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TEATRO HOJE
Direção de DIAS GOMES Alfred J arry
Série Autores Estrangeiros
Volume 20
.
VOLUMES PUBLICADOS:
Série Autores Nacionais:
Montage m de capa:
DOUNÊ I
i
I
I
Diagram ação: · j
LÉA CAULLIRA UX ~
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J·
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I
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1972
Impresso no Brasil
Printed in Brazil ALFRED ]ARRY na época em que escreveu Ubu Rei.
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'·
Happening Ubu
ix
quit rave , e um côro de com pars as prov idos
ras. Aco stum ados ao estil o decl ama de más ca- ram ente excê ntri ca (out ros dizem:
tório Foi hom em baix inho , vigoroso como for~ emente louc a).
,I
Fran çais , espe rava m ver o ator prin cipa l do Thé âtre
avan çar para seus
pate rnos cicli sta apai xon ado, esgr imid or ante pass ados
a riba lta, pron unci ando versos raci nian os
com o - dor à li~ha - apen as os olhos prof undos hábi l, pesc a-
a apa rên cia de um desp ortis ta desp reoc upad desm enti ram
pTa ctica l jokes, zom bav a de todos e
o. Dado a
((
Cet espr it d'imp1·udence et d'e1·reuT, cula riza do por todo s, leva ndo uma exis acab ou send o ridi-
Com o todo s os gran des hum oris tas, com otênc ia burl esca .
Swi ft, como Gogol, foi hom em trist e. O fato Moliêre, como
De la chut e des rois fune ste avant-cou1·eu
r", quee1·, no dizer de .Joyce, con~ribuiu para torn de ter sido
tími do. Viveu em pob reza abje cta. Rec usou á-lo isolado,
tuni dad es, por inca paci dad e inat a de faze tôda s as opor -
háb itos da vida burg ·ues a e às conv ençõ es r con cessões aos
mas em vez disso, o gran de ator Firm in da vida lite-
çou para a riba lta, dirig indo -se à plat éia,Gém ier avan - rári a pari sien se. A tôda s as suas tribu laçõ
es junt ou-se
do a pala vra que nun ca até entã o se tinh a pron unci an- doen ça tortu rant e. Enc ontr ou o únic o cons
ôlo no álcool.
ouvi do num Pod e-se afirm ar que .Jarr y se suic idou , bebe
palc o: ndo siste -
({Me rde! " màt icam ente . Mor reu em 1907 , com apen as
tro ano s de idad e, na mes ma solidão em trin ta e qua-
Foi o escâ ndal o. vive ra. que sem pre
Mas nem todos os pres ente s vaia ram a aud Os prim eiro s que reco nhec eram
ácia iné-
dita . Esta va pres ente Mal larm é, o grav e Mal larm é, e Jarr y, fora m Apo llina ire e Max Jacoab: imp ortâ ncia de
seu com entá rio foi uma surp rêsa : "Jar ry em 1903 um núm ero espe cial de uma revi dedi cara m-lh e
é poet a"1 dis-
se, "e com êste Ubu -Roi com eça uma nov
a époc a". Foi que ning uém leu. Dep ois, muit o depois, viersta liter ária
uma fras e prof ética . Mas a prof ecia ficou dura real istas , cain do n o outr o extremo: dese nter am os sur-
temp o inco mpr eend ida, ' e aind a hoje mui tos nte mui to qua se esquecido Jarr y. para colocá-lo nos rara m o já
perg unta m:
- Que m foi Ubu? Que m foi Jarry ? · dos pont ífice s do mov ime nto cheg ou a altar es; um
Que resp onda Jam es Joyce. Em Finn ega ns Ubu -Roi vale mai s que as obras com
decl arar que
obra na qual cada fras e ence rra Wak e, plet as
pear e. Mas não foi mod a efêmera. É indi de Shak es-
são crip togr afad a, Sha un diz sôbre pelo men os uma alu-
Shem : "He has nove l fluê ncia prof und a que Jarr y exerceu sôbr scut ível a in-
idea s I k1WW am:l he's a Jarr y quee gua rda fran cesa : sôbr e a poesia das grane tôda a van-
quee r é alus ão men os deli cada aos hr ábit
fish~'. O adje tivo
os da vida quot idia na, de Léo n-Pa ul Farg ue; des cidades e
suje ito da frase, mas · trata -se, sem dúvi da, sexu ais do sia de hum our noir de Aud iber ti; sôbr e sôbr e a poe-
cret a hom enag em a êsse hom em de nove _de uma se- expe riên cias ling üíst icas de Michaux; sôbras auda cios as
l zdeas: a Al- e
fred Jarr y. drar s, que tran smi tiu uma cent elha de irrev Blai se Cen -
rini ana ao mod erni smo paul ista; sôbr e erên cia jar-
Não se descreve com fras es convencionai F erna
fish. No enta nto, uma intro duçã o - com s um quee r que d edic ou a J arry um estudo notá vel, nd Lot,
pode disp ensa r cert os elem ento s info rmao esta - não depo is, pela mon ogra fia da escr itora suíç só supe rado ,
Jarr y nasc eu em 1873 em Lavai, filho de tivo s. Alfred dion -Wa lcke r, que foi ami ga de Joyc e a Caro la Gie-
cam pon eses robu stos da Bre tanh a e de umagera ções de Des de entã o, o anti liter ato Alfred Jarr y tem e Apo llina ire.
mãe ligei- men te, gara ntid o seu luga r na hist ória , para doxa l-
da liter atur a
X
xi
moderna. Ubu é rei coroado e ungido de uma vanguar- do século e do mundo. Jarry também virou simbolista e
da que já deixou de ser vanguarda. decadentista. Mas suas lam entações n ão se referiram
Jarry começara ridicularizando Ubu, caricatura do ao passado e, sim, ao futuro, e seus versos não eram
repugnante e tirânico pro!essor sec~n?ário que lhe harmoniosos, mas deliberadamente ásperos ou, como se
amargurara os dias de garoto no Coleg10 em Rennes. dizia então "barrocos" (é, aliás, surpreendente a se-
Tornando-se famoso por essa caricatura demolidora, melhança dêsses seus vers<:s com. os do maneiri~mo e
Jarry acabou identificando-se com sua vítima, andando barroco inglês, que J arry nao podia conhecer ~ nao co-
como Ubu e falando como Ubu. Foi sua máscara para nhecia). De fato, as poesias do volume Les Mznutes de
defender contra amigos e inimigos íntimos sua pTiv-acy Sable Mémo1ial são as primeiras poesias realmente van-
vulnerável e vulnerada. Criou-se um equívoco: Jarry guardistas da literatura . francesa : influ enci a~as por
teria sido o próprio Ubu e Ubu-Roi sua única obra no- Lautréamont, antecipam muitas vêzes o surrealismo de
tável ou pelo menos decisiva . Mas não é tanto assim. Breton . ,
'
Alfred Jarry '
não é homem de um livro só. Sua Obra e, É claro que em 1895 ninguém entendeu essa espe-
volumosa e multiforme e s uas obras, embora em parte cie de poesia . Mas achou alguns admiradores ,o .roman-
dificilmente acessíveis, s'empre são importantes e, às ce Messaline, porque cheio de erudição arqueolog~c:=t; e a
vêzes, de surpreendente atualidade. obra teria talvez encontrado reconhecimento oflc1al, se
Quando J arry, jovem estudante, ainda vivia na a imperat~iz ro~ãna fôsse um pouco menos ostensiva-
Bretanha, a grande moda literária da época era o na- mente ninfomaníaca.
turalismo à maneira de Zola. Sacrificando a êsse estilo, Os interêsses científicos de J arry eram muitos e
Jarry aproveitou as experiências dos seus dois anos de não se limitaram à erudição clássica. Em Le Surmâle,
serviço militar obrigatório em Lavai para escr ever o ro- o personagem principal é um técnico, um especi.alista
mance Les Jow·s et L es Nuits, quadro repugnante de em eletrônioa avant la lettre. O romance antecipa a
gente brutalizada, dir-se~ia bestializada e estupidificada science-fiction e prediz muito exatamente os horrores
pelo treinamento militar. Logicamente, o personagem que a técnica é capaz de desenfrear quando a~usam
"heróico" do romance é Sengle, o desertor. Se, naquel~ dela os tecnocratas-ditadores; também vale ,mencwnar,
época, círculos oficiais se tivessem dignado de ler êsse neste contexto, o poema "Chanson Du De?ervelag_e",
romance, estariam patrioticamente indignados. Mas que prediz a mistificação tias massas pelo bram-washzng
cinqüenta anos mais tarde, os militares de Lavai e ou- da propaganda política. .
