempre interrompe a luta por vários minutos
antes de a ação ser recomeçada. Quando um animal se submete, ele se vira; se
nenhum se submete, a luta pode continuar até ambos se cansarem.
Simulação de luta – Como uma característica de reatividade social, a “simula-
ção de luta” é observada como uma variante do brinquedo (ver pág. 1093). A forma
é de alguma maneira ritualizada, e ocorre em todas as espécies de animais de
criação quando estão agrupados. A atividade inicial é de solicitação, na qual o animal
que se aproxima vai de encontro ao animal associado com engraçados movimentos
de cabeça. A fase seguinte é geralmente uma luta na qual um empurra ou aplica o
peso sobre o outro; é comum os animais andarem em círculos. Tais movimentos
circulares são característicos do comportamento de simulação de luta em potros,
bezerros e leitõezinhos. As simulações de luta geralmente terminam sem conse-
qüência e não levam a vingança ou perseguição. A luta limitada pode ocorrer quando
animais novos brigam por autodeterminação na hierarquia social e de denominação
do rebanho.

Ingestão
O comportamento ingestivo inclui os atos de comer e beber, preferências
alimentares, padrões diários de alimentação e as mecânicas de apreensão, masti-
gação, consumo, e algumas vezes, estocagem de comida. Muitas espécies têm
suas próprias características de ingestão. Os animais em aleitamento tateiam com
o focinho sobre as tetas e sugam o leite. Os ruminantes adultos ingerem grandes
quantidades de vegetação com mastigação mínima, mas este material é sujeitado
a nova mastigação algumas horas após, durante a ruminação. Os animais carnívo-
ros têm tipicamente dentes caninos bem-desenvolvidos que facilitam o rasgamento
da carne; o consumo é rápido com mastigação mínima. Os eqüinos e suínos usam
molares para mastigação, antes da deglutição. Os roedores tipicamente roem e
despedaçam a comida com seus dentes incisivos. O consumo instantâneo é visto
em uma grande variedade de espécies, incluindo muitas aves (ato de bicar) e
répteis; o objeto levado à boca deve ser apropriado tanto em aparência como em
tamanho para consumo.
O comportamento alimentar é composto por várias características associadas:
1. necessidades metabólicas (por exemplo, as fêmeas em lactação exibem uma
exigência aumentada); 2. exigências quantitativas de apetite (quantidade necessá-
ria para os ruminantes); 3. ritmo diurno de alimentação (os gatos freqüentemente
comem à noite); 4. seletividade de alimentos preferidos (os gatos e outras espécies
podem adquirir preferências alimentares enquanto jovens); 5. consumo de fluidos
(aumentado em condições de baixa umidade ou alta temperatura); 6. exigências
digestivas (coprofagia por parte do filhote pode estabelecer a microflora intestinal);
7. competição com associados (a competição pode aumentar o consumo, enquanto
os dominantes podem fazer com que os subordinados comam menos); 8. mecânica
de alimentação (os cães engolem, os suínos “fossam”, os roedores mordiscam);
9. técnicas de procura de alimento (os ungulados pastam grandes áreas, os
carnívoros caçam , as aves ciscam); e 10. esquemas diários de atividade geral
(os herbívoros têm picos diurnos, os roedores e gatos são noturnos, os eqüinos
geralmente são contínuos).
O comportamento alimentar é fortemente influenciado por padrões e preferên-
cias adquiridos, palatabilidade dos alimentos, o ambiente no qual a alimentação
ocorre, e as associações sociais de alimentação. A herança do comportamento
alimentar também deve ser considerada. Padrões espécie-específicos são her-
dados, embora os componentes específicos possam ter contribuições genéticas
e ambientais – como cada uma delas afeta os centros de fome e saciedade no
cérebro ainda é obscuro.
Comportamento 1092

A sede é uma característica ocasional do impulso ingestivo, e os centros


cerebrais que a controlam e medeiam são localizados na porção hipotalâmica do
sistema límbico. A sede total e a manutenção de um nível crítico de fluido no corpo
em todas as circunstâncias são reguladas por um complexo sistema influenciado por
hormônios, consumo de sal, conteúdo úmido do alimento e fatores ambientais.

Cuidado corporal
O comportamento de cuidado corporal está sob seu próprio controle nervoso,
embora a motivação seja necessária para que se assegure que as necessidades
sejam supridas. A predominância de qualquer comportamento adquirido é sempre
temporária e pode ser substituída por comportamentos de maior importância (por
exemplo, autopreservação).
Características componentes do cuidado corporal – O cuidado com o corpo
é um sistema permanente de comportamento envolvido em manutenção. Quatro
categorias principais podem ser reconhecidas: 1. higiene da pele; 2. termorregula-
ção; 3. procura de conforto; e 4. eliminação. A coçadura, a sacudida e a lambedura
são freqüentemente reconhecidas como “arrumação”, o principal tipo de comporta-
mento de cuidado com o corpo. O propósito primário de tal comportamento é de
higiene apropriada da pele e do pelame (ou penas). Atividades de auto-arrumação
são quase sempre breves e freqüentemente variadas em forma, mas coletivamente
representam uma porção significativa da manutenção. A arrumação mútua entre
animais intimamente associados é também digna de nota.
A “arrumação” pode envolver ferramentas naturais como dentes ou pés, ou
auxílios ambientais como ramos de árvores ou lama. Poeira ou material seco que
tenha se instalado no pelame pode ser facilmente desalojado por uma sacudida
vigorosa; isto também remove restos naturais de pele. As aves praticam o compor-
tamento de limpeza e de banhos de poeira pelas mesmas razões.
Na termorregulação, sob condições naturais, os animais procuram abrigo, áreas
de descanso secas, sombras e formas de se refrescarem ou de se aquecerem. Os
animais usam o chão em várias atividades deliberadas direcionadas ao efeito
corporal. Antes de escolherem um local no qual se deitar, eles podem arranhar a
superfície da área pretendida. Depois disso, eles quase sempre giram seus corpos
ao redor da cama pretendida antes de se deitar. Podem também esfregar-se na
superfície do chão e rolar sobre suas costas, torcendo-se e virando-se de várias
formas (por exemplo, eqüinos e cães). Os cães podem esfregar seus corpos em
substâncias fétidas, as quais aumentam grandemente o odor corporal individual.
Sob condições de calor, alguns animais podem criar poças de lama se nenhuma
estiver disponível. Tais poças de lama permitem que a superfície do corpo seja
refrescada tanto por meio de irradiação como de evaporação, ou podem permitir que
a lama forme uma camada protetora na pele. Os comportamentos de procura de
conforto estão associados também com outras situações, tais como coçadura para
aliviar uma coceira e achar um lugar confortável para descansar.
Quando é fornecido espaço suficiente, os animais, exceto possivelmente os
ruminantes, normalmente evacuam de forma a assegurar que os locais de descanso
não sejam sujos. Quando evacuando, os animais adotam posturas espécie-
específicas que ajudam a manter a cauda e os membros posteriores limpos. Além
do mais, muitas espécies usam urina (por exemplo, borrifos de urina pelos gatos)
como um marcador olfatório para indicar um território, deixando uma mensagem
identificável, ou ajudando na “publicidade” reprodutiva.
Cuidado corporal na doença – Na doença, a automanutenção torna-se diminuí-
da ou é impedida, e a homeostasia é perdida; o comportamento de cuidado corporal
é marcadamente reduzido, e os animais com doenças persistentes têm uma
Comportamento 1093

aparência suja. Essa negligência conserva energia para usar no metabolismo


exacerbado da febre. As manchas ao redor dos olhos, nariz, ou boca são uma
indicação clara de automanutenção deficiente e do estado da doença. O comporta-
mento de cuidado corporal retorna quando começa a convalescença e se recupera
a homeostasia.

Movimento
O movimento é vital para animais de vida livre para encontrar comida e abrigo.
A forma na qual os animais se empenham voluntariamente em atividades não
específicas indica que o comportamento de movimento tem sua própria motiva-
ção. A deprivação intensa de oportunidade cinética resulta em comportamento
anormal – mesmo a falta de exercício apropriado pode causar problemas. Os
exemplos incluem várias formas de atividade de “movimentos bucais” anormais.
Embora os animais afetados possam permanecer em más condições físicas,
suas alterações comportamentais indicam manejo insatisfatório de um ponto de
vista de saúde.
Brincadeiras – Alguns comportamentos nos animais existem na forma de puro
movimento sem propósito óbvio. Os animais exigem movimento para se exercitar,
o que ajuda a manter saudáveis os sistemas musculoesquelético e cardiovascular.
A necessidade de exercício é maior nos animais jovens, e eles se empenham em
um comportamento mais puramente cinético na forma de brincadeira. Os animais
jovens brincam melhor se tiverem outros semelhantes como companhia, pois a
maior parte das brincadeiras exige contato social. Embora isto não seja um
comportamento social verdadeiro, as atividades espécie-específicas exploram a
disponibilidade dos animais associados como fontes de estímulo, as quais ajudam
o desenvolvimento do sistema nervoso e da coordenação motora, e o seqüenciamento
de padrões de comportamento (ver também SIMULAÇÃO DE LUTA, pág. 1091).
Atividades cinéticas gerais – Em geral, a cinesia inclui muitas formas espécie-
específicas como saltos, corridas, disparadas, escavações, escaladas, nados,
agitações de braço, espreguiçamento e arranhão em um substrato. O último é um
notável comportamento normal de gatos. Os animais se espreguiçam de várias
formas, inclusive extensão da cabeça e pescoço, arqueamento do pescoço,
estreitamento do dorso e extensão dos membros (tanto anteriores como posterio-
res, quase sempre um par após o outro). Os membros anteriores podem ser
estendidos sozinhos ou juntos, como quando o animal abaixa o seu tronco até o
chão, enquanto as pernas traseiras estão superestendidas. Os membros posterio-
res podem ser espreguiçados conforme o animal empurra o tronco para a frente de
tal forma que finalmente os dedos das patas posteriores sejam arrastados junto ao
chão por uma curta distância. Os membros posteriores individualmente podem ser
superestendidos um após o outro, mais comumente logo após o animal ter levantado
depois do descanso.
Nas aves domésticas, muito da atividade cinética ocorre na forma de bicadas e
andaduras. As aves também realizam atividades de espreguiçamento rotineiras, por
exemplo, extensão vigorosa de uma asa após a outra é comum. Quase sempre,
quando uma asa é superestendida em uma direção traseira, a perna do mesmo lado
também é estendida para trás. O batimento das asas representa outra forma de
exercício, embora muitas formas de engaiolamento o evitem.

Comportamento exploratório
Os animais normalmente exibem uma forte motivação para explorar e investigar
seu ambiente. Esta atividade diminui uma vez que o ambiente tenha se tornado
familiar, mas reaparece quando há alguma mudança ou novidade no ambiente. Esta
Comportamento 1094

reserva de comportamento exploratório permite ao animal ajustar suas ações


consideravelmente quando o ambiente exige adaptação.
A informação sensorial que resulta das atividades exploratória e investigadora
alerta o sistema nervoso a produzir formas apropriadas de comportamento no
ambiente em alteração. Em animais de vida livre, o comportamento se ajusta
continuamente, e pode ser considerado um componente básico na automanutenção
homeostática. Em confinamento, entretanto, as ações exploratórias diminuem e
qualquer motivação para exploração tem poucas chances de se manifestar.
Em confinamento intensivo e crônico – típico de produção animal intensiva
comercial e de manejo de animais de laboratório – o comportamento exploratório
pode-se tornar redirecionado e produzir comportamento alternativo. Um confina-
mento crônico, similarmente pode afetar de maneira adversa o comportamento de
animais de estimação e pode resultar em atividades repetitivas ou destrutivas.
O comportamento exploratório quase sempre assume a forma de atividade de
tentativa e erro; isto é muito mais evidente entre neonatos. Logo após o nascimento,
o animal se envolve em atividades exploratórias e investigadoras incluindo seu
ambiente imediato e sua mãe. Isto permite que animais jovens aprendam a identida-
de de suas mães e outros contatos sociais, como os seus companheiros de ninhada.
Necessidade perceptiva – O sistema exploratório no comportamento é evidente
em muitas atividades. A organização deste sistema pode ser listada na seguinte
seqüência de desenvolvimento: 1. necessidade no animal de perceber os fatores
ambientais que estimularão seus sentidos; 2. ativação do comportamento exploratório,
o qual se torna direcionado às interações entre o animal e seu ambiente; 3. recepção
de retorno sensorial do ambiente para satisfazer sua necessidade original; 4.redu-
ção na motivação como resultado de satisfação sensorial; 5. retorno do ciclo ao nível
basal de prontidão, presumivelmente com os eventos anteriores em memória de
curta ou longa duração.

Comportamento territorial
O espaço disponível influencia as atividades animais. Existem dois tipos gerais
de espaço: 1. o espaço real é tido como território para prover limites adequados
dentro dos quais o animal possa praticar as atividades necessárias para viver; 2. o
espaço “individual” é estabelecido para propósitos de autoproteção, autodetermina-
ção e autocuidado. Algumas formas de comportamento se relacionam conjunta-
mente ao território propriamente dito e ao espaço individual (pessoal). Muito do
comportamento social relaciona-se ao espaço conquistado, determinando a posse
do espaço e realizando privilégios espaciais. A agressividade é um componente
comum dos métodos territoriais.
Território – Uma área que é ativamente defendida, um território pode ser estabe-
lecido para um propósito específico, por exemplo, reprodução, ou pode ser usado
para atividades gerais diárias. Nem todas as espécies usam territórios e algumas
podem somente usá-los para propósitos específicos ou em certas épocas do ano.
Espaço individual – A necessidade espacial mínima e mais básica é um espaço
suficiente para um animal deitar-se, ficar em pé, virar-se, limpar-se e espreguiçar-
se. Isto pode ser definido como espaço primário, e apenas associados íntimos são
permitidos dentro dele. Este espaço básico tem que estipular uma bolha imaginária
de espaço ao redor do animal e será defendido.
O espaço adicional que se relaciona à atividade completa do indivíduo pode ser
definido como espaço secundário. Este é necessário para permitir atividades tais
como prevenção contra um vizinho; alteração radical na posição, direção ou
locação; e movimentação.
Incorporado à exigência espacial secundária está o espaço social, a distância
mínima que um animal adulto rotineiramente mantém entre ele mesmo e outros
Comportamento 1095

membros da mesma espécie. É comumente visto como “distância ao vizinho mais


próximo” ou “distância social”. (Muitos animais jovens não criam espaço social para
si mesmos.) Outro componente do mesmo fenômeno é o número máximo de
vizinhos que um animal permitirá dentro de um dado raio. Quando o espaço social
é inadequado, ocorre a lotação, que, em termos etológicos, pode ser definida
simplesmente como espaço social inadequado destinado ao animal. Uma caracte-
rística adicional do espaço individual é a “distância de fuga”, a qual é modificada
quando os animais se tornam acostumados à manipulação e ao manejo.
Todas as formas de espaço individual podem ser consideradas como portáteis
– elas tendem a ir aonde o animal for. A dominância é grandemente relacionada com
a afirmação de um animal sobre outros na aquisição de prioridade espacial, e assim
se relaciona ao espaço individual. Tal prioridade espacial dá ao animal mais
altamente ranqueado preferência de escolha para áreas disputadas para atividades
como alimentação e descanso. Como resultado, os espaços individuais normalmen-
te se tornam integrados e pedem freqüentes reajustes comportamentais para
conseguir harmonia espacial.

Descanso e sono
O sono ocupa muito tempo do animal. Os animais mais evoluídos apresentam
tipos de sono que correspondem aos do homem, embora as características do sono
de uma espécie possam ser bastante distintas. O descanso e o sono permitem
restauração do estado fisiológico. Durante o sono, ocorre recuperação metabólica
em curto espaço de tempo. Durante o descanso, o corpo pratica conservação
máxima de energia. Na prática de tal conservação, o descanso é usado mais
taticamente que o sono.
Diferentes espécies têm necessidades diferentes para quantidades de sono.
Tipicamente, os animais predadores dormem menos e dividem o sono em numero-
sas e pequenas frações. Se esses animais vivem em grupos, o descanso em turnos
é uma tática de sobrevivência que permite vigilância para avisar membros em
descanso ou adormecidos.
Formas de sono – O sono verdadeiro ocorre em duas formas, “sono cerebral”
e “sono corporal”. No sono cerebral, há uma emissão de ondas elétricas lentas; por
esta razão, é geralmente definido como “sono de ondas lentas” – e é uma forma
particularmente silenciosa de sono. No sono corporal, algumas correntes elétricas
do cérebro são do mesmo padrão que as que ocorrem quando o animal está
acordado. Devido a esse paradoxo, esta forma é também definida como “sono
paradoxal”. Devido aos olhos se moverem freqüentemente de forma rápida por
detrás de pálpebras fechadas, esta forma de sono é também conhecida com “sono
de movimento rápido dos olhos” (REM — “rapid eyes movement”). É nesta fase que
uma pessoa sonha e os cães vocalizam ou movimentam seus pés.
Descanso – Todas as espécies de animais domésticos gastam muito tempo
descansando, durante o qual o animal pode ficar sonolento, ou simplesmente deitar-
se inerte mas desperto. As posições de descanso variam de ficar em pé (por
exemplo, no caso do eqüino) a decúbito lateral ou esternal, ou uma combinação na
qual a parte dianteira fica em decúbito esternal e a traseira em decúbito lateral. O
decúbito lateral é exigido para sono REM, a menos que o animal possa se escorar
em alguma coisa.

Associação
Os animais que vivem em grupos fechados sob circunstâncias naturais são
definidos como animais sociais. As interações sociais são importantes na autode-
terminação e na estabilidade social. Por esta razão, os animais de rebanho mantidos
Comportamento 1096

em isolamento social geralmente desenvolvem comportamento anormal (por exem-


plo, comportamento bucal patológico). Suas atividades sociais são mais restritas
que as dos outros de sua espécie, e sua habilidade para enfrentar mudanças quase
sempre é afetada.
As manifestações de comportamento associativo são extremamente variadas,
numerosas e circunstanciais, e providenciam informação vital sobre o comporta-
mento em grupo; não nos é suficiente conhecer o comportamento natural de nossos
animais domesticados – devemos também saber sobre suas capacidades, adapta-
bilidades e limitações. O manejo de animais como grupos ao invés de indivíduos tem
sido ressaltado recentemente. O uso de grupos é o principal método de criação em
produção animal pecuária e no manejo de animais de laboratório.
A associação serve a muitos propósitos; um produto importante do comporta-
mento social, ela é motivada por uma força que mantém a coesão intra-específica.
Por meio da associação, as estratégias dinâmicas de uma espécie são implemen-
tadas. As afiliações sociais transmitem aprendizado e o “efeito de grupo” (“facilitação
social”) influencia atividades comunais. A associação íntima de indivíduos permite
a organização em unidades homogêneas, grupos reprodutivos, rebanhos e colô-
nias. Em virtude de os indivíduos serem disciplinados pela força da associação em
grandes grupos, a perseguição comum de táticas exigida para se alcançar harmo-
nia, sobrevivência, e proliferação é assegurada.
Associação organizada – Muitas formas de comportamento são reguladas por
interações sociais. As interações entre um par formado e equilibrado são notáveis.
Entre animais estritamente confinados, são observados comportamentos sociais
modificados, dependendo do sistema de criação e do número de animais em um
grupo. Ver também COMPORTAMENTO SOCIAL E AFILIAÇÃO, adiante.

Aspectos de sanidade da manutenção


As características comportamentais de automanutenção estão se tornando
reconhecidas como indicativas – e provavelmente definitivas – da variedade de
necessidades de sanidade animais (ver também pág. 1126). A separação e a
lotação podem ser estressantes e provocar síndromes de comportamento anormal.
Os problemas têm sido associados com métodos de criação comercial, por exemplo,
aqueles envolvidos na produção intensiva de bezerros, bovinos, ovinos, suínos e
aves. Os problemas são também comuns na criação de animais de laboratório,
principalmente primatas.
Ambientes empobrecidos e criação confinada têm mostrado afetar as habilida-
des de aprendizado nos jovens e contribuem para o desenvolvimento de padrões
estereotipados. A estimulação deficiente afeta adversamente a habilidade final do
animal para se ajustar ao seu ambiente imediato e às mudanças dentro dele. Os
comportamentos anormais indicam aflição e uma tentativa por parte do animal de
enfrentar a situação. Por fim, a saúde e o bem-estar animais podem não ser
efetivamente preservados sob essas condições. A criação animal racional tem de
reconhecer as necessidades etológicas de animais utilizados intensivamente,
alcançar suas necessidades comportamentais e amortecer o impacto do estresse
do confinamento. Os últimos fatores estão interligados no complexo de causas de
problemas de saúde animal.
As exigências da sanidade, conforme são etologicamente concebidas, têm de
ser alcançadas com mais que provisão de alimento, água e abrigo. As exigências
de maior prioridade são as que incluem itens fundamentais de reação e ingestão.
Os comportamentos de cuidado corporal, movimento, exploração, territorialismo,
descanso e associação corporal são as prioridades próximas. Cada categoria
comportamental representa necessidades combinadas que devem ser conside-
radas na sanidade.
Comportamento 1097

Um retorno ao ambiente livre e “natural” não é sugerido como forma de criação


praticável desde que o manejo protetor seja essencial à produção animal moderna
tanto comercial como de animais de laboratório. A “liberdade” seria, na verdade,
cruel para muitos animais. O gado leiteiro e os coelhos, por exemplo, encontrariam
um clima hostil, predadores, dietas pobres e outros agentes estressantes. Entretan-
to, a consideração das exigências de espaço (ver COMPORTAMENTO TERRITORIAL,
pág. 1094) como uma necessidade premente é importante.

COMPORTAMENTO SOCIAL E AFILIAÇÃO


A maioria dos animais de fazenda e de estimação é composta por espécies
altamente sociais. O sistema de criação e o tamanho do grupo afetam a
freqüência e a natureza do comportamento social. Interações sociais, incluindo
respostas dominantes ou subordinadas, são afetadas pela ordem relativa dos
animais dentro da hierarquia social dominante presente no grupo. Respostas
similares tendem a ser apresentadas em todos os encontros entre os mesmos
animais. A estabilidade dos relacionamentos sociais requer que todos os mem-
bros do grupo sejam capazes de reconhecer-se um aos outros, que a composição
do grupo seja estável (sem doenças ou remoções temporárias) e que os
indivíduos observem seu status e atuem de acordo com ele. Em sistemas de
criação extensiva, a formação voluntária de subgrupos quase sempre acontece
se os rebanhos forem suficientemente grandes.
A reunião normal de grupos animais ou em casos de alta densidade populacional
pode forçar seus membros a violarem o espaço individual de outros. A freqüência
de interações sociais em tais confinamentos aumenta e o resultado depende da
posição dos animais na ordem de dominância. Encontros agressivos entre animais
em um determinado grupo são mais freqüentes enquanto o grupo está desenvolven-
do sua própria hierarquia social. Quando o grupo alcança estabilidade social e
obtém espaço adequado, os encontros agressivos se tornam mínimos. Um animal
recentemente introduzido em um rebanho aumentará o número de encontros
agressivos dentro do grupo até que sua posição dentro da hierarquia seja estabe-
lecida. Essa agressão pode afetar a produção de todo o grupo.
Fortes vínculos são uma característica do comportamento associativo entre
pares ou pequenos grupos, e não estão restritos ao relacionamento entre a mãe e
a cria. Dentro de rebanhos, o pareamento discreto por meio de seleção mútua do
companheiro é um evento social comum que ocorre para vantagem de ambos,
particularmente em situações agonísticas ou de limpeza envolvendo outros animais
dominantes. A partir da associação livre de indivíduos, estabelece-se a organização
das unidades familiares, grupos de criação, rebanhos, manadas e colônias. Tais
afiliações asseguram a adaptação comum das táticas necessárias para o sucesso
reprodutivo, assim como a sobrevivência do indivíduo e do grupo.
A importância do comportamento social para o entendimento das muitas ativida-
des do animal doméstico necessita maior elucidação, e algumas características
sociais de espécies em particular serão consideradas adiante com mais detalhes
(ver pág. 1099).
O comportamento alelomimético, algumas vezes denominado comportamento
contagioso ou amigável, refere-se a atividades comuns apresentadas pela maioria
dos membros de grupos, manadas e rebanhos, quando eles agem juntos. Os
primeiros vínculos formados entre pais e filhotes podem ser generalizados para
incluir outros membros da espécie. Geralmente, os grupos tornam-se mais capazes
de ficar juntos se os membros coexistem pacificamente. As hierarquias sociais
Comportamento 1098

dominantes, os relacionamentos de liderança-seguimento, as associações para


limpeza mútua e outras respostas sociais são características das espécies domés-
ticas e devem ser consideradas como relativas ao manejo e à saúde do animal.
Relacionamentos de liderança-seguimento – Porcos são relutantes a se
mover em áreas estranhas e necessitam ser guiados; porém, grupos de bovinos,
ovinos e cavalos, que desenvolvem relações de liderança-seguimento quando em
condições de criação livre, movem-se mais prontamente. Em rebanhos naturalmen-
te constituídos de ovinos, a ovelha mais velha geralmente lidera, enquanto em
rebanhos de vacas leiteiras, os animais de dominância mediana lideram. O homem
pode treinar certos animais (“Judas”) para liderar o grupo, explorando, assim, os
padrões de movimentos naturais das espécies em questão. Ovinos, bovinos e
eqüinos podem ser treinados para liderar, e pares de bovinos unidos após o
desmame ensinam um ao outro como liderar. Em vacas leiteiras, a ordem de
movimentação na área de ordenha é melhor fixada por um dado período, embora
os animais seguidores sejam mais consistentes que os “líderes”. A ordem da
ordenha não é necessariamente a mesma ordem de liderança-seguimento apresen-
tada quando os animais se movem em áreas de pastagem. Em condições de
liberdade, especialmente para as espécies “seguidoras” como ovinos e eqüinos, o
animal mais velho pode transferir informações acerca das mudanças sazonais, boas
áreas de pastagens e pontos de “obtenção” de água para a sua prole se a ligação
mãe-cria não for interrompida antes do desmame natural. Desta maneira, áreas
familiares podem ser mantidas por gerações. Grandes rebanhos de ovinos em
pastos de , 250 acres (100ha) podem estabelecer até três áreas familiares
diferentes, e subgrupos do rebanho inteiro trabalham com a mínima sobreposição
nessas regiões.
Em pequenas pastagens, touros leiteiros com idade entre 4 e 5 anos estabele-
cem territórios individuais sob condições do rebanho. O súbito ataque dos touros
leiteiros a seus tratadores pode ser causado por essa mudança relacionada à idade,
levando a um comportamento territorial agressivo.

RELAÇÕES SOCIAIS ENTRE O HOMEM


E OS ANIMAIS
As características comportamentais básicas de cada espécie são ligeiramente
alteradas por meio da domesticação, embora o comportamento social normal possa
ser transferido ao proprietário ou responsável. Por exemplo, a maioria dos cães se
ajusta a famílias porque reagem às pessoas como reagiriam a outros membros da
matilha.
Durante a socialização, um animal jovem aprende a aceitar a presença de sua
própria espécie e de outras. O processo de aprendizado é restrito a um período de
tempo espécie-específico. Por exemplo, em espécies tardias (imaturas ao nasci-
mento) tais como o cão, a melhor época para socialização é de 4 a 6 semanas de
idade (variação de 3 a 12 semanas). Com espécies precoces (bem-desenvolvidas
ao nascimento) tais como ovinos, o melhor período é do nascimento até 4 a 6 dias.
Se as ligações com o homem se tornam muito exclusivas durante este período, tais
animais criados tão intimamente podem se relacionar sexualmente com seres
humanos ao invés de sua própria espécie.
Um animal doméstico dependente de seu tratador humano é para alguns ou
todos os seus cuidados e bem-estar, e o homem começa a fazer parte das reações
sociais destes animais. Uma relação de liderança-seguimento pode ocorrer à
medida que o animal segue de perto a pessoa. Em espécies que desenvolvem
Comportamento 1099

hierarquias de dominância social, é importante para o tratador ser o dominante,


particularmente quando os animais adultos são potencialmente perigosos. Pode-se
assegurar o aumento de dominância com a maturidade e o crescimento. O papel
dominante do homem é melhor estabelecido na época apropriada para as espécies,
geralmente em idade precoce quando pouca ou nenhuma punição pode ser
necessária. Desde que as interações de dominância social são específicas para os
indivíduos, o fato de uma pessoa ser dominante para o animal não é garantia de que
outra poderá sê-lo (ver também pág. 1100).
A interação íntima de um proprietário pode resultar em um comportamento social
indesejável. O isolamento precoce e completo de um animal de sua própria espécie
pode levar a dificuldades em posterior acasalamento, agressividade ou timidez
aumentadas perante estranhos e comportamento maternal deficiente. A superlo-
tação e um manejo geral deficiente também podem levar a um comportamento
social anômalo e resultar em vício, dano ou desperdício de alimento. Um bom criador
ou veterinário pode prever muitas destas condições por meio da avaliação do
comportamento social dos animais e tomando atitudes preventivas ou curativas
antes que a condição de criação piore.

COMPORTAMENTO SOCIAL DAS ESPÉCIES


COMPORTAMENTO SOCIAL DOS CÃES
São poucas as diferenças sociais entre o comportamento de cães e lobos. Os
lobos geralmente percorrem as trilhas da caça e urinam, defecam e arranham o chão
como uma forma de fazer “trilha de cheiro” ou “marcação de lugares”. Similarmente,
cães selvagens se movem em rotas regulares, utilizando as “trilhas de cheiro”. Os
machos viajam mais que as fêmeas e são mais aptos a reconhecer a “trilha de
cheiro”. O estímulo para a demarcação é o cheiro de urina ou fezes de animais
estranhos enquanto operam dentro de um dado território. O comportamento de
“trilha de cheiro” mantém os machos informados a respeito de quais animais já
passaram por ela e da receptividade sexual da fêmea. Durante o estro, a urina e as
secreções vaginais da cadela têm um odor particular que exita os machos. A fêmea
é atrativa para o macho alguns dias antes do início do sangramento do proestro,
porém não são receptivas até o estro.
Tanto o lobo como a loba cooperam para a alimentação da cria (vomitando a
comida) quando os filhotes começam a comer alimentos sólidos, com , 3 semanas
de idade. O desmame ocorre entre 7 a 10 semanas, e os lobos jovens são vistos
caçando junto com a alcatéia com , 4 meses de idade. Em geral, a mesma situação
é observada nos cães domésticos. Vestígios do comportamento parental selvagem
são observados na tendência das cadelas vomitarem a fim de alimentar suas crias.
Como o lobo, o cão é basicamente um animal que vive em matilhas, e outros cães
ou pessoas podem satisfazer sua necessidade de companhia. Pequenos períodos
de isolamento de um cão podem agir como punição, por exemplo, durante alguns
tipos de treinamento. Os animais que vivem em matilhas ou alcatéias agem dentro
de relacionamentos de dominação e subordinação, que os permitem viver em
grupos sociais estáveis. Uma ordem social estável auxilia por meio da inibição de
lutas em situações competitivas, tais como as relacionadas a alimentação, espaço
vital e desejo de atenção humana. Principalmente o tamanho, a força e o sexo
determinam a dominância social, e estes relacionamentos são desenvolvidos
durante o amadurecimento dos filhotes. Cães estranhos de uma mesma raça são
atacados e rejeitados mais freqüentemente em um grupo social fechado do que
Comportamento 1100

cães de uma raça diferente, embora existam diferenças raciais na tolerância a


estranhos. Há pouca evidência de que tanto lobos como cães desenvolvam qualquer
sistema forte de liderança.
Comportamento afiliativo e protetor – Cães adultos de certas raças geralmente
guardam o território ao redor de suas casas e mantêm os estranhos afastados por
meio de ameaça ou ataque. Longe de seu território familiar raramente causam
problemas e, se removidos para um novo lar, demoram até 10 dias para estabelecer
seu novo território. Os cães também podem atacar se os membros de sua matilha (ou
família) forem ameaçados. Isso corresponde a uma reação instintiva e não deve ser
excessivamente encorajada, pois os proprietários perderão o controle do cão quando
qualquer um que não aquele pertencer à família se aproximar. Um animal bem
treinado e bem controlado apresenta poucos problemas.
Comportamento social anormal – Embora o proprietário do cão possa dominar
seu animal, um indivíduo qualquer não pode – e pode ser mordido se tentar fazê-lo.
Quando se permite que um cão brigue com outros cães ou pessoas, logo ele
desenvolve hábitos que podem torná-lo um perigo ou um incômodo. Quando
severamente ameaçado, um cão pode morder por medo; esta atitude pode se tornar
um hábito em um típico “mordedor por medo”. Quando se permite a um cão jovem
persistir com comportamentos aparentemente prejudiciais, tais como montar nas
pernas do dono, masturbar-se com objetos, marcar trilhas com urina, e exibir
ansiedade por separação (incluindo mastigação e escavação destrutivas), tais
comportamentos podem-se desenvolver para problema mais sério. Se houver um
certo grau de satisfação individual, como na escavação, o problema é difícil de ser
detido. Se os problemas ocorrerem somente quando os proprietários estiverem fora,
a punição atrasada é contraprodutiva.
Relacionamento homem-cão – O homem e o cão interagem em pelo menos três
planos: 1. dependência – iniciando-se na primeira infância do animal, o cão se torna
um dependente perpétuo; 2. dominância social – o homem deve ser o dominante ou
corre o risco de ser ameaçado ou mordido em casos de situações competitivas. O
proprietário estabelece melhor a dominância utilizando contenção firme ao invés de
punição intensa. A maioria dos cães se submeterá quando for levantada do chão pela
pele solta do pescoço, ou quando for mantida em decúbito lateral (os proprietários
devem adotar medidas para se proteger se o cão for particularmente agressivo); 3.
relacionamento de liderança-seguimento – na maioria dos cães é necessário
treinamento para se produzir este relacionamento.

Comportamento do filhote
Treinamento familiar – Até que os filhotes comecem a ingerir alimentos sólidos,
com , 3 semanas, a cadela os mantém limpos, lambendo-os e ingerindo seus
excrementos. Após isto, os filhotes evitarão sujar sua cama saindo para urinar e
defecar; porém não usarão áreas específicas até , a oitava semana. Os filhotes
devem ser mantidos sob rigorosa supervisão a partir da idade de 7 semanas a fim de
se impedir que utilizem áreas impróprias. Eles podem ser amarrados em uma correia
curta, mantidos em um engradado pequeno ou confinados a um quarto entre saídas
ao quintal, e podem em breve ser liberados em um quarto após terem estado do lado
de fora. Devem ter acesso a áreas de toalete após despertarem, comerem ou se
tornarem ativos. Caso se queira eliminar as incursões externas quando adulto, é
melhor treinar o filhote dessa forma; a maioria dos cães não realiza facilmente a
transição entre papel e grama.
Desenvolvimento social – Existe uma variação considerável no comportamen-
to de cães de diferentes raças e linhagens. Temperamento e “treinabilidade”,
geralmente citados como fatores importantes quando se escolhe um filhote, não são
facilmente acessíveis em tenra idade. Uma vez que a idade mais adequada para se
Comportamento 1101

desenvolver um forte relacionamento entre o cão e seu dono é entre 3 e 12 semanas,


o novo filhote deve ser selecionado com , 6 semanas e deve ser levado para casa
tão logo quanto possível (ver também RELACIONAMENTO HOMEM -CÃO, anteriormente).
Os filhotes criados em canis, muito distantes do contato humano, podem nunca
ser capazes de se adaptar ao relacionamento homem-cão se adquiridos após 12
semanas; um treinamento cuidadoso e paciente pode ajudar a familiarizar o cão com
algumas pessoas, mas pode não obter sucesso. Tais cães freqüentemente desen-
volvem a síndrome de “cão de canil”; não possuem confiança e podem ser
agressivos ou “mordedores por medo”, ou então extremamente submissos. Estes
comportamentos podem desaparecer se o cão retornar ao seu canil de origem. Cães
mantidos em canis podem manter relacionamentos mais fortes com outros cães e
aceitar o canil como seu “lar” e, como resultado, podem não se tornar bons animais
de estimação.
Cães criados exclusivamente com o homem podem ter dificuldades no acasa-
lamento porque pensam que o homem é sua própria espécie e não reconhecem
outros cães. Em virtude de os cães serem animais de matilha por natureza, sua
primeira experiência social (antes das 12 semanas de idade) deve incluir os tipos de
pessoas e raças de cães com os quais eles estarão em contato por toda vida.
Fundamentos do treinamento – Todos os cães devem obedecer a comandos,
tais como não, senta, pare, venha, pule, iniciando-se na oitava semana de idade. Um
cão treinado obedece prontamente às ordens de seu dono. Apenas 10min diários
são suficientes para se obter um cão bem-treinado por volta da 16ª semana de vida.
Estas lições devem ser breves, ocorrer sem interrupções e devem-se iniciar com
ordens simples que os filhotes possam realizar. Repetição moderada, compatibili-
dade, elogios por um bom desempenho dados logo após a resposta desejada ser
apresentada e firmeza em comportamentos indesejáveis dentro de um relaciona-
mento baseado em confiança e afeição mútua são os fundamentos do treinamento.
Aulas de obediência mais formais com , 6 meses de idade, reforçam os conceitos
e ajudam a melhorar as primeiras lições.

COMPORTAMENTO SOCIAL DOS GATOS


Os gatos são animais não sociais e tendem a ser solitários em seu modo de vida.
Ocasionalmente formam uma amizade aparente, mas vão passar a maior parte do
tempo sozinhos. Muitos comportamentos felinos centram-se em seu modo de vida
solitário, incluindo comportamentos social, ingestivo e reprodutivo. Não existe
dominância na forma tradicional. Em um grupo, um gato “possui” o território, 1 ou 2
estão em categorias sociais extremamente baixas e o resto divide uma posição
social média. Esta ordem territorial vai variar entre os mesmos indivíduos se houver
mudança para outra área. Os gatos que dividem uma posição tendem a brigar
freqüentemente. Para um acasalamento bem-sucedido, o macho tem de estar
presente no momento apropriado. As vocalizações são usadas como atrativo e a
ovulação induzida garante que os óvulos e esperma se encontrem no momento
apropriado.
Desenvolvimento social dos gatinhos – Os gatinhos são sociais porque
dependem da mãe para aquecimento e alimento e dos seus companheiros de
ninhada para aquecimento e, mais tarde, brincadeiras. A brincadeira social se
desenvolve gradualmente ao redor da terceira semana. Essas interações ajudam o
gatinho a desenvolver coordenação; ensinam técnicas adultas de caça, eliminação
e sobrevivência; e concluem a maturação fisiológica e comportamental.
Quando os gatinhos atingem 6 a 8 meses de idade, eles são capazes de
sobreviver sozinhos. Os momentos de brincadeiras se tornam mais curtos e
terminam em contendas agressivas que se tornam mais intensas e compridas. Eles
Comportamento 1102

tendem a manter os companheiros de ninhada afastados e introduzir o modo de vida


solitário. Os proprietários freqüentemente notam uma mudança na personalidade
do seu gato nessa época, ficando desapontados por terem ficado menos amigáveis
e, às vezes, mais agressivos.

COMPORTAMENTO SOCIAL DOS G RANDES ANIMAIS


Estrutura de grupo ou rebanho – Animais domésticos associam-se em grupos,
mesmo em um sistema de criação extensiva. Ovinos, bovinos e eqüinos mantêm
contato visual. Os suínos gastam mais tempo em contato real uns com os outros, e
utilizam vocalizações. Se perturbados, ovinos e eqüinos primeiramente se agrupam
e, se ameaçados, correm para longe da fonte de distúrbio. Bovinos e suínos
movimentam-se em grupo sem coesão e podem resistir à razão do perigo. Durante
a aglomeração do grupo de animais na natureza ou em situações com alta
densidade, os indivíduos podem ser forçados a violar o espaço individual de outros.
Interações sociais nestes casos dependem da posição dos animais na ordem de
dominância. Uma vez que o comportamento agressivo é mais observado em
bovinos, porcos ou cavalos, quando os grupos estão sendo formados, mudanças
freqüentes entre os membros dos grupos devem ser evitadas. A produção de leite
e outras respostas fisiológicas podem ser afetadas por vários dias quando intera-
ções sociais agressivas estejam ocorrendo. Embora os ovinos raramente apresen-
tem dominância social clara, ocorrem interações intensas mas sutis, sobretudo com
os machos durante a época de reprodução. Chifradas em bovinos e ovinos;
mordidas na garupa, pescoço, ou dorso em cavalos; e empurrões, mordidas e
ferimentos com as presas em canhaços são formas comuns de comportamento
agonístico.
Desenvolvimento da dominância social – Os leitões apresentam algumas
brigas pelas tetas preferidas da porca com apenas alguns dias após o nascimento;
uma vez que a ordem de aleitamento nas tetas seja estabelecida, a seqüência se
transfere para as futuras posições de dominância. Outras espécies não desenvol-
vem uma ordem social estável até algum tempo após o desmame. Os efeitos da
dominância social podem ser importantes para rebanhos de alta densidade ou com
um esquema pobre de criação. Espaço inadequado no cocho, corredores estreitos,
espaços inadequados nas áreas cobertas ou falta de comedouros podem fazer com
que os animais dominantes obtenham recursos às expensas dos submissos. Os
últimos irão sofrer e a sua saúde e a produção geral podem ser afetadas. Em casos
extremos de dominância, apenas a presença do indivíduo dominante pode diminuir
fisiologicamente a salivação e a fome dos inferiores. Exemplos comprovados
mostraram altas porcentagens de parasitas internos em algumas cabras submissas
e alta taxa de mortalidade durante a seca quando a comida escassa foi consumida
pelos animais dominantes. Deve haver um limite máximo no número de membros
do grupo para que possam ser reconhecidos ou lembrados por cada indivíduo; este
número pode ser de 50 a 70 para bovinos e de 20 a 30 para suínos.
O cavalo é responsivo a pequenas mudanças de postura ou pressão na pele, e
estas dicas, durante as interações de dominância-submissão, são utilizadas por um
bom criador de cavalos. Algumas vezes foram utilizados tranqüilizantes para auxiliar
a tolerância social quando porcos estranhos foram criados juntamente com outros,
ou quando cavalos selvagens foram domesticados.

COMPORTAMENTO SOCIAL DAS GALINHAS


O pintinho apresenta respostas precoces ainda quando está no ovo, por
exemplo, pode dar pequenos piados quando está com frio, ou curtos trinados de
alegria quando está aquecido. Os pintos chocados a temperaturas levemente
Comportamento 1103

subnormais dão pequenos piados quando sua penugem úmida seca e perdem
contato com a casca do ovo. O contato com uma galinha choca ou outro objeto
aquecido impede estes piados. Os pintinhos recentemente chocados são atraídos
para a galinha por calor, contato, pressão e movimentos corporais; esta atração é
maior no dia da eclosão. Eles aprendem a comer, ciscar, beber e evitar inimigos na
companhia da mãe.
Em pintinhos, o período mais sensível para fixação à mãe é entre 9 a 20h após
a eclosão, e o medo é demonstrado a partir do terceiro dia. A ligação à mãe depende
primariamente do som de sua voz e aparência. Quando a penugem começa a
desaparecer de suas cabeças, os pintinhos são rejeitados pela galinha. Ela os bica
e a ninhada começa a se dispersar e tornar-se mais independente.
Galinhas e galos apresentam hierarquias de bicagem separadas, sendo as dos
galos menos estável. A hierarquia de dominância é vista mais claramente na
competição por alimento ou parceiros sexuais, e as galinhas subordinadas podem
ficar com tão pouca comida que a produção é afetada. Em um plantel mantido em
estado de desorganização social por motivo de remoção e substituição, as aves
comem menos, podem perder peso ou crescer pouco e tendem a botar menos ovos.
Alimentação e água adicionais colocadas em cochos distribuídos pelo galinheiro
permitem que as galinhas subordinadas se alimentem sem serem molestadas, e um
número adequado de ninhos dará melhores condições a essas aves para a
ovoposição. Grupos > 80 aves tendem a se separar em 2 grupos distintos, e pelo
menos 2 hierarquias de bicagem separadas parecem se estabelecer.
Comportamento de plantel – O agrupamento é a base da organização do
plantel. Um pintinho criado isoladamente tende a permanecer fora do plantel e
apresenta uma conversão alimentar menor que as aves deste. A formação de um
plantel adulto depende de tolerância mútua. Os estranhos são atacados e são
integrados ao plantel apenas gradualmente. Os novos integrantes são geralmente
relegados a baixas posições na ordem social.

COMPORTAMENTO SOCIAL DOS PERUS DOMÉSTICOS


Perus domésticos e selvagens possuem padrões semelhantes de agrupamen-
to e organização social, porém as práticas de manejo determinam o tamanho e
a composição dos grupos domésticos. A ordem de dominância social é menos
estável que a das galinhas, particularmente no caso de machos criados em
galinheiro. Certas variedades de perus tendem a dominar outras; por exemplo,
preto sobre bronze sobre cinza, e em grupos nos quais há mistura de sexo, os
machos dominam as fêmeas.
Como nas galinhas, o confronto entre pares mais comum é uma ameaça simples,
com uma ave se subordinando à outra. Por outro lado, eles podem-se ameaçar em
círculos sempre com a plumagem das asas abertas e a cauda em leque, e ambos
emitem um alto trinado. Então, um ou ambos alçam vôo e se atacam com as patas.
O que empurrar, puxar ou prensar a cabeça do outro no chão normalmente vencerá
o combate. As lutas geralmente duram poucos minutos. Muito sangue pode ser
espalhado nestas ocasiões, pois áreas da pele altamente vascularizadas podem ser
atingidas, porém o dano físico real é pequeno e as aves não costumam lutar até a
morte. Entretanto, uma ave ferida de posição inferior deve ser mantida afastada do
grupo até que sua ferida cicatrize, pois as outras tentarão bicá-la e agravar o
ferimento.
Os peruzinhos se movem livremente após a eclosão,e devem se ligar socialmen-
te à mãe durante o primeiro ou o segundo dia. Normalmente os peruzinhos formam
grupos fortemente ligados que podem inicialmente se amontoar para prover o
aquecimento, porém continuam coesos mesmo em locais aquecidos. As aves
tendem a se alimentar e perambular em grupos e, se estão com a mãe, ela é o foco
Comportamento 1104

da atividade. Sinais visuais e vocais são utilizados pelos pais e pelos peruzinhos
para manter contato até ≥ 8 semanas de idade. Brigas são raras até os 3 meses de
idade, mas aumentam até que se atinja o pico aos 5 meses, quando a ordem social
é estabelecida.

COMPORTAMENTO SOCIAL DOS PATOS


Os patos domésticos são, em sua maioria, originários de duas espécies – o pato
mallard (Anas platyrhynchos ) e o pato almiscareiro (Cairina moschata ). No
pato almiscareiro, ambos os sexos são desprovidos de penas na face.
Comportamento social dos patos almiscareiros – Os patos almiscareiros são
promíscuos. Os machos adultos, que são 2 vezes mais pesados que as fêmeas,
são solitários e agressivos para com outros machos. Sua aparência é primitiva e
seus chamados são simples. A fêmea, quando alarmada, emite um grasnido fraco;
o macho emite um ruído sibilante com batimento da cauda e encrespamento das
penas, e o balanço da cabeça dos machos atua como ameaça a outros machos ou
como exibição sexual para as fêmeas. Como as fêmeas geralmente evitam machos
em exibição, eles podem persegui-las até a exaustão antes que o acasalamento seja
possível. Após a fertilização, as fêmeas se retiram para seus ninhos e botam um ovo
por dia. O ninho não é ocupado continuamente até que a incubação se inicie com
os dois últimos ou com o último ovo. Os ovos eclodem após 35 dias. O macho ataca
sexualmente qualquer fêmea que encontre e não toma parte na seleção do ninho,
incubação, ou cuidados com os patinhos.
Comportamento social dos patos mallards – Os patos mallards selvagens são
monogâmicos e permanecem juntos da metade do inverno até o começo da
incubação, por um período de 5 meses. Em situações domésticas, isto pode não ser
possível se o número de animais por sexo não for equivalente.
Os machos estimulados sexualmente se exibem sozinhos ou em grupos para
algumas fêmeas em particular, que por sua vez incitam os machos com uma
exibição mais formalizada, que alterna ameaças e submissão com um chamado
característico. A ameaça é dirigida a um macho estranho e a submissão é mostrada
ao macho preferido, que então nada na direção da fêmea e estica seu pescoço em
sua direção. As lutas, perseguições e exibições de plumagem são comuns entre os
machos mas não são importantes para a formação dos casais.
As aves pareadas deixam o grupo, porém em algumas situações domésticas, as
fêmeas não podem evitar o ataque dos machos não pareados e podem ser
sufocadas ou perseguidas até a exaustão. A fêmea é protegida por seu companheiro
até que a ovoposição seja completada. A incubação leva 28 dias e o patinho deixa
o ninho após o primeiro dia. A fêmea sofre sua muda anual por volta de 6 a 8 semanas
após os patinhos começarem a voar.
Os filhotes normalmente ligam-se à mãe durante os primeiros dias após a
eclosão dos ovos. O reconhecimento da espécie ocorre mais gradualmente para
assegurar o acasalamento com a própria espécie na idade adulta.

COMPORTAMENTO REPRODUTIVO
FÊMEA
O estado de acasalamento das fêmeas obviamente possui fatores fisiológicos e
comportamentais. O termo estro é freqüentemente reservado para descrever componen-
tes comportamentais e não fisiológicos. Os ovários podem passar por mudanças asso-
ciadas com o estro sem que a fêmea apresente sinais de comportamento estral.
Comportamento 1105

Rotinas comportamentais normais são alteradas durante a estro manifestado, e


existe tipicamente uma diminuição nos comportamentos de alimentação e descan-
so, enquanto os comportamentos locomotor, agonístico, investigativo e vocal
aumentam. Estas respostas são secundárias em relação ao caráter essencial do
estro, isto é, a disposição da fêmea para aceitar o acasalamento.
O comportamento de monta entre fêmeas é típico do estro de vacas de grandes
rebanhos e algumas vezes é observado em cadelas, mas raramente em éguas,
gatas ou ovelhas. A égua no cio geralmente assume uma postura particular, que
envolve freqüente afastamento dos membros posteriores, enquanto a urina é
eliminada em pequenas quantidades e o clitóris é exposto em eversões rítmicas
repetidas. A égua procura a companhia de outros eqüinos e exibe um interesse
particular pelo macho. Na presença do garanhão, a égua no cio direcionará seus
quartos traseiros para ele e assim permanecerá. As porcas começarão a seguir os
cachaços ou quase qualquer coisa que se mova.
Os períodos e ciclos estrais variam consideravelmente nas éguas, possivelmen-
te porque são selecionadas para ovular no começo de fevereiro – uma época não
natural do ano. O período estral geralmente dura de 4 a 10 dias e os ciclos se repetem
a cada 28 dias. Um período de anestro ocorre tipicamente durante a estação de
menor período de luz do dia, embora algumas éguas possam exibir estro compor-
tamental e/ou fisiológico.
O estro na maioria das cadelas ocorre em intervalos de , 6 meses, independen-
temente da época do ano. A rhodesian ridgeback e a basenji tendem a manter uma
estação reprodutiva única e sazonal por ano, como a loba, sua ancestral. Algumas
das raças toy ciclam 3 vezes por ano. O sangramento pró-estral e o linhaço vulvar
são características exclusivas da cadela (ver também PSEUDOPRENHEZ, pág. 821).
O estro nos gatos tem uma periodicidade de 3 semanas, com picos no início da
primavera ou verão. A receptividade dura de 4 a 6 dias se ocorrer o acasalamento,
ou de 6 a 10 dias se não ocorrer. A vocalização do cio (“choro”) é usada para atrair
os machos, e uma vez que estejam por perto, os comportamentos de rolamento,
esfregação e lordose indicam o estado hormonal da gata.
Acasalamentos repetidos em ambientes naturais tendem a diminuir a duração de
estro nos bovinos por até 8h. Algumas fêmeas estimuladas por machos
vasectomizados mostram uma duração menor de estro. Estes exemplos confirmam
a visão moderna de que o estro não está somente sob controle endógeno e que sua
manifestação está sujeita, em parte, a fatores ambientais, inclusive bioestimulação.
As duas condições naturais comuns responsáveis pelo anestro, por exemplo, em
éguas e jumentas, são a sazonalidade e a prenhez. Cerca de 2% das vacas prenhes
apresentam estro durante a gestação e quase a mesma proporção exibe cios
silenciosos enquanto cicla.

MACHO
A libido no animal macho se desenvolve na puberdade e persiste, em certos
níveis, por toda a vida do animal. Ela depende da produção de testosterona e sua
manifestação é determinada por características herdadas. Pode ser alterada como
conseqüência de ações físicas ou inibida como resultado de situações adversas. Sob
condições naturais, um macho de baixa libido deixa pouca prole, porém em situações
domésticas, uma baixa libido pode ser perpetuada. Evidências experimentais e
circunstanciais indicam certa base genética para a libido. A nutrição exerce uma
influência leve; entretanto, um alto padrão nutricional pode inibir a produção de
testosterona em alguns machos jovens, enquanto uma subnutrição intensa pode
prejudicar a libido.
Desde que não haja correlação significante entre comportamento sexual e
qualidade do sêmen, uma avaliação adequada da habilidade de procriação do
reprodutor deve assegurar ambos os fatores.
Comportamento 1106

A libido se manifesta durante a corte do macho. O “dobramento do lábio”, ou


“flehmen”, é demonstrado na maioria dos ungulados. O macho estende a cabeça e
o pescoço, contrai as narinas e levanta e enrola o lábio superior. Isto geralmente
ocorre após ele cheirar a urina ou o períneo da fêmea e envolve o olfato.

COMPORTAMENTO COITAL
“Disposição” para o coito é freqüentemente observada nos machos que
cortejam as fêmeas imediatamente antes e durante o estro. A livre associação
dos parceiros para o acasalamento pode estabelecer uma aliança temporária
(“ligação coital”), que facilita a repetição do acasalamento e assegura condições
ideais para fertilização. Algumas formas de cutucões ocorrem no comportamento
pré-coital na maioria dos ungulados. Ao empurrar os quartos traseiros da fêmea,
o macho é capaz de sentir se ela se afasta, como no proestro, ou se aceita. Este
é um comportamento comum nos touros. Os garanhões testam o estro na égua,
cheirando mordendo e beliscando regiões do corpo, desde os quartos traseiros
até o pescoço da égua.
Uma das funções da corte é orientar o macho a encontrar maneiras de realizar
a penetração. A monta apropriada é parcialmente adquirida pelo aprendizado. Os
machos normalmente montam em fêmeas de sua própria espécie, porém
garanhões podem montar em jumentas e jumentos podem montar em éguas
(resultando em mulas). Ocasionalmente, caprinos e ovinos poderão se acasalar.
Mais raramente pode ocorrer a monta de éguas por touros, novilhas por garanhões,
e várias espécies por cães. Um afeiçoamento inadequado na infância é geralmen-
te a base para tais relacionamentos. A corte também permite ao macho conseguir
uma ereção completa, de forma que um período longo de corte é muito importante
em espécies com pênis vascular, ao contrário das espécies que possuem pênis
fibroelástico.
A fase de acasalamento do comportamento sexual masculino compreende vários
componentes comportamentais. Incluem-se entre eles a monta, abraços, investidas
pélvicas, penetração e ejaculação. As “montas falsas”, pelos machos, ocorrem se
não se conseguir a penetração e se forem necessárias mais de uma tentativa para
se conseguir o acasalamento; por exemplo, nos garanhões, 2 ou 3 montas falsas são
antes de se conseguir o acasalamento. No touros, carneiros e bodes, a penetração
consiste de uma única investida pélvica, seguida por desmonta. Nos garanhões, há
um longo período de investida pélvica antes da ejaculação. Os suínos têm uma fase
de acasalamento relativamente longa, com a ejaculação durando até 20min. O
acasalamento em gatos ocorre muito rapidamente; assim que o gato retira seu pênis,
as espículas penianas estimulam o epitélio vaginal, fazendo com que a gata se vire
e ataque o gato. Nos cães, ocorre um “engate” durante a penetração à medida que
a musculatura vulvovaginal se retesa atrás do bulbo do pênis. Este engate é mantido
por 10 a 30min, mesmo que o macho desmonte e passe um membro posterior por
sobre o dorso da fêmea, de forma que fique de costas para ela.
A fase pós-acasalamento inclui a desmonta, a limpeza genital em algumas
espécies, e um período refratário em que não há interesse em fêmeas no estro. Um
rápido retorno à presteza de acasalamento é visto em machos que receberam a
oportunidade de acasalar com uma nova fêmea.
As fêmeas normalmente são cobertas várias vezes durante cada período
estral. A freqüência é influenciada por vários fatores, incluindo o número de
fêmeas no cio, machos competidores, serviços anteriores e o grau de receptividade
nas fêmeas no cio. Quando existe competição entre as ovelhas por um número
limitado de carneiros, as mais velhas geralmente conseguem obter maior número
de montas que as mais jovens.
Comportamento 1107

TABELA 2 – Coito, Gr An
Tempo de reação Comportamento pré-coital Modo de Duração da penetração Repetição dos
do macho do macho penetração e local da inseminação acasalamentos
Eqüinos Cheira a região genital. De 1 a 4 montas. Várias 1min, intracervical Os cruzamentos são geral-
5min em média Reflexo olfatório genital. oscilações pélvicas. Fase mente arranjados de
Morde a região da garu- inativa terminal modo a permitir 2 a 4 ser-
pa. Pênis ereto viços por estro
Bovinos Cheira a vulva. Reflexo ol- Investida pélvica única com- 5 a 10s, intravaginal Os touros ao ar livre servi-
Geralmente 2min fatório genital. Alinhamen- binada com reflexo de rão às vacas 3 a 10 vezes
Média de 12min to. Lambe o quarto trasei- “abraço” no período de estro
Média para raças de corte ro
20min
Suínos Aproxima-se da porca dan- Pequenas protrusões do 9min, intra-uterina Muitos cachaços servirão às
1 a 10min do uma série de grunhi- pênis espiral repetidas até porcas 3 a 7 vezes por
dos. Cheira a vulva vigo- que a penetração ocorra. período de estro
rosamente. “Mastiga” rui- Oscilações pélvicas se-
dosamente a mandíbula guidas de fase sonolenta
e espuma pela boca
Ovinos Cheira a vulva. Reflexo ol- Investida pélvica única mui- 5s, intravaginal Os carneiros algumas vezes
De 30s a 5min fatório genital. Arranha to rápida, com “abraço” servirão à ovelha em estro
com as patas dianteiras. dos membros anteriores várias vezes. Alguns car-
Balindo, dá patadas com neiros adultos servirão a
as patas dianteiras e rápi- cada ovelha apenas 1 vez
dos abraços. Reflexo ol-
fatório genital
Comportamento 1108

CARACTERÍSTICAS DO COMPORTAMENTO REPRODUTIVO


EM AVES DOMÉSTICAS
Comportamento sexual – À medida que o frango atinge a maturidade, a
produção de testosterona resulta em características sexuais secundárias, incluindo
o crescimento de crista e barbelas e o surgimento do canto do galo. As atividades
de corte do macho incluem o ciscamento do chão, o balançar das asas e a dança
do acasalamento, que leva à cópula. O canto, que é raro nos capões, informa a
localização do macho e seu território para as pretendentes e as afasta de outros
machos. A interferência masculina na cópula é comum quando existem vários
machos em um pequeno galinheiro com poucas fêmeas.
À medida que a franga atinge a maturidade, os hormônios do córtex ovariano
estimulam o crescimento de ovidutos, inibem a plumagem masculina, e são
responsáveis pelo agachamento sexual, quando o galo coloca um pé em seu dorso
antes de acasalar. Barbelas e cristas modificadas também podem-se desenvolver.
Comportamento parental – Exceto em raças “sem choco”, a incubação se inicia
quando um certo número de ovos já foi posto. Durante o choco, os ovos são virados,
impedindo assim a adesão no interior da casca. Uma área de choco altamente
vascularizada, aquecida e sem penas se desenvolve em cada lado do tórax. A
galinha ao chocar cacareja e arrepia suas penas se perturbada. Sob condições de
perigo, um elaborado comportamento de aproximação confunde seus predadores
e permite às galinhas retornarem a seus ninhos sem serem percebidas. Durante a
incubação (20 a 22 dias), a prolactina reduz a atividade ovariana e o comportamento
sexual e assim a ovoposição cessa. Após a eclosão, a galinha se utiliza de
vocalizações curtas, repetitivas e baixas para conduzir os pintinhos e indicar as
fontes de alimento. Ela os afasta dos predadores aéreos e terrestres por meio do
cacarejo ou de um grito abafado.
Os perus são reprodutores sazonais; o pico de atividade é na primavera, porém
com o uso de luz artificial, pode-se mantê-los sexualmente ativos por todo o ano. Os
machos iniciam uma corte elaborada (cada uma pode durar até 10min) com posturas
e movimentos, porém são ignorados por todos, exceto por fêmeas receptivas. A
receptividade dura , 2 dias. As fêmeas abaixam-se em resposta ao “pavoneamento”
do macho, permanecendo quietas com a cabeça recolhida perto do corpo. O macho
se aproxima devagar, monta, pisa e realiza o contato cloacal com o oviduto evertido
da fêmea. A ejaculação se segue rapidamente, o macho desmonta e a fêmea
executa um encrespamento pós-copulatório das penas e uma corrida breve. Os
machos têm um breve período refratário e podem chegar a se acasalar com cerca
de 10 fêmeas em 30min. Não se formam pares, porém os machos dominantes
podem possuir um harém que irão defender contra outros machos. Apenas os
machos de posições superiores completam o acasalamento com sucesso. Fêmeas de
posição inferior são acasaladas mais freqüentemente que as de posição superior,
contudo botam ovos menores e em menor quantidade. Após um único acasalamen-
to, ovos férteis podem ser botados por cerca de 5 a 6 semanas. Quando os ovos são
removidos periodicamente, o comportamento de choco pode ser adiado.

ESTRESSE COMPORTAMENTAL
O controle exercido pelo homem sobre os animais domésticos continua a
aumentar, e novas fases de criação intensiva continuam a ser implementadas.
Existe um aumento de demanda pública por veterinários para avaliar condições de
manejo e sanidade do grande número de animais mantidos em condições intensivas
Comportamento 1109

em ambientes artificiais. Os estressantes são fatores ambientais que induzem


estados de estresse em animais de rebanho. O estresse pode ser indicado por
mudanças no comportamento dos animais e estratégias que estes adotam para
superar os fatores estressantes: 1. os animais necessitam de algum estímulo
para superar o estresse ou “tédio” em um ambiente inóspito; 2. o animal pode
apresentar uma resposta adaptativa efetiva aos estressantes normais; e 3. além de
um nível crítico de estresse, o animal pode não ser capaz de se adaptar da maneira
esperada e produzir respostas anormais ou anômalas. Muito da pesquisa já
realizada concentrou-se sobre as necessidades nutricionais, sanidade e higiene; as
necessidades comportamentais e sociais dos animais foram pouco compreendidas.
A superlotação e/ou confinamento levam a vários efeitos estressantes e os padrões
comportamentais resultantes quase sempre têm sido definidos como “vícios”.
Várias tentativas têm sido feitas para que se avaliem os vários estressantes de um
ambiente e se calcular um índice estressante. Uma dificuldade é que um estressante
para um indivíduo ou raça pode não o ser para outro.
Alguns dos padrões anômalos ou anormais apresentados pelos animais em
estresse quando se encaixam em sistemas de comportamento são discutidos adiante.
Comportamento anômalo – No passado existia comparativamente pouco
conhecimento disponível sobre as respostas dos animais mantidos sob sistemas
intensivos de criação. Muitas formas de comportamento anormal são relacionadas
a estímulos nocivos ou estressantes no ambiente. Ambientes inferiores parecem
estar fortemente relacionados a comportamentos anômalos, tais como canibalismo,
redução do apetite, movimentos estereotipados, pouco cuidado parental,
superagressividade, falta de responsividade, mordedura de caudas e cochos,
mastigação destrutiva, escavação, comportamento de limpeza excessivo e vários
outros. Os comportamentos que anteriormente eram vistos como vícios são formas
de comportamento anômalo que surgem à medida que um animal tenta enfrentar
restrição, superlotação ou falta de estímulos diversificados no ambiente.
Algumas tentativas recentes têm sido feitas para classificar as várias respostas
comportamentais anômalas observadas nos animais domésticos. Embora nenhu-
ma seja inteiramente satisfatória, um destes sistemas pode ser utilizado para tentar
esclarecer este difícil campo de estudo. Comportamentos anômalos podem ser
caracterizados por sua forma, freqüência e pelo sistema comportamental no qual
ocorre.
Anomalias reativas – Muitas das formas anômalas de comportamento descritas
ocorrem enquanto o animal está excitado. Estas anomalias (ver TABELA 3) incluem
a volteadura a esmo em cavalos, a esfregadura de focinho em porcos e a limpeza
de penas deslocadas em aves. Elas são em sua maioria atividades estereotipadas
dos movimentos corporais e, freqüentemente, surgem como resultado de atos
deslocados.
Comportamento oral/ingestivo anômalo – Síndromes comportamentais anô-
malas que envolvem respostas orais ou ingestivas são uma outra subclasse (ver
TABELAS 4 e 5). As deficiências nutricionais são somente um fator contribuinte no
animal que exibe movimentos bucais anormais ou anomalias ingestivas. Cãezinhos
alimentados artificialmente na mamadeira com um grande furo no bico continuavam
a sugar as orelhas de seus companheiros logo após a ingestão do leite disponível.
Da mesma maneira, bezerros criados na mamadeira freqüentemente desenvolvem
o hábito de “sugar” seus companheiros. Tais desordens devem estar envolvidas
com mudanças nas práticas comuns de criação.
Anomalias reprodutivas – Ver TABELA 6. Várias respostas de má-adaptação
relacionam-se com atividades sexual, maternal ou neonatal. Respostas anôma-
las relacionadas ao estro e à libido representam sérios problemas para a indústria
animal.
Comportamento 1110

TABELA 3 – Anomalias do Comportamento Reativo


Animais
Condição Etiologia Seqüelas clínicas
envolvidos
Volteadura a esmo Cavalos Contenção Emaciação
Dorso dolorido
Sacudidela da Aves “Frustração” Desconhecidas
cabeça Cavalos
Espécies exóticas
Inclinação da Cavalos “Frustração” Desconhecidas
cabeça Problemas dentários
Esfregadura do Suínos Lotação Incertas
focinho (nariz) Cães
Gatos
Andadura estereotipada Cavalos Confinamento Emaciação
Aves “Frustração”
Cães
Espécies exóticas
Agitação das patas Cavalos Incerta Desconhecidas
Touros
Automutilação Cavalos Confinamento Lesões
Cães “Frustração”
Esfregadura da cabeça Suínos Isolamento Desconhecidas
Gado
Esfregadura da cauda Cavalos Variada Desconhecidas
Atividades de Todas as espécies “Frustração” Desconhecidas
deslocamento
Posição de pé crônica Cavalos Incapacidade Fadiga
Bezerros e restrição
Sentada de cachorro Porcas Variada Geralmente
sonolenta Cavalos nenhuma
Gado Infecções urinárias
Morte súbita por
insuficiência renal
Sucção do flanco Cães “Frustração” Provavelmente
nenhuma
Comportamento Cães “Frustração” Nenhuma
destrutivo Gatos
Cavalos

Necessidades comportamentais – Existem muitos debates a respeito da impor-


tância das necessidades etológicas dos animais domésticos. Os suínos necessitam
chafurdar quando confinados, ou galinhas necessitam de um local para banho de pó
quando em pequenas gaiolas? Quando as condições permitirem, os suínos chafurda-
rão para regular a temperatura corporal, ou então, durante períodos de recreação. Se
um porco bem-criado possui uma temperatura ambiente confortável, ele tem a
necessidade de chafurdar; há um efeito adverso no porco se a chafurdação não for
Comportamento 1111

TABELA 4 – Anomalias do Comportamento Ingestivo Localizadas na Boca


Animais
Condição Etiologia Seqüelas clínicas
envolvidos
Mordedura do cocho Cavalos Confinamento Emaciação
Cólicas ocasionais
Afinamento do cocho Cavalos Confinamento Desconhecidas
(lambedura) Cães Nervosismo
Gatos
Mordedura da cauda Suínos Complexa; envolve Emaciação
Cavalos nutrição deficiente, Abscessos nos quartos
Cães lotação, traseiros
“frustração”
Puxamento da língua Cavalos Incerta Desconhecidas
Mordedura de grade Suínos Confinamento Produção reduzida e
subfertilidade
Sucção prolongada Bezerros Desmame precoce Formação de chumaços
Leitões de pêlos (tricobezoares)
Cãezinhos Trauma em outros
Gatinhos
Limpeza corporal Bezerros Confinamento Formação de chumaços
excessiva Cães “Frustração” de pêlos
Gatos Granuloma por lambedura
Arrancamento de lã Ovinos Confinamento Perda do velo ou de pêlos
(pêlos) Primatas “Frustração”
Enrolamento da língua Gado Confinamento Desconhecidas
Mastigação de vácuo Suínos Confinamento Notável perda de peso e
baixa fertilidade
Bicagem das penas Aves Criações em altas Perda de penas
densidades Trauma

feita; ele ficará frustado, estressado ou mesmo sentirá dor? Argumenta-se freqüen-
temente que suínos que tiveram experiências prévias de chafurdação dela necessi-
tarão; a necessidade seria a mesma em um porco que nunca a experimentou? Estas
áreas são difíceis de pesquisar, embora sejam matérias de constantes debates.
O veterinário pode responder apenas intuitivamente. Um determinado ambiente
fechado pode ser particularmente restritivo e permitir apenas algumas poucas
oportunidades de limpeza, espreguiçamento, exibição ou mesmo contato social
com os membros deste confinamento. Com possibilidades limitadas para ativida-
des, algumas espécies tendem a adotar anormalidades orais. Os suínos têm uma
profunda necessidade de fossar ou roçar a boca em alguns materiais. Quanto mais
característica de uma espécie for a resposta comportamental que foi frustada, mais
provavelmente uma necessidade etológica não estará sendo suprida. O debate está
ligado à importância das necessidades comportamentais dos animais e seu relacio-
namento com a sanidade animal. Pode-se acreditar que as muitas necessidades
comportamentais não sejam essenciais, porém, se preenchidas, ou se substituídas
por alternativas, o animal pode-se desenvolver melhor. Estudos demonstram que
bons cuidados na infância, comunicação com animais estabulados, etc. possuem
Comportamento 1112

TABELA 5 – Anomalias do Comportamento Ingestivo


Condição Animais envolvidos Manifestações
Deglutição de vento Cavalos O ar é repetidamente engolido, sozi-
(aerofagia) nho ou em associação com uma ação
de mordedura
Mastigação de madeira Cavalos, gado, Retirada de cascas de árvores e mas-
(lignofagia) carneiros tigação de cercas restritivas ou cer-
cados internos
Ingestão de fezes Cavalos, porcos, Normal em coelhos e em filhotes da
(coprofagia) cães maioria das espécies. Em animais
adultos, por exemplo, cavalos, cães
e porcos confinados. Em porcos,
pode seguir-se à atividade de mas-
sagem anal
Ingestão de pêlos Carneiros, gado, Ingestão de pelagem, isto é, pêlos ou
(tricofagia) cavalos, gatos, lã, própria ou de outros. Pode ocorrer
coelhos como seqüela de limpeza excessiva
ou sucção corporal
Ingestão anômala de leite Gado (leiteiro), cor- Sucção cruzada por animais adultos
(galactofagia) deiros, gatos
Ingestão de terra Cavalos, gado, ga- Ingestão de terra e areia em quantida-
(geofagia) tos, cães des substanciais
Empanturramento Cavalos, gado, Superingestão e deglutição rápida de
(hiperfagia) cães, gatos alimentos de forma habitual ou espo-
rádica
Ingestão excessiva de água Cavalos, carneiros, Consumo excessivo de água por meio
(polidipsia) porcos, aves da ingestão freqüente, demonstrada
em animais confinados com supri-
mento de água à vontade. Pode ser
um processo patológico, porém, mais
freqüentemente é um distúrbio com-
portamental
“Pica” Gado, carneiros, Mastigação de objetos estranhos tais
cães, gatos como ossos velhos, roupas, etc. Su-
gere deficiência, por exemplo, afos-
forose

Ingestão de camas Cavalos, aves, gati- Ingestão de camas limpas ou sujas,


nhos particularmente pedaços de madei-
ra ou palha

Ingestão das penas Aves (galinhas) Bicagem e deglutição das penas de


outras aves. Respostas alimentares
maldirigidas na criação de aves man-
tidas em grupos compactos com ra-
ção concentrada

Ingestão dos ovos Aves (galinhas) (em Quebra das cascas dos ovos por bica-
camas) das e ingestão do conteúdo

Mordedura ou bicagem do Aves, porcos Morder ou “bicar” várias partes do cor-


corpo po, tais como cabeça, cauda, orelha,
dorso, ânus, dedos e vísceras
prolapsadas
Comportamento 1113

TABELA 6 – Anomalias do Comportamento Reprodutivo


Condição Animais envolvidos Manifestações
Cio silencioso Éguas, vacas e ca- Estro comportamental ausente ou em bai-
delas xos níveis em uma fêmea que possua as
outras características fisiológicas do estro
fértil
Impotência sonolenta Touros Alinhamento correto do macho atrás da
fêmea em estro, porém com adoção da
condição de sonolência inativa; a cabeça
geralmente repousa no dorso da fêmea
Desalinhamento coital Touros, bodes Adoção de uma posição pelo macho, na qual
há desvio do alinhamento da fêmea e não
ocorre a monta (“monta pela cabeça”)
Impotência da penetra- Touros, carneiros Monta ativa, ocorre o abraço mas com
ção pouca investida e penetração insuficien-
te persistente
Síndrome monossexual Carneiros, touros, Monta sexual de outros machos à exclusão
cachaços e novi- de fêmeas, por exemplo, em carneiros
lhos em confina- criados em grupos unissexuais densos.
mento Síndrome do touro-novilho: tolerância dos
novilhos à monta freqüente por outros
novilhos quando em grupos confinados
Rejeição do neonato Todas as espécies Reação agressiva persistente em direção
ao recém-nascido ou deserção ativa pela
mãe
Deficiência materna Todas as espécies Reação materna negativa persistente em
direção ao recém-nascido, que não tem
permissão para mamar. Deficiência na
“descida do leite”
Roubo de outras crias Éguas, vacas e ove- Esforços pré-parto de uma mãe para ado-
lhas tar as crias pertencentes a outras fêmeas.
Freqüentemente é uma função de densi-
dade de rebanho e parturição sincroniza-
da ou altas densidades de rebanho
Esforço de sucção defi- Todas as espécies Deficiência do recém-nascido para apre-
ciente sentar o comportamento positivo de pro-
cura da teta
Agressão puerperal Rebanho parturien- Desenvolvimento súbito de comportamento
te agressivo violento (pós-parto), direcio-
nado anti-socialmente e ocorrendo tem-
porariamente
Canibalismo materno Porcas, ovelhas, Marrãs recém-paridas com sua primeira
cadelas e gatas leitegada podem comer sua cria quando
agitadas. Ovelhas confinadas, ocasio-
nalmente, comem as caudas e pés de
seus cordeiros recém-nascidos. As ca-
delas podem continuar a morder o coto
umbilical, romper a parede abdominal e
consumir as vísceras, bem como, oca-
sionalmente, os pés de suas crias
Pseudociese Cadelas Cadelas com corpo lúteo persistente ado-
tam comportamento parturiente, incluin-
do a formação de ninhos e a “adoção” de
objetos inanimados
Comportamento 1114

TABELA 7 – Anomalias de Comportamento Agonístico


Condição Animais envolvidos Manifestações
Agressão clara intensa Todas as espécies Investir, empurrar ou atacar agressi-
domésticas vamente animais intrusos ou que
estão se aproximando de espécies
diferentes ou da mesma espécie (in-
clusive o homem)
Alarme excessivo Todas as espécies Reações claras e intensas: estouro de
domésticas boiada, disparadas, fuga histérica
em aves
Ameaça Todas as espécies Exibição de ameaça clara e intensa,
domésticas particularmente quando da aproxi-
mação humana
Cabeçada Ruminantes, nota- Investir com a cabeça, ferir com os
damente bovinos, chifres, empurrar a cabeça contra
bodes e carneiros objetos ou pessoas competitivas/in-
trusas/acessíveis
Mordedura Cavalos, cães, ga- Dentadas ou mordidas anti-sociais
tos e porcos habituais
Coice e ataque Atacar agressivamente com uma pata
ou perna
1. Cavalos 1. Atacar frontalmente com uma pata
dianteira
2. Cavalos 2. Erguer o quarto traseiro e atacar
violentamente para trás com ambas
as patas
3. Todas as espé- 3. Escoicear para baixo e para trás
cies domésticas com uma pata traseira
4. Todas as espé- 4. Escoicear para a frente com uma
cies domésticas pata traseira
5. Mulas, burro, ga- 5. Escoicear para o lado com uma pata
do traseira
Alarme por sobressalto Todas as espécies, Refugo, empacamento, reações por
mais comumente sobressalto. Evita certas situações,
em cavalos características ambientais ou even-
tos. Reações de alarme intensas;
podem incluir arremesso da cabeça,
empinamento, saltos e retirada ime-
diata
Paralisação (hipotonia) Todas as espécies. Repouso, paralisação e imobilidade
Mais comum em tônica persistente em formas de re-
bovinos e outros pouso reativo. Recusa a levantar-se
ruminantes, gali- como resposta a uma solicitação
nhas e cães urgente. Uma forma de acinesia ou
inércia funcional

um efeito benéfico no crescimento e na produção e diminuem as chances do animal


sucumbir por doenças e estresse, o que pode refletir sobre as conseqüências da
atenção às necessidades etológicas.

CONTROLE DE SÍNDROMES COMPORTAMENTAIS


Tem se argumentado que uma anomalia comportamental induzida por estresse
(como movimento estereotipado e repetitivo) seja um sinal de adaptação; em outras
Comportamento 1115

palavras, a homeostasia comportamental diminui ou elimina o estresse. Outros


argumentam que essa interpretação, em termos de saúde animal, é ilógica. A
persistência de um comportamento anômalo pode ser adaptativa se os fatores
causais ainda estiverem presentes; entretanto, os comportamentos freqüentemente
persistem após os fatores terem sido removidos. Estudos indicam que antagonistas
narcóticos podem deter tal comportamento por pouco tempo, o que sugere que esse
comportamento possa liberar endorfinas. A deterioração posterior, tanto comporta-
mental quanto fisiológica, pode ocorrer e afetar a conversão alimentar, a saúde, a
produtividade, o crescimento e a resistência a doenças. O controle de anomalias
comportamentais é ética e fisiologicamente desejável. Adiante, métodos de controle
de anomalias comportamentais são indicados, quando praticáveis.

Síndromes
Volteadura a esmo – Reconhecida como desordem comportamental de animais
enjaulados ou confinados, é comum em eqüinos que tenham sido mantidos por muito
tempo em baias. O animal fica em uma posição, mas volteia de lado a lado ou pode
balançar-se para trás e para frente. Uma vez adquirida, a volteadura a esmo é
extremamente difícil de controlar, e acredita-se que a anomalia possa ser induzida
em outros eqüinos em um estábulo por associação. Até certo ponto, pode ser
controlada amarrando-se o eqüino com cordas atravessadas de forma a limitar o
movimento lateral de sua cabeça. Grilhões nos membros anteriores também tendem
a limitar o movimento em um estábulo. Sem exercício, porém, o problema raramente
é controlado. Teoricamente, os animais afetados devem ser retirados para pastejo,
mas quando isso não for possível, devido à falta de espaço, um exercício reforçado
pode ser feito através da cavalgadura, disparadas ou uso de exercitador mecânico.
Agitação das patas – O controle da agitação das patas é difícil, particularmente
porque a causa é desconhecida. Já que ocorre mais freqüentemente em eqüinos
confinados e isolados, pode ser aliviada retirando-se o animal afetado para pastejo
com outros eqüinos. Grilhões ou correntes para evitar coice podem ser usados em
eqüinos problemáticos com pouco sucesso.
Andadura estereotipada – Nos eqüinos, ela é definida como “marcha de
cocheira”. É um comportamento comum em animais de circo e zoológico que
estejam confinados a pequenos espaços. Também ocorre em cães que tenham sido
mantidos em canis por longo tempo e em aves. No caso das aves, parece ser
induzida por aves frustradas que estejam não só esfomeadas, mas também em
estado de grande expectativa. As aves afetadas tipicamente mostram movimentos
de andadura repetitivos, ocupando toda a extensão de um lado do galinheiro ou
gaiola. Uma vez que a condição tenha-se transformado em comportamento estabe-
lecido em um eqüino ou ave, não pode ser controlada sem liberdade ambiental.
Sacudidela da cabeça – É mais comum em aves engaioladas que em galinhas
criadas no chão. É também vista quando a proporção de reposição das aves é
aumentada. É reduzida quando as aves são transferidas a um ambiente novo em um
galinheiro de maior espaço. Os eqüinos e animais de zoológico também podem exibir
sacudidela da cabeça.
Inclinação da cabeça – Várias formas desta anomalia comportamental em
eqüinos, a qual é semelhante à sacudidela de cabeça, ocorrem como comportamen-
to estereotipado. Uma vez estabelecida a condição, o controle é difícil. Um par de
antolhos bem pesados pode distrair um eqüino nesta prática. Se o comportamento
estiver começando, deve-se ter cuidado com dentadas.
Esfregadura da cabeça – É algumas vezes observada em suínos ou bovinos
sujeitos a confinamento crônico em baias solitárias e estreitas. O controle deste
comportamento (como de outras ações estereotipadas somáticas semelhantes)
parece exigir alívio do confinamento crônico.
Comportamento 1116

Esfregadura da cauda – Este comportamento em eqüinos não é específico.


Para eliminar a possibilidade de parasitismo (ver pág. 242), o eqüino deve ser
examinado e receber um parasiticida se necessário.
Esfregadura do nariz (focinho) – Tem sido observada em certos tipos de
suínos e ocasionalmente em cães e gatos. O comportamento anômalo de
massagem anal por esfregadura do focinho e ingestão de fezes, visto em suínos,
é uma anomalia composta. A condição ocorre tipicamente entre suínos em
crescimento mantidos em condições de lotação, e tem sido mais observada
desde que o corte da cauda se tornou claramente universal no controle da
mordedura desta.
A melhora de condições de lotação pode controlar a esfregadura do focinho e
a coprofagia associada (ver pág. 1122) e é mais eficiente na prevenção. Já que
a anomalia pode ser induzida em chiqueiros contíguos por associação visual,
recomenda-se a adoção de chiqueiros com paredes sólidas. A esfregadura do
focinho também pode ser reduzida pelo fornecimento de objetos que os suínos
possam mastigar e fossar.
Automutilação – A fricção corporal vigorosa ou a mordedura de flanco é uma
anomalia comportamental severa em eqüinos, principalmente naqueles confinados
e isolados. Os cães exibem automutilação ao mastigarem destrutivamente suas
caudas ou lamberem granulomas. Tranqüilizantes maiores e menores e, experi-
mentalmente, antagonistas narcóticos têm sido usados para deter o comportamen-
to. O aumento de exercício e a diminuição de estresse são importantes. A sucção
do flanco em dobermans e alguns outros cães é vista durante estresse; o cão
mantém sua boca em seu lombo ou flanco, deixando uma mancha úmida, mas
raramente causando um problema. Enquanto os animais afetados não exibirem
qualquer afecção cutânea patológica, parasitismo, neuromas ou afecção clínica
gastrointestinal, estas possibilidades devem ser investigadas.
Atividades de deslocamento – As atividades de deslocamento são comporta-
mentos normais expressados em momentos inapropriados. Várias delas podem ser
reconhecidas em animais de fazenda. Estão quase sempre na forma de unidades
individuais de comportamento alimentar ou de limpeza, e são mostradas como
“trocas enérgicas” em situações de conflito. Embora todos esses casos não devam
ser considerados como comportamentos anômalos, uma alta incidência de ativida-
de de deslocamento implica em casos individuais.
Posição de pé crônica – Antigamente, não era incomum que os cavaleiros
fornecessem a esses animais uma corrente de viga forte ligada a postes traseiros
de uma cocheira, para que o animal apoiasse os quartos traseiros neles e assim
conseguisse descansar e dormir.
Sentada de cachorro – É vista em porcas reprodutoras confinadas na maior
parte de sua prenhez em cocheiras solitárias e estreitas. Uma forma semelhante
é vista às vezes em vitelos após confinamento demorado em engradados
estreitos. Também, de vez em quando, as posições de sentada de cachorro são
vistas em animais de criação mais pesados, como touros e alguns eqüinos. A
sentada de cachorro anômala pode ser controlada por alterações na forma de
criação; entretanto, uma vez que esses estilos de criação geralmente represen-
tam condutas eficazes na indústria de produção animal, tais alterações podem
ser difíceis de ser empreendidas.
Anomalias reativas – As manifestações de temperamento anômalo são
predominantemente hiper-reações de atitude. As etoanomalias reativas são um
problema particular entre animais de companhia, sobretudo cães. A reatividade
anômala individual pode ser determinada por observação, utilizando-se julga-
mento clínico. As formas individuais de comportamento reativo anômalo são
vistas a seguir com referências para controle.
Comportamento 1117

