Você está na página 1de 77

UNIVERSIDADE DE BELAS

FACULDADE DE CIÊNCIAS SOCIAIS E ECONÓMICAS


CURSO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS

FACTORES GEOPOLÍTICOS: O MAR COMO FACTOR DE


AFIRMAÇÃO DE ANGOLA NO CONTINENTE AFRICANO

TRABALHO DE FIM DE CURSO

ANTÓNIA JOSÉ SALVADOR

LUANDA, 2020
UNIVERSIDADE DE BELAS
FACULDADE DE CIÊNCIAS SOCIAIS E ECONÓMICAS
CURSO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS

FOLHA DE ROSTO

FACTORES GEOPOLÍTICOS: O MAR COMO FACTOR DE


AFIRMAÇÃO DE ANGOLA NO CONTINENTE AFRICANO

TRABALHO DE FIM DE CURSO

Elaborador por: Antónia José Salvador


Orientado por: Msc. Délcio Pedro Rodrigues

Trabalho de Fim de Curso apresentado à


Faculdade de Ciências Sociais e Económicas da
Universidade de Belas como requisito para a
obtenção do Grau de Licenciada em Relações
Internacionais

LUANDA, 2021 i
FICHA CATALOGRÁFICA

Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio
convencional ou electrónico para fins de estudo e pesquisa desde que citada a fonte.

Antónia José Salvador

Data____/_______/_________

SALVADOR, Antónia José

FACTORES GEOPOLÍTICOS: O MAR COMO FACTOR DE


AFIRMAÇÃO DE ANGOLA NO CONTINENTE AFRICANO

Trabalho de Fim De Curso apresentado à Faculdade de Ciências Sociais e Económicas da


Universidade de Belas como requisito para a obtenção do Grau de Licenciada em Relações
Internacionais.

Orientador: Msc. Délcio Pedro Rodrigues

Nº de páginas: 61

Tipo de letra: Times New Roman

Palavras-chave: Angola. Mar. Segurança. Defesa. Poder.

ii
ANTÓNIA JOSÉ SALVADOR

FOLHA DE APROVAÇÃO
FACTORES GEOPOLÍTICO: O MAR COMO FACTOR DE
AFIRMAÇÃO DE ANGOLA NO CONTINENTE AFRICANO

Trabalho de Fim de Curso apresentado à Faculdade de Ciências Sociais e Económicas da


Universidade de Belas como requisito para a obtenção do Grau de Licenciada em Relações
Internacionais

Aprovado,________/_________/__________

BANCA EXAMINADORA

Presidente de Júri

___________________________________________

1º Vogal

___________________________________________

2º Vogal

___________________________________________

Secretário

___________________________________________

iii
DEDICATÓRIA

“A minha família...”

iv
AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus, pela oportunidade, coragem e vontade que sempre me proporcionou.


Agradeço aos meus pais por sempre apoiarem-me e por terem acreditado em mim. Aos meus
colegas que juntos brindamos grandes momentos, sem esquecer os mestres e doutores do
conhecimento que tive durante os 4 anos de formação, ao Professor Lourenço Neto por ter
despertado em mim o interesse pela geopolítica e Geoestratégia, ao Professor Délcio
Rodrigues por ter acompanhado até aqui e por acreditar que sou capaz.
A Universidade de Belas por ter cedido o crédito de formação 50%, fazendo-me acreditar que
que tudo é possível. A todos que directas ou indirectamente contribuíram para o meu
aprendizado.
Muito obrigado...

v
RESUMO

Os Factores Geopolíticos: o Mar como Factor de Afirmação de Angola no Continente


Africano cujo seu objectivo geral visa compreender o mar enquanto factor de afirmação de
Angola no continente Africano. Desta forma recorremos a uma pesquisa qualitativa, por esta
razão entendemos, que os resultados alcançados demonstram que Angola como uma potência
emergente na região marítima que lhe é contígua e no continente Africano, fazendo com que
os aspectos de defesa, segurança e de afirmação como Estado se encontrem no centro das
premissas de desenvolvimento. Assim sendo, concluímos que este trabalho procura efectuar
uma análise interpretativa quanto ao valor acrescentado que o Mar oferece, não apenas no
âmbito da economia nacional, mas sobretudo de natureza político-estratégica, na medida que
o País terá de desenvolver e assegurar uma componente de Segurança e Defesa orientada para
o mar, favorecendo o cumprimento dos objectivos de Interesse Nacional e de aproveitamento
das oportunidades oferecidas pela ampla área marítima adjacente de interesse imediato. Nesta
perspectiva, recomendamos neste estudo, a identificação das oportunidades que o Mar oferece
para o território nacional, considerando a necessidade de fazer frente a possíveis ameaças, não
apenas ao nível da Segurança e Defesa, mas também em termos socioeconómicos, numa
perspectiva de inovação e de diversificação da economia e dos recursos marítimos, tendo
também presente a vertente do conhecimento científico e tecnológico do Mar, em ordem a
interpretar e a rentabilizar as suas capacidades e potencialidades.

Palavras-chave: Angola. Mar. Segurança. Defesa. Poder.

vi
ABSTRACT

The Geopolitical Factors: the Sea as an Affirmation Factor for Angola on the African
Continent whose general objective is to understand the sea as a factor for the affirmation of
Angola on the African continent. In this way we resort to a qualitative research, for this
reason we understand, that the results achieved demonstrate that Angola as an emerging
power in the contiguous maritime region and in the African continent, making the aspects of
defense, security and affirmation as a State are at the center of development assumptions.
Therefore, we conclude that this work seeks to carry out an interpretative analysis as to the
added value that the Sea offers, not only within the scope of the national economy, but above
all of a political-strategic nature, as the Country will have to develop and ensure a component
of Security and Defense oriented to the sea, favoring the fulfillment of the National Interest
objectives and taking advantage of the opportunities offered by the wide adjacent maritime
area of immediate interest. In this perspective, we recommend in this study, the identification
of the opportunities that the Sea transfers to the national territory, considering the need to face
possible threats, not only in terms of Security and Defense, but also in socioeconomic terms,
in a perspective of innovation and diversification of the economy and maritime resources, also
bearing in mind the scientific and technological knowledge of the Sea, in order to interpret
and make the most of its capabilities and potential.

Key-words: Angola. Sea. Security. Defense. Power.

vii
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

APSA – Arquitectura de Paz e Segurança Africana

CEEAC – Comunidade Económica do Estado da África Central

CPLP – Comunidade dos Países de Língua Portuguesa

CNUDM- Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar

EUA- Estados Unidos da América

FNLA- Frente Nacional de Libertação de Angola

FAA – Forças Armadas Angolana

FA- Forças armadas

ITCP – Integrated Technical Co-operation Programme

IUU – Ilegal, Não Reportada e Não Regulamentada

MPLA - Movimento Popular de Libertação de Angola

MIREX- Ministério das Relações Exteriores

MGA- Marinha de Guerra Angola

MN- Milhas Náuticas

NATO- Organização do Tratado do Atlântico Norte

OMI – Organização Marítima Internacional

OMAOC- Organização Marítima da África do Oeste e do Centro

ONU – organização das Nações Unidas

OKACOM- Comissão Permanente dos Recursos Hídricos da Bacia Hidrográfica do


Cubango/Okavango

OUA - União Africana e a sua antecessora

PIB- Produto Interno Bruto


viii
RDC- República Democrática do Congo

RC - República do Congo

SAM – Sistema de Autoridade Marítima

UNITA - União para a Independência Total de Angola

ZML - Zona Militar Leste

ZEE- Zona Económica Exclusiva

ZOPACAS- Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul;

ix
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO ................................................................................................................. i

FICHA CATALOGRÁFICA .................................................................................................. ii

FOLHA DE APROVAÇÃO ................................................................................................... iii

DEDICATÓRIA ...................................................................................................................... iv

AGRADECIMENTOS ............................................................................................................. v

RESUMO.................................................................................................................................. vi

ABSTRACT ............................................................................................................................ vii

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS .......................................................................... viii

I. INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 1

1.1. Introduzir o tema .......................................................................................................... 1

1.1.1. Delimitação do tema ............................................................................................. 2

1.1.2. Justificação do tema.............................................................................................. 2

1.2. Formulação do problema ............................................................................................. 3

1.3. Formulação das hipóteses ............................................................................................ 4

1.4. Objectivos .................................................................................................................... 4

1.4.1. Objectivo geral ..................................................................................................... 4

1.4.2. Objectivos específicos .......................................................................................... 4

II. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ..................................................................................... 5

2.1. Geopolítica, conceitos, utilidade e natureza ................................................................ 5

2.1.1. Conceito ................................................................................................................ 5

2.1.2. O âmbito da geopolítica........................................................................................ 7

2.1.3. A Finalidade da geopolítica .................................................................................. 8

2.1.4. Os termos (próprios) da geopolítica ..................................................................... 9

2.1.5. Geopolítica na perspectiva de Friedrich Ratzel (1844-1904) –O espaço vital ..... 9

2.1.6. Geopolítica na perspectiva de Rudolph Kjellén (1864-1922) o organicismo .... 12

2.1.7. Conceitos de estratégia ....................................................................................... 14


x
2.1.8. Geoestratégia ...................................................................................................... 16

2.1.9. Factores geopolíticos .......................................................................................... 17

2.1.10. Linha periférica................................................................................................... 18

2.1.11. O poder marítimo na perspectiva de Alfred Thayer Mahan (1840-1914) .......... 18

2.1.12. Poder e estratégia ................................................................................................ 20

2.1.13. Poder e soberania ................................................................................................ 21

2.1.14. Poder e defesa nacional ...................................................................................... 21

2.1.15. Cálculo do poder nacional .................................................................................. 21

2.2. Análise geopolítica e geoestratégica de Angola ........................................................ 22

2.2.1. Factor físico ........................................................................................................ 23

2.2.1.1. Potencialidades ............................................................................................ 23

2.2.1.2. Vulnerabilidades.......................................................................................... 23

2.2.2. Factor humano .................................................................................................... 23

2.2.2.1. Potencialidades ............................................................................................ 24

2.2.2.2. Vulnerabilidades.......................................................................................... 24

2.2.3. Factor recursos .................................................................................................... 25

2.2.3.1. Potencialidades ............................................................................................ 25

2.2.4. Factor circulação................................................................................................. 26

2.2.4.1. Potencialidades ............................................................................................ 26

2.2.4.2. Vulnerabilidades.......................................................................................... 26

2.2.5. Factor estruturas ................................................................................................. 27

2.2.5.1. Potencialidades ............................................................................................ 27

2.2.5.2. Vulnerabilidade ........................................................................................... 27

2.2.6. Explicações sobre Angola .................................................................................. 28

2.3. Angola na organização marítima internacional ......................................................... 28

III. CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO .......................................................... 31

3.1. Localização geográfica de Angola ............................................................................. 31


xi
3.1.1. Clima .................................................................................................................. 31

3.1.2. Forma de território .............................................................................................. 31

3.1.3. Hidrografia.......................................................................................................... 32

3.2. Angola no quadro político internacional ................................................................... 33

3.2.1. Breve síntese histórica até à independência ....................................................... 33

3.2.2. Enquadramento geopolítico do continente africano – principais teses .............. 35

3.2.3. Esboço das teses tradicionais.............................................................................. 35

3.3. Continente africano, esboço geopolítico de hoje ....................................................... 36

3.4. Factos sobre a história de Angola .............................................................................. 38

IV. METODOLOGIA ............................................................................................................ 39

4.1. Tipo de estudo ............................................................................................................ 39

4.2. População e amostra .................................................................................................. 39

4.2.1. Critérios de inclusão ........................................................................................... 39

4.2.2. Critérios de exclusão .......................................................................................... 40

4.3. Métodos a utilizar ...................................................................................................... 40

4.4. Procedimentos e instrumentos para a colecta de dados ............................................. 40

4.5. Processamento de dados ............................................................................................ 40

V. RESULTADOS E DISCUSSÃO....................................................................................... 41

VI. CONCLUSÕES ................................................................................................................ 52

VII. RECOMENDAÇÕES..................................................................................................... 57

VIII. BIBLIOGRAFIA........................................................................................................... 58

ANEXOS .................................................................................................................................... I

Anexo I: Mapa de Angola ..................................................................................................... II

Anexo II: Mapa topográfico de Angola ............................................................................... III

xii
I. INTRODUÇÃO
“Quem dominar o mar domina o comércio do mundo; quem dominar o comércio do mundo
domina as riquezas do mundo; quem dominar as riquezas do mundo, domina o mundo”
(ALMEIDA, 1990, p. 22).

“A protecção das nossas águas territoriais onde até agora têm vindo piratear muitos
Navios Estrangeiros, que fazem a pesca como os camaradas sabem, é um facto que
nós devemos neutralizar, devemos evitar no futuro, devemos neutralizar aqueles que
querem de qualquer maneira roubar o que existe no nosso País, ou que pretenderão
talvez através dos mares atacar o nosso País.” António Agostinho Neto (discurso de
10 de Julho de 1976).

1.1. Introduzir o tema


Nesta Monografia faremos uma abordagem sobre os factores geopolíticos que são elementos
da natureza geográfica que os Estados utilizam para a construção e dinamismo deles. Tendo
em conta os elementos básicos da natureza saída para o mar e a forma de território. Como tem
sido a influência dos mares angolanos para outros Estados. O facto de Angola ter 0,25km de
costa marítima da um realce enorme e poder de influenciar aqueles Estados sem mar
negociarem algumas transacções sobre o seu espaço, tento em conta as zonas de fricção
actuais e latentes de outros Estados.

Hoje a nível das África austral Angola é vista com uma potência emergente pelos recursos
naturais obtidos e por uma vasta experiência como potência pacificadora de conflitos entre os
Estados a nível da África. Teceremos algumas considerações a respeito da Introdução a
geopolítica, quais as contribuição dos grandes pensadores geopolíticos para Angola, visto que
na África Austral Angola acarreta um papel muito importante e uma vasta influência para os
outros Estados, actualmente ela é conhecida como um Estado mediador e pacificador de
conflitos a nível da África austral a importância dos factores geopolíticos e sua influência para
Angola, hoje com o evoluir do tempo os Estados notaram a necessidade de limitação das suas
fronteiras tanto marítima como terrestre, neste contexto nos focaremos mais sobre as
fronteiras marítimas ou seja a Saída para o mar. A grande dificuldade de muitos Estados é
saber limitar as suas fronteiras marítimas. Segundo Ratzel (1983) ʽum Estado que não
desenvolve está fadado a morrerʼ já para La Blache ele retracta sobre as influencias que um
Estado pode exercer sobre outro. Hoje as fronteiras marítimas tornaram-se um factor de
ameaças e segurança para a sobrevivência do Estado angolano, devido as grandes ocorrências
de parcelas de mar sobre o Congo, as transições de grande porte e acima de tudo as
migrações.

1
No que retracta os factores geopolíticos podemos esmiuçar a saída para o mar, Angola possui
grandes vantagens no que concerne a sua linha periférica marítima, o seu acesso para o
oceano é de extrema importância, pelo facto de proporcionar acesso às rotas oceânicas,
fundamentais para o seu maior desenvolvimento, por não ser um Estado totalmente
mediterrânico não estará sujeito a dependência contínua de Estados Terceiros

“Os Factores Geopolíticos são um conjunto de agentes, elementos, condições ou


causas de natureza geográfica, susceptíveis de serem operadas no levantamento de
hipóteses para a construção de modelos dinâmicos de interpretação da realidade,
enquanto perspectivação consistente de apoio à política e a Estratégia” - Instituto de
Altos Estudos Militares (IAEM, 1993, p. 17).
Os factores Geopolíticos estabelecem a situação geopolítica. Os factores geopolíticos de
Angola são caracterizados por várias circunstâncias com combinações múltiplas dos seguintes
factores: posição geográfica no sul do continente africano com uma extensão territorial de
1.246.700 km2, dos quais 1.650 km de costa marítima e 4.837 km de fronteira terrestre,
acesso às grandes rotas de suprimento marítimo, território compacto e acesso às bacias
hidrográficas e o potencial em recursos minerais estratégicos.

1.1.1. Delimitação do tema

Este estudo delimita-se no contexto dos factores geopolíticos e geoestratégicos (posição do


território, forma do território, hidrografia, o espaço marítimo) nas vantagens da costa
marítima, e os grandes benefícios do mar angolano de como são aplicados as estratégias no
que concerne o controlo das fronteiras marítimas e a relevância que Angola tem sobre as suas
saídas para o mar, vamos então abordar, Os Factores Geopolíticos: O Mar como Paradigma de
Afirmação de Angola no Continente Africano.

1.1.2. Justificação do tema

Actualmente verifica-se que os “espaços marítimos sob jurisdição de Estados costeiros em


África” (Dias & Branco, 2011, p. 15), na sua maioria, se caracterizam essencialmente pelo
fraco exercício da autoridade, visto que a dimensão marítima da segurança nestes espaços tem
sido por estes muito negligenciados, nomeadamente porque enquanto nalgumas regiões do
sistema mundial se tem assistido a uma dinâmica de expansão da soberania dos Estados sobre
o mar, em termos de soberania plena ou de simples jurisdição; noutras regiões, “a fraca
capacidade de ocupação, fracos controlo e projecção da soberania pelos Estados costeiros no
exercício de poderes nos seus espaços marítimos tem conduzido à proliferação de atores que

2
colocam ameaças à segurança nestes espaços” (idem, p. 13). Angola faz parte deste último
grupo, tendo esta situação sido agravada pela menor preponderância que a Marinha de Guerra
teve para a Defesa Nacional durante o período de guerra civil, uma guerra fundamentalmente
de âmbito e natureza terrestre e aérea, e em que o esforço de guerra era fundamentalmente
desempenhado pelo Exército e para a Força Aérea.

Nesta perspectiva, a principal razão que levou à escolha do presente tema com a finalidade de
cumprir um trabalho de investigação conducente à obtenção do grau de Licenciatura, reside
na paixão em desenvolver temáticas relacionadas com o Mar e com Angola; e apoiada no
reconhecimento da centralidade que o Mar ocupa no sistema mundial. No caso de Angola
torna-se importante chamar atenção para a posição periférica que, ainda hoje e no âmbito
nacional, é atribuída ao mar, olvidando muitas vezes o valor acrescentado que a área marítima
representa actualmente na consolidação do Poder Nacional de um Estado costeiro. Acresce
que a sua escolha deveu-se à actual situação favorável da economia nacional, o que permitirá
atender às necessidades de protecção da soberania e de afirmação nos âmbitos local, regional
e continental, permitindo assim um repensar em termos da segurança e da defesa marítimas a
nível superior do Estado; e ainda do que poderá ser feito para o melhor aproveitamento das
potencialidades que o mar oferece, tendo em vista o fomento e a diversificação da economia
nacional, considerados como prioritários.