tras localidades, derrotados por um inimigo estrangei- Nem todos os estudos de Jarry podem ser levados
ro ainda mais reacionário que êles próprios, deixaram a sério. Dos seus tempos de poeta simbolista tinha êle
de ser a honra 'e a esperança da Pátria Francesa, e An- guardado certo interêsse pelas ciêz:cias oAcult~s e . por
dré Gide escreveu, em 11 de ·maio de 1941, em seu Jour- brincadeiras cabalísticas; da sua mae excentnca tmha
nal as palavras seguinte-5, que esprimiram a honra e a herdado uma forte veia de misticismo. Durante anos
esperança da verdadeira Pátria Francesa: uJe ne compte ocupava-o um esfôrço sério, embora involuntàrian:ente
(ou voluntàriamente?)_ humorístico. de- "de~cobnr as
plus que sur les déserteurs". O desertor Sengle estava leis que regem as exceçoes, para explicar o Umverso Su-
vindicado. :
plementar". Monumento dêsses estudos é o ro~~nce Les
Em Paris, naqueles anos de 1895, o naturalismo já Oest es et O pinions du Dr. Faustroll, especialista em
era vieux j eu. A gente trajava, então, simbolismo e ·d e- .í "Patàfísica". Há quem goste dessas coisas. O _poe~a Que.-
cadentismo, lamentando em versos harmoniosos o fim neau chegou mesmo a fundar (e manter ate hoJe) um
xii xiii
I
I
Coll ege de Pata phys ique . Mas o fato
de que um dos fre-
qüe ntad ores mais assí duo s dess a soci edad em part idár ios do com unis mo. Abs trai
cad ores é o dram atur go do absu rdo ou e de mistifi- esq uisi tas e (par a dize r a verd ade) impndo -se das idéias
dra mat urg o ab- tafí sica ", Jarr y nun ca che gou a apre sen rest áve is da "Pa-
surd o Ione sco, êsse fato bas ta para des tar qua lque r es-
góci o inte iro. mor aliz ar o ne- péci e de prog ram a liter ário ou mes mo anti
Os :verdadeiros títu los de glór de Jarr quis . Seu espírito e sua açã o fora m tota liter ário . Nem
tros . Fo1, em tudo, o prim eiro . Jáiaem y são ou- rad ame nte nega tivos . Com o mes tre da lme nte e delibe-
Hen ri Rou ssea u, ao qua l con feri u o títu 189 4 desc obri u siva , Jarr y está men os per to do surr eali neg ação agre s-
dov anie r (ma is tard e rein ven tado lo de pein tre- um out ro mov ime nto, ecli psad o por êste smo do que de
Rou ssea u, agra dece ndo , retr atou -o: por Apo llina ire) .; e
- em com pan hia não nas cera em solo fran cês: Jarr y , talvez porq ue
Gra nde Prec urso r de Dada. é, na verdade, o
de un: pap aga io e de ~m cam aleã o. Jarr
tas cois as, um prec urso r. E o cam aleã o y foi, em mui- Dad a nasc eu na Suíça,. dura nte
seau lhe deu como com pan heir o é bem que Hen ri Rous-
' - o sím bolo com o prot esto con tra a viol ênci a ea cor gue rra, em 1916,
mul tifo rmi dad e das sua s idéi as ~ntecipa da mu, ndo que mer ecia só um qua lific ativ rup ção de um
Pre curs or êle foi, em prim eira linh a, das. pala vra de Ubu-Roi. Já ante s, em temo: o da primeira
da poé tica , e é just o, por tant o, que a da van gua r- ilus ória , tinh a Jarr y reco nhe cido essa pos de uma paz
ção de Ubu -Ro i tenh a sido con pres ente trad u-
fiad a a Fer reir a. Gul lar um mun do acad êmi co-b urgu ês-m ilita r.anti qua lidade de
um dos mai ores poetas de van gua rda com pree ndid o: com o infa ntil ism o agre Dad a foi mal
tor de um livro origin?-1 e indi spensávebras ilei ra e au~ pou co foi ente ndid o. Ain da na ediç ão ssiv o. Jarr y tam -
de 1938 do Ma-
das van gua rdas em pa1s subd esen volv idol sôb re o pape l nua l Did átic o Ofic ial de Hist ória
Lite rári a, de Mar eei
com o o nosso. Bra uns chv iq, Ubu -Ro i é cita do com o exe
Já alud i à influ ênci a exe rcid a por Jarr mpl o de "Te a-
y
c?m o Cei?-drars, Aud iber ti, Mic hau x e Fer sôb re poetas tro Côm ico" , ao lado de um fabr ican te
nan d Lot. Po- de peç as de bou -
rem , .m~1to antes, essa infl uên cia já leva rd com o Fey deau . Hoj e, a pers
pec tiva já é diferen-
foi sens ível em
Ap?llm~Ir~ ~ M~x Jaco b. ~ mai te: Jar ry pare ce-n os o prec urso r do Tea
s imp orta nte· que êsses
efei tos Indi vidu ais da poe sia de Jarr Ubu -Ro i é, em tudo , a primeira peçtro do Absurdo.
bre um mov~mento liter ário inte iro: sôb y é seu imp acto sô- Abs urdo . Mas essa veri fica ção perm ite a do Tea tro do
Os surr eali stas fora m os prim eiro sréque o surr eali smo . faze r as disti nçõe s indi spen sáve is. Jarr ime diat ame nte
ram a imp ortâ ncia de Jarr y com o mes reco nhe ce- que ver com o pess imis mo met afis y não tem nad a
ico de Sam uel Bec kett
(ou anti lite ratu ra) e com o mes tre de tre de liter atur a e mui to men os com a friv olid ade pré-
acad êmi ca de Io-
estil o de v1da. Deve-se aos surr eali stasum dete rmi nad o nesc o. Seu hum or não deix a de ser cart
de Jarr y com o prec urso r da van gua rda a in tron izaç ão mon stra ção rigo rosa men te lógi ca de umesia no: é a de-
Rea lme nte, cert as pág inas de J arry , oscido sécu lo XX. esta seja absu rda. Sain do do deca den a tese , emb ora
humor-n~gro e a mís tica do
land o entr e o
absu rdo, entr e o real e o sua moc idad e, Jarr y reco nhe ce e adm tis mo poético da
em seu redo r está dec ade nte. Por que neg ite que o mun do
irre al, lêem -se hoje com o se tive ssem á-lo ? Mas a rea-
Bre ton ou Tza ra, por Arp ou Crevel. sido escr itos por ção de Jarr y não é cho rosa o a de um Sa~ain ou
o dire ito de anex ar tota lme nte a mem ória Mas tinh am êles l ·Mo réas . É, exat ame nte, a mescom ma reaç ão - num a fam o-
de Jarr y, como
de um surr eali sta ava nt la · Zettre? Não
se
Jarr y nad a de escr ita auto mát ica e truq enc ont ra em
ues pare cido s,
I sa pág ina do Ulysses, de Joy ce- dos jude
Bab ilôn ia: ". . . and the r sit dow n by us exilad'os na
the wat ers of ba-
nem nad a daquilo que tran sfor mar ia,
gun s surr eali stas er:Q. ade ptos da psic
mai s tard e, al- I balo ng and laug h". As lágr ima s
dêst e
dem oral iza- as, dem ons tran do que são mun do, J arry
anál ise e outr os lem a pod eria ser: ({A un Absurd~, Abs absu rdas . Seu
urde et Dem i". E
xiv
XV ·
a denún cia dêsse absur do é a prime ira palav ra de
Ubu-R oi. dos s~us ~esgraçados súdit os,. 1:epresentados no palco
É uma mani festa ção delib erada ment e
pelos mfeli zes aluno s. Ubu-R oz e peça profé tica: ante-
antili
Por isso mesm o não se limit a à revol ta contr a a terár ia.
litera
cipa· a revol ta da mocid ade.
tura, oficia l ou outra . É expre ssão de uma revol ta geral- _Essa r~lação entre a peça de 1896 e sua repre sen-
que Ja. ' come çou com ta~ao na. ~Ida, na .se_gunda meta de do século
a revol ta antim ilitar ista de Les' mite deflm r a posiçao histó rica de Ubu-Roi. XX, per-
Jours et les Nuits e con tinua com a revolt a
anti-e scola r de Ubu-R oi. digam os . D~rante ~uito tempo , a hi storio grafia literá ria ofi-
· c~al nao se digno u de toma r conhe cimen to
Taf!l~ém a êsse respe ito é Jarry um da exist ên-
precu rsor. Cia d~ ~lfred J::rry . Seu nome não aparece nem seque
Ubu-R m e de 1896. O decên io segui nte assist r
e
movim ento literá rio (emb ora até hoje ainda não aregis um ~as úl.t!ma_s edi.çoes ~o L~nson . Mas depois
do surre a-
trado nem perce bido pelos histo riado res da litera tura)- lismo Ja nao fOI possivel Ignor á-lo. Para
de revol ta contr a a escola. Bast a citar o roma nce coisa, procu ravam -se casos parec idos na desin toxic ar a
histó ria li te-
A.M. D.G. (1910 ), de Pérez d e Aya la, com sua rária da Fran ça. Os mestr es-es cola lembr avam -se ent
cia contr a a educ ação nos colég ios jesuít icos da Espa
tendê n- da fam.osa e ~urbulenta ~epresentação, em 1S30, ão d~
nha, e A Portr ait of the Artis t as a Youn g Man (1916 - · Herna m, de V1ctor Hugo consi derad a como
. ' data do
) nas~Imento do ro.mantism o. E dizia m
de Joyce. São varia ntes trágic as do tema . Uma varia n- que a repre
te tragic ômica é o roma nce Profe ssor Unrat (1905 ), de taçao de Ubu- Rm no Théâ tre de L'Oeuvre, em 10sen- de
Heinr ich Mann , cujo enrêd o todo mund o conhe ce pelo dezembro de 1896, teria sido a " B ataill e D'Her nani da
filme O Anjo Azul : Unra t é o professor tirâni co, que Vang uarda ". Essa comp araçã o me parec e estúp ida, dig-
perse gue impla càvel ment e os aluno s, descobrindo nêles na de uma aula de litera tura do Prof. Ubu. Pens ando
a perversão mora l de que êle própr io se torna vítim nas conse qüênc ias e efeitos, proponho outra defin ição:
O Prof. Unra t é o irmão mais nôvo de Ubu-Rrá oi.
a. - a repre senta ção de Ubu- Roi em 10 de dezem bro de
1896 foi o prim eiro happ ening .