Agressão móvel – O comportamento agressivo na intenção de atacar um


indivíduo que se aproxima é notável em cães. É visto também em todas as espécies
de criação, de tempos em tempos, mais comumente em machos e mães de animais
recém-nascidos. O ataque agressivo é comum em cães com território ao ar livre, em
éguas com potros jovens, em gansos ao ar livre e em vacas recém-paridas de certas
raças, por exemplo, galloway e brahman. Também é comum entre garanhões e cães
na forma de agressão intermasculina. O controle reside na forma de contenção ou
prevenção.
Alarme móvel – Uma tendência anormal à fuga repentina é observada em
alguns animais. A fuga é uma forma extensiva de reação de alarme, a qual é muito
normal e adaptativa entre animais que seriam predados em vida selvagem, ou
mesmo sob condições de vida livre em animais domésticos. Sua ocorrência dentro
dos sistemas de criação sem estímulo apropriado é mal-adaptativa. A tendência a
esta síndrome nas aves é chamada “estouvamento”. O estouvamento é uma
anormalidade mais proeminente em algumas linhagens de aves do que em outras
(ver adiante). Também visto em outras espécies quando cercadas e acumulam
energia. Os eqüinos com esta tendência quase sempre reagem a pequenos
estímulos e podem derrubar seus cavaleiros. O controle exige a eliminação dos
estímulos prováveis e exercício crescente para eliminar a energia extra.
Histeria – A reação de alarme extensivo nas aves é quase sempre denominado
como histeria. O estouvamento nas galinhas domésticas aparece em diferentes
tipos de comportamento histérico e nervoso em diferentes ambientes e faixas
etárias. A histeria nas poedeiras é caracterizada por fuga repentina com grasnidos
e tentativas de se esconder. O controle está relacionado à densidade populacional.
A incidência de histeria em aves criadas em galinheiros é intimamente relacionada
à densidade populacional: plantéis de 40 aves têm apresentado 90% de incidência,
enquanto plantéis-controle de 20 aves têm uma incidência de 22%. A remoção das
unhas dos dedos em aves tem contribuído para reduzir a histeria, mas não deve ser
considerada ética. Para algumas linhagens de aves, prefere-se o engaiolamento;
sem dúvida, este procedimento controla um pouco a histeria, embora ela possa se
espalhar por todo um plantel em gaiolas enfileiradas.
Ameaça – O hábito de apresentar uma demonstração de ameaça é uma caracte-
rística comum de temperamento anômalo em alguns animais, mais freqüentemente
em machos não castrados. Assume-se a forma de demonstração de ameaça típica da
espécie quando o animal está em associação íntima ao homem. É tipicamente um tipo
estático e não a exibição móvel de agressão considerada anteriormente. Nos cães, as
mostras de ameaça têm várias características principais comuns, incluindo tensão
muscular, atividade pilomotora, levantamento da cabeça, vocalização, olhar fixo e
orientação em direção ao intruso tanto direta como obliquamente. Isto pode poten-
cializar o ataque e é uma característica de agressão dominadora nos cães. Os eqüinos
quase sempre viram suas orelhas para trás e mostram os dentes quando pessoas se
aproximam de suas baias, mesmo com comida. Alguns investem contra uma pessoa
que tenta entrar na cocheira. A contenção a fim de promover segurança deve ser
considerada. A punição pelo comportamento ou recompensa por comportamento
desejável pode diminuir o problema.
Cabeçada – Alguns ruminantes têm o hábito de atacar agressivamente com a
cabeça, não importando se têm ou não chifres. A condição pode ser agravada por
pessoas que brincam com a cabeça do animal; deve-se ter cuidado ao trabalhar-se
perto destes animais.
Mordedura – Um vício comportamental exibido ocasionalmente por cães e
eqüinos, a mordedura ocorre geralmente na forma de abocanhamento e dentada
com os dentes incisivos direcionados a outro animal ou pessoa que chegue muito
perto. Os gatos também podem morder. O mordedor típico morde com sinais de
Comportamento 1118

aviso, como voltar as orelhas para trás, retrair os lábios e mostrar os dentes, embora
alguns possam usar este comportamento apenas como um ato brincalhão. As
tentativas de mordedura geralmente são súbitas. O amordaçamento é um controle
eficiente. A punição a cada ocorrência também pode ajudar.
Coice e ataque – Os animais que exibem comportamento de coice anômalo são
considerados como hiper-reativos em temperamento. O empinamento e o ataque
com as patas dianteiras são hábitos perigosos de alguns eqüinos, mais comumente
de garanhões e eqüinos desorientados, e o golpe com um membro dianteiro pode
ser feito sem empinamento. Outros eqüinos escoiceiam com um dos dois membros
traseiros e podem mirar alvos específicos ou apenas procurar alvos aleatórios. O
controle do coice habitual é difícil. O condicionamento negativo pode ser tentado por
métodos que inflijam dor ao animal quando este escoicear, mas o sucesso depende
de ter cada coice punido com um método que seja doloroso o suficiente para que o
animal pare. Grilhões e correntes anticoice têm sido utilizados. Os animais implica-
dos devem ser manejados com cuidado.
Refugo (sobressalto/aversão) – O refugo é mais notável em eqüinos, mas pode
ocorrer em outros animais de criação. O controle, quando julgado necessário, pode
ser parcialmente alcançado pela provisão de um animal para companhia em um
cercado, por exemplo. O refugo é geralmente resultado de um objeto se movendo
muito rapidamente para que o eqüino consiga focalizá-lo; a reação instintiva que se
segue é a fuga. Os eqüinos que tendem a refugar são quase sempre aparelhados
com “antolhos” nas rédeas, um auxílio comum usado durante a cavalgada, já que
o refugo a qualquer momento pode ser perigoso.
Imobilidade tônica – O reconhecimento da imobilidade tônica anômala (inércia
submissa) ou discinesia tônica, é essencial no manejo racional do animal de criação
prostrado ou “caído”, de qualquer espécie. Corresponde ao clássico comportamento
exibido pelo gambá, no qual a catalepsia é um mecanismo instintivo para não
estimular as respostas persecutórias dos predadores. Alguns acreditam que, em
alguns casos, a vaca caída (ver pág. 669) possa ser um exemplo de “imobilidade
tônica” ou catalepsia. Em tais casos, a condição não constitui muito uma incapaci-
dade para se levantar, mas sim uma forte relutância a tentar se levantar. A relutância
não só simula um estado corporal patológico como logo estabelece um. É possível
que o controle da “imobilidade tônica” em animais resida no contexto do diagnóstico
diferencial.
Atividade oral patológica – Uma síndrome genérica complexa e importante que
compreende uma variedade de manifestações de comportamento bucal excessivas
e anormalmente orientadas (ver também pág. 1093). A maioria das formas desta
síndrome está associada a circunstâncias combinadas de contenção crônica,
hipoestimulação e talvez energia excedente.
Mordedura de coelho – Um “mordedor comedor” agarra a lateral da manjedoura
(cocho) ou algum outro acessório conveniente com os dentes incisivos. Os incisivos
superiores são quase sempre usados sozinhos. O animal pressiona os dentes para
baixo e comprime a mandíbula; o palato mole é forçado a se abrir. A deglutição de
ar também pode ocorrer. Os eqüinos quase sempre desenvolvem o problema
quando já são mastigadores de madeira (ver pág. 1121). (“Deglutição de Vento” [ver
pág. 1121] é uma forma mais intensa desta condição. Não exige um lugar de
descanso para os dentes.)
A melhor abordagem é assegurar exercício e pastejo adequados para o eqüino.
Embora isso freqüentemente obtenha sucesso, os proprietários podem querer uma
solução mais simples, o que dificulta o controle. A medida mais comum consiste em
prender uma correia ao redor da garganta, suficientemente apertada para fazer com
que o arqueamento do pescoço se torne desconfortável. Alguns tipos dessas
correias têm uma “peça de garganta” de metal que possui um orifício no qual se
Comportamento 1119

encaixa a traquéia, e que permite que o aparelho seja usado sem o perigo de afetar
a respiração. Tais correias geralmente precisam ser removidas durante a alimenta-
ção. Existem outros aparelhos preventivos, mas geralmente são dolorosos para o
animal. Os mordedores podem parar com o hábito se forem alojados em um cubículo
avulso com paredes lisas e alimentados a partir de um cocho que seja removido tão
logo a alimentação tenha-se consumado; entretanto, outros comportamentos este-
reotipados podem aparecer. A cirurgia para seccionar alguns músculos da garganta
essenciais para o comportamento é algumas vezes realizada como último recurso
(ver AEROFAGIA, pág. 1121). Antagonistas narcóticos têm-se constituído em promessa
para ajudar esses animais.
Puxamento da língua – Nesta condição, o eqüino afetado repetidamente
permite que sua língua fique pendurada para fora da boca, quase sempre dobrando-
se longitudinalmente sobre si mesma, por períodos consideráveis. O eqüino pode
ou não encolher sua língua. Os métodos de controle variam desde dor na língua
causada por cabresto até a contenção da língua. A amputação da ponta da língua
tem sido usada, porém não deve ser considerada ética.
Afinamento do cocho (lambedura) – Alguns eqüinos sujeitos a confinamento
crônico colocam o corpo da língua vagarosa mas repetidamente ao redor da lateral
de alguma parte da cocheira. Em alguns casos, a provisão de um bloco de sal para
lamber parece aliviar o hábito, o qual pode indicar uma necessidade ou que o
excesso de sal inibe o problema. Ocasionalmente, cães, gatos (geralmente positi-
vos para leucemia felina) e cavalos lambem objetos por razões inexplicadas. O
nervosismo pode fazer com que os eqüinos lambam seus tratadores, quase sempre
enquanto estão sendo exibidos.
Enrolamento da língua – O equivalente bovino do puxamento da língua em
eqüinos, que consiste em movimentos irregulares de língua no interior ou exterior
da boca. A língua é tipicamente exposta e enrolada para trás dentro de uma boca
aberta ou em direção às narinas num exagero do normal. Pode também ocorrer
deglutição de ar. As tentativas de controle têm tido sucesso apenas parcial. Correias
para deglutição de vento ou a inserção de um anel de metal através do freio da língua
têm sido tentados. Em alguns casos, alcançou-se o sucesso por meio da provisão
de misturas de sal. A liberdade de movimentos e exercícios forçados também são
sugeridos. O enrolamento da língua pode ser aprendido pela observação de animais
problemáticos, e alguns indivíduos podem herdar a tendência.
Mordedura da cauda – A mordedura da cauda em suínos tem atraído muita
atenção. Várias condições são suspeitas de predisposição, incluindo tipo de raça
(por exemplo, landrace), denso agrupamento de suínos em crescimento rápido de
, 45kg de peso corporal, espaço de cocho insuficiente, disponibilidade insuficiente
de bebida e componentes ambientais adversos (altos índices de barulho, gases
nocivos, umidade, temperatura). A combinação destes outros fatores leva a inqui-
etação dentro do grupo, o que evidentemente cria irritabilidade, superexcitabilidade,
e atividade aumentada. Afora esses fatores aparentemente estimuladores, o
agrupamento intensivo em chiqueiros pequenos consiste em um ambiente empo-
brecido, com pouca oportunidade para atividades mais variadas.
A amputação da metade distal da cauda tem-se tornado uma prática de controle
padrão na indústria suína contemporânea. A parte remanescente da cauda fica
suficientemente sensível, a ponto de os suínos reagirem efetivamente quando uma
tentativa de mordedura da cauda for feita.
Os animais que mordem caudas devem ser mantidos juntos, já que geralmente
essa medida reduz a mordedura recíproca da cauda. Outras formas potenciais de
estresse também devem ser assinaladas. Os fatores atmosféricos dentro de uma
construção devem receber atenção. O chiqueiro de suínos em crescimento deve ser
subpovoado quando o grupo for formado pela primeira vez, ou transportado para
Comportamento 1120

chiqueiros maiores, que são freqüentemente suficientes para assegurar a aquisição


de tamanho adequado quando os membros do grupo aumentarem o dobro de
tamanho. A melhora geral na forma de criação é também freqüentemente benéfica
para controlar esta condição.
A mordedura da cauda também ocorre em eqüinos, principalmente lactentes e
menores de 1 ano de idade; quantidades adequadas de proteína na dieta geral-
mente controlam o problema. Nos cães, a mordedura da cauda é geralmente
autodirecionada e é parte do comportamento de perseguição da mesma; é conside-
rada como automutilação (ver pág. 1116).
Mordedura de grade – Este comportamento anômalo ocorre em porcas
reprodutoras mantidas em um único engradado. Pode ser parcialmente controlado
pelo enriquecimento ambiental, tal como o fornecimento de palha ou serragem como
cama na qual o animal possa mastigar ou fossar, ou pela alimentação com
suplemento rugoso, por exemplo, grama, sabugo ou péletes de ração.
Mastigação de vácuo – Observada em porcas, tipicamente naquelas mantidas
solitariamente em baias sem cama; o animal afetado mastiga vigorosamente sem
conteúdo oral. O controle é essencialmente semelhante ao descrito para mordedura
de grade (ver anteriormente).
Sucção prolongada (sucção recíproca) – A sucção em outro animal ou em um
objeto é tipicamente observada em animais que são desmamados precocemente ou
que não conseguem mamar, por exemplo, os órfãos (ver também GALACTOFAGIA,
pág. 1123). Os melhores resultados de controle são obtidos por meio da provisão
de condições de alimentação que lembrem as de um padrão ingestivo normal em
animais jovens. A alimentação de bezerros com mamadeiras automáticas com tetas
e períodos de sucção durando , 30min parece eliminar o problema. A prevenção
de desmame precoce em cães, gatos e suínos também reduz a freqüência do
problema. Amarrar os bezerros por 1h após a alimentação em uma caçamba
evidentemente proporciona tempo para que o “ímpeto” de sucção diminua. O
suprimento de suplemento rugoso, como de palha, parece suprimir a desordem.
Limpeza excessiva (autolambedura) – A limpeza excessiva provavelmente é
um comportamento relacionado ao estresse. Ocorre comumente em vitelos isolados
em baias solitárias, garanhões de corrida confinados a baias e gatos e cães com
alterações importantes em seu ambiente. A limpeza excessiva pode criar lesões
superficiais tais como granulomas por lambedura (ver AUTOMUTILAÇÃO, pág. 1116).
Em gatos, as áreas afetadas parecem ter sido tosquiadas.
Arrancamento de lã – Um comportamento anormal que ocorre em ovinos em
enclausuramento restritivo e sistemas de criação intensiva. A lotação em cercados
é um fator contribuinte, mas uma deficiência de feno da dieta também pode contribuir.
O controle se torna possível por meio da redução na densidade do cercado. Cercados
de , 20m2 podem conter 10 ovinos adultos, mas o arrancamento de lã se torna
provável neste nível de população. A redução de 50% dessa densidade é eficaz no
controle; neste nível, a anomalia pode ser eliminada, especialmente se for fornecido
feno de qualidade com regularidade. O feno é ideal, mas a palha também pode ser
útil; qualquer exigência nutricional associada necessita aparecer para relacionar a
inadequação da alimentação estruturada em vez de qualquer fator nutriente especí-
fico. O controle também pode ser alcançado pela liberação dos animais ao ar livre em
condições de criação extensiva por longos períodos (ver também TRICOFAGIA, pág.
1122). Os primatas de laboratório podem arrancar pêlos quando mantidos em
ambientes relativamente monótonos. O enriquecimento comportamental tem sido
útil na eliminação dos problemas se iniciado cedo.
Bicagem das penas – Sob condições de manejo intensivo, pode ocorrer em
todas as idades e em várias espécies incluindo galinhas, perus, patos, codornas,
perdizes e faisões (ver também pág. 1124). O controle é mais comumente alcançado
Comportamento 1121

pela debicagem, que envolve a remoção da parte anterior (6mm) do bico superior.
Embora isso não elimine completamente a bicagem agressiva ou previna o desen-
volvimento de hierarquia de bicagem, as aves debicadas são menos capazes de
arrancar penas. Outro método de controle consiste em limitar a visão das aves pelo
escurecimento dos galinheiros e alteração da luz para uma coloração avermelhada,
usando-se de lâmpadas infravermelhas ou pintando-se os painéis das janelas de
vermelho. A visão de cada ave pode ser restrita pela fixação de anéis de alumínio
no bico superior ou aplicação de “cegantes”, embora o uso destes artifícios seja
proibido em alguns países. Onde os cegantes podem ser empregados, o arrancamento
das penas é mínimo.
Comportamento ingestivo anômalo – O comportamento ingestivo anômalo é
exprimido por várias manifestações. No passado, acreditava-se que esses animais
teriam deficiências nutricionais e portanto estes recebiam aditivos na alimentação
(por exemplo, sangue, farinha de carne, farinha de osso e farinha de chifre) na
tentativa de diminuir a desordem. O conhecimento atual, no que tange às causas
desta anomalia, ainda é incompleto. Em alguns casos, isto pode ser devido a
deficiências nutricionais, mas em outros se torna claro que a prática alimentar não é
uma causa contribuinte. O confinamento restritivo funciona como agente estressante.
Aerofagia – Esta anormalidade comportamental de eqüinos pode ser distinguida
em 2 formas diferentes, a saber, do afinamento de cocho (ver pág. 1119) e
deglutição de vento pura. Em ambas as formas, ingere-se ar anormalmente, por
deglutição. Na deglutição de vento pura, o eqüino balança sua cabeça e pescoço
várias vezes antes de fazer um esforço de ingestão. Então vira sua cabeça para
cima, abre sua boca, toma ar, levanta a língua e contrai a musculatura da faringe de
modo que o ar seja forçosamente engolido quando o pescoço é flexionado. O som
característico de deglutição de ar pode ocorrer quando um pouco do ar for expulso
ou engolido. A ação é praticada repetidamente.
Como conseqüência de aerofagia persistente, a musculatura da garganta sofre
hipertrofia devido ao uso excessivo. Também pode ocorrer o timpanismo de
estômago; esse por sua vez, pode levar à formação de catarro gastrointestinal e
episódios de cólica. A ingestão de alimento pode diminuir consideravelmente, e
estes eqüinos passam a apresentar baixa alimentar.
O controle da mastigação de cocho, deglutição de vento, afinamento de cocho
e puxamento da língua é tentado com vários métodos. Os eqüinos afetados quase
sempre melhoram com abundância de trabalho e exercício. Nos estágios iniciais, a
deglutição de vento pode ser desestimulada pela remoção de todos os objetos
aproximadamente à altura da boca que possam ser roídos, sugados ou lambidos.
As bordas de cochos, comedouros e manjedouras podem ser recobertas com metal.
Aversão de gosto também pode ser usada, assim como a provisão de bastante feno.
Um método comum de prevenção de aerofagia é o caso de uma correia para
engolidor de vento, a qual é amarrada firmemente ao redor da garganta, e tem uma
peça em forma de coração de couro grosso que se situa entre os ângulos das
mandíbulas com uma extremidade pontiaguda projetando-se em direção à área
faríngea. Com este aparelho no lugar certo, são causados dificuldade e desconforto
aparente ao eqüino quando seu pescoço é flexionado na tentativa de engolir vento.
Alguns eqüinos continuam a prática apesar do aparelho e finalmente adquirem
ferimentos de pressão quando a correia é pressionada.
Vários métodos cirúrgicos têm sido tentados para deter a aerofagia; entretanto,
geralmente são menos que satisfatórios. A prevenção funciona melhor.
Lignofagia (mastigação de madeira) – A mastigação e ingestão de madeira
não é incomum em eqüinos em alojamentos restritivos ou paddocks; de todas as
etopatias orais eqüinas, a mastigação de madeira é a mais comum. Não está restrita
a eqüinos estabulados, e pode ser observada em eqüinos mantidos em cercados
Comportamento 1122

externos; os eqüinos em pastejo podem derrubar troncos de árvore. Deve ser


providenciada nutrição adequada. Os eqüinos devem ter acesso a sal e feno. Em
estudos realizados, a mastigação de madeira severa foi detida quando forneceu-se
feno a 100g/kg de peso corporal. A inclusão de serragem em uma dieta altamente
concentrada, focinheiras e aversão de gosto pode ser considerada, quando o
acesso ao pastejo não for possível. O exercício ajuda no caso de um eqüino
entediado.
Coprofagia – Uma forma normal de ingestão em algumas espécies, principal-
mente coelhos, e nos jovens da maioria das espécies, esta anormalidade é
particularmente inaceitável ao proprietário, sobretudo de cães. Entre os cães, a
condição é geralmente observada pela primeira vez em cãezinhos de 4 a 9 meses
de idade. Há uma grande variação individual na intensidade deste comportamento
quando este se estabelece. Na maioria dos casos, entretanto, o hábito tende a
diminuir em intensidade após 1 ano de idade. Embora muitos superem o compor-
tamento, outros continuam a exibi-lo periodicamente e em alguns casos, ele persiste
além do período de filhote.
Certas condições clínicas são consideradas como causas de coprofagia em
cães. Entre elas estão a insuficiência pancreática crônica, malabsorção, pesadas
cargas parasitárias e inanição. Nos estados patológicos que resultam em alimento
não digerido sendo perpetuado nas fezes, acredita-se que o material se torne
aceitável ao animal para simples necessidades ingestivas. O hidrocéfalo pode
também ser um fator causador. Na maioria dos casos, entretanto, a condição é
reconhecida como anormalidade comportamental e a causa desta forma é reconhe-
cida atualmente como ansiedade ou entediamento.
O tratamento exige retreinamento do animal. Deve-se colocar ênfase no impe-
dimento do ganho de acesso às fezes pelo animal. O amordaçamento do cão é útil
quando iniciado no curso do retreinamento. Outras formas de prevenção são óbvias
e incluem manutenção do cão em corrente e retorno à sua casinha imediatamente
após a defecação no ambiente externo. O retreinamento exige um compromisso
considerável por parte do proprietário. Além disso, o animal deve receber uma dieta
de boa qualidade, rica em proteínas e pobre em carboidratos. Em muitos casos, a
adição de óleo vegetal à dieta ajuda bastante. A alimentação deve ocorrer duas
vezes ao dia em um esquema regular. Tais alterações dietéticas mantida por um
período de 2 meses suspendem esse comportamento em muitos casos. Entretanto,
nenhum tratamento definitivo para esta condição foi determinado. Os animais que
falham ao responder representam um problema ético particular, já que a ligação
entre o animal e o proprietário é quase sempre destruída como resultado.
Tricofagia (ingestão de pêlos) – Esta anomalia se relaciona à ingestão de
pêlos ou lã, geralmente removidos dos corpos de animais associados (ver
também pág. 1120). A forma mais suave é a autolimpeza durante épocas de
queda de pêlo normal. Os animais jovens algumas vezes removem parte do
pelame de sua mãe, enquanto empiricamente estão lambendo e sugando partes
do corpo dela que não as glândulas mamárias. Essa anomalia ocorre quando os
animais são densamente agrupados. Entre os ovinos, fatores causais podem se
relacionar a um sistema de confinamento imposto à ovelha e ao cordeiro. Desde
que a maior parte dos cordeiros mostre preferência por lã suja, pode haver uma
implicação de apetite depravado. A deficiência de fósforo tem sido suspeita, mas
sua implicação não foi provada.
As bolas de pêlo, que são problemas ocasionais nos estômagos de gatos,
coelhos e bezerros, podem agir como agentes irritantes para provocar vômito ou
bloquear a passagem de alimento através do trato gastrointestinal. A ingestão
de pêlo em eqüinos é uma anormalidade intimamente relacionada à mastigação de
madeira. A mordedura da cauda quase sempre pode ser detida pela adição de
Comportamento 1123

proteína à ração. Desde que fatores nutricionais são suspeitos em qualquer animal,
a avaliação cuidadosa da dieta é importante. Os arranjos espaciais são outros
métodos racionais de controle.
Ingestão anômala de leite (galactofagia) – Uma anomalia comportamental na
qual os animais “mamam” em outros que não sejam suas mães naturais ou adotivas
(ver também pág. 1120). Os bovinos que “mamam” em seus companheiros de
rebanho caracteristicamente escolhem o mesmo animal em lactação, o que leva a
um arranjo pareado. Tais pares algumas vezes mamam-se mutuamente, tanto
simultânea quanto alternadamente.
A anomalia pode estar relacionada a uma predisposição hereditária em alguns
casos; entretanto, está relacionada à forma de criação em muitos outros, e pode
aumentar em freqüência como resultado de imitação. Ao contrário do bezerro jovem,
a galactofagia no adulto é mais comum em sistemas de criação extensiva.
O rebanho deve ser extensivamente inspecionado quando um caso de “ama-
mentação cruzada” adulta estiver sendo suspeito. Por estes meios, os animais
envolvidos podem ser determinados e a disseminação endêmica por mímica pode
ser detida. Como medida preventiva, uma maior quantidade de feno pode ser
incluída à dieta, preferivelmente durante períodos em que o tédio esteja sendo
favorecido. Desde que se suspeite da hereditariedade do problema, pode não ser
conveniente cruzar animais que exibam a desordem quando adultos.
No passado, o controle foi tentado pela utilização de aparelhos com dentes
pontiagudos para a região facial e nasal do animal que “mama” para assegurar uma
reação aversiva em qualquer animal que dele se aproxime. Infelizmente, alguns
desses aparelhos podem atrapalhar a alimentação natural do animal afetado. Da
mesma forma, se o animal afetado for persistente, pode infligir ferimentos em outros.
Um aparelho elétrico preso à testa que dispara choques elétricos ao usuário quando
o circuito é fechado por pressão facial tem tido resultados. Uma vez que o choque
é recebido pelo animal que mama este método é mais apropriado que aqueles em
que o estímulo aversivo é direcionado ao animal-alvo no ato de mamar. Em alguns
casos, o animal afetado deve ser separado ou descartado.
Ingestão de terra (geofagia) – Eqüinos, bovinos, e algumas vezes cães e gatos
podem ingerir terra ou outro material estranho. O comportamento está relacionado
à pica (ver adiante). Tais animais são suscetíveis a disfunções gastrointestinais. A
condição pode ser resultado de dietas deficientes em minerais. Sabe-se que as
deficiências de fósforo e ferro são responsáveis em alguns casos, mas as deficiên-
cias nutricionais não são observadas em outros animais afetados. Os gatinhos
tipicamente exibem o comportamento em poucos dias, após o início do uso de
caixas de areia para defecação.
O controle deve levar em consideração a possibilidade de deficiência mineral.
Além disso, os animais afetados podem ser examinados para verificação de anemia
e de carga parasitária, e um tratamento apropriado deve ser providenciado quando
indicado. Como acontece com outras síndromes orais relacionadas, os eqüinos
afetados devem ser exercitados mais rigorosamente.
Hiperfagia (empanturramento) – Alguns animais são extremamente vorazes e
comedores rápidos, alguns podem engasgar no meio da deglutição de seu alimento.
Muitos foram nutricionalmente privados quando jovens. Outros estiveram em dieta. Já
que o alimento não é completamente mastigado, desordens gastrointestinais ocorrem
em alguns eqüinos. Quando esses animais ganham acesso a grandes quantidades
de comida, consomem volumes excessivos; isto pode levar a problemas gastrointes-
tinais sérios e possivelmente fatais (ver também SOBRECARGA DE G RÃOS, pág. 210).
O controle da hiperfagia envolve alimentação tática. Pequenas quantidades de
alimento podem ser fornecidas. O espalhamento de grãos em uma camada fina no
cocho e a colocação de grandes pedras lisas no fundo do cocho são métodos usados
Comportamento 1124

para fazer com que os grãos fiquem difíceis de serem consumidos rapidamente
pelos eqüinos. O suplemento de grãos em vários horários diferentes no dia pode ser
de ajuda. A alimentação com feno antes dos grãos é muito útil. É muito importante
evitar o acesso a grandes quantidades de grãos altamente energéticos.
Polidipsia nervosa – Excesso de líquidos é encontrado em várias espécies
quando em confinamento intensivo; o consumo de água geralmente é de 2 a 4 vezes
normal. A polidipsia nervosa é vista em alguns eqüinos que são isolados e
confinados em cocheiras com água fornecida à vontade. Alguns eqüinos consomem
, 140L por dia, ou , 3 a 4 vezes a quantidade normal. Isso pode-se espalhar por
um período de tempo ou se concentrar dentro de 2 a 3h. A polidipsia também pode
ser secundária a um consumo excessivo de sal, comum em eqüinos estabulados.
A poliúria pode ser a primeira indicação da anomalia.
A polidipsia não aparenta se fixar firmemente no comportamento do animal, e
permite ser controlada por manejo apropriado, que inclui o fornecimento de água
racionada. Desde que o “entediamento” é um fator contribuinte, o hábito pode ser
controlado e interrompido por aumento no nível regular de exercícios. A polidipsia
em outros animais mantidos em confinamento pode ser aparentemente controlada
por uma alteração apropriada na forma de criação.
Pica – Um apetite depravado exibido por animais que procuram material
estranho para ingestão. A condição é muito aparente em animais que tendem a
comer e mastigar lã, roupas, ossos velhos e madeira. A lambedura ou ingestão de
lã por gatos pode ter um componente genético desde que ocorra quase exclusiva-
mente em siameses e mestiços desta raça.
Deficiências nutricionais, por exemplo, de fósforo, devem ser corrigidas se
existirem. Os gatos que comem ou lambem lã devem ser examinados para aferição
de baixos níveis de hormônios tireóideos. Geralmente, mesmo assim, o problema
é controlado pela prevenção de acesso a objetos preferidos, limitando o acesso a 1
ou 2 itens, ou usando aversão ao gosto para quebrar o padrão.
Ingestão de cama – Os animais confinados estão sujeitos a comerem suas
camas mesmo após terem sido sujas. Quase todos os eqüinos estabulados comem
camas sujas de vez em quando, mas com alguns isso é habitual. Os gatinhos
também comem cama ou sujeira por alguns dias antes de alterações na evacuação
do reflexo anogenital se auto-iniciarem. O hábito se desenvolve em eqüinos e aves,
mesmo quando comida adequada for disponível. Geralmente, a ingestão de cama
visa partículas e maravalhas de madeira, tanto que pode representar, em algum
grau, um apetite por celulose.
A ingestão de cama em galinhas e perus é mais comum quando estes são criados
em cama de madeira ou maravalha, com incidência maior em plantéis que não
tenham espaço suficiente para comer no comedouro. Desde que a incidência é mais
alta em algumas raças e linhagens de aves que em outras, pode haver uma
predisposição genética. A condição pode ser diminuída em muitas aves pelo
suprimento de saibro em abundância.
Para controlar a ingestão de cama em aves, deve haver espaço abundante para
se comer no comedouro, tanto que as aves em posições baixas dentro da ordem
hierárquica possam encontrar espaço seguro no mesmo. Nos eqüinos, o controle
exige avaliação do alimento para assegurar quantidade, qualidade e variedade
adequadas. A alimentação e o exercício devem ser mantidos em um esquema
preciso. Os eqüinos com cargas parasitárias devem receber tratamento apropriado.
Ingestão das penas – Intimamente relacionada à bicagem das penas (ver
pág. 1120) e ao canibalismo (ver BICAGEM CORPORAL, adiante) em galinhas. A
bicagem de penas marca o início do comportamento canibal em muitos casos. Na
ingestão das penas, as aves arrancam as penas de locais preferidos das outras
como a cauda e a ponta da asa. Embora mais comum em adultos, a bicagem das
Comportamento 1125

penas ocorre em todas as idades desde pintos de um dia até aves idosas. Já que
o problema é relacionado a uma alimentação errônea, o controle é direcionado a
uma alimentação e nutrição corrigidas. A alimentação feita exclusivamente com
rações específicas pode interferir nas atividades envolvidas em ciscagem de
alimento e resultar em volume alimentar insuficiente; assim, com a privação destes
comportamentos introduz-se a ingestão das penas. A terapia pode incluir a mistura
de grãos ao alimento para aumentar a ciscagem; o volume pode ser aumentado pela
adição de sabugos de milho e forragem verde à dieta.
Ingestão de ovos – Um hábito encontrado em pequenos plantéis de galinhas
mantidas em galinheiros que parece ocorrer igualmente entre plantéis submeti-
dos a ninho fundo e a piso de tela aramada. O comportamento começa com uma
ave bicando um ovo até ele se quebrar. O conteúdo é então parcialmente
ingerido. Quando uma ave adquire este hábito, é provável que aumente a prática
e que outras aves também possam desenvolver o problema. Quando quantida-
des significativas de casca de ovo são comidas, isso pode indicar que a dieta das
aves afetadas seja deficiente em saibro. O controle envolve a eliminação de aves
afetadas, mas pode ser difícil a identificação em um plantel grande. Um corante
alimentar concentrado pode ser injetado dentro de um ovo para ser deixado no
chão; a ave que comer esse ovo ficará marcada pela coloração na cabeça. O
saibro deve ser providenciado em longos comedouros de forma que todas as aves
possam ocasionalmente ter acesso a ele. Até certo ponto, os problemas dessa
natureza popularizaram a introdução do engaiolamento em série algumas déca-
das atrás. O engaiolamento pode ainda ser considerado como um método de
controle desta condição em pequenos plantéis sem acesso a passeios externos.
As aves com acesso ao ar livre podem sair regularmente ao meio-dia, pois
durante esse horário o período de pôr ovos já terminou.
Bicagem corporal – Em diferentes formas, isso ocorre como vício comporta-
mental em aves sob manejo intensivo. Em contraste à bicagem (ver pág. 1120),
o bico é usado na bicagem corporal para ações combinadas de perfuração e
depenamento. A ingestão de partes arrancadas também ocorre. Esta é uma
forma de canibalismo que aparece em galinhas domésticas, outras aves galiná-
ceas (por exemplo, perus, faisões, codornas) e patos. A bicagem corporal é
freqüentemente dirigida a ferimentos abertos quando as penas já estão arrancadas.
A bicagem dos dígitos ou costas é mais comum em aves mais jovens. A bicagem
do ânus ocorre em todas as idades mas é mais séria em poedeiras, enquanto
a bicagem da cabeça é observada em aves engaioladas mais velhas.
A prevenção e o controle apropriados da bicagem corporal exigem a oportu-
nidade de fuga espacial para aves subordinadas na hierarquia de bicagem. A
debicagem é o método de controle mais comum, mesmo que ela só atinja o
problema e não a causa.
Ingestão de urina – Este problema tem sido relatado em alguns rebanhos
leiteiros na Grã-Bretanha e na França. Evidentemente é praticada durante o
inverno por vacas confinadas a sistemas de cubículos e currais comunais onde
o piso de concreto permite a formação de poças de urina. Uma vaca pode beber
dessas poças, ou algumas vezes diretamente de uma vaca que esteja urinando.
O problema se torna evidente quando os bebedouros estão muito próximos uns
dos outros ou são insuficientes em número de forma que as vacas dominantes
evitam que algumas subordinadas se aproximem dos bebedouros ou cochos de
sal apropriados. Quando a disponibilidade de água e sal é uniformemente
distribuída em currais bovinos, o problema desaparece. O comportamento
também cessa quando o bovino tem acesso ao pastejo.
Sanidade Animal 1126

SANIDADE ANIMAL
INTRODUÇÃO
O bem-estar dos animais é uma responsabilidade primária dos veterinários. Eles
são chamados a diagnosticar e tratar doenças animais, desenvolver programas de
medicina preventiva e executar uma variedade de regulamentos relacionados a
higiene e controle epidêmico. Também auxiliam os criadores a preservar padrões
éticos na indústria ou em casa.
Existem várias definições de sanidade, porém do ponto de vista prático, deve-se
perguntar: “Os métodos gerais de manejo e criação adotados impõem um pouco de
estresse (em sua conotação negativa) nos animais desta espécie nesta idade, peso,
estágio de desenvolvimento, etc?” O estresse pode ser medido por vários índices
fisiológicos e pelo comportamento apresentado pelo(s) animai(s). A partir dessas
informações que as decisões sobre o manejo devem ser tomadas.
Outras questões importantes, também envolvidas com a sanidade animal,
são: 1. se o homem tem o direito de domesticar e utilizar outros animais para
alimentação, matéria-prima, pesquisa, tração, esporte e companhia; 2. se a
intervenção humana deve organizar criações ideais pelo equilíbrio da situação
ideal com práticas diárias na indústria animal; 3. se o cuidado e o controle
abrangentes do sofrimento em animais, sob várias condições de manejo, são
uma responsabilidade essencial; 4. se a saúde animal geral requer consideração
para que se encontrem importantes necessidades físicas, sociais e etológicas
dos animais; 5. se a sanidade animal e seus custos se transferirão à sociedade
como um todo e não apenas aos criadores (um retorno econômico adequado está
implícito em qualquer fazenda). Existe também a pressão da sociedade por
alimentos baratos, o que implica aumentos na intensificação da indústria animal;
entretanto, existe a crescente pressão dos habitantes de áreas urbanas por uma
melhor sanidade dos animais de criação, freqüentemente tendo perspectivas que
não são realísticas ou naturais para a espécie envolvida. A personificação dos
animais pode ser um problema. Se os proprietários dos animais se indisporem e
se tornarem cínicos, um grande sofrimento poderá cair sobre milhares de animais
em sistemas de produção em larga escala ou sobre o consumidor a longo prazo.
Em outros dois campos, os veterinários podem auxiliar no bem-estar do
animal. Eles devem encorajar os criadores a selecionar animais com caracte-
rísticas e temperamentos desejáveis a uma criação em larga escala intensiva. A
reprodução seletiva é lenta — porém importante, pois a população mundial
deverá estar bem alimentada no futuro. O segundo é encorajar os criadores e
tratadores a pré-condicionar seus animais para futuras mudanças. Manter ani-
mais não familiares em currais adjacentes antes de misturá-los em um único
grupo poderia reduzir brigas sociais subseqüentes. A familiarização da vaca com
a sala de ordenha antes de colocá-la juntamente com o bezerro é outro exemplo
de como o manejo precoce e o condicionamento cuidadosos do animal podem
gerar dividendos na produção e sanidade.
O desenvolvimento dos regulamentos de sanidade, as formas que estes
deveriam assumir e como deveriam ser policiados são também preocupações
importantes dos veterinários. O aspecto mais positivo disto é o encorajamento da
maneira pela qual os animais são tratados. Pode-se aplicar a legislação em casos
extremos de crueldade, porém no grau atual de sanidade de animais urbanos e
rurais, os códigos são mais flexíveis para que programas de cuidados preventivos
sejam integrados. A legislação é insuficiente para provocar mudanças na mente
do criador e reordenar suas motivações básicas.
Sanidade Animal 1127

Há épocas na história humana em que o relacionamento homem-animal é


reexaminado: o crescimento de interesse com relação à sanidade animal indica que
estamos em uma destas épocas. Os veterinários como os mais intimamente
envolvidos têm um importante papel a desempenhar com relação a isso, pois
desempenham um papel intermediário no relacionamento criador-animal.

CARACTERÍSTICAS
A sanidade animal é caracterizada por componentes definitivos derivados de suas
ligações racionais com a ética, forma de criação e saúde do animal. São eles: 1. uso
ético do animal; 2. padrões de criação e produção que encontrem um nível atingível;
3. provisão de cuidado veterinário; 4. controle do sofrimento para o bem-estar do
animal; e 5. manejo ecológico. Com estes 5 fatores, a sanidade animal pode ser
incorporada a um conceito unificado.
Como uma disciplina composta e global, a sanidade animal tem uma relevância
imediata à medicina veterinária, à pesquisa animal, à criação animal e à etologia
animal aplicada. Como resultado, a sanidade animal é multidisciplinar. Seus princí-
pios racionais utilizam essas ciências colaterais e são substancialmente científicos,
devido aos seus relacionamentos. Na prática, está envolvida em todas as esferas da
indústria animal e traz consigo comandos éticos e reguladores.
Como acontece com outras disciplinas científicas aplicadas, a sanidade deve
estabelecer objetivos práticos. O objetivo principal é a prevenção e alívio do
sofrimento. O sofrimento pertence ao domínio clínico e assim sendo se torna a base
de muitos assuntos clínicos, os quais respondem por que muitas considerações de
sanidade estão incluídas no conhecimento veterinário.
Em situações acompanhadas de dor, angústia, ou medo, certas manifestações
comportamentais constituem evidência inequívoca de sofrimento (ver também
pág. 1129). Vocalizações intensas, agressividade, tremores, comportamento
depressivo passivo e comportamento agitado são expressões externas de estados
mentais e refletem estados de sofrimento. É importante reconhecer um relaciona-
mento entre comportamento e sanidade animais. As principais características da
sanidade animal providenciam sua estrutura definitiva como se vê adiante.
Uso ético do animal – Mesmo dentro de regiões, nações e culturas, as opiniões
das modalidades de uso animal que podem ser consideradas éticas (ou permissíveis)
são freqüentemente polarizadas nos extremos de natureza humanitária e utilitária.
Em geral, o grosso da opinião veterinária não está dividido em extremos polarizados.
As atitudes culturais relacionadas ao uso aceitável de animais podem ter sido
derivadas da história ou da religião prevalentes em uma dada comunidade. De
qualquer forma, um pacto comunitário se desenvolve sobre o que pode ser feito com
e para os animais usados para alimento, vestuário, recreação e trabalho. Entretanto,
os assuntos éticos não são baseados em bases subjetivas, emotivas e religiosas
totalmente sem a observação de princípios objetivos.
Padrões de criação e produção – Os padrões de criação animal são ensinados
aos estudantes de medicina veterinária e agronomia. Mesmo padrões normalmente
aceitáveis podem quase sempre ser melhorados. A forma de criação que resulta em
altos níveis de morbidade e mortalidade no plantel ou rebanho é provavelmente
reconhecida como deficiente. Padrões deficientes podem resultar de ignorância,
erros grosseiros ou negligência deliberada. Um objetivo de sanidade animal consiste
em retificar e eliminar padrões deficientes de criação, sejam para animais de
produção, de estimação, de laboratório ou animais silvestres cativos.
Para assegurar um equilíbrio entre o ideal e o básico, algum sistema de vigilância
pode ser necessário. Esse pode-se constituir em uma força reguladora de inspetores,
ou de uma sociedade voluntária reconhecida pela comunidade como sendo legítima
Sanidade Animal 1128

e preocupada em prevenir falhas na sanidade. Em muitos países, ambas as forças


operam separada mas simultaneamente.
Cuidado veterinário – O desenvolvimento de sistemas de “saúde de rebanho”
para animais de produção é um ramo especializado do cuidado veterinário que
consiste basicamente em medicina preventiva. É nesta característica que a sanida-
de animal se situa em sua forma mais científica e sistemática. As práticas de
sanidade sistemáticas asseguram, tanto a interesses econômicos como humanitá-
rios, que a conduta da operação de manutenção animal seja sadia, realisticamente
mais favorável e completamente compatível com as exigências reguladoras.
A prática veterinária humanitária para animais sob manejo intensivo, tanto
comercial como experimentalmente, requer que a manutenção seja desenvolvida
para evitar problemas previsíveis em saúde e sanidade. Tal manutenção inclui boa
higiene, uma dieta balanceada apropriada e água de bebida limpa, boas condições
de repouso, ventilação adequada, temperatura ambiente apropriada e contenção
dentro de boas instalações com espaço adequado. A saúde deve ser monitorada
para providenciar detecção precoce de qualquer afecção patológica. As medica-
ções e as vacinações de rotina também são utilizadas para prevenir ocorrência de
desordens previsíveis. A prática preventiva incorpora atenção veterinária conven-
cional quando necessário.
A saúde e a sanidade animais estão obviamente relacionadas. Um dos objetivos
práticos básicos em sanidade animal é a prevenção de doenças, o domínio especia-
lizado da medicina veterinária denominado Saúde Animal. Um programa de Saúde
Animal é posto em prática na maioria dos países por um serviço nacional que
providencie um método central de monitoração em sanidade animal em nível nacional.
À medida que tais serviços se expandem, se consolidem, e se sofisticam, o nível
de sanidade previsto neles continua a melhorar e aumentar proporcionalmente.
Os veterinários constituem o pessoal especializado em Saúde Animal, portanto
podem aconselhar sobre práticas de manejo, vacinação e profilaxia, com o reconhe-
cimento de que o estresse é um componente na etiologia de muitas doenças no
espectro moderno. O alívio do estresse é uma ação profilática adicional que
demanda uma melhor consideração.
Controle do sofrimento – A sanidade animal tem um papel implícito para
providenciar ajuda ao animal em estados de crise, adversidade e sofrimento. Este
é o componente humanitário da sanidade animal, que assegura ajuda médica ou no
manejo em qualquer sofrimento. Esse tipo de intervenção é mais freqüentemente
realizado pelos próprios proprietários e usuários dos rebanhos, com ou sem o
suporte de instrumentos tais como o serviço veterinário. Essa ação interventora é
habitualmente ampla; cobre uma grande variedade desde o alívio de partos difíceis
até a realização de sacrifícios humanitários. Seu objetivo é minimizar o sofrimento.
A maioria dos animais de criação tem suas vidas terminadas pelo abate.
Enquanto os métodos para realizá-lo variam, o objetivo humanitário é matar o animal
por um método que o deixe insensível e inconsciente o mais rápido possível. O
manejo pré-abate e o transporte de rebanho também devem ser levados em
consideração. Os projetos modernos para abatedouros, que favorecem um manejo
menos estressante dos animais por meio da manipulação de seu comportamento,
são uma notável aquisição em sanidade animal.
Apesar de os sinais comportamentais de sofrimento não exteriorizado serem
prováveis de receber atenção, eles são identificáveis. Quanto mais a criação
moderna exerce controle sobre a manutenção e a reprodução animal, mais existe
para se aprender sobre “sofrimento comportamental”. Isto também é de interesse
veterinário. As duas principais características no comportamento do sofrimento são
atividade estimulada ou deprimida. Mas o sofrimento ocorre em várias formas,
incluindo circunstâncias patológicas e relacionadas ao estresse. Muitas delas são
Sanidade Animal 1129

de ocorrência imprevisível. As formas de promover sanidade várias vezes podem


variar desde primeiros-socorros até terapia e resgate. O animal em processo de dor
pode precisar de anestesia, tranqüilização ou analgesia. O tratamento médico é
necessário no tratamento do sofrimento associado à doença.
Manejo ecológico – O conhecimento comportamental pode ser usado para
fornecer ao animal condições que permitam a exteriorização do comportamento
necessário para automanutenção. Os sistemas de homeostasia etológica são
reconhecidos como formas de trabalho comportamental que os animais produzem
para se manterem em harmonia eficaz com seu ambiente; são essencialmente os
comportamentos de manutenção (ver pág. 1086). Em virtude de as indústrias de
produção animal terem o objetivo adicional de conveniência, a automanutenção do
animal é algumas vezes comprometida.
O grande propósito ecológico corresponde à integração do animal com o
ambiente por meio da homeostasia. Os procedimentos comportamentais básicos de
animais utilizados podem ser modificados apenas por gerações de reprodução
seletiva. Como este problema se torna mais agudo para animais intensivamente
confinados, os princípios de sanidade animal criam uma consciência de que esses
animais possuam características comportamentais ecológicas evoluídas que aju-
dam na automanutenção.

OBJETIVOS
A sanidade animal tem dois objetivos principais: evitar ou reduzir o sofrimento e
promover o bem-estar.
Sofrimento – A prevenção e alívio do sofrimento são obviamente os objetivos
principais na obtenção de sanidade animal. Submissão a uma imposição ou
resistência a uma condição que seja dolorosa, angustiante ou prejudicial correspon-
dem ao significado geral de sofrimento. A resistência sugere um elemento de
continuidade. Em medicina veterinária, sanidade serve como um termo de significa-
do extenso que cobre todos os componentes provavelmente afetivos que possam
coexistir com qualquer situação nociva.
Um alto grau de julgamento clínico e etológico é necessário para avaliação
qualitativa do sofrimento animal. Entretanto, um sistema simples de classificação
pode ser utilizado tal como nas formas aguda, subaguda ou crônica. A cronicidade
pode somar-se à intensidade do sofrimento, porém o sofrimento agudo que provoca
alterações no comportamento pode também ser intenso, se estiver aliado a dor
intensa. O sofrimento subagudo tipicamente assume uma forma transitória, embora
a recidiva freqüente possa fazer com que essa forma adquira importância real,
dependendo do grau de alteração no comportamento associado.
As condições fisiopatológicas normalmente exibem evidências imediatas de
sofrimento animal. Numerosas afecções clínicas, incluindo processos patológicos
e incidentes traumáticos, se tornam aparentes inicialmente por meio de um conjunto
de indicadores comportamentais de sofrimento. De fato, a alteração comportamen-
tal é a característica mais provável de apontar o nível de sofrimento. Tais alterações
acontecem quando atividades homeostáticas são completamente detidas e substi-
tuídas por demonstrações de dor ou comportamento aberrante persistente.
Quando acontece o sofrimento, comportamentos de manutenção sistêmicos,
como alimentação, limpeza, ou afiliação, são quase sempre substituídos por
agitação, depressão, isolamento, anorexia, etc. Alterações significativas em com-
portamento acontecem e incluem formas incomuns de conduta, movimentos corpo-
rais deficientes, atividades reduzidas e perda de apetite. Tais sinais são usados para
propósitos diagnósticos quando os animais doentes ou feridos são avaliados. Eles
ajudam a determinar a natureza e a extensão da disfunção do animal e também o
Sanidade Animal 1130

tratamento apropriado. A evidência de sofrimento clínico é tão variável e vasta que


sua avaliação exige habilidade veterinária. Entre as características do sofrimento
clínico estão sinais vitais anormais, alterações físicas e comportamentais, lesões
patológicas e alteração de temperamento.
O sofrimento agregado é geralmente manifestado indiretamente quando a
própria disfunção clínica é originada por manejo problemático. Entretanto, em
alguns casos, por exemplo, trauma, o alívio do sofrimento real e agudo pode ser um
objetivo imediato antes que a disfunção física ou corporal receba atenção especí-
fica. Expressões exteriorizadas de estados mentais em afecções clínicas acompa-
nhadas por dor, angústia ou medo (ver também pág. 1128) são evidências
inconfundíveis de sofrimento. Se correlatos fisiopatológicos estão ausentes, a
constatação de sofrimento pode estar relacionada a estresse.
Uma vez que a dor é a essência do sofrimento severo, qualquer concepção de
sofrimento deve incluir uma apreciação de várias características relacionadas à dor.
A dor é uma experiência altamente variável e subjetiva, mas sua existência em
animais é abundantemente evidente em reações típicas, por exemplo, inatividade,
postura curvada, inquietação, membros rígidos ou agitadiços, contorção, mordidas
auto-infligidas e vocalização anormal. Todos esses critérios devem ser considera-
dos em conjunto com a natureza de qualquer processo patológico presente. O
comportamento resultante da dor é facilmente observado, reconhecido e interpre-
tado por qualquer um com experiência e conhecimento apropriados para a dada
espécie, tanto em estado normal como de doença.
Bioética – Enquanto os objetivos mais importantes na prática da sanidade se
relacionam ao alívio de sofrimento, a promoção do bem-estar (ou do estado de
sanidade do ou no animal) é um objetivo ético. Os dois termos, sanidade e bem-
estar, não são sinônimos. O bem-estar é a condição interior do animal; é um estado
de boa saúde e harmonia entre o animal e seu ambiente. A sanidade certamente
incorpora muito da definição anterior, mas é principalmente um sistema externo de
serviços (os quais têm o estado de bem-estar como um de seus objetivos). Em
outras palavras, a sanidade é exógena enquanto o bem-estar é endógeno.
A ética requer que o bem-estar geral dos animais, usados materialisticamente,
deva ser assegurado por padrões adequados de sanidade. A última deve ser obtida
durante o período de vida destes animais, por mais breve que este possa ser. Isto
está em total acordo com os objetivos vocacionais inerentes à medicina veterinária.
Adicionalmente, as práticas éticas no mundo da reprodução animal devem manter
problemas de sanidade em mente. Física e comportamentalmente, as raças, tipo ou
cruzamentos inadequados não devem ter sua reprodução promovida na ocorrência
de um resultado provavelmente estressante, por exemplo, distocia, síndromes de
estresse, etc. Mesmo ambientes comuns na fazenda, no meio urbano ou no
laboratório podem ser estressantes para certos tipos raciais.
A bioética animal é uma constituição de princípios éticos integrados que guiam
práticas de sanidade animal e servem ao controle do sofrimento. Os quatro grandes
princípios da bioética têm sido definidos como: 1. manejo animal responsável, com
formas de criação global apropriadas; 2. fornecimento de conforto físico, função
comportamental básica e saúde animal; 3. prevenção ou alívio de dor ou sofrimento
desnecessário; e 4. uso de vida animal consciente para razões completamente
justificadas. O papel do veterinário nestes assuntos é óbvio e tradicional e um forte
envolvimento veterinário deve continuar.
PARTE III
VALORES E PROCEDIMENTOS
CLÍNICOS
COLETA E REMESSA DE AMOSTRAS PARA EXAMES
LABORATORIAIS ......................................................................................... 1132
PROCEDIMENTOS DIAGNÓSTICOS LABORATORIAIS ............................ 1137
Bioquímica ............................................................................................... 1137
Glicemia ............................................................................................. 1138
Testes de Função Renal .................................................................... 1138
Testes de Função Hepática ............................................................... 1139
Testes de Função Pancreática .......................................................... 1140
Microbiologia Clínica ................................................................................ 1141
Culturas .............................................................................................. 1141
Teste de Sensibilidade Antibiótica ..................................................... 1142
Citologia ................................................................................................... 1142
Análise de Fluidos .............................................................................. 1144
Técnicas de Coloração ...................................................................... 1145
Hematologia ............................................................................................. 1146
Exame de Sangue Periférico para Patógenos Microscópicos ........... 1151
Parasitologia ............................................................................................ 1152
Exame para Pesquisa de Ectoparasitas ............................................ 1152
Estimativa de Carga Parasitária Interna ............................................ 1152
Sorologia .................................................................................................. 1154
Ensaios Imunoenzimáticos ................................................................ 1154
Exame de Urina (ver URN) ...................................................................... 1054
DIAGNÓSTICO POR IMAGENS ................................................................... 1155
Tomografia Computadorizada ................................................................. 1155
Ressonância Magnética ........................................................................... 1155
Radiologia ................................................................................................ 1156
Radiografia ......................................................................................... 1156
Fluoroscopia ...................................................................................... 1159
Radioterapia ....................................................................................... 1159
Proteção Contra a Radiação .............................................................. 1159
Ultra-sonografia ....................................................................................... 1160
ELIMINAÇÃO DE ANIMAIS MORTOS E DESINFECÇÃO DE
TERRENOS ................................................................................................... 1162
EXAME DE ANIMAIS PARA VENDA ........................................................... 1164
INSPEÇÃO DA CARNE ................................................................................ 1166
Detecção de Carne Deteriorada .............................................................. 1168
ALGUNS VALORES FISIOLÓGICOS ........................................................... 1169
Temperatura Corporal Basal de Várias Espécies .................................... 1169
Temperaturas Retais ............................................................................... 1170
Freqüências Cardíacas ............................................................................ 1170
Freqüências Respiratórias ....................................................................... 1170
Volume Diário de Urina ............................................................................ 1170
Valores e Procedimentos Clínicos 1132

Índices de Referência Hematológica ....................................................... 1171


Valores de Leucócitos .............................................................................. 1172
Constituintes Bioquímicos do Soro (Índices de Referência) .................... 1173
GUIAS PARA REFERÊNCIAS RÁPIDAS ..................................................... 1175
Pesos Atômicos (Aproximados) de Alguns Elementos Comuns ............. 1175
Equivalentes em Celsius-Fahrenheit ....................................................... 1175
Fatores de Conversão do SI para Bioquímica Clínica ............................. 1176
Medidas Lineares Comparativas ............................................................. 1176
Medidas Caseiras (Aproximadas) ............................................................ 1177
Equivalentes Métricos e Farmacêuticos .................................................. 1177
Prefixos e Símbolos do Sistema Métrico ................................................. 1177
Pesos e Medidas do Sistema Métrico ...................................................... 1177
Conversões Miliequivalente–Miligrama ................................................... 1178
Unidades Básicas do Sistema Métrico do SI ........................................... 1178
Equivalentes em Peso para Aditivos Alimentares ................................... 1178
Fórmulas de Conversão ........................................................................... 1179

COLETA E REMESSA DE AMOSTRAS PARA


EXAMES LABORATORIAIS
Exame histológico – Os exames microscópicos de cortes de tecidos de animais
doentes, desde que adequadamente preparados, são um grande auxílio ao diagnós-
tico. As alterações celulares presentes em tecidos lesados freqüentemente carac-
terizam uma doença específica ou um grupo de doenças. O uso dessa técnica de
diagnóstico, relativamente rápida e barata, com freqüência resulta num substancial
ganho de tempo, dinheiro e sobrevida do animal. Todo clínico deve investigar a
existência, a localização e as facilidades de um laboratório que forneça um
diagnóstico histopatológico e fazer uso de seus serviços.
Os tecidos para exames histopatológicos devem ser coletados o mais rápido
possível após a morte do animal, a fim de diminuir os riscos de autólise. Eles nunca
devem ser congelados antes da fixação. Devem-se coletar amostras de vários
órgãos, objetivando-se cortes < 1cm de espessura (de preferência 7mm), e,
imediatamente após a coleta, as amostras devem ser colocadas em solução de
formalina tamponada a 10%, para fixação com um volume ≥ 10 vezes as mesmas.
Cortes finos ou cubos garantirão que o fixador penetre adequadamente. Os tecidos
devem permanecer no fixador por ≥ 24h; após a fixação inicial, as amostras podem
ser colocadas em um volume menor de formalina fresca para remessa. As amostras
devem, então, ser passadas para frascos inquebráveis e acondicionadas de
maneira a não derramar o conteúdo durante o envio ao laboratório. Os tecidos
fixados não devem ser congelados.
Para amostras de cérebro, quando for necessário o envio do órgão inteiro, este deve
ser colocado em formalina concentrada (formaldeído a 40% – no qual flutuará); deve-
se adicionar água lentamente e misturá-la até que o órgão flutue logo abaixo da linha
de superfície do líquido. Para permitir uma fixação mais rápida, um corte longitudinal
é feito a fim de expor os ventrículos laterais. Ele deve permanecer nessa solução por
≥ 24h, sendo depois retirado e colocado em um recipiente contendo formalina a 10%
e então enviado ao laboratório (devidamente embalado), ou guardado até ser
processado. Com freqüência, o cérebro é cortado longitudinalmente e a metade não
fixada (a fresco), devidamente refrigerada, é enviada para análise microbiológica.
Coleta e Remessa de Amostras para Exames Laboratoriais 1133

TABELA 1 – Instruções para Envio de Amostras para Exame Toxicológico


Veneno ou Amostra Quantidade
parâmetro suspeitos exigida necessária Comentários
Amônia Sangue completo ou soro 5mL, Congelado
Urina 5mL, Congelado
Conteúdo ruminal 100g0000 Congelado (ou podem-se adicionar
1 a 2 gotas de HgCl3 saturado)
Arsênico Fígado 100g0000
Rim 100g0000
Sangue completo 15mL,0
Urina 50mL0,
Ingesta 100g0000
Alimento 5lb (2,5kg)
Aditivos alimentares Fígado 100g0000
à base de arsênico Rim 100g0000
Nervo ciático Fixado em formalina
Monóxido de carbono Sangue completo 15mL,0
Cloratos Conteúdo gástrico 100g0000 Congelado, em embalagem sem ar
1
Hidrocarbonetos Cérebro ⁄ 200 Usar apenas embalagens de vidro.
clorados Ingesta 100g0000 Evitar contaminação. Embrulhar
Gordura corporal 100g0000 as amostras com papel de
Fígado 100g0000 alumínio
Rim 100g0000
Colinesterase Sangue completo 10mLi0 Heparinizado, refrigerado;
1
Cérebro ⁄ 200 Refrigerado ou congelado
Cobre (e Ni, Fe, Co, Rim 100g0000
Cr e Tl) Fígado 100g0000
Soro 2mL,
Alimento 5lb (2,5kg)
Sangue completo 10mL,0
Fezes 100g0000
Cianeto Forragem 5lb (2,5kg) Correr ao laboratório ou
Sangue completo 10mL,0 enviar prontamente; congelar
Fígado 100g0000 em embalagem sem ar
Dicumarol Forragem 5lb (2,5kg)
Fígado 100g0000
Etilenoglicol Soro 10mL,0
Urina 15mL0,
Rins Fatias0, Fixados em formalina
Fluoretos Ossos 20g000 Melhor enviar o(s)
Água 100g0000 osso(s) afetado(s)
Forragem 100g0000
Urina 50mL0i
Herbicidas (vários) Ervas daninhas tratadas 5lb (2,5kg)
Urina 50mL0i
Ingesta 1lb (500g)
Fígado ou rim 100g0000
Chumbo (também Hg, Rim 100g0000
Mo, Ni e Tl) Sangue completo 10mL,0 Heparinizado. Não usar
Fígado 100g0000 EDTA
Urina 15mL,0
Mercúrio e Rim, fígado, sangue Ver chumbo
molibdênio Alimento 5lb (2,5kg)
Micotoxinas Grão, forragem 5lb (2,5kg) Consultar o serviço laboratorial
Fígado, rim 100g0000 para testes específicos
Monensina Alimento 5lb (2,5kg)
Conteúdo ruminal 500g0000
Coração Fatias,0 Fixado em formalina
Músculo esquelético Fatias,0 Fixado em formalina
(Continua)
Coleta e Remessa de Amostras para Exames Laboratoriais 1134

TABELA 1 (Cont.) – Instruções para Envio de Amostras para Exame Toxicológico


Veneno ou Amostra Quantidade
parâmetro suspeitos exigida necessária Comentários
Nitrato Forragem 5lb (2,5kg)
Água 100mL,00 Ferver por 2 a 3min antes do envio
Fluidos corporais (por Consultar o serviço laboratorial
exemplo, humor aquoso)
Organofosforados Alimento 5lb (2,5kg) Enviar também urina, sangue e
(e carbamatos) Ingesta 100g0000 conteúdo gástrico dos
Urina 50mL0i animais clinicamente normais
Oxalatos Forragem fresca Plantas Não macerar; congelar
Rim Fatias Fixado em formalina
Fenóis Conteúdo gástrico 1lb (500g) Em embalagem sem ar
ou ruminal
Bifenis Fígado 100g0000
policlorados Alimento 5lb (2,5kg)
(e polibrominados)
pH ruminal Ingesta 1qt (1L) Congelada
Selênio Sangue completo 5mLi Heparinizado
Alimento 5lb (2,5kg)
Fígado 100g0000
Pêlos cortados 10g000
Sódio (NaCl) Cérebro 100g0000 Outra metade fixada
Soro 5mLi em formalina
Líquido cerebroespinhal 1mL
Alimento 5lb (2,5 kg)
Fluoroacetato Conteúdo gástrico Tudo00i Congelado
de sódio Fígado 100g0000
(1.080)
Estricnina Fígado 100g0000
Rim Inteiro0000
Conteúdo gástrico 100g0000
Sulfatos Água 1qt (1L) Ver SDT
Cérebro 1⁄ 200 Fixado em formalina
SDT (sólidos Água 1qt (1L)
dissolvidos totais)
Triarilfosfato Ingesta 100g0000
Alimento 5lb (2,5kg)
Uréia Alimento 5lb (2,5kg) Ver amônia
Vitamina A Fígado 100g0000
(também D e E) Soro 10mL0i
Varfarim (também Sangue completo 10mL0i
outros Fígado 100mL00i
anticoagulantes) Alimento 100mL00i
Zinco Fígado 100g0000
Rim 100g0000
Fosfeto de zinco Fígado 100g0000
Conteúdo gástrico 100g0000
Coleta e Remessa de Amostras para Exames Laboratoriais 1135

Os tecidos coletados para exames histológicos devem ser representativos da


lesão e, se possível, incluir partes aparentemente normais dos tecidos circundan-
tes. Amostras de todos os órgãos devem ser enviadas. Se o animal apresentava
sinais de alterações do SNC, é imperativo que se incluam áreas do cérebro e
porções da medula espinhal. Como as alterações de autólise ocorrem rapidamente
na mucosa gastrointestinal, é importante que o tecido seja devidamente fixado.
Secções curtas dos intestinos devem ser abertas longitudinalmente para permitir a
fixação adequada. Os tecidos que estejam autolisados à necropsia geralmente são
inúteis para exames histopatológicos.
As amostras para biópsia devem ser fixadas da mesma forma que os tecidos
de necropsia. Tumores pequenos (< 1cm) devem ser cortados pela metade e
tumores maiores devem ser cortados em pedaços pequenos ou várias amostras
representativas.
Uma anamnese detalhada do caso clínico deve acompanhar a amostra para
auxiliar o patologista a chegar a um diagnóstico. Esse relatório deve identificar
espécie, raça, morbidade e mortalidade, sexo, idade e proprietário; devendo-se
descrever o quadro clínico, a aparência macroscópica, o tamanho e localização da
lesão ou lesões. Ele ainda deve indicar se houve tratamento prévio; em caso
positivo, mencionar qual o tipo de tratamento ministrado e tempo de recorrência.
As amostras não fixadas também devem ser submetidas a testes diagnósticos
adicionais (virologia, bacteriologia, micologia, toxicologia, etc.). As amostras para
exame microbiológico devem ser coletadas assepticamente, o mais rápido possível
após a morte do animal. Os tecidos devem ser congelados antes de serem enviados
para análise, o congelamento porém não será conveniente se as amostras puderem
ser resfriadas e entregues diretamente ao laboratório em um período curto.
Refrigeração adequada deve ser providenciada para que as amostras que perma-
necerem resfriadas cheguem ao laboratório.
Exame toxicológico – Para a confirmação de uma suspeita de envenenamento,
devem-se avaliar amostras apropriadas e um histórico completo, incluindo sinais
clínicos, tratamento, lesões post mortem e circunstâncias envolvidas. Se houver
suspeita de uma toxina conhecida, uma análise específica deve ser sempre
requisitada – pois os laboratórios não podem simplesmente “examinar para enve-
nenamento”. Se a mortalidade for alta, deve-se mencionar o prejuízo econômico
potencial. Uma descrição completa dos achados clínicos e epidemiológicos pode
ajudar a diferenciar envenenamento de doenças infecciosas que possam simular
envenenamento.
Os tecidos ou fluidos biológicos para análises químicas devem ser tão frescos
quanto possível e colocados sob refrigeração ou preservados quimicamente;
prefere-se embalá-los com gelo. Uma caixa de isopor, uma lata ou uma caixa de
papelão podem ser usadas para o envio do material. A embalagem deve resistir à
umidade, caso o gelo derreta. Com gelo seco, é possível preservar a amostra por
até 72h. As embalagens contendo gelo seco devem ser rotuladas por fora e
adequadamente ventiladas para evitar a formação de pressão interna e o rompi-
mento das mesmas. A refrigeração adequada é de especial importância quando
submetemos líquidos corporais límpidos (principalmente os obtidos dos olhos) e
materiais para análise de nitratos ou nitritos; esses sais são rapidamente metabo-
lizados por microrganismos e no momento da análise somente podem ser registra-
dos níveis baixos ou insignificantes. A refrigeração impede que os microrganismos
cresçam e assegura que os sais sejam preservados.
Como preservativo químico, utiliza-se de preferência etanol a 95%, , 1mL/g de
amostra. Álcool desnaturado não deve ser usado, pois contamina a amostra através
do desnaturante. O formaldeído é geralmente contra-indicado, pois interfere em
vários testes. Os frascos e as embalagens para o transporte das amostras devem
Coleta e Remessa de Amostras para Exames Laboratoriais 1136

ser limpos, livres de substâncias químicas e preparados anteriormente. As emba-


lagens plásticas (sacos e frascos) são as ideais. Frascos com tampa de rosca
metálica devem ser evitados, especialmente quando houver suspeita de envenena-
mento por metais. As amostras devem ser embaladas individualmente. Os recipien-
tes devem ser etiquetados com todas as informações necessárias à identificação da
amostra e enviados pelo correio, seguindo as regulamentações cabíveis.
Se houver a possibilidade de uma ação legal, todas as embalagens devem ser
seladas de forma que a adulteração possa ser detectada, ou enviadas pessoal-
mente ao laboratório com posterior obtenção de um recibo. Em todos os casos
legais, um mandado de prisão acuradamente documentado deve ser mantido. Se
houver qualquer possibilidade de ação legal, cada caso deve ser tratado como se
estivesse para ser julgado em tribunal.
Se comida ou água forem suspeitas como fonte de envenenamento, amostras
delas e qualquer rótulo alimentar descritivo devem acompanhar as amostras de
tecido. Se for possível, uma amostra composta representativa do alimento deve ser
retirada do lote ou carregamento envolvido no envenenamento e submetida a
exame por autoridades. Em alguns casos, se uma quantidade adequada de
alimento envolvido estiver disponível, animais experimentais devem ser alimenta-
dos com o alvo da suspeita na tentativa de reproduzir os sinais e as lesões
observados nos casos de campo.
Se houver alguma dúvida sobre como agir na preservação da amostra ou
qualquer outro procedimento essencial, é prudente comunicar-se com o labo-
ratório para pedir instruções.
Exame bioquímico – A maioria dos testes de bioquímica clínica exige soro,
mas um teste ocasional pode requerer plasma. Os anticoagulantes presentes nas
amostras de plasma podem interferir nos resultados; por isso, o soro deve sempre
ser enviado a menos que o plasma seja especificamente requisitado. Para amos-
tras de soro, deve-se permitir que o sangue coagule; a amostra deve permanecer
à temperatura ambiente para permitir a coagulação. O soro deve então ser remo-
vido e transferido a um tubo limpo que não contenha preservantes. O soro geral-
mente não precisa ser refrigerado se chegar ao laboratório em um período curto. A
maioria dos laboratórios comerciais providencia embalagens para as amostras
serem enviadas pelo correio, porém os laboratórios das universidades e do gover-
no geralmente não as fornecem.
Exame hematológico – Estudos rotineiros exigem uma amostra de sangue
completo contendo um preservante-anticoagulante e vários esfregaços sangüí-
neos. Os esfregaços devem ser preparados imediatamente após a coleta. As
amostras de sangue não devem ser refrigeradas. Estudos de coagulação e outros
testes especializados exigem manipulação e embalagem especiais; o laboratório
deve ser contactado para instruções.
Exame sorológico – Esses testes geralmente exigem soro, mas o plasma é
geralmente satisfatório. As amostras devem ser coletadas como descrito para testes
bioquímicos e devem sempre ser livres de hemólise. Em alguns casos, amostras
pareadas devem ser exigidas para um diagnóstico adequado. A amostra de doença
aguda deve ser coletada precocemente no curso da doença e congelada. A amostra
de um convalescente deve ser coletada 10 a 14 dias mais tarde, e ambas as amostras
devem ser enviadas para o laboratório ao mesmo tempo.
Exame citológico – As amostras consistem em esfregaços secos ao ar ou
fixados por álcool. Podem ser obtidas por aspiração, raspado ou decalques. Os
esfregaços devem ser preparados a partir de fluidos em 2 formas, dependendo
da celularidade. Fluidos altamente celulares podem proporcionar esfregaços
diretamente, mas fluidos de baixa celularidade devem ser centrifugados para
concentrar as células (ver também pág. 1142).
Procedimentos Diagnósticos Laboratoriais 1137

Exame analítico de fluido – A análise de fluidos geralmente envolve a determi-


nação de conteúdo proteico, contagem total de células e exame citológico. Outros
testes podem ser realizados dependendo da origem (por exemplo, fluidos articula-
res) ou aparência (por exemplo, fluido quiloso). Os fluidos de baixa celularidade
devem ser divididos em 2 porções; uma deve ser centrifugada para concentrar as
células para esfregaços e a outra ser enviada inalterada ao laboratório para outros
testes. Esfregaços sangüíneos ou citológicos não devem ser remetidos ao labora-
tório na mesma embalagem com tecidos fixados em formalina, pois os vapores de
formalina irão produzir artefatos nas amostras.

PROCEDIMENTOS DIAGNÓSTICOS
LABORATORIAIS
Numerosos testes laboratoriais podem ser feitos em um laboratório em clínica
particular, inclusive muitos que anteriormente tinham de ser enviados a um labora-
tório externo. Uma vez que as pessoas realizam estes testes quase sempre sem o
mínimo treinamento técnico, é essencial que os procedimentos de controle de
qualidade sejam rigorosos. Entretanto, o tempo e o cuidado que devem ser dedica-
dos ao controle de qualidade impedem o teste doméstico em muitos casos. Também
podem ocorrer erros não apenas nos procedimentos genuínos de teste, mas também
na coleta e manipulação de amostras e transcrição de resultados.
Os laboratórios comerciais oferecem uma grande variedade de análises bioquí-
micas acuradas e baratas. Ver anteriormente sobre manipulação de amostras; o
laboratório diagnóstico deve ser questionado acerca de instruções específicas
antes do envio de amostras para análise.

BIOQUÍMICA
As determinações bioquímicas do sangue (ver TABELA 10, pág. 1174) podem
auxiliar na confirmação dos diagnósticos clínicos. Uma bateria de testes de triagem
pode também sugerir soluções para problemas diagnósticos diferenciais. A seleção
de testes deve ser sempre baseada em fundamentos clínicos. Correntemente, uma
regra prática e econômica é o uso de laboratórios comerciais quando > 3 testes por
animal forem necessários. Laboratórios privados podem executar perfis bioquími-
cos de 12 a 20 testes em equipamentos automáticos com maior facilidade e
considerável diminuição no custo do exame. A disponibilidade de laboratórios
privados e o tempo gasto para se receber os resultados freqüentemente apresentam
problemas com referência a emergências inevitáveis (noites e feriados). Assim
sendo, uma triagem bioquímica sangüínea em laboratório próprio é desejável,
senão necessária. A aquisição de analisador bioquímico automático ou semi-
automático, o qual permite um perfil bioquímico de 12 a 20 testes, implica na
contratação de um técnico experiente para operá-lo. Métodos secos de análise
bioquímica podem fornecer bons resultados para a análise bioquímica de rotina e
para a determinação de enzimas e eletrólitos. Valores precisos de eletrólitos são
determinados com maior eficiência com um sistema específico de elétrodos para
íons. O uso de soro-controle conhecido como um procedimento de controle de
qualidade assegura a precisão de qualquer sistema de análise bioquímica sangüínea.
Para análise bioquímica sangüínea, uma centrífuga é essencial para a separa-
ção das células sangüíneas do soro ou plasma. As amostras de soro ou plasma são
exigidas para ensaio bioquímico e sorológico ao contrário do sangue completo
Procedimentos Diagnósticos Laboratoriais 1138

exigido para análise hematológica. Pequenas quantidades de soro ou plasma


limpos que sejam completamente livres de hemólise são um pré-requisito para uma
análise bioquímica acurada, e podem ser realizadas determinações múltiplas a
partir de uma mesma amostra.
A lipemia e os estados de hiper e hipoglicemia produzem falsos resultados. A
coleta competente de uma amostra de sangue em jejum e pronta separação do soro
do coágulo formado evitam tais problemas. O coágulo formado após 30min da coleta
de sangue deve ser retirado com um bastão de vidro e centrifugado a não mais que
2.200rpm, por 10min. O soro sobrenadante é aspirado e colocado em outro tubo de
ensaio limpo para análise ou refrigeração. As amostras séricas límpidas e refrige-
radas podem ser usadas para análises bioquímicas até 5 dias após a coleta se forem
aquecidas à temperatura ambiente antes do uso.

Glicemia
Um mL de sangue total coletado após 12h de jejum pode ser usado para análise
de níveis de glicemia > 100mg/dL por meio de 2 testes simples, visuais, colorimétricos
e semiquantitativos. O Dextrotest* é feito com 2 comprimidos reagentes e envolve
um filtrado fervido. Os níveis glicêmicos de 100, 150 e 200mg/dL podem ser
estimados pela comparação da mudança de cores com uma escala que acompanha
o kit. Uma determinação mais rápida pode ser obtida com tiras de glicoxidase e
sangue completo. Uma mudança positiva de cor visual ocorre com níveis altos de
glicose, sugestivos de diabetes melito (≥ 200mg/dL) em cães e gatos. A cetoacidose,
que pode acompanhar o diabetes melito, é detectável com um comprimido reagente
(“Acetest”*), que pode ser usado com soro, leite ou urina. Diluições dobradas de soro
cetoacidótico produzem uma alteração de cor no comprimido que varia de lavanda
a violeta dentro de 30s.
A determinação de hipoglicemia requer métodos específicos para medir acurada-
mente os níveis de glicose. Esses métodos são usados nos vários sistemas automá-
ticos de análise. Novamente, a amostra de escolha é o soro límpido que tenha sido
obtido após 12h de jejum e separado das células sangüíneas dentro de 30min.

Testes de função renal


Os métodos de análise da uréia incluem uma técnica enzimática e um método
colorimétrico. Uma tira de papel para cromatografia com faixas reagentes é um
método rápido (30min), simples e seguro para a estimativa de níveis de uréia no
sangue. O teste requer 0,2mL de soro límpido, uma pipeta longa, um tubo de ensaio
de 10 × 75mm e uma tira reagente “Urograph”*. Os valores normais de uréia variam
entre 10 e 30mg/dL e os níveis persistentemente elevados são mais indicativos de
doença renal que de outras causas, tais como insuficiência cardíaca congestiva.
Níveis de uréia > 75mg/dL podem ser avaliados pela diluição da amostra de soro
com um soro padrão de qualidade conhecida e repetição do teste.
A creatinina é livremente filtrada pelo glomérulo; os níveis sangüíneos são
usados para estimar a taxa de filtração glomerular. O tecido muscular contém
fosfocreatina, a qual é convertida em creatinina por um processo não enzimático;
essa degradação espontânea ocorre em uma proporção constante.
As causas do aumento tanto de uréia como de creatinina podem ser divididas em
3 categorias principais: pré-renal, renal e pós-renal. Outros testes diagnósticos
podem ser úteis na diferenciação das causas do aumento de creatinina e uréia (ver
URN, pág. 1053).

* N. do T. – Nomes comerciais americanos.


Procedimentos Diagnósticos Laboratoriais 1139

A proteinúria renal é mais freqüentemente causada por uma lesão glomerular.


O grau de proteinúria é usado para avaliar a gravidade da lesão glomerular, como
base para formulação de terapia dietética, e para avaliar a resposta à terapia ou
a progressão da doença. Uma coleta de urina é feita 24h antes. Há uma grande
correlação entre excreção de proteínas em urina durante 24h e a proporção
proteína–creatinina em uma amostra de urina casualmente invalidada.

Testes de função hepática


As funções hepáticas são numerosas e requerem inúmeros testes para
avaliação. Os sinais clínicos de icterícia ou malfunção gastrointestinal, sem
resposta à terapia, são a indicação para uma avaliação da função hepática, a fim
de se obterem maiores informações. Em geral, os testes avaliarão o catabolismo
hepático e excreção dos pigmentos biliares, a capacidade de excreção hepática
e a concentração de enzimas séricas, as quais refletem a liberação de enzimas
dos hepatócitos lesados.
Pigmentos biliares séricos – O teste de van den Bergh pode ser usado para
distinguir uma icterícia hemolítica de uma obstrutiva. A versão qualitativa é
caracterizada pela coloração violeta-avermelhada, a qual se forma em 30s para
uma ação direta positiva (icterícia obstrutiva) ou uma coloração rosa intensa
formada 15min após a adição de álcool para uma ação indireta positiva (icterícia
hemolítica). O teste pode ser avaliado quantitativamente com um fotocolorímetro
que medirá a diferença de concentração entre a bilirrubina total e o diglicuronídio
de bilirrubina de ação direta. A diferença entre essas concentrações representa a
concentração de bilirrubina de ação indireta livre nas icterícias hemolíticas,
principalmente em cães e gatos. Os eqüinos são uma exceção: eles excretam
bilirrubina de ação indireta livre e não conjugada em icterícias obstrutivas, assim
como nas icterícias hemolíticas e outras condições patológicas não hepáticas
(por exemplo, pneumonia e constipação).
Urobilinogênio – O glicuronídio de bilirrubina excretada é reduzido a
urobilinogênio pelas bactérias intestinais. O urobilinogênio pode ser reabsorvido
via circulação portal e reintroduzido no intestino pela excreção hepática ou
excretado pelos rins. O urubilinogênio fecal é oxidado em urobilina que confere
uma coloração marrom-alaranjada normal às fezes. Ele é detectável na urina 1h
após a coleta, pelo uso de tiras de testes. Uma alteração de cor em 60s é
comparada a uma tabela de cores que acompanha o kit. A ausência de mudança
de coloração positiva em associação a fezes não pigmentadas é indicativa de
obstrução de dutos biliares. Amostras de urina diluída (1:64) de não herbívoros
podem produzir uma mudança de coloração na tira para marrom-avermelhado,
quando grandes quantidades de urobilinogênio forem produzidas por icterícia
hemolítica ou doenças hepatocelulares. A urobilinogenúria em cães não tem
significado diagnóstico – testes negativos são comuns em cães normais. O cão
pode também excretar altos níveis de urobilinogênio na urina durante uma
obstrução dos dutos biliares, devido à presença de bactérias hepáticas anaeróbicas
normais, que podem produzir urobilinogênio in situ, no fígado canino.
Pigmentos fecais – Urobilina (estercobilina) é um produto pigmentado da
decomposição do urobilinogênio que contribui para a coloração alaranjada das
fezes. As fezes argilosas não pigmentadas de animais anoréticos sugerem uma
obstrução dos dutos biliares. As fezes claras estão também associadas à
insuficiência pancreática, assim como à ingestão de ossos e alguns antibióticos.
Um aumento de pigmentação laranja-escuro nas fezes é visto na icterícia
hemolítica. Muitas substâncias incluídas na dieta podem influir na coloração das
fezes.
Procedimentos Diagnósticos Laboratoriais 1140

Teste de excreção da sulfobromoftaleína sódica (bromossulfoftaleína, BSP)


– A excreção da BSP pelo fígado é retardada em doenças hepáticas e o corante pode
ser usado para detectar problemas hepáticos não ictéricos. O teste requer um
marcador de tempo contínuo e um espectrofotômetro. A excreção de 1g do corante
após injeção EV é medida pelo “clearance” plasmático em grandes animais. As
concentrações plasmáticas de BSP são medidas em dois intervalos seqüenciais de
4min, dentro de 12min da aplicação do corante. O tempo requerido para uma redução
de 50% na concentração plasmática de BSP é determinado pelo delineamento dos
valores obtidos em papel semilogaritmo. A meia-vida da BSP plasmática é de 2 a
3,7min para eqüinos sadios adultos e de 2,5 a 4,1min para bovinos normais. A
excreção da BSP em pequenos animais é determinada pelos valores de retenção
séricos medidos 30min após a injeção EV. Cães saudáveis retêm ≤ 5% de BSP após
30min da injeção.
Concentração enzimática sérica – Danos hepatocelulares resultam na libera-
ção de enzimas celulares. Níveis séricos elevados de certas enzimas são indicativos
de danos no tecido hepático em algumas espécies. Alanina aminotransferase (ALT),
antes conhecida como transaminase glutamicopirúvica (SGPT), é uma enzima
característica do fígado de cães, gatos e primatas. A concentração sérica da ALT em
amostras límpidas não lipêmicas é estável por até uma semana quando refrigerada.
Em grandes animais, as enzimas hepato-específicas geralmente são de difícil
determinação. A sorbitol desidrogenase (SDH) é a enzima de escolha para detecção
de lesões hepáticas em eqüinos, mas sua determinação deve ser feita imediatamen-
te, devido à sua termolabilidade. A desidrogenase glutâmica (GLDH) é a enzima de
escolha para a detecção de doenças hepáticas em bovinos. A arginase é hepato-
específica em eqüinos e é encontrada em altas concentrações no fígado de bovinos,
ovinos e cães. Níveis séricos de arginase podem ser determinados dentro de 1h por
colorimetria direta. A elevação nos níveis de ornitina-carbamil-transferase (OCT) no
soro é indicação de doença hepática em todas as espécies, mas a sua análise é
trabalhosa e demorada. Um teste de comprimido simples está disponível em kit para
determinação de fosfatase alcalina sérica (SAP) em cães e gatos. Entretanto,
existem várias fontes que liberam fosfatase alcalina, incluindo osteoblastos,
condroblastos, sistema hepatobiliar, mucosa gastrointestinal, túbulos renais e baço;
os níveis elevados de fosfatase alcalina devem ser interpretados em conjunto com
outros sinais clínicos e história terapêutica. A mesma precaução é recomendável na
interpretação de níveis séricos elevados de outras enzimas, especialmente aquelas
que possam ser induzidas pelo uso de determinadas drogas, incluindo a ALT (SGPT).

Testes de função pancreática


Pancreatite aguda – O pâncreas é a maior fonte de lipase e os níveis séricos
dessa enzima aparecem elevados nos casos de pancreatite necrótica. Os níveis de
amilase também se elevam na pancreatite aguda e podem ser medidos visualmente
por meio de hidrólise amiloclásica do amido. As concentrações séricas normais de
amilase aparecerão no mínimo dobradas nos casos de pancreatite aguda. Os valores
séricos normais da amilase em cães e gatos são 5 a 10 vezes maiores que os valores
humanos.
Pancreatite crônica ou atrofia – A perda do parênquima pancreático funcional
pode ocorrer por fibrose ou atrofia; a deficiência enzimática pancreática resultante
manifesta-se por uma insuficiência digestiva detectável pelo exame fecal. Uma
inspeção grosseira de fezes frescas revela uma massa brilhante, mole, pálida, de
coloração amarelo-clara a argilosa, volumosa e com odor rançoso de esteatorréia
(fezes gordurosas). Gordura e fibras musculares não digeridas podem ser observa-
das pelo exame microscópico de amostras fecais coradas, e revelam, respectiva-
mente, insuficiência pancreática de lipase e tripsina.
Procedimentos Diagnósticos Laboratoriais 1141

A atividade enzimática proteolítica pancreática pode ser testada por uma simples
tira de filme radiográfico e os resultados são verificados com um tubo-teste contendo
gelatina. As fezes são adicionadas a 9mL de solução de bicarbonato de sódio a 5%
até se alcançar um volume total de 10mL. A ponta de uma tira de filme radiográfico
não processado é imersa na suspensão de fezes, a qual é incubada a 37,5°C por
1h ou por 2h e meia à temperatura ambiente; a tira de filme é então lavada com água
de torneira e examinada para determinar se a emulsão de gelatina foi digerida. A
tripsina fecal de cães normais produz uma área clara na porção do filme que foi
submersa (teste positivo). Ao contrário, a emulsão de gelatina persiste com uma
marca d’água, no caso de insuficiência pancreática, caracterizada pela ausência de
tripsina fecal. Um teste mais sensível de tubo com gelatina deve ser requerido
quando o teste do filme for positivo, pois as proteases intestinais podem clarear a
emulsão do filme em 25% dos testes (resultados falsos-positivos). Dois mL de
gelatina a 7,5% são adicionados a cada um dos 2 tubos e liquefeitos pelo
aquecimento a 37°C. Dois mL da suspensão fecal em solução de bicarbonato de
sódio a 5% são adicionados a um dos tubos com gelatina e 2mL de solução pura de
bicarbonato de sódio a 5% são adicionados ao outro como controle. O conteúdo de
cada tubo é misturado e incubado a 37°C por 1h (ou 2h e meia à temperatura
ambiente) e então refrigerado por 20min. A formação de um gel no tubo contendo
a suspensão fecal indica uma deficiência de tripsina, que é associada à insuficiência
pancreática crônica.
A função das ilhotas pancreáticas está comprometida em 50% dos cães com
insuficiência pancreática crônica. A hiperglicemia e a glicosúria são manifestações
resultantes do diabetes melito (ver pág. 323).

MICROBIOLOGIA CLÍNICA
A coleta de amostras para a identificação de patógenos bacterianos e/ou
determinação de sensibilidade a antibióticos deve ser feita antes de se iniciar o
tratamento. O intervalo de tempo mínimo no qual a identificação e o teste de
sensibilidade podem ser efetuados é o mesmo que se requer para o crescimento
na cultura bacteriana, o que invalida a vantagem do ensaio doméstico em áreas
urbanas onde os laboratórios diagnósticos são próximos. Os detalhes que um
laboratório diagnóstico independente pode providenciar na confirmação de uma
infecção clínica podem não ter valor. Ao contrário, as capacidades mínimas do
laboratório doméstico devem incluir preparação de esfregaços corados e não
corados, inoculação de cultura (caldo de tioglicolato) ou meio de transporte, testes
preliminares para sensibilidade a antibióticos e coleta de amostras séricas.

Culturas
A cultura para a identificação de bactérias patogênicas e determinação de
sensibilidade a antibióticos requer um estoque de meios de cultura, reagentes,
equipamentos e pessoal experimentado; quatro culturas por dia são o volume
mínimo para justificar as despesas e o tempo gasto. Os kits disponíveis no comércio
podem ser usados para uma identificação presuntiva de até 18 patógenos aeróbicos
e para a determinação de suas sensibilidades frente a antibióticos. A coleta do
“swab” ou da amostra per se deve ser cuidadosa e a assepsia deve ser mantida até
o recebimento no laboratório.
A cultura pode também ser iniciada em meio apropriado, tal como caldo de
tioglicolato, o qual permitirá o crescimento de bactérias tanto aeróbicas quanto
anaeróbicas. A cultura de amostras do trato gastrointestinal pode ser iniciada
em um meio seletivo tal como ágar de MacConkey. Ágar com infusão cérebro-
coração e ágar sangue são dois exemplos de meios usados para cultivos
Procedimentos Diagnósticos Laboratoriais 1142

gerais. Os meios apropriados de transporte podem ser usados para o envio de


“swabs” não refrigerados diretamente ao laboratório de diagnóstico. Os meios
prontos disponíveis comercialmente são apresentados em frascos com tampa
de rosca e devem ser estocados sob refrigeração até o momento do uso. O
material semeado em estrias pode ser enviado diretamente a um laboratório
clínico ou incubado a 37°C por 24h. Se houver crescimento, este material pode
ser corado e semeado em ágar sangue ou meio de Mueller-Hinton para o teste
de sensibilidade a antibióticos.
Meios específicos para o cultivo de dermatófitos estão disponíveis comercial-
mente. A lesão cutânea deve ser lavada com álcool a 70% antes da coleta dos pêlos
e do raspado de pele para cultura. Os meios seletivos contendo combinações de
inibidores, enriquecedores e um indicador facilitam o crescimento e o reconheci-
mento das várias espécies de fungos patogênicos, a maioria dos quais cresce à
temperatura ambiente (25°C) sob condições aeróbicas. A Trichophyton verrucosum
(tinha bovina) cresce melhor quando incubada a 37°C e alguns agentes patogênicos
requerem de 3 a 4 semanas para manifestar crescimento. Todos os cultivos devem
ser submetidos a exame microscópico, sendo primeiramente corados com uma gota
de lactofenol azul de algodão. Devem ser observadas as estruturas micóticas
características do fungo, tais como macro e microconídios, que auxiliarão na
identificação do agente.

Teste de sensibilidade antibiótica


Uma necessidade básica na terapia das doenças infecciosas é a escolha de um
antibiótico, ao qual o agente seja invisível e que seja barato. Após a coleta das
amostras para cultura, o tratamento deve ser iniciado imediatamente com base na
experiência clínica, mesmo sem o conhecimento real dos resultados do antibiogra-
ma. Uma conseqüente falta de resposta terapêutica aumenta a necessidade de tais
informações em um nível crítico.
Discos de papel impregnados com vários antibióticos são usados para detectar
a sensibilidade in vitro da bactéria. Os discos são colocados na superfície das placas
de cultura (ágar sangue, Mueller-Hinton) que foram previamente semeadas em
estrias com o patógeno suspeito. A inibição do crescimento bacteriano ao redor de
um dos discos, após 8 a 24h da incubação a 37°C, é indicativa de sensibilidade ao
antibiótico com o qual o disco estava impregnado. A técnica de Kirby-Bauer mede
a potência antibiótica quantitativa em concentração inibitória mínima (CIM) e
concentração bactericida mínima (CBM).

CITOLOGIA
A citologia pode ser usada como um método de baixo custo na obtenção de um
diagnóstico definitivo. Inflamação, neoplasia e agentes patogênicos específicos
podem ser diferenciados usando-se procedimentos rotineiros de citologia. Ideal-
mente, as amostras citológicas devem compreender uma camada celular grossa
para permitir coloração e visualização adequadas.
Uma agulha de calibre 22 encaixada em uma seringa de 6mL pode ser usada
para mostrar vários tecidos com desconforto mínimo ao animal. Para aspirar o
tecido, a agulha é direcionada dentro da massa e aplica-se sucção com a seringa.
A agulha é redirecionada uma ou duas vezes, com o cuidado de manter sua ponta
dentro do tecido. O êmbolo da seringa é gentilmente liberado antes que a agulha
seja retirada. Quase sempre, o tecido não está visível dentro do corpo da seringa,
mas o material diagnóstico está dentro da agulha. A agulha deve ser mantida sobre
uma lâmina de vidro à medida que a seringa é removida e preenchida com ar. A
seringa é recolocada e a amostra dentro da agulha é gentilmente expulsa sobre a
Procedimentos Diagnósticos Laboratoriais 1143

lâmina. Uma segunda lâmina é usada para espalhar a amostra para se fazer um
esfregaço. Se as lâminas forem coradas com corantes do tipo Romanowsky, elas
são secadas ao ar; se forem coradas pelo método tricrômico, são colocadas
imediatamente em metanol.
As amostras de biópsia podem também ser usadas para citologia. Uma superfície
recentemente cortada da amostra de biópsia deve ser seca em uma toalha de papel
limpa. Esta superfície é então gentilmente decalcada em uma lâmina de vidro limpa.
Vários decalques podem ser feitos na mesma lâmina. Amostras citológicas devem
ser protegidas de formalina e seus gases. O formaldeído altera as características
corantes do tipo Romanowsky e dificulta a capacidade diagnóstica.
As amostras fluidas devem ser coletadas em tubos com EDTA para evitar a
formação de coágulos, que podem preencher as células, e avaliadas por contagem
de células e mensuração da proteína. Os esfregaços devem ser feitos o quanto antes
após a coleta. É usada uma técnica semelhante àquela usada para fazer esfregaços
sangüíneos. Em amostras com poucas células, pode ser melhor concentrar a
amostra antes de fazer um esfregaço.
A citologia é útil para diferenciar lesões inflamatórias de lesões neoplásicas. O
agente etiológico de lesões inflamatórias, assim como os componentes celulares da
inflamação, pode ser identificado em uma amostra citológica. Lesões inflamatórias
agudas são geralmente caracterizadas por uma grande população de neutrófilos
com poucos macrófagos e linfócitos. A inflamação crônica tende a ter macrófagos
gigantes, plasmócitos e alguns neutrófilos. Podem ser necessários corantes espe-
ciais para ajudar a identificar microrganismos infecciosos como fungos ou bactérias.
Citologicamente, a neoplasia pode ser categorizada em 3 grupos básicos:
tumores epitelioglandulares, tumores de tecido de sustentação, e um grupo variado
algumas vezes referido como tumores de células redondas. As células do grupo
epitelioglandular tendem a esfoliar em grupos. As células de tumores malignos
tendem a variar em tamanho, forma e proporção núcleo–citoplasma. Os núcleos
podem ser grandes com nucléolos proeminentes. Figuras mitóticas bizarras e,
ocasionalmente, formações glandulares podem ser vistas.
As células malignas de tumores de tecido de sustentação dividem muitas de suas
características citoplasmáticas. As células desses tumores são muito menos prováveis
de esfoliar e em geral esfoliam individualmente quando o fazem. As células geralmente
são ovóides ou em forma de fuso, com variação de tamanho discreta a acentuada. As
células quase sempre parecem “delicadas” com membranas mal definidas.
A citologia é muito útil quando se avaliam as neoplasias variadas. Essas incluem
linfomas, mastocitomas, histiocitomas, tumor venéreo transmissível e melanomas.
Os linfomas são reconhecidos por uma população claramente uniforme de grandes
linfócitos imaturos. Muitos têm nucléolos proeminentes e são classificados como
linfoblastos. Os linfomas podem ser diagnosticados a partir de aspirados não só de
linfonodos, como também do fígado, rim ou outros órgãos.
Os mastocitomas são facilmente reconhecidos pela grande população de células
com núcleos azuis-claros e numerosos grânulos corados metacromaticamente no
citoplasma. Os grânulos são tão numerosos que podem esconder o núcleo. Alguns
corantes rápidos não coram adequadamente os grânulos, permitindo visualização
fácil dos núcleos.
Os histiocitomas podem esfoliar bem ou precariamente. As células redondas a
ovais variam levemente em tamanho. O citoplasma é azul-pálido e moderadamente
abundante. Os linfócitos podem ser espalhados e aumentar de número assim que o
tumor comece a regredir espontaneamente.
O tumor venéreo transmissível pode ocorrer em outros lugares além da área
urogenital. As células esfoliam prontamente e são claramente grandes, variando
levemente em tamanho. São comuns as figuras mitóticas.
Procedimentos Diagnósticos Laboratoriais 1144

Os melanomas têm grandes células ovais com citoplasma abundante que


podem conter grânulos escuros (melanina). Ocasionalmente, os melanomas
contêm poucos ou nenhum grânulo reconhecível e podem ser confundidos com
outros tumores.
A citologia vaginal pode ser usada na identificação dos vários estágios do ciclo
estral em cães. Uma amostra das células esfoliativas é obtida da prega vaginal
cranial ao orifício uretral com um “swab” em forma de cotonete, pipeta ou bastão
de vidro. As células vaginais são delicadamente deslizadas sobre uma lâmina de
vidro limpa e desengordurada, fixada com metanol a 95% e secada ao ar. A lâmina
é então corada com um corante permanente para futura referência. Vários tipos
celulares epiteliais, eritrócitos e neutrófilos em concentrações e proporções
variadas caracterizam os diferentes estágios do ciclo estral da cadela. As células
predominantes no estágio final do proestro são eritrócitos e células epiteliais não
cornificadas. O estro é associado a numerosas células epiteliais superficiais
cornificadas e à presença de grande número de bactérias. No diestro, predominam
os neutrófilos e as células epiteliais parabasais não cornificadas e intermediárias.
A maioria das células encontradas durante o anestro são células epiteliais
parabasais e intermediárias não cornificadas.

Análise de fluidos
Os fluidos corporais podem ser analisados para auxílio diagnóstico. O fluido
normalmente encontrado nas cavidades corporais é caracteristicamente pobre em
proteínas e contém poucas células. Acredita-se ser um ultrafiltrado de plasma, e as
células do revestimento mesotelial podem regular o fluxo de fluido. Ao se avaliarem
amostras fluidas, vários parâmetros devem ser examinados. Já que os fluidos
corporais normais têm um baixo conteúdo proteico (< 3g/dL), um aumento sugere um
processo inflamatório. Os fluidos com baixo conteúdo proteico são transudatos; os
que apresentam proteína aumentada são exsudatos. Quando há um discreto
aumento no número de células e na quantidade de proteínas, trata-se de um
transudato modificado. As diferenças entre um transudato modificado e um exsudato
não são sempre óbvias.
Os transudatos podem resultar de estase venosa, hipoalbuminemia ou obstrução
linfática. O conteúdo proteico é < 3g/dL e pode ser estimado pela utilização de um
refractômetro (densidade específica ≤ 1,015). Há geralmente poucas células (< 500
células nucleadas/µL). Os esfregaços devem ser feitos a partir do sedimento de uma
amostra centrifugada. As células são tipicamente mesoteliais e ocasionalmente
inflamatórias. As células mesoteliais desprendidas podem proliferar no fluido. Já que
as células mesoteliais reativas não se dividem completamente, elas geralmente
ocorrem em grupos de múltiplos de 2. O citoplasma é abundante com núcleos
localizados centralmente. As células inflamatórias vistas em transudatos têm a
morfologia de leucócitos periféricos.
Os transudatos modificados têm um aumento discreto na proteína (3 a 5g/dL) e
densidade específica (1,018 a 1,030). A contagem de células nucleadas aumenta um
pouco, mas ainda é < 5.000/µL, e a maioria delas são células mesoteliais reativas.
Alguns dos grupos de células podem exibir figuras mitóticas e devem ser diferencia-
dos das células mesoteliais. Células inflamatórias, primariamente neutrófilos, tam-
bém podem ser encontradas no transudato modificado.
Os exsudatos são acúmulos de fluido que têm alto conteúdo proteico (> 4g/dL)
e contagem de células > 5.000/µL. As células variam com a causa de efusão. As
efusões quilosas resultam do escoamento de linfa nas cavidades corporais. Elas
têm um alto conteúdo lipídico e classicamente parecem leite. A maioria das
células corresponde a pequenos linfócitos maduros.
Procedimentos Diagnósticos Laboratoriais 1145

As efusões inflamatórias podem ser classificadas de acordo com a duração do


tempo em que tenham estado na cavidade corporal. Os neutrófilos predominam em
reações agudas; se forem degenerados, suspeita-se de causa bacteriana. As
efusões inflamatórias crônicas têm número maior de macrófagos. Mesmo que não
sejam observados microrganismos, deve-se tentar uma cultura.
As efusões neoplásicas podem conter células neoplásicas características, por
exemplo os linfossarcomas podem causar uma efusão com numerosos linfócitos
blásticos atípicos, e tumores de origem epitelial podem-se apresentar em grupos ou
individualmente. É sempre difícil diferenciar essas células neoplásicas de células
mesoteliais reativas.

Técnicas de coloração
Exsudatos, transudatos, aspirações por agulha hipodérmica, decalque de teci-
dos, sangue, fezes e sedimento urinário podem ser avaliados microscopicamente
em esfregaços corados ou não. Os corantes podem ser utilizados como auxílio na
identificação de bactérias, tipos de inflamação e neoplasias.
Coloração de Gram – Este corante separa as bactérias em 2 grupos taxonômi-
cos: microrganismos Gram-positivos, como os cocos, os quais se coram de violeta
ou preto, e os microrganismos Gram-negativos, como os coliformes e pseudomonas
que aparecem róseos. Um esfregaço moderadamente fino da amostra-teste é fixado
rapidamente por aquecimento em chama e secado ao ar. O esfregaço fixado é
coberto com violeta genciana por 1min, lavado com água e coberto com lugol
(iodeto) por 1min. Descolore-se o mesmo então por 5 a 10s com álcool-acetona,
lava-se novamente com água e colora-se com safranina ou fucsina básica por 1min.
Depois de enxaguado em água, o esfregaço é seco antes do exame ao microscópio
sob objetiva de imersão. Além de diferenciar as 2 categorias bacterianas, todos os
fungos coram-se de azul-escuro, e os núcleos das células brancas, de rosa.
Esfregaços límpidos não corados – Podem ser observados em preparações
límpidas não coradas em lâminas: fungos de dermatomicoses, ácaros de sarna,
bolor e estruturas granulares amarelas (grânulos de enxofre ou fungos raiados, os
quais caracterizam o pus produzido por actinomicetos, actinobacilos e estafiloco-
cos). Uma lâmina de bisturi é usada na coleta de pêlos e crostas de pele da periferia
de lesões recentes por raspagem na camada coriônica da pele. Na pesquisa de
ácaros, o raspado deve ser profundo até que haja sangramento dos capilares. Os
restos de tecidos purulentos ou necróticos contêm fungos patogênicos e “grânulos
de enxofre”. O material coletado é colocado em uma lâmina e algumas gotas de
solução de hidróxido de sódio em 10 a 40% são adicionadas, cobrindo-se em
seguida com uma lamínula. A clarificação da amostra ocorre em 30min podendo ser
acelerada pelo aquecimento brando por 5min. Uma objetiva de pequeno aumento
é usada para exame das áreas contendo pêlos e células epiteliais em uma única
camada fina. Sob objetiva de grande aumento com iluminação reduzida, observa-
remos hifas de fungos e/ou esporos, os quais se encontram dentro ou ao longo da
raiz dos pêlos e células da epiderme, no caso de dermatomicoses. A coloração de
Gram e culturas podem ser usadas para a identificação específica de estruturas
granulares, e fungos podem ser observados como causas de lesões subcutâneas.
Coloração de Wright – Este corante pode ser encontrado sob a forma líquida e
é usado com tampão de fosfato. A quantidade de corante suficiente é colocada sobre
a lâmina de modo a cobrir o esfregaço, permanecendo sobre ele por 1 a 3min; uma
quantidade igual de tampão de fosfato é cuidadosamente adicionada e misturada
delicadamente por sopro, tendo-se o cuidado para não derramar, até o aparecimen-
to de uma espuma verde-metálica. O tempo ideal de coloração pode variar de 3 a
5min. O corante e a espuma são escorridos e lavados com água destilada e então
Procedimentos Diagnósticos Laboratoriais 1146

a lâmina é seca ao ar. Um registro permanente da amostra pode ser feito com a
coloração de uma lâmina e um meio de montagem.
Coloração de Giemsa – Soluções-estoques são facilmente obtidas, sendo está-
veis e produzindo bons resultados. O esfregaço é fixado em metanol absoluto por 3 a
5min e seco. O corante é preparado diariamente pela mistura de um volume da
solução-estoque com 15 volumes de água destilada. O esfregaço já fixado e seco é
colocado imediatamente no corante diluído por 30 a 60min, lavado com água destilada
neutra, seco ao ar e examinado. Registros permanentes de parasitas sangüíneos
podem ser feitos pela montagem com lamínula sobre o esfregaço corado.
Corantes para colorações rápidas – Há inúmeros corantes comerciais dispo-
níveis que coram rápida e facilmente. As orientações do fabricante para o uso dos
vários corantes devem ser seguidas. O NAM (novo azul de metileno) é um corante
vital versátil que revela reticulócitos, corpúsculos de Heinz, núcleos, hemoparasitas
e plaquetas, além de outras estruturas. Em contraste com outros corantes, o NAM
não cora glóbulos vermelhos e não pode ser usado como coloração em montagens
permanentes, a menos que um contra-corante seja usado.