1.2. Formulação do problema

Tendo em conta a localização geográfica de Angola, surge a necessidade de aprimorar e dar a


conhecer as ameaças e oportunidades das fronteiras angolana, discernir no contexto das
Relações Internacionais a geopolítica e geoestratégia que Angola tem usado nos últimos
tempos. Do ponto de vista estratégico Angola é um Estado que reuni factores geopolíticos
essenciais e que consegue conciliar no âmbito das relações estratégicas entre os Estados, visto
que as suas fronteiras disponibilizam maior vantagem com relação a alguns Estados
Africanos, urge a necessidade de fazer uma análise nos ideais políticos e estratégicos do
Estado em estudo. Visto que a saída para o oceano é de extrema importância para o Estado,
pelo facto de proporcionar acesso as grandes rotas oceânicas, fundamentais para o seu maior
desenvolvimento, as fronteiras terrestres além de apresentar algumas ameaças também
apresentam vantagens delineadoras para o estado em questão.

3
Querendo fazer uma análise geopolítica de Angola no continente Africano levantamos a
seguinte questão:

 Como o Mar pode influenciar na afirmação do Estado angolano no continente


africano?
Nesta senda de pensamentos é necessário ressaltar que os Estados que dispõem tanto de linhas
periféricas marítimas e terrestres têm a maior oportunidade de economicamente e
politicamente evoluírem.

1.3. Formulação das hipóteses

 Angola ao apostar no Mar estará a investir no seu reposicionamento na senda


internacional de influência de poderes;
 O combate à insegurança marítima contribui para o melhor posicionamento
geoestratégico no âmbito regional e consecutivamente no melhor aproveitamento
económico e científico do mar;
 A edificação de uma Economia do Mar deve ser conduzida de forma gradual e
planeada e alicerçada em apoios internos e apoios externos e coordenada pelos
decisores políticos.

1.4. Objectivos

1.4.1. Objectivo geral


 Compreender o mar enquanto factor de afirmação de Angola no continente Africano.

1.4.2. Objectivos específicos

 Mencionar os factores geopolíticos que influenciam no posicionamento do mar como


factor de afirmação de Angola;
 Analisar as ameaças geopolíticas do mar em Angola, no continente Africano;
 Identificar as ameaças e oportunidades geopolíticas que o mar oferece a Angola.

4
II. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1. Geopolítica, conceitos, utilidade e natureza

2.1.1. Conceito

A Geopolítica é um campo de conhecimento multidisciplinar, isto é, não se identifica com


uma disciplina única. Ela serve-se de várias disciplinas tais como a teoria Política, a
Geografia e outras ligadas as ciências sociais e Humanas. A geopolítica considera a relação
entre processos políticos e características geográficas, localização, território, posse de
recursos naturais, contingente populacional nas relações de poder entre os Estados e entre o
Estado e a sociedade.

O termo Geopolítica1 nasceu no início do Século XX. Embora não haja acordo em relação á
data em que foi estabelecido, existe concordância de que o mesmo é de autoria do jurista e
cientista político sueco Rudolf Kjellén (1864-1922), inspirado pela obra de Friedrich Ratzel
denominada politische Geographie (Geografia Politica, 1903). Nessa altura, Kjellen (1908)
definiu-o como sendo “A teoria do Estado enquanto organismo geográfico, enquanto
fenómeno no espaço, isto é, enquanto pais, território, solo ou, de maneira caracteriza,
império”2

Tal é a variedade de definições para o termo, assim como as diferentes concepções em relação
ao mesmo que o cientista político Hans Weigert (1896-1967)3, afirmou que “não existe algo
como ciência geral da geopolítica, que possa ser subscrita por todas as organizações estaduais
(...) cada nação tem a geopolítica que pretende (...)”.

Assim sendo, este texto apresenta várias definições que ao longo do tempo foram
apresentadas para o conceito de Geopolítica, algumas das quais díspares. Para o cientista
Pierre Gallois (1990)4, a Geopolítica é o “estudo das relações que existem entre a condução da
política de um Estado levada ao plano internacional e o quadro geográfico em que ela se
exerça”.

1
1908
2
Rudolph KJELLÉN, o Estado em forma de vida, 1916., publicado pela primeira vez em 1908.
3
Alemão, Professor Emérito da Universidade de Georgetown, nos EUA, e autor de vários livros dos quais é mais
célebre «General sand Geographers: The Twilight of Geopolitics» Hans WEIGERT, General sand Geographs:
The Twiligth of Geopolitcs (Oxford Univeristy Press, 1942).
4
Italiano, General de Brigada da Força Aérea Francesa e geopolítico. É considerado o “ pai da bomba atómica
francesa” devido á sua acção para a sua consecução.
5
Neste quadro, para Gallois, a Geopolítica tinha somente um âmbito internacional. Porém,
como dizia Karl Haushofer (1931), “a Geopolítica preocupa-se com a mudança e o conflito, a
evolução e a resolução, o ataque e a defesa, a dinâmica dos espaços terrestres e as forças
politicas que nele lutam para sobreviver” 5 , não sendo portanto algo somente referente ao
âmbito internacional.

Por sua vez, para o sociólogo e geógrafo brasileiro Demétrio Magnoli (1986), a Geopolítica é
a «ciência que concebe o Estado como um organismo geográfico ou como um fenómeno no
espaço».6

É importante referir que a Geopolítica pode ser estudada no quadro geral da ciência teórica e
no quadro particular de ciência aplicada

Deste modo, enquanto ciência teórica, a Geopolítica constitui uma disciplina da ciência
Política, podendo entender-se como «o estudo dos processos políticos que ocorrem em
dependência do solo dos Estados»7. De outro modo, enquanto ciência aplicada, a Geopolítica
pode ser orientada para o sector determinado. Neste quadro entendem-se as teorias sobre os
meios de circulação, designadamente a Teoria do Poder Marítimo (Mahan), a Teoria do poder
Terrestre (Mackinder) e a Teoria do Poder Aéreo (Seversky). Neste mesmo quadro pode
empregar-se a Geopolítica no estudo de um Estado, um continente ou um conjunto de
Estados.

Para Moori-Koenig (1951), a Geopolítica supõe que a instabilidade é o princípio fundamental


das relações internacionais, dado que a Geografia é o factor menos variável dos que afectam a
realização de toda a política, desate modo, os conflitos que têm origem nos factores
geográficos nunca desaparecem da História e se reproduzem em diversas circunstâncias.

No quadro deste pensamento, Everardo Backheuser (1942) referiu que «convém que o
político não esqueça nunca a nação não vive só e isolada no mundo, tendo, ao contrário, as
contingências da sua vida e do seu desenvolvimento condicionados pelo progresso e pelas
pressões de outros povos da Terra. Para prover, pois, as necessidades do povo do seu pais, ele
precisa conhecer muito bem os outros Estados, e as respectivas organizações sociais. O estudo
de cada política nacional terá de ser feito sempre á luz da política internacional dominante.

5
MARINI, El Conocimiento Geopolitico, 1985
6
Demétrio MAGNOLI, O que é Geopolítica (S.Paulo, Brasil:Brasiliense, 1986)
7
TOSTA, Teorias Geopolíticas, 1984,28.
6
2.1.2. O âmbito da geopolítica

O estabelecimento da Geopolítica como área de estudo específica suscitou o aparecimento de


correntes de estudo, também denominadas «escolas geopolíticas» que passaram a discutir os
atributos que caracterizavam a nova disciplina, designadamente a sua eventual independência
ou integração numa das disciplinas já existentes apontava-se a geografia, e o seu âmbito e
campo de aplicação.

Neste quadro a “escola de Munique”, uma das correntes precursoras da Geopolítica, cujo
principal mentor foi o general e doutor em Geografia, História e Geologia Karl Von
Haushofer (1869-1946), definiu-a como a ciência das relações de âmbito mundial dos
processos políticos. Está baseada nos amplos conhecimentos de geografia, especialmente a
Geografia Politica (...). Ela propõe-se oferecer as armas para acção política e os princípios
para a vida política (dos Estados)8como conjuntos9.

Como se denota da acepção que a Escola de Munique atribui á Geopolítica, ela colocava-o no
campo das Ciências Politicas_ prontamente afastando-a da esfera da Geografia_ expunha a
possibilidade do seu uso criativa_ como arte_ ao referir-lhe a pretensão de proporcionara as
armas para a acção política (dos Estados) e os princípios para a vida política como conjunto».

Ainda em relação ao âmbito da Geopolítica, noutro momento, a Escola de Munique procurou


esclarece-lo ao referir que: «a Geopolítica preocupa-se com a mudança e o conflito, a
evolução e solução, o ataque e a defesa, a dinâmica dos espaços terrestres e as forças politicas
que nele lutem para sobreviver (Marini, 1985). Assim mesmo, Hermann Lautensach (1928),
um dos redactores da revista da Escola de Munique, num artigo intitulado «Geopolititik und
Schule» (Geopolítica na Escola), esclareceu a Geografia politica tem por objecto as formas do
ser estaduais e adopta uma perspectiva “estática”, a Geopolítica interessa-se pelos processos
do passado e do presente, e está imbuída de uma perspectiva “dinâmica”».

Como antes foi referido, a Geopolítica é multidisciplinar, porque se serve de várias disciplinas
da ciência, assim:

 Na política internacional, busca as relações entre Força e Poder;

8
.Acrescenta-se o termo porque se considera que ajuda a compreensão do pensamento.
9
.MARINI, El Conocimiento Geopolítico,1985.
7
 Nas Relações Internacionais, busca a verdadeira estrutura do Sistema Internacional e o
equilíbrio de forças existente, de modo a permitir ressaltar as reais motivações dos
Estados;
 Na História, tenta perceber as razões do Estado.

2.1.3. A Finalidade da geopolítica

A Geopolítica serve o objectivo de obter conhecimentos ou soluções de carácter politico


relacionadas com determinado espaço territorial - o espaço Geopolítico.

Segundo José Nogueira (2011), a Geopolítica é «o uso da geografia pela internacionalidade


politica)10.

Em resumo, nos termos deste texto, a Geopolítica é «a ciência (natureza) que estuda as
mutuas relações, influencias e acções entre o Estado e o espaço (objecto), para obter
conhecimentos ou soluções de carácter politico (finalidade)».

Deste modo, a Geopolítica encontra-se como aplicações a:

 Compreensão da organização e da definição do espaço;


 Orientação na definição das Estratégias Globais;
 Determinação do significado das regiões;
 Determinação das tendências de evolução das regiões;
 Análises perspectivam e prospectivas de factores e contextos geopolíticos.

O «Espaço Geopolítico» assume a categoria de império (Kjellén); dimensão em que ocorrem


mudanças, conflitos e as forças políticas lutam para sobreviver (Escola de Munique); ou
âmbito no qual traçam linhas de acção Politicas (Golbery Silva, 1967).

Segundo Fernando Solano Costa (1913-1992), o «Espaço Geopolítico» é «aquele em que se


desenvolve a politica na sua plenitude integral, trata-se das jurisdições territoriais dos Estados,
ou do âmbito onde o Estado pretende entender a sua influência». Assim, não correspondendo
á jurisdição territorial do Estado11, ele apresenta-se como área politica por excelência, sobre a

10
Citado por Korinman, 1990.
11
A independência dos Estados que cada vez mais se multiplica, elimina as possibilidades de isolamento dos
fenómenos, especialmente os geopolíticos, embora não impeça o seu tratamento sectorial. Assim o espaço
geopolítico pode corresponder a um Estado, mas também á uma região deste, a um território integrado vários
Estados, ao globo terrestre, ou a algum elemento com significado geopolítico, por exemplo: acidentes
geográficos, água, submarinas, etc. (Marini.1985).
8
qual se aprecia o passado e em relação ao qual se projecta uma intenção politica no futuro,
isto é, sempre em função de um interesse politico cujo protagonista é o Estado.

Desde o ponto de vista do desenvolvimento teórico da geopolítica, Rudolf Kjellén (1864-


1992) foi o primeiro a aplicar o Método da Geopolítica, ao procurara uma ciência que
explicasse o Estado em todas as suas manifestações, ou seja: império, território, economia,
sociedade e população.

2.1.4. Os termos (próprios) da geopolítica

Como qualquer outra ciência, a Geopolítica possui termos próprios que embora possam ser
empregues fora dela, tais surgiram e representam algo especifico, isto é, têm um significado
específico (único). Para a geopolítica tais termos são por exemplo: espaço geopolítico; espaço
vital; sentido de espaço; área pivot; talassocracia; possibilismo humano; determinismo
geográfico.

“Não existe algo como uma ciência geral da geopolítica, que possa ser subscrita por
todas as organizações estaduais. Há tantas geopolíticas; quantos os sistemas
estaduais em luta sob condições geográficas, as quais, no caso do Poder marítimo e
do poder terrestre são fundamentalmente diferentes. Há Uma “Geopolitik”, uma
“geopolitique”(...) cada nação tem a geopolítica que Pretende (...) Assim sendo,
temos de olhar para a geopolítica alemã como Produto de um povo envolvido numa
luta pelo domínio mundial” ( HANS WEIGIRT 1942 pag.22-23 )12

A afirmação de Hans Weigert tem razão de ser se considerar que, por um lado, a Geopolítica
pode ser estudada como ciência aplicada e, por outro, porque buscando fundamentos para suas
ideologias, os teóricos podem direccionar o seu tratamento como aconteceu com a Alemanha
nazista, por exemplo. De igual modo, explica a afirmação de Weigert o facto da Geopolítica,
ao apresentar-se simultaneamente como ciência e arte, pode ser aplicada de forma criativa.

2.1.5. Geopolítica na perspectiva de Friedrich Ratzel (1844-1904) –O espaço vital

Entre os teorizadores geopolíticos destaca-se naturalmente Friedrich Ratzel pelo seu papel
preponderante entre aqueles. Ele não só foi o primeiro Geopolítico moderno, mas o primeiro a
formular uma doutrina geopolítica de âmbito global. Assim, Ratzel é um dos precursores do
que hoje se designa Geopolítica. Por outro lado, Ratzel destaca-se também com «teorizador

12
Hans Werner Weigert, Generals and Geographs: The Twilight of Geopolitics (Oxford University Press,1942),
22-23.
9
do poder nacional», porque as suas teorias serviram de retaguarda ideológica ao carácter
expansionista da política nacional da Alemanha do último quartel do século XX.

Através das suas teorias, Ratzel explicou a cultura política em função do meio físico,
sistematizando o estudo das influências ambientais no poder nacional, estando na origem da
corrente determinista na Geopolítica.

Nascido em Karlsruhe, ao 30 de Agosto de 1844, viveu até 1904. Diplomado em filosofia pela
universidade de Heidelberg, no ano 1868, estudou ciências naturais, e Geografia em
Karlsruhe, Heidelberg e Montpellier. Grande estudioso, viajou pela Itália, Hungria, Estados
Unidos da América, México e Cuba. Como jornalista político colaborou no «Kolnischer
Zeitung» e dirigiu a sua relação do Estrangeiro. Friedrich Ratzel fundou a «Biblioteca dos
Manuais Geográficos» e escreveu várias obras das que, para além das mais conhecidas:

 Anthropo geographie (Antropogeografia) - 2 volumes; 1ªEd. 1882-1891;4ª Ed. 1921-


1922.
 Politische Geographie (Geografia Politica) - 1ª Ed. 1897; 2ª Ed. Revista 1903.

Nas suas teorias, Ratzel defende:

A existência de dois elementos básicos para afirmação de um Estado territorial, a saber:


espaço (raum) e posição, sendo o «espaço» caracterizado pela área total do Estado, a sua
extensão, as suas características físicas: o clima, o relevo, a forma, a hidrografia e a
vegetação. Para Ratzel, o espaço é um dos factores determinantes do poder do Estado, que
permite qualificá-lo, sendo por isso a ambição máxima de um povo. Por outro lado, a posição
fornece coordenadas de localização do Estado face aos outros, as suas referências geográficas,
os acidentes geográficos, fornecendo dados importantes como a insularidade e
continentalidade, permitindo criar e estudar o seu ratio. Para Ratzel, a posição diferencia os
povos em relação a sua maneira de estar, sendo assim um factor da história humana e
produziria efeitos diferentes conforme o estágio de desenvolvimento vivenciado pelas
sociedades no momento em que ocorria. Pois «povo que progride expande, difundindo sobre
as sociedades que subjuga o germe civilizatório que impulsionou seu acto». A isto Ratzel
chama de «Raum seen» (sentido de espaço) que, também explicou, pode manifestar-se de
forma diferente nos líderes recém- adquiridos. Deste modo, o êxito na conquista e dominação
do espaço depende da visão do domínio do espaço por parte dos estadistas e da mobilidade e
adaptabilidade do povo;
10
O «espaço vital» como necessidade territorial de uma sociedade, tendo em vista o seu
equipamento tecnológico, a sua demografia e a disponibilidade de recursos naturais. Isto é, a
necessidade de uma relação de equilíbrio entre a população e os recursos disponíveis, assim
como a porção de território necessária a sua produção, ou seja, á sua realização como ser
político.

Como resumo da sua teoria, o mundo conhece o que se designa como «os postulados de
Ratzel», ou também «Leis do crescimento espacial dos Estados» e «Leis dos espaços
crescentes», publicadas pela primeira vez em 1895 em «Petermanns Mitteiluge», a saber:

 O espaço é factor primordial de poder, a necessidade de Espaço cresce com a cultura


do Estado;

Backheuser denomina a esta lei do nível cultural e aplica-a através das seguintes redacção «A
velocidade de dilatação de um Estado e a importância do seu tamanho é função do nível de
cultura da época»;

 O crescimento dos Estados segue outros sintomas de desenvolvimento de ideias,


produção comercial, a actividade missionária, etc. Esta «Lei da Penetração Pacífica»,
segundo Backheuser, corresponde a ideia que: a penetração pacifica será tanto mais
frutuosa para o Estado conquistador quanto menor o nível de cultura do pais
conquistado;
 O crescimento dos Estados processa-se pela amalgamação e absorção de unidades
menores, em regra, uma após outras. Backheuser denomina-a «Lei da assimilação»;
 A fronteira é o órgão periférico do Estado e, com tal, é o indício do crescimento da
força e das modificações deste organismo;
 Em seu crescimento os Estados tendem a absorver valiosos sectores políticos,
designadamente: litorais, leito de rios, planícies, regiões ricas em recursos.