Alfred J arry escre veu a peça em 1888, com quinz
anos de idade , quan do aluno do Liceu de Renn es, ·parae Que vem a ser um happ ening ? Não é mera bade r-
na jocosa. Um verda deiro happ ening é um ato apare n-
ridicu lariza r um profe ssor de Mate mátic a, Hébe r, que temen te absur do pelo qual se prete nde pertu rbar um
os garotos costu mava m cham ar d e Pere Hébé. Ubu ato sério e cerim onios o de outro s para torná-lo tam-
como Unra t, um mons tro em senti do moral. Tamb ém é, bém absur do, desm ascar ando- o e denun ciand o-o. Um
um mons tro em senti do físico: uma barrig a gigan tescaé exemplo: na Unive rsidad e de Muni que,·o ano letivo cos- ·
que se movi ment a por meio de duas perna s fráge is; tuma ser inaug urado por uma espéc ie de proci ssão dos
cabeç a é pequ ena, mas a denta dura é a de um tubar a
ão. professôres cated rático s que, vestid os com suas togas
A essa mons truos idade física corre spond e o comp pretas, anda m lenta ment e pÇtra a sessã o solene na Rei-
ment o: ~ criat ura é burle sca, cruel , covarde, estúporta- toria; em 1969, os estud antes acom panh aram es~a "Pro-
infern al. Tiran iza os aluno s, assim como é tirânida, ico cissão", usand o máxi- vestid os prêto s e sarac otean do em
qualq uer peque no-bu rguês , quan do dispõ e de poder sô- ritmo de valsa : o prestí gio dos cated rático s sofre u ir-
bre outros. Ubu é mais que um tiran o de colégio secun remed iável abalo .
-
dário. É um símb olo socia l e uma profe cia políti ca. Ubu
é o arqué tipo dos ditad ores cruéi s e estúp idos do sécul Cada repre senta ção, passa da, prese nte ou futur a de
XX. E Ubu é rei : perso nifica o pode r totali tário do Estad o Ubu-R oi é um happ ening . Assim , é um protes to
dos alu-
Fasci sta. Cont ra sua tirani a só adian ta a revol ta tota"' o nos e ex-al unos de Ubu contr a todos os Ubus dêste mun-
do. O métod o do prote sto parec e extra vagan te: que pode
xvi
xvii
uma peça burlesca contra instituições sagradas, defen-
didas por todos os podêres? Um pensador alemão con-
temporâneo, Guenther Anders, explica: ((Happenings .
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Ce Livre=-
est dé.d ié
MARCEL SCHWOB
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' * Reprodução em francês da dedicatória do autor.
---- .
J
·''
Reprodução da capa do lançamento de Ubu R ei.
Personagens
PAI UBu
MÃE UBu
CAPITÃO BORDADURA
REI VENCESLAu
RAINHA ROSAMUNDA
BOLESLAU
LADISLAU
BUGRELAU
GENERAL LASCY
STA:NISLAU SOBIESKI
IMPERADOR ALEXIS
G TRÃo
PILA
COTICA
CONJURADOS E SOLDADOS
Povo
MIGUEL FEDEBOVITCH
NOBRES
MAGISTRADOS
Outro retrato do Sr. Ubu.
CONSELREI~OS.
FINANCISTAS
r .
GUARDAS DE FINANÇAS
CAMPONESES
EXÉRCITO Russo
EXÉRCITO POLONÊS
Os GUARDAS DE MÃE UBU
UM CAPITÃO
7
UM URSO
0 CAVALO DE FINANÇAS
A MÁQUINA DE DECAPITAR
A EQUIPAGEM
0 COMANDANTE
.,
I
8
9
Primeiro Ato
Cena I
PAI UBU
Merdra!
MÃE UBu
PAI Usu
11:
l
ão- de- coz inh a?
PA r UB u zen as de lac aio s arm ado s de facd~ cyc a, depois
Iss o qua ndo pode.r ia s pôr em cim a
on1 a!
..Juro pel os me us chi fres * que nao
est ou ent en- da cor oa de Ara gão, a cor oa da Pol
den do!
PAr Us u
MÃE Us u
Nã o sei aon de pre ten des che gar .
era s um hom em
Va is me diz er, ago ra, que te con sid MÃ E Us u
-realizado.
De bur ro que és!
PA r Us u
PA r Us u
e, cla ro que me
.Por me us chi fre s, me rdr a, ma dam I
o rei Ve ncesla u
con sid ero . Ou pel o 1nenos, pod eria
me con sid era r: ·'· Ma s por me us chi fre s, Mã e Ub u, me sm o que mo r-
a! E,
ain da est á aí viv inh o da silvde
fia nça do rei
.cap itão de Dra gões, ofi cia l ele con r a , tem filh os, urn a leg iã o filh os.
em d a Ag uia
Ve nce sla u, con dec ora do com a Ord
de Arag_ão, que
Ve rm elh a da Pol ôni a e an tig o rei MÃE Us u
.q uer es ma is?
a a fam ília e
E que m te impede de tru cid ar tôd
usu rpa r o tro no?
MÃ E Us u
PA r Us u
de Ara gão , te dás
- O quê ? 1 De poi s de ter es sid o rei
ins uit o dês ses e
. :ag ora por satisfei~o em pas sar em
rev ista cin co de- Esc uta aqu i, Mã e Ub u: ma is um
te vis to um pij am a de ma dei ra.
expr essão de Jarry , intra duzi vel,
De par ma chan delle verte é a MÃ E U su
ê le quan do estu dant e. E ssa ex-
·referência a u ma peça escri ta por - !
peça , com o uma esp écie de idios ma dei ra, que m
·pressão aparecer á vária s vêze s na
sincr asia de Ubu . Pode-Se adm itir
outr as intenções de Jarr y, com o J Inf eliz , se me ves tes um pij am a de
tenir la clum de/le , agir com o côm o man so. ~t é que vai rem end ar teu s fun dilh os?
referência a
.1,2 13
I
(.
Ih, é mesmo ! Mas e daí? Minha bunda não é me- Isso sim, Pai Ubu, · agora falas como um homem:
lhor que a dos outros. de verdade!
PAI UBU
MÃE UBU
Não, não dá pé! Eu, capitão de Dragões, matar o
Pois se essa bunda fôsse minha, t rataria de sentá- rei da Polônia ? Antes a morte!
la n um trono. Poderia s aumen tar infdnita mente
tuas posses, comer lingüiça quando te desse von- MÃE UBU
tade e passear de côche pelas ruas ...
(A parte.) Que merdra! (Alto.) Dêsse jeito vais
P Ar UBu continu ar miseráv el como uni rato.
14
-
------- ------ ------ -
tenho certeza que o conseguir ei. Graças a Deus e
a mim mesma, dentro talvez de uns oito dias, se.r;ei
rainha da Polônia.
Cena I1
MÃE Usu
PAr Usu
MÃE Usu
1
,1 (Dando de ombros.) Merdra!
16 I
;
.'1 17
PAI UBU
PAr UBu
(Pegando um frango assado.) Puxa, que fome! Vou
Eu? Na da, um pedacinh o de vi tela.
dar uma dentada nesse bicho. Parece frango. Não
está mal.
MÃE UBU
MÃE UBU
MÃEUnu . ·
18 19
i. BoRDAD URA
PAr Uau
MÃE Uau
Ouçam o menu.
MÃE Uau
PAr Uau
Bom dia, senhor es, já estáva mos impàci entes. Sen-
tem-se por favor. ôba,. isso me in ter essa.
Bom dia, madam e. Mas onde está Pai Ubu? Sopa polonesa, costela s de ratrão *, vitela, frango ,
pâté de cachor ro, sobrec u de peru, compo ta rus-
sa ...
PAI. Uau
Aqui mesmo , meu caro: Credo em cruz, por meus * C6tes de rastron. Nossa tradução é arbitrária em sua referência
I
a rato. A expressão .de Jarry alude possivelmente a um colega de
chifres , até que não sou tão magro assim. ginásio.
20 21
•
PA11JBU BORDADURA
i
MÂ~ tJBU
.I
I ,
Espera a1 que e
PAI
·ar
u vou afl
tJ.su
.
rneus dentes nas tuas
Deliciosa, já terminei.
MÃE UBU
;,.,I
ftlJJ.••· Viva Mãe Ubu!
Ai, velhaca! Que troço
23
22
- - .
• .
,
PAr UBu
Os OUTROS
(De volta.) Daqui a pouco, estarão gritando viva
Pai Ubu. (Traz uma enorme vassoura que sacode Mas ainda não comemos.
sôbre a mesa do banquete.)
PAr UBu
MÃE UBu
Como não comeram?! Pra fora todos! Bordadura.