HEMATOLOGIA
Testes de coagulação – A hemostasia envolve muitas inter-relações complexas
entre muitos sistemas (ver DISTÚRBIOS HEMOSTÁTICOS, pág. 63). O sangue coagula
quando é removido dos vasos normais revestidos por endotélio. A coagulação é
geralmente dividida em 2 sistemas principais, as vias intrínseca e extrínseca, as
quais terminam em uma via comum; isso resulta na formação de um tampão de
fibrina. Testes têm sido desenvolvidos para avaliar tanto o sistema intrínseco quanto
o extrínseco bem como os fatores específicos dentro dos sistemas. Alguns destes
testes são mais bem feitos por laboratórios comerciais. O sangue para os mesmos
requer manipulação especial, e o laboratório deve ser contactado para instruções
específicas. Entretanto, vários testes de coagulação podem ser feitos a domicílio.
Tempo de sangramento – Escolhe-se uma área limpa e não pilosa (nariz,
interior do lábio, interior da orelha) para este teste. Uma picada profunda é feita com
uma lanceta ou uma lâmina de bisturi afiada nº 11. O tempo é observado a partir da
aparição de sangue (sem aplicar pressão). A intervalos de 30s, um filtro de papel
(que não deve tocar a pele) é usado para remover o sangue. Observa-se o tempo
em que o sangramento cessa; para a maioria dos animais domésticos, esse tempo é
de 1 a 5min. O tempo de sangramento é prolongado quando ocorrem defeitos de
plaqueta, fragilidade capilar aumentada e doença de von Willebrand.
Tempo de coagulação ativada (TCA) – Coloca-se sangue completo (2mL) em
um tubo de TCA. Esse tubo contém terra diatomácea, que serve como agente
ativador para encurtar o tempo de coagulação e aumentar a sensibilidade do tempo
de coagulação do sangue completo. A contagem de tempo começa tão logo o
sangue seja colocado no tubo. Após homogeneização, o tubo é incubado a 37°C por
1min. O tubo é avaliado a intervalos de 5s para constatação de coagulação. Isso
normalmente ocorre dentro de 60 a 90s. Trombocitopenia grave (< 10.000 plaque-
tas/µL) e defeitos no sistema intrínseco prolongam o tempo de coagulação.
Fibrinogênio – O fibrinogênio é essencial para a formação do coágulo sangüí-
neo. Sua dosagem é facilmente obtida pela precipitação por calor a partir de uma
amostra de sangue completo contendo um anticoagulante. Dois tubos de VTC são
preenchidos e centrifugados por 10min para a separação do plasma. Os sólidos
totais (mg de proteína/dL) no plasma de um tubo são determinados usando-se um
refratômetro. O outro tubo de VTC centrifugado é imerso em banho-maria a 57°C por
3min para que haja precipitação do fibrinogênio. É então novamente centrifugado e
os sólidos totais remanescentes no plasma são determinados com o refratômetro.
Procedimentos Diagnósticos Laboratoriais 1147

Esse valor é subtraído do valor obtido do plasma não aquecido e a diferença é igual
à concentração de fibrinogênio em mg/dL. Os valores normais em cães, gatos e
eqüinos são de 200 a 400mg/dL. A média em bovinos é de 450 a 750mg/dL, e
valores mais elevados são uma indicação mais sensível de processos inflamatórios
e neoplasias em bovinos que a contagem total de leucócitos. A hipofibrinogenemia
pode ser congênita ou refletir processos hepáticos avançados, má nutrição,
leucemia granulocítica canina, estado moribundo, coagulação intravascular disse-
minada, etc.
Os tipos de células sangüíneas circulantes variam em número de acordo com o
estado fisiológico normal assim como com as condições patológicas. Essa variação
considerável pode ser influenciada por sexo, idade, nutrição, esforço físico, tempe-
ratura ambiente e ciclos sexual e diurno. Os valores listados na TABELA 8, página
1171, devem ser considerados como guias e não como critérios rígidos.
O número de células sangüíneas também muda em estados patológicos: os
valores de leucócitos aumentam em infecções bacterianas agudas, leucemias
neoplásicas, necrose tecidual, trauma e intoxicação metabólica ou química; no
entanto, estágios extremos das mesmas condições estão associados a valores
diminuídos. Entre os exemplos comuns de alterações diagnósticas no número de
células sangüíneas está o aumento de neutrófilos (leucócitos polimorfonucleares)
produzido por bactérias piogênicas. Números elevados de monócitos e linfócitos
estão associados a uma resposta imune em um processo inflamatório crônico ou a
caminho da cura. Ao contrário, infecções virais agudas são caracterizadas por
leucopenia. A contagem de eosinófilos aumenta em respostas alérgicas e freqüen-
temente ocorre em associação a infecções por helmintos. As anemias decorrentes
de parasitismo ou desnutrição severas são refletidas por números menores de
hemácias circulantes com menos hemoglobina. Numerosas células sangüíneas
imaturas com morfologia anormal são quase sempre os primeiros indicadores de
uma alteração neoplásica nos tecidos formadores de sangue.
Coleta de amostras sangüíneas – O sangue é coletado por meio de punção
venosa, utilizando-se agulha e seringa estéreis e secas ou por meio de tubos
coletores a vácuo, contendo um anticoagulante (EDTA de potássio). Agulhas
descartáveis, seringas plásticas e tubos coletores facilitam a coleta de sangue, pois
evitam a contaminação química e as infecções iatrogênicas. O tamanho do animal
e a quantidade de sangue requerida determinam o local para a punção venosa.
Geralmente a maior veia acessível é usada. As veias cefálica, jugular, femoral e
coccígea são os locais mais freqüentemente usados para pequenos animais e
herbívoros. A veia cava anterior é o local de escolha para suínos e a veia alar é usada
para os pássaros. As amostras sangüíneas podem ser obtidas em filhotes de cães
e gatos, pelo corte das unhas, próximo ao leito ungueal. O melhor esfregaço para
a contagem diferencial dos leucócitos é feito imediatamente após a coleta, antes de
se expor o sangue a um anticoagulante. Os tubos contendo anticoagulante devem
ser invertidos delicadamente, logo após a coleta do sangue e antes do uso deste
para permitir a mistura uniforme. O EDTA é o anticoagulante de escolha para a
maioria dos procedimentos hematológicos, se estes forem realizados até 6h após
a coleta (quanto antes melhor). Entretanto, o EDTA causa a retração dos glóbulos
vermelhos e interfere na determinação de nitrogênio não proteico, fosfatase alcali-
na, creatinina e poder de combinação do dióxido de carbono. Deve-se ter cuidado
para evitar hemólise durante e após a coleta de sangue, pois esta interferirá em
várias análises bioquímicas.
Hematócrito – O hematócrito é uma avaliação prática e precisa do estado dos
glóbulos vermelhos, considerando a relativa inexatidão das contagens manuais de
leucócitos e o esforço técnico requerido para uma determinação precisa de hemoglo-
bina. O hematócrito é melhor obtido pelo uso de centrífugas para micro-hematócrito.
Procedimentos Diagnósticos Laboratoriais 1148

Um tubo capilar é preenchido com sangue contendo anticoagulante, fechado em uma


das extremidades e centrifugado. Existem à disposição no mercado tubos capilares
contendo heparina, os quais permitem uma coleta direta de sangue do animal
(unha e orelha). A amostra centrifugada é colocada sobre um leitor de tubo de
hematócrito e o valor percentual do volume de células sangüíneas é obtido a partir
da escala subjacente. Outros parâmetros podem ser estimados de modo grosseiro
a partir do hematócrito. A contagem total de hemácias é um sexto do valor do
hematócrito e a hemoglobina é um terço dele. A cor do plasma separado no tubo
centrifugado pode ser uma indicação de icterícia em não herbívoros, anemia ou
lipemia. A lipemia é freqüentemente associada a diabetes melito, hipotireoidismo,
pancreatite aguda e doença hepática.
Contagem total de leucócitos – O sistema “Unopette” é um método manual
prático e econômico que pode ser usado para determinar os números totais dos
leucócitos, hemácias, plaquetas e eosinófilos circulantes. O sistema utiliza reserva-
tórios para diluição descartáveis e pré-preenchidos, pipetas, uma câmara de conta-
gem hematimétrica e um microscópio. Uma margem de erro de cerca de 20% não
diminui o valor diagnóstico da determinação feita com o sistema.
A carga de trabalho do laboratório deve ser avaliada antes de se decidir por
comprar e manter os analisadores automáticos mais precisos e eficientes. Três
hemogramas completos por dia são considerados como justificativa econômica
mínima para a aquisição de um aparelho automático. A precisão dos instrumentos
mais automatizados requer recalibração para cada espécie. O uso de padrões de
controle de qualidade em cada teste também assegura a precisão.
Contagem diferencial dos leucócitos (ver TABELA 9 – V ALORES DE LEUCÓCITOS,
pág. 1172) – Os melhores esfregaços sangüíneos são feitos em lâminas de vidro
novas, limpas, secas e aquecidas eletronicamente e com borda chanfrada. Uma
pequena gota de sangue fresco (dentro de 15min após adição do EDTA) é colocada
próxima do final da lâmina, apoiada sobre uma superfície plana. Outra lâmina num
ângulo de 30 o é deslizada sobre a superfície da outra até que toque a gota de sangue,
a qual espalha-se por ação capilar ao longo da interface formada pelas duas
lâminas. A lâmina em ângulo é então empurrada para a frente em um movimento
suave e regular, formando um esfregaço sobre a superfície da lâmina estacionária.
O esfregaço é seco rapidamente, agitando-se a lâmina no ar ambiente ou colocan-
do-a na frente de um ventilador, para prevenir distorções celulares e crenações. O
esfregaço seco deve ser, de preferência, corado logo a seguir, e quando isso não
for possível, fixado com metanol absoluto ou guardado em um recipiente seco, livre
de poeiras, à temperatura ambiente.
O esfregaço é corado com uma coloração do tipo Giemsa ou Wright e seco após
o excesso de corante ter sido retirado em água corrente. O esfregaço corado é
analisado sob microscópio com objetiva de pequeno aumento, para verificação da
uniformidade do esfregaço e da coloração das células brancas. Seleciona-se, então,
a área para a contagem em um local onde os glóbulos vermelhos corados apresentem
uma área central pálida. As células devem estar distribuídas em um único campo.
Posiciona-se então a lâmina sob a objetiva de imersão e contam-se os leucócitos
em um número de 100 ou múltiplo deste (de preferência). A margem externa do
esfregaço sangüíneo deve ser examinada uniformemente para compensar a
distribuição desigual dos vários tipos celulares. O uso de um tabulador de células
facilita a contagem diferencial. O número total encontrado de cada tipo celular é
expresso em valores percentuais. Os valores absolutos são obtidos pela multipli-
cação do valor percentual encontrado pela contagem total de células brancas. Os
valores são utilizados para se diferenciar um aumento real de um aumento aparente,
que é relativo à redução no número de outros tipos de células brancas. Os valores
absolutos dão-nos segurança na interpretação da contagem diferencial.
Procedimentos Diagnósticos Laboratoriais 1149

Patógenos hematogênicos (ver pág. 1152) podem ser observados no momento


em que se realiza a contagem diferencial dos leucócitos. O número de plaquetas
pode ser estimado pela contagem do número de plaquetas observadas no campo
microscópico sob objetiva de imersão (ver adiante). Quatro ou mais plaquetas estão
normalmente presentes em cada campo, a menos que se tenham acumulado nas
bordas do esfregaço.
Contagem de reticulócitos – Sinais clínicos de anemia podem ser acompanha-
dos por um aumento no número de eritrócitos imaturos não nucleados e contendo
resíduos citoplasmáticos basofílicos. Esses resíduos aparecem como um retículo
ou como pontos, quando corados com corantes vitais. Quantidades equivalentes de
sangue e solução de NAM a 1% em solução salina são colocadas em tubo
tamponado por 15min à temperatura ambiente. Um esfregaço da mistura é então
preparado em lâmina de microscópio e contracorado como para a contagem
diferencial de leucócitos. O número de eritrócitos contendo filamentos ou grânulos
corados de azul numa contagem de 500 a 1.000 eritrócitos é determinado sob
objetiva de imersão. Os valores são expressos em porcentagem e variam normal-
mente de 0% em ungulados a 1% em cães e gatos. Os valores mais altos estão
associados a uma resposta regenerativa da medula óssea às anemias em cães,
gatos e bovinos. Em eqüinos, uma exceção, não ocorre a presença de reticulócitos
periféricos como resposta a anemias.
Contagem de plaquetas – As plaquetas (trombócitos) são frágeis e as contagens
devem ser feitas 2h após a coleta do sangue. A contagem apresenta larga margem
de erros inerentes adicionais. O sistema Unopette*, projetado para contagens de
leucócitos e plaquetas, está disponível no comércio. A câmara hematimétrica
preenchida deve ser coberta com uma placa de Petri por 10min para permitir que as
plaquetas se acomodem antes de se fazer a contagem de toda a área eritrocitária da
câmara sob ampliação altamente seca. Uma contagem indireta é mais simples e mais
prática. O número de plaquetas observado a cada 100 leucócitos contados é anotado
durante a contagem diferencial. Este valor é dividido por 100 e multiplicado pelo
número de leucócitos/µL (ver CONTAGEM TOTAL DE LEUCÓCITOS, anteriormente). O
valor obtido é o número de plaquetas/µL. Uma contagem plaquetária < 50.000 está
associada a hemorragias espontâneas. Uma avaliação grosseira pode ser feita pela
contagem do número de plaquetas observadas em cada campo microscópico sob
objetiva em imersão; o número médio normal por 10 campos é igual a 5. Contagens
elevadas estão associadas ao estresse, incluindo cirurgias. Valores deprimidos
estão associados a doenças hematopoiéticas e são as causas mais comuns de
problemas de sangramento em pequenos animais.
Avaliação das hemácias – Tanto o número como a morfologia das hemácias
são sujeitos a alterações como resultado de doença. Um aumento comum no
número de hemácias é denominado policitemia (ver pág. 99).
Existem muitas causas de anemia (ver pág. 18), mas raramente ela é uma
doença primária. As anemias podem ser classificadas de acordo com os índices de
hemácias: o volume celular médio (VCM), a hemoglobina corpuscular média (HCM)
e a concentração hemoglobínica corpuscular média (CHCM). O VCM é determinado
ao se dividir o VTC pela contagem de hemácias e multiplicando-se por 10; a unidade
usada é o fentolitro (fL). A CHCM é determinada pela divisão da hemoglobina pelo
hematócrito e sua multiplicação por 100; a concentração de hemoglobina por
volume unitário de hemácias é expressa em g/dL. A HCM varia linearmente com o
VCM. Ela é calculada pela divisão do VTC pela contagem de hemácias e multipli-

* N. do T. – Nome comercial americano.


Procedimentos Diagnósticos Laboratoriais 1150

TABELA 2 – Exame de Sangue Periférico para Patógenos Microscópicos


Espécies primariamente
afetadas Exemplos de patógenos hematogênicos detectáveis
Cão Dirofilaria immitis
Dipetalonema reconditum
Ehrlichia canis
Babesia (Piroplasma) canis
Haemobartonella sp
Histoplasma capsulatum
Gato Haemobartonella felis
Dirofilaria sp
Cytauxzoon felis
Histoplasma capsulatum
Cavalo Ehrlichia sp
Babesia (Piroplasma) equi
B. caballi
Bovino Anaplasma marginale
Trypanosoma theileri (americanum) – não patogênico
Bacillus anthracis
Suíno Eperythrozoon suis
Erysipelothrix rhusiopathiae
Ovino Eperythrozoon ovis
Pato Leucocytozoon simondi (anseris)
Pombo Haemoproteus sp

cando-se o resultado por 10; o resultado é o peso médio da hemoglobina na hemácia


e é expresso em picogramas (pg). Por meio da avaliação do VCM, pode-se
determinar se as hemácias são grandes (macrocíticas), pequenas (microcíticas) ou
normais (normocíticas). A CHCM indica se o conteúdo de hemoglobina está
diminuído (hipocrômico) ou normal (normocrômico). É impossível se constatar uma
elevação verdadeira no conteúdo de hemoglobina.
A morfologia das hemácias pode ser avaliada a partir do esfregaço corado. A
morfologia anormal é mais facilmente reconhecida em cães devido ao tamanho e à
forma bicôncava das células normais. Os termos descritivos a seguir são usados
para descrever as hemácias. Anisocitose é variação no tamanho. Os macrócitos
são maiores que o normal; geralmente são células policromatofílicas jovens. Os
micrócitos são menores que as células normais. Poiquilocitose é um termo geral
usado para descrever alteração na forma da célula; deve-se avaliar precisamente
para se determinar se é um artefato de preparação de lâmina ou se é devida à
patologia das hemácias. As hemácias crenadas têm uma aparência pregueada
com pequenas projeções igualmente espaçadas saindo de sua superfície. São
comumente vistas em esfregaços sangüíneos suínos, porém sendo geralmente um
artefato de preparação em outras espécies. Os esferócitos são pequenas células
escuras sem palidez central; são resultado da perda da membrana eritrocitária, o
que faz com que as hemácias se reúnam e percam a forma bicôncava. São vistos
mais freqüentemente em anemia hemolítica auto-imune. Os acantócitos (células
esporadas) têm protuberâncias espiculares irregulares a partir da membrana
eritrocitária. Podem ser vistos em moléstias hepáticas severas, neoplasia vascular
e coagulação intravascular disseminada. Os esquizócitos são fragmentos de
hemácias. Desordens microangiopáticas cortam as hemácias em pedaços irregu-
lares. Os leptócitos são hemácias que apresentam membrana aumentada ou
volume diminuído. A membrana celular se dobra ou fica distorcida. Algumas vezes
formam “células-alvo” com uma borda escura e uma massa central aparente.
Procedimentos Diagnósticos Laboratoriais 1151

Inclusões e agentes infectantes também podem ser observados dentro das


hemácias ou em sua superfície. Os corpúsculos de Howell-Jolly são pequenas
inclusões escuras encontradas dentro das hemácias. São restos nucleares e estão
aumentados em cães e gatos com anemia regenerativa e cães que tenham recebido
glicocorticóides. A granulação basofílica pode ser observada em anemias
regenerativas de bovinos e ovinos, e em envenenamento por chumbo em cães. As
hemácias normocrômicas apresentam múltiplas e minúsculas inclusões escuras,
quando coradas com corante de Romanowsky. As inclusões sideróticas são
grânulos que contêm ferro; são parecidas com a granulação basolífica corada de
Romanowsky, mas podem ser diferenciadas por corantes de ferro. As inclusões de
cinomose são pedaços de nucleocapsídeos virais que são vistos em hemácias e
leucócitos; coram-se de azul ou rosa.
Avaliação dos leucócitos – As células nucleadas do sangue (leucócitos)
incluem neutrófilos, linfócitos, monócitos, eosinófilos e basófilos. São diferenciadas
ao se examinar um esfregaço corado. As alterações no número de leucócitos e em
sua morfologia são chamadas de resposta leucocitária. As respostas leucocitárias
típicas podem auxiliar no diagnóstico.
Neutrófilos – O neutrófilo apresenta um núcleo segmentado quando está
maduro e é liberado da medula óssea. O citoplasma se cora em rosa-pálido, com
granulações finas. Em situações emergenciais, neutrófilos imaturos (chamados
neutrófilos listrados) são liberados da medula óssea. Os núcleos dessas células têm
forma de ferradura. Continuando-se a demanda emergencial, mais células imaturas
são liberadas. Quanto mais jovem for o neutrófilo, mais arredondado será seu
núcleo.
Linfócitos – Possuem núcleos redondos que podem apresentar uma leve fissura.
O citoplasma se cora em azul e é relativamente escasso. Pequenas granulações
rosa-arroxeadas podem estar presentes no citoplasma de alguns dos linfócitos. As
células imaturas tendem a ser maiores e ter um citoplasma mais escuro.
Monócitos – Têm núcleos com várias formas, que podem ser uniformes ou
lobuladas. O citoplasma é azul-acinzentado. Pequenos vacúolos e/ou pequenas
granulações rosadas podem estar presentes no citoplasma.
Eosinófilos – Também têm núcleos segmentados, semelhantes ao dos neutró-
filos. Espécies diferentes têm granulações eosinofílicas com formas características:
em cães, podem variar em tamanho dentro de uma célula; nos gatos, são pequenas
e em forma de bastão; nos eqüinos, são grandes e redondas; nos bovinos, ovinos
e suínos são pequenas, redondas e uniformes.
Basófilos – Os núcleos dos basófilos também são segmentados. As granulações
se coram em roxo ou azul-escuro. Os cães têm poucas, os eqüinos e bovinos têm
mais. Os basófilos de felinos têm poucas granulações coradas em lavanda; difíceis
de ver, podem dar ao núcleo uma aparência “roída”.

Exame de sangue periférico para patógenos microscópicos


Ver também MICRORGANISMOS HEMATÓGENOS, AVES, página 1870.
A dirofilariose canina (ver pág. 87) continua sendo um problema grave e a felina
tem sido diagnosticada com mais freqüência. A presença de microfilárias em
esfregaço de sangue periférico fresco de cães é conclusiva de infecção tanto por
Dirofilaria immitis quanto por Dipetalonema reconditum, que é um parasita benigno.
As microfilárias devem ser identificadas antes de se iniciar o tratamento. Se o exame
do esfregaço de sangue periférico for negativo e houver a necessidade de um
diagnóstico diferencial para dirofilariose, uma amostra de sangue deve ser
centrifugada ou filtrada por meio de kits disponíveis comercialmente para aumentar
a probabilidade de encontro de microfilárias. Na ausência de microfilárias circulan-
Procedimentos Diagnósticos Laboratoriais 1152

tes, podemos agora diagnosticar infecções ocultas por meio de kits que detectam
anticorpos antimicrofilárias por intermédio da imunofluorescência ou por intermédio
de antígenos de vermes adultos por ELISA.
Exame de eritrócitos para patógenos – Esfregaços de sangue de várias
espessuras são feitos em lâminas limpas, variando-se o tamanho da gota de
sangue e alternando-se o ângulo da lâmina espalhadora (ver pág. 1149). Os
esfregaços secos são fixados em álcool absoluto por 2min e corados (ver pág.
1145) com Wright, Giemsa ou novo azul de metileno. Eles são examinados sob
objetiva de imersão para hematozoários, a maioria dos quais está incluída na
T ABELA 2. Os parasitas geralmente aparecem menos refringentes que os artefatos
de técnica.
Exame de fagócitos para patógenos – O sedimento coagulado formado no
sangue centrifugado é fonte de um grande número de fagócitos leucocitários,
incluindo polimorfonucleares e monócitos. O esfregaço desse sedimento, corado
por técnicas semelhantes àquelas usadas para os glóbulos vermelhos, é de grande
valor diagnóstico em histoplasmose, toxoplasmose, leucocitozoonose, erliquiose,
erisipelas septicêmicas, etc.

PARASITOLOGIA
Exame para pesquisa de ectoparasitas
Os animais com dermatoses devem ser avaliados quanto a ectoparasitas. A pele
é examinada para parasitas ou evidências destes, por exemplo, pulgas podem não
ser vistas em um gato ou cão, mas pequenos flocos escuros de excremento podem
estar presentes. Se esses flocos forem colocados sobre papel-toalha molhado,
produzirão um corante vermelho-brilhante.
Algumas vezes a pele deve ser raspada (por exemplo, com uma lâmina de bisturi)
para se achar parasitas. Uma gota de óleo mineral é colocada em uma lâmina de
vidro, correndo-se a lâmina do bisturi sobre o óleo; este retém os fragmentos de pele
na lâmina de vidro. Como alguns dos parasitas (por exemplo, Sarcoptes, Demodex)
vivem em buracos e folículos pilosos, pode ser necessário se raspar a pele até que
uma pequena quantidade de sangue seja obtida.
O material raspado é espalhado na gota de óleo sobre a lâmina, e uma lamínula
deve ser colocada em cima. Toda a área delimitada pela lamínula deve ser
vasculhada sob pequena ampliação. Ocasionalmente, pode ser necessário adicio-
nar 2 a 3 gotas de solução de hidróxido de potássio a 10%. Essa substância limpa
os fragmentos e permite uma melhor visualização.

Estimativa de carga parasitária interna


O procedimento ante mortem mais comum de estimativa de carga parasitária
é o exame fecal, à procura de ovos de parasitas. Se for possível, as amostras
fecais frescas devem ser coletadas diretamente do reto. Para isso, uma luva
plástica será suficiente; coletam-se as fezes invertendo-se a luva, a qual será
usada como frasco coletor. Se os animais não puderem ser contidos, coletam-se
as amostras fecais diretamente do pasto ou do piso, também usando-se luvas
plásticas; somente os materiais recém-defecados devem ser utilizados nesse
método. Um número representativo de amostras deve ser coletado e um mínimo
de 10 é o recomendado.
Os resultados de amostras velhas são mais difíceis de interpretar devido ao
desenvolvimento de embriões ou à deterioração de cistos ou ovos que ocorre nesse
método; por exemplo, as larvas de parasitas pulmonares são mais facilmente
identificadas em fezes frescas, visto que outras espécies de larvas podem ser
Procedimentos Diagnósticos Laboratoriais 1153

encontradas em fezes mais velhas. Em fezes de cão, os ovos de Strongyloides sp


eclodem e passam à fase larvária rapidamente. Para evitar tais alterações, as
amostras fecais que serão submetidas a um diagnóstico laboratorial devem ser
fixadas em solução de formaldeído a 5%, ou mantidas resfriadas mas não conge-
ladas.
Nematóideos adultos e segmentos de tênia podem ser detectados por exame
macroscópico da amostra fecal. Os exames fecais envolvem usualmente técnicas
nas quais os ovos ou as larvas são concentrados, de forma que quando em pequeno
número possam ser detectados. Uma técnica simples e direta consiste em diluir uma
pequena quantidade de fezes em água e espalhar uma fina camada da mistura em
uma lâmina de microscópio. Uma lamínula é então colocada sobre o esfregaço e a
preparação é examinada sob microscópio com objetiva de pequeno aumento. A
adição de algumas gotas de iodo ou azul de metileno ao esfregaço pode facilitar a
detecção dos ovos. Entretanto, desde que o material fecal possa conter células
vegetais, grãos e outros materiais estranhos que possam ser confundidos com ovos
de parasitas, o melhor é se utilizar um método que concentre os ovos e permita uma
preparação final mais limpa.
Esses métodos são baseados na flotação dos ovos em soluções com densidade
entre 1,1 e 1,2, tais como solução saturada de cloreto de sódio (NaCl), sulfato de
magnésio ou açúcar. Uma solução saturada de NaCl é preparada pela dissolução
de sal refinado em água, à temperatura ambiente, até a precipitação. Isto não requer
preservantes, nem é pegajoso ou atrai insetos. Uma solução saturada de sacarose,
contendo 50mL de fenol a 5%/L é capaz de flutuar os ovos de Dicrocoelium e destrói
mais lentamente larvas e oocistos delicados. Um grande número de reagentes para
análise fecal é oferecido comercialmente.
Aproximadamente 2g de fezes são colocados em um recipiente adicionando-se
, 15mL de solução de sal ou açúcar. Isto é misturado até que as fezes estejam
totalmente em suspensão, sendo então coado através de uma gaze limpa para
dentro do tubo de teste, preenchendo com solução suficiente até 6mm da borda do
tubo. O processo de flotação pode ser acelerado colocando-se o tubo em uma
centrífuga a baixa rotação (1.000 a 2.000rpm) por , 6min. Quando a centrifugação
é completada, uma gota grande é retirada da superfície do tubo e transferida por meio
de um bastão de vidro para uma lâmina de microscópio, cobrindo uma área circular
de , 1cm de diâmetro.
Esta técnica proporciona um guia quanto ao número de ovos presentes na
amostra, mas uma técnica especial que usa uma lâmina contendo câmaras com
áreas de volume conhecidas está disponível para uma estimativa mais realística do
número de ovos por grama de fezes (OPG). A solução de concentrado corado
(normalmente solução salina saturada) é introduzida em cada câmara com o auxílio
de uma pipeta de Pasteur e o número de ovos é contado sob objetiva de pequeno
aumento. Uma lâmina de contagem comumente usada é a de McMaster, que
contém 2 câmaras, cada uma com volume de 0,15mL sob cada área gravada. Se,
por exemplo, 3g de fezes são misturados em 42mL de solução concentrada, então
cada ovo contado é multiplicado por 50, o que leva ao número de OPG da amostra
fecal. Isto é calculado por:
42 + 3 1
× = 50
3 0,15 × 2

A correlação entre OPG e a carga parasitária real é quase sempre muito boa em
animais jovens, embora resultados baixos ou negativos possam confundir em
adultos. Geralmente, um resultado > 500 OPG reflete uma infecção moderada, e
>1.000 indica a necessidade de tratamento.
Procedimentos Diagnósticos Laboratoriais 1154

SOROLOGIA
Brucella canis – Uma gota de soro suspeito é necessária para o teste de
aglutinação em lâmina comercial que leva 2min para ser efetuado. A aglutinação
positiva indica infecção presuntiva por B. canis, mas deve ser encaminhada uma
amostra sangüínea para cultura do agente para um diagnóstico positivo preciso, já
que ocorrem reações falsos-positivas (ver também págs. 669 e 1155). Os cães com
resultados positivos deverão ser testados novamente a intervalos de 1 mês se as
culturas sangüíneas forem negativas. Os testes de aglutinação negativos são
geralmente considerados válidos.
Imunidade em potros – A transferência de imunoglobulina G (IgG) pelo colostro
a potros neonatos é medida pelo uso de kits comerciais que utilizam o desenvolvi-
mento de turvação do sulfato de zinco ou imunodifusão radial. Um teste mais rápido,
que usa aglutinação de látex, tem sido desenvolvido para dosagem dos níveis de IgG
por mL de soro ou sangue total, com amostras ≥ 15h após o início do aleitamento.
Os resultados dos testes são obtidos em 10 a 15min e determinados por meio de
comparação visual com tabelas e expressos em mg aproximados de IgG/dL. A
mesma metodologia é usada para medir a concentração de IgG por mL de colostro
na égua. Níveis baixos de IgG em potros predispõem ao desenvolvimento de infecções
sépticas até 4 semanas após o nascimento.

Ensaios imunoenzimáticos
O uso de anticorpos monoclonais em combinação com ensaios imunossorbentes
ligados a enzimas (ELISA), conhecidos também como ensaios imunoenzimáticos,
tem sido explorado devido ao rápido desenvolvimento de novos kits para testes de
diagnóstico. As vantagens dos métodos biotecnológicos são simplicidade, rapidez,
sensibilidade e conveniência. A mais recente vantagem reconhecida inclui a utilidade
tanto em clínicas quanto em fazendas. Atualmente, existem 17 agentes patogênicos
aviários detectáveis pelo método ELISA. A classificação dos agentes aviários
detectáveis inclui 10 vírus, 3 micoplasmas, Chlamydia psittaci, 2 outras bactérias e
Eimeria spp. Em adição aos agentes patogênicos infecciosos, micotoxinas e resí-
duos de drogas também são detectáveis pelo mesmo método.
Vírus da leucemia felina – Juntamente com o linfossarcoma, este vírus é a causa
de várias síndromes clínicas nos gatos, todas associadas com imunossupressão. Os
kits de testes ELISA foram desenvolvidos para a detecção de anticorpos séricos para
os 27 antígenos proteicos grupo-específicos do VLF. Menos de 1mL de soro ou
sangue total é necessário e os resultados são determinados visualmente em curto
tempo, com mínimo esforço. As reações positivas (as quais podem ocorrer em 3%
de todos os gatos) são indicativas de infecções, as quais podem ser transitórias,
latentes ou persistentes. A positividade em uma única amostra deve ser isolada e
testada novamente com um intervalo de 1 mês para se determinar o estado
infeccioso. Uma observação tem sido reportada, sugerindo que 10 a 30% dos gatos
infectados pelo vírus da leucemia sejam negativos tanto para o teste ELISA quanto
para o teste com anticorpos imunofluorescentes.
Níveis de progesterona no leite – Podem ser usados na determinação do estado
reprodutivo em bovinos: o leite é testado em 1h para se diferenciar fase ovariana
folicular (estro) e lútea (prenhez). A concentração de progesterona diminui a
< 5ng/mL durante o estro e aumenta a níveis >10ng/mL durante a gestação. Kits de
ELISA têm sido desenvolvidos para esse teste e os resultados são determinados por
comparação de cor visual para controle. Os resultados obtidos indicam o grande valor
deste teste na detecção do estro.
Diagnóstico por Imagens 1155

DIAGNÓSTICO POR IMAGENS

TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA
(TC, Tomografia axial computadorizada, Varredura por TAC)

O animal é colocado em uma plataforma que se move por dispositivos controlados


por meio da abertura circular de um cavalete que sustenta o tubo e os detectores de
raio-X. O posicionamento correto do animal e a ausência de movimentos durante a
varredura são essenciais. Em cada posição adicional, o tubo de raio-X rotaciona-se
rapidamente ao redor do animal enquanto emite os raios. Os detectores no lado
oposto do cavalete registram a atenuação do feixe de raio-X pelo animal em cada
posição rotativa. Os dados primários de atenuação são registrados em um compu-
tador e, por intermédio de uma variedade de algoritmos de reconstrução, são
convertidos em uma imagem transversal da “fatia”.
Considera-se sua sensibilidade melhor que a da radiografia convencional, pois
permite a diferenciação de várias densidades dos tecidos moles. Movimentos
adicionais proporcionam “fatias” múltiplas da secção corporal de interesse. Máquinas
mais modernas também permitem a reconstrução de várias vistas sagitais, desde
que recebam dados suficientes e a densidade das “fatias” transversais tenha sido
obtida. Imagens grosseiras são registradas em um visor de multiformato, e os dados
primários e/ou imagens processadas são armazenados em uma fita magnética para
posterior consulta ou análise.
A varredura por TC é valiosa principalmente para áreas que sejam difíceis de se
alcançar por meio da radiografia e da ultra-sonografia convencionais, por exemplo, o
cérebro, a cavidade nasal, os seios paranasais, o mediastino e os espaços retrope-
ritoneal e intrapélvico. A varredura transversal dos ossos dos membros, cabeça e
coluna cervical nos eqüinos também tem sido digna de nota. Técnicas de contraste
também podem ser empregadas para acentuar (aumentar) tecidos afetados por
certos tipos de processos patológicos, por exemplo, alguns tumores cerebrais.
Devido ao alto custo do equipamento e de sua manutenção, a TC na medicina
veterinária está limitada a grandes instituições. Várias escolas veterinárias já têm
unidades de TC e várias outras têm acesso a essas unidades em escolas
médicas vizinhas.

RESSONÂNCIA MAGNÉTICA
(RM, Ressonância magnética nuclear)

Embora comparativamente nova como ferramenta diagnóstica clínica, a análise


por ressonância magnética tem sido usada como técnica química em laboratório e
estabelecimentos industriais por > 30 anos.
A parte do corpo a ser registrada é submetida a um intenso campo magnético e
pulsos simultâneos de energia na forma de ondas de rádio. A composição química
dos tecidos determina a proporção em que eles vão absorver e liberar energia de
radiofreqüência. As ondas de radiofreqüência emergentes são detectadas em
bobinas receptoras e a intensidade do sinal é convertida por complexos algoritmos
de computador em uma imagem de uma secção particular do corpo. A aparência da
imagem (brilho ou contraste) depende da densidade de prótons e da composição
química do tecido. Por meio do uso de radiofreqüência com diferentes seqüências de
pulso, diferenças químicas menores entre tecidos semelhantes podem ser exibidas
como diferenças na intensidade da imagem.
Diagnóstico por Imagens 1156

As vantagens da RM são a extrema sensibilidade (material cinzento e branco


podem ser diferenciados), a não utilização de radiação ionizante e a habilidade para
conseguir “cortes” em qualquer plano na área examinada – uma característica que
não é repartida com outras técnicas de varredura transversal. A intensidade do
campo magnético usado na RM médica não tem efeitos colaterais conhecidos. Uma
grande desvantagem é o alto custo desse equipamento; como resultado, a RM em
animais é geralmente feita em instituições médicas.

RADIOLOGIA
RADIOGRAFIA
Equipamento – O equipamento básico para se obter uma radiografia satisfatória
compreende um aparelho de raio-X com uma proteção adequada. Para pequenos
animais, sua capacidade deve ser de 100kVp (picos de quilovolt) e 100mA (miliampè-
res). Um aparelho com capacidade maior, em uma instalação fixa bem planejada, é
necessário para uso em grandes animais. Entretanto, uma unidade móvel leve, com
grande mobilidade e bem protegida, com uma capacidade de 85 a 90kVp e 30mA, é
satisfatória para que se obtenham radiografias de extremidades de grandes animais.
Um filtro colocado no feixe útil ≥ 2mm de alumínio e um marcador de tempo que
permita intervalos de 1⁄ 60 de segundo em unidades grandes e 1⁄10 de segundo em
unidades móveis são essenciais.
Todas as unidades devem ser equipadas com um dispositivo limitante de
radiação. Um colimador com obturador de chumbo ajustável e um campo iluminado
limitam efetivamente a radiação primária, reduzindo, dessa maneira, os riscos de
radiação primária e dispersão secundária, aperfeiçoando a técnica radiográfica.
Se a parte a ser radiografada é > 10cm em espessura, o uso de uma grade melhora
a visualização de detalhes. Essa grade deve apresentar uma proporção de 6:1 e 60
linhas/2,5cm, sendo satisfatória para a maioria das necessidades em radiografias de
pequenos e grandes animais. O equipamento adicional deve incluir pelo menos 2
chassis de 25 × 30cm e 2 de 35 × 43cm com écran (anteparo) de alta velocidade,
colgaduras, dispositivos para marcação do filme, paquímetro para medir a espessura
da região radiografada, uma fita para medir a altura da fonte até o piso ou a distância
focal, 2 negatoscópios e implementos de câmara escura. As pessoas envolvidas com
o trabalho radiológico deverão usar roupas protetoras e com insígnias, aventais e
luvas de proteção ≥ 0,5mm de chumbo.
Câmara escura – A câmara escura deve ser à prova de luz e ter superfícies
separadas para o trabalho de montagem de chassis (ambiente seco) e revelação
(ambiente molhado). Deve ter ainda um tanque com 3 compartimentos (revelador,
fixador e de enxágüe) e capacidade para filmes com até 35 × 43cm. A temperatura
das soluções deve ser mantida entre 15,5 e 23°C, de preferência 20°C, em água
corrente ou refrigeração. Como a velocidade de revelação varia com a temperatura
do revelador, a temperatura das soluções deve ser medida antes de as mesmas
serem usadas e, em temperaturas diferentes de 20°C, o tempo de permanência no
tanque deve seguir uma tabela de tempo. As instruções do fabricante devem ser
seguidas, mas como regra geral, o tempo de permanência no revelador é de 5min,
e no fixador é de 10min. Os filmes devem ser lavados por 30min em água corrente
antes de secarem em um ambiente livre de poeira.
Durante o processamento, os filmes devem ser removidos das soluções rapida-
mente e sem permitir que o excesso destas retorne ao tanque. Essa perda de fluido
deve ser reposta por meio do preenchimento com uma solução-estoque, que
mantém a concentração e os níveis do revelador e do fixador. A reposição não pode
Diagnóstico por Imagens 1157

ser feita indefinidamente e as soluções devem ser descartadas quando o volume de


reabastecimento for igual a 3 vezes a quantidade original de revelador. De qualquer
forma, as soluções devem ser repostas ao fim de 3 meses devido à oxidação. As
soluções reveladoras não devem ser repostas enquanto os filmes estiverem sendo
processados. Elas devem permanecer cobertas quando não estiverem em uso, a fim
de se prevenir oxidação e contaminação com poeira.
Processadores automáticos estão disponíveis com tamanho compacto e preços
dentro dos limites econômicos para a maioria das clínicas. Esses pequenos
processadores podem ser instalados em câmaras escuras já existentes. Em
construções novas, o custo do processador pode ser compensado pela redução do
espaço normalmente utilizado para a câmara escura. Esses processadores redu-
zem o tempo de processamento, fornecem radiografias prontas para interpretação
e, devido à constância da técnica usada, eliminam os erros comuns em uma
revelação manual.
Fatores essenciais em radiografia – Os seguintes fatores contribuem na
produção de radiografias de boa qualidade: 1. pico de quilovoltagem correto para
uma perfeita penetração; 2. miliamperagem por segundo suficiente para assegurar
a densidade apropriada; 3. tempo de exposição pequeno, evitando uma movimen-
tação da área radiografada; 4. distância do filme/aparelho adequada para obtenção
do máximo de detalhes; 5. aproximação da parte radiografada ao filme; 6. sensibi-
lidade uniforme dos chassis e filmes; 7. técnica padrão de revelação/fixação; e 8.
posições padronizadas de exposição.
O pico de quilovoltagem (kVp) é o valor mais alto medido no gerador potencial
pulsátil e indica o nível de energia na radiação do aparelho de raio-X; quando o valor
é alto, o poder de penetração da radiação é grande, o contraste no filme diminui e
diz-se que a qualidade da radiação é “dura”. Quando o kVp é baixo, diz-se que a
radiação é “mole” e, devido a uma absorção maior, o contraste é melhorado
enquanto a penetração é diminuída. Uma boa técnica radiográfica requer a seleção
de radiação com energia suficiente para a penetração da espessura do tecido
examinado, enquanto se fornece um contraste adequado para separação visual dos
vários tecidos envolvidos.
Miliamperagem (mA) é a medida do fluxo de corrente que passa através do tubo
do raio-X. A quantidade da corrente determina diretamente a exposição ou a
densidade total do filme. Uma boa técnica requer um tempo de exposição e
amperagem que forneça a densidade necessária para as condições do exame. A mA
requerida para produzir uma determinada densidade radiográfica é diretamente
proporcional ao quadrado da distância focal do filme, quando os outros fatores são
constantes.
O uso de um kVp maior com uma redução na mA resulta em menor exposição
à radiação pelo animal sem depreciação significativa na qualidade da radiografia.
Para reduzir a perda de detalhes pela movimentação do animal, um tempo de
exposição curto é preferível. A movimentação pode também ser reduzida ou
eliminada por sedação ou anestesia. Para minimizar a distorção da imagem
causada pela divergência dos raios-X, a parte a ser radiografada deve estar em
contato estreito com o chassi. Uma recomendação prévia é o uso de écrans de
alta velocidade que aumentem o efeito fotográfico com menor perda de detalhes.
Para se executar uma boa radiografia, uma tabela técnica deve ser elaborada
usando-se a variação da medida da espessura da parte radiografada em centí-
metros e relacionando-se a mesma à variação correspondente no kVp ou na mA.
Para partes > 10cm de espessura, deve-se usar uma grade.
Posicionamento – Um posicionamento correto do animal é essencial para boas
radiografias e 2 vistas devem sempre ser tiradas com ângulos retos entre elas.
Sempre que possível, o posicionamento deve ser efetuado usando-se blocos de
Diagnóstico por Imagens 1158

borracha espumosa, peias, sacos de areia, etc., sempre tentando reduzir a exposi-
ção humana. A rotação na posição é algumas vezes necessária, particularmente em
radiografias de tórax, cabeça e pelve.
Sempre que uma articulação for radiografada, a radiação deve ser projetada
diretamente através da superfície articular, a fim de se ter melhor avaliação do espaço
intra-articular e das faces articulares. A radiação deve ser perpendicular ao filme para
minimizar as distorções.
Projeções laterais em pé utilizando-se uma radiação horizontal são úteis na
demonstração de fluidos livres na cavidade torácica ou níveis de fluidos múltiplos e
gás observados em estases intestinais
Interpretação radiográfica – Imediatamente após o processamento, a radiogra-
fia deve ser examinada para a verificação de sua qualidade técnica e um diagnóstico
preliminar pode ser efetuado. Um diagnóstico definitivo deve aguardar um estudo
completo da radiografia seca.
Na avaliação da imagem à procura de alterações patológicas, uma análise
sistemática é feita em cada região anatômica. Alterações grosseiras geralmente
recaem em uma ou mais das seguintes categorias:
Alteração na posição de um órgão ou parte – Estas alterações podem ser o
resultado de uma anomalia congênita, apoio inadequado, deslocamento passivo
por aumento da víscera adjacente ou rotação de víscera, como na torção gástrica.
Alteração no tamanho – O aumento no tamanho de um órgão pode ser uma
indicação de hipertrofia, hiperplasia, neoplasia, anomalia congênita, etc. A redução
no tamanho ocorre em atrofia, hipoplasia, cicatriz, malformação, etc.
Alteração no contorno – As mudanças no contorno podem afetar uma porção
localizada ou a silhueta total do órgão. Podem resultar de malformação, trauma,
cicatrização, perda do tono, neoplasia, necrose, etc.
Alteração na densidade – Aumentos na densidade de tecidos moles, que são
normalmente radioluminescentes, ocorrem devido à calcificação. A mineralização é
comumente indicação de má nutrição ou necrose tecidual. Outros depósitos minerais
densos incluem cálculos renal e vesical, e concreções fecais. A diminuição na
densidade de tecidos moles ocorre geralmente devido à presença anormal de ar ou
gás em tecidos, como em gangrenas, enfisema subcutâneo ou íleo do intestino
delgado.
Na avaliação de estruturas ósseas com diminuição da densidade radiográfica, 2
principais causas devem ser consideradas: distúrbios na mineralização e distúrbios
na formação óssea. A primeira inclui raquitismo e deficiências nutricionais relaciona-
das, enquanto a segunda é definida como osteoporose e pode ser devida a distúrbios
endócrinos, atrofia por desuso, deficiência proteica, etc.
Os aumentos na densidade óssea podem ser o resultado de aumento de
deposição mineral na substância óssea própria (esclerose) ou de proliferação
periosteal. A característica da proliferação óssea periosteal pode ser classificada
como em camadas, em cordão, espiculada ou amorfa e pode ser indicativa da causa.
Alterações produtivas e destrutivas podem ocorrer em um mesmo osso, como na
osteomielite e na neoplasia.
Alteração na arquitetura – O reconhecimento de alteração na arquitetura óssea
requer grande familiaridade com a anatomia normal e suas variações. Quando em
dúvida sobre um achado radiográfico particular, a comparação com uma radiografia
normal de outro membro ou de um animal normal será sempre de grande auxílio.
Alteração no alinhamento ou na função – O alinhamento de ossos e articula-
ções é geralmente demonstrado em radiografias simples; radiografias em situação
de estresse podem algumas vezes ser necessárias para determinar a extensão da
anormalidade. Os fenômenos dinâmicos podem ser estudados por meio de
fluoroscopia.
Diagnóstico por Imagens 1159

Os artefatos aparecem como um resultado do processamento do filme, posiciona-


mento, material estranho, etc., devendo sempre ser considerados em uma interpretação.
Meios de contraste – O delineamento seletivo de um órgão ou cavidade corporal
pode ser acompanhado pelo uso de um meio de contraste. Basicamente, existem 2
tipos: 1. meio negativo, como ar, CO2 e O2, os quais delimitam as estruturas pelo aumento
das áreas escuras no filme; e 2. meio positivo, como os sais insolúveis de metais
pesados ou iodetos inorgânicos, os quais são opacos e aparecem brancos no filme.
O meio negativo é normalmente usado quando se radiografam a bexiga, o peritônio
ou o cólon. O sulfato de bário, um meio positivo, é ideal para a visualização de todas
as regiões do trato gastrointestinal. A bexiga pode ser definida pela introdução de
iodetos radiopacos que, quando em conjunção com ar, produzem um contraste duplo,
excelente para definição de lesões intraluminais. Numerosos meios preparados
comercialmente com iodetos solúveis orgânicos como base encontram-se disponí-
veis para urografias, angiocardiografias, etc. Para instruções detalhadas das técnicas
radiográficas de contraste, o leitor deve recorrer a livros-textos de radiologia.

FLUOROSCOPIA
A fluoroscopia é um meio excelente para o estudo de fenômenos dinâmicos de um
órgão ou parte dele, mas deve ser utilizada com critério. Infelizmente, as unidades
de diagnóstico na maioria dos hospitais veterinários não são próprias para uma
operação segura de fluoroscopia e, em tais casos, a técnica deve ser evitada. Para
maiores detalhes sobre os padrões de equipamento, deve-se consultar o “Council on
Radiation Protection”, publicação nº 36.
Os olhos do fluoroscopista devem-se adaptar à escuridão por 20min, antes do
exame do animal, e ele deve usar avental e luvas como proteção. Somente pessoas
participantes ativamente dos procedimentos devem permanecer na sala. Se possí-
vel, o animal deve ser anestesiado ou sedado para facilitar o manejo.
As desvantagens inerentes e os riscos da fluoroscopia têm sido superados ou
marcadamente reduzidos pela amplificação da imagem por meio de intensificação
eletrônica; assim sendo, a imagem produzida em um anteparo fluorescente é
detectada por um fotocátodo sensível à luz e o padrão luminoso é convertido em
fotoelétrons de baixa energia. Por meio de aceleração e focagem desses fotoelétrons
contra o anteparo fosforescente, a imagem produzida será acentuadamente mais
brilhante, embora de tamanho reduzido. Essa imagem pode ser vista diretamente
pelo operador ou indiretamente por um monitor de televisão por meio de um sistema
de lentes e espelhos. Essa técnica permite a gravação em videoteipes, películas ou
slides. No entanto, os intensificadores de imagem são onerosos, e o risco de radiação
ao pessoal que os opera é aumentado.

RADIOTERAPIA
Existem poucas unidades de diagnóstico ou de raio-X portáteis usadas na prática
veterinária capazes de liberar com segurança uma dose suficiente de radiação para
terapia. Devido à grande liberação de radiação necessária e ao risco à segurança do
tubo e do operador, é questionável se um clínico geral deve empreender uma
radioterapia de lesões neoplásicas ou mesmo inflamatórias. Uma vez que centros de
radioterapia veterinária têm sido estabelecidos, o clínico geral deve encaminhar os
animais que requeiram esse tipo de terapia a estes especialistas.

PROTEÇÃO CONTRA A RADIAÇÃO


De acordo com as recomendações do Conselho Nacional de Proteção e Medidas
Radiológicas de 1977, a dose máxima de radiação permitida de raio-X ou raio-γ de
fontes externas para radiologistas e funcionários é de 0,1rem (1mSv) por semana.
Diagnóstico por Imagens 1160

Todas as pessoas usuárias de equipamentos produtores de radiação devem usar


rotineiramente crachás com filmes virgens e a quantidade de exposição deve ser
medida regularmente. As mãos e outras partes do corpo devem ser sempre
protegidas das radiações primárias com aventais e luvas de chumbo, protegendo-
se assim também de radiações desviadas.
Os usuários de radiação ionizante estão submetidos ao “National Council on
Radiation Protection”, publicação nº 36, “Radiation Protection in Veterinary Medicine”,
e boletins de nº 17, 22, 33, 34 e 35.

ULTRA-SONOGRAFIA
(Ecografia, Sonografia)
É uma técnica que utiliza ondas sonoras indolores e inócuas (freqüências de 2,5 a 10
megahertz [Mhz]) para obter informações sobre estrutura e função de vários órgãos e
sistemas internos. Combinada às informações obtidas a partir do exame físico, dados
laboratoriais e outras técnicas de obtenção de imagens como a radiografia, a ultra-
sonografia tem aplicado as capacidades diagnósticas em todas as espécies de animais.
Os ultra-sonogramas devem ser realizados por indivíduos altamente treinados com
conhecimento extensivo de muitos artefatos ultra-sonográficos e propriedades físicas do
feixe sônico usado para gerar as imagens ultra-sonográficas.
A geração das imagens se baseia no princípio do eco dos pulsos. Um pulso
pequeno de ultra-som é emitido em direção ao animal, e pequenas porções desse
feixe são refletidas de volta quando encontram estruturas de densidade diferentes.
A interface entre tecidos moles e o ar origina um grande eco e não fornece nenhuma
informação além dessa interface. A mesma situação ocorre em uma interface tecido
mole/mineral. No entanto, nas interfaces minerais, uma porção do feixe sônico é
absorvida, o que origina uma sombra acústica que pode ser útil na determinação da
presença de cálculos. Nenhuma evidência de efeitos colaterais biológicos tem sido
demonstrada, provavelmente devido à pequena quantidade de som que entra no
animal e à pequena duração da fase do pulso, quando comparada à fase do eco.
As imagens exibidas em um ultra-sonograma estão quase sempre no módulo de
brilho (B). O brilho da imagem é determinado pela amplitude do eco, a qual por sua
vez é determinada pela diferença na densidade dos dois tecidos adjacentes. A
“varredura no tempo-real” se refere ao fato de que a imagem é atualizada com
tamanha freqüência que se detecta na tela o movimento dos tecidos que estão
sofrendo a varredura. Isso torna a ultra-sonografia particularmente útil para o exame
do coração (ecocardiografia).
Os dois formatos de imagem usados são a varredura setorial e a formação linear.
A formação linear é a mais comumente utilizada nos exames transretais de prenhez
em éguas. A varredura setorial é o instrumento de escolha em todas as outras
aplicações, graças à sua pequena área de contato com a superfície do animal.
Os ultra-sonogramas são geralmente interpretados na hora do exame; no entanto,
podem ser também armazenados em fitas de vídeo, câmeras de multiimagem, ou
filme polaróide.

Varredura abdominal
Já que o estresse pode causar aerofagia, que interfere na geração de imagens
diagnósticas, a ultra-sonografia deve ser realizada antes de outros procedimentos de
rotina. O bário pode interferir na transmissão de som, portanto a sua administração
não deve ser feita antes de uma ultra-sonografia abdominal. Os agentes contrastan-
tes à base de iodo orgânico não têm o mesmo efeito na transmissão do ultra-som e
podem ser usados ao mesmo tempo.
Diagnóstico por Imagens 1161

A posição do animal durante a avaliação ultra-sônica é menos importante que


manter o animal confortável durante a avaliação para evitar ingestão de ar. O exame
geralmente se inicia com o animal em decúbito dorsal. Raramente precisa-se de
tranqüilização, já que o processo é indolor. A posição ereta pode ser usada se
houver interferência de gás intestinal no procedimento.
De preferência, o pêlo abdominal deve ser raspado antes do exame. Um gel
conectivo acústico é então colocado sobre a pele para facilitar a penetração do feixe
sônico e para evitar a formação de bolsões de ar entre o gerador e a pele.
Registrando o abdome cranial – Quando se registra o abdome cranial, deve-
se lembrar que o diafragma é muito ecogênico (aparece branco-brilhante em um
fundo preto) devido à interface entre pulmões (ar) e diafragma (densidade do tecido
mole). O parênquima hepático exibe um padrão ecogênico uniforme, interrompido
pela vesícula biliar e estruturas vasculares. A ecogenicidade do parênquima
hepático é um pouco maior que a do córtex renal, mas um tanto menor que a do baço.
Os vasos portais podem ser determinados no interior do parênquima hepático;
podem ser distintos das veias hepáticas devido ao seu padrão ecogênico caracte-
rístico, atribuído à gordura e ao alto conteúdo fibroso de suas paredes. Com exceção
das veias hepáticas próximas à sua origem na veia cava caudal, as veias hepáticas
geralmente não têm paredes ecogênicas.
A vesícula biliar aparece como uma área anecóica (preta na maioria das unidades
de tempo real) com bordas regulares e lisas. O tamanho da vesícula biliar varia em
animais normais de acordo com a dieta e o horário de alimentação. As estruturas
preenchidas por fluidos, como a vesícula biliar, apresentam ecos brilhantes em sua
face mais distante e ecogenicidade aumentada (aumento acústico ou distante), uma
característica de todas as estruturas verdadeiramente císticas. Os dutos biliares
normalmente não podem ser vistos em um animal saudável.
A hepatomegalia é melhor diagnosticada por palpação e radiografia. Porém,
não existem métodos precisos para quantificar o tamanho do fígado nos animais.
A moléstia hepática difusa não apresenta bordas claramente definidas; como
resultado, a ecogenicidade ou é aumentada (cirrose ou infiltração gordurosa) ou
é diminuída (edema ou infiltração linfocítica). Na moléstia hepática difusa, é
necessária uma biópsia para um diagnóstico definitivo.
Registrando o abdome médio – O baço, o rim esquerdo e o intestino delgado
podem ser vistos na região abdominal média. O pâncreas não é visível sob
circunstâncias normais devido ao gás intestinal circundante. As glândulas adrenais
e os linfonodos mesentéricos são visíveis apenas quando aumentados.
O baço está localizado próximo à superfície da pele, o que faz o ajuste para campo
próximo obrigatório para que se consigam boas imagens diagnósticas. As bordas do
baço devem ser lisas e o parênquima deve ser levemente mais ecogênico que o fígado.
A veia esplênica e suas ramificações são facilmente observadas no hilo.
Os rins normais são os menos ecogênicos dos órgãos abdominais principais, e
muitos tipos de patologia renal podem ser diagnosticados com ultra-sonografia. O
tamanho, a forma e a ecogenicidade dos rins devem ser avaliados. Cálculos renais
e nefrocalcinose são facilmente diagnosticados; as sombras acústicas geralmente
podem ser vistas, mesmo que os cálculos sejam pequenos. Como se faz com o
fígado e o baço, uma biópsia conduzida ultra-sonograficamente deve ser realizada
para se chegar a um diagnóstico definitivo.
Normalmente invisível no abdome médio, o útero aparece ocasionalmente como
uma massa tubular aumentada com um centro hipoecóico. Quantidades variadas de
fragmentos celulares dentro do útero podem ser notadas após manipulação suave
do abdome.
Registrando o abdome caudal – A bexiga pode ser claramente visualizada caudal-
mente, e seu tamanho, forma e conteúdo são facilmente examinados. O interior da bexiga
Diagnóstico por Imagens 1162

deve ser anecóico sem evidências de fragmentos flutuando na urina após agitação suave.
Os cálculos císticos aparecem como estruturas ecodensas com sombreamento acústico.
Os tumores são vistos como densidades de tecido presas à parede da bexiga.
A próstata normal é difícil de ser registrada porque se situa no interior do canal
pélvico. Quando afetada patologicamente, sempre se transfere cranialmente para
o abdome caudal, facilitando o registro da imagem. A hipertrofia benigna provoca
aumento simétrico da glândula com ecos uniformes observados através dela.
Cistos, abscessos e tumores podem ser vistos ultra-sonograficamente.

Ecocardiografia
As ecocardiografias Doppler, modo-M e bidimensional têm exercido um impor-
tante papel na capacidade de diagnóstico preciso em cardiologia veterinária. A
estrutura e a função do coração podem ser completamente examinadas sem dor e
sem perfuração. A espessura das paredes da câmara, o grau de contratilidade, o
tamanho da câmara, a estrutura e a amplitude dos movimentos valvulares e o saco
pericárdico são todos visíveis em tempo real. Tanto doenças congênitas quanto
adquiridas são mais precisamente diagnosticadas pelo uso da ecocardioagrafia. A
ecocardiografia Doppler, melhorada pelo mapeamento em cores, é sobretudo uma
ferramenta de pesquisa com pequena vantagem clínica sobre a ecocardiografia
bidimensional no presente momento (ver também pág. 47).

Tendões eqüinos
A avaliação ultra-sonográfica de tendões eqüinos apresenta uma grande capa-
cidade para avaliar a extensão e a natureza de uma lesão em tecido mole. A
capacidade para distinguir as várias causas de inchaço em tecidos moles assim
como para determinar o progresso de terapia por um método não invasivo e
facilmente repetido tem otimizado as capacidades diagnóstica e prognóstica.

Exame ocular
O exame das duas câmaras oculares assim como da área retrobulbar é possível
tanto pelo uso de contato direto com a pálpebra quanto com aparelhos isolados.
Geradores de alta freqüência (5 a 7,5Mhz) são recomendados para essas técnicas.

ELIMINAÇÃO DE ANIMAIS MORTOS E


DESINFECÇÃO DE TERRENOS
Quando animais morrem ou são abatidos em fazendas, a eliminação das
carcaças ou partes impróprias para o uso como alimento e a limpeza dos terrenos
devem ser realizadas de modo que se previna a infecção ou o risco de intoxicação
a animais saudáveis, domésticos ou selvagens, ou ao homem. Quando se aplica
a legislação de saúde animal, os procedimentos requeridos para a eliminação e a
desinfecção devem ser seguidos. Quando as circunstâncias sob as quais a morte
ocorreu sugerem uma possível doença ou risco tóxico, o oficial de saúde animal
disponível mais próximo deve ser notificado imediatamente.
Precauções gerais – As pessoas que manipulam carcaças e desinfetantes
devem usar roupas protetoras e estar equipadas apropriadamente para completar
as tarefas de eliminação e desinfecção. O manuseio e a desinfecção devem impedir
a contaminação do solo, ar ou água. O couro e outras partes dos animais que tenham
morrido por doenças infecciosas devem ser destruídos e não retidos para uso.
Eliminação de Animais Mortos e Desinfecção de Terrenos 1163

Coleta sanitária de lixo – A coleta sanitária de lixo é um método seguro, rápido,


conveniente e econômico de eliminação, quando o serviço estiver disponível e a
situação permitir. Os coletores normalmente devem usar caminhões, equipamentos
e práticas que previnam riscos à saúde.
Enterramento – O enterramento é o método preferido de eliminação. Na área
escolhida, devem-se considerar a profundidade do solo e a presença de cabos
subterrâneos, canos d’água ou linhas de gás, tanques sépticos, poços de água, etc.
A vala deve ter ≥ 2,3 de largura, por 3m de profundidade. Nessa profundidade, cerca
de 1,3m2 de área é requerido para cada carcaça de bovino adulto, ou 5 suínos ou
5 ovinos adultos. As condições do solo podem requerer valas mais profundas. Para
cada metro adicional de profundidade, o número de animais por m2 de área pode ser
dobrado. Camas contaminadas, terra, fezes, alimentos, leite ou outros materiais
devem ser colocados na vala, juntamente com a carcaça e cobertos com ≥ 2m de
terra. A terra que recobre a vala não deve estar comprimida. A decomposição e a
formação de gases provocam rachaduras, formação de bolhas e vazamentos de
líquidos em valas comprimidas. A terra deve ser amontoada e cuidadosamente
nivelada.
Queima – A queima deve ser usada somente quando as condições, tais como um
lençol freático superficial, pedras em excesso ou certas considerações sobre saúde
pública, impedirem o enterramento ou que leis ou recomendações locais a permitam.
Na seleção do local para a cremação, devemos evitar a proximidade de construções,
materiais estocados, cabos aéreos e canos d’água subterrâneos e a direção dos
ventos, que podem carregar fumaça e odores. A queima requer que a carcaça seja
colocada sobre uma plataforma combustível que pode ser de óleo, madeira, carvão,
palhas, pneus, etc. O fogo queimará melhor se a plataforma estiver em ângulo reto
com o vento, permitindo a destruição total do material e assim prevenindo a
disseminação do material contaminado por animais ou pássaros.
Para preparar o fogo: a área onde se fará a queima da carcaça deve ser
demarcada, deixando 1m entre uma carcaça bovina e outra. Devem-se colocar 3
fileiras de palha ou fardos de feno ao longo da linha de fogo, com 30cm entre elas
e a 30cm da linha. Deve-se espalhar a palha entre as fileiras e a madeira grossa ao
longo delas; então, colocam-se mais vigas de madeira através das fileiras deixando-
se um espaço de 15 a 30cm entre elas. Devem-se colocar pneus velhos e cavacos
de madeira e espalhar mais palha sobre eles; também espalha-se carvão na
proporção de 225kg/m sobre a madeira e os pneus, formando uma cama alta. São
colocadas as carcaças ao longo dessa cama e é espalhada mais palha sobre as
mesmas. Finalmente, espalha-se ou borrifa-se óleo combustível (precaução:
nunca usar gasolina) e ateia-se fogo à cama.
Sob condições favoráveis, a queima deve estar completada em 48h. Um adicional
de combustível pode ser necessário. Quando o fogo terminar, as cinzas devem ser
enterradas e a área deve ser limpa, arada ou nivelada e preparada para o plantio.
Limpeza e desinfecção – A limpeza e a desinfecção devem ser próprias para
cada agente suspeito. Para agentes infecciosos, a limpeza requer que todo o
esterco e o lixo sejam removidos e enterrados como descrito anteriormente; o chão
sujo é raspado até se chegar a um solo limpo e qualquer material – como madeira
– que não possa ser completamente limpo deve ser removido e enterrado ou
queimado. As construções são totalmente lavadas – teto, chão, paredes e todas as
outras superfícies; todos os equipamentos usados na remoção e na limpeza dos
materiais, tais como carregador de esterco, pás, escovas e raspadeiras, são lavados
minuciosamente. O agente de limpeza deve ser diluído em água; o fosfato trissódico
e o carbonato de sódio são excelentes para esse propósito. Eles são facilmente
adquiridos, baratos, seguros e não interferem na ação dos desinfetantes. O
hidróxido de sódio (lixívia) causa a precipitação de colóides, os quais protegem os
Eliminação de Animais Mortos e Desinfecção de Terrenos 1164

microrganismos da ação dos desinfetantes; portanto seu uso não é recomendado.


Todo o material é enxaguado com água limpa e uma quantidade suficiente de
desinfetante é aplicada. Os desinfetantes recomendados para uso geral em super-
fícies livres de matéria orgânica são o hipocloreto de sódio (1.200ppm de cloro
disponível) e o hipocloreto de cálcio (1.200ppm de cloro disponível).
Os desinfetantes variam de acordo com sua composição química, e sua efetividade
é limitada pela temperatura e outras condições sob as quais tenham sido usados. As
instruções do rótulo para aplicação devem ser seguidas. O rótulo deve exibir o selo
de aprovação da “US Environmental Protection Agency” dos EUA ou de uma agência
similar em outros países.

EXAME DE ANIMAIS PARA VENDA


(Exame pré-compra, Exame de sanidade)

Sempre que a propriedade dos animais é alterada e eles mudam para outro lugar,
a saúde animal merece consideração séria. O comprador quer assegurar que a saúde
dos animais seja tal que eles possam preencher o propósito para o qual estejam sendo
pretendidos e que não introduzam doença em um novo rebanho. Os oficiais reguladores
de saúde animal querem assegurar que novas doenças não sejam introduzidas em sua
área de jurisdição, ou transferidas de um rebanho para outro. Quando os negócios são
feitos em países estrangeiros, os oficiais federais reguladores de saúde animal querem
assegurar que qualquer tipo de doença, sobretudo as exóticas, se presente no país
exportador, não tenha possibilidade de ser introduzido no país importador.
Os EUA também têm regras de saúde que devem ser cumpridas antes que os
animais possam ser exportados. Estas regras foram desenvolvidas para proteger
negócios estrangeiros assegurando que os animais são saudáveis e que podem-se
juntar aos seus rebanhos com segurança.
As exigências de saúde animal variam com o país, espécie, idade, sexo, uso
pretendido para o animal e exigências específicas do comprador. Assim sendo, não
é possível listar regras específicas que se apliquem a todas as situações; esta
descrição é limitada a algumas exigências gerais para trânsito animal nos EUA. Os
oficiais locais reguladores de saúde animal devem ser contactados para se saber as
regras aplicáveis à situação específica.
Quando se vende gado reprodutor, deve-se certificar de isenção de brucelose e
tuberculose. O certificado, que deve ser assinado pelo vendedor e por um veterinário,
certifica que o mesmo inspecionou os animais e que eles não estão apresentando
sinais de doença infecciosa e/ou comunicável. O estado de prenhez da fêmea em
idade de reprodução é geralmente determinado, e o sêmen é normalmente avaliado
quando se vendem touros em idade de reprodução. Quando se vendem suínos
reprodutores, estes devem ser testados para (e ser considerados livre de) brucelose
e pseudo-raiva. Os eqüinos geralmente podem ser vendidos e transportados para
novas propriedades dentro do mesmo estado nos EUA, sem qualquer teste ou
inspeção veterinária; no entanto, o trânsito interestadual geralmente exige testes
para doenças infecciosas. Um exame detalhado quase sempre é exigido para
animais de corrida ou reprodutores valiosos.
O provável comprador pode insistir em escolher outro veterinário para realizar
uma inspeção adicional.
Ao se fazerem os exames, alguns pontos devem ser enfatizados: 1. o veterinário
está trabalhando para a pessoa que está pagando os honorários e só se comunica
com esta. A pessoa responsável pela compensação do veterinário deve ser
Exame de Animais para Venda 1165

informada do custo antes da inspeção; 2. a finalidade a que o animal se destina deve


ser estabelecida previamente: 3. o veterinário deve ser experimentado no cuidado
e no tratamento de animais dentro da finalidade a que se destina.
O exame deve ser dividido em 3 partes: anamnese, exame clínico e procedimen-
tos ou exames especiais de diagnóstico.
Embora todas as anormalidades em eqüinos de corrida sejam observadas e
registradas, os sistemas respiratório e musculoesquelético recebem atenção espe-
cial. Já que as ações legais contra veterinários têm-se tornado muito mais comuns
recentemente, muitos veterinários estão se negando a fornecer um relatório escrito
para exame eqüino. Entretanto, um registro escrito de suas constatações deve ser
feito, pois pode ser necessário em alguma data futura. O provável comprador recebe
um relato oral de todas as anormalidades identificadas. O veterinário pode emitir uma
opinião acerca do eqüino ser ou não apropriado para o propósito pretendido, mas
raramente, se muito, vai recomendar a compra. A responsabilidade do veterinário é
prover informações; o provável comprador é quem deve decidir se compra ou não.
Anamnese – É necessário que a anamnese seja a mais completa possível, por
intermédio do questionamento do vendedor, verificando as anotações, as condições
de manejo e dos outros animais do rebanho. Devem-se anotar raça, sexo, idade, cor,
etiquetas auriculares, sinais de identificação, tatuagens e marcações a fogo; os
papéis de registro devem ser verificados e a identificação efetuada. Deve-se verificar
também a filiação do animal em questão (ou seja, suas habilidades reprodutivas, a
possibilidade de ser portador de defeitos hereditários), particularmente se o mesmo
destinar-se à reprodução; e se seus pais estiverem mortos, deve-se investigar a
possível causa. Também devem-se revisar os registros de acasalamento do próprio
animal para detectar sua fertilidade. Os registros de acasalamento do rebanho de
origem do animal devem ser examinados à procura de evidências de doenças que
provavelmente afetem a reprodução. Se o animal for uma fêmea adulta, as datas de
cobertura e os estágios de prenhez, se aplicáveis, devem ser anotados.
Na verificação das anotações, deve-se considerar se o animal teve alguma
doença, lesão (e sua gravidade) ou se sofreu cirurgia anterior. Quais as vacinas que
tomou, assim como o tipo e data de sua administração também devem ser anotados.
A saúde do rebanho de origem e um possível contato com outros animais desse
rebanho, verificando-se a possibilidade de contaminação por outros animais doen-
tes, estando o animal no momento da venda incubando alguma doença, também
devem ser determinados. Deve-se estabelecer, se possível, se o animal recebeu
alguma droga ou medicação que pudesse alterar seu estado normal. Em caso de
suspeita não confirmada, devem-se requisitar exames complementares.
Exame clínico – Não se deve ignorar nenhum sistema ou área do corpo; o exame
clínico deve definir o estado atual da saúde do animal e as condições de cada
sistema corporal.
Exames especiais ou testes de diagnóstico – Certos testes de diagnóstico
especiais são rotineiramente efetuados no momento da venda; outros podem ser
pedidos pelo comprador ou indicados pelos achados do exame clínico. Se o animal
for destinado a outro estado ou país após a venda, alguns testes ou inoculações
deverão ser efetuados antes da transação, ou esta poderá estar sujeita a um
resultado satisfatório passageiro desses exames por parte do animal. Com referên-
cia aos testes realizados, a legislação do estado ou país ao qual o animal será
enviado deve ser completamente entendida.
Os compradores de animais de corrida valiosos freqüentemente solicitam vários
procedimentos diagnósticos (além do exame físico), incluindo endoscopia, ultra-
sonografia, exame retal, bloqueio neural, hematologia, microbiologia, cinematogra-
fia de alta velocidade, biópsias, radiografia, eletrocardiografia e teste de drogas.
Inspeção da Carne 1166

INSPEÇÃO DA CARNE
A inspeção da carne, realizada por indivíduos qualificados, e visando eliminar
carne deteriorada e carne ou seus subprodutos que tenham sido adulterados ou
mal classificados, ajuda a proteger os consumidores contra riscos infecciosos,
tóxicos e físicos que possam comprometer os animais destinados a consumo
alimentar, o ambiente ou os seres humanos. A atividade da inspeção é dividida
em exame ante mortem, post mortem e processamento.

Inspeção ante mortem


É conduzida no abatedouro, no dia do abate de animais que estão inadequados
para o mesmo, para detectar lesões ou sinais que podem não estar aparentes após
a morte do animal, tais como raiva, listeriose e envenenamento por metais pesados.
Animais que no exame ante mortem apresentam sinais ou lesões localizadas, que
não permitam uma condenação imediata, podem ser identificados como “suspeitos”
de modo que suas carcaças e vísceras podem ser inspecionadas separadamente.
Certos animais podem ser retidos devido a doenças menores, ou confinados por um
período suficiente para a eliminação de resíduos nocivos.
Os animais são confinados para inspeção em um galpão iluminado, de tal
forma que possam ser claramente observados em repouso e em movimento.
Portões, rampas e equipamentos devem estar à disposição para separar animais
anormais para exame mais detalhado e para identificação apropriada.

Inspeção post mortem


A inspeção post mortem é conduzida imediatamente após o abate e a
evisceração para possibilitar a detecção e a avaliação de todas as alterações e
lesões relevantes à conveniência do animal para alimento. Isto requer um exame
sistemático de todas as partes da carcaça, os procedimentos de acabamento e
as condições do ambiente na prevenção da contaminação das partes comestí-
veis. Garantias devem também ser tomadas quanto à condenação da carcaça ou
de partes contaminadas, de maneira que sejam eliminadas de forma segura.
O exame post mortem de rotina deve incluir os seguintes procedimentos.
Bovinos – Cabeça – 1. incisar e examinar os linfonodos mandibulares direito e
esquerdo, parotídeo, atlantal e suprafaríngeo; 2. examinar duas camadas
incisadas dos 2 músculos masseteres. 3. examinar e palpar a língua. Vísceras
– 1. examinar os linfonodos mesentéricos e as vísceras abdominais; 2. Examinar
e palpar a junção ruminorreticular; 3. examinar o esôfago e o baço; 4. incisar e
examinar os linfonodos brônquicos direito e esquerdo e os mediastinais anterior,
médio e posterior; 5. examinar e palpar as superfícies pulmonares costal e
ventral; 6. incisar o coração da base ao ápice através do septo interventricular e
examinar e cortar as superfícies interna e externa; 7. incisar e examinar os
linfonodos hepáticos (portais); 8. abrir os dutos biliares em ambas as direções e
examinar seu conteúdo; 9. examinar e palpar as superfícies ventral e dorsal e a
impressão renal do fígado. Carcaça – 1. examinar as superfícies expostas interna
e externa; 2. palpar os linfonodos inguinais ou supramamários superficiais e o
ilíaco interno; 3. examinar e palpar rins e diafragma.
Vacas e vitelos – Cabeça – 1. incisar e examinar os linfonodos suprafaríngeos.
Vísceras – 1. examinar e palpar os pulmões, linfonodos bronquial e mediastinal, e
coração; 2. examinar o baço; 3. examinar e palpar as superfícies dorsal e ventral do
fígado e palpar os linfonodos portais; 4. examinar as vísceras abdominais. Carca-
ça – 1. examinar as superfícies expostas externa e interna; 2. palpar os linfonodos
ilíacos internos e os rins.
Inspeção da Carne 1167

Ovinos e caprinos – Vísceras – 1. examinar as vísceras abdominais, esôfago,


linfonodos mesentéricos, gordura omental e baço; 2. examinar o duto biliar e seu
conteúdo e espremer a vesícula biliar; 3. examinar e palpar o fígado e as superfícies
costal e ventral dos pulmões; 4. palpar os linfonodos bronquial e mediastinal; 5.
examinar e palpar o coração. Carcaça e cabeça – 1. examinar a superfície externa
e cavidades corporais; 2. examinar e palpar os rins; 3. palpar os linfonodos pré-
femoral, inguinal superficial ou supramamário e o poplíteo; 4. palpar o dorso e
laterais da carcaça; 5. palpar os linfonodos pré-escapulares; 6. examinar pescoço,
paleta e cabeça; 7. incisar os linfonodos quando necessário, expulsando o conteúdo
caseoso nos casos de linfadenite.
Suínos – Cabeça – 1. examinar a cabeça e os músculos cervicais; 2. incisar os
linfonodos mandibulares direito e esquerdo. Vísceras – 1. examinar e palpar o baço
e os linfonodos mesentéricos; 2. palpar os linfonodos portais; 3. examinar as
superfícies dorsal e ventral do fígado; 4. palpar os linfonodos mediastinal e bronquial
direito e esquerdo; 5. examinar e palpar as superfícies dorsal e ventral dos pulmões;
6. examinar e palpar o coração. Carcaça – 1. examinar a superfície externa e interna
e cortar onde houver anormalidades suspeitas; 2. examinar e palpar os rins.
Cavalos – Cabeça – 1. examinar as superfícies; 2. palpar, incisar e examinar os
linfonodos mandibulares, faríngeos e parotídeos; bolsas guturais e língua. Vísceras
– 1. examinar e palpar pulmões e linfonodos bronquiais e mediastinais (incisar
quando anormais); 2. examinar e palpar baço, fígado e linfonodos portais; 3. abrir
o duto hepático; 4. examinar as vísceras restantes. Carcaça – 1. inspecionar do
mesmo modo que se faz com os bovinos; 2. além disso, examinar e incisar quando
necessário as paredes abdominais internas, visando à detecção de parasitas
encistados, processo espinhoso das vértebras torácicas, bolsa supra-espinhosa e
as 2 primeiras vértebras cervicais para processos fistulosos e examinar também os
espaços subescapular e axilar de cavalos tordilhos para detectar melanose.
Aves – 1. examinar a superfície externa à procura de alterações cutâneas,
lacerações ou lesões patológicas; 2. palpar a tíbia para detecção de doenças ósseas;
3. examinar as superfícies internas, pulmões e rins em seus lugares próprios; 4.
examinar as vísceras e palpar o fígado, o coração e o baço.

Condenações (gerais)
Não deve haver aprovação, para o uso como alimento, das carcaças que
apresentarem as seguintes anormalidades: 1. contaminação por agentes infeccio-
sos, tóxicos ou físicos perigosos; 2. afecções ou processos patológicos generaliza-
dos, incluindo tumores malignos, que tenham alterado as características normais da
carne, tornando-a não comestível ou suficientemente anormal para não ser consi-
derada apta para o consumo; 3. afecções localizadas que não afetem a sanidade da
carcaça completa devem ser removidas por aparamento das partes afetadas de
forma que a carcaça possa ser aproveitada para alimento.
Considerações especiais – Tuberculose – A carcaça inteira deve ser conde-
nada quando houver evidência de tuberculose: 1. uma lesão ativa; 2. caquexia; 3.
uma lesão em músculo, tecido intermuscular, osso, articulação, órgãos abdominais
(menos o trato gastrointestinal) ou em um linfonodo associado a essas partes; 4.
lesões extensas no tórax ou cavidade abdominal; 5. lesões múltiplas, agudas e
ativamente progressivas; ou 6. lesões cuja natureza ou extensão não indique
localização. Um órgão ou parte dele deve ser condenado quando o próprio ou o seu
linfonodo correspondente apresentar lesão. Quando lesões em suínos estão
localizadas e ocorrem em apenas um ponto primário de infecção, tal como os
linfonodos cervicais, as partes não afetadas são aceitáveis para alimentação, após
a condenação do órgão ou das partes comprometidas. As leis federais e estaduais
Inspeção da Carne 1168

permitem a comercialização de certas carcaças pouco afetadas por tuberculose,


quando industrializadas (cozidas); este processo não é recomendado para qual-
quer outro uso.

Sanitização do abatedouro
Construções, equipamentos, pessoal e procedimentos operacionais devem asse-
gurar uma carcaça e carne saudáveis e livres de adulteração. Piso, paredes e teto
devem ser construídos com materiais e de maneira que permitam operações sanitá-
rias de limpeza completa. Um amplo reservatório de água quente e fria e materiais de
limpeza devem estar disponíveis convenientemente para o abate, limpeza e higiene
pessoal. Água a 82°C deve estar disponível para a esterilização das ferramentas e
equipamentos após a lavagem. Equipamentos, facas e outros utensílios que tenham
tido contato com carcaças doentes devem ser limpos e esterilizados antes de sua
reutilização. A drenagem através de ralos próprios e o escoamento do esgoto
adequados devem manter o abatedouro em boas condições sanitárias. A ventilação
deve assegurar que as áreas de produtos comestíveis fiquem livres de odores
indesejáveis. Todos os departamentos devem estar livres de moscas, ratos e outras
pragas. A iluminação em todas as áreas deve ser mantida em intensidade adequada
para limpeza e inspeção. O equipamento deve ser feito de materiais tais e construído
de tal forma, que seja pronto e completamente limpo, devendo ter manutenção
apropriada. Recipientes limpos e separados para materiais comestíveis ou não
comestíveis devem ser colocados em locais convenientes. Mesas ou grades devem
ser providenciadas para as cabeças. Os empregados devem usar uniformes limpos.

DETECÇÃO DE CARNE D ETERIORADA


A carne para o consumo humano deve ser obtida de animais saudáveis e
sangrados. Animais portadores de doenças infecciosas, tóxicas ou de agentes físicos
em seus tecidos, que sejam prejudiciais à saúde humana ou de outra forma não sejam
saudáveis, não devem ser utilizados como alimento. É conveniente que se determine
a qualidade do produto por meio de uma avaliação detalhada, que inclua exames
organolépticos, histológicos, microbiológicos, bioquímicos e toxicológicos.
A carne deve ser examinada sob uma iluminação de intensidade adequada. Objetos
estranhos em sua superfície ou visíveis entre os tecidos podem ser coletados para exames
adicionais. Itens tais como penas, pêlos, fibras, parasitas ou larvas de insetos podem
fornecer informações valiosas sobre espécie, origem e tipo de manuseio da carne.
A textura, a cor e o odor devem ser anotados. A carne deve ser firme e ao corte sua
superfície deve ser brilhante. Coloração acinzentada ou esverdeada pode indicar ação
bacteriana. Uma cor vermelho-escura pode ser o resultado da coleta sangüínea post
mortem de animais não sangrados. Uma cor vermelho-brilhante em carnes velhas é,
alguma vezes, produzida pela adição de sulfito. A urina de roedores e algumas substâncias
produzidas por certas bactérias deteriorantes apresentam fluorescência quando expostas
à luz ultravioleta. Áreas de equimose, hemorragia ou inflamação são facilmente reconhe-
cidas. Os odores de produtos químicos, urina, peixe ou outras fontes podem estar
presentes. Alguns deles podem ser acentuados pela fervura ou fritura da carne.
O exame histológico quase sempre pode detectar anormalidades causadas por
infecções, agentes tóxicos ou corpo estranho. Exames microbiológicos que visam à
detecção de bactérias deteriorantes ou daquelas capazes de causar intoxicação ou
infecção no consumidor e exames sorológicos para determinação dessas espécies
bacterianas podem ser utilizados. Os exames químicos e toxicológicos devem ser
usados para a detecção de substâncias tóxicas ou adulterativas quando há suspeita.
Alguns Valores Fisiológicos 1169

ALGUNS VALORES FISIOLÓGICOS


TABELA 3 – Temperatura Corporal Basal de Várias Espécies, em Relação ao Peso
Temperatura
corporal
°C

Pardal Cotovia
Corvo
Cardeal Estorninho
43,3 Chapiam Pombo
Tordo (Em geral, mamíferos muito grandes ou muito
Asa-de-cera pequenos têm temperatura corporal baixa)
Tetraz
Melro Falcão
Garça
Faisão
42,2
Íbis Gavião
Mutum

Pica-pau Pato
Galinha
Atobá Ganso
41,1 Papagaio Cormorão
Gaivota Grou
Torda do mar Peru
Pelicano
Flamingo
Coruja Cisne
Pavão
40,0 Pingüim
Ouriço
Petrel
Macaco
Coelho Guaxinim
Rena
CãoCabra
Emu Carneiro
38,9 Cobaia Porco
Gato Pantera
Morcego frugívoro Casuar
Jaguatirica
Foca Vaca
Chacal Burro
Rato Cavalo
37,7

Tigre
Esquilo terrestre Homem
36,6 Camelo
Cão-da-pradaria
Camundongo

Morcego
Elefante
35,5 Musaranho
0,0045 0,045 0,454 4,5 45 454 4,500

Peso corporal (kg) Adaptado de Science , 111:465, 1950.


Alguns Valores Fisiológicos 1170

TABELA 4 – Temperaturas Retais

Espécie °F ± 1°F °C ± 0,5°C


Gado de corte 101 38,3
Gado leiteiro 101,5 38,6
Égua 100 37,8
Garanhão 099,7 37,6
Ovino 102,3 39,1
Caprino 102,3 39,1
Suíno 102,5 39,2
Cão 102 38,9
Gato 101,5 38,6
Coelho 103,1 39,5
Adaptado de Andersson, B.E. – Temperature Regulation and Environmental Physiology, in Duke’s
Physiology of Domestic Animals, 10ª ed., Swenson, M.J., Ed., 1984, com permissão de Cornell
University Press.

TABELA 5 – Freqüências Cardíacas (bpm)

Espécie Média Variação Espécie Média Variação


Cavalo 44 (23 – 70) Hâmster 450 (300 – 600)
Asno 50 (40 – 56) Leão 40
Morcego 750 (100 – 970) Macaco 192 (165 – 240)
Camelo 30 (25 – 32) Camundongo 534 (324 – 858)
Gato 120 (110 – 140) Coelho 205 (123 – 304)
Vaca (60 – 70) Rato 328 (261 – 600)
Cão (100 – 130) Ovino 75 (60 – 120)
Elefante 35 (22 – 53) Cangambá 166 (144 – 192)
Girafa 66 Esquilo 249 (96 – 378)
Caprino 90 (70 – 135) Suíno (55 – 86)
Cobaia 280 (260 – 400) Galinha (adulta) (250 – 300)
Pinto (350 – 450)

TABELA 6 – Freqüências Respiratórias em Repouso (respiração/min)

Espécie Freqüência Espécie Freqüência


Hâmster ........................................ 74 Rato .............................................. 97
Cobaia .......................................... 90 Coelho .......................................... 39
Macaco ......................................... 40 Gato .............................................. 26
Cão ............................................... 22 Ovino ............................................ 19
Vaca ............................................. 30 Cavalo .......................................... 12
Galinha ......................................... 13 Pombo .......................................... 26

TABELA 7 – Volume Urinário


Espécie mL/kg de peso corporal/dia
Gato .................................................................................. 10 – 200
Vaca .................................................................................. 17 – 450
Cão ................................................................................... 20 – 100
Caprino ............................................................................. 10 – 400
Cavalo ............................................................................... 3 – 180
Ovino ................................................................................ 10 – 400
Suíno ................................................................................ 5 – 300
Os dados nas tabelas acima (TABELAS 5 a 7) foram adaptados em parte de Duke’s Physiology of Domestic
Animals. 9ª ed. Swenson, M.J., Ed.,1977, com permissão de Cornell University Press, e de outras fontes.
Alguns Valores Fisiológicos 1171

TABELA 8 – Índices de Referência Hematológica (Aproximados)


Unidades Unidades
convencionais interna-
Determinação EUA cionais Canino Felino Bovino Eqüino Suíno Ovino Caprino
Hematócrito (VTC) % ×10–2L/L 37 – 55 (25 – 34)a 30 – 45 (24 – 34)a 24 – 46 32 – 48b 36 – 43 (26 – 35)a 27 – 45 22 – 38
Hemoglobina (Hb) g/dL × 10g/L 12 – 18 8 – 15 8 – 15 10 – 18 9 – 13 9 – 15 8 – 12
Eritrócitos × 106 /µL × 10 12/L 5,5 – 8,5 5 – 10 5 – 10 6 – 12 5–7 9 – 15 8 – 18
Reticulócitos % % 0 – 1,5 0–1 0 0 0 – 12 0 0
Volume corpuscular médio fL fL 60 – 77 39 – 55 40 – 60 34 – 58 52 – 62 28 – 40 16 – 25
Hemoglobina corpuscular média pg pg 19,5 – 24,5 13 – 17 11 – 17 13 – 19 17 – 24 8 – 12 5,2 – 8
Concentração de hemoglobina g/dL × 10g/L 32 – 36 30 – 36 30 – 36 31 – 37 29 – 34 31 – 34 30 – 36
corpuscular média
Contagem de plaquetas × 105 /µL × 10 11/L 2–9 3–7 1–8 1–6 2–5 2,5 – 7,5 3–6
Leucócitos × 103 /µL × 109/L 6 – 17 5,5 – 19,5 4 – 12 6 – 12 11 – 22 4 – 12 4 – 13
Neutrófilos segmentados % % (60 – 70) (35 – 75) (15 – 45) (30 – 75) (20 – 70) (10 – 50) (30 – 48)
× 103 /µL × 109/L 3 – 11,4 2,5 – 12,5 0,6 – 4 3–6 2 – 15 0,7 – 6 1,2 – 7,2
Neutrófilos bastonetes % % (0 – 3) (0 – 3) (0 – 2) (0 – 1) (0 – 4) 0 Raros
× 103 /µL × 109/L 0 – 0,3 0 – 0,3 0 – 0,12 0 – 0,1 0 – 0,8
Linfócitos % % (12 – 30) (20 – 55) (45 – 75) (25 – 60) (35 – 75) (40 – 75) (50 – 70)
× 103 /µL × 109/L 1 – 4,8 1,5 – 7 2,5 – 7,5 1,5 – 5 3,8 – 16,5 2–9 2–9
Monócitos % % (3 – 10) (1 – 4) (2 – 7) (1 – 8) (0 – 10) (0 – 6) (0 – 4)
× 103 /µL × 109/L 0,15 – 1,35 0 – 0,85 0,025 – 0,85 0 – 0,6 0–1 0 – 0,75 0 – 0,55
Eosinófilos % % (2 – 10) (2 – 12) (2 – 20) (1 – 10) (0 – 15) (0 – 10) (1 – 8)
× 103 /µL × 109/L 0,1 – 0,75 0 – 0,75 0 – 2,4 0 – 0,8 0 – 1,5 0–1 0,05 – 0,65
Basófilos % % Raros Raros (0 – 2) (0 – 3) (0 – 3) (0 – 3) (0 – 1)
× 103 /µL × 109/L 0 – 0,2 0 – 0,3 0 – 0,5 0 – 0,3 0 – 0,12
Relação mielóide/eritróide 0,75 – 2,4:1 0,6 – 3,9:1 0,3 – 1,8:1 0,9 – 3,8:1 1,2 – 2,2:1 0,8 – 1,7:1 0,7– 1:1
Proteínas plasmáticasc,d g/dL × 10g/L 6 – 7,5 6 – 7,5 6–8 6 – 8,5 6–8 6 – 7,5 6 – 7,5
Fibrinogênio plasmáticoe g/dL × 10g/L 0,15 – 0,3 0,15 – 0,3 0,1 – 0,6 0,1 – 0,4 0,2 – 0,4 0,1 – 0,5 0,1 – 0,4
Adaptado de Duncan, J.R. & Prasse, K.W. – Veterinary Laboratory Medicine, 2ª ed., Iowa State University Press, 1986.
a 5 a 6 semanas cachorrinhos mais velhos, gatinhos; 3 a 45 dias suínos mais velhos.
b Menor em potros e eqüinos de sangue frio.
c Refratometria.
d Menor em animais jovens.
e Precipitação de calor.
Alguns Valores Fisiológicos 1172

TABELA 9 – Valores de Leucócitos*


(Variações aproximadas × 103/µL ou × 109⁄L)
Neutrófilos
Leucócitos Neutrófilos imaturos Linfócitos Eosinófilos Monócitos
Cavalo 5 – 15 3–7 0 – 0,1 1,5 – 5,5 ,00 – 0,5 0,0 – 0,8
Vaca 5 – 13 0,6 – 40, 00 – 0,12 2,5 – 7,5 0,0 – 2,4 0,25 – 0,84
Ovino 5 – 13 0,7 – 6 Raros 2–4 0–1 0,00 – 0,75
Caprino 5 – 13 1,2 – 7,2 Raros 2–9 0,05 – 0,65 0,00 – 0,55
Suíno 7 – 20 3,2 – 10, 0 – 0,8 4,5 – 13, 0,5 – 2,0 0,25 – 2,00
Cão 8 – 18 03 – 12 0 – 0,3 0,1 – 4,8 0,1 – 1,3 0,15 – 14,0
Gato 8 – 25 2,5 – 13, 0 – 0,3 1,5 – 7,0 0,0 – 1,5 0,00 – 0,85
Coelho 6 – 13 2–6 Raros 0,2 – 0,5 0,0 – 0,5 0,1 – 1,0
Rato 5 – 25 0,001 – 5,001 Raros 17 – 13 0–1 0–1
Camundongo 4 – 12 0,5 – 4,0 Raros 3–9 0,00 – 0,05 0–1
Galinha 9 – 56 03 – 17 – 10 – 30 0,0 – 0,5 0–5
* Para contagem de eritrócitos, VTC (%) e níveis de hemoglobina, ver ANEMIA , página 18.
Alguns Valores Fisiológicos 1173

TABELA 10 – Constituintes Bioquímicos do Soro (Índices de Referência)


Cão Gato Cavalo Vaca Ovino Suíno Caprino Unidades
Em unidades convencionais americanas
ALT (SGPT) 8,2 – 57,3 8,3 – 52,5 2,7 – 20,5 6,9 – 35,3 14,8 – 43,8 21,7 – 46,5 15,3 – 52,3 u/L
Amilase 269,5 – 1.462,4 371,3 – 1.192,6 46,7 – 188,1 41,3 – 98,3 140 – 270 43,5 – 88 u/L
Fosfatase alcalina 10,6 – 100,7 12 – 65,1 70,1 – 226,8 17,5 – 152,7 26,9 – 156,1 41 – 176,1 61,3 – 283,3 u/L
AST (SGOT) 8,9 – 48,5 9,2 – 39,5 115,7 – 287 45,3 – 110,2 49 – 123,3 15,3 – 55,3 66 – 230 u/L
CPK (CK) 13,7 – 119,7 17 – 150,2 34 – 165,6 14,4 – 107 7,7 – 101 65,7 – 489,4 16,3 – 47,7 u/L
GGT 1 – 9,7 1,8 – 12 2,7 – 22,4 4,9 – 25,7 19,6 – 44,1 31 – 52 20 – 50 u/L
LDH 24,1 – 219,2 35,1 – 224,9 102,3 – 340,6 308,6 – 938,1 83,1 – 475,6 159,6 – 424,7 78,5 – 265,3 u/L
SDH 3,1 – 7,6 2,4 – 6,1 1,2 – 8,5 6,1 – 18,4 3,5 – 20,6 0,5 – 4,9 9,3 – 20,7 u/L
Bicarbonato 18,1 – 24,5 16,4 – 22 21,7 – 29,4 20,7 – 28,9 20,3 – 26,7 18 – 27 mEq/L
Cálcio 8,7 – 11,8 7,9 – 10,9 10,4 – 13,4 8,4 – 11 9,3 – 11,7 9,3 – 11,5 9 – 11,6 mg/dL
Cloreto 102,1 – 117,4 107,5 – 129,6 97,2 – 110,1 95,7 – 108,6 100,8 – 113 97,1 – 106,4 100,3 – 111,5 mEq/L
Fósforo 2,9 – 6,2 4 – 7,3 2,3 – 5,4 4,3 – 7,8 4 – 7,3 5,5 – 9,3 3,7 – 9,7 mg/dL
Magnésio 1,7 – 2,7 1,9 – 2,8 1,8 – 2,7 1,7 – 3 2 – 2,7 2,3 – 3,5 2,1 – 2,9 mg/dL
Potássio 3,8 – 5,6 3,8 – 5,3 2,8 – 4,7 4 – 5,8 4,3 – 6,3 4,4 – 6,5 3,8 – 5,7 mEq/L
Sódio 140,3 – 153,9 145,8 – 158,7 133,3 – 147,3 134,5 – 148,1 141,6 – 159,6 139,2 – 152,5 136,5 – 151,5 mEq/L
Bilirrubina 0,1 – 0,6 0,1 – 0,5 0,3 – 3 0 – 0,8 0 – 0,5 0 – 0,5 0,1 – 0,2 mg/dL
Colesterol 115,6 – 253,7 71,3 – 161,2 70,9 – 141,9 62,1 – 192,5 44,1 – 90,1 81,4 – 134,1 64,6 – 136,4 mg/dL
Creatinina 0,5 – 1,6 0,5 – 1,9 0,9 – 2 0,6 – 1,8 0,9 – 2 0,8 – 2,3 0,7 – 1,5 mg/dL
Glicose 61,9 – 108,3 60,8 – 124,2 62,2 – 114 42,1 – 74,5 44 – 81,2 66,4 – 116,1 48,2 – 76 mg/dL
Uréia nitrogenada 8,8 – 25,9 15,4 – 31,2 10,4 – 24,7 7,8 – 24,6 10,3 – 26 8,2 – 24,6 12,6 – 25,8 mg/dL
Albumina 2,6 – 4 2,4 – 3,7 2,5 – 3,8 2,8 – 3,9 2,7 – 3,7 2,3 – 4 2,3 – 3,6 g/dL
Alb/Glob 0,7 – 1,9 0,6 – 1,2 0,5 – 1,5 0,6 – 1,3 0,4 – 0,8 0,4 – 0,7 0,6 – 1,1 proporção
Globulina 2,1 – 3,7 2,4 – 4,7 2,4 – 4,6 2,9 – 4,9 3,2 – 5 3,9 – 6 2,7 – 4,4 g/dL
Proteína 5,5 – 7,5 5,7 – 8 5,7 – 7,9 6,2 – 8,2 5,9 – 7,8 5,8 – 8,3 6,1 – 7,4 g/dL
(Continua)
Alguns Valores Fisiológicos 1174

TABELA 10 (Cont. ) – Constituintes Bioquímicos do Soro (Índices de Referência)


Cão Gato Cavalo Vaca Ovino Suíno Caprino Unidades
Em unidades do Sistema Internacional
Bicarbonato 18,1 – 24,5 16,4 – 22 21,7 – 29,4 20,7 – 28,9 20,3 – 26,7 18 – 27 mmol/L
Cálcio 2,2 – 3 2 – 2,7 2,6 – 3,3 2,1 – 2,8 2,3 – 2,9 2,3 – 2,9 2,3 – 2,9 mmol/L
Cloreto 102,1 – 117,4 107,5 – 129,6 97,2 – 110,1 95,7 – 108,6 100,8 – 113 97,1 – 106,4 100,3 – 111,5 mmol/L
Fósforo 1–2 1,3 – 2,4 0,7 – 1,7 1,4 – 2,5 1,3 – 2,4 1,8 – 3 1,2 – 3,1 mmol/L
Magnésio 0,7 – 1,1 0,8 – 1,2 0,7 – 1,1 0,7 – 1,2 0,8 – 1,1 0,9 – 1,4 0,9 – 1,2 mmol/L
Potássio 3,8 – 5,6 3,8 – 5,3 2,8 – 4,7 4 – 5,8 4,3 – 6,3 4,4 – 6,5 3,8 – 5,7 mmol/L
Sódio 140,3 – 153,9 145,8 – 158,7 133,3 – 147,3 134,5 – 148,1 141,6 – 159,6 139,2 – 152,5 136,5 – 151,5 mmol/L
Bilirrubina 0,9 – 10,6 1,2 – 7,9 5,4 – 51,4 0,7 – 14 0,7 – 8,6 0,3 – 8,2 1,7 – 4,3 µmol/L
Colesterol 3 – 6,6 1,8 – 4,2 1,8 – 3,7 1,6 – 5 1,1 – 2,3 2,1 – 3,5 1,7 – 3,5 mmol/L
Creatinina 44,3 – 138,4 48,6 – 165 76,8 – 174,5 55,8 – 162,4 75,8 – 174,3 69,6 – 207,7 59,7 – 134,8 µmol/L
Glicose 3,4 – 6 3,4 – 6,9 3,5 – 6,3 2,3 – 4,1 2,4 – 4,5 3,7 – 6,4 2,7 – 4,2 mmol/L
Uréia nitrogenada 3,1 – 9,2 5,5 – 11,1 3,7 – 8,8 2,8 – 8,8 3,7 – 9,3 2,9 – 8,8 4,5 – 9,2 mmol/L
Albumina 25,8 – 39,7 24,5 – 37,5 25,3 – 37,6 27,5 – 39,4 26,7 – 36,8 22,6 – 40,4 23,5 – 35,7 g/L
Alb/Glob 0,7 – 1,9 0,6 – 1,2 0,5 – 1,5 0,6 – 1,3 0,4 – 0,8 0,4 – 0,7 0,6 – 1,1 proporção
Globulina 20,6 – 37 24,4 – 47 23,5 – 45,8 28,9 – 48,6 32,3 – 50 39,5 – 60 27 – 44,3 g/L
Proteína 55,1 – 75,2 57,5 – 79,6 57,1 – 79,1 61,6 – 82,2 58,9 – 78,1 58,3 – 83,2 61 – 74,5 g/L
Segundo Boyd, J.W., – The Interpretation of serum biochemistry test results in domestic animals. In: Veterinary Clinical Pathology, Veterinary Practice
Publishing CO., Vol. XIII, nº II, 1984.
Guias para Referências Rápidas 1175

GUIAS PARA REFERÊNCIAS RÁPIDAS

TABELA 11 – Pesos Atômicos (Aproximados) de Alguns Elementos Comuns

Íon Peso atômico Valência


Hidrogênio (H) 01 1
Carbono (C) 12 4
Nitrogênio (N) 14 3
Oxigênio (O) 16 2
Sódio (Na) 23 1
Magnésio (Mg) 24 2
Fosfato (P)* 31 3,5
Cloro (Cl) 35,5 1
Potássio (K) 39 1
Cálcio (Ca) 40 2
* Como o fósforo, inorgânico.