Em Geografia Politica (...) Arthur Dix explica esta tendência pela aspiração de:

a) Controlo da totalidade de uma bacia hidrográfica;


b) Obter saída para o mar;
c) Possuir vários acessos ao mar;
d) Controlo da margem oposta;
e) Controlo do cruzamento das grandes rotas comerciais.

11
 O primeiro impulso para o crescimento territorial chega aos Estado primitivo de fora,
de uma civilização superior;
 Grande território incita á expansão. A tendência para anexar novos territórios (e
posteriormente assimilá-los) cresce á proporção que novas aquisições são feitas; e
realizadas estas, aumenta a intensidade dos novos impulsos de conquista.

Ao comentar esta lei, Ratzel afirmou que «Neste pequeno planeta só há espaço suficiente para
um único Estado».

2.1.6. Geopolítica na perspectiva de Rudolph Kjellén (1864-1922) o organicismo

Rudolph Kjellén é aceite como sendo o criador do termo Geopolítica, embora não haja acordo
em relação á data em que o mesmo foi pela primeira vez utilizado, variando, segundo autores,
entre o ano 1899 e o ano 1900.

Tendo nascido a 13 de Julho de 1864, em Skaraborg (Suécia) Kjellén recebeu o título de


doutor em filosofia no ano 1890, passando, no ano seguinte, a leccionar a cadeira de
Geografia na Universidade de Gotemburgo, onde em 1901, obteve o grau científico de
Doutor. No ano 1916 recebeu o título de Professor em Retórica e Ciências Politicas pela
Universidade de Uppsala.

Teve influência nas suas ideias geopolíticas, o facto de ter sido um político activo,
designadamente membro da câmara de Deputados (1905-1908) e do Senado (1909-1917) da
Suécia. De particular realce nesta altura é o facto do país encontra-se profundamente dividido,
debatendo-se entre a conservação oi dissolução da União Suécia-Noruega, que acabou por
acontecer em 1905.13

Uma análise da História da s humanidade permitiu a Kjellén apreciar que desde a antiguidade
(ferindo a Aristóteles), passando pela renascença (referindo Maquiavel) o Estado tinha sempre
concebido como um “ente de Direito”, isto é, como “República”, o que deixava de ser válido
na nova era, quando já se aceitava a ideia da existência de um “poder do Estado” que umas
vezes dilatava e outras se comprimia, afectando mais ou menos os interesses e a liberdade
individual dos cidadãos.

13
A união tinha ocorrido no fim das guerras napoleónicas (1814), como compensação territorial á Suécia pela
perda da Finlândia para a Rússia Czarista (1808)
12
Na continuação do estudo, Kjellén verificou ainda que o Estado, para além da sua acção
Jurídica também exercia actividade económica e social e que, uma precisão a partir de fora da
sua relação com os outros Estados, punha-lhe de manifesto outros elementos constituintes,
tais como “o território” do Estado, delimitado pelas suas fronteiras e referindo o País; o”
povo” com determinados costumes, e referido como “nação.” Deste modo, conclui o conceito
“Estado” encerrava vários elementos, designadamente: “País”, que dá fundamenta ao Estado;
“Povo”, como seu correspondente nação; algo mais vasto e profundo, como: poder (militar e
económico); o seu governo (república, monarquia, parlamentarismo) e s sua sociedade.

Esta realidade, junta ao facto de, como também fez notar, a perfeita definição de um Estado
decorrer também das suas componentes históricas, isto é, um contexto que abriga razões de
orem cultural, social e psicológica, levou Kjellén a considera que o seu tratamento, pela
amplitude, ultrapassava quer a Geografia, quer a etnografia (pois um Estado é mais do que um
país e povo), sendo tarefa dos especialistas da ciência politica.

Octávio Tosta (1984,p.17) “Não podem compreender bem o Estado quando o imaginamos
teoricamente”.

Kjellén (1905) conclui que os Estados são “formas de vida”, sendo por isso apontado como
“organicista”, ao reconhecer nas potencias da sua época fenómenos biológicos latu sensu”,
pois, valendo-se das próprias forças e beneficiadas por determinadas circunstancias, “ vivem
em permanente competição, lutando pela existência e estabelecendo, de modo claro, uma
selecção natural, os Estados vivem de facto dobre a terra, pois vemo-los nascerem, crescerem,
entrarem em decadência e morrerem”.

Em, “o Estado como forma de vida”, Kjellen defendeu que o Estado age por impulso orgânico
e manifesta a perda de vidas humanas do que a perda de território, porque possui um núcleo
territorial fixo o País do qual não se pode separar ou desligar, sob pena de sucumbir. O estado
é” Direito por dentro”, isto necessita de uma organização e disciplina internas, onde
predomina o aspecto jurídico; e “ Força por fora”, ou seja, recorre á força para defender
interesses vitais, embora reconheça o Direito Internacional como lei geral. De igual modo
defendeu o Estado, enquanto “individuo geográfico”, prevalece sobre a “nação”- “individuo
étnico”, sendo este a sua morada; o Estado” joga um super jogo num super tabuleiro com os
outros Estados (Super seres), sofre, tem tendência para a procriação, sendo as colónias os seus
filhos”.

13
Partindo dos 5 elementos que considera serem formadores do Estado, a saber: Território,
Povo, economia, Sociedade e governo, Kjellén sistematizou a política em 5 ramos diferentes:

 Geopolítica, cujo objecto de investigação é o território com organização politica;


 Demo politica, que tem por objecto de estudo o povo e as raças, as suas relações
politicas.
 Sociopolítica estuda os factores sociais, ou a estrutura da própria sociedade;
 Eco política estuda os factores do património natural e bens da sociedade
 Craptopolitica, estuda as questões de governo e de administração designadamente as
questões relativas ao regime politico e as manifestações de soberania.

Ainda segundo Kjëllén, a interpretação dos fenómenos políticos influenciados pelos factores
geográficos se daria sob três enfoques:

 Topolítica: influência da posição do espaço físico;


 Morfopolítica: influência da forma e da extensão do território;
 Fisiopolítica: influência das riquezas naturais contidas nesse espaço.

A teoria de Kjellén. Enunciada através dos seus postulados, pode basicamente resumir-se no
seguinte:

a) Estados vitalmente fortes, com áreas de soberania limitada, são dominados pelo
categórico imperativo político de dilatar os seus territórios, pela colonização, pela
união com outros Estados ou pela conquista.
b) Aos Estados pequenos parece reservada, no mundo da política internacional, sorte
idêntica à de povos primitivos no mundo da cultura; são repelidos para a periferia,
mantidos em áreas marginais ou em zonas fronteiriças, ou desaparecem.
c) Quanto mais o mundo se organiza, mais os vastos espaços como Estados grandes,
fazem sentir a sua influência e, quanto maior o desenvolvimento dos grandes Estados,
menor a importância dos pequenos.

2.1.7. Conceitos de estratégia

A palavra Estratégia vem do grego estratégia que significava direcção de uma expedição
armada.

14
Para Silva Ribeiro (2012) esta disciplina pode ser considerada enquanto arte e ciência, arte
pela sua aplicação e ciência pelo estudo de um objecto preciso, passível de uma análise e
respectiva investigação, onde ferramentas práticas e teóricas podem ser aqui integradas. Para
este autor, a Estratégia é a arte de edificar, dispor e empregar meios de coacção num dado
meio e tempo, para se materializarem objectivos fixados pela política superando problemas e
explorando eventualidades em ambiente de desacordo. O estudo desta área foca-se no estudo
da Guerra e sua arte, cujas conflitualidades ou modalidades de acção assumem um papel
fulcral. Esta disciplina assume um papel direccionado, com uma ênfase no processo, sua
criação, e respectiva gestão. Podendo ser empregue nas mais variadas áreas, o seu estudo
passa pela análise das envolventes, ou análise SWOT, onde o auto conhecimento é
imprescindível, através da análise interna, levando-nos aos pontos fortes (Strengths) e pontos
a melhorar as Fraquezas (Weaknesses) na própria organização, para passarmos à envolvente
externa com uma caracterização das oportunidades (Oportunities) e respectivas ameaças
(Threats).

Para falarmos em Estratégia, temos de referir a Arte da Guerra de SunTzu, pela sua
teorização no século IV A.C., considerado por Samuel B. Griffith o primeiro “clássico
marcial”. Aquele autor é encarado como percursor das actuais correntes de pensamento
estratégico, onde o culminar das Operações Baseadas em Efeitos, assumem um papel
fundamental no actual estado da arte militar.

O General Cabral Couto (1988) define estratégia como ciência e arte de devolver e utilizar as
forças morais e matérias de uma unidade política ou coligação, alem de se atingirem
objectivos políticos que suscitam, ou podem suscitar, a hostilidade de outra vontade política.

Carl Von Clausewitz (1780-1831), numa perspectiva puramente militar, na obra da Guerra
(1819) definiu Estratégia como “ a teoria relativa á utilização dos combates ao serviço da
guerra”.

A apreciação das várias formas de apresentação do conceito de Estratégia e, particularmente a


reflexão de Joly de Maizeroy (1719-1780)14, mostra principalmente que ela esta relacionada
com as vias, meios e procedimentos para empregar as forças de uma unidade politica (nação
ou coligação) para atingir “os objectivos políticos nacionais e multinacionais que suscitam,
ainda que potencialmente, a hostilidade de uma outra vontade politica. ”

14
Junta de chefes de Estado-Maior dos EUA, 2010.
15
Com efeito, Maizerony afirma que:

“Fazer a guerra é reflectir, combinar ideias, prever, raciocinar profundamente e


empregar meios. Destes uns são directos e outros indirectos; estes últimos são em
número elevado, que englobam quase todos os conhecimentos humanos. Eles
servem de ajuda e de guia aos primeiros, que são as tropas, as armas e as máquinas.
Os meios directos devem ser movimento, de força e de resistência, cuja resultante
determina as proporções adequadas e a melhor forma possível. A conduta da guerra
é a ciência do general, a que os gregos chamaram estratégia, ciência profunda, vasta,
sublime que engloba muitas outras” (Charnay,1990, p.58)

2.1.8. Geoestratégia

A Geoestratégia é apresentada como um subcampo da Geopolítica15, que estuda os objectivos


de política que suscitam o antagonismo.

Tendo Hans Weigert (1942) definido a Geopolítica como “ geografia aplicada á politica de
poder nacional e á sua estratégia de facto, na paz e na guerra” e Spykman que ela
correspondia ao “planeamento da política de segurança de um país em termos dos seus
factores geográficos”, este último sentenciou que “ da análise dos factores geográficos será
possível considerar os problemas da segurança em termos geográficos, de tal maneira que as
conclusões a que se chegue sejam de uso direito e imediato para os homens de Estado
encarregados de formular a politica exterior”.

Deste modo, ao estabelecer as directrizes de uma política de segurança nacional fundada nos
factores geográficos, Spykman, Weigert e outros estudiosos norte-americanos tratam de
geoestratégia.

Como pode se ver então, se a Geopolítica tenta perceber as motivações políticas do Estado
tendo por base os condicionamentos e imperativos geográficos, a Geoestratégia assenta nos
mesmos imperativos, mas considera os objectivos antagónicos para aplicação a Estratégia.

Segundo Couto (1988) a Geoestratégia poderá ser definida como sendo “ o estudo das
constantes e das variáveis do espaço acessível ao homem que, ao objectivar-se na construção
de modelos de avaliação e emprego, ou ameaça de empregos, das formas de coacção, projecta
o conhecimento geográfico na actividade estratégica”.

15
Por exemplo Pierre Célérier considerava a geoestratégia como irmã mais nova da geopolítica pois, segundo ele,
ao estudar a relação entre os problemas estratégicos e os factores geográficos, a geoestratégia debruçava-se
essencialmente sobre os mesmos factores que desempenhavam um papel em geopolítica. Pierre CÉLÉRIER,
geopolitique et Geoestratégie, Que Sais-je (PUF, 1969), 16-17.
16
Ao ser apreciada como ou também como auxiliando a estratégia na definição dos cenários e
na escolha e caracterização das modalidades de acção estratégica, a Geoestratégia é entendida
por muitos como que “ uma derivação da geopolítica aplicada a estratégia”.

2.1.9. Factores geopolíticos

Factores geopolíticos/geoestratégicos são “um conjunto de agentes, elementos,


condições ou causas de natureza geográfica, susceptíveis de serem operadas no
levantamento de hipóteses para a construção de modelos dinâmicos de interpretação
da realidade, enquanto perspectivação consistente de apoio à Politica e a Estratégia”.
(IAEM, 1993,p.17)

Com a evolução científico-tecnológica dos últimos anos e a complexidade das diversas


variáveis que passaram a influir na aplicação do poder, elementos básicos tornaram-se
importantes para uma análise geopolítica inicial dos Estados, mostrando a tendência de suas
decisões.

Elementos da geopolítica

 Tendência dos Estados face às condições geográficas;


 Forma dos territórios dos Estados;
 Posição dos territórios dos Estados;
 Linha periférica do território dos Estados.

Tendência dos Estados face as condições geográficas Entenda-se como as melhores condições
geográficas do Estado ou a sua tendência de possuí-las politicamente, facilitando as suas
relações com o resto do mundo.

A forma do território de um Estado é o espaço geográfico que ocupa, limitado pelas suas
fronteiras, existindo formas mais favoráveis à coesão e à defesa, outras menos favoráveis e,
outras, ainda, desfavoráveis, possibilitando cisão ou desarmonia, assim como dificultando a
defesa. Há dificuldade muito grande em se padronizar a classificação dos Estados pela sua
forma, tendo em vista as mais diversas formas territoriais existentes.

Para facilitar esta identificação nos seus estudos de Geopolítica, Renner estabelece quatro
formas básicas, as quais devem enquadrar todos os Estados, ainda que por aproximação. É
uma metodologia simples e plenamente aceite. São elas: Forma compacta, Forma alongada,
Forma recortada e Forma fragmentada.

17
Forma compacta Esta forma é a mais favorável à coesão do Estado pelo seu centripetíssimo
cultural e político-administrativo; favorece, ainda, um crescimento económico mais
equilibrado pela maior facilidade no intercâmbio comercial interno, facilitado pela circulação
interna; contém uma maior área concentrada dentro de um mesmo perímetro, além de suas
fronteiras estarem também relativamente equidistantes do centro, favorecendo suas acções de
defesa.

Quanto à posição do Estado, a Geopolítica não se prende somente à localização do seu espaço
físico no planeta, definido por coordenadas geográficas, que acarretam consequências do
ponto de vista climático, de habitabilidade e de recursos naturais, e até criando predestinações
polémicas para os Estados. Leva em consideração também e principalmente a sua situação no
âmbito mundial, no espaço regional e no relacionamento inter-regional.

2.1.10. Linha periférica

“Linha periférica do território de um Estado”, mais conhecida por fronteira, é a demarcação


dos limites do Estado, sejam terrestres, marítimos ou aéreos, até onde o mesmo exerce a sua
soberania.

Segundo Ratzel, na sua “Lei de Ratzel”, também conhecida como “Lei da Fronteira Faixa”, “a
faixa fronteiriça é o real, a linha é uma abstracção, meramente simbólica”.

Segundo Kjëllén, “a epiderme do Estado”. Já para Sieger, na sua “Lei de Sieger” ou “Lei da
Artificialidade das Fronteiras”, “as fronteiras, mesmo as chamadas naturais, são resultados de
convenções (normalmente bilaterais) ou de imposição (unilaterais) ”, e ainda, “não há
fronteiras naturais nem artificiais: todas são convencionais”.

Pascal Boniface (2010), no seu dicionário de relações internacionais define assim a fronteira:

 Uma fronteira é uma linha imaginária a separar dois estados, delimitando dois
campos distintos de soberania.
 Uma fronteira nas relações internacionais, pode ser analisada como um limite a
partir do qual se exercem as principais funções de um Estado.

2.1.11. O poder marítimo na perspectiva de Alfred Thayer Mahan (1840-1914)

Para Mahan, quanto maior o poderio marítimo de um país, maior seria o seu poder efectivo e
o seu impacto no Mundo. Grande estudioso da História, procurava nesta resposta a origem do
18
grande poderio dos povos, e foi sob a sua influência que os Estados Unidos investiram e se
tornaram um poder marítimo.

As suas teorias foram, em parte, confirmadas para muitos, pela I Guerra Mundial e pela forma
como os países com maior marinha venceram a Guerra. Para alcançar este poderio, Mahan
estabeleceu linhas de planeamento para os governos, tanto em paz, como em guerra. Em caso
de paz um bom investimento numa marinha mercante, numa boa rede de trocas comerciais
marítimas iria estabelecer uma marinha e uma esfera de influência forte e alargada. Para a
guerra, e como preparação para ela, o Governo teria todo o interesse em ter e manter não só
uma boa Marinha, diversificada para todas as ocasiões, bem como um bom número de
homens prontos a entrar em combate. Mahan afirma também que colónias geograficamente
posicionadas em sítios estratégicos são uma enorme mais-valia, se bem que para ele seria
pouco provável que os Estados Unidos viessem a ter tais colónia.

Segundo Philippe Defarges (2012, p.49)” Quem dominar os oceanos domina o mercado
mundial, quem dominar o mercado mundial, domina as riquezas mundiais, quem for o senhor
das riquezas mundiais, domina o próprio mundo”.

O poder marítimo, esse foi definido por Mahan, conforme a citação de Geraldes. Como “a
soma de forças e factores, instrumentos e circunstâncias geográficas, que cooperam para
conseguir domínio do mar, garantir o seu uso e impedi-lo ao adversário” (1982, p.72.)

Para Mahan o poder marítimo depende da conjugação de seis condições que ele sistematiza de
uma forma que podemos assim enunciar:

 Posição geográfica: vantagens proporcionadas pelo posicionamento face às grandes


rotas de navegação, pelo fácil acesso aos oceanos e pelo controlo dos canais, estreitos
e principais zonas marítimas;
 Configuração física do território: o recorte da Costa, a quantidade e a profundidade
dos estuários dos rios, as facilidades para o contacto das populações com o mar.
 Extensão do território: é uma condição que se pode ser associada á anterior, o que leva
a que, por vezes, se enunciem apenas cinco condições, mas esta refere-se, no essencial,
á dimensão do seu litoral.
 Quantidade da população: a disponibilidade para conciliar as necessidades de
população para as tarefas em terra com a aventura do mar, a capacidade para

19
assegurara mão-de-obra e produzir riqueza sem a qual não é possível obter recursos
para o poder marítimo.
 Carácter nacional: estado de espírito e comportamento das populações na sua vocação
marítima e adesão a projectos marítimos.
 Instituições: tipo e competência dos governos, sua capacidade para corresponder á
vocação marítima das populações, sua continuidade ao longo dos tempos; neste
particular. Mahan terá cometido o pecado de lamentar que as democracias,
exactamente por não garantirem continuidade de poder, mão favorecem o poder
marítimo.