Que estás fazendo, miserável? você fica (Ninguém se move.)
Provem, provem. (Vários provam e caem envene- Não vão embora, é? Juro por meus chifres que vou
nados.) rebentá-los a golpes .de costeleta de ratrão. (Co-
meça a jogar costeletas nêles.)
PAr UBu
Tonos ·
Mãe Ubu, pass~-me as costeletas de ratrão, que eu
mesmo sirvo. Pára com isso! Socorro! Ajudem-nos! Desgraça!
Êle me mata!
MÃE UBU
PAr Usu
Toma.
Merdra, merdra, merdra. Rua! Estou no meu papel.
PAr Usu
Tonos
Pra fora, todo mundo! Capitão Bordadura, quero
falar com você. Salve-se quem puder! Pai Ubu miserável! tarado!
traidor! tratante!
24
. 25
PAr UBu
Cena IV ' .
PAI UBu .
BoRDADURA
PAI UBU
BORDADURA
BORDADURA
BoRDADURA
Mas como? Julgava que o senhor estivesse na ... Não, Pai Ubu, você fede demais. Nossa mãe! Nun-
merdra, Pai Ubu. ca toma banho?
PAr Uau
Piso teu pé, ouviu?
Até que êsse velhaco não é de todo burro, adivi- MÃE Uau
nhou.
Merdralhão!
BORDADURA
PAr UBu
Se se trata de matar. Venceslau, pode contar·- co-
migo. Sou seu inimigo mortal e respondo por meus B~m. Bordadura, estamos acertados. Pode ir. Juro
homens. por meus chifres, pela Mãe Ubu, que farei de você
Duque .de Lituânia.
28
29
--~- -~~ --
•
MÃE UBU
Mas ...·
P AI UBU
(Saem.) Cena V
PAI UBu
MENSAGEIRO
( O mensageiro sai. )
PAI UBu
30 .' . .:
: ~·· ' ,
I
31
~
- -
fui descoberto, vou ser decapitado, ai m eu Deus,
coitado de mim! PAr UBu
PAI Usu
Ah, já sei: vou dizer que foi coisa de Mãe Ubu e
de BOJ."dadura.
MÃE Usu
Ah, seu grande PU, se tu te atraveres ...
PAr Usu
Se me atrevo? E vou agora mesmo.
(Sai.)
MÃE Usu
(Correndo atrás dêle.) Pai Ubu, Pai Ubu, vem cá!
Te dou lingüiça, Pai Ubu.
(Ela sai.)
riqu.c IV tinha a mania de exclamar a todo momento jarnidieu (re-
nego Deus). Seu confessor, o' Padre Coton, mostrou-lhe a inconve-
niência da expressão, pedindo-lhe que passasse a exclamar jarnicoton.
(renego Coton). Jarry coloca ao final a p;ilavra bleu - jar!licoton-
bleu - reafirmando a heresia que o padre Coton quis evitar e fazen-
do a lusão a Cordon Bleu, célebre ordem da Cavalaria.
32
33
I
I REI
PAI UBU
Palácio do Rei.
Pai Ubu, quero recompensar-te pelos incontáveis
Rei V ences lau, rodeado de oficiais, Bordadura, os filhos serviços que prestaste como capitão de Dragões,
do rei: Boleslau, Ladislau e Bugrelau. Depois, Pai Ubu. fazendo-te hoje mesmo condé de. Sendomir.
\
PAr UBu
PAI UBu
Que há contigo, Pai Ubu?
\
Lá estaTei, mas ~.ceite, por favor, esta flautinha de
BoRDADURA presente.
34 35
- - - ----- -
.. )
REI PAI Uau
au,
Que vou faze r com uma flau ta, Pai Ubu ? Dare
i f
i Sois a bond ade em pess oa. (Sai .) É, rei Vencesl
a Bug rela u. mas nem por isso esca pará s da n1or te.
PAr Ua.u
ai!
E ago ra me arra nco . . . (Cai , ao se volt ar.) Ui,
in-
Soco rro! Por meu s chif res! Acho que rom pi os
test inos e queb rei a bun da!
REI
(Lev anta ndo -o.) Está s mac huca do, Pai Ubu
?
PAr Uau
a.
Crei o que sim, maj esta de, vou mor rer na cert
Que vai ser de Mãe Ubu ?
REI
-
Não se preo cupe , o sust ento dela esta rá asse gura
do, Pai Ubu.
36 37
•
sênico na comida. Quando se empanturra r, cairá
morto, e eu me tornarei rei da Polônia.
Tonos
BoRDADURA
PAr UBu
Não seria mel har nos jogarmos ·todos ao mesmo-
tem po em· cim a d êle-, berr ando e lhe dand o .den (Co rren do atrás dêles e f azendo-os volt ar.)
Sen ho-
sco
tada s? Assi m, seri a m a is fácil de arr asta r cono res, esquecemos uma cerim ônia indi spen sáve l.
Te-
as trop as. rem os com des-
mos de jura r que todo s nós luta
pren dim ento .
PAI UBU
BoRD ADU RA
.
Está bem . Eu me enca rrego de pisa r n o pé dêle- pa-
Vai ach ar ruim e então· eu lhe resp ond erei : MER Com o vam os faze r o jura men to se não há um
DRA - e ·essa será a -sen ha para que vocês ata- dre aqu i?
que m . .
A palav ra poclte (bôlso,
de Ybex , morcêgo, e de Hibou , môch o). signif icação já que Ubu
* Tradu zimos m es poches por meu papo, que é uma da~ ac7pções' ~a papo) guard a na língua origin a l sua dupla
palav ra. ~ precis o ter semp re em mente que Pai Ubu nao e prôpn a- rraz semp re seu "bastã o de física " metido
no bôlso , confo rme as in-
mente um homem , m as um ser monst ruoso , pré-h uman o (Ubu vem dicaçõ es e os desen hos de Jarry.
40 41
•
PAI UBU
Bem, vá lá.
REI
RA.!NHA
4Z .43
REI RE I
Nicolau.
Pai Ubu. Qu e De us os gua rde e o gra nde São
44 45
I
RAINHA
Cena II
Pátio de revistas.
Exército polonês, Rei, Boleslau, Ladislau, Pai Ubu,
Capitão Bordadura e
seus homens, Girão,
Pila, Cotica*.
REI
PAr UBu
46 47
--- -
- - - - - -- - ---
REI . •
REI
Êste é o regimento de guardas mon tados de Dan t-
zick. Uma tropa exemplar, na minha opinião. Ai, Socorro! Santa Virgem, estou morrendo.
PAr Uau
BOLESLAU
O Senhor acha? Pois me parecem mendigos. Olhe
aquêle ali. (Ao soldado.) Seu tratante, há quanto (A Ladislau. ) Que se passa? Lutemos.
tempo não fazes a barba?
PAI UBU
REI
É minha, a coroa! Agora, os outros!
Mas êsse soldado está impecável. Que há com o
senhor, Pai Ubu?
BORDADURA
PAr Uau
Abaixo os traidores ! (Os filhos fogem) todos os pe7·-
seguem.)
I sto! (Pisa-lhe o pé.)
REI
Miserável!
PAr UBu
48
49
•
RAINHA
BUGRELAU
BUGRELAU
RAINHA
Vejo que meus temores eram infundados.
Oh! Êle está cercado.
BUGRELAU
BUGRELAU
Claro. A senhora não tinha motivo algum para
preocupar-se. Veja! Bordadura acaba .de cortá-lo em dois feito
uma salsicha.
(Vem de fora uma zoada assustadora.)
RAIJ:ofHA
BUGRELAU
Pobre de mim! Os rebeldes invadem o palácio, so-
Veja! Pai Ubu e seus homens perseguem meus dois bem as escadas.
irmãos.
(O tumulto aumenta.)
5()
51
-- -
..
RAINHA E BUGRELAU
BUGRELAU
PAr UBu
- BUGRELAU
PAI UBu
Bordadura, Bordadura, estou com ~êdo! Quero ir
embora.
UM SOLDADO
-~ -- -
BuGRELAU
BUGRELAU
PAI Unu
RAINHA
Peguem a rainha, ela está fugindo. ·Q uanto ·a ti,
Boa, Bugrelau, isso mesmo! miserável!
PAI Unu
BUGRELAU
RAINHA
RAINHA
B UGRELAU
BUGRELAU
BUGRELAU
E por culpa de quem, meu Deus? de quem? Dêsse
Aqui estaremos seguros. abjeto Pai Ubu, aventureiro saído não se sabe de
onde, crápula dos mais vis, mísero vagabundo !
E quando penso que meu pai o condecorou e fêz
I
RAINHA
dêle conde e que, no dia seguinte, êsse bandido não
Creio que sim. Bugrelau, ajuda-me. (Ela cai na teve pejo de erguer o braço contra êle:
neve.)
RAINHA
BUGRELAU
Oh, Bugrelau! Quando me lembro o quanto éra-
M ãe; ·estás· te sentindo mal? mos felizes antes da chegada de Pai Ubu! Mas ago-
ra, ai de mim, tudo mudou !
56 .