TABELA 12 – Equivalentes em Celsius-Fahrenheit


Conversão
Para converter °F em °C, subtrai-se 32 e, Para converter °C em °F, multiplica-se por 9⁄ 5
então, multiplica-se por 5⁄9 (0,5555) (1,8) e acrescenta-se 32
Celsius °Fahrenheit °Celsius °Fahrenheit
Congelamento (água ao nível do mar) Variação clínica
0 32 36,0 96,8
36,5 97,7
Ebulição (água ao nível do mar) 37,0 98,6
37,5 99,5
100 212
38,0 100,4
–40 –40 38,5 101,3
39,0 102,2
Pasteurização (holding), 30min a: 39,5 103,1
61,6 143 40,0 104,0
40,5 104,9
Pasteurização (flash), 15s a: 41,0 105,8
71,10, 160 41,5 106,7
42,0 107,6
Guias para Referências Rápidas 1176

TABELA 13 – Fatores de Conversão do SI para Bioquímica Clínica


Unidades convencionais Fator de Unidades SI
Componente (EUA) (com exemplos) conversão (com exemplos)
Fosfatase alcalina 30 – 150u/L 1,00 30 – 150u/L
ALT (SGPT) 0 – 40u/L 1,00 0 – 40u/L
Albumina 2,8 – 4g/100mL 10,000 28 – 40g/L
Amônia (NH4) 10 – 80µg/100mL 000,5871 5 – 50µmol/L
Amilase 200-800u/L 1,00 200 – 800u/L
AST (SGOT) 0 – 40u/L 1,00 0 – 40u/L
Bilirrubina 0,1 – 0,2mg/100mL 17,100 2,4µmol/L
Cálcio 8,8 – 10,3mg/100mL 000,2495 2,20 – 2,58mmol/L
Dióxido de carbono 22 – 28mEq/L 1,00 22 – 28mmol/L
Cloreto 95 – 100mEq/L 1,00 95 – 100mmol/L
Colesterol 100 – 265mg/100mL 0000,02586 2,58 – 5,85mmol/L
Cobre 70 – 140µg/100mL 000,1574 11 – 22umol/L
Cortisol 2 – 10µg/100mL 27,590 55 – 280nmol/L
Creatinacinase 0 – 130u/L 1,00 0 – 130u/L
Creatinina 0,6 – 1,2mg/100mL 88,400 50 – 110µmol/L
Fibrinogênio 200 – 400mg/100mL 0,01 2 – 4g/L
Glicose 70 – 100mg/100mL 0000,05551 3,8 – 6,1mmol/L
Ferro 80 – 180µg/100mL 000,1791 14 – 32µmol/L
Lactato 5 – 20mg/100mL 000,1110 0,5 – 2mmol/L
Lipase
SigmaTietz (37°C) < 1 STu/100mL 00,280 < 280u/L
Cherry Crandall (30°C) 0 – 160u/L 1,00 0 – 160u/L
Lipídios totais 400 – 850mg/100mL 0,01 4 – 8,5g/L
Magnésio 1,8 – 3mg/100mL 000,4114 0,80 – 1,2mmol/L
Mercúrio < 1µg/100mL 49,850 < 50nmol/L
Osmolalidade 280 – 300mOsm/kg 1,00 280 – 300mmol/kg
Fosfato (como fósforo 2,5 – 5mg/100mL 000,3229 0,80 – 1,6mmol/L
inorgânico)
Potássio 3,5 – 5mEq/L 1,00 3,5 – 5mmol/L
Proteína total 5 – 8g/100mL 10,000 50 – 80g/L
Sódio 135 – 147mEq/L 1,00 135 – 147nmol/L
Testosterona 4 – 8mg/mL 03,467 14 – 28nmol/L
Tireoxina (T 4) 1 – 4µg/100mL 12,870 13 – 51nmol/L
Nitrogênio uréico 10 – 20mg/100mL 000,3570 3,57 – 7,14mmol/L
(Uréia)
Urobilinogênio 0 – 4mg/24h 01,693 0 – 6,8µmol/L
D-xilose 30 – 40mg/100mL 000,0666 2 – 2,71mmol/L
Zinco 75 – 120µg/100mL 000,1530 11,5 – 18,5µmol/L
Adaptado de The SI Manual in Health Care, Metric Commission, Canadá, 1981.

TABELA 14 – Medidas Lineares Comparativas


1 metro (m) = 39,37 polegadas (in)
1 centímetro (cm) = 00,39in
1 milímetro (mm) = 00,039in
1 jarda (yd) = 91,44 centímetros (cm)
1 pé (ft) = 30,48cm
1 polegada (in) = 02,54cm
Guias para Referências Rápidas 1177

TABELA 15 – Medidas Caseiras (Aproximadas)


1 gota * ................................................................ 1⁄20mL
1 colher de chá ..................................................... 5mL
1 colher de sopa ................................................. 15mL
1 xícara ............................................................. 250mL
* É o tamanho oficial para uma gota de água a 15°C ou , 1⁄45mL para líquidos alcoólicos.

TABELA 16 – Equivalentes Métricos e Farmacêuticos*


1 miligrama (mg) = 1⁄65 grão ( 1⁄60)
1 grama (g) = 15,43 grãos (15)
1 quilograma (kg) = 2,20 libras (avoirdupois)
1 mililitro (mL) = 16,23 mínimos (15)

1 grão (gr) = 0,065 gramas (60mg)


1 onça (oz)** = 31,1 gramas (30g)
1 mínimo = 0,062mL (0,06)
1 onça fluida (oz) = 29,57mL (30)
1 quartilho (pt)*** = 473,2mL (500)
1 quarto (qt)*** = 946,4mL (1.000)
1 galão (gal)*** = 3.785,6mL (4.000)
* Valores aproximados.
** Avoirdupois, 1 onça = 28,4 gramas
*** No sistema imperial:1 quartilho = 200 onças fluidas
1 quarto = 40 onças fluidas
1 galão = 160 onças fluidas

TABELA 17 – Prefixos e Símbolos do Sistema Métrico


Fator Prefixo Símbolo Fator Prefixo Símbolo
1018 exa E 10 –1 deci d
1015 peta P 10 –2 centi c
1012 tera T 10 –3 mili m
109 giga G 10 –6 micro µ
106 mega M 10 –9 nano n
103 quilo k 10 –12 pico p
102 hecto h 10 –15 fento f
101 deca da 10 –18 atto a

TABELA 18 – Pesos e Medidas* do Sistema Métrico


1 quilograma (kg) = 1.000 gramas (10 3)
1 miligrama (mg) = 0,001 grama (10 –3)
1 micrograma (µg)= 0,000001 grama (10–6)
1 litro (L) = 1.000mL (103)
1 mililitro (mL) = 0,001L(10 –3)
1 microlitro (µL) = 0,000001L(10–6)
* Termos comumente aplicados.

N. do T. – Avoirdupois é uma unidade de peso usada nos EUA e Grã-Bretanha na pesagem


de gemas, metais preciosos e drogas.
Guias para Referências Rápidas 1178

TABELA 19 – Conversões Miliequivalente – Miligrama


O miliequivalente (mEq) é a unidade de medidas mais usada para eletrólitos. Indica a
atividade química, ou o poder combinante, de um elemento relativo à atividade de 1mg de
hidrogênio. Então, 1mEq é representado por 1mg de hidrogênio (1mol) ou 23mg de Na +, 39mg
de K+, 20mg de Ca++, ou 35,5mg de Cl, etc.
(mg/L) x valência
mEq/L =
peso molecular
(mEq/L) x peso molecular
mg/L =
valência

TABELA 20 – Unidades Básicas do Sistema Métrico do SI


Quantidade física Unidade básica Símbolo no SI
Comprimento Metro m
Massa Quilograma kg
Tempo Segundo s
Quantidade de substância Mole mol
Temperatura termodinâmica Kelvin K
Corrente elétrica Ampère A
Intensidade luminosa Candela cd

A maioria dos valores laboratoriais é expressa como quantidade/litro, por exemplo, mol/
L, mg/L ou células/L. No Sistema Internacional, se o peso molecular for conhecido, é preferível
expressar a quantidade da substância em mol por litro; isto é, mol/L, mmol/L, µmol/L, nmol/L.
Exemplo: para converter 10,5mg/100mL de Ca em mmol/L
mg/100mL × 10
10,5mg/100mL =
peso molecular
10,5 × 10
= = 2,62mmol/L
40

TABELA 21 – Equivalentes em Peso para Aditivos Alimentares


Aditivo por Ton *
Grama Porcentagem ppm mg/kg**
1 0,00011 1,1 1,1
5 0,00055 5,5 5,5
10 0,0011 11,0 11,0
100 0,011 110,0 110,0
Libras (avoirdupois)
1 0,05 500,0 500,0
2 0,10 1.000,0 1.000,0
* 2.000lb ou 907,2kg; notar que 1ton métrica (1.000kg) = 2.204,6lb.
** Para unidades do Sistema Internacional, converter para mol quando o peso molecular for
conhecido.
Guias para Referências Rápidas 1179

TABELA 22 – Fórmulas de Conversão


Galões em libras – Multiplicar a densidade específica do líquido por 8,33* (peso em libras de
1 galão de água); então, multiplicar o resultado pelo número de galões para obter o peso em
libras.

Libras em galões – Multiplicar a densidade específica do líquido por 8,33 * (peso em libras de
1 galão de água); então, dividir o número de libras pelo resultado, para obter o volume em
galões.

Mililitros em gramas – Multiplicar a densidade específica da substância pelo número de


mililitros para obter o peso em gramas.

Gramas em mililitros – Dividir o número de gramas pela densidade específica da substância,


para obter o volume em mililitros.

Mililitros em libras – Multiplicar o número de mililitros pela densidade específica da


substância e então dividir o produto por 453,59 (equivalente em gramas de 1 libra avoirdupois),
para obter o peso em libras.

Libras em mililitros – Multiplicar o número de libras por 453,59 (equivalente em gramas de


1 libra avoirdupois); então dividir o produto pela densidade específica da substância para obter
o volume em mililitros.

Mililitros em onças – Multiplicar o número de mililitros pela densidade específica da


substância; então dividir o produto por 28,35 (equivalente em gramas de 1 onça avoirdupois)
para obter o volume em onças.

Onças em mililitros – Multiplicar o número de onças por 28,35 (equivalente em gramas de 1


onça avoirdupois); então dividir o produto pela densidade específica da substância para obter
o volume em mililitros.

Grãos, dracmas e onças em gramas (ou mL) – 1. Dividir o número de grãos por 15; ou 2.
multiplicar o número de dracmas por 4; ou 3. multiplicar o número de onças por 28,35. O
resultado em cada caso é igual ao número de gramas aproximado (ou mL).

Quilogramas em libras – Multiplicar o número de quilogramas por 2,2046 ou multiplicar o


número de quilogramas por 2 e somar 10% ao produto.

Libras em quilogramas – Dividir o número de libras por 2,2046 ou multiplicar por 0,4536.
* Para 10 galões imperiais.
PARTE IV

ANIMAIS SILVESTRES E DE
LABORATÓRIO
SISTEMAS DE AQUACULTURA .................................................................. 1183
CUIDADOS COM ANIMAIS SILVESTRES ................................................... 1185
DOENÇAS DOS PEIXES .............................................................................. 1191
Doenças Bacterianas ............................................................................... 1195
Doenças Micóticas ................................................................................... 1198
Doenças Parasíticas ................................................................................ 1199
Protozoários Parasitas da Pele e Brânquias ..................................... 1199
Protozoários Parasitas Internos ......................................................... 1201
Helmintíase ........................................................................................ 1203
Copépodes ......................................................................................... 1205
Doenças Virais ......................................................................................... 1205
Doenças Nutricionais ............................................................................... 1207
Doenças Não Infecciosas Variadas ......................................................... 1208
MANEJO E DOENÇAS DE AVES ORNAMENTAIS ..................................... 1209
Doenças Bacterianas ............................................................................... 1213
Doenças Micóticas ................................................................................... 1215
Doenças Parasíticas ................................................................................ 1217
Sistema Tegumentar .......................................................................... 1217
Sistema Respiratório .......................................................................... 1218
Sistema Gastrointestinal .................................................................... 1218
Sistema Hematopoiético .................................................................... 1219
Doenças Virais ......................................................................................... 1220
Neoplasias ............................................................................................... 1223
Doenças Nutricionais ............................................................................... 1224
Intoxicações ............................................................................................. 1225
Lesões Traumáticas ................................................................................. 1226
Doenças de Etiologia Incerta ................................................................... 1226
MANEJO, CRIAÇÃO E DOENÇAS DAS RAPOSAS ................................... 1228
Manejo ..................................................................................................... 1228
Doenças das Raposas ............................................................................. 1228
MANEJO, CRIAÇÃO E DOENÇAS DE ANIMAIS DE LABORATÓRIO ....... 1230
Manejo e Criação ..................................................................................... 1231
Monitoração da Colônia ........................................................................... 1232
Doenças de Ratos e Camundongos ........................................................ 1233
Doenças Bacterianas ......................................................................... 1233
Doenças Micóticas ............................................................................. 1235
Doenças Parasíticas .......................................................................... 1235
Doenças Virais ................................................................................... 1237
Doenças Não Infecciosas .................................................................. 1239
Doenças de Cobaias ................................................................................ 1242
Doenças de Hamsters ............................................................................. 1245
Doenças de Furões .................................................................................. 1246
Doenças de Primatas Não Humanos ....................................................... 1247
Doenças Bacterianas ......................................................................... 1249
Doenças Micóticas ............................................................................. 1250
Animais Silvestres e de Laboratório 1182

Doenças Parasíticas .......................................................................... 1251


Doenças Virais ................................................................................... 1252
Doenças Nutricionais ......................................................................... 1253
Doenças Diversas .............................................................................. 1254
Doenças de Anfíbios ................................................................................ 1254
MANEJO, CRIAÇÃO E DOENÇAS DOS MAMÍFEROS MARINHOS .......... 1255
Criação ..................................................................................................... 1256
Contenção ................................................................................................ 1257
Anestesia ................................................................................................. 1258
Doenças Bacterianas ............................................................................... 1258
Doenças Micóticas ................................................................................... 1260
Doenças Parasíticas ................................................................................ 1262
Doenças Virais ................................................................................... 1264
Doenças Ambientais .......................................................................... 1267
Neoplasias ............................................................................................... 1268
Nutrição e Doenças Nutricionais .............................................................. 1268
MANEJO, CRIAÇÃO E DOENÇAS DOS VISONS ....................................... 1271
Manejo ..................................................................................................... 1271
Doenças Bacterianas ............................................................................... 1273
Doenças Virais ......................................................................................... 1274
Doenças Nutricionais ............................................................................... 1276
Intoxicação ............................................................................................... 1277
Doenças Diversas .................................................................................... 1278
Nutrição (ver MCN) .................................................................................. 1506
MANEJO, CRIAÇÃO E DOENÇAS DOS COELHOS ................................... 1279
Manejo e Criação ..................................................................................... 1279
Doenças Bacterianas e Micóticas ............................................................ 1283
Doenças Parasíticas ................................................................................ 1287
Doenças Virais ......................................................................................... 1290
Doenças Não Infecciosas ........................................................................ 1293
Nutrição (ver MCN) .................................................................................. 1550
MANEJO, CRIAÇÃO E DOENÇAS DOS RÉPTEIS ..................................... 1296
Criação ..................................................................................................... 1296
Contenção ................................................................................................ 1298
Anestesia ................................................................................................. 1299
Determinação do Sexo ............................................................................ 1299
Nutrição .................................................................................................... 1300
Doenças Bacterianas ............................................................................... 1303
Doenças Ectoparasíticas ......................................................................... 1306
Doenças Endoparasíticas ........................................................................ 1306
Doenças Micóticas ................................................................................... 1308
Doenças por Protozoários ....................................................................... 1308
Doenças Virais ......................................................................................... 1309
Doenças Ambientais e Lesões Traumáticas ............................................ 1310
Doenças Metabólicas ............................................................................... 1311
Neoplasias ............................................................................................... 1312
NUTRIÇÃO: ANIMAIS EXÓTICOS E DE ZOOLÓGICO (ver MCN) ............. 1469
VACINAÇÃO DE MAMÍFEROS EXÓTICOS ................................................. 1312
Sistemas de Aquacultura 1183

SISTEMAS DE AQUACULTURA
Embora a aquacultura seja uma ciência antiga, ela não tem acompanhado o
desenvolvimento tecnológico dos métodos intensivos de produção vegetal e animal.
Um manejo eficiente de sistemas de aquacultura depende dos mesmos princípios
gerais da agricultura. Para uma produção animal em massa eficiente, esses
princípios incluem a reprodução de animais genética e nutricionalmente padroniza-
dos em um ambiente bem-administrado. O último inclui a manutenção de densida-
des populacionais ideais para cada estágio de produção e programas para prevenir
e controlar doenças específicas de cada espécie de aquacultura.
Ao mesmo tempo em que existem muitas semelhanças, existem também
algumas diferenças importantes entre aquacultura e agricultura. A aquacultura se
baseia mais no ambiente aquático que no terrestre. Exige-se um conhecimento
básico das qualidades da água, no que tange à saúde do animal aquático. A
agricultura tem desenvolvido métodos de manejo padronizados para poucas espé-
cies selecionadas de animais domésticos genética e nutricionalmente definidos
para produção em massa. Ao contrário, os padrões de manejo necessários para
aquacultura estão sendo desenvolvidos apenas recentemente. A aquacultura se
baseia muito em reservas reprodutivas de animais selvagens.
Estão sendo definidos os padrões genéticos, nutricionais e ambientais ideais
para cada uma das muitas espécies candidatas à aquacultura. Muitas dessas
espécies têm ciclos vitais complicados e requerem maior compreensão de sua
fisiologia reprodutiva e estratégias de manejo para produção em massa economi-
camente viável.
Os surtos de doenças sérias não são incomuns na aquacultura: as causas mais
comuns estão relacionadas às alterações físicas e químicas do ambiente aquático. O
ambiente tem de ser constantemente monitorado para se evitar situações perigosas,
por exemplo, esgotamento de oxigênio, hipertermia e hipotermia, e acúmulo de
resíduos metabólicos (por exemplo, amônia e nitritos). O ambiente também pode
estar contaminado por resíduos químicos industriais ou agrícolas. Microrganismos
aquáticos não domésticos podem agir como hospedeiros intermediários ou de trans-
porte, ou vetores de doenças. Os patógenos são difíceis de se manejar no ambiente
aquático devido à constante reciclagem de grupos de animais suscetíveis.
O conhecimento das doenças específicas é necessário para sua prevenção,
controle e erradicação. Uma grande variedade de animais aquáticos, vertebrados
e invertebrados, é produzida em sistemas de aquacultura ou maricultura. O salmão,
a truta, o peixe-gato, a tilápia, a enguia e a carpa são algumas das espécies de peixe
criadas para fins alimentares mais importantes comercialmente. Os peixes tropicais,
ornamentais e para isca também constituem produção importante de aquacultura.
Entre as espécies mais importantes de invertebrados estão os moluscos (ostras,
mariscos, vieiras, haliotes) e os crustáceos (camarões, lagostas, lagostins e pitus).
Embora haja uma grande variação nos ciclos vitais e no manejo de cada espécie
cultivada, todas podem ser divididas nos seguintes estágios de produção: acasala-
mento e incubadora e operações de cultivo.
Operações de acalasamento e incubadora – Há dois tipos de incubadoras.
Uma se baseia no controle artificial do ciclo reprodutivo, no qual o acasalamento e
a desova são regulados para produção de larvas. O outro depende da produção de
óvulos e esperma de adultos não domésticos (por exemplo, camarões e lagostas)
ou da captura de larvas da natureza (por exemplo, enguias).
No primeiro tipo, o acasalamento e a desova podem ser artificialmente induzidos
por meio da regulação da temperatura da água, luz, nutrição e substâncias
químicas. Extratos de pituitária crua e gonadotrofina coriônica humana são injetados
Sistemas de Aquacultura 1184

em alguns peixes reprodutores para induzir a desova em aquários. O manejo de


óvulos fertilizados e não fertilizados e do esperma na incubadora é crítico, e as
técnicas variam com a espécie cultivada. Para a fertilização artificial de óvulos com
esperma, a proporção, diluição, temperatura e precisão da fertilização são passos
importantes. Exigem-se métodos apropriados de higiene e preparação de um meio
de cultura que seja física e quimicamente compatível com os ovos embrionados.
Uma vez fertilizados, os ovos embrionados são lavados, diluídos e ressuspendidos.
A incubação e o desenvolvimento do embrião são monitorados a intervalos regula-
res. Cada espécie de aquacultura possui suas exigências de manejo particulares.
A maioria das espécies de aquacultura apresenta grande fecundidade. Uma ostra
pode produzir até 110 milhões de óvulos durante uma desova. Os peixes produzem
muito menos, mas ainda são prolíficos para os padrões dos mamíferos. Uma fêmea
de peixe-gato produz , 8.900 óvulos/kg de peso vivo.
Durante o desenvolvimento dos embriões e larvas na incubadora, muitas
espécies de aquacultura sofrem metamorfose, o que exige métodos e manejo
especiais. As larvas de moluscos bivalves (ostra, mariscos e vieiras) perdem sua
mobilidade e se prendem a substratos (conchas, rochas, etc.) seguindo-se um
processo de metamorfose (“estágio de assentamento”). Deve-se montar tanques de
assentamento para esse propósito.
Doenças específicas podem se desenvolver durante esses estágios de desen-
volvimento e incluem doenças congênitas, metabólicas, nutricionais e infecciosas.
Muitas das doenças congênitas são genéticas ou devidas a infecções em reservas
reprodutivas cultivadas ou não domésticas. As infecções transmitidas aos embriões
e larvas no meio de cultura aquático se espalham rapidamente. A superlotação nos
tanques de cultura ou aquários exacerba os processos patológicos. A mortalidade
tende a ser maior em larvas criadas em incubadora, devido à rápida dispersão de
patógenos no ambiente aquático, à falta de imunidade larval e à retenção específica
de patógenos das larvas, que são continuamente recicladas em grandes números
dentro do sistema de incubadora.
A água doce ou salgada bombeada para dentro das incubadoras pode conter
patógenos para as larvas, que se proliferam rapidamente em certas épocas do ano.
Incluem-se neles muitas bactérias, por exemplo, Aeromonas, Pseudomonas e
Vibrio spp. O alimento para as larvas também pode estar contaminado com tais
patógenos.
O suprimento de água e alimento da incubadora requer monitoração de rotina
para a prevenção contra patógenos bacterianos e substâncias tóxicas. Um progra-
ma de saúde da incubadora deve incluir exames patológicos e microbiológicos
rotineiros da cultura de larvas, do suprimento de água e do alimento para larvas
utilizado durante a produção.
Além das doenças infecciosas, o crescimento rápido de microrganismos compe-
titivos contaminantes e indesejáveis pode ocorrer nas culturas de larvas e resultar
na inanição dos animais cultivados desejáveis. Alguns microrganismos indesejáveis
introduzidos acidentalmente podem ser tóxicos, predadores ou parasitas, ou podem
interferir com os processos vitais (sujeira) do animal cultivado.
As incubadoras de peixes podem ser examinadas e certificadas como sendo
livres de patógenos específicos conhecidos. Tal certificação é necessária para que
se definam grupos reprodutivos SPF que sirvam para transporte ou exportação
interestadual. Já que o conhecimento das doenças de muitas espécies utilizadas em
aquacultura é extremamente limitado, mais pesquisas e medidas regulatórias são
necessárias para a produção de grupos reprodutivos livres de patógenos.
Operações de crescimento – Uma vez que a fase incubadora de produção esteja
completa, os peixinhos, crustáceos metamorfoseados ou os moluscos bivalvulares
juvenis exigirão condições de crescimento que providenciem mais espaço e alimento
Cuidados com Animais Silvestres 1185

para o crescimento até o tamanho de mercado ou de reprodutores adultos. O tipo de


condição de crescimento é determinado pela necessidade da espécie em particular
e pela disponibilidade de terra, água e alimentos para produção econômica.
No caso dos peixes (salmão, truta, peixe-gato, tilápia, carpa e outros), as opera-
ções de crescimento podem ser realizadas em canais, tanques, lagoas e redes ou em
gaiolas ou cercados de arame em rios ou lagos. As espécies de água salgada podem
ser criadas em gaiolas colocadas nos estuários ou mar aberto (“fazenda marinha”).
As lagoas utilizadas em aquacultura podem ser tanto naturais como construídas.
Para alguns peixes ou invertebrados herbívoros cultivados, as lagoas são fertiliza-
das artificialmente para promover o crescimento da vegetação, que é utilizada como
alimento pelo organismo cultivado (por exemplo, peixe-gato, lagostim, camarão).
Em conjunto com a vegetação da lagoa, rações suplementares comerciais ou
caseiras podem ser utilizadas. Rações com fórmulas comerciais estão disponíveis
e podem ser usadas em tanques ou canais adutores. Os peixes salmonídeos são
criados em canais e lagoas de água doce, ou em redes ou gaiolas de arame, nas
chamadas fazendas marinhas, e recebem alimento formulado.
As ostras jovens ou ovas de ostras são colocadas em estuários, rios e lagoas de
água salgada para crescerem. Se as ovas de ostras se prenderem a conchas ou
fragmentos de concha, elas podem ser colocadas em bandejas de madeira
submersas ou em sacos enredados, ou mesmo se difundir individualmente na área
de crescimento. Os mariscos podem ser fixados em canais ou bandejas submersas
e as vieiras jovens móveis podem ser suspensas em redes semelhantes a lanternas
na água do mar. Já que as ostras, mariscos, mexilhões e vieiras são filtradores de
alimento, seu alimento consiste em algas e diatomáceas planctônicas naturais
existentes na água do mar.
Os moluscos bivalvulares podem ingerir algas planctônicas tóxicas (que são
nocivas para o homem e moluscos – por exemplo, intoxicação paralisante dos
moluscos) junto com algas alimentares benéficas que estejam presentes.

CUIDADOS COM ANIMAIS SILVESTRES


A saúde e o bem-estar de animais silvestres cativos dependem do design de seu
alojamento, do manejo e dos cuidados médicos. Os recintos de simulação natural,
com solo e vegetação, que são muito chamativos para o público, tornam difíceis a
higiene e o controle parasítico e complicam a contenção. Recintos que exibem
espécies diferentes podem criar problemas de transmissão de doenças, agressão e
design dos comedouros para assegurar consumo apropriado de comida.
A medicina preventiva é a espinha dorsal de qualquer programa médico de um
zoológico, por causa de problemas inerentes aos processos de diagnóstico e trata-
mento de animais silvestres. Os procedimentos médicos preventivos são registrados
e tornam-se o início do registro médico do animal. Registros completos são essenciais
para todos os programas médicos, e os animais silvestres não são exceção.
Os animais que estiverem entrando na coleção devem ser submetidos à
quarentena. O local de quarentena deve ser isolado e projetado de forma a permitir
a contenção dos animais e limpeza e higiene apropriadas do recinto. Deve ser
servido por tratadores separados que sejam capazes de reconhecer sinais de
estresse e doença, e que possam monitorar cuidadosamente o consumo alimentar
e as características das fezes. Os animais em quarentena quase sempre requerem
cuidado especializado, incluindo alimentação forçada durante a aclimatação inicial
ao novo ambiente e à nova dieta.
Cuidados com Animais Silvestres 1186

Durante o período de quarentena, o animal deve receber a vacinação e os testes


diagnósticos apropriados (por exemplo, tuberculose). Antes de ser liberado da
quarentena, o animal deve ser libertado ou grandemente aliviado de sua carga
parasítica e passar por um exame físico, que pode incluir radiografias, hemograma
e exames de bioquímica sérica. Alguns soros devem também ser congelados para
referência posterior a possíveis estudos epidemiológicos.
Os animais silvestres são suscetíveis a uma grande variedade de infecções endo
e ectoparasíticas, semelhantes àquelas achadas nos animais domésticos. O
impacto destes parasitas nos indivíduos é variável, mas provavelmente é bem maior
quando do transporte e da chegada ao zoológico. Durante este período de estresse
extremo, muitos parasitas, normalmente comensais e especialmente protozoários,
parecem se tornar capazes de produzir doenças. A diarréia aguda pode resultar de
infecções maciças por Trichomonas, Giardia ou Balantidium spp. A amebíase é
largamente verificada em primatas e répteis, podendo levar à morte.
Exames periódicos da pele e da pelagem, assim como das fezes, devem ser feitos
durante a quarentena. Para ecto e endoparasitas, deve ser instituída uma terapêutica
apropriada. Os parasitas com ciclos de vida indiretos freqüentemente deixarão de ser
problema se a área de exibição estiver limpa e livre de hospedeiros intermediários.
Se ectoparasitas forem encontrados em animais recém-adquiridos, tanto o caixote
em que chegaram quanto o seu conteúdo deverão ser tratados com spray acaricida
ou inseticida, antes de se deixar a área de quarentena. As instalações de quarentena
podem precisar de barreiras contra o ingresso de vetores ou pragas em potencial.
Os programas de medicina preventiva prosseguem com vacinação de reforço,
exames fecais periódicos e tratamento para parasitas, além de procedimentos de
triagem. Os parasitas intestinais constituem um importante problema rotineiro em
muitas espécies mantidas em recintos naturalísticos sobre substrato de terra,
principalmente em climas mais quentes. Precisa-se de vigilância contínua para se
controlar o nível de infecção, sobretudo nos animais jovens e estressados. Como
nas espécies domésticas, pode-se desenvolver resistência anti-helmíntica e
pode ser necessária uma alteração na medicação. Os animais devem ser
examinados clinicamente para que se assegure que eles estejam saudáveis
antes de serem enviados a outros zoológicos. As necropsias de todos os animais
mortos ajudam a avaliar programas médicos, de manejo e nutricionais, e também
ajudam a identificar problemas latentes que possam exigir ação imediata visando
a proteção do resto da coleção. As variações anatômicas devem ser registradas,
já que tais observações podem ajudar no diagnóstico e na terapia de futuros
problemas em cada espécie.
O controle de pestes é quase sempre negligenciado; um programa de controle
eficaz exige um esforço combinado para restringir o abrigo e o alimento para as
pestes junto a métodos químicos e mecânicos de controle. A escolha do agente
pesticida e a forma de seu armazenamento minimizam seu acesso aos animais
e possíveis intoxicações secundárias. As pestes comuns em zoológicos são
vetores importantes de doenças: as baratas são hospedeiros intermediários para
parasitas gastrointestinais de primatas; os roedores podem albergar e espalhar
listeriose e leptospirose; e as raposas e os guaxinins podem devastar as coleções
de aves aquáticas e podem ser fontes importantes de surtos de raiva. Os
guaxinins também são capazes de transmitir Baylisascaris procyonis para outras
espécies, nas quais causa neuropatia fatal. Os pombos e estorninhos são
reservatórios potenciais de doenças aviárias e consomem ou contaminam o
alimento animal e defecam em todo lugar.
A tuberculose (TB) de mamíferos persiste como um problema potencial e indica-
se avaliação de rotina de primatas, ungulados e dos tratadores. A interpretação dos
testes de tuberculina intradérmicos não é muito precisa em algumas espécies não
Cuidados com Animais Silvestres 1187

domésticas. Quando um teste for suspeito ou positivo, podem-se indicar testes diagnós-
ticos adicionais, tais como lavagem gástrica ou brônquica para citologia e cultura.
A tuberculose aviária é um problema crônico em muitas coleções aviárias. As
medidas de controle são difíceis já que os testes ante mortem não são confiáveis. A
higiene intensiva e o descarte das aves expostas ajudam a controlar a doença, mas
não a eliminá-la. Os marsupiais e os primatas jovens também desenvolvem tubercu-
lose aviária quando expostos a aves infectadas ou ambientes contaminados como
em um recinto misto. A doença nos marsupiais geralmente se manifesta por meio de
lesões ósseas e é resistente à maior parte das terapias. A doença nos primatas é
quase sempre benigna, mas causa reações equivocadas de testes de tuberculina.
A vacinação de carnívoros exóticos é essencial devido à sua suscetibilidade a
várias doenças, tais como panleucopenia felina, rinotraqueíte felina, calicivirose
felina, cinomose e parvovirose. No passado, apenas vacinas de vírus inativados
eram recomendadas, porém estudos recentes revelaram que algumas vacinas de
vírus vivos modificados são seguras para o uso em algumas espécies; estudos
adicionais ainda são necessários. A vacinação contra a raiva é potencialmente
controversa e depende de circunstâncias próprias de cada grupo; se a vacina anti-
rábica for indicada, apenas vacinas inativadas deverão ser usadas. Encontram-se
vacinas para outras doenças repartidas entre espécies domésticas e silvestres. A
decisão de vacinar espécies silvestres para doenças menos comuns, para as quais
uma vacina possa ter valor questionável, é feita sobre uma base individual (ver
também VACINAÇÃO DE M AMÍFEROS EXÓTICOS, pág. 1312).
Práticas de manejo – A linha mestra de um programa médico consiste em um
grupo de profissionais qualificados e dedicados que observem os animais diaria-
mente à procura de anormalidades como anorexia, inatividade, fezes anormais e
mudanças no comportamento que possam refletir problemas médicos precoces.
Relatos de excesso de zelo em observações são preferíveis à indiferença. Partindo-
se do fato de que muitas espécies exóticas mascaram instintivamente sinais claros
de doença até que o problema esteja bem avançado, é necessário que os tratadores
fiquem atentos a qualquer coisa, mesmo que pareça apenas alguma mudança
trivial. Fatos passados podem ser úteis ao veterinário quando os tratadores não
notam mudanças sutis devido ao mascaramento.
O recinto do animal deve ser parecido com o seu ambiente natural e melhorar a
visualização por parte do visitante. Muitos mamíferos ou aves saudáveis podem
tolerar uma variação de temperatura bem grande se recebem acesso a sombra e
água em tempo quente e a um abrigo seco e protegido de correntes de ar, com um
local quente e comida suficiente para enfrentar as exigências energéticas aumen-
tadas no inverno. A chave para se conseguir isso é assegurar que cada animal tenha
acesso ao ambiente protegido e que um indivíduo dominante não exclua os outros
do abrigo, alimento ou água. Tal exclusão pode resultar em queimaduras por frio ou
mesmo morte devida à exposição. Os comedouros devem ser projetados para se
evitar contaminação fecal.
Na introdução em novos recintos, são necessários cuidado e planejamento para
que se previnam traumas auto-induzidos em animais assustados, que podem
trombar em barreiras ou paredes de vidro. Barreiras visuais como lonas suspensas
a partir dos cercados ou paredes do recinto, ou o escurecimento das janelas de vidro
com sabão oferecem alguma proteção contra tais acidentes.
Em casos de grandes quantidades de aves ou mamíferos, e especialmente em
exibições mistas, devem-se estabelecer várias áreas de bebida e alimentação em
elevações apropriadas para que se reduzam as lesões e mortes resultantes de
invasões territoriais. O esquema de alimentação é importante; em muitas espécies
é melhor servir pequenas quantidades de alimento o dia inteiro, para que se
obtenham animais mais ativos e uma exibição melhorada.
Cuidados com Animais Silvestres 1188

Manipulação de animais – O tratamento de doenças em animais silvestres


cativos não difere substancialmente daquele das espécies domésticas uma vez feito
o diagnóstico, exceto no método de contenção e administração de drogas. A maioria
dos animais selvagens não gosta de ser manipulada e geralmente luta contra a
contenção manual. Lutar com um animal para administrar tratamento pode ser mais
prejudicial que compensatório.
A contenção física é indicada em algumas espécies para manipulações peque-
nas ou observação mais próxima. A jaula de compressão é usada freqüentemente
em espécies maiores e perigosas. Enquanto as dimensões e a forma de construção
variam, o funcionamento da jaula baseia-se no princípio de movimentação de uma
parede para conter o animal contra a outra. A jaula de compressão tem aberturas
que permitem acesso seguro ao animal. Alguns procedimentos úteis podem ser
feitos em animais confinados, mas não anestesiados, por exemplo, exame físico
limitado, administração de injeções, administração de anestésicos, obtenção de
amostras de sangue, corte de unhas encravadas e aplicação de medicações
tópicas. É ideal que as jaulas de compressão sejam desenhadas como parte do
alojamento regular do animal. Sempre que possível, os animais devem ser atraídos
para dentro da jaula e não empurrados forçosamente para entrar. A jaula pode ficar
localizada em uma área de transferência normal onde os animais entrem diariamen-
te. Ajuda bastante se o recinto contém caixas-ninho ou cercados de contenção
equipados com portas que possam ser operadas remotamente para conter o animal.
Destes cercados de contenção, o animal pode ser prontamente transferido a uma
jaula de compressão, uma câmara anestésica ou até um caixote de transporte.
Instalações para pesagem são essenciais.
Os animais pequenos e as aves podem ser presos e contidos em redes com cabo
longo ou puçás. Estas redes devem ser suficientemente fundas para que o animal
caia em seu fundo cego, e a sua parte superior deve ser torcida para evitar a fuga.
As pessoas participantes dos procedimentos de captura ou confinamento devem
conhecer sua função e estar atentas às características comportamentais e às armas
do animal. Tal coordenação é essencial na ajuda à garantia de segurança durante
o processo. Luvas pesadas são usadas para proteger o tratador dos dentes e garras
enquanto os animais são contidos manualmente após a captura. Deve-se ter
cuidado para se evitar pressão excessiva sobre o animal, já que as luvas atrapalham
a destreza e a percepção da pressão que está sendo exercida. As luvas também são
difíceis de limpar, e podem ser um veículo para transmissão de infecções.
Administração de drogas – Poucas drogas são aprovadas para uso em
espécies que não sejam domésticas ou no próprio homem. Isso representa um
dilema, mas é correntemente aceito que para se providenciarem cuidados médicos
apropriados aos animais de zoológico, essas drogas devem ser usadas mesmo que
não sejam conhecidos seus benefícios terapêuticos, dosagem, esquema de trata-
mento, contra-indicações e toxicidade. Portanto, é necessário extrapolar os parâ-
metros conhecidos. Em geral, os animais de zoológico podem ser colocados em
cinco grupos metabólicos reconhecidos: aves passeriformes, aves não passeriformes,
mamíferos placentários, marsupiais e répteis. O veterinário deve procurar extrapolar
a dosagem dentro de tais grupos, quando se dispor de dados.
A antibioticoterapia em espécies exóticas tem sido empírica. As doses têm sido
extrapoladas a partir de outros mamíferos, mas pouca consideração tem-se tomado
a respeito das diferentes taxas metabólicas dos animais, por exemplo, cobras
versus aves. É importante reconhecer-se que as dosagens são geralmente mais
altas em animais pequenos e mais baixas em animais grandes de um grupo
metabólico. Um animal que tenha 15 vezes o tamanho (peso corporal) de um animal
menor pode precisar apenas da metade da dose do animal menor, mesmo que
ambos pertençam ao mesmo grupo metabólico ou energético.
Cuidados com Animais Silvestres 1189

A farmacocinética de drogas nas várias espécies é importante. Quando se prescre-


verem antibióticos, estes fatores deverão ser observados se um bom efeito terapêutico
for pretendido, especialmente no caso de drogas com toxicidade orgânica potencial.
A administração de drogas pode ser difícil. A medicação oral tem a vantagem de
perturbação mínima ao animal, mas o problema consiste em assegurar sua ingestão
adequada; pode-se conseguir isso ao se misturar a medicação no alimento ou
refeição preferidos. A injeção IM com seringa manual pode ser difícil a menos que
uma jaula de compressão ou outros meios de contenção física sejam utilizados.
Injeções IM à distância podem ser realizadas a partir do disparo de seringas-
projéteis por uma espingarda. Essas injeções são dolorosas e adicionam o trauma
do impacto do dardo, especialmente quando distribuem volumes grandes (por
exemplo, 10mL) por distâncias longas (60m). A prática com projéteis é obrigatória
antes de seu uso clínico, pois a pontaria assim como a familiaridade com a arma são
essenciais; tais armas nas mãos de um novato podem ser fatais. Outros métodos
menos traumáticos de injeção IM, a uma distância mais curta, incluem uma seringa
na ponta de uma vara ou numa pistola de ar comprimido.
A imobilização segura e a anestesia em animais silvestres são uma preocupação
especial. Muitos dos procedimentos rotineiramente realizados em animais domés-
ticos, com um mínimo de contenção, requerem imobilização química tanto para a
sanidade do animal de zoológico quanto para a do tratador.
A cetamina sozinha, ou em combinação com tranqüilizantes ou com xilazina é um
agente anestésico comum para pequenos e médios mamíferos e pássaros. Usa-se
geralmente a combinação com um tranqüilizante para acelerar a indução, minimizar
a excitação, aumentar o relaxamento muscular e promover um processo anestésico
mais suave que o da cetamina usada isoladamente.
A tiletamina-zolazepam, um anestésico dissociativo, é relativamente segura na
maioria das espécies, tem uma indução rápida e pode ser concentrada a 500mg/mL,
o que permite um volume menor de administração.
A etorfina, sozinha ou em combinação com outros agentes (acepromazina,
xilazina) é extensivamente utilizada na imobilização de ungulados, elefantes e
rinocerontes. Uma vantagem da etorfina é que um antagonista de ação rápida,
a diprenorfina, pode ser dado por via EV. A força anestésica da etorfina cria
perigos em potencial para as pessoas que estão administrando a droga; proce-
dimentos de emergência para serem seguidos após uma injeção acidental em
humanos devem ser estabelecidos. O carfentanil está relacionado à etorfina e
também tem uma indução rápida, mas devido à sua meia-vida longa, ocorre uma
renarcotização reversa ao se usar diprenorfina, o que pode deixá-lo indesejável
para o uso de campo.
A xilazina, usada sozinha, também promove imobilização adequada em algumas
espécies de ungulados, principalmente bovinos. Seus efeitos sedativos podem ser
antagonizados por ioimbina. Não deve ser usada como agente anestésico único em
carnívoros perigosos, pois estes podem parecer sedados, mas respondem agres-
sivamente quando estimulados.
Os fatores que afetam a resposta a drogas imobilizadoras incluem idade, sexo,
fase do ciclo reprodutivo, estado nutricional geral, e estado mental do animal antes
da administração da droga. As variações são marcantes tanto entre espécies quanto
entre indivíduos e entre coleções diferentes da mesma espécie. Um animal excitado
geralmente requer mais droga e, uma vez imobilizado, tem uma tendência grande à
hipertermia e à acidose. Quando a anestesia tiver de ser prolongada, anestésicos
inalatórios, como halotano, metoxiflurano ou isofluorano, poderão ser usados. A
constituição de um recinto no qual animais estejam para ser imobilizados quimica-
mente pode ser crítica. As espécies predadoras que se movimentam rapidamente
podem colidir contra grades ou outras barreiras.
Cuidados com Animais Silvestres 1190

Reprodução – A natureza do animal e seu comportamento social devem ser


compreendidos para que se promovam programas reprodutivos de sucesso. As
espécies devem ser mantidas sozinhas, em pares, ou em grupos, dependendo do
seu sistema social estabelecido; por exemplo, em grupos de espécies mistas de
Artiodactyla, é possível estabelecer ciclos estrais por espécies e, conseqüentemen-
te, ter apenas um macho no recinto por vez. Os outros machos podem entrar em um
esquema de rodízio que coincida com o estro das fêmeas de sua espécie. Tais
medidas reduzem as lesões devidas aos confrontos entre machos reprodutores.
Após o parto, os machos de algumas espécies devem ser removidos por várias
semanas para evitar ataques às fêmeas em pós-parto ou aos filhotes. Em climas
mais frios, os machos devem ser introduzidos em época tal que permita que os
nascimentos ocorram num período mais quente.
Um problema que tem aparecido em zoológicos é reprodução em demasia dos
animais e conseqüente superpovoamento do recinto, do zoológico e de outros
zoológicos. Tais espécies de reprodução fácil competem por alimento limitado e
podem comprometer outros programas. O controle do tamanho da população
pode incluir eutanásia, ou, de preferência, medidas de controle de natalidade tais
como intervenção cirúrgica, supressão hormonal da reprodução ou separação
de machos e fêmeas.
Outros procedimentos – As fraturas ósseas são reparadas sob anestesia geral.
Já que a manutenção de uma tala é quase sempre difícil em animais silvestres,
prefere-se fixação interna rígida sempre que possível. Para assegurar bons resul-
tados, qualquer fixação de fratura deve ser rígida, forte e requerer cuidados pós-
operatórios mínimos. Quando se colocar o gesso em algum animal, deve-se
assegurar liberdade de movimentos e um mínimo de desconforto, já que o gesso tem
de permanecer no animal por 3 a 4 semanas. Novos materiais de engessamento
mais leves, mais fortes ou à prova d’água são muito úteis para a medicina veterinária
nos zoológicos, assim como outras técnicas e aplicações ortopédicas.
O corte das asas para evitar o vôo dos pássaros é facilmente realizado por meio da
amputação de uma asa na articulação distal à radiocárpica ou por meio da execução de
uma tenectomia e fusão da articulação radiocárpica. Outros métodos de corte da asa
podem ser encontrados na literatura. O corte das asas em aves jovens é mais fácil e bem-
sucedido que o mesmo processo em aves adultas (ver também pág. 1209).
A odontologia em animais de zoológico apresenta problemas únicos. As raízes
dos caninos de primatas e carnívoros são muito mais extensas que a coroa exposta,
e não é possível removê-las inteiras por tração simples e rotação; é essencial o
desalojamento com um elevador dental. Pode ser necessário o uso de uma pequena
broca elétrica ou um cinzel para ossos a fim de remover uma parte do maxilar ao redor
da margem labial da raiz. Os incisivos de roedores, tais como castores, porcos-
espinhos e capivaras, crescem continuamente por toda a vida; a menos que estes
animais estejam servidos de alimento grosseiro ou troncos de árvore para roer, os
seus incisivos crescerão tanto que interferirão em sua habilidade para comer. A
doença periodontal em espécies exóticas é tratada, na rotina, limpando-se os dentes
e providenciando-se substâncias mastigáveis apropriadas para suplementar as
dietas fracas oferecidas a muitos animais.
Cuidados com aves e mamíferos órfãos na natureza – É importante que se
determine se o animal é verdadeiramente órfão. Em muitos casos, se a ave é
colocada de volta em seu ninho ou se o mamífero é deixado sozinho e monitorado,
a mãe volta para tomar conta. A condução de filhotes de aves de volta ao seu ninho
não assegura que os pais os aceitem de novo. Se um animal for mantido para criação
manual, o calor, a hidratação e a energia são críticos.
Já que a maioria dos órfãos não pode inicialmente manter ou regular sua
temperatura corporal, deve ser providenciado calor suplementar com a ajuda de
Doenças dos Peixes 1191

bolsas e, garrafas térmicas ou lâmpadas incandescentes. O órfão deve ser


protegido do calor para que se evitem queimaduras. Aquecedores de mola
elétricos podem desenvolver manchas de calor quando estiverem velhos ou
quebrados. A variação inicial de temperatura deve ficar entre 26 e 32oC. Um órfão
hipotérmico não deve ser alimentado até que a temperatura corporal esteja perto
do normal. Durante essa fase de reaquecimento, as exigências de hidratação e
energia podem ser supridas com soluções orais salinas e de dextrose 10 a 20%.
Várias dietas são usadas para alimentar aves nidífugas; elas geralmente
contêm 1⁄3 de gema do ovo cozido, 1⁄3 de carne (ou ração canina) e 1⁄3 de papinha
para bebês, que é misturada com um sucedâneo do leite ou leite puro na
proporção de 1:1 para fazer uma liga que é servida por meio de um conta-gotas.
Algumas gotas de multivitaminas pediátricas são adicionadas a todas as fórmulas
para órfãos. As aves jovens devem ser estimuladas pelo farfalhar do ninho ou por
pancadinhas no bico superior para estimular a abertura da boca. A comida é então
colocada no fundo da boca; o pássaro irá parar de abrir a boca quando esta estiver
cheia. Nas primeiras alimentações é melhor manter o pássaro faminto que
superalimentado, o que pode criar problemas digestivos. A ave deve ser alimen-
tada a cada 15min por 1 a 2h; depois a cada hora por 12h durante o dia.
A dieta para pombos e rolas é diferente e consiste de ração canina seca
embebida em leite evaporado e água (1:1) para formar uma liga.
A criação manual de cangambás, raposas e guaxinins órfãos não é aconselhável
devido ao risco potencial de raivas e leis locais. Para criar esquilos e gambás, um
sucedâneo do leite deve ser servido a cada 3h durante 18h por dia. Os coelhos são
muito difíceis de se criar; podem aceitar essa fórmula 2 a 3 vezes ao dia.

DOENÇAS DOS PEIXES


Os peixes são pecilotérmicos e as suas taxas metabólica e de crescimento e
respostas inflamatória e imunológica são enormemente influenciadas pela tempe-
ratura da água. Na água doce, os tecidos internos dos peixes são hiperosmóticos
e na água salgada são hipoosmóticos. Ferimentos superficiais na pele prejudicam
a osmorregulação e podem levar a sérias conseqüências como perda do eqüilíbrio
hídrico e colapso circulatório.
Os peixes não possuem linfonodos organizados e células de Kupffer. O tecido
fagocitário está localizado no tecido hematopoiético do baço e do rim e freqüente-
mente no átrio do coração, que tem duas câmaras. A estrutura do rim dos
peixes varia de acordo com a espécie; geralmente está dividida em duas regiões,
uma “cranial” e outra “caudal” ao rim, localizado retroperitonealmente, ventral à
coluna vertebral. Encontram-se tecidos renal, hematopoiético e endócrino no
rim. Os íons bivalentes são excretados principalmente pelo rim, e os monovalen-
tes e as excreções nitrogenadas pelas brânquias. Na verdade, as lesões de
brânquias e rins podem interferir seriamente na respiração, excreção e eqüilíbrio
hídrico.
A bexiga natatória em peixes ósseos, que é originada de um divertículo do
esôfago, regula a flutuabilidade do corpo e pode também ser empregada para
produção de sons. O gás é tanto secretado como absorvido pela bexiga natatória
para manter a flutuabilidade ou a densidade específica necessárias e o equilíbrio
em condições aquáticas específicas. Um sistema sensorial linear lateral, ao longo
dos lados do corpo e da cabeça, recebe estímulos do ambiente aquático e medeia
respostas adaptativas pelo SNC.
Doenças dos Peixes 1192

Um sistema humoral de anticorpos ocorre em todos os peixes, porém varia


consideravelmente entre as classes. Embora a produção de anticorpos seja quase
sempre dependente da temperatura, anticorpos séricos específicos podem ser
flagrados. Os linfócitos B, encontrados no baço e no fígado, são responsáveis pela
produção de imunoglobulinas encontradas no soro e fluidos teciduais dos peixes.
Entretanto, os peixes não têm imunoglobulinas potentes, semelhantes à IgG dos
animais superiores. Os peixes aumentam a produção de IgM, semelhante àquela
dos animais superiores, quando respondem imunologicamente a muitos agentes
infecciosos. Ao contrário dos homeotérmicos superiores, os pecilotérmicos depen-
dem de elevações na temperatura ambiente para a produção eficiente de anticorpos
durante infecções (ou vacinações), quando a maioria dos patógenos está se
replicando a uma taxa mais rápida. A temperatura ideal para a produção de
anticorpos varia com a espécie de peixe (água fria ou quente). Elevações extremas
de temperatura ambiente (acima daquelas do hábitat natural) inibem a produção de
anticorpos. Os linfócitos T dos peixes, como dos animais superiores, são responsá-
veis pela imunidade mediada por células. A imunidade não depende da idade em
peixes, como acontece nos animais superiores; os peixes jovens geralmente são
competentes imunologicamente e podem ser vacinados com sucesso. Os anticor-
pos são encontrados no muco da pele e do trato gastrointestinal dos peixes.
Ao mesmo tempo em que se têm demonstrado respostas imunológicas clássicas
nos peixes, a duração da imunidade adquirida parece limitada. A administração
parenteral individual de antígenos aparentemente resulta em imunidade mais
duradoura quando comparada com métodos de banho em massa. Embora a
vacinação dos peixes contra doenças específicas seja economicamente importante
para prevenir perdas comerciais, ainda há a necessidade de desenvolvimento de
métodos mais eficazes.
A piscicultura tem-se expandido com a produção de peixes ornamentais, produção
de pescado e reestocagem de pesca esportiva. Hoje em dia nos EUA, a produção
comercial de peixe-gato dos canais, truta, salmão, iscas e peixes ornamentais consiste
em uma indústria de pescado bastante rendosa; a criação de mariscos está se
desenvolvendo rapidamente. Embora tenha-se demonstrado muito interesse, dificulda-
des técnicas têm atrasado o desenvolvimento da criação de lagostas e camarões. Em
alguns países, a produção comercial de carpas e tilápias para alimentação continua a
ser importante. Nos países em desenvolvimento, que precisam de alimentos proteicos,
recursos aquáticos subutilizados têm sido rapidamente desenvolvidos para produção
comercial de pescado e criação de peixes ornamentais para exportação. O desenvol-
vimento técnico de todas as formas de aquacultura anteriormente citadas se faz
necessário para torná-las eficientes e economicamente competitivas com a pesca
comercial e a produção agrícola animal. Como nas outras formas de produção de
animais domésticos, as doenças em sistemas de aquacultura intensiva (ver pág. 1183)
são responsáveis por sérias perdas econômicas.
Ao mesmo tempo em que uma série de doenças infecciosas, parasíticas,
nutricionais, genéticas, tóxicas e neoplásicas é encontrada em animais aquáticos
criados, a relação destas doenças com o ambiente aquático e as práticas de
aquacultura requer um maior entendimento. Além dos sinais da doença, deve-se
dar muita ênfase às qualidades químicas e físicas do ambiente aquático, que
podem estar relacionadas à causa, duração e cura da doença: temperatura, pH,
salinidade, disponibilidade de oxigênio, pressão de gases e sólidos suspensos são
qualidades da água que afetam a saúde dos peixes e são facilmente avaliadas.
Estas qualidades da água quase sempre estão inter-relacionadas: por exemplo, um
aumento na temperatura da água diminui a sua capacidade de transportar oxigênio;
à medida que o pH aumenta, o amônio ionizado é convertido em amônia livre, que
é altamente tóxica. As intoxicações mais comuns nos animais aquáticos estão
Doenças dos Peixes 1193

relacionadas à hidrólise e à oxidação de resíduos nitrogenados, comida e produtos


de decomposição dentro do ambiente aquático, os quais resultam em altos níveis
de amônia, nitritos e nitratos.
As exigências das espécies são variadas, mas a qualidade da água pode ser
regulada controlando-se pH, temperatura, densidade populacional, conteúdo
salino e orgânico, proporção de água corrente ou diluída e filtração química e
biológica. Os salmonídeos requerem água com temperatura fresca e altos níveis
de oxigênio (8 a 12ppm); por outro lado, peixes ornamentais requerem água
morna e podem tolerar níveis de oxigênio mais baixos (4 a 6ppm). Altas
temperaturas da água e hipoxia são as causas mais comuns de mortalidade em
criações de peixes durante o verão.
A supersaturação gasosa na água de aquários e lagos pode levar à “doença das
bolhas de gás”, na qual o gás livre se acumula no olho, brânquia, vasos sangüíneos
e pele. O problema pode ser reconhecido facilmente pela observação de bolhas de
gás nos tecidos afetados. Pode ocorrer quando os peixes forem transportados de
água fria para morna, o gás for introduzido sob pressão no aquário por bombas
defeituosas ou quando houver vazamentos de ar na tubulação de água.
Embora os mesmos princípios de necropsia dos outros animais sejam emprega-
dos nos peixes, uma ênfase maior é depositada em uma história acurada, sinais ante
mortem, material fresco de necropsia e exame microscópico direto de esfregaços de
tecido fresco e preparações maceradas. Os peixes se decompõem rapidamente e
muitos microrganismos saprofíticos também se reproduzem rapidamente nos
tecidos em decomposição, o que complica o isolamento de patógenos a menos que
se coletem amostras imediatamente após a morte. Esfregaços frescos são impor-
tantes para a observação de patógenos vivos e móveis nos tecidos; eles são
facilmente vistos e quase sempre levam a um diagnóstico rápido. Muitos laborató-
rios estão equipados para ajudar no diagnóstico de doenças dos peixes, mas deve-
se solicitar uma autorização antes de se enviar o material.
As drogas são administradas em sistemas de aquacultura por vários métodos.
Os tratamentos em massa atualmente são os mais populares, e a mistura de drogas
na água é o método mais comumente praticado devido ao custo reduzido, mistura
uniforme dentro do sistema e facilidade de controle.
Os tratamentos de água são indicados nas infestações por parasitas externos na
pele e brânquias, nas quais a droga age diretamente no parasita. Os tratamentos de
água podem ser aplicados em aquários, tanques, canais e lagos de forma contínua,
intermitente ou única. Dentro dos aquários, tais tratamentos podem ser realizados
por mergulho ou banho, ou por meio de um fluxo contínuo da droga em um nível
constante.
Apesar de uma grande variedade de drogas e antibióticos não aprovados ser
empregada em animais aquáticos tanto vertebrados quanto invertebrados, a
“Environmental Protection Agency” (EPA) e a “Food and Drug Administration”
(FDA) dos EUA têm instituído ou estão considerando medidas regulatórias para
essas indústrias. Agentes terapêuticos, desinfetantes, esterilizantes, osmorregu-
latórios e anestésicos têm sido usados extensivamente para reduzir custos e
aumentar a produção. A preocupação com relação à segurança de drogas ou
produtos químicos tem sido intensificada nos peixes produzidos diretamente para
o consumo humano, tais como os salmonídeos e os peixes-gato. O uso de drogas
em peixes de pesca esportiva ou em incubadoras que produzem juvenis para
repor o número natural de peixes dessa modalidade de pesca, moluscos e
crustáceos também tem sido preocupante, já que recentemente podem vir sendo
consumidos pelo homem. Antes de usar qualquer droga, especialmente em
peixes comestíveis, as leis locais atuais devem ser conferidas, já que variam de
país para país, assim como de tempos em tempos.
Doenças dos Peixes 1194

No caso de infecções internas ou vacinações, as drogas ou vacinas podem ser


injetadas, a maioria quase sempre por via IP. Já que tais injeções parenterais
são estressantes, trabalhosas e caras, outros métodos têm sido empregados. As

TABELA 1 – Drogas para o Uso em Aquacultura


(ver nota de precaução anterior)
Limitações Período de
Droga Espécie Dosagem Indicações
de uso resguardo

Oxitetraciclina Salmonídeos 2,5 – Furunculose, 10 dias a 21 dias


3,75g/45kg septicemias 9°C (48°F)+
de peixe bacterianas
no alimento

Peixes-gato ver Septicemias 10 dias a 21 dias


anteriormente bacterianas 17°C (62°F)+

Lagostas 1g/0,45kg Gaffquemia 5 dias 30 dias


de alimento

Sulfamerazina Trutas 10g/45kg de Furunculose Não mais que 21 dias


Castanha peixe 14 dias
de Riacho diariamente
Arco-íris no alimento

Sulfadimetoxina Salmonídeos 50mg/kg Furunculose 5 dias 42 dias


+ ormetoprim de peixe
(proporção de diariamente
5:1) “Romet-30” no alimento

Peixes-gato ver Infecção por 5 dias 3 dias


anteriormente Edwardsiella
ictaluri

Solução de Salmonídeos Até 200ppm, Controle de Acima de 10°C Nenhum


formaldeído por até 1h protozoários e (50°F): até
(Formalina) trematódeos 170ppm em
monogenéticos tanques e
canais;
15 – 25ppm
em lagos;
pode ser
repetida em
5 – 10 dias

Peixes-gato ver ver Abaixo de 10°C Nenhum


anteriormente anteriormente (50°F): até
250ppm;
em lagos,
15 – 25ppm

Ovos Até 2.000ppm Controle de — Nenhum


Salmonídeos por até fungos
Esocídeos 15min

“Tricaína” Salmonídeos, 15 – 330mg/L Anestesia, Apenas em 21 dias


peixes-gato, sedação incubadoras e
outros peixes, laboratórios
anfíbios e
pecilotermos
Doenças dos Peixes 1195

infecções sistêmicas são mais comumente tratadas pela mistura de drogas na


ração. As vacinas são mais comumente administradas na água, em soluções
hiperosmóticas ou sob pressão.
Os efeitos das drogas nos sistemas de filtração dos aquários devem sempre ser
considerados antes do seu uso. Suas propriedades antibacterianas podem inibir ou
destruir as bactérias benéficas necessárias para filtração biológica (oxidação de
substâncias nitrogenadas) e assim deixar tais sistemas inoperantes, o que resulta
no acúmulo de amônia e nitrito e intoxicação dos peixes após terapia. Se possível,
os filtros devem ser removidos do aquário, ou transportados para outro aquário para
tratamento. Após o tratamento, o aquário deve ser lavado com jato forte ou o peixe
deve ser colocado em um aquário com filtros operacionais.

DOENÇAS BACTERIANAS
As epidemias de doenças bacterianas são comuns em grandes populações
de peixes ornamentais ou comestíveis. A predisposição a tais surtos freqüentemente
está associada à má qualidade da água, carga orgânica do ambiente aquático,
manejo e transporte de peixes, mudanças acentuadas de temperatura, hipoxia e
condições estressantes relacionadas. Altas concentrações de bactérias autóctones
da água são normalmente encontradas em lagos e aquários. Muitas dessas
bactérias aquáticas são patógenos facultativos oportunistas, sendo ativadas por um
ambiente adverso, um hospedeiro debilitado ou um patógeno primário. Por outro
lado, os patógenos bacterianos obrigatórios dos peixes requerem o peixe-hospedei-
ro para replicação e não são aptos a sobreviver sozinhos por muito tempo no
ambiente aquático.
A maioria dos patógenos bacterianos de peixes é de bacilos Gram-negativos
aeróbicos. Um diagnóstico pode ser realizado por meio do isolamento do microrganismo
em cultura pura a partir de tecidos infectados e identificação do agente bacteriano.
Uma das doenças bacterianas mais comuns associada a condições estressantes
do aquário, lago criatório ou água doce é a infecção por Aeromonas hydrophila
(liquefaciens, punctata). As Pseudomonas spp ( P. fluorescens e P. putida) também
constituem-se em patógenos facultativos de peixes de água doce, semelhantes à A.
hydrophila. Todas as espécies de peixes de água doce parecem suscetíveis.
Deficiências nutricionais, lesões traumáticas, parasitismos e variações sazonais de
temperatura acentuadas parecem ser predisponentes. A forma aguda é caracteri-
zada por sinais de infecção septicêmica com avermelhamento externo, enquanto
hemorragias são encontradas no peritônio, parede do corpo e vísceras. O controle
da doença é direcionado para a remoção das causas predisponentes. A oxitetraciclina
administrada na comida (providenciar 60 a 75mg/kg de peso corporal de peixe,
diariamente por 10 dias) é de grande ajuda. A droga deve ser interrompida 21 dias
antes do peixe comestível ser comercializado para consumo humano.
Aeromonas salmonicida é um bacilo Gram-negativo, imóvel, produtor de pigmen-
tos e originalmente descrito como a causa de uma doença septicêmica de salmonídeos
(furunculose) e peixes dourados (doença ulcerosa). Também é um patógeno sério
para muitos outros peixes marinhos e de água doce e pode produzir alta mortalidade.
Nas formas agudas, as hemorragias são encontradas nas nadadeiras, cauda,
músculos, brânquias e órgãos internos. Em formas mais crônicas, áreas focais de
inchaço, hemorragia e necrose tecidual desenvolvem-se nos músculos. Estas lesões
evoluem para abscessos crateriformes surgindo da superfície da pele (furúnculos).
Ocorre necrose de liquefação no baço e nos rins. O diagnóstico é feito pelo
isolamento do microrganismo em cultura pura de tecido infectado e identificação do
agente. Evitar é a prevenção mais eficiente, já que a A. salmonicida é um patógeno
Doenças dos Peixes 1196

obrigatório de peixes. Os peixes e as ovas devem ser obtidos de fontes livres de


doença. Os lotes infectados devem ser eliminados, assim como reservas de peixes
selvagens. Ovas “com olhos” devem ser tratadas por 10 a 15min em uma solução
contendo 100ppm de iodo em um pH de 7 e a uma temperatura de 10 a 15oC, embora
a droga não seja aprovada para uso em ovas de peixes comestíveis. As ovas devem
ser enxaguadas imediatamente após o tratamento. A sulfamerazina na dose de
200mg/kg de peixe por 14 dias é aprovada para o tratamento de salmonídeos. A
droga deve ser interrompida 21 dias antes do consumo humano.
A vibriose é uma doença sistêmica séria e comum de uma grande variedade de
peixes de aquário, de viveiros e selvagens (tanto marinhos quanto de estuário); ela
é menos comum em peixes de água doce. A Vibrio anguillarium e outras Vibrio spp
são as responsáveis pela doença, que produz manifestações sistêmicas, incluindo
hemorragias e ulcerações da pele, nadadeiras e cauda; também causa degenera-
ção e hemorragia de órgãos internos. O diagnóstico requer a identificação de
isolados puros de tecidos infectados. As medidas preventivas são direcionadas ao
impedimento da superpopulação e minimização do estresse. A vibriose de água
fria (doença de Hitra), um sério problema em cultivo marinho de samonídeos, é
caracterizada por mortalidade elevada, resistência à drogaterapia e mediação de
estresse. O agente etiológico é a V. salmonicida, uma espécie recentemente
descrita. Já que as Vibrio spp são comuns em ambientes marinhos, evitá-las torna-
se difícil. A vacinação preventiva com Vibrio morto em formalina é agora usada
comercialmente. A sulfamerazina na dose de 17g/100kg de peixe, por 10 dias, tem
controlado efetivamente a doença. A droga deve ser interrompida 21 dias antes da
comercialização dos peixes para o consumo humano.
A iersiniose (doença entérica da boca vermelha) é uma séria doença bacteriana,
aguda ou crônica, de salmonídeos criados intensivamente. O agente etiológico é a
Yersinia ruckeri. Os sinais incluem escurecimento e hemorragia da boca (boca
vermelha), pele, ânus e nadadeiras. Os sinais crônicos estão associados a
inapetência, exoftalmia, inchaço e degeneração de órgãos internos. O diagnóstico
é feito a partir do isolamento e da identificação de culturas puras do microrganismo
obtidas dos órgãos internos do peixe infectado.
A eliminação e o impedimento da introdução de peixes infectados podem ser
recomendadas, porém a vacinação preventiva é o procedimento normal em áreas
afetadas. A doença tem sido tratada com sucesso por meio de uma combinação de
sulfamerazina em 20g/100kg de peixe por dia durante 5 dias, seguida por oxitetraciclina
em 5g/100kg de peixe por dia durante 3 dias. As drogas devem ser interrompidas
21 dias antes da comercialização para consumo humano.
Edwardsiella tarda e E. ictaluri produzem alta mortalidade e perdas econômi-
cas sérias em criações de peixes-gato e enguias. Esta doença septicêmica entero-
bacteriana é caracterizada por sua incidência sazonal (verão), alterações
enfisematosas e putrefativas do tecido subcutâneo e necrose de liquefação (“abs-
cessos”) dos músculos. A prevenção está relacionada à eliminação de peixes
infectados, evitando-se sua introdução e eliminando-se fontes de contaminação
fecal de origem réptil ou humana. A doença pode ser controlada fornecendo-se
oxitetraciclina na dieta em 55mg/kg de peixe por dia durante 10 dias. A droga deve
ser interrompida 21 dias antes da comercialização para consumo humano.
A ordem Cytophogales (mixobactérias, bactérias do muco dos peixes) inclui um
importante grupo de patógenos oportunistas dos peixes que são habitantes comuns
do solo e da água. Os bacilos ou bactérias filamentosas ou em bastão Gram-
negativos apresentam um movimento de deslizamento distinto, pigmentação
carotenóide e formam massas em paliçada nos tecidos infectados dos peixes. As
lesões da pele ou das brânquias produzem exsudatos superficiais mucosos ou
semelhantes ao algodão, os quais geralmente recobrem a superfície necrótica,
Doenças dos Peixes 1197

ulcerações e hemorragias marginais. A Flexibacter columnaris é o membro do grupo


responsável pela doença colunar (doença da boca de algodão ou peixe-selado),
que ocorre mais comumente em água morna e espécies de peixes de água morna.
A doença pode ser evitada pelo abaixamento da temperatura da água, redução da
carga orgânica e prevenção de ferimentos traumáticos. A Cytophaga psychrophila,
responsável pela doença da água gelada (pedúnculo) e podridão das nadadeiras
e cauda, infecta mais comumente peixes de água fria, mas pode ser encontrada em
peixes de água morna sujeitos a temperaturas baixas. As lesões são comuns
especialmente na superfície posterior dorsal do peixe, abaixo da nadadeira dorsal,
mas também podem ser encontradas em qualquer parte do corpo. Casos avançados
mostram necrose e ulceração do pedúnculo. Ambas as infecções, por Flexibacter
e Cytophaga, podem ser controladas pela oxitetraciclina administrada no alimento
na dose de 60mg/kg de peixe, diariamente, por 10 dias. O alimento contendo o
medicamento deve ser interrompido, para peixes comestíveis, 21 dias antes da
comercialização para consumo humano.
A doença branquial bacteriana é um complexo de doenças mais freqüentemen-
te relatado em salmonídeos jovens criados e peixes de aquário. Pode ser iniciada
pela lotação e má qualidade da água, incluindo carga orgânica, altos níveis de amônia
e sedimentos. Bactérias oportunistas como Flexibacter, Aeromonas e Pseudomonas
spp podem seguir-se como invasores secundários do tecido branquial traumatizado.
Sinais da doença são relacionados a alterações respiratórias devido à função não
pareada das brânquias. As brânquias parecem inchadas e manchadas com áreas
irregulares de crescimento bacteriano, que podem ser confirmadas ao exame
microscópico de esfregaços diretos das brânquias. Pode-se observar hiperplasia,
aderências e deformidades das lamelas branquiais. Os alevinos afetados pela
doença estão sujeitos a alta mortalidade e morbidade estável. A prevenção é
direcionada para a melhora da qualidade da água e para o impedimento da
superlotação. Drogas antibacterianas são úteis para infecções secundárias.
A doença renal bacteriana (doença renal por Corynebacterium) é uma doença
economicamente importante de salmonídeos em cativeiro. Também tem sido relata-
da em outras espécies de peixes, incluindo peixes selvagens, de viveiros e aquários.
Um bacilo pequeno Gram-positivo, a Renibacterium salmoninarum, é o agente
etiológico. Os peixes infectados permanecem portadores, e o patógeno obrigatório
pode ser transmitido congenitamente. Os sinais característicos da doença incluem
granulomas cinzentos aglomerados ou localizados nas vísceras (sobretudo no rim ou
na parede do corpo) exoftalmia, cegueira, e emaciação. O diagnóstico da doença
requer o isolamento e a identificação da bactéria. Por causa do estado de portador
crônico, não se recomenda quimioterapia. A obtenção de lotes livres da doença e a
prevenção de contaminação por lotes selvagens infectados constituem as melhores
medidas preventivas. As propriedades infectadas devem ser inativadas.
A tuberculose dos peixes (micobacteriose) é uma doença granulomatosa
sistêmica, aguda ou crônica que ocorre principalmente em peixes de aquário e
menos comumente em peixes de viveiro. As bactérias causadoras podem ser
qualquer uma das espécies de Mycobacterium , inclusive M. piscium, M. platypoecilus
e M. fortuitum. São bactérias imóveis, ácido-resistentes e Gram-positivas que são
difíceis de ser cultivadas. Os sinais são variáveis, quase sempre lembrando os de
outras doenças; eles incluem emaciação, ascite, ulcerações e hemorragias da pele,
exoftalmia, palidez e deformidades do esqueleto. Na necropsia, lesões grosseiras
das vísceras, consistem de focos necróticos (tubérculos) e branco-acinzentados
que algumas vezes coalescem para a formação de massas tumorais. O diagnóstico
pode ser feito por isolamento e identificação das bactérias. Já que a doença pode
produzir lesões de pele e dermatite alérgica no homem, e que o tratamento não
elimina a doença, os peixes infectados devem ser destruídos. Um aquário deve ser
Doenças dos Peixes 1198

desinfetado antes que outros peixes sejam introduzidos. Os peixes infectados ou


produtos para peixe contaminados não devem ser introduzidos no aquário.
Uma grande variedade de outras doenças bacterianas menos comumente
reconhecidas tem sido descrita em peixes. Elas incluem pasteurelose, estreptococose,
infecção por Haemophilus piscium (doença ulcerosa), flavobacteriose, infecção por
Eubacterium (meningite dos peixes) e outras. O diagnóstico destas doenças requer
isolamento e identificação do agente bacteriano específico.

DOENÇAS MICÓTICAS
As doenças fúngicas aquáticas são quase sempre consideradas invasoras de
tecido secundárias que acompanham agressões ambientais como ferimentos
traumáticos, má qualidade da água e outros agentes infecciosos. Uma vez que os
fungos tenham invadido tecidos dos peixes com sucesso, eles continuam a crescer,
produzem lesões que aumentam gradualmente e podem levar à morte. Já que
muitos fungos crescem em matéria orgânica em decomposição, eles são muito
comuns no ambiente aquático. As massas de ovas, que geralmente contêm restos
de tecido e outras ovas ou embriões mortos, são especialmente vulneráveis.
Iodóforos de várias concentrações de iodo são usados para evitar infecções
micóticas em ovas de peixes não comestíveis, que podem ser desinfetadas pelo uso
de banho de iodo (100ppm) por 10 a 15min. Esta solução é tóxica para peixes recém-
incubados, e apenas os ovos devem ser tratados. O formaldeído, até 2.000ppm por
15min, pode ser usado para tratar ovas de peixes comestíveis (salmonídeos e
esocídeos) no controle de fungos.
As infecções por Saprolegnia estão entre as infecções fúngicas mais comuns
dos peixes e ovas. Os sinais macroscópicos incluem vegetações branco-acinzentadas,
semelhantes a algodão, que surgem na pele, brânquias, olhos ou nadadeiras,
podendo invadir tecidos mais profundos do corpo. Microscopicamente, a saprolegníase
pode ser reconhecida por esfregaços diretos a partir de tecidos infectados, nos quais
se observam hifas não septadas e micélios. O estágio sexual do fungo pode ser
observado apenas em culturas do microrganismo, sendo necessário para a identifi-
cação específica. A prevenção da doença é dirigida à remoção das causas predis-
ponentes – peixes mortos infectados e material orgânico em putrefação.
O verde-malaquita sem zinco é empregado em banhos, em concentrações de 0,1
a 5,0ppm da água do aquário (≤ 1h), que são relatados como eficientes. Não é
aprovado para o uso em peixes comestíveis, e peixes normais não devem ser
expostos à droga. Os peixes doentes devem ser tratados separadamente em um
ambiente protegido sem a pressão competitiva de peixes normais.
O ictiófono é uma infecção fúngica comum em peixes selvagens e peixes idosos
de aquário ou de viveiros. A doença geralmente é crônica e progressiva. Com
freqüência é detectada na necropsia quando os estágios císticos esféricos caracte-
rísticos são observados microscopicamente nos esfregaços de lesões granulomato-
sas do coração, fígado, baço, rins, pele e músculos. A prevenção é dirigida a remoção
dos peixes infectados e à recusa de rações que contenham o microrganismo.
A branquiomicose é uma doença fúngica do tecido branquial caracterizada por
distúrbios respiratórios e necrose das brânquias. Os agentes causais são
Branchiomyces sanguines e B. demigrams, os quais são patógenos oportunistas
encontrados em material orgânico em decomposição no ambiente aquático. Um
diagnóstico pode ser feito a partir de esfregaços diretos ou cortes histológicos
corados de tecido branquial afetado. A doença é da maior importância em criações
de peixes comestíveis europeus, nos quais uma intensa mortalidade é presenciada.
O verde-malaquita sem zinco tem sido empregado para o tratamento como indicado
anteriormente, mas não é aprovado para peixes comestíveis nos EUA.
Doenças dos Peixes 1199

Muitas outras infecções micóticas menos comuns têm sido relatadas em peixes
(Achlya, Aphanomyces, Dermocystidium, Ichtyosporidium, Basidiobolus, Phoma,
Candida, Cladosporium, Fusarium, Penicillium, Ichthyochytrium spp e outras).
Muitos destes microrganismos têm status questionável como fungos e necessitam
de cultura laboratorial e todo o seu ciclo de vida para um diagnóstico acurado.

DOENÇAS PARASÍTICAS
Todos os principais grupos de parasitas dos animais são encontrados nos peixes,
e peixes selvagens aparentemente saudáveis quase sempre carregam em si uma
carga parasítica pesada. Os parasitas com ciclos de vida diretos são patógenos
importantes em peixes comestíveis e ornamentais; os parasitas com ciclos de vida
indiretos freqüentemente usam peixes como hospedeiros intermediários. O conhe-
cimento de peixes hospedeiros específicos facilita, em muito, a identificação de
parasitas com grande especificidade por hospedeiro e tecido, enquanto outros são
reconhecidos devido a sua ocorrência comum e ausência de especificidade pelo
hospedeiro. O conhecimento das principais características morfológicas dos grupos
mais importantes de parasitas ajuda muito no diagnóstico e no tratamento do
parasitismo. O exame de esfregaços frescos diretos que contêm parasitas vivos
quase sempre corresponde ao diagnóstico.

PROTOZOÁRIOS PARASITAS DA PELE E BRÂNQUIAS


Ciliados
Uma das infecções fatais mais comuns da pele e das brânquias dos peixes é
o “ich” ou “doença dos pontos brancos” causada por Ichthyophthirius multifiliis.
Este protozoário ciliado e redondo é facilmente reconhecido devido a seu grande
tamanho (50µm a 1mm), macronúcleo em forma de ferradura e movimento de
rotação constante. Os estágios jovens penetram na camada do muco, em direção
à epiderme e às brânquias, e alimentam-se de células epiteliais e sangüíneas
extraídas dos capilares superficiais. Após alcançar a maturidade, o microrganis-
mo deixa o hospedeiro e vai para o fundo do aquário ou lago, onde se transforma
em uma estrutura cística, produzindo 500 a 1.200 pequenos estágios potencial-
mente infectantes (tomitos). Mortalidade súbita pode ser a primeira evidência da
doença. Em infecções mais crônicas, a resistência à infecção é evidenciada por
inflamação da pele e desenvolvimento de granulomas localizados, os quais
aumentam em tamanho e encapsulam o parasita. Os microrganismos encistados
podem ser vistos como manchas brancas na superfície da pele do peixe. Se as
brânquias estiverem envolvidas, distúrbios respiratórios poderão acontecer. A
doença pode ser evitada pela retirada de material infectado (peixes portadores;
água, plantas e ornamentos contaminados). Se os peixes forem tolerantes a
temperaturas mais altas, o melhor tratamento consiste em aumentar a tempera-
tura da água para 30 oC. O aumento da aeração ajuda a proteger os peixes durante
a elevação da temperatura da água. Embora nenhuma droga possa penetrar
seguramente na pele e matar o parasita encistado, algumas drogas comumente
empregadas matam o microrganismo na água. Apenas a formalina foi aprovada
pela FDA para o tratamento de ictioftiríase em peixes comestíveis. O tratamento
deve seguir os procedimentos recomendados e o período de resguardo antes da
comercialização do peixe. Algumas drogas não aprovadas comumente emprega-
das que matam o microrganismo na água incluem: hipocloreto de quinino, 10ppm;
cloreto de sódio, 30.000ppm; e nifurpirinol, 0,05 a 0,2ppm. Atualmente, estuda-
se uma vacina para o “ich”. Os estágios infectantes têm vida curta, tanto que um
Doenças dos Peixes 1200

aquário sem peixes por ≥ 3 dias está seguro. A forma marinha de “ich” é causada
por um ciliado semelhante, Cryptocaryon irritans.
Chilodonella e Brooklynella spp são patógenos de peixes de água doce e marinhos,
respectivamente. A quilodonelíase é comum especialmente em peixes ciprinídeos
(peixes dourados, barbos e espécies relacionadas) e peixes ciprinodontídeos (caudas
de lira, “guppies”, espadas, “platys” e muitas outras espécies comuns de aquário).
Embora a doença seja encontrada virtualmente em todas as espécies de peixes
ornamentais de água doce, as epidemias são mais freqüentemente observadas em
aquários e viveiros lotados. A forma aguda afeta primeiramente as brânquias e é
caracterizada por morte repentina sem nenhum sinal prodrômico. Em formas mais
crônicas pode haver sinais respiratórios, palidez, fraqueza e movimentos de nado
descoordenados. As formas crônicas também são caracterizadas por mudanças de
pele irregulares ou generalizadas, com produção de muco aumentada. Pode ser
diagnosticada rapidamente por meio da demonstração do agente causal em esfrega-
ços frescos diretos de pele descolada ou brânquias. Chilodonella spp (50 a 70µm)
podem ser identificadas por sua motilidade ciliar característica, forma de coração
achatado e suas organelas distintivas (citóstoma em forma de cesto, listrado e protrátil
e fileiras de cílios).
Os peixes infectados devem ser isolados já que permanecem como portadores.
O microrganismo pode ser eliminado do aquário, esvaziando-se o tanque e
permitindo-se que seque completamente. A redução da densidade do grupo de
peixes e o aumento do fluxo de água podem ajudar na prevenção e controle.
A formalina (ver TABELA 1, pág. 1194) é a única droga aprovada para tratamento
de quilodonelíase em peixes comestíveis e incubadoras. Uma droga comumente
usada em peixes ornamentais, porém não aprovada, é a acriflavina a 10ppm na água
por 10h (alguns estabelecimentos comerciais não aprovam seu uso porque ela cora
a água, aquário e objetos dentro do tanque). O sal (NaCl) pode ser usado a
2.000ppm em aquários de água doce por um período indefinido.
Os triconídeos são ciliados peritríquios que incluem vários patógenos de peixes
(Trichodina, Trichodinella, Tripartiella, Vauchomia spp e outras). Estes microrganis-
mos têm de 40 a 100µm de comprimento. Seus corpos podem ser cilíndricos,
hemisféricos ou discóides. Os membros deste grupo são caracterizados por um
disco de atracamento com uma coroa córnea de dentículos na superfície adoral da
ventosa. O patógeno tricodinídeo mais comum em peixes marinhos ou de água doce
é a Trichodina sp. Microscopicamente, possui forma de sino e pode ser observada
nadando livremente em esfregaços diretos de pele e brânquias. Quando fixado aos
tecidos, o Trichodina torna-se achatado à medida que a ventosa adoral comprime
o microrganismo contra a superfície da pele. Se presente em grande número nas
brânquias, pode produzir problemas respiratórios e morte por limitação de superfí-
cies respiratórias, sobretudo com baixa pressão de oxigênio no ambiente aquático.
Aumentando-se a taxa de fluxo de água e a pressão de oxigênio, tende-se a superar
a anoxia. A formalina, a 200ppm na água por 1h, foi aprovada pela FDA para o
tratamento de infestações por tricodinídeos em peixes comestíveis (salmonídeos,
peixes-gato e percas de brânquias azuis). Já que muitos peixes ornamentais são
mais sensíveis à droga, recomendam-se banhos de 1 parte de formalina por 4.000
partes de água por 1h.
A Tetrahymena corlissi é um patógeno protozoário importante, periforme, e
com 10 a 20µm de comprimento, que parasita peixes ornamentais e de lagos. Possui
fileiras longitudinais de cílios e citóstomas insignificantes. Embora o microrganismo
possa ser encontrado em esfregaços diretos da superfície da pele do peixe afetado,
ele é capaz de invadir e reproduzir-se em tecidos musculares profundos e vísceras.
Os surtos da doença estão associados à superpopulação de resíduos nitrogenados
em excesso. Os sinais da doença correspondem ao desenvolvimento progressivo
Doenças dos Peixes 1201

de áreas de despigmentação e hemorragia na superfície do corpo associados ao


aumento de mortalidade. Nenhum tratamento tem sido relatado. A prevenção e o
controle devem estar relacionados à redução da densidade populacional do conteú-
do orgânico da água.

Flagelados
Os dinoflagelados parasíticos, Oodinium e Amylodinium spp, são responsáveis
pelo “veludo, ferrugem, pó de ouro, ou doença do coral” em peixes ornamentais
de água doce ou marinhos, menos comumente em peixes de lagos. Os estágios
patogênicos do microrganismo são algas pigmentadas, fotossintéticas, não flageladas
e imóveis que invadem e se prendem à pele e às brânquias durante toda a sua
existência parasítica. Quando maduros, estes parasitas desenvolvem cistos que
contêm numerosos estágios flagelados, livre-nadantes e pequenos que são capa-
zes de iniciar novas infecções. Se os estágios parasíticos são abundantes nos
tecidos da pele e brânquias, eles podem ser grosseiramente detectados devido à
pigmentação alterada da pele; daí seus nomes populares. A infecção das brânquias
é muito mais séria que a da pele. O progresso da doença pode ser atrasado pelo
abaixamento da temperatura, redução da iluminação e diminuição da carga orgâni-
ca do aquário. Os tratamentos com drogas estão limitados aos peixes ornamentais
(não aprovados para peixes comestíveis), e incluem sulfato de cobre na dose de 0,5
a 1,0ppm na água de aquário. O cobre é extremamente tóxico e as taxas de
solubilidade podem variar em ambientes específicos. Os peixes tratados devem ser
observados cuidadosamente à procura de sinais de intoxicação e o tratamento deve
ser interrompido se estes aparecerem. Ao contrário, o tratamento com azul de
metileno, 5ppm em água de aquário, é relativamente seguro, até para alevinos.
As Ichthyobodo (Costia) spp são alguns dos menores parasitas protozoários
flagelados (, 15 × 5µm) da pele e brânquias. São microrganismos achatados e
periformes com dois flagelos de tamanhos diferentes. Os microrganismos movem-
se num padrão espiral convulsivo e podem ser identificados facilmente no esfregaço
direto da pele ou brânquia doente. A pele afetada quase sempre apresenta uma
descoloração cinza-férrea. Os sinais agudos da costíase são caracterizados por
hipoxia, com o peixe indo rápida e freqüentemente à superfície. Nos casos crônicos,
os peixes parecem fracos e magros e não se alimentam. A doença afeta peixes de
aquário, lacustres e marinhos. O controle da doença pode ser obtido pelo aumento
da taxa de fluxo e oxigenação da água. Um dos tratamentos mais comuns para
peixes de aquário consiste em mergulhos em 500 a 2.000ppm de ácido acético
glacial por 30 a 60s.

PROTOZOÁRIOS PARASITAS I NTERNOS


Hexamita, Octomitus e Spironucleus spp são parasitas protozoários flagelados
(com 4 pares de flagelos) comuns, bilateralmente simétricos e pequenos (,9 × 4µm).
Esses microrganismos são semelhantes, mas diferem levemente na posição e
forma de seus núcleos (2 por microrganismo). Podem ser encontrados em grande
número no trato intestinal, lesões da pele ou tecidos moles degenerados dos peixes,
porém a sua patogenicidade é variável. Alguns são habitantes normais das cavida-
des internas dos peixes; outros são mais freqüentemente associados a doenças
debilitantes em alevinos e lesões ulcerativas crônicas da pele (“buraco na cabeça”)
dos peixes de aquário mais velhos. Os peixes infectados permanecem como
portadores, assim como a própria água na qual são mantidos permanece contami-
nada. O metronidazol a 10.000ppm por 5 dias no alimento, ou o 2-amino-5-nitrotiazol
a 2.000ppm no alimento por 3 dias são recomendados para o tratamento de peixes
de aquário, mas não são aprovados para peixes comestíveis.
Doenças dos Peixes 1202

Cryptobia e Trypanosoma spp são protozoários biflagelados, alongados,


delgados e ativamente móveis, com 6 a 20µm de comprimento e facilmente
detectados no sangue fresco e esfregaços de tecidos de peixes marinhos e de
água doce. O Trypanosoma tem uma membrana ondulatória bem-desenvolvida,
enquanto o Cryptobia não tem. Enquanto as formas sangüíneas são considera-
das patogênicas, as formas encontradas no trato intestinal não são. Os sinais de
doença geralmente são inaparentes, embora inapetência, emaciação e distúrbios
circulatórios sejam relatados. A doença pode ser evitada pela remoção de
infestações por sanguessugas em peixes.

Esporozoários
A coccidiose, embora comum em peixes de água doce ou marinhos, raramente
é diagnosticada no peixe vivo. Muitas espécies de peixes são afetadas. Os ciclos
vitais de muitos peixes coccídios são desconhecidos, e alguns envolvem > 1
hospedeiro para completar seu desenvolvimento. Junto com a infecção intestinal, os
órgãos internos também são comumente afetados; oocistos esporulados semelhan-
tes aos de Eimeria e estágios sexuais e assexuais são freqüentemente encontrados
em esfregaços diretos e cortes histológicos dos órgãos internos. A sulfametazina,
na dose de 22 a 24g/100kg de peso de peixe/dia na alimentação por 50 dias a 10°C,
é usada para tratar peixes comestíveis em alguns países (com um período de
resguardo de 21 dias). Para os peixes de aquário, é profilático o uso de 10ppm na
água do aquário uma vez por semana por 2 a 3 semanas.
Os mixosporídeos são parasitas comuns de peixes. Os esporos mixospori-
dianos consistem de 2 válvulas, 1 linha de sutura e de 1 a 4 cápsulas polares
contendo filamentos extensíveis e enrolados e um corpo central infectante
chamado esporoplasma. Algumas evidências sugerem que estes microrganis-
mos tenham ciclos de vida indiretos, utilizando outros microrganismos aquáticos
como anelídeos, para hospedeiros intermediários. Daí, as infecções mixospori-
dianas serem mais comuns e mais patogênicas para peixes selvagens ou peixes
criados em lagos ao ar livre. Os microrganismos tendem a ser específicos para
hospedeiros e tecidos. De acordo com isso, a expressão da doença está
relacionada ao patógeno e ao hospedeiro específicos. A Myxosoma cerebralis,
um patógeno importante de alevinos de salmonídeos, produz deformidades do
esqueleto por infecção das estruturas cartilaginosas. Sinais nervosos e pigmen-
tação anormal acompanham as alterações do esqueleto. Os peixes recuperados
permanecem como portadores e peixes adultos não mostram sinais de doença.
A doença pode ser evitada pela aquisição de um lote não infectado e pela sua
manutenção em um ambiente livre de hospedeiros intermediários. O Ceratomyxa
infecta a musculatura e as vísceras dos salmonídeos.
Muitas espécies de mixosporídeos produzem lesões císticas ou nodulares na
pele, brânquias, músculos ou vísceras dos peixes, dependendo de suas preferên-
cias por tecido ou hospedeiro. O Henneguya é encontrado comumente em lesões
císticas e brancas da pele de peixes-gato dos canais em criações e peixes
ornamentais; é facilmente identificado pelo apêndice “em forma de forquilha” do
esporo observado microscopicamente. Se os lagos forem bem secos e caiados,
a infecção poderá ser eliminada, aparentemente pela redução dos hospedeiros
intermediários. A infecção no aquário pode ser autolimitante na ausência de
hospedeiros intermediários.
A hidropisia renal do peixe dourado é uma infecção mixosporidiana (Sphaerospora
auratus) específica de peixes dourados criados em lagos, caracterizada por degene-
ração renal e ascite. O diagnóstico geralmente é feito pela identificação de esporos
em cortes histológicos do rim. Peixes dourados, criados em lagos e recém-adquiri-
dos, quando colocados em aquário podem mostrar sinais de doença com mortalida-
Doenças dos Peixes 1203

de. Nenhum tratamento prático está disponível. O complexo de hidropisia da carpa


é uma doença de carpas e peixes dourados caracterizada por hidropisia e exoftalmia.
Está associada à infecção por Sphaerospora angulata e pode ser complicada por
infecções virais, como a viremia de primavera da carpa ou a doença da bexiga
natatória da carpa ou ainda septicemias bacterianas. A mortalidade pode ser aguda
ou ocorrer dentro de um período de 6 meses. A resposta ao tratamento com drogas
é geralmente pequena.
Os microsporídeos são microrganismos intracelulares pequeninos e esporulados,
com filamentos polares únicos, que se constituem em parasitas comuns dos peixes,
específicos para hospedeiro e tecido. Também são capazes de infectar helmintos
parasitas de peixes. Os esporos são extremamente resistentes. As carpas doura-
das jovens (peixes-isca) são freqüentemente afetadas pelo Pleistophora, que é
transmitido congenitamente. A infecção por Pleistophora e Nosema spp também é
comum em certas espécies de peixes ornamentais, por exemplo, “doença do
tetraneon”. Os peixes afetados parecem pálidos. Os esporos são facilmente
detectados ao microscópio em esfregaços diretos de órgãos afetados, como
massas de corpos redondos ou ovais, pequeninos, densos e opacos, que se
rompem a partir de células hospedeiras afetadas. Nenhum tratamento de sucesso
é conhecido. Os peixes afetados devem ser removidos, e lotes saudáveis devem
ser colocados em ambientes não infectados.
A nefropatia proliferativa (NP) afeta peixes salmonídeos; as lesões renais são
atribuídas a um agente mixosporídeo não classificado. A NP é caracterizada pela
proliferação dos tecidos fibroso e hematopoiético renais. Nenhum tratamento tem
sido descrito. Evitar é a melhor medida preventiva, embora as perdas possam ser
minimizadas diminuindo-se as perturbações e melhorando-se a criação. Os lotes
infectados em áreas não endêmicas devem ser eliminados, as instalações devem
ser sanitizadas e um lote livre da doença deve ser obtido para substituição.