2.1.12. Poder e estratégia

Comecemos por registar que o termo poder, na sua aplicação específica de poder político,
aquele que aqui nos interessa, envolve alguma ambiguidade. Claude Raffestin (1980, p.42.)
“usa exactamente este termo, ambiguidade explica porquê (...) porque há poder e poder. Mas
o primeiro é mais fácil de localizar porque se manifesta através de aparelhos complexos que
dominam o território, controlam a população e dominam os recursos. É o poder visível,
maciço, identificável (...) mas os mais perigosos e o que não se vê, ou que já não se vê porque
se pensa ter-se desembaraçado dele.”

Raymond Aron (1962, p.58), cujo livro Paix et guerre entre les nations continua a constituir
uma base importante da nossa reflexão, diz que “ no sentido mais geral, o poder é a
capacidade de fazer, de produzir, de destruir”.

Mas se nos situarmos no âmbito político do seu significado, podemos distinguir três
patamares do poder:

 O primeiro é o simbólico e anímico; é ser poder; expressão do produto de uma vontade


por uma capacidade (ter exercer); é o patamar da soberania.
 O segundo é o institucional: é ter poder, expressão de uma autoridade dos órgãos de
soberania; é o patamar do Estado.
 O terceiro é o instrumental: é exercer poder, expressão de potencial, de uma
capacidade dos agentes do Estado; é o patamar da defesa nacional.

20
2.1.13. Poder e soberania

O poder, quando entendido no significado de soberania, não é algo de material, ainda que
dependa de factores materiais. Como gosta de dizer Adriano Moreira. «O poder não é uma
coisa, é uma relação» (Janeiro - Março 1991, p. 42),que é também o conceito de Aron (p. 58)
e é muito semelhante de Michel Foucault, citado por Raffestin «o poder é parte inseparável de
toda uma relação» (p.42).

Outro processo de caracterização do poder é consoante a intensidade. Esta pode ser através da
fórmula: P = C × V, em que:

 C representa a capacidade, isto é, o somatório de vários factores objectivos, que


podem ser ou não quantificáveis, nomeadamente factores físico-geográficos, humanos,
económicos, militares, institucionais, os quais, no seu conjunto, configuram o
potencial.
 V representa a Vontade, uma componente anímica e subjectiva, que inclui a vontade
própria, mas também a percepção que quer o outro, quer os aliados, recolhem dessa
vontade.

2.1.14. Poder e defesa nacional

Considera-se interesses nacionais os grandes desígnios que devem ser preservados e


salvaguardados para garantir a sobrevivência da nação.

É comum considerar os interesses nacionais comportam três grandes áreas: a segurança


nacional, o bem-estar e a justiça social. Há quem acrescente a propriedade, mas há também
quem admita que bem-estar, prosperidade e justiça social se confundem num só, bem-estar
que, se for entendido num sentido amplo e profundo para todas as pessoas e em todos os
domínios, incluirá prosperidade e justiça social.

É a segurança nacional que constitui o interesse directamente visado pela defesa nacional.

2.1.15. Cálculo do poder nacional

Se a defesa nacional, enquanto patamar instrumental do poder, é também expressão de


potencial e de capacidade, tem de haver formas racionais de cálculo ou de quantificação desse
potencial.

21
Um método clássico para a avaliação do potencial é a chamada fórmula do poder nacional de
Ray Cline, conforme artigo do autor publicado na revista brasileira Defesa Nacional (pp. 62 a
66), Pp= (C + E + M) × (S + W).

Em que:

 Pp é o poder percebido.
 C corresponde á massa crítica: população + território.
 E corresponde a capacidade económica.
 M corresponde a capacidade militar.
 S é o objectivo estratégico.
 W é a vontade de executar a estratégia nacional.

“A fórmula de Ray Cline é também apresentada por Virgílio de Carvalho em artigo na revista
Nação e defesa. Se bem que os termos sejam referidos com outras designações, o conteúdo da
fórmula é exactamente o mesmo (1989, p.82)”, Pn = Fm (G + E + M) × Fa(S + D), em que:

a) Pn é poder nacional
b) Fm é o factor material
c) G é o elemento geográfico
d) E é o elemento económico
e) M é o elemento militar´
f) Fa é o factor anímico
g) S é a qualidade de estratégia
h) D é a determinação do povo

2.2. Análise geopolítica e geoestratégica de Angola

“Diz-se que a grandeza de uma nação não se mede apenas pelas potencialidades dos
seus recursos naturais, mas também pela nobreza de caracter, pela atitude e pelas
competências dos seus cidadãos que são de facto a base dinamizadora desses
recursos”. José Eduardo dos Santos (Discurso de 26-09-2012)

Com recurso ao método do potencial estratégico, far-se-á de seguida a análise dos factores
físico, humano, recursos, circulação e, por último, o factor estruturas, (IESM, 2007),
procurando sintetizar aquilo que são as grandes potencialidades e as grandes vulnerabilidades.
Por não ter realce significativo, o factor tecnológico não será objecto de análise.

22
2.2.1. Factor físico

2.2.1.1.Potencialidades

A extensão do seu território, com capacidade de alojar uma elevada população e com espaço
de manobra e compartimentação do seu território, possibilitam condições favoráveis em caso
de defesa contra ataques convencionais, que podem ser potenciadas pela profundidade e
extensão, possibilitando o estabelecimento de zonas de refúgio numa estratégia de resistência,
contra um invasor externo. A variedade do seu clima, conjugada com a pedogénese 16 dos seus
solos, permitem-lhe tirar partido na exploração agro-pecuária, conjugado com a posse de
vastos recursos naturais (atlânticos e continentais) alicerçada pela sua extensa ZEE 17, poderão
contribuir para uma sustentabilidade diversificada. No quadro regional, a sua posição
geográfica de charneira, permite-lhe ocupar uma posição geoestratégica, influenciando
directamente nas regiões austral (anglófona) e central (francófona), bem como as rotas
marítimas do Atlântico Sul, conferindo-lhe uma vantagem significativa sobre os países
encravados (Almeida, 1990: 139), ocupando uma posição mista, simultaneamente continental
e marítima. A extensão da orla marítima, valorizada por excelentes baías, oferece óptimas
condições para instalações portuárias, possibilitando-lhe um franco domínio, sobre as
principais rotas comerciais e energéticas do Atlântico Sul.

2.2.1.2.Vulnerabilidades

A descontinuidade territorial, devido à localização de Cabinda, cria dificuldades naturais de


comunicação e a grande extensão das suas fronteiras terrestres, tornando-a permeável, com
particular incidência à região diamantífera, cumulativamente, associado aos conflitos
regionais que geram enormes massas de refugiados, obrigam a dispersar recursos, económicos
e militares. A localização numa região onde abunda uma grande variedade étnico-cultural
(aquém e além fronteiras) poderá conduzir a um choque de culturas e por consequência, de
tensões.

2.2.2. Factor humano

Para melhor compreender a análise do factor, destacaremos os seguintes:

16
Processo natural de formação do solo
17
Zona Económica e especial
23
2.2.2.1.Potencialidades

A taxa de crescimento humano de quase 3%, num futuro próximo, poderá constituir-se como
uma fonte importante de recursos humanos, ainda que não se constitua como factor de poder.
O elevado número de população jovem permite, nas próximas décadas, uma elevada
disponibilidade de mão-de-obra. O elevado índice de fecundidade, que assegurará a
continuidade de uma população jovem. A reduzida densidade populacional indicia o potencial
desenvolvimento da população angolana.

2.2.2.2.Vulnerabilidades

A assinalável taxa de fecundidade, associada aos índices de pobreza, aumentará os cerca de


70% da população que vivem na pobreza. A reduzida esperança média de vida não permite
rentabilizar em plenitude o recurso humano. A grande concentração em áreas urbanas indica
uma desigual distribuição pelo território, não potenciando os recursos humanos disponíveis,
provocando uma desertificação no interior e um foco constante de tensões nas zonas urbanas.
A elevada assimetria na distribuição da riqueza o que provoca grandes desigualdades e
tensões sociais, poderá originar conflitos.

A elevada taxa de analfabetismo, num país tão necessitado de conhecimento, contribuem para
a reduzida capacidade produtiva. As diversidades étnicas poderão constituir-se num factor de
tensão interna e comprometer a coesão nacional 18 , podendo levar a uma competição pelo
controlo do Estado.

A elevada densidade populacional na capital, com mais de dois milhões de habitantes numa
área de 3.000 Km2, provoca graves desequilíbrios sociais e ecológicos no sistema. Os fluxos
migratórios intra-regionais, motivadas pelos constantes conflitos, contribuem para o alicerçar
da pobreza, fomentar o crime organizado, agudizando as tensões sociais internas na disputa
pela subsistência.

18
Os dois contendores e actores da guerra civil em Angola eram apoiados, na generalidade, por etnias
diferentes entre si.
24
2.2.3. Factor recursos

2.2.3.1.Potencialidades

Os recursos energéticos (petróleo, gás natural e energia hidroeléctrica) de Angola, são


estratégicos. A quantidade e qualidade do petróleo constituem um motivo de disputa de
muitos países e companhias internacionais. Com uma produção em crescente sucessiva,
Angola afirma-se como o segundo maior produtor da África Subsariana, com um diferencial
mínimo relativamente à Nigéria. As mais recentes descobertas deste recurso poderão permitir
um aumento da produção nos próximos anos.

O mercado americano, chinês e europeu representam os principais importadores deste recurso.


O gás natural, actualmente potencia a balança dos hidrocarbonetos, prevendo-se que as
reservas existentes permitam a exploração nas próximas três décadas. Igualmente, a sua
potencialidade hidroeléctrica, permitir-lhe-ão, sem acrescidas dificuldades, tornar-se um dos
principais, se não o principal, exportador de energia hidroeléctrica para a África Subsariana.
Neste capítulo, não nos podemos esquecer do biocombustível, sendo previsível que Angola,
pelas potencialidades agrícolas, se torne num dos mais importantes produtores de todo o
continente africano.

Com isto contribui não só para a “saúde do planeta”, mas para a diversificação do seu
potencial energético, diminuindo igualmente as importações de açúcar. Os recursos minerais
de Angola constituem inegavelmente uma potencialidade, muito embora não totalmente
conhecida, que para além do factor económico, permitem empregar um número significativo
de mão-de-obra. O seu desenvolvimento económico e social poderá, em parte, ser construído
com base nas suas riquezas minerais em particular nos seus diamantes, garantindo diversidade
à sua economia, à semelhança do que aconteceu na África do Sul.

As reservas diamantíferas, em quantidade e qualidade, colocam Angola como quarto maior


produtor mundial de diamantes brutos. Muito embora Angola não disponha, na actualidade,
de recursos alimentares suficientes, as condições criadas pela natureza do solo, clima,
vegetação natural, morfologia e uma extensa ZEE permitem a exploração de recursos
alimentares (agro-pecuárias e piscícolas) em quantidade, variedade e qualidade para garantir a
auto-suficiência alimentar, inclusive como fonte de exportação, podendo albergar este sector,
significativos efectivos de população.

25
2.2.4. Factor circulação

2.2.4.1. Potencialidades

Actualmente, as deficientes infra-estruturas, rodoviárias, ferroviárias, portuárias e


aeroportuárias não facilitam a acessibilidade a pessoas, bens e serviços. No entanto, Angola
começa a recuperar as estruturas existentes e redimensioná-las de acordo com a dimensão do
país, que pela sua posição geográfica, permitirá usá-las como factor de poder, perante os
países vizinhos que não dispõe de saídas para o mar. Angola disputará, assim o papel que a
África do Sul desempenha actualmente na África Austral.

As comunicações de relação, actualmente, não constituem uma potencialidade de Angola,


embora as perspectivas sejam promissoras. No entanto alguns dos seus serviços,
nomeadamente o serviço de rádio que é o de divulgação mais geral, tem sido utilizados com
objectivos de formação da opinião pública e propaganda política, constituindo como tal um
factor de poder de âmbito interno. Face ao atraso tecnológico de Angola, é difícil a
visualização de que as comunicações de relação se venham as transformar num factor de
poder a curto prazo, ainda que o quadro de investimentos externos neste sector seja notório.

2.2.4.2.Vulnerabilidades

Enquanto o sistema de comunicações de transporte não se constituir como uma


potencialidade, a usar como instrumento de política externa e interna, não lhe podemos
associar vulnerabilidades, mas sim uma fragilidade, pois a deficiente exploração das
capacidades de transporte fluvial, associada à muito degradada rede rodoviária e ferroviária,
reflectem o atraso geral do país em infra-estruturas de transporte e condicionam fortemente o
desenvolvimento do mesmo. Sem um sistema de comunicações de relação adequado não é
possível influir no processo de formação da opinião pública, nas transformações culturais, na
divulgação e difusão de informação. Para um estado com o tamanho de Angola, em que o
sistema de comunicações de transporte é deficiente, é ainda mais necessário que as
comunicações de relação sejam poderosas para que a integridade da identidade angolana não
se dissolva. Como referido nas potencialidades, os investimentos externos neste sector irão
permitir, a médio prazo, colmatar estas vulnerabilidades e potencializar Angola para uma
outra esfera a nível regional.

26
2.2.5. Factor estruturas

2.2.5.1. Potencialidades

A evolução do sistema político democrático, reforçado com as recentes eleições, permite a


Angola constituir-se como uma referência de democracia e estabilidade regional. A
estabilidade alcançada permite-lhe estabelecer as mais diversas e convenientes alianças
estratégicas, alavancadas pela integração nas organizações regionais e internacionais que
regulam o sistema económico internacional. A estabilidade que o país atravessa, proporciona
um significativo investimento externo, em sectores para além do petróleo, o qual é
normalmente seguido de contrapartidas, com as quais o Governo angolano procura dinamizar
políticas sociais para colmatar as suas lacunas. O enorme potencial dos recursos,
particularmente no que diz respeito à extracção de petróleo e diamantes e outros recursos
energéticos de que dispõe, assegura só por si um factor multiplicador das potencialidades
angolanas, não só para a reconstrução do país, como para a afirmação regional.

A redução da sua dívida externa, associada aos elevados índices do PIB, permitem-lhe
reorientar as suas políticas de reforma para os sectores mais carenciados e frágeis do Estado.
O peso que as suas forças armadas representam na região, como garante de poder, advém dos
recursos financeiros disponibilizados para as mesmas e das actividades de modernização que
têm sido alvo, potenciado pela experiência das mesmas, como resultado do conflito interno e
intervenções externas, ainda que a sua Marinha de Guerra se constitua uma fragilidade, face à
falta de meios para fazer face à extensa ZEE e respectiva responsabilidade inerente a tal facto.

2.2.5.2.Vulnerabilidade

A dimensão assumida pelo MPLA no governo e Assembleia Nacional, cumulativamente com


os poderes centrados no presidente e a sua presença quase dinástica, podem desvirtuar a
dimensão dita democrática do país. Indiciada pelos elevados índices de corrupção, poderá
fomentar o crime organizado. O grande “calcanhar de Aquiles” angolano encontra-se na nítida
ausência de estruturas sociais capazes de fazer face à caótica situação social do país.

As elevadas taxas de analfabetismo e escassez de recursos humanos com formação média e


superior, traduz-se na falta de potencial humano qualificado em áreas técnicas e do
conhecimento. Os elevados índices de desemprego, conjugados com uma inflação
significativa, potencia a crise socioeconómica angolana. A difícil situação sanitária, pela

27
ausência de pessoal qualificado, pelas insuficientes estruturas sanitárias, associada à
incidência de doenças infecto-contagiosas e elevadas taxas de mortalidade, traduzem-se em
consequências nefastas no potencial humano de Angola.

2.2.6. Explicações sobre Angola

Angola, com os seus 1.246.700 Km2 de território, estrategicamente localizada no Sudoeste


africano, que lhe confere uma posição mista (continental e atlântica) e lhe permite constitui-se
como charneira de relevo entre dois grandes blocos regionais, apresenta uma fraca densidade
populacional mal distribuída por um território com algumas das maiores riquezas de África,
encontrando-se a sua população essencialmente na faixa litoral, incidindo sobre as zonas
urbanas. Em paz desde 2002, a ainda frágil nação, procura manter o equilíbrio da
reconciliação nacional, vivendo o paradoxo de tudo ter e de tudo precisar. Para além do
petróleo e dos diamantes, abundam muitos outros recursos estratégicos.

Contudo a organização económica, social e política do país apresenta-se devastada e ainda


que significativos esforços (internos e externos) procurem inverter a situação, os seus
problemas são mais do que estruturantes. Infra-estruturas degradadas ou inexistentes,
alarmantes taxas de iliteracia e dissimetrias sociais, agravam o estrondoso fosso entre ricos e
pobres, a precariedade sanitária conducente a elevadas taxas de mortalidade, corrupção e
alinhamento com uma máquina partidária devastadora, o MPLA, indicadores incontornáveis
do crime organizado. Angola passa por um momento de esfusiante crescimento económico,
alicerçado sobretudo pela produção de petróleo, mas muitos são os recursos disponíveis no
seu menu, os quais podem contribuir para a solidificação da sua economia e resolução dos
seus problemas sociais. Se no passado a etnicidade era reveladora de posicionamento
partidário, e alinhava com facções em disputa pelo poder, hoje a realidade assim não o
aparenta. No entanto, as tensões, derivadas de questões estruturantes como as sociais, poderão
vir a manifestar-se. Militarmente, as suas forças armadas têm um peso e valor notório na
região, quer pela sua experiência, equipamentos e até organização, preconizando-se como
uma fonte de poder.