,57
•
BUGRELAU 'SOMBRA
Calma. Tenhamos esperança e nao renunciemos B:zgrelau, quando vivo fui o Sr. Mathias de Ko-
jamais aos nossos direitos. rugsberg, o primeiro rei e o fundador de noS6a
Casa. Confio-te a missão de nos vingar. (Entrega-
lhe U17'ta enor_me espada.) E que esta espada que.
RAINHA
te entrego nao tenha repouso enquanto viver ()l
usurpador.
É o que deves fazer, meu caro filho, mas para mim
está tudo terminado, não .verei um nôvo dia de (Todos desaparecem e Bugrelau fica só em ati-
felicidade. tude de transe.)
BUGRELAU
BUGRELAU
- - - ~
• PAr UBu
MÃE UBu
PAr UBu
Palác io do Rei. · ·
P ai Ubu, Mãe Ubu e
Capit ão Borda dura Escu tem mais uma vez: quero ficar rico, enten de-
ram? Não soltar ei um vinté m.
MÃE UBU
BORDADURA
.N ão, nem um tostã o! Quer es me arrui nar por cau-
.sa dêsse s idiota s? É verda de. 'Sei de um imen so tesou ro que há na
capel a. Vamos distri buí-l o ao povo.
BORDA DURA
PAr UBu
Ente nda, Pai Ubu, o povo esper a algo. de bom, um
.gesto gener osó. Ah, miser ável, se fizere s isso!
MÃE UBU BORDA DURA
•Ou mand as dar carne e ouro a o povo, agora , ou Mas, Pai Ubu, se não dás nada ao povo, êle não
paga rá os iip.postos.
·estar ás deposto em meno s de duas horas .
1
.60 ~ 61
~~\'
i:,\
l
.' I
-i
•
PAI UBU
Isso é verdade?
MÃE UBU
Mas claro!
(Saem.)
Povo
PAr UBu
Tonos
Pagaremos! Pagaremos!
62
63
•
d~ ouro. Quanto aos demais, terão como consola-
BORDADURA
Mãe Ubu, veja como êles .disputam o ouro. É uma çao esta outra caixa que será dividida entre todos.
verdadeira batalha.
TODOS
MÃE UBU
Viva Pai Ubu! R~ bom está aí! No tempo d~ Ven-
Coisa horrível. Veja aquêle lá com o crânio partido. ceslau, a gente nao ganhava tanto dinheiro. ·
PAI UBU
PAr UBu
Que espetáculo maravilhoso! Tragam mais .caixas
de ouro, trag·am. (A ~ãe Ubu, entusias.mado.) Ouve o .que êles di-
z~m. (Todo o povo vaz se colocar no fundo "do. pá-
tw.)
BORDADURA
Amigos, aqui está uma . caixa cheia de ouro. Ela Já l (Partem uns tentando derrubar os ~utros. Gri-
contém trezentos mil nobres-da-rosa em ouro, moe- tos e tumulto.)
da polonesa de bom quilate. Os q~e desejarem par-
ticipar da disputa coloquem-se n ofim do pátio. BORDAúURA
Quando eu der o sinal com o lenço, comecem a
correr, e quem chegar primeiro ganhará a caixa Estão chegando!" Estão chegando!
64
65
•
PAI UBU PAI UBU
Ei! o primeiro está perdendo terreno. E agora, meus amigos, vamos comer! Abro-lhes as
portas do palácio, façam o favor de ocupar seus
MÃE UBU lugares à minha mesa!
MIGUEL
PAI UBU
TODOS
66 67
Te rce iro A to
Ce na I
No Palá cio.
Pai Ubu, Mãe Ubu .
PAI UBU
r ei
Pelo meu s chif res, assi m com o me vês, sou o u
dêste país! Já me perm iti uma indi gest ão e esto
esperand o che gar min ha gran de capelina.
MÃE UBU
,
De que man das te fazê -la? Não é por serm os reis
que vam os a g ora esba njar dinh eiro.
PAI UBu
em
Minha. carSt senh ora, man dei faze r a cape lina
68 69
- - -
------ - -- -
•
PAI UBU PAr UBu
Ei! o primeiro está perdendo terreno. E agora, meus amigos, vamos comer l Abro-lhes as
portas do palácio, façam o favor de ocupar seus
MÃÉ UBU lugares à minha mesa!
MIGUEL
PAI UBU
Tonos
Viva Miguel Federóvitch! Viva Pai Ubu!
66 67
couro de carneiro com presilha e bridas em couro MÃE Usu
de cão.
Cometes um êrro, Pai Ubu. Êle se voltará contra ti.
MÃE UBU
P Ar Usu
Deve ficar bonito, m a s nada é mais bonito do que
a gente ser rei! E eu vou chorar por isso! Êsse pobre diabo me
preocupa tan to quanto Bugrelau.
P Ar Usu
MÃE UBU
Tinha.s tôda razão. Mãe Ubu. E pensas que já liquidast e Bugrelau ?
Temos u ma .d ívidà de gratidão para com o Duque Claro que sim, espada-d e-finança s! Que poderá
de Lituânia . fazer contra mim um bostinha de quatorze anos?
70 71
\
\
-------~
- ~
PAr Usu
MÃE UBU
PAr UBu
MÃE UBu
Moderação, Pai Ubu, por favor.
72
73
•
PAI UBU PAr UBu
PAI UBU
NOBRE
PAI UBU
Conde de Vitepsk.
Excelep.te! Excel~nte! Não percamos tempo. Alça-
PAI .UBU
NoBRE
II pão com êle. Terceiro nobre, quem és? Tens uma
cara desonesta.
NOBRE
74 75
- - -
PAI UBU
PAI UBU
Muito bem! muito bem! Possuis mais alguma
.coisa? É muito pouco. Não tens mais . n a da'?
NOBRE NOBR E
PAI UBU
TAi3ELIÃO
Merdra. Primeiro ponto: os juízes não receberão
mais nenhum provento.
Acabou.
JUÍZES'
PAI UBU
E de que vamos viver? Somos pobres.
Como acabou?! Bem, então, avancem os nobres, e
como não vou mesmo parar de enriquecer, manda-
rei executar todos os nobres, e assim ficarei com PAr UBu
seus bens. Vamos, joguem os nobres no alçapão.
( Os nobres são empilhados no alçapão.)
Recebereis as multas que impuserdes e nerdareis
os bens dos condenados à morte.
VÂRIOS
SEGUNDO Jurz
Vamos ver· isso. Infâmia!
78
79
~
.,
TERCEIRO JUIZ
PAr UBu
Escândalo!
Vamos, cala-te, idiotra. Agora, senhores, tratare-
mos das finanças.
QUARTO JUIZ
Indignidade! FINANCISTAS
MÃE UBU
PAr UBu
Que diabo estás fazendo, Pai Ubu? Quem vai agora Senhores, estabeleceremos um impôsto de dez por
ministrar a justiça? cento sôbre a propriedade, outro sôbre o comércio
um ter~e~ro sôbre os casamentos e um quarto sô~
PAI UBU bre os ob1tos, de quinze francos cada um.
.
•
TERCEIRO FINANCISTA
PAI UBU
PAI UBV
A merdra! UM CAMPONÊS
Ü UTRO CAMPONÊS
Não te preocupes, meu anjo, que eu mesmo irei re.:.
. .
colher os impostos,
.
.de povoado em povoado. .. Tenho mais notícias. Venho de Cracovia, onde .vi
transportarem os.corpos de trezentos nobres e qui-
nhentos juíZ€s _que foram · executados. Parece que
vão dobrar os imp.o stqs e que Pai Ubu virá recolhê-
los pessoalmente.
8?,. 83
•
Tonos
UM CAMPONÊS
Cena IV
Escu'tem: parece que estão batendo.
UMA Voz
letores de impostos.)
CAMPONÊS
Stanislau Leczinski.
PAr UBu
.
,.
.,
PAI UBU
CAMPÓNESES
Como não disse nada! falo há mais de uma hora.
Ou pensas que vim aqui para pregar no deserto? Senhor Ubu, tenha piedade de nós. Somos gente
pobre.
STANISLAU
PAr UBu
Longe de mim tal pensamento.
. E daí? Paguem.
PAI UBU .
CAMPONESES
Pois muito que bem, estou aqui para te dizer, te
ordenar e t e intimar a declarar e pagar imedia- Não temos com que pa.gar, Pai Ubu, já pagamos.
mente teu impôsto de renda, sob pena de sêres
trucidado. Vamos, senhores porcalhinos das finan- PAr U Bu
ças, carrocem para cá a carroça-das-finanças.
(Trazem a carroça.) Pa~uem! ou ponho vocês no papo, depois de tor-
tura-los, com degolação do pescoço e da cabeça!
STANISLAU Cornupapança, parece que o rei aqui sou eu!
Sire, nossa inscrição no registro .n os obriga a pa-
gar apenas cento e cinqüenta e dois rixdales, que Tonos
já pagamos faz seis semanas em Saint Mathieu.
Ah, ~ assim? Às armas, pessoal! Viva Bugrelau,
pela graça de Deus rei da Polônia e da Lituânia!
PAr UBu
- - - -
•
PAI UBU
PAI UBU
BORDADURA
Ar.Exrs
Cena VI Que trazes como garantia de tua lealdade?
Aventureiro infame, participaste do massacre de Aceito a espada mas, po~ São Jorge~ queima êsse
nosso primo Venceslau? n1apa. Não quero dever minha vitória a uma trai-
ção.