HELMINTÍASE
Os helmintos parasitas são comuns tanto em peixes selvagens quanto em viveiros.
Os peixes servem freqüentemente como hospedeiros intermediários ou paratênicos
para larvas de parasitas de muitos animais, inclusive o homem. Os helmintos parasitas,
com ciclos de vida diretos, são muito importantes para grandes populações, e grandes
cargas parasíticas são comuns em peixes de aquário ou viveiros.
Os trematódeos monogenéticos, que têm ciclos de vida diretos, são parasitas
obrigatórios e comuns, altamente patogênicos, da pele e brânquias dos peixes.
Possuem , 0,1 a 0,8mm de comprimento e são melhor vistos pelo microscópio.
Estes vermes podem ser identificados pelo órgão em gancho característico chama-
do haptor, que é armado com ganchos grandes e pequenos. Peixes de aquário ou
viveiros são suscetíveis a rápidas infestações de parasitas por infecção contínua e
por transferência do verme a outros peixes do tanque ou lago. Embora muitas
espécies tenham hospedeiros específicos, os tipos mais comuns observados em
aquários são menos seletivos. Os dois gêneros mais comuns são Gyrodactylus e
Dactylogyrus: o primeiro dá à luz formas jovens vivas, que podem ser vistas dentro
do corpo do verme adulto e freqüentemente são parasitas da pele; o segundo põe
ovos e é um parasita principalmente das brânquias. Os peixes infectados mostram
hiperatividade e nado errático, quase sempre irrompendo sobre a superfície da água
ou esfregando os lados do corpo contra um objeto no aquário a fim de desalojar os
vermes. Os peixes tornam-se pálidos conforme perdem a cor. Respiram rapidamen-
te e distendem a superfície das brânquias, mostrando brânquias pálidas e inchadas.
Aparecem lesões localizadas da pele com hemorragias e ulcerações espalhadas.
A mortalidade pode ser alta. Para evitar a doença, deve-se impedir a introdução de
Doenças dos Peixes 1204

peixes infectados. O tratamento deve começar cedo para se ter sucesso. O


formaldeído, até 200ppm em água por 1h, é a única droga aprovada para uso em
peixes comestíveis. Também pode ser usado em aquário; entretanto, as doses
devem ser reduzidas a 25ppm em virtude da maior sensibilidade de algumas
espécies. Os organosfosfatos (por exemplo, triclorfon a 0,25ppm) na água do aquário
por 1 semana têm sido empregados para peixes de aquário, mas não são aprovados
pela FDA. Infecções marinhas (Benedinia e Microcotyle) podem ser controladas por
meio da imersão dos peixes infectados em água doce por 1 a 5min, dependendo da
tolerância do peixe de aquário.
Os trematódeos digenéticos têm ciclos de vida complicados, com vários
estágios larvais que infectam um ou mais hospedeiros. Com raras exceções, o
primeiro hospedeiro intermediário é um molusco, sem o qual o ciclo de vida
geralmente não pode ser completado. Um diagnóstico normalmente pode ser
estabelecido por exames microscópicos ou a olho nu, que mostram cercárias,
metacercárias ou vermes adultos em quaisquer dos tecidos ou cavidades do corpo
dos peixes. Os peixes tendem a encistar os parasitas, formando encapsulamentos
de tecido pigmentado ao redor do trematódeo. Dependendo da cor dos cistos na pele,
a afecção é chamada de doença das manchas negras, brancas ou amarelas. Os
peixes excessivamente parasitados quase sempre são fracos, magros, inativos e
pouco se alimentam. Não se recomenda tratamento.
Os vermes chatos, tanto nas formas adultas quanto nas larvais, são comuns nos
peixes. As formas larvais encistam-se em vísceras e músculos, enquanto os adultos
geralmente são encontrados no trato intestinal. Os crustáceos aquáticos são os
hospedeiros intermediários mais comuns no caso dos peixes; assim sendo, peixes
selvagens ou de viveiros podem ser severamente infectados. A Diphyllobothrium
latum, que causa infecção em seres humanos, é adquirida quando se ingerem larvas
encistadas na carne de peixes comestíveis. Os peixes de aquário podem ser
adquiridos já com pesadas infecções por cestóideos, porém correm risco limitado
quando no aquário, a menos que ingiram hospedeiros intermediários infectados. Não
há nenhum tratamento eficiente e seguro para infecções por larvas de vermes chatos.
Os peixes parasitados por vermes chatos adultos podem ser tratados pela ingestão
de óxido de estanho di-n-butil na dose de 250g/kg de peixe por 3 dias; no entanto, este
não é aprovado para uso em peixes comestíveis.
Os acantocéfalos (parasitas com espículas na cabeça) são comuns em
peixes selvagens, tanto como estágios larvais teciduais, quanto como parasitas
intestinais em adultos. São mais comuns em salmonídeos e peixes marinhos. Os
artrópodes são os primeiros hospedeiros intermediários. Os acantocéfalos adul-
tos são facilmente reconhecidos pela sua probóscide protrátil, armada com
muitos ganchos voltados para trás.
Os nematóideos são comuns em peixes selvagens que estejam expostos a
hospedeiros intermediários. Os peixes podem ser hospedeiros definitivos para
nematóideos adultos ou agir como hospedeiros intermediários ou paratênicos para
larvas de nematóideos (anisaquídeos, eustrongilídeos e outros) que infectam
predadores vertebrados mais evoluídos, incluindo o homem. Nematóideos encistados
ou livres podem ser encontrados em quase qualquer tecido ou cavidade corporal dos
peixes. Alguns são visíveis a olho nu no nível do tecido subcutâneo, nas superfícies
do corpo, cabeça, cauda ou nadadeiras como vermes encolhidos ou estendidos que
contrastam com os tecidos circundantes devido a sua forma, cor e movimentos. Os
peixes de aquário e viveiros podem ser intensamente infectados se os hospedeiros
intermediários crustáceos estiverem presentes. Cyclops e Daphnia spp são hospe-
deiros intermediários muito comuns para Philometra sp, um nematóideo patogênico
para “guppies” e outros peixes de aquário. Estes vermes vermelho-sangue podem
ser vistos na cavidade abdominal inchada e saindo pelo ânus do peixe afetado
Doenças dos Peixes 1205

(doença do verme vermelho). As Capillaria spp são comumente encontradas em


peixes de aquário, e infecções pesadas podem ser nocivas.
Além do fato de serem parasitas sugadores de sangue, as sanguessugas
podem transmitir parasitas sangüíneos de peixes (por exemplo, Trypanosoma,
Cryptobia e hemogregarinas); produzindo uma anemia debilitante por perda
crônica de sangue e enfermidade. As infestações por sanguessugas são mais
comuns em peixes selvagens, mas infestações em aquários ou lagos podem
ocorrer a partir de introdução de peixes infestados, plantas, etc. O triclorfon (0,5
a 1,0ppm na água de aquário) é um tratamento eficiente, mas não é aprovado
para uso em peixes comestíveis. Os métodos de prevenção incluem vigilância
contra sanguessungas e remoção de peixes infestados.

COPÉPODES
Alguns copépodes, durante estágios específicos de seu complicado ciclo de vida,
são parasitas obrigatórios de peixes. Eles perdem a sua forma de copépode,
inclusive seus apêndices, e tornam-se estruturas em forma de saco ou bastão
especificamente adaptadas para perfurar, prender, alimentar e reproduzir. Grossei-
ramente, eles parecem apêndices semelhantes a farpas ligados à pele ou às
brânquias, nas quais se alimentam de sangue e fluidos teciduais. São capazes de
causar hemorragia, anemia e destruição de tecidos, assim como prover uma porta
de entrada para outros patógenos. Muitas espécies diferentes destes parasitas
podem ser encontradas nos peixes marinhos e de água doce. Os vermes-âncora
(Lernea spp) são normalmente encontrados em uma larga variedade de peixes de
aquário e lagos, incluindo peixes dourados e outros ciprinídeos. As Ergasilus spp
são parasitas comuns das brânquias. Os piolhos dos peixes ( Branchiura) são
próximos aos copépodes parasitas e seus corpos são achatados e adaptados para
movimentos rápidos sobre a superfície da pele. Por meio de ganchos e ventosas,
eles periodicamente se atracam à pele para alimentar-se por inserção da parte
perfurante da boca (estilete) na pele. As Argulus spp são piolhos de peixe comumen-
te encontrados em peixes selvagens, de aquário ou de lagos.
O triclorfon na proporção de 0,25ppm na água do aquário é a droga de escolha
para o tratamento de peixes infestados, mas não é aprovado para o uso em peixes
comestíveis. Peixes infestados não devem ser introduzidos.

DOENÇAS VIRAIS
A virologia dos peixes é uma ciência relativamente recente. As doenças virais de
peixes cultivados economicamente importantes têm recebido a atenção maior.
Enquanto os vírus de animais homeotérmicos mais evoluídos são cultivados em
temperaturas uniformes, os vírus dos peixes têm uma tolerância maior, porém
específica, a temperaturas mais baixas em culturas de células de peixe. Devido à
faixa relativamente definida de temperatura, a variação desta pode proporcionar um
controle, embora quase sempre ela induza meramente uma latência. Em virtude de
muitas doenças virais dos peixes serem geograficamente limitadas, agências
reguladoras e fazendas criatórias de peixes, em áreas livres das doenças, reconhe-
cem-nas como exóticas e exigem garantias dos lotes introduzidos. Muitas doenças
virais produzem alta mortalidade em alevinos e pequena ou nenhuma perda em
adultos, os quais podem se tornar portadores. Por estas razões, a prática de evitar
portadores e a certificação de reposição e lotes SPF são freqüentemente exigidas.
Testes laboratoriais específicos estão disponíveis. As vacinas ainda não estão
comercialmente disponíveis e as drogas não são eficientes. As drogas e os
antibióticos são empregados para o controle de infecções bacterianas secundárias
que, com freqüência, acompanham doenças virais.
Doenças dos Peixes 1206

A doença viral do peixe-gato dos canais é uma infecção aguda por um


herpesvírus virulento, que atinge alevinos e peixinhos, e que quase sempre causa
mortalidade > 80% na água em temperaturas ≥ 25 oC. Existem indícios de transmis-
são vertical. As vítimas demonstram ascite, exoftalmia e hemorragias nas nadadei-
ras. Originalmente conhecido apenas no sul dos EUA, o vírus espalhou-se para o oeste
(até a Califórnia) e para o sul (até a América Central). É isolado facilmente de culturas
celulares dos membros da família dos peixes-gato de água doce. Produz sincícios e
inclusões intranucleares. A soroneutralização é usada para a identificação.
O herpesvírus dos salmonídeos é uma infecção viscerotrópica que atinge a
truta arco-íris e o salmão “kokanee” jovens nos EUA. Requer temperaturas ≤ 10oC
para se desenvolver, e a morte ocorre , 1 mês após a infecção. O vírus produz
anemia, exoftalmia e ascite; a mortalidade é ≥ 50%. É isolado facilmente em culturas
de células de salmonídeos e produz sincícios e inclusões intranucleares. A identifi-
cação é presuntiva e baseada em mudanças na cultura de células.
O herpesvírus do linguado europeu é uma afecção dos linguados europeus de
viveiros ou selvagens que causa hipertrofia maciça e fusão de células epiteliais da
pele e brânquias dos alevinos. A mortalidade está associada a infecções intensas das
brânquias e à má qualidade da água. A manutenção de altos níveis de oxigenação
é essencial para tais peixes com distúrbios respiratórios. O diagnóstico é feito pelo
exame de raspado de pele ou cortes histológicos, nos quais a fusão característica de
células gigantes pode ser observada.
A necrose hematopoiética infecciosa é uma infecção aguda por rabdovírus
de salmonídeos que é verticalmente transmitida e, a uma temperatura ≥ 12 oC,
produz alta mortalidade em alevinos e peixinhos. Os peixes afetados escurecem,
mostram brânquias pálidas, exoftalmia e eliminam fezes malformadas grossas.
Os tecidos excretor e hematopoiético renais são necróticos, assim como as
células acinares pancreáticas e células granulares do epitélio glandular intestinal.
O vírus cresce facilmente em muitas células de peixes, se incubadas a ≥ 15 o C, a
identificação é feita por soroneutralização.
A necrose pancreática infecciosa (NPI) é uma doença contagiosa sistêmica
aguda, causada por um birnavírus e que atinge alevinos e jovens salmonídeos. De
ocorrência mundial, é transmitida vertical e horizontalmente, é muito difundida e
produz os maiores índices de mortalidade em trutas jovens (alevinos e juvenis). A
doença ou é subclínica ou é inaparente em salmonídeos mais velhos, que podem agir
como portadores. É uma das viroses mais comuns dos peixes no ambiente aquático
e existem múltiplas cepas que variam em virulência e respostas sorológicas. Vírus
semelhantes aos da NPI têm sido isolados em outros animais, inclusive moluscos e
crustáceos. Os alevinos e peixinhos sintomáticos giram em torno do seu eixo
longitudinal e podem apresentar um exsudato esbranquiçado (que não é alimento)
no estômago e no intestino. As células acinares pancreáticas e células da mucosa
intestinal mostram uma necrose citolítica severa. A maioria das linhagens celulares
dos peixes é suscetível e a identificação do vírus é feita por soroneutralização,
imunofluorescência, fixação de complemento e ELISA.
A rabdovirose do alevino do lúcio é uma infecção hemorrágica aguda de lúcios
jovens, conhecida até agora apenas na Europa. Os alevinos afetados têm brânquias
pálidas, exoftalmia e hidrocefalia. Os túbulos renais apresentam degeneração e
necrose. O agente causal é facilmente isolado em várias culturas de células. A
identificação é feita por soroneutralização.
A viremia de primavera da carpa é uma infecção por rabdovírus aguda, virulenta
e geralmente hemorrágica que atinge carpas cultivadas. Pode causar morte em
adultos, assim como nos jovens. Os peixes afetados perdem o controle motor,
apresentam ascite e petequiação da pele, brânquias e massa visceral. Esta doença
é conhecida apenas na Europa e na antiga Rússia. O vírus é facilmente isolado em
Doenças dos Peixes 1207

linhagens celulares comuns de peixes e identificado por soroneutralização e imuno-


fluorescência. A doença faz parte do complexo de hidropisia da carpa (ver pág. 1202).
A profilaxia adotada contra possíveis infecções secundárias por Aeromonas, os quais
quase sempre são responsabilizados por mortalidade alta, pode ser alcançada por
injeção IP de oxitetraciclina a 1,5mg/100g de peso corporal de peixe justamente antes
que a temperatura de primavera suba e os surtos da doença sejam antecipados. A
droga também pode ser administrada no alimento em 60mg/kg de peso de peixe por
dia durante 10 dias. A droga deve ser eliminada 21 dias antes da comercialização para
consumo humano.
A septicemia hemorrágica viral (doença de Egtved) é uma infecção por
rabdovírus, virulenta e aguda, que atinge trutas arco-íris de todas as idades e que
é encontrada na Europa. Surtos típicos da doença ocorrem em temperaturas da
água ≤ 10oC. Os peixes afetados tornam-se escuros e apresentam exoftalmia e
anemia severa devido a petéquias ou hemorragias mais extensas que podem se
desenvolver particularmente no abdome e musculatura. Ocorre necrose do fígado
ou dos tecidos excretor e hematopoiético renais. O isolamento em cultura de células
é feito a ≤ 15oC e a identificação é feita por soroneutralização.
A doença linfocística é uma infecção viral única e tipicamente crônica de várias
espécies marinhas e de água doce, cultivadas ou selvagens. Resulta de um
desenvolvimento de formações vegetantes benignas que são caracteristicamente
externas e compostas de enormes fibroblastos dérmicos hipertrofiados. Inclusões
citoplasmáticas Feulgen-positvas e núcleos hipertrofiados são patognomônicos. O
agente causal é um DNA-vírus icosaédrico com , 300nm de diâmetro, do mesmo
grupo (Iridoviridae) do vírus da peste suína africana.
A necrose eritrocítica viral (NEV) é uma discrasia sangüínea recentemente
descoberta no salmão, arenque, bacalhau e outras espécies marinhas. As hemácias
mostram inclusões citoplasmáticas, cariorrexia e vírions icosaédricos – provavel-
mente DNA. O impacto no hospedeiro é prejudicial. O agente ainda não foi isolado,
mas suspeita-se que seja um membro dos Iridoviridae.
Varíola dos peixes é um termo aplicado às doenças dos peixes caracterizadas por
lesões de pele semelhantes às da varíola. Essas doenças não são causadas pelo vírus
varíola, mas estão associadas à infecção por herpesvírus. As carpas são afetadas mais
comumente, e suas lesões de pele aparecem tipicamente como elevações benignas,
não necrosantes, epidérmicas, hiperplásicas e circunscritas. Muitas outras espécies de
peixe apresentam lesões semelhantes que parecem estar associadas a infecções
semelhantes àquelas por herpesvírus. As percas-vesgas manifestam lesões seme-
lhantes associadas a infecção por herpesvírus; porém, outras infecções virais também
têm sido descritas nas percas-vesgas. Estas incluem o sarcoma dérmico viral da
perca-vesga e a retrovirose epidérmica hiperplásica.
Vários vírus têm sido isolados nas enguias. Entre eles incluem-se várias cepas de
rabdovírus de patogenicidade questionável, isoladas tanto de enguias doentes como
aparentemente normais. Um agente semelhante a um ortomixovírus tem sido isolado
a partir de enguias com estomatopapilomas (doença em couve-flor). Um birnavírus
(vírus da enguia européia), relacionado sorologicamente ao da NPI, tem sido isolado
de enguias cultivadas européias, chinesas e japonesas. O vírus produz uma doença
virulenta aguda caracterizada por lesões do rim e outras vísceras. O iridovírus da
enguia japonesa tem sido isolado em enguias japonesas imaturas (leptocéfalas e
larvas) cultivadas doentes.

DOENÇAS NUTRICIONAIS
Embora as diferentes espécies de peixes variem quanto às suas necessidades
alimentares, há uma notável similaridade com vertebrados mais evoluídos no que tange
Doenças dos Peixes 1208

às necessidades de proteína, energia e vitamina. Os peixes selvagens exibem menos


sinais de deficiências dietéticas do que os peixes ornamentais ou comestíveis cultivados.
Os peixes selvagens possuem uma variedade maior de alimentos, enquanto os peixes
de aquário ou viveiro consomem dietas formuladas com ingredientes restritos, que
podem estar sujeitos à deterioração, comumente incluindo rancidez de gordura. Muitas
das doenças nutricionais observadas nos peixes são complexas e não resultam de
deficiências simples. Podem ser expressas como sinais generalizados compostos de
anemia, deformidades esqueléticas, nervosismo, baixo crescimento e degenerações
nos órgãos internos. A terapia deve ser dirigida para o aprimoramento dietético
generalizado. Algumas das alterações específicas associadas a deficiências de vitami-
nas puras em peixes são as seguintes: a deficiência de vitamina A resulta em baixo
crescimento e atrofia da retina. A deficiência aguda de tiamina resulta em convulsões e
morte; deficiências crônicas resultam em perda de equilíbrio, edema e baixo crescimen-
to. A deficiência de riboflavina é caracterizada por vascularização da córnea, hemorragia
ocular, hiperpigmentação e enevoamento e hemorragia dos olhos. A deficiência de ácido
pantotênico está associada a doenças das brânquias. As deficiências de niacina, biotina
e piridoxina são responsáveis por sinais nervosos, como espasmos e convulsões. As
deficiências de colina, inositol e ácido fólico estão associadas ao baixo crescimento. As
deficiências de ácido ascórbico resultam em deformidades esqueléticas, incluindo
lordose e escoliose. As deficiências de vitamina E estão relacionadas a miopatias,
incluindo deformidades musculares. Lesões musculares semelhantes estão relaciona-
das à deficiência de selênio e à rancidez de gorduras da dieta.
A “National Academy of Sciences” dos EUA publicou as requisições nutricionais
das trutas, salmões, peixes-gato, peixes de águas quentes e peixes ornamentais.

DOENÇAS NÃO INFECCIOSAS VARIADAS


Muita ênfase tem sido dada à monitoração de populações de peixes selvagens
a fim de detectar poluentes tóxicos. De acordo com muitas fontes, a produção
industrial e doméstica do gás de dióxido de enxofre a partir da combustão de
combustíveis fósseis tem sido responsável pela chuva ácida e a alta mortalidade
de peixes resultante em coleções naturais de água. A formação de compostos
tóxicos de alumínio em águas ácidas também tem sido incriminada como uma
causa de morbidade e mortalidade de peixes. A descarga de muitas substâncias
tóxicas em águas naturais tem resultado em matança de peixes; alguns poluentes
estão sendo investigados como carcinógenos; devido à alta incidência de
tumores em peixes de coleções definidas de água, tanto marinhas como de água
doce. Altas incidências de tumores têm sido encontradas em espécies habitantes
do fundo e acredita-se que estejam relacionadas a carcinógenos no sedimento.
A dermatite ulcerativa e a podridão da nadadeira e da cauda têm sido
descritas em peixes marinhos como linguados, salmões, trutas marinhas e
outros. Embora os poluentes aquáticos tenham sido incriminados, a etiologia
destas afecções permanece obscura.
Os peixes comestíveis de viveiros também estão sujeitos aos poluentes
ambientais devido a fatores como poluentes industriais, fertilizantes, pesticidas,
sal mineral e outros escoamentos da drenagem de superfície em tanques de
peixes. Os peixes de aquário também têm os seus problemas ambientais devido
à introdução, acidental ou intencional, de substâncias tóxicas; incluindo drogas
para medicação, desinfetantes, sabões e sprays aerossóis.
Como já foi mencionado, as intoxicações alimentares dos peixes ocorrem
comumente devido a deterioração e rancidez. Uma intoxicação alimentar dramática
é a aflatoxicose, que resulta da ingestão de rações para peixes contaminadas com
Manejo e Doenças de Aves Ornamentais 1209

aflatoxina produzida por Aspergillus flavus. Outros bolores produtores de toxinas


podem originar intoxicações semelhantes. A truta arco-íris e outros salmonídeos
são particularmente suscetíveis à aflatoxicose, o que resulta na formação de
hepatomas de desenvolvimento rápido e mortalidade alta.
A panesteatite e o espessamento da bexiga natatória devido a caroços tóxicos
de algodão em rações para peixe, incorporadas a uma dieta pobre em vitamina E, têm
sido relatados como associados à alta mortalidade em peixes de criações. Máquinas
contaminadas, usadas na confecção de rações para peixe peletizadas, e contamina-
ção por sal também têm sido relatadas. A última pode resultar de erros na formulação
da ração ou de contaminação com água marinha durante a estocagem. Metais
pesados, plásticos, óleo, compostos fenólicos e outras substâncias orgânicas têm
sido relatados como tóxicos aos peixes. Os peixes são comumente utilizados em
ensaios biológicos dessas substâncias tóxicas e têm-se tornado animais de labora-
tório padronizados para este propósito.
São encontradas neoplasias nos peixes semelhantes àquelas encontradas em
outros animais. Sua incidência freqüentemente é maior em algumas áreas geográ-
ficas e em certas espécies de peixes. Alguns tumores são mediados geneticamente,
como o melanoma maligno dos híbridos do espada e, possivelmente, o tumor
pseudo-ramificado do bacalhau, tumores tireóideos, linfossarcoma maligno do lúcio
e fibromas ou sarcomas do peixe dourado. Tubarões, arraias e raias possuem uma
baixa incidência relatada de tumores.
As anomalias de coloração e anomalias ou deformidades do saco vitelino
são comuns em peixes cultivados e podem ser de origem genética ou ambiental.
Por exemplo, a doença do saco azul, uma afecção de larvas de truta arco-íris, é
acreditada como sendo associada à água incompatível para incubação e ao
pseudo-albinismo em linguados cultivados com níveis excessivos de luz logo
após o período de incubação.
As queimaduras de sol podem ocorrer em peixes que nadam próximos à su-
perfície da água ou surgir até em habitantes do fundo, por se alimentarem de drogas
fotodinâmicas como fenotiazina, embora a luz ultravioleta penetre pouco na água.
A nefrocalcinose e o granuloma visceral são afecções encontradas particular-
mente em criações de salmonídeos e induzidas supostamente por um alto nível de
dióxido de carbono na água; isto produz acidose metabólica e precipitação urinária
e tecidual de cálcio, ao redor da qual se desenvolvem granulomas extensos.

MANEJO E DOENÇAS DE AVES


ORNAMENTAIS
Em parte porque as aves parecem compensar bem disfunções orgânicas, e em
parte porque os proprietários de aves tendem a ser menos conhecedores de seus
animais de estimação que proprietários de cães ou gatos, a doença freqüentemente
já está avançada quando se percebe que as aves ornamentais estão enfermas.
Felizmente, a medicina preventiva está se tornando mais importante na prática
aviária, com exames de “novas aves adquiridas” ou procedimentos de auxílio na
educação do proprietário. Os vendedores de animais de estimação também estão
se utilizando cada vez mais de programas veterinários amplos.
Transporte, agitação ou lotação, calor indequado ou condicionamento de ar
excessivo e má nutrição são agentes estressantes comuns associados a problemas
clínicos em aves recém-adquiridas. A doença infecciosa é a expressão mais fre-
Manejo e Doenças de Aves Ornamentais 1210

qüente de tal estresse, particularmente levando-se em conta que grupos de aves


quase sempre são abrigados e alimentados sob condições contaminadas. Neopla-
sias, doenças nutricionais e traumas são mais comuns em animais de estimação já
aclimatados. O incremento da utilização de auxílios ao diagnóstico, incluindo
patologia clínica e radiologia, e os avanços em microcirurgia e anestesiologia estão
melhorando rapidamente o nível de especialização da medicina aviária. O conhe-
cimento de técnicas básicas de criação e reprodução contribui grandemente para o
sucesso desse campo em expansão.
História – A ave deve ser trazida em sua própria gaiola para exame crítico do
ambiente, alimento e excrementos. O clima frio é uma desculpa freqüente para a
relutância a trazer uma ave de estimação a uma clínica. A exposição ao ar frio pode
ser evitada facilmente pelo embrulhamento da gaiola com um cobertor grande.
Alguns proprietários também têm reservas quanto ao manuseio ou exame de um
pássaro doente, mas um tratamento inadequado em casa pode levar a mais risco
que o estresse encontrado na clínica.
Ao se avaliar um pássaro, a história deve incluir quanto tempo ele tem estado
com o proprietário atual, assim como quanta informação for possível sobre sua
origem e história de outras aves na coleção do proprietário. Um questionamento
cuidadoso e um exame de restos de sementes são necessários antes de se
chegar a conclusões sobre nutrição. O alimento oferecido a uma ave na forma de
tipos de sementes, suplementos vitamínicos, fontes minerais, etc. não é neces-
sariamente o mesmo que ele tenha realmente comido. A maioria das enfermida-
des é descrita pelos proprietários como “repentina”, porque as penas mascaram
efetivamente qualquer emaciação severa ou distensão abdominal. Algumas aves
também continuam a comer (ou simulam comportamento ingestivo) mesmo
quando próximas da morte.
Exame físico – As aves doentes não toleram bem períodos longos de
manipulação; quaisquer drogas ou procedimentos diagnósticos devem ser adian-
tados, e todos os acessórios devem estar prontos para uso imediato. Uma fonte
de luz forte, uma balança para pesagem e um aparelho para ampliação visual
constituem o equipamento básico. Para a segurança do manejador geralmente
necessita-se do uso de uma ou mais toalhas para contenção de aves maiores
(calopsitas e outras maiores). A assistência extra também encurta o tempo de
manipulação.
A superfície externa, freqüência respiratória, movimentação e comportamento
devem ser observados antes da manipulação, conforme se alteram uma vez que
o pássaro esteja contido. Os poleiros devem ser removidos cuidadosamente da
gaiola antes da captura. O escurecimento da sala facilita a captura de aves
pequenas e reduz o estresse associado à captura. Uma vez capturadas, a maioria
das aves é melhor segurada em uma toalha, com a base da mandíbula inferior ou
bico sendo usada para controlar os movimentos da cabeça. As asas e os pés
devem ser contidos, mas o peito deve ser deixado livre para respiração. As aves
menores, tais como os periquitos, podem ser contidas sem uma toalha, mas a
cabeça deve ser controlada para evitar bicadas dolorosas. A condição física deve
ser avaliada em primeiro lugar. Os pés devem ser contidos cuidadosamente
enquanto se examina o peito ou o abdome (ou quando se aplicam injeções IM),
porque são quase sempre fortes e capazes de uma grande variedade de
movimentos. Se a ave estiver atáxica na gaiola, e magra e fraca quando
examinada nas mãos, ela pode suportar apenas um pequeno estresse adicional;
um exame curto e um diagnóstico por tentativa são obviamente preferíveis à
morte durante um exame completo.
Devem-se examinar os olhos, narinas, aberturas externas dos ouvidos, bico e
cavidade oral (a boca pode ser aberta usando-se faixas de gaze, ou “estimulada” a se
Manejo e Doenças de Aves Ornamentais 1211

abrir por meio de pancadinhas na mandíbula superior). O papo tem de ser palpado
para que se detectem espessamento ou corpos estranhos (o pássaro deve ser
mantido em posição vertical durante este procedimento). A evidência de vômito pode
ser constatada como muco seco nas penas acima das narinas, na fronte e algumas
vezes nos lados da boca. Uma descarga nasal também tinge as penas acima das
narinas. O esterno deve ser examinado de cima para baixo para que se verifiquem
desvios. As condições do corpo podem ser avaliadas através da palpação dos
músculos peitorais. As aves normais devem ter a musculatura um pouco convexa em
relação à carena do esterno. Recomenda-se a pesagem precisa da ave, o que é
essencial para a monitoração de uma doença. O abdome da maioria das aves em
decúbito dorsal é distintivamente côncavo, e os ossos púbicos são facilmente sentidos
logo à frente do ânus. Examina-se o ânus, e depois os pés, pernas e asas. As fraturas
dos ossos longos proximais (úmero, fêmur) podem ser encontradas mais facilmente
se as articulações forem palpadas enquanto se mover o membro. As penas podem
mascarar inchaço ou descoloração, mas a crepitação e o movimento da fratura
freqüentemente são detectados durante manipulação cuidadosa. O álcool, se aplica-
do com moderação, é útil na visualização de anormalidades normalmente escondidas
pelas penas. O depenamento pode rasgar a pele delicada se não for realizado com
cuidado. O dorso e a glândula uropigial também devem ser examinados.
Procedimentos de rotina – Até recentemente, não se dispunham comercial-
mente de vacinas para aves de estimação. As vacinas para bouba do papagaio (ver
pág. 1222) e doença de Pacheco (ver pág. 1221) foram introduzidas no mercado
americano nos últimos anos.
O corte de asas é um pedido freqüente dos proprietários. Pode ser um auxílio à
domesticação e uma prevenção do extravio de pássaros mantidos fora da gaiola. Os
proprietários devem ser avisados sobre vôos não esperados após o corte das asas,
sobretudo aproveitando-se uma brisa. O corte de todas as penas primárias nas duas
asas é o método mais freqüentemente usado, mas qualquer pena primária que
tenha restado tende a se tornar disforme devido ao uso e à fratura. Pode ser melhor
cortar apenas as 8 penas primárias, da face externa para a interna. Os cortes de asa
unilaterais podem resultar em quedas ou vôos imprevisíveis. As penas em cresci-
mento não devem ser cortadas ou ocorrerá hemorragia. As penas em crescimento
são freqüentemente bicadas ou quebradas pela ave, e a remoção imediata por
depenamento do canhão restante e a aplicação de pressão até o fim do sangramen-
to constituem o melhor tratamento.
O corte de unhas é quase sempre solicitado e geralmente fácil de fazer. O nitrato
de prata ou agentes hemostáticos semelhantes devem estar disponíveis para
aplicação, com pressão, em um leito ungueal hemorrágico. Furadeiras domésticas
e pedaços de lixa são úteis no caso de araras e cacatuas. Também são excelentes
para o corte corretivo do bico, mas devem ser esterilizadas entre cortes diferentes.
Como os pássaros normais raramente precisam de cortes de bico, os pedidos para
tal podem representar uma indicação de patologia.
Muitas aves são anilhadas, tanto para identificação individual como para indicar
uma história de quarentena apropriada. As anilhas apresentam certos riscos para
a ave, mas a remoção também inclui algum risco. Anilhas de aço, retorcidas e
abertas (com uma fenda) são extremamente fortes e exigem geralmente um alicate
padrão. Indica-se precaução para que um pedaço de metal projetado não machuque
o operador ou espectador, e obviamente, precisa-se de cuidado para evitar que se
machuque a ave. As anilhas de alumínio devem ser estabilizadas com coagulantes
e daí cortadas com alicates laterais ou cortadores de grampo.
A hematologia e a bioquímica sérica são especialmente importantes nas aves, já
que o exame físico tende a ser menos revelador que em outros animais. Uma unha
limpa é o local comum de coleta de sangue dos pássaros pequenos (devem-se
Manejo e Doenças de Aves Ornamentais 1212

segurar os tubos capilares horizontalmente para coletar o sangue), embora a veia


jugular (direita) seja usada às vezes. Os coagulantes devem ser sempre utiliza-
dos após tentativas de coleta em unhas, mesmo que o sangue tenha parado de
sair. A TABELA 2 enumera algumas orientações sobre volumes que podem ser
coletados. Nas aves maiores, o sangue é geralmente coletado da veia ulnar
mediana (o álcool, aplicado topicamente, pode revelar a veia e o seu caminho na
face interna do cotovelo). As veias das asas requerem hemostasia cuidadosa,
usando-se pressão local. A veia társica medial de papagaios maiores também é
algumas vezes usada. Pode ser útil a aplicação tópica de um anticoagulante com
uma seringa antes da coleta.
Métodos de tratamento – As injeções IM são facilmente aplicadas nos músculos
peitorais, embora recomende-se bastante o uso de álcool para visualizar o local. A
colocação de uma agulha em um ângulo agudo e a aplicação de pressão após a
retirada minimizam a hemorragia. As injeções s.c. também são simplificadas
quando a pele pode ser vista claramente. Uma seringa de insulina (50u ou 0,5mL)
com uma agulha de calibre 27 não serve para dosagens precisas. As injeções EV
estão se tornando mais comuns nas aves de estimação, à medida que a prática de
administração de fluidos com glóbulos em bolo torna-se popular. Alguns volumes
comuns de fluidos EV estão arrolados na TABELA 3. Os cateteres internos (agulha de
calibre 20 com estilete) colocados na superfície lateral distal da ulna também estão
se tornando populares na medicina aviária; os fluidos intra-ósseos são absorvidos
rapidamente e fáceis de se iniciar. Uma sonda (intubação do papo) pode ser usada
para manter a hidratação em certos pássaros. Em pássaros pequenos, uma agulha
de coleta metálica (com ponta esférica) é gentilmente colocada no papo, ou um tubo
estomacal em fundo cego bem pequeno também pode ser usado. A extensão do
pescoço é a chave para se entrar rapidamente no papo, principalmente em pássaros
grandes. Deve-se usar um espéculo qualquer em pássaros grandes, ou eles podem
bicar e engolir parte do tubo estomacal. O tubo não deve ser forçado, pois os tecidos
são finos e frágeis, sobretudo nas aves menores. O tubo no interior do papo fica
facilmente palpável no pescoço, e como a entrada da traquéia é anterior, a
colocação do tubo pode ser conferida ao se observar dentro da boca com uma
lanterna pequena.
Os medicamentos orais podem ser dados em algumas rações comerciais (painço
impregnado, péletes e premixes para uma mistura suave) ou administrados direta-

TABELA 2 – Quantidade Máxima de Sangue Recomendada que Pode ser Coletada


de Espécies Aviárias Comuns
Pintassilgo (,10g) 0,1mL
Periquito australiano (,30g) 0,25mL
Calopsita (,85g) 0,75mL
Papagaio da Amazônia (,400g) 3mL
Arara (,950g) 5mL

TABELA 3 – Quantidades Iniciais de Fluidos EV para Administração em Bolo


em Espécies Aviárias Comuns
Pintassilgo 0,5mL
Periquito australiano 1mL
Calopsita 2mL
Papagaio da Amazônia 8mL
Arara 12mL
Manejo e Doenças de Aves Ornamentais 1213

mente na boca. Os medicamentos em água de bebida são indicados apenas em


circunstâncias especiais, conforme fatores de dosagem, estabilidade e palatabilida-
de tornam essa rota indesejável na maioria dos casos. Os tratamentos via alimento
ou água são eficazes apenas se forem ingeridos; portanto, torna-se essencial uma
monitoração direta.
A sedação é algumas vezes desejável para procedimentos de diagnóstico ou
tratamento. Mesmo aves gravemente doentes geralmente podem ser anestesiadas
com segurança com cetamina IM (2 a 3mg para um periquito australiano, 6mg para
uma calopsita, 15mg para um papagaio de 450g), mas a recuperação extremamente
difícil tende a descompensar as vantagens de segurança. A anestesia com isoflurano
pode sedar seguramente aves estressadas ou debilitadas e providencia uma recupe-
ração extremamente rápida (geralmente não se recomendam pré-medicações).
Qualquer ave gravemente doente se beneficia de um aumento na temperatura
e na umidade. Um ambiente quente pode ser criado ao se embrulhar a gaiola (menos
a portinhola) com filme plástico claro, e se colocar a gaiola sobre uma almofada
elétrica de aquecimento (todos os poleiros, menos um, devem ser retirados para
facilitar futuras tentativas de captura). Um termômetro caseiro na gaiola permite a
monitoração da temperatura. Um local quieto é a melhor opção, embora as aves
anoréticas possam-se beneficiar se puderem ver outras aves se alimentando.

DOENÇAS BACTERIANAS
As Enterobacteriaceae Gram-negativas são patógenos comuns, embora muitas
sejam consideradas oportunistas. Freqüentemente são isoladas e incluem Citrobacter,
Enterobacter, Klebsiella, Proteus e Salmonella spp, Escherichia coli e Serratia
marcescens. Tem-se associado a salmonelose aos papagaios cinzentos africanos
(recentemente estressados). Outros microrganismos Gram-negativos importantes
são Acinetobacter spp , Aeromonas, Pseudomonas, Pasteurella e Mycobacterium
avium e M. tuberculosis. O Pasteurella tem sido relatado como possível agente
septicêmico nas aves atacadas por gatos de estimação ou ratos. A tuberculose
aviária é um problema comum no periquito de bochechas cinzentas e outras espécies
do gênero Brotogeris. Os estafilococos e os estreptococos (sobretudo as cepas
hemolíticas) e ainda as Bacillus spp também podem ser responsáveis por doenças
em psitacídeos. Os estafilococos são quase sempre isolados de lesões cancriformes
em periquitos australianos ou calopsitas. A TABELA 4 enumera alguns antibacterianos
freqüentemente recomendados para aves ornamentais. Porções restantes de
drogas reconstituídas são quase sempre guardadas refrigeradas nas seringas, embora
os períodos de estocagem permissíveis não sejam conhecidos.
A flora gastrointestinal de psitacídeos saudáveis é predominantemente Gram-
positiva (Streptococcus spp e Staphylococcus epidermidis com um número variável de
Bacillus e Lactobacillus spp), porém as bactérias Gram-negativas predominam como
patógenos. As aves estressadas ou doentes eliminam freqüentemente patógenos
potenciais como E. coli, embora o significado clínico exato varie de caso para caso.

Clamidiose
(Psitacose, Ornitose)
É uma zoonose muito difundida e notificável, causada por Chlamydia psittaci. A
doença não está limitada a psitacídeos importados recém-chegados, mas também
é vista em lotes reprodutivos (especialmente periquitos australianos e calopsitas) e
em pássaros vendidos a varejo. As aves podem albergar o microrganismo por anos
antes de desenvolver a doença sob estresse. Sempre que possível, as aves devem
ser obtidas de estabelecimentos de criação sabidamente livres da infecção.
Manejo e Doenças de Aves Ornamentais 1214

Achados clínicos – A maioria apresenta perda de peso, depressão, anorexia


transitória, uratos verde-amarelados ou verde-limão, e fezes fluidas; muitos estão
emaciados quando examinados. Os sinais respiratórios estão algumas vezes

TABELA 4 – Antibióticos Recomendados para Uso em Aves Ornamentais*


Agente Dosagem Rota, freqüência, duração
Sulfato de amicacina 15mg/kg IM, 2 vezes ao dia por 7 dias
Carbenicilina 150mg/kg IM, 2 vezes ao dia por 7 – 10 dias
Cefotaxina sódica 100mg/kg IM, 2 vezes ao dia por 7 dias
Succinato de cloranfenicol 80mg/kg IM, 2 vezes ao dia por 7 dias
Palmitato de cloranfenicol 50mg/kg VO, 3 vezes ao dia por 7 dias
Premix com clortetraciclina, 100g/9kg em única fonte de alimento
222g/kg mistura oral
Sementes com clortetraciclina 0,5% mg/g de única fonte de alimento por 45 dias
sementes(0,05%)
Péletes com clortetraciclina 4 – 10mg/g única fonte de alimento por 45 dias
(0,4 – 1%)
Suspensão de doxiciclina 50mg/kg VO, diariamente para araras, cacatuas;
25mg/kg VO, 2 vezes ao dia para outros;
todos por 45 dias
Doxiciclina 20mg/mL, 100mg/kg IM (dividida) 1 vez por semana por
injetável** 6 tratamentos
Enrofloxacina, oral ou injetável 12mg/kg VO ou IM, 2 vezes ao dia por 5 dias
Gentamicina 10mg/kg IM, 1 ou 2 vezes ao dia
por 5 dias
Nitrofurazona 1mL/L água de bebida por 7 – 10 dias
(pó solúvel a 9,3%)
Oxitetraciclina 2mL/L água de bebida por 7 dias ou mais;
(pó solúvel a 6,2%) mudar para 2 vezes ao dia
(instável); sem fonte de cálcio
Piperacilina 100mg/kg IM, 2 vezes ao dia por 7 dias
Espectinomicina 50mg/mL 5mL/L água de bebida por 7 – 10 dias
Suspensão oral de trimetoprim/ 75mg/kg VO, 2 vezes ao dia por 7 dias
sulfametoxazol
Suspensão injetável de 50mg/kg IM, 2 vezes ao dia por 7 – 10 dias
trimetoprim/sulfametoxazol
Pó solúvel de tilocina 1mL/L água de bebida por 7 – 10 dias
(tartarato de tilosina)
Tilocina, injetável 35mg/kg IM, 2 vezes ao dia por 5 dias

* A maioria dessas drogas não é aprovada para uso e indica-se precaução.


** Não disponível atualmente nos EUA.
Manejo e Doenças de Aves Ornamentais 1215

presentes e geralmente estão relacionados a uma saculite aérea. A psitacose é


freqüentemente complicada por infecções bacterianas subseqüentes. A contagem
de leucócitos é muito alta em pássaros afetados; valores de 25 a 95 × 103/µL não são
incomuns. A contagem normal de leucócitos é < 13 × 103/µL.
Diagnóstico – O diagnóstico é feito por isolamento do microrganismo causal em
embriões de galinha ou culturas de células. Pássaros claramente doentes geral-
mente eliminam o microrganismo continuamente e pássaros normais (que tiveram
contato) podem fazê-lo intermitentemente. O diagnóstico é reforçado por fixação de
complemento direta: títulos < 1:8 são considerados negativos; 1:16, suspeitos ou
equívocos; e aqueles > 1:16, positivos. Os títulos geralmente permanecem elevados
por um longo período após o tratamento. O teste de aglutinação do látex pode ser
útil, mas não está largamente disponível. Os testes ELISA para antígenos fecais
também podem ser úteis, desde que o método usado tenha sido projetado e avaliado
apropriadamente. Esfregaços especialmente corados dos sacos aéreos, baço,
fígado e pericárdio podem revelar corpúsculos elementares intracelulares de
clamídia e ajudam em um diagnóstico presuntivo, assim como a história, sinais
clínicos, hematologia e radiografia.
Lesões – Podem ocorrer hepatomegalia, esplenomegalia, alterações dos sacos
aéreos (opacificação, espessamento, caseificação) e pericardite fibrosa. O fígado pode
apresentar áreas necróticas com infiltrados mistos de células inflamatórias e estase
biliar. A inflamação tende a ser supurativa se há infecção bacteriana secundária. Os
sacos aéreos estão espessados por exsudato fibrinoso com células inflamatórias
mistas; os pulmões podem estar congestos e edematosos.
A transmissão é feita primariamente por inalação de exsudatos nasais, aerossóis
expirados ou partículas de fezes. A remoção dos comedouros e bebedouros durante
as operações de limpeza e o cuidado ao reduzir a dispersão da sujeira do piso da
gaiola ajudam a minimizar a transmissão.
Tratamento e controle – Embora seja lei nos EUA o uso de clortetraciclina (CTC)
na alimentação de todos os psitacídeos importados durante o período de quarentena
de 30 dias, este procedimento pode não eliminar todos os casos de um lote. A terapia
inclui premix com CTC no alimento por 45 dias (grandes psitacídeos), ou ração
peletizada contendo CTC, ou ainda painço descascado e impregnado com CTC. Os
tratamentos individuais com doxiciclina (50mg/kg de peso corporal, VO, uma vez ao
dia) são extremamente efetivos e evitam a fome por “seleção de alimentos”, mas
exigem 45 dias de terapia. As tetraciclinas como oxitetraciclina podem ser usadas
(em situação de lotes) na água de bebida até que formas mais efetivas de terapia
possam ser instituídas. O antibiótico sozinho na água não é eficiente para cura se for
usado como único método de tratamento. As terapias aprovadas nos EUA incluem
o premix com CTC e o painço impregnado com esta.

DOENÇAS MICÓTICAS
Candidíase
A levedura causadora é a Candida albicans. Os pássaros jovens são mais susce-
tíveis, embora os adultos de algumas espécies (sobretudo periquitos) sejam também
afetados freqüentemente. A antibioticoterapia prolongada, deficiência de vitamina A
e alimentação com comida estragada constituem fatores predisponentes. A levedura
é considerada por alguns como parte da flora normal, mas a doença resulta de um
excesso de crescimento fúngico (ver também SAPINHO, pág. 1893).
A infecção geralmente envolve a mucosa do papo; com infecção bacteriana
secundária, é uma causa comum de estase do papo e morte em psitacídeos recém-
nascidos. As aves afetadas tornam-se emaciadas, apresentam peso abaixo do
Manejo e Doenças de Aves Ornamentais 1216

normal e podem vomitar; os adultos apresentam apetite aumentado com perda de


peso concorrente. O papo é espessado e esvazia-se devagar em pássaros recém-
nascidos; pode ocorrer regurgitação. Ocorrem lesões brancas salientes na mucosa
oral. Se a levedura invadir a mucosa intestinal, uma síndrome de malabsorção pode-
se desenvolver. Os olhos e os pulmões também podem ser afetados. O diagnóstico
se baseia na cultura e na identificação da levedura.
A nistatina, o cetoconazol, o iodo tópico e a vitamina A suplementar constituem
tratamentos eficientes (ver também TABELA 5).

Aspergilose
Trata-se de uma doença fúngica sistêmica causada por Aspergillus fumigatus. É
comum em aves de rapina aquáticas e pingüins, mas não em psitacídeos. Quando
ocorre nos últimos, está geralmente associada a mau manejo, estresse, doenças
concorrentes ou anteriores ou imunodeficiência. Ambientes com poeira ou úmidos
ou exposição a comida ou material de ninho embolorados podem aumentar a
incidência. A transmissão é feita por inalação de esporos (ver também pág. 1956).
Em psitacídeos, pode haver dispnéia de início agudo ou uma doença debilitante
crônica, complicada por uma ou mais bactérias patogênicas. Na forma aguda, os
achados podem ser limitados a pequenos tampões caseosos no interior da traquéia
distal ou em pequenas placas em um ou mais sacos aéreos, que também podem
parecer espessados. Em casos crônicos, existe geralmente um crescimento fúngico
visível nos sacos aéreos, quase sempre um crescimento exagerado nas superfícies
serosas dos órgãos vizinhos; outros órgãos também podem estar envolvidos.
O lavado transtraqueal com cultura e citologia, e a laparoscopia permitem chegar
a um diagnóstico. A radiografia pode ajudar num diagnóstico presuntivo. A sorologia
não é confiável. A aspergilose deve ser considerada quando uma doença respira-
tória estiver sendo refratária à terapia, com base em cultura e antibiograma.
O tratamento de casos agudos pode ser compensador, mas o tratamento em
casos crônicos quase sempre não tem sucesso. O debridamento cirúrgico dos sacos
aéreos tem sido descrito. A anfotericina B (EV ou IP) em combinação com flucitosina
ou cetoconazol orais é útil; a nebulização também pode ser empregada. O levamisol
tem sido usado como um imunoestimulante. A TABELA 5 lista alguns antifúngicos

TABELA 5 – Antifúngicos para Uso em Aves Ornamentais: Dose, Rota e Freqüência


Agente Dose Rota e freqüência
Anfotericina B 0,001mg Administrada por via intratraqueal
diariamente até ficar assintomática ou poder
ser nebulizada, ou uma porção dada IP
5-Flucitosina 0,25mg 2 vezes ao dia via sonda
Cetoconazol* Tablete de 200mg Pulverizar e adicionar a 1L de água e
dar por 7 a 14 dias
Suspensão oral 1mL/350g de VO, 2 vezes ao dia por 7 dias
de nistatina peso corporal
(100.000u/mL)
Premix de nistatina 2 colheres de chá/ Servir por 10 a 14 dias
(20g/0,45kg) 2,25kg de mistura

* Para candidíase resistente à nistatina, misturar 0,2mL de HCl 1N, 0,8mL de água e 50mg de
cetoconazol; dosar oralmente 2 vezes ao dia por 14 dias: papagaios reais, 0,05mL;
papagaios da Amazônia, 0,07mL; cacatuas, 0,1mL.
Manejo e Doenças de Aves Ornamentais 1217

populares para o uso em aves ornamentais. Tem-se usado uma vacina autógena
com algum sucesso.

DOENÇAS PARASÍTICAS
(Ver também a seção DOENÇAS AVIÁRIAS, pág. 1867.)

PARASITAS DO SISTEMA TEGUMENTAR


Mallophaga
Várias espécies de piolhos mastigadores parasitam muitas aves; as mais comu-
mente infestadas são as calopsitas e os canários. Os sinais clínicos são leves ou
ausentes; as infestações pesadas demonstram problemas de doenças concomitan-
tes. Uma a 2 aplicações de sprays de piretrina ou carbaril em pó, divididos em 7 a 10
dias, são geralmente eficientes como tratamento.

Sarna escamosa
As Cnemidocoptes (Knemidocoptes) pilae são muito comuns nos periquitos
australianos e raros nos outros psitacídeos. Os passeriformes também são parasitados
mas apresentam sinais clínicos diferentes. O estresse é necessário para a manifes-
tação da sarna tanto em psitacídeos como em passeriformes.
Nos periquitos australianos, são típicas as crostas proliferativas, porosas e
brancas que envolvem os cantos da boca, ceroma, pálpebras e bico. O bico pode
crescer para fora de uma forma incomum. Nos passeriformes (principalmente o
pintassilgo europeu), formam-se crostas lisas e grandes na superfície plantar dos
dedos (“pé-em-espiga-de-milho”). Os ácaros podem ser obtidos a partir de raspados
faciais nos periquitos australianos; nos passeiriformes, esse procedimento não é
recomendado, pois pode haver hemorragia na base de qualquer crosta grande.
Uma ou 2 injeções de ivermectina a 200µg/kg (0,2µg/g por 1 a 2 semanas
divididos) são geralmente curativas. O óleo mineral, em pequena quantidade, alivia
rapidamente.

Sarna do periquito de bochecha cinzenta


A Myialges (Metamicrolichus) nudus ou a Megninia sp são mais freqüentemente
encontradas no periquito de bochecha cinzenta. Presume-se que os dois sejam muito
contagiosos. As lesões tendem a ser limitadas à cabeça e ao pescoço; o tratamento
com ivermectina (200µg/kg) tem sido eficaz.

Ácaros das penas


Embora a taxa total de infestação em aves ornamentais seja baixa, as Dermanyssus
gallinae (ácaros vermelhos) podem ser encontrados nos canários e seus filhotes. Os
ácaros das penas são uma reclamação comum por parte dos proprietários de
psitacídeos, visto que eles freqüentemente conhecem uma relação entre ácaros e
bicagem de penas. Mas raramente é esse o caso; fatores psicológicos ou ligados a
doenças sistêmicas estão quase sempre mais relacionados a perdas de penas. Os
sinais incluem inquietação (sobretudo à noite), anemia e morte. O diagnóstico é feito
por inspeção visual e confirmação microscópica. Um truque para a coleta de ácaros
consiste em cobrir a gaiola, à noite, com um lençol branco e procurar os ácaros na
parte de baixo do lençol na manhã seguinte.
Individualmente, ivermectina ou sprays de piretrina têm sido tratamentos eficien-
tes. Para bandos, faixas de diclorvos (Vapona) são usadas algumas vezes. A gaiola
deve ser limpa completamente (prestando-se bem atenção a rachaduras e frestas
onde os ácaros se escondem durante o dia).
Manejo e Doenças de Aves Ornamentais 1218

PARASITAS DO SISTEMA RESPIRATÓRIO


Ácaros dos sacos aéreos
A Sternostoma tracheacolum parasita o trato respiratório inteiro, mais freqüen-
temente dos canários e pintassilgos de Gould, raramente dos psitacídeos. Todos os
estágios do ácaro são encontrados nos tecidos respiratórios. O ciclo de vida é muito
pouco conhecido.
Nas infecções leves, as aves em geral são assintomáticas; nas pesadas, notam-
se dispnéia audível (arfadas profundas e estalidos-respiração ruidosa), respiração
com boca aberta e cauda oscilante. Os sinais ficam exacerbados com manipulação,
exercícios e outros estresses. A mortalidade pode ser alta.
A transiluminação da traquéia em um quarto escuro às vezes revela a
presença do ácaro. Podem ocorrer basofilia absoluta e/ou eosinofilia. A resposta
ao tratamento também pode ajudar a chegar a um diagnóstico, que é confirmado
na necropsia.
Para o tratamento, a ivermectina parenteral (200µg/kg) pode ser administrada 2
vezes, divididas em 1 a 2 semanas. Os tratamentos orais ou s.c. são preferíveis à
rota IM, sobretudo em fringilídeos.

Singamose (verme-forquilha)
A Syngamus trachea (ver também pág. 1956) parasita algumas vezes galináceos
e passeriformes; é extremamente raro em aves ornamentais.

PARASITAS DO SISTEMA G ASTROINTESTINAL


(Ver também DOENÇAS AVIÁRIAS , página 1867.)

Giardíase
É uma protozoonose intestinal, causada por Giardia psitttaci, vista mais freqüen-
temente em calopsitas e periquitos australianos. Diferentemente da doença em
mamíferos, a giardíase em aves pode ser fatal, particularmente em filhotes de
periquito australiano; as aves adultas podem ser portadoras latentes. A transmissão
é presumivelmente direta (ingestão de cistos infectantes).
As calopsitas apresentam intenso depenamento e vocalização e a plumagem
parece oleosa. Os excrementos são esmaecidos, aumentados em volume e fluidos
ou pastosos. Os periquitos australianos têm um apetite voraz, mas se tornam
anoréticos e emaciados e acabam morrendo. As alterações nos seus excrementos
são semelhantes àquelas vistas nas calopsitas.
O exame microscópico de fezes frescas em solução salina pode revelar os
trofozoítas móveis. Desde que a presença de cistos seja variável, aconselham-se
exames em série. Uma gota de solução de iodo de lugol, adicionada à preparação
salina, ajuda na detecção dos cistos.
O ipronidazol (,125mg/L) como única fonte de água de bebida trocado diaria-
mente por 7 a 14 dias é eficiente. O dimetridazol tem sido usado na água de bebida
para tratar grupos de aves (0,02 a 0,04% por 5 dias); os indivíduos podem também
ser intubados (0,05mg/g, a cada 12h em 3 doses).

Tricomoníase
A Trichomonas gallinae (ver também pág. 1893) causa difteria (membranas
diftéricas cobrindo a orofaringe e laterais da boca) nas aves de rapina e cancro nos
columbiformes. É ocasionalmente visto em canários, outros fringilídeos e periquitos
australianos.
Manejo e Doenças de Aves Ornamentais 1219

As lesões caseosas branco-amareladas, bem aderidas à mucosa da orofaginge,


papo e esôfago, causam anorexia e disfagia; resultam em perda de peso e morte.
A transmissão é feita por contágio direto (pais alimentando filhotes) ou indireto
(ingestão de comida e água contaminadas); as aves de rapina podem-se tornar
infectadas por ingerir pombos ou rolas infectados.
O exame microscópico de uma solução salina de material das lesões revela o
microrganismo flagelado.
O metronidazol (40 a 60mg/kg, VO, 1 vez ao dia por 5 dias) é recomendado para
o tratamento.

Outras doenças por protozoários


Outros protozoários parasitas, como os coccídios, são muito mais comuns em
galináceos ou columbiformes, embora os oocistos de coccídios tenham sido descritos
em periquitos australianos e alguns fringilídeos. Os tratamentos das aves aquáticas
provavelmente sejam adequados nestas espécies. A atoxoplasmose é uma
protozoonose altamente patogênica que causa hepatomegalia e esplenomegalia em
canários, com oocistos semelhantes aos de coccídios sendo eliminados nas fezes
(ver também PARASITAS DO S ISTEMA HEMATOPOIÉTICO , adiante). A sarcocistose foi
recentemente diagnosticada como causa de mortalidade em papagaios mantidos ao
ar livre no sul dos EUA (exposição ou contaminação de alimento com fezes de gambá).

Vermes cilíndricos
Os psitacídeos (sobretudo periquitos australianos e papagaios da Amazônia) são
as espécies mais freqüentemente parasitadas por Ascaridia spp. A transmissão é
direta via ingestão e ovos embrionados.
Os sinais clínicos são perda da condição, fraqueza, emaciação e morte; a
obstrução intestinal é comum em infecções pesadas. O diagnóstico da infecção por
nematódeos intestinais é feito por flotação fecal ou necropsia. O levamisol (13,65%
injetável) a 2mL/L em água de bebida por 3 a 5 dias, repetido em 2 semanas, tem sido
recomendado. Os periquitos australianos podem ser tratados individualmente com
ivermectina (200µg/kg, s.c.) ou mebendazol (sonda, 50mg/kg, VO). Esses tratamen-
tos provavelmente também são eficientes para parasitas como Capillaria (verme do
papo) e Spiroptera (verme da moela), embora estes sejam mais raros.

Cestóideos
A cestoidíase é mais comum em cacatuas, papagaios cinzentos africanos e fringilídeos;
os vermes achatados Raillietina e Hymenolepis spp são os responsáveis. Os ciclos de
vida são indiretos. Os hospedeiros intermediários são mais provavelmente insetos de
vários tipos, minhocas e lesmas. Os sinais clínicos raramente estão presentes, mas
as proglótides algumas vezes são reconhecidas nos excrementos das aves afetadas.
A niclosamida tem sido dada a 250mg/kg por sonda gástrica para psitacídeos,
500mg/kg para fringilídeos e repetida em 10 a 14 dias. O praziquantel é eficiente a
0,85mg/100g de peso corporal. O controle é conseguido por meio da prevenção
contra o contato com hospedeiros intermediários.

PARASITAS DO SISTEMA HEMATOPOIÉTICO


Ver também MICRORGANISMOS HEMATOGÊNICOS, DOENÇAS AVIÁRIAS, página 1870.

Protozoários
Cacatuas importadas, aves de rapina e alguns tipos de passeriformes são os
mais freqüentemente parasitados por hematozoários como Haemoproteus,
Leucocytozoon, Plasmodium e Atoxoplasma spp.
Manejo e Doenças de Aves Ornamentais 1220

O Haemoproteus é comumente observado em esfregaços sangüíneos de


cacatuas clinicamente normais e aparece como um gametócito intra-eritrocítico que
circunda parcialmente o núcleo da célula hospedeira. O Leucocytozoon é um grande
parasita intranuclear que pode habitar hemácias, e não leucócitos como o nome
sugere. Tem uma aparência “alada” característica no esfregaço sangüíneo. O
tratamento para essas afecções é provavelmente melhor dirigido para qualquer
doença, estresse ou problemas nutricionais intercorrentes.
O Plasmodium é uma infecção muito mais séria (malária), melhor conhecida por
causar mortalidade em canários, embora tenham sido relatadas mortes em psitacídeos.
As aves afetadas apresentam hepatomegalia, esplenomegalia e depressão; os
gametócitos e esquizontes intra-eritrocíticos podem ser vistos próximos ao núcleo
hospedeiro. O tratamento é difícil, mas o cloridrato de quinacrina a 250mg/kg, VO
(sonda), uma vez ao dia, por 5 dias (repetido em 10 dias) tem sido usado.
Os ciclos de vida desses parasitas são indiretos, geralmente empregando um
mosquito ou mutuca.
Os parasitas sangüíneos menos comuns incluem o Atoxoplasma (que algumas
vezes é reconhecido como uma inclusão intracitoplasmática nos linfócitos circulan-
tes), os tripanossomos e várias microfilárias.

Filarídeos
Os psitacídeos podem hospedar filárias adultas (Pelecitus spp, Paraprocta sp e
outras) em vários locais (pés, sacos aéreos, cavidades corporais, tecidos conectivos)
e nem sempre exibem sinais de doença. No entanto, em casos de pés, jarretes ou
dedos inchados em espécies sul-americanas, devem-se considerar os filarídeos. As
microfilárias podem ser vistas no sangue tecidual ou periférico.
Recomenda-se o tratamento por meio de remoção cirúrgica e/ou injeção de
ivermectina a 200µg/kg (provavelmente repetida em 2 a 3 semanas).

DOENÇAS VIRAIS
Doença de Newcastle velogênica viscerotrópica
A doença de Newcastle velogênica viscerotrópica (DNVV) (ver pág. 1928),
causada por um paramixovírus, é uma ameaça significante para a indústria de aves
domésticas. Existem várias cepas menos patogênicas dos vírus; uma infecção por
paramixovírus do Grupo 3 tem sido relatada em cacatuas e é suspeita em outras
espécies. Tanto a síndrome de “rodopio” como a de “agitação” têm sido ligadas a
possíveis paramixovírus do Grupo 3 em periquitos terrestres australianos, cacatuas
e fringilídeos. As calopsitas e as cacatuas são altamente suscetíveis aos paramixovírus
em geral; os papagaios da Amazônia e as aratingas o são em menor grau; As araras,
os lóris, os papagaios cinzentos africanos, os fringilídeos e os canários são
relativamente resistentes. A transmissão se faz por aerossóis respiratórios, conta-
minação fecal de comida/água, contato direto com ave(s) infectada(s) e fomitos.
As aves podem ser assintomáticas ou morrer subitamente. Os sinais incluem
depressão, anorexia, perda de peso, espirros, corrimento nasal, dispnéia, conjun-
tivite, diarréia verde-amarelada brilhante, ataxia, meneios de cabeça e opistótono.
Em casos prolongados, paralisia uni ou bilateral de pernas e asas, coréia, torcicolo
e pupilas dilatadas também podem ser observados.
As lesões incluem hepatomegalia, esplenomegalia, hemorragias petequiais ou
equimóticas em superfícies serosas de todas as vísceras e sacos aéreos, saculite
aérea e fluido peritoneal cor de palha excessivo. O diagnóstico é feito por isolamento
do vírus.
Manejo e Doenças de Aves Ornamentais 1221

Apenas o tratamento sintomático é possível, e até hoje não é aconselhável. Se


a doença for suspeitada, deve ser notificada às autoridades competentes. A
vacinação está proibida para aves que estejam entrando nos EUA, porque ela não
elimina o estado de portador e dificulta a detecção do vírus durante a quarentena.

Doença de Pacheco dos papagaios


É uma doença aguda e altamente contagiosa dos psitacídeos, causada por um
herpesvírus. Está associada ao estresse, que pode fazer com que portadores
saudáveis eliminem o vírus e iniciem a infecção em aves suscetíveis. Espalha-se por
contato direto, aerossóis ou contaminação de alimento ou água.
Os papagaios da Amazônia, araras, cacatuas e algumas aratingas, por exemplo,
as que têm fronte em forma de pêssego, são altamente suscetíveis. A morbidade em
periquitos asiáticos e australianos é geralmente apenas esporádica. A maioria das
aratingas é relativamente resistente. As jandaias e as aratingas da Patagônia e de
olho branco podem ser os hospedeiros naturais na vida selvagem, e certos indivíduos
entre elas podem ser eliminadores assintomáticos do vírus quando estressados. A
maior parte das outras espécies provavelmente pode agir como portador.
Os sinais incluem morte (carcaças bem magras), uratos amarelo-brilhantes com
fezes escassas, anorexia terminal e icterícia visível (algumas araras). À necropsia,
as aves afetadas apresentam um fígado aumentado que pode estar mosqueado ou
apresentar outras alterações de cor. As petéquias são encontradas algumas vezes
nas coronárias, moela e gordura mesentérica. Ocasionalmente, também ocorrem
edema de gordura mesentérica e ascite. Encontram-se corpúsculos de inclusão
intranucleares eosinofílicos no fígado e baço. O diagnóstico diferencial é o de
salmonelose aguda e reovirose de psitacídeos. A reovirose é semelhante à hepatite
herpesvirótica, mas é melhor conhecida por afetar papagaios cinzentos africanos,
papagaios “timneh” cinzas e cacatuas. Não se observam corpúsculos de inclusão e
usa-se sorologia para o diagnóstico. Não há tratamento disponível para nenhuma
das duas doenças, embora tenham-se usado injeções IM de aciclovir em alguns
casos de herpes. A providência mais prudente a ser tomada é dividir imediatamente
o grupo em vários grupos menores e mantê-los em quartos ou prédios separados.
São úteis a higiene rigorosa e a prevenção da contaminação da comida e água. Já
está disponível uma nova vacina (licença condicional nos EUA) e esta tem sido
recomendada para as espécies de papagaio mais suscetíveis em coleções ou
grupos reprodutivos abertos.

Bouba aviária
As poxviroses mais importantes das aves ornamentais são a bouba dos canários,
a bouba dos papagaios, a bouba dos periquitos e a bouba dos pombos.
Sinais clínicos – Os sinais dependem da suscetibilidade do hospedeiro e da
virulência do vírus. Existem três formas clínicas: 1. cutânea – pápulas discretas,
pústulas ou crostas ásperas na pele (depedendo do estágio de infecção) desenvol-
vem-se em partes do corpo sem penas. A mortalidade é baixa e a infecção
geralmente é autolimitante; 2. diftérica – lesões fibrinonecróticas extensas desenvol-
vem-se nas membranas mucosas da orofaringe, trato respiratório superior e esôfago
(ocasionalmente na conjuntiva). A mortalidade é alta; 3. aguda – o início dos sinais
gerais (incluindo depressão, cianose, anorexia e morte rápida) é repentino. A
transmissão é feita por contato direto com aves ou fômites infectados e os insetos
podem agir como vetores mecânicos.
A bouba dos canários pode ocorrer na forma aguda com sinais respiratórios e
morte em 1 a 3 dias, ou como uma infecção crônica com lesões dérmicas
proliferativas ao redor da boca, olhos, narinas ou pés. O vírus provoca a formação
Manejo e Doenças de Aves Ornamentais 1222

de corpúsculos de inclusão intracitoplasmáticos eosinofílicos (corpúsculos de


Bollinger).
A bouba dos papagaios é comum entre os papagaios da Amazônia (especial-
mente o de testa azul), tuins, agapórnis, periquitos australianos e periquitos rosela;
Os agapórnis aparentemente são suscetíveis tanto à bouba dos papagaios como à
bouba deles próprios. Os vírus da varicela podem causar mortalidade alta nos
agapórnis.
A maioria dos sinais envolve os tecidos perioculares. No curso inicial da doença,
blefarite e conjuntivite unilaterais geralmente estão presentes e levam a edema
palpebral, que faz com que o olho afetado se feche; seguem-se úlceras e crostas no
canto lateral ou medial do olho. A descarga ocular serosa torna-se mucóide e lesões
oculares podem-se desenvolver (ceratite, ceratite ulcerativa, uveíte anterior e possi-
velmente endoftalmia). O aparecimento de cicatrizes nas pálpebras e pequenas
opacificações da córnea são seqüelas comuns, embora os danos permanentes
sejam relativamente menores se comparados às lesões originais. As lesões dérmi-
cas incluem pápulas escamosas nas comissuras da boca, margem do ceroma e ao
redor ou no interior das narinas. Também são observadas placas salientes e
superficiais na área das coanas, na base da língua, na faringe posterior e dentro do
esôfago. Anorexia, espirros, dispnéia e oclusão das narinas podem ser conseqüên-
cias. Algumas vezes ocorre morte e esta pode estar relacionada a septicemia,
pneumonia ou inanição. Infecções fúngicas secundárias não são incomuns.
Diagnóstico – O diagnóstico é feito por isolamento do vírus e achados histoló-
gicos típicos (hiperplasia epidérmica com degeneração vacuolar, vesículas intra-
epiteliais e corpúsculos de inclusão intracitoplasmáticos eosinofílicos).
Tratamento e controle – Recomenda-se vitamina A parenteral, pomadas
oftálmicas, calor, umidade, antibióticos parenterais, limpeza diária do olho afeta-
do e preocupação com a dieta. Uma vacina para bouba dos papagaios tem sido
liberada sob licença condicional nos EUA e pode tornar-se rotineira para espécies
como agapórnis e papagaios de testa azul. Sempre que tais aves forem
embarcadas, ou que uma nova ave for introduzida, haverá risco. A vacina para
bouba dos canários tem sido usada há muitos anos na Europa. As vacinas
comerciais para bouba dos pombos e das galinhas não são eficientes em
psitacídeos, e as vacinas convencionais para bouba das galinhas não protegem
estas contra a bouba dos papagaios.

Vírus da influenza aviária


As influenzas aviárias são causadas por ortomixovírus. Os vírus hemaglutinantes
são quase sempre encontrados em passeriformes (sobretudo fringilídeos africa-
nos), porém menos freqüentemente em psitacídeos (ver também pág. 1961).

Doença do primeiro empenamento do periquito australiano


É uma síndrome viral (papovavírus-poliomavírus psitacídeo) melhor conhecida
devido à sua influência na mortalidade de filhotes de psitacídeos, originalmente de
periquitos australianos e agora descrita com freqüência crescente em papagaios
recém-nascidos. Embora os filhotes de periquito australiano sobreviventes apre-
sentem anormalidades de empenamento, essa síndrome pode ser distinta da “muda
francesa” clássica. A muda francesa é geralmente descrita como o surgimento
retardado ou anormal das penas primárias da cauda e asas em filhotes de periquito
australiano de segunda ninhada, e tem uma possível associação com outra
síndrome viral, a doença das penas e bico dos psitacídeos (ver adiante).
Os sinais nos filhotes afetados incluem empenamento retardado, diarréia,
desidratação, abdome inchado/ascite, pele eritematosa, hemorragias subcutâneas
Manejo e Doenças de Aves Ornamentais 1223

e morte. Observa-se mortalidade alta em aves de 1 a 3 semanas de idade. O


crescimento de algumas penas pode ser retardado nos periquitos australianos que
sobrevivem > 2 semanas; o empenamento pode variar nos sobreviventes de outras
espécies mas geralmente é normal. Os adultos assintomáticos podem ser portado-
res e a infecção é possivelmente transmitida por meio dos ovos.
Os rins e o fígado estão aumentados e podem ser pálidos, congestos, mosqueados,
ou apresentar focos puntiformes brancos. Hemorragias petequiais ou equimóticas
podem estar presentes, particularmente nas vísceras e no tecido subcutâneo do
pescoço e tórax. O coração fica aumentado, com hidropericárdio, e a superfície pode
apresentar focos puntiformes brancos e múltiplos. Os corpúsculos de inclusão
intranucleares são vistos no fígado, rins, coração, baço, medula óssea, glândula
uropigial, pele, folículos das penas e em qualquer outro lugar.

Doença das penas e bico dos psitacídeos


A doença das penas e bico dos psitacídeos (DPBP) é debilitante e pode ser
reproduzida em cacatuas e periquitos australianos que tenham recebido macerados
de folículos de penas de aves afetadas. São encontradas inclusões intracito-
plasmáticas basofílicas no epitélio folicular e recentemente encontrou-se uma
pequena partícula viral.
Embora seja principalmente uma doença de cacatuas, muitos outros psitacídeos
têm sido descritos com lesões típicas. A “muda francesa” clássica (ver também pág.
1227) também tem sido ligada ao vírus. A infecção natural parece ocorrer primaria-
mente em aves < 5 anos de idade.
Os achados típicos incluem perda de penas, penas jovens anormais (contraídas,
agrupadas ou subdesenvolvidas), penas maduras anormais (sangue no canhão) e
graus variados de anormalidade do bico. Os bicos têm sido descritos como
brilhantes, supercrescidos, quebrados ou apresentando necrose do palato. As aves
podem apresentar lesões nas penas, no bico ou em ambos; todas as lesões são
progressivas se não tratadas. A imunossupressão é parte da síndrome. O diagnós-
tico está baseado na aparência externa da ave e em biópsias de folículos de pena
afetados que exibem inclusões intracitoplasmáticas basofílicas.
A natureza contagiosa da DPBP e seu provável resultado terminal justificam a
eutanásia na maioria dos casos. Higiene rigorosa, eliminação de refugos e quaren-
tenas extensas são altamente recomendadas em colônias reprodutivas de cacatuas.
A remoção de todos os ovos para limpeza e incubação também pode ser útil.

NEOPLASIAS
Muitas formas de câncer são comuns em aves de estimação; a mais notável é o
adenocarcinoma renal nos periquitos australianos, uma importante causa de morte
em machos. A claudicação em periquitos australianos machos jovens, com perda
de peso intercorrente e uma massa abdominal palpável, constitui-se em um achado
típico. As fêmeas ocasionalmente desenvolvem tumores renais, porém mais fre-
qüentemente, uma massa em uma ave fêmea corresponde a um tumor ovariano. Os
tumores testiculares também são comuns em periquitos australianos machos e
podem produzir alterações na cor do ceroma.
A claudicação causada por pressão no nervo ciático não é tão comum em
tumores gonadais mas acontece. A constipação e/ou o emplastramento fecal são
vistos em casos avançados. As radiografias são úteis no diagnóstico (moela
deslocada ventralmente). Esses tumores raramente são metastáticos; ocasional-
mente tem-se usado microcirurgia em casos precoces. Os implantes radioativos
(125I) também têm despertado alguma atenção em terapia experimental. A maioria
Manejo e Doenças de Aves Ornamentais 1224

das aves de estimação é tratada com prednisolona de longa duração (metilpredni-


solona, 1mg/periquito australiano, IM). Os tumores gonadais são freqüentemente
císticos, e a drenagem de fluido também proporciona certo alívio. Opta-se pela
eutanásia em casos avançados.
Os fibrossarcomas são quase sempre observados em pássaros de estimação,
com afinidade por asas, pernas e face. Os fibrossarcomas alares são melhor
tratados com a amputação, à medida que a invasão local tende a impedir a remoção
da massa. As amputações das pernas não tendem a ter o mesmo sucesso.
O linfossarcoma e as síndromes semelhantes à leucose aviária são comumente
descritos em aves ornamentais. A esplenomegalia em grupos de canários (com
infiltrados mononucleares no fígado e baço) deve ser cuidadosamente distinta da
atoxoplasmose.

DOENÇAS NUTRICIONAIS
Desequilíbrio cálcio/fósforo/vitamina D 3 – As dietas de sementes são bem
conhecidas por seus problemas com o metabolismo de cálcio (Ca) e fósforo (P). As
sementes de girassol, que tendem a ser preferencialmente escolhidas pela maio-
ria dos psitacídeos, são pobres em Ca e ricas em gordura. As fontes de vitamina
D 3 também não estão sempre disponíveis em quantidades suficientes para os
pássaros de estimação que não recebem um suplemento ou dieta variada. A
remoção da semente de girassol e o oferecimento de semente de açafrão, ou
mesmo de semente de girassol descascada, quase sempre promovem a experi-
mentação e a expansão da dieta.
Algumas manifestações bem conhecidas de deficiências minerais em aves de
estimação incluem a retenção do ovo, hipocalcemia aguda (sobretudo em papagaios
cinzentos africanos) e fraturas patológicas/osteoporose. O raquitismo e a “perna-torta”
são freqüentemente vistos nos filhotes (sobretudo rolas, calopsitas e periquitos austra-
lianos) quando os pais não podem supri-los com os nutrientes corretos. A “perna-torta”
também tem sido ligada a fatores genéticos e do substrato.
A retenção do ovo às vezes está relacionada a outros problemas além do consumo
insuficiente de Ca, porém a resposta à terapia com este, em muitos casos, é notável.
A história geralmente indica um colapso agudo ou fraqueza; as fêmeas freqüentemente
descem ao chão da gaiola, ou podem-se apoiar com o bico nas grades da gaiola. Uma
palpação suave geralmente revela um ovo na cavidade abdominal. Se as radiografias
tiverem de ser usadas para o diagnóstico, as injeções de Ca deverão ser aplicadas
primeiramente, pois as aves hipocalcêmicas raramente apresentam ovos bem calcifi-
cados. Recomenda-se a terapia imediata com Ca em qualquer caso, junto com
aumentos na temperatura e umidade. O calor pode ser transferido rapidamente em uma
emergência ao se colocar a ave sobre uma bolsa plástica de água quente.
Após a ave ter-se estabilizado (,1h), pode-se lançar mão de manipulação suave
para tentar-se extrair o ovo. Outro tratamento consiste na aspiração percutânea
seguida de pressão lateral para quebrar o ovo. Raramente ocorre laceração do
oviduto. Recomenda-se terapia de suporte com antibióticos para a maioria das aves
com ovos retidos. Se a ave parece estar em choque, podem-se administrar esteróides.
Administra-se cálcio IM, e s.c. se diluído (0,5 a 1mL/kg de uma solução de 5mg/mL de
gliconato de cálcio + 5mg/mL de lactato de cálcio) e mantido com um suplemento oral.
Também se administra ocitocina em muitos casos (0,01 a 0,1mL, IM).
A hipocalcemia aguda em papagaios cinzentos africanos e calopsitas é ca-
racterizada por fraqueza, tremores e ataques convulsivos. A etiologia exata é
desconhecida, à medida que alguns pássaros parecem ser relativamente bem
nutridos. Entretanto, o Ca parenteral efetua uma melhora imediata, e os níveis
Manejo e Doenças de Aves Ornamentais 1225

sangüíneos de Ca são consistentemente baixos. O diagnóstico diferencial inclui


a intoxicação por chumbo.
Deficiência de vitamina A – Freqüentemente não é reconhecida em sua forma
subclínica nas aves de estimação, embora aves malnutridas possam exibir lesões
claras. O uso da vitamina no tratamento de várias doenças também está aumentando.
As placas brancas (hiperceratose) no interior e ao redor da boca, olhos e seios são
típicas. Afecções epiteliais crônicas como abscessos digitais, sinusite e conjuntivite
têm sido refratárias a outros tratamentos que possam justificar a terapia com vitamina
A. A vitamina A parenteral pode ser administrada IM (100.000u/kg). As dietas de
todas as aves ornamentais devem ser avaliadas quanto ao teor de vitamina A.
Deficiência de iodo – O bócio ou hiperplasia tireóidea é um problema sério de
periquitos australianos de estimação em determinadas áreas. As glândulas tireóides
normais dos periquitos australianos têm , 3mm de comprimento, mas aumentam
para ≥ 1cm. Os sinais clássicos incluem estertores respiratórios, chiados ou estalidos
devidos à pressão da tireóide na siringe. Observa-se regurgitação em alguns casos
severos, e a veia jugular (direita) pode estar ingurgitada; esses sinais estão relacio-
nados à obstrução mecânica da entrada do tórax. As aves afetadas toleram pouco
estresse; o diagnóstico algumas vezes é fechado por meio de uma injeção-teste de
iodeto de sódio (0,01 a 0,02mL/periquito australiano, IM). A resposta à terapia (por
diminuição do estertor respiratório) geralmente é vista em < 24h.
O hipotireoidismo e a neoplasia da tireóide são seqüelas possíveis em casos
crônicos. As calopsitas são ocasionalmente afetadas por hiperplasia da tireóide,
porém não se tem relatado obstrução da entrada do tórax.
Os métodos mais fáceis de se evitar essa síndrome correspondem a tabletes de
cálcio iodado (rosados) ou misturas de sementes especialmente iodadas (conteúdo
descascado). O iodo-lugol pode ser usado na água de bebida, mas a fidelidade do
proprietário é pequena em terapias a longo prazo.
Nanismo – É uma síndrome de psitacídeos jovens criados manualmente
causada por fórmulas de alimentação inadequadas e/ou consumo calórico insufi-
ciente. Os sinais incluem uma cabeça grande em proporção ao corpo; pés, dedos
e pontas das asas finos; pele pálida; empenamento retardado ou maldirecionado;
e ganhos de peso inadequados. O tratamento inclui exame minucioso da fórmula e
da freqüência e quantidade de alimentação.
Doença do acúmulo de ferro – A hemocromatose é um problema comum em
mainás e tucanos de estimação, assim como em certas aves de zoológico, como a
ave-do-paraíso. Acredita-se que a hemocromatose esteja relacionada, em parte, ao
consumo excessivo de ferro na dieta. No entanto, nem todas as aves se tornam
afetadas quando mantidas em dietas semelhantes. Alguns acreditam que uma dieta
de manutenção que contenha ferro < 40ppm (mg/kg) possa prevenir a doença.
Dietas pobres em ferro e sangrias têm sido úteis no tratamento de casos leves. É
prudente recomendação de dietas pobres em ferro para mainás. Uma base pobre
em ferro geralmente é formada pela mistura de 2 partes de arroz cozido com 1 parte
de ração para gato enlatada; frutas pobres em ferro (por exemplo, maçãs, bananas)
e suplementos vitamínicos/minerais isentos de ferro também devem ser providen-
ciados separadamente.

INTOXICAÇÕES
Ao contrário da crença popular, as mortes por intoxicação por plantas caseiras
e “gases” misteriosos raramente são encontradas na prática clínica. Porém, o
politetrafluoretileno (revestimento de assadeiras) pode liberar um gás letal se as
panelas se superaquecerem. Muito mais comum é a intoxicação por chumbo; as
Manejo e Doenças de Aves Ornamentais 1226

tintas continuam uma fonte importante, geralmente tinta “velha”. As aves de


estimação freqüentemente “provam” lampiões, chumbagem de vitrais, puxadores
de cortina feitos de chumbo e outros objetos plúmbeos.
Os sinais clínicos de intoxicação por chumbo incluem vômitos, excrementos
líquidos rosados ou castanhos (comuns com hemoglobinúria), fraqueza, ataxia e
ataques convulsivos. As radiografias quase sempre mostram material anormalmen-
te denso no interior do ventrículo. Recomenda-se remoção cirúrgica em aves
grandes o suficiente para torná-la prática. Indica-se cálcio EDTA (30 a 50mg/kg, IM,
3 vezes ao dia, até que se chegue ao estado assintomático) em todos os casos, e
a resposta à terapia geralmente é rápida. Os laxantes para felinos podem ser
administrados para ajudar a desalojar as partículas de chumbo contidas na moela.
O prognóstico é reservado em casos crônicos.

LESÕES TRAUMÁTICAS
As lesões traumáticas em aves ornamentais geralmente são fáceis de se tratar.
Quase sempre se encontram pernas fraturadas em periquitos australianos, e
normalmente envolvem o osso tibiotársico. A sedação com isoflurano e a aplicação
de uma fita de esparadrapo tipo “sanduíche” são eficientes. Os poleiros devem ser
acolchoados para aves que precisem se sustentar em 1 perna só (todas as unhas
devem ser cortadas). O solvente de esparadrapo é útil para remover as talas e
pensos, mas deve ser usado apenas em áreas bem-ventiladas.
As lesões infligidas por gatos são relativamente incomuns, mas sempre justifi-
cam a antibioticoterapia (ver DOENÇAS BACTERIANAS, pág. 1213). A necrose gangrenosa
dos dedos é uma lesão traumática vista em canários e outros fringilídeos. Filamen-
tos ou linhas muito finas podem-se enrolar ao redor dos dedos de adultos e filhotes
no interior do ninho. Necessita-se de hemostasia cuidadosa e de aumento por lupa
para uma remoção segura. As queimaduras são freqüentes em aves com vôo livre
(geralmente afetando os pés), e estão se tornando um problema importante em
papagaios recém-nascidos criados manualmente. A comida aquecida em microon-
das e não misturada antes da alimentação pode produzir queimaduras focais no
papo. Uma terapia cirúrgica conservativa geralmente obtém sucesso.

DOENÇAS DE ETIOLOGIA INCERTA


A doença da emaciação da arara ou síndrome de dilatação proventricular é
caracterizada por perda de peso crônica, regurgitação e aumento do proventrículo.
Têm sido descritos araras, cacatuas e outros psitacídeos com achados típicos,
incluindo leiomiosite linfocítica multifocal e ausência de plexos mientéricos normais
no corte histológico do proventrículo. Não se descreveu tratamento de sucesso.
A conjuntivite da calopsita é prevalente em calopsitas recentemente embarcadas
ou vendidas. Nota-se um inchaço anterior, eritematoso e característico na conjun-
tiva. Tem-se suspeitado tanto de clamidioses como de micoplasmoses localizadas.
A remissão é mais rápida com pomada oftálmica de tetraciclina em conjunto com
suporte nutricional.
Acredita-se que os papilomas cloacais sejam transmissíveis, ainda que nunca
se tenha descoberto um agente viral. Tendem a ocorrer como problema grupal,
sobretudo em colônias reprodutivas de araras. O tecido prolapsado é eritematoso
e tem origem na face interna da cloaca. Não é incomum se espalharem para a boca
e trato gastrointestinal superior. Indica-se a remoção cirúrgica (eletrocautério), mas
esta não pode ser considerada como cura permanente. Podem ocorrer recidivas
anualmente (não freqüentemente) e as vacinas autógenas podem ou não ser úteis.
Manejo e Doenças de Aves Ornamentais 1227

Os lipomas dos periquitos australianos têm sido ligados a neoplasia, hipotireoi-


dismo, fatores genéticos e obesidade simples. Recomenda-se o controle de peso no
manejo das aves afetadas.
O diabetes melito é visto em aves de estimação e causa sinais claramente
típicos de poliúria, polidipsia e níveis altos de glicose no sangue e na urina. O
tratamento com insulina é eficiente, mas pode não ser prático.
A gota é fonte de alguma confusão devido às 2 expressões diferentes de cristalização
do ácido úrico que são produzidas. A gota articular é uma doença de etiologia incerta
e é uma entidade distinta da gota visceral. A gota visceral é um evento ante mortem
relacionado à desidratação com ou sem insuficiência renal terminal. A relação da gota
articular com altos níveis de proteína ou insuficiência renal terminal nunca foi claramente
documentada. Entretanto, as aves com gota devem ter níveis de ácido úrico extrapolados,
e devem ser mantidas em uma dieta pobre em proteínas. A gota articular é melhor
diagnosticada por um aspirado que exiba os cristais fusiformes característicos. As
articulações distais das asas e pernas são afetadas primeiramente na maioria das aves.
Os tofos podem ser vistos através da pele e lembram abscessos/granulomas subcutâ-
neos. A intervenção cirúrgica é controversa e geralmente não é recomendada. O
alopurinol (30mg/kg, 2 vezes ao dia, VO) em combinação com um analgésico (ácido
acetilsalicílico) tem sido o tratamento tradicional, embora seja conhecido apenas por
deter o surgimento de lesões ou depósitos adicionais. No entanto, um novo regime de
drogas (colchicina/probenecida) mostra muito mais futuro na reversão de lesões. Embo-
ra as conclusões ainda sejam preliminares, o regime de colchicina é o primeiro a
demonstrar remissão real. Dilui-se um tablete combinado (0,5g de probenecida e 0,5mg
de colchicina) em pó de dextrose ou glicose (15mL), e deve-se dar 0,5mL da mistura
resultante (em xarope) 2 vezes ao dia a um pássaro de 100g. Outras formas de dosagem
também têm sido descritas; podem ocorrer ataxia e outros sinais nervosos em caso de
superdosagem.
Os cistos das penas são penas encravadas que resultam em uma massa
granulomatosa, e como tais, são fáceis de se tratar. Infelizmente, certas raças de
canários (norwich, border) estão quase sempre carregadas de centenas de penas
anormais nas regiões peitoral e dorsal. A remoção cirúrgica de todas as penas de
uma área ou a remoção regular de penas encistadas podem ser úteis. Não se
suspeita de etiologia viral. As “penas em espanador” são quase certamente o
resultado de um gene letal, à medida que os periquitos australianos afetados não
sobrevivem mais que alguns meses. Elas são chamadas assim devido à sua
aparência bem desgrenhada (não encontrada em outras espécies). Suspeita-se
que a muda francesa seja uma virose e possa abranger mais de um processo
patológico (ver pág. 1223).
A bicagem das penas é uma síndrome multifatorial que anteriormente era
atribuída apenas ao tédio. Os fatores importantes podem incluir (dependendo da
espécie) tédio, estresse/frustração social ou sexual, estresse associado a medo
ou nervosismo, e hábito residual após a resolução de outros fatores psicológicos.
Doenças infecciosas ou outras patologias também estão envolvidas em alguns
tipos de automutilação. Suspeita-se que a giardíase (ver pág. 163) nas calopsitas
influencie a bicagem de penas nessa espécie. As calopsitas e os papagaios,
assim como as cacatuas, podem responder a uma terapia com medroxiproges-
terona (30mg/kg, IM), mas não se recomendam doses repetidas. Os colares
elisabetanos (os de filme de raio-X são os melhores) algumas vezes são úteis na
interrupção do hábito de bicagem de penas, mas devem ser reservados para os
casos mais severos. Não se recomenda seu uso repetido; prefere-se que o
proprietário aceite a aparência da ave e a proteja do estresse do frio.
O fornecimento de brinquedos mastigáveis seguros e de ramos e galhinhos em
uma base estável ajuda a desviar o hábito de mastigação de penas do pássaro. Um
Manejo e Doenças de Aves Ornamentais 1228

companheiro de gaiola também pode distrair a ave, e recomenda-se a instalação de


uma caixa-ninho ou esconderijo.

MANEJO, CRIAÇÃO E DOENÇAS


DAS RAPOSAS
MANEJO
A importância da limpeza na criação de raposas ( Vulpes spp) não pode deixar
de ser superenfatizada. Cercados altos, com a parte inferior de arame trançado,
devem ser utilizados para raposas em fazendas de criação. Estes cercados
interrompem o ciclo de vida de muitos parasitas, devido ao fato das fezes caírem
através do arame. Geralmente as raposas são mantidas em cercados individuais
com um canil anexo.
A ração para raposas criadas em fazendas é grosseiramente a mesma servida
aos visons, consistindo em cereal comercial cozido com galinha, subprodutos
bovinos e peixe (ver pág. 1506). Rações peletizadas para raposas estão disponíveis
comercialmente e têm dado um resultado satisfatório. A raposa fêmea geralmente
mostra sinais de estro no final de janeiro e fevereiro. O período varia entre as raposas
azul e prateada. A maioria dos fazendeiros usa um sistema de acasalamento
poligâmico, levando a fêmea ao cercado do macho. A maioria das fêmeas fica em
cio por 2 a 3 dias e acasala 2 ou 3 vezes durante este período. Muitos fazendeiros
utilizam citologia vaginal ou “indicadores de cio” eletrônicos para determinar a época
apropriada para o melhor acasalamento. Uma pesquisa considerável está sendo
feita sobre inseminação artificial, a qual está se tornando largamente utilizada em
fazendas maiores. O período de gestação é de , 52 dias. As raposas têm uma
ninhada por ano. As raposas azuis devem ter em média 6 a 7 filhotes por ninhada
e as raposas prateadas 3 a 5 filhotes. As raposas são geralmente sacrificadas para
aproveitamento da pele em novembro e dezembro.

DOENÇAS DAS RAPOSAS


Cinomose – As raposas são suscetíveis ao vírus da cinomose canina (ver
pág. 494). O vírus é facilmente transmitido entre cães, visons, furões, guaxinins e
outras espécies suscetíveis. Devido a altas densidades populacionais em confinamen-
to, e à alta transmissibilidade do vírus, a mortalidade em criações de animais não
vacinados pode ser de 50% no grupo reprodutivo e 75% nos filhotes. O diagnóstico é
baseado (como nos cães) em sinais clínicos; lesões histológicas, incluindo a presença
de corpúsculos de inclusão; e imunofluorescência. O procedimento de controle mais
eficiente durante um surto é sacrificar imediatamente todas as raposas que mostrem
sinais da doença e vacinar todas as outras. Todos os animais mortos devem ser
incinerados, e todo o equipamento completamente desinfetado.
Já que não existem vacinas contra cinomose permitidas para raposas, utiliza-se
a vacina para visons. Algumas das vacinas atuais contra cinomose canina podem
levar a uma encefalite pós-vacinal nas raposas. Sugere-se a vacinação de filhotes
desmamados com 12 a 13 semanas de idade. Recomenda-se a vacinação anual de
raposas reprodutoras.
Encefalite das raposas – Essa doença, causada pelo mesmo vírus que causa
a hepatite infecciosa canina (ver pág. 505), pode causar sérias perdas quando
raposas não vacinadas são criadas em altas concentrações. A mortalidade pode
variar de 2 a 40% nas fazendas afetadas.
Manejo, Criação e Doenças das Raposas 1229

Ao contrário da cinomose, a encefalite das raposas tem um curso rápido. Os sinais


incluem perda de apetite, diarréia sanguinolenta, depressão e, quase sempre, sinais
nervosos como convulsões e paralisias; a morte ocorre após um período de poucas
horas a poucos dias. O vírus invade o revestimento endotelial de pequenos vasos
sangüíneos e células do fígado e rins. Os sinais e a morte se devem à hemorragia
de pequenos vasos por todo o corpo, incluindo o cérebro. O diagnóstico é confirmado
pela demonstração de corpúsculos de inclusão intranucleares típicos no fígado, rim
e células endoteliais; por isolamento de vírus; ou por imunofluorescência.
Existe uma vacina inativada. Os filhotes de raposas fêmeas não vacinadas são
vacinados no desmame, e os outros quando alcançam 10 a 12 semanas de idade.
Os reprodutores devem receber vacinas de reforço em dezembro ou janeiro.
Intoxicação por salmão – Esta doença (ver pág. 501), causada por Neorickettsia
helminthoeca, é o resultado da ingestão de salmão, truta ou truta-cabeça-de-ferro,
que alberguem o vetor trematódeo, Nanophyetus salmincola. Os sinais são seme-
lhantes aos do cão e incluem febre, inapetência, vômitos, letargia e diarréia. Nas
raposas não tratadas, geralmente ocorre morte.
Botulismo – Manipulação e estocagem inapropriadas de comida são a fonte usual
de botulismo nas raposas, assim como nos visons (ver pág. 1273). A estocagem de
subprodutos cárneos em tambores de metal, com condições anaeróbicas predomi-
nantes, é um excelente meio para a produção de toxina botulínica. Em quase todos
os casos, a toxina do Tipo C tem sido incriminada. Os sinais são semelhantes àqueles
vistos no visom. Os animais afetados apresentam paralisia flácida e respiração
abdominal, geralmente seguida de morte. Já que vacinas aprovadas para raposas
não estão disponíveis, usam-se as aprovadas para o visom.
Parvovirose canina – Embora canídeos em parques zoológicos tenham
sucumbido à parvovirose canina, não têm sido relatados surtos dessa última (ver
pág. 299) em fazendas comerciais de raposas; entretanto, a possibilidade de um
surto deve ser mantida em mente. Alguns fazendeiros de raposas as vacinam
rotineiramente com vacinas inativadas contra enterite viral do visom ou parvovirose
canina.
Parasitas – Tanto parasitas internos como externos são controlados por meios
essencialmente idênticos àqueles recomendados aos cães.
As pulgas (Ctenocephalides canis) infestam as raposas e causam irritação da
pele e algumas vezes anemia severa. São particularmente nocivas aos filhotes. A
sarna otodéctica (Otodectes cynotis) é comum em raposas criadas em fazendas. As
raposas infectadas balançam suas cabeças e cavoucam a base das orelhas com
suas patas dianteiras. Pode resultar uma otite bacteriana ou micótica secundárias.
Algumas raposas mantêm suas cabeças para um só lado (para tratamento ver
PULGAS, pág. 962 E OTITE EXTERNA, pág. 372).
A sarna sarcóptica (Sarcoptes scabiei) pode causar sérias perdas econômicas
em raposas criadas em fazendas. Os sinais clínicos são semelhantes àqueles vistos
em cães. A ivermectina a 200µg/kg, s.c. tem sido usada com sucesso no tratamento
de surtos, porém os relatos de reações idiossincrásicas em cães nesta dosagem
sugerem cuidado no uso deste produto em raposas.
Os nematóideos (Uncinaria stenocephala) ocorrem em raposas criadas comer-
cialmente e são responsáveis por mortes em filhotes. Estes são infectados por
larvas no leite da raposa fêmea. Eles começam a morrer aos 12 dias de idade com
anemia profunda. Amostras de fezes destes filhotes são quase sempre negativas
para ovos, e pode ocorrer morte antes que a infecção se torne patente. Os filhotes
com infecção mais discreta podem crescer pouco, parecer magros e ter uma anemia
marginal. O tratamento envolve vermifugação de filhotes aos 10 e aos 21 dias com
pamoato de pirantel. A raposa fêmea também deve ser vermifugada quando os
filhotes estiverem com 21 dias de idade.
Manejo, Criação e Doenças das Raposas 1230

As raposas são comumente infectadas por ascarídeos (Toxocara canis) , os


quais podem causar vômitos, diarréia, distensão abdominal, letargia e, ocasional-
mente, obstrução intestinal. A migração de larvas de ascarídeos pode causar
pneumonia parasítica. Os filhotes de raposa podem ser infectados, in utero ou
após a parição, pela ingestão de ovos. O tratamento envolve vermifugação de
filhotes aos 10 e aos 21 dias de idade com pamoato de pirantel ou piperazina.
Dois vermes pulmonares, Capillaria aerophila e Crenosoma vulpis, infectam
raposas. A infecção por vermes pulmonares e a conseqüente pneumonia ou
bronquite crônica podem causar morte em raposas criadas em fazenda.
As raposas podem ser infectadas com coccídios, o mais comum sendo o
Isospora bigemina. Os sinais são diarréia leve a sanguinolenta, perda de apetite
e morte. As raposas podem ser tratadas como os cães (ver pág. 870).
Dermatomicose – Embora a afecção pareça ser rara nos EUA, a Trichophyton
mentagrophytes foi incriminada em um surto. Relatou-se ser comum nas raposas
da antiga URSS.
Doenças nutricionais – O raquitismo pode ocorrer em raposas jovens logo
após o desmame. Os filhotes afetados parecem cambaios devido à curvatura dos
ossos longos e ao aumento da articulação. Algumas vezes, ocorrem a distorção dos
ossos faciais e o aumento da articulação costocondral. O raquitismo é tratado pela
correção da proporção cálcio– fósforo na dieta e pela suplementação de vitamina D.
A paralisia de Chastek (ver pág. 1277) é uma deficiência de vitamina B1 induzida
pela alimentação com certos tipos de peixe cru que contenham a enzima tiaminase.
No início do curso da doença, algumas raposas podem ter uma andadura anormal,
como se suas pernas estivessem duras; dentro de 12 a 36h, elas podem ter extensa
paralisia espástica e ser incapazes de se levantar. As convulsões quase sempre
acontecem um pouco antes da morte. O peixe cru deve ser retirado da dieta e
devem-se administrar injeções diárias de 100u de tiamina. Evita-se a doença
cozinhando-se todos os peixes antes de misturá-los à ração.
A deficiência de biotina também tem ocorrido em raposas. Medidas preven-
tivas já foram descritas para a doença no visom (ver pág. 1509).
A miocardiopatia é observada apenas quando os filhotes de raposa são
alimentados com determinados péletes comerciais. Alguns fatores estão defi-
cientes na primeira fase de crescimento do filhote, o que resulta em aumento do
ventrículo direito. A afecção pode ser evitada se a ração for suplementada com
fígado ou músculo.