2.3. Angola na organização marítima internacional

A Organização Marítima Internacional é uma agência especializada das Nações Unidas,


fundada em Genebra através da assinatura da Convenção da OMI em 1948, com o nome de
Organização Consultiva Intergovernamental Marítima. “A Organização foi criada com o
28
objectivo de fornecer mecanismos de cooperação entre os Estados no âmbito da
regulamentação e dos procedimentos relacionados com os Assuntos marítimos,
nomeadamente em matéria de segurança marítima” (Chatham House, 2012, p. 24). Em 1982
passou a denominar-se Organização Marítima Internacional (OMI). Para um país como
Angola, cujo sector marítimo encontra-se em ritmo de ascendência e restruturação, considera-
se fundamental haver um alinhamento permanente e constante com o trabalho desenvolvido
pela OMI, sobretudo porque desde 1977 Angola é Estado-membro desta Organização. Neste
racional, em agosto de 2004 foi estabelecida a Representação Permanente de Angola na OMI,
através de um Despacho do MIREX, “sendo um organismo sob tutela técnica, administrativa
e financeira do Ministério dos Transportes, à qual compete coordenar e defender os interesses
marítimos nacionais junto à OMI” (Sobrinho, 2013, pp. 7-10). O estabelecimento desta
Representação teve como base o compromisso assumido pelo Estado na 11ª Sessão da
Assembleia da Organização Marítima da África do Oeste e do Centro (OMAOC), em que este
foi convidada para assumir a Representação Acreditada da OMAOC junto à OMI, enquanto
Organismo Intergovernamental (idem, p.10). Todavia, apenas em finais de 2007 a REPANG é
acreditada, depois de serem cumpridas todas as formalidades relativas ao estabelecimento e
acreditação da Representação Permanente como Estado-membro.

A criação de uma Representação junto à Organização representa uma “manifestação do


posicionamento de Angola na arena marítima internacional, uma vez que expressa a
importância que o Estado tem atribuído às questões relativas ao Mar” (Sobrinho, 2013, p. 9).
Neste contexto, a OMI possui um quadro alargado de instrumentos que visam apoiar a criação
de capacidade em temos dos recursos humanos e materiais, necessários para a reestruturação
do sector marítimo nos Estados-membros. Para o caso concreto de Angola, importa realçar a
existência do Programa Profissional da OMI (Programa de Refrescamento ou Capacitação), o
qual oferece oportunidade para os Estados treinarem e capacitarem os seus quadros juniores.
De igual modo, o País pode também, em conjunto com a OMI, nomeadamente com as
Instituições de Educação Marítima desta Organização, e no âmbito do "Programa Integrado
de Cooperação Técnica da OMI (ITCP – Integrated Technical Co-operation Programme)",
assegurar a planificação e a mobilização de financiamento para um “Plano de Formação
dirigido e específico para dotar o País de quadros capazes para conduzirem a implementação
efectiva e eficientemente, dos instrumentos e convenções obrigatórias da OMI a nível
nacional” (idem, p. 8).

29
Até Outubro de 2013 Angola ainda não tinha aderido a esta iniciativa, fazendo parte dos
Estados não auditados do continente Africano. No entanto, de acordo com a Representante
Permanente Adjunta de Angola e Representante Acreditada da OMAOC na OMI, Rosa
Sobrinho, a Autoridade Marítima Nacional pretendia apresentar o seu pedido oficial durante a
28ª Assembleia da OMI (2013), para que no ano 2014 o país possa ser auditado, no intuito de
sair da "Lista Negra" da OMI. A presença de Angola nessa lista, deve-se essencialmente ao
facto do país não ter quadros técnicos habilitados para certificar marinheiros, escolas e cursos
marítimos internacionais nos termos estabelecidos pela OMI, o que não lhe permite cumprir
com as regras defendidas pela Convenção Internacional sobre Normas de Formação,
Certificação e Serviço de Quartos para os Marítimos.

30
III. CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO

3.1. Localização geográfica de Angola

Angola situa-se na Costa do atlântico sul da África ocidental (região Austral) entre a Namíbia
e o Congo, também faz fronteira com a RDC e a Zâmbia a oriente, com uma superfície de
1.246.700 km. Angola esta dividida em 18 províncias, sendo a sua capital Luanda, é o sétimo
maior pai de África pela sua superfície. Apesar de estar localizada numa zona subtropical,
Angola tem um clima que não é caracterizado por aquela condição, devido a influência de
factores como a corrente de Benguela ao longo da parte Sul da Costa e o relevo no interior
influenciado deserto do Namibe.

Geograficamente, África divide-se em África do Norte e África Subsariana, ou África Negra.


Nesta última, Angola encontra-se no chamado “Cone Austral”, abarcando o Heartland e com
importância significativa para com o Rimland, o que a fazem uma das mais importantes e
mesmo vitais regiões de África. Considerando o conceito de Ratzel, de que “espaço é
poder” 19 , conclui-se que Angola tem potencialidades para competir através do seu espaço
(Raum) e pela sua posição geográfica (Lage) de charneira entre África Austral e Central.
“Para Portugal o estatuto de Angola é claro! Angola (...) é potência regional africana. Esta é
uma realidade estratégica incontornável ”

3.1.1. Clima

Deste modo, o Clima é caracterizado por duas estações a das chuvas, de Outubro a Abril, e a
de Cacimbo de Maio a Agosto, mais seca e com temperaturas mais baixas. Por outro lado,
enquanto a Costa apresenta elevados indícios de pluviosidade que vão decrescendo de Norte
para Sul e dos 800 mts para os 50 mts, com temperaturas médias anuais acima dos 23ºC. Com
uma costa Atlântica de 650 kms, onde os rios caudalosos desaguam em amplos estuários
depositando sedimentos arrastados das zonas planálticas, formaram-se numerosas ilhas, baias
e restingas onde se localizam excelentes praias.

3.1.2. Forma de território

Os países de formato fragmentado, são os que têm parte do território dividido por outros
Estados ou por acidentes geográficos.

19
A sua tese preconiza o poder do estado assente nas coordenadas, de Espaço (Raum) e de Posição (Lage) – o
espaço vital.
31
Angola, embora tenha maior parte do território com configuração compacta, também pode ser
considerado como tendo o formato fragmentado pois, tem uma parte do território, a província
de Cabinda, separada da massa principal, quer pelo rio Zaire (Congo), quer pela RDC. As
características do Estado fragmentado de forma geral desenvolvem um importante impulso de
coesão no sentido do controle e apoio á parte do território separada.20

3.1.3. Hidrografia

Os rios podem constituir vias de penetração e de comunicação. Enquanto via de comunicação


(circulação), a sua utilização pode obrigar a abertura de canais ou drenagem, porém, a
navegação naval é o meio mais barato, especialmente quando se trata de transporte de
materiais que ocupam grande volume

Angola possui uma extensa e complexa rede hidrográfica com 47 bacias hidrográficas
principais, tendo, praticamente, todos os principais rios as suas nascentes no interior do País
com excepção dos rios Zaire ou Congo, Zambeze e Chiluango. As potencialidades hídricas
quer superficiais, quer subterrâneas são consideráveis. Contudo, a actual utilização da água
em Angola assume, ainda, reduzidas proporções, uma vez que os esquemas de irrigação à
grande escala não estão ainda desenvolvidos e o parque industrial só agora começa a ser
restaurado, prevendo-se que a médio e longo prazo aumente consideravelmente a demanda
dos recursos hídricos, sendo de extrema importância o estabelecimento de mecanismos que
permitam uma gestão integrada dos recursos hídricos, de forma a salvaguardar a sua
utilização sustentável a longo prazo, garantindo um melhor aproveitamento dos recursos
disponíveis, bem como um criterioso planeamento de utilização, tendo em consideração a
importância da água como factor de produção para os diferentes sectores da actividade
socioeconómica e para a manutenção dos ecossistemas.

Os principais rios e tributários de diversas bacias hidrográficas partilhadas com os países


vizinhos, tais como a bacia do rio do Cubango, Cunene, Zaire ou Congo e Zambeze, têm
origem na mesa planáltica que se situa na zona central do País, sendo que a vertente do
Cubango, com uma área de afluências de 11,9% da superfície total do território angolano,
alimenta a região do Okavango, na República de Botswana. O Rio Cubango-Okavango nasce
no planalto central de Angola, de onde provém a maior parte do seu caudal, atravessa a
fronteira entre a Namíbia e Angola e desagua no Delta do Okavango, no Botswana,

20
Vide em anexo
32
percorrendo 1000 km, sendo que a extensão topográfica da bacia hidrográfica 21abrange uma
área de aproximadamente 700 000 km2.

O sistema ribeirinho do Cubango-Okavango é um dos poucos sistemas fluviais no mundo


relativamente virgem, e uma maravilha da natureza numa região seca. O Rio
Cubango/Okavango continua a ser um dos menos afectados pelo homem no continente
africano. No seu estado actual, o rio fornece benefícios significativos ao nível dos
ecossistemas. Com vista a assegurar o desenvolvimento e utilização dos recursos hídricos da
bacia hidrográfica do Cubango/Okavango a longo termo, os Estados-Membros da Bacia
estabeleceram, em 1994, a Comissão Permanente dos Recursos Hídricos da Bacia
Hidrográfica do Cubango/Okavango (OKACOM), visando levar a cabo uma série de
iniciativas com vista a gestão conjunta da bacia. A actual situação oferece aos países
ribeirinhos da bacia do Cubango/Okavango uma oportunidade de escolher uma via de
desenvolvimento cuidadosamente planeada e negociada.22

3.2. Angola no quadro político internacional

Este capítulo, e recorrendo a uma breve análise histórica, pretende-se identificar os principais
antecedentes geoistóricos de Angola, com alguma ênfase à fase final do período colonial e
mais em particular ao pós independência, no intuito a uma melhor compre Leonilde Bernardo
(Mariete) então da sua actual situação. Utilizaremos para o efeito o “factor histórico”,
abordando os factos considerados de realce.

3.2.1. Breve síntese histórica até à independência

Os primeiros habitantes da região, que agora é designada por Angola, têm origem na tribo dos
caçadores-colectores Pré-Bantos23. “O povo Banto chegou à região, vindo de Norte, no século
XII, obrigando a uma migração dos Khoisan para Sul” (Abrantes, 2005, p 16). “Com a
descoberta do rio Zaire, em 1482, por Diogo Cão e a posterior exploração da costa de Angola,
os portugueses foram-se instalando progressivamente na região e, excepto um período de
tempo compreendido entre 1641-48, em que Angola foi tomada pelos holandeses” (Barata,
1997, p. 24), “esteve sob domínio português, até à independência do país em 11 de Novembro

21
Vide mapa no anexo
22
Carlos Andrade, Biólogo, Msc, Técnico do Gabinete para Administração da Bacia Hidrográfica do Rio
Cunene, Ministério da Energia e Águas da República de Angola, Luanda, Angola. Membro do Comité
Directivo da Bacia do Okavango, calucarlos@yahoo.com.br
23
Khoisan, Pigmeus, cuissis e cuepes.
33
de 1975” (Teixeira, 2004, p 586). Muito embora os portugueses tenham falhado naquilo que
era o seu intento inicial, a descoberta de ouro e outros metais preciosos, descobriram em
alternativa, uma excelente fonte de escravos para alimentar a sua colonização do Brasil. “A
colonização portuguesa em Angola começa verdadeiramente em 1575, com a fundação de
Luanda” (Selvagem, 2006, p. 332). “Após várias tentativas, as tropas portuguesas finalmente
conseguem conquistar o reino Mbundu em 1902, quando o planalto do Bié foi tomado e a
colonização branca chegou às terras altas angolanas” (REBELO, 2006).

“O desenvolvimento e modernização de Angola acontecem verdadeiramente após a segunda


Guerra Mundial, com resultados muito significativos nas décadas de 60 e 70” (Rela, 2005, p
30 e 34). Em 1951 a “designação de colónia passa a província ultramarina” (Afonso, 2000,p.
20). Embora fosse professado que Angola era uma sociedade multirracial de igualdades, a
verdade é que a maioria dos africanos continuava a sofrer com a repressão conduzindo à
fundação, em 1962, um grupo de refugiados no Zaire liderados por Holden Roberto, a Frente
Nacional de Libertação de Angola (FNLA). Mantendo as suas bases de apoio no Zaire,
desencadearam uma guerra de guerrilha em Angola, desenvolvendo contactos com nações,
Ocidentais e Comunistas e obtendo o apoio da Organização da Unidade Africana. “Os
movimentos de libertação de Angola eram compostos também por outros dois movimentos de
guerrilha. Um de influência Marxista, Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA),
fundado em 1956, de entre muitos, por Agostinho Neto, com o seu quartel-general na Zâmbia.
O terceiro, a União para a Independência Total de Angola (UNITA), fundado em 1966, sob a
liderança de Jonas Savimbi. Portugal viu-se forçado a manter mais de 50.000 efectivos
militares no Teatro de Angola no início dos anos 70” (Alves, 1998, p. 574 e 575). Em 1971 a
UNITA aceitou um estatuto secreto de colaboração com o comando português da Zona
Militar Leste (ZML), a “Operação Madeira”, através da qual ajudou as “Forças Armadas
Portuguesas no combate aos outros dois movimentos, cujas bases foram erradicadas da ZML
e cuja actividade de guerrilha passou a depender de bases no exterior, no Zaire e na Zâmbia”
(Alves, 1998, p.575). Em Abril de 1974, “um movimento das forças armadas derrubou o
regime ditatorial português e marcou o início da Terceira República” (Saraiva, 2003, p. 365).
Nesse mesmo ano, o novo governo português proclamava tréguas com os movimentos de
libertação. Contudo a situação no território apresentava-se extremamente complicada, devido
ao “elevadíssimo número de portugueses e outros europeus aí residentes (estimados em mais
de 500.000), pela continuação dos combates entre os movimentos de libertação e pelo desejo
dos cabindenses em se tornarem não só independentes como separados de Angola” (Alves,
34
1998, p.576). No dia 10 de Novembro de 1975, o Governador-Geral de Angola, em nome do
“Governo Português, anuncia a independência de Angola, transferindo a soberania de
Portugal, para o “Povo Angolano”, a partir de 11 de Novembro de 1975” (James, 2004).

3.2.2. Enquadramento geopolítico do continente africano – principais teses

A África é a mais maciça de todas as partes do Velho Mundo. “As suas costas não são
recortadas, ao invés das do Báltico e da Indonésia” (Barreau, 2008, p. 237). “A sua geografia
física revela que se trata de um continente tradicionalmente isolado, quer pelo deserto, quer
pelo mar, sendo o segundo maior continente do planeta 24 , com 30.334.592 quilómetros
quadrados (Km2) de área, o seu maior comprimento no sentido Norte-Sul de 8.000
quilómetros (Km) e no sentido Este-Oeste, 7.500 Km” (Almeida, 1990, p. 110). A sua
aparência compacta e de isolamento, atenuam-se quando analisado o seu clima muito
diversificado e o seu relevo muito variado 25 . De “hidrografia peculiar, apresenta grandes
bacias de recepção, com escoamento muito estrangulado para o mar” (Almeida, 1990, p. 110).
A “população africana é superior a 800 milhões de habitantes, distribuídos em 54 países e
representando cerca de um sétimo da população mundial, com uma densidade populacional
média (2000) de 25,88 habitantes por Km2” (SOGEOGRAFIA, 2007-2009). Situada na região
ocidental da África Austral, RA faz fronteira a Norte com a República do Congo (RC), a
Nordeste com a RDC (ex-Zaire), a Este com a Zâmbia e ao Sul com a Namíbia.

3.2.3. Esboço das teses tradicionais

As tradicionais teses geopolíticas não manifestam grande relevo ao continente africano,


secundarizando-o e incluindo-o no “OuterWorld” (Almeida, 1990, p. 112). No entanto,
teorizadores houve que se debruçaram sobre o continente africano. Para Mahan, “nas teses do
Poder Marítimo, África afigurava-se valiosa por aí se poderem constituir colónias
proporcionadoras de desenvolvimento comercial e por consequência ao crescimento das
marinhas” (Almeida, 1990, p. 113).

Mackinder, teorizador do Poder Terrestre, fez vários contributos relativos ao continente.


“Primeiro situou-o no World Island, inevitavelmente ligado com a Europa e com a Ásia.
Segundo, definindo no seu interior austral o “Heartland do Sul”. Terceiro, considerando a

24
Imediatamente três vezes maior que a Europa
25
Desde a cordilheira do Atlas do Norte, às mesetas Sahariana e Sudanesa, até à região dos grandes lagos e da
imensa falha Sul-Norte, correspondente sensivelmente ao curso do Nilo
35
África Mediterrânica incluída no “Crescente Interior”, outorgando-lhe a categoria de aliado
potencial dos poderes anfíbios. Por último, definindo “WorldPromontory”, em que o corredor
central Norte-Sul 26 assume uma importância vital para o equilíbrio” do “Velho Mundo”
(ALMEIDA , 1990, p. 113).

As teses do Poder Aéreo consideram África como um continente isolado, afastado das
principais rotas transatlânticas, devido ao grande distanciamento entre continentes situados
em semelhantes latitudes (Almeida, 1990, p. 113). Para SpyKman, Mackinder e Haushofer,
que se enquadram nas teses dos Poderes Conjugados, áreas específicas do continente são
valorizadas. Spykman considerava toda a área mediterrânica contida no “Rimland” europeu.
Cohen divide a zona em três regiões. Primeira, a zona do Maghreb ligada à Europa, o
“MaritimeEuropeandtheMaghreb”; segundo, a África “South Sahara”, incluída no
“TradeDependentMaritimeWorld”. Terceiro, o Nordeste africano, ligado ao Médio Oriente,
designado por “MiddleEastShatterbelt” (ALMEIDA, 1990, p. 113).

Finalmente, a tese das “Pan-Regiões” de Haushofer, onde considera que o “limite Sul da
Europa coincide com o deserto do Sahara, procurando demonstrar que uma pan-região euro-
africana seria um grande espaço geopoliticamente compensado por abarcar uma ampla faixa
de latitude, beneficiando dos equilíbrios que se geram ao longo dos meridianos” (ALMEIDA,
1990, p. 114).

3.3. Continente africano, esboço geopolítico de hoje

Embora a geografia permaneça a mesma, África está mais próxima do resto do mundo. As
novas tecnologias e a difusão cultural, permitem aproximar África do sistema dinâmico das
relações internacionais. Dividida em várias unidades políticas, agrupa-se por sua vez em
grandes unidades geopolíticas, cada uma com distintas vocações, resultantes essencialmente
da geografia e da vizinhança. De acordo com Políbio Valente, “o continente africano
organiza-se em África mediterrânica, África do “MiddleOcean”, África do “Shatterbelt”,
África Sahariana, África Insular e África ao Sul do Sahara. É nesta última que Angola se
encontra localizada, que por sua vez se subdivide em “SudanGrassland”, “Heartland” do Sul,
“Rimlands” e “Cone Austral”. É igualmente neste último que Angola se encontra localizada”.
(ALMEIDA, 1990, p. 116).