BORDADURA
BORDADURA
Perdoai-me, Senhor, Pai Ubu me arrastou a isso
contra a minha vontade. Um filho de Venceslau, o jovem Bugrelau, continua
_vivo, e eu tudo farei para reconduzi-lo ao trono.
ALE XIS
ALE XIS
És um sórdido mentiroso ! Mas, afinal de contas,
que desejas? Qual era teu pôsto no Exército polonês?
BoRDADURA
BoRDADURA
ime n-
Mu ito bem nom eio- te sub tene nte do 10. Reg
0
ALE XIS
aten tos
S enh ores, está abe rta ·a sess ão. Este jam
qüil os.
para . o que vou dize r e man ten ham -se tran
nça s e
Primeiro, trat arem os do cap ítul o das fina
que
em segu ida fala rem os dum peq uen o sist ema
o bom
bole i par a evi tar as chu vas e pres erva r
tem po.
E os novos impostos, Sr. Ubu, estão dando resul- É dêle mesmo. Diz que o czar o acolheu muito bem,
tado? que vai invadir teus domínios para restaurar o
podet de Bugrelau e que serás executado.
MÃE UBU
PAr UBu
Vão de mal a pior. O impôsto sôbre casamentos
rendeu até agora apenas onze sous, e assin: mesmo Não! Tenho mêdo! Tenho mêdo! Acho que vou.
porque Pai Ubu persegue as pessoas por toda par- morrer. Coitadinho de mim! Que vai me acontecer,
te para obrigá-las a se casarem. meu Deus? Êsse homem malvado vai me matar.
Santo Antônio e todos os santos, protegei-me, pro-
PAI UBU
meto dar esmolas e acender velas a todos vós. Se-
nhor, o que me espera ainda? (Chora e 80luça.)
Espada . das finanças, corna de minha pança, se-
nhora financista eu tenho or.relhas para falar e MÃE
tu t ens bôca para' escutar. (RtSos.)
. Allas, -
. , nao e,
UBU
95
PAI UBu •
PAI UBU
Qual é, meu amor?
Ah, isso é que não! Eu te mato! Não vou dar di~
MÃE UBU nheiro algum. Tomem de outro! A guerra já está
paga e ninguém vai guerrear às minhas custãs.
A guerra! Pelos meus chifres, façam a guerra mas porque
vocês estão com raiva. Nada de gastar dinheiro.
Tonos Viva a guerra!
Graças a Deus! Eis uma atitude digna!
PAI UBU
PRIMEIRO CONSELHEIR O
SEGUNDo CoNsELHEIR o
E estocar víveres.
TERCEIRO CONSELHEIR O
QUARTO CONSELHEIR O
97
11'
PAI U BU
UM SOLDADO
C ena VIII
Senhor Ubu, a tesoura-d e-cortar- orrelhas vai cair.
M ÃE UBU
SOLDADOS E P ALHADINO S
Como êle está bonito de capacete e coura.ça, pa-
Viva a Polônia! Viva Pai Ubu! rece uma abóbora blindada .
PAr · UBu
PAI UBU
MÃE UBU
·... .
10'1
· -
•
Quarto Ato
Cena I
MÃE UBu
, , -'-
'
I
\
'
c:~/
•
'
/
'
'
Mas onde está o tesouro? Pelo som, nenhuma des-
sas lousas parece ôca. No entanto, contei treze
pedras a partir do túmulo ,de Ladisla.u, o Grande,
ao longo da parede, e nada. Devo ter me enganado.
Não, aqui parece ôco. Mãos à obra, Mãe Ubu. Co-
ragem, vamos arrancar esta pedra. Está muito prê-
sa. A ponta .do gancho-de-finanças cumprirá sua
finalidade. Achei! Aqui está o ouro misturado aos
ossos dos reis. Vamos, tudo dentro do saco! ... Que
barulho é êsse? Quem poderia estar aqui, sob estas
velhas cúpulas? Não, não é ninguém, apressemo-
nos. Levemos tudo. Esta riqueza tôda é mais útil
102
103
•
à luz .do dia do que enterrada no túmulo de ve-
lhos príncipes. Recoloquemos a pedra. Ei, o ba-
rulho de nôvo. l!:sses lugares sempre me causa-
ram pavor. Depois venho buscar 9 resto do ouro,
volto amanhã.
UMA Voz
BUGRELAU
Tooos
I
I Viva Bugrelau!
I BUGRELAU
- - - -
- -----------------
TODOS BUGRELAU
Pessoal, Mãe Ubu está saindo com seus guardas Ah, é assim!? (Desembainha a espada e avança
pela escadaria. provocando verdadeira ·carnificina.)
Que querem comigo? Oh, é Bugrelau. Deixem por minha conta. (A Girão. ) Defende-te,
covarde!
(A multidão joga pedras.)
(Lutam os dois.)
PRIMEIRO GUARDA
GrRÃo
Todos os carros estão quebrados.
Vou morrer!
SEGUNDO GuARDA
BUGRELAU
Vão acabar comigo, meu São Jorge.
Vencemos, companheiros! Abaixo Mãe Ubu! Avan-
te!
TERCEIRO . GUARDA
(Ouvem-se clarins.)
Cornão-bleu vou morrer *
BUGRELAU
* Cornebleu, palavra cunhada por Jarry partindo da exl?ressão ve!t-
trebleu (ventredieu, ventre de deus). Come, co~ne plzyszque, alusao Estão chegando os nobres. Vamos, pessoal, agar-
ao "bastão de Física" do prof. Hébert; alude amda a Cordon Bleu remos essa maldita harpia!
e a côrno. traído.
106 107
Tonos
Cena III
PAI UBu
Cornão-bleu, vôte, cabeça de vaca! A sêde e o can-
saço vão nos matar. Senhor soldado, tenha a gen-
tileza de segurar nosso capacete-de-finanças e, tu
aí, senhor lanceiTo, cuida da tesoura-de,..cortar-or-
relhas e do bastão-de-física, pra me dar um pouco
de folga. Repito que estamos muito cansados. (Os
soldados obedecem.)
PILA
GENERAL LASCY
Que é que tem êsse rapaz?
Pai Ubu, não estais vendo os russos na planície?
RENSKY
·PAI UBU
Está tudo perdido, Senhor, ~s poloneses. se revolta-
ram. Mataram Girão, e Mae Ubu fugiu para as
É verdade, os russos! Estou metido em boa. Se ao
montanhas.
menos houvesse um jeito· de me arrancar, mas não
dá pé: es~amos numa colina e ficaríamos expostos
PAI UBU
ao fogo inimigo.
Ave agoureira, coruja de polainas, donde" tiras
tantas asneiras? E ma:is essa agora! Quem fez tu- EXÉRCITO
do isso? Aposto que foi Bugrelau. Donde estás
vindo? Os russos! O inimigo!
110 111
•
PAr UBu
PAr U Bu
Vamos, senhores, preparemo-nos para a batalha.
Ficaremos nesta colina e não cometeremos a bes-
teira de descer daqui. Vou ficar no centro como
l,lma cidadela viva e vocês à minha volta. Reco-
I Vamos, então, almoçar porque os russos não ata-
carão antes do meio-dia. General, diga aos solda-
dos que façam suas necessidades e entoem a Can-
ção das Finanças.
mendo-lhes carregar os fuzis com o máximÓ de
balas, pois oito balas podem matar oito russos e
s~:rão menos oito a me atacar. Mandaremos a in- SOLDADO E P ALHADINOS
fantaria lá . para baixo a fim de que recebam os
~ussos e matem alguns dêles; a cavalá.ria irá logo Viva Pai Ubu, nosso grande Financista! Ting, ting,
atrás para entrar na confusão e a artilharia fica- ting; ting, ting, ting; ting, ting, ting, tating !
rá em tôrno do moinho aqui presente para atirar
em cima. do bôlo. Quanto a nós, ficaremos dentro PAi
do moinho .e atiraremos com a pistola-de-finanças
UBU
pela janela, colocaremos de través na porta o bas- Ah, gente boa, adoro vocês todos. (Um petardo
tão-de-física, e se alguém tenta entrar, gancho-de- russo atinge e quebra a pá do moinho.) Estou com
merdra nêle!!! mêdo, senhor Deus, estou morrendo! Ah, não es-
tou, não é nada.
OFICIAIS
PAr UBu
GENERAL LASCY
112
113
•
PAI U BU
RENSKY
Ai, eu morro l
CAPITÃO PAI U BU
(Chegando.) Senhor Ubu, os russos atacam. Avante, camaradas! Ah, tu me machucaste, vou
acabar contigo, seu bêbado, contigo e com essa tua
espingarda que ~ão atira.
PAr UBu
E daí, que é que você quer que eu faça? Não fui U.M R usso
eu quem os mandou atacar.. Mas, senhores (das
Experimenta isso! ( Dá-lhe um tiro de revólver.)
Finanças, preparemo-nos para o combate.
PAI UBU
GENERAL LASCY
Ai, ui! Estou baleado, estou furado, perfurado,
Outro p r ojétil. encomendado, enterrado. Oh, mas ainda assim!
Vou pegá-lo. Toma! Me provoca de nôvo !
114
115
GENERAL LASCY
que mereces, Jean Sobiesky. (Bordadura o abate.)