MANEJO, CRIAÇÃO E DOENÇAS


DE ANIMAIS DE LABORATÓRIO
Esta discussão contém as doenças mais importantes dos animais usados em
grande número para propósito de pesquisa: camundongos, ratos, cobaias, hams-
ters, assim como furões, vários primatas não humanos e anfíbios. As doenças das
outras espécies domésticas que também são largamente usadas em pesquisa,
como cães, gatos, coelhos e galinhas, são tratadas em outras partes do MANUAL.
O Guia de Cuidados e Uso de Animais de Laboratório, DHHS, PHS (NIH,
Publicação 85-23), é uma referência primária para informação sobre princípios
básicos e padrões. Também devem-se consultar os regulamentos promulgados sob
autoridade de PL 89-544 (1966), e emendados por PL 91-579 (1971), PL 94-279
(1976) e PL 99-198 (1985), para requisições legais federais (EUA) detalhadas.
Manejo, Criação e Doenças de Animais de Laboratório 1231

MANEJO E CRIAÇÃO
Roedores de laboratório, livres de patógenos e doenças e não portadores de
anticorpos indicativos de infecção anterior, são prontamente disponíveis em vendedo-
res comerciais. A procura de tais animais em origens de boa qualidade, o transporte
deles em embalagens esterilizadas e a manutenção dos mesmos em instalações
providas de barreiras físicas e de manejo de agentes infecciosos são medidas efetivas
na prevenção contra a introdução de doenças na colônia.
Entretanto, embora existam colônias de algumas espécies de primatas, livres da
maioria dos agentes que causam doenças infecciosas nessas espécies, a maioria
dos primatas utilizados são capturados na natureza. Por essa razão, devem-se
implementar uma quarentena e um programa de isolamento rigorosos, junto ao
programa seguido nas instalações do importador.
Para o manejo apropriado, os tratadores e os pesquisadores devem ser respon-
sáveis, bem treinados, altamente motivados, sensíveis à saúde e ao bem-estar dos
animais, e diligentes na realização de suas funções e responsabilidades. Devem-se
determinar procedimentos operativos padrão e providenciar treinamento e supervisão
para assegurar um alto nível de cuidado animal, uniforme e consistentemente
aplicado. Os pesquisadores também devem ser treinados apropriadamente em
cuidado e uso humanitários dos animais de laboratório. As instalações de pesquisa
devem possuir condições ambientais cuidadosamente controladas que, junto com
programas de cuidado e uso animal conscientemente aplicados, providenciem as
melhores condições possíveis para se conduzir uma pesquisa.
Alojamento – As gaiolas, cercados ou criatórios devem providenciar 3 espaços
dimensionais adequados para permitir ajustamento postural e comportamento espé-
cie-específico normais. Quando possível, grupos compatíveis de animais devem ser
alojados juntos. Os recintos primários devem ser construídos com materiais duráveis,
ser facilmente limpos e higienizados e projetados para conforto e segurança.
Devem-se controlar cuidadosamente a temperatura, umidade, taxas de ventilação
e condições de iluminação (qualidade, quantidade e fotoperíodo) em todo o tempo.
Em geral, deve-se manter a temperatura entre 19 e 26oC para a maioria dos roedores
e 18 a 29oC para primatas. Dentro dessas faixas, os sistemas devem ser capazes de
manter temperaturas ± 2oC do ponto ideal. Deve-se manter a umidade relativa em 40
a 70% para a maioria dos roedores, 40 a 60% para coelhos e 30 a 70% para primatas,
preferivelmente dentro de 5% do ponto ideal. As taxas de ventilação devem ser de 10
a 15 trocas de ar/h. O ar não deve ser recirculado, a menos que tenha sido tratado para
remover contaminantes gasosos e particulados. A intensidade de iluminação deve ser
distribuída uniformemente e adequada para permitir a inspeção dos animais e a
manutenção da higiene e segurança pessoal, e o mais importante, o bem-estar do
animal. Os ciclos diurnos ou dia:noite, por serem determinados pelas necessidades
de uma dada espécie, devem ser controlados por temporizadores automáticos para
manter a regulação circadiana e neuroendócrina. O microambiente no interior de
certos tipos de gaiola pode ser muito diferente do macroambiente da sala. Necessita-
se de uma pesquisa cuidadosamente conduzida para que se definam as condições
ambientais ideais para cada espécie ou grupo de espécies em gaiola.
Alimentação – O alimento deve ser servido em quantidade adequada, palatável,
livre de contaminantes e nutricionalmente adequado, de acordo com as necessida-
des específicas da espécie. Os alimentos especificamente manufaturados para o
uso em animais de pesquisa são mais prováveis de ser uniformemente constituídos,
livres de contaminantes e de possuir data de fabricação. O alimento deve ser
manufaturado, transportado, armazenado e utilizado de forma que minimize sua
deterioração, contaminação ou infestação. A maioria dos animais pequenos é
alimentada à vontade; os coelhos, carnívoros de laboratório e primatas podem ser
Manejo, Criação e Doenças de Animais de Laboratório 1232

restritos a quantidades medidas de alimento por dia. Além das dietas preparadas
comercialmente e geralmente peletizadas, podem-se preparar dietas semi-sintéti-
cas ou completamente sintéticas para o uso em certos tipos de pesquisa. Dietas
autoclaváveis ou irradiadas estão disponíveis para roedores e podem ser utilizadas
quando se desejar a esterilização do alimento.
Forração – Os materiais de forração (cama) devem ser não irritantes, absorven-
tes, livres de contaminação química e patógenos e não palatáveis. Devem-se usar
quantidades adequadas para se manter os animais secos e limpos entre as
mudanças de forração ou alojamento. Recomendam-se produtos para forração
feitos com madeira rija e outros materiais que não sejam madeira macia, pois os
produtos feitos com esse material contêm óleos voláteis que podem alterar os
sistemas enzimáticos hepáticos e afetar certos tipos de pesquisa.
Água – Deve-se providenciar água potável e não contaminada em quantidades
adequadas para suprir as necessidades particulares das espécies. Recomendam-
se programas de asseguramento de qualidade que meçam pH, resistência, conteú-
do químico e carga microbiana. Pode-se exigir, sob certas condições experimentais
ou de criação, água altamente purificada, desionizada, acidificada, clorada ou
esterilizada. A água é geralmente servida à vontade em aparelhos manualmente
preenchidos ou automáticos.
Higiene – É obrigatório um nível uniformemente alto de higiene. Os comparti-
mentos de alojamento e o espaço de suporte auxiliar devem ser limpos e sanitizados
tão freqüentemente quanto necessário para manter os animais livres de sujeira,
resíduos e contaminação potencialmente nociva. As gaiolas primárias também
devem ser limpas e sanitizadas tão freqüentemente quanto necessário para manter
os animais limpos e secos. Para roedores em gaiola de piso sólido, geralmente serão
suficientes 1 a 3 mudanças/semana; para os roedores mantidos em gaiolas
suspensas sobre bandejas de excreção, as trocas quinzenais devem ser adequa-
das. Para animais maiores, os excrementos e a cama suja devem ser removidos
diariamente e os alojamentos primários devem ser limpos e sanitizados pelo menos
quinzenalmente. As garrafas de água e outros equipamentos utilizados para servir
alimento ou água devem ser limpos e sanitizados pelo menos semanalmente. Os
equipamentos automáticos de servir água em gaiolas, grades e compartimentos
devem ser drenados, enxaguados e sanitizados a intervalos freqüentes e regulares.
O aquecimento de gaiolas e outros equipamentos a 82,2oC e/ou uso de desinfecção
química apropriada, por exemplo, soluções de hipocloreto, matam bactérias e vírus
patogênicos não formadores de esporos. Todas as gaiolas e outros equipamentos
devem ser enxaguados completamente, seguindo-se o tratamento com detergentes
e/ou desinfetantes.
Controle de pestes – Devem-se instituir programas profissionalmente dirigidos
para prevenir, identificar e erradicar ou controlar insetos ou roedores ferozes ou que
tenham escapado. O uso de pesticidas deve estar geralmente confinado a áreas que
não sejam utilizadas para animais ou estocagem de alimento ou cama. Substâncias
relativamente inertes, como aerogel de sílica ou pó de ácido bórico, são recomen-
dadas e úteis no controle de insetos rastejadores, como por exemplo, baratas.

MONITORAÇÃO DA COLÔNIA
Embora a maioria dos roedores comercialmente criados, alguns coelhos, e
relativamente poucos cães, gatos e primatas possam ser obtidos como animais
SPF, os animais residentes em colônias devem ser monitorados à procura de
doenças naturalmente ocorrentes como uma medida da efetividade do programa de
controle e prevenção. Devem-se informar regularmente os pesquisadores acerca do
Manejo, Criação e Doenças de Animais de Laboratório 1233

estado de saúde dos animais de pesquisa. Junto à monitoração para doenças


infecciosas, um programa de asseguramento de qualidade deve monitorar a procura
de integridade genética, especialmente em linhagens isogênicas de pesquisa, assim
como a procura de fatores ambientais (qualidade do alimento, da água e da cama,
eficácia do programa de sanitização, manejo e qualidade do ar, luz, barulho, etc.) que
possam afetar a saúde da colônia.
A monitoração da saúde da colônia consiste em um programa definido de avalia-
ções laboratoriais e físicas regulares dos animais dentro de uma unidade, assim
como um sistema de relato de morbidade e mortalidade que permita a identificação
oportuna dos problemas potenciais. As investigações completas das enfermidades
e mortes em uma colônia são componentes essenciais de tal programa.
Ao mesmo tempo em que certos princípios gerais são aplicados, um programa de
monitoração de saúde deve ser desenvolvido especificamente para cada espécie
mantida em uma instalação, por exemplo, geralmente todos os primatas são quarentenados
e isolados em sua chegada. Devem-se realizar exames físicos, testes de tuberculina,
exames hematológicos básicos e outros testes de patologia clínica. Somando-se a
isso, pode-se realizar avaliação sorológica para herpesvírus B, síndrome da imuno-
deficiência adquirida símia e outros agentes específicos, dependendo da espécie de
primata. Os primatas devem ser liberados da quarentena apenas quando tanto o
estado de saúde como a conveniência para o uso forem determinados. Além do mais,
os primatas devem possuir tabelas de fiscalização sanitárias anuais, semestrais e
trimestrais, cada uma delas consistindo de elementos definidos.
No caso dos ratos e camundongos criados em colônia, os programas para
monitoração de doenças podem consistir de qualquer um ou todos os seguintes itens:
1. supervisão do vendedor; 2. avaliação de quarentena e isolamento; 3. avaliação
clínica regular e post mortem durante o curso dos estudos; 4. programa de animal-
sentinela; e 5. avaliação ao término do estudo. Somando-se a isso, todos os tumores
transplantáveis, células ou outros produtos biológicos a serem introduzidos devem
ser selecionados para que se evitem patógenos zoonóticos e murinos. É de interesse
particular para a saúde da colônia a necessidade ocasional e justificável para se obter
animais de origens menos bem-definidas, tais como uma colônia de pesquisador ou
outra fonte não aprovada. A presença de agentes infecciosos, tanto em tumores
transplantáveis como em fontes animais não comerciais, pode representar uma
ameaça substancial às colônias residentes e ao pessoal.

DOENÇAS DE RATOS E CAMUNDONGOS


A intervenção terapêutica pode ser prática para animais de estimação individuais,
mas pode não o ser em colônias de roedores e sob certas condições de pesquisa.
Como já foi descrito, um programa de prevenção de doenças é essencial em colônias
de ratos e camundongos.

DOENÇAS BACTERIANAS
Infecção por Corynebacterium kutscheri (Pseudotuberculose) – A infecção
por este patógeno oportunista é mais comumente inaparente, mas pode causar
descargas nasais e oculares, dispnéia, artrite ou abscessos na pele. As lesões são
variáveis, porém geralmente incluem abscessos focais no fígado, rins, pulmões,
linfonodos, e, ocasionalmente, artrite purulenta. Os abscessos geralmente se
apresentam como discretos nódulos de coloração cinzento-amarelada com até
15mm de diâmetro. O diagnóstico depende do encontro das lesões características
e do isolamento do microrganismo ou da sorologia (aglutinação ou fixação de
Manejo, Criação e Doenças de Animais de Laboratório 1234

complemento ou ainda ELISA). O tratamento com penicilina (4.500u/100g do peso


corporal IM) por 7 a 10 dias pode impedir a doença clinicamente aparente, mas não
eliminará o estado de portador.
Micoplasmose respiratória murina – É uma síndrome patológica crônica
relativamente comum, caracterizada por inflamação do trato respiratório e do ouvido
médio. Os sinais incluem estertores e dispnéia em camundongos, sendo que em
ratos ocorre descarga nasal, espirros, coriza, estertores, dispnéia, inclinação da
cabeça, incoordenação e andadura em círculos. As lesões incluem bronquite e
broncopneumonia supurativas, rinite mucopurulenta e otites média e interna. O
agente etiológico primário é a Mycoplasma pulmonis; entretanto, Pasteurella
pneumotropica, Corynebacterium kutscheri, Bordetella bronchiseptica, bacilos res-
piratórios associados a cílios (bacilos RAC), estreptococos ou vírus podem atuar
conjuntamente com o agente primário. O diagnóstico depende das lesões e do
isolamento do agente etiológico ou demonstração de anticorpos contra o agente. Já
se encontram comercialmente disponíveis testes de ELISA para detectar a IgG
sérica dos ratos contra M. pulmonis. A prevenção desta afecção pode ser feita pela
manutenção de colônias livres da infecção protegidas por uma barreira microbioló-
gica. Os surtos podem ser controlados até certo ponto por meio da administração
de oxitetraciclina na água de bebida na dose de 2 a 5mg/mL em água açucarada,
(5% de sacarose) por 10 a 14 dias. A solução deve ser preparada a cada dois dias.
Pasteurelose – A Pasteurella pneumotropica, um patógeno oportunista, existe
em estado de latência em portadores em algumas colônias de roedores. Quando
outras doenças estiverem presentes, como a infecção por vírus Sendai em camun-
dongos ou a infecção por Mycoplasma pulmonis em ratos, estas podem resultar em
pneumonia ou otite média graves. Além disso, quando os roedores estão estressados,
podem ocorrer abscessos na pele, útero, linfonodos ou sistema urinário. A
oxitetraciclina (500mg/L) ou o cloranfenicol (1g/L) na água de bebida, por 10 a 14
dias, podem ser eficientes no tratamento da doença clinicamente aparente porém
não eliminarão o estado de portador.
Infecção por Pseudomonas – As pseudomonas fazem parte da flora intestinal
normal, porém podem causar mortes prematuras em camundongos estressados,
irradiados ou imunossuprimidos de qualquer outra forma. A Pseudomonas aeruginosa
também pode causar otites média e interna em camundongos não irradiados. A
prevenção e o controle são melhor alcançados por acidificação (pH 2,5) ou cloração
(10 a 12ppm) da água de bebida.
Salmonelose (paratifóide) – Salmonella spp, geralmente a S. typhimurium ou
a S. enteritidis, podem causar enterite e septicemia com necrose focal do fígado ou
do baço em ratos e camundongos. Embora raramente seja um problema em
roedores criados comercialmente, a salmonelose pode ser introduzida em uma
colônia por roedores selvagens ou silvestres, ou por alimento ou material utilizado
para cama contaminados. Os sinais clínicos incluem anorexia, pelagem áspera,
perda de peso, conjuntivite e mortes esporádicas. Os portadores subclínicos tornam
difícil a eliminação da infecção. Devido ao risco de saúde pública, os roedores
infectados devem ser eliminados (ver também pág. 178).
Hiperplasia colônica murina transmissível – Esta síndrome, causada pela
Citrobacter freundii, variante 4.280, afeta primariamente camundongos de 2 a 4
semanas de idade. Os sinais clínicos não são específicos e incluem uma postura
curvada, pelagem áspera, prolapso retal, desidratação, tingimento perineal e fezes
malformadas e líquidas. À necropsia, um espessamento do colo descendente
devido a hiperplasia da mucosa é característico. A oxitetraciclina (500mg/L na água
de bebida) reduz os sinais clínicos, mas não eliminará o estado de portador. O
sulfato de neomicina (2g/L em água de bebida) eliminará comprovadamente a
bactéria do hospedeiro.
Manejo, Criação e Doenças de Animais de Laboratório 1235

Doença de Tyzzer – Essa doença endêmica é muito difundida em camundongos


de laboratórios da Europa e do Japão, e têm-se relatado surtos numa ampla variedade
de animais de laboratórios nos EUA (ver também págs. 182 e 1286). O microrganismo
causador é a Bacillus piliformis, um bastonete delgado e Gram-negativo. Embora a
doença seja geralmente subclínica, o estresse ou injeções de cortisona ou outras
drogas imunossupressoras podem precipitar epidemias. Os sinais incluem diarréia,
arqueamento de dorso, pelagem em más condições e mortes súbitas, especialmente
em animais jovens. As lesões geralmente incluem necrose focal hepática e inflamação
do íleo terminal. O diagnóstico depende da demonstração histológica do bacilo em
feixes dentro dos hepatócitos que circundam as áreas de necrose focal; um teste
baseado em ELISA é eficiente na detecção de anticorpos em ratos e camundongos.
Os microrganismos se coram bem com Giemsa, ácido periódico de Schiff e corantes
à base de prata. Os surtos podem ser controlados por isolamento dos animais afetados
e implementação de procedimentos higiênicos rigorosos; no entanto, a eliminação de
B. piliformis de uma instalação é difícil, devido aos esporos resistentes. Uma solução
de hipocloreto a 0,5% é eficaz para matar esporos; os compostos de amônio
quaternário geralmente não são eficientes.
Infecções bacterianas diversas – A Staphylococcus aureus causa abscessos
cutâneos e faciais em camundongos atímicos pelados. A Klebsiella pneumoniae
pode raramente causar broncopneumonia, pleurite e abscessos em vários órgãos
de camundongos. A Streptococcus pneumoniae é uma causa de broncopneumonia
aguda, pleurite, pericardite, meningite e infartos esplênicos em ratos. A Streptobacillus
moniliformis é um bacilo Gram-negativo, altamente pleomórfico e freqüentemente
encontrado na nasofaringe de ratos assintomáticos; raramente pode causar artrites,
pericardites e necrose focal hepática ou esplênica em camundongos domiciliados
na mesma sala. Também causa a febre por mordida de rato ou febre de Haverhill
no homem. A Bordetella bronchiseptica é um habitante comum do trato respiratório
de ratos e camundongos. Embora seu papel como um patógeno primário em ratos
e camundongos seja incerto, tem sido identificada como uma causa primária de
pneumonia. A Pasteurella multocida pode ocasionalmente causar abscessos ou
pneumonia em ratos e camundongos. Os diagnósticos destas infecções dependem
do isolamento do microrganismo. A terapia é baseada em culturas e antibiogramas.

DOENÇAS MICÓTICAS
Para tinhas, ver TINHAS EM COBAIAS, página 1245. A histoplasmose, a coccidioi-
domicose, a esporotricose, a criptococose e a ficomicose geralmente não causam
problemas significantes em colônias laboratoriais; no entanto, podem interferir
ocasionalmente em dados experimentais de pesquisa, devido ao efeito opressor em
animais cuja resistência tenha sido diminuída pela radiação ou por drogas imunos-
supressoras.

DOENÇAS PARASÍTICAS
Parasitas sangüíneos – Vários parasitas sangüíneos têm sido registrados em
ratos e camundongos. Entre estes se incluem a Plasmodium berghei, a P. vinckei,
a Trypanosoma lewisi, a T. cruzi, a Hepatozoon muris, a Babesia muris, a
Haemobartonella muris (primariamente em ratos) e a Eperythrozoon coccoides
(primariamente em camundongos). Estes microrganismos geralmente não causam
doença clinicamente aparente, a menos que o animal seja esplenectomizado ou
esteja severamente estressado. Os ectoparasitas sugadores de sangue podem
transmitir estes parasitas.
Cestóideos – O verme chato anão (Hymenolepis nana) ocorre no intestino
delgado de ratos e camundongos e é transmissível ao homem. O ciclo de vida pode
Manejo, Criação e Doenças de Animais de Laboratório 1236

ser direto ou indireto. A Hymenolepis diminuta ocorre no íleo anterior de ratos e


camundongos. Os besouros, as baratas ou as pulgas podem atuar como hospedei-
ros intermediários. O tratamento de escolha para vermes chatos é a niclosamida
(100mg/kg, VO). Os ratos e camundongos também podem abrigar as formas
intermediárias da Taenia taeniaeformis (Cysticercus fasciolaris) no fígado, e da T.
(Coenurus) serialis no tecido conjuntivo. Sua presença indica provável contamina-
ção fecal do suprimento alimentar pelo(s) hospedeiro(s) definitivo(s).
Ectoparasitas – Em camundongos, os ácaros de Myobia musculi e de Radfordia
affinis podem causar queda de pêlo e lesões crostosas sobre a cabeça, pescoço e
escápulas. Os efeitos em diferentes linhagens de camundongos variam grandemente.
Os camundongos machos reprodutores parecem ser os mais severamente afeta-
dos. A Myocoptes musculinus e a Trichoecius (Myocoptes) romboutsi também
podem causar queda de pêlo e dermatites. A Psorergates simplex causa cistos
epidérmicos cronicamente inflamados que são visíveis apenas na superfície interna
do pelame ou pele à necropsia. Os ácaros que afetam os ratos incluem a Laelaps
echidninus e a Radfordia ensifera, que causam dermatite, e a Notoedres muris, o
ácaro da sarna de ouvido. Os piolhos e ácaros superficiais são mais fácil e
consistentemente diagnosticados por meio da identificação dos parasitas na pele ou
pêlo com uma lente de aumento ou microscópio de dissecção. A migração pode ser
acelerada pela colocação prévia da carcaça ou da pele na geladeira, procedendo-
se ao exame após a mesma ter retornado à temperatura ambiente. O ácaro
escavador, P. simplex, pode ser diagnosticado por meio do exame do pelame à
procura de lesões focais, brancas, puntiformes e subcutâneas.
É incomum a infestação de ratos ou camundongos de laboratório por pulgas,
como Xenopsylla cheopis, Nosopsyllus fasciatus ou Leptopsylla segnis. Mais
comum que a infestação por pulgas é a infestação por piolhos, como Polyplax
spinulosa (em ratos) e P. serrata (em camundongos), que pode causar perda de
pêlos e prurido.
Os ectoparasitas só podem ser eliminados por procedimentos derivados de
cesariana. O controle clínico pode ser alcançado por meio da administração de
13cm2 de tiras de resina contendo diclorvos no topo das gaiolas por um período de
24 a 48h a cada 2 semanas por 2 ou 3 vezes. A diminuição do fluxo de ar na sala
ou na gaiola durante o tratamento aumenta sua efetividade. Recomenda-se a
ivermectina a 200µg/kg de peso corporal por via oral ou parenteral.
Nematóideos – A Heterakis spumosa é encontrada no ceco e colo de ratos e
camundongos. Não se têm registrado lesões. O diagnóstico baseia-se na identifica-
ção dos ovos nas fezes. A Nippostrongylus muris ocorre no intestino delgado de ratos
e camundongos. Os sinais clínicos incluem debilitação, diarréia e dispnéia. As lesões
incluem pneumonia e hemorragia pulmonar devidas à migração larval através dos
pulmões. São encontrados ovos característicos nas fezes. A Gongylonema
neoplasticum ocorre no epitélio do estômago, esôfago e língua. Existe uma pequena
reação tecidual; a infecção não produz neoplasia. O hospedeiro intermediário é a
barata. Encontram-se ovos embrionados nas fezes. No duodeno de ratos e muitos
outros animais, são encontrados adultos de Trichinella spiralis (ver pág. 467). Os
oxiúros Aspicularis tetraptera e Sphacia spp ocorrem no ceco e cólon de ratos e
camundongos. Podem resultar em impactação por vermes, intussuscepção colônica
ou prolapso retal. Os ovos de Aspicularis são encontrados nas fezes; os ovos de
Syphacia são depositados na região perianal pelo verme fêmea. O diagnóstico pode
ser feito por flotação de fezes (Aspicularis) ou pelo método da fita adesiva (Syphacia).
O controle é difícil, pois a reinfecção ocorre devido à presença de ovos em fomitos
e em correntes de ar; entretanto, a ivermectina, a piperazina ou o pamoato de pirantel
podem ser úteis. A Capillaria hepatica é encontrada no parênquima hepático de ratos
e camundongos. Os ovos provocam a formação de sulcos amarelados e manchas
Manejo, Criação e Doenças de Animais de Laboratório 1237

no fígado devidos à resposta inflamatória crônica local. Só são liberados quando


o fígado é comido por algum outro animal. A partir daí, os ovos passam para as fezes
e desenvolvem-se no solo, onde se tornam infectantes. O nematóideo Trichosomoides
crassicauda vive na bexiga, pelve renal e ureteres de ratos. Os ovos operculados são
eliminados na urina. A migração larval através dos pulmões pode causar granulomas
focais. Para que se matem os ovos, pode ser necessária a limpeza completa da
instalação, seguida por desinfecção com gás de formaldeído.
Acantocéfalos – O verme de cabeça espinhosa (Moniliformis moniliformis)
habita o intestino delgado de ratos, camundongos e outros roedores. Os ganchos
em forma de espinhos da cabeça podem causar enterites, ulcerações e, ocasional-
mente, perfuração intestinal com peritonite subseqüente.
Protozoários – Pelo menos 4 espécies de coccídios (Eimeria spp) podem
infectar o trato intestinal de ratos de laboratório e 8 espécies podem infectar
camundongos. Uma espécie ( Cryptosporidium muris) ocorre no estômago. O
diagnóstico está baseado na identificação de oocistos após flotação de fezes, ou
pelo encontro dos microrganismos nas células epiteliais do trato intestinal. Em
camundongos, ocorre coccidiose renal devida a Klossiella muris. Os oocistos são
passados na urina. As infecções por coccídios no estômago, intestino ou rins
raramente causam lesões ou sinais clínicos. O camundongo é o principal hospedeiro
intermediário do parasita coccidiano, Toxoplasma gondii (ver pág. 441); os ratos e
outros mamíferos, inclusive o homem, são outros hospedeiros intermediários.
A Spironucleus (Hexamita) muris, um protozoário flagelado oportunista, pode
causar diarréia, perda de peso, além de mortes esporádicas primariamente em
camundongos lactentes. Entre as lesões, inclui-se a duodenite com dilatação das
criptas pela presença de grande quantidade de hexamitas. O diagnóstico é baseado
em lesões microscópicas e demonstração dos microrganismos em montagens
salinas e esfregaços fixados do duodeno. A transmissão ocorre por ingestão do
estágio estável do parasita encistado ambientalmente. A Hepatozoon muris ocorre
em hepatócitos de ratos e camundongos. A Pneumocystis carinii pode ser encon-
trada nos pulmões de ratos e camundongos; os sinais respiratórios podem resultar
de estresse ou imunossupressão.

DOENÇAS VIRAIS
Ectromelia (varíola dos camundongos) – É uma doença altamente contagiosa
dos camundongos de laboratório, causada pelo vírus da ectromelia. Pode permanecer
latente ou causar endemia de baixo grau ou epidemia violenta. As linhagens de
camundongos isogênicos variam amplamente em suscetibilidade. Na forma sistêmica
aguda, podem ocorrer mortes sem lesões. Em casos mais crônicos é possível ocorrer
tumefação facial, conjuntivite com exantema secundário e lesões ulcerativas ou
escamosas na cabeça, cauda ou extremidades. Ocasionalmente, as extremidades se
tornam necróticas e caem. Outras lesões incluem necrose focal do fígado, baço,
pâncreas e linfonodos e hemorragias intestinais. Corpúsculos de inclusão citoplasmá-
ticos eosinofílicos podem ser encontrados em hepatócitos, em células acinares
pancreáticas ou em células epidérmicas edemaciadas que se encontrem em áreas de
inflamação cutânea. O diagnóstico é baseado em lesões características, sorologia e
a confirmação da morfologia do poxvírus por microscopia eletrônica.
Ocorrem surtos esporadicamente em colônias de pesquisa, sobretudo as que
são utilizadas em pesquisa imunogenética. Enquanto os animais de criadores
comerciais estão livres do vírus, os camundongos que procederem de outras
colônias dos EUA ou outros países devem ser selecionados criteriosamente para se
evitar ectromelia. Os camundongos recém-chegados devem ser isolados e obser-
vados por 2 a 3 semanas, antes de serem introduzidos à colônia.
Manejo, Criação e Doenças de Animais de Laboratório 1238

As colônias infectadas devem ser geralmente destruídas, as instalações e equipa-


mentos devem ser completamente desinfetados e todos os materiais biológicos
derivados dos camundongos infectados devem ser selecionados para se evitar o vírus,
utilizando-se, por exemplo, o teste de produção de anticorpos no camundongo (PAC).
Entretanto, em pequenas colônias de camundongos que não podem ser descartados,
pode-se alcançar o controle por meio da vacinação de todos os animais suscetíveis
com a cepa IHD-T do vírus da vacinia, em conjunto com todas as medidas anteriores.
Infecção por hepatite viral dos camundongos (MHV) – É uma infecção por
coronavírus que afeta camundongos, sendo muito difundida, altamente contagiosa
e quase sempre de difícil controle. A infecção é geralmente endêmica e subclínica
ou epidêmica; há uma variação marcante na suscetibilidade das diferentes linha-
gens isogênicas. Existem muitas cepas diferentes do vírus; cada uma possui um
tropismo para um tecido característico e habilidade para se expressar diferentemen-
te em diferentes linhagens isogênicas de camundongos. Dependendo da cepa do
vírus e da linhagem do camundongo, os sinais clínicos podem incluir diarréia, sinais
neurológicos, perda de peso, icterícia e morte. A doença clínica pode ser precipitada
por uma droga ou procedimento imunossupressor, ou infecção intercorrente pelo
vírus K ou Eperythrozoon coccoides. Os camundongos lactentes suscetíveis
geralmente são mais severamente afetados, mas os camundongos mais velhos
podem perder peso, ter eficiência de reprodução diminuída e morrer. A infecção por
MHV altera uma grande variedade de parâmetros imunológicos e, assim sendo,
representa uma ameaça à pesquisa. A infecção por cepas enteropatogênicas de
MHV em camundongos lactentes produz uma síndrome anteriormente conhecida
como virose intestinal letal dos camundongos jovens. As lesões histopatológicas
incluem necrose focal hepática e formação de células sinciciais no epitélio intestinal.
O diagnóstico é baseado na sorologia (fixação de complemento ou ELISA) e lesões
características. Não existe tratamento efetivo; entretanto, tem-se relatado que a
cessação da reprodução e a introdução de novos camundongos suscetíveis em uma
colônia por 8 a 15 semanas têm detido a infecção. Acredita-se que os camundongos
que se recuperam readquirem imunocompetência normal, comprovadamente não
eliminam mais vírus, e podem ser considerados aptos para algumas pesquisas.
Rotavirose – Conhecida anteriormente como diarréia epizoótica dos camun-
dongos jovens, a rotavirose afeta os camundongos jovens de 1 a 3 semanas de
idade. Estes animais eliminam fezes amareladas e moles que mancham a região do
períneo e secam ao redor do ânus, podendo causar grave constipação e morte. O
diagnóstico é baseado nos sinais clínicos e história e na confirmação do rotavírus
nas fezes diarréicas por meio de microscopia eletrônica ou identificação por
imunofluorescência. O único tratamento efetivo é a remoção das fezes que estive-
rem obstruindo o ânus e o períneo. A infecção pode ser prevenida por meio da
obtenção de camundongos não infectados e do uso tanto de barreiras físicas como
processuais para se evitar a transmissão do agente.
Infecção pelo vírus sendai – É uma infecção que geralmente permanece
subclínica em ratos e hamsters, mas é a causa mais importante de doenças
respiratórias em camundongos, nos quais pode causar violentas epidemias com alta
mortalidade. Como na hepatite viral dos camundongos, produz profundas altera-
ções no sistema imune, e dessa forma, pode resultar em conseqüências sérias para
muitos tipos de pesquisa. Os sinais devem-se à pneumonia e incluem perda de peso,
dispnéia, ranger de dentes e mortalidade aumentada. Geralmente, são afetados os
camundongos lactentes, em desmame e jovens. O diagnóstico é baseado na
histologia característica das lesões pneumônicas e na sorologia (inibição da
hemaglutinação e ELISA) de animais expostos ou recuperados. As lesões histoló-
gicas características são pneumonite intersticial, proliferação do epitélio brônquico
com células atípicas, posteriormente metaplasia escamosa e, finalmente,
Manejo, Criação e Doenças de Animais de Laboratório 1239

bronquiolização alveolar com coleções focais de macrófagos. A doença é altamente


contagiosa e de difícil controle. Como os animais em desmame servem como
população-reservatório em uma colônia fechada, o controle de surtos pode ser
efetuado pela exclusão de animais jovens da colônia por 1 a 2 meses. A vacinação
proporciona proteção a curto prazo de grupos suscetíveis.
Sialodacrioadenite (SDA) – É uma coronavirose comum que causa uma grave
inflamação autolimitante e necrose das glândulas nasolacrimais e salivares de
ratos, especialmente os jovens. É uma infecção altamente contagiosa que causa
alta morbidade, porém baixa mortalidade em colônias suscetíveis. Os sinais são
exoftalmia, estrabismo, piscamento excessivo, cromodacriorréia (lágrimas verme-
lhas) e pescoço e faces inchados. As lesões no duto lacrimal podem resultar em
ressecamento da córnea com lesões oculares secundárias severas. A doença é
autolimitante, e a maioria das lesões se resolve dentro de um período de 2 semanas.
A transmissão se faz por aerossóis respiratórios e contato direto com secreções
respiratórias. Durante a fase aguda da sialo da SDA, pode ocorrer uma alta
incidência de mortes por anestesia.
Outras infecções virais – Vários vírus podem ser isolados de ratos e camun-
dongos que parecem clinicamente normais. Esses vírus quase sempre não cons-
tituem problemas significantes de doença clínica em colônias laboratoriais; entre-
tanto, podem causar sérios danos à pesquisa por afetarem diretamente os re-
sultados obtidos ou causarem doenças em animais cuja resistência tenha sido
diminuída por procedimentos experimentais (ver TABELA 6, OUTRAS INFECÇÕES VIRAIS
DE RATOS E CAMUNDONGOS, adiante).

DOENÇAS NÃO INFECCIOSAS


Doenças associadas à idade – Os ratos e camundongos são utilizados
largamente em pesquisa gerontológica. A longevidade máxima de muitas linhagens
e grupos de ratos é de 36 a 40 meses, sendo que 50% sobrevivem por um período
, 30 meses. Os camundongos possuem uma longevidade comparável de 21 a 40
meses, sendo que 50% sobrevivem por um período de 14 a 30 meses, dependendo
da linhagem. A longevidade e a prevalência das doenças associadas à idade são
claramente influenciadas por fatores genéticos e ambientais. Quando ratos e
camundongos vão ser utilizados em pesquisas relacionadas ao envelhecimento é
desejável que estes sejam mantidos sob barreiras sanitárias para prevenir que se
exponham a doenças infecciosas. As principais lesões não neoplásicas associadas
à idade de ratos e camundongos possuem bases degenerativas, inflamatórias ou
auto-imunes e incluem as glomerulonefropatias crônicas, poliarterites nodosas,
degeneração do miocárdio e as radiculoneuropatias. Entre as neoplasias de ocor-
rência mais comum, destacam-se os adenomas hipofisários ou pulmonares, os
feocromocitomas da glândula adrenal, os tumores das ilhotas pancreáticas
hepatocelulares, os tumores das células intersticiais testiculares e as leucemias. A
prevalência ou severidade das lesões, tanto em ratos como em camundongos,
aumenta após 1 ano de idade. A diferenciação das lesões de ocorrência espontânea
associadas à idade é um grande desafio na gerontologia experimental. O uso de
procedimentos diagnósticos na seleção de ratos e camundongos idosos para
pesquisas pode ser útil na separação de animais portadores de lesões que poderiam
somar-se à variabilidade dos resultados de pesquisa ou, então, na seleção de lesões
específicas de interesse científico.
Luta – Os traumas devidos a luta sempre são causas significantes de morbidade
e mortalidade em camundongos machos. As lutas geralmente ocorrem à noite,
resultando em mordidas e arranhões sobre a cabeça, o períneo e a pele da região
lombossacral. Freqüentemente, estas lesões se tornam infectadas. Uma alta inci-
dência de amiloidose secundária tem sido relatada em animais que tiveram lesões
Manejo, Criação e Doenças de Animais de Laboratório 1240

TABELA 6 – Outras Infecções Virais de Ratos e Camundongos


Doença Agente Lesões Diagnóstico Observações
Adenovirose Adenovírus Necrose focal no coração. FCa Muito rara. Contamina
de camundongos Inclusões intranucleares no tumores ou culturas teciduais
coração, rins e adrenais de camundongos
Citomegalovirose Herpesvírus Inclusões intranucleares no Lesões Ratos e camundongos apresentam
epitélio do duto salivar infecções espécie-específicas
Virose K Papovavírus Pneumonia intersticial com IHb, FC; inclusões Dispnéia e morte em camundongos
proliferação das células intranucleares nas células lactentes. Contamina tumores ou
endoteliais endoteliais culturas teciduais de camundongos
Vírus (vírus de ratos) Parvovírus Necrose cerebelar em ratos IH, ELISAc Afeta células com atividade mitótica.
de ratos Kilham lactentes. Reabsorção fetal. É teratogênico. Contamina tumores
Malformações congênitas transplantáveis e linhagens
celulares
Infecção por vírus da Vírus RNA Polioencefalomielite Elevação da LDH plasmática Causa elevação dos níveis das
desidrogenase láctica não experimental em em camundongos enzimas plasmáticas. Contamina
(LDH) classificado camundongos tumores transplantados
imunossuprimidos
Coriomeningite Arenavírus Coriomeningite linfocítica; Inoculação em cobaias ou Convulsões clônicas, infecções
linfocítica (CML) necrose do fígado e tecido camundongos livres de CML. transplacentárias. Transmissível
linfóide FC, IFI d ao homem
Carcinoma mamário de Agente Bittner; Adenocarcinomas mamários, Lesões Vírus no leite de fêmeas infectadas
camundongos vírus RNA adenocantomas,
carcinossarcomas
Vírus diminuto de Parvovírus Hipoplasia cerebelar IH, IFI Contamina tumores transplantados.
camundongos Também afeta hâmsters e ratos
Encefalomielite de Picornavírus Necrose do tronco cerebral, IH. Ratos também podem Paralisia flácida posterior,
Theiler em camun- medula espinhal ter anticorpos vírus portado no intestino
dongos (GD-VII)
Manejo, Criação e Doenças de Animais de Laboratório 1241

Infecção por vírus Herpesvírus Necrose tímica Inoculação em camundongos Afeta somente recém-nascidos
tímico de recém-nascidos
camundongos
Pneumonia viral Paramixovírus Pneumonia intersticial, edema IH, ELISA. Também pode afetar ratos e hâmsters
de camundongos pulmonar Inoculação em
(PVC) camundongos livres de PVC
Infecção por vírus Papovavírus Tumores experimentais em IH, FC A infecção natural raramente produz
do polioma vários locais tumores
Coronavirose Coronavírus Pneumonia experimental FC, ELISA Ocorre naturalmente em ratos.
dos ratos Reação cruzada com vírus da
sialodacrioadenite
Reovirose Reovírus do Tipo 3 Necrose do fígado, miocárdio, IH, ELISA. Ratos Icterícia, fezes amareladas,
pâncreas. Degeneração também podem apresentar pelame e pele oleosos, sinais
neuronal. Encefalite anticorpos neurológicos em camundongos
Infecção por IH de Parvovírus Lesões cerebelares IH, ELISA Ocorre naturalmente em ratos
Toolan
a Fixação de complemento. b Inibição da hemaglutinação. c Ensaio imunoenzimático. d Imunofluorescência.
Manejo, Criação e Doenças de Animais de Laboratório 1242

crônicas originadas de lutas. As lutas podem ser prevenidas por meio da separação
dos machos ou, de preferência, pelo agrupamento dos mesmos na época do
desmame em vez de posteriormente.
Mastigação de pêlos (barbeamento) – A alopecia parcial devida à mastigação
de pêlo por companheiros de gaiola é mais comum em camundongos pigmentados.
A primeira indicação de mastigação de pêlos é a perda dos bigodes sensitivos de
alguns dos camundongos. É típico que, em seguida, ocorra alopecia do focinho,
cabeça e dorso médio do tronco. Não há dermatite, mas a pele pode-se tornar
progressivamente pigmentada. Os camundongos mastigadores de uma gaiola
geralmente podem ser identificados como aqueles que possuem bigodes e pelame
normais. Quando os mastigadores de pêlo são retirados da gaiola, o novo cresci-
mento do pêlo nos remanescentes costuma-se completar num período de 60 a 90
dias. Em camundongos pretos, o pêlo novo pode-se apresentar cinzento.
Doenças nutricionais – Existem no comércio rações balanceadas padroni-
zadas para ratos e camundongos. A maioria dos produtores fornecem dietas
separadas para manutenção, reprodução e outros propósitos específicos. As
rações devem ser estocadas apropriadamente, protegidas de contaminação e
servidas dentro de 180 dias após a data de fabricação. Se as colônias estiverem
sendo alimentadas com rações industrializadas frescas e de boa procedência,
torna-se remota a possibilidade de surgirem deficiências nutricionais clinicamen-
te aparentes. Entretanto, se a alimentação por fornecida à vontade por longos
períodos, tanto ratos como camundongos tornar-se-ão obesos, aumentando
desta forma a prevalência ou a gravidade de certas lesões associadas à idade e
reduzindo a longevidade. A alimentação com suplementos vegetais naturais não
é necessária e nem desejável, já que pode estar contaminada por Salmonella
spp, Yersinia spp ou Bacillus piliformis. O controle desses problemas é complexo,
porém a restrição a longo prazo do consumo de calorias, a redução do consumo
de proteínas, ou ambas, podem ser úteis.
Cauda anelada – É uma infecção de ratos e camundongos jovens caracterizada
por constrições anulares e posteriormente por edema, necrose e queda espontânea
da cauda. Em ratos, pode-se produzir esta afecção experimentalmente por meio da
diminuição da umidade relativa ambiental. O controle desta doença pode ser feito
pela manutenção de uma umidade relativa ≥ 50% e pelo alojamento em gaiolas
plásticas de fundo sólido com cama profunda.

DOENÇAS DE COBAIAS
Intoxicação induzida por antibióticos – As cobaias e os hamsters são
altamente suscetíveis aos efeitos tóxicos de muitos antibióticos comumente utiliza-
dos. A intoxicação é resultante do crescimento excessivo de Clostridium difficile e
da subseqüente produção de toxinas. Isto causa enterocolite com diarréia e morte
em 3 a 7 dias. Os antibióticos que possuem um espectro de atividade primariamen-
te dirigido contra microrganismos Gram-positivos (por exemplo, penicilina, lincomi-
cina, eritromicina e tilosina) não devem ser utilizados em cobaias e hamsters. Os
antibióticos de amplo espectro também não devem ser utilizados em cobaias e
hamsters. Os antibióticos de amplo espectro também não devem ser utilizados via
oral devido aos seus efeitos diretos sobre a flora intestinal, mas podem ser usados
parenteralmente com cautela. Pomadas antibióticas de uso tópico também podem
produzir a síndrome se os animais as ingerirem.
Conjuntivite – A conjuntivite é freqüentemente causada por Chlamydia psittaci
em cobaias, embora Salmonella spp, Streptococcus spp, Staphylococcus aureus e
Pasteurella multocida também possam estar envolvidos. Os sinais clínicos incluem
Manejo, Criação e Doenças de Animais de Laboratório 1243

hiperemia e quemose conjuntivais e um exsudato ocular purulento. O diagnóstico


está baseado na demonstração do agente em esfregaços conjuntivais ou isolamen-
to e identificação do microrganismo causador. O tratamento com antibióticos
oftálmicos apropriados deve ser eficiente.
Linfadenite – A inflamação e a dilatação dos linfonodos cervicais são comuns em
cobaias. O microrganismo causador geralmente é a Streptococcus zooepidemicus
β-hemolítica, embora outras bactérias também possam causar esta afecção. Os
microrganismos podem entrar nas vias linfáticas a partir de escoriações da mucosa
oral ou do trato respiratório alto. Os achados clínicos são grandes tumefações ou
abscessos, quase sempre unilaterais, na região ventral do pescoço. A linfadenite
cervical também pode-se associar a otite média e panoftalmite. Microscopicamen-
te, ocorre a supuração dos linfonodos cervicais. O diagnóstico está baseado nos
sinais clínicos e no isolamento e identificação do microrganismo causador. O uso de
materiais abrasivos no comedouro ou cama deve ser evitado. Além disso, as
infecções do trato respiratório alto devem ser prevenidas e controladas. Os animais
afetados devem ser descartados, pois os microrganismos provenientes da drenagem
dos abscessos podem infectar os outros animais da colônia. A antibioticoterapia
geralmente não é recompensadora devido aos efeitos colaterais de muitos antibióti-
cos (ver anteriormente). Existem relatos de que a cefaloridina via IM (25mg/kg de peso
corporal, diariamente) é efetiva no controle e na eliminação da doença.
Calcificação metastática – Embora em geral seja clinicamente inaparente,
ocorre mais freqüentemente em cobaias machos > 1 ano de idade. Os sinais
incluem articulações rígidas e alta mortalidade. À necropsia, observam-se depósitos
de cálcio nos pulmões, fígado, coração, aorta, estômago, cólon, rins, articulações
e musculatura esquelética. Existem relatos conflitantes a respeito da etiologia;
entretanto, a maioria dos investigadores concorda que quando os animais são
alimentados com dietas pobres em magnésio e potássio, as lesões calcificantes
aumentam com o teor fosfórico da ração. A afecção pode ser minimizada ou
prevenida pela administração de dietas que contenham níveis adequados de
magnésio (0,35%), uma proporção cálcio–fósforo de 1,3 a 1,5:1, e não mais que 6UI
de vitamina D/g.
Distrofia muscular – As cobaias são intensamente sensíveis à deficiência de
vitamina E. Os sinais são rigidez, claudicação e recusa para se movimentar. As
lesões microscópicas incluem necrose coagulativa e inflamação e proliferação dos
núcleos das fibras musculares esqueléticas. As dietas devem providenciar vitamina
E a 3 a 5mg/100g de peso corporal/dia.
Doenças parasíticas – Vários protozoários (Toxoplasma gondii, Eimeria caviae,
Encephalitozoon (Nosema) cuniculi), nematóideos (Paraspidodera uncinata) e
piolhos (Gyropus ovalis, Gliricola porcelli) podem infectar as cobaias (ver DOENÇAS
PARASÍTICAS DE RATOS E CAMUNDONGOS, pág. 1235 para o controle e tratamento de
nematóideos e ectoparasitas).
Pneumonia – É causada nas cobaias por várias bactérias ( Bordetella
bronchiseptica, Streptococcus zooepidemicus, S. pneumoniae, Klebsiella
pneumoniae ou Pasteurella pneumotropica ) e os sinais clínicos correspondem aos
de dificuldade respiratória. O diagnóstico está baseado nos sinais, lesões pneu-
mônicas e isolamento e identificação do microrganismo causador. A prevenção e o
controle dependem da manutenção de um bom manejo e do descarte de animais
afetados. Deve-se indicar antibioticoterapia com cautela, já que a maioria dos
antibióticos comumente utilizados são tóxicos para cobaias (ver anteriormente). O
tratamento com tetraciclina VO ou parenteral ou cloranfenicol parenteral pode ser
útil.
Toxemia ou cetose da prenhez – Esta desordem metabólica é similar àquela
observada em ovelhas antes da parição (ver pág. 550). Os fatores predisponentes
Manejo, Criação e Doenças de Animais de Laboratório 1244

incluem obesidade e qualquer estresse que possa induzir anorexia temporária


durante os últimos estágios da prenhez. A relativa isquemia uterina em porcas
obesas e/ou naquelas com um tamanho de ninhada maior que o normal pode
também contribuir para o desenvolvimento desta afecção. Os achados clínicos
incluem anorexia, adipsia, espasmos musculares, coma dentro de um período de
48h e morte dentro de 4 a 5 dias, a menos que o curso seja interrompido pela parição.
Os achados laboratoriais incluem acidúria, proteinúria e hiperlipemia. Microscopica-
mente encontra-se degeneração gordurosa de órgãos parenquimatosos. Pode-se
conseguir o controle por meio da prevenção de obesidade, prevenção do estresse
durante o final da prenhez e provisão de uma ração de boa qualidade durante a
prenhez. O tratamento precoce com propilenoglicol VO, gliconato de cálcio IP ou
corticosteróides parenterais pode ser útil, embora o prognóstico permaneça ruim.
Tinha – Nas cobaias, esta infecção dermatomicótica é geralmente causada por
Trichophyton mentagrophytes e menos freqüentemente por Microsporum gypseum.
Pode causar alopecia irregular, geralmente começando na cabeça e caracterizada
por lesões descamativas e crostosas na pele. As lesões faciais são geralmente
proeminentes mas a doença pode-se espalhar para as porções posteriores do
dorso. O diagnóstico está baseado nas lesões, isolamento e identificação do agente
causal dentro ou sobre pêlos infectados. A doença é geralmente autolimitante se
forem mantidas boas condições de manejo e higiene. A administração a longo prazo
de griseofulvina (2,5mg/100g de peso corporal) no alimento é efetiva. As lesões de
pele isoladas podem ser tratadas efetivamente com creme de tolnaftato aplicado
diariamente por 2 a 4 semanas. A doença é contagiosa para o homem e outros
animais.
Salmonelose – Em cobaias, a doença é semelhante àquela causada em outros
animais (ver pág. 178).
Escorbuto (deficiência de vitamina C) – As cobaias requerem um suplemento
dietético contínuo de ácido ascórbico (vitamina C) porque não possuem as enzimas
necessárias para a conversão de L-gulonolactona para ácido L-ascórbico e não
podem estocar a vitamina pelo tempo necessário. Os sinais da deficiência de
vitamina C incluem andadura irregular, locomoção dolorosa, hemorragias gengi-
vais, inchaço das juntas e articulações costocondrais e emaciação. As lesões
incluem hemorragias no subcutâneo, na musculatura esquelética ao redor das
articulações e em todas as superfícies serosas. Microscopicamente, existe o
desarranjo das colunas cartilaginosas e fibrose da medula nas áreas de osteogê-
nese ativa. A afecção pode ser evitada pela provisão de 15 a 25mg/dia de ácido
ascórbico. Se as rações comerciais para cobaias forem estocadas apropriada-
mente após a fabricação, a vitamina C ficará estável por 3 meses. As rações
manufaturadas para uso em laboratório devem ter datas de fabricação imprimidas
no pacote, mas as rações destinadas ao comércio de animais de estimação podem
não exibi-las. Deve-se considerar a suplementação das rações fora de padrão com
vitamina C na água de bebida. Os vegetais ricos em vitamina C, como a salsa, o
repolho, a pimenta verde e a couve, podem ser usados, mas podem servir de fonte
de infecção por doença de Tyzzer, salmonelose, etc. A alface (freqüentemente
usada pelos proprietários de animais de estimação) é uma fonte pobre de vitamina C.
Salivação (ptialismo) – São várias condições caracterizadas por pêlos molha-
dos e emaranhados ao redor da boca, queixo e parte ventral do pescoço. A salivação
ocorre sempre que a mastigação ou a deglutição estiverem prejudicadas, o que
geralmente se deve a anormalidades dentárias; no entanto, o escorbuto subagudo
(deficiência de vitamina C) também pode causar ptialismo devido à deformidade
mandibular, da mesma forma que a deficiência de folato ou o excesso de fluoreto na
dieta. Os incisivos das cobaias, assim como os de outros roedores, crescem
continuamente. Assim sendo, a maloclusão pode resultar em supercrescimento dos
Manejo, Criação e Doenças de Animais de Laboratório 1245

dentes e mastigação difícil. Quando se percebe o ptialismo, deve-se fazer uma


cuidadosa avaliação da boca do animal. Para se melhorar a oclusão dentária, os
incisivos podem ser aparados ou os molares podem ser limados, mas se a maloclu-
são persistir, pode ser necessária uma profilaxia dentária a intervalos mensais. O
prognóstico é ruim se a deformidade mandibular for resultante de escorbuto.

DOENÇAS DE HAMSTERS
Os hamsters dourados ou sírios (Mesocricetus auratus) são suscetíveis à
infecção por inúmeras bactérias comuns, incluindo os estreptococos, as salmone-
las, as leptospiras, os estafilococos e as pasteurelas. Os sinais clínicos e lesões
são similares àqueles vistos em outros animais. Deve-se utilizar a antibioticotera-
pia cautelosamente, pois os hamsters são altamente suscetíveis à enterocolite
associada aos antibióticos. Para intoxicação por antibióticos, ver o texto em
DOENÇAS DE COBAIAS, página 1242.
Ocasionalmente os hamsters podem ser infectados pela tênia Hymenolepis nana
e o oxiúro Syphacia obvelata (ver DOENÇAS PARASÍTICAS DE RATOS E CAMUNDONGOS,
pág. 1235, para lesões e terapias).
Duas espécies de ácaros demodéticos, Demodex criceti e D. aurati, são comu-
mente encontradas em hamsters, geralmente > 18 meses de idade. Podem resultar
em dermatite e alopecia no dorso e no lombo. O diagnóstico é feito por meio da
identificação dos ácaros em um raspado de pele. A afecção responde ao tratamento
com acaricidas que são utilizados em cães (ver pág. 1816). A aplicação diária de
solução de Ronnel a 4% em propilenoglicol, por várias semanas, tem sido efetiva.
A dermatite de orelhas, face, patas e cauda pode ser causada por Notoedres sp.
Tem-se recomendado a ivermectina a 200µg/kg de peso corporal.
Os hamsters são muito sensíveis à deficiência de vitamina E, que leva à distrofia
da musculatura esquelética. No comércio, existem rações balanceadas, formuladas
especialmente para hamsters; entretanto, eles também se desenvolvem com ra-
ções comerciais destinadas a ratos e camundongos.
A amiloidose é comum em hamsters > 1 ano, e a prevalência aumenta com a
idade. Geralmente é subclínica até que a função renal seja prejudicada devido aos
depósitos de amilóide. Quando ocorre azotemia, os sinais incluem anorexia, pelagem
eriçada, postura encurvada e depressão. Não há nenhum tratamento efetivo.
Tem-se descrito a coriomeningite linfocítica (CML), ocorrendo naturalmente,
em colônias reprodutivas tanto comerciais como de laboratório. Os camundongos
silvestres geralmente servem como reservatórios na natureza, mas os tumores
transplantáveis ou outras linhagens celulares contaminadas com o vírus constituem
a origem dos surtos em laboratório. A doença é geralmente subclínica nos hamsters,
mas grandes quantidades de vírus são eliminadas na urina e podem servir como
fonte de infecções humanas.
Os hamsters são suscetíveis a outros vírus que produzem enfermidade clínica
discreta ou infecção subclínica (ver TABELA 6, OUTRAS INFECÇÕES VIRAIS DE RATOS E
CAMUNDONGOS, pág. 1240).
A ileíte proliferativa é uma doença específica, aparentemente infecciosa e de
etiologia incerta, embora tenha-se relacionado a Campylobacter jejuni. É também
chamada de cauda úmida, enterite regional ou hiperplasia ileal transmissível. É
uma doença endêmica em alguns laboratórios e colônias comerciais e pode atingir
proporções epidêmicas. Os sinais clínicos agudos incluem diarréia (cauda úmida),
desidratação, anorexia, depressão e morte em 48h. Os animais em desmame (3 a
8 semanas de idade) são mais freqüentemente afetados. As lesões incluem ileíte
ou tiflite, ou ambas, e colite com hiperplasia acentuada do epitélio do íleo. Esta
Manejo, Criação e Doenças de Animais de Laboratório 1246

hiperplasia epitelial resulta em espessamento e rigidez acentuados da parede


ileal com estenose parcial do lúmen, o que pode levar a obstrução, intussuscepção
ou impactação ileais. A afecção pode responder à terapia com tetraciclina (400mg/L
na água de bebida por 10 a 15 dias) e suspensão oral de caulim-pectina. Relatou-
se que 0,5g de fosfato de eritromicina/gal (3,8L) em água de bebida reduziu a
mortalidade em uma colônia reprodutiva grande. Embora esse procedimento possa
predispor a uma enterocolite associada a antibiótico, pode-se tentá-lo em casos
selecionados. Geralmente, necessita-se de uma vigorosa terapia voltada para de-
sidratação e acidose. Os animais afetados devem ser isolados em gaiolas cobertas
com filtros e devem-se manter as barreiras físicas e processuais nos alojamentos
contaminados.

DOENÇAS DE FURÕES
Os furões devem ser vacinados rotineiramente contra cinomose com vírus vivo
modificado ou somente originado em cultura de tecido de embrião de galinha. As
vacinas de vírus de cinomose vivo modificado, originado em cultura de células de
furão, não devem ser usadas porque induzem doenças vacinais. A vacina com vírus
da cinomose inativado produz imunidade questionável. A vacinação deve começar
a 8 a 10 semanas de idade (4 a 6 semanas, se a mãe não tiver nenhum título) e deve
ser repetida a 10 a 12 semanas, e então a cada 2 a 3 anos. Uma vacina anti-rábica
inativada e de origem murina pode ser administrada s.c. em furões ≥ 3 meses de
idade, e pode ser repetida anualmente. Os furões criados comercialmente são, em
geral, vacinados às 6 a 8 semanas de idade com o toxóide Clostridium botulinum do
Tipo C; porém, os furões de estimação não precisam ser vacinados se receberem
alimentação fresca, como rações felinas ou caninas, enlatadas ou secas. Os furões
não são suscetíveis à panleucopenia felina, à rinotraqueíte felina, à calicivirose felina,
à parvovirose canina, à hepatite infecciosa canina ou à enterite viral do visom sob
condições naturais; logo, a vacinação contra estas doenças não se faz necessária.
Doenças bacterianas – A Staphylococcus aureus causa mastites, dermatites,
abscessos e infecções vulvares durante o estro. A Streptococcus zooepidemicus
causa abscessos, pneumonias, metrites e infecções vulvares. A Escherichia coli
causa mastite, metrite, infecções vulvares, pneumonia e septicemia. Os
Campylobacter spp e os microrganismos semelhantes têm sido associados a colite
proliferativa e úlcera gástrica. O tratamento é o mesmo instituído para cães e gatos.
Os furões também são suscetíveis ao botulismo e às cepas humana, bovina e aviária
da tuberculose. As injeções intradérmicas de tuberculina não são diagnósticas no
caso dos furões.
Cinomose – Os furões são suscetíveis à infecção por vírus da cinomose canina
(VCC). A transmissão é feita por aerossóis e contato direto com secreções
infectadas por VCC. Os animais expostos parecem normais até 7 a 10 dias após a
exposição, quando tornam-se evidentes a anorexia e um exantema no queixo e na
região inguinal; 1 a 2 dias mais tarde, são características as descargas mucopurulentas
nasais e oculares. A condição do animal se deteriora até que ocorra a morte, 12 a
14 dias após a exposição. As terapias antibacteriana e de suporte podem ser úteis,
mas o prognóstico é grave. Os furões que sobreviverem inicialmente podem morrer
da forma neurotrópica da doença, semanas ou meses mais tarde.
Influenza – Os furões são suscetíveis à infecção por vírus de influenza humana.
As pessoas que estejam eliminando o vírus devem usar luvas e máscaras faciais,
quando estiverem manipulando furões. Os furões infectados podem exibir anorexia,
depressão e febre. Os espirros e a descarga nasal purulenta podem acompanhar a
febre por 1 a 2 semanas. Tipicamente, a recuperação é rápida após o abaixamento
Manejo, Criação e Doenças de Animais de Laboratório 1247

da febre. A imunidade é conferida contra as cepas homólogas por 4 a 6 semanas.


A vacinação com vírus vivo atenuado oferece pequena proteção contra cepas não
homólogas. O vírus pode ser transmitido dos furões para o homem.
Infecções micóticas – Têm-se descrito tinhas (Microsporum canis) em furões.
As suas lesões são semelhantes àquelas dos gatos. A griseofulvina (25mg/kg) VO,
por várias semanas, é efetiva.
Parasitas – Os furões podem apresentar sarna sarcóptica, pulgas, otoacaríase,
dirofilariose e helmintos gastrointestinais. O tratamento dessas afecções é o mesmo
que para gatos.
Doenças variadas – A anemia aplásica causada por depressão da medula
óssea induzida por estrogênios está comumente associada ao estro prolongado em
furões fêmeas que ainda não cruzaram. As fêmeas são induzidas a ovular e
permanecem no estro por até 6 meses se não cruzarem. A síndrome pode ser
evitada por meio da castração de fêmeas aos 6 a 8 meses de idade. O prognóstico
é reservado nas fêmeas afetadas clinicamente. Uma vez que o animal fique
estabilizado por reposição de sangue e/ou término do estro devido à administração
IM de 20µg de hormônio liberador de gonadotrofina ou de 50 a 100UI de gonadotro-
fina coriônica humana, recomenda-se a ovário-histerectomia.
Os tumores do sistema linfóide, mais comumente o linfossarcoma, são os mais
freqüentemente descritos nos furões. O parvovírus dos furões (vírus da doença
aleutiana) e um retrovírus de furões são agentes etiológicos suspeitos. Os tumores
do trato reprodutivo (por exemplo, leiomioma dos ovários) e os tumores subcutâneos
e cutâneos (por exemplo, carcinoma das células escamosas) são os próximos
tumores mais comumente descritos nos furões.
A perda de peso sazonal na primavera, até 30 a 40% do peso corporal, ocorre
normalmente em ambos os sexos quando os depósitos subcutâneos de gordura do
outono são absorvidos. Os testículos descem ao escroto apenas de dezembro a
julho, quando ocorre a espermatogênese.
Os olhos dos neonatos se abrem aos 34 dias de idade, e o desmame acontece
a 6 a 8 semanas, embora eles já possam consumir alimento sólido por volta de 2
semanas. Os furões são alimentados com uma combinação de rações felinas e
caninas comerciais. São extremamente suscetíveis à prostração por calor; a
temperatura ambiente ideal é de 4 a 18°C, com umidade de 40 a 65%. As cores de
pelagem incluem a albina, a zibelina ou a doninha (pêlos traseiros negros), siamesa
(pêlos traseiros castanhos), a luva prateada (zibelina com pés e peitos brancos) e
a luva prateada siamesa. Os anestésicos utilizados para os gatos podem ser
utilizados nos furões.

DOENÇAS DE PRIMATAS NÃO HUMANOS


As espécies de primatas mais largamente utilizadas nas pesquisas são a
Macaca mulatta (macaco rhesus), a M. fascicularis (macaco comedor-de-caran-
guejos), a M. nemestrina (macaco rabo-de-porco), a Cercopithecus aethiops
(macaco verde africano ou macaco-do-Sudão), as Papio spp (babuínos), a
Saimiri sciureus (mico-de-cheiro), a Aotus trivirgatus (macaco-da-noite), as
Cebus spp (macacos-prego), as Ateles spp (macacos-aranha), as Saguinus spp
(sagüis) e as Callithrix spp (sagüis).
A crescente restrição na exportação ou na disponibilidade de primatas, por
parte dos países de origem, tem levado a um decréscimo da importação e a um
aumento da produção em cativeiro destes animais com um concomitante aumen-
to no custo dos primatas. A importação de primatas nos EUA está proibida, exceto
para propósitos científicos, educacionais e de exibição.
Manejo, Criação e Doenças de Animais de Laboratório 1248

TABELA 7 – Alguns Dados Fisiológicos dos Animais de Laboratório


Período Tamanho Idade de Total de Total de Temperatura Consumo

aproximado de aproximado maturidade sexual hemácias leucócitos corporal aproximado


Espécies gestação*(dias) da ninhada (peso corporal) (× 1012/L) (× 109/L) média (oC) de água ** (por dia)
Camundongos 19 – 21 6 – 10 6 semanas 7 – 11 4 – 12 37 4 – 7mL
(20 – 30g)
Ratos 21 – 23 6 – 14 3 meses 7 – 10 5 – 15 38 30mL
(0,2 – 0,3kg)
Cobaias 68 1–4 3 – 4 meses 5–7 7 – 14 39 150mL
(0,4 – 0,5kg)
Hâmsters 16 4 – 10 2 meses 6–7 7 – 10 38 30mL
dourados (85 – 110g)
Gerbos 25 2–9 3 meses 7–8 8 – 11 39 4mL
(60 – 100g)
Coelhos 30 4 – 12 5 – 6 meses 5–7 6 – 12 40 300 – 700mL
(3 – 4kg)
Mico-de-cheiro 170 1 3 – 5 anos 8,3 8,2 39 70 – 110mL
(0,6 – 1,1kg)
Macaco rhesus 165 1–2 3 – 5 anos 4–6 10 – 20 38 0,2 – 1L
(5 – 11kg)
Chimpanzés 225 1 8 – 12 anos 4–6 6 – 14 37 0,6 – 1,5L
(40 – 50kg)
Babuínos 154 – 183 1 3 – 6 anos 4–5 5–9 39 0,3 – 0,5L
(11 – 30kg)
* Ver também FENÔMENO REPRODUTIVO, página 775.
** Varia de acordo com o número de animais por gaiola, umidade da comida, temperatura, etc.
Manejo, Criação e Doenças de Animais de Laboratório 1249

Os primatas são suscetíveis a, ou podem ser portadores de várias doenças


infecciosas, muitas das quais são antroponoses e zoonoses. Devem passar em
quarentena um período de 1 a 3 meses antes de sua utilização, permitindo, assim,
uma avaliação adequada do seu estado de saúde e adaptação ao ambiente
laboratorial.
DOENÇAS BACTERIANAS
Doenças intestinais – As bactérias mais comumente associadas a doenças
intestinais nos primatas são Shigella, Salmonella , Yersinia spp, Campylobacter
jejuni, e ocasionalmente as enterotoxigênicas, Escherichia coli, Pseudomonas
aeruginosa e Aerobacter aerogenes (hydrophila). Os primatas podem ser porta-
dores assintomáticos e intermitentes de qualquer um desses microrganismos.
A diarréia é um problema importante em primatas. Os sinais clínicos incluem
fezes aquosas ou mucóides tingidas de sangue, e rápidas desidratação, emaciação
e prostração. O prolapso retal é uma seqüela ocasional. Os helmintos ou protozoá-
rios podem ser um fator agravante. A mortalidade pode ser extremamente alta em
surtos agudos, a menos que se institua prontamente um tratamento para restabe-
lecer e manter normais os equilíbrios eletrolíticos e de fluidos. As lesões mais
comuns à necropsia são enterites hemorrágicas, enterocolites, úlceras de cólon ou
simplesmente colites.
Em geral, os sinais clínicos e a morte são devidos a desidratação, hipocalemia
e acidose metabólica. Os primatas afetados devem ser tratados individualmente. A
hidratação deve ser mantida com solução de lactato de Ringer parenteral. Potássio,
vitaminas B, eletrólitos e antibióticos podem ser administrados por VO ou via sonda
nasogástrica, na maioria dos primatas. O uso intensivo e disseminado de antibióti-
cos de largo espectro pode levar ao desenvolvimento de cepas resistentes de
microrganismos. A combinação do trimetoprim (4,4mg/kg de peso corporal) e do
sulfametoxazol (17,6mg/kg de peso corporal) administrada como dose oral total
diária por 10 dias é útil no tratamento de shigelose ativa e pode ajudar na eliminação
do microrganismo dos portadores. A eritromicina (5mg/kg, IM, duas vezes ao dia),
por 7 a 14 dias é recomendada para o tratamento da diarréia associada ao
Campylobacter.
Pneumonia – As doenças do trato respiratório superior e as pneumonias de
origem bacteriana podem causar doença generalizada e mortalidade, particu-
larmente em primatas recém-importados. Os agentes causadores incluem
Streptococcus pneumoniae, Klebsiella pneumoniae, Bordetella bronchiseptica,
Haemophilus influenzae, e várias espécies de estreptococos, estafilococos e
pasteurelas. A pneumonia pode acompanhar ou seguir uma doença primária
qualquer, por exemplo, pneumonia e disenteria quase sempre ocorrem juntas.
Os sinais clínicos podem incluir tosses, espirros, dispnéia, descargas nasais mu-
cóides ou mucopurulentas, letargia, anorexia e emaciação. As principais lesões
observadas à necropsia são aquelas devidas a broncopneumonia ou pneumonia
lobar.
A antibioticoterapia é geralmente útil no tratamento das pneumonias de primatas.
As culturas a partir de “swabs” faríngeos ou lavados transtraqueais são utilizáveis
no isolamento do agente causador e na determinação do antibiograma. É apropriado
o tratamento dos animais em risco com penicilina de longa ação ou um antibiótico
de largo espectro. Cuidados intensivos e outras terapias de suporte, tais como a
administração de fluidos e de oxigênio, também podem auxiliar na recuperação de
casos específicos.
Tuberculose – Todos os primatas são suscetíveis à tuberculose, embora
existam diferenças entre as espécies; por exemplo, as espécies de primatas do
Velho Mundo, tais como os macacos rhesus, são muito sensíveis à infecção,
Manejo, Criação e Doenças de Animais de Laboratório 1250

enquanto as espécies do Novo Mundo, tais como os micos-de-cheiro, parecem ser


menos suscetíveis. Os sinais clínicos não são uma indicação confiável da extensão
da tuberculose em macacos. Um animal que pareça saudável pode ter uma doença
miliar extensa envolvendo órgãos torácicos e abdominais; os sinais de debilitação
podem aparecer apenas um pouco antes da morte. Um programa de testes é
obrigatório. Os testes de tuberculina devem ser realizados em todos os primatas
quando de sua chegada à instalação, e daí em diante repetidos com intervalos de
2 semanas até que se registre pelo menos 3 testes negativos consecutivos em todo
o grupo.
O tempo decorrido desde a infecção inicial até a manifestação cutânea é de 3 a
4 semanas nos macacos rhesus. Com o curso da doença, a anergia pode resultar
em um teste de pele negativo. Após sua liberação da quarentena, todos os primatas
devem passar pelo teste cutâneo ao menos semestralmente, e recomendam-se
testes trimestrais. O teste consiste na inoculação de tuberculina mamífera ou
tuberculina velha (15mg ou 1.500 unidades de tuberculina em 0,1mL de água)
intradermicamente na pálpebra superior ou na pele abdominal raspada. O animal é
examinado em 24, 48 e 72h. Uma reação de hipersensibilidade positiva é marcada
por edema, induração ou eritema. O exame radiográfico do peito pode ajudar o
diagnóstico em casos bem-caracterizados, mas não é confiável, já que as lesões
raramente calcificam ou formam cavidades, como ocorre no homem. O teste de
tuberculina cutânea é o método diagnóstico primário para supervisão de rotina.
Outros testes diagnósticos, como cultura e coloração de uma amostra de lavagem
gástrica, ELISA e teste comparativo com tuberculinas aviária e atípica, podem
ajudar no diagnóstico. Devido ao risco de saúde pública, recomenda-se a eutanásia
para todos os positivos. A tuberculose deve ser então confirmada por necropsia. O
pessoal que trabalha nas instalações de primatas deve passar por testes de pele
semestrais.
A isoniazida é um tuberculostato efetivo quando administrada diariamente em
5 a 10mg/kg de peso corporal em cubos de açúcar ou incorporada na comida de
primatas valiosos e em risco de extinção, como os grandes macacos. Entretanto,
ela pode suprimir a reação do teste cutâneo. Não existe evidência de que o uso
contínuo de isoniazida leve ao desenvolvimento de micobactérias resistentes a
esta droga.

DOENÇAS MICÓTICAS
Ver também INFECÇÕES FÚNGICAS, página 411.
As Microsporum e as Trichophyton spp afetam primatas. Recomenda-se o
tratamento tópico das tinhas com pomadas de ácido undecilênico ou com creme
de tolnaftato a 1%, duas vezes ao dia, por 2 a 3 semanas, ou administração de
griseofulvina (25mg/kg, VO, por 3 a 4 semanas). A Candida sp é um saprófita
comum da pele, tratos gastrointestinal e reprodutivo, e atua como um patógeno
facultativo em condições de debilitação. As úlceras ou placas brancas e salientes
podem ser vistas na língua ou na boca; o fungo também pode atacar as unhas.
As lesões orais têm de ser diferenciadas daquelas produzidas por traumas,
varicelas dos macacos ou herpesviroses. Cremes tópicos que contenham nistatina
são efetivos no tratamento de infecções superficiais. A nistatina oral (200.000u,
quatro vezes ao dia, continuada por 48h após a recuperação clínica) é efetiva no
tratamento da candidíase do trato gastrointestinal. Têm-se descrito a Dermatophilus
congolensis em macacos-da-noite. As lesões papilomatosas são vistas na face
e extremidades. A infecção é transmissível ao homem. A aspergilose pode ocorrer
em várias espécies de primatas, e o microrganismo geralmente é um patógeno
facultativo.
Manejo, Criação e Doenças de Animais de Laboratório 1251

DOENÇAS PARASÍTICAS
Os primatas recentemente importados albergam numerosos parasitas. Alguns
são comensais; outros podem-se tornar autolimitantes através de rigorosa sani-
tização e bom manejo. Entretanto, alguns podem causar sérias doenças ou
debilitação e devem ser removidos por tratamento específico.
Artrópodes – A acaríase pulmonar (Pneumonyssus sp) é comum em primatas
africanos e asiáticos capturados na natureza, particularmente em macacos rhesus
e babuínos. A infecção é rara em primatas criados em laboratórios. O ciclo de vida
da Pneumonyssus sp não é bem conhecido. A infecção geralmente não produz
doença séria, embora possa causar espirros e tosse. As lesões incluem a dilatação
e a inflamação focal crônica dos bronquíolos terminais. As lesões grosseiras podem
ocasionalmente ser confundidas com o granuloma tuberculoso. A ivermectina
(200µg/kg de peso corporal, s.c.) tem sido usada para tratamento em colônias
reprodutivas fechadas.
Os ácaros da sarna (Psorergates spp, Sarcoptes scabiei) ou os piolhos sugado-
res (Pedicinus obtusus [longiceps]) são observados ocasionalmente e podem
produzir dermatoses. Recomenda-se o tratamento tópico dos animais afetados com
piretrina, repetido após 3 dias, se necessário. A utilização de parasiticidas mais
tóxicos deve ser evitada devido à possibilidade de ingestão durante a limpeza oral
dos pêlos.
Helmintos – O Oesophagostomum pode causar nódulos granulomatosos ca-
racterísticos no intestino grosso, associados ao desenvolvimento das larvas e à
reação imune do hospedeiro. Os nódulos podem-se romper e causar peritonite. Os
Strongyloides e Trichostrongylus são invasivos; os adultos podem causar enterite
e diarréia; as larvas podem causar lesões pulmonares durante a migração. Estes
helmintos, assim como o Trichuris, podem ser tratados efetivamente com tiabendazol
(100mg/kg de peso corporal), administrado VO em intervalos de 2 a 4 semanas. Os
Prosthenorchis são vermes filarídeos, comuns em primatas das Américas Central
e do Sul, que escavam a mucosa da junção ileocecal e, algumas vezes, perfuram
o intestino ou causam obstrução quando presentes em grande número. As baratas
são os hospedeiros intermediários, e a sua eliminação, aliada a higiene rigorosa, é
essencial caso se pretenda controlar a infecção. O Dipetalonema e o Tetrapetalonema
ocorrem na cavidade peritoneal das espécies do Novo Mundo; podem estar
presentes em grande número sem danos aparentes ao hospedeiro. Os Filaroides
são encontrados nos pulmões.
Protozoários – Os primatas podem servir de hospedeiros para várias amebas
intestinais. A Entamoeba histolytica é a principal forma patogênica, tanto em
primatas não humanos como no homem. Em infecções pesadas, pode causar
enterites severas e diarréia, e os cistos podem ser demonstrados em grande número
nas fezes. O Giardia habita a parte superior do intestino delgado e pode causar
diarréia. Recomenda-se o tratamento com metronidazol (50mg/kg, VO, diariamen-
te, por 5 a 10 dias).
Também podem ocorrer parasitas sangüíneos, como Plasmodium, Leishmania
e Trypanosoma spp. Geralmente, existe um equilíbrio entre os parasitas e o
hospedeiro natural, mas podem ocorrer sérias reações a partir de infecções
cruzadas. A transmissão da malária símia para humanos tem ocorrido em áreas
onde o mosquito-vetor apropriado esteja presente. A doença não representa ge-
ralmente problema clínico em colônias de primatas. Algumas espécies de primatas,
como os macacos-da-noite, são excelentes modelos para a pesquisa de malária.
A ocorrência natural de toxoplasmose (T. gondii) tem sido relatada mais freqüen-
temente em primatas centro e sul-americanos do que em primatas africanos ou
asiáticos. Os sinais clínicos da infecção tendem a ser inespecíficos (letargia,
Manejo, Criação e Doenças de Animais de Laboratório 1252

anorexia e diarréia). A necrose focal hepática e a pneumonia fibrinosa com edema


são achados histológicos comuns. Em casos agudos, o Toxoplasma pode ser
demonstrado em esfregaços sangüíneos.

DOENÇAS VIRAIS
Muitos herpesvírus afetam os primatas; alguns existem sob a forma de infecção
latente ou subclínica em hospedeiros-reservatórios, mas causam doença severa ou
morte quando transmitidos naturalmente para outros hospedeiros. Todos os maca-
cos asiáticos são considerados eliminadores potenciais dos herpesvírus símios
(herpesvírus B). A infecção é geralmente subclínica ou leve (conjuntivite ou
vesículas orais) nas Macaca spp, mas pode causar encefalite e encefalomielite
fatais no homem. A transmissão pode ocorrer por mordida, por contaminação de
uma ferida superficial com saliva infectada, secreção conjuntival, ou por aerossóis.
Os óbitos entre os tratadores de primatas, devidos à encefalite por herpesvírus B,
enfatizam a importância da prevenção de contato direto ou indireto com as
secreções e fluidos corporais dos macacos asiáticos.
Os herpesvírus T (H. tamarinus, H. platyrrhinae) causam leves úlceras linguais
herpéticas e estomatites em micos-de-cheiro (Saimiri sciureus), mas epidemias
fatais têm-se seguido à transmissão natural aos macacos-da-noite (Aotus trivirgatus)
e sagüis (Saguinus spp). O “herpesvirus hominis” (vírus 1 da Herpes simplex)
causa uma infecção leve em homens e em outros determinados primatas, porém
macacos-da-noite, gibões e tupaias ( Tupaia glis) são altamente suscetíveis e
podem morrer; os sinais podem incluir ulcerações da pele ou membranas mucosas,
conjuntivite, meningite ou encefalite.
O homem pode transmitir o vírus da hepatite infecciosa (vírus da hepatite A) aos
chimpanzés. Valores elevados de AST (SGOT) e ALT (SGPT) possuem importância
diagnóstica. Altos níveis de anticorpos contra o vírus da hepatite A têm sido
demonstrados em macacos-da-noite mantidos em laboratório, sugerindo que esta
espécie também seja suscetível à infecção natural.
Visto que não são disponíveis vacinas para proteger o pessoal que trabalha em
colônias de primatas ou os próprios primatas contra as infecções por herpes e
hepatite viral, deve-se evitar a exposição. Isso será melhor realizado com um
cuidadoso treinamento do pessoal em relação ao manejo dos primatas; uso de
roupas protetoras, máscaras ou proteções faciais e luvas; separação dos primatas
em salas espécie-específicas; e atenção restrita em relação aos padrões higiênicos.
Vários outros vírus produzem comumente doença clínica em primatas recen-
temente importados. A rubéola (sarampo) pode assumir proporções epidêmicas. O
vírus causa erupções exantematosas e não pruriginosas no peito e nas porções
baixas do corpo; também pode causar pneumonia intersticial por células gigantes,
rinite e conjuntivite. Não existe tratamento específico. Recomenda-se a vacinação
de macacos rhesus filhotes, outros macacos asiáticos e sagüis com vacina humana
contra sarampo. A varicela dos macacos pode ocorrer em colônias de primatas.
É caracterizada por erupções cutâneas maculopapulares e pústulas variolares. Os
macacos afetados geralmente sobrevivem; após a recuperação, ficam imunes ao
desafio com vírus da vacínia.
A síndrome de imunodeficiência adquirida símia (SIAS) é causada por pelo
menos 4 isolados virais distintos, e nenhum deles foi demonstrado como infectante
do homem. Dois retrovírus do Tipo D e 3 lentivírus diferentes podem produzir um
complexo de doenças relacionadas a imunodeficiência, como micobacteriose
atípica, criptosporidiose intestinal, pneumonia pneumocística e candidíase em co-
lônias de macacos asiáticos, macacos-verdes-africanos e mangabeis fuliginosos.
Há uma grande variação hospedeiro-interespécies, no que tange aos sinais clínicos
e à suscetibilidade de vírus a vírus. A transmissão entre os primatas ocorre via
Manejo, Criação e Doenças de Animais de Laboratório 1253

TABELA 8 – Terapêutica de Primatas Não Humanos


Antibióticos
Amoxicilina 11mg/kg, IM ou s.c., diariamente
11mg/kg, VO, duas vezes ao dia
Gentamicina 5mg/kg, IM ou s.c., diariamente
Trimetoprim-
sulfadiazina 24% 1mL/9kg, s.c., diariamente
Xarope de TMP 4mg/kg, VO, duas vezes ao dia
trimetoprim- SMZ 20mg/kg, VO, duas vezes ao dia
sulfametoxazol
Parasiticidas
Ivermectina 200µg/kg, IM ou s.c.
Fenbendazol 50mg/kg, VO, diariamente, por 3 dias, repetir em 2 semanas
Mebendazol 22mg/kg, VO, diariamente, por 3 dias, repetir em 2 semanas
Metronidazol 50mg/kg, VO, diariamente, por 5 dias
Tiabendazol 100mg/kg, VO, dose única, repetir em 3 semanas
Anestésicos/Analgésicos
Cloridrato de cetamina 10mg/kg, IM, apenas para contenção; com diazepam,
0,5mg/kg, IM, para relaxamento muscular adicional
Manutenção de anestesia
em plano cirúrgico:
a) Gás inalatório
(isoflurano,
metoxiflurano,
halotano) ou
b) Pentobarbital sódico 25mg/kg, EV, aplicado lentamente para resultar em efeito
Banamina (analgésico) 1mg/kg, EV, duas vezes ao dia
Meperidina 1 – 4mg/kg, IM, cada 4 – 6h
Pentazocina 1 – 5mg/kg, IM, cada 3 – 4h

contato direto ou indireto com sangue ou outros fluidos corporais infectados. O


prognóstico é grave nos animais afetados clinicamente.

DOENÇAS NUTRICIONAIS
Ver também NUTRIÇÃO: ANIMAIS EXÓTICOS E DE ZOOLÓGICO, página 1469.
Todos os primatas de laboratório são suscetíveis à deficiência de vitamina C.
Um animal deficiente em vitamina C geralmente sucumbe às doenças infecciosas
antes do aparecimento dos sinais clínicos da deficiência. As rações comerciais para
macacos contêm vitamina C que permanece estável por 3 meses após a fabricação
e embalagem, se forem estocadas apropriadamente. As frutas cítricas são fontes
suplementares. A administração oral de preparações vitamínicas pediátricas que
contenham ácido ascórbico é prontamente aceita. O consumo diário de vitamina C a
, 4mg/kg de peso corporal previne o escorbuto. Os primatas necessitam de vitamina
D para prevenir o raquitismo e a osteomalacia. Os primatas asiáticos e africanos
podem utilizar a pró-vitamina D2 (em matérias vegetais); os primatas centro e sul-
americanos não podem utilizá-la – precisam de pró-vitamina D3. As proteínas animais
e o óleo de fígado de peixes proporcionam uma fonte adequada de D3, ou então um
mínimo de 1,25UI/g de dieta pode ser adicionado à ração. Na ausência de níveis
adequados de D3, os primatas do Novo Mundo podem desenvolver osteodistrofia
fibrosa (ver pág. 581).
Manejo, Criação e Doenças de Animais de Laboratório 1254

DOENÇAS DIVERSAS
Dilatação gástrica aguda – Ocorre esporadicamente em colônias de primatas e
pode estar associada a restrição de alimentos ou água, e superalimentação ou
superingestão de água acidentais. Os fatores etiológicos podem incluir a fermenta-
ção intragástrica associada à Clostridium perfringens e à função gástrica anormal.
Os achados clínicos são similares àqueles observados em pequenos animais (ver
pág. 281). Esta afecção é quase sempre fatal, a menos que um tratamento de emer-
gência seja administrado. O estômago tem de ser esvaziado e deve haver reposi-
ção hídrica em volume semelhante, com solução de lactato de Ringer administrada
parenteralmente. Geralmente ocorrem choque e desidratação, e isso requer trata-
mento imediato. O esvaziamento periódico do estômago pode ser necessário por
vários dias até que se restaure a função gastrointestinal normal. A perda contínua de
ácido hidroclorídrico pode resultar em alcalose metabólica. Devem ser fornecidos
níveis adequados de sódio, cloreto e potássio via fluidoterapia parenteral.
Trauma – Podem ocorrer ocasionalmente tanto o trauma por agressão de compa-
nheiro de gaiola ou automutilação (mordedura ou arrancamento de pêlos) como a
rarefação dos pêlos devida a alopecia auto-induzida. Atualmente, estão sendo ava-
liadas medidas para se aumentar o bem-estar psicológico dos primatas, por exemplo,
alojamentos grupais, cercados para exercício e brinquedos no interior da gaiola.

DOENÇAS DE ANFÍBIOS
Os anfíbios mais largamente utilizados são rã-leopardo (Rana pipiens), rã-touro
(R. catesbiana), “xenopo-liso” (Xenopus laevis), e “sapo-cururu” (Bufo marinus), as
salamandras (Ambystoma spp), e axolotles mexicanos (Seridon mexicanum). A
maioria dos espécimes de laboratório é capturada na natureza, porém existem
várias colônias de criação. São comuns a má nutrição, o parasitismo e determinadas
doenças bacterianas e virais. O bom manejo e uma alimentação adequada são
elementos-chave na criação de anfíbios para uso laboratorial. No entanto, o
tratamento individual ou em massa dos anfíbios doentes pode ser utilizado seletiva-
mente no manejo de determinadas doenças.
Doenças bacterianas – Microrganismos Gram-negativos e saprofíticos, tais
como Aeromonas hydrophila e Pseudomonas, Proteus e Citrobacter spp, podem
causar a assim chamada síndrome da “perna-vermelha” (septicemia bacteriana).
Os anfíbios recém-recebidos e malnutridos que forem mantidos em água de má
qualidade são particularmente suscetíveis. Os sinais clínicos podem incluir letargia,
emaciação, ulceração da pele, nariz e dedos dos pés, além de hemorragias
cutâneas puntiformes características nas pernas e abdome. As hemorragias tam-
bém podem ocorrer na musculatura esquelética, língua e membrana nictante. Em
casos agudos, estes sinais podem estar ausentes. As evidências histológicas de
infecção sistêmica podem incluir focos inflamatórios ou necróticos no fígado, baço
e outros órgãos celômicos. Pode ser útil o tratamento do tanque com nifurpirinol. O
tratamento individual com oxitetraciclina (150mg/kg de peso corporal, duas vezes ao
dia) ou cloranfenicol (50mg/kg de peso corporal, duas vezes ao dia) pode ser eficaz.
Os antibióticos devem ser administrados em pequenos volumes de água destilada
(0,2mL para uma rã de 30g) por meio de sonda gástrica por ≥ 5 dias consecutivos.
O prognóstico é reservado. A prevenção é melhor alcançada pela manutenção de
condições ótimas de manejo e alojamento, evitação de superlotação e uso de água
filtrada circulante ou de água corrente.
A micobacteriose dos anfíbios ocorre principalmente em animais debilitados
e geralmente não é um problema da colônia. As micobactérias de “água fria” estão
largamente presentes nos ambientes aquáticos, e acredita-se que a porta de
Manejo, Criação e Doenças dos Mamíferos Marinhos 1255

entrada normal seja a pele. Pode ocorrer uma infecção acidental através de injeções
parenterais não esterilizadas. Os animais afetados podem exibir granulomas
tuberculosos típicos no fígado, rins, baço, pulmões e outros órgãos celômicos. O
tratamento específico não é praticável.
Têm ocorrido infecções por Chlamydia psittaci em Xenopus laevis. As rãs afe-
tadas morrem de forma superaguda ou exibem letargia, desequilíbrio, despigmen-
tação cutânea, petéquias e edema. Histologicamente, podem ser identificados cor-
púsculos de inclusão intracitoplasmáticos basofílicos nas células de revestimento
dos sinusóides hepáticos e esplênicos. A antibioticoterapia, da mesma forma como
foi descrita para outras doenças bacterianas de anfíbios, pode ser eficaz.
Doenças parasíticas e micóticas – Os helmintos parasitas, protozoários e os
ectoparasitas são comuns em anfíbios capturados na natureza, porém as cargas
parasíticas pesadas são nocivas. Acredita-se que a administração de tiabendazol
aos anfíbios via sonda gástrica e a prevenção da reinfestação através da desinfec-
ção ou substituição do substrato sejam eficazes. As reações inflamatórias ao
parasitismo são quase sempre imperceptíveis. Os animais criados em laboratório
possuem uma incidência de helmintos extraordinariamente baixa em relação
àqueles coletados no campo. A carga parasítica dos anfíbios coletados na natureza
pode ser marcadamente reduzida pela manutenção de boas condições de manejo
e nutrição no laboratório.
A Fonsecaea sp e a Cladosporium sp estão entre os gêneros de fungos septados,
pigmentados de marrom, que causam a cromomicose. Os fungos são patógenos
oportunistas comuns. As lesões macro e microscópicas são similares àquelas da
micobacteriose, mas são diferenciadas pela presença de formas fúngicas pigmen-
tadas. A higiene adequada dos tanques de contenção, a boa nutrição e a manuten-
ção da homeostasia ambiental contribuem na prevenção de infecção.
Doenças virais – Os adenocarcinomas renais (tumor de Lucké) são relativa-
mente comuns em Rana pipiens capturadas na natureza, no centro-norte e nordeste
dos EUA. Poucas rãs portadoras de tumores são encontradas no verão, já que a
replicação viral depende da temperatura. As partículas virais e os corpúsculos de
inclusão são observados quando as rãs estão em hibernação, em 5 a 10 oC. São
comuns as metástases do tumor no fígado, pulmões e outros órgãos; tanto os
tumores primários como os metastáticos podem-se tornar muito grandes. Não existe
tratamento. Essa neoplasia é um modelo de câncer induzido por herpesvírus.
Doenças nutricionais – A manutenção laboratorial a longo prazo da maioria dos
anfíbios requer o uso de alimentos vivos. O raquitismo é um exemplo da deficiência
nutricional que pode ocorrer nas rãs (Rana spp). Os anfíbios devem ser alimentados
com alimento vivo, como grilos, tatuzinhos, tenébrios ou moscas, como parte de uma
dieta balanceada que inclua ração comercial de cão ou macaco. Uma forma de
suplementar uma dieta natural consiste no revestimento dos insetos com prepara-
ções multivitamínicas pulverizadas, que incluam vitamina D e cálcio.

MANEJO, CRIAÇÃO E DOENÇAS


DOS MAMÍFEROS MARINHOS
Os mamíferos marinhos constituem um grupo diverso de espécies colocadas
juntas primariamente porque dependem de ambientes marinhos para sobrevive-
rem. Nos EUA e seus territórios, o “Ato de Proteção dos Mamíferos Marinhos” de
1972 protege cetáceos, pinípedes, sirênios, lontras-marinhas e ursos polares,
Manejo, Criação e Doenças dos Mamíferos Marinhos 1256

considerados como mamíferos marinhos. Os cetáceos incluem 2 grupos principais,


com fisiologia e anatomia diferentes – baleias com dentes (Odontocetes) e baleias
sem dentes (Mysticetes). Os pinípedes incluem 3 grupos principais: focas verdadei-
ras (Phocidae), focas com orelhas (Otariidae) e morsas (Odobenidae). Os sirênios
(Sirenidae) constituem uma única família, que inclui manatis e dugongos. A lontra-
marinha é um membro marinho dos Mustelidae, e o urso polar é o único membro dos
Ursidae que é considerado marinho.
Poucos medicamentos ou vacinas têm sido aprovados para o uso em mamíferos
marinhos. Muitas recomendações podem ser feitas, baseadas na experiência
pessoal ou trabalhos publicados; no entanto, é improvável que exista documentação
suficiente para aprovação oficial, e portanto indica-se cuidado.

CRIAÇÃO
A regra geral para a manutenção de mamíferos marinhos no cativeiro é a
reprodução de seu ambiente natural da forma mais próxima possível. A maioria dos
cetáceos vive em hábitats marinhos, embora algumas espécies migrem para água
doce, e algumas estejam adaptadas a hábitats fluviais. As focas de Baikal se
adaptaram completamente à água doce. Os cetáceos marinhos devem ser mantidos
em água com salinidade de 25 a 35g/L. Preferivelmente, essa água “salgada” deve
consistir em sais marinhos balanceados, embora animais cativos tenham sobrevi-
vido por longos períodos, aparentemente com saúde, em soluções simples de
cloreto de sódio. O pH da água do meio do oceano é 8 a 8,3; a água para os cetáceos
marinhos cativos deve ser mantida tão próxima desse valor quanto possível. Os
cetáceos de água doce também requerem água semelhante à do seu hábitat. Nos
EUA, o “Ato de Proteção dos Mamíferos Marinhos” especifica que a contagem de
bactérias coliformes na água dos mamíferos marinhos cativos tem de ser ≤ 1.000
NMP (número mais provável por 100mL).
A variação da tolerância de temperatura de cada espécie de cetáceo pode ser
relativamente grande, mas a variação da temperatura ideal é menor. As exigências
de temperatura devem ser avaliadas cuidadosamente para qualquer cetáceo em
cativeiro. Os animais mantidos nos extremos de sua variação de tolerância de
temperatura são mais suscetíveis a doenças ambientais e infecciosas. Combina-
ções inapropriadas de animais em exposição podem resultar em situações nas
quais uma ou todas as espécies estejam mantidas em temperaturas que ponham em
risco seu bem-estar, mas não a sua sobrevivência imediata.
A boa qualidade do ar, sobretudo em instalações fechadas (10 a 20 mudanças
de ar/h), é tão importante quanto a boa qualidade da água. Requisições de foto-
período, intensidade e espectro da luz, tolerâncias de som e exigências de dis-
tâncias de vôo não estão bem-estabelecidos para qualquer cetáceo. Variam
indubitavelmente entre as espécies com hábitats largamente diversos e entre
indivíduos. Os extremos em qualquer um desses fatores devem ser considerados
nocivos na ausência de dados específicos para a espécie em questão.
A maioria dos pinípedes vive em hábitats marinhos. Suas exigências ambientais
são semelhantes às dos cetáceos, mas os pinípedes podem-se “arrastar” em terra
seca. Embora os pinípedes cativos possam ser mantidos em água doce desde que
se forneça sal adicional em sua dieta, preferem-se tanques de água salgada que
preencham as especificações listadas anteriormente para os cetáceos. A maioria
dos pinípedes obtém suas necessidades metabólicas de água a partir do alimento
e não exige acesso a água doce se receber peixes com alto teor gorduroso.
Entretanto, é comum a prática de se permitir o acesso de pinípedes à água doce.
A maioria dos pinípedes é muito mais tolerante a temperaturas frias que ao calor
excessivo. As considerações acerca dos cetáceos são igualmente válidas para os
Manejo, Criação e Doenças dos Mamíferos Marinhos 1257

pinípedes. Os tanques para pinípedes cativos devem providenciar abrigo do vento


e alguma sombra. As necessidades de se arrastar em terra seca são diferentes para
cada espécie, e alguns pinípedes, por exemplo, a otária do norte, necessitam de um
senso de oportunidade muito específico para ganhar acesso a terra seca apenas na
época dos partos.
Os sirênios apresentam necessidades de água semelhantes às dos cetáceos,
embora o sirênio mais comum nos EUA, o manati, migre sazonalmente entre os
ambientes marinho e fluvial. São melhor criados se a salinidade for alterada sazonal-
mente para igualar as migrações na natureza. É uma espécie de águas quentes.
O hábitat da lontra-marinha é o noroeste do Pacífico, do norte da Califórnia até
o Alasca. No cativeiro, é melhor criada em um sistema de água marinha fria. Já que
o pelame da lontra-marinha é a sua principal proteção contra a hipotermia, a água
tem de ser mantida completamente livre de óleos e material orgânico que possam
emaranhar ou danificar o pelame.
O urso polar vive naturalmente no gelo ártico e subártico. Tem-se adaptado com
sucesso ao cativeiro, mesmo em climas subtropicais, mas fica mais suscetível a
doenças nos climas quentes. Os ursos polares têm sido mantidos tradicionalmente
com água doce no cativeiro. É benéfica a preocupação apropriada com a filtração
e qualidade da água.