26
Do Cairo ao Cabo
36
O “SudanGrassland”, “constitui-se numa região de pastagens, onde é possível a agricultura
permanentemente, constituindo-se como uma zona amortecedora nas relações entre o Norte e
o Sul-africanos” (Almeida, 1990, p. 117 e 118). O “Heartland do Sul”, expressão de
Mackinder, situando o limite Norte desta área por volta dos cinco graus de latitude Sul.

Caracteriza-se por ser uma “área tipicamente continental, inacessível ao poder


marítimo, plana, facilitando as comunicações e com uma enorme variedade de
recursos, o que lhe permite abarcar grandes quantidades de população e ser auto-
sustentável, fazendo parte dela, além de Angola, a RC, a RDC, o Uganda, o Ruanda,
o Burundi, a Tanzânia, o Malawi, a Zâmbia, o Zimbabwe e Moçambique. Destes,
oito não têm acesso ao mar, o que irá conferir especial importância ao país objecto
do nosso estudo”. (ALMEIDA, 1990, p. 117 e 118).

Os “Rimlands” caracterizando-se por se tratar de um anel anfíbio envolvente do chamado


“Cone Austral”, com “potencialidades de condicionar extremamente o desenvolvimento
político da área, onde Angola pode desempenhar um papel crítico e onde a África do Sul
possui importância quase hegemónica”. (ALMEIDA, 1990, p. 117 e 118).

O “Cone Austral abarca o Heartland e parte dos Rimlands, pelo que se constitui como uma
das mais importantes e vitais regiões africanas” (Almeida, 1990, p. 117 e 118). África é um
continente em transição, essencialmente à custa de múltiplas tensões. Pelas suas
características geopolíticas está profundamente ligado ao mundo marítimo. As
potencialidades em recursos minerais, associadas à atlanticidade (da maioria da África do Sul
do Sahara), relevam o papel que pode “desempenhar nas ligações entre a estratégia da NATO,
e as estratégias definidas para o Atlântico Sul, o que pode vir a conferir-lhe um lugar de
destaque no futuro” (CORREIA, 2008, p. 20)27.

À medida que o seu desenvolvimento se vai acentuando, o “Estado há-de aparecer com mais
nitidez, os blocos regionais com mais objectividade e o continente com uma contribuição de
inegável valor para a cooperação mais dinâmica e uma paz mais esclarecida” (ALMEIDA,
1990, p. 119).

27
In Prof. Doutor Adriano Moreira: “Dois terços da população mundial concentram-se na Ásia, em torno de dois
pólos de poder e de influência que são a China e a Índia. A proximidade a África dita a sua apetência pela
projecção de poder e influência. Estrategicamente, é da maior importância para o mundo ocidental manter uma
estreita afinidade com África (...) ”.

37
3.4. Factos sobre a história de Angola

Marcada por lutas, desde a descoberta em 1482, Angola só conhece a pacificação do seu
território já no início do século XX. O seu verdadeiro desenvolvimento dá-se na metade desse
mesmo século, contudo, os movimentos de libertação e a potência colonizadora, conduzem
Angola ao primeiro grande conflito, o da independência, marcado pelo enorme esforço de
guerra dos portugueses, mas também pelos conflitos internos na disputa do poder.

Tornada independente a 11 de Novembro de 1975, as suas potencialidades foram de imediato


sangradas, pelo abandono da maioria da população europeia, dada a frágil situação política e a
confrontação militar eminente pela disputa do poder. Seguem-se quase três décadas de guerra
civil, com o fim marcado pelo dia 22 de Fevereiro de 2002.

Marcadamente isolado, o continente africano é o segundo maior do planeta, destacando-se a


grande diversidade do seu clima e relevo. Apesar de relegado para segundo plano, pensadores
houve que se debruçaram sobre África, inicialmente pela possibilidade de aí se constituírem
colónias, fomentadoras de comércio e por consequência contribuírem para o crescimento das
marinhas e posteriormente, pela subdivisão e análise mais dedicada, constituindo-se a África
Subsaariana “Trade Dependent Maritime World”.

38
IV. METODOLOGIA

O método é o caminho pelo qual se pretende atingir um objectivo. É ainda entendido, como
um conjunto de operações pelas quais uma disciplina procura atingir as verdades que ela
persegue demonstrando e verificando. Para a problemática do tema em questão, pretende-se
fazer o uso da pesquisa bibliográfica. Sabe-se que a pesquisa bibliográfica é aquela feita a
partir do levantamento de referências bibliográficas já analisadas, e publicadas por meios
escritos e electrónicos, como exemplo disto existem os livros, artigos científicos páginas de
web sites.

A metodologia de pesquisa é vista como abordagem das técnicas científicas, a nível da


investigação, que venham a proporcionar resultados, cujas margens de erros sejam
desencantadas, possibilitando o alcance dos objectivos específicos, a curto prazo, e do
objectivo geral, no final da pesquisa.

4.1. Tipo de estudo

A realização do estudo deu-se através da pesquisa qualitativa de carácter exploratório,


observando-se os fenómenos a fim de delimitar a extensão do tema, devido à natureza fluida
do assunto a ser investigado. Considerando as manifestações cada vez mais optimistas em
relação a utilização da abordagem qualitativa.

4.2. População e amostra

O nosso estudo foi delimitado no mar angolano, no que tange a Marinha de Guerra e os
grandes portos.

Amostra não probabilística: fontes documentais.

4.2.1. Critérios de inclusão

 Foram incluídos na pesquisa as províncias de Luanda, Benguela Namibe, Cabinda por


serem zonas de relevância marítima principalmente Cabinda devido a disposição
fronteiriça.

39
4.2.2. Critérios de exclusão

 Foram excluídas da pesquisa as províncias que não constam nos critérios de inclusão e
tendo em conta a necessidade de delimitação do estudo por causa da amplitude do
objecto de estudo.

4.3. Métodos a utilizar

A técnica utilizada nesta pesquisa foi a elaboração de fichas bibliográficas, resumos de livros.

E por fim, quanto as técnicas de processamento de dados, utilizaremos a análise qualitativa/


análise de conteúdo. Esta análise tem sido muito utilizada na interpretação dos dados nas
ciências humanas e sociais. Minayo (1994) afirma que é o método mais comummente
adoptado no tratamento de dados das investigações qualitativas.

4.4. Procedimentos e instrumentos para a colecta de dados

Quanto aos procedimentos, trata-se de um estudo bibliográfico. A pesquisa bibliográfica é


feita a partir do levantamento de referências teóricas já analisadas, e publicadas por meios
escritos e electrónicos, como livros, artigos científicos, páginas de web sites. Qualquer
trabalho científico inicia-se com uma pesquisa bibliográfica, que permite ao pesquisador
conhecer o que já se estudou sobre o assunto.

Elaborada ou desenvolvida a partir de material já publicado, em geral livros, artigos de


periódicos e materiais disponibilizados na Internet. Fizemos a colecta de vários livros, artigos,
matérias, sites, programas televisivos, filmes, manuais que retractavam o tema em análise.

4.5. Processamento de dados

Depois dos procedimentos de colecta dos dados, o momento agora é dar o tratamento
adequado a esses dados. Assim os primeiros passos são em direcção à selecção e revisão, para
que se alcance o processo de categorização.

Para a literatura utilizamos o método qualitativo na selecção do conteúdo. Seleccionamos


apenas o que nos seria útil, no caso livros e manuais que viessem com citação ou referência
bibliográfica com o objectivo de podermos justificar posteriormente determinada abordagem,
ou seja, fizemos a triagem do material que é importante para o sustento da nossa pesquisa.

40
V. RESULTADOS E DISCUSSÃO

 Angola e os Espaços Marítimos: Delimitações, Competências e Fronteiras

Embora o caminho percorrido pelo Direito do Mar tenha sido longo e na sua totalidade
desconhecido, sabe-se que foi a «Declaração do Presidente do Chile de 23 de Junho de 1947»,
sobre a delimitação das zonas de protecção de caça e pesca marítimas, que mais destacou a
reivindicação dos direitos económicos sobre os espaços marítimos contíguos aos Estados.
Como resultado, hoje, a soberania una e indivisível do Estado angolano é exercida sobre a
totalidade do território nacional, compreendendo nos termos da Constituição da República, da
Lei e do Direito Internacional, a extensão do espaço terrestre, as águas interiores e o mar
territorial, bem como o espaço aéreo, o solo e o subsolo, o fundo marinho e os leitos
correspondentes, demonstrando desta forma o compromisso do Estado com o Direito
internacional e sobretudo com a «Convenção de Montego Bay»28. Semelhantemente, o Estado
exerce soberania e/ou jurisdição material na zona contígua, na ZEE e na plataforma
continental (Lei 14/10, Artigo 3).

Neste seguimento e para efeitos do presente trabalho, consideram-se as zonas do espaço


marítimo que surgem como mais importantes na abordagem das diferentes temáticas,
considerando a distribuição geográfica do território angolano, a saber: as águas territoriais
(mar territorial), a zona contígua, a ZEE e a plataforma continental. De acordo com a parte II
da CNUDM, entende-se por "Mar Territorial" a “zona do mar contígua ao território do Estado
costeiro até um limite que não ultrapasse as 12 MN, medidas a partir das linhas base
determinadas em conformidade com a «Convenção Montego Bay»29” (Oliveira, 2007, p. 203;
Lei 14/10, Artigo 8 e 24). Com isso a soberania total do Estado costeiro estende-se para além
do seu território e das suas águas interiores; no caso de Estados que são arquipélagos, incluirá
as suas águas arquipelágicas, o mar territorial e o respectivo espaço aéreo sobrejacente ao mar
territorial, bem como o leito e o subsolo deste mar.

28
O Estado exerce jurisdição e direitos de soberania em matéria de conservação, exploração e aproveitamento
dos recursos naturais, biológicos e não biológicos, na zona contígua, na zona económica exclusiva e na
plataforma continental, nos termos da lei e do Direito Internacional. De acordo com o Artigo 164 da CRA, à
Assembleia Nacional compete legislar com reserva absoluta a definição dos limites do mar territorial, da zona
contígua, da zona económica exclusiva e da plataforma continental.
29
A Lei n.º 2130 de 22 de agosto de 1966 promulgou as bases sobre a jurisdição do mar territorial e da zona
contígua e remeteu para diploma especial a definição das linhas de base rectas. Na sequência do disposto n.º2 da
Base I da Lei n.º 2130, o Decreto n.º 47 771 de 27 de Junho de 1967 fixou o limite interior do mar territorial
angolano com o traçado de algumas linhas de fecho e de base recta que suplementam as linhas de base normal,
tendo sido reiteradas pela Lei 21/92 de 28 de agosto de 1992, e actualmente pela Lei 14/10 de 14 de Julho.
41
Por seu turno e de acordo com o artigo 33 da Convenção Montego Bay, a "Zona Contígua"
corresponde à área marítima contada a partir das linhas de base que servem para medir a
largura do mar territorial, não podendo estender-se para além das 24 MN; nesta área marítima
o Estado costeiro pode tomar todas as medidas de fiscalização necessárias, de forma a evitar
as infracções às leis e regulamentos aduaneiros, fiscais, de imigração ou sanitários no seu
território ou no seu mar territorial, ou ainda, reprimir as infracções às leis e regulamentos no
seu território ou no seu mar territorial30. Dessa maneira, a “zona contígua angolana estendesse
a partir do seu mar territorial numa largura de 12 MN” (Lei 14/10, Artigo 9 e 31).

No que toca às fronteiras laterais, “encontra-se em curso o processo de delimitação da


fronteira lateral norte entre a República de Angola e a República Democrática do Congo”
(Oliveira, 2007, pp. 212-222; Lei 14/10, Artigo 12), sendo seguramente a que oferece maior
complexidade, por estarem envolvidos muitos interesses para o Estado, nomeadamente no que
concerne à exploração dos recursos energéticos no mar, ao exercício da soberania nestes
espaços e à unidade nacional; especialmente pelo posicionamento do enclave de Cabinda. Por
sua vez, a “delimitação da fronteira sul do mar territorial, ZEE e plataforma continental de
Angola, foi definida através do Tratado de delimitação assinado entre Angola e a Namíbia, a 4
de Junho de 200231” (Oliveira, 2007, p. 222; Lei 14/10, Artigo 13). Em suma é neste quadro
legal de espaços marítimos, delimitações e competências, onde nos próximo anos Angola
deverá definir o seu posicionamento como Nação atlântica, num quadro global onde a
evolução da «Ordem Mundial» foi desde cedo influenciada pelo posicionamento dos estados,
relativamente ao Mar.

 O Espaço Marítimo

Angola é banhada em toda sua fronteira oeste pelo “Oceano Atlântico, numa linha costeira de
cerca de 1 650 km de extensão, com um mar territorial que vai até as 12 MN e uma ZEE que
vai até as 200 MN, numa área de cerca de 540 390,95 km2, estando limitada a norte pelo
paralelo 5º S e a sul pelo paralelo 17º 10’ S” (MINUA, 2006, p. 1). A plataforma continental

30
A zona contígua angolana foi criada pela Lei n.º 2130 que estabeleceu poderes a Angola para exercer na zona
do alto mar contígua ao seu mar territorial, entre outros poderes, o de “prevenir e reprimir as infracções às leis de
polícia aduaneira, fiscal, sanitária ou de imigração cometidas no seu território ou no seu mar territorial”.
31
Concluídos os estudos as partes acordaram por unanimidade que o ponto de separação ficasse posicionado na
posição geográfica com 17o15´00´´ S de Latitude e 11 o45´07´´, 79 E de Longitude.

42
interior32 é larga a norte, com limites entre as 40 e 50 MN de Cabinda até Lobito; do Lobito
ao sul do Namibe torna-se mais estreita, com menos de 20 MN. “Nas áreas do norte e centro o
talude continental tem limites de 120 – 140 MN, e menos de 60 MN a Sul” (MINUA, 2006, p.
63). Por sua vez, a “profundidade marítima na orla marítima angolana tem uma variação
mínima média entre os 3 aos 5 metros de profundidade, enquanto as profundidades na zona do
talude continental atingem os 5 000 – 5 500 metros nas zonas Centro e Sul” (MINUA, 2006,
p. 63).

Portanto, o mar angolano apresenta-se na maior parte da sua extensão como espelhado e
calmo, com velocidades médias dos ventos que rondam os 0,3 m/s e correntes marítimas que
ao longo da costa raramente atingem um nó e com uma ondulação suave; para além de ser
navegável durante todo ano e permitir o trânsito submarino, visto que a partir das 5 MN da
costa as profundidades rondam os 100 metros. “A localização geográfica do país permite que
o seu mar seja próspero em biodiversidade, especialmente pelo cruzamento de duas correntes
marítimas importantes, a «Corrente Fria de Benguela» e a «Corrente Quente da Guiné»,
fazendo com que o país albergue um rico ecossistema de mangais, funcionando como a base
do ciclo de vida e um habitat para a sua flora e fauna33” (FAO, 2011, p. 108).

Assim e assumindo como «fio condutor» o enunciado das teses que vêm no mar a principal
força de preservação e manutenção do poder, o «enquadramento geopolítico de Angola»
como Estado ribeirinho assume algumas particularidades, sobretudo por se situar numa região
do Atlântico muito rica em recursos naturais e de considerável importância no contexto
geopolítico e geoestratégico regional, apresentando a «6.ª maior ZEE do Atlântico Sul» e
sendo detentor de potencialidades de vária ordem. Dentre essas potencialidades, sublinha-se: a
centralidade no contexto da África Subsariana, pertencendo simultaneamente a duas sub-
regiões africanas (África Central e Austral); a abundância em termos de recursos hídricos,
sendo um dos, senão o, mais privilegiado na África Austral; as riquezas no seu mar e
plataforma continental, surgindo como principal produtor de petróleo a sul do Equador; a
excelente localização dos seus portos principais a nível do Atlântico Sul, com excelentes

32
Actualmente encontra-se em curso um projecto que visa a extensão da plataforma continental para além das
200 MN, tendo sido criada uma comissão interministerial, de forma a elaborar uma proposta que deverá ser
submetida à Comissão de Limites da Plataforma Continental (CLPC).
33
O ecossistema da Corrente Fria de Benguela é subdividido em duas áreas, uma considerada a zona Norte do
ecossistema e outra correspondente a zona Sul, sendo a sua separação tecnicamente situada ao largo de Lüderitz,
cerca de 300 quilómetros ao norte da fronteira entre a Namíbia e África do Sul, no sentido em que normalmente
quando se fala sobre a zona Norte refere-se à Angola e a Namíbia, uma vez que a zona Sul corresponde a África
do Sul.
43
portos de águas profundas, servidos de várias ligações logísticas (rodoviárias e ferroviárias),
rivalizando apenas com a Namíbia; a vantagem geoestratégica dos corredores transversais,
nomeadamente a do «Corredor de Benguela», no quadro do abastecimento dos países
encravados da África Austral. Todos estes factores se bem valorizados, podem funcionar
como um catalisador do desenvolvimento dos países da região austral, sendo já considerado
como um "pulmão" da África Austral; em que se soma a privilegiada posição geográfica, o
que lhe permite controlar os acessos da RDC e da Zâmbia ao Oceano Atlântico. Procurando
traçar um esboço geopolítico de Angola, enquanto Estado ribeirinho, enunciam-se as suas
particularidades geopolíticas:

1. Faz parte do «Rimland africano» de Nicholas Spykman;


2. Faz parte do Mapa geoestratégico do «Trade Dependent Maritime World» de Saul
Cohen;
3. Possui a maior parte das características que Alfred Mahan considerava fundamentais
para o desenvolvimento de um Poder Marítimo;
4. Projecta-se inequivocamente para o Atlântico Sul;
5. Faz parte do triângulo estratégico lusófono do Atlântico Sul (Brasil – Angola – São
Tomé e Príncipe;
6. Pertence à região do Golfo da Guiné, uma região estrategicamente rica em recursos
naturais, designadamente de recursos fósseis, importantes para as "grandes potências
mundiais";
7. Estabelece relações amigáveis com as maiores potências mundiais, nomeadamente, os
EUA, a China, a Rússia, o Brasil, a Alemanha, a França, o Reino Unido, a India, e
outros Estados;
8. Tem potencial, como Estado ribeirinho, para desenvolver um Poder Marítimo
Regional;

 O Soft Power Angolano

Como anteriormente exposto, com o término da guerra civil em Angola a «Política Externa
Nacional» tem como principal linha de acção o fomento da economia, tendo em conta o
melhor posicionamento geopolítico do país, através de uma maior interacção com os países
vizinhos e com as maiores potências mundiais, viabilizando assim uma maior dinamização e
valorização da diplomacia. O Estado angolano através do seu Ministério das Relações
Exteriores, tem alargado os “seus organismos centrais de representação político-económica,
44
permitindo por um lado a manutenção dos laços de amizade e cooperação com todos os
Estados com os quais já se relacionam, e por outro lado a formalização de laços com outros
países, cujos laços de amizade são mais afastados34” (Chikoti & Vines, 2012, p. 3). Nesta
óptica e considerando a actual dinâmica das relações internacionais, reconhece-se que existe a
necessidade de adequar a actividade diplomática à actual conjuntura internacional, a fim de
defender o Interesses Nacional, num cenário em que nos últimos anos a actuação de Angola
tem-se mostrado imprescindível a nível regional e continental.