Avancemos, todo vigor, pessoal, atravessemos o A15ora, os outros! (Mata uma porção de polonese~..)
fôsso. A vitória é nossa!
PAI UBU
PAr UBu
Avante, camaradas. Peguem êsse biltre! Compota
Acha mesmo, general? Até o momento, sinto na de moscovitas! A vitória é nossa. Viva a águia ver-
fronte mais "galos" que lauréis. melha! .
CAVALEIROS Russos
Too os
Afaste·m-se !. Abram passagem para o Czar!
Avançar! Hurra! Caspité! Peguemos o safadão!
(Chega o Czar acompanhado de Bordadura,
disfarçado.)
BORDADURA
BORDADURA
BORDADURA
Ah, ainda não acabaram com vocês?! Pois toma o
Foi um tiro de pistola com pólvora sêca.
116
117.
•
PAI UBU . P Ar U su
Ah, e ainda me gozan do ! Estás no papo! (Joga-se Toma ! Oh! Ah! Deu em nada. Ui, perdã o, senho r,
sôbre êle e o àilace ra.)
deixe-m e em paz. Ai, inas n ão fiz por querer! (Es-
capa, o Czar o perse gue.)
GENE RAL LASCY
PAr Usu Santa Virgem, êsse danad o lfle perseg ue! Que fiz
eu, meu Deus! Felizm ente, êle ainda tem de trans-
Estou vendo, não agüen to mais, crivar am-m e de por de volta o fôsso. Ih, sinto- o atrás de mim e
ponta pés. Gosta ria de me senta r um pouco , mes- à minh a frente o burac o. Corag em, fechem os os
olhos!
mo no chão. E meu cantil ?
P AI U BU POLON ÊS
É pra já . Vamos! Sabre -de-co rtar-m erdra , cump re ôba! O Czar caiu lá emba ixo!
tua funçã o, e tu, ganch o-de-f inanç as, não fiques
atrás. Que o bastão -de-física trabal he com gene-
rosa emula ção e divida com o bastão zinho a: h onra
PAI UBU
GENERAL LASCY
PAr UBu
Chegou a hora de baixar o cacête. Portanto, se-
nhores poloneses, avançar, ou melhor, botar o ga-
lho dentro.
POLONESES
PAr UBu
Vamos, em marcha! Que cambada, que fuga, que
120
121
PAr Usu
COTICA
PAr UBu
Uma caverna na Lituân~. Neva.
Pai Ubu, PiLa, Cotwa.
Bem feito. Não estavas a fim de bater nos outros?
Dei prova tota l de bravura, e sem me expor ma-
PAI UBU tei quatro inimigos com minha própria mão, sem
contar todos aquêles que já estavam mortos e que
Que tempo maldito, faz um frio ~e rachar e a pes- acabamos de matar .
soa do Mestre das Finanças esta bastante estro-
piada.
COTICA
PAI UBU
Recebeu uma bala na cabeça.
COTICA
Assim como a papoula e o taraxaco, que à flor da
idade são ceifados pelo ferro e pelo êrro de arrado,
nosso pequeno Rerisky foi ceifado p ela guerra e
( A parte.) Porco!
122 12.'3
- - - - - - - -- - - - - - - -
assim foi-se, emborra tenha lutado bravamente.
Mas havia russos demais!
PILA E COTICA
Uh! Senhoire!
UM Eco
Cena VI
.R homrrr! ··
Os m esmos. Entra um urso.
PILA
Essa não! Aposto que são os russos outra vez! Já Ai, senhoire das Finanças!
é demais! e depois a coisa é simples, se êles me
pegam, estarão no papo. .
I
PAI UBU
PILA
PAI UBU
Aqui oh! Te safa, meu caro, agora estou rezando Consegui feri-lo.
o Padre Nosso. Cada um tem sua vez .de ser co-
mido. PILA
COTICA COTICA
Agüenta, Pila, êle começa a me soltar. Agarra firme, enquanto pego meu sôco explosivo.
CoTICA PILA
Asno asqueroso!
PILA E COTICA
PAI UBU
Aqui está um enorme animal. Graças a mim vocês
terão o que comer. Que barriga tem o bicho, gen-
. Sed libera nos a maio. Amen. Enfim, morreu mes- te ! Os gregos aí teriam ficado bem mais à von ta,de
·m o?.· Já::posso descer daqui? do que no ventre do cavalo de Tróia, e por pouco,
caros amigos, íamos ter a oportunidade de veri-
ficar pessoalmente a ·capacidade interior dessa
PILA
pança.
i-29
•
PILA
PAI UBU
E as espolêtas ?
Isso é ruim, seria melhor cbmê ~ io quente. O Mes-
tre das Finanças vai ter· uma indigestã o.
PAI UBU
PAI UBU
PILA
E, enquanto isso, Sr. Ubu, vá esfolando o bicho. Não, não quero fazer nada! Estou muito cansado!
COTICA
PAI UBU
PILA
PILA
Ah, isso já é demais! Vem trabalhar , guloso, do
Mas, Sr. Ubu, êle já está gelado. contrário não vais comer coisa a1gumal ·
130
131
-------- --- - - -
•
PAI ·usu.
bom que nos inteirássem os da veracidade dessas
Pra mim dá na mesma.. Como cru. Pior pra vocês. notícias.
Além do mais estou com muito sono ! ·
PILA
COTICA
Tens razão. Devemos abandonar Pai Ubu ou ficar
Que achas, Pila? Comemos tudo sozinhos. Nãó da- com êle aqui '?
mos nada a êle, tá? Ou lhe damos os ossos.
COTICA
PILA
COTICA COTICA
Gostaria de saber se é verdade o que disse Rensky, Vamos, então.
se Mãe Ubu foi deposta ·realmente. Não me parece i·
difícil. .
::
(Partem:) :
':.·.
PILA
C OTICA
PAI UBU
134 135
- -- - -
···-------- -------- --------
- - - - - - -- - - - -- -
Quinto Ato
I
• I
f Cena I
I
\ Noite. Pai Ubu dorme. Entra Mãe Ubu.
A escuridão é total.
,
I
I
MÃE UBU
137
-
-- --- -----
.,
va disso é que foi cortado em quatro por Bugrelau. Graças a Deus entrevejo
.Pif paf pan! Puxa, pensei que ia morrer! Em se- Senhor Pai Ubu que dorme perto de mim.
guida, fugi perseguida pela multidão enfurecida.
Deixo o palácio, chego ao Vístula, tôdas as pontes
vigiadas. Atravesso o rio a nado, na esperança de
.fazer meus perseguidores desistirem. Dissim~lada
entre poloneses dispostos a acabar comigo, ~stive PAr .UBu
mil vêzes a um passo da morte. Mas terminei es-
capando-lhes à fúria, e depois de quatro dias de Muito mal! Êsse danado dêsse urso não é molef
caminhadas pela neve do que fôra meu reino, con- Combate dos v:Ç>rácios càm os curiácios, mas os vo-
.sigo me esconder aqui. Não bebi nem comi na.da rácios comeram e devoraram os curiácios ' como
,
.durante todos êsses dias. Bugrelau, no meu rasto, veras ao amanhecer. Entendestes, nobres palha-
o tempo todo ... Enfim, estou salva. Ai, estou qua- dinos?
se morta de frio e de cansaço. Mas gostaria de
.s aber que fim levou meu gordo polichinelo, isto é,
meu respeitável espôso. Tomei muito dinheiro dêle.
:Roubei-lhe rixdales. Enganei-o com mentiras. E Quem é que êle está gozando assim? Ficou mais
seu cavalo de finanças morreu de fome: não via i.diota do que era antes de partir. Que será que êle
comida com muita freqüência. A história de sem- tem?
'Pre! Mas coitada de mim que perdi meu tesouro.
Ficou em Varsóvia, e quem se arriscaria a ir bus-
cá-lo? PAr UBu
138 139
. ·. ____________ - .
PAr UBu
PAI Usu
Meu Santo Antônio, quem fala aí? Cruz credo! Vã o
me enforcar! Muito família, não resta dúvida.
(Engrossando a voz.) Sim, Sr. Ubu, alguém real- Calai-vos, por Deus!
men:t~ ~stá falando aqui, e a trombeta do arcanjo
qu.e ergue os mortos da. cinza e do pó final não PAI UBU
fS:laria· çie outra maneira! Escutai esta voz grave.
E a voz de São Gàbriel que só dá bons conselhos.
Uai, nunca vi anjo se exaltar.
PAr Usu:
MÃE Usu
Só faltava essa!
Merdra! ( Continuando.) Sois casado, Sr. Ubu?
MÃE UBU
PAr UBu
Não me interrompei, Pai Ub.u, ou eu me calo e será
pior para você! Exato, com a última das megeras.
Dizían.ws, ·.·Sr:-Ubü,. que ·éreis. um pateta. tamanho Um monstro. Tem esporões pqr todp o corpo, não
família! , :. ~ .. .:~: : ·. ·. ·• :···. :. · . ·· · ·· há por onde pegá-la.
140
141
•
MÃE UBU
MÃE UBU
Pela doçura, Sr. Ubu. Se fôrdes carinhoso, vereis
que, na pior das hipóteses, ela é igual à Vênus de Ela não bebe!
Cápua.