CONTENÇÃO
Os mamíferos marinhos têm de ser contidos para exames detalhados. Os
cetáceos e pinípedes treinados podem aprender comportamentos que facilitem o
exame e a coleta de amostras diagnósticas. Para esses animais, a presença de
tratadores familiares é importante.
No caso de procedimentos complexos ou de animais não treinados, a forma
mais segura para se conter um cetáceo corresponde à sua remoção da água. Os
alojamentos devem permitir a drenagem de água, de forma que os cetáceos pos-
sam ser capturados sem o uso de redes. À medida que o animal começa a perder
a flutuabilidade com a drenagem da água, ele deve ser colocado sobre grossas
almofadas de espuma, para minimizar o debatimento e as lesões. As redes são uma
alternativa para cercar ou capturar pequenos cetáceos mantidos em cercados
marinhos ou encontrados na natureza; entretanto, exige-se pessoal experiente para
minimizar os riscos de afogamento ou ferimento do animal ou dos tratadores. Os
cetáceos enredados são colocados em espuma ou macas especialmente projetadas,
que possam ser suspensas acima do nível do oceano para suportar e conter o
animal.
A contenção de cetáceos em espuma depende do procedimento a ser realizado
e do animal. Os pequenos cetáceos (golfinhos) podem quase sempre ser contidos
através do peso de 3 ou 4 tratadores – uma pessoa controla o pedúnculo da na-
dadeira da cauda e as outras aplicam peso sobre o corpo do animal. As nadadeiras
peitorais devem ser colocadas junto ao animal em uma posição fisiológica que evite
dano permanente. Nos cetáceos maiores (baleias), a poderosa nadadeira caudal
pode precisar ser segura com uma alça sobre o corpo da cauda.
A captura de pinípedes é geralmente mais fácil em chão seco; as espécies
menores podem ser capturadas na água com puçás, mas os animais maiores não
devem ser enredados na água. Eles têm de ser induzidos a sair da água ou retirados
da mesma, ou ainda, a água deve ser drenada de seu tanque. Em terra, os puçás
podem ser usados nos animais maiores, mas redes de carga, anteparos de madeira
e “cambões” também podem ser úteis. Uma vez capturadas, as focas menores
podem ser contidas para alguns procedimentos por um tratador experiente, sen-
tando no dorso da foca e segurando sua cabeça. Os pinípedes maiores ou os
Manejo, Criação e Doenças dos Mamíferos Marinhos 1258

procedimentos mais complexos demandam uma jaula de compressão projetada


apropriadamente.
Os sirênios geralmente são relativamente dóceis; os problemas da contenção se
concentram em seu corpanzil e seu peso, e recomenda-se cuidado, pois tendem a
rolar. Podem ser contidos de muitas maneiras pelas quais os cetáceos são conti-
dos. As lontras-marinhas podem ser contidas como a maioria dos outros mustelídeos
grandes. Podem-se utilizar puçás para removê-las de seus tanques. Uma vez fora
da água, sacos de contenção, jaulas de compressão ou outros artefatos de
contenção para pequenos carnívoros silvestres podem ser usados. Os ursos
polares são grandes e perigosos; não se aconselha contenção manual.

ANESTESIA
Os tranqüilizantes, sedativos e anestésicos devem ser usados apenas por
pessoal experiente. As adaptações fisiológicas ao mergulho e aos ambientes
marinhos tornam difícil a anestesia geral de cetáceos e pinípedes. As drogas
anestésicas comumente utilizadas nos outros animais quase sempre apresentam
margens estreitas de segurança ou causam reações inesperadas em mamíferos
marinhos. Exigem-se máquinas anestésicas e respiradores especializados para
cetáceos. Os sirênios raramente exigem anestesia geral ou tranqüilização para
tratamento. As lontras-marinhas podem ser sedadas com diazepam (0,2mg/kg de
peso corporal) ou tiletamina-zolazepam (1mg/kg). Anestesia cirúrgica pode ser
obtida com altas doses de tiletamina-zolazepam (2mg/kg) ou com halotano e óxido
nitroso. Os ursos polares são rotineiramente imobilizados com etorfina, tiletamina-
zolazepam e outras drogas IM. A dose necessária é altamente dependente do
animal e do ambiente.

DOENÇAS BACTERIANAS
Actinomicetos – A nocardiose ( Nocardia spp) é comumente descrita em mamí-
feros marinhos debilitados. Tem sido diagnosticada no baleote, na toninha, na orca,
na falsa-orca, no golfinho-fiandeiro e na foca-leopardo. Também têm-se diagnostica-
do infecções devidas a Actinomyces spp nos golfinhos-nariz-de-garrafa. Não se tem
descrito tratamento de sucesso, mas o tratamento de escolha poderia ser a terapia com
sulfonamidas, exceto nas orcas, nas quais elas são contra-indicadas.
Miosite clostridiana – Tem-se descrito uma miosite severa devida a infecções
por Clostridium spp em orcas, baleotes, golfinhos-nariz-de-garrafa, leões-marinhos
da Califórnia e manatis. Provavelmente, todos os mamíferos marinhos são susce-
tíveis. A doença é caracterizada por inchaço agudo, necrose muscular e acúmulo de
gás nos tecidos afetados, acompanhados por uma leucocitose grave. Se não trata-
da, pode ser fatal. O diagnóstico se baseia na detecção de bacilos Gram-positivos
nos aspirados das lesões e se confirma por cultura anaeróbia e identificação do
microrganismo. O tratamento inclui antibióticos locais e sistêmicos, drenagem
cirúrgica das áreas abscedadas e lavagem com água oxigenada. Bacterinas
clostridianas inativadas, comercialmente disponíveis, são utilizadas rotineiramente
em algumas instalações, embora sua eficácia em mamíferos marinhos não tenha
sido estudada.
Pneumonia – Acredita-se que a pneumonia seja a causa principal de morte em
mamíferos marinhos cativos. Não é comum em ursos polares. A maioria dos casos
de pneumonia em mamíferos marinhos possui envolvimento bacteriano significan-
te, e a maioria dos microrganismos cultivados a partir das espécies terrestres foi
identificada em mamíferos marinhos. A doença pode ser considerada como resul-
tado de manejo precário. Os mamíferos marinhos necessitam de boa qualidade de
ar, incluindo altas taxas de troca de ar na superfície da água em instalações
Manejo, Criação e Doenças dos Mamíferos Marinhos 1259

cobertas. O ar temperado ou a aclimatação a temperaturas frias também é


importante para prevenir doenças pulmonares, mesmo no caso de espécies
polares. Os animais aclimatados a temperaturas frias são geralmente muito resis-
tentes; porém, a transição súbita de ambientes quentes para o ar frio, mesmo com
água mais quente, pode precipitar pneumonias fulminantes, particularmente em
animais nutricionalmente, ou por outra razão, comprometidos. Os sinais clínicos
incluem letargia, anorexia, halitose intensa, dispnéia, pirexia e leucocitose acentua-
da. A doença pode progredir rapidamente. O diagnóstico geralmente se baseia nos
sinais clínicos e se confirma por resposta à terapia. O tratamento consiste na
correção de fatores ambientais e em antibioticoterapia e terapia de suporte inten-
sas. O antibiótico inicial geralmente é de largo espectro, comumente a cefalexina
(40mg/kg, três ou quatro vezes ao dia); os ajustes se baseiam em culturas e
antibiogramas a partir de amostras do orifício respiratório ou da traquéia.
Erisipela (doença da pele de diamante) – A erisipela pode ser uma séria
doença infecciosa de pinípedes e cetáceos cativos. O microrganismo, Erysipelothrix
rhusiopathiae (insidiosa), que causa erisipela em suínos e outras espécies domés-
ticas, é um contaminante comum dos peixes. A forma septicêmica da doença nos
mamíferos marinhos pode ser aguda ou superaguda; os animais afetados morrem
subitamente sem sinais prodrômicos, ou apenas com depressão repentina, inape-
tência e/ou febre. A forma cutânea, que origina lesões de pele romboidais típicas,
é geralmente uma forma mais crônica da doença. Os animais que apresentam essa
forma geralmente se recuperam com tratamento antibiótico oportuno.
A necropsia dos casos superagudos geralmente não revela lesões macroscó-
picas diferenciáveis, além de petequiação disseminada. O diagnóstico se baseia na
cultura do microrganismo a partir do sangue, baço ou cavidades corporais. Tem-se
constatado artrite nos animais que morreram da forma crônica da doença.
O tratamento das formas aguda e superaguda tem sido raramente tentado, pois
a ausência de sinais prodrômicos dificulta o diagnóstico. Os animais que apresen-
tam a forma dermatológica geralmente se recuperam com a administração de
penicilinas, tetraciclinas ou cloranfenicol, e terapia de suporte.
O controle parece primariamente relacionado ao fornecimento de peixes de
boa qualidade, apropriadamente armazenados e manipulados. A vacinação é con-
troversa e não é empregada em muitos aquários por causa dos problemas com a
bacterina. As falhas vacinais são comuns. As ampolas das bacterinas de erisipelas
mortas devem ser cultivadas para verificação de microrganismos sobreviventes
antes do uso em mamíferos marinhos. Devem-se evitar as bacterinas vivas mo-
dificadas para a vacinação inicial. Pode ocorrer anafilaxia fatal na revacinação. Por
essa razão, alguns programas de vacinação têm sido reduzidos a uma administração
única, mesmo que os títulos de anticorpos caiam abaixo do nível efetivo presumido.
Se os cetáceos tiverem de ser revacinados, devem-se proceder testes de sen-
sibilidade através da injeção de pequena quantidade de bacterina, via submucosa,
na superfície inferior da língua. Os animais hipersensíveis desenvolvem inchaço e
vermelhidão no local da injeção dentro de 30min. Não se deve usar mais que 3 a 5mL
da vacina em qualquer local, pois a mesma é extremamente irritante, mesmo em
mamíferos não sensíveis. Deve-se usar uma agulha longa (≥ 5cm) para se assegurar
que a vacina seja depositada no músculo, e não entre o músculo e a camada de
gordura, ou pode haver abscesso estéril. A bacterina deve ser administrada na
musculatura dorsal anterior e lateral à nadadeira dorsal. A administração posterior
à nadadeira dorsal pode imobilizar o animal por vários dias a partir da reação tecidual
intensa. Para se manter altos os títulos de anticorpos, precisa-se de um reforço
após 6 meses e revacinação anual.
Leptospirose – Tem sido diagnosticada em pinípedes otarídeos e ursos. Nas
focas, a doença é caracterizada por depressão, relutância a se mover, polidipsia e
Manejo, Criação e Doenças dos Mamíferos Marinhos 1260

pirexia. Pode também causar abortos e mortes neonatais nos leões-marinhos da


Califórnia e otárias do norte. As lesões incluem uma severa nefrite intersticial difusa,
com túbulos renais obstruídos com espiroquetas. A vesícula biliar pode conter bile
negra condensada, porém a hepatite pode não ser aparente macroscopicamente.
Histologicamente, observam-se hiperplasia de células de Kupffer, eritrofagocitose
e hemossiderose. Pode ocorrer também gastroenterite. Têm-se identificado anticor-
pos para vários sorotipos ( canicola, icterohaemorrhagiae, autumnalis e pomona)
nos animais afetados através de técnicas de imunofluorescência; no entanto,
apenas a Leptospira pomona foi isolada de mamíferos marinhos. O tratamento nos
pinípedes é semelhante ao dos cães (ver pág. 428). O controle nas situações de
cativeiro requer exame sorológico de novos animais durante a quarentena. Nas
áreas endêmicas, podem-se vacinar os animais cativos. A leptospira pode infectar
o homem, e devem-se tomar precauções apropriadas.
Tuberculose – Os mamíferos marinhos são suscetíveis a várias micobactérias.
Um caso de tuberculose não confirmado foi descrito em um golfinho-nariz-de-
garrafa selvagem capturado no Mediterrâneo; por outro lado, a micobacteriose tem
sido uma doença de cativeiro. Os pinípedes, cetáceos e sirênios têm desenvolvido
a doença devida a Mycobacterium bovis, M. smegmatis, M. fortuitum, M. chelonei
e M. marinum. São observadas as formas cutânea e sistêmica. Há fortes indicações
de que a imunossupressão possa estar envolvida no desenvolvimento de infecções
por micobactérias atípicas. Os testes intradérmicos com alta concentração de
tuberculina derivativa proteica purificada (DPP) aviária ou bovina podem ser
utilizados para separar os animais expostos; entretanto, ocorre anergia. Nos
pinípedes, as injeções na membrana das nadadeiras traseiras devem ser aplicadas
em 48 e 72h. A separação por ELISA tem identificado anticorpos nas focas, mas
requer avaliação adicional antes de ser considerada um teste de separação. O
diagnóstico é feito através da cultura e identificação do microrganismo proveniente
de biópsia de lesões, lavados traqueais ou fezes. A tuberculose nos mamíferos
marinhos possui, provavelmente, importância em saúde pública.
Doenças bacterianas variadas – Os mamíferos marinhos são provavelmente
suscetíveis a uma grande variedade de bactérias patogênicas. Outras bactérias,
além daquelas já descritas anteriormente, causam doenças significantes nos
mamíferos marinhos. A Pasteurella multocida tem causado vários surtos de enterite
hemorrágica com depressão e sofrimento abdominal, levando à morte aguda
golfinhos e pinípedes. Também tem sido descrita como causa de pneumonia em
pinípedes. Nos golfinhos, a P. haemolytica tem sido responsabilizada por traqueíte
hemorrágica que respondeu à terapia com cloranfenicol.
A Plesiomonas shigelloides tem sido responsável por gastroenterites em focas
comuns. A Pseudomonas pseudomallei tem causado sérios surtos fatais de doença
em vários mamíferos marinhos em cativeiro no Extremo Oriente. As Salmonella spp
têm causado gastroenterite fatal em manatis e baleias belugas. A septicemia
estafilocócica causou a morte de um golfinho com osteomielite da coluna (espondilite
piogênica). Outro caso de osteomielite intradiscal, devida a Staphylococcus aureus,
foi tratado com sucesso com um período prolongado de cefalexina e sódio-cefa-
zolina. A Staphylococcus aureus também foi incriminada em uma pneumonia fatal
em uma orca. As Vibrio spp infectam ferimentos de cicatrização lenta em cetáceos
criados em cercados no mar aberto.

DOENÇAS MICÓTICAS
Os mamíferos marinhos cativos parecem particularmente propensos a infecções
fúngicas. Não há evidência definitiva de transmissão horizontal da maioria dos
fungos; eles parecem ser secundários a estresse, comprometimento ambiental ou
Manejo, Criação e Doenças dos Mamíferos Marinhos 1261

outra doença infecciosa. Algumas micoses sistêmicas apresentam distribuições


geográficas distintas. O diagnóstico se baseia nos sinais clínicos e se confirma pela
identificação do microrganismo em biópsia ou, preferivelmente, cultura. Amostras
embebidas em lactofenol ou azul de algodão podem proporcionar um diagnóstico
imediato com alguns dos fungos morfologicamente distintos. Os esfregaços de
tecido clareados em hidróxido de potássio a 10% morno podem ser examinados
para identificar corpos de frutificação ou hifas característicos.
A medicação tópica para dermatofitose é praticável em pinípedes. Os cetáceos
menores podem ser mantidos fora da água em uma tipóia por 2 a 24h, para
providenciar que as áreas do corpo que não estejam sendo tratadas continuem
úmidas. Do contrário, emprega-se terapia sistêmica.
Aspergilose – Tem-se diagnosticado aspergilose pulmonar fatal nos golfinhos-
nariz-de-garrafa e um leão-marinho da Califórnia. A aspergilose cutânea tem sido
observada em focas cinzentas com micobacteriose intercorrente. A forma respi-
ratória tem sido um diagnóstico post mortem. As lesões cutâneas respondem ao
povidona-iodo tópico com terapia de cetoconazol (10mg/kg, VO, uma vez ao dia).
Candidíase – Doença micótica comum em cetáceos cativos, a candidíase ocorre
secundariamente a estresse, desinfecção excessiva da água com cloro ou antibio-
ticoterapia indiscriminada. As lesões são geralmente encontradas ao redor das
aberturas do corpo. Na necropsia, quase sempre se observam úlceras esofágicas,
particularmente na região da junção gastroesofágica. O diagnóstico é baseado na
identificação da levedura em culturas ou biópsia. A candidíase geralmente responde
bem ao cetoconazol (6mg/kg, VO, uma vez ao dia) em conjunto com a correção de
qualquer deficiência ambiental. A detecção e o tratamento precoces geralmente
obtêm sucesso. Outra levedura oportunista, a Cryptococcus neoformans, foi diag-
nosticada em pneumonia avançada fatal em um golfinho-nariz-de-garrafa.
Dermatofitose – A dermatite micótica devida a Trichophyton spp ou Microsporum
canis geralmente responde ao povidona-iodo tópico e/ou à griseofulvina oral.
Estreptotricose (pseudovaricela dos golfinhos, dermatofilose cutânea) – A
estreptotricose (Dermatophilus congolensis ), uma micose subcutânea, tem sido
descrita nos pinípedes. Tem de ser distinguida da varicela das focas. Têm-se
registrado infecções simultâneas de estreptotricose e varicela nos leões-marinhos.
A estreptotricose cutânea geralmente se manifesta como nódulos nitidamente
delineados, distribuídos por todo o corpo, e geralmente progride para a morte. O
diagnóstico se baseia na demonstração do microrganismo em biópsias ou cultura.
O tratamento com drogas antifúngicas sistêmicas não tem obtido sucesso. A
Sporothrix schenckii, causa de outra micose subcutânea, foi descrita em um
golfinho-de-flanco-branco do Pacífico.
Micoses sistêmicas – As micoses sistêmicas dos mamíferos marinhos representam
um risco zoonótico. Devem ser tomadas precauções para se evitar a infecção quando
da manipulação de animais mortos e doentes. A blastomicose queloidal (doença de
Lobo) foi descrita apenas em homens e golfinhos. A blastomicose tem causado doença
fatal em leões-marinhos da Califórnia, leões-marinhos de Stellar e otárias do norte.
Encontra-se lobomicose devida a infecção com Loboa loboi no golfinho-nariz-de-garrafa
do Atlântico. Descreveu-se histoplasmose sistêmica fatal em uma foca cativa da
Groenlândia. A coccidioidomicose tem sido encontrada no leão-marinho da Califórnia e
na lontra-marinha. A blastomicose vem sendo tratada com sucesso com manejo
intensivo, incluindo 70 dias de itraconazol (3,5mg/kg, VO, uma vez ao dia) combinado
com um antibiótico e uma terapia de suporte, quando indicado.
Zigomicetoses – As Mucor spp e as Entomophthora spp têm causado doença
fatal no golfinho nariz-de-garrafa e na foca da Groenlândia. A dermatite por
Fusarium ocorre nos leões-marinhos da Califórnia e focas cinzentas. Deve ser
considerada doença de animais debilitados; a causa de base da baixa resistência
Manejo, Criação e Doenças dos Mamíferos Marinhos 1262

do hospedeiro a essas infecções oportunistas tem de ser corrigida caso se queira


que a terapia obtenha sucesso. A anfotericina B é a terapia de escolha para as
infecções por zigomicetos, mas os imidazóis mais novos merecem consideração.

DOENÇAS PARASÍTICAS
Os mamíferos marinhos são suscetíveis a todos os grupos principais de para-
sitas, inclusive vários nematóideos, trematódeos, cestóideos, ácaros, piolhos e
acantocéfalos. É limitada a experiência clínica com muitos deles, enquanto outros
são comumente vistos em espécimes recentemente capturados.
Acaríase – Os ácaros nasais e pulmonares são encontrados em focídeos e
otarídeos. Os ácaros pulmonares causam tosses ruidosas. Os ácaros nasais
causam descargas nasais mas aparentemente pouco desconforto. O diagnóstico
é feito por identificação do ácaro nas secreções nasais ou esputo. Os ciclos de
vida desses ácaros são desconhecidos. As infecções têm sido liquidadas rapida-
mente com 2 injeções de ivermectina (200µg/kg) com intervalo de 2 semanas. O
tratamento dos animais infectados elimina o problema em recintos de cativeiro
sem tratamento ambiental. Os ácaros têm sido associados a grandes lesões
ásperas na região da laringe dos cetáceos, mas o seu significado ou tratamento
totais são desconhecidos.
A sarna demodética tem sido diagnosticada nos leões-marinhos da Califórnia.
Ocorrem lesões alopécicas e não pruriginosas com hiperceratose, escamação e
escoriação nas nadadeiras e outras superfícies do corpo que tenham contato com
o substrato. O diagnóstico é feito por raspados profundos de pele e identificação do
ácaro. Nos casos crônicos, a infecção bacteriana secundária resulta em piodermia.
O tratamento é o mesmo que em cachorros. Os fatores predisponentes nos
pinípedes são desconhecidos. A doença não é facilmente transmitida entre animais
em contato.
São comuns pesadas infestações de piolhos sugadores em pinípedes selva-
gens e podem causar anemia severa. Os piolhos podem ser vistos a olho nu e são
facilmente transmitidos. São altamente sensíveis a inseticidas com hidrocarboneto
clorado. A rotenona em pó também é eficiente. O animal afetado tem de ser
removido da água, secado antes de se aplicar o pó, e mantido fora da água ≥ 12h.
O tratamento deve ser repetido em 10 a 12 dias. Os animais em cativeiro podem ficar
livres dos parasitas, desde que se evite que novas fontes de infestação sejam in-
troduzidas.
Vermes pulmonares – Os vermes pulmonares são comuns em todos os
pinípedes. Os leões-marinhos são parasitados por Parafilaroides decorus, enquan-
to as focas verdadeiras são geralmente parasitadas por Otostrongylus circumlitus.
O último parasita também tem sido encontrado no coração de alguns focídeos;
entretanto, ele não produz microfilaremia. Existem pelo menos 4 espécies de
vermes pulmonares em vários hospedeiros cetáceos.
A infecção por vermes pulmonares pode ser diagnosticada por exame de fezes
ou de muco bronquial. Anorexia, tosse e, algumas vezes, muco manchado de
sangue são os primeiros sinais de parasitismo pulmonar. O tratamento da infecção
por P. decorus consiste na administração intratraqueal de agentes mucolíticos, de
antibióticos para tratar qualquer pneumonia bacteriana intercorrente, e de fosfato de
levamisol (15mg/kg) diariamente por 5 dias. O tratamento de O. circumlitus tem
consistido na administração intratraqueal de fosfato de levamisol (5mg/kg) diaria-
mente por 5 dias. É provável que os vermes pulmonares dos cetáceos também
sejam suscetíveis ao levamisol e à ivermectina.
As infecções por vermes pulmonares quase sempre permanecem assintomáti-
cas por longos períodos; quando um animal fica debilitado por outras razões, podem
Manejo, Criação e Doenças dos Mamíferos Marinhos 1263

aparecer os sinais clínicos. No cativeiro, as infecções por vermes pulmonares são


geralmente autolimitantes se as larvas não forem introduzidas em peixes frescos
que funcionem como hospedeiros intermediários. A alimentação com peixes conge-
lados previne a reinfecção.
Vermes cardíacos – Os vermes cardíacos do gênero Dipetalonema são um
achado comum de necropsia nos pinípedes, mas não têm sido descritos em
cetáceos ou sirênios. Os focídeos são afetados por D. spirocauda, e os otarídeos
são infectados no tecido subcutâneo por D. odendhali. Ambos os grupos de pinípedes
podem ser infectados pelo verme cardíaco canino, Dirofilaria immitis, em áreas
endêmicas; entretanto, os focídeos são hospedeiros anormais. O diagnóstico de
dirofilariose é feito por identificação de microfilárias no sangue. A transmissão é feita
pelos mesmos mosquitos que picam os cães. Um regime com altas doses de fosfato
de levamisol (40mg/kg, uma vez ao dia, por 1 semana) tem liquidado com sucesso
a infecção em pinípedes cativos, com a vantagem da administração oral. A pre-
venção em áreas endêmicas tem obtido sucesso com a administração diária de
dietilcarbamazina em 3,3mg/kg de peso corporal no alimento durante a estação
de mosquitos. Esta droga também é eficaz como larvicida.
Outros nematóideos – Os membros dos Anasakidae são nematóideos muito
patogênicos encontrados no estômago de mamíferos marinhos. Causam a forma-
ção de granulomas em seus locais de atracamento e podem levar a perda de
sangue, ulceração e, finalmente, perfuração e peritonite. Os peixes crus são quase
sempre incriminados como fonte de infecção. As infecções por Contracaecum spp
são comuns nos cetáceos e pinípedes selvagens. Os ursos polares em cativeiro são
propensos a pesadas infecções por ascarídeos. Os nematóideos gástricos podem
ser tratados com sucesso com diclorvos oral (30mg/kg), fenbendazol (11mg/kg) ou
mebendazol (9mg/kg) administrados duas vezes, com intervalo de 10 dias. Deve-
se considerar a ivermectina.
Os ancilostomatídeos (Uncinaria spp) são encontrados nos pinípedes. Graves
infecções são conhecidas apenas nas otárias. Os filhotes recém-nascidos são
infectados via colostro. O disofenol (12,5mg/kg) ou a ivermectina (100µg/kg),
injetados s.c., são eficientes contra esses parasitas.
Muitas espécies de grandes nematóideos espirurídeos ( Crassicauda spp) in-
fectam os seios craniais, vasos principais, rins e dutos das glândulas mamárias de
cetáceos. Não se descreveram tratamentos de sucesso, mas são potencialmente
possíveis com parasiticidas sistêmicos.
Cestoidíase – O cestóideo Diphyllobothrium pacificum é comumente encontra-
do em leões-marinhos, e acredita-se que infecções pesadas causem obstrução
intestinal. A niclosamida (160mg/kg) ou o praziquantel (10mg/kg) são tratamentos
eficientes. Outros cestóideos comumente observados incluem Diphyllobothrium
lanceolatum nos focídeos, Diplogonoporus tetrapterus em todos os pinípedes e
Tetrabothrium forsteri e Strobilocephalus triangularis nos cetáceos. Os cetáceos
são também comumente infectados por cistos subcutâneos de vermes chatos por
toda a camada de gordura. Geralmente, são formas larvais de vermes chatos de
tubarões.
Trematodíase – É um problema comum em pinípedes e cetáceos. As Nasitrema
spp são encontradas nas passagens e seios nasais dos cetáceos. Os ovos desses
trematódeos têm sido associados a focos necróticos nos cérebros de animais que
apresentam aberrações comportamentais, e também têm sido incriminados como
causa de pneumonia localizada nos cetáceos. As infecções estão quase sempre
acompanhadas por halitose, muco castanho ao redor do orifício respiratório e,
ocasionalmente, tosse. O diagnóstico é baseado na demonstração de ovos de
trematódeos operculados típicos em “swabs” do orifício respiratório ou fezes. O
tratamento com praziquantel oral (10mg/kg, duas vezes, com intervalo de 1 semana)
Manejo, Criação e Doenças dos Mamíferos Marinhos 1264

é geralmente eficiente. A reinfecção pode ser controlada pelo não fornecimento de


peixe fresco ou vivo.
A Zalophotrema hepaticum é um importante trematódeo hepático do leão-
marinho da Califórnia; causa hipertrofia biliar e fibrose do fígado. Os sinais são
geralmente vistos nos adultos e incluem icterícia, letargia e anorexia. São comuns
bilirrubinemia e altos níveis de enzimas hepáticas séricas. O diagnóstico está
baseado na identificação dos ovos de trematódeos nas fezes. O tratamento com
bitional a 20mg/kg de peso corporal tem obtido sucesso.
Vários outros trematódeos infectam o estômago, intestinos, fígado, pâncreas e
outros órgãos abdominais de mamíferos marinhos. A fibrose pancreática devida a
trematodíase é um achado comum de necropsia.
Coccidiose – Os coccídios (Eimeria phocae) têm sido encontrados nas focas
comuns que apresentam diarréia sanguinolenta fatal. Esses coccídios são prova-
velmente suscetíveis a drogas anticoccidianas usadas contra outras espécies, por
exemplo, amprólio. Não tem havido relatos de coccidiose em outros mamíferos ma-
rinhos.
DOENÇAS VIRAIS
Adenovírus – O adenovírus foi isolado de uma baleia “sei” e de baleias-
verdadeiras e observado no fígado de 6 leões-marinhos da Califórnia (Zalophus
californianus) jovens encalhados com hepatite. Nenhuma doença foi observada nos
cetáceos. Os pinípedes desenvolveram fraqueza, emaciação, fotofobia, polidipsia,
aumento de volume abdominal, diarréia tingida de sangue e eventualmente paresia
posterior, e exibiram uma linfopenia relativa e monocitose. Todos os pinípedes
desenvolveram pneumonia e morreram 1 a 28 dias após a observação inicial.
A lesão histológica mais proeminente em todos os casos foi necrose hepática.
Necrose de coagulação maciça, sem distribuição zonal aparente, ocorreu em alguns
animais. Observaram-se inclusões intranucleares basofílicas nos hepatócitos ou
inclusões intranucleares anfofílicas granulares nas células de Kupffer. Não se
detectou nenhuma evidência do adenovírus nos pulmões. Não se sabe se o
adenovírus dos leões-marinhos da Califórnia causam doença no homem.
Calicivírus (vírus do leão-marinho de San Miguel) – Os calicivírus têm sido
isolados de otárias, morsas, golfinhos-nariz-de-garrafa do Atlântico ( Tursiops
truncatus) e peixes olhos-de-opala (Girella nigricans). Os calicivírus marinhos
parecem ser sorotipos do vírus do exantema vesicular dos suínos (VEVS, ver
pág. 469). Várias espécies de cetáceos misticetos apresentam anticorpos para
diferentes sorotipos de VEVS. Aos 4 meses de idade, a maioria dos leões-marinhos
da Califórnia possui anticorpos neutralizantes para 1 ou mais dos sorotipos. Os
peixes olho-de-opala são provavelmente responsáveis pelo status endêmico dos
calicivírus nos mamíferos marinhos que habitam as águas costeiras da Califórnia.
Até hoje, essas infecções não foram diagnosticadas nos mamíferos marinhos do
Oceano Atlântico.
As vesículas de pele são a lesão mais consistente em mamíferos marinhos. Nos
pinípedes, as vesículas são mais prevalentes na superfície dorsal das nadadeiras
dianteiras. Nos golfinhos, as lesões vesiculares têm sido observadas em associação
com lesões “de tatuagem” e cicatrizes antigas. As vesículas possuem de 1mm a 3cm
de diâmetro. Geralmente se desgastam e deixam úlceras rasas de recuperação
rápida, mas de vez em quando as vesículas regridem e deixam lesões em forma de
placa. As lesões de pele geralmente se resolvem sem qualquer tratamento de su-
porte. A infecção pode causar parto prematuro nos pinípedes. Os filhotes afetados
apresentam pneumonite intersticial e encefalite, e exibem crescimento deficiente.
A inoculação de calicivírus marinhos em suínos causa lesões vesiculares
idênticas às vistas no exantema vesicular. Não há evidência de que os calicivírus
Manejo, Criação e Doenças dos Mamíferos Marinhos 1265

marinhos causem doença clínica no homem, mas a exposição forte pode resultar na
neutralização de anticorpos, e o isolamento recente de calicivírus em um primata
clinicamente doente indica que esses vírus devem ser manipulados com cuidado.
Herpesvírus – Os herpesvírus têm sido isolados em focas comuns (Phoca
vitulina) recém-nascidas, 1 leão-marinho da Califórnia (Zalophus californianus) e
1 foca cinzenta (Halichoerus grypus ). Têm-se demonstrado partículas semelhantes
a herpesvírus em lesões de pele de belugas (Delphinapterus leucas ). Lesões
semelhantes a herpesvírus ocorrem em uma grande variedade de outros pinípedes
e cetáceos.
As focas comuns apresentam descargas nasais, inflamação da mucosa oral,
vômitos, diarréia e febre seguidos de tosse, pneumonia, anorexia e letargia que
podem resultar em morte dentro de 1 a 6 dias. A morbidade pode atingir 100% em
focas estressadas em condições de lotação; a mortalidade é de , 50%. O período
de incubação parece ser de 10 a 14 dias.
No leão-marinho da Califórnia e na foca cinzenta, o sinal primário da infecção se
constitui em áreas de alopecia circunscritas e recorrentes de , 0,5cm de diâmetro.
Pode ocorrer doença sistêmica, incluindo pneumonia. As lesões herpéticas nas
belugas são geralmente circulares, com até 2cm de diâmetro, e podem parecer
levemente achatadas com uma aparência de escudo ou ser elevadas e proliferati-
vas. Os centros de algumas lesões são necróticos ou podem conter crescimentos
verrucosos. As infecções sistêmicas não foram documentadas nas baleias.
Os achados de necropsia incluem pneumonia intersticial, hepatomegalia com
necrose de coagulação maciça, e pequenas erosões da mucosa oral e pele. As
inclusões intranucleares podem ser vistas em biópsias de lesões de pele iniciais.
Nas focas, a pneumonia intersticial causada pelo herpesvírus tem de ser distinguida
da pneumonia bronquial causada pelo vírus da influenza. Outros microrganismos
infecciosos, por exemplo, bactérias e parasitas, podem complicar a pneumonia
por herpesvírus. A hepatite por herpesvírus tem de ser diferenciada da hepatite por
adenovírus, que apresenta corpúsculos de inclusão intranucleares.
Na infecção sistêmica, a terapia é de suporte. Em uma epidemia registrada, o
aciclovir oral não eliminou a infecção, mas aparentou ter diminuído significativa-
mente os sinais clínicos em infecções primárias. A vacinação com 1mL de vacina
contra poliovírus trivalente para controlar recrudescência de lesões suspeitadas
por herpesvírus tem sido usada com algum sucesso; embora reduza a gravidade de
recrudescência em focas, há um potencial risco de saúde pública, já que o poliovírus
vivo pode ser transmitido após a vacinação. O estresse e a imunossupressão estão
associados com a recrusdescência de infecções latentes. Não há evidências de que
os herpesvírus dos pinípedes ou cetáceos sejam zoonóticos.
Vírus da influenza – Dois vírus de influenza A diferentes foram isolados de focas
comuns ( Phoca vitulina) encalhadas e 2 outros subtipos foram isolados de um
baleote (Globicephala melaena) encalhado. A infecção é provavelmente comum. Os
sinais clínicos nas focas são dramáticos; mesmo animais bem-nutridos tornam-se
fracos, incoordenados e dispnéicos, com descarga nasal sanguinolenta ou esbran-
quiçada ocasional. São comuns os pescoços inchados devidos ao aprisionamento
fascial do ar que escapou pela entrada do tórax. O único baleote afetado apresentou
manipulação difícil, estava extremamente emaciado e descamava a pele. O período
de incubação durante epidemia é ≤ 3 dias. Provavelmente, muitos fatores contri-
buem para a natureza explosiva da epidemia em focas comuns. As altas densidades
populacionais e a temperatura alta inoportuna contribuem para a alta mortalidade.
Nas focas, a pneumonia se caracterizou por bronquite e bronquiolite necrosantes
e alveolite hemorrágica. No baleote, os pulmões estavam hemorrágicos e um nódulo
hilar enormemente aumentado. Para o diagnóstico diferencial, ver HERPESVÍRUS,
anteriormente.
Manejo, Criação e Doenças dos Mamíferos Marinhos 1266

A virulência das epidemias tem impossibilitado tentativas de terapia de suporte


sério. Pessoas cujos olhos foram contaminados enquanto estiveram realizando
necropsias ou que tiveram contato com secreção nasal proveniente de espirros de
focas afetadas desenvolveram ceratoconjuntivite em 2 a 3 dias, e foram isolados
vírus idênticos. Todas as pessoas afetadas se recuperaram completamente em 7
dias, sem desenvolver quaisquer títulos de anticorpos, o que sugere que a reação
seja local, como acontece com o vírus da doença de Newcastle.
Paramixovírus – Os focídeos são suscetíveis ao vírus da cinomose. Geralmen-
te, as focas jovens são afetadas e mostram depressão, anorexia, conjuntivite
crostosa, descarga nasal e dispnéia. Desenvolve-se pneumonia e a mortalidade
pode ser alta em populações não expostas previamente. Surtos recentes em focas
comuns selvagens têm sido extensos no Mar do Norte. Experimentalmente, as focas
cativas têm sido vacinadas com vacinas de cinomose canina e têm sido imunes ao
desafio com o vírus (suspensão de material orgânico) obtido de focas selvagens
mortas.
Poxvírus – Tem-se identificado morfologicamente poxvírus em lesões de pele,
tanto de pinípedes e cetáceos de vida livre como de cativos. As lesões nos leões-
marinhos da Califórnia (Zalophus californianus), focas comuns (Phoca vitulina) e
focas cinzentas ( Halichoerus grypus) são provavelmente devidas a parapoxvírus.
As lesões nos leões-marinhos sul-americanos (Otaria byronia) e nas otárias do norte
(Callorhinusus) provavelmente não o são. Um poxvírus não classificado está
também associado a lesões de pele nos golfinhos-nariz-de-garrafa do Atlântico
(Tursiops truncatus ) e um golfinho-de-flanco-branco do Atlântico (Lagenorynchus
acutus) encalhado.
Os surtos ocorrem tipicamente nos pinípedes recém-desmamados e recém-
introduzidos no cativeiro. O período de incubação é de 3 a 5 semanas. Uma
interrupção da superfície epitelial pode ser necessária para começar uma infecção.
As lesões podem ser recorrentes. Pequenos nódulos salientes e cutâneos (0,5 a
1cm de diâmetro) ocorrem na cabeça, pescoço e nadadeiras de pinípedes afetados.
Podem aumentar para 1,5 a 3cm de diâmetro durante a primeira semana, e podem
ulcerar ou desenvolver lesões periféricas durante a segunda semana. Após a quarta
semana, as lesões começam a regredir, embora os nódulos tenham sido descritos
como persistentes por até 15 a 18 semanas. As áreas de alopecia e tecido de
cicatrização podem permanecer após a cura.
As infecções cutâneas por poxvírus nos cetáceos podem ocorrer em qualquer
parte do corpo, mas são mais comuns na cabeça e nadadeiras peitoral, dorsal e
caudal. Variam de lesões anelares ou puntiformes a padrões mosqueados, puntifor-
mes e negros (lesões “em tatuagem”). As lesões anelares ou puntiformes aparecem
como manchas redondas ou elípticas, solitárias, com 0,5 a 3cm, que algumas vezes
coalescem. São geralmente cinza-claras e podem ter um contorno cinza-escuro,
embora também se observe o padrão de cores reverso. As lesões podem persistir
por meses ou anos sem quaisquer efeitos danosos aparentes para o animal.
Os principais diagnósticos diferenciais incluem estreptotricose cutânea e cali-
civírus. Os poxvírus não têm sido isolados de pinípedes ou cetáceos. O diagnóstico
se baseia na presença de corpúsculos de inclusão intracitoplasmáticos e eosinofílicos
em biópsias de lesões, e é confirmado pela identificação de partículas de poxvírus
típicas em microscopia eletrônica.
Os poxvírus de mamíferos marinhos não parecem causar infecções sistêmicas.
Embora os animais com lesões cutâneas de poxvírus tenham morrido, outros fatores
foram responsáveis. Indica-se terapia para controle de infecções bacterianas
secundárias apenas quando as lesões de pele supuram. Os parapoxvírus dos
pinípedes podem causar lesões isoladas nas mãos de pessoas que não estejam
usando luvas quando estiverem em contato com animais afetados.
Manejo, Criação e Doenças dos Mamíferos Marinhos 1267

Vírus variados – Uma foca anelada da Noruega foi ferida e apareceu confusa;
sua condição geral se deteriorou nos 5 dias seguintes, e ela se tornou agressiva.
Confirmou-se raiva por exame de imunofluorescência do cérebro. Na época, havia
uma epidemia de raiva nas raposas da área.
O único retrovírus identificado até hoje em um mamífero marinho foi um
espumavírus isolado de lesões de pele recorrentes de um leão-marinho da Califórnia
que morreu subseqüentemente de pneumonia por Pasteurella, complicada por
herpesvírus.
Um enterovírus de patogenicidade desconhecida foi isolado a partir de um “swab”
retal de uma baleia cinzenta da Califórnia. Foram encontrados anticorpos, não
associados com doença, contra o vírus da influenza humana (após desafio) e vírus
da poliomielite, em Tursiops truncatus.
Uma enterite grave e vômitos em uma beluga cativa foram sugestivos de enterite
por parvovírus. A morte foi rápida; entretanto, nenhum vírus foi isolado.

DOENÇAS AMBIENTAIS
Edema corneal – A opacidade corneal ocorre freqüentemente nos pinípedes
cativos mantidos tanto em água doce como salgada; também é observada em
cetáceos cativos, mas é rara em animais selvagens. Pode ser devida a vários pro-
blemas ambientais. Os casos transitórios podem ser causados pela simples mu-
dança de um animal da água doce para a salgada ou vice-versa. A falta de sombra
e a iluminação brilhante excessiva têm sido implicadas. Condições não higiênicas
da água com grandes cargas bacterianas e superutilização de desinfetantes oxi-
dativos também têm sido associadas à doença. As deficiências nutricionais têm sido
sugeridas como causa, mas a resposta à suplementação de vitamina C ou A não tem
sido dramática. A afecção geralmente é autolimitante se a agressão latente à córnea
for removida.
Úlceras corneais – Ocorrem freqüentemente em pinípedes e cetáceos cativos.
Podem ser seqüelas de casos não resolvidos ou não tratados de edema corneal, ou
iniciadas por trauma direto. O diagnóstico é feito por observação dos defeitos
epiteliais em córneas coradas com fluoresceína. As lesões pequenas podem ser
tratadas topicamente em animais treinados. Em animais não treinados, as injeções
subconjuntivais de antibióticos e esteróides são necessárias. As lesões extensas
se beneficiam pela proteção por sutura das pálpebras. As úlceras ou lacerações
profundas, em risco de erodir a membrana de Descemet, devem ser estabilizadas
com um esparadrapo fino de metilacrilato. Como no edema de córnea, a cura de
sucesso e a prevenção de recidiva dependem da remoção da causa de base.
Corpos estranhos – Muitos mamíferos marinhos cativos desenvolvem o vício de
engolir objetos caídos em seus tanques. Nos cetáceos, a abertura do segundo
compartimento do estômago é pequena, e os objetos estranhos permanecem no
primeiro compartimento. Nos pinípedes, o piloro pequeno evita a passagem da
maioria dos corpos estranhos. Freqüentemente, não há evidência de sinais clínicos.
De vez em quando, podem-se observar anorexia, regurgitação ou letargia. Entretan-
to, os corpos estranhos gástricos devem ser considerados um risco para o animal
e todos os esforços devem ser feitos para evitar a sua ingestão ou para remover os
que já foram ingeridos. Objetos afiados podem causar perfuração gástrica. Outros
objetos, inclusive moedas, podem iniciar ulceração, que culminará em perfuração.
O diagnóstico é quase sempre feito pela observação do animal engolindo um objeto.
Os animais menores podem ser radiografados, e os pequenos cetáceos podem ser
palpados via esôfago para confirmar a presença de corpos estranhos. Às vezes, os
animais regurgitam corpos estranhos; no entanto, geralmente indica-se remoção
assistida. A remoção de objetos é geralmente melhor realizada através de gas-
Manejo, Criação e Doenças dos Mamíferos Marinhos 1268

troscopia, que também é utilizada como método de confirmação. Acredita-se que o


treinamento de animais para entregar objetos em troca de recompensa, como forma
de remoção da deglutição de objetos estranhos, seja benéfico.
Ulceração gastrointestinal – As úlceras gastrointestinais representam um
problema importante em mamíferos marinhos cativos. As úlceras do primeiro com-
partimento do estômago cetáceo são um achado de necropsia comum e repre-
sentam problemas clínicos menos severos que as úlceras da região pilórica ou do
duodeno proximal. As úlceras gástricas nos pinípedes freqüentemente progridem
para a perfuração, o que resulta em peritonite e morte subseqüente. As úlceras
gástricas também ocorrem nos sirênios. Embora as úlceras nos cetáceos perfurem
menos freqüentemente que nos pinípedes, devem ser tratadas como um problema
clínico sério. Várias etiologias têm sido sugeridas, incluindo danos parasíticos e teor
aumentado de histamina em peixe apodrecido, porém a doença tem de ser con-
siderada primariamente como afecção ambiental ou relacionada ao estresse.
Alterações ambientais dramáticas, incluindo mudanças de pessoal ou animais de
companhia, podem precipitar sérias ulcerações gastrointestinais nos cetáceos ou
pinípedes.
Os sinais clínicos incluem letargia, anorexia parcial, aumento de volume abdo-
minal, palidez e ocasionalmente regurgitação. Os casos com úlceras sangrantes
mostram anemia e possivelmente leucocitose. O diagnóstico está geralmente
baseado na identificação de hemácias de mamíferos nos lavados gástricos; a
confirmação é feita por visualização endoscópica das lesões. Um tratamento
paliativo de úlceras não perfurantes consiste na administração de cimetidina
(6mg/kg, três vezes ao dia) e antiácidos baseados em gel de óxido de alumínio com
ou sem simeticona, junto com refeições pequenas e freqüentes. A causa de base
tem de ser identificada e corrigida caso se queira que o tratamento obtenha sucesso
a longo prazo. O tratamento de úlceras perfurantes com peritonite conseqüente tem
de incluir antibioticoterapia de largo espectro e fluidoterapia intensivas. Como no
homem, uma vez que os mamíferos marinhos desenvolvem úlceras gastrointesti-
nais induzidas por estresse, tornam-se mais predispostos a desenvolver úlceras que
os que não tenham desenvolvido.
Trauma – Muitas lesões traumáticas (cortes, ferimentos a bala ou lâmina de
hélice de barco) são encontradas em mamíferos marinhos. As lesões por hélice
são um problema importante em manatis, que comumente entram em águas
recreacionais pesadamente navegadas na Flórida. Os ferimentos traumáticos
devem ser limpos, debridados e geralmente permite-se que cicatrizem como
feridas abertas, a menos que as cavidades corporais estejam rompidas. Os
antibióticos devem ser administrados durante a convalescença para prevenir
infecção generalizada. A manutenção de boa qualidade de água e de um alto nível
de nutrição é benéfica para melhorar o processo de cura. Os ferimentos maiores
freqüentemente se curam tranqüilamente.

NEOPLASIAS
Os tumores nos mamíferos marinhos não são freqüentes e são de pouca
conseqüência, com exceção do linfoma maligno nas focas comuns, no qual pode
haver transmissão horizontal em uma população fechada. Uma grande variedade
de tumores tem sido descrita nos mamíferos marinhos.

NUTRIÇÃO E DOENÇAS NUTRICIONAIS


No cativeiro, os animais que comem apenas ou primariamente peixes são
geralmente alimentados com peixes mortos que tenham sido congelados. A
logística e a dificuldade em providenciar esses peixes podem levar a alguns
Manejo, Criação e Doenças dos Mamíferos Marinhos 1269

problemas nutricionais especiais. Todos os peixes não possuem valor nutricional


igual; as dietas que consistem em apenas uma espécie de peixe não são provavel-
mente capazes de fornecer nutrição balanceada para qualquer animal. Da mesma
forma, uma dieta não servirá a todos os piscívoros igualmente. Só peixes que sirvam
para consumo humano devem ser servidos (ver também pág. 1481).
Os peixes congelados apresentam os riscos de armazenamento e descongela-
mento impróprios; esses procedimentos têm de ser monitorados com cuidado. Os
peixes para alimento devem ser mantidos a < –1 oC para reduzir a deterioração de
seu valor nutricional devida à oxidação de aminoácidos e lipídios insaturados. A
desidratação do peixe congelado também pode ser um problema para animais que
obtêm água a partir de seu alimento. Os peixes gordurosos não devem ser
estocados por > 6 meses. Poucos peixes, com a possível exceção do eperlano,
devem ser estocados por > 1 ano. Para reter o teor de vitaminas ótimo e reduzir a
perda de umidade, o peixe deve ser descongelado em ar sob refrigeração. O
descongelamento na água lixivia as vitaminas solúveis em água. O descongelamen-
to à temperatura ambiente estimula o crescimento bacteriano e o apodrecimento.
As necessidades de energia dos mamíferos marinhos variam com a idade,
temperatura ambiente e condições gerais. Os golfinhos jovens em crescimento e os
pinípedes menores geralmente requerem 9 a 15% de seu peso corporal em peixes
de boa qualidade por dia. Os animais mais velhos podem precisar de apenas 4 a 9%
de seu peso corporal para manutenção. As espécies maiores (baleias, elefantes-
marinhos) geralmente requerem menos alimento (2 a 5% de peso corporal) como
adultos.
Os sirênios precisam de uma dieta de grama hidropônica e várias verduras e
alfaces suplementadas com ração para macacos rica em vitaminas, cenouras,
bananas e suplementos multivitamínicos minerais usados particularmente para
balancear as proporções cálcio/fósforo. Acredita-se que os sirênios ingiram consi-
derável proteína animal acidentalmente durante o pastejo na natureza. As necessi-
dades de consumo foram estimadas em 7 a 9% do peso corporal diariamente. Os
sirênios são geralmente alimentados várias vezes por dia para atender ao seu
padrão de alimentação por pastejo.
As lontras-marinhas geralmente ingerem dietas que consistem de vários
invertebrados (equinodermos, moluscos, crustáceos ocasionais) e peixes. Os
animais adultos requerem , 25 a 30% do seu peso corporal em alimento por dia.
Os ursos polares apresentam, na natureza, dietas ricas em lipídios, particular-
mente no inverno, quando subsistem basicamente de focas. São considerados
como tendo uma exigência dietética excepcional por vitamina A e algumas afecções
dermatológicas respondem à suplementação diária de 20.000 a 1.000.000UI na
dieta. Os ursos polares ingerem comumente grandes quantidades de peixe no
cativeiro, e por isso devem ser seguidas as precauções para animais piscívoros.
Nutrição neonatal – Os mamíferos marinhos jovens são freqüentemente
encontrados encalhados. Quase sempre não estão desmamados e têm de ser
alimentados com uma dieta que lembre o leite de sua mãe. No cativeiro, os neonatos
podem ser abandonados por seus pais e requerer aleitamento artificial. Os mamí-
feros marinhos possuem leite rico em lipídios. A maioria das espécies é intolerante
a carboidratos, e os neonatos alimentados por fórmulas com carboidratos desenvol-
vem gastroenterite bacteriana severa, correndo risco de vida. A maioria dos
mamíferos marinhos recém-nascidos também precisa de imensa densidade calórica
no substitutivo do leite.
Os focídeos e os otarídeos podem ser criados com a mesma fórmula, composta
de 340g de arenque moído, sem cabeça e sem cauda, em 100mL de água. Esse
arenque é passado por um espremedor de batatas para produzir uma ração de
peixe, a qual é suplementada com uma mistura de 150mL de lactato de Ringer, 8,3g
Manejo, Criação e Doenças dos Mamíferos Marinhos 1270

de cloreto de sódio, 400mg de tiamina, 400UI de vitamina E, 1,3g de gliconato de


cálcio em pó, 250mg de vitamina C, 5mL de óleo de açafroa, 2,5g de lecitina com
0% de carboidratos, e 1 comprimido multivitamínico humano pulverizado. A mistura
é então homogeneizada com 200mL de creme batido denso, que tenha sido tratado
com enzimas de lactase por, pelo menos, várias horas antes. Essa fórmula pode ser
armazenada no refrigerador por até 24h.
Os filhotes de pinípedes devem ser alimentados a cada 4h em sua primeira
semana de vida; a quantidade de fórmula ingerida deve ser gradualmente
aumentada e as refeições devem diminuir para 5 por dia. Os filhotes de focas
comuns devem ser alimentados por sonda até 2 a 3 semanas de idade antes do
desmame, com pequenos pedaços de peixe. Os filhotes de elefantes-marinhos
precisam de alimentação por sonda até terem 4 semanas de idade, quando o
desmame pode começar. Os filhotes de leão-marinho da Califórnia podem ser
forçados a ingerir peixe logo às 4 semanas de idade e podem-se alimentar
livremente às 6 semanas.
As morsas recém-nascidas têm sido criadas com fórmulas baseadas em creme
batido, enriquecidas com mais moluscos (mariscos) que peixes, e parecem tolerar
carboidratos razoavelmente bem. Esses animais apresentam um período de aleita-
mento muito mais longo que os outros pinípedes.
Os cetáceos recém-nascidos têm períodos de aleitamento mais longos que os
pinípedes. O sucesso do aleitamento com mamadeira tem sido mínimo. O teor de
gordura do leite dos cetáceos varia consideravelmente: o leite do golfinho-nariz-de-
garrafa tem , 17% de gordura (metade da maioria dos leites dos pinípedes); o leite
de beluga, 27%; o leite de toninha, 46% e o leite da baleia-azul, 42%. Fórmulas
semelhantes à fórmula dos pinípedes, ajustadas para o teor de gordura com óleos,
devem obter sucesso em cetáceos recém-nascidos, caso se resolva a logística de
fornecimento.
Os sirênios recém-nascidos começam a mordiscar algas marinhas logo após o
nascimento, mas continuam a mamar até os 18 meses. Podem ser criados com leite
artificial, com desmame precoce. As lontras-marinhas recém-nascidas também têm
sido criadas com sucesso, a partir do nascimento, com fórmulas artificiais. Os ursos
polares recém-nascidos são extremamente nidífugos e representam um desafio por
causa de um sistema imune aparentemente imaturo. O leite do urso polar é rico em
gordura (31%) e contém o mínimo de lactose. Os ursos polares têm sido criados com
sucesso com fórmulas baseadas em creme batido e óleo.
Deficiência de tiamina – Pode ser vista em qualquer animal piscívoro. A tiamina
contida no alimento é destruída pela atividade das enzimas tiaminases ou das
substâncias antitiamina contidas no peixe que está sendo ingerido. Essas enzimas
ativas também destroem a tiamina suplementar que é colocada nos peixes, se
permanecerem por longos períodos antes da alimentação. Os sinais clínicos da
deficiência de tiamina são primariamente distúrbios do SNC. Os animais afetados
podem exibir anorexia, regurgitação ou ataxia. A afecção pode progredir para
ataques convulsivos, coma e morte.
Os casos clínicos de deficiência de tiamina respondem rapidamente à injeção IM
de cloridrato de tiamina (até 1mg/kg de peso corporal), seguida por suplementação
oral. O controle geralmente envolve tiamina suplementar a 25mg/kg de alimento,
administrada preferencialmente 2h antes da refeição principal.
Deficiência de vitamina E (esteatite, doença da gordura branca) – Acredita-
se que as propriedades antioxidantes da vitamina E exerçam um papel impor-
tante na manutenção da integridade das membranas celulares. Os processos
oxidativos, que ocorrem durante a estocagem do peixe, destroem a vitamina E e
outros antioxidantes. A esteatite tem sido induzida experimentalmente nos focídeos
e suspeita-se de relação entre a deficiência de vitamina E e hiponatremia. Os
Manejo, Criação e Doenças dos Visons 1271

piscívoros cativos são comumente suplementados VO com vitamina E em uma dose


de até 100mg/kg de alimento, o que geralmente mantém altos os níveis séricos da
vitamina. Isso não parece necessário se os peixes forem apropriadamente esto-
cados e descongelados.
Hiponatremia (deficiência de sal, doença de Addison) – A hiponatremia nos
pinípedes está intimamente relacionada à exaustão adrenal e ao desenvolvimento da
doença de Addison, que liga a síndrome aos estressantes ambientais mais do que
a uma simples deficiência de sal primária. É mais comum nos pinípedes mantidos em
exibições de água doce, mas pode ser vista em animais mantidos em água salgada.
É mais comum nos focídeos, mas ocorre em otarídeos e outros mamíferos marinhos.
Os sinais incluem fraqueza periódica, anorexia, letargia, incoordenação, tremores e
convulsões. Os níveis séricos de sódio podem cair a < 140mEq/L. Os casos severos
podem colapsar em crise addisoniana, que pode ser fatal.
A terapia de emergência consiste em infusão de cloreto de sódio e corticosterói-
des de reforço. O tratamento a longo prazo dos casos avançados requer suplemen-
tação mineralocorticóide em conjunção com suplementação oral de cloreto de sódio
e monitoração periódica dos níveis séricos de sódio. O controle consiste em
provisão de tanques de água salgada ou suplementação de cloreto de sódio (3g/kg
de alimento) na dieta de pinípedes cativos mantidos em tanques de água doce. Os
animais sob suplementação de sal devem ter acesso contínuo à água doce.
Intoxicação por histamina (envenenamento escombróide, envenenamento
por cavala) – Os peixes escombróides (cavala, atum) e outros peixes de carne
escura possuem uma “vida de prateleira” curta, mesmo se congelados a tempera-
turas baixas. Possuem um alto teor de histidina, que é convertida em histamina por
bactérias, à medida que o peixe se deteriora. A ingestão de um desses peixes pode
causar intoxicação por histamina nos mamíferos marinhos. É mais comum nos
pinípedes, mas também é vista em outros mamíferos marinhos. Os sinais clínicos
incluem anorexia, letargia, boca ou garganta inflamada ou avermelhada, conjuntivite
e lacrimejamento aumentado, e ocasionalmente vômito, diarréia, prurido, urticária
e posturas indicativas de dor abdominal. As anti-histaminas podem providenciar
alívio sintomático, mas a afecção é geralmente autolimitante e o animal começa a
se alimentar dentro de 2 a 3 dias. O controle consiste em evitar os peixes
escombróides na dieta ou na atenção cuidadosa a sua qualidade, estocagem e
manipulação quando forem usados.

MANEJO, CRIAÇÃO E DOENÇAS


DOS VISONS
MANEJO
A fazenda para criação de visons ( Mustela vison) deve estar localizada em um
solo bem-drenado, bem distante de áreas urbanas. Um manejo bom e apropriado
e um controle regular de fezes ajudam a controlar o mau cheiro e as moscas. Uma
cerca de proteção ao redor da fazenda ajuda na prevenção de fuga de visons e na
manutenção dos animais silvestres ou selvagens no lado de fora. Muitas espécies
selvagens, como o cangambá (Mephitis mephitis) ou o guaxinim (Procyon lotor),
podem agir como vetores de doenças como a cinomose.
Os visons são domiciliados individualmente em cercados de tela de arame,
situados logo acima do chão. Uma caixa-ninho com um buraco de entrada é anexada
do lado de fora ou colocada no interior do cercado. A madeira usada para a caixa-
Manejo, Criação e Doenças dos Visons 1272

ninho não deve ser pintada ou tratada com preservativos. Feno do pântano sem
barba de espiga e macio, palha cortada, lascas e maravalhas de madeira comum ou
de lei constituem material para confecção de ninho aceitável. As caixas-ninho
devem ser limpas e o material do ninho reposto quando necessário, especialmente
antes de a fêmea parir, e durante o tempo frio.
Usam-se galpões por todo o ano. Eles devem permitir a entrada de luz natural
suficiente para suprir as horas normais de luz diurna, e deve haver bastante
circulação de ar nos meses mais quentes.
A alimentação do visom pode ser fornecida, tanto como um mingau úmido
colocado no topo da tela de arame, como uma ração peletizada, seca, preparada
comercialmente e colocada em comedouros. Durante os períodos de desmame e
pós-desmame, a alimentação é fornecida em bandejas de comida colocadas no
chão do cercado para filhotes pequenos que não podem alcançar o topo. Água
fresca deve sempre estar disponível. Recipientes de bebida fixados no lado de fora
do cercado, com uma canelata que entre no mesmo, são comumente usados. Um
sistema automático de fornecimento de água, com bicos de mamadeira ou bóias
flutuantes, é usado em galpões, desde que a temperatura permita.
Instalações para estocagem fria são necessárias para congelar e estocar a parte
de carne da ração. Descongela-se um fornecimento diário de derivados de peixe e
carne, adiciona-se um cereal comercial e mistura-se a ração combinada com água
até se alcançar uma consistência que permita sua permanência na tela do cercado
sem cair. Rações previamente misturadas podem ser entregues diariamente,
prontas para alimentação, ou podem ficar em blocos congelados que sejam
descongelados quando necessário. Rações peletizadas secas são usadas em
algumas fazendas durante parte ou por todo o ano (ver também NUTRIÇÃO: VISONS,
pág. 1506).
O sacrifício com retirada da pele geralmente é feito em novembro ou dezembro.
O monóxido de carbono consiste na maneira mais humanitária de se matar o visom.
Os fazendeiros geralmente mantêm um macho para cada 5 fêmeas reproduto-
ras. Os visons são reprodutores sazonais com atividade sexual controlada por
períodos de aumento de luz do dia. Luzes artificiais nos galpões têm de ser usadas
com cuidado, já que podem inadvertidamente afetar o fotoperíodo e interferir no ciclo
reprodutivo normal. No Hemisfério Norte, a estação de monta começa no fim de
fevereiro ao início de março, e dura , 4 semanas. O acasalamento deve ocorrer
dentro de 1h depois de a fêmea ter sido colocada no cercado do macho. Se ocorrer
uma briga, eles devem ser separados. A ovulação é induzida pelo coito. As fêmeas
acasaladas antes do meio de março são geralmente acasaladas de novo após 7 a
8 dias, quase sempre com um acasalamento adicional no dia seguinte; logo, as
fêmeas podem ser acasaladas 2 a 3 vezes. Sabe-se que óvulos de 2 acasalamentos
podem formar a mesma ninhada. A implantação dos óvulos fertilizados é retardada,
tanto que o período aparente de gestação varia entre 40 e 75 dias.
Os visons têm uma ninhada por ano de 1 a 12 filhotes (média de 4). A maioria
nasce durante a última semana de abril e as primeiras 2 semanas de maio. Os
filhotes são cegos, pelados e pesam , 10g ao nascer, porém crescem rapidamente
durante todo o verão*, alcançando um peso de , 800g (fêmeas) ou 1.600g (machos)
em outubro. Os filhotes são desmamados com , 6 a 8 semanas de idade, podem
ser separados logo depois disso e domiciliados em cercados individuais. Os visons
adultos são extremamente ágeis, fortes e manhosos. A manipulação requer o uso
de luvas de couro especiais ou gaiolas de captura de arame.

* N. do T. – Estes dados referem-se ao Hemisfério Norte.


Manejo, Criação e Doenças dos Visons 1273

DOENÇAS BACTERIANAS
Botulismo – O botulismo (ver pág. 396) ocasionalmente causa pesadas perdas
em visons não vacinados, os quais consomem comida que contém toxina do Tipo
C. Geralmente, muitos visons são encontrados mortos dentro de 24h de exposição
à toxina, enquanto outros apresentam graus variados de paralisia e dispnéia. Os
achados post mortem não são específicos e estão relacionados à morte por paralisia
respiratória. O diagnóstico é confirmado por inoculação de soro ou tecido filtrado do
visom afetado em camundongos. O imunotipo da toxina de botulismo é Tipo C em
quase todos os surtos.
O alimento tóxico deve ser removido, e as rações ou ingredientes estocados
devem ser examinados à procura da toxina. O visom recuperado não está imune a
um desafio posterior. Recomenda-se a vacinação anual de filhotes e reprodutores
com toxóide de botulismo (Tipo C) para prevenir surtos.
Pneumonia hemorrágica – A Pseudomonas aeruginosa pode resultar em
sérias perdas. Visons de todas as idades são afetados, particularmente durante o
estresse da muda de outono. São geralmente encontrados mortos sem nenhum
sintoma prodrômico. Um exsudato nasal sanguinolento pode ser observado no
momento da morte. As lesões macroscópicas incluem uma pneumonia hemorrágica
severa com inchaço e consolidação de 1 ou mais lobos pulmonares. O tratamento
envolve vacinação imediata de todo o plantel ou uma “zona-tampão” de animais ao
redor do foco de infecção com uma bacterina de Pseudomonas e administração de
sulfatiazol sódico (410mg/kg de alimento úmido misturado) e uma quantidade
equivalente de bicarbonato de sódio por 1 semana como tratamento do plantel.
Deve-se ter cuidado com a dosagem, já que as sulfonamidas são potencialmente
tóxicas para o visom. Este deve ter água em abundância. As bacterinas de
Pseudomonas são disponíveis para vacinação em fazendas.
Tuberculose – Os visons, particularmente os tipos aleutianos, são suscetíveis
à infecção por bacilos das tuberculoses humana, bovina e aviária. A infecção
geralmente é de origem alimentar e a doença tem-se tornado endêmica em algumas
fazendas. Os sinais incluem perda de peso e, em alguns casos, distensão abdomi-
nal. Os visons afetados acham-se severamente emaciados e apresentam baço e
linfonodos aumentados. Pode haver envolvimento miliar dos pulmões, fígado, e
outros órgãos. O diagnóstico é confirmado por identificação de microrganismos
intracelulares ácido-resistentes em esfregaços de tecidos afetados. Não há trata-
mento e o controle consiste no descarte dos visons visivelmente afetados e
alimentação com produtos de carne de fábricas inspecionadas. Os testes de
tuberculina são geralmente ineficientes para detectar visons infectados.
Infecções urinárias e urolitíase – As infecções do trato urinário, comumente
chamadas de “bexiga arroxeada”, causam sérias perdas em fêmeas no fim da
primavera (durante prenhez e lactação) e em machos no fim do verão e outono
(durante os períodos de desenvolvimento rápido e crescimento de pêlos). Vários
fatores predisponentes têm sido sugeridos: contaminação de comida, gaiolas ou
caixas-ninho por bactérias patogênicas; menor consumo de água; ou maior consu-
mo mineral.
Os visons podem morrer sem apresentar sinais ou podem ter dificuldade em
urinar, urinar apenas um filete e, ocasionalmente, apresentar hematúria. Os acha-
dos post mortem macroscópicos incluem cistite hemorrágica aguda, pielonefrite, ou
ambas, geralmente associadas a cálculos (fosfato de amônio-magnésio) na bexiga
ou rins. Uma grande variedade de microrganismos, incluindo estafilococos, coliformes
e Proteus sp, tem sido isolada.
Em surtos graves, devem-se realizar culturas e antibiogramas, e adicionar a
medicação ao alimento. A boa higiene para reduzir a contaminação ambiental, o
Manejo, Criação e Doenças dos Visons 1274

aumento do suprimento de água e o sacrifício de famílias nas quais tenha-se


observado a afecção ajudam a prevenir a doença. Quando houver um problema
contínuo (com cálculos de fosfato de amônio-magnésio), pode-se acrescentar ácido
fosfórico em nível alimentar (75%) à alimentação (8g/kg de alimento úmido mistu-
rado) de março ao início de junho e de meados de julho a outubro, para reduzir o pH
da urina; o ácido fosfórico não deve ser usado em visons jovens. Pode-se acrescen-
tar sal (NaCl, 0,5%) à dieta para aumentar o consumo de água.
Mastite – Uma das doenças mais importantes economicamente nas fazendas
comerciais de visons envolve várias bactérias, mas principalmente estafilococos,
estreptococos e Escherichia coli. A mastite estafilocócica resulta tipicamente em
abscedação das glândulas afetadas, ou em doença subclínica percebida apenas
por diarréia discreta nos filhotes. A Escherichia coli causa uma mastite necrosante
superaguda, semelhante às vistas no gado leiteiro. Os fatores predisponentes
incluem más condições de higiene na gaiola e caixa-ninho, bordas ásperas ou
afiadas na entrada das caixas-ninho e grande contaminação bacteriana do alimento.
O tratamento e a prevenção envolvem melhoramento do manejo e tratamento
individual ou do plantel com o antibiótico apropriado, baseado em antibiograma.
Doenças bacterianas diversas – Várias doenças ou sinais de doenças,
incluindo septicemia, pneumonia, pleurite purulenta, abortos, abscessos, celulite e
enterite ocorrem esporadicamente em fazendas de visom; por vezes, podem-se
tornar problemas de plantel. Muitas bactérias, incluindo Proteus, Klebsiella e
Campylobacter spp, coliformes, estreptococos, estafilococos e salmonelas, têm
sido isoladas.
Deve-se escolher o tratamento com base em antibiogramas. As drogas podem
ser administradas parenteralmente ou no alimento ou na água. A dosagem pode ser
estimada na base de peso corporal – a fêmea pesa , 0,8 a 1kg e os machos variam
de 1,8 a 2,1kg. As dosagens recomendadas para gatos devem ser usadas e
ajustadas ao peso. Entretanto, algumas sulfonamidas, por exemplo, sulfaquinoxalina
e sulfametazina, e estreptomicina não devem ser usadas no visom.
A fonte de infecção deve ser determinada e eliminada. A enterite é quase sem-
pre causada por alimentos estragados ou contaminados, e abscessos por ferimen-
to de arame ou lascas de madeira nos cercados, barbas de espiga do feno ou palha
usados para a cama, ou espículas de osso no alimento. Surtos de tularemia, car-
búnculo, brucelose e infecções clostridianas têm sido causados por alimentação
contaminada com tecidos de animais que morreram ou eram portadores destas
infecções. Uma seleção criteriosa dos ingredientes alimentares e a desinfecção do
equipamento e cercados são importantes na prevenção e controle de muitas
infecções do visom. Não se deve usar “restos de outras criações” como alimento
para visons.
DOENÇAS VIRAIS
Doença aleutiana (DA, plasmocitose) – É uma infecção viral lenta do visom,
caracterizada por queda na produção, perda de peso gradual, sangramentos
bucal e gastrointestinal, insuficiência renal e uremia, e alta mortalidade. Todas as
fases de cor do visom podem ser infectadas pela DA, porém as fases de cor leve,
geneticamente derivadas da fase de cor aleutiana, são mais suscetíveis. A causa é
um parvovírus não relacionado à enterite viral do visom (ver adiante). A transmissão
ocorre in utero e por contato direto ou indireto com visons infectados.
Após a infecção, o visom freqüentemente responde com aumento acentuado
nos níveis de imunoglobulina. As imunoglobulinas não são capazes de neutralizar
o vírus da DA; imunocomplexos são formados e depositados em vários tecidos,
resultando em glomerulonefrite e arterite por imunocomplexos. As alterações pa-
tológicas macroscópicas incluem esplenomegalia; alterações renais, que variam de
Manejo, Criação e Doenças dos Visons 1275

edema e petéquia a atrofia e depressões referentes a cicatrizes; e aumento dos


linfonodos mesentéricos. As lesões histológicas incluem infiltrado de células plas-
máticas nos rins, fígado, baço, linfonodos e medula óssea; proliferação do duto
biliar; glomerulonefrite membranosa; e arterite fibrinóide. Filhotes com mães
DA-negativas podem morrer de pneumonia intersticial aguda.
A doença é controlada através de um programa de teste e abate. Os visons
positivos são identificados por exame de sangue para anticorpos específicos
através de imunoeletroforese quantitativa. Todos os visons positivos devem ser
mortos. Aqueles que forem mantidos para o estoque de reprodução são testados
no fim do outono (antes da seleção dos estoques de reprodução e esfola) e em
janeiro ou fevereiro (antes da procriação)*. Novas introduções ao plantel devem ser
testadas.
Não há vacinação ou tratamento eficiente; as fêmeas positivas e suas ninhadas
devem ser separadas do resto do plantel e esfoladas na estação própria. O vírus está
presente na saliva, urina, fezes e sangue de animais infectados. Os cercados devem
ser limpos imersos ou aspergidos com spray com hidróxido de sódio a 2%. Deve-
se desinfetar o equipamento após manuseio, vacinação ou exame de visons em
fazendas infectadas. Pássaros silvestres e moscas podem funcionar como vetores,
e o seu controle é essencial.
Cinomose – Visons de todas as idades são suscetíveis ao vírus da cinomose
canina. O período de incubação varia de 9 a 14 dias. O vírus pode ser obtido de
visons infectados 5 dias antes de aparecerem sinais clínicos. Os visons que
aparentemente se recuperarem da infecção podem continuar a eliminar o vírus por
várias semanas. A transmissão pode ser direta (através de contato ou aerossol) ou
indireta (o vírus pode persistir ≥ 1 dia no ambiente).
Os sinais clínicos incluem descargas nasal e ocular; hiperemia, espessamento
e aspereza da pele no focinho, pés e parede abdominal ventral; sinais neurológicos
(convulsões e “acessos de histeria”); ou uma combinação destes. Exames histoló-
gicos ou de imunofluorescência podem revelar inclusões intracitoplasmáticas ou
intranucleares ou antígenos de cinomose nas células epiteliais da bexiga, rins, dutos
biliares, intestinos, pulmões, traquéia e, às vezes, cérebro. A encefalite não
supurativa pode estar presente no visom com sinais neurológicos.
Em situações de surto, os animais afetados devem ser mortos e a estabilidade
do plantel vacinado deve ser alcançada tão cedo quanto possível. Os filhotes de
visom devem ser vacinados profilaticamente com 9 a 10 semanas de idade com
vacina de vírus vivo modificado (parenteral ou via aerossol). Os adultos são
geralmente vacinados na mesma época, embora acredite-se que a vacinação dos
adultos em anos alternados seja suficiente.
Enterite viral do visom – É uma doença altamente contagiosa, causada por um
parvovírus relacionado, mas não idêntico, ao da panleucopenia felina. Todas as
idades são suscetíveis, mas a doença é muito mais séria em filhotes. A transmissão
geralmente ocorre pela via fecal/oral; o período de incubação varia de 4 a 8 dias.
Os sinais clínicos incluem anorexia repentina; depressão; diarréia mucosa,
aquosa e tingida de sangue; desidratação; e morte. As lesões macroscópicas
características incluem um intestino delgado, hiperêmico, dilatado e flácido, com
conteúdo fétido e líquido. Alguns visons podem morrer repentinamente sem nenhu-
ma lesão grosseira. As lesões intestinais são caracterizadas por erosão da super-
fície da mucosa, espessamento e enfraquecimento dos vilos e dilatação das criptas.
As células epiteliais inchadas podem conter corpúsculos de inclusão semelhantes

* N. do T. – Lembrar que se trata dos EUA.


Manejo, Criação e Doenças dos Visons 1276

aos da panleucopenia felina. As lesões no baço e linfonodos incluem exaustão


linfóide e necrose.
No início do surto, todo visom que apresentar sinais deve ser morto ou isolado
e todos os clinicamente normais devem ser vacinados imediatamente com uma
vacina formalinizada de cultura de tecidos. Os visons afetados podem ser tratados
VO, com uma mistura de caulim, pectina e neomicina. A enterite viral do visom pode
ser prevenida através de vacinação. Todo visom deve ser vacinado com 7 a 8
semanas de idade com uma combinação de vacinas de botulismo/enterite viral do
visom. Recomenda-se vacinação anual. Se a fêmea tiver passado por um surto, ou
tiver sido vacinada contra enterite viral em janeiro ou fevereiro, seus filhotes que
nascerem em maio e junho não devem ser vacinados até que tenham 12 semanas
de idade.
Doença de Aujeszky (pseudo-raiva) – Ocorre ocasionalmente em visons
alimentados com derivados de carne suína contaminados com o vírus da pseudo-
raiva. A mortalidade pode ser alta, e os sinais clínicos referem-se ao SNC (convul-
sões tônicas e clônicas; excitação alternada com depressão; e, em alguns casos,
automutilação). O diagnóstico é confirmado por isolamento do vírus ou sorologia.
Como a carne suína contaminada é a fonte normal de infecção, todos os produtos
derivados dessa carne devem ser cozidos antes de serem oferecidos aos visons.
Encefalopatia transmissível do visom (“scrapie” do visom) – A encefalopatia
nos visons é rara, mas tem potencial para causar alta mortalidade em adultos. O
período de incubação em infecções experimentais é ≥ 8 meses. Os sinais clínicos
são semelhantes aos da encefalopatia no carneiro (ver pág. 753) e incluem
hiperirritabilidade, ataxia, mordidas compulsivas, sonolência, coma e morte. As
lesões histológicas no cérebro de visons afetados são semelhantes às da “scrapie”
nos carneiros. Embora visons tenham sido experimentalmente infectados por
inoculação intracerebral de material cerebral de carneiros infectados com “scrapie”
e por alimentação com tecidos de carneiros infectados, os meios de transmissão
natural ainda não são conhecidos. As medidas de controle não são conhecidas,
exceto a exclusão da dieta dos subprodutos de carneiro (e provavelmente de gado
bovino) em áreas endêmicas.
Gastroenterite catarral epizoótica – Milhões de visons têm sido afetados
por um agente (mais provavelmente um vírus) que causa gastroenterite catarral
aguda. A doença, em geral, ocorre no visom escuro adulto. O surto ocorre mais
freqüentemente durante períodos de estresse, ou seja, durante o início da muda de
outono, acasalamento de primavera e época de parição. Os sinais clínicos (muco
nas fezes e anorexia parcial) raramente duram mais que 5 a 6 dias. A morte pode
acontecer se os visons afetados forem imunossuprimidos pelo vírus da doença
aleutiana. Não existem vacinas disponíveis comercialmente. O tratamento é sinto-
mático e de valor questionável. É importante diferenciar esta afecção da enterite viral
do visom.

DOENÇAS NUTRICIONAIS
A esteatite (doença da gordura amarela, ver pág. 664) ocorre em visons jovens,
de crescimento rápido, como resultado de um excesso de ácidos graxos insaturados
rançosos ou de deficiência de vitamina E na dieta. Os visons afetados podem ser
encontrados mortos, ou podem exibir ligeiros distúrbios locomotores seguidos por
morte. Os achados de necropsia incluem gordura subcutânea ou interna, edema-
tosa e amarelada, que contém um pigmento ácido-resistente. O controle consiste na
remoção da fonte de gorduras rançosas e estocagem apropriada de alimento. Pode-
se administrar vitamina E estabilizada no alimento (15mg/visom) por 2 semanas, e
devem-se injetar parenteralmente 10 a 20mg de vitamina E por vários dias nos
Manejo, Criação e Doenças dos Visons 1277

filhotes afetados. A afecção pode ser prevenida através do fornecimento de uma


dieta nutricionalmente saudável.
A paralisia de Chastek (deficiência de tiamina) resulta do fornecimento de certos
peixes crus que contêm a enzima tiaminase. Isto inclui o salmão-branco, o eperlano-
de-água-doce, a carpa, o peixe-dourado, a perca-do-riacho, a carpinha-de-cabeça-
gorda, a carpa-prateada-castanheira, o cascudo, o peixe-gato-dos-canais, o peixe-
gato-cabeça-de-touro e a carpinha, a perca-de-cabeça-branca, o lúcio, o barbo e o
arenque-de-água-salgada. Os visons afetados perdem gradualmente seu apetite e
peso e morrem depois de convulsões e paralisias terminais. Os peixes que contêm
altos níveis de tiaminase devem ser completamente cozidos a 83oC por ≥ 5min, ou
servidos crus como parte da dieta, apenas em dias alternados. Podem-se injetar
50mg de cloridrato de tiamina s.c. nos visons afetados, o que resulta em recupera-
ção rápida. A ração deve conter tiamina apropriada (levedura de cerveja).
Devido ao rápido crescimento dos filhotes de visom, o raquitismo ocorre quando
as rações são deficientes em vitamina D, cálcio e fósforo. Os visons afetados, em
geral, rastejam invariavelmente numa posição “de sapo”, têm ossos flexíveis e
também são menores que o normal. Se necessário, a dieta deve ser suplementada
e os filhotes severamente afetados podem ser tratados individualmente.
A doença do aleitamento é uma doença metabólica que afeta visons em
lactação, , 40 dias após o parto. É caracterizada por rápida desidratação, desequi-
líbrio eletrolítico sérico, insuficiência renal e morte. O tratamento pode alcançar
sucesso se as fêmeas afetadas forem identificadas tão logo comecem a rejeitar
alimento, e reidratadas com fluidos estéreis IP ou s.c. A doença é multifatorial;
embora pareça ser uma predisposição genética em determinadas mutações de
coloração clara, é mais severa em fêmeas com ninhadas grandes e durante o tempo
quente. Quase sempre as fêmeas afetadas apresentam mastite subclínica intercor-
rente. Água adequada, sistemas de refrigeração ambiental, adoção de filhotes de
ninhadas grandes para tornar o tamanho das ninhadas mais aceitável para a fêmea
e desmame precoce previnem essa afecção.
O subpêlo de algodão geralmente indica anemia, e pode ser causado por certos
peixes (badejo do Pacífico, pescada-escura, pescada “marlonga”) que interferem no
metabolismo de ferro do visom e, conseqüentemente, na formação de melanina. A
afecção pode ser prevenida ao se cozinhar completamente o peixe ofensor a 83oC
por ≥ 5min, ou ao servi-lo em dias alternados.
O subpêlo-cinzento e a queda do pêlo externo ocorrem quando grandes
quantidades de ovos não cozidos, particularmente os de peru, são servidos. A
avidina, um fator presente em ovos, inativa a biotina, uma vitamina necessária
para a pigmentação e crescimento de pêlos. Pode-se injetar 1mg de biotina, duas
vezes por semana por 4 semanas, nos visons afetados, e pode-se também
adicioná-la à ração. A deficiência de biotina pode ser evitada ao se cozinhar ovos
a 91oC por 5min.

INTOXICAÇÃO
O envenenamento por chumbo pode ocorrer no visom que tenha ingerido tintas
que contenham chumbo, a partir do arame da tela ou de outro equipamento. O visom
afetado perde peso gradualmente e morre dentro de 1 a 2 meses com sinais clínicos
uniformes, como gastroenterite ou distúrbios do SNC. O indivíduo pode ser tratado
com cálcio EDTA como um agente quelante. Todas as fontes de chumbo devem ser
removidas.
Os inseticidas (menos piretro, butóxido de piperonil e rotenona) podem ser
altamente tóxicos ao visom. Mesmo os inseticidas entre parênteses não devem
ser utilizados em visons com menos de 8 semanas de idade, ou onde estes visons
Manejo, Criação e Doenças dos Visons 1278

possam ter contato com eles (por exemplo, caixas-ninho). Os outros inseticidas
devem ser evitados sempre que possível.
Os conservantes de madeira (fenóis clorados, cresóis) causam mortalidade de
filhotes nas primeiras 3 semanas de vida e, ocasionalmente, de animais mais velhos.
Não devem ser usados onde o visom possa mastigar a madeira tratada (cercados,
caixas-ninho ou cama dos ninhos). As maravalhas, utilizadas como cama de caixas-
ninho, não devem conter conservantes de madeira.
Os produtos que contêm dietilestilbestrol causam insuficiência reprodutiva
e alta incidência de infecções no trato urinário do visom, e não devem ser incluídos
na ração. Similarmente, as glândulas tireóide e paratireóide, incluídas em sobras
de carne servidas ao visom, podem resultar em insuficiência reprodutiva, se
presentes em níveis altos.
Os hidrocarbonetos organoclorados e bifenilpoliclorados (BPC) contidos na
ração têm causado insuficiência reprodutiva nos visons. O visom parece ser in-
tensamente sensível aos bifenilpolibromados (BPB); 1ppm na ração tem provo-
cado diminuição do tamanho da ninhada e da viabilidade dos filhotes.
DMNA – No passado, a adição de nitrato de sódio, como conservante para
aumentar o tempo útil de refeições de arenque, resultou na formação de dimetil-
nitrosamina (DMNA), a qual é hepatotóxica para o visom. Provoca degeneração
hepática, ascite e extensa hemorragia interna.
A sulfaquinoxalina perturba os mecanismos normais de coagulação sangüí-
nea dos visons e causa extensas hemorragias internas, que resultam em sérias
perdas. A estreptomicina é tóxica para os visons.

DOENÇAS DIVERSAS
O arrancamento de pêlo e a mordedura de cauda são vícios comuns do visom,
e podem estar relacionados a padrões de comportamento anormais do cativeiro. O
arrancamento de pêlos diminui o valor da pele e a mordedura de cauda freqüente-
mente resulta em hemorragia fatal. Não existe tratamento eficiente: todos os visons
que demonstrarem estes vícios devem ser esfolados.
A incontinência urinária (doença da barriga molhada) é uma afecção não fatal
que geralmente afeta os machos obesos no final do verão e outono. É caracterizada
pela micção de um filete de urina e hiperemia da pele ao redor do orifício urinário.
Como as áreas afetadas do pelame têm de ser descartadas, a afecção assume
importância econômica. A causa é desconhecida, mas pelo menos 3 fatores,
incluindo linhagem genética, altos níveis de gordura dietética e obesidade, parecem
ter a maior influência na incidência. Os animais afetados devem receber um amplo
suprimento de água.
A inanição e o excesso de frio causam morte em visons alimentados com
gordura inadequada ou servidos de refeições muito pequenas durante o inverno e
começo da primavera. Os visons afetados se tornam magros e podem correr até que
tenham um colapso e morram, ou podem ser encontrados mortos em suas gaiolas.
Tais mortes geralmente ocorrem após uma diminuição repentina na temperatura
ambiente, especialmente no início da primavera, quando os visons estão chegando
à época de procriação. A necropsia revela emaciação e ausência de gordura
corporal, em alguns casos, acompanhadas por lipidose hepática e ulceração
gástrica. Esta doença de manejo tem de ser diferenciada de doenças infecciosas.
A diarréia cinzenta nos visons lembra clinicamente a necrose pancreática
crônica nos cães, e é caracterizada por um apetite voraz e pela eliminação de
grandes quantidades de fezes fétidas e cinzentas. O visom afetado parece morrer
de inanição. Nenhuma anormalidade pancreática, vírus, bactéria ou parasita tem
sido demonstrado como causa. O tratamento é de valor questionável.
Manejo, Criação e Doenças dos Coelhos 1279

As úlceras gástricas e lipidoses renal e hepática são comuns no visom, e


geralmente estão associadas a altos níveis de gordura dietética, outras doenças ou
períodos de estresse, que resultam em vários dias de inapetência. Esta afecção
ocorre geralmente durante o final da gestação, durante o período do desmame dos
filhotes e durante o período outonal de crescimento de pêlos.
Doenças hereditárias, como hidrocefalia, alopecia generalizada, “pescoço
torcido”, “cauda curta”, síndrome de Ehlers-Danlos, hemivértebras e tirosinemia,
ocorrem ocasionalmente e têm de ser controladas pelo sacrifício de pai, mãe e
ninhada afetados.
A coccidiose causa ocasionalmente perdas nos visons jovens. Os animais
afetados têm diarréia, desidratação e perda de peso. Os coccidiostáticos podem ser
usados para controlar surtos. A coccidiose pode ser prevenida através de boa
higiene e remoção regular de fezes.
Miíase – As fêmeas de Wohlfahrtia spp depositam larvas diretamente na pele
dos filhotes. As larvas penetram na pele e produzem inflamação e lesões que
lembram abscessos. Os filhotes afetados tornam-se inquietos, emagrecem e podem
morrer. O malation em pó (5%) colocado nas caixas-ninho debaixo da ninhada
começando alguns dias antes da ocorrência de moscas, pode ajudar a prevenir
infestações. Não deve ser utilizado antes do parto ou até que os filhotes completem
1 semana de idade. O tratamento pode ser repetido uma vez após um intervalo de
2 semanas. Esse tratamento também pode ser utilizado para o controle de pulgas
(ver também CUTEREBROSE, PQ AN, pág. 950, e INTOXICAÇÃO POR INSETICIDAS E
ACARICIDAS, pág. 2011).
As infestações por pulgas são comuns nos visons e podem causar prurido,
mastigação do pelame, e conseqüentemente perdas econômicas.