No intuito de “tornar a abordagem sobre o poder diplomático de Angola mais clara,


abrangente e ao mesmo tempo direccionada ao objectivo, estabeleceu-se um
paralelismo no que toca à taxonomia piramidal na qual a Estratégia se subdivide
(Total, Gerais e Particulares), para fazer a descrição sobre a diplomacia de Angola
de acordo com as áreas fundamentais da «nova diplomacia» (diplomacia económica,
diplomacia securitária, diplomacia humanitária e diplomacia ambiental) ” (Silva,
2009, p. 637).

Para efeitos deste estudo, o centro da abordagem incide apenas na dimensão securitária e
económica da diplomacia nacional ou seja, foca-se na análise dessas duas perspectivas por
considerar que são os dois principais fundamentos da mais recente Política Externa Angolana.

 Angola e o Espaço Estratégico de Interesse Nacional

Qualquer país no mundo que disponha de litoral terá de se identificar com o mar, por tudo o
que ele significa para o desenvolvimento e sobrevivência das nações. O “espaço estratégico
associado ao espaço marítimo, cujo controlo, fiscalização e manutenção reforça as
potencialidades de Angola, enquanto actor na cena internacional, contempla todos os espaços
cruciais e de interesse a nível global, que interferem ou influenciam a prossecução dos
interesses nacionais, em que o núcleo duro é constituído pelo "Território Nacional", a "Zona
Económica Exclusiva", o "Espaço Interterritorial" e o "Espaço Aéreo" sob responsabilidade
Nacional” (FERREIRA, 2011, p. 229).

Para Angola, o “Mar adjacente ao seu território constitui um «espaço vital»” (Dias, 2005, p.
72-73), porquanto surge como um elemento de importância geopolítica e geoestratégica para
o país, constituindo um espaço necessário à completa e perfeita realização do Estado, quer a

34
Assim, de forma a haver uma melhor implementação da política externa angolana, preconizando a defesa dos
interesses nacionais, sobretudo a nível político, securitário e económico, Angola detém actualmente mais de 72
embaixadas e representações consulares, espalhadas em vários países, por todos continentes, permitindo uma
maior aproximação a todos os países parceiros. De facto, o chamado «soft power» angolano tem-se mostrado
cada vez mais forte, no que toca à sua intervenção a nível da esfera internacional, permitindo dar uma nova
dimensão ao país, sobretudo nos aspecto geopolítico, geoestratégico e geoeconómico, sendo o último a principal
aposta do país, depois do final da guerra civil.
45
nível interno como no externo, sendo essencial para a prossecução do Interesse Nacional. Tal
como Friedrich Ratzel colocou um acento tónico na importância do Espaço Vital para os
Estados, numa dupla perspectiva de «espaço habitável e de espaço acessível», a presença de
Angola no Mar deve permitir o devido controlo do mar sob sua soberania e/ou jurisdição, a
sua exploração como fonte de riqueza, bem como abrir caminho a uma maior expansão
económica do país pelo controlo das linhas de comunicações marítimas, a garantia do acesso
aos portos nacionais e a afirmação da segurança e defesa neste espaço.

A valorização do mar por parte de Angola tem sido marcada pelo fortalecimento de alianças,
tendo em vista o estabelecimento da paz, segurança e estabilidade no quadro geopolítico em
que faz parte ou seja, no âmbito da ZOPACAS, na região do Golfo da Guiné, na região da
África Central e Austral e no Atlântico Sul como um todo.

Em suma e tal como para outros Estados, para Angola as FAA têm representado uma das
garantias fundamentais de sobrevivência do Estado, apesar de que na actualidade haja cada
vez menos uma relação directa entre a força militar e a condição de segurança, pois a
segurança não está unicamente dependente da força militar, englobando outros sectores da
estrutura do Estado. Portanto, deve ser dentro destes «espaços» que Angola deverá continuar a
definir os seus objectivos, defender os seus interesses, orientar as suas estratégias e projectar a
sua imagem, dentro do quadro geopolítico onde se insere, onde os espaços podem ser
contíguos ou não, mas cujas valências devem ser complementares.

 O Mar e os Desafios à Soberania Angolana

Os espaços marítimos sob soberania e/ou jurisdição de Estados ribeirinhos no continente


Africano são marcados, maioritariamente, pelo fraco exercício da autoridade dos Estados,
muito graças à consciência predominantemente territorial das suas comunidades e
organizações. Um exemplo genuíno deste fenómeno é o facto da “União Africana e a sua
antecessora (OUA) sempre terem privilegiado a segurança territorial em detrimento de uma
maior segurança marítima, deixando o espaço marítimo no esquecimento e menosprezando
deste modo o seu valor estratégico” (Dias & Branco, 2011, p. 13). Esta menor importância
associada ao facto de que ao longo dos anos estes Estados não terem conseguido edificar um
modelo de Estado-Nação com princípios democráticos e transparentes, com estruturas
nacionais fortes, e com instituições orientadas para o interesse colectivo e não sectorial,
explica o vazio de autoridade nos espaços líquidos africanos, em oposição ao que A missão

46
estratégica de Defesa Militar no mar evidencia as exigências genéricas de segurança militar da
sociedade nacional, a que as FA devem atender, através da sua Marinha de Guerra em
coordenação com outros Órgãos e Instituições públicas.

Desde logo, “o exercício da soberania e da autoridade do Estado no mar não pode deixar de
constituir uma das principais preocupações e obrigações dos Estados ribeirinhos, quer seja
numa perspectiva de desenvolvimento como numa outra complementar de segurança” (Neves,
2010, p. 13), porquanto o primeiro objectivo da Marinha é óbvio, “...a participação na defesa
do país soberano que quer manter-se independente...” (Sacchetti, 2005a, p. 14), pelo que este
apresenta-se como o principal objectivo da MGA, justificável perante a Nação. Assim:

“a influência do Poder Naval coadjuvado pelo papel das Estratégias Navais surgem
como temas centrais na actualidade, especialmente devido a influência do Poder
Marítimo no século XXI, tendo importância estratégica na conjuntura mundial, uma
vez que a força gerada pelo uso do mar é incontestável, criando um laço forte entre o
Poder Naval e o Poder Económico dos Estados, sendo que para muitos no passado o
mar foi como a internet na actualidade, tendo impulsionado de forma preponderante
a globalização” (DUARTE, 2011, p. 4).

Naturalmente neste clima de instabilidade futura, as convergências e divergências de


interesses continuarão a ser constantes nas relações internacionais, em nome da sobrevivência
dos Estado «Pacheco, 1985, p. 124», num cenário em que a defesa como contributo de um
país e dos seus legítimos interesses, continua a ter fortes condicionamentos nos países
subdesenvolvidos. Portanto, o novo fenómeno das redes de que o mar é centro, a sua
disseminação transversal, e o sentimento de insegurança que as mesmas semeiam –
nomeadamente no mundo ocidental – “exige, pois, novos modelos de combate e de sanção, e
novas posturas e alianças por parte dos Estados e das sociedades” (Diogo, 2004, p. 88-89),
onde a análise das novas ameaças terá de ser bem mais ampla, fruto da realidade da «Nova
Ordem Internacional».

 A Importância do Mar na Afirmação de Angola nos domínios da Segurança e


Defesa

Independentemente da dicotomia existente entre o Poder Marítimo e o Poder Terrestre, o


potencial geoestratégico dos oceanos é inegável, encontrando-se na base doutrinária do
Direito Internacional que reconhece a sua dimensão política, económica, militar e cultural,
nomeadamente para a prossecução de qualquer estratégia de desenvolvimento de um Estado
ribeirinho. Já no passado as viagens de circunavegação portuguesas, durante os séculos XIV e

47
XV, tentando “quebrar a orientação geopolítica continentalista da Europa cristã face à Ásia
muçulmana” (Carvalho, 1992, p. 18), utilizou o Mar para atingir as riquezas de África e da
Índia, cercando assim o Médio Oriente Muçulmano através da África Oriental e do Oceano
Índico, materializando a sua importância no processo de desenvolvimento das nações.

O Poder Marítimo revela-se assim como uma componente fundamental do potencial


estratégico 35 e das estratégias nacionais de qualquer Estado ribeirinho, por o Mar ser um
factor económico e também um factor estratégico da economia.

Actualmente, são vários os “indicadores e referências que revelam a maior


centralidade dos oceanos no sistema político internacional, em especial daqueles
países cuja posição geográfica lhes conferiu uma maior proximidade ao espaço
marítimo, tornando-se cada vez mais necessárias políticas marítimas consistentes,
que promovam a gestão sustentada das riquezas do Mar” (Neves, 2010, p. 2).

Para Angola, enquanto país ribeirinho, o seu desenvolvimento e afirmação no quadro das
relações internacionais passa inequivocamente pela edificação de um «Poder Marítimo, como
reforço saliente do Poder Nacional», tornando-se imperiosa a necessidade dos decisores
políticos e económicos equacionarem recursos, que possam concretizar o devido valor do
Mar, através de um maior investimento nas suas diferentes componentes estratégicas e
económicas, onde a actuação das Marinhas (Mercante e de Guerra) surge como um factor
chave em todo o processo. Por isso, de forma a traçar uma «análise prospectiva sobre o valor
qualitativo do mar para Angola», considerou-se, em simultâneo, por um lado a tese de Alfred
Mahan, que define como principais elementos do Poder Marítimo de um Estado: a posição
geográfica, a configuração física, a extensão do território do Estado, as características da
população, o carácter nacional e o carácter do Governo; e por outro lado, no

“potencial da «Economia do Mar» nacional, tendo em conta as funções estratégicas


e económicas do mar, dado que a realização de qualquer estratégia marítima deverá
passar pela análise qualitativa dos diferentes subsectores (transportes e logística;
pescas e alimentação; construção naval; passageiros, lazer e turismo; recursos e
energia; e segurança e defesa), enquanto pilares de uma economia centrada no Mar”
(SAER, 2009, p. 95).

Em termos geopolíticos e geoestratégicos, a "posição geográfica" constitui um dos factores


mais importantes do «potencial estratégico» de qualquer Estado visto que e com base neste
elemento, um País pode estar mais vulnerável a riscos, que resultem em ameaças dos mais

35
Para avaliar o Poder Nacional de um Estado interessa analisar o poder efectivo, mas também o poder potencial
segundo os mesmos elementos constitutivos, nomeadamente porque o potencial diferencia-se do efectivo, visto
que este é a revelação da força em certas circunstâncias com vista à obtenção de objectivos concretos, enquanto
o potencial é usado para estabelecer objectivos amplos a serem alcançados a longo prazo (Couto, 1988).
48
variados tipos. Muito mais para um Estado como Angola situado numa área estratégica para
as «rotas marítimas do Atlântico Sul que passam pelo Cabo da Boa Esperança» ou com
destino aos pólos, com acesso fácil ao mar aberto (o que facilita a projecção de forças navais).
Confirma-se assim que a posição geográfica é de tal modo importante, que se torna
indispensável para a análise do panorama actual e previsão de futuros cenários.

A "configuração da orla de Angola" confirma o atrás “descrito, mormente pela


possibilidade da exploração simultânea dos recursos naturais da terra e do mar (o
poder anfíbio de Spykman), acrescida pelas possibilidades de comunicação marítima
com todo mundo; esta vantagem não acontece com os Estados interiores” (Carvalho,
1992, p. 39).

Neste contexto, além dos 1 650 km de costa marítima e do potencial em recursos naturais,
importa sublinhar a importância da localização dos portos nacionais, nomeadamente o Porto
de Lobito, um dos maiores portos de águas profundas da África Ocidental, com uma
localização estratégica privilegiada, surgindo como o ponto de escoamento de mercadorias de
um extenso corredor ferroviário que liga o Oceano Indico (cidade da Beira – Moçambique) ao
Oceano Atlântico (Lobito), através do Corredor de Benguela.

Relativamente às "características da população de Angola", esta pode “constituir o seu maior


elemento de força, visto que dela depende a transformação do poder potencial ou presumível
em poder real ou efectivo e a condução das estratégias de desenvolvimento implementadas
pelo Estado” (Carvalho, 1992, p. 42). O factor demográfico surge como um aspecto
fundamental, sobretudo para Angola, em que mais de metade da população total tem uma
idade inferior aos 35 anos, sendo a maior parte da massa crítica do país muito jovem. Assim e
associado às características da massa crítica encontra-se o "carácter nacional" “...as
affecting the development ofS ea Power...” (Mahan, 1889, p. 47), mormente para um país
onde mais de 29% dos centros demográficos se situam a uma distância inferior a 100 km da
costa e onde uma considerável percentagem da população se dedica à pesca artesanal, o que
para a segurança, defesa e afirmação no quadro internacional, tem grande relevância.

Considera-se então que Angola tem potencial para vir a tornar-se, a longo prazo, numa
Potência Regional com consideráveis capacidades marítimas, quer pelas suas potencialidades
marítimas, quer pelas actividades económicas que aí se desenvolvem e outras ainda que
podem ser exercidas, necessitando para tal de uma estrutura nacional e de políticas públicas
capazes de garantir o uso sustentável do mar. Efectivamente, numa Era marcada por
descontinuidades, nos padrões e modelos de desenvolvimento em todo mundo, e nas

49
circunstâncias específicas do desenvolvimento económico angolano, a exploração dos
sectores de actividades associados ao mar aparece como uma possibilidade de exploração de
uma continuidade estrutural que é constituinte da sua realidade estratégica, o Oceano
Atlântico.

Quanto à "expressão económica", materializa-se pelo conjunto de actividades ligadas directa e


indirectamente com o sector marítimo e a respectiva economia, revelando-se importantes para
a consolidação da economia nacional, estando directamente associada ao desenvolvimento
sustentável do país; em que para reconhecer a dimensão estratégica dos oceanos na economia
angolana, será suficiente observar os valores do sector petrolífero «offshore», no PIB
nacional, agregados às taxas de empregabilidade deste sector na economia nacional. Este
sector possui um efeito multiplicador em outros sectores de actividades da economia nacional,
nos quais o maior investimento nas Ciências do Mar permitirá catalisar melhor os benefícios
deste espaço no bem-estar dos Angolanos. Por sua vez, "a expressão sociocultural" encontra-
se associada à consciência de que, os Angolanos começam a experimentar um novo ciclo da
sua História com o desabrochar da mentalidade marítima, onde a criação de uma cultura
marítima consolidará um melhor legado para o futuro do País.

A percepção do potencial marítimo do território nacional e o adequado equilíbrio das suas


componentes no controlo e uso do mar será a "última fase da maritimidade de Angola" por
assegurar a exploração do mar, gerar riqueza e atrair parceiros, num cenário onde será
necessário «investir acreditando e esperar investindo», para que a longo prazo o mar se perfile
como elemento chave na identidade nacional.

De onde se infere que a questão da «Economia do Mar» e de todos os seus segmentos tem de
ser necessariamente objecto de uma nova visão política e da sociedade civil angolana, num
contexto em que o tratamento transversal de todas as actividades e o desenvolvimento
associado de políticas públicas e de iniciativas privadas se torna numa exigência, tendo em
vista que os benefícios do mar e da posição geográfica de Angola não continuem a limitar-se
prioritariamente na exploração de combustíveis fósseis.

Por isso e tal como advogou Virgílio de Carvalho, os países como Angola, “...com grandes
interesses marítimos, ou cuja independência e mesmo sobrevivência dependem
consideravelmente do mar, terão conveniência em adoptar uma Estratégia de utilização do
mar, ou seja do «Sea Use»” (Carvalho, 1982, p. 131), pois os princípios da boa governação

50
dos recursos do mar apontam para a necessidade de uma Política Marítima, fundamentada por
uma Estratégia Marítima36, que englobe todos os aspectos dos oceanos e Mares, e sustentada
por um Planeamento Estratégico Nacional para a Economia do Mar.

36
Segundo o General Cabral Couto (2009), citado por Lourenço (2011, p. 31), para operacionalizar uma
Estratégia para o Mar consistente, deve-se satisfazer quatro questões fundamentais: saber o que se quer; querer
fazê-lo; poder fazê-lo; e saber fazê-lo.
51
VI. CONCLUSÕES

Na perspectiva de realçar as principais linhas de pensamento traçadas deste processo de


investigação sobre a relação do Mar com Angola, onde se provou representar uma mais-valia;
importará aqui sublinhar que o objectivo do presente trabalho nunca foi quantificar os meios
que o Estado deve alocar à promoção da segurança dos espaços marítimos sob sua soberania
e/ou jurisdição, nem de traçar uma fórmula para a afirmação marítima do País, através da
edificação do sector marítimo e da consolidação de uma Economia do Mar, no quadro dos
interesses nacionais. Pretende-se sim apresentar um estudo que representa uma «visão
estratégica alargada sobre a importância do Mar para Angola», nos vários domínios, centrados
na segurança, defesa e afirmação, associada à multiplicidade de usos económicos do mar, por
se considerar que falta uma «visão concertada relativamente ao Mar» que leve os Angolanos a
perceber e a interpretar o exacto valor do seu mar, desvendando a sua importância como
factor de «diferenciação no quadro geográfico onde o país se encontra».

Paralelamente e porque se acha que o posicionamento geográfico de Angola permite


vislumbrar o desenvolvimento de vantagens económicas que poderão assumir contornos de
vantagens geopolíticas e geoestratégicas, enquanto confere maior relevância política ao
Estado; as características da costa, a vasta fronteira marítima, a extensa ZEE, a importância
estratégica dos portos nacionais, as reservas de recursos naturais no mar, a vontade de
afirmação regional, entre outros factores relativos ao potencial marítimo nacional;
representam motivações evidentes para o desenvolvimento de uma indústria nacional forte
dedicada ao mar, onde a valorização e o potenciamento da Marinha de Guerra constitui peça
fundamental. De facto, o caminho a percorrer é longo e muito difícil, todavia o País ainda está
em tempo de ultrapassar os principais desafios que o sector marítimo nacional atravessa, na
consciência de que os esforços esperados são incalculáveis e que sozinhos os Angolanos não
conseguirão alcançar esse desiderato, num processo em que será necessário que se continue a
trabalhar nas mentalidades nacionais e que se exige o redobramento dos esforços por parte
dos decisores políticos e económicos. Assumindo as particularidades geopolíticas marítimas
de Angola, a importância estratégica atribuída ao mar como elemento estratégico de
segurança, defesa e de afirmação ainda é muito reduzida e até incipiente.