PAr UBu
PAr UBu
Sim, depois que lhe tomei a · chave da adega. An-
Caspa? Quem tem caspa? tigamente, à~ sete da manhã já estava bêbeda, re-
cendendo a cachaça. Agora que se perfuma com
MÃE UBU heliotropo, não cheira mal. Pra mim tanto faz.
Quem se embebeda agora sou eu.
Não me escutastes bem, Sr. Ubu. Prestai melhor
atenção. (A pm·te.) Tenho de me apressar pois já MÃE UBu
amanhece. (Alto.) Sr. Ubu, vossa mulher é adorá-
vel e deliciosa, ela não tem ·um só defeito. Homem tolo! Vossa mulher não toca em vosso ouro.
Estais enganada, não há um só defeito que ela não Não me diga! Isso é piada!
tenha.
MÃE UBu
:MÃE UBU
Ela não desvia um único centavo!
Silêncio! Vossa mulher é fiel!
PAr UBu
PAr UBu
Que sirva de testemunha meu nobre e desgraçado
cavalo-de-finanças que, tendo passado três meses
Seria difícil aquela gralha me trair.· Não ia achar sem comer, teve de fazer tôda a campanha puxado
com quem. pelas rédeas através da Ucrânia. Também fizeram
142
tudo para acabar com êle, pobre animal!
143
-- - -- -
···-~------------
MÃE UBU PAI UBU
Tudo isso é mentir a. Possuis um modêlo de mulhe r Azar dêles! Queria m me bater.
e fazeis dela ·um monstr o!
MÃE UBU
PAI UBU
Não cumpr iste a prome ssa ;feita a Bordad ura e mais
Tudo isso é verdad e. Minha mulhe r é uma liberti na tarde ainda o assassi na$te . .
e falas como se ela fôsse atraen te feito uma lin-
güiça! -
PAr UBu
MÃE UBU
Prefiro que seja eu e não êle o rei da Lituân ia. A tu-.
Cuidad o, Pai Ubu. almente~ não é nenhu m de nós dois. I sso prova que
não fui eu quem o matou.
PAI UBU
MÃE UBU
Ah, sim, esquec i com quem estou faland o. Não, não
quis dizer isso!
Só há .um meio de conseg uirdes perdão para vossas
faltas.
MÃE U~u
144 145
. )
~
------
- --~------~
•
• PAr UBu . PAI UBU
Essa não! Perdôo depois que ela me devolve r tudo Ah, carniça !
o que roubou , depois de ser açoitad a e depois que
ressusc itar meu cavalo- de-finan ças.
MÃE UBU
(Descar adame nte.) Não é verdade , vou te exco- É assim? P ois a boa alma vai encontr ar agora um
mungar . palmípe de. (Joga o urso em .cima dela.)
146 . 147
• . - ~~~~-
-----
.
.'
•
MÃE UBU MÃE UBU
? Pel as
(Ca indo sob o pêso do urso .) Que horr or, m eu Pila , Cot ica, Pat er Nos ter. Que sign ific a isso
Deu s! Vou mor rer! Esto u sufo ca.d a! Êle me
mor de, min has fina nça s, êle end oido u de vez!
me engole, me dige rt;
PAr UBu
PAI Uau és um a
Diss e exa tam ent e . o que hou ve. Tu é que
m sa-
O bicho está mor to, esca nda losa . Ui, mas que reu , idio ta, min ha bon stra *. ·
! Êle··n ão mor
be? pod e ser que não ! Nos sa Mãe
qui es...
fuja mos . (Su bind o na ped ra.) Pa.t er Nos ter MÃE UBU
148 149
•
1.
-- - - - -- - --- - - - -
~
·
-
- --
- - --- - -
•
MÃE UBU assim consiga extrair também os espinhos de seu
caráter) , sem esquecer a abertura da bexiga nata-
E eu com isso?! Sa bes que Bugrelau m a tou o P a - tória e finalmen te a grande decapitaçã o renovada
lhadino Girão! de S. João Batista, tudo de acôrdo com as Santís-
simas Escritura s, tanto do Antigo como do Nôvo
Testame nto, organizad o, corrigido e aperfeiço ado
PAr UBu
pelo aqui presente Mestre das Finanças ! De acôrdo,
lingüiça?
E eu com isso?! E depois mataram o pobr~ Lascy.
(Êle a rasga. )
MÃE UBU
MÃE UBU
E eu com isso?!
Piedade, Sr. Ubu!
PAr UBu
(Alarido na entrada da caverna.)
Sim, mas de qualquer jeito, ~arniça, chega pra cá!
Ajoelha- te aos pés de teu senhor (Agarra-a e a põe
de joelhos.) Vais sofrer o derradeiro suplício.
MÃE UBu
PAr UBu
•
BUGRELAU
~EUBU
BUGRELAU I!
/ Também temos pés, senhores poloneses.
I
Avante, camaradas! Viva a Polônia! I
PAr UBu
PAr UBu
1
,I
~j
~I
Espere um pouco, senhor polonês. Deixe-me aca- Outro ainda! Ah, se eu tivesse aqui meu cavalo-
bar aqui com minha cara metade. de-finanças!
·l
BUGRELAU
! BUGRELAU
PAI UBu
PA.r UBu
capota, calota, borrabotas, bosta!
152 ôba! São êles! Viva! São os Pais Ubus. Venham,
153
. \
·· - - _- -
•
...
cheguem, precisamos de vocês, senhores das Finan- JEAN SoBIESKr
ças.
Batam, batam pra valer, êles fogem pela porta, os
(Entram os Palhadinos que se jogam na con- miseráveis.
tusão.)
l
Só há dois guardando a saída.
I
STANISLAU LE:CZINSKI
PAI UBU
Não foi nada, senhor.
! (Espancando-os a golpe de urso.) Dou-lhe uma,
BUGRELAU 1 .dou-lhe duas! Uf! consegui sair. Fujamos! Sigam
os outros.
É, só fiquei um pouco tonto. t
154 155
,-
, ,,
MÃE UBu
(Desaparecem na distância.)
;
Cena III
PAr UBu
MÃE UBu
PAr UBu
l
-
··- - -- ------
PAI UBU
COMANDANTE
Cena IV To.do mundo a sota-vento, amarrem o mezena!
COMANDANTE
COMANDANTE
Sopra ótimo vento. Devagar, amainar as velas.
PAI UBU
PAI UBU
D'e fato, navegamos com prodigiosa rapidez. Deve- Devagar, o quê! Nada disso! Tenho pressa, ouviu?
mos estar fazendo no mínimo um milhão de nós A culpa é tua, capitão de merdra, se não chegar-
por hora, e êsses nós têm a vantagem de que, uma mos, a culpa é tua. Já devíamos ter chegado, pô!
vez feitos, não se desfazem mais. Bem, é verdade Àssumo o comando! Evitar de virar, fé em Deus e
que temos muito vento no traseiro. e pé na tábua1 Ancorar, virar de vento em pôpa,
virar .de vento-em proa! Icem as velas, arreiem as
PILA velas, leme a barravento, leme a sota-vento, leme
de 18..do .. . Estamos indo bem? Nã o? Então, cortar
É UII} pobre imbecil. a onda pelo meio, e pronto, tudo est ará perfeito.
(Uma rajada faz o nav io adernar.) (Todos se riem, o vento sopra mai s forte. )
158 159
•
Co MA ND AN TE MÃE UBu
f
lhã o e 'ab rir a bu rda ! bre ve r everemos no s-
Af ro ux ar os rizes, de sv iar o co Ah como é bo m sa be r qu esem igo s e nosso . ca stelo
sa do ce Fr an ça , os velho am
de Ma ud rag ão .
PA r UBu
tá esc uta nd o, sen h9 ra PA r UBu
Iss o até .qu e nã o é ma u. Es de sv iar o cu lhã o e
Tr ipu laç ão ? Af rou xa r os risos, os pa ssa nd o pelo caste~
ab rir a bu nd a! É, nã o vai de mo rar ! Es tam
lo de Elsenor.
a on da va rre o co n-
(A lgu ns mo rre m de rir . Um PIL A
vé s.)
em . rev er mi nh a qu e-
Unu Fi co co nte nte só de pe ns ar
PA :r rid a Es pa nh a.
da s ma no br as que or-
Qu e dilúvio! É co ns eq üê nc ia Co TIC A
de na mo s.
mb rar os co mp atr iot as
Eu tam bé m, e va mo s de slu rav ilh os as av en tur as.
1\tl:ÃE UB U
co m a his tór ia de no ssa s ma
Co isa aprazível, a na ve ga çã o! PA r UBu
rco .)
(O utr a on da inv ad e o ba anto a mi m, ser ei no me ad o
Oh ' sem dú vid a!nçQu ris .
me str e da s Fi na as em Pa
PIL A
UBu
do De mô nio e de su as ten-
MÃ E
(E nc ha rca do .) De sco nfi e
taç õe s. Iss o mesmo! Ui, qu e· ho uv e?
PA r UBu Co TICA
bida. de do br ar a po nta de
Se nh or ga rço m, tra ga -n os be Nã o é na da, é qu e ac ab am os
(S en tan do -se pa ra be be r.)
El sen or.
160 161
-- -- ---- -- --
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- ··- - - -
-
•
PILA
PAr UBu
MÃE UBU
PAI UBU
FIM
i
(
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