MANEJO, CRIAÇÃO E DOENÇAS


DOS COELHOS
MANEJO E CRIAÇÃO
A aplicação consistente dos princípios de higiene, reprodução, nutrição e con-
trole das enfermidades faz a diferença entre sucesso e fracasso na criação de
coelhos. O uso de equipamento apropriado na coelheira também é de importância
fundamental. O que se segue é o resumo desses princípios, primariamente como se
aplicam a coelhos mantidos como animais de estimação, e usados para produção
comercial de peles, forrações e carne.
Alojamento – As necessidades de alojamento dos coelhos dependem do clima.
Pode-se utilizar o alojamento mínimo (telhado em forma de “A”, sem lados) nos
climas moderados, enquanto pode ser necessária uma coelheira com controle de
temperatura em áreas com calor ou frio excessivos. As coelheiras devem estar
localizadas perto do nível do chão e utilizar solos bem-drenados ou fossas revestidas
por azulejos para o destino das fezes. Deve-se providenciar sombra na maior parte
possível da coelheira. A boa ventilação é imperativa a todo o momento. Os prédios
estreitos, de construção modular, oferecem a vantagem de facilitação da ventilação
e da expansão quando necessário.
Gaiolas e equipamentos auxiliares – É preferível usar gaiolas completamente
fabricadas de arame. O tamanho normal é de 75 × 90cm, com altura de 40 a 45cm.
Uma gaiola do estilo semicircular metálica (teto arredondado), com a porta na frente,
Manejo, Criação e Doenças dos Coelhos 1280

torna todos os cantos acessíveis. As gaiolas devem ser construídas com arame
soldado de 2,5 × 5cm para o teto e lados e com arame soldado de 1,25 × 2,5cm para
os pisos. As divisórias das gaiolas podem ser feitas do mesmo material que o teto
e os lados ou com um tipo de arame chamado “salva-crias”, no qual a dimensão da
tela (2,5 × 5cm) é progressivamente reduzida para 1,25 × 5cm. Isso evita que os
coelhos neonatos, nascidos sobre o arame, rastejem de uma gaiola para outra.
Durante sua fabricação, o arame pode ser galvanizado antes ou depois da
soldadura; o primeiro tipo é mais caro, porém sua duração é consideravelmente
maior. Deve ser evitado o uso de madeira na construção de gaiolas, pois este
material pode ser mastigado e não pode ser higienizado adequadamente.
A gaiola deve estar equipada com um recipiente para alimentos granulados e um
sistema de bebedouros. Os recipientes para alimento são melhor construídos com
uma chapa de metal com orifícios ou uma tela no fundo para remoção de “pó”
(pequenas partículas de alimento quebrado). Nas coelheiras grandes, são usados
sistemas de bebedouros automáticos, formados por uma série de tubos conectados
com válvulas individuais para beber água em cada gaiola. Os coelhos quase sempre
mastigam a válvula de beber água e finalmente a destroem, a menos que seja feita
de aço inoxidável ou possua uma peça central inoxidável. Preferem-se garrafas com
tubos restritivos de quantidade de água, mas potes de barro e latas também são
usados nas coelheiras pequenas. A contaminação dos potes de barro ou lata
abertos precisa ser monitorada com cuidado; seus efeitos podem ser diminuídos
através da lavagem e desinfecção diária dos recipientes.
As caixas-ninho devem ser construídas de tal forma que possam ser facilmente
colocadas na gaiola e mais tarde removidas para limpeza e desinfecção entre as
camas. A desinfecção da caixa-ninho por duas vezes, uma antes da limpeza e
novamente logo após colocá-la na gaiola, ajuda a reduzir a incidência da doença.
A caixa deve ser grande o suficiente para evitar a lotação, mas pequena o bastante
para manter os filhotes aquecidos. O tamanho padrão da caixa-ninho para coelhos
de tamanho médio é de 40 × 25 × 20cm. As caixas-ninho de madeira parecem
funcionar melhor, mas as de arame soldado com revestimento de papelão descar-
tável estão se tornando populares. O material para a cama do ninho, que consiste
de palha, maravalhas de madeira ou cana-de-açúcar cortadas em tiras, serve bem
tanto para tempo quente como frio.
Lote reprodutor – A seleção de animais reprodutores é vital para uma boa
reprodução. O potencial genético individual do macho e da fêmea contribui para a
produção global da coelheira. Os animais reprodutores de boa qualidade são
obtidos de criadores conhecidos por seu êxito na reprodução. Os tipos de animais
reprodutores que devem ser selecionados dependem do propósito do criador:
carne, lã ou exibição. As melhores raças para carne são as brancas da Nova
Zelândia e da Califórnia. As raças comuns para lã são os coelhos angorá ingleses,
alemães e franceses. Para exibição de coelhos, a “American Rabbit Breeders
Association” reconhece , 40 raças.
Reprodução – As raças de coelhos do tamanho médio chegam à maturidade
sexual aos 4 a 4,5 meses, as raças gigantes aos 6 a 9 meses e as raças pequenas,
como o anão polonês e o holandês, aos 3,5 a 4 meses de idade. A coelha apresenta
ovulação induzida, mas, ao contrário da crença popular, as coelhas possuem um
ciclo de receptividade de acasalamento; são receptivas para o acasalamento em
, 14 de cada 16 dias. O grau de receptividade do acasalamento é indicado pela cor
do orifício vaginal e pela quantidade de umidade presente nos lábios da vagina. O
ciclo de cor vaginal varia de um rosa-esbranquiçado pálido a um roxo-avermelhado.
Uma coelha é mais receptiva quando a vagina estiver roxa e úmida. As coelhas que
não estão receptivas apresentam uma cor vaginal rosa-esbranquiçada com pouca
ou nenhuma umidade. Muitos criadores testam reproduzir a coelha 16 dias após o
Manejo, Criação e Doenças dos Coelhos 1281

acasalamento, como meio de detectar e acasalar com sucesso as coelhas que


tenham sofrido gravidez psicológica após o acasalamento inicial.
Uma proporção de 1 coelho para 10 coelhas consiste na prática comum, mas
muitos criadores comerciais acreditam que 1 coelho para 20 a 25 coelhas seja
mais econômico. Os coelhos podem ser usados diariamente sem diminuir a sua
fertilidade; o uso mais freqüente exige períodos de descanso. A coelha é sempre
levada à gaiola do coelho para acasalamento. O programa de acasalamento deve
continuar por todo o ano. As coelhas experimentam longos períodos de descanso
entre as ninhadas, tendem a se tornar obesas e ter dificuldades de acasalamento.
Aquelas que estiverem constantemente em gestação e lactação podem ficar
abaixo do peso, e sua receptividade ao coelho e a fertilidade diminuem conside-
ravelmente.
O período de gestação é de , 31 a 33 dias. As coelhas com um pequeno número
de fetos (geralmente quatro) parecem ter um período de gestação mais longo que
as coelhas que produzem ninhadas maiores. Se uma coelha não tiver parido com
33 dias de gestação, devem-se administrar 1 a 2UI de ocitocina para induzir o parto;
da mesma forma, uma ninhada morta quase sempre nasce após o 34º dia de
gestação. Ocasionalmente, as fêmeas prenhes abortam ou reabsorvem os fetos
devido a deficiências nutricionais ou enfermidade.
A palpação abdominal 10 a 12 dias após o acasalamento consiste em uma
técnica valiosa para detectar fetos no útero, e para as coelhas não danificarem os
filhotes. As fêmeas não prenhes são reconduzidas ao coelho para reacasala-
mento.
As caixas-ninho são colocadas nas gaiolas 28 ou 29 dias após o acasalamento.
Se as caixas forem colocadas muito cedo, as fêmeas sujam os ninhos com urina e
fezes. Um ou 2 dias antes da parição, a fêmea arranca os pêlos do corpo e constrói
um ninho na caixa. As crias nascem peladas, cegas e surdas. Começam a obter
pêlos no segundo ou terceiro dia após o nascimento e com 10 dias abrem seus olhos
e ouvidos. O reacasalamento pode ocorrer em qualquer momento após o parto.
Alguns criadores comerciais utilizam programa de acasalamento acelerado e
reacasalam entre 7 e 21 dias após o parto, enquanto a maioria das pessoas que cria
para exibição ou uso doméstico reacasala entre 35 e 42 dias após o parto.
A maioria das coelhas de tamanho médio possui 8 a 10 tetas; entretanto, não é
incomum elas parirem 15 a 18 filhotes. Como uma coelha é geralmente incapaz de
aleitar todos os filhotes eficazmente, alguns filhotes são “adotados” por outras
coelhas. Os filhotes são removidos da caixa-ninho durante os 3 primeiros dias e são
dados a uma coelha com ninhada pequena (por exemplo, 8), com aproximadamente
a mesma idade. Os filhotes adotados são geralmente aceitos se forem misturados
com os próprios filhotes da coelha e cobertos com o pêlo desta.
Nutrição – A alimentação é uma importante prática de manejo nas coelheiras.
É fácil superalimentar ou subalimentar fêmeas e coelhos jovens. A quantidade de
alimento depende da idade dos coelhos jovens e da etapa de prenhez ou lactação
das coelhas. Uma regra geral na alimentação de coelhos adolescentes e em
crescimento (jovens) consiste em oferecer tudo o que possa ser consumido em 20h,
com o recipiente de ração vazio por , 4h por dia. As coelhas são geralmente
alimentadas à vontade quando parem. A prática geral é transportar a coelha da
alimentação restrita até a livre vagarosamente durante a primeira semana de
lactação. No período entre ninhadas, as coelhas criadas para parir 5 vezes por ano
geralmente têm sua alimentação restrita; as coelhas criadas intensivamente devem
estar em alimentação completa continuamente, uma vez que comece a primeira
lactação. A alimentação de coelhos tem sido grandemente auxiliada por rações
comerciais peletizadas e cientificamente formuladas, a maioria das quais é nutricio-
nalmente completa (ver NUTRIÇÃO: COELHOS, pág. 1550).
Manejo, Criação e Doenças dos Coelhos 1282

Quando não são observados, geralmente de manhã cedo ou à noite, os coelhos


ingerem parte de suas fezes, contorcendo-se de maneira que a boca toque o ânus.
Alimentam-se exclusivamente da matéria macia que tenha sido processada no
ceco. A coprofagia ou pseudo-ruminação é normal nos coelhos e não um sinal de
deficiência nutricional. Serve como uma importante função nutricional, ao suprir o
animal com complexo vitamínico B e proteínas sintetizadas no intestino. A estabi-
lidade da microflora intestinal normal pode depender de coprofagia normal. O piso
de arame em malha da gaiola não evita a coprofagia.
Higiene – A higiene é importante em qualquer empresa de criação, mas
especialmente na produção de coelho. Já que pouca higiene leva a doença e morte,
a limpeza e a higiene têm de ser constantes. Os ninhos têm de ser desinfetados entre
um uso e outro. As gaiolas, comedouros e bebedouros devem ser higienizados
periodicamente. Uma solução higienizante econômica e eficaz é 30mL de hipocloreto
de sódio (cloro alvejante caseiro) misturados em 30mL/1L de água.
Uma coelheira ativa constantemente passa por problemas de perda de pêlo. As
coelhas arrancam os pêlos de seus corpos para fazer ninhos, e uma parte desse pêlo
é transportada pelo ar. Gruda na gaiola, teto, lâmpadas e em quase qualquer outra
superfície e deve ser removida periodicamente. As maneiras mais eficientes de
removê-las das gaiolas incluem lavagem ou uso de um maçarico ou chama de
propano. A lavagem, escovação, varredura e aspiração também são eficientes em
outras partes da coelheira.
A remoção de fezes é essencial. O excesso de fezes leva a níveis inaceitáveis
de amônia no ar, o que predispõe a doenças respiratórias. Ou se constrói um sistema
eficiente de fossa para armazenamento das fezes, ou elas têm de ser removidas
periodicamente (diariamente é melhor).
Outras técnicas de manejo – Os coelhos podem ser carregados pela apreensão
da pele solta dos ombros com uma das mãos e colocando-se a outra por baixo das
ancas para sustentar o peso. Se não forem seguros, apropriada e seguramente,
podem ocorrer fraturas ou luxações das vértebras lombares devido à luta do animal;
assim mesmo, as unhas das patas traseiras podem ferir gravemente os braços não
protegidos dos tratadores. Alguns criadores tatuam ou colocam brincos nas orelhas
de seus animais para identificá-los. Para propósitos de exibição, a orelha direita
reserva-se para marcas de registro aplicadas pelos registradores da “American
Rabbit Breeders Association”.
O sexo pode ser determinado no momento do nascimento, porém geralmente se
determina no momento do desmame. Ao se comprimir a genitália externa, pode-se
expor a membrana mucosa. No macho, a membrana mucosa protrai e forma um
círculo; na fêmea esta membrana se estende e forma uma ranhura. A castração não
produz benefícios para os coelhos produtores de carne; o crescimento de machos
e fêmeas é aproximadamente igual até depois da idade de venda. Às vezes, se
castram os coelhos angorá criados por > 6 meses. A técnica é similar à utilizada para
se castrar gatos, embora tenha que se notar que os testículos no escroto estão
dispostos em posição lateral a anterior ao pênis como nos marsupiais, e não como
na maioria dos outros mamíferos placentários.
Embora a maioria das técnicas apropriadas para cães e gatos possa ser aplicada
em coelhos para a realização do exame físico e contenção, a anestesia geral de
coelhos com barbitúricos é quase sempre acompanhada de mortalidade significativa.
É mais seguro usar agentes inalatórios, por exemplo, o halotano. O uso de agentes
pré-anestésicos, como o cloridrato de clorpromazina (25mg/kg), diazepam e propio-
promazina (5mg/kg) ou fentanil e droperidol (um produto combinado [0,22mL/kg]),
diminui a apreensão, pode reduzir a dose necessária de anestesia geral em 50% e,
quase sempre, prolonga a anestesia. A administração conjunta de cetamina (35 a
60mg/kg) e xilazina (5 a 10mg/kg) proporciona uma anestesia geral adequada.
Manejo, Criação e Doenças dos Coelhos 1283

DOENÇAS BACTERIANAS E MICÓTICAS


Pasteurelose
É uma enfermidade muito contagiosa, comum em coelhos domésticos, transmi-
tida tanto por contato direto como indireto. O agente etiológico é a Pasteurella
multocida. Aparentemente, os coelhos desenvolvem pouca imunidade após a
infecção; muitos são portadores assintomáticos e perpetuam a enfermidade na
coelheira. Um teste de imunofluorescência indireta, para uso em “swabs” nasais, é
eficiente na identificação de portadores, que podem corresponder a 30 a 90% dos
coelhos aparentemente saudáveis em colônias convencionais.
Uma técnica nasofaríngea pediátrica, que utiliza pequenos “swabs” umedecidos
em solução salina, tem-se mostrado superior ao grande “swab” nasal padrão. Dire-
ciona-se o “swab” medialmente através das narinas, passando-o ossos turbinados
e sobre a superfície dorsal do palato mole. Pode-se então retrair o “swab” e usá-lo
em um teste de imunofluorescência ou na semeadura de um meio de cultura. Um
teste de ELISA, recentemente desenvolvido para a detecção de anticorpos contra
P. multocida, também se mostrou benéfico na detecção de portadores. As infecções
por P. multocida podem-se manifestar como qualquer um dos seguintes sintomas:
rinite (coriza), pneumonia, otite média, conjuntivite, abscessos, infecções genitais
ou septicemia.
O diagnóstico se baseia nos sinais clínicos e no isolamento de P. multocida. O
tratamento é difícil e não erradica o microrganismo. Os antibióticos parecem ofe-
recer somente uma remissão temporária dos sinais, e o próximo período de estresse
(por exemplo, um parto) pode causar recidiva. Como não se desenvolveu uma
vacina eficaz, o melhor método de controle consiste em descarte estrito. Usa-se
correntemente a prática de se estabelecer colônias-tampão de coelhos de labora-
tório livres de Pasteurella.
A rinite (coriza ou catarro nasal) é uma inflamação induzida por Pasteurella, que
é aguda, subaguda ou crônica, e atinge as membranas mucosas das passagens de
ar e pulmões. O sinal inicial corresponde a um exsudato seroso e fino a partir do nariz
e dos olhos, que mais tarde se torna purulento. O pelame da região interior das patas
dianteiras, logo acima dos pés, apresenta-se emaranhado e emplastrado com um
exsudato seco, como resultado do arranhamento do focinho com as patas. Os
animais infectados geralmente espirram e tossem. Geralmente a coriza ocorre
quando a resistência do coelho está baixa. Os animais que aparentarem se
recuperar, permanecem portadores. Pode-se seguir pneumonia (ver adiante).
Os abscessos causados por Pasteurella podem ser encontrados em qualquer
parte do corpo ou da cabeça. Todas as idades são suscetíveis. Quando se colo-
cam machos em uma mesma gaiola, seus ferimentos de luta freqüentemente
abscedam. Na maioria dos casos, é aconselhável eliminar o coelho infectado em vez
de tratá-lo. A afecção pode terminar em septicemia e morte em 48h. A necropsia
pode revelar congestão bronquial, traqueíte, esplenomegalia e hemorragias sub-
cutâneas.
Uma incômoda infecção genital é quase sempre causada por Pasteurella, mas
vários outros microrganismos também podem estar envolvidos. Manifestada por
uma inflamação aguda ou subaguda do trato reprodutor, é mais freqüentemente
encontrada em adultos, e mais freqüentemente em coelhas que em coelhos. Se
ambos os cornos uterinos estiverem afetados, as coelhas se tornam quase sempre
estéreis; se apenas um corno estiver envolvido, pode-se desenvolver uma ninhada
normal no outro. O único sinal de piometria nas coelhas pode ser uma descarga
vaginal espessa e cinzento-amarelada. Os coelhos podem eliminar pus pela uretra,
mas geralmente se observa orquite. É muito provável que ocorra infecção crônica
da próstata e vesículas seminais, e já que pode haver transmissão venérea, é melhor
Manejo, Criação e Doenças dos Coelhos 1284

descartar o animal. A gaiola infectada e seu equipamento devem ser completamente


desinfetados. No caso de um reprodutor valioso, podem-se usar antibióticos para
combater a infecção, no entanto, o prognóstico é ruim.
A pneumonia, que não é incomum em coelhos domésticos, pode ocorrer em
adultos ou infectar os filhotes enquanto estiverem na caixa-ninho. Freqüente-
mente, é um fator complicante e secundário no complexo da enterite. A causa
é bacteriana, com P. multocida sendo responsável pela maior parte dos casos.
Outras bactérias envolvidas podem incluir Klebsiella pneumoniae, Bordetella
bronchiseptica e pneumococos. A enfermidade do trato respiratório superior
(coriza) é quase sempre um precursor da pneumonia. Ventilação, higiene e
material de cama inadequados são fatores predisponentes. O número de casos
de pneumonia é diretamente proporcional ao nível de amônia em uma coelheira.
Os coelhos sucumbem geralmente dentro de 1 semana após o aparecimento dos
sinais. Os coelhos afetados ficam inapetentes e apresentam febre (40oC),
dispnéia e prostração. A necropsia revela broncopneumonia, pleurite, piometria
ou petéquias no pericárdio. O diagnóstico depende dos sinais e lesões. O
tratamento consiste em oxitetraciclina, clortetraciclina ou penicilina. As combina-
ções de penicilina e estreptomicina também são úteis e podem ser eficazes para
infecções mistas. Entretanto, o tratamento quase sempre falha porque a pneumo-
nia já está avançada antes de ser detectada.
Os coelhos machos adultos e filhotes parecem particularmente suscetíveis à
conjuntivite (olho lacrimejante) causada por P. multocida, porém a incidência é
baixa. A transmissão ocorre por contato direto ou fomitos. Os coelhos afetados
coçam seus olhos com as patas dianteiras, e o exsudato pode variar quanto a
consistência e cor. Qualquer pomada oftálmica comum, que contenha sulfonamidas,
antibióticos ou somente antibióticos e um esteróide, é satisfatória para o tratamento,
mas a recidiva é comum. Nas infecções profundas, devem-se administrar injeções
de penicilina. A lavagem do duto lacrimal com uma solução antibiótica é quase
sempre benéfica em coelhos de exibição cronicamente afetados. A conjuntivite
também acompanha a varicela do coelho (ver pág. 1291) e a mixomatose (ver
pág. 1290).

Listeriose
É uma doença septicêmica esporádica, caracterizada por morte e/ou abortos
repentinos. A má criação e o estresse podem ser importantes na origem da
doença. Os sinais clínicos são variáveis e não específicos e incluem anorexia,
depressão e perda de peso. Em contraste com a doença nos gados bovino e ovino,
a listeriose raramente afeta o SNC dos coelhos, porém se espalha para o fígado,
baço e útero grávido por meio do sangue. À necropsia, o fígado apresenta con-
sistentemente focos múltiplos, branco-acinzentados e puntiformes. Já que o diagnós-
tico ante mortem é raramente feito, raras vezes se tenta o tratamento. O agente
causal é a Listeria monocytogenes, que pode infestar muitos animais, incluindo o
homem.

Estafilococose
A infecção por Staphylococcus aureus é comum nos animais, incluindo o homem.
Nos coelhos domésticos e selvagens, se manifesta como uma septicemia fatal em
coelhos jovens (geralmente na caixa-ninho) ou como inflamação supurativa de
coelhos mais velhos envolvendo aproximadamente qualquer órgão ou tecido, quase
sempre a pele ou as glândulas mamárias. O microrganismo é transmitido por con-
tato direto ou por aerossol, porém se trata de um comensal da pele de distribuição
universal. Os coelhos podem ser colonizados mas exibem pouca ou nenhuma
Manejo, Criação e Doenças dos Coelhos 1285

doença clínica, a menos que a resistência fique diminuída. Desenvolvem-se


abscessos nas infecções crônicas. Na septicemia aguda, geralmente ocorre febre,
depressão e anorexia, terminando em morte. O diagnóstico depende do isolamento
da bactéria. Como a S. aureus é resistente a muitos antibióticos, o tratamento deve
ser precedido de antibiograma, sempre que possível. A desinfecção completa da
caixa-ninho, tanto antes como depois do uso, ajuda a prevenir a forma septicêmica
nos coelhos neonatos.

Mastite
(Mamas azuladas)
É uma doença comum nas coelheiras comerciais e ocasionalmente vista em
criações menores. Afeta coelhas lactentes e pode-se disseminar por toda a
coelheira se não existir boa higiene. A mastite pode-se transformar em septicemia
e matar rapidamente a coelha. Geralmente é causada por estafilococos, mas
também se têm isolado estreptococos e outras bactérias. As glândulas mamárias se
tornam quentes, avermelhadas e inchadas; mais tarde, podem-se apresentar
cianóticas, de onde se deriva seu nome comum. A coelha não vai comer, mas pode
precisar de água. Quase sempre se nota febre ≥ 40,5oC. A afecção pode ser tratada
com penicilina por injeção parenteral. Se o tratamento for instituído no início da
infecção (no primeiro dia em que a fêmea deixa de comer), a coelha pode ser salva
com danos limitados a 1 a 2 glândulas mamárias. No caso de perder > 2 glândulas,
pode não ser econômico manter a coelha. Na medida em que a penicilina geralmen-
te causa diarréia em coelhos em virtude do conseqüente desequilíbrio microbiano
no trato gastrointestinal, as coelhas devem ser tratadas apenas após a ração
peletizada ter sido substituída por feno ou alguma outra dieta rica em fibra. As crias
não devem ser levadas a outra coelha, já que transmitem a infecção à mãe adotiva.
Pode-se tentar a criação manual de filhotes infectados, mas é difícil. A incidência
pode ser reduzida se as caixas-ninho forem higienizadas tanto antes como depois
do uso.

Treponematose
(Proctopatia, Sífilis, Espiroquetose)
É uma doença venérea específica dos coelhos domésticos, caracterizada pelo
aparecimento de áreas desnudas ou cobertas de crostas ao redor dos órgãos
genitais externos, e causada pelo espiroqueta Treponema cuniculi. Ocorre em
ambos os sexos e é transmitida pelo coito e da mãe para a ninhada. Não é
transmissível para outros animais domésticos, nem para o homem. Formam-se
vesículas ou úlceras pequenas que, finalmente, se cobrem com uma crosta grossa.
Em geral, estas lesões se limitam à região genital, mas também podem envolver os
lábios e pálpebras. Os animais infectados não devem ser acasalados. O diagnóstico
depende da detecção das lesões nos órgãos genitais e da observação dos
espiroquetas em microscopia de campo escuro. A queimadura de gaiola (ver
adiante) é um problema de diagnóstico.
É necessária a administração de 3 injeções s.c. de penicilina G benzatina-
penicilina procaína (42.000UI/kg de peso corporal) em intervalos semanais para
eliminar a treponematose de um plantel. Todos os coelhos têm de ser tratados,
mesmo que não haja lesões. Geralmente, as lesões se curam em 10 a 14 dias e os
animais recuperados podem-se acasalar, sem o perigo de transmitir a infecção. Um
dos efeitos colaterais potenciais do tratamento com penicilina é diarréia e a
possibilidade de um surto de enterite, devido à proliferação de bactérias Gram-
negativas no intestino. Os coelhos tratados com penicilina devem ser transferidos
para cama de feno e tratados com antidiarréicos imediatamente, se for necessário.
Manejo, Criação e Doenças dos Coelhos 1286

Enteropatia
A doença entérica é a principal causa de morte em coelhos jovens. Anteriormen-
te, a maioria das doenças diarréicas incluía-se sob a classificação de complexo
entérico, ou era simplesmente chamada de enterite mucóide. Mais recentemente,
começaram a ser delineadas doenças específicas.
A enterotoxemia é uma doença diarréica explosiva, primariamente de coelhos
de 4 a 8 semanas de vida. Ocasionalmente, afeta os animais adultos e os jovens.
Os sinais incluem letargia, pelame áspero, área perineal coberta de materiais fe-
cais marrom-esverdeados e morte em 48h. Quase sempre, o coelho parece normal
à noite e está morto na manhã seguinte. A necropsia revela lesões típicas de
enterotoxemia, ou seja, distensão intestinal por fluidos e petéquias na superfície
serosa. A Clostridium spiroforme é uma causa reconhecida, que produz uma toxina
iota. Pouco se sabe sobre a transmissão do microrganismo; pressume-se que seja
um comensal normalmente presente. O tipo de dieta parece ser um fator no de-
senvolvimento da doença. Uma incidência menor de enterotoxemia é observada
quando se usa uma dieta mais rica em fibras. Devido à rapidez com que ocorre a
morte, raramente se tenta um tratamento. A lincomicina e antibióticos relacionados
induzem a enterotoxemia relacionada com o Clostridium (por exemplo, C. difficile),
em virtude de seu efeito seletivo sobre as bactérias Gram-positivas normais, e são
contra-indicados nos coelhos. Essas diarréias mimetizam acentuadamente aque-
las que ocorrem naturalmente e são descritas anteriormente como enterotoxemia.
A alimentação com feno ou palha é quase sempre útil. A redução da quantidade de
alimento ajuda na prevenção. A mudança para um novo tipo de alimento também
pode ajudar. O diagnóstico depende da história, sinais e lesões.
A enteropatia mucóide é uma doença diarréica de coelhos de qualquer idade.
Embora a etiologia ainda seja enormemente desconhecida, ela resulta basica-
mente de constipação. A impactação do ceco ou porção terminal do intestino del-
gado, ou de ambos, é um achado comum de necropsia. Isso, conjuntamente com
a observação de muco gelatinoso no cólon, é quase patognomônico. Os sinais
clínicos consistem de fezes gelatinosas ou cobertas de muco, anorexia, letargia,
temperatura subnormal, desidratação, pelame áspero e, quase sempre, abdome
inchado devido ao excesso de água no estômago. A área perineal está quase sem-
pre coberta de muco e fezes. A impactação pode ser palpada através da parede
abdominal nos coelhos jovens. A doença é crônica em natureza, os coelhos podem
viver por ≥ 1 semana. O diagnóstico baseia-se nos sinais clínicos e nos achados de
necropsia. O tratamento não tem muito êxito. Às vezes, é benéfica a reidratação com
eletrólitos. A mudança da fórmula dietética geralmente previne a afecção.
A doença de Tyzzer (ver págs. 182 e 1235), causada pela Bacillus piliformis, tem
sido reconhecida como causa de diarréia severa e morte em coelhos de 6 a 12
semanas. Caracteriza-se por diarréia profusa, anorexia, desidratação, letargia e
morte dentro de 1 a 3 dias. As lesões consistem em enterite necrótica junto a
necrose focal no fígado e coração. A infecção ocorre por ingestão e está associada
à pouca higiene e ao estresse. O diagnóstico é feito histologicamente; corantes
especiais (por exemplo, Giemsa ou prata) mostram a bactéria intracelular caracte-
rística. A cultura não é prática porque a bactéria não cresce em meios artificiais.
Nenhum caso foi descrito no homem, mas a doença afeta outras espécies de
animais.

Salmonelose
Embora não seja comum em coelhos, o número de relatos está aumentando.
Pode ser caracterizada por septicemia e morte rápida, porém é mais freqüentemen-
te assintomática. O agente causal mais comum é a Salmonella typhimurium ou S.
Manejo, Criação e Doenças dos Coelhos 1287

enteritidis. Os coelhos jovens e as coelhas prenhes são os mais suscetíveis, o que


sugere que o estresse desempenhe um papel importante na doença. A transmissão
se dá por contato direto e ingestão de alimentos ou água contaminada com fezes.
Os sinais clínicos não específicos consistem em anorexia, depressão, febre e, às
vezes, diarréia. Quase sempre só se encontra um coelho morto. Nos casos supe-
ragudos, estão presentes lesões de septicemia (observa-se congestão vascular na
maioria dos órgãos, com petéquias na superfície dos órgãos abdominais e toráci-
cos). Nos casos agudos, observam-se áreas puntiformes de necrose no fígado e
baço aumentado. O diagnóstico depende do isolamento e identificação do agente
específico. Raramente se tenta o tratamento, pois os coelhos tratados podem-se
tornar portadores. Os animais suspeitos devem, portanto, ser eliminados. A preven-
ção depende primariamente da higiene. Como a salmonelose é observada em
muitas espécies animais, incluindo o homem, deve-se praticar boa higiene em um
surto em coelhos.

Tinha
(Dermatofitose)
É uma doença incomum de coelhos domésticos, geralmente associada a más
condições de criação. As lesões geralmente aparecem primeiro na cabeça e po-
dem-se espalhar para qualquer área da pele. As áreas afetadas são circulares,
elevadas, avermelhadas e cobertas de material esbranquiçado, farináceo e escamoso.
A causa mais comum é a Trichophyton mentagrophytes, var. granulare, que também
afeta o homem, cobaias, camundongos e ratos. Como os coelhos com infecções
ativas são infecciosos para o homem e outros animais, eles devem ser isolados e
tratados ou sacrificados. Pode-se obter um grau de controle através da aplicação
de enxofre em pó em todas as caixas-ninho antes da parição, ou pelo uso de agentes
tópicos, como os que contêm ésteres salicílico e benzóico de propilenoglicol,
soluções aquosas de caprilato de sódio, e tinturas que contenham ácidos tâni-
co, benzóico e salicílico. A griseofulvina, na dose individual de 25mg/kg de peso
corporal, diariamente durante 2 semanas, ou misturada com o alimento na propor-
ção de 825mg/kg de alimento, é eficiente, mas não é aprovada para o uso em
coelhos; não deve ser usada em animais destinados ao consumo humano.

Doenças diversas
A tuberculose e a tularemia são infecções incomuns de coelhos, sendo atualmen-
te de grande interesse histórico. As infecções micóticas sistêmicas são raras,
embora já se tenham-se descrito casos isolados.

DOENÇAS PARASÍTICAS
Coccidiose
É uma doença por protozoário comum e mundial dos coelhos. Os animais que se
recuperam freqüentemente se tornam portadores. Existem 2 formas anatômicas: a
hepática, causada pela Eimeria stiedae, e a intestinal, cuja causa pode ser E.
magna, E. irresidua, E. media, E. perforans ou outras Eimeria spp. Tanto a forma
hepática quanto a intestinal são transmitidas pela ingestão de oocistos esporulados,
geralmente em alimentos ou águas contaminados.
Coccidiose hepática – A gravidade da doença depende do número de oocistos
ingeridos. Pode haver infecção sem sinais aparentes ou, em raras ocasiões, a morte
pode-se seguir a um curto curso de doença. Os coelhos jovens são mais suscetíveis.
Os animais afetados podem apresentar anorexia e um pelame áspero. Os coelhos
em crescimento podem falhar ao obter ganhos de peso normais, mas a afecção é
Manejo, Criação e Doenças dos Coelhos 1288

mais freqüentemente assintomática. Os animais geralmente sucumbem dentro de


1 mês após uma exposição experimental severa. À necropsia, as lesões são
geralmente reconhecidas com facilidade. Encontram-se pequenos nódulos branco-
amarelados por todo o parênquima hepático. Eles podem ser claramente demarca-
dos nos primeiros estágios, ao passo que nos estágios posteriores coalescem. As
primeiras lesões apresentam um conteúdo leitoso; as lesões mais velhas podem ter
uma consistência mais semelhante à do queijo. Microscopicamente, os nódulos
compõem-se de dutos biliares hipertrofiados. Observa-se grande número de oocistos.
Esta forma de coccidiose é diagnosticada com base em alterações macro e
microscópicas, juntamente com a demonstração dos oocistos nos dutos biliares. Um
esfregaço de impressão de uma lesão do fígado, se examinado sob microscopia
óptica, quase sempre revela oocistos. Os oocistos também podem ser demonstra-
dos facilmente por flotação fecal.
A sulfaquinoxalina, administrada continuamente na água de bebida (a 0,04%
durante 30 dias) evita os sinais clínicos da coccidiose hepática nos coelhos
extremamente expostos a E. stiedae. Também pode ser administrada no alimento
a 0,025% durante 20 dias ou durante 2 dias a cada 8, até a comercialização. A
sulfaquinoxalina em nível alimentar tornou-se difícil de se obter. O período de
“resguardo” é de 10 dias, para os coelhos usados para alimento. Os coelhos que
obtiverem sucesso em seus tratamentos ficarão imunes a infecções subseqüentes.
O tratamento anterior não terá vantagem a menos que se institua um programa de
higiene, simultaneamente. Os recipientes de alimento e potes de água não devem
ser contaminados com fezes. As gaiolas devem ser mantidas secas e as fezes
acumuladas devem ser retiradas freqüentemente. O fundo das gaiolas aramadas
deve ser escovado diariamente com uma escova de arame para ajudar a quebrar
o ciclo de vida. Alguns produtos químicos, como solução de amônia a 10%, são letais
para os oocistos e podem ser usados para desinfecção de gaiolas e equipamentos
auxiliares expostos à matéria fecal.
Coccidiose intestinal – Esta forma de doença pode ocorrer tanto em coelhos
que recebem ótimos cuidados como nos criados sob más condições de higiene.
Tipicamente, as infecções são suaves e não se observa nenhum sinal clínico. Nas
infecções iniciais, há poucas lesões; mais tarde, os intestinos podem ficar espes-
sados e pálidos. Todos os coccídios responsáveis se desenvolvem no intestino.
Embora um bom programa de higiene possa eliminar a coccidiose hepática, o
mesmo programa parece não eliminar a forma intestinal. O diagnóstico da coccidiose
intestinal é geralmente feito por flotação fecal e identificação microscópica dos
oocistos (espécies). O tratamento é o mesmo da coccidiose hepática.

Infecções por larvas de vermes chatos


Apesar de as infecções por vermes chatos adultos serem raras nos coelhos
domésticos, o descobrimento de cistos de suas larvas na serosa peritoneal não é
incomum. Os coelhos são hospedeiros intermediários de 2 espécies de vermes
chatos caninos, Taenia pisiformis e T. serialis. Apesar de a T. serialis ser rara nos
coelhos domésticos, é um pouco mais comum nos coelhos silvestres. O estágio
larval da T. pisiformis é um cisticerco. A maioria dos cisticercos é encontrada fixada
no mesentério. Antes de formar estes cistos preenchidos com fluidos, as larvas
jovens migram pelo fígado deixando tratos subcapsulares tortuosos e esbranquiça-
dos. Geralmente, não há sinais clínicos associados a esta afecção. O diagnóstico
é estabelecido durante a necropsia. Não se tenta tratamento, porém o controle é
alcançado através da restrição do acesso dos cães à área onde são armazenados
os alimentos e materiais de ninhos. Não se devem alimentar cães com coelhos
mortos infectados, já que isto perpetua o ciclo.
Manejo, Criação e Doenças dos Coelhos 1289

Infestação por ácaros


O ácaro dos ouvidos, Psoroptes cuniculi, é um parasita comum dos coelhos em
todo o mundo. Os sinais comuns incluem meneios de cabeça e batimento das
orelhas, assim como a coçadura das orelhas. Podem ser observados torcicolo e
espasmos dos músculos oculares. Os coelhos afetados perdem carne, falham ao
ganhar peso e sucumbem a infecções secundárias que freqüentemente danificam
o ouvido interno e podem alcançar o SNC. Os ácaros irritam o revestimento do
pavilhão auricular e causam acúmulo de cera e crostas espessas. Sob boa conten-
ção ou mesmo anestesia geral, deve-se remover o exsudato marrom e farináceo
com algodão embebido em água oxigenada diluída e tratá-lo com qualquer um dos
acaricidas aprovados para uso em cães e gatos, ou mesmo apenas com óleo mineral
suave. Os produtos que contêm um agente ceruminolítico são particularmente úteis
na remoção do material grosso crostoso. O medicamento deve ser aplicado ao redor
do ouvido externo e também para baixo, nos lados da cabeça e pescoço. A aplicação
tem de ser repetida em 6 a 10 dias. Podem ser necessários tratamentos adicionais.
As gaiolas utilizadas pelos coelhos afetados têm de ser cuidadosamente limpas e
desinfetadas. A incidência é muito mais baixa em gaiolas de arame que em gaiolas
sólidas. O ácaro é transmitido facilmente por contato direto.
Os coelhos são infectados pouco freqüentemente por Sarcoptes scabiei ou
Notoedres cati. Eles se coçam quase que continuamente. Ocorre perda de pêlo
no queixo, nariz, cabeça, base das orelhas e ao redor dos olhos. A afecção é
extremamente contagiosa, e pode ser transmitida ao homem. É difícil eliminar os
parasitas nos coelhos domésticos. Os proprietários devem ser aconselhados a
descartar os animais, a menos que sejam reprodutores valiosos. Podem ser
mergulhados em uma preparação de cal-enxofre, ou pode-se friccionar rotenona
nas lesões.
As infecções por ácaros do pelame são comuns; duas espécies são encontradas
em todo o mundo: Cheyletiella parasitovorax e Listrophorus gibbus. Estes parasitas
vivem na superfície da pele (ao contrário dos ácaros sarcópticos, que escavam a
pele). Não causam o prurido intenso observado na sarna sarcóptica. As infestações
por ácaros do pelame são geralmente assintomáticas, a não ser que o animal fique
debilitado. Ocasionalmente, são observadas pequenas crostas e feridas no pesco-
ço de coelhos adultos. O diagnóstico é realizado através de raspado da pele e obser-
vação em microscópio óptico. Estes ácaros não parecem afetar o homem. A trans-
missão ocorre por contato direto e raras vezes se faz o tratamento, a não ser em
animais domésticos ou de exibição. O uso de uma solução de malation a 0,5%,
usada duas vezes como banho de imersão em intervalos de 1 semana, é eficaz para
o controle. A ivermectina representa promessa no controle de infestações de ácaros
tanto nos ouvidos como no pelame; porém não é aprovada para uso em coelhos.

Nosematose
A Encephalitozoon (Nosema) cuniculi causa uma protozoonose amplamente
disseminada em coelhos e, às vezes, em camundongos, cobaias, ratos e cães.
Geralmente não se observam sinais clínicos. É levemente contagiosa em uma
coelheira e acredita-se que se espalhe na caixa-ninho, de coelhas portadoras para
os filhotes lactentes. À necropsia, as lesões mais significativas são cicatrizes nos
rins. As lesões microscópicas consistem em granulomas focais e pseudocistos no
cérebro e nos rins. Às vezes, observa-se severa nefrite intersticial focal. O diagnós-
tico é feito por identificação das lesões (pseudocistos) e observação dos microrga-
nismos quando corados com corantes especiais. Vários testes sorológicos e
dérmicos são úteis na seleção de coelhos, à procura de anticorpos para o microrga-
nismo. Não se tem tentado o tratamento. A prevenção está ligada à boa higiene, e
Manejo, Criação e Doenças dos Coelhos 1290

talvez à triagem sorológica do lote reprodutivo, com a eliminação dos reagentes


positivos. Foi relatado um caso de nosematose no homem.

Oxiúros
O oxiúro dos coelhos, Passalurus ambiguus, geralmente não apresenta signi-
ficado clínico, mas quase sempre transtorna os proprietários. O parasita é comum
em muitas coelheiras e se distribui mundialmente. Não é transmissível ao homem.
A transmissão se faz por ingestão de alimento ou água contaminados. O verme
adulto habita o ceco ou cólon anterior. O diagnóstico é feito pela observação dos
vermes adultos durante a necropsia, ou pelo achado de ovos no exame das fezes.
Os tratamentos isolados não são muito eficazes, já que o ciclo de vida é direto e a
reinfecção é comum. O tratamento de coelhos de estimação com citrato de pipe-
razina (3g/L) em água, por períodos alternados de 2 semanas, é eficaz. Experi-
mentalmente, a ivermectina representa promessa no tratamento de oxiúros.

DOENÇAS VIRAIS
Os vírus não são causas importantes de doença clínica em coelhos nos EUA. As
viroses aqui listadas incluem os fibromas infecciosos, papilomatose, varicela dos
coelhos, mixomatose e herpesvirose (vírus III). Recentemente, houve especulação
acerca do possível papel dos vírus nos surtos de enterite nas coelheiras. Sugeriu-se
a rotavirose, mas os relatos são preliminares e inconclusivos.
Os fibromas infecciosos dos coelhos-cauda-de-algodão (Sylvilagus) são com-
postos de tecido conjuntivo e consistem em sua maior parte de fibroblastos e seus
derivados. Estão localizados mais abaixo do que no interior da pele, no que diferem
dos papilomas. Ocorrem naturalmente 2 síndromes principais de tumores fibróticos
infecciosos: as lesões areolares frouxas da mixomatose infecciosa e o fibroma de
Shope. Ambas são virais e restritas aos coelhos.

Mixomatose infecciosa
A mixomatose é uma doença fatal de todas as raças de coelhos domésticos e da
Oryctolagus cuniculus (o coelho selvagem europeu). Os coelhos-cauda-de-algodão
(Sylvilagus) e as lebres-americanas são muito resistentes. Todos os outros mamí-
feros são refratários. O vírus da mixomatose, um membro do grupo dos poxvírus, é
transmitido por mosquitos, mutucas e por contato direto. Várias cepas são
patogênicas.
Nos EUA, a mixomatose está enormemente restrita à zona costeira da Califór-
nia e Oregon, onde raramente ocorrem epidemias. Estas áreas representam a
distribuição geográfica do coelho do mato da Califórnia (Sylvilagus bachmani), que
é o reservatório da infecção. As perdas podem alcançar 25 a 90% nas coelheiras.
Todas as idades são suscetíveis, embora os jovens com até 1 mês de idade pareçam
ser mais resistentes que os adultos.
O primeiro sinal característico é a conjuntivite, que se acentua rapidamente e é
acompanhada por uma descarga ocular leitosa. O animal apresenta-se apático e
anorético e a temperatura alcança freqüentemente 42 oC. Nos surtos agudos, alguns
animais podem morrer dentro de 48h após os sinais aparecerem. Os que sobrevi-
vem se tornam progressivamente deprimidos e desenvolvem pelame áspero; as
pálpebras, nariz, lábios e orelhas se tornam edematosos, o que resulta em uma
aparência inchada da cabeça. Nas fêmeas, a vulva se torna inflamada e edematosa;
nos machos, o escroto se avoluma. Um sinal característico neste estágio é o
abaixamento das orelhas edematosas. Invariavelmente se observa descarga nasal
purulenta, a respiração se torna forçada e o animal entra em coma pouco antes da
Manejo, Criação e Doenças dos Coelhos 1291

morte, que geralmente ocorre dentro de 1 a 2 semanas após aparecerem os sinais


clínicos. Em certas ocasiões, o animal sobrevive várias semanas; nestes casos,
aparecem nódulos fibróticos no nariz, orelhas e patas dianteiras. Os coelhos
inoculados experimentalmente com cepas de laboratório do vírus invariavelmente
desenvolvem nódulos pequenos no local da injeção depois de vários dias, seguidos
do desenvolvimento de nódulos similares em outras partes do corpo, particularmen-
te nas orelhas.
Durante a necropsia, são encontradas poucas lesões características. O baço
está ocasionalmente aumentado e quase sempre desprovido de linfócitos quando
examinado histologicamente. A incidência sazonal da enfermidade, o aspecto
clínico dos coelhos infectados (especialmente a genitália inchada) e a mortalidade
elevada apresentam todos valor diagnóstico. Também servem de ajuda os grandes
corpúsculos de inclusão citoplasmáticos eosinofílicos, encontrados nas células
epiteliais conjuntivais.
Uma vacina atenuada, preparada a partir do vírus da mixomatose, tem protegido
tanto animais infectados em laboratório como no campo. Esta vacina não está
disponível nos EUA e, como não existe tratamento eficaz, indicam-se eutanásia e
enterro ou incineração dos coelhos afetados.

Fibroma de Shope
O fibroma de Shope ocorre sob condições naturais apenas no coelho-cauda-de-
algodão, embora o coelho doméstico também possa ser infectado, através da
inoculação de material que contenha o vírus. A doença pode ocorrer nos coelhos
domésticos em regiões onde seja endêmica nos coelhos silvestres e onde as
práticas de criação permitam o contato com vetores artrópodes.
A causa deste tumor, que ocorre nas pernas, nos pés e orelhas, é um vírus de
fibroma que pertence ao grupo dos poxvírus. A primeira lesão observada em um
coelho infectado é um ligeiro espessamento do tecido subcutâneo, seguido pelo
desenvolvimento de uma tumefação macia e claramente demarcada. Estes tumores
podem persistir por vários meses antes de regredir, deixando o coelho essencial-
mente normal. Não se têm desenvolvido medidas de controle para esta enfermida-
de, já que ela é de pouca importância para os coelhos domésticos.

Papilomatose
Dois tipos de papilomas infecciosos são reconhecidos nos coelhos domésticos
nos EUA. O mais importante clinicamente, e de maior incidência, é causado pelo
vírus do papiloma oral (papovavírus). As lesões consistem de pequenos nódulos ou
verrugas pedunculados, branco-acinzentados, na superfície inferior da língua ou no
assoalho da boca (vírus do papiloma oral). O segundo tipo, produzido pelo vírus do
papiloma de Shope, e caracterizado por verrugas córneas no pescoço, ombros,
orelhas ou abdome, é primariamente uma enfermidade natural dos coelhos-cauda-
de-algodão. O vírus do papiloma de Shope é transmitido por vetores artrópodes. O
vírus do papiloma oral é diferente do vírus do papiloma de Shope (o qual também
distingue-se do vírus do fibroma de Shope). Os tumores dérmicos, produzidos pelo
vírus do papiloma de Shope, nunca ocorrem na boca. Nenhum tipo de papilomatose
é tratado.

Varicela dos coelhos


É uma enfermidade aguda e generalizada dos coelhos de laboratório
( Oryctolagus) (aparentemente, não tem sido reconhecida nos coelhos selva-
gens [ Sylvilagus]), caracterizada por pirexia, descargas nasal e conjuntival e
erupção cutânea. A mortalidade varia, mas é sempre alta. Desde 1930, têm sido
Manejo, Criação e Doenças dos Coelhos 1292

poucos os surtos comunicados nos EUA. O vírus causador está intimamente


relacionado ao vírus da vacínia, e alguns surtos podem ter sido causados por
uma cepa virulenta desta. O vírus pode ser isolado ou diagnosticado
sorologicamente por métodos apropriados para vacínia (ver V ARÍOLAS, pág.
996). A contaminação de uma coelheira é rápida, mas os coelhos inoculados
com vacina de varíola (com vírus de vacínia) ficam imunes. O vírus da varicela
dos coelhos não infecta o homem.
As lesões mais características observadas durante a necropsia são erupção
cutânea, edema subcutâneo e da boca e outros orifícios corporais. Quase sempre
se observam pequenas áreas acinzentadas de necrose por todo o parênquima
hepático, esplênico, pulmonar, testicular, ovariano e uterino. Tem sido descrito um
tipo de varicela dos coelhos “não pustular” que, devido ao edema, pode ser
confundido com a mixomatose.
Doença hemorrágica viral
(DHV, Hepatite necrótica)
É uma infecção aguda, altamente contagiosa, que afeta primariamente os
lagomorfos domésticos. Primeiramente descrita em 1984 na China, Coréia e
Alemanha, tem sido desde então descrita em outros países europeus e no México.
Etiologia e transmissão – Acredita-se que o agente causador seja um par-
vovírus, antigenicamente relacionado ao parvovírus suíno e aos parvovírus do
camundongo e do rato, embora alguns autores sugiram que possa pertencer às
famílias Caliciviridae ou Picornaviridae.
A transmissão por aerossóis parece ser importante, embora todas as secreções
e excreções também possam ser fontes de infecção. A transmissão mecânica,
através de fomitos, roedores e outras pestes, subprodutos de coelho e do homem,
também pode ser importante. Os insetos não parecem ser vetores importantes.
A doença ocorre mais freqüentemente nos coelhos domésticos. As fêmeas em
lactação e gestação são as mais suscetíveis, seguidas dos outros adultos; os
coelhos jovens (< 2 meses de idade) são os mais resistentes. A existência de
portadores entre os animais domésticos sobreviventes e os silvestres ainda não foi
determinada, mas suspeita-se que ocorra.
Achados clínicos – O período de incubação é curto (24 a 72h). Tipicamente, os
coelhos são encontrados mortos, sem nenhuma indicação prévia de enfermidade na
colônia. Nos casos mais demorados, podem-se observar dispnéia, congestão das
pálpebras, ortopnéia, respiração abdominal, taquicardia e agitação aumentada.
Antes da morte, ocorre atividade violenta na gaiola, com voltas e saltos rápidos, que
lembram convulsões ou mania. Algumas vezes, os únicos sinais relatados são gritos
agudos, seguidos rapidamente de colapso e morte. Em alguns casos, pode-se
observar uma descarga nasal tingida de sangue. Também se têm descrito pisos
tingidos de sangue sob gaiolas em que tenham morrido animais. A morbidade é
estimada em 30 a 80%, com a mortalidade atingindo até 80 a 90%.
Lesões – Devido ao curso rápido, os animais encontrados mortos estão
geralmente em boas condições. As lesões macroscópicas são sutis e geralmente
limitadas a congestão do trato respiratório e fígado. O trato respiratório parece ser
o mais afetado, com congestão intensa da traquéia e pulmões. A traquéia pode estar
preenchida com espuma, algumas vezes tingida de sangue. São comuns as
hemorragias no timo. Podem-se observar congestão suave a acentuada e aumento
de volume do fígado, baço e rins. O fígado pode apresentar áreas superficiais
castanho-amareladas. Também se tem descrito a congestão das meninges. Obser-
va-se distensão do intestino distal com gás, mesmo quando a necropsia foi realizada
imediatamente após a morte. As áreas proximais ao intestino geralmente estão
completamente preenchidas por ingesta.
Manejo, Criação e Doenças dos Coelhos 1293

Histologicamente, ocorre necrose de coagulação focal hepática, submaciça a


maciça. Nos pulmões, podem-se observar hemorragias em grupos de alvéolos. As
lesões no baço variam de congestão simples a necrose e hemorragia. Também se
observam áreas focais múltiplas de necrose no miocárdio. Nos casos de campo,
registra-se necrose grave das criptas do intestino delgado; o mesmo achado foi mais
discreto em coelhos de laboratório inoculados.
Diagnóstico – A característica mais destacada é o curso superagudo da doença.
Isso, junto a distúrbio respiratório, alta mortalidade e rápida disseminação, sugere
um diagnóstico presuntivo. As suspensões teciduais de fígado, baço e pulmões
hemaglutinam hemácias humanas, Tipo O. O soro de coelhos convalescentes inibe
a aglutinação. Testes de imunofluorescência e técnicas de imunocoloração também
têm sido utilizados para identificar o antígeno viral; fígado, baço e pulmão são os
espécimes de escolha, já que contêm altas concentrações do vírus. Devem ser
enviados ao laboratório, utilizando-se gelo ou gelo seco, se o período de envio for
estimado em > 48h.
A DHV deve ser diferenciada das formas agudas das outras doenças de coelhos,
como a pasteurelose, mixomatose atípica, enterotoxemia e o envenenamento.
Prevenção – Devem-se adotar medidas de quarentena absoluta nos coelhos
que chegarem de países onde a DHV esteja presente.
A documentada resistência aumentada dos coelhos jovens pode ser devida a
imunidade passiva adquirida a partir da ingestão de anticorpos colostrais contra o
parvovírus leporino apatogênico. Tem-se desenvolvido, em vários países, uma
vacina que confere proteção por 6 meses, a qual está sendo comercializada na
Espanha. A vacina deve ser usada apenas onde a doença já estiver bem-dissemi-
nada e os esforços de erradicação sejam difíceis de empregar. As vacinas têm sido
usadas para complementar os esforços de controle, mas podem ser uma desvan-
tagem, se mascararem a infecção ou ajudarem a induzir o estado de portador entre
os vacinados.

DOENÇAS NÃO INFECCIOSAS


Fratura das ancas – A fratura ou deslocamento das vértebras lombares com
compressão ou rompimento da medula dorsal é comum tanto em coelhos de
estimação quanto em comerciais. Os sinais comuns incluem paresia ou paralisia
posterior e incontinências urinária e fecal, devidas à perda do controle do esfíncter.
Quase sempre os sinais iniciais de paralisia resolvem-se em 3 a 5 dias, à medida que
o inchaço ao redor da medula diminui. A paralisia após 3 a 5 dias, ou incontinência,
corresponde a um prognóstico grave e justifica a eutanásia.
Canibalismo – As coelhas jovens podem matar e consumir suas crias por
qualquer razão, incluindo nervosismo, abandono (falha ao amamentar) e frio
intenso. O canibalismo dos filhotes mortos acontece como instinto natural de
limpeza do ninho. Os cães ou predadores que entrarem numa coelheira quase
sempre fazem com que as coelhas nervosas matem e comam os filhotes. Se todas
as práticas de manejo forem apropriadas e a coelha comer 2 ninhadas consecutivas,
ela deve ser descartada.
Maloclusão dentária – Nos coelhos, os incisivos, pré-molares e molares
crescem durante toda a vida. O comprimento normal é mantido através da ação de
desgaste dos dentes opostos. O prognatismo mandibular (maloclusão, braquigna-
tismo) é, provavelmente, a doença congênita mais comum nos coelhos e leva ao
supercrescimento dos incisivos e, em conseqüência, à dificuldade para comer e
beber. Pode-se realizar uma correção temporária ao se cortar, de vez em quando,
os dentes supercrescidos com alicates para osso ou arame. Às vezes, os dentes
molares supercrescem e causam lesões graves na boca e na língua. Já que é
Manejo, Criação e Doenças dos Coelhos 1294

geralmente considerada como herdada, os coelhos com essa afecção não devem
acasalar. Porém, os coelhos jovens podem danificar seus dentes incisivos ao puxar
o arame da gaiola, o que resulta em desalinhamento e possivelmente maloclusão,
graças ao crescimento dos dentes. Esta afecção não pode ser diferenciada da
maloclusão genética, e esses coelhos também devem ser descartados.
Mastigação dos pêlos e “bolas” de pêlos – O coelho limpa-se constantemente
e, quase sempre, o conteúdo do estômago inclui pêlos, que normalmente passam
pelo trato gastrointestinal e são excretados com as fezes. O pêlo ou lã (angorá) se
torna um problema, apenas se quantidades excessivas forem consumidas ou
quando se acumulam no estômago e bloqueam o piloro. Se isso acontecer, o coelho
se torna anorético, perde peso e morre dentro de 3 a 4 semanas. A escovação diária
para remoção dos pêlos soltos evita eficientemente esta afecção. O óleo mineral e
os laxantes não são eficazes na remoção da massa de pêlos. No caso de animais
valiosos, pode-se tentar a remoção cirúrgica.
O suco de abacaxi contém a enzima digestiva bromelaína, e tem sido utilizado
para tratar casos precoces de tricobezoares ou “bolas” de pêlo; um adulto recebe
10mL de suco fresco ou congelado, por meio de uma sonda gástrica ou de agulha
de intubação, diariamente por 3 dias. Tanto o fluido como a enzima ajudam a
dissolver a matriz da “bola” de pêlo. Deve-se oferecer feno ou palha durante o
tratamento. Essa forragem ajuda a transportar as fibras de pêlo pelo trato gastroin-
testinal e a eliminá-las com as fezes.
A mastigação de pêlos causa outro problema em coelhos jovens. Devido à perda
dos pêlos, a pele estraga-se e perde o valor. Este tipo de mastigação de pêlos é
geralmente o resultado de uma dieta deficiente em fibra, que pode ser corrigida
aumentando-se a última ou oferecendo-se feno juntamente com o alimento granu-
lado. Também pode ser útil a adição de óxido de magnésio na dieta, na proporção
de 0,25%. Em alguns casos, a mastigação de pêlos resulta de tédio. A colocação de
distrações na gaiola, por exemplo, latas de refrigerante ou anéis de metal, quase
sempre detém esse vício.
Exaustão pelo calor – Os coelhos são sensíveis ao calor. O tempo quente e úmido,
juntamente com gaiolas malventiladas ou transporte em veículos malventilados pode
levar à morte de muitos coelhos, particularmente coelhas prenhes. Os coelhos
afetados deitam-se de lado e respiram rapidamente. Devem ser imersos em água
fresca. As gaiolas devem ser construídas de maneira que possam ser borrifadas com
água em tempo quente e úmido. Deve-se proporcionar livre acesso à água fresca.
Quando for possível controlar o ambiente, os critérios ideais são: temperatura de 15,5
a 21oC e umidade relativa de 40 a 60%, com 10 a 20 trocas de ar por hora. Preferem-
se gaiolas de arame a sólidas.
Queimadura de gaiola (queimadura por urina) – É uma doença quase sempre
confundida com a treponematose, e que pode ser verdadeiramente diferenciada
apenas devido à ausência de espiroquetas em microscopia de campo escuro e à
ausência de anticorpos contra Treponema cuniculi. Afeta o ânus e os genitais
externos e é causada por pisos de gaiola úmidos e sujos. Os coelhos que carecem
de controle adequado do esfíncter da bexiga gotejam constantemente urina, e
também podem estar afetados. As membranas do ânus e da região genital ficam
inflamadas e fendidas. A região logo se torna secundariamente infectada por
qualquer bactéria patogênica. As crostas amarronzadas recobrem a área e um
exsudato purulento hemorrágico pode estar presente. A manutenção da limpeza e
secura dos pisos de gaiola e a aplicação de nitrofurazona ou de uma pomada
antibiótica nas lesões aceleram a recuperação.
Hidrocefalia – Esta condição, que se observa ocasionalmente em coelhos
neonatos, caracteriza-se por um aumento de volume da cabeça. A parte superior do
crânio parece ter a forma de uma cúpula e a fontanela está mais larga que o normal.
Manejo, Criação e Doenças dos Coelhos 1295

A maioria dos coelhos afetados nasce morta, mas às vezes eles vivem por várias
semanas. Entretanto, geralmente exibem sinais neurológicos. À necropsia, o
cérebro está aumentado; em seção de corte, os ventrículos estão grandemente
aumentados e preenchidos com líquido cerebroespinhal. A causa da hidrocefalia
tanto pode ser genética como resultante de uma dieta deficiente ou excedente em
vitamina A. Se for resultado de deficiência dietética ou hipervitaminose, observa-se
baixo desempenho reprodutivo (baixa fertilidade, tamanho de ninhada pequeno,
abortos, etc.) no lote reprodutivo.
Um fornecimento correto de vitamina A se torna crítico em um tratamento. Tanto
o soro como o fígado devem ser analisados à procura de vitamina A. Uma deficiência
faz com que o nível sérico de vitamina A desça abaixo do normal (2,6 a 4,2UI/mL).
Em uma intoxicação, o nível sérico pode estar normal, mas a vitamina A hepática
pode estar muito alta (> 4.000UI/g). O tratamento da deficiência envolve o aumento
do teor de caroteno da dieta ou a adição de suplemento de vitamina A. O tratamento
da hipervitaminose A requer a redução da vitamina A na dieta. O controle da
hidrocefalia genética requer o descarte de ambos os pais, já que parece ser de
genética recessiva.
Cetose (toxemia da prenhez) – É um distúrbio raro que pode resultar na morte
de coelhas durante o parto ou 1 a 2 dias antes da parição. Os fatores predisponentes
incluem obesidade e falta de exercícios. A enfermidade é mais comum em coelhas
de primeira ninhada. Os sinais incluem embotamento dos olhos, apatia, anorexia,
distúrbios respiratórios, prostração e morte. A lesão mais significativa é a esteatose
do fígado e rins. A causa provável é a inanição. Por algum motivo ainda não com-
preendido, ocorre anorexia. O corpo mobiliza as gorduras e as transporta para o fíga-
do para serem metabolizadas para gerar energia, causando a esteatose do fígado. O
diagnóstico depende dos sinais clínicos e das lesões de necropsia. As injeções de
fluidos que contenham glicose podem ser úteis na correção da doença. A reprodução
precoce das coelhas jovens, antes que fiquem muito gordas, também é útil.
Envenenamento por asclépia – Este tipo de envenenamento, comunicado
exclusivamente na costa sudoeste dos EUA, é causado pela alimentação com feno
que contenha a vagem pegajosa da asclépia, Asclepias eriocarpa. Algumas vezes
é chamada de “doença da cabeça baixa”, visto que os coelhos afetados desenvol-
vem paralisia dos músculos do pescoço e perda de coordenação. Se o animal não
tiver consumido muita erva e a paralisia não tiver progredido demais, pode-se tentar
o tratamento. A cabeça do coelho fica suspensa, de modo que ele possa beber água
e consumir alimento. Devem-se servir verduras e cenouras. O feno e a cama têm de
estar livres dessa erva para prevenção. O princípio do veneno é um resinóide; o
consumo de , 0,25% do peso do animal, em forma de planta verde, é letal.
Dermatite úmida (papada molhada) – A maioria das coelhas tem uma prega de
pele grossa na região ventral do pescoço. Quando a coelha bebe água, esta pele
pode ficar molhada e encharcada (“baba”), o que leva a uma inflamação. Os fatores
que podem contribuir com esta afecção incluem maloclusão dentária, potes de água
abertos e cama úmida. O pêlo pode-se soltar e a área pode ser infectada ou infes-
tada por moscas. A área quase sempre se torna esverdeada, se for infectada por
Pseudomonas sp. Os sistemas automáticos de bebedouros com válvulas de bebida
geralmente evitam a umidificação da papada. Se recipientes de água abertos forem
usados, estes devem possuir aberturas pequenas e ser colocados em locais
elevados. Uma vez infectada a área, devem-se cortar os pêlos e aplicar talco anti-
séptico. Nos casos severos, podem ser necessários antibióticos parenterais.
Pododermatite ulcerativa (jarretes doloridos) – A doença não envolve o
jarrete, mas sim a região metatársica e, menos comumente, a metacarpofalângea.
A causa é uma pressão na pele, devida à sustentação do peso corporal em gaiolas
com piso de arame, ou trauma à pele devido à prensa dos pés, com infecção
Manejo, Criação e Doenças dos Coelhos 1296

secundária da pele necrótica. Vários fatores, inclusive acúmulo de fezes embebidas


de urina, nervosismo, paralisia posterior após lesão da medula espinhal, e o tipo de
arame, podem influenciar o desenvolvimento. Também envolvem-se fatores gené-
ticos. Os coelhos de raças pesadas, como o gigante flamengo ou o gigante xadrez,
são mais suscetíveis. A pododermatite é um problema importante no coelho rex,
devido à presença neste de um coxim plantar maldesenvolvido. Os coelhos
afetados sentam-se numa posição peculiar, descansando seu peso sobre as patas
dianteiras e, se todas as 4 patas estiverem afetadas, “andam na pontinha dos
dedos”. Não há método eficaz de tratamento e os animais afetados devem ser
descartados. Já que essas características são hereditárias, a seleção do lote
reprodutivo para pés grandes e coxins grossos pode reduzir a incidência de
pododermatite.

MANEJO, CRIAÇÃO E DOENÇAS


DOS RÉPTEIS
Os répteis podem ser facilmente reconhecidos devido ao seu revestimento
córneo ou escamoso. A classe Reptilia compreende 4 ordens. O tuatara é a única
espécie da ordem Rhynchocephalia; os Crocodilia incluem os aligátores, jacarés,
crocodilos e gaviais; os jabutis e as tartarugas são membros dos Chelonia; e a
ordem Squamata compreende os lagartos e cobras. O conhecimento das muitas
características fisiológicas e anatômicas dos répteis é essencial para o bom ma-
nejo desses animais em cativeiro. A maioria dos répteis é de pecilotérmicos ecto-
térmicos, enquanto a maioria dos mamíferos e aves são homeotérmicos endotér-
micos. Estruturalmente, os répteis, à exceção dos crocodilianos, apresentam um
septo ventricular incompleto, mas funcionalmente, o coração age mais como
um coração de 4 câmaras. Um sistema portal renal existe, além do sistema portal
hepático. Ocorre fertilização interna e o desenvolvimento do embrião se dá no
interior de um ovo amniótico, tanto externa (oviparidade) quanto internamente
(viviparidade). Existem muitas outras diferenças morfológicas e biológicas entre os
répteis e os outros vertebrados.

CRIAÇÃO
Os répteis, quando em cativeiro, devem ser mantidos em um ambiente seme-
lhante ao do seu hábitat nativo. As necessidades específicas do ambiente do
cativeiro correspondem a muitas variações naturais (temperatura, chuva, fotoperíodo,
disponibilidade de alimento, etc.) observadas no meio selvagem. Estas necessida-
des precisam de um conhecimento completo da história natural e biologia da
herpetofauna para assegurar uma boa qualidade de vida no cativeiro.
Temperatura – A maioria dos répteis é ectotérmica; o calor gerado pela atividade
metabólica é limitado e eles não possuem mecanismos de controle para retenção
do calor produzido. No entanto, muitos répteis vencem esta aparente deficiência
procurando áreas mais frescas ou quentes para controlar as flutuações diárias da
temperatura corporal. Em seu hábitat, são capazes de manter uma variação
relativamente estreita de temperatura corporal, comparada ao ambiente. Por isso,
a gaiola ou recinto utilizado para alojá-los deve providenciar um gradiente térmico
(dentro da temperatura ótima para cada espécie); o que providencia bem-estar tanto
fisiológico como psicológico. As espécies tropicais geralmente preferem tempera-
turas na faixa de 27 a 38°C; as espécies de clima temperado, 20 a 35oC; as
Manejo, Criação e Doenças dos Répteis 1297

tartarugas semi-aquáticas preferem uma faixa ligeiramente mais baixa. As tempe-


raturas letais para algumas espécies podem estar dentro de 5 oC do limite superior
da temperatura ideal. Os répteis tornam-se inativos em temperaturas mais baixas
(torpor). Isto é um evento sazonal normal para as espécies temperadas e pode ser
necessário para uma ótima reprodução no cativeiro. Devem-se evitar extremos e
flutuações rápidas de temperatura no recinto animal.
Fotoperíodo – As exigências de fotoperíodo para os répteis estão baseadas em
necessidades de atividade circanual e circadiana. Para espécies temperadas, as
variações no fotoperíodo são utilizadas como insinuações ambientais para sincro-
nizar a ciclicidade reprodutiva com as melhores condições ambientais. Para
espécies tropicais, as variações do fotoperíodo são de pouca importância na
sincronização da ciclicidade reprodutiva, enquanto outros fatores (umidade, chuvas
sazonais, estiagem, alterações na disponibilidade de alimento, densidade popula-
cional, etc.) assumem maior importância como insinuações ambientais sazonais.
Flutuações no fotoperíodo de , 10h de luz do dia, nos meses de inverno, a , 14h
de luz do dia, para meses de verão, são comuns em áreas tropicais. As áreas
temperadas passam por mudanças no fotoperíodo que variam de , 8h de luz do dia,
nos meses de inverno, a , 16h, durante os meses de verão. As alterações sazonais
na intensidade de luz têm-se mostrado benéficas para a reprodução em cativeiro.
Recomenda-se luz de espectro completo; isso requer o uso de tubos fluorescentes
com qualidades espectrais semelhantes às da luz solar natural (incluindo ultravio-
leta). O comportamento de alimentação e a reprodução melhorados têm sido
observados em luz de espectro completo. Lâmpadas incandescentes podem ser
usadas para luz e calor em gaiolas de répteis, mas o contato direto deve ser evitado,
para prevenir queimaduras térmicas. Luminárias de calor podem ser usadas para
providenciar pontos quentes dentro de um recinto, mas devem ser protegidas e
colocadas a ≥ 45cm do substrato.
Água/umidade – As espécies semi-aquáticas requerem água suficiente para
permitir imersão completa. Entre muitas espécies, alimentação, reprodução e
interação social ocorrem na água. A qualidade da água deve ser controlada através
de filtração e aeração para prevenir o acúmulo de detritos orgânicos tóxicos, e o
supercrescimento de microrganismos patogênicos. Para espécies de estuário,
deve-se considerar a salinidade da água. O pH da água para algumas espécies de
tartarugas aquáticas pode precisar ser ajustado ao do seu hábitat.
As necessidades de consumo de água estão ligadas à disponibilidade no hábitat.
As espécies aquáticas e semi-aquáticas tendem a ser ureotélicas (excretoras de
uréia), o que resulta em perda de água significante. As espécies de ambientes mais
secos tendem a ser uricotélicas (excretoras de ácido úrico), agindo como conserva-
doras de água. A perda de água pela pele ocorre em muitas espécies, quando
privadas de áreas para se molharem, com uma perda de até 20% de peso corporal
acontecendo em crocodilianos. Da mesma forma, tem-se descrito a absorção
transcutânea de água. Muitas espécies bebem facilmente de tanques ou tigelas,
mas muitos lagartos pequenos (anoles e camaleões verdadeiros) bebem através da
lambedura de gotículas de água que se acumulam por condensação. A cerração no
ambiente providencia opções para consumo de água.
A umidade deve ser muito próxima à do ambiente natural. Umidade excessiva-
mente baixa (< 35%) pode resultar em uma pele anormalmente seca e disecdese,
sobretudo em espécies que não estejam adaptadas a um ambiente árido. Umidade
excessivamente alta (> 70%) pode resultar em florescimento bacteriano e/ou
fúngico, e predispõe a infecções cutâneas.
Projeto do recinto – Muitos répteis parecem nervosos e inseguros no cativeiro.
Isto pode ser diminuído providenciando-se equipamentos do recinto apropriados e
lugares para se esconder. As espécies arborícolas devem ser providas com
Manejo, Criação e Doenças dos Répteis 1298

orientação vertical, colocando-se galhos de árvore ou outros objetos apropriados


para escalar. As espécies terrestres geralmente requerem uma orientação mais
horizontal. Muitas espécies terrestres/cavadoras requerem lugares para se escon-
der; estes podem estar na forma de caixas, troncos de árvore, rochas ou outros
objetos. Para algumas espécies, uma margem negra uniforme, pintada na parede
de vidro a 20cm do chão do recinto, providencia segurança adicional. A domiciliação
de comunidades de espécies diurnas altamente sociais quase sempre exige a
colocação de diversos lugares para tomar sol, comer e beber, que estejam fora da
vista dos congêneres dominantes e de qualquer observador humano. A superlotação
tem de ser evitada para reduzir o estresse e a competição por comida, água, locais
de tomar sol, parceiros sexuais, etc. A separação de espécies agressivas durante
a alimentação pode ser obrigatória para prevenir ferimentos nos parceiros de
recinto. A luta pode ser reduzida significantemente ao se domiciliar espécimes
compatíveis conjuntamente.
Substratos – Os substratos do recinto devem ser disponíveis, baratos, atóxicos,
não abrasivos, fornecer áreas mínimas para crescimento microbiano e facilitar a
limpeza do recinto. Papel de jornal, areia, musgo de turfa, terra e vaso, maravalhas
de madeira e grama artificial (de náilon) têm todos sido usados com sucesso para
a maioria das cobras. As cobras não devem ser alimentadas enquanto estiverem
sobre maravalhas, já que estas se acumulam ao redor da boca (predispondo a
estomatites), e podem ser engolidas (predispondo a impactação intestinal). As
substâncias voláteis cáusticas das maravalhas de cedro podem provocar irritação
de mucosa, assim como problemas neurológicos. Areia, terra de vaso e cama de
folhas são substratos adequados para muitas espécies de lagartos e tartarugas. Os
crocodilianos e tartarugas aquáticas podem ser mantidos em uma combinação de
substratos de areia, cascalho e cimento, se forem providenciadas áreas de sol.
Cascas de arroz e sabugos moídos de milho são facilmente disponíveis, mas são
relativamente caros e quase sempre contêm ácaros que se proliferam rapidamente
se a cama estiver úmida. Estes ácaros podem ser eliminados se a cama for aquecida
a , 121oC, por 1h, antes do uso.
Higiene – A higiene é essencial para uma manutenção a longo prazo de répteis.
As gaiolas devem ser mantidas livres de excrementos e a comida desperdiçada
deve ser removida diariamente. As ferramentas utilizadas para remover detritos
devem ser desinfetadas com um composto de amônio quaternário antes do uso em
cada gaiola para reduzir a possibilidade de transmissão da doença. Cercos
aquáticos e terrestres devem ser desmontados e desinfetados a cada 6 meses. As
tartarugas parecem tolerar cloro em água tratada razoavelmente bem, porém os
efeitos da cloramina são desconhecidos.
CONTENÇÃO
A maioria dos lagartos pode ser contida manualmente para exame, apertando-
os perto da cintura escapular e envolvendo-se gentilmente o corpo. A cobertura dos
olhos com um pano facilita o procedimento. Muitos lagartos perdem a cauda quando
apertados distalmente à cintura pélvica (autotomia). Algumas das espécies peque-
nas são delicadas demais para serem manuseadas, e devem ser acondicionadas
em pequenas caixas teladas para exame visual, ou indução de contenção química;
as espécies maiores devem ser apertadas atrás da cabeça e na cintura pélvica.
As pequenas cobras não venenosas podem ser contidas, apertando-se o
pescoço imediatamente atrás da cabeça e suportando-se o corpo com a outra mão.
Muitas cobras podem ser movidas pelo uso de um gancho de cobras posicionado
perto do centro do corpo; elas mover-se-ão sem que o contato físico seja necessário.
As cobras agressivas podem ser gentilmente presas justamente atrás da cabeça,
para manipulação inicial. As grandes constritoras requerem mais de uma pessoa
Manejo, Criação e Doenças dos Répteis 1299

para contenção adequada. A cabeça é envolta com um trapo úmido para obscurecer
a visão da cobra. A área justamente atrás da cabeça é apertada e outros indivíduos,
então, contêm as voltas do corpo.
Os répteis venenosos devem ser manuseados com extrema cautela, apenas por
pessoal experiente e nunca por uma só pessoa. Tubos claros de “plexiglass” com
uma extremidade bloqueada podem ser seguramente usados para o exame e
tratamento de espécies venenosas. Isto é obtido colocando-se o tubo de diâmetro
conveniente (grande o suficiente para a cobra entrar, mas pequeno demais para
mexer a sua cabeça), seguro por um par de pinças ou tenazes, na frente da cobra.
Quando metade da cobra tiver entrado no tubo, a extremidade aberta do tubo e a
cobra são apertadas juntas e seguras como uma unidade. O tipo de contenção
permite exame, administração de medicação e mesmo procedimentos menores de
tratamento.
Os quelônicos são contidos ao se apertar o casco. Várias espécies (tartarugas
mordedoras e tartarugas de casco mole) são mordedoras agressivas e deve-se ter
cuidado.
A contenção de grandes crocodilianos requer imobilização química, embora os
menores possam ser contidos com um laço. O laço é colocado ao redor da cabeça
e o cabo enrolado sobre a pelve; o cabo do laço e pelve são, então, apertados juntos.
Isto evita que o animal se vire. Os olhos são cobertos com um trapo e a boca é
forçadamente fechada e amarrada. Os espécimes > 1,5m de comprimento exigem
2 pessoas para providenciar contenção adequada. Mesmo pequenos crocodilianos
podem infligir sérios ferimentos, tanto com a cauda como com a boca.

ANESTESIA
Apesar de os protocolos para anestesia em répteis terem sido inconsistentes no
passado, pesquisas e experiências clínicas estão trazendo melhores resultados.
Antes da cirurgia pretendida, o animal deve ser aclimatado a uma temperatura
dentro da variação de temperatura preferida, com a indução e a recuperação
acontecendo na mesma temperatura. Os sistemas enzimáticos funcionam melhor
na temperatura ótima e a confiabilidade é melhor alcançada com controle de
temperatura.
Muitas técnicas anestésicas não são apropriadas para uso em répteis. A
hipotermia reduz os movimentos, mas não induz analgesia, sendo portanto inacei-
tável. Os barbitúricos têm sido usados em répteis, mas não são recomendados: a
duração da ação é prolongada e a profundidade de anestesia é difícil de ser alcan-
çada e mantida.
O cloridrato de cetamina pode ser usado para indução de anestesia ou para
procedimentos menores, de curta duração. Os efeitos tranqüilizantes são vistos em
doses mais baixas. Os espécimes menores podem exigir doses proporcional e
ligeiramente mais altas. A quantidade necessária para anestesia varia consideravel-
mente com a espécie. As dosagens de 40 a 100mg/kg são apropriadas para indução,
enquanto 5 a 30mg/kg reduzem a agressividade e retardam reflexos de ataque. A
recuperação ocorre em 2 a 72h, dependendo da dose e temperatura.
A tiletamina-zolazepam pode ser usada para induzir anestesia. Como no caso da
cetamina, o grau de analgesia é quase sempre inadequado para maiores procedi-
mentos. As doses são de 3 a 30mg/kg, IM.

DETERMINAÇÃO DO SEXO
O sexo pode ser determinado em cobras usando-se uma sonda cloacal de
tamanho apropriado. A extremidade da sonda tem de ser lisa e arredondada para
evitar ferir os delicados tecidos cloacais. A sonda lubrificada é inserida na cloaca e
Manejo, Criação e Doenças dos Répteis 1300

dirigida caudal e imediatamente lateral à linha mediana. Na fêmea, a sonda entrará


2 a 4 escamas subcaudais; no macho, entrará 8 a 12 escamas subcaudais. Algumas
espécies de lagartos apresentam dimorfismo sexual; para espécies que não
apresentam esta característica, o hemipênis do macho pode ser exposto pela
cloaca, exercendo-se pressão com o polegar sobre o ânus rolando-se o primeiro
cranialmente. Algumas espécies de lagartos podem ser sondadas à semelhança do
procedimento usado em cobras. É difícil determinar o sexo dos helodermatídeos e
de alguns cincídeos com certeza; alguns podem exigir o uso de ultra-sonografia ou
laparoscopia. O pênis do crocodiliano macho pode ser identificado através de
palpação digital profunda da cloaca.
A tartaruga macho tem uma cauda mais longa que a fêmea; em espécies semi-
aquáticas, o macho é menor e tem garras mais longas. Os machos também podem
possuir um esporão nos membros posteriores. Os jabutis apresentam diferenças
distintas na forma do plastrão. O plastrão do macho é côncavo, enquanto o da fêmea
é plano. Alguns jabutis machos também possuem um par de escamas aumentadas
na garganta.

NUTRIÇÃO
As exigências nutricionais dos répteis são muito pouco definidas. As pesquisas
na área são limitadas e a maioria das recomendações é empírica. O nível de
macronutrientes, proteínas, carboidratos e gordura na dieta é qualitativamente
similar às exigências dos mamíferos. A taxa metabólica reduzida dos ectotérmicos
permite que se alimentem menos freqüentemente. O comportamento de alimenta-
ção, a digestão e a assimilação estão relacionados à temperatura ambiente e à
ativação dos sistemas de enzimas associados. Umidade, fonte de luz, densidade
populacional e o tipo de comida também afetam o comportamento de alimentação.
Nas tartarugas e em alguns lagartos herbívoros, a cor do alimento contribui para a
aceitação da comida: vermelho e amarelo são as cores preferidas. Alguns répteis
se habituam a certos alimentos e são relutantes a comer outros. Providenciando-se
comida variada a cada refeição, pode-se aliviar o problema.
A qualidade é importante quando se fornecem animais inteiros como alimento.
Peixes-dourados, tenébrios, grilos, larvas de mariposas de cera (Galleria sp),
camundongos ou ratos pretendidos para uso como alimento de répteis devem ser
servidos em uma dieta completa e balanceada para providenciar nutrientes adequa-
dos. Os herbívoros e onívoros também requerem rações balanceadas. Muitas
dietas vegetais são deficientes em calorias, proteína e cálcio. Os insetos e suas
larvas são deficientes em cálcio disponível e exige-se suplementação. Uma técnica
comum de suplementar insetos-“presas” com vitaminas e cálcio é colocá-los em um
saco de plástico com uma pequena quantidade de um suplemento mineral/vitamínico
em pó. Chacoalhando-se o saco, cobrir-se-ão esses insetos com o pó e eles devem
ser imediatamente servidos ao réptil. As limitações desta técnica são: 1. muitos
répteis chacoalham os insetos no processo de ingestão, fazendo com que a maior
parte do pó caia do inseto; e 2. os insetos tratados têm de ser comidos imediatamen-
te, ou o pó cairá do inseto-“presa” no curso de uma locomoção normal. A adição de
cálcio à dieta de grilos e larvas de mariposa de cera, destinados a ser presas para
animais insetívoros, aumenta a sua proporção cálcio:fósforo a um nível mais
aceitável.
O teor de proteína da dieta deve ser de , 18 a 20% para carnívoros e 11 a 12%
para herbívoros. As exigências de aminoácidos são idênticas às dos mamíferos,
com a adição de histidina nos répteis. Níveis inadequados de proteína causam perda
de peso, desgaste muscular, aumento de suscetibilidade a infecções secundárias,
deficiência na reprodução e cicatrização mais lenta após ferimento. Qualquer
Manejo, Criação e Doenças dos Répteis 1301

processo infeccioso não responsivo pode ser resultado de uma deficiência nutricio-
nal primária. A maioria das deficiências nutricionais é observada em espécies
herbívoras com dieta “tipo salada” ou em indivíduos anoréticos. As dietas herbívoras
podem ser suplementadas com brotos de alfafa, brotos de feijão, grãos ou farinha
de soja, invertebrados, ou ração de gato enlatada ou ligeiramente úmida; o abuso
de dietas com altos níveis de proteína preparadas para carnívoros tem sido
responsabilizado pela produção de doenças em jabutis. Os espécimes anoréticos
podem exigir alimentação forçada, alteração ambiental, ou variedade suficiente na
dieta para se identificar o item alimentar preferido.
Os carboidratos não parecem ser essenciais às espécies carnívoras, mas, em
muitos casos, as exigências calóricas podem ser resolvidas com adição de carboi-
dratos à dieta, ou através da gliconeogênese de proteínas dietéticas. Os crocodilianos
parecem incapazes de assimilar certos polissacarídios. Os valores de glicose
sangüínea são variáveis para cada ordem e podem permanecer elevados por até 1
semana após uma refeição. A glicose sangüínea se eleva durante as estações de
acasalamento, sobretudo nos machos.
A hipoglicemia clínica tem sido relatada em crocodilianos cativos. Os sinais
incluem midríase, tremores, opistótono, perda do reflexo de endireitamento e morte.
A superlotação e o estresse com liberação prolongada de compostos adrenérgicos
são tidos como causadores. A hipoglicemia sem sintomas clínicos é normalmente
observada em aligátores durante o inverno.
Em tartarugas gigantes de terra e outras espécies herbívoras, a adição de
forragem na forma de feno tem eliminado diarréias fétidas crônicas. A fibra é exigida
para o funcionamento normal do trato digestivo.
As exigências de ácidos graxos específicos não estão determinadas para répteis,
porém recomenda-se 0,2% de ácido linoléico na dieta. Não se têm descrito
deficiências. Reservas reduzidas nos corpos gordurosos viscerais têm sido associa-
das a um pequeno tamanho de ninhada durante a estação de procriação. Tem-se
descrito aterosclerose; a restrição de colesterol pode ser uma importante conside-
ração dietética a longo prazo nos répteis cativos.
A água é essencial para a hidratação normal. A habilidade das espécies
desérticas para conservar água não é indicativa de redução das necessidades de
consumo. Em várias espécies, a disponibilidade de água reduzida tem resultado em
taxas de crescimento diminuídas, sem alterações aparentes no estado fisiológico
dos animais.
As deficiências minerais são vistas freqüentemente em répteis cativos. Deve-se
adicionar um suplemento vitamínico mineral à dieta de cada réptil cativo; para isso,
muitos dos suplementos comercialmente disponíveis para o uso em aves e peque-
nos mamíferos domésticos são úteis.
Geralmente, recomenda-se uma proporção de cálcio–fósforo (Ca:P) de 1,2:1.
Entretanto, em algumas situações (fêmeas pondo um grande número de ovos
calcários, ou jovens de crescimento rápido), uma proporção Ca:P que alcance 2:1
é mais apropriada. Como fonte de alimento, o músculo esquelético apresenta uma
proporção Ca:P de , 1:25; o músculo cardíaco e o fígado apresentam uma
proporção Ca:P de , 1:44. O exoesqueleto quitinoso de insetos é desprovido de
cálcio. A vitamina D é requisitada para o metabolismo apropriado e equilíbrio de
cálcio. Tem-se recomendado a vitamina D 3 e/ou o acesso a luz ultravioleta, como
fontes dessa vitamina/hormônio. Os tubos fluorescentes “Vitalite”, “Grolux” e “Black
Light” constituem fontes de luz ultravioleta comumente usadas. Estes tubos são
quase sempre usados juntos para répteis. Níveis inadequados de vitamina D ou uma
proporção inapropriada de cálcio–fósforo podem resultar em hiperparatireoidismo
secundário nutricional, osteodistrofia fibrosa, osteomalacia, cálculos císticos, cálcu-
los na cloaca e raquitismo. Podem-se observar fraturas patológicas, deformidades
Manejo, Criação e Doenças dos Répteis 1302

ósseas e cascos moles ou deformados em tartarugas. Os sinais terminais podem


incluir ataques tetânicos. O tratamento consiste na correção da proporção Ca:P e
injeção de vitamina D3, a intervalos semanais. A doença metabólica óssea avançada
raramente responde ao tratamento. A suplementação excessiva de vitamina D tem
resultado em calcificação de tecidos moles em répteis. Embora as necessidades
específicas para vitaminas em répteis não tenham sido adequadamente estudadas,
tem-se recomendado vitamina D dietética suplementar a 100UI/kg de peso
corporal/semana. Boas fontes de cálcio para répteis incluem osso de siba pulveri-
zado ou moído, Neo-Calglucon, casca de ovo de galinha moída, concha de ostra
moída e tabletes de lactato de cálcio pulverizados ou moídos.
Letargia e um inchaço anormal na entrada do tórax (bócio) podem indicar uma
deficiência de iodo. A alimentação com compostos bociogênicos, incluindo certas
forragens verdes, pode precipitar o problema. O desequilíbrio é corrigido por
suplementação com uma mistura vitamínico-mineral balanceada (1g/kg de peso
corporal) ou sal iodado (0,5% da dieta).
Têm-se descrito deficiências de ferro e cobre, associadas a anemia, em tartarugas.
A hipovitaminose A é vista freqüentemente em tartarugas cativas, nas quais tem
estado associada a edema palpebral, doença crônica respiratória e nefropatia. A
metaplasia escamosa de estruturas epiteliais é característica. O edema palpebral é
caracterizado por glândulas de Harderian obstruídas, pálpebras inchadas e conse-
qüente incapacidade na localização do alimento. Podem ocorrer doença crônica
respiratória e problemas de pele, inclusive hiperceratose, disecdise freqüente e
ulceração. O tratamento consiste em injeções semanais de 2.500UI/kg de vitamina
A de peso corporal.
As dietas que contêm peixes com altos níveis de tiaminase podem causar uma
deficiência de vitamina B1 e exige-se suplementação exógena. É característica a
perda de peso com consumo de comida adequado. O peixe-dourado é pobre em
atividade de tiaminase, enquanto o eperlano é extremamente rico. Em iguanas, tem-
se observado paresia posterior, que progride para paralisia flácida e está associada
a uma deficiência do complexo B. As deficiências de vitaminas hidrossolúveis quase
sempre envolvem mais que uma vitamina, e exigem tratamento com uma prepara-
ção multivitamínica.
Tem-se descrito deficiência de biotina, associada à alimentação com ovos de
galinha não fertilizados e não cozidos, em Helodermata, algumas varanos, teiús, e
cincos maiores. Anorexia e fraqueza são sinais primários. Encontra-se avidina, uma
substância antibiotina, na ovalbumina. A alimentação com ovos fertilizados reduz a
quantidade de avidina no ovo e a suplementação de biotina reduz a freqüência da
afecção.
Tem-se descrito produção endógena de vitamina C por parte do rim dos répteis.
Tem-se incriminado a deficiência de ácido ascórbico nos casos de estomatite
infecciosa, e tem-se sugerido a suplementação oral ou injetável de vitamina C
(diariamente ou quando necessário, a administração de 25mg a vários g de vitamina
C, dependendo do tamanho do indivíduo) como incremento ao tratamento, especial-
mente na presença de nefropatia.
Têm-se descrito coagulopatias responsivas à vitamina K em crocodilianos,
caracterizadas por sangramento gengival prolongado, após perda de dentes decíduos.
Sugere-se o tratamento com vitamina K a 0,5mg/kg de peso corporal.
A esteatite tem sido relatada em crocodilianos alimentados com cavalinha e
atum, e em cobras alimentadas com ratos obesos. Observou-se deposição ceróide
no post mortem . Tem-se recomendado a suplementação de vitamina E a 100UI/dia,
como preventivo, mas é mais importante evitar o oferecimento de peixes que tenham
sido congelados e descongelados inapropriadamente, armazenados por muito
tempo, ou deixados sem ser ingeridos por ≥ 1 dia.
Manejo, Criação e Doenças dos Répteis 1303

Os animais anoréticos podem exigir alimentação forçada para corrigir deficiên-


cias severas. A alimentação inicial deve incluir soluções eletrolíticas com aminoá-
cidos e carboidratos simples, seguidas por misturas combinadas de eletrólitos, ovo
cru e ração de gato ou cachorro. A ração animal inteira e sólida só deve ser fornecida
quando o sistema digestivo e tecidos estiverem mostrando sinais de recuperação.
Dois procedimentos são usados com freqüência para alimentar forçadamente
répteis cativos. Em um deles, uma tubulação mole é lubrificada e introduzida no
esôfago até aproximadamente 1⁄3 do comprimento do corpo; soluções alimentares
são, então, injetadas usando-se uma seringa mililitrada ou espingarda de chumbinho.
A regurgitação pode ser evitada ao se servir pequenas quantidades de alimento.
Deve-se ter cuidado em não danificar estruturas orais, quando da remoção do tubo.
A segunda técnica envolve colocação de pequenos animais inteiros, lubrificados
com clara de ovo, em uma pequena distância do esôfago. O bolo é, então,
massageado manualmente até o estômago. Tem-se recomendado, junto com a
alimentação forçada oral, a administração parenteral de fluidos, tais como dextrose
(2,5 a 5%) e solução de lactato de Ringer, tanto subcutânea como intracelomicamente.
Os fatores ambientais (isto é, temperatura, luz, umidade, etc.) devem ser melhora-
dos para todos os espécimes anoréticos.

DOENÇAS BACTERIANAS
Observam-se doenças bacterianas em todas as ordens de répteis. São comuns
as infecções oportunistas, causadas por bactérias Gram-negativas. Em todas as
infecções bacterianas ou fúngicas, os estados nutricional e ambiental do animal
devem ser considerados e as deficiências corrigidas. A cultura e a sensibilidade são
características importantes na determinação da terapia apropriada. As culturas
devem ser incubadas a 23°C e 37oC.
O tratamento com antibióticos é melhor realizado por injeção parenteral; o grau
de absorção de drogas pela parede intestinal de animais clinicamente anormais é
variável e a regurgitação é freqüente. Indica-se uma terapia de suporte de vitaminas
múltiplas na maioria das doenças infecciosas. Os fluidos, tais como a mistura em
partes iguais de solução salina normal e dextrose a 5%, podem ser administrados
via injeção intracelômica. A higiene e o controle ambiental aumentam as chances de
sucesso. As temperaturas ambientais devem ser mantidas próximas dos ideais para
que a espécie melhore sua função imunológica. Altas taxas metabólicas podem
necessitar de alimentação forçada de espécimes anoréticos.
Os antibióticos freqüentemente usados incluem: triidrato de ampicilina, IM ou
s.c., numa dose de 5mg/kg diários; penicilina potássica, em 50.000u/kg, IM ou
s.c.; penicilina benzatina com penicilina procaína, 10.000u/kg, IM, a cada 24 a
72h; carbenicilina, 400mg/kg/dia em temperatura corporal constante de 30°C;
ticarcilina, 20mg/kg, IM, diários; e ceftazidima, 20mg/kg, IM a cada 72h em
temperatura corporal constante de 30oC. Tetraciclina, de 25 a 50mg/kg/dia, IM ou
s.c.; clortetraciclina a 200mg/kg/dia, VO; e oxitetraciclina de 6 a 10mg/kg, IM, EV
ou VO têm sido recomendadas para infecções por Arizona e Salmonella spp nos
lagartos e quelônicos. A sulfametazina a 1oz de uma solução a 33% por gal. a
8mL/L de água bebida e a sulfadimetoxina a 30mg/kg, VO no primeiro dia e
15mg/kg/dia por 3 dias também têm sido sugeridas. Também se utiliza o
trimetoprim-sulfadiazina, a 15mg/kg/dia. Para microrganismos Gram-positivos
resistentes à penicilina, podem-se usar a cefalotina sódica, 30mg/kg, IM, diaria-
mente, e a cefaloridina, 7mg/kg, diariamente. O succinato de cloranfenicol é
recomendado para muitas infecções, a 40mg/kg, IM, diariamente, a uma tempe-
ratura corporal constante de 24 oC. A tilosina (25mg/kg, IM, diariamente) e a
lincomicina (6mg/kg, IM, diariamente) podem ser benéficas.
Manejo, Criação e Doenças dos Répteis 1304

Os aminoglicosídios são usados freqüentemente para os vários microrganismos


Gram-negativos encontrados em répteis. A neomicina pode ser usada VO para
infecções intestinais, ou para limpar abscessos ou ferimentos, mas não é recomen-
dada sistemicamente. Os aminoglicosídios sistêmicos podem exigir administração
concomitante de fluidos para prevenir danos tóxicos aos rins e fígado. O sulfato de
estreptomicina e o sulfato de canamicina têm sido recomendados a 10mg/kg, IM,
diariamente. O sulfato de gentamicina tem sido recomendado a 2,5mg/kg, s.c., a
cada 72h para cobras e jabutis, a uma temperatura corporal constante de 24 oC. A
dose recomendada de gentamicina para tartarugas aquáticas é de 10mg/kg, a
cada 48h, a uma temperatura corporal constante de 26°C, por no máximo 2 se-
manas. Em aligátores, gentamicina a 1,75mg/kg, a cada 96h, a 22°C notou-se ser
útil. Amicacina tem sido recomendada em dose inicial de 5mg/kg, IM, seguida de
2,5mg/kg a cada 72h.
Várias afecções infecciosas são semelhantes em aparência, independentemente
das espécies e são consideradas conjuntamente. A septicemia é uma causa comum
de morte. A doença sistêmica pode ser precedida por trauma, abscedação local,
parasitismo ou estresse ambiental. As Aeromonas e as Pseudomonas spp são
freqüentemente isoladas; os primeiros podem ser transmitidos pelo ácaro das
cobras, Ophionyssus natricis. A morte pode ser superaguda ou crônica. Os sinais
freqüentemente vistos incluem distúrbios respiratórios, letargia, convulsões e inco-
ordenação. Petéquias podem ser encontradas no abdome ventral, e os quelônicos
apresentam eritema de plastrão. A higiene e o manejo podem ser fatores signifi-
cativos na redução de surtos. Os répteis afetados devem ser isolados e uma
antibioticoterapia iniciada.
A Clostridium novyi foi isolada a partir de uma tartaruga que morreu de septicemia.
A Clostridium botulinum causa a “doença da nadadeira caída” em tartarugas mari-
nhas, a qual é caracterizada por incoordenação, perda de equilíbrio e afogamento.
A doença ulcerativa cutânea septicêmica (DUCS) em tartarugas é quase
sempre causada pela Citrobacter freundii. A Serratia sp pode agir sinergisticamente
para facilitar a entrada de C. freundii na tartaruga. As placas córneas ficam com
cicatrizes e podem se desprender com uma descarga purulenta de base. Observam-
se anorexia, letargia e hemorragias petequiais no casco e na pele; a necrose
hepática é comum. Os antibióticos sistêmicos são recomendados. A boa higiene é
importantíssima na prevenção.
Outra doença de casco de tartarugas é causada pela Beneckea chitinovora, um
agente infeccioso comum de crustáceos. Observam-se eritema e cicatrizes no
casco, com ulceração. A septicemia não é comum. Recomenda-se o tratamento com
iodo tópico.
A dermatite ulcerativa (podridão das escamas) é vista em cobras e lagartos.
Alta umidade pode ser predisponente. A infecção secundária por Aeromonas spp,
Pseudomonas sp e várias outras bactérias pode resultar em septicemia e morte, se
não for tratada. Eritema, necrose e ulceração da derme, e uma descarga exsudativa
são comuns. O tratamento com antibióticos sistêmicos, higiene e manejo melhora-
dos são essenciais.
Os abscessos, causados por ferimentos traumáticos, mordidas ou má qualidade
ambiental, são vistos em todas as ordens. Os abscessos subcutâneos são vistos
como nódulos ou inchaços. O diagnóstico diferencial inclui nódulos parasíticos,
tumores e hematomas. Isolados do microrganismo anaeróbico, Peptostreptococcus,
e dos aeróbicos, Pseudomonas, Aeromonas, Serratia, Salmonella, Micrococcus,
Erysipelothrix, Citrobacter freundii, Morganella morganii, Proteus, Staphylococcus,
Streptococcus, Escherichia coli, Klebsiella, Arizona e Dermatophilus, têm sido obtidos
a partir de abscessos reptilianos, quase sempre em combinações. Abscessos
localizados devem ser excisados e, em seguida, tratados agressivamente no local da
Manejo, Criação e Doenças dos Répteis 1305

ferida. Os antibióticos sistêmicos apropriados podem ser também indicados (ver


anteriormente).
A abscedação visceral pode ocorrer como resultado de uma infecção
hematogênica. Os abscessos do sistema reprodutivo feminino são comuns e podem
resultar em peritonite. Indica-se intervenção cirúrgica; antibióticos sistêmicos sozi-
nhos raramente obtêm sucesso.
A abscedação subocular é vista em cobras, e a conjuntivite em outras ordens. A
severidade varia de uma inflamação leve a uma panoftalmite e pode ocorrer como
resultado de uma estomatite infecciosa. Pomadas tópicas com antibióticos são
aplicadas em tartarugas, lagartos e crocodilianos. Em cobras, a drenagem é
alcançada por remoção cirúrgica de uma pequena fatia dos “óculos” e limpeza com
uma solução antibiótica (neomicina ou estreptomicina). Todos os casos devem ser
tratados com suplementação de vitamina A.
A estomatite infecciosa é observada em cobras, lagartos e tartarugas; é
caracterizada precocemente por petéquias na cavidade oral. Desenvolve-se mate-
rial caseoso ao redor da arcada dentária quando a afecção se agrava. Em casos
severos, a infecção estende-se às estruturas ósseas da boca. As Aeromonas e as
Pseudomonas spp, habitantes normais da boca, são as mais freqüentemente
isoladas, junto a uma variedade de cocos Gram-positivos e negativos. Infecção
respiratória ou gastrointestinal pode acontecer em casos de manejo muito ruim.
Indicam-se debridamento, irrigação com anti-sépticos e/ou antibióticos, antibióticos
sistêmicos e terapia de suporte. Em casos severos, com ulceração ou formação de
granulomas, pode-se indicar cirurgia. Recomenda-se suplementação vitamínica,
especialmente de vitaminas A e C.
As infecções respiratórias são comuns; a incidência pode ser influenciada por
parasitismo respiratório e/ou sistêmico, temperaturas ambientais desfavoráveis,
condições anti-higiênicas, doenças intercorrentes e má nutrição. Respiração com
boca aberta, descarga nasal e dispnéia são sinais freqüentes. As Aeromonas e as
Pseudomonas spp são freqüentemente isolados, mas muitas infecções respirató-
rias são mistas. Pode ocorrer septicemia em casos severos ou prolongados. O
tratamento consiste no melhoramento do ambiente, antibióticos sistêmicos, e
suplementação com vitamina A a 5.000UI, semanalmente. A terapia por nebulização
com antibióticos diluídos em solução salina, em combinação com sulfóxido de
dimetila e/ou acetilcisteína, tem também sido usada, em conjunto com antibióticos
parenterais para o tratamento de pneumonia bacteriana.
As infecções do ouvido médio e interno ocorrem nas tartarugas, mais freqüen-
temente nos jabutis-gregos. Um inchaço nítido é constatado na membrana timpâ-
nica e material caseoso está presente. Proteus sp, Pseudomonas sp, Citrobacter sp,
Morganella morganii, Enterobacter sp e outras bactérias têm sido isoladas. A
drenagem e antibióticos sistêmicos são apropriados. A afecção pode ser secundária
à hipovitaminose A; suplementações parenteral e dietética de vitamina A podem ser
benéficas.
A cloacite infecciosa é caracterizada por edema e descargas hemorrágicas. A
causa pode ser traumática. Cálculos cloacais podem se formar em desequilíbrios
vitamínicos/minerais e devem ser removidos manualmente, seguindo-se uma
correção dietética. Escherichia coli e Pseudomonas e Staphylococcus spp têm sido
isolados. Os abscessos pericloacais quase sempre envolvem migração da infecção
cranialmente através do tecido subcutâneo ou celômico. As infecções ascendentes
dos tratos urinário e genital são seqüelas comuns. Indica-se terapia agressiva,
incluindo debridamento cirúrgico, tratamento local de ferida e antibióticos sistêmicos
apropriados.
As infecções micobacterianas estão quase sempre associadas a emaciação
crônica e são vistas como lesões granulomatosas à necropsia. Os quelônicos
Manejo, Criação e Doenças dos Répteis 1306

geralmente apresentam envolvimento pulmonar, enquanto lagartos, cobras e


crocodilianos apresentam granulomas viscerais. Não há tratamento conhecido para
tuberculose reptiliana. As espécies isoladas são Mycobacterium ulcerans, M.
chelonei e M. thamnophis. Todas são cultivadas em temperaturas reduzidas e
podem necessitar de longos períodos para crescimento.
As Salmonella, Arizona e Edwardsiella spp são isoladas de tartarugas clinica-
mente normais. A natureza zoonótica destes microrganismos tem de ser conside-
rada ao se manusear ou tratar tartarugas. As tentativas de eliminar estes microrga-
nismos de animais infectados e seus ovos não têm obtido sucesso.

DOENÇAS ECTOPARASÍTICAS
Exceto nos espécimes selvagens ou recentemente adquiridos, poucos ectopa-
rasitas são observados. O ácaro Ophionyssus natricis é mundialmente distribuído,
e afeta a maioria das espécies de répteis. Pode ocorrer vitalidade reduzida, e em
infestações pesadas, morte devida a anemia. A pele de animais afetados parece
áspera e, com freqüência, ocorre disecdese. O ácaro é < 1,5mm de comprimento e
é quase sempre encontrado nas proximidades das cápsulas dos olhos. A O. natricis
pode ser associada à transmissão mecânica de Aeromonas hydrophila e resultar em
septicemia ou pneumonia. O tratamento consiste na colocação de tiras de diclorvos
nas proximidades da gaiola por 4 dias. Deve-se evitar o contato direto do animal com
as tiras. As gaiolas podem ser tratadas com spray de solução de triclorfon a 0,1 a
0,2%. Os répteis maiores também podem ser aspergidos com spray desta solução.
Preparações de sílica-gel têm sido recomendadas na forma de pó tópico. Deve-se
ter cuidado quando os espécimes menores forem tratados com preparações de
sílica.
As larvas de ácaros trombiculídeos (micuins) são vistas ocasionalmente, mas
não são consideradas patogênicas.
Os carrapatos ixodídeos são freqüentemente encontrados nos répteis, e infes-
tações pesadas podem resultar em anemia. Os carrapatos argasídeos podem
causar paralisia com degeneração muscular no local da picada. A transmissão do
vírus associado ao papiloma do lagarto verde, de várias hemogregarinas e do verme
filarídeo, Macdonaldius oscheri, tem sido associada aos carrapatos. Os carrapatos
podem ser removidos manualmente.
As sanguessugas têm sido encontradas em várias tartarug

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