Face a esta realidade, importa responder à questão central sobre: qual o valor do mar, em
termos fluídos, como factor estratégico de Segurança, Defesa e Afirmação do Estado

52
angolano no continente africano? Angola, como um país com uma vasta costa e rica em
recursos naturais, até há alguns anos pouco importante no contexto geopolítico mundial,
encontra-se situada numa região onde convergem vários interesses das principais potências
mundiais – o Atlântico Sul – que tem hoje uma crescente importância económica, mormente
devido às descobertas de grandes reservas de hidrocarbonetos. Neste quadro o Golfo da Guiné
tem um lugar destacado, favorecido pela contínua instabilidade no Golfo Pérsico. Soma-se o
facto de existirem facilidades geográficas de acesso aos portos e ao seu interior através de
ligações ferroviárias, que num futuro muito breve serão melhor apoiadas por infra-estruturas
rodoviárias com os países vizinhos interiores, detentores de reservas de minerais estratégicos,
o que irá aumentar o valor geoestratégico do Mar para os Angolanos.

De uma forma geral, o potencial do Mar afirma-se a vários níveis, enquanto factor estratégico
de segurança, de defesa e de afirmação: ao nível da função transporte e logística, por ser
responsável pelo abastecimento do mercado interno que depende mais do que 90% das
importações; ao nível da função pesca e alimentação, por representar uma fonte de
subsistência de uma parcela da população e de fonte de receitas para a economia nacional; ao
nível da construção naval, por apoiar a indústria marítima, nomeadamente da indústria
petrolífera; ao nível do turismo marítimo enquanto fomentador de uma cultura marítima; ao
nível da função energia e recursos naturais, designadamente da exploração do petróleo
offshore, responsável por mais de 44% do PIB nacional e de aproximadamente 80% das
receitas fiscais públicas e de 98% das exportações; e por último e não menos importante ao
nível da segurança e defesa do Estado, enquanto pilar para a preservação da soberania e de
integridade nacionais.

Neste quadro importará perceber: quais os principais desafios que se colocam ao Estado no
âmbito da Segurança e da Defesa Nacional, de forma a proteger o seu espaço marítimo?
Obviamente que a natureza dos desafios marítimos da actualidade obriga qualquer Estado a
reequacionar a problemática da dimensão marítima da segurança para além dos limites e das
perspectivas realistas e neo-realistas, onde o Interesse Nacional e o vector militar surgem
como elementos delineadores e onde a maior interacção com os atores não-estatais, como as
ONG, OI, ou as empresas multinacionais, constituem pilares para a sobrevivência de Angola.
Neste particular, tendo em conta a vasta área marítima que o Estado angolano precisa de
continuar a proteger, sobretudo caso o processo de extensão da plataforma continental exterior
seja aprovado, existe a necessidade em adaptar o Sistema Nacional de Autoridade Marítima

53
ao novo contexto internacional, contra as ameaças vindas do exterior e proliferadas por
diferentes atores do crime organizado, nomeadamente porque existe a necessidade de proteger
os recursos que existem no mar Haverá então que definir quais são as ameaças mais
relevantes, na perspectiva do Conceito Estratégico Nacional, que devem ser consideradas na
segurança no mar angolano, particularmente porque a situação actual do SFN reflecte a
inexistência de uma posição política consistente perante este problema; bem como de uma
metodologia para a avaliação periódica das suas consequências para os interesses nacionais.
Neste contexto e não ignorando a limitação em termos de recursos relativamente aos desafios,
terá de ser considerado o caso específico da Marinha de Guerra enquanto braço armado do
Estado no mar, pelo que existe a necessidade de prosseguir com a reforma no quadro das RSS
e RSD; o que significará um novo «redimensionamento» na actuação da MGA no mar e no
quadro do SAM, uma remodelação das infra-estruturas nacionais ligadas ao ramo e ao SAM e
um reequipamento da Esquadra Naval. Considera-se que e numa primeira fase, os poucos
recursos disponíveis devem ser utilizados fundamentalmente para a edificação de uma
Marinha de Guerra orientada para o controlo e policiamento dos espaços marítimos sob
responsabilidades do Estado angolano, dedicado sobretudo às missões de segurança e defesa
militar e de autoridade do Estado no mar ou seja, uma Marinha de carácter costeiro
englobando as funções de uma guarda costeira dispondo de alguma capacidade oceânica
(Marinha de Zona), de forma a optimizar melhor os poucos recursos a médio e longo prazo,
que a MGA tem disponíveis. Posteriormente, será de considerar o amadurecimento de uma
doutrina naval de segurança e de defesa dos espaços marítimos, onde a actuação da Marinha
deverá transcender as actuações de carácter puramente militar para uma perspectiva mais
alargada como «Marinha de Duplo Uso», o que implicaria que o Comandante da Marinha
surgisse cumulativamente como a Entidade Superior do SAM, num cenário onde a actuação
harmoniosa entre as instituições desse sistema pudesse surgir como requisito fundamental. De
forma semelhante e porque a Marinha de Guerra não é uma peça isolada neste quadro
institucional de Autoridade Marítima, será de considerar que este processo de 3R deva ser
estendido para as outras Forças com actuação no mar, conjuntamente por um processo de
aproximações concertadas (parceiros internacionais e Estados vizinhos) e participações
estratégicas quer ao nível local, regional e como internacional (SADC, CEEAC, UA,
ZOPACAS, CPLP e ONU); e como vector para o reforço das valias de Angola no âmbito da
segurança e defesa marítimas, no quadro da APSA. Isto porque, os riscos com origens a
ameaças para a Segurança Nacional têm proliferado, num quadro onde a costa ocidental do

54
continente Africano começa a ser uma zona preferencial das acções criminosas,
nomeadamente da pirataria, do narcotráfico, da pesca IUU, do terrorismo marítimo, do
contrabando, do eco crime e de outros riscos que reproduzem ameaças para a segurança, a
soberania e a integridade nacional, e onde exige a necessidade de defender o Interesse
Nacional. Por isso e para o melhor aproveitamento das dinâmicas proporcionadas pelo Mar,
Angola deve adoptar uma Estratégia Marítima, apoiada por uma Estratégia Naval, o que
justifica a necessidade de, a médio e longo prazo, edificar uma indústria de defesa com uma
componente naval associada aos estaleiros, implementar sistemas de vigilância marítima,
fortificar o patrulhamento no mar, e continuar a investir na formação de recursos humanos em
áreas especializadas, como a investigação científica, constituindo assim algumas linhas de
acção estratégica, de forma a dar lugar ao desenvolvimento de todo o sector marítimo.
Destarte, se Angola espera vislumbrar um futuro próspero como parte interessada e integrante
de um mercado emergente no quadro mundial, o País terá de exercer um maior controlo do
seu espaço marítimo, sobretudo porque a segurança marítima é essencial para manter o fluxo
de receitas do petróleo e gás, enquanto grande catalisador para o desenvolvimento nacional.
Deste modo e numa perspectiva de "Geopolítica e Prospectiva", será de considerar a
indissociabilidade entre a segurança marítima e a exploração económica do mar; o que
justifica o fomento do interesse de toda a Nação nas questões de segurança e defesa do mar,
que se traduz num investimento estratégico na exploração e dinamização da economia do mar,
significando por isso para Angola um factor de afirmação, de alavancagem e de diversificação
económica para Angola. Portanto e em confirmação da hipótese 2, o maior combate da
insegurança marítima poderá contribuir para o melhor posicionamento geoestratégico no
âmbito regional e consecutivamente no melhor aproveitamento económico e científico do mar

A concluir pretende-se ainda referir que, por razões de racionalidade na dimensão do texto,
da sua inteligibilidade e especialização, a abordagem apenas focou os elementos que foram
tidos como fundamentais para o expressado valor qualitativo do mar: como elemento de
segurança, defesa e de afirmação de Angola; não tendo sido aprofundados alguns aspectos
relacionados com a segurança e a defesa nacional, como um todo. Assim, tal como referiu
Santo Agostinho embora num contexto diferente, espera-se que deste «pequeno esforço e a
pulso de remos» tenha resultado uma «obra para advertir outros cidadãos e a ela se
acolherem», servindo também de um estímulo para a visão marítima dos Angolanos. Por
último e como "proposta de trabalho futuro", considera-se que um estudo centrado nas
principais estratégias e medidas necessárias e determinantes para a criação de um «cluster da
55
Economia do Mar», seria uma mais-valia para o sector marítimo nacional, pelo que deverão
ser analisados e avaliados os principais activos da Economia do Mar no país, tendo em
consideração os efeitos directos e indirectos destes activos no PIB nacional.

Angola, ao ser detentora de recursos "críticos" indispensáveis para a sustentação e progresso


do seu povo e da comunidade internacional, terá de assumir a sua identidade de potência em
ascensão, nomeadamente na costa ocidental de África. Para isso torna-se indispensável
estabelecer uma Política Nacional que valorize o Mar e as suas potencialidades com base nas
quais essa Política, através da respectiva Estratégia possa vir a materializar e a alicerçar a
vantagem geopolítica e também de projecção geoestratégica na terra e no mar que a sua
privilegiada localização lhe confere.

56
VII. RECOMENDAÇÕES

Após a apresentação descritiva da nossa monografia somos a tecer as seguintes


recomendações, no sentido de o Estados angolano melhor aproveitar as oportunidades que sua
posição geopolítica lhe confere, nomeadamente:

 Investir cada vez mais no sector marítimo, para que a longo prazo o mar se perfile como
elemento chave na identidade nacional;

 Dinamizar um maior entrosamento entre as Marinhas de Guerra e a Mercante: a primeira


como pilar da segurança militar de todo o sector marítimo-portuário, e a segunda como
pulmão fomentador da economia deste sector e de toda a estrutura nacional ligada ao mar.

 Projectar uma Estratégia Marítima Nacional, onde esteja identificada a necessidade de se


edificar um Poder Marítimo que contribua para a melhor exploração dos benefícios a
partir dos vários usos que se podem dar ao mar, pois só a partir de uma exploração
harmoniosa e integral de todas as componentes do sector marítimo se poderá maximizar
os activos do mar na economia nacional, contribuindo dessa forma para a segurança,
defesa e afirmação nacional.

 Aos académicos sugerimos que se deve olhar com maior interesse em torno da
geopolítica, abordando cada vez mais esta questão.

57
VIII. BIBLIOGRAFIA

ANGOLA. Constituição (2010). Constituição da República de Angola: promulgada em 5 de


Fevereiro de 2010. Luanda, Where Angola, 2014.

ANGOP, Agencia Angola Press. Ministra considera estratégico sector das Pescas. Luanda,
8 Novembro2012, Disponível em: http://www.portaldeangola.com/2012/11/ministra-
considera-estrategico-sector-daspescas/. Acesso em 21 de Novembro de 2019

ARON, Raymond. Paix et Guerre entre Les nations. Paris: Calmann- Lévy, 1962.

ATTALI, Jacques. Linhas de horizonte. Lisboa: Difel, 1991

ALMEIDA, João. Ensaios de Geopolítica. Lisboa: ISCSP / IICT. 1994.

BONIFACE, Pascal. Dicionário Das Relações Internacionais. 3ª Edição. Lisboa: Plátano


Editora,2013.

CARVALHO, João. O Mundo em renovação. Um sucesso da Idade Transoceânica


iniciada por Portugal. Porto: Universidade Portucalense, 1992.

CHALIAND, Gérard; RAGEAU, Jean-Pierre. Atlas Stratégique. Belgica: Éditions


Complexe, 1994.

CHARNAY, J. Patrick. Critique de la Stratégie. Paris: Editions de l’Herne, 1990.

CLAUSEWITZ, Carl Von. Da Guerra. Lisboa: Perspectivas e Realidades, 1976.

CLINE, Ray S. Avaliação do poder mundial: Defesa Nacional. Rio de Janeiro: IAEM,
1982.

COHEN, Saul Bernard.Geography and Politics in a Divided Word.Londres: Rabdom


House, 1963.

CORREIA, Pedro de Pezarat. Manual de Geopolítica e Geoestratégia– Vol.1, conceitos,


teorias, doutrinam. Portugal: Edições Almedina,2010.

CORREIA, Pedro de Pezarat. Geopolítica e Geoestratégia. Lisboa: Nação e Defesa, 2012.

COUTO, Cabral Abel. Elementos de Estratégia, Apontamentos para um Curso. Volume I,


Lisboa: Instituto de Altos Estudos Militares, 1988.
58
COSTA, Fernando Solano da. Significação actual da geopolítica. Lisboa: IAEM, 1982.

DALA, E. Reforço da Soberania. Jornal de Angola. Luanda: 16, Março de 2013.


Disponívelem:http://jornaldeangola.sapo.ao/politica/reforco_da_soberania_no_mar. Acesso
em 12 Nov. 2019.

DEFARGES, Philippe. Introdução a Geopolítico. Lisboa: Gradiva, 2012.

EMBAIXADA DA REPÚBLICA DA POLÓNIA EM LUANDA. Assinatura do contrato


referente à 2ª fase da construção da Academia das Pescas e Ciências do Mar no Namibe.
Luanda, 30 maio, 2012.
Disponívelem:http://www.luanda.msz.gov.pl/pt/acontecimentos/assinatura_do_contrato_refer
ente. Acesso em 11 de Janeiro de 2019.

GERALDES, Araújo. O pensamento geopolítico e geoestratégico, uma perspectiva da sua


evolução. Lisboa: Nação e Defesa, 1983.

HAUSHOFER, Karl. Japan und die Japaner. Eine Landeskunde. (trad. fr., Le Japon et
les Japonais, 1937). Paris-Genève: Éditions Payot, 1931.

INSTITUTOS DE ALTOS ESTUDOS MILITARES. Elementos de Análise Geopolítica e


Geostratégica (ME 71-00-08). Lisboa: IAEM,1993.

KJELLEN, Rudolf. Um Programa das Linhas Nacional Gathering. Suécia: Estocolmo,


1908.

KORINMAN, Michel. Quand l´Allemagne pensait le monde, Grandeur et décadence


d´une géopolitique. Paris: Fayard, 1990.

KORINMAN, Michel. Continents Perdus. Les Precurseurs de la Géopolitique


Allemande. Paris: Económica, 1991.

MAGNOLI, Demétrio. O que é Geopolítica. São Paulo: Brasiliense, 1986.

MINAYO, Maria Cecília de Souza. Pesquisa Social: teoria, método e criatividade.


Petrópolis: Vozes, 1994

59
MONTEIRO, N. S.; MOURINHA, A. A. Marinha de Duplo Uso: Um conceito pós
moderno de utilização do poder marítimo. Jornal Defesa e Relações Internacionais.23,
Agosto 2011. Disponível em:
http://database.jornaldefesa.pt/politicas_de_defesa/portugal/Marinha%20de%20Dupl
o%20Uso%20Um%20conceito%20p%C3%B3smoderno%20de%20utiliza%C3%A7
%C3%A3o%20do%20poder%20mar%C3%ADtimo.pdf. Acesso em 23 de Nov. de 2019.

RAFFESTIN, Claude. Pour une Geographie du Pouvoir. Paris: Librairies Techniques,


1980.

RATZEL, Friedrich. O Solo, a Sociedade e o Estado. In: Revista do Departamento de


Geografia. São Paulo: USP/DG, n. 2, 1983.

ROCHA, Humberto Santos. Contributos para uma caracterização da Geopolítica


Marítima de Portugal. Portugal: Cadernos Navais, 2009.

RODRIGUES, Alexandre Reis. O Poder Naval na bacia do Atlântico. Actualidade e


futuro. Portugal: Maria Scientia – Revista Científica Electrónica Scientific e-Journal, 2013.

ROQUE, Fátima Moura. O Desenvolvimento do continente africano na Era da


Mundialização. Coimbra: Almedina, 2005.

ROSA, Armindo Bravo. Política de Defesa de Angola. Portugal: Nação & Defesa, 2010

RIBEIRO, A. Silva. Uma Visão Estratégica do Mar – perspectivas de análise. Portugal:


Cadernos Navais,2008.

SACCHETTI, António Ferraz. O Pensamento Estratégico e o Mar. Lisboa: Nação &


Defesa, 2009.

SANTOS, José Loureiro. Segurança e Defesa na viragem do milénio: reflexões sobre


Estratégia II. Portugal: Publicações Europa-América, Lda.,2001.

SANTOS, José Loureiro. O Estado e as Políticas de Defesa. Portugal: Revista Militar, 2007.

SANTOS, José Loureiro. Uma visão Portuguesa da Segurança do Atlântico Sul. Portugal:
Nação & Defesa, 2011.

60
SANTOS, José Loureiro. Um Sistema de Segurança Para a Totalidade do Ocidente
Geográfico. Portugal: Revista Militar, 2008.

SANTOS, José Loureiro. Uma visão Portuguesa da Segurança do Atlântico Sul. Portugal:
Nação & Defesa, 2011.

TOSTA, Octávio. Teorias Geopolíticas. Rio de Janeiro, Brasil: Biblioteca do Exército,1984.

TZU, Sun. A arte da Guerra. Lisboa: Clássica Editora, 2012.

VERÍSSIMO, Gilberto. Elementos de Geopolítica e Geoestratégia. Lisboa: Edição Ler


Devagar, 2013.

VIANA, V. R. O Novo Ambiente Estratégico: uma reflexão sobre as mudanças na


distribuição do Poder Internacional. In A. P. Lousada & F. P. Garcia (Coords.), Da
História Militar e da Estratégia: Estudos de homenagem ao General Loureiro dos
Santos. Loures: Diário de Bordo, 2013.

WEBER, Max. A política como profissão. Lisboa: Edições Universitária Lusófonas, 2000.

WEIGERT, Hans Werner. Generals and Geographs: The Twilight of Geopolitics. Oxford:
University Press, 1942.

61
ANEXOS

I
Anexo I: Mapa de Angola

Fonte: Manual de Geopolítica e Geoestratégia de Gilberto Veríssimo.

II
Anexo II: Mapa topográfico de Angola

Fonte: www.gov.ao

III

Você também pode gostar